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DOCÊNCIA EM

NEUROBIOLOGIA
SAÚDEDA ANSIEDADE
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Portal Educação

P842n Neurobiologia da ansiedade / Portal Educação. - Campo Grande: Portal


Educação, 2012.

91p. : il.

Inclui bibliografia
ISBN 978-85-8241-74-0

1. Ansiedade. 2. Neurobiologia. 3. Ansiedade patológica I. Portal Educação.


II. Título.

CDD 616.8522
SUMÁRIO

1 O QUE É ANSIEDADE: DEFINIÇÕES .......................................................................................4

2 MEDO OU ANSIEDADE? .........................................................................................................11


2
3 ANSIEDADE NORMAL E ANSIEDADE PATOLÓGICA ...........................................................15

4 CLASSIFICAÇÃO DOS TIPOS DE ANSIEDADE .....................................................................18

4.1 Transtorno do pânico ..............................................................................................................20

4.2 Fobia específica ......................................................................................................................23

4.3 Fobia social ..............................................................................................................................26

4.4 Transtorno obsessivo-compulsivo ........................................................................................30

4.5 Transtorno do estresse pós-traumático ................................................................................35

4.6 Transtorno de ansiedade generalizada .................................................................................40

5 TESTE DE ANSIEDADE EM ANIMAIS DE LABORATÓRIO ...................................................43

5.1 Teste do sobressalto potencializado pelo medo ..................................................................45

5.2 Teste de pressão à barra ........................................................................................................48

5.3 Teste do beber punido ............................................................................................................51

5.4 Teste da hipertermia induzida por estresse ..........................................................................53

5.5 Teste do labirinto em cruz elevado ........................................................................................55

5.6 Teste do labirinto em T elevado .............................................................................................58

5.7 Teste da transição claro-escuro .............................................................................................60

6 AS BASES NEUROBIOLÓGICAS DA ANSIEDADE ................................................................63

6.1 O Sistema de Inibição Comportamental ................................................................................68

6.2 O Sistema Cerebral de Defesa ................................................................................................71


6.3 Substâncias endógenas e ansiedade ....................................................................................75

6.4 O sistema GABA-benzodiazepínico .......................................................................................75

6.5 A serotonina.............................................................................................................................77

REFERÊNCIAS ...................................................................................................................................80

3
1 O QUE É ANSIEDADE: DEFINIÇÕES

“A ansiedade é um desejo daquilo que tememos, um temor


daquilo que desejamos, uma antipatia-simpática. É um
poder estranho que agarra o indivíduo sem que ele possa 4
desvencilhar-se dele, nem queira desvencilhar-se, pois tem
medo disso. Mas esse medo é também um desejo”.
Sören Kierkegaard

“Mas, em verdade, o que chora


Na minha amarga ansiedade
Mais alto que a nuvem mora,
Está para além da saudade
Não sei o que é nem consinto
À alma que o saiba bem.
Visto da dor com que minto
Dor que a minha alma tem.”
Fernando Pessoa

“Se marco uma entrevista às 2


1:15 já fumei 10 cigarros
Se vou gravar uma faixa
A mesa do estúdio está quebrada
Não sei esperar, não sei esperar (...)
Se tenho uma festa às 10
8:30 já estou pronto
Fico balançando os pés
Sentado na beira da cama
O tempo não passa pra mim (...)”
Cazuza
Embora seja considerada um mal atual, relacionada ao ritmo acelerado da vida nos dias
atuais, a ansiedade e as sensações desagradáveis que a acompanham têm sido alvo da
preocupação, curiosidade e do interesse humano, desde tempos muito remotos, e têm ocupado
o imaginário e a literatura nas mais diferentes culturas e nas mais variadas épocas históricas.
Os três trechos transcritos acima ilustram o fato. O primeiro encontra-se na obra “O
Conceito de Ansiedade”, de 1884, de autoria de Sören Kierkegaard, filósofo e teólogo
dinamarquês. 5
O segundo, retirado de um poema do poeta português Fernando Pessoa, foi escrito em
meados de 1930. O terceiro trecho refere-se à letra da música “Alta Ansiedade”, de autoria do
cantor e compositor carioca Cazuza, falecido em 7 de julho de 1990. Escritos em lugares
diferentes do mundo e em épocas históricas também diferentes, os três trechos têm algo em
comum: representam de forma clara a angústia experimentada por aqueles que acreditam sofrer
de ansiedade.
Embora esses relatos sejam de 1884, 1930 e da década de 80, respectivamente,
portanto relativamente atuais, a ansiedade humana tem despertado o interesse e a curiosidade
humana muito antes disso, há milênios.
Inscrições descobertas remetendo à era antes de Cristo, bem como relatos na literatura
leiga dos séculos subseqüentes, demonstram o antigo interesse das pessoas pelo tema. As
primeiras reflexões sobre a ansiedade, registradas na Grécia clássica, já sugerem a possível
existência de uma relação entre experiências subjetivas (aquilo que se sente) e sintomas
corporais (aquilo que o corpo mostra).
Embora o próprio Hipócrates, filósofo grego que viveu por volta de 370 a.C. e que é
considerado o pai da medicina, já tivesse descrito casos óbvios de fobias e de outros tipos de
ansiedade, a ansiedade raramente era tida como doença, até relativamente pouco tempo.
A relação entre experiências subjetivas e sintomas corporais, característica da
ansiedade, apresenta-se claramente na etimologia da palavra, bem como na de outras emoções
correlacionadas. Do ponto de vista etimológico, a palavra “ansiedade” deriva do termo grego
ansheim, que significa “estrangular, sufocar, oprimir”, remetendo à experiência subjetiva
característica da ansiedade. Já a palavra “pânico”, também considerado um dos tipos de
ansiedade, relaciona-se ao deus grego Pan, o qual, segundo a crença helênica, aterrorizava os
incautos por sua fealdade e grande estatura.
Outro deus grego que inspirava terror nos inimigos era Phobos, de onde deriva o termo
“fobia”, utilizado para designar outras categorias de ansiedade.
Embora muito anteriormente registrada, foi somente a partir do final do século XIX que a
ansiedade passou a ser encarada de forma diferente: as fobias adquiriram status de “problemas
médicos” e a ansiedade passou a ter maior importância na cultura ocidental.

Na Psiquiatria, a ansiedade adquiriu grande proeminência a partir da última classificação


feita por Sigmund Freud, quando separou a neurose de ansiedade da neurastenia, e distinguiu a
ansiedade crônica (a qual se relaciona à ansiedade generalizada do Manual de Estatística e 6
Diagnóstico, em sua quarta edição) dos ataques de ansiedade (os quais, atualmente,
denominam-se ataques de pânico).

Nas últimas décadas, o tema tem sido alvo de inúmeros estudos. As palavras dos
autores Dractu e Lader (1993) representam de forma clara o crescente aumento do interesse
sobre o tema:

“se a ansiedade não dá sossego aos homens, os homens, em resposta, resolveram não dar
sossego à ansiedade”

Os estudos científicos mais recentes sobre a ansiedade têm se dirigido às bases


genéticas, ao conhecimento da neuroquímica, às interpretações de resultados farmacoterápicos
e aprimoramentos de técnicas psicoterapêuticas, mas, via de regra, apresentam-se atrelados
aos estados patológicos, particularmente àqueles descritos nos atuais sistemas classificatórios
psiquiátricos, os quais serão mencionados de forma mais clara posteriormente: o Manual de
Diagnóstico e Estatística, em sua quarta edição (DSM-IV), publicado pela Associação
Psiquiátrica Americana, e a Classificação de Transtornos Mentais e de Comportamento do
Código Internacional das Doenças, em sua décima edição (CID-10), publicado pela Organização
Mundial de Saúde.
1 2

1) Manual de Diagnóstico e Estatística, quarta edição, publicado pela Associação Psiquiátrica Norte Americana
e 2) Classificação de Transtornos Mentais e de Comportamento do Código Internacional das Doenças, décima
edição, publicado pela Organização Mundial de Saúde.

As definições de ansiedade são inúmeras, bem como as causas de sua manifestação, e


variam de acordo com diferentes autores.
O professor Marcus Lira Brandão, um dos mais respeitados pesquisadores brasileiros
sobre as bases neurobiológicas da ansiedade, define a ansiedade, de modo geral, como sendo
um estado subjetivo de apreensão ou tensão, difuso ou vago, freqüentemente acompanhado por
uma ou mais sensações físicas – como aumento da pressão arterial, da freqüência cardíaca, da
respiração, urgência de micção ou defecação – induzidas pela expectativa de perigo, dor ou
necessidade de um esforço especial.
Na tentativa de se compreender as diferentes nuances da ansiedade, muitas outras
definições foram sendo criadas. De maneira geral, portanto, a ansiedade pode ser considerada
como sendo:

a) um estado emocional com a qualidade subjetiva do medo ou emoção correlacionada (terror,


horror, alarme, pânico, etc.);
b) uma emoção desagradável, podendo manifestar-se através de um sentimento de morte
iminente;
c) direcionada para o futuro;
d) relacionada tanto a um perigo reconhecível e real quanto a um perigo aquém da emoção
evocada, muitas vezes apenas potencial;
e) freqüentemente, a sensação subjetiva de apreensão ou medo é acompanhada por alterações
somáticas também de caráter subjetivo, como sensação de constrição torácica (aperto no peito),
de dificuldade de respiração (falta de ar, sufocamento), de fraqueza, etc.
f) com freqüência também acompanhada por alterações somáticas perceptíveis, como sudorese, 8
tremores, palpitação e outras funções relacionadas à atividade autonômica.

Qualquer que seja a definição empregada, a ansiedade parece ser composta, de


maneira geral, por duas categorias distintas de características: características mentais e
características físicas. Esse fato é especialmente importante quando se leva em consideração
que as características mais facilmente diagnosticáveis são as físicas: a taquicardia, os tremores,
a falta de sono, as palpitações, os emagrecimentos súbitos (ou aumentos de peso súbitos), entre
outros.
Por serem mais facilmente percebidas, e causarem grande desconforto, as pessoas
tendem a buscar ajuda médica para controlar especificamente esses quadros. Tem-se tornado
muito comum, portanto, um paciente dar entrada ao hospital relatando estar sofrendo de um
ataque cardíaco quando, na verdade, está sofrendo de uma crise de ansiedade.
Muitos médicos cardiologistas, inclusive, têm incluído em suas prescrições
medicamentos ansiolíticos, no lugar de medicamentos que atuariam especificamente sobre a
função cardiovascular, ao perceberem que os sintomas relatados dizem mais respeito à
condição ansiosa do paciente do que propriamente a um problema cardíaco.
Esse pequeno exemplo ilustra a complexidade do quadro ansioso e a importância da
multidimensionalidade da abordagem no tratamento de condições de ansiedade.
Além de definições a respeito do que representa a ansiedade, ainda pode ser
compreendida em termos de características individuais de personalidade. Assim, uma pessoa
pode ter uma personalidade mais ansiosa ou menos ansiosa, de forma inata, ou ainda
desenvolver um quadro de ansiedade que não faça parte de sua personalidade.
Desta maneira, a ansiedade poderia ser distinguida como um estado ou como um traço:
a ansiedade como um estado seria aquela transitória, passageira, geralmente voltada para um
fato ou situação específica (exemplificado de maneira ilustrativa pela expressão “estou ansioso”).
Nessa situação, os sentimentos de tensão e apreensão acima mencionados estariam
presentes, acompanhados pela hiper-reatividade autonômica, caracterizada pelos sintomas
físicos perceptíveis: taquicardia, sudorese, respiração rápida, tremores musculares, entre outros.
Já a ansiedade como um traço seria uma característica individual de personalidade
(exemplificado ilustrativamente pela expressão “sou mais ansioso”): as pessoas reagem
naturalmente com uma ansiedade maior ou menor a situações percebidas como estressantes.
Por exemplo: a forma como Maria reage a um problema pode ser muito diferente da 9
forma como Ana reage; se frente a um problema, de qualquer natureza, Maria se mostrar mais
ansiosa que Ana, pode-se dizer que Maria apresenta uma ansiedade-traço, característica de seu
modo de agir, de sua personalidade.
Assim, torna-se compreensível que um indivíduo com maior grau de ansiedade-traço
também apresente maior grau de ansiedade-estado, frente a situações que possam representar
algum tipo de ameaça à sua integridade física ou sobrevivência.
A ansiedade não se apresenta como um quadro constante: pode ser normal ou
desproporcional às possíveis causas; ser branda ou ter alguma gravidade; ser benéfica ao
indivíduo ou prejudicial; ocorrer esporadicamente ou de maneira persistente; ser causada por
condições físicas ou condições psicológicas; ocorrer de maneira isolada ou juntamente com
algum outro transtorno, como a depressão, por exemplo; pode afetar outras potencialidades
humanas, como a memória, ou não afetar o funcionamento normal do organismo, entre outras
condições.

Em linhas gerais, a ansiedade não representa um quadro único e homogêneo, pelo


contrário. Na dependência das características particulares, pode estar focada ou ser
desencadeada por situações específicas (como no caso das fobias), aparecer subitamente e
sem causa facilmente identificável (como no pânico), ser desencadeada por traumas anteriores
(como no transtorno de estresse pós-traumático), entre outras condições associadas a diferentes
tipos de ansiedade.

De qualquer forma, qualquer que seja o fator desencadeante ou a caracterização do


transtorno, uma coisa é fato: traz grande sofrimento para o indivíduo, muitas vezes atrapalhando
a realização de suas atividades habituais e prejudicando o curso normal da vida.

É importante mencionar, ainda, que os transtornos de ansiedade são muitas vezes


encarados de maneira bastante preconceituosa por um número relativamente grande de
pessoas. Muitas vezes, o diagnóstico de transtornos de ansiedade é interpretado, por aqueles
que não conhecem muito bem suas características, como falhas de caráter, fraqueza de
personalidade ou outras condições de pouco valor.

Essas interpretações equivocadas agravam ainda mais o sofrimento pessoal


experimentado por aqueles que vivenciam transtornos de ansiedade e o apoio familiar constitui-
se um fator de grande importância no tratamento de tais condições. 10
2 MEDO OU ANSIEDADE?

Os progressos recentes das neurociências, o advento da Etologia (ciência que estuda o


