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br Razera, Rio, 2017.

PSICOLOGIA POSITIVA: UMA PROPOSTA DE PREVENÇÃO


SECUNDÁRIA
NO TRATAMENTO DA BULIMIA NERVOSA.

Esp. Maria das Graças RAZERA


( Psicóloga CRP 08/09793
UFRJ | 2000.
Membro da Federação Brasileira de Terapias Cognitivas (2002).
Dra. Mônica PORTELLA.
(Doutora em Psicologia UFRJ, 2000).
Presidente do IIPsiMais.
INTRODUÇÃO

O artigo é a versão resumida da monografia aprovada para a conclusão da


Pós-Graduação Latu Sensu do Instituto AVM da Universidade Cândido Mendes para a
obtenção do título de Especialista em Psicologia Positiva: uma integração com o
Coaching, com a orientação da Prof. Dr. Mônica Portella, no ano de 2014. Estrutura-se
em três eixos: a bulimia nervosa, critérios de diagnóstico e o tratamento pela terapia
cognitivo-comportamental, destacando a autoestima deficitária como fator de maior
vulnerabilidade das pacientes bulímicas. Em função disso, o segundo eixo é dedicado à
introdução da psicologia positiva no que se refere à importância da emoção positiva como
fator essencial à manutenção do bem-estar alcançado com o tratamento psicológico. E
visando a manutenção do bem-estar a médio e longo prazo, sugere-se a realização do
inventário das virtudes, na fase final – da prevenção de recaída - do tratamento
psicoterápico da abordagem da terapia cognitivo-comportamental voltado para os
transtornos alimentares, em especial, à bulimia nervosa.

• O que é bulimia nervosa?

A bulimia nervosa é um transtorno alimentar, sendo um tema recente no


âmbito das pesquisas em saúde mental. Os primeiros artigos científicos começaram a ser
publicados em 1986. Destacando que 21% das publicações referem-se à América do Sul.
Chile e Brasil lideram as publicações na América do Sul, sendo que o percentual
brasileiro corresponde a 12,5 %. A título de complementação, Estados Unidos
correspondem com 45,5% e a Europa corresponde a 30% das publicações, sendo que o
Reino Unido liderou o ranking com 8%, seguida da Itália com 6,5% e Holanda com 4,5%.
Os estudos da Ásia e da Oceania são inexpressivos (ROMARO E ITOKAZU, 2002, p.
408).
De acordo com o Manual Estatístico de Doenças Mentais (DSM-5, 2013),
publicado pela Associação Americana de Psiquiatria (APA), os transtornos alimentares
são classificados com a devida equivalência com relação ao critério da Organização
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Mundial da Saúde (OMS), responsável pela publicação da Classificação Internacional


de Doenças, em décima edição, (CID-10, 1990), nos seguintes tipos: PICA, desordem de
ruminação, esquiva/evitação restritiva alimentar, anorexia nervosa (AN), bulimia nervosa
(BN), compulsão alimentar, transtorno alimentar de outra especificação e transtorno
alimentar sem especificação.
De acordo com o DSM-5 (2013), a BN é caracterizada por um persistente
distúrbio alimentar referente ao comportamento alimentar que resulta em alteração na
absorção, com significante prejuízo funcional em termos biopsicossociais. Os critérios
para o diagnóstico especificam cinco condições:

1. Critério A: apresentar episódios de compulsão alimentar (ECA);

2. Critério B: recorrer a mecanismos compensatórios inapropriados


no intuito específico de perder peso: como vômito auto-induzido;
abuso de medicamentos como laxantes, diuréticos e outros; e abuso
de atividade física.

3. Critério C: ter ocorrido concomitantemente um episódio de


compulsão alimentar seguido de uma atividade compensatória por
pelo menos três meses.

4. Critério D: excessiva preocupação com o ganho de peso e a


forma corporal.

5. Critério E: os episódios não ocorrem durante episódios de


anorexia nervosa.

A intensidade de cada um dos sintomas é determinada pela quantidade de


episódio de compulsão alimentar (ECA) que a paciente teve no período de uma semana:

1. Fraco: ocorre 1 a 3 episódios de compulsão alimentar.

2. Moderado: ocorre entre 4 a 7 episódios.

3. Severo: ocorre entre 8 a 13 episódios.

4. Gravíssimo: presente a ocorrência superior a 14 episódios.

Há um subtipo de BN que é a bulimia não-purgativa, ou seja, sem a presença


de métodos compensatórios de expurgo, mas o paciente, após o episódio de compulsão
alimentar, passa a exagerar na prática da atividade física.
Para o diagnóstico diferencial deve-se investigar se há presença de sintomas
referentes a anorexia nervosa, compulsão alimentar (binge eating disorder), a Síndrome
de Kleine-Levin, Depressão Maior e Personalidade Borderline.
A etiologia da BN ainda é pouco conhecida, sendo multifatorial, ou seja,
vários fatores que por um modo ainda desconhecido ou pouco esclarecido para os
pesquisadores desencadeia o TA, variando com o histórico existencial de cada paciente.
Suspeita-se que a genética com base em estudos de gêmeos monozigóticos, o sistema
endócrino, além de fatores comportamentais e socioculturais acentuem o problema do
transtorno alimentar. Em termos psicológicos, a baixa autoestima e a preocupação
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excessiva com o peso são fatores preditivos e de maior vulnerabilidade ao


