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Lectio divina

Lectio Divina – Leitura orante da Bíblia

Ouvindo a Palavra de Deus nas Escrituras

Ouvir a palavra de Deus nas Escrituras (Lectio Divina) é um modo tradicional 1


de cultivar a amizade com Cristo. É uma forma de escutar os textos das
Escrituras como se estivéssemos conversando com Cristo e Ele estivesse
sugerindo os temas da conversa.

A tradicional lectio divina possui quatro passos fundamentais, que em latim se


chamam lectio (leitura), meditatio (meditação), oratio (oração)
e contemplatio (contemplação). Cada um desses passos é como que uma escada
espiritual usada pelos monges desde o século III para elevarem-se até Deus
através das Sagradas Escrituras. Originalmente uma oração monástica, a lectio
divina popularizou-se e é indicada a todos nós católicos enquanto “diálogo
entre Deus e o homem; porque ‘a Ele falamos, quando rezamos, a Ele ouvimos,
quando lemos os divinos oráculos’”, dizia Santo Agostinho.

O encontro diário com Cristo e a reflexão sobre Sua palavra nos conduz
para além do mero conhecimento, para uma atitude de amizade,
confiança e amor. A autêntica meditação cristã não é feita em primeiro
lugar para dela tirar proveito. Se isto acontecer, é uma coisa a mais,
porém ela tende a uma única finalidade: aumentar a comunhão com
Deus.1

Quem deve fazer lectio divina

Alguns dentre vós dizem: ‘Não sou monge, tenho mulher, filhos e
negócios do meu lar pelos quais sou responsável’. Mas aí está o que
destrói tudo: você estima a leitura das divinas Escrituras reservada só
aos monges, quando ela seria bem mais necessária a você que a eles.
Quem vive no mundo e aí recebe feridas a cada dia tem muito maior
necessidade de remédios. Também há um mal maior do que não ler, é
acreditar que a leitura é vã e inútil. Conclui-se finalmente que tal
maneira de viver sem lectio é uma prática inspirada por satanás.2

1
Enzo Bianchi, in: Lectio divina ontem e hoje, p. 44.
2
São João Crisóstomo, apud: Lectio divina ontem e hoje, p. 64.
Lectio divina

A Leitura orante no Magistério da Igreja

Catecismo da Igreja Católica

QUARTA PARTE: A ORAÇÃO CRISTÃ


2
PRIMEIRA SECÇÃO: A ORAÇÃO NA VIDA CRISTÃ

CAPÍTULO TERCEIRO: A VIDA DE ORAÇÃO

2697. A oração é a vida do coração novo. Deve animar-nos a todo o momento.


Mas acontece que nos esquecemos d'Aquele que é a nossa vida e o nosso tudo.
É por isso que os Padres espirituais, na sequência do Deuteronômio e dos
profetas, insistem na oração como «lembrança de Deus», frequente
despertador da «memória do coração». «Devemos lembrar-nos de Deus com
mais frequência do que respiramos». Mas não se pode orar «em todo o tempo»,
se não se orar em certos momentos, voluntariamente: são os tempos fortes da
oração cristã, em intensidade e duração.

2698. A Tradição da Igreja propõe aos fiéis ritmos de oração destinados a


alimentar a oração contínua. Alguns são quotidianos: a oração da manhã e da
noite, antes e depois das refeições, a Liturgia das Horas. O Domingo, centrado
na Eucaristia, é santificado principalmente pela oração. O ciclo do ano litúrgico
e as suas grandes festas constituem os ritmos fundamentais da vida de oração
dos cristãos.

2699. O Senhor conduz cada pessoa pelos caminhos e da maneira que


Lhe apraz. Por seu turno, cada fiel responde-Lhe conforme a determinação do
seu coração e as expressões pessoais da sua oração. No entanto, a tradição
cristã conservou três expressões principais da vida de oração: a oração vocal, a
meditação e a contemplação. Têm um traço fundamental comum: o
recolhimento do coração. Esta atenção em guardar a Palavra e permanecer na
presença de Deus faz destas três expressões tempos fortes da vida de oração.