comportamento animal), a evolução da teoria da aprendizagem e o sucesso relativo da 11
psicofarmacoterapia vêm orientando a Psiquiatria em direção à Biologia.
Isso quer dizer que a Psiquiatria também vem interpretando a ansiedade de um ponto de
vista biológico.
Em outras palavras, a ansiedade também pode ser compreendida dentro do paradigma
evolucionário e, nesse contexto, algumas perguntas parecem ser relevantes: Por que sentimos
ansiedade? Como surge? Em que momento da história evolutiva dos seres humanos ela surgiu?
Se ela persistiu como um padrão de comportamento até o estágio atual do ser humano, que
vantagens biológicas pode ter proporcionado à espécie humana?
Ao se tentar compreender a importância evolutiva da ansiedade para a espécie humana
é imprescindível ter em mente a perspectiva instituída por Charles Darwin. Como se sabe,
Charles Darwin foi o naturalista inglês que propôs que todas as espécies biológicas existentes
fossem provenientes de um ancestral comum e que suas características, assim como as próprias
espécies, seriam decorrentes de uma seleção natural e sexual.
Essa é a teoria que representa o cerne dos fenômenos biológicos.
Dessa forma, Darwin apresenta fatos que indicam que os diferentes comportamentos e
emoções, tanto em animais quanto em humanos, tenham sido (e sejam até hoje) fundamentais
para a sobrevivência e seriam, portanto, biologicamente baseados nos princípios evolutivos.
Ou seja, os diferentes comportamentos e as diferentes emoções são características tão
confiáveis e conservadas nas espécies quanto às características corporais, tais como as formas
dos ossos, dos dentes ou qualquer outra estrutura corporal. Desta forma, Charles Darwin
analisou e explicou todas as emoções existentes do seguinte ponto de vista: Qual a função
dessas emoções? Como elas contribuíram para o processo de adaptação do indivíduo ao meio-
ambiente? Os princípios dessa análise feita por Darwin, sobre as emoções, encontram-se no
livro escrito por ele e intitulado The Expression of the Emotions in Man and Animals (A
Expressão das Emoções no Homem e nos Animais), publicada em 1872 e reeditada em1965.
De forma resumida, nesta obra, Darwin aponta o caminho de buscar o valor adaptativo
dos processos comportamentais e psicológicos, caminho esse que hoje é percorrido pela
Etologia.
Tendo em vista esta perspectiva, pergunta-se: O que a ansiedade representou – e ainda
representa – para espécie humana em termos de sobrevivência? Em que ponto ela pode ter
representado um benefício à espécie, a ponto de permanecer até os dias de hoje? Que
vantagens ela pode trazer? Uma segunda dúvida, muito freqüente no senso comum, é com 12
relação às semelhanças e diferenças entre ansiedade e medo. Qual a diferença entre os dois? O
que estou sentindo é ansiedade ou é medo? São padrões de emoção diferentes ou são iguais?
Essas dúvidas são realmente pertinentes, principalmente quando se considera a história
evolutiva desses dois padrões de emoção.
Se considerarmos o medo e a ansiedade a partir da perspectiva evolutiva instituída por
Charles Darwin, pode-se afirmar que ambos têm suas raízes nas reações de defesa dos
animais.
Ou seja, estariam baseadas no instinto de sobrevivência que determina estratégias de
defesa contra perigos comumente encontrados no meio ambiente.
Desta forma, quando um animal é confrontado com uma ameaça ao seu bem-estar, à
sua integridade física ou à sua própria sobrevivência, ele apresenta um conjunto de respostas
comportamentais e neurovegetativas, que caracterizam a reação de medo. Alguns exemplos das
respostas comportamentais da reação de medo são: tremores, taquicardia, sudorese, posturas
corporais de defesa, dilatação das pupilas, etc.
Quais seriam os estímulos considerados perigosos e, portanto, que estariam aptos a
desencadear tais comportamentos e reações? Isso varia de acordo com a biologia da espécie e
envolve conhecer diversos aspectos de sua história biológica, tais como: quais são seus
predadores naturais, quais situações representam perigo para aquela espécie, quais condições
podem colocar sua sobrevivência ou integridade física em risco.
Assim, por exemplo, as reações de medo de um gato podem ser provocadas pela
presença de um cachorro, mas não pela presença de um rato, já que a última alternativa não
representa para o gato um perigo biológico. Se transportarmos essa analogia para a espécie
humana, podemos listar uma série de situações em que as reações de medo poderiam ser
evocadas.
No entanto, diferentemente dos outros animais, não é somente a constituição biológica
que determina quais estímulos são considerados ameaçadores para os seres humanos; tão ou
mais importantes são as características sociais e ambientais em que os indivíduos vivem, bem
como as condições psicológicas de cada um e sua história de vida.
Assim, embora um estímulo possa, de maneira geral, eliciar uma reação de medo na
maioria das pessoas, muitas delas não irão considerá-lo como realmente associado a um perigo.
Vejamos um exemplo: uma pessoa está andando por uma rua quando se depara com
um grande cachorro. O fato da presença do cachorro eliciar ou não uma reação de medo vai
depender da história de vida dessa pessoa e de sua constituição psicológica, embora o cachorro 13
realmente pudesse representar um perigo à sobrevivência, se considerássemos apenas a
história biológica humana.
E muitos são os padrões de resposta possíveis, que variam de indivíduo para indivíduo:
a pessoa pode paralisar de medo, sem nunca ter tido uma experiência negativa com cachorros;
a pessoa pode sentir muito medo, por já ter tido experiências negativas com cachorros ou por ter
se lembrado de outras pessoas que vivenciaram experiências negativas; ou ainda, a pessoa
pode não se importar e não sentir medo, por ter contato freqüente com outros cachorros.
A diferença de comportamento vai depender - como já mencionado - da história de vida
e de características psicológicas individuais.
Mas qual é a relação entre o medo e a ansiedade? No que se assemelham e no que
diferem?
Embora exista ainda alguma discussão a respeito, e novas possíveis teorias estejam sendo
ainda desenvolvidas, de maneira geral, considera-se que as reações de MEDO seriam evocadas
em situações onde o perigo é considerado REAL.
Ou seja, é uma resposta a uma ameaça realmente existente, presente, definida.
A ANSIEDADE, por sua vez, embora apresente respostas comportamentais e
neurofisiológicas muito semelhantes às observadas nas reações de medo, seria evocada onde a
ameaça ou o perigo é apenas POTENCIAL.
Ou seja, embora a ansiedade possua a qualidade subjetiva do medo (sensação
desconfortável, freqüentemente voltada para a dúvida de que algo poderá ou não acontecer), o
perigo ou a ameaça podem não ser reais, concretos, iminentes.
De forma geral, pode-se dizer que as reações de medo envolvem uma certeza de perigo;
o perigo está presente; não há dúvidas sobre sua existência; é reconhecível. Já a ansiedade
envolve uma possibilidade de perigo ou ameaça; o perigo pode ou não estar presente, ou às
vezes nem existir; é um perigo potencial; não necessariamente é reconhecível.
Para exemplificar em termos práticos, pense na seguinte situação hipotética: Você está
andando por uma rua quando uma pessoa encapuzada e segurando uma arma caminha em sua
direção. Nessa situação, o que você sente: medo ou ansiedade? Muito provavelmente, sua
resposta seja MEDO. A ameaça está ali, ela é real, reconhecível, não há dúvidas sobre sua
existência.
Agora pense na seguinte situação hipotética: Você está no trabalho quando é abordado
por seu chefe, que diz que quer que você se dirija à sala dele em 1 hora. O que você sente 14
nessa situação: medo ou ansiedade? Você pode acreditar que sente os dois, uma vez que a
ansiedade possui a qualidade subjetiva do medo, mas é muito provável que, durante essa 1
hora, você fique extremamente ansioso. Pode ser que exista uma ameaça, ou seja, ela é
potencial, não é certa, é direcionada para o futuro, existem dúvidas.
Se, apesar dessas diferenças, a ansiedade se assemelha tanto ao medo em termos de
reações, isso significa que possui uma base neurofisiológica semelhante e que, portanto,
também foi semelhantemente selecionada ao longo da história biológica humana.
Ou seja, embora seja freqüentemente – e na maioria das vezes – interpretada como
sendo uma emoção negativa, se a ansiedade se manteve presente na psicobiologia humana até
hoje é porque algum tipo de benefício à sobrevivência da espécie ela representa. Portanto,
pergunta-se: Que tipo de benefício a ansiedade pode acarretar? Ao contrário do que se pode
pensar, a ansiedade não é um padrão patológico, doentio.
A ansiedade tem sido reconhecida como uma resposta habitual e freqüente do ser
humano ao seu meio. Mas pode, realmente, se tornar patológica.
3 ANSIEDADE NORMAL E ANSIEDADE PATOLÓGICA

Como dito acima, a ansiedade é considerada uma resposta habitual do ser humano ao
meio em que vive e às situações que vivencia. Do ponto de vista biológico, se ela está presente
até os dias atuais como um padrão de comportamento humano significa que possui alguma 15

função adaptativa. E realmente possui.


A sensação de ansiedade prepara o indivíduo para situações que podem ser difíceis,
sejam quais forem essas dificuldades. Ao se preparar para tais situações, a chance de sucesso
pode, conseqüentemente, aumentar. Além disso, a ansiedade adverte o organismo a respeito de
possíveis perigos, sejam eles físicos (dor, cansaço, esforço, ferimentos) ou psicológicos
(impotência, punição, frustração, separação).
Ou seja, a ansiedade motiva o indivíduo a providenciar o que é necessário para evitar o
perigo ou a ameaça, ou pelo menos reduzir suas conseqüências.
Um exemplo pode ser dado ao analisar a situação vivida por adolescentes que prestam
vestibulares concorridos. Muito provavelmente, eles irão se preparar durante um ano inteiro,
ansiosos por chegar o dia da prova. Mas essa ansiedade faz com que eles se preparem e se
dediquem, com o objetivo de evitar o dano – nesse caso, representado pela não-aprovação.
Essas medidas tomadas em função da ansiedade não irão garantir que esses
adolescentes sejam, com certeza, aprovados, mas minimizarão a chance de não o serem.
Portanto, como pode ser observado nessa e em outras inúmeras situações, a ansiedade não é,
por si só, uma condição negativa. Ela se torna negativa quando passa a ser patológica.
A própria Psiquiatria aceita que em todo ser humano existe um “grau” de ansiedade
considerado normal e que tem função adaptativa, o que remete, novamente, à perspectiva
biológica. No entanto, é difícil estabelecer o limite entre a ansiedade normal e a patológica,
precisar o momento em que ela passa de vantajosa para prejudicial.
Esse é, inclusive, um conceito que varia de acordo com diferentes autores, os quais
estudam os distúrbios de ansiedade.
Como mencionado, sabe-se que certo grau de ansiedade é necessário para um bom
desempenho em tarefas cognitivas.
Contudo, uma ansiedade exagerada pode ser inadequada, perturbando acentuadamente
o desempenho. Ou seja, conforme vai aumentando o grau de ansiedade de um indivíduo, o seu
desempenho também vai aumentando, melhorando as chances de sucesso em determinada
atividade; até que atinge um ponto a partir do qual o aumento da ansiedade passa a não ser
mais associado a vantagens e, sim, a prejuízos, passando a alterar o comportamento normal do
indivíduo e a afetar negativamente sua vida.
Esse conceito pode ser representado esquematicamente pelo gráfico abaixo. 16

Relação entre a ansiedade normal e a ansiedade patológica

É importante mencionar, no entanto, que delimitar qual é o ápice de ansiedade a partir


do qual se torna prejudicial, ou patológica, é uma tarefa quase impossível, considerando ser a
ansiedade uma experiência subjetiva e, portanto, altamente variável entre os indivíduos.
Pode-se mesmo dizer que a linha divisória entre a ansiedade normal e a patológica é
extremamente tênue, e sujeita a inúmeras variáveis, sendo praticamente impossível precisá-la.
Mas o que é e o que caracteriza a ansiedade patológica?
Segundo alguns autores, a ansiedade patológica pode ser considerada como uma
resposta inadequada a um determinado estímulo (ou a vários estímulos, simultaneamente).
Inadequada em função de sua intensidade e de sua duração (ser muito intensa e durar por muito
tempo).
Pode provocar, naqueles que a sofrem, confusão e distorções da percepção temporal,
espacial - em relação a pessoas e ao significado dos acontecimentos.
Diferentes pesquisadores afirmam que a ansiedade somente deverá ser considerada
patológica e, portanto, alvo de intervenção médica, quando for desproporcional às possíveis
causas aparentes, muito persistente e interferir no funcionamento global do indivíduo de maneira 17
significativa. A ansiedade patológica pode ser de natureza primária ou secundária. É primária
quando representa a manifestação principal ou única do quadro clínico e secundária quando é
resultado de outras doenças, de natureza psiquiátrica ou não.
De forma resumida, portanto, pode-se afirmar que a ansiedade é um estado emocional
que possui tanto componentes psicológicos (como medo persistente, preocupação, entre outros)
como componentes fisiológicos (como taquicardia, tremores, palpitações, sudorese, entre outros)
e que faz parte do repertório normal de experiências humanas.
Na grande maioria das vezes, inclusive quando a ansiedade é manifestada em
intensidade normal, chega mesmo a ser propulsora do desempenho.
Passa a ser patológica, portanto, quando é desproporcional à possível causa, persiste
por tempo muito maior do que o necessário, quando se repete em pequenos intervalos de tempo
ou quando não existe um fato ou situação específica, para os quais seja direcionada.
4 CLASSIFICAÇÃO DOS TIPOS DE ANSIEDADE

A classificação dos transtornos de ansiedade surgiu tardiamente, dentro da história das


classificações de transtornos mentais, por dois motivos principais.
Primeiro, pelo fato de que não eram reconhecidos como entidades clínicas distintas e, 18
segundo, porque as primeiras classificações oficiais de que se têm notícia se destinavam
basicamente a documentar pacientes internados em instituições psiquiátricas, sem a
preocupação de diferenciar uma condição de outra.
Nessas classificações iniciais, os sintomas mais representativos de ansiedade, quando
descritos, relacionavam-se à depressão grave e não à ansiedade propriamente dita.
Além do surgimento tardio, as classificações dos transtornos de ansiedade vêm
sofrendo inúmeras modificações ao longo das últimas décadas, em função do maior
conhecimento que vem sendo acumulado sobre as diferentes condições.
Atualmente, em detrimento dos critérios de classificação inicialmente empregados pela
Psiquiatria, os quais se mostravam muito subjetivos, foram adotados critérios mais operacionais,
tanto pelo Código Internacional das Doenças como, principalmente, pelas últimas classificações
elaboradas pela Associação Psiquiátrica Americana, designadas pela sigla DSM, do título em
inglês Diagnostic Statistical Manual ou Manual de Estatística e Diagnóstico.
Em 1994, a Associação Psiquiátrica Americana publicou a quarta edição do Manual de
Estatística e Diagnóstico das doenças mentais. Nesta edição, cada categoria diagnóstica contém
informações sobre aspectos diagnósticos, transtornos e aspectos associados, aspectos
específicos de idade/cultura/sexo, prevalência/incidência/risco, curso, complicações, fatores
predisponentes, padrão familiar e diagnóstico diferencial. A tabela abaixo apresenta os diferentes
tipos de ansiedade, segundo o Manual de Estatística e Diagnóstico das doenças mentais, em
sua quarta edição (DSM-IV).

Classificação dos transtornos de ansiedade segundo o Manual de


Estatística e Diagnóstico em sua quarta edição (DSM-IV)
 Transtorno do pânico sem agorafobia
 Transtorno do pânico com agorafobia
 Agorafobia sem história de transtorno do pânico
 Fobia específica
 Fobia social
 Transtorno obsessivo-compulsivo
 Transtorno de estresse pós-traumático
 Transtorno de estresse agudo
 Transtorno de ansiedade generalizada
 Transtorno de ansiedade devido a uma condição médica geral
 Transtorno de ansiedade induzido por substância
 Transtorno de ansiedade não-especificado
19

Embora, para fins práticos, a Associação Psiquiátrica Americana tenha organizado os


diferentes tipos de ansiedade em 12 transtornos, com características sintomáticas e diagnósticas
distintas, o diagnóstico preciso de um quadro de ansiedade é difícil de ser realizado e exige do
psiquiatra um grande preparo e envolvimento com o quadro do paciente.
Uma das dificuldades relatadas por esses profissionais como sendo a mais comumente
encontrada é a superposição que existe entre os sintomas da ansiedade e os sintomas
depressivos. Essa dificuldade, inclusive, não é relatada apenas pelos clínicos da área da
Psiquiatria; muitos pesquisadores relatam grande dificuldade em separar a ansiedade da
depressão, e vice-versa. Embora muitos pesquisadores tenham sugerido que ambos os quadros
– ansiedade e depressão – sejam componentes de um processo único, os quais denominam de
“estresse psicológico geral”, é importante salientar que possuem bases neurobiológicas distintas
e, portanto, constituem realmente duas entidades separadas.
Inclusive, alguns autores sugerem que essa aparente superposição entre os sintomas
da ansiedade e da depressão seja devido ao fato de existirem limitações psicométricas nas
escalas de avaliação de ansiedade utilizadas atualmente. Portanto, fica evidente a grande
importância de um diagnóstico preciso realizado pelo psiquiatra, de forma a evitar, inclusive,
tratamentos psicoterápicos e farmacológicos equivocados.
Embora do ponto de vista neurobiológico exista uma evidente distinção entre as vias
neurofisiológicas implicadas em cada uma dessas condições, muitas pessoas, no senso comum,
não sabem diferenciar precisamente a ansiedade da depressão.
De maneira geral, podem-se dizer esses dois quadros são diferentes basicamente em
dois aspectos: no nível de estimulação autonômica e na qualidade do afeto apresentado. Em
transtornos de ansiedade, há a presença de sintomas de hiperestimulação autonômica, tais
como palpitação, tremores, aumento da freqüência cardíaca e respiratória, sudorese,
hiperatividade constante, entre outros, enquanto que a depressão apresenta o quadro inverso,
uma hipoestimulação autonômica.
Com relação à qualidade do afeto presente, a depressão pode ser distinguida da
ansiedade pela presença do que se chama de anedonia (que é a perda da capacidade de sentir
prazer). No entanto, em função da semelhança na questão da ausência do afeto positivo, que é
observada tanto na depressão quanto na ansiedade, muitas vezes os quadros podem ser
confundidos entre si, o que justifica o fato de que a depressão seja o principal fator de 20
comorbidade em transtornos de ansiedade.
Para fins de melhor compreensão, o presente Módulo apresentará os aspectos
característicos dos principais transtornos de ansiedade observados atualmente na clínica.
Portanto, serão detalhadas as principais características dos seguintes transtornos: a)
transtorno do pânico (de maneira geral, e não subdividido em termos de presença ou ausência
de agorafobia, que é o medo de estar em locais públicos, abertos ou no meio de multidões); b)
fobia específica; c) fobia social; d) transtorno obsessivo-compulsivo; e) transtorno de estresse
pós-traumático; e f) transtorno de ansiedade generalizada. Esses transtornos foram escolhidos
para maior detalhamento em função de ocorrerem de forma mais freqüente na população em
geral, quando comparados aos demais transtornos de ansiedade.

