Na própria semana da vitoria do governo angolano na internacionalizada
guerra, já a África do Sul lançava uma campanha de desestablização contra Angola. Entre os dias 3 de Abril e 30 de julho de 1976, as SADF realizaram 17 raids contra este país, a partir da Namíbia e, em Maio do mesmo ano, o coronel Iko carreira, ministro da Defesa angolano observa:
A guerra continua. Os nossos combatentes continuam a morrer na luta
contra o que resta das forças fantoches ( UNITA ). Temos de compreender que o facto de termos optado pelo socialismo nos fez entrar em confronto com o imperialismo, e o imperialismo irá de todos os meios possíveis para nos combater, desde a sabotagem até ao equipamento de pequenos grupos armados, para tentar criar um clima de instabilidade no seio do nosso povo.
A invasão de Angola pela África do Sul iniciava doze anos de confronto
militar directo que viria devastar o país. A África do Sul começou a desestabilização de Angola porque era, para si, um imperativo assegurar que os países da região da África Austral se mantinham neocoloniais e pró – ocidentais e esta responsabilidade advinha – lhe da relação sub – imperial que mantinha com os Estados Unidos. O nível de desenvolvimento industrial sul – africano também ditava uma atitude em que os seus interesses económicos regionais tinham de ser cautelados e defendidos. Como os EUA estavam impedidos de continuar a intervir militarmente em Angola, rapidamente a África do sul assume o papel de debilitar, e mesmo de arruinar, o Estado angolano. Defendendo esta posição porque a segurança da região estava a ser «ameaçada » pelo « expansionismo » soviético e cubano. As alegações que a África do Sul ( e carter e Brzezinski ) faziam em relação ao papel da União Soviética e de cuba não correspondiam á realidade. No que se refere a Angola, como já disse no terceiro capitulo, a União Soviética tinha desejado apoiar a solução política portuguesa que envolvia o MPLA. A escala do apoio militar soviético só começou de facto quando a China e os Estados Unidos intervieram para eliminar aquela organização, da cena política. A intervenção não fazia parte de nenhum grande desígnio por parte da União Soviética e, quanto ao «expansionismo» cubano, a maior parte das tropas cubanas que participaram na guerra de 1975, havia regressado a cuba depois de o MPLA ter declarado vitoria. No final de 1976, apenas 1400cubanos permaneciam em Angola e a sua presença militar só aumentou depois de a África do Sul ter intensificado as suas manobras de desestabilização. Em 1978, havia 4000 cubanos em Angola ; 19 000 em 1979; 21 000 em 1980; e 23 000 em 1981. O seu papel era defender, sobretudo, os pontos estratégicos e as cidades. Ironicamente, a presença cubana veio, de facto, reforçar a acusação de « expansionismo soviético e cubano » por parte da África do Sul.
O estado sul – africano estava estruturado de maneira a procurar
sistematicamente a desestabilização da região. O ministro da defesa, P.W. Botha, é eleito presidente, depois de John Vorster se ter afastado em 1978, proclamando « o crescente ascendente dos militares no processo político dos brancos, no qual a tomada de decisões e o planeamento eram dominados por considerações de estavam a favor de um governo de unidade nacional com a participação de Savimbi. Mas Savimbi tem que debater – se também com oposição á sua presença. O grupo dos congressitas negros recusa encontrar – se com ele. O TransAfrica patrocina uma conferencia de imprensa « para ter a certeza que o povo americano, e em especial a comunidade negra , compreende Jonas Savimbi está a fazer trabalho sujo da África do Sul em Angola ». A fenton Comunications, uma firma de relações públicas que representava o governo angolano, faz propaganda no Washington Post e no New York Times, denunciando Savimbi como « agente secreto da África do sul ». Além destas oposições, a visita de uma delegação angolana aos Estados Unidos ajuda também a contrabalançar a influencia de SAVIMBI. Esta delegação avista - se com Shultz, com o conselho para a segurança nacional, Scrowcroft, com o chefe de estado – Maior das Forças Armadas, Colin Powell, e com o comité da câmara dos representantes para os serviços secretos. A delegação fez uma muito importante concessão para o processo de negociações em curso, ao afirmar que o governo não iria exigir o fim da ajuda á UNITA como condição para aceitar o acordo para a Namíbia.
