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A alarmante escalada de violência no nosso país é fato.

Diante dessa realidade


medidas estruturantes são necessárias para reorganização dos problemas históricos
enfrentados pelo Estado brasileiro no que tange à segurança pública. O enfrentamento
ao tráfico internacional de drogas e de armas, a necessidade de dar celeridade e
efetividade com produção de provas técnicas pelas polícias (com a necessária
aproximação com o Ministério Público) são correções necessárias para quebra do ciclo
de impunidade no nosso país.

O atlas de violência 2018 apresentou diagnóstico extremamente preocupante:


“Segundo o Sistema de Informações sobre Mortalidade, do Ministério da Saúde
(SIM/MS), em 2016 houve 62.517 homicídios no Brasil. Isso implica dizer que, pela
primeira vez na história, o país superou o patamar de trinta mortes por 100 mil
habitantes (taxa igual a 30,3).”

“Em 2016, foram registrados nas polícias brasileiras 49.497 casos de estupro,
conforme informações disponibilizadas no 11º Anuário Brasileiro de Segurança Pública.
Nesse mesmo ano, no Sistema Único de Saúde foram registrados 22.918 incidentes
dessa natureza, o que representa aproximadamente a metade dos casos notificados à
polícia. Certamente, as duas bases de informações possuem uma grande subnotificação
e não dão conta da dimensão do problema...”

Importa ressaltar ainda que enfrentamos uma corrupção sistêmica. Segundo a


CGU, 4 em cada 5 Prefeituras fiscalizadas (80%) apresentam irregularidades graves e
médias, que indicam a ocorrência de desvios de recursos públicos federais. Mais de um
terço dos Municípios já foram fiscalizados. Em apenas uma operação da Polícia Federal
("Sanguessugas"), 10% dos municípios brasileiros (mais de 500) estavam envolvidos.

Esses números podem ser explicados, em boa parte, pela falta de um sistema
organizado de persecução criminal, trabalhando conjuntamente com um sistema de
prevenção e auditagem independentes. Isso gera inoperância na prevenção e impunidade
no sistema criminal brasileiro.

Precisamos de um novo modelo Constitucional em segurança pública, adequado


aos desafios impostos no século XXI. Buscar alternativas na prevenção, trabalhando o
viés de transversalidade da segurança pública (necessidade de habitação digna,
empregabilidade, educação, cultura e esporte em contra turno, urbanismo, dentre outros)
bem como a imediata modernização dos sistemas penal e processual penal.

No âmbito da Polícia Federal, importante ressaltar que, durante as últimas três


décadas, houve imposição legal de inúmeras competências legais, que não encontram
seu paralelo em rol de atribuições, com a necessária Lei Orgânica, e tampouco de
recursos para desempenho eficaz de todo esse rol.

Para exemplificarmos quais seriam essas atividades, citamos: Controle De


Produtos Químicos (cadastro, licença, controle de importação e exportação com emissão
de autorização prévia, e fiscalização), controle de armas (registro e porte de arma de
fogo, além do controle de profissionais com atuação na área), Controle de segurança
privada (registro, licença, fiscalização, registro de vigilantes, autorização para porte de
arma de fogo na esfera de empresas de segurança), controle de imigração (emissão de
passaporte, controle de imigração, cadastro e registro de estrangeiros, retiradas
compulsórias), segurança de dignitários e testemunhas, atividades de tecnologia da
informação (desenvolvimento de sistemas), controle e coordenação de grandes eventos,
aviação operacional, segurança aeroportuária, segurança marítima, e entrega de
intimações e notificações, dentre outras.

Observamos que há previsão, via SUSP, de gestão de informações,


estabelecendo padronização, intercâmbio e disseminação do conhecimento dos bancos
de dados policiais. Entretanto, essa coordenação dos bancos de dados policiais hoje se
mostra muito precária. A ampliação dessa rede de comunicação em uma grande base de
dados deixaria a informação disponível a todos os centros de polícia - com maior refino
de perfil do usuário - bem como mais acessível ao titular da ação penal.

Com relação às Fronteiras, mostra-se imperioso o incremento do combate ao


crime organizado, com destinação específica para o controle e combate a criminalidade
no âmbito fronteiriço, aeroportuário e marítimo. É notória a grande extensão de área de
fronteiras no Brasil. A fronteira “seca” tem 16.886 quilômetros de extensão, sendo
7.363 quilômetros de linha por terra e 9.523 quilômetros de rio, lagos e canais. Seu
litoral possui 7.408 quilômetros de extensão e se forem computadas todas as
reentrâncias chega-se à marca de 9.198 km. Não só isso, o combate ao tráfico
internacional de drogas e armas – corrente nas fronteiras e aeroportos – é essencial para
contenção da violência nos centros urbanos.

Nossos portos sempre representaram um grande atrativo econômico ao longo da


história, fato este que requer um Estado que seja capaz de prevenir e reprimir as
diversas modalidades de crimes que podem ser cometidos na área marítima/portuária.
Tais características tornam os portos brasileiros em um portal de acesso as mais diversas
rotas dos mercados ilícitos internacionais.

