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Leonarda Castro

A História de Vossa Majestade Tereza de Benguela, do Brasil e do


Mundo !
Apresentação
Quem era Tereza? De onde veio? Como se tornou uma rainha
africana no Brasil?
Essa história se encontra entre os romances e os documentos da
história e a intra história de dois países entrelaçados: Brasil e África.
Seus protagonistas são Tereza de Benguela e José Piolho, que
através da sua união formaram o quilombo de Quariterê em Mato
Grosso, no Brasil Colonial do século XVIII.
A história de Tereza tem vários objetivos dependendo da expectativa
de cada leitor. Assim, você conhecerá a história do Brasil colonial,
através da história pessoal, com acertos e erros, triunfos e fracassos
enfrentados, na trajetória de nossa heroína, que nos faz acreditar que
ela possa ser chamada de Tereza de Benguela, porque foi onde
nasceu, na África. Pela luta contra a escravidão ela é do Brasil.
Tereza como uma mulher guerreira, pertence ao mundo.
Na literatura histórica quando os fatos são repetidos no dia a dia,
perdem o aspecto antigo, se tornam atuais. Os quilombos permitiam
o livre desenvolvimento da pessoa, sem romper, sua harmoniosa
integração em uma coesa sociedade dos que lutavam contra o
sistema escravocrata no Brasil. É tema atual porque esses ideais
ainda não foram alcançados. Os direitos humanos e a igualdade de
gênero são temas que ainda se encontram no espaço do vir a ser,
apesar de sua construção diária.
Contar a história de Vossa Majestade me é intensamente gratificante,
ela é uma Benu e me encantam as pessoas que ressurgem e vencem
a despeito das adversidades. Esse livro é digital e para se ter acesso
as fontes e saber mais, o leitor deve acessar as fontes de pesquisa
e livros os quais pode descarregar através dos links, que encontram-
se em azul.
Boa leitura.
Grata e atenciosamente.
Leonarda Castro
Acesse e me conheça melhor
http://lattes.cnpq.br/6132608843243013
http://www.youtube.com/chanel/UCHH1gSr-JPs_hhYMiiYBEOQ

1. APROPRIAÇÃO DA ÁFRICA E DA AMÉRICA LATINA PELOS


EUROPEUS E AS MUDANÇAS NA FORMAÇÃO DO MUNDO

A África, berço da humanidade em todos os âmbitos na religião, na


formação do planeta, na multirracialidade, multiculturalidade, no
conhecimento de arquitetura, medicina, pedagogia, rica e
desenvolvida com reinos e impérios foi destruída pelos europeus.

Houve muita rivalidade entre a Espanha e Portugal, que foi decidido


pelas Bulas Papais no século XV através do Tratado de Tordesilhas.
O Papa de Roma, concedeu aos portugueses a exploração exclusiva
de conquista por dois documentos papais ou bulas papais: Primeiro
Romanus Pontifex de 1454 concedido ao rei Afonso da capacidade
de Portugal para conquistar terras nas mãos de muçulmanos ou
pagão, ameaçando excomungar aqueles que bloqueiam estas
conquistas foi publicado.

Depois a bula Inter Caetera 1456 confirma o exposto, ficando nas


mãos dos reis portugueses todas as novas terras foram descobertas
além do Cabo Bojador, incluindo toda a África Central e Austral e
qualquer território que encontraram em seu projeto de chegar à Índia.
Leia o Tratado na íntegra o Tratado de Tordesilhas, questione o papel
da Igreja e da salvação de almas na conquista desses territórios.

O Tratado de Tordesilhas estabeleceu também os limites


jurisdicionais da Espanha e de Portugal na América Latina. Nesse
link você encontrará uma aula de História sobre os Fundamentos da
colonização portuguesa no Brasil. Mas nossa história começa num
período onde nenhum sol aquecia com beleza os africanos da
chamada África Centro Ocidental, que hoje são os territórios de
Angola, Gabón e uma pequena parte da costa da República
Democrática do Congo.

É certo que a escravidão já existia na África desde o antigo Egito. Se


convertia em escravo aquele que perdia sua liberdade por haver sido
vendido ou por ser prisioneiro na guerra.

O sadismo ou a excitação e prazer provocados pelo sofrimento


alheio, sempre foi uma marca dos poderosos. Para distinguir os
escravos, cortavam parte de suas orelhas e seu nariz, ou os
marcavam na testa com um sinal a ferro quente, para toda a vida.
Atormentados, com frequência eram açoitados, não por haver
cometido uma falta ou por render pouco no trabalho, mas
simplesmente porque exigia seu dono ou sua dona que lhe fosse
tratado com perversidade. Toda a beleza das grandes obras do Egito
estão impregnadas de sangue, suor e lágrimas. Agradavam à seus
deuses, mas não esqueciam de alimentar a seus demônios.

