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MIGUEL ANTONIO PINHO BRUNO

CRESCIMENTO ECONÔMICO, MUDANÇAS ESTRUTURAIS E DISTRIBUIÇÃO


AS TRANSFORMAÇÕES DO REGIME DE ACUMULAÇÃO NO BRASIL

Uma Análise Regulacionista

Tese em co-tutela submetida ao Instituto de


Economia da Universidade Federal do Rio de Janeiro
(UFRJ) e à École des Hautes Études en Sciences
Sociales (EHESS) - Paris, como parte dos requisitos
necessários à obtenção do título de Doutor em
Economia.

ORIENTADORES:

Prof. João SABOIA (IE / UFRJ)


Prof. Robert BOYER (EHESS)

RIO DE JANEIRO
2005
À Andreia,
pelo apoio, compreensão e por acreditar que as
verdadeiras metas são realizáveis e acabar me
convencendo disto. Enfim, mais uma vez, por tudo...

Às nossas famílias ... pais, mães e irmãos ...

À Yedda Lúcia de Abreu Pinho, minha tia (in memorian),


Pela grandeza de espírito e porque foi um exemplo de
que ser e saber, sensibilidade e razão
não precisam estar dissociados...
sobretudo, numa sociedade que tende a valorizar apenas
o ter...
AGRADECIMENTOS

Ao Professor João Saboia, meu orientador no Instituto de Economia da Universidade


Federal do Rio de Janeiro (UFRJ), pelo apoio e estímulo desde 1997, durante a defesa de tese
de Mestrado, na Universidade Federal Fluminense. O Professor Saboia foi pioneiro na
divulgação dos trabalhos da Escola da Regulação no Rio de Janeiro, inclusive ministrando o
curso Teoria da Regulação a nível de Mestrado e de Doutorado no IE/UFRJ. Além de sua
atenção contínua, pude desfrutar como orientando, do ambiente intelectual e de pesquisa
proporcionado pelo IE/UFRJ, com seu quadro de professores e pesquisadores entre os mais
gabaritados do país.

Ao Professor Robert Boyer, meu orientador na École des Hautes Études en Sciences
Sociales EHESS / Paris, e um dos pais da Teoria da Regulação, pelo encorajamento e
estímulo permanentes. Os trabalhos desenvolvidos por Boyer constituem a prova irrefutável
do potencial explicativo e heurístico das macroanálises em termos de regulação, bem como de
sua ampla aplicabilidade. Este fato por si mesmo é já um grande estímulo para trilhar o
mesmo percurso teórico-metodológico. Agradeço-lhe também os comentários e as críticas
construtivas para que as diversas etapas desta análise permanecessem coerentes com os
princípios teóricos e metodológicos regulacionistas.

Aos colegas e pesquisadores franceses do Centre d Études Prospectives d Économie


Mathematique Appliquée à la Planification CEPREMAP / Paris, onde tive a oportunidade
de desfrutar de um ambiente de pesquisa voltado para as problemáticas da regulação das
economias capitalistas contemporâneas. Foi lá que tive a oportunidade de conhecer as grandes
personalidades da Escola da Regulação, como Pascal Petit, Bruno Théret, Jaime Marques-
Pereira, Michel Aglietta, Luis Miotti, Bernard Billaudot, Benjamin Coriat, Alain Lipietz, para
citar os que pude interagir mais diretamente no âmbito das discussões teóricas e empíricas.

À Pierre Salama, também pelo estímulo em ler e discutir um dos artigos sobre uma das
etapas deste trabalho e que foi apresentado no Encontro Nacional da Sociedade Brasileira de
Economia Política SEP / 2004. Inclusive aos demais membros de seu grupo de pesquisa,
particularmente a Mamadou Camara e Alexis Saludjian.

Aos Professores Francisco Oliveira e Luiz Carlos Bresser Pereira, pelo estímulo e
valorização sincera do meu trabalho. Durantes os eventos da SEP 2003 e 2004, eles muito me
prestigiaram assistindo as apresentações de meus artigos e tecendo comentários pertinentes e
motivadores.
Também sou grato à Hawa Diawara, pelas reflexões conjuntas sobre temas de alta
relevância para a economia brasileira atual. Sua tese de doutoramento, orientada por Jaime
Marques-Pereira, possui um ponto de convergência básico com um dos momentos da presente
análise: o lugar fundamental do Estado, das finanças e dos regimes monetários na explicação
da performance macroeconômica brasileira nos anos 80 e 90. Marques-Pereira também muito
me estimulou ao ler e discutir meus artigos sobre o trabalho de tese, apresentados no Encontro
Nacional da SEP em Florianópolis / 2003 e Uberlândia / 2004, além de assistir minha
apresentação nos Seminários de Pesquisa do IE/UFRJ, sobre regulação e crescimento no
Brasil.

Ao Professor Getúlio Borges da Silveira Filho, do IE/ UFRJ, pelos esclarecimentos


das dúvidas quanto às questões econométricas.

A Regis Bonelli, do Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada-IPEA, pelos


esclarecimentos quanto à metodologia de estimação dos dados sobre utilização da capacidade
produtiva para o total da economia brasileira, inclusive pelo envio das séries que estimou. No
IPEA também sou grato à Lucilene Morandi pelo envio de seus dados sobre o estoque de
capital fixo do Brasil.

A Adalmir Marquetti, da PUC-RS, que gentilmente me enviou suas Notas


Metodológicas para a construção das séries do nível geral de emprego e da massa salarial da
economia brasileira, no período 1950-2000.

Ao Departamento de Evolução Econômica da Faculdade de Ciências Econômicas da


UERJ e ao seu Programa de Capacitação Docente PROCAD pela minha liberação com
vencimentos durante o ano que estive em Paris.

Ao Instituto de Economia da Universidade Federal do Rio de Janeiro pela concessão


de uma bolsa ao licenciar-me do Departamento de Contas Nacionais do IBGE para
desenvolver esta tese. À sempre atenciosa Anna Elizabeth e ao Ronei, cujos trabalhos na
Secretaria de Pós-Graduação do IE são fundamentais ao desenvolvimento de nossas pesquisas
de tese. Devo agradecer também ao Professor Antonio Licha pelo empenho na consecução do
acordo de co-tutela entre a UFRJ e a EHESS-Paris.

A CAPES pela bolsa de doutorado no Brasil e ao CNPQ pela bolsa no exterior,


durante a estada em Paris.
Ao amigo Ricardo Caffe, companheiro dos cursos dos Professores Boyer, Robert
Guttmann e Michel Aglietta, tanto na École Normale Superieure CEPREMAP/ Boulevard
Jourdan, quanto na Université de Paris XIII.

Enfim, a todos aqueles que contribuíram de alguma maneira para a realização deste
trabalho, os meus mais sinceros agradecimentos.

Rio de Janeiro, dezembro de 2004.


CRESCIMENTO ECONÔMICO, MUDANÇAS ESTRUTURAIS E DISTRIBUIÇÃO:
AS TRANSFORMAÇÕES DO REGIME DE ACUMULAÇÃO NO BRASIL
Uma Análise Regulacionista

Resumo

A performance macroeconômica brasileira nas décadas de 80 e 90 permaneceu muito abaixo


da média histórica. Várias explicações foram propostas, destacando-se o ambiente de alta
inflação vigente até 1994, o elevado passivo externo ou a insuficiência de poupança. Não
faltaram críticas às ineficiências geradas pela própria lógica do modo de desenvolvimento por
substituição de importações. Em geral supõe-se que as saídas para as grandes crises residem
sempre em se trilhar a direção oposta. Se havia protecionismo, então deve-se agora liberalizar;
se a presença do Estado era excessiva, então deve-se reduzir a participação do setor público;
se havia garantias mínimas de emprego, então é preciso removê-las e aprofundar o grau de
flexibilidade das relações de trabalho. As economias são premidas a transitar de um extremo a
outro, com os governos aceitando passivamente as soluções exógenas, em geral
completamente desconectadas das especificidades nacionais. O objetivo básico desta análise é
proporcionar uma abordagem alternativa aos dois extremos, mobilizando os aportes teóricos e
metodológicos da Teoria (francesa) da Regulação, enquanto macroeconomia histórica e
institucionalista. Procura-se mostrar as particularidades dos modos de regulação e dos regimes
de acumulação que respondem pelas principais tendências macroeconômicas observadas na
economia brasileira.
CROISSANCE ÉCONOMIQUE, CHANGEMENTS STRUCTURELS ET
DISTRIBUTION:
LES TRANSFORMATIONS DU RÉGIME D'ACCUMULATION AU BRÉSIL
Une Analyse Régulationniste

Résumé

La performance macroéconomique brésilienne dans les décennies de 80 et 90 est


restée beaucoup au-dessous de la moyenne historique. Plusieurs explications ont été
proposées, les plus importantes étant l environnement de haute inflation présente jusqu en
1994, l excessif endettement externe et l insuffisance d épargne. Les critiques adressées aux
inefficacités produites par la propre logique du mode de développement par substitution
d importations n ont pas manqué. En général on suppose que les sorties des grandes crises
consistent à toujours explorer la direction opposée. S il y avait protectionnisme, alors il faut
libéraliser ; si la présence de l État était considérée excessive, alors sa participation doit être
réduite ; s il y avait des garanties minimes d emploi, alors il est nécessaire de les enlever et
d approfondir le degré de flexibilité des relations de travail. Les gouvernements sont censées
faire transiter les économies d un extrême à l autre, en acceptant passivement les "solutions"
exogènes, en général complètement déconnectées des spécificités nationales. L objectif
principal de cette analyse est de fournir une approche alternative à ces deux extrêmes, en
mobilisant les contributions théoriques et méthodologiques de la Théorie (française) de la
Régulation, en tant que macroéconomie historique et institutionnelle. La thèse explicite les
particularités des modes de régulation et des régimes d accumulation qui sont à l origine des
principales tendances macroéconomiques observées dans l économie brésilienne.
Monsieur le Président du Jury
Chers Collègues

C est avec le plus grand plaisir que j avais accepté de faire partie du Jury de la thèse de
Miguel BRUNO. Ayant rencontré le candidat lors de son séjour à Paris il y a 2 ans, je
connaissais ses qualités de chercheur, et me réjouissais par avance de discuter de sa thèse.

Malheureusement une suite fortuite d évènement malencontreux, me force à renoncer à cette


perspective. Et je me vois contraint, inopinément de quitter Rio avant la soutenance pour
rejoindre Paris en toute urgence.

Je regrette ce contre-temps, et j espère vivement que ma défaillance ne portera pas tord au


candidat.

Pour suppléer mon absence, je vous prie de trouver ci-joint, un document qui consigne par
écrit les remarques essentielles que m a inspiré la lecture de la thèse. Si vous le jugez utile,
elles peuvent être lues en séance, et en tous cas être reproduites dans le procès verbal de
soutenance.

En souhaitant plein succès au candidat, je vous prie d agréer Monsieur le Président,


l expression de mes cordiales salutations.

Fait à Rio de Janeiro, le 23 mars 2005


Benjamin Coriat
SUMÁRIO
INTRODUÇÃO GERAL..........................................................................................................19
CAPÍTULO 1 - A REGULAÇÃO COMO PRINCÍPIO DE ANÁLISE: ORIGENS,
FUNDAMENTOS TEÓRICOS E METODOLÓGICOS.........................................................25
1.1 Introdução ...........................................................................................................................25
1.2 Teoria da regulação e macroeconomia .........................................................................26
1.3 Regulação e reprodução em economias capitalistas .....................................................28
1.4 Macrodinâmica capitalista: as relações sociais determinativas ....................................34
1.5 Fundamentos epistemológicos: as dimensões ontológicas do conceito de regulação ..37
1.6 Fundamentos teóricos: o hard core da Teoria da Regulação........................................46
1.7 Dos conceitos intermediários ao nível meso-econômico de análise.............................52
1.7.1 A forma institucional do rapport salarial ou wage-labor nexus (WLN) ..................55
1.7.2 A forma institucional da moeda ou regime monetário-financeiro (RMF)................63
1.7.3 A forma institucional da concorrência (FC) .............................................................68
1.7.4 A forma institucional do Estado (FE) .......................................................................70
1.7.5 A forma institucional de inserção no regime internacional (FII)..............................75
1.8 Síntese das principais questões .....................................................................................78
CAPÍTULO 2 - MODOS DE REGULAÇÃO E REGIMES DE ACUMULAÇÃO: OS
DETERMINANTES ENDÓGENOS DA PERFORMANCE MACROECONÔMICA ..........80
2.1 - Introdução.........................................................................................................................80
2.2 Os modos de regulação e a variabilidade das dinâmicas econômicas e sociais ..............81
2.3 Modos de regulação e formas particulares de capitalismo ..............................................82
2.4 O conceito de paradigma tecnológico-industrial .............................................................85
2.5 Os regimes de crescimento ou de acumulação ................................................................89
2.6 Regimes de produtividade e regimes de demanda...........................................................99
2.7 Os modos de desenvolvimento e os períodos de regime e de crise ...............................110
2.8 Uma macroeconomia histórica e institucionalista: método e princípios de análise.......113
2.8.1 Agentes e estruturas em interação: a racionalidade situada ou contextual ....................116
2.8.2 Uma hipótese central: a macrodinâmica e a política econômica dependem dos modos de
regulação .................................................................................................................................128
2.8.3 Análise regulacionista: uma macroeconomia do crescimento e das crises econômicas 133
2.8.4 As hipóteses de complementaridade e hierarquia das formas institucionais .................142
2.9 Avanços recentes da Teoria da Regulação: uma síntese................................................148
CAPÍTULO 3 A PERFORMANCE MACROECONÔMICA EM PERSPECTIVA
HISTÓRICA: PRINCIPAIS FATOS ESTILIZADOS ...........................................................153
3.1 Introdução ...................................................................................................................153
3.2 A performance macroeconômica em perspectiva histórica: principais fatos estilizados
157
3.2.1 Acumulação de capital e crescimento econômico: primeiras constatações............159
3.2.2 Inflação ...................................................................................................................168
3.2.3 Desemprego e relações de trabalho ........................................................................171
3.2.4 Setor externo ...........................................................................................................179
3.2.5 Setor público ...........................................................................................................189
3.2.6 Evolução setorial e de ramos específicos da indústria............................................196
3.3 Síntese dos principais resultados ................................................................................200
CAPÍTULO 4 AS FORMAS INSTITUCIONAIS NA ECONOMIA BRASILEIRA:
CONFIGURAÇÕES E TENDÊNCIAS EVOLUTIVAS .......................................................205
4.1 Introdução ...................................................................................................................205
4.2 As relações Estado-economia: entre intervencionismo autoritário e democracia política
206
4.2.1 Uma primeira periodização da evolução do Estado brasileiro................................208
4.2.2 A evolução do regime fisco-financeiro...................................................................233
4.2.3 Industrialização, regime fisco-financeiro e regime de política econômica ............234
4.2.4 Seguridade social e estruturas de bem-estar ...........................................................241
4.2.5 Evolução do grau de centralização fiscal................................................................248
4.2.6 Investimento, consumo e poupança do governo .....................................................248
4.2.7 Uma estrutura tributária regressiva e amplamente favorável ao capital .................259
4.2.8 As transformações do regime fisco-financeiro: uma análise em termos de mudança
estrutural 262
4.2.9 Síntese dos principais resultados ............................................................................277
4.3.1 O rapport salarial como sistema de relations salariales .......................................281
4.3.2 Condicionantes históricos da constituição do salariado no Brasil ..........................284
4.3.3 As configurações-tipo da WLN em dois modelos teóricos ............................................288
4.3.4 Uma sociedade salarial dual e a configuração da WLN ..........................................290
a) Características gerais do modo de consumo assalariado ............................................295
b) Dualidade e flexibilidade da WLN .............................................................................303
c) A formação dos salários por segmento .......................................................................319
d) A WLN e a fixação do salário mínimo .......................................................................326
e) A WLN e o setor industrial.........................................................................................337
f) Os ajustamentos do emprego total da economia......................................................360
4.3.5 Síntese dos principais resultados ............................................................................362
4.4 O regime monetário-financeiro: a difícil construção da moeda nacional .........................373
4.4.1 Introdução ......................................................................................................................373
4.4.2 O conceito de regime monetário-financeiro (RMF) e sua relevância............................373
4.4.3 A evolução do RMF brasileiro: uma periodização em termos de mudança institucional
375
4.4.4 Particularidades do sistema financeiro brasileiro ..........................................................379
4.4.5 Indicadores de desenvolvimento financeiro ..................................................................384
4.4.6 O regime monetário-financeiro dual..............................................................................391
4.4.7 O regime monetário-financeiro pós-Plano Real ............................................................406
4.4.8 Síntese dos principais resultados ...................................................................................415
4.5 As formas da concorrência e de inserção internacional da substituição de importações
à globalização .........................................................................................................................418
4.5.1 Introdução ......................................................................................................................418
4.5.2 Concorrência e inserção internacional no contexto da globalização .............................419
4.5.3 Da substituição de importações à globalização neoliberal .........................................422
4.5.4 Liberalização comercial e financeira nos anos 90 .........................................................425
4.5.5 A dimensão comercial ...................................................................................................426
4.5.6 Concentração e internacionalização...............................................................................435
4.5.7 Comportamento dos mark ups setoriais e mudanças estruturais na indústria................442
4.5.8 A dimensão financeira ...................................................................................................448
4.5.9 Impactos das transformações das formas da concorrência sobre a WLN: primeiras
constatações ............................................................................................................................459
4.5.10 Síntese dos principais resultados ............................................................................461
CAPÍTULO 5 CRESCIMENTO ECONÔMICO, MUDANÇAS ESTRUTURAIS E
DISTRIBUIÇÃO: AS TRANSFORMAÇÕES DO REGIME DE ACUMULAÇÃO NO
BRASIL ..................................................................................................................................464
5.1 Introdução ...................................................................................................................464
5.2 Distribuição e acumulação de capital: as bases do crescimento econômico ..............465
5.3 Estoque de capital fixo bruto, intensidade do capital e ritmo de substituição
capital/trabalho........................................................................................................................466
5.4 Uma análise da mudança estrutural como mudança de regime ..................................502
5.3 A relação de Kaldor-Verdoorn e os regimes de produtividade...................................513
5.4 A relação de Kaldor-Verdoorn e a economia brasileira..............................................515
5.5 Teste da primeira lei de Kaldor...................................................................................522
5.6 A lei de Kaldor-Verdoorn nos setores não-industriais................................................537
5.7 Regimes de acumulação e abordagem neo-estruturalista: o modelo de Bowles-Boyer e
o caso brasileiro ......................................................................................................................542
5.8 Uma análise econométrica das relações entre lucro e acumulação de capital ............555
5.9 Poupança e acumulação de capital no período [1984 2003]....................................572
5.10 Os determinantes da taxa de poupança na abordagem Aglietta-Vidal .......................600
5.11 A evolução das tendências da demanda agregada: o regime de demanda..................603
5.12 Indicadores das tendências da demanda .....................................................................607
5.13 A economia brasileira em financeirização forçada .................................................612
5.16 Financeirização na economia brasileira e o padrão finance led growth .....................620
5.17 Utilização da capacidade instalada (u) e razão dívida externa / PIB (bx) ..................628
5.18 Determinantes da taxa de investimento produtivo sob condições de elevado
endividamento externo e finanças liberalizadas .....................................................................630
5.19 Lucro empresarial, juros e acumulação de capital ......................................................632
5.20 Indicadores de financeirização....................................................................................647
5.21 Síntese dos principais resultados ................................................................................656
CONCLUSÃO GERAL..........................................................................................................673
BIBLIOGRAFIA ....................................................................................................................684
ÍNDICE DE GRÁFICOS........................................................................................................705
ÍNDICE DE TABELAS..........................................................................................................710
ÍNDICE DE QUADROS ........................................................................................................712
ÍNDICE DE FIGURAS ..........................................................................................................719
ANEXOS ................................................................................................................................721
1. FONTES DE DADOS ................................................................................................721
2. SOFTWARES UTILIZADOS:...................................................................................722
RÉSUMÉ DE LA THÈSE (deux pages).................................................................................722
RÉSUMÉ DE LA THÈSE (quarante-six pages).....................................................................724
INTRODUÇÃO GERAL
Nothing is as practical as a good theory
(Johnson, Jr et alii, Econometrics, 1987)

Esta análise é fruto de mais de uma década de pesquisas no âmbito da Teoria


(francesa) da Regulação. Mais precisamente, no campo das macroanálises regulacionistas que,
por natureza, são voltadas à compreensão da evolução das economias que se organizam sob o
modo de produção capitalista, com as especificidades de suas crises e de seus períodos de
crescimento.

No trabalho de tese de Mestrado, concluído em 1997, a preocupação principal foi


basicamente teórica e metodológica. Tratou-se de um estudo das origens e evolução da
abordagem em termos de regulação, o que possibilitou uma compreensão mais qualificada de
seu potencial heurístico e explicativo. Por outro lado, esta etapa foi também fundamental para
dirimir dúvidas e incompreensões comuns acerca de seus objetivos e objetos privilegiados de
análise.

No Brasil, muitas das críticas frequentemente endereçadas à Teoria da Regulação,


normalmente partem de leituras parciais ou de estudos centrados na primeira geração dos
trabalhos. Na maior parte dos casos, essas críticas revestem-se de conteúdos destrutivos, como
se o surgimento e a difusão de novas abordagens alternativas à visão tradicional implicasse
necessariamente na exclusão ou no demérito das demais visões existentes. Paradoxalmente, as
interpretações mais negativas são provenientes do campo heterodoxo, o que, do ponto de vista
epistemológico, tende a fragilizá-lo diante da coesão e da institucionalização da visão
neoclássica e de suas variantes contemporâneas, que normalmente não travam disputas intra-
paradigma. Estas últimas avançam com o suporte ideológico de uma época de
mundialização do capital e de disseminação do pensamento único.

Após um longo período de estudos no campo da Epistemologia da Economia,


confrontando teorias e métodos de análise, os resultados das pesquisas regulacionistas
pareciam proporcionar um conjunto de respostas originais para as grandes questões
macroeconômicas do nosso tempo: os fatores que possibilitaram os trinta gloriosos anos de
prosperidade do pós-Guerra; a crise do fordismo e seus desdobramentos; o lugar das
economias em desenvolvimento no contexto das transformações trazidas pelo processo de
globalização; etc.
A escolha do tema da presente tese foi então uma decorrência natural do percurso
teórico-metodológico que levou à dissertação de 1997. Considerando-se como
suficientemente assimilados os fundamentos teóricos e as noções de base das macroanálises
regulacionistas, tratava-se agora de aplicá-las a uma formação social concreta. E mais uma
vez a escolha seguiu uma ordem também natural, pois desde 1995, a oportunidade de
ministrar as disciplinas de Formação Econômica do Brasil e Economia Brasileira
Contemporânea na UFF, UERJ e UCAM, contribuíram para suscitar problemáticas e questões
intelectualmente instigantes.

O capítulo 1 fornece uma síntese da problemática instaurada pela aplicação do


conceito de regulação (em sua acepção macroeconômica e não-neoclássica) em economia.
Mostra os vínculos teóricos entre regulação e reprodução nas economias capitalistas e procura
responder às freqüentes acusações de funcionalismo nas análises. O hard core da Teoria da
Regulação é então explicitado com as hipóteses fundadoras. Em seguida, são apresentados os
chamados conceitos intermediários com as definições de formas institucionais. Estas últimas
ocupam um lugar fundamental na construção de um nível meso-econômico de análise,
permitindo a passagem micro-macro sem o subterfúgio do agente representativo.

