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A PRODUÇÃO DO HABITAR: POLÍTICAS PÚBLICAS – O ESTATUTO

DA CIDADE E SEUS INSTRUMENTOS


PLANO DIRETOR DE ORDENAMENTO TERRITORIAL (PDOT): A
BUSCA POR UMA NOVA FORMA DE PENSAR TERESINA, PI

PESSOA, THISCIANNE (1); MARQUES, RÔMULO (2); CARDOSO, J. (3); JACOB,


CONSTANCE (4).

1. Prefeitura Municipal de Teresina. Secretaria Municipal de Planejamento e Coordenação


E-mail: thisciannempessoa@gmail.com

2. Prefeitura Municipal de Teresina. Superintendência de Desenvolvimento Urbano Centro Norte


E-mail: mr.romulomarques@gmail.com

3. Prefeitura Municipal de Teresina. Secretaria Municipal de Planejamento e Coordenação


E-mail: jwellenn@gmail.com

4. Prefeitura Municipal de Teresina. Superintendência de Desenvolvimento Urbano Centro Norte


E-mail: consjacob@gmail.com

RESUMO
Este artigo tem como objetivo narrar o processo de elaboração do Plano Diretor de Ordenamento
Territorial de Teresina, PI (PDOT), que se encontra em fase final de concepção na Secretaria Municipal
de Planejamento e Coordenação da Prefeitura Municipal de Teresina (SEMPLAN/PMT). Na iminência
do envio à Câmara Municipal de Teresina, do projeto de lei que instituirá o PDOT, pretendeu-se registrar
as intenções iniciais do Estado, a forma de participação da sociedade e as intervenções do setor
privado no processo de elaboração do instrumento que ordenará a cidade nos próximos dez anos. O
novo plano diretor proposto pelo Poder Executivo Municipal traz disposições que auxiliarão o alcance
das metas previstas tanto na Agenda 2030, quanto na Nova Agenda Urbana.

Palavras-chave: plano diretor; DOTS; Teresina

Fórum HABITAR 2019: Habitação e Desenvolvimento Sustentável


Belo Horizonte/MG de 08 a 11/10/2019.
1. Introdução

Este artigo tem como objetivo narrar o processo de elaboração do Plano Diretor de
Ordenamento Territorial de Teresina, PI (PDOT), que se encontra em fase final de concepção
na Secretaria Municipal de Planejamento e Coordenação da Prefeitura Municipal de Teresina
(SEMPLAN/PMT).

O processo foi iniciado em 2016, ano no qual o plano diretor vigente, instituído em 2006,
haveria de ser revisado. Enquanto este é caracterizado, sobretudo, pela preponderância do
caráter normativo, o PDOT foi proposto de forma a contemplar não somente institutos
jurídicos, tributários e financeiros; mas, também, estratégicos: a cidade deverá ser gerida e
construída sob os princípios da coordenação, compactação e conexão.

A novidade estratégica que se pretende implementar no município é o Desenvolvimento


Orientado pelo Transporte Sustentável (DOTS). Para tanto, a concepção do PDOT, nesse
aspecto, foi condicionada a outro instrumento de planejamento já existente na cidade: o Plano
Diretor de Transportes e Mobilidade Urbana de Teresina (PDTMU), publicado em 2008, que
alterou a forma de funcionamento do sistema de transporte público coletivo do município.

O PDTMU incorporou na cidade o sistema de BRT (Transporte Rápido por Ônibus),


estruturado a partir de terminais de integração, corredores e faixas exclusivas para circulação
de veículos do transporte público coletivo municipal. O PDOT pretende reconhecer as
centralidades urbanas existentes e criar novas por meio do desenvolvimento sustentável dos
corredores e dos entornos dos terminais, isto é, a partir do Modelo DOTS.

Para viabilização do Modelo DOTS, o PDOT pretende alterar um conjunto de parâmetros


urbanísticos, principalmente, os índices de aproveitamento das zonas, inicialmente proposto
para ser único igual a 1 em toda a cidade. Tal fato desencadeou uma série de manifestações
emanadas do setor privado, que por ser um dos principais agentes produtores do espaço,
conseguiu provocar mudanças em algumas estratégias do PDOT aplicáveis à justa
distribuição dos ônus e benefícios decorrentes da urbanização territorial.