4.1 Transtorno do pânico

Segundo o DSM-IV, um ataque de pânico pode ser caracterizado por um período de


medo ou desconforto intenso, o qual surge subitamente e aumenta progressivamente. Esse
pavor súbito e crescente atinge um pico rapidamente (10 minutos ou menos, em geral) e é
freqüentemente acompanhado por uma sensação de perigo e morte iminentes, e de urgência de
fuga.
A sensação de pavor é acompanhada por, no mínimo, 4 a 13 sintomas somáticos ou
cognitivos, geralmente associados a uma hiperativação autonômica, incluindo: palpitações;
sudorese; tremores; sensação de falta de ar ou sufocamento; sensação de abafamento; dor ou
desconforto torácico; vertigens; despersonalização; medo de perder o controle ou de “estar
ficando louco”; medo de morrer; parestesias; arrepios ou ondas de calor.
Em um ataque de pânico, podem não ocorrer todos esses sintomas, mas sempre um
mínimo de 4 deles estará presente.
Esses ataques ocorrem de maneira inesperada, recorrente, sendo freqüentemente
seguido por pelo menos um mês de preocupação e medo persistentes a respeito da
possibilidade de se ter um novo ataque e de não ser capaz de controlá-lo, caso venha a ocorrer.
O transtorno do pânico, com ou sem agorafobia (medo de lugares abertos, públicos e 21
de multidões), tem sido considerado como um dos transtornos de ansiedade mais
incapacitantes, tanto em função da sensação experimentada por quem o apresenta como pelas
constantes buscas por tratamento e hospitais. Na tentativa de controlar o transtorno ou
simplesmente de evitar que novos ataques aconteçam.
Os relatos mais freqüentes de pacientes, com relação à sensação experimentada em
um ataque de pânico, dizem respeito ao medo intenso de morrer, e à sensação de que
realmente irão morrer naquele instante. Isso faz com que essas pessoas criem uma expectativa
de que isso pode ocorrer a qualquer momento, e que da próxima vez não haverá escapatória.
Portanto, é fácil perceber a intensa angústia e sofrimento causados por esse transtorno.
Outra característica relevante desse transtorno relaciona-se ao comportamento de
evitação que a pessoa passa a desenvolver. Isso significa que, tendo ocorrido um ataque de
pânico em um determinado local, a pessoa passa a evitar esse local ou outros que remetam
àquele em que um ataque tenha ocorrido. Isso porque ela passa a acreditar que aquele contexto
pode, novamente, desencadear uma nova crise.
Esse comportamento acaba por limitar drasticamente a autonomia e a vida cotidiana
desses pacientes, uma vez que passam a não querer mais realizar tarefas sozinhos, por medo
de que ocorra um novo ataque e de que ninguém possa socorrê-lo.
Em função dessa característica, a vida social e profissional de pessoas que sofrem
com o transtorno do pânico pode se tornar muito comprometida, uma vez que eles passam a
desenvolver uma ansiedade antecipatória a qualquer evento ou situação pelos quais precisem
passar.
Em alguns casos, o uso de substâncias psicoativas pode desencadear um ataque de
pânico em pessoas que nunca o havia apresentado.
É o caso da maconha, de alguns alucinógenos e de substâncias psicoestimulantes
como a cocaína e algumas anfetaminas.
No entanto, esses casos não caracterizam a existência de transtorno do pânico e, sim,
um ataque de pânico secundário, induzido por substância.
Na comunidade norte-americana, parece haver uma prevalência do transtorno do
pânico da ordem de 3,2% nas mulheres e 1,3% nos homens.
Outros levantamentos, no entanto, sugerem que as mulheres apresentem ainda
maiores prevalências de ocorrência do transtorno do pânico: 4 mulheres para cada homem com
relação ao transtorno do pânico com agorafobia e 1,3 mulheres para cada homem com relação
ao transtorno do pânico sem agorafobia. Existem dados que indicam que, ao longo da vida, 22
exista uma prevalência de transtorno de pânico da ordem de 3,5%, considerada relativamente
alta quando comparada a outras doenças incapacitantes.
Essas proporções são similares ou maiores que as de outros distúrbios médicos
comuns, como a hipertensão, o que sugere a relativamente alta ocorrência do distúrbio nessa
população. Pacientes com transtorno do pânico, assim como os pacientes com ataques de
pânico, mas que não se enquadram no critério para o transtorno do pânico, tendem a ser
grandes usuários de serviços médicos.
Uma explicação para o fato é que estes pacientes são predispostos a considerar sua
saúde como estando sempre frágil e necessitando de consulta e tratamento médico. Isso
representa enormes custos anuais aos programas de saúde.
Com relação à idade de aparecimento dos sintomas, alguns levantamentos sugerem
que os primeiros sintomas do transtorno do pânico surjam entre o final da adolescência (por volta
dos 17 anos) e o início da idade adulta (em torno dos 25 anos), embora muitas variações
individuais ocorram. Alguns estudos indicam que existe uma correlação positiva entre a
ocorrência de transtornos de ansiedade na infância e o desenvolvimento de transtorno do pânico
na idade adulta.
Isso quer dizer que, em grande número de casos, pacientes adultos com ataques de
pânico podem ter sido crianças dependentes, medrosas, com intensa ansiedade e, muitas vezes,
que tenham apresentado dificuldades no período escolar.
Sugere-se, inclusive, que indivíduos que tenham apresentado ansiedade de separação
na infância (ansiedade excessiva em relação ao afastamento dos pais ou de seus substitutos.
Não adequada ao nível de desenvolvimento da criança) tenham maior probabilidade de
desenvolver ataques de pânico (bem como fobia social e transtorno obsessivo-compulsivo) na
vida adulta quando confrontados com situações de perdas ou separações.
Mas quais são as causas do transtorno do pânico? Muitos trabalhos encontram-se
atualmente em curso, nas mais diferentes áreas do conhecimento, na tentativa de se responder
a esse questionamento. Acredita-se que a etiologia do transtorno, como a maior parte dos
transtornos de ansiedade, seja de ordem multifatorial; ou seja, não pode ser explicada em
termos de apenas uma causa e, sim, como um conjunto delas. Nesse contexto, incluem-se
fatores biológicos, genéticos, psicológicos, sociais e cognitivo-comportamentais, os quais, em
conjunto, contribuem para o seu aparecimento.
O tratamento do transtorno do pânico baseia-se numa combinação do uso de
medicamentos e técnicas psicoterapêuticas comportamentais. Considerada muito eficaz, a 23
terapêutica farmacológica é baseada nos antidepressivos tricíclicos, inibidores seletivos da
recaptação de serotonina, inibidores da enzima monoaminoxidase e em alguns
benzodiazepínicos.
As principais drogas utilizadas no tratamento do transtorno do pânico têm sido a
imipramina, a qual é considerada como a droga referência para comparação de outros
medicamentos.
A clomipramina, que parece ser tão eficiente quanto à imipramina, mas atuando em
doses menores, benzodiazepínicos como o alprazolam e inibidores seletivos da recaptação de
serotonina tais como a fluoxetina, a paroxetina, a fluvoxamina, a sertralina e o citalopram. Além
desta abordagem farmacológica, as abordagens psicoterapêuticas comportamentais e cognitivas
têm alcançado êxito no tratamento dos sintomas fóbicos e nas conseqüências psicológicas do
pânico.

4.2 Fobia específica

Medo de barata, medo de voar de avião, medo do mar, medo de lagartixa, medo de
altura. Esses são, entre tantos outros, medos muito comuns. No entanto, o medo direcionado a
determinada situação somente passa a constituir um quadro de fobia específica quando
influenciar decisivamente a vida e a saúde do indivíduo.
Fobias específicas são caracterizadas pelo medo intenso e pavor, muitas vezes
paralisante, de determinadas situações, altamente específicas, ainda que a situação
desencadeante seja inofensiva e o medo pareça irracional.

Além do pavor à determinada situação realmente presente, a fobia específica se


caracteriza pela antecipação da situação temida (chamada de situação fóbica); ou seja, a pessoa
tem intenso medo de se deparar com tal situação, mesmo que ela não esteja presente. Alguns 24
exemplos de estímulos fóbicos são: lugares fechados (claustrofobia), animais, altura (acrofobia),
alimentos, trovão, ventos, escuridão, tratamento dentário, avião, ferimentos, dirigir, entre outros.

Da mesma forma como ocorre nos demais transtornos de ansiedade, esse medo é um
medo persistente, excessivo e, na maioria das vezes, irracional.

A pessoa que apresenta fobia específica tem consciência da irracionalidade ou


improcedência do medo que sente a determinadas situações, mas não consegue controlá-lo, e a
consciência da irracionalidade do seu medo acaba por trazer um sofrimento ainda maior, pois
sabe que existe, mas não pode controlá-lo.

Em função disso, a pessoa passa a evitar inúmeras situações com medo de que a
situação fóbica se apresente - o que interfere diretamente em seu fluxo de vida, ou acaba
limitando suas ações. Tanto o medo intenso da possível ocorrência da situação fóbica quanto o
comportamento de evitar inúmeras condições, fazem com que a rotina dessas pessoas seja
significativamente alterada, bem como seus relacionamentos, aumentando ainda mais o quadro
de angústia gerado por esse transtorno de ansiedade.

Até o início da década de 90, a fobia específica era chamada de fobia simples,
principalmente em função do DSM-IV assim classificar esta condição. Após a renomeação, em
sua quarta edição, a fobia específica passou a ser subdividida em cinco tipos principais: 1) fobia
específica tipo animal; 2) fobia específica tipo ambiente natural; 3) fobia específica tipo sangue-
injeção-ferimentos; 4) fobia específica tipo situacional; e 5) fobia específica de outro tipo não
classificado. Os critérios diagnósticos do DSM-IV para fobias específicas são os seguintes:

A – Temor significativo e persistente, excessivo ou irracional, desencadeado pela presença ou


antecipação de um objeto ou situação específica;
B – A exposição ao estímulo fóbico quase invariavelmente provoca ansiedade, que pode tomar a
forma de um ataque de pânico situacional;

C – A pessoa reconhece que seu temor é excessivo e irracional (exceto em crianças);

D – As situações temidas são evitadas ou são vividas com intensa ansiedade e desconforto;

E – A evitação, a ansiedade antecipatória ou o desconforto na situação temida interferem 25


significativamente com a rotina normal da pessoa, desempenho acadêmico ou profissional,
atividades ou relacionamentos, ou há um desconforto significativo por ter a fobia;

F – Em pessoas com menos de 18 anos, a duração deve ser de pelo menos seis meses;

G – A ansiedade, ataques de pânico ou evitação fóbica associada com o objeto específico ou


situação, não é mais bem classificada como outra doença mental, como transtorno obsessivo-
compulsivo, transtorno de estresse pós-traumático, transtorno de ansiedade de separação, fobia
social, transtorno do pânico com agorafobia ou sem agorafobia, sem história de transtorno do
pânico.

Geralmente, a fobia específica se inicia na infância ou adolescência, com exceção das


fobias de origem traumática, as quais não apresentam necessariamente uma idade característica
para início.

É, muitas vezes, subdiagnosticada, ou seja, os pacientes acabam por não procurar


atendimento médico, somente quando apresentam alguma comorbidade que agravam o quadro,
como no caso dos ataques de pânico em contexto fóbico. Há uma estimativa de que somente 12
a 30% dos pacientes busquem ajuda profissional.

O índice de comorbidade é relativamente alto: estima-se que entre 50 e 80% dos


pacientes com fobia específica tenham algum outro transtorno psiquiátrico.

É um transtorno de ansiedade com prevalência relativamente alta: alguns estudos


indicam cerca de 10% de taxa de prevalência de fobias específicas em algumas comunidades.
As prevalências são, em geral, maiores em mulheres, o que pode refletir diferenças genéticas ou
ambientais nos padrões etiológicos das fobias.
Alguns pesquisadores discutem o fato de que a transmissão social de medos poderia
ser mais freqüente e facilitada nas mulheres, daí a maior prevalência nesse gênero. Qualquer
que seja a explicação constata-se que a fobia específica é o transtorno mental mais comum em
mulheres e, nos homens, perde apenas para abuso de substâncias.

Dados existentes sugerem que familiares de pacientes com fobia específica


apresentam maior chance de também apresentar tal transtorno. Existe uma possível agregação 26
familiar pelo tipo de fobia, embora tal conclusão necessite de estudos adicionais para sua
confirmação.

No Brasil, não existem muitos estudos sobre fobias específicas. Um grupo de


pesquisadores, os quais investigaram a morbidade psiquiátrica na população da região de Porto
Alegre, verificou uma prevalência estimada de fobia específica de 12,8%.

Ao contrário do que ocorre com a maioria dos transtornos de ansiedade, os quais


possuem duas vertentes de tratamento, o psicoterapêutico e o farmacológico, a fobia específica
possui um tratamento preponderantemente psicoterapêutico, sendo a abordagem farmacológica
empregada apenas em quadros de comorbidade.

O tratamento mais eficaz para as fobias específicas tem sido a exposição sistemática
ao objeto ou situação fóbica, quando o indivíduo é exposto à fonte de pavor. Geralmente, são
realizadas sessões semanais de exposição gradual até a resolução do problema. Atualmente,
com o desenvolvimento da tecnologia, exposições a situações fóbicas por meio de realidade
virtual têm sido empregadas com sucesso.

4.3 Fobia social

Embora o termo “fobia social” tenha sido cunhado em 1903, para designar o medo que
algumas pessoas têm de serem observadas enquanto realizam tarefas, o transtorno de fobia
social somente passou a ter mais importância a partir da terceira edição revisada do DSM. A
fobia social é um transtorno de ansiedade caracterizado pelo medo de ser observado ou
analisado pelos outros, ou ainda pelo medo do embaraço durante a interação com outras
pessoas, ou em situações de exposição pública.

A pessoa com transtorno fóbico social apresenta um medo intenso e persistente de


uma ou mais situações nas quais poderá ser exposta à possível avaliação por parte de outras 27
pessoas, como por exemplo: comer, beber, falar em público, ser o centro das atenções, interagir
com o sexo oposto, entre outras situações. A pessoa tem constante pavor de fazer algo em
público, temendo comportar-se de maneira humilhante ou embaraçosa.

Em função desse medo, acaba evitando qualquer tipo de situação em que a


possibilidade de interagir com outras pessoas exista, isolando-se e criando um quadro de
angústia do qual não consegue sair. O comportamento de evitar o contato com outras pessoas,
temendo ser analisado ou apenas observado, caracteriza o quadro chamado de esquiva fóbica.

Em função de muitas dessas situações não poderem ser evitadas, a pessoa acometida
pela fobia social apresenta intensas manifestações de ansiedade, o que fornece uma leve
perspectiva do grande sofrimento individual experimentado por esses pacientes. A fobia social
pode ser classificada em dois subtipos: generalizada e não generalizada.

O subtipo generalizado inclui indivíduos com amplo espectro de medos sociais, ao


passo que o subtipo não generalizado envolve a ansiedade limitada a situações específicas.

A despeito de ser um dos transtornos de ansiedade mais freqüentes na população em


geral, a fobia social ainda é um transtorno relativamente negligenciado. Isso porque a grande
maioria das pessoas não a considera como um quadro patológico, portanto, consideram que não
há necessidade de tratamento médico e acompanhamento.

Pelo contrário, muitas vezes interpretam a grande dificuldade de interação com outras
pessoas como falta de sociabilidade ou até mesmo como uma fraqueza ou falha de caráter. Isso
demonstra o duplo sofrimento experimentado pelos fóbicos sociais: sofrem com o medo que
sentem da possível interação com outros e sofrem pelo julgamento que é feito deles pela grande
maioria das pessoas.
Os próprios clínicos de outras áreas, que não a Psiquiatria, muitas vezes subestimam
ou sub-reconhecem um quadro de fobia social. Isso é preocupante, uma vez que o diagnóstico
precoce pode evitar o desenvolvimento de comorbidades, favorecendo um melhor prognóstico.

Estima-se que a prevalência de fobia social ao longo da vida fique entre 10 e 15%,
sendo o terceiro transtorno psiquiátrico mais comum na prática clínica, ficando atrás da
depressão e da dependência ao álcool. 28

Na prática médica, costuma ser a razão primária para a busca de tratamento, embora o
desenvolvimento de comorbidades psiquiátricas, como depressão, pânico ou abuso de
substâncias, acabem muitas vezes por ser o principal motivo para buscar tratamento médico.

Esse é um importante aspecto associado à ocorrência de fobia social: a relação


estreita existente entre este transtorno e o desenvolvimento de dependência a substâncias
psicoativas, como o álcool e outras.

De acordo com alguns autores, os transtornos de ansiedade, e em especial a fobia


social, quando têm um início precoce na adolescência, parecem trazer severas conseqüências
potenciais, predispondo os indivíduos afetados a uma maior vulnerabilidade para a depressão e
para transtornos envolvendo o abuso de substâncias. Diversos estudos, utilizando evidências
clínicas e epidemiológicas, têm demonstrado que a fobia social tende a preceder o início dos
problemas com o álcool.

Os pesquisadores explicam essa relação em termos de tentativa de automedicação: ao


experimentar bebidas alcoólicas, as pessoas com fobia social experimentam uma sensação de
relaxamento, de maior sociabilidade, de diminuição do medo e dos sintomas ansiosos pelos
quais eram dominadas anteriormente. Assim, a ação do álcool acaba por reforçar seu uso
contínuo, podendo levar ao abuso comórbido, que representa uma importante complicação dos
quadros de fobia social.

E essa situação, infelizmente, é muito mais freqüente do que se pensa: um grande


número de parentes de alcoolistas relata que seus familiares passaram a fazer uso de grandes
quantidades de bebidas alcoólicas para se tornarem mais sociais e conseguirem conviver em
sociedade, o que, para eles, era muito difícil antes da bebida. Isso é um aspecto a ser
considerado no tratamento do alcoolismo, uma vez que pessoas com fobia social devem ser
acompanhadas de maneira mais próxima, em função deste quadro contribuir para a recidiva do
uso de álcool.

Apenas a título de exemplo, um estudo realizado em 1998 mostrou que 70% dos
pacientes com fobia social estudados relataram que o quadro fóbico se iniciou antes do
alcoolismo, sendo que 60% destes bebiam deliberadamente para suportar a fobia, o qual reforça
a hipótese da automedicação. 29

A etiologia da fobia social ainda não se encontra totalmente esclarecida, embora


existam algumas evidências sugerindo uma grande importância de fatores familiares, genéticos e
neurobiológicos. A ocorrência de traumas e dificuldades na infância estão implicados como
fatores de contribuição na gênese da fobia social.

Com relação à transmissão genética, sabe-se que familiares de pacientes com fobia
social apresentam o mesmo diagnóstico com uma freqüência maior que familiares de pacientes
com síndrome do pânico ou que pessoas sadias.

É necessário fazer uma diferenciação entre pessoas que sofrem com timidez excessiva
e aquelas que possuem fobia social.

Embora os dois quadros apresentem muitas semelhanças, tais como: ocorrer em


situações de desempenho social, reconhecer o medo como irracional e produzir fortes sintomas
ansiosos, se diferenciam em outros aspectos: pacientes com fobia social são acometidos por um
medo paralisante de situações de interação com outras pessoas, enquanto que pessoas tímidas,
embora se sintam desconfortáveis, não sentem um medo tão intenso; embora os tímidos possam
sentir-se encabulados em determinadas situações, não desejam sair correndo por medo daquela
situação, nem ficam com pensamentos obsessivos sobre a possibilidade de uma interação
pública, como ocorre com fóbicos sociais; pacientes com fobia social freqüentemente
apresentam ataques de pânico frente a situações sociais, o que não acontece com pessoas
apenas tímidas; e, tão importante quanto os demais aspectos, embora os tímidos possam sentir-
se desconfortáveis em algumas situações, não chegam a experimentar o sofrimento intenso
experimentado por aqueles que possuem fobia social.
Com relação às formas existentes de tratamento, embora a busca por tratamento
médico para tal condição seja relativamente pequena, a fobia social responde tanto à terapia
medicamentosa quanto ao tratamento psicoterapêutico.

Do ponto de vista farmacológico, o tratamento da fobia social tem quatro objetivos


principais: reduzir e controlar a ansiedade antecipatória; controlar as manifestações físicas e
subjetivas da ansiedade quando da exposição a estímulos eliciadores de ansiedade; eliminar a 30
esquiva fóbica associada; e tratar adequadamente, também, os transtornos comórbidos
associados.

Nesse contexto, três classes de fármacos têm se mostrado eficazes na fobia social: os
betabloqueadores (em casos de fobia social não generalizada, ou seja, circunscrita a uma
determinada situação) e os benzodiazepínicos e antidepressivos (em casos de fobia social
generalizada).

Do ponto de vista psicoterapêutico, certos tipos de psicoterapia podem auxiliar os


pacientes e, muitas vezes, representam a principal e mais vantajosa alternativa, uma vez que
muito do que se aprende durante a psicoterapia pode ser usado no decorrer da vida do paciente,
funcionando como um instrumento para a prevenção de recaídas.

A terapia do tipo cognitivo-comportamental tem sido amplamente utilizada com este


intuito, embora muitos pacientes apresentem apenas uma diminuição parcial dos sintomas.

