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All content following this page was uploaded by Jorge Assis on 27 May 2014.
Produção de conteúdos: Mundo Gobius Comunicação e Ciência, Lda, Centro de Ciências do Mar
e Departamento de Oceanografia e Pescas, Universidade dos Açores, segundo o novo acordo
ortográfico.
Fotografias: Carlos Franco (p 4); Jorge M. F. Assis - Gobius (pp 7, 30); AlgaeBase (pp 11, 20); Luis
Quinta (p 18); Departamento de Oceanografia e Pescas, Universidade dos Açores (pp 27, 29);
Shutterstock (pp 12, 14, 22)
Esquemas e Ilustrações: J. T. Tavares - Gobius (pp 8, 10, 16, 17, 21, 23, 24, 25, 26); Jorge M. F.
Assis - Gobius (p 6, 9)
ISBN: 978-989-97260-0-0
Citação: Assis, J; Tavares J.T., Serrão E.A.; Alberto F; Ferreira C; Tavares D; Paulos L; Tempera
F. (2011). Florestas marinhas. As espécies de algas castanhas gigantes de Portugal. Centro de
Ciências do Mar e Mundo Gobius Comunicação e Ciência, Lda
Florestas marinhas
As espécies de algas castanhas gigantes de Portugal
Assis, J.1,3, Tavares, J.T.3, Serrão, E. A.1, Alberto, F.1, Ferreira, C.3, Tavares, D.3, Paulos, L.3, & F. Tempera2
Prémio BES-Biodiversidade
Fundo EDP para a Biodiversidade
1. Centro de Ciências do Mar, Universidade do Algarve, Campus de Gambelas, 8005-139 Faro, Portugal
2. Departamento de Oceanografia e Pescas, Universidade dos Açores, 9901-862 Horta, Portugal
3. Mundo Gobius Comunicação e Ciência, Av. Infante D. Henrique, 41 1º Esq., 2780-063 Oeiras, Portugal
Floresta marinha de Saccorhiza polyschides, Arrábida, 1987
Florestas marinhas _ 5
A elevada produtividade das espécies de kelp, a sua complexidade estrutural e as dimensões que
as caracterizam1, tornam-nas muito importantes para outras espécies marinhas, particularmente
quando presentes em elevadas densidades, formando as florestas marinhas.
As algas que constituem as florestas de kelp são importantes produtores primários e desempenham
um papel ativo na minimização do fenómeno do aquecimento global, uma vez que fixam carbono,
que pode acumular-se nos sedimentos marinhos, reduzindo a quantidade de CO2 presente na
atmosfera.
Destas algas são também extraídos produtos como os alginatos utilizados na alimentação, na
cosmética e na indústria. Nos últimos séculos, foram ainda utilizadas como fertilizante de solos,
uma atividade outrora muito comum em Portugal e atualmente restrita a algumas zonas do litoral
norte (ex. Afife e Viana do Castelo).
Estima-se que os níveis de serviços do ecossistema das florestas de kelp sejam na ordem dos biliões
de euros anuais para a economia global, dependendo deste ecossistema centenas de milhões de
pessoas em todo o mundo.
Conhecem-se cerca de 13 espécies de kelp nas águas europeias, das quais 7 distribuem-se por todo o
território de Portugal continental, principalmente, a norte do Cabo Mondego, sendo uma delas exótica,
nativa do Japão, introduzida na Europa (Undaria pinnatifida). Só recentemente foi confirmada a existência
de kelp no arquipélago dos Açores.
Como se reproduzem?
As espécies de algas kelp possuem um ciclo biológico com alternância de gerações, com uma fase muito
reduzida, formada por poucas células, só visíveis ao microscópio (que produzem gâmetas e, por isso,
denominada gametófita); e com uma fase de grandes dimensões, que observamos no meio natural (que
produz esporos e, por isso, denominada esporófita).
Os gâmetas masculinos (espermatozoides) possuem dois flagelos, que lhes permitem nadar no fundo
do mar até aos gâmetas femininos (óvulos), atraídos por uma hormona sexual, e fertilizá-los. O ovo
resultante divide-se, crescendo até formar uma nova alga castanha gigante (esporófito).
Algumas espécies, como Saccorhiza polyschides, são anuais, enquanto que outras são perenes, podendo
viver mais de 20 anos.
