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EXPANSÃO DO SERVIÇO SOCIAL E A IDEOLOGIA DESENVOLVIMENTISTA

Américo Ribeiro
RESUMO

A proposta deste artigo é sintetizar os elementos centrais da ideologia desenvolvimentista e


sua relação com a expansão sofrida pelo Serviço Social no Brasil bem como se deram as
formas de intervenção social do assistente nesse período, em particular a abordagem
comunitária ou Desenvolvimento da Comunidade (DC).

Palavras-chave: Desenvolvimentismo. Serviço Social. Abordagem Comunitária.

INTRODUÇÃO

De acordo com Iamamoto (2010) é na década de 1960 que se observa a existência


de um franca expansão do Serviço Social no Brasil. No decorrer desse período, observar-se
ainda que a profissão sofre transformações acentuadas, isto é, “moderniza-se” tanto o
assistente quanto a teoria, método e técnicas que emprega. Há também uma extensão maior de
cobertura de suas funções, como a coordenação e o planejamento, contribuindo para uma
evolução do status da profissão. Os métodos de Serviço Social de Grupo e, em especial o de
Comunidade, assumem maior relevo e aplicação exigindo uma nova caracterização dos
agentes. É no período que se situa os entre os dois primeiros Congressos Brasileiros de
Serviço Social (1947-1961) que situaremos essencialmente as condições que promoverão a
expansão da profissão no Brasil. Estas condições floresceram acima de tudo, dentro de um
quadro mais amplo, de expansão econômica e da afirmação do desenvolvimentismo como
ideologia dominante.


 Graduado em História pela Universidade Estadual do Maranhão – Centro de Estudos
Superiores de Caxias (CESC-UEMA) e Pós-Graduando em História do Brasil pelo Instituto
de Ensino Superior Franciscano (IESF).
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2 A IDEOLOGIA DO DESENVOLVIMENTISMO

Um dos trabalhos mais fundamentais quando se fala em desenvolvimentismo é


Ideologia do Desenvolvimento – Brasil JK-JQ, tese de Doutoramento de 1972 de Miriam
Limoeiro Cardoso. Em entrevista concedida por e-mail à Revista do Instituto de Humanitas
Unisinos a autora definiu o desenvolvimentismo como
[...] uma ideologia. A partir da Segunda Guerra Mundial começa a se forjar uma
nova hegemonia, comandada pelos Estados Unidos, sob a qual se projeta um novo
ciclo de expansão do capitalismo em que as regiões então chamadas “pobres” do
mundo eram estratégicas, tanto do ponto de vista econômico quanto do ponto de
vista político. Os grandes formuladores norte-americanos, artífices políticos dessa
expansão, tinham clareza da necessidade de dispor de uma ideologia dentro da qual
os países-alvo pudessem adotar como seu objetivo próprio, maior e imediato, a sua
inserção naquela expansão capitalista sob a forma requerida pelo capital então
hegemônico.

A ideologia desenvolvimentista de acordo com a autora, de maneira geral


envolveria a proposta de crescimento econômico acelerado, continuado e auto-sustentado. O
problema central a resolver constitui-se em superar o estágio transitório do
subdesenvolvimento e do atraso. A meta a atingir é a prosperidade, a grandeza material,
soberania, paz e ordem social.
O problema central seria superar o atraso que colocava o Brasil em uma posição
secundária no sistema capitalista. As razões desse subdesenvolvimento estão de acordo com
essa ideologia no modelo agrário-exportador bem como no fraco desempenho das chamadas
indústrias de transformação. A meta seria, neste sentido, fortalecer a indústria de base, sendo
necessário que se desenvolva no sentido da produção industrial pesada, garantindo dessa
maneira a libertação econômica e sua expansão. (IAMAMOTO, 2010, p. 341).
Apesar desse caráter dominante da ideologia desenvolvimentista, o Serviço Social
se mostrará, todavia, até o final da década de 1950, alheio ao seu chamamento. Os motivos
são diversos: o desenvolvimentismo juscelinista que subordinava todos os problemas ao
econômico, a diferença de objetivos em relação à política social e uma maior independência
dos assistentes sociais ao conquistarem posições e campos de atuação em seu interior e por
fim, uma certa aversão ao discurso demagógico da política desenvolvimentista. Contudo, o
Serviço Social beneficiou-se dessa expansão econômica ao interiorizar o caminho das grandes
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instituições, a modernização das administrações municipais, e o surgimento de novos


