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A ocupação dos “espaços vazios”

no governo Vargas:
do “Discurso do rio Amazonas” à saga
dos soldados da borracha
María Verónica Secr eto

A redenção do sertão e a revalorização da Amazônia


são capítulos essenciais do programa traçado pelo governo para dar
ao Brasil a prosperidade e a cultura que merece.
(Discurso pronunciado no estádio do Vasco da Gama, por ocasião das
comemorações do Dia do Trabalhador, em 1º de maio de 1941).

Por lo demás, acumular espacio no es lo contrario de acumular tiempo:


es uno de los modos de realizar esa para nosotros única operación.
Los ingleses que por impulsión ocasional o genial del escribiente Clive
o de Warren Hasting conquistaron la India, no acumularon espacio,

Nota: María Verónica Secreto é professora do CPDA/UFRRJ.

Estudos Históricos, Rio de Janeiro, nº 40, julho-dezembro de 2007, p. 115-135.

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estudos históricos l 2007 – 40

sino tiempo: es decir, experiencias, experiencias de noches,


días, descampados, montes, ciudades, astucias, heroísmos,
traiciones, dolores, destinos, muertes, pestes, fieras,
felicidades, muertes, cosmologonías, dialectos, dioses, veneraciones.
(Jorge Luis Borges, La penúltima versión de la realidad)

Introdução

Sempre que pensamos no que foi chamado de “era Vargas” vêm a nossa
memória imagens urbanas, de trabalhadores industriais, de operários da cons-
trução civil. Parece que o Brasil deixou de ser agrário em 1930. É verdade que o
processo de industrialização se aprofundou e o de urbanização se acelerou de for-
ma inédita, mas muitas pessoas continuaram a trabalhar e morar no campo. O
que aconteceu com essas pessoas? Todas migraram para os centros urbanos? Evi-
dentemente, não.
O governo Vargas tinha planos para os habitantes do campo. O princi-
pal: que eles ficassem onde estavam. Os trabalhadores rurais seriam mantidos no
seu “habitat” e as leis trabalhistas não os atingiriam senão num futuro que não
podia ser determinado.
Considerou-se que existia um “fluxo natural” das correntes de povoa-
mento que devia ter o sentido litoral-sertão. O contrário – a migração dos serta-
nejos para o litoral – era considerado no discurso e nas políticas oficiais um “erro
histórico”. Para fixar o trabalhador rural nos sertões de Goiás e Mato Grosso, o
governo Vargas concebeu um amplo plano chamado de “Marcha para Oeste”.
Mas a idéia de marchar para o interior logo se estendeu à região amazônica, que
também ingressou no “imaginário oficial” entre os territórios internos a serem
ocupados pelos homens do sertão, preferencialmente pelos nordestinos.
Este artigo tem por objetivo descrever e analisar o processo que se esten-
de desde o momento em que é anunciada a política de colonização da Amazônia,
dentro das políticas de ocupação dos “espaços vazios” do governo Vargas, até a
mudança desta política, quando depois dos Acordos de Washington, no contexto
da Segunda Guerra Mundial, o Brasil se compromete a produzir mais borracha
para os aliados, abandonando as intenções “colonizadoras” e adotando uma prá-
tica de encaminhamento de trabalhadores sem suas famílias. Essa mudança de
atitude será observada através do discurso oficial e da propaganda de recruta-
mento de trabalhadores, conhecidos como soldados da borracha, para a Amazô-
nia. Finalizamos com uma breve análise sobre a apropriação que os trabalhado-
res e suas mulheres fizeram do discurso oficial quando tiveram que reclamar do
abandono do Estado.

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A ocupação dos “espaços vazios” no governo Vargas

Ocupação dos “espaços vazios”

Para alguns historiadores, a Revolução de 1930 significou o rompimen-


to com o ordenamento agrário-conservador (Linhares e Teixeira, 1999). O suces-
so do modelo econômico e de desenvolvimento, por meio da substituição de im-
portações, dependia do alargamento do mercado interno. Este garantiria o de-
senvolvimento econômico e permitiria romper com a dependência das flutua-
ções do mercado internacional, condenando-se assim o predomínio da política
agrário-exportadora. Para o sucesso desse plano, seria necessária a intervenção
do Estado em matéria de infra-estrutura viária e mercado de trabalho, além – e o
mais importante para os nossos objetivos – do incentivo à mobilidade da frontei-
ra, incorporando amplos “espaços vazios”, e da reunião dos diversos núcleos de-
mográficos isolados. Para tal fim, a ideologia da fronteira, ou bandeirantismo,
teve um papel fundamental.
O campo deveria atender às necessidades que a nova regulação econômi-
ca exigia. Planejou-se a consolidação de uma ampla base urbana e fabril. A partir
das cidades, se conquistaria o campo. O litoral marcharia para o sertão. Os histo-
riadores Maria Yedda Linhares e Francisco Carlos Teixeira da Silva referem-se a
uma incorporação imaginária do trabalhador rural. A opção por este tipo de incor-
poração deveu-se à impossibilidade de incorporá-lo nos mesmos moldes do tra-
balhador urbano. Essa impossibilidade esteve marcada por implicações políti-
cas, o que significaria abrir uma dupla frente: organizar o trabalho fabril e liber-
tar o trabalhador rural do “plantacionismo”.
Essa incorporação imaginária mobilizou grande número de intelectuais e
artistas populares. Sambas, poesias, romances, ensaios, pinturas foram produzi-
dos durante o período, retratando o homem do campo, o retirante, o lavrador.
Entre os vários intelectuais e artistas que contribuíram para esta construção sim-
bólica destacamos Cassiano Ricardo, por seu forte vínculo com Vargas e com o
Estado Novo (1937-1945), além de pela abrangência e pela influência de seu ensaio
Marcha para Oeste (A influência da bandeira na formação social e política do Brasil).
A obra de Cassiano Ricardo estabelece continuidade, e com esta, legiti-
midade, entre o bandeirismo dos séculos XVII e XVIII, as penetrações no planalto
paulista no século XIX e o projeto estadonovista de colonização denominado
“Marcha para o Oeste”. O Marcha para Oeste de Ricardo inscreve-se no programa
homônimo elaborado pelo Estado Novo. No último ponto do livro, sugestiva-
mente intitulado “O verdadeiro sentido da brasilidade está na marcha para Oes-
te”, Ricardo afirma que

o novo regime tem parentesco muito próximo com o


que o grupo social histórico da conquista nos havia indicado, embora

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em caráter rudimentar. O governo forte não é uma novidade para o nos-


so país, pois nasceu com a bandeira. (...) retomando o fio histórico da ci-
vilização brasileira, a Constituição de 10 de novembro reata, finalmente,
o espírito bandeirante interrompido no século XIX e tão deturpado pela
dialética do litoral. (Ricardo, 1979: 648)

Salientamos desta citação de Cassiano Ricardo o seu caráter “americanis-


ta”, vinculado a um pensamento que podemos chamar de “profundamente ameri-
cano”. Com efeito, ele foi definido como “um Turner autoritário” (Velho, 1979),
em uma clara associação do seu pensamento com a obra do historiador americano
F. J. Turner, autor de The frontier in American history (Turner, 2004 [1893]). Sinteti-
camente, esse pensamento “profundamente americano” define a formação das na-
ções americanas com o Leste voltado para a Europa e o Oeste verdadeiramente
americano – ou brasileiro, na versão de Ricardo (Secreto, 2006).
A originalidade de Ricardo consiste em ter elaborado o conceito de ban-
deirismo com tal plasticidade que permite ser adaptado ao longo da história. Po-
demos citar como exemplo dois capítulos: “O neobandeirismo do século XIX” e
“As bandeiras do século XX”. Nestes casos, o bandeirismo é transformado, ana-
cronicamente, num conceito com o qual se pode interpretar toda a história do
Brasil.