ARTIGO 1: AS EXPRESSÕES DA ORAÇÃO

I. A oração vocal

2700. Pela sua Palavra, Deus fala ao homem. É nas palavras, mentais ou vocais,
que a nossa oração toma corpo. Mas o mais importante é a presença do
coração Àquele a Quem falamos na oração. «Que a nossa oração seja atendida
não depende da quantidade de palavras, mas do fervor das nossas almas».

2702. A necessidade de associar os sentidos à oração interior corresponde a


uma exigência da natureza humana. Nós somos corpo e espírito e
experimentamos a necessidade de traduzir exteriormente os nossos
Lectio divina

sentimentos. Devemos rezar com todo o nosso ser para


dar à nossa súplica a maior força possível.

2704. Porque exterior e tão plenamente humana, a oração vocal é, por


excelência, a oração das multidões. Mas até a oração mais interior não pode
prescindir da oração vocal. A oração torna-se interior na medida em que
tomamos consciência d'Aquele «a Quem falamos». Então, a oração vocal torna-
se uma primeira forma da contemplação.

II. A meditação

2705. A meditação é sobretudo uma busca. O espírito procura compreender o 3


porquê e o como da vida cristã, para aderir e corresponder ao que o Senhor lhe
pede. Exige uma atenção difícil de disciplinar. Habitualmente, recorre-se à
ajuda dum livro e os cristãos não têm falta deles: a Sagrada Escritura, em
especial o Evangelho, os santos ícones (as imagens), os textos litúrgicos do dia
ou do tempo, os escritos dos Padres espirituais, as obras de espiritualidade, o
grande livro da criação e o da história, a página do «hoje» de Deus.

2706. Meditar no que se lê leva a assimilá-lo, confrontando-o consigo mesmo.


Abre-se aqui um outro livro: o da vida. Passa-se dos pensamentos à realidade.
Segundo a medida da humildade e da fé, descobrem-se nela os movimentos
que agitam o coração e é possível discerni-los. Trata-se de praticar a verdade
para chegar à luz: «Senhor, que quereis que eu faça?».

2707. Os métodos de meditação são tão diversos como os mestres espirituais.


Um cristão deve querer meditar com regularidade; doutro modo, torna-se
semelhante aos três primeiros terrenos da parábola do semeador. Mas um
método não passa de um guia; o importante é avançar, com o Espírito Santo,
no caminho único da oração: Cristo Jesus.

2708. A meditação põe em ação o pensamento, a imaginação, a emoção e o


desejo. Esta mobilização é necessária para aprofundar as convicções da fé,
suscitar a conversão do coração e fortalecer a vontade de seguir a Cristo. A
oração cristã dedica-se, de preferência, a meditar nos «mistérios de Cristo»,
como na «lectio divina» ou no rosário. Esta forma de reflexão orante é de
grande valor, mas a oração cristã deve ir mais longe: até ao conhecimento
amoroso do Senhor Jesus, até à união com Ele.

III. A contemplação

2709. O que é a contemplação? Responde Santa Teresa: «Outra coisa não é, a


meu parecer, oração mental, senão tratar de amizade – estando muitas vezes
tratando a sós – com Quem sabemos que nos ama».

A contemplação procura «Aquele que o meu coração ama» (Ct 1,7), que é Jesus,
e n'Ele o Pai. Ele é procurado, porque desejá-Lo é sempre o princípio do amor, e
é procurado na fé pura, esta fé que nos faz nascer d'Ele e viver n'Ele. Nesta
modalidade de oração pode, ainda, meditar-se; todavia, o olhar vai todo para o
Senhor.

