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Tiradentes

“Hei de armar uma meada tal


que se não há de desembaraçar
em vinte ou cem anos …”

Joaquim José da Silva Xavier, Alferes da 6ª Companhia do


Regimento Regular de Cavalaria de Minas.
Vila Rica. Minas Gerais. 1788.

Francis Albert Cotta


Tiradentes e suas representações
iconográficas
A CONSTRUÇÃO DO HERÓI REPUBLICANO
O suplício e a representação como cristo cívico da Nação Brasileira

Décio Villares Tiradentes. Litografia. 1890.


Museu Histórico Nacional. Rio de Janeiro.
A CONSTRUÇÃO DO HERÓI REPUBLICANO
O suplício e a representação como cristo cívico da Nação Brasileira

“O processo de “heroificação” inclui


necessariamente a transmutação da figura real, a
fim de torná-la arquétipo de valores ou
aspirações coletivas.

Há tentativas de construção de heróis que falham


pela incapacidade da figura real de permitir tal
transformação.”

Pedro Américo de Figueiredo e Melo. Tiradentes Esquartejado.


1983. Museu Mariano Procópio. Juiz de Fora. MG
Tiradentes e suas representações
iconográficas: o Cristo Cívico

Alberto da Veiga Guignard. Execução de Tiradentes. Coleção Juscelino Kubistscheck de Oliveira.


Tiradentes e suas representações
iconográficas: o Cristo Cívico

Rafael Falco. Tiradentes diante do carrasco. Palácio do Congresso Nacional. Brasília.


Tiradentes e suas representações
iconográficas: o Cristo Cívico

21 de Abril de 2015. Praça Tiradentes. Ouro Preto. Minas Gerais


Tiradentes e suas representações
iconográficas: o Militar

Autor: Kaukal.

Em 9 de dezembro de 1965, pela Lei 4.897, Tiradentes foi


José Washt Rodrigues. 1940. Museu Histórico Nacional.
declarado oficialmente o Patrono Cívico da Nação Brasileira
Tiradentes e suas representações
iconográficas: o Alferes de Minas
Tiradentes e suas representações
iconográficas: o Alferes de Minas
Representações sobre Tiradentes

O INÍCIO DO DEBATE: REPUBLICANOS x MONARQUISTAS

A força das ideias republicanas no


Brasil a partir de 1870.

O Congresso Republicano de Itu


ou a Convenção de Itu.

Manifesto assinado por 58 líderes


republicanos em São Paulo.
A Convenção de Itu, de 1873, representada pelo artista ituano Jonas
de Barros (1875-1939)
O INÍCIO DO DEBATE:
REPUBLICANOS x MONARQUISTAS

Um dos signatários, o médico Pedro Bandeira de Gouveia,


publicou em 1872 um livreto em que levantava uma
campanha para erguer no Rio de Janeiro uma estátua ao
“mártir do ideal republicano”.

Joaquim Norberto de Souza Silva, monarquista apaixonado,


alto funcionário do Ministério do Reino e membro do Instituto
Histórico e Geográfico, sentiu-se no dever de combater os
republicanos através da demolidação da figura de Tiradentes.
JOAQUIM NORBERTO E O LIBELO
CONTRA TIRADENTES

SILVA, Joaquim Norberto de Souza. História da Conjuração


Mineira. Rio de Janeiro: Garmier, 1873.
Deturpou alguns depoimentos, transcreveu trechos
isolados de outros, com modificação total do sentido das
palavras, deformou fatos, falsificou episódios.

Tem-se a impressão de que, dada a dificuldade em ler os


manuscritos dos sete volumes dos Autos da Devassa,
teria imaginado que ninguém jamais, em tempo algum,
iria ler aquele processo e , dessa forma, poderia alterar o
que quisesse.
TRADIÇÃO LIVRESCA E REPRODUÇÃO

Durante várias décadas o livro de Joaquim Norberto foi a única fonte


de consulta sobre a Inconfidência Mineira

RIBEIRO, João. História do Brasil. Rio de Janeiro: Livraria São José, 1953.
ALENCAR, Gilberto de. Tal dia é o batizado. Belo Horizonte: Itatiaia, 1959.
PEIXOTO, Afrânio. História do Brasil. São Paulo: Nacional, 1944.
CARVALHO, Ronald de. Pequena história da literatura brasileira. Rio de Janeiro: Briguet, 1922.
CALÓGERAS, J. Pandiá. Formação histórica do Brasil. São Paulo: Nacional, 1957.

