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(RE)CONSTRUINDO SERGIO BERNARDES

(RE)CONSTRUYENDO SERGIO BERNARDES

(RE)CONSTRUCTING SERGIO BERNARDES

Novos conceitos e “novos” patrimônios

Adriana Mattos de Caúla


Doutora em Urbanismo PPG-AU/UFBA – Pesquisadora Projeto PróMemória/NPD/UFRJ
Kykah Bernardes
Jornalista PUC-Rio – Coordenadora Projeto PróMemória

Resumo:
Este trabalho traz como núcleo a cartografia da trajetória do arquiteto Sergio Bernardes. A composição
desta cartografia acompanha o processo de abertura e inventário do acervo de Bernardes. O ineditismo de
grande parte do material integrante do acervo é outro fator que nos move associado ao desejo de
(re)descobrir este arquiteto e sua obra como importantes partes de nosso patrimônio recente. A canalização
do amplo material pertencente ao acervo através da composição de uma cartografia da trajetória e
produção de Bernardes vem se mostrando como uma ferramenta ágil e capaz de suportar o grande volume,
a multiplicidade de projetos e expressões componentes do acervo. Este trabalho também levanta
questionamentos que objetivam contribuir para a intensificação das trocas, para as discordâncias e outras
aberturas sobre o patrimônio arquitetônico e sua preservação; e para começar a compreender, revelar e
problematizar a obra contida em um acervo tão rico e pleno de ideias em potência e com tamanha
variedade e variabilidade como o do arquiteto Sergio Bernardes.

Palavras-chave: Sergio Bernardes, cartografia, preservação.

Resumen: Este trabajo trae como núcleo el mapeo de la trayectoria del arquitecto Sergio Bernardes. La
composición de esta cartografía acompaña el proceso de apertura e inventario de la colección de
Bernardes. Lo inédito de gran parte del material de la colección es otro factor que nos lleva, asociado al
deseo de (re) descubrir este arquitecto y su obra, como parte importante de nuestro patrimonio reciente.
Canalizar la gran cantidad de material perteneciente a la colección a través de la composición de un mapeo
de la trayectoria y producción de Bernardes está demostrando ser una herramienta ágil y capaz de soportar
gran volumen, múltiples proyectos y componentes de las expresiones de la colección. Este trabajo también
plantea preguntas que tienen como finalidad contribuir a la intensificación de intercambios por los
desacuerdos y otras aberturas sobre el patrimonio arquitectónico y su conservación; y para empezar a
entender, revelar y discutir la obra contenida en una colección tan rica y llena de potenciales ideas y con tal
variedad y variabilidad como la del arquitecto Sergio Bernardes.

Palabras-clave: Sergio Bernardes, cartografia, preservación.

Abstract: The main purpose of this project is the presentation of a cartography of the architectural work of
Sergio Bernardes, designed to accompany the opening and cataloguing of his archive. Much of this material
has never before been available to the public, a key factor in the process of (re)discovery of this architect
and an appraisal of his work as an important part of our recent tradition. A cartography places Bernardes’


work in a framework of an agile research tool, capable of dealing with the huge volume and the multiplicity of
projects contained in the archive. This project also raises questions looking to contribute to a more intense
exchange of ideas surrounding architectural heritage and its preservation – and also to a process of
understanding and discussion on the material contained in the archive so rich in ideas, of such variety and
variability, as that of the architect Sergio Bernardes.
Keywords: Sergio Bernardes, cartography, preservation.



BREVE HISTÓRICO DO ACERVO SERGIO BERNARDES

Para que este trabalho seja apresentado, é necessário, antes, falar da trajetória que teve o acervo
de Sergio Bernardes; das condições em que este se encontrava quando sofreu a primeira ameaça
de destruição e das ações empreendidas no sentido de salvaguardá-lo, ao longo de quase trinta
anos.

Em 1984 os documentos estavam, ainda, nas dependências do escritório do arquiteto1, período


este em que o prédio do escritório estava ameaçado de ir a leilão em consequência de dívidas
causadas pelo cancelamento do contrato do projeto da Escola Superior de Guerra2.