No capítulo 2, são introduzidos os conceitos de modo de regulação e modos de


desenvolvimento. Explicitam-se as condições teóricas que fazem das macroanálises em termos
de regulação uma alternativa possível às tradicionais abordagens pelo equilíbrio. A idéia de
racionalidade situada ou contextual torna-se fundamental no âmbito da interação agente-
estrutura sendo então uma das bases para o desenvolvimento de uma macroeconomia histórica
e institucionalista.

A noção de regime de acumulação ou de crescimento é definida como a conjunção de


um regime de produtividade com um regime de demanda. Neste contexto, uma hipótese
central é explicitada: a macrodinâmica e a política econômica dependem das particularidades
do modo de regulação vigente. Isto significa que a eficácia de um determinado regime de
política econômica é uma função das condições estruturais através das quais as macro-
regularidades econômicas são reproduzidas. Mudar a política econômica ou o modelo que a
pressupõe implica em mudar a institucionalidade e os demais fatores organizacionais que
suportam o padrão vigente de relacionamento entre setores ou entre agentes econômicos.

Uma taxionomia regulacionista das crises econômicas e as hipóteses de hierarquia e


complementaridade das formas institucionais também constam deste capítulo que conclui com
uma síntese dos avanços recentes da Teoria da Regulação.
O capítulo 3 proporciona uma visão geral da performance macroeconômica brasileira
numa perspectiva de longo prazo. São apresentados vários indicadores concernentes à
acumulação de capital, crescimento econômico, inflação, desemprego, setor público, relações
internacionais e evolução setorial. Seu principal objetivo é reunir um conjunto de fatos
estilizados na definição kaldoriana, preparando a análise para as etapas subseqüentes onde
deverão ser explicados de acordo com os pressupostos e hipóteses teóricas.

O capítulo 4 desenvolve uma análise da evolução das cinco formas institucionais que
compõem um modo de regulação: o rapport salarial ou wage-labor nexus; as relações
Estado-economia; o regime monetário-financeiro; as formas da concorrência e de inserção
internacional. Busca-se periodizar sua evolução e explicitar sua lógica, através da análise de
séries temporais e de testes econométricos com os dados disponíveis para a economia
brasileira. A hipótese básica neste contexto é que cada economia e sociedade desenvolve
configurações particulares para essas formas institucionais. Essas configurações específicas
respondem pelos padrões de desenvolvimento macroeconômico na medida em que
determinam as características do regime de acumulação.

Há aqui uma nítida ruptura com as visões tradicionais que procuram explicar o
econômico pelo econômico, ou seja, mediante o recurso a uma axiomática totalizante e ao
mesmo tempo redutora, a realidade econômica é considerada movida por determinações
puramente mercantis, derivadas do comportamento de sujeitos individuais. Quando as
estruturas, instituições ou formas sociais de organização são consideradas, elas são
simplesmente acrescentadas à axiomática de partida sem jamais alterar seus pressupostos
microeconômicos. Utilizando-se de uma analogia, as instituições são introduzidas no âmbito
das análises neoclássicas como se estivessem entrando pelas janelas de uma construção já
completa e definitiva ; são adornos ou componentes para enriquecer uma estrutura teórica
considerada universalmente válida. Mas nas análises regulacionistas, as instituições surgem
como os próprios alicerces de um edifício que deve, por princípio metodológico, adaptar-se
às mutações irreversíveis da realidade ; as instituições, regras, convenções não são entes
dedutíveis de uma lógica de otimização. São suportes de micro, meso e macro-regularidades
fundamentais à reprodução social e econômica. Mais do que dotar os mercados de densidade e
eficiência, elas surgem como o substrato par excellance das relações e regularidades
econômicas.

O capítulo 5 conduz a análise ao plano da regulação global (régulation d ensemble),


convergindo para o principal objeto deste trabalho: a identificação dos regimes de
acumulação, explicitando suas particularidades e suas transformações. Os padrões de
crescimento e acumulação de capital durante o Plano de Metas e o milagre econômico
brasileiro são explicitados em suas características básicas, mobilizando vários recursos
estatísticos e procedimentos teóricos. A análise de co-integração constitui uma técnica
recorrentemente utilizada. Todavia, são consideradas as mudanças estruturais ou os períodos
de estabilidade, não só porque a periodização é um dos objetivos deste trabalho, mas porque
afetam os resultados dos testes de raízes unitárias e de co-integração.

Talvez um dos contributos desta análise seja o fato de proporcionar uma abordagem
macroeconômica do crescimento brasileiro, onde os seus determinantes como a taxa de lucro
e a taxa de acumulação de capital são explicitados em sua evolução de longo prazo.
Normalmente, as abordagens tradicionais preocupam-se demasiadamente com problemas de
insuficiência de poupança e minimizam os aspectos desestabilizadores de um ambiente
caracterizado por finanças liberalizadas. Praticam um retorno apressado e teoricamente pouco
fundamentado às estruturas de um capitalismo concorrencial, abstraindo-se do fato de que
foram estas que conduziram à grande crise dos anos 30. Estranha terapia ortodoxa que vê no
restabelecimento da livre concorrência financeira as condições para a retomada sustentada
do crescimento econômico, abstraindo-se desta crise estrutural e das demais crises financeiras
que marcaram os anos 90 e os primeiros anos deste século.

Uma hipótese considerada fundamental nesta análise refere-se ao processo de


financeirização que tem início nos ano 80 com a crise da dívida e a crise fiscal do Estado. Um
regime monetário-financeiro dual e inflacionista pôde emergir e reproduzir as tendências à
estagnação, ao mesmo tempo em que se tornava o suporte de uma acumulação rentista-
patrimonial, centrada nos grandes lucros do setor bancário. O setor para o qual não houve nem
primeira nem segunda década perdida . Nos anos 90, os ganhos inflacionários são
rapidamente substituídos pela renda financeira derivada de umas das taxas de juros reais mais
elevadas do planeta. Tratava-se de se criar as condições estruturais para o aprofundamento da
dimensão financeira da abertura econômica e então a alta inflação deveria cessar. Surgem
muitas promessas de aumento de eficiência econômica com o conseqüente retorno a uma
trajetória de crescimento forte e durável. Todavia, os dados empíricos mostram que apesar da
taxa de lucro, que havia permanecido em queda desde o fim do milagre , ter-se recuperado a
partir da vigência do Real, a taxa de acumulação de capital permaneceu em um nível
historicamente medíocre e em tendência de declínio.
O retorno do crescimento econômico em 2004 não significa nenhuma garantia de que
a economia brasileira tenha encontrado uma nova trajetória estável de expansão. Nas atuais
condições de financeirização e acumulação rentista-patrimonial, o crescimento não é um
resultado impossível. Todavia, a economia tende a alternar fases curtas de expansão com fases
de contração desencadeadas pela própria lógica do regime de política econômica sob finanças
liberalizadas. Como a taxa de lucro se desconectou da taxa de acumulação de capital
produtivo, uma expansão prolongada sustentável é de fato muito pouco provável e até mesmo
indesejável por parte dos segmentos beneficiários da acumulação de base rentista e do próprio
Estado que periodicamente é levado a desacelerar o nível de atividade ou interromper o
crescimento em prol da estabilidade .

Este último capítulo procura desenvolver esta problemática fundamental à


macrodinâmica do crescimento econômico. Neste sentido, além de recuperar, sob a ótica
regulacionista, diversos aportes de trabalhos que se dedicaram a problemáticas convergentes,
a presente análise testa o modelo de BOWLES-BOYER (1990; 1995) para o caso brasileiro,
na versão proposta por UEMURA (2000). Em seguida, novas especificações são propostas
para que o fenômeno financeiro na economia brasileira possa ser abordado em seus impactos
sobre o padrão atual de acumulação de capital.

Ao final de cada capítulo pode ser encontrada uma síntese dos principais resultados, o
que deve facilitar o acesso às problemáticas desenvolvidas e a compreensão das questões de
base tratadas nesta tese. A conclusão geral busca sumarizar os resultados básicos em conjunto,
isto é, em suas vinculações com as questões abordadas nos diferentes capítulos, para que o
leitor possa constatar a unidade temática.
CAPÍTULO 1 - A REGULAÇÃO COMO PRINCÍPIO DE ANÁLISE: ORIGENS,
FUNDAMENTOS TEÓRICOS E METODOLÓGICOS

1.1 Introdução
O objetivo básico deste e do próximo capítulo é apresentar as principais características
da abordagem teórica que será utilizada neste trabalho, justificando-se sua aplicação à
economia brasileira contemporânea. As origens, estrutura conceitual e os fundamentos
teóricos das análises em termos de regulação são explicitados em seus vínculos com a
macroeconomia do crescimento e das crises econômicas. Procurar-se-á esclarecer de que
modo o conceito de regulação constitui uma alternativa verdadeiramente profícua à noção
convencional de equilíbrio e de que maneira ele permite construir as bases epistemológicas
para uma macroeconomia histórica e institucionalista.

A aplicação do conceito de regulação em economia ocorre no contexto da crise teórica


que abalou os fundamentos da macroeconomia tradicional, a partir da emergência da
estagflação nos anos 70. Assim como a grande crise dos anos 30 fornecera os argumentos
empíricos para a crítica keynesiana da teoria neoclássica, a estagflação abriria o espaço
teórico para o surgimento de novas abordagens e análises alternativas. As correntes de análise
econômica que foram alijadas pela revolução keynesiana, encontraram então um terreno livre
para o resgate de posições perdidas no campo da ortodoxia marginalista e de sua concepção
do equilíbrio econômico. Neste ambiente intelectual propício à renovação teórica, surgiriam
as abordagens monetarista e novo-clássica com suas investidas contra a macroeconomia
keynesiana e a versão formal que a síntese neoclássica se encarregou de divulgar, a partir
dos trabalhos de P. SAMUELSON (1939), J.HICKS (1937) e A. HANSEN (1987).1

Mas para os proponentes da Teoria da Regulação, as condições que permitiram os


Trinta Gloriosos , bem como as causas de sua interrupção com a grande crise de 1973,
permaneciam ainda obscuras e as explicações atribuídas à ausência de microfundamentos da
macroeconomia keynesiana, pouco satisfatórias. Em meio ao grande debate que se instaura no
seio da Macroeconomia estabelecida, o princípio de racionalidade neoclássica parecia ter
vindo inesperadamente recobrar sua suposta pertinência no longo prazo. Curiosamente após o
longo período de prosperidade do Pós-Segunda Guerra. À medida que a política econômica

1
Em The Role of Monetary Policy de 1968, FRIEDMAN procura demonstrar que as políticas expansionistas de
orientação keynesiana dos anos 50 e 60 políticas do cheap money, assim como o ativismo fiscal teriam
resultado em maior inflação. Em finais dos anos 70, com o objetivo de oferecer uma visão alternativa à de
KEYNES, LUCAS e SARGENT argumentariam em After Keynesian Macroeconomics que o autor da General
Theory não possui mais do que uma simples teoria para o caso particular de salários rígidos.
derivada do instrumental IS-LM mostrava-se inoperante frente ao fenômeno da estagflação, a
investida teórica anti-keynesiana afirmava-se atribuindo as origens da crise a fatores
exógenos, provenientes de intervenções indevidas do Estado e às expectativas racionais de
agentes econômicos sempre bem informados quanto à lógica e natureza das macro-
regularidades envolvidas.

1.2 Teoria da regulação e macroeconomia


Desde os trabalhos fundadores, surgidos na segunda metade dos anos 1970, a Teoria
da Regulação tem se pautado por uma tradição do pensamento econômico que se posiciona
criticamente à abordagem neoclássica e suas variantes contemporâneas. Como observa
BOYER (2002), a corrente regulacionista encontra sua origem em uma crítica severa e radical
do programa de pesquisa neoclássico, que postula um caráter auto-regulador das economias
de mercado.

Esta postura teórica convencional tem resultado em interpretações insatisfatórias tanto


no que concerne à compreensão das condições estruturais que propiciaram os Trinta
Gloriosos , quanto à apreensão dos desequilíbrios e contradições que marcam o fim deste
longo período de crescimento econômico. Em conseqüência, a problemática das crises
econômicas não tem nenhum estatuto teórico na análise macroeconômica estabelecida. As
variantes neoclássicas reduzem-na ao tratamento dos ciclos e das flutuações econômicas,
pressupondo sempre a existência de uma tendência inexorável para o equilíbrio geral.

A Teoria da Regulação reconhece os impasses do individualismo metodológico


neoclássico no contexto das macro-análises. De fato, uma questão já identificada por
KEYNES (1936) ao estabelecer as bases para uma teoria macroeconômica fora dos limites do
equilíbrio geral walrasiano. Mas os problemas teóricos veiculados por um reducionismo
economicista, presente na ortodoxia marxista e em sua versão estruturalista, não foram menos
relevantes para motivar a busca de análises alternativas.

Como observa BUNGE (1987), uma sociedade é um sistema de indivíduos inter-


relacionados e enquanto algumas de suas propriedades são meras resultantes de
propriedades de seus membros, outras, contudo, são derivadas de relações entre estes. No
entanto, a busca dos micro-fundamentos da teoria macroeconômica, cara ao legado
neoclássico e suas derivações contemporâneas, tem sido mobilizada contra o projeto
keynesiano original. Mas ao preocupar-se demasiadamente em resgatar as posições teóricas
perdidas para a crítica keynesiana, as variantes neoclássicas promovem um apressado e pouco
fundamentado retorno às origens da concepção naturalista em Ciências Econômicas e se
abstém do necessário movimento inverso: a busca dos fundamentos macro-sociais dos
comportamentos microeconômicos, pois as regularidades macroeconômicas possuem sua
própria autonomia e não se reduzem jamais à mera agregação de racionalidades individuais
otimizadoras.

Os fundamentos teóricos regulacionistas foram então concebidos contra a tradicional


concepção naturalista do sistema econômico que, quando não esvazia completamente o
estatuto teórico da macroeconomia como disciplina autônoma, a reduz a uma microeconomia
dilatada pela hipótese do agente representativo. Todavia, na medida em que se apreende a
economia enquanto sistema complexo, funcionando sob informação incompleta e sujeito ao
problema das externalidades, menos os mercados são modos exclusivos de coordenação e
mais a aplicação do conceito de equilíbrio para representá-lo em seu conjunto, se torna
ambígua e precária (AGLIETTA, 1997).

A noção de regulação foi então mobilizada para o tratamento de processos


heterogêneos em que se conjugam necessidade e contingência, restrições do passado e criação
do novo. Foi deliberadamente concebida para traduzir, no plano das macro-análises, as
condições endógenas que permitem a reprodução do sistema sócio-econômico, através da
gestão de novas formas ou estruturas organizativas, caracterizadas por sua historicidade e
irreversibilidade inerentes.

Quando aplicada em economia, a idéia de regulação procura expressar o modo como


um processo essencialmente contraditório o processo de acumulação de capital consegue
reproduzir-se com um grau suficientemente inteligível de regularidade, apesar e a partir
mesmo das contradições e dos conflitos que ele permanentemente engendra. Todavia, uma
determinada forma de regulação permanecerá sempre geográfica e historicamente datada, não
sendo capaz, portanto, de suprimir as condições endógenas que levam à passagem do
crescimento à crise. Conseqüentemente, esta abordagem permite compreender-se como,
apesar da existência de fatores que perturbam a lógica da acumulação de capital e dos
obstáculos que lhe são continuamente repostos por sua própria dinâmica, as economias do
mundo real encontram trajetórias estáveis de crescimento e acumulação. Trata-se, portanto, de
um conceito-chave capaz de traduzir momentos determinantes da reprodução sócio-
econômica. De fato, por seu conteúdo dinâmico e complexo, a regulação supera os obstáculos
epistemológicos2 que o conceito de equilíbrio normalmente impõe às macro-análises.

1.3 Regulação e reprodução em economias capitalistas


Falo de casos em que não há nada que limite a concorrência,
nenhum obstáculo a ela, nem na natureza do caso nem na forma de
obstáculos artificiais e, no entanto, o resultado não é determinado
pela concorrência, senão pelo costume ou uso, sendo que a
concorrência ou simplesmente não vem ao caso, ou então produz
seu efeito de uma forma bem diferente daquela que normalmente se
supõe ser-lhe natural.
(John Stuart MILL, in Princípios de Economia Política, pg.
200, 1848)
O sistema sócio-econômico capitalista reproduz-se pela gestação de novas estruturas
de produção e de distribuição e, exatamente por isso, que qualquer concepção determinista,
expressa em termos de leis econômicas gerais ou de princípios universais de otimização ,
possuirá vigência historicamente datada e não pode conter a priori, a direção e as formas
particulares das transformações sócio-econômicas no tempo e no espaço.

Uma lei econômica é sempre relativa, isto é, dependente e vulnerável à ação da


história, porque é uma função das próprias condições materiais e humanas que estabelecem as
bases para as regularidades econômicas e sociais. Se tais regularidades parecem anteceder a
dinâmica dos comportamentos privados (daí expressar-se no plano da teoria sob a forma
aparente de leis exteriores), elas são, em essência, um resultado e não causa das formas
sociais que estruturam objetivamente a instância econômica nas sociedades. Em
conseqüência, um sistema econômico jamais se reproduz da mesma maneira; ele se reproduz
se transformando, criando e recriando novas regularidades que não podem ser diretamente
dedutíveis de padrões previamente observados.3

O problema fundamental das economias que se organizam sob o capitalismo pode ser
enunciado da seguinte maneira: se a lei dos mercados de Say (formulada por KEYNES
como a oferta cria sua própria demanda ) não encontra validade empírica, uma vez que a
moeda no capitalismo é mais do que uma simples intermediária de trocas mercantis, então,
compra e venda, demanda e ofertas são momentos dissociáveis no tempo e não têm razão
alguma para se compatibilizarem automaticamente como conseqüência necessária dos
mecanismos de mercado. Em outros termos, se a estrutura de produção (base de toda a oferta

2
O conceito de obstáculo epistemológico é utilizado segundo a definição de BACHELARD (1996). Uma análise
de suas implicações pode ser encontrada em CANGUILHEM, G.(1985).
3
Segundo BLAUG (1980) e HOLLIS e NELL (1975), o estudo das condições para que uma economia se reproduza
corresponderia de fato à essência de qualquer ciência adequada da economia.
agregada) não encontra uma estrutura de circulação4(base de toda a demanda agregada) que
lhe seja dinamicamente compatível, o processo capitalista de acumulação é obstado e o
sistema econômico submerge em uma fase de crise.

Para DE BERNIS5, um dos primeiros a aplicar a noção de regulação em economia


há de fato a necessidade inescapável de uma coerência mínima entre produção e consumo,
como dois momentos fundamentais do processo de acumulação de capital:

la coherencia minimal tiene una doble exigencia: a cada periodo, una


correspondencia entre la estructura de la producción y la estructura del
consumo, las cuales evolucionan cada una según leyes independientes. Sin esa
correspondencia el capital no puode ser valorizado. De periodo en periodo,
una correspondencia entre la estructura de la producción en t0 y las
necesidades del funcionamiento del aparato produtivo en t1, correspondencia
sin la cual no podría reproducirse sobre una base ampliada ;
E De BERNIS conclui então, que para compreender-se o funcionamento das
economias capitalistas é preciso:
(...) enunciar según qué procedimientos sociales las decisiones de agentes
soberanos puoden combinarse para crear las condiciones de esa coherencia.
Empleo a propósito el término procedimientos sociales en oposición a
mecanismos para subrayar que estamos frente a fuerzas colectivas, a grupos
activos y no frente a una mecánica abstracta o automática. 6
Como as macro-regularidades que veiculam a oferta e a demanda agregadas tendem a
evoluir sob trajetórias que se mostram relativamente independentes, a regulação surge como
estrutura intermediária capaz de compatibilizar dinamicamente produção e circulação dos
capitais. Em conseqüência, a regulação emerge como fator de coesão das estruturas e de
coerência dos momentos constitutivos do sistema, apesar, e a partir mesmo, das forças que
tendem permanentemente a desestruturá-lo. Uma forma ou modo de regulação é um processo
endógeno que mantém as regularidades macroeconômicas básicas da acumulação de capital
em limites compatíveis com a coesão social enquanto condição necessária à
reprodutibilidade do sistema sócio-econômico.

Segundo R. DELORME (1990):

4
O processo de acumulação de capital pode ser apreendido em seus quatro momentos constitutivos: a produção,
a distribuição, a circulação e o consumo. Mas como o consumo emerge como o momento que de fato fecha o
circuito - quer dizer, nele reside latente o famoso problema da realização ou, em termos keynesianos, o da
problemática da demanda efetiva serão utilizadas indistintamente as expressões correspondência ou
compatibilidade entre produção e consumo , ou entre produção e demanda . Todavia, a expressão
correspondência entre produção e circulação apenas opera a um nível maior de abstração, sem que as
anteriores sejam impróprias.
5
DE BERNIS, G.D. Equilibrio y regulación: una hipótesis alternativa y proposiciones de análisis. Investigación
económica, 1983.
6
Os grifos são de DE BERNIS.
In essence the concern of régulation theorists is to describe how economic
systems change while keeping their basic principles of organization. Tension
and conflict, unevenness of development, disequilibrium, mutual dependence
and order are basic to this reasoning. I define regulation as the process
through which a given type of order or consistency obtains in a complex entity
- a socio-economic system -which is itself submitted to a never ending
tension. 7
Deve-se observar que não se pode apreender uma tal problemática, a partir de uma
concepção de equilíbrio essencialmente física ou naturalista. No contexto dos sistemas sócio-
econômicos, não se poderia conceber algo como um processo de mudança equilibrada , já
que as mudanças sociais são, pela lógica e natureza mesma dos processos que a definem
enquanto tais, desequilibrantes.8 No mesmo texto, R. DELORME argumentaria que:

Is thus differs from the idea of tuning, of a conscious adjustment mechanism.