programas voltados para as populações rurais. Inicia-se também, novas formas de abordagem
no campo social, que serão assinaladas a seguir. (IAMAMOTO, 2010, p. 342-344).

3 AS NOVAS ABORDAGENS DO SERVIÇO SOCIAL

Aprofundando-se no plano teórico, o Serviço Social sob influencia norte-


americana, volta-se a psicologia e a psiquiatria para solucionar desajustes psicossociais. O
Serviço Social de Grupo, usado em sua forma tradicional somente como recreação e
educação, passa a partir da década de 1950, a fazer parte de programas nacionais em
hospitais, favelas, escolas etc. dando origem a uma nova abordagem que se tornaria
predominante na década de 1960: O Desenvolvimento da Comunidade (DC), que relaciona
estudos piscossociais do participante com os problemas da estrutura social e que utilizava a
dinâmica de grupo. As iniciativas vinculadas ao Desenvolvimento da Comunidade apresentam
no período desenvolvimentista, grande expansão, surgindo uma série de organismos e a
realização de importantes Seminários. Esses organismos se inspirarão, sobretudo na
experiência norte-americana. (IAMAMOTO, 2010, p. 344-345). Baseados nas técnicas desse
tipo de abordagem irão buscar a modernização agrícola brasileira tendo a Educação de
Adultos uma função estratégica. Sua consagração dentro do Serviço Social será vista no item
a seguir.

4 O II CONGRESSO BRASILEIRO DE SERVIÇO SOCIAL E A DESCOBERTA DO


DESENVOLVIMENTISMO

Na mentalidade predominante nesse período, o assistente social quer deixar de ser


apostolo para transformar-se em agente da mudança. Não é somente a descoberta do
desenvolvimentismo, é a consagração do DC como área de preferência do Serviço Social, na
ponta da profissão e a mais condizente com as demandas sociais do Brasil. (NETTO, 2010,
p.138-139). Sendo assim, esse marco histórico ao qual se referimos trata-se do II Congresso
Brasileiro de Serviço Social, realizado em 1961, no Rio de Janeiro.
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A vitória de Janio Quadros marca uma nova fase no desenvolvimentismo: a meta


agora é o social e não o crescimento econômico proposto pelos os governos antecedentes.
Essa ênfase não é demagógica, dando grande importância a saúde, enfatizando a melhoria da
qualidade de vida. A educação também é outro ponto a ser destacado, não sendo vista como
meramente atrelada a produtividade, mas tendo a função reestruturar a sociedade. No âmbito
do trabalho, tem em relação a este uma perspectiva moralizadora e de Justiça Social. O
projeto janista propõe enfim, um desenvolvimento humano. (IAMAMOTO, 2010, p. 347).
Janio Quadros traria, ainda, uma linguagem mais próxima do Serviço Social,
situando-o como instrumento para o alcance desses objetivos. E determina sua forma de ação:
o Desenvolvimento da Comunidade. Esse novo clima ideológico que emana do Estado
representam a importância do desenvolvimento da profissão ao mesmo também um desafio:
os assistentes se propõem através do DC a contribuir para esse processo de mudança exigido.
Apesar disso, as intervenções e resoluções do II Congresso Brasileiro de Serviço Social foram
um tanto incoerentes: procuraram-se soluções técnicas para grandes problemas estruturais.
(IAMAMOTO, 2010, p. 348-354).
Entretanto, esse momento de consagração, ainda que tímida, seria silenciado. A
renúncia de Jânio Quadros pegaria a todos de surpresa no mesmo ano, abortando esse
processo de maneira definitiva como diz José Paulo Netto (2010, p. 141)