CALMOM, Pedro. História da civilização brasileira. São Paulo: Civilização Brasileira.


FRIEIRO, Eduardo. O diabo na livraria do cônego. Belo Horizonte: Itatiaia, 1957.

NECESSIDADE DE IR ÀS FONTES PRIMÁRIAS…


SÃO JOSÉ DEL REI, COMARCA DO RIO DAS MORTES,
NAS MINAS DO OURO E DIAMANTES …

… ONDE TUDO COMEÇOU …


NASCIMENTO DE TIRADENTES

Quarto filho do casal Domingos e Antônia, nasceu


no Sítio do Pombal em 16 de agosto de 1746 e foi
batizado:
“Aos 12 dias do mês de novembro de mil setecentos e
quarenta e seis, na Capela de São Sebastião do Rio Abaixo,
filial desta Paróquia de São João Del Rei, o reverendo Padre
João Gonçalves, capelão da dita capela, batizou e pôs Santos
Óleos a Joaquim, filho legítimo de Domingos da Silva Santos e
Antônia da Encarnação Xavier. Foi padrinho Sebastião da Silva
Leitão e não teve madrinha.
Coadjutor Jerônimo da Fonseca Alves”

Livro de Assentos da Matriz de Nossa Senhora do Pilar de São João Del


Rei. Anos de 1742 a 1746, p. 51.
A FAMÍLIA DE TIRADENTES

O PAI – Domingos da Silva Santos, natural de Portugal


(seus pais residiam em Braga - Portugal).
Exerceu o cargo de Almotacé (fiscalizador de pesos,
medidas e preços de alimentos) na Câmara da Vila de São
José del Rei, Comarca do Rio das Mortes. Minas Gerais.
Dono do Sítio do Pombal.
Proprietário de numerosa escravatura, que empregava na
mineração (a Serra de São José era riquíssima de ouro de
beta de aluviões fartos).

Mineração de diamantes. Guinda. Diamantina.


Minas Gerais.Carlos Julião. Ca 1770s
A FAMÍLIA DE TIRADENTES

A MÃE – Dona Antônia da Encarnação Xavier, nascida em São José Del Rei,
filha do português Domingos Xavier Fernandes e de Dona Maria de Oliveira
e Sá, natural de São Paulo.

O pai de Antônia exerceu o cargo de


Procurador dos Reais Quintos na Vila de
São José Del Rei.
Dona Antônia teve sete filhos.
A FAMÍLIA DE TIRADENTES
ALGUNS IRMÃOS

Padre Antônio da Silva Santos


Ordenado sacerdote em Mariana. Permaneceu por
algum tempo em São João Del Rei, posteriormente foi
nomeado Capelão da Ressaca, no caminho do Rio de
Janeiro, o que logo abandonou para dedicar-se a vida
de lavrador e hospedeiro da Fazenda do Castelo.

Padre Domingos Xavier


Ordenado sacerdote em Mariana. Foi missionário no
Presídio do Cuieté.
Hermann Burmeister. Viagem ao Brasil Através das províncias
Capitão de Auxiliares José da Silva Santos do Rio de Janeiro e Minas Gerais. 1853.
ÓRFÃO E PRIMEIROS OFÍCIOS
Sua mãe faleceu quando tinha 9 anos de
idade. Dois anos após, morreu o seu genitor.
Estudou as primeiras letras com o Padre
Gonçalves Chaves, que o batizou.
O padrinho, Sebastião Leitão, assumiu a sua
guarda e o introduziu no ofício de “tirar e
colocar dentes”, uma vez que era licenciado
em cirurgia.
Sebastião também possuía uma mineração,
Johann Moritz Rugendas. Lavage du mineral_d'or prés
onde Joaquim José aprendeu a conhecer os
de la montagne Itacolomi. Ouro Preto. Centro de minerais e metais preciosos.
Documentação D. João VI. Ca. 1820-1825.
OS BENS DA FAMÍLIA