desencadeamento do transtorno (ROMARO E ITOKAZU, 2002).
A bulimia nervosa (BN) foi diagnosticada em 1979, por Gerald Russel,
descrita como quadro clínico que envolvia forte medo de engordar, e classificada como
transtorno alimentar pelo DSM-III em 1980 (DUCHESNE; FREITAS, 2011, p. 393).
Atinge em sua grande maioria as mulheres, numa proporção de dez mulheres
jovens para um homem jovem (10:1), em idade jovem até no máximo 40 anos, cuja
prevalência é de 1 a 2% dos transtornos alimentares, com incidência de 12 por 100 mil
pessoas/ano, tendendo a ser crescente. O diagnóstico é considerado difícil, pois a paciente
leva cerca de cinco anos ou mais até sentir a necessidade de uma orientação profissional,
em geral quando começa a engordar descontroladamente, quando suas estratégias de
enfrentamento se tornam ineficazes (DSM 5).
Vale enfatizar novamente que a marca deste transtorno alimentar é a
frequência habitual do uso de métodos compensatórios para a manutenção do peso, seja
através do abuso frequente de dietas radicais sem acompanhamento profissional, seja pelo
abuso de anorexígenos sem orientação especializada, seguidos por períodos de jejum,
com ou sem métodos purgativos como vômitos provocados, laxantes e diuréticos, além
não raro da prática exagerada da atividade física (DSM-5).
Devido a estes comportamentos que são comuns principalmente na
adolescência, o diagnóstico precoce é muito difícil, uma vez que é comum iniciar na
adolescência. A taxa de mortalidade é baixa (0.3 a 0.7%), contudo na literatura
especializada há casos de suicídio. Sendo assim, o objetivo de tratamento é a remissão
parcial e se possível: remissão completa dos episódios bulímicos deflagrado por episódios
de compulsão alimentar. Aproximadamente 74,5% apresenta remissão total dos sintomas
num período longo de sete (07) anos a dez (10) anos, mas estudos apontam que cerca de
25% dos casos terão curso crônico, ou seja, permanecerão para o resto da vida. A
comorbidade, ou seja, a presença de algum outro(s) transtorno mental, é considerada alta,
tais como: transtorno de humor, transtorno de ansiedade e transtorno de substâncias, além
do que pode migrar para outros transtornos alimentares, por exemplo: anorexia ou
transtorno de compulsão alimentar (DUCHESNE; FREITAS, 2011; DSM-5, 2013).
Por isso, um tratamento eficaz contempla a atenção multidisciplinar. Em
Psicologia, a primeira opção terapêutica de tratamento psicológico para o transtorno
alimentar vem sendo a Terapia Cognitivo-Comportamental (TCC), que aborda os fatores
cognitivos, emocionais, comportamentais e interpessoais, visando a psicoeducação da
paciente quanto ao transtorno e seu perfil cognitivo, consistindo-se “em uma intervenção
semi-estruturada, objetiva, orientada para metas e prioritariamente voltada para o
presente e o futuro” (DUCHESNE, 2006, p.125; MEYER, 2011).

Vale ressaltar que o diagnóstico dos TAs só se faz por meio


de entrevistas. Questionários autoaplicáveis não são
instrumentos diagnósticos. A entrevista considerada o
padrão-ouro para o diagnóstico dos TAs é a Eating Disorder
Examination – EDE já traduzida e em processo de validação
no Brasil. Pode também ser utilizado o módulo de TA da
Entrevista Clínica Estruturada para os Transtornos do DSM-
IV- (SCID-I/P) e, para crianças e adolescentes, a Sessão de
Transtornos Alimentares do DAWBA (DUCHESNE;
FREITAS, 2011, p. 396).

Uma dificuldade quanto à precisão diagnóstica é a tendência da paciente


migrar de um quadro clínico, por exemplo de BN (bulimia nervosa) para AN (anorexia),
podendo inclusive passar para o quadro mais grave, o de TCAP (transtorno de compulsão
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alimentar), e vice-versa. Por isso, a maior parte dos casos vem sendo diagnosticada como
transtorno alimentar não especificado. A pista para o fechamento do diagnóstico é o IMC
e a presença ou não de comportamentos compensatórios com o objetivo maior de não
engordar (DUCHESNE, 2011; MEYER, 2011). Estudos na área de TCC apontam que o
tratamento em grupo são mais eficazes do que os atendimentos individuais (Neulfeld e
col, 2016).
O objetivo principal da psicoterapia seja individual e a de grupo consiste
em conscientizar adequadamente de acordo com o perfil cognitivo (psicoeducar) a
paciente sobre a dinâmica cerebral do ciclo vicioso retroalimentado por três fases bem
demarcadas que obedece à seguinte ordem: hipofagia, hiperfagia e purgação.
A hipofagia é a primeira fase caracterizada por um longo período de jejum ou
inanição, servindo de gatilho neurológico para a segunda fase: hiperfagia, sendo a própria
compulsão; seguida da purgação, que é a terceira fase seja via oral, via excreção
(diuréticos e laxantes) ou excesso de atividade física (suor). De um modo específico,
aliado ao perfil cognitivo de cada paciente, é fundamental haver a psicoeducação sobre a
dinâmica de cada episódio bulímico que venha a ter durante o tratamento, levantando
evidências de sua retroalimentação, e informando sobre o risco de migrar por exemplo
para outros quadros de transtornos alimentares (BARRETO; FIGUEIRÓ; SOARES,
2006, p.121). Sendo assim,

A abordagem cognitivo-comportamental da BN no tratamento


nutricional inclui: educação sobre a regulação do peso
corpóreo, efeitos adversos da dieta, crenças e mitos sobre
dietas e consequências clínicas do comportamento purgativo.
Inclui também a orientação de um plano alimentar que
consiste em três refeições principais a quatro intermediárias
de modo a ajudar na quebra do padrão alimentar caótico que
continua o ciclo da compulsão e purgação (BARRETO;
FIGUEIRÓ; SOARES, 2006, p.122).

O modo de tratamento psicoterápico segue um modelo semelhante em quase


todos os transtornos alimentares, uma vez que o foco inicial é a psicoeducação, com o
intuito de ensinar a paciente a regularizar o comportamento alimentar, de modo a
prevenir-se gradativamente das situações-gatilhos, assim como identificar as crenças
disfuncionais que desencadeiam os episódios de compulsão alimentar. Em geral, o
tratamento da TCC obedece a três fases: a conceituação, a psicoeducação e a prevenção
de recaída, com atenção especial aos pensamentos sabotadores (BECK, 2011, p.43).
Na conceituação, o terapeuta passa a ter uma noção mais clara da estrutura
cognitiva da paciente, permitindo a ele – com base no empirismo colaborativo – ou seja,
em uma parceria direta com a demanda da paciente, objetiva e colaborativamente,
estabelecer a melhor forma de tratamento, considerando os recursos cognitivos e
familiares. A segunda fase tem como foco principal a psicoeducação sobre o transtorno
alimentar e as estratégias funcionais e disfuncionais de enfrentamento, visando
a reestruturação cognitiva da paciente. Para então, na terceira fase, havendo a remissão
parcial dos principais sintomas, preparar a paciente para a última fase do tratamento: a
prevenção das recaídas, de modo a que a paciente se previna principalmente das próprias
vulnerabilidades pelo aumento do senso de autoeficácia (DUSCHESNE, 2006, p.125-
136). Somente assim, aumentará paulatinamente a sua autoestima, por se sentir
responsável pela própria saúde de modo saudável.
O ponto central do tratamento do transtorno alimentar é psicoeducar
empaticamente a paciente a identificar o ciclo vicioso da compulsão
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alimentar, municiando-a com técnicas cognitivas e técnicas comportamentais


