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Aula 3 – TEXTO ARGUMENTATIVO: ASPECTOS ENUNCIATIVO-

PRAGMÁTICOS I

Apresentação

Caro(a) aluno(a), nas aulas anteriores você entrou no mundo de uma teoria
da argumentação e lá conheceu algumas noções consideradas básicas e mais
gerais relativas à questão em foco. A partir de agora, iremos dissecar, de forma
mais profunda e detalhada, o texto argumentativo.
Compreender um texto argumentativo pressupõe a análise simultânea dos
diversos aspectos envolvidos e imbricados entre si: o(s) autor(es), interlocutor
(es), questão em foco, contexto de produção, intenção comunicativa, gênero,
suporte, posicionamentos enunciativos (tese defendida/tese refutada e
argumentos/contra-argumentos), entre outros.
Considerando a diversidade de elementos e as especificidades do texto
argumentativo, precisávamos definir um ponto de partida e assim o fizemos.
Esclarecemos, portanto, que a trajetória de análise aqui adotada constitui uma
escolha exclusivamente metodológica. Na inviabilidade de proceder a uma análise
de textos argumentativos abarcando, simultaneamente, todos os aspectos que
envolvem essa operação, tomamos a decisão de começar por um primeiro nível
de análise, sob a perspectiva enunciativo-pragmática, do que chamamos
mecanismos enunciativos do texto argumentativo, ou seja, alguns aspectos
enunciativo-pragmáticos relativos ao uso de enunciados que levam a uma ação
persuasiva por meio de uma argumentação, considerando a intenção
comunicativa e o contexto/a situação em que são produzidos.
Você poderia nos perguntar: qual o motivo dessa decisão? A resposta é
simples: não se pode estudar o texto argumentativo sem se identificar a situação
de comunicação e se proceder à análise de seu sistema enunciativo, para se
chegar aos objetivos da argumentação, à tese, aos argumentos e às estratégias
argumentativas. É importante que esse processo se inicie com a identificação das
marcas da enunciação, ou seja, mecanismos enunciativos que revelam os polos
enunciativos constituídos pelos interlocutores (quem fala? a quem fala?),
materializados nas marcas da posição do autor em relação ao seu enunciado: o
grau de certeza (modalizadores), a natureza do julgamento (avaliativo)...
Estamos considerando que o discurso argumentativo tem duas características
essenciais: de um lado, − sob o ponto de vista enunciativo-pragmático −, sua
interação explícita com o contexto; de outro – sob o ponto de vista estrutural −,
sua intenção, declarada ou não, de refutar o discurso do outro e, se este não for o
caso, de, pelo menos, defender uma posição (AURICCHIO; MASSERON;
PERRIN-SCHIRMER, 1992, p. 7).
Dado o extenso conteúdo dos procedimentos linguísticos por intermédio dos
quais o locutor imprime sua marca o enunciado e neste se inscreve implícita ou
explicitamente, os aspectos enunciativo-pragmáticos do texto argumentativo
serão objeto de análise nas Aulas 3 e 4.

Objetivos
São objetivos desta aula:
 descrever e analisar o sistema enunciativo do texto argumentativo: as
marcas da enunciação (dêiticos e termos subjetivos) e a expressão das
modalizações;
 analisar textos argumentativos considerando os mecanismos enunciativo-
pragmáticos acima descritos.

MECANISMOS ENUNCIATIVOS DO TEXTO ARGUMENTATIVO


Apoiados em Bronckart (1999), consideramos os mecanismos enunciativos
como um dos elementos responsáveis pela manutenção da coerência pragmática
(ou interativa) do texto: eles esclarecem os posicionamentos enunciativos (quais
são as instâncias que assumem o que é enunciado no texto, quais são as vozes
que aí se expressam) e traduzem, por meio do emprego de termos subjetivos e
das modalizações, as diversas avaliações (julgamentos, opiniões, sentimentos)
formuladas a respeito de algum aspecto do conteúdo temático.
Na figura que segue, você encontra a representação esquemática dos
aspectos enunciativo-pragmáticos que serão objeto de estudo nas Aulas 3 e 4.
Destacamos com preenchimento de cor apenas aqueles que são focalizados
nesta aula: as marcas da enunciação (dêiticos e termos subjetivos) e as
modalizações.