Na África, quando as tribos brigavam entre si, as populações


derrotadas, nestas guerras, serviam como recompensa. Os
derrotados viravam escravos, para servirem as tribos vencedoras.
Porém com as grandes navegações e a América para conquistar, os
africanos passaram a negociar os escravos dos reinos do Sego, a
confederação Ashanti, o reino do Dahomé e das cidades-Estados
iorubas para as colônias dos europeus. Eram muitos os caminhos
que levavam um africano ao cativeiro e a escravidão.

Leia sobre história geral da África sob dominação colonial, 1880-


1935.

Os europeus encontraram nessa tradição a saída para seus


problemas de mão de obra entre os séculos XVI e XIX da chamada
região de Angola escravos africanos, que vinham da Àfrica Centro
Ocidental, a maior parte deles embarcados nos portos de Luanda e
Benguela fundada em 1617, mas com a aduana em Luanda,
localizada a 700 quilômetros, abertos pela coroa portuguesa, entre
1575 e 1617 com o objetivo de atender a mão de obra escrava onde
havia o declínio da população indígena e para expandir o cristianismo
entre os povos.

É importante citar Ogot (2010):


“ Os portugueses não ignoravam que isto pudesse resultar em uma
intensificação dos conflitos entre os diversos povos e Estados
africanos, os prisioneiros de guerra tornando-se o principal objeto
deste comércio, mas eles deixaram muito cedo de se opor às
objeções morais, pois, como muitos outros na Europa, eles
acreditavam que o tráfico abria aos negros o caminho para a
salvação: não sendo cristãos, os negros haveriam de ser
condenados por toda a eternidade se eles ficassem em seus países.

Logo, um outro argumento foi enunciado: os negros são


descendentes de Ham, que foi amaldiçoado, e, por isso, são
condenados à escravidão perpétua. “ (p.8) Coleção História Geral da
África Volume V. Brasília: UNESCO, Secad/MEC.

Manoel Cerveira Pereira, foi governador de Angola de 1615 a 1617,


fundou a Baía de Santo Antônio, em 1615 o rei Felipe II de Portugal
dividiu o Reino de Benguela de Angola. Em 1617 é fundada a cidade
de São Felipe de Benguela numa região de tradições vivas,
imergidas de uma localidade encravada entre montanhas, mais ou
menos desérticas, porta de entrada do Namibe, por um lado, e por
outro, uma fértil bacia hidrográfica em torno da foz do rio Kupololo
que faz intercessão ao Oceano Atlântico. Agregam comunidades de
origens Bantu e não-Bantu. Os Ovimbundu são os povos que
habitam nas províncias do Huambo, Bié, Benguela e Kwanga-Sul,
cuja a língua e os costumes são Umbundu. Tereza é uma delas. A
cidade já contava com grande edificações, nos séculos XVII-XVIII.
2. OS OVIMBUNDU

Tereza pertencia à etnia Ovimbundu, entre seus costumes estava o


de chamar as p?essoas pelo nome acrescido do lugar de onde elas
tinham vindo, certamente é devido ao rito africano de a mãe enterrar
após os dez dias depois do nascimento a placenta e o umbigo de seu
filho ou filha há poucos metros da aldeia em um ritual chamado
INKABA YAKHO IPHI? (Onde está seu umbigo?). Esse ritual tem
como objetivo identificar de onde a pessoa é, de quem descende,
qual é sua identidade cultural e religiosa. A criança africana recebe
primeiro o seu nome em africano e depois um nome que possa ser
entendido pelo colonizador. Esse costume explica o fato de Tereza
ser chamada Tereza de Benguela.

Para o povo ovimbundun, a criação do mundo se deu assim: “ Um


dia caiu do céu um homem que teve o nome de Féti, que quer dizer
o princípio.