. Esquema genérico do ciclo biológico de uma alga kelp (adaptado de Kent Simmons, 2000)
. gametófito
masculino
. esporos
. gametófito
feminino . gâmetas
. fertilização
. esporófito do óvulo
As algas kelp dependem diretamente da intensidade solar disponível para realizar a fotossíntese. Por este
motivo, a sua distribuição é limitada pela profundidade (até cerca de 30 m, no Atlântico Norte e Pacífico
Norte, e até aos 120 m em condições de elevada penetração de luz, como no Mediterrâneo ou nas ilhas e
montes submarinos no meio do oceano). Por outro lado, a radiação ultravioleta pode inibir o crescimento
de algas kelp em águas superficiais. Desta forma, quanto mais transparente é uma massa de água, mais
profundo será o limite superior e inferior da distribuição de espécies de algas kelp.
As espécies de algas kelp necessitam de utilizar os nutrientes disponíveis na coluna de água para o seu
crescimento. No geral, as espécies de kelp tendem a estar associadas a regiões de afloramento costeiro,
um processo oceanográfico responsável pelo ressurgimento de água fria e rica em nutrientes, de zonas
de elevada profundidade para a camada superficial do oceano. Muitas espécies ocorrem em regiões de
fortes correntes marinhas, que possibilitam o fornecimento de nutrientes dissolvidos na água para as
lâminas das algas.
A temperatura também é um fator que controla as populações de algas kelp. As diferentes espécies
possuem intervalos de tolerância à temperatura bastante concretos que determinam a sua distribuição
geográfica. De uma forma geral, as algas kelp ocorrem em águas de temperaturas baixas ou moderadas.
As lâminas são estruturas planas e as principais . Estrutura geral das espécies de algas kelp
responsáveis pela absorção de nutrientes da coluna
de água e pela realização da fotossíntese, processo de
utilização da luz solar e de moléculas simples, como o
dióxido de carbono e os sais minerais, para produção de
matéria orgânica. Este processo permite que cresçam,
gerando ao mesmo tempo oxigénio e biomassa.
O estipe é uma estrutura flexível que suporta as lâminas e que permite aguentar fortes correntes marítimas.
Em algumas espécies (ex. Saccorhiza polyschides) o tecido do estipe, localizado a poucos centímetros da
base, expande-se ao longo do crescimento, transformando-se num bolbo que acaba por cobrir a sua base.
Floresta marinha
Uma floresta marinha da espécie Laminaria hyperborea,
ondula com a forte corrente a uma profundidade de cerca
de 20 m. As espécies de kelp também colonizam regiões
mais profundas como os montes submarinhos, desde que
nesses locais existam condições de luminosidade.
Florestas marinhas _ 15
Laminaria hyperborea
Laminaria hyperborea é uma espécie perene que pode viver até aos
18 anos. Em Portugal, distribui-se até aos 20 m de profundidade
sobre fundos rochosos de regiões expostas a correntes, que vão
desde a foz do Rio Minho (Caminha) a Vila do Conde (Porto).
Laminaria ochroleuca
Laminaria ochroleuca é uma espécie de kelp perene. A idade
máxima que pode atingir é ainda desconhecida (provavelmente da
mesma ordem de grandeza do que a Laminaria hyperborea, isto é,
Saccorhiza polyschides
Saccorhiza polyschides é uma espécie anual, aparecendo na
primavera e, geralmente, só sendo visível até finais de setembro.
Em Portugal, distribui-se até aos 19 m de profundidade sobre
fundos rochosos desde a foz do Rio Minho (Caminha) a Aveiro,
reaparecendo mais a sul na região do Cabo Mondego (Figueira da
foz), entre Peniche e Ericeira, entre o Cabo Raso (Cascais) e o Cabo
Espichel (Sesimbra) e na região do Sudoeste Alentejano e Costa
Vicentina, entre o Cabo Sardão (Almograve) e a Carrapateira (Vila
do Bispo).
Saccharina latissima
Saccharina latissima é uma espécie perene, pode viver de 2 a 4
anos e, em Portugal, coloniza fundos rochosos ou de rocha rolada
da região de Viana do Castelo. É muito comum na praia Amorosa,
na zona a descoberto nas marés mais baixas.
Undaria pinnatifida
Undaria pinnatifida é uma espécie anual, nativa do Japão, que
invadiu muitos dos mares e oceanos, desde a Europa até à Nova
Zelândia. Foi recentemente detetada na região do Porto (2008) e do
Cabo Mondego (2010).
Adulto . . Jovem
Florestas marinhas _ 25
Phyllariopsis brevipes
Phyllariopsis brevipes é uma espécie anual, que se distribui até
aos 21 m de profundidade sobre fundos rochosos do infralitoral,
na região de Perafita (Porto) e, mais a sul, entre Peniche e a ilha do
Farol (Faro).
Phyllariopsis purpurascens
Phyllariopsis purpurascens é uma espécie anual, de águas
temperadas, que se distribui até aos 22 m de profundidade sobre
fundos rochosos do infralitoral desde os Farilhões (Peniche) à praia
da Ingrina (Vila do Bispo).