INÍCIO CAIXA [[
dêiticos
Marcas da
enunciação
termos subjetivos

lógicas
Aspectos enunciativo-
pragmáticos

deônticas
Mecanismos Modalizações
enunciativos apreciativas

pragmáticas

voz do autor
empírico

Posicionamentos vozes de
enunciativos personagens

vozes sociais

]] FIM CAIXA

 MARCAS DA ENUNCIAÇÃO
Como sabemos, em um texto argumentativo, o locutor toma partido por uma
determinada tese e manifesta, mais ou menos, essa implicação, procurando agir
sobre o interlocutor, seja para distanciá-lo de uma tese adversa, seja para levá-lo
a uma mudança de ponto de vista. Tal quadro revela a importância de estudarmos
esses indicadores de subjetividade, signos da enunciação ou marcas da
enunciação.
As marcas da enunciação são marcas linguísticas que expressam a posição
do argumentador em relação ao enunciado. São traços de subjetividade que
podem ser subdivididos em dêiticos e termos subjetivos (afetivos ou avaliativos).

o Dêiticos
O termo dêitico é formado a partir de dêixis (do grego), que significa a ação
de mostrar, indicar, assinalar. Transformado em termo da teoria gramatical, é
frequentemente utilizado por filósofos (designação de uma das expressões
referenciais definidas) e por linguistas, sendo, para alguns deles, equivalente à
noção bastante ampla de enunciação (LAHUD, 1979).
Em suas leituras, você poderá encontrar outras denominações para o termo
dêiticos, tais como: indexical symbols (indicadores, símbolos-índices), na teoria de
Pierce; shifters, termo introduzido por Jespersen e traduzido para o francês por
Ruwet como embrayeurs (embreantes); indicadores de subjetividade ou índices
da enunciação, na teoria de Benveniste.
A maioria dos estudos sobre os dêiticos registra a dificuldade, por um lado, de
se definir tal noção e, por outro, de se identificar precisamente os termos que
podem se enquadrar nessa categoria. Neste curso, entendemos dêiticos como
termos que articulam o enunciado sobre a realidade extralinguística, referindo-se
à situação de comunicação. Eles podem ter a seguinte classificação:
 pessoais, constituídos por pronomes pessoais de 1ª e 2ª pessoas e os
pronomes possessivos correspondentes, tais como: eu, nós, tu, vós, você;
meu, nosso, vosso, seu e variações;
 espaciais, constituídos por pronomes demonstrativos, advérbios ou
expressões adverbiais que delimitam o espaço da enunciação, tais como:
aqui, lá, acolá, este, aquele...
 temporais, constituídos por advérbios ou expressões adverbiais que
delimitam o tempo da enunciação, tais como: agora, ontem, ultimamente,
daqui a x dias...

INÍCIO CAIXA [[
Disponível em: <http://www.chargeonline.com.br> Acesso em: 9 jul. 2013.

“Os corruptos, sem saber a dimensão dos protestos, se encastelaram e, ainda


atordoados com o levante, traçam estratégias para continuar roubando e
desviando a atenção e os parcos recursos da educação, saúde, segurança... Mas
2014 vem aí, e nós haveremos de passar o Brasil a limpo.”
(Carta do leitor Jadson Júlio Teixeira Freitas, publicada em Veja, 3/7/2013, p. 36)

“Mas, repito aqui, nenhuma intolerância resiste ao anúncio de um plano


benfeito que, crível, anuncie metas, prazos, controles, fontes de financiamento,
supervisão e gestão qualificada.”
(Extraído do artigo Uma agenda para o Brasil, de Ciro Gomes, publicado em
CartaCapital, 10/7/2013)

“Ontem, as gentes do movimento clamavam contra as tarifas. Eram dez gatos


pingados. Hoje, os céticos de ontem observam o descontentamento dos
‘perdedores’ alastrar-se Brasil afora. Agora já são muitos e a mídia cuida de
discernir os alvos dos manifestantes.”
(Extraído do artigo Condenados à liberdade, de Luiz Gonzaga Belluzzo, publicado em
CartaCapital, 26/6/2013)

