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David Ferraz
Introdução
A grande questão que se coloca é, porém, mesmo no âmbito dos modelos híbridos,
onde se situa a fronteira entre política e administração.
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Esta problemática tem sido constantemente debatida. Porém poucas foram as
conclusões objectivas e práticas. Pretende-se pois com este paper analisar a forma
como têm sido escolhidos os dirigentes da Administração pública no contexto da
evolução dos modelos de Estado e de Administração e explorar, no âmbito do novo
estatuto do pessoal dirigente, aprovado recentemente em Portugal as relações com a
evolução do modelo burocrático para o modelo do New Public Management e deste
para o modelo neo-weberianismo / Burocracia liberal.
O modelo Burocrático
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Organização fundada em normas e procedimentos escritos (racionais, legais e
exaustivos);
Hierarquia da autoridade;
Impessoalidade das relações;
Carácter formal das comunicações;
Separação entre propriedade e administração;
Recrutamento baseado no mérito, através de concursos públicos;
Profissionalização dos funcionários;
Carácter racional e divisão do trabalho;
Rotinas e procedimentos estandardizados
orientação para
processos
Com o alargamento das funções do Estado para áreas mais complexas, nomeadamente
para as áreas sociais e com o advento da globalização e das novas tecnologias, o
contexto no qual o modelo burocrático se desenvolve deixa de ser previsível e a
mudança passa a ser uma constante, desfavorecendo modelos organizacionais
administrativos assentes em procedimentos rígidos e estandardizados, como eram o caso
das organizações e estruturas burocráticas. Se o contexto se altera constantemente e,
consequentemente deixa de ser previsível, as normas e procedimentos que haviam sido
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definidos, para esse mesmo contexto, deixam de fazer sentido gerando as chamadas
“disfunções burocráticas”. Esta foi uma das principais críticas ao modelo burocrático,
fundamentando-se na incapacidade de um rápido reajustamento das rotinas e
procedimentos estandardizados, sempre que o contexto muda (Blau 1956; Dimock
1959; Crozier 1967; Mouzelis 1975).
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Pretendia-se, com uma análise aos factores críticos de sucesso das empresas privadas, a
importação de práticas de gestão privada assentes nos princípios da descentralização, da
desregulação e da delegação (Peters and Waterman 1982), fomentando a criação de
estruturas mais autónomas, fora das estruturas hierarquizadas tradicionais típicas do
modelo burocrático (Flinders, 2009).
Assiste-se pois à desagregação das grandes unidades burocráticas para novas estruturas,
autónomas e descentralizadas, com competências delegadas para o cumprimento de
resultados que passam a ser contratualizados.
Estruturas burocráticas
orientação para
processos
. .
Orientação Estruturas flexíveis
para resultados
(ex. Institutos Públicos;
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O referido processo de desagregação das unidades burocráticas em estruturas flexíveis,
implica, em teoria, a configuração de estruturas administrativas diametralmente opostas
no que respeita aos seus princípios orientadores, conforme explicitado na figura 3.
• Centralização • Descentralização
• Coordenação • Delegação
• Controlo • Desregulação
Figura 3: Oposição entre os princípios orientadores do Modelo Burocrático e do Modelo do New Public
Management
O New Public Management, com a sua expansão para a maior parte dos países
ocidentais, passou a ser o modelo hegemónico e visto por muitos governantes como o
modelo de tipo ideal, tendo estado “na moda” até recentemente. Em Portugal alguns
autores, como Isabel Corte-Real (2001), enquadram a adopção do New Public
Management num subtipo do New Public Management que Pollitt e Bouckaert (2004)
denominaram como o Estado neo-Weberiano, que melhor caracterizava um conjunto de
países (Continental European modernizers group) face às especificidades da reforma. A
verdade é que, nesta altura, estavam ainda por fazer, em Portugal, uma parte muito
significativa das reformas gestionárias entre as quais a introdução do SIADAP, da nova
Lei de Vínculos, Carreiras e Remunerações, coadjuvada pelo novo Regime de Contrato
de Trabalho em Funções Públicas e do PRACE. Tais reformas aproximaram a
administração pública portuguesa aqueles que eram os princípios originais do New
Public Management resultando, no final do Governo de José Sócrates, do ponto de vista
teórico e não tanto prático, à conclusão da reforma da administração pública central, em
conformidade com os desígnios originais do New Public Management (Magone 2011).
Exceptua-se porém, desta reforma, um dos principais pressupostos de funcionamento do
New Public Management: a profissionalização da gestão. Na verdade, durante a reforma
da Administração Pública portuguesa, a direcção pública continuou a ser nomeada
politicamente, sem prejuízo para alguns [poucos] cargos de direcção superior.
Assim, a adopção plena, do ponto de vista teórico dos princípios do NPM, colocou
Portugal no leque de críticas que, por esta altura (inícios dos anos 2000), e em particular
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no contexto de uma crise que se começara a desenhar e agravar, eram feitas ao modelo
do New Public Management, em particular à incapacidade dos Governos controlarem e
coordenarem as estruturas criadas no âmbito do New Public Management, e às quais
havia sido dada autonomia, no quadro de uma descentralização administrativa, de uma
desregulação da economia e de uma delegação de competências.
Esta incapacidade de coordenação e controlo por parte dos Governos, das estruturas
autónomas (administrativa e financeiramente) que haviam criado, complementado por
um quadro de desorçamentação e crescente endividamento, leva a um aumento muito
significativo da despesa do Estado tornando-o, já no quadro do NPM, curiosamente e ao
contrário daquilo que havia sido preconizado pelo NPM, muito pouco eficiente.