As BOYER writes the process of fitting production and social demand in a
given set of structures and institutions is always an uneven, unbalanced and
usually contradictory consequence of very partial rationalities and strategies,
however integrated modern corporate economies may seem . Why then,
notwithstanding these disruptive pressures, are there alternating phases of
stable growth and crisis ? 9
Observe-se como BOYER [1993], partindo das origens do conceito de regulação,
apresenta essa problemática geral dos regulacionistas:

Basically, the name of this school of economic analysis derives from the
transformation of a concept borrowed from biology: a régulation mode
describes the set of negative and positive feedbacks in relation to the stability

7
DELORME, Robert. The State and economic development. CEPREMAP nº 9102, Paris, 1990 ( grifos do
autor).
8
Uma mudança equilibrada , sobretudo, em se tratando de fenômenos sociais, implicaria não apenas que as
variáveis envolvidas no processo sofram variações quantitativas na mesma proporção. Seria ainda necessário que
as transformações qualitativas, que normalmente acompanham dialeticamente as variações de quantum, ocorram
em direções e vínculos sistêmicos mutuamente compatíveis e de modo a garantir que as estruturas do sistema em
estudo possam evoluir de forma inalterada e coesa. Ora, não há evidência empírica de que alguma vez no campo
sócio-econômico um tal fenômeno tenha realmente existido. Neste contexto, a questão verdadeiramente
pertinente para a macro-análise passa a ser a da relevância das mudanças equilibradas , não no sentido estrito
(oferta igual à demanda) como fatores da coerência macroeconômica e da coesão sistêmica. Uma configuração
macrodinamicamente estável não requer uma tal condição tão irrealista ou de ínfima probabilidade de
ocorrência. Não é um fato empírico pouco conhecido que o crescimento econômico processa-se
independentemente da existência e permanência de equilíbrios nos diversos mercados por onde circulam a
pluralidade dos capitais em uma economia real. E exatamente por isto que BLAUG (1993, p. 327) havia
argumentado: colocando de forma contundente: nunca se observou uma economia em estado constante de
crescimento e, além disso, existem motivos profundos e inerentes que explicam por que o crescimento real é
sempre inconstante e sempre desequilibrado.
9
Em Technical change and the theory of régulation [in DOSI et alii (eds.), Technical change and economic
theory, Pinter Publishers, 1988, pg. 68], Robert BOYER chama a atenção para a possível confusão entre o
significado do vocábulo regulation na língua inglesa e a conotação diversa que assume para a Escola da
Regulação: This approach, called régulation in French, is not easily translated into English, since the English
word regulation is usually associated with the much narrower problem of regulation of the behavior of public
utilities, while the expression socio-economic tuning brings a connotation of a conscious and sophisticated
adjustment mechanism.
of a complex network of interactions. When transposed to economics and
completely re-elaborated, a form of régulation denotes any dynamic process
of adaptation of production and social demand, resulting from the conjunction
of economic adjustments linked to a given configuration of social relations,
forms of organization and productive structures. 10
A partir da argumentação desenvolvida acima, pode-se precisar a forma como a Teoria
da Regulação apreende o mercado nas sociedades que se organizam sob o capitalismo. O
mercado emerge historicamente como o locus da socialização de uma pluralidade de trabalhos
individuais e independentes, permitindo a unidade (entendida como correspondência ou
adequação) entre produção e demanda agregada. Mas essa unidade contraditória é apenas
formalmente veiculada pelo mercado, que para tanto deve contar com as outras instâncias da
sociedade, através do estabelecimento de diversos procedimentos de coordenação e de
estruturas organizacionais, que são elas mesmas irredutíveis a pura lógica mercantil.

Conseqüentemente, a unidade entre produção e consumo não se processa


automaticamente como decorrência lógica e necessária do comportamento racional de agentes
otimizadores. Tão pouco a agregação das racionalidades parciais seria por si mesma suficiente
para estabelecer as regularidades micro e macroeconômicas básicas para a promoção e
garantia de um padrão, a priori, ótimo, definitivo e universalizável do sistema sócio-
econômico. As configurações estáveis ou instáveis de uma economia capitalista estão
organicamente correlacionadas com as formas particulares assumidas pelas relações sociais de
produção e de distribuição, ao longo de sua evolução histórica. Formas essas que constituem,
na realidade, os pressupostos estruturais da eficácia do mercado como um fator de
coordenação das atividades econômicas. Como argumenta BOYER [1995]:

« le marché est une forme de coordination des activités économiques beaucoup


plus organisée et sophistiqué que ne le supposent les théories néoclassiques
qui, sur ce point, confondent hypothèses et résultats: une fois institué et inséré
dans un réseau de contrôles et de règles, le marché peut opérer avec une
grande efficacité et sembler autorégulateur, mais il est incapable d auto-
institutionnalisation. »11

10
BOYER, R. Labour institutions and economic growth: a survey and a regulationist approach. Fondazione
Giacomo Brodolini, 1993.
11
Os trabalhos desenvolvidos pela Teoria da Regulação para as economias da antiga URSS, apontam exatamente
para a impossibilidade de auto-institucionalização das relações mercantis e capitalistas, a partir da simples
remoção do Estado e demais instituições do regime soviético anterior. Como o mercado surge como uma
construção institucional e organizacional complexa, são necessárias novas formas sociais e dispositivos jurídico-
institucionais para torná-lo social e economicamente eficiente. Até que isso seja realizado, a estagnação e a crise
social e econômica tendem a permanecer. Para maiores detalhes, vide Bernard CHAVANCE, nos capítulos 42
(Institutions, régulation et crise dans les économies socialistes) e 43 (Réforme du socialisme et conversion au
marché: les voies centre-européennes) de Théorié de la Régulation: L état des Savoirs. La Découverte, 1995.
Em conseqüência, no plano macroeconômico, o sucesso de um modo de regulação em
compatibilizar as estruturas de produção e de consumo reside em sua capacidade de dotar os
mercados de densidade e eficiência, superando os problemas de falha de coordenação.
Características estas que os mercados não podem alcançar sem instituições, convenções,
regras e demais dispositivos organizativos que codificam as relações sociais e conformam os
comportamentos privados à lógica maior e à natureza da macrodinâmica da acumulação de
capital.

Todavia, a compreensão do objeto teórico regulacionista exige que se elimine qualquer


confusão do termo regulação com a concepção anglo-saxônica de regulation ou
regulamentação. A regulamentação refere-se diretamente às ações do poder estatal para
disciplinar, impor e organizar os comportamentos dos agentes econômicos a partir de regras
legalmente instituídas. Os procedimentos legais de regulamentação estão, portanto, contidos
na noção mais ampla de regulação e integram-lhe as estruturas materiais como um momento
da codificação de processos e práticas econômicas e sociais. Mas se a regulação engloba a
regulamentação, ela a ultrapassa porque se baseia também em regras, convenções e hábitos ou
costumes que não se apresentam necessariamente expressos em dispositivos institucionais ou
normas escritas.12

O conceito de regulação traduz então a necessidade de existência de uma coerência


macroeconômica mínima para assegurar as condições de reprodutibilidade sócio-econômica.
Mas a eficácia e a coerência de um modo de regulação não obedecem a nenhuma lei geral pré-
estabelecida. Trata-se de uma singularidade histórica que pode estabelecer as bases
macroeconômicas para a estabilidade de um regime de crescimento ou de acumulação. A
vigência de uma determinada forma de regulação é um fator fundamental para se explicar
como, apesar de suas contradições essenciais, uma economia organizada em bases capitalistas
é capaz de alcançar trajetórias sustentáveis de crescimento. Todavia, como os períodos
históricos de coerência são finitos à escala de vida das nações, a eficácia dos modos de
regulação se revela vulnerável à própria dinâmica do processo de acumulação e as crises
sobrevêm. Em termos do método dialético de análise, a regulação expressaria a unidade
(sempre relativa) apesar da contradição (sempre absoluta) entre produção e circulação do

12
Os trabalhos em Antropologia reconhecem a diversidade de formas de regulação econômica e social vigentes
em sociedades primitivas que não possuíam a escrita, enquanto base para a codificação de relações sociais
básicas para a coesão e sobrevivência dos grupos e categorias sociais. Por exemplo, os de M. SALLINS, A
Primeira Sociedade da Afluência e Stone Age Economics.
capital, permitindo a reprodução da lógica e natureza do capitalismo apesar de suas
contradições permanentemente renovadas.13

Segundo BOYER (2003, p. 3), a viabilidade do modo de produção capitalista impõe


certas restrições institucionais quanto à organização da relação capital-trabalho e quanto à
dinâmica da concorrência. Para a análise desta problemática, a Teoria da Regulação busca
explicitar os fundamentos macro-institucionais de uma economia de mercado .14

Conseqüentemente, uma hipótese central nas análises em termos de regulação decorre


de uma constatação empírica, continuamente reposta pela história viva das economias
capitalistas reais: o capitalismo é uma força extraordinária de mudança que não contém em si
mesmo os princípios que lhe asseguram a coerência macroeconômica e a coesão social,
enquanto condições necessárias de sua própria permanência histórica. Fatores de mediação
são então requisitados para compor uma determinada estrutura social de acumulação15, sem a
qual o capitalismo se encontraria historicamente inviabilizado.

Isto não significa supor que o sistema sempre será capaz de encontrar formas de
regulação adequadas, que lhe faculte a reprodução ad infinitum, não importando a gravidade
das crises que atravesse. Pode ser, como o foi para os modos de produção pré-capitalistas, que
as economias não sejam mais capazes de reproduzir a mesma lógica e natureza que as
singularizam na história longa. Há sempre a possibilidade de uma transformação mais
profunda, isto é, ao nível da própria estrutura invariante ou fundamental que o caracteriza
enquanto sistema capitalista. Neste caso, ter-se-ia de buscar novos conceitos e novos
princípios para expressar a emergência de uma outra lógica de se organizar a produção e a

13
Segundo a metodologia histórico-dialética, o princípio epistemológico implícito é o de que a unidade entre
produção e circulação do capital é sempre relativa, mas possível. Do contrário não haveria reprodução sócio-
econômica e as fases de crescimento econômico não seriam factíveis. Mas isto não elimina as forças que
expressam o caráter contraditório dessa unidade entre produção e circulação, ou seja, a contradição é sempre
absoluta, tendencial, latente. Pode ser temporariamente contida dentro de limites suportáveis pelas estruturas da
regulação vigente e então superada - mas não suprimida - pela criação de novas formas também contraditórias.
Com o desenvolvimento do processo capitalista de acumulação, novas contradições surgem e se manifestam na
história concreta das economias através de configurações particulares de crises.
14
R. BOYER, em Les Institutions dans la Théorie de la Régulation, CEMPREMAP n° 2003-08, août 2003.
15
A noção de social structure of accumulation (SSA) deriva dos trabalhos de BOWLES, GORDON e
WEISSKOPF (1986) e designa o ambiente institucional específico no qual o processo capitalista de acumulação
se desenvolve. Sua convergência com os conceitos de modo de regulação e de regime de acumulação foi
reconhecida pelos próprios proponentes da abordagem regulacionista. Para mais detalhes, ver BOYER e
SAILLARD em Théorie de la régulation l état des savoirs, La Découverte, Paris, 1995.
distribuição do produto social. Mas enquanto este tipo de crise não acontece, o economista
não deve se furtar a explicitar as condições ainda factíveis de reprodutibilidade sistêmica.16

1.4 Macrodinâmica capitalista: as relações sociais determinativas


A definição de capitalismo não é consensual e de acordo com os pressupostos de cada
corrente teórica, seu conteúdo declina, freqüentemente enfatizando momentos parciais da
lógica e natureza deste sistema. Em A dinâmica do Capitalismo, o historiador econômico
Fernand BRAUDEL procura mostrar que economia de mercado e capitalismo não são
sinônimos, uma vez que as análises históricas confirmam a existência das relações mercantis e
monetárias muito antes da emergência das relações capitalistas de produção. No entanto, o
mesmo autor ressalta que o surgimento e desenvolvimento da moeda como aceleradora das
trocas mercantis proporcionaria as condições necessárias para o advento do capitalismo.17
Como argumenta BRAUDEL:

Entre os séculos XV e XVIII, certos processos reclamam uma designação


especial. Quando observados de perto, seria quase absurdo incluí-los e dispô-
los, sem mais nem menos, na economia ordinária de mercado. A palavra que
então acode mais espontaneamente ao espírito é bem capitalismo.
Tais processos correspondem ao surgimento de novas relações sociais, instituições e
formas de se organizar o funcionamento de uma economia baseada em trocas mercantis
monetizadas e que estabeleceram as condições estruturais para a emergência e expansão do
modo de produção capitalista.

A argumentação de BRAUDEL fundamenta-se numa análise histórica comparativa


das economias ocidentais e orientais. Segundo o historiador, sem nenhuma exceção, todos os
mecanismos da troca se reencontram fora da Europa, desenvolvidos e utilizados em graus
diversos. Pode-se mesmo discernir uma certa hierarquia: no estágio superior, o grupo formado
pelo Japão, a Insulíndia, o Islã e a Índia, com sua rede de crédito desenvolvida pelos
mercadores banianos, sua prática de empréstimo de dinheiro às iniciativas arriscadas, seus

16
Na teoria econômica marxiana as crises cíclicas expressam processos endógenos de reprodutibilidade
sistêmica. Apenas a chamada crise final ou geral marcaria a passagem para um novo modo de produção com
lógica e natureza diversa.
17
A moeda é definida aqui como o dinheiro em suas várias formas, pois diversas mercadorias ( metais preciosos,
animais, sal, etc) foram utilizados como padrão de trocas mercantis ao longo da história econômica.
Rigorosamente, a moeda como forma do dinheiro corresponde a uma etapa superior do desenvolvimento das
relações mercantis, quando o dinheiro não mais se representa como uma mercadoria particular, pois passa então
a representar o universo de todas elas. Em termos marxistas clássicos, ele converte-se no chamado equivalente
geral e com isso ganha autonomia relativa frente às demais formas do capital (capital-mercadoria e capital-
produtivo, que por natureza possuem menor liquidez). Neste momento fundamental ao desenvolvimento das
relações de produção e de distribuição capitalistas é que surgem os Bancos Centrais como instituições destinadas
a administrar a autonomia relativa do equivalente geral e garantir deste modo, a aceitação de uma moeda
fiduciária e de curso forçado.
seguros marítimos; no estágio inferior, habituada a viver como economia autárquica, a China;
e finalmente, logo abaixo dela, milhares de economias ainda primitivas.

Para BRAUDEL, a explicação da emergência do capitalismo primeiro no Ocidente,


deveu-se à superioridade de seus instrumentos e de suas instituições; por exemplo, as Bolsas
e as diversas formas de crédito. Um fato histórico que vem reforçar a relevância teórica da
problemática das instituições nas análises econômicas regulacionistas. Todavia, ao reconhecer
a determinação institucional das economias capitalistas, o caráter determinante da expansão
do salariado como relação básica de produção e distribuição do produto social parece estar
apenas implícito nas análises braudelianas.18

Em MARX, o trabalho assalariado surge como a relação básica de produção e de


distribuição que efetivamente singulariza o capitalismo na história longa. Em outros termos,
moedas e mercados o antecedem e apenas estabelecem duas das condições necessárias para a
emergência da lógica e natureza desses sistemas. Mais do que um mero resultado da
generalização de trocas monetizadas, a relação salarial converte-se na forma especificamente
capitalista de se produzir e distribuir o produto social.19

Embora GUTTMANN [1995, p.87] reconheça que os regulacionistas tenham


construído sua abordagem da moeda sobre o conceito pós-keynesiano de economia monetária
de produção (KEYNES, 1936)20, isto não significa que a dinâmica capitalista possa ser
compreendida apenas com base em análises centradas nas implicações desta instituição
fundamental. Como observa BILLAUDOT (1996), uma definição regulacionista de
capitalismo deve explicitar suas relações sociais determinativas. A natureza e a lógica das
economias que se organizam sob este sistema particular de produção são resultantes da
conjugação de três relações sociais fundamentais ao processo de acumulação de capital: a
relação mercantil, a relação monetária e a relação salarial.

18
Segundo BOYER [1986, P. 120], os trabalhos de BRAUDEL mostram que o capital comercial e financeiro é,
há muito tempo, um fenômeno internacional, enquanto que a inserção vitalícia do salariado no interior do
capitalismo é bem mais recente, inovadora e portadora de uma nova forma dos conflitos sociais e da dinâmica
econômica . Seria a partir da mesma que o capitalismo encontraria sua base própria de desenvolvimento,
fazendo da relação capital-trabalho assalariado, a premissa e o resultado de seu funcionamento. (Os grifos são de
BOYER).
19
No capítulo VI, inédito de O Capital, MARX argumenta que o trabalho assalariado é, para a produção
capitalista, uma forma socialmente necessária do trabalho, assim como o capital, valor elevado a uma potência, é
uma forma necessária que devem adotar as condições objetivas do trabalho para que este último seja trabalho
assalariado. De modo que o trabalho assalariado constitui uma condição necessária para a formação de capital e
se mantém como premissa necessária e permanente da produção capitalista .
20
Cunhado por KEYNES em A Teoria Geral do Emprego, do Juro e da Moeda, Nova Cultural, 1988.
Conseqüentemente, não se poderia pensar e desenvolver o espaço teórico da
macroeconomia sem pensar precisamente, a problemática instaurada por essa conjugação no
plano concreto de atuação dos agentes econômicos e de suas organizações. Um ponto de
partida analiticamente profícuo é exatamente este que se pode denominar por princípio da
regulação (AGLIETTA, 1988) e cujo objetivo maior consiste em expressar, no plano das
macro-análises, os momentos em que a conjunção dessas três relações sociais fundamentais
apresenta-se sob configurações coerentes com a dinâmica da acumulação de capital,
constituindo regimes particulares de crescimento e acumulação.

A Figura 1 ilustra essa problemática fundamental ao desenvolvimento das análises em


termos de regulação.

FIGURA 1 TRÊS RELAÇÕES SOCIAIS FUNDAMENTAIS DETERMINAM A LÓGICA E A


NATUREZA DAS ECONOMIAS CAPITALISTAS

Teoria da regulação

Economias Capitalistas = Relação Mercantil + Relação Monetária + Relação Salarial

Teoria Teoria
Teoria neoclássica e
pós-keynesiana ortodoxa marxista
suas variantes
contemporâneas

FONTE: Extensão a partir de M. BRUNO (1997).

A dinâmica das economias que se organizam sob o modo de produção capitalista


resulta da conjugação de três relações sociais fundamentais. As economias capitalistas não são
apenas mercantis e monetárias, são também salariais. A ênfase em apenas uma dessas
relações tende a obscurecer momentos determinantes da lógica e natureza desses sistemas
econômicos. De uma maneira geral, as teorias neoclássica, pós-keynesiana e marxista
privilegiam, respectivamente, a relação mercantil, a relação monetária e a relação capital-
trabalho assalariado. Mas para as macro-análises regulacionistas, a conjunção sempre
contraditória entre mercados, moedas e salariado define precisamente o espaço concreto de
existência e o estatuto teórico do conceito de regulação, considerado-o fundamental à
compreensão da macro-dinâmica da acumulação capitalista.
1.5 Fundamentos epistemológicos: as dimensões ontológicas do conceito de regulação

Em um nível ainda elevado de abstração, uma forma ou modo de regulação é um


conjunto de mediações institucionais e organizacionais que mantém as distorções produzidas
pela acumulação de capital nos limites compatíveis com a coesão social e a coerência
macroeconômica dos sistemas sócio-econômicos (AGLIETTA, 1997). Esta noção possibilita
a compreensão de processos que emergem, se reproduzem e depois se enfraquecem sob o
efeito de forças desiguais de desenvolvimento que são inerentes ao modo de produção
capitalista.

Os fundamentos epistemológicos para a aplicação deste conceito em macroeconomia


podem ser mais bem compreendidos quando explicitados em suas bases ontológicas. Em
BRUNO (1997), procura-se mostrar de que maneira estas últimas terminam por fundamentar
o percurso teórico regulacionista e a própria escolha do método de análise.21 Mostra-se
também de que modo a Sociologia de BOURDIEU, as análises históricas de BRAUDEL e a
ontologia de LUKÁCS fornecem elementos teóricos fundamentais à validação epistemológica
das macroanálises em termos de regulação. Esta seção buscará uma síntese da argumentação
desenvolvida por estes autores e considerada suficiente para efeitos deste trabalho.

A Ontologia pode ser definida como um ramo da Epistemologia que procura apreender
as propriedades essenciais e as singularidades dos objetos submetidos à análise22.
Conseqüentemente, uma apreensão ontológica do objeto econômico implica considerar que a
escolha do método de análise e dos princípios teóricos utilizados precisa estar fundamentada
em uma correta percepção das características da economia enquanto sistema de relações
sociais de produção e de distribuição, cujo modo de funcionamento tem se revelado, a nível
empírico, essencialmente diverso dos sistemas físicos e biológicos.23 Daí a relevância do que
se denomina no título desta seção por dimensões ontológicas do conceito de regulação.24

21
BRUNO, Miguel. A Macroeconomia da Teoria da Regulação: uma análise do projeto teórico regulacionista,
Tese de Mestrado, UFF, 1997.
22
Rigorosamente, um ramo da Filosofia, mas como a preocupação básica neste contexto refere-se à Filosofia da
Ciência ou Epistemologia, optou-se por vincular a questão ontológica de um modo direto e explícito à Teoria do
conhecimento econômico. Segundo JAPIASSÚ e MARCONDES (2001), o termo foi introduzido pelo filósofo
alemão Rudolph GOCLENIUS, Professor na Universidade de Marburg, em seu Lexicon Philosophicum (1613)
designando o estudo do ser enquanto ser, isto é, independentemente de suas determinações particulares, mas
naquilo que constitui sua inteligibilidade própria . Distingue-se ainda ontológico , que se refere ao ser em geral,
de ôntico, que se refere ao ser em particular.
23
Talvez não seja redundante lembrar que, como produto das concepções positivistas em ciências sociais, a
teoria neoclássica e suas variantes contemporâneas não empreendem nenhuma ruptura com o naturalismo que
marcou o pensamento econômico fisiocrático e clássico. Em termos da epistemologia de BACHELARD, elas
não realizam nenhum corte epistemológico que implicaria reconhecer as bases ontológicas próprias aos sistemas
sociais e empreender uma ruptura efetiva com a concepção fisicalista de se produzir conhecimento econômico.
Como observa BILLAUDOT (1996, p.12), a necessidade de se explicitar a dimensão
ontológica das teorias e hipóteses econômicas foi inclusive ressaltada por autores como
SCHUMPETER25. Para este economista, toda teoria concebida como uma análise
organizada em princípios e hipóteses baseia-se numa determinada visão ou concepção das
propriedades do sistema em estudo. Em conseqüência, pode-se definir como base ontológica
uma determinada concepção acerca do modo específico de funcionamento do objeto sob
teorização. Isto implica considerar-se que um dado método de análise pressupõe sempre uma
ontologia que lhe é subjacente, ou seja, uma concepção acerca das características próprias de
funcionamento ou modo específico de existência do objeto em estudo.

Segundo AGLIETTA (1997, p.13), a regulação na Biologia refere-se a um processo


que permite a reprodução de uma estrutura fundamental, de um modelo de base que incorpora
toda a informação necessária à diferenciação característica de um organismo complexo. A
diversidade dos seres singulares que pertencem a um mesmo modelo de base provém do
número gigantesco de combinações às quais as diferenciações procedem. No entanto, são
combinações estritamente controladas pelo código genético que seleciona a informação
pertinente. Mas as mutações dos modelos genéticos se processam de forma aleatória. Acaso e
adaptação ao meio ambiente fazem a evolução das espécies vivas. Diferentemente da
regulação sócio-econômica, não há nada que possa engendrar uma história. Observa ainda
AGLIETTA (1997, p.13) que:

C est pourquoi nous nous inscrivons en opposition tranchée avec les discours
prétendument totalisants qui font de l histoire humaine le prolongement de
l évolution des espèces. »
A base ontológica neste contexto advém do reconhecimento de que a história não é
fundada sobre nenhuma ordem natural. Contra essa concepção reducionista ( presente também
na banalização do pensamento marxiano original) que faz da história um resultado de leis
econômicas inescapáveis, LUKÁCS (1968) argumentara que o homem é um ser que dá
respostas . E neste contexto se expressa a unidade contida de modo contraditoriamente

Conseqüentemente, o objeto econômico é enquadrado num naturalismo que necessariamente conduz a uma visão
determinista e reducionista do funcionamento das economias reais. Evidentemente numa tal concepção, a
historicidade das análises não tem nenhuma relevância teórica. Elementos históricos quando são mobilizados não
passam de simples ingredientes de contextualização de teorias supostamente válidas em todos os tempos e
lugares.
24
Observa AGLIETTA (1997) que nas Ciências Físicas e Biológicas sabe-se que os fenômenos microscópicos e
macroscópicos não podem ser descritos com as mesmas ferramentas teóricas. As regularidades macroscópicas
têm sua própria autonomia e especificidades.
25
SCHUMPETER não utiliza explicitamente o conceito de ontologia, mas suas preocupações podem ser
efetivamente traduzidas pela busca das bases ontológicas das teorias e análises desenvolvidas pelo economista e
pesquisador.
indissolúvel no ser social entre liberdade e necessidade. Uma unidade que se reproduz
continuamente sob formas sempre novas, cada vez mais complexas e mediadas em todos os
níveis sócio-pessoais da atividade humana. Para este autor, o fator subjetivo, humano,
conserva-se como fator modificador das estruturas da economia e sociedade e por vezes se
mostra mesmo decisivo26.