O Conforto na Barragem de Calueque altera o equilíbrio de forças
Dois dias depois das conversações no Cairo, ocorre um confronto militar
entre a África do Sul e cuba na barragem de Calueque, junto da fronteira Angola/Namíbia, perto do complexo hidroeléctrico do rio Cunene. A 27 de julho, um comandante das SADF lidera uma unidade motorizada até 36 km ao norte da barragem. Surpreende uma unidade de Cubanos, os Sul – africanos disparam sobre eles, matando 150 soldados e destruindo dois tanques, regressando rapidamente á base perto da barragem. Os cubanos nos retaliam com ataque aéreo á barragem de Calueque, matando Sul – africanos. O receio inicial era de que as conversações não tivessem condições para continuar. Como o ministro Sul – africano das relações exteriores Botha afirma: « se as coisas continuarem assim, de nada servirão as negociações ». Mas o incidente acaba por dar um novo ímpeto a uma tentativa séria de acordo.
A mediação Portuguesa
Durante o verão, os portugueses tentam que o governo de Angola e a
UNITA aceitem encontrar – se. Em Lisboa. A 27 de Agosto, realiza – se uma terceira ronda de conversações, na qual, embora a UNITA tenha abandonado a sua exigência de um governo de transição, Savimbi se recusa a aceitar o cessar – fogo a não ser que o governo reconheça a UNITA como partido político. O governo angolano diz que apoiaria um sistema multipartidário, depois da UNITA renunciar á violência e aceitar o cessa – fogo. E não saem destas posições. A situação mantinha – se inalterada na quarta ronda de conversações, no final de setembro em Lisboa. Co0ntudo, nessa sessão, Barroso concorda com a constituição de uma comissão conjunta política militar ( CCPM ), composta pelo governo angolano e a UNITA, que estudasse a implementação de um eventual acordo. Portugal, os Estados Unidos e a União Soviética seriam observadores junto da comissão. Entretanto, o comité do senado para os serviços secretos vota a favor do pedido de Bush, feito em Agosto, de um financiamento secreto adicional á UNITA. O Comité da câmara, a12 de Setembro, também vota a favor de uma dotação de 10 a 12. Mas no congresso do partido, dizendo que « as mudanças do partido nas arena internacional não deixam muita escolha a Angola ». O governo angolano sentia que tinha pouca « escolha », porque a desestabilização provocada pelos os Estados Unidos/UNITA não iria abrandar até que o governo capitulasse, perante os termos impostos por ambos, para reconciliação nacional.
O governo angolano e a UNITA assinam os acordos de Bicesse
No dia 11 de Dezembro, o secretario de Estado Baker e o ministro dos
negócios estrangeiros Shevardnadze encontram – se em Houston para discutir as relações americano – soviéticas, em acelerada mudança. O « conflito interno » em Angola era um dos « principais tópicos regionais » a discutir. Nesta conversações, o secretario de estado adjunto Cohen apresenta um quadro de referência para as discussões sobre a reconciliação nacional e, no dia seguinte, Savimbi encontra – se com Shevardnadze, em Washington, enquanto Baker se avista com o ministro dos negócios estrangeiro de Angola, Van – Dunem ( Loy ). E com Lopo do nascimento, conselheiro político especial do presidente . É dito a uns e ao outro que tanto os Estados Unidos como a União Soviética estavam empenhados em eleições « livres e honestas », supervisionadas pela comunidade internacional e qualquer deles esta preparado para suspender fornecimentos de armas assim que fosse decidido um cessar – fogo, como meio de levar a paz a Angola. O departamento de Estado avalia os encontros como « uma abertura muito significativa ». No dia seguinte Bush recebe Savimbi para discutir o que ao Estados Unidos esperavam de Angola. Nesse mesmo dia, representantes do Estados Unidos, União Soviética, Portugal, Angola e UNITA, debruçavam – se em Washington sobre os princípios gerais para um acordo, nomeadamente os seguintes: 1) A UNITA tinha o directo de tomar parte nas actividades políticas de uma revisão constitucional baseada num sistema multipartdário, quando o cessar – fogo se tornasse efectivo; 2) o governo angolano auscultaria todos os partidos políticos, relativamente a proposta para uma revisão alargada da constituição, e trabalharia com todos os partidos para o estabelecimento de uma lei eleitoral. 