4.4Transtorno obsessivo- compulsivo

O ator norte-americano Jack Nicholson interpreta no filme “Melhor Impossível” (As


Good As It Gets), aclamado pelo público no ano de 1997, um homem chamado Melvin Udall.
Melvin é um escritor solitário e grosseiro, que leva uma vida no mínimo peculiar.
Quem assiste ao filme percebe claramente os principais sintomas do transtorno
obsessivo-compulsivo, o qual será denominado a partir deste ponto apenas pela sigla TOC.

Melvin sofre deste transtorno, o que significa dizer que sua vida é delineada em função
das manias que desenvolveu ao longo dos anos. Apenas a título de exemplo, Melvin tem, em
seu armário do banheiro, uma dezena de sabonetes, uma vez que utiliza cada um apenas uma
vez, jogando-o no lixo em seguida. 31

Outra mania sua diz respeito ao número de vezes que precisa verificar se a porta está
trancada antes de ir se deitar. A posição dos chinelos à beira de sua cama também deve estar
precisamente correta, entre outras manias apresentadas pelo personagem.

Embora provoque risos e surpresas, é fácil perceber, ao assistir o filme, como esse
quadro psiquiátrico acaba por afastá-lo do convívio com outras pessoas, as quais o consideram
um excêntrico, ou apenas uma pessoa muito esquisita, e isso vai trazer problemas mais sérios à
sua vida. É uma sugestão de filme que vale a pena assistir para se compreender um pouco mais
das características sintomáticas do TOC, embora esteja representada anedoticamente.

Do ponto de vista psiquiátrico, o TOC é caracterizado pela presença de obsessões,


compulsões e/ou manias que causam profunda ansiedade e sofrimento.

Obsessões podem ser definidas como processos mentais – pensamentos, idéias,


impulsos e imagens – que são vivenciados como intrusivos, repetitivos e incômodos. Podem ser
criadas a partir de qualquer evento mental, tais como palavras, medos, preocupações,
memórias, imagens, músicas, pessoas ou cenas. Já as compulsões são definidas como
comportamentos ou pensamentos repetitivos, intensos, que são realizados para diminuir o
incômodo ou a ansiedade causada pelas obsessões, ou para evitar que uma situação temida
venha a ocorrer, e estes acabam virando regras a serem cumpridas rigidamente.

Assim, no caso do personagem Melvin Udall, mencionado anteriormente, sua


compulsão por limpeza se dava pelo temor de contrair alguma doença, e o fator doença era,
para ele, uma obsessão.

É fácil perceber, portanto, como as duas situações se acompanham: desenvolve-se um


quadro de obsessão por alguma idéia e um quadro de compulsão pode ser desenvolvido à
medida que comportamentos para evitar a idéia obsessiva passam a ocorrer repetitivamente.
Existe uma imensa variedade de obsessões e compulsões possíveis.

O diagnóstico para TOC, entretanto, é feito quando as obsessões e/ou as compulsões


causam profunda interferência nas atividades do indivíduo, ou as limitam, quando consomem
tempo (pelo menos uma hora por dia para realizá-las). E quando passam a causar sofrimento e
incômodo tanto para o paciente quanto para seus familiares.

Assim como outras condições psicopatológicas, não existe um diagnóstico laboratorial 32

para identificação deste quadro psiquiátrico, estando o diagnóstico vinculado apenas à avaliação
clínica. Entretanto, é importante ressaltar que, apesar dos casos mais típicos de TOC em geral
não serem de difícil identificação, trata-se de um quadro que faz fronteira com vários outros
transtornos mentais, o que pode dificultar seu diagnóstico diferencial.

Em geral, seus sinais e sintomas parecem seguir um contínuo entre os transtornos de


movimentos repetitivos, que variam dos tiques simples à ideação obsessiva, formando um
espectro de quadros patológicos que incluem, entre outros:

 Transtornos somatoformes: presença repetida de sintomas físicos associados à


busca constante de assistência médica, sem que os médicos consigam encontrar algo anormal;
 Transtornos alimentares;
 Tricotilomania: distúrbio caracterizado por arrancar cabelos de maneira
compulsiva e sem finalidade estética;
 Transtornos do controle dos impulsos: comportamentos repetitivos baseados no
fracasso em resistir a um impulso ou à tentação em executar um ato que pode ser nocivo à
própria pessoa ou a outros;
 -Outras condições.
Quando alguns sintomas do quadro de TOC passam a ocorrer em conjunto, esses
sintomas podem ser agrupados e analisados como um único quadro.

Assim, já foi possível estabelecer algumas categorias sintomatológicas desta condição


psiquiátrica: obsessões religiosas, sexuais e compulsões relacionadas; obsessões de agressão e
compulsões relacionadas; obsessões de simetria e compulsões de ordenação e arranjo;
obsessões de contaminação e compulsões de limpeza ou lavagem; e obsessões e compulsões
de colecionismo.

É importante ressaltar, ainda, que a simples ocorrência de sintomas obsessivo-


compulsivos não determina o diagnóstico do TOC.

Eles podem fazer parte da apresentação clínica de outro transtorno primário, como
depressões, esquizofrenias e demências. Podem também ser manifestações normais de 33

determinadas fases da vida, como os rituais na hora de dormir observados na infância e outros
rituais presentes durante a gravidez e puerpério, tais como pensamentos intrusivos sobre a
saúde do feto ou rituais de verificação de bem-estar do recém-nascido.

Por isso, assim como no caso dos outros transtornos psiquiátricos mencionados nesta
apostila, torna-se extremamente importante o treinamento médico adequado para fazer o preciso
diagnóstico de uma real condição de TOC.

Vários autores salientam que, no início do processo de instalação de um quadro de


TOC, nem sempre os sintomas têm um caráter claramente classificável como obsessivo. No
início, o TOC pode ser manifestado apenas como sintomas de ansiedade, principalmente fobias,
ou como distúrbios do humor, com quadros depressivos ou certa disforia, acompanhada de
tensão e irritabilidade. Acredita-se que tende a se instalar inicialmente entre a infância e o início
da adolescência, persistindo na fase adulta. No entanto, ainda não existe um consenso sobre
como determinar a idade de início do aparecimento dos sintomas.

A maioria dos estudos existentes considera o surgimento dos sintomas como a idade
de início do transtorno; outros consideram o início do incômodo causado pelos sintomas ou a
primeira vez em que o paciente procurou ajuda profissional como a idade de início.

Um estudo epidemiológico americano, entrevistando uma amostra populacional de


20.862 indivíduos, constatou que 64% dos portadores de TOC apresentaram início dos sintomas
antes dos 25 anos de idade, e 74% antes dos 30 anos.

Esses dados confirmam observações de estudos clínicos de que o TOC instala-se


predominantemente na infância, na adolescência e no início da idade adulta. Para alguns
pesquisadores, quanto mais precoce for o início do transtorno, maior parece ser a gravidade dos
sintomas obsessivos, e pior tende a ser sua evolução.
De uma maneira geral, parece haver uma grande demora entre o início dos sintomas
obsessivos e a busca por tratamento. Alguns estudos indicam que esse tempo costuma ser, em
média, de sete a dez anos.

Essa demora talvez possa ser explicada, em parte, pelo caráter secreto e reservado
dos sintomas, que faz com que os pacientes evitem ao máximo o contato com psiquiatras e só
procurem auxílio quando a intensidade do quadro se acentue a tal ponto que os familiares e 34
amigos precisem intervir.

Estudos sobre a evolução dos quadros obsessivos demonstram que ela é crônica na
maioria das vezes, sendo raros os períodos de remissão completa dos sintomas. Os sintomas
obsessivos, ainda, apresentam flutuações, com períodos de melhora e piora, sem que ocorra
remissão completa na maioria dos casos.

Existem evidências de que, na fase adulta, o curso do TOC pode ser mais episódico e
menos grave em mulheres do que em homens. Além disso, mulheres com TOC podem ter um
início mais agudo do transtorno do que homens, o que facilitaria tanto o diagnóstico quanto o
tratamento. No período da infância, entretanto, parece haver uma preponderância do transtorno
em meninos.

Alguns estudos epidemiológicos sugerem que o TOC seja menos raro do que se
supunha anteriormente e, segundo a Organização Mundial da Saúde, é atualmente a décima
causa de incapacitação no mundo.

A influência de fatores genéticos na etiologia do TOC tem sido investigada por meio de
estudos de famílias, estudos com gêmeos e, mais recentemente, estudos de genética molecular.

Em vários estudos com gêmeos, as taxas de concordância de TOC entre gêmeos


monozigóticos variam entre 53 e 87%.

Enquanto para gêmeos dizigóticos elas variam entre 22 e 47%, sugerindo um


componente genético forte para este transtorno, embora os fatores ambientais pareçam
contribuir decisivamente para o seu aparecimento, uma vez que a concordância em gêmeos
monozigóticos é inferior a 100%. Além disso, parece haver maior prevalência de TOC, sintomas
obsessivo-compulsivos, Síndrome de Tourette (caracterizada pela presença intensa de tiques) e
transtorno de tique motor ou vocal crônico entre familiares de pacientes com TOC, o que sugere
um forte componente familial.

Com relação ao tratamento empregado para quadros de TOC, e seguindo a tendência


já manifestada e mencionada nos subtipos de ansiedade mencionados anteriormente, a
psicoterapia aliada à intervenção medicamentosa parece ser a melhor escolha.

A introdução de terapia do tipo cognitivo-comportamental parece induzir uma melhora 35

dos sintomas, além de diminuir o risco de recaída após o término do tratamento medicamentoso.

As drogas de escolha no tratamento do TOC têm sido na última década os inibidores


da recaptação de serotonina, principalmente a clomipramina, a fluvoxamina e a sertralina.

No entanto, o tratamento com tais medicamentos deve ser feito apenas quando os
sintomas apresentam-se muito graves, ou quando houver risco de suicídio ou quadro depressivo
muito pronunciado. Além disso, é importante ressaltar que, com os tratamentos disponíveis,
muitos pacientes podem esperar melhora significativa ao longo do tempo, mas muito raramente
ocorre a remissão completa dos sintomas.

4.5 Transtorno de estresse pós-traumático

Embora os sintomas presentes no transtorno de estresse pós-traumático (TEPT) já


tenham sido descritos há cerca de 100 anos, embora ainda não apresentasse essa denominação
nessa época, foi somente após a Guerra do Vietnã que foi dada maior atenção a esse
transtorno. Ao regressarem aos Estados Unidos após servirem nessa guerra, os soldados
passaram a manifestar sintomas de trauma psicológico pronunciado, com significativo prejuízo
de sua vida pessoal, e os médicos passaram a se interessar por esta condição.

Em 1980, o transtorno passou a compor, oficialmente, o quadro dos subtipos de


transtornos de ansiedade apresentados pela terceira edição do DSM. A partir daí, muitos
estudos psicológicos, farmacológicos e neurológicos foram sendo desenvolvidos em ordem de
se conhecer melhor o TEPT.

O TEPT é um transtorno caracterizado por sintomas que surgem após a exposição do


indivíduo a um evento traumático grave. Esses sintomas incluem:

36
 Sentimentos de estar revivendo a situação indefinidas vezes;
 Comportamento de evitação a situações ou estímulos que lembrem a situação
traumática;
 hiperexcitabilidade associada a essas condições;
 Embotamento afetivo;
 Intenso e constante medo, horror e sentimento de impotência;
 Diminuição do interesse geral em relação às pessoas ou situações;
 Sintomas persistentes de ansiedade que não estavam presentes antes do
trauma.

Para o diagnóstico do TEPT, esses sintomas devem ocorrer em conjunto e persistir por
no mínimo três meses. Muitas vezes, ocorre uma latência entre a ocorrência do evento
traumático e o aparecimento dos sintomas. O indivíduo sente-se como se estivesse revivendo o
evento traumático indefinidamente, o que é vulgarmente chamado de flashback. Neste momento,
as sensações psíquicas e físicas experimentadas são exatamente as mesmas que se teve no
momento exato do trauma psicológico. Geralmente, a pessoa tende a evitar ativamente
situações e conversas associadas ao evento e, adicionalmente, desenvolve um medo extremo,
verdadeiro pavor, de que venha a ocorrer novamente, consigo ou com outros.

Em conjunto, essas sensações acabam por diminuir significativamente seu interesse


em atividades rotineiras, perde a vontade de interagir com outras pessoas ou de participar de
eventos sociais. Afastando-se dos amigos e até mesmo da família, e criando um isolamento que
tende a agravar não só seus sentimentos negativos com relação ao trauma; como cria novos
sentimentos negativos, relacionados à solidão provocada pelo evento traumático. Além dos
sintomas comportamentais mencionados, sintomas físicos também são manifestados,
principalmente os associados a uma hiperativação autonômica, com profundas alterações do
sono, dificuldade de concentração, presença constante de palpitações, sudorese ou tremores,
hipervigilância e reações exageradamente intensas de sobressalto a qualquer estímulo.

Apenas a título de exemplo, abaixo está descrito um depoimento verídico de um


paciente atendido pelo Ambulatório de Ansiedade, do Instituto de Psiquiatria do Hospital das
Clínicas da Faculdade de Medicina da Universidade de São Paulo, para exemplificar o
sofrimento experimentado por quem sofre de TEPT: 37

“Aquele dia poderia ter sido apenas mais um, mas na realidade ele mudou
completamente minha vida. Estava com meu pai em um pequeno
supermercado perto de casa e, quase já saíamos, quando apareceram
dois indivíduos encapuzados. Foi tudo muito rápido. Apontaram suas
armas para nós, que estávamos no caixa, e deram uma coronhada no
dono do mercadinho para intimidá-lo. Meu pai, por puro reflexo, tentou
ampará-lo e acabou levando dois tiros. Enquanto ele estava caído,
sangrando muito, um dos ladrões mantinha sua arma em minha cabeça e o
outro roubava. Fui levado como refém, sofrendo ameaças de morte
constantes. Após rodar duas horas pela cidade e ter que sacar dinheiro em
caixas eletrônicos, fui abandonado numa avenida muito longe do local
onde eu estava anteriormente. Quando cheguei ao hospital meu pai já
estava morto. Já faz três meses e não consigo esquecer, tenho pesadelos
diários com o ocorrido ,não entro mais em supermercados, não tenho
vontade de sair com meus amigos, falar a respeito de tudo aquilo me faz
muito mal, começo a suar e tremer. Ultimamente, não tenho conseguido
dormir direito. Passei a andar armado, tenho tido algumas visões, parecem
pedaços de um filme que passam em minha mente, flashes do ocorrido.
Desconfio de todos, tenho até medo de atirar em alguém suspeito”

Um dado importante a ser mencionado é que o TEPT pode ser desenvolvido não
somente pela pessoa que vivenciou diretamente o evento traumático. Indivíduos que tenham
testemunhado um evento traumático ocorrido com terceiros, ou pessoas que tenham apenas
tomado conhecimento da ocorrência de um evento traumático, também podem vir a desenvolver
o TEPT.

No caso de eventos ocorridos diretamente à pessoa, as situações traumáticas mais


freqüentemente associadas ao desenvolvimento do TEPT são: assaltos; vivência de guerras; ser
vítima de atos terroristas; de seqüestro; torturas ou violência sexual; acidentes automobilísticos
graves; receber notícia de estado grave de saúde; violência infantil; entre outros. 38

Entre os estímulos eliciadores de TEPT em pessoas que tenham testemunhado o


evento estão: presenciar um assassinato ou violência extrema; encontrar corpos humanos;
presenciar evento traumático ocorrido com parente ou amigo íntimo. Já entre as situações que
podem vir a desencadear o TEPT em pessoas que apenas tomaram conhecimento de uma
situação traumática estão: saber da ocorrência de um ataque violento; sério acidente ou
ferimentos graves sofridos por um membro da família ou ente querido; saber da morte súbita ou
inesperada de um membro da família ou ente querido; saber da ocorrência de doença com risco
de vida a filhos ou pais; entre outros.

Um fator interessante é o fato de que nem todas as pessoas que vivenciaram um


evento traumático acabam por desenvolver o TEPT, e essa é uma questão que tem intrigado os
pesquisadores. Segundo algumas pesquisas, apenas 15 a 30% dos indivíduos que vivenciam
situações traumáticas acabam desenvolvendo o TEPT. Embora ainda não se saiba exatamente
o motivo disso, acredita-se que existam alguns fatores predisponentes ao desenvolvimento deste
transtorno.

Acredita-se que o sexo feminino apresenta maior predisposição ao TEPT, uma vez que
o transtorno ocorre em uma proporção de 2:1 em relação ao sexo masculino. Além disso, outros
fatores parecem contribuir ao seu aparecimento, tais como: já ter vivenciado outras situações
traumáticas; ter uma história pessoal ou familiar de outros transtornos psiquiátricos; ter
vivenciado história de separação precoce (seja com relação aos pais e cuidadores, sejam em
relação a companheiros afetivos); ter vivenciado situações traumáticas na infância; entre outros
fatores.

Além disso, parecem existir alguns fatores específicos os quais dispõe o indivíduo a
uma maior vulnerabilidade ou tolerância à ocorrência do TEPT, como fatores que precedem o
trauma (variações genéticas); fatores concomitantes ao trauma (severidade e duração); e fatores
que estão presentes após o trauma (apoio social e compreensão familiar).

Diferentes estudos comprovam a existência de elevadas taxas de comorbidade nas


pessoas com TEPT. Indivíduos com TEPT têm duas a quatro vezes maior probabilidade de
apresentar outro transtorno psiquiátrico, em relação às pessoas sem TEPT, e os mais
freqüentemente observados são depressão severa, transtorno de abuso de substâncias e 39
transtornos de personalidade.

Além disso, é importante ressaltar que as pessoas com TEPT tendem a tentar o
suicídio seis vezes mais do que outras pessoas, sendo o transtorno de ansiedade com a maior
relação com tendências suicidas, daí sua elevada importância em termos de tratamento, apoio e
acompanhamento.

Outro aspecto importante em relação à vida produtiva dos indivíduos com TEPT se
refere ao comprometimento no trabalho, o qual é similar ao prejuízo associado às pessoas com
depressão, mas menor que o comprometimento dos indivíduos com transtorno do pânico. Esse
comprometimento refere-se tanto à alta porcentagem de ausências quanto ao fato de que
pacientes com TEPT tendem a se submeter a atividades profissionais que lhes pagam salários
inferiores, em função do fato de se julgarem incapazes de lidar com o estresse provocado por
um trabalho que lhes remunere melhor.