“Viu a terra, ouviu o homem. E compreendeu os anseios de todos”

Pensamos Cassiano Ricardo como um dos ideólogos da “Marcha para o


Oeste”, mas ele não esteve sozinho na grande empresa estadonovista de criação
de consenso em torno da idéia de conquista do espaço interior, de criação da uni-
dade nacional por meio da integração territorial. Na revista Cultura Política – Re-
vista Mensal de Estudos Brasileiros, circulavam algumas das idéias e dos slogans
que o Estado Novo se encarregou de criar e recriar sobre o “Novo Brasil” (Vello-
so, 1982). O DIP (Departamento de Imprensa e Propaganda) foi o encarregado da
produção e da difusão desse discurso. A rev ista era somente um – embora quali-
tativamente diferenciado – de seus instrumentos. Entre as idéias veiculadas na
revista Cultura Política, encontramos a da “Marcha para o Oeste”, que contou
com um grupo heterogêneo de colaboradores: Péricles Melo Carvalho, Nelson
Werneck Sodré, Ademar Vidal, Herberto Sales etc.
Segundo Mônica Pimenta Velloso, à alta concentração de poder político
durante o Estado Novo correspondeu uma igual concentração de poder simbóli-
co. À elite intelectual correspondia a produção das representações que confor-
mavam o discurso estadonovista. Aos intelectuais menores cabia a reprodução e

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A ocupação dos “espaços vazios” no governo Vargas

a difusão das idéias geradas por essa elite. Em Cultura Política escrevia esta últi-
ma, composta por um seleto grupo de intelectuais divididos em dois grupos: a
nata do Estado Novo e um conjunto heterogêneo de figuras que cobriam um am-
plo leque ideológico, que ia de Gilberto Freyre a Graciliano Ramos.
Em 1941 Péricles Melo Carvalho (1941: 15-18), diretor de seção do De-
partamento Nacional de Imigração (DNI), dizia:

Quem examinar o panorama que nosso país oferece no


momento (…) vê, com pesar, que durante longos anos se processou no
país o inverso do objetivo colonizador, na marcha lenta e assustadora da
população rural para as cidades litorâneas do leste (grifo nosso).

Carvalho explicava esse movimento da população reconhecendo que os


trabalhadores rurais estavam privados do “progresso dos operários das cidades
do litoral”. A legislação social, continuava ele, só poderia ter começado nos cen-
tros urbanos, para avançar nas esferas rurais em um momento posterior. Por isso,
em seu balanço da legislação social, considerava que ela foi “prejudicial” aos efei-
tos da “Marcha para o Oeste”, concorrendo, pelo contrário, para a drenagem de
trabalhadores rurais para as cidades do litoral em busca da proteção de que goza-
vam os operários urbanos. Tudo isso teria contribuído, segundo Carvalho, para o
desequilíbrio da balança entre o urbanismo e o ruralismo. Nas cidades, os traba-
lhadores desfrutavam de ensino gratuito, garantia de assistência policial e segu-
rança da propriedade, cooperativismo político, econômico e sindical, assistência
social com a proteção da família, das mulheres e dos menores etc. Mas no presen-
te, afirmava, o Brasil voltava-se para o interior, buscando conquistar-se.
Carvalho salientava a importância do DNI na tarefa de encaminhar os
trabalhadores rurais para lugares onde a sua falta se fazia sentir “no seu respecti-
vo habitat”. Com o movimento de internalização dos trabalhadores, buscava-se
afastar as tensões sociais no campo. Carvalho salientava que no ano anterior,
1940, o DNI tinha encaminhado oito mil trabalhadores nordestinos para os se-
ringais do Alto Amazonas e do território do Acre. Lembremos que isto aconte-
ceu antes dos acordos de Washington, selados em 1942. Estes acordos, na con-
juntura da Segunda Guerra Mundial, modificariam os planos do governo Vargas
a respeito do povoamento e ocupação da Amazônia. O programa original de “se-
dentarização” dos habitantes da região amazônica deu lugar ao já conhecido mo-
delo de exploração extrativa tradicional e ao “nomadismo”. Apesar disso, quan-
do do recrutamento dos “soldados” para a Amazônia, criou-se a ilusão de que se
tratava de um programa geral de colonização de um território “vazio” com ga-

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rantias e proteção do Estado, e não de providenciar mão-de-obra barata para a


elite agrária amazônica (Guillen, 2002: 69-82).
Carvalho dizia que, com a “Marcha para o Oeste”, era a primeira vez que
um governo no Brasil dirigia a conquista do interior do país. A “Marcha” e o seu
complemento de ocupação da região amazônica tinham como objetivo a coloni-
zação, a fixação da família sertaneja nos territórios interiores. Num discurso pro-
nunciado em Belém, em 1933, Vargas afirmava que o desafio maior para a Ama-
zônia era transformar a exploração nômade em sedentária, e para isso era neces-
sário povoá-la, colonizá-la, fixar o homem à terra.
Em Manaus, em 1940, em outro pronunciamento, que ficaria conhecido
como “Discurso do rio Amazonas” (Vargas, 1938-1947), Vargas disse aos amazo-
nenses reunidos no Ideal Club daquela cidade que, sem demora, eles seriam in-
corporados ao corpo da nação, sendo necessário adensar o povoamento, incremen-
tar o rendimento agrícola, aparelhar os transportes. Até o momento, segundo
Vargas, o caluniado clima amazônico tinha impedido que partissem contingen-
tes humanos de outras regiões com excesso demográfico. Somente o nordestino,
com o seu “instinto de pioneiro”, teria se embrenhado pela floresta, abrindo tri-
lhas de penetração e talhando a seringueira silvestre. Mas essa, segundo ele, ti-
nha sido uma etapa que era desejável superar – embora dois anos depois se vol-
tasse a clamar por esse “pioneirismo”. Era tempo, segundo palavras do presiden-
te, de cuidar do povoamento amazônico em caráter permanente:

O nomadismo do seringueiro e a instabilidade econô-


mica dos povoados ribeirinhos devem dar lugar a núcleos de cultura
agrária, onde o colono nacional, recebendo gratuitamente a terra des-
bravada, saneada e loteada, se fixe e estabeleça a família com saúde e con-
forto.
Nada nos deterá nesta arrancada, que é, no século XX, a
mais alta tarefa do homem civilizado: conquistar e dominar os vales das
grandes torrentes equatoriais, transformando sua força cega e sua fertili-
dade extraordinária em energia disciplinada. A Amazônia, sob o impul-
so fecundo da nossa vontade e do nosso trabalho, deixará de ser, afinal,
um simples capítulo da história da Terra, e, equiparado aos outros gran-
des rios, tornar-se-á um capítulo da história da civilização. (Vargas,
1938-1947, vol. 10)

Dias depois de ter estado em Manaus e pronunciado estas palavras, Ge-


túlio Vargas estava diante de outro auditório, o de trabalhadores cearenses, na ci-
dade de Fortaleza. “Venho da região amazônica, do extremo norte do país.

