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A CRIANÇA MIGRANTE NA FRONTEIRA BRASIL-BOLÍVIA:

DESAFIOS E DIFICULDADES

Maria Lúcia Ortiz Ribeiro*

RESUMO: Este estudo busca apresentar algumas considerações a respeito de


migrantes na fronteira Brasil-Bolívia, especificamente na região de Corumbá, Puerto
Suarez e Puerto Quijarro. De forma mais particularizada queremos discutir a relação
didático-social no interior da escola de fronteira e, de um modo mais geral os
desafios e dificuldades enfrentadas pela criança migrante em região de fronteira. Os
aspectos observados nos levam a conclusão de que a escola de fronteira ainda é
deficitária em políticas públicas que de fato contemplem as particularidades da
região fronteiriça.

Palavras-chave: Criança. Escola. Fronteira. Migrantes. Políticas Públicas.

RESUMEN: Este estudio busca presentar algunas consideraciones al respecto de


los migrantes em la frontera Brasil-Bolivia, espec ificamente em la región de
Corumbá, Puerto Suarez y Puerto Quijarro. De forma particular queremos discutir la
relación didactico-social em el interior de la escuela de frontera y de modo general
los desafios y dificultades enfrentados por el niño migrante em región de frontera.
Los aspectos observados nos llevan a la conclusión, de que, la escuela de frontera
aún es deficiente em políticas públicas que de hecho conteplan las particularidades
de la región fronteriza.

Palabras Clave: Nino. Escuela. Frontera. Migrante. Políticas Públicas.

INTRODUÇÃO

Pretendemos neste artigo abordar a mobilidade populacional no contexto da


fronteira Brasil-Bolívia, especialmente no estado de Mato Grosso do Sul, na cidade
de Corumbá. Queremos enfocar de maneira particular a situação da criança
migrante. Para atingirmos esse objetivo, se faz necessário analisar e levantar
questões que nos permitam compreender as relações existentes entre os dois
países.
A movimentação populacional nesse espaço fronteiriço pode ser entendida
como um processo de migração internacional entre os países ou simplesmente uma
migração interna? Seria apenas um movimento migratório gerado pela proximidade
geográfica, em busca de melhores oportunidades no mercado de trabalho ou para
recebimento de benefícios sociais, do outro lado da fronteira? De que forma ocorre
esse fluxo migratório, nos dois sentidos?
Para responder essas questões, considerando apenas os migrantes vindos
para o Brasil, é preciso um estudo mais detalhado, notadamente no que diz respeito
às causas econômicas que regem os fluxos migratórios e também das políticas
sociais do Estado brasileiro. Um resultado quantitativo seria obtido levando-se em
conta os atendimentos realizados nas áreas sociais e assistenciais, tais com os
realizados pelo Sistema Único de Saúde (SUS), e outros do âmbito da Assistência
Social e nas escolas públicas, aos imigrantes bolivianos.
Considerando-se os aspectos elencados acima, não podemos discordar de
que as migrações no que se refere à mobilidade para o mercado de trabalho
associada à procura de melhores condições de subsistência, têm importante papel
na explicação do movimento migratório, já que o Brasil é visto como um país estável
para se viver e trabalhar. A Bolívia, por sua vez, se caracteriza como um território de
constantes crises econômicas e visível instabilidade política, tornando-se, em
consequência, um pólo de emigrantes que procuram melhores condições de vida e
de empregabilidade.