Em 1986 tendo sido obrigado a deixar o imóvel para aguardar o leilão, Sergio Bernardes
expressava o desejo de fazer uma grande fogueira do acervo que lá permanecera. Aqueles que
os cercavam naquele momento, mesmo diante da necessidade de compreender a legitimidade
dos seus sentimentos, tentavam demovê-lo daquela intenção, conscientes de que se tratava
apenas de um adiamento. Os arquivos permaneceram abandonados até o inicio da década de 90,
tendo sofrido, nesse período uma grande perda de patrimônio. Houve uma avaliação de que algo
em torno de 20% foi perdido, incluindo suas grandes maquetes3, uma biblioteca de mais de 2.000
volumes catalogados e alguns dos projetos mais icônicos como o Pavilhão de São Cristovão, O
Pavilhão temporário da CSN, para o Ibirapuera e o Pavilhão de Bruxelas.

Em 1992, os arquivos foram transferidos para um local provisório, uma vez que o prédio de seu
escritório fora vendido em pagamento das dividas e entraria em reforma. Mesmo a contra gosto,
Sergio Bernardes concordou com a guarda dos arquivos. Uma catástrofe urbana, as enchentes do
Rio de Janeiro, em 1994, quase causaram um estrago irreversível aos documentos. Essa ameaça
impulsionou a procura por uma solução mais definitiva, mesmo sem o conhecimento de Sergio
Bernardes que mantinha o firme propósito de destruir tudo numa fogueira.

Ana Lucia Niemeyer, abrigou o acervo na Fundação Oscar Niemeyer em 1996, quando Oscar
Niemeyer tomou conhecimento de toda dificuldade e empenho empreendido para a salvaguarda
de 65 anos de trabalho de Sergio Bernardes; e lá permaneceu durante mais de dez anos, apesar
da falta de espaço, tratamento e acondicionamento adequados por falta de recursos.

Entre 2000 e 2002, período em que Bernardes já estava debilitado, a catalogação de 30% do
acervo foi feita por ocasião de um convênio firmado com o Centro de Arquitetura e Urbanismo
(CAU-RJ) da Prefeitura da Cidade do Rio de Janeiro, objetivando pesquisa no acervo para
realização de uma exposição retrospectiva do trabalho do arquiteto.

Em 2011 diante da urgência de medidas de controle e preservação do acervo, sem as quais seria
impossível garantir o seu valor informativo e sua integridade física, tomamos a iniciativa de
encaminhá-lo ao Núcleo de Pesquisa e Documentação da Faculdade de Arquitetura da
Universidade Federal do Rio de Janeiro, onde sob a direção de Prof. Elizabete Martins, vem


1
É preciso que se diga que esse não era um espaço qualquer, era um prédio de 2.500 metros quadrados implantados
em terreno da Av. Sernambetiba, 4446, na Barra da Tijuca, construído para abrigar a Escola de Livre pensamento, que
era voltada para o desenvolvimento de propostas relativas ao Urbanismo. O chamado Laboratório de Investigações
Conceituais – o LIC. Nesse espaço, que tinha auditório, biblioteca, salas de aulas e restaurantes, ele pretendia com
conteúdo multidisciplinar provocar nos alunos o interesse pela busca por soluções, as mais abrangentes para os
problemas urbanos das grandes cidades.
2
Todas as etapas do projeto da Escola de Guerra foram concluídas e entregues. No momento do cancelamento do
contrato a construção do edifício já havia sido iniciada em Brasília.
3
As maquetes mediam a maioria 2,00 X 2,40m, e foram desenhadas por ele para expor os macro projetos urbanísticos,
sendo a mais importante a do Munícipio do Rio de Janeiro, na escala de 1:2000.


recebendo tratamento técnico adequado, o que permitirá ser desvendado, através de um
inventario preliminar, já iniciado.

(RE)DESCOBRINDO A PRODUÇÃO DE SERGIO BERNARDES

Sergio Bernardes dedicou-se ao longo de sua trajetória aos mais variados projetos, desde a
criação de elementos construtivos, passando pelo desenho de mobiliário e alcançando planos
diretores e macro planos que abarcavam todo território nacional. Sua produção, criação, crítica,
reflexões e experimentações transitavam livremente por diferentes campos e tocavam as mais
variadas escalas impulsionadas sempre por sua infindável curiosidade, sua clareza de
pensamento e seu rigor técnico característico.