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A ocupação dos “espaços vazios” no governo Vargas

Enquanto percorria o prodigioso vale, a cada momento, lembrava-me de vós”


(Vargas, 1938-1947, vol. 10). A seca teria dado aos cearenses um destino, o de ocu-
par a bacia amazônica. Graças ao pioneirismo deles, dizia Vargas, foram até os
confins do Brasil, reivindicando para a pátria e incorporando à soberania nacio-
nal o território do Acre, cerca de duzentos mil quilômetros quadrados.
O “Discurso do rio Amazonas” foi “inflacionado” pelo DIP e transfor-
mado em marco da marcha para a Amazônia. Após um ano de seu pronuncia-
mento, realizou-se no Palácio Tiradentes uma sessão comemorativa, na qual vá-
rias autoridades referiram-se ao discurso: o diretor-geral do DIP, o presidente da
Comissão de Eficiência do Ministério de Viação, o ministro Bernardino de Sou-
sa, o interventor paraense José Malcher, o prefeito de Belém, Abelardo Conduru,
o ex-governador do Acre, Hugo Carneiro etc. Dois anos depois, quando o presi-
dente Vargas fez 60 anos, a revista Cultura Política editou uma coletânea de arti-
gos selecionados entre os primeiros 25 números. A coletânea foi intitulada O
pensamento político do presidente e reuniu quatro textos sobre o “Discurso do rio
Amazonas” que tinham sido produzidos para a solenidade do primeiro aniversá-
rio. Também no aniversário do ano do discurso, a revista fez um inquérito entre
intelectuais da região amazônica, cujas respostas foram publicadas no número 9,
de 1941. Todos os depoimentos foram sumamente elogiosos, destacando a pene-
tração sociológica das palavras do presidente. Francisco Pereira da Silva, consul-
tor jurídico do Instituto dos Marítimos, expressou que “desde aquele momento,
estava iniciada a ‘Marcha da Amazônia’! O Presidente, depois de reunir todos os
dados estatísticos e econômicos sobre a planície verde, foi vê-la… Viu a terra, ou-
viu o homem. E compreendeu os anseios de todos”.1
Inflacionado ou não, o “Discurso do rio Amazonas” foi uma “carta de
intenções” que não seria cumprida. A Segunda Guerra Mundial e os compromis-
sos internacionais assumidos pelo Brasil demandavam extrativismo. No biênio
1942-1943 se fazia urgente obter borracha para fornecer aos aliados. Assim, em
junho de 1943, declarado o mês da borracha, Vargas explicava a urgência:

Hoje, o problema se apresenta incomparavelmente


mais grave. Não mais se trata de uma industrialização para as nossas ne-
cessidades pacíficas, mas de produzir para o consumo gigantesco de uma
Guerra Mundial. É o problema de nossos aliados, aos que devemos for-
necer a borracha sobre a qual rodarão as armas vitoriosas da liberdade.

A idéia de povoamento, de famílias sendo encaminhadas para a região


amazônica, foi substituída pela de recrutamento de trabalhadores, homens, a se-
rem trasladados em caráter de urgência para os seringais.

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Em um discurso que atribuía ao sertanejo imensa cota de abnegação, o


próprio Getúlio Vargas fez suas as palavras de Euclides da Cunha: “À sua miséria
devemos um pouco de nossa opulência relativa, às suas desgraças, a maior parte
de nossa glória. E esta dívida tem mais de 400 anos” (Vargas, 1938-1947, vol. 2).
Em meio a esse discurso, esperava-se ainda do sertanejo mais três sacrifícios: que
se dirigisse às fronteiras do Oeste e da Amazônia, que aguardasse pela chegada da
legislação social, e que não fosse, de modo algum, em busca das cidades. Com
isto, dizia-se estar reparando um erro histórico, o das migrações acontecidas no
sentido inverso ao “natural”, e retomando o fio inaugurado com as bandeiras.
Pelo resgate do passado bandeirante-caboclo, podemos perceber como
esse programa de “inclusão” dos habitantes do campo recolhia alguma coisa que
estava muito internalizada no mundo das representações populares. Há uma re-
apropriação de signos e significados. O discurso oficial do Estado Novo apropri-
ou-se de um conjunto de idéias que faziam parte do “senso comum” e as reelabo-
rou na forma de um projeto político que cristalizava também uma reivindicação
tão secular quanto as entradas e bandeiras, o “destino” amazônico do nordesti-
no: a do direito à terra, à ocupação dos “espaços vazios”. Esta última elaboração
passaria ainda por novas apropriações.2
No caso do Estado Novo, a sua cuidadosa geração de idéias faz parte de
um discurso hegemônico articulado nos mínimos detalhes. Mas esse discurso,
pelo menos no caso que nos ocupa, retoma idéias arraigadas no imaginário das
classes médias urbanas como as de ingenuidade, autenticidade, simplicidade e
paciência do homem rural. O discurso gerado desde o Estado, em torno da “Mar-
cha para Oeste”, é acolhido favoravelmente porque satisfaz expectativas e repro-
duz idéias há muito consensuais. Responde às expectativas, talvez urbanas, do
que deve ser o campo e às expectativas rurais do que deve ser a cidade. Retoma,
para corrigir, o mito dos “dois Brasis”. O “sucesso” dessa construção poder ser
avaliado a partir do grande número de trabalhadores recrutados na campanha da
borracha, e também da apropriação que de seus slogans fizeram tanto os soldados
como suas mulheres, na correspondência trocada entre eles e na que elas encami-
nharam ao presidente da República, reclamando, quando em junho de 1944 foi
suspendida a assistência familiar (Secreto, 2007: 89-114).