[...] no estado de Mato Grosso do Sul, a linha divisória tem uma


extensão de 1,517km; destes 386km de fronteira com a Bolívia,
e 1.131km com o Paraguai. São 12 municípios situados na
linha de fronteira, sendo que, entre eles, alguns na condição de
conurbação. Se contarmos a faixa (150 km da linha), o
território abrangido corresponde aproximadamente 48% da
área do Estado, com 39 municípios, 895.680 habitantes e uma
densidade demográfica de 5,23hab./km², ou seja, uma região
pouco povoada. (OLIVEIRA, 2005, p. 391)

A fronteira Brasil-Bolívia tem 3.126km de extensão. Em todos os países da


fronteira, desde o Estado do Acre, na cidade de Plácido Gomes, até Mato Grosso
do Sul na cidade de Corumbá, as condições de infraestrutura aduaneira e social são
precárias quando existem. A cidade de Corumbá, com uma população aproximada
de 100.000 habitantes (IBGE, 2006), é um importante entreposto rodo-ferroviário-
fluvial de articulação internacional. A comunicação com as cidades fronteiriças é
feita por via terrestre e com as demais cidades bolivianas por vias ferroviária e
aérea. A conurbação Corumbá - Puerto Suarez - Puerto Quijarro, permite o
reconhecimento de práticas de integração e complementaridade, conforme Oliveira
(2005).
Do total de imigrantes residentes em Corumbá, de acordo com o censo
demográfico (IBGE, 2000), 77% é formado por pessoas que tiveram sua residência
anterior na Bolívia. É um percentual bastante significativo, motivado em sua maioria
pelo fato de o Brasil se apresentar diante da América do Sul como um país de
economia estável, com política flexível e cooperativista diante dos outros países sul-
americanos. Em Corumbá podemos destacar dois incentivos simples que favorecem
o intercâmbio: o Documento Fronteiriço da Polícia Federal que permite ao cidadão
boliviano trabalhar e residir no Brasil, válido apenas para a região de Corumbá e o
projeto da feira livre BRASBOL, na qual os cidadãos bolivianos podem vender suas
mercadorias, ou seja, podem trabalhar vendendo artesanatos e hortifrutigranjeiros.
Este objetivo encontra-se hoje muito distorcido, mas isso seria, sem sombra de
dúvidas, matéria de outro artigo.
De acordo com Sandes (2009), Brasil e Bolívia representam a dinâmica dos
fluxos migratórios visto que a zona fronteiriça entre ambos os países, especialmente
a região de Corumbá, porta de entrada dos bolivianos no Brasil, possui grande fluxo
de imigrantes bolivianos.

A exemplo de outros problemas que decorrem da interpretação os


estudos sobre imigrantes e fronteiras correm riscos de sucumbirem
perante algumas armadilhas. A mais comum é a de limitar-se ao
esforço da caracterização. Pensando melhor, a formação de um alvo
comum, as Ciências Humanas postas na posição de Zênite, colabora
definitivamente para a criação de um estigma veloz e confuso.
Embora por um lado sistematize informações, organize coleta de
dados, configure princípios, hipóteses e resultados, por outro, sendo
elaboração de paradigmas, arrisca retardar conceitos, inibir
interpretações - ou seja, o pensamento distancia-se do pensado.
(OLIVEIRA, 2009, pp. 79-80).

De fato, corremos sempre um risco de interpretação errônea quando falamos


de imigrantes e de fronteiras. Na atualidade a fronteira perdeu um pouco da
concepção de um lugar depravado e isolado para se transformar num espaço de
trocas e de comunicação, de compartilhamento de culturas, de atividades
comerciais. Ela não é mais um simples limite territorial e divisório entre dois países.
O conceito de zona de fronteira aponta para um espaço em que se expressam
políticas públicas de integração e cooperação, destacando-se como territorialidade
mais aprimorada e evoluída, o conceito de cidades-gêmeas, de acordo com
Machado (2005, apud OLIVEIRA, 2005, p. 95).
A presença de imigrantes brasileiros em território boliviano é mal distribuída.
Eles se agrupam na cidade de Santa Cruz de La Sierra, ligada à industrialização e à
expansão da sojicultura e no centro-oeste de departamento de Beni, área de
expansão da indústria madeireira. Os bolivianos no Brasil se distribuem de maneira
acentuada na fronteira, porém em sua maior parte procuram a região metropolitana
de São Paulo. As cidades da fronteira servem mais como espaço de trânsito dos
migrantes.
Ao mesmo tempo em que as migrações servem como indicativo de interação
entre os dois países e de integração regional na fronteira, também alimentam
conflitos graves como os debates a cerca do trabalho escravo dos bolivianos
residentes em São Paulo, a facilitação do narcotráfico e do contrabando na fronteira
e as políticas do governo Evo Morales com relação às propriedades rurais dos
brasileiros em áreas bolivianas e ainda, as questões relativas à exploração do
minério, do petróleo e do gás em território boliviano.
Todas essas conjunturas nos levam a uma preocupação: a situação
específica das crianças e das mulheres dentro desse movimento migratório. É
impossível não dar a essas criaturas uma atenção especial, porque a não-
integração do migrante à nova terra escolhida, tem sempre duas vítimas principais :
as crianças e as mulheres.

