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AUMENTO DA CAPACIDADE E VELOCIDADE DA LINHA DIRETA DO INTER 2

NO ÂMBITO DA POLÍTICA SETORIAL DE MOBILIDADE URBANA DA CIDADE


DE CURITIBA

(MIZUTA, Daniela¹; SENTONE, Daniel Tourinho¹; TEIXEIRA, Alcion José Viana¹; TIBONI, Priscila¹)

1 – Instituto de Pesquisa de Pesquisa e Planejamento Urbano de Curitiba

1 – INTRODUÇÃO

O conceito de Estado é deveras polissêmico, tendo seus significados


interdisciplinarmente derivados a partir de distintas perspectivas (política, sociológica,
constitucional, Código Civil brasileiro), as quais convergem a um mesmo ponto de
comum: poder político/autoridade e suas estruturas. No âmbito de organização
política, pode-se entender o Estado como o espaço natural onde justamente se
desenvolve esse poder (MATIAS-PEREIRA, 2018). Contudo, cabe ao Estado, dentro
de uma perspectiva democrática, como papel fundamental, a garantia do bem-estar,
segurança e justiça a todos os seus cidadãos (TCU, 2020). Portanto, é função do
Estado, através de seu poder constituído e estruturas, seja por meio de autoridade ou
força, assegurar a estrutura e ordem social necessária de forma a garantir essa
promoção do bem comum.

Governo é, portanto, um conjunto de instituições, estas compostas por


pessoas, as quais administram e exercem funções executivas no Estado no sentido
de promover a garantia de condução dos rumos da sociedade a qual representa. É o
governo, assim sendo, quem executa as políticas, garante o cumprimento de suas
decisões (seja por meio do poder legitimado ou através da força se necessário for) e
promove a segurança de seus cidadãos de forças internas ou externas (VEIGA-NETO,
2005).

Há que se distinguir, desta forma, a diferença fundamental entre governo e


governança. Esta, refere-se justamente a forma com a qual o governo instituído
cumpre suas funções exercendo seu poder na administração, planejamento,
formulação e implementação de políticas públicas (GONÇALVES, 2005). É a ação de
governar envolvendo processos (com suas inúmeras ferramentas) e atores distintos
os quais podem estar organizados em regiões ou objetos, dispostos pelos seus

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cidadãos através uma interface com o governo que os rege nos seus diferentes níveis
de arranjos.

É neste contexto que se pode definir então que políticas públicas versam sobre
o que e como um governo decide (positivamente) ou não (negativamente) fazer
através de suas atividades, agindo diretamente ou delegando, para promover efeitos
específicos na vida de seus cidadãos (SOUZA, 2006). Tem o papel fundamental de
resolução de problemas de um Estado, colocando em ação e/ou análise pelo governo
instituído, nos seus diversos âmbitos de atuação: econômico, social, político,
geográfico, de planejamento, gestão, entre outros.

O presente artigo, tem por objetivo analisar o projeto de aumento da


capacidade e velocidade da linha direta Inter 2 na perspectiva da política de
Mobilidade Urbana de Curitiba: suas origens, implicações, desdobramentos como
parte de uma política pública, suas relações com o cenário internacional de
deslocamento sustentável e políticas associadas.

2 – POLÍTICA INTERNACIONAL DE DESENVOLVIMENTO URBANO

A presença da Organização das Nações Unidas (ONU) em cada país varia de


acordo com as demandas apresentadas pelos respectivos governos diante da
Organização. No Brasil, o Sistema das Nações Unidas está representado por
agências especializadas, fundos e programas. Com o objetivo de contribuir para o
desenvolvimento humano sustentável, o crescimento do país e o combate à pobreza,
as Nações Unidas no Brasil têm a constante missão de alinhar seus serviços às
necessidades locais.

Em 2000, durante a Cúpula do Milênio das Nações Unidas, foram assinados 8


Objetivos do Milênio, um conjunto de medidas e metas elaborado no âmbito da
Organização das Nações Unidas (ONU) para promover um melhor desenvolvimento
das sociedades até o ano de 2015. Em 2012, durante o evento da ONU RIO+20,
estabeleceu-se mandato para que os Estados Membros da ONU construíssem
coletivamente o conjunto de objetivos e metas da Agenda 2030, ampliando a
experiência dos Objetivos do Milênio. Após isso, ainda em 2015 durante a 21ª
Conferência das Partes em Paris, um novo acordo foi assinado, do qual o Brasil é

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signatário, com o objetivo central de fortalecer a resposta global à ameaça da
mudança do clima e de reforçar a capacidade dos países para lidar com os impactos
decorrentes dessas mudanças.