No inventário realizado após a morte de Antônia, o espólio foi


avaliado em dez contos, quatrocentos e oitenta mil réis:

Sítio do Pombal, com sua casa de morada coberta de telhas e


suas dependências, com Ermida de Nossa Senhora da Ajuda e
suas imagens; terras minerais, de cultura e campos de criar,
além de trinta e cinco escravos, ferramentas e animais.
Joaquim recebeu uma herança no valor de 965$774 réis.
CIRURGIÃO PRÁTICO E
BOTICÁRIO

Joaquim aperfeiçou seus


conhecimentos com cirurgiões e
boticários. Ele possuía uma caixa de
“ferrinhos” e com ela no bolso dava
alívio às dores de dentes ou curava
as feridas com seus emplastros de
ervas ou os diversos males com as
“águas misteriosas” ou drogas
medicinais que ele e seus
conhecidos preparavam.

Jean-Baptiste Debret. Botica. Aquarela. 1823. Museu Castro Maya. Rio de Janeiro.
BOTICA EM VILA RICA

Em Vila Rica, Joaquim possuía,


juntamente com o Padre Francisco
Ferreira da Cunha, uma botica que
mantinham numa casa localizada nas
proximidades da ponte do Rosário. À
época da Inconfidência Mineira e
conseqüente seqüestro encontram neste
local muitos livros de medicina
pertencentes a Joaquim.
Em um de seus depoimentos nos autos da
devassa da Inconfidência Mineira afirmou
ter: “alguma inteligência de curativo”.
CIRURGIÃO-PRÁTICO

A perícia do cirurgião prático Joaquim José seria


atestada, em finais do século XVIII, pelo frade
franciscano do Convento de Santo Antônio do Rio
de Janeiro, Frei Raimundo de Penaforte:

“O Alferes tirava com efeito, dentes, com a


mais sutil ligeireza, e ornava a boca de novos
dentes feitos por ele mesmo, que pareciam
naturais”.
Relação Circuntanciada…
Frei Raimundo de Penaforte
CIRURGIÃO-PRÁTICO

Adquiriu seus conhecimentos por meio de suas


longas viagens pelos sertões mineiros, de sua
prática na arte de extrair dentes e dos diálogos
com seu primo naturalista, Frei Velloso.
Frei José Velloso Xavier
Nasceu em São João del Rei em 1741, formou-se
em Mariana, estudou Botânica e no Convento do
Rio de Janeiro, dedicou-se a pesquisas de campo.
Classificou mais de 2.000 plantas no Vale do
Paraíba do Sul. Publicou a Flora Fluminense.
Organizou o Jardim Botânico.
O TROPEIRO

Por volta dos 20 anos de


idade Joaquim José iniciou
suas atividades de
“Comissário-comercial”, por
conta própria, fazendo
viagens entre as vilas de São
João Del Rei, São José, o Rio
de Janeiro e o Norte de
Minas.

Realizava, com sua pequena tropa de bestas de cargas, a compra e


venda de mercadorias.
PRISÃO DO JOVEM TROPEIRO JOAQUIM JOSÉ EM MINAS NOVAS

A caminho da Bahia Joaquim José parou num


rancho de viajantes em Minas Novas, onde
encontrou um mercador de escravos torturando
DEBRET, J. B. Feitores corrigeant des négres
um dos seus negros.
… 1828. Museu Castro Maya. IPHAN.

Revoltado com a cena, investiu contra o mercador derrubando-o e iniciando


uma luta corporal que terminou com a prisão de ambos. No final do processo
o jovem tropeiro perdeu por furtos e por despesas de custas tabelioas os
animais cargueiros que constituíam seu meio de vida.
Arvoredos de Minas Novas
DE VOLTA PARA VILA RICA

Vista de Ouro Preto.Thomas Ender. Início do século XIX.