O bom do homem deu em percorrer a terra e notou que, havendo


muitos animais, se encontrava um só homem, que era ele. Que
aborrecimento e enfado sentir-se tão só no meio dessa criação! Para
ver se espairecia, lembrou-se de ir ao Cunene para caçar um pouco.
Pega, pois, nas armas e vai em busca de um hipopótamo, que lhe
fornecesse carne e gordura. Horas esquecidas esteve Féti à espera
de uma peça de caça, quando em vez do suspirado animal vê surgir
das águas uma forma humana, muito semelhante a si mesmo: era a
primeira mulher a quem denominou Tchoya, que, derivando do verbo
okuoya, quer dizer enfeite, ornato, perfeição. E tão bela, tão garrida
a achou o nosso Féti que dela se enamorou e com ela fundou a
primeira família que pela luz do sol foi alumiada. Passaram dias,
passaram meses, e numa bela manhã foram os ecos da mata
despertados pelos vagidos de um novo ser, que viera albergar a
habitação do felizardo Féti. Não houve ave do céu, nem animal da
floresta, que não viesse dar aos pais os parabéns por tão bom
acontecimento. Encantados, impuseram os progenitores ao recém-
nascido o nome de Ngalangi. Passaram tempos, e eis que em casa
aparece um novo bebezinho, desta vez uma menina, a quem
chamaram Viyé. Viyé, provém do verbo okuiya, que em português se
traduz por vir.

Queriam os pais significar que aquela filha havia de chamar a si as


populações e ser o tronco de uma grande família. E Viyé veio a ser a
mãe das raças do norte, isto é, das terras do Bié, enquanto foi o pai
das gentes do Sul. Assim contam os ngalangi e terminam por afirmar
que deles descendem todos os habitantes do Bié, Huambo, Sambo,
Cuíma e Caconda “.

Seus principais rituais são realizados em local sagrado chamados de


Akokoto ou Etambo (O ritual fúnebre foi feito durante o período da
noite onde o corpo é enterrado e a cabeça depositada no
tabernáculo). O ritual da chuva (nda Kuli ocitenya) é realizado na
seca, porque os anciãos (as Sekulo) se preocupam com o bem estar
de seu povo. República de Benguela

Em sua agricultura estão presentes o sisal, o algodão, a cana de


açúcar, o café, abacateiro, banana, batata doce, gergelim, macunde,
girassol, goiabeira, mangueira, maracujá, massambala, massango,
plantas aromáticas, hortas, rícino, tabaco, eucalipto, pinheiro, o milho
e o feijão são a principal dieta dos ovimbundos.

O povo ovimbundu manifesta seus sentimentos através da música e


da dança de acordo às circunstâncias dos rituais, que podem ser de
alegria ou tristeza. O (a) dançarino (a) tem destaque na sociedade.
As danças ritualistas são feitas durante o dia. A dança dos mais
velhos (Olundongo), é usada tradicionalmente na coroação do rei, em
óbitos, despedidas de lutos das dançarinas, dos caçadores,
circuncisadores e soberanos. A Onyaca é uma dança tradicional,
executada pelas mulheres, na despedida de luto de quem em vida
também usava tal dança.

Entre eles permanece a circuncisão (Evamba ou Ekwendje) como


uma prática sagrada e obrigatória, como um ritual de passagem de
menino (Otjilombo) para adolescente. É realizado nos meses de
junho, julho e agosto, épocas mais frias do ano que facilita a
cicatrização.

O Ovimbundu de Benguela acredita que o poder da autoridade está


dentro da pessoa, como um elemento anatômico, o Soma y’Akokoto
é vitalício e eterno. Esta convicção explica o poder da gestão
comunitária compartilhada entre as autoridades endógenas vivas e
não vivas. A resolução de alguns problemas que afetam a nação
exigem a intervenção direta dos ancestrais por serem eles os
gestores antecedentes, que ajudam aos vivos para que estes
possam melhor gerir através e com eles.

Eles são Bantu, isso é, do grupo que identifica o ser humano pelo
radical-ntu, a partir do qual forma-se o substantivo singular muntu (o
ser humano, o homem) e o plural bantu (os seres humanos, o povo).
São responsáveis pela formação inicial e características de uma
cultura e religiosidade afro-brasileira. É um povo que até hoje luta
para sua reconstrução através do MPSO – Movimento em Prol da
Sobrevivência dos Ovimbundu.

Em 4 de fevereiro de 2002, é publicada a seguinte declaração de


emancipação: “ Governo do MPLA, gigantesca estátua de ferro com
pés de barro assentes na tirania, incompetência, despotismo e
corrupção, viemos, em nome da nossa etnia, vítima de um genocídio
silencioso praticado por vocês, dizer-vos que basta.

