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ORGANIZAÇÃO

Princípios e prática
contemporâneos

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ORGANIZAÇÃO
Princípios e prática
contemporâneos
John Child
Tradução de Beatriz Sidou

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353.271.001.001

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A quem inspirou este livro por meio do amor e do exemplo.

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Prefácio

No mundo contemporâneo, as organizações têm de se adaptar e ino‑


var para competir no mercado, quando são empresas, ou para satisfazer
as expectativas crescentes da sociedade, quando são provedoras de ser‑
viços públicos. Está cada vez mais evidente que as formas convencionais
de organização não são muito adequadas para suportar essas exigências;
assim, um amplo espectro de novas abordagens está sendo experimenta‑
do. Essas alternativas normalmente são descritas como “novas formas
organizacionais”.
O surgimento dessas novas formas foi anunciado no inovador livro
de Tom Burns e G. M. Stalker1, publicado em 1961, que detectou uma al‑
ternativa “orgânica” para a abordagem mecânica da organização conven‑
cional. Por volta dos anos 1980, foi identificada a chamada organização
“pós­‑burocrática”, pelo menos a princípio, como uma clara alternativa
à forma burocrática que, por mais de um século, refletira a filosofia dos
negócios hierárquicos e formalizados de grande escala. No entanto, so‑
mente no começo dos anos 1990 começaram a aparecer artigos sobre as
novas formas alternativas e estudos de caso de empresas que as haviam
aplicado. Ainda hoje há notavelmente poucos livros sobre o assunto.
Estimulado por grandes mudanças econômicas e tecnológicas, o rit‑
mo do experimento e da inovação no sistema organizacional superou
a capacidade dos autores especializados em organização de perceber e
explicar o que está ocorrendo. O desafio aqui não é apenas oferecer uma
descrição sistemática das mudanças em andamento, por mais importan‑
tes que sejam. Também precisamos compreender os desenvolvimentos or‑
ganizacionais mais recentes numa tentativa de chegar a uma teoria que

1. BURNS, Tom; STALKER, G. M. The management of innovation. 1961.

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os explique. Somente uma boa teoria nos fornecerá orientações sobre as
consequências da adoção de novas formas organizacionais e sua pertinên‑
cia em relação a situações específicas.
Este livro visa descrever os principais aspectos da organização con‑
temporânea, discernir os princípios fundamentais e relacioná­‑los a seus
contextos, para que as alternativas disponíveis no momento de escolher
este ou aquele caminho para organizar atividades sejam esclarecidas e
compreendidas. Acredito que tais opções sejam de grande importância
viii
para todos, porque a organização é mais do que um simples conjunto de
arranjos para obter os resultados desejados por meio do esforço coletivo,
organização  princípios e prática contemporâneos

embora este seja um aspecto decisivo. A maneira como organizamos e


administramos as nossas empresas e outras instituições também afeta a
forma como benefícios, oportunidades e privilégios são distribuídos na
sociedade. Está cada vez mais claro que isso tem efeitos diretos sobre a
saúde e o bem­‑estar pessoal. Este livro, portanto, se baseia na pesquisa e
na experiência para ter uma boa visão das práticas organizacionais con‑
temporâneas. O objetivo e o conteúdo de cada capítulo são apresentados
no início do Capítulo 1. Embora o livro se concentre mais na organização
de companhias comerciais, boa parte de sua análise pode ser aplicada a
outros setores da atividade organizada.
Como o livro anterior, Organization: a guide to problems and prac‑
tice (Organização: um guia para os problemas e a prática), este surgiu
2

principalmente de minha experiência em pesquisa e consultoria, e foi


aperfeiçoado com o envolvimento dos participantes de cursos de MBA
nas universidades de Birmingham, Cambridge e Hong Kong, que muito
contribuíram com suas diversas experiências em administração e organi‑
zação. Ao redigir o texto, tive em mente as pessoas que praticam a ad‑
ministração, bem como as que a estudam. Para benefício dos estudantes,
os capítulos são encerrados com questões para discussão e notas com as
fontes bibliográficas utilizadas mais importantes. As notas também ser‑
vem para indicar outras leituras. Cada capítulo começa com um rápido
panorama e termina com um resumo dos pontos essenciais.
Embora a organização seja considerada assunto para gestores e estu‑
diosos de administração, acredito piamente que tenha importância direta
e imediata para todos. A organização afeta a todos de tantas maneiras
que não deveríamos nos contentar em deixar as decisões relativas a ela

2. CHILD, John. Organization: a guide to problems and practice. 1977, 1984.

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nas mãos de “líderes” e “especialistas”. Não se trata simplesmente de
uma questão técnica para encontrar a melhor solução. Espero que a leitu‑
ra deste livro mostre que existem diversas maneiras de organizar para sa‑
tisfazer uma dada exigência funcional, e que a escolha de uma delas tanto
é uma questão de preferência social como de racionalidade científica. É
importante perceber que há algumas alternativas possíveis na maneira
como são organizadas as instituições públicas, industriais e outras, por‑
que trata­‑se da expressão de uma preferência entre tais alternativas que
ix
irá nos aproximar de uma sociedade plenamente democrática.
Fiquei muito feliz por ter recebido enorme ajuda e estímulo para escre‑

Prefácio
ver este livro. Muitos amigos, em especial Homa Bahrami, Ray Loveridge,
Eugene McKenna e Stuart Evans, me incentivaram durante anos, dizen‑
do que eu deveria aplicar ao mundo contemporâneo a abordagem volta‑
da para a prática que desenvolvi no livro anterior sobre a Organização.
Demorei muito, mas espero que eles sintam que o resultado tenha feito a
espera valer a pena. Suzana Rodrigues, uma colaboradora muito próxi‑
ma em boa parte de meu trabalho recente, contribuiu com muitas ideias
excelentes e jamais permitiu que eu divagasse, afastando­‑me demais de
minhas raízes de autor especializado na organização, apesar do grande
fascínio que tenho pela China. O periódico envolvimento com a notável
mente analítica de Max Boisot foi de imenso estímulo, como também a
convivência com Marc Verstringhe, cuja sabedoria vem de uma carreira
bem­‑sucedida como diretor superintendente. Também me beneficiei da
troca de ideias com muitos colegas nas Universidades de Birmingham,
Cambridge, Hong Kong e Oxford, entre os quais Andrew Brown, Peter
Clark, David Faulkner, George Frynas, Sally Heavens, Sek Hong Ng,
Yigang Pan, Christos Pitelis, Robert Pitkethly, Edmund Thompson, David
Tse e Malcolm Warner. O trabalho de antigos alunos nessas universida‑
des me proporcionou muitas observações novas sobre a organização e
tópicos a ela relacionados. Aqui eu gostaria de mencionar especialmente
Roberto Duarte, Said El Banna, Aldemir Drummond, Noreena Hertz,
Yuan Lu, Lívia Markóczy, Guido Möllering, Stephen Rudman, Terence
Tsai, Eric Tsang, Niti Villinger, Roland Villinger, Christine Wong, Daniel
Yan e Yanni Yan.
Os anos que passei editando a revista acadêmica Organization Studies,
de 1992 a 1996, ampliaram significativamente minha compreensão e meu
entendimento sobre diversas perspectivas a respeito do tema da organi‑
zação. Isso me leva a expressar especial gratidão a Sally Heavens, que foi

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minha assistente no departamento editorial da OS e depois colaborou no
trabalho sobre aprendizado organizacional e evolução corporativa. Sally
muito contribuiu no esforço de editoração para tornar este livro mais le‑
gível. Também sou grato pelas incontáveis maneiras com as quais minha
secretária na Escola de Negócios de Birmingham, Janet Whitmarsh, me
ajudou a tratar de diversas questões em prazos curtíssimos e como, de
modo geral, fez a preparação deste livro fluir mais suavemente. Como
sempre, minha mulher Elizabeth fez críticas construtivas e sofreu as pri‑
x
vações de ter de competir com o computador por meu tempo.
organização  princípios e prática contemporâneos

John Child

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Apresentação

Este livro trata do componente organizacional no sucesso do negó‑


cio. Embora concentre­‑se mais nas empresas, boa parte de seu conteúdo
também se aplica a muitas instituições públicas e organizações sem fins
lucrativos que também devem se organizar para prestar serviços de for‑
ma econômica. O sucesso de qualquer empresa depende basicamente de
dois requisitos fundamentais: estratégia e organização. Se a organização é
falha, a empresa não será capaz de cumprir sua estratégia, por mais bem
concebida que seja. Mais do que isso, a formulação de uma boa estraté‑
gia no mundo contemporâneo dos negócios se baseia no conhecimento
e no insight provenientes de todos os níveis e unidades de uma empresa.
Inicialmente, a incapacidade de motivar e coordenar esses inputs em
decorrência de uma organização inadequada pode impedir a formulação de
uma boa estratégia.
A excelência na gestão é uma das melhores fontes sustentáveis da
vantagem competitiva. Os ganhos, anteriormente proporcionados pelo
protecionismo de mercado, pela tecnologia detida legalmente pela em‑
presa e pela economia de escala, foram sendo gradualmente erodidos pela
liberalização do comércio, pela transferência de tecnologia e pelo desen‑
volvimento de tecnologias de produção flexíveis. A maioria dos recursos
e das tecnologias pode ser adquirida no mercado ou copiada. Por outro
lado, a gestão é um ativo que cada empresa desenvolve para adequá­‑la a
suas necessidades e situação, não podendo ser simplesmente comprada. A
globalização dos mercados e das cadeias de valor, as pressões competiti‑
vas e os ciclos de inovação, que estão cada vez mais curtos, tornam cada
vez mais valiosa a capacidade de organizar uma ampla gama de recursos,
especialmente os recursos humanos, de modo a fazer movimentos rápi‑
dos, inteligentes e coordenados no jogo da competição.

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Vivemos em uma era competitiva e dinâmica para a organização.
As maneiras convencionais como empresas e outros empreendimentos
coletivos se organizaram no passado são vistas como inadequadas para
as condições do século XXI. Emergem novas formas, que são distantes
de muitos dos princípios fundamentais da organização convencional.
Embora algumas pesquisas e estudos de caso1 já estejam disponíveis, o
ritmo da inovação e da experiência prática supera a capacidade da maio‑
ria dos livros de apreender o que está acontecendo. Qualquer período de
xii
mudança e experimentação é interessante e animador, mas sua natureza
efervescente pode impedir uma avaliação equilibrada. Houve muito exa‑
organização  princípios e prática contemporâneos

gero acerca da revolução organizacional. Os gurus andaram ocupadís‑


simos e o discurso sobre o assunto deixou a avaliação ponderada para
trás. Portanto, está na hora de revisar as novas ideias e práticas organi‑
zacionais, compará­‑las com o conhecimento tradicional e, a partir dessa
comparação, oferecer orientações para a prática.
Este livro visa apresentar o estado da arte dos princípios e práticas
mais recentes na organização das atividades dos negócios. A obra consis‑
te em quatro partes e uma conclusão. A Parte I proporciona um indispen‑
sável histórico e examina o panorama geral que vai além dos detalhes. O
primeiro capítulo introduz a natureza e a contribuição da organização.
O Capítulo 2 examina a importância para a organização de avanços de‑
cisivos no ambiente dos negócios – a globalização, as novas tecnologias
de informação e comunicação, o aumento da competição com base no
conhecimento e na informação, o número crescente de trabalhadores do
conhecimento e as expectativas sociais cada vez maiores depositadas nos
negócios. A mensagem transmitida pela Parte I é que os novos avanços na
organização só podem ser avaliados em relação a um contexto diferente,
no qual os negócios atualmente funcionam.
As Partes II e III estão voltadas para os detalhes da forma organi‑
zacional. Os capítulos da Parte II se concentram nos aspectos internos
da organização, enquanto os da Parte III examinam diversas formas de
organização em rede, que se estendem além das fronteiras tradicionais.
O Capítulo 3 analisa principalmente a hierarquia, um aspecto estrutural
fundamental da organização, e reflete sobre o downsizing e a redução
dos níveis hierárquicos, movimentos em direção a estruturas adminis‑
trativas menores e mais enxutas. A tentativa de reduzir a hierarquia ge‑
ralmente é acompanhada pelo uso mais frequente de equipes; o trabalho
de equipe também figura no capítulo seguinte como importante recurso

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para aperfeiçoar a integração. O Capítulo 4 leva em conta a experiência
da organização para uma melhor integração por meio do uso de equipes
multifuncionais e modernas tecnologias de informação e comunicação.
O controle, tema do Capítulo 5, é outro aspecto fundamental da or‑
ganização. Novas abordagens adequadas às condições modernas foram
desenvolvidas. O Capítulo 6 examina as políticas de recompensa e sua
contribuição nas relações de trabalho para reconciliar as exigências ge‑
renciais com as necessidades dos empregados. O Capítulo 7 discute a
xiii
importância do pagamento dentro de uma gama de recompensas e dá

Apresentação
especial atenção às variadas opções do sistema de remuneração.
Os quatro capítulos da Parte III estão voltados para além das fron‑
teiras convencionais das organizações, discutindo diversos arranjos que
envolvem a formação de redes entre empresas e fronteiras nacionais.2 Um
dos aspectos principais da nova organização está na forma como ela am‑
plia essas fronteiras mediante a terceirização, as cadeias virtuais de valor,
as alianças e a corporação multinacional. Esses aspectos levaram algumas
pessoas a chamar a nova organização de “organização sem fronteiras”. O
Capítulo 8 examina a terceirização. O Capítulo 9 considera o caso espe‑
cial, mas cada vez mais significativo, da organização “virtual”, baseada
no comércio on­‑line e em estratégias similares. O Capítulo 10 aborda o
caso, especialmente complexo, da organização híbrida, quando dois ou
mais parceiros formam uma aliança estratégica formal, como uma joint
venture, em que investem recursos financeiros, gestão e outros recursos.
O Capítulo 11 está voltado para a discussão de outro tipo de fronteira – a
da nacionalidade, levando em conta os desafios organizacionais da gestão
entre fronteiras.
Os capítulos das Partes II e III, de modo geral, dizem respeito às es‑
truturas e mecanismos que facilitam os processos em curso. Esses deverão
permitir, até mesmo estimular, uma empresa a evoluir de forma satisfa‑
tória por meio da adaptação e da inovação. No entanto, uma evolução
bem­‑sucedida exige outras capacidades específicas, como gerenciar mu‑
danças, aprender, gerar confiança e assegurar a legitimidade da governan‑
ça corporativa. Essas habilidades podem ser promovidas, em parte, com
políticas organizacionais apropriadas, mas baseiam­‑se também de modo
bastante significativo na integridade e no ethos da gestão. Por sua vez, os
capítulos da Parte IV examinam o papel de cada uma dessas capacidades
para a evolução de organizações eficientes.

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O Capítulo 12 identifica as políticas e as práticas que facilitam mu‑
danças significativas nas empresas quando acontecimentos e tendências o
exigem. O Capítulo 13 focaliza a influência que a organização pode ter
sobre o aprendizado e sobre a criação do conhecimento nas empresas. Os
gestores começam a valorizar cada vez mais a confiança nos negócios e no
relacionamento com os funcionários. O Capítulo 14 identifica as políticas
organizacionais que promovem essa confiança. Já o Capítulo 15 examina
as crescentes demandas sociais de uma responsabilidade corporativa mais
xiv
ampla e transparente e a relação da organização com tais demandas.
Concluindo, o Capítulo 16 volta aos detalhes dos capítulos anteriores
organização  princípios e prática contemporâneos

para compreender o quadro variado da organização, fazendo a distinção


entre suas duas faces. Uma dessas faces é o conjunto de arranjos para em‑
preender, de maneira coerente e coesa, ações coletivas voltadas para as
metas. Esse é o lado da organização que contribui para alcançar as ne‑
cessidades estratégicas; uma reflexão sobre como essas necessidades estão
mudando nos ajudará a compreender as formas organizacionais atuais. A
outra face é um conjunto de arranjos que distribui poder, recompensas e
bem­‑estar pessoal. Se esse aspecto da organização for falho, ele terá efei‑
tos deletérios sobre o desempenho, colocando em questão a legitimidade
do negócio. Algumas empresas têm tomado providências no sentido de
enfrentar esse problema.

Notas
1. Veja Organization Science, edição “Co­‑evolution of strategy and new organi‑
zation forms”, 10(5), 1999; PETTIGREW, Andrew M; FENTON, Evelyn M.
(Org.). The innovating organization. London: Sage, 2000; CHILD, John; MC‑
GRATH, Rita (Org.). New and evolving organizational forms. Academy of Ma‑
nagement Journal, 44(6), 2001; PETTIGREW, Andrew M; WHITTINGTON,
Richard; MELIN Leif. et al. (Org.). Innovative forms of organizing. London:
Sage, 2003. Outras discussões sobre as novas formas organizacionais incluem:
DIMAGGIO, Paul. (Org.). The twenty­‑first century firm. Princeton: Princeton
University Press, 2001; MALONE, Thomas W; LAUBACHER, Robert; MOR‑
TON, Michael S. Scott (Org.). Inventing the organizations of the 21st Century.
Cambridge: MIT Press, 2003.
2. Para discussão sobre os diversos significados de “network” e formas de organi‑
zação em rede, veja: THOMPSON, Grahame F. Between hierarchies and mar­
kets: the logic and limits of network forms of organization. Oxford: Oxford
University Press, 2003.

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Sumário

PARTE I  PANORAMA GERAL 1


Capítulo 1  Introdução à organização 9
Capítulo 2  Novas condições, nova organização 31

PARTE II  NOVAS FORMAS INTERNAS 79


Capítulo 3  Estruturas mais simples 81
Capítulo 4  Como obter a integração 111
Capítulo 5  Controle 157
Capítulo 6  Questões da recompensa 197
Capítulo 7  Sistemas de remuneração 225

PARTE III  NOVAS FORMAS DE TRABALHO EM REDE 259


Capítulo 8  A terceirização 261
Capítulo 9  Organização virtual 287
Capítulo 10  Alianças estratégicas 325
Capítulo 11  Organizando além das fronteiras 351

PARTE IV  O DESENVOLVIMENTO DE ORGANIZAÇÕES EFICIENTES 401


Capítulo 12  Realização da mudança organizacional 403
Capítulo 13  Organizar para o aprendizado 451
Capítulo 14  Como gerar e utilizar a confiança 493
Capítulo 15  A governança corporativa nas novas formas organizacionais 521

CONCLUSÃO 553
Capítulo 16  Como entender a organização 555

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PARTE I

PANORAMA GERAL

Capítulo 1 Introdução à organização


Capítulo 2 Novas condições, nova organização

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Capítulo 1
Introdução à organização

Conteúdo do capítulo
O capítulo se inicia com a definição dos termos essenciais: organizar,
organização e organizações. A seção seguinte introduz os componentes
da organização – uns são de natureza estrutural, outros dizem respeito a
processos fundamentais e, por fim, outros definem os limites. Os componentes
da organização são os parâmetros a partir dos quais as diretrizes da empresa
devem ser escolhidas. Essas escolhas são fundamentais para se diferenciar
as formas organizacionais convencionais das novas formas. Elas podem ter
também consequências importantes, pois sérios problemas podem decorrer
da gestão inapropriada.

1.1 Gerenciar, organização e organizações


Praticamente todos os bens e serviços que consumimos são resultado
de ações coletivas organizadas dentro de organizações de negócios – ‘fir‑
mas’ ou ‘companhias’. As instituições que moldam nossas vidas por meio
de educação, saúde, lei, política e religião são também altamente organi‑
zadas. Os líderes das organizações bem­‑sucedidas geralmente atribuem
uma parte significativa desse sucesso à qualidade de sua gestão. Tal uso
de termos semelhantes para dar significado a coisas diferentes pode ser
bastante confuso. É importante distingui­‑las logo no início.

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Gerenciar é o processo de ordenar o esforço coletivo de forma a obter
um resultado potencialmente superior àquele de indivíduos que agem ou
trabalham sozinhos. Quase sempre isso envolve a divisão de trabalho,
com pessoas ou grupos diferentes empenhados em diversas atividades que
depois têm de ser integradas (coordenadas) para se alcançar um resulta‑
do satisfatório. O ato de organizar também exige certo grau de controle
para monitorar o progresso em relação às intenções iniciais e fazer os
ajustes necessários ao longo do processo. Se mais pessoas além de um
4
pequeno grupo estão envolvidas e se a atividade organizada é contínua,
alguma forma de hierarquia surge naturalmente, de tal forma que uma ou
parte i  panorama geral

mais pessoas assumem a liderança, formulando instruções, coordenando


e controlando os resultados. Juntas, essas manifestações do ato de admi‑
nistrar normalmente são chamadas de organização, como na expressão
“a organização da companhia XYZ”. Esse termo significa que a forma de
organizar usada por uma empresa persiste de maneira reconhecível, pelo
menos por algum tempo.
É tão essencial que as companhias ou instituições estejam organizadas
que é bastante comum referir­‑se a esses grupos como “organizações” – uma
abreviação para grupos ou sistemas organizados. A expressão se refere a
todos os atributos do coletivo tomado como um todo, o que pode levar a
muita confusão, por duas razões: em primeiro lugar, uma entidade como a
empresa tem atributos que não são de natureza estritamente organizacional,
mas que podem, no entanto, influenciar seu comportamento e desempenho.
Entre esses atributos estão sua história, sua nacionalidade, sua liderança
e sua reputação. A segunda razão decorre da primeira: uma organização
terá caráter e identidade próprios e específicos ao passo que os atributos
organizacionais abordados por este livro se aplicam a diferentes empresas e
instituições.
Portanto, este é um livro sobre organização e sobre o ato de orga‑
nizar, que significa os modos pelos quais as atividades e as pessoas que
as executam estão organizados em firmas ou outros tipos de arranjos
coletivos. No passado, esse enfoque geralmente era chamado de “design
organizacional” – expressão atualmente em desuso, porque sugere um
pré­‑planejamento consciente e racional de arranjos organizacionais for‑
mais, ao passo que o pensamento contemporâneo dá mais ênfase a um
processo do tipo adaptável e emergente do ato de organizar, a fim de res‑
ponder às circunstâncias em permanente mutação. De fato, podem existir
aspectos fortuitos e involuntários da organização, alguns dos quais talvez

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se revelem bastante construtivos. Este livro, no entanto, concentra­‑se em
formas de organização que têm um caráter propositivo no sentido de que
resultam de uma intenção e uma reflexão conscientes.

1.2 Componentes da organização


A organização conta com características estruturais, processuais e
definidoras de limites. Essas características estão listadas no Quadro 1.1.
5
Entre os componentes estruturais da organização, há uma distinção entre
a “estrutura básica” e os “procedimentos”. Uma estrutura básica distri‑

Introdução à organização
bui as responsabilidades entre os membros de uma empresa. Seu propó‑
sito é contribuir para uma implementação bem­‑sucedida dos objetivos,
alocando pessoas e recursos para as tarefas e atribuindo responsabilidade
e autoridade para o controle e a coordenação dessas tarefas. Essa divi‑
são do trabalho tem tanto um aspecto vertical quanto um horizontal. O
vertical se refere a uma especialização das responsabilidades nos proces‑
sos de tomada de decisão, especificando os níveis em uma hierarquia. As
hierarquias normalmente descrevem também as linhas de subordinação
para instruções e feedback de resultados, embora essas linhas nem sempre
respeitem esses níveis. O aspecto horizontal diz respeito à especialização
das tarefas, segundo a especialidade funcional, o enfoque do negócio ou
a geografia.
A estrutura básica da organização assume a forma de gráficos orga‑
nizacionais, descrições de funções e a constituição de conselhos, comitês,
grupos de trabalho, forças­‑tarefa e equipes. Uma estrutura básica pode
apresentar somente um esboço ou a sua constituição geral. É mais sensato
manter um caráter geral, com espaço para adaptações locais, porque sua
modificação pode ser bastante complexa. Como veremos, quanto mais
frequentemente mudam as circunstâncias, mais essa confiança em uma
dada estrutura básica deve dar lugar a uma abordagem mais flexível, mui‑
tas vezes usando forças­‑tarefa e equipes. Esses grupos de trabalho reúnem
pessoas de toda a estrutura a fim de focar o esforço em determinados
problemas e novos projetos, conforme surge a necessidade.
Os procedimentos estão mais concentrados no comportamento. A in‑
tenção das regras e padrões é deixar claro o que se espera das pessoas. Por
exemplo, procedimentos padrão podem estabelecer as maneiras como
as tarefas devem ser realizadas. Além disso, ou talvez como alternativa
para quando a maneira de realizar as tarefas não pode ser rigorosamente

Book_Organizaçoes.indb 5 16/9/2011 16:23:18


definida, podem ser estabelecidos padrões de desempenho que incorpo‑
ram critérios, como o nível de produção ou a qualidade dos resultados.
Normalmente esses padrões são acompanhados por procedimentos para
a revisão do desempenho. Também é comum haver outros procedimentos
para lidar com problemas recorrentes, cujos parâmetros são razoavel‑
mente conhecidos. Existem muitos exemplos na área de gestão de pessoas
em que o princípio da equidade requer coerência na maneira como as
pessoas são tratadas. Procedimentos padronizados costumam ser usados
6
para recrutamento e seleção, avaliação, determinação das recompensas e
resolução de reclamações.
parte i  panorama geral

Boa parte do trabalho rotineiro ou de natureza recorrente pode ser


ordenada de maneira eficiente por meio de cronogramas. A produção de
relatórios de informativos sobre o desempenho, a elaboração do balanço
financeiro, a manutenção preventiva e as avaliações de pessoal estão entre
as atividades típicas que podem ser planejadas e realizadas conforme pro‑
gramação estabelecida. A programação visa melhorar a eficiência dessas

Quadro 1.1  Componentes da organização

Estruturais
Estrutura básica
Hierarquia: níveis, camadas, autoridade, linhas de subordinação
Especialização: papéis, grupos e unidades
Procedimentos
Regras e padrões
Cronogramas
Sistemas
Processuais
Integração/coordenação
Controle
Recompensa
Entre fronteiras
Terceirização
Organização virtual
Alianças
Administração entre fronteiras

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atividades por meio da atribuição de tempo e outros recursos que devem
estar disponíveis quando necessário.
Sistemas são mais complexos e abrangentes do que regras e cronogra‑
mas. Na realidade, os sistemas normalmente incorporam ambos. São um
conjunto de procedimentos para o desempenho de atividades associadas
que compõem determinada tarefa e frequentemente utilizam a tecnologia
como apoio. Os sistemas para controle de estoque e gestão do conheci‑
mento e a comunicação de necessidade de transação em redes organizadas
7
de empresas são exemplos que se tornaram especialmente significativos
nos últimos anos. Os sistemas geralmente dependem da coleta, análise e

Introdução à organização
distribuição de informação entre diferentes unidades dentro de uma em‑
presa ou rede de negócios. Para funcionar de forma eficaz, é essencial pos‑
suir protocolos (regras) que assegurem a padronização dessa informação.
Existem três processos de administração decisivos: integração, con‑
trole e recompensa. O propósito de cada um deles é auxiliar no dire‑
cionamento do esforço físico e mental, levando ao bom desempenho
corporativo. A integração objetiva assegurar que haja uma coordenação
adequada entre atividades diferentes mas complementares, criando valor
coletivo. Os mecanismos organizacionais que visam reforçar a integração
variam desde arranjos simples, tal como o encontro periódico das pessoas
envolvidas, até arranjos complexos como estruturas multidimensionais,
em que as contribuições de unidades especializadas são coordenadas por
meio de um arranjo matricial conforme o cliente, o processo, a região ou
outros requisitos.
O controle diz respeito ao estabelecimento de metas, sua implemen‑
tação e o monitoramento de sua realização. “Sistemas” de controle, no
sentido de apoio ao processamento de informação para disseminar o que
se quer das pessoas e para dar feedback sobre os resultados, seguem um
princípio padronizado. É evidente, todavia, que há, nas diversas estraté‑
gias de controle, muitas opções e variações disponíveis para os gestores.
Algumas dessas estratégias exigem apoio organizacional sofisticado, ao
passo que outras se baseiam mais no “autocontrole” dos indivíduos, por
meio da compreensão e aceitação dos objetivos coletivos.
A recompensa é um processo fundamental para garantir a motivação
entre os membros de uma empresa, de modo que eles contribuam positi‑
vamente para o alcance das metas da organização. O design dos sistemas
de recompensa faz parte do conjunto de instrumentos dos gestores. De
modo geral, os sistemas de recompensa devem atender a dois requisitos

Book_Organizaçoes.indb 7 16/9/2011 16:23:18


importantes: um é atrair pessoas com competências e qualificações ne‑
cessárias para a empresa; o outro é incentivar as pessoas a se compro‑
meterem com seu emprego, incluindo a disposição em aceitar a inovação
e outras mudanças. Várias questões podem emergir no que se refere ao
design de sistemas de recompensa, especialmente no que diz respeito ao
conceito de remuneração por desempenho.
Os aspectos transfronteiriços da organização tornaram­‑se proemi‑
nentes com a crescente flexibilidade e permeabilidade das fronteiras. No
8
passado, muito da preocupação da administração era direcionada para
a criação de linhas de separação, tanto entre as unidades dentro das em‑
parte i  panorama geral

presas como entre as próprias empresas. Os cargos eram definidos de


maneira que identificassem suas áreas exclusivas de responsabilidade e
autoridade. Da mesma forma, as sobreposições entre unidades maiores,
como departamentos e divisões, eram consideradas potencialmente con‑
fusas e dispendiosas. A terceirização de atividades mais importantes e as
alianças com outras organizações eram, em geral, vistas com suspeita,
por arriscarem o controle e a independência.
Na medida em que nos movemos em direção ao futuro, a prática orga‑
nizacional muda de direção. As empresas estão abandonando a alocação
de pessoas em papéis e unidades muito limitados, com a ideia de contro‑
lar e concentrar seus esforços de maneira eficaz. Hoje há mais ênfase na
administração de relacionamentos entre funções e unidades, de maneira a
obter uma sinergia criativa e proativa entre elas – por isso a maior atenção
dada à integração. Do ponto de vista externo, as empresas também têm
dado menos ênfase à exclusividade e estão, em vez disso, preparadas para
atravessar, ou mesmo romper, fronteiras entre si. Elas participam de diver‑
sos arranjos, relacionando­‑se com outras empresas. Mais atividades são
terceirizadas, permitindo à empresa se concentrar em suas capacidades­
‑chave e se beneficiar das vantagens de custo e de expertise oferecidas por
empresas externas especializadas. Algumas cadeias de valor, que reúnem
vários fornecedores em rede, estão sendo organizadas de maneira virtual.
A organização virtual oferece vantagens que indicam que ela será progres‑
sivamente cada vez mais utilizada. Há também um número crescente de
alianças entre empresas visando assegurar presença global no mercado,
acesso à inovação e fontes de produção de baixo custo. Muitas alianças
são formadas entre empresas de diferentes países como parte da tendên‑
cia de se internacionalizar o escopo das cadeias de valor de negócios.1 A
corporação multinacional (CMN) tornou­‑se uma forma organizacional

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importante e, em muitos setores, dominante. Junto com as pequenas e
médias empresas (PMEs), que também estão se internacionalizando, as
CMNs enfrentam o desafio de se organizar entre fronteiras. Essas CMNs
poderão optar por fazer isso por meio de suas próprias estruturas ou por
meio de alianças com outras empresas.
A organização visa oferecer um conjunto de estruturas, a partir dos
quais os processos necessários para o desenvolvimento efetivo de uma
atividade coletiva podem ser realizados. Entretanto, ela só pode propor‑
9
cionar uma contribuição parcial para a eficácia desses processos. Um
pressuposto compartilhado pelos que defendem a adoção de novas for‑

Introdução à organização
mas organizacionais é que, no futuro, teremos que nos basear menos na
“organização” como uma referência, e mais no “ato de organizar” como
um processo. O argumento é que as estruturas se concentram em regras
e papéis formais articulando conhecimento adquirido no passado, en‑
quanto hoje precisamos de processos inovadores e adaptáveis, baseados
em comunicação intensa e no compartilhamento do conhecimento entre
as pessoas. Nas condições modernas, de grande mudança e turbulência,
as estruturas podem se tornar obsoletas antes mesmo de sua implementa‑
ção e inibir a flexibilidade da qual a sobrevivência das empresas depende
cada vez mais. Em vez disso, processos espontâneos que permitem ajustes
rápidos e inovadores às novas circunstâncias são considerados mais apro‑
priados. Dessa maneira, distinções muito claras entre as novas formas
organizacionais e as formas convencionais têm sido feitas. Evidências
apresentadas em capítulos posteriores esclarecerão se tal completa des‑
consideração da abordagem convencional é justificável.

1.3 Alternativas organizacionais


A comparação entre a organização convencional e as novas formas
organizacionais ressalta as alternativas básicas inerentes a cada compo‑
nente da organização. Essas alternativas estão resumidas na Tabela 1.1 e
serão discutidas mais adiante.

1.3.1 Hierarquia
Autores que discutem a questão da organização mostram acentuada
aversão à hierarquia e seus efeitos supostamente deletérios. Esses efeitos
serão discutidos nos capítulos 3 e 16. Apesar disso, a hierarquia continua

Book_Organizaçoes.indb 9 16/9/2011 16:23:18


sendo a espinha dorsal de quase todas as empresas em qualquer lugar do
mundo. As principais escolhas do design das hierarquias estão relacio‑
nadas ao número de níveis que elas devem conter, se a autoridade res‑
ponsável pelo processo decisório deve estar centralizada no topo ou ser
distribuída em seus diversos níveis, e se as pessoas devem ter apenas uma
ou várias linhas de subordinação (esta última é conhecida como “organi‑
zação matricial”).
10
1.3.2 Especialização
parte i  panorama geral

Existem duas alternativas básicas para a especialização. A primeira


admite que, exceto no caso de uma unidade muito pequena, será eficaz
se as pessoas tiverem certo grau de especialização naquilo que fazem. A
questão então é: em que base se especializar? Diversas lógicas se opõem.
As pessoas podem se especializar conforme suas expertises; quando gru‑
pos de pessoas ou departamentos estão organizados dessa forma, fala‑
mos de uma “organização funcional”. Um princípio relacionado a essa
alternativa é que as pessoas envolvidas em um mesmo processo, com‑
partilhando o mesmo local de trabalho ou utilizando o mesmo tipo de
equipamento, devem trabalhar em conjunto. Alternativamente as pessoas
podem se especializar conforme o produto ou o serviço para o qual tra‑
balham. Em uma empresa com diversas linhas de produtos ou negócios,
essa lógica pode dar origem à chamada “forma multidivisional”, baseada
em uma série de divisões de produtos. Ainda outra lógica é especializar­‑se
por país ou região, quando as características políticas, culturais ou das
subsidiárias regionais são distintas.
A segunda alternativa diz respeito à extensão do princípio da espe‑
cialização. Uma abordagem possível é definir os papéis de forma bastante
especializada, a fim de permitir que as pessoas alocadas nessas funções
desenvolvam o máximo de expertise e experiências específicas. A alterna‑
tiva a essa abordagem consiste em definir essas funções em termos gerais,
encorajando a capacidade e a disposição das pessoas em mudar de manei‑
ra flexível entre as diferentes tarefas, conforme a situação. Relacionada
a essa alternativa, há outra que se baseia em papéis claramente defini‑
dos ou em permitir que tais papéis sejam definidos de forma vaga, aber‑
ta. As mesmas questões deverão ser levantadas em relação aos grupos,
unidades e departamentos de uma empresa. Eles deveriam ser altamente

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Tabela 1.1  Alternativas organizacionais básicas

Componente da organização Escolha


Hierarquia:
Níveis / camadas Vertical versus horizontal
Autoridade Centralizada versus descentralizada
Linhas de subordinação Única versus múltipla
Qual lógica de especialização: função, processo,
produto ou região? 11
Especialização Funções especializadas versus funções gerais

Introdução à organização
Definição clara das funções versus definição
vaga das funções
Hierarquias especializadas versus uso de equipes
mistas
Hierarquia e especialização Alta autonomia e conteúdo da função bem
definido versus baixa autonomia e conteúdo da
função pouco definido
Mandatório versus discricionário
Regras e cronogramas Baseada em regras versus baseada em
relacionamentos
Voltados para a redução da incerteza versus
Sistemas
ênfase na necessidade de adaptação
Vertical versus horizontal
Grau de formalização: contato direto, papéis de
Integração
conexão, forças­‑tarefa, coordenadores, equipes,
estruturas matriciais
Qual estratégia de controle: pessoal, burocrática,
Controle baseada em metas, cultural ou baseada na
gestão de pessoas?
Critérios: nível hierárquico, desempenho,
mercado
Recompensa
Individual versus coletiva
Frequente versus periódica
Intensidade do network
Papel do contrato versus confiança
Vínculos de curto prazo versus vínculos de
Entre fronteiras e networking longo prazo
Networks dominadas por um parceiro versus
networks com parceiro igualitário
Virtual ou não virtual?

Book_Organizaçoes.indb 11 16/9/2011 16:23:18


Terceirização das atividades da cadeia de valor
Terceirização (outsourcing) versus terceirização apenas de atividades
periféricas de suporte
Participação acionária versus contratual
Alianças Dominada por um parceiro versus gestão
integrada
Ênfase global versus ênfase local
Organização transfronteira
Base da integração: negócio, função ou região?
12
parte i  panorama geral

especializados e restringir a si próprios ou deveriam ser mais generalistas,


até mesmo com certa sobreposição e rotação entre os membros?

1.3.3 Hierarquia e especialização


A combinação das escolhas de hierarquia e especialização permi‑
te identificar algumas das configurações organizacionais mais relevan‑
tes utilizadas na prática. Por exemplo, o nível de liberdade de escolha
(refletindo a centralização versus a descentralização nas hierarquias),

Figura 1.1  Diferentes níveis de liberdade de escolha e especialização na


organização do trabalho

Liberdade de escolha

Alta Baixa
A B
Há uma grande confiança A empresa está organizada
na expertise profissional. em hierarquias centralizadas
Diferentes profissionais e especializadas. Nelas,
podem ter os seus próprios o trabalho é dividido em
clientes. Os experts funções estreitas, com
Alta
trabalham em equipes ou pouca ou nenhuma rotação
comitês para criar e aprovar entre elas. Espera­‑se que
novas iniciativas que dão as pessoas nessas funções
forma à estratégia coletiva. trabalhem seguindo
rigorosamente as instruções
determinadas pelos gestores.

Book_Organizaçoes.indb 12 16/9/2011 16:23:18


Especialização D C
As pessoas estão Exemplos dessa forma
organizadas em equipes organizacional podem ser
ou grupos de trabalho com encontrados quando há um
pouca distinção hierárquica fator comum a um conjunto
entre elas; às vezes, as de tarefas que pressupõem
equipes podem decidir sobre um esforço físico básico. Um
Baixa
suas metas e sobre como exemplo é o de uma unidade
13
atingi­‑las; os membros de uma empresa em que as
dessas equipes e grupos pessoas cuidam dos jardins

Introdução à organização
são capazes de exercer as em uma parte do dia e
funções uns dos outros. limpam os escritórios em
outro momento.

considerado junto com o nível de especialização, permite identificar dife‑


rentes maneiras como o trabalho pode ser organizado, conforme ilustra
a Figura 1.1.

1.3.4 Regras e cronogramas


Uma das questões básicas das regras e dos cronogramas refere­‑se a
sua obrigatoriedade ou discricionariedade. Em algumas circunstâncias –
por exemplo, no caso da aplicação de normas legais, as regras devem ser
obrigatórias. Em outros casos, as regras não têm esse caráter obrigatório,
mas derivam do aprendizado e da experiência organizacional anteriores.
Talvez seja aconselhável adotar uma abordagem mais flexível ao uso das
regras, ou seja, encorajar as pessoas a substituí­‑las por novas práticas
quando decidem que as existentes não são mais funcionais.
Essa escolha reflete o contraste entre a chamada “filosofia burocrá‑
tica da organização”, que favorece a previsibilidade do comportamento
decorrente da obediência a regras, e a nova filosofia, que favorece a adap‑
tação e inovação por meio de dinâmicas relacionais. Esta última perspec‑
tiva encara os relacionamentos como modos de adaptação, que podem
ocorrer por meio da sensibilização às mudanças externas mediante inten‑
so networking e por meio da abertura a novas oportunidades via nego‑
ciação pessoal com partes externas à empresa. De maneira semelhante,
a maioria das inovações atuais parece surgir de um processo intensivo

Book_Organizaçoes.indb 13 16/9/2011 16:23:18


e interpessoal entre indivíduos qualificados, que trabalham em conjun‑
to em busca de novas soluções. Em nenhum dos casos se pode confiar
demasiadamente nas regras existentes, que podem dificultar, em vez de
estimular, as mudanças.

1.3.5 Sistemas
Opção semelhante surge no uso de sistemas. Uma possibilidade é dire‑
14
cionar os sistemas para reduzir a incerteza filtrando qualquer informação
ou comportamento que não esteja em conformidade. Um exemplo seria
parte i  panorama geral

um sistema de produção baseado no princípio do tamanho de um lote,


que não permita a inclusão de pedidos especiais ou extras. O problema é
que, em geral, um pedido especial representa uma nova oportunidade, que
pode ser importante. A outra alternativa é definir sistemas que indiquem
rigorosamente as exceções ou a nova informação em um nível hierárquico
suficientemente alto, de modo a influenciar a percepção das pessoas que
participam do processo de formulação da estratégia. Esta abordagem dá
ênfase ao potencial dos sistemas como mediadores da adaptação.

1.3.6 Integração
Uma das principais escolhas organizacionais a ser feita em relação
à integração é assegurá­‑la mediante uma abordagem vertical (de cima
para baixo) ou por meio da comunicação horizontal direta e dos rela‑
cionamentos entre as pessoas ou unidades envolvidas. Em uma empresa
pequena, constituída de poucos departamentos, basta que o gerente, a
quem todos se reportam, garanta que haja o grau necessário de entendi‑
mento comum e integração entre as atividades dessas pessoas. Em uma
organização grande e complexa, contudo, essa abordagem vertical pode
falhar. Em vez de passar a informação para cima e para baixo nas hierar‑
quias, torna­‑se muito mais eficaz confiar nas relações e na comunicação
direta entre as diferentes partes da empresa para garantir a colaboração
no trabalho e a solução de problemas.
Outros fatores também tornam a abordagem horizontal mais efetiva
para a integração. As modernas tecnologias de comunicação e de infor‑
mação, especialmente o e­‑mail, eliminaram muitas barreiras – temporais
e geográficas – às comunicações diretas, horizontais, anteriormente im‑
postas pelas diferenças na geografia e no tempo. Hoje, outra consideração

Book_Organizaçoes.indb 14 16/9/2011 16:23:19


pode ser feita a respeito das necessidades de uma competição baseada na
inovação, em que a informação e o conhecimento relevantes estão disper‑
sos entre as pessoas e em que são precisos resultados rápidos. Nesse caso,
é mais efetivo essas pessoas trocarem informações diretamente entre elas
e incentivar a criatividade por meio do contato direto.
Outra questão diz respeito à necessidade de formalizar ou não ações
para integrar as atividades e, se for o caso, quão detalhadas essas ações
devem ser. A maneira mais simples de organizar para a integração é
15
simplificar o contato direto entre gestores ou empregados que comparti‑
lham um problema ou precisam trocar informações. Progressivamente,

Introdução à organização
ações cada vez mais elaboradas (e caras) têm sugerido que pessoas
atuem como elo com outros grupos ou unidades, reunindo pessoas em
forças­‑tarefa temporárias, indicando coordenadores e montando equi‑
pes com indivíduos de diversos departamentos – ou até mesmo estrutu‑
ras matriciais mais permanentes. Independentemente do arranjo formal
escolhido para ser usado, em geral, vale a pena também promover a
integração por meios informais, estimulando a ampla circulação de in‑
formações por e­‑mail e oferecendo instalações comuns para refeições e
outras finalidades sociais.

1.3.7 Controle
Embora o conceito de controle seja essencialmente muito simples, sua
aplicação não o é. Há diversas possibilidades organizacionais para imple‑
mentar o controle, que anteriormente foram chamadas de “estratégias de
controle”.2 Muitos fatores parecem estar relacionados à escolha de uma

Quadro 1.2  Cinco estratégias de controle

Cada estratégia utiliza uma ou mais das seguintes características:

1. Controle centralizado na pessoa


1.1 tomada de decisão centralizada
1.2 supervisão direta
1.3 liderança pessoal: fundamentada na propriedade, no carisma ou no
conhecimento técnico
1.4 punição e recompensa reforçam a obediência à autoridade pessoal ­­­­­­

Book_Organizaçoes.indb 15 16/9/2011 16:23:19


2. Controle burocrático
2.1 divisão das tarefas em elementos facilmente definíveis
2.2 definição formal de métodos, procedimentos e regras aplicados à re‑
alização das tarefas
2.3 controles orçamentário e contábil
2.4 tecnologia voltada para limitar a variação de ritmo, sequência e, pos‑
sivelmente, método físico na realização de tarefas
16
2.5 Delegação do processo de tomada de decisão dentro dos limites
estabelecidos
parte i  panorama geral

2.6 sistemas de punição e recompensa reforçam a obediência a procedi‑


mentos e regras

3. Controle de produção
3.1 cargos e unidades definidos para assumir a responsabilidade por toda
a produção
3.2 especificação de padrões e metas de produção
3.3 uso de sistemas de “responsabilidade contábil”
3.4 delegação de decisões em questões operacionais: semiautonomia
3.5 punição e recompensa associadas às metas de produção alcançadas

4. Controle cultural
4.1 desenvolvimento de forte identificação com as metas gerenciais
4.2 trabalho semiautônomo: poucos controles formais
4.3 forte ênfase na seleção, treinamento e desenvolvimento de pessoal
4.4 recompensas voltadas para a estabilidade no emprego e desenvolvi‑
mento de carreira

5. Controle por meio da gestão de pessoas


5.1 critérios de seleção voltados para as características pessoais e sociais
desejadas
5.2 uso de sistema de avaliação e recompensa para reforçar o desempe‑
nho desejado
5.3 treinamento com finalidade de socialização bem como obtenção de
novo conhecimento e qualificação

Fonte: Adaptado de CHILD, J. Organization: a guide to problems and practice. 2. ed. London:
Harper & Row, 1984. p. 159.

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dessas estratégias, entre os quais a cultura e o tamanho da empresa, as
tarefas a serem realizadas e as características das pessoas que trabalham
para ela. Tais fatores serão discutidos no Capítulo 5. O Quadro 1.2 resu‑
me cinco diferentes estratégias de controle que podem ser adotadas, em
separado ou combinadas.

1.3.8 Sistemas de recompensa


17
As principais opções relacionadas à organização dos sistemas de re‑
compensa são a base desse sistema – se individual ou em grupo – e sua

Introdução à organização
frequência. Elas podem basear­‑se principal ou exclusivamente no nível
hierárquico. Em geral, os salários são definidos de acordo com esse prin‑
cípio. A justificativa para isso é que o nível hierárquico equivale ao grau
de responsabilidade do indivíduo; os cínicos diriam que também está es‑
treitamente relacionado ao grau de poder que a pessoa tem na empresa.
Outra base para a recompensa é o desempenho, embora haja sérias di‑
ficuldades em se avaliar a responsabilidade via desempenho de um in‑
divíduo, em distinguir critérios de curto e longo prazos, bem como em
assegurar estabilidade relativa aos pagamentos. Outro princípio é pagar
o trabalho a ser realizado tendo como base o mercado. Esse princípio
pode criar as chamadas “anomalias” para empresas burocraticamente
organizadas, como aconteceu com Giles – famoso cartunista do Express
Newspaper, no Reino Unido – que sabidamente ganhava mais do que o
diretor executivo da empresa. Entretanto, tal princípio está em sintonia
com as novas formas de negócios organizadas com base em uma rede de
contratos de mercado que abrange associados, consultores, fornecedores
e outros trabalhadores autônomos.
As recompensas podem ser específicas para indivíduos ou grupos.
Uma recompensa coletiva seria a divisão igualitária dos lucros anuais da
empresa. Embora dessa maneira se possa ajudar a promover o senso de
identidade corporativa, percebe­‑se claramente que essa forma de recom‑
pensa não reflete o nível de contribuição de cada indivíduo. Além disso, é
uma recompensa periódica, com longos intervalos entre os pagamentos,
o que pode enfraquecer os efeitos do reforço dessas recompensas no com‑
portamento das pessoas. Portanto, a frequência com que as recompensas
são concedidas é outra alternativa a ser considerada no momento de se
decidir sobre a gestão desse sistema.

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1.3.9 Relacionamento interorganizacional e formação
de network
Network é um conceito amplo que remete a uma forma de transa‑
ção alternativa a mercados ou hierarquias. Refere­‑se às transações inter­
‑organizacionais recorrentes, ou seja, envolve relacionamentos contínuos
com um conjunto de parceiros. As transações são coordenadas e contro‑
ladas por consenso mútuo, o que pode demandar sistemas e protocolos
18
comuns, mas não requer necessariamente uma supervisão direta do staff
da própria organização.
parte i  panorama geral

A formação de network implica em uma série de escolhas organi­


zacionais:
1. A intensidade da rede. As possibilidades variam da terceirização,
em que as relações entre uma empresa principal e seus fornecedo‑
res externos estão restritas às atividades específicas contratadas, a
uma aliança muito bem integrada, como entre pesquisadores que
desenvolvem uma tecnologia e na qual os participantes trabalham
intensamente uns com os outros.

2. Contrato ou confiança? As relações no network devem se basear


primariamente em um contrato formal ou envolver parcerias de
longo prazo com base na confiança? Essa pergunta vincula­‑se à
próxima escolha.

3. Prazo determinado ou indeterminado? O network é formado


com prazo determinado, como no caso de um consórcio para
a construção de um projeto especial de infraestrutura, ou com
duração maior, como no caso do sistema de fornecedores da Dell
Computers?

4. Network com parceiro dominante ou com parceiros igualitários? A


rede será comandada por uma empresa principal ou será formada
por parceiros mais ou menos iguais? No primeiro caso, haverá uma
empresa central que decide quais atividades serão realizadas inter‑
namente e quais serão terceirizadas. A Dell, a Toyota e a Benetton
são exemplos de uma rede em que há um parceiro principal. Em
uma rede de parceiros iguais, nenhum deles forma e controla a
rede. A abordagem da parceria igualitária funciona bem em locais

Book_Organizaçoes.indb 18 16/9/2011 16:23:19


como o Vale do Silício, em que a cultura empresarial e o ambien‑
te de comunicação intensiva estimulam a formação frequente de
novas redes de colaboração e limitam o domínio pelos participan‑
tes mais importantes.3

5. Virtual até que ponto? Até que ponto a rede deverá ser gerenciada
virtualmente?

1.3.10 Terceirização 19

Introdução à organização
Uma decisão chave na terceirização é a contratação de outras em‑
presas ou pessoas para a prestação de serviços. O critério normalmente
usado é manter na empresa atividades consideradas “essenciais”. Um dos
aspectos que deve ser levado em conta para se determinar que atividades
são essenciais é a vantagem relativa da empresa no desempenho dessas
atividades, ou seja, sua capacidade em agregar mais valor a essas ativida‑
des do que terceiros. Outro aspecto é o valor competitivo dessas ativida‑
des, que podem ser ativos estratégicos – por exemplo, marcas, sistemas
de distribuição e pesquisa e desenvolvimento. Veremos que as empresas
variam bastante em relação às atividades que terceirizam – algumas ter‑
ceirizam apenas atividades periféricas de apoio, como os refeitórios, en‑
quanto outras terceirizam partes centrais de suas cadeias de valor.

1.3.11 Alianças
Para terceirizar é preciso definir as atividades que serão realizadas
dentro da empresa, as que serão feitas externamente e gerenciar as cone‑
xões entre elas. Geralmente, não há compartilhamento de propriedade ou
pessoal, a não ser de pessoas que atuam na atividade de coordenação. As
alianças entre empresas podem envolver o compartilhamento de proprie‑
dade e gestão quando assumem a forma de uma nova joint venture. Esse
tipo de aliança cria formas de organização híbridas e ainda há muita dis‑
cussão sobre a melhor maneira de constituí­‑las. É importante decidir se
uma aliança se baseará em uma participação igualitária ou se se restrin‑
girá a um arranjo exclusivamente contratual. Além de o empreendimento
poder exigir um novo investimento de capital, a participação igualitária é
mais aberta em relação ao tempo e à escala do retorno para os parceiros;
ele também dá direitos de longo prazo para determinar a gestão e a políti‑
ca do empreendimento. Em joint ventures com participação equivalente,

Book_Organizaçoes.indb 19 16/9/2011 16:23:19


o envolvimento de poucos parceiros, às vezes de apenas dois, apresenta
questões fundamentais sobre como essas parcerias devem ser organiza‑
das e gerenciadas. Por exemplo, apenas um dos parceiros determinaria a
estrutura organizacional e os gestores para essa parceria? Esse seria um
arranjo interessante para a integração interna da parceria e também para
o parceiro que disponibiliza os recursos essenciais, tais como marcas,
tecnologias e/ou expertises. Ou, alternativamente, os parceiros deveriam
determinar conjuntamente a estrutura organizacional e os gestores dessa
20
parceria? Essa alternativa seria apropriada para maximizar o aprendiza‑
do e as sinergias entre os parceiros, ajudando­‑os a construir uma relação
parte i  panorama geral

sólida e baseada na confiança, que poderia ser aplicada a outras parceiras


no futuro.

1.3.12 Organizando entre fronteiras


Operações transfronteiras demandam mais da organização do que as
operações nacionais. As demandas inevitavelmente aumentam à medida
que a empresa multinacional (EMN) vai se diferenciando tanto geografi‑
camente, como em relação aos produtos e serviços oferecidos. Uma ques‑
tão fundamental na estratégia de uma empresa internacional é equilibrar
e unir as vantagens da integração global com a necessidade de sensibili‑
dade e receptividade às condições existentes nos diferentes locais em que
opera e para as quais produz bens e serviços. Essa escolha estratégica
tem implicações para a maneira como a empresa organiza suas principais
atividades: autonomia concedida às operações locais, integração e siner‑
gia entre essas operações, e centralização por meio de funções de apoio,
ou descentralização por regiões ou por divisões de produtos. Muitas
EMNs têm tentado combinar os benefícios da integração global com os
da localização. Essa combinação tornou­‑se conhecida como abordagem
“transnacional”. Essa abordagem é uma das arenas mais relevantes para
o experimento de novas formas de organização, porque a complexidade
dessa abordagem pressiona e tensiona os limites das formas convencio‑
nais baseadas na hierarquia e burocracia. Para garantir a combinação de
flexibilidade, inovação e integração exigidas, essa nova abordagem da
organização da EMN depende de uma gestão efetiva das redes internas e
do apoio de uma cultura corporativa muito bem desenvolvida.
Existem clara interdependência entre essas escolhas organizacionais,
especialmente com relação à estrutura e ao processo. Se uma decisão é

Book_Organizaçoes.indb 20 16/9/2011 16:23:19


tomada em direção a certo aspecto da organização, isso influenciará de‑
cisões em outras áreas. Por exemplo, quando se prefere a centralização e
a hierarquia, é quase certo que serão favorecidas estratégias de controle
pessoal e/ou burocrático, integração vertical e recompensas baseadas pri‑
mordialmente na posição hierárquica. Se, por outro lado, há preferência
pelo trabalho em equipe descentralizado, isso pode favorecer estratégias
de controle baseadas em metas, cultura, integração horizontal e recom‑
pensas com base no desempenho. Embora existam inúmeras combina‑
21
ções possíveis dos elementos organizacionais, certas configurações têm
maior coerência interna do que outras e são, então, mais prováveis de

Introdução à organização
serem usadas.

1.4 Consequências das deficiências na


organização4
As escolhas organizacionais que acabamos de revisar têm ramificações
para todas as partes das atividades de uma empresa, mas implementá­‑las
não é algo fácil. É muito comum surgir problemas resultantes de falhas
organizacionais. Vale a pena considerarmos alguns deles, pois podem ser‑
vir como advertência a uma empresa acerca da necessidade de prestar
atenção à própria organização.
Certos problemas surgem repetidamente em empresas que enfren‑
tam dificuldades. Mesmo nos melhores momentos, esses problemas
podem sinalizar perigos com os quais se deve lidar. As deficiências na
organização podem exacerbar cada um desses problemas. No topo da
lista estão: (1) motivação e moral baixas; (2) decisões demoradas e ina‑
dequadas; (3) conflito e falta de coordenação; (4) resposta geralmente
insatisfatória às novas oportunidades e mudanças externas; e (5) custos
crescentes.

1.4.1 Motivação e moral


A motivação e o moral podem estar baixos porque:

1. As decisões parecem contraditórias e arbitrárias na ausência de


regras padronizadas.

2. As pessoas percebem que têm pouca responsabilidade, pouca opor‑


tunidade de realização ou reconhecimento de seu mérito porque a

Book_Organizaçoes.indb 21 16/9/2011 16:23:19


delegação de poder para as tomadas de decisões é insuficiente. Isso
pode ser consequência do excesso de níveis hierárquicos de gestão
e margem de controle muito estreita. Pode ser ainda resultado de
um excesso de especialização das funções.

3. Falta clareza em relação ao que é esperado das pessoas e à avalia‑


ção de seu desempenho. Isso pode ocorrer devido à má definição
das funções, a um sistema de recompensa mal elaborado e à comu‑
22 nicação inadequada da visão corporativa.

4. As pessoas estão sujeitas a pressões competitivas de diferentes


parte i  panorama geral

partes da organização, devido à ausência de uma definição clara


das prioridades, das regras de tomada de decisão ou dos progra‑
mas de trabalho.

5. As pessoas estão sobrecarregadas, seja porque não são encorajadas


a delegar, seja porque os sistemas de apoio são inadequados. Por
exemplo, gasta­‑se tempo demais procurando a informação neces‑
sária porque o departamento de TI da empresa e os sistemas de
gestão de conhecimento não estão bem organizados.

O Quadro 1.3 descreve um exemplo de como inconsistência entre


o reconhecimento das realizações do staff e as recompensas que lhe são
oferecidas podem prejudicar seriamente a motivação.

Quadro 1.3  O efeito desmoralizante de um sistema inadequado de


avaliação de desempenho

Amy Wong*, chinesa que havia concluído seu MBA, acabara de ser contratada
para o departamento de treinamento de uma grande companhia. Em seu primeiro
ano de emprego, elaborou e implementou três novos programas sobre desenvolvi‑
mento da criatividade e aprendizagem pessoal. Os participantes acharam os progra‑
mas tão úteis que lhe pediram para repeti­‑los diversas vezes. Por iniciativa própria,
ela também organizou cafés da manhã com o propósito de orientar os gerentes de
divisão sobre como fazer negócios na China, o que foi muito bem recebido.
Ao final de seu primeiro ano, Amy participou da reunião anual da empresa sobre
desenvolvimento de pessoal. Nessa reunião, ela discutiu com seu gerente o que
gostaria de desenvolver no ano seguinte a partir de sua experiência profissional

Book_Organizaçoes.indb 22 16/9/2011 16:23:19


e expertise. Embora não fosse uma reunião de avaliação (a empresa não tinha
um sistema de avaliação formal), o gerente falou sobre o desempenho de Amy
e expressou sua enorme satisfação em relação a isso. Estimulada pelo que ele
lhe disse e pela maneira com que seu trabalho fora recebido, Amy pediu um
aumento de salário. O caso foi para o comitê de revisão de cargos e salários da
companhia. O gerente dela não fazia parte desse comitê, mas apresentou uma
sólida recomendação, apoiando a solicitação de Amy.
O comitê recusou o pedido de Amy, alegando que ela estava há pouco tempo 23
no emprego para receber um aumento. Na verdade, o comitê estava sob pres‑

Introdução à organização
são para evitar aumentos de salário, porque a empresa enfrentava uma situa‑
ção financeira delicada. Amy sentiu que a companhia não estava reconhecendo
seu desempenho excepcional e ficou ainda mais magoada ao descobrir que um
colega, que era assistente pessoal do diretor executivo, recebera um aumento
sem que houvesse uma razão especial para isso. A experiência levou Amy a bus‑
car outro emprego e logo uma empresa concorrente lhe ofereceu um cargo com
melhor remuneração.
A saída de Amy e os sinais de insatisfação de outros profissionais levaram a
empresa a reexaminar seus procedimentos relacionados à gestão de pessoas.
Tendo um sistema de desenvolvimento de pessoal que enfatizava o desempe‑
nho individual, mas que não estava associado às decisões sobre os salários dos
empregados, a empresa compreendeu que alimentava expectativas que muitas
vezes não eram correspondidas. De fato, em casos como o de Amy, a empresa
permitiu que outros aspectos além do desempenho influenciassem sua decisão.

* O nome foi mudado para proteger sua identidade.

1.4.2 Tomada de decisão


A demora e a falta de qualidade no processo decisório ocorrem
porque:
1. A informação necessária não é transmitida a tempo para as pessoas.
Isso pode ser causado por hierarquia excessiva.
2. Aqueles que tomam as decisões estão alocados em unidades sepa‑
radas e não há medidas para integrá­‑los.
3. Aqueles que tomam as decisões estão sobrecarregados e não dele‑
gam a outros.

Book_Organizaçoes.indb 23 16/9/2011 16:23:19


4. Não existem procedimentos adequados para avaliar e aprender a
partir dos resultados de decisões semelhantes tomadas no passado.

O Quadro 1.4 ilustra como decisões inadequadas podem ser resulta‑


do de problemas durante a troca de informações entre as diferentes partes
de uma mesma empresa.

24 Quadro 1.4  Impacto das falhas internas nas decisões da empresa


parte i  panorama geral

Uma empresa de engenharia tinha várias divisões operacionais diferentes, loca‑


lizadas em uma mesma área de uma cidade industrial. A empresa apresenta‑
va dificuldades para enfrentar a competição dos fabricantes asiáticos e vinha
sofrendo com a queda no número de pedidos de equipamentos. Por outro lado,
a empresa estava expandindo sua produção de sistemas de controle eletrônico.
Essas duas categorias de produtos estavam organizadas em divisões separadas,
cada uma com o seu próprio departamento de recursos humanos. O RH corpo‑
rativo da empresa considerava ser seu papel o desenvolvimento profissional –
assim, concentrava­‑se mais no desenvolvimento e na atualização da equipe de
RH que em atividades rotineiras.
Muitas semanas se passaram até a empresa descobrir – por causa de uma his‑
tória publicada na imprensa local – que sua divisão de equipamentos despedia
empregados enquanto a divisão de sistemas de controle recrutava pessoas com
habilidades semelhantes no mercado. Essa falha no compartilhamento de infor‑
mações levou a empresa a uma série de ações inconsistentes, que não apenas
custaram muito caro, mas também foram prejudiciais à sua reputação e imagem.

1.4.3 Conflito e falta de coordenação


Pode haver conflito e falta de coordenação porque:

1. Há metas conflitantes que não são estruturadas num conjunto


único de objetivos e prioridades. Por exemplo, as pessoas podem
ser pressionadas a alcançar objetivos funcionais do departamento
à custa dos objetivos do projeto ou do produto.

2. Apesar da grande interdependência de suas atividades, as pessoas


não trabalham em sincronia umas com as outras porque estão
alocadas em unidades separadas.

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3. As pessoas modificam o que estão fazendo em função de mudanças
nas circunstâncias, mas não há nenhum sistema para garantir que
essas alterações sejam comunicadas a outras partes da organização.

O Quadro 1.5 descreve um caso de sério conflito e ruptura na coor‑


denação. Este exemplo será mais detalhado no Capítulo 4, que trata da
integração nas organizações.

25
Quadro 1.5  Problemas de conflito e falta de coordenação

Introdução à organização
Uma empresa tinha seis grupos de venda e dezoito unidades de produção dife‑
rentes. Havia um conflito constante entre a produção, que desejava limitar a
gama de produtos para atingir um nível mais econômico de produção para cada
um deles, e os departamentos de vendas, que tentavam forçar a produção a
cumprir as especificações exatas de seus clientes, sem levar em conta qualquer
padronização. Também surgiram conflitos entre os diferentes grupos de ven‑
das, porque cada um deles tentava garantir para seus clientes a entrega mais
rápida possível, deixando de lado o sistema de prioridades estabelecido pela
companhia. O propósito dessas prioridades era dar preferência a determinados
tipos de pedido, como os de exportação e aqueles apresentados por clientes
maiores e mais importantes. Alguns vendedores foram recrutados pela produ‑
ção e podiam, assim, dar tratamento preferencial aos seus “próprios” clientes,
porque negociavam informalmente com os amigos da unidade de planejamento
da produção.

Fonte: Adaptado de Sykes, AJM; Bates, J. Study of conflict between formal company policy and
the interests of informal groups. Sociological Review, p. 313­‑327, nov. 1962.

1.4.4 Mudanças nas circunstâncias


Uma organização pode não responder de maneira inovadora às mu‑
danças nas circunstâncias porque:

1. Não criou funções especializadas relacionadas à previsão e à análi‑


se do ambiente.

2. Há deficiência em garantir que o aprendizado e a inovação constituam


práticas essenciais apoiadas pela direção, por meio de procedimentos
que garantam prioridade, programação e recursos adequados.

Book_Organizaçoes.indb 25 16/9/2011 16:23:20


3. Não há uso adequado do trabalho em equipe para reunir pesso‑
as que possam sugerir perspectivas interessantes sobre os novos
projetos, além de soluções exclusivamente tecnológicas. Tais pers‑
pectivas incluem o potencial de mercado, a facilidade na fabrica‑
ção, a probabilidade do retorno sobre investimento e quaisquer
exigências regulatórias relevantes.

O Quadro 1.6 apresenta um exemplo de empresa com dificuldades


26
para criar produtos inovadores competitivos.
parte i  panorama geral

Quadro 1.6  Um caso de inovação mal direcionado

Uma grande empresa do setor de computação e equipamentos para escritório


fez um investimento significativo em um novíssimo centro de pesquisas, locali‑
zado perto de uma importante universidade. A empresa recrutou um grupo de
jovens cientistas entusiasmados e técnicos especializados para suas instalações.
Nos primeiros dez anos o centro gerou algumas inovações tecnológicas signi‑
ficativas, mas nenhuma delas foi produzida com fins comerciais. Consequente‑
mente, muitos dos melhores cérebros deixaram o centro de pesquisa e foram
para outras empresas; em alguns casos, suas invenções e protótipos foram
então desenvolvidos e se transformaram em novos produtos bem sucedidos
comercialmente.
Diversos fatores contribuíram para essa falha – com custo muito elevado – na
comercialização da torrente de invenções desenvolvidas pelo centro de pesqui‑
sas da empresa. A organização autônoma do centro e sua localização a mais
de três mil quilômetros da matriz e distantes das principais unidades de pro‑
dução acentuaram o sentimento de distância cultural e ausência de identidade
comum entre o centro e as demais unidades. Poucos projetos tiveram a com‑
preensão, para não falar em apoio, dos executivos da empresa quando che‑
gava o momento de decidir sobre o investimento necessário para produzi­‑los.
Temendo desestimular a criatividade, a empresa não envolvia aqueles que não
eram cientistas em seus novos projetos, a não ser quando eles alcançavam está‑
gio bastante adiantado. Assim, a empresa não tinha especialistas das áreas de
produção, comercial e contabilidade nas equipes dos projetos. Em função disso,
argumentava­‑se em favor do desenvolvimento de novos produtos tendo como
base a inovação científica e não a atratividade mercadológica, a facilidade de
produção e o valor agregado.

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1.4.5 Custos crescentes
Os custos podem ser crescentes, particularmente os gerais, porque:

1. A organização é bastante hierarquizada, com alta proporção de


“chefes” em relação ao número de “trabalhadores”.

2. Há excesso de regras, procedimentos e papelada, desviando a aten‑


ção das pessoas do trabalho produtivo e exigindo mais pessoal
para administrar. 27

Introdução à organização
3. Alguns ou todos os outros problemas organizacionais estão presentes.

A lista de sintomas pode ser facilmente transformada em uma ferra‑


menta de diagnóstico simples, mas útil, para alertar sobre possíveis defi‑
ciências no planejamento de uma organização. A forma dessa ferramenta
é apresentada no Quadro 1.7.

Quadro 1.7  Checklist de sintomas das deficiências organizacionais

Leia o questionário abaixo e marque “sim” (se for o caso) para: (1) sua organiza‑
ção como um todo; e (2) para sua equipe ou unidade

Sua
Sua
Sintomas equipe ou
organização
unidade

O moral e a motivação parecem notavelmente


baixos?
As decisões parecem inconsistentes e arbitrárias,
sem conexão com regras ou critérios?
As pessoas sabem claramente o que se espera
delas e como sua contribuição pode ser avaliada?
As pessoas sentem que têm pouca responsabilidade
e poucas oportunidades para a realização pessoal?
As pessoas estão sujeitas a pressões competitivas
de diferentes partes da organização?
As pessoas estão sobrecarregadas?

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A tomada de decisões é demorada e inadequada?
A informação vital chega até os que tomam decisões
no devido tempo?
Aqueles que tomam as decisões estão segregados em
unidades separadas? Se sim, há coordenação adequada
de suas atividades?

28
Aqueles que tomam as decisões estão sobrecarregados
porque não delegam de maneira suficiente?
parte i  panorama geral

Os procedimentos para avaliação dos resultados de


decisões semelhantes tomadas no passado são
inadequados?

Há conflito e falta de coordenação perceptíveis?


Indivíduos ou grupos têm metas conflitantes que não
estão associadas aos objetivos e prioridades
organizacionais de modo geral?
Foram perdidas oportunidades de coordenar as
atividades das pessoas por meio da formação de
equipes ou de outros mecanismos que garantam
o vínculo entre elas?
Os sistemas garantem que a informação sobre
mudanças operacionais seja devidamente
comunicada a outras partes da companhia?

A organização não reage de modo inovador


a mudanças de circunstâncias?
Não há nenhum responsável pelo monitoramento
das mudanças que ocorrem fora da organização?
A inovação e o planejamento das mudanças não
recebem apoio adequado dos executivos?
É inadequada a coordenação entre as pessoas
que podem detectar novas oportunidades e
aquelas capazes de desenvolvê­‑las (por exemplo,
entre vendas e Pesquisa e Desenvolvimento (P&D)?

Book_Organizaçoes.indb 28 16/9/2011 16:23:20


Os custos estão aumentando muito além da
inflação, especialmente nas áreas administrativas?
A organização tem excesso de gestores e pouca gente
realizando o trabalho?
Há excesso de procedimentos e papelada, desviando as
pessoas do trabalho produtivo e exigindo mais pessoal
administrativo?
29

Introdução à organização
Resumo
1. A organização é o produto da ação de “organizar”, especificamente
do processo de coordenar o esforço coletivo de modo que este atinja um
resultado potencialmente superior àquele que seria alcançado por indiví‑
duos que agem ou trabalham sozinhos. O termo implica que o formato
de organização utilizado pela empresa persista de forma reconhecível,
durante algum tempo.

2. A excelência na gestão proporciona uma das últimas fontes susten‑


táveis de vantagem competitiva. É um ativo que toda empresa precisa
desenvolver de modo a responder às suas necessidades e situação, e que
não pode ser adquirido no mercado.

3. As maneiras convencionais com que as empresas e outros empreendi‑


mentos coletivos eram organizados no passado são consideradas cada vez
mais inadequadas para as condições do século XXI.

Questões para discussão


1. De que maneira a organização contribui para o sucesso da empresa?

2. Por que a excelência na gestão é uma das últimas fontes sustentáveis de


vantagem competitiva?

3. Qual é a diferença entre organização como estrutura e organização


como processo?

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4. Como a organização atual se estende além dos limites legais das empresas?

5. Quais são as principais deficiências que a organização pode ter?

Notas
30
1. PETTIGREW; FENTON, 2000, op. cit., p. 39­‑40.
parte i  panorama geral

2. CHILD, John. Strategies of control and organizational behavior. Administrative


Science Quarterly, 18(1), p. 1­‑17, 1973. CHILD, John. Organization: a guide to
problems and practice. 2. ed. London: Harper & Row, 1984. Cap. 6.

3. BAHRAMI, Homa; EVANS Stuart. Flexible re­‑cycling and high­‑technology en‑


trepreneurship. California Management Review, 37, p. 62­‑89, 1995.

4. Trecho extraído de CHILD, John, 1984, op. cit., p. 5­‑7.

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Capítulo 2
Novas condições, nova organização

Conteúdo do capítulo
Este capítulo apresenta as grandes mudanças na forma organizacional,
resultantes das novas condições no ambiente de negócios. A intenção é
fornecer um panorama geral como pano de fundo para determinados aspectos
das novas formas e processos organizacionais, que serão examinados nas
partes II e III. O capítulo começa com uma revisão da crescente insatisfação
com a forma convencional de organização, que foi moldada em torno do
paradigma da burocracia. Discute, ainda, como as novas condições sob as quais
os negócios funcionam deram impulso às novas formas organizacionais. Tais
condições estão ligadas à globalização, às novas tecnologias, à economia do
conhecimento, à hipercompetição e às demandas por responsabilidade social.
O capítulo termina com uma comparação entre as formas organizacionais –
novas e convencionais – com base nas alternativas analisadas no Capítulo 1.

2.1 O recuo das formas convencionais de


organização
Ao longo da história, as atividades militares, políticas e religiosas
têm sido organizadas, geralmente, em grande escala. As formas de or‑
ganização evoluíram compartilhando muitos aspectos, apesar das di‑
ferenças de localização e objetivo. Tais formas incluíam declarações de

Book_Organizaçoes.indb 31 16/9/2011 16:23:20


metas coletivas, especialização de funções e papéis (deveres e direitos)
tanto vertical como horizontalmente, regras de conduta e outros arranjos
de controle e coordenação do comportamento. Há milhares de anos já
havia exemplos de grandes organizações formalizadas que empregavam
princípios similares de hierarquia, subdivisão funcional e coordenação.1
A dinastia Han, na China (206 a.C. a 220 d.C.), estabeleceu um governo
central burocrático altamente formalizado, que perdurou até o início do
século XX e incorporava práticas de seleção de pessoas mediante avalia‑
32 ções, bem como sistemas para avaliação de desempenho e promoção.2
Durante a Idade Média, na Europa, os monastérios continuaram elabo‑
parte i  panorama geral

rando os princípios da organização, tais como a especialização de papéis,


hierarquias cuidadosamente definidas, dependência com relação às regras
e até o uso de equipes de projeto para resolver problemas mais relevantes.
Essa organização altamente formalizada funcionava muito bem para a
acumulação de riqueza, embora deixasse pouco espaço para a autodeter‑
minação do indivíduo.3
Na Era Moderna, a forma organizacional evoluiu para a onipresen‑
ça da burocracia entre as grandes corporações públicas e privadas. A
burocracia era fundamentada em princípios racional­‑legais de adminis‑
tração e gestão e era, geralmente, complementada pelos princípios da
organização do trabalho enunciados por F. W. Taylor, o “pai da admi‑
nistração científica”. A burocracia parecia corresponder muito bem aos
imperativos organizacionais, em condições de razoável continuidade e
estabilidade.
Na segunda metade do século XX houve um rompimento funda‑
mental com o modelo burocrático há muito estabelecido. Em primeiro
lugar, estudos de caso cuidadosamente realizados mostraram que, na
prática, as burocracias não eram necessariamente úteis para o alcance
das metas organizacionais, especialmente no que diz respeito à quali‑
dade do serviço prestado ao cliente. Muitas vezes a empresa precisava
desviar­‑se das regras e estruturas formais para funcionar com eficácia.4
A operação padrão torna­‑se, assim, uma forma de protesto contra o
empregador.
Posteriormente, aqueles que estudavam a organização chegaram à
conclusão que, em vez de adotar um modelo único, diferentes formas
de organização adequam­‑se a diferentes condições (contingências), como
tamanho, tecnologia e ambiente. Ao identificarem uma forma de organi‑
zação que era consideravelmente mais orgânica e menos hierárquica que

Book_Organizaçoes.indb 32 16/9/2011 16:23:20


Tabela 2.1  Formas mecanicistas e orgânicas

Forma mecanicistas Forma orgânica

Ênfase na horizontalização – inten‑


Ênfase na hierarquia – comunicação
sa comunicação lateral nas redes
verticalizada predomina
organizacionais
Tomada de decisões centralizada Tomada de decisões descentralizada
33
Papéis menos especializados e definidos
Papéis especializados bem definidos
vagamente

Novas condições, nova organização


Baseada em regras e procedimentos Baseada na mútua adaptação entre
padronizados colaboradores

a burocracia típica (veja a Tabela 2.1)5, Burns e Stalker trouxeram uma


contribuição significativa para os estudos da organização. Eles concluí‑
ram que, em um ambiente turbulento e imprevisível, a forma orgânica
tinha mais probabilidade de sucesso que a forma mais comum – mecani‑
cista (burocrática). Assim, alternativas à burocracia passaram a ser reco‑
mendadas por funcionar melhor em certas condições.
Além das crescentes disfunções burocráticas, havia uma preocupação
sobre o impacto restritivo, até opressivo, que a burocracia teria sobre os
indivíduos. Muitas pessoas que trabalhavam em organizações, além de
seus clientes e consumidores, começavam a se sentir cada vez mais insa‑
tisfeitas com as formas organizacionais convencionais, baseadas na com‑
binação de sistemas de trabalho tayloristas e estruturas administrativas
burocratizadas e hierarquizadas. Os cientistas sociais articularam esses
descontentamentos nas décadas de 1950 e 1960 em estudos de referência,
como os de Argyris e Blauner.6 Minuciosos estudos de caso expuseram
o uso das organizações por grupos de interesse, como de gestores, para
alcançar objetivos pessoais.7 Surgiu então a crítica radical às formas orga­
nizacionais convencionais, de que estas incorporavam desigualdades de
poder e estimulavam, assim, a exploração. Essa crítica, direcionada tanto
às falhas da burocracia quanto à nova perspectiva contingencial, rejeitava
qualquer abordagem funcionalista que justificasse a eficiência da organi‑
zação. Sustentava que a eficiência simplesmente refletia os interesses
da elite e que essa abordagem não confrontava realmente as estruturas
existentes de poder e controle.8

Book_Organizaçoes.indb 33 16/9/2011 16:23:20


Nos anos 1970, teóricos da organização elaboraram uma série de
modelos e paradigmas.9 Parte dessa diversificação originou­‑se de uma
atenção crescente dada à política da organização baseada em estudos de
casos aprofundados e na teoria crítica,10 dando a entender que pressupos‑
tos racionais da teoria burocrática e seu enfoque na estrutura eram insus‑
tentáveis. Também se percebia cada vez mais que era impossível prever, e
muito menos entender, os efeitos do design organizacional sobre o com‑
portamento e o desempenho sem saber como as pessoas que trabalhavam
34
em organizações interpretavam e compreendiam a organização e seu con‑
texto.11 Mais pragmaticamente, a redução do ritmo de crescimento da
parte i  panorama geral

produtividade e o aprofundamento dos desafios competitivos impostos


pelas empresas japonesas estavam levando à conclusão de que a busca da
racionalização por métodos burocráticos e tayloristas atingira seu limite
e estava, então, em crise. Isso estimulou a busca por novas formas de
organização que levassem a maior produtividade, qualidade e inovação.
Assim, a forma burocrática convencional da organização estava sob fogo
cada vez mais cerrado. A perspectiva que lhe servia de base era conside‑
rada equivocada e, na qualidade de forma organizacional, passou a ser
considerada cada vez menos adequada aos ambientes em transformação
e à mudança nas expectativas sobre a maneira como as pessoas deveriam
trabalhar.
Em função dessas tendências, por volta dos anos 1980 foi identifica‑
da a chamada organização “pós­‑burocrática”, que, pelo menos em prin‑
cípio, seria uma clara alternativa à forma burocrática que por mais de um
século refletiu a filosofia da grande empresa hierárquica, racionalizada
e de grande escala. Os seus defensores argumentavam em favor de um
distanciamento da hierarquia, de um retorno a unidades menores, mais
orgânicas e menos diferenciadas, da ênfase na capacidade de julgamento
e criatividade individuais em lugar de uma obediência passiva às regras, e
de arranjos que estimulam o empowerment, a flexibilidade, o aprendiza‑
do, a inovação e o trabalho em equipe.
Nos anos 1990, a transição de uma economia baseada na transfor‑
mação de materiais para uma outra baseada nos fluxos de informação fi‑
cou cada vez mais evidente, especialmente nos países desenvolvidos. Essa
transição libertou muitos aspectos da organização de suas restrições físi‑
cas anteriores, permitindo, por exemplo, que atividades em locais afas‑
tados estivessem tão integradas quanto aquelas reunidas em um mesmo
local. A crescente intensidade da informação é hoje o principal fator a

Book_Organizaçoes.indb 34 16/9/2011 16:23:20


que devem responder os novos designs organizacionais, porque desafia a
premissa sobre a qual se baseia a demanda por desempenho econômico
da organização burocrática: o aproveitamento de recursos por meio de
combinações eficientes em uma dada economia.12
Essa questão é fundamental porque o conhecimento que tem utilidade
competitiva origina­‑se em pequenos grupos de estudiosos – por exemplo,
em uma equipe de pesquisa e desenvolvimento (P&D). Na burocracia, o
objetivo é codificar esse conhecimento valioso da maneira mais rápida
35
possível. Em uma economia alicerçada em objetos físicos, a organização
poderá obter retorno a partir da disseminação de seu conhecimento, ofe‑

Novas condições, nova organização


recendo produtos novos e melhores ou fabricando­‑os de maneira mais
eficiente. Uma empresa que produz novo conhecimento e o mantém para
si, gozando de um pseudomonopólio, pode assim obter rendimentos eco‑
nômicos cuja lucratividade apresenta­‑se acima do normal.
O problema da burocracia é que essa estratégia de “acumulação” do
conhecimento é impraticável no caso de bens e serviços baseados nesse
ativo. Por um lado, isso ocorre porque o conhecimento pode se perder
em uma transação econômica. Por outro lado, o próprio ato de codifi‑
car o conhecimento para torná­‑lo mais proveitoso pode fazer com que
seja também mais fácil difundi­‑lo, transformando­‑o em uma commodity.
Como consequência, observa­‑se que os regimes existentes de proteção à
informação patenteada são, em muitos setores, ineficazes para controlar
os fluxos de conhecimento de maneira eficaz.
Isso implica que a única maneira de sustentar um desempenho supe‑
rior é promover aprendizagem mais rápida. O problema é que o controle
e a conformidade às regras, implícitos na forma burocrática, inibem os
processos acidentais, altamente fortuitos, e os criativos, que facilitam a
aprendizagem exploratória.13 Quando associados à estabilidade, rotina e
robustez da burocracia, tem­‑se uma receita para a rigidez das atividades
essenciais de uma empresa e, consequentemente, o mau desempenho.14
Hoje buscam­‑se novas formas de organização que possam evoluir
com a mudança das circunstâncias, proporcionando oportunidades para
que as pessoas se expressem, alcancem a realização pessoal e contribuam
com entusiasmo para o aprendizado organizacional. A equipe com poder
é um exemplo que parece corresponder a muitos desses novos critérios.
Uma equipe pode criar um contexto favorável para a criatividade e ino‑
vação, que adquirem crescente importância competitiva. É também con‑
sistente com o retorno das estruturas reduzidas e do foco naquilo que se

Book_Organizaçoes.indb 35 16/9/2011 16:23:20


faz bem.15 Portanto, as empresas estão sendo aconselhadas a se livrar das
atividades não essenciais. Em vez de internalizar a totalidade da cadeia
de valor e suas atividades de apoio em grandes hierarquias, as redes de
unidades menores e mais focadas parecem oferecer um melhor retorno
econômico e humano.16 Uma forma híbrida de organização – a aliança
estratégica – também se tornou proeminente como um meio para se al‑
cançar benefícios, como a expansão internacional, economia de escala e
sinergia em termos de aprendizagem. Um arranjo mais comum é a joint
36
venture, que embora não seja rigorosamente uma nova forma organi‑
zacional, vem se disseminando e crescendo em importância nos últimos
parte i  panorama geral

anos. As alianças e as redes têm uma dinâmica própria especial que gera
novos desafios gerenciais.17
Atualmente, o pensamento mais moderno sobre a organização avan‑
çou mais um estágio. A metamorfose de organizações formais e unitárias
em formas alternativas de rede “virtual”, baseadas na combinação das
tecnologias da informação e comunicação (TIC), tornou­‑se algo que não
pode ser ignorado. A Dell Computers e outras empresas de sucesso que
competem com base na resposta rápida para atender às exigências do
consumidor em condições altamente competitivas fizeram progressos ao
longo do caminho em direção à virtualidade. Na virada do século XXI,
a explosão de novas empresas “pontocom” que usam a internet para
fornecer informação, vinculando assim, consumidores e produtores, tam‑
bém sintetizou a introdução de uma forma virtual de organização que
se aproxima do mercado eficiente. Até mesmo para as empresas da “ve‑
lha economia” a organização estaria agora assumindo um caráter mais
temporário. Para corresponder às mudanças na demanda e manter sua
participação em mercados mais competitivos, as empresas têm estado sob
crescente pressão para se reorganizar frequentemente, para recombinar
ou reciclar seus ativos e competências­‑chave, e, ao mesmo tempo, apro‑
veitar as possibilidades oferecidas pelo e­‑commerce.

2.2 Novas condições, nova organização


A experimentação de novas formas de organização tem sido estimu‑
lada por uma série de progressos no ambiente de negócios, que está im‑
pondo novas exigências à organização. De modo geral, acredita­‑se que as
formas convencionais de organização já não respondem adequadamente
ao desafio imposto por essas exigências. A principal mensagem expressada

Book_Organizaçoes.indb 36 16/9/2011 16:23:20


por muitos executivos é: “a estrutura corporativa que serviu de base para
a formação e o crescimento dos negócios durante todo o século XX está
em declínio há muito tempo”.18A globalização, as novas tecnologias, a
sociedade baseada no conhecimento, a hipercompetição e as expectativas
sociais relacionadas aos negócios estão criando novas exigências para a
organização, e no caso das novas tecnologias estão oferecendo também
novas oportunidades de design organizacional. Examinaremos agora
cada um desses tópicos e suas implicações para a organização.
37

Novas condições, nova organização


2.2.1 Globalização
O FENÔMENO
O termo “globalização” é usado de maneiras tão diferentes que cor‑
re o risco de perder sua utilidade. Tornou­‑se um conceito tão amplo e
difundido que é difícil apreender seu significado, embora já tenha sido
criado pelo menos um “índice de globalização”, que a separa em suas
partes mais importantes.19 Essencialmente, globalização refere­‑se aos ní‑
veis crescentes de interdependência existentes no mundo. Nos negócios,
ela está evidente na erosão das fronteiras entre os mercados comerciais
e financeiros. Essas fronteiras foram criadas em um contexto de regula‑
mentações restritivas, barreiras de comunicação e diferenças de nacio‑
nalidade e cultura. Os acordos internacionais para liberar o comércio e
o surgimento da TIC moderna têm facilitado, de maneira importante, a
globalização.
A globalização é um fenômeno complexo. Na verdade, a expressão
faz referência a uma série de fatos que ganharam destaque a partir de
meados dos anos 1980. Entre esses fatos estão o acelerado crescimento
do comércio mundial e do investimento estrangeiro direto, a integração
global da moeda e dos mercados de capital, e a disseminação de cadeias
de valor pelo mundo; aliados à redução nos custos dos transportes, esses
fatos permitiram a aplicação de novas tecnologias de informação e a dis‑
seminação do conceito de “melhores práticas” organizacionais.
A globalização é impelida por forças econômicas poderosas, incluin‑
do fatores tais como mercado, custos, competição e governo.20 Há diver‑
sos fatores importantes que regem o mercado. Um deles é o aumento das
preferências do consumidor comum estimulado pelas marcas de sucesso
global, como acontece com os jeans de estilistas famosos, calçados espor‑
tivos e hambúrgueres. Outro fator é o desenvolvimento de canais globais

Book_Organizaçoes.indb 37 16/9/2011 16:23:21


de distribuição e serviços, como acontece, por exemplo, nas indústrias de
câmeras fotográficas e de computadores pessoais. Como resultado dis‑
so, está comprovado que é possível, em certas categorias de produtos,
desenvolver ações mercadológicas que são transferíveis entre fronteiras
culturais e geográficas.
Em termos de custos, a globalização oferece as vantagens da econo‑
mia de escala e padronização, não apenas na produção, mas também em
aspectos como os custos da publicidade e propaganda, quando se usa,
38
por exemplo, um anúncio padronizado. Uma escala global de produção
também oferece vantagens de custo no que se refere à compra de insumos.
parte i  panorama geral

As forças competitivas tornam­‑se relevantes quando as empresas compe‑


tem mundialmente e não apenas nacional ou regionalmente, e podem,
assim, se beneficiar das economias mencionadas acima. A liberalização
do comércio aumentou claramente a força do fator competição para a
globalização, mas a sua importância também depende do quão segmen‑
tados ou não são os mercados. Os governos reconheceram os benefícios
econômicos do comércio mais livre e dos movimentos de capital e muitos
abriram suas economias a partir dos anos 1990. O comércio mais livre
teve como consequência também o desenvolvimento de padrões técnicos
compatíveis entre os países, o que por sua vez facilita a produção e a co‑
mercialização globais.
Com essas forças poderosas, assume­‑se que a globalização dos negó‑
cios avança implacavelmente. A realidade não é, contudo, tão simples as‑
sim. A ascensão do terrorismo internacional, por exemplo, levou alguns
a se perguntarem se haveria limites para a liberalização das transações
internacionais, transferências financeiras e liberdade de movimento.21
Foram feitas muitas afirmações genéricas e sem base sobre a globalização;
é preciso tratá­‑las com certo cuidado. Em primeiro lugar, a globalização é
uma tendência, mais do que uma condição necessariamente existente. Ela
não está se espalhando da mesma forma pelo mundo, sendo mais eviden‑
te em alguns setores do que em outros. É uma característica das teleco‑
municações e da aviação civil, mas menos dos setores da construção civil,
serviços pessoais e gêneros alimentícios. A maior parte da integração do
comércio e do investimento transfronteiriço ocorre, na realidade, dentro
de blocos econômicos regionais, e não em uma escala verdadeiramente
global.22 A globalização é sem dúvida uma tendência muito forte, mas
ainda resta ver até que ponto e com que velocidade se disseminará, pois
tem adversários poderosos.

Book_Organizaçoes.indb 38 16/9/2011 16:23:21


Ao mesmo tempo que a globalização avança, as pessoas se tornam
cada vez mais conscientes de sua identidade étnica e cultural, insistindo
no reconhecimento dessa identidade. A comunicação internacional pela
internet, que é a cada dia mais intensa e que promove a convergência da
ideologia de economia de mercado e dos métodos empresariais, parece re‑
forçar as identidades culturais e subculturais. A nova tecnologia melhora
a comunicação entre os membros de comunidades culturais e de outros
grupos sociais, além de proporcionar oportunidades de autoexpressão.
39
Essa autoexpressão manifesta­‑se em diferentes níveis e de forma ampla,
embora às vezes de maneira mais superficial, mediante as preferências

Novas condições, nova organização


que as pessoas expressam como consumidores e empregados. Muitas
empresas passaram a reconhecer que terão novas oportunidades de ne‑
gócios atendendo aos gostos locais e operarão de modo mais efetivo se
adaptarem suas políticas às práticas de emprego locais. Isso deu origem
ao critério de “localização”. As empresas sabem que a globalização de‑
verá ser equilibrada e reconciliada com esse critério. Esse paradoxo tem
profundo significado na maneira como as empresas se organizam. A lo‑
calização requer iniciativa e organização descentralizadas ao passo que a
globalização exige – e facilita – a padronização centralizada das práticas
organizacionais.23

IMPLICAÇÕES PARA A ORGANIZAÇÃO


A globalização pode permitir e assegurar mais economias de escala
e padronização para as empresas. Com a queda das barreiras de entrada
nos mercados, as empresas podem disseminar os custos de desenvolvi‑
mento de produtos e de produção por grandes volumes, especialmente
quando são usadas plataformas ou módulos padronizados. A liberaliza‑
ção do comércio mundial também abre novas oportunidades em termos
de diversificação em diferentes regiões ou países, acesso a recursos e aber‑
tura de novos mercados consumidores.
A padronização e a diversificação criam novas demandas na organi‑
zação de uma empresa, que nem sempre são facilmente conciliáveis. Para
aproveitar plenamente os potenciais benefícios da globalização, uma em‑
presa deve ter flexibilidade para reconfigurar seus recursos à medida que
mudam os atrativos dos países e das regiões. Pode ser que haja considerá‑
vel vantagem na coordenação de atividades em escala mundial e na rigo‑
rosa manutenção de qualidade e outros padrões que dão suporte à marca
ou à reputação da empresa, mas também deve haver uma organização

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com flexibilidade suficiente para reconhecer os novos progressos ocorri‑
dos em nível local e aprender com eles. Portanto, a globalização aumenta
a necessidade de as empresas manterem tanto a padronização quanto a
flexibilidade dentro da mesma estrutura organizacional.
Um dos motivos para a expansão internacional das empresas está na
oportunidade de aplicar seu know­‑how nas novas localidades. Em geral,
elas competem e/ou produzem com sucesso em outros países porque suas
melhores práticas lhes garantem vantagens. Essa é mais uma razão pela
40
qual muitas empresas preferem padronizar suas práticas de gestão e orga‑
nização à medida em que se expandem globalmente. Contudo, as empre‑
parte i  panorama geral

sas às vezes podem encontrar dificuldades na padronização, em virtude


de circunstâncias locais, como as diferenças culturais – o que aconteceu,
por exemplo, com alguns grandes varejistas, como o Walmart (veja o
Quadro 2.1).
A globalização também expõe a empresa a uma complexidade externa
maior do que antes. Além disso, a globalização expande o número de agen‑
tes – clientes, competidores, governos, organizações não­‑governamentais
(ONGs) – cujas ações são relevantes. Atualmente, diferentes eventos que
ocorrem no entorno da organização precisam ser levados em conta. Na
verdade, a maioria das empresas começa a dialogar mais com outros gru‑
pos externos do que antes. Isso se aplica amplamente, desde uma ênfase
maior no marketing de relacionamento até a necessidade de interagir com

Quadro 2.1  Resistência à introdução de uma prática global

Desde 1991, o Walmart trabalha com o Grupo Cifra, um varejista mexicano. Em


1997, o Walmart assumiu o controle da operação. Contudo, a empresa só intro‑
duziu um moderno sistema de caixas registradoras anos depois dos concor‑
rentes já terem feito isso. O aumento esperado nas margens de lucro com esse
método padronizado custou a se materializar. Os gerentes locais relutavam em
anunciar as demissões que a nova tecnologia provocou. Isto aconteceu porque
a mão de obra local era muito barata e também porque as comunidades locais
sofreriam, numa sociedade em que a cultura de apoio coletivo mútuo é mais
acentuada que nos Estados Unidos.

Fonte: Adaptado de Globalisation: making sense of an integrating world. The Economist,


Londres, Economist Books, p. 205, 2001.

Book_Organizaçoes.indb 40 16/9/2011 16:23:21


as ONGs sobre as questões ambientais.24 Essa maior complexidade exter‑
na necessariamente tem repercussão na organização interna da empresa.
Não apenas a cúpula organizacional deverá dedicar mais tempo e atenção
às relações externas, como também deverá receber apoio de mais espe‑
cialistas. Portanto, a complexidade externa tende a criar a necessidade de
uma complexidade interna correspondente na organização da empresa.
A teoria da complexidade sugere que um ambiente mais complexo,
com um número maior de agentes relevantes, interligados em redes, tam‑
41
bém apresentará um índice mais alto de mudanças. O alto nível de in‑
terdependência entre esses agentes significa que as ações de qualquer um

Novas condições, nova organização


deles tende a influenciar o sistema como um todo, especialmente se as
relações entre aquela unidade e as outras forem instáveis, devido talvez
às mudanças nas conjunturas – do mercado, da política ou da tecnologia.
Sendo assim, em geral é bem mais difícil prever o resultado de eventos em
um sistema complexo.
Ao globalizar sua estratégia e suas operações, essa ampliação de es‑
copo tende a aumentar a complexidade externa que a empresa encontra.
O resultado pode ser tensão entre assegurar os benefícios da padroniza‑
ção mundial e adaptar­‑se às incertezas geradas pela complexidade. Isso
apresenta, então, um dilema relativo ao design organizacional. É melhor
tentar “reduzir” a complexidade a uma forma na qual rotinas e paradig‑
mas padrões – já experimentados e testados – possam ser manejados com
eficiência? Embora econômica, essa alternativa apresenta o risco de des‑
cartar informações externas que não se conformam ao paradigma exis‑
tente, mas que podem, no entanto, ter implicações fundamentais sobre a
maneira como a organização deveria mudar. O resultado seria a busca efi‑
ciente de uma alternativa que pode não ter nenhuma viabilidade futura.
É melhor, então, “absorver” a complexidade, organizando­‑se de modo a
levar em conta informações e dissonâncias não rotineiras, desenvolvendo
múltiplas opções e mantendo­‑as abertas tanto quanto possível, embora
isso possa custar mais caro e consumir mais tempo?25
A primeira opção requer uma organização que proteja e filtre os fato‑
res externos o máximo possível, de modo a permitir que o core business
da empresa continue com suas rotinas de gestão eficientes e já conhe‑
cidas. Isso pode ser obtido tentando­‑se reduzir a variabilidade externa
mediante o aumento da dependência em relação a grupos externos, como
fornecedores, e até governos em relação à organização, ou, pelo menos,
aumentando o poder de negociação frente a esses grupos. Evidentemente,

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essa política é mais viável para multinacionais financeiramente poderosas
e tecnologicamente avançadas do que para pequenas e médias empresas
(PMEs). Uma alternativa seria a empresa proteger seu core business por
meio da terceirização, nem tanto para poder focar mais em suas compe‑
tências fundamentais, mas para ganhar mais flexibilidade em suas ativi‑
dades periféricas.
A segunda opção requer uma forma de organização inteiramente di‑
ferente, que descentraliza a iniciativa para unidades que estão em contato
42
com desenvolvimentos externos, muito possivelmente trabalhando em
estreita associação com parceiros. Mais do que proteger o core business
parte i  panorama geral

de perturbações externas, essa alternativa visa melhorar sua sensibilida‑


de às mudanças externas. Seu objetivo é permitir que o pensamento e o
comportamento rotineiros sejam desafiados por novas informações, em
vez de simplesmente forçar sua inserção na estrutura existente. Uma em‑
presa que adota essa solução considera fundamental a sua capacidade de
se organizar de forma a se adaptar rapidamente a novas circunstâncias.

2.2.2 Novas tecnologias


O FENÔMENO
Apesar da tremenda queda nas ações das empresas de novas tecnolo‑
gias em 2000 e 2001, o uso da TIC, em geral, e da internet, em particular,
continuará a crescer rapidamente. Projeções estimam gastos muito maio‑
res em aplicações de TIC nas diversas áreas de e­‑business, tais como co‑
mércio on­‑line, compras, gestão do conhecimento e relacionamento com
clientes.
Duas conclusões podem ser tiradas a partir da experiência com a
internet e com a TIC até o presente momento. Em primeiro lugar, o im‑
pacto da TIC não será uniforme; será maior e potencialmente mais revo‑
lucionário em alguns setores do que em outros. Como uma tecnologia de
comunicação, ela provocará mais mudanças nos campos que mais depen‑
dem das comunicações, tais como serviços financeiros, educação, entre‑
tenimento, varejo, saúde e setor público. Pode ter um papel significativo,
embora mais limitado, nas áreas de suprimento de manufaturas, de ener‑
gia e de viagens. O potencial impacto da internet está na maneira como
ela reduz drasticamente o custo da comunicação. Isso significa que ela
pode ter uma influência fundamental em qualquer atividade dependente
de fluxos de comunicação e de informação, tanto no âmbito do mercado

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como na esfera dos próprios sistemas da empresa de produção e entrega
de bens e serviços para o cliente.
A TIC e a internet têm facilitado o crescimento da interdependência
entre organizações. Em resposta a essas novas possibilidades, durante os
anos 1990 as grandes corporações aprenderam a “separar” atividades
– algumas das quais, consideradas parte do core business – enquanto
outras foram vendidas. Para manter a capacidade do sistema de entregar
um produto ou serviço completo aos clientes, as empresas precisaram
43
desenvolver redes suficientemente disciplinadas com seus fornecedores e
terceirizados. Os melhores exemplos dessas redes costumam estar entre

Novas condições, nova organização


os produtores de equipamento de TIC (por exemplo, a Cisco Systems, a
Dell Computers e a Palm) e os de serviços dependentes de informação,
como o mercado financeiro (por exemplo, a E*Trade e a Charles Schwab)
e o varejo (eBay). Um estudo da McKinsey concluiu que mesmo durante
a recessão de 2000/2001 as empresas conectadas em redes superavam o
desempenho das convencionais e provavelmente continuariam a fazê­‑lo.26
Em negócios intensivos em informação como esses, as empresas mais
importantes se desfizeram de muitas de suas atividades e não são pro‑
prietárias de todos os ativos que utilizam. As empresas não precisam ter
a propriedade de um ativo para utilizá­‑lo. Organizações tradicionais, em
contraste, pressupunham vínculos estreitos entre o produto final, a pro‑
priedade dos ativos e o controle desses ativos. O desempenho estava rela‑
cionado à eficácia com a qual os ativos eram empregados em comparação
com outras empresas. A capacidade de coordenar uma série de atividades
complementares dispersas entre os membros da rede mediante o uso da
TIC abriu toda uma nova área de possibilidades sobre como organizar
o fornecimento para os clientes e sobre o que reter no campo de ação de
uma determinada equipe.
A segunda conclusão é mais cautelosa e ecoa a história da mudança
tecnológica desde o início da revolução industrial. O ritmo no qual a TIC
pode ser introduzida será limitado por barreiras regulatórias, em áreas
como governo e serviços financeiros, e por resistência institucional, em
áreas altamente profissionalizadas, como educação e saúde. Essas bar‑
reiras reduzirão a velocidade com a qual a TIC é usada para mudar a
organização e as práticas de trabalho.27
Contudo, a TIC é parte de uma tendência mais ampla, na qual a ino‑
vação tecnológica passou a desempenhar um papel cada vez mais impor‑
tante na estratégia competitiva. Os rendimentos econômicos decorrentes

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da inovação, especialmente se retornos crescentes se aplicam – como acon‑
tece muitas vezes – quando o pioneiro estabelece novos padrões técnicos,
estimulam o desenvolvimento tecnológico como estratégia competitiva.
A obsolescência de certas técnicas e competências estabelecidas em fun‑
ção da emergência de novas tecnologias não é novidade. Foi um aspecto
fundamentalmente disruptivo da primeira revolução industrial, que esti‑
mulou uma mudança da produção nacional em favor de uma nova forma
organizacional revolucionária, o “sistema fabril”. O impacto dramático e
44
rápido que a tecnologia eletrônica teve na indústria relojoeira suíça é um
exemplo bastante conhecido no período recente. A introdução de nova
parte i  panorama geral

tecnologia pode gerar uma onda de destruição criativa, que Schumpeter


identificou como uma característica do ciclo de negócios. Hoje, em casos
extremos, a introdução de nova tecnologia pode prenunciar o fim de toda
uma indústria.28
O processo de deslocamento tecnológico tornou­‑se frequente e se es‑
palhou afetando tanto a natureza dos produtos quanto a sua forma de
produção. Isso é mais evidente em certas áreas de manufatura em que no‑
vas tecnologias – biotecnologia, engenharia genética e editoração eletrô‑
nica – tiveram impactos fundamentais. É ainda mais evidente em setores
de serviços que lidam com fluxos de informação, como bancos, educação,
editoração, corretoras de ações e telecomunicações. A TIC não está sendo
usada apenas para transformar o tipo de serviço oferecido e como sua
produção é organizada e administrada, mas tem favorecido também a en‑
trada de novos competidores e a formação de alianças além das fronteiras
de setores tradicionais.

IMPLICAÇÕES PARA A ORGANIZAÇÃO


As tecnologias de comunicação e informação abriram novas possibi‑
lidades para a organização interna e a organização das transações entre
empresas. Internamente, em muitas grandes empresas, os movimentos
visando reduzir os níveis hierárquicos e criar estruturas mais horizonta‑
lizadas somente podem ocorrer se houver melhor comunicação – o que
é facilitado pela TIC – entre as pessoas que permanecem. A intranet me‑
lhorou imensamente as comunicações internas e estimulou a dissemina‑
ção de redes formais e informais dentro das empresas. A TIC também
contribui para a formação de redes entre as diferentes funções e locali‑
dades geográficas, o que, por sua vez, contribuiu muito para a difusão
do trabalho em equipe e por projeto. A dinamarquesa Oticon A/S é um

Book_Organizaçoes.indb 44 16/9/2011 16:23:21


exemplo esclarecedor de como a TIC foi usada para dar suporte a uma
nova maneira de organizar (veja o Quadro 2.2).
As novas tecnologias de comunicações estão ajudando também as
empresas a internacionalizar suas operações e gerenciá­‑las à distância.
Isso ficou evidente no trabalho que realizei sobre a internacionalização
de empresas de Hong Kong, cujos executivos atribuem grande impor‑
tância ao recebimento frequente de informações sobre as operações e ao
rigoroso controle delas. Antes do surgimento da moderna TIC, o estabe‑
lecimento de filiais e subsidiárias no exterior causava grande tensão em 45

função da exigência de se manter essa intensidade de informações. Hoje a

Novas condições, nova organização


tecnologia permite o acesso constante à informação operacional, além de
um contato menos formal, quase pessoal, por meio da videoconferência
e do e­‑mail. Em outras palavras, a TIC permite o “controle de perto” em
organizações geograficamente diversificadas.
Externamente, o grau com que uma organização pode operar de for‑
ma interdependente com outras organizações era restrito pelas limitações
na capacidade de processamento de informação e pela distância física.
Com o avanço da TIC, as operações interdependentes são uma possibili‑
dade bem mais econômica. Aliada às mudanças nos regimes regulatórios
e nos fluxos de capital, que são parte da globalização, a TIC fez com que
essas operações interdependentes se tornassem desejáveis. Embora qual‑
quer sistema social apresente algum tipo de interdependência, está claro
que o nível de interdependência atual não tem precedentes e está crescen‑
do.29 Atualmente, as empresas trocam cotidianamente grande volume de
informações com fornecedores, clientes, parceiros estratégicos, consulto‑
res, distribuidores e agentes. Elas usam frequentemente a TIC para facili‑
tar o desenvolvimento de trabalhos em conjunto com fornecedores e para
programar atividades de cadeias de valor que estão estreitamente associa‑
das. A TIC permite assim às empresas líderes utilizar ativos de uma ampla
rede, sem precisar necessariamente ter a posse desses ativos. A organiza‑
ção virtual é uma forma altamente desenvolvida de se fazer isso, que ficou
bastante conhecida pela abordagem adotada pela Dell Computers e que
será discutida em detalhes no Capítulo 9.
Portanto, as empresas devem aprender como se organizar de modo
a dar suporte aos relacionamentos e fluxos de informação entre suas
fronteiras – e é isso que a TIC tem viabilizado. Elas também devem
estar preparadas para gerenciar seus relacionamentos além das fron‑
teiras, terceirizando algumas atividades e trabalhando por meio de

Book_Organizaçoes.indb 45 16/9/2011 16:23:21


Quadro 2.2  O uso de novas tecnologias para uma nova organização

A Oticon (hoje William Demant Holding) é líder mundial na produção de apare‑


lhos auditivos, com sede nos arredores de Copenhague. No final dos anos 1980,
a Oticon sofria com a concorrência crescente de empresas como Philips, Sie‑
mens e Sony e precisava urgentemente de inovações que rompessem com os
paradigmas existentes. Lars Kolind, o novo diretor executivo, decidiu que para
dar essa virada era necessário romper inteiramente com o modo de organização
46 convencional. Para ele, o pessoal precisava “tornar­‑se mais criativo, mais atuante
e eficiente”, e, além disso, a organização hierárquica formal era um empecilho
parte i  panorama geral

para se alcançar essa exigência. Ele introduziu uma nova forma organizacional,
que foi chamada de “organização espaguete”, enfatizando a combinação entre
flexibilidade e coerência.
A hierarquia da empresa foi reduzida a apenas dois níveis. Kolind e dez gerentes
formavam a equipe de gestão e as outras partes da organização foram organi‑
zadas por projetos. Os departamentos deram lugar aos “centros de competên‑
cia” como audiologia e engenharia mecânica, para romper os limites que eles
mesmos haviam imposto. Projetos, e não funções ou departamentos, passaram
a definir as unidades de trabalho. As equipes eram montadas, desfeitas e remon‑
tadas conforme o trabalho exigia. Os projetos eram aprovados por um Comitê de
Projetos e Produtos, formado por Kolind e outros três gerentes, que depois moni‑
toravam seus progressos a cada três meses. Fora isso, as equipes trabalhavam
com grande autonomia. A empresa tinha mais de cem projetos ao mesmo tempo
e a maioria das pessoas trabalhava em diferentes projetos simultaneamente. Os
empregados podiam participar de tantos projetos quanto desejassem e eram
estimulados a desenvolver novas habilidades além daquelas que já tinham. Ves‑
tígios da hierarquia, como escritórios e escrivaninhas individuais, foram abolidos.
Em vez disso, os empregados que trabalhavam no mesmo projeto ficavam juntos,
levando consigo as pastas e arquivos necessários.
A Oticon tem usado uma série de novas tecnologias para dar suporte a esse
modo de organização. Pela manhã, a correspondência que chega é digitalizada
e o papel enviado para reciclagem. A digitalização permite o acesso a partir de
todos os terminais espalhados pelo edifício, tornando inútil o arquivo tradicio‑
nal. E­‑mails e celulares são usados na comunicação, especialmente para contato
com clientes e fornecedores. As equipes podem usar uma grande sala de con‑
ferência equipada com computadores e softwares para trabalhos em grupo, e
equipamentos de videoconferência para realização de brainstorming e solução
de problemas. Kolind argumentava que essas ferramentas aceleravam em cinco
vezes os processos intelectuais da empresa.

Book_Organizaçoes.indb 46 16/9/2011 16:23:22


Depois de instalar a nova tecnologia e romper com a organização convencio‑
nal, a Oticon deu uma grande virada. A nova abordagem promoveu um intenso
compartilhamento do conhecimento, produzindo uma torrente de inovações nos
produtos e uma redução de 50 por cento no tempo de desenvolvimento deles.
Durante a década de 1990, a empresa teve um aumento significativo nas vendas,
nas margens de lucro e na rentabilidade. No entanto, após 1996, a Oticon fez
uma revisão dessa abordagem radical “de cima para baixo”, visando evitar uma
série de custos e imprevistos decorrentes de problemas na coordenação e distri‑
47
buição do tempo dos empregados e da necessidade de intervenção dos gestores
após a aprovação dos projetos, o que provocava uma séria perda de motivação.

Novas condições, nova organização


A direção procurou também alinhar as iniciativas relacionadas a novos projetos
aos objetivos estratégicos da empresa. O Capítulo 16 discute as implicações des‑
se caso para o design organizacional.

Fontes: LABARRE, Polly. This organization is dis­‑organization. The Fast Manager, Jun./Jul. 1996.
Disponível em <http://www.fastcompany.com/magazine/03/oticon.html>; FOSS, Nicolai J. Se­
lective intervention and internal hybrids: interpreting and learning from the rise and decline
of the Oticon spaghetti organization. Organization Science, 14(3), p. 331­‑349, 2003. Disponível
em: <http://www.oticon.com>.

redes externas quando uma combinação de economia e possibilidade


tecnológica for atrativa. Considerando que a TIC permite mais inter‑
dependência em termos de processamento de informação, para que ela
funcione efetivamente são necessários novos suportes organizacionais,
como práticas que promovem a coordenação e a confiança entre os
membros da rede.
A interdependência entre firmas apresenta várias demandas novas
em termos de organização. Qual o nível de coordenação necessário para
se criar uma rede, de modo que todos os seus participantes contribu‑
am adequadamente para uma atuação coletiva eficiente no atendimento
às demandas do cliente? Como conectar de maneira apropriada as dife‑
rentes unidades? Até que ponto o desejo dessas unidades de coordenar
e cooperar pode ser enfraquecido pela perda de identidade corporativa
comum quando os principais componentes do negócio são externaliza‑
dos? Podem os novos processos organizacionais manter pelo menos parte
da identidade comum? Até que ponto a cooperação de natureza virtual
exige suporte organizacional – tais como protocolos padrão de dados e

Book_Organizaçoes.indb 47 16/9/2011 16:23:22


assistência para coordenar operações em diferentes fusos horários – para
compensar a falta de proximidade física?
A necessidade de integrar atividades interdependentes também está
presente em uma corporação grande e diversificada, embora os meios pe‑
los quais isso ocorre sejam de natureza mais convencional. Nesse sentido,
é interessante fazer distinção entre interdependência externa e interna.
A externa existe quando uma empresa opera com uma rede externa e a
interna quando uma empresa é diversificada e/ou requer um alto grau
48
de integração vertical ao longo de sua cadeia de valor. Opiniões recentes
argumentam que a solução da rede externa, combinando a internalização
parte i  panorama geral

das competências­‑chave com a externalização de outras atividades, é ge‑


ralmente superior à interdependência e à diversificação internas.
A combinação entre globalização e as possibilidades criadas pelas
novas tecnologias de comunicação apresenta uma dificuldade adicional
que o design organizacional deve resolver: a velocidade. Mais velocidade
passou a caracterizar virtualmente todos os aspectos do funcionamento
organizacional – da comunicação interna ao intercâmbio competitivo,
passando pelo desenvolvimento de produtos. As mudanças nas condi‑
ções estratégicas também se aceleraram, pois as barreiras informais para
a entrada em novos mercados foram reduzidas em função da crescente
simplificação da comunicação de longa distância.
Com mais velocidade no ambiente, aumenta a imprevisibilidade
ou a volatilidade dos eventos aos quais as organizações devem reagir.
Isso é evidente quando o investimento de capital pode cruzar fronteiras
de forma rápida e com custo baixo, alterando a configuração das ca‑
deias de fornecimento e de competição no mercado. Da mesma forma,
a simplicidade com que as ações das empresas podem ser compradas e
vendidas internacionalmente por meio de transações eletrônicas deixou
as empresas mais vulneráveis a ataques visando a tomada do controle
acionário. Uma terceira consequência da velocidade é reduzir o tem‑
po necessário de resposta a um estímulo, mesmo das atividades mais
triviais da organização. Assim, as empresas estão experimentando ou‑
tras formas de aproveitamento do tempo: por exemplo, um grupo de
trabalho sediado na Índia desenvolve uma programação de softwares,
manda­‑o para outro grupo nos Estados Unidos, que por sua vez envia­‑o
novamente para o grupo indiano.30
Para lidar com a alta velocidade e tomar decisões estratégicas com a
rapidez correspondente, as empresas devem se organizar de modo a suprir

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os tomadores de decisões com mais informações e com mais capacidade
para desenvolver diferentes alternativas, além de promover a integração
e a solução de conflitos entre esses indivíduos. Esses são alguns dos requi‑
sitos necessários para o sucesso em um ambiente caracterizado pela alta
velocidade.31

2.2.3 A economia com base no conhecimento


49
O FENÔMENO
Em função das novas tecnologias e novos padrões de demanda, uma

Novas condições, nova organização


mudança fundamental na base da criação de valor está ocorrendo. Cada
vez mais o valor é criado por meio do processamento de fluxos de infor‑
mação e conhecimento em vez de processamento de fluxos de materiais.
O valor criado pela manufatura e produção representa parcelas cada vez
menores do valor agregado de uma organização, alterando assim a natu‑
reza das contingências críticas ali existentes.32 Consequentemente, orga‑
nizar para maximizar a eficiência da produção está se tornando cada vez
menos importante para o desempenho econômico. Isso acontece, particu‑
larmente, em países como os Estados Unidos, em que é o conhecimento,
e não o baixo custo do processamento de materiais, que proporciona aos
principais setores econômicos a necessária competitividade. A Tabela 2.2
mostra a mudança permanente – trabalho com base no conhecimento –
no perfil do emprego nos Estados Unidos.33 Cada vez mais o trabalho
deixa de ser apenas um trabalho de produção, em que matérias­‑primas
são transformadas em produtos acabados, para ser um trabalho com base
no conhecimento, em que as atividades relacionam­‑se à criação e à distri‑
buição de informação.
Naturalmente, isso não significa o fim da produção em massa e de
baixo custo, mas sim a transferência dessas atividades para países em
desenvolvimento recentemente industrializados. A produção das empre‑
sas de nações desenvolvidas está sendo cada vez mais terceirizada para
os países em desenvolvimento (veja Capítulo 8), e as empresas locais, de
países como a China, tornam­‑se cada vez mais competitivas em termos
de custo e preço. Deve­‑se destacar que o tempo que essas empresas le‑
vam para aprender as tecnologias de maior valor agregado e know­‑how
é cada vez mais reduzido. As empresas chinesas em setores como a fabri‑
cação de computadores pessoais e eletrodomésticos da linha branca já
são competidoras mundiais. Além dos custos mais baixos, o aprendizado

Book_Organizaçoes.indb 49 16/9/2011 16:23:22


e a capacidade de atualização rápidas são as principais forças que têm
intensificado a competição global. Isso significa que os concorrentes já
estabelecidos no mercado devem aprender como obter vantagens (de dife‑
renciação) baseadas na inovação e customização e como combiná­‑las de
forma a oferecer a melhor relação custo­‑benefício.
Paralelamente à mudança em direção a um trabalho cuja base é o
conhecimento, há um aumento do número de trabalhadores do conhe‑
cimento. A Tabela 2.2 mostra que os trabalhadores especializados e
50
técnicos constituem o grupo que mais cresce na força de trabalho norte­
‑americana. Há dúvidas se os trabalhadores assim classificados são real‑
parte i  panorama geral

mente altamente capacitados e não meros processadores de informação.34


No entanto, é certo que pessoas altamente qualificadas são encontradas
em áreas como pesquisa e desenvolvimento (P&D), engenharia, jurídica
e em outras unidades especializadas das empresas; em um crescente nú‑
mero de organizações de serviços como consultoria, contabilidade, as‑
sessoria jurídica e pesquisa de mercado; e também em departamentos
especializados do serviço público.35
A posse de conhecimento superior e a habilidade da organização em
utilizá­‑lo tornaram­‑se uma das últimas vantagens competitivas inimitá‑
veis que a empresa pode ter. Consequentemente, tem havido uma acelera‑
ção constante do ritmo em que as empresas precisam aprender. A corrida
para ganhar vantagem por meio do aprendizado promoveu crescimen‑
to dos relacionamentos entre as empresas e também dentro delas, espe‑
cialmente em setores como a biotecnologia, em que novas descobertas e
avanços da ciência frequentemente disseminam­‑se para um grande nú‑
mero de novos empreendimentos. Muitas empresas têm, há algum tem‑
po, utilizado alianças com outras empresas e institutos de pesquisa para
acelerar o processo de aprendizado. Em meados dos anos 1980 a Toyota
aprendeu como gerenciar a mão de obra americana e a vender para o
consumidor americano, formando a NUMMI, uma joint venture com a
General Motors. Mais recentemente, o uso da TIC para apoiar as comu‑
nicações internacionais entre os membros de equipes virtuais acelerou a
transferência de conhecimento e o aprendizado. A habilidade em adquirir
e assimilar um conhecimento novo e relevante de forma rápida e eficiente
reduz uma importante barreira intangível à entrada em um dado mercado
e, sendo assim, uma posição consolidada em certos mercados – produto
ou geográfico – é cada vez menos uma garantia para o futuro. Em alguns
casos, como o da Amazon.com, a Internet permitiu que novas empresas

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Tabela 2.2  O movimento de intensificação do conhecimento na
economia americana: porcentagem de trabalhadores do conhecimento
por grupos ocupacionais

2008
Grupo ocupacional (%) 1988 1998
(previsão)
Executivos, gerentes 10,3 10,5 10,7
Especialistas, técnicos 15,7 17,6 19,4 51

Vendas, apoio administrativo 28,8 28,3 27,6

Novas condições, nova organização


Total dos trabalhadores do
54,8 56,4 57,7
conhecimento

Fonte: US Bureau of Labor Statistics.

“born global”* tivessem acesso aos mercados e inputs mundiais de uma


maneira que não seria possível há poucos anos.

IMPLICAÇÕES PARA A ORGANIZAÇÃO


Para a organização, o crescimento da economia do conhecimento
teve implicações importantes, surgidas de duas necessidades interligadas:
motivar os indivíduos a colaborar entusiasticamente com o processo de
geração do conhecimento organizacional e criar arranjos organizacionais
para apoiar os diversos tipos de processo de aprendizado organizacional.
Em relação à motivação, muitos profissionais e outros especialistas
parecem responder muito bem aos arranjos organizacionais derivados do
modelo tradicional, mas que são também, em certos aspectos, análogos à
forma “orgânica”. Tais arranjos são caracterizados por um alto nível de
autogestão no trabalho cotidiano em que se aplicam capacidade crítica,
participação no estabelecimento de normas e critérios de desempenho,
troca de informações com outros especialistas (em geral, grupos ou equi‑
pes) e existência de oportunidades atraentes de carreira baseadas no de‑
sempenho competitivo. Ao passo que uma forma de gestão organizacional

* A expressão “born global” refere­‑se a empresas que são globais desde o momento
de sua criação.

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hierárquica convencional por não especialistas pode afastar muitos tra‑
balhadores do conhecimento, essas formas alternativas, provenientes,
pelo menos em parte da tradição profissional, podem mobilizar melhor
as identidades sociais profissionais para atender às metas corporativas.36
Como acontece frequentemente com a organização, os requisitos
para apoiar os processos de aprendizado apresentam um dilema do pon‑
to de vista do design, porque a capacidade de competir com base nos
ativos intelectuais em vez de materiais pode implicar tanto na explo‑
52
ração efetiva do conhecimento existente como na exploração criativa
de novas possibilidades.37 A primeira diz respeito a uma capacidade de
parte i  panorama geral

adaptar o conhecimento existente e rotinas no sentido de melhorar am‑


bos, enquanto a última tem a ver com uma capacidade de inovar. O uso
de alternativas conhecidas pode servir para o melhor aproveitamento do
conhecimento existente, mas incorre no risco de estimular a passivida‑
de e o conformismo, resultando assim no enfraquecimento da cultura
de divergência que proporciona um clima fértil para a criatividade. A
exploração do conhecimento existente não pressupõe necessariamente
a contribuição dos trabalhadores do conhecimento, podendo estar atre‑
lada à experiência operacional de empregados menos habilitados. Na
organizacão, essa abordagem requer procedimentos que definam o bom
desempenho em relação a aperfeiçoamentos progressivos na esfera do
fazer – o que Argyris e Schön chamaram de “aprendizado single­‑loop”.38
Esses procedimentos incluem grupos de discussão e programas de suges‑
tões para trazer à tona o conhecimento tácito dos empregados e ainda
o estabelecimento de metas para o alcance de melhorias. Eles têm sido
usados por algumas empresas há muitos anos, embora nem sempre com
eficiência, mas podem facilmente ser inseridos em um design organiza‑
cional convencional.
Em compensação, a inovação – exploração de novas possibilidades
– pede modificações nos modos convencionais da organização, especial‑
mente no que diz respeito ao uso intensivo de equipes para estimular a
sinergia entre aqueles que podem contribuir com diferentes pontos de
vista e respectivos conhecimentos especializados para o processo criativo.
Como as novas possibilidades precisam ser reconhecidas antes de serem
exploradas, um processo de inovação bem­‑sucedido requer arranjos que
estimulem o reconhecimento dessas possibilidades o mais cedo possível.
Um exemplo desse tipo de abordagem ocorre por meio de uma definição
flexível de papéis e métodos de trabalho, facilitando, assim, a ampliação

Book_Organizaçoes.indb 52 16/9/2011 16:23:22


casual da rede com contatos externos por pessoas de todos os níveis da
organização. Outro exemplo é o incentivo à comunicação aberta entre
as diferentes partes da organização, chegando­‑se até mesmo ao ponto de
criar um certo grau de redundância das informações.
Em outras palavras, tanto a manutenção de uma variedade suficiente
de especialistas (diferenciação) como a sua integração são políticas or‑
ganizacionais decisivas para a exploração de novas possibilidades.39 O
trabalho de equipes interdisciplinares é a maneira preferida para aten‑
53
der a esses requisitos. As equipes envolvidas devem também possuir um
grau considerável de autonomia para tomar a iniciativa no que fazem

Novas condições, nova organização


e propõem, de modo que sua criatividade não seja reprimida. Esse tipo
de aprendizado está mais próximo do “aprendizado double­‑loop”, na
terminologia de Argyris e Schön, e não pode ser realizado no âmbito de
uma estrutura organizacional convencional que seja hierárquica e extre‑
mamente dependente de regras e procedimentos estabelecidos.

2.2.4 Hipercompetição
O FENÔMENO
As novas tecnologias e a explosão do conhecimento deram origem a
uma enorme onda de inovações que está redefinindo os mercados, crian‑
do novas necessidades para o consumidor. Os limites das indústrias, que
antes eram claros e relativamente fixos, foram erodidos. Como já não
podem mais contar com o auxílio de barreiras protecionistas ou basear­
‑se em antigos pressupostos, as pressões para que as empresas se mostrem
flexíveis na reação aos acontecimentos e proativas na identificação de
opções para o futuro têm aumentado expressivamente. As condições sob
as quais muitas empresas operam hoje resultam no que tem sido chamado
de “hipercompetição”.40 Tal expressão foi cunhada de modo a apreen‑
der a essência da competição intensa e a consequente incerteza vividas
por muitas empresas atualmente. A hipercompetição é caracterizada por
“mercados em clima de plena incerteza, diversidade de atores globais,
rápida mudança tecnológica, guerras de preços e reorganização aparen‑
temente interminável”.41 Ela é, ao mesmo tempo, causa e consequência
de outras mudanças no mundo dos negócios, tais como a globalização, a
liberalização do comércio e a rápida mudança tecnológica. Além disso, a
hipercompetição é exacerbada por outras forças, como as alterações cons‑
tantes nas estruturas etárias das populações, a rápida industrialização e a

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urbanização. Juntos, esses fatores têm remodelado o panorama da com‑
petição em todo o mundo.
Mesmo sem compreendermos tudo desse novo ambiente da compe‑
tição, suas diferenças em relação ao passado e suas implicações para a
estratégia e a organização das empresas começam a tornar­‑se percep‑
tíveis. A sobrevivência de uma empresa já não é mais garantida sim‑
plesmente pela seleção de um setor de alta lucratividade e pela defesa
contra a entrada de novos concorrentes. A velocidade da mudança das
54
condições competitivas está mudando, incluindo a entrada de novos
concorrentes, e é tão rápida que talvez nem faça muito sentido definir
parte i  panorama geral

o que e um mercado atraente. Na verdade, esse ônus recai sobre a ca‑


pacidade das próprias empresas de desenvolver e explorar novas habi‑
lidades que as tornarão mais atrativas para o mercado. Essencialmente,
tal fato pede uma estratégia mais agressiva e próativa das empresas no
sentido de atacar os pontos fortes de seus competidores e seguir em
frente antes que eles possam alcançá­‑las. Também pede a busca per‑
manente de oportunidades que possam estimular as competências da
companhia, de modo a contribuir para seu avanço em novas áreas de
negócios.
A implicação para o modo de organização é a necessidade de per‑
mitir, ou melhor, de estimular a reconfiguração espontânea, em vez de
tolerar forças que resistam à mudança e promovam a rigidez. É muito
importante a auto­‑organização, isto é, a capacidade de ser espontâneo
e adaptável, a facilidade de absorver eventos aleatórios, e a descoberta
por conta própria de alternativas criativas. A organização está sendo im‑
pelida a lidar com os paradoxos que uma política de adaptação criativa
tem de resolver, porém sem poder contar com o luxo do tempo e outros
recursos. Isso é pedir muito e significa, entre outras coisas, encontrar for‑
mas de diferenciar e integrar simultaneamente as atividades, sempre frag‑
mentando e recombinando equipes e unidades de trabalho, estimulando
a experimentação sem deixar de manter o controle.
O Vale do Silício é considerado um precursor dos ambientes empre‑
sariais hipercompetitivos, de alta velocidade, que hoje estão se tornando
a norma. Nas palavras de Homa Bahrami e Styart Evans:

As empresas de alta tecnologia no Vale do Silício prosperam num ambien‑


te em constante mutação e de inovações incessantes, que servem de com‑
bustível para suas trajetórias de crescimento fugaz e, às vezes, espetacular.

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Esse ambiente singular é caracterizado por oportunidades voláteis, alte‑
rações constantes das preferências do consumidor, enxurrada de inova‑
ções tecnológicas, produtos com ciclos de vida brutalmente curtos e uma
furiosa competição global. Coletivamente, essas forças resultam em uma
infinita corrente de mudanças caleidoscópicas que podem estimular o rá‑
pido crescimento de uma empresa e também instigar sua morte súbita.42

No início dos anos 1970, as condições competitivas na indústria da


55
computação já estavam mudando de modo notável. O ritmo da intro‑

Novas condições, nova organização


dução de novos produtos se acelerava ao mesmo tempo em que se au‑
mentava o custo do desenvolvimento de novos produtos. Isso obrigou
as empresas a se concentrarem no que faziam melhor e a adquirirem o
restante dos inputs necessários de uma rede cada vez mais densa de for‑
necedores (regionais ou não). O enfoque na especialização e a capacidade
de confiar em fornecedores igualmente dedicados permitiu que empre‑
sas como a Sun Microsystems introduzissem novos produtos em ritmo
acelerado, mantendo­‑se à frente dos imitadores. Essa estratégia exigiu
mudanças na maneira como as empresas administravam suas fronteiras,
de modo a desenvolver relações mais estreitas e de longo prazo com os
fornecedores, chegando até mesmo ao considerável desenvolvimento em
conjunto.43 Ao mesmo tempo, a disponibilidade de capital para investi‑
mento, mobilidade de engenheiros e gerentes experientes, e uma imensa
rede de contatos mantiveram a flexibilidade e a competição intensa que
caracterizaram o ecossistema do Vale do Silício.

IMPLICAÇÕES PARA A ORGANIZAÇÃO


A hipercompetição impõe novas demandas à empresa sobre como
deve se organizar para sobreviver. A palavra­‑chave é flexibilidade, ou
seja, as estratégias, a alocação de competências e as atividades devem
ser reformuladas a fim de antecipar novas ameaças e oportunidades re‑
sultantes da competição. A ideia de “empresa flexível” surgiu dessas ne‑
cessidades.44 É preciso um modo de organizar que estimule a iniciativa e
a inovação para manter a vantagem estratégica sobre os concorrentes. A
simples adaptação como resposta aos acontecimentos não basta para a
empresa sobreviver sob as condições da hipercompetição.
A complexidade e a velocidade que acompanham a globaliza‑
ção e a hipercompetição significam que as empresas devem aprender

Book_Organizaçoes.indb 55 16/9/2011 16:23:23


a organizar seu trabalho de maneira a permitir ajustes rápidos e fre‑
quentes, informando­‑se sobre o mercado externo e as condições técni‑
cas e reguladoras. Isso não significa manter­‑se atualizado apenas, mas
antecipar novos direcionamentos. A inovação e a mudança podem vir
de praticamente qualquer lado, de um horizonte bem mais amplo. Em
mercados globais abertos, isso se aplica igualmente aos novos pedidos
de clientes e aos concorrentes. Cada vez mais a globalização e as novas
tecnologias estão reduzindo o protecionismo de alguns tradicionais ni‑
56
chos de mercado e as barreiras à entrada de novas empresas em setores
já estabelecidos.
parte i  panorama geral

Para a maior parte das empresas, não há mais a antiga estabilidade


associada a burocracias indestrutíveis, endossada por uma posição do‑
minante no mercado e pelo capital acumulado no passado. Praticamente
tudo, na atual conjuntura, requer a capacidade de reconstruir processos
e resultados com frequência cada vez maior diante de rápidas mudanças.
Um dos maiores contrastes entre as ideias convencionais sobre as organi‑
zações e os modelos mais recentes é que os primeiros não questionam a
mudança. As organizações, no passado, eram concebidas como estrutu‑
ras estáveis planejadas para absorver a incerteza. Hoje, contudo, os estu‑
diosos sugerem que a flexibilidade e a capacidade de lidar com a mudança
constante são requisitos indispensáveis na nova organização.45
A flexibilidade inovadora exige que as atividades e recursos para
apoiá­‑la sejam reconfigurados espontaneamente. Novas configurações
não podem esperar a aprovação da cúpula da empresa. Talvez não seja
simples conciliar esse alto grau de autonomia descentralizada e “auto­
‑organização” com as disciplinas convencionais da alocação de recursos
e controle coordenado. A rigidez que tende a acompanhar práticas tra‑
dicionais, como o orçamento, pode não ser funcional para o desenvolvi‑
mento da capacidade para se lidar com as novas incertezas de maneira
flexível e inovadora. Uma das maneiras de lidar com essa potencial ten‑
são é a empresa criar uma bifurcação de suas formas organizacionais,
operando seu core business por meio do método convencional de orga‑
nização enquanto aplica uma forma bem mais livre às atividades em que
deseja ter flexibilidade de reação às condições hipercompetitivas. Essa foi
a abordagem adotada por duas companhias regionais da Bell Telephone
(veja o Quadro 2.3).
Lidar com a hipercompetição requer uma excepcional capacidade
de aprendizado da empresa. Em muitos setores, nos quais determinadas

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Quadro 2.3  Ajuste para a hipercompetição

Em janeiro de 1984, sete novas corporações surgiram da AT&T – eram as novas


companhias de telecomunicações regionais norte­‑americanas, conhecidas como
“Baby Bells”. Grande parte de seu negócio estava focado inicialmente em serviços
de telefonia local, e seu monopólio era bastante regulado. Contudo, no início dos
anos 1990, esses serviços locais enfrentaram expressivas mudanças e as empresas
já percebiam os indícios claros das iminentes condições hipercompetitivas. Novos
agentes com grande potencial competitivo emergiam na forma de empresas de 57
telefonia de longa distância, sem fio e a cabo, garantindo novas licenças, colabo‑

Novas condições, nova organização


rando além das tradicionais fronteiras do setor e desenvolvendo novas networks.
Duas das Baby Bells responderam a esse desafio por meio da flexibilidade estratégi‑
ca em uma das áreas não reguladas – a esfera internacional. Para isso, desenvolve‑
ram algumas capacidades nas atividades internacionais, separadas das atividades
de seus serviços locais. Com a crescente ameaça das condições hipercompetitivas
no fornecimento do serviço de telefonia local tradicional, as empresas integra‑
ram as novas capacidades adquiridas com as iniciativas internacionais em toda a
organização.
Essas novas capacidades foram geradas por meio de uma organização flexível. A
administração passou a experimentar, na base da tentativa e erro, uma enorme
variedade de projetos internacionais, em áreas como sistemas de satélite e digi‑
tais, caixas postais (voice mail), edifícios inteligentes e mensagens. Os gerentes
que encabeçavam esses experimentos eram ambiciosos e nada convencionais
– chamados de “radicais” e “renegados” –, e tinham bastante poder de decisão.
Muitas vezes negociavam com parceiros locais que tinham expertise relevante
ou contatos. Cada projeto, entretanto, era em pequena escala e, em geral, não
impunha grande risco para as empresas.
O aprendizado foi essencial para o sucesso nessa área de operações altamen‑
te empreendedora e não regulamentada. Os administradores dessas iniciativas
internacionais tiveram de aprender rapidamente a firmar novos contratos, lidar
com as parcerias internacionais e operar os novos sistemas e redes de teleco‑
municações. Tiveram também de aprender a trabalhar sem uma equipe de apoio
burocrático, típica das operações norte­‑americanas das empresas, e a comparti‑
lhar o conhecimento adquirido entre os diferentes projetos. Tudo isso exigiu um
modo de organização e de trabalho nada convencionais.

Fonte: SMITH, Anne D; ZEITHAML, Carl. Garbage cans and advancing hypercompetition: the crea­
tion and exploitation of new capabilities and strategic flexibility in two regional Bell operating
companies. Organization Science, 7, p. 388­‑399, 1996.

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habilidades podem ser adquiridas no mercado, a capacidade de aprender
como combinar essas habilidades de maneira inovadora e singular, de modo
a enfrentar as novas oportunidades e ameaças, continuam a ser a única
vantagem competitiva sustentável à disposição das empresas.46 O segredo
do sucesso de uma empresa sob a hipercompetição é manter­‑se à frente do
jogo e mobilizar os recursos disponíveis de maneira mais eficiente do que a
concorrência. A experiência tem deixado muito claro que a maneira como
as pessoas e as atividades são organizadas e gerenciadas pode ter grande
58
influência sobre a eficácia com que elas aprendem enquanto unidade.47
parte i  panorama geral

2.2.5 Demandas por responsabilidade social


O FENÔMENO
Enquanto poucas empresas, incluindo as mais fortes, são capazes de
evitar o impacto de turbulentos ambientes hipercompetitivos, torna­‑se evi‑
dente que significativas assimetrias de poder econômico estão emergindo
entre vencedores e perdedores do jogo. As pressões competitivas estimulam
as empresas a se unirem por meio de fusões, aquisições e alianças, e o resul‑
tado é que os ativos e os rendimentos das grandes corporações têm aumen‑
tado. Mais uma vez estamos lidando com um paradoxo. Em meio à busca
pela “beleza” da pequenez na organização, a tendência para a consolida‑
ção continua rápida entre os “500” da revista Fortune. O crescimento de
megaempresas globais foi um fenômeno decisivo no final do século XX e
parece continuar, apesar de certo abrandamento no início do novo milênio.
Ironicamente, uma das forças que têm levado os administradores corpora‑
tivos a consolidar ativos e sua participação no mercado é a intensidade da
competição e o medo do fracasso. Ao mesmo tempo em que as empresas se
tornam maiores, competem com mais ferocidade e em um terreno global
mais amplo. A pressão sobre as pequenas empresas para unir­‑se às maiores
ou então serem extintas é intensa em muitos setores da “velha economia”,
mesmo quando as iniciantes injetam sangue novo na economia.
Essa tendência de se ter megaempresas globais gera uma crescente
assimetria de poder entre os agentes das grandes corporações e a maioria
dos outros grupos sociais, como consumidores, empregados e membros
das comunidades locais em que as fábricas dessas empresas estão locali‑
zadas. As corporações multinacionais (CMNs) são acusadas, com alguma
justificativa, de moldar indevidamente as políticas públicas por meio de
sua influência sobre a política nacional e instituições supranacionais como

Book_Organizaçoes.indb 58 16/9/2011 16:23:23


a Organização Mundial do Comércio (OMC).48 As ONGs tornaram­‑se
uma força significativa de protesto contra o que veem como uma ameaça
aos valores e direitos humanos básicos, imposta pela globalização por
meio das ações das multinacionais e seus fornecedores. O desenvolvimen‑
to da internet e outros meios de comunicação de massa ajudou na mobi‑
lização e coordenação de grupos dissidentes por todo o mundo. É irônico
que os críticos da globalização tenham dominado a nova tecnologia, um
de seus principais facilitadores, para a ela se oporem.
59
Os avanços na TIC facilitaram a administração de operações à distân‑
cia e permitiram ainda um desvio dos vínculos geográficos e culturais das

Novas condições, nova organização


organizações. Isso cria tensões acerca das ideias convencionais sobre os re‑
lacionamentos entre o mundo empresarial e a sociedade de modo geral. As
corporações que operam por meio de extensas redes e supply chains estão
sendo criticadas por todo tipo de fenômeno social negativo, do trabalho in‑
fantil à perda da coesão social.49 Um dos desafios que estão emergindo para
a organização é o da governança no sentido mais amplo: como combinar
os benefícios de alcance e de escala globais com a responsabilidade efetiva
em relação aos interesses locais das sociedades em que as empresas operam.
A questão da governança tem crescido em virtude da séria perda
de confiança nas empresas e em seus gestores. Diversos progressos re‑
lacionados à globalização, às novas tecnologias e à hipercompetição
contribuíram para esse problema. O Capítulo 15 menciona o rompi‑
mento da confiança quando, nos anos 1990, aumentou o número de
empregados marginalizados pelo downsizing, pela terceirização de ati‑
vidades não essenciais e pelo fim dos contratos de emprego de longo
prazo e benefícios. Essas tendências se explicam como uma reação às
pressões da competição, que foram facilitadas pela introdução da TIC,
com a qual a comunicação passou a ser direta, em vez de ser feita
por intermediários e por gerentes de nível médio. Elas fazem parte da
mudança para formas organizacionais mais enxutas, que aumentam
a flexibilidade por meio da terceirização de atividades em redes e da
redução do peso econômico decorrente de empregados diretos – o que
é financeiramente racional do ponto de vista do empregador, mas está
alterando o equilíbrio, sendo que empregados e ex­‑empregados estão
claramente em desvantagem. Ainda que muitos destes venham a encon‑
trar novas oportunidades como fornecedores ou autônomos, os custos
sociais desse ajuste em termos de perda de benefícios, estresse e pertur‑
bação doméstica são evidentes.

Book_Organizaçoes.indb 59 16/9/2011 16:23:23


A confiança do público nos gestores das corporações enfraqueceu ain‑
da mais frente aos escândalos corporativos que surgiram em 2001 e com
os novos casos que ainda aparecem. Muitos perderam não apenas seus
empregos e pensões, mas também sofreram como investidores, especial‑
mente aqueles que tinham ações das empresas afetadas. Essas transgres‑
sões levantam sérias questões relativas à necessidade de uma legislação
mais rígida sobre a responsabilidade e conduta dos altos executivos – o
que será discutido em detalhes no Capítulo 15.
60

IMPLICAÇÕES PARA A ORGANIZAÇÃO


parte i  panorama geral

Os custos sociais que são atribuídos às ações dos administradores


corporativos têm certa influência na organização, porque podem contri‑
buir para as injustiças percebidas. A organização tem duas faces: uma
é o sistema de alocação e administração do trabalho. Aqui, a forma or‑
ganizacional representa uma tecnologia necessária com um valor social
potencialmente positivo. A outra refere­‑se à organização como um meio
de diferenciação e alocação de poder e recompensa. Nesse sentido, a or‑
ganização é um mecanismo distributivo que está longe da neutralidade
social. A organização não pode ser apenas uma questão técnica, mas é
também usada para determinar retornos econômicos e outros (como a
realização pessoal no trabalho) recebidos pelos indivíduos. Uma con‑
sequência imediata de uma estrutura verticalizada nas corporações,
ou das distinções organizacionais entre as categorias dos empregados
– centro e periferia –, é a criação de diferenças significativas na compen‑
sação, nas oportunidades de progresso de carreira e outros benefícios.
Isso torna mais difícil o reconhecimento da responsabilidade e respeito
pela cúpula por parte dos membros de nível inferior da organização.
Um dos aspectos mais importantes das novas formas organizacionais
é a redução da distância hierárquica, com estruturas mais enxutas e a
devolução do poder de tomada de decisão e iniciativas a níveis inferiores
da organização. Espera­‑se que esse movimento reduza a distância e a de‑
sigualdade que os empregados sentem em relação aos altos executivos – o
que, se for acompanhado por mais circulação e transparência da informa‑
ção, poderá permitir ainda que os empregados tenham mais poder de voz
nas empresas para expor e corrigir as transgressões dos níveis mais altos
da gestão, por exemplo.
Naturalmente, os problemas sociais atribuídos às ações das empresas
levantam questões sobre sua responsabilidade social – ou melhor, a de

Book_Organizaçoes.indb 60 16/9/2011 16:23:23


seus executivos. Essa é a preocupação central da governança corporativa
e começa­‑se a perceber que a administração está relacionada à eficiência
de tal governança. A definição convencional e superficial de governança
corporativa enfoca o papel e os direitos da diretoria e outros grupos de
dirigir a organização em nome dos proprietários. As preocupações com
a responsabilidade social da empresa reforçaram a necessidade de uma
definição mais ampla da responsabilidade corporativa, incluindo os dife‑
rentes stakeholders: empregados, consumidores e membros das comuni‑
dades empenhados em proteger seu ambiente. Se aceita, essa visão mais 61

ampla da responsabilidade social significará que o processo da governan‑

Novas condições, nova organização


ça terá de ser estendido à administração e às redes de cadeia de valor de
uma empresa, de modo que se possa falar de responsabilidade mútua de
altos executivos, empregados e parceiros. Isso impõe novas exigências;
como por exemplo a necessidade de controle, que dependerá mais de va‑
lores compartilhados e do monitoramento livre de resultados por meio da
TIC, a fim de se manter uma conduta ética e socialmente responsável, sem
interferir, contudo, na criatividade e nas iniciativas locais. Além disso, o
ônus de assumir a responsabilidade pela conduta de todos os membros da
cadeia de valor recairá sobre as empresas líderes das redes empresariais, o
que vai bem além das obrigações contidas nos contratos comerciais.
Tradicionalmente, presume­‑se que a boa governança corporativa pos‑
sa ser implementada dentro da empresa por meio de controle e respon‑
sabilidade hierárquicos rigorosos. Portanto, a redução da hierarquização
requer novas formas de responsabilidade e controle para que a gover‑
nança seja preservada. O escândalo da Enron mostra a dificuldade en‑
frentada nesse aspecto, deixando em aberto uma questão: até que ponto
os problemas que surgiram na Enron podem ser atribuídos ao abranda‑
mento da responsabilidade, devido ao uso de formas não convencionais
da organização, envolvendo a descentralização da iniciativa e sistemas
extensivos de controle?

2.3 Novas condições, novas formas


organizacionais resumidas
Tendo em vista as mudanças significativas no ambiente empresa‑
rial, o potencial oferecido pelas novas formas organizacionais se tornou
uma grande preocupação para administradores e estudiosos da área. A
Tabela 2.3 resume as novas formas que parecem corresponder às novas

Book_Organizaçoes.indb 61 16/9/2011 16:23:23


Tabela 2.3  Resumo das novas condições e das novas formas
organizacionais

Novas condições Novas formas organizacionais


Ajuste à (1) necessidade de integração global por meio da
padronização, combinada com (2) a necessidade de sensibili‑
dade local por meio da flexibilidade
Globalização
Lidar com a complexidade por meio da (1) estratégia de redu‑
62
ção, para preservar as rotinas existentes, ou (2) estratégia de
absorção, mediante descentralização e parceria
parte i  panorama geral

Estruturas administrativas enxutas (menos níveis hierárqui‑


cos e mais horizontalizadas)
Maior interdependência entre as unidades (dentro e fora da
organização)
Redes e fronteiras indefinidas
Novas
Controle de ativos separado de seu uso
tecnologias
Uso de procedimentos de controle “remoto”
Sistemas de informação para decisões em situações que
mudam rapidamente
Apoio da gestão do conhecimento para a inovação e o apren‑
dizado organizacional
Procedimentos para incentivar a efetiva aplicação e explo‑
Sociedade baseada
ração da informação existente, em uma estrutura de design
no conhecimento
organizacional relativamente convencional (“adaptação”)
Sociedade Iniciativa descentralizada para equipes e redes visando pro‑
baseada no mover a colaboração criativa para a exploração de novas
conhecimento possibilidades (“inovação”)
A “empresa flexível”
Hipercompetição Organizar para maximizar o aprendizado organizacional, com
forte ênfase na inovação
Controles normativos apoiados pelo monitoramento do
comportamento
Responsabilidade
Gestão do comportamento dos integrantes da rede – além
social
e acima dos limites legais dos contratos – pelas empresas
líderes dessa rede

Book_Organizaçoes.indb 62 16/9/2011 16:23:23


condições que acabamos de discutir. Deve­‑se notar que boa parte da tabe‑
la é especulativa, enquanto esperamos por mais evidências, especialmente
no que tange à maneira pela qual a adaptação das novas formas às novas
condições impactará no desempenho.

2.4 Comparação entre formas organizacionais


novas e convencionais 63
O Capítulo 1 identificou os componentes estruturais, processuais e

Novas condições, nova organização


definidores de limites da organização e as escolhas essenciais relativas
a esses componentes. Esta seção compara as formas convencionais e
as novas em relação a esses mesmos componentes. A comparação é co‑
locada em contexto com o agrupamento desses componentes em três
conjuntos de atividades para os quais a organização é indispensável.
O primeiro grupo consiste em identificar, disseminar e implementar
as metas coletivas da unidade, seja empresa comercial ou instituição
sem fins lucrativos. Aqui a organização refere­‑se aos arranjos para a
geração de inputs no processo de tomada de decisão, à comunicação
das consequências das decisões e ao controle dos resultados. O segun‑
do grupo envolve identificar e tomar providências para a administra‑
ção dos direitos e funções (papéis) dos membros dentro da unidade
ou que trabalham em associação com ela. A administração estabelece
um padrão de especialização horizontal e vertical. O terceiro grupo
refere­‑se à manutenção do sistema para agregação de valores, princi‑
palmente regulação do fluxo de recursos entre as fronteiras organiza‑
cionais. Aqui entram em jogo os aspectos definidores dos limites da
organização.50
Usando esse framework, a comparação entre as novas formas organi‑
zacionais e as convencionais é mostrada na Tabela 2.4. Na verdade, como
veremos mais adiante, algumas empresas não precisam estar localizadas
em nenhum dos extremos apresentados; os perfis organizacionais que elas
adotam podem variar segundo as diferentes localizações ou especialida‑
des de trabalho. A opção por uma posição em determinada dimensão é
muitas vezes consistente com uma determinada posição em outra dimen‑
são. Por exemplo, basear­‑se na hierarquia para a manutenção das metas
organizacionais muitas vezes corresponde à formulação de regras.

Book_Organizaçoes.indb 63 16/9/2011 16:23:23


Tabela 2.4  Contrastes entre as formas organizacionais
convencionais e as novas

Componentes
Organização
organizacionais e Nova organização
convencional
atividade
Definição e disseminação de metas

64 Iniciativa e autoridade Iniciativa e autoridade


centralizadas distribuídas
Liderança por meio da Liderança por meio da
parte i  panorama geral

Hierarquia
autoridade formal orientação
Uso de canais Uso de equipes, com
hierárquicos menos níveis hierárquicos
Discricionário; orien‑
Mandatório; orientação
Regras e planos tação com base no
com base em regras
relacionamento
Descentralizado: baseado
Centralizado: pessoal ou
Controle nas metas, na cultura e/
com base em regras
ou no RH
Com base no nível hierár‑ Com base no desempenho
Recompensa
quico do indivíduo do grupo
Identificação de deveres e funções
Funções especializadas, Funções generalizadas,
claramente definidas indistintas
Especialização
Preferência por funções Preferência por funções
restritas mais amplas
Mais ênfase na
Forte ênfase na
Grau de integração diferenciação que
integração
na integração
Mantendo um sistema para agregação de valor
Orientados para reduzir a Orientados para indicar a
Sistemas
incerteza necessidade de mudança
Por meio de procedimen‑ Por meio do contato dire‑
Modo de integração
tos e regras to e da TIC
Apenas com os principais Com todos os integrantes
Redes
stakeholders da cadeia de valor

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Integração horizontal
Integração vertical em entre unidades menores;
Terceirização grandes unidades; pouca terceirização de ativida‑
terceirização des que não fazem parte
do core business
Evitadas por receio de
Alianças perda de controle e Amplamente usadas
conflitos
65
Conglomerado coordena‑ Complexa organização

Novas condições, nova organização


do vagamente do ponto multidimensional que
de vista financeiro ou busca obter simultanea­
Organização
por meio de uma divi‑ mente os benefícios da
transfronteiras
são internacional; inte‑ coordenação global e da
gração primordialmente iniciativa local; integração
verticalizada vertical e horizontal

2.4.1 Definição e disseminação das metas da


organização
As maneiras contrastantes com que a organização pode ser estrutu‑
rada para dar apoio ao estabelecimento e disseminação de metas recaem,
por um lado, sobre a hierarquia centralizada, de cima para baixo e, por
outro, sobre o trabalho de equipe descentralizado, de baixo para cima.
No modelo convencional, a visão da empresa é prescrita a partir da cúpu‑
la e disseminada para os níveis inferiores. Essa abordagem tem na hierar‑
quia a base para a autoridade, controle e coordenação; as recompensas se
baseiam primordialmente na posição do indivíduo nessa hierarquia. No
novo modelo organizacional, há arranjos para estimular a ampla partici‑
pação na definição da visão organizacional: é uma abordagem coletiva,
que depende da aceitação por todos de uma cultura comum da organi‑
zação, que é administrada e não imposta pelos níveis superiores. Nessa
segunda abordagem, equipes que aproximam as pessoas (horizontalmen‑
te) desempenham um papel muito mais importante na coordenação e na
tomada de decisão e são estimuladas a contribuir de maneira ativa no
processo de liderança por meio de iniciativas locais. É mais provável que
as recompensas sejam baseadas de forma significativa no desempenho do
grupo ou da equipe.

Book_Organizaçoes.indb 65 16/9/2011 16:23:24


A primeira abordagem está de acordo com a burocracia tradicional,
que pressupõe que quanto mais alta a posição dos administradores em
uma organização, mais informações terão, inclusive aquelas relacionadas
à definição de metas e à tomada de decisões. Em uma burocracia modelo,
cada nível da organização é responsável pela definição de metas e tomada
de decisão daquele nível e dos inferiores. Caracteristicamente, as metas
são estabelecidas pela equipe sênior e cumpridas por gerentes de linha.
Decisões que requerem ação coordenada entre as unidades são remetidas
66
aos níveis superiores da organização para serem resolvidas. A equipe sê‑
nior elabora as diretrizes para toda a empresa.
parte i  panorama geral

A vantagem de tal abordagem burocrática está em sua potencial eco‑


nomia de pessoal e tempo. Uma visão formulada de maneira centralizada
e difundida por uma hierarquia claramente definida não requer o esforço
de muita gente, podendo ser rapidamente implementada. Em compensa‑
ção, a alocação de pessoas para equipes pode afastá­‑las de suas atividades
normais. Além disso, as equipes custam tempo e dinheiro em ajustes até
mesmo antes de começarem a funcionar. A burocracia promete consis‑
tência na implementação e manutenção das metas da organização, que
poderiam ser ameaçadas por um alto grau de descentralização na inicia‑
tiva local. Parte da rigidez associada à definição de metas nas burocracias
pode ser compensada por esforços da cúpula para romper barreiras in‑
terpessoais e de comunicação que impedem uma participação mais ampla
no processo. Com isso, os gestores podem fazer esforços no sentido de
evitar que a cultura da organização tenha a conformidade ao modelo
como critério de desempenho, além de substituí­‑lo por critérios baseados
em metas que visem o futuro.51
Nas novas formas, a organização hierárquica dá lugar ao funcio‑
namento “horizontal”, reduzindo ao mínimo as atividades centrais da
organização e atribuindo outras responsabilidades a unidades semi­
‑independentes. Essa ideia se relaciona com a reengenharia, que conta
com processos multifuncionais, eliminação dos níveis hierárquicos e em‑
powerment.52 O objetivo é fazer com que as decisões sejam tomadas onde
estão o conhecimento e as informações relevantes, e, depois, usar a TIC
como fonte de apoio. Essa abordagem tem o benefício potencial de se
adaptar rapidamente a circunstâncias novas ou em alteração porque as
pessoas presentes no local podem tomar decisões importantes. Além do
mais, essa abordagem cria condições para que os membros da organiza‑
ção tenham a sensação de que eles próprios definem seus objetivos, em

Book_Organizaçoes.indb 66 16/9/2011 16:23:24


vez de sentirem que estes lhes são impostos. Isso aumenta o empenho das
pessoas na busca pelo sucesso de tais objetivos. Se além disso os membros
também tiverem conhecimento valioso ou acesso às fontes desse conhe‑
cimento, seu envolvimento nas decisões e nas propostas para inovação
seria, mais uma vez, vantajoso para a empresa.
Portanto, a abordagem convencional da definição e disseminação das
metas organizacionais está voltada para satisfazer as necessidades da efi‑
ciência. A nova abordagem visa corresponder às necessidades organiza‑
67
cionais de adaptação e inovação.