Sem produtos para negociar, voltou para Vila Rica, mas como não possuía
recursos partiu para o Rio de Janeiro.
FORMAÇÃO INTELECTUAL E INFLUÊNCIAS

“Do ponto de vista cultural, Joaquim


José da Silva Xavier estava acima da
média de seus contemporâneos, com
o mérito de possuir aguçada e
diversificada curiosidade pelas coisas
do intelecto”.
Prof. Dr. Caio César Boschi. Professor de História da PUC
Minas e de História do Brasil na Universidade do Porto.
O CORTA-VENTO; GRAMATICÃO; O REPÚBLICA

Já nos finais da década de 1770 andava com


livros sobre a Independência norte-americana
(Coleção da Leis Constitutivas dos Estados
Unidos, livro que lhe foi apreendido).

Estava entusiasmado pelo assunto, era


loquaz, procurava convencer as pessoas de
suas idéias, andava apressado, agitado.
O INÍCIO DA CARREIRA MILITAR:
A GUARDA DOS VICE-REIS NO RIO DE JANEIRO

Joaquim “assentou praça”, como Alferes, no Esquadrão


de Cavalaria da Guarda dos Vice-reis, no Rio de
Janeiro.
Seguiu com os reforços para a Ilha de Santa Catarina,
no sul, e tomou parte nas lutas contra o invasor
Ceballos.
Serviu ao lado dos mineiros: José da Silva Brandão e
Francisco de Paula Freire de Andrade, futuro
comandante do Regimento de Cavalaria de Minas.

Carlos Julião. Oficiais da Companhia de Cavalaria da


Guarda dos Vice-reis (Rio de Janeiro). Século XVIII.
REGIMENTO REGULAR DE CAVALARIA DE MINAS
1775

Antecedência dos oficiais do Regimento de Cavalaria de Minas. Século XVIII

Antigos Dragões das Minas


Regimento de Cavalaria Auxiliar das Minas

Guarda dos vice-reis

Ofícios diversos nas Minas

Regimento de Infantaria de Campo Maior

Proprietário de terras nas Minas

Em d ez embro de 17 7 5, Joa quim Jo sé


n :A u i ra a ri v l
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Alferes, na sexta companhia do Regimento Regular de Cavalaria de Minas Gerais.


Posto/ Nome ESTADO-MAIOR Quando assentou praça
Tenente Coronel Francisco de Paula Freire de Andrada 1º de Julho de 1775
Oficiais do Regimento de Cavalaria das Minas Sargento Mor Pedro Afonso Galvão de São Martinho 1º de Julho de 1775
Quartel Mestre Antônio Dias de Macedo 1º de Julho de 1775
1775 Capelão Mor Manuel Gonçalves Solano 1º de Julho de 1775
Cirurgião Mor José Pereira dos Santos 15 de Outubro de 1775
1ª COMPANHIA
Primeiro-tenente Jerônimo José Machado 1º de Julho de 1775
Segundo-tenente Maximiliano de Oliveira Leite 1º de Julho de 1775
Alferes Roberto de Mascarenhas Lobo 1º de Julho de 1775
2ª COMPANHIA
Primeiro-tenente José Luiz Saião 1º de Julho de 1775
Segundo-tenente Antônio Agostinho Lobo Leite 1º de Julho de 1775
Alferes José Antônio de Melo 1º de Julho de 1775
3ª COMPANHIA
Capitão Francisco Antônio Rebelo 1º de Julho de 1775
Tenente Bernardo Teixeira Alves 1º de julho de 1775
Alferes Felipe José da Cunha 1º de Julho de 1775
4ª COMPANHIA
Capitão Luiz Antônio Saião 1º de Julho de 1775
Tenente José de Souza Lobo 1º de Julho de 1775
Alferes Tomás Joaquim de Almeida Trant 1º de Julho de 1775
5ª COMPANHIA
Capitão Manoel da Silva Brandão 1º de Julho de 1775
Tenente Antônio da Silva Brandão 1º de Julho de 1775
Alferes José da Silva Brandão 1º de Julho de 1775
6ª COMPANHIA
Capitão Baltazar João Mayrink 1º de Dezembro de 1775
Tenente João Gonçalves de Castro 1º de Dezembro de 1775
Alferes Joaquim José da Silva Xavier 1º de Dezembro de 1775
7ª COMPANHIA
Capitão José de Vasconcelos Parada e Souza 1º de Dezembro de 1775
Tenente Carlos Caetano Monteiro 1º de Dezembro de 1775
Alferes Simão da Silva Pereira 1º de Dezembro de 1775
8ª COMPANHIA
Capitão Francisco Antônio de Oliveira Lopes 1º de Janeiro de 1776
Arquivo Histórico Ultramarino. Lisboa Tenente João de Magalhães 12 de Janeiro de 1776
Alferes José da Silva Brum e Ataíde 1º de Janeiro de 1776