Sergio era um pensador da(s) cidade(s). Dedicava-se igualmente à prática, à teoria e às


experimentações, debruçando-se sobre criações prospectivas, explorando as possibilidades de
transformação da própria existência humana. Ele acreditava que a arquitetura deveria permitir a
antecipação do desenvolvimento da cidade do amanhã e buscava por respostas - e por mais
questionamentos - ao formar equipes pluridisciplinares que reuniam arquitetos, engenheiros,
filósofos, geógrafos, cartógrafos, sociólogos, antropólogos, biólogos... Seu pensamento e suas
criações estavam sempre em movimento, sempre em processo de atualização, atento a todos os
acontecimentos e avanços técnicos, tecnológicos e científicos. Era uma figura singular no
pensamento sobre o homem, a arquitetura, as cidades e toda problemática que os envolve.

Seu emblemático projeto “Rio do Futuro – Antevisão da Cidade Maravilhosa no Século da


Eletrônica”, publicado em um número especial da Revista Manchete no ano de 1965, demonstra a
complexidade e alcance de suas reflexões. Introduz seu plano como uma “contribuição
desinteressada ao meu Estado e, sobretudo, ao seu povo” (BERNARDES, 1965, p.42) e
apresenta-o como uma síntese sucessiva de etapas futuras, partindo de uma análise do hoje.
Assume a responsabilidade e o desafio de analisar os problemas existentes, ciente da condição
socioeconômica do país e considerando ainda a escala global, apresenta soluções para o Rio de
Janeiro em pontos até hoje sensíveis para a cidade, como os transportes e a habitação, sem
deixar de lado a crítica contundente à situação vigente.

Ele sempre se mostrou como um questionador e isso nos leva a crer que a (re)descoberta da obra
do arquiteto se dá em momento extremamente oportuno, não só pelas condições favoráveis que
se desenham com o abrigo do acervo no NPD/UFRJ, como também pelo momento propício a
debates e reflexões no qual nos encontramos. Acontecimentos como o reconhecimento pela
UNESCO, em 2012, da cidade do Rio de Janeiro, como Patrimônio Mundial, na categoria
Paisagem Cultural4, a escolha da capital fluminense como cidade-sede dos próximos Jogos
Olímpicos em 2016 e também como uma das cidades que abrigará jogos da Copa do Mundo de
2014. Esta conjectura vem provocando não só a intensificação de significativas transformações
urbanas, construção de novos equipamentos, remodelação de edificações preexistentes, aumento
do número de eventos abrigados pela cidade, mas também ações que estão reverberando na
dinâmica da cidade e na relação entre moradores e visitantes com o espaço urbano e construído5.


4
Com este título reconheceu-se o valor universal da paisagem da cidade do Rio de Janeiro, assentada entre a
montanha e o mar e a interação da sua beleza com a intervenção humana. Foi a primeira cidade do mundo a receber
este título.
5
Podemos citar um aumento da apropriação do espaço público urbano da cidade seja por manifestações, por
intervenções artísticas, o aumento do número de turistas (e cariocas) que passaram a visitar e frequentar favelas
pacificadas...


O ACERVO E A CARTOGRAFIA
“Os documentos, incluindo-se as obras de arquitetura – que são também
documentos da maior importância e densidade para nosso campo de estudos –
aguardam pacientemente por nossas reflexões. Mas jamais serão esgotados por
elas: a qualquer momento um outro olhar lhes trará nova vida. Os mesmo
documentos, iluminados por outras perguntas, sugerirão precisões e revisões, de
singelas a revolucionárias. Mas para que isso ocorra é preciso se permitir fazer
novas perguntas. Sem a dúvida sistemática não há ampliação ou revisão de
campo; mas ela só pode consistentemente ocorrer se aceitarmos que nem tudo
está claro, dito e definido. E sem nos darmos ao trabalho de voltar às origens – à
documentação – e novamente interroga-la.” (ZEIN, 2011, p.3)

A produção de Sergio Bernardes impressiona não só pela abrangência como também pelo
número de projetos elaborados. Foram sessenta e cinco anos de atividade profissional que
resultaram em mais de vinte e duas mil e quinhentas plantas, oito mil e quinhentas fotografias,
trezentas caixas arquivo contendo plantas e suas cópias heliográficas, dezesseis conjuntos de
documentos variados como croquis e escritos. Este rico material será “interrogado”, como
colocado por ZEIN (2011), para que assim possamos (re)construir o arquiteto Sergio Bernardes.