Do “Discurso do rio Amazonas” ao recrutamento dos soldados


da borracha

A guerra criou uma nova conjuntura. Apesar de o modelo econômico não


priorizar – muito pelo contrário – as exportações agrícolas, por elas implicarem, na
visão varguista, uma fragilidade econômica, um ponto de vulnerabilidade, o ali-

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nhamento com os Estados Unidos e a demanda de borracha, além de outras maté-


rias-primas, recolocaram em pauta a questão do incremento das exportações de al-
guns produtos primários. Junto veio a necessidade de o litoral chegar no sertão. O
litoral fez-se presente no Nordeste com a batalha da borracha e, para os trabalha-
dores, com o contrato de trabalho. Este, que tinha por intuito proteger o trabalha-
dor, em lugar de explorá-lo, era uma novidade. Não foi a panacéia dos direitos tra-
balhistas, por causa da distância entre a lei escrita e a prática jurídica, mas foi im-
portante na luta por direitos, uma luta com poucas conquistas, é certo.
O bombardeio japonês a Pearl Harbor, em dezembro de 1941, pôs fim à
ambigüidade da política externa do governo de Getúlio Vargas e, de alguma for-
ma, condicionou a política interna a respeito da Amazônia. O ingresso dos Esta-
dos Unidos na guerra exigiu uma posição clara das nações americanas. O domí-
nio japonês de largos trechos do continente asiático e das ilhas do Pacífico cortou
o fornecimento de borracha ao bloco Aliado e, com isso, foi necessário definir a
política econômica dos países do continente que fossem capazes de abastecer as
nações aliadas com matérias-primas. Em março de 1942, o Brasil assinou em
Washington uma série de acordos sobre matérias-primas estratégicas, entre as
quais a borracha. Durante a Primeira Guerra Mundial, cada pessoa em serviço
militar utilizava 16 quilos de borracha, enquanto na Segunda Guerra Mundial
essa quantidade tinha aumentado para 98 quilos, motivo pelo qual estava justifi-
cada a qualificação da matéria-prima como “estratégica”.3
Fazia tempo que os Estados Unidos intentavam aumentar o suprimento
de borracha por meio da pesquisa voltada para duas áreas diferentes: a heveicul-
tura – denominação derivada do nome científico da planta, Hevea brasiliensis –,
isto é, o cultivo sistemático e racional de borracha, com plantas resistentes ao
mal das folhas e de alta produtividade, e a borracha sintética. O incentivo ao ex-
trativismo, a partir de 1942, foi somente circunstancial – e a terceira alternativa
conjuntural. Dados os magros resultados obtidos com esta campanha extrativis-
ta, ficou evidente que a crescente demanda não podia ser suprida com base no ex-
trativismo tradicional. As exportações da borracha brasileira, entre 1943 e 1946,
alcançaram a cifra de 42,8 mil toneladas. Esta quantidade apresenta-se modesta
se comparada com o consumo dos Estados Unidos em um único ano, 1943, quan-
do os norte-americanos consumiram 332,7 mil toneladas de borracha vegetal,
173,6 mil toneladas de borracha sintética e 162,7 mil de borracha regenerada
(Pinto, 1984: 101). O Brasil teve seu melhor desempenho em 1912, quando pro-
duziu 43,3 mil toneladas. Nesse mesmo ano, América Central e Ásia produziam
aproximadamente 28 mil toneladas cada uma. Um ano depois, em 1913, a Ásia
atingiria as 47,6 mil toneladas e aumentaria progressivamente ano após ano. Em
1919, enquanto o Brasil produzia 34,2 toneladas, a Ásia seria responsável por
381,8 mil toneladas de borracha (Weinstein, 1993: 47).

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Com a deflagração da guerra, afirma o historiador Warren Dean, eviden-


ciou-se que as companhias químicas norte-americanas não dominavam o proce-
dimento para a produção de borracha sintética, daí a busca frenética de alternati-
vas. A partir de 1940, antes do bombardeio a Pearl Harbor, o governo norte-ame-
ricano aprovou medidas destinadas a adquirir borracha – mas essa foi uma polí-
tica de estocagem, e não de produção. Em 1940 foi criada a Rubber Reserve Com-
pany, com um capital de 140 milhões de dólares, cuja finalidade era a aquisição
de borracha. Outra instituição norte-americana, que interviria nas áreas gomífe-
ras da América Latina, ou nas quais a seringa poderia se adaptar, foi o Departa-
mento de Agricultura dos Estados Unidos (USDA – United States Department of
Agriculture), que planejava uma estratégia a longo prazo: ampliar a heveicultura
fora do espaço sob domínio do Japão.
Os Acordos de Washington (de março de 1942) previam o incremento da
produção de borracha no velho esquema: ampliação da atividade extrativa, com
base no recrutamento de mão-de-obra no Nordeste do Brasil.

A propaganda para o recrutamento de trabalhadores

Assinalamos anteriormente que, nas décadas de 1930 e 1940, com o dis-


curso de “unidade nacional”, um setor da sociedade, formado pelos trabalhado-
res rurais e pelos habitantes do campo, em geral, foi incorporado de forma sim-
bólica ao “corpo da nação”. Pela natureza desta incorporação, foi fundamental o
trabalho da propaganda oficial.
Durante o primeiro governo de Vargas surgiram órgãos de propaganda
oficial, que implicavam também controle e repressão de idéias contrárias ou con-
sideradas ameaçadoras. Com o Estado Novo, foi criada, em 1939, uma peça fun-
damental: o Departamento de Imprensa e Propaganda (DIP), órgão vinculado
diretamente à Presidência da República, que se ocupava não só do controle dos
meios de comunicação, isto é, da censura, mas também da difusão e da divulga-
ção das mensagens propagandistas. Em 1940 o DIP teve seu poder ampliado, com
a instalação, em cada estado do país, de um Departamento Estadual de Imprensa
e Propaganda (DEIP). Entre os objetivos do DIP, estavam centralizar, coordenar e
orientar a propaganda e auxiliar os ministérios e as entidades públicas e privadas
sobre a propaganda nacional, assim como incentivar a arte e a literatura “genui-
namente brasileiras”.
O trabalhador e o trabalho não eram prioritários nos meios de comuni-
cação. Por exemplo, na imprensa paulista, controlada pelo DIP, os temas domi-
nantes eram a doutrina do Estado Novo e as suas realizações. Entre 127 textos
pesquisados por José Inácio Melo Souza, 2,2% referiam-se ao trabalho (apud Ca-