Fonte: CARTA de dom Antônio de Noronha. Vila Rica, 13/1/1776. APM. SC. 211. fls. 86-86v.
A PERSPECTIVA MILITAR: DEFESA DO RIO DE JANEIRO

A partir de 1777, o Alferes Xavier,


juntamente com o Tenente-Coronel
Francisco de Paula Freire de Andrade,
o Capitão Francisco Antônio de Oliveira
Lopes, o Alferes Simão da Silva Pereira
e outros oficiais e praças do Regimento
de Cavalaria de Minas, permanecem
em Copacabana, no Rio de Janeiro
(ficarão até 1779). O objetivo: defesa
Rio de Janeiro. J. M. Rugendas. Malerische reise in Brasilien. Paris. 1835.
da sede do Vice-reinado e do sul
contra invasões dos espanhóis.
O Regimento de Gendarmes

Pinturas do Quartel do Regimento Regular da Cavalaria de Minas Gerais. Construído em 1779.


Hotel Dom Bosco. Cachoeira do Campo. Minas Gerais. 2008.
O Regimento de Gendarmes

O alemão Wilhelm Ludwig Von Eschwege,


coronel do Corpo de Engenheiros do Exército
Real Português, afirmou:
O brasileiro tem um talento natural para
aprender os exercícios militares e dar-se um
ar militar, especialmente na cavalaria (...) O
Regimento de Cavalaria de Linha de Minas
Gerais, por exemplo, que na verdade só
cumpre a função de gendarmes e nunca se
exercitava em manobras, já fazia três meses Quartel do Regimento Regular da Cavalaria de Minas
após a nova organização, (mas) realizava suas Gerais. Construído em 1779. Hotel Dom Bosco.
Cachoeira do Campo. Minas Gerais.
manobras com tal precisão que nada deixava
a desejar.
COMANDANTE DO CAMINHO
PARA O SERTÃO

Em 178O, o Alferes Xavier


recebeu a missão de comandar
o Registro de Sete Lagoas, uma
das entradas para o Sertão do
Norte de Minas Gerais.

Entrada para o Sertão do Rio São Francisco. Von Martius, K.E.P. Vogél… In: SPIX, J. B. Reise in brasilien. Séc. XIX
A MANUTENÇÃO DOS CAMINHOS:
UMA QUESTÃO DE POLÍCIA

As boas condições de
tráfego eram essenciais ao
eficiente abastecimento das
vilas e dos arraiais e, em
consequencia, ao
SOSSEGO DOS POVOS
que podiam se levantar
caso houvesse fome ou
carestia. Caminhos de São Paulo e Rio de Janeiro para Minas. Século XVIII. Arquivo Público
Mineiro.
A CONSTRUÇÃO DO CAMINHO DO MENESES

Em 1781, o Governador de Minas Gerais, Dom


Rodrigo José de Meneses, determinou a
construção de um caminho que cortasse a
Capitania de Minas para leste atravessando o
sertão e fosse dar no Registro do Paraibuna,
depois de passar pelos vales dos rios Peixe e
Preto.
Para tanto foram designados: o Tenente-
Coronel de Auxiliares Manoel do Vale Amado,
residente na região e o Alferes Xavier.
Registro do Paraibuna. Primeiro posto fiscal, onde também estavam barcas prontas para passarem os viandantes e suas carregações do negócio, que conduziam do
Rio de Janeiro para Minas Gerais
A CONSTRUÇÃO DO CAMINHO DO MENESES