O referido agravamento das finanças públicas, no quadro de uma crise que tendeu a
agravar-se e a alargar-se a vários países, da europa e do mundo, fez com que as criticas
feitas ao New Public Management, no espaço internacional, tivessem cada vez mais
eco, desde logo porque o seu principal objectivo de diminuir o peso do Estado e torná-lo
mais eficiente, não fora plenamente atingido. Neste quadro surgem sugestões de
organização administrativa alternativas que salientam a necessidade dos Governos,
legitimamente eleitos, retomarem o controlo e coordenação das instituições públicas que
gozam de alguma autonomia, de modo a que os gastos financeiros sejam sujeitos a uma
tutela muito mais estrita. É neste âmbito que alguns autores (Emery and Giauque 2001;
Drechsler 2005; Giauque, Resenterra et al. 2009; Giauque, Resenterra et al. 2010)
sugerem que o controlo e coordenação da máquina administrativa se conseguiria à custa
de uma menor decentralização e/ou delegação, havendo pois necessidade de promover a
centralização da decisão e, em certa medida, das estruturas (neo)burocráticas (ver figura
4).
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neo-weberianismo / Burocracia
New Public Management
Liberal
Estruturas flexíveis
Estruturas Flexíveis, horizontais, autónomas,
(ex. Institutos Públicos;
orientadas para resultados
Ent. Publicas Empresariais)
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Tal acaba por corresponder a um certo retrocesso (como alguns autores referem, não
necessariamente negativo) na consolidação do modelo do New Public Management, surgindo,
aparentemente, um maior estimulo à centralização, coordenação e controlo político. Evidências
de uma certa centralização e coordenação, no quadro das actuais reformas são:
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Determina a obrigatoriedade de pedido de parecer prévio
vinculativo dos membros do Governo responsáveis pelas áreas
das finanças e da Administração a todos os contratos de
aquisição de serviços, nomeadamente nas modalidades de
tarefa e de avença e, ou, cujo objeto seja a consultadoria
técnica, designadamente jurídica, arquitetónica, informática ou
de engenharia, celebrados por órgãos e serviços abrangidos
pelo âmbito de aplicação da Lei n.º 12-A/2008, de 27 de
fevereiro, excepto contratos inferiores a 5000 euros (sem iva),
acções de formação com menos de 132horas, aquisição de
serviços cuja execução se conclua no prazo de vinte dias a
contar da notificação da adjudicação, devendo porém
comunicar ao membro do Governo responsável pelas áreas das
finanças e da Administração Pública, até ao final do mês
seguinte àquele em que foram adjudicados, os contratos
celebrados.
Vimos, nos pontos antecedentes, que o modelo de administração pública escolhido para
promover a prossecução do interesse público não é indiferente quanto aos princípios
administrativos de centralização VS descentralização, de coordenação e controlo VS
delegação e liberdade de gestão. Dependendo da escolha, existirá maior ou menor
centralização, maior ou menor coordenação e maior ou menor controlo por parte dos
actores políticos e administrativos nas decisões tomadas pela administração e pelos seus
dirigentes. Consequentemente, as formas de efectivar responsabilidades, sejam elas
políticas ou administrativas, pelos resultados alcançados, é também distinta. Assim,
uma maior ou menor centralização, uma maior ou menor coordenação e um maior ou
menor controlo, por parte dos actores político-administrativos, pressupõe distintas
configurações organizacionais com, distintas configurações político-administrativas e,
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também, distintos pressupostos de selecção e responsabilização de dirigentes públicos
(Quadro 1).
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cumprimento de determinados resultados, contratualizados previamente com o poder
político.
1
Conforme demonstra inquérito realizado em 2011 e que conclui que apenas 3 dirigentes cessaram a
sua comissão de serviço por via da avaliação do desempenho (entre os mais de 1700 respondentes).
2
Não se aplica aos cargos dirigentes:
a) Dos órgãos e serviços de apoio ao Presidente da República, e aos tribunais;
b) Das Forças Armadas, das forças e serviços de segurança e dos órgãos públicos que exercem
funções de segurança interna, nos termos definidos pela Lei de Segurança Interna, bem como
do Sistema de Informações da República Portuguesa e do serviço que tenha por missão
assegurar a gestão do sistema prisional;
c) Dos órgãos de gestão dos estabelecimentos de ensino;
d) Dos órgãos de gestão dos estabelecimentos do sector público administrativo de saúde;
e) Do Ministério dos Negócios Estrangeiros que, por força de disposição legal própria, tenham
de ser providos por pessoal da carreira diplomática ou para cujo provimento tenha sido
escolhido pessoal da mesma carreira ou que sejam exercidos nos serviços externos;
f) Integrados em carreiras.
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técnica, aptidão, experiência profissional e formação adequadas ao exercício das
respectivas funções” (Lei nº64/2011).
Conclusão
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a necessidade de dar execução ao Plano da Troika, parecem ter-se tomado algumas
decisões, nomeadamente de coordenação e controlo ao nível central, que se inserem
mais dentro da lógica do modelo neo-weberiano / Burocracia Liberal, tendente a uma
certa centralização. Refira-se porém que, sem prejuízo para o modelo de administração
adoptado, o importante é, conforme se procurou explicitar, compreender que cada
modelo tem princípios e pressupostos de funcionamento distintos que influenciam a
estruturação da Administração Pública, em particular ao nível das estruturas e
configurações administrativas (administração directa VS indirecta) e, adentro destas
macro configurações, as estruturas mais hierarquizadas ou mais flexíveis tenderão a
proporcionar diferentes formas de efectivação de responsabilidades.
Não devem pois ser aprovadas medidas avulsas que não sejam contextualizadas neste
amplo quadro de inter-relações e de variáveis que influenciam e são influenciadas.
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