Com relação ao tipo de tratamento deste transtorno, as abordagens psicoterapêuticas


e farmacológicas são de fundamental importância, principalmente quando administradas em
conjunto. O tratamento psicoterápico facilita à adesão ao tratamento farmacológico, bem como
evita recidivas, e o tratamento farmacológico permite a melhora dos sintomas, para que o
paciente possa se dedicar mais ao tratamento psicoterapêutico.

Do ponto de vista farmacológico, diferentes categorias de medicamentos têm sido


empregadas no tratamento do TEPT, na dependência da sintomatologia e das características
individuais do paciente.

Entre essas categorias estão: antidepressivos (como a imipramina, fluoxetina e


paroxetina), benzodiazepínicos (como o diazepam) e outras drogas, embora de uso menos
comum, como o topiramato e o valproato de sódio. Do ponto de vista psicoterapêutico, a técnica
com maiores níveis de sucesso no tratamento do TEPT tem sido a psicoterapia do tipo cognitivo-
comportamental. Neste ponto, é importante ressaltar que um estudo realizado na Universidade
de São Paulo.

Ele mostrou por meio de investigações com neuroimagem, que a terapia de exposição
e reestruturação cognitiva foi capaz de alterar o funcionamento de determinadas estruturas
cerebrais (diminuição da atividade da amígdala cerebral e aumento da atividade do córtex pré- 40
frontal) em pacientes com TEPT (vítimas de assalto, acidentes graves ou violência sexual).

Isso comprova a importância da abordagem psicoterapêutica no tratamento desses


pacientes.

4.6 Transtorno de ansiedade generalizada

Quando se fala popularmente em ansiedade, com seus sinais e sintomas, geralmente


é a esse transtorno que se refere. Entre os subtipos de ansiedade, o transtorno de ansiedade
generalizada (TAG) é, sem dúvida, o mais freqüente na população em geral.
Pessoas que sofrem desse transtorno apresentam medo excessivo, preocupações ou
sentimentos de pânico irracionais a respeito das mais diferentes situações.
Estão freqüentemente tensas e dão a impressão de que qualquer situação é - ou pode
ser - provocadora de ansiedade.
Estão sempre preocupadas com o julgamento que os outros fazem em relação ao seu
desempenho em diferentes áreas e precisam, conseqüentemente, que lhes renovem a confiança
e as tranqüilizem.
É importante mencionar que a preocupação constante presente nesses pacientes não
caracterizam um quadro de obsessão, uma vez que não diz respeito a um único fato nem são
repetitivos; são preocupações constantes que mudam de tema e geram profunda ansiedade.
Ao contrário do transtorno do pânico, por exemplo, que tem caráter episódico, do ponto
de vista clínico o TAG caracteriza-se pela persistência, na maioria dos dias de um período de
seis meses ou mais, de um estado de apreensão constante, embora com intensidade flutuante,
cuja causa pode não ser identificável.
Seu padrão básico, segundo o DSM em sua quarta edição, consiste em ansiedade e
preocupação difíceis de serem controladas e que ocorrem na maioria dos dias dentro de um
período de seis meses, com relação a vários eventos ou atividades.
Esses sentimentos de ansiedade e preocupação são acompanhados por, no mínimo,
três sintomas somáticos adicionais de uma lista que inclui inquietação, fadiga, dificuldade de
concentração, irritabilidade, tensão muscular e distúrbios do sono.
Embora, quando comparado aos outros subtipos de transtornos de ansiedade, o TAG 41
seja visto inicialmente como um transtorno leve, acredita-se atualmente que seja uma doença
crônica, associada a uma morbidade relativamente alta e a altos custos individuais e sociais.
Como exemplo desta condição, pode-se mencionar que cerca de 24% dos pacientes
classificados como grandes usuários de serviços médicos ambulatoriais apresentam também o
diagnóstico para TAG. Além disso, pode acompanhar o transtorno do pânico, quadros
depressivos e outros quadros patológicos psiquiátricos.
Na maioria dos casos, essa comorbidade indica uma maior gravidade, constituindo um
problema terapêutico importante, onde o tratamento específico do transtorno primário ou a
necessidade de tratamento de cada patologia associada deve ser julgado caso a caso.
O TAG é o transtorno de ansiedade mais comum na prática médica geral, sendo quatro
vezes mais freqüente que o transtorno do pânico. O sexo feminino é mais acometido que o
masculino, numa proporção de 2:1. É, também, um dos transtornos de ansiedade mais
comumente diagnosticados, com uma prevalência média de 4,1 a 6,6% na população geral.
Determinar a idade de início dos sintomas é difícil, porque a maioria dos pacientes não sabe
precisar quando isto ocorreu.
Referem que sempre foram assim, talvez caracterizando apenas que seu início se deu
na adolescência ou quando adultos jovens, apresentando uma estimativa de idade média em
torno dos 20 anos.
Infelizmente, a despeito de sua alta prevalência e intenso prejuízo que seu quadro
sintomatológico causa aos pacientes, o TAG tem recebido menos investigações científicas que o
transtorno do pânico/agorafobia, transtorno do estresse pós-traumático e transtorno obsessivo-
compulsivo.
Como na maioria dos transtornos de ansiedade, o tratamento pode ser dividido em
abordagens psicológicas e farmacológicas. A experiência clínica sugere que a psicoterapia,
qualquer que seja sua orientação, aumenta a adesão ao tratamento farmacológico e sua
eficácia, diminuindo sua duração. A psicoterapia está indicada para todos os pacientes que
sofrem de TAG.
Já do ponto de vista da abordagem farmacológica, o tratamento da ansiedade
generalizada compreende uma vasta gama de farmacoterápicos. Todos os compostos
benzodiazepínicos (como o diazepam, o alprazolam e o midazolam) são eficazes no tratamento
do TAG, principalmente os que possuem meia-vida, média ou longa.
A buspirona, pertencente à classe das azilpiperazinas, e única droga comercializada
desse grupo, parece ser eficaz apenas no TAG, não atuando de forma tão eficaz em outros 42
transtornos de ansiedade. Antidepressivos também têm sido muito utilizados no tratamento do
TAG, sozinhos ou combinados a outros compostos ansiolíticos.
Os antidepressivos tricíclicos e os inibidores da enzima monoaminaoxidase parecem
ser eficazes neste tipo de transtorno psiquiátrico.
5 TESTE DE ANSIEDADE EM ANIMAIS DE LABORATÓRIO

Entre os transtornos psiquiátricos, a ansiedade é aquele que conta com o maior


número de modelos animais já desenvolvidos, com respeitável grau de credibilidade. O que se
pode entender por modelos animais de ansiedade são tentativas de se reproduzir em animais de 43
laboratório determinados aspectos da sintomatologia, da etiologia ou do tratamento da
ansiedade.
De forma a se compreender melhor tanto suas bases neurobiológicas quanto auxiliar
no desenvolvimento de fármacos para o tratamento da ansiedade e seus subtipos.
Um modelo animal considerado ideal deve seguir um critério de semelhança
fenomenológica, ou seja, reproduzir todas as características do fenômeno que procura
investigar, desde os sintomas apresentados até o tratamento adequado.
Quase toda a base neurobiológica não só da ansiedade como de outros quadros
psicopatológicos somente pôde ser conhecida, e ainda continua sendo, em função de
investigações utilizando modelos animais. Apenas há relativamente pouco tempo, com o
aumento da tecnologia biomédica, é que essas bases neurobiológicas também passaram a ser
estudadas com o auxílio de técnicas de neuroimagem em humanos.
Mais de 30 modelos animais para a investigação da ansiedade encontram-se
atualmente em uso e, enquanto alguns consideram respostas fisiológicas (como por exemplo, a
elevação da temperatura, ou hipertermia) ou endócrinas (como o nível de corticosterona
plasmática) ao estresse, uma grande parte é comportamental por natureza. Modelos
comportamentais podem ser convenientemente classificados como respostas condicionadas
(baseadas no aprendizado) ou incondicionadas (consideradas inatas ao animal) a estímulos, os
quais são capazes de causar ansiedade em humanos e medo em animais.
As pesquisas farmacológicas obtiveram importantes avanços, principalmente em
meados das décadas de 50 e 60, a partir da utilização de modelos baseados na aprendizagem
associativa e, como conseqüência, em respostas condicionadas.
Diferentes pesquisadores, entre eles importantes pesquisadores brasileiros, classificam
os modelos animais de ansiedade em dois tipos, de acordo com a natureza do estímulo que
utilizam: modelos animais baseados em estímulos neutros, os quais adquirem propriedades
aversivas através de condicionamento, e aqueles que se baseiam em estímulos inatamente
aversivos, os chamados modelos etologicamente fundamentados.
Além de atenderem de maneira satisfatória ao critério de semelhança fenomenológica
almejado nas investigações atuais de ansiedade.
Os modelos etologicamente fundamentados apresentam a vantagem de serem
baseados nas respostas inatas de medo de diferentes espécies animais frente a situações e/ou
estímulos naturalmente aversivos, tais como lugares novos e/ou intensamente iluminados,
presença de co-específicos e confronto com predadores. 44
Ademais, não empregam estímulos nocivos aos animais, tais como choques elétricos e
privação de água ou alimento, os quais geram estados motivacionais que podem interferir no
comportamento que será avaliado. A despeito dessa diferença de característica, os testes
baseados em aprendizagem associativa continuam a ser amplamente utilizados no mundo todo,
em função de gerarem informações importantes não só para a elucidação dos processos
neurobiológicos, como também para a descoberta de novos fármacos para diferentes condições
psicopatológicas.
Os testes de ansiedade em animais de laboratório são baseados na perspectiva
evolutiva instituída por Charles Darwin, discutida mais detalhadamente no primeiro módulo desta
apostila. Isso significa que, considerando-se a perspectiva evolutiva e o fato de que tanto os
animais de laboratório quanto os seres humanos pertencem ao grupo dos mamíferos, possuímos
estruturas cerebrais e comportamentos associados muito semelhantes, com funcionamento
também semelhante.
Lembrando que a ansiedade tem suas raízes nas reações de defesa dos animais a
perigos normalmente encontrados em seu ambiente, é compreensível que a maioria dos testes
sejam baseados em estímulos os quais representem perigo aos animais e que,
conseqüentemente, eliciem respostas comportamentais de medo.
Considerando, também, que a ansiedade e o medo possuem raízes neurobiológicas
comuns, como foi visto também no primeiro módulo, os pesquisadores consideram que os
comportamentos estudados nesses testes também estejam relacionados ao comportamento de
ansiedade. No entanto, como saber se o que está sendo observado no animal é semelhante ao
quadro patológico observado em humanos? A resposta para esta indagação está na utilização
da farmacologia.
Isso quer dizer que, com o auxílio de medicamentos já disponíveis no mercado e
empregados para o tratamento das diferentes condições de ansiedade, é possível saber se
determinado teste está reproduzindo uma condição equivalente.
Em outras palavras, quando um animal de laboratório é tratado com uma droga já
utilizada na clínica como um ansiolítico, é de se esperar que o seu comportamento de medo
produzido por testes específicos apresente-se reduzido.
Assim, e com o auxílio de outros parâmetros, esse modelo pode ser considerado um
teste para a avaliação de possíveis compostos ansiolíticos, bem como ser empregado para a
investigação das bases neurobiológicas da ansiedade.
Este módulo da apostila apresenta aspectos referentes a alguns dos principais testes 45
animais desenvolvidos para a investigação da ansiedade, tanto de sua base neurobiológica
como para a avaliação de compostos com perfis ansiolíticos de ação.
Serão apresentadas as principais características dos seguintes testes: teste do
sobressalto potencializado pelo medo; teste de pressão à barra; teste do beber punido; teste da
hipertermia induzida por estresse; labirinto em cruz elevado; labirinto em T elevado; e teste da
transição claro-escuro. Grande parte dos compostos farmacêuticos, disponíveis hoje para o
tratamento dos diferentes tipos de ansiedade, foram primeiramente avaliados, em sua fase pré-
clínica, com o auxílio de alguns dos testes a seguir apresentados.

5.1 Teste do sobressalto potencializado pelo medo

A resposta de sobressalto, que pode ser interpretada como um “susto” sofrido pelo
animal pode ser eliciada por diferentes tipos de estímulos, tais como estímulo sonoro
(sobressalto acústico), estímulo visual ou estímulo táctil. Uma resposta típica de sobressalto é
composta por uma contração muscular súbita de diferentes músculos do corpo e, possivelmente,
essa reação tem como função biológica reduzir a latência para a fuga, ou proteger-se contra o
ataque de um predador.

O teste do sobressalto potencializado pelo medo foi proposto pela primeira vez no ano
de 1951, por Brown, Kalish e Farber, e consiste no seguinte conceito: os animais (geralmente
roedores) são colocados em uma caixa de condicionamento, contendo uma luz sinalizadora e
fontes de estímulos aversivos, geralmente uma fonte de choque e uma fonte sonora capaz de
alcançar um forte estímulo sonoro. A cada vez que a luz acende, o estímulo aversivo é aplicado.
Ou seja, ao acendimento da luz segue-se um choque de pequena intensidade.

Esse procedimento é pareado até que haja condicionamento, ou seja, até que o animal
aprenda que a luz indica algo aversivo virá na seqüência – o choque. Isso quer dizer que um
estímulo neutro – a luz – tornou-se aversivo por meio de condicionamento, passando a ser um
estímulo condicionado. Esse condicionamento é o que, em Psicologia, chama-se de 46
condicionamento Pavloviano, quando um estímulo inicialmente neutro produz respostas
defensivas após sua associação repetida com um evento aversivo.

Esse processo de condicionamento aversivo apresenta muitas vantagens para o


estudo da ansiedade humana e dos transtornos de ansiedade, uma vez que diferentes estruturas
cerebrais são ativadas durante o processo.

Normalmente, um animal que recebe inesperadamente um estímulo sonoro intenso


tende a apresentar uma resposta de sobressalto.

Neste teste, observou-se que após o condicionamento da luz com o choque, o animal,
ao ver a luz se acender e, seqüencialmente, ouvir um som intenso, apresenta uma resposta de
sobressalto com uma amplitude cerca de 50 a 100% maior do que se o som tivesse sido
apresentado sozinho, sem a presença da luz.

A diferença de amplitude do sobressalto entre essas duas situações (luz+barulho e


barulho sozinho) é chamada de resposta de sobressalto potencializada pelo medo, e representa
uma medida de medo, podendo ser representada numericamente.

Uma das vantagens do teste do sobressalto potencializado pelo medo é que ele
permite a produção de respostas aversivas muito semelhantes em animais e humanos. Outra
vantagem diz respeito ao fato da resposta de sobressalto ficar sobre controle do experimentar.

Isso quer dizer que, num experimento típico de sobressalto potencializado pelo medo,
o estímulo eliciador do sobressalto pode ser apresentado a qualquer momento, funcionando
como um sinalizador das alterações emocionais, fornecendo, assim, informações sobre a
contribuição de diferentes estados afetivos na manifestação de respostas de medo ou
ansiedade.
A resposta de sobressalto (a um som) potencializada pelo medo (de uma luz) é
bastante influenciável por fármacos, e também pode ser uma medida de ansiedade
antecipatória. O fato de ser bastante influenciável por fármacos com atividade sobre o sistema
nervoso central quer dizer que o valor do sobressalto pode aumentar ou diminuir quando o
animal é tratado com diferentes categorias de compostos. Espera-se que, ao ser tratado com um
composto ansiolítico (que diminua, portanto, a ansiedade), o animal apresente uma menor
resposta de sobressalto quando comparado a um animal que recebeu uma substância inerte, 47

como solução salina.

Muitos pesquisadores já investigaram o efeito de diferentes classes de substâncias,


utilizando o teste do sobressalto potencializado pelo medo. Drogas que mostraram diminuir a
resposta de sobressalto dos animais nesse teste e que teriam, portanto, um perfil ansiolítico de
ação, são: antagonistas noradrenérgicos, agonistas benzodiazepínicos (como o diazepam,
bastante utilizado na clínica no tratamento de transtornos de ansiedade), antagonistas
dopaminérgicos, agonistas opióides, agonistas serotonérgicos, etanol, entre outros compostos.

Muitas dessas drogas, quando administradas a seres humanos, também apresentam


um perfil ansiolítico de ação, demonstrando que esse teste possui uma validade preditiva, ou
seja, pode ser utilizado para a avaliação da atividade do tipo ansiolítica de compostos com perfil
desconhecido de ação.

A figura a seguir representa, esquematicamente, o procedimento realizado no teste do


sobressalto potencializado pelo medo.
Treino: pareamento luz e choque

48
Teste: sessão barulho sozinho

Sobressalto normal (no escuro)

Teste: sessão luz + barulho

Representação esquemática do procedimento realizado no


teste do sobressalto potencializado pelo medo.

5.2 Teste de pressão à barra (ou teste de punição da pressão à barra)

Em função de este teste ter sido desenvolvido primeiramente pelos pesquisadores


Geller e Seifter, em 1960, o teste da pressão à barra também pode ser chamado pelo nome de
teste de Geller-Seifter, ou ainda teste de conflito de Geller-Seifter.
Este teste é baseado tanto no conceito de condicionamento operante, ou seja, quando
o animal é condicionado a realizar uma ação para obter uma determinada resposta. Quanto no
conceito de conflito, quando o animal se vê em uma situação em que precisa escolher entre
opções que podem ser consideradas antagônicas ou incompatíveis.

Situações de conflito são padrões comuns, e clinicamente relevantes, presentes em


muitos testes animais para a detecção de agentes ansiolíticos. Será visto mais à frente nesta 49
apostila que os testes do labirinto em cruz elevado e da transição claro-escuro também são
testes baseados em conflito (a tendência a explorar um lugar novo versus o medo de encontrar
algum perigo).

No entanto, os estímulos apresentados nesses dois testes são baseados no


comportamento natural do animal (explorar um ambiente novo).

Enquanto que no teste de punição da pressão à barra, assim como em outros testes
animais, de ansiedade, o comportamento aversivo é produzido por meio de uma punição que
levaria à supressão do comportamento condicionado por reforço positivo.

Os testes de conflito estão sendo empregados há mais de quarenta anos na


identificação e caracterização de agentes ansiolíticos, bem como no estudo das bases
neurobiológicas da ansiedade.