Sergio Bernardes projetou e construiu em todas as regiões do país, em outros países e


continentes. Não tomava limites territoriais, administrativos, políticos ou culturais como barreiras e
transpassava de um território a outro explorando, pesquisando e propondo continuamente. Com o
início da composição da cronologia, onde estamos registrando sua trajetória, este movimento tão
característico do arquiteto começa a se tornar visível. A cartografia está nos permitindo
justamente transpor limites. Acreditamos que continuidades e descontinuidades, rupturas e
retomadas de pensamento poderão ser visualizadas de uma forma livre, permitindo outras
aproximações e conexões, outras reflexões neste resgate pela trajetória de Bernardes.

Esta cartografia está sendo construída acompanhando o processo de abertura do acervo de


Bernardes. Acervo este que permaneceu com acesso limitado por longo período, como foi exposto
na introdução deste artigo. Portanto, este é um trabalho em construção que vem acompanhando o
processo de desvelamento e (re)conhecimento do material disponível. Por isso, a cartografia de
Bernardes permanece aberta, ela está sendo e continuará sendo construída e ampliada
adquirindo maior complexidade a partir da sucessiva abertura de caixas e volumes pertencentes
ao acervo.

Aproximação de projetos, pensamentos, acontecimentos, visões e posicionamentos começam a


se tornar possíveis e visíveis com a composição da cartografia. Evidenciar ligações, aproximar
sujeitos, parear pensamentos e discursos à primeira vista distantes e diversos, localizando no
tempo e no espaço sua profícua e heterogênea produção é um de nossos objetivos. Acreditamos
que este mapeamento está nos permitindo não só a visualização do volume, abrangência e
pluralidade de sua produção, mas começa a desempenhar o papel de ferramenta importante para
futura associação a um banco de dados e de imagens e figurar como guia para o acesso de
pesquisadores e estudantes ao acervo.

Figura 01: Trecho da cronologia em construção que vem acompanhando o inventário do acervo de Sergio Bernardes




SERGIO BERNARDES, SUAS OBRAS E SEUS ELEMENTOS

A obra de Sergio Bernardes é permeada por conceitos e questões que na contemporaneidade tem
sido foco de discussões: fluidez e mutabilidade do espaço, sustentabilidade, ecologia, novas
tecnologias, concentração urbana, clima, arquitetura não presencial, mobilidade, direito à moradia,
habitação em condições extremas... E a variabilidade de enfoques e as suas numerosas criações
levam-nos a tomá-lo como um criador pleno de desejo, versátil, dono de um vocabulário
construtivo riquíssimo, explorador de texturas, cores, luz e da natureza circundante.

Valorizava diferentes materiais construtivos, principalmente os materiais locais. Trabalhou com


aço, tijolo, pedra, concreto, alumínio, madeira, alvenaria tradicional... E nota-se, ao percorrermos
suas diversas obras, a manutenção da identidade destes materiais, utilizados sem revestimento.
O arquiteto ainda vinculava-os a funções tectônicas, expondo interessantes composições
construtivas. Ele próprio dizia que “(...) não pode haver pensamento arquitetônico, espacial sem
pensamento estrutural. (...) O material é que cria a expectativa do cenário”.

O arquiteto criou elementos que se tornaram corriqueiros em nossa arquitetura, como o tijolo-
cubo, o tijolo de vidro soprado tijolux e a cobertura em telha meio-tubo de fibrocimento - produzida
pela Eternit em larga escala. Em muitas das suas obras, Sergio Bernardes criou e desenvolveu
novos elementos construtivos, sempre visando a sua produção em escala industrial. De acordo
com Jayme Mason, engenheiro que trabalhou com Bernardes na década de 1960, “a ideia central
da mente criadora de Sergio está na dinâmica da curiosidade, provocada a criar o que não existe,
a partir de arquétipos daquilo que existe”.