Novas condições, nova organização


2.4.2 Identificação de deveres e papéis
As abordagens novas e convencionais utilizadas para identificar de‑
veres e funções nas organizações também diferem em relação à especia‑
lização e à integração. A primeira escolha é entre organizar com clara
especificação das funções e departamentos diferenciados, porque isso
pode ser uma estrutura relativamente permanente, ou optar por uma
abordagem mais fluida. Nesta última, há tendência maior à flexibilidade
das funções, que são imprecisas e se sobrepõem umas às outras, de modo
que há mais ênfase na integração do que na clareza. O pressuposto básico
dessa alternativa é que as circunstâncias não permitirão que determinado
conjunto de funções tornem­‑se permanentes. Assim, ela visa manter a fle‑
xibilidade das funções para incentivar a cooperação e adaptação mútuas
entre as pessoas e evitar definições formais dessas funções, o que resulta‑
ria na inibição da iniciativa e da inovação.
As burocracias convencionais são organizadas para refletir o princípio
da especialização. As diversas funções da empresa – finanças, marketing,
produção, entre outras – são especializadas na fabricação eficiente de seus
produtos específicos e são todas coordenadas por gerentes gerais que, pelo
menos em teoria, exercem influência de comando e controle sobre tais
funções. Os defensores das novas formas organizacionais sugerem a alte‑
ração desse sistema elementar. Assim, no novo paradigma, a expectativa
de que os empregados respondam à autoridade hierárquica e cumpram
tarefas bem definidas é substituída pela priorização do comprometimento
e contribuição na qualidade de “membros de confiança” da organização.
Isso significa organizar para “tratar as pessoas mais como ativos a serem
desenvolvidos do que como custos a serem controlados e mais como re‑
cursos estratégicos renováveis do que peças substituíveis das operações”.53

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Os membros das novas formas organizacionais são cada vez mais respon‑
sáveis por funções mais amplas, embora menos definidas.
Se antes a posse de ativos e know­‑how era a questão mais importan‑
te para as organizações, nas estruturas atuais organizar para se criar co‑
nhecimento é tido como algo essencial, indicando grandes alterações nas
funções, tarefas e maneiras de integrar as atividades. Nonaka e Takeuchi
propõem uma forma de organização específica, o “hipertexto”, para fa‑
cilitar o processo de criação do conhecimento, unindo as vantagens da
68
estabilidade da forma funcional à flexibilidade estratégica de uma força­
‑tarefa horizontal e multifuncional, como estrutura paralela independente.
parte i  panorama geral

A forma funcional oferece a especialização ao passo que a sobreposição


da força­‑tarefa horizontal ajuda a unir e colocar em sinergia as possíveis
contribuições dos especialistas. Com base na experiência de empresas ja‑
ponesas inovadoras, como a Sharp, esta é apenas uma das muitas formas
organizacionais híbridas sugeridas para assegurar a polivalência, combi‑
nando a capacidade de inovar com a de operar de modo eficiente, para
explorar novas possibilidades e também o conhecimento já existente.54

2.4.3 Mantendo um sistema para agregar valor


A abordagem convencional de organização de um sistema que agre‑
gue valor utiliza unidades verticalmente integradas, geralmente de grande
porte, cuja integração depende significativamente de regras e procedi‑
mentos padronizados. A nova abordagem defende a terceirização de ati‑
vidades que não fazem parte do core business, baseando­‑se a cadeia de
valores em redes de unidades, ligadas por relacionamentos que podem ser
reformulados de modo flexível, conforme a mudança das circunstâncias.
As unidades verticalmente integradas têm geralmente limites claros e rela‑
tivamente fixos, que abrangem toda ou a maior parte da cadeia de valor.
São, normalmente, de propriedade legal unitária e, em geral, grandes. Na
burocracia típica, maior é melhor. Em compensação, as redes horizon‑
talmente integradas tenderão a ter limites menos definidos ou fixos entre
as unidades que as constituem. Essas unidades podem ser bem pequenas,
a menos que as economias de escala sejam importantes. Em uma rede,
haverá uma série de empresas de propriedades distintas, bem como algu‑
mas alianças estratégicas, cada uma com vários proprietários. Portanto, a
propriedade não coincide com a da cadeia de valores, contrariamente ao
que acontece com o modelo verticalmente integrado.

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A nova filosofia em torno das redes traduz a expectativa de que as
unidades constituintes sejam relativamente pequenas e se concentrem em
suas atividades essenciais para as quais desenvolveram uma competência
distinta. Essas unidades menores e especializadas respondem melhor às
exigências do mercado e se adaptam mais rapidamente a mudanças ex‑
ternas. Elas podem se organizar mais prontamente do que as grandes e
chegar a soluções criativas diante de grandes incertezas, o que fez com
que essa nova forma recebesse o nome de “organização caórdica” – capaz
69
de gerar a ordem a partir do caos.55
A abordagem convencional, que se baseia na integração vertical e

Novas condições, nova organização


padronização por meio de regras, possui algumas vantagens. Seus sis‑
temas são elaborados para reduzir as incertezas, assegurando que tanto
a estratégia como as operações de um sistema que agregue valor sejam
coerentes e unificadas. Primeiramente, embora uma rede mais aberta
possa indicar antecipadamente a necessidade de mudança, um dos pro‑
blemas das redes é a dificuldade em manter o consenso entre diferentes
parceiros em relação às metas e modos de operação em cada parceria.
Em segundo lugar, a abordagem convencional também deveria ajudar a
eliminar o desperdício decorrente das sobreposições e promover a oti‑
mização dos recursos. Em terceiro lugar, ela deveria ser mais econômica
no que se refere ao esforço gerencial, pois é uma entidade única em
oposição à ampla dispersão de diferentes unidades, todas contribuindo
para a cadeia de valores.
Inevitavelmente, há algumas desvantagens na organização conven‑
cional de sistemas que agregam valor. Essas desvantagens fornecem os
argumentos em favor da nova abordagem organizacional. A coordenação
vertical, de cima para baixo, baseada em regras padronizadas, apresen‑
tará dificuldades na adaptação frente às mudanças das circunstâncias, a
menos que possam ser previstas e incorporadas aos procedimentos padro‑
nizados da organização. A incorporação de todas ou quase todas as ativi‑
dades que agregam valor a uma mesma unidade organizacional significa
o abandono da especialização de atividades que representam competên‑
cias essenciais, assim como da terceirização de outras. A concentração do
capital em uma única fonte pode criar dificuldades no financiamento da
inovação oriundas de outras partes da cadeia de valor. A inovação tam‑
bém pode ser inibida no modelo organizacional verticalmente integrado
porque envolve poucos parceiros (ou nenhum) que podem proporcionar
novos conhecimentos e insights.

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A nova abordagem visa a uma otimização das contribuições ao sis‑
tema de agregação de valor, estimulando combinações e recombinações
flexíveis de relacionamentos inter e intraorganizacionais. Por vezes tais
relacionamentos são criados entre pequenas unidades, cada um trazendo
uma contribuição que pode ter como base sua única competência. De
modo geral, os argumentos em favor das novas formas organizacionais
priorizam a adaptação e a inovação como requisitos para a sobrevivência
da organização, mais do que a economia e a eficiência.
70
A tensão para manter os limites organizacionais – como responder à
pressão para ser, por um lado, coerente e eficiente e, por outro, adaptar­‑se
parte i  panorama geral

e ser inovador (flexível) – é fundamental. Bartlett e Ghoshal enfrentaram


essa questão no contexto da grande corporação multinacional diversifi‑
cada. A “solução transnacional” que eles apresentaram prevê o uso de
um formato de rede integrada, no qual o centro corporativo orienta o
processo de coordenação e cooperação entre as unidades subsidiárias em
um clima de tomada de decisão compartilhada. A solução transnacional
procura combinar a hierarquia com o trabalho em rede, ao mesmo tempo
em que mantém a criação do valor dentro da corporação.56
Os próximos capítulos abordarão as contribuições que as formas con‑
vencionais de organização continuam a oferecer, às vezes combinando­‑se
com as novas formas, inclusive na mesma empresa. Os gestores procuram
encontrar soluções organizacionais que satisfaçam diversas áreas de ativi‑
dade da mesma empresa, mas que podem ser diferentes umas das outras
segundo a função, a localização nacional (e, portanto, cultural), entre
outros fatores. Assim, conforme já observado, o design organizacional
deve ser suficientemente polivalente para apoiar a criação e a exploração
do conhecimento na mesma empresa.57 A contribuição contínua que as
formas organizacionais convencionais talvez possam oferecer em devidas
circunstâncias é um lembrete de que não devemos nos deixar levar pelo
entusiasmo e modismo em torno das novas formas organizacionais nem
pressupor que as antigas deixaram de ser relevantes.

Resumo
1. Muitos executivos e analistas acreditam que as formas convencionais
da organização não correspondem mais às exigências do presente.

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2. A burocracia tem sido a forma de organização convencional mais pro‑
eminente, com uma longa história de mais de 2000 anos. A burocracia
acumulou considerável experiência ao longo dos anos.

3. A crítica à burocracia cresceu a partir dos anos 1950. Inicialmente era


baseada na evidência de que a burocracia não funcionava muito bem, e
mais recentemente, no argumento de que até as burocracias bem dirigi‑
das são insuficientemente flexíveis para se adaptar às atuais condições
competitivas. 71

Novas condições, nova organização


4. Cada grande avanço no ambiente empresarial impõe novas exigências
à organização.

5. A globalização requer que as empresas mantenham a padronização


e a flexibilidade em uma mesma estrutura organizacional e, ao mesmo
tempo, aumenta a necessidade de organização das empresas no sentido
de lidar com a crescente complexidade da conjuntura. Para lidar com
a complexidade, uma opção é organizar­‑se numa tentativa de se redu‑
zir a complexidade; outra é organizar­‑se para absorver a complexidade
porque ela apresenta novas oportunidades, mantendo, assim, as alter‑
nativas em aberto.

6. Novas tecnologias abrem novas possibilidades organizacionais.


Internamente, elas permitem a simplificação das estruturas administrati‑
vas. Externamente, tornam mais fácil a administração dos fluxos de in‑
formação e os relacionamentos entre suas “fronteiras”, facilitando assim
as operações internacionais, a terceirização e a formação de redes.

7. A maior interdependência das empresas, estimulada pela globalização


e pelas novas tecnologias, impõe novas demandas à sua capacidade orga‑
nizacional. Em parte essas demandas resultam da complexidade adicional
decorrente das múltiplas transações, e em parte da maior velocidade de
mudança e de novos avanços associados ao processamento mais aberto e
mais intensivo da informação em todo o mundo.

8. A importância crescente da inovação como estratégia competitiva na


economia do conhecimento também pede modificações na organização,
especialmente com relação ao uso intensivo de equipes interdisciplinares.

Book_Organizaçoes.indb 71 16/9/2011 16:23:24


9. A hipercompetição exige que as empresas se organizem com flexibili‑
dade para se adaptarem antecipadamente às novas oportunidades e ame‑
aças da competição.

10. As pressões para mais responsabilidade social representam mais exi‑


gências para as organizações, especialmente no sentido de manter uma
conduta socialmente responsável nas redes empresariais.

11. Diferenças entre as novas formas organizacionais e as convencionais


72
podem ser extraídas de cada um dos componentes da organização apre‑
sentados no Capítulo 1.
parte i  panorama geral

Questões para discussão


1. Por que muitos acreditam que as formas convencionais de organização
já não atendem às exigências do presente?

2. Quais são as principais diferenças entre as novas formas organizacionais


e as convencionais? Como elas se relacionam com a distinção entre as
formas de organização mecanística e orgânica?

3. Discuta o significado da expressão “globalização” e sua importância para


a organização.

4. Quais são as implicações da tecnologia das comunicações e da


informação (TIC) para a organização?

5. O que você entende por “trabalhadores do conhecimento”? Que tipo de


arranjo organizacional seria melhor para eles?

6. Quais são os três conjuntos de atividades para os quais a organização é


essencial?

7. Qual é a importância das “duas faces” da organização?

Book_Organizaçoes.indb 72 16/9/2011 16:23:24


Notas
1. MOONEY, J. D; REILEY, C. A. Onward industry! The principles of organiza‑
tion and their significance to modern industry. New York: Harper, 1931.

2. WONG, F. Y. Human resource management in traditional China: an examina‑


tion of how imperial officials were recruited and its legacy (Tese de doutorado).
University of Hong Kong, 1997.

3. KIESER, Alfred. Rhetoric and myth in management fashion. Organization, 4, 73


p. 49­‑74, 1997.

Novas condições, nova organização


4. BLAU, Peter M. The dynamics of bureaucracy. Chicago: University of Chicago
Press, 1955; GOULDNER, Alvin W. Patterns of industrial bureaucracy. Chica‑
go: Free Press, 1954.

5. BURNS, Tom; STALKER, G. M. The management of innovation. London: Ta‑


vistock, 1961.

6. ARGYRIS, Chris. Personality and organization: the conflict between system


and the individual. New York: Harper & Row, 1957; BLAUNER, Robert. Alie‑
nation and freedom. Chicago: University of Chicago Press, 1964.

7. Por exemplo, DALTON, Melville. Men who manage. New York: John Wiley &
Sons, 1959.

8. BENSON, J. K. Innovation and crisis in organizational analysis. Sociological


Quarterly, 18, 1977, p. 3­‑16; PERROW, Charles. Complex organizations: a
critical essay. Glenview: Scott; Foresman, 1972.

9. Resenha em BURRELL, Gibson; MORGAN, Gareth. Sociological paradigms


and organizational analysis. London: Heinemann, 1979.

10. Por exemplo, CHILD, John. Organization, environment and performance: the
role of strategic choice. Sociology, 6, p. 1­‑22, 1972.

11. WEICK, Karl E. The social psychology of organizing. Reading: Addison­‑Wesley,


1969.

12. A discussão nesta seção foi extraída de CHILD, John; MCGRATH, Rita G.
Organizations unfettered: organizational form in an information intensive eco‑
nomy. Academy of Management Journal, 44, p. 1135­‑1148, 2001.

Book_Organizaçoes.indb 73 16/9/2011 16:23:24


13. MCGRATH, Rita G. Exploratory learning, adaptive capacity and the role of
managerial oversight. Academy of Management Journal, 44, p. 118­‑131, 2001.

14. BARTON, Dorothy Leonard. Core capabilities and core rigidities: a paradox
in managing new product development. Strategic Management Journal, 13, n.
especial, p. 111­‑125, 1992.

15. PETERS, Thomas J.; WATERMAN JR., Robert H. In search of excellence. New
York: Harper & Row, 1982.
74
16. NOHRIA, Nitin; ECCLES, Robert G. (Eds.) Networks and organizations. Bos‑
ton: Harvard Business School Press, 1992; HÄCKI, Remo; LIGHTON, Julian.
parte i  panorama geral

The future of the networked company. McKinsey Quarterly, n. 3, p. 26­‑39,


2001.

17. CHILD, John; FAULKNER, David. Strategies of cooperation. Oxford: Oxford


University Press, 1998.

18. Economist Intelligence Unit (EIU), em colaboração com Andersen Consulting.


Vision 2010. Designing tomorrow's organization. New York: EIU, 1997.

19. KEARNEY, A. T. Measuring globalization. Foreign Policy, p. 56­‑65, jan./fev.,


2001.

20. YIP, George S. Total global strategy: managing for worldwide competitive ad‑
vantage. Englewood Cliffs: Prentice­‑Hall, 1992.

21. What's at stake. How terrorism threatens the global economy. Business Week,
22 out. 2001, p. 22­‑25. Disponível em: <http://www.businessweek.com/maga‑
zine/content/01_43/b3754039.htm>.

22. RUGMAN, Alan. The end of globalization. London: Random House, 2000.

23. Ulrich Steger (Ed.) Discovering the new pattern of globalization. Ladenburg:
Gottlieb Daimler und Karl Benz­‑Stiftung, 1998.

24. CHILD, John; TSAI, Terence. The dynamic between firms' environmental strat‑
egies and institutional constraints in emerging economies. Journal of Manage‑
ment Studies, 2005.

25. Sobre a escolha entre reduzir ou absorver a complexidade, veja BOISOT, Max;
CHILD, John. Organizations as adaptative systems in complex environments:
the case of China. Organization Science, 10, p. 237­‑252, 1999.

26. HÄCKI; LIGHTON, 2001, op. cit.

Book_Organizaçoes.indb 74 16/9/2011 16:23:24


27. CHILD, John; LOVERIDGE, Ray. New technology in european services.
Oxford: Blackwell, 1990.

28. SCHUMPETER, Joseph. Business cycles. New York: McGraw­‑Hill, 1939.

29. WHITMAN, M. N. New world, new rules: the changing role of the american
corporation. Boston: Harvard Business School Press, 1999.

30. CHILD; MCGRATH, 2001, op. cit.


75
31. EISENHARDT, Kathleen M. Making fast strategic decisions in high­‑velocity
environments. Academy of Management Journal, 32, p. 543­‑576, 1989.

Novas condições, nova organização


32. QUINN, James B. Intelligent enterprise: a knowledge and service based para‑
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33. Devo esta informação a Rita McGrath.

34. THOMPSON, Paul; MCHUGH, David. Work organisations: a critical Intro‑


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35. Organization Studies, número especial sobre Knowledge and Professional Or‑
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40. D'AVENI, Richard A. Hypercompetition. New York: Free Press, 1994.

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43. SAXENIAN, Annalee. The origins and dynamics of production networks in
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BERDA, Henk W. Building the flexible firm. Oxford: Oxford University Press,
1998.

76 45. VOLBERDA, 1998, op. cit.

46. GRANT, Robert M. Prospering in dynamically competitive environments: or‑


parte i  panorama geral

ganizational capability as knowledge integration. Organization Science, 7, p.


375­‑ 387, 1996.

47. CHILD, John; HEAVENS, Sally J. The social constitution of organizations and
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48. MOKHIBER, Russell; WEISSMAN, Robert. Corporate predators. Monroe:


Common Courage Press, 1999.

49. Por exemplo, CARNOY, M. The family, flexible work and social cohesion at
risk. International Labour Review, 138, p. 411­‑429, 1999.

50. CHILD; MCGRATH, 2001, op. cit.

51. Para um exemplo de como uma grande corporação multinacional convencio‑


nalmente organizada foi capaz de adotar um processo eficaz para desenvolver
as metas corporativas, veja GALUNIC, D. Charles; EISENHARDT, Kathleen L.
Architectural innovation and modular organizational forms. Academy of Ma‑
nagement Journal, 44, p. 1.229­‑1.249, 2001.

52. HAMMER, Michael; CHAMPY, James. Reengineering the corporation: a ma‑


nifesto for business revolution. New York: Harper Business, 1993.

53. BARTLETT, Christopher A; CHOSHAL, Sumantra. Beyond strategy, structure,


systems to purpose, process, people: reflections on a voyage of discovery. In:
DUFFY, Paula B. (Ed.) The relevance of a decade: essays to mark the first ten
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Press, 1994. p. 323­‑ 345.

54. NONAKA, Ikujiro; TAKEUCHI, Mirotaka. The knowledge creating company:

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how japanese companies create the dynamics of innovation. New York: Oxford
University Press, 1995; TUSHMAN, Michael L.; O’REILLY III, Charles A. The
ambidextrous organization. California Management Review, 38, 1996, p. 8­‑30;
MARCH, James G. Exploration and exploitation in organizational learning.
Organization Science, 2, p. 71­‑87, 1991.

55. SENGE, Peter. Through the eye of the needle. In: GIBSON, Rowan (Ed.). Re‑
thinking the Future. London: Nicholas Brealey, p. 123­‑145, 1997.

56. GHOSHAL, Sumantra; BARTLETT, Christopher A. Managing across borders: 77


the transnational solution. 2. ed. Boston: Harvard Business School Press, 1998.

Novas condições, nova organização


57. TUSHMAN; O'REILLY III, 1996, op. cit.

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Book_Organizaçoes.indb 78 16/9/2011 16:23:24
PARTE II

NOVAS
FORMAS INTERNAS

Capítulo 3 Estruturas mais simples


Capítulo 4 Como obter a integração
Capítulo 5 Controle
Capítulo 6 Questões da recompensa
Capítulo 7 Sistemas de remuneração

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Capítulo 3
Estruturas mais simples

Conteúdo do capítulo
Este capítulo refere­‑se à hierarquia e às iniciativas para minimizá­‑la.
Começa observando como a hierarquia atraiu considerável crítica por
causa de seus efeitos negativos, embora continue sendo um aspecto
muito difundido na organização. A hierarquia foi a espinha dorsal das
formas convencionais da organização e até hoje continua a desempenhar
uma série de funções aparentemente indispensáveis. Ao mesmo tempo,
observamos que a hierarquia tem alguns aspectos bastante negativos.
A abordagem mais recente da organização busca reduzir a hierarquia e,
dessa forma, simplificar as estruturas organizacionais. Mais adiante, o
capítulo analisa as possibilidades de se obter estruturas mais simples com
o downsizing, a eliminação dos níveis hierárquicos e o uso de equipes. A
eliminação desses níveis é uma consequência do downsizing e reflete a
estreita associação entre o número de funcionários em uma empresa e a
extensão de sua hierarquia. A introdução de equipes pode ajudar a reduzir
o número de níveis hierárquicos, substituindo a coordenação vertical por
gerentes intermediários que coordenem diretamente e tomem decisões
dentro da própria equipe.

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3.1 Hierarquia
3.1.1 Onipresente, mas desprezada
A hierarquia passou a ser quase universalmente desprezada/insultada.
Como Elliot Jaques disse, “à primeira vista, pode parecer difícil elogiar a
hierarquia. Burocracia é uma palavra suja até mesmo entre os burocratas
e no mundo dos negócios a ideia comum é de que a hierarquia adminis‑
82 trativa mata a iniciativa, suprime a criatividade e que, portanto, seus dias
terminaram”.1 Contudo, apesar das tentativas de se afastar da hierarquia,
para a maioria das empresas que cresceram muito depois de uma fase
parte ii  novas formas internas

inicial pequena é muito difícil funcionar sem ela. Ricardo Semler alega
que sua empresa no Brasil acabou com a hierarquia e até a inverteu para
as decisões sobre aumentos salariais.2 A empresa de eletrodomésticos de
James Dyson tem a política de minimizar a hierarquia e as marca de sta‑
tus. Embora seja presidente e dono, Dyson diz que o que mais gosta é de
trabalhar com seus engenheiros.3 Essas são, entretanto, exceções, e não a
regra. O exemplo apresentado no Quadro 3.1 é uma indicação de quão
persistente é a hierarquia.
De fato, a hierarquia é onipresente no mundo natural e em toda a
sociedade humana. Embora algumas das razões para essa presença tão
difundida talvez não tenham a aprovação da sociedade contemporânea,
elas continuam válidas. Uma delas é a necessidade que as pessoas têm de
se sentirem mais importantes do que as outras. Assim, a hierarquia ofere‑
ce uma estrutura que satisfaz as necessidades de status e poder. Como se
fosse uma escada para níveis superiores, a hierarquia motiva as pessoas
a lutarem para chegar ao topo por meio da promoção ou do avanço na
carreira. Outra razão está na aceitação da ideia de que a hierarquia seria
uma consequência natural da liderança.
Outras razões para a hierarquia estão mais sintonizadas com o fun‑
cionamento eficaz de uma organização. Conforme aumenta o número de
pessoas trabalhando na organização, fica cada vez mais difícil manter a
coordenação e o controle adequados apenas com ajustes diretos entre os
funcionários. Inevitavelmente, as pessoas se dividirão em grupos para fazer
trabalhos diferentes, às vezes em locais distintos, e o contato pessoal já não
surgirá naturalmente no decorrer do trabalho. Se o contato pessoal direto
continua, ele acarretará em perdas de tempo cada vez maiores e será preciso
nomear gerentes para facilitar a comunicação, o controle e a coordenação.

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Quadro 3.1  A persistência da hierarquia

No início de 2002, a Sociedade Industrial do Reino Unido produziu um relató‑


rio sobre The state of the office: the politics and geography of working space [A
situação do escritório: política e geografia do espaço de trabalho], parcialmen‑
te baseado em uma pesquisa com pessoas que trabalhavam em escritórios. O
aspecto mais notável desse relatório é o que ele revela sobre a persistência da
hierarquia e o uso do simbolismo no escritório para transmitir status. Boa parte
do tempo e energia que as pessoas deveriam dedicar a suas funções era usada 83
na competição umas com as outras para ficar perto da melhor janela ou com

Estruturas mais simples


a maior mesa. Uma entrevistada disse que chegou a encontrar os nomes das
pessoas listados em ordem alfabética do lado de fora do escritório. Por ser a
gerente, ela arrumou a lista, de modo a ter seu nome no alto. A pesquisa desco‑
briu que uma ordem hierárquica tradicional geralmente se refletia na ostenta‑
ção com que era usado o espaço do escritório. Em geral, os executivos no topo
da hierarquia ocupavam o escritório do andar mais alto, com a melhor vista e o
mais iluminado. Os encarregados pelos serviços gerais, normalmente, iam para
o porão e os funcionários de nível intermediário ficavam entre os executivos e
o pessoal dos serviços gerais.

Fonte: NATHAN, Max. The state of the office: the politics and geography of working space.
Londres: The Industrial Society, 2002. Reportagem de Richard Donkin, Financial Times, 17 de
janeiro de 2002, FT seção CareerPoint, p. XII.

A hierarquia também emerge por ser adequada para a distinção entre


diferentes níveis de autoridade e responsabilidade, estendendo­‑se a uma
forma vertical de especialização. As tarefas realizadas em uma organiza‑
ção variam em complexidade, das rotineiras às estratégicas. Da mesma
forma, as responsabilidades que as pessoas têm de assumir variam desde
as consequências limitadas de curto prazo, normalmente de natureza roti‑
neira, até as consequências de longo prazo, em que uma falha pode levar
a empresa à ruína. Há certa lógica na diferenciação das funções com base
na responsabilidade, o que acaba levando à hierarquia.
Tendo isso em mente, não é nenhuma surpresa descobrir que a hie‑
rarquia tem uma longa história na organização humana. Trata­‑se de um
princípio organizacional que ajudou a assegurar a realização de alguns
dos mais importantes empreendimentos coletivos da humanidade, como
a construção das pirâmides do Egito, os antigos impérios da China e o

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de Roma, a Igreja medieval na Europa e a moderna corporação multina‑
cional. Obviamente, esse longo legado histórico poderia significar que a
hierarquia é um arranjo que, com o passar do tempo, se tornou mera con‑
venção, entranhada em nossas expectativas. Contudo, é mais plausível
a ideia de que ela contém uma sabedoria proveniente da experiência na
organização de atividades complexas que envolvem um grande número
de pessoas. Sendo assim, a dificuldade a enfrentar não é tanto saber como
nos livrarmos da hierarquia, mas como reformá­‑la de modo a aperfeiçoar
84
suas contribuições e minimizar suas desvantagens. É disso que trata boa
parte do pensamento sobre as novas formas organizacionais.
parte ii  novas formas internas

Na próxima sessão examinaremos a natureza da hierarquia nas for‑


mas convencionais da organização, que representa, em grande medida,
a hierarquia como ainda a conhecemos. Em seguida, refletiremos sobre
sua contribuição para o processo de organizar, antes de nos voltarmos
para seus aspectos negativos, que explicam por que os métodos orga‑
nizacionais mais recentes tentam se afastar das formas hierárquicas
tradicionais.

3.1.2 A hierarquia na organização convencional


A hierarquia fornece a estrutura de apoio principal para as formas
convencionais da organização. Na organização tradicional ela normal‑
mente tem as seguintes características:

„„Os cargos estão segmentados em níveis claramente diferencia­


dos, segundo o grau de autoridade e responsabilidade atribuídos
a cada um.

„„Os níveis superiores têm maior autoridade e responsabilidade.

„„As pessoas dos níveis superiores da hierarquia tomam as decisões


mais complexas em relação aos riscos e incertezas a elas associa‑
dos, suas implicações para a política da empresa e o compromisso
financeiro envolvido.

„„As pessoas designadas para as mesmas áreas recebem instruções e


se reportam a executivos que têm responsabilidade sobre elas.

„„Esses aspectos dão origem a uma “cadeia de comando” em que os


executivos ou funcionários em cargos superiores na hierarquia têm

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autoridade para dar instruções ou fazer exigências aos que estão
abaixo. Ao mesmo tempo, os executivos assumem a responsabili‑
dade final pelo trabalho das pessoas que a eles se reportam.

„„A liderança é exercida por um sistema “de comando e controle”


que percorre as hierarquias da organização de alto a baixo.

„„A hierarquia é o principal canal para o controle e a coordenação.

„„A informação é transmitida primeiro para pessoas em posição 85


superior, e depois para os diversos graus hierárquicos abaixo.

Estruturas mais simples


„„Embora não seja um aspecto indispensável da hierarquia em orga‑
nizações convencionais, na prática há uma tendência de aumento
no número de níveis ou camadas hierárquicas, conforme o tempo
passa e o número total de funcionários aumenta. Com isso, as
organizações convencionais tendem a ter estruturas administrati‑
vas verticalizadas, com muitos níveis hierárquicos.

As estruturas hierárquicas convencionais se baseiam em três princí‑


pios: o primeiro é a “cadeia escalar de autoridade”, que é praticamente
uma definição de hierarquia. Esse princípio diz que a autoridade deve
estar distribuída para cima e para baixo em uma escala linear, na qual
os membros de uma organização se reportam a pessoas do nível acima.
O segundo princípio, “unidade de comando”, sustenta que essa cadeia
de autoridade não deve ser afetada por muitos vínculos de prestação de
contas. Segundo o princípio da unidade de comando, as pessoas que tra‑
balham em uma organização só devem se reportar a um executivo ou
superior, pois quando o fazem a um ou mais gerentes, é provável que
recebam instruções conflitantes, que confundirão suas responsabilidades
e impedirão que sejam responsabilizadas por seu desempenho. O terceiro
princípio é a “esfera de controle”, que determina a extensão da respon‑
sabilidade de um dado executivo por seus subordinados, ou seja, pelo
número de pessoas que se reportam a ele. Deve­‑se atentar para falhas na
comunicação, no controle e na coordenação, que podem surgir quando
a esfera de controle de um executivo se torna excessivamente ampla. A
importância da esfera de controle para a redução da hierarquia por meio
da eliminação de níveis será esclarecida mais adiante, neste capítulo.
As conexões íntimas estabelecidas no pensamento organizacional
convencional entre hierarquia, autoridade e responsabilidade merecem

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um exame mais detalhado.4 A autoridade é um aspecto essencial da hie‑
rarquia. Para ser eficaz, segundo Elliott Jaques, a autoridade de um geren‑
te deve conter quatro elementos:

1. O direito de veto na indicação de qualquer candidato que esteja


abaixo do padrão mínimo de qualificação para um cargo em sua
área de responsabilidade.

2. O poder de atribuir tarefas a membros de sua equipe.


86
3. O poder de avaliar desempenhos e tomar decisões relativas a
parte ii  novas formas internas

aumentos salariais e prêmios por mérito.

4. Ter autoridade para despedir pessoas, pelo menos aquelas de sua


própria equipe.

A autoridade também deve corresponder à responsabilidade atribuída


a um executivo. Embora tenha sido criticado por ser desnecessariamente
rígido, esse é um velho princípio da gestão, que tem como objetivo evitar
sérios problemas. Se um executivo tem um nível de responsabilidade que
excede sua autoridade para obter os recursos e a cooperação necessários
para cumprir suas obrigações, é provável que o resultado seja ineficaz
para a organização e estressante para o indivíduo. Por outro lado, quan‑
do há mais autoridade (poder) do que responsabilidade pelos atos de um
indivíduo, torna­‑se tentador assumir um comportamento arbitrário ou
até mesmo de corrupção absoluta. Em um sentido literal, esse desequilí‑
brio provoca a irresponsabilidade.

3.1.3 A contribuição da hierarquia


Já nos referimos às maneiras pelas quais a hierarquia pode cor‑
responder a algumas exigências fundamentais na organização de ati‑
vidades de grande escala. A mais importante é como ela identifica e
define claramente a responsabilidade. Todas as organizações requerem
um processo por meio do qual o trabalho é alocado e sua execução
é julgada por critérios de desempenho. Isso é necessário para regu‑
lar de modo coordenado o que as pessoas fazem, com metas cole‑
tivas. Embora elas possam formar os próprios julgamentos sobre a
qualidade de seu desempenho e fazer os ajustes necessários, o fato de
não estarem trabalhando em isolamento exige que um gerente com a

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responsabilidade por um grupo ou unidade de pessoas avalie o desem‑
penho, tendo em mente a contribuição de cada um. Mesmo quando
estão organizadas em equipes que têm responsabilidade pelo que o
grupo realiza, as pessoas terão de prestar contas a um líder ou gerente.
Em alguns casos, quando o trabalho passa por muitos departamentos
diferentes ou até por toda a empresa, deve haver prestação de contas
a um grupo de gerentes, seja à diretoria ou a um comitê. O princípio
da prestação de contas a um nível superior na organização permanece
87
o mesmo.
A ordenação hierárquica dos cargos segundo o nível de responsabili‑

Estruturas mais simples


dade corresponde e sustenta o processo de prestação de contas de baixo
para cima. A clara definição dos cargos nas hierarquias de uma empresa,
de modo a corresponder a diferentes áreas e níveis de responsabilidade,
também facilita a atribuição das responsabilidades sem nenhuma ambi‑
guidade no que diz respeito ao exercício das obrigações. A contribuição
da hierarquia ao determinar tais responsabilidades é, em princípio, bas‑
tante compatível com a responsabilidade dos gerentes e seus subordina‑
dos, como acontece na chamada “avaliação 180 graus” do desempenho
individual. A prestação de contas entre ambos os lados é igual. Da mesma
forma, continuará havendo uma distinção em suas responsabilidades e,
portanto, nos critérios para avaliar se estão ou não estão sendo cumpri‑
das de modo satisfatório.
As decisões que a empresa tem de tomar variam entre rotineiras e não
ro­tineiras, e também correspondem à lógica da hierarquia. As decisões ro‑
tineiras têm geralmente consequências de curto prazo, estão relacionadas
a parâmetros conhecidos e são influenciadas por procedimentos baseados
na experiência prévia e também nos precedentes. Muitas vezes é possível
usar regras de decisão que podem ser incorporadas a sistemas informa‑
tizados; por exemplo, nos pedidos de compra de material de escritório,
tais como artigos de papelaria. Embora tenham importância para a em‑
presa, a maioria das decisões rotineiras não exige um alto grau de dis‑
cernimento. Nesse sentido, a tomada de decisões não representa grande
responsabilidade e não requer muita autoridade, podendo até mesmo ser
automatizada.
Em compensação, as decisões não rotineiras geralmente são de natu‑
reza mais estratégica. Elas têm consequências de longo prazo, envolvem
gastos maiores e requerem o exercício do discernimento sob condi‑
ções bastante incertas na maioria das vezes. Embora algumas decisões

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operacionais rotineiras acarretem risco significativo, especialmente se ti‑
verem consequências potenciais para a segurança pessoal ou para o meio
ambiente, os riscos das más decisões são em geral muito maiores e, con‑
sequentemente, com grau de responsabilidade muito maior associado às
decisões estratégicas. A relação entre decisões rotineiras e não rotineiras
também é de natureza hierárquica. As decisões rotineiras compreendem
os parâmetros de uma empresa, e como tal devem servir de base para as
decisões estratégicas de níveis mais altos. Procedimentos como a análise
88
de pontos fortes, fraquezas, oportunidades e ameaças (análise SWOT)
dão ênfase à maneira como os pontos fracos e fortes da empresa devem
parte ii  novas formas internas

ser levados em conta quando se formula as suas estratégias.


Assim, a hierarquia reflete uma ordem natural na tomada de de‑
cisões e pode ser seu suporte estrutural. A ordenação hierárquica dos
níveis de responsabilidade pelas decisões tem exigências corresponden‑
tes nas capacidades e habilidades requeridas das pessoas que trabalham
nesses diferentes níveis. A ordenação das funções em uma hierarquia
permite alocar pessoas com a competência necessária em cada nível
organizacional.
As claras distinções entre os diferentes níveis de tomada de decisões
nas hierarquias tornam­‑se mais difíceis de ser mantidas sob as condições
de mudança rápida e grandes inovações. Assim, é provável que os avan‑
ços no nível operacional percam sua natureza rotineira na medida em que
o progresso tecnológico ocorre cada vez mais rápido e as inovações são
introduzidas com mais frequência. As inovações podem ter importantes
implicações estratégicas, a ponto de tornarem supérfluas as estratégias da
competição já existentes. Em tais circunstâncias, não é sensato manter as
pessoas envolvidas em decisões rotineiras distantes da tomada de deci‑
sões estratégicas; dessa forma, a racionalidade da hierarquia começaria,
então, a se desfazer.
Outra contribuição atribuída à hierarquia trata­‑se, na realidade, de
“uma faca de dois gumes” sob condições de rápida mudança e compe‑
tição acirrada. Muitas pessoas gostam de uma estrutura hierárquica que
lhes ofereça a aparente segurança de “conhecer seu lugar” e poder limitar
sua responsabilidade, jogando­‑a para cima. Uma hierarquia verticalizada
oferece ainda a possibilidade de promoção na carreira em etapas relati‑
vamente fáceis. Essas características ajudam a explicar a aceitação gene‑
ralizada da hierarquia como estrutura administrativa natural. Por outro
lado, o conforto da hierarquia pode causar uma complacência cômoda e

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indisposição para mudar, o que não é compatível com as condições tur‑
bulentas que muitas empresas estão vivenciando atualmente.

3.1.4 Aspectos negativos da hierarquia


A hierarquia convencional se torna cada vez mais disfuncional para
muitas empresas. As barreiras que ela impõe para a adaptabilidade e a
inovação neutralizam suas contribuições para uma gestão eficiente e or‑
denada. Com sua preocupação pela delineação da autoridade, responsa‑ 89

bilidade e prestação de contas, a hierarquia tende a endossar o status quo,

Estruturas mais simples


em vez do emergente modo de organização adaptável. A hierarquia dá
origem à inflexibilidade, e além disso, com o tempo tende a crescer sobre
si mesma, acrescentando sobrecargas às despesas gerais.
É uma questão de matemática simples observar que, quanto mais
extensa a hierarquia, mais aumentam os custos da administração. Por
exemplo, se uma empresa tem 3.600 funcionários não administrativos
e um número fixo de 200 gerentes de primeira linha, precisará de 102
administradores acima da primeira linha com cinco níveis na hierar‑
quia, e apenas 41 com três níveis.5 O fator que intervém aqui é a esfera
de controle (o número de pessoas que se reportam a cada gerente),
que em breve examinaremos ao discutirmos o downsizing e a elimina‑
ção dos níveis hierárquicos. A cada salário de gerente economizado,
acrescentam­‑se outras economias de escritório e apoio. Como regra
geral, o salário de um gerente representa apenas cerca de um terço
de seu custo total. Há também economias a ganhar em custos menos
tangíveis, como o tempo gasto em reuniões e outras atividades neces‑
sárias para coordenar e controlar as atividades de um grande grupo de
gestores, com o processo de comunicação mais complexo, e assim por
diante. Quanto mais reduzida for a hierarquia, menores serão os custos
que a empresa terá.
Um dos fatores que podem facilmente levar a uma dispendiosa pro‑
liferação de níveis gerenciais é a confusão entre a justificativa vinculada
às tarefas da hierarquia, em termos de autoridade e responsabilidade, e
aspectos não vinculados às tarefas, relativos a salários e status. Os es‑
tudos de campo de Jaques o levaram a concluir que não há qualquer
justificativa para uma organização ter mais de seis níveis administrativos,
independentemente de seu tamanho. Mesmo assim, na prática, muitas
empresas costumam ter mais níveis do que isso e as organizações públicas

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ainda mais. Uma das razões é que os títulos estão associados a graus de
remuneração, e as responsabilidades em determinado nível são divididas
para deixar claras as diferenças de status. Esses dois fatores podem resul‑
tar na proliferação de títulos como gerente­‑adjunto, gerente­‑assistente e
afins. Logo eles facilmente se convertem em níveis distintos de prestação
de contas, em que nenhum é realmente justificável quanto ao trabalho a
realizar ou às decisões a serem tomadas.
Além do custo financeiro adicional resultante, níveis desnecessários
90
em uma hierarquia podem gerar confusão, ainda que, paradoxalmente,
uma justificativa fundamental para sua existência seja precisamente o
parte ii  novas formas internas

contrário, porque cria a ordem. Níveis em excesso levam à sobreposição


de responsabilidades, o que, por sua vez, dá origem a um desnecessário
deslocamento dos problemas por todo o sistema em vez de resolvê­‑los
rapidamente em seu devido nível. Os gerentes serão responsáveis pela
supervisão rigorosa do trabalho, e podem até contradizer as ações dos
que se reportam a eles, quando, na verdade, isso não deveria ser neces‑
sário. No momento em que os subordinados procurarem ter suas ações
aprovadas ou tomarem decisões, se sentirão tentados a ignorar o superior
imediato, que não está de fato em um nível realmente alto de autoridade
e, portanto, não poderá dar a necessária aprovação.
É bastante provável que dessa situação surjam consequências motiva‑
cionais negativas. As pessoas se sentirão monitoradas muito rigorosamente
e com pouco espaço para a iniciativa. O Quadro 3.2 apresenta um exem‑
plo do tipo de problema que pode surgir, e me foi relatado pessoalmente.
O exemplo do Quadro 3.2 mostra como a hierarquia pode alienar
um membro da equipe competente e motivado, além de apresentar outro
grande problema associado à hierarquia convencional: a inflexibilidade
para responder com rapidez às demandas. Como mostra o exemplo, a
ação pode ser atrasada devido à interferência desnecessária entre os ní‑
veis organizacionais, comprometendo a capacidade da equipe para reagir
rapidamente a clientes e outros grupos externos.
Às vezes uma reação dos funcionários a esse problema tem mais con‑
sequências negativas para o processo administrativo. Eles podem tentar
extrair a autonomia de que acreditam precisar, restringindo a comuni‑
cação com níveis superiores e reinterpretando as instruções que lhes são
passadas pelos mesmos. Assim, a equipe talvez consiga recuperar a ca‑
pacidade de reagir mais depressa e com maior flexibilidade às mudanças
em sua área de trabalho. Contudo, outros problemas podem aparecer,

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Quadro 3.2  Uma sobreposição desmoralizante de responsabilidades

Elizabeth Mitchiner trabalhava para a empresa pública responsável pela cria‑


ção de uma nova cidade no Reino Unido. Seu chefe imediato era um homem
mais velho, com a responsabilidade geral pelo desenvolvimento das instalações
sociais na nova cidade. Elizabeth respondia pelo planejamento e, depois, pelo
funcionamento das instalações para o lazer infantil e juvenil, localizadas em
uma série de centros comunitários dos distritos locais, que abriram um a um
enquanto a cidade era construída. Com um diploma universitário, Elizabeth 91
se sentia capaz de aceitar esse nível de responsabilidade, pois normalmente

Estruturas mais simples


superava as metas estabelecidas. Seu trabalho foi bem recebido pelos usuários
das instalações e ela tinha boas relações com a equipe médica, professores,
pastores e outros profissionais que trabalhavam nos centros comunitários e
arredores.
No decorrer de seu trabalho, Elizabeth frequentemente precisava se correspon‑
der com outras unidades da empresa construtora e com o público. Ela escre‑
via pessoalmente essas cartas. Seu superior imediato, embora conhecesse bem
menos os detalhes de cada caso, fazia questão não apenas de verificar cada
carta, mas também de assinar seu nome, o que retardava a postagem, às vezes
em muitos dias. A correspondência em resposta também era endereçada ao
escritório dele, para depois ser repassada a Elizabeth sem qualquer comentário,
retardando ainda mais o andamento do trabalho. Tudo isso impedia a capacida‑
de dela de responder prontamente às preocupações e outras questões expres‑
sadas nas cartas.
O efeito dessa intrusão de um gerente em suas atividades era extremamente
desmoralizante, e foi decisivo para Elizabeth deixar o emprego. Talvez o chefe
tivesse alguma necessidade psicológica de controlar ou tinha menos confiança
em Elizabeth, por ser mulher e bem mais jovem do que ele. Mesmo deixando
de lado essas questões subjetivas, o nível de responsabilidade administrativa
dele não estava suficientemente diferenciado do de Elizabeth, mas sua posição
superior lhe deu a oportunidade de interferir, com consequências prejudiciais.

porque essa maneira de fazer as coisas não é reconhecida nem sancionada


pelos gestores e pode levar a sérias restrições na comunicação ascenden‑
te, comprometendo a capacidade de entendimento dos gerentes seniores
acerca de fatos relevantes. Pode também resultar no encobrimento da
informação por diferentes sub­‑hierarquias, em vez de sua divulgação a
pessoas em outras partes da organização que precisem dela.

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O grande número de níveis na hierarquia administrativa costuma
causar problemas de comunicação e sensação de distância entre o topo e
a base de uma empresa. As comunicações eletrônicas, e o e­‑mail em espe‑
cial, podem facilitar bastante a distribuição da informação e de opiniões
entre os níveis organizacionais, mas não substituem a troca informal de
ideias, que é de extrema importância para a construção de um sentido de
identificação entre os gerentes e suas diferentes equipes. O Quadro 3.3
descreve como os problemas de comunicação surgiram em uma empresa
92 de porte médio que possuía diversos níveis hierárquicos.
parte ii  novas formas internas

quadro 3.3  Problemas de comunicação na alta hierarquia

Uma empresa fabricante de bebidas tinha cerca de 1.200 funcionários e geren‑


tes. Havia oito níveis em sua principal hierarquia de produção, acima do nível
de chão de fábrica. O diretor superintendente, que valorizava sua equipe, tinha
plena consciência do que chamava de “problemas de comunicação” entre ele
e os trabalhadores da empresa. Ele tentou superá­‑los com métodos um tan‑
to heterodoxos, como fazer visitas surpresa quase diárias à fábrica, trabalhar
alguns dias em funções operativas e, sem aviso, acompanhar os motoristas em
suas entregas aos depósitos de distribuição da empresa.
Essas ações geraram grande consideração pelo superintendente da parte dos
funcionários – o que teve custo e não resolveu o problema real. Os supervisores
e gerentes de produção não gostaram dessa abordagem. Estavam apreensivos
sobre o que, de seu ponto de vista, tratava­‑se de um persistente “passar por
cima” de sua autoridade. Para eles era irritante serem questionados pelo staff
da fábrica, com argumentos de que “o patrão” tinha dito algo que ia contra
a opinião deles. Era questionável se o tempo e esforço do diretor focado em
melhorar a comunicação estaria sendo ponderado com sensatez em relação ao
tempo necessário para o cumprimento de outros deveres que só ele poderia
fazer, como criar estratégias de longo prazo para a empresa.
Quando me pediram conselhos sobre o caso, cheguei à conclusão de que o
efeito do método do diretor superintendente foi gerar uma sensação difusa de
que as barreiras do status estavam sendo rompidas, em vez de criar condições
para que informações precisas fossem efetivamente transmitidas diariamente
entre os diferentes níveis da hierarquia. Recomendei a redução do número de
níveis gerenciais com a expansão de muitas das esferas de controle na hierar‑
quia administrativa. No final, foi uma boa contribuição para resolver o problema
e recuperar o equilíbrio do uso do tempo do diretor superintendente.

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3.1.5 Hierarquia na nova organização
Esses aspectos negativos da hierarquia podem limitar seriamente as
empresas sujeitas às forças das condições competitivas modernas, que
valorizam em especial a adaptabilidade e inovação. Portanto, a evolução
da nova organização é caracterizada por uma tentativa de minimizar os
aspectos da hierarquia menos adequados a essas condições. A nova abor‑
dagem da hierarquia tem as seguintes características:
93
„„As relações verticais são definidas pela autoridade de uma equipe

Estruturas mais simples


ou unidade de trabalho em vez de um indivíduo, segundo o grau
hierárquico.

„„O desequilíbrio entre autoridade e responsabilidade pode ser tole‑


rado, em vez de se perder tempo e esforço tentando defini­‑las com
precisão em uma situação que está em constante mudança. Espera­
‑se que os gerentes usem suas qualidades de iniciativa e liderança
para superar quaisquer problemas que venham a surgir.

„„A descentralização é favorecida com autoridade e iniciativa


distribuídas.

„„A liderança é exercida por meio de orientação às ideias coletivas e


não como sistema de comando e controle.

„„A comunicação é aberta, com informações pertinentes sendo


ampla e simultaneamente passadas a todos os interessados.

„„O controle já não é mantido primordialmente pela supervisão


pessoal e adesão a regras e procedimentos. Em vez disso, as metas
são estabelecidas como marcadores do desempenho; as políticas
de RH para seleção, treinamento e avaliação são usadas para
conciliar as competências e metas individuais com requisitos cole‑
tivos; e há esforços voltados para a criação de cultura e identidade
corporativas em comum.

„„Há tentativa consciente no sentido de minimizar os níveis hie­


rárquicos.

A revolução na tecnologia da comunicação tem profundas impli‑


cações para a tentativa de reduzir a hierarquia tradicional e passar de

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relações verticais para relações horizontais, mais colaborativas.6 As in‑
tranets e a internet facilitam o trabalho de estruturas corporativas mais
planas e das equipes que trabalham em rede que integram diferentes
funções. Com ajuda das novas tecnologias, as empresas conseguem se
desfazer de camadas gerenciais mais rapidamente e transformar o pa‑
drão das comunicações a partir de um fluxo descendente ao longo das
rotas hierárquicas prescritas para um processo multidirecional, baseado
em redes.
94
Um dos fatores que tradicionalmente levam ao aumento dos níveis
hierárquicos é o crescimento da organização. Por este motivo, muitas
parte ii  novas formas internas

empresas aproveitaram a oportunidade de “horizontalizar” ou reduzir


os níveis hierárquicos em suas estruturas gerenciais enquanto diminuíam
suas dimensões e custos. Portanto, esse movimento de downsize tem sido
um fator determinante para a obtenção de estruturas mais simples.

3.2 Downsizing e horizontalização


3.2.1 Tamanho e hierarquia
Um dos aspectos mais universais da organização convencional sem‑
pre foi a estreita relação entre o tamanho e a quantidade de níveis hie‑
rárquicos. O tamanho faz aumentar os níveis, embora seja em ritmo
decrescente. Em estudos realizados antes do início do movimento para o
downsizing em meados dos anos 1980, os números típicos para a confi‑
guração de tamanho e níveis estavam de acordo com os que estão apre‑
sentados na Tabela 3.1.7
A relação entre tamanho e hierarquia está na esfera de controle co‑
mum, ou seja, no número de pessoas que se reportam diretamente a
determinado gerente. Para uma organização de dado tamanho, quanto
maior a esfera de controle comum, menor será o número de níveis em sua
estrutura gerencial. Contudo, há um limite para a esfera de controle que
um gerente pode aceitar, e uma vez alcançado esse limite, qualquer au‑
mento no tamanho da empresa aumentará também o número de gerentes
e, naturalmente, o número de níveis na hierarquia administrativa.
Os pioneiros da ciência da administração sustentavam que seis era
o limite absoluto para a esfera de controle com que um gerente poderia
lidar eficazmente quando o trabalho de subordinados está interligado e
precisa de coordenação.8 Mais recentemente, começamos a entender que

Book_Organizaçoes.indb 94 16/9/2011 16:23:26


Tabela 3.1  Números típicos para a configuração do tamanho e níveis da
administração

Total de empregos Níveis administrativos*


100 2
500 3
1.000 5
95
3.000 6

Estruturas mais simples


10.000 7

* Número de níveis acima dos funcionários não administrativos, ou seja, sem considerar tais
funcionários como nível.

os limites para as esferas de controle são variáveis, dependendo de uma


série de ponderações. A extensão do controle tende a ser mais reduzida
quanto mais se aplicarem os seguintes fatores:

1. O gerente tem de dedicar uma parte do tempo a deveres não admi‑


nistrativos, como seria o caso de um engenheiro­‑chefe.

2. Os subordinados (pessoas que se reportam ao gerente) precisam


interagir intensamente.

3. Os subordinados estão trabalhando em tarefas diferentes.

4. Novos problemas emergem com regularidade em seu trabalho.

5. Os subordinados estão fisicamente dispersos.

6. A competência e o nível de treinamento dos subordinados são


baixos.

7. É necessário controlar o trabalho dos subordinados por meio de


uma ampla supervisão pessoal direta.

8. Uma grande parte da comunicação entre os executivos e os que se


reportam a eles exige interação cara a cara e não pode ser realiza‑
da de outras formas, como por e­‑mail.

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Evidentemente a maneira como o trabalho é realizado e as tecnolo‑
gias da informação e das comunicações disponíveis têm influência sobre
a abrangência do controle, evitando­‑se, assim, a ruptura do processo ad‑
ministrativo ou que um gerente fique sobrecarregado. Embora os fatores
listados permitam considerável variação na extensão do controle, sempre
há um limite máximo além do qual começam a ocorrem sérias disfunções.
Esse limite máximo significa que, conforme aumenta o número de funcio‑
nários em uma organização, há mais pressões para aumentar o número
96
e os níveis gerenciais. Portanto, a diminuição do número de empregados
por meio do downsizing oferece então uma oportunidade de reduzir os
parte ii  novas formas internas

níveis gerenciais.

3.2.2 Downsizing
Downsizing é a eliminação planejada de cargos ou funções.
Funções são categorias de cargos semelhantes, como os programado‑
res de computadores ou o pessoal da contabilidade. O downsizing
pode acontecer como resultado de uma queda na demanda e na deci‑
são de reduzir a quantidade ou a amplitude das atividades da empresa.
O downsizing obtido com a eliminação de funções e unidades pode
refletir em redução na diversificação das atividades de uma empresa
e/ou na terceirização de algumas dessas atividades. Ele também pode
ser obtido com a redução dos níveis hierárquicos e do número de ge‑
rentes. O downsizing e a horizontalização são complementares, pois
a segunda é um meio de obter o primeiro, ao mesmo tempo em que a
redução dos níveis é facilitada pela redução do número total de fun‑
ções de uma empresa.9
Há uma importante distinção a ser feita entre o downsizing “de re‑
ação” e o “estratégico”. O primeiro remete a situações em que ocorrem
reduções no emprego, muitas vezes até na diretoria, em resposta a fatos
externos e necessidades imediatas. Essa forma de downsizing prevale‑
cia entre as empresas norte­‑americanas nos anos 1970 e início dos anos
1980, quando muitas o adotaram em reação à crescente competição in‑
ternacional, principalmente de empresas japonesas no setor industrial.
Naquela época, era comum exigir de cada departamento o corte de uma
porcentagem de seus empregados, desconsiderando o valor estratégico
do departamento. Essa forma indiscriminada de downsizing não levava
em conta se os diferentes departamentos suportavam cortes sem perdas

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desproporcionais de eficiência ou se certas partes da empresa que incor‑
poram competências raras ou áreas de conhecimento especial deveriam
ser protegidas.10
O downsizing estratégico, por vezes chamado de “rightsizing”, reme‑
te a um processo cuidadosamente elaborado, planejado para dar suporte
à estratégia organizacional de longo prazo. Em outras palavras, esse tipo
de abordagem é uma oportunidade para fazer uma transformação orga‑
nizacional, como lean production, reengenharia, foco nas competências
97
de base ou outros aspectos da reforma organizacional. Em meados dos
anos 1980, a combinação da competição e da recessão mundiais forçou

Estruturas mais simples


muitas empresas norte­‑americanas a competir com mais eficiência e a
adotar uma visão mais estratégica do downsizing. Este começou a ser
combinado com tentativas de reorganização por meio da reengenharia e,
nos anos 1990, com uma distinção mais clara entre as atividades centrais
e as periféricas.
Nos últimos anos, algumas empresas foram além da visão do down‑
sizing como uma simples reação ao declínio econômico. Elas agora ado‑
tam uma visão estratégica e aceitam os benefícios que uma empresa de
tamanho reduzido traz, incluindo as oportunidades para reforma organi‑
zacional que o downsizing oferece. Outras, no entanto, ainda acreditam
que se pedirem a todos para cortarem um pouco, não haverá prejuízos em
nenhuma área e poderão manter todas as atividades intactas. Uma abor‑
dagem exclusivamente reativa mais uma vez se tornou evidente frente à
desaceleração econômica no início do século XXI, quando era tentador
cortar custos de qualquer forma em toda a empresa, na tentativa de recu‑
perar as margens de lucro.11
A adoção do downsizing nos Estados Unidos e em outras economias
desenvolvidas tem sido rápida e generalizada. Por exemplo, entre 1987 e
1991, mais de 85% das corporações ranqueadas na revista Fortune 500 re‑
duziram seus empregados administrativos. Muitas pessoas foram atingidas.
A IBM cortou cerca de 400.000 trabalhadores em 1992, e, em meados de
1993, o serviço postal dos Estados Unidos eliminou 30.000 de suas 130.000
funções administrativas.12 A crise econômica de 2000–2002 deu origem a
uma nova onda de downsizing. Em 2000, empresas norte­‑americanas aca‑
baram com 614.000 empregos e anunciaram quase 2 milhões de cortes em
2001.13 Um dos maiores programas de downsizing é o do serviço postal do
Reino Unido, que no início de 2002 anunciou planos de acabar com mais
de 30.000 empregos – dos quais 10.000 eram de gestores intermediários. A

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diretoria da empresa associava downsizing e horizontalização de maneira
clara, acreditando que “é possível economizar montantes expressivos por
meio da eliminação de níveis da “'ineficiente' gestão intermediária”.14

3.2.3 Contexto e razões para o downsizing


Muitas das razões para o downsizing advêm de mudanças econômi‑
cas e tecnológicas no ambiente empresarial. As pressões da competição
98 que acompanham a desregulamentação e a redução de barreiras para en‑
trada em outros mercados têm forçado as empresas a diminuir suas exa‑
parte ii  novas formas internas

geradas burocracias e ajustar suas estruturas administrativas para reduzir


as despesas gerais e acelerar o processo de tomada de decisão. A racio‑
nalização foi um dos benefícios mais importantes relacionados à onda de
fusões e aquisições (F&As) que eclodiram na década de 1990 e deram
impulso ao downsizing. Outro fator tem sido o investimento em tecnolo‑
gias mais eficientes para economia de mão de obra, que contribui para a
redução do número dos empregos diretos. A tecnologia da comunicação
e da informação também reduziu o número de gerentes intermediários
necessários para preparação e processamento da informação.
Além dos argumentos econômicos para o downsizing, há outras
razões manifestamente menos racionais. A motivação de incrementar
o “valor para o acionista” por meio do downsizing nem sempre foi
benéfica para as empresas interessadas. Resultou de takeovers por ou‑
tras empresas, calculando­‑se que seus alvos proporcionariam melho‑
res retornos, pelo menos no curto prazo, se tivessem suas estruturas
forçosamente reduzidas. A compra de empresas por meio de emprés‑
timos concedidos por instituições financeiras agressivas teve efeitos
semelhantes. Esses fatos trouxeram ganhos financeiros para os com‑
pradores, e deixaram os gestores das corporações mais alertas para a
necessidade de usar produtivamente os investimentos dos acionistas.
No entanto, essa orientação de curto prazo geralmente adotada pelos
compradores os torna mais orientados para o lucro que para o cres‑
cimento da empresa, e não há nenhuma comprovação de que suas
atividades sejam racionais quanto à viabilidade de longo prazo das
empresas envolvidas.
Em particular, a compra financiada por grandes empréstimos deixa a
empresa endividada, levando­‑a a reduzir sua estrutura, e até mesmo a se
desfazer de ativos como pesquisa e desenvolvimento, em um esforço para

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pagar suas dívidas. Esse esvaziamento pode custar a competitividade e a
produtividade da empresa. Portanto, o downsizing por meio de aquisi‑
ções e buy­‑outs tende a levar a uma distribuição dos ativos corporativos
para os acionistas. Isso contrasta com o período anterior, até os anos
1970, quando a maioria das empresas adotava uma política de reter e
reinvestir os lucros na própria empresa.15
Um exemplo ainda mais claro dessa irracionalidade está na maneira
como o downsizing virou moda na gestão. Muitos executivos acredita‑
99
vam que sua empresa deveria adotar um programa de downsizing por‑
que outras o haviam feito. A revista Newsweek comentou, em 1996, que

Estruturas mais simples


“… despedir funcionários virou moda entre as corporações dos Estados
Unidos, exatamente como a construção de novas fábricas, e o fato de ser
considerado um bom cidadão corporativo eram razões para se gabar há
vinte e cinco anos atrás”.16 Nadando nessa maré, os gestores muitas vezes
deixavam de prestar atenção à lógica organizacional do downsizing, às
experiências e competências que estavam sendo perdidas ou aos efeitos
no empenho e moral dos funcionários que permaneciam.

3.2.4 Consequências do downsizing no desempenho


Há expectativa de que o downsizing proporcione diversos benefícios
para a empresa. Entre os benefícios econômicos estão os baixos custos, a
adoção de uma psicologia da administração “simples e eficiente” e uma
série de benefícios organizacionais. Custos mais baixos dão uma con‑
tribuição mais previsível aos resultados financeiros de uma empresa em
períodos de desaceleração econômica, mais do que o aumento de ren‑
dimentos, difícil de ser obtido em momentos de demanda em queda ou
estagnada. Uma psicologia organizacional simples e eficiente prioriza a
redução dos desperdícios e a concentração de esforços em atividades que
contribuam para agregar valor.
Também se espera que o downsizing traga uma série de benefícios
organizacionais, especialmente quando usado como uma oportunidade
para reduzir o número de níveis na hierarquia administrativa de uma
empresa. Nesse caso, ele pode ser um meio para se cortar custos admi‑
nistrativos. Uma estrutura administrativa mais simples poderia servir
de base para a redução da burocracia, principalmente da dependência
com relação às reuniões formais e procedimentos complexos. Outros
benefícios esperados de uma estrutura administrativa mais simples e

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menos burocrática são: melhoria das comunicações e mais rapidez na
tomada de decisões e disseminação da iniciativa na organização.
Embora possa ser obtido em parte pela terceirização de algumas ati‑
vidades, espera­‑se que o downsizing resulte em maior produtividade nas
atividades que permanecem na empresa. Contudo, para que isso acon‑
teça, algumas condições são imprescindíveis. Podem ser penosas e, na
prática, geralmente são deixadas de lado:

100 „„O trabalho deve ser reorganizado para que as tarefas anteriormente
realizadas por outros, inclusive por gerentes, sejam acrescentadas
parte ii  novas formas internas

às funções dos que permanecem na empresa. Esse “enriquecimen‑


to” da atividade não será necessariamente mal recebido pelos
envolvidos, desde que implique em verdadeiro aumento de sua
responsabilidade e autoridade, com o correspondente aumento da
recompensa. Se esses critérios não forem atendidos, é provável que
haja perda de interesse e de motivação.

„„O programa de downsizing não pode ter influência psicologica‑


mente negativa sobre os que permanecem na empresa. Um de seus
problemas é que muitas vezes ele dá origem a uma “síndrome do
sobrevivente”, em que os gerentes e funcionários remanescentes
sentem efeitos negativos, como ansiedade, culpa, apatia, desmo‑
tivação e outros estados mentais e emocionais que resultam em
moral baixo, perda da produtividade, queda da qualidade e
aumento de lesões relacionadas ao trabalho.17

„„Os empregados que deixam a empresa não devem fazer parte da


equipe principal que detém conhecimento e competência especiais,
uma vez que terão de ser recontratados posteriormente, geralmen‑
te a preços inflacionados de consultoria. O Quadro 3.4 mostra um
exemplo do desastre que pode acontecer com a perda de especia‑
listas indispensáveis e de seu conhecimento decisivo.

„„As atividades mantidas pela empresa que faz o downsizing devem


agregar mais valor do que as que foram extintas ou terceirizadas.

Resultados de pesquisas indicam que, de modo geral, o downsizing


de empregos não teve efeito positivo no desempenho financeiro, seja
quanto aos retornos sobre os ativos, seja quanto ao preço das ações. Em
compensação, descobriu­‑se que o downsizing de ativos, mediante a venda

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Quadro 3.4  Downsizing e perda de memória corporativa

Em 1999 houve um sério acidente ferroviário em Ladbroke Grove, Londres, no qual


31 pessoas morreram. A investigação do governo revelou até que ponto a perda do
conhecimento e especialização das empresas ferroviárias havia sido uma das causas
do desastre. Especialistas haviam perdido seus empregos depois que a British Rail
foi privatizada, em 1996, e os gerentes intermediários que permaneceram não
compreendiam as atividades rotineiras de sua equipe. Uma perda da “memória
corporativa” deu origem à inconsistência e confusão a respeito dos procedi‑ 101
mentos para os maquinistas. Além disso, muitos dos recém­‑recrutados para as

Estruturas mais simples


funções em que a segurança era importante também não tinham experiência ou
não haviam tido treinamento apropriado.

Fonte: MAITLAND, Alison. If downsizing, protect corporate memory. Financial Times, p. 18, 16
out. 2001.

de negócios e a terceirização, melhorou o retorno sobre os ativos.18 Uma


das razões para esse mau desempenho está, sem dúvida, relacionado à
irracionalidade e ao desinteresse em relação aos benefícios de longo prazo
para a companhia apontados anteriormente. Além disso, há problemas
em atribuir alterações no desempenho ao downsizing. Por exemplo, en‑
quanto empresas que estão passando por dificuldades têm mais incentivo
para fazer o downsizing, a raiz de seu mau desempenho pode estar em ou‑
tro lugar. Se existem outras causas fundamentais, como o mau desenvol‑
vimento de um novo produto, o downsizing não levará necessariamente
a um melhor desempenho por parte da empresa.
A maneira pela qual o downsizing é planejado e implementado pode
ter grande impacto no sucesso da empresa. É provável que a incidência da
síndrome do sobrevivente seja maior quando o downsizing é realizado de
maneira que pareça arbitrária e ameaçadora. Em outras palavras, as rea‑
ções mais negativas ao downsizing e demissões associadas a tal processo
devem ocorrer quando:

„„a insegurança no trabalho aumenta, talvez porque as demissões


sejam compulsórias e não voluntárias;

„„o processo é considerado injusto, tanto no procedimento usado como


na forma com que são selecionadas as pessoas a serem dispensadas;

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„„a empresa deixa de adotar uma abordagem socialmente responsá‑
vel para ajudar as pessoas afetadas pelo downsizing a encontrar
novos empregos;

„„a atração intrínseca da função é reduzida, devido à maior pressão


do trabalho que recai sobre os empregados remanescentes.19

Quando o downsizing é planejado antecipadamente para ser realiza‑


102 do por meio de demissões voluntárias e não impostas, é menos provável
que gere a síndrome do sobrevivente. Da mesma forma, ele tem mais
parte ii  novas formas internas

chances de atingir bons resultados financeiros quando a empresa faz es‑


forço para ajudar os demitidos e treinar os membros remanescentes que
terão de arcar com mais responsabilidades. O Quadro 3.5 mostra exem‑
plos de atitudes socialmente responsáveis na implementação do down‑
sizing, com probabilidade de resultados melhores tanto para a empresa
quanto para seus empregados.
O Capítulo 12 mostrará que os membros de uma organização estão
muito menos propensos a aceitar mudanças que consideram arbitrárias e

Quadro 3.5  Uma abordagem socialmente responsável do downsizing

Algumas empresas como a Hewlett­‑Packard e a Volkswagen minimizaram a


demissão dos empregados por meio de uma abordagem flexível e socialmente
responsável. Entre as medidas adotadas estavam a redução de horas de trabalho
e de salários, a realocação, a reciclagem e a dispensa de pessoal (ou concessão
de períodos sabáticos) por tempo limitado sem remuneração, mas sem a perda
de direitos de aposentadoria, demissão voluntária e restringindo o máximo pos‑
sível o recrutamento a fontes de dentro da empresa.
No Reino Unido, a Pilkington Glass empreendeu uma grande reestruturação por
um longo período, face à competição e à mudança tecnológica, processo que
resultou em grande perda de empregos. Em uma iniciativa socialmente respon‑
sável, a empresa estabeleceu um fundo que patrocinava programas de cria‑
ção de empregos. Esses programas ajudavam e orientavam o financiamento de
novos negócios e asseguravam suas instalações. Eles ajudaram cerca de 1.900
empreendimentos e criaram 15.800 empregos.

Fonte: BILMES, L. Bilmes; WETZKER, K. Wise tending in the jobs garden. Financial Times, p. 12,
3 jun. 1996.

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ameaçadoras. Isso significa que, se os empregos forem reduzidos de modo
inaceitável, a oportunidade de mudanças mais amplas na forma organi‑
zacional criada pelo downsizing será prejudicada. Assim, as implicações
decorrentes da maneira pela qual o downsizing é implementado terão
consequências maiores do que a simples redução dos empregos ou dos
ativos em si.

3.2.5 Horizontalização 103

Obtém­‑se uma estrutura mais horizontal, essencial para formas no‑

Estruturas mais simples


vas de organização, com a redução do número de níveis na hierarquia
administrativa. A horizontalização tem sido defendida como recurso para
simplificar as estruturas administrativas, diminuir a burocracia, eliminar
desvios de comunicação, acelerar a tomada de decisões e transferir mais
responsabilidade para os níveis inferiores, dando­‑lhes mais autoridade (o
chamado “empowerment”). Enquanto o downsizing facilitaria a elimina‑
ção desses níveis segundo o critério de esfera de controle, os dois aspectos
não estão necessariamente inter­‑relacionados. As empresas podem buscar
os benefícios da horizontalização sem necessariamente realizar o down‑
sizing. Por exemplo, Craig Littler descobriu, em pesquisas feitas em em‑
presas australianas realizadas em 1995 e 1998, que cerca de 11% delas
haviam eliminado níveis hierárquicos sem o downsizing.20
Das pesquisas realizadas em 1995 e 1996 com 1703 empresas na
Austrália, Nova Zelândia e África do Sul, Littler constatou que 42% ha‑
viam passado por um processo de horizontalização nos dois anos prece‑
dentes. Os números variavam de 37,5%, na Nova Zelândia, a 44%, na
Austrália, e 45,5%, na África do Sul. Uma pesquisa com 3500 compa‑
nhias europeias de médio e grande portes revelou que, no período de 1992
a 1996, 30% haviam eliminado níveis organizacionais.21 Por outro lado,
é surpreendente que, nesse mesmo período, 20% das empresas tenham
aumentado o número de níveis, talvez em consequência do aumento de
tamanho ou complexidade. Entre as empresas pesquisadas por Littler que
eliminaram níveis hierárquicos, cerca de 10% a 11% os retomaram pos‑
teriormente. Entretanto, tudo indica que a tendência global é uma via de
mão única levando à horizontalização.
Tal processo tem mais impacto sobre os gerentes. O achatamento
da hierarquia reduz as oportunidades de promoção e, por isso, parece
restringir possibilidades de se fazer carreira. Digo parece porque o seu

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real impacto para o avanço da gestão não precisa ser necessariamente
negativo. A horizontalização oferece aos gerentes a oportunidade de
assumir mais responsabilidade num ponto inicial de suas carreiras e
também de receber recompensas melhores por fazê­‑lo. No entanto, ela
pode causar efeitos da síndrome do sobrevivente semelhantes aos do
downsizing. O impacto mais negativo para os gerentes e os emprega‑
dos deve ser esperado quando o downsizing e a horizontalização são
introduzidos juntos, especialmente no caso de repetidas investidas do
104 downsizing.
O downsizing e a horizontalização podem acarretar imensos custos
parte ii  novas formas internas

sociais e psicológicos. Uma abordagem esclarecida e voltada para o futuro


em relação a esses dois processos, que visa a minimizar os efeitos negati‑
vos e oferecer a maior assistência possível às pessoas que perderam seus
empregos, pode abrandar tais efeitos. O downsizing exclusivamente reati‑
vo é o que mais cria ansiedade, hostilidade e tensão, sendo que esses sinto‑
mas se manifestam pelo aumento do absenteísmo por motivo de doença.22

3.3 Das hierarquias às equipes


A horizontalização conduz à descentralização da autoridade e da
iniciativa. Simplificando as estruturas administrativas, a eliminação dos
níveis hierárquicos permite também introduzir melhor comunicação e
trabalho de equipe entre diferentes departamentos e unidades. As equipes
podem ser formadas para aproximar pessoas de diferentes unidades, além
de incluir outras que anteriormente estavam em diferentes níveis hierár‑
quicos. A horizontalização e o trabalho de equipe são complementares.
A passagem da hierarquia para as equipes é uma das formas pelas quais
as estruturas organizacionais podem ser simplificadas e suas atividades
melhor focadas.
Passar de hierarquias a equipes significa que, em vez de ser conferi‑
da a um único gerente, a autoridade passa para uma equipe ou unidade
de trabalho. As equipes devem conter pessoas com expertise, capaci‑
dade e informações necessárias para tomar decisões. Da mesma forma,
elas devem ter autoridade e capacidade para assegurar que as decisões
tomadas pela equipe sejam executadas com eficiência. Quanto mais
rápidos se tornam os ciclos das operações, e quanto mais integrados

Book_Organizaçoes.indb 104 16/9/2011 16:23:26


os processos que os apoiam, mais adequada a abordagem de equi‑
pes em lugar da tradicional abordagem hierárquica. Conforme Lynda
Applegate observa:

Uma vez integrados e simplificados os processos operacionais, os limites


rígidos que permitiam a restrição da autoridade a um único chefe em
uma única unidade funcional são destruídos, assim como o tempo e os
estoques reguladores que permitiam aos gerentes filtrar cuidadosamen‑
105
te a informação e repassá­‑la para a hierarquia acima para a tomada de

Estruturas mais simples


decisão. Atualmente, os departamentos de marketing, vendas, fabricação
e compras precisam se unir para decidir se devem alterar um preço ou
oferecer uma promoção especial, e essa decisão terá de ser implementada
em semanas em vez de em meses.23

Applegate apresenta exemplos comuns de equipes. As equipes ope‑


racionais são constituídas de gerentes intermediários de diversas espe‑
cialidades relevantes, que recebem autoridade para definir, executar e
gerenciar a estratégia de operação. Nas estruturas mais planas, horizon‑
talizadas, que caracterizam a nova forma organizacional, essas equipes
normalmente estão localizadas em dois níveis: empregados de linha e
gerência sênior. Uma grande empresa de produtos petrolíferos dá um
exemplo de reestruturação em que passou de uma hierarquia tradicio‑
nal para equipes operacionais. Em meados dos anos 1980, a empresa ti‑
nha nove níveis hierárquicos administrativos acima dos operários; com
a reestruturação, esses níveis foram reduzidos para quatro. Equipes da
área operacional que se reportavam a gerentes de operações ficavam
imediatamente abaixo destes. As equipes substituíram o que antes era
composto por quatro níveis de gerência intermediária. Outros tipos de
equipe incluem as que gerenciam seu trabalho de maneira autônoma,
as equipes gerenciais de processo criadas para coordenar, controlar e
aperfeiçoar as operações, além das equipes de criação de conhecimento
estabelecidas para gerar novas ideias e soluções conforme os objetivos
da corporação.
As equipes, assim como a criação das mesmas, serão discutidas
no próximo capítulo, em relação a sua contribuição para a integração
organizacional.

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Resumo
1. Apesar da crítica generalizada à hierarquia, a maioria das empresas
acredita ser difícil evitá­‑la quando crescem.

2. Na organização convencional, a hierarquia é caracterizada por uma


escada muito clara de autoridade e responsabilidade que forma uma “ca‑
deia de comando”. A hierarquia é uma forma vertical de especialização,
106 baseada em três princípios históricos da administração: cadeia escalar de
autoridade; unidade de comando; e esfera de controle.
parte ii  novas formas internas

3. Uma razão para a persistência da hierarquia é que ela corresponde à


necessidade que as pessoas têm de uma estrutura social de status e poder.
Outras razões, no entanto, estão relacionadas ao funcionamento eficiente
de uma organização, como:

„„a conveniência de níveis diferenciados de autoridade e responsa‑


bilidade, para distinguir diferentes níveis de tomada de decisão e
responsabilidade;

„„a ideia de que a hierarquia decorre naturalmente da liderança;

„„a necessidade de definir níveis de gerência para controlar e coorde‑


nar uma organização grande e complexa.

4. Não obstante, a hierarquia convencional tornou­‑se cada vez mais ina‑


dequada para as condições modernas dos negócios, em que a capacidade
de uma empresa de se adaptar e inovar é decisiva para sua competitivida‑
de. Entre os aspectos negativos estão os seguintes:

„„a manutenção do status quo;

„„a criação de barreiras verticais de comunicação;

„„o mau uso dos talentos das pessoas na base da organização;

„„o aumento dos custos administrativos;

„„desmotivação entre empregados e o sentimento de distância em


relação aos gerentes seniores;

„„a deformação dos níveis reais de responsabilidade, transformando­


‑os em meras diferenças em termos de status.

Book_Organizaçoes.indb 106 16/9/2011 16:23:26


5. A evolução da nova organização é caracterizada por uma tentativa de
minimizar os problemas da hierarquia inadequados às condições atuais.
O objetivo é reduzir a hierarquia e introduzir estruturas mais simples, que
permitam iniciativas de baixo para cima, comunicação mais aberta e de
amplo alcance, e mais envolvimento de toda a equipe. A autoridade é cada
vez mais conferida a grupos de trabalho, em vez de permanecer confinada
a determinados cargos hierárquicos. A comunicação é mais aberta e a in‑
formação mais disseminada. O controle é mantido menos por meio da su‑
107
pervisão administrativa direta e mais por metas e normas internalizadas.

Estruturas mais simples


6. Atualmente há também a tentativa consciente de minimizar a quantida‑
de de níveis hierárquicos. A redução de níveis, ou horizontalização, está
estreitamente associada ao downsizing, porque o tamanho tem grande in‑
fluência no número de níveis hierárquicos. Em muitos casos, o downsizing
é apenas uma reação a uma breve deterioração no desempenho da empre‑
sa. Contudo, uma visão mais estratégica admite que o downsizing é uma
oportunidade para introduzir reformas organizacionais.

7. As consequências da redução de níveis hierárquicos e do downsizing


no desempenho da empresa são afetadas pela maneira como essas altera‑
ções são introduzidas. Sem um planejamento cuidadoso, mecanismos de
proteção para os empregados e incentivos para manter o staff indispensá‑
vel, o downsizing pode ter efeitos negativos sobre os gerentes e o pessoal
remanescente, além de resultar em séria perda da memória corporativa.

8. Uma das maneiras de se obter a horizontalização da estrutura organiza‑


cional é transformar níveis hierárquicos em equipes de trabalho. Equipes
oferecem outras vantagens organizacionais potenciais, especialmente para
integrar as contribuições entre departamentos ou de especialistas.

Questões para discussão


1. Quais são as principais razões para a persistência da hierarquia nas
organizações?

2. Quais são as principais características da hierarquia na organização


convencional? Em que princípios se baseiam?

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3. Descreva e discuta os aspectos negativos da hierarquia.

4. Quais são as características essenciais da hierarquia nas novas formas


organizacionais? Em que princípios se baseiam?

5. Faça a distinção entre o downsizing e a horizontalização, e discuta como


esses conceitos estão potencialmente relacionados.

108 6. Como a horizontalização pode ser obtida de maneira construtiva?


parte ii  novas formas internas

Notas
1. JAQUES, Elliott . In praise of hierarchy. Harvard Business Review, p. 127, jan./
fev. 1990.

2. SEMLER, Ricardo. Maverick! London: Random House, 1993.

3. SIMMS, Jane. Keeping up appliances. The Director, p. 46­‑49, fev. 2002.

4. Esta discussão foi extraída da obra de JAQUES, Elliott. Veja, em especial, os li‑
vros Measurement of responsibility. London: Tavistock, 1956; A general theory
of bureaucracy. London: Heinemann, 1976.

5. BARKDULL, C. W. Span of control: a method of evaluation. Michigan Business


Review, 15, p. 25­‑32, 1963.

6. CAIRNCROSS, Frances. The company of the future: how the communications


revolution is changing management. Boston: Harvard Business School Press,
2002.

7. Para um resumo da evidência, veja: CHILD, John. Organization: a guide to


problems and practice. London: Harper & Row, 1984. cap. 3.

8. URWICK, Lyndall. The manager's span of control. Harvard Business Review,


34(3), p. 39­‑47, mai./jun. 1956.

9. BRUTON, Garry D.; KEELS, J. Kay; SHOOK, Christopher L. Downsizing the


firm: answering the strategic questions. Academy of Managemenl Executives,
10(2), p. 38­‑45, 1996.

10. CASCIO, Wayne F. Responsible restructuring. San Francisco: Berrett­‑Koehler,


2002.

Book_Organizaçoes.indb 108 16/9/2011 16:23:27


11. SKAPINKER, Michael. How to manage in a downturn. Financial Times, p. 21,
9 abr. 2001.

12. CASCIO, Wayne F. Downsizing: what do we know? What have we learned?


Academy of Management Executive, 7(1), p. 95­‑104, 1993.

13. Rewarding employees. The Economist, p. 65, 2 fev. 2002.

14. WAPLES, John; GODSON, Rory. Consignia to cut 30.000 jobs in drive for mail
efficiency. The Sunday Times, p. 2, 13 jan. 2002. 109

15. LAZONICK, William; O'SUILIVAN, Mary. Maximizing shareholder value: a

Estruturas mais simples


new ideology for corporate governance. Economy and Society, 29, p. 13­‑35,
2000.

16. Newsweek, 26 Feb. 1996, p. 44, citado por MORRIS, James R; CASCIO Wayne
F; YOUNG, Clifford E. Downsizing after all these years: questions and answers
about who did it, how many did it, and who benefited from it. Organizational
Dynamics, p. 78­‑86, 1999.

17. LITTLER, Craig R. Comparing the downsizing experiences of three countries:


a restructuring cycle? In: BURKE, Ronald J.; COOPER, Cary L. (Org.). The
Organization in Crisis. Oxford: Blackwell, 2000. cap. 4.

18. MORRIS, James R.; CASCIO, Wayne F.; YOUNG, Clifford E., 1999. Os au‑
tores informam os resultados de uma pesquisa de 3.628 companhias norte­
‑americanas em um período de 15 anos.

19. BROCKNER, J.; WEISENFELD, B. M. Living on the edge of social and orga‑
nizational psychology: the effects of layoff on those who remain. In: MURNIN‑
GHAM, K. (Org.). Social psychology in organizations: advances in theory and
research. New Jersey: Prentice Hall, 1993. p. 119­‑140.

20. LITTLER, 2000, op. cit.

21. PETTIGREW, Andrew M.; FENTON, Evelyn M., (Eds.). The innovating orga‑
nization. London: Sage, 2000. p. 37.

22. KIVIMÄKI, Mika; VAHTERA, Jussi; GRIFFITHS, Amanda; COX, Tom;


THOMSON, Louise. Sickness absence and organizational downsizing. In:
BURKE, Ronald J.; COOPER, Cary L. (Org.)., 2000. cap. 5.

23. APPLEGATE, Lynda M. Designing and managing the information age organi‑
zation. Harvard Business School, notas 9­‑196­‑003, p. 14­‑15, 1995.

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Capítulo 4
Como obter a integração

Conteúdo do capítulo
Este capítulo discute a contribuição da organização para a obtenção da
integração – uma situação em que há coordenação adequada entre atividades
diferentes, mas complementares, que agregam valor coletivamente. A integração
é um produto essencial da boa organização, embora muitas vezes subestimada.
O capítulo começa examinando a necessidade de integração, que é mais difícil
de se obter conforme as organizações se tornam mais complexas e diferenciadas.
São identificadas diversas áreas em que podem surgir problemas de integração.
O capítulo mostra como uma integração deficiente conduz ao desastre e como
a boa integração pode criar dinamismo de grande valor. Mais adiante, outra
seção aponta indícios de que as necessidades de integração não estão sendo
correspondidas, e é apresentada uma útil ferramenta de diagnóstico. Uma série
de mecanismos organizacionais visa promover a integração, cada um apropriado
para os diferentes níveis e tipos de integração necessária. Para encerrar, é feita
uma discussão sobre a importância do trabalho em equipe, frequentemente
utilizado como meio para melhorar a integração.

4.1 O conceito
Integração significa coordenação, coesão e sinergia entre as diferentes
funções ou unidades em uma organização, cujas atividades são diferentes,
mas interdependentes na criação de valor. O conceito pode ser aplicado

Book_Organizaçoes.indb 111 16/9/2011 16:23:27


a relações verticais, referindo­‑se especialmente a um processo coeso do
controle, no qual os planos são implementados conforme previsto e há o
devido feedback sobre os resultados. No entanto, a integração normal‑
mente é aplicada a relações horizontais ou laterais existentes na organi‑
zação, ou entre uma série de organizações que formam uma rede para
cumprir determinada tarefa.

112 4.2 A necessidade de boa integração


As necessidades de integração pressionam mais do que nunca as em‑
parte ii  novas formas internas

presas que adotam configurações operacionais cada vez mais complexas,


em resposta à globalização e à competição intensa. Para aproveitar as
oportunidades oferecidas pela globalização, as empresas estão ampliando
a esfera de seus mercados internacionais e de suas fontes de fornecimento.
As multinacionais também estão distribuindo globalmente sua produção
em locais que oferecem custos favoráveis e outros recursos, ao passo que
os fornecedores de serviços em âmbito internacional estão abrindo mais
pontos de venda para estar perto de clientes novos. Quando uma empresa
desenvolve suas atividades internacionais, já não basta administrá­‑las por
meio do mecanismo de uma única divisão especializada. Sua natureza
multifuncional e multirregional se torna muito complexa e o que ante‑
riormente era um terreno nacional se incorpora ao domínio internacio‑
nal. Essas empresas agora requerem integração por meio de um sistema
que coloca juntas as atividades multidimensionais – tipicamente forma de
uma organização matricial.
A competição crescente é outro fator importante que demanda novas
necessidades de integração. São evidentes os efeitos em todas as princi‑
pais áreas funcionais, especialmente marketing, pesquisa e desenvolvi‑
mento e garantia de qualidade. Os mercados podem ser expandidos e
as margens aumentadas por meio de maior sensibilidade à segmentação
do mercado, o que dá origem a uma variedade maior de produtos e ser‑
viços que, em alguns setores, têm de ser complementados por suporte
pós­‑venda local. Para manter alguma homogeneidade nesse portfólio de
marketing mais complexo e para assegurar sua compatibilidade em re‑
lação à capacidade de fornecimento, torna­‑se necessária a coordenação
mais intensa.
Em pesquisa e desenvolvimento (P&D), destacam­‑se três fatores
que aumentam a necessidade de integração. O primeiro é a necessidade

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de se colocar novos produtos no mercado em tempo bem mais curto, a
fim de competir com as novidades disponíveis no mercado. Levar novos
produtos ou serviços ao mercado em menos tempo obriga as empresas
a se empenharem em atividades de desenvolvimento simultâneas e não
sequenciais. O desenvolvimento simultâneo impõe novos requisitos de
integração entre as atividades dos níveis superiores e inferiores, principal‑
mente para evitar falhas de informação. O segundo fator é a tendência de
instalar atividades de P&D perto dos mercados mais importantes de uma
113
empresa, para melhor alinhar os projetos com as necessidades do mer‑
cado e também para explorar recursos escassos, como pessoal altamente

Como obter a integração


qualificado. As empresas também estão estabelecendo mais parcerias de
P&D e tecnologia. Quanto mais a P&D e as atividades relacionadas a ela
estiverem dispersas pelo mundo e/ou entre diferentes companhias, maior
será a dificuldade de integrá­‑las em torno das metas de determinados
projetos e programas. O terceiro fato diz respeito aos gastos significativos
com P&D, o que tem estimulado a formação de parcerias de tecnologia
em alguns setores, tornando a duplicação extremamente cara. Tal fato
confirma a ideia de que a empresa deve se concentrar em seus pontos
fortes e centrais da P&D. Quando essa política é adotada, é provável que
as instalações de P&D da empresa tenham de atender a muitos de seus
negócios simultaneamente, e isso traz necessidade de integração.
A garantia de qualidade é outra área em que a coordenação se torna
cada vez mais crucial. De modo geral, as empresas estão expandindo sua
linha de produtos e seu enfoque geográfico. Para manter a integridade de
suas marcas e sua reputação, a empresa terá de assegurar bons níveis de
qualidade em uma linha de produção mais ampla, com diversos pontos
de distribuição. Isso gera a necessidade de integração e controle, princi‑
palmente de assegurar que a informação sobre a fabricação e entrega do
produto ou sobre a prestação de serviços seja devidamente transmitida a
uma unidade central de garantia de qualidade, e que a empresa prepare
sua equipe dispersa de maneira adequada para assegurar padrões compa‑
tíveis com sua política e normas de qualidade.

4.3 Conseguir a integração é um desafio


A falta de integração é uma das acusações mais frequentes das orga‑
nizações. “A mão direita não sabe o que a mão esquerda está fazendo”,
essa é a queixa comum de clientes e consumidores.

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É relativamente fácil falar da necessidade de integração adequada,
mas não é tão simples obtê­‑la. Por mais estranho que pareça, a integra‑
ção também recebe menos atenção do que outras questões na literatura
disponível para os gestores. Conseguir a integração em geral é mais difícil
nos países que têm forte cultura individualista, como o Reino Unido e os
Estados Unidos, que em países como o Japão, cuja cultura está mais vol‑
tada para atividades coletivas. Problemas de integração são comuns em
muitos aspectos da vida organizacional. Os exemplos a seguir ilustram o
114
quão amplo pode ser o alcance destes problemas.
parte ii  novas formas internas

4.3.1 Integração entre funções


Um dos problemas mais comuns da integração aparece no relacio‑
namento entre as diferentes funções ou especialidades existentes em
uma empresa. O problema se apresenta de forma mais notável nas rela‑
ções entre funções que precisam se adaptar continuamente ao ambiente
externo, como vendas, relações com os clientes e compras e aquelas
responsáveis pela produção de bens ou serviços conforme parâmetros
relativamente fixos estabelecidos na empresa, como áreas de equipa‑
mento e design. Esse é o problema de integrar as “periferias” de uma
organização com seu “centro”. Porém, sem a integração, uma organi‑
zação não é viável.
No Quadro 4.1 temos o exemplo de um problema de integração en‑
tre vendas e produção, que ilustra como a empresa superou muito bem
essa dificuldade estabelecendo uma unidade especializada de integração.
Atualmente, a mesma solução poderia ter como base um sistema de TI,
que concilia automaticamente o pedido, a alocação das capacidades e
considerações acerca da programação, segundo procedimentos e priori‑
dades acordadas.
Outra empresa viu­‑se diante de problemas de integração entre a equi‑
pe de compras e outros departamentos internos, como o de engenharia e
o de produção.1 As responsabilidades básicas do comprador eram:

1. negociar e fazer o pedido de materiais junto a fornecedores exter‑


nos nos melhores termos possíveis, mas somente de acordo com as
especificações estabelecidas por outros;

2. despachar os pedidos, ou seja, manter a comunicação com os forne‑


cedores para assegurar que as entregas fossem feitas no prazo.

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Quadro 4.1  Integração inadequada entre vendas e produção

Uma empresa tinha seis departamentos de vendas e dezoito fábricas diferentes.


Havia constantes conflitos entre o pessoal da produção – que desejava limitar
a linha de produtos para aumentar o volume da produção de cada um deles e
reduzir custos unitários – e o departamento de vendas – que tentava forçar a
produção a aceitar as especificações exatas dos clientes, sem levar em conta
a necessidade de padronização. Também surgiram conflitos entre os diferen‑
tes departamentos de vendas, porque cada um procurava assegurar a data de 115
entrega mais rápida possível para seus clientes, sem levar em conta o progra‑

Como obter a integração


ma das prioridades estabelecidas pela companhia. Tais prioridades favoreciam
certos tipos de pedidos, como os de exportação e os de clientes selecionados
(maiores e mais importantes). Como os vendedores haviam sido recrutados
entre o pessoal da produção, conseguiam dar tratamento preferencial para os
“próprios” clientes, por meio de negociações informais com os antigos colegas.
Esses problemas causaram grandes ineficiências internas, além de incertezas
para os clientes. A empresa superou­‑os muito bem, estabelecendo um “depar‑
tamento de organização de relacionamento de vendas” entre os departamentos
de vendas e produção. As principais funções desse departamento eram garantir
a informação sobre a capacidade de produção e as necessidades das vendas,
coordená­‑las em relação a prazos de entrega para os clientes, atuar como liga‑
ção entre os setores de vendas e de produção, mantendo­‑os informados sobre
as exigências uns dos outros, formular uma política de preços compatível e
manter as estatísticas, enviando relatórios de produção ao presidente e à direto‑
ria. Antes, nenhum dos seis departamentos de vendas podia se comunicar com
quaisquer das dezoito fábricas, e depois da reorganização a comunicação entre
as funções passou a ser administrada pelo novo departamento.
Foram criadas instruções detalhadas sobre como o novo departamento deveria
funcionar. Por exemplo, ele deveria alocar os pedidos para a fábrica que tives‑
se capacidade de produção requerida e fosse mais conveniente para entregar
ao cliente; deveria repassar as datas de entrega aos departamentos de vendas
conforme o sistema de prioridades da empresa; e, além disso, acompanharia os
pedidos.

Fonte: SYKES, A. J. M; BATES, J. Study of conflict between formal company policy and the
interests of informal groups. Sociological Review, p. 313­‑327, nov. 1962.

Surgiram conflitos porque os engenheiros davam especificações


exatas sem deixar nenhum poder de decisão para o comprador. A esses

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problemas se somavam a formação e a credibilidade profissional dos en‑
genheiros, cujas maiores preocupações eram a qualidade e a confiabilida‑
de, enquanto os compradores estavam preocupados em conseguir preços
mais baixos e rapidez na entrega. Os conflitos com a produção surgiram
porque os responsáveis pelo planejamento exigiam prazos de entrega cur‑
tíssimos (pressionados pelo setor de vendas) ou faziam pedidos em quan‑
tidades nada econômicas.
Em uma tentativa de diminuir esses problemas, o pessoal de com‑
116
pras adotou vários métodos – alguns principalmente para se proteger,
outros para melhorar a integração. Usaram o contato direto para per‑
parte ii  novas formas internas

suadir outros departamentos a levar em conta os critérios de compra


e tentaram modificar o padrão do fluxo de trabalho para regularizar a
situação. Por exemplo, os responsáveis da área de compras pediam ao
pessoal da produção que verificassem junto ao departamento de com‑
pras a possibilidade de entregar rapidamente o que era solicitado antes
de fazer um pedido.

4.3.2 Integração operacional


Um grande desafio nas operações é disponibilizar para a produção, de
forma constante e confiável, uma série de serviços de apoio necessários.
Esses serviços são de natureza tecnológica (como a engenharia industrial,
a engenharia de produção e o controle de qualidade), financeira (controle
orçamentário, custos e informação de controle administrativo), pessoal
(contratação e treinamento) e planejamento (controle da produção). Em
uma fábrica grande e complexa, com muitas linhas de produção, a inte‑
gração de tais serviços representa uma tarefa árdua para a gerência de
produção.
Uma tentativa para obter melhor integração dos serviços foi realizada
na maior fábrica de doces de uma corporação multinacional de alimen‑
tos. O conceito empregado foi o do “time do diretor da fábrica”, inicial‑
mente aplicado aos gerentes de função e depois levado progressivamente
para níveis inferiores, na forma de equipes integradas. Anteriormente,
produção, controle de qualidade, engenharia industrial, manutenção,
contabilidade administrativa, relações trabalhistas, emprego e outras ati‑
vidades eram organizadas de maneira rigorosamente funcional. Contudo,
isso não resultou em um relacionamento de trabalho eficiente entre a
produção e as funções de prestação de serviço. Por exemplo, os gerentes
do departamento de produção achavam que as informações sobre custos

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e variações apresentadas pelos gerentes da contabilidade não estavam no
formato adequado às suas necessidades, mas determinadas por conven‑
ções oriundas do escritório do diretor financeiro.
Em comparação, a equipe do diretor da fábrica está muitíssimo bem
integrada com todas as funções, envolvendo o diretor da fábrica e seus
subordinados imediatos da produção, o gerente sênior da contabilidade,
o gerente encarregado dos serviços de produção (basicamente serviços
da fábrica e emprego), os gerentes de relações trabalhistas e os gerentes
117
de controle de qualidade. No nível abaixo na hierarquia da produção,
os gerentes seniores de produção, por sua vez, têm o apoio das próprias

Como obter a integração


equipes, abrangendo contabilidade, serviços de produção e controle de
qualidade. A função da contabilidade foi ampliada e adquiriu um papel
de “desempenho financeiro”, voltado para ajudar na melhoria do desem‑
penho bem como no controle financeiro.
Esse método de integrar produção e serviços auxiliares melhorou em
grande parte a qualidade da informação disponível para a produção e
seus padrões de desempenho. Após alguns anos, facilitou também o pla‑
nejamento e a implementação da nova fábrica na qual, por meio de TI,
programação da produção, qualidade, custos e manutenção estão combi‑
nados e integrados num sistema informatizado e de controle. Além disso,
essa tendência permitiu considerável redução no número de empregados,
processo definido pelo pessoal conjuntamente com o planejamento da
produção.
Sempre há espaço para discussão a respeito de quais funções deve‑
riam ser integradas à produção no sentido de reportação formal. No caso
descrito, o controle de qualidade e a gerência de recursos humanos não
eram diretamente responsáveis pela produção. As razões para isso eram
preservar uma visão independente sobre os padrões de qualidade espe‑
cialmente cruciais em uma empresa de alimentos e, no caso da gerência
de RH, preservar as economias de escala e racionalização funcional, visto
que esta ainda atende a todas as áreas administrativas do local (abran‑
gendo muitos departamentos divisionais e a sede regional). Outro aspecto
que vale a pena observar neste caso é que, além da integração horizontal
mediante a criação de equipes de gerenciamento de produção, a integra‑
ção vertical foi incentivada pela sobreposição hierárquica dos membros
dessas equipes. Seguindo o princípio dos “pontos de ligação” defendido
por Rensis Likert, os gerentes de produção são parte da equipe de seus
superiores hierárquicos.2

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4.3.3 Outras áreas com problemas de integração
As outras áreas em que normalmente aparecem problemas de integra‑
ção são: (1) coordenação entre matriz e divisões em uma multinacional,
(2) inovação, (3) desenvolvimento simultâneo e (4) a coordenação dos
serviços complementares oferecidos por profissionais diferentes.

A INTEGRAÇÃO ENTRE OS NÍVEIS CORPORATIVOS E DIVISIONAIS


118 O caso de uma grande empresa diversificada mostra como a separa‑
ção entre níveis corporativos e divisionais em uma estrutura multidivi‑
parte ii  novas formas internas

sional pode criar um problema sério. Nesse caso, o desenvolvimento do


negócio era a atividade não coordenada. A empresa tinha uma função
de planejamento corporativo na sede, que reunia informações para iden‑
tificar áreas de negócios completamente novas para diversificar. Cada
uma das divisões também tinha o próprio departamento de planejamen‑
to, que obtinha e avaliava informações externas que pudessem indicar
modificações desejáveis para os produtos existentes. Esses dois níveis de
planejamento da atividade não tinham nenhuma coordenação, de forma
que não havia nenhum esforço voltado para a área talvez mais fértil para
expansão: o desenvolvimento de novos produtos entre os negócios exis‑
tentes da companhia. Os planejadores de cada nível, tanto corporativo
como divisional, pressupunham que o outro havia assumido esse aspecto
da P&D.

INOVAÇÃO
Muita atenção tem sido dedicada à maneira como cientistas e outros
especialistas organizam seu trabalho para promover inovação mais eficaz
de produtos e processos.
Esse desafio se divide em dois requisitos potencialmente conflitantes
para a integração, relacionados à invenção e às etapas de implementa‑
ção do processo de inovação. O primeiro requisito é integrar as contri‑
buições dos diferentes especialistas criativos. Em geral, é desejável que
eles trabalhem em grupo, desde que tenham autonomia para desenvolver
soluções criativas. Tal autonomia dá ao grupo uma identidade e o livra
de interferências, motivando os processos criativos e estimulando o tra‑
balho coeso. O segundo requisito, no entanto, é que as inovações este‑
jam integradas a uma estratégia e às principais atividades da empresa.
Para tanto, o grupo criativo deve ter metas claras e não pode se isolar de

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outros departamentos ou unidades de cujas funções ou trabalho depende
o sucesso da implementação e comercialização da inovação (no caso de
um novo produto). O grupo criativo deve estar ligado a toda a organi‑
zação de forma que seu trabalho seja devidamente orientado e para que
os desenvolvimentos sejam aceitos. Isso reflete o princípio básico de que,
ao menos para as empresas que buscam o lucro, é fundamental que a
invenção seja baseada em considerações acerca de sua implementação e
aceitação comerciais.
119
O tipo de organização normalmente utilizado para satisfazer esses
requisitos é a equipe de projeto, que será discutida mais adiante neste

Como obter a integração


capítulo. Essa equipe é estabelecida pelo tempo de duração do projeto,
do início até o encerramento, reunindo todas as pessoas que possam fa‑
zer contribuições relevantes. Sua composição pode mudar conforme o
projeto avança para diferentes fases. Para corresponder aos requisitos de
invenção e implementação da integração já discutidos, é importante que
participem da equipe de projeto não apenas o staff científico e técnico,
mas também representantes de outras áreas importantes para a viabili‑
dade econômica de um novo projeto. Por exemplo, no caso de um novo
produto, essa questão diz respeito a seu potencial de atração no mercado
ou a se pode ser produzido com eficiência e confiabilidade. Entre as áreas
pertinentes estão as funções do marketing ou de contato com o consu‑
midor, custos, engenharia de produção ou equivalentes. Estudos sobre a
inovação indicam que uma das mais frequentes razões do fracasso comer‑
cial de um novo produto é a falta de compreensão das necessidades do
consumidor, o que mostra ausência grave de integração entre a equipe de
pesquisa e a de marketing.

DESENVOLVIMENTO SIMULTÂNEO
Refere­‑se à prática de realizar atividades de desenvolvimento em pa‑
ralelo e não em sequência, o que tornou­‑se um modo comum de organizar
o desenvolvimento de produtos em setores como o automotivo, no qual,
desde os anos 1980, o tempo para se colocar um produto no mercado
ganhou importância como fator de competitividade. Christian Teriesch e
seus colegas descrevem sucintamente a natureza dos problemas da inte‑
gração em situações desse tipo:

Com uma programação de projeto apertada, muitos engenheiros não


podem se permitir esperar até que toda a informação necessária esteja

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disponível, e têm de começar “no escuro”, o que exige rigorosa coorde‑
nação com outras atividades independentes. A coordenação entre tarefas
estreitamente relacionadas (interdependentes) força as equipes a com‑
partilhar as informações preliminares sobre o trabalho em andamento. Os
pedidos de ferramentas da produção devem basear­‑se em esboços rudi‑
mentares do produto, os conceitos do produto devem ser desenvolvidos
enquanto permanece a incerteza sobre as necessidades do consumidor, e
120
os componentes devem ser especificados enquanto os sistemas de intera‑
ção ainda estão em desenvolvimento.3
parte ii  novas formas internas

Essas questões dão origem a dois problemas fundamentais de coor‑


denação. Um diz respeito à maneira como as pessoas trabalhando no
projeto podem informar aos do baixo escalão que a informação passada
é apenas preliminar. O segundo é como o pessoal do baixo escalão deve
usar essa informação preliminar, averiguar sua exatidão e saber se irá
mudar. Esses problemas representam as dificuldades envolvidas na in‑
tegração de atividades interdependentes de alto e baixo escalão para a
obtenção de melhores resultados.

COORDENAÇÃO DE SERVIÇOS PROFISSIONAIS


A integração de diferentes especialidades profissionais é sempre
difícil devido a culturas diferentes e fortes convicções de identidade
ocupacional. Muitos alunos de MBA devem ter sentido esse problema
entre seus professores, o que levou muitas escolas de administração a
se esforçarem para integrar especialistas em determinados assuntos nas
equipes dos programas. Os serviços sociais constituem outra área de
trabalho profissional em que a integração deficiente teve consequências
trágicas. Muitos dos casos de mortalidade infantil na Grã­‑Bretanha
poderiam ter sido evitados se as relações de trabalho entre os gru‑
pos envolvidos fossem mais próximas. Publicado em 1968, o Relatório
Seebohm, sobre os serviços sociais na Inglaterra e no País de Gales,
pedia melhor integração das contribuições dos diferentes especialistas,
que deveriam abandonar a divisão entre saúde, criança, bem­‑estar so‑
cial, psiquiatria e outros campos, voltando­‑se para uma abordagem
“genérica”. Por exemplo, era muito comum um caso de ruptura fami‑
liar ser tratado separadamente por diferentes profissionais, por falta
de coordenação entre eles, gerando confusão nos clientes. Depois do

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Relatório Seebohm, os departamentos de serviço social trataram des‑
se problema de diversas maneiras: normalmente, montavam equipes
de trabalho social, nas quais os especialistas trabalhavam de maneira
conjunta, ou entregavam a um determinado assistente social a respon‑
sabilidade por certos casos. Entretanto, o problema ainda não foi intei‑
ramente resolvido. Um relatório oficial publicado em outubro de 2002
– Protegendo as crianças – observou que oito serviços separados que
trabalhavam com crianças tinham interpretações inconsistentes acerca
121
de suas responsabilidades.4
A saúde é outro campo em que a integração de diferentes contribui‑

Como obter a integração


ções profissionais continua sendo um desafio. Na maioria dos países a
saúde é tratada por uma série de profissões e disciplinas, organizadas em
hierarquias especializadas e discretas, de acordo com linhas funcionais.
No Serviço Nacional de Saúde britânico, equipes e grupos de trabalho
com relações horizontais têm sido usados há muitos anos na tentativa de
obter coordenação entre as fronteiras de tais especialidades. Por exemplo,
a utilização de equipes tem sido considerada indispensável para integrar
as contribuições de diferentes áreas de conhecimento e perspectivas no ní‑
vel local da administração dos serviços de saúde: medicina, enfermagem,
administração e finanças. Há também inúmeras equipes especializadas
no tratamento da saúde e prestadores de serviços afins, como médicos,
enfermeiros, assistentes sociais e psicólogos. Uma restrição ao trabalho
dessas equipes de base está na responsabilidade individual dos médicos
pelos pacientes sob seus cuidados – o que vai contra o princípio da res‑
ponsabilidade da equipe.

4.4 A falta de integração pode ser desastrosa


O exemplo da área de saúde ilustra como um fracasso na integra‑
ção pode ser literalmente desastroso. Evitar o possível desastre é uma
das razões primordiais pelas quais as organizações precisam assegurar a
integração de suas atividades interdependentes. Há casos em que o sis‑
tema entra em colapso quando tal fato é negligenciado. Na melhor das
hipóteses, atraso, frustração e desperdício são os resultados; na pior, a
consequência pode ser a perda de uma vida. Tomemos três exemplos, um
de algum tempo atrás e os outros dois mais recentes.
O relatório especial do Fundo Carnegie evidenciou a má adminis‑
tração de duas das maiores organizações de combate à fome no mundo,

Book_Organizaçoes.indb 121 16/9/2011 16:23:27


que deveriam prestar ajuda a 22 milhões de pessoas afetadas pela seca
na África Ocidental, após 1968. A Agência Norte­‑americana para o
Desenvolvimento Internacional (AID) e a Organização das Nações
Unidas para Alimentação e Agricultura (FAO) eram as duas agências em
questão. A doação dos países foi generosa: até outubro de 1973 mais de
vinte países haviam doado mais de 150 milhões de dólares. Mesmo as‑
sim, doenças e desnutrição permaneciam em níveis alarmantes, piores do
que os registrados em Bangladesh na mesma época. O relatório identifica
122
como culpada uma organização burocrática inadequada, com muitos
exemplos de integração inapropriada. Por exemplo, os telegramas de
parte ii  novas formas internas

aviso provenientes da área assolada pela seca não eram devidamente


checados ou não recebiam atenção: eram simplesmente colocados em ar‑
quivos espalhados pelo mundo. Mesmo depois do início da operação de
resgate, os planos mostraram que não havia nenhuma coordenação. Os
grãos se empilhavam em Dacar, no Senegal, porque não havia transporte
para levá­‑los ao interior. Um observador disse que as únicas criaturas
gordas que viu na área foram os ratos do porto de Dacar. O relatório
afirma que esse fracasso era devido em parte à falta de cooperação en‑
tre diferentes grupos e que, apesar da dedicação de muitos funcionários
em todos os níveis, todo o programa era obscurecido por fatores bu‑
rocráticos nos Estados Unidos ou na ONU, que não tinham qualquer
relação com o sofrimento humano na África – programas continuados
ou iniciativas negligenciadas pela inércia institucional, rivalidades entre
departamentos e agências, além da relutância em admitir publicamente
seus fracassos.
Será esse um caso extremo? Em termos de impacto em questões hu‑
manitárias sim, mas como exemplo de integração organizacional inade‑
quada, não. Vejamos outro exemplo.
Em meados dos anos 1990, como parte da privatização das ferro‑
vias britânicas, foi criada uma empresa chamada Railtrack para desen‑
volver, administrar e manter a malha ferroviária, fornecendo os serviços
de infraestrutura para as empresas privatizadas que operavam os trens.
A Railtrack recebeu 32.000 quilômetros de ferrovias e milhares de sinais,
pontes, túneis, viadutos e estações. Metade dos rendimentos da empresa
vinha indiretamente de recursos públicos, por meio de subsídios para as
empresas operadoras que, por sua vez, lhes possibilitam o pagamento
das tarifas de acesso à Railtrack. Em outubro de 2001, o governo britâ‑
nico assumiu a administração da empresa, movimento esse que obrigou

Book_Organizaçoes.indb 122 16/9/2011 16:23:28


a suspensão das negociações de suas ações e foi um precursor para sua
reestruturação, transformando­‑a em organização sem fins lucrativos. A
frustração do público e dos políticos com a Railtrack vinha de muitos
problemas, entre os quais excessivos custos dos projetos de moderniza‑
ção, enormes perdas e taxas assustadoras que ameaçavam os recursos
públicos.
Outra causa mais impressionante da perda da confiança do públi‑
co na Railtrack foi o descarrilamento fatal que aconteceu em Hatfield,
123
ao norte de Londres, no dia 17 de outubro de 2000. Esse desastre, que
aconteceu logo após uma colisão também fatal fora do terminal londri‑

Como obter a integração


no de Paddington, em 1999, deixou exposta uma grande falha na in‑
tegração dos arranjos para a manutenção da ferrovia. Um cronograma
do Financial Times sobre os acontecimentos que levaram à colisão de
Hatfield é apresentado no Quadro 4.2. Curiosamente, o problema de in‑
tegração surgiu da adesão da empresa a uma das ortodoxias da nova
organização: concentrar­‑se em sua competência principal – a adminis‑
tração e o desenvolvimento da malha ferroviária – e terceirizar as tarefas
rotineiras de baixo valor agregado, como a manutenção.
A manutenção da malha ferroviária talvez tenha sido considerada
uma atividade rotineira, de baixo valor agregado, mas é indispensável
para a segurança dos trens. Para realizá­‑la, a Railtrack tinha sete forne‑
cedores muito bem qualificados, que, por sua vez, repassavam o trabalho
para mais de dois mil subfornecedores. As provas apresentadas após esses
acidentes mostraram as graves consequências de tais arranjos organiza‑
cionais. Elas indicavam o fim da velha camaradagem entre os trabalhado‑
res da ferrovia que estavam habituados a problemas comuns, facilmente
detectados e consertados, e que podiam conversar uns com os outros.
Além disso, sinalizavam também a crescente falta de controle sobre o
pessoal e o padrão de seu trabalho.5
Houve falta de integração fundamental no sistema que veio logo após
o rompimento e a privatização da antiga ferrovia estatal. A falha estava
evidente tanto na organização do trabalho de manutenção quanto nas
relações entre as empresas que constituíam o sistema. Essas empresas bri‑
gavam constantemente entre si. Os fornecedores lutavam com a Railtrack
para terem acesso aos trilhos e a Railtrack lutava com as empresas ope‑
radoras do trem, que não queriam interrupção em seus horários. Até
mesmo dentro da Railtrack havia disputas constantes entre os departa‑
mentos, como os de produção e sinalização.

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Quadro 4.2  Contagem regressiva para o desastre

Inverno de 1999: Trechos com rachaduras nos trilhos são vistos pela primeira
vez na ferrovia próxima a Hatfield durante uma inspeção rotineira da Balfour
Beatty. A empresa informa o problema ao escritório regional da Railtrack, em
York, e recomenda “moer” o trilho para se livrar das rachaduras. Diariamente,
seiscentos trens passam sobre esses trilhos.
Dezembro de 1999: A Balfour Beatty entende que o problema é bastante sério
124
e que o trilho deve ser substituído – o que seria feito por outra empreiteira, a
Jarvis Fastline.
parte ii  novas formas internas

Janeiro de 2000: A Balfour Beatty diz à Railtrack que o trilho precisa ser
substituído.
Fevereiro de 2000: Engenheiro da Railtrack inspeciona o trilho com problema.
Março de 2000: A Railtrack chega à conclusão de que o trilho está em tão mau
estado que tem de ser substituído como “prioridade n° 1” – a mais alta categoria
de urgência. O trilho deve ser trocado dentro de um mês. Nenhum aviso para
redução da velocidade é posto no local. Uma “retenção” – quando nenhum trem
pode circular para o trabalho ser realizado – é marcada para o domingo, 19 de
março; um trem especial está designado para levar os trilhos ao local três dias
antes. Mas esse trem – propriedade da Railtrack, operado por ela sob gestão da
Jarvis – está atrasado. Os trilhos não podem ser levados, e a “retenção” é perdida.
Abril de 2000: Duas semanas depois, outra entrega de trilhos é marcada, mas
não acontece porque as linhas elétricas – operadas pela Balfour Beatty – não
foram desligadas. Na semana seguinte, uma terceira entrega é frustrada porque
mais uma vez o trem está atrasado e só conseguiu deixar alguns trilhos antes
de seguir em frente. No final do mês, é feita uma quarta tentativa, seis semanas
depois da primeira. Os trilhos são entregues.
Maio/agosto de 2000: A Railtrack demora quatro meses para entrar em acordo com
a Jarvis sobre a data para troca dos trilhos – embora haja uma interrupção de qua‑
tro horas entre os trens todas as noites e de oito horas todos os fins de semana.
Agosto de 2000: Os administradores da Railtrack e os da Jarvis finalmente
entram em consenso sobre a “retenção”, e a data para a troca dos trilhos é mar‑
cada para a última semana de novembro.
Setembro de 2000: A Railtrack está cada vez mais alarmada com o trilho que está
se deteriorando e dá ordens para que ele seja reparado por outra empreiteira,
a Serco. O inspetor de ferrovia da Balfour Beatty caminha pela linha depois do
reparo, e ela parece bem melhor. Os engenheiros agora temem que o reparo de
um trilho em condição tão ruim tenha feito mais mal do que bem.

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12h23, terça­‑feira, 17 de outubro: O trilho se rompe sob as rodas do expresso
GNER 12.10 Londres­‑Leeds poucas horas antes de o inspetor da Balfour Beatty
iniciar sua verificação semanal. Quatro pessoas no vagão­‑restaurante morrem,
70 ficam feridas, e começa a crise na malha ferroviária britânica.

Fonte: Financial Times, p. 4, 22 fev. 2001.

125
O terceiro exemplo de um grande desastre para o qual a falta de inte‑

Como obter a integração


gração contribuiu foi o acidente da nave espacial Columbia, no dia 1° de
fevereiro de 2003. A causa física do desastre foi uma fissura no sistema
de proteção térmica na ponta da asa esquerda da nave, originada por um
pedaço de espuma isolante que se desgarrou e atingiu a asa pouco depois
do lançamento. O comitê oficial de investigação do acidente da Columbia
encontrou uma série de deficiências organizacionais que levaram a esse
acidente e que estão resumidas no Quadro 4.3. A falta de integração foi
uma dessas falhas, incluindo barreiras à comunicação entre os gerentes
da missão e os engenheiros sobre o problema do choque da espuma. O
relatório concluiu que “deficiências na comunicação (...) foram a base
para o acidente da Columbia. Tais deficiências são produto da estrutura
pesada, burocrática e muito complexa do programa da nave espacial, e

quadro 4.3  Causas organizacionais do acidente com a


nave espacial Columbia

Emergiram métodos organizacionais e traços culturais prejudiciais à segurança,


entre os quais: confiar no sucesso passado em vez de utilizar bons métodos de
engenharia (como testar, para compreender por que os sistemas não funciona‑
vam segundo as exigências); barreiras organizacionais que impediam a comuni‑
cação eficaz de informação crítica para a segurança e impediam diferenças na
opinião de profissionais; falta de administração integrada entre os elementos do
programa, e a evolução de uma cadeia de comando e processos de tomadas de
decisão informais que funcionavam fora das regras da organização.

Fonte: Comissão de Investigação do Acidente da Columbia, Report, Washington: Government


Printing Office, ago. 2003. p. 9.

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da ausência de autoridade em duas áreas chaves responsáveis pela inte‑
gração da informação entre todos os programas e elementos no progra‑
ma da nave”.6 Mais especificamente, “no programa da nave espacial, o
Departamento de Órbita lida com muitas tarefas essenciais de integração,
embora pareça ser mais lógico que o Departamento de Integração as con‑
duza; o Departamento de Órbita não participa ativamente da Diretoria
de Controle da Integração; e os gerentes do Departamento de Órbita, na
verdade, estão em uma categoria acima de seus colegas do Departamento
126
de Integração. Esses papéis sem coordenação resultam em informação
conflitante e incorreta”.7
parte ii  novas formas internas

Os acidentes da nave espacial Columbia e da ferrovia Hatfield são


exemplos extremos e felizmente raros de como a falta de integração pode
ser desastrosa, mas sombras desse mesmo problema afetam muitas or‑
ganizações com bastante frequência. Um exemplo mais comum, já men‑
cionado no Quadro 1.4 do Capítulo 1, é o da empresa com uma divisão
que estava demitindo pessoas enquanto outra contratava profissionais
semelhantes, ao mesmo tempo e no mesmo local. Esse exemplo de baixa
integração não ameaçou a vida humana, mas foi bastante prejudicial à
reputação da empresa envolvida.

4.5 Integração efetiva pode criar


capacidade dinâmica
A integração inadequada pode ter sérias consequências negativas, mas
o outro lado da moeda mostra que uma competência superior na inte‑
gração é uma vantagem evidente para as empresas que enfrentam forte
competição.
A diferença decisiva para uma empresa que possui um conjunto de
bons recursos e tem competência distintiva está basicamente em sua capa‑
cidade de integrar esses recursos e aplicá­‑los com flexibilidade, de modo
a aproveitar as novas oportunidades. O conceito de “capacidades dinâ‑
micas” apreende essa competência. David Teece define tais capacidades
como “a habilidade de avaliar e aproveitar as novas oportunidades, de
reconfigurar e proteger o conhecimento, as competências e os recursos
e tecnologias complementares para obter vantagem competitiva susten‑
tável”.8 A criação de capacidade dinâmica requer integração efetiva en‑
tre os que buscam novas oportunidades de negócios e os que decidem

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sobre a configuração dos recursos e competências para aproveitar essas
oportunidades.
A organização convencional depende da integração entre oportuni‑
dade e resposta, por meio da coordenação e tomada de decisões da dire‑
toria. A nova filosofia organizacional dá preferência à descentralização
de tais iniciativas, para que as pessoas diretamente envolvidas possam se
reunir e decidir como reconfigurar as capacidades sem ter de depender da
decisão de diretores distantes do cenário ou ter que esperar por ela.
127
O uso da integração direta de forma descentralizada foi chamado
de “organização lateral”, em oposição à organização tradicional “ver‑

Como obter a integração


tical” ou hierárquica.9 A descentralização é conseguida recriando uma
organização em microcosmo para a questão que está sendo analisada.
Cada unidade que detém um ativo relevante – conhecimento, tecnologia,
recursos humanos, ligações com fornecedores de recursos externos e as‑
sim por diante – contribui com um representante para a solução coletiva
do problema. Assim é formado um grupo de decisão, reunindo lado a
lado pessoas de toda a organização. Esse grupo equivale a um gerente
geral para a questão que está sendo tratada e, evidentemente, tem poten‑
cial para agir com rapidez e flexibilidade, porque integra diretamente as
pessoas com conhecimento pertinente, sem depender de quaisquer inter‑
mediários ou coordenadores externos. Usando uma abordagem lateral,
a organização pode aumentar sua capacidade de tomar decisões com
maior frequência e/ou maior rapidez. Também é muito provável que haja
melhoria na qualidade das decisões tomadas, uma vez que essa aborda‑
gem reúne pessoas com conhecimentos e recursos diretamente relacio‑
nados à questão discutida. Portanto, a integração horizontal visa reunir
as competências necessárias para tirar proveito de uma oportunidade ou
tratar de um problema de maneira dinâmica e criativa.
Jay Galbraith diz que há três tipos gerais de organização lateral. Uma
coordena as funções. O segundo tipo coordena as atividades entre uni‑
dades de negócios. O terceiro tipo coordena atividades entre os países.10
Já observamos diversos exemplos da necessidade de integrar as funções
e examinamos brevemente algumas das soluções adotadas. O caso da
companhia SMH, criada para resgatar a indústria relojoeira na Suíça, é
um bom exemplo de como a integração de unidades de negócios e países
foi usada para revitalizar uma organização ameaçada de extinção.
O Quadro 4.4 conta como Nicholas Hayek resgatou duas gi‑
gantes da indústria relojoeira suíça, a SSIH e a ASUAG, que corriam

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Quadro 4.4  Integração na SMH para criar um potencial dinâmico

Ao tornar­‑se diretor­‑superintendente da SMH, Hayek precisou decidir como


reestruturar a empresa de forma a alcançar o objetivo estratégico de reconquis‑
tar o mercado de massa para relógios e recuperar a lucratividade. Ele conseguiu
sair de uma situação em que a SMH teve uma perda de 124 milhões de dólares,
com vendas de 1,1 bilhão de dólares, em 1983, para um lucro de 2,1 milhões, com
vendas de 2,1 bilhões, em 1993.
128
A estratégia dele foi combinar a reputação suíça de excelência com técnicas de
produção tecnologicamente inovadoras, com linhas de produto muito bem defi‑
parte ii  novas formas internas

nidas e delineadas para competir em todo o espectro do setor relojoeiro global. A


tarefa era criar uma organização que pudesse apoiar sua estratégia. Ele integrou
o desenvolvimento e a fabricação do produto das unidades de negócios, combi‑
nando mais de cem pequenas operações ineficientes de fabricação e montagem
em uma só. Isso permitiu economia de escala e justificou a subsequente introdu‑
ção de tecnologias mais atualizadas. A produção em massa combinada às novas
tecnologias reduziu de forma significativa os custos de produção.
Hayek também descentralizou os setores de marketing, vendas e distribuição,
integrando essas funções nos diferentes países em torno das principais linhas
de produto da empresa. Tais funções ficaram sob o controle de gestores glo‑
bais de produto. Ao mesmo tempo, a SMH nomeou um gerente nacional em
todos os locais em que vendia relógios para manter e reforçar as conexões
locais com o consumidor.
O dinamismo das capacidades da SMH foi imensamente revigorado por esses
novos agrupamentos, que permitiram a integração em torno de competências
essenciais e pontos centrais. A empresa foi moldada em uma operação global
descentralizada, que dependia inteiramente da dinâmica entre seus gerentes,
ou seja, de sua disposição e habilidade para negociar e cooperar entre fron‑
teiras de função, produto e geografia. Para ter gerentes que pudessem operar
de maneira flexível, Hayek acabou por substituir todos os membros da equipe
executiva original.

Fonte: NADLER, David A.; TUSHMAN, Michael L. Competing by design: the power of organiza‑
tional architecture. New York: Oxford University Press, 1997. p. 71­‑72, 85­‑86.

risco de falir por causa da competição de produtores do Japão, Hong


Kong e Estados Unidos, que haviam adotado novas tecnologias eletrôni‑
cas na confecção de relógios. Quando banqueiros suíços assumiram o

Book_Organizaçoes.indb 128 16/9/2011 16:23:28


controle das duas empresas, eles as uniram, formando uma nova com‑
panhia chamada SMH. Pediram a Hayek, fundador de uma das mais
importantes consultorias da Suíça, que lhes mostrasse como salvar a
nova empresa e o convenceram a adquirir o controle da SMH e ser seu
diretor­‑superintendente.
A operação que Hayek assumiu estava extremamente fragmentada.
Havia uma coleção de mais de cem marcas diferentes, cada uma com a
própria função de P&D, fabricação e marketing. Em geral, as marcas
129
visavam consumidores em países do mundo inteiro. Assim, quando foi
criada, a SMH era uma mistura heterogênea de feudos que competiam

Como obter a integração


entre si. Para recuperar a competitividade e lucratividade da empresa,
Hayek teve de encontrar uma maneira de integrar funções, unidades de
negócios e países.

4.6 Indícios de que as necessidades de


integração não estão sendo atendidas
É cada vez mais improvável que empresas organizadas convencional‑
mente consigam lidar com as necessidades de integração impostas pela
exigência de tomar decisões e implementá­‑las sob condições de incerteza
e pressões de tempo. Existem alguns sinais comuns de advertência de que
tais necessidades de integração não estão sendo atendidas e de que é pre‑
ciso tomar providências no sentido de melhorar a capacidade integradora
da empresa.11

1. Conflito persistente entre departamentos. O ponto importante


aqui é admitir quando disputas sobre as mesmas questões são recorren‑
tes. Quando isso acontece, o conflito se torna inerente e muito maior que
um desacordo ocasional, que é esperado quando surgem novas questões
e pode produzir saudável variedade de soluções. A persistência do con‑
flito indica um fracasso básico na integração e é especialmente traiçoeira
quando as pessoas ou unidades envolvidas começam a aceitá­‑lo como
normal. Este é o perigo: quando uma ameaça ao desempenho proveniente
de um problema de integração deixa de ser questionada.
2. Obscurecendo as questões de integração por meio da proliferação
de reuniões formais. Reuniões formais, como as de comitês, são impor‑
tantes mecanismos para a integração, com a vantagem de representarem

Book_Organizaçoes.indb 129 16/9/2011 16:23:28


os vários interesses e, assim, preservarem o equilíbrio da visão e do po‑
der entre os departamentos. Não obstante, comitês e grupos de trabalho
podem acabar por obscurecer as disputas interdepartamentais e retardar
a resolução dessas disputas. Eles são fáceis de montar e imediatamente
proliferam em uma hierarquia. Reúnem­‑se apenas periodicamente, e a
junção de seus interesses aos procedimentos estabelecidos pelos comitês
podem dar origem à procrastinação e acordos insatisfatórios. Portanto,
a disseminação de comitês é, paradoxalmente, um sinal de que não está
130
havendo uma integração adequada por meios apropriados. Os comitês
podem ser mecanismos eficazes para chegar a consenso em questões que
parte ii  novas formas internas

envolvem a aplicação de determinadas regras e procedimentos, mas são


péssimos para a integração de esforços em torno de uma tarefa a ser rea‑
lizada ou troca informal de ideias e conhecimento tácito.
3. A sobrecarga da alta administração. Um modo de integração é
remeter as questões que exigem coordenação entre departamentos
para níveis superiores na hierarquia ou, em última análise, ao diretor­
‑superintendente. Isso, é claro, sobrecarrega o CEO, conflitando com o
tempo exigido por outras questões que também precisam ser atendidas e
só podem ser devidamente tratadas naquele nível – em especial, questões
importantes relativas às diretrizes e relacionamentos com grupos rele‑
vantes fora da organização. Dessa forma, a sobrecarga da diretoria pode
ser um indício de integração inadequada. Em seu extremo, os diretores e
outros gerentes sêniores podem se proteger evitando deliberadamente o
contato com os chefes de departamentos, deixando para eles os proble‑
mas de coordenação. Caso isso aconteça, o relacionamento hierárquico
estará rompido e seria melhor estimular os gerentes de nível intermediá‑
rio a trabalharem juntos nas questões pertinentes ao seu nível, em vez de
empurrá­‑las para cima em busca de uma decisão.
4. O ritual da burocracia. O uso de procedimentos e regras estabe‑
lecidos no papel, às vezes monitorados por relatórios em papel, é outra
maneira convencional que a administração pode buscar para assegurar
a integração. Por exemplo, os procedimentos podem especificar a neces‑
sidade de consulta entre dois departamentos a respeito de determinadas
questões. Um sinal de advertência acende quando os gerentes e outros
membros da organização deixam de seguir os procedimentos ou de le‑
var a sério os relatórios por escrito e estes tornam­‑se meros rituais. Isso
não significa que a burocracia deva ser reforçada; pelo contrário, já que

Book_Organizaçoes.indb 130 16/9/2011 16:23:28


ela pode significar que os procedimentos são deficientes e que talvez
essa não seja a melhor maneira de garantir a integração na situação em
questão.
5. Acúmulo de poder por parte dos coordenadores. Mais adiante
nesse capítulo mencionamos a necessidade que normalmente aparece de
apoiar a posição do coordenador, de modo que o indivíduo nessa função
possa exercer suficiente influência nos departamentos por ele coordena‑
dos – o que pode significar dar ao coordenador uma equipe de apoio.
131
Contudo, é importante que os papéis de coordenador não sejam reforça‑
dos de maneira excessiva. Um sinal de que os coordenadores deixaram

Como obter a integração


de ser úteis é quando eles começam a se opor às formas mais simples de
integração direta que parecem passar por cima deles. Se os coordena‑
dores tentam monopolizar a coordenação e bloquear as soluções mais
inovadoras para a integração, isso significa que a situação está fadada
ao fracasso.
6. Queixas de clientes, consumidores e outros grupos externos. Um
sinal certo da falta de integração é quando pessoas de fora que têm
negócios com a organização se queixam, por exemplo, de um departa‑
mento ter dito uma coisa e outro ter informado algo diferente; quan‑
do precisam entrar em contato com uma série de pessoas de diferentes
departamentos a respeito de uma única questão; ou quando o pessoal
de um departamento demonstra ignorância e, por vezes, indiferença à
pergunta sobre quem na organização poderia ajudar. Essas são falhas
muito comuns que obviamente depreciam a qualidade do serviço pres‑
tado pela organização, e num contexto comercial podem levar à perda
de negócios valiosos.

4.7 Uma ferramenta de diagnóstico


Os indícios de alerta apontam para a possibilidade de haver proble‑
mas de integração significativos em uma organização. Se for o caso, há
uma ferramenta simples e econômica para o diagnóstico que, pela minha
experiência, é útil para uma primeira identificação das áreas em que ocor‑
rem dificuldades. Pede­‑se aos gerentes e/ou membros das unidades que
deem suas impressões sobre onde estaria o foco do problema e o que esta‑
ria errado. Eles devem preencher um formulário semelhante ao apresen‑
tado na Figura 4.1, em particular ou por meio de uma rápida entrevista.

Book_Organizaçoes.indb 131 16/9/2011 16:23:28


parte ii  novas formas internas

132
Figura 4.1  Exemplo de método para avaliar as percepções da integração em uma organização
Gostaríamos de saber sobre o relacionamento entre as diferentes partes da nossa organização. Abaixo estão oito afirmações que descrevem

Book_Organizaçoes.indb 132
o relacionamento geral entre diversas unidades.
Por favor escolha a afirmação que mais pareça descrever a sua impressão sobre o relacionamento entre cada unidade, mesmo que você não
esteja diretamente envolvido.
Pontuação dos relacionamentos entre duas unidades:
1. Excelente – integração obtida
Matriz das relações entre unidades de operação 2. Integração quase perfeita
3. Relações um pouco acima da média
Vendas Vendas
4. Média – boa o suficiente para se sair mais ou menos bem, embo‑
Serviços Serviços ra haja muitos problemas na realização de esforços conjuntos
3
aeroportuários aeroportuários 5. Relações um tanto complicadas
Serviços em Serviços em 6. Relações quase inteiramente rompidas
4 3 7. Não poderia ser pior: relações péssimas; sérios problemas que
voo vôo
não estão sendo resolvidos
Ajustes de Ajustes de
3 4 2 8. Relações desnecessárias
programação programação
Controle Controle
3 2 2 1
operacional operacional
Operações Operações
3 3 6* 1 1
aéreas de vôo

Manutenção 8 2 4 2 1 2 Manutenção
Divisões Regionais
entre
Relações

Divisões/escri‑
2 2 3 2 1 3 2 1
tórios regionais

16/9/2011 16:23:28
O exemplo apresentado na Figura 4.1 é um formulário criado por uma
empresa aérea internacional que mostra as notas dadas por um determi‑
nado entrevistado para os relacionamentos entre as diferentes unidades
da empresa. Nesse caso, a integração entre Operações Aéreas e Serviços
em Voo é considerada péssima. Como essas duas especialidades devem es‑
tar muito bem coordenadas para fornecer o serviço para o público, qual‑
quer falha pode causar sérios atrasos – o que, de fato, estava acontecendo.
Indiretamente, também estava gerando entre a tripulação um baixo moral,
133
o que, por sua vez, tinha efeito prejudicial para o clima dos passageiros.
O formulário pode ser adaptado a qualquer tipo de organização; sua

Como obter a integração


matriz serve para avaliação coletiva acerca da adequação das relações
entre as unidades. Quando aparecem inadequações (pontuações de 4 ou
acima), o formulário poderá ser acompanhado pelas perguntas: (1) quais
serão as razões para essas inadequações? e (2) que problemas são cau‑
sados pelas mesmas? As respostas de cada unidade ajudam a saber se as
impressões sobre o problema são gerais e se há consenso em relação ao
que está errado. Como outros métodos sistemáticos de se buscar a opi‑
nião dentro de uma organização, esse método serve de base para indicar
problemas e discutir possíveis melhorias.

4.8 A escolha do mecanismo de integração


Acabamos de discutir maneiras de detectar problemas de integração.
A integração é, no entanto, uma necessidade fundamental em qualquer
organização e não acontecerá uma vez que haja uma unidade maior que
um grupo inicial, em que as relações são pessoais. Portanto, é necessário
decidir quais são os melhores mecanismos de integração para determina‑
da situação, o que é especialmente importante, porque uma abordagem
imprópria de integração corre o risco de apresentar as falhas discutidas
no início deste capítulo. Por outro lado, além de acrescentar custos des‑
necessários, uma abordagem muito complexa poderá ter o efeito desmo‑
ralizante de ser considerada irrelevante e ser uma perda de tempo para o
staff envolvido. Como fazer a escolha certa?

4.8.1 Perguntas fundamentais


Os indícios de fracasso da integração são o ponto de partida para um
diagnóstico que pode levar à identificação de aperfeiçoamentos a serem

Book_Organizaçoes.indb 133 16/9/2011 16:23:28


realizados. Uma ferramenta para diagnóstico como a descrita também
pode ajudar na localização exata do problema. Uma boa gestão, no en‑
tanto, tentará avaliar a efetividade de sua integração organizacional sem
esperar por uma crise. Tal avaliação pode ser feita com algumas pergun‑
tas relativamente simples.

O primeiro passo é saber se a seguintes circunstâncias se aplicam:

134 1. As atividades realizadas por unidades ou pessoas diferentes na


organização são altamente interdependentes? A qualidade do
parte ii  novas formas internas

produto ou serviço se beneficiaria com um melhor ajuste organiza‑


cional a essa interdependência? Por exemplo, a qualidade de uma
campanha publicitária se beneficiaria se especialistas em redação e
gráfica trabalhassem na mesma equipe do cliente?

2. Estão surgindo mudanças imprevistas nas atividades para as quais


contribuem diferentes pessoas ou unidades e com as quais os
processos normais não estão lidando satisfatoriamente? Por exem‑
plo, o pessoal deve lidar com essas mudanças de forma ad hoc e
informal como antes?

3. A competitividade de uma empresa ou a capacidade de uma insti‑


tuição pública responder às necessidades do público se beneficiaria
com a redução do tempo para oferecer seus produtos e serviços?

4. O tempo dos gerentes está sendo usado desnecessariamente em


reuniões e para assegurar que a informação seja comunicada entre
diferentes unidades e diferentes pessoas, em detrimento de outras
questões?

Respostas positivas a essas questões sugerem que a organização pre‑


cisa melhorar seu grau de integração. O próximo conjunto de perguntas
a fazer é mais específico:

1. Que tipo de integração é necessária?

1.1 Que informação precisa ser trocada e/ou que decisões devem
ser tomadas?

1.2 Que forma assume a informação? Por exemplo, ela é


formalizada e explícita, ou informal, analítica e tácita? São

Book_Organizaçoes.indb 134 16/9/2011 16:23:29


decisões de natureza rotineira ou dizem respeito a novos
acontecimentos?

1.3 Quem precisa trocar ou compartilhar a informação ou partici‑


par do processo decisório?

1.4 Com que frequência a informação precisa ser trocada e as


decisões tomadas?

1.5 É possível prever quando haverá essa necessidade de 135


integração?

Como obter a integração


2. Quais são as dificuldades para obter o tipo necessário de integração?

2.1 Que dificuldades emergem de diferenças de especialização e


ponto de vista?

2.2 Que obstáculos resultam da localização física dos participantes?

2.3 Que problemas surgem de dificuldades e incertezas inerentes


às questões a serem resolvidas?

3. Quais são os prós e os contras de mecanismos de integração


alternativos?

3.1 Efetividade em responder às exigências.

3.2 Custos – incluindo custos de oportunidade de tempo e concen‑


tração das pessoas e possíveis custos de viagens.

Um diagnóstico desse tipo prepara a administração para esco‑


lher entre os mecanismos de integração alternativos, incluindo a
possibilidade de usar mecanismos diferentes para diferentes neces‑
sidades. Agora revisaremos as abordagens da integração normal‑
mente usada na organização convencional, e depois continuaremos
com a ênfase na coordenação lateral que caracteriza a nova filosofia
organizacional.
Existem basicamente duas abordagens tradicionais para assegurar a
integração. Uma é passar tudo o que requer coordenação ao gerente su‑
perior com responsabilidade global pelas atividades em questão; a outra
é antecipar todos ou quase todos os requisitos necessários à integração,
tendo como base procedimentos formais, planos e/ou programações ela‑
borados antecipadamente.

Book_Organizaçoes.indb 135 16/9/2011 16:23:29


4.8.2 Integração por um gerente superior
Pedir a um gerente para coordenar a integração é uma abordagem
econômica e eficiente somente em certas condições. Para começar, a ne‑
cessidade de coordenação não deve ser frequente, pois o gerente seria
desviado de outras tarefas e terminaria sobrecarregado. Em segundo lu‑
gar, o gerente deve estar em posição de se comunicar diretamente com as
pessoas cujo trabalho requer coordenação. Terceiro, a situação deve ser
136 tal que o superior seja realmente a melhor pessoa para analisar e julgar
o que precisa ser feito. Em quarto lugar, o staff que se reporta ao gerente
parte ii  novas formas internas

deve respeitar sua opinião e desejar passar as questões ao seu superior, em


vez de tratá­‑las diretamente.
Essas condições que favorecem a integração por meio do envolvi‑
mento pessoal do gerente em geral não existem mais. Se a empresa estiver
operando com uma estrutura menos hierarquizada, a esfera de controle
dos gerentes será ampla demais para que se envolvam na coordenação
cotidiana. Se os membros das equipes ou departamentos que a eles se re‑
portam estão espalhados pelo mundo, as diferenças nos horários exigirão
soluções diferentes. Se o trabalho com o qual as contribuições de diferen‑
tes pessoas devem ser integradas é de natureza criativa ou de solução de
problemas, então as pessos envolvidas tendem a possuir expertise mais
relevante que qualquer gerente. Esse argumento favorece a coordenação
por meio do contato direto. Sob tais circunstâncias, pessoas que traba‑
lham de maneira interdependente precisarão de orientações e de aprova‑
ção periódica do gerente superior, mas este não pode integrar o trabalho
com a necessária eficácia por si só.

4.8.3 Integração por meio do planejamento e


procedimentos formais
A forma burocrática de integração apoia­‑se em três mecanismos bá‑
sicos: o primeiro é a integração pela padronização, que exige regras ou
procedimentos para canalizar as ações de cada empregado ou departa‑
mento em uma direção compatível com as ações dos demais. As descri‑
ções de funções, as regras para os participantes e a conduta dos comitês
são alguns exemplos. Podem ser criados procedimentos para tratar de
emergências, até onde sua natureza permita a previsão, mesmo sendo
impossível prever o momento em que elas irão ocorrer – é o que fazem

Book_Organizaçoes.indb 136 16/9/2011 16:23:29


os serviços de emergência pública. O segundo mecanismo burocrático
é a criação de planos e programas para coordenar as ações de unidades
separadas. A integração via planejamento é um pouco mais flexível que a
padronização, pois os planos podem ser modificados muito rapidamente.
O terceiro mecanismo é a reunião formal – o comitê, geralmente.
Regras e procedimentos são alterados e estendidos no tempo; eles
formalizam o que a experiência mostrou ser a melhor maneira de lidar
com problemas recorrentes. Ao formular um conjunto de procedimentos
137
e planos de operação, as contribuições de departamentos separados po‑
dem ser claramente especificadas e, assim, integradas à organização como

Como obter a integração


um todo. Quando ocorrem exceções, ou seja, aberrações em uma rotina,
elas podem ser remetidas para níveis superiores da hierarquia até o pon‑
to em que os diversos departamentos envolvidos têm um chefe comum.
Em outras palavras, a integração também é mantida por uma referência
hierárquica quando vem à tona algo fora do comum – é o princípio da
chamada “gestão pela exceção”. Se questões de procedimento e política
operacional exigem alguma discussão ou alteração de tempos em tempos,
pode ser acionado o terceiro mecanismo burocrático para a integração: as
reuniões de comitês. Tais reuniões permitem que os membros da organi‑
zação se reúnam e concordem com ajustes necessários a procedimentos e
políticas. Quando a questão está fora de seu poder de decisão, os comitês
podem enviar uma recomendação para aprovação hierarquia acima. Sob
condições estáveis, muitas vezes é arranjado um programa de reuniões
desse tipo dentro de um prazo de doze meses.
Neste sistema burocrático de integração há alguns méritos que podem
funcionar bem em condições de estabilidade e previsibilidade. Muitas
pessoas gostam de saber onde estão pisando, e a integração burocrática se
baseia num sistema de papéis e procedimentos claramente definidos que
estão ali para todos verem. Essa é também uma abordagem da integração
relativamente barata, uma vez que seus procedimentos e sistemas foram
testados e comprovados. Não são necessários gastos adicionais com equi‑
pes especiais de coordenação; tampouco é necessário que os emprega‑
dos se tranquem em “reuniões intermináveis”. No entanto, quando uma
organização passa a condições menos estáveis e aumenta a necessidade
do processamento de informação, a abordagem burocrática tradicional
começa a mostrar suas falhas.
Essa tem sido a experiência de muitas empresas. Elas acharam ne‑
cessário aumentar a intensidade dos contatos diretos entre grupos e

Book_Organizaçoes.indb 137 16/9/2011 16:23:29


departamentos mais ou menos do mesmo nível. Na ausência de qual‑
quer providência formal para uma integração horizontal desse tipo, é
comum surgir o contato informal. Muitas vezes se ouve dizer: “se ti‑
véssemos passado pelos canais oficiais, jamais teríamos conseguido fazer
qualquer coisa a tempo”. O problema é que não se pode depender de
arranjos informais emergentes, e os que funcionam, como na empresa
que teve problemas na ligação vendas­‑produção (descritos no Quadro
4.1), talvez não reflitam as prioridades políticas de toda a organização.
138
Também há o risco de que a coordenação informal não seja adequada
para os outros membros. Assim, pode haver vantagens em se adotar uma
parte ii  novas formas internas

política de usar a coordenação horizontal como processo rotineiro, e não


excepcionalmente.

4.8.4 Coordenação lateral


A coordenação lateral é uma abordagem que visa integrar as con‑
tribuições de diferentes pessoas ou unidades em uma organização,
quando todas realizam partes de uma tarefa comum. Isto acontece
promovendo­‑se o contato direto e a mútua adaptação entre os cola‑
boradores, de modo que eles, e não os superiores na administração,
tomem as decisões necessárias para realizar sua tarefa. Assim, a co‑
ordenação lateral é “um mecanismo para descentralizar as decisões
administrativas gerais”.12
Conforme aumentam as exigências de processamento de informa‑
ção em uma organização inserida em um ambiente de constante mu‑
dança e complexidade, a abordagem burocrática revela­‑se cada vez
mais incapaz de tratar tais exigências. Há quatro alternativas. Em
primeiro lugar, a organização pode aumentar os recursos humanos
envolvidos na manutenção da integração, ou então aceitar patrões
inferiores de eficiência da tomada de decisões. Evidentemente, esse
caminho irá resultar na redução do desempenho. Em segundo lugar,
a organização pode ser segmentada para agrupar pessoas em clusters,
segundo as necessidades de comunicação. Essa é a abordagem da divi‑
sionalização que, em geral, incorre em custos adicionais de duplicação
de recursos. Em terceiro lugar, a organização pode melhorar seus siste‑
mas de informação vertical para aliviar a carga dos níveis superiores.
A melhoria dos sistemas verticais de informação exigia no passado
mais investimento em pessoal e tempo com TI. O advento dos sistemas

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informatizados melhorou imensamente a relação custo-benefício dessa
opção, combinando velocidade, precisão, simplicidade da operação e
queda nos preços do hardware. (O uso da informática na integração
será mais detalhado no Capítulo 9.) A quarta alternativa também con‑
ta com a poderosa ajuda da informática, com a utilização de e­‑mail e
videoconferências, por exemplo. Essa opção aumenta a capacidade de
processamento da informação via desenvolvimento de relacionamen‑
tos laterais em determinados pontos na hierarquia abaixo, comple‑
139
mentada pela delegação de certa autonomia de ação aos envolvidos.

Como obter a integração


Como veremos logo adiante, embora possa incorrer em custos adicio‑
nais, o uso de relacionamentos laterais oferece o maior potencial para
aperfeiçoamento da integração.
O trecho a seguir, extraído de um documento interno de consultoria
corporativa, ilustra como a gestão passou a valorizar a superação de es‑
truturas tradicionais mediante a incorporação da integração lateral:

Em termos de organização, parece que aprendemos um saudável desres‑


peito por estruturas e relacionamentos formais, e pelas fronteiras fun‑
cionais. Em muitas áreas foram criados arranjos que transcendem as
estruturas tradicionais no interesse da eficácia geral. Em uma organiza‑
ção com o nosso tamanho e complexidade, precisamos de uma estrutura
formal e de uma clara definição das responsabilidades, mas é um sinal
promissor sermos aparentemente capazes de adaptar e desenvolver boas
estruturas que respondem a mudanças de padrões. Entre os exemplos de
avanços nessa área estão o uso da equipe de projetos (em especial, no de‑
senvolvimento de novos produtos e na engenharia) e a evolução de todo
o nosso planejamento de longo prazo. Em outras partes tem havido uma
boa aceitação da estrutura matricial (trabalhar para mais de um chefe),
com a necessidade de mais ênfase na formação de equipes e com aceita‑
ção dos objetivos coletivos.

As diversas formas de integração por meio de relacionamentos late‑


rais estão listadas no Quadro 4.5 – elas formam uma “escada” de cres‑
cente sofisticação, dificuldade no design e custos. De modo geral, quanto
mais pesado o processamento de informações, que deriva de pressões e da
complexidade das tarefas a realizar, mais alto se terá de subir na escada
da gestão para garantir um nível adequado de integração. Na prática,

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Quadro 4.5  A escada da coordenação lateral

1. Estabelecer contato direto entre gerentes ou empregados que compartilham


um problema.
2. Se os departamentos precisam ter muito contato, pode ser atribuída respon‑
sabilidade especial a uma ou mais pessoas da equipe para atuar como elo
com os colegas de outros departamentos.
140 3. Quando surge um problema ou fato novo que pede a contribuição de muitos
departamentos até sua finalização ou solução, talvez seja interessante criar
parte ii  novas formas internas

uma força­‑tarefa temporária para tratar da questão, com participantes pro‑


venientes desses departamentos.
4. Se problemas interdepartamentais são recorrentes, um bom método de inte‑
gração pode ser a criação de uma equipe ou grupo permanente para tratar
da questão.
5. Se a gestão dos relacionamentos laterais se torna um problema, talvez por
causa de sua complexidade, pode ser criado então um papel especial de inte‑
gração – “coordenador” ou título semelhante. Talvez seja preciso dar a esse
coordenador uma equipe de apoio.
6. Outra função desse papel integrador separado é decidir sobre o direito aos
recursos dos departamentos funcionais. Eles podem até mesmo desaparecer
como departamentos separados. No setor industrial, esses coordenadores
integradores costumam ser chamados de gerentes de produto, e são respon‑
sáveis por todas as operações necessárias para desenvolver, produzir, comer‑
cializar e pelos serviços relativos a um produto.
7. O método mais complexo e sofisticado de garantir a integração lateral é a
criação de um sistema matricial. Aqui há uma tentativa de combinar a inte‑
gração do pessoal em cada um de seus departamentos funcionalmente espe‑
cializados com uma integração de especialistas de diferentes departamentos
para focar na contribuição comum para produtos ou programas específicos.

conforme sobem a escada, os gestores geralmente adotam mecanismos


mais sofisticados de integração em adição, e não apenas simples substitu‑
tos aos que estão em níveis inferiores da hierarquia.
Pesquisas confirmam que, para permanecerem eficientes, as organiza‑
ções que operam em ambientes mais dinâmicos e com maior diferenciação
no ritmo da inovação e mudança entre suas funções mais importantes,

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devem investir em arranjos mais abrangentes para a coordenação hori‑
zontal. Também ficou claro que, quanto mais difícil e variável o trabalho
a ser feito, e por isso maior a incerteza, mais intensamente os diferentes
colaboradores devem interagir. Essas circunstâncias servirão de incentivo
para uma organização buscar níveis mais altos de coordenação lateral.13
Combinações de mecanismos para a integração em geral são usadas
por organizações que enfrentam grandes incertezas e alta tensão entre a
diferenciação interdepartamental e a interdependência. A administração
141
desse tipo de organização, especialmente das mais bem­‑sucedidas, assegu‑
ra a integração por meio de variados mecanismos, em vez da simples ado‑

Como obter a integração


ção de uma abordagem e não de outra. Embora atinjam níveis mais altos
de coordenação lateral para algumas atividades, as organizações usam
também os níveis mais baixos para outras necessidades. Isso significa que
até mesmo em uma organização que esteja passando por grandes mudan‑
ças e operando com complexa interdependência dos departamentos ou
grupos de trabalho, parte das comunicações e alguns processos decisórios
ainda pode ser adequadamente tratada com arranjos mais simples que
custam menos em termos de tempo e gastos administrativos.

4.8.5 Custos da gestão da integração


Os custos da integração são fatores importantes a serem considera‑
dos. Eles tendem a aumentar de maneira paralela à sofisticação do me‑
canismo de integração utilizado. Por essa razão, eles devem ser pesados
em relação ao valor e à necessidade dos benefícios passíveis de serem
obtidos quando se avalia se determinado conjunto de arranjos é inade‑
quado, exageradamente complicado ou mais ou menos correto. Portanto,
ao decidir quando e o quê investir na integração, é melhor não imaginar
que ela seja uma milagrosa solução para todos os problemas, ou poderá
haver acúmulo de custos, desperdício de energia e até despertar o cinismo
de muitos.14
Os custos da gestão da integração podem incluir:

1. Custos de tempo e recursos humanos em comunicação mais inten‑


sa e extensa. O tempo gasto na comunicação com pessoas de
outras unidades é tempo não gasto no desenvolvimento de novos
empregados ou nas relações com fornecedores e consumidores.

Book_Organizaçoes.indb 141 16/9/2011 16:23:29


2. Tempo e esforço necessários para resolver conflitos. Embora nas
organizações os conflitos sejam inevitáveis e tenham que ser resol‑
vidos de algum modo, a intensidade da coordenação lateral às
vezes parece exacerbar o conflito, em parte por causa da tensão
maior que impõe às pessoas.

3. Gastos adicionais. Entre eles, podemos citar os custos de coorde‑


nadores, quando nomeados; também os custos do treinamento em
142 questões de como lidar com conflito e montar uma equipe.

4. Possíveis efeitos colaterais. Por exemplo, arranjos para melhorar a


parte ii  novas formas internas

comunicação entre os departamentos, que podem incluir a mudan‑


ça dos escritórios, às vezes são realizados às custas da comunicação
nesses departamentos. Os membros de uma unidade que trabalha
em equipe com o pessoal de outra unidade podem se sentir insatis‑
feitos ao descobrirem que os termos de seus contratos de emprego
são piores.

5. Por fim, mas não menos importante, a qualidade da tomada de


decisões descentralizada pela coordenação lateral talvez demonstre
não ser melhor que a qualidade das decisões tomadas por gerentes
em níveis superiores. Esse é um custo possível, mas se torna menos
provável quando as decisões tem de ser tomadas rapidamente em
resposta a mudanças locais, e quando precisam ter como base
alguma opinião especializada.

Outra preocupação que os altos executivos costumam ter com a abor‑


dagem lateral da integração pode equivaler a um custo: a preocupação
em não enfraquecer o controle. Por isso, muitas vezes preferem os méto‑
dos convencionais de integração, mesmo quando não funcionam muito
bem para o processamento da informação ou para a tomada de decisão.
Assim, eles insistem que as questões que exigem coordenação sejam en‑
viadas hierarquia acima, ou em tratar da coordenação, até onde possível,
por meio de procedimentos formais ou, ainda, em confiar a coordenação
aos comitês, dos quais participam gerentes seniores que podem exercer
considerável influência. Talvez esta seja, em parte, uma questão de cultu‑
ra e estilo por meio dos quais gerentes tentam preservar uma abordagem
que lhes é familiar. Serve ainda para ilustrar um pouco mais a questão de
que diferentes mecanismos integradores serão usados até mesmo onde as

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necessidades de integração são maiores. Além disso, nos faz lembrar que
certas maneiras de lidar com a integração têm de se adaptar mais do que
outras à cultura de gestão prevalecente.

4.8.6 Exigências para coordenação


Os arranjos mais complexos da integração lateral direta exigem a
nomeação de um coordenador – papel especialmente difícil, porque os
coordenadores parecem ter mais responsabilidade que autoridade. Há 143

expectativa de que os coordenadores obtenham resultados, mas não têm

Como obter a integração


plena autoridade nem sobre as pessoas nem sobre os recursos que estão
coordenando. Outra fonte de frustração pode surgir quando os coorde‑
nadores permanecem no papel por muito tempo e, em razão disso, seu
futuro profissional torna­‑se incerto.
A competência dos coordenadores para exercer qualquer influência
real sobre o pessoal das diferentes unidades que estão integrando depende
principalmente do apoio da diretoria e do poder para recorrer à autorida‑
de de um gerente geral quando necessário. A compreensão e a determina‑
ção da diretoria têm um importante papel para o sucesso da integração,
mesmo quando a ênfase está em consegui­‑lo por meio de relacionamentos
laterais diretos. Quando surge um conflito entre pessoas ou unidades que
estão sendo coordenadas horizontalmente, a solução pode estar além da
capacidade de um coordenador.
Há outras maneiras de melhorar a influência e o potencial para o
sucesso dos coordenadores, entre as quais estão:

1. preencher essas posições com pessoas já influentes na organização


e conhecidas por terem conquistado o respeito dos departamentos
ou grupos que deverão coordenar;

2. assegurar­‑se de que os coordenadores tenham entendimento sufi‑


ciente sobre o trabalho dos departamentos a serem coordenados;

3. escolher como coordenadores pessoas que saibam lidar com a


ambiguidade inerente ao cargo;

4. esclarecer os direitos formalmente ligados ao cargo, como o de


convocar reuniões e estabelecer programas para o projeto; quando
necessário, oferecer recursos e pessoal de apoio ao coordenador.

Book_Organizaçoes.indb 143 16/9/2011 16:23:29


O “campeão do produto” ou “inovador empresarial” é uma mistura
de coordenador e gestor. A essas pessoas é atribuído um papel de liderança
ou de empreendedorismo corporativo voltado para a obtenção da inova‑
ção em uma empresa. Elas se empenham no sucesso de uma inovação;
podem ser a força criativa original por trás de uma inovação ou de uma
ideia de negócios, e também podem estar à frente da comercialização de
tal inovação. O papel do campeão do produto é a maneira mais comum de
capturar e direcionar o entusiasmo dos que contribuirão para o sucesso de
144
uma novidade; ele toma a iniciativa de integrar as necessárias contribui‑
ções para o sucesso de uma inovação, geralmente por meio do crescimento
parte ii  novas formas internas

de uma rede de comunicações na fase de criação e da liderança de equipes


interfuncionais na fase do desenvolvimento. É um papel indispensável,
dada a tendência à resistência a mudanças e ao isolamento funcional nas
organizações. Embora muitos campeões de produtos se autosselecionem,
eles podem precisar do benefício resultante do apoio administrativo pro‑
movido pelos coordenadores, conforme identificamos anteriormente.

4.9 Trabalho de equipe: um auxílio para a


integração
A tendência dos novos métodos organizacionais em romper frontei‑
ras funcionais e a crescente quantidade de trabalho com base em projetos
que requerem a colaboração de pessoas com diferentes especialidades e
experiências tem provocado um aumento no uso de equipes ou do “tra‑
balho de equipe”. As equipes integram indivíduos em torno de tarefas,
e espera­‑se que as equipes tenham um desempenho melhor do que o de
indivíduos trabalhando sozinhos, quando tais tarefas requerem opiniões,
experiências e conhecimentos diversificados.15 Há provas de que a produ‑
tividade e outros ganhos serão alcançados após a adoção do trabalho em
equipe. Por exemplo, como resultado da reorganização dos empregados
de sua planta em Trenton, Ohio (Estados Unidos) em 31 equipes autôno‑
mas de 9 a 16 pessoas, a cervejaria Miller obteve uma redução de 30%
nos custos da mão de obra em relação a demais fábricas organizadas em
linhas tradicionais, sem equipes. A K­‑Shoes, do Reino Unido, relatou que
a adoção do trabalho de equipe resultou em um aumento de 19% na pro‑
dutividade, uma redução de rejeitos de 5.000 por milhão para 250, e na
melhora de entrega no prazo de 80 para 97%.16 Esses benefícios levaram

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as organizações a aumentar notavelmente sua confiança nas equipes desde
os anos 1980. Após estudar sua utilização em 20 “organizações de classe
mundial” localizadas nos Estados Unidos e em outros países, Wellins e
colegas concluíram que as “equipes podem funcionar em qualquer tipo
de organização”.17

4.9.1 Tipos de equipe


Em poucas palavras, a equipe é um grupo que abrange pessoas com 145

habilidades e conhecimentos complementares que trabalham com um ob‑

Como obter a integração


jetivo comum e pelo qual têm responsabilidade coletiva. O conceito é
muito amplo e há muitos tipos de equipe. Uma importante distinção se
dá entre as equipes que são “permanentes” e as que são montadas com
determinado objetivo. As equipes permanentes têm continuidade com o
passar do tempo e seus participantes em geral são bastante estáveis. Elas
são organizadas em torno de operações para produzir um produto ou
serviço. Equipes temporárias, também chamadas de “forças­‑tarefa” ou
“grupos de trabalho”, são montadas para realizar determinado projeto
ou tratar de uma questão especial. Essas equipes costumam ter prazo e
“marcos” de progresso para trabalhar.
Os diversos tipos de equipe se distinguem por seus participantes e/ou
finalidade.18 Todas visam promover melhor integração e incluem equipes
da alta administração, interfuncionais e de projeto.

