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Os colegas pediram para que eu falasse sobre o ateísmo a partir de uma perspectiva filosófica.

Bom, acho legal entendermos como todas as nossas ideias a cerca da realidade, são frutos de
um processo desenvolvido por toda uma história humana. Então, o que eu quero mostrar aqui
é como que esse ateísmo , como entendemos hoje, também não foge esse padrão.

O ateísmo, certa forma, é fruto de um processo de dessacralização espontânea ( eu digo


espontânea porque ela não é movida por ideais políticos ou ideológicos , mas sim por
motivações de querer entender como funciona a realidade ) , que começou na Grécia antiga,
com o surgimento da filosofia. Eu digo na Grécia,pois,não se vê,até então, em nenhum outro
lugar,uma preocupação desse tipo. Na china pode ter o confucionismo, mas em nenhum
momento Confúcio quer emitir opiniões a cerca dos Deuses,a busca espiritual de Sidarta , o
famoso buda, também não parece emitir nenhuma opinião a cerca da existência ou não de
Deuses..

Então, o famoso esquema, que a maioria de nós aprendemos , da passagem do mythos para o
logos. Bom , o que isso significa? Primeiro que não foi algo imediato, mas sim, teve todo um
percurso, uma história. Segundo que agora o homem parece querer entender esse quê
originário, esse princípio (arché) despido de explicações sacras,isto é , religiosas.

Com isso, aos poucos, vão surgindo dois grupos que vão construindo os seus argumentos a
cerca disso. Pode-se dizer que os primeiros são os Teístas, que são o oposto dos ateístas, isto
é, acreditam na existência de um Deus ou Deus, podendo o elemento religioso ser facultativo e
os ateístas,onde há uma ausência total da crença nesse Ser, ou seres, que são responsáveis
pela existência da realidade.

No primeiro grupo,vamos ter nomes célebres como Platão, que argumenta que esse Deus só
pode ser o sumo bem de onde todas as ideias derivam, e Aristóteles, que tem o famoso
argumento do motor imóvel.

Já, no grupo dos ateístas, podemos incluir nomes como Diágoras de melos, que dizia que os
Deuses são invenções humanas, Protágoras , que dizia que “ O homem é a medida de todas as
coisas” e ,por fim, e, talvez o mais importante, Epicuro, embora ele não fosse propriamente
um ateu, ele foi o primeiro a formular uma refutação à existência de Deus a partir do problema
do Mal. Colocar formulação>

E Epicuro, dá as chaves da argumentação ateísta ao reduzir toda a realidade à matéria, onde a


existência de um Deus não tem nenhuma importância pois tudo que acontece são relações,
sendo ele o precursor do materialismo.Pois Epicuro foi discipulo da escola atomista de
Demócrito e Leucipo, portanto, que toda a realidade era explicada a partir dos movimentos de
átomos ,isto é, corpo, se movimentando pelo espaço e pelo vazio.