Expressão de fatores relacionais complexos que vinculam os indivíduos e grupos uns


aos outros, o lien social não tem o status de um modelo biológico fundamental que
promoveria a organização das sociedades complexas a partir de uma lógica de reprodução
sistêmica que o deixaria essencialmente intacto (AGLIETTA, 1997)27. O lien social é um
princípio de transformação permanente, pois os sistemas sócio-econômicos reproduzem-se, se
transformando. Neste contexto, deve-se adotar uma certa prudência com a utilização do
conceito de reprodução em Ciências Econômicas. Não se trata da reprodução ad infinitum de
uma estrutura invariante.28 A reprodução do sistema sócio-econômico implica
necessariamente na mutação das estruturas que lhe constituem, permitindo recompor, sobre
novas bases, duas condições essenciais à sua permanência histórica: a coesão social e a
coerência macroeconômica. Ambas são viabilizadas por formas historicamente definidas de
regulação. Mas, segundo AGLIETTA, contrariamente às interpretações correntes, a noção de
regulação não recorre a nenhuma hipótese teleológica. A Teoria da Regulação do capitalismo
é a da gênese, do desenvolvimento e do desaparecimento das formas sociais que permitem a
reprodução sócio-econômica como possibilidade histórica.

Em as Bases Ontológicas do Pensamento e da Atividade do Homem, o epistemólogo


LUKÁCS observa que:

Toda sociedade se desenvolve até níveis onde a necessidade deixa de operar


de maneira mecânico-espontânea (ou sob um padrão determinista); o modo

26
.LUKÁCS, G. As Bases Ontológicas do Pensamento e da Atividade do Homem, 1968.
27 Conforme ÉCHAUDEMAISON et alii (2000), o lien social é ce qui rattache les individus et les groupes les
uns aux autres. Il peut s agir de liens directs (ou relations « primaires ») basés sur l inter connaissance : lien
conjugal, familial, relations amicales, relations de voisinage, etc., ou de liens indirects tissés par la médiation
d institutions complexes : monde professionnel, associations, syndicats, partis, etc. Três tipos de lien possuem
um status particular nas ciências sociais: a troca comercial (o comércio, vetor de relações), a troca não comercial
(circulação de bens simbólicos), enfim o laço político baseado nos sentimentos de solidariedade numa
coletividade nacional.
28
Talvez seja relevante pensar-se num exemplo biológico. A evolução dos cetáceos e dos quirópteros lhes
permitiram desenvolver mutações bem sucedidas de seus membros para se adaptarem às novas condições
ambientais. Todavia, a estrutura mais interna destes animais, isto é, a estrutura que os definem enquanto
mamíferos que são, permaneceu inalterada ao longo de sua evolução. Em suma, eles continuam mamíferos.
Agora, basta que o pesquisador no campo da economia atente para as diferenças essenciais entre as estruturas
internas que definem os modos de produção feudal e capitalista. A reprodução sócio-econômica foi alcançada
através da transformação das próprias estruturas ou relações sociais de produção no tempo histórico.
de manifestação típico da necessidade passa a ser, cada vez mais nitidamente
e a depender do caso concreto, aquele de induzir, impelir, coagir, etc. os
homens a tomarem determinadas decisões teleológicas, ou então de impedir
que eles o façam (o espaço da regulação). O processo global da sociedade é
um processo causal, que possui suas próprias normatividades, mas não é
jamais objetivamente dirigido para a realização de finalidades29. Mesmo
quando alguns homens ou grupos de homens conseguem realizar suas
finalidades, os resultados produzem, via de regra, algo que é inteiramente
diverso daquilo que se havia pretendido .30
As contribuições de LUKÁCS revelam-se particularmente profícuas para o método e
hipóteses propostos pela Teoria da Regulação. Para se apreender as especificidades do sistema
social é preciso compreender-se que uma sociedade só pode surgir e se desenvolver sobre a
base de um sistema orgânico e que este último só o faz sobre a base de um sistema inorgânico.
A passagem do sistema inorgânico ao social implica em um nível crescente de complexidade.
Se existem propriedades comuns aos três sistemas que integram a realidade concreta, também
há propriedades que respondem pelas particularidades de cada um deles e que não podem ser
deduzidas logicamente dos outros. Conseqüentemente, métodos e princípios teóricos devem
refletir os padrões de comportamento e reprodução característicos do sistema em estudo.31

O espaço da regulação de um sistema sócio-econômico é também o do nível teórico


mediador entre os comportamentos micro e macroeconômico de análise. A necessidade de se
apreender as estruturas particulares às economias reais no tempo e no espaço levou a Teoria
da Regulação a buscar um enriquecimento do conceito de modo de produção. O princípio
teórico de base se expressa no argumento de que, na história longa, o modo de produção
capitalista desenvolve-se pela gestação de diferentes modos de regulação e de regimes de

29
LIPIETZ (1988, p. 3 e 4) observa que a introdução do conceito de regulação não é suficiente para dissipar as
ambigüidades funcionalistas presentes nas interpretações do conceito de reprodução. Este autor cita então E.
TERRAY (1977), que argumenta que on a fréquemment vu se réintroduire, à la faveur de considérations sur la
reproduction, tout l arsenal périme des interprétations fonctionnalistes: la reproduction est conçue comme une
cause finale dont procède l ensemble des structures et des institutions analysées ( ). Pour éviter cette erreur, il
faut se rappeler d abord que la reproduction ne saurait être un but : seul un sujet peut se proposer un but. Or la
société n est pas un sujet. Il faut se rappeler surtout que ce qui est reproduit, c est précisément et avant tout une
contradiction ( ). Dès lors, se placer du point de vue de la reproduction, c est en définitive comprendre
comment le cycle même de la production et de la distribution remet constamment en présence les deux termes de
cette contradiction qu est le rapport de production fondamental : dominants et dominés, exploiteurs et exploités
( ). La reproduction dans son ensemble est à la fois l enjeu de leur affrontement et son résultat. »
30
As expressões sob negrito entre parênteses são nossas e objetivam mostrar que a abordagem ontológica
lukacsiana converge precisamente para a problemática da regulação das economias capitalistas.
31
Em As Bases Ontológicas do Pensamento e da Atividade do Homem, p. 3, LUKÁCS argumenta que, no que
concerne às especificidades dos sistemas sócio-econômicos: (...) não seremos capazes de captar sua
especificidade se não compreendermos que um ser social só pode surgir e se desenvolver sobre a base de um ser
orgânico e que esse último pode fazer o mesmo apenas sobre a base do ser inorgânico. (...) tornou-se claro que,
entre uma forma mais simples de ser (por mais numerosas que sejam as categorias de transição que essa forma
produz) e o nascimento real de uma forma mais complexa, existe algo qualitativamente novo, cuja gênese não
pode jamais ser simplesmente deduzida da forma mais simples.
acumulação. Um regime de acumulação é uma forma particular e historicamente
determinada do processo de acumulação de capital em uma economia dada. Se expressa num
determinado padrão de crescimento, resultante das especificidades de certa configuração das
estruturas institucionais e organizacionais que codificam o modo de regulação vigente.

Os dois últimos conceitos (o de modo de regulação e de regime de acumulação) são,


portanto um enriquecimento da noção de modo de produção, à medida que operam a um nível
menor de abstração, introduzindo nos quadros das análises, as formas particulares de evolução
e de crise que atravessam a dinâmica das economias capitalistas reais.

Esta problemática foi enfatizada por LUKÁCS ao chamar a atenção para o significado
da dialética necessária entre as categorias universal, particular e singular. Para este autor, de
um ponto de vista metodológico, o movimento analítico do singular ao universal é sempre
mediado pelo particular. Observa LUKÁCS que,

(...) o particular é um membro intermediário real, tanto na realidade objetiva


quanto no pensamento que a reflete de modo aproximadamente adequado. Ele
é, porém, um membro intermediário com características muito específicas (...)
a transformação da universalidade em particularidade e com isto a dialética
entre universalidade e particularidade é o problema da ininterrupta
transformação da sociedade como lei fundamental da história.
LUKÁCS havia observado que se um conceito mais universal, como o de modo de
produção, é liberado de qualquer relação dialética (determinação, limitação, enriquecimento,
concretização, etc.) com suas próprias formas particulares de estrutura e movimento histórico,
a análise submerge numa pseudodialética formalista e incapaz de apreender as especificidades
dos novos fenômenos sócio-econômicos reais. Conseqüentemente, esta concepção lukacsiana
é nitidamente sancionadora da metodologia de análise e do percurso teórico proposto pelas
macroanálises em termos de regulação.

A Figura 2 abaixo procura esquematizar essa problemática lukacsiana, recuperando-a


para a problemática da regulação das economias capitalistas. Uma concepção mais realista do
funcionamento dos mercados e do próprio sistema sócio-econômico pode então se beneficiar
das dimensões ontológicas do conceito de regulação, considerado mais apto a traduzir, no
plano das análises, os momentos determinativos próprios a um sistema efetivamente mais
complexo. Conseqüentemente, em termos epistemológicos, a noção de regulação mostra-se
mais adequada aos fenômenos macroeconômicos do que o conceito de equilíbrio, originário
da física clássica newtoniana e de uma ontologia naturalista do funcionamento das economias
e sociedades.
Conseqüentemente, uma apreensão das dimensões ontológicas da noção de regulação
e de seu estatuto teórico requer o reconhecimento das especificidades de cada um dos
sistemas, a fim de que a escolha do método e dos princípios de análise possam melhor
traduzir, no plano da teoria, o funcionamento das economias realmente existentes. As
propriedades encontradas na região (c) são específicas dos sistemas sócio-econômicas, pois
não estão presentes nos demais sistemas. Na região (a) encontram-se propriedades que são
comuns aos três e na região (b) podem ser identificadas características que são compartilhadas
pelos sistemas orgânicos e sociais. Nas regiões (d) e (e) há propriedades que pertencem
apenas, respectivamente, aos sistemas inorgânicos e orgânicos. A lição metodologicamente
pertinente é esta: as propriedades de um sistema mais complexo não podem ser deduzidas por
simples analogia com o comportamento de sistemas de menor complexidade. Reelaborada
por uma ontologia própria aos sistemas sócio-econômicos, a noção de regulação procura
expressar a existência de momentos de compatibilidade dinâmica entre produção e demanda,
como um resultado da conjugação de estruturas sociais complexas e não como uma
derivação lógica de mecanismos puramente mercantis, centrados exclusivamente em
comportamentos individuais otimizadores.

FIGURA 2 O CONCEITO DE REGULAÇÃO PODE EXPRESSAR, NO PLANO DAS


MACROANÁLISES, PROPRIEDADES E MOMENTOS DETERMINATIVOS QUE SÃO
ESPECÍFICOS DOS SISTEMAS SOCIAIS
Nível crescente
Totalidade Real de complexidade

Sistemas Sócio-Econômicos (c)

(b)
Sistemas Orgânicos

Sistemas Inorgânicos (a)

(e)

(d)

Os trabalhos de Fernand BRAUDEL, Pierre BOURDIEU e Karl POLANYI também


contribuem com valiosos elementos teóricos e preceitos metodológicos que fundamentam a
problemática das análises regulacionistas.
Os estudos históricos de longa duração empreendidos por BRAUDEL mostram o lugar
fundamental das instituições e demais formas organizacionais na emergência das economias
capitalistas. Além disso, este historiador da dinâmica longa do capitalismo conclama os
pesquisadores a desenvolverem uma fecundação recíproca entre história e análise econômica.
Em A Dinâmica do Capitalismo, observa o historiador que:

toda sociedade densa se decompõe em vários conjuntos : o econômico, o


político, o cultural e o social hierárquico. O econômico só se compreenderá em
ligação com os outros conjuntos, dispersando-se neles mas abrindo também suas
portas para os vizinhos. Há ação e interação. Essa forma particular e parcial do
econômico que é o capitalismo, só se explicará plenamente, à luz dessas
vizinhanças e dessas intrusões (...) .
Na obra de BRAUDEL podem ser encontrados diversos elementos que atestam a
grande plasticidade estrutural das economias que se organizam em bases capitalistas. Define-
se como plasticidade estrutural a capacidade de reconversão e de adaptação que um dado
sistema sócio-econômico é capaz de revelar face às mais diversas conjunturas econômicas e
sociais, desafiando as previsões mais catastrofistas quanto à sua viabilidade histórica. Em
outros termos, o sistema é capaz de se transformar ao nível das formas sociais e das estruturas
que suportam a produção e a distribuição, mas sem por em causa as condições que
reproduzem a lógica e a natureza mais essencial do processo capitalista de acumulação (a
busca permanente do excedente sob a forma de lucro e sua apropriação privada). Na visão
proposta por SCHUMPETER trata-se do famoso processo de destruição criativa que
permite às economias capitalistas relançarem-se em novas trajetórias de expansão econômica
e de acumulação de riquezas. Portanto, a plasticidade estrutural pode ser interpretada também
como um resultado de inovações técnicas, organizacionais e institucionais.

O estatuto teórico das instituições no contexto da reprodução social constitui uma das
temáticas centrais dos trabalhos de BOURDIEU, considerado o sociólogo da reprodução. Em
sua teoria da ação social, este autor propõe o conceito de habitus para compreender-se as
bases da reprodução sócio-econômica. Segundo BOURDIEU,

o habitus refere-se a um sistema de disposições duráveis, estruturas


estruturadas, predispostas a funcionarem como estruturas estruturantes, isto é,
como princípio que gera e estrutura as práticas e as representações que podem
ser objetivamente regulamentadas e reguladas , sem que por isso sejam o
produto de obediência de regras, objetivamente adaptadas a um fim, sem que se
tenha necessidade da projeção consciente deste fim ou do domínio das operações
para atingi-lo, mas sendo ao mesmo tempo, coletivamente orquestradas sem
serem o produto da ação organizadora de um maestro. 32
Observa BILLAUDOT (1996), que para BOURDIEU, as ações, as opções, as
estratégias nas quais os agentes se engajam não são diretamente restritas, do exterior, pela
posição que esses agentes ocupam no espaço social. Estes últimos são orientados do interior
por seu senso prático, sistema adquirido de preferências, de princípios de visão e de divisão,
de estruturas cognitivas duráveis (que em essência são o produto da incorporação de
estruturas objetivas) e de esquemas de ação que orientam a percepção da situação e a resposta
adaptada. Este senso prático em que se baseia uma determinada ação num contexto social
dado traduz-se pelo conceito de habitus próprio a um agente.

Conseqüentemente, o habitus forma-se na confluência de fatores e propriedades que


resultam das macro-estruturas, e das regularidades que veiculam, com as micro-estruturas
cognitivas dos agentes econômicos. Trata-se de um conceito que permite a superação dos
impasses entre o objetivismo e o subjetivismo nas análises dos sistemas sócio-econômicos, na
medida em que articula dialeticamente o agente social e a estrutura social para encontrar-lhes
os fatores de mediação. A formação do habitus envolve tanto a introjeção como a simples
aceitação de valores, normas e princípios sociais que asseguram a adequação entre as ações
individuais e a realidade objetiva do sistema sócio-econômico.

O conceito de habitus surge então como um dos fundamentos microeconômicos do


conceito de regulação, mobilizado como saída para os impasses teóricos tanto do
individualismo metodológico característico da tradição neoclássica, quanto do holismo,
veiculado pelo estruturalismo marxista. Nas palavras de LIPIETZ (1988):

(...) réintroduire dans le monde des structures sans agent le ferment d instabilité
et de changement que représente la possible déviance des individus ou des sous-
groupes sociaux, sans tomber pour autant dans un monde d agents sans
structure .33
Observa BILLAUDOT (1996, p. 115) que, constatando que a teoria da ação de
BOURDIEU se adequava à problemática regulacionista, LIPIETZ (1988) e BOYER (1995) a
mobilizaram para elucidar um primeiro problema teórico: explicitar como operam as formas
institucionais nos quadros da regulação em curso. Questão que será recuperada na última
seção deste capítulo, onde se encontrarão explicitados os fundamentos para uma
macroeconomia histórica e institucionalista, propostos pela Teoria da Regulação.

32
BOURDIEU, P. e PASSERON, J.C. A Reprodução, Rio de Janeiro, Francisco Alves, 1975.
33
Para um tratamento detalhado dessa problemática, consultar M.BRUNO (1997), em A Macroeconomia da
Teoria da Regulação .
Os aportes de POLANYI, sobretudo em A Grande Transformação, são
particularmente importantes na medida em que também reforçam os fundamentos teóricos da
concepção regulacionista do mercado. O mercado não surge espontaneamente do simples
desenvolvimento das trocas, ele não tem nada de natural e precisa ser instituído. Este
processo de montagem das estruturas sócio-políticas que permitem a lógica mercantil
desenvolver-se incorporando dimensões econômicas e não-econômicas da realidade social
está na base da expansão capitalista nas sociedades ocidentais, sendo viabilizado tanto por
meio de estruturas de dominação e de poder político, quanto por formas explícitas de
violência.

As concepções naturalistas, que se atém às analogias físicas ou biológicas como base


para o estudo dos fenômenos sociais, devem ser superadas em prol de uma ontologia
adequada da economia na sociedade. Sem essa superação metodológica, tanto o reducionismo
fisicalista quanto o biológico , presentes no pensamento econômico moderno desde suas
origens, permanecem nos quadros das análises, reduzindo o potencial explicativo das teorias
na mesma proporção em que se convertem em portadores da ideologia do mercado eficiente e
auto-regulável.

Neste contexto, as análises institucionalistas tornam-se um expediente incontornável.


De um ponto de vista epistemológico, a existência de ajustamentos puramente econômicos,
promovidos por forças de um mercado que se impõe com o mesmo estatuto das leis naturais,
é refutada pela própria história viva das sociedades. Conceber o processo econômico como
um fenômeno natural ou puramente mercantil é, como observa GANEM (1993), preservar o
mito de uma ordem racional, subproduto singular e exclusivo do funcionamento de uma
economia de mercado.

Conseqüentemente, sob a ótica da Teoria da Regulação, os mercados emergem como


construções institucionais, eles não existem prévia e independentemente das relações sociais
entre agentes. Trata-se da primeira inversão regulacionista com relação à concepção
neoclássica do mercado. Como o mercado apresenta-se como o locus de uma sociabilidade
inerentemente conflituosa, sua eficácia como veículo de coordenação dos comportamentos
econômicos privados é estruturalmente dependente da forma da regulação em curso.

Compreende-se então o lugar privilegiado das análises históricas e das comparações


internacionais no programa de pesquisa desenvolvido pela Teoria da Regulação. Concebida
para apreender as regularidades macroeconômicas resultantes de diferentes configurações
institucionais, as análises em termos de regulação contribuem para explicitar as formas de
evolução e de crise observadas nas economias capitalistas reais. Mas a historicidade que a
metodologia regulacionista procura resgatar para a teorização macroeconômica não se reduz a
simples ingrediente de contextualização de teorias, supostamente válidas em todos os tempos
e lugares. Diferentemente das análises derivadas da tradição neoclássica, a historicidade
emerge como um de seus principais fundamentos espistemológicos e está contida em sua
própria estrutura conceitual de base, objeto das próximas seções.

O Quadro 1 permite uma comparação entre os conceitos de equilíbrio e de regulação,


enquanto noções de base no processo de teorização econômica. Explicitam-se também as
diferenças entre a regulação aplicada em Biologia e em Economia, além das dimensões
ontológicas respectivas.

1.6 Fundamentos teóricos: o hard core da Teoria da Regulação


Três influências principais integram as matrizes teóricas do programa de pesquisa
regulacionista: a) a teoria marxiana34 e a macroeconomia kaleckinana; b) o institucionalismo
americano (J. COMMONS, W. MITCHELL e T. VEBLEN); c) Os trabalhos da Nouvelle
Histoire, desenvolvidos pela École des Annales (BRAUDEL, L. FEBVRE). Além dessas três
correntes, deve-se acrescentar a influência das análises pós-keynesianas, com autores como
KALDOR e MINSKY.35

Segundo BOYER (1995, p. 24), o programa de pesquisa da teoria padrão dominante


apresenta-se como uma espécie de cultura intensiva de um pequeno número de princípios fundadores,
operando uma nítida e completa dissociação do campo da economia, dita pura, em relação às
interações entre política, cultura e economia, que fazem a riqueza e a complexidade da sociedade
moderna. Em contraste, as análises em termos de regulação encontram sua origem na confrontação e
na transformação de uma série de ferramentas e abordagens diferentes. Combinando análise histórica,
comparações internacionais e modelagem macroeconômica, o programa de pesquisa regulacionista
necessita e favorece, por sua própria construção e método, as abordagens interdisciplinares. Nas
palavras de BOYER (1995, p. 24):

« De la théorie marxiste elles retiennent l intérêt pour les mouvements


longs sans pour autant retenir la dynamique grandiose et erronée que les
successeurs de Marx ont pieusement admirée.36 De la macroéconomie

34
Utiliza-se a expressão marxiana para ressaltar que se trata da influência direta do pensamento econômico de
Marx e não de suas interpretações veiculadas por um marxismo ortodoxo ou oficial.
35
No que concerne à área de pesquisa desenvolvida por AGLIETTA, moeda e macroeconomia financeira, torna-
se muito nítida a influência dos trabalhos de MINSKY.
36
Segundo Henri NADEL em La Régulation et Marx (capítulo 3 da mesma obra citada na nota anterior) os
regulacionistas distinguem a teoria marxiana das interpretações marxistas instituídas ou vulgarmente difundidas,
e empreendem um contínuo esforço para se livrar de toda e qualquer relação dogmática com a mesma. Observa
hétérodoxe - d ailleurs plus Kalecki que Keynes, il est retenu que le plein
emploi et la croissance forte et stabilisée sont l exception et non la règle. De
l école des Annales, les recherches prolongent les méthodes et les
enseignements: si toute société a la conjoncture et les crises de sa structure, il
importe d analyser comment les diverses étapes du capitalisme industriel
affectent cycles économiques et grandes crises. »

Como o conceito de equilíbrio, a noção de regulação também procura expressar a idéia


de coerência, de compatibilidade entre as estruturas de oferta e de demanda. No entanto, não
se trata agora de um estado de equilíbrio estático, plenamente alcançável por mecanismos
puramente mercantis e concorrenciais. A análise em termos de regulação reconhece o lugar
das instituições, formas organizacionais, convenções e regras comportamentais como fatores
endógenos inerentes às particularidades estruturais dos sistemas sócio-econômicos. Estas
últimas podem se expressar em configurações estáveis ou instáveis das economias, mas não
podem ser logicamente deduzidas da racionalidade individual de agentes otimizadores. Como
a passagem micro-macro - ou o processo pelo qual as micro-regularidades se traduzem num
determinado conjunto de regularidades macroeconômicas - repõe continuamente os problemas
de agregação e de falhas de coordenação, a regulação é mobilizada como estrutura de
mediação entre os dois níveis de análise. Neste contexto, observa BOYER (1986, p. 80), que
o conceito de modo de regulação visa substituir a teoria da decisão individual e o conceito de
equilíbrio geral como ponto de partida para o estudo dos fenômenos macroeconômicos.