Na iminência do envio à Câmara Municipal de Teresina, do projeto de lei que instituirá o


PDOT, pretendeu-se registrar neste artigo, as intenções iniciais do Estado, a forma de
participação da sociedade e as intervenções do setor privado no processo de elaboração do
instrumento que ordenará a cidade nos próximos dez anos.
2. Habitat humano: pontos de mutação

O mundo testemunhou, da segunda metade do século passado para as primeiras deste, as


maiores taxas de crescimento da população humana já registradas: em 60 anos, houve um
incremento populacional estimado em 4.094.362.000 habitantes. Segundo o Perspectivas
Mundiais de População 2019: Destaques, relatório publicado pelas Nações Unidas em
meados de 2019, estima-se que a população mundial atinja, em 2020, 7.794.799.000
habitantes. Seguindo a mesma lógica, o número de habitantes do Brasil também cresceu: no
ano de 1970 foi estimado em 95.113.000, saltou para 143.628.000 em 1988, manteve o
crescimento em 2001 (177.196.000), em 2015 era de 204.472.000, e, por fim, estima-se que
em 2020 atinja 212.559.000 habitantes (ONU, 2019).

Outra peculiaridade deste período foi a mudança da natureza do habitat humano: as


sociedades migraram, em massa, do campo para a cidade, tornando os assentamentos
humanos predominantemente urbanos. Na década de 1970, a zona rural concentrava maior
número de habitantes (estima-se em 63,4% da população mundial). Em 1985 e 1990 esse
percentual diminuiu para 58,80% e 57%, respectivamente. Nos anos 2000, continuou em
queda, porém, no último ano do século XX ainda prevalecia a ocupação populacional rural,
cerca de 53,3%. O “ponto de mutação” somente veio ocorrer em 2010, quando 51,7% da
população mundial estava inserida na zona urbana (ONU, 2018).

Em 2015, ano de publicação da Agenda 2030, quando a população mundial já ultrapassara


os 7 bilhões de habitantes, 53,90% desse total encontravam-se nas áreas urbanizadas. No
ano de 2018, em números absolutos, 4.219.817.000 de pessoas residiam em cidades,
enquanto 3.413.002.000 residiam no campo, isto é, a população urbana continuou a crescer,
atingindo 55,30%. Conforme o relatório “Perspectivas da Urbanização Mundial: Revisão
2018”, também publicado pelas Nações Unidas, estima-se que em 2020, 56,2% da população
mundial seja urbana e, em 2050, aumente para 68,40% (ONU, 2018).

O “ponto de mutação” do Brasil ocorreu ainda no século XX, no ano de 1965, quando já
detinha 51% de sua população residindo em cidades. Em 1970, quando o mundo, na escala
global, ainda era preponderantemente rural, os quase 4 mil municípios brasileiros já
abrigavam em suas sedes 55,90% da população nacional. Entre 1985 e 1990 este percentual
saltou de 69,90% para 73,90%. Nos anos 2000, o Brasil já era um país massivamente urbano,
com cerca de 81,20% de sua população assentados em cidades. Em 2015, esse percentual
seguiu aumentando, atingindo os 85,80%. No ano de 2018, em números absolutos,
182.546.000 habitavam na zona urbana, ao passo que apenas 28.321.000 habitavam na zona
rural, ou seja, 86,60% da população total concentravam-se nas cidades. A perspectiva é que
em 2020 e em 2050, esse percentual amplie-se para 87,10% e 92,40%, respectivamente
(ONU, 2018).

Posto que sejamos entendidos como seres vivos racionais, algumas manifestações de nossa
natureza animal não conseguem ser facilmente suprimidas, como a agressão, instinto que,
associado às condições ambientais, resulta em conflitos inter e intraespecíficos. Essa
característica humana, teorizada incialmente por Konrad Lorenz, quando na esfera
intraespecífica, pode ser muito bem observada nos conflitos ora originados, ora ampliados,
pela massiva concentração de habitantes nas cidades, que, por sua vez, demandaram a
criação de agendas e estatutos para ordenar as relações ecológicas, sobretudo, no final do
século XX e no início do XXI.