EQUIPES DA ALTA ADMINISTRAÇÃO


São formadas para coordenar a formulação e implementação de po‑
líticas entre as diferentes unidades de uma organização – negócios, fun‑
cionais ou regionais. Nem sempre essas equipes atingem a integração
desejada devido ao alto nível de individualismo característico de muitos
gerentes seniores, além da dificuldade de reuni­‑los fisicamente. As tecno‑
logias modernas de informação e comunicação, especialmente a video‑
conferência, ajudam a superar este último problema.

EQUIPES MULTIFUNCIONAIS
Essas equipes são compostas por funcionários e gerentes intermediá‑
rios que representam diversos departamentos ou funções. Elas podem ser
permanentes, como uma equipe de segurança de toda a fábrica. Outras

Book_Organizaçoes.indb 145 16/9/2011 16:23:29


equipes interfuncionais são temporárias, como as criadas para desenvol‑
ver um novo produto ou aperfeiçoar um processo organizacional.
As equipes multifuncionais tornaram­‑se um mecanismo de inte‑
gração bastante comum. São responsáveis por um produto, serviço
ou processo, e permitem que o trabalho seja planejado em torno de
processos, não de funções. Tipicamente, caracterizam­‑se por habilida‑
des múltiplas, uma vez que seus participantes possuem competências
transversais às fronteiras ocupacionais tradicionais. As competências
146
da equipe de apoio muitas vezes são incorporadas às equipes inter­
funcionais. Uma vez estabelecidas, as equipes costumam ter a esfera
parte ii  novas formas internas

de suas responsabilidades ampliada, especialmente quando são perma‑


nentes. Podem assumir alguns papéis gerenciais e responsabilidades or‑
ganizacionais amplas, como fazer recomendações sobre as políticas de
recursos humanos ou sobre os requisitos de um serviço de atendimento
ao consumidor. O desenvolvimento desse tipo de equipe na Hannaford
Brothers Company dá um exemplo instrutivo (veja o Quadro 4.6).
Elas também têm sido usadas com sucesso para realizar grandes refor‑
mulações de práticas organizacionais. Um exemplo é a notável virada da
Nissan logo após sua aliança estratégica com a Renault. Carlos Ghosn, o
novo diretor­‑superintendente vindo da Renault, havia usado com êxito as
equipes interfuncionais nesta última e na Michelin. Pouco depois de assu‑
mir o cargo em junho de 1999, Ghosn criou nove equipes interfuncionais
que se concentrariam no desenvolvimento de negócios, compra, fabrica‑
ção, vendas e marketing, pesquisa e desenvolvimento, custos financeiros,
custos administrativos, sistemas organizacionais e de tomada de decisão,
e racionalização da gama de modelos. Tais equipes eram constituídas de
gerentes intermediários de diferentes partes da empresa e lideradas por
vice­‑presidentes corporativos, e obtiveram cinco principais resultados:
(1) rompimento de barreiras departamentais; (2) coleta de informações
e ideias em toda a empresa; (3) oferta de oportunidades de recompensa
e/ou promoção ao staff mais jovem; (4) incentivo à colaboração den‑
tro da empresa; e (5) disseminação da filosofia subjacente ao Plano de
Renovação da Nissan, anunciado por Ghosn em outubro de 1999. Tais
equipes interfuncionais foram fundamentais no processo de recuperação
da empresa, pois ressaltaram fatores essenciais que poderiam ser incor‑
porados ao seu plano de renovação. Ao mesmo tempo, essas equipes aju‑
daram a transformar a cultura conservadora e a estrutura rígida existente
na empresa.

Book_Organizaçoes.indb 146 16/9/2011 16:23:29


Quadro 4.6  Equipes interfuncionais na Hannaford Brothers Company

A transformação da Hannaford Brothers, que passou de atacadista de alimentos


a poderoso supermercado regional no nordeste dos Estados Unidos, foi uma his‑
tória de sucesso marcante. Contudo, o rápido crescimento da empresa causou
problemas internos. Em especial, ameaçou seriamente o sistema de distribuição
da empresa, e surgiram sinais de considerável insatisfação dos empregados em
seu principal centro de distribuição em South Portland, no Maine.
147
A empresa planejou um novo centro de distribuição no estado de Nova York; os
gerentes seniores estavam decididos a não deixar que os problemas de South

Como obter a integração


Porland ressurgissem. Uma equipe de planejamento fez um estudo exaustivo
dos requisitos operacionais, com extensas consultas dentro da empresa e com
o pessoal do varejo (os clientes do centro de distribuição). A partir desse estu‑
do, definiram uma nova abordagem para a organização, baseada em equipes
interfuncionais.
As tarefas funcionais mais importantes de um centro de distribuição são o con‑
trole de inventário, a seleção de produtos no inventário e seu carregamento
em paletes, a operação das empilhadeiras, a programação de atribuições e a
supervisão geral. Na nova organização, equipes de cerca de cinco a 25 pessoas
eram responsáveis por todos esses deveres, anteriormente especificados. Cada
equipe se concentrava em determinados clientes – e abastecia diretamente até
três supermercados. Seis equipes atendiam aos supermercados da Hannaford e
só eram especializadas pelo fato de diferentes equipes manipularem diferentes
categorias de alimentos, como os congelados ou perecíveis. A sétima equipe,
com dez participantes, fornecia recursos especializados para as demais equipes.
A liderança da equipe era eleita e rotativa, com mandato máximo de um ano; em
cada equipe as decisões eram tomadas por consenso.
Foi investido tempo considerável no treinamento e no desenvolvimento. Cerca
de 20% do tempo foi gasto com isso no primeiro ano e, depois, cerca de 15%
passou a ser dedicado a reuniões e treinamento. Conforme amadureciam, as
equipes assumiam mais responsabilidades, como a programação das atribuições
de trabalho, controle de inventário, desenvolvimento e treinamento, estabeleci‑
mento de metas, orçamento da equipe, contratação de novos membros, segu‑
rança, garantia de qualidade, revisões do desempenho dos colegas e solução de
problemas de desempenho e disciplinares.
A recompensa pela adoção do trabalho de equipe interfuncional foi espetacular.
Os custos operacionais do novo centro de distribuição eram muito inferiores
aos dos centros de distribuição de tamanho semelhante, principalmente devido
ao staff enxuto, ao absenteísmo insignificante e à baixa rotatividade de pessoal.

Book_Organizaçoes.indb 147 16/9/2011 16:23:29


O número menor de acidentes de trabalho reduziu os custos de indenizações em
mais de 500 mil dólares por ano, em relação a centros semelhantes. As melho‑
rias operacionais realizadas pelas equipes também trouxeram outras economias
nos gastos gerais.

Fonte: WELLINS, Richard S.; BYHAM, William C.; DYXON, George R. Inside teams: how 20 world­
‑class organizations are winning through teamwork. San Francisco: Jossey­‑Bass, 1994. cap. 12.

148
parte ii  novas formas internas

EQUIPES DE PROJETO
Normalmente, uma equipe de projeto é estruturada para a duração de
todo o projeto sobre o qual tem responsabilidade. Uma vez encerrado o
projeto, os participantes retornam às suas respectivas unidades ou são de‑
signados para uma nova equipe de projeto. Embora alguns trabalhem em
um projeto por tempo indeterminado, garantindo a integração durante sua
continuidade, outros podem entrar e depois deixar a equipe, dependendo da
fase em que suas contribuições são necessárias. Uma equipe de projeto nor‑
malmente não se autoadministra, mas tem um coordenador que desempenha
tanto o papel de liderar o grupo para o cumprimento das metas do projeto
como o de integrar as contribuições dos participantes. O desafio de integrar
contribuições de diversas áreas de especialização pode ser bastante difícil.

Outros tipos de equipe normalmente usados são: os círculos de qua‑


lidade, as equipes autogerenciadas e os grupos de afinidade.

CÍRCULOS DE QUALIDADE
São equipes preocupadas com a melhoria da qualidade, a eficácia dos
métodos de trabalho, o uso do equipamento e questões de custo e segurança.
Uma característica importante do círculo de qualidade é o envolvimento de
empregados de todos os níveis. Tais círculos passaram a ser parte integrante
do sistema de gestão no Japão. Houve dificuldades quando da transferência
desse conceito para outros países; hoje, muitas empresas inserem o círculo
de qualidade no conceito mais amplo de estruturas baseadas em equipe.

EQUIPES AUTOGERENCIADAS
As equipes introduzidas na Hannaford Brothers (veja o Quadro
4.6) ilustram os princípios da autoadministração, por vezes tida como

Book_Organizaçoes.indb 148 16/9/2011 16:23:30


a maneira ideal para neutralizar os piores aspectos da vida organizacio‑
nal, como a ausência de significado do trabalho, a tensão e o isolamen‑
to social. Certas questões importantes precisam ser resolvidas quando
se decide trabalhar com uma equipe autogerenciada, tais como: o que
acontece com os executivos; que ajuda podem receber para passar de
uma gestão direta de pessoas para o treinamento e a facilitação do traba‑
lho da equipe; e que limites será preciso impor à liberdade das equipes.

GRUPOS DE AFINIDADE 149

São equipes compostas por profissionais ou trabalhadores do conheci‑

Como obter a integração


mento, que se reúnem regularmente para compartilhar informação, apro‑
veitar oportunidades e resolver problemas. Embora já existam poderosos
sistemas de informação para codificar e distribuir o conhecimento nas
organizações, não há nenhuma garantia de que ele será bem utilizado.
Grupos de afinidade e outros tipos de equipe ajudam a criar uma cultura
que estimula a troca de conhecimento e a romper barreiras nas organiza‑
ções. Quando o conhecimento é considerado poder, as pessoas relutam em
trocar informações e conhecimento. Muitos dos problemas de integração
pelos quais as empresas e outras organizações já passaram emanam dessa
tendência humana, e a principal contribuição das equipes e outros meca‑
nismos integradores está na maneira de se contrapor a essa tendência.

4.9.2 Outras vantagens oferecidas pelas equipes


Há outras vantagens no trabalho em equipe, além da contribuição
à integração organizacional. As equipes substituem o tradicional contro‑
le hierárquico do trabalho pelo controle baseado em pares, aumentando
assim o empenho e a interação entre os funcionários. As equipes podem
reduzir o absenteísmo e aumentar o senso de responsabilidade dos empre‑
gados. Ao mesmo tempo, a transferência de responsabilidades administra‑
tivas para equipes permite a redução dos níveis hierárquicos e o corte dos
custos administrativos. Como agora podem tomar as próprias decisões,
sem precisar esperar a aprovação de superiores, e como os colegas de uma
mesma equipe se comunicam imediatamente uns com os outros, a intro‑
dução do trabalho em equipe normalmente acelera o tempo de reação e
melhora a capacidade da organização de se adaptar de maneira flexível a
novas circunstâncias.
A integração por meio de equipes facilita também o aprendizado e a
inovação. Aqui é necessário distinguir entre “invenção”, fase criativa da

Book_Organizaçoes.indb 149 16/9/2011 16:23:30


inovação, e “implementação”, que é a fase da aplicação.19 Equipes não são
necessariamente superiores a indivíduos em matéria de criatividade – sem‑
pre há o risco de o pensamento coletivo levar a soluções conformistas e
conservadoras20 –, mas ajudam a refinar ideias por meio de discussão e feed­
back mútuo; elas mostram seu valor quando da implementação de novas
ideias e propostas. Nesta etapa é essencial integrar funções diferentes, como
engenharia de hardware e software, operações, custos e marketing, o que
também pode ajudar a alinhar a implementação com os objetivos organiza‑
150 cionais e com o contexto mais amplo e global da organização. Observamos
anteriormente neste capítulo como é importante a integração das tarefas de
parte ii  novas formas internas

implementação no apoio a uma política de engenharia simultânea.

4.9.3 O melhor método do trabalho em equipe:


um resumo
De um estudo detalhado de 20 empresas, Wellins e seus colegas extra‑
íram um conjunto dos “melhores métodos” para o trabalho de equipe,21
que são resumidos a seguir:

1. A adoção do trabalho em equipe deve se basear nas necessida‑


des da empresa. Nos 20 casos estudados por Wellins e colegas,
a razão principal era a crescente pressão competitiva. As impli‑
cações de tais necessidades empresariais devem ser claramente
compreendidas – especialmente os requisitos de integração que
elas determinam, para que as equipes não sejam adotadas apenas
por modismo.

2. O apoio e a orientação da diretoria são indispensáveis para a


obtenção de uma mudança organizacional bem­‑sucedida, o que
será discutido em detalhes no Capítulo 12.

3. Entre as 20 empresas, a introdução de equipes em geral envolvia


um grupo condutor, com a participação da diretoria, complemen‑
tado por uma equipe de planejamento que detalhava o traba‑
lho. Os participantes das equipes de planejamento normalmente
vinham de diferentes níveis da organização e tinham diferentes
qualificações. As visitas desses grupos condutores e das equipes de
planejamento a outras organizações em que as equipes já haviam
sido implementadas eram fontes de valiosas informações que
aceleravam o aprendizado, evitando falhas habituais.

Book_Organizaçoes.indb 150 16/9/2011 16:23:30


Tabela 4.1  Princípios tradicionais versus modelo de equipes

Estrutura tradicional Design de equipes


Trabalho planejado em torno de funções Trabalho planejado em torno de processos
A equipe é dona de um produto, serviço
Nenhum sentimento de propriedade
ou processo
Funções individuais especializadas Funções multifuncionais/diversificadas
151
Líderes governam equipes Equipes governam equipes

Como obter a integração


Staff de apoio/as capacidades estão Staff de apoio/capacitação incorporada à
fora da equipe equipe
Gerentes tomam todas as decisões Equipes envolvidas nas decisões
organizacionais organizacionais

4. Devem ser definidos novos papéis e responsabilidades da equipe.


As equipes não funcionam bem, muito menos atingem seu pleno
potencial, quando são constituídas com base em definições ante‑
cipadas. Wellins e seus colegas descobriram que o redesenho de
processos e responsabilidades era guiado por seis princípios recor‑
rentes. Esses princípios contrastavam com os princípios tradicio‑
nais do desenho organizacional (Tabela 4.1).22

5. Um princípio básico do conceito de equipe é criar o sentimento de


propriedade. Isso significa dar às equipes responsabilidade total
por produtos, serviços ou grupos de clientes.

6. Para que a flexibilidade oferecida pelo trabalho de equipe seja


plenamente aproveitada, deve haver um prêmio para o desenvolvi‑
mento de capacidades multifuncionais.

7. Além do extenso treinamento multifuncional, os empregados em


situações bem­‑sucedidas de trabalho em equipe devem assumir
outras responsabilidades que antes eram reservadas a supervisores e
gerentes.

8. Os serviços de apoio devem ser integrados às equipes, o que foi feito


de duas maneiras pelas 20 empresas estudadas: a primeira foi manter
os especialistas de apoio unidos em equipe, com suas contribuições

Book_Organizaçoes.indb 151 16/9/2011 16:23:30


orientadas para cada equipe ou conjunto de equipes operacionais.
Uma segunda abordagem, mais abrangente, foi incorporar os espe‑
cialistas de apoio às próprias equipes. Neste caso, os especialistas
transmitiam suas capacitações aos membros da equipe – é uma abor‑
dagem mais audaciosa, mas certamente traz mais satisfação aos que
participam da equipe e mais eficiência para a organização.

9. O trabalho de equipe implica em significativas mudanças no papel


152 dos gerentes, por isso é importante não haver pressa na reestrutu‑
ração administrativa e envolver os gestores no processo. O traba‑
parte ii  novas formas internas

lho em equipe implica esferas de controle mais amplas, menos


cargos administrativos e menos níveis hierárquicos.

10. É preciso também dar atenção à questão da liderança nas equi‑


pes. As práticas variam imensamente nesse aspecto: algumas
organizações nomeiam líderes de equipe, posição que pode ser
rotativa. Outras não têm alguém formalmente responsável pela
liderança da equipe, ou seja, as diversas responsabilidades da
governança são compartilhadas entre os participantes. Essa últi‑
ma solução não significa necessariamente menos controle sobre
as equipes, pois elas ainda podem ser responsabilizadas por seu
desempenho.

11. Como acontece com qualquer mudança na forma organizacio‑


nal, outros sistemas organizacionais contingentes deverão ser
realinhados. Por exemplo, os membros da equipe talvez prefiram
se envolver na seleção de novos membros participantes, o que
pode levantar problemas relacionados à discriminação étnica e
outras questões éticas. Nas fases iniciais do trabalho em equipe
é necessário haver muito treinamento para que sejam desenvol‑
vidas as qualificações adequadas da equipe e o aperfeiçoamento
da multifuncionalidade. Os sistemas tradicionais de recompen‑
sa e remuneração deverão ser redesenhados para corresponder
às novas responsabilidades da equipe e para oferecer apoio a
novas prioridades, como o aperfeiçoamento das qualificações.
Conforme as equipes assumem novas responsabilidades e novos
critérios de desempenho, a maneira como os participantes são
reconhecidos e recompensados também deve mudar.

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Resumo
1. A integração é uma condição em que há coordenação adequada entre
atividades diferentes, ainda que complementares, para a criação coletiva
de valor. É indispensável para uma boa organização, embora muitas vezes
não receba a devida atenção.

2. A partir de uma perspectiva acauteladora, a integração é imprescin‑


dível para evitar o fracasso, ou mesmo um desastre, no fornecimento
153
adequado de serviços aos clientes e ao público.

Como obter a integração


3. De um ponto de vista mais positivo, um bom grau de integração é
um dos fatores que podem transformar as pessoas e os conhecimentos à
disposição de uma empresa em recursos que a distinguem e dinamizam,
emprestando­‑lhe vantagem competitiva e permitindo que ela se adapte
muito bem às demandas sob constante transformação.

4. É improvável que a integração ocorra espontaneamente em uma or‑


ganização, além da esfera dos relacionamentos pessoais em um grupo
de trabalho. Portanto, é importantíssimo reconhecer os sinais de que a
integração em andamento possa estar inadequada.

5. Existem diversos mecanismos para reforçar a integração, que variam


de simples arranjos para que os interessados se reúnam periodicamen‑
te a complexas estruturas multidimensionais, em que as contribuições
de unidades especializadas são coordenadas por meio de um arranjo
matricial de acordo com o consumidor, o processo, a região e demais
requisitos.

6. As equipes desempenham um papel importante nesta série de pos‑


sibilidades, e são hoje um dos meios mais utilizados para se obter a
integração.

7. O trabalho em equipe reflete a forte ênfase nos novos métodos


organizacionais para obter­‑se a integração, bem como a transferên‑
cia das iniciativas às pessoas que possuem a informação necessária
para adaptar ou inovar as atividades de uma organização. Os méto‑
dos informatizados de integração serão discutidos mais adiante, no
Capítulo 9.

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Questões para discussão
1. Descreva sucintamente o conceito de integração e como ela pode ser
aplicada nas organizações.

2. Quais são os principais problemas que uma organização pode encontrar


quando procura obter a integração?
154
3. Descreva as abordagens tradicionais para atingir a integração.
parte ii  novas formas internas

4. Quais são os principais aspectos da integração nas novas formas


organizacionais?

5. Como o trabalho em equipe facilita o processo de integração?

6. Compare o trabalho em equipe com as estruturas tradicionais.

Notas
1. STRAUSS, George. Tactics of lateral relationship: the purchasing agent. Admi‑
nistrative Science Quarterly, 7(2), p.161­‑186, 1962.

2. LIKERT, Rensis. New patterns of management. New York: McGraw­‑Hill, 196l.

3. TERIESCH, Christian; LOCH ,Christoph H; MEYER Arnoud De. Exchanging


preliminary information in concurrent engineering: alternative coordination
strategies. Organization Science, 13(4), p. 402­‑419, 2002.

4. FORD, Richard; FREAN, Alexandra. National offenders register will protect


children. The Times, p. 13, 14 out. 2002.

5. JOWIT, Juliette. Why an accident like Hatfield was waiting to happen. Finan‑
cial Times, p. 4, 22 fev. 2001. MARTIN, Peter. Lessons from Railtrack. Finan‑
cial Times, p. 21, 9 out. 2001.

6. COLUMBIA ACCIDENT INVESTIGATION BOARD. Report. Washington:


Government Printing Office, 2003. p. 187.

7. COLUMBIA ACCIDENT INVESTIGATION BOARD, 2003, op.cit., p. 187­‑188.

Book_Organizaçoes.indb 154 16/9/2011 16:23:30


8. TEECE, David J. Managing intellectual capital. Oxford: Oxford University
Press, 2000. p. 26. Veja também TEECE, David J.; PISANO, Gary; SHUEN,
Amy. Dynamic capabilities and strategic management. Strategic Management
Journal, 18(7), p. 509­‑533, 1997.

9. GALBRAITH, Jay R. Competing with flexible lateral organization. 2. ed. Rea‑


ding: Addison­‑Wesley, 1994.

10. GALBRAITH, 1994, op. cit., cap. 2.

11. Esses sinais de advertência foram identificados por PUGH, Derek. Effective co‑ 155
ordination in organizations. Advanced Management Journal, 1979.

Como obter a integração


12. GALBRAITH, 1994, op. cit., p. 6.

13. Veja LAWRENCE, Paul R.; LORSCH, Jay W. Organization and environment.
Boston: Harvard Business School Press, 1967; VAN DE VEN, Andrew H; DEL‑
BECQ, Andre L.; KOENIG JR., Richard. Determinants of coordination modes
within organizations. American Sociological Review, 41(2), p. 322­‑338, 1976;
GALBRAITH, 1994, op. cit.

14. GOOLD, Michael; CAMPBELL, Andrew. Desperately seeking synergy. Har‑


vard Business Review, p. 131­‑143, set./out. 1998.

15. MOHRMAN, A.; S. COHEN, G.; MOHRMAN JR., A. M. Designing team­


‑based organizations. San Francisco: Jossey­‑Bass, 1995.

16. WELLINS, Richard S.; BYHAM, William C.; DIXON, George R. Inside teams:
how 20 world­‑class organizations are winning through teamwork. San Francis‑
co: Jossey­‑Bass, 1994.

17. WELLINS; BYHAM; DIXON, 1994, op. cit., p. 299.

18. Uma boa discussão sobre os diferentes tipos de equipe e sua eficácia pode ser
encontrada em MCKENNA, Eugene F. Business psychology and organizational
behaviour. 3. ed. Hove: Psychology Press, 2000. Cap. 10.

19. Veja WEST, Michael A. Sparkling fountains or stagnant ponds: an integrative


model of creativity and innovation implementation in work groups. Applied
Psychology, 51(3), p. 355­‑387, 2002. Veja também os comentários e resposta
após o artigo, no mesmo número.

20. JANIS, I. L. Victims of groupthink: a psychological study of foreign policy de‑


cisions and fiascos. Boston: Houghton Mifflin, 1972.

21. WELLINS; BYHAM; DIXON, 1994, op. cit., cap. 21.

22. WELLINS; BYHAM; DIXON, 1994, op. cit., p. 308.

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Capítulo 5
Controle

Conteúdo do capítulo
Controle é um conceito indefinido, embora seja um processo indispensável, da
gestão. Portanto, este capítulo começa por esclarecer sua natureza, apontando
uma série de fundamentos sobre como criá­‑lo em uma organização. Depois,
são apontadas importantes distinções sobre o exercício do controle. Uma,
por exemplo, é a diferença entre o nível de controle estratégico e controle
operacional. Outra diz respeito aos três principais aspectos do controle
sobre os quais recaem os critérios das decisões: a extensão, o enfoque e os
mecanismos pelos quais ele é exercido. Essas distinções nos ajudam a resolver
a questão das alternativas para o controle, que estão classificadas em seis
estratégias básicas, discutidas em detalhe.
Algumas estratégias de controle estão associadas às formas organizacionais
convencionais, enquanto outras estão em sintonia com as novas abordagens.
A escolha entre elas e a configuração das estratégias de controle adotadas
reflete o contexto e as contingências enfrentadas por uma organização. O
capítulo encerra com algumas considerações a respeito de tais contingências.

5.1 Um conceito indefinido


O controle é um processo central indispensável da administração; no
entanto, como acontece com a integração, muitos autores que escrevem
sobre a organização o deixam de lado.1 Há muitas razões possíveis para

Book_Organizaçoes.indb 157 16/9/2011 16:23:30


tal omissão. Alguns, talvez, considerem inquestionável a ideia de que a
administração tenha a ver com o controle e que, por esse motivo, não seja
necessário tratar desse tema em separado – mas tratá­‑lo assim, de modo
implícito, não permite discussão sobre o controle. Para outros, o controle
tem algo de ameaçador, associado ao poder e à manipulação, daí certa re‑
lutância entre muitos autores da área de negócios em discuti­‑lo, tentando
evitar embaraços para seus patrocinadores em cargos de poder corporati‑
vo. O argumento de que seja um simples processo técnico, relacionado ao
158
feedback sobre a responsabilidade e as operações, também significa uma
dessensibilização sobre o assunto.
parte ii  novas formas internas

A definição de controle no dicionário Cambridge é “ordenar, limi‑


tar, instruir ou regrar o comportamento de alguém”.2 No contexto da
organização, o controle pode ser definido como “um processo pelo qual
a direção ou outros grupos são capazes de iniciar e regular a conduta de
atividades de modo que seus resultados estejam de acordo com as suas
expectativas”. Assim, o controle é um processo fundamental da organiza‑
ção e muito mais que apenas o sistema que lhe dá suporte. Um “sistema
de controle” é um mecanismo projetado para transmitir informação e,
assim, ajudar o início e a regulação de atividades, mas isso não garante
que elas sejam realizadas satisfatoriamente. De modo geral, o processo do
controle visa assegurar que determinado resultado seja atingido e susten‑
tado, com um resultado previsível.
Embora o controle seja corretamente visto como um aspecto essen‑
cial da gestão, devemos ter em mente que os gestores não são o único
grupo que tentará exercer controle, porque operários, pessoal técnico,
profissionais e outros grupos organizacionais também tentarão fazê­‑lo.
Isso explica o paradoxo de que o controle em uma organização não é
apenas um processo que todos compartilham e em que têm as mesmas
metas; pode haver também resistência na busca de objetivos que não es‑
tão plenamente de acordo com os dos gestores.
Há grande ambiguidade em torno da palavra “controle”, apesar de
ser comum e usada no dia a dia. Em parte, isso se deve ao fato de que
a palavra tem ao mesmo tempo significado limitado e amplo, conforme
mencionado – controle como sistema e controle como processo. Outra
ambiguidade está na relação muito próxima do controle com um fenôme‑
no igualmente indistinto: o poder. Por um lado, há um aspecto do contro‑
le exclusivamente funcional, já que, de algum modo, ele é essencial para
que uma organização de indivíduos atinja seus objetivos e seja a base da

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direção futura de seus esforços. Por outro lado, o controle depende do
poder, e assim facilmente pode ser corrompido, favorecendo a exploração
de indivíduos.
Os gestores contratados pelos donos de uma empresa ou seus re‑
presentantes, ou por agências estatais no caso do setor público, gozam
de autoridade legal, sujeita a revisão periódica, sobre a conduta da or‑
ganização. Essa situação legal não garante que os empregados aceitem
o poder da gestão. Contudo, em organizações a que se juntam espon‑
159
taneamente e das quais são livres para sair, eles poderão aceitar muito
desse poder como legítimo. Eles têm a segurança de, por meio de uma

Controle
competência coletiva, se opor ao mau uso do poder pelos gestores e po‑
dem sair da organização quando a situação se torna intolerável.3 Sob tais
circunstâncias, o poder se transforma em “autoridade”, que os emprega‑
dos normalmente estão preparados para aceitar, pelo menos no exercício
das atividades cotidianas. A autoridade pode melhorar muito quando
são oferecidas compensações por cumprir o que os gestores esperam, o
que os empregados valorizam.
Poder e autoridade não são inerentes apenas a gestores. Em uma or‑
ganização, as pessoas dotadas de conhecimentos especiais gozam da au‑
toridade que emana de sua especialização. O poder também pode ser
compartilhado por uma questão de política da empresa. Esse é o princí‑
pio do “empowerment”, que pode ir até o controle organizacional pelo
próprio indivíduo, em que as decisões sobre a definição dos objetivos e
os recursos para atingi­‑los são compartilhadas. Aqui, a questão é que,
independentemente de como o poder se apresenta, o controle continuará
presente. A relação íntima entre poder e controle dá origem a uma defini‑
ção alternativa de controle: “uso do poder para garantir o cumprimento
de metas especificadas por meio de esforço organizado”.
Resumindo, o controle em uma organização pode ser obtido por
meio de uma série de atributos, entre os quais:4

„„o poder, como o domínio dos recursos;

„„a autoridade, que são os direitos delegados pelos proprietários


legais;

„„a especialização, que é a posse de um conhecimento especializado


relevante para as operações da organização;

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„„as compensações, como a oferta de remuneração em níveis acei‑
táveis para os empregados, principalmente quando há elementos
associados às metas de desempenho em tal remuneração.

Na próxima seção, iremos além das definições, com algumas distin‑


ções importantes. A primeira delas é entre controle estratégico e opera‑
cional. O conceito de controle também é analisado, para identificarmos
diferentes aspectos relativos à sua extensão e enfoque, e as característi‑
160
cas dos mecanismos de controle. Essas distinções básicas nos ajudarão
a resolver a questão das alternativas de controle e associá­‑las às formas
parte ii  novas formas internas

organizacionais convencionais e às novas. A terceira sessão identifica os


fatores contextuais importantes para a escolha entre diferentes estratégias
de controle. A questão do controle também será discutida em capítu‑
los posteriores que tratam de duas de suas aplicações contemporâneas: o
Capítulo 11 contém uma seção sobre o controle nas corporações multi‑
nacionais e o Capítulo 15 examina o controle relacionado à questão da
responsabilidade na governança corporativa.

5.2 O controle nas organizações:


distinções importantes*
5.2.1 Níveis de controle
Há dois níveis de controle nas organizações: o estratégico e o ope‑
racional. O controle estratégico é aquele sobre recursos e métodos dos
quais depende toda a conduta e a direção futura de uma organização.
Eles incluem o capital, a forma dos ativos nos quais o capital está incor‑
porado, e suas disposições estratégicas, como as áreas ou mercados que
precisam ser atendidos, as comunidades e mercados de trabalho em que
a organização está localizada, e suas relações com fornecedores, organi‑
zações rivais e departamentos do governo. Esse é o nível de controle que,
em geral, as pessoas preocupadas com a governança corporativa efetiva
têm em mente.
A capacidade que a administração tem de exercer o poder nas organi‑
zações vem primordialmente do controle em seu nível estratégico, porque
esse nível de controle lhe permite realocar o capital, o que pode acarretar

* Specialization, simplification e standard methods no texto original (N. do R.).

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o fechamento de instalações e levar em consideração ofertas de comuni‑
dades para inaugurar outras. O controle sobre a provisão de capital de
investimento, por exemplo, já serviu de base para obter a cooperação de
autoridades locais em áreas de desenvolvimento para garantir mercados
de trabalho “captados”, em que uma empresa se torna o empregador
dominante, e também para assegurar a ajuda dos líderes dos trabalha‑
dores para eliminar métodos restritivos ao trabalho, reduzindo os níveis
hierárquicos e promovendo a “disciplina industrial”. O poder de recru‑
161
tar seletivamente a partir de uma vasta oferta de candidatos ao emprego
permite aos gestores contratar aqueles que tenham maior probabilidade

Controle
de aceitar sua autoridade e substituí­‑los prontamente, se o desempenho
não corresponder ao esperado. O fornecimento de habitação, de hipote‑
cas ligadas ao emprego na empresa e de benefícios intransferíveis, como
as aposentadorias, são mais alguns exemplos de como o controle sobre
recursos estratégicos pode ser usado para incentivar e até mesmo coagir
os empregados a aceitarem o controle administrativo na organização –
controle esse que as simples cláusulas de um contrato de emprego em
si não garantem. Uma análise semelhante poderia ser feita em relação
ao controle em outras áreas estratégicas, como o domínio em um mer‑
cado de determinado produto ou o monopólio sobre o fornecimento de
um serviço de utilidade pública. De modo geral, o poder para exercer o
controle no nível operacional em uma organização depende, em grande
parte, do controle no nível estratégico, e certamente é facilitado por ele.
O segundo nível de controle, o controle operacional, está mais próxi‑
mo do principal enfoque deste capítulo. Esse é o controle sobre o trabalho
feito em uma organização no sentido de determinar a maneira pela qual
os empregados realizam suas funções. O exercício do controle operacio‑
nal depende do poder, especialmente se não houver probabilidade de que
os envolvidos cooperem espontaneamente. O poder poderá ser usado de
maneira abertamente coerciva, quando os empregados são ameaçados de
demissão, especialmente em situação de alto desemprego, quando isso te‑
ria grande influência em suas vidas. O poder também pode ser usado para
oferecer persuasão material, como incentivos para atingir determinadas
metas. Há ainda um terceiro uso do poder: o uso de meios de persuasão
ideológica; por exemplo, a capacidade de implantar eventos simbólicos,
como cerimônias periódicas, ou financiar uma revista da empresa, ambos
visando promover a ideia de comunidade e uma identificação cultural
com a organização e sua administração.

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Assim, o controle operacional é a realização de um potencial ofe‑
recido pelo poder nas organizações. Embora a direção detenha a maior
parcela desse poder por controlar os recursos estratégicos, outros grupos
também detêm algum poder capaz de afetar as operações. Os trabalha‑
dores com habilidades e competências especiais necessárias para realizar
determinadas tarefas, e que não podem ser prontamente substituídos, são
exemplo de um grupo potencialmente poderoso. Por exemplo, quando
há uma falha da TIC, os serviços do pessoal de apoio normalmente são
162
convocados com urgência. Os gestores, no entanto, não têm como prever
quando esse tipo de serviço será necessário e, assim, organizar uma as‑
parte ii  novas formas internas

sistência alternativa, caso não haja cooperação dos especialistas da casa.


É no nível estratégico da administração que os objetivos são estabe‑
lecidos e traduzidos – primeiro em políticas e, depois, em planos de ação.
Quem controla os recursos estratégicos e os meios para assegurar sua boa
utilização, como captação de recursos, também determina os objetivos e
as políticas da empresa. Apesar da existência de extenso controle acioná‑
rio dos empregados em algumas empresas, como na United Airlines e na
John Lewis Partnership, varejista do Reino Unido, não é muito comum
que eles participem da formulação de seus objetivos. Por isso, talvez não
compartilhem ou compreendam plenamente os objetivos da diretoria, o
que dá origem a certa resistência ao controle administrativo.
Tal possibilidade aumenta por causa do potencial conflito de interes‑
ses inerentes aos contratos de emprego, já que remunerações e salários
são deficits na lucratividade final. Se esse conflito permanece na mente
dos empregados, ele tenderá a suscitar resistência, às vezes até coletiva‑
mente organizada, ao controle administrativo. Para os envolvidos, tal
resistência parecerá significar a proteção de seus interesses, por exemplo,
em relação ao equilíbrio entre o esforço necessário e o pagamento ofere‑
cido, ou à preservação do poder do mercado de trabalho, restringindo a
possibilidade de a gestão de desgastar as habilidades dos empregados. As
pressões competitivas na economia mundial estão forçando os gestores a
exercer controle mais rigoroso, na tentativa de reduzir custos, aumentar
a produtividade e reagir mais depressa às mudanças do mercado. No
Capítulo 3 observamos que as reduções dos custos geralmente são ob‑
tidas por meio do downsizing, que ameaça os interesses imediatos dos
empregados. Em tais circunstâncias, é razoável que o curto prazo tenha
precedência na mente das pessoas; alguns empregados descobrem que já
participam das recompensas de longo prazo, como havia sido prometido.

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O resultado pode ser a desmoralização entre os empregados, a ponto de
neutralizar quaisquer economias de custo inicialmente esperadas.

5.2.2 Aspectos do controle


São três os principais aspectos do controle: sua extensão, seu enfoque
e os mecanismos pelos quais ele é exercido5.

163
5.2.2.1 Extensão do controle

Controle
A extensão corresponde ao grau de controle exercido sobre determi‑
nada atividade e pode ser avaliada diretamente em relação à amplitude
das decisões ou áreas de atividade que um gerente controla, seja sozinho
ou com outros. O leque das atividades sobre as quais um gerente recebe
informações que poderiam provocar sua intervenção, se julgada necessá‑
ria, permite uma avaliação menos direta, mas ampla da extensão do con‑
trole. Essa mesma distinção se aplica ao caso do controle em uma aliança
entre empresas, com a simples troca da expressão “empresa parceira” por
“gerente”.
É importante enxergar o controle como uma variável contínua, mais
do que um fenômeno do tipo “tudo ou nada”. Em outras palavras, os
gestores podem exercer diferentes graus de controle sobre sua organiza‑
ção e também distribuí­‑lo entre vários níveis e cargos, não sendo, portan‑
to, uma questão de ter controle total ou nenhum. Isso permite tomada
de decisões e outras iniciativas aos diferentes níveis e seções de uma or‑
ganização, sem necessariamente perder o controle global. Um princípio
básico da nova filosofia organizacional está no reconhecimento de que o
controle centralizado pode não gerar os melhores resultados. O Capítulo
3 observou como o controle pode causar sobrecarga nos custos adminis‑
trativos e desmotivação dos funcionários, além de inibir a inovação e a
flexibilidade. Portanto, o centro e a distribuição da autoridade são um
importante critério para a escolha da política organizacional, e meca‑
nismos especiais de controle podem ser adaptados para atender a cada
necessidade.
Semelhantes considerações se aplicam à organização de atividades nas
alianças entre empresas parceiras, como as joint ventures. Obter controle
suficiente sobre a aliança para proteger os próprios interesses é importan‑
te para qualquer empresa parceira, mas há também o risco de controle
excessivo. A tentativa de exercer mais controle do que o necessário não

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apenas incorrerá em maiores custos diretos, mas também terá consequ‑
ências negativas. Se uma empresa tentar exercer controle excessivo em
uma aliança, pode ameaçar a qualidade das relações com seus parceiros.
Além disso, se os parceiros, sozinhos ou juntos, tentam controlar demais
suas alianças, podem acabar por inibir a flexibilidade necessária para o
desenvolvimento das mesmas, em seus próprios ambientes competitivos.
Então, conforme Ohmae argumentou, “os gerentes devem superar a con‑
cepção popular de que o controle total aumenta as chances de sucesso”.6
164

5.2.2.2 Foco do controle


parte ii  novas formas internas

Entender que o controle na organização não precisa ser um fenô‑


meno tudo ou nada também chama a atenção para a possibilidade de
enfocá­‑lo em um nível mais específico em determinadas atividades, de‑
cisões ou processos. Por exemplo, muitas corporações multinacionais
consideram essencial ter o controle central da qualidade do produto, im‑
pondo padrões rígidos. A intenção é proteger a integridade e reputação
de suas marcas globais, que poderiam ser gravemente prejudicadas por
uma falha local na qualidade. Da mesma forma, a possível ameaça de
uma falha ambiental à sua reputação corporativa em alguma localidade
está levando muitas multinacionais a controlar centralizadamente seus
padrões ambientais. Em compensação, a multinacional pode considerar
apropriado exercer controle indireto mais relaxado sobre o departamento
de recursos humanos e os métodos de marketing de suas filiais estrangei‑
ras, porque é mais interessante ajustá­‑los às condições do mercado e da
cultura locais. Até mesmo em determinada unidade de uma empresa, o
controle poderá estar mais concentrado em algumas atividades do que
em outras.
O enfoque nas alianças entre empresas sugere a importância de a
empresa parceira exercer controle seletivo sobre atividades e decisões que
considera decisivas. Algumas atividades em uma aliança podem ser mais
importantes que outras. Por exemplo, a deficiência de recursos nos sis‑
temas de tecnologia e marketing de muitos países em desenvolvimento
poderia levar um parceiro estrangeiro a considerá­‑la um dos itens im‑
portantes a serem ofecerecidos e controlados para viabilidade de uma
aliança. Diante do problema da corrupção em muitos países em desenvol‑
vimento, as empresas estrangeiras investidoras normalmente acreditam
ser necessário controlar a gestão financeira de suas filiais. Essa abordagem
seletiva se torna mais sensível diante dos custos de transição envolvidos

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no exercício do controle. Os custos da gestão de algumas áreas de ativi‑
dade da aliança podem ser menores para um parceiro que para outro, se
um deles já tiver adquirido competência e familiaridade no exercício do
controle em tais áreas.

5.2.2.3 Mecanismos de controle


„„Há uma enorme diversidade de mecanismos de controle e é
comum empregá­‑los de forma combinada. As principais configu‑ 165
rações de mecanismos de controle se tornam estratégias diferentes

Controle
de controle, e elas são descritas na próxima seção. As caracterís‑
ticas que distinguem os diferentes mecanismos de controle estão
relacionadas a:

„„sua natureza negativa ou positiva;

„„sua formalidade ou informalidade;

„„como funcionam;

„„sua ênfase no feedback de informações do passado em oposição ao


“feedforward” de informações preditivas.

A primeira distinção é entre mecanismos de controle negativos e po‑


sitivos. Os gestores usam os mecanismos negativos para evitar que outros
membros de uma organização empreendam ações não aprovadas. Um
exemplo típico é a exigência de que decisões específicas devem ser ratifi‑
cadas por níveis superiores da administração ou até mesmo pela diretoria,
o que pode ser aplicado a questões como orçamentos e planejamento de
gastos do capital, e nomeações de gerentes seniores. O controle negativo
depende principalmente de regras e outras condições formais. Contratos
de emprego, por exemplo, podem estabelecer restrições à revelação de
informações fora da organização; um exemplo disso é a Lei dos Segredos
Oficiais Britânicos. Muitas empresas insistem em restrições contratuais
semelhantes em relação à tecnologia patenteada.
Outros mecanismos são de natureza positiva porque são usados para
incentivar e promover comportamentos desejados. O controle positivo
está no cerne de muitas práticas dos departamentos contemporâneos de
recursos humanos. Os dispositivos dos sistemas e programas de RH para
seleção, treinamento e desenvolvimento, avaliação, avanço na carreira e

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recompensa podem tanto ajudar a controlar a qualidade do pessoal de
uma organização como gerar um bom entendimento das normas de uma
cultura organizacional forte, bem como o comprometimento com elas.
As multinacionais têm interesse em promover suas culturas corporativas
para melhorar o controle e a integração de suas afiliadas estrangeiras. Até
processos como consulta e participação, que podem ser desejáveis por ou‑
tras razões como o aperfeiçoamento da qualidade da tomada de decisão,
podem servir como mecanismos positivos de controle quando resultam
166
em maior comprometimento dos empregados com a implementação das
decisões.
parte ii  novas formas internas

Em segundo lugar, os mecanismos de controle podem ser formais ou


informais. Os procedimentos para a nomeação de pessoal e os critérios
especificados para o aumento de salários estão entre os controles for‑
mais mais importantes. A formalização de relacionamentos de prestação
de contas a superiores, o planejamento e processo de aprovação dos or‑
çamentos e a alocação dos recursos são outros exemplos proeminentes.
Como acontece com qualquer formalização, o problema da rápida obso‑
lescência surge nas atuais condições de mudança rápida.
Em consequência, tem havido crescente interesse no potencial dos me‑
canismos de controle informais e mais flexíveis. Uma abordagem é promo‑
ver o contato regular entre gerentes e empregados de níveis hierárquicos
inferiores, na expectativa de que tal contato crie um compromisso pessoal
maior com relação aos objetivos da direção. Talvez seja possível ter um
contato mais pessoal por meio de reuniões e eventos sociais, ou, se isso
não funcionar, por meio de vídeos personalizados e outras comunicações.
Dados técnicos, administrativos e recomendações passados constantemen‑
te pelo pessoal corporativo às afiliadas, acompanhados pela manutenção
das relações entre os funcionários de diferentes níveis, têm grande potencial
para melhorar o controle operacional do centro corporativo. Os defensores
da nova organização recomendam essa abordagem mais informal e pessoal
por ser mais compatível com a transferência da iniciativa para empregados
e equipes. Ela não se baseia necessariamente na supervisão individual, no
sentido da tradicional estratégia centralizada de controle pessoal que logo
será discutida; em vez disso, ela pode servir de reforço a uma estratégia que
promova o controle por meio de recursos normativos e “culturais”.
A terceira distinção diz respeito a como funcionam os mecanismos
de controle. Eles podem influenciar a natureza do que é feito, o contexto
em que é feito e/ou os processos pelos quais são executadas as atividades.

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Os mecanismos de controle voltados para o conteúdo se baseiam na
especificação de questões substanciosas, como a proibição do roubo nas
oficinas das fábricas. Ao contrário, o controle voltado para o contexto
visa criar na organização uma atitude mental que sirva de suporte para
atingir as metas da gestão. A promoção de uma forte cultura corporativa
seria uma abordagem para gerar a compreensão e aceitação de tais metas.
A norma expressa por uma cultura corporativa pode ser, por exemplo, a
importância de se trabalhar com flexibilidade quando a situação exigir –
167
isso ilustra uma potencial vantagem dessa abordagem que, em princípio,
se aplica a qualquer situação, inclusive em circunstâncias imprevistas.

Controle
Os controles voltados para o processo baseiam­‑se no efeito do controle
na definição do processo pelos quais as coisas são feitas na ou pela orga‑
nização. Um bom exemplo já examinado é incentivar os empregados a
participar da tomada de decisões visando assegurar seu comprometimen‑
to na implementação bem­‑sucedida dessas decisões. Essa é a abordagem
característica da tomada de decisões nas maiores empresas japonesas, o
chamado sistema ringi.7
O quarto aspecto distinto dos mecanismos de controle é se eles se
baseiam no feedback, ou se incorporam o feedforward, ou ambos. Os
sistemas tradicionais de controle administrativo funcionam com base na
informação relativa a eventos do passado. O problema em um ambiente
que muda rapidamente é que muito desse feedback logo se torna irrele‑
vante. Em oposição a esse princípio, temos o feedforward, que acontece
quando informações previsivas são a base para avaliar se e como é neces‑
sário adaptar. Ele pode ser inserido no processo do controle administra‑
tivo por vários canais, como na prestação de contas de empregados que
estão em contato direto com os fatos externos, ou por informações ob‑
tidas pelos gerentes em suas redes de contato e por assinaturas de fontes
de informação acerca de tendências e novidades. Assim, o feedforward
habitualmente depende de um amplo espectro de fontes de informação,
que estão de acordo com a nova filosofia organizacional, segundo a qual
o controle já não pode estar exclusivamente nas mãos do alto escalão.

5.3 Estratégias de controle


Um dos paradoxos sobre o controle nas organizações é que ele é dire‑
cionado a algumas questões sobre as quais pode haver consenso entre geren‑
tes e empregados, mas também há outras sobre as quais pode haver conflito.

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Quando algo está em disputa, um aumento do controle pelos empregados
em relação a determinada questão se dá às custas do controle pela gestão,
e vice­‑versa. O controle então assume o caráter “tudo ou nada” ou de um
jogo de soma zero. Um exemplo seria o controle sobre o nível de hierarquia
em um departamento. Onde há questões sobre as quais diferentes grupos
tendem a concordar prontamente, como a segurança, o controle não tem
esse caráter de tudo ou nada. É possível partilhar o controle. Transferir o
controle para os empregados não significa a perda de controle pelos ges‑
168
tores. Em termos práticos, essa conjunção de conflito e consenso indica se
vale mais a pena adotar um portfólio de estratégias de controle, em lugar
parte ii  novas formas internas

de apenas uma. Cada estratégia estaria voltada para um assunto de acordo


com o grau de conflito ou consenso envolvido, e da mesma forma, diferentes
abordagens seriam usadas para os diferentes grupos na organização.
Por exemplo, em locais em que pode haver conflito relativo ao ritmo de
trabalho ou em que o desempenho pode ser mensurado mediante vincula‑
ção entre trabalho e salário, pode­‑se se esperar que a gestão use a supervisão
direta. Em assuntos em que há um alto grau de consenso, como segurança, é
provável que a gestão mantenha o controle por meio do apelo à identidade
comum das metas, como campanhas que recomendam aos trabalhadores
não assumirem riscos pessoais. Em questões consensuais, é mais certo que o
poder de decisão seja delegado ao empregado. Além do mais, categorias de
empregados cuja aceitação das metas administrativas não é objeto de dispu‑
ta ou que são altamente qualificadas – engenheiros de desenvolvimento são
um exemplo – em geral estão sujeitas a um modo de controle menos direto
que os grupos de empregados que possuem mais tendência a resistir aos
objetivos administrativos e/ou requerer mais assistência técnica.
Outra razão para a gestão usar diversas estratégias de controle é que
o controle não é associado a um único objetivo. A gestão tem de levar
em conta a eficiência, que costuma ser um objetivo de curto prazo, do
tipo “aqui e agora”. Ao mesmo tempo, também terá de assegurar que a
organização se adapte a novas circunstâncias, e para isso é melhor pre‑
servar certa flexibilidade nos arranjos do trabalho. Além disso, a gestão
deve se ocupar do incentivo à criatividade dos empregados e à capacidade
de inovar e aprender de toda a organização, o que requer espaço para o
pensamento criativo e a experimentação. Um misto de objetivos requer
um equilíbrio correspondente entre as estratégias de controle. Por exem‑
plo, uma ênfase excessiva no controle da eficiência poderá colocar em
risco outros objetivos se prejudicar a boa vontade dos empregados para

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adaptar os esquemas do trabalho, eliminar o espaço da criatividade ou
eliminar investimentos em desenvolvimento do pessoal.
Tornou­‑se evidente que, no caso do controle, estamos diante de um
processo complexo que o planejamento organizacional somente pode defi‑
nir até certo ponto. Os paradoxos e contradições inerentes aos relaciona‑
mentos organizacionais significam que pode haver resistência ao controle
administrativo por outros grupos que buscam reforçar as próprias medidas
de controle. Por sua vez, isso quer dizer que pode ser ilusório explicar a
169
resistência ao controle e as tentativas de subvertê­‑lo apenas devido à inade‑
quação da estratégia de controle. Muito já foi escrito sobre o quanto certas

Controle
estratégias de controle, como a supervisão estrita e a rigorosa confiança
nas regras, são incompatíveis com as necessidades psicológicas de adultos
maduros.8 Se aplicada sem levar em consideração o contexto mais amplo,
tal abordagem poderia implicar que a resistência ao controle desapareceria
assim que fosse adotada uma estratégia de controle adequada. Embora a
psicologia do controle certamente tenha importância, ela não conta a his‑
tória toda, a não ser, quem sabe, para os membros de uma organização
que estejam totalmente comprometidos com metas e políticas da gestão.
No caso deles, o problema seria apenas encontrar um estilo de controle
administrativo aceitável – não haveria nenhum conflito com seu conteúdo e
sua lógica. No caso dos empregados que veem algum conflito com a gestão,
nenhuma estratégia de controle, por mais sensível que seja a ponderações
psicológicas, será aceita inteiramente sem alguma resistência.
Portanto, a posição ideal a ser adotada pela organização em cada di‑
mensão do controle será diferente conforme as circunstâncias. Essas dimen‑
sões não são independentes umas das outras, mas servem como funções
complementares à gestão. Por exemplo, o uso da formalização como recurso
para “estruturar” as atividades das pessoas em uma organização tanto pode
facilitar um aumento na delegação como uma redução da supervisão mais
estreita. Uma pesquisa sobre o desenvolvimento estrutural de faculdades
canadenses ilustra essa complementaridade entre as dimensões do controle.
E é também uma das poucas investigações que examinaram como o uso do
mecanismo de controle muda ao longo do tempo em função do crescimento
das organizações, conforme descrito no Quadro 5.1.
As interpretações das descobertas de Friesen e colegas mostram que
os gestores têm algumas opções em relação ao controle, nas quais dife‑
rentes configurações das dimensões do controle são possíveis. A escolha
às vezes será determinada em função da situação prevalente, mas deve

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Quadro 5.1  Mudanças nos mecanismos de controle frente ao
crescimento das organizações

Um estudo com 23 escolas pós­‑secundárias em Alberta e na Columbia Britânica


(Canadá) nos permite uma visão interessante de como os métodos de contro‑
le tendem a mudar quando uma organização cresce. Também se deve esperar
mudanças no controle quando as organizações diversificam suas atividades e
suas localidades.
170
Com o crescimento e amadurecimento das escolas, ocorreu uma série de mudan‑
ças. Para começar, houve aumento constante no uso de controles formais. Ao
parte ii  novas formas internas

mesmo tempo, a delegação da tomada de decisão cresceu em relação aos anos


anteriores. A proporção dessa delegação, então, diminuiu antes de aumentar
novamente em anos posteriores. Na primeira fase, aumentou a confiança na
supervisão pessoal de gerentes intermediários, em compasso com a delegação
de poderes por parte da alta administração, mas depois houve o seu declínio.
Esses relacionamentos indicam uma série de conclusões ainda não definitivas.
Em primeiro lugar, a diferença entre organizações menores, mais jovens, e as
mais antigas era marcante. Uma organização menor e mais jovem costumava
ser muito centralizada, pouco formalizada e com moderada supervisão pessoal
pelos administradores intermediários. Conforme cresciam, aumentava também
a delegação de poderes, mas ela vinha acompanhada de um aumento da super‑
visão pessoal e, pouco depois, da formalização. Então, parece ter havido uma
crise de controle na qual a formalização aumentou bastante, a delegação de
poderes diminuiu e uso da supervisão pessoal também caiu. A essa altura, pare‑
ce que a formalização foi rapidamente instituída como estratégia de controle
em lugar da supervisão direta e que, enquanto procedimentos formais e defini‑
ções de funções eram implementados, certo grau da tomada de decisão voltou
a ser centralizado para compensar a redução da supervisão direta. Em fases pos‑
teriores do desenvolvimento, a formalização aumentou de maneira constante e
a delegação de poderes foi reinstituída e ampliada.

Fonte: FRIESEN, D.; HERON, R. P.; HOLDAWAY, E. A.; KELSEY, J. G. T.; SACKNEY, L. E. Organizational
structures: the educational sector. Edmonton: University of Alberta, 1978.

permitir a expressão da filosofia administrativa desejável. Atualmente,


diante da necessidade de se garantir flexibilidade para lidar com a alta
velocidade das mudanças e de se motivar os empregados, fazendo uso
de suas qualificações, há crescente interesse em descobrir maneiras de

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promover o autocontrole e abrandar os mecanismos de controle mais
estruturados.
Nas organizações existem seis estratégias de controle particular‑
mente significativas. Seus aspectos estão resumidos no Quadro 5.2.
Cada uma delas se baseia em uma configuração diferente dos mecanis‑
mos de controle. Embora mais de uma estratégia possa ser adotada em
uma única organização, elas tendem a ser aplicadas a diferentes tipos
de unidades, ou localizadas em diferentes ambientes culturais. A tenta‑
171
tiva de aplicar mais de uma estratégia a determinado grupo de pessoas
envolvidas em trabalho semelhante poderia ser contraproducente, pois

Controle
Quadro 5.2  Seis estratégias de controle em organizações

1. Controle pessoal centralizado


1.1 supervisão direta das atividades das pessoas
1.2 tomada de decisão centralizada
1.3 liderança pessoal: baseada nos direitos de propriedade, no caris‑
ma e/ou na especialização técnica
1.4 recompensas e punições reforçam a obediência à autoridade
pessoal

2. Controle burocrático
2.1 divisão da tarefa em elementos de fácil definição
2.2 métodos, procedimentos e regras formalmente especificados e
aplicados à realização das tarefas
2.3 controles orçamentário e contábil (variância de custos padrão)
2.4 tecnologia voltada para limitar a variação – ritmo, frequência e
métodos físicos ‑­ na realização das tarefas*
2.5 delegação da tomada de decisão rotineira dentro de limites
estabelecidos
2.6 sistemas de recompensa e punição reforçando a obediência a pro‑
cedimentos e regras

3. Controle do output
3.1 funções e unidades planejadas com a responsabilidade pela tota‑
lidade do output
3.2 especificação de padrões e metas de output

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3.3 uso de sistemas de “contabilidade por responsabilidade”
3.4 delegação de decisões em questões operacionais: semi­‑autonomia
3.5 recompensa e punição associadas ao cumprimento de metas de
output
4. Controle por meio de supervisão eletrônica
4.1 velocidade e qualidade do trabalho registradas e avaliadas a distân‑
cia por meio da tecnologia da informação e comunicação (TIC)
172 4.2 desempenho do empregado avaliado em relação ao de outros
empregados
4.3 monitoramento do desempenho usado para recompensar e discipli‑
parte ii  novas formas internas

nar os empregados
5. Controle pelo RH
5.1 uso de métodos de seleção para assegurar que os novos contrata‑
dos “se encaixem” no perfil de atitude, comportamento e qualificações desejado
pela administração
5.2 treinamento e desenvolvimento planejados para reforçar o perfil
desejado
5.3 procedimentos de avaliação e sistemas de recompensa usados para
estimular a obediência
6. Controle cultural
6.1 desenvolvimento de meios da identificação pessoal dos emprega‑
dos com as metas da administração
6.2 forte ênfase na característica coletiva de apoio mútuo da organiza‑
ção – por exemplo, analogia com a “família”
6.3 emprego caracterizado pela estabilidade e progressão na
organização
6.4 trabalho semi­‑autônomo: poucos controles formais

* Algumas autoridades a distinguem como uma estratégia de controle isolada. Por exemplo,
EDWARDS, Richard. Contested terrain: the transformation of the workplace in the twentieth
century. New York: Basis Books, 1979.

haveria o risco de confundir os empregados e destruir a iniciativa ou


até provocar resistência devido ao ressentimento provocado pelo que é
considerado como controle excessivo.
Esse pode até ser o caso do que é chamado de “controle cultural” no
Quadro 5.2. Ele pode ser usado para reforçar os outros cinco tipos, em

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especial o “controle pelo RH”. Não obstante, os empregados que acei‑
tam o controle cultural em sua forma plenamente desenvolvida poderão
resistir a uma aplicação rigorosa de outras estratégias. Pelo menos na
cultura anglo­‑saxônica, que dá ênfase ao individualismo e à independên‑
cia pessoal, uma abordagem cultural do controle normalmente estará
aliada a uma filosofia de empoderamento e autocontrole. Há evidências
que indicam que a imposição rigorosa do controle mediante o uso si‑
multâneo de mais de uma estratégia pode ser mais comum em situações
173
em que a aceitação passiva da autoridade é a norma, combinada com o
baixo nível de confiança e de qualificação, como no emprego de traba‑

Controle
lhadores imigrantes. Isso não costuma ser recomendado em uma organi‑
zação “saudável”.

5.3.1 Controle pessoal centralizado


Trata­‑se de uma estratégia geralmente encontrada em pequenas
empresas administradas pelo proprietário e também historicamente
associada ao subempreiteiro na construção e na engenharia civil, ao
“companheiro” nas minas de carvão, e a arranjos semelhantes na enge‑
nharia em geral e na siderurgia. A centralização da tomada de decisão e
da iniciativa em torno de uma figura da liderança é fundamental nessa
abordagem. As decisões estão a cargo do executivo principal da orga‑
nização ou de quem estiver encarregado pela unidade. O processo de
controle em sua maior parte consiste em assegurar que essas decisões
sejam, por meio da inspeção pessoal e da prestação de contas, imple‑
mentadas. O líder pode passar boa parte de seu tempo supervisionando
pessoalmente o trabalho. Quando uma organização cresce o bastante
para contratar alguém para supervisionar os detalhes das operações co‑
tidianas, há uma separação entre a tomada de decisão e a supervisão.
Ambas continuam sendo feitas pessoalmente, com os supervisores se
reportando pessoalmente ao líder. A autoridade do líder costuma se
basear no direito de propriedade, em qualidades pessoais muito espe‑
ciais (carisma) ou na especialização técnica. Um importante critério na
distribuição de recompensas e punições provavelmente é a obediência à
autoridade do líder. Sob tais circunstâncias, é fácil o favoritismo se de‑
senvolver, distorcendo o feedback ao líder. O Quadro 5.3 ilustra o uso
da estratégia de controle pessoal centralizado.

Book_Organizaçoes.indb 173 16/9/2011 16:23:31


Quadro 5.3  Estratégia de controle pessoal centralizado

Um hotel cinco estrelas foi comprado e transformado num famoso resort por uma
empresa pertencente a uma família de origem mediterrânea. O hotel oferecia
muitos serviços: além da acomodação dos hóspedes, comida e bebidas, oferecia
também instalações para congressos, compras, apartamentos para alugar e
estacionamento público. De manhã, todos os chefes de departamento se reu‑
niam no escritório do proprietário. Os dois filhos dele, que estavam sendo
174 educados para assumir cargos importantes, normalmente também estavam
presentes. Durante a reunião, o proprietário pedia a cada gerente informações
parte ii  novas formas internas

sobre os acontecimentos do dia anterior, sobre as intenções para aquele dia e


para o futuro próximo. Depois, passava as instruções a cada gerente. Às vezes,
ele mencionava um e outro plano futuro para o hotel como um todo ou para
alguma das propriedades do grupo. O tom dessas reuniões, às quais assisti pes‑
soalmente, era repleto de deferências e havia um processo implícito por meio
do qual a lealdade de cada gerente ao proprietário era reafirmada. Como pro‑
cedimento de controle e motivacional, as reuniões pareciam funcionar muito
bem. Dado o tamanho relativamente pequeno da organização e a sofisticação
de suas operações, parecia improvável que a significativa distância de poder
entre o dono e seus gerentes permitisse que estes distorcessem a informação
do feedback que forneciam. Sua lealdade era ainda mais reforçada pelo fato de
todos fazerem parte de uma equipe muito antiga, que era tratada com gene‑
rosidade. Esse pessoal e suas famílias eram, na verdade, “servidores” da família
proprietária.

Fonte: Observações pessoais do autor.

5.3.2 Controle burocrático


A estratégia do controle burocrático é bem conhecida, não apenas nos
serviços públicos onde dizem ter surgido, mas também em grandes orga‑
nizações de todos os tipos. Seu princípio baseia­‑se na tentativa de garantir
a previsibilidade por meio da especificação de como as pessoas devem se
comportar e cumprir seus deveres em uma organização. O aspecto mais
característico da estratégia de controle burocrático é a formalização no
sentido de definições escritas e padronizadas das responsabilidades e pro‑
cedimentos. A administração científica era um exemplo clássico de tal es‑
tratégia de controle aplicada à indústria manufatureira. Essa abordagem

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defendia os “três S”∗: a especialização que, por meio da simplificação,
permitia a padronização dos métodos de realização de cada elemento da
função. Ela permanece em uso pelo mundo afora, mesmo nos novos tipos
de trabalho, como os call centers.9
Os sistemas de recompensa e punição podem ser definidos a fim
de reforçar essa estratégia de controle. Cumprir as tarefas e evitar pro‑
blemas podem ser recompensados por meio de promoção na carreira,
admissão ao staff, benefícios mais favoráveis e (não menos importante)
175
estabilidade no emprego. Essas perspectivas de admissão em um setor
privilegiado do emprego – que os economistas do trabalho costumam

Controle
chamar de segmento “primário” da organização interna do mercado de
trabalho – têm estreitas afinidades com a possibilidade de estabilidade
no trabalho e a progressão dos benefícios para aqueles que trabalham
em uma burocracia do serviço público. Em compensação, a desobediên‑
cia normalmente significa sanções em ordem crescente, finalizando com
a demissão.
Os sistemas de controle contábeis mais compatíveis com a estraté‑
gia de controle burocrático são os orçamentos e o controle da variância
dos custos padrões. O controle orçamentário envolve um processo re‑
gularmente repetido de formulação de um orçamento, em geral anual,
seguido de uma série de relatórios apresentados com maior frequência
(geralmente mensais). Como os orçamentos são tipicamente divididos em
normas de despesas para tarefas ou operações específicas, os orçamentos
são controles estruturados do comportamento de unidades, grupos ou
indivíduos. Da mesma forma, um sistema de controle de custo­‑variância
padrão envolve um processo para determinar qual deveria ser o nível dos
custos sob sistemas de operação específicos, utilizando os gastos como
padrões de desempenho, avaliando o custo real do desempenho e depois
comparando­‑o aos custos padrão. A determinação dos custos padrão es‑
tabelece um importante parâmetro para a forma pela qual os subordina‑
dos podem se organizar no trabalho. Toda a estratégia burocrática está
voltada para o controle de como são feitas as coisas e como as pessoas
devem se comportar na organização. Nesse sentido, é uma abordagem de
“controle de comportamento”, diferente do “controle do output” discu‑
tido a seguir.10

* Specialization, simplification e standard methods no texto original (N. do R.).

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A estratégia burocrática de controle evidentemente permite uma fle‑
xibilidade bastante limitada. Se os orçamentos e os padrões precisarem
ser revisados com frequência, isso torna­‑se uma atividade custosa, o que
desvia o esforço empreendido nas atividades de criação de valor. Uma
abordagem mais flexível não especificaria o comportamento com tanto
rigor, ou com qualquer rigor, mas se concentraria nos objetivos globais e
em como as pessoas progrediriam para alcançar tais objetivos. Por exem‑
plo, um monitoramento minucioso do fluxo de caixa poderia substituir o
176
uso de orçamentos detalhados. Se uma unidade fosse um centro de custo,
sua despesa total seria monitorada em relação a metas, e não em relação
parte ii  novas formas internas

a elementos específicos na medida em que as tarefas fossem concluídas.


Esses desenvolvimentos são mais compatíveis com a devolução de toda a
responsabilidade pelo desempenho a unidades e equipes, e representa um
passo em direção ao controle do output.
Outro problema está na maneira pela qual o controle burocrático
tenta impor normas e procedimentos uniformemente a todos os empre‑
gados, sem levar em conta seus pontos fracos e fortes. O exemplo do
Quadro 5.4 mostra como, por esse motivo, um sistema de controle bu‑
rocrático desenhado para todos os empregados terminou isolando um

Quadro 5.4  “Prezado escritório central: você está me ouvindo?”

Charles (Hap) Clonninger é um excepcional vendedor de seguros de vida – ele


sabe disso e a companhia também. O total de apólices em dólares que ele vende
por mês o inclui entre os 10% melhores agentes da empresa. Quanto mais ele
vende, mais fácil é vender. O próprio Hap assim expressou essa ideia há algum
tempo: “…as vendas criam a confiança em um homem e a confiança em si mes‑
mo é o que motiva o sujeito a fazer mais. É um processo contínuo”.
Hap Clonninger é um vendedor de seguros altamente motivado e produtivo. A
seguradora já reconheceu – bem acima das comissões de vendas habitualmente
generosas – a contribuição de Hap. Por exemplo, nos últimos três anos Clonnin‑
ger recebeu:

1. Uma viagem de quinze dias a Nassau, nas Bahamas, com tudo pago
para ele e a esposa, por estar entre os dez melhores vendedores do ano.
2. Um fim de semana na Cidade do México (tudo pago, é claro) pelas
maiores vendas em dólar no mês de janeiro.

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3. Entradas gratuitas para diversos espetáculos teatrais e atividades
esportivas.
4. Um fim de semana em Pasadena, na Califórnia, para o Torneio do
Roses Parade e duas entradas para um jogo no estádio Rosebowl.
5. Incontáveis citações e placas que estão expostas com proeminência
em seu escritório no centro de Atlanta.

Hap Clonninger também já foi reconhecido por profissionais do setor fora de 177
sua empresa e recentemente foi eleito para a vice­‑presidência da Associação dos

Controle
Executivos do Seguro, com sede na Geórgia.
Hap adora seu trabalho e não trocaria de lugar com ninguém. Muitas vezes ele
diz: “Eu realmente não penso em mim como vendedor, prefiro pensar que sou
o cara que ajuda os outros a construírem suas propriedades… uma espécie de
planejador e conselheiro de finanças. É um trabalho que me dá muita satisfação,
e além disso, vejo imediatamente as recompensas por meus esforços”.
Contudo, parece que nenhum trabalho é perfeito e uma parte desse trabalho
irrita Hap Clonninger: a companhia exige um relatório com a descrição das
perspectivas de venda. Leia o depoimento de Hap: “Aquele maldito relatório
acaba com um dia inteiro de trabalho por mês! Imagine só: um dia inteiri‑
nho por mês enchendo seis páginas de perguntas, descrevendo em detalhes
como eu pretendo fechar as vendas do mês seguinte. Quer dizer, até dá
pra entender o ponto de vista da empresa, especialmente com vendedores
jovens e inexperientes. Um relatório como esse obriga o funcionário a pen‑
sar num plano de vendas para o próximo período. E o ajuda, porque trans‑
forma ideias vagas ou confusas em sua cabeça num plano viável no papel. O
plano também ajuda a empresa, porque mostra que o agente realmente tem
um plano de vendas bem definido. Também pode servir para acompanhar o
progresso dele… como ele está em relação ao que disse que faria.
Mas um plano de vendas mensal não tem realmente valor algum para a empresa
ou para mim no que se refere aos meus esforços. Também tem pouco ou nenhum
valor para qualquer outro agente experiente. Temos tantos negócios sendo gera‑
dos o tempo todo que não nos preocupamos em trabalhar a partir de um plano.
Certo mês, há cerca de um ano, não fiz o relatório pela primeira vez desde que
entrei na companhia. Eu pensei: ‘se não me disserem nada, vou deixá­‑los de
lado’.Nossa! Foi como se eu tivesse cometido um grande crime! Recebi avisos
formais de dois vice­‑presidentes e muitos burocratas abaixo deles sobre a omis‑
são e cheguei à conclusão de que não valia a pena lutar contra o sistema… eu
continuaria a entregar meus planos de venda como antes.

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Algum tempo depois, pensei que a única vez que eu escutara algum comentário
sobre os meus relatórios mensais tinha sido exatamente no mês em que não o
entreguei! Eu não conseguia me lembrar de qualquer comentário ou questio‑
namento sobre meu plano de vendas em qualquer outro momento.
Há quatro meses, no dia do relatório, eu estava me sentindo muito bem. Tinha
acabado de vender uma grande apólice para o executivo de um supermercado e
não estava a fim de escrever o relatório. Mas, condicionado por anos de obedi‑
178 ência, comecei a redigi­‑lo.
Mais ou menos no meio do caminho, na página 3 ou 4, de repente escrevi: ‘Se
alguém se incomodou em ler até aqui, eu, Hap Clonninger, pagarei um martini
parte ii  novas formas internas

para essa pessoa’. Sabe, eu não tive de pagar nenhum martini… e aquele relatório
passa por, pelo menos, quatro mesas!
No mês seguinte, escrevi no meio daquilo tudo: ‘Este relatório foi preparado
pelo maior vendedor de seguros do mundo!’ Mais uma vez, nenhuma resposta
da matriz.
Claro, ainda havia a possibilidade de que o relatório estivesse sendo lido, mas
que minhas anotações fossem consideradas bobagens. Então, no mês passado
resolvi testar o sistema pra valer. Na página 2, sob o título ‘novas perspectivas’,
escrevi o seguinte: ‘Edgar Millikan (o presidente da companhia) é um velho sujo
e risco alto em termos de seguro’.
Você acredita que não tive nenhuma resposta?! Ninguém lê o relatório mensal…
mas se eu deixo de entregar um… Nossa! O mundo vem abaixo!”

Fonte: Trecho de JOYCE, Robert D. Encounters in organizational behavior. New York: Pergamon
Press, 1972. p. 17­‑19.

dos funcionários mais competentes da empresa. Talvez você, leitor, possa


imaginar como esse dilema poderia ser resolvido.

5.3.3 Controle do output


Esta estratégia de controle depende da capacidade de identificar ativi‑
dades completas em si, no sentido de terem um output mensurável ou um
critério de realização da atividade. Nesse contexto, output não precisa
significar um produto final – pode ser uma peça fabricada segundo de‑
terminadas especificações, um grupo de microchips ou montagem de um
subconjunto. Os critérios mais comuns de realização são as quantidades
de artigos produzidos, o valor agregado e a lucratividade. Tais critérios

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podem ser aplicados a indivíduos, grupos, linhas de produtos e unidades
inteiras, conforme a maneira como o trabalho está organizado. No caso
de muitos tipos de serviços, a produção mensurável seria todo o serviço,
com base na satisfação expressa pelo cliente – embora alguns deles, como
os transportes, possam ter o desempenho separado em elementos como
pontualidade, conforto e cortesia dos funcionários.
Uma vez identificado o output ou os critérios para o desempenho
de maneira geral, a administração pode especificar padrões e metas de
output. As compensações e as sanções podem estar associadas ao cumpri‑ 179

mento do desempenho expresso em termos de output. Dessa forma, cria­

Controle
‑se um incentivo direto para que os empregados cumpram e superem os
padrões de produção. A efetividade desse incentivo dependerá em grande
parte da confiança na intenção da administração em honrar a equação
entre recompensa e desempenho. Se não existir tal confiança, tanto o
valor do incentivo do sistema como a exatidão da informação passada
à administração podem ser prejudicados. As avaliações de desempenho
estão sujeitas a tensão e a ressentimento se houver qualquer suspeita de
desequilíbrio.
“Contabilidade por responsabilidade” é o tipo de sistema de conta‑
bilidade financeira mais adequado à estratégia de controle do output.11
Ela atribui responsabilidade financeira a determinadas subunidades or‑
ganizacionais, mede o desempenho de tais unidades e dá feedback do
desempenho às pessoas a quem foi atribuída a responsabilidade e ao seu
gerente. A atribuição da responsabilidade pode ser em termos de centros
de investimentos, em que os interessados têm autoridade sobre rendimen‑
tos, custos e investimento de capital; centros de lucro, em que a autorida‑
de é delegada sobre rendimentos e custos, mas não sobre o investimento;
ou centros de custo, em que é delegada autoridade sobre os custos, mas
não sobre rendimentos ou investimento de capital.
Uma estratégia de controle de output visa facilitar a transferência da
tomada de decisão operacional sem incorrer na parafernália dos caros
e potencialmente desmotivadores controles burocráticos, ou na supervi‑
são pessoal, que também pode ser desmotivadora e aumentar os custos
administrativos. Uma vez que os empregados tenham concordado com
os padrões de output, é possível deixá­‑los livres de um controle minu‑
cioso sobre como fazer as coisas, favorecendo um relacionamento semi­
‑autônomo com a administração. Essa estratégia tem também o mérito de
direcionar o processo de controle para a questão que realmente importa

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para a sobrevivência de longo prazo de uma organização: o desempe‑
nho. É importante, contudo, minimizar os conflitos que possam surgir
por causa dos critérios atribuídos a diferentes subunidades que competem
por recursos ou (às vezes) por clientes em um mesmo mercado.
Portanto, em princípio, o controle do output é uma estratégia atra‑
ente, que geralmente tem a ver com a adoção de novas formas organiza‑
cionais. Quais são, então, os possíveis obstáculos para sua adoção? Um
problema é que a autonomia dada a grupos ou equipes de trabalho, o que
180
é incentivado pelo controle do output, pode impedir a introdução de avan‑
ços tecnológicos que exigem um processo mais integrado, unindo tarefas
parte ii  novas formas internas

antes realizadas separadamente pelos grupos em questão. Um exemplo é


a introdução de equipamento de transferência automatizado – neste caso,
talvez seja mais viável mudar o foco de controle de output do grupo para
o nível da fábrica em geral. Outro problema pode surgir quando os gru‑
pos de trabalho resistem às sugestões de melhorias feitas pela administra‑
ção, por suspeitarem que sejam um prelúdio para a renegociação visando
baixar o pagamento por unidade produzida. Aqui, evidentemente, a con‑
fiança é uma questão. Um problema técnico desse tipo de controle talvez
seja a dificuldade de estabelecer medidas adequadas e aceitas de output.
Como, por exemplo, medir o output do departamento jurídico em uma
corporação? Por outro lado, se os processos por meio dos quais os resul‑
tados são alcançados não forem bem compreendidos e, assim, não forem
codificáveis pela administração, será necessário encontrar uma forma de
avaliação do output, porque a abordagem burocrática é inviável. Algumas
atividades de pesquisa industrial entram nessa categoria.

5.3.4 Controle por meio de supervisão eletrônica


A vigilância em si não é uma forma nova de controle. É essencial para
o controle por meio da supervisão pessoal. O aspecto novo da vigilância
está na aplicação de meios eletrônicos para a monitoração do desempenho.
A essência do controle por vigilância eletrônica é que a velocidade e
a qualidade do trabalho são registradas e avaliadas à distância mediante
o uso da TIC, evitando o alto preço da supervisão pessoal; além do mais,
os dados de controle registrados são precisos e não subjetivos ou sujeitos a
distorções gerenciais. Com esses meios, o desempenho de um empregado
pode ser avaliado em relação ao dos demais e às tendências com o passar
do tempo. Por sua vez, essa monitoração bastante precisa do desempenho

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pode ser prontamente usada como base para compensar ou disciplinar os
empregados.
A supervisão eletrônica está sendo aplicada a diferentes tipos e níveis
de atividades. Por volta de 1990, cerca de dez milhões de trabalhadores
nos Estados Unidos, inclusive empregados de nível gerencial, já estavam
sujeitos a ela.12 Uma das primeiras aplicações foi o registro dos toques
no teclado dos operadores em estações de trabalhos ou computadores
pessoais. A pressão para que professores universitários apresentem seus
181
materiais em sites da internet e se comuniquem com os alunos por e­‑mail
e em salas de chat são mais um exemplo do potencial da supervisão ele‑

Controle
trônica do trabalho profissional.
Os call centers são outro exemplo cada vez mais comum desse tipo de
controle. Por volta de 2002, os call centers já eram responsáveis por 3% da
população trabalhadora nos Estados Unidos. Sistemas automatizados de
distribuição de chamadas (ACDs – automated call distribution) permitem
que o gerente coordene a distribuição, a natureza e a velocidade das tarefas
a realizar. O desempenho do pessoal de determinado call center (serviço
de atendimento ao cliente) pode ser monitorado, avaliado e comparado
internamente ou entre diferentes locais. Em um estudo de caso relatado
por Callagham e Thompson, o call center especificava 19 padrões bási‑
cos de comportamento em escalas de sete pontos para medir a destreza
dos operadores durante a avaliação. A vigilância das ligações de clientes
é realizada por um “departamento de pesquisa”, que faz verificações ao
acaso e responde às queixas do consumidor, e também pelos de chefes de
equipe, que escutam pelo menos cinco ligações por semana. As estatísticas
sobre quantas chamadas são recebidas, como elas são tratadas, para onde
são direcionadas e o tempo médio de duração são recolhidas e recebem
uma pontuação para servir de base para feedback, disciplina e avaliação.
A meta é que não mais de três ligações em cada dez mil resulte em queixas.
Não é necessário dizer que os representantes do serviço de atendimento ao
cliente não gostam da pressão imposta por essa forma de controle e já há
provas de que ela causa exaustão emocional.13 Muitos questionam a ob‑
jetividade e a adequabilidade das estatísticas produzidas eletronicamente
para estimular a uniformidade das respostas e aumentar a velocidade des‑
considerando as necessidades individuais de cada cliente ou consumidor.
Os call centers atraem muitas pessoas que não pensam em permanecer por
muitos anos nessa função, mas a natureza do controle a que estão sujeitas
contribui bastante para a alta rotatividade e o baixo moral.14

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5.3.5 Controle pelo RH
As atividades primordiais do departamento de RH estão identificadas
na Figura 5.1, que também mostra como elas se relacionam na forma de
um ciclo.
A seleção de novos candidatos visa melhorar o desempenho de uma
organização, adequando indivíduos compatíveis com o trabalho ou com
as atividades que precisam ser realizadas. O desempenho de gerentes e da
182 equipe passa por uma avaliação em intervalos regulares que serve de base
para a remuneração e também para a detecção de alguma necessidade de
parte ii  novas formas internas

maior desenvolvimento e treinamento. Se apropriado, o sistema de remu‑


neração pode motivar certos comportamentos que contribuem para um
melhor desempenho. Da mesma forma, se o treinamento e os programas
de desenvolvimento oferecidos aos empregados estão em sintonia com
suas necessidades em relação às exigências da função, eles também con‑
tribuirão para o melhor desempenho. Se ocorre que é necessário um gran‑
de volume de investimento em desenvolvimento para que os indivíduos
atuem adequadamente, essa informação dá feedback importante para o
processo de seleção, pois indica que as pessoas que estão sendo seleciona‑
das para o emprego não possuem as devidas qualificações.
Os procedimentos do departamento de RH podem ser usados tan‑
to para desenvolver as pessoas no trabalho (“recursos humanos”) como

Figura 5.1  O ciclo da administração dos recursos humanos

Compensações

Seleção Desempenho Avaliação

Desenvolvimento

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para controlar seu comportamento e desempenho. Eles são parte do ar‑
senal de controle da administração porque melhoram a contribuição das
pessoas no trabalho para alcançar as metas e objetivos organizacionais.
As técnicas de seleção são delineadas para garantir que os novos candida‑
tos atendam ao perfil de atitude, habilidade social e competência técnica
que a administração procura. A avaliação do desempenho servirá de feed­
back para a administração e para os próprios empregados. Atualmente,
tais processos estão bastante formalizados em muitas organizações. Cada
183
vez mais se espera que o feedback sobre o desempenho seja construtivo,
identificando as possibilidades para se alcançar metas mais ambiciosas

Controle
e para melhorar a qualificação e as condições de trabalho para cumprir
essas metas. O Capítulo 6 discute em detalhes mais uma contribuição que
a área de RH pode dar ao processo do controle por meio da definição de
compensações que incentivem as pessoas a alcançar essas metas.

5.3.6 Controle cultural


O controle cultural tem sido associado às formas não convencionais
da organização. Sua lógica é manter o controle por meio da obediên‑
cia internalizada e não pela restrição externa. Seu objetivo é assegurar o
comprometimento dos membros com as exigências administrativas, acei‑
tando a legitimidade da autoridade dos gestores e identificando­‑se com
suas metas.
O exemplo mais notável de controle cultural talvez seja o que se vê
nas maiores corporações japonesas, em que a norma é a elevadíssima
produtividade e a lealdade do empregado. Uma base importante para
esse compromisso é a socialização na cultura corporativa e a pronta acei‑
tação de seus valores e crenças. Nas empresas japonesas, e também em
muitas das grandes corporações ao redor do mundo, foram criados pro‑
gramas para eliminar as identidades entre grupos e gerar consciência e
compromisso com uma identidade corporativa comum. Entre os métodos
empregados está o “treinamento para ser consciente” por meio de cen‑
tros educacionais, vídeos corporativos e outras mídias, além de reuniões
sociais organizadas por gerentes e líderes de equipe.
Os críticos têm considerado tais tipos de atividades como uma for‑
ma de “sociabilidade compulsória”.15 A estratégia do controle cultural
dá muita ênfase ao caráter coletivo de apoio mútuo da organização, e
muitas vezes invoca uma analogia com a família. Para que tal analogia

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seja digna de crédito, os empregadores devem estar dispostos a aceitar
as obrigações de chefes de família no sentido de proteger seus mem‑
bros, o que inclui garantir mais estabilidade de emprego e oportuni‑
dades para que os empregados progridam na organização. É preciso
ver até quando as grandes empresas japonesas continuarão a oferecer
esse apoio diante de grandes pressões para racionalizar e reestrutu‑
rar. Muitas corporações norte­‑americanas, diante de um aperto nos
ganhos, certamente não têm mostrado grandes escrúpulos em despedir
184
empregados, e com isso puxam o tapete da credibilidade dos progra‑
mas de cultura corporativa.16
parte ii  novas formas internas

Realmente, é muito difícil para empregadores e executivos evita‑


rem emaranhar­‑se em contradições quando abraçam o controle cultural,
como muitos tentam fazer. Uma contradição diz respeito à maneira pela
qual uma cultura corporativa forte seria uma alternativa ao controle.
Embora se alegue que o desenvolvimento de uma cultura corporativa
forte e amplamente aceita permita a concessão de alto grau de auto‑
nomia, na prática os esforços são para assegurar que os empregados se
adaptem às normas e aos rituais dessa cultura. Na realidade, a criação
da cultura corporativa costuma ser empreendida tendo­‑se em mente o
controle, que é visto como um exercício para desenvolver uma ordem
social adequada, que sirva de base para o comportamento desejado. O
controle cultural funciona moldando as atitudes das pessoas, e geral‑
mente é combinado com a ênfase no controle pela área de pessoas. A
ideia é que, para deixar as pessoas livres para serem “autônomas”, elas
devem ser mentalmente programadas primeiro, selecionando­‑se candi‑
datos adequados que depois serão socializados por meio de um bom trei‑
namento. Conforme Thompson e McHugh comentaram: “… por meio
da experiência da equipe e da retórica da família, a empresa produz 'em‑
pregados planejadores' que aceitam a identidade segura oferecida pela
comunidade simulada”.17
Como acontece com o controle de output, os indivíduos sujeitos
a um regime eficaz de controle cultural às vezes recebem considerável
poder de decisão sobre como agir em seu trabalho, pressupondo­‑se que
tenham as necessárias aptidões e competências, pois compreendem bem
as metas estabelecidas pela organização e têm algum entusiasmo em re‑
lação a elas. A administração pode contemplar modos semi­‑autônomos
de trabalho, se houver um grande consenso na organização. Outro as‑
pecto a ser levado em conta é que, quanto maior o leque dos envolvidos

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no processo de definição de metas e objetivos comuns, maior será a
aceitação da ideia de que uma cultura corporativa ajuda a manter a
coesão entre as metas das equipes e as de outras unidades integrantes
da organização.
Esses aspectos do controle cultural oferecem vantagens claras so‑
bre as demais formas no atual contexto, em que as empresas devem
basear­‑se no comportamento mais flexível entre seus membros. Para
uma empresa que combina a economia de custos com um apelo de
185
mercado por meio de produtos e serviços diferenciados, a maioria das
outras formas de controle apresentam inconveniências. A supervisão

Controle
pessoal centralizada tende a criar sobrecarga nos altos escalões e res‑
tringir indevidamente a iniciativa e a inovação. O controle burocráti‑
co se baseia na recomendação prévia de ações e comportamentos que,
nas presentes condições, se tornam obsoletos antes mesmo de serem
introduzidos. Tanto o controle burocrático como o controle pessoal
também podem ser muito desmotivantes, especialmente para os traba‑
lhadores do conhecimento. O controle do output permite a delegação
de autonomia, mas também se baseia na especificação de padrões e
metas. No mínimo, esses deverão ser revistos em intervalos frequentes
sob condições de hipercompetição e de ambientes que mudam rapi‑
damente. A supervisão eletrônica também depende da capacidade de
especificar padrões de desempenho, que podem ser viáveis no trabalho
relativamente rotineiro, mas nem tanto em atividades criativas não
rotineiras.
Apesar da manipulação psicológica e social, até mesmo da completa
hipocrisia que geralmente acompanha o uso do controle cultural, este úl‑
timo realmente está em sintonia com o número crescente de profissionais
e outros trabalhadores do conhecimento, como observado no Capítulo 2.
O controle cultural já é aplicado em profissões nas quais ele é combinado
com a autonomia individual para seguir as regras fortemente internali‑
zadas de competência e conduta correta. Os profissionais, mais do que
a maioria das pessoas, se ressentem do controle administrativo externo
imposto quando se tornam empregados ou são contratados por grandes
instituições. A proporção cada vez maior de trabalhadores do conheci‑
mento está criando a necessidade de uma nova abordagem de controle
mais baseado no autocontrole internalizado.
O controle cultural também é compatível com a democracia indus‑
trial e a equalização do poder dentro das organizações. Na verdade, essa

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é provavelmente a única maneira de garantir que o controle cultural te‑
nha como base o verdadeiro consenso, em vez de ser imposto pela alta
administração. Dado que qualquer atividade organizada requer algum
controle, a participação pode se tornar um meio de controle organiza‑
cional baseado na legitimidade. Na visão da nova organização, uma
cultura organizacional amplamente aceita estabeleceria os valores para
orientar metas e objetivos mais específicos pelos quais o progresso da
atividade coletiva poderia ser monitorado. Tal abordagem é consisten‑
186
te com unidades ou equipes autogerenciadas que aceitam a responsabi‑
lidade de corresponder aos objetivos aceitos por consenso e completar
parte ii  novas formas internas

os projetos coletivamente endossados. Se avalizada com legitimidade, a


combinação das estratégias de controle de output e de controle cultural
pode reconciliar a necessidade subjacente da administração e o desejo
dos empregados de maior participação e auto­‑realização.

5.3.7 Abordagens de controle convencionais e novas


As estratégias de controle diferem em termos de compatibilidade com
as abordagens convencionais e novas da organização. Três estratégias de
controle, de modo geral, correspondem aos modos convencionais da or‑
ganização, enquanto as outras são mais compatíveis com as novas formas
organizacionais. Como descrito no Capítulo 2, o controle em organiza‑
ções convencionais e tradicionais costuma basear­‑se basicamente na su‑
pervisão pessoal e na tomada de decisão centralizada ou na aplicação de
regras e normas de conduta. A vigilância eletrônica também é compatível
com essas abordagens convencionais do controle, ainda que utilize tecno‑
logia bastante contemporânea.
Em compensação, as outras três estratégias de controle são mais
usadas nas abordagens mais novas da organização, que se esforçam
para promover a iniciativa descentralizada com o intuito de estimular
a inovação e reação flexível à mudança. A iniciativa descentralizada
é melhor administrada pelo monitoramento de como as pessoas atin‑
gem as metas aceitas por consenso, em vez da supervisão direta ou da
imposição de regras. A nova filosofia organizacional também destaca
o valor do capital humano e a gestão mais adequada dos empregados
com melhor formação por meio da promoção de seu potencial e em‑
penho, que é mais compatível com a abordagem do controle pelo RH.
O desenvolvimento da identificação com uma cultura corporativa e as

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metas administrativas que ela articula é altamente compatível com a
nova filosofia organizacional, desde que não se torne exageradamente
manipuladora.

5.4 Estratégias relevantes de controle e


contingências
A escolha entre formas organizacionais é feita levando­‑se em conta 187
as contingências – quanto uma empresa foi afetada pela competição e

Controle
mudanças e o tipo de pessoas que ela emprega. Isso se aplica igualmente
à questão do controle. Por exemplo, deve­‑se utilizar a combinação de
diversas estratégias? Diferentes estratégias devem ser aplicadas em dife‑
rentes áreas de atividade ou tipos de pessoas?
O caso de Hap Clonninger, descrito no Quadro 5.4, ilustra o dilema
de ter de variar o controle segundo o tipo de empregado. A função de
monitoramento do relatório mensal evidentemente não funcionava para
um excelente vendedor como Hap – tomava tempo de seu trabalho e a
descoberta de que ninguém estava lendo seus relatórios tornou­‑se seria‑
mente desmotivadora. De qualquer maneira, a seguradora poderia avaliar
prontamente o desempenho de seus vendedores por meio dos novos negó‑
cios que cada um fechava. No entanto, o próprio Clonninger admite que
o acompanhamento mensal poderia ser útil para vendedores jovens e inex‑
perientes. Ele poderia ser acrescentado aos procedimentos de orientação
e treinamento da área de RH para o pessoal menos experiente. Será que a
seguradora deveria pedir os relatórios apenas a certas categorias de ven‑
dedores? Poderia ser assim, desde que ela estipulasse critérios para decidir
quem deveria completar o relatório detalhadamente – por exemplo, falta
de experiência, tempo no emprego e nível de desempenho. Caso contrário,
uma aplicação diferencial do controle poderia ser facilmente interpretada
como comportamento arbitrário por parte da administração.
A Tabela 5.1 resume as implicações para a escolha da estratégia de
controle apresentadas por diferentes contingências. A primeira é a es‑
tratégia competitiva que a empresa está usando.18 Se ela visa assegurar
vantagem sobre os concorrentes com base em baixo custo, será preciso
contar com um rigoroso controle dos gastos e incentivos para atingir
as metas quantitativas. Esse rigoroso controle do custo pode ser rea‑
lizado por meio de diversos procedimentos de controle burocrático,

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Tabela 5.1  Estratégias relacionadas de controle e contingências

Estratégias de controle
Fatores contingentes Quando
mais adequadas
Burocrática, supervisão
1 Estratégia competitiva Liderança de custo
eletrônica (SE), de output
RH, cultural, de output
188
Diferenciação (qualitativa)
2 Grau de diversificação Alta RH, output, cultural
Baixa Centralizada pessoal (CP),
parte ii  novas formas internas

burocrática
3 Variabilidade do ambiente: Alta CP (pequenas organiza‑
imprevisibilidade das tarefas e ções), RH, cultural
necessidade de flexibilidade Baixa Burocrática
4 Característica da tarefa: Mensurável Burocrática, output, SE
produção Não mensurável CP, RH, output
5 Característica da tarefa:
Boa CP, burocrática
conhecimento dos processos
Limitada RH, output, cultural
de transformação
6 Importância de obter a Alta RH, output, CP
inovação Baixa CP, burocrática, SE
7 Especialização e aptidão do Alta RH, output, cultural
empregado Baixa CP, burocrática, SE
8 Posição dos empregados no Forte Cultural, output
mercado de trabalho Fraca CP, burocrática, SE
Pequena CP
9 Tamanho da organização
Grande Outros tipos

entre os quais a necessidade de aprovação prévia da administração


para despesas, a especificação de métodos mais econômicos de traba‑
lho para evitar o desperdício e a formalização das condições para ou‑
tros gastos, como a classe permitida em viagens aéreas, ferroviárias ou
rodoviárias. A supervisão eletrônica também ajuda a reduzir o custo
dos serviços fornecidos, porque registra em detalhe certos elementos,
como o tempo necessário para completar uma transação e o valor

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agregado obtido. O controle do output, quando viável, também pode
ajudar a manter baixo o custo de cada atividade ou transação, espe‑
cificando metas que depois são monitoradas em intervalos regulares.
Uma estratégia bastante diferente é ganhar vantagem sobre os con‑
correntes assegurando um preço prêmio para um produto superior, ou
mesmo singular, exclusivo. Michael Porter chamou­‑a de “estratégia de
di­fe­renciação”.19 A diferenciação requer capacidade para se adaptar a dife­
rentes exigências do consumidor e capacidade de inovar em produtos e
189
serviços. Por sua vez, isso requer uma boa coordenação entre todas as
funções, criatividade e ênfase em metas qualitativas. Se a qualidade pu‑

Controle
der ser medida, os devidos controles de output podem ser usados para
monitorá­‑la. Uma estratégia de diferenciação pode ser sustentada em
toda a organização por meio do uso de processos de RH para recrutar,
desenvolver e motivar pessoas criativas e muito bem qualificadas, e tam‑
bém de uma cultura corporativa que destaque a importância da criativi‑
dade, do interesse do cliente, da qualidade e de outros aspectos desejados.
A variabilidade ambiental significa que as condições sob as quais a
empresa opera e as atividades que deve realizar são caracterizadas por
significativa incerteza. Uma grande variabilidade ressalta a importância
da flexibilidade organizacional. Os controles burocráticos costumam
ser rígidos demais e não permitem tal flexibilidade. Se a empresa for pe‑
quena, será preciso confiar no controle pessoal centralizado ou em uma
combinação de controles pelo RH e culturais. Se for possível determinar
medidas de desempenho para respostas flexíveis a demandas imprevistas
e outros fatos externos, talvez seja possível usar o controle da supervi‑
são eletrônica e o controle de output. Entretanto, é improvável que essas
abordagens sejam suficientemente adaptáveis a todos os casos de variabi‑
lidade conjuntural. Um baixo nível de variabilidade ambiental torna mais
viável empregar o controle burocrático, pressupondo­‑se que as outras
circunstâncias sejam favoráveis a essa abordagem.
Dois aspectos das tarefas a fazer em uma organização são especialmen‑
te importantes na escolha da estratégia de controle. Em primeiro lugar, é
importante saber se as tarefas são mensuráveis e se há bom conhecimento
dos processos de transformação envolvidos – ou seja, como realizá­‑los. O
desempenho de tarefas com parâmetros prontamente mensuráveis pode
ser monitorado tanto por controles burocráticos, caso os métodos pos‑
sam ser medidos, como pelo controle de output ou eletrônico, quando a
produção pode ser medida. Tarefas com mensuração difícil ou impossível

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exigem supervisão pessoal ou apoio constante do RH e estratégias cul‑
turais. Tarefas normalmente envolvem a transformação de materiais fí‑
sicos ou de informações. Se os processos usados nessas transformações
forem conhecidos de tal forma que a best practice possa ser especificada,
pode­‑se empregar o controle pessoal ou burocrático. A escolha entre am‑
bos depende de fatores como o tamanho da empresa e das unidades de
trabalho que a constituem, e da atitude dos empregados com relação à
monitoração pessoal em vez da impessoal. Por outro lado, quando os
190
processos de transformação não são muito conhecidos e por isso têm de
ser elaborados pelos empregados diretamente envolvidos, a gerência não
parte ii  novas formas internas

pode especificar os métodos a serem utilizados, e outras estratégias de


controle serão então mais convenientes: output, RH e cultural.
Outras duas contingências estão associadas ao conhecimento limitado
dos processos de transformação: a inovação e os altos níveis de qualifica‑
ção dos empregados. A competição com base na inovação de produtos e
serviços está se tornando importante em praticamente todos setores. Por
definição, inovação significa trabalhar em novas tarefas, com novos parâ‑
metros e condições, de modo que os processos de transformação envolvi‑
dos tenham de ser descobertos ou inventados conforme a inovação avança.
Os empregados que trabalham em inovação e novos desenvolvimentos
devem ter excelente nível de expertise e capacidades. Em compensação, o
trabalho totalmente rotineiro envolve pouca ou nenhuma inovação e nível
inferior de qualificação. As tarefas compreendendo trabalho e funções dos
empregados têm processos de transformação perfeitamente claros. Enfim,
as estratégias de controle que funcionam com a inovação e empregados al‑
tamente qualificados são as de output, RH e cultural, ao passo que o con‑
trole pessoal centralizado, o burocrático e a supervisão eletrônica atendem
melhor ao trabalho rotineiro e a empregados menos capacitados. A super‑
visão eletrônica não funciona muito bem no controle de atividades inova‑
doras, mas é suficientemente flexível para ser aplicada na avaliação tanto
de operadores qualificados quanto de encarregados de tarefas rotineiras, e
pode abranger alguns aspectos de seu comportamento. Por exemplo, parte
do trabalho de um call center requer excelente capacidade para lidar com
as comunicações interpessoais, o que pode ser monitorado eletronicamen‑
te pela escuta de uma amostragem de ligações.
A posição dos empregados no mercado de trabalho pode influenciar a
eficácia das diferentes estratégias de controle. Algumas categorias de pes‑
soal e, sem dúvida, alguns indivíduos, têm excelente posição no mercado

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de trabalho – a qualquer momento podem trocar de emprego, se não gos‑
tarem da maneira como são controlados. Essas pessoas normalmente são
as que têm notável desempenho, diplomas e/ou um histórico exemplar.
Hap Clonninger entra precisamente nessa categoria; o Quadro 5.4 ilustra
sua frustração com um controle burocrático formalizado que desperdiça
seu tempo e, pior, não está sendo seguido, por ser na verdade desne‑
cessário. Os empregados que têm posição consolidada no mercado de
trabalho provavelmente reagem melhor a controles de output e cultural,
191
especialmente se os critérios de recompensa forem por bom desempenho
por meio de incentivos e reconhecimento público, gratificações e outros

Controle
símbolos. Em compensação, o uso do controle pessoal centralizado ou
burocrático e da supervisão eletrônica tende a ser mais bem tolerado por
empregados com posição mais frágil no mercado de trabalho, ainda que
não gostem necessariamente desses controles.
Por fim, mas não menos importante, há o fator tamanho da organi‑
zação. Com muitos exemplos, a Tabela 5.1 enumera as contingências do
controle pessoal centralizado em relação às circunstâncias do controle bu‑
rocrático. Ambas as estratégias correspondem ao controle de custos, pouca
diversificação e variabilidade conjuntural, necessidade de inovação limita‑
da, baixa qualificação dos empregados e posição mais frágil dos mesmos
no mercado de trabalho. Basicamente, é o tamanho da organização que
dita qual dessas duas formas de controle deve ser adotada, embora outros
fatores, como o carisma pessoal e o dinamismo do executivo, também te‑
nham certa importância. Conforme a organização cresce, vai se tornando
cada vez mais difícil confiar no controle pessoal centralizado, mesmo com
a ajuda das modernas tecnologias das comunicações, e a ‘balança’ das
vantagens, portanto, se inclina para a abordagem burocrática. Outras es‑
tratégias de controle menos direto – de output, supervisão eletrônica, pelo
RH e cultural – não são muito afetadas pelo fator tamanho, embora seja
cada vez mais difícil sustentar uma cultura corporativa comum quanto
maior e mais diversificada for a empresa.
Resumindo: a escolha da estratégia de controle deve ser feita levando
em consideração o tipo de atividade realizada pela organização, as qua‑
lidades das pessoas que ela emprega (inclusive a escassez dessas pesso‑
as) e uma série de fatores nesse contexto. Trata­‑se de uma área bastante
complexa para os administradores tomarem decisões e que ainda não é
alvo de pesquisas. A Tabela 5.1 chama a atenção para as principais con‑
tingências que influenciam a escolha das estratégias de controle, mas não

Book_Organizaçoes.indb 191 16/9/2011 16:23:33


resolve toda a complexidade das decisões a serem tomadas. Tais decisões
se tornam mais complicadas pela presença de inúmeras contingências
e diferentes condições dentro de uma mesma empresa. O Capítulo 11
mostra que muitas corporações multinacionais diversificadas por função,
produto e região enfrentam alto nível de complexidade interna e, em fun‑
ção disso, consideram apropriado empregar uma série de estratégias de
controle na mesma empresa.

192
Resumo
parte ii  novas formas internas

1. O controle é um processo central das organizações, que tem recebido


relativamente pouca atenção.

2. Em geral, ele está ligado ao exercício do poder gerencial, embora ou‑


tros grupos também procurem controlar o que acontece em uma organi‑
zação e como ocorre.

3. Há ambiguidade acerca do conceito de controle porque é usado para


caracterizar processos que variam desde o exercício do poder e a influ‑
ência no sentido mais amplo até sistemas de controle muito específicos e
concentrados em determinados objetivos.

4. É interessante, então, revelar a ideia de controle e trazer à luz seus


diferentes aspectos. Há distinção entre controle estratégico e controle
operacional. Outros aspectos são: a extensão e o foco do controle e as
características de seus mecanismos.

5. Distinções básicas como essas nos ajudam a identificar as melhores op‑


ções de controle. Podemos classificar seis estratégias de controle, algumas
das quais são compatíveis com as formas convencionais da organização,
enquanto outras funcionam melhor com as formas mais recentes.

6. Fatores contingenciais são importantes na escolha entre as diferentes


estratégias de controle. Eles incluem a estratégia competitiva da empresa,
grau de diversificação, a natureza de seu ambiente, as tarefas que realiza,
a qualificação de seus empregados e seu tamanho.

7. O controle ainda será discutido em outros dois capítulos que discorrem


sobre aplicações contemporâneas específicas. O Capítulo 11 traz uma dis‑
cussão do controle nas corporações multinacionais e como a manutenção

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do controle pode ser um problema para pequenas e médias empresas que
estão se expandido no exterior. O Capítulo 15 examina o controle em
relação à questão da accountability na governança corporativa.

Questões para discussão


1. Discuta os diferentes significados associados ao conceito de controle e
sua importância para a organização. 193

Controle
2. Quais são os principais aspectos do controle na organização?

3. Qual a importância de se distinguir controle estratégico e controle


operacional na organização?

4. Descreva e discuta as principais estratégias de controle na organização.


Quais são as principais vantagens e desvantagens de cada uma?

5. Como cada estratégia de controle está relacionada às formas de


organização convencionais e/ou novas?

6. Descreva as principais contingências que influenciam a escolha de uma


estratégia de controle nas organizações.

Notas
1. Por exemplo, LOCKE, Edwin A. (Org.). Handbook of principles of organi‑
zational behavior. Oxford: Blackwell, 2000, refere­‑se ao controle apenas em
relação ao controle da rotatividade do empregado e ao uso do poder nas orga‑
nizações. BAUM, Joel A. C. (Org.). The companion to organizations. Oxford:
Blackwell, 2002, dedica ao controle apenas 13 páginas esparsas em um total de
957. NADLER, David A.; TUSHMAN, Michael L. Competing by design, New
York: Oxford University Press, 1997 é um excelente livro sobre arquitetura
organizacional, salvo o detalhe de só se referir ao controle ocasionalmente. Li‑
vros sobre as novas formas organizacionais, como o editado por PETTIGREW,
Andrew M.; FENTON, Evelyn M. The innovating organization, London: Sage,
2000, ou o de BROWN, Shona L.; EISENHARDT, Kathleen M. Competing

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on the edge. Massachusetts: Harvard Business School Press, 1998, não fazem
nenhuma referência explícita ao controle. VOLBERDA, Henk W. Building the
flexible firm, Oxford: Oxford University Press, 1998, tem uma pequena seção
sobre o “controle dinâmico” e considera a flexibilidade “uma nova maneira
de obter alguma forma de controle em ambientes muitíssimo turbulentos”
(p. 89­‑90). Uma notável exceção a essa negligência em relação ao controle é
THOMPSON, Paul; MCHUGH, David. Work organizations. 3. ed. Basings‑
toke: Palgrave, 2002, que intenciona ser “uma alternativa crítica aos textos
clássicos, em geral norte­‑americanos”.
194
2. Cambridge dictionaries online. Disponível em <http://dictionary.cambridge.org>.
parte ii  novas formas internas

3. Essas possibilidades são discutidas em HIRSCHMAN, Albert O. Exit, voice


and loyalty: responses to decline in firms, organizations and states, Cambridge:
Harvard University Press, 1972.

4. FRENCH JR., J. R. P.; RAVEN, B. oferecem uma análise clássica das bases do
poder e do controle nas organizações em seu ensaio de 1960. The bases of social
Power. In: CARTWRIGHT, D; ZANDER, A. (Org.). Group dynamics: research
and theory, 2. ed. New York: Harper & Row. p. 607­‑623.

5. Essas dimensões são tiradas de GERINGER, J. Michael; HÉBERT, Louis. Con‑


trol and performance of international joint ventures. Journal of International
Business Studies, 20, p. 235­‑254, 1989.

6. Veja CHILD, John; FAULKNER, David. Strategies of cooperation. Oxford:


Oxford University Press, 1998. Cap. 9. A citação é de OHMAE, Ken. The glo‑
bal logic of strategic alliances. In: BLEEKE, Joel; ERNST, David (Org.). Colla‑
borating to compete. New York: John Wiley & Sons, 1993. p. 42.

7. MCMILLAN, Charles L. The japanese industrial system.3. ed. New York: De


Gruyter, 1996.

8. Uma pequena resenha de CONGER, Jay A. Motivate performance through em‑


powerment. In: LOCKE, Edwin A. (Org.). Handbook of principles of organiza‑
tional Behavior. Oxford: Blackwell, 2000. p. 137­‑149.

9. Para um exemplo, veja CALLAGHAN, George; THOMPSON, Paul. We recruit


attitude: the selection and shaping of routine call centre labour. Journal of ma‑
nagement studies, 39, p. 233­‑254, 2002.

10. A primeira distinção entre controle do comportamento e controle da produção


é de OUCHI, William G. The relationship between organizational structure and
organizational control. Administrative science quarterly, 22, p. 95­‑113, 1977.

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11. FLAMHOLTZ, Eric C. Human resource accounting. 2. ed. San Francisco:
Jossey­‑Bass, 1985.

12. PFEFFER, Jeffrey. New directions for organizational theory: problems and
practices. New York: Oxford University Press, 1997. p. 114.

13. DEERY, Stephen; KELSON, Roderick; WALSH, Janet. Work relationships in


telephone call centers: understanding emotional exhaustion and employee wi‑
thdrawal. Journal of Management Studies, 39(4), p. 471­‑496, 2002.
195
14. CALLAGHAN; THOMPSON, 2002, op. cit.

Controle
15. THOMPSON; MCHUGH, 2002, op. cit., p. 20.

16. CASCIO, Wayne F. Responsible restructuring. San Francisco: Berret­‑Koehler,


2002.

17. THOMPSON, Paul; MCHUGH, David, 2002, op. cit., p. 204.

18. PORTER, Michael E. Competitive advantage. New York: Free Press, 1985.

19. PORTER, 1985, op. cit.

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Capítulo 6
Questões da recompensa1

Conteúdo do capítulo
O tema dos critérios e sistemas de recompensa pelo trabalho nas organizações
é tão vasto que dois capítulos foram dedicados para sua discussão: juntos, os
capítulos 6 e 7 apresentam os principais problemas e alternativas , ponderando
como essas podem ser adaptadas às condições contemporâneas e à adoção de
novas formas organizacionais. Para que as compensações venham a contribuir
de maneira efetiva no processo da organização, é preciso conciliar objetivos
da administração com os dos empregados. O Capítulo 6 examina as teorias
e conceitos elaborados para ajudar a compreendermos as recompensas; o
Capítulo 7 trata especificamente da questão da remuneração.
O presente capítulo começa pela distinção entre compensações extrínsecas
e intrínsecas. Depois, examina os critérios que gerência e empregados,
respectivamente, aplicam às recompensas. Os critérios administrativos refletem
as contingências a que uma política de recompensa pretende corresponder, como
atrair o tipo desejado de empregados e motivá­‑los para atingir o desempenho
necessário das tarefas. Os critérios que os empregados aplicam às compensações
são um guia sobre o que pode motivá­‑los. São consideradas as áreas de pesquisa
psicológica e sociológica, que têm determinado esses critérios. O capítulo discute,
então, duas perspectivas que indicam como podem estar ligados os fatores
contingenciais e motivacionais em uma boa política de recompensa. Essas
perspectivas são a teoria da expectância e a teoria do condicionamento.

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6.1 O papel das políticas de recompensa
Um amplo escopo de compensações é aplicado diariamente nas orga‑
nizações, e elas são essenciais para o processo do emprego. O contrato de
emprego especifica o salário, além de outros benefícios possíveis, ofereci‑
dos a um indivíduo em troca de sua capacidade de trabalho. Entretanto,
essa capacidade ainda precisa ser transformada em contribuição dinâmi‑
ca para que os objetivos organizacionais sejam atingidos. Uma política
198 de recompensa visa obter tal contribuição por meio de uma série de in‑
centivos. Assim, ela é um complemento indispensável para o processo do
Organização - Princípios e prática contemporâneos

controle discutido no capítulo anterior.


Uma política de recompensa requer a seleção de um catálogo de re‑
compensas e o planejamento de forma bastante precisa de como elas serão
oferecidas, com a intenção de motivar os empregados a contribuir para os
objetivos organizacionais. O fato de haver um vasto espectro de recom‑
pensas disponíveis, que podem ser distribuídas de maneiras diferentes, e
de serem muitos os objetivos a atingir, tornam muito complexa essa ques‑
tão, sobre a qual são propostas muitas opiniões e teorias antagônicas.
Recompensas e punições podem ser usadas juntas, embora possu‑
am natureza e objetivos diferentes. Em princípio, as recompensas vi‑
sam incentivar o tipo de comportamento que as precede, ao passo que
as punições visam desestimular o comportamento que as precede. Para
a gerência, o critério do sucesso das políticas de recompensa é que elas
motivam o empregado a dedicar grande esforço físico e/ou mental para
realizar bem as tarefas necessárias. Outra condição para funcionarem
é que os interessados considerem atraentes e justas as recompensas que
lhes são oferecidas, e que as punições sejam consideradas legítimas e
merecidas.
O planejamento do sistema de recompensa complementa o da or‑
ganização, já que é apropriado considerá­‑lo um aspecto da política or‑
ganizacional. Os capítulos anteriores chamaram a atenção para muitos
exemplos da interdependência entre a organização e os sistemas de re‑
compensa. O Capítulo 3 discutiu o problema de agregar­‑se uma estru‑
tura salarial ao planejamento de níveis hierárquicos de autoridade. O
Capítulo 4 observou como as modificações na organização do trabalho,
que visam melhorar a integração, podem exigir o fim de incentivos indi‑
viduais para dar suporte a um modo de trabalho em grupo ou equipe. O
Capítulo 5 mostrou que recompensas bem planejadas contribuem para

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a operação de um sistema de controle da organização ao estimular os
empregados a atingir metas ou padrões determinados. O que é dado
como recompensa deve ser compatível com as tarefas e estruturas previs‑
tas pela organização, o que dá aos sistemas de recompensa um aspecto
imprevisível.

6.2 Recompensas extrínsecas e intrínsecas


199
As recompensas tangíveis são as extrínsecas. Elas são associadas a
cargos em uma organização, em vez de derivadas diretamente do con‑

Questões da recompensa
teúdo real de tais funções. As principais recompensas extrínsecas são
a remuneração, os benefícios adicionais, a estabilidade no emprego,
a promoção, os prêmios especiais e os símbolos de status. A remune‑
ração é uma compensação muito visível que atrai a maior atenção de
empregadores e empregados. Para o empregador, a remuneração habi‑
tualmente é um importante elemento nos custos da organização; para o
empregado, é o meio de manter sua vida e satisfazer suas necessidades
materiais, e além disso também pode ser um marco de realização e
status social.
Ao contrário, as recompensas intrínsecas surgem da natureza das
próprias funções e dos relacionamentos criados no trabalho. São menos
tangíveis do que as extrínsecas e mais difíceis de ajustar, o que não signi‑
fica que seus efeitos sejam menos importantes. Por exemplo, um relató‑
rio publicado em 2000 descobriu que as recompensas intrínsecas trazem
mais satisfações do que as extrínsecas (veja o Quadro 6.1). Os aspectos
que podem gerar recompensas intrínsecas para os empregados incluem
a variedade no teor da função, a responsabilidade, o reconhecimento, a
autonomia, a interação social, a participação no estabelecimento de me‑
tas e nas decisões a respeito dos métodos de trabalho, e o feedback da in‑
formação. Para o empregador, as recompensas intrínsecas são vantajosas
porque não aumentam necessariamente os custos e podem até melhorar
a produtividade. Mudanças para recompensas intrínsecas muitas vezes
podem ser realizadas sem novos investimentos ou modificações na tecno‑
logia – na verdade, a automação moderna e as tecnologias de informação
costumam permitir consideráveis opções na maneira como o trabalho é
organizado.2
Portanto, o movimento para a iniciativa descentralizada, funções que
exigem maior responsabilidade e o trabalho de equipe encontrado nas

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Quadro 6.1  Recompensas intrínsecas são importantes fontes de
satisfação no trabalho

Um relatório da Confederação da Indústria Britânica de 2000 descobriu que


apenas 45% dos pesquisados classificaram as recompensas materiais entre os
principais fatores para criar e manter a satisfação do empregado. Em compen‑
sação, 68% consideraram fontes importantes de satisfação os “bons relaciona‑
mentos do trabalho” e 57%, o “trabalho interessante”.
200

Fonte: CIB. Employment Trends Survey 2000: measuring flexibility in the labour market. London:
Organização - Princípios e prática contemporâneos

CIB & William Mercer, 2000.

novas formas organizacionais representa uma mudança de política, vol‑


tada agora para recompensas intrínsecas de nível mais alto para os mem‑
bros de uma organização.
A punição acontece sempre que uma esperada recompensa é corta‑
da ou é aplicada qualquer outra sanção para desestimular determinado
comportamento. Por exemplo, a gerência pode recusar dar um bônus sob
determinadas circunstâncias, como em uma fábrica em que um bônus
mensal combinado é retirado de qualquer indivíduo ou grupo que se re‑
cuse a mudar de função segundo os termos de um acordo de flexibilidade.
Para citar um acordo semelhante: “a recusa a realizar o trabalho solicita‑
do sem uma boa razão será tratada como ofensa disciplinar”.
O adiamento de uma promoção seria outro exemplo da retenção de
uma recompensa. Uma sanção mais séria, a demissão, encerra um contra‑
to de emprego e normalmente está associada a transgressões muito claras,
como o roubo no trabalho. Pensando nos argumentos deste capítulo so‑
bre os critérios para as recompensas, o aspecto da punição também deve
ser lembrado. Em tempos de alto desemprego, a ameaça de punição com
a perda do emprego assume enorme proporção para muita gente. Não
obstante, a punição tem uma implicação negativa que é associada ao au‑
toritarismo mais depressa do que o tratamento de membros da organiza‑
ção como pessoas potencialmente responsáveis com valiosa contribuição
a dar. Agora nos concentraremos nas recompensas, embora sua retenção
seja, de fato, uma punição.

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6.3 Critérios aplicados a recompensas
6.3.1 Critérios administrativos
Existem cinco critérios que a administração pode aplicar em um siste‑
ma de recompensas, em relação aos comportamentos que visa incentivar.
Tais comportamentos são necessários para atingir as metas estabelecidas
para a organização, embora seu relativo destaque dependa do tipo de tra‑
balho que a organização empreende e das condições em que está operan‑ 201
do no momento. Os cinco critérios são: a atração e retenção do pessoal

Questões da recompensa
valorizado, a previsibilidade do comportamento, o percentual extra, a
flexibilidade e a inovação.
1. Atração e retenção de pessoal valorizado. As pessoas têm de ser
atraídas para preencher vagas de emprego em uma organização, além
de sentirem­‑se satisfeitas o suficiente com as compensações oferecidas
para que não troquem de emprego. As condições do mercado de traba‑
lho evidentemente são importantes para o nível das compensações que
satisfarão este critério, em especial com relação a outras oportunidades
de emprego que oferecem mais recompensas (e/ou menos desvantagens)
e a acessibilidade do local em que empregado está disposto a viver. Não
obstante, o custo da rotatividade no trabalho é em si imprevisível: depen‑
de do investimento em qualificação e experiência que é perdido quando
um empregado deixa sua posição, em relação ao custo de se obter um
substituto, incluindo o tempo e as despesas para levar o novo contratado
ao padrão necessário. Contudo, em algumas circunstâncias, esse pode ser
um custo muito baixo. Por exemplo, quando uma empresa recorre ao do‑
wnsizing, a rotatividade é uma oportunidade para a redução do nível de
emprego sem incorrer em indenizações ou criar um clima de medo sobre a
insegurança no emprego. Também há ocasiões em que as pessoas decidem
deixar o emprego porque não consideram que ele seja adequado, o que,
na verdade retifica um erro no processo de seleção dessas pessoas. Outro
aspecto do critério “entre e permaneça” da política de recompensa é o ato
de evitar o absenteísmo, que muitas vezes reflete a decepção dos empre‑
gados em relação às compensações que recebem, e uma atitude negativa
para com o empregador enquanto dividem seu tempo e procuram outro
emprego. Os custos incorridos nas organizações devido ao absenteísmo
normalmente superam em muito os custos devidos aos conflitos laborais.

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2. Previsibilidade de comportamento. Este é o critério pelo qual as
políticas de recompensa deveriam estimular os empregados a serem con‑
fiáveis, cumprindo seus deveres corretamente e em padrões aceitáveis.
Por exemplo, oportunidades de melhorar ou até mesmo de promoção
tendem a aumentar a probabilidade do comportamento desejado entre
os empregados com alguma ambição, se estiver claro que tal comporta‑
mento aumenta suas perspectivas de avanço na carreira. Alguns críticos
têm argumentado que políticas de recompensa desse tipo podem gerar
202
comportamento excessivamente confiável, no sentido de se conformar in‑
devidamente e sem questionamento às expectativas da alta administração
Organização - Princípios e prática contemporâneos

– o que poderia ir contra o critério do comportamento inovador discutido


a seguir.
3. O percentual extra. Uma boa gestão deveria promover uma polí‑
tica de recompensa capaz de estimular um desempenho acima da média.
Esse “percentual extra” é definido como um nível de compromisso e es‑
forço dos empregados além do previsível e do confiável. A perspectiva do
percentual extra é acessível e pode fazer grande diferença na competitivi‑
dade de uma empresa comercial, ou no caso de uma agência do governo,
na qualidade e nos custos dos serviços fornecidos.
Esses três critérios basicamente enfocam a meta da eficiência orga‑
nizacional – como atingir a meta de alta produtividade do empregado
e a minimização dos custos. Atualmente, com as grandes mudanças, a
competição feroz e as pressões para inovar sentidas por muitas organi‑
zações, dois outros critérios têm se tornado cada vez mais importantes,
como mencionado no Capítulo 5 em relação ao controle: a flexibilidade
e a inovação.

4. Flexibilidade. Já vimos como as condições que as empresas hoje


enfrentam forçam os gestores a buscar flexibilidade na maneira como
as pessoas trabalham e nas atividades que empreendem. O arranjo fle‑
xível economiza pessoal e simplifica o gerenciamento de configurações
mais complexas e variadas do trabalho; por exemplo, dadas instalações
de produção auxiliadas por controles computadorizados. Estratégias
competitivas que tentam combinar custo e liderança com a diferenciação
de produtos e serviços dependem dessa flexibilidade. É apropriado ter
políticas de recompensa que incentivem os empregados a aceitar a cons‑
tante ampliação de suas funções pelos seguintes meios: (1) estendendo as
qualificações que adquirem e utilizam e (2) trabalhando com pessoas ou

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departamentos que requerem outras especializações quando necessário.
Exemplos da aplicação desse critério da flexibilidade à política de recom‑
pensa são a oferta de melhoria salarial em troca da aquisição de novas
competências consideradas relevantes e já testadas, e o pagamento de um
bônus pela flexibilidade em aceitar deslocamentos estipulados.
5. Inovação. Para a organização renovar a si mesma e seus produtos,
seus membros devem ser estimulados a sugerir, e até mesmo defender, a
mudança e a inovação. Certas pessoas ocupam funções em que é especial‑ 203
mente importante reconhecer e lidar com novos problemas e desafios de

Questões da recompensa
modo inovador. Alguns grupos especializados são incumbidos de inovar
produtos e processos sistematicamente – o exemplo mais evidente é o
pessoal da área de pesquisa e desenvolvimento. Tal contribuição especia‑
lizada é vital, porém cada vez mais se reconhece que ideias e iniciativas
valiosas podem vir de qualquer membro da organização. A política de
recompensa deve estimular essas contribuições, apesar das dificuldades
que podem surgir ao recompensar sugestões para mudança e inovação de
qualquer membro da força de trabalho. Por exemplo, empregados sem
treinamento ou experiência com problemas podem apresentar sugestões
nada práticas, que não justificam uma recompensa, apesar das boas in‑
tenções e do trabalho por trás da proposta. No entanto, problemas como
esse costumam se tornar insignificantes quando comparados à capacida‑
de que uma boa política de recompensa tem de liberar o conhecimento
tácito que os membros de uma organização possuem.
Os cinco critérios que a gerência pode usar para as recompensas
dependem evidentemente do tipo de pessoal requerido, da natureza do
trabalho realizado e sobretudo das pressões para mudança e inovação
enfrentadas pela organização. Em algumas situações, certos critérios te‑
rão mais destaque que outros. Alguns poderão ser aplicados apenas a
determinadas seções da força de trabalho; outros serão mais facilmente
satisfeitos com um tipo específico de recompensa. Por exemplo, incenti‑
vos que visam estimular grande esforço individual poderão inibir a dis‑
posição dos trabalhadores em aceitar a flexibilidade no deslocamento
entre as tarefas, se acreditarem que algumas delas não permitem níveis
semelhantes de produção medida. A evolução de uma política de recom‑
pensas exigirá decisão sobre o equilíbrio da ênfase que a diretoria consi‑
dera apropriada para suas prioridades e sua avaliação de eventualidades,
sendo que a escolha dos sistemas de recompensa em princípio deverá
acompanhar essa decisão.

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SEXTO CRITÉRIO ADMINISTRATIVO E O USO DA AVALIAÇÃO DE CARGOS
Cada um dos cinco critérios mencionados está relacionado ao tipo
de comportamento que a gestão procura estimular entre os empregados.
Um sexto critério, ao contrário, é de natureza estrutural: o requisito de
que níveis diferenciais de recompensa, especialmente o salário, estejam
de acordo com a estrutura da organização, pelo menos quanto à relativa
posição hierárquica das categorias de funções. O recurso tradicional para
corresponder a este requisito estrutural é a avaliação de cargos – pro‑
204
cesso que analisa e avalia sistematicamente as diferentes funções para
estabelecer seu valor relativo em relação à remuneração, e que se inicia
Organização - Princípios e prática contemporâneos

pela análise para obter uma descrição do cargo. Tal descrição é então
relacionada à estrutura salarial da organização, para se determinar o va‑
lor relativo daquela função ou grupo de funções. Habilitações, qualifi‑
cações e responsabilidade são alguns dos fatores levados em conta pelos
planos de avaliação de cargos. Depois, são fixados valores monetários,
estabelecendo­‑se preços para cada grupo de funções com base em sua
relativa contribuição. A avaliação de cargos pode ser aliada ao uso de
prêmios, que servem para promover o comportamento desejado (bom
desempenho), se for utilizada para estabelecer uma base de recompen‑
sas que especifique um diferencial entre uma categoria de função e as
outras, além de recompensas adicionais ligadas ao comportamento e ao
desempenho.3
O argumento por trás do sexto critério administrativo é de que é
necessário associar a estrutura básica das recompensas à estrutura geral
da organização, não apenas para preservar a ordem, mas também para
refletir a lógica dessa estrutura quanto a aspectos como as diferenças
hierárquicas no trabalho. Tal critério também é compatível, em princí‑
pio, com a importância que os empregados dão a salários diferenciais e
sua preocupação de que estes sejam um reflexo “justo” das diferenças
na natureza intrínseca das funções e das qualificações necessárias para
preenchê­‑las. Entretanto, pode ocorrer uma série de problemas na ava‑
liação de cargos:

1. Ela pressupõe um razoável grau de estabilidade na estrutura de


uma organização, com o risco de incentivar um excesso de rigidez
no comportamento do empregado sob condições que exigem boa

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flexibilidade e até mudanças frequentes. Conforme a organização
muda, os planos de avaliação de cargos se deterioram.

2. Sua instalação e manutenção podem custar caro.

3. Depende de avaliações subjetivas; nenhum plano comprovou ser


válido e confiável.

4. Planos aplicados a toda uma organização tendem a simplificar


demais, ao passo que planos mais específicos podem introduzir 205
incompatibilidades e desigualdades visíveis.

Questões da recompensa
Também é preciso levar em conta que, se o número de níveis hierár‑
quicos for reduzido como parte da mudança para uma estrutura mais
simples (veja o Capítulo 3), o número de graus de remunerações e salários
básicos terá de ser reduzido de modo correspondente. Isso significa que
as faixas salariais associadas a qualquer grau terão de ser ampliadas por
duas razões: em primeiro lugar, a ampliação refletirá a faixa maior de
qualificações e competências agora esperadas em dado nível hierárquico;
em segundo lugar, com menos faixas salariais, a ampliação de cada uma
reterá o incentivo do avanço entre as faixas anteriormente oferecidas aos
empregados, para adquirir novas competências e melhorar seu desempe‑
nho com o tempo.

6.3.2 Critérios dos empregados


Os critérios que os empregados aplicam a suas recompensas são um
guia para seu potencial motivacional. Os psicólogos acreditam que esses
critérios vêm das necessidades de cada trabalhador; muito já se discutiu
para saber se os indivíduos diferem muito em suas necessidades, prefe‑
rências e valores, ou se há um modelo único que pode ser aplicado de
modo mais geral aos empregados. Em compensação, os que adotam a
perspectiva das relações industriais ou sociológicas dão ênfase ao fato de
que os critérios mais influentes aplicados pelos empregados às recompen‑
sas são de natureza social. Isso significa que os critérios são coletivamente
definidos por grupos sociais, como os membros de determinada ocupa‑
ção, e têm base em comparações com outros grupos sociais. Portanto, o
contraste fundamental na abordagem se resume a saber se o valor que as

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pessoas no trabalho colocam nas recompensas, e a base em que as ava‑
liam, vêm basicamente das necessidades humanas dos empregados ou das
normas compartilhadas em seu grupo social.

A perspectiva psicológica
Enquanto alguns psicólogos afirmam que os seres humanos buscam
satisfazer uma série de necessidades, outros tentam reduzir essa complexi‑
dade agrupando, classificando e criando uma tipologia das necessidades.
206
Obviamente, se fosse possível estabelecer dada tipologia, ela serviria aos
objetivos de gestores preocupados com o aspecto prático de motivar pessoas
Organização - Princípios e prática contemporâneos

a agir de determinada maneira, que não conseguem aplicar um modelo com


essa complexidade sem incorrer em custos indevidos e possível confusão.
Isso ajuda a explicar a popularidade de Maslow, que agrupou as
necessidades humanas em apenas cinco categorias. Ele sugeriu que tais
categorias formavam uma hierarquia, na qual somente quando as neces‑
sidades de uma categoria estivessem satisfeitas, as necessidades do pró‑
ximo nível adquiriam importância para o indivíduo. Esta hierarquia da
necessidade contempla uma progressão ascendente, desde as necessidades
fundamentais “fisiológicas” ou materiais, evoluindo para as necessidades
de “segurança” ou estabilidade, “pertencimento”, “estima” e “autorrea‑
lização” em seu nível mais alto.4
A formulação de Maslow para essa hierarquia das necessidades não
tinha base empírica, mas obteve ampla aceitação e influenciou muitas
ideias administrativas e acadêmicas sobre as prováveis reações motivacio‑
nais dos empregados a determinadas recompensas. Tal hierarquia sugere
que, conforme enriquecem, as pessoas atribuem valor cada vez menor
aos aumentos salariais (pelo menos em termos reais) e valor crescente a
outras recompensas intrínsecas. Herzberg, que na verdade fez uma sim‑
plificação maior, distinguia duas categorias de recompensas relacionadas
à hierarquia das necessidades de Maslow. Em primeiro lugar, recompen‑
sas que satisfaziam necessidades de ordem inferior, como o salário e as
condições de trabalho, eram consideradas componentes do fator higiene.
Qualquer inadequação em atender às necessidades de higiene criariam
insatisfação, mas ao serem corretamente satisfeitas, elas não gerariam
motivação alguma para um melhor desempenho do trabalho em si. Em
segundo lugar, recompensas como a realização, a responsabilidade, o re‑
conhecimento e um trabalho interessante, envolvidas nas necessidades
superiores de Maslow, eram consideradas parte do fator motivação. Este

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tipo de recompensa, argumentava Herzberg, estimularia um bom desem‑
penho no trabalho, além de gerar satisfação.5
As ideias de Hertzberg deram grande incentivo ao princípio do en‑
riquecimento da função. Contudo, a metodologia dos estudos dos quais
ele tirou sua teoria tem sido criticada, e muitas pesquisas subsequentes
não deram nenhum apoio à reconhecidamente elegante simplicidade de
sua formulação. Tal fato nos traz de volta ao problema do excesso de
simplificação das necessidades das pessoas e os critérios que elas aplicam
207
às recompensas. Não se sabe se, na verdade, as pessoas pensam em suas

Questões da recompensa
necessidades ou metas em relação a apenas algumas categorias, se pessoas
diferentes compartilham exatamente a mesma hierarquia de preferências,
ou se essas hierarquias continuam compatíveis, uma vez que as circuns‑
tâncias e os estímulos mudam com o passar do tempo. O modelo estático
universal implícito nas formulações de Maslow e Herzberg não trata da
discussão bem mais realista dos critérios de recompensa dos empregados
apresentada por sociólogos.

A perspectiva sociológica
À primeira vista, necessidades como a subsistência e a segurança pes‑
soal podem parecer absolutas e universais em sua natureza. Porém, após
analisá­‑las com cuidado, percebe­‑se que também estão sujeitas a uma
definição social que varia de sociedade para sociedade, e entre as classes
de uma sociedade. Isso fica claro nas definições do que é considerado um
nível de “pobreza”, e também nas variadas definições do que é um am‑
biente “seguro”. Em outras palavras, as normas do que é aceitável e espe‑
rado são definidas socialmente, não surgem diretamente das necessidades
do indivíduo sem mediação social. O ponto de vista sociológico adverte
que, na prática, é muito difícil generalizar acerca dos critérios pelos quais
os empregados avaliam as recompensas.
O papel das normas sociais é especialmente importante no caso do
salário. Normas de justiça são muito significativas quando os emprega‑
dos avaliam as recompensas que lhes são oferecidas. A pesquisa mostra
que as pessoas fazem duas comparações ao avaliar a justiça: a primeira é
a do equilíbrio entre recompensa e produção (por exemplo, tempo e es‑
forço) em relação às próprias expectativas. A segunda é como esse equilí‑
brio se sai em uma comparação com as recompensas que outros recebem
por suas produções.

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Comparação social
Aqui, a comparação a que as pessoas atribuem maior significado
é com outros que estão no mesmo grupo socialmente definido, como
as pessoas que têm a mesma função. É o que dá origem ao chamado
“princípio da comparabilidade”, ou seja, as pessoas que fazem o mes‑
mo trabalho querem receber o mesmo pagamento, não importa se estão
empregadas no setor público ou no privado, em organizações prósperas
ou fracas. Teoricamente, um mercado de trabalho perfeito permite essa
208
comparabilidade. A comprovação do que as pessoas fazem quando per‑
cebem estar sendo excessivamente recompensadas é bastante confusa,
Organização - Princípios e prática contemporâneos

mas os efeitos de uma recompensa inferior são muito claros: pessoas mal
remuneradas normalmente reduzem o nível de sua produção, fazendo
menos esforços ou sacrifícios pessoais, ou deixam o emprego na primeira
oportunidade.
As normas do que se considera justo em uma comparação com os
outros também ajudam a explicar o fato de que diferenciais nas recom‑
pensas entre pessoas que ocupam níveis de funções adjacentes em termos
de habilitação, qualificação necessária ou autoridade, geram mais frus‑
tração e conflitos do que níveis absolutos de compensação. Por exem‑
plo, um gerente com 50 anos de idade que tem um assistente bem mais
jovem contratado por um salário quase igual se ressentirá ou se sentirá
ameaçado pela ausência de diferença significativa entre os dois salários.
Se os empregados aplicassem critérios relativos apenas aos níveis de suas
necessidades pessoais, seria de esperar que os níveis absolutos de recom‑
pensa fossem gerar problemas, o que na prática não acontece. Assim,
Elliott Jacques argumentou que uma política aceitável para a distribuição
dos rendimentos não seria encontrada enquanto o problema da impar‑
cialidade em salários diferenciais não fosse compreendido e resolvido.
Em seus estudos, ele concluiu que membros da população compartilham
normas profundamente sentidas sobre diferenciais justos, com base em
diferença nos níveis intrínsecos.6 As comparações que entram na noção
de recompensa justa para um indivíduo também têm por base tradições
há muito estabelecidas, que se institucionalizaram em determinados seto‑
res do trabalho. Por exemplo, trabalhadores com certificados de habilita‑
ções esperam ter a garantia de um salário mais alto do que trabalhadores
sem qualificações, mesmo que os dois grupos sejam capazes de realizar
as mesmas tarefas e igualmente bem. Portanto, a comparabilidade é um
princípio básico que os empregados aplicam às compensações.

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Nas comparações são incluídos muitos pontos de referências. Por
exemplo, um estudo na fábrica de processamento do grão de cacau da
Cadbury­‑Schweppes, em Chirk, no País de Gales, descobriu que três bases
de comparação estavam presentes nas avaliações que os empregados fa‑
ziam de seus níveis salariais.7 A primeira era uma comparação com as taxas
salariais oferecidas por outras funções na comunidade local – nesse caso, a
comparação era favorável. Esse ponto de referência local favorável teve um
efeito mais acentuado nas motivações dos empregados em sua disposição
209
de aceitar as exigências administrativas no estágio inicial da fábrica que,
ao abrir, deu trabalho para os mineiradores locais desempregados. Uma se‑

Questões da recompensa
gunda dimensão de comparabilidade era a da qualificação, que significava
que os trabalhadores qualificados deveriam ter um salário diferencialmente
superior, mesmo quando faziam o mesmo trabalho de empregados sem
qualificação. Uma terceira dimensão se referia ao equilíbrio entre recom‑
pensas e produção que prevalecia em outras fábricas de uma mesma divi‑
são da empresa, mas em diferente localização. Tal comparação tornou­‑se
mais fácil, porque a força de trabalho em Chirk tinha criado seu sistema
de representação sindical e seus membros entraram em contato com seus
equivalentes nas outras fábricas – contato esse incentivado pela inaugura‑
ção das estruturas de participação e comunicação em toda a empresa. A
comparação com outras fábricas da empresa deu origem a uma avaliação
menos favorável das compensações que a gerência oferecia em Chirk.

Teoria da equidade
Essa teoria vem da psicologia e se concentra nos processos cognitivos
que levam um indivíduo a decidir se deve se esforçar ou não em uma ati‑
vidade.8 Mesmo assim, sua lógica vem da comparação social. A teoria da
equidade afirma que as pessoas são motivadas a buscar o que percebem
ser uma recompensa justa por seus esforços. O sentimento de justiça, ou
equidade, vem de uma comparação que as pessoas fazem entre si em rela‑
ção a suas contribuições e resultados. As contribuições são, por exemplo,
o esforço, a qualificação, a educação e a experiência. Os resultados são as
recompensas como salário, promoção e outras formas de reconhecimen‑
to, além de benefícios adicionais ou prêmios.
As pessoas tendem a se comparar com outras que fazem o mesmo
trabalho ou ocupam cargos semelhantes. Ao perceber que outra pessoa
está recebendo maior recompensa por contribuição igual ou menor, o
indivíduo se sente injustiçado; um sentimento desmotivador, que faz com

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que a pessoa contribua menos. Por outro lado, quando alguém percebe
que outro está recebendo menos pela mesma contribuição ou por con‑
tribuição maior, pode talvez sentir culpa ou constrangimento, e tentará
melhorar seus esforços. Contudo, para alguns essa comparação pode dar
origem a certa complacência. O ponto mais importante do atual interesse
está na previsão da teoria da equidade, que sustenta que as pessoas re‑
duzirão seus esforços ou seu empenho se considerarem sua recompensa
injusta ou prejudicial.
210

Mercado de trabalho
Organização - Princípios e prática contemporâneos

Os critérios que os empregados atribuem às compensações também


variam conforme sua posição no mercado de trabalho, o que influi no ní‑
vel de recompensa que eles acreditam ser aceitável para a tarefa a ser feita
e nas condições de emprego sob as quais devem realizá­‑la. A relativa im‑
portância associada a diferentes compensações também pode estar sujeita
a questões ligadas ao mercado de trabalho. Há indícios de que, em mo‑
mentos de grande desemprego, os empregados dão menos importância ao
enriquecimento ou participação no trabalho – algo que, segundo Maslow
e Herzberg, corresponde a necessidades de ordem superior – do que dão
a manter o próprio emprego e o rendimento que ele proporciona. (No en‑
tanto, é preciso dizer que a comprovação sobre os efeitos do desemprego
demonstra como a maioria dos cargos e funções também oferece significa‑
tivas compensações sociais e de status, cuja perda é muito lastimada.) Em
outras palavras, os critérios que os empregados aplicam às recompensas
oferecidas não se baseiam apenas em normas de comparabilidade e justi‑
ça, mas também se referem à sua posição no mercado de trabalho.
Os fatores identificados até o momento implicam que uma política
ideal de recompensas deve levar em conta:

1. as contribuições que a diretoria deseja dos membros de sua organi‑


zação expressas como critérios de desempenho;

2. normas de justiça, de modo que todos os membros de uma organi‑


zação sintam que estão sendo tratados segundo as mesmas regras
do jogo;

3. os critérios e prioridades associados a determinadas recompensas


por diferentes categorias de membros da organização.

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Na prática, esses três pontos podem entrar em conflito. Assim, um
sistema de recompensa altamente diferenciado voltado para atender os
diversos grupos de empregados facilmente começa a parecer injusto. Um
problema dessa ordem surgiu em uma pequena empresa familiar conheci‑
da do autor. O proprietário dirigia a empresa de forma muito paternalista.
Ele conhecia pessoalmente todos os empregados, e tentava reconhecer suas
necessidades individuais tomando providências especiais para cada um.
Por exemplo, ele permitiu que uma pessoa com a mãe doente trabalhas‑
211
se em horário reduzido com o mesmo salário, fez pagamentos especiais
voluntariamente para ajudar outro empregado que estava em dificuldade

Questões da recompensa
financeira. Embora a intenção do proprietário fosse manter confidenciais
essas variações nas recompensas, a informação vazou e levou a uma sen‑
sação generalizada de favoritismo, causando ressentimento e moral baixa.
Pode até ser difícil corresponder a qualquer uma dessas três pon‑
derações. Por exemplo, o dilema que as administrações normalmente
enfrentam ao tentar barganhar critérios de desempenho potencialmente
contraditórios, como eficiência e inovação, significa que será muito difícil
atingir o equilíbrio exato entre os componentes de uma política de recom‑
pensa relacionada ao desempenho. Mesmo assim, é melhor haver alguma
compatibilidade entre as expectativas dos empregados, os critérios do de‑
sempenho da gerência e as recompensas do que nada disso. Os adminis‑
tradores têm de descobrir formas de planejar políticas de recompensa que
unam esses elementos. Alguma orientação útil sobre como isso pode ser
realizado vem de duas linhas de pesquisa das ciências sociais. A primeira,
associada ao que veio a ser conhecida como “teoria da expectância”,
chama a atenção para as condições necessárias quando as recompensas
devem dirigir o comportamento das pessoas para o alto desempenho em
suas funções. A segunda linha de pesquisa está associada ao que é conhe‑
cido como “condicionamento”, e chama a atenção para as consequências
comportamentais da programação das recompensas.

6.4 Teoria da expectância


Em poucas palavras, a teoria da expectativa afirma que as pessoas de‑
cidirão quanto esforço será aplicado em seu trabalho, de acordo com: (1)
o que elas percebem que receberão como recompensa por aquele esforço,
e (2) o quanto valorizam a recompensa (ou o quanto desgostam das san‑
ções ou punições). Como acontece com muitas ideias nas ciências sociais,

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isso parece simples bom senso, porém chama a atenção para uma série de
exigências no sentido de orientar a motivação que, na prática, são deixa‑
das de lado com bastante frequência. A teoria da expectância surgiu da
percepção de que garantir uma vinculação muito clara entre o desempe‑
nho e as compensações é de extrema importância, e que até onde possível,
tais compensações devem corresponder às expectativas dos empregados.
Nessa cadeia há muitas ligações que a teoria da expectância conside‑
ra vitais para um bom sistema de recompensa. Lyman Porter e Edward
212
Lawler integraram essas associações no modelo apresentado na Figura
6.1. O modelo da teoria da expectância sugere que é preciso haver quatro
Organização - Princípios e prática contemporâneos

elos e sequências de informações importantes para motivar os emprega‑


dos a atingirem os requisitos do desempenho estabelecidos pela (ou com)
a administração:9

1. até que ponto os empregados percebem que seu esforço leva a um


melhor desempenho;

2. se o desempenho é considerado algo a ser recompensado;

3. a legitimidade associada à maneira pela qual as recompensas são


administradas;

4. o valor associado às recompensas oferecidas.

Elo 1: Expectância
A primeira associação dá nome à teoria – “expectância”. Ela diz
respeito ao relacionamento que os empregados percebem existir en‑
tre a quantidade de esforço que dedicam a seu trabalho e o nível de
desempenho que acreditam ter obtido. Em outras palavras, será que
os membros de uma organização esperam esforço ou aplicação maior
de parte deles para levar a um desempenho melhor? Os empregados
devem acreditar que podem controlar a qualidade de seu desempenho
na função; caso contrário, não terão motivo para se esforçar mais.
Observe que isso é o que a gestão admite ser importante aqui, porque
é o que servirá de base para qualquer feedback e quaisquer recompen‑
sas que os empregados recebam. O modelo também considera que o
relacionamento entre os esforços dos empregados e seu desempenho

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será mediado por (1) suas capacidades e competências e (2) suas per‑
cepções do que sua função requer e a melhor maneira de realizá­‑la
(“percepções da função”). Tais fatores de mediação indicam a poten‑
cial contribuição do treinamento e do estabelecimento de metas com‑
preendidas e aceitas para a transformação do esforço e da disposição
em desempenho eficaz.

Figura 6.1  Relacionamentos entre a recompensa, o esforço e o 213


desempenho individual

Questões da recompensa
Valor da
recompensa
Medida em
que as
recompensas
Habilidades e são percebidas
competências como
equitativas

Recompensas
intrínsecas
Esforço do Desempenho
Satisfação
empregado (realização)
Recompensas
extrínsecas

Percepções da
função

Probabilidade
percebida de
recompensa
pelo esforço EXPECTÂNCIA INSTRUMENTALIDADE

Fonte: Adaptado de PORTER, Lyman W.; LAWLER III, Edward E. Managerial attitudes and perfor‑
mance. Homewood: R. D. Irwin, 1968. p. 165.

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Elo 2: Instrumentalidade
O próximo link central nessa cadeia é chamado de “instrumentali­
dade” e se refere à relação que os empregados percebem entre seu desem‑
penho e os seus resultados em relação a recompensas e punições. O que
está em questão aqui é até que ponto um “bom” desempenho na avalia‑
ção do gerente é verdadeiramente recompensado e se a remuneração ofe‑
recida compensa os custos e riscos com os quais o empregado deve lidar.
A probabilidade de um esforço maior resultar em uma recompensa maior
214
deverá influenciar a quantidade de esforço que as pessoas se disporão a
fazer, representando, portanto, um feedback em termos de informação
Organização - Princípios e prática contemporâneos

importante para elas. Mesmo se as pessoas concluírem que um esforço


maior leva a um melhor desempenho, tal esforço dificilmente será incenti‑
vado se não for considerado algo que resulte em uma recompensa maior.
Como já observado neste capítulo, as recompensas podem ser do tipo
extrínseco ou intrínseco.

Elo 3: Legitimidade
A terceira associação importante no modelo da teoria da expectativa
diz respeito à legitimidade que os empregados associam às recompen‑
sas oferecidas por seu desempenho. Aqui, surgem as noções de justiça e
equidade. A ideia de justiça entrará na cabeça dos empregados à medida
que eles tiverem ideia do nível e do tipo de recompensa que “deveriam”
estar a disposição da pessoa que realiza o trabalho requerido em deter‑
minada função. A questão da equidade também influi na maneira como
as pessoas veem as recompensas sendo distribuídas entre diferentes in‑
divíduos em relação a seu desempenho e também quaisquer privações
sofridas, como trabalhar no turno da noite. Neste ponto o importante é
notar que provavelmente os empregados não ficarão satisfeitos com as
recompensas que recebem, a menos que sejam percebidas como equitati‑
vas. A insatisfação com as recompensas acabará por reduzir a sua força
motivadora.

Elo 4: Valência
Por fim, o potencial motivador das recompensas não dependerá
apenas de sua legitimidade, mas também do valor que os empregados
atribuem a elas. Em outras palavras, se forem consideradas justas e
equitativas, mas não forem o tipo de recompensa a que os empregados

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atribuem grande valor, seu potencial motivador provavelmente será bai‑
xo. Para citar um exemplo:

Sim, eu sei que se me dedicar mais, meu desempenho aumentará. Sim,


a gerência reconhece a melhoria do meu desempenho, e quando ele au‑
menta, recebo maior recompensa. Sim, a recompensa parece estar sendo
administrada com justiça entre meus colegas e eu. Só que não quero mais
aquela ****** de vale­‑alimentação… então por que eu deveria me preocu‑
215
par com isso?

Questões da recompensa
O conceito de “valência” foi cunhado para chamar a atenção para
o valor positivo ou negativo que as pessoas atribuem à maneira como as
recompensas resultam de seu comportamento no trabalho.
De um ponto de vista prático, a utilidade do modelo da expectância
está na maneira como ele atrai atenção para as condições básicas que de‑
vem ser satisfeitas para que as recompensas ajudem a associar a motivação
aos requisitos do desempenho. Repetindo, os requisitos são: (1) os empre‑
gados devem acreditar que maiores esforços levam a um melhor desempe‑
nho; (2) eles devem perceber que o melhor desempenho leva a uma maior
recompensa; (3) devem considerar legítimas a administração e a distribui‑
ção de recompensas; (4) devem atribuir algum valor às recompensas que
lhes são oferecidas. O Quadro 6.2 traz um exemplo instrutivo de como
esses princípios da teoria da expectância se mostraram práticos em uma
fábrica do sul da Inglaterra, cuja administração enfrentava um problema.
A teoria da expectância evidentemente deixa para a gestão o ônus
de recompensar o que ela deseja que aconteça, e não qualquer outra coi‑
sa ou absolutamente nada. Steven Kerr, ao escrever sobre “a loucura de
recompensar A tendo esperanças em B”, mostra com que frequência tal
surpreendente equívoco na recompensa é encontrado na prática.10 O pro‑
blema muitas vezes surge quando a quantificação de alguns objetivos é
mais difícil do que a de outros. Por exemplo, na maioria dos casos de
salário relacionado ao desempenho, objetivos ou metas deixam de ser es‑
pecificados em áreas como a criatividade e o trabalho de equipe, que são
difíceis de medir – o que leva a organização a recompensar formalmente a
consecução de apenas alguns objetivos em detrimento de motivar os em‑
pregados para atingir outras metas, por mais importantes que sejam para
o sucesso da organização no longo prazo. Problema semelhante surge em
organizações não comerciais, já que impõe dificuldades semelhantes para

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Quadro 6.2  Aplicação prática da teoria da expectância

Os gerentes de uma fábrica no sul da Inglaterra não conseguiam entender


por que os operários dirigiam tão mal os veículos internos, gerando custos
extraordinários de manutenção e tempo parado, e às vezes danificando tan‑
to as instalações como os materiais. Seria bastante sensato concluir que a
motivação dos motoristas para satisfazer as eventuais exigências estivesse
baixa. O modelo da teoria da expectância indicou certos pontos fracos em
216 elos essenciais que contribuíam para a motivação baixa e o pouco esforço:
para começar, não havia nenhum programa de treinamento para os motoris‑
Organização - Princípios e prática contemporâneos

tas da fábrica. A associação entre esforço e desempenho poderia melhorar se


o motorista recebesse algum treinamento, e também se uma série de trechos
perigosos e outros riscos de acidente fossem removidos. Em segundo lugar,
a definição que a gerência tinha de desempenho era falha; nada jamais fora
decidido a respeito de padrões aceitáveis de direção. Em terceiro lugar, não
havia nenhum link entre dirigir bem e a recompensa do motorista. Para a
administração, havia retorno com a direção mais cuidadosa em termos de
custos reduzidos relativos a danos e manutenção. Contudo, no mínimo os
motoristas garantiam as compensações que valorizavam ao dirigir mal: por
exemplo, correr era emocionante e, além disso, eles ganhavam um pouquinho
mais de tempo livre na sala de recreação. Era imprescindível que a empresa
encontrasse uma forma de recompensar os motoristas pela boa direção. Por
último, não havia nenhum tipo de feedback para os motoristas sobre a quali‑
dade e as consequências da maneira como dirigiam. Ninguém dizia nada sobre
o motorista ser bom ou ruim. Para haver associação da recompensa à qualida‑
de da direção também seria necessário existir uma sequência de informações
acerca desse fato.
Nenhum dos pontos nesta análise é revolucionário. Na verdade, metade deles
haviam sido mencionados em diversas reuniões convocadas para tratar do pro‑
blema. Contudo, a solução do problema sistematicamente de acordo com o
modelo da teoria da expectância ajudou imensamente, dando aos gerentes um
novo ponto de vista a partir do qual puderam agir e obter bons resultados.

Fonte: BAKER, Jeremy. Accounting age, 24 fev. 1978.

os que planejam os sistemas de recompensa. Por exemplo, em universida‑


des espera­‑se que os professores não descuidem de suas responsabilidades
no ensino, mas eles são recompensados basicamente por suas pesquisas
e publicações. Os médicos estão mais sujeitos à punição e estão sendo

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mais processados por errar o diagnóstico de um paciente que por recei‑
tar tratamentos desnecessários. Ambos são erros que podem ter sérias
consequências para os envolvidos, embora o equilíbrio entre punição e
recompensa esteja longe de qualquer simetria em ambos os casos.
A teoria da expectância também revela a importância de saber que re‑
compensas os empregados valorizam. Eles dão maior valor a um aumento
em determinadas recompensas intrínsecas ou a certas recompensas extrín‑
secas? Qual é a probabilidade de os empregados mudarem suas preferên‑
217
cias com o tempo e será que tal mudança pode ser prevista em relação às
condições que mudam na economia e também em relação às circunstâncias

Questões da recompensa
pessoais e domésticas de cada um deles? Uma aplicação mais precisa da
teoria da expectância levaria qualquer um a pensar no indivíduo. Embora
normalmente essa não seja uma proposta prática do ponto de vista da ges‑
tão de um sistema de recompensa, é uma indicação da utilidade de se dis‑
tinguir diferentes categorias de empregados para quem diferentes políticas
de recompensa seriam adequadas segundo seus valores particulares.
A teoria da expectância é uma teoria cognitiva. Ela pressupõe que os
empregados adotarão uma atitude em relação ao trabalho e sua recom‑
pensa, que é ponderada e racional quanto a seus objetivos e preferências.
É quase certo que essa teoria exagere a amplitude e a frequência com que
as pessoas realmente fazem cálculos deliberados e exatos no momento
em que decidem como responder às recompensas que lhes são oferecidas.
No entanto, essa ênfase cognitiva é uma correção valiosa de teorias psi‑
cológicas anteriores, que tendiam a ver pessoas no trabalho reagindo a
necessidades relativamente inarticuladas de maneira não muito distante
do comportamento de animais. A teoria da expectância não leva em con‑
ta explicitamente as influências sociais, como o costume, as práticas ou
normas culturais, mas é compatível em relação à necessidade de se locali‑
zar a questão de como as pessoas reagem às recompensas no contexto das
percepções de equidade e confiança, tão importantes nas relações organi‑
zacionais. De acordo com a teoria da expectância, quando os empregados
não consideram justas as recompensas que lhes são oferecidas, e quando
não confiam nas intenções da gestão, eles não se sentirão motivados para
trabalhar na direção de eventuais exigências. O ceticismo a respeito das
intenções da gestão em continuar a honrar, no longo prazo, a escala das
recompensas associadas ao desempenho ajuda a explicar por que em mui‑
tas ocasiões os trabalhadores deixam de reagir a esse tipo de incentivo.
Para eles, seria sensato reagir se pudessem confiar nas intenções da gestão

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de honrar o plano ou não retirar outros benefícios, como a estabilidade
no emprego, uma vez que a produção aumenta. Sem tal confiança, pode
se tornar mais sensato para os trabalhadores continuar a controlar e res‑
tringir os níveis de produção.

6.5 Teoria do condicionamento


A teoria do condicionamento é diferente da teoria da expectân‑
218
cia por ser comportamental, e não cognitiva. Em vez de se preocupar
com o que as pessoas pensam sobre as recompensas, ela as considera
Organização - Princípios e prática contemporâneos

organismos que reagem a recompensas como estímulos positivos ou


negativos. A pesquisa da teoria clássica do condicionamento foi rea‑
lizada em animais – a mais famosa delas foi o cão de Pavlov, que foi
condicionado a salivar ao som de uma campainha. O condicionamen‑
to tem a ver com métodos que induzem mudanças comportamentais
nas pessoas.11
Há mais de um tipo de condicionamento, mas todos envolvem es‑
tímulos que são positivos ou negativos para o indivíduo em questão.
O “condicionamento instrumental” é o tipo mais pertinente para uma
discussão acerca de políticas de recompensa. Nele, uma pessoa é posta
em uma situação em que aprende que certos comportamentos desenca‑
deiam uma recompensa ou uma punição. Normalmente, a recompensa
é chamada de “reforço positivo” e a punição, de “reforço negativo”.
Uma lei básica do condicionamento instrumental é que o comportamen‑
to recompensado provavelmente será repetido, e o comportamento que
atrai a punição (ou castigo) tem menor probabilidade de se repetir. Não
obstante, recompensas e punições nem sempre são reforçadoras – por
exemplo, quando não são fortes o bastante para modificar o comporta‑
mento de uma pessoa ou quando são administradas tarde demais para
ter algum efeito. O exemplo do Quadro 6.3 ilustra claramente a falha da
administração neste aspecto.
Estudos do condicionamento também apontam para análises mais
sutis. Em primeiro lugar, parece haver amplo consenso de que o reforço
deve ser positivo e construtivo, e não negativo e destrutivo. Em parte,
porque o reforço negativo pode gerar muita perturbação emocional e
também porque visa treinar pessoas no que não fazer em vez de treiná­‑las
no comportamento desejado. Assim, o reforço negativo geralmente não
estimula a inovação, que é tão decisiva para as organizações atualmente.

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Quadro 6.3  Um caso de reforço ao comportamento inadequado

Alex Smith* foi contratado por um bufê como coordenador de projeto no


departamento comercial. Com o tempo, percebia­‑se claramente que ele não
estava fazendo seu trabalho apropriadamente: deixava de atender o telefone,
não dava entrada dos novos cargos no banco de dados da empresa e deixava
de providenciar a documentação necessária, como pedidos e faturas. Ele tam‑
bém resistia a instruções, dando a impressão de que sabia de tudo. Tinha um
diploma de pós­‑graduação (em área sem nenhuma pertinência), o que, em 219
parte, explicaria por que a gestão deixou de resolver imediatamente a situação,

Questões da recompensa
não passando de algum comentário aqui e ali, porém nunca forte ou detalha‑
do o bastante para modificar seu comportamento. Além disso, ele recebia um
salário fixo, de modo que seu desempenho fraco não era registrado no nível
de sua remuneração. Mas essa situação acabou prejudicando­‑o: depois de se
atrapalhar com um cliente importante, ele foi sumariamente despedido. Foi
um grande choque para ele e para os colegas, pois a administração não deu
nenhuma indicação de que houvesse algum problema significativo. É claro que
àquela altura já era tarde demais para haver qualquer mudança no desempe‑
nho de Alex no trabalho.