Não se deve, no entanto, apreender este movimento de forma unilateral, com a


causalidade processando-se sempre do micro ao macro, pois as estruturas mediadoras
informam e enquadram os comportamentos individuais. Os agentes tendem a se conformar às
estruturas em períodos de crescimento e a reagir e a lutar por sua modificação em períodos de

ainda Nadel, que esse movimento de emancipação marca profundamente os autores regulacionistas. Esta
característica é radicalmente notável num autor fundador como AGLIETTA. Em Régulation et Crisis du
Capitalisme ele demonstra uma adesão explícita à teoria do valor-trabalho desenvolvida por Marx em O Capital,
para, posteriormente, secundarizá-la em prol da utilização da problemática de René GIRARD. Vide
particularmente, AGLIETTA, M. & ORLÉAN, A . em La Violence de la Monnaie. Paris, PUF, 1982 e
AGLIETTA, M. & BRENDER, A . em Les Métamorphoses de la Societé Salariale. Paris, Calmann-Lévy, 1984.
No entanto, contrariamente às críticas mais hostis ao projeto teórico regulacionista, a teoria do valor-trabalho,
sem deixar de ser fundamental para a compreensão das relações econômicas sob o capitalismo, ainda necessita
de desenvolvimentos subsequentes como toda e qualquer teoria com pretensões ao estatuto de cientificidade. A
questão fundamental é que entre a dimensão mais abstrata e oculta, por onde o valor se processa como substância
do mundo das mercadorias e o espaço visível e tangível por onde circulam e atuam os agentes econômicos reais,
há uma distância ou separação que traduz a existência de instâncias que comportam níveis de determinação
intermediários. Tal distância ou separação não pode ser devidamente tratada com a apreensão de suas
consequências macroeconômicas fundamentais, se a análise descarta a necessidade de uma estrutura conceitual
mediadora. Uma consequência direta de tal procedimento, é impossibilitar uma solução satisfatória e consensual
para o interminável problema da transformação dos valores em preços de produção; ou então reduzí-lo a um
mero problema algébrico, quando sua solução demanda muito mais do que uma análise formal; ela necessita de
uma abordagem verdadeiramente dialética. (Os grifos são nossos)
crise, quando as formas particulares de um determinado modo de regulação convertem-se em
fatores de rigidez e de perda de coerência macroeconômica.

Os elementos que compõem as estruturas institucionais e organizacionais de um


sistema sócio-econômico real não são nunca entidades introduzidas ex post nos modelos
regulacionistas. Não se parte de um modelo geral puramente econômico ou concorrencial para
em seguida introduzir, sob o rótulo de imperfeições , exatamente o que a axiomática de
partida não poderia conter sem destruir as bases de uma ontologia equivocada que assimila o
funcionamento do mundo social ao do mundo físico ou biológico .

QUADRO 1 - EQUILÍBRIO E REGULAÇÃO COMO NOÇÕES DE BASE DAS TEORIAS


ECONÔMICAS: UMA COMPARAÇÃO

NOÇÕES DE
BASE EQUILÍBRIO REGULAÇÃO REGULAÇÃO SÓCIO-
ECONÔMICO BIOLÓGICA ECONÔMICA
CARACTERÍSTICAS
Situação na qual as Conjunto de processos bio-
Conjunto de processos sociais
DEFINIÇÃO diferentes forças econômicas químicos que permitem a
que permitem a reprodução de
se compensam e se reprodução de determinada
uma determinada estrutura de
neutralizam estrutura orgânica
acumulação de capital

DIMENSÃO Naturalista /
Organicista Social
ONTOLÓGICA Fisicalista

MODO DE Movimentos dos preços Relações físico-químicas Fatores institucionais e


OPERAÇÃO garantem a tendência com o meio ambiente organizacionais permitem a
espontânea ao equilíbrio garantem a continuidade compatibilidade dinâmica entre
das funções vitais produção e demanda agregada

FATOR DE Código genético e O lien social é um principio


Concorrência mercantil
TRANSFORMAÇÃO adaptação ao meio de transformação permanente,
ambiente que não se limita às
determinações mercantis

Não-histórico: fundado Não-histórico: fundado Historicidade forte: fundado


PADRÃO
sobre uma lógica mercantil sobre uma ordem natural- sobre as interações agentes-
EVOLUTIVO
assimilada a uma ordem biológica estruturas (regularidades
natural econômicas são historicamente
datadas)
Ótimo econômico
IMPLICAÇÕES Sobrevivência e reprodução A coesão social e a
coincidiria automática e
dos seres vivos coerência macroeconômica
necessariamente com
podem ser alcançadas como
o ótimo social
suportes de um determinado
padrão de crescimento

FONTE: M. BRUNO (2004)

Segundo BASLE et alii (1984), a abordagem neoclássica tradicional está


completamente centrada na noção de equilíbrio. Se ela admite a existência de desequilíbrios
transitórios, a flexibilidade dos preços permite o retorno automático ao equilíbrio. Na
abordagem pela regulação, o pivô da análise não é mais o valor de equilíbrio das variáveis,
mas o processo de ajustamento que rege a dinâmica dessas variáveis:

« (...) On ne suppose pas non plus que les prix jouent nécessairement un rôle
équilibrant. On cherche à expliciter quels sont les mécanismes qui déterminent
l évolution de l offre et de la demande sociales et à montrer comment la
cohérence de ces évolution est assuré pendant les périodes de croissance, ou
au contraire fait défaut pendant les périodes de crise. Mais cette cohérence n a
rien à voir avec un équilibre statique. »

Todavia, o processo de ajustamento de que fala BASLE et alii é precisamente


veiculado pelas estruturas institucionais e organizacionais vigentes numa economia e
sociedade dadas. Em termos epistemológicos, o fenômeno macroeconômico não tem seu
estatuto teórico independente das relações sociais e centrado apenas na racionalidade de
sujeitos econômicos otimizadores. As relações macroeconômicas não são dissociáveis das
relações sociais que lhe conferem a forma concreta de existência.37

Como um resultado da conjunção complexa de racionalidades individuais através de


uma rede densa de estruturas organizativas, a macroeconomia nunca se manifesta como um
fenômeno resultante de variáveis puramente econômicas. Suas regularidades são produto de
práticas sociais moldadas e reprodutíveis pelas formas institucionais que compõem um
determinado modo de regulação. Estas últimas compreendem um conjunto de relações sociais
fundamentais à reprodução das economias que se organizam sob os diversos capitalismos.
Como fatores mediadores, as formas institucionais não podem ser diretamente deduzidas de
uma lógica puramente econômica e individual, mas apresentam-se codificadas em
compromissos sociais, convenções, regras e rotinas socialmente estabelecidas. Para as
economias capitalistas três relações sociais mostram-se fundamentais na caracterização de sua
lógica e natureza: a moeda, a relação salarial e a concorrência (BOYER, 1986, p. 73).

Um pressuposto teórico compartilhado pelos proponentes da Teoria da Regulação


pode então ser enunciado: a reprodução da estrutura determinante de um sistema sócio-
econômico, isto é, a estrutura que o caracteriza enquanto forma histórica específica de
organização da produção e do trabalho social, só é factível enquanto o mesmo for capaz de
engendrar determinadas particularidades organizacionais e institucionais que garantam a
coerência do processo de acumulação de capital e seu desenvolvimento em limites
compatíveis com a coesão social no espaço das nações.
37
Uma questão fundamental para uma teoria da regulação do capitalismo e que foi abordada em suas
conseqüências analíticas por BOYER em Le paradoxe de l adhoc en économie. in Colloque « L économie
devient-elle une science dure ? ». CEMPREMAP, octobre 1992.
Este pressuposto é, em termos da epistemologia de LAKATOS, o hard core da Teoria
da Regulação e que BOYER (1986, p. 111) desdobrará em três hipóteses fundadoras,
diretamente vinculadas a uma problemática essencialmente macroeconômica:

Hipótese 1: O processo de acumulação de capital é determinante na dinâmica


macroeconômica. Como o processo de acumulação é, para o modo de produção
capitalista, expressão de sua lógica e natureza, a hipótese I traduz o fato de que se a
acumulação é o ponto de partida e de chegada para uma pluralidade de capitais
individuais, a macrodinâmica econômica é diretamente condicionada por suas
determinações (taxa de lucro, estado da técnica, concorrência, nível de produto e
emprego, etc);

Hipótese 2: O processo de acumulação de capital não é espontaneamente auto-


equilibrado por fenômenos puramente mercantis e concorrenciais. Esta hipótese
contém o ponto de partida para a superação das metodologias reducionistas que
tendem a enquadrar como fatores perturbadores e exógenos todas as propriedades ou
regularidades que não podem ser derivadas diretamente de uma lógica individual
otimizadora. Tais metodologias promovem uma espécie de validação teórica da lei
dos mercados de Say , desde que esses fatores exógenos e perturbadores sejam
efetivamente removidos. Operacionalmente a hipótese II implica a introdução nos
quadros das análises, de um conjunto de variáveis tradicionalmente secundarizadas
pela teoria econômica padrão com o rótulo de extra-econômicas , mas que são,
todavia, imprescindíveis para a apreensão das regularidades macroeconômicas que
veiculam a acumulação de capital, determinando a dinâmica do crescimento.

Hipótese 3 - As instituições e as formas estruturais são determinantes para


direcionar o processo de acumulação de capital através de um conjunto de
comportamentos coletivos e individuais macro dinamicamente coerentes. Esta
hipótese traduz o reconhecimento de que as regularidades macroeconômicas são
veiculadas por um conjunto de estruturas organizacionais e institucionais que mantém
os comportamentos microeconômicos sob configurações compatíveis com a coerência
dinâmica da totalidade do sistema. Conseqüentemente, uma determinada forma ou
modo de regulação surge como instância de mediação na interação agente-estrutura,
superando, mesmo provisoriamente, os problemas de coordenação.
FIGURA 3 O LUGAR DA TEORIA DA REGULAÇÃO NAS PESQUISAS SOBRE AS INSTITUIÇÕES

SELEÇÃO
PELA
Teoria da
EFICIÊNCIA Justiça
Escola Austríaca
(Hayek, Menger) (Posner)
Teoria do Principal /
Agente
Teoria Economia dos
Custos de (J. Stiglitz, Jensen,
Evolucionista Meckling)
Transação
(Nelson e Winter)
(O. Williamson)
Nova Economia Teoria dos Jogos
Institucional Repetidos
(North) (Schelling, Schotter)
COESÃO COORDENAÇÃO
SOCIAL LOCAL DAS
Função estruturante Teoria das AÇÕES
das instituições Convenções
(Polanyi, Granovetter) (Lewis, Thévenot,
Boltanski)
Teoria da Regulação
(Aglietta, Boyer, Teoria da
Economia Neo- Ação Coletiva
Billaudot, Petit, Théret, Institucionalista (Olson)
Lipietz, Coriat) (Hodgson) Teoria das
Escolhas Públicas
Institucionalismo (Buchanan)
Americano
(Veblen, SELEÇÃO
Commons) PELA AÇÃO
COLETIVA

FONTE: Adaptação a partir de Marie Claire VILLEVAL (1995, p. 484) e Robert BOYER (1998, p. 54)

A Teoria da Regulação inscreve-se, portanto no âmbito das pesquisas


institucionalistas. Mas cada um dos programas de pesquisa heterodoxo no campo das
instituições segue sua própria escolha metodológica e de princípios de base. Há pesquisas que
mantém-se fiéis a uma metodologia individualista tais como as desenvolvidas pela economia
dos custos de transação(O. WILLIANSON) e pela teoria das convenções (LEWIS,
THÉVENOT, BOLTANSKI). Todavia, as análises regulacionistas reconhecem que a
viabilidade das economias que se organizam sob o capitalismo depende da imposição de
certas restrições quanto à organização da relação capital-trabalho assalariado e das formas da
concorrência. Para BOYER (2003, p. 3) é neste sentido que se pode falar de fundamento
macro-institucional de uma economia de mercado. A Teoria da Regulação busca explicitar o
conjunto de instituições fundamentais à viabilidade das economias capitalistas e a maneira
como elas determinam padrões contrastados de crescimento e acumulação, geográfica e
historicamente. Observa BOYER (2003) que:
« Contrairement à beaucoup de recherches institutionnalistes contemporaines
qui se concentrent sur les équilibres de court terme et l écart que peuvent
introduire les institutions par rapport à un hypothétique équilibre de marché,
la Théorie de la Régulation plonge les institutions dans le temps long de
l histoire et cherche en particulier à expliciter comment les facteurs même du
succès d un régime d accumulation sont à l origine de sa déstabilisation et de
l entrée dans une crise qualifiée de structurelle, au sens où n est plus assurée
la stabilisation dynamique de l accumulation au sein des formes
institutionnelles héritées du passé. »

1.7 Dos conceitos intermediários ao nível meso-econômico de análise


Ou há, verdadeiramente, leis da história e, nesse caso,
uma genuína atividade humana é impossível, a não ser, na
melhor das hipóteses, enquanto técnica; ou então os
homens fazem a sua história e a tarefa do trabalho
teórico não é mais a descoberta de leis , mas a elucidação
das condições que enquadram e delimitam essa atividade,
das regularidades que ela pode apresentar, etc.

(Cornelius CASTORIADIS, in As Encruzilhadas do


Labirinto, 1986)

O conceito de forma institucional ou forma estrutural ocupa um lugar fundamental na


Teoria da Regulação. De um ponto de vista metodológico, este conceito visa à construção de
um nível intermediário ou meso-econômico de análise, permitindo a passagem micro-macro
sem o subterfúgio da noção de agente representativo. Reconhece-se neste contexto, que as
regularidades macroeconômicas possuem níveis suficientes de autonomia, não se
apresentando jamais como derivações imediatas e necessárias das racionalidades individuais
microeconômicas. Conseqüentemente, as propriedades observadas no plano macroeconômico
não resultam da simples agregação de ações individuais, supostamente homogêneas e
orientadas exclusivamente pela lógica de otimização.

Em termos epistemológicos, esta démarche busca superar a concepção reducionista


promovida pelas variantes neoclássicas, que descaracterizam o estatuto teórico e o objeto da
macroeconomia ao eliminar, sem resolver, os problemas de agregação e de falhas de
coordenação. Este reducionismo das análises main-stream mostra-se, portanto teoricamente
insatisfatório. Na medida em que buscam apreender os macro-fenômenos econômicos a partir
de derivações lógicas de primeiros princípios que compõem a axiomática do equilíbrio geral
walrasiano, as variantes neoclássicas tendem a esvaziar o conteúdo mediador das instituições.
Reduzem-nas a fatores exógenos de perturbação de mecanismos supostos puramente
mercantis e considerados portadores de soluções superiores a toda e qualquer forma
alternativa de coordenação.38

Em BOYER (1986), as formas institucionais (FI) expressam configurações


particulares das relações sociais de produção e distribuição, estabelecidas através da mediação
de fatores que não são dedutíveis de uma lógica puramente mercantil ou da racionalidade de
agentes individuais. Nas economias modernas, elas resultam de um processo de codificação
de compromissos sociais, convenções, regras ou procedimentos socialmente aceitos como
imprescindíveis à coesão social e à coerência macro-dinâmica do conjunto do sistema.
Conseqüentemente, as formas institucionais tornam-se o substrato de regularidades
econômicas e sociais básicas, que emergem na história longa como um resultado do caráter
inerentemente conflituoso das relações sociais.

Para uma economia organizada em bases capitalistas, cinco formas institucionais são
consideradas fundamentais na reprodução da estrutura determinante deste modo de produção.
De um ponto de vista teórico, cada uma delas compõe uma unidade de análise ou área da
régulation d ensemble: a) a relação salarial; b) o regime monetário-financeiro; c) a forma da
concorrência; d) as relações Estado-econmia e e) a forma de inserção internacional.

As formas institucionais engendram regularidades sócio-econômicas por meio de


procedimentos que são ao mesmo tempo geradores de rigidez (AGLIETTA, 1997). Isto
explica por que determinadas configurações favorecem, num primeiro momento, a
emergência de trajetórias estáveis de crescimento, mas depois tendem a se converter em
fatores endógenos de inércia e de crise dos regimes de acumulação. Uma questão que será
analisada na seção 1.5.3.

Para AGLIETTA (1997), as FI criam referências convencionais e diferenciações


estáveis que permitem aos grupos sociais estratificados de conceber estratégias necessárias à
sua sobrevivência. Elas permitem a formação de um horizonte temporal parcialmente
deslocado da incerteza radical que é uma característica inerente do sistema sócio-econômico.
Ao mesmo tempo, as FI bloqueiam a fluidez dos movimentos econômicos, pois elas limitam e
enquadram as forças mercantis em prol da própria coesão social e da coerência
macroeconômica da totalidade do sistema. Trata-se precisamente de um dos paradoxos do

38
Observa BLANCHARD (1991) que « no nosso processo de voltar aos fundamentos , erramos muito, e nos
confundimos a respeito do que se trata a macroeconomia. Ao insistirmos religiosamente em fundamentos micro,
e na derivação dos resultados de gostos e tecnologia , construímos muitos monstros, muitos modelos pesados
com poucos resultados interessantes. Esquecemos a utilidade dos cortes concisos, evitando-os em favor de
derivações completas de primeiros princípios.
capitalismo constatados por BOYER (1992), em que o sistema viabiliza suas condições de
estabilidade e reprodutibilidade, impondo determinadas restrições institucionais à lógica
mercantil.39 Para AGLIETTA (1997),

la dynamique du capital est une force productive gigantesque, mais que c est
aussi une puissance aveugle. Elle ne contient pas en elle-même de principe
d autolimitation, ni d orientation dans un sens qui permet de garantir la
réalisation de l imaginaire des capitalistes : l accumulation perpétuelle.
Autrement dit, le capitalisme a en lui-même la capacité de mobiliser les
énergies humaines pour les transformer en croissance. Il n a pas celle de faire
une cohérence globale du choc des intérêts individuelles. »
Em conseqüência, as formas institucionais emergem como centro de convergência de
toda sorte de tensões provenientes da dinâmica da acumulação de capital. Elas podem
absorver essas tensões e conflitos apenas dentro de certos limites, que uma vez ultrapassados
explodem sob a forma de um questionamento de sua legitimidade. Abre-se então uma fase de
crise e de transformação institucional irreversível.

A relevância teórica do conceito de forma institucional reside na constatação


empírica de que as FI permitem derivar relações macroeconômicas dotadas de uma certa
permanência estatística. E a partir do momento em que adquirem configurações estáveis, elas
estruturam um determinado modo de regulação.40 Conseqüentemente, o espaço concreto e o
estatuto teórico de um modo de regulação decorrem do reconhecimento de que para dirigir as
forças produtivas de forma ordenada, isto é, capaz de preservar a potência do trabalho
produtivo de que necessita, o capitalismo deve estar inserido em estruturas que limitam os
efeitos destrutivos do próprio processo de acumulação de capital. Isto porque em seu próprio
movimento, o capitalismo desencadeia conflitos e distorções que se convertem em obstáculos
endógenos ao seu desenvolvimento.

A existência de mediações sociais cria a possibilidade histórica de que o progresso


técnico possa se transformar em progresso social. Neste sentido, a abordagem da regulação
afirma a convicção de que os mecanismos de mercado devem ser completados ou suplantados
pela ação coletiva que se inscreve nas mediações sociais (AGLIETTA, 1997, p. 421). E na

39
Segundo AGLIETTA (1997), la dynamique du capital est une force productive gigantesque, mais que c est
aussi une puissance aveugle. Elle ne contient pas en elle-même de principe d automilitation, ni d orientation
dans un sens qui permet de garantir la réalisation de l imaginaire des capitalistes : l accumulation perpétuelle.
40
No posfácio de Régulation et Crises du Capitalisme (1997), AGLIETTA argumenta que as formas
institucionais criam processos globais como os encadeamentos macroeconômicos e observa que la négociation
collective modifie la formation des salaires, comment l avènement de la grande entreprise transforme le
système des prix. Bref, l ensemble des médiation contribue à façonner un mode de régulation. La pérennité d un
mode de régulation est celle de la compatibilité des médiations qui lui donnent sa cohérence ». (Os grifos são do
autor).
estrutura conceitual proposta pelas macro-análises regulacionistas, esses fatores de mediação
são denominados por formas institucionais. Estas últimas são estruturas intermediárias que
modificam as relações nas quais se desenvolvem as tensões entre o individual e o social nas
economias organizadas sob os diversos capitalismos.

A lição metodologicamente relevante neste contexto refere-se ao fato de que o


domínio de validade dessas relações macroeconômicas necessariamente coincide com o
domínio de validade das instituições sociais em vigor. As macro-regularidades dependem de
condições estruturais particulares e que se transformam com a história viva das economias
reais. Trata-se de um princípio básico da Teoria da Regulação que põe em causa a pretensão
universalizante dos modelos de equilíbrio geral de origem neoclássica.

Todavia, a regulação é sempre duplamente incompleta (AGLIETTA, 1997).


Primeiramente porque o dinamismo das relações privadas contorna o campo das convenções
estabelecidas e faz surgir o afrontamento econômico direto, provocando uma transformação
irreversível das instituições. E em segundo lugar porque as instituições reguladoras não são
portadoras senão de coerências locais. O que as análises podem identificar como padrões
estáveis em certas épocas, os regimes de crescimento ou de acumulação, são o resultado de
instâncias parciais de regulação, vulneráveis à ação da história e, portanto, sujeitos a crises e
transformações estruturais.

Uma determinada configuração estável das FI é então a matriz geradora de um modo


estabilizado da regulação que, do ponto de vista analítico, pode ser expresso por um modelo
macroeconômico particular. Seguem-se abaixo as definições para esses cinco componentes de
um modo de regulação:41

1.7.1 A forma institucional do rapport salarial ou wage-labor nexus (WLN)


As cinco formas institucionais se definem como a codificação de relações sociais
fundamentais à constituição de uma economia capitalista. Mas os estudos históricos destacam
42
o lugar primordial de uma delas, a relação salarial ou rapport salarial, definida como uma
modalidade de organização da produção e do processo de trabalho associada a uma
determinada forma de remuneração dos assalariados e de estruturação de seu modo de vida.
Esta forma institucional é considerada central na definição das relações entre salário e

41
No próximo capítulo as cinco formas institucionais serão retomadas em sua aplicação à economia brasileira.
42
Em termos teóricos mais rigorosos o conceito de relation salariale difere do conceito de rapport salarial e é
por isso que a tradução em língua portuguesa é mantida entre aspas. No capítulo 4, que analisará a evolução das
formas institucionais na economia brasileira, serão explicitadas as definições precisas de cada uma dessas
noções.
emprego, na medida em que cada princípio de divisão do trabalho induz um certo tipo de
mudança técnica e então de evolução da produtividade (BOYER, 1998, p.21).