3. A agenda urbana do século XXI

Dando continuidade aos trabalhos iniciados no final do século XX, onde destacam-se as
conferências Eco-92 e Habitat II, ambas realizadas pelas Nações Unidades em 1992 e em
1996, respectivamente, os representantes de 191 países reuniram-se em setembro de 2000
para aprovarem a Declaração do Milênio das Nações Unidas, um pacto estruturado em 8
objetivos de desenvolvimento do milênio, sendo eles: a erradicação da pobreza extrema e a
fome, o alcance do ensino primário universal, a promoção da igualdade de gênero, a redução
da mortalidade infantil, a melhoria da saúde materna, o combate ao HIV/AINDS, à malária e
a outras doenças, a garantia da sustentabilidade ambiental e a celebração de uma parceria
global para o desenvolvimento (ONU, 2000).

Findado o prazo para cumprimento desta agenda, em 2015, um novo instrumento foi criado,
a Agenda 2030, que ampliou o leque de objetivos nos campos econômico, social e ambiental.
Os 17 Objetivos de Desenvolvimento Sustentável (ODS) foram definidos para serem
implementados pelos governos, organizações internacionais, setor empresarial, outros
setores não estatais e pelos indivíduos. Trata-se, pois, de um pacto global que envolve e
responsabiliza todos os agentes sociais (ONU, 2015).

A Agenda 2030, expressamente, passou a reconhecer o desenvolvimento urbano e a gestão


sustentáveis como fundamentais para a qualidade de vida e para a justiça social. Para tanto,
quatro dos seus objetivos foram dedicados especialmente para orientar tal planejamento:
assegurar a disponibilidade e gestão sustentável da água e o saneamento básico para todos;
promover o crescimento econômico sustentado, inclusivo e sustentável, emprego pleno e
produtivo e trabalho decente para todos; tonar as cidades e os assentamentos humanos
inclusivos, seguros, resilientes e sustentáveis; e tomar medidas urgentes para combater a
mudança do clima e os seus impactos (ONU, 2015).

Em 2016, novamente as Nações Unidas reuniram-se na Conferência sobre Habitação e


Desenvolvimento Urbano Sustentável (Habitat III), para assumirem o compromisso de
adotarem a Nova Agenda Urbana (NAU), que propõe a:

promoção de um planejamento urbano e territorial que garanta o uso sustentável do


solo e dos recursos naturais ao pedir por cidades compactas, policêntricas, com
densidade e conectividade apropriadas e controle da dispersão urbana. [...] a
integração dos planos de mobilidade no planejamento urbano das cidades e [...] a
priorização do transporte ativo sobre o transporte motorizado, e ao Desenvolvimento
Orientado pelo Transporte Sustentável (DOTS), que minimiza os deslocamentos – em
particular dos mais pobres – e possibilita custos mais acessíveis. O planejamento da
mobilidade urbana sustentável deve promover segurança e acessibilidade responsivo
a questões de gênero e de idade, promovendo sistemas eficientes para passageiros
e mercadorias que ligam pessoas, lugares e oportunidades econômicas (TANSCHEIT,
2016).

A NAU prever que cidades e aglomerados urbanos devem exercer a função social; serem
participativos; cumpram os desafios e oportunidades do presente e do futuro; exerçam
funções territoriais para além dos limites administrativos; promovam investimentos para a
mobilidade sustentável, segura e acessível, que efetivamente conectem as pessoas com a
cidade; adotem e implementem a redução e gestão do risco de catástrofes; e protejam,
conservem, restaurem e promovam os ecossistemas e a biodiversidade, assim como mudem
os padrões de consumo e produção (ONU, 2016).

O Brasil, pioneiramente, já abrira o século XXI com a instituição do que viria a tonar-se uma
das maiores referências internacionais de ordenamento jurídico-urbanístico: a Lei Nº 10.257,
de 10 de julho de 2001 – o Estatuto da Cidade. Esta lei “estabelece normas de ordem pública
e interesse social que regulam o uso da propriedade urbana em prol do bem coletivo, da
segurança e do bem-estar dos cidadãos, bem como do equilíbrio ambiental” (BRASIL, 2001).