INÍCIO LEITURAS COMPLEMENTARES [[


Leituras Complementares
De acordo com Maingueneau (2001), a interpretação dos pronomes de
primeira e segunda pessoas, na condição de embreantes, só pode ser realizada
se considerarmos o movimento enunciativo do texto em que figuram. Para
entender melhor essa questão, leia O emprego das pessoas, capítulo 3 de
Análise de textos de comunicação, de Dominique Maingueneau (2001, p. 125-
135).
]] FIM LEITURAS COMPLEMENTARES

INÍCIO ATIVIDADE [[
Atividade 1
Analise o efeito de sentido das manchetes das capas da revista ISTOÉ e
do slogan do Boticário, considerando os elementos dêiticos presentes.
Fonte: <http://www.grupoboticario.com.br/institucional/Paginas/nossa-marca.aspx> Acesso
em: 21 jul.2013.

Provavelmente, você já deve saber que os elementos linguísticos relativos à


categoria de pessoa não são os únicos reveladores da subjetividade, ou seja,
reveladores da presença do sujeito no enunciado. Passemos agora ao estudo de
outros elementos linguísticos marcadores de subjetividade.

o Termos subjetivos
A oposição de pontos de vista própria ao texto argumentativo pode ser
marcada também em nível lexical: frequentemente o efeito das oposições de
termos, isolados ou em série, correspondem às teses em conflito.
Os termos subjetivos (marcas do sujeito) podem ser de qualquer categoria
gramatical (adjetivos, substantivos, verbos, advérbios): por intermédio deles, o
argumentador avalia, qualitativa ou quantitativamente, a questão em foco ou
manifesta sua reação a respeito dela.
Para o reconhecimento desses termos e a compreensão do papel que
exercem em um texto argumentativo, é importante também que você conheça as
noções de campo semântico e campo lexical. O primeiro refere-se ao conjunto de
sentidos que uma palavra pode tualizar em diversos contextos; o segundo, a uma
série de termos que remetem a uma mesma realidade ou a um mesmo conceito
(BOISSINOT, 1994).
Observamos, no texto abaixo, que, apesar de não haver marcas de primeira
pessoa, as escolhas lexicais em destaque revelam a presença de um sujeito que
se posiciona criticamente em relação ao atual contexto político brasileiro. Daí
poder-se afirmar que mesmo o discurso “objetivado” (em terceira pessoa) não
anula o sujeito, apenas procura apagar do enunciado as marcas que o afirmariam.

INÍCIO CAIXA [[
“Descontentamento no Brasil
Milhares de brasileiros – na maioria, jovens (e uma minoria de marginais e
vândalos – protestaram no país contra o aumento do preço da passagem de
ônibus e aproveitaram para expor a insatisfação com os impostos sufocantes, os
gastos públicos abusivos, a corrupção escancarada, a impunidade absurda, a
criminalidade desenfreada, a repressão policial, a educação vergonhosa, a
saúde precária, a economia frágil, os políticos ineficientes...”
(Extraído da seção Leitor, da Veja, 26/62013)
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INÍCIO ATIVIDADE [[
Atividade 2
Para Antunes (2010, p. 216), o “léxico precisa ser vista na sua dupla função: a
dos sentidos que ativa e a do papel que cumpre na construção do texto”; assim,
“toda análise do léxico será tanto mais significativa qunto mais considerar a
interdependência das palavras na construção de um sentido global para o que é
dito”.
Faça um levantamento das escolhas lexicais feitas por Elio Gaspari, no artigo
O comissariado quer tungar o ronco (aqui reproduzido), para referir-se à
presidente Dilma, a seu governo e a algumas de suas ações. Em seguida, analise
essas escolhas, estabelecendo a relação que existe entre elas e o
posicionamento defendido pelo articulista.

