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“O termo ‘tradição inventada’ é utilizada num sentido amplo, mas nunca indefinido.
Inclui tanto as ‘tradições’ realmente inventadas, construídas e formalmente
institucionalizadas, quanto as que surgiram de maneira mais difícil de localizar num
período limitado e determinado de tempo – às vezes coisa de poucos anos apenas – e se
estabeleceram com enorme rapidez.” (pag. 7)
“Provavelmente, não há lugar nem tempo investigados pelos historiadores onde não
haja ocorrido a ‘invenção’ de tradições neste sentido. Contudo, espera-se que ela ocorra
com mais frequência: quando uma transformação rápida da sociedade debilita ou destrói
os padrões sociais para os quais as ‘velhas’ tradições são incompatíveis; quando as
velhas tradições, justamente com seus promotores e divulgadores institucionais, dão
mostras de haver perdido grande parte da capacidade de adaptação e da flexibilidade; ou
quando são eliminadas de outras formas. Em suma, inventam-se novas tradições quando
ocorrem transformações suficientemente amplas e rápidas tanto do lado da demanda
quanto da oferta.” (pag. 11, 12)
“Ainda assim, pode ser que muitas vezes se inventem tradições não porque os velhos
costumes não estejam mais disponíveis nem sejam viáveis, mas porque eles
ddeliberadamente não são usados, nem adaptados.” (pag. 15)
“Antes de mais nada, pode-se dizer que as tradições inventadas são sintomas
importantes e, portanto, indicadores de problemas que de outra forma poderiam não ser
detectados nem localizados no tempo. Elas são indícios.” (pag. 20)
“Em segundo lugar, o estudo dessas tradições esclarece bastante as relações humanas
com o passado e, por conseguinte, o próprio assunto e oficio do historiador. Isso porque
toda a tradição inventada, na medida do possível, utiliza a historia como legitimadora
das ações e como cimento da coesão grupal.” (pag. 20, 21)
“As linguagens-padrão nacionais, que devem ser aprendidas nas escolas e utilizadas na
escrita, quanto mais na fala, por uma elite de dimensões irrisórias, são, em grande parte,
construções relativamente recentes. Conforme observou um historiador francês
especializado no idioma flamengo, o flamengo ensinado hoje na Bélgica não é a língua
com que as mães e avós de Flandres se dirigiam às crianças: em suma, é uma ‘língua
materna’ apenas metaforicamente, não no sentido literal.” (pag. 22)
“Aliás, até a ideia de que existem uma cultura e uma tradição especificas das Terras
Altas não passa de uma invenção retrospectiva. Os montanheses (highlanders) da
Escócia não constituíam um povo separado antes dos últimos anos do século XVII.
Eram simplesmente emigrados irlandeses, vindos para a Escócia devido a pressões
populacionais.” (pag. 25)
“Em que época o ‘saiote de lã xadrez’, o kilt moderno, começou a ser usad pelos
habitantes das Terras Altas? Não há dúvidas profundas a respeito, especialmente desde
a publicação da excelente obra do sr. J. Telfer Dunbar. Enquanto o tartan – tecido com
um padrão colorido e geométrico – já era conhecido na Escócia no século XVI (vindo
ao que parece de Flandres e chegando às Terras Altas depois de atravessar as Terras
Baixas), o saiote (philibeg) – tanto o termo como a peça – só surgiu no século XVIII.
Longe de ser uma vestimenta tradicional montanhesa, foi inventado por um inglês após
a União, em 1707; os ‘tartans dos clãs’, por sua vez, são uma invenção ainda mais nova,
cuja forma atual se deve a outro inglês, mais jovem do que Sir Walter Scott.” (pag. 29)
“Durante o século XVII – no qual se rompeu o vinculo entre a Irlanda e as Terras Altas
– o vestuário montanhês foi se transformando. As mudanças ocorreram de maneira
irregular ao longo do século.” (pag. 30)
“O resultado doi o feliebeg,philibeg, ou ‘saiote curto’, obtido pela separação entre saia e
manto, e convertido numa peça separada, com pregas já costuradas. Este novo traje foi
usado pelo próprio Rawlinson, cujo exemplo foi seguido pelo sócio, Ian MacDonell de
Glengarry. Os membros do clã, como sempre, não tardaram a imitar seu chefe, e a
novidade ‘foi considerada tão prática e conveniente que num instante o seu uso alastrou-
se por todas as regiões montanhesas e também por muitas áreas das Terras Baixas
setentrionais’.” (pag. 33)
“Não foi apenas através da literatura que Stewart defendeu a nova causa montanhesa.
Em janeiro de 1820, fundou a Sociedade Céltica de Edimburgo, composta por jovens
civis cujo principal objetivo era o de ‘promover o uso generalizado dos antigos trajes
montanheses entre os habitantes das Terras Altas’, e fazer isto usando os ditos trajes em
Edimburgo.” (pag. 41)
“Assim foi a Escócia ‘tartanizada’ para receber seu rei, que também veio com o mesmo
tipo de traje, desempenhou seu apel na pantomima céltica e, no clímax da visita,
convidou os dignitários presentes a fazerem um brinde não à elite verdadeira e histórica,
mas ‘mas aos chefes e clãs da Escócia’.” (pag. 43)
“O ultimo rei britânico que manteve uma corte em Holyrood julgou que não poderia dar
prova mais definitiva de seu respeito pelos costumes que prevalecem na Escócia desde a
União do que fantasiar-se com um traje que, antes da União, era considerado por nove
entre dez escoceses como roupa de ladrão.” (pag. 44)
“Este artigo começou com uma referencia a James Macpherson. Termina com os
Sobieski Stuarts. Existem varias semelhanças entre estes inventores da tradição
montanhesa. Ambos idealizaram uma Idade de Ouro no passado das Terras Altas
célticas. Ambos criaram fantasmas literários, forjaram textos e falsificaram a historia
para sustentar suas ideias. Ambos iniciaram uma indústria que prosperaria na Escócia
durante muito tempo após a morte deles.” (pag. 54)