2710. A escolha do tempo e duração da contemplação depende duma vontade


determinada, reveladora dos segredos do coração. Não se faz contemplação
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quando se tem tempo; ao invés, arranja-se tempo para


estar com o Senhor, com a firme determinação de não
Lho retirar durante o caminho, sejam quais forem as provações e a aridez do
encontro. Não se pode meditar sempre; mas pode-se entrar sempre em
contemplação, independentemente das condições de saúde, trabalho ou
afetividade. O coração é o lugar da busca e do encontro, na pobreza e na fé.

2711. A entrada na contemplação é análoga à da liturgia eucarística: «reunir» o


coração, recolher todo o nosso ser sob a moção do Espírito Santo, habitar na
casa do Senhor que nós somos, despertar a fé para entrar na presença d'Aquele
que nos espera, fazer cair as nossas máscaras e voltar o nosso coração para o
Senhor que nos ama, de modo a entregarmo-nos a Ele como uma oferenda a
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purificar e transformar.

2712. A contemplação é a oração do filho de Deus, do pecador perdoado que


consente em acolher o amor com que é amado e ao qual quer corresponder
amando ainda mais. Mas ele sabe que o seu amor de correspondência é o que o
Espírito Santo derrama no seu coração, porque tudo é graça da parte de Deus.
A contemplação é a entrega humilde e pobre à vontade amorosa do Pai, em
união cada vez mais profunda com o seu Filho muito amado.

2713. Assim, a contemplação é a expressão mais simples do mistério da


oração. É um dom, uma graça; só pode ser acolhida na humildade e na
pobreza. É uma relação de aliança estabelecida por Deus no fundo do nosso
ser. A contemplação é comunhão: nela, a Santíssima Trindade conforma o
homem, imagem de Deus, «à sua semelhança».

2714. A contemplação é, também, por excelência, o tempo forte da oração.


Nela, o Pai enche-nos de força, pelo Espírito Santo, para que se fortaleça em
nós o homem interior, Cristo habite nos nossos corações pela fé e nós sejamos
radicados e alicerçados no amor.

2715. A contemplação é o olhar da fé, fixado em Jesus. «Eu olho para Ele e Ele
olha para mim» – dizia, no tempo do seu santo Cura, um camponês d'Ars em
oração diante do sacrário. Esta atenção a Ele é renúncia ao «eu». O seu olhar
purifica o coração. A luz do olhar de Jesus ilumina os olhos do nosso coração;
ensina-nos a ver tudo à luz da sua verdade e da sua compaixão para com todos
os homens. A contemplação dirige também o seu olhar para os mistérios da
vida de Cristo. E assim aprende «o conhecimento íntimo do Senhor» para mais
O amar e seguir.

2716. A contemplação é escuta da Palavra de Deus. Longe de ser passiva, esta


escuta é obediência da fé, acolhimento incondicional do servo e adesão
amorosa do filho. Participa do «sim» do Filho que se fez Servo e do «faça-se»
da sua humilde serva.

2717. A contemplação é silêncio, este «símbolo do mundo que há-de vir» ou


«linguagem calada do amor». Na contemplação, as palavras não são discursos,
mas acendalhas que alimentam o fogo do amor. É neste silêncio, insuportável
para o homem «exterior», que o Pai nos diz o seu Verbo encarnado, sofredor,
morto e ressuscitado e que o Espírito filial nos faz participar da oração de
Jesus.
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2718. A contemplação é união à oração de Cristo na


medida em que nos faz participar no seu mistério. O
mistério de Cristo é celebrado pela Igreja na Eucaristia e o Espírito Santo faz-
nos viver dele na contemplação, para que seja manifestado pela caridade em
ato.

2719. A contemplação é uma comunhão de amor, portadora de vida para a


multidão, na medida em que é consentimento em permanecer na noite da fé. A
noite pascal da ressurreição passa pela da agonia e do sepulcro. São estes três
tempos fortes da «Hora» de Jesus, que o seu Espírito (e não a «carne», que é
«fraca») nos faz viver na oração contemplativa. É preciso consentir em velar
uma hora com Ele.
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Resumindo:

2720. A Igreja convida os fiéis para uma oração regular: orações quotidianas,
Liturgia das Horas, Eucaristia dominical, festas do ano litúrgico.