Em nome dos Bailundos (va-mbalundu), os Biés (va-vihé), os


Uambos (va-wambu), os Galanguis (va-ngalangui), os Quibulos (va-
kimbulu), os Adulos (va-ndulu), os Quingolos (va-kingolo), os
Kalukembes (va-kaluquembe), os Sambos (va-sambu), os Ekeketes
(va-ekekete), os Kacondas (va-kakonda), os Quitatos (va-kitatu), os
Seles (va-sele), os Ambuis (va-mbui), os Hanhas (va-hanha), os
Gandas (va-nganda), os Chicumas (va-chikuma), os Dombes (va-
dombe) e dos Lumbos (va-lumbu), pedimo-vos, a vós, que sempre
estivestes à margem do nosso sofrimento, que nos deixeis em Paz.
Fomos hospitaleiros para com vocês. As portas dos nossos onjango
estiveram sempre abertas. Em troca, vocês transformaram os nossos
sorrisos em lágrimas; minaram as nossas lavras, nakas e
consciências. E como se não bastasse, secaram as lágrimas das
nossas mulheres. A partir de hoje nunca mais sereis bem-vindos no
nosso espaço social, cultural e psicológico, o “onjango”. Sois ingratos
e mal-agradecidos.

Definitivamente, deixamos de reconhecer a vossa soberania.

Não somos um governo eleito, muito menos um Estado


independente, ainda que um dia (quem lá sabe) possamos evoluir
para tal. A única autoridade que legitima a nossa ação é a liberdade,
a consciência e a identidade étnica, que é emanação mais profunda
das nossas crenças, atitudes e valores. Isso torna-nos
independentes da vossa tirania e do policiamento que sempre
fizestes ao nosso pensamento e às nossas ações.

Vocês não tem qualquer legitimidade moral, social e cultural (esta já


nem se fala) para nos governarem. Conhecemos, desde muito cedo,
os vossos métodos de coação.

Por isso não reconhecemos o vosso governo; aliás, nunca vos


elegemos para nos governarem. Pena que vocês são demasiados
cínicos para aceitarem que nós, os Ovimbundu, nunca vos quisemos.
Demos-vos um cartão vermelho nas primeiras eleições que se
realizaram no País. Ovimbundu algum se revê no vosso programa
(social, econômico, político e militar) e no projeto de sociedade que,
em vão, vocês procuram sustentar.

Vocês são tudo de mais nefasto e de hediondo que existe na face


da terra. A vossa ambição desmedida pelo poder já atingiu as raias
do anormal. Da falhada tentativa de implantação da “ sociedade
socialista “ (que excluía a alternância no poder) à criação e
alimentação de um Monstro (ingênuo e esquizofrênico), oriundo da
nossa etnia, para justificar ao País e ao mundo a destruição metódica
do nosso grupo, vocês mostraram que não olham a meios quando se
tratam de questões atinentes ao poder. Daí os bombardeamentos
indiscriminados, as bombas químicas, a deslocação forçada das
populações para fora do seu habitat, (condenando-as a morrer de
stress, fome e doenças) e a incorporação, na vossa máquina de
guerra, de soldados capturados e rendidos.

Vocês sempre recorreram a bodes expiatórios para justificarem o


extermínio que levam a cabo. Para além do Monstro, criado e nutrido
por vocês, é tática vossa fazer crer ao mundo que nós estamos em
guerra contra vocês; pelo contrário, vocês é que estão em guerra
contra nós, contra a Paz e contra a Democracia e por uma razão
muito simples: nós somos a maioria e isso sempre vos preocupou,
pois num pleito eleitoral, transparente e justo, qualquer nosso
representante sairia vencedor.

Defendemos a ideia segundo a qual, os problemas são intrínsecos a


vida humana; mas não precisamos de vocês para os resolvermos.
Nós temos capacidade e inteligência suficientes para identificar,
catalogar e dar soluções aos nossos problemas e pelos próprios
meios. Não precisamos de vocês para nada.

O “onjango” é um espaço que pretende promover o diálogo, a troca


de opiniões, de pontos de vista de resultados de pesquisas sobre
aspectos econômicos e sócio-culturais da etnia Ovimbundu, assim
como denunciar, energicamente, o extermínio a que esta etnia está
sendo sujeita, desde o regime colonial e que se agravou logo após a
ascensão do País à independência.

Pretendemos, deste modo, criar um espaço aberto a todos que


pretendam contribuir, com o que tem, para a sobrevivência da etnia
Ovimbundu, independentemente da raça, etnia, poder econômico,
militar e filiação partidária. Trata-se, portanto, de um espaço onde
cada um, em qualquer parte do mundo, poderá expressar as suas
opiniões sem temer por represálias ou que venha, um dia, a retratar-
se do que disse.