Podemos destacar algumas obras nas quais, Sergio Bernardes, demonstrou o potencial de sua
inventividade relativa à criação de novos elementos: Complexo Sanatorial de Curicica (Rio de
Janeiro, 1949-51), onde criou um sistema de placas pré-moldadas em concreto; Residência de
Maria Carlota Soares Macedo (Petrópolis,1951), onde, frente à falta de cimento no mercado
devido às obras aceleradas do Estádio Mário Filho – Maracanã6, Sergio criou perfis metálicos
dobrando vergalhões de aço que permaneceram aparentes; Edifício Justus Wallerstein (Rio de
Janeiro, 1953), no qual primou pela utilização de elementos pré-fabricados e “curtain-wall”;
Residência Cincinato Cajado (1952) reformada para Mansur Kathuian (1990), quando transformou
sua obra com estética moderna em um espaço de experimentação pleno de produções artesanais
como a adaptação de dutos em ferro7como elementos de iluminação e exaustão dos banheiros;
Residência do Arquiteto (Rio de Janeiro, 1959-60), obra na qual cria a telha meio-tubo a partir da
serragem no sentido do comprimento de tubos de fibrocimento utilizados nas ligações de esgoto e
águas pluviais; Espaço Cultural José Lins do Rego (João Pessoa, 1980) onde atualiza o uso da
malha poligonal inicialmente usada na cobertura leve de treliças espaciais das Indústrias Shering
(Rio de Janeiro, 1974); e Residência William Khoury (1981-1995), onde cria o muro acústico
revestido de xaxim coberto por vegetação e nomeado por ele de muro “tijucano”, a cobertura
composta por calhões de fibra de vidro vermelhos produzidos in loco, além de todo o mobiliário,
incluindo camas, vasos sanitários e lavatórios esculpidos em madeira e vidro, ferragens e
fechaduras, design da cozinha, alcançando até os talheres e copos (VIEIRA, 2006).

Mas a inventividade e criatividade de Sergio Bernardes iam muito além dos materiais e soluções
construtivas... Suas experimentações plásticas, ligadas à pesquisa extensiva de novas tecnologias

6
De acordo com o depoimento do arquiteto Flavio Ferreira, colhido por Flávio Castelotti (2006), em razão das obras do
Estádio do Maracanã para a Copa de 1950, houve, em todo o Estado do Rio de Janeiro, a falta de cimento, fato que
desafiou a inventividade de Sergio durante a construção da residência de Lota Macedo Soares, no bairro de
Samambaia na cidade serrana fluminense de Petrópolis.
7
Trazidos pelo proprietário Mansur da demolição de uma usina de açúcar em Porto Feliz, interior de São Paulo
(VIEIRA, 2006).


e em igual importância ao aprofundamento da relação do homem com a arquitetura/ambiente
construído e com a natureza/sítio/ambiente natural sempre tendo como objetivo a qualidade do
espaço construído, surpreendiam em seus resultados finais. Como exemplos, podemos mencionar
obras como o Pavilhão da Companhia Siderúrgica Nacional (São Paulo, 1954); a primeira
construção toda em aço, marcada por suas vigas arqueadas ligando as margens do rio que
cruzava o parque Ibirapuera8; Pavilhão de São Cristóvão (Rio de Janeiro, 1957), quando Sergio
alia uma malha de cabos de aço à estrutura em concreto criando uma surpreendente cobertura
em paraboloide hiperbólico para recobrir uma forma elíptica com vãos de 250m x 150m9; o
Pavilhão de Bruxelas (Bruxelas, 1958) quando superou a problemática localização com uma
solução plástica composta por malhas e cabos de aço e cobertura em concreto de 40 x 60m com
uma imensa abertura circular em seu centro; novamente a Residência do Arquiteto (Rio de
Janeiro,1959-69), onde explora a integração da construção com o terreno, uma ponta rochosa da
Avenida Niemeyer e a relação com o mar; Hotel Tambaú (João Pessoa, 1962), com planta
formada por dois anéis concêntricos, localizado “mimeticamente” nas areias do encontro das
praias de Tambaú e Bessa; Conjunto Residencial Casa Alta (Rio de Janeiro, 1963), obra
localizada no alto do Morro do Pasmado em que explora a arquitetura flexível com soluções
construtivas que asseguram a planta livre gerando uma fachada modulada e aleatória.

São muitas as ideias e soluções de Bernardes que poderiam continuar a ser mencionadas, visto o
número extenso de projetos que criou. O potencial de contribuição da trajetória de Sergio
Bernardes à arquitetura, às reflexões e ao pensamento arquitetônico é considerável. Assim como
este artigo é apenas um breve olhar sobre o acervo do arquiteto, acreditamos que esta ainda
tímida amostragem possa instigar e inspirar a busca, o aprofundamento e a divulgação das
criações e da trajetória singular deste grande arquiteto brasileiro.