* O nome foi mudado para proteger a identidade.

A proporção entre o reforço positivo e o negativo também deve ser levada


em conta. Uma alta incidência de feedback negativo tem maior probabi‑
lidade de desmotivar: “…só se leva patadas neste lugar!” Por outro lado,
o uso frequente do reforço positivo combinado com uma advertência ou
punição ocasional merecida provavelmente será considerado justo, e por‑
tanto mais eficaz: “…normalmente o chefe não reclama do meu trabalho;
devo ter me saído muito mal para ele ter reclamado agora”.
Outro aspecto a se levar em conta é que o reforço tem mais efeito se
for imediatamente circunstancial em relação ao comportamento. O re‑
forço atende a duas funções: sustentar a motivação e dar o feedback, e o
valor da função do feedback é perdido especialmente se houver atraso.
Por outro lado, pode custar caro administrar recompensas ou punições
imediatamente. Se isso for feito pelo gerente, significa que ele será des‑
viado continuamente de outras questões para examinar o desempenho
do empregado. Evidentemente será preciso conseguir um equilíbrio, mas
a questão do imediatismo e da imprevisibilidade do feedback ajuda,

Book_Organizaçoes.indb 219 16/9/2011 16:23:35


por exemplo, a explicar o valor muito limitado do condicionamento
de recompensas como o bônus dos dividendos anuais. É claro que eles
são muito bem recebidos, mas os empregados não conseguem associar
prontamente as variações nesses prêmios a quaisquer ações particulares
pelas quais tenham sido pessoalmente responsáveis. Tal fato acontece
devido à grande demora e também porque um indivíduo em um nível
mais baixo da organização dificilmente perceberá que seu comporta‑
mento tem muita influência na lucratividade de uma empresa.
220 Há uma série de alternativas possíveis na maneira como o reforço
pode ser associado ao comportamento. A base sobre a qual o reforço é
Organização - Princípios e prática contemporâneos

planejado para rastrear o comportamento é conhecida como “reforço”.


O reforço pode ser “constante”: sempre que ocorre determinado com‑
portamento, há um feedback positivo ou negativo. Este pode assumir
uma forma intrínseca, como o comentário de um gerente, ou uma for‑
ma extrínseca, como a recompensa ou punição. Ao contrário do reforço
constante, existe uma possibilidade de reforço intermitente pela qual a
recompensa e/ou punição é dada depois de algumas ocorrências do com‑
portamento, mas não todas. Tais reforços podem ser dados a intervalos
estabelecidos, como prêmios semanais, e por isso são esquemas de “in‑
tervalo”. Os esquemas proporcionais incorrem em algum reforço depois
que certo número de ações foi realizado, como um plano que permite aos
empregados irem para casa mais cedo uma vez terminada determinada
cota de trabalho.
Há outra distinção entre os programas intermitentes fixos, nos
quais a frequência do reforço não muda, e programas intermiten‑
tes variáveis, em que ela muda. O cheque do salário mensal é um
exemplo do primeiro, e uma visita pessoal do diretor administrativo
à fábrica em intervalos variados ilustra o último (pressupondo­‑se que
os empregados gostem dessa atenção pessoal). Com base em resul‑
tados de experimentos de laboratório, enquanto o reforço constante
aparentemente é a maneira mais rápida de estabelecer ou extinguir
determinado comportamento, os esquemas proporcionais conduzem
à maior incidência de um comportamento desejado. Até certo ponto,
talvez seja possível “esticar” um programa proporcional de modo que
o reforço seja dado em intervalos progressivamente menos frequen‑
tes, e com o mesmo efeito. Do ponto de vista administrativo, existe
a vantagem de economizar nos gastos de recursos. Contudo, há risco
evidente de que tal ato destrua a credibilidade de uma política de

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recompensa; além disso, é preciso questionar sua moralidade. Se “esti‑
car” significa retardar um pagamento incremental acordado anterior‑
mente, em vez de estarem aguardando com ansiedade a recompensa, é
bem possível que os empregados pensem em quebra de confiança. Foi
exatamente o que aconteceu entre os bombeiros britânicos enquanto
eu escrevia este livro, e prejudica seriamente a qualidade das relações
trabalhistas. Isso nos lembra que as pessoas aplicam normas e valores
às recompensas que lhes são oferecidas de maneira séria. O fato de
221
poderem pensar por si e aplicar os próprios padrões subjetivos impõe
sérios limites à validade da abordagem do condicionamento.

Questões da recompensa
Toda a questão do condicionamento também levanta problemas éti‑
cos, porque não deixa de ser uma forma refinada de manipulação. É claro
que se pode argumentar que uma gestão sofisticada seja exatamente isso.
Há uma sutil diferença entre “extrair o melhor das pessoas” e “extrair
o máximo” ou explorá­‑las. Também se pode argumentar que é melhor
discutir abertamente a questão em vez de ignorá­‑la, na esperança de que
desapareça. O condicionamento não tem uma visão cognitiva da humani‑
dade; seus criadores pensavam em termos de estímulo-resposta e não na
reação calculada a recompensas e punições. A maior parte da pesquisa do
condicionamento tem sido realizada em laboratórios e não no mundo real
do trabalho. Portanto, essa abordagem tem suas limitações, ainda que seja
dirigida, como a teoria da expectância, à questão muito pragmática de
como planejar sistemas de recompensa que estimulem o desempenho que a
administração julga ser necessário. O fato de que esta última possa mudar
frequente e radicalmente, em especial nas atuais condições de hipercompe‑
tição, é apenas mais um fato a ser considerado. É essencial a flexibilidade
recíproca – da parte do empregado, de se adaptar às exigências da gestão
e do mercado que estão sempre mudando; e da parte da administração, de
oferecer a recompensa adequada a essa flexibilidade e desempenho.
Enquanto a teoria da expectância se concentra nas associações ne‑
cessárias para que uma política de recompensa funcione, a teoria do con‑
dicionamento chama a atenção para a programação das recompensas
em relação ao comportamento das pessoas. As ponderações levantadas
pela pesquisa do condicionamento dizem respeito basicamente ao equilí‑
brio entre recompensas e punições, e com o momento mais adequado de
aplicá­‑las. Elas complementam as análises levantadas pela teoria da ex‑
pectância em relação às associações fundamentais necessárias para fazer
um sistema de recompensa funcionar inicialmente.

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Resumo
1. Não existe nenhuma “melhor maneira” para o planejamento das polí‑
ticas de recompensa.

2. As recompensas têm um papel decisivo no direcionamento dos esfor‑


ços das pessoas para a implementação da estratégia de uma organização.
Portanto, elas devem ser sensíveis, até onde é possível, aos critérios de
empregados e gestores – em outras palavras, ao mesmo tempo devem
222
levar em conta a motivação pessoal e as exigências das tarefas. Cada um
desses aspectos varia entre pessoas e organizações, e também muda com
Organização - Princípios e prática contemporâneos

o tempo.

3. Isso mostra que os sistemas de recompensa precisam estar sempre


sintonizados para se adaptarem às contingências dos indivíduos e das
organizações, o que na prática é algo muito difícil de conseguir. Os em‑
pregados podem se sentir muito perturbados com as fórmulas e regras do
jogo que mudam constantemente, erodindo ainda mais sua confiança na
administração. Também pode ser proibitivamente caro para os emprega‑
dores ficar mudando os planos de recompensa.

4. Não obstante, pode haver algum progresso em direção à flexibilidade


hoje exigida nos critérios das recompensas, com relação tanto a recom‑
pensas intrínsecas como extrínsecas.

5. No caso das recompensas intrínsecas, o trabalho das pessoas deve


ser arranjado de modo a atender suas necessidades em aspectos como
a variedade, o desenvolvimento pessoal ou a interação social até
onde possível, dado o tipo de contribuições exigido pela estratégia da
organização.

6. Isso pode ser conseguido por meio de concessão de autonomia a gru‑


pos ou equipes de trabalho para administrar o próprio trabalho, em con‑
sulta com gerentes sensíveis a circunstâncias nas quais surja a necessidade
de mudar as recompensas intrínsecas. Muitas vezes tais mudanças podem
ser realizadas sem novos investimentos ou modificações da tecnologia.
De fato, as novas tecnologias da informação em geral permitem muitas
alternativas na maneira como o trabalho é administrado.

7. No caso das recompensas extrínsecas, como o próximo capítulo mos‑


trará, a exigência é de planos que permitam o ajuste dos critérios do

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desempenho quando as circunstâncias mudam. O ideal é que esse ajuste
seja realizado por meio de um debate mútuo entre gerentes e empregados.

Questões para discussão


1. Qual é a diferença entre recompensas extrínsecas e intrínsecas?
223
2. Você concorda que as pessoas que trabalham para organizações
atualmente estão cada vez mais interessadas em recompensas

Questões da recompensa
intrínsecas?

3. Quais são os principais critérios administrativos aplicados às


recompensas?

4. Quais são os principais critérios que os empregados podem aplicar às


recompensas?

5. O que é a “teoria da expectância”? Como ela pode servir de base para o


planejamento dos sistemas de recompensas?

6. O que é a “teoria do condicionamento”? Como ela pode servir de base


para o planejamento dos sistemas de recompensas?

Notas
1. Partes deste capítulo e do Capítulo 7 são baseadas em CHILD, John. Organization:
a guide to problems and practice. 2. ed. London: Harper & Row, 1984. Cap. 7.

2. Veja CHILD, John; LOVERIDGE, Ray. Information technology in european


services. Oxford: Blackwell, 1990; THOMPSON, Paul; MCHUGH, David.
Work organizations. 3. ed. Basingstoke: Palgrave, 2002.

3. Para mais detalhes sobre a avaliação das tarefas, veja KANUNGO, Rabindra N;
MENDONÇA, Manuel. Compensation: effective reward management. 2. ed.
Toronto: John Wiley & Sons, 1997. Cap. 11.

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4. MASLOW, Abraham H. Motivation and personality. New York: Harper, 1954.

5. HERZBERG, Frederick. Work and the nature of man. Cleveland: World Publishing,
1966.

6. JAQUES, Elliott. Equitable payment. London: Heinemann, 1961.

7. WHILAKER, Alan. People, tasks and technology: a study in consensus. Univer‑


sity of Lancaster, Department of Behavior in Organizations, 1982.
224
8. ADAMS, J. S. Towards an understanding of inequity. Journal of Abnormal and
Social Psychology, 67, p. 422­‑416, 1963.
Organização - Princípios e prática contemporâneos

9. PORTER, Lyman W; LAWLER III, Edward E. Managerial attitudes and perfor‑


mance. Homewood: R. D. Irwin, 1968.

10. KERR, Steven. On the folly of rewarding A, while hoping for B. Academy of
Management Journal, 18, p. 769­‑783, 1975.

11. PAVLOV, I. P. Conditioned reflexes. New York: Oxford University Press, 1927;
SKINNER, B. F. Analysis of behavior. New York: McGraw­‑Hill, 1961.

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Capítulo 7
Sistemas de remuneração

Conteúdo do capítulo
Este capítulo se concentra na fonte mais importante da recompensa extrínseca
– a remuneração – e, particularmente, na escolha de sistemas salariais. Esse
enfoque é justificado pela inequívoca importância do salário e também porque
já discutimos um pouco sobre os aspectos organizacionais das recompensas
intrínsecas associadas ao trabalho de equipe (Capítulo 4), novas abordagens
do controle (Capítulo 5) e os critérios dos empregados na avaliação dessas
recompensas (Capítulo 6).
O salário é importante para a maioria das pessoas, por razões que são
discutidas na primeira seção deste capítulo. Depois, serão classificados os
diferentes métodos de remuneração em termos de quatro dimensões: os
fatores a que o salário está atrelado, se há um elemento de incentivo embutido
no método de remuneração, a frequência e a programação do pagamento e
a unidade organizacional a que o salário está relacionado. São discutidas as
remunerações fixas, incentivos de produção, avaliação por mérito, remuneração
por desempenho, divisão de lucros e propriedade de ações. O capítulo então
pondera sobre a escolha de um sistema de pagamento e as tendências nas
políticas salariais compatíveis com as novas formas organizacionais.

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7.1 A importância do salário
Embora se diga corretamente que a felicidade não pode ser comprada,
o dinheiro é o meio universal de troca, e evidentemente, a chave para obter
muitas coisas que importam para as pessoas. A Bíblia diz que “o vinho ale‑
gra a vida e o dinheiro satisfaz todas as necessidades” (Eclesiastes, 10:19,
versão revista). Até mesmo Frederick Herzberg, um grande representante
da teoria de que o dinheiro não motiva, admite: “Com certeza absoluta,
226 ele me ajuda a solucionar minhas prioridades!”. Numa era em que os con‑
sumidores do mundo inteiro estão sempre sendo incentivados pela mídia
parte ii  novas formas internas

a “gastar, gastar, gastar!” e assumem dívidas cada vez maiores, a quantia


que recebem em pagamento por seu trabalho possui evidente importância.
De fato, observar a maneira como as pessoas se comportam mostra
que, para a maioria, ganhar dinheiro é um objetivo primordial. Isso é
verdade tanto para os que têm a sorte de ter empregos que oferecem con‑
sideráveis recompensas intrínsecas quanto para aqueles cujo salário é um
dos poucos aspectos compensadores de seu emprego. Muitos consultores
de hospitais, por exemplo, querem acrescentar lucrativo trabalho priva‑
do a seus deveres públicos assalariados, assim como muitos executivos
seniores dão grande importância a seus salários, prêmios e stock option.
O dinheiro é valorizado por uma série de razões. Ele serve como meio
de satisfazer desejos materiais. Assim, até certo ponto, o valor do dinhei‑
ro para as pessoas é determinado pelo valor intrínseco do que ele pode
comprar; por exemplo, um indivíduo pode tirar férias muito caras e outro
investir cada centavo poupado em melhorias na sua casa. A posse e o uso
do dinheiro também são um símbolo do sucesso pessoal e status, uma
base sobre a qual a posição e o valor de uma pessoa podem ser compara‑
dos aos de outra, o que ajuda a explicar a importância que os empregados
atribuem ao diferencial entre sua remuneração e a dos outros. As pes‑
soas podem adquirir o impulso para ganhar dinheiro porque, para elas,
sua falta está associada à incapacidade de satisfazer necessidades básicas,
algo que provoca ansiedade, especialmente quando existem dependen‑
tes a sustentar. Tal ansiedade poderá ser exacerbada naqueles que foram
demitidos ou dispensados de empregos anteriores. Além disso, como o
dinheiro está associado a outras recompensas desejáveis, ele pode ter po‑
der motivador dessas recompensas, o que, por sua vez, pode resultar em
um condicionamento pela busca do dinheiro como fim em si mesmo, um
fenômeno que já foi identificado por alguns psicólogos.

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Portanto, não é de surpreender que o salário seja uma recompensa
que atrai grande interesse entre os empregados de todos os níveis nas or‑
ganizações. Tal interesse não está confinado aos necessitados ou àqueles
para quem o dinheiro faz parte de uma recompensa para uma vida de tra‑
balho de baixa qualidade, embora as razões subjacentes para o interesse
pelo salário possam variar entre diferentes empregados. É bem interes‑
sante notar dois aspectos à luz do fato de que muitos argumentam que o
enriquecimento da função e uma melhor qualidade na vida do trabalho
227
tenham diminuído o significado motivacional do salário. Em primeiro lu‑
gar, no estudo de Herzberg sobre contadores e engenheiros (empregados

Sistemas de remuneração
que já gozavam de um bom salário e recompensas intrínsecas), o salário
era a recompensa mais frequentemente citada por gerar ao mesmo tempo
satisfação e insatisfação.1 Se o salário pode trazer satisfação, não se trata
apenas de uma “compensação”, como às vezes é chamado, pelo tempo, es‑
forço e parte da liberdade pessoal que o indivíduo dedica ao trabalho. Em
segundo lugar, muitos planos voltados para a melhoria das recompensas
intrínsecas por meio do enriquecimento da função ou da reestruturação
do trabalho ofereciam, ao mesmo tempo, salários mais altos. Há motivo
para se acreditar que esse tenha sido um importante indutor para os em‑
pregados aceitarem as mudanças, especialmente quando havia também
redução dos níveis do staff. Os salários e os benefícios adicionais materiais
continuam sendo aspectos centrais nos contratos de emprego e são ques‑
tões proeminentes tanto na negociação coletiva como na individual.
O valor que as pessoas atribuem ao salário em relação a outras recom‑
pensas possíveis do emprego pode variar de acordo com as contingências
externas sobre as quais a gestão não tem muito controle. Circunstâncias do‑
mésticas podem ditar a margem que um empregado tem de negociar o salá‑
rio em troca de outros benefícios. Uma perspectiva internacional identifica
algumas sociedades em que o materialismo é um fator cultural menos central
do que em outras. Entretanto, essas são questões em que o grau de importân‑
cia de um dado fator apenas varia. Mesmo em sociedades menos tradicional‑
mente materialistas, como a da China, tudo indica um forte apego a valores
materialistas entre a população urbana mais jovem. Há pouca evidência para
se questionar que o salário é uma recompensa que tem elevado potencial mo‑
tivador positivo e negativo. Além disso, o salário – por ser expresso – facilita
o cálculo e o ajuste quando associado a medidas de desempenho.
Tendo em mente a mensagem da teoria da expectativa, isso significa
que, em princípio, o salário se presta especialmente bem a duas condições

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necessárias para associar a motivação e a realização de contingências opera‑
cionais. Primeiro, o salário é uma recompensa valorizada, e segundo, pode
ser associado ao desempenho muito claramente. Também é totalmente com‑
patível com a base da contabilidade em organizações modernas, que fun‑
cionam com base em uma economia monetária. Ele pode ser prontamente
calculado como um gasto para a organização, ao passo que o custo de algu‑
mas recompensas intrínsecas, como o tempo despendido nos relacionamen‑
tos sociais no trabalho, não pode ser facilmente quantificado.
228 Há uma série de métodos pelos quais a remuneração pode ser ofereci‑
da como recompensa, cada um com seus prós e contras. Como o papel do
parte ii  novas formas internas

salário possui tamanho significado, é importante pesar as alternativas e sua


conveniência em relação às circunstâncias e políticas de cada organização.

7.2 Métodos de remuneração


Os métodos de remuneração podem ser classificados em relação a di‑
versas dimensões, das quais as seguintes são particularmente significativas:

„„Os aspectos aos quais o salário é atrelado, que podem ser intrínse‑
cos em relação ao emprego (por exemplo, a determinação dos requi‑
sitos da função e as condições nos planos de avaliação da mesma)
ou estar relacionados ao desempenho em um ou diversos cargos.
Entre os aspectos aos quais o salário pode ser associado estão:
– tempo: número de horas que o empregado dedica ao trabalho;
– esforço: quantidade de trabalho realizado ou outras medidas
de energia gasta;
– habilidade ou competência: qualificação ou requisitos para a
função;
– status: pode ser um atributo do indivíduo, como idade e
tempo no emprego, ou da própria função, como posição na
hierarquia.

„„Se um elemento de incentivo está incorporado ao método de remu‑


neração. Esta dimensão refere­‑se ao grau com que a gestão reflete a
correspondência entre variações no desempenho e no nível salarial.

„„Frequência e programação do pagamento. Dizem respeito ao


pagamento imediatamente após a satisfação dos critérios ou ao
seu adiamento.

Book_Organizaçoes.indb 228 16/9/2011 16:23:36


„„A unidade a que está relacionada a base para o pagamento. Embora
a remuneração seja dada ao indivíduo, seu nível também pode ser
determinado com base no grupo de trabalho, departamento, fábri‑
ca ou toda a organização.

A Tabela 7.1 apresenta seis métodos de remuneração habitualmente


usados, resumindo suas características gerais quanto às quatro dimensões
citadas. A avaliação do cargo foi omitida na tabela porque é uma base
229
para a estrutura de remuneração mais do que um método de pagamento
em si. Em um resumo tal como a Tabela 7.1 não é possível incluir as va‑

Sistemas de remuneração
riações detalhadas que são encontradas na aplicação prática entre cada
método de remuneração. Seu objetivo é simplificar o processo de compa‑
ração de diferentes métodos de remuneração e os requisitos e condições
que influenciam a adequabilidade de cada um deles.

7.2.1 Remuneração fixa


Um sistema de remuneração fixa envolve o pagamento de um valor ou
salário em intervalos especificados em um contrato de emprego ou acor‑
do semelhante. O pagamento de remuneração ou salário fixo depende do
número de horas trabalhadas. É “fixo”, no sentido de não ser ajustado
com frequência – normalmente, os ajustes podem ser realizados com base
em incrementos periódicos ou por negociação coletiva ou individual. A
remuneração poderá ser por hora, por semana ou ser um salário mensal.
Em geral, os salários têm aumentos anuais incorporados, especialmente
no setor público. Trabalhadores de meio período são pagos por hora ou
pelo período trabalhado. Quando trabalham além das horas normais,
recebem hora extra, em geral mais alta que a hora normal. Outra opção
é a troca das horas extras por tempo livre.
Os critérios para avaliar a remuneração estão relacionados ao indiví‑
duo, embora os salários sejam fixos para determinadas funções ou cate‑
gorias. Diferentes graus de pagamento são determinados pela avaliação
da função, levando em conta os deveres e os requisitos do cargo e/ou as
qualificações necessárias para realizá­‑lo. Contudo, esse método de paga‑
mento não remunera o desempenho no trabalho, ou seja, o nível de paga‑
mento não varia conforme a quantidade ou qualidade da produção nem
segundo a flexibilidade e cooperação na maneira como o trabalho é rea‑
lizado. De modo geral, ele recompensa a frequência ou disponibilidade,

Book_Organizaçoes.indb 229 16/9/2011 16:23:36


parte ii  novas formas internas

230
Tabela 7.1  Classificação dos métodos de pagamento e suas principais características

Book_Organizaçoes.indb 230
Método de pagamento
6
1 2 3 4 5 Participação
Dimensão
Remuneração Incentivos à Remuneração Remuneração por Participação nos nos lucros e
fundamental
fixa produção por mérito desempenho resultados propriedade
de ações
Aspecto com Cumprimento das Fórmula fixa Desempenho Desempenho (1) Aumento na Participação nos
o qual o paga‑ horas de trabalho relacionada ao: avaliado avaliado de acordo produtividade/ lucros: aumento
mento se acordadas. nível de produção subjetivamente com critérios prees­ economia nos gastos no lucro da
relaciona Avaliação da alcançado por supervisores tabelecidos, que devido a mudanças organização;
função, em geral, (incentivos e seus superiores podem conter previstas nas regras titularidade de
serve de base de produção) imediatos elementos objetivos e e nos métodos de ações: pagamento
para a taxa de ou nível de de acordo subjetivos trabalho de dividendos e
remuneração, vendas atingido com critérios (2) Melhorias valorização das
mas também (comissão), entre preestabelecidos previstas com relação ações
pode ser usada outros desse tipo à flexibilidade dos
a taxa praticada empregados
no mercado de
trabalho

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Método de pagamento
6

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1 2 3 4 5 Participação
Dimensão
Remuneração Incentivos à Remuneração Remuneração por Participação nos nos lucros e
fundamental
fixa produção por mérito desempenho resultados propriedade
de ações
Existência de Não Sim, remuneração Sim, Sim, normalmente Sim, pode ser de Sim, mas indiretos
incentivos pode ser total ou normalmente representa bônus pagamento único ou e insignificantes
principalmente representa bônus de importância negociado de acordo
relacionada de importância significativa. com uma porcentagem
ao desempenho significativa. dos ganhos; ou
alcançado Incentivos bônus garantido
(por exemplo, podem ser quando melhorias
produção por insignificantes são realizadas; ou
peça) ou pode, se os requisitos pagamentos para
ainda, consistir relativos habilidades extras
em um bônus ao mérito utilizadas para o
além do salário não forem trabalho flexível
fixo claramente
definidos, ou
se forem tidos
como de difícil
alcance

Sistemas de remuneração
231

16/9/2011 16:23:36
parte ii  novas formas internas

232
Método de pagamento

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6
1 2 3 4 5 Participação
Dimensão
Remuneração Incentivos à Remuneração Remuneração por Participação nos nos lucros e
fundamental
fixa produção por mérito desempenho resultados propriedade
de ações
Frequência Salário semanal Semanal Em geral, Geralmente, entre Pagamento único; Adiado por um
habitual dos ou mensal. bônus ao final seis meses e um ou bônus periódico / longo período de
pagamentos Recompensas de um período ano, mas pode pagamento de uma tempo; em geral,
por horas extras ou aumento no variar porcentagem dos participação nos
trabalhadas nível salarial ganhos lucros é anual
podem ser e a divisão dos
autorizadas (por ganhos, em um
exemplo, folga intervalo de 6
em uma data meses.
futura)

Unidade em Individual (após Individual, Individual Individual ou grupo Geralmente aplica­ Toda a empresa
que se baseia alocação a uma por grupo de ‑se em todo o esta‑ ou pode ser cen‑
o pagamento função ou cate‑ trabalho ou belecimento; pode trado nas uni‑
goria específica) departamento ser limitado a grupos dades de maior
específicos nos quais lucratividade,
acordos são nego‑ como divisões e
ciados (por exemplo, subsidiárias
empregados do setor
de manutenção)

16/9/2011 16:23:36
embora, na prática, tal incentivo muitas vezes seja comprometido pela
facilidade com que os empregados podem tirar licenças de curto prazo
por motivo de “doença”. Muitos empregadores relutam em monitorar
de forma rigorosa os horários de seu pessoal, especialmente dos mem‑
bros do staff, quanto às pausas para almoço, e ajustar os níveis de pa‑
gamento de acordo com o cumprimento de horários. Como já vimos no
Capítulo 5, a monitoração rigorosa pode custar muito caro; também
pode ser desmotivadora, porque pode significar falta de confiança por
233
parte da liderança.
Há muitas razões para o uso disseminado do sistema de remuneração

Sistemas de remuneração
fixa:

1. em muitas funções, o desempenho não pode ser medido com


precisão;

2. com o uso de tecnologias automatizadas de produção, o requisi‑


to esforço vem sendo substituído pela necessidade de monitora‑
ção confiável em salas de controle, que usam conhecimento e o
discernimento;

3. a remuneração fixa limita a negociação sobre remuneração a


intervalos regulares e por isso é uma base mais favorável para os
gestores que buscam desenvolver uma filosofia de controle funda‑
mentado em um compromisso normativo entre os empregados.

O sistema de remuneração fixa tem diversas vantagens:

1. é relativamente fácil de administrar;

2. está aberto à inspeção e é justo no sentido de que pessoas que


realizam a mesma tarefa terão o mesmo nível de remuneração,
embora possam existir muitos pontos para incrementos de salário
incorporados em cada nível

3. a transparência e a natureza relativamente fixa do sistema redu‑


zem a incidência de conflito sobre a remuneração;

4. um sistema de remuneração fixa ajuda a organização a reter o


pessoal porque está vinculado a uma hierarquia de funções, ofere‑
cendo, assim, a perspectiva de avanço para níveis superiores, além
de possíveis incrementos em cada um deles;

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5. um sistema desse tipo não enfatiza a quantidade de trabalho
e produção às custas da qualidade. Isso pode ser especialmente
importante para organizações que competem com base na alta
qualidade e em que cada trabalhador ou equipe pode ter influência
direta, por exemplo, em questões como relações com o consumidor.

A maior desvantagem desse sistema está na ausência de incentivos


para o bom desempenho. Se algumas pessoas em um mesmo nível têm
234
um desempenho inferior ao de outras, por que deveriam receber o mes‑
mo pagamento? Ou, em outras palavras, que incentivo haveria para uma
parte ii  novas formas internas

pessoa melhorar seu desempenho se ela não recebe nenhuma recompen‑


sa adicional por isso? Por esse motivo, um sistema de remuneração basi‑
camente fixa pode ser complementado pela negociação de acordos sobre
produtividade e flexibilidade, ou então pela divisão de lucros (ambos
discutidos a seguir). Embora essas modificações ou extensões estejam
vinculadas ao desempenho, podem ocorrer apenas uma única vez, ou
na questão de divisão de lucros, podem envolver pagamentos após um
longo período de tempo.
Outro problema é que a atratividade de tais sistemas de progresso na
carreira ao longo da hierarquia, não é muito compatível com os movi‑
mentos de horizontalização e de criação de estrutura mais enxuta. Caso
o sistema exija a monitoração rigorosa de cima para baixo para verificar
a maneira como as tarefas estão sendo realizadas, esse sistema influen‑
ciará negativamente quaisquer políticas para estimular a iniciativa en‑
tre os trabalhadores qualificados e a descentralização da iniciativa nas
organizações.

7.2.2 Remuneração variável


Os esquemas de remuneração variável, por sua vez, associam o paga‑
mento (normalmente, parte da remuneração total) à produção alcançada
por um indivíduo ou um grupo. Quando se discute o tema dos “incen‑
tivos” para o pessoal administrativo, geralmente leva­‑se em conta esses
esquemas, embora não sejam esses os únicos métodos de pagamento com
um elemento de incentivo, exemplos de esquemas de incentivo são:

„„por peça: pagamento por unidade produzida;

„„prêmio: parte do pagamento é fixa, mas uma porcentagem da

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remuneração é um prêmio que depende da produção obtida – em
geral, de 10% a 30%;

„„comissão: pagamento de uma quantia a mais em dinheiro a repre‑


sentantes de vendas para cada venda excedente (ou valor incre‑
mental de vendas).

Para os empregadores, a principal atração dos planos de incentivo


de produção está em seu poder motivacional, que pode ser consideravel‑ 235
mente relevante caso as condições destacadas pela teoria da expectativa

Sistemas de remuneração
estejam presentes (ver Capítulo 6). Em primeiro lugar, a oportunidade de
receber um pagamento extra deve ser atraente para os empregados – mas
tal incentivo pode não ser atraente se, por exemplo, a carga de impostos
for muito elevada. Em segundo lugar, a recompensa deve superar os custos
adicionais envolvidos, relativos ao esforço ou a inconveniência pessoal.
Em terceiro lugar, os empregados devem confiar na boa­‑fé da organização:
(1) os empregados devem considerar que a obtenção dos prêmios ofereci‑
dos pela organização é uma possibilidade real e (2) devem acreditar que
ao alcançar níveis mais altos de produção, a administração não tentará
renegociar um índice mais baixo de pagamento de incentivo simplesmente
porque os empregados foram beneficiados. Esse último requisito mostra
que a direção não pode cometer erros ao fixar tais índices, por causa, por
exemplo, da baixa qualidade de mensuração do trabalho, e depois tentar
retificar o erro renegociando o pagamento previamente acordado.
Planos de remuneração variável que têm base em uma medição clara
e objetiva da produção são vistos como justos pelos empregados, pois
o nível das recompensas está diretamente associado ao nível da produ‑
ção. O potencial motivador desses planos também pode fazer com que
os empregados precisem de menos supervisão. O aspecto negativo desses
planos de pagamento decorre principalmente de dois problemas: (1) da
ênfase na quantidade em detrimento da qualidade e (2) do conflito com
a administração no que diz respeito ao estabelecimento de um índice de
pagamento justo por unidade de produção.

Remuneração fixa versus remuneração variável: prós e contras


As vantagens e desvantagens dos sistemas de pagamento por produ‑
ção e remuneração fixa são diametralmente opostas. De maneira geral, os
pontos fortes de um sistema são os pontos fracos da outra. Os respectivos

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méritos dos planos de remuneração fixa e de pagamento por produção
normalmente são considerados apenas do ponto de vista administrativo, a
despeito de que a escolha entre um sistema e outro tenha grandes implica‑
ções para os trabalhadores e seus representantes. Surpreendentemente, essa
discussão tem sido conduzida em termos simplistas, sem levar em conta
as circunstâncias de determinadas organizações e suas forças de trabalho
ou ainda as práticas e os costumes estabelecidos entre eles com o passar
do tempo. A seguir, examinaremos os principais argumentos acerca dessa
236
questão.
parte ii  novas formas internas

Argumentos a favor da remuneração por produção e contra a


remuneração fixa ou planos semelhantes
1. Mais produção por pessoa/por hora. Em pesquisa realizada pela
Confederação dos Empregados Suecos, encontraram­‑se fortes evidên‑
cias de que os planos de pagamento de incentivo à produção em geral
contribuíam para aumentar a produtividade. Nas 36 fábricas suecas
que mudaram o pagamento por produção para salários fixos houve uma
queda média na produtividade de cerca de 10% a 20%. Essa queda
aconteceu entre três e quatro meses após a mudança para o sistema de
pagamento fixo. Outras 37 empresas haviam adotado planos que inclu‑
íram prêmios: 21 delas começaram com um sistema de pagamento por
produção e, em média, aumentaram sua produtividade entre 5% e 10%;
16 começaram com salários fixos e aumentaram sua produtividade de
25% a 35%. Aquelas que trabalham na indústria manufatureira sabem
que se deve esperar uma queda na produtividade cerca de 20% quando
se muda da remuneração por incentivo para por tempo de trabalho.
2. Menos supervisão e mais liberdade para os empregados. Uma crí‑
tica importante aos planos de pagamento por unidade é que eles cau‑
sam perda de controle administrativo sobre a produção. Entretanto, os
empregados podem considerar isso uma virtude. Os planos de incentivo
incorporam uma filosofia de controle da produção que delega aos traba‑
lhadores envolvidos o controle sobre os métodos e, implicitamente, sobre
os níveis da produção. Eles podem legitimamente pedir aos gestores para
deixarem­‑nos em paz para realizar seu trabalho como bem entenderem,
uma vez que estão cientes de que serão os primeiros a sofrer caso não
alcancem um alto nível de produção. Esse tipo de arranjo é atraente para
qualquer trabalhador que valorize a autonomia. Para a gerência, pode

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haver grande redução de gastos relacionados à supervisão se os traba‑
lhadores são motivados pelo sistema de pagamento de incentivos a as‑
sumir as funções de supervisão, tais como garantir o bom suprimento de
materiais, solicitar a manutenção do equipamento quando necessário e,
de modo geral, manter as condições para uma produção eficiente. Num
sistema de remuneração fixa, a tarefa de motivar os trabalhadores para
aumentar seu desempenho recai sobre o supervisor, pois o nível de paga‑
mento dos trabalhadores não está em jogo.
237
3. Oportunidade de obter altos ganhos. Um plano de pagamento por

Sistemas de remuneração
produção que associe o desempenho à remuneração pode não apenas
gerar alto nível de produção, mas também dar aos empregados a oportu‑
nidade de aumentar a sua remuneração. Em princípio, esse tipo de plano
permite que eles decidam a melhor relação entre esforço e pagamento.
Todavia, é evidente que quanto mais essa opção é exercida de modo indi‑
vidual e fragmentado ao mesmo tempo em que está inserida em um fluxo
de trabalho integrado, mais alta a probabilidade de que apareçam.

Argumentos contra a remuneração por produção e a favor da


remuneração fixa ou planos semelhantes
1. Perda de controle gerencial. Quando se usa os pagamentos por
produção, o controle administrativo pode ser enfraquecido de diversas
maneiras. Só há sentido em oferecer incentivos à produção quando
os trabalhadores têm poder para modificar seu nível de produção por
meio de seu próprio esforço e dedicação. Se a gerência pode controlar
o nível da produção, o que ocorre num processo automatizado, não há
razão para oferecer esse tipo de pagamento. Quando os empregados
podem controlar o nível da produção, a noção do que seria um objeti‑
vo razoável transforma­‑se em uma questão de negociação formal ou em
uma prática informal. A mensuração do trabalho está longe de ser uma
ciência exata, e sendo assim, os trabalhadores têm oportunidades de
aproveitar isso para tentar garantir um equilíbrio mais vantajoso entre
seu esforço e o pagamento que recebem por ele, ou ainda a de proteger
o equilíbrio existente. Assim, eles podem tentar controlar sua produção
para reduzir o risco de a gerência cortar os incentivos, aumentar as co‑
tas de produção ou até mesmo despedir trabalhadores. “Não trabalhe
ao ponto de tirar seu colega do emprego” é um velho dito popular que
ilustra esse pensamento, que por si só demonstra certa desconfiança em

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relação às intenções dos gestores. Além disso, se o fluxo da produção é
variável devido a problemas no abastecimento de matéria­‑prima ou a
condições específicas da fábrica, é razoável que os trabalhadores redu‑
zam esse fluxo para garantir ganhos semanais mais estáveis. Esse tipo
de ação informal empreendida pelos empregados pode fazer com que
a gerência receba informações equivocadas sobre a produção, criando
problemas relacionados à programação, entre outros. Outro problema
de controle em relação ao pagamento por produção é que tais incenti‑
238
vos podem facilmente levar a flutuações nos salários. Essas flutuações
salariais podem alterar a paridade e as diferenças na estrutura de pa‑
parte ii  novas formas internas

gamento de uma organização – entre os empregados que têm incenti‑


vos e os que não têm, entre os trabalhadores diretos e os indiretos, e
entre os empregados que têm incentivos e seus gerentes juniores. Para
que as paridades sejam mantidas, os ganhos daqueles que não recebem
incentivos de produção devem ser aumentados, o que evidentemente
aumentará os custos globais do emprego. O processo para se fazer
tais ajustes pode causar disputas e desordem. Portanto, o pagamento
por produção aplicado apenas a uma parte da força de trabalho terá
impacto negativo sobre a integração e a harmonia da organização. O
controle da gerência pode ser afetado também em outros aspectos em
função do pagamento por produção: os trabalhadores serão mais relu‑
tantes em trocar de funções com as quais já estão familiarizados e nas
quais podem ganhar prêmios mais elevados, de modo que é mais difícil
obter flexibilidade; a qualidade do trabalho poderá diminuir, uma vez
que os trabalhadores usam atalhos para obter maior produção, a me‑
nos que seja introduzido um sistema de inspeção rigoroso e caro. Além
disso, discussões a respeito de prêmios ou pagamento por peça podem
reduzir o tempo de produção por meio de ações dos empregados e
causar ainda um sério rompimento na produção, afetando os clientes e
perdendo­‑se pedidos.
2. Estímulo à competição e ao conflito. Conforme acabamos de men‑
cionar, o uso paralelo de incentivos à produção e outros sistemas de pa‑
gamento na mesma organização pode levar a rupturas e conflitos entre
os diferentes grupos envolvidos. Qualquer sistema de recompensa com
diferenças e alterações frequentes no pagamento de diferentes grupos de
empregados pode gerar inveja e conflito, causando queda no moral. O
mesmo acontece quando se trata de indivíduos: os incentivos individuais

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têm potencial para provocar inveja, conflitos interpessoais e outros
comportamentos disfuncionais. Tais incentivos estimulam as pessoas a
se concentrarem em seus próprios interesses, o que pode ser desastroso
quando as funções são interdependentes e têm como requisito a flexibili‑
dade e a cooperação entre os colegas, o que é cada vez mais comum nas
organizações.
3. Índices mais altos de acidentes. A pressão por mais produção pode
ameaçar a segurança no trabalho. Nas indústrias em que existem planos 239
de incentivos individuais, em geral há índices mais altos de acidentes,

Sistemas de remuneração
principalmente quando o padrão da produtividade estabelecido é muito
alto. O desejo de aumentar os ganhos pode levar os empregados a igno‑
rar regulamentos de segurança (como o uso de proteção nas máquinas),
a usar atalhos e a se exporem a níveis mais elevados de risco pessoal. A
pressão gerada por uma situação desse tipo também pode gerar mais es‑
tresse, afetando a eficiência geral e o bem­‑estar do indivíduo.
4. Desestímulo à inovação. Planos de remuneração por desempenho
podem desestimular a inovação, a menos que haja algum arranjo para
dividir os ganhos advindos de melhorias sugeridas pelos empregados com
o intuito de aumentar a produtividade. Do contrário, sugestões de melho‑
ria podem significar redução do esquema de incentivo por desempenho.
Se a inovação facilita a tarefa para alguns trabalhadores, torna­‑se mais
sensato guardar a inovação para eles mesmos, pelo menos no curto pra‑
zo, como recurso para aliviar as pressões que eles enfrentam. Quando a
gerência procura introduzir um novo produto ou serviço em uma situ‑
ação em que são usados esquemas de remuneração por desempenho, é
provável que haja um período de mais conflito, ressentimento e negocia‑
ção devido às alterações no conteúdo da função, avaliação do trabalho e
estabelecimento de novos esquemas de incentivos. Além do problema da
baixa flexibilidade já mencionado, é possível perceber que esquemas de
planos de incentivo por desempenho podem inibir inovação e mudanças.
5. Custos administrativos. Se, por um lado, os programas de remu‑
neração por desempenho podem representar economiza na quantidade
de supervisão direta necessária, sua gestão é mais cara. Normalmente é
necessário consultar especialistas em avaliação do trabalho, embora haja
expectativa de que eles também tragam benefícios para a engenharia in‑
dustrial. Gestores devem ser realocados para realizar o cálculo de paga‑
mento de incentivos, o que aumenta o tempo de supervisão necessário

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para tratar de um número maior de disputas entre os trabalhadores,
uma vez que métodos complexos de pagamento geralmente resultam em
conflitos.

7.2.3 Remuneração por mérito


O salário por mérito é outro sistema de pagamento com base no
desempenho. Ao contrário dos incentivos por produtividade, a ideia da
240
remuneração por mérito é abranger a recompensa de um tipo de desem‑
penho que não é especialmente tangível e mensurável por indicadores
parte ii  novas formas internas

“objetivos”. São aplicados critérios como a “disposição para assumir a


responsabilidade” ou “cooperação”. A remuneração por mérito pode se
concentrar nos aspectos do trabalho que a gestão considera especialmente
importantes, incluindo elementos quantificáveis, como a eliminação das
devoluções de produtos defeituosos ou a diminuição das queixas dos con‑
sumidores. Assim, a remuneração por mérito pode ser uma boa maneira
de comunicar os objetivos de uma empresa para sua força de trabalho.
A recompensa pelo mérito pode assumir a forma de um aumento na
remuneração ou um prêmio especial. Tradicionalmente, o aumento de salá‑
rio é o símbolo de bom desempenho. O problema está no fato de que não é
comum as organizações reduzirem o salário se o desempenho do emprega‑
do voltar a cair, ou seja, o aumento permanece mesmo quando o indivíduo
já não apresenta nenhum mérito especial, enfraquecendo sua percepção
sobre a associação entre o pagamento e o desempenho. Um bônus especial
é uma boa alternativa, pois permite que o empregado veja a relação entre o
pagamento e o desempenho. Com esse sistema, o prêmio pode não ser pago
num determinado período caso não tenha sido merecido.
O principal problema da remuneração por mérito é como avaliá­‑lo.
A base para determinar o pagamento por mérito é necessariamente uma
avaliação subjetiva, normalmente feita pelo gerente do indivíduo e pelo
superior imediato desse gerente (às vezes com inputs dos colegas). A in‑
formação necessária para a avaliação do mérito é fornecida por avalia‑
ções periódicas do desempenho. Um sistema de avaliação do desempenho
tem papel decisivo na remuneração por mérito, e é crucial que tal sistema
seja considerado justo. Programas de pagamento pelo mérito podem ge‑
rar grande irritação, porque sua subjetividade se presta a acusações de
favoritismo e desigualdade. Esses programas também podem deixar de

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ser um método de distribuição das recompensas por mérito individual e
se transformar em prêmios anuais para toda a organização, evitando o
embaraço e o rancor que pode surgir em vista de recompensas dadas para
alguns, mas não para outros.
Uma pesquisa acerca das classificações subjetivas de desempenho
apontou um nível de consenso fraco entre as avaliações feitas pelos geren‑
tes superiores e aquelas consideradas adequadas pelo indivíduo avaliado.
Um estudo que conduzi junto com Bruce Partridge a respeito das avalia‑
241
ções de desempenho de supervisores de primeira linha nos fizeram chegar
à mesma conclusão, além de indicar que as características do avaliador

Sistemas de remuneração
influenciam em grande medida a avaliação como um todo.2 Embora o
sistema de avaliação por mérito tenha a virtude de aplicar o princípio do
incentivo a funções para as quais não existem medidas quantitativas de
desempenho precisas, tal sistema não é apreciado por gerentes e é consi‑
derado suspeito pelos empregados devido a sua subjetividade.
Conseguir um bom sistema de remuneração por mérito é, portanto,
um desafio, que requer quatro etapas:3

1. A definição das funções de uma pessoa e de seus objetivos deve


ser muito clara. Uma das maneiras de se conseguir isso é trabalhar
com os empregados no sentido de identificar quem recebe ou quem
se beneficia dos resultados obtidos em uma determinada função –
ou seja, quem é o “consumidor” daquela posição. A abordagem
do consumidor ajuda os empregados a conhecerem o significado
de seu trabalho e a maneira como este ajuda a atingir as metas da
organização.

2. Fixar as expectativas sobre o que precisa ser feito em uma função,


assim como seus padrões de desempenho. Aqui, tornam­‑se úteis
as pesquisas sobre como estabelecer metas. Pesquisas indicam que
o desempenho do empregado melhora de maneira significativa
quando as metas atribuídas são difíceis mas não impossíveis de se
atingir.4 Elas também devem ser definidas em termos específicos e
pertinentes aos objetivos da organização.

3. Monitorar o desempenho do empregado entre as avaliações –


o que deveria ser normal no processo administrativo. Se feito
de forma construtiva, o monitoramento ajuda os empregados a
compreender seu nível de desempenho e permite a discussão das

Book_Organizaçoes.indb 241 16/9/2011 16:23:37


possibilidades de melhoria, além de permitir também mudança de
prioridades e métodos de trabalho em uma situação de mudança
que requeira flexibilidade.

4. A última etapa é a avaliação formal. As consequências do desem‑


penho de um gerente sênior demoram mais tempo para apare‑
cer do que aquelas dos gerentes juniores.5 Portanto, é necessário
pensar em um prazo adequado para avaliar e classificar por méri‑
242 to. O prazo pode ser de até dois anos para gerentes e de seis meses
para trabalhadores não administrativos. Como parte da avalia‑
parte ii  novas formas internas

ção, o gerente e o empregado devem dar uma nota ao desempenho


deste último, e esta será a base da informação necessária para uma
análise justa. Quando discutida de maneira construtiva e progres‑
siva, a avaliação não parecerá ameaçadora, podendo criar então
uma atmosfera de confiança. Uma abordagem que está se tornan‑
do comum é a avaliação 360 graus, na qual os empregados, inclu‑
sive gerentes, são avaliados por seus colegas e por todos os que se
reportam a eles, além de seus superiores imediatos. Essa aborda‑
gem tem como objetivo otimizar o nível de informação relevan‑
te obtida e minimizar injustiças. Tal abordagem é especialmente
adequada às novas formas organizacionais que dão ênfase à since‑
ridade e às iniciativas bottom­‑up.

7.2.4 Remuneração por desempenho


O pagamento relativo ao desempenho (PRD) amplia a abordagem
da remuneração por mérito, combinando­‑a com o princípio da remu‑
neração por produção. Normalmente essa abordagem leva em conta os
resultados ou a produção, bem como o comportamento dos empregados
na função. A abordagem PRD começou nos níveis superiores, com a in‑
trodução de maneiras mais criteriosas de se determinar os salários­‑base
e os esquemas de bônus para os executivos. Nos anos 1990, o PRD foi
ampliado, passando a abranger outros grupos de empregados em diver‑
sas empresas.
Em princípio, o PRD é compatível com a adoção das novas formas
organizacionais, tendo como princípio revisar o sistema de pagamento de
modo que tal sistema responda melhor às necessidades da organização e
do indivíduo. Esse sistema pode focar o indivíduo ou o grupo (equipes).

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O PRD recompensa as pessoas pelo alcance de resultados melhores do
que o desempenho esperado, e dessa forma visa, então estimular a ini‑
ciativa do indivíduo ou do grupo. Como a eliminação dos níveis hie‑
rárquicos dificulta a recompensa pela promoção, o PRD, junto com a
ampliação das faixas salariais, pode ser uma solução para esse problema.
Alguns defensores do PRD consideram que o princípio segundo o qual se
recompensa alguém por sua real contribuição e realização representa, de
fato, um grande avanço em relação aos sistemas anteriores.
Há outras razões pelas quais o PRD agrada aos empregadores. Em 243

primeiro lugar, ao criar diferenciais nos salários, o PRD não apenas re‑

Sistemas de remuneração
compensa o desempenho, mas dificulta a união para regular a produção
em relação ao pagamento, como ocorre frequentemente com os sistemas
de remuneração por produção. O PRD individualiza o salário e enfra‑
quece a negociação coletiva. Em segundo lugar, as empresas conseguem
economizar nos custos dos salários quando a introdução do PRD leva
à abolição dos aumentos automáticos nas escalas salariais. Em terceiro
lugar, o PRD permite que as pessoas sejam recompensadas por seu desem‑
penho sem que haja a obrigação de promovê­‑las para um nível além de
suas capacidades.6
Assim como na remuneração por mérito, o estabelecimento de pa‑
drões de desempenho e a qualidade do sistema de avaliação são decisivos
para o funcionamento dos programas de PRD. Na prática, a experiência
mostra que é muito difícil convencer os empregados de que os progra‑
mas de PRD são aplicados sem o viés da subjetividade ou que eles têm
influência suficiente para definir as metas de desempenho. Com grande
frequência, quando alguns são mais recompensados do que outros, es‑
ses programas acabam por desmotivar os empregados, podendo gerar
ressentimento e descomprometimento entre eles. Além disso, quando os
critérios para o desempenho não são muito bem elaborados, pode haver
conflito entre a qualidade do trabalho realizado e quantidade de trabalho
executado. Alguns desses problemas podem ser minorados quando os
programas de PRD visam mais o grupo que o indivíduo.
Como ocorre na remuneração por mérito, há sempre o risco de os pro‑
gramas de PRD serem desvirtuados – situação em que gerentes e emprega‑
dos recebem o bônus porque eles já eram esperados, e não como reflexo de
desempenho excepcional da parte deles. Alguns dos piores casos envolvem
pagamentos de grandes prêmios a altos executivos de empresas cujo de‑
sempenho estava piorando. Não tem sido apenas a remuneração exagerada

Book_Organizaçoes.indb 243 16/9/2011 16:23:37


e indevida que tem causado ressentimento generalizado, mas principalmen‑
te os evidentes cinismo e hipocrisia no abuso do princípio do PRD.

7.2.5 Participação nos resultados


Programas de participação nos resultados constituem uma categoria
ampla, abrangendo uma série de arranjos para dar oportunidades aos
empregados de aumentar seus ganhos quando propõem ideias para me‑
244 lhorar a produtividade, reduzir custos, entre outros. Em alguns casos,
um bônus coletivo é pago em troca de um acordo para se introduzir mais
parte ii  novas formas internas

flexibilidade nas atividades, de modo a reduzir os custos trabalhistas. Os


programas de participação nos resultados são diferentes dos programas
de participação nos lucros, pois têm foco nas melhorias da produtividade
de um grupo, unidade ou fábrica em um determinado período de tempo,
e não na lucratividade geral. Com isso, esses programas reconhecem as
melhorias advindas de contribuições dos próprios empregados e são me‑
nos influenciados por fatores externos. Os benefícios de tais programas
podem, assim, ser repassados de maneira legítima aos empregados que
ajudaram a criá­‑los.
Programas de participação nos lucros baseados em grupos ou uni‑
dades são voltados para situações em que a natureza do processo de
trabalho não permite evidenciar a relação existente entre os esforços do
empregado e a produção. Alguns exemplos são siderúrgicas, refinarias de
petróleo, indústrias químicas e outras fábricas de beneficiamento. Assim,
não é apenas coincidência o fato de que os primeiros exemplos de tais
programas de participação tenham surgido na indústria norte­‑americana
de aço, com o Plano Scanlon e com as chamadas negociações de pro‑
dutividade das refinarias de petróleo nos anos 1960. Esses programas
também foram utilizados nos setores de serviços, incluindo comunicação,
serviços financeiros, transportes e varejo. Os acordos de divisão de lucros
habitualmente são negociados coletivamente entre empregadores e sin‑
dicatos ou outros representantes do empregado, uma vez que costumam
abranger toda uma unidade ou fábrica.
A participação nos resultados funciona bem nas situações em que é
difícil ou impossível medir o desempenho individual e em que as opera‑
ções envolvidas são interdependentes, exigindo a cooperação de todos
os empregados. Os programas de divisão de lucros incentivam o envol‑
vimento do empregado tanto na definição como na implementação do

Book_Organizaçoes.indb 244 16/9/2011 16:23:37


programa; sua base é a convicção de que cada empregado pode contribuir
para o sucesso de toda a organização com sua participação. A ênfase
na participação permite ainda que os empregados experienciem compen‑
sações não financeiras, como por exemplo mais responsabilidade e en‑
volvimento sociais. Kanungo e Mendonça, em sua análise detalhada de
programas de divisão de ganhos, comentam:

O processo participativo é decisivo para o sucesso do plano. A experiên‑


245
cia da Herman Miller, da Donnelly Mirrors, da Lincoln Electric, da Nucor
Corporation – algumas das corporações que usaram os programas de par‑

Sistemas de remuneração
ticipação nos resultados com bons resultados – mostra que esses planos
são mais que um simples artifício para aumentar a produtividade: eles re‑
presentam um estilo de vida. Algumas organizações adotaram uma estru‑
tura paralela, um comitê de orientação do qual fazem parte representantes
dos empregados e gestores de todos os níveis e funções, além de represen‑
tantes do sindicato. Outras organizações usaram o sistema de sugestão,
com prêmios especiais para sugestões que se mostraram eficazes.7

Os benefícios dos programas de participação nos resultados podem


ser significativos, desde que apenas as melhorias reais, e não as pseu­
domelhorias, sejam recompensadas. Eles direcionam a atenção de
gestores e empregados para a mudança efetiva e o aperfeiçoamento da
produtividade, ao mesmo tempo em que destacam o interesse comum e
melhoram as relações trabalhistas. Quando abrangem toda uma unidade
ou uma fábrica, esses programas podem ajudar a romper as divisões en‑
tre grupos de trabalhadores e reduzir as barreiras verticais da hierarquia.
Muitas empresas usaram formas de participação nos resultados para
“comprar” demarcações estabelecidas e conseguir mais flexibilidade na
alocação de pessoas. Essa participação é uma boa maneira de assegurar
que os empregados se beneficiem financeiramente desses desenvolvimen‑
tos. Como foi observado no Capítulo 3, os empregados tendem a respon‑
der de maneira positiva a essa oportunidade, desde que os acordos não
envolvam demissões compulsórias.

7.2.6 Participação nos lucros e propriedade de ações


A participação nos lucros é um método bastante antigo e estabeleci‑
do na política salarial de algumas empresas, podendo ser resumida como

Book_Organizaçoes.indb 245 16/9/2011 16:23:38


uma estratégia de recompensa que associa a remuneração do empregado
ao desempenho financeiro da empresa. De acordo com a estratégia de
participação nos lucros, uma determinada porcentagem anual dos lucros
é distribuída entre a gerência e os empregados. Seu princípio é baseado
na tentativa de eliminar conflitos de interesse fundamentais entre os pro‑
prietários e os empregados de uma empresa capitalista. Se acionistas e
empregados tiverem participação nos lucros da empresa, também terão
interesse em manter um crescimento estável desses lucros. Esse princípio
246
é semelhante ao dos planos de propriedade de ações pelos empregados
(veja adiante), incluindo os gerentes, nos quais os membros de uma em‑
parte ii  novas formas internas

presa também podem ser proprietários, e assim beneficiar­‑se de sua pros‑


peridade, seja por meio dos dividendos, seja com a possível valorização
das ações. Para os empregados que têm remuneração fixa, os planos
de participação nos resultados trazem um elemento de variabilidade no
pagamento com base no desempenho de toda a empresa, tornando a
empresa mais atraente para empregados altamente qualificados que de‑
sejam participar da prosperidade das organizações em que trabalham.
Os planos de participação nos lucros, assim como os de participação
nos resultados, visam promover o sentimento de parceria entre os empre‑
gados. Entretanto, a participação nos lucros, ao contrário da participa‑
ção nos resultados, não estimula necessariamente a gestão participativa,
encorajando os empregados ou seus representantes a se envolverem na
definição de planos ou na melhoria da produtividade. A participação nos
lucros geralmente é introduzida de cima para baixo, tomando por base
exclusivamente os critérios da alta administração.
Além do aumento do nível geral da cooperação e empenho em
toda a organização, alguns veem a divisão dos lucros como um es‑
tímulo para os empregados aperfeiçoarem o desempenho da orga‑
nização, especialmente por meio de mais empenho e aceitação de
mudanças. O fato de que a recompensa – uma parte dos lucros – só
será paga quando houver lucro pode ser considerado mais uma van‑
tagem, pelo menos do ponto de vista do empregador. A participação
nos resultados não causa danos à empresa, a menos que isso implique
no abandono de determinados investimentos ou que o financiamen‑
to de investimentos por meio de lançamento de novas ações ocorra
em condições menos favoráveis. Por outro lado, é improvável que a
participação nos lucros tenha um efeito muito favorável. O longo

Book_Organizaçoes.indb 246 16/9/2011 16:23:38


período de espera envolvido nesse tipo de pagamento (geralmente de
um ano) faz essa recompensa parecer remota e incerta em relação a
quaisquer ações especiais que o empregado tenha realizado. Também
é difícil para os indivíduos relacionar o lucro ao próprio desempenho,
porque é um indicador de toda a empresa. O lucro é determinado por
muitos fatores que não estão relacionados aos esforços dos emprega‑
dos, incluindo fatores externos.
Os planos de propriedade de ações pelos empregados (ESOPs –
247
sigla em inglês para employee stock ownership plans) podem ser con‑

Sistemas de remuneração
siderados um dos critérios de recompensa, mas também têm grandes
implicações para a governança corporativa, como será discutido no
Capítulo 15. Em um plano de propriedade de ações, os empregados
recebem ações da empresa ou têm o direito de comprá­‑las a um preço
mais baixo, geralmente após completar certo tempo trabalhando na
empresa. Assim como na participação nos resultados, a intenção é con‑
ceder aos membros da organização uma participação nas recompensas
de sua prosperidade, na forma de dividendos das ações e valorização
de capital, e dessa forma melhorar seu empenho para o sucesso da em‑
presa. Muitas vezes esse tipo de plano está associado a um sistema de
participação mais amplo.
Os ESOPs estão sintonizados com o atual contexto organizacional
em dois aspectos. Em primeiro lugar, muitas empresas são forçadas a
transferir a iniciativa para determinados empregados ou equipes de
projeto para se tornarem mais inovadoras e adaptativas. Uma das in‑
tenções da propriedade de ações é diminuir os riscos do oportunismo
que surge com essa transferência de iniciativa, reforçando seu empenho
nas metas globais da empresa. Em segundo lugar, muitos trabalhadores
são fonte de conhecimento para as empresas, o que é um recurso pri‑
mordial e escasso. Peter Drucker disse que isso na verdade “significa
que os trabalhadores do conhecimento são coletivamente os donos dos
recursos produtivos”.8 O conhecimento nos dias de hoje assume tanto
ou mais significado para o sucesso da empresa quanto o capital finan‑
ceiro.9 Caso esse conhecimento tenha valor para uma empresa, e par‑
te dele é necessariamente mantido em forma tácita pelos empregados,
então o argumento econômico para aumentar seu comprometimen‑
to concedendo­‑lhes formalmente uma parte da propriedade torna­‑se
convincente.

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De fato, as evidências acerca das consequências dos ESOPs mos‑
tram que eles são economicamente interessantes para as empresas mes‑
mo em termos de indicadores tradicionais, tais como a produtividade.10
Exemplos dos supostos fracassos de planos desse tipo, como o da United
Airlines, geralmente indicam, com um exame mais detalhado, a presença
de outros fatores, como instabilidade econômica no momento em que o
plano foi estabelecido ou ausência de cooperação por parte do sindica‑
to.11 Exemplos de empresas que obtiveram sucesso, como a John Lewis
248
Partnership, que colheu muitos benefícios com a participação do empre‑
gado, raramente se tornam manchete na mídia.12
parte ii  novas formas internas

7.3 Considerações na escolha de um sistema


de pagamento
Diferentes planos de remuneração atendem a diferentes funções e ti‑
pos de empregado. Inevitavelmente, há uma troca entre, por um lado, a
regularização de políticas salariais para responder em diversas circuns‑
tâncias, de modo que diferentes categorias e níveis de empregados te‑
nham seu próprio programa, e por outro lado, os custos da gestão de uma
abordagem complexa como essa. A disposição dos empregados em serem
flexíveis em suas tarefas e mudar de função quando necessário pode ser
prejudicada se diferentes funções tiverem os seus próprios arranjos de
remuneração. Tais razões explicam por que muitos empregadores con‑
solidaram um único sistema de pagamento para diferentes categorias de
empregado, e por que os planos cujo foco está nos indivíduos em vez de
nas funções, como ocorre na remuneração por mérito e por desempenho,
têm ganhado a preferência de muitos.
No entanto, é possível (e bastante comum) combinar diferentes
métodos de pagamento. A combinação mais evidente é a de um salá‑
rio ou remuneração baseada na hora trabalhada com um ou mais ele‑
mentos de incentivo. Um programa de remuneração por desempenho
ou de mérito oferece prêmios a desempenhos acima da média, além
do salário fixo do indivíduo. Os ESOPs e a divisão de lucros também
podem ser acrescentados a planos com base em salário por hora e/ou
mérito e desempenho. Diferentes planos de incentivo podem ser com‑
binados de modo a refletir circunstâncias especiais, como as variações
sazonais na produção. Um exemplo vem de uma engarrafadora de gás

Book_Organizaçoes.indb 248 16/9/2011 16:23:38


na Irlanda do Norte. A administração da fábrica negociou um acordo
de pagamento por peça, dando aos trabalhadores uma remuneração
maior quando a demanda pela produção era alta no inverno e permitia
terminar o expediente mais cedo no verão, quando o nível da produção
era mais baixo e os empregados apreciavam o tempo extra de lazer nas
tardes. Essa combinação de dois elementos de incentivo atendia à ne‑
cessidade da gerência por uma produção flexível e, ao mesmo tempo,
ao estilo de vida dos trabalhadores. Tal programa resultou em um nível
249
mais alto de cooperação dos trabalhadores, permitindo à supervisão

Sistemas de remuneração
mais tranquilidade e um aumento na autonomia dos grupos de traba‑
lho. Além disso, houve aumento da produtividade e queda no nível de
absenteísmo.13
Há muitas questões a se considerar no planejamento de uma política
de recompensa. Uma delas é a questão da simplicidade versus complexi‑
dade já mencionada. As principais escolhas são entre:

„„um sistema simples versus um sistema que contemple diferentes


dimensões importantes;

„„um sistema padronizado versus um sistema sensível a diferenças


individuais;

„„um sistema relativamente fixo ou rígido versus um sistema flexível


e adaptável;

„„sistemas que tentam influenciar a motivação versus sistemas


que conduzem ao desenvolvimento de relacionamentos mais
cooperativos.

A Tabela 7.2 apresenta essas escolhas e resume as possíveis van‑


tagens de cada uma. Embora a tabela ilustre sistemas de pagamento,
as escolhas enumeradas também se aplicam à definição de políticas de
recompensa de modo geral. Por exemplo, a padronização poderia sig‑
nificar planejamento de funções segundo especificações que se aplicam
a todos em uma determinada categoria, enquanto a diferenciação daria
aos empregados liberdade para decidir sobre o que fazer e ajustar o
escopo de suas funções desde que correspondam aos critérios de desem‑
penho estabelecidos.

Book_Organizaçoes.indb 249 16/9/2011 16:23:38


Tabela 7.2  Opções no planejamento de sistemas de pagamento

1 Simplicidade Complexidade
Exemplo: taxas de remuneração fixa; Exemplo: avaliação do cargo combi‑
remuneração tradicional por peça nada com diversos tipos de incentivo
sem outros adicionais ou programas de participação nos
Em um contexto de mudança e pres‑ lucros
são, tal abordagem facilita o exer‑ Esta abordagem oferece à gerência
250 cício do controle e do rastreamento mais opções para responder a dife‑
dos custos rentes exigências, mas dificulta o
parte ii  novas formas internas

equilíbrio ou a previsão das implica‑


ções dos custos envolvidos

2 Padronização Diferenciação
Exemplo: todos os emprega‑ Exemplo: remuneração por mérito;
dos possuem remuneração fixa e série de outros benefícios que os
encontram­‑se agrupados em poucas empregados podem escolher
categorias Há reconhecimento das diferenças
Abordagem simples e de baixo custo individuais e os salários são adapta‑
administrativo; evita o risco de acu‑ dos a elas, melhorando a motivação
sações de favoritismo

3 Relativamente fixo ou rígido Flexível e adaptável


Exemplo: níveis de remuneração Exemplo: pagamento por desempenho
baseados na avaliação do cargo Opção atraente no que se refere à
Opção atraente em termos de manu‑ união dos esforços dos indivíduos
tenção da disciplina e do controle com os objetivos da empresa e com as
diante de mudanças e pressões necessidades de mudança

4 Tentativa de influenciar a motiva‑ Ênfase na criação de relacionamentos


ção ou aumentar o desempenho coletivos harmônicos
individual Exemplo: participação nos lucros;
Exemplo: planos de remuneração por opções em ações; participação nos
produtividade resultados
Esta opção maximiza o potencial Esta abordagem conduz a relações
motivacional e ajuda a controlar os cooperativas e a grupos mais flexíveis
custos diretos diante da competição
cada vez mais intensa

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7.4 Tendências das políticas de recompensa
compatíveis com as novas formas
organizacionais
A rigidez nas estruturas salariais sempre foi um dos obstáculos mais
relevantes para a introdução de novas formas de organização. A bus‑
ca de maneiras de se amenizar tal rigidez tem caracterizado as aborda‑
gens mais recentes de políticas de recompensa, desfavorecendo algumas 251
abordagens tradicionais. A definição de cargos mostrou ser um processo

Sistemas de remuneração
demorado demais para se adaptar às novas exigências, em constante mu‑
dança. Ademais, desencoraja os empregados a adotarem uma abordagem
flexível em seu trabalho, parte essencial da disposição dos indivíduos em
trabalhar em tarefas que não foram formalmente especificadas em suas
funções. Programas de remuneração por produtividade podem também
estimular a resistência em vez da flexibilidade, uma vez que os emprega‑
dos podem avaliar que será mais difícil obter o bônus se lhes for exigido
que assumam tarefas novas com as quais não estão familiarizados.
O trabalho de equipe tem se tornado cada vez mais parte integral da
organização contemporânea, e assim espera­‑se, em decorrência disso, a
utilização crescente de sistemas salariais com base no trabalho em equipe.
Em princípio, o mais adequado no caso do trabalho de equipe é um sis‑
tema de remuneração de grupo com incentivos baseados em medidas ob‑
jetivas de desempenho (quando viável) ou em uma fórmula relacionada
ao desempenho. No entanto, poucos empregadores utilizam sistemas de
remuneração em grupo – por exemplo, apenas 5% dos empregadores no
Reino Unido fazem uso de tal método.14 Uma grande empresa de seguros
de vida e aposentadoria decidiu abandonar a remuneração baseada em
equipes, recompensar mais diretamente o desempenho de cada emprega‑
do e ressaltar a responsabilidade dos indivíduos quanto aos resultados.
Ao relatar tal mudança, a IRS Employment Review comentou sobre os
“duros critérios” que deveriam ser alcançados para que os planos de re‑
muneração com base na equipe funcionassem:

[Eles] precisavam estabelecer metas de desempenho claras e significativas,


que refletissem o esforço do grupo e permitissem a diferenciação entre
aqueles que possuem altos níveis de desempenho e aqueles que têm uma

Book_Organizaçoes.indb 251 16/9/2011 16:23:38


atuação menos significativa. Se isso não for feito, os sistemas de remu‑
neração em grupo podem se tornar desmotivadores, sabotar o esforço
individual e funcionar como barreira para o movimento entre as equipes,
funções e divisões.15

A remuneração por desempenho se destaca na nova abordagem sobre


remuneração, que visa melhorar o desempenho em relação à necessidade
de flexibilidade e inovação. As políticas de recompensa atuais, ao lado
252
da avaliação do potencial de desenvolvimento e treinamento dos empre‑
gados, priorizam a associação entre a remuneração e o desempenho do
parte ii  novas formas internas

indivíduo por meio de incentivos variáveis associados aos objetivos da


corporação. Tal associação é um elemento importante na abordagem “es‑
tratégica” da gestão de recursos humanos.
As estruturas de pagamento estão incorporando faixas mais am‑
plas, associadas a menos níveis hierárquicos, que estimulam o trabalho
flexível e o movimento dos empregados. Por exemplo, a Norwich and
Peterborough Building Society em 1999 substituiu sua antiga estrutura
de doze faixas por um plano mais simples, com cinco níveis de funções.
O pagamento associado a cada faixa tem como referência os salários do
mercado de trabalho. A progressão do pagamento está hoje associada à
aquisição de habilidades e conhecimentos no “quadro de progressão da
carreira” do empregado, que é um plano de desenvolvimento indivi­dual.
A mudança resultou em turnover menor, aumento da produtividade e
maior satisfação entre os empregados e os clientes.16
Alguns empregadores estão oferecendo uma faixa mais ampla de
opções e benefícios com o intuito de incentivar o empenho e a moti‑
vação dos empregados, adaptando­‑se às diferentes necessidades indivi­
duais, embora outros temam pela introdução de critérios excessivamente
complexos nas políticas de recompensa. Em janeiro de 2003, o Lloyds
TSB, banco britânico, lançou um plano desse tipo, no qual seus 72.000
funcionários podiam trocar o salário por benefícios extras de maneira a
evitar impostos. O catálogo dos benefícios flexíveis oferecidos incluía o
direito a até cinco dias de folga, seguro de saúde privado, contribuições
para aposentadoria, compra de computadores, formação subsidiada,
vouchers para assistência infantil e varejo, além de seguro com desconto.
Com algumas limitações, os empregados podiam optar por trocar esses
benefícios por pagamento extra. O objetivo da empresa ao introduzir
tal plano era diferenciá­‑la de outros empregadores do setor financeiro,

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e principalmente reter o pessoal mais jovem e de contratos mais curtos,
cuja rotatividade é desproporcionalmente alta.17
Outra tendência tem sido a descentralização do poder nas negocia‑
ções acerca da remuneração em organizações com estabelecimentos múl‑
tiplos, visando permitir o desenvolvimento de políticas de pagamento que
atendam melhor às contingências de cada estabelecimento ou unidade de
uma empresa. Essa é uma questão importante e deve ser levada em conta
pelas empresas que se internacionalizaram e estão presentes em uma série
253
de países, onde fatores jurídicos e culturais podem exigir diferentes for‑

Sistemas de remuneração
mas de pagamento e recompensas.
O caso apresentado no Quadro 7.1 é um exemplo do uso crescente
de planos de incentivo e também ilustra duas questões discutidas aqui: (1)
incentivos no sentido de aumentar o desempenho individual podem, ao
mesmo tempo, prejudicar o trabalho em equipe e (2) planos adaptados a
contextos locais podem ter efeitos positivos.
Resumindo, as novas tendências na política de pagamento incluem:18

1. O pagamento direcionado pelo mercado: uma abordagem flexível


do pagamento e dos benefícios que reflete o valor do trabalho dos
empregados no mercado do trabalho.

2. Pagamento relacionado ao desempenho: aplicação crescente da


remuneração por desempenho individual e interesse crescente
acerca das recompensas com base no trabalho da equipe.

3. Faixas amplas: para obter mais flexibilidade em organizações com


menos níveis hierárquicos.

4. Pagamento com base na competência: uso crescente das competên‑


cias como critérios na gestão de desempenho aliado ao reconheci‑
mento de que a competitividade de uma empresa depende muito
da qualidade de tais competências.

5. Benefícios flexíveis: refletindo as necessidades de uma força de


trabalho diversificada, além de focar nos custos de diferentes
benefícios.

6. Recompensas não financeiras (intrínsecas): reconhecimento cres‑


cente do poder motivacional das recompensas intrínsecas e de
sua compatibilidade com as novas formas organizacionais, que

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transferem a iniciativa e a responsabilidade dos empregados, indi‑
vidualmente ou em equipes.

7. Harmonização e consolidação: para eliminar divergências quando


a gestão promove a integração e o deslocamento mais flexível nas
organizações.

Ao mesmo tempo, certas políticas de recompensa são aplicadas com


254 menor frequência atualmente:
1. Sistemas de pagamento incrementais: incrementos regulares peri‑
parte ii  novas formas internas

ódicos não são considerados uma boa iniciativa, porque não

Quadro 7.1  Introdução de um plano de incentivo e seus efeitos

Um grande varejista introduziu um plano de incentivo para os 40.000 empre‑


gados de suas lojas. O objetivo era aumentar as vendas de quatro planos de
seguro, que cobrem produtos contra acidentes ou estrago. Serviços financeiros
desse tipo eram importantes para a empresa, por se tratar de um segmento com
potencial de crescimento importante, que já representava 6% do lucro total.
O novo plano de incentivo oferecia recompensas de acordo com as metas de
venda dos produtos e seguros em cada loja. Quantias em dinheiro eram dadas
aos empregados de acordo com o desempenho deles. Outro elemento competi‑
tivo foi acrescentado para gerar mais motivação, envolvendo prêmios semanais.
Os gerentes das lojas também recebiam “pontos de férias”.
O plano de incentivo deu certo e as vendas aumentaram em 20%. Contudo, os
incentivos também geraram efeitos negativos, prejudicando o trabalho em equi‑
pe nas lojas. O nível do pagamento dos incentivos foi considerado muito baixo
pela maioria dos empregados, o que gerou descontentamento, e os gerentes das
lojas de menor volume de vendas se sentiram discriminados porque não podiam
atingir o nível das recompensas das lojas de maior volume. A maioria das lojas
deu então início a planos locais, que funcionavam em paralelo ao oficial. Em tais
planos locais, dias de folga eram dados como prêmio aos melhores vendedores e
os empregados eram organizados em equipes, que recebiam prêmios pelo maior
volume de vendas. Essas adaptações locais foram mais motivadoras e geraram
maior interesse entre os empregados.

Fonte: HIGGS, Malcolm; RENTON, Hamish. Recognition and rewards. IRS Employment Review,
n. 781, 1 ago. 2003, p. 20­‑23.

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respondem ao valor de mercado do empregado e porque não asso‑
ciam a recompensa ao desempenho, e assim, aos objetivos estraté‑
gicos da organização.

2. Aumentos por causa da inflação: estão perdendo lugar, tendo em


vista os níveis de inflação baixa, o que reduz as expectativas dos
empregados de que esses aumentos sejam dados.

3. Avaliação tradicional do cargo: há preocupações sobre a inflexi‑


255
bilidade da avaliação tradicional quando as estratégias de recom‑
pensa precisam se adaptar a mudanças e inovações.

Sistemas de remuneração
4. Revisão anual do salário: negociações salariais de longo prazo
estão se tornando mais comuns, especialmente quando associadas
a melhorias da produtividade.

5. Subsídios e gratificações: estão se transformando, cada vez mais,


em sistemas de recompensa mais simples no sentido de enfocar os
objetivos organizacionais principais.

Resumo
1. Um sistema de remuneração visa oferecer aos empregados recompen‑
sas que eles valorizem e que, ao mesmo tempo, sirvam para motivá­‑los a
alcançar as metas de desempenho de uma organização.

2. A facilidade com que o dinheiro pode ser medido e vinculado como re‑
compensa a critérios específicos de desempenho dá à remuneração flexibi‑
lidade, que é atraente tanto para empregadores quanto para empregados.

3. Cada um dos diferentes sistemas de pagamento apresentados neste


capítulo tem seus pontos fortes e suas limitações quando avaliado em
relação aos grupos de gerentes e de empregados, discutidos no capí‑
tulo anterior. Por isso, é comum haver a combinação de dois ou mais
sistemas.

4. Por outro lado, é possível observar tendências nas políticas de paga‑


mento que dão preferência a sistemas mais compatíveis com as práticas
contemporâneas do emprego e das formas organizacionais. Há exemplos,
como o pagamento relacionado ao desempenho e faixas mais amplas
de pagamento. Sistemas relativamente inflexíveis, como a avaliação do

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cargo, estão sendo abandonados em organizações que precisam se adap‑
tar e inovar de maneira constante.

Questões para discussão


1. Por que o pagamento continua a ter um papel tão importante nas
relações entre empregadores e empregados?
256

2. Descreva e discuta os métodos de pagamento mais comuns.


parte ii  novas formas internas

3. Quais são os principais aspectos a serem considerados na escolha entre


os métodos de pagamento nas organizações?

4. Do ponto de vista gerencial, analise os argumentos contra os esquemas


de incentivo por produção.

5. Discuta os prós e os contras da remuneração por mérito.

6. Quais são as tendências que têm surgido em termos de políticas


de remuneração e como elas se relacionam com as novas formas
organizacionais?

Notas
1. HERZBERG, F.; MAUSNER, B.; SNYDERMAN, B. B. The motivation to
work. New York: John Wiley & Sons, 1959.

2. CHILD, John; PARTRIDGE, Bruce. Lost managers: supervisions in industry


and society. Cambridge: Cambridge University Press, 1982.

3. KANUNGO, Rabindra N.; MENDONÇA, Manuel. Compensation: effective


reward management. 2. ed. Toronto: John Wiley & Sons, 1997. Cap. 9.

4. LOCKE. E. A.; G. P. Lathan, Goal Setting: a motivational technique that works.


Englewood Cliffs: Prentice­‑Hall, 1984.

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5. JAQUES, Elliot A general theory of bureaucracy. London: Heineman, 1976.

6. MCKENNA; Eugene. Business psychology and organizational behaviour. 3. ed.


Hove: Psychology Press, 2000. p. 565­‑566.

7. KANUNGO; MENDONÇA, 1997, op. cit., p. 224.

8. DRUCKER, Peter. The next society: a survey of the near future. The Economist,
p. 1­‑22, 3 nov. 2001.
257
9. BOISOT, Max. Knowledge assets: securing competitive advantage in the infor‑

Sistemas de remuneração
mation economy. Oxford: Oxford University Press, 1998.

10. HELER, Frank; PUSIC, Eugen; STRAUSS, George; WILPERT, Bernhard. Or‑
ganizational participation: myth and reality. Oxford: Oxford University Press,
1998.

11. Economic Focus: a capital idea. The Economist, p. 86, 29 mar. 2003.

12. BRADLEY, K; TAYLOR, S. Business performance in the retail sector: the expe‑
rience of the John Lewis partnership. Oxford: Clarendon Press, 1992.

13. DONALDSON, Lex; LYNN, Richard. The conflict resolution process. Person‑
nel Review, primavera 1976.

14. Case study. From team to individual pay. IRS Employment Review, n. 744, p.
25­‑28, 28 jan. 2002.

15. IRS Employment Review, 2002, op. cit.

16. Building a new pay framework. IRS Employment Review, n. 758, p. 25­‑28, 19
ago. 2002.

17. Lloyds TSB develops a taste for flexibility. IRS Employment Review, n. 768, p.
24­‑28, 24 jan. 2003.

18. Para outras discussões sobre as novas tendências de recompensa, veja PILBE‑
AM, Stephen; CORBRIDGE, Marjorie. People Resourcing: HRM in Practice.
2. ed. London: Financial Times Management, 2002.

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PARTE III

NOVAS FORMAS DE
TRABALHO EM REDE

Capítulo 8 A terceirização
Capítulo 9 Organização virtual
Capítulo 10 Alianças estratégicas
Capítulo 11 Organizando além das fronteiras

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Capítulo 8
Terceirização

Conteúdo do capítulo
A terceirização é hoje uma característica importante da reestruturação
organizacional. Este capítulo começa com sua definição e descreve
seu crescimento, que tem ocorrido em larga escala. Duas categorias de
terceirização são identificadas – a primeira, relacionada às atividades da cadeia
de valor, e a segunda, às atividades de apoio. São apresentados exemplos da
terceirização da produção e de empresas prestadoras de serviços. O capítulo
discute ainda os pontos positivos da terceirização bem como os problemas
e obstáculos que podem surgir. Por fim, são feitas ponderações que servem
de base para a decisão sobre terceirização e sugere­‑se o esboço de uma
metodologia para a criação de boas parcerias no processo de terceirização.

8.1 Terceirização e mudança das fronteiras


organizacionais
A terceirização se tornou uma importante área da reestruturação,
que está mudando de maneira notável as fronteiras tradicionais das or‑
ganizações. James B. Quinn, autor de bestsellers e visionário empresarial,
refere­‑se à terceirização como “uma das maiores mudanças na estrutura
da organização e da indústria deste século “.1 Dun e Bradstreet estimaram

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que a terceirização representava, já no ano de 2000, um mercado global
de 1 trilhão de dólares.2
A terceirização é a contratação de terceiros para realizar atividades
regulares que, de outra forma, poderiam ser realizadas pela organização.
Em geral, a expressão não é usada para definir serviços especializados ne‑
cessários apenas ocasionalmente, como consultas jurídicas, ou que estão
fora do escopo de atividades da organização, como o planejamento de
viagens de negócios. Terceirização normalmente significa a transferência
262
de atividades que costumavam ser realizadas na própria empresa e que
possivelmente ainda o são por algumas organizações do mesmo setor. A
parte iii  novas formas de trabalho em rede

expressão é usada também para descrever a transferência de atividades


de um país para outro – o que às vezes também é chamado de offshoring.
Grande parte da manufatura mudou de países desenvolvidos para países
como o México e a China, enquanto cada vez mais serviços, desde design
de softwares a call centers, estão sendo transferidos para a Índia3.
O amplo uso da terceirização leva à redução da organização tradi‑
cional da empresa, o que muitas vezes é chamado de “esvaziamento”.
Quando as empresas transferem um número crescente de atividades para
fornecedores e parceiros externos, suas fronteiras se contraem, fazendo
com que mantenham apenas uma pequena equipe central, que possui as
qualificações essenciais e pode se concentrar em atividades mais estraté‑
gicas, que agregam valor. Uma dessas atividades essenciais é a capacidade
de coordenar as transações que devem ser realizadas de maneira efetiva
na rede que a empresa, ao terceirizar, estabelece com seus fornecedores.
A empresa se torna uma “coordenadora de rede” e, levando­‑a ao extre‑
mo, especialmente quando se possui o apoio das modernas tecnologias
de comunicação, essa forma de rede se aproxima muito da “organização
virtual” – que será discutida no próximo capítulo.
A Metro International, editora sueca com sede em Londres, é um
exemplo de empresa com um nível considerável de terceirização (veja o
Quadro 8.1).

8.2 A escala da terceirização


A década de 1990 foi caracterizada por um aumento significativo na
terceirização. Por exemplo, apenas no ano de 1999, a terceirização de
operações e instalações em todas as indústrias norte­‑americanas aumen‑
tou cerca de 18%. Os gastos mundiais com a terceirização aumentaram

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Quadro 8.1  Metro international: um exemplo de extensa terceirização

A Metro International publica 34 edições locais de seu jornal gratuito e as dis‑


tribui em 16 países. Ela emprega muito menos repórteres por editoria do que os
jornais tradicionalmente organizados, comprando a maior parte de seu conte‑
údo de agências de notícias e fotográficas, apresentando­‑o sob a marca Metro.
A empresa também terceiriza a impressão e boa parte da distribuição do jornal.
Em fevereiro de 2004, como uma empresa anônima, anunciou, pela primeira
263
vez, seu lucro trimestral. Nos 12 meses anteriores, havia crescido 40% em mer‑
cados publicitários que eram fracos e o preço de suas ações subiu 457%, mos‑

Terceirização
trando que, depois de um grande investimento inicial, o modelo de organização
(nada tradicional) da empresa estava indo muito bem.

Fonte: FREEDMAN, Peter. The age of the hollow company. Sunday Times, p. 3.1­‑3.2, 25 abr. 2004.

em 25% entre 1999 e 2000. Houve uma época em que a fábrica de River
Rouge da Ford fazia os próprios pneus, vidros, aço e a parte elétrica. No
entanto, atualmente, os fornecedores respondem por cerca de dois terços
da indústria automobilística norte­‑americana, no valor de 750 bilhões
de dólares. As grandes corporações automobilísticas, como a Daimler­
‑Chrysler, a Ford e a GM, são responsáveis pelo design e pela montagem
de veículos, mas possuem fornecedores para a fabricação da maioria de
seus componentes. Em média, no ano de 2001, o fabricante original de
equipamento eletrônico (original equipment manufacturer – OEM) pla‑
nejava terceirizar 73% de sua produção; a Dell Computer Corporation,
que será abordada no próximo capítulo, é um exemplo de empresa com
nível especialmente alto de terceirização. Em 2001, constatou­‑se que
40% de todos os OEM da América do Norte planejavam terceirizar a
fabricação de pelo menos 90% de seus produtos finais.4
A terceirização hoje é realizada em enorme escala global. A estima‑
tiva era de que até 2005 cerca de 588.000 empregos norte­‑americanos
seriam transferidos para o exterior, para países de mão de obra barata,
como a Índia, a China, o México e as Filipinas. Por volta de 2015, prevê­
‑se que esse número chegue a 3,3 milhões. A transferência para o exterior
seria em sua maioria de funções administrativas: gabinete de apoio, in‑
formática, operações comerciais e gestão.5 Previu­‑se que os gastos norte­
‑americanos com serviços de tecnologias de informação passariam de

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16 bilhões de dólares, em 2004, para 46 bilhões de dólares, em 2007.6
Igualmente, previu­‑se que 275.000 empregos do Reino Unido mudariam
para o exterior entre 2004 e 2010.7
A globalização é um fator que tem impulsionado a terceirização. A
liberalização do comércio internacional expôs as empresas a níveis cres‑
centes de competição, impondo pressões cada vez maiores para cortar
custos por meio de terceirização e offshoring. Ao mesmo tempo, a ter‑
ceirização tem sido facilitada em grande medida pela liberalização do
264 comércio, que simplificou o acesso a fornecedores em todo o mundo.
Tecnologias de comunicação e informação avançadas, especialmente a
parte iii  novas formas de trabalho em rede

internet, também estão reduzindo os custos das interações e as imperfei‑


ções no mercado. Esses poderosos facilitadores têm dado às empresas um
vasto leque de opções no que diz respeito à forma com que seus negócios
são estruturados. Andrew Berger, um associado da Accenture, prevê que
as corporações multinacionais se dividirão cada vez mais em áreas com
competências específicas, nas quais manterão sua excelência operacional,
com novas empresas prestadoras de serviço surgindo a fim de prover ex‑
celência em outras áreas de sua cadeia de valor ou a ela relacionadas.8
Os fabricantes de automóveis e a Dell são exemplos de terceirização
da produção. Essa é a primeira das duas mais importantes categorias
da terceirização: refere­‑se às principais operações na cadeia de valor. A
terceirização da cadeia de fornecedores, especialmente da manufatura, é
o exemplo mais comum, embora outras operações, como a distribuição,
também sejam terceirizadas. Tal categoria, evidentemente, deve ser or‑
ganizada de modo a preservar um alto nível de integração operacional.
Isso ocorre especialmente porque, como veremos, um dos principais atra‑
tivos é a possibilidade de minimizar o estoque. A segunda categoria é a
terceirização das atividades de apoio, como pesquisa e desenvolvimento,
recursos humanos e a gestão das instalações. Essas atividades são funda‑
mentais, embora sejam mais de apoio à cadeia de valor do que parte inte‑
grante dela e por isso não criem custos de estoque nem exijam integração
perfeitamente sintonizada com as operações rotineiras da cadeia de valor.
Grande parte do impulso inicial para a terceirização foi a redução de
custos por meio da transferência de trabalho rotineiro para países com
mão de obra barata. Há sinais de que isso agora esteja mudando, e com
o constante aumento das qualificações e competência nos países emer‑
gentes, as empresas têm procurado cada vez mais transferir a produção
e os serviços de maior valor agregado para o exterior. Um exemplo é a

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Hewlett­‑Packard, que terceirizou o desenvolvimento e a produção de um
novo servidor (veja o Quadro 8.2). Muitos países emergentes, como Índia
e Taiwan, estão formando inúmeros cientistas e técnicos com excelente
qualificação, capazes de fazer trabalhos de pesquisa e software do mais
alto nível, que até o momento estiveram concentrados em países como os
Estados Unidos.9

Quadro 8.2  A terceirização na trajetória da Hewlett­‑Packard


265

Terceirização
Em 2003, a Hewlett­‑Packard começou a produzir o novo servidor, o ProLiant
ML150, voltado para as pequenas empresas. O processo de criação desse pro‑
duto e sua comercialização foram realizados com pouco investimento da sede
norte­‑americana.
A ideia para o produto surgiu em Cingapura. Houston aprovou o projeto. O
design do conceito foi realizado em Cingapura. O design da engenharia foi feito
em Taiwan, onde muitos componentes de computadores são fabricados. A fabri‑
cação inicial também ocorreu em Taiwan. A montagem final do servidor está
localizada em Cingapura, Austrália, China e Índia. Os produtos feitos na Austrá‑
lia, China e Índia são basicamente destinados a esses mercados, e as máquinas
feitas em Cingapura se destinam ao sudeste asiático.
As razões para tal distribuição das atividades dizem respeito a capacidades
locais, logística, impostos e custos envolvidos. Por exemplo, a localização do
design em Cingapura e Taiwan reflete a capacitação técnica existente ali nos
dias de hoje. A China estava longe demais de alguns mercados para que toda
a fabricação fosse instalada ali. A produção na Índia encontra­‑se mais próxi‑
ma desses mercados, além de evitar os altíssimos impostos incidentes sobre a
importação de produtos acabados.

Fonte: Wall Street Journal, p. A3, 23 fev. 2004.

8.3 Terceirização na prática


8.3.1 Manufatura
Em 2003, segundo informações reunidas pela Engineering Employers
Federation, 30% das empresas britânicas haviam transferido parte de sua
manufatura para o exterior e 49% das maiores empresas com mais de

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500 empregados tinham ao menos parte de sua manufatura realizada
no exterior. Uma em cada três fábricas britânicas declarou planejar au‑
mentar nos cinco anos seguintes a proporção de produção no exterior.
Quase dois terços dessas empresas (62%) disseram que o custo baixo foi
a principal razão para transferir a produção para outro país. A maio‑
ria da produção dos países desenvolvidos da Tríade (América do Norte,
Europa Ocidental e Japão) foi transferida para a China.10 Uma parte
dessa produção, globalmente realocada, permanece em filiais no exterior
266
com administração direta; portanto, não é terceirizada no pleno sentido
de ser terceirizada para outras empresas. Em outros casos, no entanto, a
parte iii  novas formas de trabalho em rede

produção é deslocada da empresa original ou ao menos repassada a uma


joint venture de sócios estrangeiros.11
A Hornby Company, fabricante de modelos de estrada de ferro e car‑
ros Scalextric, ilustra essa tendência. Sua decisão de mudar a fabricação
para a China é descrita no Quadro 8.3.
O uso da terceirização, rapidamente disseminado nos anos 1990,
foi inspirado na recomendação de que as empresas deveriam se con‑
centrar em suas atividades essenciais e transferir as outras.12 As gran‑
des corporações aprenderam a “desagregar” suas partes constituintes,
algumas das quais eram tidas como parte do core business, e outras
podiam ser vendidas. Um dos melhores exemplos de empresas foca‑
das nas atividades essenciais é a Cisco Systems, que nos mostra como
continuar a produzir um produto ou entregar um serviço completo
para o consumidor e, ao mesmo tempo, integrar uma rede em que ou‑
tras empresas fornecem partes vitais de sua cadeia de valor. A Cisco
estava se retirando dos setores de sua cadeia de valor em que não
gozava de uma vantagem proeminente. Contudo, isso não significa‑
va que estivesse se livrando das empresas das quais dependia para o
bom fornecimento de seus produtos aos consumidores – fabricantes,
fornecedores e assim por diante. A Cisco coordenava rigorosamente
sua rede de cadeia de valor por meio da Cisco Connection On­‑line,
um canal de rede mundial para codificar e transmitir informações ge‑
radas por seus clientes e parceiros de rede.13 No Capítulo 9 veremos
como a Dell trata de sua rede de fornecimento de modo semelhan‑
te. O caso da Cisco é instrutivo porque, como discutiremos adiante,
as dificuldades subsequentes enfrentadas pela empresa ilustram al‑
guns problemas que podem surgir quando a terceirização não é bem
administrada.

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Quadro 8.3  A Hornby se muda para a China

No Natal de 1986, a Hornby Company era uma das últimas empresas voltada
para a fabricação de brinquedos no Reino Unido. Era elogiada pelo público devi‑
do ao seu patriotismo, mas suas perdas anuais já chegavam a aproximadamente
4,5 milhões de libras. A empresa, que fora fundada em 1920 e tinha um nome
conhecido, corria agora o risco de ir à falência.
O maior problema da empresa eram os altos custos de fabricação no Reino
267
Unido, principalmente a mão de obra. Era preciso reduzir esses custos. Todos
os concorrentes da Hornby já haviam mudado sua produção para o Extremo

Terceirização
Oriente, o que a levou a fazer o mesmo. Primeiro, a companhia transferiu gradu‑
almente a produção dos modelos de estradas de ferro de Margate, em Kent, para
a China. Com isso, houve alívio imediato da pressão na produção e a empresa
pôde usar os recursos poupados para melhorar a qualidade e o nível de detalhe
em seus modelos, de tal maneira que as vendas começaram a aumentar. Com o
sucesso da mudança, a Hornby decidiu mudar também a produção do Scalextric
para a China; a última etapa da transferência foi completada em 2001. A empre‑
sa reduziu sua força de trabalho de 550 pessoas para um grupo de apenas 130
designers e gerentes. Em março de 2003, a empresa apresentou um lucro de 5,4
milhões de libras para o final do ano e, em junho deste mesmo ano, o preço de
suas ações era quase três vezes maior que em 2001.

Fonte: Sunday Times, p. 3.5, 8 jun. 2003.

A General Electric (GE) é um dos muitos exemplos de grandes cor‑


porações industriais que não apenas mudou suas operações de manu‑
fatura para países como a China, mas também terceirizou importantes
atividades de apoio, especialmente para a Índia. Por volta de 2003, mais
de 7.000 pessoas em empresas indianas de software trabalhavam exclu‑
sivamente em projetos para a GE. O call center e a parte operacional da
empresa na Índia empregam outras 11.000 pessoas. A GE investiu mais
de 80 milhões de dólares para criar na Índia seu maior centro de pesquisa
fora dos Estados Unidos, com mais de 1.600 funcionários. Um importan‑
te fator que levou a empresa a passar de uma terceirização mais direta,
como a dos call centers e do desenvolvimento de software, para a de
pesquisa de alto nível foi a grande disponibilidade de engenheiros e cien‑
tistas de nível mundial, cujos salários anuais giravam em torno de 5.500
dólares (em 2003). Um fator mais específico foi o número de indianos que

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já trabalhavam na pesquisa da GE nos Estados Unidos. Eles não apenas
indicaram técnicos indianos de excelente qualidade que falavam inglês,
como também estimularam a divisão de plásticos da empresa a criar um
centro de pesquisa na Índia, o que abria possibilidades para que alguns
retornassem a seu país de origem.14

8.3.2 Serviços
268 As prestadoras de serviços financeiros estão entre as empresas que
planejam a terceirização de funções, basicamente para a Índia. Por exem‑
parte iii  novas formas de trabalho em rede

plo, em junho de 2003, foi noticiado que os maiores bancos e seguradoras


da Grã­‑Bretanha pretendiam mudar cerca de 200.000 empregos adminis‑
trativos, de processamento e de escritório para a Índia até o ano de 2010.
Uma empresa de recrutamento previa a transferência de 100.000 empre‑
gos da Grã­‑Bretanha para a Índia somente em call centers, mas muitos
sindicalistas acreditavam que esse número seria duas vezes maior. Um ex‑
periente executivo do setor bancário teria declarado que havia encontra‑
do colegas seus em grupos financeiros rivais e todos desejavam terceirizar
empregos para locais mais baratos. No final de 2003, estimava­‑se que o
HSBC, um dos maiores bancos globais, teria transferido cerca de 9.000
empregos para escritórios na China, Índia e Malásia.15 Outro exemplo
significativo foi a National Savings, do Reino Unido, que oferece uma
série de produtos de poupança pessoal. Em meados dos anos 1990, essa
organização empregava 5.000 pessoas. Por volta de 2002, tinha apenas
120 empregos diretos, após terceirizar quase todas as suas funções.
Em novembro de 2001, o Abbey National – banco britânico com alta
concentração de hipotecas – estabeleceu uma joint venture com a Stiell,
especializada na gestão de empresas, para administrar as propriedades
e instalações do banco durante dez anos. Cerca de 70 empregados do
banco foram transferidos para a associada, com economias de aproxi‑
madamente 3 milhões de libras por ano. Ao explicar os princípios dessa
terceirização, um porta­‑voz do banco disse: “A nossa estratégia de dei‑
xarmos de ter participação direta em atividades não essenciais não nos
deve tornar completamente inflexíveis para as oportunidades de econo‑
mizar nos gastos e aumentar os ganhos dos acionistas”.16
Três grandes empresas de serviços do Reino Unido – a BT (British
Telecommunications), a Powergen e a Thames Water – anunciaram no
mesmo dia, em março de 2003, que estavam transferindo os call centers

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da Grã­‑Bretanha para a Índia. A BT abriu dois call centers em Delhi e
Bangalore em 2004, criando 2.200 empregos para indianos. Esses novos
call centers indianos realizarão os negócios rotineiros da BT, entre os quais
telefonemas para clientes no Reino Unido para lembrá­‑los de pagar suas
contas e tratar das dúvidas relacionadas à lista telefônica. A Thames Water
planejava mudar parte de suas operações de atendimento ao cliente para a
Índia, onde os trabalhadores locais seriam capazes de processar as leituras
dos hidrômetros e lidar com mudanças de endereços. A Tabela 8.1 mostra
grandes diferenças no que se refere aos gastos de call centers compostos por 269

trabalhadores britânicos e aqueles compostos por trabalhadores indianos.

Terceirização
Em abril do ano anterior, a BT havia assinado um acordo de tercei‑
rização no valor de 55 milhões de libras, segundo o qual a impressão e
distribuição das contas dos cliente seriam feitas pela Endotech, uma em‑
presa privada com sede no condado inglês de Shropshire. Antes disso, a
BT já havia terceirizado uma série de operações de apoio, entre as quais
a folha de pagamento e o suporte de informática, como parte do esforço
para reduzir custos em um setor altamente competitivo.
Uma das pioneiras da terceirização entre as prestadoras de serviço do
Reino Unido é a Cattering & Allied (C&A), empresa de alimentação cuja
experiência é relatada no Quadro 8.4.

Tabela 8.1  Perfis dos trabalhadores de call centers britânicos e indianos

O trabalhador britânico, em média: O trabalhador indiano, em média:


Vive em Londres, Glasgow ou na Gales Vive em Delhi
do Sul
Trabalha sete horas por dia, com pausa Trabalha oito horas por dia, em três tur‑
de uma hora para o almoço nos, começando às 5h, 11h30 e 20h30
Salário anual: 10.000 a 13.000 libras Salário anual: 2.500 libras
Um terço possui formação Quase todos possuem formação
universitária universitária
Número de empregos (março de 2003): Número de empregos: até 100.000 em
510.000 call centers na Índia em 2008

Fonte: Laura Peek, Sam Coates e Catherine Philp, “Sindicatos acusam a BT de exportar trabalho
em call centers”, The Times, 8 de março de 2003, p. 5.

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Quadro 8.4  Catering & Allied: uma história de terceirização
bem­‑sucedida

A Catering & Allied (C&A) foi fundada em 1975 durante a direção de Marc Vers‑
tringhe. Depois dos primeiros 18 meses de operação, a C&A passou a ter lucro
e permaneceu lucrativa em toda a sua história. A empresa tornou­‑se conhecida
por introduzir novas abordagens em sua gestão, buscando alcançar um padrão
de alta qualidade na área de restaurantes a fim de oferecer serviços de catering.
270
Verstringhe atribui boa parte do sucesso da empresa em um setor muito com‑
petitivo a essas inovações organizacionais.
parte iii  novas formas de trabalho em rede

A administração da C&A percebeu que a terceirização oferecia, ao mesmo tem‑


po, benefícios intrínsecos e ganhos de produtividade. Importantes benefícios
intrínsecos vinham do fato de que o trabalho com especialistas estrangeiros
proporcionava à empresa acesso a um melhor nível de especialização, com
mais flexibilidade. O primeiro passo foi dado na área de serviços financeiros e
administrativos da empresa. Em 1975, o advogado de Verstringhe o apresen‑
tou a Keith Moore, sócio de uma firma de contabilidade estrangeira. O motivo
de tal encontro foi o aniversário de dez anos da C&A e a necessidade de se ter
um plano de investimento para, na opinião do advogado, viabilizar a empre‑
sa financeiramente. A partir desse encontro inicial com Moore, iniciou­‑se um
relacionamento de trabalho. Em novembro de 1975, Moore foi convidado pelos
acionistas para conduzir as atividades administrativas da empresa, de modo a
assegurar que todas as questões jurídicas, administrativas e fiscais fossem con‑
duzidas de maneira profissional e eficiente desde o princípio. Logo se percebeu
que o experiente Moore também era valioso ao atuar como conselheiro finan‑
ceiro da empresa em questões relacionadas à cobrança de impostos e contabi‑
lidade, além de fazer minutas das reuniões da diretoria.
A terceirização também foi utilizada no design de um novo restaurante. O
acesso a especialistas estrangeiros em tal projeto acrescentava um certo
charme, que se somava à conhecida reputação da empresa, além de permi‑
tir uma abordagem mais flexível dos projetos inovadores. Essa foi a política
da C&A desde o início, inteiramente focada em prover um serviço superior
para seus clientes. Verstringhe e seus colaboradores enxergaram na ideia de
competências­‑chave a possibilidade de a empresa aumentar a qualidade dos
serviços oferecidos a seus clientes por meio da inclusão de habilidades trazi‑
das de fora, que complementariam seus próprios recursos. Com esse tipo de
terceirização a empresa conseguiu a flexibilidade necessária para trabalhar
com especialistas de fora da empresa, além de se beneficiar da sinergia ino‑
vadora que eles ofereciam.

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Com o passar do tempo, a C&A percebeu que a terceirização poderia oferecer
uma série e benefícios intrínsecos e, no final dos anos 1970, ela tornou­‑se uma
abordagem consolidada na empresa. Um outro benefício dessa abordagem era
o de resolver o desafio de manter as vantagens do tamanho menor e, ao mesmo
tempo, crescer. Muitos clientes pediam que a C&A se mantivesse pequena, por
receio de que uma empresa maior pudesse perder o estilo singular, a atenção
ao detalhe e, acima de tudo, o contato próximo com eles. No entanto, o cres‑
cimento era a consequência natural do sucesso no mercado. O uso de especia‑
271
listas externos representava uma maneira de se atingir essa meta de “crescer
mantendo­‑se pequeno”.

Terceirização
Os ganhos da produtividade vieram com a redução dos custos. A terceirização
da empresa reduziu os custos de serviços de apoio, tais como contabilidade,
secretariado, relações públicas, marketing, informática e recursos humanos.
A seguir, os números apresentados em uma palestra que Verstringhe deu em
1986 ilustram o cálculo desses benefícios de economia de custo:*

Função Terceirização Provisão interna


£ £
Financeiro/secretaria 20.000 40.000
RP/marketing 20.000 40.000
Especialista em informática 12.000 30.000
Depto. pessoal e treinamento 12.000 30.000
64.000 140.000

Benefícios de custo
Economia de 76.000 libras em um rendimento de 1.036.950 libras.
Além de não precisar de espaço para escritório, secretária, telefone etc.

* Marc Verstringhe, “Uma abordagem diferente da administração de um negócio voltado para


as pessoas”, palestra patrocinada pelo HCIMA, 17 de novembro de 1986.

Fonte: HEAVENS, Sally; CHILD, John; VERSTRINGHE, Marc. Managing to serve – learning from
Catering & Allied. Cambridge: RH Business Books, 2002.

8.4 Atrativos da terceirização


A terceirização da C&A e de outras empresas aqui mencionadas ser‑
ve para ilustrar alguns dos aspectos atrativos desse modo popular de re‑
estruturação organizacional. A terceirização se tornou a nova doutrina

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corporativa, pois pode oferecer, ao menos em princípio, os seguintes be‑
nefícios gerenciais:

1. Permite que as empresas se concentrem no que fazem melhor;

2. Permite, ao mesmo tempo, que as empresas selecionem e utilizem


os melhores especialistas disponíveis no mercado para realizar
outras atividades;

272 3. Oferece economias de custo significativas, em geral imediatas, que


podem resultar da oferta de mão de obra mais barata no exterior
parte iii  novas formas de trabalho em rede

e/ou da economia dos custos administrativos internos e despesas


gerais das instalações da empresa. A terceirização também permite
que uma estrutura de custos fixa seja transformada em uma estru‑
tura variável;

4. Livra as empresas de problemas e outras dores de cabeça


operacionais;

5. Evita situações problemáticas relativas às relações trabalhistas e


deficiências administrativas;

6. Com a transferência de atividades antes realizadas internamente,


a terceirização ajuda no downsizing e na eliminação dos níveis
hierárquicos;

7. A terceirização, ou mais precisamente, a “ameaça da terceirização”,


pode fortalecer o controle administrativo em uma organização.

Examinaremos agora cada uma dessas vantagens em potencial.

1. A terceirização permite que as empresas se concentrem no que fa‑


zem melhor. Essa vantagem está de acordo com um dos princípios mais
antigos da economia: a lei da vantagem comparativa. Toda organização
precisa estabelecer um limite entre aquilo que pode realizar e o que está
além de suas capacidades. A racionalidade dessa abordagem é avaliar
quais atividades a organização está mais bem preparada para realizar. O
impulso da terceirização tem redesenhado os limites, de modo a aumen‑
tar o grau de concentração e enfoque da empresa em suas principais com‑
petências. As redes de telecomunicações servem de exemplo, pois muitas
empresas literalmente construíram minicompanhias telefônicas em suas

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instalações, ainda que a telefonia não seja seu negócio. Terceirizar uma
atividade de apoio logístico como essa permite que as empresas dediquem
sua energia a outras atividades, por meio das quais conseguem criar mais
valor. Muitas vezes, terceirizar significa vender alguns dos ativos de uma
empresa para um prestador de serviço externo e depois trabalhar com
seus especialistas, no intuito de aperfeiçoar o uso de tais ativos. Algumas
empresas levaram este princípio ao extremo, dirigindo um negócio multi‑
milionário na forma de uma rede de operações terceirizadas, com apenas
273
alguns poucos funcionários no núcleo. Um exemplo é a Topsy Tail, em‑
presa de acessórios de moda que, em 1998, teve rendimentos em torno de

Terceirização
80 milhões de dólares e apenas três empregados.17
2. Permite, ao mesmo tempo, que as empresas selecionem e utilizem
os melhores especialistas disponíveis no mercado para realizar outras ati‑
vidades. Esse é outro benefício proveniente da lei da vantagem compara‑
tiva, à qual é acrescentada a vantagem da flexibilidade. A C&A usou a
terceirização dessa forma ao criar novos restaurantes para seus clientes. A
empresa selecionava o melhor designer, que melhor atendesse às exigên‑
cias do projeto de cada cliente. Terceirizando a função de design das ins‑
talações em vez de mantê­‑la internamente, como fazem algumas empresas
do setor, a C&A foi capaz de escolher de forma flexível entre diferentes
especialistas externos.
3. A terceirização oferece economias de custo significativas, em geral
imediatas. Esse benefício ficou muito evidente na maioria dos casos de
terceirização. Em geral, fabricantes ou prestadores de serviços externos
têm custos mais baixos que um departamento interno, até dentro do mes‑
mo país. A disponibilidade de modernas TICs simplificou a administra‑
ção da terceirização em escala global. No caso de alguns serviços, como
call centers, manutenção e design de softwares e gestão contábil, a TIC
permite a integração das operações entre os continentes. A globalização
melhora consideravelmente as economias de custo oferecidas pela tercei‑
rização, permitindo a alocação de operações em regiões de baixo custo,
como Índia e China.
4. Livra as empresas de gargalos e dores de cabeça operacionais.
As empresas enfrentam às vezes problemas nas áreas operacionais com
mau desempenho ou quando há gargalos persistentes na cadeia de va‑
lor. A terceirização é uma possível solução, adicionando uma capacidade

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necessária ou eliminando uma área problemática. Se uma unidade com
baixo desempenho não é essencial para as atividades essenciais da em‑
presa, ela pode ser fechada sem que seja necessário criar uma alternativa.
Caso a unidade desempenhe um papel essencial, seu fechamento deve ser
compensado por meio da compra de produtos ou serviços terceirizados.
5. A terceirização evita situações problemáticas nas relações traba‑
lhistas e deficiências administrativas. Aqui, a lógica é semelhante à que foi
274 discutida no item 4. Pode ser muito difícil e/ou oneroso mudar uma uni‑
dade marcada por uma longa história de más relações trabalhistas e ges‑
parte iii  novas formas de trabalho em rede

tão deficiente. Uma cultura negativa pode simplesmente ter se instalado


na unidade, com uma atmosfera de desconfiança arraigada. O problema
de efetuar uma transformação em uma unidade desse tipo por meio de
ação administrativa interna está no fato de que, aos olhos dos emprega‑
dos, a própria administração é parte do problema. A terceirização oferece
a alternativa de vender a unidade/área, assegurando que seu produto seja
fornecido por outra empresa ou então pela própria unidade, após ser de
reconstituída sob nova direção e administração. A mudança do proprie‑
tário e da liderança pode ser às vezes a solução de muitas unidades em
decadência.
6. Com a transferência de atividades antes realizadas internamente, a
terceirização ajuda no downsizing e na eliminação dos níveis hierárqui‑
cos. Uma das dificuldades que empresas menores bem­‑sucedidas enfren‑
tam é como manter as vantagens de seu tamanho reduzido e, ao mesmo
tempo, crescer. O problema, como foi resumido por Marc Verstringhe,
presidente da C&A, é "como crescer e permanecer pequeno". A tercei‑
rização de certas atividades para o que a empresa chama de parceiros
estratégicos ajudou a C&A a resolver esse paradoxo e se expandir, per‑
manecendo uma organização pequena e compacta. Manter uma pequena
organização central pode evitar o crescimento dos níveis hierárquicos. A
terceirização oferece os meios para retomar a pequenez e eliminar tais
níveis hierárquicos. Essa é uma condição para o downsizing, assim como
o downsizing é, por sua vez, concomitante com o foco nas atividades es‑
senciais, na qual se baseia a terceirização. Este processo de terceirização
é parte essencial da mudança para as formas organizacionais em rede.
Como os capítulos anteriores já mostraram, o novo modelo organizacio‑
nal define conexões fundamentais entre (1) a redução da hierarquia e a

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eliminação de níveis, (2) o downsizing e o foco em atividades essenciais,
e (3) a terceirização, ou integração por meio de redes.
7. A terceirização, ou mais precisamente, a ameaça da terceirização,
pode fortalecer o controle administrativo em uma organização. Uma das
preocupações com as novas formas organizacionais (conforme será dis‑
cutido em detalhes no Capítulo 15) é que tais arranjos são mais difíceis
de serem administrados internamente. Se por um lado há os benefícios de
inovação e flexibilidade trazidos pela transferência da iniciativa a empre‑ 275
gados cada vez mais qualificados e instruídos, por outro pode haver um

Terceirização
enfraquecimento da direção da alta gestão. Isso acontece porque o alto
grau de inovações e mudança aliado à iniciativa oferecida aos trabalhado‑
res qualificados torna menos viável a confiança nos modos tradicionais de
controle, como a prestação de contas aos níveis superiores da hierarquia
e a avaliação de planos predeterminados. Contudo, a terceirização repre‑
senta uma nova disciplina de governança, em que há a possibilidade de
sanções contra desempenhos inadequados. Quando há mau desempenho
em uma das unidades da organização, existe a ameaça de que essa unidade
seja vendida ou fechada, e que suas atividades sejam terceirizadas.

8.5 Problemas da terceirização


Conforme observado anteriormente, o entusiasmo pela terceiriza‑
ção foi tal que ela assumiu o status de nova doutrina administrativa.
Tal fato traz o risco de que a terceirização venha a ser considerada
uma resposta para todos os problemas de uma empresa. Seria mais
sensato comparar, em primeiro lugar, as possíveis desvantagens e os
benefícios prometidos em cada caso. Embora as empresas relutem em
informar fracassos nos processos de terceirização, esses casos exis‑
tem. Em 2000, a Dun & Bradstreet informou que de 20% a 25% das
redes de terceirização em todas as áreas – inclusive produção, servi‑
ços financeiros, software e TI – fracassam em dois anos e 50% fracas‑
sam em cinco anos. Isso não reflete uma preferência por arranjos de
curto prazo na terceirização, porque a maioria das empresas apontou
ter enfrentado problemas reais. Entre as empresas que responderam
à pesquisa da Dun & Bradstreet, 70% se queixaram de falhas na
competência dos fornecedores, baixa qualidade do serviço ou custos
muito elevados.18

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Os seguintes problemas organizacionais têm surgido com frequência
na terceirização:

1. terceirização das atividades erradas, provocando a perda de habi‑


lidades e competências essenciais;

2. fornecedores não confiáveis;

3. contrato mal redigido;


276
4. moral do empregado abalada;
parte iii  novas formas de trabalho em rede

5. problemas de comunicação;

6. perda de controle sobre a atividade terceirizada;

7. pressão excessiva sobre os fornecedores;

8. fornecedores que exploram a dependência da organização.

1. Terceirização das atividades erradas. O primeiro problema re‑


sultante da terceirização de atividades erradas é a perda de habili‑
dades e competências centrais ou, pelo menos, a perda do controle
sobre elas. Enquanto desenvolvia seu PC, a IBM resolveu terceirizar a
produção de chips de microprocessador para a Intel e a operação de
software de sistemas para a Microsoft, acreditando que aceleraria a
introdução do novo produto no mercado. Olhando o passado, torna­
‑se evidente que a empresa abriu mão de uma posição dominante,
ao menos em potencial, em duas áreas centrais de sua competência.
Houve casos em que as empresas passaram a ter custos mais elevados
e uma perigosa dependência de fornecedores externos após a terceiri‑
zação de aplicações de TI muito próximas a seu core business – como
o sistema de reservas para uma locadora de automóveis.19 A Toyota
preferiu manter na empresa alguns processos como a estamparia, a
soldagem e a injeção de moldes, que lhe davam controle sobre o ajuste
e o acabamento de seus carros – pelos quais possui notável reputação
– ainda que alguns deles pudessem ter sido transferidos para outros
lugares a um custo mais baixo.
2. Falta de confiança com relação aos fornecedores. Os fornecedores
podem não se mostrar dignos de confiança. Em princípio, é possível a

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empresa manter muitos fornecedores, mas isso pode anular vantagens
tais como economia de escala, trabalho junto com o fornecedor em ino‑
vações técnicas no longo prazo e convencimento do fornecedor a com‑
prometer seus ativos com as exigências da empresa. Em alguns países,
como a Alemanha, que favorecem o relacionamento de negócios a longo
prazo, as empresas às vezes relutam em correr o risco de iniciar um re‑
lacionamento com um novo fornecedor, apesar das vantagens com rela‑
ção ao custo. Por exemplo, uma pequena empresa de TI em Bombaim
277
informou que as empresas alemãs "parecem relutar em experimentar um
novo relacionamento e certamente não o fazem com uma pequena em‑

Terceirização
presa indiana".20 Muitas das queixas expressas na pesquisa da Dun &
Bradstreet refletem experiências de problemas de confiança com relação
ao fornecedor.
3. Contrato mal redigido. Os contratos de terceirização às vezes são
imprecisos ou incompletos. Contratos incompletos, como são chamados
por alguns economistas, têm sido associados à confiança nos arranjos de
parceria entre cliente e fornecedor. Contudo, eles podem criar problemas
se, por exemplo, as tarifas forem fixadas com muita rigidez e se não hou‑
ver nenhuma cláusula especificando medidas objetivas dos serviços do
fornecedor. Os contratos também devem ter cláusulas de flexibilidade que
ajudem as duas partes a se ajustarem às mudanças no ambiente dos ne‑
gócios. Alguns contratos, por exemplo, se mostraram inadequados para
controlar a terceirização em momentos de grandes variações na demanda.
Foi esse problema que fez a Cisco Systems perder 2,25 bilhões de dólares
no segundo trimestre de 2001. As admiradas cadeias de fornecimento da
Cisco deveriam ter avisado sobre as iminentes reduções na demanda com
mais antecedência. O problema pode surgir quando os contratos de uma
empresa com os fornecedores não são suficientemente flexíveis para lidar
com certos imprevistos. Outras empresas já sofreram com a incapacida‑
de de fornecedores em responder a repentinos aumentos na demanda –
como a Sony, a Apple Computer, a Philips e a Compaq.
Na opinião de três autores da Booz­‑Allen, o problema não tem a ver
com os princípios da terceirização, mas com a forma com que tem sido
praticada. Eles concluem que as empresas mencionadas:

…haviam terceirizado sua fabricação de componentes essenciais sem


compreender plenamente as mudanças necessárias em seus modelos de

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negócios. As empresas não traduziram os velhos métodos bem­‑sucedidos
para novos relacionamentos de negócios. Não codificaram devidamente
as práticas e canais informais de comunicação de informações em sua ca‑
deia de fornecimento. Não alinharam os incentivos em termos e acordos
contratuais, o que tornou quase impossível para a cadeia de fornecedores
aumentar o fornecimento de um produto de sucesso ou reduzir em res‑
posta a uma queda na demanda.21
278
Persuadir os fornecedores a aceitar contratos mais flexíveis, que as‑
sinalam capacidade sem especificar exatamente o que deve ser fabricado,
parte iii  novas formas de trabalho em rede

pode ajudar a reduzir esse problema, mas apenas até certo ponto. A ter‑
ceirização de ativos atuais (na forma de estoque) e de ativos fixos para
fornecedores não elimina a necessidade de ter esses ativos disponíveis
para satisfazer mudanças imprevistas na demanda. Quando se espera que
os fornecedores assumam esse custo adicional, eles são obrigados a au‑
mentar os preços. Se o estoque é eliminado, em lugar de proteger a em‑
presa de repentinas oscilações na demanda, essa eliminação pode causar
mais estragos.22
4. Moral do empregado abalada. A terceirização pode causar séria des‑
moralização dos empregados, tanto entre aqueles cujas funções são tercei‑
rizadas como entre os que são mantidos na empresa. Se não for planejada
junto aos empregados, levando em conta seus interesses, a terceirização
pode despertar um temor semelhante ao que ocorre no downsizing. Podem
surgir boatos a respeito da segurança no emprego e a proposta de tercei‑
rizar ser interpretada como subestimação das habilidades e do valor dos
empregados. A consequência disso pode ser a saída dos empregados cujas
qualificações a empresa deseja manter. Esses efeitos negativos podem ser
evitados, de maneira geral, quando a organização mantém os empregados
essenciais. Uma organização deverá manter os empregados com experiência
e conhecimentos específicos, necessários para a interface junto ao vendedor
externo. Tal fato representa novas responsabilidades e oportunidades para
estes empregados. Em muitos casos, os empregados que são transferidos
para um fornecedor especializado preferem trabalhar para uma empresa
de fora, mas bem­‑sucedida, a trabalhar em uma unidade interna que tem
baixa prioridade ou, ainda, é vista como perto de fechar.23
5. Problemas de comunicação. Podem surgir problemas quando a
atividade terceirizada envolve ou depende da comunicação pessoal – o

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que é mais provável de acontecer quando as comunicações ocorrem entre
países diferentes e há diferenças linguísticas ou culturais. Alguns call cen‑
ters deixaram a Índia porque considerou­‑se que os empregados ali apre‑
sentavam um nível inferior de produtividade e serviço. A Dell e a Lehman
Brothers Holdings, por exemplo, levaram parte das funções de seus call
centers de volta para os Estados Unidos depois de queixas dos consu‑
midores e empregados. Em janeiro de 2004, o Shop Direct Group, uma
empresa de mala direta, anunciou que planejava fechar seu call center
279
indiano e repatriar as funções para o Reino Unido. Também apareceram
problemas com a terceirização de desenvolvimento de softwares, quan‑

Terceirização
do isso requer mais frequência de comunicação entre os programadores.
Por exemplo, a Valicert teve dificuldades quando, em 2001, começou a
substituir os engenheiros de software no Vale do Silício por equivalentes
na Índia, cuja remuneração era bastante inferior. Uma reportagem do
Wall Street Journal disse: "… os engenheiros indianos, que não conhe‑
ciam muito bem o software da Valicert ou como ele era usado, omitiram
aspectos que os norte­‑americanos consideravam intuitivos. Os programa‑
dores norte­‑americanos, acostumados a rápidas conversas por cima das
divisórias em suas estações de serviço, passaram meses escrevendo instru‑
ções detalhadas para as tarefas no estrangeiro, atrasando a finalização de
novos produtos".24 Depois, a empresa melhorou o problema entregando
projetos inteiros para sua equipe indiana, reduzindo, assim, a intensida‑
de de comunicação necessária e enviando especificações mais detalhadas
para cada tarefa.
6. Perda de controle. Há risco de se perder o controle sobre uma ati‑
vidade terceirizada. Confiar nas cláusulas de um contrato talvez não seja
suficiente para garantir que a atividade terceirizada esteja sob controle
para ser realizada satisfatoriamente. Por essa razão, recomenda­‑se que,
sempre que uma atividade for terceirizada, seja mantido um pequeno gru‑
po de gerentes internos para tratar do fornecedor externo. Terceirizar
uma atividade não é o mesmo que abdicar da responsabilidade admi‑
nistrativa sobre ela, o que é especialmente decisivo quando tal atividade
é um elemento central na cadeia de valor de um serviço essencial. Uma
falha pode ter influência negativa e uma mudança para um fornecedor
alternativo pode ser dispendiosa ou inviável.25
7. Pressão excessiva sobre os fornecedores. Esse problema pode surgir
quando grandes OEMs lutam por economias de custo na terceirização,

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a ponto de pressionar demais seus fornecedores. Podemos citar um caso
na indústria automobilística em que os OEMs são bem maiores do que
seus fornecedores e, por isso, têm mais poder de barganha. Nos Estados
Unidos, eles pressionaram tanto seus fornecedores que a capacidade de
investimento em inovação e qualidade e, em alguns casos, a sobrevivên‑
cia financeira dos fornecedores, têm sido ameaçadas. Na última metade
da década de 1990, o preço real dos carros nos Estados Unidos caiu em
aproximadamente 0,5% ao ano. A resposta dos OEMs foi pressionar os
280
fornecedores. A Ford, por exemplo, conseguiu reduções de preço de 3%
a 5% de muitos de seus fornecedores.26
parte iii  novas formas de trabalho em rede

8. Exploração pelos fornecedores. Esse problema, que é o contrário


da excessiva pressão sobre os fornecedores, pode surgir quando uma em‑
presa terceiriza para seu fornecedor ativos que somente podem ser objeto
de uma transação de longo prazo. Se em tal situação a empresa for inca‑
paz (ou simplesmente deixar) de especificar uma fórmula consensual pela
qual os imprevistos serão tratados – como, por exemplo, a reclamação de
um fornecedor de que os custos subiram além do esperado – a empresa
acaba tornando­‑se vulnerável, sendo obrigada a renegociar a favor do
fornecedor. Nessa situação, o fornecedor efetivamente prende a organi‑
zação em um relacionamento no qual a renegociação é muito onerosa, e
portanto, o fornecedor estará em posição de explorar a dependência de
seu cliente.

8.6 Como tomar uma decisão acerca da


terceirização
Diante das vantagens potenciais advindas da terceirização e dos pro‑
blemas que dela podem surgir, é indispensável que as empresas façam
uma cuidadosa avaliação antes de decidirem terceirizar qualquer ativida‑
de. Nem sempre ganhos de eficiência são obtidos com a transferência de
determinados processos para fornecedores. Às vezes eles podem ser obti‑
dos por meio de melhorias na própria empresa. Stephen Doig e seus co‑
laboradores da McKinsey and Company sugerem que, nessa avaliação, a
cúpula de uma empresa deve examinar três dimensões do desempenho:27

1. Estratégica: a propriedade ou o acesso preferencial a um ativo ou


atividade possui importância estratégica? O relacionamento direto

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com os clientes e a propriedade do design normalmente são ativos
essenciais que uma empresa não deveria terceirizar, uma vez que
permitem à empresa estar em dia com as exigências do mercado e
manter uma liderança tecnológica, que pode ser importante para
eles. A Dell, por exemplo, preferiu manter essas duas atividades
internamente, enquanto sua cadeia de valor é virtual e terceirizada.

2. Operacional: aqui, a questão primordial diz respeito à otimização


dos arranjos produtivos e da cadeia de fornecimento para alcançar as 281
metas de desempenho, o que se resume a fatores como prazos, custos

Terceirização
unitários e facilidade de integração entre as diferentes etapas de opera‑
ção de uma empresa. Uma cadeia de fornecimento deve ser configura‑
da de modo que dê apoio a toda a estratégia de uma organização.

3. Organizacional: a terceirização implica em uma mudança organi‑


zacional. Unidades ou departamentos são eliminados, processos
de controle e coordenação são alterados. A questão, portanto, é
saber se empresa tem capacidade de realizar tais mudanças, espe‑
cialmente se esteve funcionando de determinada maneira por um
longo período. Doig e seus colaboradores advertem: "Empresas
há muito estabelecidas, quer administrem redes reconfiguradas
ou trabalhem com redes internas muito antigas, raramente têm a
capacidade de transformar suas cadeias de fornecimento".28 (Veja
o Capítulo 12 para discussão mais detalhada sobre a gestão para a
mudança organizacional.)

A Tabela 8.2 resume os fatores que pesam na balança quando se


considera as possibilidades de manter uma atividade ou processo interna‑
mente ou então de terceirizá­‑los.

Tabela 8.2  Os processos devem ser mantidos na empresa ou


terceirizados?

Existe a possibilidade de terceirizar


Há fundamento em manter na
um processo quando um fornecedor
espera qualquer processo que:
externo oferece:
Possa responder ou superar as normas Economia importante de custo com mão de
de desempenho do setor no prazo de obra e insumos mais baratos, menor inten‑
três anos sidade de capital ou escala de produção

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Represente uma vantagem competiti‑ Boa localização, tecnologia de processo
va única, que não pode ser copiada ou um conjunto de habilidades que seria
difícil de adquirir ou reproduzir
Não esteja disponível externamente e Mais capacidade de produção base mais
provavelmente não estará disponível diversificada para responder à demanda
no curto prazo do usuário final, o que ajudaria a reduzir
a escassez ou o excesso de fornecimento
282 Defina o caráter único de uma empre‑ Potencial para compartilhar o conheci‑
sa em seu mercado mento adquirido em outros mercados ou
setores
parte iii  novas formas de trabalho em rede

Fonte: Adaptado de DOIG, Stephen J.; RITTER, Ronald C.; SPECKHALS, Kurt; WOOLSON, Daniel.
Has outsourcing gone too far? McKinsey Quarterly (4), p. 34­‑35, 2001.

8.7 Criação de parcerias bem­‑sucedidas na


terceirização29
Os arranjos para a terceirização parecem ter aproximadamente o
mesmo índice de fracassos que outro tipo de parceria: as joint ventures.
Cerca de 50% de todos os arranjos de terceirização fracassam em cinco
anos. As questões inerentes a esses arranjos são equilíbrio e distribuição
dos benefícios entre as partes interessadas. Se a organização concluir que
a terceirização é desejável, ela deverá, então, considerar as sete áreas pro‑
blemáticas já identificadas e como lidar da melhor maneira com essas
questões, caso apareçam.
De sua análise sobre o sucesso e fracasso da terceirização, a Dun &
Bradstreet concluiu que as empresas precisam adotar uma metodologia
que consiste de quatro elementos:

1. Saber o que quer – estabelecer objetivos precisos e mensuráveis


para o processo de terceirização.

2. Determinar como a terceirização ajudará – refere­‑se ao estabele‑


cimento de quais melhorias devem ser feitas no core business da
empresa como resultado de uma concentração em suas capacida‑
des essenciais. É preciso determinar um ganho mensurável para
o core business como resultado da terceirização. Por exemplo, o

Book_Organizaçoes.indb 282 16/9/2011 16:23:41


objetivo pode ser o de usar o dinheiro economizado para aumen‑
tar em 5% a fidelização de clientes, reduzindo o tempo de resposta
às suas dúvidas.

3. Mensurar – a Dun & Bradstreet sugere criar um scorecard para


quantificar cada objetivo que se espera alcançar com a terceirização.

4. Compartilhamento – é necessário estabelecer avaliações periódicas


com os empregados­‑chave internos e o parceiro de terceirização,
a fim de avaliar se tudo está correndo bem e se os objetivos estão 283

sendo alcançados ou não.

Terceirização
Resumo
1. A terceirização tornou­‑se uma característica importante da reestrutu‑
ração organizacional e seu uso continua a se expandir rapidamente.

2. A globalização incentiva a terceirização devido às pressões resul‑


tantes da competição por custos. Ao mesmo tempo, a liberalização
do comércio e o desenvolvimento das tecnologias de informação e co‑
municação simplificaram, em muito, a terceirização em uma escala
global.

3. Há duas categorias importantes da terceirização na fabricação e na


prestação de serviços: (1) a terceirização de operações nas cadeias de va‑
lor centrais e (2) a terceirização de atividades de apoio.

4. A terceirização oferece, ao menos em princípio, uma série de vanta‑


gens. Entre elas, podemos citar a possibilidade de as empresas se concen‑
trarem no que fazem melhor, permitindo a contratação dos especialistas
para a relização das outras atividades, além de poupá­‑las de problemas
operacionais. Além de oferecer mais economia em relação aos custos, a
terceirização pode facilitar políticas de downsizing e a eliminação de ní‑
veis hierárquicos. A perspectiva da terceirização também pode fortalecer
o controle gerencial.

5. Ao mesmo tempo, há provas de que, por vezes, a terceirização falha.


Podem surgir problemas com a terceirização de atividades erradas, con‑
tratos incompletos, controle inadequado da atividade terceirizada, em‑
pregados com moral baixo, falhas na comunicação e dificuldades com
fornecedores e vendedores.

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6. As decisões relativas à terceirização devem, portanto, ser tomadas
após uma análise cuidadosa. O dilema entre terceirizar um processo ou
mantê­‑lo na empresa pode ser analisado com base em uma série de crité‑
rios. Da mesma forma, há uma série de etapas para o estabelecimento de
uma parceria bem­‑sucedida na terceirização.

Questões para discussão


284
1. Defina "terceirização" e "offshoring", e discuta exemplos desses dois
conceitos.
parte iii  novas formas de trabalho em rede

2. Qual é a relação entre globalização e terceirização?

3. Como a terceirização influencia a estrutura organizacional?

4. Descreva e discuta as principais vantagens da terceirização.

5. Descreva e discuta as principais desvantagens da terceirização.

6. O que uma empresa deve levar em conta ao pensar em terceirizar­‑se?

Notas
1. CORBETT, Michael F. Outsourcing's next wave. Disponível em: <http: www.
corbettassociates.com/firmbuilder/articles/19/48/752/>. Acesso em 2002.

2. D&B Barometer of Global Outsourcing. Disponível em: <http://www.dnb.


com>. Acesso em 2000.

3. The new global job shift. Business Week, 3 fev. 2003, p. 36­‑48; Special report:
software. Will outsourcing hurt America's supremacy? p. 52­‑60, 1 mar. 2004.

4. Esta informação foi extraída de DOIG, Stephen J.; RITTER Ronald C.; SPE‑
CKHALS, Kurt; WOOLSON, Daniel. Has outsourcing gone too far? McKinsey
Quarterly (4), p. 25­‑37, 2001.

5. Business Week, p. 40­‑41, 3 fev. 2003.

Book_Organizaçoes.indb 284 16/9/2011 16:23:41


6. Metrics, 27 fev. 2004. Disponível em: <http://www2.cio.com/metrics/2004/me‑
tric667text.html>.

7. SMITH, David. Job takeaway is good for you. Sunday Times, p. 3­‑4, 1 fev. 2004.

8. ECollaboration: how supply chains will drive the new economy. London: Ac‑
centure; Management Today, 2001.

9. Special report: software. Will outsourcing hurt America's supremacy? Business


Week, 1 mar. p. 52­‑60, 2004.
285

10. The exodus in manufacturing and services. Sunday Times, p. 3.5, 8 jun. 2003.

Terceirização
11. UNCTAD. Promoting linkages. World Investment Report. New York: United
Nations, 2001.

12. Veja HAMEL, Gary; PRAHALAD, C. K. Competing for the future. Boston:
Harvard Business School Press, 2001.

13. HÄCKI, Remo; LIGHTON, Julian. The future of the networked company.
McKinsey Quarterly (3), p. 26­‑39, 2001.

14. SLATER, Joanna. GE reinvents itself in India. Wall Street Journal Europe, p.
A6, 25 mar. 2003.

15. WAPLES, John; ARMITSTEAD, Louise. Banks prepare to shift 200,000 jobs to
India. Sunday Times, p. 3.1, 8 jun. 2003.

16. COHEN, Norma. Abbey Nat in U­‑turn on services side. Financial Times, 2 nov.
p. 28, 2001.

17. Outros exemplos são discutidos em DAHGREN, Bo Göran; HANSSON, Jör‑


gen; OLVE, Nils­‑Göran. Virtual organizations and beyond. Chichester: John
Wiley & Sons, 1997.

18. DOIG et al., 2001, op. cit. p. 27.

19. BARTHÉLEMY, Jérôme. The seven deadly sins of outsourcing. Academy of


Management Executive. 17(2), p. 87­‑98, 2003.

20. MERCHANT, Khozem. Software companies look beyond traditional borders.


Financial Times (Pesquisa sobre a terceirização indiana), p. 22­‑23, out. 2001.

21. LAKENAN, Bill; BOYD, Darren; FREY, Ed. Why Cisco fell: outsourcing and
its perils. Strategy and Business, 2001. Disponível em: <http://www.strategy­
‑business.com/01306/pag1.html>.

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22. MARTIN, Peter. The limits of outsourcing. Financial Times, p. 14, 25 set. 2001.

23. BARTHÉLEMY, 2003, op. cit. p. 91­‑92.

24. THURM, Scott. How US software firm fixed bugs in system of outsourcing to
India. Wall Street Journal Europe, p. A1­‑A6, 3 mar. 2004

25. BARTHÉLEMY, 2003, op. cit. p. 92.

286 26. DOIG et al., 2001, op. cit. p. 28­‑29.

27. DOIG et al., 2001, op. cit. p. 32.


parte iii  novas formas de trabalho em rede

28. DOIG et al., 2001, op. cit. p. 32.

29. Esta seção se baseia em D&B Barometer of Global Outsourcing, 2000.

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Capítulo 9
Organização virtual

Conteúdo do capítulo
As definições e descrições da organização virtual variam bastante, e este
capítulo começa identificando os aspectos que são comuns a essa nova forma
organizacional. Depois, examina os benefícios que a organização virtual
promete. São necessárias certas condições para a obtenção desses benefícios e
para que uma organização virtual se torne viável. Suas limitações também são
consideradas. Em seguida, o capítulo aborda três questões a respeito do uso da
organização virtual: quando ela é preferível em vez das formas convencionais
de organização; se deve ser administrada de maneira diferente; como pode
ser aplicada ao trabalho de equipe. O capítulo termina com um exame da Dell
Computer Corporation, exemplo de organização virtual de sucesso global.

9.1 O que é uma organização virtual?


Uma organização virtual existe em um espaço que não é limitado
pelas estruturas jurídicas e físicas que definem uma organização conven‑
cional. Segundo Malcolm Warner e Morgen Witzel, em seu livro ino‑
vador sobre o tema, as organização virtuais "usam constructos mentais
e tecnológicos para representar certos aspectos da organização que, em
organizações mais convencionais, têm existência física".1
Bo Hedberg e seus colaboradores descrevem as organizações virtuais
em termos do constructo mental do "sistema imaginário" que atravessa

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e transcende as fronteiras tradicionais definidas por identidades jurídicas
legais, sistemas de contabilidade, quadros de organização e bens físicos.
Essa perspectiva revela "novos empreendimentos que podem utilizar a
imaginação, a tecnologia da informação, alianças e outras redes para or‑
ganizar e sustentar uma atividade que transcende fronteiras".2 Warner e
Witzel fazem eco à ideia de que a virtualidade envolve um salto mental
que permite uma forma fluida e que transcende os limites da atividade
coletiva:
288
Nas organizações virtuais, as realidades físicas sólidas do tijolo e da ar‑
parte iii  novas formas de trabalho em rede

gamassa, de escritórios e fábricas, de colaboradores e clientes que se en‑


contram cara a cara, são, até certo ponto – às vezes até um ponto bem
extremo –, dissolvidas e substituídas por formas virtuais. Os tijolos sólidos
se tornam redes finíssimas. Em vez de organizações que nos encerram
e nos envolvem, somos parte de uma organização que é fluida, flexível,
em grande parte invisível, que passa a existir com um simples esforço
mental de nossa parte. No espaço virtual, damos menos ênfase a nossos
cinco sentidos físicos e muito mais à nossa imaginação e conhecimento
interior.3

As novas formas de tecnologia são consideradas os facilitadores mais


significativos da organização virtual. Na verdade, uma definição diz que
a organização virtual é um repertório de módulos de conexão bastante
variável, inserido em uma rede de informação eletrônica. No entanto, é
possível ter atividade organizada a partir de módulos ou grupos flexivel‑
mente conectados sem a ajuda da moderna tecnologia da comunicação
e informação (TIC). O modo de organização de clã se aproxima dessa
descrição e funcionou em sociedades como a China e o sul da Itália por
muitos séculos. Não obstante, a TIC abriu um vasto leque de novas possi‑
bilidades e estendeu a potencial abrangência da organização virtual para
o nível global.
Algumas expressões costumam ser usadas para identificar a organi‑
zação virtual: ausência de estrutura física, base na informática, fluidez e
mobilidade, transcendência das fronteiras convencionais, redes e flexibili‑
dade. As definições da organização virtual tendem a enfatizar uma ou mais
dessas características, e variam consideravelmente. Algumas destacam o
papel da TIC, considerando a organização virtual uma organizadora de
informações e tecnologia, não de pessoas. Outras destacam aspectos da

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rede, aplicando a ideia da virtualidade a redes e parcerias entre indivíduos
ou empresas que se juntam para realizar uma tarefa ou fazer um produto.
Michael Dell, por exemplo, define a "integração virtual" como "a ideia
de entrelaçar distintas empresas de modo que nossos parceiros sejam tra‑
tados como se estivessem dentro da nossa companhia".4 Outra variante é
a ideia de reunir forças de trabalho flexíveis para realizar algo necessário
e depois dispersá­‑las. Em todos esses aspectos, a organização virtual é
vista como uma tentativa de evitar hierarquias e fronteiras rígidas que,
289
em geral, caracterizam as organizações convencionais.
A organização virtual amplia a ideia da organização em rede a um

Organização virtual
nível superior. Enquanto organizações que são parte de uma rede ainda
podem se apresentar como distintas entidades em relação ao ambiente
externo, a organização virtual é vista de fora como uma entidade úni‑
ca, na qual as companhias que são seus membros atuam de modo bem
mais coordenado. Para obter essa coordenação, é preciso uma rede alta‑
mente desenvolvida, que normalmente utiliza a informática. A confiança
mútua baseada na aceitação das metas comuns de negócios também é
necessária.
Diante dessa vastidão de interpretações, Warner e Witzel sugerem
que vale a pena observar os aspectos que praticamente todas as organi‑
zações virtuais têm em comum. No Quadro 9.1 está um resumo desses
aspectos.

9.2 Formas de organização virtual


É importante reconhecer que podem existir graus diferentes e diver‑
sas formas de virtualidade na organização. Cada organização tem alguma
espécie de virtualidade, porque ela não pode se basear apenas em bens
tangíveis e rotinas formais. Ela também depende do conhecimento e da
experiência inerente a seu pessoal e da comunicação informal de uns com
os outros. Nos capítulos anteriores já vimos como essas características
e, em especial, a flexibilidade e a inovação, se tornaram cada vez mais
importantes nas atuais condições competitivas.
Algumas empresas organizam virtualmente certas atividades e ou‑
tras de maneira convencional. Por exemplo, as operações em supermer‑
cados são físicas e tangíveis. Ao contrário, suas ligações com muitos
fornecedores costumam ser virtuais, utilizando sistemas automatizados
de renovação de pedidos. Além disso, programadores especializados

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Quadro 9.1  Aspectos comuns das organizações virtuais

„„ Ausência de estrutura física: as organizações virtuais têm presença físi‑


ca menos intensa que as convencionais. Elas têm menos bens tangíveis,
como prédios de escritórios e almoxarifados, e as que têm estão em ge‑
ral geograficamente dispersas. Já foi dito que no futuro as empresas se‑
rão estruturadas em formatos virtuais, com programas de computador
assumindo o lugar da infraestrutura física, e que existirão somente no
290 ciberespaço.
„„ Baseada na tecnologia das comunicações: a TIC moderna tem papel es‑
parte iii  novas formas de trabalho em rede

sencial na existência da organização virtual; muitos a consideram sua


parte vital. Enquanto as organizações convencionais baseiam­‑se em es‑
truturas físicas, as organizações virtuais usam redes de comunicação
com o suporte da internet e de outros sistemas. Contudo, é importante
lembrar que a tecnologia é apenas um recurso para a organização virtual
e não a organização em si.
„„ Mobilidade no trabalho: o uso das redes de comunicações em vez de
prédios e bens tangíveis significa que hoje é menos importante onde o
trabalho está fisicamente localizado; por isso, departamentos e equipes
já não precisam manter contato tão estreito uns aos outros. As equipes
de projeto podem reunir pessoas em diferentes países ou diferentes con‑
tinentes para trabalharem juntas sem jamais terem qualquer contato fí‑
sico – em alguns setores, como o editorial, isso já é rotina.
„„ Formas híbridas: como as organizações virtuais geralmente envolvem
colaboração entre indivíduos ou empresas, elas têm sido chamadas de
híbridas – redes ou consórcios trabalhando juntos em uma estrutura
livre para atingir um objetivo comum. Essas formas híbridas podem ser
temporárias, como os consórcios que reúnem participantes para em‑
preenderem pesquisa e desenvolvimento de projetos arriscados, ou de
prazo mais longo, como as cadeias virtuais de abastecimento.
„„ Sem fronteiras e abrangentes: Essa característica está associada à ma‑
neira como as organizações virtuais não estão confinadas a entidades
jurídicas. Elas podem abranger fornecedores e distribuidores que traba‑
lham em estreitos relacionamentos com produtores, e trazer os clientes
para o processo da produção por meio do conceito de marketing de re‑
lacionamento. Serviços financeiros on­‑line são exemplos altamente de‑
senvolvidos deste último fenômeno.

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„„ Flexíveis e capazes de boas reações: as organizações virtuais em princí‑
pio são responsivas e flexíveis. Devem ser capazes de juntar elementos
dispersos rapidamente, que são utilizados para alcançar determinada
meta empresarial e depois desmontados. Na prática, as organizações
virtuais dependerão das pessoas envolvidas: se conseguem negociar
satisfatória e rapidamente os arranjos e se gestores e empregados es‑
tão dispostos a trabalhar com flexibilidade.
291
Fonte: WARNER, Malcolm; WITZEL, Morgen. Managing in virtual organizations, London:

Organização virtual
Thompson, 2004. Capítulo 1.

trabalham de sua própria casa na manutenção dos softwares desses e


de outros sistemas. No entanto, pouquíssimas empresas são capazes de
virtualidade completa em todas as suas atividades. Elas mantêm alguma
conexão física com seus clientes e/ou também produzem bens tangíveis.
A exata mistura de aspectos virtuais e tangíveis em uma organização
dependerá da natureza de seus produtos ou serviços, e da maneira como
essa mistura adiciona valor às necessidades. Aqui vale a pena fazer a dis‑
tinção entre a mistura de bens organizacionais tangíveis e virtuais e até
que ponto eles podem ser administrados dessa maneira.
Uma organização amplamente virtual existe quando tanto seus ativos
quanto sistemas administrativos são altamente virtuais. Muitas empresas
de serviços financeiros entram nessa categoria. Elas comercializam uma
commodity em grande parte virtual – moedas e instrumentos financei‑
ros – em redes esparsas de escritórios pelo mundo afora, administrando
as transações por meio de diversas tecnologias de comunicação. Outros
casos ilustram a administração não virtual de bens virtuais, como, por
exemplo, nos setores do conhecimento, em que a propriedade intelectual
é criada ou tratada por equipes de projeto, equipes de ensino e editoras.
Sempre há potencial para que esses ativos virtuais sejam administrados e
coordenados virtualmente. Há um interesse crescente no uso de equipes
virtuais globais para a pesquisa e desenvolvimento.
Outra forma em que os ativos e a gestão são altamente virtuais é
encontrada nas empresas que levam a terceirização ao limite. Quando
a empresa terceiriza todas as atividades de sua cadeia de valor – com

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exceção de seu núcleo estratégico – e as coordena de modo virtual, ela
pode ser grande em termos comerciais, mas pequena em termos de ativos
fixos e pessoal permanente. No capítulo anterior mencionamos a Topsy
Yail, empresa de acessórios de moda que, em 1998, tinha rendimentos
de aproximadamente 80 milhões de dólares, mas apenas três emprega‑
dos. A empresa jamais toca em seus produtos ao longo de toda a cadeia
de produção. Ela contrata diferentes empresas para a criação de moldes
para a fabricação de seus artigos, usa agências de design para criar sua
292
embalagem, distribui e vende seus produtos por uma rede de atacadistas,
distribuidores e representantes de vendas independentes.5
parte iii  novas formas de trabalho em rede

Tradicionalmente, a administração de ativos tangíveis é não virtual e


usa a forma convencional de organização, em que a maioria dos ativos e
do pessoal estão fisicamente concentrados em fábricas e escritórios, ad‑
ministrados por meio de hierarquias. Como exemplos, temos as linhas
de produção e as fábricas de processos integrados, como as indústrias
de vidro, aço e papel. Por motivos técnicos é difícil contemplar qualquer
outra coisa que não seja uma administração e configuração não virtual
do processo de produção integrada, a menos que esses processos sejam ou
venham a ser completamente automatizados.
Os ativos tangíveis podem ser parcialmente administrados de manei‑
ra virtual quando a cadeia de valor – a sequência de produção e monta‑
gem, ou as etapas envolvidas na oferta de um serviço – pode ser separada
em etapas. Cadeias globais de fornecimento virtual, comuns nas indús‑
trias automotivas e de computadores, entram nessa categoria. A Dell é
um caso exemplar de cadeia de valor virtual em rede de extraordinário
sucesso. "Os microprocessadores e outros semicondutores podem passar
por quatro ou cinco diferentes fábricas – em geral em diferentes países
– ao longo da cadeia de valor. As plantas de produção física são con‑
troladas 'virtualmente' a partir da corporação ou da sede da cadeia de
fornecimento".6

9.3 Potenciais benefícios da organização virtual


A operação da organização virtual é imensamente facilitada pelo desen‑
volvimento da TIC, mas temos de examinar outros fatores que estimulam
os gestores a adotá­‑la. Os benefícios que a organização virtual prometem
se tornam os motivos primordiais para sua adoção diante do novo ambien‑
te competitivo e das pressões a que estão sujeitas. Devemos usar termos

Book_Organizaçoes.indb 292 16/9/2011 16:23:42


como "promessa" e "potencial" associados a esses benefícios, porque a
organização virtual é um fato complexo que precisa ser implementado com
imenso cuidado, não um remédio automático para o sucesso.
Os potenciais benefícios da organização virtual decorrem da:

1. boa coordenação entre as fronteiras do tempo e do espaço;

2. redução dos custos pela eliminação de transações intermediárias;

3. combinação mais flexível de atividades; 293

Organização virtual
4. simplificação da administração.

O uso de sistemas informatizados abre portas para a coordenação


eficiente entre fronteiras de tempo e espaço. Sistemas de e­‑mail superam a
necessidade de sincronizar a comunicação por zonas de tempo e de dispo‑
nibilidade imediata da outra parte, como acontece com as comunicações
telefônicas. Além do mais, eles superam prontamente as limitações do
espaço geográfico, permitindo a distribuição simultânea da informação
por meio de uma rede de destinatários em locações dispersas. Outros
sistemas, como a videoconferência, eliminam a distância espacial criando
a virtualidade de um espaço único entre pessoas que estão a distâncias
consideráveis. É possível reunir pessoas localizadas a milhares de quilô‑
metros entre si, e também prestar serviços, como a educação, de modo
simultâneo e interativo a grupos em diferentes locais. Serviços financeiros
on­‑line reduzem os custos unitários dos bancos além de estarem pronta‑
mente disponíveis fora do horário comercial.
Tal aspecto da virtualidade evidentemente proporciona enormes be‑
nefícios para a organização de atividades relacionadas entre distâncias
físicas, como pode acontecer com uma cadeia de fornecimento virtual.
As economias de tempo, de custos, de viagens e assim por diante são
imensas. Portanto, a organização em modo virtual oferece uma resposta
construtiva às exigências de coordenação e controle que surgem com a
tendência de formação de redes de negócios em escalas globais.
Um benefício da organização virtual é reduzir os custos ao eliminar
as transações intermediárias. Nos modos convencionais de organização,
as imperfeições inerentes às transações intermediadas, por exemplo, pelo
pessoal que anota pedidos de consumidores ou de visita da assistência
técnica, geram custos pelo tempo de espera devido à distância física e

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organizacional entre as partes que negociam. Os componentes e as partes
aguardam em estoque ou é preciso esperar até que o pessoal da assistên‑
cia técnica esteja livre. Em uma transação virtual, é possível reduzir bas‑
tante e até eliminar tempos de espera como esses, bem como os custos da
intervenção administrativa. Os pedidos podem ser feitos automaticamen‑
te por formulários eletrônicos, orientados por um sistema de verificação
do estoque e reformulação do pedido. Recomendações técnicas muitas
vezes podem ser dadas rapidamente com uma representação eletrônica de
294
parâmetros do problema, ou aplicando­‑se um sistema especializado, ou
por meio de comunicação eletrônica com pessoal técnico que trabalha em
parte iii  novas formas de trabalho em rede

outro local – podendo ser até a casa deles. Os gerentes não precisam gas‑
tar tempo arranjando essas transações porque seu trabalho de avaliação
e supervisão foi efetivamente eliminado.
Outro conjunto de benefícios potenciais da organização virtual
emana da maneira como ela permite uma combinação mais flexível de
atividades para formar uma cadeia de valor. Ao proporcionar um meio
alternativo de administrar atividades ligadas entre si para colocá­‑las sob
uma estrutura hierárquica e unificada, a organização virtual permite a
desagregação coordenada dessas atividades, muitas vezes espalhadas en‑
tre empresas diferentes. Com os modos virtuais de administração, é bem
mais fácil separar etapas de produção e outras atividades na cadeia de
valor, mantendo, ao mesmo tempo, a boa coordenação dessas atividades.
A comunicação veloz da informação por meio de protocolos comuns em
um sistema virtual permite que atividades desagregadas sejam recombi‑
nadas de diversas formas a fim de corresponder às necessidades de uma
situação específica. A organização virtual promete benefícios econômicos
consideráveis:

1. Permite que a empresa se concentre nas atividades em que tem


vantagem relativa com base em suas competências mais importan‑
tes e/ou localização específica. A empresa pode, então, se concen‑
trar em aperfeiçoar sua vantagem principal para manter a posição
competitiva.

2. Da mesma forma, a empresa pode selecionar os melhores parcei‑


ros para se juntar a eles formando uma cadeia de valor completa.
Os parceiros também se beneficiam ao se concentrarem em suas
competências mais importantes.

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3. As parcerias em uma rede estão ligadas umas às outras por contra‑
tos sujeitos a revisão periódica para alterar ou incluir cláusulas
referentes a imprevistos. Esses arranjos permitem mais flexibilida‑
de na adaptação às mudanças na demanda do mercado compara‑
tivamente a um modo de organização em que todas as atividades
estão integradas em uma única empresa. Se há um ajuste por
causa de uma retração no mercado, uma rede virtual facilita a
dispensa de atividades que já não são mais necessárias; se for para
295
aproveitar oportunidades, a comercialização de novos produtos

Organização virtual
pode ser resolvida com o acréscimo de novos parceiros à rede.

4. Quando reduz seu pessoal a um pequeno grupo central e cria uma


organização virtual que se encarrega de outras atividades da cadeia
de valor, a empresa pode usar arranjos flexíveis de emprego, permi‑
tindo expandir ou contrair a força de trabalho conforme necessário.
Esse tipo de arranjo não é novo nem está limitado a organizações
virtuais; entretanto, a virtualidade permite um grau a mais de "liber‑
dade", permitindo mais flexibilidade no ajuste das funções do que
na organização convencional. Vinculações mais ‘soltas’ surgem com
a dispersão espacial das unidades de trabalho e arranjos de emprego
flexível, como o contrato de trabalho a ser cumprido em casa.

5. O uso das redes de comunicação em vez de uma concentração


física de pessoas e equipamentos abre opções no local do traba‑
lho. As pessoas e suas atividades agora podem se estabelecer em
locais de custo mais baixo, que é uma das principais razões pela
qual a terceirização se tornou tão atraente para as empresas. Até
mesmo o pessoal que trabalha nos escritórios centrais não preci‑
sa estar localizado em escritórios centrais: muitos podem traba‑
lhar em casa ou em sua comunidade local. Isso reduz os custos de
modo impressionante: por exemplo, o custo direto per capita do
trabalho feito em casa pode ficar abaixo de um terço do custo do
trabalho em um escritório no centro da cidade.

Alguns dos benefícios potenciais oferecidos pela organização virtual


estão associados à redução da necessidade de intervenção gerencial. Em
parte por causa da automatização de grande parte do processamento da
informação com base em protocolos compartilhado, e em parte porque

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facilita as comunicações diretas entre os membros da rede, a organização
virtual permite transferir iniciativas, o que poupa tempo e esforço da
administração. Em consequência, o uso da virtualidade deveria permitir
uma simplificação na administração e a correspondente redução em cus‑
tos administrativos diretos.
Ao oferecer esses benefícios potenciais, a organização virtual respon‑
de às necessidades que a maioria das empresas enfrenta em virtude das
mudanças em seu ambiente competitivo. As empresas estão sob pressão
296
para oferecer mais valor e, ao mesmo tempo, custos menores. A organi‑
zação virtual promete reduzir os custos de muitas maneiras, oferecendo
parte iii  novas formas de trabalho em rede

pelo menos uma maneira viável de terceirizar para empresas com custos
menores. As empresas também precisam preservar sua vantagem compe‑
titiva. A flexibilidade oferecida pela organização virtual deveria contri‑
buir para a rapidez da reação.
A organização virtual também pode beneficiar as pequenas empresas
combinando suas vantagens com as vantagens das grandes. Empresas in‑
dependentes porém estreitamente associadas podem colaborar em uma
organização virtual para alcançar metas comuns de maneira eficiente. Seu
tamanho relativamente pequeno as ajuda a serem mais inovadoras e a re‑
agirem depressa às mudanças das demandas do mercado. Por outro lado,
sua combinação em uma organização virtual permite que elas funcionem
como uma grande empresa e se beneficiem do poder de mercado.