profiláticas a fim de desnutrir ou romper com o ciclo vicioso do episódio de compulsão
alimentar (ECA), presente em todos os transtornos alimentares. Quanto mais frequente
for o ECA, mais grave tende a ser o transtorno alimentar, desde a inanição hipofágica
(AN) até a hiperfagia (TCAP). Enfim, havendo o controle preventivo do ECA, previne-
se a migração para outros quadros de transtornos alimentares ainda mais graves que a
própria BN.

• Episódio de Compulsão Alimentar (ECA).

O transtorno alimentar, seja a anorexia, bulimia nervosa, transtorno de


compulsão alimentar e mesmo os transtornos alimentares mistos ou transtornos
alimentares não identificados, envolve a ocorrência de binge eating, que significa no
idioma inglês: orgia alimentar. Também denominado por episódio de compulsão
alimentar (ECA). As características são: comer rapidamente sem apreciar e sem degustar
o sabor dos alimentos, do contrário, a paciente come avidamente, quase sem mastigá-los,
parando ao sentir um desconforto abdominal, sendo por isso comum comer escondido ou
sozinho. Ao final, é comum sentir muita culpa, arrependimento e vergonha (DSM-5,
DUCHESNE; 2006, p. 131; DUCHESNE; FREITAS, 2011).
O ciclo do ECA, repetindo, apresenta três fases: hipofagia, hiperfagia e
purgação. Sobre a terceira fase, Duchesne (2006, p. 131) ressalta que: “É importante
explicar para o paciente que a indução de vômito dificulta a ocorrência da sensação de
saciedade, aumentando a necessidade de ingerir grande quantidade de alimentos”. Do
mesmo modo, adverte quanto a ineficácia do uso de diuréticos e laxantes, por serem na
verdade “desidratantes”, que fisiologicamente, não impedem o ganho de peso – que em
síntese significa ganho de massa gorda – pois o que os medicamentos fazem é apenas
perder líquidos. Emagrecer significa reduzir o percentual de gordura.
Havendo uma psicoeducação da fisiologia referente à ingestão calórica, faz-
se necessário psicoeducar emocionalmente a paciente para a tolerância de emoções
negativas, uma vez que o ECA, passa a servir como método “antidepressivo” ou
“ansiolítico”. Para então haver a psicoeducação cognitiva, ou seja, focar nas crenças
disfuncionais da paciente ligadas ao comportamento alimentar. Logo, a TCC dispõe de
técnicas cognitivas e comportamentais que são eficazes porque aumentam a
autorregulação emocional (DUCHESNE, 2006, p.131).

• A auto-estima: fator de vulnerabilidade da BN.

A autoestima está entre os principais fatores cognitivos que predispõem à maior


vulnerabilidade para desenvolver a BN, que se soma à dificuldade em habilidades sociais
e na resolução estratégica de problemas, referentes ao enfrentamento adequado do
estresse, apresentando por isso um baixo limiar à frustração, deflagrados não raro
inclusive por experiências traumáticas como abuso sexual, bullying, negligência parental
e abuso psicológico por parte dos cuidadores. Aliado a isso, um fator mais comum em
transtorno alimentar, vem sendo a impulsividade acentuada, em que, segundo Galvão,
Pinheiro e Somenzi (2006, p.61): “(...) observa-se, predominantemente, uma
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incapacidade de controle dos impulsos, não apenas no comportamento alimentar, como


também em outras áreas da vida do indivíduo”.
Não raro, os pacientes de um quadro mais grave de TA, notadamente: o transtorno
de compulsão alimentar (TCAP), apresentam um deslocamento da impulsividade, durante
o tratamento de perda de peso ou após por exemplo à cirurgia bariátrica que é a compulsão
por compras, mais comum em mulheres e o aumento do consumo de álcool: em homens.
E na minha prática clínica também constatei alguns casos assim com esta tendência, o
que me permitiu trabalhar preventivamente ao longo do acompanhamento pós-cirúrgico
e pós-balão intragástrico. Além disso, Silva (2005, p.101), afirma que alguns pacientes
com traços de TCAP apresentam a tendência migratória da impulsividade alimentar que
se desloca também para a dependência de jogos de azar.
Após o tratamento, é necessário que a paciente tenha desenvolvido a
capacidade de superar desafios, fator mais essencial quanto simplesmente impor o
consenso da adoção de um novo estilo de vida. A questão central é como se cuidar da
maneira eficaz, no longo prazo, sem ficar dependente da psicoterapia.
É interessante destacar que, de acordo com alguns estudos, pessoas com
maior autoestima, tendem a ser mais perseverantes nas tarefas do que as pessoas com
baixa autoestima. Peterson e Seligman afirmam que os efeitos da autoestima e da
tenacidade indicam implicações simbólicas sobre a pessoa e seu envolvimento diante das
demais e o modo como percebem as tarefas em questão (2004, p.232). Por isso, é
necessário que cada paciente se torne ciente de suas virtudes. Daí a proposta de inserir a
psicologia positiva como recurso para reforçar a autoestima da paciente.
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DESENVOLVIMENTO.

• Autoeficácia como estratégia de melhoraria da autoestima.