INÍCIO CAIXA
O comissariado quer tungar o ronco

A proposta escalafobética da doutora Dilma de convocar uma constituinte


exclusiva para decidir uma reforma política foi coisa de um governo que acha que
pode tudo, mesmo não sabendo nada. Seu objetivo é tungar o ronco das ruas. Ao
tratar das tarifas de transporte público propondo um "Plano Nacional de
Mobilidade Urbana", a doutora falou no dialeto de comissários que empulham a
rua com eventos. Falando em reforma política, fala de nada.
Ganha um mês em Pyongyang quem souber como um plebiscito poderia
legitimar uma discussão que não se sabe como começa nem como termina. Hoje,
há apenas uma insistente proposta de reforma do sistema eleitoral, vinda do PT,
sucessivamente rejeitada pelo Congresso.
São dois os seus tendões. Um é o financiamento público das campanhas. Em
tese, nenhum dinheiro privado iria para os candidatos. Só o público, seu, nosso. A
maior fatia iria para o PT. Quem acredita que esse sistema acabaria com os
caixas dois tem motivo para ficar feliz. Para quem não acredita, lá vem tunga.
Seria mais lógico proibir as doações de empresas. O Congresso pode decidir que
quem quiser dar dinheiro a candidatos deverá tira-lo do próprio bolso e não mais
das empresas que buscam-no de volta nos preços de seus produtos.
O segundo tendão é a criação do voto de lista. Hoje o voto de um cidadão em
Delfim Netto vai para a cumbuca do partido e acaba elegendo Michel Temer.
Tiririca teve 1,3 milhão de votos e alavancou a eleição de três deputados, um
deles petista, com apenas 93 mil votos.
Pelo sonho do comissariado, os partidos organizariam listas e os votos que a
sigla recebesse seriam entregues aos candidatos, na ordem em que foram
arrolados pelos mandarins. Em poucas palavras: Os eleitores perdem o direito de
escolher o candidato em quem querem votar e as cúpulas partidárias definem a
composição das bancadas. (O sujeito que votou em Delfim elegeu Temer, mas
em Delfim votou.) Uma proposta sensata de emenda constitucional veio
exatamente de Michel Temer: cada Estado torna-se um distritão e são eleitos os
mais votados, independentemente do partido. Tiririca elege-se, mas não carrega
ninguém consigo.
O comissariado queria contornar a exigência de três quintos do Congresso
(357 votos em 594) necessários para reformar a Carta. Numa constituinte, as
mudanças passariam por maioria absoluta (298 votos). Esse truque some com 59
votos, favorecendo quem? A base governista.
Todas as constituintes brasileiras derivaram de um rompimento da ordem
institucional. Em 1823, com a Independência. Em 1891, pela Proclamação da
República. Em 1932, pela Revolução de 30. Em 1946, pelo fim do Estado Novo.
Em 1988, pelo colapso da ditadura. Hoje, a ordem institucional vai bem, obrigado.
O que a rua contesta é a blindagem da corrupção eleitoral e administrativa. Disso
o comissariado não quer falar.
Há um século o historiador Capistrano de Abreu propôs a mais sucinta
Constituição para Pindorama:
"Artigo 1º: Todo brasileiro deve ter vergonha na cara.
Artigo 2º Revogam-se as disposições em contrário."
Na hora em que a rua perdeu a vergonha de gritar, a doutora diz que o
problema e sua solução estão noutro lugar.

Elio Gaspari, nascido na Itália, veio ainda criança para o Brasil, onde fez sua carreira
jornalística. Recebeu o prêmio de melhor ensaio da ABL em 2003 por "As Ilusões Armadas".
Escreve às quartas-feiras e domingos na versão impressa de "Poder".