9.4 Condições para a viabilidade de uma


organização virtual
Certas condições são necessárias para que um conjunto potencial‑
mente benéfico de ligações entre pessoas e unidades se transforme em
uma organização virtual viável. Antes de mais nada, e como qualquer
outra, a organização virtual requer gestão. Warner e Witzel dizem que
quatro tarefas administrativas têm mais importância em uma organi‑
zação virtual: comunicação, avaliação, aprendizado e valorização.7
Administrar a comunicação apresenta dificuldade especial no plane‑
jamento, coordenação e controle de atividades que já não estão mais
reunidas sob um mesmo teto. Isso significa que é preciso assegurar que
os fluxos de informação e conhecimento sejam eficientes, pertinentes e
oportunos, de modo a facilitar as ligações entre os diversos elementos

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da organização, assim como com fornecedores e clientes. Em segundo
lugar, como uma organização virtual é composta de várias unidades pra‑
ticamente independentes, é necessário fazer avaliações frequentes para
saber se estão correspondendo às metas da organização e como devem
se vincular umas às outras. Como a forma e a estrutura de uma orga‑
nização virtual são bastante flexíveis, ela precisa de avaliações e ajustes
periódicos. Em terceiro lugar, uma organização virtual costuma se ba‑
sear no que Max Boisot chamou de "ativos do conhecimento", em vez
297
de bens físicos tangíveis.8 Essa reserva de ativos do conhecimento exige
constante renovação mediante atividades como treinamento, educação,

Organização virtual
pesquisa, desenvolvimento e busca de novo e relevante conhecimento
no ambiente. Quarto, é preciso haver avaliação frequente do valor dos
ativos do conhecimento. Quanto mais a virtualidade for considerada
uma maneira de adquirir flexibilidade em função da mudança das exi‑
gências de consumidores ou clientes, mais frequente será a contribuição
de diferentes pessoas e unidades no sistema virtual e, sendo assim, esse
conhecimento precisa ser reavaliado.
A importância da gestão em uma organização virtual decorre do fato
de ela exigir direção estratégica e operacional. No nível operacional, é
necessário reunir um conjunto de participantes competentes da cadeia
de valor que entregue a produção no tempo certo e conforme as especifi‑
cações. Esse é, por assim dizer, o sistema nervoso central da organização
virtual, que por sua vez provê comunicação e processos para assegurar
os necessários padrões de qualidade, prazo de entrega e assim por diante.
Ter um sistema como esse é evidentemente uma condição necessária, mas
não suficiente, porque a organização virtual também precisa de orienta‑
ção estratégica. Precisa de um cérebro e de um sistema nervoso central.
O cérebro é o centro que dá a orientação estratégica e faz as escolhas
difíceis, conforme uma visão condizente: ele sabe quem acrescentar à rede
e quem deve ser dispensado dela.
Na prática, uma organização virtual provavelmente será liderada, ou
até dominada, por uma empresa que é seu centro, dona de um nome que
é uma marca de qualidade e com apelo no mercado. Essa empresa líder
também serve de "comandante" dos sistemas centrais de informação,
assumindo a responsabilidade pelo planejamento e manutenção de um
padrão de informação comum em toda a rede virtual. Isso se aplica tanto
aos sistemas administrativos, como a contabilidade, quanto aos sistemas
técnicos. Com relação a esses últimos, é essencial que um padrão comum

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seja adotado quando o trabalho realizado em diferentes etapas da cadeia
de valor, como o projeto, o desenvolvimento, a engenharia de produção,
a montagem dos componentes e dos sistemas de software, são interliga‑
dos segundo especificações técnicas muito precisas.

9.5 Limitações da organização virtual


Há preocupações sobre as limitações da organização virtual, espe‑
298
cialmente com relação à sua capacidade de estimular o aprendizado e
a inovação, e à vulnerabilidade que pode surgir com a dependência de
parte iii  novas formas de trabalho em rede

parceiros.
Ao contrário das alianças estratégicas entre empresas diferentes,
muitas das quais esperam transferir conhecimento ou gerar aprendi‑
zado organizacional, o aprendizado não é um objetivo fundamental
da organização virtual. Ou melhor, sua principal intenção é criar uma
organização flexível de empresas permitindo que cada uma se especia‑
lize em sua área de excelência e forneça um produto competitivo ao
cliente. Assim, uma limitação da organização virtual é a capacidade
de promover o aprendizado e a inovação somente nos limites de cada
empresa na rede.
Pode ser difícil inovar de forma sistêmica com grandes fundos de
P&D para projetos estreitamente integrados em uma organização virtu‑
al, porque investimentos como esse requerem estabilidade nas relações
entre os parceiros por um certo período de anos. A natureza essencial‑
mente flexível da organização virtual vai contra a estabilidade ou pelo
menos apresenta um alto risco de a estabilidade não durar muito tempo.
O problema pode ser evitado se a empresa principal em uma rede virtual
se encarregar da pesquisa e desenvolvimento. Se o produto em questão
abrange unidades relativamente separadas que podem ser montadas em
diferentes configurações, como acontece com o microprocessador, drives
de disco, monitor, teclado e alto­‑falantes em um sistema de computador
pessoal, a responsabilidade pela inovação nessas unidades componentes
pode ser em grande parte deixada para os produtores. Nessa situação, o
relacionamento virtual entre eles e a empresa mais importante no projeto
e montagem do PC pode não ser problemática.
Outra limitação da organização virtual está em sua capacidade res‑
trita de transmitir e compartilhar o conhecimento tácito, que é pessoal e

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não muito explícito.9 A organização virtual se caracteriza por relaciona‑
mentos distantes, embora a tecnologia que a suporta possa comprimir
distâncias de tempo e de espaço. Isso é uma barreira para o comparti‑
lhamento de ideias e de conhecimento nascentes ainda não codificados,
especialmente quando a disposição de compartilhá­‑los depende de as
pessoas interessadas se conhecerem bem e confiarem umas nas outras.
Isso implica que os processos necessários para atingir as etapas criativas
iniciais da inovação nem sempre são possíveis em uma organização vir‑
299
tual. As etapas posteriores da inovação estão mais abertas à coordenação
e ao controle virtuais – por exemplo, quando se trata de calcular como

Organização virtual
produzir um novo produto ou serviço muito bem especificado, ou uma
nova técnica codificada.
O exemplo da IBM mencionado no Capítulo 8 ilustra o risco da vul‑
nerabilidade quando se trabalha em uma rede virtual. Nesse caso, a ino‑
vação de uma parceria que operava virtualmente funcionou contra os
interesses de longo prazo da empresa principal. Quando a IBM, que está
longe de ser uma corporação virtual, resolveu projetar e fazer virtual‑
mente seu PC, ela juntou seu hardware com os softwares da Microsoft
e o microprocessador da Intel. Isso deu à Microsoft e à Intel o impulso
para crescerem e se tornarem maiores que a própria IBM. A IBM perdeu
a oportunidade de fazer um microprocessador e desenvolver o software
na própria empresa, que certamente tinha todos os recursos para fazê­
‑lo. Em vez disso, simplesmente entregou algumas de suas competências
essenciais. Foi um erro entrar em uma parceria virtual em vez de fazer
internamente as coisas para os quais era competente e que tinham impor‑
tância estratégica.10

9.6 Questões sobre o uso da organização virtual


Frequentemente surgem três questões a respeito do uso de modos
virtuais, de organização. A primeira é decidir quando usar esses modos
virtuais em vez das formas convencionais de organização. A segunda é
saber se a organização virtual tem de ser administrada de maneira dife‑
rente. A terceira questão é descobrir como arranjos virtuais permitem
que pessoas em locais muito distantes trabalhem juntas como equipe e
se beneficiem da coordenação e sinergia que o trabalho de equipe pode
proporcionar.

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9.6.1 Quando usar a organização virtual
Já foi dito anteriormente que todas as empresas têm uma mistura de
componentes virtuais e físicos, que usam ativos tangíveis e intangíveis. A
questão é decidir sobre a melhor combinação desses ativos.
A solução está na análise das necessidades econômicas, tecnológicas
e organizacionais do negócio.

300 Fatores econômicos


1. Relações com os clientes. Quão importante é manter o conta‑
parte iii  novas formas de trabalho em rede

to cara a cara com o cliente? Esses clientes esperam ter um alto nível
de contato pessoal ou não? Se o produto for padronizado e a marca
já estiver consolidada, normalmente não haverá necessidade de con‑
tato pessoal com o produtor e o relacionamento pode assumir a forma
virtual. Isso porque não é preciso selecionar o produto por inspeção
pessoal; o risco de produto defeituoso também é baixo e, se surgir, o
problema pode ser facilmente identificado e corrigido. Além do mais,
muitos produtos padronizados não requerem nenhuma instalação es‑
pecial ou serviços pós­‑venda. Artigos de classificação internacional ou
de marca e o fornecimento de energia elétrica, luz e água são exemplos
de produtos e serviços em que o relacionamento entre produtor e con‑
sumidor costuma ser virtual.
Em outros casos, a transferência do atendimento ao cliente para o modo
virtual é tecnicamente possível, mas pode atrapalhar a possibilidade de ofe‑
recer outros serviços associados que os consumidores preferem receber de
modo mais pessoal. Por exemplo, os bancos estavam preocupados com a
perda do contato com seus clientes no momento em que introduziram os
caixas eletrônicos. Mais recentemente, bancos britânicos descobriram que
a qualidade de seu relacionamento com os clientes depois de mudar para
call centers havia caído bastante; tendo assim, um grande banco fez do
acesso por telefone ao pessoal das agências locais um meio de atrair novos
clientes. Alguns serviços pessoais não têm como ser virtuais – por exemplo,
os que exigem a presença física do cliente, como o cabeleireiro e o dentista.
Produtos como acessórios de decoração, cujos consumidores preferem fa‑
zer uma escolha pessoal, têm poder limitado de atração quando oferecidos
unicamente para compra pelo correio ou pela internet.
2. Relações com fornecedores. Até que ponto o relacionamento en‑
tre uma empresa e seus fornecedores pode ser virtual também depende

Book_Organizaçoes.indb 300 16/9/2011 16:23:42


da natureza dos produtos ou serviços oferecidos. Na manufatura, com‑
ponentes e peças requerem entrega física e procuram ser fornecidos lo‑
calmente para facilitar a entrega just­‑in­‑time. A remessa não pode ser
feita virtualmente, embora o processo de informação que a acompanha
– informações sobre componentes ou especificação de peças e prazo de
entrega – possa. Serviços que consistem no fornecimento de informação
ou que podem ser negociados sem qualquer presença física, como reser‑
vas de passagens aéreas, estão sendo cada vez mais feitos pela internet.
301
Outros serviços de apoio, como consultoria e propaganda, precisam ser
customizados às necessidades de cada empresa. Normalmente, exigem

Organização virtual
interação pessoal entre o fornecedor e os membros da organização, e não
podem ser realizados virtualmente. Há grande economia de custo e tem‑
po quando bens ou serviços podem ser negociados virtualmente, porque
são eliminados os intermediários, como atacadistas e agentes de viagem.

Fatores tecnológicos
Muitas das ponderações econômicas que acabamos de mencionar
estão associadas à natureza tecnológica das atividades desenvolvidas
por uma empresa e, em consequência, ao tipo de mercado do qual é
fornecedora e ao tipo de insumo que utiliza. Outro fator tecnológico é
o tipo de trabalho realizado na empresa. Se desenvolve trabalho de pes‑
quisa avançada e/ou design, a necessidade de promover a criatividade e
compartilhar o conhecimento tácito na equipe de trabalho pode limitar
a extensão com que esse trabalho poderá ser realizado virtualmente,
apesar do enorme interesse hoje existente nas equipes virtuais. Os ge‑
rentes deverão ponderar de um lado (1) a otimização dos processos que
levam à criatividade e, de outro, (2) a otimização entre disponibilidade
e custo dos recursos criativos, especialmente quando estão espalhados
por diferentes regiões e fusos horários. O primeiro componente dessa
ponderação favorece o trabalho em modo não virtual com equipes em
estreita proximidade física, enquanto o segundo permite a reunião de
uma equipe, embora dispersa, por meio de um sistema virtual.
Outras áreas de trabalho podem funcionar e ser administradas vir‑
tualmente. Equipes de vendas em geral estão fisicamente dispersas e
trabalham por meio de ligações virtuais. Elas podem ser reunidas perio‑
dicamente em congressos de vendas para compartilhar pessoalmente suas
experiências e discutir alguns possíveis aperfeiçoamentos.

Book_Organizaçoes.indb 301 16/9/2011 16:23:43


Fatores organizacionais
Além do trabalho de diferentes unidades em uma organização, como
o design e vendas, também se deve ponderar sobre as relações entre elas e
entre gerentes e empregados. A conclusão a que Lawrence e Lorsch che‑
garam nos anos 1960 continua válida: as organizações diferem no grau e
na forma de integração interna que exigem, dependendo da incerteza e da
velocidade com que as organizações deverão tratar as novas exigências.11
302 Se frequentemente estão diante de novos problemas que envolvem novos
parâmetros, especialmente diante daqueles que exigem solução rápida,
as organizações têm de se organizar de forma a simplificar uma intera‑
parte iii  novas formas de trabalho em rede

ção criativa e intensa entre as pessoas que devem resolver os problemas.


Sistemas virtuais de processamento de informação podem ajudar, mas há
também a necessidade de discussão e interação pessoais. Quando o traba‑
lho da organização é relativamente rotineiro ou há tempo para fazer ajus‑
tes, pode­‑se usar métodos virtuais. O relacionamento entre as diferentes
unidades em uma empresa deve ser examinado cuidadosamente antes de se
tomar qualquer decisão sobre a conveniência de se trabalhar virtualmente.
Além desses relacionamentos basicamente "horizontais", é preciso
pensar também no aspecto vertical – o relacionamento entre gestores e
empregados. Um problema que muitas vezes surge quando as organi‑
zações adotam o modo virtual é a perda de controle e de motivação. A
perda de controle talvez não seja tão grave, se a quantidade e a qualidade
do que as pessoas produzem puderem ser medidas ou avaliadas. Mesmo
assim, as pessoas que trabalham distantes de sua organização às vezes se
sentem sozinhas e desenvolvem o sentimento, que pode ser desmotivador,
de terem sido deixadas de lado pela empresa. Portanto, se os arranjos
virtuais pretendem substituir a proximidade física e social entre gestores e
empregados, isso precisa ser compensado por mecanismos que assegurem
que o relacionamento permaneça ativo.
Para resumir, ao decidir sobre o equilíbrio entre a organização virtual
e convencional, os gerentes podem usar um checklist parecido com o a
seguir. Ele identifica as questões que devem ser ponderadas no momento
de decidir qual a forma e a amplitude do tipo de organização virtual que
se deve utilizar.

1. Relações com clientes:

„ „ Quão padronizado é o produto ou serviço?

Book_Organizaçoes.indb 302 16/9/2011 16:23:43


„ „ Até que ponto o produto tem o suporte de uma marca consolidada?

„ „ Existem variações de estilo ou questões de gosto pessoal


envolvidos?

„ „ O produto é um serviço pessoal?

2. Relações com fornecedores:

„ „ Quão tangíveis são os itens fornecidos?


303
„ „ Os fornecedores precisam estar fisicamente próximos dos

Organização virtual
consumidores?

3. Fatores tecnológicos:

„ „ Até que ponto o trabalho exige criatividade e inovação?

„ „ Até que ponto os empregados podem realizar seu trabalho


longe dos colegas?

4. Fatores organizacionais:

„ „ Que forma de integração é necessária entre diferentes pessoas e


unidades em uma organização?

„ „ Os funcionários podem ser motivados quando trabalham sepa‑


rados uns dos outros e longe de seus gerentes?

„ „ Há algum risco de perda importante de controle se os funcioná‑


rios trabalharem longe de seus gerentes?

9.6.2 Administrando a organização virtual


Warner e Witzel perguntam até que ponto é diferente a administração
de uma organização virtual. Eles sugerem haver certa afinidade com a
gestão de organizações convencionais. Os gestores devem ter ampla visão
de suas organizações; nesse aspecto, a tarefa primordial é a mesma quan‑
do se administra a rede de atividades que compõem a organização virtual.
Não se espera que a diretoria se envolva estreitamente na coordenação e
controle operacional, embora na prática algumas o façam;12 nos sistemas
informatizados da organização virtual, espera­‑se que participem da coor‑
denação operacional necessária.

Book_Organizaçoes.indb 303 16/9/2011 16:23:43


A abordagem tradicional para a identificação de atividades espe‑
cíficas do gestor foi extraída de conjuntos de tarefas definidos pelo te‑
órico francês da administração, Henri Fayol, e conhecida pela sigla
POSDCORB [planning, organizing, staffing, directing, coordinating, re‑
porting, budgenting]:13

„„ Planejar;

„„ Organizar;
304
„„ Assessorar;
parte iii  novas formas de trabalho em rede

„„ Dirigir;

„„ Coordenar;

„„ Informar;

„„ Fazer o orçamento.

Na gestão de uma organização virtual, algumas dessas tarefas as‑


sumem mais significado do que outras. O planejamento no sentido de
formulação e implementação da estratégia continua muito importante,
assim como a "prestação de contas" (ou seja, o controle) e a coordenação
das atividades e funções ao longo da cadeia de valor. Como já observa‑
mos, em uma organização virtual as pessoas talvez sejam praticamente
o único ativo; portanto, as questões de RH (o equivalente moderno de
"pessoal") adquirem importância especial. Como são tratadas as tarefas
do RH em uma organização virtual depende de como a empresa é consti‑
tuída. Se for uma rede entre parceiros organizados, isto é, entre empresas
diferentes, muitas questões de RH podem ser resolvidas em cada uma
dessas organizações. No entanto, se a organização virtual tem muitos
empregados ou pessoal autônomo trabalhando por conta própria ou em
pequenas unidades dispersas, tais questões serão de responsabilidade da
administração central da organização virtual. Outras tarefas, como o tra‑
balho de organização, orientação (no sentido da gestão de pessoas) e or‑
çamento, provavelmente terão menos destaque na organização virtual do
que na convencional, onde as pessoas trabalham em uma única entidade
física, jurídica e financeira.
A natureza da organização virtual significa que sua gestão deverá ser
caracterizada, acima de tudo, por:

Book_Organizaçoes.indb 304 16/9/2011 16:23:43


1. orientação e motivação da organização, mediante uma visão arti‑
culada via estratégia e bem comunicada a seus membros;

2. forte enfoque no processamento da informação e na gestão do


conhecimento;

3. ênfase na coordenação de terceiros;

4. constante reforço das qualificações e da disponibilidade de coope‑


ração entre o pessoal. 305

Organização virtual
Essa última exigência decorre do reconhecimento de que, embora
uma organização virtual dependa da tecnologia avançada para simplifi‑
car seus processos, a vantagem competitiva que a distingue está em sua
rede de pessoas e na maneira como essa rede funciona. Um requisito con‑
comitante é a necessidade de dar prioridade ao desenvolvimento das qua‑
lificações relevantes, valorizando o fato de que entre essas qualificações
deve estar a capacidade de trabalhar em conjunto num formato virtual.
Portanto, é essencial gerenciar pessoas de forma a promover a confiança
entre os membros; e, consequentemente, uma comunicação aberta para
aperfeiçoar as vantagens competitivas da organização virtual e, em espe‑
cial, a flexibilidade no aprendizado e na adaptação.
A gestão da organização virtual envolve algumas das mesmas ques‑
tões existentes na terceirização e na gestão das alianças estratégicas, dis‑
cutidas nos capítulos 8 e 10 respectivamente. Quando alguns membros,
se não todos, de uma cadeia de valor virtual são parceiros independentes
– empresas ou indivíduos –, existe dificuldade de manter um ajuste estra‑
tégico adequado entre eles. Os gestores de uma rede virtual têm de forjar
a unidade entre os objetivos dos membros ou, no mínimo, criar alguma
compatibilidade entre eles. Os mesmos problemas aparecem quando se
tenta conciliar as prioridades da empresa com as dos fornecedores para
os quais certas atividades foram terceirizadas. Outra questão comum às
redes virtuais, à terceirização e às alianças é saber o que deve ser centra‑
lizado na empresa principal e o que deve ser passado aos parceiros. Na
terceirização, a questão é o que e até que ponto terceirizar. Numa aliança,
a questão diz respeito às tarefas que devem ser assumidas por cada par‑
ceiro e sobre quais manter mais influência.
Em sua pesquisa sobre telecommuting (trabalho feito em casa com
a ajuda da tecnologia da comunicação e informática), planejamento

Book_Organizaçoes.indb 305 16/9/2011 16:23:43


produto em coordenado globalmente e integração das cadeias de for‑
necimento, Fritz e Manheim identificam o que chamam de "processos
decisivos" que devem ser gerenciados nas organizações virtuais.14 Esses
processos são a gestão de pessoas, relacionamentos, trabalho, conheci‑
mento e tecnologia. Os autores argumentam que uma boa gestão desses
processos na organização virtual pode garantir grandes benefícios para a
empresa, como menos tempo para comercializar um produto e/ou servi‑
ço, melhor reação aos movimentos da concorrência, boa administração
306
das cadeias integradas de fornecimento e melhor aproveitamento do pes‑
soal com programas de trabalho flexíveis. A diferença fundamental entre
parte iii  novas formas de trabalho em rede

a gestão desses processos na organização convencional e na organização


virtual é a baixíssima incidência de contatos pessoais na última. As pró‑
ximas seções resumem as conclusões de Fritz e Manheim.

Gestão de pessoas
Em uma organização virtual as pessoas trabalham de forma autô‑
noma e devem estar prontas para tomar decisões independentes e, ao
mesmo tempo, de forma coordenada com os outros, porque geralmente
trabalham em colaboração com colegas distantes. Para essas pessoas, a
administração do tempo e a autoadministração são competências ope‑
racionais particularmente importantes. Elas talvez se preocupem com a
ausência de visibilidade organizacional, que pode reduzir suas oportuni‑
dades de promoção e desenvolvimento. Seus gerentes devem compreender
essas preocupações e, principalmente, saber selecionar seu pessoal. Isso
implica ter grande sensibilidade para as questões de RH e desenvolver
sistemas de gestão sofisticados.

Gestão de relacionamento
Os relacionamentos entre pessoas são especialmente importantes para
o bom desempenho no trabalho virtual. Muitos ressaltam a importância
da confiança como requisito para a sustentação de relacionamentos vir‑
tuais que estão fisicamente distantes, sem o apoio do contato pessoal ou
de suporte administrativo.15 A confiança é decisiva porque os processos
virtuais devem ser abertos e transparentes. No entanto, é mais difícil criar
e manter essa qualidade quando as pessoas trabalham fisicamente separa‑
das e tem dificuldades em confiar nos entendimentos informais e na em‑
patia pessoal, que ajudam a desenvolver a confiança (veja o Capítulo 14).

Book_Organizaçoes.indb 306 16/9/2011 16:23:43


Por isso, os gerentes de organizações virtuais devem criar mecanis‑
mos para alimentar e sustentar o relacionamento entre os que partici‑
pam da rede e entre essas pessoas e eles próprios, visando neutralizar
a impessoalidade e a sensação de distância psicológica que poderiam
reduzir a qualidade dos relacionamentos e até levar a causar um senti‑
mento de alienação entre o pessoal. Esses mecanismos podem ser, por
exemplo, reuniões regionais periódicas, para reunir as pessoas fisica‑
mente dispersas. Elas serviriam para discutir questões relacionadas ao
307
trabalho e, ao mesmo tempo, seriam eventos sociais para ligar pessoas
que se comunicam remotamente. Visitas às organizações parceiras na

Organização virtual
rede virtual constituem, por exemplo, um aspecto importante do tra‑
balho desses gerentes. Estudos das alianças estratégicas mostraram que
essas visitas contribuem para criar um sentimento de confiança entre
os parceiros, o que, por sua vez, melhora a parceria em função do
aprendizado mútuo e espírito de cooperação para a realização das mu‑
danças necessárias.16 Nesses eventos e visitas sociais, notícias e outras
informações podem ser distribuídas por toda a organização virtual por
meio de canais informatizados, como boletins com notícias, atualiza‑
ção de novos clientes, programas de trabalho em andamento e assim
por diante.

Gerenciamento do trabalho
Em uma organização virtual, o gerenciamento do trabalho em si deve
estar concentrado nos processos de coordenação e controle. Essa coorde‑
nação de atividades é mais complexa, porque as metas e as prioridades
devem ser comunicadas a pessoas que estão em diversos locais diferentes.
As necessidades e circunstâncias locais também devem ser comunicadas
de volta aos gerentes. Em um ambiente de trabalho convencional, o ge‑
rente muitas vezes consegue rápida e eficazmente essa coordenação em
encontros pessoais, de maneira informal ou em reuniões programadas.
Na organização virtual, esses encontros são substituídos por protoco‑
los eletrônicos, e pode haver regras para torná­‑los eficazes – por exem‑
plo, uma instrução para todo o pessoal verificar sua caixa de entrada de
e­‑mails pelo menos uma vez ao dia. Quando as unidades de uma orga‑
nização virtual estão globalmente distribuídas, pode ser necessário um
apoio especial para auxiliar o trabalho em conjunto, como acontece com
o trabalho de equipe global virtual (veja a seguir).

Book_Organizaçoes.indb 307 16/9/2011 16:23:43


Como nas organizações virtuais a iniciativa é descentralizada interna‑
mente e entre as organizações, o controle deve mudar, passando de uma
atenção à maneira como o trabalho é realizado para o resultado desse
trabalho. Em outras palavras, deve haver uma mudança do controle so‑
bre o processo para a simplificação do bom desempenho desse processo.
De modo geral, nas organizações virtuais o poder de tomar a iniciativa
é delegado porque, para trabalhar bem em localizações geograficamente
dispersas, os trabalhadores devem ter autonomia para tomar decisões im‑
308
portantes sobre como realizar seu trabalho – por exemplo, como reagir
imediatamente a determinadas exigências do cliente. Isso significa que os
parte iii  novas formas de trabalho em rede

gerentes têm de criar novas abordagens para avaliação e monitoramento


do desempenho de trabalhadores que estão distantes.

Gestão do conhecimento
Em uma organização fisicamente compacta, boa parte do conhecimento
é compartilhado e criado no contato direto entre as pessoas. Em uma or‑
ganização virtual, mesmo o compartilhamento do conhecimento explícito
pode ser difícil. Os dados podem ser transmitidos e distribuídos sem proble‑
mas, mas o raciocínio e a compreensão que distinguem o conhecimento de
um simples dado ou informação impõem um problema maior para a gestão
do conhecimento na organização virtual. Certificar­‑se de que as pessoas te‑
nham acesso à informação necessária para realizar seu trabalho é essencial e
essa questão se torna mais complexa quando elas não estão no mesmo lugar.
Experiências com o trabalho de equipe virtual (discutidas adiante) mostram
que o planejamento de bons sistemas para coordenar o compartilhamento
do conhecimento estruturado e opiniões nem tão estruturadas pode ter um
papel importante na efetividade do trabalho em um modo virtual.

Gestão da tecnologia
Está claro que a tecnologia da comunicação e da informação têm pa‑
pel indispensável na organização virtual. Embora não seja nem o começo
nem o fim desse tipo de organização, uma boa gestão é decisiva para que
a tecnologia funcione bem.
A tecnologia é necessária para apoiar o trabalho virtual em uma série
de modalidades:

1. estruturada, como acontece no uso de sistemas para administrar e


informar tarefas estruturadas, como o envio de pedidos de compra

Book_Organizaçoes.indb 308 16/9/2011 16:23:43


na forma de mensagens EDI (electronic data interchange – "troca
estruturada de dados") em uma cadeia de fornecimento;

2. semiestruturada, como o uso de sistemas de gestão do fluxo de


trabalho (WF – workflow); por exemplo, o envio de faturas para
pagamento que podem passar por muitos níveis de revisão, tanto
em unidades de compras como de vendas na rede virtual;

3. não estruturada, que poderia usar grupos e e­‑mail para lidar com
309
a distância e/ou o trabalho não sincronizado.17

Organização virtual
A necessidade de atender a uma série de modalidades de interação
e transação significa que, na organização virtual, uma estratégia de TIC
para apoiar esses processos precisa levar em conta todas as interações de
modo integrado. Já ressaltamos a importância de estimular uma dimen‑
são social nos relacionamentos da organização virtual, a fim de aprimo‑
rar a identificação e a confiança entre os participantes. Isso significa que,
em sua política de TIC, os gerentes devem focar no suporte ao trabalho
virtual como um todo, incluindo o aspecto social e também as questões
exclusivas do negócio. Desnecessário dizer que o treinamento é parte es‑
sencial desse suporte.

9.6.3 Trabalho em equipe virtual


O Capítulo 4 discutiu como as equipes estão sendo cada vez mais
usadas para integrar as contribuições dos membros da organização cujas
especializações e experiências são complementares e a concentrar essas
capacitações em um determinado projeto ou tarefa. O trabalho em equi‑
pe é um poderoso instrumento organizacional para a coordenação de
atividades interdependentes. Essas atividades podem ter natureza rotinei‑
ra, como acontece com muitas equipes, ou estar voltadas para a solução
criativa de problemas, como a equipe de projeto encarregada do desen‑
volvimento de um novo produto. Esse último tipo de equipe em geral
mantém­‑se conforme a duração do projeto.
A aplicação da abordagem virtual ao trabalho em equipe pode ajudar
a superar algumas das limitações do método tradicional e de encontro
cara a cara.18 Em primeiro lugar, no formato tradicional não é possível
organizar uma equipe sem reuniões em determinado local. Isso faz com
que um determinado local seja característico da equipe. Com o uso de

Book_Organizaçoes.indb 309 16/9/2011 16:23:43


formas de TIC, como o e­‑mail, a videoconferência, sistemas de escrita a
distância, e­‑mail multimídia e sistemas de apoio a grupos, uma equipe
virtual pode se comunicar e levar adiante seu trabalho sem essas reuniões
pessoais que consomem muito tempo.
Em segundo lugar, tanto para reduzir o custo e o tempo de reuni‑
ões quanto para permitir um processo interpessoal gerenciável, o traba‑
lho em equipe do tipo tradicional não pode agrupar um número muito
grande de participantes. O uso de equipes virtuais permite mobilizar
310
as contribuições de um grande número de pessoas. Essa participação
mais ampla tem a vantagem de aproveitar uma maior faixa de contri‑
parte iii  novas formas de trabalho em rede

buições e disseminar o sentido de pertencimento e de comprometimen‑


to com um projeto particular. Por exemplo, a NCR Corporation criou
uma força­‑tarefa virtual com mais de mil pessoas em 17 locais para
desenvolver um sistema de computador de nova geração. Ao aplicar
sistemas informatizados e redes de telecomunicação de alta velocidade,
essa força­‑tarefa virtual completou o projeto dentro do orçamento e
antes do tempo programado.19
Um terceiro conjunto de problemas que às vezes surge em equipes
não virtuais convencionais é a distinção entre os participantes "de den‑
tro" (os insiders) e os de fora (os outsiders). Quando a participação na
equipe se restringe a um número pequeno de pessoas, as que ficaram de
fora logo se sentem afastadas e desvalorizadas. Atritos entre esses dois
grupos de pessoas podem surgir facilmente. Mesmo estando motivados
a contribuir com o trabalho da equipe, os outsiders têm a desvantagem
de não saber quem está envolvido nem o que a equipe está fazendo. Esse
foi o problema que aconteceu uma vez na escola de negócios do autor
quando seu "comitê executivo" deixou de informar os termos de referên‑
cia, para não falar do resultado de suas deliberações. Isso levou a grande
hostilidade entre os demais acadêmicos. Quando mais tarde os planos e
as minutas do comitê circularam eletronicamente para todos na escola e o
pessoal também foi convidado a contribuir com suas ideias e observações
pertinentes às questões apresentadas pelo comitê por e­‑mail, a impressão
de afastamento diminuiu e a escola se beneficiou de moral e comprometi‑
mento muito melhores. Nesse caso, a aplicação de alguns dos princípios
da virtualidade a um processo de equipe trouxe benefícios significativos,
eliminando boa parte da barreira entre os de dentro e os de fora. Um dos
argumentos para restringir o acesso ao trabalho em equipe é a possível
necessidade de segurança da informação. Paradoxalmente, quando há

Book_Organizaçoes.indb 310 16/9/2011 16:23:44


necessidade de segurança, o armazenamento e a circulação eletrônica da
informação facilitam o controle, porque o fluxo de informação pode ser
facilmente rastreado.
Há interesse cada vez maior no uso de equipes virtuais globais. Muitas
empresas que utilizam a tecnologia estão espalhando suas instalações de
pesquisa em várias partes do mundo em busca de pessoal científico e
técnico especializado. Às vezes, a busca por graduados de baixo custo
também é um fator motivador.20 A equipe virtual global é um grupo de
311
indivíduos dispersos geográfica e temporariamente, reunidos por meio do
uso da TIC para a realização de uma tarefa organizacional. As atividades

Organização virtual
de âmbito global são, ao mesmo tempo, dispersas (estão em lugares dife‑
rentes) e assincrônicas (realizadas em momentos diferentes). As equipes
convencionais normalmente operam mais ou menos nos mesmos parâme‑
tros de espaço/tempo.
A tecnologia hoje disponível permite o trabalho em equipe em nível
global. A grande questão é como organizar e administrar bem esse tra‑
balho. Equipes virtuais, montadas para superar barreiras de espaço e de
tempo, não se baseiam nos indícios sociais tradicionais ou em mecanis‑
mos comportamentais. É preciso encontrar novas maneiras de coordená­
‑las e, por exemplo, resolver conflitos entre seus participantes.21
Uma experiência realizada com equipes de 35 pessoas, compostas
por estudantes universitários localizados nos Estados Unidos e no Japão,
lança alguma luz sobre a maneira de administrar essas exigências.22 Tais
equipes tinham tempo limitado para chegar a uma solução relativa a de‑
terminada tarefa. Os membros da equipe se comunicavam unicamente
por fóruns de discussão do Lotus Notes feito sob medida e com acesso
controlado, de tal maneira que as equipes fossem rigorosamente virtuais.
Os pesquisadores avaliaram o desempenho das equipes em relação a (1)
os aspectos analisados na tomada de decisão, (2) quão bem organizado
era o processo de tomada de decisão e (3) a profundidade com que cada
equipe explorou cada aspecto. Eles descobriram que:

1. Evitar o conflito teve influência negativa no desempenho da equi‑


pe. Esse impacto negativo foi, no entanto, reduzido por meio do
uso do Lotus Notes, criando­‑se um mecanismo de coordenação
temporal que revelou as posições iniciais dos membros da equipe,
impôs tarefas progressivas, como as revisões necessárias, e estabe‑
leceu limites de tempo para determinadas tarefas.

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2. O comportamento que tentou resolver o conflito na equipe – aceita‑
ção, por exemplo, impensada do que o outro membro estava dizen‑
do – em nada contribuiu para o desempenho. Como esse tipo de
comportamento tinha mais o propósito de manter a harmonia do que
de discutir as melhores soluções integradoras, a aplicação do meca‑
nismo de coordenação temporal a esse comportamento não ajudou.

3. Quando o conflito dentro das equipes era resolvido por meio da


312 dominação por uma das partes ou pelo comportamento colabora‑
tivo, o desempenho da equipe melhorava. A tentativa de resolver
parte iii  novas formas de trabalho em rede

o conflito por meio de acordos levou a um desempenho pior da


equipe, embora esse efeito negativo tenha melhorado com o uso de
mecanismos de coordenação temporal. Contudo, tais mecanismos
não tiveram nenhum efeito moderador nos estilos de dominação,
conflito e colaboração.

Essa pesquisa experimental pioneira sugere que um mecanismo infor‑


matizado para coordenar as contribuições dos membros da equipe virtual
global através das barreiras de espaço e tempo pode ajudar o desempe‑
nho da equipe sob determinadas condições. Ao providenciar uma estru‑
tura para o trabalho em equipe e, talvez mais importante, ao estimular
a transparência na equipe, o mecanismo de TIC pode reduzir os efeitos
negativos do comportamento que levou a um pior desempenho, porque
os membros, em lugar de expressar­‑se de forma aberta e clara, calam­‑se
e não exprimem suas questões e opiniões. Metas claramente definidas e
restrições de tempo também foram importantes para ajudar a equipe a
focar seus esforços em busca de um bom resultado.
Um estudo de três equipes virtuais globais em uma empresa de tec‑
nologia industrial norte­‑americana e dois de seus parceiros estratégicos
europeus esclarece um pouco mais sobre as condições necessárias para
uma boa interação entre tais equipes.23 Duas dessas equipes tiveram su‑
cesso, mas a terceira não. Um requisito é ter boa adaptação entre (1) a
forma escolhida para a interação (mídia e duração) e (2) o processo de
decisão e a complexidade da comunicação exigida na equipe. Por exem‑
plo, estabelecer um compromisso exige que os participantes estejam mui‑
to empenhados no processo decisório e também a troca de mensagens
complexas. Nesse caso, a boa interação pede uma excelente mídia, como
a videoconferência. Outra mídia não tão boa, como o e­‑mail, não funcio‑
naria, embora servisse em estágios mais simples do processo decisório e

Book_Organizaçoes.indb 312 16/9/2011 16:23:44


para mensagens menos complexas. Tentar discutir questões estratégicas
complicadas por e­‑mails rápidos não funcionava muito bem e acabou
não dando certo. Descobriu­‑se que sair da virtualidade para reuniões pe‑
riódicas presenciais significava uma injeção de ânimo na equipe e parecia
ser particularmente importante nas primeiras fases de sua vida, e tam‑
bém para equipes com tarefas que requeriam grande interdependência.
Equipes virtuais globais bem­‑sucedidas também se concentraram na cria‑
ção de relacionamentos para aumentar a confiança e compartilhar ideias
313
através de "fronteiras" de país, cultura, empresa ou ocupação.
A confiança entre os membros é uma das condições para o sucesso do

Organização virtual
trabalho em equipes virtuais. Ishaya e Macaulay examinaram o papel da
confiança entre os que participavam de duas equipes virtuais experimen‑
tais.24 Eles concluíram que havia três níveis principais de confiança nessas
equipes. Os dois primeiros estavam relacionados à tecnologia e mídia, ou
seja, ao mecanismo e software usados para a colaboração. Se estes falhas‑
sem, a confiança poderia não se desenvolver entre os membros da equipe.
O terceiro nível de confiança era mais complexo. Referia­‑se às intera‑
ções entre os membros da equipe e pode ser chamado de nível "social".
Os pesquisadores descobriram que a confiança estava correndo risco na
comunicação virtual, porque as pessoas poderiam se esconder atrás do
relativo anonimato da tecnologia – por exemplo, elas ficavam criticando
umas às outras por muito tempo, dizendo coisas que normalmente não
seriam ditas na comunicação cara a cara.
Ishaya e Macaulay sugerem que, para ajudar a criar a confiança social
em uma equipe virtual, certas convenções ou protocolos de comunica‑
ção precisam ser estabelecidos e cada membro da equipe deve aceitá­
‑los, relacionados a cinco dimensões: integridade, capacidade, abertura,
benevolência e expectativa. Cada dimensão tem certas características
definidoras; os protocolos esclarecem os termos específicos dessas carac‑
terísticas, como mostrados na Tabela 9.1.

9.7 Exemplo de organização virtual: Dell


Computer Corporation25
A Dell Computer foi fundada em 1984 por Michael Dell, que no mo‑
mento em que eu escrevia este livro ainda era o diretor superintendente
executivo com o mandato mais longo no setor. A Dell entrou para a lista

Book_Organizaçoes.indb 313 16/9/2011 16:23:44


�Tabela 9.1  Dimensões e protocolos de confiança social em equipes virtuais

Características de
Dimensões Protocolos
cada dimensão

Integridade Honestidade, con‑ Ser honesto


fiabilidade, lealdade, Ser direto
fidelidade e empenho Cumprir as promessas
Ser leal e confiável
314
Responder a tempo
Ser responsável
parte iii  novas formas de trabalho em rede

Capacidade Conhecimento inter‑ Demonstrar conhecimento pessoal


pessoal, qualifica‑ Demonstrar capacidades individuais e
ções e experiência, de grupo
competência Compartilhar experiências individuais
Demonstrar competência pessoal

Abertura Disposição para Informar os membros da equipe


compartilhar ideias Livre compartilhar de ideias
e informações Livre compartilhar de informações
livremente Oferecer feedback positivo
Pedir desculpas publicamente

Benevolência Desejo de fazer o Ajudar e dar apoio a outros


bem, boa vontade e Ser amistoso para com os outros
generosidade Ser gentil e cortês
Ter consideração para com os outros
Ter empatia pelos outros
Elogiar as pessoas pelo bom trabalho
Ser humilde

Expectativas Ganhos/perdas pos‑ Estar aberto às expectativas


síveis, confiabilidade, Estar preparado para se empenhar nas
coerência e opinião expectativas dos outros
Ser justo nas expectativas
Ser coerente nas expectativas pessoais

Fonte: adaptado de ISHAYA, Tanko; MACAULAY, Linda. The role of trust in virtual teams. In:
SIEBER, Pascal; GRIESE, Joachim (Org.). Organizational virtualness and electronic commerce:
proceedings of the 2nd International VoNet Workshop, 23­‑24 set. 1999. Berna: Simowa Verlag,
1999. Tabela 2, p. 146.

Book_Organizaçoes.indb 314 16/9/2011 16:23:44


das 500 da Fortune em 1992, e se estabeleceu como a empresa de com‑
putadores preferida no mundo inteiro. Ela também era a principal forne‑
cedora de produtos e serviços demandados pelos clientes para criar suas
infraestruturas de TI e internet. Um comentarista observou: "Ao longo
de uma carreira que se estende por quase duas décadas, o sr. Dell alinhou
as companhias que dominam os mercados de computadores pessoais, no‑
tebooks, servidores, sistemas de armazenamento e de rede como garrafas
em uma prateleira. De sua mesa em Austin, no Texas, ele as derrubou
315
uma após a outra".26
A Dell Computer cresceu mais depressa que o resto do mercado, sus‑

Organização virtual
tentando seu crescimento e o aumento na participação no mercado até
mesmo no difícil ambiente do início deste milênio. Em 2002, por exem‑
plo, a empresa informou um aumento de 75% do seu lucro bruto. Foi
o único grande fabricante de PCs a ter lucro significativo, enquanto as
outras empresas cortavam custos e lutavam em condições econômicas
bem frágeis.
Há evidentemente algo distinto por detrás desse notável sucesso. A
base é seu modelo de vendas "Direto da Dell", com vasto uso da organi‑
zação virtual. Ao criar seus produtos sob medida e ao aperfeiçoar a lo‑
gística e a distribuição, a Dell reduziu suas operações e cortou os custos,
conseguindo vender mais barato que a concorrência e conquistar sua fatia
do mercado. Ela mantém um estoque mínimo e aproveita a customização
em massa das configurações dos sistemas de computador, permitindo que
os clientes definam suas especificações e as obtenham a preço competitivo
com o menor atraso possível. Michael Dell descreve assim as "estratégias
para o sucesso" da empresa:

Velocidade para vender, serviço de qualidade para o cliente e um feroz em‑


penho em produzir sistemas computacionais customizados que ofereçam
alto desempenho e a mais moderna tecnologia para os nossos clientes. E,
conforme a empresa evoluía, nossas estratégias se tornavam mais sóli‑
das… quando eliminei o intermediário e passei a vender diretamente aos
consumidores, ajustei minhas ideias visando estreitar os relacionamentos
que tínhamos com os fornecedores, reduzindo o número de etapas envol‑
vidas na administração do estoque e aperfeiçoando as vantagens de custo
e de oferta de novos produtos que oferecemos aos nossos consumidores.
As vendas por telefone funcionaram muito bem por bastante tempo – e

Book_Organizaçoes.indb 315 16/9/2011 16:23:44


O modelo sob medida da Dell significa que é possível simplificar a cadeia de valor eliminando distribuidores e varejistas
ou revendedores. Enquanto a cadeia de valor tradicional do PC é:

Varejistas
Fornecedores Fabricante do PC Distribuidores Revendedores Consumidor final
Integradores

A cadeia de valor “Direto da Dell” é a seguinte:

316
Fornecedores Fabricante do PC Consumidor final
parte iii  novas formas de trabalho em rede

Algumas unidades (p.ex., monitores) são des‑


pachadas diretamente para o consumidor

ainda funcionam para alguns clientes – até começarmos a explorar o po‑


tencial ilimitado da internet 27.

A Dell Computer coordena uma rede global de produção para mon‑


tagem em seus mercados mais importantes. Embora não fabrique os
próprios componentes ou montagens parciais, ao contrário de outros fa‑
bricantes, ela evitou terceirizar a montagem final de seus produtos, em‑
pregando mais de 40.000 pessoas em 150 países e territórios pelo mundo
afora. Ela compra cada vez mais de seus fornecedores unidades de base
para notebooks e faz a configuração final para oferecer mais opções aos
consumidores. Embora prefira manter o controle direto sobre a configu‑
ração e a qualidade do produto, a Dell permite que algumas unidades
muitíssimo confiáveis, como os monitores da Sony, sejam despachadas
para o cliente sem inspeção adicional.
A maior parte da terceirização da Dell é global: ela terceiriza os com‑
ponentes mais importantes para todos os pontos de montagem por meio
de um sistema centralizado de informação. Para os componentes mais im‑
portantes, a empresa procura fornecedores com capacidade global, como
a Intel, a IBM, a Samsung, a Toshiba, a Sony e a Seagate. O fornecimento
de produtos, como caixas de papelão, material para envio e impressão de
manuais, é sempre local. Quando recebe um pedido de um computador, a
Dell envia eletronicamente a informação necessária correspondente para

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seus fornecedores mundo afora para entrega imediata a um ponto de pro‑
dução, onde o computador é montado e despachado diretamente para o
cliente em uma semana.
O modelo da Dell se baseia na demanda mais que na oferta do produto.
Nenhum computador é produzido se não houver o correspondente pedido
do consumidor. Isso praticamente elimina os enormes almoxarifados que
costumam ficar parados nas lojas de varejo, nos atacadistas de distribuição
e nas fábricas. Com essa abordagem customizada e uma sofisticadíssima
317
tecnologia de informação, a Dell pode fazer seus planos diários. A empresa
também consegue discernir se movimentos na demanda são específicos de

Organização virtual
certos segmentos de cliente ou se ocorrem em todo o mercado. Ela trans‑
mite a avaliação dessas informações a seus fornecedores, permitindo que
eles ajustem seu estoque de modo a satisfazer a demanda. As vantagens
desse sistema são que a Dell pode funcionar com a metade do número de
empregados e um décimo do almoxarifado de seus concorrentes organiza‑
dos de modo tradicional. Isso também permite à empresa reagir de forma
mais flexível tanto em relação às tendências do mercado que estão sempre
mudando, como em relação às demandas e novas tecnologias.
A Dell administra virtualmente sua cadeia de valor, faz todos os seus
negócios por telefone e internet, e é, ao mesmo tempo, a arquiteta e a
pedra fundamental dessa organização virtual. Na qualidade de membro
principal e único ponto de referência para os consumidores, a Dell estabe‑
lece metas comuns para toda a organização virtual. Nessa função, a Dell
pode selecionar e avaliar seus parceiros em relação aos padrões estabele‑
cidos como mínimos para participar de sua organização virtual.
A Dell Computer está usando a tecnologia e a informação para apa‑
gar as fronteiras tradicionais na cadeia de valor entre fornecedores, fa‑
bricantes e usuários finais. A empresa está evoluindo em direção ao que
Michael Dell chama de "integração virtual", que é descrita assim:

Cada parte dessa estratégia – o enfoque no cliente, parcerias com os


fornecedores, customização em massa, fabricação em tempo real – tal‑
vez já seja conhecida. Mas a maneira como Michael Dell percebeu como
combiná­‑las em uma tecnologia realmente inovadora está permitindo a
coordenação através das fronteiras da empresa para atingir novos níveis
de eficiência e produtividade, além do extraordinário retorno para os in‑
vestidores. A integração virtual utiliza os benefícios econômicos de dois
modelos de negócios muito diferentes. Ela oferece as vantagens de uma

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cadeia de fornecimento rigorosamente coordenada que se originou tradi‑
cionalmente da integração vertical. Ao mesmo tempo, se beneficia do foco
e da especialização que direcionava as corporações virtuais. Na visão de
Michael Dell, a integração virtual tem potencial para garantir a coordena‑
ção e o foco. Se cumprir essa promessa, talvez se torne um novo modelo
organizacional para a era da informação.28

Por meio do uso da TIC e do compartilhamento de informações com


318
fornecedores e clientes, o sistema da Dell cria um vínculo estreito, que
é benéfico para todas as partes envolvidas. O consumidor pode fazer o
parte iii  novas formas de trabalho em rede

pedido com a especificação que atenda suas necessidades, além de poder


rastrear eletronicamente o andamento de seu pedido. Para seus grandes
clientes globais, a Dell desenvolveu sites customizados de intranet, que
lhes permitem acesso direto à compra e às informações técnicas sobre as
configurações escolhidas. A Dell também trabalha estreita e permanen‑
temente ligada a grandes clientes corporativos. Por exemplo, a empresa
carrega os softwares dos próprios clientes nas máquinas em suas fábri‑
cas. Para alguns clientes, como a Boeing, ela tem pessoal trabalhando
no local, que mais parecem membros do departamento de informática
da própria Boeing que empregados de um fornecedor.
Em matéria de fornecimento, a Dell trabalha com um número limi‑
tado do que chama de “parceiros”. "Nossa regra é manter o relaciona‑
mento com os fornecedores simples e ter o mínimo de parceiros possível.
Menos de 40 fornecedores nos fornecem cerca de 90% de nossas neces‑
sidades materiais. Parcerias mais próximas com menos fornecedores são
uma excelente maneira de eliminar custos e acelerar a velocidade da che‑
gada dos produtos no mercado."29 Alguns desses parceiros são grandes
corporações como a Intel, a Microsoft e a Sony, com as quais mantém um
longo relacionamento.
A empresa usa a tecnologia das comunicações on­‑line para transmitir
as necessidades da produção diretamente para os fornecedores e em tem‑
po real. Por uma rede externa, a Supplier Web Pages, oferece acesso em
tempo real a dados especiais das empresas e simplifica a comunicação en‑
tre os 20 fornecedores mais importantes e a Dell. As Supplier Web Pages
são utilizadas em 85% a 90% das aquisições. Por sua vez, essa ligação
virtual transmite à Dell informação sobre capacidades, qualificações, es‑
toques e atuais estruturas de custos dos fornecedores. Em troca, a Dell re‑
úne o feedback dos consumidores sobre os produtos e seu desempenho e

Book_Organizaçoes.indb 318 16/9/2011 16:23:44


repassa­‑os aos fornecedores, proporcionando­‑lhes uma oportunidade de
responder às demandas do cliente e melhorar a qualidade de seus produ‑
tos. Assim, as preocupações e necessidades do consumidor são satisfeitas
diretamente.30
Essas conexões virtuais reduzem o tempo necessário para a monta‑
gem e entrega de um produto segundo as especificações do cliente. Do
próprio computador do cliente, o pedido é repassado para as instalações
de montagem da Dell. Com essa informação, o hardware e o software
319
especificados são comunicados aos fornecedores e os componentes ne‑
cessários são entregues e montados em uma das fábricas da Dell. As em‑

Organização virtual
balagens de cada produto e outras partes completas do pedido, como os
monitores, são entregues por um parceiro de entrega, como a UPS ou a
Fedex, e levadas diretamente ao cliente que fez o pedido. O processo leva
o produto ao consumidor no menor tempo e com a menor despesa possí‑
vel. Alguns fornecedores da Dell, como a Sony, que produz os monitores
para computador, são tão confiáveis que não é preciso verificar os produ‑
tos antes da entrega. Assim, os parceiros de entrega apenas recolhem os
produtos, e após juntar as outras partes do pedido, entregam diretamente
ao consumidor.
As vantagens da integração virtual são claras para a Dell. Sem
tantos ativos e pessoal interno, a gestão da cadeia de valor é simpli‑
ficada. Como o próprio Michael Dell diz: "Se há poucas coisas para
administrar, há poucas coisas para dar errado".31 A integração vir‑
tual também permite que a empresa tenha flexibilidade na resposta
às demandas do consumidor. Como podem ser feitos sob medida, os
consumidores atribuem grande valor aos produtos. A flexibilidade
do sistema permite que os produtos da Dell incorporem a tecnologia
mais recente, e a implementação de medidas rigorosas garante sua
grande qualidade. Ser uma organização virtual permite que a Dell
tenha acesso a uma ampla faixa de recursos especializados. Ela pode
detectar produtos selecionados de diversas fontes, o que lhe dá maior
flexibilidade na escolha dos melhores componentes para seus compu‑
tadores. Cada membro da cadeia de valor da empresa pode manter
sua independência e continuar a desenvolver suas habilidades especí‑
ficas, acrescentando mais competências a toda a organização virtual.
Evidentemente, os fornecedores têm de aceitar algumas limitações em
troca de participar de uma rede virtual muitíssimo bem­‑sucedida. São
muito dependentes da Dell para a programação de sua produção;

Book_Organizaçoes.indb 319 16/9/2011 16:23:45


devem manter um almoxarifado nas fábricas da empresa ou a no má‑
ximo 10 quilômetros dessas fábricas para atender a produção sob
medida. Portanto, têm de arcar com os custos de parte do estoque, o
que a Dell evita.
Se a integração virtual é tão vantajosa para a Dell e presumivelmente
também para seus fornecedores, o que impede que a concorrência adote
o mesmo modelo?
Boa parte da resposta a essa pergunta parece estar relacionada a uma
320
questão de cultura e filosofia corporativa. Fundada apenas em 1984, a
Dell é uma novata na indústria do computador, e não está atravancada
parte iii  novas formas de trabalho em rede

por normas e estruturas consolidadas da cadeia de valor tradicional da


indústria. O livro de Michael Dell e o site da Dell enfatizam a filosofia
que distingue a empresa. O que eles chamam de "Alma da Dell" destaca
os seguintes valores:

1. trabalho em equipe;

2. meritocracia;

3. atrair, desenvolver e manter os melhores empregados;

4. adesão a um objetivo comum;

5. competitividade e responsabilidade pelos resultados;

6. ser direto nas relações com os clientes, nas comunicações, no


enfrentamento de problemas, e escutar as críticas de subordinados;

7. trabalhar sem a ineficiência da hierarquia e burocracia;

8. boa cidadania global.32

Enquanto essas são aspirações que muitas empresas apoiariam publi‑


camente, para a Dell elas desempenham um importante papel no atendi‑
mento e suporte a clientes e fornecedores – é o segredo do sucesso de sua
organização virtual.

Resumo
1. Uma organização virtual pode ser considerada a mais recente forma
organizacional, porque não está presa às estruturas jurídicas e físicas que
definem a organização convencional.

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2. É um tipo bastante avançado de organização em rede, que compreende
diferentes unidades ou empresas que agem de modo muito bem coordenado.

3. Embora as organizações virtuais variem imensamente, elas têm alguns


aspectos em comum:

„„ ausência de estrutura física;

„„ baseiam­‑se na tecnologia das comunicações;


321
„„ trabalho móvel;

Organização virtual
„„ forma híbrida;

„„ inclusão entre fronteiras;

„„ flexibilidade e responsividade.

4. Diferentes formas de organização virtual são caracterizadas por varia‑


das composições de ativos e atividades virtuais e tangíveis. As organiza‑
ções que são virtualmente abrangentes compreendem ativos e sistemas
administrativos que são altamente virtuais, como acontece com empresas
que negociam instrumentos financeiros e moedas.

5. O uso da organização virtual oferece benefícios potenciais, entre os


quais uma boa coordenação entre as fronteiras de tempo/espaço, uma
significativa redução dos custos, combinações de atividades mais flexíveis
e simplificação da administração.

6. Certas condições são, entretanto, indispensáveis para que uma organi‑


zação virtual seja bem­‑sucedida. A organização virtual tem uma série de
limitações. Por exemplo: ela poderá ter capacidade limitada para promo‑
ver a inovação e compartilhar conhecimento tácito.

7. É importante fazer uma série de perguntas essenciais sobre a organi‑


zação virtual: quando utilizá­‑la em vez das formas convencionais da or‑
ganização; saber se a organização virtual deve ser gerenciada de maneira
diferente; e como aplicar a abordagem virtual ao trabalho em equipe.

8. A possibilidade do trabalho em equipe virtual global está atraindo


muito interesse; pesquisas agora desvendam alguns dos requisitos para as
equipes virtuais globais funcionarem bem.

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9. A Dell Computer é uma empresa muito bem­‑sucedida que aplicou mui‑
tos aspectos da organização virtual em suas operações globais; ela ilustra
muitas das questões tratadas neste capítulo.

Questões para discussão


1. Quais são as principais características de uma organização virtual? Como
322 ela difere de (a) uma organização convencional e (b) uma organização
em rede?
parte iii  novas formas de trabalho em rede

2. Quais são os principais benefícios econômicos possíveis de uma


organização virtual?

3. Discuta os aspectos­‑chave que a gestão deve levar em conta ao estabelecer


uma comparação entre as formas organizacionais convencionais e as
virtuais.

4. Quais são as principais diferenças entre administrar uma organização


convencional e uma organização virtual?

5. Tomando como referência o Capítulo 8, compare o trabalho de equipe


virtual e o trabalho em uma organização convencional.

6. Tomando como referência o Capítulo 4, compare e contraste o trabalho


em equipe virtual e o convencional.

Notas
1. WARNER, Malcolm; WITZEL, Morgen. Managing in virtual organizations.
London: Thomson, 2003. p. 18.

2. HEDBERG, Bo; DAHLGREN, Göran; HANSSON, Jörgen; OLVE, Nils­‑Göran.


Virtual organizations and beyond: discover imaginary systems. Chichester: John
Wiley & Sons, 1997. p.13­‑14.

3. WARNER; WITZEL, 2004, op. cit. p. 18.

Book_Organizaçoes.indb 322 16/9/2011 16:23:45


4. DELL, Michael. Direct from Dell. New York: Harper Business, 2000. p. 185.

5. MALONE, Thomas W.; LAUBACHER, Robert J. The dawn of the e­‑lance eco‑
nomy. Harvard Business Review, p. 148, set./out. 1998.

6. WARNER; WITZEL, 2004, op. cit. p. 6.

7. WARNER; WITZEL, 2004, op. cit. Cap. 8 e 10.

8. BOISOT, Max. Knowledge assets: securing competitive advantage in the infor‑


323
mation economy. Oxford: Oxford University Press, 1998.

Organização virtual
9. POLANYI, Michael. The tacit dimension. London: Routledge and Kegan Paul,
1966.

10. CHILD, John; FAULKNER, David. Strategies of cooperation: managing allian‑


ces, networks and joint ventures. Oxford: Oxford University Press, 1998. p.
138.

11. LAWRENCE, Paul R.; LORSCH, Jay W. Organization and environment. Bos‑
ton: Harvard Business School Press, 1967.

12. MINTZBERG, Henry. The nature of managerial work. New York: Harper &
Row, 1972.

13. FAYOL, Henri. General and industrial management. London: Pitman, 1949
[publicado em francês, em 1916]. Para uma crítica das POSDCORB baseada
em observações do comportamento de CEOs, veja Henri Mintzberg.

14. FRITZ, Mary Beth; MANHEIM, Marvin L. Managing virtual work: a framework
for managerial action. In: SIEBER; GRIESE (Org.). Organizational virtualness:
proceedings of the VoNet Workshop. Bern: Simowa Verlag, 1998. p. 123­‑135.

15. Por exemplo, HANDY, Charles. How do you manage people whom you do not
see? Harvard Business Review, 73, p. 40­‑50, 1995; JARVENPAA, Sirkka L.;
SHAW, Thomas R. Global virtual teams: integrating models of trust. In: SIEBER;
GRIESE (Eds.), 1998, p. 35­‑52; HOLLAND, Christopher P. The importance of
trust and business relationships in the formation of virtual organizations. In:
SIEBER; GRIESE (Eds.), 1998, p. 53­‑64; ISHAYA, Tanko; MACAULAY, Linda.
The role of trust in virtual teams. In: SIEBER; GRIESE (Eds.). Organisational
virtualness and electronic commerce: proceedings of the 2nd International VoNet
Workshop. Bern: Simowa Verlag, p. 135­‑151, 1999.

16. CHILD; FAULKNER, op. cit. 1998.

Book_Organizaçoes.indb 323 16/9/2011 16:23:45


17. FRITZ; MANHEIM, 1998, p. 128, op. cit.

18. EOM, Sean B.; LEE, Choong Kwon. Virtual teams: an information age oppor‑
tunity for mobilizing hidden manpower. SAM Advanced Management Journal,
64(2), p. 12­‑15, 25, 1999.

19. LIPNACK, J.; STAMPS, J. Virtual teams: reaching across space, time and orga‑
nization with technology. New York: John Wiley & Sons, 1997.

324 20. ENGARDIO, Pete; BERNSTEIN, Aaron; KRIPALANI, Manjeet. The new glo‑
bal job shift. Business Week, p. 36­‑46, 3 fev. 2003.
parte iii  novas formas de trabalho em rede

21. MONTOYA­‑WEISS, Mitzi M.; MASSEY, Anne; SONG, Michael. Getting it to‑
gether: temporal coordination and conflict management in global virtual teams.
Academy of Management Journal, 44(6), p. 1251­‑1262, 2001.

22. MONTOYA­‑WEISS; MASSEY; SONG, 2001, op. cit.

23. MAZNEVSKI, Martha L. CHUDOBA, Katherine M. Bridging space over time:


global team dynamics and effectiveness. Organization Science, 11(5), p. 473­
‑492, 2000

24. LSHAYA; MACAULAY, 1999, op. cit..

25. DELL, 2000; MAGRETTA, Joan. The power of virtual integration: an inter‑
view with Dell Computer's Michael Dell. Harvard Business Review, mar./abr.,
1998, p. 73­‑84; HOPKINS, Nic. Computer pioneer aims for yet another bull's­
‑eye. The Times, p. 32, 6 jun. 2003; CASTRO, Léo de; OSSENDOTH, Volker;
PATIÑO, Maria E. Dell – a virtual organization. Monografia de MBA. Birmin‑
gham Business School, 27 fev. 2003.

26. HOPKINS, op. cit. 2003.

27. DELL, 2000, op. cit. p. 102.

28. MAGRETTA, op. cit. 1998, p. 74.

29. DELL, 2000, op. cit. p. 177.

30. Esse parágrafo e o próximo foram adaptados de CASTRO et al., 2003, op. cit.

31. MAGRETTA, 1998, op. cit. p. 75.

32. DELL, Michael. What you don't know about Dell. Business Week, 3, p. 46­‑ 54,
nov. 2003.

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Capítulo 10
Alianças estratégicas

Conteúdo do capítulo
Este capítulo começa pela definição de aliança estratégica e mostra sua
crescente importância nos negócios contemporâneos. Depois, o capítulo
detalha as diferentes formas que as alianças podem assumir em termos
de integração, situação jurídica e propriedade, e a intenção estratégica
do parceiro ao formá­‑las. Devido a sua natureza híbrida, as alianças
apresentam dificuldades especiais de gestão e organização. São discutidas
quatro dessas dificuldades: geração de confiança em uma aliança, o
conflito no papel da gestão da aliança, os choques entre culturas parceiras
e a conquista de suficiente controle do parceiro. A seção final identifica
três configurações encontradas nas joint ventures, cada uma das quais
adequada a diferentes circunstâncias e exigindo diferentes arranjos para
o bom desempenho. Essas configurações são a subsidiária, a parceria
equilibrada e a parceria em pequena escala.

10.1 O que é uma aliança estratégica?


Uma "aliança" é qualquer relacionamento de cooperação de médio
a longo prazo entre organizações, em geral entre empresas. Ela exclui
contratos de exclusividade ou de curto prazo e outros acordos que não
envolvam algum trabalho em conjunto entre empresas com o passar do
tempo. Às vezes as alianças recebem o adjetivo "estratégica" porque

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normalmente são formadas para ajudar as empresas parceiras a alcançar
objetivos estratégicos com base no fato de que isso pode ser feito melhor
em cooperação que individualmente. Assim, as alianças estratégicas são
os agentes do que passou a ser conhecido como "estratégia cooperativa".1
Em nome da simplicidade, passaremos a nos referir a essa forma organi‑
zacional como "aliança".

326 10.2 O significado crescente das alianças


As alianças e outras formas de cooperação entre empresas aumen‑
parte iii  novas formas de trabalho em rede

taram de modo notável a partir de meados dos anos 1980, e são hoje as
mais importantes novas formas organizacionais. Apesar dos problemas
administrativos e organizacionais que elas apresentam, não há sinais de
que sejam um fenômeno passageiro. Uma pesquisa de 2000 baseada num
questionário de 323 respostas e mais de 400 entrevistas com executivos do
alto escalão indicava a expectativa de que as alianças "seriam responsáveis
por 16% a 25% do valor da empresa mediana em cinco anos e, espantosa‑
mente, mais de 40% do valor de mercado de um quarto das empresas".2
Juntamente com a terceirização e as cadeias virtuais de valor, as
alianças são uma das formas que definem o atual trabalho em rede en‑
tre as empresas. Elas representam um claro rompimento com o modelo
hierárquico internalizado de empresa, do qual a General Electric e a
IBM eram exemplos há bem pouco tempo, nos anos 1980. Hoje, grandes
corporações como essas chegam a ter mil alianças, embora no passado
as tenham considerado uma atividade relativamente periférica. As alian‑
ças eram usadas para entrar nos mercados de países emergentes em que
os riscos eram altos ou as regulamentações do governo exigiam joint
ventures (JVs) ou acordos de licenciamento. Atualmente, as alianças são
consideradas um meio para se alcançar objetivos estratégicos fundamen‑
tais, como uma boa posição no mercado, aquisição de conhecimento e
redução de custos.

10.3 Formas da aliança


As alianças assumem grande variedade de formas, que diferem entre
si em algumas dimensões essenciais:

Book_Organizaçoes.indb 326 16/9/2011 16:23:45


1. grau de integração organizacional entre os parceiros;

2. forma de propriedade legal e jurídica;

3. intenção estratégica primordial.

10.3.1 Integração organizacional


O nível mais alto de integração entre empresas é a fusão ou a aqui‑
327
sição de uma pela outra. A rigor, a fusão não é uma aliança, porque em
geral sua meta é mais uma estrutura global única, em que as identidades

Alianças estratégicas
de cada empresa desaparecem. No caso de uma aquisição, a empresa
adquirente procura integrar a adquirida à sua estrutura ou dirigi­‑la como
subsidiária. Mais uma vez, o resultado não é uma aliança no sentido de
empresas trabalhando juntas como parceiras. Passando ao outro extremo
da escala, existem alianças inteiramente informais, firmadas apenas com
um aperto de mãos, sem nenhuma base contratual. Outras alianças re‑
lativamente informais incluem os arranjos para troca de informação ou
para compartilhar canais de distribuição. As JVs entram na faixa média
de integração, entre fusões totalmente integradas e parcerias informais.
São as formas de alianças mais comuns.

10.3.2 Formas legais e de propriedade


As formas jurídica e de propriedade das JVs variam bastante. Algumas
se baseiam inteiramente em contratos, sem nenhuma participação con‑
junta. Um exemplo desse tipo é a parceria "construa, opere, transfira"
muitas vezes usada em projetos de infraestrutura, como a construção de
estradas com pedágio. Nesse caso, um parceiro entra com o financiamen‑
to e a tecnologia para construir a instalação; depois a opera por algum
tempo, recolhendo os pagamentos ou royalties, antes de entregá­‑la ao ou‑
tro parceiro. Em outras JVs também há uma troca de participação entre
os parceiros, ou é estabelecida uma JV de participação, em que cada um
dos parceiros assume uma parte. Essas participações acionárias podem
ser iguais ou desiguais, o que significa que as participações na JV podem
variar de "meio a meio", participações semelhantes ou dominantes, ou
seja, um dos parceiros tem a maioria acionária.

Book_Organizaçoes.indb 327 16/9/2011 16:23:45


A Figura 10.1 combina as dimensões jurídica e de grau de integração
para identificar as formas de alianças normalmente existentes. A tabela
apresenta as diferentes formas dentro de um amplo escopo possível de
ligações interfirmas. Acordos exclusivamente contratuais compreendem
formas tradicionais e formas não tradicionais. Contratos tradicionais en‑
tre empresas, como os de compra e venda, franquias e contratos de licen‑
ciamento, normalmente seriam considerados alianças, a não ser quando
são de longo prazo, servindo de base a um relacionamento permanente
328
de cooperação. Isso nos leva à área dos contratos não tradicionais, em
que há certo grau de organização conjunta, como equipes conjuntas de
parte iii  novas formas de trabalho em rede

projetos. As formas não tradicionais de contratos, como projetos con‑


juntos de P&D, fabricação conjunta e distribuição conjunta estão se tor‑
nando cada vez mais comuns. Tais contratos oferecem alguns benefícios,
como a associação de colaborações de conhecimento técnico e as econo‑
mias da criação de um sistema de distribuição conjunta no território de
um novo mercado.
Outras formas de aliança envolvem a participação de algum capital
pelas empresas parceiras. O grau de propriedade em geral corresponde
à intensidade de integração entre a aliança e os parceiros, e entre os
próprios parceiros. Quando a aliança envolve apenas um investimento
de participação minoritária ou uma troca de participação, sem nenhu‑
ma nova entidade conjunta sendo estabelecida, o nível de integração
dos parceiros pode ser baixo – talvez reduzido a projetos em conjunto
e à troca de informações. Os investimentos dos parceiros neste caso
simbolizam a mútua disposição e o empenho, mas não o aporte de
capital para estabelecer uma nova unidade operacional. Outra forma
de arranjo é a criação de uma JV, que pode ser semi­‑independente das
empresas que a formaram ou subsidiária de uma delas. Isso vai depen‑
der da extensão da propriedade e da gestão desse contrato de risco.3
Se a JV for administrada como subsidiária de uma empresa, pode­‑se
questionar se é realmente uma parceria entre os donos do negócio. A
terceira forma de arranjo baseado na participação é a fusão ou aquisi‑
ção, e como já observado, não se trata de uma aliança no sentido mais
rigoroso da palavra.

Book_Organizaçoes.indb 328 16/9/2011 16:23:45


Figura 10.1  Formas de aliança na faixa das ligações entre empresas

Associações entre empresas

Book_Organizaçoes.indb 329
Acordos contratuais Acordos de participação

Contratos Contratos Criação de entidade


Sem criação de nova Dissolução de entidade
tradicionais não tradicionais
entidade

P&D em Joint ventures não Joint ventures


Compra/venda conjunto Investimento subsidiárias subsidiárias de
próximas com participação
Desenvolvimento de multinacionais
minoritária
Franquias produto em conjunto JVs 50 x 50 Fusões e
Licenciamentos Permutas de (“meio a meio”) aquisições
Acordos de terceirização
de longo prazo participação JVs de participação
Licenciamento cruzado
desigual
Fabricação em conjunto
Comercialização
conjunta
Serviços/distribuição
compartilhados
Consórcios de pesquisa/
padronização

Alianças

Alianças estratégicas
329

16/9/2011 16:23:46
10.3.3 Intenção estratégica
Outra maneira de categorizar as alianças é com relação à intenção
estratégica que os parceiros têm ao formá­‑las. Contractor e Lorange iden‑
tificam sete "objetivos mais ou menos sobrepostos" para a formação de
uma aliança:4

1. Redução do risco: compartilhar o investimento em um novo negó‑


cio pode reduzir o risco que uma empresa pode enfrentar, especial‑
330
mente se o parceiro tiver bom conhecimento e conexões locais.
parte iii  novas formas de trabalho em rede

2. Obtenção de economias de escala e/ou racionalização: a economia


de escala pode não ser obtida por uma empresa sozinha.

3. Troca de tecnologia: dados os elevados custos da P&D e o poten‑


cial criativo que surge entre especialistas de duas ou mais empresas
que trabalham em colaboração, uma aliança de tecnologia oferece
os benefícios de custo e inovação.

4. Antecipação dos movimentos da concorrência: juntar­‑se a outras


empresas pode aumentar sua força no mercado.

5. Superação de barreiras de comércio ou investimento impostas pelo


governo: em algumas economias emergentes ou em transição os
governos exigem parcerias com empresas locais para permitir o
comércio ou o investimento. Essa condição tende a desaparecer no
momento em que mais países entram na Organização Mundial do
Comércio ou assinam tratados bilaterais de investimento.

6. Facilitação da expansão internacional inicial de empresas sem


experiência: alianças com empresas experientes podem ajudar
na expansão internacional; muitas empresas de pequeno e médio
portes se internacionalizam como parceiras na cadeia de valor de
multinacionais maiores.

7. Vantagens da semi­‑integração vertical: podem surgir da associação das


contribuições complementares dos parceiros em uma cadeia de valor.

Dussauge e Garrette dividem as alianças em seis tipos distintos, ba‑


seados nos objetivos que elas desejam atingir. Três tipos são alianças en‑
tre concorrentes e os outros três são entre empresas não concorrentes
(Quadro 10.1).5

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Quadro 10.1  Tipos de aliança

Parcerias entre empresas não concorrentes:


„„ JVs para expansão internacional
„„ Parcerias verticais
„„ Acordos entre indústrias
331
Alianças entre concorrentes:

Alianças estratégicas
„„ Alianças para compartilhar a cadeia de fornecimento
„„ Alianças de semiconcentração
„„ Alianças complementares

Fonte: DUSSAUGE, Pierre; GARRETE, Bernard. Cooperative Strategy: competing successfully


through strategic alliances. Chichester: John Wiley & Sons, 1999. Capítulo 4.

„„ JVs para expansão internacional em geral são estabelecidas para


superar barreiras de comércio ou investimento ou para facilitar
a expansão internacional inicial em territórios onde os riscos são
altos; quando a empresa não conhece muito bem as condições
locais ou quando os governos exigem parcerias com empresas
locais. Essas razões explicam o fato de JVs terem predominado
no período inicial do investimento na China; depois de 1997,
subsidiárias com capital total próprio passaram a ser a forma
preferida.

„„ Parcerias verticais são alianças entre empresas que operam em


duas etapas sucessivas da mesma cadeia de valor. Em geral são
formadas para obter vantagens da integração semivertical, racio‑
nalizar a produção pela especialização em competências essen‑
ciais ou compartilhar os custos do desenvolvimento de novas
tecnologias. Por exemplo, a Intel e a Hewlett­‑Packard criaram
uma JV para projetar um microprocessador de nova geração e o
sistema operacional a ser construído em torno dele. Com isso, as
duas empresas juntaram suas competências essenciais, que eram
complementares, e também compartilharam os imensos custos de
desenvolvimento.

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„„ Acordos entre indústrias podem reunir competências complemen‑
tares e contribuir para a diversificação ou antecipar a concorrência
em um novo terreno. Por exemplo, a American Airlines (AA) e a
empresa ferroviária nacional da França, SNCF, criaram uma joint
venture – a Resarail 2000 – para desenvolver um novo sistema
informatizado de venda de passagens para redes ferroviárias, apli‑
cando a tecnologia em que a AA foi pioneira: reservas aéreas. A
American Airlines contribuiu com sua longa experiência e conhe‑
332
cimento de sistemas informatizados de reserva, e a SNCF contri‑
buiu com uma profunda compreensão dos serviços ferroviários e
parte iii  novas formas de trabalho em rede

das necessidades dos usuários. Em outro exemplo, a Philips e a


Dupont criaram uma JV para juntar a tecnologia do disco ótico da
primeira com o know­‑how da segunda sobre produtos químicos
e a produção de revestimentos de superfície para os discos óticos.

Esses três tipos são alianças formadas entre empresas não concor‑
rentes, o que costuma facilitar o desenvolvimento de um relacionamento
cooperativo de longa duração com base na confiança e em interesses com‑
plementares. Os outros três tipos identificados por Dussauge e Garrette
são alianças entre empresas concorrentes, fato esse que pode criar sérias
tensões no relacionamento da aliança. Assim, é claro que os benefícios
comerciais desse tipo de aliança devem superar os riscos envolvidos.

„„ Alianças para compartilhamento de fornecimento são formadas


para obtenção de economias de escala e, em geral, para reduzir
os riscos, compartilhando os custos de P&D. Um exemplo é a
Butachemie, uma JV criada entre duas concorrentes da indústria
química – a Dupont e a Rhône­‑Poulenc – para abastecer as duas
empresas com um produto químico intermediário que ambas utili‑
zavam. Nenhuma dessas duas empresas era grande o suficiente
na Europa para obter economias de escala na produção, e isso
era especialmente importante dado o alto investimento de capital
inicial necessário.

„„ Alianças de semiconcentração podem ser estabelecidas para


enfrentar a concorrência e reduzir os riscos mediante o compar‑
tilhamento de custos de P&D. Uma aliança desse tipo muito
bem­‑sucedida e que existe há muito tempo é a Airbus Industrie, em
que concorrentes europeus fabricantes de estruturas de avião se

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juntaram para enfrentar a ameaça da concorrência de fabricantes
norte­‑americanos, especialmente da Boeing, e também para unifi‑
car os altíssimos custos de P&D que caracterizam o setor.

„„ Alianças complementares geralmente são formadas para alcan‑


çar sinergias potenciais. Muitas das alianças entre empresas da
biotecnologia e farmacêuticas, ou entre as farmacêuticas entre
si, são desse tipo. Elas são concorrentes potenciais que procuram
os benefícios de unir forças complementares, como a inventivi‑ 333
dade da pequena empresa de biotecnologia e a força financeira,

Alianças estratégicas
de fabricação e comercialização da grande empresa farmacêutica.
Paradoxalmente, a própria complementaridade entre dois tipos
tão diferentes de empresas, com suas abordagens antagônicas da
organização e da gestão, pode resultar em sérios problemas que
põem em risco sua capacidade de trabalhar juntas.6 Apesar disso,
o número de alianças que visam promover a troca de conhecimen‑
tos e unir o desenvolvimento tecnológico hoje é muito grande.7

10.4 Dificuldades organizacionais impostas


pelas alianças
As alianças são uma forma "híbrida" de organização, em que o pes‑
soal designado ou indicado pelos diferentes parceiros tem de aprender
a trabalhar junto.8 Se um dos parceiros dominar a aliança, talvez con‑
siga gerenciar essa aliança como uma organização unitária convencio‑
nal. Contudo, se a parceria for relativamente equilibrada, para a qual os
parceiros contribuem em termos de participação e gestão, será preciso
encontrar a maneira de conciliar suas diferentes estruturas, estilos e cultu‑
ras de organização.9 Não é uma tarefa simples, especialmente quando há
algum conflito de interesses ou desconfiança entre os parceiros, caso esse
em que rivalizam para assumir o controle sobre a aliança ou sobre suas
funções mais importantes.

10.4.1 Conquista da confiança


Conforme já mencionado, os benefícios das alianças podem não se
materializar por causa das dificuldades administrativas geradas por essa
forma híbrida de organização. Muitos executivos afirmaram ao autor sua

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ideia de que as alianças são o arranjo organizacional menos preferido –
se possível, a ser evitado. A maioria das multinacionais (CMNs) procura
estabelecer suas próprias subsidiárias como alternativa às JVs ou, na im‑
possibilidade de evitar as últimas, manter o controle administrativo por
meio de participação acionária majoritária garantida por direitos contra‑
tuais claros.
O Capítulo 14 discute em detalhes como as alianças devem ter
como base a confiança entre os parceiros e seu pessoal. Embora ge‑
334
ralmente sejam estabelecidas contratualmente, elas precisam desen‑
volver arranjos de trabalho e relacionamentos que vão além desse
parte iii  novas formas de trabalho em rede

contrato, de modo a ter um bom desempenho e evoluir com o tempo.


O problema é que a confiança é um fenômeno frágil e pode ser facil‑
mente erodido por uma série de fontes inerentes de tensão. Quando as
empresas entram em uma aliança apenas para ganhos de curto prazo
e permanecem concorrentes, é provável que se preocupem mais com
o fato de não entregar de mão beijada benefícios a seus parceiros do
que em trabalhar com eles para obter vantagem mútua. O Capítulo 13
descreve como isso tem acontecido em situações em que parceiros de
aliança estão mais preocupados em usar a aliança como uma oportu‑
nidade para conseguir a tecnologia ou outros conhecimentos de seus
parceiros e não em trocar conhecimento para inovar em conjunto ou,
no mínimo, em aprender com o outro. Em um relacionamento desse
tipo, que permanece fundamentalmente competitivo, um parceiro não
pode permitir que o outro obtenha mais vantagem por meio da alian‑
ça. Se isso acontece, ou seja, um parceiro estabelecendo canais pri‑
vilegiados para acessar informações oriundas da JV, ele pode acabar
conquistando uma posição dominante na aliança. Portanto, seria de
esperar que os três tipos de aliança entre concorrentes, identificados
por Dussauge e Garrette, tenham mais tensões e conflitos a resolver,
e assim os parceiros precisam trabalhar muito seriamente para criar
a confiança mútua.

10.4.2 Conflito do papel administrativo


Executivos de JVs e outras novas unidades estabelecidas por parcei‑
ros de aliança podem se ver sujeitos a pressões. Isso dá origem a uma si‑
tuação em que o gerente está sujeito a prioridades e pressões conflitantes
de fontes variadas. As empresas parceiras geralmente formam alianças a

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partir do pressuposto de que seus objetivos são complementares e que po‑
dem então ser alcançados por meio de uma parceria. Entretanto, isso não
significa que suas prioridades para a aliança sejam as mesmas. Por exem‑
plo, um parceiro pode buscar retornos de curto prazo enquanto o outro
pode preferir reinvestir o excedente nos primeiros anos para reforçar a
posição de mercado da aliança. De modo geral, foi esse o caso das JVs
entre parceiros chineses e internacionais, em que os primeiros buscavam
retornos mais imediatos.
335
Se cada matriz esperar que o gerente geral de uma JV busque diferen‑
tes prioridades, o gerente ficará em uma posição difícil. Também podem

Alianças estratégicas
surgir conflitos com a matriz quando o gerente geral procura desenvolver
a JV como uma empresa independente. Isso acontecerá, por exemplo, se
a JV começar a competir com as matrizes em seus mercados.10 Como já
observado, pode haver discussão se se deve reinvestir os lucros na JV ou
distribuí­‑los entre as matrizes. Além disso, o gerente geral precisa enfren‑
tar as pressões normais de acionistas e diversos grupos de empregados.
Se o pessoal da JV for transferido ou indicado pelas diversas matrizes, o
gerente geral terá de dedicar mais tempo para resolver os conflitos entre
esse pessoal vindo das diferentes empresas.
É muito provável que pressões e expectativas incompatíveis como
elas causem um "conflito de papéis" do gerente geral. Usualmente tal
conflito tende a ser mais grave quanto maior for a diferença entre os ob‑
jetivos das matrizes, suas formas de propriedade, tamanho e culturas. A
gravidade do conflito pode ser ainda maior quando o gerente da aliança
precisa satisfazer duas matrizes igualmente fortes, com diferentes priori‑
dades. A experiência, o treinamento e o nível de instrução podem ajudar
os gerentes das alianças a lidar com esse conflito de papéis, mas talvez
isso resulte em tensão, insatisfação, tomadas de decisão inseguras e baixa
produtividade. Alguns desses conflitos são inevitáveis por causa da na‑
tureza inerentemente híbrida das alianças, mas sem dúvida contribuirão
para o fracasso da JV e de seus gerentes.
O que pode ser feito para atenuar esse problema? Se a solução for
deixar cada gerente tratar de seu problema, é bem possível que surjam
comportamentos não funcionais. Eles podem ser obrigados a se proteger
das pressões conflitantes dizendo coisas diferentes para as diferentes fon‑
tes de pressão. Eles podem estar sempre mudando, "arrumando as velas
conforme o vento", como se diz, o que pode resultar em decisões frágeis
e critérios muito perturbadores para seus subordinados. Eles podem se

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omitir, retardando tomadas de decisões importantes, ou buscar o com‑
promisso que, muitas vezes, dá origem a uma solução subótima.
A única maneira construtiva de sair desse dilema é uma abordagem
proativa. A pesquisa mostra que os métodos informais, por meio dos
quais a gerência de uma JV exerce influência sobre os altos escalões,
como persuasão e a aquisição de confiança da matriz, são os mais efica‑
zes.11 Entre outras ações construtivas estão os esforços do gerente geral de
trazer qualquer conflito "à mesa" para discussão, pedindo que as empre‑
336
sas matrizes esclareçam e conciliem as exigências que impõem à aliança,
propondo soluções construtivas integrando essas exigências. As pressões
parte iii  novas formas de trabalho em rede

das matrizes também podem diminuir quando a JV for suficientemente


bem­‑sucedida para andar com os próprios pés, sem depender mais destas
para recursos e outras ajudas. Como já foi observado, o problema é que
algumas diretorias das matrizes receiam perder o controle sobre uma JV
que se torna autossuficiente demais.
De sua parte, as matrizes podem tomar certas providências para
minimizar o conflito que os gerentes de aliança experimentam. Isso
inclui:

1. clarificar e apoiar a autoridade do gerente geral;

2. criar posições especiais de ligação com a JV, ajudando na compre‑


ensão e no desenvolvimento de uma abordagem política em
comum em relação à aliança e também para representar o ponto
de vista da própria aliança. Esses papéis são às vezes conhecidos
como "guardiões da aliança";12

3. estabelecer mecanismos claros para resolver as disputas entre


matrizes e/ou outras partes que estejam impondo pressões diver‑
gentes sobre a gestão da aliança;

4. criar processos para a ampla disseminação da informação e opini‑


ões dentro das alianças em suas redes de matrizes, departamentos
do governo, fornecedores e assim por diante.

10.4.3 Choques entre as culturas parceiras


As alianças requerem a cooperação entre parceiros que têm culturas
organizacionais diferentes. No caso de alianças entre fronteiras, como
as JVs internacionais, as diferenças das culturas organizacionais dos

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parceiros serão muito provavelmente acentuadas pelas diferenças em
suas culturas nacionais. Tais diferenças exigem uma gestão cuidadosa, ou
gerarão mal­‑entendidos, desconfiança e até o rompimento da parceria.
Por essa razão, muitos consideram indispensável avaliar o "entrosamen‑
to cultural" como parte da seleção do parceiro de aliança.13 O problema
é que, por razões estratégicas e econômicas, como a necessidade de um
parceiro local para facilitar a entrada em um novo mercado, talvez não
seja sempre possível alcançar um bom entrosamento cultural. Se for esse
337
o caso, a prioridade tem de ser dada à maneira de tratar de diferenças
culturais. Apesar de alguns gerentes as considerarem barreiras para uma

Alianças estratégicas
boa cooperação, elas têm um lado positivo também. A cultura se reflete
nos métodos, e uma parte importante da contribuição dos parceiros para
as alianças está em seus "modos de fazer" singulares, algum dos quais
podem ser adotados por outros parceiros, porque funcionam ou servem
melhor no contexto em que a aliança opera.
A cultura tem sido definida de muitas formas diferentes. Basicamente,
é uma série de convicções e valores compartilhados, nos quais as normas
de comportamento e identidade comum se baseiam. Com o tempo, as cul‑
turas ganham várias formas tangíveis. As normas se transformam em re‑
gras sociais pelo desenvolvimento de instituições como o sistema jurídico
e as cerimônias formais. A cultura de uma sociedade também é expressa
em seus artefatos e tecnologias.
Dimensões semelhantes podem identificar a cultura de uma organi‑
zação, como uma empresa. Sempre existe alguma variação na maneira
como as pessoas entendem suas culturas nacionais ou regionais, mas
talvez haja menos consenso sobre o que é a cultura de uma empresa,14
porque ela é uma organização pluralista, constituída por grupos ou ca‑
tegorias de pessoas que diferem segundo a ocupação, nível hierárquico
e, às vezes, a nacionalidade. Para incentivar alguma identificação com a
empresa entre esses grupos diversos, a direção muitas vezes procura criar
a chamada "cultura corporativa" – por meio, por exemplo, de declara‑
ções de missão, estabelecimento de metas, treinamento de empregados,
encorajando certas normas e estilos de comportamento e formalizando
essas práticas organizacionais.
Existem áreas em que as diferenças culturais entre os parceiros de
alianças podem criar dificuldades para a gestão da aliança. Essas diferen‑
ças dizem respeito a autoridade, relacionamento, incerteza e tempo. A
seguir, alguns exemplos.

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Autoridade
Um dos problemas mais citados por gestores ocidentais em alian‑
ças em países emergentes mais tradicionais é que o pessoal local reluta
em assumir responsabilidade e exercer a autoridade. Isso foi associado
a uma "distância do poder" maior entre os níveis hierárquicos nessas
sociedades – em outras palavras, há uma deferência maior em relação
a uma autoridade superior, e nenhuma disposição em questioná­‑la.15 As
alianças entre grandes companhias formalizadas e pequenas empresas in‑
338
formais podem naufragar porque suas atitudes e métodos em relação à
autoridade diferem. Por exemplo, na aliança entre a gigante farmacêu‑
parte iii  novas formas de trabalho em rede

tica Ciba­‑Geigy e a pequena empresa AZ, os gerentes da AZ tentavam


se comunicar com quem lhes parecia mais adequado na hierarquia da
Ciba­‑Geigy, independentemente do grau de autoridade formal. Isso cau‑
sou imenso ressentimento na direção da Ciba­‑Geigy, aumentando uma
desconfiança que mais adiante levou ao término da aliança. Na cultura
informal da AZ, as pessoas se dirigiam diretamente à pessoa apropriada,
sem levar em conta o nível de autoridade formal; na cultura formalizada
da Ciba­‑Geigy, esperava­‑se que as pessoas se comunicassem com outras
do mesmo nível.16

Relacionamentos
As diferenças em atitudes culturais nos relacionamentos às vezes
criam uma tensão entre a ideia de aplicar as mesmas regras a todos, inde‑
pendentemente de laços pessoais ou de amizade ("universalismo") versus
a ideia de levar esses laços em conta ("particularismo"). Em uma aliança
entre organizações muito opostas na dimensão universalismo/particula‑
rismo, será mais difícil estabelecer a confiança mútua, que deve ser a base
de um bom relacionamento. Tal questão influenciou na escolha dos mé‑
todos de seleção e recrutamento para as JVs entre CMNs e parceiros chi‑
neses.17 As primeiras preferem procedimentos universais padronizados,
enquanto os chineses costumam valorizar o uso de conexões familiares
ou afins.

Incerteza
Organizações e países diferem quanto à maneira como estimulam as
pessoas a evitar o risco e a incerteza ("evitação de incerteza").18 Uma or‑
ganização com uma cultura contrária ao risco provavelmente enfatizará

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o controle e a certeza por meio do estabelecimento de regras formais, não
tolerando ideias e comportamentos transgressores e recompensando seus
empregados com o avanço na carreira e não com um pagamento asso‑
ciado ao desempenho. Embora empresas há muito consolidadas frequen‑
temente entrem em alianças com pequenas empresas numa tentativa de
melhorar sua criatividade e capacidade inovadora, elas podem fracassar
nesses objetivos, quando sua cultura prefere evitar o risco e a incerteza.

339
Tempo

Alianças estratégicas
O interesse pelo tempo há muito foi observado como dimensão fun‑
damental da diferença cultural.19 Ele pode se manifestar superficialmente,
quando surge alguma tensão entre o pessoal da aliança oriundos de cultu‑
ras diferentes, porque um grupo se mantém rigoroso em relação às ques‑
tões de tempo e outro não. Isso pode se traduzir em falta de confiança, se
um dos parceiros se sentir desapontado em virtude da falta de confiabili‑
dade do outro, por exemplo, em cumprir prazos previamente acordados.
Fundamentalmente, culturas corporativas e nacionais diferem quanto à
orientação mais para o longo ou mais para o curto prazo. Isso pode levar
desacordo em uma aliança com relação a decisões sobre as políticas a se‑
guir, como pagar os lucros ou como reinvesti­‑los no futuro.
Se o prejuízo potencial que pode resultar de diferenças culturais nas
alianças é reconhecido e providências são tomadas, a diferença cultural
pode não ser um problema sério. Essa necessidade é para aqueles que se
preocupam em ter compreensão e sensibilidade em relação às diferenças
culturais, e que respondem de maneira flexível e construtiva. Um caso
em minha pesquisa, resumido no Quadro 10.2, ilustra tanto o risco da
insensibilidade cultural quanto o de se evitá­‑la.

Quadro 10.2  A necessidade de sensibilidade cultural em uma aliança

Uma joint venture entre uma companhia multinacional holandesa e um par‑


ceiro chinês quase acabou porque o primeiro gerente geral, um europeu com
pouca experiência em negócios internacionais, insistiu em introduzir os méto‑
dos de sua matriz com muita agressividade e sem nenhuma sensibilidade
cultural. Ele não apenas deixou de consultar seus colegas chineses, como se
empenhou em impor suas ideias com um comportamento arrogante e inade‑
quado nas reuniões, algo especialmente ofensivo à normas culturais chinesas.

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Nessa JV, como os parceiros chineses juntos detinham 60% da participação, o
que lhes dava maioria nas assembleias, eles insistiam em substituir o gerente
antes que as relações fossem inteiramente rompidas. O substituto, um canaden‑
se com ampla experiência em negócios internacionais, conseguiu reparar o dano
adotando um estilo bem mais suave, culturalmente mais aceitável pelos chine‑
ses. Ele consultava periodicamente o subgerente chinês, especialmente antes
das reuniões de todos os executivos mais experientes. Também tomou o cuidado
de não provocar em público nenhum arranhão na respeitabilidade dos outros, e
340
envolveu mais os gerentes chineses no processo de comunicar as informações
aos empregados.
parte iii  novas formas de trabalho em rede

10.4.4 Controle
O controle geralmente é considerado uma questão decisiva na boa
administração das alianças. De fato, há muitas empresas que só aceitam
entrar em uma aliança se tiverem garantido o direito de administrá­‑la.
Isso acontece em alianças entre corporações multinacionais e empresas
locais menores e sem experiência, quando os gerentes das multinacionais
alegam ter know­‑how tecnológico superior e pleno conhecimento da ges‑
tão. O controle é uma preocupação porque a formação de uma aliança
exige que os parceiros o compartilhem, o que introduz um elemento de
incerteza. Geringer e Hébert expressaram a questão quase graficamente
com relação às JVs internacionais (JVIs): "embora, por definição, cada
parceiro deva ceder parte do controle sobre as atividades de uma JVI, em
geral esse movimento é acompanhado por enorme consternação".20
A maneira como uma aliança é constituída e organizada tem cla‑
ras implicações sobre as oportunidades de um parceiro exercer controle
sobre ela. No caso de uma JV com participação acionária, a maioria
das ações normalmente dá direito à maioria no conselho da diretoria.
Isso permite que o parceiro controle as políticas e a tomada de decisões
estratégicas, sujeitas a algumas limitações. Uma delas é que, em alguns
países, há necessidade da maioria de dois terços da diretoria para certas
decisões importantes, e a unanimidade para decisões cruciais, como ter‑
minar a aliança, por exemplo. Outra limitação mais fundamental é que,
se a racionalidade de uma aliança for assegurar os benefícios de uma
parceria cooperativa, tais benefícios correm riscos se um parceiro insistir
em impor decisões em função de seu direito de participação contra o

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desejo do(s) outro(s) parceiro(s). Uma terceira limitação é que as deci‑
sões estratégicas precisam ser implementadas. Isso significa que um par‑
ceiro que esteja buscando o controle total também deve estar atento aos
mecanismos e cláusulas que lhe darão o controle operacional. A pesquisa
identificou alguns deles.21
A indicação de gerentes para assumir funções decisivas pode ser um
bom recurso para um parceiro assegurar o controle operacional em uma
aliança. O parceiro pode realmente decidir focar seu controle em certas
341
áreas da aliança, como a qualidade e a tecnologia do produto e a promo‑
ção dos interesses de sua participação com marca internacional. Como as

Alianças estratégicas
nomeações de executivos do alto escalão costumam ser decididas pela di‑
retoria, ter a maioria é a condição mais importante para garantir o direito
de fazer essas nomeações. Acordos contratuais formais podem estabelecer
certos direitos de decisão a um dos parceiros em relação a questões de ad‑
ministração da aliança, como sua estrutura, as principais nomeações, os
sistemas administrativos e métodos utilizados na gestão, e suporte para
treinamento. Além disso, os acordos contratuais podem determinar os
direitos de um parceiro no uso de suas tecnologias pela aliança.
Métodos não contratuais também podem melhorar o controle sobre
as operações de uma aliança. Por exemplo, ao fornecer apoio do RH a
uma aliança, um parceiro pode selecionar pessoas que tenham as quali‑
ficações necessárias e que aceitarão sua cultura e a maneira de fazer as
coisas. Ele pode reforçar essa aceitação com treinamento e avaliações. As
CMNs em particular estão interessadas em exportar as culturas e méto‑
dos corporativos para suas alianças, o que aumenta seu controle sobre
elas e melhora a integração da rede global da multinacional.22 O suporte
na forma de métodos e sistemas para uma aliança aumenta a influência
de um parceiro sobre as áreas operacionais envolvidas e com frequência
é feito sem contrato.
Há uma série de métodos informais que podem intensificar o controle
de um dos parceiros sobre a aliança. Um desses métodos é a manutenção
de um relacionamento regular e pessoal com o alto escalão da aliança.
Muitas vezes escutei queixas de executivos de alianças de que sua influên‑
cia em nome da empresa­‑mãe é sabotada por causa da aparente falta de
interesse apresentada pela matriz. Mesmo quando o parceiro tem apenas
minoria no conselho de uma JV, a indicação de diretores bem informados
sobre a aliança, com grande qualificação e muita experiência, pode me‑
lhorar consideravelmente sua influência em decisões relativas às políticas

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da empresa. Um parceiro pode ter influência bem maior quando mostra
vivo interesse e apoia a aliança, em parte por causa do impacto do envol‑
vimento pessoal e em parte por causa da boa disposição e confiança que
tal interesse desperta no(s) outro(s) parceiro(s).

10.5 Configurações das alianças


A diversidade de formas das alianças mostra que não há uma ma‑
342
neira única de se organizar as alianças. Diferentes configurações de
propriedade, controle e administração parecem viáveis sob diferentes
parte iii  novas formas de trabalho em rede

circunstâncias. Formas alternativas de aliança atendem às contingências


existentes.23 Minha investigação detalhada de 20 joint ventures de capital
entre empresas chinesas e parceiros ingleses identificou várias configura‑
ções, cada uma capaz de ter desempenho satisfatório.24 Do ponto de vista
dos parceiros do Reino Unido (os estrangeiros), essas configurações pode‑
riam ser respectivamente chamadas de subsidiária representante, parceria
equilibrada e parceria minoritária.

10.5.1 A subsidiária representante


Essa configuração baseia­‑se em uma participação majoritária do
acionista estrangeiro. É tipicamente encontrada em JVs com grande in‑
vestimento de capital. Nesses casos, a escassez de capital dos parceiros
locais faz com que tenham uma participação minoritária nos projetos.
Comparada com as outras duas configurações, parceiros estrangeiros
com a maioria das ações e por deterem o controle global da JV tendem
a insistir menos em salvaguardas contratuais para proteger os recursos a
mais que tenham de fornecer, pois podem decidir sobre seu uso e assegu‑
rar o devido retorno por deterem o controle global da JV. Esse controle
normalmente é reforçado pela presença de gerentes e executivos expatria‑
dos, especialmente na qualidade de gerentes gerais e chefes de departa‑
mentos financeiros e de funções técnicas.
Parceiros estrangeiros com participação majoritária remetem mais
decisões acima da diretoria da JV para os níveis corporativos ou regionais
do que nas demais configurações. As diretorias da JV, que são o princi‑
pal canal de representação da parceria chinesa, assumem função menos
importante nas tomadas de decisões nessa configuração. Embora se apli‑
quem os dispositivos normais, ou seja, a unanimidade em questões como

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a aprovação de seus planos de negócios, geralmente as JVs com partici‑
pação majoritária britânica na verdade são dirigidas como subsidiárias.
O contexto formador da subsidiária representante é distinto. A
maioria das JVs nessa categoria foi estabelecida por corporações multi‑
nacionais com imensa experiência em negócios internacionais. As CMNs
ocidentais tendem a preferir o controle total, quando não a propriedade
exclusiva, das afiliadas. Sua experiência anterior costuma proporcio‑
nar mais confiança para administrar a entrada num novo mercado sem
343
contar com parceiros locais. A concessão de propriedade majoritária
de JV se tornou cada vez mais fácil na China, conforme afrouxavam

Alianças estratégicas
as restrições e o crescimento e o investimento estrangeiro cresciam nos
anos 1990. As CMNs passaram a ser cada vez mais favorecidas pelas
autoridades chinesas, porque eram fornecedoras de investimento dire‑
to estrangeiro e tinham capital, know­‑how e tecnologia avançada para
oferecer. Nesse aspecto, a subsidiária representante ilustra o crescente
número de CMNs que estão entrando na China e em outros mercados
emergentes como o Brasil, com projetos relativamente grandes e inten‑
sivos em capital.
Uma participação majoritária geralmente é recomendada como for‑
ma de diminuir o risco da perda de controle, assegurar uma gestão única
e obter a consolidação entre inúmeras parcerias. Contudo, há outro risco:
o de marginalizar e desmotivar o parceiro local, que tende a limitar suas
contribuições às operações, com conhecimentos e conexões locais que fa‑
cilitam a formação das redes. Convencionalmente, defende­‑se a participa‑
ção majoritária porque esta reduziria a complexidade. Se necessário, ela
sacrifica a qualidade das relações com o parceiro em troca do benefício
percebido de ter as suas políticas executadas sem discussões ou atrasos,
e conforme os procedimentos padronizados da organização da matriz
estrangeira.
Houve dois casos entre as joint ventures do Reino Unido estudadas
na China que foram exceções a esse modelo. Elas sinalizam a possibi‑
lidade de se ter a palavra final no processo de definição da estratégia
da JV em função da participação majoritária, mas também de incluir o
parceiro local no processo de tomada de decisão. A participação domi‑
nante não precisa ser usada para a gestão da subsidiária representante;
ela também permite a opção de gerenciar a JV como parceria. Em vez
de tentar reduzir a complexidade por meio da unilateralidade e da pa‑
dronização, essa política permite que o parceiro local contribua para

Book_Organizaçoes.indb 343 16/9/2011 16:23:47


o processo de absorção a complexidade e possa oferecer alternativas.25
Os executivos nos dois casos ressaltam que nesse tipo de configuração
de participação majoritária a qualidade da parceria tem um papel mais
decisivo.

10.5.2 A parceria equilibrada


Essa configuração se baseia na participação igual entre os parceiros,
344
normalmente 50/5Ø, dividida entre dois parceiros. Tal arranjo pode ser
obrigatório em alguns setores quando há regulamentações que impedem
parte iii  novas formas de trabalho em rede

empresas não nacionais de adquirir a propriedade majoritária de uma JV


em outro país. Também pode funcionar em uma situação em que os dois
parceiros dão contribuições complementares de valor semelhante para a
aliança. As joint ventures desse tipo geralmente tem capital total inves‑
tido de baixo valor, facilitando assim as possibilidades para o parceiro
local corresponder à contribuição do parceiro estrangeiro. Em geral, as
parcerias equilibradas não costumam ter multinacionais como sua ma‑
triz, como acontece com as subsidiárias representantes.
Para compensar os rendimentos menores devido ao menor controle e
participação, os parceiros do Reino Unido costumavam oferecer mais re‑
cursos e cobrar por eles. Recursos sem contrato geralmente eram limitados
a serviços administrativos e treinamento. O controle estratégico e operacio‑
nal da joint venture era compartilhado, embora normalmente prevalecesse
a influência do parceiro estrangeiro em questões técnicas. Havia poucos
executivos expatriados. Nessa configuração, a qualidade das relações do
parceiro é especialmente decisiva e as tensões entre parceiros terão conse‑
quências mais sérias que no modelo de participação dominante. Parcerias
equilibradas em que houve um bom relacionamento de confiança entre
os parceiros se beneficiaram plenamente de suas forças complementares, e
tiveram muito sucesso. Sem dúvida, seu sucesso contribuiu para o fortaleci‑
mento da parceria. Por outro lado, ficou muito claro que quando surge um
conflito sério numa parceria equilibrada, é dificílimo resolvê­‑lo.

10.5.3 A parceria minoritária


Nesta terceira configuração, o parceiro estrangeiro detém uma cota
minoritária de participação na joint venture. Isso não significa necessa‑
riamente que o parceiro deixa de ter influência significativa. Em cada um

Book_Organizaçoes.indb 344 16/9/2011 16:23:47


dos casos estudados a empresa do Reino Unido detinha um grau de in‑
fluência sobre questões estratégicas que se assemelhava à do parceiro chi‑
nês majoritário. Mecanismos exigindo unanimidade nas decisões sobre o
plano de negócios e a distribuição de lucros contribuíram para melhorar
a influência do parceiro minoritário inglês, mas outros fatores também
foram significativos. O fato de o parceiro do Reino Unido fornecer a base
tecnológica para produtos e processos em cada JV foi uma importante
fonte de influência estratégica, e também para dar a palavra final nos
345
aspectos técnicos das operações.
Cada uma das JVs de parceria minoritária tinha um gerente geral

Alianças estratégicas
estrangeiro ou um executivo do parceiro estrangeiro que fazia visitas
periódicas. Em tais circunstâncias, o que mantinha a influência do par‑
ceiro do Reino Unido era a confiança que havia criado com seu par‑
ceiro chinês. Isso indica o importante aspecto evolucionário da criação
de um bom relacionamento entre parceiros, gerando confiança mútua
e, assim, influência compartilhada nas circunstâncias em que direitos
contratuais e outros direitos jurídicos não permitiam o controle for‑
mal. Contudo, com poucos executivos expatriados alocados em JVs
minoritárias, o tempo e o esforço necessários para construir relações
de tal qualidade poderia impor um peso enorme sobre os executivos
estrangeiros.
A maioria dos casos com participação minoritária envolvia parcei‑
ros britânicos que não tinham ou não queriam empenhar recursos para
assumir uma participação majoritária. Um desses investidores durante
muitos anos preferiu se beneficiar da expansão internacional com o licen‑
ciamento de sua tecnologia, em vez de investir seu capital. E estendeu essa
filosofia para a China. Outros também preferiram o caminho de menor
risco, assegurando mais retorno por meio da transferência de tecnologia
em lugar de retorno mediante participação. Somente em um desses casos
os regulamentos chineses relativos a um setor estratégico determinaram
que a participação deveria ser minoritária, em detrimento da preferência
do investidor estrangeiro.

10.5.4 Implicações
Os estudos de caso lançam alguma luz sobre os diferentes requisitos
para se ter um bom desempenho nas diferentes JVs. O exame das diversas
configurações de propriedade, recursos, gestão e controle associados ao

Book_Organizaçoes.indb 345 16/9/2011 16:23:47


desempenho satisfatório mostra que o ajuste entre esses fatores é particu‑
larmente significativo nesse sentido.
Por exemplo, as joint ventures do tipo subsidiária representan‑
te que tiveram o melhor desempenho gozavam de considerável apoio
administrativo e técnico de suas matrizes no Reino Unido e de per‑
manente comunicação com elas. Ao mesmo tempo, os gerentes locais
eram estimulados a ter papel ativo na supervisão das atividades ex‑
ternas para as quais podiam contribuir com seu conhecimento parti‑
346
cular, como marketing e relações com o governo. Em compensação,
as subsidiárias representantes com um desempenho "razoável" eram
parte iii  novas formas de trabalho em rede

caracterizadas por menor contribuição da gestão local para as ativi‑


dades externas. Em dois casos de subsidiárias representantes (uma das
quais acabou falindo), produtos de marca internacional trazidos para
a China pelas matrizes do Reino Unido eram caros demais para atrair
o mercado local, apesar das recomendações do parceiro local. O que
está implícito nesses contrastes é que, nas subsidiárias representantes,
uma combinação de forte apoio de recursos com a sensibilidade às
condições locais (tanto em relação aos produtos como em relação à
contribuição da gestão local) pode ser importante para se ter um bom
desempenho.
Outro aspecto relevante implícito nos estudos de caso é a impossi‑
bilidade de definir uma única abordagem da distribuição de controle em
uma joint venture que resulte em bom desempenho.26 Isso depende em
boa parte da configuração particular. Na subsidiária representante, em
que um parceiro tem o controle total, aparentemente o jeito é envolver
o(s) outro(s) parceiro(s) em áreas que conhece(m) ou em que possui(em)
conexões especiais. Em uma parceria equilibrada, um controle verda‑
deiramente compartilhado e uma administração baseada em muita con‑
fiança e comunicação pessoal parecem ser condições necessárias para o
bom desempenho. O controle compartilhado pode muito bem envolver a
divisão das responsabilidades entre os parceiros conforme os respectivos
pontos fracos. Nas parcerias minoritárias, em que o parceiro interna‑
cional da joint venture tem propriedade e controle minoritários, o bom
desempenho parece estar associado ao envolvimento contínuo desse par‑
ceiro na gestão geral e apoio técnico necessário. Um alto nível de con‑
fiança mútua é uma condição importante para o parceiro minoritário se
envolver de fato.

Book_Organizaçoes.indb 346 16/9/2011 16:23:47


Resumo
1. As alianças estratégicas são um novo modo organizacional muito im‑
portante; elas são parte do movimento para aproveitar as oportunidades
decorrentes da formação de redes entre as empresas.

2. Alianças assumem uma ampla variedade de formas e as joint ventures


(JVs) são as mais comuns.

3. As JVs apresentam uma série de dificuldades organizacionais e não são 347


arranjos fáceis de administrar.

Alianças estratégicas
4. Quando as empresas entram em uma JV visando o curto prazo ou a
exploração, esse contrato de risco pode naufragar por falta de confiança.

5. Mesmo quando os parceiros têm boas intenções na aliança, podem sur‑


gir problemas sérios em relação às prioridades administrativas, ao con‑
trole e às diferenças culturais.

6. As JVs podem ser configuradas em relação à propriedade, ao controle e


à administração. A pesquisa mostra que os requisitos para o bom desem‑
penho variam conforme a configuração adotada.

Questões para discussão


1. Descreva o que significa uma "aliança estratégica".

2. A aliança estratégica tem sido chamada de "organização híbrida". Por


que é uma forma organizacional diferente e o que significa?

3. Como uma aliança estratégica difere de uma organização virtual/


terceirização?

4. Quais são as principais motivações para a formação de uma aliança?

5. Discuta as principais dificuldades organizacionais das alianças.

6. Discuta o relacionamento entre a forma e o desempenho da aliança.

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Notas
1. Para mais discussões sobre estratégia e alianças cooperativas, veja CHILD, John;
FAULKNER, David; TALLMAN, Stephen B. Cooperative strategy. Oxford:
Oxford University Press, 2005; CONTRACTOR, Farok J.; LORANGE, Peter
(Org.) Cooperative strategies and alliances. Oxford: Pergamon Press, 2002.

2. CONTRACTOR, Farok J.; LORANGE, Peter. The growth of alliances in the


knowledge­‑based economy. In: CONTRACTOR; LORANGE (Org.), 2002, p.
348 4, op. cit.

3. CHILD, John. A configurational analysis of international JVs drawing upon


parte iii  novas formas de trabalho em rede

experience in China. Organization Studies, 23(5), p. 781­‑815, 2002.

4. CONTRACTOR, Farok J.; LORANGE, Peter. Why should firms cooperate?


The strategy and economics basis for cooperative ventures. In: CONTRAC‑
TOR, Farok J.; LORANGE, Peter (Org.). Cooperative strategies in internatio‑
nal business. New York: Lexington Books, 1988. p. 3­‑28.

5. DUSSAUGE, Pierre; GARRETTE, Bernard. Cooperative strategy: competing


successfully through strategic alliances. Chichester: John Wiley & Sons, 1999.

6. Veja, por exemplo, a aliança entre a Ciba­‑Geigy e a AZ descrita em DOZ, Yves


L. The evolution of cooperation in strategic alliances: initial conditions or learning
processes? Strategic Management Journal, 17, p. 55­‑83, 1996.

7. World Investment Report 1995. New York: United Nations, 1995. p. 155­‑159.

8. BORIS, Bryan; JEMISON, David B. Hybrid arrangements as strategic alliances:


theoretical issues in organizational combinations. Academy of Management Re‑
view, 14(2), p. 234­‑249, 1989.

9. KILLING, J. Peter. Strategies for joint venture success. New York: Praeger,
1983.

10. Para um exemplo desta situação, veja o caso relatado em LYLES, Marjorie A.;
REGER, Rhonda K. Managing for autonomy in JVs: a longitudinal study of
upward influence. Journal of Management Studies, 30, p. 383­‑404, 1993.

11. LYLES; REGER, 1993, op. cit.

12. Veja DYER, J. H.; KALE, P.; SINGH, H. How to make strategic alliances work.
MIT Sloan Management Review, 42, p. 37­‑43, 2001.

13. CHILD; FAULKNER; TALLMAN, 2005, op. cit.

Book_Organizaçoes.indb 348 16/9/2011 16:23:47


14. MARTIN, Joanne. Culture in Organizations. New York: Oxford University
Press, 1992.

15. Para estudos influentes que identificaram as dimensões da cultura, veja HO‑
FSTEDE, Geert. Culture's consequences. 2. ed. Thousand Oaks: Sage, 2001;
TROMPENAARS, Fons. Riding the waves of culture. London: Economist
Books, 1993.

16. DOZ, 1996, op. cit.


349
17. LU, Yuan; BJÖRKMAN, Ingmar. HRM practices in China­‑Western JVs: MNC

Alianças estratégicas
standardization versus localization. International Journal of Human Resource
Management, 8, p. 614­‑628, 1997.

18. HOISTEDE, 2001, op. cit.

19. KLUCKHOHN, F. R.; STRODBECK, F. L. Variations in value orientation. New


York: Peterson, 1961.

20. GERINGER, J. Michael; HÉBERT, Louis. Control and performance of interna‑


tional JVs. Journal of International Business Studies, 20, p. 236, 1989.

21. Para mais detalhes veja SCHAAN, Jean Louis. How to control a JV even as
a minority partner. Journal of International Management, 14, p. 4­‑16, 1998;
CHILD, John; YAN, Yani. Investment and Control in international JVs: the
case of China. Journal of World Business, 34, p. 3­‑15, 1999.

22. RUDMAN, Stephen. Controlling interests: management control processes em‑


ployed by US multionational corporation within their China affiliates. (Tese de
doutorado). Universidade de Cambridge, 2003.

23. Por exemplo, TALLMAN, Stephen B; SHENKAR, Oded. A managerial decision


model of international cooperative venture formation. Journal of International
Business Studies, 25, p. 91­‑113, 1994.

24. CHILD, 2002, p. 781­‑815, op. cit.

25. BOISOT, Max; CHILD, John. Organizations as adaptive systems in complex


environments: the case of China. Organization Science, 10, p. 237­‑252, 1999.

26. Um ponto defendido também por HÉBERT, Louis; BEAMISH, Paul W. Cha‑
racteristics of Canada­‑based international joint ventures. In: BEAMISH, Paul
W.; KILLING, J. Peter. (Org.). Cooperative strategies: north american perspec‑
tives. San Francisco: New Lexington Press, 1997. p. 403­‑427.

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Capítulo 11
Organizando além das fronteiras

Conteúdo do capítulo
Este capítulo enfoca a organização de corporações multinacionais (CMNs),
empresas que compreendem uma holding e filiais estrangeiras que operam
em mais de um país; elas são, ao mesmo tempo, produto da globalização e um
de seus principais fatores determinantes. O capítulo começa com um exame
da globalização e o significado das CMNs. A seguir são avaliadas as quatro
principais estratégias que as CMNs adotam para a expansão internacional em
relação à necessidade de se integrarem globalmente e, ao mesmo tempo, de
responder às realidades locais. As quatro estratégias – nacional, internacional,
global e transnacional – implicam em diferentes configurações organizacionais
e abordagens quanto à integração entre fronteiras.
Apesar dessas diferenças, até certo ponto todas as CMNs têm exigências
semelhantes em relação a controle, gestão de processos integradores e
diversidade cultural e transferência de conhecimentos e métodos para outros
países. Dificuldades como essas estimularam pesquisadores e executivos
de CMNs a apresentarem novas formas de organização. A última seção do
capítulo examina os problemas especiais que as pequenas e médias empresas
(PMEs) enfrentam quando se internacionalizam.

11.1 Globalização e a importância das CMNs


Como já vimos no Capítulo 2, há muita discussão sobre o signifi‑
cado e a extensão da globalização. Alguns perguntam se a globalização
não recebeu destaque exagerado; por exemplo, dizem que, em termos
de comércio, a economia mundial era bem mais aberta e integrada nos

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cinquenta anos que antecederam a Primeira Guerra Mundial que hoje.1
Outros argumentam que a integração econômica internacional está acon‑
tecendo mais no âmbito dos blocos regionais, como a União Europeia e o
Acordo de Livre Comércio da América do Norte (Nafta), do que em nível
verdadeiramente global.2
Entretanto, há uma diferença crucial entre a integração econômica
mundial em meados do século XIX e a de hoje. As interconexões agora
são de um tipo diferente. É importante fazer a distinção entre as duas
352
formas de integração, que podem ser chamadas de "internacionalização"
e "globalização". A internacionalização era tão grande em 1914 quanto
parte iii  novas formas de trabalho em rede

hoje, mas assumiu a forma de uma integração superficial: era basicamen‑


te um comércio pequeno entre firmas não relacionadas e movimentos de
capital. Por sua vez, os processos de globalização introduzem uma forma
nova de atividade econômica transnacional, organizada primordialmente
nas redes de produção de corporações multinacionais, envolvendo uma
forma de integração mais profunda.
Está ocorrendo um número crescente de transações entre as unidades
das corporações multinacionais (CMNs) internacionalmente distribuídas.
O desenvolvimento dessas unidades resulta de um considerável aumento
na importância do investimento direto das CMNs em locais estrangeiros
(investimento direto estrangeiro ou IDE). Isso colocou em evidência as
interações transfronteiras nas CMNs. Um ex­‑CEO da Procter & Gamble
disse ao autor que "esse é o maior desafio que hoje enfrentamos".
Há definições conflitantes do que seja uma corporação multina‑
cional. Basicamente, são empresas que abrangem holdings e afiliadas
estrangeiras, sendo que essas afiliadas podem ser subsidiárias, filiais
ou joint ventures.3 Elas têm instalações para produção ou prestação
de serviços em dois ou mais países, ou ao menos poder para controlar
e coordenar as operações em mais de um país.4 Além disso, podem
ter redes de terceirização e/ou distribuição mundo afora. Outra abor‑
dagem é não utilizar um critério absoluto para definir se a empresa é
ou não uma CMN, mas avaliar o grau de sua “transnacionalidade”
quanto a indicadores, como a proporção de ativos estrangeiros em
relação a ativos totais, vendas estrangeiras em relação a vendas to‑
tais, emprego estrangeiro em relação a emprego total. Há também
certa confusão de terminologia nessa área, porque enquanto a maioria
das pessoas fala em corporações multinacionais, alguns especialistas
preferem a expressão "corporação transnacional" (CTN).5 Como a

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expressão "transnacional" também é aplicada à estratégia específica e
ao modo de organização da CMN, referiremo­‑nos às CMNs em todo
o capítulo, para minimizar a confusão. Sempre que alguma fonte se
referir a CTNs, como acontece no próximo parágrafo, por favor, leia
CMNs!
Dicken afirma, com autoridade, que "mais que qualquer outra ins‑
tituição, a corporação transnacional passou a ser vista como uma das
forças primordiais da economia global contemporânea".6 Alguns fatos
353
confirmam essa imensa importância da CMN/CTN. Estima­‑se que em
2002 havia algo em torno de 65.000 CMNs no mundo, com mui‑

Organizando além das fronteiras


to mais de 500.000 afiliadas no exterior. Além do mais, havia muito
mais arranjos não participativos com empresas independentes, como
relacionamentos de longo prazo entre consumidor–fornecedor em ca‑
deias internacionais de valor. Em 2001, as vendas no exterior das cem
maiores CMNs chegaram a 2,2 trilhões de dólares. As maiores vendas
foram as das companhias petrolíferas internacionais, mas as CMNs
automotivas também tiveram vendas imensas no exterior. Essas cem
maiores CMNs representavam 4,3% do PNB do mundo em 2000, e
seus ativos no exterior aumentaram em mais de 20% somente naquele
ano.
As CMNs também são importantes por causa de padrões interna‑
cionais que estabelecem. A produtividade de suas afiliadas no exterior
em geral é superior à de empresas nacionais nos países que as hospedam,
onde as CMNs são consideradas, pela maioria das economias emergen‑
tes, fontes de valiosa tecnologia avançada e especialistas em gestão. É
delas a esmagadora maioria de P&D pelo mundo afora, sendo que cerca
de 70% dos royalties internacionais em tecnologia provém das matrizes
das CMNs e de suas afiliadas no exterior.7
Hoje muitas CMNs são de origem norte­‑americana, embora também
haja vários outros países de origem, inclusive alguns pequenos, quando
se conta as 1000 maiores. Exemplos incluem a ABB e a Nestlé, da Suíça;
a Electrolux, da Suécia; a Interbrew, da Bélgica; e a Philips, da Holanda.
Também seria equivocado concluir que todas as CMNs são grandes em‑
presas. Por exemplo, estima­‑se que em 1996, CMNs de pequeno e mé‑
dio portes que empregavam menos de 500 pessoas abrangiam 80% das
CMNs suecas e 60% das italianas. Até as PMEs estão se internacionali‑
zando e desempenhando um papel cada vez mais importante em redes de
produção no exterior.8

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11.2 Estratégias para a expansão global
Economias e outras vantagens da globalização muitas vezes coexis‑
tem com certas necessidades de localização, às vezes para a mesma em‑
presa. Enquanto globalização se refere a aspectos como a produção de
bens ou serviços padronizados para um mercado mundial e a integração
global das atividades de uma empresa, a localização remete a aspectos
como o fornecimento de produtos feitos especialmente para um mercado
354 regional ou nacional ou a adoção de métodos locais de gestão. Essas duas
forças costumam ser chamadas, respectivamente, de pressões para a inte‑
parte iii  novas formas de trabalho em rede

gração global e pressões para a responsividade local.


A globalização pode oferecer oportunidades para uma empresa se
beneficiar de economias de escala, abrindo novos mercados. Quanto mais
fortes suas marcas ou sua reputação, mais atraentes serão para os novos
mercados, a menos que esses mercados estejam sujeitos a importantes
especificidades locais que diminuem a atratividade de produtos interna‑
cionalmente padronizados. Por sua vez, um produto global reforça as
marcas. Empresas que fornecem insumos ou serviços a clientes globali‑
zados, tais como componentes ou serviços de propaganda, geralmente
precisam se expandir em paralelo se desejarem manter as contas desses
clientes. Essas contas, no entanto, poderão estar ameaçadas porque, da
parte do fornecedor, com a extensão global da cadeia de valor de uma
empresa, ele terá acesso a novos materiais ou serviços de custo mais bai‑
xo ou qualidade superior, podendo assim otimizar sua terceirização de
componentes, materiais, serviços de apoio e inovação. Dada a importân‑
cia competitiva da inovação hoje, uma empresa também fica sob pressão
para explorar os recursos globais de aprendizagem, em vez de simples‑
mente confiar nas capacidades nacionais. Quando fatores como esses se
aplicam e os concorrentes reagem a eles, deixar de se globalizar pode
fazer com que a empresa perca sua vantagem competitiva.
Nem sempre é possível uma CMN criar valor transferindo diretamen‑
te suas competências essenciais a países estrangeiros. É comum precisar
fazer algumas modificações para se ajustar às preferências dos mercados
locais e às características dos empregados locais. Em diferentes países, os
consumidores podem exigir diferentes características de determinado pro‑
duto, até mesmo dos muito padronizados, promovidos por uma marca
global e por propaganda no mundo inteiro. Por exemplo, os fabricantes
de refrigerantes de cola acrescentam mais açúcar para atender ao paladar

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dos chineses, e o McDonald's teve dificuldades para entrar no mercado
sul­‑africano, até que decidiu aumentar o tamanho de seus hambúrgue‑
res para satisfazer as expectativas locais. No entanto, esses são casos de
pequenas modificações em produtos de marcas globais fortes num setor
em que o gosto local pode ser fortemente influenciado por produtos mais
tradicionais, limitando a capacidade das empresas de adotar uma estraté‑
gia global de produto. Da mesma forma, algumas empresas que estabele‑
cem plantas em países em desenvolvimento descobriram ser problemático
355
aplicar a organização do trabalho que usam em suas fábricas nacionais,
devido aos diferentes níveis de qualificação e aos hábitos arraigados do

Organizando além das fronteiras


trabalho local. Assim, de modo geral, quanto maior a diferença entre os
países em que uma CMN opera, maiores serão as pressões em termos de
responsividade ou diferenciação locais.
Há uma série de diferentes estratégias que as CMNs podem adotar
para a expansão global, diante do possível conflito entre integração e
diferenciação. A Figura 11.1 mostra que há quatro estratégias básicas de
expansão global segundo as diferentes combinações de pressão para glo‑
balização e localização. Na prática, as CMNs combinam essas estratégias
conforme as circunstâncias de suas diferentes divisões de produto ou ser‑
viço, o que dá origem a uma variante bastante complexa da abordagem
transnacional. É bom analisar esse quadro de referências estratégicas,
porque importantes implicações organizacionais decorrem dele.
Quando as pressões da localização superam as da integração global
ou da padronização, é possível utilizar uma estratégia multidoméstica.
O objetivo dessa estratégia é maximizar as vantagens da diferenciação
local em produtos, serviços e produção. Os produtos e a maneira como
são comercializados e distribuídos são adaptados a cada mercado local.
Haverá poucas economias de escala na produção desses bens e serviços
ou estas poderão ser obtidas no âmbito de um mercado local. Portanto, é
provável que a produção também seja nacional ou regional. Alguns des‑
ses produtos podem ser de natureza tradicional, exigindo bem poucas al‑
terações, e o desenvolvimento necessário pode ser realizado localmente.
Uma empresa que usa essa estratégia transfere suas competências essen‑
ciais para as divisões estrangeiras, descentraliza o controle estratégico
para elas e trata­‑as como negócios relativamente autônomos, que coor‑
denam as próprias atividades de criação de valor. A empresa, contudo,
não se beneficia significativamente do compartilhamento de instalações
ou conhecimento.

Book_Organizaçoes.indb 355 16/9/2011 16:23:48


Figura 11.1  Quatro estratégias para a expansão global.

Pressões para a integração global


Atividades de criação Atividades de criação de
de valor são coordena‑ valor são coordenadas
das em cada país simultaneamente e glo‑
balmente e em cada país
Baixas Altas
356 Produtos e Meta da estratégia é a Meta da estratégia é tanto
abordagens vantagem da diferen‑ diferenciação quanto bai‑
parte iii  novas formas de trabalho em rede

são altamente ciação local xo custo


customizados Altas Estratégia Estratégia transnacional
Pressões por reação local

para cada multidoméstica Os custos organizacionais


mercado local Os custos organizacio‑ são mais altos
nais são mais baixos
Os mesmos A meta da estratégia é A meta da estratégia é
produtos a diferenciação global baixo custo
padronizados Estratégia internacional Estratégia global
são oferecidos Baixas Custos organizacionais Custos organizacionais
a consumido‑ são baixos são altos
res em todos
os países

Fonte: JONES, Gareth R. Organization theory: text and cases. Reading: Addison­‑Wesley, 2001.
p. 240.

Nos casos em que as pressões para localização e integração global


não são muito fortes, as CMNs preferem adotar uma estratégia inter‑
nacional. Empresas nessa situação não enfrentam muita pressão para
adaptar seus produtos ou serviços a mercados locais, e assim podem
oferecer basicamente os mesmos produtos aos consumidores de todos
os países, com ligeiras adaptações para se adequar a preferências lo‑
cais. Ao mesmo tempo, não veem nenhuma vantagem na coordenação
simultânea de suas atividades pelo mundo afora. Por exemplo, elas
não usam suas cadeias globais de valor para a produção padronizada e
não se beneficiam de grandes economias concentrando sua produção e
coordenando­‑a a partir de um centro. Empresas como a Coca­‑Cola, a
PepsiCo, o McDonald's e a Toys R Us usam a estratégia internacional.

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A Pilkington Glass também adotou essa estratégia por muitos anos,
com sua tecnologia patenteada para a produção de vidro plano, muito
usado na construção de edifícios. Essa empresa tinha uma política de
licenciar sua tecnologia para produtores locais em países estrangeiros,
em vez de investir em novas fábricas que precisaria financiar e admi‑
nistrar sozinha. Ela obtinha rendimentos por taxas de licenciamento
normalmente relacionadas ao valor das vendas, e não de um retorno
de investimento externo direto. Com essa estratégia, o mesmo produto
357
padronizado era oferecido a consumidores em diferentes países, mas a
empresa não precisava arcar com os custos da coordenação dessa pro‑

Organizando além das fronteiras


dução. Mais recentemente, a Pilkington começou a investir em fábricas
próprias ou de propriedade conjunta de vidros especiais para ter mais
retorno, mas as filiais ainda são administradas de acordo com os costu‑
mes locais ou regionais.
Uma das limitações de uma estratégia internacional é que a empresa não
obtém benefícios, seja da responsividade local, seja da coordenação global.
Essa estratégia está sendo substituída por duas outras que aumentam o
valor que as CMNs podem criar em função de seu escopo internacional.
Nos últimos anos, um número crescente de CMNs tem adotado
uma estratégia global, seguindo o exemplo de corporações japonesas,
como a Toyota, a Sony e a Matsushita. Essa estratégia é a fabricação
de produtos padronizados em locais de custo baixo, que depois são co‑
mercializados globalmente. No máximo, há um pequeno ajuste local. A
padronização permite significativa economia de escala e as unidades de
baixo custo resultantes se traduzem em preços altamente competitivos.
Quando preço baixo vem acompanhado de excelente qualidade, manti‑
da com uniformidade pelo globo afora, a empresa tem uma forte van‑
tagem competitiva. A estratégia global tem sido adotada na produção
de automóveis, câmeras, computadores e eletrodomésticos. Ela sacrifica
algumas das vantagens possíveis da diferenciação em favor da relação
preço/qualidade dos produtos, atraindo a maioria dos consumidores no
mundo inteiro. Com uma estratégia global, a empresa instala suas ati‑
vidades criadoras de valor em países que oferecem vantagens de custo e
utilizam uma rede global (de fornecedores que ofereçam os custos mais
baixos) para fornecer insumos, em geral por meio de contratos de longo
prazo. As constantes pressões sobre esses fornecedores para reduzir os
custos podem ser intensas.

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A crescente competitividade internacional está obrigando muitas em‑
presas a visar, ao mesmo tempo, as vantagens do baixo custo e as es‑
tratégias de diferenciação. Ter como única base as vantagens de custo é
perigoso, diante de novos concorrentes das mais importantes economias
emergentes como a China, que podem combinar os custos baixos com
design e qualidade de produto internacionalmente aceitáveis. A ameaça
para as indústrias de eletrodomésticos e iluminação em países ocidentais
é um exemplo. A atratividade de produtos mais sofisticados é necessária.
358
Também é arriscado contar apenas com as vantagens da diferenciação,
quando os concorrentes estão combinando produtos ou serviços igual‑
parte iii  novas formas de trabalho em rede

mente atraentes com os benefícios do baixo custo obtidos em escala glo‑


bal. Alguns fabricantes europeus de automóveis estão sob séria pressão
por esse motivo.
Assim, uma estratégia transnacional tem sido recomendada para se
conseguir os benefícios da globalização e da localização simultaneamen‑
te: em outras palavras, para conseguir as vantagens de uma estratégia
global e de uma multidoméstica.9 Escopo global e coordenação de ca‑
pacidades e recursos podem oferecer benefícios de custo significativos.
A descentralização de competências importantes para os mercados lo‑
cais pode contribuir para a diferenciação, que é necessária nesses mer‑
cados. Gareth Jones descreve os requisitos para se ter uma estratégia
transnacional:

Em primeiro lugar, a organização transnacional deve transferir competên‑


cias essenciais para os países onde elas possam ser utilizadas da melhor
maneira para criar valor, tanto a partir dos custos baixos quanto da atrati‑
vidade diferenciada. Em seguida, a organização cria uma rede global para
garantir que as divisões nacionais e as estrangeiras compartilhem recur‑
sos e habilidades para melhorar suas competências­‑chave. Espera­‑se que
cada divisão melhore os recursos recebidos de outras divisões e transfira
produtos e processos aperfeiçoados para as outras. A meta de uma estra‑
tégia transnacional é criar a competência­‑chave de coordenação global de
recursos organizacionais entre as divisões mundo afora. Diferentemente
de uma empresa de estratégia exclusivamente global, que leva ao con‑
sumidor um produto padronizado em todos os países, uma empresa que
adota uma estratégia inteiramente transnacional deve agir como multi‑
nacional e customizar seus produtos para satisfazer as necessidades dos

Book_Organizaçoes.indb 358 16/9/2011 16:23:49


consumidores, e assim aumentar a demanda por seus produtos. A custo‑
mização exige que uma empresa transnacional instale atividades agrega‑
doras de valor, como fabricação e marketing, em quase todos os países ou
na região do mundo em que opera.10

A estratégia transnacional também leva em conta o fato de que o


equilíbrio entre a integração global e a responsividade local pode variar,
dependendo das exigências de diferentes áreas de atividades em uma em‑
359
presa. A Tabela 11.1 enumera os fatores que afetam esse equilíbrio. A ne‑
cessidade de permitir, e mesmo conciliar, a diferenciação organizacional

Organizando além das fronteiras


interna desse tipo impõe às vezes um enorme desafio para a manutenção
do equilíbrio organizacional e a integração nas grandes CMN, que é di‑
versificada tanto em termos de escopo de produto quanto de presença
geográfica.
Ghoshal e Bartlett utilizam a Unilever para mostrar essa dificuldade
de conciliar as necessidades simultâneas de integração e coordenação glo‑
bal, e de obter diferenciação nacional e responsividade.11 A Figura 11.2
mostra a representação gráfica de como essas necessidades variam nos
diferentes negócios, funções e tarefas da Unilever.
Entre os vários negócios da Unilever, os produtos químicos são
bastante padronizados, com notável economia de escala na produção e
pouca variação nas exigências dos mercados locais. Portanto, um alto
nível de integração e coordenação global entre locais de produção, for‑
necedores e mercados, bem como a P&D centralizadas são possíveis.
Ao contrário, alimentos embalados estão sujeitos a diferenças de pala‑
dar e cultura local, seu beneficiamento não oferece economias de escala
muito significativas e é mais apropriado realizar o desenvolvimento dos
produtos in loco. Os detergentes ocupam uma posição intermediária,
porque se beneficiam das inovações geradas por uma P&D central, ao
passo que as vendas, a distribuição e a promoção devem ser descentra‑
lizadas para atender a diferentes mercados. Da mesma forma, algumas
funções podem ser melhor conduzidas globalmente, como P&D, en‑
quanto outras, como vendas, precisam atender às necessidades locais.
Até mesmo na função do marketing há certa diferenciação, com a po‑
lítica do produto sendo melhor coordenada globalmente e a promoção
do produto sendo melhor tratada localmente para atender a normas
nacionais e culturais.

Book_Organizaçoes.indb 359 16/9/2011 16:23:49


Tabela 11.1  Fatores que afetam o equilíbrio entre organização local e
global em diferentes áreas de atividades

Área de Fatores que favorecem Fatores que favorecem


atividade a organização global a organização local
Marketing Homogeneidade de gosto, apelo O gosto é específico da cultu‑
360 de marca global, natureza de pro‑ ra (p. ex., alguns alimentos),
duto intrinsecamente padronizada fortes marcas locais, exigência
(p. ex., produtos químicos) de serviço personalizado
parte iii  novas formas de trabalho em rede

Operações Significativas economias de Limitadas economias de esca‑


(localização) escala; produto com valor e la, valor e custos de transporte
custos de transportes eleva‑ baixos, e/ou economias de
dos, e/ou pouco perecíveis (p.ex., escala podem ser obtidas no
microprocessadores) local (p. ex., gases industriais)
Operações Necessidade de padronização glo‑ Métodos operacionais podem
(métodos) bal por exigências de qualidade ser ajustados aos níveis de
(p. ex., remédios) aptidão local para aproveitar
custos de mão de obra variá­
veis (p. ex., confecção de
vestuário)
P&D Desenvolvimento do produto Nível de conhecimento
requer pesquisa de alto nível e menor relativo a caracterís‑
intensamente coordenada (p.ex., ticas extrínsecas do produto
sistemas de TIC) (por ex., a cor), mais do que a
características intrínsecas
RH Padronização de produto ou servi‑ Variações em termos de cul‑
(políticas) ço e métodos de produção exigem tura, educação e habilidades
políticas de RH em comum; os requerem adaptação local das
benefícios da mobilidade inter­ políticas de RH
‑regional dos executivos requerem
padronização do RH; reputação
global da empresa também requer
padronização do RH, especialmen‑
te no que se refere aos direitos
pessoais e ética

Book_Organizaçoes.indb 360 16/9/2011 16:23:49


Figura 11.2  Necessidades de integração e diferenciação na Unilever

Book_Organizaçoes.indb 361
Negócios Funções Tarefas
Alta
Pesquisa Produtos Política do
químicos produto
Necessidade
de coordenação Propaganda
Produtos
e integração
Detergentes químicos
globais
Fabricação Preço
Produtos
pessoais Distribuição
Marketing
Alimentos
embalados Vendas
Baixa Vendas

Baixa Alta Baixa Alta Baixa Alta

Necessidade de diferenciação e reação nacional

Fonte: BARTLETT, Christopher A.; GHOSHAL, Sumantra. Managing across borders: the transnational solution. 2. ed. London: Random House, 1998. Figura 6.1, p. 111.

Organizando além das fronteiras


361

16/9/2011 16:23:49
Dada a mistura das necessidades de integração global e responsi‑
vidade local para todos os seus diversos negócios, funções e tarefas, a
Unilever foi obrigada a passar para uma abordagem transnacional, ba‑
sicamente devido à pressão competitiva da Procter & Gamble, que mais
ou menos em 1990 reorganizou suas atividades para entrar em uma es‑
tratégia transnacional. O desempenho da Unilever continuava, entretan‑
to, pior que o da P&G, e uma das razões disso foi exatamente a imensa
dificuldade que teve para implementar as mudanças organizacionais e
362
administrativas para dar suporte à estratégia transnacional. Embora
cada uma das quatro estratégias mencionadas tenha suas próprias impli‑
parte iii  novas formas de trabalho em rede

cações para a estrutura organizacional, está claro que as exigências da


estratégia transnacional são tão grandes que ela deve basear­‑se, primei‑
ramente, na gestão dos processos organizacionais e das culturas, e não
em estruturas. Isso, é claro, mantendo­‑se a tendência dos novos modos
de se organizar.

11.3 Implicações organizacionais de diferentes


estratégias
Em termos organizacionais, a estratégia multidoméstica é a me‑
nos exigente e menos dispendiosa. A estrutura que melhor se adequa
a uma estratégia é a geográfica global, em que divisões localizadas
em um país ou uma região reproduzem e contêm as mesmas ativi‑
dades de criação de valor que a empresa tem seu país de origem, e
as adaptam às situações locais (Figura 11.3). Como essas divisões
operam de maneira relativamente autônoma, a necessidade de in‑
tegração entre a sede e as divisões corporativas e entre as próprias
divisões é pequena. As divisões podem operar muito bem com deci‑
sões estratégicas transferidas para elas, e a empresa pode administrar
tudo com uma hierarquia relativamente horizontal. A combinação
da hierarquia horizontal e a pouca necessidade de integração signifi‑
ca economia de custos de gestão. O lado ruim dessa estrutura é não
facilitar a troca internacional de informação e o aprendizado entre as
divisões; a empresa pode preferir adotar determinadas medidas para
resolver essas questões, como promover periodicamente congressos
interdivisionais.

Book_Organizaçoes.indb 362 16/9/2011 16:23:49


Book_Organizaçoes.indb 363
Figura 11.3  Estrutura geográfica global

Matriz corporativa
(localizada em
Nova York)

Divisão doméstica Divisão Divisão Divisão Divisão Divisão América


(América do Norte) Europeia Ásia­‑Pacífico Ásia­‑Austrália Japonesa do Sul

Atividades funcionais

Organizando além das fronteiras


363

16/9/2011 16:23:49
A estratégia internacional impõe maior necessidade de coorde‑
nação na medida em que as competências essenciais da empresa,
como garantia de qualidade e P&D, estão centralizadas e as outras
funções descentralizadas. Se a empresa se concentra demasiadamen‑
te em apenas uma categoria de produto, ela pode se estruturar por
divisões geográficas; se não, pode adotar uma estrutura por produto
(Figura 11.4). As divisões estrangeiras em geral fabricam e comer‑
cializam seus produtos segundo as tecnologias e diretrizes desenvol‑
364
vidas pela matriz. Por causa da mistura de competências essenciais
centralizadas e operações descentralizadas, essa estratégia requer
parte iii  novas formas de trabalho em rede

mais hierarquia e impõe maior necessidade de integração a uma


estratégia multidoméstica. Além disso, seus custos organizacionais
são maiores.
A estratégia global visa realizar economias de escala e localização,
oferecendo produtos padronizados de alta qualidade a um custo bai‑
xo. Há relativamente pouca adaptação local dos produtos. Para essa
estratégia é mais conveniente uma estrutura de produto global, em que
as decisões sobre recursos para produtos ou grupos de produtos padro‑
nizados são decididas centralmente, tendo enfoque global. Esse arranjo
pode estimular a racionalização da produção ao redor do mundo, além
de concentrar recursos na inovação do produto. Portanto, requer um
nível razoavelmente elevado de coordenação centralizada, com grande
integração da cadeia de fornecimento por meio de sistemas eletrônicos e
redes de gestão.
A coordenação centralizada tende a ampliar as hierarquias admi‑
nistrativas. A combinação de uma necessidade de integração relativa‑
mente alta e uma hierarquia vertical resulta em custos organizacionais
elevados. Além disso, essa estrutura atende apenas a uma coordenação
limitada entre as divisões de produtos em determinado território, o que
pode ter consequências negativas. Em um país como a China, por exem‑
plo, as agências do governo podem intervir diretamente nas decisões
empresariais por meio de seu poder para retirar licenças e outras medi‑
das. Essas agências podem se ressentir de ter de lidar em separado com
diferentes divisões da mesma empresa e podem cair na tentação de jogar
uma contra a outra. As oportunidades para o aprendizado global entre
as divisões também podem ser inibidas por uma estrutura divisional de
produto global.

Book_Organizaçoes.indb 364 16/9/2011 16:23:49


Figura 11.4  Estrutura por grupo de produto global

Book_Organizaçoes.indb 365
Sede corporativa
(localizada em
Nova York)

Sede mundial do Sede mundial do gru‑ Sede mundial do


grupo de produtos po de produtos cos‑ grupos de produtos
químicos méticos e de higiene alimentícios embalados

Divisão Divisão Divisão Divisão Divisão América


doméstica Europeia Ásia­‑Pacífico Japonesa do Sul

Grupos de produto
Divisão doméstica/estrangeira

Organizando além das fronteiras


365

16/9/2011 16:23:49
A estratégia transnacional é organizacionalmente a mais exigente e a
mais cara de todas. Ela tenta combinar os benefícios do aprendizado das
unidades locais e responsividade local com os benefícios da centraliza‑
ção na configuração de cadeias globais de valor, provendo competências­
‑chave e mantendo os padrões corporativos globais em áreas decisivas,
como a qualidade dos produtos e práticas socialmente responsáveis. Essa
combinação de controle centralizado com divisões estrangeiras descentra‑
lizadas, que desenvolvem suas próprias abordagens dos mercados locais
366
e suas competências­‑chave, dificulta especialmente as tarefas de controle
e coordenação. A empresa transnacional deve ter aptidão para ser ao
parte iii  novas formas de trabalho em rede

mesmo tempo "livre" e "firme" ao combinar a qualidade de flexibilidade


e aprendizagem com a capacidade de explorar as vantagens do alcance e
da escala globais.12
Uma estratégia transnacional requer uma hierarquia relativamente
horizontalizada para permitir que os gerentes encarregados de ativida‑
des de coordenação central respondam rapidamente às novas necessida‑
des locais e às novas informações provenientes de unidades nacionais ou
regionais descentralizadas. Ela deverá integrar as contribuições dessas
unidades dispersas, especializadas e interdependentes com as operações
mundiais centralmente coordenadas. A empresa transnacional se empe‑
nha em assegurar e desenvolver o conhecimento conjuntamente com os
níveis central e local; tal abordagem conjunta apresenta exigências de
integração muito significativas. A estrutura preferida para satisfazer es‑
sas exigências costuma ser uma estrutura matricial global relativamente
horizontal, que estabelece inúmeras linhas de comunicação e presta‑
ção de contas entre atividades centralizadas e descentralizadas (veja a
Figura 11.5).
Uma estrutura multidimensional como a matriz global pode, no
máximo, estimular os gerentes de uma empresa transnacional a levar
em conta todas as suas inúmeras exigências. Por essa razão, muitas
multinacionais que adotam uma estratégia transnacional também atri‑
buem grande importância à criação entre seus gerentes de uma cons‑
ciência dos diversos aspectos da estratégia que são levados em conta.
Isso significa ampliar sua perspectiva acima e além da perspectiva da
unidade ou divisão em que atuam para assimilar uma visão que seja
global e também especializada, criando assim o que já foi chamado de
“matriz mental”.13

Book_Organizaçoes.indb 366 16/9/2011 16:23:50


Tabela 11.2  Adaptação organizacional entre as CMNs mais bem­
‑sucedidas

Estratégia Perfil organizacional

Multinacional Ajuste diferenciado: a organização responde às necessidades dos


ambientes locais; integração limitada de toda a estrutura

Internacional Variação ad hoc: pouca diferenciação entre locais; a limitada 367


integração exigida pode ser implementada centralmente

Organizando além das fronteiras


Global Uniformidade estrutural: pouca diferenciação entre as unidades
locais; estrutura integradora comum a toda a empresa e unifor‑
midade de práticas

Transnacional Variedade integrada: estrutura da diferenciação local exigi‑


da assegurada por fortes mecanismos integradores em toda a
empresa

Há evidências mostrando que existem benefícios para o desempe‑


nho quando as CMNs ajustam sua organização à estratégia, como antes
descrito. Por exemplo, um estudo com 41 CMNs realizado por Goshal
e Nohria comparou seus perfis organizacionais com os imprevistos am‑
bientais decorrentes das distintas estratégias utilizadas. O estudo oferece
provas sugestivas de que as empresas que adotam o perfil organizacio‑
nal previsto para "se adequar" a sua estratégia obtiveram em média
um desempenho superior ao das empresas que não tinham um ajuste
organização­‑estratégia.14 A Tabela 11.2 resume os aspectos do perfil or‑
ganizacional para cada estratégia associada ao desempenho superior da
empresa. Os termos usados para rotular cada perfil organizacional são de
Goshal e Nohria.

Book_Organizaçoes.indb 367 16/9/2011 16:23:50


parte iii  novas formas de trabalho em rede

368
Figura 11.5  Estrutura matricial global

Book_Organizaçoes.indb 368
Área Americana Área Europeia Área Ásia­‑Pacífico

Divisão Divisão Divisão Divisão Rússia/ Divisão


Divisão
América do América do União Comunidade dos China
Japão
Norte Sul Europeia Estados Independentes (CEI)

Grupo de
produtos
químicos

Grupo de
cosméticos e
produtos de
higiene

Grupo de
alimentos
embalados

16/9/2011 16:23:50
11.4 Novos arranjos para organizar entre
fronteiras
Operações entre fronteiras apresentam mais demandas na organiza‑
ção de uma empresa que aquelas puramente domésticas. Essas demandas
inevitavelmente aumentam conforme a CMN se diferencia mais, tanto
geograficamente quanto em termos da variedade de produtos e serviços
oferecidos. Quanto mais a empresa se movimenta em direção a uma es‑
369
tratégia transnacional, maior o desafio organizacional. Já não é mais con‑
veniente basear­‑se nos arranjos convencionais, sendo preciso encontrar

Organizando além das fronteiras


novas soluções. Para lidar com novas situações de forma criativa e flexí‑
vel, essas novas soluções envolvem mais diferenciação interna na manei‑
ra como as atividades são agrupadas e coordenadas e novas abordagens
do controle. Baseando­‑se menos na hierarquia e na burocracia, a nova
abordagem da organização da CMN depende significativamente da boa
administração das redes internas e do apoio de uma cultura corporativa
bem desenvolvida. Cultura corporativa diz respeito aos valores e métodos
específicos de uma empresa.
Portanto, a CMN transnacional é uma das arenas mais importantes
para a experimentação de novas formas de organização. A próxima seção
discute alguns desses desenvolvimentos.

11.5 Novas abordagens organizacionais nas CMNs


Esta seção examina os desenvolvimentos organizacionais nas CMNs
com o benefício de obter a diversidade e a diferenciação internas, preser‑
vando o necessário grau de integração. Discutem­‑se as seguintes questões
nesta seção:

1. controle;

2. processo de gestão integradora;

3. gestão da diversidade cultural;

4. transferência de conhecimento e práticas organizacionais entre


fronteiras.

O surgimento de novas formas organizacionais em uma CMN é ilus‑


trado com o caso da importante empresa farmacêutica Eli Lilly.

Book_Organizaçoes.indb 369 16/9/2011 16:23:50


11.5.1 Controle
A complexidade dos relacionamentos entre as unidades corporati‑
vas, as unidades regionais e as filiais locais das CMNs reflete na com‑
plexidade relativa à escolha dos métodos de controle empregado por
esse tipo de empresa. Hoje a maioria das CMNs utiliza uma série des‑
ses métodos de controle, combinando, em especial, controles formais
e informais – baseados em laços pessoais –, inculcando uma visão, e
370 adota valores articulados pela cultura corporativa. As CMNs também
aprenderam a variar seus métodos de controle de modo a atender às
parte iii  novas formas de trabalho em rede

necessidades das diferentes funções e áreas de atividades.


Muitas CMNs tentaram reagir às inconveniências dos controles for‑
mais em suas complexas organizações, em que um exagero desse tipo de
controle poderia inibir a iniciativa e o aprendizado local. Para isso, usa‑
ram a cultura corporativa e redes informais de comunicação. O Capítulo
5 descreve a contribuição das culturas corporativas para o processo de
controle. A aceitação dos valores e práticas de uma organização ajuda a
direcionar as energias do pessoal para a realização de suas metas, que é
justamente o propósito do controle. Gerentes expatriados desempenham
um papel muito significativo na disseminação da cultura de uma corpo‑
ração multinacional para as filiais internacionais. Uma vez estabelecida,
essa abordagem de controle baseada na cultura tem a considerável van‑
tagem de não requerer supervisão pessoal regular, e reduz portanto, a ne‑
cessidade de empregar expatriados de alto custo em subsidiárias e filiais
estrangeiras. A natureza informal das normas e regras contidas em uma
cultura corporativa também permite que as pessoas as adequem rapida‑
mente a novas situações e exigências, e assim reajam de forma eficaz a
novas situações.
Em seu estudo, Rudman descobriu que as CMNs norte­‑americanas
preferem usar os mesmos processos de controle para todas as suas
filiais no exterior.15 Elas também não fazem nenhuma distinção en‑
tre as filiais de sua propriedade e as joint ventures das quais têm
propriedade parcial, o que aparentemente é uma boa política, pelo
menos quando as CMNs têm maioria na propriedade da joint ven‑
ture. Na prática, entretanto, as empresas faziam distinção entre as
atividades exclusivamente internas de suas filiais e as que envolvem
o trato com mercados e instituições locais. Internamente, a fabrica‑
ção e a qualidade, e também a natureza e o escopo dos relatórios

Book_Organizaçoes.indb 370 16/9/2011 16:23:50


financeiros, estão sujeitos a controles e métodos padronizados para
toda a multinacional. Externamente, o controle é mais flexível, per‑
mitindo um ajuste de determinados métodos do marketing e do RH
para atender às condições dos mercados locais do produto e da mão
de obra. Descobriu­‑se também que era necessária alguma variação
das práticas habituais da empresa em matéria de relacionamento e
construção da confiança com os agentes (oficiais) locais. Os estu‑
dos deste autor sobre nove corporações norte­‑americanas com joint
371
ventures da China constataram que, em geral, elas descentralizavam
as decisões sobre questões externas, como a escolha de mercados e

Organizando além das fronteiras


fornecedores para suas filiais, ao passo que as questões internas com
implicações nas políticas globais do produto, como modificações do
produto, eram controladas centralmente.16
A considerável diversidade geográfica e de produtos de muitas CMNs
forçou­‑as a desenvolver novas configurações de mecanismos de controle,
para manter uma coordenação central e padrões corporativos em algumas
áreas de atividade e, ao mesmo tempo, permitir adaptação local em ou‑
tras. Como consequência, essas empresas apresentam variações internas
em sua abordagem do controle e combinações de uma série de métodos
formais e informais para ele. Com o tempo, o uso de métodos informais
passou a ter mais peso, como a cultura corporativa e redes intensas de
comunicação.

11.5.2 Gestão de processos integradores


Uma CMN que adota uma estratégia transnacional não pode se ba‑
sear apenas em configurações organizacionais do tipo estrutural: precisa
criar e desenvolver processos organizacionais até que eles transcendam
sua estrutura. Processos são as ações que ocorrem dentro de uma organi‑
zação, como a comunicação, a tomada de decisões e o fluxo do trabalho.
Estruturas são apenas o quadro de referência para esses processos. A inte‑
gração em uma CMN depende de uma série de processos que ocorrem em
toda a corporação, entre os quais a coordenação de atividades e inicia‑
tivas diversificadas, a criação de uma visão compartilhada e comprome‑
timento das pessoas em relação a essa visão, e a abertura de canais para
transferência de conhecimento e aprendizado. Ao vincular dinamicamen‑
te pessoas e grupos, esses processos se tornam o sangue das "redes inte‑
gradas".17 Embora muita atenção seja dedicada a essas redes nas CMNs,

Book_Organizaçoes.indb 371 16/9/2011 16:23:50


a integração efetiva das redes externas da cadeia de valor é igualmente
importante (veja os Capítulos 8 e 9).
A ideia de redes chama a atenção para as redes de relacionamentos
organizacionais, algumas das quais podem ser estabelecidas formalmen‑
te, enquanto outras emergem informalmente. As redes informais às vezes
são baseadas em relacionamentos de amizade, de aconselhamento ou de
conversa, tanto dentro de uma organização quanto fora de suas fronteiras
formais.18 Elas são reforçadas por uma identificação dos membros uns
372
com os outros e pelo compartilhamento de um objetivo comum. As redes
ajudam na concretização dos objetivos operacionais da estrutura e, ao
parte iii  novas formas de trabalho em rede

mesmo tempo, no desenvolvimento de novos padrões de colaboração na


empresa.
CMNs de grande porte desenvolvem níveis em que as atividades
estão concentradas, normalmente, e no nível corporativo, nas divi‑
sões e nas subsidiárias ou filiais. Esses níveis configuram as redes
dentro da empresa. Um papel crucial do "gerente de rede global" é
construir pontes e fazer a ligação entre esses níveis. A integração ver‑
tical é decisiva para CMNs que tentam unir a centralização corpo‑
rativa de algumas atividades e decisões à descentralização de outras,
em filiais geograficamente dispersas. De certa maneira, o executivo
que integra as redes verticais é semelhante ao coordenador horizon‑
tal, que liga pessoas e unidades formando uma rede horizontal (veja
o Capítulo 4). Alguns executivos de redes globais desempenham es‑
ses dois papéis.
Os executivos de redes globais são os participantes­‑chave e catali‑
sadores das redes das corporações multinacionais, e devem gerenciar os
processos que nelas ocorrem. São as pessoas entre as quais fluem impor‑
tantes comunicações, que consolidam a informação proveniente de diver‑
sas fontes, interpretam e conciliam as exigências corporativas e locais,
além de atuarem como principal ponto de transmissão de informações
e das políticas a outras partes e níveis nessa rede. Executivos de redes
globais podem desempenhar esse papel vital em função de uma posição
hierárquica que liga os níveis­‑chave dentro de uma empresa. Também
estão em posição que lhes permite dar contribuições à rede, em função
de sua competência e seu conhecimento especializado e pelo respeito e
confiança que inspiram.
Não se pode pensar que as redes e os processos necessários para se organi‑
zar uma corporação multinacional entre países apareçam espontaneamente.

Book_Organizaçoes.indb 372 16/9/2011 16:23:50


Executivos de uma rede global devem ser colocados em pontos­‑chave nas
redes. O Quadro 11.1 ilustra essa questão, apresentando o caso de uma mul‑
tinacional norte­‑americana que nomeou um CEO para suas operações na
China, para melhorar tanto a integração vertical entre a corporação e o país
como as ligações horizontais entre as divisões de produto locais.
Os executivos, que servem como gerentes da rede global das CMNs,
desempenham uma série de papéis distintos. Eles precisam:

„„ facilitar as interações entre os diferentes níveis da unidade em suas 373


empresa e, muitas vezes, entre a empresa e as pessoas externas

Organizando além das fronteiras


chaves para os negócios;

„„ ser responsáveis pelas redes, reunindo pessoas geográfica e organi‑


zacionalmente dispersas, que devem colaborar na implementação
das estratégias internacionais da CMN;

„„ ser capazes de coordenar, sintetizar e transferir a informação


dentro das redes;

„„ transmitir a visão corporativa nos níveis inferiores e defender as


iniciativas descentralizadas nos níveis superiores.

Uma coisa é identificar o papel do gerente da rede global; outra


é assegurar que pessoas com as devidas qualidades e preparo ocupem
essa posição. E isso levanta duas questões: em primeiro lugar, quais
são as qualidades necessárias dos gerentes de uma rede global que
têm papéis integradores nas CMNs? Em segundo lugar, que práticas
podem ajudar a desenvolver e preparar pessoas para desempenhar tais
papéis?
Pesquisas e textos identificaram as qualidades essenciais necessárias
dos gerentes de uma rede global.19 O consenso geral diz que um atri‑
buto fundamental é ter ampla percepção estratégica, necessária para
se operar em uma rede internacional. No exemplo apresentado, a di‑
versidade das responsabilidades anteriores de Jack Hislop, culminando
no nível corporativo, ajudou­‑o a ter essa perspectiva mais ampla. Se
o trabalho de filiais no exterior devem estar estreitamente associado à
estratégia de negócios da empresa, o gerente de rede global deve estar
em posição não apenas de entender toda a sua estratégia, mas também
de refletir as oportunidades e necessidades das filiais em sua formulação
e implementação.