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A ocupação dos “espaços vazios” no governo Vargas

pelato, 1998: 173-191). Silvia Goulart analisou o conteúdo das matérias publica-
das pelo DEIP de São Paulo na imprensa local em seu estudo de 5.799 recortes de
jornais anexados aos processos do DEIP. Esses processos eram constituídos por
correspondência de empresas editoriais reclamando o pagamento pela publica-
ção de materiais oficiais. Da tabela temática que ela elabora a partir das matérias
pagas entre 1941 e 1944, depreende-se que o tema do trabalho teve a mesma mé-
dia de 2,2% (Goulart, 1990).
Segundo Maria Helena Capelato, o trabalhador que aparecia nos carta-
zes produzidos pelo DIP era representado como força de trabalho. A organização
racional do trabalho era representada pelo binômio trabalhador-máquina. Nesse
binômio, a máquina ofuscava o trabalhador. Capelato explica a inexpressiva re-
presentação do operário na iconografia varguista pela negação estadonovista de
identidade de classe, substituída pela identidade nacional. No entanto, na pro-
paganda destinada ao recrutamento de nordestinos para a Amazônia, o
homem-trabalhador foi a figura central na iconografia.
Um dos conceitos-símbolo utilizados pelo Estado Novo foi a bandeira e
o bandeirismo, aos quais nos referimos. O regime também utilizou-se de outros
conceitos de menor sofisticação teórica, tais como: a simplicidade e a autentici-
dade da população sertaneja; o seu destino de desbravadora do Norte e a sua pre-
disposição ao sacrifício; a ocupação efetiva do território brasileiro como ações de
patriotismo; a seca como situação extrema e desumanizante. E, como contrapon-
to a esse último aspecto, a Amazônia era então apresentada como terra de possi-
bilidades para aqueles que não tinham opção alguma.
A propaganda para mobilizar os trabalhadores para a Amazônia teve
duas dimensões: uma nacional e outra local. Na dimensão nacional, a batalha
pela borracha se encaixava no programa de ocupação e colonização dos “espaços
vazios” e nos esforços de guerra do Brasil. Na esfera local, a emigração de nordes-
tinos para a Amazônia era uma questão que contava com uma longa tradição e al-
guns debates. Um dos destinos mais procurados pelos nordestinos nas conjuntu-
ras de seca, e não apenas nelas, era o Norte, especialmente os estados do Pará e do
Amazonas. A propaganda para recrutar trabalhadores explorou alguns elemen-
tos do imaginário, dos desejos e das emoções, por meio de símbolos e de um dis-
curso direto e apelativo (Secreto, 2003).
O historiador italiano Carlo Ginzburg (2001) analisou um cartaz famo-
so, que todos já vimos alguma vez em sua versão original, ou nas imitações que
correram o mundo. Durante a Primeira Guerra Mundial, Lord Kitchner, secre-
tário de Guerra de Sua Majestade britânica, realizou um chamado às armas me-
diante um cartaz que teve como resposta um alistamento voluntário sem prece-
dentes. No cartaz aparecia Lord Kitchner em uma perspectiva que deixava o seu
dedo gigante num primeiro plano apontando para o espectador. Trata-se, segun-

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do Ginzburg, de um dos cartazes mais eficazes da história, e prova disso foi a


adaptação que dele foi feita pelos Estados Unidos e pela URSS (União das Repú-
blicas Socialistas Soviéticas), em que apareciam Tio Sam e Trotsky, respectiva-
mente, e, claro, o resultado imediato do recrutamento de voluntários para a guer-
ra. A imagem no cartaz britânico era acompanhada por estas palavras: Teu rei e
teu país te necessitam, ou Kitchner quer mais homens, Quero você etc. “A representa-
ção da autoridade atuou como a própria autoridade”, concluiu Ginzburg. A que
se deveu esse sucesso, ou melhor, a sua eficácia, se pergunta Ginzburg? Este his-
toriador constrói a resposta utilizando o conceito de “fórmula de emoção” de
Aby Warburg. Não entraremos aqui nos detalhes da análise, mas é importante
salientar que, para que um cartaz desse tipo – de recrutamento de homens – te-
nha sucesso, ele deve comover, deve despertar anseios ou apelar moralmente,
deve acordar antigas emoções.
Como foi realizada a propaganda para recrutar trabalhadores para a
Amazônia? Essa campanha contou com alguma peça da eficácia do cartaz de Kit-
chner?
No ano de 1942, a Coordenação da Mobilização Econômica foi incumbi-
da de realizar um plano geral para seleção e encaminhamento de trabalhadores
para a Amazônia, que seriam conhecidos como “soldados da borracha”. Pelo De-
creto-Lei nº 4.750, foi criado o Serviço Especial de Mobilização de Trabalhado-
res para Amazônia (SEMTA), e pelo Decreto-Lei nº 5.044, de 4 de dezembro de
1942, foi criada a Superintendência de Abastecimento do Vale Amazônico
(SAVA). O primeiro encarregava-se de recrutar e levar o trabalhador até Belém; a
partir dali, a SAVA colocava o trabalhador nos seringais e se encarregava, com a
Rubber Development Corporation (RDC), de fornecer gêneros essenciais direta-
mente aos seringueiros, evitando os intermediários, que não tardaram a se quei-
xar. Segundo Nelson Prado Alves Pinto, depois do breve interregno bélico, a
SAVA e a RDC passaram a operar por intermédio dos comerciantes da região, pon-
do fim, dessa forma, às tentativas de enfraquecer a estrutura do aviamento.
O SEMTA teve uma vida curta e intensa. Por meio dele foi organizado ra-
pidamente todo um sistema que implicava assistência às famílias, seleção dos
trabalhadores, alojamento nas barracas, exames médicos, alimentação, trans-
porte, vestuário e adiantamentos – até a colocação nos seringais. Mas o encontro
do litoral com o sertão não seria tão simples como fora pensado e projetado no
papel.
O pintor suíço Jean Pierre Chabloz, que emigrou para o Rio de Janeiro
em 1940, foi o encarregado de realizar parte da arte da propaganda oficial do
SEMTA. Depois de uma permanência de quase três anos no Rio, fixou residência
em Fortaleza, após o convite de George Rabinovitch para trabalhar no serviço de
desenho da campanha da borracha. Como responsável pela propaganda gráfica,

126
A ocupação dos “espaços vazios” no governo Vargas

realizou diferentes tipos de material, tais como folhetos e cartazes, caracterizou