Em um nível elevado de abstração, o conceito de wage-labour nexus refere-se a uma


configuração particular da relação capital-trabalho assalariado, resultante da combinação de
fatores sócio-políticos e econômicos. Tais fatores são apreendidos como um dos momentos
fundamentais da regulação das economias capitalistas e, em se tratando de sociedades
democráticas, freqüentemente são a expressão de compromissos institucionalizados. Estes
últimos distinguem-se também da institucionalização autoritária que provém das ações
governamentais. Como observam DELORME e ANDRÉ ( 1983, p. 672-674):

a l origine des compromis, nous trouvons une situation de tension et de conflit


entre groupes sócio-économiques. L opposition d intérêt varie suivant l enjeu
( ). Dans la mesure où aucune des forces en présence ne parvient à dominer
les forces adverses à un degré qui permettrait d imposer totalement ses intérêts
propres, le compromis finit par en découler. ( ) L institutionnalisation
désigne la mise en place d une forme d organisation créant des règles, des
droits et des obligations pour les partie prenantes, imposant une discipline à
l égard de l institution qui prend alors les apparences d une donnée objective
pour chaque acteur, individu ou groupe, par rapport à laquelle se trouvent
progressivement adaptés des comportements et des stratégies.
Um dos exemplos notáveis que resultam dos trabalhos regulacionistas foi a
identificação do compromisso salarial fordista que implicava num particular modo de
repartição do valor adicionado entre assalariados e capitalistas. A relação salarial fordista foi
estruturada em torno de compromissos institucionalizados que garantiam o repasse de parte
dos ganhos de produtividade para o salário direto dos trabalhadores, possibilitando a expansão
da demanda agregada de forma compatível com as tendências da produção de massa. Essa
institucionalização pressupunha ainda um certo nível de estabilidade das relações de emprego
que se articulava com o desenvolvimento dos institutos de seguridade social e mais
amplamente com a afirmação política do Welfare-State nos países centrais.

De um ponto de vista teórico, os vínculos entre RS e a moeda sob o capitalismo são


destacados por AGLIETTA (1997), um autor cujas preocupações analíticas estão centradas
numa problemática essencialmente financeira, mas sob um prisma macroeconômico.43 Para
este economista, a relação salarial estabelece o poder de uma classe social sobre outra, através

43
Em seus trabalhos mais recentes, AGLIETTA (2001) chama a atenção para a relevância teórica das relações
entre sistema financeiro e macroeconomia: si la pratique de la finance s écarte de l idéologie
microéconomique de l efficience des marches, les relations entre les systèmes financiers et la macroéconomie
sont des défis encore plus aigus ». Para enfatizar a importância desta problemática, este autor utiliza o conceito
de macroeconomia financeira , onde analisa a questão das finanças, do crescimento e dos ciclos econômicos,
bem como as crises financeiras e a regulação monetária.
da clivagem que instaura e reproduz. O poder das classes que têm a iniciativa de criar moeda
para a transformar em meio de financiamento sobre as classes que não têm acesso à moeda
senão mediante a venda de sua força de trabalho. A relação salarial é a separação que torna
possível um conjunto de indivíduos livres incapazes de se constituir em produtores privados
nos quadros da economia mercantil capitalista. Os assalariados são também indivíduos livres
para perseguirem seus objetivos, mas sempre sob a restrição de privação da propriedade.

A partir do reconhecimento desta assimetria de poder, resultante da subordinação que


a convenção salarial instaura entre indivíduos sob seu domínio, os desenvolvimentos recentes
das análises em termos de rapport salarial terminaram por ampliar a definição deste conceito.
Conforme BILLAUDOT (2000, p. 155), a relação salarial não se reduziria aos vínculos entre
empregadores capitalistas e seus assalariados. Trata-se da vinculação institucional e
convencional entre todos os empregadores e seus assalariados, englobando portanto, a
definição precedente.

Em BOYER (1986, p. 49), o conceito de relação salarial tem por objetivo básico
explicitar as configurações existentes entre diferentes tipos de organização do processo de
trabalho (a dimensão da relação salarial enquanto relação de produção) e os sistemas de
remuneração vigentes (a dimensão da relação salarial enquanto relação de distribuição). Em
termos operacionais, BOYER identifica cinco componentes básicos que permitem caracterizar
geográfica e historicamente uma determinada forma institucional do wage-labour nexus:

Organização da produção e do processo de trabalho esta dimensão da RS busca


apreender as formas organizacionais responsáveis pelas modalidades de articulação
do coletivo de trabalhadores às bases técnicas produtivas existentes, bem como
elucidar as características destas últimas.44 A este nível são definidos os fatores de
geração dos ganhos de produtividade, incluindo os princípios de gestão, que
dependem diretamente da estrutura de produção, considerando-se as especificidades
do paradigma tecnológico-industrial vigente (tipos de bens de produção e as formas
organizacionais adequadas a sua operação). Amparado em diversos estudos de caso, o
princípio regulacionista aplicado a esta dimensão da relação salarial é o de que a
combinação homem-máquina é essencialmente um atributo sócio-técnico e não um
elemento completamente determinado pela tecnologia.45 Neste sentido, uma mesma

44
Os trabalhos de CORIAT e LIPIETZ são particularmente elucidativos dos chamados paradigmas sócio-
técnicos e oganizacionais que respondem pelas particularidades estruturas.
45
Uma das características marcantes do percurso teórico regulacionista é exatamente a ruptura com as
concepções que promovem o determinismo econômico, incluindo neste último o determinismo tecnológico.
base técnica produtiva pode se encontrar associada a diferentes formas de se organizar
o processo de trabalho, incluindo os padrões de remuneração ou sistemas de
pagamento da força de trabalho mobilizada46;

Qualificação do trabalho a qualificação do trabalho é o principal fator de


determinação do salário direto. De acordo com BILLAUDOT (1996, p.83), pode-se
substituir a noção de capacidade ou força de trabalho pela noção mais operativa de
qualificação. Esta última expressaria o conjunto de habilidades e conhecimentos
prático-teóricos que o trabalhador assalariado possui e que o tornam apto a
desenvolver um processo produtivo determinado. A questão da hierarquia das
qualificações e dos salários é analisada também em seus impactos sobre a distribuição
da renda e então, por seus efeitos sobre o crescimento da demanda.

A utilização deste conceito nas análises regulacionistas exige, no entanto, a


consideração de outras dimensões que enriquecem seu conteúdo. Conforme observa
PIRIOU (2001) pode-se distinguir a qualificação do emprego da qualificação do
trabalhador. A primeira corresponde às habilidades e conhecimentos necessários para
se ocupar um determinado posto de trabalho ou função. A qualificação do trabalhador
não corresponde necessariamente à qualificação do emprego (perfil do posto,
definição da função) pois esta não é sempre corretamente definida ou percebida pelo
empregador. Por outro lado, a elevação do desemprego e o acesso de parcelas
crescentes da população à formação educacional superior têm conduzido várias
categorias profissionais a aceitarem postos de trabalho sub-qualificados.

Segundo classificação proposta em ÉCHAUDEMAISON (1989), três tipos


de qualificação podem ser definidos:

a qualificação individual que inclui a aptidão do trabalhador para executar


a tarefa que lhe foi atribuída, mas também o conjunto de conhecimentos
(know-how) que resultam de seu nível cultural e de sua formação, de sua
experiência ou de sua prática pessoal;

a qualificação requisitada ou qualificação do emprego que é definida pelo


empregador em função das características do posto de trabalho. Esta

46
Por exemplo, nos EUA e na França a intensidade do trabalho é principalmente imposta por meio de um
controle hierárquico em conjunção com um sistema de pagamentos estruturado com mecanismo de incitação ao
trabalho. No caso da Alemanha e Japão, constata-se a existência de mercados internos de trabalho (conforme
definição proposta por PIORE e DOERINGER) como estímulo à produção.
qualificação é essencialmente formal, pois é acordada pelo contrato de
trabalho;

a qualificação oficial que é definida pelas convenções coletivas, podem


também anexar uma classificação detalhada dos diferentes empregos,
atribuindo a cada um deles um índice hierárquico (SQ, sem qualificação;
OP, operário profissional, etc.).

As análises podem então integrar a questão da precariedade e da


desvalorização do trabalho a nível deste componente da relação salarial, um fenômeno
comum nas economias em desenvolvimento, mas também observado em países
desenvolvidos.

Modalidades de mobilização e de vínculo dos assalariados às empresas a


mobilidade da força de trabalho pode ser apreendida intra e inter-firmas e entre estas e
o mercado de trabalho. No caso do modo de desenvolvimento fordista típico, o
desemprego tecnológico e o mercado de trabalho funcionavam como fatores de
impulsão da mobilidade do trabalho. No caso do ohnismo (relação salarial toyotista)
no Japão, o modelo de organização da produção supõe uma grande mobilidade interna
às empresas, tanto no que tange aos postos de trabalho ocupados, quanto às funções e
respectivas remunerações. Todavia, a mobilidade externa (inter-firmas e entre o
mercado de trabalho e as firmas) é veiculada pela rede de empresas sub-contratadas e
as demais pequenas e médias empresas. Segundo BOYER [1995, p.51], o Japão
apresenta-se como uma exceção muito forte à hipótese neoclássica de que um mercado
de trabalho perfeitamente competitivo seria o meio mais eficiente para a alocação da
mão-de-obra na estrutura de produção. Em razão dessas particularidades de seus
sistemas sócio-econômicos, o Japão, a Alemanha e os países nórdicos (Dinamarca,
Finlândia, Suécia, Noruega e Islândia)47 constituem uma rica fonte empírica para o
teste das hipóteses e princípios básicos propostos pela Teoria da Regulação;

Determinantes do salário direto e indireto os fatores de formação do salário direto e


indireto (recursos provenientes da seguridade social, acesso a serviços públicos de
saúde e educação e outras transferências sociais) são cruciais na determinação da
estrutura de demanda. O problema da demanda efetiva em Keynes, ou o seu análogo
47
Quanto aos países nórdicos, ver especialmente BOYER em Le bout du tunnel ? Stratégies conservatrices et
nouveau régime d accumulation, in Economies et Sociétés, Série Théorie de la Régulation, nº 5, déc. 1990, pp. 5-
66.
em Marx (problema da realização), não pode ser equacionado em seus impactos
macroeconômicos fundamentais, sem uma investigação dos elementos institucionais,
convenções e regras que codificam os sistemas de remuneração que mantém o
salariado conectado às unidades produtivas. Uma das especificidades da relação
salarial fordista, já mencionada acima, foi exatamente a maior estabilidade das
relações de emprego, sob contratos que previam uma indexação explícita dos salários
diretos à evolução dos ganhos de produtividade e do custo de vida. No modelo
japonês, a relação salarial toyotista codifica, institucionalmente, uma fórmula peculiar
de determinação dos salários. A remuneração dos assalariados é composta por uma
parte fixa (ainda que negociável e modulável) e uma parte variável (correlacionada
positivamente com a situação financeira da empresa)48. Portanto, nos dois casos, tanto
para o fordismo quanto para o ohnismo, a formação dos salários está longe de ser um
atributo ao sabor exclusivo das determinações mercantis e concorrenciais, como
promovem as visões clássica e neoclássica, pois trata-se de uma função do modo de
regulação e do regime de acumulação que lhe é resultante.49 Conseqüentemente, pode-
se apreender o sistema de remuneração da força de trabalho como um dos
determinantes da produtividade, da divisão salário-lucro e, portanto, do nível de
emprego;

O modo de vida assalariado - relacionado à aquisição de bens e serviços, incluindo os


serviços coletivos ou públicos, este componente da RS é uma função dos fatores que
concorrem para a reprodução imediata (salário direto) e de longo prazo do salariado
(salário indireto). Como um resultado macroeconômico necessário tem-se um
determinado modo ou norma social de consumo, que responde pelo estilo de vida
assalariado. Historicamente, constata-se que o Estado sempre foi induzido a gerir o
salário direto e indireto, como parte integrante da gestão monetária e dos conflitos
inerentes às relações capital-trabalho assalariado. As análises comparativas apontam

48
BOYER observa que o conceito de economia participativa (économie de partage) desenvolivdo por M.
WEITZMAN, adere de forma suficiente ao modelo de determinação dos salários japonês. Para maiores detalhes,
vide A Economia Participativa: superando a estagflação de WEITZMAN, Editora da USP, 1984.
49
Como argumenta BOYER [1995, p. 108], as convenções coletivas podem codificar um processo de revisão
automática dos salários nominais em função do custo de vida e deste modo o salário real, escapa, ao menos
transitoriamente, das forças diretas do mercado de trabalho. Uma das características fundamentais que
garantiram a estabilidade durável do modo de desenvolvimento fordista foi a evolução sincrônica entre normas
de produção e normas de consumo, possibilitada por uma configuração muito particular da relação salarial que
promovia, exatamente, a correlação positiva entre salário real, produtividade e custo de vida, além de diversas
formas de salário indireto e transferências sociais, nos quadros do Estado de Bem-Estar.
para a variedade de configurações possíveis deste componente da RS, que pode
combinar intervenções públicas em graus qualitativa e quantitativamente diversos por
país, no que tangem a promoção de setores como o habitacional, a seguridade social
(previdência, assistência e saúde) e educacional. No caso da Alemanha, Inglaterra,
França e Suécia, a participação do setor público como provedor desses bens e serviços
mostra-se maior do que em países como o Japão e EUA, onde tais demandas
permanecem fragmentadas e as respostas, por conseguinte, localizadas. BOYER
[1995, p. 51] observa que no Japão, especialmente nas grandes empresas, existe uma
espécie de company-ist welfare, isto é, um sistema microcentrado de seguridade
social, a fim de atrair e manter os trabalhadores mais qualificados. De forma
surpreendente, as desigualdades sociais não são muito grandes, como era de se
esperar, tendo-se em vista que o país não possui um Welfare State no sentido ocidental
deste conceito.

Os cincos componentes ou dimensões da WLN estão obviamente micro e


macroeconomicamente interconectados e sua dissociação é efetuada apenas para fins
analíticos. Mas duas dimensões mostram-se essenciais, na medida em que permanecem como
matrizes das outras três: a RS como relação de produção (ao nível dos processos de trabalho
ou das bases técnicas produtivas) e a RS como relação de apropriação (ao nível dos sistemas
de remuneração que implica). Estas duas dimensões respondem pelo caráter contraditório da
relação salarial que se processa simultaneamente como custo de produção (na perspectiva das
empresas individualmente consideradas) e componente básico de impulsão da demanda
agregada (na ótica da economia nacional). Esta contradição está na base da RS como relação
de distribuição primária da renda, sua divisão entre salários e lucros, cuja influência decisiva
sobre a dinâmica da acumulação é reconhecida desde os autores clássicos. Como observa
LIPIETZ (1987, p.99 ):

Le taux de partage de la valeur ajoutée établit donc une nouvelle


contradiction: trop de salaire et pas assez d accumulation, ou trop de profits et
pas assez de demande. C est le problème fondamentale de la régulation du
rapport salarial »50
As análises dos regimes de acumulação fordistas sugerem que as economias
capitalistas podem encontrar trajetórias sustentáveis de crescimento desde que essa regulação
da relação salarial possa superar essa contradição. Os salários enquanto custos de produção

50
Os grifos pertencem a A. LIPIETZ, em ZERBATO, Michel et alii, Keyésianisme et Sortie de Crise Keynes
contre le libéralisme?, Dunod, Bordas, Paris, 1987.
devem evoluir em níveis que sejam suportáveis pelas estruturas de oferta e ao mesmo tempo
capazes de assegurar a expansão continuada da demanda efetiva que a acumulação de capital
exige.

A lição teoricamente relevante, extraída da investigação das condições endógenas que


permitiram o crescimento excepcional do pós-Segunda Guerra, é exatamente esta: os
mecanismos puramente mercantis ou concorrenciais mostram-se incapazes de estabelecer
por si mesmos essa compatibilidade dinâmica entre a taxa de salário como custo de produção
e como fator fundamental do nível de demanda efetiva que o crescimento sustentável requer.
Formas institucionais são então reconfiguradas, fatores políticos e normativos agenciados e
convenções salariais estabelecidas como parte essencial dos dispositivos de coordenação para
o conjunto de mercados e organizações econômicas. E então, após um longo processo de
transformação social, freqüentemente por meio de tentativas e erros, novas condições
estruturais tendem a emergir e talvez possam proporcionar a necessária coerência
macroeconômica entre as cinco áreas da regulação.

BOYER [1995] e CORIAT [1992] reconhecem os limites da noção de RS quando a


mesma é aplicada a nível microeconômico, dada a heterogeneidade das fórmulas salariais e
contratuais que refletem as especificidades setoriais e de cada ramo particular da estrutura de
produção. Todavia, BOYER observa que o conceito de RS adquire sua significância teórica
apenas a nível macroeconômico de análise. Neste nível, o rapport salarial emergirá como
uma síntese dos elementos convergentes no conjunto das relations salariales51 que operam no
plano microeconômico. Uma determinada configuração do rapport salarial será definida
pela coerência entre uma forma particular de organização do trabalho e um princípio de
remuneração que deve abarcar os problemas de gestão e de controle do coletivo de
trabalhadores.

Esta perspectiva conceitual deve permanecer em conformidade com cada grande


etapa da história do salariado e, em se tratando de um mesmo período de análise, contemplar
também os diferentes arranjos setoriais. O conceito de relação salarial possui então uma dupla
dimensão analítica: de um lado, trata-se de apreender os fatores de ativação do sistema
técnico-produtivo a partir das formas organizacionais vigentes. De outro, busca explicitar os
fatores que viabilizam o sistema de remuneração correspondente, considerando-se essas duas

51
Como foi mencionado na nota 38, os regulacionistas franceses mobilizam dois conceitos próximos na estrutura
conceitual proposta: o de rapport salarial (operacionalizado a nível macroeconômico) e o de relation salariale
(operacionalizado a nível microeconômico e setorial). Todavia, como não há em português dois vocábulos aptos
para uma tal distinção, utilizam-se os termos originalmente em francês ou a tradução inglesa wage-labor nexus.
dimensões como momentos interdependentes no contexto da macrodinâmica da acumulação
capitalista. Respeitando a maior aderência do conceito de rapport salarial ao nível
macroeconômico, a Teoria da Regulação mobiliza então a noção de relation salariale como
uma projeção da RS ao nível das unidades produtivas.

Pode-se então passar dos níveis mais alto de agregação, onde opera o rapport salarial,
para o nível microeconômico e apreender as especificidades da organização da produção e dos
processos de trabalho, explicitando-se inclusive, as fórmulas salariais vigentes. Para CORIAT
[1991 e 1992], isto pode ser facilitado pela noção de relação de emprego que se encontra na
base do contrato salarial. Ela permitirá, através da análise do modo de regulação, a passagem
teórica da relação salarial às normas ou modo de consumo como principal determinante da
demanda agregada.

As análises em termos de regulação identificam três formas históricas básicas para a


relação salarial:

a) a relação salarial concorrencial é a forma predominante nas economias do século


XIX. Caracteriza-se pela fraca inserção do consumo dos trabalhadores assalariados na
produção capitalista e pela pró-ciclicidade dos salários e da conjuntura
macroeconômica;

b) a relação salarial taylorista trata-se da forma típica nas três primeiras décadas do
século XX, onde a difusão de novos princípios de gestão permite uma produção de
massa, sem que o modo de vida dos trabalhadores assalariados seja profundamente
modificado;

c) a relação salarial fordista é a forma predominante nos países da OCDE no pós-


Segunda Guerra, caracterizando os Trinta Gloriosos . Este tipo de relação salarial
permitiu o desenvolvimento de novas normas de consumo assalariado compatíveis com
as estruturas de produção sob regimes de acumulação intensiva com consumo de massa.

1.7.2 A forma institucional da moeda ou regime monetário-financeiro (RMF)


Esta segunda forma institucional corresponde a uma das três relações determinantes
das economias que se organizam sob o capitalismo. Para BOYER (1986, p. 48), a moeda ou
forma monetária é uma relação social fundamental que institui os sujeitos da economia
mercantil. Isto significa que a moeda não é uma mercadoria especial, mas a forma de
relacionamento fundamental entre os centros de acumulação, o trabalho assalariado e os
demais agentes econômicos.
A moeda é a entidade graças à qual cada agente da economia mercantil pode conectar-
se uns aos outros. Em conseqüência a realização das mercadorias na troca assume a forma de
uma restrição monetária (AGLIETTA (1997, p.352)). Em um sentido geral, a forma da
restrição monetária é a modalidade de gestão da moeda que permite aos agentes econômicos
quitarem as obrigações contraídas ao longo do processo capitalista de acumulação.
Conseqüentemente, as modalidades de crédito são formas de se contornar a restrição
monetária que a lógica da acumulação capitalista instaura e reproduz.

Como observa GUTTMANN (1995, p. 85), a contribuição maior da Teoria da


Regulação à teoria monetária é sua compreensão da moeda como uma instituição social de
base dos regimes de acumulação. E como tal, a moeda não é neutra, sendo concebida como
endógena, no sentido de que sua emissão decorre da própria dinâmica da atividade
econômica.52 A análise das normas monetárias predominantes em um regime de crescimento
dado, exige então uma investigação cuidadosa das instituições e estruturas organizacionais
que permitem as circulações monetária e financeira desenvolverem-se de forma
macroeconomicamente coerente com as necessidades da acumulação. Em conseqüência, as
mudanças nas dimensões de uma norma monetária jogam um papel crucial na transição de um
regime de acumulação a um outro (BOYER, CORIAT, 1984; BOYER, 1993).

O funcionamento de toda norma monetária está sujeito a configurações institucionais


específicas que compreendem:

a gestão pelo banco central da criação de moeda ( política monetária );

as regulamentações públicas do setor bancário ( política financeira );

os mecanismos de empréstimos em última instância para conter as crises


financeiras;

as regras de circulação financeira com o exterior.

O conjunto destes dispositivos normativos e institucionais constitui os regimes


monetário-financeiros e cada regime de acumulação possui seu próprio regime monetário. A
transformação de um regime de acumulação coincide historicamente com reformas
significativas ao nível das estruturas que codificam os regimes monetários, como foi o caso
52
GUTTMANN reconhece também que les régulationnistes ont bâti leur approche de la monnaie sur le
concept postkeynésien d une économie monétaire de production. Mais par contraste avec les postkeynésiens
(LAVOIE, 1984), ils font appel à une notion plus large de l endogénéité de la monnaie et se centrent davantage
sur ses caractéristiques institutionnelles. Ces différences ont permis à la Théorie de la Régulation de clarifier la
nature de la monnaie de crédit par la mise en évidence de plusieurs traits clé de cette forme contemporaine de la
monnaie »(GUTTMANN, 1995, p. 87).
nos EUA durante e após a guerra civil (1863-1879) ou no auge da Grande Depressão dos anos
30 (GUTTMANN, 1989, p. 86).

Conseqüentemente, em termos operativos, a moeda como uma das instituições de base


das economias mercantis, monetárias e salariais será apreendia sob a forma de um regime
monetário-financeiro. Conforme BILLAUDOT (1996, p. 49), cada forma de organização da
moeda é um regime monetário que respeita dois princípios fundamentais, enunciados por
AGLIETTA (1988; p. 110):

Existência de uma unidade de conta comum que delimita um espaço monetário;

Toda transação econômica é conduzida em moeda; todo saldo não nulo entre
receitas e despesas individuais é regulado em moeda.