Book_Organizaçoes.indb 373 16/9/2011 16:23:50


Quadro 11.1  Um executivo de uma rede global de uma multinacional

Antes de ser nomeado presidente do conselho e CEO de uma nova empresa chinesa
de uma multinacional norte­‑americana, Jack Hislop trabalhou em diversas partes
da corporação, terminando como controller corporativo. Por isso, era muito conhe‑
cido na corporação e gozava da confiança dos executivos na matriz. Isso significa‑
va que ele era capaz de tratar diretamente com o vice­‑presidente corporativo de
operações internacionais sem ter de passar por nenhum intermediário. Ao chegar
374 na China, Jack imediatamente estabeleceu ligações diretas com as atividades de
desenvolvimento de negócios e de marketing dos inúmeros “negócios” de produtos
parte iii  novas formas de trabalho em rede

(isto é, divisões globais), cujos gerentes foram realocados para seu escritório.
As principais tarefas de Hislop eram formular e implementar uma estratégia cor‑
porativa coerente para a China. Ao trabalhar em uma estratégia para a China, ele
precisou tomar providências para que ocorressem as necessárias comunicações e
discussões entre gerentes em diferentes níveis, de tal maneira que a corporação
apoiasse a estratégia e os gerentes locais agissem para levá­‑la adiante. Ele infor‑
mava regularmente seu chefe corporativo sobre os fatos mais importantes que
ocorriam na China, e ao mesmo tempo, mantinha os gerentes da China informados
sobre discussões e desdobramentos no nível corporativo que pudessem influenciar
os negócios de suas áreas. Para promover uma rede de informações abertas, o escri‑
tório de Hislop organizava visitas periódicas dos executivos da corporação à China,
incluindo os executivos das divisões de produtos. Duas vezes por ano, ele mesmo
participava de um grupo de discussão da diretoria, com os executivos das divisões
de negócios da empresa e das divisões geográficas. Seu grupo visitava os Estados
Unidos regularmente e usava cada vez mais a videoconferência e o e­‑mail.
Seu papel como executivo desse processo de integração vertical foi essencial
para a empresa alinhar sua estratégia de desenvolvimento de produto global às
necessidades e oportunidades do crescente mercado chinês. A equipe de desen‑
volvimento de negócios na China tinha a tarefa de detectar futuras oportu‑
nidades no mercado local para os produtos da empresa – o que poderia ser
importado, as modificações necessárias e assim por diante. Essas oportunidades
de mercado deveriam ser transmitidas para os níveis superiores da empresa e
conciliadas com os produtos recém­‑lançados e com aqueles sendo desenvolvi‑
dos para lançamento dois ou três anos depois. Hislop era o centro dessas dis‑
cussões, e em especial, assegurava que levassem em conta as ideias dos grandes
clientes da China, com quem ele mantinha estreito contato.

Fonte: Entrevistas pessoais.

Book_Organizaçoes.indb 374 16/9/2011 16:23:50


Pessoalmente, o gerente de rede global deve ser capaz de compreen‑
der a natureza de prioridades conflitantes e encontrar soluções dentro da
rede corporativa internacional. Deve saber também trabalhar com dife‑
rentes grupos na empresa, o que requer capacidade de se comunicar bem
e um bom jogo de cintura no relacionamento com os outros. Na esfera
global de uma CMN, uma competência importante para um relaciona‑
mento construtivo pode ser a habilidade para lidar com as diferenças
culturais. Essas exigências apontam para a importância da sensibilidade
375
e habilidade pessoais, implicando que, seja qual for o treinamento ofe‑
recido, certas pessoas serão mais adequadas às demandas dessa função

Organizando além das fronteiras


que outras.
Entre as habilidades pessoais indispensáveis para um executivo de
uma rede global estão as seguintes:

„„ adaptabilidade;

„„ capacidade de operar em condições instáveis e de lidar com a


ambiguidade e o stress;

„„ competência para trabalhar com diferentes grupos de pessoas


cujas visões e culturas são diferentes;

„„ talento para o relacionamento e a negociação;

„„ aptidão para se comunicar em mais de um idioma.

Essas qualificações são reforçadas quando há sensibilidade em re‑


lação aos outros, especialmente sensibilidade para culturas diferentes e
abertura para aprender com novas situações e pontos de vista diversifi‑
cados. Como esses executivos muitas vezes precisam dar início a novas
redes ou expandir as existentes, também pode ser necessário acreditar em
si, e ter muita autoconfiança é importante – desde que esta não se trans‑
forme em arrogância.
Os executivos de rede global trabalham com grande número de pes‑
soas sobre as quais não têm nenhuma autoridade direta. Às vezes nem
subordinados, o que pode acontecer quando as filiais estrangeiras de uma
CMN formam parcerias com outras empresas. Nessa situação, até mais
do que em outras, eles devem ser capazes de gerar a confiança entre os
membros da rede, sendo que alguns deles podem ter sido realocados e,

Book_Organizaçoes.indb 375 16/9/2011 16:23:50


portanto, tenderem a manter identificação com as empresas de origem e
com as próprias carreiras, e não com a CMN.20 Evidentemente, flexibili‑
dade pessoal e habilidades interpessoais são fundamentais nesse tipo de
profissional.
As pressões sobre tais executivos podem ser intensas, especial‑
mente quando trabalham com parceiros independentes em ambien‑
tes desconhecidos. 21 Muitos são incapazes de suportar a pressão, e
esse custo pode ser alto tanto para o indivíduo que fracassa em uma
376
posição altamente exposta como para a rede em si, que também so‑
frerá grande pressão. Muitos executivos são expatriados, como Jack
parte iii  novas formas de trabalho em rede

Hislop, e o custo financeiro do fracasso de um expatriado pode pas‑


sar de um milhão de dólares. Portanto, é imprescindível selecionar
pessoas que possuam as qualidades adequadas às exigências desse
papel.
Igualmente importante é preparar as pessoas para assumir esse cargo.
A natureza desse papel e as qualificações que ele requer mostram que a
política para o desenvolvimento desse tipo de executivo deve compreen‑
der uma série de elementos indispensáveis:

„„ A seleção de futuros candidatos para esse papel deve se basear nas


características pessoais adequadas, entre as quais mente aberta,
estabilidade emocional e energia interna.

„„ A carreira deve permitir ao candidato ter contato tanto com tare‑


fas locais quanto globais por tempo suficiente para que ele possa
produzir efeitos positivos.

„„ O executivo deve passar por funções principais e também por


algumas divisões, para que tenha uma boa visão de toda a empresa
e ampla credibilidade dentro dela.

„„ O candidato deve ser encorajado a usar essa passagem por diver‑


sos lugares da empresa como recurso para desenvolver uma rede
global pessoal dentro da empresa e também com organizações
externas importantes.

„„ O treinamento deve ser adequado, como, por exemplo, o desen‑


volvimento da sensibilidade cultural.

Book_Organizaçoes.indb 376 16/9/2011 16:23:51


11.5.3 Gestão da diversidade cultural nas CMNs
Por definição, uma corporação multinacional opera em uma série de
diferentes culturas nacionais. Mesmo essas culturas nacionais, que em ge‑
ral são agrupadas em categorias como a chamada "anglo­‑saxônica", têm
distintos métodos de gestão que devem ser harmonizados para permitir
uma boa integração dentro da empresa. A administração de empresas
norte­‑americanas costuma ser diferente dos métodos usados nas empre‑
sas do Reino Unido. As diretrizes adotadas para a gestão das diferenças 377
culturais também refletem as orientações da filosofia da administração

Organizando além das fronteiras


que as multinacionais usam em seu país de origem.22 Diferenças na cul‑
tura nacional são, portanto, fatores que a gestão da CMN deve levar em
conta. Se fusões e aquisições forem componentes importantes para a po‑
lítica de crescimento de uma CMN, as diferenças da cultura corporativa
também terão de ser tratadas.23 Se os parceiros ou filiais recentemente
adquiridas forem de países diferentes, suas culturas corporativas refleti‑
rão muitos aspectos da cultura nacional, mas é preciso ter em mente que
a cultura das próprias empresas pode variar bastante, mesmo quando são
da mesma nacionalidade.
Culturas não são apenas obstáculos para a integração nas multinacio‑
nais, mas revelam também competências e práticas valiosas. Compreendê­
‑las pode ajudar uma empresa a se orientar nos ambientes em que opera
e nos mercados locais. No início deste capítulo, discutimos as estratégias
para a expansão global que as multinacionais podem utilizar e o equi‑
líbrio entre as necessidades globais e locais que cada estratégia reflete.
Assim, é recomendável que a política de uma CMN na gestão de sua di‑
versidade cultural interna corresponda à estratégia específica de expansão
global adotada.
Há duas alternativas básicas que gerentes de uma CMN devem levar
em conta no momento de definir as opções políticas para tratar da diver‑
sidade cultural em sua empresa:

1. procurar ou não uma base para a integração entre a cultura domés‑


tica da CMN e a cultura de suas filiais estrangeiras;

2. manter ou não a diversidade cultural nas práticas da empresa, seja


de forma integrada ou não.

Book_Organizaçoes.indb 377 16/9/2011 16:23:51


Essas duas opções dão origem às quatro possibilidades mostradas na
Figura 11.6.
1. Pluralismo cultural. Quando uma CMN atribui relativamente
pouca importância à integração de suas várias culturas e, ao mesmo
tempo, valoriza sua diversidade, é provável que siga uma política de
pluralismo cultural. Isso significa que ela buscará incentivar, e não
desestimular, suas filiais nacionais ou regionais a operarem segun‑
378 do as próprias normas culturais, para que estas atendam às condi‑
ções locais, como normas de emprego e preferências do consumidor.
Portanto, a preservação da diversidade cultural proporcionará mais
parte iii  novas formas de trabalho em rede

flexibilidade. A agilidade na celebração da diversidade cultural se tor‑


na um aspecto proeminente da própria cultura corporativa da empre‑
sa. Uma empresa pode, por exemplo, procurar estimular comparações
entre suas subculturas contrastantes e o discurso ativo sobre elas, a
fim de explorar o potencial de aprendizagem com seus pontos fortes
e limitações.
2. Segmentação cultural. Acontece quando uma CMN atribui rela‑
tivamente pouca importância à integração cultural, e, ao mesmo tem‑
po, não valoriza muito a diversidade cultural. A consequência dessa
atitude de laissez­‑faire provavelmente é uma situação de segmentação

Figura 11.6  Políticas para a gestão da diversidade cultural em


multinacionais

Valor atribuído à integração cultural


Baixo Alto
Valor atribuído à diversidade cultural

Alto
Pluralismo cultural Síntese cultural

Baixo Segmentação cultural Dominação cultural

Book_Organizaçoes.indb 378 16/9/2011 16:23:51


em que as normas culturais refletirão as origens das atividades e das
funções. As atividades geradas centralmente serão acompanhadas por
práticas que refletem as normais culturais nacionais da empresa, e as
atividades oferecidas localmente refletirão as normas locais. A dife‑
rença entre uma política pluralista e uma segmentada na gestão da
cultura é que a primeira reconhece a diversidade cultural como recur‑
so, e a outra não. O risco de uma política segmentada com base na
indiferença cultural é que ela deixa de aproveitar as oportunidades de
379
aprendizado e pode levar, pela omissão, a uma fragmentação prejudi‑
cial dentro da empresa.

Organizando além das fronteiras


3. Dominação cultural. Quando uma CMN atribui baixo valor à di‑
versidade cultural entre suas localizações e filiais operacionais, mas in‑
siste na integração cultural em sua organização, provavelmente é para
favorecer a supremacia de sua cultura nacional. A dominação cultural é
uma política que visa à integração com base em uma cultura nacional. As
vantagens potenciais dessa política são que, quando bem­‑sucedida, ela
cria uma identidade corporativa unificada, apresenta um rosto comum
para o cliente e torna mais fácil implementar programas e métodos pa‑
dronizados. Entretanto, esse e outros benefícios potenciais são difíceis de
se alcançar se a política de dominação cultural criar ressentimento entre
as subculturas da minoria na empresa. Esse ressentimento poderia provo‑
car oposição às práticas da empresa e reduzir a flexibilidade. Uma polí‑
tica de integração pela dominação de uma cultura precisa ser “vendida”
aos membros da subcultura por meio de uma visão persuasiva e de uma
perspectiva de clareza dos benefícios para esses membros.
4. Síntese cultural. Tal diretriz surge quando uma CMN atribui valor
às diversas culturas nacionais em sua organização, mas também percebe
uma grande necessidade de integrá­‑las. A síntese cultural é uma política
voltada para a integração cultural por meio da fusão de todas as culturas
presentes em uma CMN. Ela não confere necessariamente peso igual a
cada cultura, mas visa chegar ao ajuste mais completo possível entre elas.
Embora demore mais que as outras, a implementação dessa política ofere‑
ce muitos benefícios potenciais: permite mais flexibilidade na abordagem
dos mercados locais e das condições operacionais, mantém os benefícios
potenciais de aprendizagem com as diferentes subculturas e pode ter mais
sucesso do que a dominação cultural ao criar uma integração cultural em
toda a empresa sem perda de valor. Conforme discutido a seguir, essa é a

Book_Organizaçoes.indb 379 16/9/2011 16:23:51


política de gestão da diversidade cultural que melhor se harmoniza com
uma estratégia transnacional.
A Tabela 11.3 apresenta um resumo das vantagens e desvantagens
associadas a cada uma dessas quatro opções de diretrizes para a gestão
da diversidade cultural em uma multinacional.
Essas quatro políticas para gerir a diversidade cultural têm intensas
repercussões sobre as quatro estratégias para expansão global já discuti‑
das. A Figura 11.7 indica a diretriz para a gestão da diversidade cultural
380
compatível com cada uma das quatro estratégias. Uma estratégia multi‑
nacional pode extrair benefícios da preservação da diversidade cultural,
parte iii  novas formas de trabalho em rede

ajudando as filiais a se adaptar aos mercados locais e a outras condições.


Nas multinacionais, a integração cultural não é uma prioridade, porque
sua necessidade de coordenação global é baixa. Uma estratégia interna‑
cional implica transferir algumas competências para países estrangeiros,
geralmente na fabricação e na distribuição, e reter outras centralmente,
como P&D, desenvolvimento de produto e marketing. Essa mistura de
funções centralizadas e descentralizadas pode coexistir com uma segmen‑
tação de culturas na empresa, embora o baixo valor atribuído à integra‑
ção cultural não seja o ideal. Na verdade, como já foi observado, um dos
problemas dessa estratégia é que ela não busca os benefícios da responsi‑
vidade ou da coordenação global. Uma estratégia global exige excelente
coordenação global e favorece uma política de dominação cultural. Nas
CMNs japonesas que adotam essa estratégia, suas práticas e até mesmo
cerimônias e símbolos culturais nacionais costumam ser aplicados em to‑
das as operações internacionais das empresas com poucas modificações
locais.
A estratégia transnacional procura obter ao mesmo tempo os bene‑
fícios da globalização e da localização. Uma CMN que adota essa estra‑
tégia se esforça para agregar valor com a customização de seus produtos
e serviços, e, ao mesmo tempo, capitaliza suas habilidades para instalar
operações nos lugares mais favoráveis, coordenando­‑as de modo global.
A estratégia transnacional depende de iniciativas, de propostas e do novo
conhecimento proveniente dos associados locais e da capacidade de coor‑
dená-los e disseminá­‑los por toda a empresa. Uma política de síntese cul‑
tural é a que tem mais probabilidade de servir de apoio a essa estratégia
e aos métodos para colocá­‑la em prática.
A sinergia cultural também é a melhor política para estimular o víncu‑
lo interpessoal entre os diversos grupos, permitindo à CMN transnacional

Book_Organizaçoes.indb 380 16/9/2011 16:23:51


Tabela 11.3  Vantagens e desvantagens das opções de políticas para a
gestão da diversidade cultural

Política Vantagens Desvantagens


Pluralismo Aborda as diferenças geográficas Reduz os ganhos de sinergia
cultural ou de mercado
Permite subculturas mais fortes Inibe o consenso acerca dos
Proporciona maior flexibilidade objetivos
Mantém a produtividade durante Reduz o movimento das pes‑
a fusão soas e das ideias 381
Comparações estimulam o Reduz a padronização de

Organizando além das fronteiras


aprendizado práticas
Segmenta‑ As mesmas do pluralismo cultural, As mesmas do pluralismo cul‑
ção cultural mais: tural, mais:
Evita conflitos culturais Não capitaliza as oportuni‑
dades de se aprender com a
diversidade cultural
Pode levar a uma fragmen‑
tação prejudicial dentro da
empresa
Dominação Cria identidade unificada Minimiza o desenvolvimento
cultural Proporciona um rosto para o de subculturas
cliente Não aborda os problemas das
diferenças geográficas ou de
mercado
Dominação Permite políticas e métodos Reduz a flexibilidade
cultural padronizados Pode causar o ressenti‑
mento dos grupos culturais
minoritários
Síntese Dá um novo rosto e uma nova Pode causar grande resistên‑
cultural identidade às empresas que se cia à mudança
fundiram e às joint ventures Pode ter influência negativa
Assegura mais flexibilidade à na produtividade durante a
adaptação às diferenças geográfi‑ transição
cas ou de mercado Sua implementação é mais
Facilita a integração de empresas demorada
ou parceiros
Maximiza o potencial de aprendi‑
zado mútuo

Fonte: Adaptado de Hewitt Associates, Mergers and Acquisitions in Europe Survey Results 2003,
Amsterdam: Hewitt Associates, p. 30.

Book_Organizaçoes.indb 381 16/9/2011 16:23:51


Figura 11.7  Políticas para a gestão da diversidade cultural compatíveis
com estratégias de expansão global

Pressões para a integração global


Baixa Alta
Pressões para a responsividade local

Alta Estratégia multinacional Estratégia transnacional


382
Pluralismo cultural Síntese cultural
parte iii  novas formas de trabalho em rede

Estratégia internacional Estratégia global


Baixa
Segmentação cultural Dominação cultural

criar uma rede coesa. Tal sinergia cultural não impõe uma cultura sobre
as outras, mas respeita e admite o potencial de se aprender com cada
uma. A intenção é combinar os melhores elementos da cultura de cada
parceiro para estimular novas ideias, distribuir os recursos com mais efi‑
cácia, criar e desenvolver processos organizacionais mais eficientes. O
conceito de sinergia é, naturalmente, que o todo é maior que a soma de
suas partes. A ideia fundamental por trás da cooperação cultural é que
"os aspectos positivos das diversas culturas são preservados, combinados
e expandidos para criar um novo todo".24

11.5.4 Transferência internacional de conhecimento e


práticas entre fronteiras
O Capítulo 13 examina a transferência do conhecimento e, portanto,
o potencial de aprendizagem por meio da formação de alianças entre as
organizações, algumas das quais podem estar no estrangeiro. Esta seção
enfoca a transferência internacional do conhecimento e de práticas nas

Book_Organizaçoes.indb 382 16/9/2011 16:23:51


próprias multinacionais. Com a intensificação da competição, a efetiva
transferência internacional do conhecimento localizado em diferentes
pontos nas multinacionais está se tornando cada vez mais importante. É
fato amplamente reconhecido que o conhecimento novo é a base sobre
a qual as empresas renovam suas competências, assegurando sua vanta‑
gem competitiva.25 As diferenças culturais, entre outros fatores, podem
influenciar o sucesso dessa transferência.
O conhecimento consiste de informação que foi agrupada e associada
383
a determinadas tarefas e/ou contextos. Assim, pode­‑se dizer: "eu sei como
fazer isto" ou "eu sei o que fazer quando surgir esse tipo de situação".

Organizando além das fronteiras


O conhecimento pode ser implícito (conhecimento tácito), ou articulado
e até codificado (conhecimento explícito). Pode permanecer em posse de
alguns indivíduos, pode estar contido em normas culturais ou normas
de grupo ou embutido em práticas organizacionais – sistemas, proces‑
sos, regras e rotinas. O conhecimento também pode variar do simples
ao complexo, sendo que a complexidade está associada à necessidade de
informação mais factual para resolver uma incerteza causal. Certo tipo
de conhecimento independe de dadas situações organizacionais e pode
ser descrito por si, ao passo que outro tipo de conhecimento só pode ser
descrito em relação a situações muito específicas.26
Quando levadas em conta junto com as diferenças culturais, essas
distinções entre diferentes tipos de conhecimento nos ajudam a entender
a provável dificuldade na transferência do conhecimento entre as diver‑
sificadas unidades de uma CMN. A transferência do conhecimento pode
ser mais eficiente, quanto à velocidade e riqueza do conhecimento a ser
transferido, quando esse conhecimento é simples, claro e independente.
Em geral, a transferência internacional é mais eficaz entre unidades cultu‑
ralmente semelhantes.27 Pode haver mais dificuldade na transferência de
conhecimento complexo, tácito e dependente do contexto entre unidades
culturalmente muito diferentes.
Do ponto de vista estratégico, o conhecimento mais significativo que
as multinacionais precisam transferir entre as sedes e as filiais das corpo‑
rações, e entre as próprias filiais, está relacionado a questões novas e de
longo prazo, como futuras oportunidades de mercado, ideias criativas,
potenciais relacionamentos de negócios e avanços incipientes de parte
dos concorrentes. Portanto, tende a ser complexo e depende do contex‑
to, além de ser de natureza não muito explícita. Muito desse conheci‑
mento tem de ser transferido entre fronteiras culturais. Essa combinação

Book_Organizaçoes.indb 383 16/9/2011 16:23:51


de características realça a dificuldade que as CMNs enfrentam para ga‑
rantir que a troca interna de conhecimento significativo seja rápida, sem
perder seus matizes mais sutis. O conhecimento complexo e tácito que
depende do contexto exige uma boa quantidade de informação ao ser
transferido para outros, e isso é mais bem tratado em discussões e apre‑
sentações pessoais. Se o conhecimento é suscetível de ser influenciado
pela cultura, talvez porque esteja relacionado a idiossincrasias de uma
filial estrangeira, pode ser necessária defesa e a discussão entre colegas
384
de confiança para superar a resistência pela gestão corporativa. Esse tipo
de situação não permite uma transferência efetiva de conhecimento por
parte iii  novas formas de trabalho em rede

meios inteiramente formais, como documentos. Na verdade, uma em‑


presa provavelmente manterá confidenciais certos conhecimentos consi‑
derados estrategicamente importantes, o que favorece sua transferência
com base na interpretação.
A necessidade de transferir conhecimento não rotineiro nas CMNs
realça outra dimensão da contribuição que os gerentes de rede global
podem oferecer. A gestão de redes de CMN por meio de contato e re‑
lações de confiança é a mais adequada para superar as dificuldades que
essa transferência de conhecimento enfrenta. Quanto mais eficiente for a
transferência, maior a capacidade de a empresa aprender e, com isso, ad‑
quirir vantagem sobre seus concorrentes, por ser mais inovadora e hábil
que eles.
Para se ter todos os benefícios potenciais, o conhecimento deve ser
aplicado. Um conhecimento mais rotineiro pode ser transformado em
métodos organizacionais padronizados. A transferência internacional de
melhores práticas pelas empresas é também um meio cada vez mais im‑
portante mediante o qual o conhecimento é aplicado no mundo globali‑
zado. Embora essas práticas tenham com frequência duas características
importantes que auxiliam sua transferência – são explícitas e codificadas –,
as diferenças entre os contextos envolvidos nessa transferência podem
apresentar problemas. Por essa razão, as práticas transferidas em uma
multinacional normalmente precisam ser "recontextualizadas".28 Isso
significa que, enquanto os princípios que servem de base às práticas po‑
dem ser transferidos, o modo específico de operação talvez necessite ser
modificado para se adequar ao novo contexto organizacional.
Por exemplo, segundo os princípios sobre os quais se baseia o método
japonês de aperfeiçoamento da qualidade e dos métodos da produção,

Book_Organizaçoes.indb 384 16/9/2011 16:23:51


uma empresa deve acumular o conhecimento tácito pela experiência no
trabalho e o aperfeiçoamento permanente deve ser integrado como par‑
te essencial do trabalho cotidiano. Entretanto, as práticas por meio das
quais esses princípios se concretizam no Japão não funcionam necessaria‑
mente em um contexto diferente como os Estados Unidos, especialmen‑
te em fábricas sindicalizadas, com métodos de trabalho profundamente
arraigados. As tentativas anteriores de transferir o método japonês dos
círculos de qualidade para os Estados Unidos quase sempre fracassaram,
385
e foram tratadas com hostilidade por trabalhadores e com indiferença
por muitos executivos. Tentativas posteriores de aplicar os mesmos prin‑

Organizando além das fronteiras


cípios por meios diferentes, como incorporá­‑los ao trabalho de equipes
multifuncionais, de modo geral tiveram mais sucesso. Esse tipo de arranjo
organizacional é mais compatível com o uso frequente de equipes, já que
as hierarquias são reduzidas.29
Uma pesquisa realizada pelo autor e colegas sobre a transferência
internacional de práticas por 615 empresas de Hong Kong para suas
filiais localizadas na China continental detectou muitos outros fatores
que ajudaram nesse processo.30 Entre eles estão a boa qualidade dos re‑
cursos humanos locais, a confiança na equipe dos executivos da filial,
controles intensos e recrutamento internacional. As implicações dessas
descobertas são:
1. A transferência bem­‑sucedida de práticas da matriz para uma fi‑
lial internacional requer pessoal local com suficiente competência para
implementá­‑las. Assim, é importante recrutar e/ou treinar gerentes e em‑
pregados com a qualificação correta. Se for impossível ou custar caro
demais, será melhor não adotar as práticas padronizadas da empresa.
2. A confiabilidade do pessoal da filial local também ajuda na boa
transferência das práticas. Para que funcionem com eficácia em outra
situação, os executivos locais terão de mostrar disposição para aceitá­‑las
e ter competência para trabalhar com elas. A confiança no pessoal da
filial pode aumentar a motivação dos executivos da matriz em investir na
transferência das práticas, decidindo se vale o custo e o esforço.
3. O controle intensivo de uma filial usando mecanismos de controle
ajuda a dar o necessário impulso à transferência, e depois, à sua sustenta‑
ção. Por sua vez, depois de implantadas nas filiais, as práticas padroniza‑
das ajudam no processo de controle corporativo.

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4. O recrutamento internacional de candidatos para as filiais inter‑
nacionais encoraja a transferência de novas práticas para essas filiais. Os
fornecedores internacionais de matérias­‑primas e serviços são a origem e
também transmissores das práticas, além de serem ainda fontes de acon‑
selhamento sobre sua aplicação nas empresas.

As CMNs, mais do que as empresas menores, têm maior facilidade


em transferir de forma eficaz suas práticas para as filiais internacionais.
386
Parece haver muitas razões para isso. Em primeiro lugar, porque seu ní‑
vel geralmente maior de diversificação cria a necessidade de assegurar a
parte iii  novas formas de trabalho em rede

integração internacional para gerir complexas cadeias de valor, manter


padrões de qualidade global e implementar padrões éticos e políticas de
RH compatíveis. A ampla implementação de métodos corporativos pa‑
dronizados entre as filiais pode contribuir para as atividades de controle
e coordenação.31 Segundo, e em parte devido a essa razão, a empresa de
maior porte normalmente adota uma abordagem formalizada, com base
em um conjunto de práticas padronizadas bastante elaboradas. Terceiro,
esse tipo de empresa costuma ter mais recursos para implementar a trans‑
ferência dessas práticas, dinheiro para o treinamento e capacidade para
sustentar os custos associados às disfunções iniciais causadas pela intro‑
dução das mudanças necessárias.

11.6 Eli Lilly: Um exemplo de novas formas


organizacionais que surgem em uma CMN32
A Eli Lilly foi fundada em 1876, nos Estados Unidos, e é líder na
indústria farmacêutica, com uma longa história de operações globais. Em
2003, tinha mais de 41.000 empregados em todo o mundo, com filiais em
159 países. Seu departamento de P&D está espalhado por nove países e
realiza estudos clínicos em mais de 30. Como outras importantes empre‑
sas farmacêuticas, a Lilly sofreu crescentes pressões “para inovar desen‑
volvendo de forma contínua novos produtos, acelerar o desenvolvimento
e o lançamento de novos produtos, melhorar a eficiência do ponto de
vista dos custos em todas as operações e ser agressiva na venda de produ‑
tos para os mercados mais importantes do mundo".33 Essas dificuldades
afetaram diretamente a maneira como as empresas farmacêuticas operam
globalmente e a maneira como se organizam.

Book_Organizaçoes.indb 386 16/9/2011 16:23:52


Antes de 1990, a organização da Lilly podia ser descrita como uma
estrutura funcional em que a pesquisa, a fabricação e o marketing/vendas
estavam em divisões separadas. A gestão de suas filiais nacionais era cen‑
tralizada, mais concentrada nas vendas do que na identificação de novas
necessidades e oportunidades de produtos. Essa estrutura demonstrava
sérias limitações, inclusive a ineficácia das comunicações, demora nas to‑
madas de decisão, baixo índice de inovação e de responsividade a novas
oportunidades de negócios, sobrecarga de informações no alto escalão e
387
alto custo administrativo. As oportunidades de aprender e adaptar esta‑
vam sendo perdidas.

Organizando além das fronteiras


Durante os anos 1990, a organização da Lilly evoluiu de várias ma‑
neiras. Ela adotou uma estrutura matricial, com os grupos de produ‑
to constituindo uma dimensão e as filiais nacionais, outra. Na matriz,
utilizavam­‑se equipes multifuncionais e redes. Anteriormente, a desco‑
berta de novos compostos havia sido organizada em torno de disciplinas
científicas como a química, a biologia e a farmacologia, e comitês atua‑
vam como coordenadores para iniciativas individuais de pesquisa. Essa
estrutura deu aos cientistas bastante liberdade na realização de pesquisas,
mas não canalizava seus esforços mais diretamente a áreas com potencial
de mercado. Nessa nova estrutura, executivos responsáveis por áreas te‑
rapêuticas globais administram descobertas e se reportam a um comitê
multifuncional do alto escalão. Esse comitê define a alocação de recursos,
as prioridades e monitora as descobertas de cada equipe, além de resolver
os conflitos. Da mesma forma, em 1994, a Lilly introduziu as equipes
multifuncionais dedicadas ao desenvolvimento, aprovação regulatória e
lançamento de compostos individuais. A Figura 11.8 ilustra o uso de
equipes em diferentes fases da cadeia de valor da empresa.
A Lilly também adaptou sua organização para melhor corresponder
a suas exigências, inclusive de globalização, em outro aspecto muito sig‑
nificativo. Ela mudou a organização de seus mais importantes processos
de criação de valor (apresentada na Figura 11.8) para formas orientadas
globalmente, embora mantivesse um misto de estruturas entre as diferen‑
tes etapas da cadeia de valor. Assim, P&D estava estruturado em torno de
unidades de produto global; a aprovação regulatória inicial, em torno de
unidades voltadas para o processo global; e a maior parte da fabricação,
em torno de estruturas funcionais globais. Os processos de apoio e entre‑
ga também foram reorganizados, com estruturas de produto regional de
apoio ao marketing e estruturas funcionais regionais para a produção em

Book_Organizaçoes.indb 387 16/9/2011 16:23:52


Figura 11.8  Eli Lilly: cadeia de valor e uso de equipes

* Visão holística da cadeia de valor


* Descoberta inicial Pesquisa de Fase posterior do
* Pesquisa descoberta desenvolvimento Comercialização
na área terapêutica

388

parte iii  novas formas de trabalho em rede

Fase inicial do Aprovação Gestão


desenvolvimento pós­‑lançamento
*
* Processo de inovação Processo demanda–
realização
* Equipes de programa Equipes de produto
*

massa e distribuição. Por meio dessas adaptações organizacionais, a Lilly


ajustou suas estruturas e processos para se adequar a diferentes ativida‑
des e passou para formas de organização mais comuns para cada ativida‑
de. Ao mesmo tempo, isso significou que a empresa estava aumentando a
variação e complexidade organizacionais como um todo.
A minuciosa investigação de Thomas Malnight sobre os padrões es‑
truturais emergentes descobriu tendências muito semelhantes, durante os
anos 1990, em outra multinacional farmacêutica, a Hoffman LaRoche.
Suas comparações com a Lilly indicam uma divergência crescente nas es‑
truturas internas da empresa, mas uma convergência entre essas empresas
nas estruturas específicas adotadas para atividades e processos semelhan‑
tes. As duas empresas desenvolveram diferentes tipos de redes internas.
Algumas enfocando a troca de conhecimento global; outras, a troca de
dados globais, e outras, o compartilhamento de instalações globais. A
partir de sua pesquisa, Malnight sugere que:

Em vez de selecionar uma única estrutura, as multinacionais respondem


às pressões e às oportunidades decorrentes de suas operações globais

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aumentando sua complexidade estrutural, diferenciando sistematica‑
mente suas estruturas para responder a subambientes com processos
individualizados. As dificuldades organizacionais que os executivos das
multinacionais enfrentam são […] o desenvolvimento e a integração de
inúmeros tipos de redes internas que compartilham recursos comuns e
globalmente dispersos.34

11.7 Pequenas e médias empresas internacionais 389

Grande parte das discussões sobre a organização entre fronteiras

Organizando além das fronteiras


concentra­‑se nas corporações multinacionais, e até aqui este capítulo não
foi nenhuma exceção. Contudo, uma série de fatos associados à globali‑
zação permitiram, e às vezes tornaram até necessário, que muitas peque‑
nas e médias empresas também se expandissem além de suas fronteiras
nacionais. A disseminação mundial de tecnologia de comunicações e
transporte eficazes permite que essas empresas estendam seus mercados
a países estrangeiros e mantenham estreito contato com seus executivos
ou agentes nesses países. A expansão internacional para novos merca‑
dos pode ser decisiva para as pequenas e médias empresas, porque a li‑
beralização do comércio e a consequente redução no número de nichos
de mercado geograficamente protegidos aumentaram a ameaça em seus
mercados nacionais.35 Estender suas operações para o exterior às vezes
também é uma condição para as pequenas e médias empresas manterem
seus clientes quando estes também vão para novos territórios.
Comparadas com as empresas maiores, especialmente as que já se
estabeleceram como corporações multinacionais, as PMEs são relativa‑
mente deficientes em termos de recursos necessários de apoio a um pro‑
cesso de diversificação internacional. As áreas comuns de deficiência são
as seguintes:

1. informação sobre os atributos de possíveis locais para a diversifi‑


cação internacional;

2. capital (investimento e giro);

3. experiência em (a) operações internacionais e (b) arranjos para


realizá­‑las, como parcerias com empresas estrangeiras;

4. tecnologia adequada a mercados estrangeiros;

Book_Organizaçoes.indb 389 16/9/2011 16:23:52


5. capacidade técnico­‑administrativa (especialmente em relação a
pessoas que devem permanecer).

Para as grandes CMNs em expansão internacional, o risco é não ade‑


quar uma posição estratégica nos mercados de produtos e/ou fornecedo‑
res desde o início, mais do que empenhar recursos que possam prejudicar
a empresa em caso de fracasso. Essa última possibilidade, no entanto,
pode ser uma preocupação para muitas PMEs. Deficiências em informa‑
390
ção, experiência e capital aumentam o risco de uma PME que se inter‑
nacionaliza, porque limitam sua capacidade para lidar com as incertezas
parte iii  novas formas de trabalho em rede

de uma nova situação. Recursos administrativos limitados e um modo


de controle e tomada de decisão geralmente centralizado também podem
dificultar a gestão das atividades à distância. Embora seu envolvimento
na internacionalização esteja crescendo, essas limitações significam que
as PMEs ainda não estão plenamente representadas na economia interna‑
cional como as grandes corporações.36
As PMEs podem escolher basicamente entre quatro modos mais im‑
portantes de internacionalização, cada um exigindo diferentes arranjos.
1. A exportação normalmente exige que as PMEs estabeleçam acor‑
dos com agentes locais. A extensão desses acordos depende da natureza
do produto ou serviço oferecido. No caso de um serviço exclusivo, como
um trabalho de consultoria no exterior, o papel do agente local pode
ser apenas o de agilizar as apresentações iniciais e resolver problemas
de viagem e logística. Em casos como o de exportação de maquinário
sofisticado, a empresa pode precisar confiar em agentes locais para provi‑
denciar serviços como instalação, assistência pós­‑venda e peças de repo‑
sição. De modo geral, a exportação pode ser uma estratégia que implica
na dependência de agentes, mas o risco financeiro é relativamente baixo.
No entanto, confiar apenas na exportação traz outro risco: o de que as
oportunidades nos novos mercados não sejam bem exploradas.
2. Um modo cooperativo baseado em alianças e outros arranjos coo‑
perativos entre empresas. Embora com esse modo a empresa que se inter‑
nacionaliza possa hoje contar com certo controle administrativo direto,
ela se mantém na dependência de seu(s) parceiro(s) e enfrenta um alto
risco financeiro quanto aos recursos que deverá empenhar. O modo coo‑
perativo pode assumir muitas formas, entre as quais projeto de desenvol‑
vimento em conjunto com um parceiro local, outras parcerias contratuais

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como consórcios, participação acionária em empresa estrangeira existen‑
te ou participação acionária em uma joint venture (veja o Capítulo 10).
Uma PME pode fazer parceria com uma ou mais empresas do país que
a recebe, com empresas do próprio país ou, ainda, de um terceiro país.

Devido a seus recursos financeiros limitados, é mais provável que


as PMEs façam alianças no exterior com participação de 50% ou me‑
nos. O Capítulo 10 observou como a pesquisa sugere que as exigências
391
administrativas para o sucesso em uma parceria não majoritária são
diferentes quando a empresa é o parceiro majoritário. Nessa situação,

Organizando além das fronteiras


é essencial grande confiança entre os parceiros, porque a PME não tem
poder de voto nem suficiente presença na gestão para exercer o contro‑
le direto.
3. Um modo de rede, mantendo uma posição nas cadeias de valor
da rede de grandes empresas e acompanhando­‑as em novos mercados.
Muitas PMEs japonesas adotaram essa estratégia.37 A rápida internacio‑
nalização de pequenas empresas de software muitas vezes teve o impulso
de relações nas redes, com os parceiros mais importantes orientando a
seleção do mercado estrangeiro e providenciando os mecanismos para
entrada no mercado.38 O papel quase secundário que as PMEs podem
ter nas redes da cadeia de valor implica grande dependência de empresas
maiores, mas reduz os riscos financeiros da internacionalização a um
nível relativamente baixo, pelo menos no curto prazo. No médio e longo
prazos, essa forma pode se tornar transitória, porque há o risco de o(s)
parceiro(s) majoritário(s) encerrar(em) seu relacionamento com a PME.

Surge uma variante do modo de internacionalização de rede quando


a entrada no mercado estrangeiro é facilitada pela presença de compa‑
triotas que migraram para o país visado. Para as PMEs de Hong Kong
que se expandiam para o exterior, a disponibilidade na América do
Norte, no Reino Unido e em alguns países do sudeste asiático de uma
diáspora de Hong Kong/Cantão proporcionou executivos locais consi‑
derados confiáveis, que poderiam ajudar a lidar com um novo ambiente.
A participação em redes sociais, como as câmaras de comércio e outras
associações empresariais, também poderia facilitar a internacionalização
da PME pelo compartilhamento de experiência e de outras informações
importantes.

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4. Um modo autônomo, pelo qual as empresas entram em novo am‑
biente estrangeiro de maneira abrangente e independente. Elas se compro‑
metem com o investimento direto estrangeiro na localidade estrangeira,
financiando e administrando elas mesmas a diversificação no exterior. É
uma estratégia comum para grandes empresas, mas em geral além do al‑
cance das PMEs devido às restrições de recursos mencionadas. Também é
um modo de alto risco financeiro, por causa do desconhecimento que as
PMEs costumam ter das condições locais, por seu baixo poder de nego‑
392
ciação com as instituições locais e o empenho proporcionalmente alto de
seus recursos. Entretanto, se a empresa consegue isso, a baixa dependên‑
parte iii  novas formas de trabalho em rede

cia em relação a outras empresas daria às PMEs mais espaço para utiilizar
a vantagem da flexibilidade que a empresa pequena tem que os outros
modos, menos independentes.

Algumas das PMEs que tiveram maior sucesso na expansão interna‑


cional são as que têm sede em Hong Kong. A pesquisa conduzida pelo
autor e colegas sobre a internacionalização de empresas de Hong Kong
ilustra os métodos que as PMEs podem usar para gerenciar operações
estrangeiras.39 Todas elas operam em ambientes altamente competitivos.
Algumas competem com multinacionais muito maiores, enquanto outras
devem satisfazer a severas exigências, que estão sempre mudando, de
CMNs para as quais fabricam equipamentos originais.
As PMEs de Hong Kong pertencem a famílias ou empreendimentos
de primeira geração, normalmente administradas de modo centralizado
pelo próprio dono, às vezes ajudado por membros da família. Esses lí‑
deres ressaltam a importância da lealdade à empresa e se baseiam no
contato pessoal, na confiança mútua e no paternalismo para controlar
e motivar seus empregados. Suas empresas têm estruturas horizontais
muito simples e pouca organização formal, embora seus métodos sejam
muito sofisticados em áreas como a contabilidade. A maioria de suas
operações internacionais está localizada na China continental, no sudeste
asiático, na América do Norte ou na Europa, e assume a forma de subsi‑
diárias, filiais e joint ventures.
Há uma preocupação entre muitos presidentes de PMEs de que a
expansão internacional possa levá­‑los além da capacidade desse estilo
personalizado de administrar. Alguns se abstiveram por essa razão. Na
prática, eles conseguem se adaptar de várias maneiras, com a escolha
dependendo em grande parte se (1) a expansão internacional é a entrada

Book_Organizaçoes.indb 392 16/9/2011 16:23:52


em novos mercados ou a realocação de sua fabricação; e (2) a expansão é
primordialmente para a China continental ou mais longe.
As PMEs que passaram sua fabricação para outros territórios man‑
têm um controle muito centralizado sobre essas fábricas por meio de in‑
tensa informação (muitas vezes por dia) sobre as questões operacionais.
Se a fabricação foi transferida para o outro lado da fronteira, na China
continental, os executivos da matriz em Hong Kong normalmente assu‑
mem o encargo e são aplicados os métodos padronizados da empresa.
393
Visitas pessoais frequentes dos executivos entre a sede e a fábrica mantêm
o controle e a comunicação. PMEs com fabricação em ambientes não

Organizando além das fronteiras


chineses costumam se associar a parceiros ou executivos locais para lidar
com um mercado de trabalho desconhecido e com as relações com os
agentes do governo.
As empresas prestadoras de serviço em geral se expandiram para o
exterior para aumentar seus mercados. Todas as construtoras, empresas
de serviços financeiros, imobiliárias e varejistas nomearam executivos
de confiança, com anos a serviço da companhia em Hong Kong para
dirigir as filiais internacionais, a maioria localizada na China continen‑
tal. Em um setor bastante regulamentado, como os serviços financeiros,
executivos e gerentes de filiais internacionais recebem muitos treina‑
mentos para seguir as práticas estabelecidas em manuais muito detalha‑
dos. Em compensação, duas empresas de software e desenvolvimento
de sistemas contrataram executivos locais que conhecem o mercado, a
língua e a cultura, e eram considerados mais habilitados para reter os
clientes. Essas empresas dão autonomia aos empreendimentos no exte‑
rior para reagir com flexibilidade a mercados que se desenvolvem muito
rapidamente, e compensam a distância comunicando­‑se intensamente
por meio da TIC.
Apesar dessas variações, há certos aspectos comuns na maneira como
essas PMEs organizam e administram suas atividades no exterior. Ainda
que a influência da cultura tradicional chinesa de negócios possa ser ob‑
servada nos atributos dessas empresas, elas são exemplos que poderiam
servir de referência para PMEs de outras partes do mundo, pois elas pa‑
recem funcionar. Essas empresas fazem bom uso das redes chinesas no
exterior quando exploram a viabilidade da entrada em novo local, o que
indica quão desejável é que as PMEs em geral usem o máximo possível as
redes locais quando examinam a possibilidade da expansão internacio‑
nal. As missões comerciais chinesas localizadas no país da PME podem

Book_Organizaçoes.indb 393 16/9/2011 16:23:52


facilitar o acesso a essas redes. Os donos ou executivos das PMEs estuda‑
das preferem enviar pessoal da matriz com experiência de anos de serviço
para instalar e dirigir suas atividades internacionais. São pessoas confi‑
áveis que conhecem profundamente a cultura da empresa. Quando não
há pessoas assim em número suficiente, as PMEs contratam executivos
de comunidades chinesas no exterior – às vezes antigos empregados que
emigraram. Quando nomeiam executivos locais ou escolhem parceiros
locais de joint venture, deve­‑se ressaltar que devem ser pessoas confiáveis,
394
e muito desses escolhidos são velhos amigos do dono da PME.
A transferência dos executivos confiáveis dos altos escalões da sede
parte iii  novas formas de trabalho em rede

é algo caro. Em muitos casos, apenas transforma o problema de tratar


com a incerteza no nível da unidade do negócio em um problema de
recursos humanos, ou seja, ajudar o expatriado pela matriz a lidar com
as ansiedades provenientes da natureza diferente do ambiente no exte‑
rior. Quando questionados sobre o custo da transferência dos expatria‑
dos, a escassez de gerentes locais competentes era mencionada como o
limite principal para a alocação, especialmente para as unidades base‑
adas na China continental. Aqui, é difícil discernir quanto a falta de
confiança nos executivos locais reflete a deficiência de sua competência
e treinamento e não um fator mais sutil, como a confiabilidade pessoal.
Uma alternativa para a transferência da equipe de executivos como
forma de reduzir o risco e a incerteza em localidades no exterior é a cria‑
ção de parcerias colaborativas com o pessoal da empresa local. Trata­‑se
de outra forma de rede social. Quando as relações de confiança já foram
consolidadas ao longo dos anos de comércio e outros tipos de relaciona‑
mentos, essas parcerias podem ser estabelecidas fácil e rapidamente. Em
outros casos, em que não existiam relacionamentos sociais anteriores,
as parcerias demoram mais tempo para ser estabelecidas, exigindo mais
esforço para funcionarem.
Embora ressaltem a importância da confiança nas relações com os
executivos de suas unidades no exterior, os chefes das PMEs de Hong
Kong a complementam mantendo intensa comunicação. O custo de li‑
gações internacionais de telefone está caindo e a crescente facilidade do
e­‑mail e das comunicações pela internet tem desempenhado um papel
importante na simplificação da comunicação pessoal de longa distância.
Muitos executivos do alto escalão de PMEs aproveitam essa facilidade
para se comunicarem pessoalmente muitas vezes por dia com unidades
no exterior. Alguns também passam mais da metade de seu tempo de

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trabalho viajando para visitar essas unidades estrangeiras. Esses conta‑
tos pessoais vão muito além das atualizações operacionais frequentes,
às vezes diárias, que os escritórios centrais recebem por e­‑mail e fax. Até
que ponto essa comunicação intensa é um atributo da cultura chinesa, e
quanto dessa comunicação está realmente relacionada à confiança, é uma
questão que permanece em aberto. Mesmo assim, é útil para empresas
que operam com estruturas administrativas muito simples e econômicas,
além de melhorar sua capacidade de decidir rapidamente e se adaptar
395
bem a novas circunstâncias.
A capacidade das PMEs de reagir depressa a novos problemas e opor‑

Organizando além das fronteiras


tunidades depende da qualidade de seus processos de aprendizado. As
CMNs contam com gerentes de rede global para integrar as contribui‑
ções em diversos níveis para seus processos de aprendizado; em geral, é o
diretor executivo que desempenha papel equivalente nas PMEs de Hong
Kong. Em seus intensos programas de viagens frequentes eles recebem
muitas informações e conhecem novas oportunidades de negócios, além
de manterem estreito contato com suas unidades estrangeiras. Mais uma
vez, isso ilustra como os chefes de empresas menores costumam se encar‑
regar de funções que, na estrutura administrativa das empresas maiores,
são ocupadas por especialistas.

Resumo
1. Corporações multinacionais (CMNs) são empresas com filial ou filiais
em pelo menos um país, além da sede nacional. Por meio de investimento
direto no exterior, são as principais participantes do processo da globali‑
zação. Há um número crescente de transações entre suas unidades inter‑
nacionalmente diversificadas.

2. Existem quatro estratégias principais que as CMNs adotam para a


expansão internacional, em função das exigências de integração global
e da necessidade de responsividade a situações locais. São as estratégias
multinacional, internacional, global e transnacional.

3. Cada uma dessas estratégias tem implicações na estrutura organizacio‑


nal de uma CMN e na maneira como esta gerencia processos organizacio‑
nais, como a integração, por exemplo. A organização de suas transações
internacionais é uma das maiores dificuldades que as CMNs enfren­
tam hoje.

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4. Uma estratégia multinacional tem relativamente poucas exigências de
integração; de modo geral, basta uma estrutura geográfica global.

5. Uma estratégia internacional impõe mais necessidades de integração e,


dependendo do grau de diversidade do produto, pode ser implementada
tanto por uma estrutura geográfica global como por uma estrutura global
de produto.

6. A estratégia global requer coordenação centralizada de alto nível, e


396
desde que haja pouca customização local de produto, uma estrutura glo‑
bal de produto em geral atende a essa estratégia.
parte iii  novas formas de trabalho em rede

7. Organizacionalmente, a estratégia transnacional é a mais exigente por‑


que procura combinar o controle centralizado de certas atividades com
unidades descentralizadas que podem se adaptar a requisitos locais. Ela
tem enorme necessidade de integração no processamento da comunica‑
ção e da informação.

8. Embora uma matriz multidimensional seja adotada com frequência


para dar apoio à estratégia transnacional, o êxito de sua implementação
também requer um nível de consciência entre executivos e suas equipes
que transcende limites internos da empresa.

9. As CMNs estão sendo instadas a adotar uma estratégia transnacional,


o que significa que devem admitir os benefícios da diferenciação e diver‑
sidade internas, preservando ao mesmo tempo o ideal de integração geral.

10. Portanto, muitas CMNs abriram novos caminhos na organização


para tratar de questões fundamentais como o controle, a integração, a
diversidade cultural e a transferência internacional de conhecimento e
práticas.

11. A Eli Lilly é um exemplo instrutivo de como uma grande CMN aper‑
feiçoou sua organização para conciliar os benefícios da coordenação
global de algumas atividades e, ao mesmo tempo, descentralizar outras,
como a distribuição e o marketing. Enquanto diferenciava sua organiza‑
ção interna conforme tais necessidades, a empresa passou a usar inúme‑
ras redes internas para preservar o grau de integração entre as atividades
e o uso dos recursos.

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12. Menor atenção tem sido dada aos problemas enfrentados pelas pe‑
quenas e médias empresas (as PMEs) no momento em que lutam para
expandir suas atividades internacionais.

13. As PMEs têm quatro opções principais para se internacionalizarem:


exportação, aliança com um parceiro, acompanhamento de uma empresa
maior ao exterior como parte de sua rede de fornecedores e investimento
por conta própria no exterior. A experiência das PMEs de Hong Kong
aponta uma série de medidas que essas empresas podem tomar para or‑ 397
ganizar e administrar suas atividades no exterior, e também indica a ma‑

Organizando além das fronteiras


neira como as tecnologias de informação e comunicação modernas estão
facilitando o contato entre as unidades estrangeiras e a base nacional.

Questões para discussão


1. Levando em conta também o Capítulo 2, discuta a relação que há
entre o desenvolvimento das corporações multinacionais (as CMNs) e a
globalização.

2. Quais são as implicações organizacionais das estratégias de expansão


global das CMNs?

3. Como as pressões para a localização servem de base para a definição de


estratégias de expansão global das CMNs?

4. Descreva e discuta os aspectos que definem uma organização


transnacional.

5. Quais são as funções­‑chave de um gerente de rede global?

6. De que forma algumas CMNs estão tornando­‑se pioneiras nos novos


modos de organizar?

7. Descreva e discuta as principais diferenças entre a maneira como uma


CMN e uma PME podem se organizar para a expansão internacional.

Book_Organizaçoes.indb 397 16/9/2011 16:23:53


Notas
1. DICKEN, Peter. Global shift: reshaping the global economic map of the 21st
Century. 4. ed. London: Sage, 2003. p. 10.

2. RUGMAN, Alan M. The end of globalization. London: Random House, 2000.

3. United Nations Conference on Trade and Development/UNCTAD. World in‑


vestment report 2003. New York: United Nations, 2003. p. 231.
398
4. DICKEN, 2003, op. cit. p. 198.
parte iii  novas formas de trabalho em rede

5. Especialmente Peter Dicken e UNCTAD.

6. DICKEN, 2003, op. cit. p. 198.

7. Os dados são de vários números do Relatório do Investimento Mundial, UNCTAD.

8. OVIATT, Benjamin M; MCDOUGALL, Patricia P. A framework for unders‑


tanding accelerated international entrepreneurship. In: RUGMAN, Alan M;
WRIGHT, R. W. (Org.). Research in Global Strategic Management. vol. 7,
p. 23­‑40. Stamford: JAI Press, 1999.

9. Em especial, por BARTLETT, Christopher A; CHOSHAL, Sumantra. Mana‑


ging across Borders: The Transnational Solution. 2. ed. London: Random Hou‑
se, 1998.

10. JONES, Gareth R. Organization Theory: Text and Cases. Reading: Addison­
‑Wesley, 2001. p. 244­‑245.

11. BARTLETT;GHOSHAL, 1998, op. cit. cap. 6.

12. PETERS, Tom J; WATERMAN, Robert H. In Search of Excellence. New York:


Harper & Row, 1982.

13. BARTLETT; GHOSHAL, 1998 op. cit. p. 227. A expressão foi cunhada por
um executivo de alto escalão de CMN.

14. GHOSHAL, Sumantra; NOHRIA, Nitin. Horses for courses: organizational


forms for multinational corporations. Sloan Management Review, inverno, p.
23­‑35, 1993.

15. RUDMAN, Stephen Todd. Controlling interests: management control processes


employed by US multinational corporations within their China affiliates. (Tese
de doutorado). Universidade de Cambridge, 2003.

Book_Organizaçoes.indb 398 16/9/2011 16:23:53


16. CHILD, John. The management of joint ventures within international business
networks: US companies in China. In: Bruce McKern (Org.). Managing the
Global Network Corporation. London: Routledge, 2003. cap. 4.

17. BARTLETT; GHOSHAL, 1998, op. cit. cap. 5.

18. NOHRIA, Nitin. Is a network perspective a useful way of studying organiza‑


tions? In: NOHRIA, Nitin; ECCLES, Robert G. (Org.). Networks and Organi‑
zations. Boston: Harvard Business School Press, 1992. p. 1­‑22.
399
19. LANE, Henry: W. Joseph L: di Stefano e MAZNEVSKI, Martha L. Internatio‑

Organizando além das fronteiras


nal Management Behavior. 4. ed. Malden: Blackwell, 2000.

20. CHILD, John; RODRIGUES, Suzana B. The role of social identity in the inter‑
national transfer of knowledge through joint ventures. In: CLEGG, Stewart;
PALMER, Gill (Org.). The Politics of Management Knowledge. London: Sage,
1996. p. 46­‑48.

21. Para o caso da gestão de parcerias, veja CHILD, John; FAULKNER, David;
TALLMAN, Stephen. Cooperative Strategy. 2. ed. Oxford: Oxford University
Press, 2005.

22. Sobre as diferenças culturais nacionais e sua influência sobre os métodos admi‑
nistrativos, veja CHILD, John; FAULKNER, David; PITKETHLY, Robert. The
Management of International Acquisitions. Oxford: Oxford University Press,
2001; LUBATKIN, Michael; CALORI, Roland; VERY, Philippe; VEIGA, John
F. Managing mergers across borders: a two­‑nation exploration of a nationally
bound administrative heritage. Organization Science, 9, p. 670­‑684, 1998.

23. Para uma discussão útil sobre a adaptação cultural em fusões e aquisições, veja
Hewitt Associates, Mergers and Acquisitions in Europe: Survey Results 2003,
www.hewitt.com.

24. TUNG, Rosalie L. Managing cross­‑national and intra­‑national diversity. Human


Resource Management, 32, p. 461­‑477, 1993. A citação foi tirada da p. 465.

25. Moingeon, Bertrand; EDMONSON, Amy; (Org.). Organization Learning


and Competitive Advantage. London: Sage, 1996.

26. Essas distinções foram feitas por BHAGAT, Rabi S.; KEDIA, Ben L.; HARVES‑
TON, Paula D.; TRIANDIS, Harry C. Cultural variations in the cross­‑border
transfer of organizational knowledge: an integrative framework. Academy of
Management Review, 27, p. 204­‑221, 2002.

Book_Organizaçoes.indb 399 16/9/2011 16:23:53


27. Idem, p. 208.

28. BRANNEN, Mary Yoko; LIKER, J. K; FRUIN, Mark. Recontextualization and


factory­‑to­‑factory transfer from Japan to the US: the case of NSK. Ensaio apre‑
sentado na Reunião Anual da Academy of International Business, Monterrey,
México: outubro, 1997.

29. LILLRANK, Paul. The transfer of management innovations from Japan. Orga‑
nization Studies, 16, p. 971­‑989, 1995.
400
30. CHILD, John; CHUNG, Leanne; RODRIGUES, Suzana B. Creating actionable
knowledge through the cross­‑border transfer of practices. Ensaio apresentado
parte iii  novas formas de trabalho em rede

na Reunião Anual da Academy of Management, Nova Orleans, agosto 2004.

31. Rudman, 2003, op. cit.

32. Fontes: YOSHINO, Michael Y; MALNIGHT, Thomas W. Eli Lilly – 1998 (b):
Emerging Global Organization. Harvard Business School Case, referência n.
9­‑399­‑174, 1999; MALNIGHT, Thomas W. Emerging structural patterns with‑
in multinational corporations: toward process­‑based structures. Academy of
Management Journal, 44, p.1187­‑1210, 2001.

33. A citação foi tirada da p. 1190.

34. MALNIGHT, 2001, op. cit. p. 1203.

35. Patricia Phillips McDougall e Benjamin M. Oviatt. International entrepreneur‑


ship: the intersection of two research paths. Academy of Management Journal,
42, p. 902­‑906, 2000.

36. LAMB, P. W; LIESCH, P W. The internationalization process of the smaller


firm: reframing the relationships between market commitment, knowledge and
involvement. Management International Review, 42, p. 7­‑26, 2002.

37. ANAND, Jaideep R: AINUDDIN, Azimah; MAKINO, Shige. An empirical


analysis of multinational strategy and international joint venture characteristics
in Japanese MNCs. In: BEAMISH, Paul W; KILLING, I. Peter (Org.). Coopera‑
tive Strategies: Asian Pacific Perspectives. San Francisco: New Lexington Press,
1997. p. 325­‑340.

38. COVIELLO, N. E; MUNRO, H. Network relationships and the internationali‑


sation process of small software firms. International Business Review, 6(4), p.
361­‑386, 1997.

39. Essa pesquisa ainda não tinha sido publicada no momento da redação deste livro.
Ela abrange o estudo de 17 firmas, 13 das quais eram pequenas e médias empresas.

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parte IV

O DESENVOLVIMENTO
DE ORGANIZAÇÕES
EFICIENTES
Capítulo 12 Realização da mudança organizacional
Capítulo 13 Organizar para o aprendizado
Capítulo 14 Como gerar e utilizar a confiança
Capítulo 15 Governança corporativa nas novas
formas organizacionais

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Capítulo 12
Realização da mudança organizacional

Conteúdo do capítulo
Este capítulo examina as abordagens para efetuar a mudança organizacional e
colocá­‑las em seu contexto. A mudança se tornou um aspecto normal da vida
da organização e hoje se acredita amplamente que as organizações devam estar
em permanente evolução para sobreviver. Não obstante, os tipos de mudanças
necessárias variam conforme as diferentes circunstâncias. Assim, a primeira
seção abre com o contexto, examinando os diversos fatores decisivos externos
e internos da mudança organizacional. A etapa seguinte é a identificação das
diferentes variedades da mudança, que são cotejadas e comparadas em relação a
três importantes aspectos: se a mudança é radical ou incremental, se é planejada
ou emergente, e qual é o seu enfoque. Identificar essas dimensões ajuda a
definir o que é a mudança organizacional e a esclarecer abordagens alternativas
que atendam a diferentes situações. O capítulo se encerra com uma revisão
das políticas que dão suporte à mudança planejada bem­‑sucedida e resume as
principais orientações.

12.1 A dificuldade de realizar a mudança


organizacional
As empresas precisaram se ajustar de um mundo em que faziam mu‑
danças organizacionais de tempos em tempos para um mundo em que

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devem estar preparadas para fazer mudanças quase continuamente. Hoje
em dia, três quartos dos executivos de níveis intermediário e superior
informam que suas organizações estão com duas ou mais iniciativas de
mudança ao mesmo tempo.1 Paradoxalmente, a mudança se tornou uma
norma organizacional.
No passado, bastava que as empresas se reorganizassem periodica‑
mente, conforme a esfera de seu negócio e suas estratégias se desenvol‑
viam além de sua capacidade organizacional. No período relativamente
404
estagnado entre as reorganizações, bastava revisar regras, responsa‑
bilidades e procedimentos específicos, à luz da experiência e de novas
parte iv  o desenvolvimento de organizações eficientes

regulamentações externas, ou adaptar­‑se a novos planos de negócios.


Atualmente, as empresas devem manter seus arranjos organizacionais
sob constante revisão.
A natureza do processo de mudança mudou nesses últimos tempos.
Hoje, organizar, depende menos de previsões do tipo estrutural, tais como
regras e descrições formais de função. Depende muito mais do uso da in‑
teligência pelos indivíduos e da iniciativa destes em adaptar o que fazem
e como fazem quando as circunstâncias exigem. Em consequência, a mu‑
dança está sendo cada vez mais estimulada por iniciativas empreendidas
em toda a organização, em vez de se basear em planos formulados pela
diretoria. No passado, os programas de mudança organizacional eram
planejados pela diretoria e realizados em estreita ligação com ela, ao pas‑
so que hoje as empresas costumam adotar configurações de equipes de
projeto flexíveis que reúnem pessoas de níveis e atividades diferentes para
trabalhar em propostas para o aperfeiçoamento da organização.
Não é fácil mudar uma norma organizacional. Há muitas barreiras
e diversas tentativas fracassam. Os arranjos organizacionais existentes
são mais que simples maneiras de distribuir tarefas e responsabilidades
pelo trabalho. Uma organização envolve estruturas que determinam a
distribuição do poder e as recompensas entre seus membros. As pessoas
que tem interesse em manter seus privilégios organizacionais, como exe‑
cutivos ou especialistas, seriam irracionais se não os defendessem. Uma
organização estabelecida também é um ambiente de trabalho familiar co‑
nhecido, ao qual as pessoas se adaptaram e muitas vezes desejam manter
como está. A mudança é uma perturbação que pode ter sérias consequên‑
cias psicológicas. Questões como essas podem provocar reação negativa
à mudança e explicam por que iniciativas de mudanças fundamentais tan‑
tas vezes fracassam. Já no ano 66 a.C., o romano Gaius Petronius Arbiter

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resumiu o problema: “Só bem tarde na vida aprendi que temos tendência
a resolver qualquer situação nova com a reorganização, e que método
maravilhoso ela pode ser para criar a ilusão de progresso, enquanto pro‑
duz confusão, ineficiência e desmoralização”. “Plus ça change, plus c'est
la même chose” é um dito que expressa esse mesmo cinismo sobre o re‑
sultado de tentativas de introduzir a mudança.
Todos concordam que é dificílimo fazer mudanças em organizações;
elas são realmente uma tarefa perigosa. Especialistas contemporâneos,
405
como Warren Bennis e John Kotter, alegam que não estamos tratando
adequadamente a mudança organizacional, mas não chegam a concor‑

Realização da mudança organizacional


dar com o que Gaius Petronius Arbiter deixa implícito – a ideia de que,
para começar, deveríamos evitar até mesmo a tentativa.2 É verdade que
quando se tenta e a mudança organizacional fracassa, os custos podem
ser altos em relação ao tempo e ao dinheiro gastos à toa, além da des‑
moralização e perda de credibilidade da gerência. Não obstante, evitar
a questão e tentar manter o status quo já não é possível. Tudo o que foi
dito até aqui neste livro mostra a absoluta necessidade de empresas e ou‑
tras organizações de tratar da mudança, incorporando esse recurso a seu
repertório de competências indispensáveis.

12.2 O contexto da mudança


Existem fatores externos e internos que determinam a mudança orga‑
nizacional. No longo prazo, os externos delineiam as regras básicas fun‑
damentais que nenhuma empresa pode se dar ao luxo de ignorar. Nesse
sentido, eles são os fatores determinantes da mudança organizacional.
No entanto, empresas com vontade e capacidade para adotar estratégias
inovadoras e agressivas podem moldar as condições que seus concorren‑
tes enfrentam. O sucesso dessa configuração depende principalmente de
sua capacidade de desenvolver uma maneira flexível de organizar suas
atividades.

12.2.1 Fatores externos


Na categoria mais ampla dos fatores externos determinantes da mu‑
dança, estão os que atuam em toda uma faixa de indústrias e países. Eles
incentivam a introdução da mudança a fim de se aproveitar novas opor‑
tunidades, embora também possam desencadear pressões para mudar, até

Book_Organizaçoes.indb 405 16/9/2011 16:23:54


mesmo entre empresas que relutam em fazê­‑lo. Muitas das facetas da glo‑
balização entram nessa categoria. No lado institucional, estão as novas
oportunidades decorrentes da liberalização dos mercados comerciais e
financeiros. Hoje está mais fácil expandir­‑se para novos mercados e terri‑
tórios com a ajuda de parceiros locais, fornecedores de serviços e fontes
de financiamento. Existem também novas restrições institucionais, como
as regulamentações sobre a governança corporativa e os padrões ambien‑
tais. Entre outros fatores importantes igualmente amplos e de caráter não
406
institucional estão as inovações tecnológicas, o aumento do nível educa‑
cional, as mudanças demográficas e o crescimento de movimentos sociais.
parte iv  o desenvolvimento de organizações eficientes

Todos esses fatores são determinantes para a evolução de estratégias e


configurações corporativas, e são eles que despertam a necessidade de
efetuar a mudança organizacional.
A maneira como o ambiente dos negócios está evoluindo nesse nível
mais amplo, muitas vezes global, oferece oportunidades para que as empre‑
sas se reorganizem, especialmente quanto à gestão de suas fronteiras. Como
os Capítulos 8 e 9 descreveram, o desenvolvimento de nós de competência
especializada, como o do desenvolvimento de software em Bangalore, e a
maior facilidade na administração de redes extensas da cadeia de valor com
a ajuda das tecnologias modernas de informação e comunicação, estimulou
as empresas a se livrarem de atividades não essenciais e a subcontratar ou
comprar diretamente do mercado. Da mesma forma, agora para muitas
empresas é mais viável distribuir sua produção mundo afora em locais eco‑
nomicamente mais vantajosos. Fatos como esses desencadeiam mudanças
importantes na organização da empresa.
A dinâmica competitiva do setor em que uma empresa está localiza‑
da é afetada por essas mudanças ambientais mais amplas, especialmen‑
te quando elas facilitam a entrada de novos concorrentes. Os velhos
preceitos do paradigma da organização industrial da economia, que
recomendavam que os executivos se concentrassem na escolha de um
setor atraente, fechassem acordos de cavalheiro com outras empresas
no mesmo setor e dedicassem esforços vigorosos para manterem longe
esses recém­‑chegados, eram uma receita para a existência estável que já
não é mais viável. Ilustram esse ponto a capacidade do Virgin Group,
de Richard Branson, ou a do easyGroup, de Stelios Haji­‑Ioannou, de
chacoalhar esses confortáveis arranjos entre os participantes de setores
como tráfego aéreo de passageiros, aluguel de carros e investimento
em varejo.

Book_Organizaçoes.indb 406 16/9/2011 16:23:54


Impelida por empreendedores como esses, a hipercompetição se tor‑
nou um fator determinante da mudança organizacional. Empresas que
enfrentam maior competição e velocidade maior na mudança em seus
setores estão sob pressão para acelerar sua reorganização e redobrar as
tentativas de adquirir novas capacidades por meio de alianças ou aquisi‑
ções. Como já vimos no Capítulo 2, a hipercompetição é causada pelas
inovações das empresas que buscam estratégias não convencionais e estão
preparadas para adotar novas formas organizacionais que lhes propor‑
407
cionem uma capacidade superior de adaptação. Quanto mais as empresas
tentam resistir às mudanças na estratégia agarrando­‑se às regras anterior‑

Realização da mudança organizacional


mente aceitas da competição e mantendo seus arranjos organizacionais,
maior o seu risco de sobrevivência diante de tais concorrentes.

12.2.2 Fatores internos


As empresas não reagem da mesma maneira aos fatos externos.
Algumas buscam estratégias voltadas à criação de vantagens novas e pio‑
neiras no setor, como está fazendo a Toyota com seus carros híbridos,
que não prejudicam o ambiente e são eficientes do ponto de vista do
consumo de combustível. Outras adotam uma atitude mais defensiva. As
alternativas estratégicas dos executivos seniors têm implicações na pos‑
sibilidade de optarem por mudanças significativas em suas organizações.
Entre essas opções estão a de adotar o papel de líder ou de seguidor no
setor, focar em retornos normais ou acima da média, adaptar para ter
retorno por meio da inovação ou por meio de maior eficiência, e diversifi‑
car ou concentrar. Quanto mais a direção escolher o primeiro de cada um
desses pares de alternativas – o papel de líder, retornos acima da média,
inovação e diversificação –, mais provável será o estimulo à mudança e à
evolução em sua organização. Mais uma vez a Toyota é um bom exemplo
no setor automotivo, por ser sempre pioneira em inovações estratégicas e
organizacionais. A Dell Computer também se encaixa nesse perfil, embo‑
ra suas inovações tenham sido basicamente no sistema de negócios, mais
que em produtos.
Arie Lewin e colegas criaram um modelo de como ambientes, setores
e empresas evoluem uns em relação aos outros com o passar do tempo.3
Ao resumir fatores externos e internos para a mudança e a ligação entre
eles, esse modelo oferece uma orientação para o contexto da mudança
organizacional. Ele é reproduzido na Figura 12.1.

Book_Organizaçoes.indb 407 16/9/2011 16:23:54


parte iv  o desenvolvimento de organizações eficientes

408
Figura 12.1  Modelo evolutivo da mudança e seus fatores

Ambiente institucional – países

Book_Organizaçoes.indb 408
Ambiente extrainstitucional

Avanços tecnológicos Novos entrantes Regulação Sistema educacional


Demografia Interdependência global Criação de regras Relações trabalhistas
Movimentos sociais Lógica da gestão Mercados de capital Estrutura da governança

Ação gerencial Fatores de mediação


„„ CEO, equipe da diretoria „„ Condições fundadoras
Intenção estratégica „„ História de adaptação
„„ Opção estratégica „„ Capacidade de absorção
Dinâmica „„ Ajuste estratégico „„ Legado
competitiva „„ Desenho organizacional
„„ Lógica da gestão
Adaptação da organização
„„ Exploração
„„ Aproveitamento
Desempenho
„„ Retornos normais
Setor
„„ Retornos acima da média
Empresa

Legenda Macroevolução Microevolução Co­evolução

Fonte: Lewin, Arie; Long, Chris P.; Carrol, Timothy. The co­‑evolution of new organizational forms”. Organization Science, 10, apresentação 1, 1999. p. 537.

16/9/2011 16:23:54
12.3 Variedades de mudança organizacional
Há muitas variedades de mudança em andamento nas empresas: fu‑
sões e aquisições, reengenharia, reenfoque, reestruturação, programas de
qualidade, desenvolvimento humano e organizacional, corte de custos,
downsizing, terceirização, formação de redes de cadeias de fornecimento
e inovação e aperfeiçoamento incrementais. A única maneira de entender
esse cenário confuso é esquecer os rótulos por algum tempo e procurar os
aspectos subjacentes essenciais. Três desses aspectos são particularmente 409
importantes.

Realização da mudança organizacional


„„ Até que ponto a mudança é radical?

„„ A mudança é planejada ou emergente?

„„ Qual é o foco da mudança?

12.3.1 Até que ponto a mudança é radical?


Em um artigo clássico, Robert Marshak argumentava que tendemos
a usar metáforas quando pensamos em mudança.4 Ele examinou qua‑
tro metáforas da mudança que incorporam diferentes pressupostos sobre
como deveria ser e como deve ser realizada a mudança radical. Essas
quatro metáforas são as seguintes:

1. corrigir e manter;

2. construir e desenvolver;

3. mudar e realocar;

4. libertar e recriar.

A metáfora corrigir e manter significa basicamente manter as coisas


tais como estão. Ela enxerga a organização como uma máquina. Quando
seu desempenho começa a falhar, a reação apropriada não é questionar
a capacidade da máquina em si, mas ajustar, tratar de sua manutenção,
talvez reabastecê­‑la. Por exemplo, diferentes unidades talvez não estejam
se comunicando muito bem – portanto, uma boa reação poderia ser sepa‑
rar e­‑mails e outras desordens da rede de comunicações da organização.
Diante da queda nas vendas, poderia haver uma campanha de recruta‑
mento de novos vendedores. Embora as organizações realmente precisem

Book_Organizaçoes.indb 409 16/9/2011 16:23:54


de reparos e manutenção, essa metáfora pesa contra qualquer revisão
mais fundamental do arranjo corrente, que talvez já não sirva para tratar
das novas circunstâncias. Ela indica uma atitude de resistência à mudan‑
ça, mais do que uma visão acerca da necessidade da mudança.
Marshak conta a história de uma grande empresa high­‑tech que se
viu diante de uma barreira de problemas: erosão de sua base no mercado,
entrada de novos concorrentes, custos inflacionados, colaboração em bai‑
xa e resposta insuficiente aos clientes. Os altos executivos da corporação
410
sabiam desses problemas, mas suas ideias caíram na armadilha da metá‑
fora do corrigir e manter. O resultado foi que eles instigaram uma série de
parte iv  o desenvolvimento de organizações eficientes

retiros, forças­‑tarefa e reuniões de empregados – tudo isso para encontrar


maneiras de resolver problemas –, mas nenhum deles produziu nada além
de algumas ideias mínimas para melhorar a situação. A coisa piorou e o
moral baixou, até o ponto em que, desesperado, o CEO chamou alguns
consultores. Esses consultores recomendaram que a empresa repensasse
todo o seu negócio e seu modo de funcionamento. Ainda acreditando que
bastava consertar a máquina existente, o CEO não aceitou essa recomen‑
dação e mais tarde foi substituído pelo conselho.
A metáfora construir e desenvolver também pressupõe que o arranjo
básico da empresa seja adequado, mas admite ser possível construir com
base no passado. Ao contrário da maneira como a metáfora do corrigir
e manter encara a necessidade de aprender, a ideia do construir e desen‑
volver permite o que Argyris e Schön chamaram de “aprendizado de uma
volta”.5 É a busca por aperfeiçoamento dentro dos amplos parâmetros do
sistema existente. Por exemplo, o desenvolvimento poderia ser guiado por
metas anuais de melhoria do desempenho, acordado por meio de consul‑
ta entre os gerentes e cada um dos executivos, ou realizado em grupos. A
delegação de mais iniciativa para melhorar as funções dos empregados da
linha de frente e a introdução de equipes interdepartamentais são exem‑
plos do tipo de mudança organizacional que essa metáfora estimula.
A metáfora mudar e realocar concebe a mudança organizacional
como uma transição, o que significa a passagem de um estado para ou‑
tro – de A para B, com os parâmetros do sistema existente sendo alte‑
rados. Contudo, o estado final é conhecido, e provavelmente planejado
antecipadamente. A alta gerência e seus consultores costumam ter papel
decisivo na condução desse tipo de mudança, embora possam incentivar
a ampla participação de outros no planejamento detalhado e na implan‑
tação. Uma transição comum é a de algumas atividades feitas na empresa

Book_Organizaçoes.indb 410 16/9/2011 16:23:54


ou em seu país de origem, para terceirizá­‑las externamente ou transferi­
‑las para outro país (veja o Capítulo 8). Outro tipo de transição é a pas‑
sagem de uma estrutura centralizada, que conta apenas com vendas locais
e unidades de atendimento para diferentes grupos de produto, para uma
em que divisões descentralizadas são suficientemente autônomas para se‑
rem constituídas como centros de lucro. Um caso bastante comum é a
integração da estrutura e sistemas de uma empresa ao de uma nova ma‑
triz, logo depois da aquisição. Algumas transições organizacionais, como
411
os dois últimos exemplos, são de grande peso e acarretam considerável
transtorno.

Realização da mudança organizacional


A quarta metáfora, liberar e recriar, é a que está mais sintonizada
com a filosofia da mudança adequada para a organização para o futuro.
Ela concebe mais a transformação do que a transição, no sentido de que
visa liberar o potencial de uma organização para criar uma nova visão de
futuro, reinventar­‑se e, assim, escapar dos problemas atuais. A transfor‑
mação é um processo aberto de descoberta evolutiva, em que emergem
resultados de um processo de vivo debate e experimentação, mais do que
a gestão de uma transição para um novo estado previamente planejado e
especificado. Não é nada fácil para os membros de uma organização supe‑
rar a ansiedade e a confusão que naturalmente surgem quando percebem
que devem abandonar sua base organizacional anterior e elaborar novas
soluções. Uma vez que eles se permitem pensar em novas possibilidades
sem a restrição dos pressupostos e normas anteriores, muitas ideias co‑
meçam a fluir. Argyris e Schön chamaram esse tipo de aprendizado mais
inovador de “aprendizado de circuito duplo”.6 O maior obstáculo para
alcançá­‑lo normalmente surge do medo do impacto que a transformação
terá sobre as funções, especialmente em empresas que não proporcionam
garantias no emprego. Os gerentes intermediários muitas vezes temem
que a mudança trazida pela transformação torne suas funções supérfluas
e conduza à eliminação de níveis hierárquicos. Claudio Ciborra e colegas
relatam como, por esse motivo, os gerentes intermediários da Fiat blo‑
quearam uma possível transformação na organização da produção (veja
o Quadro 12.1).
Os diferentes conceitos da mudança organizacional contidos nas
quatro metáforas não se excluem mutuamente. É uma questão de bom
senso saber qual metáfora é apropriada e em que momento. Contudo, é
necessário ter dois aspectos em mente. Em primeiro lugar, as diferentes
pessoas envolvidas na mudança podem aderir a diferentes metáforas, e

Book_Organizaçoes.indb 411 16/9/2011 16:23:54


Quadro 12.1  O bloqueio da mudança transformacional

Ao aconselhar a diretoria da empresa sobre como atingir sua meta de integra‑


ção, Ciborra e colegas recomendaram que as unidades da fábrica, abrangendo
trabalhadores e supervisores, fossem apresentadas aos conceitos da dinâmi‑
ca dos sistemas. Essa seria uma boa maneira para todos aprenderem estraté‑
gias eficientes de lidar com falhas e gargalos complexos. Eles concluíram que a
aquisição de novos conceitos e rotinas, como o controle disperso dos fluxos de
412 trabalho, daria suporte ao desenvolvimento de novas habilidades importantes.
Por fim a diretoria da Fiat preferiu não proporcionar tal conhecimento às uni‑
parte iv  o desenvolvimento de organizações eficientes

dades de trabalho. Diante do desafio de compartilhar insights sobre a dinâmica


dos sistemas e o mapeamento de um fluxo de produção complexo e, assim,
compartilhar o controle com os trabalhadores a fim de deixar a planta ope‑
rar com mais eficácia, os executivos tiveram medo. Em última análise, eles não
estavam dispostos a abrir a porta para o que consideravam seu conhecimento
privilegiado.

Fontes: Ciborra, Claudio V.; Patriotta, Gerardo; Erlicher, Luisella. Disassembling frames
on the assembly line: the theory and practice of the new division of learning in advanced
manufacturing. In: Orlikowski, Wanda J.; Walsham, Geoff; Jones, Matthew R.; Degross,
Janice I. (Org.). Information Technology and Changes in Organizational Work. London: Chapman
& Hall, 1996, p. 397­‑418; palestra inédita de Claudio Ciborra, Judge Institute of Management,
Universidade de Cambridge, 8 de dezembro de 1995.

assim, terminar trabalhando com objetivos cruzados. Um exemplo é o


caso do CEO que não conseguia sair da metáfora corrigir e manter, e
assim discursava construtivamente com os consultores que havia contra‑
tado. É crucial esclarecer e compartilhar os pressupostos sobre o tipo de
mudança necessária logo no início.
O segundo aspecto é que essas quatro metáforas constituem uma hie‑
rarquia, ou seja, indo da metáfora 1 para a 4, de corrigir e manter para
liberar e recriar, o horizonte das possibilidades é ampliado, ao passo que,
descendo da 4 para a 1, as possibilidades são excluídas. Portanto, sempre
é mais sensato visar o topo da hierarquia, mantendo a capacidade de a
empresa aplicar a metáfora do liberar e recriar e promovendo uma cultu‑
ra que lhe sirva de apoio. Soluções transformacionais estão se tornando
cada vez mais necessárias nos negócios contemporâneos. A abordagem
exploratória aberta que acompanha a metáfora transformacional ainda

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permite aos membros de uma organização retornar a outras metáforas
quando conveniente. Naturalmente, isso exige considerável flexibilidade
mental, mas, como repetimos inúmeras vezes, esse é o jogo da competição
moderna.

12.3.2 Mudança planejada ou emergente?


Em certo sentido, praticamente todas as mudanças nas organiza‑
ções são planejadas, ou porque são tomadas decisões deliberadas para 413

iniciar uma mudança ou porque são decididas para estimular a emer‑

Realização da mudança organizacional


gência de mudanças por meio de um processo dinâmico de aprendizado
em todos os níveis da organização. Entretanto, vale a pena fazer uma
distinção entre mudança “planejada” e mudança “emergente”, porque
elas são distintas em relação às suas fontes de iniciativa e graus de
prescrição.

MUDANÇA PLANEJADA
A mudança é planejada quando um novo conjunto de arranjos e o
processo para viabilizá­‑los são articulados antecipadamente. Em geral, o
planejamento da mudança ocorre a partir dos níveis superiores da orga‑
nização, e a direção influencia essa mudança. Essa agenda envolve uma
série de objetivos e metas de aperfeiçoamento e, muitas vezes, abrange
um plano de mudanças específicas na organização. Em contraste, a abor‑
dagem emergente vê a mudança como iniciada e implementada de baixo
para cima. Ela é mais transformacional no sentido de que essa mudan‑
ça não emerge de pressupostos, mas de um processo de aprendizado e
adaptação no nível mais baixo da hierarquia e que está mais próximo do
cenário da ação.
As fases da mudança planejada serão examinadas em detalhe mais
adiante neste capítulo. O processo pode ser descrito em termos simpli‑
ficados: ele começa quando pressões ou oportunidades para a mudança
se tornam evidentes. A direção então reage a pressões externas para a
mudança ou conclui, a partir de avaliação interna própria, que novas
oportunidades ou novos problemas tornam desejável a mudança. Assim
é iniciado um processo de solução de problemas, com a discussão de
alternativas, que termina com uma decisão sobre qual delas adotar. A
mudança é implementada e depois avaliada, de modo a proporcionar um
feedback para se avaliar a necessidade de mais mudanças.

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A mudança planejada em geral envolve um agente, que é o indiví‑
duo responsável pela gestão dos esforços para facilitar essa mudança.
O agente da mudança pode ser um consultor interno ou externo; mais
adiante discutiremos os méritos dessas alternativas. Enquanto a gestão
de linha assume a responsabilidade pela decisão sobre a necessidade da
mudança e, depois, por sua efetiva implementação, os agentes priorizam
as seguintes ações: facilitar o processo de aceitação da mudança, tomar
providências para que membros da organização trabalhem nos detalhes,
414
além de ajudar na implementação e condução de avaliações posteriores.7
parte iv  o desenvolvimento de organizações eficientes

MUDANÇA EMERGENTE
A abordagem emergente examina a mudança como um processo con‑
tínuo e descentralizado de aprendizado a partir da experiência e adapta‑
ção às mudanças das circunstâncias. Isso contrasta com a tendência da
mudança planejada, que assume a forma de programas periódicos. O
argumento da abordagem emergente é que a complexidade, o ritmo e a
incerteza do ambiente atual de negócios tornam impossível que apenas
um grupo restrito de gerentes tomem uma decisão sobre a reação mais
adequada. O tamanho descomunal de muitas corporações e unidades de
negócios não permite julgar corretamente do alto o que funcionará me‑
lhor no nível operacional.
A partir de um estudo realizado ao longo de cinco anos em em‑
presas norte­‑americanas, Michael Beer e colegas concluíram que pro‑
gramas de mudança planejados antecipadamente não funcionam. Em
muitas dessas empresas, a direção, com o apoio de um grupo de execu‑
tivos corporativos, em geral do RH, lançou programas para educação e
treinamento, pagamento relacionado ao desempenho, círculos de qua‑
lidade, cultura corporativa, reengenharia e reorganização, mas nenhum
produziu verdadeira mudança. Ao contrário, a abordagem que funcio‑
nava era aquela em que a direção estimulava inovações pelas próprias
unidades operacionais e depois promovia sua disseminação para outros
locais da empresa.8
Há evidências crescentes de que os executivos seniores mais eficientes
têm consciência de sua capacidade limitada em prescrever a natureza da
renovação corporativa longe das áreas de operação. Seu papel, segundo
essa abordagem emergente, é dar uma orientação geral sobre a direção da
mudança e criar um clima de apoio para que ela ocorra. Em vez de tentar
elaborar soluções específicas na fase inicial do processo de mudança, eles

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estimulam novas soluções provenientes dos níveis inferiores. No final,
quando aparecem as soluções, o papel desses executivos é estimular sua
adoção por todos e alinhar a estrutura e os sistemas da empresa.
Portanto, a abordagem emergente não diminui, mas modifica o papel
dos altos executivos na mudança organizacional. Em vez de dirigirem e
atuarem na mudança a partir de um plano, nessa nova abordagem seu
papel é facilitar o processo proporcionando a visão, assegurando o ne‑
cessário apoio dos recursos e dos sistemas, e reforçando a disposição de
415
implantar novas soluções em outras partes da organização às quais elas
se aplicam. Mudanças abrangentes introduzidas pela cadeia de supermer‑

Realização da mudança organizacional


cados ASDA, que modificaram sua sorte, ilustram o amplo uso de uma
nova abordagem que teve todo o apoio da diretoria (Quadro 12.2).

12.3.3 O foco da mudança


A mudança pode ser empreendida em níveis diferentes, indo da orga‑
nização como um todo até arranjos para determinada unidade ou área de
atividade, ou tratando de simples alterações na natureza de determinadas
funções e do pessoal que as realiza. Seu enfoque pode variar de amplo a
restrito. Contudo, é muito artificial e equivocado separar dessa maneira
áreas e níveis de mudança, porque a esfera de influência de cada uma de‑
las certamente é maior. A interdependência dos elementos na organização
significa que não é realista pensar em mudar uma parte do sistema sem
levar em conta a reação em cadeia.
É relativamente fácil avaliar esse aspecto quando o foco inicial da mu‑
dança é a organização inteira. Quando a diretoria inicia a reorganização
de uma empresa para dar apoio a um redirecionamento estratégico como
a diversificação, é provável que essas mudanças foquem a estruturação
das relações entre suas divisões e unidades funcionais mais importantes,
e sobre o controle, a informação e outros sistemas que as unem. Para ser
bem implantada, a reorganização geral exige mudanças mais específicas
na maneira como é organizada cada unidade e seu pessoal. Por sua vez,
as mudanças em nível de unidade provavelmente têm implicações sobre
os indivíduos e suas funções.
Poderia parecer que o inverso não é necessariamente verdade. Por
que mudanças em uma área especializada ou em um nível especificamente
operacional teriam qualquer influência sobre toda a empresa? Na prática
geralmente não têm, mas é quase certo que a empresa sofrerá por deixar

Book_Organizaçoes.indb 415 16/9/2011 16:23:55


Quadro 12.2  Mudança bem­‑sucedida na ASDA

A recuperação da ASDA, uma cadeia de mercados do Reino Unido que praticamen‑


te saiu da bancarrota para se tornar uma empresa altamente competitiva, ilustra o
sucesso no uso de uma abordagem emergente para a mudança organizacional. Uma
das inovações mais importantes introduzidas por Archie Norman, o CEO nomeado
em 1991 para promover uma virada na empresa, foi identificar uma “loja renová‑
vel”, cujos gerentes teriam liberdade para inovar em sua proposta de varejo, no uso
416 do espaço físico e em como as pessoas estavam organizadas e eram gerenciadas.
Além disso, ele fez visitas não anunciadas a muitas das lojas da empresa para
parte iv  o desenvolvimento de organizações eficientes

descobrir o que seus empregados e gerentes consideravam barreiras para um


desempenho melhor. Em nove meses, os gerentes de “loja renovável”, que tra‑
balhavam com uma equipe multifuncional da corporação, haviam criado uma
abordagem completamente nova. Depois, a inovação se espalhou, por insistên‑
cia da direção, para todas as 200 lojas da empresa. Ao mesmo tempo, Norman
também tomou providências para que a cultura da empresa e as comunicações
entre o nível corporativo, as lojas e entre gerentes e empregados fossem modi‑
ficadas para dar apoio à mudança.

Fonte: BEER, Michael; WEBER, J. ASDA (A), (A1), (B), (C) Cases. Boston: Harvard Business School
Press, 1997.

de adotar uma estratégia organizacional integrada. Esse argumento é se‑


melhante àquele favorável a uma abordagem emergente da mudança. As
mudanças iniciadas no nível operacional podem reforçar a habilidade da
empresa em fazer o melhor uso dos recursos e também proporcionam
inovações em produtos e serviços. Boas mudanças que vêm de baixo têm
implicações para os arranjos organizacionais em que os grupos operacio‑
nais estão trabalhando. Quando melhora sua produtividade e sua quali‑
dade ao assumir maior poder de decisão e maior responsabilidade, uma
unidade operacional também assume o trabalho de gestão anteriormente
realizado em nível superior, o que é uma oportunidade para simplificar
e dinamizar os níveis intermediários de organização da empresa. Por sua
vez, mais eficiência no aproveitamento dos recursos, melhorias em ino‑
vação e qualidade e economia de organização oferecem potencialmente a
toda a empresa uma vantagem competitiva maior sobre os concorrentes,
que ela poderá distribuir estrategicamente. Em geral, é de interesse de

Book_Organizaçoes.indb 416 16/9/2011 16:23:55


uma empresa adotar mudanças bem direcionadas, o que pode ter impli‑
cações muito maiores.
É melhor pensar sobre o foco ou nível da mudança em relação ao
melhor local para se começar. Mesmo quando uma empresa enfrenta difi‑
culdades, não é necessariamente melhor iniciar uma mudança radical por
toda a organização. Essa abordagem tem sido defendida com frequência e
muitas vezes fracassou, como aconteceu em vários casos de reengenharia
empresarial (ou BPR – Business Process Reengenering).9 Reorganizações
totais como essas são drásticas e arriscadas, especialmente se todos os 417

seus componentes começam a funcionar ao mesmo tempo. É quase certo

Realização da mudança organizacional


que são baseadas em planos criados antecipadamente. Esse tipo de pla‑
nejamento dificilmente compreenderá as condições complexas presentes,
que estão se alterando muito depressa; e será bastante complicado con‑
trolar o processo se muitos problemas de implementação surgirem de
uma só vez. A advertência de Gaius Petronius Arbiter é muito apropriada
para uma reorganização de grande envergadura.
Os aperfeiçoamentos, seja pela exploração de possibilidades conhe‑
cidas ou de novas possibilidades, muitas vezes podem ser focados na
primeira vez. A boa implementação de projetos de mudança específicos
pode servir de piloto experimental para desdobramentos subsequentes
por toda a empresa. Tais programas ajudam a demonstrar os benefícios
potenciais da mudança organizacional e servem para resolver as preocu‑
pações e reduzir as resistências. Os ajustes sucessivos também podem ser
explorados nessa escala mais limitada, para depois serem implementados
mais amplamente.
A mudança na organização do trabalho de uma empresa pode co‑
meçar em determinada seção ou sistema operacional. O sucesso da mu‑
dança em áreas limitadas serviria então para dar ímpeto à mudança em
outras partes da companhia. Por exemplo, a base de um programa de
reorganização de toda a Air Canada foi a implementação bem­‑sucedida
de projetos­‑piloto nas áreas de manutenção das aeronaves e na manipu‑
lação de bagagens no aeroporto. O sucesso dessas mudanças deu muita
segurança à direção e aos executivos, que perceberam que uma mudança
bem administrada teria bons resultados para todos os interessados. As
mudanças feitas na organização do trabalho tiveram efeitos em cadeia
para a supervisão, o controle, o pagamento, o apoio e outros sistemas
pertinentes, e serviram para abrir os olhos da empresa para possibilida‑
des mais vastas de mudança construtiva.10 Outro exemplo de como as

Book_Organizaçoes.indb 417 16/9/2011 16:23:55


mudanças focadas podem ser decisivas para desdobramentos mais am‑
plos pode vir da transferência da responsabilidade pelas relações com o
cliente e feedback dos executivos (ou de unidades especializadas) para os
operadores que têm contato direto com os clientes. Esse tipo de mudança
provou ser bem­‑sucedido e tem grandes implicações na maneira como
a empresa organiza seu marketing e as atividades de relações­‑públicas e
queixas, por exemplo.11

418
12.4 Classificação das abordagens para a
parte iv  o desenvolvimento de organizações eficientes

mudança
Foram identificadas três dimensões da mudança: (1) quão radical ela
é, (2) se é planejada ou emergente, e (3) a amplitude do seu foco (por
exemplo, toda a organização versus parte da organização). Essas dimen‑
sões descrevem atributos essenciais da mudança, que seus realizadores
têm obrigação de examinar sempre. A Figura 12.2 mostra como essas
dimensões servem ainda para comparar as diferentes abordagens da mu‑
dança organizacional.

Figura 12.2  Comparação das abordagens da mudança organizacional

Planejada Emergente
Reengenharia dos Desenvolvimento orgâ‑
Toda a
negócios nico (p. ex., início de
organização
empresa)
Radical
Fusão de Mudanças para a seleção
Parte da
departamentos de novos membros feitas
organização
por equipes
Aperfeiçoamentos com Aprendizado Toda a
Incremental metas anuais organizacional organização

Mudanças de consenso Aperfeiçoamento cons‑


em planos de desem‑ tante por meio de equipes Parte da
penho dos executivos de projeto organização

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12.4.1 Mudança radical planejada: exemplo de
reengenharia de negócios
Uma das abordagens mais divulgadas de mudança nos anos 1990 foi
a reengenharia de negócios, que abrange a mudança planejada em toda
a organização. Os que a apresentaram diziam que era a mudança mais
radical na filosofia de negócios desde a revolução industrial. Ela atraía
executivos que sentiam que os grandes investimentos em informática e
gestão de qualidade total (TQM – total quality management) não propor‑ 419

cionaram a revolução no desempenho que pareciam prometer – em parte

Realização da mudança organizacional


porque eram mudanças desenvolvimentistas, e não transformacionais.
Elas envolviam a organização do trabalho de maneira muito semelhante
à anterior, com mais ou menos a mesma força de trabalho, mas agora
usando computadores e tomando mais cuidado sobre a maneira como
tudo era feito. Uma vez que a maioria das corporações havia adotado
nova tecnologia e a gestão da qualidade total (TQM), de onde viriam
mais aperfeiçoamentos competitivos?
A reengenharia empresarial oferecia uma filosofia radical, resumi‑
da na expressão de Michael Hammer: “Não automatize, elimine”. Em
outras palavras, processos ultrapassados não deveriam estar embutidos
em novas tecnologias que apenas serviriam de apoio por algum tempo,
resultando em equívoco no investimento de hardware e software. A re‑
engenharia exige que o repensar e o replanejamento radical sejam incor‑
porados à mudança organizacional em grande escala, na direção oposta
à lógica funcional voltada para processos de agregação de valor para
o cliente. Essa mudança fundamental deve ser complementada por uma
revolução no papel que os empregados estão autorizados a desempenhar
– o argumento é que melhorias substanciais no tempo de conclusão de
um processo, nos serviços customizados e assim por diante são impro‑
váveis se as decisões operacionais indispensáveis não forem tomadas por
aqueles que estão mais próximos da ação. A abordagem da reengenharia
exige que os empregados tenham autoridade para tomar decisões perti‑
nentes e tenham acesso a informação adequada. Essas pessoas devem ter
as qualificações apropriadas e autoconfiança, o que implica uma política
de desenvolvimento pessoal mais dinâmica e positiva.
De modo geral, hoje a reengenharia empresarial é atualmente consi‑
derada falha em relação a suas promessas. Em alguns casos ela realmente

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obteve resultados impressionantes rapidamente em termos de downsizing
e eliminação de níveis hierárquicos. O problema é que a reengenharia
muitas vezes foi aplicada visando obter muito depressa reduções de cus‑
tos à custa dos empregados. Em tais casos, ela não passava de mais um
“jeitinho” pragmático, em vez de ser a base para uma melhoria perma‑
nente, fundamentada na reorientação do trabalho e da responsabilidade
do empregado em relação ao cliente. Os críticos logo começaram a cal‑
cular o custo para o moral e o empenho das pessoas em virtude de como
420
a reengenharia estava sendo implementada. Entretanto, como observare‑
mos mais adiante, houve algumas exceções notáveis a esse quadro negati‑
parte iv  o desenvolvimento de organizações eficientes

vo, que oferecem importantes lições sobre como a mudança planejada em


grande escala é introduzida e implementada.12

12.4.2 Comparação entre a mudança radical planejada


e a mudança incremental emergente:
reengenharia e kaisen
A maneira como a reengenharia foi aplicada ilustra uma ênfase tipi‑
camente americana: obter resultados rápidos por meio de iniciativa de
cima para baixo. Muitas vezes se faz a comparação entre o método de
gestão americano e o japonês, e não é surpresa que esta se aplique à abor‑
dagem preferida da mudança organizacional.
Na Figura 12.2, no canto oposto à mudança radical planejada está a
abordagem incremental emergente, com forte presença nos métodos ja‑
poneses de aperfeiçoamento constante (kaisen) e estímulo à inovação por
meio do uso disseminado de equipes de projeto. Aqui a preferência é pela
mudança por meio do aprendizado e do bom exemplo, em vez de imposta
a pessoas relutantes em aceitá­‑la. Em geral, a mudança está focada em
determinadas atividades e orientada para o aperfeiçoamento de arranjos
existentes, e não para a transformação do sistema. Nas empresas japone‑
sas, a mudança incremental por meio de processos emergentes é auxiliada
pelo alto valor atribuído à lealdade coletiva e ao desenvolvimento das
habilidades. Informações provenientes de fontes externas, como novas
patentes, e da experiência interna, como visitas dos engenheiros a clien‑
tes, são cuidadosamente anotadas. Depois, essas informações são efeti‑
vamente comunicadas e compartilhadas em toda a empresa, processo em
que os gestores intermediários desempenham papel essencial ao vincular
a visão da direção com um fluxo de novas propostas de baixo para cima.

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Ainda que muitas empresas japonesas ainda precisem da aprovação final
dos níveis superiores para mudar, sua cultura não ameaçadora, o incen‑
tivo a fluxos de informação produtivos e abertos, e a convicção de que a
iniciativa pode ir de baixo para cima são características que promovem
essa nova abordagem.
Comparações a partir de pesquisas sobre como empresas america‑
nas e japonesas lidaram com a mudança em empresas que adquiriram
no Reino Unido servem para enfatizar o contraste entre elas.13 Ficou
421
visível que as empresas americanas tendem a introduzir seus sistemas e

Realização da mudança organizacional


métodos corporativos nas firmas adquiridas. Muitas eliminam a iden‑
tidade anterior da empresa adquirida, impondo a adoção do logotipo,
das marcas e da cultura corporativa da matriz. Exigem rápida melhoria
no desempenho da nova subsidiária, ameaçando intervenção significati‑
va caso não apareçam resultados. Um executivo de uma das empresas
adquiridas descreveu essa abordagem como aquela em que “há muita
informalidade e, por outro lado, muito rigor e uma grande insistência no
conformismo”. Contudo, essa abordagem radical e até mesmo dura em
relação à mudança obtém resultados financeiros, e a maioria das empre‑
sas americanas atinge o objetivo de garantir os lucros das subsidiárias
adquiridas no curto prazo.
Em geral, a atitude que as empresas japonesas adotam em relação às
aquisições e à maneira de programar a mudança logo depois da aquisição
são muito diferentes. Elas fazem a mudança bem mais pela cooperação
ou por meios indiretos. A maioria das iniciativas para a mudança vem das
novas subsidiárias, mais que das matrizes japonesas. Em vez de exercer
grande pressão sobre uma nova subsidiária para empreender uma mu‑
dança rápida e radical, as empresas japonesas tendem a confiar em “con‑
selheiros” pessoais nomeados para a subsidiária, de modo a incentivar
aperfeiçoamentos e fornecer informações à matriz. Como o CEO britâni‑
co de uma subsidiária japonesa disse: “Há o sentimento de que devería‑
mos saber o que temos de fazer e de que não precisamos pedir conselhos
à matriz. Mas eles sabem o que está acontecendo e nos dão muito apoio”.
É instrutivo observar que essa abordagem mais emergente da mudança
depois da aquisição geralmente foi muito bem­‑sucedida em transformar
empresas que anteriormente não eram lucrativas em negócios lucrativos,
incorrendo em custos menores em termos de estresse para o pessoal que
passava pela mudança.

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A abordagem japonesa parece levar a uma boa melhoria do valor
no longo prazo. Ela é mais destinada à exploração mútua de novas pos‑
sibilidades que à exploração rápida dos ativos existentes.14 Talvez seja
necessário um ajuste inicial significativo por parte do pessoal acostuma‑
do a decisões rápidas e orientações claras da direção. Alguns executivos
britânicos de subsidiárias japonesas se queixaram de não conseguir uma
decisão rápida das matrizes japonesas ou de ter limites claros em seu po‑
der de decisão.
422
O contexto também tem certa influência sobre essas abordagens con‑
trastantes de gestão da mudança. As empresas norte­‑americanas estuda‑
parte iv  o desenvolvimento de organizações eficientes

das de modo geral tinham mais experiência em operações internacionais;


para elas, as operações no Reino Unido não apresentaram importantes
diferenças culturais ou linguísticas. E a probabilidade era que adquiris‑
sem uma empresa já lucrativa. Nessas circunstâncias, é compreensível
que sua tendência fosse introduzir rápidas mudanças de cima para bai‑
xo, com ênfase na exploração dessa base lucrativa e sua integração à
organização corporativa e ao portfólio de produtos. Em comparação, as
empresas japonesas em geral tinham menos experiência internacional e
muitas vezes adquiriam uma empresa por razões estratégicas, nem tanto
por sua lucratividade. Além de estarem preparados para adotar uma vi‑
são de longo prazo, os executivos japoneses tinham sensibilidade para o
fato de não conhecerem a cultura anglo­‑saxã e outras diferenças locais.
Assim, buscavam um modo de mudança mais lento e emergente, que re‑
fletisse esses fatores.

12.5 Contextos e escolhas


A comparação descrita mostra que cada uma dessas abordagens da
mudança organizacional tem seus pontos fortes e limitações. Portanto,
cada uma será mais adequada a certas situações ou propósitos a outros.
As formas de mudança variam no grau de radicalismo, ainda que
todas possam contribuir para melhorar e aperfeiçoar o desempenho da
organização. Distinguimos quatro categorias: corrigir, desenvolver, admi‑
nistrar transições, e empreender transformações. As coisas estão sempre
dando errado no cotidiano das organizações e precisam ser corrigidas. Por
exemplo, pessoas não conseguem lidar com as demandas de determinada
função e precisam ser transferidas. Muitas das melhorias atuais na pro‑
dutividade e na qualidade entram na categoria seguinte: desenvolvimento

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do sistema existente. Uma empresa que adquire outra provavelmente exi‑
girá que esta mude seus controles financeiros, talvez também sua estrutu‑
ra administrativa, de modo a se adequar aos arranjos da adquirente. Esse
é um caso de transição simples, em que o ponto final da mudança está
predeterminado.
A mudança transformacional é o modo de mudança mais adequado
ao processo de constante adaptação a ambientes turbulentos de negócios.
Ela se baseia em uma filosofia de aprendizado organizacional, mas ao
423
mesmo tempo está limitada pela resistência que pessoas e sistemas em
uma empresa têm para lidar com a mudança constante. Se os membros

Realização da mudança organizacional


de uma empresa tiverem clareza sobre o tipo de metáfora de mudança
adotado, a organização tem todas as razões para incluir todas as quatro
metáforas em seu repertório de práticas organizacionais.
Apesar das advertências sobre os limites da capacidade de previsão
dos altos executivos, há situações em que a mudança precisa ser planeja‑
da antecipadamente pela direção. Isso acontece quando há investimento
significativo de capital novo em ativos que são indivisíveis e inflexíveis
na maneira como têm de ser utilizados. Pode ser vital também planejar a
mudança quando a capacidade de uma empresa empreender a mudança
emergente ainda não foi desenvolvida, talvez porque não houvesse ante‑
riormente uma norma aceita em sua cultura. Nessa situação, a diretoria
precisa criar medidas para desenvolver as capacitações relevantes, como
programas de mudança cultural, treinamento e modificação no sistema
de recompensas, antes de poder confiar mais em processos emergentes.
Tornou­‑se evidente que, até mesmo em uma empresa como a ASDA –
com capacidade para gerar a mudança emergente devido à descentra‑
lização de suas unidades operacionais –, a diretoria tem papel atuante
quando é necessária uma extensa mudança em toda a empresa.
Decisões sobre o foco da mudança também devem ser tomadas com
relação a seu contexto. Quanto mais amplo o foco dado à mudança,
maiores as exigências em relação à capacidade dos executivos para lidar
com ela. Até mesmo mudanças graduais demandam considerável esfor‑
ço para se consolidarem por toda a organização. Em algum momento,
as recomendações apresentadas por diferentes equipes de projeto deve‑
rão ser reunidas para que suas implicações para a organização sejam
trabalhadas. Embora o estímulo para a mudança emergente em toda
uma organização seja geralmente recomendável, pode haver circuns‑
tâncias em que tentar lidar com a mudança mediante uma frente ampla

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diminua a capacidade da empresa para tratar de uma crise imediata por
meio de ações mais focadas. Uma empresa que está em crise deverá se
concentrar em mudanças que poupem custos, melhorem sua produtivi‑
dade e não arrisquem relacionamentos­‑chave com fornecedores e clien‑
tes. Em tais circunstâncias, o perigo de uma abordagem da mudança
sem foco é que a redução no custo possa se tornar uma operação sem
critérios, em que atividades importantes e produtivas, essenciais para
o futuro da empresa, são eliminadas junto com outras relativamente
424
improdutivas.15
parte iv  o desenvolvimento de organizações eficientes

12.6 Diretrizes para uma mudança planejada


bem­‑sucedida
Conforme sugerido, a mudança bem­‑sucedida não pode ser plane‑
jada antecipadamente com muita precisão, devendo levar em conta os
processos de aprendizado emergentes. No entanto, importantes aspectos
de uma mudança de grande envergadura podem ser antecipados, talvez
até planejados, e é isso o que vamos discutir agora. O capítulo seguinte,
sobre aprendizado organizacional, aborda o principal fundamento para a
mudança emergente bem­‑sucedida.

12.6.1 O que é uma mudança “bem­‑sucedida”?


A mudança bem­‑sucedida suscita a pergunta: “bem­‑sucedida para
quem?” Se a mudança organizacional estiver centrada no downsizing,
algumas pessoas sairão perdendo. Ainda que o prejuízo econômico logo
seja reparado em termos de indenização generosa e rápido retorno ao
trabalho, as cicatrizes psicológicas permanecerão. Assim, a exigência éti‑
ca fundamental para a introdução da mudança é fazer todo o esforço
possível para evitar que o seu custo recaia sobre certos grupos, e, em
situações de recessão e crise, para procurar sempre as soluções menos
destrutivas em termos humanos. As implicações práticas dessa postura
ética significam que todos os membros de uma organização devem ser
mantidos informados antes de qualquer etapa em que serão tomadas de‑
cisões sobre as mudanças, e que devem receber oportunidade máxima
para influenciar as mudanças introduzidas. Tal abordagem normalmente
é também a melhor maneira de tratar da mudança do ponto de vista de

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sua influência sobre o resultado financeiro final. Uma abordagem ética
sempre vale a pena.
É fundamental que as organizações prestem atenção na maneira como
lidam com a mudança. Há evidências de que quando o processo é bem
gerenciado, as pessoas são mais propensas a aceitar a mudança, ainda que
ela imponha algum sacrifício. Estudos mostram que quando alguém se
incomoda em explicar as razões da mudança para as pessoas afetadas, e
estas percebem que o processo é gerenciado de forma justa, é menos pro‑
425
vável que elas busquem retaliações com ações como o roubo após corte
nos pagamentos, ou processos contra a empresa por demissões equivo‑

Realização da mudança organizacional


cadas.16 Falhas no tratamento da mudança podem custar caro de outras
maneiras também. No Capítulo 3 observou­‑se, em relação ao downsizing,
que o grupo dos executivos mais valorizados se distanciará, se perceber
que seus colegas foram maltratados ou mal aproveitados – o que pode
ser desastroso se levar à perda de uma equipe competente, detentora de
vasto conhecimento, o que é escasso mesmo durante uma crise econô‑
mica. A negatividade provocada pela má gestão da mudança impedirá
também que os gerentes tenham acesso ao conjunto de conhecimentos
tácitos dos empregados que pode fazer toda a diferença para a efetividade
do funcionamento dos novos arranjos. Finalmente, o fracasso contínuo na
gestão da mudança pode afetar todo o comprometimento com a empresa.
Comparados ao preço de uma má gestão da mudança organizacional, os
custos extraordinários de uma boa gestão são relativamente modestos.

12.6.2 Etapas da mudança planejada


O que envolve uma “boa” gestão da mudança planejada? Autoridades
como John Kotter apresentaram as etapas que a experiência indica serem
necessárias para a realização de mudanças grandes. Esse e muitos outros
modelos para conduzir a mudança devem bastante ao modelo de três
etapas descrito por Kurt Levin – descongelar, mudar e voltar a congelar:17

„„ Descongelar é o processo pelo qual as pessoas reconhecem e acei‑


tam a necessidade de mudança e estão prontas para descartar o
sistema existente. É importante que as pessoas vejam que as atuais
atividades organizacionais a que estão apegadas já não são sufi‑
cientemente eficazes e que é necessária a mudança para corrigir
a situação. Isso significa que um aspecto essencial no processo de

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descongelamento é informar as pessoas sobre a importância da
mudança e como ela provavelmente as afetará.

„„ Mudar é o movimento que parte da situação antiga para a nova.


Pode exigir considerável trabalho de logística, muitas vezes faci‑
litado por projetos­‑piloto em escala menor, por meio dos quais
lições podem ser aprendidas e as pessoas tranquilizadas.

„„ Recongelar significa deixar de lado os novos métodos e o compor‑


426
tamento modificado das pessoas, de forma que assumam uma
aparência rotineira e não sejam afetados ou invertidos facilmente.
parte iv  o desenvolvimento de organizações eficientes

Às vezes é chamado de “institucionalização” de uma mudança.


Nesta etapa é preciso tomar cuidado para garantir que a cultura e
os sistemas da organização deem apoio aos novos arranjos, o que
normalmente exige considerável retreinamento e mudanças em
aspectos como os critérios de recompensas, informações e sistemas
de controle, e processos de tomadas de decisão.

Lewin formulou sua análise logo depois da Segunda Guerra Mundial,


num momento em que as organizações consideravam que mudanças
de maior envergadura eram implementadas apenas periodicamente. As
condições contemporâneas limitam a ideia do recongelamento se isso
significar a reimplementação de comportamentos e procedimentos or‑
ganizacionais estáveis e rígidos. A institucionalização de uma mudança
hoje requer que ela seja implementada de modo que permita flexibilida‑
de e maior adaptação. Em outras palavras, a mudança planejada deve
ser implementada de modo que a mudança emergente construtiva se
torne uma norma organizacional. A participação ampla é uma das prin‑
cipais condições para favorecer a germinação de um futuro processo de
mudança emergente a partir de um processo de mudança planejada.
O modelo de oito etapas de Kotter foi formulado com a introdução
bem­‑sucedida de uma grande mudança radical em mente, ou o que ele
chama de “transformação”. Embora a sequência dessas fases seja pare‑
cida com a do modelo básico de Lewin, cada uma das etapas de Kotter
reflete os oito erros que ele percebeu serem fontes comuns do fracasso
(Figura 12.3). Esses erros são os seguintes:

1. Não estabelecer um sentido de urgência suficientemente gran‑


de, baseado na identificação de uma crise ou oportunidade, seja

Book_Organizaçoes.indb 426 16/9/2011 16:23:56


qual for o caso. Isso é necessário para dar partida no processo de
mudança.

2. Não criar uma coalizão orientadora suficientemente forte, de


modo a gerar uma massa crítica de apoio à mudança.

3. Falta de visão que proporcione uma direção clara para a mudança.

4. Comunicar mal essa visão para as muitas pessoas cuja ajuda é


necessária para fazer a mudança acontecer. 427

Realização da mudança organizacional


5. Deixar de eliminar os obstáculos para essa nova visão. Esses
obstáculos podem ser gestores que tentam impedir a mudança por
medo de seu futuro, sistemas organizacionais que deixam de dele‑
gar poderes ou compensar as pessoas pela realização da mudança,
ou sistemas de informação inadequados para sustentar as novas
formas desejadas de operar.

6. Não criar nem planejar sistematicamente vitórias de curto prazo.


Elas podem ser projetos selecionados que aparentemente darão
retorno rápido, criando satisfação entre os empregados e/ou
clientes envolvidos. As vitórias de curto prazo ajudam a manter a
motivação das pessoas para um grande esforço de mudança, que
literalmente poderá levar anos para se completar.

7. Declarar vitória antes do tempo. Como a mudança pode levar muito


tempo, é tentador dizer que ela está completa prematuramente, antes
de completar todos os requisitos para o novo congelamento. Isso
pode enfraquecer a mudança e permitir a volta do sistema antigo.

8. Não ancorar as mudanças na cultura da corporação. Kotter iden‑


tifica dois fatores particularmente importantes na institucionali‑
zação da mudança na cultura corporativa. Um desses fatores é
o esforço deliberado para mostrar às pessoas como essas novas
abordagens, comportamentos e atitudes têm ajudado a melhorar o
desempenho de todos. Outro é dispender o tempo necessário para
garantir que a próxima geração de altos executivos aceite plena‑
mente a mudança e esteja preparada para melhorá­‑la, sem deixar
que seja erodida. Ancorar a mudança e, na verdade, a necessidade
de contínua inovação e renovação, é um passo necessário na cultu‑
ra corporativa para a empresa poder crescer no futuro.

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Figura 12.3  Processo em oito etapas para criar uma grande mudança

1. Estabelecer um sentido de urgência


„„ Examinar as realidades do mercado e da competição
„„ Identificar e discutir as crises, as crises potenciais ou as boas oportunidades

2. Criar a coalizão orientadora
428
„„ Formar um grupo com suficiente poder para liderar a mudança
„„ Fazer com que esse grupo trabalhe como uma equipe
parte iv  o desenvolvimento de organizações eficientes


3. Elaborar uma visão e uma estratégia
„„ Criar uma visão para ajudar a direcionar o esforço da mudança
„„ Desenvolver estratégias para alcançar essa visão

4. Comunicar a visão da mudança
„„ Usar todos os veículos possíveis para comunicar constantemente a nova vi‑
são e as estratégias
„„ Fazer a coalizão orientadora modelar o comportamento esperado dos
empregados

5. Empoderar uma ação de base ampla
„„ Livrar­‑se dos obstáculos
„„ Mudar os sistemas ou estruturas que enfraquecem a visão da mudança
„„ Estimular a assunção e risco e ideias, atividades e ações não tradicionais

6. Gerar vitórias de curto prazo
„„ Planejar melhorias visíveis no desempenho (ou “vitórias”)
„„ Criar essas vitórias
„„ Reconhecer e compensar visivelmente as pessoas que tornaram essas vitó‑
rias possíveis

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7. Consolidar ganhos e criar mais mudanças
„„ Usar a credibilidade crescente para mudar todos os sistemas, estrutu‑
ras e políticas que não funcionam juntos nem combinam com a visão de
transformação
„„ Contratar, promover e desenvolver pessoas que podem implementar a visão
da mudança
„„ Revigorar o processo com novos projetos, novos temas e agentes de mudança 429

Realização da mudança organizacional


8. Ancorar as novas abordagens na cultura
„„ Criar um desempenho melhor por meio do comportamento voltado para o
consumidor e a produtividade, de melhor liderança e de gestão mais eficiente
„„ Articular as conexões entre os novos comportamentos e o sucesso da
organização
„„ Desenvolver recursos para assegurar o desenvolvimento da liderança e a
sucessão

Fonte: Adaptado de Kotter, John P. Why transformation efforts fail. Harvard Business School,
mar./abr. 1995. p. 61.

As recomendações de Kotter estão direcionadas para a mudança pla‑


nejada radical, que envolve toda a organização. Contudo, uma aborda‑
gem muito parecida com essa pode ser aplicada a uma área da mudança
mais específica, como o redesenho do trabalho operacional. Parker e
Wall reuniram boa parte do conhecimento disponível sobre o desenho
da função e do trabalho e também recomendam uma sequência de oito
etapas para a reestruturação do trabalho.18 Esse conhecimento está resu‑
mido na Figura 12.4, que ilustra as atividades normalmente exigidas em
cada etapa. A figura é particularmente instrutiva, porque mostra como
a abordagem foi aplicada em uma empresa de componentes eletrônicos
que precisou mudar porque estava ameaçada pela concorrência por cau‑
sa de seu mau desempenho. As entregas aos clientes chegavam no prazo
em apenas 65% dos casos, os custos eram exagerados e os defeitos de
qualidade frequentes. Todos esses problemas estavam ligados à sua for‑
ma tradicional de trabalho, que a empresa decidiu mudar.

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Figura 12.4  Etapas fundamentais do redesenho de estruturas de trabalho

Etapas Atividades ilustrativas O exemplo da Electrox


„„ Decida o escopo, os princi‑ „„ Decisão de reorganizar o
Etapa 1
pais papéis da mudança, a trabalho para aumentar a
Estabelecer a
abordagem e a composição produtividade
direção da equipe
„„ Gerente de produção como
„„ Estabeleça o apoio da agente da mudança
430 gestão
„„ Nenhuma demissão
„„ Identifique as restrições
compulsória
parte iv  o desenvolvimento de organizações eficientes

Etapa 2 „„ Aprenda sobre o plano de „„ Papéis de operador limitados


Fazer o trabalho, o processo, os
„„ Problemas com a qualidade e
diagnóstico sistemas mais amplos, a
inflexibilidade
da situação cultura, os acionistas, a his‑
tória, a estratégia e iniciati‑ „„ Sistemas de RH tradicionais
vas futuras

„„ Treine a equipe de pla‑ „„ Equipe da gestão treinada em


Etapa 3 nejamento em plano de questões de plano de trabalho
Formular trabalho
o plano de „„ Decisão de implementar gru‑
trabalho „„ Decida sobre uma for‑ pos autônomos de trabalho em
ma específica de plano de células baseadas em produtos,
trabalho com multifuncionalidade par‑
cial e integração de engenhei‑
„„ Planeje os papéis e distri‑
ros de teste em equipes
bua as tarefas

„„ Considere os recursos hu‑ „„ Novas descrições das funções


Etapa 4
manos (remuneração, trei‑
Considerar o „„ Graus simplificados de
namento etc), o controle,
contexto mais remuneração
os sistemas de informação
amplo
„„ Considere a tecnologia e o
esquema do processo

Etapa 5 „„ Planeje quais sistemas se‑ „„ Primeiro, introduzir as mu‑


Planejar a rão redesenhados, quando danças contextuais; depois,
implementação e como seleção de uma equipe piloto
„„ Planeje a sequência da im‑ „„ Comunicação dos planos à
plementação do plano de força de trabalho
trabalho

Book_Organizaçoes.indb 430 16/9/2011 16:23:57


Etapa 6 „„ Reúna os dados relacio‑ „„ Pesquisadores fazem estu‑
Realizar nados a todos os critérios do em profundidade sobre as
uma avalia‑ organizacionais (p. ex., atitudes
ção antes da tempo de entrega, qualida‑
„„ Reunião de dados sobre a
mudança de) e critérios humanos (p.
qualidade, o tempo de proces‑
ex., satisfação na função)
samento do pedido, etc.

Etapa 7 „„ Introduza novos papéis „„ Introdução da equipe piloto


431
Implementar, „„ Introduza as mudanças de „„ Problemas iniciais resolvidos

Realização da mudança organizacional


re­examinar, apoio por meio de discussão
avaliar,
„„ Reúna os dados da Etapa 6; „„ Avaliação após a mudança de‑
sintonizar
revise monstrou êxito
„„ Comunique os sucessos „„ Introdução de treinamento
para a formação de equipes
„„ Monitore e sintonize
permanentemente
Etapa 8 „„ Difundir a mudança usan‑ „„ Funções replanejadas por toda
Divulgar o do as “lições aprendidas” e a empresa
plano de traba­ a expertise acumulada
„„ Matrizes de capacitação
lho e sustentar „„ Altere outros sistemas or‑ estabelecidas
a mudança ganizacionais mais amplos
„„ Novos critérios de avaliação
(se necessário)
elaborados
„„ Sistemas de informação
alterados

Fonte: Parker, Sharon; Wall, Toby. Job and Work Design, Thousand Oaks: Sage, 1998. p. 123.

12.6.3 Questões específicas a considerar


PARTICIPAÇÃO
A questão de quem é convidado a participar do processo de mudan‑
ça apresenta um dilema. Do ponto de vista ético, o certo seria que os
afetados pela mudança proposta tivessem a oportunidade de participar
de seu planejamento e implementação. Entretanto, do ponto de vista da
conveniência, a contribuição que a participação pode ter para o sucesso
da mudança depende da situação. Há três principais situações a levar
em conta:

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1. Há um acordo implícito sobre o objetivo da mudança, mas (a)
as pessoas discordam sobre a melhor maneira de realizá­‑la; e (b)
nenhum grupo tem o monopólio de poder ou conhecimento rele‑
vante. Nesse caso, a participação ampla pode fazer contribuições
construtivas para a mudança organizacional. Todos os interessa‑
dos estarão motivados a se envolver nas discussões e haverá uma
perspectiva razoável de se alcançar um consenso no final.

432 2. A administração é suficientemente poderosa para forçar sua solu‑


ção preferida. Nesse caso, a participação pode muito bem ser
parte iv  o desenvolvimento de organizações eficientes

dispensada, pois é uma perda de tempo. No entanto, o risco de


forçar unilateralmente a mudança está na maneira como o ressen‑
timento criado pode gerar problemas no futuro.

3. Há oposição inflexível a uma mudança proposta em função de um


desacordo fundamental com os objetivos daqueles que a promo‑
vem. Aqui a consulta e a participação provavelmente serão usadas
apenas como oportunidades para obstruir a implementação. Quer
a mudança proposta seja levada adiante, quer seja modificada ou
simplesmente retardada, é algo que depende muito do poder de
ação dos gestores.

A alteração já antiga no equilíbrio de poder nos mercados de trabalho


em favor dos contratantes do trabalho é significativa, porque reforça a
tentação de introduzir unilateralmente a mudança. Muitos empregadores
percebem agora que têm a oportunidade de forçar mudanças no staff e na
organização do trabalho de natureza fundamental, e mais rapidamente
do que seria possível sob um regime verdadeiramente participativo. Em
lugar disso, aos empregados é frequentemente apresentada a desagradá‑
vel opção de escolher entre aceitar a mudança ou enfrentar a demissão.
Também se argumenta que quando subcontratadas, as pessoas talvez não
se interessem por quaisquer questões organizacionais além daquelas es‑
pecificadas em seus contratos. Contudo, a rejeição da consulta, e muito
menos a participação, significa excluir pessoas com experiência e conhe‑
cimento relevantes. Isso pode prejudicar a eficácia com que a mudança é
implementada e causar a perda da boa vontade dos interessados e de suas
comunidades mais amplas.
Algumas organizações do setor público oferecem exemplos de oposi‑
ção inflexível à reorganização. Esse é outro tipo de situação em que uma

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abordagem participativa na implementação da mudança tem probabi‑
lidade de não funcionar. Se um modo de operação habitual estiver sufi‑
cientemente enraizado em uma burocracia há muito estabelecida, a única
maneira de mudá­‑lo será atacar unilateralmente sua estrutura e ideologia.
Em tais situações, a tendência é que a participação venha a ser utilizada
pelos responsáveis da organização apenas para desviar a atenção para
longe dos planos de ação e atrasar sua implementação. Por exemplo, em
seu livro A Theory of Public Bureaucracy, Donald Warwick documenta
433
a resistência do Departamento de Estado norte­‑americano às tentativas
de reforma estrutural.19 Essa resistência foi liderada pelos executivos de

Realização da mudança organizacional


carreira mais antigos do próprio departamento, reforçada por sua capa‑
cidade de mobilizar o apoio externo no Congresso. Warwick questiona
o que chama de “defesa às vezes um tanto superficial da participação do
empregado em decisões sobre a mudança” (p. 199) nas burocracias do
serviço público e afins, em que o tamanho, a hierarquia rígida e a introdu‑
ção de diferentes forças políticas inviabilizam a ideia de se chegar a uma
solução de consenso por meio da participação.
Quando uma proposta de mudança vai de encontro aos interesses dos
afetados, ao menos do ponto de vista ético vale a pena iniciar discussões
para ver se existe alguma alternativa. Se isso não funcionar, uma partici‑
pação maior provavelmente será inútil. Os que perderão seu emprego es‑
tarão preocupados em descobrir maneiras de bloquear a mudança, ou não
sendo possível, renegociar os melhores termos de corte. Isso, é claro, dá
lugar à possibilidade de oferecer garantias de não haver perdas de empre‑
go ligadas à reorganização como base para obter a cooperação dos empre‑
gados, participação no planejamento e implementação da mudança. Uma
política sem demissões incorre em riscos evidentes e será mais adequada a
condições em que o nível de atividade provavelmente permanecerá aque‑
cido; além disso, poderá dar origem a um perfil inadequado da força de
trabalho e a dificuldades no recrutamento de pessoas com novas qualifica‑
ções. Por outro lado, essa é uma política que algumas empresas adotaram
com sucesso, em combinação com um cuidadoso planejamento da mão de
obra e acordos sobre flexibilidade entre funções. Essas empresas alegam
que há benefícios significativos quando se promove um clima em que os
empregados se identificam com os objetivos da direção e de facilitação do
processo de adaptação às novas exigências. Foi assim que a Corning Glass
introduziu a reengenharia empresarial com resultados construtivos e sem
encontrar a oposição que esse tipo de mudança geralmente suscita.20

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Se não houver barganha do tipo soma zero e se for possível uma
convergência de interesses, a participação de pessoas no desenho e na
implementação da mudança resulta em mais chance de êxito. Uma razão
para tal é que essa participação é uma oportunidade para se explicar e
examinar criticamente a lógica da mudança proposta – o que pode ame‑
nizar o temor que emana do desconhecimento e da sensação de impo‑
tência. Quando lhes é negada a chance de discutir a visão que orienta
uma grande mudança, as pessoas realmente não conseguem entendê­‑la
434
facilmente e muito menos participar. Se elas contribuem ativamente para
a mudança proposta, isso ajuda a criar entre elas certo compromisso com
parte iv  o desenvolvimento de organizações eficientes

ela, e fazer com que funcione. Por exemplo, descobriu­‑se em empresas


norte­‑americanas que a probabilidade de projetos de desenvolvimento
de sistemas serem bem implementados é muito maior quando os depar‑
tamentos usuários são totalmente envolvidos em seu planejamento e se
sentem donos deles do que quando não existe essa participação.
Uma segunda razão é que boa parte da informação necessária para o
planejamento da mudança – dados sobre problemas correntes, atividades
do trabalho, pontos da decisão, ciclos de tempo, arquivos, custos, pessoal
e assim por diante – só será conhecida em detalhe pelas pessoas direta‑
mente afetadas. Portanto, essa participação é indispensável para que a
reorganização seja baseada na realidade da situação. Em terceiro lugar,
a participação do empregado pode ajudar os executivos a aprender algo
sobre as atitudes, valores e percepção dos empregados, e esse aprendiza‑
do servirá para ajudar no planejamento de outras mudanças de modo que
provoquem menos conflito. Da mesma maneira, a chance de influenciar e
compreender a mudança organizacional deve criar nos empregados uma
consciência sobre a necessidade de adaptação nas condições empresariais
modernas.
Assim, na maioria dos casos, a participação é benéfica na gestão da
mudança. Ela oferece as melhores perspectivas de desenvolvimento de
uma “capacidade de aprendizado adaptativo” em organizações, utilizan‑
do o conhecimento dos membros de uma ampla faixa da organização e
gerando diversas soluções alternativas. Muitos, entre os quais o autor,
também afirmariam que esse é o procedimento eticamente correto para
planejar mudanças que afetam outras pessoas. Contudo, pode haver uma
expectativa exagerada, e eu já indiquei as condições sob as quais esse
procedimento talvez não funcione. A participação é uma maneira de en‑
frentar as questões políticas envolvidas na mudança, não um meio de

Book_Organizaçoes.indb 434 16/9/2011 16:23:57


evitá­‑las ou amenizá­‑las. Quando há um conflito de interesses enraizado
entre os grupos envolvidos numa mudança proposta, provavelmente a
participação não será uma solução mutuamente aceitável. Se existirem
ansiedades e hostilidades ocultas, também pode ser necessário introduzir
uma terceira parte, um consultor social, para trazer essas ansiedades e
hostilidades para campo aberto, onde podem ser enfrentadas e dissipa‑
das. Enquanto existirem ansiedades e conflitos que não foram totalmente
admitidos, a participação será um exercício infrutífero.
435
Uma abordagem participativa também pode ser difícil por outros moti‑
vos. Em geral, ela é demorada, e mais ainda em uma organização de grande

Realização da mudança organizacional


porte, em que a participação precisa atravessar muitos níveis hierárquicos
para ligar as decisões sobre a mudança iniciadas em um nível superior às
as pessoas afetadas nos níveis inferiores. Em algumas circunstâncias, não
há tempo para isso – como quando é necessária uma reação rápida a um
evento inesperado. Os executivos também dizem que o tempo gasto em dis‑
cussões é tempo, perdido na execução do trabalho. São dificuldades reais,
embora até certo ponto exageradas, pois revelam falhas na antecipação de
novos desenvolvimentos a tempo de modo que eles possam ser discutidos
anteriormente, em lugar de se precisar reagir no último instante.
Outro problema levantado com frequência é a aparente ausência de
interesse dos empregados na participação – má vontade em dedicar esfor‑
ço e compartilhar a responsabilidade. É verdade que alguns experimen‑
tos de adoção de um estilo de gestão democrática americana não deram
certo em países europeus, como a Noruega, onde foi feita uma cópia
direta de um experimento norte­‑americano.21 No entanto, isso não indica
resistência do empregado à participação. Na Europa, tem sido tradicio‑
nalmente empreendido por representantes dos sindicatos e representantes
departamentais eleitos, e não por meio de relações pessoais diretas com
os executivos. Não tenho ciência de nenhuma evidência indicando que os
membros de organizações não desejem discutir a respeito de questões de
importância imediata para seus empregos e trabalho, seja por discussão
direta ou por meio de representantes.
Para resumir, a abordagem participativa para tratar da mudança não
é fácil, e nem sempre funcional para a gestão. As consequências da re‑
cusa de executivos em participar podem, no entanto, custar muito caro
quando as pessoas estão em posição de resistir ou até mesmo de sabotar
a mudança, mas não quando estão dispostas a levar adiante a mudança,
construtivamente, se consultadas.

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RESISTÊNCIA À MUDANÇA
Qualquer mudança organizacional encontra alguma resistência. A re‑
sistência à mudança é um fenômeno universal entre grupos que sentem
seus interesses ameaçados. É encontrada em todos os níveis da organiza‑
ção, da sala da direção ao chão de fábrica, e em toda a história, desde os
tecelões dos primeiros teares industriais do início do século XIX até os
grupos de protestos atuais.
É indispensável que os executivos entendam as razões pelas quais
436
as pessoas resistem a determinada mudança. Sem essa compreensão,
é impossível distinguir entre fatores essenciais e fatores triviais, e to‑
parte iv  o desenvolvimento de organizações eficientes

mar as providências necessárias. Muitas vezes a mudança aparente‑


mente racional e objetiva do ponto de vista de um executivo senior
assume um caráter muito diferente para as pessoas de outras partes da
organização.

1. Os executivos se sentem alarmados com uma proposta de enxugar


a estrutura de organização da sua empresa por meio da redução do
número de níveis hierárquicos, por considerarem ameaçador para
a segurança de seu emprego e para o número de futuras chances de
promoção.

2. Gerentes intermediários consideram o enriquecimento do trabalho


de seus subordinados uma ameaça à sua autoridade e até mesmo à
viabilidade de suas funções.

3. Executivos experientes veem a realocação das responsabilidades


entre as funções que chefiam como ameaça às suas reivindicações
de orçamentos e outros recursos, e não como um ajuste sensato às
novas necessidades.

4. Os trabalhadores reagem negativamente aos poderes que lhes são


concedidos como um peso imposto a eles.

5. Um técnico especialista vê a requisição para trabalhar em uma


equipe multifuncional como potencial diluição de sua posição e
valor de mercado como profissional.

As razões pelas quais as pessoas resistem à mudança organizacional


são bastante claras, e portanto, previsíveis (veja o Quadro 12.3). Isso

Book_Organizaçoes.indb 436 16/9/2011 16:23:57


significa ser possível adotar uma abordagem sistemática para fazer essas
previsões e agir com base nos resultados.
Para a gestão, o problema da resistência à mudança tem três elementos:

„„ Como minimizar as possíveis perturbações durante o período da


mudança.

Quadro 12.3  Por que as pessoas resistem à mudança organizacional? 437

Realização da mudança organizacional


1. Inicialmente, a maioria das pessoas reagirá à proposta de mudança com
certa desconfiança porque a consideram uma perturbação importuna e
uma interferência desagradável em sua rotina.
2. Para essas pessoas, mudanças organizacionais podem afetar negativa‑
mente sua segurança no emprego, o seu pagamento e o seu status, as
condições de trabalho e o valor das qualificações que adquiriram. Esses
são os fatores de “higiene” apontados por Herzberg que, ameaçados, são
fontes de insatisfação.* Esse assunto tornou­‑se muito sensível devido a
grande insegurança hoje sentida em função do downsizing e de outras
ações que se afastam das antigas estruturas de emprego relativamente
estáveis.
3. Os gerentes de linha muitas vezes resistem a mudanças propostas por
especialistas, como os experts em RH e sistemas, que até certo ponto
as justificam com os projetos que apresentam para a melhoria e mu‑
dança. Com frequência, os gerentes resistem a essas propostas, que
percebem como arriscadas para o bom funcionamento de suas opera‑
ções se aceitarem a potencial perturbação causada por algo novo. Eles
também podem se ressentir do que encaram como crítica implícita,
pelo fato de especialistas lhes dizerem como melhorar sua abordagem
da gestão.
4. Por sua vez, os especialistas sentem­‑se desconfortáveis com a ênfase que
as novas formas de organização colocam em sua integração com outros
especialistas e com outras unidades, que atravessam fronteiras entre dis‑
ciplinas e funções. Assim, eles podem resistir a novidades desse tipo.

Fonte: Herzberg, Frederick; Mausner, Bernard; Snyderman, Barbara. The Motivation to


Work. New York: John Wiley & Sons, 1959.

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„„ Como transformar a resistência em compromisso com a mudan‑
ça, de modo que as pessoas contribuam com seu conhecimento e
experiência para resolver os detalhes e garantir sua implementação
de forma bem­‑sucedida.

„„ Como passar rapidamente para uma nova situação estável que


trará um desempenho satisfatório.

438 Tendo em mente essas considerações, recomenda­‑se aos que planejam


a mudança tomar as seguintes providências:22
parte iv  o desenvolvimento de organizações eficientes

1. Enumerar todas as alternativas para a implantação de sua mudan‑


ça, com os cronogramas estimados.

2. Identificar todos os setores da organização, categorias funcionais


ou grupos de trabalhos afetados, até mesmo indiretamente, pela
mudança.

3. Avaliar em termos gerais a provável reação desses grupos.

4. Calcular sua provável reação a questões específicas como salários,


diferenciações, perspectiva de promoção, retreinamento, métodos
de trabalho e redistribuição de funções. Obter dados de qualida‑
de razoável sobre essas questões envolve ter acesso à opinião de
gestores em estreito contato com todos os grupos e, ainda melhor,
à reação dos interessados.

5. Concluir, por meio de uma estimativa aproximada, a possibilidade


de aceitação geral da mudança e de suas abordagens.

6. Decidir até que ponto as possíveis objeções à mudança podem ser


resolvidas por meio de garantias e/ou de uma comunicação efetiva
sobre as razões para a mudança.

7. Ponderar a importância de assegurar a contribuição de cada grupo


para o desenho e implantação da mudança e seu custo para a orga‑
nização se alguns de seus membros forem isolados e decidirem se
demitir.

8. Ajustar o processo de como envolver diferentes grupos na mudan‑


ça, conforme as avaliações feitas.

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Informações reunidas sobre as prováveis reações a uma mudança pro‑
posta permanecerão, por meio de uma abordagem como essa, claramente
muito subjetivas. Contudo, serão sistematicamente organizadas, o que é
bem melhor que a alternativa da pura e simples adivinhação. Um impor‑
tante requisito na coleta de informações é verificar se os porta­‑vozes e
outras fontes refletem com precisão as ideias das pessoas por quem falam.
Esse é um dos principais aspectos em favor da abordagem participativa
no desenho e na implementação da mudança.
439

Realização da mudança organizacional


USO DE PROJETOS-PILOTO
Se uma considerável resistência a uma mudança é prevista, talvez seja
interessante o uso de um projeto­‑piloto para introduzi­‑la aos poucos. Há
consenso de que determinadas mudanças na organização devem ser feitas
experimentalmente, por meio de um projeto­‑piloto. Depois de dado perí‑
odo, a mudança será avaliada, entendendo­‑se que ela será abandonada se
não der certo ou for considerada inaceitável.
Essa abordagem tem uma série de vantagens. Poderá ser escolhida
uma situação favorável como programa­‑piloto, talvez com recrutamen‑
to de voluntários. Isso poderá contribuir para o sucesso da mudança,
levando­‑a a superar o período inicial de tentativa e erro, em circunstân‑
cias mais adequadas para a produção de bons resultados. Membros da
organização menos empenhados e menos confiantes estarão mais prepa‑
rados para aceitar a mudança quando o piloto estiver concluído; nessa
categoria estão gestores receosos de comprometer recursos com qualquer
novidade até que possam avaliar seu efeito. O Quadro 12.4 descreve um
bom uso de projetos­‑piloto preliminarmente à implementação de uma
grande mudança na Air Canada.
Contudo, projetos­‑piloto acarretam riscos. Eles prolongam o perí‑
odo de incerteza que acompanha qualquer mudança, e se isso for uma
fonte de muita ansiedade, pode aumentar, e não diminuir, a hostilida‑
de à mudança. Se o projeto­‑piloto estiver localizado em um ambiente
favorável demais, talvez não seja possível reproduzir em outras partes
da organização qualquer sucesso que ele tenha. Um projeto­‑piloto que
exclui pessoas menos receptivas à mudança também pode excluir as que
detêm poder. Representantes dos empregados possivelmente serão mui‑
to cautelosos sobre mudanças organizacionais propostas, porque tem a
responsabilidade de examinar quaisquer efeitos para os interesses de seus

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Quadro 12.4  O uso de projetos­‑piloto para facilitar a mudança
organizacional

Como prelúdio à introdução da mudança organizacional por toda a empresa, a


Air Canada iniciou uma série de projetos específicos no período de 1974 a 1976.
Phil Chartrand, vice­‑presidente de Pessoas e de Desenvolvimento Organizacio‑
nal, viu nesses projetos uma oportunidade de aplicar princípios inovadores no
desenho de funções, e ao mesmo tempo demonstrar os benefícios crescentes
440
para a empresa e seus empregados de um programa sistemático de mudan‑
ça organizacional. Eram projetos­‑piloto que facilitavam a subsequente inova‑
parte iv  o desenvolvimento de organizações eficientes

ção organizacional em escala maior, reduzindo as ansiedades relacionadas à


mudança e promovendo o reconhecimento de seus benefícios potenciais.
Chartrand publicou um ensaio sobre dois desses projetos e as lições a serem
extraídas deles.* Um tratava do redesenho do sistema pelo qual a turma de
solo no aeroporto Dorval, em Montreal (Canadá), acomodava as aeronaves que
chegavam em termos de desembarque de passageiros e bagagem, limpeza e
manutenção da aeronave e embarque das provisões necessárias. A equipe desse
projeto era chefiada por um dos especialistas em desenvolvimento organiza‑
cional da empresa, e consistia do gerente de aeroporto e três comissários do
sindicato. A recomendação era fazer um redesenho completo do método de
organizar e gerenciar a operação de solo. O resultado foi um aperfeiçoamento
nos padrões de desempenho, a redução dos custos operacionais e uma melho‑
ria nas comunicações com passageiros relacionadas a atrasos e questões afins.
É interessante notar que os comissários do sindicato, que antes eram céticos,
foram conquistados e aceitaram o valor desse tipo de mudança que, mais tarde,
aplicaram para o trabalho na gerência.
O outro projeto aconteceu na oficina da base de manutenção. O objetivo era
obter melhorias na manutenção da colmeia de alumínio (um caríssimo material
de fibra de vidro de alumínio muito leve, mas muito forte, usado em aerona‑
ves), de modo que a oficina obtivesse um certificado oficial para fazer esse tipo
de manutenção para outras linhas aéreas. A equipe de projeto consistia de um
chefe, três mecânicos licenciados e um especialista em desenvolvimento orga‑
nizacional colocados à disposição da empresa para dez sessões, e podia solicitar
conselhos a supervisores e a um engenheiro industrial. A equipe obteve o cer‑
tificado, que ampliou imensamente os mercados da empresa para trabalho de
manutenção da colmeia. Com resultado desse projeto, também melhoraram o
retorno de investimento, a produtividade e as condições de trabalho.

Fonte: Chartrand, Philip J. “Job redesign: progress or pipedream?. Business Quarterly, 41(4),
1976. p. 65­‑77.

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representados. Por esse motivo talvez não seja fácil assegurar a aprovação
de um projeto­‑piloto pelos representantes dos empregados. Há também o
perigo de que a direção faça alguma mudança adicional totalmente con‑
dicional ao projeto­‑piloto. Se a mudança for inevitável, é importante que
isso seja explicado e que se apresente o piloto como uma oportunidade
para aprender e avaliar de modo participativo a melhor maneira de avan‑
çar. Um outro problema é que, dada a conexão entre funções e níveis, em
muitas situações será impossível isolar uma mudança na organização e
441
utilizar um piloto experimentalmente.

Realização da mudança organizacional


TEMPO NECESSÁRIO
A execução de uma mudança organizacional planejada quase sempre
leva mais tempo que o previsto. É um processo que deve seguir uma série
de etapas, em geral pontuado por crises, além de exigir considerável in‑
vestimento em recursos materiais e empenho dos envolvidos. Leva algum
tempo para satisfazer esses requisitos.
Uma mudança planejada de grande envergadura deve passar por
muitas etapas, que abrangem as ações recomendadas, como as que John
Kotter identificou. Na prática, a tendência é que elas se sobreponham,
mas quatro etapas – resumidas no Quadro 12.5 – podem ser identificadas
e definidas em separado: (1) montar uma equipe para liderar a mudança;
(2) permitir que a resistência venha à tona; (3) garantir a identificação
com os objetivos da mudança; e (4) avaliar a mudança e criar condições
de aprendizado para o futuro. Normalmente o fracasso na mudança or‑
ganizacional é consequência de uma tentativa de reduzir ou eliminar uma
ou mais dessas etapas.
A escala de tempo contemplada no Quadro 12.5 é extremamente
longa e está se tornando cada vez mais irrealista nas condições contem‑
porâneas de turbulência e hipercompetição. Na prática, boa parte das
mudanças organizacionais menores, como a criação de novas equipes
ou unidades, não chegará nem perto do planejamento e implementação.
Entretanto, uma mudança de grande envergadura, como a integração de
uma empresa recém­‑adquirida, poderia levar muitos anos antes de estar
satisfatoriamente sedimentada.
Portanto, o tempo necessário para a realização de uma mudança de
sucesso é um desafio real. Criar condições para gerar mudanças de forma
mais constante e emergente ajudará a evitar que mudanças futuras assu‑
mam a forma de projetos grandes, exclusivos e perturbadores, e as escalas

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Quadro 12.5  O tempo necessário para realizar as etapas da mudança

„„ Etapa 1: Construir um grupo de liderança e conseguir aceitação. Esta eta‑


pa vem logo depois da identificação da necessidade da mudança. Envolve
a criação de um grupo que assumirá a liderança, será responsável pela in‑
trodução da mudança organizacional e deverá conquistar a aceitação dos
outros. O que está envolvido aqui é mais que a simples aceitação pessoal
por cada membro do grupo; abrange também a aceitação de seu papel no
442 processo (p. ex., membro da equipe do projeto, facilitador do projeto) ou
de sua legitimidade, quando são consultores trazidos de fora. Esta etapa
parte iv  o desenvolvimento de organizações eficientes

pode durar cerca de seis meses.


„„ Etapa 2: A resistência à mudança vem à tona. Durante esta etapa, que
pode durar outros seis meses, as hostilidades subjacentes, desconfian‑
ças e temores relativos às mudanças propostas aparecem. Até que essas
ideias e sentimentos sejam abertamente expressos, não importa quanta
informação a direção forneça, ela não será aceita per se.
„„ Etapa 3: Identificação com os objetivos da mudança. Para que esta eta‑
pa tenha início, os temores subjacentes encontrados na Etapa 2 têm de
estar resolvidos. O pessoal afetado pela mudança começa então a acei‑
tar os objetivos do programa da mudança como seus, e não como algo
simplesmente imposto. Pode ser dada partida em direção à elaboração
dos detalhes da mudança e sua implementação. Dependendo da abran‑
gência e complexidade da mudança, esta etapa de esforço conjunto para
sua implementação pode levar algo em torno de dois anos.
„„ Etapa 4: Avaliação da mudança e consolidação das condições do apren‑
dizado para o futuro. Nesta etapa a mudança na organização já foi in‑
troduzida e está sendo avaliada. Talvez seja preciso deixar passar algum
tempo antes de iniciar uma avaliação. O monitoramento da mudança
e subsequentes ajustes podem ajudar a organização a passar para um
modo de aprendizado constante. Por sua vez, essa pode ser a base para
realizar novas mudanças de forma mais emergente, em vez de a direção
esperar até ser forçada a se adaptar a novas circunstâncias.

Fonte: Baseado em Hugh Marlow, Managing Change: A Strategy for Our Time, Londres: Institute
of Personnel Management, 1974.

de tempo deverão ser bem mais curtas. O risco de não ter a flexibilidade
necessária para se adaptar a circunstâncias que se alteram rapidamente

Book_Organizaçoes.indb 442 16/9/2011 16:23:58


é uma das principais razões para as empresas criarem capacidade e cul‑
tura de constante autoavaliação e aprendizado, e fazerem mudanças
emergentes.

uso de terceiros, incluindo a pesquisa de ação


A expressão “terceiros” no contexto da mudança organizacional se
refere a qualquer indivíduo ou grupo que auxilie no diagnóstico de proble‑
mas e na implementação das soluções, mas que não faça parte do sistema
443
da organização diretamente envolvido na mudança. Terceiros podem ser

Realização da mudança organizacional


consultores, o corpo docente de escolas de administração ou membros da
equipe de desenvolvimento de uma organização. Entre os benefícios que
podem trazer estão a contribuição da técnica e da experiência analítica
adquirida em outro lugar, os recursos para ajudar na resolução de visões
conflitantes permanecendo, todavia, fora do conflito e a aceitabilidade de
suas recomendações por sua imagem de especialistas (principalmente os
acadêmicos) e sua posição mais ou menos neutra com relação à política
da organização. Por motivos como esses, terceiros frequentemente são
chamados para ajudar em mudanças organizacionais.
O envolvimento de terceiros pode criar certos problemas. Para os em‑
pregados, os consultores normalmente só estão comprometidos com os
interesses da direção por causa da comissão que recebem. Os consultores
também têm a tendência de aplicar uma solução padronizada a proble‑
mas organizacionais – em parte porque sua experiência é basicamente a
aplicação de técnicas padronizadas, e em parte porque os custos da con‑
sultoria são altos e não podem ser mantidos por muito tempo, de modo
que é preciso uma solução rápida. As abordagens padronizadas não estão
adaptadas a circunstâncias variadas e é pouco provável que estejam em
harmonia com a cultura singular de determinada organização. Se a di‑
reção pretende contratar consultores que atuam no campo da mudança
organizacional, é bom assegurar­‑se de que as soluções não sejam decidi‑
das logo no início, ou com a exclusão de outros grupos interessados na
mudança.
O corpo docente de escolas de administração está em melhor posição
para uma longa colaboração com as organizações, e para estender essa
colaboração pelo período de diagnóstico e implementação da mudança.
Para os docentes é mais fácil assumir o papel de pesquisador de ação, que
dedica algum tempo à formação de um consenso a respeito da direção da
mudança por meio de pesquisa, feedback e discussão.

Book_Organizaçoes.indb 443 16/9/2011 16:23:58


A sequência típica de eventos em uma abordagem de pesquisa de
ação para a mudança organizacional seria: (1) a pesquisa é realizada para
obter dados para o diagnóstico de problemas; (2) esses dados voltam para
gestores e grupos de empregados relevantes; (3) o feedback é avaliado por
todos os interessados e há uma discussão com os pesquisadores sobre as
opções para a ação; e (5) é tomada uma decisão sobre a ação e feita uma
mudança. O pesquisador, talvez junto com outras pessoas da organiza‑
ção, pode então investigar os efeitos da mudança. Há mais um feedback,
444
mais discussão, e o ciclo prossegue. As etapas da pesquisa e do feedback
provavelmente identificarão problemas, criando uma consciência de sua
parte iv  o desenvolvimento de organizações eficientes

existência na mente dos envolvidos. Isso equivale mais ou menos às


primeiras etapas do processo que acaba de ser mencionado. A discussão
de opções para a ação pode promover um sentimento de “propriedade”
do projeto de mudança e a identificação com os objetivos da mudança
que são classificados pela própria discussão (equivalente à Etapa 3 do
Quadro 12.5).
Se a organização for grande o suficiente para empregar as próprias
equipes de planejamento organizacional e desenvolvimento ou equipes
de consultoria interna, tais equipes estarão habilitadas a desempenhar o
papel de pesquisador de ação. Naturalmente, deverão ganhar credibili‑
dade e ser vistos como desempenhando um papel relativamente neutro.
Às vezes esses consultores dependerão de recomendações externas sobre
técnicas, como a análise de surveys. Os consultores internos têm mais
familiaridade com a história da organização, logo será mais fácil para a
administração instruí­‑los que a consultores externos.
A pesquisa de ação é um processo demorado; é preciso manter con‑
trole cuidadoso da programação das discussões e relatórios de feedback
para não perder tempo valioso e não decepcionar as expectativas na
organização. O corpo docente de escolas de administração tem outras
tarefas a cumprir, e talvez não consiga oferecer comprometimento com a
intensidade desejável. Outro aspecto é que, enquanto uma equipe desse
tipo, com seu status acadêmico, é considerada mais neutra em relação
a questões políticas em uma organização, o preço dessa independência
pode ser que os acadêmicos se sintam livres para importar os próprios
valores para dentro da organização.
Tanto os executivos como os empregados devem procurar estar cer‑
tos sobre o que estão aceitando quando o terceiro é um acadêmico in‑
dependente, porque os acadêmicos diferem bastante em seus valores e

Book_Organizaçoes.indb 444 16/9/2011 16:23:58


abordagens. Alguns chegam a considerar a pesquisa de ação um meio de
subverter o que acreditam ser instituições burocráticas, exploradoras e
opressivas. Outros parecem limitar­‑se exclusivamente ao ponto de vista
da direção, o que também limita sua possível contribuição como terceiros,
facilitadores do processo de mudança organizacional. Por outro lado, o
pessoal de escolas de administração tem sensibilidade em relação às difi‑
culdades de desempenhar um papel que inevitavelmente os leva para den‑
tro da política organizacional, mas acreditam ter obrigação de oferecer o
445
melhor de seus serviços e de aplicar seu conhecimento à prática.
Tendo em mente que a mudança organizacional deve ter a compre‑

Realização da mudança organizacional


ensão e o envolvimento daqueles que devem viver com os novos arranjos
e fazer com que funcionem, recomenda­‑se que os terceiros adotem um
papel que facilite isso. Em outras palavras, não se exige que eles resolvam
problemas organizacionais, mas há uma expectativa de que colaborem
com as partes imediatamente envolvidas para que estas encontrem as pró‑
prias soluções por meio de atividades como, por exemplo, recomendar
com base em surveys de atitudes, ajudar as pessoas a estabelecer relacio‑
namentos construtivos de trabalho e facilitar o enfrentamento aberto de
questões sujeitas a conflito.
Os que têm experiência nesse campo dizem que há situações em que o
avanço pode ser feito pela própria terceira parte no papel de expert na so‑
lução de problemas – quando há uma questão técnica, por exemplo. Foi
sugerido que um papel dominante, apoiado pela direção, pode acelerar a
mudança. Embora seja verdade que, para ser eficaz, a terceira parte deve
ter alguma influência, não é muito provável que a adoção de um papel
de liderança ou dominante seja uma estratégia efetiva. Deixando de lado
considerações éticas de poder sem responsabilidade, papéis desse tipo po‑
dem criar dependência indevida com relação a essa terceira parte. No
longo prazo, a boa implementação da mudança organizacional requer
a participação ativa dos interessados na elaboração de novos arranjos.
Tanto como experiência de aprendizagem como base para gerar compro‑
metimento pessoal com a mudança – pois essas pessoas terão de conviver
com a mudança e assumir a responsabilidade por ela.
Não é fácil administrar o relacionamento entre terceiros e membros
de uma organização. Pode haver diferenças nos valores e na linguagem,
diferentes maneiras de trabalhar, diferentes perspectivas de tempo. Isso
piora quando o treinamento técnico dos interessados também varia,
como acontece com um cientista comportamental que trabalha com

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engenheiros na mudança do desenho de um cargo, ou um especialista em
organização que trabalha com contadores na mudança nos procedimen‑
tos de controle. Integração em uma equipe efetiva pode ser difícil, mas
esse é o desafio de juntar as pessoas mais adequadas para fazer o detalha‑
do trabalho das diferentes facetas que uma mudança deve levar em conta.

Resumo
446 1. As empresas hoje precisam manter seus arranjos organizacionais sob
constante revisão. Mudanças organizacionais são empreendidas mais fre‑
parte iv  o desenvolvimento de organizações eficientes

quentemente que antes, em função dos desenvolvimentos em seus am‑


bientes e das iniciativas estratégicas adotadas por elas mesmas.

2. Entretanto, muitas tentativas de realizar a mudança organizacional


falham no alcance de resultados satisfatórios, indicando que a questão
permanece mal compreendida.

3. Há muitas variedades de mudança organizacional e pode ser útil


classificá­‑las em relação a três aspectos subjacentes essenciais. A mudan‑
ça pode ser:

(a) radical ou incremental;


(b) planejada ou emergente;
(c) de enfoque amplo ou restrito.

4. Na prática, esses aspectos são quase sempre complementares. Por


exemplo, a implementação de uma nova visão radical poderá avançar
aos poucos, passo a passo, se o tempo permitir.

5. Em condições incertas e mutáveis, é arriscado acreditar que a direção


possa planejar antecipadamente toda uma mudança organizacional, espe‑
cialmente de grandes proporções.

6. O surgimento de muitos elementos que contribuem para a mudança


deve ser estimulados pelo envolvimento das pessoas próximas à ação.
Uma mudança que tem enfoque restrito em determinado grupo ou unida‑
de de trabalho logo pode ter implicações mais amplas mediante efeitos de
reação em cadeia ou pelo precedente que se estabelece para outras partes
da organização. Uma mudança com foco restrito também pode servir
como plano­‑piloto antes de uma reorganização mais extensa.

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7. A mudança é um processo que passa por uma série de etapas. Tratar
com negligência qualquer etapa pode colocar todo o processo em risco.
Isso significa que mudanças complexas de grande envergadura exigem
muito esforço e tempo. O tempo que elas tomam desde o início até serem
postas em prática com sucesso geralmente é maior que o previsto. Se a
organização desenvolver a capacidade de mudar de forma emergente por
meio do processo contínuo de aprendizagem, é mais provável que ela se
adapte com mais velocidade e menos traumas às novas circunstâncias.
447
8. Há determinadas questões específicas que devem ser levadas em conta

Realização da mudança organizacional


no momento de realizar a mudança organizacional. Uma diz respeito à
extensão e ao papel da participação no processo da mudança. Outra é
a inevitabilidade da resistência à mudança e como pode ser resolvida.
Outra questão está relacionada às condições sob as quais o preparo de
projetos­‑piloto pode ajudar a realizar bem a mudança. O envolvimento
de terceiros, como os consultores, e o papel que desempenham também
merece reflexão. Há ainda a questão do tempo envolvido.

Questões para discussão


1. Descreva e discuta as principais barreiras­‑chave à mudança nas
organizações.

2. Quais são os aspectos essenciais dos determinantes (a) externos e (b) in‑
ternos da mudança nas organizações? Como eles constituem o contexto
da mudança organizacional?

3. Discuta o relacionamento entre a mudança planejada e a mudança


emergente nas organizações.

4. Considerando também o Capítulo 3, discuta os requisitos essenciais para


uma gestão da mudança bem­‑sucedida.