os caminhões em que eram transportados os soldados, fez os braceletes de identi-
ficação que levavam os trabalhadores etc. Trabalhou principalmente com duas
técnicas: desenho e colagem com fotografias.4
Afirma Abraham Moles que, sobre a base da simplificação necessária, o
cartaz constrói um novo quadro de símbolos pertencentes à nossa cultura. Por
exemplo: as faces coradas da criança de boa saúde e a transparência da água mi-
neral são símbolos elementares aceitos por todos (Moles, 1974: 25). São símbolos
“axiomaticamente evidentes, com conotações estereotipadas, que vão constitu-
ir-se em uma linguagem simbólica das imagens”. Chabloz tinha trabalhado na
Europa na área de publicidade e realizara vários cartazes publicitários. Foi essa
experiência que utilizou em seu novo trabalho. As idéias sobre o Estado Novo e
as dele a respeito do recrutamento de trabalhadores estavam mediadas, em gran-
de parte, pelos contatos que o próprio Chabloz tinha feito: o círculo de funcioná-
rios que tinha viajado do Rio de Janeiro para Fortaleza, em final de 1942, para or-
ganizar todo o serviço do novo órgão – todos domiciliados, no princípio, em um
par de hotéis do centro da cidade. Alguns permaneceram ali até a dissolução do
SEMTA, uns tantos meses depois. Houve um convívio muito intenso devido, so-
bretudo, ao tipo de trabalho, encarado como uma missão dos homens do litoral,
da cidade marchando para o interior – embora se tenha escolhido Fortaleza
como sede. Segundo Mônica Velloso (1982), existia uma verdadeira divisão inte-
lectual do trabalho entre os responsáveis por produzir idéias, conceitos, valores,
e os encarregados de os reproduzirem. Qual seria o lugar de Chabloz? Acredita-
mos que seu trabalho implicou duas coisas: reproduzir idéias geradas pela “elite
intelectual” do regime e criar, ele mesmo, imagens e conceitos.
Uma das preocupações do Estado Novo, manifestada em sua campanha
“Marcha para o Oeste”, era a do movimento migratório dos sertões para o litoral,
expressa claramente nas palavras de Péricles Melo Carvalho: “Corrente migra-
tória dirigida no sentido inverso da marcha que a verdadeira civilização indica-
va”; ou quando ele diz: “Encaminhar o trabalhador rural para seu respectivo
‘habitat’” (Carvalho, 1941). Na conjuntura da guerra, essa idéia foi representada
por Chabloz por meio de uma imagem: um mapa do Brasil, em cujo litoral
pode-se observar os soldados, e no interior amazônico os seringueiros extraindo
látex das árvores, acompanhado da frase: “Cada um no seu lugar!”. A mensagem
“cada um no seu lugar” não está falando somente da conjuntura – soldados na
defesa do litoral e seringueiros nas florestas extraindo látex – mas, em geral, do
lugar dos homens do litoral, da cidade, e do lugar dos homens do sertão, do cam-
po. A imagem está dizendo que no Brasil de Vargas cada um tem um lugar. Na
fotografia de uma manifestação de trabalhadores no Rio de Janeiro, acontecida
no dia 9 de novembro de 1940, pode ver-se um grupo de homens carregando

127
estudos históricos l 2007 – 40

uma faixa que diz: “Trabalhador também tem o seu lugar no Estado Novo”
(FGV, 1983). Pela metáfora espacial, o Brasil em que cada um tinha o seu lugar se
contrapunha àquele do passado em que nem todos o tinham, o Brasil de inclusão
se opunha, na propaganda, ao Brasil da exclusão. O Brasil da unidade era uma so-
matória de lugares. O lugar do sertanejo era no sertão.
Outra das peças criadas por Chabloz é um cartaz colorido, desenhado a
partir de uma perspectiva muito particular: do interior da casa do sertanejo para
fora. Enquanto grupos de trabalhadores vão para a Amazônia, “para a fartura”,
quem observa o cartaz pode ser o “caboclo passivo” da cena ilustrada por Chabloz:
um homem forte encostado no umbral da porta que vê passar os caminhões. É para
ambos a frase: “Vai também para a Amazônia protegido pelo SEMTA”. O especta-
dor da representação de Chabloz é um homem de pés no chão, que está contem-
plando, ou esperando, e em condições de ser um trabalhador recrutado e “protegi-
do” pelo SEMTA. É um caboclo desenhado com traços arredondados, de membros
grandes, como os trabalhadores de Portinari de uma década antes.
Uma imagem idílica da floresta amazônica começou a surgir dos carta-
zes de Chabloz. Num de seus cartazes, “Vida nova na Amazônia”, a exploração de
borracha aparece como uma atividade de “fundo de quintal”. Toda a cena é idíli-
ca e indica fartura: casa, lenha, porcos, galinhas, boi e, para completar o quadro,
uma criança brincando e uma mulher pendurando roupas brancas no varal. Até
mesmo a densa floresta amazônica não é tão fechada e deixa passar alguns raios
de sol. A casa está cercada e o homem está tirando látex de uma seringa vizinha
ao cercado. Segundo Samuel Benchimol (1945), o que a monocultura fez em ou-
tras regiões do Brasil, o extrativismo fez na Amazônia: “Seringa e roça, portanto,
não rimam bem… Seringa rima bem é com béri-béri, com charque e farinha,
com pirarucu seco e feijão. Não combina com batatas, legumes, galinhas, ovos,
leite”. Nessa ilustração de Chabloz, o extrativismo é ilusoriamente apresentado
como uma atividade complementar na economia camponesa. Salientemos que o
público a que era dirigido o cartaz era sobretudo camponês, para o qual a agricul-
tura é uma parte importante do cotidiano.
O trabalhador recrutado recebia um enxoval composto por uma calça de
mescla azul, uma blusa de morim branco, um chapéu de palha, um par de alpar-
catas de rabicho, uma caneca, um prato fundo, um talher que era colher e garfo,
uma rede e um saco de estopa. Esse enxoval foi desenhado por Chabloz e anunci-
ado com as seguintes palavras: “Equipamento de viagem fornecido pelo SEMTA”.
Este desenho correspondia à cláusula segunda do contrato de encaminhamento.
As cláusulas gerais do “Contrato padrão de trabalho nos seringais” também me-
receram o desenho de Chabloz. Estas ilustrações serviam para tornar conhecido
o conteúdo do contrato numa sociedade em que grande parte da população era
analfabeta.

128
A ocupação dos “espaços vazios” no governo Vargas

“Perfeitamente aparelhado, o SEMTA alista, transporta, hospeda, veste,


alimenta, ampara, trata e defende, por todos os meios, o homem que se entrega
aos seus cuidados, a fim de prepará-lo para o trabalho – sadio, forte, produtivo”,
dizia um texto da extensa propaganda de recrutamento. Era o que mais se asse-
melhava a “direitos trabalhistas”.
As representações de Chabloz nos trazem a terra, o homem, a luta, para
usar o esquema de Euclides de Cunha. Diferentemente do trabalhador urbano, o
trabalhador rural é o centro da iconografia do SEMTA. Numa colagem feita com
fotografias, o protagonista é o soldado da borracha. Ele aparece em formação mi-
litar, fazendo ginástica, sendo examinado pelos médicos, cortando o cabelo, fa-
zendo a barba, sendo vacinado, jogando vôlei, luzindo o seu uniforme, marchan-
do, nos caminhões. Mas o centro do cartaz é o soldado no singular, o homem que
personalizou o chapéu recebido, escrevendo nele o seu nome, Leonardo, prova-
velmente, de olhar orgulhoso e distante, de cruz amarrada ao pescoço, carregan-
do uma sacola nos ombros. Em várias das fotografias que o rodeiam, aparecem
funcionários do SEMTA, também trabalhando, vacinando, fazendo fichas, pales-
trando, organizando. A fotografia que constitui o centro, a de Leonardo, nos
apresenta um homem “pronto”, que já passou por todos os preparativos e, de sa-
cola no ombro, está disposto a partir. Perdeu a vulnerabilidade que tinha deitado
na camilha, de frente ao funcionário, respondendo às perguntas para preencher a
ficha, ou nas mãos do barbeiro com navalha. Ganhou individualidade.
É uma campanha de recrutamento, como a realizada com o cartaz de
Kitchner. Apela-se ao heroísmo pessoal. O homem do campo, nessas manifesta-
ções, aparece desprovido de tecnologia, de maquinaria. É ele contra a natureza.
Ele espremerá a seringa até brotar o látex, o que fará com suas próprias mãos.
Podemos nos aproximar do processo criativo de Chabloz por meio do
bosquejo do cartaz “Rumo à Amazônia”. É evidente que ele quer explorar a se-
quidão da paisagem nordestina e contrapô-la à uberdade amazônica. A migração
aparece nesta representação como um percurso entre dois pontos: um seco, de
formações vegetais tortuosas e com espinhos, e outro verde e frondoso. Se a se-
quidão é a pobreza, a umidade é a riqueza; por isso, a esperança se transforma em
certeza, em fartura. Num primeiro bosquejo que trazia um caminhão carregado
de trabalhadores deslocando-se por uma estrada que começava numa paisagem
de espinho e acabava na frondosidade amazônica, Chabloz escreveu: “Rumo à
esperança”; na versão final o mesmo desenho trazia a frase: “Rumo à fartura”.
Nesse caso, está-se explorando uma série de elementos que, se pretende,
fazem parte do imaginário do sertanejo. De fato, entre 1872 e 1900, segundo o
cálculo de Furtado (1979: 121), quinhentos mil nordestinos se mobilizaram para
a região amazônica, e o fizeram, em grande medida, com a ilusão de enriquecer
na terra da fartura. Nesta representação, porém, não só o elemento de atração é