O Ten.-Cel de auxilares Manoel do Vale Amado


não cumpriu a sua parte, retirou os seus
homens e deixou o Alferes Xavier sozinho na
empreitada.
Apareceram na região dois mineradores, que
se achavam à procura de um ribeirão onde
minerar: traziam 12 escravos.
O Alferes Xavier negociou com os
mineradores oferecendo-lhes o pagamento de
150 réis ao dia pelo serviço a ser realizado
por cada escravo na abertura da estrada.
A CONSTRUÇÃO DO CAMINHO DO MENESES
Segundo os relatos o serviço era duro:

Derrubada de árvores, limpeza e,


com enxadas, preparo do terreno. À
frente dos negros ia o Alferes Xavier a
cortar o mato para indicar o rumo a
seguir.
A CONSTRUÇÃO DO CAMINHO DO MENESES

O trabalho era realizado no meio de


nuvens de mosquitos e das terríveis
mutucas.

Após concluídos os trabalhos


(1783), o Alferes Xavier estabeleceu
o Quartel e o um local para
ancoragem das canoas, que
denominou Porto do Meneses.
O CAMINHO DO MENESES:
Exploração de lavras

Ao verificar as riquezas minerais de rios e córregos da


região, solicitou o direito de explorar 80 datas minerais.
Recebeu autorização para explorar 43 lavras.
Até ser preso durante a devassa da Inconfidência Mineira
em 1789, explorava aquelas terras.
Com os lucros obtidos nessa mineração pôde emprestar ao
Cadete José Pereira de Almeida Beltrão 200 mil-réis
(correspondia ao valor de 30 vacas leiteiras ou ao de uma
fazenda de médio porte na região dos sertões), e a Luís
Pereira de Queirós, a quantia de 220 mil-réis, encontrados
no seqüestro de seus bens.
PORTO DO MENESES:
Sítio Rocinha da Negra

A devassa instaurada com a Inconfidência Mineira


descobriu, quase um mês após o seqüestro dos bens,
que o Alferes Xavier era dono de um sítio de
aproximadamente 50 quilômetros quadrados na Rocinha
da Negra, no Porto do Meneses.

André Figueiredo Rodrigues. O Clero e a Conjuração


Mineira. São Paulo: USP, 2002.
A PRISÃO DE MONTANHA E SEU BANDO

O Alferes Xavier permaneceu a Comandar o Caminho Novo por


cinco anos. De acordo com a análise da historiadora e
professora titular da UFMG, Dra Carla Anastasia, o Alferes
Xavier “era um homem metódico e dotado de uma lógica
excepcional”.
Em abril de 1783, o Alferes escreve uma carta ao governador,
onde relata as ações desenvolvidas por ele e seus homens
para prender os bandidos salteadores que infestavam a Serra
da Mantiqueira. Esperava que com o anúncio das prisões
trouxesse “o sossego, principalmente aos negociantes
interessados no comércio com as Minas”.
Arquivo Público Mineiro. Seção Colonial. Códice 236.
LEVANTAMENTOS E COLETAS DE DADOS

Por ser possuidor de vasto


conhecimento sobre a região, o Alferes
Xavier acompanhou o Governador Dom
Rodrigo nas expedições que realizou ao
Itamarandiba e ao Cuieté.
Realizou, por determinação do
Governador, o levantamento dos
moradores da Mantiqueira e das
cabeceiras do Rio Preto, até a sua foz no
Paraibuna.
DILIGÊNCIAS NOS SERTÕES FECHADOS

Em 16 de abril de 1784, o Governador das


Minas, Luís da Cunha Meneses, determina ao
Sargento-Mor Pedro Afonso Galvão de São
Martinho – Sub Comandante do Regimento
de Cavalaria de Minas - chefiar uma
expedição para “Levantar plantas do terreno,
tirar configurações cosmográficas e
geográficas das terras situadas a leste da
Capitania, nos vales dos rios Paraíba e
Pomba.”
Johan Moriz Rugendas. Passagem pelo Rio Paraibuna.
Biblioteca Nacional do Rio de Janeiro.
Inteligência Mineralógica
O Sargento-Mor solicitou que em sua companhia fosse o
Alferes Xavier, que se encontrava em uma “ronda no
mato”, isto é, percorrendo as partes da Capitania onde era
proibida a entrada de aventureiros ou novos moradores, a
fim de se impedir a extração clandestina de ouro e
diamante.
Da expedição participaram o Coronel de Auxiliares Manuel
Rodrigues da Costa, o Sargento-Mor Pedro Afonso e o
Alferes Joaquim José da Silva Xavier, como “perito, por ser
conhecidamente dotado de inteligência mineralógica”

Arquivo Público Mineiro. Seção Colonial. Códice 224.