8
Sergio, neste projeto, como em outros que se seguiram, cria seu partido arquitetônico a partir de um problema
encontrado. Neste caso, o pavilhão ganhou “ares” de ponte.
9
Esta foi a primeira solução da cobertura. A malha de aço seria recoberta por um sanduíche plástico de fabricação
italiana, inicialmente especificado, mas foi substituído, por motivo financeiro, por um produto similar produzido por um
fabricante nacional de telhas de plástico, segundo relato de Murilo Boabaid (VIEIRA,2006). Este material foi danificado e
desprendeu-se após uma ventania. Após este episódio, Bernardes especificou uma telha em alumínio fino refrescada
por um sistema de captação de águas pluviais que desaguavam em dois lagos de captação nas extremidades do
prédio. A segunda solução para a cobertura foi danificada em um incêndio do Pavilhão nos anos 1980 e desde então
permaneceu descoberto. Hoje, o pavilhão abriga a Feira dos Nordestinos, mantida sob suas coberturas efêmeras de
lona azul tensionada.

SANATÓRIO DE CURICICA RESIDÊNCIA MARIA CARLOTA SOARES MACEDO


Rio de Janeiro, RJ Petrópolis,, RJ
1949 1951

CONCRETO
PRÉ-MOLDADOS
AÇO/ESTRUTURAS METÁLICAS
TELHAS DE ALUMÍNIO
PEDRA (material local)

COBOGÓ
TIJOLO
TELHAS ONDULADAS
CONCRETO ARMADO
ESQUADRIAS DE MADEIRA
ALVENARIA
TIPOLOGIA PAVILHONAR

‘RESIDÊNCIA-GALPÃO’ (CAVALCANTI, 2004, P.29)


CIRCULAÇÃO E LIGAÇÕES ENTRE PAVILHÕES APOIADAS
GALERIA-CIRCULAÇÃO
POR ESTRUTURAS TUBULARES COLOCADAS NA FORMA

DE “V”
MODULAÇÃO
COBERTURA DOS PAVILHÕES EM “ASA DE BORBOLETA”
TELHAS ONDULADAS SOBRE LAJE PLANA

BERNARDES ADOTOU O SISTEMA CONSTRUTIVO
MODULADO E ELABOROU E PRODUZIU PRÉMOLDADOS RUPTURA COM A LINGUAGEM ARQUITETONICA DA
DE CONCRETO NO CANTEIRO DE OBRAS (em 207 dias e ÉPOCA (plástica exuberante ou diálogo moderno-
2 operários foram produzidas 164 placas pré-moldadas colonial) (CAVALCANTI, 2004, P.29)
de concreto e 7896 unidades de cobogó)
EXPERIMENTO DO USO DE ESTRUTURAS METÁLICAS –
RELAÇÃO DIRETA COM A NATUREZA CIRCUNDANTE esqueleto metálico foi construído in loco a partir de
(Morro Dois Irmãos situa-se ao fundo da paisagem local vergalhões.
e o prédio era rodeado pela vegetação do Maciço da
Pedra Branca) RELAÇÃO DIRETA COM A NATUREZA CIRCUNDANTE.


NO ANO DE 2006 UM PROCESSO DE TOMBAMENTO
COM UMA LISTAGEM DE DIVERSAS OBRAS
LOCALIZADAS NO RIO DE JANEIRO, INCLUINDO O
ATUALMENTE A CASA É MANTIDA POR SUA
COMPLEXO SANATORIAL DE CURICICA FOI SUBMETIDO
PROPRIETÁRIA, SEM QUALQUER AUXÍLIO OU AÇÃO DE
À ANÁLISE PELO CONSELHO MUNICIPAL DE PROTEÇÃO
PRESERVAÇÃO.
AO PATRIMÔNIO CULTURAL.


A COBERTURA GANHOU UMA CAMADA SUPERIOR DE
ERA UMA EDIFICAÇÃO ISOLADA POR SUA FUNÇÃO
AMIANTO, ACIMA DO ALUMÍNIO, FORMANDO UM
SANATORIAL, HOJE O CRESCIMENTO URBANO
COLCHÃO DE AR.
ALCANÇOU A ÁREA.