A unicidade da moeda no sistema de pagamentos não implica a unicidade dos signos


monetários. Para BILLAUDOT, a primeira exigência comum a todo regime monetário-
financeiro é a de garantir a homogeneidade desses signos, sua equivalência integral qualquer
que seja o emissor desses signos. Este modo de convertibilidade não pode ser um mercado, tal
como o mercado de câmbio. Trata-se de um processo de compensação centralizada.

A segunda exigência é a da existência de um meio de pagamento último para todas as


dívidas. Este meio de pagamento não é por si mesmo uma dívida, mas uma moeda fiduciária
que não pode ser emitida senão por uma instituição central. Conseqüentemente, todo regime
monetário é uma forma de regular as relações entre credores (estes que possuem receitas
superiores às despesas) e os devedores (estes que possuem as despesas superiores às receitas).
Dito de outro modo, trata-se de um modo de operação da restrição monetária (BILLAUDOT,
1996, p. 50).

Mas a lógica de um determinado regime monetário-financeiro deve ser analisada em


conjunção com as configurações vigentes das outras quatro formas institucionais. Este
preceito está em consonância com o princípio regulacionista básico, para o qual as
regularidades macroeconômicas não são jamais universais ou generalizáveis no tempo e no
espaço, uma vez que permanecem sempre indexadas por estruturas organizacionais e
institucionais que se revelam provisórias ou historicamente datadas.53

53
Esta hipótese regulacionista torna-se particularmente importante no debate com as teorias monetaristas que
normalmente são caracterizadas por uma concepção essencialmente redutora da moeda e de suas determinações
no funcionamento das economias capitalistas realmente existentes.
Segundo a definição proposta por AGLIETTA (2001, p. 66), os regimes monetários
são conjuntos específicos de instrumentos e de objetivos intermediários (ligados à política
monetária), que podem estar fundados sobre regras ou repousar sobre julgamentos
discricionários. Tais regimes permitem às autoridades governamentais manterem um controle
relativo sobre a regulação monetária (conjunto dos modos de influência da moeda sobre a
economia, consideradas as estruturas financeiras vigentes). As seguintes definições devem
então ser esclarecidas:

Os instrumentos referem-se a variáveis que podem ser fixadas de uma maneira


discricionária pelas autoridades monetárias;

Os objetivos finais correspondem a variáveis econômicas cuja evolução as


autoridades buscam influenciar;

Os objetivos intermediários são as variáveis financeiras que se conectam aos


objetivos finais, mas que não podem ser controlados diretamente pelas autoridades
governamentais. Tais variáveis são as metas (targests) que estas últimas buscam
atingir;

Os indicadores são variáveis que contém a informação sobre as relações entre


instrumentos e objetivos finais, sobre a evolução futura da economia ou sobre o
estado imediato das tensões inflacionistas e deflacionistas, mas que não são por si
mesmas, metas;

Os canais de transmissão são encadeamentos de relações pelas quais os


instrumentos agem sobre os objetivos finais, eventualmente via objetivos
intermediários;

Os choques monetários correspondem a variações inesperadas de uma variável


econômica que retroage sobre os objetivos intermediários e perturba a realização
dos objetivos finais;

A política monetária é uma estratégia para atingir os objetivos finais e para


adaptar os regimes monetários aos choques, de maneira a garantir a eficácia da
regulação monetária.

A definição de regime monetário utilizada neste trabalho busca no entanto, superar a


esfera da gestão monetária e financeira na qual este conceito é habitualmente mobilizado e
que se transformou através da teoria monetarista e suas derivações atuais, na base para
proposições deus ex machina da política monetária ativa.54 Nos quadros da análise aqui
proposta, um regime monetário-financeiro será apreendido como um resultado da conjunção
de estruturas organizacionais e institucionais (públicas e privadas) que servem de suporte à
circulação monetária e financeira, conferindo-lhes determinados padrões de regularidade,
em função das atividades econômicas, das relações Estado-economia e do próprio nível de
desenvolvimento da acumulação de capital.

Esta definição fundamenta-se sobre as premissas seguintes:

i. O desenvolvimento econômico pressupõe a moeda e as outras instituições que lhe


correspondem, uma vez que as economias capitalistas são economias mercantis,
monetárias e salariais. Em conseqüência, a hipótese da complementaridade e
hierarquia das formas institucionais torna-se fundamental à compreensão das
condições de estabilidade dinâmica dos regimes de acumulação;55

ii. O Estado tem um papel fundamental no estabelecimento e viabilidade de um


determinado regime monetário-financeiro, pois a moeda em sua forma
contemporânea repousa sobre a confiança e a credibilidade do poder que a institui e
emite. Mas confiança e credibilidade não são atributos completamente determinados
por avaliações subjetivas (da parte dos agentes privados) ou de ingerências político-
normativas (da parte do poder estatal), pois as funções reserva de valor, meio de
pagamento e de precificação permanecem igualmente dependentes de fatores
objetivos reais: as instituições e formas de organização do regime monetário vigente
e as estruturas de produção e de demanda existentes, mas sobretudo da forma como
se articulam e se expressam num regime de acumulação particular;56

iii. O Estado tem a capacidade de influenciar o regime monetário-financeiro, seja em


função das escolhas de política econômica que dispõe, seja em função da forma

54
No sentido de que a estabilidade monetária é considerada por si mesma condição necessária e suficiente para a
estabilidade macroeconômica. Para os países em desenvolvimento e altamente endividados, as mesmas
condições que promovem a estabilidade de preços têm se convertido em condições de bloqueio permanente da
taxa de acumulação de capital. Isto é particularmente claro nos casos da Argentina e do Brasil.
55
As hipóteses de complementaridade e hierarquia das formas institucionais serão explicitadas no próximo
capítulo.
56
É por esta razão que um banco central não pode pretender garantir de forma duradoura a estabilidade de
preços, com base apenas na gestão monetária. Uma vez que a condição de estabilidade macroeconômica
permanece dependente da evolução das estruturas reais em que se baseiam a acumulação de capital produtivo, os
fatores que mantêm a estabilidade monetária tendem a se converter em obstáculos endógenos ao crescimento
econômico. Compreende-se portanto, por que o objetivo de geração de emprego e crescimento econômico
estejam presentes na constituição do Federal Reserve nos EUA e não apenas a manutenção da estabilidade de
preços.
institucional de inserção no regime internacional e das estruturas que sustentam a
acumulação produtiva nos setores não-financeiros;

iv. Um regime monetário-financeiro pode ser favorável ao desenvolvimento do crédito


para os setores diretamente produtivos ou servir de base para uma acumulação
predominantemente financeira.

A época atual é particularmente rica em fatos estilizados concernentes às


conseqüências de um determinado regime monetário-financeiro sobre a performance
macroeconômica das nações. A liberalização comercial e financeira promovida pelo processo
de globalização confere a esta forma institucional um lugar de destaque nas análises dos
novos modos de regulação e de regimes de crescimento.

1.7.3 A forma institucional da concorrência (FC)


O objetivo básico deste conceito é apreender o modo como se organizam as relações
entre um conjunto de centros de acumulação fracionados, cujas decisões são a priori
independentes uns dos outros (BOYER, 1986, p. 49). Dois casos extremos podem ser
distinguidos:

a) Processos concorrenciais quando é a confrontação ex post no mercado que define


a validação ou não dos trabalhos privados;

b) Processos monopolísticos quando prevalecem determinadas regras de socialização


ex ante da produção por uma demanda social de um montante e de uma composição
sensivelmente equivalentes.

Neste contexto, a análise das estruturas de mercado, um objeto tradicional da


teoria econômica padrão, é retomada sob novos princípios metodológicos suportados pela
noção de regulação. Uma análise regulacionista das estruturas de mercado não implica
considerar a concorrência como um fim em si, apreendendo-a como a única situação onde o
ótimo econômico coincidiria com o ótimo social . Por exemplo, há casos em que muita
concorrência no mercado de trabalho torna o regime de crescimento instável, conspirando
contra a geração de emprego ou os ganhos de produtividade. Além disso, parte-se da
constatação empírica de que um mercado concorrencial é uma construção institucional,
suportada por uma rede complexa de organizações, convenções e canais de informação que
possam dotar a lógica mercantil de eficiência e densidade.

Em conseqüência, as formas da concorrência expressam as configurações


existentes das diversas estruturas de mercado, elas mesmas baseadas em estruturas
institucionais mutáveis pela ação da história. Como observa HOLLARD (1995, p. 162),
quando se procura distinguir diferentes períodos na evolução econômica ou comparar
sistemas econômicos diferentes, a análise das formas da concorrência exerce um papel
decisivo. Várias características são requisitadas neste contexto:

a) o tamanho das unidades de produção ou das empresas;

b) as relações entre empresas situadas em diferentes estágios das cadeias de


produção;

c) o papel dos mercados e das organizações nos procedimentos de coordenação;

d) as relações entre o capital financeiro e o capital industrial;

e) a participação relativa dos bens materiais e dos serviços;

Para caracterizar as formas da concorrência é preciso levar em conta não somente o


número de intervenientes nos diversos mercados, mas também os procedimentos de
ajustamento utilizados em diferentes níveis de produção. A análise das formas da
concorrência deve integrar as formas de organização da produção (suas regras de
funcionamento), as regras de gestão, os objetos da concorrência (serviços ou bens,
informação) e de articulação entre as empresas e o sistema financeiro. Pode-se então examinar
as condições de estabelecimento de um regime estável (HOLLARD, 1995, p; 169).

De um ponto de vista metodológico, as análises em termos de regulação procuram


superar as limitações de uma visão histórica linear do capitalismo na qual a concentração e a
centralização do capital constituem a tendência mais essencial. Por outro lado, a própria
definição de capitalismo mobilizada pela Teoria da Regulação implica no reconhecimento de
que as formas da concorrência não podem ser analisadas independentemente das
características do regime monetário-financeiro e da relação salarial vigente.

Observa BILLAUDOT (2000, p.21) que a concorrência à que se refere esta forma
institucional é concernente ao processo concorrencial no mercado de bens e serviços. A
concorrência no mercado de capitais e no mercado de trabalho serão consideradas,
respectivamente, na forma institucional do regime monetário-financeiro e na relação salarial.
Considerando-se que nas economias capitalistas as unidades produtivas permanecem
descentralizadas, busca-se explicitar a forma como as empresas tomam suas decisões
(quantidades produzidas e preços de oferta) que lhes permite desenvolver procedimentos de
coordenação das atividades de produção e distribuição.
Em termos teóricos, pode ser relevante trabalhar-se com uma partição do sistema
econômico em um setor concorrencial (price-taker), normalmente composto de micro,
pequenas e médias empresas; e um setor oligopolista (price-maker), caracterizado pelo
predomínio das grandes empresas nacionais e transnacionais. Em uma análise dos fatores que
determinam a formação de preços, esta dualidade das estruturas de mercado pode ser uma
aproximação razoável, considerando as condições reais de funcionamento das economias
capitalistas atuais. Mas um terceiro setor poderia ser definido a partir da consideração da
existência de bens públicos e meritórios e onde a participação do Estado, seja diretamente ou
por meio de suas ações regulatórias, termina por imprimir determinadas particularidades no
provimento desses produtos e no modo de funcionamento dos capitais privados envolvidos.

1.7.4 A forma institucional do Estado (FE)


Em sua definição geral, o Estado é a forma institucionalizada do poder supremo que,
por meio do monopólio da violência legal, cria a ordem social pela lei. O poder do Estado se
exerce nos limites de um território (soberania territorial) e corresponde freqüentemente à uma
nação (forma moderna do Estado-nação). Como instituição ele se manifesta concretamente
como um conjunto de órgãos político-jurídicos e administrativos: o executivo, o legislativo, o
judiciário (ÉCHAUDEMAISON et alii, 2000).

O estudo das funções fundamentais do Estado moderno pode ser apreendido como
instância de articulação do processo econômico e político em uma dupla dimensão: o nacional
e o internacional. Em sua dimensão nacional, o Estado pode ser analisado como a instância
reguladora e organizadora de um modo particular de desenvolvimento capitalista,
correspondente aos interesses de determinadas classes sociais, que traduzem sua hegemonia57
através de formas particulares de legitimação.58 Em sua dimensão internacional, pode ser

57
Segundo GRAMSCSI deve-se reconhecer a dimensão ideológica e institucional da hegemonia, que se
distingue da coerção direta (o exercício do poder pela violência ou imposição). Uma classe dominante é
hegemônica quando, pelo controle das instituições da sociedade civil (Escola, mídia, religião, etc.), é capaz de
difundir seus valores em toda a sociedade e exerce assim sua orientação cultural . Neste sentido, uma certa
legitimidade é conferida ao autor hegemônico.
58
Conforme ÉCHAUDEMAISON et alii (2000), a legitimidade é a qualidade do que é aceito e reconhecido
pelos membros de uma sociedade. É necessário distinguir a legitimidade da legalidade que se refere às
disposições e procedimentos que estão conforme o ordenamento jurídico. Para Max WEBER, a legitimidade que
confere a autoridade se funda sobre a tradição, sobre o carisma ou sobre a autoridade racional-legal (conjunto
das regras legais consideradas racionais e então válidas), característica das organizações modernas. Ela se aplica
primeiramente ao poder estatal. Da legitimidade do Estado deriva a de seus atributos. Sociólogos
contemporâneos como Pierre BOURDIEU, recuperam a legitimidade nos quadros das relações de dominação
entre grupos sociais. Toda instituição busca adquirir e/ou conservar uma legitimidade: designa-se por
legitimação o processo aberto pelos atores sociais para fazer-se reconhecer em sua competência, seu estatuto ou
poder que eles detêm.
analisado como uma instância de articulação econômica e política da formação social
nacional com o sistema capitalista mundial (AFONSO e SOUZA, 1977).

A forma institucional do Estado refere-se igualmente ao conjunto de compromissos


institucionalizados que, uma vez estabelecidos, criam regras e regularidades na evolução das
despesas e das receitas públicas (BOYER, 1986). Mas segundo BOYER (1995), a
complexidade dos compromissos sociais que estão na origem das intervenções públicas,
excluem as interpretações funcionalistas das ações econômicas do Estado. Inclusive porque
este último não pode garantir ex ante sua completa eficácia, nem tão pouco prever a totalidade
das conseqüências que pode desencadear a nível da economia. Em conseqüência, se as
relações entre Estado e mercado, e mais amplamente entre Estado e economia, mostram-se
necessariamente complexas, é em virtude das múltiplas dimensões envolvidas (econômica,
político-jurídica, cultutal, etc.). Todavia, com o intuito de compreendê-las em sua
processualidade, a teoria não pode reduzi-las à lógica dos agentes econômicos privados,
fundamentando-as em um conjunto de comportamentos pré-determinados por critérios de
pura racionalidade mercantil otimizadora.

A Teoria da Regulação reconhece a existência de vínculos de complementaridade


entre as ações econômicas do Estado e o processo de mercado que lhe estabelece o cenário
básico de intervenção e presença. Há mútua dependência entre as duas instâncias no âmbito
da reprodução social e econômica. Embora esteja permanentemente limitado pela lógica da
acumulação de capital, pois necessita da mesma para subsistir enquanto instância reguladora,
o Estado possui autonomia relativa quanto à codificação do regime monetário, das formas da
concorrência e da regulação da relação salarial. Três áreas básicas de atuação da política
econômica e de desenvolvimento dos compromissos institucionalizados.59

Neste sentido, as macro-análises regulacionistas têm procurado superar os


determinismos mecanicistas entre economia e intervenção pública, que ainda subsistem nos
debates acadêmicos quando estão em causa a eficácia dos instrumentais de política
econômica. Ao empreender a análise das formas possíveis de articulação entre o Estado e o
sistema econômico, os regulacionistas procuram apreender também a natureza do Estado em
geral, pois as instituições públicas são os canais através dos quais a teoria econômica se insere
no ambiente real dos agentes e de suas organizações sob a forma de política.

59
Mais detalhes dessa problemática podem ser encontrados em BOYER (1999), L État, marche et
développement: une nouvelle synthèse pour le XXIe siècle ?. Cepremap, Paris, 1999.
Conseqüentemente, é através da forma institucional do Estado que a Ciência Econômica
converte-se numa praxeologia.60

A importância do Estado reside, sobretudo no lugar que esta forma institucional ocupa
no processo de codificação das estruturas que definem os modos de regulação. Como observa
AGLIETTA (1997), a existência do Estado é a expressão política do caráter incompleto da
regulação sócio-econômica. O Estado surge como o totalizador, a síntese das tensões sociais
que atravessam as formas institucionais estabelecidas, sem poder jamais abolir o caráter
contraditório entre regulação e crise, pois estas são de fato dois pólos indissociáveis de
transformação da economia e sociedade. Mas ele não é nenhum sujeito exterior à economia,
nem tampouco um conjunto de instrumentos à disposição de uma determinada classe social.

A criação de novas instituições por intermédio da expressão política dos conflitos


passa pelo Estado. Neste contexto, a ambivalência entre a síntese das normas sociais
estabelecidas e a totalização dos conflitos aparece em dois locais privilegiados:

no orçamento na medida em que ele socializa os fluxos monetários e transforma as


condições de apropriação da riqueza;

na moeda pois é a forma de restrição geral pesando sobre as estratégias privadas.

Na abordagem da regulação, o Estado é também apreendido em outros dois níveis de


análise: o Estado na economia, na medida em que esta forma institucional tem parte de suas
operações realizadas em moeda (despesas e receitas públicas, financiamentos, etc.) e a
economia no Estado, uma vez que este último a delimita como economia nacional, fixando
parte das regras do jogo ou das codificações institucionais necessárias (leis e regulamentos
editados ou autenticados pelo poder público (BILLAUDOT 1996, p. 51). Neste contexto,
como observa THÉRET (1992), deve-se reconhecer que a moeda não pode ser compreendida
sem o Estado.

As contribuições de THÉRET (1990, 1992 e 1995) fornecem um fundamento para a


autonomia relativa do Estado, superando as concepções economicistas e reducionistas,
tradicionalmente veiculadas pelas análises ortodoxo-marxistas e neoclássicas. O objetivo
deste autor regulacionista consiste em:

60
As ciências praxeológicas são aquelas que participam simultaneamente do descritivo e do normativo. Neste
sentido H. JAPIASSU [1975, p. 63] observa que ...a análise epistemológica (...) leva-nos a reconhecer que a
economia, enquanto ciência teórica, não está mais dissociada de suas técnicas de aplicação: teoria e prática não
apenas se dão sentido, mas também se determinam reciprocamente. E é por isso que a economia é, hoje, uma
disciplina intervencionista, quer dizer, uma praxeologia ....
tirer du savoir des sciences spécialisées dans la question du politique les
éléments nécessaires à la saisie de l État comme forme structurelle à la fois
partie prenante de l économie, à travers les finances publiques, et constitutive
de l environnement économique marchand, à travers le jeu de l ensemble des
politiques mises en uvre »(THÉRET, 1995).
O Estado pode assumir diversas formas em suas relações com a economia. Cada forma
transitoriamente estável será a expressão de um determinado regime político, que se apresenta
com um certo grau de desenvolvimento da cidadania. Em correspondência com esse regime
político, a análise identificará um certo regime econômico ou regime fisco-financeiro. Este,
por sua vez, deverá estar em coerência com o regime de acumulação no qual está inscrito
(BILLAUDOT, 1996, p.58).

Conforme ANDRÉ (1993, p. 504), a análise regulacionista de longo período das


intervenções públicas na França permitiu identificar duas configurações contrastadas das
relações Estado-economia. Entre a Revolução Francesa e a Primeira Guerra Mundial observa-
se um Estado circunscrito com relação a uma economia considerada como espaço
autônomo que se impõe às outras instâncias sociais. A Segunda Guerra Mundial marca a
passagem a um Estado inserido na esfera econômica, caracterizada na França por duas
inovações maiores, a institucionalização do salário indireto (uma das bases do Estado de
Bem-Estar) e a concepção de uma coordenação entre gestão monetária e política
macroeconômica sob a égide das autoridades públicas. Esta segunda configuração que é
verdadeiramente associada ao conceito de Estado- providência.

A Teoria da Regulação busca superar a apreensão das intervenções estatais através da


tradicional dualidade Estado-mercado. A economia de mercado é de fato um sistema
complexo conjugando diversas ordens de racionalidade e não apenas à que se supõe
diretamente derivada da lógica mercantil otimizadora. As análises históricas e as comparações
internacionais têm contribuído para elucidar os vínculos estruturais e complementares entre
Estado e mercado. Como observam BOYER e HOLLINGSWORTH (1997), o sucesso do
desenvolvimento resulta da complementaridade entre essas duas lógicas e não à afirmação de
uma em detrimento da outra. As pesquisas institucionalistas atuais atestam que os arranjos
institucionais intermediários entre o Estado e o mercado, tais como as associações, as
comunidades, as representações de classe, podem jogar um papel determinante na conciliação
dos imperativos de eficiência dinâmica (crescimento da produtividade e do nível de vida) com
objetivos de justiça social (como a repartição mais eqüitativa dos dividendos do crescimento).
A abordagem em termos de regulação deverá analisar as modalidades pelas quais o
Estado soberano, regulado por um regime político, define suas formas de legitimidade,
assume-se como Estado de direito e, através desse, modela o Estado Fiscal e o Estado
Fazendário (THÉRET, 1996, p. 83). Como observa THÉRET, o grau de restrição financeira
sobre o regime monetário - e por meio deste, sobre o regime de acumulação e sobre o regime
fisco-financeiro - depende do lugar ocupado pela finanças privadas no conjunto do sistema
econômico. Se as finanças privadas controlam diretamente as finanças públicas, ela terá um
lugar importante na regulação política e o crédito será o instrumento privilegiado de
financiamento de um déficit financeiro auto-sustentado, atribuindo-se aos encargos da dívida
um papel central no regime fisco-financeiro61. Todavia, se as finanças privadas não
conseguem se impor como instância intermediária obrigatória na relação entre o Estado e os
setores diretamente produtivos, então, a relação de forças entre credores e devedores pode
beneficiar os últimos, permitindo um financiamento monetário que compatibiliza a dinâmica
da acumulação de capital com o regime fisco-financeiro vigente. Neste caso, a restrição
financeira sobre o regime monetário se enfraquece em favor de uma restrição social e a
regulação monetária não depende mais da ancoragem da moeda nacional em algum padrão de
valor exterior ao sistema social, com supervisão das finanças, devendo então manter
correspondência direta com um compromisso institucionalizado interno (uma política de
rendas, por exemplo) entre os ocupantes das três ordens a administração pública, o
patronato e os trabalhadores.

Para DELORME (1995), a forma institucional do Estado é composta por um conjunto


de instituições detentoras de prerrogativas de poder público (o Estado central, coletividades
locais e organismos de Seguridade Social) cuja emergência e desenvolvimento baseiam-se em
três lógicas de ação:

a) a coordenação o estabelecimento de estruturas normativas e organizacionais que


permitem superar os problemas de coordenação entre setores, mercados e agentes
econômicos;

b) a legitimidade caracteriza a medida na qual uma situação é tornada justa ou


aceitável mesmo em presença de falhas de coordenação (desemprego,
desigualdades). A legitimação decorre da criação de um conjunto de normas e de

61
Este parece ser o caso dos países em desenvolvimento altamente endividados, onde a dívida pública torna-se a
base para uma acumulação financeira e patrimonial, freqüentemente às expensas da acumulação nos setores
diretamente produtivos.
valores que influenciam a representação que os diversos atores sociais desenvolvem
acerca do sistema sócio-econômico em que operam;

c) o poder de coerção derivado da soberania do Estado esta dimensão articula-se


com a legitimidade e refere-se à formação e exercício do poder, seja a partir das
estruturas cognitivas e do consentimento dos próprios participantes do jogo social e
econômico, seja por meio da utilização direta da força.