E por que eu estou falando disso tudo ? por que nós, em certa medida, somos fruto desse
processo. A modernidade, com a racionalização iluminista, dá continuidade a esse tipo
de pensamento dessacralização, tendo Ateus como Diderot e Hume ( não se pode ter certeza
da existência de um Deus, já que nosso raciocínio é indutivo ).E ,já no século XIX, movimentos
filosóficos como o psicologismo( onde toda realidade pode ser explicada a partir de leis da
mente) ,e o idealismo (doutrina que expõe que não conhecemos o mundo exterior ,m as
somente o mundo da mente) vão levar pensadores como Feuerbach a dizer que a nossa ideia
de Deus é a ideia que nós temos de nós mesmos ,ou seja, uma construção do
homem.Marx,que também foi influenciado pelas ideias de Feuerbach, retoma a concepção
materialista de mundo dos atomistas ( Epicuro e Demócrito ) e diz que as relações humanas
podem ser explicadas a partir da forma a qual nós nos relacionamos materialmente com o
mundo(meios de produção , interpretação marxista do hinduísmo, alguma relação material
que eu tenho com a vaca e etc)E , pra fechar esse panorama, Nietzsche dá o grande
diagnóstico que a maioria de nós conhecemos “Deus está morto”,mas , ele prossegue “Nós o
matamos “ ( Gaia a ciência) , mas por que ele está morto ? Porque Nós não parecemos mais
pautar a nossa vida prática realmente para fins transcendentes, se antigamente uma guerra
sacra era pautada por um fim transcendental ,Deus,agora nós transferimos isso e guerreamos
pelo lucro, ou por uma utopia ideológica; se outrora pedíamos à ajuda de Deus para cura de
uma enfermidade, agora procuramos um especialista – questão da técnica. Então, esse
processo de dessacralização, de racionalização, fez com que, em certa medida, nós ,
matássemos Deus , e, já que o tema é o ateísmo contemporâneo, não pode-se negar que toda
forma de ateísmo atual, de uma forma ou de outra, é alimentada por essa cosmovisão de
mundo,que foi sendo construída aos poucos.E , esse processo, fez com que nós
separássemos,hoje,na contemporaneidade, as coisas,permitindo assim a existência,também,
de um ateísmo prático e um ateísmo teórico.

O ateísmo prático:

Aqui,não precisamos mais recorrer mais à existência de um Deus para realização de nossas
ações ou para explicações a cerca do funcionamento do mundo. Nossa ética é pautada a partir
de uma ética pura, originada de um senso de dever que todos nós compartilhamos. Ou seja,
Deus aqui não é mais o mediador do que é Justo ou não, mas nós , movidos por uma
“racionalização” somos capazes de dizer o que é justo e não é ( Moral Kantiana) . Um ateu
aqui,pode até concordar com algumas éticas religiosas, mas não porque um Deus sancionou
essa ética, mas porque ele está de acordo a partir da forma lógica. Nesse sentido, em que
Deus, o elemento da transcendência, não é o fim último ( e o mais importante) , um ateu pode
ser “religioso” ao se aproximar de uma religião por nutrir,por ela, uma apreciação estética. No
caso, um ateu que acredita que há vários elementos bonitos no cristianismo , ele pode se
aproximar das práticas por ter por elas alguma admiração, mas não por fins últimos.

Ateísmo teórico:

Aqui é a área onde se alimenta as discussões filosóficas a respeito da existência de Deus, e


onde vários filósofos se debruçaram, dando suas próprias visões. Com a separação do mundo
prático e o mundo da ciência e da técnica, a própria existência de Deus se torna um “campo”,
isto é, ela passa a ser discutida para fins epistemológicos, ou do conhecimento.Não é que a
descoberta da existência de Deus vá mudar e algo o mundo que nós vivemos, mas ,sim,
olhando pela ótica teórica, o mundo o qual conhecemos – Deus é uma discussão do campo do
saber.

Entre esses, há os Ateus epistemológicos, que dizem que não há como conhecer se existe um
Deus ou não, pois não conseguimos deduzir sua existência do já conhecido.Ou seja, a
existência de Deus parte de uma derivação axiomática. Essa posição,ainda em voga hoje em
dia, é uma derivação do ceticismo de Hume e do racionalismo iluminista.

Há,os ateus, como Bertrand Russel,que são os Ateus lógicos,que argumentam que as
qualidades, ou os atributos, dados à Deus , são inconsistentes , pois, se compararmos todas as
qualidades de Deus e relacionarmos ,como por exemplo, a existência do mal no mundo,
veremos que são inconsistentes.

Mas, o interessante a analisar é que todo esse processo, levou a formas de ateísmos muito
particulares, mesmo entre as pessoas e mesmo entre os filosófos, como o próprio ateísmo de
Sartre, o qual ele dizia que era um ateísmo existencialista, que em suma é que “o homem deve
lidar com a responsabilidade que não há nada além de si mesmo, ele deve salva-lo de si
mesmo. O homem ,em sua existência,é o ser que precede toda a essência ( até mesmo a de
Deus).

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