Como foi destacado anteriormente, a característica psicológica comum de


uma paciente com sintomas de BN é a autoestima deficitária.
A Psicologia Positiva se assenta em três pilares que são indissociáveis. São
eles: a emoção positiva, as virtudes humanas e as instituições positivas (SELIGMAN,
2009). Para este trabalho, o eixo de introdução será destacar a importância da autoeficácia
como forma de estimular a frequência da emoção positiva, por ser a autoestima o fator
essencial do primeiro pilar para o bem-estar positivo.
A autoestima é uma qualidade humana que faz parte da emoção positiva, a
respeito de si mesma, ligado ao seu autoconceito, em que a pessoa tem uma satisfação
consigo mesma.
Em uma pesquisa sobre bem-estar, este tópico esteve presente na seguinte a afirmação:
“De modo geral, sinto-me positivo em relação a mim mesmo” (SELIGMAN, 2011, p.52).
Para se sentir positivo consigo mesma, é necessário que a pessoa se sinta realizada ou
capaz de realizar seus objetivos. Logo, para que as mudanças sejam concretizadas, é
fundamental que disponha de um nível razoável de autoconfiança. Esta autoconfiança
reflete sua autoestima, que por sua vez, precisa ser estimulada pelo sentimento
progressivo de autoeficácia.
A autoeficácia é um conceito proposto por Albert Bandura (apud SYDNEY;
LOPEZ, 2009, p.165), sendo definido como: “ as crenças das pessoas em suas
capacidades de produzir efeitos desejados por meio de suas ações próprias”. Sendo assim,
não seria um equívoco supor que o respeito por si mesma esteja diretamente relacionada
com os resultados profícuos, portanto positivos de suas ações. É importante relembrar
que a paciente bulímica nutre a crença de não ter controle sobre seu comportamento
alimentar, sendo a autoestima baixa um reforçador negativo neste contexto. A visão
negativa de si é distorcida, por ser baseada em frustrações relacionadas às tentativas de
se manter magra mas engordar cada vez mais.
Afirmam Sydney e Lopez (2009, p. 165) que: “a autoeficácia é um padrão de
pensamento humano aprendido, e não geneticamente herdado. Ela começa na infância e
continua durante a vida toda”. Logo, é factível aprender novas estratégias de
comportamento alimentar, incrementando assim o sentimento de controle em um
crescente senso de autoeficácia. A manutenção da saúde dependerá então da habilidade
de manter o bem-estar.
A teria do bem-estar proposta por Martin Seligman tem como característica
essencial a metáfora do florescimento individual, isto é, para que as virtudes da pessoa
predominem no seu cotidiano é imprescindível que vivencie emoções positivas. porque
“a emoção positiva é claramente a força motriz, e não a emoção negativa” (2011, p. 219).
Daí a sua proposição da teoria do bem-estar positivo, em que define a psicologia positiva
por sendo a ciência do bem-estar, ou seja, é “o estudo das emoções positivas, do
engajamento, do sentido, das realizações positivas e dos bons relacionamentos
(SELIGMAN, 2011, p. 83). Havendo o predomínio das virtudes, a pessoa floresce. Vale
lembrar que a ausência de doenças ainda não é saúde, pois saúde inclui o bem-estar, de
acordo com a Organização Mundial da Saúde (PORTELLA, 2014).
Em síntese, neutralizar um transtorno alimentar, embora seja essencial, ainda
não basta para que a saúde seja mantida por um longo prazo, pois a médio prazo, este
espaço dedicado ao abuso alimentar, que implica em um ritual de hábitos aprendidos na
infância, estará presente. O acesso ao alimento que antes era propiciado por alguma figura
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de apoio, é agora patrocinado pela própria paciente, não raro, às escondidas, exigindo
toda uma logística que a mantem ocupada. Logo, a presença deste vazio pode ser até mais
desconfortável do que o abuso alimentar. Para que a paciente não tenha a sensação de
vazio ou de privação ou perda, parece prudente desde o início delinear as crenças sobre a
ideia de perda e privação, delineando também outras fontes de prazer que sejam
específicas da memória afetiva do paciente.
Deste modo, ajudar a elaborar empaticamente, através de um empirismo
colaborativo com a paciente, estratégias assertivas para novos emparelhamentos
comportamentais mais adaptativos, mais saudáveis neste lugar “habituado” por uma
rotina de excesso de comida, até que os novos comportamentos se tornem os hábitos de
um novo estilo de vida. Logo, o desafio do tratamento psicoterápico na fase da prevenção
de recaídas consiste em descobrir e relembrar os meios específicos de cada paciente para
que a autoestima seja nutrida semanalmente, em um nível mais funcional, mantendo a
automotivação vitalícia.
Neste contexto, a autoeficácia é o atalho oportuno, pois estando mais
autoconfiante, tenderá a estar menos vulnerável psicologicamente, atenuando a
frequência e a intensidade dos episódios de compulsão alimentar, até a completa extinção
deste comportamento. Se o objetivo é a psicoprofilaxia, não basta apenas cortar o
comportamento negativo, é preciso estimular a positividade na vida cotidiana da paciente.
Assim evitando a sensação de vazio.

Como terapeuta, eu de vez em quando ajudava um paciente a


se livrar de sua raiva, ansiedade e tristeza. Eu achava que
então teria um paciente feliz. Mas isso nunca aconteceu. O
que eu tinha era um paciente vazio. E isso porque as práticas
que produzem o florescimento – emoções positivas, sentido,
boas obras e relacionamentos positivos – estão acima e além
das práticas que minimizam o sofrimento (SELIGMAN,
2011, p. 65).

Desta constatação, Seligman, que é terapeuta há mais de quarenta anos, alerta


que: “Se quisermos florescer e ter bem-estar, precisamos, sim, minimizar nosso
sofrimento; mas além disso precisamos ter emoção positiva, sentido, realização e
relacionamentos positivos” (2011, p.65). Além do engajamento, que é o quinto elemento,
em que a ausência de um destes elementos, o bem-estar será deficitário (SELIGMAN,
2011). No caso da BN, as emoções positivas, é o fator a ser reforçado para que mantenha
a sua condição de saúde, estando a paciente na fase final do tratamento de TCC, que é a
prevenção de recaída.
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• Psicologia Positiva: a teoria do bem-estar positivo.