129
estudos históricos l 2007 – 40

importante, mas também o de expulsão: a sequidão. A uberdade amazônica tem


o mesmo efeito que as faces coradas da criança de boa saúde, ou deveria ter.
Desde as primeiras crônicas sobre a América, as representações edênicas
estiveram vinculadas a ela e à paisagem tropical. Com o tempo, surgiria outra
imagem, a de floresta-inferno. Mas, no pensamento ocidental, a representação
paradisíaca ainda tinha força. Pode ser que, para o desenhista suíço, fosse axio-
mática a preferência pelo verde e úmido em contraposição ao cinzento e seco.
Mas Samuel Benchimol iria mostrar como os cearenses declaravam gostar do
“enxuto”, e não do “encharcado”. Claro que essas declarações eram de cearenses
na Amazônia, e outra poderia ter sido a sua representação do Vale do Grande Rio
antes de chegar nele.
Em 1944 foi realizado o X Congresso Brasileiro de Geografia. Nessa oca-
sião, Benchimol apresentou um trabalho intitulado “O cearense na Amazônia.
Inquérito antropogeográfico sobre um tipo de imigrante”. Era “um trabalho de
estréia”, como ele o definiu, no qual se propôs apanhar as primeiras impressões
dos imigrantes sobre a terra, o rio, a seca, a borracha etc. O imigrante, segundo
seu dizer, chegava com alguma impressão adquirida nas primeiras conversas nos
portos de lenha onde os navios paravam para carregar madeira a fim de abastecer
as caldeiras dos vapores. Nessa viagem vagarosa pelo rio Amazonas os imigran-
tes observavam silenciosamente a transformação da paisagem, as águas moven-
do-se debaixo do barco:

As barracas mergulhadas, a canoa andando de um lado


para outro como se fosse um cavalo, o silêncio da atividade humana no
meio da mata (…). Daí o terror pânico da água, o medo do rio que se
agrava à medida que ele toma contato definitivo com a várzea. O sertão
ainda está perto dele.

Por isso o recém-chegado diz coisas como: “Não gosto desta terra feia e
encharcada”, ou “gosto do enxuto”.
Não podemos avaliar individualmente o efeito de cada peça de propa-
ganda. Mas podemos pensar no efeito que certos slogans tiveram a partir das re-
clamações realizadas pelas mulheres dos soldados da borracha depois que foi
cortada a assistência às famílias em junho de 1944. Os milhares de trabalhadores
nordestinos recrutados desde inícios de 1943 para trabalhar na região amazônica
na extração da borracha assinaram um contrato de “encaminhamento”, no qual
podiam optar – e a grande maioria optou – pela assistência que o SEMTA oferecia
para suas famílias que ficavam no Nordeste.5 Muitas mulheres (e filhos) desses
trabalhadores permaneceram em seus lugares de origem ou nas hospedarias im-

130
A ocupação dos “espaços vazios” no governo Vargas

provisadas, esperando o momento para empreender, também elas, a viagem que


as levaria ao encontro de seus maridos, ou aguardando o retorno deles ao termo
de dois anos de ingresso no seringal. Nas hospedarias, chamadas de “núcleos”,
longe dos maridos, entre pessoas estranhas e tendo que seguir normas e ordens
antes desconhecidas, essas mulheres escreveram cartas angustiadas a seus espo-
sos. Cartas pedindo desculpas pela fraqueza de se queixar; contando das injusti-
ças contra elas cometidas; do desejo de ir ao encontro deles; das saudades senti-
das por elas e pelos filhos. Cartas nas quais uma mulher podia assim se definir:
“Tua triste e sem sorte esposa”.6
Depois, em junho de 1944, quando foi suspenso o pagamento da assis-
tência, sentiram-se novamente abandonadas e escreveram ao presidente da Re-
pública, Getúlio Vargas, como último recurso, apelando por justiça.7 Do Crato
(Ceará), um grupo de mulheres escreveu ao presidente dizendo que a assistência
às famílias tinha sido cortada e, em seu lugar, eram oferecidas passagens ao Ama-
zonas para, supostamente, se encontrarem com seus maridos, dos quais não sabi-
am se ainda estavam vivos, muito menos o domicílio. A resposta que deu a Presi-
dência da República a essas mulheres não a conhecemos, porque não aparece no
processo, não obstante este caso tenha sido mencionado como um antecedente
quando a CAETA teve que dar uma resposta pouco tempo depois a outro telegra-
ma escrito em termos semelhantes, enviado pelas mulheres de Mossoró (Rio
Grande do Norte), motivo pelo qual acreditamos que a resposta deve ter sido
mais ou menos a mesma.8
Com base nesses argumentos do voluntariado, do status de “soldado”,
que em lugar de metralhadora carregava nas suas costas a mochila e o machadi-
nho para abrir os cortes na seringueira por onde escorreria o látex, foi que as mu-
lheres do Nordeste escreveram a Vargas. Jovelina e as outras dizem: “Com espe-
ranças de serem bem-sucedidos e prestarem relevante serviço à pátria no comba-
te ao inimigo comum, produzindo borracha para a vitória das nações unidas”. É
bom observar que esta última passagem está repleta de expressões do discurso
oficial.9 E estas não foram as únicas mulheres a reclamar (Secreto, 2007: 89-114).
Em 1945 a imprensa internacional denunciava o desastre da campanha
da borracha, falava-se em 25 mil mortos ou desaparecidos. Levada a debate da
Assembléia Constituinte de 1946 a gravidade da situação criada pela batalha da
borracha, foi formada uma CPI que trabalhou entre os meses de julho e setembro
de 1946. Ela reuniu documentos e tomou depoimentos dos funcionários vincu-
lados ao DNI, SESP, SEMTA, CAETA, Banco do Brasil, Banco de Crédito da Borra-
cha, Instituto Agronômico do Norte etc. Os depoimentos dados à Comissão de
Inquérito da Campanha da Borracha deixam transparecer problemas políticos e
até pessoais entre os depoentes. Mas, mais importante que isto, trazem à luz o
verdadeiro desastre que foi a campanha. Alguns tinham consciência das conse-