Este desenvolvimento foi abortado pelo golpe de abril. Como variável independente,
a autocracia burguesa modificou substantivamente o cenário em que ele vinha se
desenrolando. Modificou-o mito contraditoriamente: num primeiro momento, pela
neutralização dos protagonistas sociopolíticos comprometidos com a
democratização da sociedade e do Estado, cortou os efetivos suportes que poderiam
dar um encaminhamento critico e progressista à crise em andamento no Serviço
Social “tradicional”; mas, com a implementação do seu projeto de “modernização
conservadora”, precipitou esta mesma crise. [...] as vertentes que, no processo de
“Desenvolvimento da Comunidade”, revelavam-se compatíveis com os limites da
autocracia burguesa [...] encontrariam um campo aberto para o seu florescimento.

Para Miriam Limoeiro (1972 apud ARNT, 2004, p. 44) autora da já citada tese,
Janio teria sido ingênuo em não considerar as reais relações de poder, “sendo bem menos
político que o necessário para efetivar suas decisões e muito mais formal que o desejável no
exercício de um cargo político, resultante de uma certa combinação de forças”.
O Serviço Social embora tenha sofrido literalmente um duro golpe, seria renovado
mais tarde pelo processo de redemocratização e desta vez sem ideologias vindas do Estado,
mas fruto da emancipação política e ideológica dos próprios profissionais do Serviço Social
em romper definitivamente com o passado.
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5 CONCLUSÃO

A ideologia desenvolvimentista que marcou o período que vai de Juscelino a João


Goulart, pretendia colocar o Brasil no eixo das nações desenvolvidas na época, com medidas
de integração, modernização e crescimento. Mas essas políticas, embora úteis em grande
escala, foram implementadas com capital estrangeiro, o que provocaria futuros problemas
para o Brasil. Ademais,privilegiando demais o econômico, o desenvolvimentismo não trouxe
o tão sonhado crescimento econômico das nossas regiões, mas pelo contrario, aprofundou as
já existentes desigualdades entre elas e que permanecem até hoje.
Uma analise detalhada do fracasso dessas metas, não foi o objetivo deste artigo,
mas sim de situá-lo enquanto ideologia para o Serviço Social. Como vimos, este ainda
encontrava-se alheio à essa ideologia dominante, seja por razões políticas ou teórico-
metodólogicas, embora tenha se beneficiado deste, com a expansão do curso de Serviço
Social e suas demandas. A vitória de Janio Quadros, aparentemente aproximaria o Serviço
Social do Desenvolvimentismo, visto que este seria no discurso do presidente, mais humano e
menos economicista.
O II Congresso Brasileiro de Serviço Social seria a consagração dessa
aproximação ao adotar a abordagem comunitária como forma definitiva de intervenção social.
O golpe militar de 1964, como reação as mudanças que estavam ocorrendo não apenas no
Brasil, mas em toda a América Latina, interrompeu permanentemente esse processo, que seria
retomado com o retorno a democracia e uma maior autonomia do Serviço Social em relação
ao Estado.

REFERÊNCIAS

ARNT, Ricardo. Jânio Quadros: O Prometeu da Vila Maria. Rio de Janeiro: Ediouro, 2004.
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CARDOSO, Miriam Limoeiro. Falta política à política. Disponível em:


http://www.ihuonline.unisinos.br/index.php?option=com_content&view=article&id=51 4
&secao=201 . Acessado em: 01 dez 2012. Entrevista concedida a IHU On-Line.

IAMAMOTO, Marilda Vilela. Relações sociais e serviço social no Brasil: esboço de uma
interpretação histórico-metodológica. 32 ed. São Paulo: Cortez [Lima, Peru]: CELATS, 2010.

NETTO, José Paulo. Ditadura e serviço social: uma analise do serviço social no Brasil pós-
64. 15 ed. São Paulo: Cortez, 2010.

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