Os conceitos promulgados por vocês em matéria de direitos


econômicos, sociais e culturais (propriedade, trabalho, saúde e
educação) e de liberdade (consciência, expressão, associação) não
se aplicam a nós, porquanto a nossa existência é imaterial.

Não somos anarquistas e muito menos aventureiros; daí que,


contrariamente a vocês que impõem a ordem através da força física
das estruturas políticas e partidárias, sempre a desfavor da nossa
etnia, a nossa forma de governação será baseada na Ética própria
dos valores africanos, que vocês sempre ignoraram. Nunca
aceitaremos as vossas ideias e a vossa forma de olhar para o mundo.
Escusado será dizer que tudo que fizerdes para nos forçarem a
mudarmos de opinião será em vão. Estamos, assim, a criar uma nova
nação.

Desejamos que ela seja mais justa, mais equilibrada, isenta de


guerras; diferentemente da nação criada por vocês, dentro do lema
“um só povo uma só nação”, que fez tábua-rasa ao nosso modo de
ser e de estar no mundo e que hoje, de uma forma solene, nos
emancipamos. “ Declaração de emancipação.

3. KAKULI OKUPEKELA (NÃO HÁ DORMIR)

O descobrimento da América, organizou um sistema político,


econômico capitalista e militar que garantiu aos europeus o controle
sobre africanos e os latino americanos.

Mas houve uma intensa disputa entre Portugal e a Espanha pelo


direito de conquistar as novas terras.
Dessa forma surgiu o período colonial, que durou do século XVI ao
século XIV. O território do Brasil foi delineado através de três
Tratados Internacionais: Os limites do Brasil no Tratado de
Tordesilhas (1494) o Tratado de Madri (1750) e o Tratado de Santo
Idefonso (1777). Através do comércio, os povos de Luanda e
Benguela estabeleceram fortes laços com o mundo atlântico,
principalmente no Brasil do século XVIII ao saber das grandes jazidas
e o ciclo do ouro, se intensifica o tráfico de escravos para Coxipó
Mirim em 1718, Mato Grosso, onde Tereza de Benguela entra na
História do Brasil.

Um comércio exterior muito ativo organizou-se em torno do


transporte marítimo de mercadorias da África e das Américas: os
escravos africanos capturados eram mantidos em barracões pelos
comerciantes africanos enquanto esperavam pela negociação da
“mercadoria” com os europeus. Dali partiam rumo às Américas,
enquanto os produtos agrícolas e metais preciosos eram enviados
das Américas rumo à Europa Ocidental. A trágica travessia da
Kalunga (grande mar na língua bantu), viagem de Angola ou
Benguela para o Brasil durava em média 35 dias. Para cada um que
chegava vivo, haviam dois mortos. Em cada porto de desembarque
há um cemitério de “ pretos novos “, outros eram jogados no mar.

Tudo está na natureza encadeado e em movimento – cuspe, veneno,


tristeza, carne, moinho, lamento, ódio, dor, cebola e coentro, gordura,
sangue, frieza, isso tudo está no centro de uma mesma e estranha
mesa. Misture cada elemento – uma pitada de dor, uma colher de
fomento, uma gota de terror. O suco dos sentimentos, raiva, medo ou
desamor, produz novos condimentos, lágrima, pus e suor, mas,
inverta o segmento, intensifique a mistura, temperódio, lagrimento,
sangalho com tristeza, carnento, venemoinho, remexa tudo por
dentro, passe tudo no moinho, moa a carne, sangre o coentro, chore
e envenene a gordura: você terá um unguento, uma baba, grossa e
escura, essência do meu tormento e molho de uma fritura de paladar
violento que, engolindo, a criatura repara o meu sofrimento co’a
morte, lenta e segura. Eles pensam que a maré vai, mas nunca volta.
Até agora eles estavam comandando o meu destino e eu fui, fui, fui,
fui recuando, recolhendo fúrias. Hoje eu sou onda solta e tão forte
quanto eles me imaginam fraca. Quando eles virem invertida a
correnteza, quero saber se eles resistem à surpresa, quero ver como
eles reagem à ressaca.
(BUARQUE, Chico e PONTES, Paulo. Gota D’Água. Rio de Janeiro,
RJ: Civilização Brasileira Ed., 1983, p.161)