A Agenda 2030 é um plano de ação global que reúne 17 objetivos de


desenvolvimento sustentável e 169 metas, criados para erradicar a pobreza e
promover vida digna a todos, dentro das condições que o nosso planeta oferece e
sem comprometer a qualidade de vida das próximas gerações. Dentre os 17 Objetivos
de desenvolvimento Sustentável, destaca-se o Objetivo 11, relativo diretamente à
gestão das cidades:

● Tornar as cidades e os assentamentos humanos inclusivos, seguros, resilientes


e sustentáveis
o 11.2 - Até 2030, proporcionar o acesso a sistemas de transporte
seguros, acessíveis, sustentáveis e a preço acessível para todos,
melhorando a segurança rodoviária por meio da expansão dos
transportes públicos, com especial atenção para as necessidades das
pessoas em situação de vulnerabilidade, mulheres, crianças, pessoas
com deficiência e idosos;

3 – POLÍTICA NACIONAL DE DESENVOLVIMENTO URBANO

A Constituição Federal de 1988, em seu capítulo II, trata da Política Urbana que
em seu Art. 182 estabelece que a política de desenvolvimento urbano seja executada
pelo poder público municipal, tornando obrigatório o Plano Diretor, aprovado pela
Câmara Municipal, para cidades com mais de vinte mil habitantes (além de outros
critérios). O plano diretor passa a ser o instrumento básico da política de
desenvolvimento e de expansão urbana (BRASIL, 1988).

Em 2001 foram regulamentados os Art. 182 e 183 da Constituição Federal,


culminando no Estatuto da Cidade, Lei Federal 10.257/2001. Em diretrizes gerais, o
Estatuto da Cidade estabelece os objetivos da política urbana, tendo por instruções a
“garantia do direito a cidades sustentáveis, entendido como o direito à terra urbana, à
moradia, ao saneamento ambiental, à infraestrutura urbana, ao transporte e aos

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serviços públicos, ao trabalho e ao lazer, para as presentes e futuras gerações”
(BRASIL, 2001).

O Plano Diretor é então definido, nesta mesma Lei, como Instrumento da


Política Urbana de planejamento municipal, sendo ainda complementado por outros
instrumentos: os Planos, Programas e Projetos Setoriais.

4 - POLÍTICA MUNICIPAL DE DESENVOLVIMENTO URBANO

Em Curitiba, as diretrizes de desenvolvimento urbano foram delineadas no


Plano Diretor de 1966 (Lei 2828/1966), que estabeleceu os eixos estruturantes da
cidade com base na integração do transporte público, sistema viário e uso do solo
(REGO; JANUÁRIO, 2022).

Em 2004, o Plano Diretor foi revisado e adequado ao Estatuto da Cidade, na


Lei 11.266, que trouxe o planejamento municipal como processo e apresentou outros
instrumentos, como os planos setoriais divididos em sete macro eixos de atuação.
Dentre eles, o Plano de Mobilidade e de Transporte Urbano Integrado, de especial
interesse no tema em questão. Esta mesma lei define ainda a macro hierarquia dos
Eixos de Estruturação do Transporte Coletivo, dentro os quais estão os “Eixos
Interbairros – eixos de transporte coletivo, circulares ou pendulares, que integram
diversos bairros ao eixo estrutural” (CURITIBA, 2004).

A última revisão do Plano Diretor é de 2015, regulamentado através da Lei


Municipal nº 14.771, onde em seu Art. 4º, § 2º, Inc. II positiva os Planos Setoriais
enquanto ações e projetos a serem implementados no território municipal.

O Plano de Mobilidade e Transporte Integrado já existente é então atualizado


– PlanMob 2022 sob coordenação do Instituto de Pesquisa e Planejamento Urbano
de Curitiba, sendo recentemente submetido ao Conselho da Cidade (CONCITIBA) em
sua 63º reunião ordinária em 2021 e posteriormente apresentado em audiência
pública realizada em agosto de 2022. Estabelece em suas diretrizes, metas e ações
para um intervalo temporal de 10 anos, buscando implementar ou aperfeiçoar a
promoção da cidadania e inclusão social, através de ações voltadas ao
desenvolvimento urbano, à mobilidade e à proteção ao meio ambiente (IPPUC, 2022).
Evoluiu em relação ao plano setorial anterior, de 2005, ao ampliar o escopo das ações
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voltadas à mobilidade, que agora não estão apenas relacionadas ao transporte
público, sistema viário e ao transporte de carga, passando também a versar sobre
circulação não motorizada, novas tecnologias para veículos e aquelas necessárias à
integração do sistema, compartilhamento de infraestrutura urbana entre diferentes
modais, investimento para melhorar a qualidade dos espaços para circulação das
pessoas e garantir a acessibilidade. Também contempla políticas para tornar o
transporte público mais atrativo, estimulando assim a retomada dos seus usuários,
que ao longo dos anos têm migrado para outros modais individuais de transporte.

A partir do encadeamento deste instrumento de planejamento urbano, destaca-


se o projeto para o Aumento da Capacidade e Velocidade da Linha Direta Inter 2, que
possui previsão de implantação de 4 a 8 anos, de acordo com o Plano Setorial de
Mobilidade e Transporte Integrado.

5 – INTER 2

A conexão Inter bairros teve início em 1979, iniciando de fato a Rede Integrada
de Transporte (RIT) de Curitiba ao perfazer roteiros circulares, conectando os eixos
estruturais em anéis (PRESTES, 2018). Destes, o Inter bairros 2 apresentou tamanha
demanda que, no início dos anos 1990 originou a criação da Linha Direta Inter 2, com
paradas menos frequentes no intuito de perfazer viagens longas em tempo reduzido.
A linha percorre 60km ao longo de 28 bairros de Curitiba, sendo a que atualmente
mais cresce em demanda (MENDONÇA, 2020).