O Estatuto da Cidade normatiza e estabelece instrumentos da política urbana que visam, em


suma, o direito à moradia e à participação popular. Ao longo dos anos, a Lei 10.257/2001 foi
submetida a sucessivas alterações, onde observa-se uma tentativa de aperfeiçoamento e
reconhecimento, pelo arcabouço jurídico, dos objetivos previstos nas cartas de planejamento
urbano globais elaboradas pelas Nações Unidas.
4. Teresina, a cidade que temos
Teresina, capital do Estado do Piauí, está localizada na porção Centro-Norte do Estado e
ocupa 0,55% do território estadual (SEMPLAN, 2015). O Município possui área de 1.392km²
e desta apenas 264,12km² correspondem ao território urbano (Figura 01). De acordo com o
Censo realizado pelo Instituto de Geografia e Estatística – IBGE, em 2010, a população total
do município era de 814.230 pessoas, das quais 96,26% ocupavam o território urbano. Dessa
forma, tem-se, em Teresina, 17% da sua área (território urbano) ocupados por 96,26% de
sua população.

Figura 01: Localização de Teresina e Delimitação da Zona Rural e Urbana.


Fonte: LIMA; LOPES; FAÇANHA (2017) apud PESSOA (2019).

A relação entre área urbana e população urbana leva a crer que a capital piauiense possui
uma elevada densidade populacional, no entanto, comparando com outras capitais do
Nordeste, Teresina possui a menor densidade urbana, de 29,06 habitantes por hectare. A
cidade passou por um intenso crescimento demográfico desde a década de 1960 até a
atualidade, fato que pode ser explicitado pelos dados referentes ao crescimento
populacional: em 1960 a população total era de 142.691 habitantes e em 2010, a população
total era de 814.230 habitantes, ou seja, um incremento populacional de 617.539 habitantes
em 50 anos (SILVA, G., 2017). Façanha (1998) explica que a intensificação do crescimento
populacional se deve a consolidação de Teresina como principal cidade do Estado, não
apenas por sua função de sede administrativas, mas por atrair diversas atividades
importantes na conjuntura desenvolvimentista vivida pelo país nas décadas de 1950 e 1960.

O intenso crescimento populacional ocorrido a partir da década de 1960, ocasionou uma série
de alterações espaciais, grande parte financiada pelo Governo Federal, que fomentou no
município as seguintes políticas públicas: construção de vias, implantação do sistema de
abastecimento de água e rede coletora de esgoto, construção de rede de energia elétrica e
edificação de conjuntos habitacionais populares (MELO, 2009).

Dentre as políticas públicas acima listadas destaca-se a edificação de conjuntos habitacionais


como a principal responsável pela expansão do tecido urbano. Contudo, esse processo de
expansão ocorreu de forma desordenada, fato que fez com que esses conjuntos habitacionais
se apresentassem como verdadeiras cidades dormitórios, porquanto foram edificados em
locais apartados do tecido urbano consolidado, tornando-se essa a principal característica do
processo de urbanização de Teresina, o crescimento descontinuo do tecido urbano (MELO,
2009). A Figura 02 exemplifica essa realidade, nela pode-se visualizar o conjunto habitacional
Parque Piauí, construído na década de 1960, e os vazios urbanos do entorno.

Figura 02: Vista aérea do Conjunto Habitacional Parque Piauí, 1970.


Fonte: SEMPLAN apud MELO (2009).
No que tange a esse processo desordenado de ocupação do território urbano teresinense,
destaca-se que até a década de 2010, os terrenos localizados à margem do perímetro urbano
existente, na área rural, poderiam solicitar revisão do perímetro para serem incorporados à
área urbana, fomentando ainda mais o processo de expansão desenfreada do perímetro
urbano e, por consequência, o aumento do número de vazios urbanos. Somente em 2015, a
Prefeitura Municipal de Teresina (PMT) deu início ao processo de revisão das diversas leis
urbanísticas vigentes com o objetivo de propor um novo modelo de ordenamento territorial.

Dentre as leis municipais sancionadas naquele ano, destaca-se a Lei Municipal nº 4.831, de
26 de outubro de 2015, que dispõe sobre a delimitação da zona urbana de Teresina e dá
outras providências. A Lei Municipal nº 4.831/2015 foi sancionada com objetivo de delimitar e
fixar o perímetro urbano, buscando assim controlar o crescimento horizontal da cidade
(TERESINA, 2015). Todavia, é sabido que propor um novo modelo de ordenamento territorial
urbano vai muito além da simples delimitação e fixação do perímetro urbano, nesse sentido a
prefeitura iniciou o processo de revisão do plano diretor vigente, o Plano de Desenvolvimento
Sustentável – Teresina Agenda 2015 (TERESINA, 2006).