2721. A tradição cristã compreende três expressões principais da vida de


oração: a oração vocal, a meditação e a contemplação. Têm em comum o
recolhimento do coração.

2722. A oração vocal, fundada na união do corpo e do espírito na natureza


humana, associa o corpo à oração interior do coração, a exemplo de Cristo que
orava ao Pai e ensinava o «Pai-nosso» aos seus discípulos.

2723. A meditação é uma busca orante que põe em ação o pensamento, a


imaginação, a emoção, o desejo. Tem por finalidade a apropriação crente do
tema considerado, confrontado com a realidade da nossa vida.

2724. A contemplação é a expressão simples do mistério da oração. É um olhar


de fé fixo em Jesus, uma escuta da Palavra de Deus, um amor silencioso. Realiza
a união com a oração de Cristo, na medida em que nos faz participar no seu
mistério.

Constituição dogmática Dei Verbum, do Concílio Vaticano II

Leitura da Sagrada Escritura

25. É necessário, por isso, que todos os clérigos e sobretudo os sacerdotes de Cristo e
outros que, como os diáconos e os catequistas, se consagram legìtimamente ao
ministério da palavra, mantenham um contacto íntimo com as Escrituras, mediante a
leitura assídua e o estudo acurado, a fim de que nenhum deles se torne «pregador vão
e superficial da palavra de Deus, por não a ouvir de dentro», tendo, como têm, a
obrigação de comunicar aos fiéis que lhes estão confiados as grandíssimas riquezas da
palavra divina, sobretudo na sagrada Liturgia. Do mesmo modo, o sagrado Concílio
exorta com ardor e insistência todos os fiéis, mormente os religiosos, a que aprendam
«a sublime ciência de Jesus Cristo» (Fil. 3,8) com a leitura frequente das divinas
Escrituras, porque «a ignorância das Escrituras é ignorância de Cristo». Debrucem-se,
pois, gostosamente sobre o texto sagrado, quer através da sagrada Liturgia, rica de
palavras divinas, quer pela leitura espiritual, quer por outros meios que se vão
espalhando tão louvavelmente por toda a parte, com a aprovação e estímulo dos
Lectio divina

pastores da Igreja. Lembrem-se, porém, que a leitura da


Sagrada Escritura deve ser acompanhada de oração para que
seja possível o diálogo entre Deus e o homem; porque «a Ele
falamos, quando rezamos, a Ele ouvimos, quando lemos os divinos oráculos».

Evangelii Gaudium (Exortação apostólica do Papa Francisco, 2013)

A leitura espiritual

152. Há uma modalidade concreta para escutarmos aquilo que o Senhor nos quer dizer
na sua Palavra e nos deixarmos transformar pelo Espírito: designamo-la por «lectio 6
divina». Consiste na leitura da Palavra de Deus num tempo de oração, para lhe
permitir que nos ilumine e renove. Esta leitura orante da Bíblia não está separada do
estudo que o pregador realiza para individuar a mensagem central do texto; antes pelo
contrário, é dela que deve partir para procurar descobrir aquilo que essa mesma
mensagem tem a dizer à sua própria vida. A leitura espiritual dum texto deve partir do
seu sentido literal. Caso contrário, uma pessoa facilmente fará o texto dizer o que lhe
convém, o que serve para confirmar as suas próprias decisões, o que se adapta aos
seus próprios esquemas mentais. E isto seria, em última análise, usar o sagrado para
proveito próprio e passar esta confusão para o povo de Deus. Nunca devemos
esquecer-nos de que, por vezes, «também Satanás se disfarça em anjo de luz» (2
Cor 11, 14).