DESENVOLVIMENTO

Por que as crianças e as mulheres são vítimas num processo de migração


não bem resolvido? As crianças são as primeiras a sofrerem com problemas de
saúde, defasagem e dificuldades educacionais extremas. São praticamente alijadas
das escolas e de outras políticas públicas porque seus pais muitas vezes na
condição de imigrantes ilegais, não possuem documentos que comprovem uma
estada regular no país o que as impedem de se matricularem em uma escola ou se
cadastrarem para receber um tratamento de saúde.
Quando percebemos uma criança fora da escola, os motivos são os mais
diversos: podem ser pedagógicos, socioeconômicos e até mesmo pessoais. Os
filhos de migrantes irregulares não estão na escola porque não têm acesso, porque
têm dificuldades para acompanhar o currículo, por questão de segurança da família,
por preconceito, por vergonha. Eis um grande problema social.
As mulheres num mundo machista e patriarcal sofrem a violência doméstica,
que aumenta à medida que se frustra a expectativa masculina de realização em um
novo país. Assim são vitimizadas numa terra estranha em que se encontram
irregularmente. Impossibilitadas de procurar socorro oficial , sentem mais forte o
medo de serem presas e separadas de seus filhos. O seu sofrimento aumenta
quando são vítimas de abusos sexuais, como forma de lhe abrir acesso a benefícios
aos quais como criatura humana, teria direito legal.
Todos estes fatos também se agravam diante do grande número de migrantes
que têm filhos ainda na adolescência. As meninas fogem de seu país de origem
acompanhadas de seus parceiros que também são muito jovens, engravidam-se e a
situação torna-se ainda mais complicada, porque não têm um representante legal.
Aos muitos problemas já existentes, se junta mais este da gravidez precoce.

Uma das características fundamentais do fenômeno da imigração é


que, fora algumas situações excepcionais, ele contribui para
dissimular a si mesmo sua própria verdade. Por não conseguir
sempre por em conformidade o direito e o fato, a imigração
condena-se a engendrar uma situação que parece destiná-la a uma
dupla contradição: não se sabe mais se se trata de um estado
provisório que se gosta de prolongar indefinidamente ou, ao
contrário, se se trata de um estado mais duradouro, mas que se
gosta de viver com um intenso sentimento de provisoriedade.
Oscilando, segundo as circunstâncias, entre o estado provisório que
a define de direito e a situação duradoura que a caracteriza de fato,
a situação do imigrante se presta, não sem alguma ambigüidade, a
uma dupla interpretação: ora, como que para não confessar a si
mesmo a forma quase definitiva que com freqüência cada vez maior
a imigração reveste, apenas se leva em conta na qualidade de
imigrante o seu caráter eminentemente provisório (de direito): ora,
ao contrário, como se fosse preciso desmentir a definição oficial do
estado de imigrante como estado provisório, insiste-se com razão na
tendência atual que os imigrantes possuem de se ‘instalar’ de forma
cada vez mais duradoura em sua condição de imigrantes. (SAYAD,
1998, p. 235).