Com base em estudos de Felicia Huppert e Timothy So, da Universidade de


Cambridge, foi analisado a qualidade de vida resumido em um estudo abrangente
envolvendo 23 países da União Européia, numa pesquisa aplicada em 2 mil adultos, na
qual concluiu-se que a Dinamarca ocupa o primeiro lugar em bem-estar, seguido da Suíça
e da Finlândia. Os últimos lugares pertencem à Bulgária, Portugal e por último: Rússia
(SELIGMAN, 2011, p.38-39).
A teoria do bem-estar positivo combina cinco elementos, em que a ausência
de um, compromete o bem-estar como um todo, sendo a Emoção Positiva o fator principal
de retroalimentação de todos os demais elementos principalmente na vida adulta.
Destacaria na infância, como fator primordial, os relacionamentos positivos, pois somos
uma espécie social, onde aprendemos a ter as primeiras crenças a respeito de nós mesmos,
dos outros e do futuro influenciados pela maneira como fomos gerados e criados pelos
nossos cuidadores. Quanto mais emoções positivas vivenciarmos nesta fase, mais
propensos seremos a viver o bem-estar.
Figura Bem-Estar Positivo de Martin Seligman (2011).
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O Bem-Estar de Martin Seligman (2011) :

Sentido da Vida

Realização
Positiva

Emoções
Positivas

Engajamento
Social

Relacionamentos
Humanos Virtuosos

Foco: Presente-Futuro.

Presente
Referência: Passado.

Criação gráfica: Graça Razera (2017).

A proposta do bem-estar de Martin Seligman (2011) depende de cinco


fatores indissociáveis: relacionamentos positivos, emoções positivas, sentido da
vida, realização positiva e engajamento social. Faltando um destes cinco fatores,
o bem-estar estará deficitário.
Somos uma espécie social. Dependemos uns dos outros para sermos
quem somos. Não há como ser feliz sozinho, isoladamente. Por isso, para mim,
a semente do bem-estar é o relacionamento positivo, seja através da modelação
(aprendizagem social) seja como reforço positivo retro-alimentador do que se
internalizou de positivo na infância. As primeiras impressões humanas, a partir
da convivência com os primeiros cuidadores (mãe, pai, avós), é norteador do
padrão pelo qual cada pessoa selecionará os demais seres humanos essenciais
ao seu bem-estar ao longo da vida (amigos da escola, colegas de trabalho,
vizinhos, professores, mentores, escritores, pensadores e principalmente os
relacionamentos afetivos maritais mais duradouros).

Fonte: Razera (2017).


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Com o objetivo de descobrir meios eficazes para a saúde mental, Seligman


fez ressurgir a Psicologia Positiva, ao assumir em 1998, quando presidiu a Associação
Americana de Psicologia (APA). Em função disso, descobriu que havia mais pesquisas
científicas para a depressão que para a felicidade, então passou a pesquisar a felicidade
com vários pesquisadores ao redor do mundo (SELIGMAN, 2009). Desta união, surgiu
o primeiro tratado de virtudes humanas do mundo, em parceria com Christopher Peterson,
intitulado: Character Strengths and Virtudes: a handbook and classification(VIA,
2004). Este tratado complementa os tratados de doenças mentais, publicados
respectivamente pela Associação Americana de Psiquiatria (APA) e Organização
Mundial da Saúde (OMS) que são o CID (1990) e o DSM-5 (2013). Desde modo, a
Psicologia Positiva, proposta por A. Maslow na década de 50, ressurge sob sólidas bases
científicas, ao final da década de 90 (SNYDER & LOPEZ, 2009; PORTELLA, 2014,
SELIGMANN, 2011).

A psicologia positiva está alicerçada em evidências


científicas de sua eficácia. Utiliza métodos testados e
comprovados de avaliação, experimentação, pesquisas
longitudinais e estudos com distribuições aleatórias,
controladas com placebo, para avaliar quais intervenções
efetivamente (são) funcionais e quais são fajutas
(SELIGMAN, 2011, p. 83).

Os pesquisadores da psicologia positiva são enfáticos em ressaltar que o VIA


não exclui, nem ignora os tratados dos transtornos psiquiátricos, como o DSM-5 e o CID-
X. Sobre isso, é oportuno informar também que Seligman afirma ser importante, antes de
haver uma aplicação do inventário das virtudes, avaliar a presença de sintomas
depressivos, para depois explicar à paciente que a ausência de bem-estar é um agravante
dos quadros de depressão (SELIGMAN, 2011).
Não é recomendável aplicar o VIA em pacientes com sintomas ativados de
ansiedade e depressão, pois isso predispõem à distorção cognitiva em subvalorizar as
qualidades e maximizar catastroficamente as vulnerabilidades. Por isso, a Psicologia
Positiva é indicada somente para pessoas com as emoções mais neutralizadas
(PORTELLA, 2014).
Havendo uma considerável neutralização dos sintomas disfuncionais, é
preciso reocupar este espaço com ações que promovam o bem-estar, para que os
resultados sejam duradouros e a paciente não se torne dependente do terapeuta. Isto não
significa de modo algum negar a necessidade de haver uma intervenção que promova o
reajustamento da paciente. A ideia é apenas haver uma complementação psicoprofilática
na fase final do tratamento da BN.
Portanto, a Psicologia Positiva complementa a terapia cognitivo-
comportamental, referente à prevenção de recaídas, cujo foco é a princípio descobrir as
principais virtudes e forças de caráter de cada paciente, corroborando para a diminuição
da probabilidade da reincidência dos episódios de compulsão alimentar, ou a mais rápida
recuperação da mesma, após cada episódio, já que a reincidência é muito comum.
A sugestão em utilizar a Psicologia Positiva é complementar ao tratamento
psicoterápico na fase da prevenção de recaídas, através da aplicação do inventário das
virtudes, para conscientizar a paciente da importância do bem-estar para manter a sua
autoestima, ancorando o foco no presente-futuro através da teoria do bem-estar positivo,
que, a longo prazo, otimizará a remissão dos sintomas bulímicos.
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Neste sentido, para Sydney e Lopez (2009, p.168), pessoas com baixa
autoeficácia costumam estar concomitantemente com sintomas depressivos, além de
sintomas de ansiedade, sugerindo que manter estratégias que mantenham a autoeficácia
elevada seja essencial para superar transtornos e abusos alimentares. É importante frisar
mais uma vez que a paciente bulímica é egodistônica, pois uma característica é não aceitar
sua conduta, havendo um sofrimento psicológico intenso e agudo, que propicia sintomas
da depressão (visão negativa de si, do outro e do futuro) e ansiedade (crenças
catastróficas). Não se trata de uma simples vaidade juvenil, mas de algo muito mais
profundo: trata-se de uma identidade social.
Uma vez que a paciente vivencia mais emoções positivas, se torna, como
provam as pesquisas, mais propensa a flexibilizar crenças disfuncionais e a produzir
soluções (SYDNEY; LOPEZ, 2009, p. 126). A psicoeducação sobre as emoções tanto
negativas quanto as positivas, estudadas por Paul Ekman (2011) e por Fredrickson (2009)
serviram-me de base didática, e como estratégia biblioterápica, no intuito de identificar e
controlar as emoções.