A PRISÃO DE MÃO DE LUVA E SEU BANDO

A Estratégia: o “Sistema de engano”.


Para o arraial do Mão de Luva foram enviados um cabo-de-
esquadra, um soldado e oito negros (soldados pedestres),
carregados de toucinho e caçacha. À noite, entraria a tropa.

O Governador de Minas autorizou a infiltração de soldados na


extração proibida. Acreditava que somente soldados pedestres
e homens do mato poderiam derrotar o bando do Mão de Luva
“pela facilidade que penetravam nos sertões mais agrestes e
sua subsistência não depender de tão pesada bagagem”.
Arquivo Histórico Ultramarino. Minas Gerais. Caixa 125. Doc.64.
Sistema de abastecimento de água do Rio
de Janeiro: uma atividade de polícia

No Rio de Janeiro, os moradores


lutavam com a falta d’água. Depois
de percorrer os arredores, Em
1787, o Alferes Xavier traçou um
projeto devidamente instruído com
plantas e cálculos, entregando-o ao
Vice-Rei Luís de Vasconcelos, que o
remeteu à Lisboa para decisão
régia. ENDER, T. Ein thein von Rio de Janeiro… 1828.

Os rios Andaraí e Maracanã podiam ser canalizados e trazidos até o centro da


cidade.
Construção de Armazéns Públicos no Rio

J. M. Rugendas. Malerische Reise in Brasilien… 1835. Biblioteca Baden-Wüttemberg. Stuttgart.

O Alferes Xavier propôs ao Vice-rei a construção de armazéns, onde se


guardaria as mercadorias, que desembarcadas, ficavam nas praias sujeitas ao
sol e à chuva, além dos furtos que sofriam.
Prof. Dr. Kenneth Maxwell. Universidade de Harvad e autor de A devassa da Devassa. A
inconfidência Mineira: Brasil e Portuga, 1750-1808. São Paulo: Paz e Terra, 1977.
Moinhos públicos no Rio de Janeiro

Diante da exploração que muitos proprietários de moinhos


faziam com abusos de preços na moagem e fraude nas
trocas com os moradores que não dispunham de seus
próprios engenhos, o Alferes Xavier elaborou um Plano e
o encaminhou à Câmara do Rio de Janeiro sugerindo a
construção de engenhos aproveitando os desníveis dos
córregos Caboclas, Laranjeiras, Andaraí, Maracanã e
Trapiceiro, a fim de facilitar ao povo os seus alimentos.
A VIDA AFETIVA DO
ALFERES XAVIER

Partida de Militar para o Sul do Brasil. Carlos Julião. Biblioteca Nacional. RJ.
A VIDA AFETIVA DO ALFERES TIRADENTES

O Alferes Xavier morreu solteiro, mas deixou descendência: uma


filha de nome Joaquina, de sua união com Antônia Maria do Espírito
Santo, que vivia em companhia de sua mãe, Maria Josefa da Silva,
em Vila Rica. O relacionamento teria ocorrido entre maio de 1786 e
fevereiro de 1787.