5. Teresina, a cidade que queremos

O processo revisão do plano diretor vigente teve início em 2016, dentro do prazo estabelecido
pela Lei Federal nº 10.257, de 10 de julho de 2001, que regulamenta os arts. 182 e 183 da
Constituição Federal, estabelece diretrizes gerais da política urbana e dá outras providências.
A revisão tem acontecido por meio de um processo participativo, que une a administração
pública direta e indireta e a sociedade civil.

No que concerne à participação da sociedade civil, ressalta-se que foram realizadas oficinas
temáticas, fóruns participativos, audiências públicas e levantamento de sugestões online. O
processo de levantamento de sugestões online foi feito, inicialmente, através do aplicativo
COLAB, mas diante das limitações de acesso democrático à plataforma do aplicativo foi criada
a Van Teresina Participativa, que circulou por diversos bairros coletando sugestões da
população para a revisão do plano direto. Após três anos de discussões, a PMT se prepara
para o envio da Minuta do Projeto de Lei do Plano Diretor de Ordenamento Territorial – PDOT
para a Câmara Municipal de Teresina.

O PDOT apresenta quatro pontos fundamentais norteadores da estratégia de ordenamento


territorial por ele proposto: a criação de um novo modelo de desenvolvimento sustentável; o
aproveitamento dos investimentos já realizados na cidade, promovendo a união entre a
política de mobilidade urbana e a de ordenamento territorial; o estabelecimento de uma nova
organização da expansão do mercado imobiliário; e a construção de uma cidade para as
pessoas.

Na busca da implementação efetiva das estratégias propostas no PDOT, propõe-se uma


estrutura para o plano diretor que diverge da estrutura do plano diretor vigente. O plano
Teresina Agenda 2015 apresenta diversos princípios e diretrizes sem estabelecer uma relação
direta com as normas urbanísticas municipais vigentes. Tal fato fez com que poucas das
diretrizes propostas fossem implementadas. O PDOT, com o objetivo de sanar essa
deficiência do Plano Teresina Agenda 2015, propõe uma estrutura baseada em três eixos
principais: as propostas e estratégias; o modelo territorial de ordenamento e os instrumentos.
Dessa forma ,o PDOT une em seu escopo os princípios, diretrizes e normativos urbanísticos
referentes ao ordenamento territorial.

Diante da Teresina distante, dispersa e desconectada, apresentada de forma breve no tópico


quatro do presente artigo, destaca-se as três principais propostas do PDOT para a construção
da Teresina compacta, coordenada e conectada. A primeira proposta é a implementação do
Modelo de Desenvolvimento Orientado ao Transporte Sustentável – DOTS. O DOTS é uma
estratégia de planejamento urbano que vincula o uso e a ocupação do solo aos sistemas de
mobilidade, buscando priorizar a transformação urbana junto aos principais eixos de
circulação (EVER; et al., 2018). O PDOT propõe a implementação do DOTS na Macrozona
de Desenvolvimento, macrozona com maior infraestrutura urbana e preferencial para o
adensamento populacional, sendo o este incentivado por meio de descontos no valor da
Outorga Onerosa do Direito de Construir – OODC.

Os descontos na OODC serão dados quando as seguintes características forem incorporadas


ao projeto proposto na Macrozona de Desenvolvimento: habitação, fachada ativa,
permeabilidade visual, uso âncora, uso misto e sustentabilidade ambiental. Cada uma dessas
característica promove de forma direta ou indireta os oito pontos essenciais do DOTS:
transporte coletivo; uso misto e edifícios eficientes; espaços públicos e recursos naturais;
centros de bairros e pisos térreos ativos; mobilidade não motorizada; gestão do uso do
automóvel; diversidade de renda; e adequadas densidades.