• Prevenção primária e prevenção secundária.

O processo de psicoprofilaxia na psicologia positiva é denominado por


prevenção primária, quando o problema não eclodiu, nem teve base para se estabelecer.
Pode ainda haver um traço difuso, mas se houver meios para a correção, há uma remissão
espontânea. Mas quando o problema de transtorno alimentar se instalou na vida da
paciente, mesmo após conseguir se recuperar apresentando uma remissão parcial ou total
dos sintomas, chama-se a este processo de prevenção secundária (PORTELLA, 2014,
p.45). No segundo caso, o desafio é a prevenção de recaída ou evitação da reincidência,
pois com o envelhecimento, a recuperação torna-se cada vez mais difícil tanto em
recursos físicos, como financeiros, familiares e sociais.
A aplicação do inventário das virtudes humanas (PETERSON; SELIGMAN,
2004, SELIGMAN, 2009, SELIGMAN, 2011), pode ser um importante elemento de
persuasão para que a paciente se convença de que, apesar das vulnerabilidades e
aprendizagens disfuncionais do passado, também possui qualidades. E uma vez que
aprenda a cultivar suas virtudes, a probabilidade de reincidência da Bulimia Nervosa
tenderá a ser menor e menos intensa, mesmo diante das frustrações naturais da vida. Desta
maneira, a paciente, além de aprender a controlar o mal-estar, aprenderá a ter uma visão
menos catastrófica de si, através do bem-estar positivo.
Neste estágio, a prevenção não seria apenas secundária, ou seja, após a
doença ter se instalado e estar em fase de remissão parcial ou total, mas de certa maneira
há concomitantemente também a profilaxia de outros males subsequentes, por exemplo:
a evitação da migração para a anorexia nervosa (AN) ou transtorno de compulsão
alimentar (TCAP).
Sobre isso, vale destacar que Portella, apoiando-se no conceito de
autoeficácia, na proposta pragmática sobre o otimismo proposta por Seligman (2004) e
na teoria da esperança de Cheavens (apud SELIGMAN, 2011, p, 52) afirma que: “quando
a psicoterapia é bem-sucedida, ela pode produzir a prevenção primária ao reduzir ou
prevenir a recorrência do mesmo problema ou problemas semelhantes no futuro” (2014,
p. 48).
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• Inventário das virtudes (VIA).

O VIA é resultado de um estudo que abarcou cerca de 3 mil anos de história


humana em todos os países, sendo portanto fruto de um estudo transcultural no âmbito da
Filosofia, Ciência e Religião, em 220 países, que desde final da década de 90, reúnem
esforços para aprimorar as pesquisas sobre as virtudes humanas. As virtudes, enquanto
processos e mecanismos psicológicos, como definem Sydney e Lopes (2009, p. 65), são
organizadas em seis virtudes, que somam o total de 24 qualidades. Logo, cada uma das
seis (6) virtudes é composta mais de uma forças de caráter, de um universo de vinte e
quatro pesquisadas, que são os sustentáculos ou pilares de cada virtude (PETERSON;
SELIGMAN, 2004; SELIGMAN, 2009; SELIGMAN, 2011; PORTELLA, 2014,
PORTELLA, 2015).
O Inventário de Virtudes, detalhado no tratado de sanidades
intitulado Character Strengths and Virtues (VIA), ou VIA Handbook (2004), pode ser
realizado gratuitamente pela internet, através do
site http://www.viacharacter.org/www/Positive-Psychology, cujo tempo estimado de
preenchimento é de 30 minutos. Por ser autoexplicativo, o resultado sai no mesmo
instante após responder a última pergunta. São 120 questões (SELIGMAN, 2011).
É importante delinear a diferença entre talento, virtude e força de caráter,
sendo este um parâmetro imprescindível para que a paciente tenha condições de elaborar,
manter e criar estratégias mais adaptativas de enfrentamento ao longo da sua vida, após
o término do tratamento.

Característica marcante do VIA-IS é a diferença entre


talentos, virtudes e forças de caráter. Os talentos são inatos,
desde o nascimento e, portanto não podem ser desenvolvidos
enquanto as virtudes e a força de caráter podem ser
aprimoradas a partir do estado em que se encontram. O único
requisito é a vontade. (OLIVEIRA; NASCIMENTO;
PORTELLA, 2015, p. 20).

A partir desta discriminação inicial, a paciente pode ser estimulada a trazer


evidências de talentos e forças de caráter, alinhadas com os objetivos de auto-realização.
A segunda etapa é averiguar quais forças de caráter gostaria de desenvolver ou de manter.
Neste momento, apresenta-se o VIA, com o intuito de descobrir as cinco forças de caráter
mais valentes (01 a 05) e compará-las com as cinco forças menos valentes (19 a 24), ou
seja, as forças menos treinadas. É sugerido que a pessoa realize o teste pelo menos uma
vez por ano (SELIGMAN, 2011).
Na minha experiência clínica, auxiliei cada cliente a preencher os dados no
site www.viame.org, lendo cada pergunta, pausadamente. Esta conduta de parceria está
de acordo com os princípios da psicologia positiva, referente à qualidade de vinculação
psicoterapêutica entre o terapeuta e o cliente, ou seja, baseada “no acolhimento, empatia,
confiança, sinceridade e relacionamento profissional”, em que Seligman (2011, p.52)
afirma que “esses princípios permitem o ajuste de técnicas às necessidades individuais
dos clientes (...)”.
Pela minha experiência clínica, fazendo o preenchimento junto com a
paciente, em uma sessão pré-agendada somente para esta finalidade, percebi que
geralmente a queixa inicial ou o objetivo a ser conquistado dependia do treinamento de
alguma força menos treinadas, dentre alguma das ultimas cinco forças (19 a 24). A partir
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de então, a paciente leva consigo o desafio de a cada ano, ou sempre que quiser, refazer
seu VIA sozinha.
De acordo com Seligman (2011, p.49): “1.8 milhões de pessoas já se
registraram no site e fizeram os testes. Entre quinhentas a 1.500 novas pessoas se
registram todos os dias”. O terceiro momento será então discorrer sobre uma listagem de
novos comportamentos mantenedores ou comportamentos profiláticos, aliado ao objetivo
prioritário da paciente.