Especificamente com relação ao teste de punição da pressão à barra, o procedimento


consiste em privar o animal de alimento por um tempo não longo o bastante para que represente
um sofrimento, mas longo o suficiente para que ele sinta fome. Após a privação alimentar, o
animal é repetidamente colocado na caixa-teste, onde ele é treinado a apertar uma barra
localizada em uma das paredes da caixa para receber o alimento.

Essa etapa é denominada de treino e ocorrerá até que a aprendizagem tenha


acontecido. Após a etapa de aprendizagem, inicia-se a etapa de condicionamento aversivo: cada
vez que o animal pressionar a barra para obter o alimento, ele receberá um leve choque. Nesse
momento, se instala o conflito: pressionar ou não pressionar a barra? Se pressionar, embora
receba a comida, levará um choque.

Se não pressionar, não levará o choque, mas também não receberá comida, ficando
com fome. Essa situação conflitante gera, no animal, um estado de medo e desconforto.
Nesse modelo, considera-se a resposta de liberação do comportamento punido (ou
seja, apertar a barra mesmo que receba o choque) como um bom preditor de atividade
ansiolítica, uma vez que os efeitos de ansiolíticos considerados clássicos, como os
benzodiazepínicos e compostos barbitúricos, são facilmente detectáveis neste teste.

Quando compostos com já conhecida atividade clínica ansiolítica são administrados


aos animais de laboratório, eles tendem a aumentar o número de pressão à barra induzido por 50
substância. Esse tipo de resposta é considerado um forte indicativo de efeito ansiolítico e muitos
estudos já foram realizados confirmando esse padrão de resposta, o que representa uma grande
vantagem do modelo. Drogas benzodiazepínicas, barbitúricos, compostos com ação semelhante
à da buspirona, entre outras drogas, demonstram esse perfil de ação neste teste de conflito.

No entanto, algumas desvantagens têm levado os pesquisadores do mundo todo a


substituir a utilização do teste de punição da pressão à barra por testes baseados no
comportamento natural do animal e que não precisem, portanto, de condicionamento. As
principais desvantagens estão associadas à necessidade de um grande período de tempo para a
aprendizagem da tarefa, em geral de meses, com sessões-treino que devem ocorrer
diariamente, o que dificulta a pesquisa.

A figura a seguir representa o aparato utilizado no teste de Geller-Seifter, ou teste de


conflito (ou punição) de pressão à barra.
51

Representação esquemática do aparato e do procedimento realizado no teste de conflito da pressão


à barra (ou teste da punição da pressão à barra, ou ainda teste de Geller-Seifter).

5.3 Teste do beber punido (ou teste de conflito de Vogel)

O teste do beber punido, também chamado de teste de conflito de Vogel, baseia-se


nos mesmos conceitos do teste de punição da pressão à barra: condicionamento e conflito. Esse
teste foi desenvolvido por Vogel, Beer e Clody, em 1971. Os autores privaram ratos machos de
água durante 48 horas e, após esse período, os animais foram colocados em caixas contendo
um bebedouro conectado a uma fonte elétrica. Durante uma sessão-teste de 3 minutos, cada
vez que os animais lambiam o bebedouro para saciar a sede, esse comportamento era punido
por um leve choque, fornecido a cada 20 lambidas. O aumento do número de lambidas induzido
por determinadas substâncias, a despeito de receber a punição do choque, é considerada como
um parâmetro de atividade ansiolítica.
Atualmente, muitas variações já foram incorporadas ao modelo, de forma que os
pesquisadores conseguem investigar diferentes aspectos do comportamento de medo nos
animais. Embora ambos os testes sejam baseados no conceito de conflito, o teste de conflito de
Vogel apresenta uma desvantagem com relação ao teste de punição da pressão à barra de
Geller-Seifter, representada pela presença de punição. Considerando que o teste de Geller-
Seifter não utiliza a punição do comportamento condicionado, os pesquisadores acreditam que
isso facilite a avaliação da especificidade de ação das drogas testadas. 52

Muitos compostos com ação ansiolítica já foram avaliados no teste de conflito de


Vogel, tais como benzodiazepínicos, agonistas gabaérgicos, como o muscimol e o zolpidem,
antagonistas de receptores do tipo NMDA, inibidores da síntese do óxido nítrico, agonistas
serotonérgicos como a buspirona, entre outros. Todos esses mencionados agindo no sentido de
liberar o comportamento punido (indicativo de efeito ansiolítico). No entanto, assim como deve
ocorrer em todos os testes animais de ansiedade, os efeitos ansiolíticos obtidos devem ser
cuidadosamente interpretados. A fim de evitar que respostas relacionadas apenas ao
desempenho locomotor, ao maior apetite por água ou ainda a influências sobre os limiares de
dor, levem à ocorrência de falsos-positivos.

Da mesma maneira que outros testes de conflito responsivos ao tratamento com


benzodiazepínicos, o teste de conflito de Vogel possui uma ampla relevância com relação ao
estudo da ansiedade clínica. No entanto, parecer ser de particular relevância para o estudo do
transtorno de ansiedade generalizada, bem como de drogas mais seletivas empregadas no
tratamento desta condição. As figuras a seguir representam dois equipamentos diferentes que
podem ser utilizados no teste de conflito de Vogel.
A
Bebedouro

Controlador de intensidade
53
do choque

Grades elétricas

Bebedouro

Representação esquemática de dois diferentes aparatos utilizados para realização do teste de


conflito de Vogel (ou teste do beber punido). A: aparato em que o choque de punição é oferecido
pelas barras paralelas do piso da caixa. B: aparato em que o choque de punição é oferecido no
dosador do bebedouro.

5.4 Teste da hipertermia induzida por estresse

O teste da hipertermia induzida por estresse baseia-se, como o próprio nome sugere,
na elevação da temperatura de animais de laboratório, principalmente camundongos, em
situações em que são submetidos a algum tipo de estresse. Foi desenvolvido inicialmente em
1989 por Borsini, Lecci, Volterra e Meli, embora atualmente seja utilizado com muitas
modificações no protocolo inicial proposto por tais autores.
A hipertermia é parte integrante do repertório de respostas individuais dos animais a
situações percebidas como estressantes. Esse fenômeno é mediado pelo sistema nervoso
autônomo e ocorre antes e durante a exposição a situações as quais geram ansiedade. Em 54
formas patológicas humanas, representa um dos sintomas do distúrbio de ansiedade.
Realmente, a hiper-reatividade autonômica, quando presente de forma exacerbada, representa
um dos itens de diagnóstico da ansiedade generalizada presente no DSM em sua quarta revisão.
Além disso, é uma medida que pode ser muito útil como modelo animal, podendo ser utilizada
para testar drogas com potencial de inibição desta hiper-reatividade autonômica.
O teste da hipertermia induzida por estresse, em camundongos, é um paradigma
desenvolvido há alguns anos para representar a expressão da hiper-reatividade autonômica
presente em quadros de ansiedade. Neste paradigma, o fenômeno é explorado da seguinte
forma: após a remoção individual dos camundongos, um por vez, de uma caixa-moradia, um
aumento gradual da temperatura dos animais pode ser observado. Esta elevação da temperatura
corporal é interpretada como um sinal de ansiedade antecipatória experimentada pelos animais
que foram removidos primeiro. O teste da hipertermia induzida por estresse já foi validado
farmacologicamente e, atualmente, é considerado um paradigma robusto e reprodutível com
grande sensibilidade a compostos ansiolíticos atualmente disponíveis no mercado. Além disso,
tem apresentado grande sensibilidade para a identificação de novos compostos com tal ação.
Em sua forma original, no entanto, o paradigma da hipertermia induzida por estresse
mostrava-se muito trabalhoso e, mais importante, necessitava de uma quantidade extremamente
grande de animais. Felizmente, em uma modificação do modelo em camundongos, descrita em
1997, os animais passaram a ser alojados individualmente, e não mais em grupos. Isto tornou o
modelo mais acessível para a avaliação rápida de compostos com atividade tipo-ansiolítica.
Atualmente, o modelo tem sido utilizado da seguinte forma: os animais são alojados
individualmente em suas caixas-moradias um dia antes da realização dos experimentos. No dia
do teste, os animais são tratados com o composto o qual se pretende investigar a ação central e,
em diferentes intervalos do tempo, é realizada a medida da temperatura retal de cada animal,
com o auxílio de um termômetro digital conectado a um probe. Em animais controles, a
temperatura tende a se elevar em resposta ao estresse representado tanto pelo tratamento em
si, quanto pelo procedimento de medição. Animais tratados com compostos ansiolíticos, como o
benzodiazepínico diazepam, por exemplo, não apresentam essa resposta hipertérmica, ou seja,
sua temperatura corpórea se mantém no nível basal. Essa resposta é considerada um índice
seguro de ação do tipo ansiolítica.

A figura a seguir representa o procedimento utilizado para a avaliação da temperatura


dos animais no teste da hipertermia induzida por estresse. 55

A B

Procedimento empregado no teste da hipertermia induzida por estresse em camundongos. A:


animal isolado em sua caixa-moradia previamente à realização do teste. B: procedimento de
medição da temperatura retal do camundongo, com o auxílio de um termômetro digital.

5.5 Teste do labirinto em cruz elevado

O teste do labirinto em cruz elevado é um dos testes animais de ansiedade mais


utilizados por diversos grupos de pesquisa em todo o mundo. O teste, validado inicialmente por
Handley e Mithani em 1984, é baseado no comportamento natural dos animais, não oferecendo
nenhum tipo de punição aos mesmos. O aparato utilizado neste teste, o qual pode ser construído
em madeira ou em acrílico, é constituído por dois braços abertos unidos perpendicularmente a
dois braços circundados por paredes (braços fechados) e foi a princípio utilizado para avaliar o
comportamento de ratos.
Os autores do teste observaram que os animais, ao serem colocados no centro do
aparato, demonstravam clara tendência a explorar os braços fechados, em detrimento dos
abertos. A exposição dos ratos a situações naturalmente ameaçadoras, representadas no 56
modelo pela altura e pelo espaço aberto, explicaria a maior aversão para explorar os braços
abertos.
O labirinto em cruz elevado é um teste de ansiedade amplamente utilizado tanto para a
descoberta de novos agentes ansiolíticos, quanto para investigar as bases psicológicas e
neuroquímicas da ansiedade. Sua ampla utilização por pesquisadores de todo o mundo se deve
aos seguintes fatores: é de simples e rápida utilização; não é um equipamento caro, podendo ser
construído facilmente; é eficaz na detecção de drogas com possível atividade ansiolítica, sem
que seja necessário o condicionamento aversivo, como ocorre com testes como o teste de
punição da pressão à barra de Geller-Seifter ou o teste do beber punido de Vogel, mencionados
anteriormente.
É considerado, portanto, um teste baseado em respostas naturais dos animais.
Assume-se que os braços abertos do labirinto combinam dois componentes naturalmente
aversivos aos animais: ser um ambiente novo e ser um espaço aberto, uma vez que não
possuem paredes protetoras. Em contraste, os braços fechados por paredes altas representam,
ao animal, um ambiente que oferece proteção contra estímulos potencialmente nocivos, tais
como a presença de predadores.
Quando um rato ou camundongo é colocado no labirinto para que o explore livremente
durante um período de tempo determinado, geralmente de 5 minutos, o animal tende a explorar
os braços abertos somente durante 20 a 25% do tempo, sugerindo que a possível aversão
causada por esses braços realmente exista. Esse parâmetro (tempo total de permanência nos
braços abertos do modelo), portanto, representa um forte índice relacionado à ansiedade.
Quando os animais são tratados com compostos ansiolíticos, tais como diazepam ou
clordiazepóxido, o tempo total de permanência nos braços abertos tende a aumentar
significativamente em comparação a animais que não tenham recebido nenhum tipo de
tratamento. Contrariamente a esta resposta, quando os animais são tratados com compostos
conhecidos por aumentar os níveis de ansiedade (compostos ansiogênicos), acabam passando
mais tempo acuados nos braços fechados do que explorando os braços abertos.
Geralmente, o procedimento empregado no teste do labirinto em cruz elevado consiste
em colocar o animal, individualmente, no espaço onde os braços abertos e os braços fechados
se cruzam. A partir daí, cada animal é observado durante 5 minutos para registro do tempo total
de permanência nos braços abertos do modelo, bem como do número de entradas em cada um
dos braços. Após o desenvolvimento deste teste, muitas modificações foram introduzidas, sejam
estruturais ou metodológicas. Atualmente, existem labirintos construídos em madeira ou em 57
acrílico, com as paredes dos braços fechados sendo transparentes ou opacas, entre outras
variações.
Com relação aos parâmetros observados, além do tempo total de permanência em
cada um dos braços e do número total de entradas. Alguns pesquisadores também consideram
na análise outras medidas, consideradas comportamentais, tais como o número de vezes que o
animal explora a extremidade dos braços abertos, número de vezes que se levanta contra as
paredes dos braços fechados, entre outras medidas. Os parâmetros obtidos neste teste podem
ser observados tanto pela presença do pesquisador na sala do experimento quanto por meio de
uma câmera filmadora, a qual grava as sessões-teste para análise posterior.
Este teste, entretanto, possui algumas limitações. Uma delas é o fato de que seu valor
como teste preditivo para a ação de determinadas drogas ainda permanece incerto. Isso quer
dizer que, embora algumas categorias de ansiolíticos utilizados na clínica produzam efeitos
confiáveis e reprodutíveis (como os compostos benzodiazepínicos), outros ansiolíticos também
utilizados na clínica nem sempre produzem resultados satisfatórios no modelo, como é o caso de
agonistas serotonérgicos. Isso sugere que, na verdade, o teste esteja produzindo diferentes tipos
de ansiedade.
Portanto, devido ao fato do teste do labirinto em cruz elevado aparentemente gerar
tipos diferentes de medo/ansiedade, resultando numa complexa variabilidade dos efeitos de
drogas serotonérgicas. Um grupo de pesquisadores (incluindo um pesquisador brasileiro)
modificou o aparato por meio do fechamento da entrada de um de seus braços fechados,
produzindo o que se conhece por labirinto em T elevado, o qual será discutido no próximo
subitem. A figura a seguir apresenta alguns tipos de labirintos empregados no teste do labirinto
em cruz elevado.
A B

58

A: Labirinto em cruz elevado construído em acrílico, com as paredes dos braços fechados transparentes. B:
Labirinto em cruz elevado construído em madeira. C: Exemplo de situação experimental, com filmagem da
sessão-teste (modificado de Dawson e Trickelbank, 1995).

5.6 Teste do labirinto em T elevado

Como mencionado no subitem anterior, o labirinto em T elevado foi desenvolvido a


partir do labirinto em cruz elevado, por meio do fechamento de um dos braços fechados do
último modelo. Em função do teste do labirinto em cruz elevado aparentemente gerar tipos
diferentes de medo/ansiedade, os criadores do labirinto em T propuseram a modificação, na
tentativa de separar os diferentes tipos de ansiedade e, assim, estudar cada um mais a fundo.
Desta maneira, os pesquisadores Viana, Tomaz e Graeff publicaram um trabalho em 1994
propondo a modificação e, conseqüentemente, a criação do teste do labirinto em T elevado. O
labirinto em T constitui-se, portanto, de dois braços abertos dispostos perpendicularmente a um
braço fechado.
Ao contrário do labirinto em cruz elevado, o labirinto em T permite o estudo de dois
tipos de comportamentos negativamente motivados: 1) a esquiva inibitória, medida através do 59
tempo que o animal leva para, colocado no braço fechado, alcançar um dos braços abertos, e 2)
a fuga, considerada o tempo que o animal leva para, colocado na extremidade de um dos braços
abertos, alcançar o braço fechado. Os autores do teste afirmam que essas duas medidas podem
estar relacionadas a dois tipos diferentes de medo: o medo condicionado e o medo inato,
respectivamente. Transpostos para a condição de ansiedade avaliada na clínica, o medo
condicionado estaria relacionado ao transtorno de ansiedade generalizada, enquanto que o
medo inato estaria relacionado ao transtorno do pânico. Assim, drogas com perfis mais seletivos
de ação para cada um desses transtornos agiriam de maneira diferente em cada uma dessas
medidas.
A validação farmacológica deste teste demonstrou que drogas utilizadas
preferencialmente na clínica para o tratamento do transtorno de ansiedade generalizada, como o
benzodiazepínico diazepam. O agonista serotonérgico buspirona e o antagonista serotonérgico
ritanserina, fizeram com que os animais saíssem mais facilmente do braço fechado em direção
ao braço aberto, indicando um perfil ansiolítico de ação. No entanto, quando avaliadas no braço
aberto do modelo (medida relacionada ao medo inato e, portanto, ao transtorno do pânico), não
produziram alterações.
A partir destes dados, os autores sugeriram que a esquiva inibitória (medida no braço
fechado) realmente estaria relacionada com o transtorno de ansiedade generalizada. Já a
avaliação da droga imipramina no modelo, droga utilizada na clínica como um medicamento
antipânico, mostrou que esse composto fazia com que os animais permanecessem mais tempo
quando colocados em um dos braços abertos, ou seja, os animais não fugiam para o braço
fechado do labirinto. Esse efeito, de acordo com a interpretação feita pelos criadores do teste,
realmente relacionaria a medida de fuga observada no teste com os sintomas do transtorno do
pânico, observado na clínica.
Resumidamente, portanto, o labirinto em T elevado representa um teste de ansiedade
que permite avaliar, no mesmo animal, respostas relacionadas a dois subtipos diferentes de
ansiedade: o transtorno de ansiedade generalizada (pela análise da esquiva inibitória no braço
fechado) e o transtorno do pânico (pela análise da fuga de uma via no braço aberto).

É importante ressaltar que este modelo, bem como os primeiros estudos de sua
validação farmacológica, foi idealizado por um grupo de pesquisadores brasileiros na Faculdade
de Filosofia, Ciências e Letras de Ribeirão Preto, da Universidade de São Paulo. Representa
uma das muitas contribuições que diferentes pesquisadores brasileiros têm feito a respeito do 60
estudo das bases neurofarmacológicas dos transtornos de ansiedade. A figura abaixo apresenta
a modificação feita no labirinto em cruz elevado, para a criação do labirinto em T elevado.