O projeto de aumento da capacidade e velocidade da Linha Direta Inter 2 prevê


requalificação da infraestrutura viária e mobiliário urbano ao longo de todo o itinerário,
com vistas à melhoria de velocidade operacional, racionalidade do sistema, segurança
e regularidade do serviço, no escopo da estratégia governamental para recuperação
dos usuários do sistema RIT. O objetivo é reestabelecer a prioridade ao transporte
público coletivo e incentivar a mobilidade ativa. Sua rede de veículos será movida por
nova matriz energética, estando alinhado às metas do Município na busca por
neutralizar a emissão de carbono até 2025 (PLANCLIMA) atendendo assim a agenda
2030.

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Vale ainda ressaltar a implementação de novas estações de embarque
denominada Prisma Solar. Ela funcionará como ponto nodal da região, integrando a
outros modais, o que potencializará o uso da linha. Contará com placas para captação
de energia, que poderá ser utilizada para garantir o funcionamento da própria estação
além de funcionar como ponto de recarga para outros modais, a exemplo do patinete
elétrico. Contará com tecnologia que promoverá conforto aos usuários. Além disso o
entorno da estação garantirá acessibilidade plena, e a promoção de segurança
através de iluminação e sinalização adequados.

Para estruturar o projeto, a Prefeitura de Curitiba buscou cooperações técnicas


e financiamento internacional. Neste último, assinou contrato com o Banco
Interamericano de Desenvolvimento (BID), que incluiu, entre os critérios de
elegibilidade, atender aos requisitos socioambientais no Marco de Gestão Ambiental
e Social daquele órgão.

De forma a oferecer suporte ao desenvolvimento dos projetos, o BID abrangeu


o fornecimento de ferramentas de trabalho (software e capacitação em BIM – Building
Information Modeling) e oficinas de sensibilização ao tema de caminhabilidade
sensível a gênero – realizada em parceria com a organização SampaPé!
(www.sampape.org). Desse trabalho resultou o “Índice de Caminhabilidade e Gênero
Curitiba”, com o intuito de despertar no corpo técnico da Prefeitura de Curitiba o olhar
sobre segurança e vulnerabilidade de gênero, caracterizando um alinhamento das
políticas internacionais com os projetos urbanos desenvolvidos pelo município.

Outra parceria foi desenvolvida com o WRI (World Resources Institute -


www.wribrasil.org.br) tendo por objeto uma pesquisa de mercado para aquisição de
ônibus elétricos a bateria para sistema de transporte público coletivo de Curitiba, tendo
em vista a possibilidade de atendimento da demanda para a cidade no ano 2025,
considerando a Linha Direta Inter 2. Desse trabalho derivarão os estudos de
viabilidade técnica e econômico/ financeira do projeto, possibilitando a comparação
com tecnologias de ônibus convencionais operantes, subsidiando metas de redução
de emissão de carbono no transporte coletivo (IPPUC, 2022).

6 - CONCLUSÃO

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Dentro do arcabouço legal do planejamento urbano no Brasil são
disponibilizadas ferramentas e desenvolvidas as políticas públicas que orientam o
desenvolvimento das cidades. Em Curitiba, cidade com tradição no uso do Plano
Diretor como instrumento do processo de planejamento urbano, o governo local
desempenha o papel principal no direcionamento das ações no âmbito da mobilidade.
No entanto, é nítida a participação de agentes não governamentais para viabilizar o
desenvolvimento e implantação de propostas, a exemplo de estudos de viabilidade e
aplicação de novas tecnologias, além das ferramentas de controle e participação
popular.

Neste trabalho buscou-se localizar o projeto de Aumento da Capacidade e


Velocidade da Linha Direta Inter 2 no escopo de diretrizes municipais e federais de
planejamento urbano. Além disso, é notável como as políticas globais atuam no
balizamento das decisões locais, seja por compromissos com a agenda mundial (ex.:
ODS), seja por exigências impostas por órgãos de financiamento, com vistas à fonte
energética e acessibilidade sensível a gênero.

O conjunto dessas ações busca manter Curitiba em seu papel de vanguarda,


tendo por objetivo o desenvolvimento sustentável, promovendo a inclusão social e
mitigando o custo ambiental causado pela mobilidade urbana.

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7 – REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS

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Brasília, DF: Senado Federal: Centro Gráfico, 1988.
BRASIL. Lei nº. 10.257, de 10 de julho de 2001 (Estatuto da Cidade). Regulamenta
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do Plano Diretor de Curitiba ao Estatuto da Cidade - Lei Federal nº 10.257/01,
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Disponível em: <http://www.ippuc.org.br> Acesso: 25 ago. 2022.
GONÇALVES, Alcindo. O conceito de governança. XIV Encontro do Conpedi, v. 16,
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REGO, Renato Leão; JANUÁRIO, Isabella Caroline. Arquitetura paranaense na
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