O ALUMÍNIO RECEBEU PINTURA BRANCA E AS
O COMPLEXO ENCONTRA-SE DIVIDIDO PELA
TRELIÇAS, PINTURA PRETA.
ADMINISTRAÇÃO FEDERAL REPERCUTINDO NO ESTADO
DE CONSERVAÇÃO DAS UNIDADES



ESQUADRIAS SUBSTITUÍDAS E ADIÇÃO DE NOVAS
EDIFICAÇÕES NO CENTRO DE REFERÊNCIA HELIO FRAGA

TRÊS PAVILHÕES FORAM DEMOLIDOS

MAIORIA DOS PAVILHÕES TEVE COBERTURA ALTERADA
COM A INVERSÃO DO CAIMENTO

PRÊMIO JOVEM ARQUITETO NA II BIENAL DE SÃO



PAULO 1953

RESIDÊNCIA DO ARQUITETO HOTEL TAMBAÚ


Rio de Janeiro, RJ João Pessoa, PB
1959/60 1962

TELHAS DE FIBROCIMENTO
PEDRA (material local)
ESTRUTURA EM CONCRETO APARENTE

MADEIRA ALVENARIA CERÂMICA
TIJOLO MACIÇO MADEIRAMENTO ENVERNIZADO
TIJOLO CUBO COBERTURA EM MEIO-TUBO DE FIBROCIMENTO
COBOGÓS CERÂMICOS
LAJES VOLTERRANAS
PLANTA EM ANEL
MODULAÇÃO
GRANDES VÃOS FORMA NUCLEADA
LONGOS BEIRAIS
TELHADO PLANO ÁREA DE CONVIVÊNCIA ABERTA NO INTERIOR DO
ANEL
EXPERIMENTAÇÃO E ADAPTAÇÃO DE NOVOS
MATERIAIS

MATERIAIS APARENTES/ESTADO BRUTO ARQUITETURA SEM PRESENÇA

CRIAÇÃO DA TELHA MEIO-TUBO RELAÇÃO DIRETA COM A NATUREZA

CRIAÇÃO DO TIJOLO CUBO USO DE MATERIAIS DURÁVEIS E COM SEU ASPECTO
NATURAL
RELAÇÃO DIRETA COM A NATUREZA
CIRCUNDANTE (TERRENO FOI MOLDADO
PARA RECEBER A CASA)

ATUALMENTE ENCONTRA-SE BASTANTE FOI OBJETO DE ESTUDOS DA UNIVERSIDADE


DESCARACTERIZADA APÓS SUCESSIVAS FEDERAL DA PARAÍBA SOBRE BENS DE INTERESSE
REFORMAS ARQUITETÔNICO.

PAVILHÃO DA CSN
São Paulo, SP
1954

CABOS DE AÇO
PERFIS DE AÇO


COBERTURA SUSPENSA
PONTES CURVAS COMO VIGAS DE SUSTENTAÇÃO
COBERTURA CURVA EM PLACAS DE CONCRETO
ESTRUTURADAS POR PERFIS “T” SOBRE CABOS DE
AÇO ATIRANTADOS

ADOTA O CONCEITO DE PAVILHÃO-PONTE


IMPLANTADO SOBRE UM CURSO-DÁGUA

DESMONTADO APÓS A EXPOSIÇÃO


COMEMORATIVA DO IV CENTENÁRIO DE SÃO
PAULO


PAVILHÃO DE BRUXELAS PAVILHÃO DE SÃO CRISTÓVÃO
Bruxelas, BEL Rio de Janeiro, RJ
1958 1959/60


ESTRUTURA EM AÇO
CABOS DE AÇO TENSIONADOS
CONCRETO ARMADO
ESTRUTURA EM CONCRETO APARENTE

COBERTURA EM MATERIAL PLÁSTICO E CABOS DE AÇO
VIDRO PROTENDIDOS
COBERTURA EM PAINÉIS DE PLÁSTICO, ALUMÍNIO (SEGUNDA SOLUÇÃO DE COBERTURA)
CONCRETO E CAMADA IMPERMEÁVEL BLOCOS CERÂMICOS VAZADOS
TIJOLOS CERÂMICOS APARENTES


COBERTURA SUSPENSA E ARQUEADA
COM CENTRO VAZADO (impluvium)
RAMPA ELÍPTICA COMO ELEMENTO PLANTA ELÍPTICA
PRINCIPAL DO PRÉDIO COBERTURA SUSPENSA
JARDIM NO CENTRO DA EDIFICAÇÃO GRANDE ÁREA LIVRE INTERNA
EXTENSO VÃO LIVRE
ILUMINAÇÃONATURAL

EXPERIMENTAÇÃO EM AÇO E EM
CONCRETO ARMADO

TIRA PARTIDO DA LOCALIZAÇÃO NÃO
PRIVILEGIADA DO TERRENO

EXPERIMENTAÇÃO E ADAPTAÇÃO DE NOVOS MATERIAIS
CRIAÇÃO DE ELEMENTO SURPRESA

(BALÃO DE GÁS HÉLIO VERMELHO)