153. Na presença de Deus, numa leitura tranquila do texto, é bom perguntar-se, por
exemplo: «Senhor, a mim que me diz este texto? Com esta mensagem, que quereis
mudar na minha vida? Que é que me dá fastídio neste texto? Porque é que isto não me
interessa?»; ou então: «De que gosto? Em que me estimula esta Palavra? Que me atrai?
E porque me atrai?». Quando se procura ouvir o Senhor, é normal ter tentações. Uma
delas é simplesmente sentir-se chateado e acabrunhado e dar tudo por encerrado;
outra tentação muito comum é começar a pensar naquilo que o texto diz aos outros,
para evitar de o aplicar à própria vida. Acontece também começar a procurar
desculpas, que nos permitam diluir a mensagem específica do texto. Outras vezes
pensamos que Deus nos exige uma decisão demasiado grande, que ainda não estamos
em condições de tomar. Isto leva muitas pessoas a perderem a alegria do encontro com
a Palavra, mas isso significaria esquecer que ninguém é mais paciente do que Deus Pai,
ninguém compreende e sabe esperar como Ele. Deus convida sempre a dar um passo
mais, mas não exige uma resposta completa, se ainda não percorremos o caminho que
a torna possível. Apenas quer que olhemos com sinceridade a nossa vida e a
apresentemos sem fingimento diante dos seus olhos, que estejamos dispostos a
continuar a crescer, e peçamos a Ele o que ainda não podemos conseguir.

Quais textos ler?

A Lectio divina é um método de leitura, meditação, oração e contemplação para


qualquer texto bíblico, em qualquer momento. Por isso, você é livre para
escolher o texto, mas indicamos o seguinte:

1. Faça todos os dias, no mesmo horário e local. Faça da leitura orante um


hábito, um exercício ascético: para isso a rotina e o planejamento é
importante.
Lectio divina

2. No momento da leitura, não se prenda a


dificuldades de interpretação do texto ou dúvidas que
não possam ser sanadas de imediato (com ajuda das notas de rodapé de
uma boa bíblia católica). Em outro momento faça um estudo bíblico
mais aprofundado ou peça ajuda.
3. Tenha um plano de leituras: jamais “sorteie” um texto bíblico. Siga a
liturgia diária ou faça uma leitura sequencial de livros inteiros da Bíblia
(neste caso, leia trechos inteiros, perícopes). Tenha em conta a unidade
de toda a Sagrada Escritura e a unidade da fé da Igreja. A oração é
pessoal, mas não individual. É preciso ter uma alma eclesial.
7
Eis por que, sim, eis por que uma tão grande tibieza tomou conta de
nós: não se leem mais as Escrituras em sua totalidade, mas se escolhem
certas partes mais evidentes e úteis e não se diz mais uma só palavra
sobre o restante. Eis aí como são introduzidas as próprias heresias: não
se quis mais ler todo o corpo das Escrituras; escolheram-se algumas
partes como essenciais e outras como secundárias.

Quando você voltar para casa, deveria tomar a Escritura e com sua
esposa e seus filhos relerem e repetirem juntos a palavra ouvida (na
igreja); [...] Volte para casa e prepare duas mesas, uma com os pratos
dos alimentos e outra com os pratos da Escritura; que o marido repita o
que foi lido na igreja... Faça de sua casa uma igreja.3

Os passos ou degraus da lectio divina devem ser seguidos sem saltos e


omissões. Sem qualquer um deles não se faz leitura espiritual. Segundo Guigo
II, cartuxo (século XII)4:

[...] podes ver como os ditos degraus se ligam uns aos outros entre si. E
como um precede a outro, tanto no tempo, como na causalidade.
Qual primeiro fundamento, vem a leitura. Ela fornece a matéria e nos
leva à meditação.
A meditação, por sua vez, perscruta com maior diligência o que se deve
desejar e, como que cavando, acha e mostra o tesouro. Mas, como não
pode por si mesma obtê-lo, leva-nos à oração.
A oração, elevando-se a Deus com todas as suas forças, obtém o tesouro
desejável, a suavidade da contemplação.
Sobrevindo a contemplação, ela recompensa o trabalho dos três
degraus referidos, embriagando a alma sedenta com o orvalho da
doçura celeste.
A leitura é feita segundo um exercício mais exterior, a meditação,
segundo uma inteligência mais interior, a oração, segundo o desejo; a
contemplação passa acima de todo sentido.
O primeiro degrau é dos principiantes; o segundo, dos que progridem; o
terceiro, dos fervorosos; o quarto, dos bem-aventurados.