Disponível em: <http://www1.folha.uol.com.br/colunas/eliogaspari/2013/06/1301391-o-


comissariado-quer-tungar-o-ronco.shtml> Acesso em: 19 jul. 2013.
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]] FIM ATIVIDADE

 MODALIZAÇÕES
Segundo Cervoni (1989), na linguística contemporânea, a problemática das
modalidades recuperou seu lugar em razão do desenvolvimento de pesquisas
sobre lógica da linguagem (Pottier e Martin), do interesse pela análise do que se
faz ao falar, a partir da noção de atos de fala (Austin), e do desenvolvimento da
semiótica concebida como um estudo do discurso narrativo.
Há muito, verifica-se uma oscilação entre uma concepção ampla e uma
restrita de modalização. A primeira tende a confundi-la com a própria enunciação:
se “a enunciação é definida como a atitude do sujeito falante diante de seu
enunciado”, “a modalização define a marca que o sujeito imprime em seu
enunciado (DUBOIS, 1969, apud CHARAUDEAU; MAINGUENEAU, 2004). A
segunda considera a modalização apenas como uma das dimensões da
enunciação, que integra outras (particularmente, a dimensão referencial). Nessa
última linha de pensamento, encontra-se Charaudeau (2008, p. 81), para quem a
modalização “é uma categoria de língua que reúne o conjunto de procedimentos
estritamente linguísticos, os quais permitem tornar explícito o ponto de vista do
locutor”.

INÍCIO CAIXA [[
Saiba mais
Em suas leituras sobre a expressão das modalizações, você, com certeza,
encontrará referência ao termo modalidades. Estas, de acordo com o Dicionário
de análise do discurso (CHARAUDEAU; MAINGUENEAU, 2004, p. 334), “são
facetas de um processo mais geral de modalização, de atribuição de
modalidades ao enunciado, pelo qual o enunciador, em sua própria fala, exprime
uma atitude em relação ao destinatário e ao conteúdo de seu enunciado”.
Os estudos das modalidades não são recentes. A definição de modalidades
lógicas como aquelas em que o conteúdo da proposição é modificado por uma
ideia de necessidade, impossibilidade, possibilidade ou contingência, foi
inaugurado por Aristóteles. Segundo Cervoni (1989), esses conhecimentos
gregos chegaram, por intermédio dos latinos, aos gramáticos da Idade Média,
que, à época, já analisavam os enunciados em duas partes constitutivas: o
conteúdo proposicional (o dito) e a modalidade (um ponto de vista do sujeito
falante sobre esse conteúdo).

No quadro abaixo, você encontra as categorias das modalidades lógicas.

MODALIDADES LÓGICAS

MODALIDADES MODO

Aléticas necessário impossível possível contingente

Epistêmicas certo excluído provável contestável

Deônticas obrigatório proibido permitido facultativo

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Diante das diversas teorizações existentes sobre o tema, optamos por adotar
a noção e a sistematização desenvolvidas por Bronckart (1999). Para ele, a
finalidade geral das modalizações é “traduzir, a partir de qualquer voz enunciativa,
os diversos comentários ou avaliações formulados a respeito de alguns elementos
do conteúdo temático”. Elas contribuem para a coerência interativa do texto,
“orientando o destinatário na interpretação de seu conteúdo temático”
(BRONCKART, 1999, p. 330).
Na figura abaixo, você poderá ver, de forma esquematizada, a sistematização
das modalizações apresentada pelo pesquisador genebrino.
A seguir apresentamos as características de cada modalização.
As modalizações lógicas
 consistem numa avaliação de certos elementos do conteúdo temático,
apoiada em critérios (ou conhecimentos) elaborados e organizados no
âmbito das coordenadas formais que definem o mundo objetivo;
 apresentam esses elementos de conteúdo sob o aspecto de suas
condições de verdade, como fatos atestados ou certos, como fatos
possíveis, prováveis, eventuais, necessários...;
 abrigam as determinações que pertencem ao registro do saber,
abrangendo, portanto, noções como certo, provável e possível.

Nos fragmentos textuais que seguem, colocamos em destaque as expressões


linguísticas que marcam essas modalizações.