3os Estados Unidos, a União Soviética e todos os outros países evitaram fornecer equipamento bélico e apoiaram o cessa – fogo; 4) O cessar – fogo seria seguido por observadores estrangeiros neutros ( e as Nações Unidas seriam convidadas a participar ) ; 5 ) depois do cessar – fogo, seria formado um exercito nacional até as eleições; 6) as eleições seriam supervisionadas por observadores internacionais. Estes princípios foram aceites pelas cinco partes envolvidas na negociações. O comunicado oficial esclarecia que « tinha sido feitos importantes progressos » que « aumentavam » as perspectivas para a sexta ronda de negociações, agendadas para o final de Janeiro. A 10 de Janeiro de 1991, os Estados Unidos, a União Soviética e Portugal concordam em basear as negociações nos termos acordados em Dezembro, mas as conversações marcadas para esse mês têm que ser canceladas porque a UNITA se recusa a aceitar a exigência angolana de um acordo de cessa – fogo, antes da discussão das condições políticas. Segue – se uma serie de encontros, em separado, durante os meses de Fevereiro, Março e Abril, entre os EUA, a União Soviética e Portugal, com o governo angolano e com a UNITA, para discutir o recomeço das negociações. Em Março, Bush escreve a Savimbi sugerindo que « entre na luta política com o mesmo fervor que sempre demostrara na luta militar ». Mas era evidente que a UNITA estava a tentar ganhar tempo até á retirada final das tropas cubanas.
Em Abril, o secretário de Estado adjunto Cohen consegue acabar com o
impasse político ao sugerir que as eleições sejam realizadas nos 15 a 18 meses seguintes. O governo angolano aceita estes termos e, a 1 de Maio, chegam finalmente a acordo. É importante referir que o congresso do MPLA votara o abandono do marxismo – leninismo e adoptara o socialismo democrático, como ideologia oficial, apenas dois dias antes. Fixa – se o cessar – fogo para 15 de Maio, embora a UNITA continue a cercar Luena, no leste. Ambas as partes concordam com a realização de eleições entre 1 de Setembro e 30 de Novembro de 1992. O presidente José Eduardo dos Santos e Savimbi assinam o acordo a 31 de Maio, no Estoril ( o acordo foi denominado inicialmente de Acordo de Bicesse ). Com a retirada cubana terminada a 24 de Maio, os Estados Unidos tinham alcançado todos os objectivos que tinham exigido de Angola, á excepção do poder político para Savimbi. A Administração Bush estava convencida que isso iria acontecer nas eleições nacionais.
A Implementação do Acordo de Bicesse
O Acordo de Bicesse previa o fim dos processos políticos e militares nos 16
meses seguintes. A nível militar, os acordos envolviam o aquartelamento e a desmobilização de 152 000 soldados do governo e da UNITA e a formação de um exercito nacional de 40 00 homens até ás eleições ( as forças governamentais constituiriam uma Marinha de 6000 homens e uma Força aérea de 4000 ). A nível político, criar – se – iam condições para a realização de eleições multipartidarias. A responsabilidade da implementação dos acordos devidia – se por varias entidades. A responsabilidade principal cabia á CCPM que deveria supervisionar a implementação dos acordos, assegurar o seu cumprimento rigoroso e tomar decisões em casos de possíveis violações são assim constituídas a comissão mista de verificação e fiscalização no cessar- fogo ( CMVF ) e a comissão conjunta para formação das Forças armadas angolanas ( CCFA ) para gerir e verificar a desmobilização dos militares e constituição das forças armadas, bem como fiscalizar o cessar – fogo. Estas comissões deviam relatar os progressos feitos e qualquer incumprimento á CCPM. Á UNITA cabia a responsabilidade igual á do governo, sendo a presidência rotativa. Os Estados Unidos, Portugal e a União Soviética ( Federação Russa, depois de Setembro de 1991 ) – apelidados de « troika » - serviam de observadores nas comissões, tendo todos os direitos o direito de exigir investigações, em caso de incumprimento. O governo do MPLA manteve um controlo formal sobre o estado Angolano até ás eleições, controlando igualmente os requisitos políticos dos acordos, nomeadamente a constituição de partidos políticos e a escolha de uma data para as eleições. Cabia – lhe estabelecer um conselho eleitoral multipartidário nacional responsável; Recensear os eleitores; Criar condições para campanha eleitoral; Conduzir as eleições; E compilar os resultados eleitoras. As