Fato é que, hoje, não há um controle efetivo e eficaz das fronteiras, nem
tampouco a necessária centralização de suas ações para que as mesmas sejam
uniformes, em que pesem as características e especificidades de cada região. Mostra-se
urgente o incremento do policiamento de fronteira e controle migratório, da fiscalização
de entrada e saída de pessoas, cargas e veículos no país, do controle dos meios de
transporte que fazem o tráfego internacional, e da investigação e o combate dos crimes
nacionais ou transnacionais que ocorram ou tenham início na faixa de fronteira.

Necessário ainda o reconhecimento do sistema socioeducativo como integrante


do planejamento em segurança pública, abandonando qualquer interferência política.

A adoção do ciclo completo de polícia, assim como do ingresso único como


pilares de reforma interna nas instituições policiais fomentariam a meritocracia
(competência e capacitação) e a manutenção da motivação intrínseca ao todo ser
humano.

Alterações na investigação criminal, via CPP são, há muito, esperadas, pois


trazem maior intercâmbio com os Ministérios Públicos, desburocratizam o processo,
dão celeridade e ampliam as possibilidade de investigação.

A restrição dos números de recursos dentro de um mesmo processo penal em


concreto, visando dar eficiência ao sistema, atacando a sensação de impunidade, com
respeito à ampla defesa e o contraditório, evitando os recursos meramente protelatórios
e premiando o bom profissional da advocacia é outra solução importante.

A LEP necessita de alterações pontuais, colocando o trabalho como ponto


nevrálgico do sistema de execução. Pleito apoiado por mais de 90% da população
brasileira, colocando o trabalho como força motriz para a recuperação do apenado,
tornando-o atrativo, mediante acesso a remuneração e benefícios. O apenado tem a
opção de não trabalhar, mas tem também a responsabilidade pela sua escolha, qual seja,
a restrição aos benefícios da LEP, que ficariam condicionados ao trabalho.

Importante ressaltar que "os custos gerados pela violência no Brasil são três
vezes maiores do que o valor destinado a políticas de segurança pública e prevenção da
criminalidade.” Em 2013, homicídios, serviços de saúde de emergência e contratação de
segurança privada, por exemplo, consumiram 193 bilhões de reais – cerca de 4% do PIB
nacional, de acordo com a parcial do Anuário Brasileiro de Segurança Pública.

Se somados os gastos com prisões e unidades de medidas socioeducativas, em


2013, a violência gerou ao Brasil um custo de 258 bilhões de reais ou 5,4% do PIB.
Estima-se, ainda, que a corrupção custou ao Brasil 200 bilhões de reais em 2017. É o
que afirmam o MPF e a ONU (https://istoe.com.br/brasil-perde-cerca-de-r-200-bilhoes-
por-ano-com-corrupcao-diz-mpf/).

É de se destacar que a falta de perspectiva de melhoria nos índices de


impunidade e a cultura da corrupção no país afetam diretamente a sociedade. Citamos
pesquisa da UNB em que:

- 50,3% dos brasileiros afirmaram que contratariam parentes se fossem servidores


públicos;

- 28,1% afirmaram que utilizariam cartões corporativos com despesas pessoais;

- No caso dos servidores públicos, 22,5% admitiu já ter desobedecido alguma lei e
outros 18,1% confessaram ter cobrado propina para atender alguma reivindicação
legítima dos cidadãos (https://www1.folha.uol.com.br/fsp/brasil/fc1502200904.htm).

São dados assustadores que se refletem direta e indiretamente na economia e


cidadania brasileiras. Para além dos custos acima, soma-se R$ 114 bilhões pela perda de
capital humano. Ainda, R$ 36 bilhões com seguros contra roubos e furtos e R$ 3 bilhões
com o sistema público de saúde (https://oglobo.globo.com/brasil/estudo-mostra-que-
custo-da-violencia-no-brasil-ja-chega-54-do-pib-14517004#ixzz5M7RP8fa5).

Para Bruno Paes Manso, pesquisador do Núcleo de Estudos da Violência da


USP, o erro da gestão dos gastos em segurança pública está no investimento num
"modelo falido". "Além de não haver investimento na prevenção, o país gasta muito
dinheiro com um modelo que há 30 anos se mostra equivocado", afirma.

A falência no modelo de segurança pública adotado no país se reflete num


sentimento de impunidade. O Índice de Confiança na Justiça Brasileira, medido pela
FGV, mostra que 81% da população acredita que é fácil desobedecer às leis brasileiras e
que sempre é possível "dar um jeitinho". Além disso, 57% acham que há poucos
motivos para seguir as leis." (http://www.dw.com/pt-br/inefici%C3%AAncia-da-
seguran%C3%A7a-p%C3%BAblica-eleva-custo-do-combate-%C3%A0-
viol%C3%AAncia/a-18054924)

Diante do acima apresentado, é de suma importância repensar todo o sistema de


persecução criminal brasileiro, adequando o mesmo aos anseios da nossa sociedade e à
realidade hoje existente no país. Os dados apresentados e os fatos relatados são críticos.
Vivemos um caos em segurança e insistimos na manutenção de uma política falida na
área. Ou implementamos bons exemplos que funcionam em outros países ou estaremos
fadados ao fomento cada vez maior do ciclo de violência e impunidade vividos e
chegaremos a situação crítica de comando por organizações criminosas e descrédito
total do modelo de governo democrático.

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