INÍCIO CAIXA [[
“Engajamento político e interesses pessoais ajudam a evitar tristeza, tédio,
inércia e depressão, diz a pesquisa [pesquisa realizada por cientistas ligados à
World Happiness Database, em Roterdã, Holanda]. Provavelmente por isso, a
maioria dos brasileiros enxergue nas manifestações de rua um saldo positivo,
apesar dos tumultos.”
(Extraído do artigo Seja ativo e feliz, de Ruth de Aquino , Veja, 15/7/2013, p. 98)
“Com os políticos acuados e amedrontados em seus palácios, um novo Brasil
parece emergir, com o vigor de uma juventude que se vê mais forte do que a
polícia e todas as instituições do Estado.”
(Extraído do artigo Democracia direta?, de Leonardo Attuch, publicado em ISTOÉ
26/6/2013, p. 76)

“É evidente que as manifestações não resultam apenas do reajuste de tarifas


no transporte público, já que no cotidiano do país há violência, impunidade,
corrupção, crescimento econômico pífio, inflação, saúde em frangalhos, educação
negligenciada...”
(Extraído da carta da leitora Verter Santa Cecilia, publicada em Veja, 26/6/2013, p. 98)
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As modalizações deônticas
 consistem numa avaliação de certos elementos do conteúdo temático,
apoiada nos valores, nas opiniões e nas regras constitutivas do mundo
social;
 apresentam esses elementos de conteúdo como relacionados ao direito, à
obrigação social e/ou à conformidade às normas em uso;
 abrangem todo tipo de expressão relacionada com as noções como
necessidade, obrigação, permissão e proibição.

Nos fragmentos textuais que seguem, colocamos em destaque as expressões


linguísticas que marcam essas modalizações.

INÍCIO CAIXA [[
“Sou contrária aos que se infiltram nas passeatas para vandalizar o ato. Eles
devem ser coibidos pela lei. Os que protestam pacificamente devem ter a
segurança dos policiais para garantir seu direito de se manifestar.”
(Carta da leitora Camila Hori, publicada em ÉPOCA, 24/6/2013, p. 19)

“É preciso conferir se as manifestações de agora não serão encerradas


concomitantemente com o final da Copa das Confederações.”
(Extraído do artigo Democracia direta?, de Leonardo Attuch, publicado em ISTOÉ
26/6/2013, p. 76)
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As modalizações apreciativas
 consistem numa avaliação de alguns elementos do conteúdo temático,
procedente do mundo subjetivo da voz que está na origem desse
julgamento;
 apresentam esses elementos de conteúdo como benéficos, infelizes,
estranhos..., do ponto de vista da entidade avaliadora.

Nos fragmentos textuais que seguem, colocamos em destaque as expressões


linguísticas que marcam essas modalizações.

INÍCIO CAIXA [[
“Aliar-se a um movimento de moralização, protestar por um Brasil menos
desigual, mais justo e mais transparente, um Brasil que consulte sua população,
que preste contas a seu eleitorado... toda essa participação contribui para a
felicidade individual. É ruim sentir-se alienado e impotente. Por isso, o atual
debate frenético no Brasil, em todas as classes sociais, tem algo de euforia.”
[...]
“É triste e assustador ver a ação de vândalos e arruaceiros que depedram
equipamento público, picham, invadem prédios do governo, quebram lojas,
saqueiam, incendeiam.”
(Extraído do artigo Seja ativo e feliz, de Ruth de Aquino, publicado em Veja, 15/7/2013, p.
98)

“No caso do Brasil, acredita Magnoli, tanto governo quanto oposição são alvo
de manifestantes. ‘É bom que ninguém se engane: o que os jovens estão dizendo
é que as coisas não vão tão bem quanto estão dizendo para eles’.”
(Extraído da reportagem A voz das ruas, de Sérgio Pardellas, publicada em ISTOÉ
26/6/2013, p. 55)
FIM CAIXA [[
As modalizações pragmáticas
 contribuem para a explicitação de alguns aspectos da responsabilidade de
uma entidade constitutiva do conteúdo temático (personagem, grupo,
instituição etc.), em relação às ações das quais ela é o agente;
 atribuem, a esse agente, intenções, razões (motivos, restrições etc.) ou
ainda capacidades de ação.

Nos fragmentos textuais que seguem, colocamos em destaque as expressões


linguísticas que marcam essas modalizações.