eleições seriam presidências e parlamentais ( se o vencedor presidencial obtivesse menos de 50% dos voto, proceder – se – ia a uma segunda volta ). Os acordos exigiam que o governo usasse da autoridade em todo o país, mas a UNITA recusou - se entregar a maior parte do território que ocupava. Questão primordial nas mudanças políticas internas, eram os esforços que tinham de ser feitos para abranger a inexperiente sociedade civil. O governo produz legislação para proteger os direitos dos partidos políticos, o direito de reunião e de manifestação, o direito a greve e a liberdade de imprensa. São levantadas as restrições ás viagens internas e a escolher obrigatório. Em finais de 1991, tinham surgido 27 partidos políticos assim como numerosas organizações não governamentais ( ONGs ), nomeadamente grupos de conterrâneos, organizações comercias e profissionais associações de negócios, e comités ambientalistas, organizações de mulheres e de jovens e associações de caridade. Diversa ONGs internacionais começam a colaborar com organismos estatais e ONGs locais. Quando o conselho de segurança concede um novo mandato á II Missão de verificação das nações unidas em angola ( UNAVEM II ), o papel das Nações Unidas alarga – se pois, paralem de supervisão da retirada cubana cabe – lhe também fiscalizar a implementação dos acordos de Bicesse. O mandato da UNAVEM I terminava com a retirada final dos cubanos e a UNAVEM II participava em diversas comissões de supervisão da desmobilização das tropas governamentais bem como da dos guerrilheiros da UNITA. É importante notar que a UNAVEM II não tinha poder para fazer cumprir os processos militares e políticos. Os seus recursos eram limitados: Tinha um orçamento de cento e dezoito milhões de dólares e um total apenas 350 observadores militares e 126 observadores policias.
A Emenda Tunney e Cuba ajudam o MPLA a vencer
Em Novembro, o MPLA a as tropas cubanas impedem que a ofensiva EUA
– África do Sul tomem Luanda. Nos dois meses que se seguem, o MPLA e os cubanos lutam por todo p país contra a aliança ocidental e, em meados do mês de Dezembro, conseguem alterar o sentido da guerra. O MPLA prova a sua eficácia devido á presença das tropas cubanas ( 10 000 a 12 000 no final ), tendo recebido treino por parte dos cubanos e armas por parte dos Soviéticos. Contudo, a aprovação da Emenda Tunney que acabava com os financiamentos para o programa secreto americano foi um factor determinante. A República popular de Angola, chefiada pelo MPLA, ganha legitimidade internacional quando o seu reconhecimento diplomático, a partir de 13 de Novembro é assumido pelas antigas colónias portuguesas ( Moçambique e Guiné – Bissau ), União Soviética, países da Europa de leste cuba, Vietname, Argélia, Congo – Brazaville, Etiópia, Madagáscar, Tanzânia, Nigéria, Iraque e Síria. O Brasil foi o primeiro a reconhece – La de imediato. A determinação da África do Sul tinha perdido força. Depois de terem sido empurradas para o Sul, as SADF começam a retirar para a fronteira entre Angola e a Namíbia, em Janeiro de 1976. Em meados de Janeiro, a África do Sul ainda ponderava sobre o recomeço das operações em Angola, mas como tinha de « fazê – lo sozinha », sem apoio dos Estados Unidos, John Vorster decide começar a retirar, embora a luta contra o governo de Angola não tivesse completamente acabado.
Em Dezembro e Janeiro ( 1976 ), a imprensa começara a falar do
recrutamento de mercenários americanos para lutar ao lado da FNLA e da UNITA em Angola, mercenários esses que era suposto serem veteranos do Vietname, brancos e negros, bem como cubanos anticastristas sediados na Florida. Os negros estavam a ser recrutados pela organização de direitos cívicos, congresso para igualdade racial ( CORE ), chefiada por Roy Innis. O governo nega qualquer envolvimento neste recrutamento e declara que não sabe o que é que a UNITA e a FNLA estavam a fazer com o dinheiro que tinham recebido dos estados unidos. O secretario da casa Branca para a imprensa, Ronald Nesson, afirma em 27 de Dezembro: « Não é segredo que os Estado a dar ajudas modestas a alguns países africanos, mas não temos maneira de saber precisamente como é que esse dinheiro é gasto até ao ultimo centavo ». Independentemente da validade deste episódio, os mercenários nunca chegaram a Angola.
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