Quando aqui chegavam podiam ir para venda, hipoteca que é um


direito real de garantia sobre bens imóveis ou arresto que é a
apreensão judicial dos bens do devedor, para o pagamento de uma
dívida comprovada. Por ser um bem imóvel de valor o escravo entra
como herança da família de seu proprietário segundo o direito são
bens incorpóreos, imateriais, que não são em si, móveis ou imóveis.
A lei considera os direitos sobre imóveis (servidões, usufruto, uso,
habitação, rendas constituídas sobre imóveis, penhor, anticrese e
hipoteca, além da propriedade) como imóveis, e, como tal, as
respectivas ações, que são a própria dinâmica desses direitos (ações
de reivindicação, confessória e negatória de servidão, hipotecárias,
pignoratícias, de nulidade ou rescisão de compra e venda, entre
outras formas de transação comercial. A supressão da categoria dos
bens imóveis. Tenha acesso direto da Biblioteca Nacional a “ sete
blocos temáticos, que são introduzidos por textos com os seguintes
títulos: 1) Tráfico e comércio de escravos; 2) Acordos Internacionais
e legislação sobre a escravidão; 3)Trabalho escravo e negro de
ganho; 4) Castigos físicos; 5) Movimentos abolicionistas e alforrias;
6) Resistência negra à escravidão e, por fim, 7) Cultura afro-
brasileira. Cada documento está ligado (linkado) a um desses blocos
temáticos, podendo a consulta ser feita, também, pelo assunto
desejado.
Acesse Fotos da escravidão e veja as imagens.

4. O MATO GROSSO (BRASIL)

A História de Mato Grosso iniciou-se, em 1719, nas margens do rio


Coxipó-Mirim, com a descoberta de ouros pelos homens que
acompanhavam o bandeirante Pascoal Moreira Cabral. A capitania
de São Paulo era responsável por Mato Grosso, em 1734 os irmãos
Fernando e Artur Paes Barros, descobriram as minas de ouro do
Mato Grosso, situados nas margens do rio Galera, Vale do Guaporé,
a ocupação e povoamento da Capitania de Mato Grosso, pelo alvará
de 09 de maio de 1748, para formar a população garimpeira através
de um padre jesuíta. De cassange, mina, benguela a gentio da Guiné.
Grupos étnicos e formação de identidades africanas na cidade de
São Paulo (1800-1850).

O Mato Grosso tem várias jazidas é um Estado muito rico em


recursos minerais como ouro, diamante entre outros Programa
Recursos Minerais do Brasil Em meio a tudo isso se encontram José
Piolho, escravo da herança do defunto Antônio Pacheco de Morais e
Tereza da nação Benguela, escrava do capitão Timóteo Pereira
Gomes, nas margens do rio Guaporé região de fronteira territorial
entre duas Coroas ibéricas: Portugal e Espanha. Esse limite natural
se estabelecia nos domínios de ambas as margens. A fronteira entre
as duas possessões era uma possibilidade de liberdade, porque era
mal vigiado, havia muitas trilhas e um fluxo de todos os que
coexistiam na região.

Para Tereza era a segurança de não voltar a seu “dono”, após sua
fuga, na busca por liberdade e melhores condições de vida. Era o
amor de José, era a oportunidade de lutar por seus ideais de
liberdade, sua casa e seus filhos.

Os escravos do ouro tinham pepitas de ouro, metais preciosos e


pedras que trocavam por armas, pólvora e alforria. Os dois tinham os
mesmos ideais. Não houveram muitos encontros, mais um dia ele
deixou o mapa de onde estaria e Tereza escolheu seguir. Muito do
conhecimento do candomblé e da linguagem do tambor ajudou a luta
pela libertação dos escravos. Tereza sabia ler o mapa que para os
portugueses era indecifrável.

Depois do casamento com danças e de bênçãos de seus costumes,


formaram uma monarquia onde ele era o rei e ela a rainha.
Acesse e navegue, conheça o Mapa de Mato Grosso.

5. O QUILOMBO DO QUARITERÊ

O quilombo (kilombo) pode ser definido como uma instituição sócio-


política, cultural e militar. O artigo Origem e histórico do quilombo na
África nos conta que em 1610 na África, Kuiguli já adotavam o
quilombo como formação de exército e os Ovibumdu foram quem lhe
deram uma estrutura de campo que se encontra hoje entre os
mbundu e os cokwe de Angola, onde eram realizados os
treinamentos independentes de linhagem unindo os lunda,
imbangala, mbindu, Congo, wovimbundu e todos os outros que
desejam afiliar-se. (p.60)

Não são apenas comunidades de negros interligados entre si pela


mesma nação, língua, história ou cultura, mas por pessoas que
construíram parentescos pelo desterro. Os laços de afetividades
compartilhada por um desejo coletivo de resistir a um modo de vida
onde se negava qualquer sentimento. Se tornavam comadres,
compadres, por serem padrinhos de casamento, dos filhos uns dos
outros. Tios, tias, sobrinhos, pai, mãe, avós. O que chamamos hoje,
uma família socioafetiva.