INÍCIO CAIXA [[

EPITÁFIO
Devia ter amado mais
Ter chorado mais
Ter visto o sol nascer
Devia ter arriscado mais
E até errado mais
Ter feito o que eu queria fazer...
[...]
(Epitáfio, de Sérgio Brito, música interpretada pelos Titãs)

Disponível em: <http://www.chargeonline.com.br> Acesso em: 19 jul. 2013.


INÍCIO CAIXA [[
Saiba mais
Leituras Complementares
Sempre ressaltando que, dada a natureza do objeto estudado, qualquer
classificação dará lugar a uma problemática, Cervoni (1989) distingue o que pode
ser classificado em tipicamente modal (“núcleo duro” das modalidades) e o que é
parcialmente modal (modalidades impuras).
Na figura abaixo, você tem a representação esquemática das modalidades
linguísticas construída por Cervoni (1989), sob a concepção da lógica.

MODALIDADES LINGUÍSTICAS

]]FIM CAIXA

INÍCIO LEITURAS COMPLEMENTARES [[


Para conhecer, de forma mais detalhada, essa sistematização das
modalidades linguísticas, leia As modalidades, capítulo 3 do livro A enunciação,
de Jean Cervoni (1997, p. 53-83).
]] FIM LEITURAS COMPLEMENTARES
Resumo
Nesta aula, começamos a estudar e analisar alguns aspectos relacionados
com o sistema enunciativo de textos argumentativos, como as marcas da
enunciação (dêiticos e termos subjetivos) e as modalizações (lógicas, deônticas,
apreciativas e pragmáticas).
Vimos que a expressão da “presença” do sujeito que argumenta no texto não
se revela apenas pelo emprego de determinadas categorias de pessoas
(nomeadamente, a primeira pessoa circunscrita ao sujeito enunciador); ela se
estende a outros mecanismos linguísticos (termos subjetivos e modalizações),
cuja escolha, muitas vezes, constitui uma estratégia daquele que tenta persuadir
o seu interlocuor acerca da tese que defende.
Na próxima aula, dando continuidade aos nossos estudos, focaremos os
posicionamentos enunciativos.

Autoavaliação
Responda às questões que seguem tomando por base os artigos Desespero de
causa, de Ruth Aquino, e A notícia foi à passeata, de Eugênio Bucci, publicados
na revista Època, de 24/6/2013 e 01/7/2013, respectivamente.
1 Descreva o contexto sociopolítico em que os artigos se inserem e, por meio de
pesquisa, construa o perfil político-ideológico dos autores e da revista Época.
2 Faça um levantamento das marcas de enunciação e das modalizações
presentes nos textos.
3 Proceda a uma análise comparativa dos textos que seguem, considerando as
escolhas lexicais feitas pelos autores e as respectivas intenções comunicativas de
cada texto.
Referências
ANTUNES, Irandé. Análise de textos: fundamentos e práticas. São Paulo:
Parábola Editorial, 2010. (Estratégias de ensino 21).
AURICCHIO, Agnès; MASSERON, Caroline; PERRIN-SCHIRMER, Claude. La
polyphonie des discours argumentatifs: propositions didactiques. Pratiques, n. 73,
p. 7-49, Mars 1992.
BOISSINOT, Alain. Les textes argumentatifs. Bertrand-Lacoste; CRDP-
Toulouse, 1992. (Collection DIDATICQUES).
BRONCKART, Jean-Paul. Atividade de linguagem, textos e discursos: por um
interacionismo sócio-discursivo. São Paulo: Educ, 1999.
CERVONI, Jean. A enunciação. São Paulo: Ática, 1989.
CHARAUDEAU, Patrick. Discurso das mídias. Tradução Angela M. S. Corrêa.
São Paulo: Contexto, 2008.
CHARAUDEAU, Patrick; MAINGUENEAU, Dominique. Dicionário de análise do
discurso. Coordenação da tradução Fabiana Komesu. São Paulo: Contexto,
2004.
LAHUD, Michel. A propósito da noção de dêixis. São Paulo: Ática, 1979.
MAINGUENEAU, Dominique. Análise de textos de comunicação. Tradução
Cecília P. de Souza-e-Silva e Décio Rocha. São Paulo: Cortez, 2001.

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