INTEGRANTE MÓVEL DA COBERTURA

QUE SE ENCAIXAVA NA ABERTURA
CIRCULAR DA COBERTURA, BATIZADA
DE IMPLUVIUM


ENCONTRA-SE HOJE SEM QUALQUER COBERTURA E ABRIGA A


FEIRA DE TRADIÇÕES NORDESTINAS.
DESMONTADO APÓS O TÉRMINO DA
NÃO HÁ NENHUMA AÇÃO DE PRESERVAÇÃO OU TOMBAMENTO
EXPOSIÇÃO
MAS ESTÁ LOCALIZADO DENTRO DA DELIMITAÇÃO DA APAC DE
SÃO CRISTÓVÃO.

O PAVILHÃO RECEBEU DOZE PRÊMIOS



EM BRUXELAS

EDIFÍCIO CASA ALTA EDIFÍCIO JUSTUS WALLERSTEIN


Rio de Janeiro, RJ Rio de Janeiro, RJ
1963 1953

CONCRETO ARMADO
ESTRUTURA EM CONCRETO APARENTE


ALVENARIA CERÂMICA
VIDRO

ALUMÍNIO
MADEIRAMENTO ENVERNIZADO

LAJE DUPLA
VIGAS DE CONCRETO EMBUTIDAS PLANTA EM ANEL
MODULAÇÃO FORMA NUCLEADA
FACHADA COMO ELEMENTO
ORDENADOR ÁREA DE CONVIVÊNCIA ABERTA NO INTERIOR DO ANEL
“LOTEAMENTO DE CONCRETO”


PLANTA LIVRE – ARQUITETURA ARQUITETURA SEM PRESENÇA
FLEXÍVEL
CRIAÇÃO DE SHAFTS PARA PRUMADAS RELAÇÃO DIRETA COM A NATUREZA
ELÉTRICAS E HIDRÁULICAS
USO DE MATERIAIS DURÁVEIS E COM SEU ASPECTO NATURAL

APENAS UMA DAS TORRES FOI FEITA


SEGUINDO O PROJETO DE BERNARDES, FOI OBJETO DE ESTUDOS DA UNIVERSIDADE FEDERAL DA PARAÍBA
AS OUTRAS TORRES FORAM SOBRE BENS DE INTERESSE ARQUITETÔNICO.
CONSTRUÍDAS SEM A SUA APROVAÇÃO

POSTO DE SALVAMENTO DA ORLA


Rio de Janeiro, RJ
19

CONCRETO ARMADO
TUBOS ESTRUTURAIS DE ALUMÍNIO
MADEIRA

FIBERGLASS PRÉ-MOLDADO(Plástico reforçado com
fibra de vidro)
PAINÉIS ESPELHADOS DE FIBRA DE VIDRO
MODULAÇÃO
GRANDES VÃOS
LONGOS BEIRAIS
TELHADO PLANO

ARQUITETURA SEM PRESENÇA (SUPERFÍCIE REFLETORA


DA PAISAGEM)

NÃO RECEBERAM O MATERIAL ESPECIFICADO


INICIALMENTE PELO ALTO CUSTO (PAINÉIS
ESPELHADOS) E FORAM CONSTRUÍDOS EM CONCRETO
ARMADO SEGUINDO ESPECIFICAÇÕES DO ARQUITETO

ENCONTRAM-SE DEGRADADOS E DESCARACTERIZADOS
TANTO COM RELAÇÃO À FUNÇÃO QUANTO À FORMA.

.


Figura 04: Fotografia atual da Residência de Maria Carlota Macedo Soares (foto acervo de Sergio Bernardes)

REFERÊNCIAS:

“O Rio do Futuro”, Revista Manchete, número especial, 678, 17 de abril de 1965.

ARCHITECTURE D’AUJOURD’HUI. Números: 13-14, 41-43, 78, 90.

BACKHAUSER, J.P. Sérgio Bernardes: sob o signo da aventura e do humanismo disponível


em: <http://www.vitruvius.com.br>

BACKHEUSER, J.P. A obra de Sergio Bernardes. Monografia de final de curso de pós-


graduação apresentada ao Departamento de Arquitetura da Universidade Federal de
Pernambuco, out. 1997. Não paginado.

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