Pode-se escolher o que aperfeiçoar (a pessoa decide se quer


ou não aperfeiçoar uma determinada força), quando será
utilizada (momento de utilização) e como será aperfeiçoada.
Qualquer pessoa relativamente saudável pode adquirir as
forças, desde que haja tempo, esforço e determinação
(OLIVEIRA; NASCIMENTO; PORTELLA, 2015, p. 20).

Diferente dos talentos (aptidões inatas), das habilidades (treinamento), as forças


de caráter (matéria-prima das virtudes) são mais profundas, embora também passem pela
aprendizagem. De acordo com as orientações do VIA ou Manual de
Sanidades (PETERSON; SELIGMAN, 2004), dez exigências devem ser satisfeitas para
que uma determinada qualidade seja considerada de fato uma força de caráter. Em
primeiro lugar, a qualidade deve obrigatoriamente contribuir para o bem-viver
concomitantemente de si e do outro, estando coerente com os princípios mais éticos de
uma determinada cultura local, com reflexos positivos diretos e indiretos para a
comunidade local e à sociedade. Logo, é importante destacar também que a exaltação da
força de uma pessoa jamais diminui outra pessoa, grupo ou comunidade. Outro fator
importante, é que a força de caráter precisa estar presente de modo coerente não apenas
em palavras, mas ao longo do percurso biográfico da pessoa (OLIVEIRA;
NASCIMENTO; PORTELLA, 2015).
As forças de caráter são da primeira à última instância qualidades individuais,
presentes ao longo da linha de tempo, ou ciclo vital da Paciente, contendo consequências
positivas para si, para os outros (família) e para a sociedade (comunidade). Neste sentido,
investir no bem-estar positivo de um único indivíduo significa a médio e longo prazo
contribuir para o progresso da sociedade e vice-versa, numa retroalimentação bilateral:
indivíduo e sociedade, sociedade e indivíduo. Logo, a teoria do bem-estar positivo é
sistêmica, ou seja, não dissocia o indivíduo de seu contexto sóciocultural, tendo a
sociedade como um fim em si, e ao mesmo tempo, a fonte mantenedora do bem-estar
individual, através de um senso comunitário.

A sociedade maior deve prover instituições e rituais


associados para cultivar a força ou virtude e sustentar suas
práticas.

A cultura incentiva e oferece suporte às forças por meio de


instituições, rituais, modelos parábolas, máximas e histórias
infantis. As instituições e os rituais funcionam como ensaios
que permitem às crianças e adolescentes praticar e
desenvolver forças (qualidades) em um lugar seguro com
orientação explícita. (OLIVEIRA; NASCIMENTO;
PORTELLA, 2015, p. 21-22).
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Neste sentido, é importante que o terapeuta cognitivo conheça grupo de apoio


locais, como por exemplo, grupos que contribuam com a reeducação alimentar, da
produção à manufatura de alimentos, por exemplo, caso o talento seja para a culinária; ou
buscar centros de atividade física comunitária nas escolas e parques com professores de
educação física voluntários para idosos ou crianças em vulnerabilidade sociais, para
aquelas que se mostram mais propensas à hiperatividade psicomotora e ansiedade; bem
como atividades de terapias ocupacionais por exemplo presentes em instituições sociais
e religiosas para as pacientes com maior propensão à sintomas depressivos e para as que
tendem a se isolarem em suas casas.
A metáfora com as qualidades humanas é que – assim como as
psicopatologias são em potencial contagiantes e alimentadoras de ciclos viciosos – as
virtudes desencadeiam ciclos virtuosos por meio de ações positivas para consigo próprio,
o que se reflete positivamente no meio social, a partir de um novo modelo gerador de
padrões de comportamentos funcionais. Por isso que o bem-estar positivo, proposto por
Seligman (2011), contempla necessariamente o engajamento social, ou seja, o
compartilhamento de ações positivas em uma comunidade.
Os pesquisadores da Psicologia Positiva partiram da premissa de que a
quantidade de pessoas saudáveis no mundo é muito maior do que o percentual de pessoas
mentalmente comprometidas. E este enorme contingente formada por pessoas saudáveis,
estava sendo negligenciado no campo da psicologia até o final do século passado, em
função das graves consequências advindas da 2 Guerra Mundial. Recentemente, o
a

interesse pelo bem-estar vem aumentando. Por isso, o tratado VIA Handbook (2004) é um
primeiro esforço científico para a padronização da linguagem técnica sobre as principais
qualidades humanas no campo da saúde mental. As qualidades humanas ou forças de
caráter são mensuráveis e podem ser aprendidas a partir de um processo de reeducação.
Logo, o bem-estar positivo pode ser aprendido, e se pode ser aprendido, também pode ser
ensinado (SELIGMAN, 2009, SELIGMAN, 2011, PORTELLA, 2014).
O desafio da fase da prevenção de recaídas passa a ser reforçar as estratégias de
sucesso aplicadas durante o tratamento, mas focando nas forças de caráter menos
treinadas, estando ciente das forças de caráter mais fortes, ou seja, mais treinadas. Desta
maneira, além de descobrir suas maiores forças, o desafio pode ser, melhorar as forças
menos treinadas que sejam pertinentes ao seu objetivo maior (SELIGMAN, 2011, p.51).
A partir da elaboração do VIA, a ênfase é a ação, em que são apresentadas uma
série de técnicas pragmáticas, com o intuito de estimular a predominância de
comportamentos virtuosos. Por exemplo: o diário de positividade, em que a paciente
registra todas as noites por uma semana, três ocorrências positivas vivenciadas durante o
dia (SELIGMAN, 2011; PORTELLA, 2013; PORTELLA, 2014; PORTELLA, 2015).
Após a aplicação de cada prática, Seligman (2011, p.51) sugere ao terapeuta faça
as seguintes considerações: “- Como você se sentiu antes, durante e depois de fazer a
atividade? A atividade foi desafiadora? Fácil? O tempo passou rápido? Você perdeu a
consciência de si mesmo? Pretende repetir o exercício?”; e complementa através da auto-
exposição, que:

Estes exercícios de psicologia positiva funcionaram comigo,


funcionaram com a minha família, funcionaram com meus
alunos, foram ensinados a profissionais e funcionaram com os
clientes deles – mesmo os mais deprimidos. E os exercícios
funcionaram até no estudo aleatório controlado por placebo
(SELIGMAN, 2011, p.51).
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Como vimos anteriormente, no caso de pacientes que sofrem


de bulimia nervosa, a autoestima está diretamente relacionada com a tenacidade ou
persistência no processo de mudança de hábitos alimentares, logo ligada à sua
assertividade, assim como potencial de resiliência ou resistência ao stress. Ensinar a
paciente a descobrir suas virtudes, criando estratégias para manter a sua positividade,
podendo inclusive potencializá-las, é benéfico para que os resultados alcançados com a
psicoterapia sejam mais duradouros.
Como afirma Portella (2014, p.87), “a força (de caráter) comumente produz
estados emocionais e emoções positivas em quem a exerce, como por exemplo,
felicidade, orgulho, satisfação, alegria, bem-estar, harmonia, paz, calma”. No caso da
pessoa com sintomas bulímicos, a autoestima sendo baixa, o superávit de emoção positiva
estimulará seu bem-estar. O que pode sem dúvida deixá-la menos vulnerável aos
episódios de compulsão alimentar mediante situações estressantes. Se a mesma estiver
mais segura de si, ciente de suas qualidades, se tornará mais resiliente e imune
psicologicamente. Por isso, é imprescindível que conheça as suas principais virtudes.
A utilização do VIA pode então estimular a pessoa bulímica primeiro a iniciar
os ciclos virtuosos, evidenciados pela terapia cognitivo-comportamental, bem como a
mantê-los com maior consciência para no futuro até potencializá-los. Uma vez que o ideal
da terapia cognitivo-comportamental é que o paciente/cliente se torne independente da
terapia no tempo mais breve possível.
Neste sentido, ao adotar uma visão mais realista das situações, se torna mais
flexível e apta para resolver seus problemas assertivamente. Deste modo, ultrapassa-se a
fase da prevenção primária e secundária, e alcança-se o nível da saúde, que é a
potencialização dos ganhos com a terapia.

Em comparação com a potencialização primária – na qual a


pessoa busca um desempenho ótimo e uma satisfação por
meio da busca de objetivos -, na potencialização secundária o
objetivo é aumentar os níveis já positivos para chegar ao
máximo em termos de desempenho e satisfação (SYDNEY;
LOPEZ, 2009, p. 330).

Por fim, vale relembrar que a ausência de doença ainda não significa bem-
estar, de acordo com a Organização Mundial da Saúde. Para que haja realmente o bem-
estar, é necessário conhecer além de suas vulnerabilidades, as suas forças de carácter.
Assim sendo, a próxima etapa, de acordo com a Psicologia Positiva, é a da
potencialização das virtudes e consequentemente da qualidade de vida (PORTELLA,
2013).

As prevenções primárias e secundárias implicam esforços


para garantir que os resultados negativos não aconteçam, ao
passo que as potencializações primárias e secundárias
refletem iniciativas para garantir que os resultados positivos
aconteçam. Libertas de seus problemas por meio de
prevenções primárias e secundárias, as pessoas podem dar
atenção a potencializações primárias e secundárias com vistas
a atingir experiências e satisfação na vida em níveis ótimos
ou até mesmo de pico (SYDNEY; LOPEZ, 2009, p.333-334).
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A paciente no controle da bulimia nervosa, e não apenas resistindo aos


principais sintomas, estaria realmente apta para manter sua saúde por mais tempo,
aprendendo a retomá-la após recaídas, podendo até potencializar seu bem-estar.

Conclusão:
No caso em especial da BN, reforçar o bem-estar positivo é uma necessidade
essencial para a remissão total dos sintomas bulímicos. Logo, todo esforço para que a
autoestima se mantenha em um nível minimamente saudável é essencial para que
continue, após o término do tratamento, motivada a manter seus hábitos alimentares
funcionais e adaptativos. Por isso, a realização anual do Inventário das Virtudes (VIA) é
providencial. Pois assim terá “ferramentas cognitivas” para se manter mais saudável por
mais tempo, reforçando sua própria autoestima, ao focalizar seu bem-estar através da
autoconsciência plena de suas principais virtudes.
Desde modo, a tendência é haver uma manutenção mais duradoura dos
ganhos obtidos com o tratamento psicoterapêutico. A aplicação do Inventário das
Virtudes pode auxiliar na fase de prevenção de recaídas, fase final da terapia cognitivo-
comportamental.
Concomitantemente, é necessário alertar sobre o risco de hipervalorizar a
sensação de perda e de automenosprezo após uma recaída, por serem os principais
gatilhos para a auto-recompensa através da hiperfagia. Por outro lado, às vezes convém
aceitar as perdas. Há perdas que geram ganhos. Por exemplo, a perda de massa gorda
otimiza o ganho em qualidade de vida.
Diante do exposto, é importante que a equipe multidisciplinar, por meio de
uma postura empática, não necessariamente complacente, seja treinada para focar nos
pontos positivos de cada mudança na rotina alimentar de cada paciente, sem julgamentos,
mas com um acolhimento mais humanizado, componho o universo de instituições
positivas.

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Contato:

Me. Maria das Graças Razera
Psicóloga Positiva | UFRJ | 2000
CRP 08/09793

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