5. Quais são os elementos principais na gestão da resistência à mudança?

6. Discuta os prós e os contras do uso de “projetos­‑piloto” e “terceiros” na


mudança organizacional planejada.

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Notas
1. BROCKNER, Joel. Change: success is all in the detail. Financial Times, Maste‑
ring Management, Parte 5, 30 out. p. 2000, 8-10.

2. BENNIS, Warren. Organizational Development. Reading: Addison­‑Wesley,


1996; KOTTER, John P. Leading Change. Boston: Harvard Business School
Press, 1996.

448 3. LEWIN, Arie; LONG, Chris P; CARROLL, Timothy N. The coevolution of


new organizational forms. Organization Science, 10, p. 535­‑550, 1999.
parte iv  o desenvolvimento de organizações eficientes

4. MARSHAK, Robert J. Managing the metaphors of change. Organizational Dy‑


namics. 22, p. 44­‑50, 1993.

5. ARGYRIS, Chris; SCHÖN, Donald. Organizational Learning. Reading:


Addison­‑Wesley, 1978.

6. ARGYRIS; SCHÖN, 1978, op. cit.

7. MCKENNA, Eugene K. Business Psychology and Organizational Behavior. 3.


ed. Philadelphia: Taylor & Francis, 2000. Cap. 15.

8. BEER, Michael; EISENSTAT, Russel A; SPECTOR, Bert. The Critical Path to


Corporate Renewal. Boston: Harvard Business School Press, 1990.

9. MICKLETHWAITE, John; WOOLDRIDGE, Adrian. The Witch Doctors. Lon‑


don: Heinemann, 1997. Cap. 1.

10. CHARTRAND, Phillip J. The design, implementation and measurement of a


macrochange programme. (Tese de doutorado). University of Aston, 1981. Veja
também o Quadro 12.4, p. 302.

11. Veja, por exemplo, Hannaford Brothers Company, em WELLINS, Richard S;


BYHAM, William C; DIXON, George R. Inside Teams: How 20 World­‑Class
Organizations are winning through teamwork. San Francisco: Jossey­‑Bass,
1994. p. 179­‑191.

12. Para uma análise bastante interessante da reengenharia empresarial e sua histó‑
ria, veja MICKLETHWAITE; WOOLDRIDGE, 1997. Cap. 1.

13. CHILD, John; FAULKNER, David; PITKETHLY, Robert. The Management of


International Acquisitions. Oxford: Oxford University Press, 2001.

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14. MARCH, James G. Exploration and exploitation in organizational learning.
Organization Science, 2, 1991. p. 71­‑87.

15. FEIGENBAUM, Armand V. Managing cuts in a cold climate. Financial Times,


11 abr. 2001. p.17.

16. Brockner, 2000, op. cit.

17. KOTTER, John P. Leading Change. Boston: Harvard Business School Press,
1996. LEWIN, Kurt. Field Theory in Social Science. New York: Harper & 449
Row, 1951.

Realização da mudança organizacional


18. PARKER, Sharon; WALL, Toby. Job and Work Design. Thousand Oaks: Sage,
1998.

19. WARWICK, Donald P. A Theory of Public Bureaucracy. Cambridge: Harvard


University Press, 1975.

20. MICLETHWAITE; WOOLDRIDGE, 1997, op. cit. Cap. 1.

21. HELLER, Frank; PUSIC, Eugen; Strauss, George; Wilpert, Bernhard. Or‑
ganizational Participation: Myth and Reality. Oxford: Oxford University Press,
1998. p. 181.

22. Essas etapas se baseiam parcialmente em LUPTON, Tom. The practical analy‑
sis of change in organizations. Journal of Management Studies, 2, p. 218­‑227,
1965.

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Capítulo 13
Organizar para o aprendizado1

Conteúdo do capítulo
Este capítulo trata do aprendizado tanto dentro das organizações como nas
alianças entre elas. Após analisar a importância estratégica do aprendizado,
discute­‑se a natureza do aprendizado “organizacional” e faz­‑se algumas
distinções importantes que ajudam a desvendar esse fenômeno complexo. São
identificados então os fatores que facilitam o processo do aprendizado em uma
organização, especialmente a liderança gerencial, os canais de comunicação,
o equilíbrio entre controle e autonomia, a gestão dos limites internos por
meio de métodos como equipes multifuncionais e a garantia de que os fluxos
de informação interna atravessem as fronteiras externas. A capacidade de
aprendizado de uma organização depende de uma série de fatores, que serão
examinados. Então, analisa­‑se a crescente importância do aprendizado por meio
da formação de alianças estratégicas. A seção que encerra o capítulo mostra
como o aprendizado organizacional pode ser facilitado em termos práticos.

13.1 A importância estratégica do aprendizado


organizacional
A economia contemporânea é cada vez mais baseada no conhecimen‑
to e sujeita a rápidas mudanças. Uma das principais razões pelas quais
algumas empresas têm melhor desempenho que outras deve­‑se ao fato

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das primeiras aplicarem conhecimento superior e se adaptarem com mais
competência a condições que estão sempre se alterando. Isso significa que
são melhores no que se convencionou chamar de “aprendizado organiza‑
cional”. Aprendizagem organizacional é o processo de desenvolvimento
do pensamento e das ações das pessoas que pertencem às organizações e
trabalham nelas; essas ações depois se institucionalizam em propriedades
organizacionais, assumindo a forma de rotinas, sistemas, estruturas, cul‑
turas e estratégias novas ou revisadas.2
452
“Aprendizado organizacional” se refere tanto ao processo de ad‑
quirir ou gerar novo conhecimento como ao resultado desse processo.
parte iv  o desenvolvimento de organizações eficientes

O resultado do aprendizado é a aquisição de uma nova competência.


Pode levar a uma habilidade na aplicação do novo conhecimento para
aperfeiçoar o desempenho de uma atividade ou tarefa existente. Também
pode ajudar uma organização a se preparar para novas circunstâncias, e
assim promover a mudança constante conforme surgir a necessidade (a
“mudança emergente” discutida no Capítulo 12). Portanto, a capacidade
de aprender confere uma vantagem competitiva à empresa e permite à
organização pública ser mais eficaz e competente na prestação de ser‑
viços. Os gestores cada vez mais procuram novas maneiras de promo‑
ver a capacidade de gerar novo conhecimento útil em suas organizações.
Muitas alianças estratégicas estão sendo estabelecidas para aprimorar o
conhecimento ou a capacidade de gerar novo conhecimento por meio do
aprendizado.
Por muitos anos vigorou entre economistas e teóricos da estratégia
a ideia de que o desempenho superior poderia ser explicado em vir‑
tude dos aspectos estruturais das indústrias, como barreiras contra os
concorrentes. No entanto, outra visão tem recentemente atraído muita
atenção – a de que os recursos e competências de determinada empresa
têm papel decisivo na capacitação para obter um desempenho supe‑
rior no mercado.3 Essa visão ressalta o papel do conhecimento organi‑
zacional como base para o sucesso competitivo. Tem­‑se argumentado
que, nas condições contemporâneas, o conhecimento e a capacidade de
aprender mais depressa que os concorrentes são as únicas fontes segu‑
ras de vantagem competitiva duradoura. Por exemplo, um consultor da
General Electric chegou à conclusão de que “as empresas devem apren‑
der melhor que seu maior concorrente ou o negócio está condenado a
ficar para trás. O aprendizado se tornou essencial para a sobrevivência
das organizações”.4

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Peter Senge vai mais longe, afirmando que o ritmo da mudança no
mundo moderno é tão veloz que não vale a pena simplesmente aprender
como se adaptar.5 O aprendizado adaptativo precisa dar lugar ao apren‑
dizado prévio, que Senge chama de “aprendizado gerador”. Dessa forma,
as empresas podem ser mais proativas, em vez de apenas reagirem. Elas
podem identificar as necessidades latentes do consumidor para criar novos
mercados e explorar a aplicação de novas tecnologias para satisfazê­‑las, e
dessa forma conseguirão se manter à frente dos concorrentes, assegurando
453
uma longa sobrevivência. Nas expressões cunhadas por James March, as
empresas têm de se organizar de modo a poder “explorar” novas possibi‑

Organização para o apredizado


lidades e também “aproveitar” o conhecimento existente.6
Argumentou­‑se que, mais ou menos na mesma linha e devido a incer‑
tezas dos novos mercados e outras condições, as empresas estarão mais
bem equipadas para a concorrência concentrando­‑se em suas competên‑
cias essenciais.7 Tais competências são as habilidades ou talentos difíceis
de serem imitados pelos concorrentes; são alguns conhecimentos espe‑
cíficos da empresa e sua capacidade para renová­‑los. Diversos tipos de
conhecimento constituem as competências essenciais de uma empresa,
como os conhecimentos técnicos, organizacionais e estratégicos. Como
exemplo, temos a compreensão técnica especial ou aptidão no desenho
ou no projeto que empresta certa superioridade a produtos e serviços, o
talento organizacional de combinar e recombinar os ativos para aprovei‑
tar novas oportunidades e a mentalidade distinta que leva a estratégias
inovadoras. Parte desse conhecimento é tangível e explícito, embora uma
boa parte seja intangível e de natureza tácita.
A visão baseada em recursos chama atenção também para o signi‑
ficado dos processos pelos quais o conhecimento relevante se torna dis‑
ponível para uma empresa, o que pode acontecer por meio da aquisição
de fontes externas ou de sua criação dentro dela. Esses dois processos
são considerados aspectos centrais do aprendizado organizacional, mas
nenhum deles acontecerá com grande eficácia se não existirem certas con‑
dições de apoio. Uma dessas condições é a competência da própria equipe
de gestão da empresa para aprender e estimular o aprendizado por toda
a empresa. Por exemplo, a direção ou os executivos são receptivos aos
sinais do mercado e tem capacidade para orientar a reação de sua organi‑
zação a tais sinais? Outra condição é a capacidade da gestão de organizar
para o aprendizado, estimulando o livre fluxo da informação e reunindo
competências dentro e fora da empresa.

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Este capítulo enfoca as diversas maneiras pelas quais as empresas
podem se organizar e gerir para obter boa capacidade de aprendizagem.
Primeiro examinaremos o aprendizado dentro das empresas e depois pas‑
saremos ao papel da parceria por meio de alianças entre empresas. O
capítulo se encerra com as implicações disso tudo na prática.

13.2 A natureza do aprendizado organizacional:


454
principais distinções
parte iv  o desenvolvimento de organizações eficientes

Desde os anos 1970 a expressão “aprendizado organizacional” tem


sido usada para enfatizar o fato de que, assim como os indivíduos, as
organizações podem adquirir novos conhecimentos e novas habilidades
para melhorar e aperfeiçoar seu desempenho futuro. Nos últimos anos
tem havido muita discussão e apareceram muitos textos sobre o assun‑
to, grande parte dos quais reunidos em dois compêndios.8 Contudo, não
existe um modelo nem mesmo uma definição de aprendizado organiza‑
cional que seja de consenso geral. A maioria dos autores concorda que
o aprendizado organizacional contém elementos cognitivos e comporta‑
mentais, que, respectivamente, correspondem à compreensão e à capaci‑
dade de aplicar essa compreensão. Villinger afirma que o aprendizado nas
organizações é “o processo de desenvolver o potencial para aperfeiçoar as
ações (comportamento) por meio de melhor conhecimento e compreen‑
são (cognição)”.9 Embora esteja claro que o aprendizado é um processo,
alguns vão além e incluem seus resultados no escopo dessa expressão. Tal
extensão serve como lembrete de que uma organização não se beneficia
necessariamente da aquisição e compreensão do conhecimento a menos
que estes sejam aplicados e o “potencial para aperfeiçoar as ações” se
realize.
Villinger prefere usar a expressão “aprendizado nas organizações”
porque não se sabe se é possível dizer que as próprias organizações real‑
mente aprendem. A ideia não resolve o paradoxo de que “o aprendizado
organizacional não é meramente um aprendizado individual, ainda que
as organizações só aprendam por meio da experiência e das ações dos in‑
divíduos”.10 Num sentido mais rigoroso, o conhecimento só é criado por
indivíduos; uma organização pode apenas dar suporte a indivíduos criati‑
vos ou proporcionar contextos adequados para que estes criem o conhe‑
cimento. A noção de “criação de conhecimento organizacional” proposta

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por Nonaka e Takeuchi é uma indicação de como esse aprendizado in‑
dividual pode se tornar disponível e permanecer em toda a organização:
“A criação do conhecimento organizacional […] deve ser entendida como
um processo que amplifica 'organizacionalmente' o conhecimento criado
por indivíduos e o cristaliza como parte da rede de conhecimento da or‑
ganização. Esse processo ocorre em uma 'comunidade de interação' em
expansão que atravessa fronteiras intra e interorganizacionais”.11
Isso toca na questão muito prática de entender como um aprendizado
455
por indivíduos ou grupos de indivíduos pode se transformar em proprie‑
dade de uma organização. O desafio aqui é, em parte, saber como deixar

Organização para o apredizado


explícito, codificar, disseminar e guardar o conhecimento possuído pelos
membros de uma organização para que se torne um recurso coletivo.
Parte do problema é descobrir como reduzir as barreiras que as estrutu‑
ras, culturas e interesses da organização podem impor ao compartilha‑
mento do conhecimento e ao aprendizado.
A natureza do conhecimento reunido pelos membros de uma orga‑
nização ou aliança de organizações tem considerável significado para
o aprendizado. Um importante requisito para a transformação do co‑
nhecimento em propriedade organizacional é deixá­‑lo claro o bastante
para ser prontamente disseminado. Aqui, a distinção de Polanyi entre
conhecimento tácito e conhecimento explícito se torna pertinente.12 O
primeiro geralmente é considerado pessoal, intuitivo e característico de
um contexto; portanto, é difícil de verbalizar, formalizar e ser comunica‑
do a outros. Em compensação, o conhecimento explícito é especificado e
codificado; pode ser transmitido em linguagem sistemática formal. Para
que se torne disponível para toda a organização de forma que permita
sua retenção para uso futuro, o conhecimento tácito deve ser convertido
em uma forma codificada ou programável. Talvez não seja possível fazer
isso por razões técnicas ou porque as pessoas que detêm o conhecimento
tácito não desejam perder o controle sobre ele. Se for esse o caso, a única
maneira de tornar o conhecimento tácito disponível para uso na organi‑
zação será delegar a responsabilidade por tal ação aos interessados e/ou
persuadi­‑los informalmente a compartilhar seu conhecimento com outros
especialistas.
A natureza tácita de grande parte do conhecimento útil pode apre‑
sentar dois problemas para uma aliança estratégica ou outra forma de
cooperação interorganizacional, dependendo da intenção dos parcei‑
ros. O primeiro problema surge quando esses parceiros se consideram

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concorrentes. Se estiverem procurando aprender um com o outro em es‑
pírito competitivo, é provável que mantenham seu conhecimento em for‑
ma tácita como medida defensiva, porque isso significa que apenas seus
membros têm acesso a ele. Ao adotar essa tática, ambos ou todos os par‑
ceiros enfrentarão grandes dificuldades para transformar o conhecimento
que cada um detém tácita ou secretamente em uma forma utilizável para
atividades cooperativas. Evidentemente, isso se torna contraproducente
para o sucesso dessa cooperação, que quase certamente exige o aprendi‑
456
zado mútuo para realizar outros objetivos estratégicos.
O segundo problema aparece quando o conhecimento tácito detido
parte iv  o desenvolvimento de organizações eficientes

pelos membros de uma organização parceira é superado pelo novo co‑


nhecimento e por novos métodos trazidos por outro parceiro. Seu conhe‑
cimento tácito pode ter considerável significado para a própria identidade
pessoal e valor para um indivíduo. A consequente ameaça à identidade
pessoal e coletiva dos executivos do primeiro parceiro pode gerar bastan‑
te resistência à aceitação das novidades. Tal situação surge, muitas vezes,
nas alianças entre empresas de países em desenvolvimento e desenvolvi‑
dos, em que os últimos procuram trazer novas ideias e novos métodos
para a aliança.13
Outra distinção com importantes implicações para a prática é a
que existe entre os diferentes níveis do aprendizado organizacional
(Tabela 13.1). Tanto teóricos como autores que escrevem mais do pon‑
to de vista da prática de gestão identificaram três níveis principais de
aprendizado organizacional, de modo paralelo. A abordagem teórica
identifica aperfeiçoamentos rotineiros dentro dos limites do conheci‑
mento organizacional existente como nível inferior. O nível intermedi‑
ário envolve mudanças dos limites ou estruturas das bases existentes
de conhecimento, o que implica em “reenquadramento” de sistemas e
perspectivas organizacionais. O nível mais alto é o aprender a aprender
por processos cognitivos reflexivos, que é proativo e produtivo. Esses
três níveis de aprendizado correspondem aos termos “aprendizado
laço simples”, “aprendizado em laço duplo” e “deutero­‑aprendizado”
(ou “aprendizado secundário”), cunhados por Argyris e Schön.14
A abordagem voltada para a prática faz um distinção entre os níveis
técnico, sistêmico e estratégico do aprendizado organizacional. O nível
técnico trata da aquisição de técnicas novas, especiais, como para a men‑
suração de qualidade ou para fazer pesquisa de mercado. Isso correspon‑
de ao aprendizado rotineiro. O nível sistêmico trata do aprendizado para

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introduzir e trabalhar com novos sistemas e procedimentos organizacio‑
nais. Aqui o foco está num tipo de aprendizado que envolve a reestrutu‑
ração de relacionamentos e a criação de novos papéis, paralelo à ideia do
reenquadramento organizacional. O nível estratégico envolve mudanças
na mentalidade de executivos seniores, especialmente nos seus critérios de
sucesso organizacional e mapas mentais dos fatores significativos para a
obtenção do sucesso. Aqui a ênfase é um tanto diferente do “aprender a
aprender”, mas há um paralelo nos processos cognitivos reflexivos envol‑
457
vidos, com uma visão de gerar novas percepções e ser proativo. O nível
de aprendizado a que um projeto de colaboração aspira dependerá de

Organização para o apredizado


seu objetivo e do envolvimento e necessidades de seus parceiros. Níveis

Tabela 13.1  Níveis de aprendizado organizacional

Nível Abordagem teórica Abordagem empírica


Superior Aprendizado secundário – “deu‑ Aprendizado estratégico
tero aprendizado” Mudanças na mentalidade
Aprender a aprender para aper‑ gerencial, especialmente na
feiçoar a qualidade do processo compreensão dos critérios e
de aprendizado organizacional condições para o sucesso da
em si organização
Intermediário Reenquadramento – “laço Aprendizado sistêmico
duplo” Mudanças nos sistemas orga‑
Mudança dos referenciais nizacionais, com ênfase no
existentes na organização; aprendizado de como obter
questionamento dos siste‑ melhor integração das ativida‑
mas existentes; voltado para des da organização
a sobrevivência em ambientes
instáveis
Inferior Rotina – “ laço simples” Aprendizado técnico
Aperfeiçoamentos e ajustes Aquisição de novas técnicas
para otimizar o desempenho específicas, como a programa‑
dentro dos limites dos referen‑ ção avançada da produção, ou
ciais e sistemas existentes na técnicas de gestão, como testes
organização avançados de seleção

Fonte: Adaptado de Child, John; Faulkner, David. Strategies of Cooperation. Oxford: Oxford
University Press, 1998.

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superiores de aprendizado são mais difíceis de atingir, questão a qual
retomarei adiante.
Andreu e Ciborra mostram os processos dinâmicos que ligam esses
três níveis de aprendizado por meio de três “laços”.15 O esquema dos
autores está reproduzido na Figura 13.1. No nível inferior está o laço do
aprendizado rotineiro, que visa o domínio no uso dos recursos-padrão e
dá origem a práticas eficientes de trabalho. A maior parte do aprendiza‑
do nesse nível é de natureza técnica. Os autores citam como exemplo o
458
domínio de um gráfico por um indivíduo ou uma equipe em certo depar‑
tamento, para resolver um problema concreto.
parte iv  o desenvolvimento de organizações eficientes

A empresa pode internalizar novas práticas de trabalho na forma de


rotinas, e assim, elas se tornam parte de suas capacidades. Isso dá ori‑
gem ao laço do aprendizado de capacitação, em que novos métodos de
trabalho são combinados com as rotinas organizacionais. O processo de
aprendizado tem caráter sistêmico porque envolve a generalização dessas
práticas e técnicas de trabalho colocando­‑as em contexto mais amplo.
Isso não define apenas o que fazem e como funcionam as práticas de tra‑
balho, mas também as circunstâncias sob as quais é conveniente utilizá­
‑las e quem tem a autoridade ou competência para aplicá­‑las.
O terceiro laço, superior, é o estratégico. Nesse processo de apren‑
dizado as habilidades evoluem para habilidades essenciais, que di‑
ferenciam estrategicamente a empresa e proporcionam sua vantagem
competitiva. Essas qualificações são decisivas para a prosperidade da
empresa.
Enquanto o quadro de referências de Andreu e Ciborra mostra um
processo interno de ciclos ascendentes de aprendizado em uma única
empresa, a cooperação com organizações parceiras oferece o potencial
de aprender em todos os três níveis. Ela proporciona o acesso direto
e rápido a técnicas aperfeiçoadas e tecnologias especializadas, além de
facilitar a transferência e a internalização de novos sistemas, como a pro‑
dução enxuta e a gestão de qualidade total (TQM). A cooperação pode,
dessa forma, aperfeiçoar as capacidades de um parceiro, e elas assumirão
então maior significado se a cooperação abre também portas para novas
possibilidades estratégicas mediante, por exemplo, o auxílio na entrada
de mercados.

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Figura 13.1  Os laços do aprendizado organizacional em três níveis

Laço (formativo) organizacional

Eficiência dinâmica
CAPACIDADES ESSENCIAIS
Valiosas, raras etc. Essencial

Padrões de Permite
excelência 459
diferentes
Missão
Ambiente

Organização para o apredizado


laço estratégico da empresa
competitivo
Necessidade de Necessidade de
(compreender) (compreender)

Diante de Fundamental para


CAPACIDADES
Necessidade de
Desenvolver
laço do
aprendizado de
Rotinas Novas
rotinização
organizacionais rotinas
organizacionais

PRÁTICAS DE Necessidade
TRABALHO de novos

Uso e
laço do
aproveitamento de
aprendizado de
capacitação Necessidade de
novos

RECURSOS

Fonte: Andreu A; Ciborra, C. Core capabilities and information technology: an organizatio‑


nal learning approach. In: MOINGEON, B; EDMONDSON, A. (Org.). Organizational Learning and
Competitive Advantage, London. Sage, 1996. Figura 6.1, p. 126.

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13.3 Requisitos para o aprendizado
organizacional
A Figura 13.2 representa o processo de aprendizado em uma organi‑
zação e os requisitos para que seja bem­‑sucedido. Boa parte desse processo
existe também no aprendizado mediante alianças entre organizações, em‑
bora dificuldades adicionais possam surgir se os parceiros tiverem objetivos
diferentes de aprendizado e diferentes modos de organização, ou se hou‑
460
ver falta de confiança mútua. O requisito mais importante para o sucesso
do aprendizado organizacional é o apoio de uma liderança adequada e
parte iv  o desenvolvimento de organizações eficientes

apropriada. Isso significa que a gerência senior tenha realmente a intenção


de promover o aprendizado e aproveitar plenamente as oportunidades de
aprendizagem, promovendo uma cultura favorável ao aprendizado organi‑
zacional, e estabeleça arranjos organizacionais adequados. Esses arranjos
dizem respeito aos canais de comunicação, ao equilíbrio entre autonomia e
controle, à conexão entre fronteiras internas e externas e ao uso de equipes.

Figura 13.2  O processo de aprendizado nas organizações e as condições


necessárias para o sucesso

Competência

Liderança
(intenção de aprender, Criação de
organizar para aprender) Capacidade conhecimento
de aprender

Receptividade Experiência
e transparência anterior

Transformação
do conhecimento
em propriedade
organizacional

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Mesmo se a direção está empenhada no aprendizado e existem os
arranjos adequados, a organização deve ter capacidade de aprender antes
que o novo conhecimento possa realmente ser criado (ou importado) e
absorvido. Por fim, é essencial que esse novo conhecimento seja trans‑
formado em propriedade organizacional, o que requer armazenamento e
disseminação eficientes por toda a organização. O sucesso na realização
dessas etapas do processo de aprendizado proporcionará um feedback
positivo para a direção, e servirá para convencê­‑la do valor do aprendiza‑
461
do – incrementando sua intenção em promover o aprendizado organiza‑

Organização para o apredizado


cional no futuro. Embora todos esses requisitos pareçam bastante óbvios,
na prática não são muito fáceis de realizar.

13.3.1 Liderança
A liderança tem importante papel no aprendizado organizacional.
Muitas vezes é necessário que os gerentes seniores expressem claramente
sua firme intenção de promover o aprendizado necessário para quebrar a
filosofia e os métodos estabelecidos. Também é necessária certa liderança
para que o processo em si seja orientado para metas claras, coordenado,
baseado em canais de comunicação abertos e, não menos importante,
conte com os recursos necessários. Assim, há uma série de facetas na con‑
tribuição que a liderança pode fazer para um aprendizado organizacional
bem­‑sucedido.
Um requisito fundamental é que a direção expresse de forma cla‑
ra sua intenção de que a organização aprenda. Um dos exemplos mais
conhecidos de empresa que por muitos anos apresentou a firme inten‑
ção de aprender por meio da exploração de novas possibilidades é a 3M
Corporation. A 3M cria “projetos de garagem” para promover novas
ideias, um conceito que lembra as origens da Hewlett­‑Packard e da Apple
Computers. Na 3M, os empregados podem usar 15% de seu tempo de
trabalho para desenvolver novas ideias, questionar os métodos existen‑
tes e inovar. Uma clara intenção de aprender a partir de uma aliança é
ilustrada pelo caso de um fornecedor da indústria automobilística norte­
‑americana que, como aconteceu com muitos outros no setor, estava per‑
dendo sua fatia de mercado para empresas japonesas. A formação de uma
joint venture com uma empresa japonesa estreitamente ligada a um dos
maiores fabricantes de carros japoneses foi considerada pela direção da

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empresa americana uma excelente oportunidade de aprender algo sobre
os métodos orientais de gestão.
Os executivos também podem dar importante contribuição ao pro‑
mover uma cultura voltada para o aprendizado organizacional, trans‑
formando, se necessário, a barreira do legado do passado em ativo.
Frequentemente é possível romper barreiras por meio da comunicação
de uma ideia que vem de cima. Contudo, ao mostrar­‑se insuperável,
essa barreira deve ser destruída. Mudanças radicais que se distanciam
462
de culturas organizacionais enraizadas, às vezes chamadas de mudanças
que “rompem com paradigmas” ou “transformações”, precisam ser li‑
parte iv  o desenvolvimento de organizações eficientes

deradas pelo alto escalão (veja o Capítulo 12). Jack Welch desempenhou
esse papel na General Electric. O outro lado da moeda é que um líder
organizacional conservador, que se agarra a um conjunto estabelecido
de políticas e práticas isolando­‑se das realidades instáveis, pode impedir
que uma organização aprenda e se adapte. Assim, não é de surpreender
que mudanças radicais e turnarounds corporativos normalmente preci‑
sem de gerentes seniores experientes trazidos de fora, bem como do en‑
volvimento direto de seus executivos em todos os aspectos do processo.
A introdução da mudança radical ilustra uma conexão estreita entre
a liderança da organização e o aprendizado. Entretanto, uma cultura que
apoie o aprendizado deve ser sustentada no cotidiano. Aqui podem surgir
tensões entre o controle gerencial e a liberdade para se explorar alterna‑
tivas, que é uma condição para o aprendizado efetivo nas organizações.
Assim, outro papel da liderança na promoção do aprendizado organizacio‑
nal é estabelecer uma cultura que garanta a autonomia necessária para es‑
timular insights e a criação de novo conhecimento, dentro de um contexto
de esforço coletivo direcionado para o desenvolvimento de toda a organi‑
zação. Isso indica a necessidade de que a direção assegure que os devidos
arranjos organizacionais estejam prontos para dar apoio ao aprendizado.

13.3.2 Organizar para aprender


COMUNICAÇÃO
Três canais de comunicação e relacionamentos entre as fronteiras in‑
ternas e externas de uma organização são essenciais para o processo do
aprendizado, conforme mostra a Figura 13.3. É indispensável que esses
três canais sejam mantidos abertos e efetivos. O primeiro canal é vertical
e os outros dois são mais horizontais.

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„„ O primeiro canal é entre a direção e outros grupos mais especia‑
lizados na organização. Há uma divisão de função, pelo fato de
a direção normalmente estar preocupada com o conhecimento
estratégico, enquanto os outros grupos trabalharão mais com o
conhecimento organizacional e técnico. Cada área de conhecimen‑
to deve ser informada pelas outras. Observe que o grau de apoio
que a direção oferece às atividades e sistemas de aprendizado em
níveis inferiores de uma organização pode ter impacto importante.
463
„„ O segundo canal envolve a integração das contribuições em termos

Organização para o apredizado


de conhecimento entre as diferentes especialidades e unidades em
uma organização. É indispensável para a operação dos bancos de
dados de conhecimento e para um trabalho efetivo de equipe entre
departamentos e disciplinas.

Figura 13.3 Os três canais de comunicação e relacionamento necessários


para um aprendizado organizacional adequado (a comunicação entre
grupos em outras partes da rede a que pertence a organização, como
fornecedores e institutos de pesquisa, podem ter importantes resultados
para o aprendizado da organização)

A organização

A direção Clientes
Fornecedores
Parceiros de
rede
Equipes Concorrentes
de projeto etc. Institutos de
pesquisa

Fonte: Child, John; Heavens, Sally. The social constitution of organizations and its impli‑
cations for organizational learning”. In: Dierkes, Meinolf; Antal, Arianne B.; Child, John;
Nonaka, Ikujiro (Org.). The Handbook of Organizational Learning and Knowledge. Oxford:
Oxford University Press, 2001, p. 308­‑326.

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„„ O terceiro canal promove os fluxos de informação e conhecimento
entre as fronteiras de uma organização por meio da comunicação
e inteligência com outras organizações e grupos, entre os quais
clientes, fornecedores, parceiros de aliança e rede, concorrentes e
institutos de pesquisa. Os fluxos de conhecimento podem ocorrer
em qualquer nível da organização, embora os fluxos relevantes
para o aprendizado estratégico geralmente se concentrem mais nos
níveis superiores e os relevantes para o aprendizado organizacio‑
464
nal e técnico, nos níveis abaixo.
parte iv  o desenvolvimento de organizações eficientes

A informação é indispensável ao aprendizado. Por essa razão, alguns


autores defendem a ideia de uma “redundância de informação” ou “in‑
formação além das necessidades operacionais imediatas dos membros da
organização”.16 Ter canais efetivos para a informação circular e ser co‑
municada é então um requisito essencial para que ocorra o aprendizado
organizacional.

CONTROLE E AUTONOMIA
O segundo aspecto importante de organizar para aprender diz res‑
peito ao difícil relacionamento entre autonomia e controle. A liderança
gerencial implica certo grau de direcionamento e controle de cima para
baixo, o que talvez não seja fácil de conciliar com a autonomia e abertu‑
ra normalmente vistas como as condições que estimulam o aprendizado
criativo. É verdade que as pressões para a mudança e reforma que natu‑
ralmente resultam do aprendizado organizacional podem ser vistas como
um desafio para a liderança senior. A tensão inerente entre liderança e
autonomia concedida pode então ser um problema para o aprendizado
organizacional.
Tal problema muitas vezes surge em função da questão da informa‑
ção e sua disponibilidade. A questão de qual informação estará disponí‑
vel e para quem dentro da empresa implica um elemento de escolha. Essa
escolha é uma prerrogativa da direção, já que é ela quem cria e propor‑
ciona os recursos para os canais de informação. Ao mesmo tempo, os
contextos organizacionais que mudam rapidamente, caracterizados por
uma crescente descontinuidade e turbulência, tornam ainda menos viável
que antes a possibilidade de a direção reter ou até mesmo compreender
toda a informação relevante para adaptar a organização a essas condições

Book_Organizaçoes.indb 464 16/9/2011 16:24:01


instáveis. Embora seja o papel dela assegurar que a organização tenha
uma orientação de longo prazo apropriada, o aprendizado organizacio‑
nal requer certo grau de iniciativa cognitiva e comportamental por parte
dos membros da organização que estão em contato mais estreito com os
eventos e desenvolvimentos relevantes. O desafio para a liderança facili‑
tar o aprendizado organizacional está, portanto, na manutenção de uma
combinação adequada do controle, sob a forma de orientação e apoio e
da autonomia necessária para motivar os que geram o conhecimento e
465
estimular o livre fluxo da informação. Deve­‑se obter uma “autonomia
controlada”.

Organização para o apredizado


O controle pode ser do tipo “direção e apoio”, em vez de apenas
restritivo. Uma espécie de direção que dê suporte ao aprendizado pode
ser posta em prática por meio da alocação de recursos essenciais para
projetos de criação de conhecimento: pessoal, dinheiro, equipamento e
tempo. Este último é especialmente significativo para o aprendizado, que
requer um duplo investimento de tempo. O tempo que o pessoal leva para
assimilar e trabalhar uma nova informação, ou aprender novas práticas,
é também tempo “perdido” para a organização, pois os que aprendem se
afastam de suas funções e rotinas usuais para aprender.
É necessário assegurar ao aprendizado organizacional orientação su‑
ficiente para que ele seja considerado significativo, e assim, adequada‑
mente apoiado; ao mesmo tempo, deve-se garantir suficiente autonomia
ao processo, de modo que ele seja capaz de produzir novos insights. Por
exemplo, uma empresa britânica de fornecimento de alimentos e bebidas
fez considerável economia em custos de compra, reduzindo o número de
fornecedores sem sacrificar a qualidade dos alimentos, quando um novo
diretor­‑executivo estabeleceu como objetivo essa economia; mas deixou
nas mãos de equipes de chefs, gerentes de restaurante e demais empre‑
gados com conhecimento operacional a decisão de quais fornecedores a
empresa deveria manter.17
O conceito de controle interativo oferece uma abordagem constru‑
tiva de retenção do controle e, ao mesmo tempo, abertura de diálogo
organizacional para estimular o aprendizado.18 Uma gestão que adota
essa abordagem procura reconciliar a necessidade simultânea de controle
e criatividade em uma organização de aprendizagem. Isso deve ser feito
simultaneamente com políticas ativas para crenças (comunicando mis‑
sões e valores essenciais), limites (especificando e reforçando as regras do
jogo) e diagnósticos (criando e apoiando metas claras). Tal abordagem

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é um esforço de combinar processos criativos de aprendizado no nível
operacional com a manutenção, pela direção, de uma rede organizacional
de comunicação, por meio da qual essas experiências idiossincráticas de
aprendizado se tornam disponíveis para outras partes da organização. A
3M Corporation mostra como a direção pode promover dinamicamente
o aprendizado e a inovação com esse tipo de controle interativo (veja o
Quadro 13.1).
Como liderança também denota status, poder e privilégio, os que têm
466
a autoridade estão sempre procurando defender suas posições; com isso,
podem eliminar propostas que vêm de baixo e que, ao mesmo tempo,
parte iv  o desenvolvimento de organizações eficientes

são oportunidades para a organização aprender e questionar a situação


presente. Ao exercer o direito de escolher quanto poder será delegado
para os níveis abaixo, a liderança de uma organização pode determinar
quantas oportunidades de aprendizado estarão disponíveis para os su‑
bordinados. Quando fazem essa escolha, alguns executivos ainda estão
de acordo com o preceito da gestão científica, em que o pensar deve estar
seguido do fazer. Essa tendência e a maneira como ela pode pesar con‑
tra o aprendizado são ilustradas pelo caso de um grande fabricante de

Quadro 13.1  Autonomia e aprendizado na 3M

“Gerações da direção na 3M viram sua organização crescendo de baixo – a equi‑


pe de projeto – para cima. Sob um princípio que a empresa chama de ‘cresça e
divida’, equipes de projeto competentes, consistindo em um empreendedor com
uma ideia e um pequeno grupo que acredita nela, crescem e se transformam
em departamentos […] A direção organizou amplas redes colegiadas em que os
cientistas de toda a empresa podem solicitar assistência e conselhos […] Roti‑
neiramente essa rede aperfeiçoa novas tecnologias em duas ou três divisões e as
aplica em inúmeros mercados. Esse processo de criação da competência muito
bem lubrificado se tornou a verdadeira competência essencial da 3M.”
Em empresas como a 3M, “a direção delega às unidades operacionais o desafio
de criar as competências necessárias para buscar oportunidades locais. A direção
limita seu papel a providenciar que essas competências sejam compartilhadas por
meio de fluxos de recursos, conhecimento e pessoas entre as unidades”.

Fonte: Goshal, Sumantra; Bartlett, Christopher. Changing the role of top management:
beyond structure to processes. Harvard Business Review, 73(1), 1995, p. 86­‑96. As citações fo‑
ram tiradas das p. 89­‑94.

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automóveis apresentado no capítulo anterior (Quadro 12.1). Tal caso
mostra o potencial que os consultores externos tem de promover o apren‑
dizado organizacional e também como suas recomendações podem ser
rejeitadas para se manter o poder administrativo. Ele ressalta a relação
entre aprendizado, diferenciação vertical e controle. O controle pode ser
associado prontamente à manutenção da diferenciação vertical, e certa‑
mente esse foi o ponto de vista da direção da empresa automobilística.
Por outro lado, esse também é o ponto de vista de empregados que res‑
467
tringem o acesso da direção a informações sobre operações e qualidade.
Uma forma “orgânica” de organização tem mais probabilidade de

Organização para o apredizado


levar ao aprendizado que a organização convencional hierárquica mais
“mecânica” (veja o Capítulo 2, Tabela 2.1). A razão é que uma forma
orgânica facilita o cruzamento de níveis e limites organizacionais e a co‑
municação da informação até mesmo ao ponto da resundância.19 Uma
forma hierárquica não conduz a um aprendizado eficaz, especialmente
nas condições contemporâneas. O conhecimento relevante e a especiali‑
zação hoje estão amplamente distribuídos entre os grupos que fazem par‑
te das organizações. Portanto, os líderes precisam conciliar a necessidade
de controle e autonomia de modo aceitável para esses grupos, de forma a
despertar e incentivar uma contribuição positiva por parte dessas pessoas
para o processo de aprendizado.
Questões de autonomia e controle chamam a atenção para como a
diferenciação vertical das empresas pode influenciar sua capacidade de
estimular o aprendizado. Naturalmente, as organizações também são di‑
ferenciadas horizontalmente por limites internos e externos. Uma ênfase
vertical na hierarquia encoraja a separação entre as linhas de reportação
entre unidades organizacionais, e assim torna mais difícil integrá­‑las ho‑
rizontalmente. No entanto, o aprendizado organizacional requer essa co‑
municação e cooperação horizontal tanto entre os limites internos quanto
externos, como indicou a Figura 13.3. Em outras palavras, esses limites
devem ser gerenciados.

GESTÃO E INTEGRAÇÃO DOS LIMITES INTERNOS


A menos que sejam extremamente pequenas, as empresas normalmen‑
te desenvolvem limites internos distinguindo diferentes grupos, departa‑
mentos ou subunidades especializadas. Cada uma dessas especializações
terá o próprio conjunto de competências e conhecimento. Contudo,
grupos especializados atribuem valores próprios à sua especialidade, e

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os articulam por meio de códigos e terminologia próprios. Lawrence e
Lorsch observaram que a especialização nas organizações tende a estimu‑
lar a “diferença na orientação cognitiva e emocional entre os executivos
em diferentes departamentos funcionais”.20 O pessoal especializado pode
permanecer apegado a seus códigos e linguagem como reflexo de sua iden‑
tidade social e valor de mercado fora de uma organização específica. No
caso de grupos profissionalizados, ser membro de instituições ocupacio‑
nais externas reforça essa identidade separada. Portanto, talvez seja difícil
468
conectar limites internos e integrar as contribuições de grupos diferentes
para o aprendizado organizacional, devido aos contrastes das tecnologias
parte iv  o desenvolvimento de organizações eficientes

que eles oferecem e dos objetivos que eles atribuem ao processo.


Não obstante, uma empresa deve se basear no conhecimento e nas
competências especializadas dos diferentes grupos existentes a fim de
oferecer contribuições substantivas e insights necessários ao aprendiza‑
do. Por essa razão, um aprendizado organizacional efetivo requer um
certo nível de diferenciação e um nível complementar de integração – o
equilíbrio adequado entre ambos depende de fatores contextuais, como
a complexidade, a velocidade da mudança e as pressões competitivas no
ambiente da organização. Em suas investigações, Lawrence e Lorsch che‑
garam à conclusão que as organizações de alto desempenho eram as que
obtiveram esse equilíbrio ideal.
No entanto, não há nenhuma garantia de que a integração nos limites
internos possa sempre ser entendida como fonte de aprendizado coletivo.
Por exemplo, suas normas e métodos podem tornar os indivíduos e grupos
menos dispostos ao aprendizado. Conflitos entre os grupos que venham a
surgir com a diferenciação também podem constituir um impedimento ao
aprendizado organizacional. Estudos de como as organizações do setor
público e do setor privado em serviços europeus reagiram à disponibili‑
dade de nova tecnologia da informação demonstram que o aprendizado
pode ser contestado ou colaborativo entre os diferentes grupos da orga‑
nização envolvidos, como especialistas técnicos, direção, especialistas em
pessoal e representantes dos empregados.21 A introdução de poderosos e
novos sistemas de tecnologia da comunicação e informação integrados
abre a possibilidade de inovações radicais na organização do trabalho e
na prestação de serviços. Portanto, expõe os interesses e pontos de vista
conflitantes de diferentes grupos ocupacionais, que de outro modo per‑
maneceriam relativamente subjugados.

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A integração das contribuições para o aprendizado que as subuni‑
dades organizacionais podem dar exige boa vontade da parte delas em
compartilhar com as outras a interpretação e uso de seu conhecimen‑
to especializado. Uma condição para isso acontecer é a disponibilida‑
de para se comunicar abertamente com um nível mínimo de respeito e
confiança mútuos, embora a comunicação aberta em si não baste para
solucionar conflitos subjacentes. Executivos são as pessoas­‑chave para
mediar o processo de diferenciação/integração e para resolver conflitos
469
entre os departamentos. Eles têm a responsabilidade de identificar os
membros da organização que têm competências apropriadas, reuni­‑los

Organização para o apredizado


e ajudá­‑los a alinhar as diferentes interpretações que eles aplicam ao
conhecimento.
Outro tipo de integração também promove o aprendizado – é a do
staff com a direção. Grande parte da expertise dos profissionais mais
qualificados se baseia no conhecimento tácito, que é difícil de ser trans‑
formado em rotinas organizacionais. Esses profissionais tipicamente
fazem um julgamento baseado em uma expertise que não pode ser ime‑
diatamente traduzida em procedimentos sistematizados e racionalizados
ou delegada a outros. Se o julgamento e o conhecimento profissional
podem ser associados aos dos executivos, a capacidade conjunta deles
para aprender e tomar decisões mais bem embasadas deve melhorar.
Como sempre, a dificuldade está em como fazê­‑lo. Isso requer políticas
de desenvolvimento de recompensa e carreira para motivar profissionais
e o staff especializado a contribuir com sua especialidade, e mecanis‑
mos como forças­‑tarefa para reunir e apropriar essa expertise como uma
competência organizacional.
A integração é, então, essencial para o aprendizado organizacio‑
nal. Uma organização costuma saber menos que a soma de seus mem‑
bros. A primeira etapa é reunir os diversos corpos de conhecimento
especializado para maximizar seus recursos de conhecimento. A etapa
seguinte é promover a colaboração entre os que detêm o conhecimen‑
to, de modo a criar novos insights para que a organização, em termos
de conhecimento, se torne mais que a soma de suas partes. O uso de
equipes pode ter papel essencial para alcançar essa sinergia. Em geral,
as equipes são usadas para promover o aprendizado, reunindo pessoas
com o conhecimento e por meio da colaboração entre os membros de
organizações parceiras.

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EQUIPES
O Capítulo 4 descreveu os diversos tipos de equipe, seus objetivos e
as condições sugeridas pela pesquisa e pela experiência para um trabalho
em equipe bem­‑sucedido. Equipes multifuncionais ou multiespecializadas
são provavelmente os tipos mais utilizados com o propósito de alcançar
o aprendizado organizacional. Há três temas dominantes na discussão
sobre como as equipes promovem o aprendizado e a inovação:22

470 1. A importância da tarefa dada à equipe. A tarefa é suficientemen‑


te complexa para criar oportunidades para a criatividade e, ao
parte iv  o desenvolvimento de organizações eficientes

mesmo tempo, realizável do ponto de vista das capacidades da


equipe e do tempo e de outros recursos proporcionados para sua
realização?

2. A diversidade na equipe. A equipe conta com suficiente diversidade


de conhecimento e capacidades entre seus membros para que estes
tenham boa chance de gerar novas ideias e novos conhecimentos?

3. A integração da equipe. Como os membros de uma equipe podem


ser estimulados para trabalhar em conjunto de modo integrado, de
forma que possam aproveitar suas capacidades e conhecimentos
diversificados?

Há duas etapas do aprendizado organizacional no processo de ino‑


vação: uma criativa e uma de implementação da inovação. Essa dis‑
tinção é importante para a maneira como as equipes empenhadas no
aprendizado são gerenciadas. Enquanto uma equipe está na fase de gerar
novas ideias ou propostas criativas, as restrições externas podem ini‑
bir seu progresso. Isso pode acontecer mediante o bloqueio de possíveis
opções criativas ou mediante o reforço de diferentes prioridades que os
membros trazem para a equipe, tornando­‑se muito difícil a obtenção
do consenso. Entretanto, quando se trata de orientar novas ideias para
uma possível aplicação, é indispensável que entrem na discussão os fatos
externos. Por exemplo, um novo produto corresponderá à demanda do
mercado? Será que ele pode ser fabricado em níveis aceitáveis de custo e
qualidade? O equilíbrio entre exclusão e intromissão dessas considera‑
ções externas durante a vida de uma equipe empenhada no aprendiza‑
do inovador levanta questões cruciais para sua devida participação nas
diferentes etapas do trabalho, para seu relacionamento com os gestores

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para prestar contas e para os pressupostos que orientam as prioridades e
a esfera de suas atividades.

GESTÃO DE FRONTEIRAS EXTERNAS


O terceiro canal de comunicação mostrado na Figura 13.3, que dá
suporte ao aprendizado organizacional, é o que protege a informação e
o conhecimento relevantes através de fronteiras “externas” de uma orga‑
nização. Emergem tensões decorrentes do paradoxo de que as fronteiras 471
externas de uma empresa devem ser mantidas, ao mesmo tempo, perme‑

Organização para o apredizado


áveis. Essas fronteiras são muros em torno das realidades contratuais e
legais da propriedade e do emprego. Elas definem os limites de direitos
e obrigações e também demarcam uma identidade e cultura corporativa
comum. Ao mesmo tempo, essas fronteiras devem estar sempre abertas e
as informações serem transferidas através delas, para que o aprendizado
organizacional possa ser estimulado e alimentado pelos fatos externos.
É vital para a capacidade de aprender e inovar da empresa que ela
tenha acesso ao conhecimento e a informações externas. Ela pode obter
essas informações ou conhecimento por meio de contatos próprios diretos
ou formando alianças com outras empresas que os detenham. Em seto‑
res como biotecnologia, cuja base de conhecimento é complexa e está em
permanente expansão e cujos especialistas estão amplamente dispersos, as
alianças podem ser decisivas para a obtenção de informações e conheci‑
mento.23 O aprendizado nas alianças entre as empresas será discutido mais
adiante, em outra seção. A informação externa interessa a todos os níveis
da atividade organizacional: o estratégico, o organizacional e o técnico.
Por meio de suas conexões externas, como a participação no conselho de
outras empresas, associações de comércio e indústria e grupos de trabalho
do governo, os executivos seniores podem ser um importante canal para a
entrada de informações relevantes para o aprendizado estratégico. No nível
técnico, que tem o foco de boa parte da pesquisa sobre a inovação, espe‑
cialistas e equipes de projeto de P&D devem manter boas conexões com as
fontes de informação técnica, como universidades e institutos de pesquisa.
Há importantes paralelos entre os processos de vincular as fronteiras in‑
ternas e externas das organizações, e o uso de equipes com participação
conjunta é um deles. Equipes de desenvolvimento ou projeto com membros
de diversas organizações que colaboraram entre si se tornam cada vez mais
comuns.

Book_Organizaçoes.indb 471 16/9/2011 16:24:01


Os inputs para o processo de aprendizado de uma empresa além de
suas fronteiras variam de dados mal estruturados e dispersos a conjun‑
tos de conhecimento altamente codificados. Quanto menos codificado e
mais tácito o conhecimento, mais difícil será para a organização que o
recebe compreendê­‑lo, mesmo se pode ter acesso a ele em primeiro lugar.
Uma das razões pelas quais as empresas são incentivadas a trabalhar em
estreita associação em joint ventures ou outras formas de colaboração é
porque isso aumenta a oportunidade de acesso e utilização do conheci‑
472
mento tácito, não codificado, detido e internalizado por seus parceiros. A
alternativa é recrutar pessoal de outras organizações que têm esse conhe‑
parte iv  o desenvolvimento de organizações eficientes

cimento, e enxertá­‑lo no sistema da “casa”.


O conhecimento explícito, no entanto, nem sempre pode ser im‑
portado através das fronteiras de uma organização. Isso depende
muito da capacidade que a organização receptora tem para absor‑
ver esse conhecimento, especialmente de sua experiência para inter‑
pretá-lo, armazená-lo e utilizá­‑lo. Podem surgir problemas porque
diferentes organizações codificam o conhecimento para atender aos
próprios objetivos. O conhecimento importado pode estar codificado
de forma específica para determinado objetivo ou situação que não
sirva para a organização receptora. Nesse caso, será necessário voltar
aos princípios mais abstratos que são a base desse conhecimento e
criar uma ponte para sua reaplicação e codificação no novo contexto
organizacional.
Os “boundary spanners”, profissionais que fazem a interface entre
a empresa e seu ambiente externo, têm papel decisivo no processo de
transferência de informação e conhecimento para uma organização. Essa
atividade envolve acessar o conhecimento externo, interpretá-lo, refiná-lo
e direcioná­‑lo a outros membros da organização (como a outros partici‑
pantes de uma equipe de projeto e a executivos apropriados). Contudo,
a Figura 13.3 já indicou que as fronteiras externas e internas devem ser
vinculadas mediante informações coletadas externamente, de modo a
contribuir para o aperfeiçoamento do conhecimento interno.
Tal requisito se traduz em três processos necessários:

1. reunir informação externa;

2. comunicar a informação através das fronteiras horizontais inter‑


nas, em geral por meio de equipes multifuncionais;

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3. interpretar a informação para benefício dos níveis superiores da
gerência.
Um problema que normalmente ocorre é que as pessoas que fun‑
cionam bem como “boundary spanners” externos, porque têm a mesma
especialização e compartilham uma identidade ocupacional com seus in‑
formantes, podem enfrentar considerável dificuldade ao atuar nos limites
internos com os colegas que não compartilham dessas características.

473
13.3.3 Capacidade para aprender

Organização para o apredizado


A capacidade de aprendizagem de uma organização é determinada por
uma combinação de fatores: (1) a transferibilidade do conhecimento recebi‑
do de fora; (2) a receptividade de executivos e empregados ao novo conhe‑
cimento; (3) sua competência para entender e absorver esse conhecimento; e
(4) sua capacidade para aplicar essas lições a partir de experiência anterior.

transferibilidade
Ao contrário dos outros três fatores enumerados, a transferibilidade
refere­‑se à qualidade do conhecimento em si, e não a algum aspecto da
organização que supostamente aprende. Essa capacidade diz respeito à
facilidade com que um tipo de conhecimento pode ser transferido de uma
parte a outra, seja de fora para dentro de uma organização ou de uma
de suas unidades para outra. O conhecimento explícito, como as especi‑
ficações técnicas de um produto, é relativamente fácil de transferir e ser
absorvido. Isso não acontece com o conhecimento tácito, que é menos
codificado que o conhecimento explícito.

receptividade
Quanto mais receptivas forem as pessoas para o novo conhecimento,
mais é provável que elas aprendam. Quando os membros de uma orga‑
nização adotam uma atitude de estudantes em relação aos outros que
podem repassar novos conhecimentos, estão sendo mais receptivos a no‑
vos insights que se presumirem que já possuem técnicas superiores e ca‑
pacidade de organização e de avaliação estratégica. Por exemplo, alguns
executivos cometem um equívoco ao assumirem que não podem aprender
técnicas motivacionais úteis do pessoal do RH porque têm contato diário
estreito com seus subordinados e, “portanto”, sabem a melhor maneira

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de motivá­‑los. Da mesma forma, algumas empresas multinacionais insen‑
satamente não seguiram as recomendações de seus parceiros locais sobre
a melhor maneira de se relacionarem com os empregados do governo no
país anfitrião, que em geral exercem influência fora do comum sobre as
condições para fazer negócios.
Muitos fatores podem influenciar a receptividade de uma organiza‑
ção parceira. As empresas que estão ficando para trás em geral não se en‑
tusiasmam muito em aprender com outras mais bem­‑sucedidas, mesmo
474
entrando em alianças com elas, e também não se sentem muito confiantes
de que realmente possam aprender. Sua tendência é prender­‑se a culturas
parte iv  o desenvolvimento de organizações eficientes

e comportamentos profundamente enraizados, que dificultam bastante a


tarefa de se abrir a novos conhecimentos. Ao apegar­‑se ao passado, elas
são incapazes de desaprender, um pré­‑requisito para aprender.
A receptividade depende também da disponibilidade de tempo e recur‑
sos para se engajar nos processos de reunir conhecimento e internalizá­‑lo
nas rotinas da própria organização por meio do treinamento de pesso‑
al e investimento em novas instalações. O paradoxo da deterioração da
competitividade, que é composto ao mesmo tempo por uma pressão para
aprender e pela restrição à capacidade de aprender, é decisivo para as
empresas com desempenho fraco. Se uma empresa estiver muito atrás de
seus concorrentes ou parceiros em termos de habilidades e competências
necessárias para absorver o novo conhecimento, pode ser muito difícil
acabar com essa diferença.

competência
A “capacidade de absorção” de uma empresa é uma competência
decisiva para sua capacidade de aprendizado e inovação.24 A capacidade
absortiva é a aptidão de uma empresa para reconhecer o valor de uma
nova informação externa, de assimilá-la e aplicá­‑la para fins comerciais.
Essa aptidão é em grande parte uma função do nível do conhecimento já
existente na empresa e da posse das habilidades necessárias para utilizá­
‑lo. Por isso, a competência existente facilita a aquisição de novas com‑
petências – e por essa razão, se não houver habilidade para manipular a
nova informação, o treinamento do pessoal para adquiri­‑la deveria então
ser prioridade.
Quando a empresa quer aproveitar as oportunidades para aprender
oferecidas pela cooperação com outras organizações, é necessário haver
competência em todos os três níveis do conhecimento: o estratégico, o

Book_Organizaçoes.indb 474 16/9/2011 16:24:02


organizacional e o técnico. No nível estratégico, a colaboração que é con‑
siderada periférica para a estratégia geral de um parceiro provavelmente
significará relativamente poucas oportunidades para a transferência de
aprendizado resultante da colaboração de volta à organização principal
do parceiro. Essa tendência surge porque a percepção da falta de impor‑
tância estratégica reduz o grau de interação entre o parceiro e a joint
venture. Um problema similar aparece quando um parceiro falha na apre‑
ciação das amplas lições estratégicas que pode extrair da cooperação, no
475
lugar das lições restritas decorrentes de questões relativamente menores.
Para a General Motors, por exemplo, sua joint venture NUMMI (New

Organização para o apredizado


United Motor Manufacturing Inc.) com a Toyota criou a expectativa de
que o que aprenderia com a Toyota se restringiria ao know­‑how de pro‑
dução de carros compactos. Em consequência, embora as lições a serem
aprendidas fossem na realidade de relevância geral, elas não puderam ser
aplicadas imediatamente à General Motors como um todo.25
A competência no nível organizacional é necessária de forma a se
utilizar de modo inovador a nova tecnologia ou o novo conhecimento
adquirido. Por exemplo, a introdução da informática na indústria do
papel e celulose surgiu por meio da estreita cooperação entre fabricantes
de papel e fornecedores de sistemas. Ela abriu possibilidades inteiramen‑
te novas no planejamento da organização da fábrica, com a delegação
do poder de decisão e o enriquecimento das funções dos trabalhado‑
res. Ao reunir todas as informações sobre as operações da fabricação
de papel em uma sala de controle, a nova tecnologia permitiu que uma
pequena equipe operasse toda a fábrica, eliminando a antiga estrutura
intermediária de gestão. Contudo, a capacidade dos fabricantes de papel
de aproveitar plenamente esse potencial dependia da sua capacidade de
conceber e aceitar mudanças radicais de papéis e relacionamentos. Na
prática, essa competência e visão organizacional estavam frequentemen‑
te ausentes.
É evidente que os membros de uma organização precisam também
ter as habilidades necessárias para absorver e usar o novo conhecimento
tecnológico. Diante da complexa natureza de muitas tecnologias moder‑
nas e com a importância de alocá­‑las levando em conta as motivações
dos empregados e suas aptidões “humanas”, competência técnica multi‑
disciplinar é necessária. No caso de empresas ou alianças internacionais,
a incompetência linguística pode impor limitações sérias à capacidade de
aprender com suas filiais ou parceiros locais. Em algumas alianças entre

Book_Organizaçoes.indb 475 16/9/2011 16:24:02


empresas ocidentais e japonesas, o fato de quase todos os empregados
das em­presas ocidentais desconhecerem a língua japonesa limitou seu
acesso ao know­‑how do parceiro japonês. Os japoneses não tinham essa
incompetência linguística no mesmo grau e se beneficiaram do acesso que
o domínio da língua lhes proporcionava em relação ao conhecimento de
seus parceiros.26

experiência prévia
476
Dois aspectos da experiência facilitam o aprendizado. O primeiro é a
experiência de ter aprendido em ocasiões anteriores e compreender como
parte iv  o desenvolvimento de organizações eficientes

ela aconteceu. O segundo é a experiência de ter aprendido por meio da


colaboração com antigos parceiros e os “ativos de relacionamento” que
se acumulam com isso.
A experiência anterior de aprendizagem bem sucedida serve para
melhorar a capacidade de uma organização aprender no futuro, desde
que as lições dessa experiência sejam transmitidas às pessoas envolvidas
em projeto subsequente de aprendizado. A experiência prévia também
deve ser relevante para a nova situação.27 Se as circunstâncias de um
projeto subsequente de aprendizado forem muito diferentes, a incorpo‑
ração formal da experiência anterior nas rotinas de uma organização
pode até criar uma barreira para o novo aprendizado. Muitos autores
especializados em aprendizagem recomendam a criação de uma “capa‑
citação para o aprendizado constante”, que é a aptidão para aprender
com a experiência e, ao mesmo tempo, adaptá­‑la a novas circunstân‑
cias. Os procedimentos organizacionais mencionados, que estimulam
e apoiam o aprendizado na organização reduzindo barreiras internas e
externas, são essenciais para a existência dessa capacidade de aprendi‑
zado constante.
A experiência de trabalhar com outras organizações em parcerias de
longo prazo pode criar ativos de relacionamento para os parceiros. Eles
teriam, assim, a oportunidade de adquirir alguma compreensão dos pon‑
tos fortes de cada um e, possivelmente, estabeleceriam certo grau de con‑
fiança mútua. O fato de já terem passado pelo período inicial de trabalho
em conjunto gerará certo compromisso entre as partes, o que servirá para
melhorar a eficácia de sua colaboração para gerar aprendizado, quer pela
troca de conhecimento, quer por meio da criação de novo conhecimento.
Do ponto de vista da promoção do aprendizado, no final desse processo
os parceiros não devem terminar muito semelhantes um ao outro. Na

Book_Organizaçoes.indb 476 16/9/2011 16:24:02


verdade, o fato de terem competências muito diferentes é o que aperfei‑
çoa a oportunidade de aprendizado mútuo.

13.3.4 Transformação do conhecimento em


propriedade organizacional
Nonaka e Takeuchi, baseados em histórias de inovações bem­
‑sucedidas dos japoneses, ressaltam o fato de que a transformação do
477
conhecimento em uma forma que as organizações podem usar é um “tra‑

Organização para o apredizado


balho de interação dinâmica e constante entre o conhecimento tácito e
o conhecimento explícito”. Para que esse processo funcione, segundo os
dois autores, devem ser criadas condições para ocorrerem quatro diferen‑
tes modos de transformação do conhecimento:28

1. Socialização (conhecimento tácito  conhecimento tácito): “expe‑


riências compartilhadas criam conhecimento tácito, como habilida‑
des técnicas e modelos mentais compartilhados”. Aqui, membros
da organização que já adquiriram uma compreensão pessoal de
seu trabalho e refinaram as habilidades ao desempenhá­‑lo podem
transmiti­‑las a outros, o que envolve observação e explicação. Os
estágios na indústria e o treinamento nos escritórios de advocacia
são métodos tradicionais para transmitir o conhecimento tácito
aos novos aprendizes – eles disseminam o conhecimento tácito
mais extensamente em uma organização.

2. Externalização (conhecimento tácito  conhecimento explícito):


“um processo de articular o conhecimento tácito em conceitos
explícitos”. Esse tipo de conversão do conhecimento é visto tipica‑
mente na criação de conceitos que oferecem acesso mais amplo ao
conhecimento e também o associam a aplicações. O conhecimento
tácito é transformado em uma propriedade organizacional mais
acessível por meio de sua codificação. A elaboração de sistemas
especializados é um exemplo desse processo, mas ele está presente
sempre que a experiência é transformada em orientações, regras e
protocolos formais.

3. Combinação (conhecimento explícito  conhecimento explíci‑


to): “um processo de sistematização de conceitos em um sistema
de conhecimento. Esse modo de transformação do conhecimento

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implica a combinação de diferentes conjuntos de conhecimento
explícito […] mediante documentos, reuniões, conversas ao tele‑
fone ou redes informatizadas de comunicação”. A elaboração de
conjuntos integrados e sistematicamente organizados de conheci‑
mento é um aspecto central da moderna “gestão do conhecimento”.

4. Internalização (conhecimento explícito  conhecimento tácito):


esse processo envolve aprendizagem por meio da aplicação e práti‑
478 ca do conhecimento explícito, que assim é incorporado ao conhe‑
cimento tácito do indivíduo, tornando­‑se um know­‑how pessoal.
parte iv  o desenvolvimento de organizações eficientes

Um importante exemplo de internalização acontece quando os


membros de uma organização participam de programas de treina‑
mento e trazem de volta técnicas e/ou conceitos gerais que depois
serão adaptados a circunstâncias específicas da organização. Pelo
menos inicialmente, o conhecimento sobre a maneira como essa
adaptação é alcançada pode estar limitado aos interessados e é de
natureza tácita.

Nonaka e Takeuchi enfatizam o fato de o aprendizado organizacional


depender do conhecimento tácito e da capacidade de combinar de modo
criativo as fontes do conhecimento tácito e transformá­‑las em formas
mais explícitas, que são subsequentemente combinadas. O conhecimen‑
to tácito em si é aperfeiçoado pelo conhecimento explícito obtido, por
exemplo, por meio do treinamento, da leitura de notícias sobre economia
e negócios ou pela observação das táticas da concorrência. O modelo de
Nonaka e Takeuchi contém ainda uma checklist dos processos que devem
ser implantados para maximizar as oportunidades para esse novo conhe‑
cimento se tornar uma propriedade organizacional e, assim, constituir
um aprendizado “organizacional”. Não obstante, como sempre na ges‑
tão, é um caso de “mais fácil falar que fazer”, e já foi visto que barreiras
significativas podem surgir no meio do caminho.

13.4 Aprendizado por meio de alianças


Como já vimos no Capítulo 10, as empresas estão formando cada
vez mais alianças com a intenção de adquirir novo conhecimento e
know­‑how. Mesmo quando essas alianças são formadas por ou‑
tros motivos, o aprendizado pode ser um subproduto desejável da

Book_Organizaçoes.indb 478 16/9/2011 16:24:02


colaboração. A perspectiva de adquirir tecnologia relativamente avan‑
çada e expertise gerencial é uma importante razão para que empresas
de países emergentes deem preferência a alianças com países desenvol‑
vidos. Por sua vez, os parceiros de países desenvolvidos muitas vezes
consideram essas alianças oportunidades para aprender sobre ambien‑
tes desconhecidos de negócios. Em setores como a biotecnologia, cujos
conhecimentos se expandem rapidamente, embora de maneira disper‑
sa, as alianças fazem parte de vastas redes de aprendizado. Mesmo as‑
479
sim, apesar de sua indubitável importância, sabe­‑se muito pouco sobre
o aprendizado em alianças ou outras formas de cooperação entre as

Organização para o apredizado


organizações.

13.4.1 A natureza do aprendizado por meio de


alianças estratégicas
Alianças estratégicas são arranjos híbridos porque combinam objeti‑
vos estratégicos e culturas de organizações parceiras. Se forem firmadas
por meio de uma nova joint venture, as alianças podem precisar combinar
elementos dos sistemas e estruturas de gestão dos parceiros. A natureza
híbrida das alianças tem uma série de implicações para as possibilidades de
aprendizado por meio delas. Um aspecto positivo é que a expertise e o co‑
nhecimento complementares trazidos para a aliança pelos parceiros podem
promover o aprendizado tanto pela transferência como pela sinergia dinâ‑
mica que pode ser estimulada pela reunião de experts com diferentes histó‑
ricos corporativos e diferentes nacionalidades. As alianças entre empresas
de biotecnologia relativamente pequenas dedicadas à pesquisa e grandes
empresas farmacêuticas com expertise em desenvolvimento, produção e
marketing servem de exemplo nesse caso. Uma questão problemática são as
barreiras ao compartilhamento de conhecimento entre parceiros da alian‑
ça. Essas barreiras podem surgir por uma série de razões. Por exemplo,
o relacionamento entre os parceiros pode permanecer fundamentalmente
competitivo. Pode ser difícil conciliar as diferentes identidades corporativas
ou sociais dos diferentes grupos de pessoas. Pode haver aspectos incompa‑
tíveis nos sistemas e estilos de gestão dos parceiros. A equipe de um dos
parceiros pode presumir que nada tem a aprender com a outra e vice­‑versa,
ou pode resistir às mudanças implícitas que a aprendizagem implica. As
empresas talvez não tenham experiência ou capacidade para adquirir e ab‑
sorver o conhecimento de seus parceiros de aliança.

Book_Organizaçoes.indb 479 16/9/2011 16:24:02


Há três processos diferentes pelos quais pode ocorrer o aprendizado
em joint ventures internacionais.29 O primeiro é a transferência de conhe‑
cimento pelos parceiros para a joint venture, boa parte da qual na forma
de transferência de tecnologia. Semelhante transferência de conhecimen‑
to pode ocorrer diretamente entre parceiros que colaboram por outros
meios que não o estabelecimento de uma joint venture em separado. Essa
forma envolve o movimento da tecnologia, do conhecimento ou do mé‑
todo de gestão existente para um cenário organizacional para o qual tal
480
transferência representa um novo input de conhecimento.
O segundo processo de aprendizado é diferente, porque envolve a
parte iv  o desenvolvimento de organizações eficientes

criação de conhecimento ou, pelo menos, uma transformação substancial


do conhecimento existente no âmbito da cooperação. Aqui o aprendiza‑
do mútuo ocorre por meio de uma integração construtiva dos diferentes
inputs das empresas parceiras e seus membros. Esse tipo de aprendizado
é qualitativamente diferente do aprendizado por meio da transferência
de conhecimento, e sua execução apresenta um desafio proporcional‑
mente maior. Não obstante, é um dos possíveis prêmios da cooperação
entre organizações que podem oferecer uma à outra conhecimento com‑
plementar valioso.
O terceiro processo de aprendizado, a colheita, envolve a recupera‑
ção do conhecimento que foi gerado na joint venture, ou em outra uni‑
dade colaboradora, e sua internalização nas matrizes das empresas, para
que estas possam utilizá­‑lo em outras áreas de operação.
Esses processos mostram que as alianças estratégicas podem ser um
meio para adquirir ou gerar conhecimento que não estaria disponível de
outra forma. As alianças também podem ser um importante veículo para
a incorporação de novo conhecimento à prática, especialmente por meio
de joint ventures ou equipes mistas, compostas por membros dos parcei‑
ros que trabalham na necessária adaptação e aplicação do conhecimento
extraído das empresas parceiras.
Em alianças estratégicas, até mesmo a transferência do conhecimento
existente ou de práticas apresenta dificuldades. O conhecimento abstra‑
to e codificado adquire o status de novos dados para as pessoas que os
recebem pela primeira vez, se não estiverem em posição para validá­‑los
imediatamente. Os membros das alianças serão incapazes de validar esse
conhecimento se ele não estiver estruturado de maneira familiar para eles.
O conhecimento técnico é mais fácil de absorver se já estiver classificado
e codificado segundo padrões amplamente aceitos e conhecidos, mas essa

Book_Organizaçoes.indb 480 16/9/2011 16:24:03


característica é pouco provável para o conhecimento organizacional e
estratégico.
A criação de conhecimento deve se basear em um número de diferen‑
tes sistemas de conhecimento que a aliança reúne e sintetizá-los, sendo
que nenhum pode ter sido aplicado anteriormente às circunstâncias espe‑
cíficas vivenciadas pela aliança. Talvez seja preciso uma série de tentativas
para chegar a esquemas aceitáveis e efetivos de classificação e codificação,
e pelo menos um projeto­‑piloto pode ser necessário para demonstrar a
481
adequação dessa nova abordagem às novas circunstâncias.
Além do problema de tradução do meio do parceiro da aliança

Organização para o apredizado


para o outro, a transmissão de informações e conhecimento entre
diferentes participantes ou grupos no ciclo de aprendizado implica
a necessidade de relacionamentos construtivos entre eles para que o
processo funcione. O conhecimento é socialmente constituído, pois é
criado ou compilado por grupos sociais que têm a sensação de pro‑
priedade sobre ele. Conforme observado anteriormente, esse senso de
propriedade significa que os grupos atribuirão valor ao conhecimento
e assumirão o direito de arbitrar sobre esse valor. Quando o conheci‑
mento é transferido entre organizações, ou quando os membros de di‑
ferentes organizações unem seus recursos de conhecimento, a maneira
como as pessoas que recebem o conhecimento percebem sua validade
terá efeitos sobre o grau de sua preparação para aceitá-lo e trabalhar
com ele.
A questão da validade é provavelmente mais sensível para a prática
e o conhecimento organizacional e estratégico que para o conhecimento
de natureza primordialmente técnica. Embora o conhecimento técnico
também seja socialmente constituído, algumas de suas características re‑
duzem sua vulnerabilidade, ao ser transferido ou compartilhado entre
diferentes organizações. Uma dessas características é que o conhecimento
técnico em geral é expresso de modo amplamente acessível e padroniza‑
do, e parte dele dentro dos padrões internacionais. Outra é que especialis‑
tas treinados podem aceitar a validade do conhecimento técnico porque
têm a linguagem conceitual e a identidade ocupacional das pessoas que
geraram o conhecimento. Essa identidade faz a ponte entre as fronteiras
da organização. Podem surgir problemas quando a geração do conhe‑
cimento requer a colaboração de pessoas de diferentes especialidades, e
assim, a presença de diferentes padrões técnicos validados pode aumentar
o problema da integração.

Book_Organizaçoes.indb 481 16/9/2011 16:24:03


13.4.2 Aprendizado competitivo e colaborativo entre
parceiros de aliança
As alianças estratégicas apresentam um trade­‑off entre as oportu‑
nidades que oferecem para gerar e compartilhar o conhecimento e a
possibilidade de que o parceiro aja de forma oportunista. Essa questão
aparece quando as metas de aprendizado são complementares ou compe‑
tem entre si, seja em termos do cálculo custo­‑benefício para a formação e
482 manutenção de uma determinada aliança, seja, mais fundamentalmente,
em termos da sua localização nas estruturas do setor ou do mercado.
parte iv  o desenvolvimento de organizações eficientes

Há dois tipos qualitativamente diferentes de benefícios disponíveis


para os parceiros em alianças cujo objetivo básico é aprenderem um
com o outro.30 O primeiro tipo são os benefícios privados, que uma
empresa pode adquirir unilateralmente, aprendendo com o parceiro
e aplicando a suas operações em áreas não relacionadas às atividades
da aliança. Nesse caso, os parceiros têm metas divergentes em termos
de aprendizado por meio de uma aliança. A presença dos benefícios
privados pode ser o estímulo para uma corrida entre os parceiros para
aproveitar as oportunidades de aprender um com o outro. Uma vez fei‑
to isso, não há muito incentivo para continuar com a cooperação. Até
mesmo concorrentes totais podem colaborar entre si para se beneficiar
das oportunidades do aprendizado, mas eles serão cautelosos quanto
ao compartilhamento de seu conhecimento. Um relacionamento funda‑
mentalmente competitivo tornará o equilíbrio entre as contribuições de
cada parceiro à aliança e os benefícios que dela poderão extrair uma
questão sensível. Esse tipo de relacionamento é um incentivo ao opor‑
tunismo. Em tal situação, muitas vezes a cooperação tem vida relativa‑
mente curta e os parceiros podem voltar a competir entre si quando a
aliança for rompida.
Um segundo tipo são os benefícios comuns, que surgem do apren‑
dizado mútuo na esfera da aliança e se aplicam às suas operações.
Benefícios comuns promovem a cooperação contínua e o investimento
em alianças como veículos para aprendizagem mútua. Muitas alianças
estratégicas são formadas entre organizações que percebem que podem
se beneficiar de suas complementaridades. Tal percepção dá aos parcei‑
ros um interesse comum: aprender como extrair as sinergias potenciais
de suas respectivas competências. Com o passar do tempo, a ausência
de competição fundamental entre os parceiros também promoverá o

Book_Organizaçoes.indb 482 16/9/2011 16:24:03


compartilhamento do conhecimento e sua acumulação como ativo de
aliança.
Essas distinções identificam duas possíveis situações de aprendizagem
na aliança estratégica: o aprendizado competitivo, que se baseia em uma
atitude de competição subjacente entre os parceiros, e o aprendizado co‑
laborativo, que se baseia no espírito de colaboração entre eles.
O aprendizado competitivo indica a situação em que um dos parcei‑
ros da aliança pretende aprender tanto quanto possível com o outro, em
483
vez de adotar o aprendizado mútuo como prioridade. Falando de suas

Organização para o apredizado


investigações sobre alianças estratégicas internacionais, Hamel descreveu
essa “competição para competência”:

“Muitas vezes os executivos expressaram a preocupação de que, ao cola‑


borar com um possível competidor, a falha em ‘superar’ o outro parceiro
poderia, primeiro, deixar a empresa dependente; depois, torná­‑la desne‑
cessária na parceria e competitivamente vulnerável fora dela. As duas pre‑
missas das quais emana essa preocupação pareciam ser que (1) poucas
alianças eram perfeitas e perpetuamente coordenadas; (2) o fato de uma
empresa escolher colaborar com o competidor (presente ou futuro) não
pode ser considerado prova de que essa empresa não tenha mais uma
intenção competitiva frente a seu parceiro.”31

Hamel apontou a possibilidade de que o aprendizado assimétrico en‑


tre parceiros de aliança derive do fato de não conseguirem ou não se dis‑
porem a transformar a parceria em uma organização plenamente coesa.
A ausência de coordenação perfeita representa a falha dos parceiros em
alcançar a integração total de suas operações na joint venture. Há disputa
entre os parceiros para aprender um com o outro, mais em vantagem pró‑
pria que em benefício da aliança como organização em si. O desempenho
nessa corrida está associado ao poder de negociação entre os parceiros.
O parceiro que tiver mais poder de barganha na formação da aliança
estabelece condições favoráveis para um aprendizado assimétrico, insis‑
tindo, por exemplo, que a tecnologia do outro parceiro esteja plenamente
disponível.
O aprendizado colaborativo ocorre quando os parceiros da aliança
não se consideram em competição ou não acreditam ter interesses incon‑
ciliáveis de longo prazo. Com isso, as alianças entre organizações podem

Book_Organizaçoes.indb 483 16/9/2011 16:24:03


melhorar o aprendizado de duas maneiras: uma é aprender de um parcei‑
ro, a outra é a aprender com um parceiro.
No primeiro caso, a colaboração significa acesso ao conhecimento
e habilidades do parceiro, podendo abranger a tecnologia de produtos
e processos, capacidades organizacionais e o conhecimento dos novos
ambientes (inclusive apresentação a pessoas significativas nesses ambien‑
tes). A transferência pode ser obtida de várias maneiras, como por meio
da troca de conjuntos de dados e da alocação temporária de pessoal­
484
‑chave, com o propósito de enxertar o novo conhecimento ou mesmo
transformá­‑lo nas atividades. Se a aliança assume a forma de uma nova
parte iv  o desenvolvimento de organizações eficientes

unidade, como uma joint venture estabelecida com determinado objetivo,


o conhecimento dos parceiros talvez seja relevante e só tenha utilidade
para a essa unidade. Tal aprendizado pode não ter nenhum valor geral
fora do escopo da colaboração específica. Entretanto, sempre há o risco
de subestimar o valor, para toda a organização do parceiro, do conheci‑
mento assim adquirido, como aconteceu no já examinado caso da cola‑
boração entre a General Motors e a Toyota. Também há o risco de que
o conhecimento importado seja rejeitado, como acontece com qualquer
enxerto.
O segundo modo de aprendizado colaborativo envolve o aprendiza‑
do com um parceiro. Um exemplo é a acumulação de experiência mútua
e o conhecimento sobre como gerir a cooperação entre organizações. Esse
benefício está se tornando cada vez mais importante num mundo em que
mais atividades empresariais são organizadas por meio de alianças estra‑
tégicas, entre as quais, por exemplo, aquelas em que os gestores devem li‑
dar com as diferenças culturais e ambientes não familiares. O know­‑how
colaborativo pode ser usado mais adiante no planejamento e na gestão de
outras colaborações.
O Quadro 13.2 é um exemplo desses dois modos de aprendizado
colaborativo: aprender de e com um parceiro.

13.5 Implicações para a prática


Tornou­‑se evidente que há muitos obstáculos para se conseguir um
bom aprendizado organizacional. O pior deles é a falta de desejo da
alta direção em promover tal aprendizado. Um segundo grande obstá‑
culo surge das linhas de demarcação – tanto as demarcações internas
nas organizações como as fronteiras externas entre uma organização e

Book_Organizaçoes.indb 484 16/9/2011 16:24:03


Quadro 13.2  O Royal Bank Of Scotland e o banco Santander

A aliança entre o Royal Bank of Scotland e o Banco Santander da Espanha foi


anunciada formalmente no dia 3 de outubro de 1988. É mais uma colaboração
do tipo aberta que uma joint venture formal, embora, como demonstração de
compromisso, as duas empresas tenham trocado uma pequena porcentagem de
sua participação. Na época, a aliança foi basicamente motivada pelo desejo dos
dois bancos de encontrar um parceiro europeu para ajudá­‑los a se posicionarem
no mercado único da Comunidade Europeia. Cada banco procurava um parceiro 485
de tamanho semelhante, com atividades e culturas compatíveis, e semelhantes

Organização para o apredizado


atitudes em relação a esse mercado único.
Embora mais tarde se tenha comprovado que tais semelhanças eram benéfi‑
cas para a cooperação entre os dois bancos, as dificuldades iniciais na colabo­
ração entre ambos os levaram ao estabelecimento de gateways na forma de
um diretor de aliança especialmente nomeado por cada banco, por quem pas‑
saria todo o movimento da aliança. Esses gateways continuaram tendo um
papel essencial na promoção de projetos conjuntos, como mecanismos para
o aprendizado mútuo.
A aliança evoluiu por meio da intensificação da cooperação entre os dois ban‑
cos, especialmente com a criação e lançamento de um sistema interbancá‑
rio on­‑line (o Interbank Online System), em 1994. Diretores dos dois parceiros
perceberam que a aliança havia promovido o aprendizado organizacional em
mútuo benefício. Cada parceiro pôde aprender e absorver aperfeiçoamentos
nas operações bancárias e também, com o tempo, aprender como aprofun‑
dar o processo de trabalhar em conjunto. Inicialmente, as principais áreas de
cooperação entre os dois bancos incluíam o acesso às agências, a propriedade
compartilhada de bancos alemães e belgas, os serviços bancários offshore em
Gibraltar, os serviços bancários comerciais e o desenvolvimento de tecnologia
e aquisições.
Os comentários de altos executivos de ambos os bancos ilustram o aprendizado
obtido com o parceiro de aliança e, mais uma vez, nem tudo isso havia sido pre‑
visto. O superintendente do Royal Bank comentou:
“Fomos surpreendidos pelos benefícios intangíveis dessa aliança, pois cada uma
das partes veio a conhecer e observou os métodos de trabalho da outra. Coi‑
sas simples como as diferentes maneiras com que preparamos e organizamos
reuniões, a natureza e o conteúdo de documentos apresentados a públicos
internos, e as diferenças nas estruturas e nos relacionamentos de prestação de
contas ofereceram ampla oportunidade para reflexão.
Com relação ao negócio de crédito, o diretor de aliança do Royal Bank observou:

Book_Organizaçoes.indb 485 16/9/2011 16:24:03


“O Santander investiu bastante tempo e muitos especialistas nessa área. Em
termos, há uma imensa quantia de dinheiro que pode ser poupada, não apenas
em custos, mas também em tempo. Penso então que é uma aprendizagem do
que eles aprenderam… é a capacidade da outra organização, é estar preparada,
de ambos os lados, para ajudar.
O diretor de aliança do Banco Santander acrescentou outros exemplos:
“Aprendemos a melhor maneira de lançar uma conta-corrente com juros depois
486 de ver como foi a experiência do RBS. Admiramos a maneira como eles criam
negócios por telefone, e até vendem empréstimos. No nível da alta direção,
parte iv  o desenvolvimento de organizações eficientes

estamos trocando ideias sobre a melhor maneira de tratar o crédito e os riscos


geográficos. De parte do Royal, eles examinam a nossa rede de agências com
cinco pessoas ou menos por agência, comparando­‑a com sua média de nove.
Provavelmente eles irão centralizar mais o back office. Além disso, eles são mui‑
to bons no atendimento aos clientes, são muito bons em desenvolver clientes
lucrativos... Esses são os processos em andamento, enriquecedores para ambas
as partes.”
O mesmo diretor do Banco Santander observou que “vender é algo que, com
toda certeza, e de cima para baixo, o Royal Bank incorporou de nossa cultura”.

Fontes: Faulkner, David. The Royal Bank of Scotland and Banco Santander. In: Roos, Johan
(Org.). European Casebook on Cooperative Strategies, Hemel Hempstead: Prentice­‑Hall, 1994, p.
157­‑173; John Child e Sally Heavens, 1997, entrevistas pessoais.

as outras. Esse problema surge porque a diferenciação constitui a base


para percepções distintas e identidades sociais de interesses concorrentes.
Internamente, os indivíduos podem se considerar rivais quanto à pro‑
gressão, e os departamentos rivais quanto à fatia do orçamento total da
empresa. Externamente, quando duas ou mais organizações formam uma
aliança, essas barreiras aumentam por causa de suas diferentes culturas
corporativas, e no caso de alianças internacionais, por diferentes culturas
nacionais. Se as organizações se consideram rivais, as barreiras para o
múltiplo aprendizado se tornam ainda maiores. Mais uma vez, medidas
para a integração além das linhas de demarcação em geral não surgem
espontaneamente; elas dependem da iniciativa dos gestores.
Assim, a implicação prática do que foi dito neste capítulo é: o aprendiza‑
do organizacional bem­‑sucedido deve ser ativamente gerenciado. Isso se apli‑
ca igualmente ao aprendizado nas empresas e nas alianças entre as empresas.

Book_Organizaçoes.indb 486 16/9/2011 16:24:03


Nas empresas, os altos executivos, os coordenadores de projeto e os
profissionais especializados têm importantes contribuições a dar. Os ges‑
tores senior devem reconhecer a importância do aprendizado organiza‑
cional para legitimar e estimular o processo, fornecendo os recursos e
incentivos adequados. Mais difícil, devem aceitar a possibilidade de esta‑
rem atrapalhando o aprendizado organizacional. Ou, como já observado,
as pressões para remover a equipe dos executivos podem se acumular.
A alta direção também deve reconhecer que é muito importante e
487
complexo o papel dos coordenadores de projeto ou líderes de equipe
diante do desafio de assegurar a integração entre os que contribuem de

Organização para o apredizado


diferentes maneiras para o processo do aprendizado. É preciso dar su‑
porte considerável aos líderes de projeto e equipe, e ter cuidado ao es‑
colher pessoas com as habilidades necessárias para tais funções. Liderar
equipes de aprendizado envolve gestão de conflito e requer a combinação
de considerável habilidade interpessoal e capacidade para entender gru‑
pos díspares de conhecimento. Como indivíduos e grupos são “donos”
de diferentes informações e conhecimento, compartilhá-los e conciliá­
‑los de forma consensual pode ser um processo politicamente exaustivo.
Isso exige medidas enérgicas para promover a identidade e um sentido de
propósito compartilhados entre os membros da organização. O trabalho
dos líderes de equipe para isso pode ser auxiliado de forma importante
quando a alta direção define e explica o propósito do aprendizado orga‑
nizacional. O Capítulo 12 mostrou quão importante é a liderança da alta
direção para a realização da mudança organizacional, e esse aprendizado
inevitavelmente implica mudança também na mente das pessoas.
O enfoque deste capítulo foi a capacidade de aprendizagem de uma
organização e como aperfeiçoá­‑la. O vínculo entre aprendizagem e mu‑
dança ressalta a questão da quantidade de mudança com que uma or‑
ganização pode lidar em qualquer período. Esse é um julgamento que a
gestão deve aplicar à sua política de aprendizagem. Quando uma empresa
busca o aprendizado e a mudança para exclusão de tudo o mais, e essa
busca ameaça sua estrutura e cultura, é possível que logo perca a coope‑
ração dos grupos sobre o qual se baseia esse processo. A razão é que esses
grupos não terão tido nenhuma oportunidade de redefinir seu papel e sua
identidade na organização em termos do que podem aceitar. Se, por outro
lado, houver muita ênfase na manutenção do consenso e em “não virar
o barco”, é bem possível que ocorra pouca aprendizagem (e ainda menos
implementação).

Book_Organizaçoes.indb 487 16/9/2011 16:24:04


Também é provável existirem ainda mais barreiras ao aprendizado
organizacional nas formas híbridas que as alianças assumem que em em‑
presas unitárias. Podem ser barreiras cognitivas, emocionais e organiza‑
cionais. A ausência da intenção de aprender pode ocorrer uma grande
barreira cognitiva para a realização do potencial de aprendizado da cola‑
boração com outras empresas, e isso pode ser devido à ignorância sobre
esse potencial. Barreiras emocionais podem surgir por desconfiança entre
os parceiros da aliança, e pode ser necessário considerável esforço para
488
superá­‑las e criar bons relacionamentos pessoais entre os executivos dos
parceiros.
parte iv  o desenvolvimento de organizações eficientes

Os gestores seniores têm importante papel na redução de barreiras or‑


ganizacionais ao aprendizado por meio de alianças. As providências que
eles podem tomar são, de modo geral, semelhantes àqueles nas empresas
unitárias. Mais importante que tudo, eles podem mostrar a importância
que atribuem ao aprendizado por meio da colaboração de maneira a in‑
fluenciar o comportamento das pessoas em todas as empresas parceiras.
Eles estão em posição de estabelecer práticas organizacionais úteis, como
reuniões e visitas periódicas entre os executivos dos parceiros, rotação
periódica dos executivos entre a unidade da aliança e as empresas par‑
ceiras, e compartilhamento de informações. Providências para garantir
que as comunicações sejam abertas e que a tecnologia da informação
seja utilizada apropriadamente também ajudam a reduzir as barreiras ao
aprendizado e a assegurar a disponibilidade da informação para alimen‑
tar o processo de aprendizado.

Resumo
1. A aprendizagem organizacional é o processo de desenvolvimento do
pensamento e das ações das pessoas que fazem parte das organizações ou
trabalham nelas; depois, esse pensamento e essas ações institucionalizados,
transformam­‑se em propriedades organizacionais, que assumem a forma
de rotinas, estruturas, culturas, estratégias e sistemas novos ou revisados.

2. A aprendizagem organizacional pode envolver diferentes níveis de co‑


nhecimento: técnico, sistêmico e estratégico.

3. A capacidade de aprendizagem organizacional é um recurso estratégico


cada vez mais importante para as empresas, emtregando­‑lhes vantagem
competitiva.

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4. Ela pode ocorrer com a aquisição de conhecimento de fontes externas
ou por meio da sua criação na própria empresa.

5. Nenhum processo ocorrerá de maneira muito eficiente, ou sequer ocor‑


rerá, sem que existam certas condições de apoio.

6. Uma dessas condições é que os executivos incentivem energicamente o


aprendizado em toda a empresa e introduzam as providências para apoiá­
‑lo. Entre essas providências estão os necessários canais de comunicação,
489
o devido equilíbrio entre autonomia e controle, o uso de equipes e a liga‑

Organização para o apredizado


ção entre fronteiras internas e externas.

7. Outra condição é que a empresa tenha capacidade para aprender. Entre


outros aspectos, isso exige pessoas que possam assimilar, avaliar e disse‑
minar o conhecimento adquirido.

8. A criação de conhecimento – nas empresas e nas alianças entre empre‑


sas – se beneficia de uma combinação de recursos de conhecimento com‑
plementares. Isso depende de encontrar meios de promover a cooperação
e a colaboração entre os grupos envolvidos.

9. Há muitos obstáculos à aprendizagem organizacional devido ao pensa‑


mento e às práticas enraizados, e a barreiras para a comunicação e coo‑
peração entre diferentes grupos. A competição entre os parceiros em uma
aliança pode impor sérios limites até que eles estejam preparados para com‑
partilhar seu conhecimento com propósito de alcançarem a aprendizagem.

10. Um requisito indispensável para um aprendizado organizacional


bem­‑sucedido é que os executivos compreendam seu valor estratégico e
tenham consciência das condições para obtê­‑lo. O processo deve ser ge‑
renciado dinamicamente.

Questões para discussão


1. O que é aprendizagem organizacional? Como ela pode contribuir para
um desempenho superior da organização?

2. Discuta os principais processos pelos quais práticas inovadoras /


aprendizado individual podem ser transformados em propriedade
organizacional.

Book_Organizaçoes.indb 489 16/9/2011 16:24:04


3. Descreva e discuta os requisitos indispensáveis para o aprendizado
organizacional.

4. Referindo­‑se também ao Capítulo 2, discuta a influência da forma da


organização sobre o processo de aprendizagem organizacional.

5. Com relação aos capítulos 4, 9 e 10, discuta o significado de (a) tra‑


balho de equipe e (b) alianças estratégicas para a aprendizagem
490 organizacional.
parte iv  o desenvolvimento de organizações eficientes

6. Que aspectos essenciais determinam a capacidade de uma organização


aprender?

Notas
1. Este capítulo se baseia em material mais detalhado apresentado por Dierkes,
Meinolf. ANTAL, Arianne Benthoim; CHILD, John; NONAKA, Ikujiro (Org.).
The Handbook of Organizational Learning and Knowledge. Oxford: Oxford
University Press, 2001; ou seja, Child, John; Heavens, Sally J. The social
constitution of organization and its implications for organizational learning.
p. 308­‑326; CHILD, John. Learning through strategic alliances. p. 657­‑680.
Recomenda­‑se que os leitores em busca de uma fonte abrangente sobre o apren­
dizado organizacional consultem o Handbook.

2. Esta definição é semelhante à sugerida por VERA, Dusya; CROSSAN, Mary.


Organizational learning and knowledge management: toward an integrative
framework. In: EASTERBY­‑SMITH, Mark; LYLES, Marjorie A. (Org.) Hand‑
book of Organizational Learning and Knowledge Management. Oxford: Black‑
well, 2003, Cap. 7.

3. MOINGEON, B; EDMONDSON, A. (Org.). Organizational Learning and


Competitive Advantage. London: Sage, 1996.

4. WICK, C. The Learning Edge: how Smart Managers and Smart Companies
Stay Ahead. New York: McGraw­‑Hill, 1993. p. 4.

5. SENGE, Peter M. The Fifth Discipline: The Art and Practice of the Learning
Organization. New York: Doubleday, 1990.

6. James G. March, Exploration and exploitation in organizational learning. Or‑


ganization Science, 1, p. 71­‑87, 1991.

Book_Organizaçoes.indb 490 16/9/2011 16:24:04


7. HAMEL, Gary; PRAHALAD, C. K. Competing for the future. Boston: Harvard
Business School Press, 1994.

8. DIERKES et al., 2001; EASTERBY­‑SMITH; LYLES, 2003, op. cit.

9. VILLINGER, Roland. Post acquisition managerial learning in Central East Eu‑


rope. Organization Studies, 17, p.185, 1996.

10. ARGYRIS, Chris; SCHÖN, Donald A. Organizational Learning, Reading:


Addison­‑Wesley, 1978. p. 9. 491

11. NONAKA, Ikujiro; TAKEUCHI, H. The Knowledge­‑Creating Company. New

Organização para o apredizado


York: Oxford University Press, 1995. p. 59.

12. Michael Polanyi, The Tacit Dimension. London: Routledge and Kegan Paul,
1966.

13. CHILD, John; RODRIGUES, Suzana B. The role of social identity in the inter‑
national transfer of knowledge through joint ventures. In: CLEGG, Stewart;
PALMER; Gill (Org.). The Politics of Management Knowledge. London: Sage,
1996. p. 46­‑68.

14. Argyris e Schön, 1978, op. cit.

15. ANDREU, A; CIBORRA, C. Core capabilities and information technology: an


organizational learning approach. In: MOINGEON, B; EDMONDSON, A.
(Org.). Organizational Learning and Competitive Advantage. London: Sage,
1996. p. 121­‑138.

16. NONAKA; TAKCUCHI, 1995, op. cit. p. 80.

17. HEAVENS, Sally J; Child, John. Managing to Serve: Learning from catering
& Allied. Cambridge: RH Business Books, 2002.

18. SIMONS, R. Control in an age of empowerment. Harvard Business Review,


73(2), p. 80­‑88, 1995.

19. BURNS, T; STALKER, G. M. The Management of Innovation. London: Tavis‑


tock, 1961.

20. LAWRENCE, Paul R; LORSCH, Jay W. Organization and Environment: Ma‑


naging Differentiation and Integration. Boston: Harvard Business School Press,
1967. p. 11.

21. CHILD, John; LOVERIDGE, Ray. Information Technology in European Servi‑


ces. Oxford: Blackwell, 1990.

Book_Organizaçoes.indb 491 16/9/2011 16:24:04


22. WEST, Michael A. Sparkling fountains or stagnant ponds: an integrative model
of creativity and innovation implementation in work groups. Applied Psycho‑
logy, 51, p. 335­‑387, 2002.

23. POWELL, W. W; KOPUT, K. W; SMITH­‑DOERR, L. Interorganizational colla‑


boration and the locus of innovation: networks of learning in biotechnology.
Administrative Science Quarterly, 41, p. 116­‑145, 1996.

24. COHEN, W. M; LEVINTHAL, D. A. Absorptive capacity: a new perspective


492 on learning and innovation. Administrative Science Quarterly, 35, p. 128­‑152,
1990.
parte iv  o desenvolvimento de organizações eficientes

25. INKPEN, Andrew C. The Management of International Joint Ventures: An Or‑


ganizational Learning Perspective. London: Routledge, 1995.

26. HAMEL, Gary. Competition for competence and inter­‑partner learning within
international strategic alliances. Strategic Management Journal, 12 (número es‑
pecial de verão) p. 83­‑103, 1991.

27. SIMONIN, Bernard L. The importance of collaborative know­‑how: an empiri‑


cal test of the learning organization. Academy of Management Journal, 40, p.
1150­‑1174, 1997.

28. NONAKA; TAKEUCHI, 1995, p. 62, 64, 67, 69 e 70.

29. LINDHOLM, N. Learning processes in international joint ventures in China.


Advances in Chinese Industrial Studies, 5, p. 139­‑154, 1997.

30. KHANNA, T; GULATI, R; NOHRIA, N. The dynamics of learning alliances:


competition, cooperation, and relative scope. Strategic Management Journal,
19, p. 193­‑210, 1998.

31. HAMEL, 1991, p. 84.

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Capítulo 141
Como gerar e utilizar a confiança

Conteúdo do capítulo
Este Capítulo trata do papel da confiança na criação e manutenção de bons
relacionamentos em duas áreas de colaboração que são de especial importância
nos negócio contemporâneos: o trabalho de equipe e as parceiras entre
organizações.
Após mostrar a importância da confiança no mundo dos negócios atuais,
o capítulo discute a natureza desse conceito sutil e complexo. Em seguida,
apresenta duas grandes fontes de confiança. Uma tradicional, quando a confiança
vem de relacionamentos pessoais próximos. Outra base para a confiança é
institucional, em que a confiança é assegurada por garantias formais. Ambas
nos permitem entender como a confiança pode ser criada nas colaborações de
negócios por meio do cálculo, da mútua compreensão e do vínculo.
O capítulo revisa então os benefícios que surgem da confiança nas organizações
e entre elas. Tais benefícios tornam útil, e até obrigatório, gerar e manter a
confiança na organização. O capítulo encerra com orientações para fazê­‑lo.

14.1 Introdução
A economia global moderna é caracterizada pela necessidade de co‑
laboração entre pessoas com diferentes habilidades e experiências. As
formas de colaboração variam de equipes multifuncionais a alianças e

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outros tipos de redes que atravessam fronteiras organizacionais e nacio‑
nais. Como visto nos capítulos anteriores, os velhos modelos da organiza‑
ção autossuficiente dentro de limites rigorosamente delineados em torno
de especialidades e nacionalidades são cada vez menos utilizados. As em‑
presas estão cada vez mais usando equipes para diferentes propósitos,
entre os quais reduzir o tempo de desenvolvimento de novos produtos
e promover o aprendizado organizacional. A colaboração internacional
também aumentou de modo acentuado, com fusões, aquisições, alianças
494
estratégicas globais e o desenvolvimento de redes globais. Obter uma boa
colaboração para o trabalho é um requisito primordial para o sucesso
parte iv  o desenvolvimento de organizações eficientes

nesse novo ambiente dos negócios, e a confiança é um elemento indispen‑


sável entre os envolvidos.
Os executivos estão descobrindo o papel decisivo da confiança mútua
no sucesso de parcerias e projetos. Providências formais, como diretrizes
dos projetos para as equipes e contratos entre parceiros de aliança, são
imprescindíveis para estabelecer condições e referências de desempenho
para a colaboração. Na verdade, elas oferecem a única base sobre a qual
as pessoas podem começar a trabalhar juntas num primeiro momento.
Não obstante, providências formais em si raramente bastam. A compre‑
ensão informal, baseada na confiança, em geral é um fator mais forte
para determinar como funciona a colaboração. Obviamente, a confiança
deve ser reforçada por um bom relacionamento e esse é o círculo virtuoso
que se deve buscar.
Não é surpresa que, em todos os países, os envolvidos nos negócios e
na indústria afirmem valorizar a confiança e a confiabilidade, e ao mesmo
tempo admitam que não é algo fácil de conseguir. Veja esses dois exem‑
plos: o primeiro foi tirado de uma conversa entre dois executivos seniores
de uma empresa de serviços de sistemas de informática, com uma série de
alianças estratégicas:

A: “Nenhuma parceria funcionará sem confiança, que é uma das coisas


mais difíceis de se obter.”

B: “Sim. Creio que ela tem todos os tipos de dimensões. Em todo caso, a
maneira como penso ter conquistado a confiança [ de um dos parceiros da
empresa] foi garantindo que a nossa empresa fizesse o que eu disse que fa‑
ria… entreguei o prometido e foi aí que eles começaram a confiar em mim.”

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O segundo exemplo é o de uma gráfica industrial britânica, uma den‑
tre as tecnologicamente mais avançadas do mundo, que deu início a um
projeto de desenvolvimento junto com sua subsidiária norte­‑americana,
um grande cliente norte­‑americano e um fornecedor especializado em
material de impressão. O projeto visava desenvolver a impressão indus‑
trial rápida usando a tecnologia de laser possuída pela subsidiária, que foi
a principal razão para sua aquisição. A colaboração se baseava inteira‑
mente na confiança e na boa disposição – nenhum contrato foi assinado.
495
O diretor técnico da empresa britânica comentou:

Como gerar e utilizar a confiança


“Conseguimos os benefícios da colaboração em consequência de relacio‑
namentos pessoais paulatinamente conquistados, compreendemos que
poderíamos aproveitar mais entendendo os pontos fortes e fracos uns
dos outros… Este é um relacionamento informal, que surgiu a partir do
desejo mútuo de levar o negócio adiante e da confiança na boa vontade
de todos.”

Apesar de sua valorização, a confiança ainda é um fenômeno mal


compreendido. O que é a confiança? É um fenômeno universal ou carac‑
terístico de alguma cultura? Que benefícios ela pode trazer? O que gera
e mantém a confiança? Existe algum tipo de orientação para se “desen‑
volver” e “administrar” a confiança? Essas questões serão tratadas neste
capítulo, com especial atenção à criação e à manutenção de bons relacio‑
namentos em duas áreas da colaboração de especial importância nos ne‑
gócios modernos: o trabalho de equipe e as parcerias entre organizações.
Quando envolvem pessoas de culturas diferentes, essas colaborações po‑
dem ser muito produtivas, mas é difícil transformá­‑las em verdadeiros
sucessos.

14.2 O que é a confiança?


Por ser tão central nos relacionamentos humanos, há muitas defini‑
ções de confiança. Em geral, essas definições concordam que a confiança
refere­‑se à disposição de uma pessoa ou grupo a se relacionar com outro
na crença de que as ações desse outro serão benéficas, e não prejudi‑
ciais, embora não haja nenhuma garantia disso. No mundo dos negócios,
isso pode significar ter suficiente confiança nos outros para comprome‑
ter recursos valiosos – financeiros e know­‑how – apesar do risco de que

Book_Organizaçoes.indb 495 16/9/2011 16:24:05


se aproveitem desse comprometimento. Mesmo a colaboração entre di‑
ferentes grupos e nacionalidades dentro de uma empresa pode parecer
arriscada. Há o receio de que, se as suas conexões pessoais ou seu conhe‑
cimento único forem compartilhados com outros, o valor para a empresa
e as perspectivas de carreira do indivíduo ou grupo possam se reduzir.
Quanto maior o número de ativos e recursos exclusivos de uma em‑
presa parceira ou de um membro da equipe que faz parte da colaboração,
maior o risco de que o outro parceiro rompa o compromisso de enten‑
496
dimento entre eles. A confiança entre as partes é necessária para ajudar
a neutralizar esse risco, ainda que a ameaça do risco em si possa inibir
parte iv  o desenvolvimento de organizações eficientes

o desenvolvimento da confiança. O processo de construção de confiança


é, portanto, um grande desafio. Ela também é um fenômeno frágil, que
pode ser facilmente perdido e exigir muito tempo e esforço para ser res‑
tabelecido. O Capítulo 15 ilustra esse ponto, indicando como infrações
e problemas de governança corporativa quebram seriamente a confiança
entre a direção e os funcionários.
A confiança é indispensável em qualquer relacionamento, seja de
negócios ou qualquer outro, quando há insuficiente conhecimento e en‑
tendimento da outra pessoa ou grupo. Devemos ter em mente que a con‑
fiança existente na colaboração entre departamentos ou organizações
reflete a qualidade dos relacionamentos entre as pessoas que represen­
tam ou simbolizam tais unidades. É uma forma de lidar com a ignorância
e a incerteza e implica ter fé e confiar sobre e acima de qualquer base que
se tenha para a certeza. Pode surgir incerteza com relação a imprevistos
futuros e a como os colaboradores reagirão a eles. Sob tais condições,
a confiança estabiliza as expectativas que as pessoas têm umas em rela‑
ção às outras e proporciona a segurança necessária para continuarem
a trabalhar juntas. No entanto, isso não significa recomendar confiar
nos outros sem qualquer fundamento; confiar cegamente seria extrema‑
mente ingênuo e não é algo que favoreça a sobrevivência no mundo dos
negócios.
De modo geral, existem duas bases para a confiança. A primeira, de
natureza tradicional, emana da participação em um mesmo grupo social
e é reforçada pelas normas que regem o comportamento sancionado pelo
grupo. A confiança tradicional se baseia nos relacionamentos pessoais e é
reforçada por sua experiência positiva. Normalmente, a família é a base
mais forte para a confiança mútua; outras bases são o fato de pertencer
à mesma comunidade local, compartilhar de educação ou ter uma longa

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história de negociações, às vezes de muitas gerações. Quando as partes
têm uma boa experiência no trabalho conjunto, é inevitável haver con‑
fiança, e como observado posteriormente, isso se torna um importante
fator no cultivo da confiança no trato de negócios internacionais e ou‑
tros. Muitos fundamentos tradicionais da confiança são sinônimos do
pertencimento a uma mesma cultura, razão pela qual as relações entre
pessoas de culturas diferentes podem apresentar considerável desafio nos
negócios internacionais.
497
Especificações institucionais constituem outro importante funda‑
mento da confiança. Excelentes exemplos são os contratos jurídicos e

Como gerar e utilizar a confiança


as garantias de competência e qualidade atestadas por certificados re‑
conhecidos oficialmente, como as qualificações e padrões determinados
pela International Organization for Standardization (ISO) – Organização
Internacional para Normalização. Contratos endossados por um sistema
jurídico eficaz e certificação após testes rigorosos e com monitoração pos‑
terior podem reduzir o risco de entrar em novos negócios e relações de
emprego envolvendo pessoas sobre as quais não há muito conhecimento
e experiência.
Quando as pessoas podem extrapolar a partir da experiência passada
ou não precisam questionar a proteção de instituições, pode­‑se confiar
sem muita apreensão. O problema é que, em relações de negócios globais,
essas duas condições talvez signifiquem muito pouco. Entrar em merca‑
dos de economias emergentes é um bom exemplo.
Se a confiança é uma característica de relacionamentos interpessoais,
significa que os pressupostos que lhe são inerentes são específicos de di‑
ferentes culturas? Se sim, é um presságio de dificuldades na colaboração
internacional. Alguns autores, como Francis Fukuyama, distinguem as
sociedades altamente confiáveis das não confiáveis – o que se resume
à questão de haver ou não uma forte base institucional em um país na
qual os cidadãos possam confiar quando assumem o risco de confiar em
outros. Nesses termos, os Estados Unidos constituem uma sociedade de
alta confiabilidade porque têm um sistema jurídico altamente desenvol‑
vido, que protege o indivíduo, presumindo­‑se que esse indivíduo possa
recorrer a ele. Isso encoraja as pessoas a valorizarem a honestidade, a
franqueza, a igualdade e a justiça. Em compensação, um país como a
China pode ser considerado um ambiente de baixa confiabilidade, por‑
que ainda há limitada proteção no sistema e muitas condições permane‑
cem arbitrárias.

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Embora essa caracterização generalizada indique as condições sob
as quais as empresas operam nesses países, ainda precisamos estender
essa análise ao nível do indivíduo para extrair orientações úteis para a
ação. Aqui surge um paradoxo. Em sociedades em que existe um alto
grau de incerteza e baixa confiabilidade, saber em quem se pode realmen‑
te confiar é uma questão decisiva. Em outras palavras, quando suportes
institucionais para a confiança são fracos, as pessoas precisam recorrer
a suportes de natureza tradicional. Em tais circunstâncias, a confiança
498
proporciona aos relacionamentos pessoais um caráter importantíssimo,
que assume um significado muito maior que em sociedades de alta con‑
parte iv  o desenvolvimento de organizações eficientes

fiabilidade. Ao mesmo tempo, como dependem muito da confiança, as


pessoas exigem garantias tradicionais antes de se disporem a confiar nos
outros. Em sociedades como a China, o sucesso na colaboração em negó‑
cios depende muito da confiança estabelecida entre as pessoas, mas é algo
que requer mais tempo e esforço. Em grande parte, isso também aconte‑
ce em outras sociedades orientais, como o Japão. Como nessas culturas
é atribuído imenso valor à confiança, as pessoas reagirão com grande
amargura se a confiança for traída. Nos países orientais, os empresários
relutam em encerrar relações de negócios, como acontece, por exemplo,
quando uma aliança já não cumpre seus objetivos estratégicos, ao passo
que os ocidentais têm uma visão menos personalizada dessa questão. Por
exemplo, dizem que os executivos da Honda se sentiram traídos quando
a Rover voltou atrás na aliança automobilística após ter sido comprada
pela BMW.
A confiança é um componente fundamental dos relacionamentos
humanos em todo o mundo. Em função de suas experiências históricas
e das condições presentes das instituições, há uma enorme variação no
significado que as sociedades atribuem à confiança e às condições para
criá­‑la. Embora essas diferenças possam estar sendo reduzidas à medida
que as economias emergentes ou em transição introduzem “modernas”
instituições, elas ainda apresentam desafios para a criação da confiança
na colaboração global.

14.3 Os benefícios da confiança


A confiança é um fator especialmente importante para o sucesso das
alianças entre empresas.2 James R. Houghton, presidente da Corning
Glass Works, disse uma vez que “o principal ingrediente em uma boa

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aliança é a confiança”. Ela também tem se mostrado uma condição muito
importante para um bom trabalho de equipe e na criação do conhecimen‑
to entre diferentes unidades de uma empresa, especialmente quando estas
se estendem além de fronteiras nacionais e culturais.3
A comprovação de quanto a confiança contribui para o desempe‑
nho de uma empresa vem de várias fontes.4 Uma, por exemplo, é a
comparação do relacionamento dos fornecedores da indústria automo‑
bilística no Japão e nos Estados Unidos, pelo menos até poucos anos
499
atrás. A Toyota desenvolveu um relacionamento social e econômico de
longo prazo com uma rede de fornecedores. Essas relações entre cliente

Como gerar e utilizar a confiança


e fornecedor eram caracterizadas por grande confiança e menor receio
de comportamento oportunista do que era normal nos Estados Unidos.
A Toyota se baseava bem menos em contratos formais que uma empresa
como a GM. Em consequência, a Toyota e seus fornecedores puderam
desenvolver vários trabalhos em conjunto, trocar informações até mes‑
mo sensíveis e operar com um sistema de entrega just­‑in­‑time. A GM, ao
contrário, não contava com esse relacionamento de confiança cultivado
por um longo período para reduzir os riscos de oportunismo; em vez
disso, procurava tratar esses riscos reduzindo o seu comprometimen‑
to de investimentos específicos com fornecedores, estabelecendo salva‑
guardas contratuais inflexíveis e internalizando o fornecimento em vez
de terceirizá­‑los. Produtores japoneses, como a Toyota, conseguiram
grandes vantagens no desempenho ao operar com base na confiança.
Eles têm sido bem mais eficientes que os produtores norte­‑americanos
ou europeus quanto às horas totais de engenharia necessárias para o de‑
senvolvimento de um novo carro e o número de meses requeridos para
completar e apresentar um novo produto. Seus níveis de qualidade em
geral também têm sido superiores; a confiança nos fornecedores para
manter defeito zero permite ainda economizar custos relativos à inspe‑
ção e à garantia.
Outros exemplos de benefícios que um alto grau de confiança pode
trazer vêm da gestão de operações de investimento estrangeiro na China
continental. Pode­‑se observar que o ambiente dos negócios na China é
semelhante ao de muitos países em desenvolvimento, em que a confiança
pessoal é valorizada, porque os suportes institucionais para garantir os
acordos de negócios, que no Ocidente são considerados inquestionáveis,
são limitados. Em tais circunstâncias, a confiança se torna um ativo em‑
presarial de particular importância a ser cultivado.

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Um estudo com 615 empresas de Hong Kong com operações do ou‑
tro lado da fronteira, na China continental, evidenciou que a confiança
que seus executivos tinham nos executivos e pessoal do continente era
o indicador mais forte do sucesso dessas operações.5 Como seria de es‑
perar, os altos níveis de confiança estavam estreitamente associados ao
desenvolvimento de competências entre o pessoal chinês e os grandes
aperfeiçoamentos tecnológicos em suas unidades. A confiança reforçou
a decisão de investir no desenvolvimento do pessoal local. Ao mesmo
500
tempo, a comprovação do aperfeiçoamento aumentou a confiança dos
executivos de Hong Kong no pessoal, incluindo a disponibilidade em de‑
parte iv  o desenvolvimento de organizações eficientes

legar mais a eles. Como um desses executivos disse: “Os funcionários do


continente trabalham duro e são leais à empresa, por isso confio neles.
Acredito ser ótimo delegar poderes e atribuições a eles. Trabalhadores
confiáveis e competentes fazem o meu negócio prosperar.” Esse círculo
virtuoso também contribuiu para melhorar o desempenho operacional e
financeiro nas unidades da China continental.
Pesquisa anterior realizada junto a joint ventures sino­‑britânicas tam‑
bém mostrou que altos níveis de confiança entre os altos executivos dos
parceiros é um importante fator de sucesso, especialmente por evitar uma
quebra de confiança destrutiva entre esses parceiros, algo de que existem
muitos exemplos. Quando o parceiro britânico não tem a maioria nas
ações da joint venture, a geração de confiança mútua por meio do culti‑
vo do relacionamento entre os parceiros pode criar uma base para com‑
partilhamento da influência em circunstâncias em que direitos jurídicos
contratuais e outros direitos legais não garantem o controle formal. Para
as empresas menores, é especialmente importante que seus executivos
principais encontrem colegas chineses pessoalmente e invistam seriamen‑
te na construção de uma relação de confiança. Enquanto tais empresas
podem aproveitar as oportunidades em nichos de mercado como sistemas
especializados de controle eletrônico, elas não têm recursos financeiros
para se arriscar sozinhas nem os recursos humanos para empreender por
si todas as atividades necessárias. Elas precisam confiar inteiramente no
parceiro local.
Sally Heavens e eu examinamos a experiência de seis equipes mul‑
ticulturais de projeto montadas para atingir determinados objetivos de
aprendizado organizacional.6 Cada equipe foi escolhida para o estudo
porque havia realizado um exemplo evidente de criação de conhecimento.
Apesar da disparidade e do fato de que os processos internos das equipes

Book_Organizaçoes.indb 500 16/9/2011 16:24:05


variavam conforme as restrições de tempo e orçamento, o elemento co‑
mum ao sucesso desses grupos estava na capacidade de cada equipe gerar
confiança mútua entre seus membros. Esse foi um aspecto particularmen‑
te importante nas equipes cujos membros não se conheciam antes.
As equipes enfrentaram problemas causados por diferenças na iden‑
tidade nacional e nos interesses percebidos entre seus membros. Estava
claro que a maneira como as equipes eram gerenciadas reduzia suas dife‑
renças internas e facilitava o trabalho. Quando houve tempo e cuidado
501
para criar uma atmosfera não ameaçadora, permitindo o desenvolvimen‑

Como gerar e utilizar a confiança


to de amizades pessoais, a confiança entre os participantes aumentou. Por
sua vez, essa confiança pessoal foi um fator decisivo para que as equipes
alcançassem as condições necessárias para o aprendizado e a criação do
conhecimento, como a troca aberta de ideias e informações. A confian‑
ça ajudou os membros da equipe a transcenderem os fatores que defi‑
niam suas identidades sociais individuais e que ameaçavam o processo de
aprendizado coletivo. Conforme se estreitavam os relacionamentos entre
seus membros, as equipes aos poucos se sentiam mais à vontade para
trocar ideias e conhecimento e ficaram mais conscientes de um objetivo
comum de aprendizado. A equipe e sua meta proporcionaram uma iden‑
tidade comum aos seus membros.
Nossa conclusão sobre a importância da confiança coincidiu com as
observações dos participantes, além de corroborar uma observação feita
por Claudio Ciborra: “até mesmo os economistas institucionais interessa‑
dos nas arquiteturas das transações entre 'modelos de homens oportunis‑
tas' admitem que a produtividade e competência dos arranjos de equipe
são fortemente influenciadas por [...] todas as sutilezas da qualidade dos
relacionamentos humanos que emergem em uma equipe”.7 Essa observa‑
ção está ilustrada no Quadro 14.1, com um dos casos que estudamos – uma
empresa de águas.
Para resumir, a confiança traz uma série de benefícios importantes
para a colaboração entre nacionalidades, o que é comprovado por sua
associação ao desempenho superior:

1. A confiança gera a boa vontade para superar as diferenças cultu‑


rais e outras que surgem na colaboração.

2. A confiança incentiva os parceiros a trabalharem juntos para lidar


com os imprevistos. Ela permite que se adaptem mais rapidamente

Book_Organizaçoes.indb 501 16/9/2011 16:24:06


Quadro 14.1  Desenvolvendo uma equipe de criação do conhecimento
por meio da confiança

O cenário do trabalho de equipe multinacional neste caso se desenvolveu por


meio de uma série de aquisições. Elas decorreram do desejo de uma companhia
britânica de tratamento de água e esgoto de se expandir em determinada área
de negócios, após a aquisição de uma empresa sueca que detinha a tecnolo‑
gia utilizada nessa área. Subsequentemente, esta última comprou uma empresa
502
norueguesa menor, cujas patentes passaram para a companhia britânica, que
era a proprietária do grupo. Foi estudado o trabalho dessa empresa menor em
parte iv  o desenvolvimento de organizações eficientes

novos processos de tratamento do esgoto – um de uma série de projetos de


colaboração com os escandinavos.
O trabalho em equipe com suecos e noruegueses, com base na tecnologia
desenvolvida pelos últimos, demorou muito para evoluir. O chefe britânico de
inovação tecnológica tinha a missão de estabelecer as regras básicas e um pro‑
grama de pesquisa adequado, mas foi impedido pela empresa norueguesa, que
relutava em contar qualquer coisa por duas razões: em primeiro lugar, por ser
pequena e vulnerável, a empresa receava ser “esvaziada” e ter suas patentes
tomadas e vendidas; em segundo lugar, os noruegueses em geral não gostavam
dos britânicos por conta de contenciosos relacionados à identidade ocupacional
de engenheiros hidráulicos, tais como a chuva ácida e a poluição proveniente
dos esgotos costeiros do Reino Unido. Somente retendo o conhecimento e dis‑
torcendo os canais de informação é que a subsidiária norueguesa acreditava
preservar seu valor, e assim, sua identidade e segurança. A falta de confiança
impedia que os noruegueses contribuíssem para o aprendizado da organização
maior. Observe que o quadro inicial formal de referências, procedimentos e pro‑
gramas criado para o trabalho conjunto e visando promover a confiança mútua
foi insuficiente para facilitar o processo do aprendizado.
As barreiras para a troca de conhecimento começaram a aparecer cerca de um ano
após o início do projeto. As primeiras barreiras, criadas pelo medo e desconfiança da
subsidiária norueguesa, foram superadas pelo relacionamento pessoal criado pelo
novo gerente de projeto com seu colega escandinavo, o que abriu a comunica‑
ção entre o grupo britânico e o norueguês, permitindo o reconhecimento dos
objetivos e benefícios mútuos. O programa de P&D conjunto também foi impor‑
tante para aliviar os receios dos noruegueses e porque serviu de ponte sobre
a divisória nacional, favorecendo o compartilhamento baseado em identidades
científicas comuns. Isso ilustra a importância da congruência das metas, da con‑
ciliação das identidades sociais e da sensação de segurança psicológica como
condições para que os membros da equipe desenvolvam suficiente confiança
mútua para trocar conhecimentos, gerando assim o aprendizado organizacional.

Book_Organizaçoes.indb 502 16/9/2011 16:24:06


O programa de P&D permitiu que as descobertas do projeto fossem aplicadas
a todas as empresas britânicas e escandinavas. As pessoas concordaram que
os processos operacionais relacionados ao cotidiano do tratamento de águas e
esgotos e o conhecimento do processo – a tecnologia de fato de tratamento do
esgoto – melhoraram consideravelmente com o trabalho de grupo. O programa
foi também uma indicação simbólica da nova identidade organizacional que
estava sendo forjada no grupo corporativo internacional.
503

Como gerar e utilizar a confiança


e com menos conflitos a novas circunstâncias que não estavam
previstas em contratos e outros acordos formais.

3. A confiança é um alternativa aos custos e aos efeitos potencialmen‑


te desmotivadores do controle rigoroso e de contratos inflexíveis.

4. A confiança entre organizações ou unidades que colaboram entre


si estimula a abertura para a troca de ideias e informações, o que
é uma condição indispensável para a inovação e outras formas de
criação do conhecimento.

5. Por essas razões, a confiança é um ingrediente particularmente


essencial para o sucesso de equipes e alianças globais.

14.4 Como gerar e manter a confiança


A confiança tem um papel positivo nos relacionamentos de negócios,
mas é um ativo que requer esforço, sensibilidade e tempo para ser cons‑
truído e mantido. A questão é saber como gerar e sustentar a confiança.
Analisarei isso em duas etapas, examinando, primeiro, o complicado caso
das alianças internacionais entre empresas, com uma análise das bases
para a geração da confiança nos negócios sobre as quais ela pode evoluir
com o tempo; e, em segundo lugar, a partir dessa análise, apresentarei
orientações práticas para o cultivo da confiança.

14.4.1 Confiança baseada no cálculo – frequente


ponto de partida
À primeira vista, a confiança baseada no cálculo é aparentemente uma
contradição. Contudo, basta um pouco de cálculo para corroborar a crença

Book_Organizaçoes.indb 503 16/9/2011 16:24:06


de que a ação da outra parte será benéfica e confiável, e não o contrário. O
cálculo de que parceiros de negócios têm competência, habilidade e moti‑
vação para cumprir suas promessas, e de que a reputação e a lei proporcio‑
nam suficientes motivos para impedir que um decepcione o outro, é uma
condição indispensável para estar preparado para cooperar com estranhos
relativos. Algumas autoridades falam sobre isso em termos de “confiança
calculada” – o compromisso de entrar em um relacionamento de negócios
a partir do cálculo dos prováveis resultados relativos aos custos e riscos de
504
sua manutenção (ou, mais tarde, eliminação). Está claro que as salvaguar‑
das legais e outras formalidades serão importantes para o cálculo.
parte iv  o desenvolvimento de organizações eficientes

A confiança baseada primordial ou unicamente no cálculo costuma ser


encontrada em relacionamentos novos, formados entre parceiros ou mem‑
bros de equipe que não têm quaisquer outras conexões sociais anteriores.
Talvez esse seja o único tipo de confiança que pode ser aplicado a transa‑
ções econômicas arm’s lenght, logo impessoais. Não depende de nenhuma
das bases mais tradicionais da confiança, e portanto, deve proceder com
base na proteção institucional e na reputação do parceiro. O investimen‑
to conjunto num contrato de risco pode ser um “refém” contra a fraude.
Outro requisito, que também reduz a motivação de dar para trás mais
tarde, é que os parceiros só entrem em acordo se a colaboração for consi‑
derada justa e equitativa para ambos na partilha dos retornos projetados.
Podemos aplicar o conceito da confiança calculada à formação de
uma nova aliança entre duas empresas. No início dessa formação, os fu‑
turos parceiros deverão concluir se preferem a aliança entre uma série de
alternativas possíveis. Por exemplo, se o objetivo de um dos parceiros é
entrar em um novo mercado, ele tem uma série de possibilidades para
atingir esse objetivo: exportar para esse mercado usando agentes locais,
licenciar a tecnologia ou franquear uma marca para um produtor local,
formar uma aliança com uma empresa local (na forma de colaboração,
joint venture ou fusão) ou estabelecer uma subsidiária própria. A escolha
entre essas alternativas será provavelmente definida em função das inten‑
ções estratégicas do parceiro e da experiência anterior de gerenciar dife‑
rentes formas de entrada em mercado. Estará quase inteiramente baseada
no cálculo dos custos e benefícios relativos de cada alternativa. Nessa
etapa, o cálculo baseia­‑se primordialmente na inteligência do negócio.
Se decidir explorar as possibilidades de formar uma aliança, a seleção
de um parceiro também deve ser baseada no cálculo. Em princípio, os
possíveis parceiros procuram descobrir o máximo que podem um sobre

Book_Organizaçoes.indb 504 16/9/2011 16:24:06


o outro, depois cotejam a informação obtida com uma série de critérios
para avaliar o grau de ajuste estratégico entre eles. Na verdade, as infor‑
mações sobre possíveis parceiros são limitadas, especialmente em rela‑
ção a sua culturas, suas competências e valores internos, o que significa
que os julgamentos terão como base a reputação dos parceiros, incluindo
aqueles relativos à confiança. Essa etapa tem sido chamada de “etapa da
informação”, durante a qual os potenciais parceiros tentam descobrir o
máximo possível sobre o outro. Essa fase precede o início das negociações
505
e o contrato. Ao aprenderem um sobre o outro, os parceiros também en‑
tram no processo de se conhecerem.

Como gerar e utilizar a confiança


No caso de uma suposta aliança internacional, a natureza das dife‑
renças culturais entre os parceiros em perspectiva também se tornará evi‑
dente. Essas diferenças podem inibir o desenvolvimento da compreensão
e confiança mútuas, colocando em risco o movimento em direção a um
acordo formal, possibilidade bastante realista quando as alianças são dis‑
cutidas entre parceiros de sociedades cultural e institucionalmente dife‑
rentes. Nessa etapa, a troca de informações depende do desenvolvimento
inicial da confiança, que, por sua vez, depende de como as relações entre
os parceiros são afetadas por sua distância cultural.
Quando a coleta de informações passa para a etapa da negociação,
cada uma das partes complementará seu conhecimento sobre salvaguar‑
das legais, institucionais e outras com a informação direta que terão
obtido por meio do contato pessoal. Com isso, eles podem iniciar um re‑
lacionamento e lançar a segunda base para a confiança, que é o conheci‑
mento mútuo. Uma negociação bem­‑sucedida não é apenas um contrato
fechado por consenso mútuo; é também o começo de um relacionamento
baseado na confiança. Nesse momento se sobrepõem as duas etapas da
construção da confiança: o cálculo e a compreensão mútua. Não há como
prever todas as questões que venham a surgir nos termos de um contrato
formal em uma aliança. Tais questões terão de ser resolvidas, e a confian‑
ça será decisiva para a solução, permitindo uma discussão construtiva do
problema em vez de um enfrentamento hostil.

14.4.2 Confiança baseada na compreensão mútua –


construção a partir do trabalho conjunto
A segunda base para a confiança é de natureza mais tradicional: é a
confiança mútua, que vem do conhecimento e da experiência em comum

Book_Organizaçoes.indb 505 16/9/2011 16:24:06


dos parceiros. Como um gerente de compras disse uma vez: “Desde que
trabalho aqui, a companhia X jamais nos deixou na mão. Quando eles
prometem entregar, sempre entregam. Creio que é uma empresa honesta,
que jamais jogará sujo comigo”. Quando trocas repetidas correspondem
às expectativas das partes, estas se sentem confiantes de que o parceiro
não trapaceia e é capaz de cumprir suas promessas. Isso é importante,
porque nos negócios a confiança depende da capacidade para cumprir os
acordos e também da intenção em cumpri­‑los. A percepção do risco en‑
506
volvido na fase inicial de cálculo é reduzida por meio da experiência po‑
sitiva do trabalho conjunto. Isso explica por que os empresários tendem
parte iv  o desenvolvimento de organizações eficientes

atribuir cada vez menos importância aos termos de contratos formais


quanto mais longo for o relacionamento entre eles.
A essa altura, os parceiros acumulam mais conhecimento uns sobre
os outros e criam maneiras de pensar em comum por meio da troca de
ideias e experiências. Pensemos novamente no caso da aliança estra‑
tégica. Logo depois de sua formação, com o capital e outros recursos
devidamente alocados, há uma fase de implementação, durante a qual
a aliança um contrato de risco produtivo. Na implementação, pessoas
são nomeadas, tecnologias e sistemas são instalados e as operações, ini‑
ciadas. Essa fase é de extrema importância para a qualidade das rela‑
ções de cooperação em uma aliança. Para trabalhar juntas, as pessoas
nomeadas podem ter ou não as necessárias competências técnicas para a
aliança dar certo, e o mesmo se dá em relação às competências culturais.
Se não existirem tais competências e, em consequência, os fundadores
da aliança, os cálculos subjacentes para a aliança podem não ser mais
válidos.
Portanto, é essencial não violar a base do cálculo que determinou a
disposição dos parceiros em entrar em um relacionamento colaborativo,
mesmo com o investimento e o risco implícitos. Uma vez implementada
a aliança, ou quando uma equipe começa a trabalhar, seus membros têm
a oportunidade de se conhecer com mais intensidade. A crescente compe‑
tência de se entenderem e prever as ideias e as ações um do outro oferece
mais uma base para a confiança entre eles. Tal compreensão mútua pode
reduzir a incerteza que parceiros de aliança e membros de equipe sentem
uns em relação aos outros.
Os sistemas instalados na implementação, especialmente os que
servem para relatórios de controle e informação, são por essa razão
muito significativos. A maneira como são desenhados e operados pode

Book_Organizaçoes.indb 506 16/9/2011 16:24:06


determinar a qualidade do conhecimento disponível para cada parceiro.
Por exemplo, se os sistemas de contabilidade, marketing, operacional e
de informação técnica de um parceiro são instalados em uma joint ven‑
ture, eles aprimoram a qualidade do conhecimento disponível para esse
parceiro, mas não necessariamente para o outro. Portanto, o primeiro
parceiro goza de uma base para uma confiança crescente que está sendo
negada ao outro. Da mesma forma, se o pessoal designado para trabalhar
na aliança não se preocupa em compreender as culturas do outro, dimi‑
507
nuirá a probabilidade de criarem um relacionamento estreito em que haja
conhecimento e respeito mútuo.

Como gerar e utilizar a confiança


14.4.3 Confiança baseada no vínculo – construção
a partir do gostar do outro
Uma terceira base para a confiança está associada a fortes relaciona‑
mentos pessoais, como os de uma família ou entre amigos íntimos. Essa
forma da confiança surge entre pessoas que têm uma identidade comum,
o que significa que têm valores semelhantes, incluindo um mesmo con‑
ceito de obrigação moral. Psicologicamente, pessoas nessa situação terão
“vínculos” que as unem.
Esses vínculos não são tão incomuns nas relações de negócios, como
se poderia pensar. Quando um relacionamento de negócios é mantido por
um longo período e as partes se reúnem com regularidade, elas terminam
se identificando umas com as outras e estabelecem um vínculo psicológi‑
co. Assim, são desenvolvidos relacionamentos estáveis. A abertura resul‑
tante de um relacionamento próximo permite que as pessoas se conheçam
mais, o que tende a reforçar o relacionamento.
Conforme os relacionamentos se desenvolvem com o tempo, no con‑
texto de uma colaboração bem­‑sucedida, há uma tendência natural de
que os envolvidos se identifiquem cada vez mais uns com os outros e
aumentem seus laços emocionais. Formam­‑se vínculos entre os parceiros,
que alguns especialistas argumentam ser um importante requisito para o
sucesso da colaboração. Um círculo virtuoso pode ser estabelecido, incen‑
tivando e reforçando a confiança e a cooperação. É claro que tal círculo
pode ser rompido e revertido, como observaremos adiante. Embora o
vínculo normalmente surja depois de alguns anos de boa colaboração,
sob certas circunstâncias ele pode se tornar a base inicial para o estabele‑
cimento de uma colaboração, como acontece quando amigos íntimos ou

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familiares decidem montar um negócio ou quando é formada uma equipe
de pessoas que já têm grande amizade.
O sucesso da colaboração entre o Royal Bank of Scotland e o Banco
Santander ilustra a possibilidade de uma confiança que evolui para o
nível de um vínculo. Ambos os bancos possuem participação minoritá‑
ria um do outro, mas não estabeleceram uma estrutura legal para sua
colaboração. Quando estudei esse caso, no final dos anos 1990, a cola‑
boração já prosperava há mais de uma década. Dois diretores de nível
508
intermediário, um britânico e um espanhol, dividiam a responsabilidade
para facilitar o alcance dos objetivos de negócios da aliança: (1) criar
parte iv  o desenvolvimento de organizações eficientes

bases lucrativas de clientes na Europa, (2) prestar serviços para pessoas


físicas e jurídicas dos dois grupos e (3) comercializar serviços financei‑
ros melhores no estrangeiro. Em conjunto, eles prestavam contas a uma
Comissão de Fiscalização, da qual participavam os diretores executivos
de cada banco, e se reuniam a cada mês e meio para examinar os avanços
e as estratégias da aliança.
O relacionamento entre os bancos, mediado pelos dois diretores da
aliança, evoluiu ao longo da curva da confiança. O diretor espanhol me
disse:

“… a primeira realização é o fato de ainda estarmos juntos, de hoje ser‑


mos mais amigos que éramos; no início foi preciso esforço dos dois lados,
porque me lembro de apresentações em que era chamado um gerente
regional para explicar o que fazia, e ele sussurrava: ‘até onde posso ir, o
que posso contar para eles?’ – e a resposta era: ‘tudo. Fale sobre as suas
vitórias, os seus fracassos, as suas frustrações, o seu lucro, a sua perda.
Conte tudo’.”

Mediante uma abordagem aberta do compartilhamento de suas


experiências em processos e conexões das filiais, “pouco a pouco, co‑
meçamos a dizer 'podemos aprender isso', que 'eles estão fazendo isto
melhor do que nós' – e eles diziam o mesmo sobre certas coisas que
estávamos fazendo”. A única barreira para o aprendizado, identificada
tanto pelos parceiros britânicos como pelos espanhóis, era a língua; o
primeiro se refere a “nossa incapacidade de, corporativamente, falar
espanhol” e o último diz que “a língua acabou sendo um obstáculo
quase insuperável”. Contudo, em última análise, a língua não diminuiu
a importância do sucesso global de uma aliança que, como observa o

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diretor britânico, “nos negócios, talvez seja menor do que a média; mas
salta acima da média quando se acrescenta o aspecto do aprendizado,
da troca de ideias”.
O trabalho desses dois diretores da aliança era monitorar as oportu‑
nidades para o desenvolvimento de negócios em comum, e como observa
o diretor britânico, “estimular tantas ligações quanto possível para os
propósitos do negócio”. Isso abrangia facilitar de forma abrangente os
relacionamentos pessoais, espelhando a relação entre ele e seu colega es‑
panhol, que disse: 509

Como gerar e utilizar a confiança


“O que tentamos e fazemos é chamar o chefe de uma unidade [de nosso
banco] e o chefe de unidade semelhante do banco [do parceiro], colocar
os dois juntos e esperar que algo aconteça. É difícil: nunca se pode esque‑
cer as personalidades humanas. Estou certo de que poderíamos trocar de
lugar um com o outro e continuaríamos com a mesma competência um
no banco do outro, porque nos tornamos muito íntimos em todas as áreas
dos negócios e das ideias. E isso tem nos ajudado imensamente.”

Essa colaboração levou a notáveis melhorias na capacidade de venda


e na competência organizacional do banco britânico, enquanto o parceiro
espanhol se beneficiou em áreas como a qualidade dos serviços e clientes
corporativos.
A Figura 14.1 resume a evolução dos relacionamentos baseados na
confiança analisados nesta seção.
É importante fazer mais duas observações relativas a essa análise. Em
primeiro lugar, como vimos em relação aos dois bancos, geralmente serão
relativamente poucos os indivíduos que se relacionarão entre si além das
fronteiras das organizações em cooperação. O mesmo acontece com as
equipes. Pode­‑se dizer que a confiança existente entre as organizações e

Figura 14.1  Etapas na evolução da confiança

CÁLCULO COMPREENSÃO VÍNCULO


“Preparando­‑me “Conhecendo “Identificando­‑me
para trabalhar você” com você”
com você”

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nas equipes vem da qualidade da confiança mútua que existe entre esses
indivíduos. Os membros da organização dos quais depende o sucesso
da colaboração poderiam, portanto, justificadamente ser chamados de
“guardiões da confiança”. Além desses dois bancos, algumas outras em‑
presas, como a Hewlett­‑Packard atribuem papéis desse tipo: no caso da
HP eles são chamados de “gerentes de relacionamento”. A contribuição
desses guardiões da confiança para a cooperação organizacional depende‑
rá (1) da confiança mútua que se desenvolver entre eles, (2) da influência
510
que tiverem em suas respectivas organizações, e (3) de quantos existirem
em cada organização.
parte iv  o desenvolvimento de organizações eficientes

Depreende­‑se, então, que se houver rotatividade frequente do pes‑


soal alocado pelos parceiros para uma aliança ou uma equipe interna‑
cional, as oportunidades para o desenvolvimento de uma cooperação
baseada na confiança entre eles serão diminuídas. As viagens a trabalho
ao exterior para o pessoal de um parceiro de uma aliança estrangeira são
em geral de duração limitada, especialmente quando o outro parceiro
está localizado em um país em desenvolvimento em que as condições são
difíceis. Isso pode inibir o desenvolvimento da confiança em alianças in‑
ternacionais, principalmente quando a cultura do parceiro local atribui
grande valor às transações baseadas em relacionamentos pessoais.
Em segundo lugar, a cooperação baseada na confiança entre alianças é
vulnerável. Como já foi observado no Capítulo 10, as alianças se baseiam
na cooperação entre parceiros cujos interesses em geral não coincidem
inteiramente, e que, no caso de alianças horizontais, poderiam se tornar
concorrentes em algum momento no futuro. O modelo multietapas de
evolução da confiança aponta o risco de fracasso num relacionamento de
aliança em qualquer etapa de seu desenvolvimento, quando são retiradas
as bases anteriores da confiança. Não é possível que um vínculo sustente
um relacionamento de negócios se um ou todos os parceiros chegam à
conclusão que a base do cálculo ou da previsão de sua cooperação desa‑
pareceu. Foi sugerido anteriormente que essa é especialmente a reação de
executivos ocidentais.
Da mesma forma, quando há um problema na construção da base
para um nível superior de desenvolvimento da confiança, como o sur‑
gimento de uma antipatia pessoal, talvez seja necessário retornar às ba‑
ses iniciais para a recriação do relacionamento. Por exemplo, se surgir
aversão ou animosidade pessoal entre os guardiões da confiança de duas

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organizações, talvez ainda seja possível resgatar o relacionamento entre
as organizações por meio de seus líderes, que podem admitir que há be‑
nefício econômico para as duas partes. Aqui estamos presumindo uma
hierarquia de bases para a confiança e cooperação, com o cálculo na base,
a previsão no meio e o vínculo pessoal no alto.

14.5 Orientações para o cultivo da confiança


511
O fato de a confiança nas relações de negócio se desenvolver por meio

Como gerar e utilizar a confiança


de muitas etapas e possuir bases diferentes nos ajuda a identificar o tipo
de políticas e medidas práticas que podem ser tomadas para desenvolvê­
‑la e promovê­‑la.

14.5.1 Criação de uma base clara e calculável para


benefício mútuo
Em qualquer colaboração é indispensável manter a clareza e o rea‑
lismo nos compromissos que os participantes se propõem a cumprir. Há
cinco aspectos a levar em conta:

1. Os compromissos devem ser realistas e, portanto, estão sujeitos a


cálculo e exame minuciosos. Os participantes devem ter capacida‑
de para honrar esses compromissos.

2. Os parceiros também devem ter a intenção de honrar seus compro‑


missos. Por isso, deve ser investigada sua reputação em relação à
confiança e à confiabilidade. Em geral, isso é bem mais fácil de
descobrir para fins de colaboração em uma empresa ou em um
mesmo país que para alianças internacionais entre empresas.

3. O comprometimento que cada um dos participantes oferece deve


ser suficiente para que, juntos, correspondam ao alcance do obje‑
tivo de sua colaboração.

4. Em uma etapa inicial, antes que qualquer confiança possa ser esta‑
belecida, é importante pesquisar as salvaguardas formais disponí‑
veis caso algum parceiro da colaboração não cumpra sua parte.
Em uma empresa, esse sistema de vagas pode constar das diretivas
da gestão ou ser administrado por meio das práticas usuais. Nas

Book_Organizaçoes.indb 511 16/9/2011 16:24:07


colaborações entre empresas, é pertinente verificar as salvaguar‑
das institucionais legais e outras, caso um dos parceiros deixe de
cumprir seus compromissos.

5. Por fim, mas de importância especial na colaboração entre empre‑


sas, o acordo entre os parceiros deve ser fechado por escrito, em
detalhe e sem ambiguidades.

512 A lógica por trás dessas orientações vem da probabilidade de que a


primeira etapa no estabelecimento de uma colaboração, até mesmo den‑
parte iv  o desenvolvimento de organizações eficientes

tro de uma empresa, exija o cálculo de parte a parte. Se o cálculo estiver


errado no início, esse relacionamento se torna imediatamente refém de
censura e de recriminação. “Funcionar bem” com outros membros de
uma equipe ou parceiros de uma aliança é essencial, e apressar o pro‑
cesso é uma falsa economia. De qualquer maneira, isso pode ser feito
muito rápido, talvez em questão de poucas semanas, no caso de uma
nova equipe formada por membros da mesma empresa que, em geral, já
se conhecem.
A situação é diferente na formação de novas equipes de gestão
conjunta em joint ventures internacionais. Tal processo deve avançar
de uma situação em que as partes permanecem conscientes de suas
identidades sociais separadas para uma em que constroem uma nova
identidade conjunta. Na prática, isso pode demorar muitos anos e às
vezes sequer ser atingido.8 No caso das alianças, algumas empresas,
como a Corning Glass preferem por esse motivo um “namoro”, em
que a colaboração começa de forma limitada e, se bem­‑ sucedida,
transforma-se em uma joint venture totalmente desenvolvida. Muitas
alianças potenciais são fechadas com parceiros futuros cujas compe‑
tências ou cujo acesso ao mercado não são conhecidos. Isso costu‑
ma acontecer com parceiros de países em desenvolvimento. Em tais
casos, é imprescindível fazer uma avaliação completa do parceiro
na perspectiva e no contexto em que este opera, e não confiar no
que a outra parte informa à guisa de estimativas ou garantias. Para
um parceiro potencial é tentador prometer mais que realisticamente
pode oferecer, quando está ansioso para conseguir a cooperação de
outra empresa cuja assistência técnica ou financeira é considerada
uma prioridade estratégica.

Book_Organizaçoes.indb 512 16/9/2011 16:24:07


14.5.2 Aperfeiçoamento da previsibilidade mútua: a
luta para resolver conflitos e manter a
comunicação aberta
Costumam surgir conflitos entre parceiros e membros de equipes,
mesmo quando não há muito conflito inerente entre os seus interesses
subjacentes. Frequentemente surgem conflitos em equipes de uma única
organização, e, claro, há maior probabilidade de ocorrerem entre pes‑
513
soas de organizações diferentes. Em geral, há uma mistura de disputas

Como gerar e utilizar a confiança


“duras”, sobre questões tecnológicas ou financeiras, e atritos de natureza
cultural e interpessoal, mais “suaves”. Em cada caso é importante evitar
surpresas perturbadoras, além de ter mecanismos para resolver os confli‑
tos desde o início da colaboração.
Estudos sobre a dinâmica de grupos de trabalho mostraram que nor‑
malmente são necessárias duas formas de liderança: uma é a “liderança de
tarefa” e a outra tem sido chamada de “liderança de manutenção”. A lide‑
rança de tarefa mantém a equipe focada para que seus esforços permaneçam
dirigidos para a meta que a equipe decidiu alcançar. A liderança de manu‑
tenção procura manter a equipe como um grupo, removendo as causas dos
conflitos, aumentando a motivação e assim por diante. Como as equipes são
grupos que não trabalham isolados de outras partes da organização, ou que
numa aliança não trabalham isolados dos membros de suas empresas, outra
função da liderança é a gestão dos limites externos da equipe.9
Como já foi visto, a confiança exige uma base inicial que é assegurada
por uma boa liderança de tarefa que esclareça os objetivos de uma equipe
e assegure que tal equipe receba o suporte adequado para realizá­‑los, di‑
minuindo a ameaça de fracasso. A partir daí, o aspecto da manutenção se
torna mais proeminente para o desenvolvimento da confiança, até mesmo
a manutenção de relações de apoio com organizações e grupos externos.
Em alianças estratégicas, os “guardiões da confiança” desempenham tan‑
to funções de tarefa como de manutenção com relação à qualidade da
colaboração entre as empresas parceiras. Eles têm um papel valioso na
preparação do terreno para novos projetos colaborativos, evitando sur‑
presas e ajudando a resolver conflitos.
O risco das disputas “duras” para a confiança também pode ser re‑
duzido por meio de certas rotinas que forneçam as informações entre
os membros de equipe ou aliança. Essas rotinas ajudam a desenvolver a

Book_Organizaçoes.indb 513 16/9/2011 16:24:07


confiança baseada no conhecimento e na previsibilidade. Um exemplo
nas alianças é a organização de reuniões periódicas e frequentes entre
os executivos e o pessoal indicado para a aliança pelos parceiros. Essas
reuniões devem estabelecer os fatos sobre quaisquer assuntos em ques‑
tão, anotando­‑se a discussão e as soluções apresentadas. Essas anotações
servem de base para a solução de problemas em nível mais alto entre os
parceiros, quando não há solução na unidade da aliança ou na própria
equipe colaborativa. Uma importante meta de reuniões e outros mecanis‑
514
mos formais para solucionar conflitos é assegurar que disputas relativa‑
mente “duras” não se transformem em antipatias pessoais ou se misturem
parte iv  o desenvolvimento de organizações eficientes

com elas. A ideia é despersonalizar essas questões tanto quanto possível.


Outra abordagem importante para diminuir a incidência de disputas
“duras” é investir na especificação formal de regras e orientações apro‑
priadas. Elas esclarecem questões como as expectativas de desempenho
das equipes e joint ventures. Além disso, também podem indicar o re‑
conhecimento que os membros da equipe receberão por revelar seu co‑
nhecimento tácito e o reconhecimento de direitos de propriedade sobre
a tecnologia em uma aliança. Talvez seja necessário maior investimento
de tempo dos executivos seniores para entrar em acordo a respeito dessa
formalização na etapa inicial da colaboração.
Além do mais, cláusulas formais podem estimular a troca de informa‑
ções entre os membros de uma aliança ou equipe, dentro dos limites dos
direitos de confidencialidade e propriedade intelectual que foram aceitos
por consenso nos termos da cooperação. Embora não possam garantir a
quantidade e a qualidade da troca de informações, procedimentos como
senha para ter acesso às redes de computador, a circulação de material
bem documentado antes das reuniões e a disseminação regular de dados
de desempenho da aliança ou de progresso da equipe podem ser de gran‑
de ajuda. Com o tempo, essa troca de informações contribui para romper
barreiras entre pessoas de diferentes backgrounds e com diferentes res‑
ponsabilidades que foram designadas para trabalhar em conjunto. Isso
ajudará a gerar confiança mútua, desenvolvendo­‑a além da base de cál‑
culo para uma base de compreensão e de previsibilidade compartilhadas.
Certo grau de estruturação parece facilitar o desenvolvimento da con‑
fiança, mesmo quando os colaboradores vêm de territórios culturalmen‑
te semelhantes. O mencionado estudo de empresas de Hong Kong com
operações na China continental é um exemplo. Confiança nas políticas
para construção da confiança, que visavam estabelecer relacionamentos

Book_Organizaçoes.indb 514 16/9/2011 16:24:07


pessoais entre o pessoal de Hong Kong e o pessoal do continente, certa‑
mente ajudou. No entanto, a introdução dos métodos padronizados da
empresa nas unidades da China contribuiu ainda mais para o desenvol‑
vimento da confiança, principalmente por ter ajudado a estabilizar as ex‑
pectativas. Essa abordagem é uma espécie de “microinstitucionalização”
de atitudes e comportamento, o que está na alçada do controle de uma
empresa e pode ser feito por meio de treinamento adequado.
Os métodos para reduzir conflitos interpessoais de natureza mais
515
“suave” em relacionamentos de cooperação são menos formais, mas
também devem ser organizados. No centro desse esforço está a sensi‑

Como gerar e utilizar a confiança


bilização sobre como as pessoas que trabalham juntas, provenientes
de diferentes departamentos, unidades ou empresas, percebem umas as
outras. Consultores especializados em desenvolvimento organizacional
elaboraram técnicas bastante conhecidas para resolver essa questão, que
geralmente funcionam na cultura ocidental. Outras abordagens, no en‑
tanto, serão necessárias para a colaboração em culturas não ocidentais,
não exigindo os “confrontos” rápidos preferidos nos Estados Unidos,
mas um processo mais paciente de discussão e socialização que exponha
menos o indivíduo.
A questão da “inveja” e os problemas organizacionais que surgem da
discriminação percebida no tratamento de pessoas oriundas de diferen‑
tes backgrounds também deverão ser sistematicamente abordados. Por
exemplo, podem surgir sérios problemas interpessoais em joint ventures
com empresas estrangeiras estabelecidas nos países em desenvolvimento
no que tange às imensas disparidades na remuneração oferecida a exe‑
cutivos estrangeiros e locais. O ressentimento local relativo às elevadas
recompensas dos chamados “expatriados” pode ser minorado ao atribuir
esses custos diretamente ao parceiro estrangeiro em vez de considerá­
‑lo encargo direto da aliança. Contudo, a solução mais efetiva é deixar
clara para todos os interessados a base para essa recompensa em relação
a qualificação, desempenho, fatores de mercado e assim por diante. Isso
ajuda a explicar a lógica do sistema de recompensa e também indica os
possíveis canais para aperfeiçoamento que estão abertos aos executivos e
ao pessoal local.
É claro que medidas desse tipo, tomadas para eliminar os conflitos
interpessoais, se bem­‑sucedidas também ajudarão a eliminar barreiras para
o estabelecimento de amizades pessoais entre os membros da aliança e da
equipe. A terceira base importante para a confiança é o vínculo da amizade.

Book_Organizaçoes.indb 515 16/9/2011 16:24:07


14.5.3 Passando para o vínculo recíproco
A cuidadosa seleção dos que vão trabalhar juntos em uma equipe ou
aliança contribui para o fortalecimento de vínculos. A seleção não deve
usar apenas o critério da competência técnica, por mais importante que
seja, mas ter como base também a avaliação de sua capacidade para criar
bons relacionamentos com pessoas de outras culturas organizacionais,
ocupacionais ou nacionais. O histórico pode dizer muito sobre isso. Por
516 esse motivo, algumas empresas globais têm agora criado oportunidades
para que os executivos expatriados de alianças bem­‑sucedidas permane‑
parte iv  o desenvolvimento de organizações eficientes

çam em suas atribuições internacionais e interorganizacionais sem detri‑


mento ao progresso de sua carreira na corporação de origem. Pessoas de
mente aberta e personalidade sem preconceitos têm mais probabilidade
de criar vínculos pessoais em alianças e equipes. Essas características po‑
dem ser avaliadas por meio de cuidadosa observação, e quando necessá‑
rio, de testes de personalidade.
O vínculo pessoal é promovido pela socialização, e é importante
estimulá­‑la entre os envolvidos em colaborações. Quando as pessoas
são reunidas para trabalhar em uma equipe multinacional ou em uma
aliança internacional, sua participação em esportes e eventos sociais
pode ajudar a romper barreiras entre elas. No caso de expatriados
apontados para trabalhar nas alianças, atividades conjuntas como es‑
sas, junto com atividades de caridade e patrocínio na comunidade local,
ajudam a promover o vínculo mútuo, além de evitar a criação de guetos
de expatriados. Essas iniciativas também ajudam a criar uma identidade
social comum.
No caso de alianças, uma importante maneira de estimular o vínculo
entre as pessoas diretamente envolvidas na colaboração é que os líderes
das organizações cooperantes mantenham contatos amistosos periódicos.
Isso significa planejar visitas pessoais entre os diretores executivos pelo
menos uma vez por ano, e dar a essas visitas toda a publicidade possível.
Além do mérito inerente para resolver quaisquer diferenças de visão entre
os parceiros e para estabelecer planos para o futuro, essas visitas estabele‑
cem um exemplo importante e um clima de cooperação entre os que tra‑
balham nos níveis inferiores da aliança. O apoio da direção é igualmente
essencial para o sucesso da colaboração em equipes internacionais, e deve
ser visível para todos os que trabalham abaixo dela.

Book_Organizaçoes.indb 516 16/9/2011 16:24:07


O tempo da designação do pessoal para uma atividade colaborativa
também é uma questão importante. Quanto mais curto, menor a chan‑
ce de se obter o vínculo pessoal. Equipes de projeto geralmente traba‑
lham numa escala de tempo curta, mas o vínculo entre seus membros
deve ser fortalecido se já trabalharam juntos em outra equipe. O tempo
necessário para que os participantes de alianças e equipes de projeto
superem a falta de familiaridade uns com os outros será maior se tive‑
rem de aprender uma língua. Os indicados para uma colaboração mais
517
longa também têm mais probabilidade de investir em relacionamentos
nessa colaboração, porque a consideram parte mais significativa de sua

Como gerar e utilizar a confiança


carreira. As empresas ocidentais, especialmente as norte­‑americanas,
costumam nomear seu pessoal para alianças em contratos de no máxi‑
mo quatro anos, ao passo que as empresas japonesas costumam fazê­‑lo
até pelo dobro desse tempo. Isso reflete uma diferença cultural na im‑
portância atribuída aos relacionamentos pessoais. Os parceiros prove‑
nientes de países em que o relacionamento pessoal é um requisito para
a cooperação nos negócios em geral se queixam de que o tempo do
pessoal designado para suas alianças é muito curto para a formação de
qualquer vínculo pessoal.
Naturalmente, é impossível legislar a respeito do desenvolvimento de
amizade pessoal entre os que trabalham juntos em uma aliança estraté‑
gica ou equipe multinacional. É inevitável haver um elemento de impre‑
visibilidade na dinâmica interpessoal. Não obstante, políticas como as
esboçadas anteriormente podem ajudar bastante, principalmente quando
não há nenhum conflito fundamental de interesses funcionando como
obstáculo entre os interessados. E uma vez estabelecidos, o vínculo pes‑
soal e a sensação de uma identidade comum entre parceiros de aliança
ou equipe podem reforçar sua determinação em resolver os problemas do
negócio, e fornecem uma base sólida para a confiança recíproca quando
o fazem.

Resumo
1. A confiança diz respeito à disponibilidade de pessoas ou grupos de
se relacionarem uns com os outros na crença de que as ações do ou‑
tro serão mais benéficas que prejudiciais, embora isso não possa ser
garantido.

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2. A confiança é essencial para uma boa colaboração nos relacionamen‑
tos das organizações, especialmente naqueles que envolvem pressões de
diferentes ambientes e culturas. Essas colaborações variam de equipes
multifuncionais a alianças e outras redes que atravessam fronteiras orga‑
nizacionais e nacionais. Uma pesquisa recente demonstra os benefícios da
confiança para o desempenho.

3. A confiança encoraja a vontade de trabalhar em conjunto e lidar com


518 circunstâncias imprevistas, e fazer os ajustes necessários não previstos em
acordos formais. Ela é uma alternativa aos custos e aos efeitos potencial‑
parte iv  o desenvolvimento de organizações eficientes

mente desmotivadores do controle e da alta dependência de contratos,


estimulando a troca de ideias e informações, que são condições indispen‑
sáveis para a inovação e o aprendizado organizacionais.

4. A compreensão informal, baseada na confiança, em geral é um fator


mais poderoso na determinação do sucesso da colaboração que arranjos
formais, como contratos.

5. A confiança “tradicional” vem da participação em um grupo social,


como a família ou a comunidade. Ela é reforçada pelas normas do grupo
que regem o comportamento aceito. A confiança tradicional se baseia
em relacionamentos pessoais e é reforçada por uma experiência positiva
nesses relacionamentos.

6. As disposições institucionais constituem o outro fundamento crucial


da confiança. Contratos jurídicos que devem ser respeitados e certificados
de competência e qualidade emitidos por órgãos oficiais autorizados são
alguns exemplos dessas disposições institucionais.

7. Uma combinação de elementos tradicionais e institucionais permite en‑


tender a maneira como a confiança nas colaborações nos negócios pode
se desenvolver por meio do cálculo, da compreensão mútua e do vínculo
pessoal. O primeiro estabelece a disponibilidade em fazer negócios ou
trabalhar com outra pessoa, grupo ou organização. A segunda dá lugar à
confiança com base na previsibilidade mútua, quando as partes começam
a se entender melhor, enquanto o vínculo pessoal reforça o relacionamen‑
to com base na amizade pessoal.

8. Por sua vez, esses elementos levam a orientações práticas que visam
criar uma base clara e calculável para benefício recíproco, melhorando a
previsibilidade mútua e evoluindo para o vínculo mútuo.

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Questões para discussão
1. Como você definiria “confiança”? Você acha que hoje ela está aumen‑
tando ou diminuindo nas organizações?

2. Discuta as diferenças entre as bases tradicionais e institucionais da


confiança.

519
3. Quais são as duas áreas da colaboração especialmente significativas nos
negócios modernos? Qual é a influência da confiança sobre elas?

Como gerar e utilizar a confiança


4. Quais são os principais benefícios da confiança nas organizações e entre
elas?

5. Levando em consideração o Capítulo 13, discuta o relacionamento entre


confiança e criação do conhecimento/aprendizado.

6. Diante do que você já leu até aqui, e tendo em vista especialmente os


Capítulos 2, 3, 5, 8, 9 e 10, reflita sobre o significado da confiança para
as novas formas organizacionais.