131
estudos históricos l 2007 – 40

qüências sociais da introdução dos “migrantes nordestinos” nos seringais, como


o responsável pela Hospedaria do Pensador, em Manaus, o doutor Ezequiel Bur-
gos. Ele escreveu ao senhor Péricles de Carvalho, diretor do DNI, em setembro de
1943, comentando que os trabalhadores que voltavam dos seringais traziam no-
tícias das piores, de que eram maltratados e ameaçados pelos capangas, de que a
carne podre era vendida a 16 cruzeiros, de que o seringalista lhes negava remédi-
os quando doentes etc. Burgos levou cópia desta carta, como de outras, para a CPI.
Outros depunham que o transporte dos trabalhadores era realizado em condi-
ções deploráveis, que se desperdiçavam dinheiro e comida jogando ao rio ali-
mentos em mau estado ou por carecer de meios para distribuir nos seringais, que
se produziu pouca borracha e ainda se adulteraram as estatísticas etc.10
O relatório da CPI concluía que se impunha com urgência o amparo ime-
diato aos soldados da borracha e às famílias que haviam ficado no Nordeste, afir-
mando que deveriam receber a assistência que lhes fora prometida na fase de
propaganda. Aconselhava também a elaboração de um plano geral de assistência
social e econômica.
Quando, em 1944, as mulheres dos trabalhadores escreveram ao presi-
dente da República contando que tinha sido cortado o pagamento da assistência
familiar, que lhes era devido por força contratual, aquele teria sido um bom mo-
mento para se começar a reparação. Mas não começou. Em 1946, uma comissão
de inquérito do Congresso chamou vários altos funcionários para depor sobre a
campanha da borracha. A imprensa internacional denunciava a atrocidade co-
metida contra os trabalhadores brasileiros. Mas também não foi nessa oportuni-
dade que se intentou a reparação. Foi apenas recentemente que a Constituição de
1988 estabeleceu pensão para esses trabalhadores.

Notas

1. A opinião de Francisco Pereira o “destino amazônico”: “Cearense vai


da Silva, como dos outros intelectuais ao Norte, / Sonhando áureos castelos, /
consultados, está publicada em Sai daqui robusto e forte, / Volta
“À margem do ‘Discurso do rio magro e amarelo. / Vai de camisa e
Amazonas’”. Cultura Política, ano 1, ceroula / Às vezes rasgado em tiras / E
n. 9, 1941, p. 163-171. volta de lá, pachola, / De chapéu de sol,
2. Estes versos populares recolhem cartola / E terno de caxemira.”
as duas possibilidades que deparavam A migração entre o Nordeste o a
ao migrante cearense que escolhesse Amazônia foi freqüente sobretudo a

132
A ocupação dos “espaços vazios” no governo Vargas

partir da seca de 1877-1879. Ver Secreto telegrama recebido dava lugar a um


(2007: 35-59). processo.
3. Cf. http://www.exordio.com/1939-1945/
civilis/industria/caucho.html. 8. Parecer Auditoria Jurídica da Caeta.
Fundo Presidência da República.
4. As referências sobre Chabloz e sua Arquivo Nacional.
obra baseia-se em pesquisa no Arquivo
Chabloz do Museu de Arte da 9. Fundo Presidência da República.
Universidade Federal do Ceará e no Arquivo Nacional.
fundo Paulo de Assis Ribeiro do Arquivo
Nacional. 10. Diário da Assembléia, em
5. Fundo Paulo de Assis Ribeiro. 24 de agosto de 1946. Entre 1º de
Arquivo Nacional. agosto e 12 de setembro de 1946 foram
vários os números do Diário da
6. Arquivo Regina Frota. Museu de Arte Assembléia em que apareceu o
da Universidade Federal do Ceará. trabalho realizado pela Comissão
7. Fundo Presidência da República. de Inquérito da Campanha da
Arquivo Nacional. Cada carta ou Borracha.

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Resumo
Este artigo analisa dois momentos e duas políticas de ocupação dos “espaços
vazios” do governo Vargas. O primeiro momento é quando são anunciadas a
marcha para Oeste e a incorporação da Amazônia numa política de
colonização. O segundo, quando, na conjuntura da guerra e respondendo aos
compromissos assumidos nos Acordos de Washington, se implementa uma
política de mobilização de trabalhadores para a extração da borracha, produto
estratégico para a guerra. O artigo explora as representações dos espaços
geográfico e social dos sertões e da Amazônia nas criações de Chabloz e,
finalmente, avalia os efeitos da propaganda, através da utilização de seus
slogans, nas reclamações que as esposas dos trabalhadores fizeram chegar a
Vargas.
Palavras-chave: fronteira amazônica, soldados da borracha, “espaços vazios”,
migração, propaganda, trabalho/trabalhadores

134
A ocupação dos “espaços vazios” no governo Vargas

Abstract
This article analyses two moments and two policies for the occupation of the
“empty land” during president Vargas administration. The first moment was
when government announced the march to the West and the incorporation of
Amazonia in a policy of colonization. The second was when, in the context of
World War II and responding to the commitments of the Washington
Agreement, government implemented a policy of mobilization of workers for
the rubber extraction, since rubber was a strategic product for the war. The
article explores the representation of the geographic and social spaces of the
“sertões” e the Amazonia in Chabloz creations and evaluates the effects of
propaganda, through the use of slogans, in the claims that the workers’ wives
directed to president Vargas.
Key words: Amazonian frontier, rubber soldiers, “empty land”, migration,
propaganda, work/workers

Résumé
Cet article analyse deux moments et deux politiques d’occupation des
“espaces vides” pendant le gouvernement Vargas. Le premier moment a été
quand le gouvernement a annoncé la marche vers ouest et l’incorporation de
l’Amazonie à la politique de colonisation. Le second, quand, dans la
conjoncture de la II Guerre Mondiale et en répondant aux compromis des
Accords de Washington, a été mise en oeuvre une politique de mobilisation
de travailleurs pour l’extraction du caoutchouc, produit stratégique pour la
guerre. L’article explore la représentation des espaces géographiques et
sociaux des “sertões” et de l’Amazonie dans les créations de Chabloz, et
finalement examine les effets de la propagande à travers l’utilisation de ses
slogans dans les réclamations que les femmes des travailleurs ont adressé au
président Vargas.
Mots-clés: frontière amazonique, soldats du caoutchouc, “espaces vides”,
migration, propagande, travailleurs/travail

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