Fechamento do
braço fechado

Labirinto em T elevado, criado pelo fechamento de um dos braços


fechados. O modelo passa a ficar, portanto, com dois braços
abertos e um braço fechado.

5.7 Teste da transição claro-escuro


Desenvolvido em 1980 pelos pesquisadores Crawley e Goodwin, o modelo da
transição claro-escuro constitui-se de uma caixa contendo dois compartimentos, um escuro e um
iluminado, interligados por uma abertura divisória, tendo sido inicialmente desenvolvido para
avaliar os efeitos ansiolíticos de drogas benzodiazepínicas. O paradigma claro-escuro é baseado
em uma situação de conflito, sem que haja a presença de um estímulo punitivo. O conflito se dá
entre a tendência natural dos animais a explorar e a tendência inicial de se esquivar do que não
é familiar (neofobia). O comportamento aversivo dos animais é produzido neste modelo pelos 61

estímulos estressores moderados “ambiente novo” e “iluminação”.

O procedimento, geralmente empregado no teste da transição claro-escuro, consiste


em colocar o animal, individualmente e por um determinado período de tempo (geralmente de 5
minutos), no lado claro do modelo, intensamente iluminado, com a cabeça voltada para a porta
divisória. Após a primeira entrada do animal no compartimento escuro, são registrados os
seguintes parâmetros: tempo total de permanência em cada um dos compartimentos (claro e
escuro), número total de transições entre os dois compartimentos e o tempo que o animal levou
para entrar pela primeira vez no lado escuro do modelo. Considerando que locais altamente
iluminados representam uma ameaça natural aos roedores, que são animais de hábitos
noturnos, eles possuem a tendência natural de passar mais tempo no lado escuro do modelo.

Quando tratados com drogas utilizadas na clínica para o tratamento da ansiedade,


como os benzodiazepínicos, os animais acabam passando significativamente mais tempo no
compartimento claro do modelo, quando comparados aos animais controles. Portanto, o
parâmetro tempo total no compartimento claro pode ser considerado um índice forte e
reprodutível do nível de ansiedade. De fato, os autores do trabalho inicial realmente relataram
uma facilitação dose-dependente da atividade exploratória entre os dois compartimentos após a
administração de drogas benzodiazepínicas.

Muitos autores têm utilizado versões modificadas do modelo inicial. Tais modificações
podem ser de natureza estrutural, tal como alterações no tamanho da caixa, adição de um túnel
entre os dois compartimentos, ou adição de um sistema computadorizado de coleta das
informações. Outras alterações também têm sido utilizadas, desta vez nos tipos de parâmetros
utilizados como índices de ansiedade. Neste sentido, alguns autores relatam o tempo de
permanência no compartimento claro do modelo como sendo a medida capaz de fornecer um
índice relativamente seguro de ansiedade, enquanto que a medida do número de transições
entre compartimentos estaria correlacionada à atividade motora dos animais. A figura a seguir
apresenta uma das versões do equipamento utilizado no teste da transição claro-escuro.

62
Compartimento
escuro

Porta divisória

Compartimento
claro

Aparato utilizado no teste da transição claro escuro.


6 AS BASES NEUROBIOLÓGICAS DA ANSIEDADE

Como foi discutido no módulo I desta apostila, o medo e a ansiedade são emoções
correlacionadas; ambos têm suas raízes nas reações de defesa dos animais e, portanto, estão
baseados no instinto de sobrevivência que determina estratégias de defesa contra perigos 63
comumente encontrados no ambiente em que vivem. O conjunto de respostas, comportamentais
e neurovegetativas, apresentadas tanto pelos seres humanos quanto por mamíferos de outras
espécies, parecem ser bastante semelhantes e, de forma simplificada, baseiam-se em um
espectro contínuo de respostas que variam do extremo “luta” ao extremo “fuga”, passando por
diferentes nuances neste percurso. Se as respostas observadas são assim semelhantes, é de se
esperar que as bases neurobiológicas desses comportamentos também o sejam.
E é baseado nesta perspectiva evolutiva, instituída pela primeira vez pelo naturalista
Charles Darwin, que os estudos sobre a ansiedade continuam a ser desenvolvidos,
principalmente no âmbito da investigação das bases neurobiológicas do medo em animais
experimentais. Portanto, o conhecimento atual sobre as estruturas cerebrais envolvidas na
regulação da ansiedade foi, e continua a ser, construído, em grande parte, sobre evidências
experimentais, obtidas tanto em seres humanos quanto em animais de laboratório.
Considerando que a ansiedade é originada a partir do repertório comportamental de
defesa do indivíduo frente a situações consideradas ameaçadoras, para compreendê-la é
necessário, primeiramente, conhecer esse repertório de defesa. E nada melhor do que identificar
nossas próprias reações em determinadas circunstâncias para compreender o que acontece no
organismo humano em situações consideradas ameaçadoras. Para tanto, faremos um exercício
de simulação, procurando identificar as emoções evocadas em diferentes situações.
Suponha, portanto, que você esteja dormindo em sua casa, sozinho, e que no meio da
madrugada tenha acordado com um barulho vindo de outro cômodo. Neste momento, o seu
cérebro processa essa informação como um perigo em potencial, ou seja, pode ser que tenha
um intruso lá – perigo! – mas você não tem certeza se tem ou não – por isso, potencial. A
tendência natural da maioria das pessoas seria procurar saber qual a origem do barulho – saber
se tem ou não tem um intruso ali. Para isso, muito provavelmente você se levantará
cautelosamente da cama, pegará algo que sirva como um instrumento de defesa (pode ser até o
abajur) e se direcionará, na ponta dos pés, em profundo silêncio e com intensa tensão muscular,
até a fonte do barulho.
Procure visualizar essa cena, prestando atenção aos componentes comportamentais e
fisiológicos evocados: olhos bem abertos, dilatação da pupila, coração acelerado, aumento da
freqüência respiratória, musculatura contraída, comportamento cauteloso, atenção a todos os
possíveis movimentos, entre outras características. Você vai até a sala e percebe que o barulho
foi originado por um quadro que, acidentalmente, se soltou do prego e caiu no chão, provocando
o ruído. Nesse momento, quando você percebe que não há risco real de perigo em sua casa, a 64
postura tensa assumida, aos poucos, vai se desfazendo e o seu corpo vai, lentamente, voltando
ao estado de repouso inicial. Nessa situação fictícia descrita, o perigo foi identificado por seu
cérebro como sendo um perigo POTENCIAL, ou seja, você não sabia se realmente existia.
E, para vir a saber, procurou avaliar a situação, por meio da interpretação dos sinais
ambientais à sua volta. Esse comportamento, evocado quando o perigo é POTENCIAL, pode ser
chamado, portanto, de AVALIAÇÃO DE RISCO.
Agora vamos supor outra situação hipotética, em que você esteja andando sozinho, à
noite, por uma rua escura e deserta. De repente você percebe que, no final da rua, aparece um
vulto humano, com um comportamento suspeito. Nesse momento, em que você está vendo de
longe a ameaça – ela é real, porém distante – você tenderá inibir todos os seus movimentos,
assumindo uma postura de congelamento frente àquela fonte distante de perigo.
É aquele medo que paralisa, que congela, do qual tanto se fala. E, pensando
friamente, talvez seja bom realmente que seus movimentos se congelem. Talvez o seu ancestral
menos cauteloso que, ao invés de congelar os movimentos, continuou a caminhar normalmente,
tenha chamado a atenção do predador e não tenha sobrevivido para gerar descendentes e
contar o final da história... Nessa situação, portanto, em que o perigo é REAL, porém DISTANTE,
a estratégia comportamental evocada parece ser o CONGELAMENTO.
Em uma terceira e última situação hipotética, imagine que você acabou de sair do
banco, onde foi receber o pagamento do seu salário, cheio de contas para pagar, quando
percebe que um garoto pára ao seu lado na tentativa de roubar a sua bolsa ou carteira. Nessa
situação, o perigo também é REAL, mas está próximo, não mais distante como na situação
anterior, e dificilmente você conseguirá escapar. A emoção também muda, em função da
proximidade da ameaça e, nessa circunstância, você muito provavelmente sentirá
instintivamente um entre dois impulsos: LUTAR ou FUGIR. No entanto, como você é uma
pessoa bem informada sobre a violência nas ruas e tem, portanto, condições de analisar a
situação e ponderar sobre as possíveis conseqüências do seu comportamento em uma
circunstância como essa talvez você nem fuja nem lute e, embora com muita raiva, acabe por
entregar sua carteira e o seu salário de um mês de trabalho ao ladrão. Isso embora seu desejo
instintivo fosse, realmente, o de lutar ou de fugir.
Por meio da análise dessas três situações hipotéticas, torna-se fácil compreender
como diferentes estímulos ameaçadores também evocam diferentes estratégias
comportamentais, com diferentes padrões emocionais. Da mesma forma, as diferentes
estratégias comportamentais evocadas, bem como os padrões emocionais associados, 65
relacionam-se à maior ou menor ativação de diferentes estruturas cerebrais, as quais, por sua
vez, compõem diferentes sistemas cerebrais de defesa.
Assim, considerando os exemplos de situações ameaçadoras mencionadas acima, é
simples perceber que a emoção evocada em cada uma delas é diferente, e parece diferir em
função da proximidade do perigo. Pesquisadores que investigam as bases biológicas do
comportamento de defesa puderam correlacionar a emoção evocada à proximidade do perigo,
às estratégias comportamentais de defesa assumidas em cada caso e, também, às possíveis
estruturas cerebrais envolvidas em cada situação. Assim, chegaram à conclusão, por meio da
observação sistemática do comportamento em situações reais e experimentais, que em
situações em que o perigo é considerado apenas POTENCIAL, a emoção evocada parecer ser a
de ANSIEDADE. Em situações em que o perigo é considerado REAL, porém DISTANTE, a
emoção evocada passa a ser o MEDO e, em situações de perigo REAL e PRÓXIMO, as
emoções de RAIVA ou PÂNICO são evocadas.
O pesquisador brasileiro Frederico Guilherme Graeff, professor aposentado
permissionário da Universidade de São Paulo, o qual dedicou sua carreira à investigação das
bases biológicas de transtornos psiquiátricos, principalmente dos transtornos de ansiedade,
sumarizou esses achados em uma tabela semelhante à apresentada a seguir.

TIPO DE AMEAÇA EMOÇÃO EVOCADA ESTRATÉGIA


COMPORTAMENTAL

POTENCIAL ANSIEDADE Avaliação de risco;


investigação cautelosa

REAL, PORÉM DISTANTE; MEDO Congelamento


ESCAPÁVEL (imobilidade tensa)
REAL E PRÓXIMA; RAIVA, PÂNICO Ameaça, luta
INESCAPÁVEL
ou fuga

Adaptado de Graeff, F. G., 1999.

Conhecendo-se o repertório de defesa de uma dada espécie, pode-se explorar o 66


substrato neural subjacente a cada modalidade de defesa pelos métodos clássicos da
neurofisiologia e da neurofarmacologia. Desta forma, após muitos anos de investigações
experimentais, os pesquisadores tiveram condições de associar diferentes padrões emocionais
defensivos a regiões e estruturas cerebrais envolvidas especificamente em cada caso, com
relativo grau de concordância entre os grupos de pesquisa. A tabela a seguir apresenta as
diferentes estruturas neurais envolvidas em cada um dos padrões comportamentais de defesa.

EMOÇÃO EVOCADA ESTRUTURAS NEURAIS


RELACIONADAS

ANSIEDADE Sistema septo-hipocampal e


Amígdala

MEDO Amígdala e Substância Cinzenta


Periaquedutal

PÂNICO Amígdala, Hipotálamo e


Substância Cinzenta
Periaquedutal

Adaptado de Graeff, F. G., 1999.

Por meio da análise da tabela anterior, percebe-se que diferentes estruturas cerebrais
são decisivas na manifestação de diferentes aspectos do comportamento de defesa,
principalmente as estruturas cerebrais denominadas amígdala, sistema septo-hipocampal,
substância cinzenta periaquedutal e hipotálamo. No entanto, é importante ressaltar que as
estruturas citadas na tabela são aquelas que desempenham um papel determinante em cada
comportamento considerado, sendo que diversas outras estruturas cerebrais participam da
modulação e ajuste desse comportamento, como é o caso do córtex cerebral, especialmente de
sua região pré-frontal. A figura a seguir apresenta, de forma simplificada, a localização
neuroanatômica dessas estruturas no cérebro.

67

Principais estruturas cerebrais envolvidas na modulação do comportamento defensivo


e, consequentemente, da ansiedade.

Em função da interação neurofisiológica entre as estruturas cerebrais mencionadas, as


quais são mais ou menos ativadas em situações distintas de ameaça, técnicas neurofisiológicas
e neurofarmacológicas permitiram aos pesquisadores postular a existência de dois sistemas os
quais seriam ativados em diferentes situações de perigo. Assim, duas proposições teóricas
foram elaboradas na tentativa de se ordenar os dados disponíveis sobre as bases
neuroanatômicas dos diferentes comportamentos de defesa, as quais foram denominadas de
SISTEMA DE INIBIÇÃO COMPORTAMENTAL e SISTEMA CEREBRAL DE DEFESA. Embora
funcione em íntima correlação, cada um desses sistemas estaria envolvido em um aspecto do
comportamento defensivo, como será visto a seguir.

6.1 O Sistema de Inibição Comportamental

68

A existência de um sistema de inibição comportamental foi postulada entre os anos de


1982 e 1987, por um grupo de pesquisadores liderado por Jeffrey Alan Gray, um psicólogo inglês
nascido em 1934. De maneira resumida, o sistema de inibição comportamental é composto pelas
seguintes estruturas cerebrais: formação septo-hipocampal, circuito de Papez (composto pelo
corpo mamilar do hipotálamo, tálamo anteroventral e córtex do giro cíngulo), córtex pré-frontal,
além das vias de neurotransmissão de noradrenalina, dopamina e serotonina ascendentes que
inervam essas estruturas. A figura a seguir representa esquematicamente as principais
estruturas envolvidas no conceito de sistema de inibição comportamental.

Principais estruturas neuroanatômicas envolvidas no


constructo do Sistema de Inibição Comportamental, proposto
por Jeffrey Alan Gray.
Segundo o postulado de Gray, esse sistema seria ativado por estímulos condicionados,
ou seja, estímulos que adquirem propriedades aversivas por meio do condicionamento. Assim,
de acordo com essa teoria, a ansiedade seria devido à ativação deste sistema por estímulos,
como:
 Sinais condicionados de punição (estímulos neutros que adquirem a propriedade
de indicar a presença de um evento aversivo); 69
 Sinais condicionados de frustração (associados com a omissão de uma
recompensa esperada, física ou psicológica);
 Estímulos ou situações que representem novidade;
 Sinais de perigo espécie-específicos.

As estruturas cerebrais que constituem o sistema de inibição comportamental agem,


portanto, no sentido de receber as informações a respeito do ambiente em torno e da ameaça
presente, elaborar os próximos passos a serem dados pelo indivíduo e funcionar como um
sistema de alarme. Portanto, os efeitos diretos da ativação do sistema de inibição
comportamental estão relacionados, como o próprio nome diz, à inibição do que o indivíduo está
fazendo em prol do aumento da vigilância. Ou seja, de maneira simplificada, os efeitos da
ativação deste sistema são: a inibição de qualquer comportamento que esteja sendo realizado; o
aumento do nível de vigilância e de atenção, principalmente voltadas para estímulos que
representem ameaça; e o preparo para uma ação vigorosa em caso de necessidade.
Evidências experimentais indicam que o complexo formado pelo septo e pelo
hipocampo, chamado formação septo-hipocampal, desempenhe um papel de destaque no
funcionamento do sistema de inibição comportamental. Lesões desta formação causam
alterações comportamentais em animais de laboratórios semelhantes às alterações causadas
pela administração de agentes ansiolíticos do tipo benzodiazepínicos, quando avaliados em
baterias de testes de aprendizagem. Além dessas evidências, resultados de estudos
eletrofisiológicos levaram Gray a sugerir que a formação septo-hipocampal fosse o componente
determinante do sistema de inibição comportamental e que seu funcionamento seria facilitado
pelas aferências noradrenérgicas e serotonérgicas provenientes de outras regiões cerebrais,
principalmente de uma região chamada mensencéfalo.
De acordo com diferentes autores, o papel da formação septo-hipocampal seria o de
organizar os dados, tanto os recebidos quanto os armazenados na memória, bem como
compará-los. A partir dessa organização, o córtex pré-frontal teria condições de analisar ou criar
os planos comportamentais mais adequados. Supondo que as informações recebidas pela
formação septo-hipocampal sejam coerentes com o que já se vivenciou e que tenham sido
consideradas não ameaçadoras, o comportamento normal do indivíduo continua a ser realizado.
No entanto, quando o septo e o hipocampo detectam uma incoerência entre o estímulo que está
sendo apresentado e o que já está armazenado na memória, inicia-se a ativação do sistema de
inibição comportamental. 70
O comportamento permanece inibido até que o cérebro tenha condições de avaliar se
os estímulos potencialmente ameaçadores detectados pela formação septo-hipocampal,
juntamente com as demais estruturas moduladoras do sistema de inibição comportamental,
apresentam-se realmente ou não. No caso de, em última e detalhada análise, não representarem
um perigo real, o sistema de inibição comportamental vai sendo desativo e o indivíduo volta a
desempenhar suas atividades normalmente. Entretanto, se a avaliação de risco detectar a
presença real de um estímulo ameaçador, inicia-se a participação do Sistema Cerebral de
Defesa.
Considerando, portanto, os tipos de sinais que ativam o sistema de inibição
comportamental, é razoável aceitar que, por exemplo, quando o seu celular toca e no visor você
vê que trata-se de uma ligação do seu chefe (estímulo condicionado que significaria mais
trabalho), é o sistema de inibição comportamental que está sendo ativado. Embora este seja
apenas um exemplo anedótico, fornece a real dimensão dos processos capazes de ativar o
funcionamento deste sistema.
Como já foi exposta no módulo I, a ansiedade possui uma função adaptativa à medida
que prepara o indivíduo para situações nas quais podem ser difíceis. Funcionando como uma
motivação para que o indivíduo providencie o que é necessário para evitar o perigo ou a
ameaça, ou pelo menos para reduzir suas conseqüências, o que aumentaria suas chances de
sucesso. Portanto, a ativação normal do sistema de inibição comportamental, em última análise,
é favorável ao indivíduo em função de prepará-lo melhor para uma ação necessária. No entanto,
acredita-se que seja justamente quando ocorre a ativação desnecessária, intensa e contínua
deste sistema, geralmente voltada a estímulos que não representam uma ameaça, que surge o
quadro de ansiedade patológica, prejudicando o desempenho geral do indivíduo.
Os fármacos utilizados na clínica como ansiolíticos, empregados em quadros de
ansiedade diagnosticados como patológicos (como o diazepam, o midazolam e o alprazolam)
atuam prejudicando o funcionamento do sistema de inibição comportamental. No caso dos
transtornos de ansiedade, portanto, ao agir prejudicando o funcionamento deste sistema, os
medicamentos ansiolíticos produzem os efeitos ansiolíticos esperados: diminuem a inibição do
comportamento, fazendo com que o indivíduo consiga desempenhar suas atividades de forma
normal; diminuem o nível exagerado de vigilância; e reduzem a imobilidade tensa. Os conceitos
apresentados até aqui, tanto sobre o funcionamento do sistema de inibição comportamental
quanto sobre a ação de fármacos ansiolíticos sobre este sistema, estão representados
esquematicamente, de forma a facilitar a compreensão, na figura seguinte. 71

Representação esquemática dos efeitos produzidos pela ativação do Sistema de


Inibição Comportamental e da ação de fármacos ansiolíticos.