A situação dos migrantes de um modo geral é bastante difícil, porém eles


possuem uma motivação muito grande. Acalentam um sonho e a esperança está
sempre presente. Mesmo sabendo das precárias condições que muitas vezes
enfrentarão, eles preferem isso, à falta de opção em seu país de origem.
Notadamente em relação aos bolivianos que vêm para o Brasil, seja para São Paulo
ou Corumbá, o êxodo é um grito de sobrevivência.
A presença de um número considerável de crianças migrantes representa um
desafio para os sistemas educativos dos países que a recebem. É preciso evitar a
criação de contextos escolares agregados e atrelados a currículos de realidades
completamente diferentes para, assim, melhorar a qualidade na educação, conciliar
a diversidade crescente de línguas maternas e perspectivas culturais, para
desenvolver competências interculturais e também adaptar as competências
pedagógicas e vencer as distâncias que separam as comunidades e as famílias
migrantes.
Como resolver tudo isso? Somente com a aplicação de políticas públicas na
área da educação que, permitam aos sistemas de ensino responder melhor aos
desafios provocados pelos fluxos de imigração e mobilidade interna nos países. O
aprimoramento de medidas socioeducativas é o único meio eficaz capaz de efetivar
melhorias nesse setor tão sensível.
A maioria das crianças migrantes encontra-se numa situação de desvantagem
educacional em relação aos seus colegas originários dos próprios países. O
abandono precoce é mais frequente entre os alunos filhos de imigrantes e
futuramente, sua inscrição no ensino médio e superior é também muito menor. Há
situações em que ocorrem segregações com base nas circunstâncias
socioeconômicas e, pais que têm situação financeira mais privilegiada tendem a
retirar seus filhos de escolas onde existem muitos alunos migrantes. Fatos como
estes prejudicam o sucesso dessas crianças e jovens no mercado de trabalho por
conta de um percurso escolar marcado pelo insucesso, preconceito e estigmas.
Estudos já realizados identificaram várias causas que se agregam à
desvantagem educacional das crianças migrantes. Podemos destacar alguns:
antecedentes pessoais dos alunos migrantes, meio sócio-econômico desfavorecido,
a língua e as expectativas da família e das comunidades. Entretanto, todos esses
fatores poderão ser superados quanto mais se aprimorarem os sistemas de ensino,
o que se justifica porque alguns países são mais bem sucedidos do que os outros na
redução das diferenças entre alunos migrantes e os não migrantes As políticas
implementadas podem influir positivamente no desempenho escolar, permitindo que
as crianças se motivem em busca de adaptação e, consequentemente, de melhores
resultados.
O desenvolvimento da faixa de fronteira constitui importante diretriz da política
nacional e internacional brasileira. Esse fato já foi elencado pelo Plano Nacional de
Desenvolvimento Regional (PNDR) que o incluiu no Programa de Desenvolvimento
da Faixa de Fronteira (PDFF) da Secretaria de Programas Regionais do Ministério
da Integração Nacional, criado em 1.999 e reestruturado em 2007. Contudo, seus
resultados na atuação da promoção da cidadania da população fronteiriça e como
fomentador do fortalecimento das atividades econômicas e de aproveitamento das
vantagens e particularidades locais, ainda não se concretizaram.
No contexto do Mercado Comum do Sul (MERCOSUL) tem se mostrado
evidente a necessidade de maior integração educacional entre os países membros.
Em 2001 foi realizada a Reunião de Ministros de Educação do MERCOSUL (RME),
em Assunção no Paraguai, que estabeleceu plano estratégico para o
desenvolvimento e integração dos sistemas educacionais dos países que o compõe.
Existem intenções e políticas, entretanto como disse Fedatto (2005, apud OLIVEIRA,
2005, p.496): “frente à realidade que vivemos fica evidente a distância entre o escrito
e o feito, a sua total desconsideração”.
Ao longo do século XX, mais intensamente em suas últimas décadas, surgiu
um movimento cuja expressão máxima foi a Convenção Internacional dos Direitos
da Criança (ONU, 1989), proclamado na Carta das Nações Unidas e ratificado pelo
Brasil em 1.990 através do Decreto Presidencial de nº 99.710. Este documento veio
confirmar tantos outros já firmados, tais como Declaração de Genebra sobre os
Direitos da Criança em 1924 e na Declaração dos Direitos da Criança adotada pela
Assembléia Geral (ONU, 1948). A concepção de criança e adolescente trazida por
estes documentos se baseou no reconhecimento desses seres humanos como
sujeitos de direito, em oposição à noção de incapacidade jurídica que a
caracterizava anteriormente.
De acordo com levantamento efetuado em 2003 pela Comissão de Migrantes,