Esses degraus são de tal modo ligados, e de tal forma servem uns aos
outros, que os precedentes pouco ou nada aproveitam sem os seguintes,
e os seguintes, por sua vez, nunca ou só raramente podem ser
adquiridos sem os precedentes.

3
São João Crisóstomo, apud: Lectio divina ontem e hoje, p. 41 e 65.
4
In: Lectio divina ontem e hoje, p. 28-29.
Lectio divina

Uma oração para antes da leitura da Bíblia

Ó Deus, torna meu espírito digno de encontrar sua alegria na compreensão do


mistério de Cristo, teu Filho bem-amado, revelado nas Escrituras.

Acende tua santa luz no meu coração, a fim de que meu espírito penetre para
além das palavras escritas com tinta. 8

Que eu veja, com os olhos iluminados, os sagrados mistérios escondidos na tua


Boa Nova.

Concede, ó meu Senhor, por tua graça e tua misericórdia, que a tua lembrança
nunca desapareça do meu coração, nem de dia nem de noite. Amém.

Filoxênio de Mabboug5

A seguir, um quadro síntese dos passos da Lectio divina:

5
In: Uma Lectio divina na Bíblia, na História de Israel, na Liturgia.
Lectio divina www.cursoscatolicos.com.br
Lectio Meditatio Oratio Contemplatio
O que Leia a passagem da Escritura Reflita, saboreie as palavras. Responda espontaneamente ao Descanse em Deus.
fazer pela primeira vez. Permita que tenham eco em seu continuar a escutar a frase,
coração. sentença ou palavra.
Como Antes de iniciar a Lectio, reze Fique atento ao que fala ao seu Uma vez que Deus falou Simplesmente “permaneça com” a
fazer pedindo a luz do Espírito Santo. coração. É hora de “ruminar”, conosco, trata-se agora de presença de Deus, abrindo-se a uma
Escute a leitura com “o ouvido saborear a Palavra de Deus. Na responder. Talvez surja uma escuta mais profunda da Palavra de
do seu coração”. meditação vamos questionando, oração de louvor, Deus.
confrontando a passagem com agradecimento ou petição. Caso se sinta levado de volta às
a nossa vida, por meio do Ofereça essa oração e depois Escrituras, siga a sugestão do
Espírito Santo. retorne à repetição da palavra Espírito.
em seu coração.
O que Que frase, sentença ou mesmo Permita um ou dois minutos de Leia a passagem de novo e Permita a Deus que fale no silêncio.
mais você palavra se destaca para você? silêncio. responda espontaneamente à Permita alguns minutos de silêncio.
pode Comece a repetir essa frase, palavra de Deus. Permita um ou Para estender a Prática: Depois do
fazer sentença ou palavra vez após dois minutos de silêncio. descanso, inclua a frase, sentença ou
vez, permitindo que ela se fixe palavra em sua atividade diária e
profundamente em seu coração. escute-a, reflita sobre ela, reze e
descanse com ela o tempo que puder
durante o dia. “Orai sem cessar”.
Dicas O que fala o texto? Esteja O que diz o texto de forma O que o texto me faz responder O que a Palavra faz em mim? É o
atento aos detalhes: o ambiente, pessoal para mim? Este é o ao Senhor? A oração nasce próprio Deus que age em nossas
o desenrolar dos momento de se colocar diante como fruto da meditação. Os vidas. É permitir a ação de Deus que
acontecimentos, os da Palavra. sentimentos nos levam a dar recebe a nossa oração e nos leva ao
personagens, os diálogos, a Ao invés de ficar voltando ao uma resposta a Deus. Através Seu coração. Na contemplação nós
reação das pessoas; procurando texto a todo o momento, se já o do Espírito Santo, nos é somos impelidos a ser como Cristo.
perceber os seus sentimentos, tivermos no nosso coração as suscitado o louvor, a súplica, a
as questões mais interessantes, coisas ficam mais fáceis. oração penitencial, a oferta.
as palavras e trechos que
chamam mais atenção.
Cuidados Não estamos lendo um livro Não se trata de buscar Lembremos que a presença de Deus
qualquer. Nós estamos lendo as sentimentos. Trata-se de buscar é uma presença ativa. Jesus está
Sagradas Escrituras, que são um uma verdade. A verdade do presente, Se doando a nós. Então,
instrumento para nós amor de Cristo manifestada por permaneçamos nessa presença como
entrarmos em contato com nós. É importante que, quando o evangelista São João, que se
Jesus ressuscitado. Então, nós pegamos um trecho do reclinou no peito do Mestre (cf. Jo
precisamos ler as Sagradas Evangelho, compreendamos que 13, 23). Não sentimos nada, não
Escrituras num sentido nele Cristo pensava em nós pensamos nada, esquecemos de nós;
espiritual, que nos leve ao particularmente. somente miramos e desejamos a
Cristo. Deus.
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A Lectio Divina e o Estudo da Bíblia