O Alferes assumiu a paternidade, prometendo se casar com Antônia, revelou tal intento ao
Soldado Ventura Mendes Barreto.
Batizou a filha em 31 de agosto de 1786 na Igreja Matriz de Vila Rica, convidou para ser
padrinho um dos comerciantes mais ricos da Capitania, Domingos de Abreu Vieira
(companheiro no movimento conspiratório).
O Alferes construiu uma casa na rua da Ponte Seca para sua filha, além de dar-lhe uma
escrava, Maria, da “nação Angola”.
O MOTIVO DA SEPARAÇÃO

O Capitão do Regimento de Cavalaria, Luís Antônio


Velasco Sayão, afirmou em depoimento que
conversando ele no quartel do Regimento com o
Alferes Xavier comunicou que Antônia “não procedia
bem, e por isso estava mal com ela”

Nesta época, O Alferes Xavier viajava muito e passava a maior parte do


tempo no Rio de Janeiro. Num dos regressos, desgostou-se com o
comportamento de Antônia e rompeu a promessa de casamento
PAPEL DO ALFERES JOAQUIM JOSÉ DA SILVA
XAVIER NA INCONFIDÊNCIA MINEIRA

Coube ao Alferes Xavier a condução da primeira reunião oficial dos


conspiradores realizada na casa do Ten.-Cel. Francisco de Paula Freire
de Andrada, em 26 de dezembro de 1789, expondo os planos e os
projetos da sublevação.
PAPEL DO ALFERES NA
INCONFIDÊNCIA MINEIRA

“O Alferes Joaquim José da Silva Xavier era o principal motor da


projetada sublevação, o que mostrava maior empenho e eficácia na
execução dela, e o que amotinava o povo e pretendia corromper a Tropa,
já com enganosas esperanças adequadas aos interesses de cada um e do
público, que se portava com um ardil muito proporcionado ao objeto de
suas diligências e superior aos talentos que se lhe reconheciam”.
Carta do Visconde de Barbacena, Governador de Minas Gerais
a Martinho de Melo e Castro, Ministro da Marinha e Ultramar.
Vila Rica, 11 de junho de 1789.
Autos da Devassa . Vol.8, p. 192/193.
PAPEL DO ALFERES NA
INCONFIDÊNCIA MINEIRA

Relatório do desembargador José Pedro Machado Coelho Torres, juiz


que presidiu a Devassa no Rio de Janeiro, dirigido ao Vice-rei:

“Inclusa verá V. Exa a lista dos réus principais. O Alferes da Tropa


de Minas, Joaquim José da Silva Xavier, foi quem espalhou a
sediciosa proposição de que podiam as Minas ficar independentes,
livres da sujeição real e uma república, porque tinham em si todas
as produções.
Rio de Janeiro, 11 de dezembro de 1789.”
PAPEL DO ALFERES XAVIER NA INCONFIDÊNCIA MINEIRA

Relatório do escrivão da Devassa em Minas, Ouvidor José


Caetano César Manitti, apresentado ao Governador das Minas
Visconde de Barbacena:

“Não se admite a menor cosntestação, segundo o que se deduz de todo o


processo e seus apensos, que o Alferes Joaquim José da Silva Xavier, por
alcunha Tiradentes, era um dos mais empenhados e atrevidos em
promover à intentada sublevação, para cujo fim agenciava o maior séquito
possível, persuadindo e exagerando a una a beleza, comodidade e riquezas
deste país, que poderia ser independente; a outros, o abatimento e
indigência em que jaziam, entretanto, que estavam presenciando saírem
todos os anos para a Europa os tesouros da América, excitando o povo…

Vila Rica, 10 de fevereiro de 1790.”


Sentença proferida contra os réus do levante e
conjuração de Minas Gerais, 1792. Arquivo Nacional.
REABILITAÇÃO HISTÓRICA DO ALFERES XAVIER
REABILITAÇÃO HISTÓRICA DO ALFERES XAVIER

Discurso proferido pelo Presidente de Portugal,


Dr. Mário Soares no dia 7 de setembro de 1994.

“Joaquim José da Silva Xavier foi um maçon convicto e


desinteressado. O Tiradentes é hoje para todo o Brasil uma figura
mítica, um herói, um mártir e uma referência tutelar. É pois,
essencial que Portugal o assuma como um herói igualmente seu,
num sincero ato de contrição e de reabilitação histórica. É certo que
a História não se apaga nem se reescreve. Assume-se, como um
todo, nas suas claridades e sombra, nas suas gestas heróicas e nos
seus baixios e até crimes, nas suas grandezas e misérias.”
O ENIGMA TIRADENTES …

“Hei de armar uma meada tal


que se não há de desembaraçar
em vinte ou cem anos …”
Para saber mais …

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