Refugiados e Itinerantes, sobre crianças estrangeiras em relação à vida escolar,
constatou-se na resposta recebida de 1.300 crianças, o seguinte: entre 6 e 7 anos
de idade, de 25 crianças uma não está na escola. Entre 8 e 14 anos, de 50 crianças
tem uma que não vai à escola. De 15 a 18 anos um em cada 5 adolescentes não
está mais estudando. Observe-se que é um universo pequeno de pesquisa,
certamente se fosse de nível mais amplo, seria maior o número de evasão escolar.
Um dos maiores desafios sociais enfrentado pelos países em
desenvolvimento é o de compatibilizar crescimento econômico com desenvolvimento
social, incluindo-se aqui o bem-estar da criança, evitando-se a existência de milhões
de meninos e meninas, abandonados pelas ruas do mundo, sem qualquer respeito
aos seus direitos.
È importante aprofundar a nossa investigação sobre as relações sociais no
interior da escola de fronteira, considerando fronteira no sentido geográfico e
simbólica. Essa escola tem uma dinâmica própria que se caracteriza pelo trânsito
físico e intercultural que ali se produz.
No Brasil a educação se organiza segundo a Lei de Diretrizes e bases da
Educação Nacional (LDB – Lei nº 9.394/96) que orienta os dois níveis: educação
básica e educação superior. Os sistemas de ensino municipal e estadual constituem-
se de escolas que oferecem ensino fundamental e médio. A educação infantil está a
cargo dos municípios e a rede estadual oferece o ensino médio e médio
profissionalizante, podendo também arcar com o ensino superior que é prerrogativa
do governo federal. As secretarias de educação municipais e estaduais aplicam nas
escolas políticas oriundas do Ministério da Educação tais como: programa Nacional
do Livro Didático, Bolsa Escola, Merenda Escolar, Mais Educação e outros.
A expansão do ensino público na Bolívia só ocorreu a partir da segunda
metade da década de 70, quando cresceu o fluxo migratório em direção à fronteira
com o Brasil. A instabilidade política atrasou o desenvolvimento da educação na
Bolívia. Desde 1994 a Bolívia implementa o Programa de Reforma Educativa (PRE)
em que se estabelece o caráter democrático da educação, com a sociedade
participando do seu planejamento. Outro plano estratégico denominado Educación
Boliviana, está em processo de consulta e planeja ações para todos os níveis
educacionais.
O sistema educacional é dividido em educação infantil, primária secundária e
superior. O fato de ser a Bolívia um dos países mais pobres da América Latina, com
mais da metade da sua população em situação de pobreza, especialmente aquela
que vive na área rural, influi negativamente nos resultados educativos.
É notório que as áreas de fronteira, onde circulam muitas pessoas diferentes,
constituem um cenário de vulnerabilidade para crianças e adolescentes. Muitos
direitos são violados, por isso é preciso que se estabeleçam metas e
recomendações para superar as dificuldades. Entre as dificuldades e desafios a
serem enfrentados para garantir esses direitos podemos destacar: situação de
pobreza, necessidades básicas insatisfeitas, mortalidade infantil, desnutrição,
inadequado saneamento básico, falta de registro de nascimento e documentação. O
trabalho infantil é outra séria ameaça ao direito das crianças à educação. A
repetência e a evasão também são presenças que incomodam. A dificuldade com o
idioma nas escolas é mais um problema que provoca o afastamento da escola. Não
podemos deixar de citar os diversos tipos de abuso, exploração e violência além do
perigo do tráfico internacional de seres humanos.
É importante evidenciar que a população da Bolívia é formada por muitos
grupos étnicos e culturais. A desigualdade é comum, resultando em pobreza e falta
de oportunidades. Famílias inteiras migram internamente das áreas rurais para as
cidades, esperando melhorar suas vidas. Os homens, as mulheres e as crianças,
todos, desempenham papel importante na economia familiar. Frequentemente esses
migrantes se tornam vítimas de abusos dos direitos humanos e sofrem maus tratos.
Esse sofrimento torna-se maior quando percebem o quanto é difícil continuar com
seus antigos costumes e hábitos. Esgotadas as possibilidades de viver em seu país,
eles passam a acalentar o sonho da emigração.
Em Corumbá o ingresso dos bolivianos caracteriza-se pela procura de
emprego e melhores meios de sobrevivência. Na feira BRASBOL, a maioria dos
comerciantes é boliviana. Eles também são inúmeros nas feiras livres, nas portas
dos hotéis, em toda a área central da cidade e no porto geral. Muitos estão se
instalando em residências e pontos comerciais, utilizando-se dos serviços públicos
de saúde e educação e de todo o aparato institucional do município.