O estudo da Bíblia é a leitura das escrituras para nossa informação e compreensão do


contexto da passagem. Ele oferece uma base conceitual sólida para a prática da Lectio
Divina.

A Lectio Divina é uma leitura reflexiva das escrituras. É um método de oração que nos
leva ao significado mais profundo das escrituras e à transformação de nossas vidas. A
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leitura contemplativa das Escrituras é perfeitamente compatível com a interpretação bem
fundada da Bíblia.

Recomendamos vivamente que se aprofunde no estudo bíblico, para melhor embasar a


vida de oração.

[...] como poderemos evitar que, meditando coisas erradas e vãs, se transgridam os
limites constituídos pelos santos Pais, a não ser que sejamos antes instruídos a tal
respeito pela leitura ou pelo ensino?
O ensino, de certo modo, se relaciona com a leitura, o que nos leva habitualmente a
dizer que lemos para nós mesmos ou para os outros, mas também o que ouvimos dos
mestres. 6

Referências

 Catecismo da Igreja Católica


 Constituição dogmática Dei Verbum
 Exortação Apostólica Evangelii Gaudium
 https://padrepauloricardo.org/aulas/quais-sao-os-passos-da-lectio-divina
 https://www.comshalom.org/como-fazer-a-lectio-divina/
 https://www.oracaocentrante.org/FolderLectioDivina.pdf
 Ir. Paula Iglésias, OSB. Uma lectio divina na bíblia, história de Israel, na Liturgia. 4ª
ed. Edições Subiaco, 2017.
 VV.AA. Lectio divina ontem e hoje. 4ª ed. aumentada. Edições Subiaco, 2017.

Organizado por Márcio Carvalho


© Formação Católica Online – www.cursoscatolicos.com.br

Iniciação Bíblica - Iniciação Teológica - Teológico Pastoral Completo


Introdução aos Dogmas - Introdução à Filosofia - Liderança e Missiologia
Passos para uma reforma litúrgica local - Catecismo da Igreja Católica em exame
Mariologia - Cultura Mariológica - História da Igreja - Latim - Canto Gregoriano
Moral Fundamental e das Virtudes - Doutrina Social da Igreja
Secretaria e Adm. Paroquial - Matrimônio, Família e Fecundidade

6
Guigo II, cartuxo, in: Lectio divina ontem e hoje, p. 29.

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