No quilombo se falava o africano, o guarani, o português e o


espanhol. Era certo que negociavam entre os estrangeiros e entre si,
estavam em uma fronteira transnacional dentro e fora. Seus
pensamentos, tinham que se abraçarem em todas essas coisas de
uma só vez, tempo, lugares, substâncias, qualidades, quantidades e
idiomas. Se conseguirmos entender isso, entenderemos o mundo de
Tereza e de todos os que estavam no Vale do Guaporé.

No entanto eram todos fugitivos e resistentes ao sistema, e muito


tinham que cuidar da defesa, não em forma de uma estrutura social
rígida de fase africana, mas como uma comunidade multiétnica de
pessoas escravizadas no Brasil, que eram: Sudaneses da Nigéria ou
da Costa do Marfim, Dahomé, e Bantus de Moçambique, Congo e
Angola. Índios. Mestiços, espanhóis e alguns historiadores falam na
presença de judeus. Prisioneiros da Santa Inquisição.

A resistência à escravidão se deu por fuga, emboscadas para os


brancos, compra de arma e munição. Era uma sociedade plural e,
transcultural defendendo seu direito a uma vida digna.

A atividade econômica se deu pelas plantações nas terras férteis


ribeirinhas, várias frutas e verduras, além de peixes e caças.
Também desfrutavam das plantas nativas como o cacau, o cupuaçu,
o guaraná, pimenta do reino, açaí, buriti, pau-Brasil e outros. Esse
era o mundo de Tereza. A natureza generosa lhes apresentou as
belezas tropicais, na rica fauna e flora. Entre elas os animais nativos
da região.

No quilombo as tarefas eram divididas: aos homens cabia a colheita


do mel, a lenha, o cuidado com os animais, a construção de fornos
de tijolos e o feitio do tear. Ás mulheres cabia o artesanato em sisal,
o tear do algodão, a culinária e a costura.

Tereza e José foram pais de algumas crianças, a maternidade é a


maior riqueza para uma pessoa africana. Fizeram os batismos,
tinham comadres e compadres. Ela os amamentou, andou com seus
bebês atados em suas costas. Nomeou o mundo para eles e lhes
ensinou a gostar dos banhos de rio e a amar a natureza.

Houve intensa disputa entre as coroas de Portugal e da Espanha,


havendo nos exércitos a presença dos escravos depois de muitas
baixas e negociações foram assinados o Tratado de Tordesilhas em
1494 e de Madri em 1750. Ano da morte de José Piolho.

Enquanto o bando deles atacava, Tereza de preservou, depois


chorou a morte de seu marido, tudo que era para ser desgraça se
tornou motivo de reconstrução e de formação das identidades
africanas no Brasil. Não espanta a ninguém, ver uma Ovimbundu, a
identificar-se com a cultura, os valores, as atitudes e as posturas de
seu povo. Ela dança a Onyaca e recebeu o poder da autoridade que
continua vivo e interventivo (Graf, 42 – 43:1984). A sua condição de
rainha, lhe foi transmitida através do Akokoto.

Assim é. Assim foi. Continuou o sistema de governo compartilhado


com deputados e conselheiros anciões. Não inventou nada, apenas
seguiu a tradição, buscou alcançar o objetivo: o fim da escravidão.
(Bandeira, 1988:118). A defesa era assunto muito sério para todos
Quilombos e revoltas escravas no Brasil.

6. SUA MAJESTADE TEREZA DE BENGUELA

A história do reinado de Sua Majestade Tereza se alastrou como


pólvora, nos outros quilombos e para os portugueses. O povo temia
Tereza, porque era boa administradora e guerreira. Embora tudo
corresse na fartura, fugir para o Quariterê não era um spa. Todos
trabalhavam.

Ela não perdoava infidelidade a seu povo, seus costumes e sua


ideologia. Então eram duras as penas daquele que traísse a ela, a
seu quilombo ou a sua ideologia. Também por suas artes mágicas e
seu humor sarcástico. Contam que ela dizia: “Ove a Ngulu, ove
ambuá” e a pessoa se tremia, ela sorria porque isso significa em
português, “ tu porco, tu cão “ e não uma maldição. Tereza era bem
humorada.