6.2 O Sistema Cerebral de Defesa

Constituído por estruturas como a amígdala, o hipotálamo e a substância cinzenta


periaquedutal, o sistema cerebral de defesa tem recebido maior atenção e existe, atualmente,
um número maior de investigações científicas na tentativa de se esclarecer o seu funcionamento,
quando comparado com o sistema de inibição comportamental. A figura abaixo apresenta
esquematicamente a localização neuroanatômica das estruturas cerebrais envolvidas no sistema
cerebral de defesa.

72

Principais estruturas neuroanatômicas envolvidas no Sistema Cerebral de


Defesa.

O funcionamento desse sistema, por meio da investigação da ação de suas estruturas


componentes, começou a ser estudado pelo suíço Robert Hess, na década de 30, por meio da
estimulação elétrica do hipotálamo de diferentes espécies de animais de laboratório.
Hess observou que essa estimulação elétrica provocava uma reação de defesa afetiva,
semelhante à que os animais apresentavam quando eram confrontados com um predador:
pronunciada atividade motora, hiper-reatividade das funções neurovegetativas (piloereção,
aumento da freqüência cardiorespiratória, exoftalmia) e posição de ataque. Evidências adicionais
foram sendo obtidas ao longo do tempo por meio de estimulações elétricas de diferentes áreas,
tanto da substância cinzenta periaquedutal quanto da região cerebral denominada amígdala,
observando-se que esse mesmo padrão de defesa afetiva era observado: ameaça, luta ou fuga.
Desta forma, concluiu-se que essas estruturas estariam decisivamente envolvidas nos estados
considerados aversivos, principalmente de medo intenso e pânico.
Outras evidências, vindas de investigações clínicas com pacientes submetidos à

neurocirurgia, reforçaram as evidências experimentais iniciais, uma vez que se observou que,
nesses pacientes, a estimulação elétrica dessas estruturas provocava intensa reação de medo e
pânico, e o indivíduo relatava que sentia como se fosse morrer a qualquer instante. Acredita-se,
com base nas investigações neurofisiológicas realizadas, que das estruturas componentes do
sistema cerebral de defesa, a substância cinzenta periaquedutal desempenha um papel decisivo,
enquanto a amígdala e o hipotálamo parecem desempenhar um papel de moduladores do 73
estado aversivo produzido pelo funcionamento da substância periaquedutal.
Essa crença baseia-se no fato de que lesões produzidas tanto na amígdala quanto no
hipotálamo não afetam o comportamento de defesa de forma significativa; no entanto, se as
mesmas lesões forem produzidas na substância cinzenta, passa a haver um considerável
prejuízo no padrão comportamental de defesa, com o efeito produzido pela ativação da amígdala
ou do hipotálamo sendo praticamente anulados. Um grupo de pesquisadores brasileiros de
Ribeirão Preto, SP, de reputação reconhecida internacionalmente, tem realizado importantes
pesquisas com o intuito de elucidar cada vez mais as bases neurobiológicas do comportamento
defensivo, principalmente o papel desempenhado pelo sistema cerebral de defesa nesse tipo de
comportamento.
Evidências experimentais também têm oferecido contribuições importantes para a
compreensão do papel desempenhado por cada estrutura envolvida no funcionamento do
sistema cerebral de defesa. Assim, existem dados que sugerem que o hipotálamo atue
integrando as informações sobre o repertório comportamental de defesa; já a amígdala atuaria
modulando a resposta comportamental de defesa, a qual, por sua vez, seria gerada pela
substância cinzenta periaquedutal, considerada a estrutura responsável pelo padrão de resposta
agressiva completo.
Ao contrário do sistema de inibição comportamental, o qual parece ser ativado apenas
por estímulos de natureza condicionada, a ativação do sistema cerebral de defesa parece
ocorrer tanto pela presença de alguns estímulos condicionados quanto, principalmente, pela
presença de estímulos incondicionados. Os estímulos incondicionados são aqueles naturalmente
aversivos ao indivíduo, sem necessidade de condicionamento. Assim, estímulos inatamente
ameaçadores, alguns estímulos aversivos condicionados e estímulos nociceptivos (relacionados
à percepção da dor) ativariam a amígdala, a qual, por sua vez, envia projeções tanto para o
hipotálamo quanto para a substância cinzenta periaquedutal.
A ativação do hipotálamo pelo estímulo aversivo (com modulação da amígdala) produz
as alterações hormonais características da reação de medo ou pavor por meio de sua interação

com a glândula pituitária, também chamada de hipófise. Já a ativação da substância cinzenta


periaquedutal, produz todos os padrões típicos de uma reação de defesa afetiva: luta ou fuga,
imobilidade, analgesia, aumento da pressão arterial e da freqüência cardiorespiratória.
Em função do tipo de resposta que controla, a ativação do sistema cerebral de defesa
parece estar associada, portanto, aos transtornos de pânico e às diferentes fobias observadas
na clínica e detalhadas mais profundamente no módulo II desta apostila. Já o sistema de inibição 74
comportamental estaria mais relacionado à ocorrência do transtorno de ansiedade generalizada
observado na clínica.
O funcionamento do sistema cerebral de defesa, ativado pela ocorrência de
determinados estímulos aversivos, está representado esquematicamente na figura a seguir.

Representação esquemática dos efeitos produzidos pela ativação do Sistema de Inibição


Comportamental.
6.3 Substâncias endógenas e ansiedade

Muitos sistemas de neurotransmissores têm sido implicados na ansiedade. Entre eles


estão, principalmente, substâncias chamadas de aminas biogênicas (noradrenalina, serotonina e 75
dopamina) e os aminoácidos (ácido -aminonobutírico – GABA – e glicina). Além destes,
compostos pertencentes a outras categorias também têm sido atualmente bastante investigados
em função de seu papel na modulação da ansiedade, como os peptídeos (fator de liberação de
corticotrofina, ou CRF, o hormônio adrenocorticotrófico, ou ACTH, e a colecistocinina, ou CCK) e
os esteróides (como a corticosterona).
A seguir serão abordados aspectos referentes ao papel desempenhado pelo sistema
GABA-benzodiazepínico e pela serotonina na etiologia dos transtornos de ansiedade.
Embora muitos outros neurotransmissores estejam envolvidos nas causas deste
transtorno psiquiátrico, será dada ênfase a esses dois sistemas por três motivos principais: são
dois dos sistemas de neurotransmissores mais estudados atualmente no âmbito das pesquisas
sobre ansiedade; constituem vias de neurotransmissão sobre as quais atuam grande número de
medicamentos ansiolíticos utilizados na clínica; e, principalmente, porque a maior parte do
conhecimento científico atual sobre as bases neurobiológicas da ansiedade baseia-se no
emprego de técnicas neurofarmacológicas que envolvem ambos os sistemas de
neurotransmissores.

6.4 O sistema GABA-benzodiazepínico

O GABA foi identificado como um constituinte químico cerebral em 1950, mas sua
potência como depressor do sistema nervoso central não foi imediatamente estabelecida.
Neurônios e terminais nervosos GABAérgicos têm sido localizados por meio de métodos de
imunohistoquímica, os quais visualizam a descarboxilase do ácido glutâmico, enzima que
catalisa a síntese do GABA a partir do ácido glutâmico. As principais drogas utilizadas para a

confirmação da mediação GABAérgica têm sido a bicuculina e a picrotoxina. No entanto, muitas


drogas convulsivantes, as quais não tiveram suas ações previamente elucidadas (incluindo a
penicilina e o pentilenotetrazol), também atuam como antagonistas seletivos da ação do GABA.

Ainda não foi possível obter efeitos terapêuticos completamente eficazes por meio do 76

uso de agentes que mimetizam a ação do GABA (como o muscimol), que inibem sua recaptação
ativa (como o 2,4-diaminobutirato, o ácido nipecótico e a guvacina), ou que alteram sua taxa de
metabolização (como o ácido amino-oxiacético).

A questão da participação do GABA na ansiedade foi levantada como conseqüência ao


estudo do mecanismo de ação dos benzodiazepínicos (BZDs), ansiolíticos introduzidos na clínica
na década de 60. Estudos clínicos controlados revelaram que, além de possuírem eficácia em
distúrbios de ansiedade, os BZDs ainda apresentam baixíssima toxicidade e menor capacidade
de causar dependência em relação aos barbitúricos, seus antecessores.

Os BZDs têm desempenhado um importante papel no tratamento da ansiedade.


Apresentam efeitos benéficos imediatos na ansiedade generalizada e são, em altas doses,
eficazes no transtorno do pânico. Já se encontra bem estabelecido que sua ação ansiolítica
deve-se à alta afinidade por receptores BZDs centrais, embora uma possível modulação sobre
vias noradrenérgicas e serotonérgicas também seja considerada como a causa de sua ação
ansiolítica. Os BZDs, e outras drogas que atuam sobre receptores GABA, possuem uma longa
história de uso sobre a ansiedade. O álcool etílico talvez tenha sido o ansiolítico mais
amplamente utilizado e sua ação está relacionada aos receptores GABA.

O receptor BZD possui uma farmacologia singular, com a existência de três classes de
ligantes. Existem drogas agonistas, as quais são ansiolíticas, anticonvulsivantes e miorelaxantes
(como o diazepam); drogas antagonistas, as quais não apresentam atividade intrínseca, mas
bloqueiam os efeitos dos agonistas (como o flumazenil); e drogas que funcionam como agonistas
inversos. Estes últimos (como a β-carbolina FG 7142) são ansiogênicos e convulsivantes, tendo
sido demonstrada sua ação ansiogênica inclusive em voluntários sadios.
Os BZDs são capazes de intensificar as ações do GABA, o principal neurotransmissor
inibitório do sistema nervoso central e que modula diversos sistemas funcionais. Acentuam as
ações do GABA em nível pós-sináptico, aumentando a afinidade dos receptores do tipo GABAA
pelo neurotransmissor. Como são moléculas artificiais, a presença de receptores BZDs no

sistema nervoso central indica uma possível existência de substâncias centrais endógenas que
atuam sobre eles, regulando estados de ansiedade normais ou patológicos. Seriam agentes 77
ansiolíticos ou ansiogênicos endógenos se atuassem como agonistas diretos ou como agonistas
inversos, respectivamente.

Embora tais evidências indiquem claramente a participação do sistema GABA-BZD na


regulação da ansiedade, os sistemas neuronais envolvidos nessa regulação permanecem
incertos, embora algumas evidências experimentais apontem para a participação do complexo
GABA-BZD localizados na amígdala e na substância cinzenta periaquedutal.

6.5 A serotonina

A serotonina (5-hidroxitriptamina, 5-HT) tem sido considerada, há quase 50 anos, como


um neurotransmissor envolvido na regulação de grande número de processos fisiológicos, bem
como em seu mau funcionamento. A despeito desta informação, os locais e os modos exatos de
ação da 5-HT encontram-se ainda mal elucidados. Esta ambigüidade se deve em grande parte
ao grande número de subtipos de receptores, os quais foram determinados inicialmente por meio
de análises farmacológicas e clonagem de DNA.

A 5-HT é sintetizada a partir do aminoácido essencial triptofano, por meio de uma


reação que envolve dois passos. A captação ativa do triptofano é o primeiro passo para a síntese
de 5-HT em regiões centrais. O triptofano é ativamente carregado para o interior dos neurônios
centrais por meio de um transportador, o qual também transporta outros aminoácidos essenciais.
Desta forma, os níveis cerebrais de triptofano são influenciados não apenas por sua
concentração plasmática, mas também pelas concentrações plasmáticas de outros aminoácidos,
os quais competem pelo mesmo transportador cerebral. A enzima triptofano hidroxilase
representa o fator limitante na via de síntese e transforma o triptofano em 5-hidroxitriptofano.

Uma segunda enzima, uma descarboxilase de aminoácidos aromáticos, converte o 5-


hidroxitriptofano em 5-HT e encontra-se amplamente distribuída nas regiões cerebrais. O 5- 78

hidroxitriptofano não é de fácil detecção cerebral, devido ao fato deste aminoácido ser
descarboxilado rapidamente. Portanto, não é possível alterar níveis cerebrais de 5-HT por meio
da manipulação dos níveis de 5-hidroxitriptofano. A degradação da 5-HT é feita pela enzima
monoaminoxidase, a MAO, resultando em 5-hidroxindolacetaldeído o qual é desidrogenado, em
sua maior parte, por uma aldeído-desidrogenase, resultando no ácido 5-hidroxindolacético (5-
HIAA), o qual é eliminado na urina.

Uma complexa gama de receptores 5-HT tem sido estudada nos últimos anos.
Atualmente, são conhecidas as funções de quatro famílias de receptores 5-HT (5-HT1, 5-HT2, 5-
HT3 e 5-HT4). Agonistas 5-HT possuem uma ampla diversidade química e estrutural, bem como
diferentes propriedades farmacológicas. Esta diversidade não é surpreendente quando se
considera o vasto número de subtipos de receptores 5-HT, agonistas seletivos do receptor.

Do ponto de vista da contribuição da serotonina em quadros de ansiedade, uma


subclasse de receptores se distingue por sua importância, a subclasse 5-HT1A, a qual tem
contribuído muito para a elucidação da ansiedade, além de resultar em uma nova classe de
drogas. Medicamentos utilizados na clínica para tratar alguns transtornos de ansiedade agem
justamente sobre essa classe de receptores, como é o caso da buspirona. A buspirona tem a
primeira droga desta classe a ser clinicamente utilizada, tendo apresentado, até o presente
momento, um sucesso limitado no tratamento da ansiedade. Outras drogas com o mesmo
mecanismo de ação, como a gepirona e a ipsapirona, vêm sendo testadas tanto para o
tratamento da depressão quanto da ansiedade.

Neurônios contendo 5-HT ocorrem no mesencéfalo, ponte e bulbo, mas em todas


essas regiões a 5-HT está essencialmente confinada às zonas mediana e paramediana, nos
chamados núcleos da rafe. As vias serotonérgicas ascendentes seguem um estreito paralelismo
com as vias noradrenérgicas e dopaminérgicas. Podem ser distinguidas duas vias
serotonérgicas ascendentes: a ventral e a dorsal, a primeira originando-se nos núcleos da rafe,
projetando-se principalmente no hipotálamo posterior, contribuindo para a regulação tanto do
sistema de inibição comportamental quanto do sistema cerebral de defesa.
Outro contingente de fibras atravessa o fórnix em direção ao septo e ao hipocampo, o
que envolve a serotonina na modulação do sistema comportamental de defesa. Acredita-se que

essas fibras são especialmente importantes na inibição comportamental. De fato, a lesão desse
sistema serotonérgico ascendente resulta na ocorrência de respostas prematuras a estímulos e 79
mesmo em impulsividade. A via serotonérgica ascendente dorsal origina-se principalmente do
núcleo dorsal da rafe e distribui-se para a substância cinzenta periaquedutal e hipotálamo,
reforçando seu papel sobre os comportamentos de defesa afetiva, controlados pelo sistema
cerebral de defesa.
Quando se fala no envolvimento da serotonina em quadros de ansiedade, uma teoria
deve ser mencionada, que é chamada de Teoria de Deakin e Graeff, nomes dos pesquisadores
que a idealizaram. Esta teoria concilia duas correntes antagônicas de pensamento, uma
afirmando que a ativação de sistemas serotonérgicos promovia um aumento da ansiedade
(considerada a teoria clássica serotonérgica) e a outra dizendo o contrário, que a ativação de
sistemas de serotonina diminuía os sintomas ansiosos. Assim, baseados em evidências
experimentais obtidas durante anos de pesquisas, Deakin e Graeff, em 1991, propuseram uma
hipótese dual da ação da serotonina sobre os mecanismos de defesa e, conseqüentemente,
sobre a ansiedade. Essa teoria leva em consideração as diferenças anatômicas e funcionais das
vias serotonérgicas e os diferentes subtipos de receptores envolvidos na ação dessas vias.
Desta forma, os autores sugeriram que a via serotonérgica que inerva a amígdala e o córtex pré-
frontal, atua em situações de perigo potencial ou distal, podendo estar envolvidas em transtornos
de ansiedade antecipatória, tal como o transtorno de ansiedade generalizada. Já a via
serotonérgica que inerva a substância cinzenta periaquedutal, estaria envolvida nas reações de
luta ou fuga em resposta a um perigo proximal e, presumidamente, estaria relacionada ao
transtorno do pânico. Essa teoria explicaria, por exemplo, a eficácia de alguns medicamentos
antidepressivos no tratamento do transtorno do pânico, uma vez que esses medicamentos atuam
restaurando o mecanismo serotonérgico inibitório na substância cinzenta periaquedutal.
Resumidamente, a ativação anormal da amígdala poderia resultar, em termos clínicos,
no transtorno de ansiedade generalizada, enquanto que uma hiperativação da substância
cinzenta periaquedutal ocasionaria o transtorno do pânico.
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