A segunda proposta é a implementação do índice de aproveitamento básico único em toda


área urbana. Atualmente, o índice de aproveitamento básico varia de acordo com a zona em
que o lote se encontra inserido, gerando uma valorização diferente para cada um dos lotes,
promovendo assim, uma situação de injustiça. Silva (1981, p.234) explica que:

Quando a legislação de uso e ocupação do solo fixa coeficientes variáveis,


como têm que ser, para os vários terrenos edificáveis, isso gera desigualdade
de tratamento entre os seus proprietários, porquanto os que podem construir
com coeficiente mais elevado têm seus terrenos mais valorizados. Com isso
o conteúdo econômico dos terrenos urbanos edificáveis varia também em
razão do volume possível de construção que neles pode ser implantado. Se
uma nova lei de uso do solo modificar a situação existente no interesse
mesmo da coletividade, trará, como conseqüência, a alteração da relação
econômica dos terrenos, gerando outros tantos tratamentos desiguais. Pois
bem, a fixação do coeficiente único iguala esta equação econômica.

Dessa forma, o PDOT propõe a implementação do índice básico único de 1,5. A escolha do
valor 1,5 ocorreu após diversas discussões com o setor da construção civil. De forma que foi
acordado a alteração do primeiro valor proposto, 1, para 1,5. Essa alteração tem como objetivo
principal evitar que a OODC seja cobrada para os pequenos construtores.

A terceira proposta refere-se à implementação dos instrumentos da política urbana previstos


na Lei Federal nº 10.257/2001. Dentre os diversos instrumentos do Estatuto da Cidade,
somente a OODC vem sendo aplicada de fato em Teresina. No entanto, sua aplicação não
está vinculada a uma estratégia de ordenamento territorial. O PDOT propõe uma revisão sobre
a forma de como a OODC é aplicada na área urbana do município e regulamenta os demais
instrumentos propostos pela Estatuto.

Com o objetivo de evidenciar a forma como esses instrumentos estão sendo usados para
fomentar a estratégia de ordenamento territorial, destaca-se a inter-relação estabelecida entre
o Parcelamento, Edificação e Utilização Compulsória – PEUC, o Imposto Predial e Urbano
Territorial Progressivo e a Outorga Onerosa do Direito de Construir. A aplicação do PEUC, e
quando couber do IPTU Progressivo, está previsto para acontecer, inicialmente, na
Macrozona de Desenvolvimento, área preferencial para adensamento definida no PDOT. Nos
casos em que houver a aplicação do IPTU Progressivo e chegar a acontecer a
desapropriação, os imóveis desapropriados serão demarcados como Zonas Especiais de
Interesse Social. Dessa forma, a PMT poderá utilizar a contrapartida da OOCD para promover
a função social da terra nos imóveis desapropriados.

6. Conclusão

O Poder Executivo Municipal de Teresina, que é signatário da Agenda 2030, segue o


entendimento da Nova Agenda Urbana, a qual o Brasil também é signatário: que os países
devem reorientar a forma de planejamento, dando protagonismo à elaboração da política
urbana aos governos locais, visto que são estes os mais próximos dos cidadãos.
Nesse sentido, a PMT iniciou em 2016 o processo de revisão do plano diretor da cidade,
marcado pela diversidade de formas de participação. Embora haja agentes sociais que não
concordem com tal assertiva, deve-se ressaltar que é função típica do Poder Executivo
apenas a governança administrativa e que a função atípica de legislar deve ser empregada
somente para regulamentação e propositura de leis. Ademais, compete à União legislar sobre
normas gerais de direito urbanístico. Dessa forma, caso haja um entendimento coletivo da
ineficácia dos instrumentos de participação social vigentes, cabe ao Poder Legislativo
promover tal aprimoramento.

Embora o Estatuto da Cidade esteja caminhando para os seus 20 anos de existência, é


somente agora que o ordenamento jurídico-urbanístico de Teresina passará a contemplar e a
regulamentar todos os instrumentos normativos e estratégicos previstos na Lei 10.257/2001.
O novo plano diretor proposto pelo Poder Executivo Municipal traz disposições que auxiliarão
no alcance das metas previstas tanto na Agenda 2030, quanto na Nova Agenda Urbana. Sua
aprovação, que caberá ao Poder Legislativo Municipal, é urgente para que se consiga mitigar
as consequências da urbanização insustentável, e necessária, para que se possa construir
uma cidade justa, resiliente e competitiva.

Referências Bibliográficas
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