Notas
1. Boa parte deste capítulo se baseia em CHILD, John. Trust: The fundamental
bond in global collaboration. Organizational Dynamics, 29, p. 274­‑288, 2001.

2. PARKHE, Arvind. Understanding trust in international alliances. Journal of


World Business, 33, p. 219–240, 1998a; PARKHE, Arvind. Building trust in
international alliances. Journal of World Business, 33, p. 417– 437, 1998b.

3. EDMONDSON, Amy. Psychological safety and learning behavior in work te‑


ams. Administrative Science Quarterly, 44, p. 350–383, 1999; SALK, Jane E;
SHENKAR, Oded. Social identities in an international joint venture: an explo‑
ratory case study. Organization Science, 12, p. 161­‑178, 2001.

4. PARKHE, Arvind, 1998a, op. cit.

5. CHILD, John; MÖLLERING, Guido. Contextual confidence and active trust


development in the Chinese business context. Organization Science, 14, p. 69­
‑80, 2003.

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6. HEAVENS, Sally; CHILD, John. Mediating individual and organizational
learning: the role of teams and trust. Ensaio apresentado na 3rd Interna‑
tional Conference on Organizational Learning, Lancaster, jun. 1999.

7. CIBORRA, Claudio U. Teams, Markets and Systems. Cambridge: Cambridge


University Press, 1993. p. 56.

8. SALK, Jane E; SHENKAR, Oded. Social identities in an international joint ven‑


ture: an exploratory case study. Organization Science, 12, p. 161­‑178, 2001.
520
9. MCKENNA, Eugene. Business Psychology and Organisational Behaviour. 3.
ed. Hove: Psychology Press, 2000. cap. 10.
parte iv  o desenvolvimento de organizações eficientes

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Capítulo 151
Governança corporativa nas novas
formas organizacionais

Conteúdo do capítulo
Este Capítulo começa mostrando a surpreendente falta de diálogo entre o
estudo da governança corporativa e o das novas formas organizacionais.
Depois, descreve a crescente preocupação acerca da governança corporativa,
normalmente entendida como um problema de como responsabilizar os
executivos como agentes dos acionistas ou dos stakeholders. O Capítulo
examina as implicações da agência de dois desdobramentos na forma
organizacional: a devolução da iniciativa nas empresas e as parcerias entre
empresas. Enquanto as novas formas organizacionais apresentam novos
desafios de agência, também oferecem oportunidades para se pensar a
governança corporativa de forma mais inclusiva, o que pode ajudar a
resolver a séria quebra da confiança entre executivos seniores
e empregados.

15.1 Introdução
A governança corporativa e as novas formas organizacionais são dois
dos temas abordados com mais frequência nos negócios e na administra‑
ção. Elas são complementares, pois a governança corporativa preocupa­
‑se com a maneira como os gestores podem ser responsabilizados pelo

Book_Organizaçoes.indb 521 16/9/2011 16:24:08


o alcance das metas dadas às empresas, enquanto o ímpeto para desen‑
volver novas formas de organização vem da necessidade de atingir essas
metas com mais eficácia nas condições instáveis do mundo dos negócios
contemporâneos.
Assim, é surpreendente descobrir que tem havido pouquíssimo
diálogo entre esses dois campos de investigação. Especialistas em con‑
tabilidade, finanças e direito têm dominado as discussões da gover‑
nança corporativa. A maioria considera inquestionável um modelo
522
convencional de organização, em que a responsabilidade é garantida
por meio de relacionamentos hierárquicos de “comando e contro‑
parte iv  o desenvolvimento de organizações eficientes

le”. Até mesmo esse modelo convencional tem pressupostos heroicos


sobre a efetividade do controle das hierarquias. Na prática, muitas
corporações estão indo além disso. Por sua vez, os especialistas em
organização de modo geral deixaram de lado a questão da governan‑
ça, apesar de ser fundamental para a legitimidade e o status das orga‑
nizações na sociedade moderna. Eles raramente investigam acima do
nível dos executivos.
O resultado é que as discussões sobre governança corporativa
não costumam se arriscar abaixo do nível do CEO, ao passo que
o exame da organização em geral não vai além desse nível. Não há
muita unanimidade entre esses níveis. Essa desconexão recíproca é
insustentável, especialmente quando as novas formas organizacionais
apresentam significativo desafio para o processo da governança cor‑
porativa num momento em que sua reforma se tornou questão de
grande urgência.
O capítulo começa revisando os apelos crescentes para se melhorar a
governança corporativa. O mais vigoroso deles defende a ideia de reforçá­
‑la de forma convencional, mas a adequação disso é questionada pelos
desenvolvimentos ocorridos na forma organizacional. Uma comparação
entre as características da governança da organização hierárquica con‑
vencional e das formas mais recentes ajuda a esclarecer suas implicações
para a agência e o controle. Os relacionamentos contidos nas novas for‑
mas organizacionais tornam mais difícil garantir o comportamento dos
participantes por meio de mecanismos convencionais. Entretanto, elas
oferecem oportunidades para se pensar a governança de forma diferente,
que envolva mais completamente os membros da organização e possa
restaurar uma parte da confiança na gestão que foi perdida nos últimos
anos. O capítulo termina examinando essas possibilidades.

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15.2 Crescente preocupação a respeito da
governança corporativa
A preocupação com a governança das empresas tem uma longa his‑
tória. Logo depois da industrialização, alguns se assustaram com o po‑
der dos proprietários de empresas na sociedade.2 Outros, ao contrário,
preocupavam­‑se com a diluição do controle da propriedade entre os exe‑
cutivos profissionais nas grandes corporações modernas.3 Mais recente‑
523
mente, a preocupação com a responsabilidade dos executivos renasceu

Governança corporativa nas novas formas organizacionais


com uma série de fatos, especialmente nos países anglo­‑saxônicos. Os
pontos fracos da governança corporativa vieram à luz quando as grandes
recessões do início dos anos 1980 e 1990 expuseram a má ou fraudulenta
gestão de algumas empresas norte­‑americanas e britânicas com problemas
que haviam recebido anteriormente relatórios tranquilizadores de audi‑
toria. Os efeitos catastróficos de grandes fracassos corporativos recentes
sobre o bem­‑estar de pessoas como empregados, cotistas de fundos de
pensão e investidores hoje constituem o que a Business Week, em um arti‑
go sobre “Como consertar a governança corporativa”, chamou de “maior
crise do capitalismo desde a era dos demolidores de monopólios”.4
A globalização dos mercados de capital também exerceu pressão para
as empresas adotarem métodos e padrões internacionais de governança
corporativa, e os mercados ofereciam mais acesso a capital mais barato
para investimento em troca de mais responsabilidade e transparência. O
prejuízo infligido a investidores e empresas locais pela crise financeira
asiática do final dos anos 1990 alimentou as exigências de mais transpa‑
rência e responsabilidade pelo desempenho. Com os mercados financei‑
ros cada vez mais sensíveis ao desempenho corporativo, os mecanismos
para acabar com gestões de baixo desempenho, como aquisições e leve‑
raged buy­‑outs, têm sido empregados com frequência cada vez maior.
Uma consequência do uso desses mecanismos foi a generalizada perda
de empregos, que, por sua vez, erodiu a confiança que os empregados,
inclusive executivos, esperam ter em seus empregadores.5 A propriedade
institucional das maiores corporações tem se tornado mais concentrada,
e isso, combinado com a competição cada vez mais intensa entre os for‑
necedores de serviços financeiros para oferecer melhores retornos a seus
clientes, incentivou ainda mais essas instituições a buscarem maneiras de
melhorar a responsabilidade dos diretores e altos executivos pelo desem‑
penho corporativo.

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Mais pressões pela responsabilidade corporativa também estão emer‑
gindo além do terreno de acionistas e mercados financeiros. Grandes de‑
sastres ambientais em proeminentes corporações, como os incidentes de
Bophal, na Índia, e o do petroleiro Exxon Valdez, acentuaram as pressões
para que as gestões corporativas tenham também mais responsabilidade
com as comunidades em que operam. Essas pressões por responsabili‑
dade social também estão aumentando devido à crescente expectativa
de que as ricas corporações multinacionais sirvam como agentes para o
524
desenvolvimento de economias emergentes, em vez de explorá­‑las.6 Isso
deu origem ao conceito de “terceirização ética”, e padrões de benchmark
parte iv  o desenvolvimento de organizações eficientes

tem sido propostos.7


A questão da responsabilidade do alto escalão tem sido evidenciada
pela comprovação de que os níveis de confiança nas empresas e seus exe‑
cutivos corporativos estão caindo pelo mundo afora. Por exemplo, uma
pesquisa da Environics e do Gallup International que reuniu 36.000 cida‑
dãos em 47 países e seis continentes, e que afirmou representar 1,4 bilhão
de pessoas, confirmou tal queda. Isso indicou que as pessoas depositavam
seus níveis mais baixos de confiança em grandes companhias e nos órgãos
legislativos nacionais.8 Pesquisas no Reino Unido confirmam a queda ge‑
ral na confiança e também indicam que os líderes empresariais estão en‑
tre os grupos menos confiáveis da sociedade.9 Outra pesquisa em grande
escala com empregados, realizada em 15 países da União Europeia (em
2003), concluiu que sua confiança nos empregadores havia sido bastante
danificada por uma série de fatos.10 Um deles foi o downsizing generaliza‑
do em grande escala nos anos 1990, que continua ainda hoje. O corte das
contribuições dos empregadores para os fundos de pensão e, em particu‑
lar, o encerramento dos planos de pensão pelo último salário na empre‑
sa foi outro. As revelações que seguiram os escândalos corporativos da
Enron, da Worldcom e outros, de conluio entre empregadores corruptos
e instituições financeiras supostamente independentes que aconselhavam
investidores, erodiram ainda mais a confiança.11 Não há nenhuma dúvida
de que hoje existe desconfiança generalizada entre as pessoas, tanto em
seus papéis como empregados quanto nos de público. Essa desconfiança
corroeu ainda mais a confiança na efetividade da governança corporativa
com relação às empresas.
Esses problemas, e em particular, os escândalos corporativos que marca‑
ram a entrada no novo milênio, colocaram a governança no topo das agen‑
das de acadêmicos, funcionários do governo, instituições internacionais e

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empresas de consultoria. Essa discussão diz respeito tanto a quem teria
direitos e poderes na alocação de recursos e retornos corporativos quan‑
to a como o uso desses direitos e poderes pode se tornar suficientemente
transparente e responsável. Outra questão polêmica diz respeito às partes
cujos interesses a corporação deve satisfazer, sejam elas acionistas ou as
diversas categorias de interessados, como empregados, fornecedores, clien‑
tes e a comunidade. A ideia dominante por trás da maioria das discus‑
sões sobre o assunto continua voltada para os interesses dos acionistas,
525
enfocando suas relações com os conselheiros e a diretoria da empresa. Em
apoio ao princípio do valor do acionista está o fato de que muita gente

Governança corporativa nas novas formas organizacionais


hoje depende do retorno que recebe de ações, como participantes de fundos
de pensão, acionistas de fundo de investimento e acionistas individuais.
Foi a ameaça a esses interesses e também ao emprego que despertou a ira
maior com relação aos erros corporativos. Assim, os códigos de princípios
da boa governança corporativa, que órgãos como a OECD (Organização
para Cooperação e Desenvolvimento Econômico) desenvolveram, definem
como objetivo primordial da corporação a otimização do tempo de retorno
para seus acionistas.12 Em relação a métodos para tornar esses objetivos
eficazes, a OECD concedeu mais atenção aos direitos dos acionistas no
que diz respeito a voto, divulgação de informações e proteção de acionistas
minoritários, além das responsabilidades do conselho.13
Os acionistas, especialmente as instituições financeiras, passaram
com o tempo a ter papel mais atuante na monitoração do desempenho
de conselhos e diretorias, embora o escândalo da Enron mostre como
isso é difícil. Muitos CEOs proeminentes foram demitidos por presidi‑
rem péssimos desempenhos corporativos ou auditorias, entre os quais
Jacques Nasser na Ford, Jean­‑Marie Messier na Vivendi, Ron Sommer na
Deutsche Telekom, Sir Philip Watts na Shell e Luc Vandevelde na Marks
& Spencer. Os investidores institucionais também expressaram sua impa‑
ciência mais vigorosamente pela falta de vínculos efetivos entre a remune‑
ração dos executivos e o desempenho da corporação. A importância que
os investidores institucionais atribuem à “boa” governança corporativa é
indicada em pesquisas que mostram que eles estariam dispostos a pagar
prêmios entre 18% e 27% a mais pelas ações de uma empresa bem ad‑
ministrada que para outra mal administrada com desempenho financeiro
equivalente. O nível do prêmio que os investidores estariam dispostos a
pagar é mais alto em países asiáticos e latino­‑americanos, em que a qua‑
lidade dos relatórios financeiros é inferior.14

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Esses fatos refletem o apoio ao princípio do valor do acionista, e são
um reforço para ele. Contudo, eles enfocam apenas o relacionamento
entre dois grupos. O primeiro grupo é o de acionistas proprietários e o se‑
gundo, de diretorias executivas e conselhos de empresas. No que a OECD
caracterizou como um sistema outsider da governança corporativa, os
proprietários devem confiar em mecanismos e apoios externos para asse‑
gurar que seus gestores agirão de acordo com seus interesses. Esse sistema
não leva em conta as questões “de dentro” da responsabilidade e controle
526
na empresa, levantadas pela teoria da organização.
parte iv  o desenvolvimento de organizações eficientes

15.3 O problema da agência


Alimentar o sistema outsider da governança corporativa é uma pre‑
ocupação de modo que os acionistas tenham incentivos apropriados e de
maneira que se disponham a correr o risco para receber retornos residuais
das atividades de uma empresa, uma vez satisfeitas todas as exigências
contratuais. Presume­‑se que a capacidade de suportar o risco residual
estimule os acionistas a alocar os recursos da corporação da melhor ma‑
neira possível para maximizar o tamanho desse residual – o que significa
que, quando as corporações são geridas para maximizar o valor do acio‑
nista, tanto os interesses desses acionistas como o desempenho de todo o
sistema econômico são beneficiados.
Por esse motivo, os economistas financeiros mostram os benefícios
de uma separação entre o suporte ao risco residual e a direção executi‑
va corporativa. No entanto, eles estão preocupados com o problema da
agência que existe no relacionamento entre as duas partes. Como Mary
O'Sullivan observou: “O problema da governança da corporação moder‑
na, como os economistas financeiros a conceituam, é que os que correm o
risco residual – os acionistas ou 'capitalistas' – não têm nenhuma garantia
de que os executivos (ou agentes) da corporação que tomam as decisões
que afetam a sua fortuna atuarão em defesa dos seus interesses”.15 Os
economistas financeiros se preocuparam com a análise dos mecanismos
para mitigar esse “problema da agência”, incluindo incentivos como stock
options e restrições impostas por mercados eficientes, como a ameaça de
take over se os acionistas não recebessem retorno satisfatório.
A teoria da agência se concentra na capacidade de os controladores
garantirem que seus “agentes” cumpram seus objetivos. Essa teoria assume
que esses agentes não sejam necessariamente confiáveis e que isso impõe

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um sério risco para os controladores quando há assimetria de informação
a favor de seus agentes. Ela está interessada nos mecanismos da governança
que limitam o comportamento egoísta dos agentes. Esse comportamento,
que vai de recompensas exageradas para o alto escalão à fraude pura e sim‑
ples, diminui os retornos residuais para os proprietários e outros.
Tal teoria está firmemente associada ao princípio do valor do acio‑
nista, o que é um lastimável equívoco, porque um problema de agência
pode surgir em qualquer relacionamento em que uma pessoa ou grupo
527
de pessoas age em nome do outro. As questões identificadas pela teoria
da agência permanecem quando grupos que não os acionistas são os con‑

Governança corporativa nas novas formas organizacionais


troladores das corporações. A agência é um problema generalizado nos
negócios complexos e nos relacionamentos organizacionais modernos, e
surge sempre que há uma divisão de trabalho ou função entre pessoas que
as tornam dependentes de outras. Essa é uma das razões pelas quais hoje
há tanta preocupação em melhorar o nível da confiança nas organizações
e entre elas.

15.4 O problema da dupla agência


Um relacionamento de dupla agência aparece quando um controla‑
dor precisa confiar em agentes em mais de uma etapa no processo entre
a expressão de seus interesses e as ações empreendidas para realizar esses
interesses. Esse tipo de relacionamento é encontrado nas empresas maio‑
res e mais complexas, que hoje dominam muitos setores. Aqui, o processo
de responsabilizar os representantes pelo alcance das metas organizacio‑
nais envolve dois conjuntos de relacionamentos de controle, refletindo a
presença de agentes em dois níveis principais. O primeiro é o relaciona‑
mento entre proprietários e stakeholders por um lado e os gestores corpo‑
rativos por outro. O segundo relacionamento, que em grande parte tem
sido deixado de lado nas discussões da governança corporativa, é entre a
gestão corporativa e os empregados.
Os teóricos da organização se referem ao primeiro relacionamento como
“controle estratégico”. O Capítulo 5 observa que o enfoque do controle
no nível estratégico está nos recursos e métodos dos quais depende toda a
conduta de uma organização – entre os quais estão seu capital, a forma de
ativos em que o capital está incorporado e também suas disposições estraté‑
gicas, como mercados e áreas que deverão ser atendidas, as comunidades e
mercados de trabalho em que a organização está localizada e suas relações

Book_Organizaçoes.indb 527 16/9/2011 16:24:09


com os concorrentes, os fornecedores e o governo. A gestão corporativa
representa o proprietário e/ou os stakeholders nesse nível estratégico.
Um pressuposto essencial na literatura da governança é que o conselho
de administração tem capacidade para garantir que os gestores de capital
façam a coisa certa para os donos do capital. Ele está baseado na premissa
de que os executivos da corporação podem controlar o comportamento
dos próprios agentes nas organizações que supervisionam. Em outras pa‑
lavras, a visão convencional da governança corporativa pressupõe que o
528 controle estratégico seja suficiente tanto para evitar a desinformação como
para assegurar um nível de efetividade operacional que proporcione um
parte iv  o desenvolvimento de organizações eficientes

bom retorno aos acionistas. Para isso, é preciso que o alto escalão tenha au‑
toridade e conhecimento para assegurar que as operações de uma empresa
estejam alinhadas com seus objetivos estratégicos. O controle estratégico
é considerado a garantia do controle operacional, que é o controle sobre
a produção ou prestação de serviços em uma organização, no sentido de
determinar e monitorar como as pessoas que contribuem para esse proces‑
so se comportam e atuam. Uma hierarquia forte, com relacionamentos de
subordinação claramente definidos, tem sido a abordagem tradicional para
alcançar o controle operacional utilizada por parte do alto escalão que, por
sua vez, presta contas ao conselho ou outras entidades governantes.
Na prática, essa abordagem convencional e o pressuposto por trás
dela são problemáticos. Até mesmo em organizações com hierarquias
claramente delineadas há riscos associados à implementação de estraté‑
gias corporativas por meio de representantes situados em níveis inferio‑
res. Três consultores da Booz Allen Hamilton observaram que “nos dias
de hoje, falsificar os livros não é a única via segura para a fama das em‑
presas. Bem mais endêmica é a disfunção corporativa. Do CEO para bai‑
xo, as queixas são bem conhecidas: 'Temos a estratégia certa e um plano
de ação muito claro, mas parece que não conseguimos executar'.”16
Uma razão está na luta pela autonomia entre os subordinados, cau‑
sando a “perda do controle” e o fracasso na realização plena das intenções
corporativas. Outra razão vem do fato de que as hierarquias são escadas
para a carreira e o progresso, além de sistemas de controle, e que, portan‑
to, os subordinados procuram apresentar suas ações da melhor maneira
possível. Assim, o controle hierárquico é enfraquecido pela tendência de
os subordinados reinterpretarem as ordens que vêm de cima para baixo
e, ao mesmo tempo, transmitirem para cima a informação de modo que
pareça boa. Há até ocasiões em que a autoridade é abertamente ques‑
tionada por meio de ação industrial. Os empregados no ponto em que a

Book_Organizaçoes.indb 528 16/9/2011 16:24:09


estratégia é aplicada por meio de operações sempre tiveram o potencial de
questionar o poder da alta gestão, empreendendo diversas formas de ação
organizada. Eles podem manter uma ação informal por longos períodos,
de maneira que também distorça as intenções da gestão.17
Entre as abordagens convencionais da organização, acreditava­‑se
que a forma multidivisional fosse melhor que a forma tradicional, es‑
truturada por funções, para transmitir as metas da diretoria por toda a
empresa e manter a diretoria informada sobre até que ponto essas metas
529
foram atingidas.18 A forma multidivisional permite que os objetivos do
desempenho sejam alocados em divisões que abrangem áreas distintas

Governança corporativa nas novas formas organizacionais


e focadas de criação de valor. Portanto, ela substitui a dependência de
relatórios de resultados para uso da supervisão pessoal e prestação de
contas como mecanismos de controle. O argumento é que isso serviria
para reduzir o comportamento oportunista e a construção de impérios
por executivos de nível inferior e melhorar o foco dos esforços da em‑
presa para a maximização dos lucros em benefício de seus donos.
No entanto, estudos de decisões de grande significado estratégico,
como investimento de capital, demonstram a dependência que o alto
escalão das empresas multidivisionais tem de informações e propostas
passadas pelos que estão nos níveis nas divisões.19 Em outras palavras, as
formas convencionais de organização – seja por divisões ou por funções
– permanecem vulneráveis ao problema da dupla agência. Demsetz as‑
sim apresentou a questão: “a forma de organização que causa distorções
mais sérias nas políticas da empresa será uma função do que pode criar
a informação mais distorcida sobre a qual o alto escalão trabalha”.20
O problema da dupla agência está presente em todas as formas
de organização que são de escala suficiente para criar um distancia‑
mento pessoal e muitas vezes físico entre os executivos do alto esca‑
lão e os agentes, a quem eles confiam a implementação das diretrizes
nos níveis inferiores. E não é um problema novo, embora raramente
seja reconhecido na literatura convencional sobre a governança cor‑
porativa, que, pelo menos implicitamente, presumiu que hierarquias
e sistemas de controle e incentivos bem planejados resolvem a ques‑
tão. Ainda que seja um problema sério, veremos que a passagem de
formas de organização hierárquicas para formas menos hierárquicas
ou não hierárquicas, e também a abertura de fronteiras organizacio‑
nais por meio de joint ventures e redes, podem ser ainda mais difíceis
de tratar.

Book_Organizaçoes.indb 529 16/9/2011 16:24:09


15.5 O problema de agência múltipla
“Múltipla agência” remete a uma situação em que há mais de uma
parte em relacionamentos de agência, seja como controlador, agentes ou
ambos. Um importante exemplo de múltipla agência surge quando empre‑
sas entram em parcerias com outras empresas nas chamadas alianças es‑
tratégicas. Essas parceiras podem ser formadas com objetivos específicos,
como ajuda à entrada em mercado estrangeiro ou acesso a tecnologias e
530 outros recursos, ou podem abranger componentes de redes mais amplas de
negócios. O Capítulo 10 observou que joint ventures baseadas em participa‑
parte iv  o desenvolvimento de organizações eficientes

ção acionária são uma forma comum de aliança estratégica em que há uma
associação de ativos e geralmente certo grau de gestão conjunta entre duas
ou mais empresas parcerias. São na realidade as “organizações híbridas”.21
A multiplicidade de relacionamentos de agência em joint ventures
de participação acionária e semelhantes formas organizacionais surge
a partir de suas características mais destacadas. Em primeiro lugar,
existem vários donos, embora normalmente sejam poucos. Eles devem
ser vistos como controladores múltiplos, porque cada um tem a pró‑
pria racionalidade para entrar na aliança e cada um é suficientemente
especial para exigir que seus interesses sejam respeitados. Se apenas
um dos parceiros decide se retirar, normalmente a aliança é rompida.
Em segundo lugar, como os parceiros­‑proprietários em geral entram
na joint venture com ativos tangíveis e intangíveis complementares,
na verdade eles se tornam agentes um do outro, assegurando sua via‑
bilidade. Terceiro, os executivos da joint venture atuam como agentes
para os proprietários. Seu papel de agente costuma ser dificultado pela
presença de muitos donos, quando cada um coloca as próprias expec‑
tativas sobre executivos da joint venture. Podem surgir outros proble‑
mas se uma joint venture for gerida por um misto de pessoal fornecido
ou nomeado pelos diferentes parceiros, e se eles vierem de diferentes
culturas e tradições de gestão.

15.6 Implicações para a governança corporativa


Os capítulos anteriores descreveram como as novas formas organiza‑
cionais reduzem a ênfase na hierarquia e favorecem relacionamentos ho‑
rizontais com base em equipes, transferem a iniciativa para unidades que
se auto­‑organizam e toleram uma diversidade de arranjos como controles
com uma empresa. Os capítulos 8, 9 e 10 mostraram como as empresas

Book_Organizaçoes.indb 530 16/9/2011 16:24:09


também estão usando mais do que antes sistemas de produção e parcerias
em forma de redes.
Não há nenhuma razão para pensar que as novas formas organiza‑
cionais substituirão as burocracias convencionais em áreas de trabalho
em que a consistência e a eficiência oferecidas pela hierarquia e a rotina
são necessárias, como os departamentos internos de receitas do gover‑
no. Ao mesmo tempo, é muito improvável que as novas formas organi‑
zacionais sejam moda passageira. Já foi visto que elas são uma resposta
a uma gama de desenvolvimentos contextuais de significado profundo e 531
duradouro, entre os quais a globalização, as tecnologias da informação

Governança corporativa nas novas formas organizacionais


e das comunicações, a competição intensa e o crescente significado do
conhecimento como fonte de criação de valor e vantagem competitiva.
Assim, as novas formas organizacionais são uma reação à mudança no
ambiente dos negócios que está ocorrendo com velocidade cada vez
maior. Elas apresentam um novo cenário, para o qual os que estudam a
governança corporativa precisarão de novos mapas.
Há outras duas grandes questões implícitas na governança corporativa
trazidas pela adoção dessas novas formas organizacionais. A primeira é a
diluição do controle no alto escalão, devido à transferência da iniciativa.
Isso se soma ao problema da dupla agência. A segunda diz respeito às com‑
plicações da agência múltipla que surgem com o uso crescente de parcerias
em rede, especialmente as alianças. A Tabela 15.1 resume as principais
características dessas novas formas organizacionais e suas implicações para
os aspectos de controle e agência da governança corporativa. Essa tabela
começa com a hierarquia tradicional para propósito de comparação.

Tabela 15.1  Formas organizacionais e implicações para a agência e o


controle

Forma Principais características Implicações para a agência e o


organizacional controle
Hierarquia Iniciativa centralizada e Baseada em processo de “coman‑
tradicional autoridade unificada; lide‑ do e controle” vertical; estrutura
rança de cima para baixo de gestão unificada (agência),
por meio de processos for‑ que presta contas aos repre‑
mais e canais hierárquicos; sentantes dos controladores,
obediência compulsória às normalmente ao conselho de
regras. Ênfase na submis‑ administração.
são e na eficiência.

Book_Organizaçoes.indb 531 16/9/2011 16:24:09


Iniciativa Iniciativa e autoridade Dificuldade na aplicação de
transferida distribuídas; uso de equi‑ mecanismos tradicionais de con‑
pes; reconhecimento de trole; maior confiança no arm’s
papel positivo da disputa length “controle de produção”,
intra e intergrupo para a complementado por tentativas de
inovação; liderança por gerar compreensão e cultura cor‑
meio da orientação e res‑ porativa compartilhadas; empre‑
posta às iniciativas de endedorismo interno e inovação
532 baixo para cima; ênfase aumentam o risco de perda de
na inovação, em intra­ controle e a necessidade de revi‑
parte iv  o desenvolvimento de organizações eficientes

‑empreendedorismo e na sar objetivos dos controladores à


flexibilidade. luz de fatos novos.
Parcerias Definição negociada de Problemas de perda de contro‑
objetivos; complementari‑ le por cada controlador surgem
dade de contribuições de por causa do conflito inerente ao
recursos; modo de gestão papel gerencial e probabilidade
e trabalho conjunto evolui de ambiguidade de papel; risco
por meio da acomodação e de oportunismo e rompimento da
do aprendizado. colaboração.

15.6.1 Iniciativa transferida e diluição do controle


Já foi dito que a governança corporativa se estende além da supervi‑
são externa para incluir o processo de controle na empresa exercitado por
meio de sua forma de organização. Esse processo de supervisão em duas
etapas cria o problema de dupla agência. Tal problema existe até mesmo
em empresas organizadas em hierarquias convencionais. Isso acontece
apesar da presença, característica desse tipo de empresa, de linhas defini‑
das de autoridade, reforçadas por métodos formalizados como descrições
de função, manuais de procedimento e acordo com os subordinados a
respeito de metas e objetivos. Um princípio da teoria da burocracia é que
os executivos experientes de uma empresa tomem as decisões mais impor‑
tantes, controlem e influenciem os recursos mais importantes, e tenham
poder para executar os planos aprovados pelo conselho. Isso pressupõe
que os gestores corporativos possam controlar o comportamento de seus
agentes na empresa.
Esse pressuposto é menos provável em uma organização que retirou a
ênfase da hierarquia. A flexibilidade e a iniciativa descentralizada que ela

Book_Organizaçoes.indb 532 16/9/2011 16:24:09


pretende promover implica mais confiança no “controle de produção”:
enfocar mais em metas de desempenho e sistemas de “responsabilidade”
que em supervisão hierárquica ou especificação de algum comportamento
aceitável. No Capítulo 5, observou­‑se que os controles da produção se
tornam mais apropriados quando os executivos tem apenas conhecimen‑
to limitado sobre os processos de transformação envolvidos no trabalho
de uma organização. As condições incertas e mutantes que estimularam a
busca de novas formas organizacionais, no entanto, podem pesar contra
533
essa especificação a priori de metas de produção. Além disso, a incapaci‑
dade de especificar o comportamento apropriado requer muita confiança

Governança corporativa nas novas formas organizacionais


na eficácia bastante incerta de normas culturais organizacionais.
Os altos executivos e os conselhos aos quais se reportam talvez pos‑
sam ter influência limitada sobre o lócus de atividade mais crítico na
organização porque, sob a nova abordagem organizacional, o papel dos
executivos mais experientes está confinado a articular uma filosofia e
moldar uma cultura coletiva, mais que a supervisionar o comportamen‑
to. Nas novas formas organizacionais, a iniciativa está amplamente dis‑
persa – dentro e fora da empresa – e, de fato, o que ocorreu foi a diluição
do relacionamento de agência para agentes semiautônomos dispersos.
A consequência pode ser que um conselho não tenha muita influência
sobre as atividades da organização, ainda que possua enorme influência
sobre os executivos seniores. Embora tenha poder para demitir um CEO,
um conselho tem relativamente pouca influência sobre a organização
de modo geral. Por exemplo, sabe­‑se que muitos dos novos negócios da
Enron, sendo que alguns dos quais passavam por cima do controle da di‑
retoria, eram resultado de iniciativas empresariais de executivos de nível
intermediário e não do alto escalão (Quadro 15.1).22 É urgente encontrar
uma nova maneira de preservar os benefícios da transferência de inicia‑
tiva sem incorrer na desastrosa perda de controle que arruinou a Enron.
O caso da Enron ilustra como a inovação é um dos fatores deter‑
minantes das novas formas de organização. O processo da inovação é
cumulativo e coletivo, o que significa que envolve pessoas na organiza‑
ção que trabalham juntas, às vezes em equipes, para gerar o aprendizado
organizacional. Também é incerto tanto porque pode não gerar retornos
superiores quanto porque pode levar a estratégia de uma empresa em
direções não previstas por seus líderes. Isso apresenta um desafio para
a responsabilidade da diretoria e também para a ideia convencional da
governança corporativa.

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Quadro 15.1  Enron – Sem controle?

A Enron foi louvada por uma série de autores especializados em gestão pela
maneira como sua organização transferiu responsabilidade e poder, além de ser
fracamente acoplada, estimulou a inovação e o intraempreendedorismo. Gary
Hamel, por exemplo, escreveu que a Enron é “uma organização em que milhares
de pessoas se veem como potenciais revolucionários”. Kathy Eisenhardt elogiou
a capacidade da Enron de descentralizar a iniciativa de modo a permitir que os
534 executivos desenvolvessem novos negócios onde a vantagem competitiva seria
obtida a partir da confusão do mercado.
parte iv  o desenvolvimento de organizações eficientes

O colapso da Enron foi atribuído aos atalhos para o financiamento de novas


atividades, arrogância na gestão e enorme fraude. Parte desse problema está em
um fracasso no controle associado à transferência da iniciativa, que a organiza‑
ção da empresa havia incentivado. Muitos dos novos negócios da Enron, cujos
desastres foram escondidos por manipulações da contabilidade, resultaram de
iniciativas empresariais feitas por executivos de nível intermediário, mais do que
pela diretoria. Jeffrey Skilling, um ex­‑diretor superintendente da companhia,
afirma não ter sabido das irregularidades que aconteciam, nem mesmo sobre
algumas das parceiras privadas que ocultavam as dívidas dos investidores e, ao
mesmo tempo, enriqueciam alguns funcionários da empresa.
Tal afirmação não absolve Skilling da responsabilidade suprema, ou da culpa por
tolerar uma atmosfera moralmente frouxa na empresa. No entanto, o caso da
Enron demonstra como uma estrutura frouxa em rede pode levar a uma situa‑
ção em que o CEO não se preocupa nem se informa sobre as iniciativas tomadas
nos níveis mais baixos.

Fonte: Financial Times, 4 de dezembro de 2001, p. 16; 22 de agosto de 2002, p. 26; 22 de agosto
de 2002, p. 21.

Os debates sobre governança corporativa geralmente são sobre


a alocação dos retornos corporativos e negligenciam a relação entre
a alocação de recursos e o processo de inovação.23 Além disso, ne‑
gligenciam também a dependência da inovação em relação ao modo
como os recursos são organizados, especialmente os trabalhadores do
conhecimento. Com isso, deixam de levar em conta até que ponto as
novas formas de organização, a maioria visando promover a inovação
e a flexibilidade, questionam o princípio fundamental da governança
corporativa convencional de que o CEO e a equipe da direção têm

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controle total, e portanto, são totalmente responsáveis pelas ações de
indivíduos e grupos de nível inferior no decorrer da inovação. Aqui há
uma potencial tensão entre a necessidade de inovação e a necessidade
de controle.
A decomposição de grandes empresas integradas em redes de cadeias
de valor também cria uma nova dificuldade de governança para as em‑
presas que são responsáveis pelas ações de outros membros da rede. São
consideradas responsáveis porque o produto da cadeia de valor é comer‑
535
cializado para o público com sua marca. Contudo, elas dizem que seu
poder para controlar o comportamento na rede é seriamente circunscrito

Governança corporativa nas novas formas organizacionais


e que enfrentam uma variante do problema da dupla agência. Isso porque
a integração de uma rede de produção depende de sistemas padronizados
para compartilhar informação operacional,24 e esses sistemas não lidam
facilmente com questões comportamentais de natureza ética e não pa‑
dronizada. Então surge uma dúvida: quando as empresas principais se
desassociam de sua rede organizacional de apoio, quem assume a respon‑
sabilidade pelo comportamento das empresas nessa rede?
Nos últimos anos essa questão ganhou mais importância. As cor‑
porações multinacionais podem permitir (intencionalmente ou não) que
seus subcontratados nos países em desenvolvimento apliquem códigos
e métodos diferentes de suas políticas nos países de origem. A Nike e
a Gap são exemplos de marcas multinacionais importantes cujos sub‑
contratados asiáticos exploravam o trabalho local. Embora uma atração
para as empresas líderes adotarem a nova filosofia organizacional talvez
tenha sido a possibilidade de se livrar de empregados não essenciais e da
responsabilidade por seu bem­‑estar, a opinião pública já não se dispõe a
aceitar isso. Por mais livremente ligada e desagregada que seja, a cadeia
de valor continua sendo um sistema que permite e suporta a marca da
empresa líder nesse sistema.

15.6.2 Parcerias e agência múltipla


Parcerias estratégicas apresentam mais complicações do ponto de vista
da governança corporativa, especialmente agudas no caso de joint ventu‑
res (JVs) baseadas em participação acionária. Essas complicações surgem
como resultado dos relacionamentos de mútua dependência e problemas
de agência decorrentes da propriedade e gestão compartilhadas nesse
tipo de empreendimento. Em joint ventures internacionais, os contextos

Book_Organizaçoes.indb 535 16/9/2011 16:24:10


jurídico e social das matrizes, que moldam sua experiência e suas expecta‑
tivas do processo da governança corporativa, também vão diferir.
Os aspectos jurídicos da governança corporativa das JVs se referem
principalmente aos direitos dos parceiros em relação a sua participação.
Dão prioridade ao poder de voto nos conselhos como forma de garan‑
tir a participação no controle estratégico. Evidentemente, se o poder for
dividido, como acontece no caso de uma divisão 50/50, há o risco de
surgirem sérios impasses.
536
Naturalmente, a estrutura de propriedade dividida das JVs cria pro‑
blemas de agência. Quando as JVs são constituídas, o relacionamento
parte iv  o desenvolvimento de organizações eficientes

controlados­‑agente mais evidente é o que existe entre os proprietários


parceiros e os executivos da joint venture. A situação complica quando os
parceiros discordam em relação a objetivos e/ou têm diferentes preferên‑
cias de risco ou tempo. Muitas vezes os parceiros decidem constituir uma
JV porque percebem que a cooperação proporciona os meios para atingir
seus respectivos objetivos, mas o fato de esses objetivos normalmente
não serem idênticos pode levar a conflitos com relação a prioridades.
As diferenças culturais e os mal­‑entendidos que elas criam aumentam a
possibilidade de conflito. No Quadro 15.2 é apresentado um exemplo de
como esses problemas de múltipla agência levaram ao rompimento em
uma joint venture de participação acionária anglo­‑chinesa.
A possibilidade de discordância entre parceiros faz lembrar o fato de
que as JVs são arranjos cooperativos que visam melhorar a capacidade
dos parceiros para atingir seus objetivos, por meio de contribuições em
conjunto que exploram a existência de complementaridades entre eles.
Assim, além de empregar agentes para gerir a própria JV, cada parceiro
também é um agente para o outro. Isso aumenta a importância do con‑
trole que cada um exerce sobre a JV em relação ao outro. Ao mesmo
tempo, para um parceiro exercer controle demais sobre o outro, a ideia
de formar uma parceria será frustrada.
Muitas alianças são formadas entre multinacionais e empresas locais,
especialmente nos países em desenvolvimento. Essas alianças impõem
diferentes problemas de governança para cada parceiro. Para a multi‑
nacional, um controle maior ajuda a protegê­‑la contra o vazamento de
tecnologia e a manter seguros o conhecimento e a informação. Mesmo
assim, há um aumento nos custos administrativos, especialmente quan‑
do isso significa empregar expatriados com altos salários em cargos im‑
portantes. O parceiro local pode ter o controle pessoal de muitas das

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Quadro 15.2 ­‑ Ruptura devido a problemas de múltipla agência

Uma joint venture com participação anglo­‑chinesa no setor de bens de consu‑


mo vivia problemas crescentes que levaram a uma crise em seu desempenho.
A participação acionária no empreendimento estava dividida meio a meio entre
britânicos e chineses. O parceiro britânico havia sido contratado para trazer a
tecnologia e o suporte de sistemas, além de uma de suas marcas internacionais,
e o parceiro chinês proporcionava o acesso vital ao mercado nacional. A con‑
cretização dos objetivos dos dois parceiros no estabelecimento da joint venture
dependia da cooperação de ambos como agentes um do outro.
537
O parceiro chinês detinha o monopólio na província para o seu produto. Poten‑

Governança corporativa nas novas formas organizacionais


cialmente, isso oferecia um mercado cativo e uma excelente lucratividade.
Entretanto, os parceiros logo começaram a brigar por conta da precificação
de um produto de marca internacional. O parceiro chinês acreditava que os
britânicos queriam um preço alto demais para o mercado local. Esse parceiro
deixou então de se comprometer com a promoção da marca da joint venture, e
em seguida começou a produzir um similar mais barato, que passou a competir
diretamente com tal produto. O domínio do mercado e da distribuição nacional
pelo parceiro deixou de ser um valioso ativo para ser uma força repressora.
A capacidade do parceiro britânico de exercer influência estratégica foi mais
abalada por uma ruptura em sua organização. A maior parte da comunicação
passava por seus escritórios regionais de Hong Kong e Singapura; não havia
muito contato direto com a sede, no Reino Unido. Essa ruptura deu lugar a
inconsistências na sua política, que foram zelosamente observadas pelo par‑
ceiro chinês, aumentando ainda mais sua frustração. Embora recebesse faxes
com regularidade, o escritório do Reino Unido não estava bem informado sobre
a situação, e por isso intervinha apenas esporadicamente, de uma maneira que
o parceiro chinês considerava muito desestabilizadora. As questões estratégicas
se tornaram um fator de divisão entre os parceiros, e não uma base para sua
cooperação.
A gestão operacional era especializada segundo cada parceiro: os indicados
pelos britânicos chefiavam o marketing e a produção; o gerente geral era um
chinês, bem como os chefes das outras funções. Nesse clima de hostilidade, em
vez de integrar, a especialização levou a um rompimento na gestão operacional;
muitas decisões eram bloqueadas pelo pessoal do outro parceiro. Não é de sur‑
preender que a joint venture tivesse problemas sérios de comunicação interna e
baixa confiança. A língua já era uma barreira natural, mas a disponibilização de
ajuda de intérpretes se transformou em fonte de atritos constantes na atmos‑
fera de baixa confiança que prevalecia. Quando lá estive, a joint venture havia
passado por uma queda nas vendas e nos lucros nos três anos anteriores e esta‑
va administrando o prejuízo.

Fonte: Pesquisa de campo do autor.

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atividades operacionais do empreendimento conjunto, mas em geral não
tem a última palavra em questões estratégicas. Se um relacionamento
potencialmente instável como esse tiver longa duração, o aprendizado
e a criação da confiança serão ingredientes essenciais que poderiam re‑
duzir a necessidade do controle pessoal e também aumentar a efetiva
responsabilidade.
Os problemas de múltipla agência que surgem em joint ventures com
parceria acionária podem se estender por toda uma “rede de parceiros
538
iguais”.25 Nesse tipo de redes cooperativas nenhum dos parceiros esta‑
belece e controla as atividades. Os relacionamentos de poder entre os
parte iv  o desenvolvimento de organizações eficientes

parceiros, embora relativamente iguais, podem mudar com a sorte dos


membros. Embora essas redes tenham grande flexibilidade potencial e
capacidade de reagir a ambientes em geral turbulentos, elas não têm um
“cérebro” permanente e um “sistema nervoso central” de redes lideradas
por empresas de marcas fortes. Portanto, a questão da múltipla agência
se torna especialmente difusa e difícil de tratar em redes de parceria igual
e está sujeita a negociação quase constante.
No caso de redes, a responsabilidade é confusa porque o uso dos ati‑
vos pode não ser condicionado a sua propriedade. A organização virtual
é um exemplo disso: uma empresa como a Dell Computer na verdade
utiliza os ativos de seus parceiros de rede para produzir sob a marca cor‑
porativa. Entretanto, ela não é legalmente responsável pela conduta dos
produtores da rede em relação a seus acionistas, empregados, comunida‑
des e ambientes. Há o caso de uma empresa que se beneficia do domínio
na rede para assumir mais responsabilidade pela conduta das empresas
nessa rede, reconhecendo assim como a organização de sistemas de ca‑
deia de valor se externalizou além de seus limites.

15.7 Aplicação de insights organizacionais ao


sistema da governança corporativa
15.7.1 Limitações de contrato e hierarquia
Nenhuma das questões identificadas neste capítulo está recebendo
muita atenção nas atuais discussões sobre a governança corporativa, con‑
forme a leitura atenta de um texto importante como o de Monks e Minow
confirmará.26 Mesmo assim, elas aparecem a partir de alguns desenvol‑
vimentos significativos na natureza da firma, que tornam insustentáveis

Book_Organizaçoes.indb 538 16/9/2011 16:24:10


a ideia e os métodos convencionais da governança corporativa. Essa vi‑
são convencional foi extraída de um modelo de organização baseado em
contrato e estruturado por obrigações, regras e controles hierárquicos.
Presume­‑se que diretores situados no topo dessas hierarquias conheçam,
compreendam e controlem o que está acontecendo em suas empresas e
parcerias. As limitações da hierarquia são ignoradas, assim como o são
os problemas de dupla e múltiplas agências.
Talvez o insight mais importante proporcionado pela perspectiva
539
organizacional seja a impossibilidade de garantir por contrato uma boa
governança corporativa. Já foi sugerido que os contratos poderiam ser

Governança corporativa nas novas formas organizacionais


mais “previdentes” antevendo riscos e contingências futuras.27 Contudo,
em condições de rápida mudança e incerteza, há um rigoroso limite
para o que pode ser previsto; e, evidentemente, contratos previdentes
em si não bastam. De qualquer maneira, contratos não necessariamente
motivarão as pessoas a se comportar de modo a corresponder aos inte‑
resses dos proprietários e outros stakeholders. Os processos contínuos
de interpretação e adaptação nas organizações são mais importantes
para as ações das pessoas que a base formal à qual estão vinculadas
contratualmente.
Discussões sobre a governança corporativa também tendem a ver as
organizações como estruturadas por obrigações, regras e controles hie‑
rárquicos. Na prática, muitas empresas estão reduzindo sua dependência
da hierarquia, transferindo a iniciativa para níveis mais baixos em suas
organizações porque desejam aproveitar melhor as qualificações de seus
empregados. Em especial, desejam empenhar a contribuição deles para a
inovação e adaptação às novas exigências, mas percebem que não podem
depender de contratos ou regras para conseguir esses benefícios. Não
obstante, essa parceria com os empregados traz certo risco. Na melhor
das hipóteses, cometerão às vezes erros e embarcarão em iniciativas ina‑
dequadas, e na pior das hipóteses, como aconteceu com a Enron, alguns
se aproveitarão da liberdade recebida. Evidentemente, esse risco pode
abalar a governança corporativa.
Aqui temos dois aspectos desejáveis que, diante disso, não pare‑
cem facilmente conciliáveis: um diz respeito aos benefícios que podem
ser oferecidos por novas abordagens da organização, enquanto o outro
é a necessidade geralmente aceita de fortalecer a governança corporati‑
va. Contudo, apesar da dificuldade que as novas formas organizacionais
criam para a governança corporativa devido aos problemas de dupla e

Book_Organizaçoes.indb 539 16/9/2011 16:24:10


múltiplas agências, precisamos lembrar que esse tipo de governança tam‑
bém não estava necessariamente em boa forma nem mesmo nas empre‑
sas convencionalmente organizadas. Existem algumas medidas bastante
compatíveis com essas abordagens mais recentes da organização que real­
mente podem ajudar a melhorar a governança corporativa. Entre elas
estão o mútuo monitoramento e questionamento pelos empregados, a
transparência, uma abordagem mais ampla do controle, a promoção da
confiança e a cooptação dos empregados e gestores intermediários por
540
meio do stock option e programas de participação nos lucros. Embora a
discussão a seguir esteja centrada na organização em uma única empre‑
parte iv  o desenvolvimento de organizações eficientes

sa, os princípios de algumas dessas medidas, especialmente o controle


compartilhado, a confiança e o benefício mútuo, podem também oferecer
uma boa base para administrar uma parceria entre empresas.

15.7.2 Monitoramento mútuo


Se o objetivo for manter as vantagens decorrentes da transferência de
responsabilidades das novas formas organizacionais, é preciso dar mais
alguns passos para assegurar um comportamento responsável e uma boa
governança. Um desses passos é admitir que os conflitos de interesse são
endêmicos à organização das empresas e devem ser geridos por meio de
uma combinação de negociações e barganhas, divulgação e aprovação e
monitoramento mútuo.28
Em uma organização com transferência de responsabilidades, para
não falarmos de uma rede de parcerias, não basta confiar apenas na
monitoração do CEO pelo conselho e seus comitês, e do conselho pe‑
los acionistas. Dado que, na prática, é impossível que um CEO ou até
mesmo altos executivos conheçam detalhes do que está acontecendo,
é necessário que as partes envolvidas nas atividades de uma empresa
se monitorem e tornem públicas quaisquer preocupações. Isso significa
dar voz aos stakeholders, como empregados, credores e parceiros das
redes. Em uma joint venture, significa escutar um parceiro minoritário,
em vez de tentar dominá­‑lo. Os líderes da corporação devem estimular
o que Michael Useem chama de liderar para cima (leading up) – crítica
e questionamento de empregados e outros. A denúncia de irregularida‑
des e afins devem ser estimulada, em vez de punida. Se a Enron tivesse
feito isso, o desastre poderia ter sido evitado (Quadro 15.3). O grupo de
mineração Anglo American é um dos líderes entre as grandes empresas

Book_Organizaçoes.indb 540 16/9/2011 16:24:10


Quadro 15.3  A necessidade de “liderar para cima”

Kenneth Lay, ex­‑CEO da Enron, aparentemente deixou de escutar quando Sher‑


ron Watkins, o vice­‑presidente, avisou que havia problemas na contabilidade […]
Outros dois executivos falaram a um comitê do conselho sobre os riscos financei‑
ros criados por entidades com propósitos específicos. Um advogado de dentro da
empresa escreveu a seus superiores que aparentemente “os livros contábeis da
Enron estavam sendo alterados para eliminar uma redução nos ganhos, que teria
sido evidenciada se houvesse contabilidade de valor justo”. Os gestores devem 541
resistir à tentação de ignorar as advertências que vêm de baixo.

Governança corporativa nas novas formas organizacionais


Fonte: Orts, Eric. Law is never enough to guarantee fair dealing. Financial Times, 23 ago. 2002.

em que funciona uma política de denúncia de corrupção. O programa é


chamado Speakup (“Conte tudo”) e estimula os empregados a reportar
confidencialmente quaisquer violações das regras da boa prática empre‑
sarial da Anglo American ou quaisquer preocupações éticas e legais que
eles possam ter.29

15.7.3 Transparência
Do ponto de vista do acionista, uma governança competente requer
mais transparência nas negociações corporativas e melhores mecanis‑
mos que evidenciem práticas inadequadas ou a iminência de problemas.
O monitoramento mútuo tem o objetivo de promover a transparência.
Movimentos em direção a mais transparência estão em sintonia com os
objetivos das novas formas organizacionais, especialmente promoção do
aprendizado e inovação. Embora esses processos em geral visem criar
novo conhecimento que depois será guardado em segredo, a geração des‑
se conhecimento e outras formas de aprendizado organizacional requer
mais transparência interna. A menos que a informação relevante seja
compartilhada em uma organização, a eficácia do aprendizado coletivo
estará prejudicada. O clima organizacional mais aberto pode facilitar o
aprendizado visando tanto evitar erros da governança quanto realizar
melhorias inovadoras.
A transparência requer comunicação aberta e troca de informa‑
ções nas organizações e entre ela e os stakeholders. Até certo ponto, a

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exigência de transparência é o resultado inevitável de uma sociedade que
se baseia cada vez mais no conhecimento, em que os cidadãos instruídos
exigem o direito de saber e conhecer e os gestores devem compartilhar
a informação de modo que as competências dos indivíduos possam ser
aplicadas para agregar efetivamente mais valor. Além disso, é também
uma reação à acumulação de poder pelos agentes, levando a um acesso
desigual à informação a menos que isso seja feito de outra maneira. O
resultado dessa tensão entre a assimetria de poder e a exigência de trans‑
542
parência terá influência direta no futuro da forma organizacional. Se
a transparência vencer, é provável que sejam introduzidos mecanismos
parte iv  o desenvolvimento de organizações eficientes

mais extensos para consulta e participação, em que métodos como a ava‑


liação 360 graus são estendidos até o topo das organizações. Unidades
organizacionais menores, que operam mais como equipes orgânicas e
estão mais próximas dos interesses locais também favorecem a trans‑
parência. As multinacionais podem sofrer pressões para transferir mais
autonomia em reconhecimento às particularidades locais e a mudança de
hierarquias convencionais para redes de unidades semiautônomas será
mais encorajada.
Uma transparência maior na forma de monitoramento mais aber‑
to e reportação das preocupações e inquietudes limitarão o risco de
oportunismo nas novas formas de organização, ou melhor, em qualquer
forma de organização. Naturalmente, essa transparência não eliminará
o problema da dupla agência e a consequente necessidade de controle
sobre o que fazem as pessoas em uma organização ou em seu nome. No
entanto, ela demanda uma abordagem mais aberta e participativa do
controle.

15.7.4 Uma abordagem mais ampla do controle


Para reduzir o problema da dupla agência em organizações, é preciso
uma abordagem mais sofisticada do controle, que vá além do foco – de
cima para baixo – do CEO que encontramos na maioria das discussões
sobre a governança corporativa. Essa perspectiva de baixo para cima ca‑
racterizava a análise do controle na teoria tradicional da organização. Por
exemplo, houve preocupação sobre como, conforme as empresas crescem,
as limitações da supervisão pessoal centralizada pelos executivos de alto
escalão poderiam ser compensadas pelo desenho de um sistema de re‑

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gras, incluindo as incorporadas em procedimentos como a “gestão por
exceção”.30
Atualmente, a discussão já avançou bastante. O Capítulo 5 descreveu
a gama mais ampla de estratégias de controle que surgiram desde então.
Além da supervisão pessoal e do “controle do comportamento” por meio
da aplicação de regras, há outras opções, como o controle de produção
com base em metas acordadas, controle por normas culturais e contro‑
le por meio de processos do RH, como a seleção e avaliação. O papel
543
dos sistemas de recompensa como artifício de controle foi examinado no

Governança corporativa nas novas formas organizacionais


Capítulo 6. O controle por metas acordadas, o processo de avaliação e
as normas culturais comuns levam a um compromisso conjunto de exe‑
cutivos e sua equipe de gestão. Essas diferentes formas de controle foram
desenvolvidas em reação à dificuldade de se manter a responsabilidade
sob condições e formas organizacionais cada vez mais variadas. Essas
formas podem ser aplicadas para atender a diferentes tipos de equipes,
trabalhando em diferentes circunstâncias. Abordagens menos formais,
como o contato pessoal e normas culturais, podem reforçar mecanismos
de controle mais formais, e vice­‑versa.
Hoje em dia, os gestores mais eficientes reconhecem a vantagem
competitiva de ganhar o apoio sincero de sua equipe e de seus parcei‑
ros quando formam alianças e redes. Qualquer imposição de controle
unilateral, seja propositalmente, seja por negligência, que não permita
que empregados e parceiros discutam e entrem em acordo a respeito
de critérios e métodos a serem aplicados, exclui uma contribuição que
poderia ser valiosa e enfraquece o comportamento com as metas que o
controle supostamente deveria ajudar a atingir. Em outras palavras, um
bom sistema de controle deve operar com participação, transparência e
evidente justiça. O ethos de empoderamento e transparência da “nova
organização” deve ser aplicado à maneira como funcionam os sistemas
de controle, que visam apoiar as metas da transferência da iniciativa
para outros níveis e propiciar um meio eficaz de assegurar a responsabi‑
lidade. É por isso que gestores atentos estão vivamente interessados nas
possibilidades de aumentar a extensão do controle em suas empresas,
com base na confiança e em objetivos compartilhados – que também
reduzem a probabilidade de oportunismo, a principal preocupação da
governança corporativa.

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15.7.5 Confiança
A indisposição generalizada de muitos stakeholders e membros da or‑
ganização em confiar nos gestores corporativos é um dos fracassos mais
sérios das empresas contemporâneas. Pessoas que não confiam na gerên‑
cia para qual trabalham certamente não darão o melhor de si. Isso vai
contra as intenções das mais recentes perspectivas organizacionais, que
reconhecem os talentos dos membros da organização e visam atraí­‑los.
544 Do ponto de vista da governança corporativa, empregados que não con‑
fiam e não se comprometem com suas organizações têm mais probabili‑
parte iv  o desenvolvimento de organizações eficientes

dade de cometer abusos e se comportar de maneira oportunista às custas


do controlador. Portanto, a confiança é indispensável.
O capítulo anterior identificou as formas pelas quais a confiança
pode ser cultivada. Trata­‑se de um processo bidirecional. Quando sentem
que podem confiar naqueles para quem trabalham, as pessoas tenderão
a apresentar um comportamento confiável. De início, para desenvolver a
confiança entre os empregados, é fundamental evitar ameaças à sua segu‑
rança pessoal por meio de garantias de que não serão demitidos do empre‑
go, de políticas justas de reconhecimento e recompensas, de transparência
para tratar de queixas e questões disciplinares, entre outros. Com essa
base sólida, a confiança poderá ser reforçada e aprofundada por meio
da comunicação aberta e da difusão ampla da informação. Assim, os
membros da organização saberão dos eventos e propostas relevantes, o
que poderá gerar mais compreensão mútua. Isso reduzirá também a pos‑
sibilidade de os empregados serem surpreendidos e consequentemente se
sentirem ameaçados e abandonados. Esforços para desenvolver interação
social entre empregados e executivos em todos os níveis e por todas as
unidades podem reforçar a confiança na empresa mediante vínculos pes‑
soais e identificação entre as pessoas.
Todas essas medidas são compatíveis com o espírito das novas formas
organizacionais; elas ajudam a promover a flexibilidade e a inovação,
bem como facilitar os processos complementares a essas metas, como a
mudança, o aprendizado e a renovação. Esses mesmos critérios para a
consolidação da confiança também servem para fortalecer a governança
corporativa ao endossar as providências já mencionadas: mais transpa‑
rência, abordagem mais ampla do controle e uma atitude positiva em
relação ao monitoramento mútuo.

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15.7.6 Cooptação dos agentes por meio da
participação acionária
Há mais um meio de reduzir o risco de oportunismo de parte dos
empregados e aumentar o comportamento deles em relação às metas da
empresas: cooptá­‑los com participação na propriedade, ou pelo menos,
com direito de compartilhar as recompensas decorrentes da propriedade,
de modo que sejam controladores e agentes a se tornarem donos, e ao
mesmo tempo, funcionários. O Capítulo 7 discutiu os planos de parti‑ 545

cipação acionária dos empregados e planos de participação nos lucros

Governança corporativa nas novas formas organizacionais


como componentes da política de recompensa.
Shoshana Zuboff, da Harvard Business School, e James Maxim
apoiam o princípio da participação acionária do empregado em seu livro
e o levam mais adiante. Observam que o capitalismo é um sistema econô‑
mico robusto, que resistiu antes a crises por meio da adaptação. Eles acre‑
ditam que a próxima etapa em seu desenvolvimento será o que chamam
de “capitalismo distribuído”, em que a propriedade será mais ampla‑
mente distribuída e as empresas serão mais sensíveis às demandas de seus
empregados e comunidades como são às de seus acionistas.31 Embora os
planos de participação dos lucros não ofereçam aos empregados parte da
propriedade, pelo menos permitem compartilhar as recompensas de um
desempenho organizacional melhor e contribuir com ideias para avanços
por meio de uma participação significativa.
Embora o valor financeiro da participação de cada empregado na
propriedade normalmente seja uma proporção minúscula do todo, seu
valor absoluto para indivíduos e suas famílias é mais significativo. O va‑
lor simbólico de uma parcela na propriedade da empresa em que traba‑
lham também é importante por significar uma identidade de interesses
com a empresa e um comprometimento para o alcance do objetivo co‑
mum. Esse mesmo princípio – stock options ­– tem sido amplamente usa‑
do com os executivos seniores, e foi aplaudido por autores especializados
na governança corporativa. Entretanto, quando limitados a um pequeno
grupo de elite, os lucros potenciais podem estimular o comportamento
oportunista e desonesto a despeito do restante da empresa – em outras
palavras, o contrário da transparência. Ter um grande número de mem‑
bros bem esclarecidos em uma empresa, motivados como proprietários
para monitorar o comportamento dos gestores, seria uma boa maneira de
impedir esse abuso de poder.

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Já se sugeriu que a desonestidade e a arrogância dos gestores que
provocaram as recentes crises corporativas refletem uma cultura de “es‑
perteza” dos executivos e consultores, que estudaram em escolas de ad‑
ministração e direito e se sentem quase compelidos a criar formas mais
criativas e complexas de explorar o sistema.32 A aceitação da ideolo‑
gia da expertise gerencial tem servido como justificativa do direito de
se usar o poder executivo além do controle efetivo, deixando de lado
os interesses de acionistas, clientes e membros do público em geral. A
546
democratização da opinião nas corporações, por meio de reformas na
governança corporativa já mencionadas, seria um antídoto contra essa
parte iv  o desenvolvimento de organizações eficientes

arriscada tendência. Executivos em situação privilegiada afirmam que


isso abriria portas para a irresponsabilidade. Tirando o fato de essa ser
uma alegação vazia diante dos escândalos recentes, os capítulos ante‑
riores, especialmente o 3 e o 12, mostraram como o peso das evidências
desmentem isso.

15.8 Conclusão
A conclusão é que as empresas podem transformar em virtude a
necessidade de depender cada vez mais da transferência da iniciativa
para os seus membros. Ao cooptar esses membros como parceiros de
um sistema de governança, permitindo que tenham verdadeira partici‑
pação na propriedade corporativa e recompensas pelo sucesso futuro, e
ao alimentar a confiança deles na gestão mediante abertura e levando a
sério os valores, a adoção de uma nova filosofia organizacional pode ser
aliada do bom desempenho e da boa governança corporativa. Há mui‑
tos exemplos de empresas de sucesso que se beneficiaram por seguirem
essa abordagem – da Southwest Airlines à Harley­‑Davidson. O Quadro
15.4 mostra o exemplo da Springfield ReManufacturing Corporation.
A conclusão seguiria na mesma linha com relação a parcerias entre em‑
presas, em que os riscos que surgem da desonestidade e do oportunismo
são igualmente sérios. É preciso haver algumas salvaguardas contratuais
para proteger os interesses de cada parceiro, especialmente quando recursos
patenteados estão sendo fornecidos. A aliança também deve estar baseada
em boa adequação entre os interesses estratégicos de cada parceiro. Um
interesse estratégico comum e uma participação na propriedade comparti‑
lhada ajudarão a proporcionar uma base sólida para a aliança. Uma vez es‑
tabelecida essa base, é o comprometimento psicológico de cada parceiro da

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Quadro 15.4  Organização aberta e boa governança

No final dos anos 1980, a Springfield ReManufacturing Company, sob a liderança


de Jack Stack, emergiu como um modelo de como gestores e trabalhadores pode‑
riam atuar em conjunto e com sucesso em uma cultura de transparência, mútua
confiança e propriedade. Stack persistiu nessa abordagem até mesmo quando
ela deixou de estar sintonizada com os impetuosos dias da riqueza rápida do
final dos anos 1990. Nessa época, a empresa mantinha sua cultura de “gestão de
livro aberto”. Ao compartilhar informações sobre todas as questões financeiras da 547
empresa com todos os empregados, e ao dar­‑lhes uma participação na proprie‑

Governança corporativa nas novas formas organizacionais


dade, a companhia criou um grau fora do comum de respeito mútuo e confiança.
Na empresa de Stack há reuniões semanais entre executivos e trabalhadores,
com cartazes nas paredes da fábrica mapeando o progresso do trabalho, e
constante ênfase dos executivos em construir uma empresa e não apenas um
produto. Os trabalhadores passam por treinamento de forma que possam com‑
preender balanços e demonstrações de resultados.

Fonte: Byrne, John A. After Enron: the ideal corporation. Business Week, 26 ago. 2002,
p. 32­‑35.

aliança, reforçado pela transparência e pela confiança mútua, o que melhor


garantirá a boa governança e o sucesso futuro (veja o Capítulo 10).

Resumo
1. A governança corporativa está essencialmente interessada na conduta
e no desempenho de pessoas que atuam como agentes dos acionistas e
outros stakeholders das empresas.

2. Escândalos como o da Enron reforçaram a demanda pública por sis‑


temas de responsabilidade corporativa mais amplos e eficientes. Os altos
executivos foram agora postos na linha em relação aos padrões de con‑
duta e prestação de contas. A governança está no topo da agenda pública
para a reforma da corporação.

3. A governança corporativa requer diretores corporativos e CEOs respon‑


sáveis pelo desempenho e padrões de conduta de suas empresas, em seus
papéis de agentes dos acionistas e outros grupos que detenham direitos de
propriedade.

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4. Com isso, a governança corporativa pressupõe que esses executivos
realmente conheçam e controlem o que acontece em suas empresas. Esse
pressuposto se baseia em um modelo hierárquico tradicional de orga‑
nização corporativa, mas é questionável até mesmo para essa forma
convencional.

5. Os novos desenvolvimentos organizacionais descritos nos capítulos


anteriores tornam mais difícil satisfazer esse pressuposto. A transfe‑
548 rência da iniciativa para outros níveis nas empresas mais frouxamente
acopladas aumenta os problemas associados à dupla agência. Quando
parte iv  o desenvolvimento de organizações eficientes

são formadas parcerias e redes, surgem problemas associados à agência


múltipla.

6. Assim, os movimentos em direção às novas formas organizacionais


podem entrar em conflito com a responsabilidade requerida pela gover‑
nança corporativa. Esse conflito reflete uma tensão entre a necessidade de
controle e a de adaptabilidade e inovação.

7. Contudo, as abordagens mais novas da organização visam formas de


controle e recompensa que deveriam auxiliar a boa governança, facilitan‑
do a participação e a transparência da informação.

8. Esses fatos, combinados com outras medidas como uma propriedade


corporativa mais dispersa, oferecem a perspectiva de conciliar novas for‑
mas organizacionais com a governança corporativa aperfeiçoada. Uma
abordagem da governança corporativa baseada na inclusão também aju‑
daria a resolver o problema da quebra da confiança entre a direção e os
empregados.

Questões para discussão


1. A partir de sua leitura dos capítulos anteriores, descreva e discuta a
complementaridade que há entre governança corporativa e organização.

2. Descreva e discuta os problemas da agência em questões de governança


corporativa e controle.

3. Como as novas formas organizacionais influenciam a governança


corporativa?

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4. Como as questões da governança corporativa poderiam esclarecer nossa
compreensão das alianças estratégicas?

5. Discuta os conceitos de “monitormento mútuo” e “transparência” em


relação à governança corporativa.

6. Tomando como referência o Capítulo 14, discuta o relacionamento entre


as questões da confiança e da governança corporativa.
549

Governança corporativa nas novas formas organizacionais


Notas
1. Este capítulo foi extraído de CHILD, John; RODRIGUES, Suzana B. Corporate
governance and new organizational forms. Journal of Management and Gover‑
nance, 7, p. 337­‑360, 2003.

2. Entre eles, Karl Marx e Thorsten Veblen. MARX, Karl; ENGELS, Friedrich.
Manifesto of the Communist Party. Moscow: Foreign Languages Publishing
House, 1959 (tradução do original de 1848); Veblen, Thorsten. The Theory
of Business Enterprise. New York: Scribners, 1904.

3. BERLE, A. A; MEANS, G. C. The Modern Corporation and Private Property.


New York: Macmillan, 1932.

4. How to fix corporate governance. Business Week, reportagem especial, p. 43­


‑50, 6 maio 2002.

5. CHILD, John; RODRIGUES, Suzana B. Repairing the breach of trust in corpo‑


rate governance. Corporate Governance, 12, 2004, p. 143­‑151.

6. MOKHIBER, Russell; WEISSMAN, Robert. September in Washington, D.C.


Disponível em: <http://www.corporatepredators.org62>, 7 set. 2001.

7. THAMOTHERAM R. (Org.). Visions of Ethical Sourcing. London: Financial


Times Prentice­‑Hall, 2000.

8. ELKINGTON J. Trusting values. The Director, 56, 25 abr. 2003.

9. GROOM, B. As accusations fly between BBC and government, is there a deepe‑


ning crisis of trust in British public life? Financial Times, p.11, 26 jul. 2003, p. 11.

10. SKAPINKER, M. Building trust and profits by telling staff the truth. Financial
Times, Survey of Best Workplaces 2003, p. 2, 28 mar. 2003.

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11. British Broadcasting Corporation/BBC. The banks that robbed the world. BBC
Money Programme, 9 jan. 2003.

12. Para um panorama geral veja: MONKS, Robert A. G; MINOW, Nell. Corpo‑
rate Governance. 2. ed. Oxford: Blackwell, 2001.

13. OECD, Corporate Governance: Effects on Firm Performance and Growth, Pa‑
ris: OECD, 1999.

550 14. COOMBES, P; WATSON, M. Three surveys on corporate governance. McKin‑


sey Quarterly, (4), p. 74­‑77, ed. especial, 2000.
parte iv  o desenvolvimento de organizações eficientes

15. O’SULLIVAN, Mary. The innovative enterprise and corporate governance.


Cambridge Journal of Economics, 24, p. 395, 2000.

16. NEILSON, G. D; Kletter; JONES J. Treating the troubled corporation.


Strategy+Business Enews, 28 mar. 2003. Disponível em: <http://www.strategy­
‑business.com/press/enewsarticle/22230?pg=o>.

17. Por exemplo, HICKSON, David J. Motives of workpeople who restrict their
output. Occupational Psychology, 35(3), p. 111­‑121, 1961; DALTON, Melvil‑
le. Men Who Manage. New York: John Wiley & Sons, 1959.

18. WILLIAMSON, Oliver E. Corporate Control and Business Behavior. En‑


glewood Cliffs: Prentice­‑Hall, 1970.

19. BOWER, Joseph L. Managing the Resource Allocation Process. Boston: Divi‑
são de Pesquisa, Harvard Business School, 1970.

20 DEMSETZ, H. The emerging theory of the firm. Acta Universitatis Upsaliensis,


n. 33. Suécia, University of Uppsala, 1992. p. 21.

21. CHILD, John; FAULKNER, David; TALLMAN, Stephen. Cooperative Strate‑


gy: Managing Alliances, Networks and Joint Ventures. 2. ed. Oxford: Oxford
University Press, 2005.

22. LONDON, S. Enron: revolution can fail the people. Financial Times, p. 16, 4
dez. 2001.

23. LAZONICK, William; O’SULLIVAN, Mary. Perspectives on Corporate Gover‑


nance, Innovation, and Economic Performance. Relatório para o contrato de
pesquisa da UE no SOE1­‑CT98­‑1114, projeto n° 053, Fontainebleau, INSEAD,
2000.

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24. HÄCKI, R; LIGHTON, J. The future of the networked company. McKinsey
Quarterly, (3), p. 26­‑39, 2001.

25. CHILD et al., 2005, op. cit.

26. MONKS; MINOW, 2001, op. cit.

27. WILLIAMSON, Oliver E. The Mechanisms of Governance. New York: Oxford


University Press, 1996.
551
28. ORTS, Eric. Law is never enough to guarantee fair dealing. Financial Times, p.

Governança corporativa nas novas formas organizacionais


9, 23 ago. 2002.

29. EGLIN, Roger. Companies that play by the rules. Sunday Times, 9 mai. 2004,
p. 79.

30. Veja, por exemplo, CHILD, John. Organization structure and strategies of con‑
trol. Administrative Science Quarterly, 17(2), p. 163­‑177, 1972.

31. ZUBOFF, Shoshana; MAXIM, James. The Support Econom. New York: Viking
Books, 2002.

32. LETRENT­‑JONES, Tony G. What lies beneath: a critical look at the role of
management consulting and business education in the Enron­‑Andersen case.
Documento inédito, 2002. LeTrentJones@CS.COM.

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Book_Organizaçoes.indb 552 16/9/2011 16:24:12
CONCLUSÃO

Capítulo 16  Como entender a organização

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Capítulo 16
Como entender a organização

Conteúdo do capítulo
Os capítulos anteriores identificaram uma variedade crescente de formas
organizacionais. Novas formas estão sendo elaboradas, enquanto as formas
convencionais persistem. Este capítulo examina os detalhes com certo
distanciamento para compreender esse quadro variado e refletir sobre as
possibilidades futuras.
Começaremos enfocando uma das duas faces da organização identificadas
no Capítulo 2: a organização como um conjunto de arranjos para realizar as
atividades coletivas, dirigidas a um objetivo de modo coeso e metódico. Esses
arranjos devem corresponder a três necessidades estratégicas: eficiência,
adaptabilidade e inovação. Enquanto a necessidade de eficiência continua
significativa, as necessidades de adaptabilidade e inovação estão assumindo
mais importância. Identificar essas três necessidades nos ajuda a compreender
as escolhas organizacionais. São apresentados exemplos que ilustram como
as diferentes configurações da necessidade estratégica dão lugar a variações
nas formas de organização. Abordagens mais recentes da organização
tentam refletir sobre a necessidade de se empregar uma série de formas
organizacionais em uma mesma empresa – às vezes com a criação de unidades
modulares menores – e, ao mesmo tempo, preservar a integração entre elas.
A segunda parte do capítulo enfoca a outra face da organização, um conjunto
de arranjos que distribui poder, recompensas e bem­‑estar. Se a forma de
organização em uso deixar de corresponder às expectativas associadas a
esses aspectos, o desempenho e a legitimidade de um negócio podem ser
prejudicados. Observaremos indícios dessa falha e exemplos de como algumas
empresas estão resolvendo o problema.

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16.1 Formas de organização e necessidades
estratégicas
Há uma opinião cada vez mais comum de que a organização
convencional do passado já não atende às necessidades do presente.
Essa ideia elimina pela raiz os alegados benefícios da burocracia: ad‑
ministrar atividades organizadas com imparcialidade e eficiência. A
mensagem dos críticos da organização convencional é atraente, mas
556
permanece obscura quanto à questão fundamental: saber se as novas
formas organizacionais podem ou não oferecer um caminho alterna‑
Conclusão

tivo para o sucesso econômico. Temos ainda de perguntar até que


ponto, e sob quais condições, deveríamos descartar o conhecimento
acumulado nos últimos 4.500 anos.1 Deveríamos pensar em termos
de refinamento da organização convencional mais que em substituí­‑la
completamente? Se esse for o caso, isso levaria a formas de organiza‑
ção mistas, modulares ou híbridas, dentro da mesma empresa, que po‑
deriam ser muito difíceis de administrar? Para discutir tais questões,
esta seção apresenta uma estrutura baseada na identificação de neces‑
sidades estratégicas que empresas e outras organizações enfrentam nas
circunstâncias atuais.
O Capítulo 2 descreveu as tendências gerais que hoje influenciam
um amplo espectro de empresas, desde grandes corporações multi‑
nacionais até empresas menores. Há pouquíssimos setores em que a
intensidade da competição não está aumentando. Há evidência da in‑
ternacionalização da competição e a entrada de novos concorrentes no
mercado, provenientes de países como Brasil, China, Índia e Coreia do
Sul. Especialmente significativo é o fato de que esses novos concorrentes
com produção de baixo custo estão conseguindo avançar rapidamente
do ponto de vista tecnológico e de design de produtos. Uma das conse‑
quências da globalização dos mercados é que a distinção delineada por
Michael Porter entre dois tipos de vantagem competitiva que as empre‑
sas poderiam visar – baixo custo e diferenciação – agora está sucumbin‑
do.2 As empresas que competem em mercados abertos devem procurar
desenvolver cada vez mais as vantagens de custo e diferenciação.
As vantagens do custo podem derivar de insumos baratos, especial‑
mente da mão de obra; de outra forma, devem ser alcançadas por meio
de eficiência superior. A eficiência tem base física, como nas economias
de escala e alta produtividade. Há também uma importante contribuição

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organizacional à eficiência, quando, por exemplo, os custos administrati‑
vos são mantidos baixos e os empregos estão concentrados em atividades
que agregam mais valor. As vantagens da diferenciação são provenientes
de produtos de características inconfundíveis e superiores e/ou da capa‑
cidade de abastecer mercados velozes e que exigem customização. A pri‑
meira requer a capacidade de inovar; a última exige uma boa capacidade
de adaptação. Portanto, as três necessidades estratégicas fundamentais
com as quais a organização deve estar sintonizada são: eficiência, inova‑
557
ção e adaptabilidade.
A necessidade de inovar tem origem na crescente sofisticação dos

Conclusão
consumidores dotados de maior poder de compra. Eles estão em pa‑
íses desenvolvidos ou nas regiões em rápido desenvolvimento de ou‑
tros países, como nas cidades costeiras da China. Produtos e serviços
mais complexos e refinados são atraídos pelo desenvolvimento cons‑
tante (“aperfeiçoamento”) dos produtos existentes e pelas novidades.
Exemplos bastante conhecidos são os produtos de entretenimento ele‑
trônico e os telefones celulares. A crescente complexidade dos produ‑
tos leva a uma heterogeneidade cada vez maior de insumos a serem
fornecidos para sua produção, especialmente no momento em que as
empresas aproveitam a liberalização do comércio e a melhoria da in‑
formação global para terceirizar atividades para fornecedores que po‑
dem oferecer transações mais competitivas. A pressão para o constante
aperfeiçoamento da maioria dos produtos, com exceção dos artigos de
primeira necessidade, encurta seus ciclos de vida e aumenta a ênfase na
inovação.
A vantagem competitiva também pode ser obtida a partir da capa‑
cidade de uma empresa de se adaptar rapidamente à mudança, inclusi‑
ve a determinadas exigências do cliente. Essa capacidade de identificar
e reagir com rapidez às novas circunstâncias que oferecem novas opor‑
tunidades de lucro é a essência do empreendedorismo. Uma impor‑
tante forma de adaptação está na capacidade de ajustar rapidamente
produtos ou serviços às necessidades de diferentes clientes. O Capítulo
9 descreveu como a Dell Computer desenvolveu sistemas que lhe per‑
mitem montar cada computador segundo as especificações do cliente,
operar com estoque mínimo e ainda oferecer um prazo bem curto de
entrega, de até dois dias após o recebimento do pedido. A Dell sim‑
boliza a adaptabilidade quanto à agilidade e à velocidade. Empresas
de confecção bem­‑sucedidas também têm alta adaptabilidade e são

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capazes de reagir muito depressa às mudanças nas tendências do mer‑
cado e nas preferências do consumidor. A Benetton, por exemplo,
alcança essa capacidade por meio de uma rede altamente flexível ba‑
seada em padrões informais de cooperação, em vez de em contratos
formais.3
Há muitos anos está claro que há tensões fundamentais entre os re‑
quisitos que impomos sobre a organização.4 No passado, a maioria das
empresas e outros tipos de organizações eram capazes de manter alguma
558
“folga” de reserva de recursos ou de tempo disponível para lidar com
essas exigências da competição. Uma das consequências das novas con‑
Conclusão

dições que hoje as empresas têm de enfrentar, especialmente a hipercom‑


petição, é que tal folga desapareceu, talvez para sempre. Portanto, para
os que tomam a decisão sobre como organizar, é imprescindível ponderar
cuidadosamente sobre a relativa importância dessas três necessidades es‑
tratégicas que se espera que a organização satisfaça. Examinaremos ago‑
ra as implicações de cada necessidade estratégica para as organizações, e
então, as das diferentes combinações entre elas.

16.1.2 Eficiência
A eficiência pode ser considerada a necessidade mais constante. Até
mesmo uma empresa que esteja conseguindo grandes vantagens na di‑
ferenciação não pode descuidar de sua eficiência sem incorrer em perda
de lucro. Quando produtos e serviços são oferecidos a um preço mais
alto devido a ineficiências dos produtores, quer dizer que os consumi‑
dores estão recebendo menos que o valor ótimo pelo dinheiro. Portanto,
quando competem com base na diferenciação mas têm custos altos, as
empresas enfrentam a ameaça de que imitadores ou “seguidores” de
baixo custo entrem no mercado e enfraqueçam sua posição. Seja qual
for a maneira que a empresa escolher para se organizar, terá de ser mui‑
to eficiente.
A força das formas convencionais de organização está em seu enfo‑
que na eficiência: as práticas convencionais da organização visam melho‑
rar a eficiência em condições estáveis. Elas são também inerentemente
econômicas por si mesmas. Quando isso não acontece, aponta para uma
condição patológica, como excesso de pessoal administrativo ou acúmu‑
lo injustificado de níveis hierárquicos, mais que para uma falha que é
necessariamente inerente à própria forma organizacional. Os seguintes

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aspectos da organização estão voltados para responder às necessidades
de eficiência:

„„ definição clara das responsabilidades especializadas ligadas aos


papéis na organização;

„„ sistemas de controle concentrados na responsabilidade pelo desem‑


penho dessas responsabilidades;

„„ diferenciação de papéis de acordo com os níveis e áreas de 559


responsabilidade (ou seja, hierarquia e especialização de função,

Conclusão
respectivamente);

„„ unidades controladas e coordenadas pelo alto escalão;

„„ estruturas simples de modo a reduzir os custos da gestão e maxi‑


mizar a visibilidade dos líderes;

„„ regras claras e transparentes para compensar os membros da orga‑


nização segundo o desempenho de seus papéis;

„„ uso de regras e práticas padronizadas para guardar a experiência e


o conhecimento acumulados;

„„ forte identidade organizacional e compromisso com a organiza‑


ção (esprit de corps).

Surgem outras duas necessidades estratégicas na busca das vanta‑


gens da diferenciação: a adaptabilidade e a inovação. A distinção entre
elas às vezes é negligenciada devido ao fato de ambas estarem associa‑
das à ideia geral de “flexibilidade”; é bom ter em mente que não são a
mesma coisa e podem não aparecer juntas. A inovação pode ser definida
como a criação ou desenvolvimento de um novo produto, processo ou
serviço. A adaptabilidade é a capacidade de se ajustar a novas circuns‑
tâncias, o que não significa necessariamente inovação. Ela pode, ao con‑
trário, assumir a forma de uma rápida reação à mudança das demandas
do consumidor ou a novas demandas, a partir dos produtos ou serviços
existentes, como acontece com a encomenda de serviços de alfaiataria
“para o mesmo dia” em Hong Kong. Essa distinção é de importância
fundamental porque elas não têm as mesmas implicações para o plane‑
jamento organizacional.

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16.1.3 Inovação
A pesquisa e a experiência mostram que uma série de características
organizacionais podem facilitar a inovação. Elas devem apoiar duas eta‑
pas distintas do processo de inovação: a etapa criativa (invenção) e a do
desenvolvimento (aplicação). Essas etapas correspondem à dicotomia de
James March entre a geração ou “exploração” do novo conhecimento, e
sua aplicação, ou “aproveitamento”.5
560 A geração de ideias criativas geralmente é estimulada por uma
abordagem que ressalta o significado da invenção, mas não é dirigida,
Conclusão

por exemplo, em relação à forma exata que a invenção terá, assim


como o desenvolvimento de redes de comunicação para troca de novas
ideias nas empresas e entre elas. Ao mesmo tempo, o pessoal da criação
e da pesquisa precisa conhecer as necessidades comerciais que regem a
inovação, por meio de contato ativo com as operações de negócios. Na
etapa seguinte, quando ideias ou protótipos estiverem se transforman‑
do em produtos ou serviços comerciais, o principal requisito organiza‑
cional é vincular criatividade e especialização técnica aos recursos da
empresa em outras áreas: produção, marketing, contabilidade e finan‑
ças, distribuição e atendimento ao consumidor. Aqui, duas inovações
organizacionais, discutidas do Capítulo 4, ajudam a conciliar a etapa
da criação e a do desenvolvimento da inovação. Uma é a equipe mul‑
tifuncional de desenvolvimento do produto; a outra é a do produto
campeão.
Embora os requisitos organizacionais sejam diferentes nas duas eta‑
pas da inovação, a pesquisa mostra que determinados aspectos mais
gerais podem facilitá­‑la. Eles abrangem muitas das novas formas organi‑
zacionais identificadas no Capítulo 2:

„„ definição menos precisa dos papéis organizacionais e seus limites;

„„ autoridade e iniciativa distribuídas;

„„ comunicações abertas;

„„ uso de equipes;

„„ sistemas de responsabilidade concentrados no alcance de metas da


pesquisa e nos projetos de desenvolvimento;

Book_Organizaçoes.indb 560 16/9/2011 16:24:12


„„ recompensas em termos de autonomia e reconhecimento; também
oportunidades de participar de recompensa financeira resultante
das inovações.

16.1.4 Adaptabilidade
O requisito mais decisivo para a adaptabilidade competitiva está na
rápida comunicação das novas informações e na capacidade de reagir
com rapidez a elas. Portanto, os arranjos organizacionais devem ser esta‑ 561
belecidos para garantir proximidade com o cliente ou o cenário da ação.

Conclusão
Deve haver um dispositivo para que decisões importantes sejam tomadas
rapidamente e para que quaisquer recursos necessários para apoio a essas
decisões sejam ordenados rápida e flexivelmente. Entretanto, ao contrá‑
rio do que acontece com a inovação, a natureza da ação apropriada às
novas circunstâncias pode ser muito bem conhecida e compreendida. Isso
pode permitir que alguns aspectos da organização convencional sejam
aplicados, como a padronização de procedimentos e categorias de ação, a
formalização de especificações técnicas relevantes e talvez uma definição
clara dos papéis a serem assumidos. Os seguintes aspectos organizacio‑
nais apoiam o requisito da adaptabilidade:

„„ A provisão de agentes especializados para a manutenção de conta‑


tos estreitos com clientes ou outros no ambiente externo relevante.
O meio de contato pode variar. Pode, por exemplo, ser realizado
por meio de reuniões pessoais com os clientes, visitas a exposições
e feiras, ou pela venda direta, usando o telefone ou a internet.

„„ A delegação de autoridade para a tomada rápida de decisões em


resposta à nova informação.

„„ Os sistemas que especificam as ações a serem tomadas em resposta


a novas exigências ou novos fatos – se tais respostas se enquadram
em categorias já conhecidas, podem se beneficiar da codificação e
do treinamento preparatório.

„„ Definição clara de quem tem autoridade para solicitar recursos e


alocar pessoal para conseguir uma resposta rápida a novas situa‑
ções. Isso pode depender da importância da situação (sua urgência,
sua importância para a organização, etc.) e de quem está em contato
direto com ela.

Book_Organizaçoes.indb 561 16/9/2011 16:24:13


Figura 16.1  Exemplos de altas e baixas necessidades de adaptar e inovar

Necessidade de inovar
(gerar novos produtos e processos)
Alta Baixa
Alta A B
(resposta rápida à mudança externa)

Agências de propagan‑ Serviços públicos de


Necessidade de adaptar

562
da e desenvolvedores de emergência (p. ex.,
software bombeiros)
Conclusão

C D

Unidades de P&D militares Autoridades do fisco

Baixa

16.1.5 Combinações da necessidade estratégica


A eficiência é uma necessidade estratégica permanente, devido à sua
contribuição para a vantagem do custo na estratégia competitiva de uma
empresa. A escolha estratégica que as empresas enfrentam diz respeito,
então, ao peso relativo que elas dão a cada uma das duas necessidades de
diferenciação – adaptabilidade e inovação – e como estas se equilibram em
relação à necessidade de eficiência. Uma maneira de analisar isso é levar
em conta as organizações que variam quanto à força de suas necessidades
para inovar e adaptar, respectivamente. Onde essas duas necessidades são
relativamente baixas, a necessidade de eficiência se torna primordial.
A Figura 16.1 apresenta exemplos de organizações que se enquadram
nas quatro categorias identificadas em termos de alta e baixa necessida‑
des de adaptar e inovar. A existência de diversas categorias serve como
lembrete de que empresas diferentes, ou variadas divisões em uma empre‑
sa, não operam necessariamente em ambientes idênticos.
Podemos distinguir duas categorias entre as organizações que se
veem diante de grande necessidade de adaptação. A primeira categoria
(quadrante A na Figura 16.1) abrange as organizações que devem ser,
ao mesmo tempo, adaptáveis e inovadoras. As empresas que se oferecem
para desenvolver um novo software para clientes terão de se adaptar a

Book_Organizaçoes.indb 562 16/9/2011 16:24:13


circunstâncias especiais que acompanhem um novo pedido. Embora seja
possível criar muitos softwares a partir de módulos existentes, também
pode ser necessário elaborar um novo software. Num setor altamente
competitivo, as agências de propaganda estão em semelhante situação,
em que têm de se adaptar em intervalos frequentes a exigências de clien‑
tes para novas campanhas e serviços inovadores ou às necessidades de
novos clientes.
Quando é necessário ser muito adaptável e inovadora, a empresa preci‑
sa usar uma forma organizacional que permita tanto a análise e a expressão 563

das exigências instáveis do mercado quanto o estímulo à inovação e ao

Conclusão
aprendizado necessários para satisfazer essas exigências. No caso de uma
agência de propaganda, por exemplo, um gerente de marca ou de conta
que tenha contato direto com os clientes pode articular as necessidades
destes em relação a desempenho, prazo de entrega e preço. Uma equipe de
projeto é o modo organizacional preferido para gerar a criatividade neces‑
sária para uma nova campanha de publicidade. Nessa situação, um modo
de liderança “vertical”, com a legitimidade do mercado por trás, deverá
ser combinado com a natureza predominantemente “horizontal” do traba‑
lho de equipe. O planejamento organizacional dessa combinação apresenta
enorme desafio. As soluções já experimentadas, como arranjos matriciais,
geralmente incorrem em certos custos para a eficiência, devido aos confli‑
tos criados entre sua inerente multiplicidade de pontos de vista e linhas de
autoridade. O Quadro 16.1 apresenta o exemplo da agência ADD.
Empresas e outras organizações que estão no segundo quadrante (B) não
precisam se adaptar por meio da inovação, porque em suas atividades en‑
frentam novas demandas cuja natureza pode ser conhecida antecipadamente,
embora seja impossível saber quando ocorrerão. Um exemplo característico
são os serviços públicos de emergência, que podem criar procedimentos pa‑
dronizados para lidar com diferentes tipos de emergência. Em seu conjunto,
a natureza dessas emergências não muda muito no curto e médio prazo. Não
obstante, o serviço precisa ser organizado de modo a permitir uma resposta
muito rápida a uma emergência, com suficiente flexibilidade na distribuição
dos recursos para lidar com escala e esfera de abrangência sempre singulares.
Isso significa que a unidade que tem grande necessidade de adaptação, mas
necessidade de inovação relativamente baixa, pode ser organizada segundo
linhas burocráticas convencionais, desde que garanta procedimentos que lhe
permitam lidar com mudanças súbitas. O caso dos bombeiros na Califórnia,
resumido no Quadro 16.2, é um exemplo.

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Quadro 16.1  O alcance da adaptação e da inovação por meio de equipes
bem orientadas

A agência ADD enfrenta a necessidade de criar uma nova campanha para


cada uma de suas empresas clientes mais ou menos a cada três meses. Os
clientes esperam que a maior parte dessas campanhas sejam novos pro‑
dutos, com novos textos e visual novo, mesmo quando desejam man‑
ter determinados temas ou valores nas diferentes campanhas. Alguns
564
anúncios também devem ser adaptados a diferentes culturas, merca‑
dos e mídias. Os contatos da agência com seus clientes são realizados por
Conclusão

meio de “diretores de conta”, uma interface indispensável para a agência.


Esses diretores são pessoas com grande sensibilidade às exigências dos clientes,
as quais mudam com bastante frequência – até mesmo na etapa final da for‑
mulação de uma nova campanha. Os diretores de conta representam os desejos
do cliente nas equipes de criação, formadas para cada novo trabalho. Redatores
criativos e o pessoal da produção normalmente constituem a essência de cada
equipe; conforme a necessidade, também comparecem às reuniões o pessoal da
contabilidade, de planejamento de mídia e outros. Os diretores de conta estão
presentes nas reuniões mais importantes da equipe, especialmente na etapa
inicial da campanha, quando as possibilidades devem ser checadas com o clien‑
te ou enquanto são preparadas e feitas as apresentações. São frequentes os
conflitos entre os diretores de conta e o pessoal da criação a respeito de como
aplicar diferentes critérios para adaptação aos desejos do cliente, inovando de
forma profissionalmente satisfatória e considerada boa para a reputação da
agência. Às vezes também ocorrem discussões entre o pessoal da criação e dos
departamentos financeiros ou diretores com relação a excessos no orçamento
da campanha.

Fonte: Pesquisa pessoal do autor.

Unidades militares de P&D e empresas que desenvolvem produtos e


sistemas de alta tecnologia estão na categoria (C). Nessa categoria, aci‑
ma de tudo, as organizações devem ser inovadoras. Às vezes, enfrentam
intensa competição de concorrentes inovadores, mas podem programar
seus projetos em períodos suficientes para evitar a necessidade de se adap‑
tar a mudanças externas de curto prazo. O programa da NASA que levou
os homens à Lua foi um excelente exemplo dessa categoria.
Uma organização com grande necessidade de inovação deve estabe‑
lecer arranjos que possam, ao mesmo tempo, estimular a invenção e mais

Book_Organizaçoes.indb 564 16/9/2011 16:24:13


Quadro 16.2  Um sistema burocrático adaptável

Gregory Bigley e Karlene Roberts estudaram a maneira como os bombeiros da


Califórnia lidam com incêndios repentinos e às vezes enormes como os incên‑
dios florestais. Os bombeiros classificam os diferentes tipos de incêndio que
podem ocorrer isoladamente ou em combinação – incêndios florestais, incên‑
dios químicos, incêndios que envolvem residências e assim por diante. Contudo,
eles não têm como saber antecipadamente de que tipo será o próximo incêndio.
Quando irrompe, eles devem responder imediatamente. 565

Em colaboração com o departamento florestal, o governo estadual da Califórnia

Conclusão
e o governo federal, os bombeiros criaram um “sistema de domínio de inciden‑
te” (ICS: em inglês, incident command system), que hoje é usado por todos os
Estados Unidos e aplicado a uma ampla gama de situações de emergência. O ICS
denota uma abordagem particular para reunir e controlar organizações tempo‑
rárias altamente confiáveis, utilizada por muitos bombeiros, polícias e outros
profissionais da segurança pública, para administrar diversos recursos em uma
ampla variedade de cenários de emergência. Basicamente é um sistema buro‑
crático padronizado que cria arranjos de notável flexibilidade e confiabilidade
para manejar ambientes complexos, de tarefas arriscadas e imprevisíveis.
Bigley e Roberts identificaram três importantes aspectos que permitem o fun‑
cionamento eficientíssimo do ICS. O primeiro envolve diversos mecanismos
estruturais que permitem adaptação imediata, específica, entre os quais a cria‑
ção de equipes e recursos locais para cada caso, a ativação dos papéis segundo
as necessidades imediatas da situação, a realocação das autoridades conforme
as necessidades e a especialização do pessoal disponível, e mudanças imediatas
nos planos de combate ao incêndio sempre que necessário. O segundo aspecto é
a atribuição de considerável liberdade para comandantes e supervisores do inci‑
dente improvisarem regras e rotinas dentro dos amplos termos estabelecidos
pelos objetivos e critérios de desempenho dessa organização. O terceiro aspecto
é o acúmulo, ao longo do tempo, de compreensão das condições operacionais
por meio de intensa comunicação.
A pesquisa conduzida por Bigley e Roberts propõe novas formas organizacio‑
nais capazes de capitalizar a partir do controle e dos benefícios da eficiência da
burocracia e, ao mesmo tempo, mostra que é possível evitar ou superar a consi‑
derável tendência à inércia que se acredita acompanhar sistemas burocráticos.

Fonte: Bigley, Gregory A.; Roberts, Karlene H. The incident command system: high reliability
organizing for complex and volatile task environments. Academy of Management Journal, 44,
2001. p. 1281­‑1299.

Book_Organizaçoes.indb 565 16/9/2011 16:24:13


adiante aplicar essa criatividade para um resultado útil (inovação). O
primeiro requisito é identificar pessoas que tragam ideias promissoras,
além de abrir canais para ideias novas e quaisquer informações pertinen‑
tes que possam vir de fora da organização – por exemplo, as provenientes
das atividades científicas das universidades. As ideias iniciais talvez se‑
jam muito simples e abstratas; portanto, o próximo passo é refinar essas
ideias, transformando­‑as em conhecimento mais detalhado e utilizável.
Conforme já apontado, uma equipe multifuncional é o melhor arranjo
566
organizacional para obter esse resultado, reunindo representantes de di‑
ferentes especialidades e pontos de vista, incluindo científico, de engenha‑
Conclusão

ria, contábil e comercial.


Se for possível alocar ao processo de inovação um prazo e ele não
estiver sujeito a mudanças frequentes por iniciativa dos clientes, é pos‑
sível realizar o trabalho com equipes relativamente estáveis e até com
mudança planejada dos membros. Essas equipes podem ter recursos e ser
controladas por meio de orçamentos e planos que incorporem os progres‑
sos mais importantes. Por meio da auto­‑organização flexível de tarefas,
as próprias equipes podem lidar com suas necessidades internas de adap‑
tação, quando, por exemplo, surgirem problemas técnicos inesperados.
Uma equipe encarregada de desenvolver um novo microcomputador
serve para ilustrar a auto­‑organização flexível de tarefas para obter ino‑
vação em determinado período (Quadro 16.3).
A quarta categoria (D) compreende as organizações que não têm
grande necessidade de adaptação ou inovação, e podem se concentrar no
desempenho de atividades rotineiras da maneira mais econômica e efi‑
caz. Há o perigo de que toda a atenção dada às mudanças no ambiente e
às novas formas organizacionais venha a obscurecer o fato de ainda exis‑
tirem algumas organizações nessa categoria. Antes de mais nada, certas
funções rotineiras das empresas, como a gestão da folha de pagamento,
também devem satisfazer as necessidades de eficiência. As atividades de
organizações rotineiras continuam a ter significativa influência na so‑
ciedade e a empregar grande número de pessoas. Restam bem poucas
organizações desse tipo entre as empresas comerciais, mas elas conti‑
nuam comuns entre as instituições governamentais e outras instituições
públicas da sociedade. Na maioria dos países, as autoridades do fisco e
da justiça seriam exemplos. Para essas organizações, a burocracia con‑
vencional ainda é a melhor forma de organização, porque a eficiência,
a incorruptibilidade e a confiabilidade continuam sendo os principais

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Quadro 16.3  Uma equipe inovadora

A Data General, empresa norte­‑americana, deu um ano para uma brilhante


e agressiva equipe de dinâmicos geniozinhos do computador criar e fabricar
um minicomputador. Em seu relatório gráfico do progresso da equipe naque‑
le ano, Tracy Kidder descreve como o pessoal trabalhava por horas a fio, às
vezes sob intensa pressão, boa parte em função do compromisso em resol‑
ver tarefa tão desafiadora. A equipe “Grupo Eclipse” costumava se organizar
sozinha: ”Todo o Grupo Eclipse, especialmente os gerentes, pareciam ope‑ 567
rar por instinto. Somente arranjos visíveis mais simples pareciam existir entre

Conclusão
eles. Não mantinham nenhuma tabela, nenhum gráfico ou regras organiza‑
cionais que significassem alguma coisa. Apenas aquelas teias espontâneas
de responsabilidade mútua, produto de concordância dos membros, os man‑
tiveram juntos […] Naturalmente, alguém que preferisse um controle rigoro‑
so se sentiria mal com esse espetáculo […] A equipe criou o computador em
mais ou menos seis meses e pode ter estabelecido um recorde de velocidade!”

Fonte: Kidder, Tracy. The Soul of a New Machine. Harmondsworth: Penguin, 1982, p. 111.

atributos que delas esperamos. O Quadro 16.4 é um exemplo de agência


do governo dedicada a fazer cumprir a lei. Essa agência era necessária
para aplicar determinados regulamentos legais, usando métodos estabe‑
lecidos e recorrendo a orientações formalizadas, mais do que inovando
ou mesmo se adaptando a quaisquer circunstâncias, por mais importan‑
tes ou notáveis que fossem.
É importante admitir que cada empresa ou instituição deve ter a sua
própria combinação de necessidades de eficiência, adaptação e inovação,
dependendo da base sobre a qual prefere competir no mercado ou justi‑
ficar seu papel para o público. Diferentes atividades em uma única em‑
presa também terão diferentes prioridades de necessidades. Por exemplo,
P&D normalmente terá grande necessidade de inovação; a promoção do
produto e a produção sob encomenda precisarão de grandes adaptações,
e o controle da qualidade, a fabricação de produtos padronizados e os
serviços de apoio rotineiros terão imensa necessidade de eficiência. Isso
explica a variação interna nos modos de controle, na coordenação e na
organização do trabalho, que é evidente em muitas empresas, como foi
notado no Capítulo 11.6 Ajuda também a explicar recentes descobertas
de pesquisas que sugerem que as novas formas organizacionais estão

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Quadro 16.4  Uma burocracia do governo

Uma agência federal dos Estados Unidos era responsável pelo cumprimento de
práticas estabelecidas para a aplicação uniforme das cláusulas das leis federais
pelas empresas privadas. Isso exigia a fiscalização das empresas para assegurar
o cumprimento dessas leis, que na época eram relativamente novas. Os prin‑
cipais deveres dos agentes eram realizados em campo; um supervisor atribuía
a cada um deles as empresas a investigar. Os agentes deviam avaliar a confia‑
568 bilidade da informação obtida para, depois, decidir se havia ocorrido alguma
violação, com base em um conjunto enorme e complexo de regulamentações
Conclusão

legais. Todos os agentes possuíam um manual com mais de mil páginas de


regulamentos a que se recorriam constantemente. Quando o manual não bas‑
tava, o que acontecia com frequência, o agente precisava consultar os volumes
de explicações administrativas e opiniões jurídicas, que ocupavam duas prate‑
leiras da biblioteca.

Fonte: Blau, Peter. The Dynamics of Bureaucracy. ed. rev. Chicago: University of Chicago Press,
1963, cap. VII.

complementando, e não substituindo, as convencionais.7 As formas or‑


ganizacionais muitas vezes são de natureza híbrida e a identificação das
necessidades contrastantes que elas devem apoiar ajuda a entender essa
diversidade interna.

16.1.6 Formas organizacionais híbridas


Nicolai Foss distinguiu duas classes de formas híbridas de organiza‑
ção.8 As “híbridas internas” são formas de organização que infundem
a hierarquia com elementos de controle de mercado, como transferir a
responsabilidade pelo alcance de metas a equipes de projeto que gozam
de grande autonomia para decidir como conduzir o trabalho. Podem ser
oferecidos incentivos para que essas equipes se dediquem e para motivar
seus esforços. A combinação de grande independência e um elemento de
incentivo significa mesclar o controle por meio de métodos do tipo de
mercado com, e parcialmente em substituição, ao controle hierárquico. O
elemento hierárquico permanece, já que o progresso pode continuar sen‑
do monitorado em determinados intervalos em relação aos severos custos
incorridos, à etica comportamental e assim por diante. As formas híbridas

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externas são trocas de mercado infundidas com elementos de controle
hierárquico. Elas incluem arranjos para a terceirização, cadeias virtuais
de valor e alianças, cujos exemplos foram discutidos nos Capítulos 8, 9
e 10. As formas híbridas externas unem aspectos de hierarquia em suas
relações contratuais, para obter diversos benefícios – entre outros, a oti‑
mização da integração operacional pela aplicação de protocolos padro‑
nizados, controle do uso de conhecimento de propriedade da empresa ou
exclusivo e introdução de um elemento pessoal nas relações externas, que
569
permite o desenvolvimento da confiança.
As formas híbridas visam satisfazer duas ou mais das necessidades

Conclusão
estratégicas identificadas e atribuir a cada uma diferentes modos de tra‑
balho e gestão mais convenientes. Com exceção das empresas na catego‑
ria D, que não exigem muita adaptação ou inovação, essas necessidades
devem estar equilibradas com relação à necessidade constante de eficiên‑
cia. A experiência da dinamarquesa Oticon, uma empresa de produtos
auditivos, é um exemplo da necessidade desse equilíbrio e de quão difícil
é obtê­‑lo. O Quadro 2.2, no Capítulo 2, descreve a forma de organização
bastante flexível, horizontal e com delegação de poderes introduzida em
1990 pela Oticon, que visava melhorar a sua enfraquecida capacidade
de inovação em um mercado competitivo em que o desenvolvimento de
novos produtos era indispensável para o sucesso. Embora tal forma de
organização radical tenha se mostrado muito eficaz, melhorando o de‑
sempenho no desenvolvimento de novos produtos da empresa, em 1996 a
Oticon decidiu recuar parcialmente, voltando a uma estrutura matricial,
mais convencional. Em boa parte, esse movimento pode ser explicado em
termos de custos imprevistos (perdas de eficiência) que a delegação de
poderes provocara.9 Esses custos vieram de problemas na coordenação
dos empregados, que não tinham restrição quanto ao número de projetos
que podiam acompanhar, da impossibilidade de rastrear o uso do tempo
desses empregados em diferentes projetos e da exagerada complexidade
dos sistemas criados para monitorar o comportamento do empregado. As
intervenções da gestão para corrigir esses problemas causaram enorme
desmotivação, porque os empregados as consideravam uma atitude arbi‑
trária incompatível com a filosofia declarada da empresa, que era a ação
de baixo para cima.
Como resultado, a empresa focou suas atividades com a introdução
de três equipes de negócios, o que exigiu a adição de mais um nível de
gestão. Estabeleceu ainda um “Centro de Competência”, encarregado de

Book_Organizaçoes.indb 569 16/9/2011 16:24:14


todos os projetos e seu financiamento, além de um grupo operacional
para controlar a gestão, tecnologia da informação, logística, vendas e
exportações. Os líderes das equipes de negócios, junto com o chefe do
centro de competência e o CEO, integram um “grupo de desenvolvimen‑
to”, que formula toda a estratégia e agora tem também a maior parte das
iniciativas para começar novos projetos. Essa introdução de um novo
nível hierárquico e formalização parece ter evitado algumas das perdas
de eficiência em que havia incorrido a forma organizacional anterior, sem
570
necessariamente impedir a capacidade de inovação da empresa. Embora
tenha rompido com a abordagem de baixo para cima que adotara, a
Conclusão

Oticon manteve considerável delegação de iniciativa. As mudanças intro‑


duzidas depois de 1996 foram uma tentativa de melhorar sua eficiência e,
ao mesmo tempo, manter a capacidade de inovar.
Os experimentos da Oticon mostram a complexidade de satisfazer
inúmeras necessidades por meio de formas organizacionais híbridas. O
caso da Eli Lilly, citado no Capítulo 11, também é um exemplo de como
pode ser complicadíssima a gestão de formas organizacionais contras‑
tantes na esfera de uma única empresa. Facilmente surgem acusações de
tratamento desigual quando as atividades estão sujeitas a diferentes esti‑
los de gestão e formas de controle. A confiança pode se perder em uma
gestão cuja calculada inconsistência de forma organizacional venha a ser
confundida equivocadamente com incompetência. Essa é uma das razões
pelas quais muitas empresas desagregaram a organização de suas diferen‑
tes atividades, ligando­‑as livremente por redes e dando a cada atividade
a própria identidade e metas dentro de uma missão corporativa global
claramente definida.
Esse processo é levado adiante mediante formas organizacionais mo‑
dulares na produção ou outros sistemas que agregam valor. Eles envol‑
vem arranjos externos híbridos, como a terceirização e a formação de
redes de cadeia de valor, em que diferentes empresas estão ligadas por
contratos e parcerias. Aparentemente, o uso de formas modulares é esti‑
mulado pela heterogeneidade dos inputs e outputs da cadeia de valor, e
consequentemente da provável variação na organização de cada módulo
do sistema. Como o Capítulo 9 descreveu, quando essas redes são coor‑
denadas virtualmente, as informações estreitamente integradas fluem e
a aplicação rigorosa de padrões técnicos fornece o necessário controle
dessa cadeia de valor.10 Uma rede virtual pode prontamente lidar com a
variedade de formas organizacionais dos participantes, desde que todos

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aceitem os protocolos operacionais e os padrões técnicos. No futuro, tal
solução talvez venha a ser cada vez mais utilizada na fabricação e na pres‑
tação de serviços; os constantes avanços na tecnologia da comunicação e
da informação estão reduzindo seus custos e aumentando sua viabilidade
técnica. Ela tem a grande virtude de combinar todas as três necessida‑
des básicas que identificamos, sem as insuportáveis tensões que poderiam
acompanhar a tentativa de obter essa combinação em uma mesma unida‑
de organizacional.
Assim, pode­‑se entender bem as novas formas organizacionais em 571

relação à crescente importância de satisfazer as necessidades estratégicas

Conclusão
de adaptabilidade e inovação. A ênfase cada vez maior nas estratégias de
diferenciação aumenta o destaque dessas duas necessidades. Ao mesmo
tempo, os arranjos organizacionais continuam tendo de satisfazer a ne‑
cessidade de eficiência, especialmente importante em alguns setores e em
algumas atividades rotineiras das organizações. As combinações de ne‑
cessidade estratégica dão origem a diferentes misturas de organização, em
que elementos convencionais coexistem com formas novas. As tentativas
de criar organizações eficazes, criativas e adaptáveis estão dando origem
a diversas formas de diferenciação integrada. A diferenciação pode ser
obtida por meio de:

„„ uso de múltiplas formas organizacionais variadas para diferentes


atividades e processos em uma empresa, como mostra o caso da
Eli Lilly;

„„ desagregação das cadeias de valor por meio de terceirização, alian‑


ças e redes, o que resulta em unidades modulares menores, cada
uma podendo ser organizada de modo diferente, adequado à tare‑
fa a cumprir;

„„ criação de métodos e procedimentos que permitam que o modo


organizacional possa passar de eventos rotineiros a novos, garan‑
tindo uma rápida resposta a eles. Tal abordagem já foi chamada de
“modulação” entre formas organizacionais, conforme o exemplo
do Quadro de 16.2.

A diferenciação organizacional crescente implica ainda a descentra‑


lização da iniciativa e da tomada de decisão. Torna­‑se impróprio, e até
impossível, oferecer a necessária integração entre diferentes unidades
de atividades essencialmente por meio da coordenação hierárquica. A

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enorme complexidade do sistema impede que isso aconteça. Uma tentati‑
va de impor restrições hierárquicas não apenas causaria grandes atrasos,
como também causaria estragos nas contribuições diretas para a criativi‑
dade e adaptabilidade exigidas dos membros ou parceiros da organiza‑
ção. Igualmente, a integração dentro dessas novas formas organizacionais
depende de uma série de arranjos examinados em capítulos anteriores:

„„ o uso comum de protocolos e especificações padronizados para


572 transações entre unidades diferenciadas;

„„ o uso da TCI para permitir a comunicação instantânea e precisa


Conclusão

de exigências guiadas pelo mercado entre os que participam da


cadeia de valor;

„„ as relações pessoais diretas baseadas na confiança entre os parti‑


cipantes de equipes e redes, especialmente para tratar de questões
não rotineiras que requeiram negociação, solução de problemas
e afins.

16.2 O aspecto social da organização


A referência às necessidades estratégicas nos ajuda a entender certos
avanços na forma organizacional, especialmente o fim da ênfase na hie‑
rarquia em favor de contribuições de modo mais cooperativo dos parti‑
cipantes, com maior delegação de poderes. Obviamente, o desempenho
de uma organização depende das qualificações de seu pessoal e de sua
motivação para utilizá­‑las. Acumulam­‑se comprovações de que “políticas
progressivas de RH” contribuem para o desempenho das empresas e até
predizem melhor esse desempenho que estratégia, tecnologia ou P&D.
Estudos descobriram influências de 10% a 19% sobre o desempenho
das empresas.11 Essas descobertas avalizam a chamada “perspectiva com
base nos recursos da empresa” e indicam o valor especial que as pessoas
podem oferecer como “recursos humanos”. As políticas em questão se
distanciam de muitos dos aspectos da organização convencional. Elas in‑
cluem trabalho de equipe, descentralização, diferenciais menores de sta‑
tus e muita comunicação. Outros componentes dessas políticas têm a ver
com a proteção dos interesses dos empregados e o investimento neles: a
segurança no emprego, o cuidado no recrutamento, bons salários com
elementos de incentivo e treinamento intenso.

Book_Organizaçoes.indb 572 16/9/2011 16:24:14


É importante observar que entre as boas políticas de RH estão as provi‑
dências para proteger os interesses dos empregados em termos de segurança
e o investimento em suas qualificações. Aqui há uma lição que também se
aplica às formas de organização e à maneira como são usadas. Se incorre‑
rem em custos significativos para os empregados, certamente serão desmoti‑
vadoras e poderão até isolar as pessoas em seu emprego. Em última análise,
formas de organização socialmente equivocadas podem debilitar a gestão
corporativa e até todo o sistema da empresa. Há evidências de que os modos
573
convencionais de organização estão tendo efeitos negativos, cuja consequ‑
ência é a alienação do empregado e a perda da legitimidade gerencial. No

Conclusão
mínimo, essa lacuna entre as expectativas que as pessoas têm ao trabalhar
nas organizações e o que elas realmente sentem está aumentando – e esse
problema dá mais ímpeto à busca por formas organizacionais alternativas,
e no longo prazo talvez prove ser o fator mais importante para sua adoção.
Nesta seção examinaremos a existência de uma questão social ligada
à organização, e o fato de ser essa mais uma importante razão para a pro‑
cura de alternativas. Primeiro, são esboçados os efeitos sociais negativos
da organização convencional, especialmente a hierarquia. Depois, são
mostrados exemplos de como as abordagens alternativas podem mitigar
esse problema e oferecer vantagens no desempenho.

16.2.1 O problema social


Está claro que nem tudo vai bem nas organizações contemporâneas:
seus gestores percebem a enorme falta de confiança de parte dos empre‑
gados. Aumenta rapidamente a desigualdade dos rendimentos entre os
que estão no topo e na base das organizações. Os custos psicológicos e
os relacionados à saúde do trabalho nas organizações aumentam a cada
ano. Um número crescente de pessoas deixa o emprego nas grandes or‑
ganizações para encontrar a realização no trabalho autônomo ou em pe‑
quenas comunidades. Serão examinados cada um desses problemas, para
depois refletirmos como eles são exacerbados pela organização inadequa‑
da, principalmente pela hierarquia.

PERDA DE CONFIANÇA
A desconfiança do empregado em relação a seus empregadores não é
nenhuma novidade; há muito tempo é associada a conflitos de interesse e
à alienação do trabalho. Os cientistas sociais consideram esses fenômenos

Book_Organizaçoes.indb 573 16/9/2011 16:24:14


endêmicos no sistema capitalista, e aperfeiçoados por instituições que ga‑
rantem a primazia dos interesses dos acionistas. Não obstante, depois da
Segunda Guerra Mundial muitas empresas fizeram grandes esforços para
melhorar a ligação e a confiança que os empregados sentiam em relação
a elas, proporcionando treinamento e desenvolvimento das qualificações,
programas de enriquecimento da função e criação da cultura corporativa.
Esses esforços foram estimulados pela mudança no emprego para catego‑
rias de pessoas mais sensíveis a responder a tais esforços, especialmente
574
trabalhadores do conhecimento, os de colarinho branco e as mulheres,
além de também coincidirem com uma queda secular na participação em
Conclusão

sindicatos.
Embora a confiança popular nas corporações aparentemente tenha
aumentado dos dois lados do Atlântico, nos últimos anos o quadro mu‑
dou bastante. O capítulo anterior relata a comprovação das pesquisas
indicando que mundo afora estão caindo os níveis de confiança nas em‑
presas e nos líderes de setores. Não há mais nenhuma dúvida de que hoje
há desconfiança generalizada em relação às empresas.12

DESIGUALDADE CRESCENTE
Está acontecendo uma impressionante ampliação nos diferenciais
das recompensas entre os que estão nos cargos mais altos das empresas
e os que estão na base. A tendência nos Estados Unidos é mostrada
na Tabela 16.1. Estimativas mais recentes indicam que a proporção do
salário médio de um diretor norte­‑americano em relação ao do traba‑
lhador médio da indústria saltou para espantosas 531 vezes por volta
do ano 2000.13

Tabela 16.1  As recompensas do CEO médio norte­‑americano em relação


às do operário médio da indústria

1970 1996
Rendimentos (apenas salário e bônus) Proporção de 30 Proporção de 85
Rendimento total (com a propriedade
Proporção de 30 Proporção de 210
de ações)
Fonte: Murphy, K. J. Executive compensation. ”, In: ASHENFELTER, O.; CARD, D. (Org.). Handbook
of Labour Economics. vol. 3b. Amsterdam: Elsevier, 1999. p. 2.485­‑2.563.

Book_Organizaçoes.indb 574 16/9/2011 16:24:14


Tal situação teve consequências bastante prejudiciais. A perspectiva
de recompensas tão altas, especialmente quando reforçadas pelas opções
de ações, levou alguns executivos do alto escalão a agirem de maneira
perniciosa para suas empresas: eles aumentaram os lucros a curto prazo
em vez de se concentrarem nas oportunidades de longo prazo, e desconsi‑
deraram o pagamento de dividendos aos seus acionistas.14 Houve muitas
declarações de que as empresas não poderiam arcar com os aumentos sa‑
lariais dos operários e outros empregados comuns, mas, ao mesmo tem‑
po, concediam aumentos gigantescos a executivos do alto escalão com 575

baixa produtividade.

Conclusão
Por exemplo, no mesmo dia, 16 de dezembro de 2002, o Financial
Times trazia duas reportagens: uma informava que Tony Isaac, CEO da
British Oxygen Company, havia recebido um aumento de 47% naquele
ano, apesar de ter sido o segundo ano consecutivo de queda nos lucros;
a outra declarava que as negociações para os salários dos operários da
indústria haviam chegado a, em média, 2,3%, e para os empregados do
setor de serviços, a 3,7%. Não é de espantar que o privilégio tenha se
tornado um divisor social, despertando a ira de empregados e acionistas.

CUSTOS PSICOLÓGICOS E RELACIONADOS À SAÚDE


Aumentam as evidências de que hoje o trabalho nas organizações
está cobrando um preço cada vez mais alto em relação à saúde das
pessoas. Por exemplo, um total de 33 milhões de dias foram perdidos
em 2001 na Grã­‑Bretanha por conta de doenças ocupacionais – com
o estresse em primeiro lugar. Esse número subiu dos 18 milhões de
dias perdidos em 1996. Nos Estados Unidos, pesquisas indicam que
o estresse “se tornou um problema muito caro e bastante comum no
ambiente de trabalho, sendo poucos os trabalhadores que não são
atingidos”.15 O custo das ausências para as empresas britânicas subiu
para 11,8 bilhões de libras (22 bilhões de dólares) em 2001. Há in‑
formações de que o pessoal das grandes organizações gasta cerca de
470 milhões de libras em terapias para lidar com as exigências do em‑
prego.16 O estresse é uma questão complexa e é difícil identificar suas
causas precisas, mas os modos hierárquico e burocrático de organizar
o trabalho contribuem para o problema. O raciocínio por trás dessa
afirmação é o que segue.
Os que ocupam posições superiores na sociedade (ou seja, perten‑
cem às classes sociais superiores) tendem a gozar de saúde superior e

Book_Organizaçoes.indb 575 16/9/2011 16:24:14


ter longevidade superior – é um fenômeno estatisticamente comprovado,
existente em muitas sociedades.17 Uma vez atingido um limiar econômico
mínimo, a posição que as pessoas ocupam em relação a outras na mesma
sociedade é um prognosticador mais compatível de sua saúde do que seu
padrão absoluto de vida. Já foi visto como os diferenciais de rendimentos
subiram de modo impressionante entre os empregados em diferentes ní‑
veis organizacionais. Como a organização tem influência direta sobre os
diferenciais de rendimento, presume­‑se que seu efeito sobre a saúde dos
576 empregados comuns seja cada vez mais negativo.
Outra influência negativa da maneira como as pessoas são orga‑
Conclusão

nizadas decorre dos efeitos não econômicos sobre elas: quanto maior
a diferenciação hierárquica entre as pessoas, maiores as diferenças
entre seu status, autoestima, controle pessoal do trabalho e rendi‑
mento.18 Uma pesquisa realizada por um período de 25 anos mostra
que as variações em saúde e longevidade se devem ao fato de que, ao
subirem na hierarquia, as pessoas adquirem poder para decidir como
trabalhar e viver.19
A organização de grande porte amplia esse problema. Organizações
maiores têm mais níveis hierárquicos e mais distância entre as pessoas
que estão no alto e as que estão na base. Desse ponto de vista, a elimi‑
nação de camadas e o downsizing trazem benefícios para a qualidade de
vida no trabalho se forem feitos de modo planejado, que não ameace a
segurança pessoal dos indivíduos. Organizações maiores em geral tam‑
bém tendem a ser mais burocráticas, o que é mais uma fonte de frustra‑
ção para seus funcionários. O NIOSH (Instituto Nacional para Saúde e
Seguridade Social norte­‑americano) detectou que aspectos negativos da
burocracia como a baixa qualidade da comunicação, a baixa autonomia
para realizar tarefas e a falta de participação na tomada de decisões
estão entre as condições organizacionais que podem levar ao estresse.20
As pessoas com competências mais valiosas, com alto nível de instrução
e experiência profissional são as que têm mais probabilidade de ter essa
experiência negativa. Em geral, consideram as tentativas de controlar
suas atividades por meio da definição formal de tarefas e imposição de
regras algo que desnecessariamente restringe a utilização de sua capaci‑
dade de julgamento em determinados casos.21 O considerável aumento
da papelada que tem acompanhado a burocratização de setores como
o Serviço Nacional de Saúde do Reino Unido deixa os médicos e ou‑
tros profissionais ainda mais frustrados por reduzir o tempo que podem

Book_Organizaçoes.indb 576 16/9/2011 16:24:15


dedicar ao trabalho para o qual foram treinados. Muitos médicos estão
preferindo se aposentar cedo, o que acarreta a perda de suas qualifica‑
ções valiosas.

DESEJO DE FUGIR DAS GRANDES ORGANIZAÇÕES


Apesar do aumento do trabalho feito em casa, muitas pessoas ain‑
da passam grande parte de sua vida adulta trabalhando em organiza‑
ções. A pesquisa mostra que o emprego tem papel central na formação 577
da autoestima e da identidade em sociedades industriais, embora, pelas

Conclusão
razões que acabaram de ser esboçadas, a experiência do trabalho e do
local de trabalho nas grandes organizações muitas vezes seja conside‑
rada limitadora e até mesmo nociva. O resultado é que um número
crescente de pessoas está procurando deixar as grandes organizações
modernas, preferindo outras formas de trabalho – por exemplo, o tra‑
balho autônomo e o trabalho de natureza cooperativa em pequenas
comunidades. Uma característica em comum dessas alternativas é que
elas livram essas pessoas de restrições administrativas e dos valores que
lhes são impostos pelas formas convencionais da organização.22

16.2.2 Organização como ré


Sem dúvida, parte do problema mencionado anteriormente deve ser
atribuída a falhas humanas, como o uso deturpado do poder por execu‑
tivos do alto escalão. Portanto, qualquer forma de organização pode ser
usada em função de interesses pessoais, caso distribua a informação e a
autoridade de modo desigual. Não obstante, há certos aspectos organi‑
zacionais comuns que podem acentuar eles próprios esse problema. Aqui
entra a hierarquia, espinha dorsal da organização convencional, que pode
ser objeto de censura particular.
O controle e a coordenação hierárquica permitiram notáveis reali‑
zações coletivas, como a construção das pirâmides egípcias, os antigos
impérios da China e de Roma, a igreja medieval na Europa e a moderna
corporação empresarial. Aparentemente, a hierarquia contém um conhe‑
cimento que vem da experiência de como organizar atividades complexas
que envolvem imenso número de pessoas. Em todo caso, também se pode
dizer que com o tempo a hierarquia simplesmente se tornou “convencio‑
nal” – está integrada em nossas expectativas e é muito conveniente para
os líderes preservá­‑la.

Book_Organizaçoes.indb 577 16/9/2011 16:24:15


A hierarquia certamente tem recebido muitas críticas. Como já obser‑
vado no Capítulo 3, até Elliott Jacques, leal defensor da hierarquia, admitiu
que “há uma ideia generalizada de que a hierarquia administrativa mata a
iniciativa, esmaga a criatividade e está com os dias contados”.23 Contudo, a
maioria das empresas que foram além da fase inicial, e praticamente todas
as organizações públicas, parecem achar muito difícil existir sem a hierar‑
quia. Pesquisas na Europa, no Japão e nos Estados Unidos mostram que,
em seu conjunto, as inovações na organização mais complementaram que
578
substituíram a hierarquia e outros aspectos da “organização convencio‑
nal”.24 As características das novas formas organizacionais, discutidas no
Conclusão

Capítulo 2 e resumidas na Tabela 2.4, apontam para o uso menos centrali‑


zado e mais consultativo da hierarquia que para sua eliminação.
O que há por trás dessa persistência da hierarquia? Algumas das ra‑
zões são ostensivamente racionais, e estão ligadas à necessidade de efici‑
ência já discutida neste capítulo. Desse ponto de vista, a hierarquia:

„„ dá um foco à liderança;

„„ distingue os níveis de autoridade e responsabilidade;

„„ separa as tomadas de decisão rotineiras das não rotineiras;

„„ aloca os executivos segundo níveis de responsabilidade e tomada


de decisão;

„„ permite que as tarefas e responsabilidades sejam definidas e super‑


visionadas por executivos diretamente responsáveis pelo trabalho
em diferentes níveis;

„„ coordena e controla.

Outras razões para a sobrevivência da hierarquia são de natureza


mais política que racional. Esse é o lado da hierarquia que serve de instru‑
mento para alguns pontos fracos na natureza humana e causa problemas
sociais. Dessa perspectiva, a hierarquia:

„„ oferece recompensas melhores a algumas pessoas que a outras,


quase sempre com base no tempo de serviço e não no desempenho;

„„ é condescendente com as necessidades das pessoas de se sentirem


mais importantes que as outras;

Book_Organizaçoes.indb 578 16/9/2011 16:24:15


„„ dá a sensação de progresso pessoal por meio da promoção;

„„ legitima o exercício do poder de algumas pessoas sobre outras.

O que há na hierarquia que engendra os problemas sociais menciona‑


dos? Ela é a origem dos dois aspectos da organização citados no preâm‑
bulo deste capítulo. A hierarquia é um recurso para se conseguir fazer o
trabalho por meio da distribuição de tarefas e responsabilidades, e tam‑
bém a coordenação e controle desse trabalho. Ao mesmo tempo, é uma 579
base para a distribuição de recompensas, privilégios e poderes de modo

Conclusão
diferenciado, criando diferentes identidades sociais. Fundamentalmente,
significa que qualquer organização baseada na hierarquia divide as pes‑
soas e, ao mesmo tempo, se esforça para juntá­‑las. Por um lado, a hierar‑
quia proporciona uma divisão vertical do trabalho, com a distribuição de
diferentes decisões e tarefas a serem empreendidas num esforço coletivo.
Por outro lado, ela atende aos atributos de uma escada de status, distin‑
guindo “superiores” de “inferiores”. Isso indica que a expressão “supe‑
rior” é usada normalmente, o que implica que para cada superior deve
haver pelo menos um inferior!
Esse paradoxo da organização hierárquica contribui para os proble‑
mas sociais mencionados antes. A chamada “quebra de confiança” entre
o alto escalão e outros empregados em parte vem de uma disparidade
nos critérios aplicados para o bem­‑estar dos indivíduos em diferentes ní‑
veis da hierarquia de uma organização, e também da recusa em revelar
informações aos empregados. Por exemplo, enquanto escrevo (janeiro de
2004) está ocorrendo grande descontentamento dos trabalhadores do úl‑
timo fabricante britânico de automóveis de produção em grande escala
– isso tem impacto negativo sobre as vendas, está criando alarme entre
os revendedores e ameaça o futuro da empresa. Esse descontentamento
surgiu da criação de um fundo especial de pensões para o pessoal do alto
escalão, que está sugando os fundos da empresa num momento em que
os trabalhadores sentem seu emprego ameaçado. A situação piorou com
a recusa dos executivos interessados em discutir publicamente a questão
salarial.
A distância criada pela hierarquia entre os membros da mesma orga‑
nização pode se somar a assimetrias em informações desse tipo, tornando
mais fácil esconder os abusos corporativos. Se não fosse por esses efeitos
da hierarquia, o salário dos executivos não se tornaria questão polêmica

Book_Organizaçoes.indb 579 16/9/2011 16:24:15


a ponto de atrair o rótulo de “escândalo”. As reformas sugeridas no
Capítulo 15 para melhorar a governança corporativa nas empresas são
todas medidas que visam diminuir a distância hierárquica: elas acarretam
mais transparência da informação, direitos dos empregados em compar‑
tilhar os benefícios de propriedade, monitoramento de baixo para cima
– assim como de cima para baixo – e maior participação na tomada de
decisões.
Outras medidas podem ser tomadas para reduzir diretamente os ní‑
580
veis hierárquicos, como as discutidas no Capítulo 3. Tal capítulo reco‑
nhecia que, diante da relação estreita entre os níveis hierárquicos e o
Conclusão

número total de empregos, a eliminação dos níveis hierárquicos normal‑


mente exige o downsizing. Em princípio, passar para unidades meno‑
res também deveria ser benéfico, por reduzir a alienação que emana da
impessoalidade da grande organização, adicionalmente ao seu aspecto
hierárquico. Foi feita uma distinção, no entanto, entre o downsizing que
prejudica evidentemente os interesses dos empregados e poderia deixar
muitas cicatrizes psicológicas e a “reestruturação responsável”, feita com
base nas sugestões dos empregados e aceitável para eles. O movimento
socialmente aceitável a fim de combinar lugares de trabalho menores e
menos hierárquicos com certeza mitigaria alguns dos custos psicológicos
do emprego moderno.
Considerações como essas corroboram o argumento de que uma al‑
ternativa à hierarquia e a outros aspectos da organização convencional
é necessária por razões sociais, em adição aos dividendos que possam
trazer para o desempenho. Espera­‑se um dividendo pelo desempenho por
acreditar­‑se que membros de uma organização empenhados e satisfeitos
darão mais a ela. Isso traz outro aspecto da organização, dado que as
condições contemporâneas valorizam a inovação e adaptabilidade. A
capacidade de inovar e adaptar depende muito mais da disposição dos
membros de uma organização de trabalhar em conjunto de modo cons‑
trutivo e engenhoso que da habilidade dos executivos em comandar e
aplicar regras organizacionais estabelecidas.
Algumas empresas tentaram minimizar a hierarquia e seus efeitos ne‑
gativos, além de adotar outros aspectos da nova forma organizacional.
Pouca iniciativas foram divulgadas e menos ainda emuladas, apesar de
seu êxito às vezes impressionante. A próxima seção descreve dois exem‑
plos dessa nova filosofia organizacional em ação.

Book_Organizaçoes.indb 580 16/9/2011 16:24:15


16.3 Modelos da nova organização em ação
16.3.1 Southwest Airlines25
O Quadro 16.5 enumera os pontos de destaque dessa empresa. A
Southwest Airlines foi fundada em 1966 e se tornou uma das empre‑
sas aéreas de maior sucesso na história, que está no topo da lista das
mais admiradas em todo o mundo desde 1997. Ela foi uma das primeiras
linhas aéreas de baixo custo, que inicialmente voava um número limi‑ 581
tado de rotas. Por volta de 2004, era um negócio de 11,7 bilhões de

Conclusão
dólares, atendendo a 59 cidades norte­‑americanas, com 34.000 emprega‑
dos. Desde sua fundação, concorrentes como a Braniff Airlines e a Texas
International usaram todas as estratégias políticas e jurídicas para manter
a Southwest no chão. Não conseguiram. A partir do momento em que se
tornou lucrativa, em 1973, a empresa jamais registrou uma única perda
e atravessou as crises do setor após o 11 de setembro muito melhor que
qualquer outra das grandes linhas aéreas dos Estados Unidos.
Desde sua criação, a Southwest estimulou seus empregados a se iden‑
tificarem com outros na empresa, a atender o cliente com atenção e a se
divertirem em seu trabalho. Seu lema é “Somos uma empresa de pesso‑
as, não de aviões”. A Southwest foi reconhecida como uma das dez me‑
lhores empregadoras na lista da Fortune das “Empresas mais admiradas
dos Estados Unidos” desde que o programa começou, em 1993. Todos

Quadro 16.5  Southwest Airlines

„„ Uma das mais bem­‑sucedidas companhias aéreas da história.


„„ Líder em produtividade.
„„ Os concorrentes tentaram imitar sua estratégia, mas não conseguiram
copiar o sucesso, porque não adotaram sua abordagem em relação à or‑
ganização e às pessoas.
„„ A política da Southwest Airlines é de:
­‑ segurança no trabalho;
­‑ hierarquia e burocracia mínimas;
­‑ aplicação consistente de sua cultura corporativa.

Book_Organizaçoes.indb 581 16/9/2011 16:24:15


querem trabalhar para ela. Em 2000, por exemplo, a Southwest avaliou
216.000 candidatos para apenas 5.000 vagas. A empresa também alcan‑
çou um nível notável de produtividade, o que sustenta suas baixas tari‑
fas. Em 1998, tinha em média 94 empregados por aeronave, enquanto a
American e a United Airlines tinham quase 160 cada uma. A média do se‑
tor estava acima de 130. Contudo, essa alta produtividade não é simples
produto de uma cultura corporativa tranquila e simpática para o empre‑
gado: a empresa também leva seus empregados ao limite. Os salários são
582
mais ou menos a média do setor, mas há expectativa de que trabalhem
mais duramente e assumam deveres extraordinários, sem remuneração
Conclusão

extra. Na verdade, a empresa tem discutido com seus comissários de voo


a questão dos salários em relação ao esforço e flexibilidade esperados.
As concorrentes – entre as quais, America West, Reno Air, Kiwi Air,
United, Continental, US Airways e Delta – tentaram copiar o modelo
da Southwest, até mesmo seu planejamento de rotas bastante focado. A
concorrência compreende a tecnologia, as estruturas de custo e o planeja‑
mento de rotas; tem o mesmo equipamento, as mesmas locações e o mes‑
mo conhecimento do mercado. Mesmo assim, não consegue reproduzir o
sucesso da Southwest, em boa parte porque não adotou sua abordagem
em relação à organização e às pessoas.
Que espécie de abordagem a Southwest segue? Basicamente, o res‑
peito às pessoas, sejam empregados ou clientes. São estes os aspectos de
destaque:

1. Segurança no trabalho. A empresa jamais demitiu qualquer empre‑


gado, nem mesmo após o 11 de setembro.

2. Hierarquia e burocracia mínimas. A empresa elimina distinções


de hierarquia e função. Por exemplo, se necessário, comissários
de voo e pilotos ajudam a limpar a aeronave, carregam sacos ou
fazem o check­‑in dos passageiros. O fundador e CEO até 2001,
Herb Kelleher, resumiu sua filosofia sobre esse ponto referindo­‑se
ao que aprendeu com sua mãe: “Ela falava muito sobre como se
deve tratar as pessoas com respeito. Dizia que cargos e títulos nada
significam […] Me ensinou que cada pessoa e cada função valem
tanto quanto qualquer outra pessoa e qualquer outra função”.26

3. Uma cultura corporativa aplicada de forma consistente. A empre‑


sa leva a sério sua missão quando diz que “estamos empenhados

Book_Organizaçoes.indb 582 16/9/2011 16:24:15


em oferecer a nossos empregados um ambiente estável de trabalho,
com igual oportunidade de aprendizado e desenvolvimento pessoal.
[…] Acima de tudo, os empregados receberão a mesma atenção,
o mesmo respeito e o mesmo carinho dentro da organização que
se espera que compartilhem externamente com cada cliente da
Southwest”. A empresa também se empenha em fazer o trabalho
ser divertido: dá séria atenção a festas, premiações e comemorações.
Mas a garantia de segurança no trabalho é o mais importante teste‑
583
munho da importância que a empresa confere à sua filosofia.

Conclusão
16.3.2 Semco27
O segundo caso exemplar é o de uma empresa brasileira: a Semco.
O Quadro 16.6 resume suas características mais importantes. A Semco
é uma fabricante de equipamento industrial, localizada nos arredores de
São Paulo. Seu proprietário e CEO, Ricardo Semler, atraiu a atenção pela
maneira muito bem­‑sucedida e nada ortodoxa como se afastou da or‑
ganização convencional. Em 1980, quando a recebeu do pai, a empresa
era dirigida nas linhas tradicionais, mas estava praticamente quebrada.
Desde que Semler introduziu suas reformas, a empresa sempre teve su‑
cesso e atravessou muitos períodos tempestuosos na economia brasileira.
Por exemplo, o volume das vendas, ajustado à inflação, aumentou
cinco vezes entre 1980 e 1992, e triplicou entre 1990 e 1996. Sob seu
comando, a empresa nunca sofreu perdas, apesar de ter como pano de
fundo uma economia instável nas décadas de 1980 e 1990, com quatro
desvalorizações da moeda, hiperinflação, desemprego recorde e uma com‑
pleta cessação de toda a produção industrial. Hoje é um conglomerado de

Quadro 16.6  Semco

„„ Notável sucesso comercial em uma economia difícil


„„ Uma proposta original de organização com base em:
– participação;
– participação nos lucros;
– hierarquia e burocracia mínimas;
– liberdade de informação.

Book_Organizaçoes.indb 583 16/9/2011 16:24:16


100 milhões de dólares anuais. Mais de 150 das 500 empresas da Fortune
visitaram a Semco para tentar descobrir o segredo de seu sucesso.
Seguindo três valores essenciais interdependentes – a participação do
empregado, a divisão dos lucros e o livre fluxo de informações – a Semco
virou de cabeça para baixo a organização tradicional. Entre outras coi‑
sas, ela introduziu:

1. A participação: grupos autônomos de seis a dez operários da fábrica


584 se encarregam de todos os aspectos da produção. Eles decidem como
organizar seu trabalho, fazem seu orçamento e estabelecem as metas
Conclusão

de produção. Os salários estão vinculados ao orçamento mensal e ao


desempenho da produção. O pessoal gerencial estabelece o próprio
salário e os bônus e os resultados têm sido bastante sensatos.

2. Divisão dos lucros: os empregados recebem um quarto do lucro


líquido de suas respectivas divisões. Uma comissão democrati‑
camente eleita decide a distribuição dos lucros, que facilmente
dobram ou até chegam a triplicar o salário de um operário.

3. Redução de hierarquia e burocracia: “A característica mais impor‑


tante da Semco é a completa liberação dos empregados do contro‑
le de hierarquias e da rigidez de regras uniformes.”28 O que antes
eram 12 camadas de burocracia da gestão foram reduzidas a três,
e os executivos foram reduzidos em 75% desde 1982, com ajuda
da terceirização de muitas funções administrativas. As distinções
hierárquicas foram reduzidas ao mínimo. A Semco não tem recep‑
cionistas, secretárias ou assistentes pessoais. Todos os empregados
e o próprio Semler recebem seus convidados, fazem as próprias
cópias, escrevem e despacham a própria correspondência. Não há
escritórios particulares, os trabalhadores estabelecem os próprios
horários e a roupa de trabalho fica a critério de cada um. Títulos
não têm grande importância. O alto escalão consiste em seis
conselheiros, que determinam a estratégia e a política geral. Cada
conselheiro, inclusive Semler, assume um turno de seis meses
como CEO. A política da Semco é não ter nenhuma: seu manual é
um livreto de 20 páginas cheio de desenhos e um conciso esboço
da cultura da organização. Em “quadro da organização” consta:
“A Semco não tem um quadro formal de organização. Somente o
respeito do liderado cria o líder. Quando é absolutamente neces‑
sário apresentar a estrutura de alguma parte da empresa, sempre

Book_Organizaçoes.indb 584 16/9/2011 16:24:16


desenhamos a lápis e jogamos fora assim que possível”.29 Sobre
a participação: “A nossa filosofia foi criada com base em parti‑
cipação e envolvimento. Não se acomode. Dê opiniões, procure
oportunidades e progresso, diga sempre o que você pensa. Não
seja apenas mais um na empresa”.30

4. Liberdade de informação: A Semco deixa todos os seus dados


financeiros à disposição de todos os empregados, e até criou um
curso para ensinar os empregados a interpretar os balanços e 585
livros de contabilidade. Todos conhecem os salários dos gestores,

Conclusão
que chegam a dez vezes o salário inicial médio. Todas as reuniões,
inclusive as do conselho, estão abertas a todos os empregados que
desejarem assistir, com liberdade para questionar os gestores sobre
quaisquer aspectos do negócio.

A empresa sobreviveu a uma crise nacional de liquidez no início dos


anos 1990 que causou muitas falências, porque em vez de enfrentar de‑
missões, o comitê dos trabalhadores se dispôs a aceitar um corte nos
salários e propôs arranjos de trabalho mais flexíveis para aumentar a
produtividade, incluindo a liberdade para trocar funções. As negociações
marcaram nesse momento uma grande mudança em direção a uma gestão
democrática do trabalhador, incluindo sua participação no planejamento,
na tomada de decisões e a delegação para as equipes de trabalho da auto‑
ridade para contratar e demitir colegas e gestores pelo voto democrático.
Tudo isso não apenas tirou a empresa do buraco, mas também resultou
em pessoal polivalente e muito bem qualificado.
Há mais exemplos que podem ser citados, de empresas como a Harley­
‑Davidson, a Lincoln Electric, a SAS e a Springfield ReManufacturing
Corporation, nos Estados Unidos, e a John Lewis Partnership, no Reino
Unido.31 Exemplos de casos são especialmente úteis para chamar a aten‑
ção para ações específicas que empresas pioneiras empreenderam de for‑
ma a torná­‑las mais benéficas para as pessoas. Eles mostram como essas
mudanças foram realizadas, às vezes enfrentando considerável oposição
de executivos que temem perder parte de seu poder e privilégio.
Embora sejam todas diferentes, há alguns aspectos comuns a essas empre‑
sas que foram mais adiante, assumindo mais responsabilidade em relação aos
seus empregados e às vezes também em relação a outros stakeholders. Elas
reduziram os níveis hierárquicos ou, no mínimo, tomaram providências para
reduzir os aspectos negativos da hierarquia, compartilhando informações,

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aumentando a participação, minimizando os privilégios e delegando autori‑
dade. Muitas vezes procuraram minimizar os efeitos negativos da burocra‑
cia, por meio de medidas como a introdução de equipes com poderes para
agir de forma flexível na busca dos objetivos acordados, a redução do status
das estruturas formais e a abolição de demarcações rígidas de funções.
Há cada vez mais evidências de que esse tipo de organização não con‑
vencional traz benefícios reais para as pessoas. Por sua vez, essas políticas
despertam um tal empenho dos empregados que muitas vezes ajudaram
586 empresas a resolver crises e ganhar certa vantagem sobre a concorrência.
Já foram discutidas algumas dessas comprovações neste livro; outras fon‑
Conclusão

tes as apresentam em detalhes.32 Elas são importantes porque mostram


que exemplos como os que acabamos de mencionar não devem ser des‑
cartados como esquisitice ou excentricidade.

16.4 Para concluir, um comentário


É essencial compreendermos o que é a organização, o que ela faz e
sobre que bases pode ser justificada, porque não é apenas um meio para
obter melhor desempenho econômico, mas também para exercer pro‑
funda influência sobre a sociedade em que vivemos. É preciso ter sempre
em mente que a organização tem reflexos na sociedade que nos rodeia e
também ajuda a moldar o tipo de sociedade em que vivemos. A forma
de organização que usamos transmite seus valores à sociedade e conduz
uma mensagem sobre como tratar os outros. Ao ser usada no dia a dia,
a organização legitima os métodos do trabalho, razão pela qual há sem‑
pre o risco de que estes não sejam mais questionados. Eles se tornam
“convencionais”, e por isso falamos em organização “convencional”.
Dados os custos sociais que a organização convencional pode infligir, é
importantíssimo romper os limites que ela impõe a nosso pensamento.
Este livro procurou argumentar que a abordagem convencional da
organização que herdamos há séculos pode ser modificada para melhor
satisfazer as necessidades estratégicas das empresas e ser uma fonte de ex‑
periência de trabalho mais satisfatória. Contudo, apesar dos resultados
impressionantes obtidos por algumas empresas, poucas deram passos re‑
almente significativos nessa direção. A reforma da organização claramente
enfrenta uma considerável inércia. O alto escalão reluta em sacrificar os
interesses que a organização convencional pode assegurar, e até certo pon‑
to, ocultar. É mais confortável manter métodos e sistemas que preservam
certa distância entre executivos e o resto do pessoal, especialmente quando

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isso significa imensas diferenças nas recompensas e privilégios, conforme já
observado. Da mesma forma, fatos recentes demonstram uma relutância
em reformar a governança corporativa de modo a reduzir significativamen‑
te a distância entre o alto escalão e os acionistas. O resultado é que quase
sempre algumas políticas socialmente desejáveis são aceitas, mas apenas
da boca pra fora. Tudo indica que muitos executivos do alto escalão só
introduzirão mudanças que tenham alguma importância quando forçados
pela reação do público a suas contravenções ou aos efeitos prejudiciais da
maneira como organizam as empresas ou os serviços públicos. 587
Devemos ser pessimistas à luz dessa aparente relutância? Não comple‑

Conclusão
tamente. A mensagem deste livro em geral tem sido que, mesmo se a ética
social não obriga os diretores e executivos a mudar sua maneira de ver a
organização, no final a realidade econômica os obrigará. O contexto dos
negócios e do trabalho está mudando de modo impressionante; ele forçará
todos os tipos de organização a valorizarem mais as pessoas e ajustarem
suas formas de realização de acordo com isso. A competição mais acirrada,
em que o sucesso requer uma competência distintiva, a necessidade de se
ter organizações de aprendizagem, capazes de inovar e se adaptar à mudan‑
ça, e uma dependência cada vez maior de trabalhadores qualificados para
obter vantagens sobre a concorrência estão entre os desenvolvimentos mais
óbvios. Empregadores que decidem se organizar de maneira mais esclare‑
cida ganharão ainda mais em razão da qualidade das pessoas que podem
atrair. Mesmo assim, para acelerar a reforma ajudariam padrões para os
novos métodos ou sistemas, talvez algo semelhante ao esquema ISO.
De forma importante, a pesquisa mostra que vale a pena adotar juntos
esses aspectos da nova organização que se apoiam mutuamente – menos
níveis hierárquicos, a delegação da iniciativa, o trabalho de equipe, boas
políticas de recursos humanos e o suporte das tecnologias da comunica‑
ção – em vez de reformar apenas um pouquinho aqui e um pouquinho
ali.33 Essa é uma descoberta importante, porque implica que a adoção
de arranjos alternativos deve ser feita com uma filosofia e compromisso
claros, que assegurem a consistência e a abrangência.34 Não vale a pena
fazer remendos ou seguir a moda do momento.

Resumo
1. Este capítulo de conclusão trata da questão de como poderíamos com‑
preender melhor a organização, tendo em mente que ela contém dois
aspectos fundamentais, identificados no Capítulo 2.

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2. Um aspecto da organização é um conjunto de arranjos para alcançar as
metas por meio da atividade coletiva. O outro é um conjunto de arranjos
que distribui poder, recompensas e bem­‑estar.

3. A maior parte deste livro se concentra no primeiro aspecto da organiza‑


ção, relacionando­‑o com as condições instáveis do mundo dos negócios. É
impossível refletir sobre a viabilidade da organização no futuro sem levar
em conta o segundo aspecto, do qual depende sua legitimidade social.
588
4. Tornou­‑se aparente que, ao mesmo tempo em que estão sendo ado‑
tadas novas formas de organização, certas características da organiza‑
Conclusão

ção convencional, como a hierarquia, não são descartadas. Há crescente


profusão de diferentes formas organizacionais, razão pela qual se torna
ainda mais urgente fornecer uma base sobre a qual possamos avaliar sua
importância para as diferentes necessidades que se espera que a organi‑
zação atenda.

5. Foram identificadas três necessidades desse tipo: eficiência, adaptabi‑


lidade e inovação. A eficiência deve persistir, mas está se tornando cada
vez mais importante que as formas organizacionais também satisfaçam as
necessidades de adaptabilidade e/ou inovação. Foi esse o grande estímulo
para a busca de novas formas organizacionais.

6. Essas três necessidade pedem diferentes abordagens da organização e é


um grande desafio criar formas organizacionais para a situação cada vez
mais comum em que todas as três devem ser atendidas simultaneamente.

7. Por esse motivo, prevê­‑se que as formas híbridas de organização se


tornem mais numerosas, como acontece com as redes modulares que de‑
sagregam unidades e são diferentemente organizadas, mantendo o neces‑
sário grau de integração entre elas.

8. O interesse nas novas formas organizacionais também tem sido esti‑


mulado pelo evidente fracasso social das formas convencionais da orga‑
nização, especialmente a hierarquia. Isso faz lembrar o segundo aspecto
da organização: um conjunto de arranjos para resolver a questão da dis‑
tribuição de poder, recompensas e bem­‑estar.

9. Há evidências de que a atenção às consequências sociais da organi‑


zação pode ter um impacto positivo sobre a qualidade de vida das pes‑
soas e a capacidade das empresas de agregarem valor e permanecerem
competitivas.

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10. Algumas empresas estão tomando importantes iniciativas para satis‑
fazer suas necessidades estratégicas, dando, ao mesmo tempo, priorida‑
de às necessidades de seu pessoal. Seu pioneirismo tem alguns aspectos
em comum com as novas formas organizacionais que apareceram para
facilitar a inovação e a adaptação, especialmente com a redução da
hierarquia.

11. O cumprimento da necessidade de inovação e adaptação depende


muito do compromisso e da iniciativa dos funcionários, que normalmen‑ 589
te são os recursos mais preciosos da empresa.

Conclusão
12. É improvável que haja real cooperação se a organização em que as
pessoas trabalham lhes impõe custos sociais significativos. Tomar como
referência critérios sociais ajuda a compreender melhor as alternativas
organizacionais envolvidas.

Questões para discussão


1. Por que você acha que as formas convencionais da organização ainda
persistem, apesar das críticas que lhe são feitas?

2. Quais são as diferentes necessidades fundamentais que esperamos que


a organização satisfaça, como um conjunto de arranjos para atingir me‑
tas por meio da atividade coletiva?

3. Quais são as formas organizacionais adequadas às diferentes necessidades?

4. Como os arranjos organizacionais híbridos poderiam ajudar as empresas


a satisfazer diferentes necessidades simultaneamente?

5. Que abordagens da organização melhor satisfazem aos critérios sociais?

6. Até que ponto você acredita ser possível desenvolver uma abordagem da
organização que satisfaça aos requisitos sociais e econômicos?

7. Por que relativamente poucas empresas têm explorado as novas formas


de organização?

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Notas
1. O Egito Antigo é um dos primeiros exemplos de Estado bastante organizado,
capaz de proezas de esforço coletivo, como a construção das pirâmides, em
Gizé, por volta de 2500 a.C.

2. PORTER, Michael E. Competitive advantage. New York: Free Press, 1985.

3. LORENZONI, G. Benetton. In: BADEN­‑FULLER, C.; PITT, M. (Org.). Strate‑


590 gic Innovation. London: Routledge, 1996. p. 355­‑388.

4. Essas tensões foram expressadas em termos de “dilemas”, por HAMPDEN­


Conclusão

‑TURNER, Charles. Charting the corporate mind: from dilemma to strategy.


Oxford: Blackwell, 1990. Elas também aparecem em discussões sobre os para‑
doxos inerentes à organização, como QUINN, Robert E.; CAMERON, Kim.
Paradox and transformation. Cambridge: Ballinger, 1988.

5. MARCH, James G. Exploration and exploitation in organizational learning.


Organization Science, 2, p. 71­‑87, 1991.

6. RUDMAN, Stephen Todd. Controlling interests: management control processes


employed by US multinational corporations within their China affiliates (Tese
de doutorado). Universidade de Cambridge, 2003.

7. PETTIGREW, Andrew M.; FENTON, Evelyn M. (Org.). The innovating orga‑


nization. London: Sage, 2000; PETTIGREW, Andrew M.; WHITTINGTON,
Richard; MELIN, Leif et al. (Org.). Innovative forms of organizing. London:
Sage, 2003.

8. FOSS, Nicolai J. Selective intervention and internal hybrids: interpreting and


learning from the rise and decline of the Oticon Spaghetti Organization. Orga‑
nizational Science, 14(3), p. 331­‑349, 2003.

9. FOSS, 2003, op. cit.

10. Melissa A. Schilling e H. Kevin Steensma, “The use of modular organizational


forms: an industry-level analysis”, Academy of Management Journal, 44, 2001,
p. 1149-1168.

11. Chartered Institute of Personnel and Development/CIPD. Performance through


People. London: CIPD, 2001; Skapinker, Michael. Human capitalism. Fi‑
nancial Times, 11 dez. 2002, p. 18; Dearlove, D. Official: HR can make mo‑
ney. The Times, Appointments Section, 12 dez. 2002, p. 9; Pfeffer, Jeffrey.
Seven practices of successful organizations. California Management Review,
40, 1998, p. 96-124.

Book_Organizaçoes.indb 590 16/9/2011 16:24:16


12. A perda de confiança nos empregadores e na diretoria, e as medidas para repa‑
rar os prejuízos são discutidas em Child, John; Rodrigues, Suzana. Repai‑
ring the breach of trust in corporate governance. Corporate Governance, 12,
2004, p. 143-151.

13. Citado por Watkins, Sherron. Address to Academy of Management. 3 de


agosto. Academy of Management Executive, 17, 2003, p. 119-125.

14. Osterloh, Margit; Frey, Bruno. Corporate governance for crooks? The
case for corporate virtue. Documento apresentado no Congresso Internacional 591
sobre “Corporate Governance and Firm Organization: Nexuses and Frontiers”,

Conclusão
Bocconi University, 5 a 7 de dezembro de 2002.

15. National Institute for Occupational Safety and Health/NIOSH. Stress at Work.
1999. Disponível em: <www.cdc.gov/niosh/stresswk.html>.

16. Revill, Jo. Life makes you sick. The Observer, 12 out. 2003, p. 19.

17. Williams, Richard G. (Org.), Class and Health: Research and Longitudinal
Data, London: Tavistock, 1986; Marmot, Michael. The Status Syndrome: How
Social Standing Affects our Health and Longevity. London: Times Books, 2004.

18. Prowse, Michael. Is inequality good for you?. Financial Times FT Weekend,
7 dez. 2002, p. I-II.

19. Leake, Jonathan. Sweet smell of success makes you live longer. Sunday Times,
30 mai. 2004, p. 1.14.

20. NIOSH, op. cit., 1999.

21. Child, John. Professionals in the corporate world: values, interests and control.
In: Dunkerley, David; Salaman, Graeme. International Yearbook of Or‑
ganization Studies 1981. London: Routledge & Kegan Paul, 1982, p. 212-240.

22 Bell, Emma; Taylor, Scott. Breaking away: organizational disidentification


and spiritual work. Documento inédito. Universidades de Warwick e Birmin‑
gham, 2003. Veja também Casey, Catherine J. Critical Analysis of Organiza‑
tion: Theory, Practice, Revitalization. London: Sage, 2002.

23. Jaques, Elliott. In praise of hierarchy. Harvard Business Review, jan./fev.


1990, p. 127-133. A citação foi tirada da p. 127.

24. Pettigrew, Andrew M.; Whittington, Richard. The New Internal Ne‑
twork Organization: Process and Performance. Relatório final para o Conselho
de Pesquisa Social e Econômica. Warwick Business School, 2000.

Book_Organizaçoes.indb 591 16/9/2011 16:24:17


25. Gittell, Jody H. The Southwest Airlines Way. New York: McGraw-Hill,
2002; Cascio, Wayne F. Responsible Restructuring, San Francisco: Berrett-
Koehler, 2002, p. 83-87; www.fortune.com/fortune/mostadmired 2004; Frei‑
berg, Kevin; Freiberg, Jackie. Nuts! Southwest Airlines’ Crazy Recipe for
Business and Personal Succes, New York: Texere, 2001; literatura da empresa.

26. Citado em Brooker, K. Herb Kelleher: the chairman of the board looks
back. Fortune, 28 maio 2001, p. 62-76.

592 27. Semler, Ricardo; Semco S.A. Thunderbird, The American Graduate School
of International Management, estudo de caso A07-98-0024, 1998; Semler,
Conclusão

Ricardo. Maverick London: Random House, 2001; Semler, Ricardo. The


Seven-Day Weekend. London: Random House, 2003.

28. Guimarães, Roberto; Southerst, John. Semco: work + space = freedom.


2003. Disponível em: http <//www.steelcase.com/en/pdf/knowledgepapers/Se‑
mco.pdf>.

29. Semler, op. cit., 2001, p. 300.

30. Ibid., p. 309.

31. Sobre a Harley-Davidson, veja http://www.harley-davidson.com. Sobre a Lin‑


coln Electric, veja Cascio, Wayne F. op. cit., 2002, p. 75-77; também Berg,
Norman A.; Fast, Norman D. The Lincoln Electric Company. ed. rev. Harvard
Business School caso 9-376-028, 1983; Berg, Norman A. Lincoln Electric Co.,
George Willis, video, Harvard Business School, vídeo do caso 9-889-517,1989.
Sobre a Springfield, veja Byrne, John A. After Enron: the ideal corporation.
Business Week, 26 ago. 2002, p. 32-35. Sobre a John Lewis Partnership, veja
Bradley, Keith; Taylor, Simon. Business Performance in the Retail Sector:
The Experience of the John Lewis Partnership. Oxford: Clarendon Press, 1992;
também http://www.john-lewis-partnership.co.uk.

32. Por exemplo, Heller, Frank et. al. Organizational Participation: Myth and
Reality. Oxford: Oxford University Press. 1998; Pfeffer, Jeffrey. op. cit.,
1998; Cascio, Wayne F. op. cit., 2002.

33. Heller et al., op. cit., 1998; Pettigrew; Fenton, (Org.), op. cit., 2000.

34. Indiquei os benefícios do desempenho da compatibilidade organizacional em


Child, John. Organization: A Guide to Problems and Practice. London: Har‑
per & Row, 1977, p. 169-173.

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