CONSIDERAÇÕES FINAIS

A escola de fronteira tem que ser diferenciada das demais escolas públicas
brasileiras. Tem que estar voltada para as necessidades locais, com disciplinas e
livros que contemplem este universo. A falta de adaptação para as necessidades
das crianças fronteiriças, bem o sabemos, tem início antes da sala de aula da escola
de fronteira e tem sua origem nos cursos de magistério e de pedagogia que ignoram
totalmente as especificidades da muitas realidades que o educador enfrentará no
exercício profissional.
As escolas de zona de fronteira devem desenvolver um modelo de ensino
comum, com um programa de educação intercultural com ênfase no ensino do
português e do espanhol, com o objetivo de atacar os problemas da exclusão social
e educacional a que vem sendo expostas as crianças e adolescentes que não
finalizam ou sequer iniciam um processo educacional.
Se o profissional da educação for devidamente preparado para lidar com a
diversidade própria da fronteira, pode melhorar o seu desempenho e seus
resultados, pois a ele compete a missão de aglutinar e identificar aptidões, atitude
fundamental na condução do processo.
Quanto mais os sistemas priorizarem metas igualitárias e inovadoras na
educação, mais estarão integrando os alunos migrantes. Como atitudes eficazes
para melhoria do desempenho, citamos a educação pré-escolar, a aprendizagem de
línguas e um apoio educativo complementar. A criação de equipes de
aconselhamento, acompanhamento de estudos, de ações interculturais e o
estabelecimento de parcerias com as famílias e comunidades, são também
ferramentas importantes e indispensáveis no processo.
A implementação de todas essas medidas exigiria do poder público a
aplicação de mais recursos para as escolas. Para isso, é preciso vontade política e
comprometimento com as causas da educação. A Constituição Federal ao dar
tratamento igualitário aos brasileiros e estrangeiros residentes no país (art. 5º)
assegurou a todos eles acessos às políticas públicas existentes. Em que pesem os
avanços alcançados, os poderes públicos federal, estadual e municipal devem,
ainda, abraçar conjunta e articuladamente, o cumprimento desta responsabilidade.
Mas essa responsabilidade é também de todos nós, a quem compete fortalecer a
ação do governo e exigir o cumprimento das obrigações.
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