Em 1990 e 1991, o Departamento de Biologia da Universidade dos Açores recolheu alguns exemplares
na mesma área, através de mergulhos profundos, que serviram para confirmar a identificação da
espécie. Desde 2002, as missões Bancos, promovidas pelo Departamento de Oceanografia e Pescas
da Universidade dos Açores, iniciaram um levantamento das áreas efetivamente colonizadas por este
tipo de algas no Banco das Formigas e estenderam a prospeção de florestas marinhas a outras áreas do
arquipélago com características similares.
Os locais de ocorrência de florestas marinhas nos Açores parecem confirmar a associação destas espécies
a condições oceanográficas caracterizadas por hidrodinamismo intenso e afloramento de águas frias
e ricas em nutrientes. Dada a escassa informação disponível sobre os tipos de fundo ou a localização
das florestas marinhas sobre o Banco das Formigas, o Departamento de Biologia da Universidade dos
Açores efectuou levantamentos sobre os diferentes sectores da coroa do banco, bem como em zonas
de declive mais acentuado, onde a probabilidade de encontrar substratos rochosos adequados para o
desenvolvimento de macroalgas é mais elevada.
Nos locais onde se identificaram os povoamentos mais exuberantes de florestas marinhas nos Açores,
as superfícies de rocha vulcânica de baixo e médio pendor, entre os 43 m e os 79 m de profundidade,
são dominadas por estas algas. Nesses locais de maior densidade de florestas marinhas foram registados
vários indivíduos por metro quadrado, o que se pode considerar como uma densa floresta face aos
povoamentos algais que caracterizam a generalidade dos fundos dos Açores.
Os estipes dos maiores exemplares observados nos Açores não ultrapassam cerca de 1 m de comprimento,
mas as longas lâminas que deles partem chegam a dar a cada planta comprimentos totais de 2,5 m a 3 m.
A ocorrência de florestas marinhas a tais profundidades só é possível devido à reduzida turbidez das
águas oceânicas que banham os Açores, permitindo uma maior penetração da radiação solar na coluna
de água.
Até ao momento, para além de confirmada a presença destas algas no Banco das Formigas, situado entre
São Miguel e Santa Maria, sabe-se que existem populações de florestas marinhas na Baixa da Serreta,
junto à ilha Terceira.
Os peixes mais frequentes nas florestas marinhas dos Açores são peixes-rei (Coris julis) e garoupas (Serranus
atricauda), tendo-se ainda registado no estudo efetuado a presença de canário-do-mar (Anthias anthias),
bodião-verde (Centrolabrus caeruleus), peixe-galo (Zeus faber) e sopapo (Sphoeroides marmoratus).
O projeto findkelp!
Findkelp é uma iniciativa do CCMAR-CIMAR, da Universidade do Algarve, em parceira com a empresa
Gobius Comunicação e Ciência, que se iniciou em março de 2008. É um projeto que recorre à integração
de diversos técnicos e ferramentas científicas, com o objetivo de conhecer o estado das florestas marinhas
de Portugal, bem como divulgar a sua importância junto das comunidades costeiras, utilizando o binómio
conhecer para proteger.
Até à data, foram conduzidos trabalhos que recorreram a ferramentas de participação comunitária
e a metodologias de validação estatística. Através de sessões públicas e de oficinas de capacitação,
formaram-se cerca de 200 voluntários mergulhadores que aportaram resultados inéditos e extremamente
úteis sobre a distribuição atual de 6 espécies de kelp dos 0 aos 42 m de profundidade, em todo o território
de Portugal continental, incluindo os montes submarinos Gorringe e Montanha de Camões.
Através de questionários efetuados a utilizadores da zona costeira, foi também possível obter informação
sobre a distribuição das espécies de kelp para décadas transatas. Essa ação permitiu documentar uma
regressão de distribuição de kelp, principalmente, a sul do Cabo do Mondego. Essa informação é o ponto
de partida para que agora se monitorizem as regiões onde a regressão foi mais intensa, se comparem séries
de dados temporais e sejam identificados os fatores físicos, oceanográficos, climatéricos e antropogénicos
responsáveis por essa alteração.
Para além dos dados de distribuição, foram obtidos dados muito concretos sobre os habitats que são
utilizados por cada uma das espécies de algas kelp. Esta informação é crucial para a sua proteção, por
permitir informar os intervenientes sobre as áreas mais importantes para a continuidade de cada uma
das espécies. Com a informação recolhida sobre as florestas marinhas de Portugal iniciaram-se vários
trabalhos para melhor compreender a biologia destas espécies e as suas relações de dependência com
espécies de valor comercial.