Diplomática visitava outros quilombos, convidava para as festas de


seus costumes e procurava ajudar aos outros. Tereza administrava
e negociava a produção excedente com estrangeiros, recebia
pequenas pedras de ouro e de pedras preciosas em pagamento.
Comprava arma. Treinava duro os homens e mulheres. Tereza
guerreira.
Houve o alagamento da fronteira ocidental do Estado até o Vale de
Guaporé, as margens do Rio Paraguai. Os portugueses para
defender-se dos espanhóis foram construídos fortes e acelerou-se a
compra de escravos.

A escravidão negra no vale do Guaporé não se restringia à vida


econômica. Os escravos negros foram utilizados em forças militares,
a fim de guerrear contra os vizinhos castelhanos, que também
disputavam os territórios de fronteira. Dessa forma, o ofício datado
de 31 de maio de 1763, enviado pelo governador da capitania de
Mato Grosso, Antônio Rolim de Moura Tavares, ao secretário de
Estado da Marinha e Ultramar.

Os escravos já estavam bem treinados na arte da capoeira, alguns


historiadores se referem a seu nascimento no Quilombo de
Palmares, mas o certo é que em Alagoas, no Rio de Janeiro e na
Bahia também era temida. A capoeira estava em Mato Grosso
também.

Mas Tereza andava inquieta, a cada por do sol no Guaporé, lhe batia
uma angústia, eles pareciam muito vermelhos e isso para ela não era
bom sinal, outros sinais lhe foram mostrados. Ela intuiu e se sentiu
impotente para mudar o destino. O Ifá já havia confirmado.

De acordo com o Anal de Vila Bela de 1770, em 27 de junho partiu a


Companhia especificamente para atacar o quilombo do Piolho saindo
de Vida Bela, o trajeto fluvial seguiu pelo rio Galerinha, chegando ao
rio Galera, Taquaral, rio Piolho, rio Pedra, com um efetivo de
aramado com munições, depois de quase um mês de viagem
chegaram na madrugada do dia 22 chegaram ao quilombo e abriram
fogo.

Ela se armou e a ordem era defender-se. Contava com a ajuda


preciosa dos índios que sabiam como deslocar-se e conheciam as
ervas para envenenar as flechas. Tinham os ferreiros para forjar as
armas. Todos sabiam capoeira e manejar armas.

Mas o efeito surpresa e crueldade dos algozes a mando do Capitão


general do Mato Grosso Luís de Albuquerque de Melo Pereira e
Cáceres, matou quase a todos. Os escravos que sobreviveram foram
capturados e levados para Vila Bela. Todos vieram alimentados pelos
jacás de frutas, bolos de milho e de polvilho, grandes panelas de mel
e outros mantimentos da dispensa do quilombo.

Chegando a Vila, todos foram colocados para reconhecimento


público e submetidos a castigos exemplares, com surras, tendo parte
de suas orelhas cortadas e tatuados o rosto com a letra “F — de
Fugitivo — feita com ferro em brasa. Haviam que retornarem a seu
trabalho nas minas ou onde seus respectivos donos mandassem.

A Rainha Tereza não teve fome, sede, desespero, não podia mover-
se, levantar-se, não tinha água para nadar, nem barcos e remos para
fugir pelo rio. Não tinha pés para correr. Não tinha asas para voar. O
terror estava filmado em sua retina, não havia outra saída. Tudo
estava morto e destruído. Ela concretizou o que sentia. Como diz
Drummond: “ Além da Terra, além do Céu, no trampolim do sem-
fim das estrelas. “

7. TEREZA É BENU (GARÇA OU FÊNIX)

No local do quilombo do Piolho, após sua destruição, foi criada a


aldeia —, para garantir a posse do território, os moradores da aldeia
contavam com o apoio do governador.

Depois de 244 anos, dois séculos e 44 anos Tereza ressurge, e me


relembra o mito africano do pássaro Benu, do verbo egípcio ueben,
“brilhar”, “erguer”, parecida com uma cegonha, que criou-se a partir
de um fogo que ardia no topo de uma árvore sagrada e descansou
numa pedra, alimentada pelo sol, morre em chamas toda tarde e
emerge a cada manhã. Refazendo-se através de suas próprias
cinzas, demonstrando que a perpetuação, a ressurreição, e a
esperança nunca acabam. Essa ave pode viver mais de mil anos e
durante todo esse tempo, só existirá uma única. Enquanto a
escravidão existir Tereza não perecerá.

Vejo na metáfora a imortalidade intocável de Sua Majestade Tereza


de Benguela.

Ressurgida para representar a mulher negra do Brasil, data


comemorada todo dia 25 de julho de cada ano. Voa linda guerreira,
o mundo é teu!

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