A teoria econômica tradicional tende a minimizar a relevância das dimensões da


legitimidade e da soberania, centrando-se na problemática dos mecanismos de coordenação
mercantil. Mas as análises históricas e as comparações internacionais revelam o reducionismo
e o conseqüente empobrecimento das abordagens centradas na questão da coordenação
(DELORME, 1995, p. 185).

Conseqüentemente, um regime fisco-financeiro expressa um determinado padrão de


relacionamento entre o Estado e a economia, resultante da interação entre a instância político-
jurídica e a lógica da acumulação capitalista. A análise regulacionista pode então identificar
um conjunto particular de estruturas institucionais que emergem desta interação e se tornam
responsáveis pelas regras e regularidades na evolução das finanças públicas. Mas essas
estruturas sócio-políticas e econômicas que suportam o regime fisco-financeiro não são
necessariamente capazes de promover as condições de acumulação em sincronia com os
compromissos institucionalizados e com as demandas dos diversos grupos e atores que
participam do jogo político e econômico. Pode acontecer, por exemplo, que uma dada
estrutura de finanças públicas apresente-se em contradição com as condições que favorecem
uma expansão sustentada do nível de atividade econômica, seja porque sua base política
carece de legitimidade, seja porque o regime de acumulação correspondente se encontra em
crise.62

1.7.5 A forma institucional de inserção no regime internacional (FII)


Este conceito intermediário tem por objetivo apreender as relações internacionais em
suas determinações sobre a dinâmica econômica nacional. Conforme observa BOYER (1986,
p. 76), a forma institucional de inserção internacional define-se pela conjunção de regras que
organizam as relações entre o Estado-nação e o resto do mundo, tanto em termos de trocas

62
Este caso tem sido analisado por THÉRET (1996), com relação à crise do Estado Providência que pressupôs
um regime fisco-financeiro particular, correspondente ao modo de desenvolvimento fordista. Entre outras
características, este regime fisco-financeiro permitiu a conjunção de um elevado crescimento da produção com
níveis igualmente elevados da carga tributária e das despesas públicas.
de mercadorias, como de localização das produções (via investimento direto estrangeiro) ou
de financiamento de fluxos e saldos externos.

A dialética entre autonomia nacional e a restrição externa deve ser relativizada,


considerando que uma mesma característica do regime internacional pode favorecer o regime
de crescimento em um país e inibi-lo ou dificultá-lo em outro.63 Desta forma, para BOYER, a
Teoria da Regulação busca superar a oposição um tanto maniqueísta entre economia fechada e
economia aberta (como faz a teoria macroeconômica convencional) e também relativizar a
idéia comumente aceita de que o processo de internacionalização das economias desenvolve-
se de uma forma invariante ou inexorável. As comparações internacionais evidenciam a
extrema variedade das formas de inserção de cada país ao regime internacional, bem como as
relações específicas que regem a dinâmica interna e as tendências da economia mundial.

Uma segunda problemática deve ser considerada no âmbito das análises


regulacionistas: a identificação e a transformação das condições estruturais que asseguram a
coesão e a estabilidade de todo o regime internacional. Este campo de pesquisa tem sido
trabalhado de forma intensiva por AGLIETTA, em consonância com suas preocupações com
os regimes monetário-financeiros. Numa época em que a globalização ganhou impulso muito
mais como um projeto político do que como tendência inelutável da economia internacional,
as condições que garantem a liberalização financeira mostram-se na verdade em contradição
com as condições que asseguram a liberalização comercial. Portanto, a origem das
dificuldades das economias nacionais em encontrar novos regimes de crescimento estáveis
exige a consideração do conjunto de restrições estruturais impostas por esse processo.

Em recente trabalho apresentado ao Forum de la Régulation (2003), FOURQUET64


problematiza o conteúdo do conceito de regime internacional. Seu objetivo é mostrar que:

l international n est pas au bord, mais au coeur d une société nationale.


Quelle que soit la période, les rapports mondiaux dominent toujours les
rapports nationaux. Cette domination peut être discrète, elle n en est pas
moins efficace. Il ne s agit pas d une causalité linéaire du type A => B, tel
événement A entraîne un événement B. Il s agirait plutôt d une causalité par
imprégnation. Un modèle de cette forme de causalité est donnée par Marcel
Mauss dans son concept de fait social total : dans chaque phénomène social le
chercheur trouve la société tout entière. À la limite, tout fait social total est
mondial par essence. »

63
Pode-se citar como exemplo os casos da China e do Brasil. Ambas as economias respondem de maneira
64
F. FOURQUET. Le régime international est toujours la forme institutionnelle dominante. Forum de la
Régulation 2003, Paris.
O estatuto teórico do conceito de regime internacional seria então de difícil delimitação. Para
FOURQUET, dever-se-ia defini-lo como um sistema ou uma outra forma institucional?

Para efeitos da presente análise serão propostas as seguintes definições:

a) Um regime internacional refere-se a um determinado padrão de desenvolvimento


das relações entre as economias nacionais, a partir da vigência de um conjunto de
instituições reguladoras dos fluxos de comércio, de capitais e demais fatores
produtivos. Tal regime inclui necessariamente o conjunto de vinculações e
relacionamentos políticos enquanto suporte dessas relações. Este padrão pressupõe
o funcionamento de um sistema monetário e financeiro internacional (padrão-ouro
até os anos 30; sistema de Bretton Woods; etc.) que por sua vez está baseado em um
determinado regime de câmbio e em organizações e instituições que possam
representar os diversos países em suas inter-relações econômicas e financeiras.65
Neste sentido, observa PIRIOU (2001) que um sistema monetário-financeiro deve
preencher três funções:

Assegurar a troca e a circulação de moedas nacionais (conversibilidade,


regime de câmbio fixo ou flexível);

Permitir o ajustamento dos balanços de pagamentos (automático, dirigido


ou imposto como constante dos programas de ajustamento do FMI );

Assegurar a oferta de liquidez internacional de maneira a favorecer o


crescimento da economia mundial.

Segundo BILLAUDOT (2000, p.21) qualquer que seja a organização do regime


internacional, esta é sempre um quadro aberto deixando lugar a diversos graus e modalidades
de inserção de um Estado-nação na economia mundo. A investigação centra-se então sobre as
regras que organizam as relações entre este Estado-nação e o Resto do Mundo, em matéria de
mercadorias, de transferências de capitais, notadamente em termos de localização de
produções, por meio do investimento direto e de financiamento dos fluxos e balanços
bilaterais.

65
Conforme ÉCHAUDEMAISON et alii, um sistema monetário-financeiro é um conjunto de regras e de
instituições que definem os modos de determinação dos fluxos de moedas e a natureza das reservas
internacionais. Tal sistema pode ser codificado quando é a resultante de uma negociação internacional (caso do
sistema de Bretton Woods) ou então resultar de decisões unilaterais dos Estados participantes. Será unificado,
quando todos os países participantes adotam um mesmo regime de câmbio. No caso em que alguns membros
adotam regimes cambiais diferentes, o sistema será considerado híbrido.
b) Uma determinada forma de inserção no regime internacional resulta da
confluência de fatores internos à economia nacional e de fatores provenientes das
estruturas monetárias e financeiras que compõem o ambiente externo aos países,
consubstanciando-se no cenário político e econômico sobre o qual desenvolvem-se
as relações internacionais. Estes últimos fatores podem pré-existir às economias
nacionais (por exemplo, restrições políticas e econômicas impostas por nações mais
desenvolvidas às menos desenvolvidas)66 e então escapar parcial ou completamente
ao controle dos Estados nacionais. Conseqüentemente, uma configuração particular
da forma institucional de inserção no regime internacional será responsável pelo
conjunto das regularidades econômicas resultantes das relações comerciais e
financeiras de uma formação social nacional com o resto do mundo, refletindo
tanto as imposições das nações hegemônicas quanto o grau de autonomia relativa
que a economia nacional pode dispor.

Em razão das cinco formas institucionais permanecerem como estruturas


interdependentes fato que pode ser facilmente constatado ao se observar, por exemplo, os
vínculos entre a WLN, forma da concorrência e Estado a abordagem regulacionista deve
proceder a uma análise detalhada de cada uma delas em particular e ao mesmo tempo buscar
identificar sua configuração global (BILLAUDOT, 2000). Neste contexto, surgirá a questão
da hierarquia e complementaridade das formas institucionais que definem um determinado
modo de regulação e que será objeto do próximo capítulo.

1.8 Síntese das principais questões


As origens históricas da Teoria da Regulação e as condições epistemológicas que
fazem das macroanálises regulacionistas uma alternativa possível às tradicionais abordagens
pelo equilíbrio foram explicitadas neste capítulo. As chamadas noções intermediárias,
compostas pelas cinco formas institucionais: a wage-labor nexus (WLN); as relações Estado-
economia(FE); o regime monetário-financeiro (RMF); as formas da concorrência(FC); e a
forma de inserção no regime internacional(FII) também foram definidas.

Apesar das concepções positivistas em Epistemologia terem esvaziado a questão do


estatuto ontológico das teorias, relegando-a a discussões puramente filosóficas e

66
Uma vez que determinadas estruturas econômicas e políticas são típicas de países desenvolvidos, elas ou não
se encontram em países considerados subdesenvolvidos ou se apresentam sob configurações apenas
embrionárias e pouco eficazes. No entanto, a existência destas estruturas organizacionais e institucionais lhes
confere vantagens em termos de poder político, sanções econômicas ou demais formas impositivas direcionadas
aos países economicamente mais fracos. Este fato torna-se muito evidente no plano das negociações ao nível da
Organização Mundial do Comércio e no que tange à criação de blocos comerciais e mercados comuns.
cientificamente estéreis, reconhece-se a relevância desta perspectiva no âmbito da teorização
macroeconômica. Buscou-se mostrar que a maior adequabilidade da noção de regulação ao
estudo das macro-regularidades econômicas, vis-à-vis à concepção neoclássica de equilíbrio, é
antes uma questão fundamentalmente ontológica que determinará a escolha do método e do
percurso teórico. Utilizando-se da terminologia proposta por SCHUMPETER (1954), trata-se
de uma certa visão ou concepção acerca das características específicas do objeto analisado.

Conforme argumentado em BRUNO (2004, p.2), no caso das teorias econômicas


tradicionais, sabe-se que essa visão tem-se pautado por um conjunto de analogias com
fenômenos físicos ou biológicos: equilíbrio , histerese , taxa natural , etc. Nas palavras de
JEVONS, a teoria econômica tratada desta forma, sugere uma estreita analogia com a
ciência da Mecânica e verifica-se que as leis da troca se assemelham às leis do equilíbrio de
uma alavanca . No entanto, ao reduzir a padrões comportamentais característicos do mundo
natural , vários processos sociais determinantes, essas teorias se abstraem de propriedades
que são específicas dos sistemas sócio-econômicos: dinâmica evolutiva, complexidade,
historicidade, indeterminismos, etc. Como já observara LATOUCHE (1977), os fenômenos
econômicos são então apreendidos fora de seu enraizamento social efetivo, como se a
economia fosse ou uma dimensão do homem ou uma dimensão da natureza, e não um produto
da história.

A Teoria da Regulação do capitalismo é uma teoria da gênese, do desenvolvimento e


do desaparecimento das formas sociais que permitem a reprodução sócio-econômica apenas
como uma possibilidade histórica. A reprodução em economia processa-se sempre sobre
formas novas e não dedutíveis de nenhuma axiomática, pois a historicidade contida no lien
social é essencialmente criadora. Procurou-se mostrar que o lien social é um princípio de
transformação permanente, pois os sistemas sócio-econômicos reproduzem-se se
transformando. E o conceito de regulação está apto a apreender as formas através das quais
essa transformação se processa em uma dinâmica histórica, onde crescimento e crise se
alternam. Ele não recorre a nenhuma hipótese teleológica. Seus fundamentos epistemológicos
divergem, portanto dos pressupostos contidos na noção neoclássica de equilíbrio.
CAPÍTULO 2 - MODOS DE REGULAÇÃO E REGIMES DE ACUMULAÇÃO: OS
DETERMINANTES ENDÓGENOS DA PERFORMANCE MACROECONÔMICA

2.1 - Introdução
Cada uma das cinco formas institucionais, definidas no capítulo anterior, corresponde
a uma área da regulação global ou macroeconômica (DELORME, 1990). Igualmente referem-
se a campos de análise ou áreas do programa de pesquisa regulacionista67. As formas
estruturais ou institucionais são, portanto as componentes fundamentais de todo modo de
regulação. Uma vez estabilizado, o modo de regulação responderá pelas particularidades de
um determinado regime de crescimento ou de acumulação.

Um regime de crescimento ou de acumulação corresponde a um conjunto de


regularidades macroeconômicas que permitem uma progressão geral e relativamente coerente
do processo de acumulação de capital, apesar das distorções e desequilíbrios que lhe são
inerentes. A estabilidade dinâmica de um regime de crescimento é uma função das formas
organizacionais e dos arranjos institucionais que possam garantir níveis mínimos de coerência
macroeconômica e de coesão social das estruturas que suportam a acumulação de capital.

Tais atributos dependem precisamente das características da regulação em curso, pois


um modo de regulação resulta da conjunção de estruturas organizacionais e institucionais
que promovem a articulação entre produção e demanda agregada como um pressuposto lógico
e teórico para o desenvolvimento sustentável do processo capitalista de acumulação.
Conseqüentemente, as análises regulacionistas não recorrem a nenhum automatismo em
termos de lei de Say ou a preceitos mecanicistas veiculados por algum tipo de leiloeiro
walrasiano . De um ponto de vista teórico, as forças sociais que permitem ao regime de
acumulação alcançar configurações estáveis não são mais importantes ou predominantes com
relação às tendências endógenas que o conduzem à crise. Os mercados não se constituem
jamais em entes autônomos e exclusivos de coordenação. Como processos complexos e
suportados por arranjos organizacionais e institucionais, eles estão necessariamente
submetidos tanto a forças equilibrantes quanto desequilibrantes que, numa dialética
permanentemente reposta, estabelece a possibilidade histórica para a vigência de uma

67
De uma maneira geral, pode-se considerar que autores como M. AGLIETTA e A. ORLÉAN concentram seus
esforços nas análises da forma institucional da moeda ou dos regimes monetário-financeiros. B. CORIAT
desenvolve seus trabalhos no contexto dos paradigmas tecnológico-industriais ou das formas de organização da
produção e do processo de trabalho. B. THÉRET e MARQUES-PEREIRA centram-se nas análises das relações
Estado-economia. Enquanto Robert BOYER, por sua preocupação em desenvolver as bases teóricas para uma
macroeconomia histórica e institucionalista, torna-se o mais eclético dentre os autores regulacionistas, uma vez
que deve necessariamente considerar as interdependências estruturais das cinco grandes áreas da régulation
d ensemble.
determinada forma de regulação. Conseqüentemente, o estatuto teórico do conceito de modo
de regulação encontra um fundamento ao mesmo tempo lógico e histórico. As crises existem e
são historicamente recorrentes, mas os períodos de crescimento e de estabilidade estrutural
são igualmente observáveis. As análises devem então explorar os fatores que garantem a
estabilidade da regulação e do regime de acumulação que lhe corresponde e também
identificar as mutações estruturais que caracterizam os períodos de esgotamento e crise das
macro-regularidades em que se baseavam.

2.2 Os modos de regulação e a variabilidade das dinâmicas econômicas e sociais


Os homens não compreendem como é possível
que algo que se transforma incessantemente,
possa, no entanto, permanecer coerente consigo
mesmo. Há uma harmonia das tensões opostas, tal
como a do arco e da lira .
(HERÁCLITO)68
Um modo de regulação resulta de uma configuração particular das estruturas
intermediárias compostas pelas cinco formas institucionais. Ele responde pelas rotinas e
regularidades através das quais se opera o ajustamento recíproco do conjunto das decisões
descentralizadas dos agentes individuais e coletivos (BILLADOUT, 1995). A configuração
estabilizada das formas institucionais é então a matriz geradora de um determinado modo de
regulação (AGLIETTA, 1997).

Os comportamentos e as regras modificam-se com as formas institucionais. Em


conseqüência, um modo de regulação responderá por um conjunto de regularidades
macroeconômicas que por sua vez condicionam a formação das rotinas (ou modos de gestão)
microeconômicos.

Na definição proposta por BOYER (1986, p. 54-55), um modo de regulação refere-se


a todo conjunto de procedimentos e de comportamentos individuais e coletivos, caracterizado
pelas seguintes propriedades:

Reproduzir as relações sociais fundamentais através da conjunção das formas


institucionais historicamente determinadas;

Sustentar e pilotar o regime de acumulação em vigor;

68
Em La Trame, la Chaine et la Régulation: um outil pour les sciences sociales (1988), LIPIETZ mobiliza este
fragmento do pensamento de Heráclito para ilustrar o conteúdo dialético da idéia de regulação aplicada em
economia.
Assegurar a compatibilidade dinâmica de um conjunto de decisões
descentralizadas, sem que seja necessário a interiorização pelos atores
econômicos, dos princípios de ajustamento da totalidade do sistema.

Uma vez estabilizado, um modo de regulação torna-se potencialmente capaz de:

compatibilizar o conjunto das decisões descentralizadas dos agentes


econômicos individuais sem que estes últimos tenham a necessidade de dispor
de toda a informação relevante quanto ao funcionamento da totalidade do
sistema econômico;

garantir níveis mínimos de coerência macroeconômica ao regime de


acumulação, compatiblizando-o com o paradigma tecnológico-industrial
vigente;

assegurar a reprodução das relações sociais que estruturam cada uma das cinco
formas institucionais.

2.3 Modos de regulação e formas particulares de capitalismo


Quando macrodinamicamente associados, os regimes de acumulação e os modos de
regulação que lhes correspondem permitem situar num mesmo quadro analítico a questão da
gênese, evolução e esgotamento das formas institucionais sobre as quais se desenvolveram na
dinâmica longa. Neste contexto, as análises históricas regulacionistas para os países da OCDE
identificam quatro (4) períodos caracterizados por seus modos particulares de regulação: 69

1º Período - na primeira metade do século XIX observa-se um período de transição de


uma regulação à antiga (modo de regulação ancienne) para uma regulação
concorrencial ou competitiva;

2º Período - na segunda metade do século XIX, assiste-se à afirmação da extensão das


relações econômicas capitalistas conduzindo progressivamente ao predomínio de uma
regulação concorrencial, muito embora já apareçam tendências à monopolização, à
sindicalização e à fusão do capital social e bancário, nos quadros do desenvolvimento
dos grandes grupos industriais e financeiros;

69
Esta parte baseia-se também nos seguintes trabalhos de Robert BOYER, La crisis en una perspectiva
histórica: algunas reflexiones a partir de una análises a largo plazo del capitalismo francés, Universidad
Autónoma Metropolitana, México, 1984; La flexibilité du travail en Europe, La Découverte, 1986 e em La
formación del salario en la perspectiva histórica: la experiencia francesa.
3º Período o período entre-guerras (1918-1939) registra a intensificação acelerada da
monopolização dos capitais, porém, ainda sem mudanças essenciais dos mecanismos
de ajustes característicos de uma regulação concorrencial. Trata-se de uma fase de
transição ou de gestação de uma nova forma de regulação.70

4º Período - a partir do final da Segunda Guerra Mundial (1945), observam-se


profundas mudanças políticas e sociais que implicariam na emergência e consolidação
de uma regulação fundamentalmente nova: a regulação monopolista; destacam-se
neste período novas formas institucionais, entre as quais um novo padrão de
intervenção e presença do Estado na economia;

Na regulação à antiga, o setor agrícola é o dominante, frente a uma indústria ainda


rudimentar e com reduzida participação no valor adicionado. A relação capital-trabalho não é
a relação social básica de produção e distribuição do produto social. Em conseqüência,
observa-se um único padrão cíclico para este tipo de regulação, em função das oscilações
sazonais das culturas agrícolas: toda a colheita ruim conduz a uma elevação dos preços
agrícolas, reduzindo o poder de compra dos consumidores de bens manufaturados e deste
modo, arrastando a crise para o emergente setor industrial. Os trabalhadores perdem então o
emprego e o salário nominal é rebaixado, mesmo se o nível geral de preços esteja subindo.

Na regulação concorrencial observa-se uma mudança muito significativa das formas


de evolução das principais macrovariáveis. O setor industrial na segunda metade do século
XIX desenvolve-se de modo intenso e impõe progressivamente sua lógica por todo o sistema
sócio-econômico. A consolidação do capital industrial como segmento hegemônico do capital
social pressupôs por sua vez, uma expansão sem precedentes do trabalho assalariado e este
dado será histórica e teoricamente relevante para uma Teoria da Regulação do capitalismo.

Uma das conseqüências das transformações sociais e econômicas deste movimento foi
a elevação da produtividade também no setor agrícola. Neste período, a escassez de gêneros
alimentícios é substituída pela abundância. Os modernos business cycles industriais emergem
como novo padrão para a evolução macrodinâmica da acumulação capitalista. As crises
econômicas tornam-se endógenas ao processo de acumulação de capital e assumem a forma

70
As análises empíricas constatam a intensificação dos processos de centralização (um resultado direto da
acumulação de capital que se traduz num aumento da escala de produção, logo do capital social) e de
concentração (fusão de capitais já existentes, seja através da concorrência, seja pela formação de sociedades
anônimas e que não implica em aumento do capital social; é apenas redistribuição do capital já existente) nas
fases de crise econômica. E é exatamente o que aconteceria no período entre-guerras com os desdobramentos da
grande crise de 1929/30 no que concerne à aceleração da tendência à monopolização de inúmeras empresas,
indústrias e bancos.
geral de crises de superprodução (ou crises de superacumulação, considerando-se as demais
formas do capital social).71 Um outro macrofenômeno de grande importância teórica refere-se
às conseqüências inflacionistas das fases de expansão em contraposição aos movimentos
deflacionistas característicos das recessões e crises. Em um contraste bem nítido com a
regulação à antiga, a maior parte das variáveis macroeconômicas tornam-se pró-cíclicas neste
período.

Na regulação monopolista, a distribuição de renda é significativamente socializada


através de uma série de compromissos entre capital e trabalho assalariado (formação do
salário acordada em função da evolução da inflação e da produtividade), entre as empresas (a
prática do mark-up ), entre o Estado, cidadãos e o capital ( Welfare State, novo padrão de
gastos públicos e de sistema tributário). Num tal contexto, os ajustamentos via concorrência
de preços passariam a representar apenas uma pequena parte dos mecanismos de coordenação
macroeconômica entre produção e demanda agregada. Um conjunto complexo de instituições,
convenções e regras permite compatibilizar a taxa de crescimento das capacidades de
produção - que por sua vez apresenta-se parcialmente conectada à intensidade e à direção da
mudança técnica - através do processo de acumulação de capital.

Como resultado, o crescimento econômico é mais rápido, enquanto os retornos


crescentes de escala associados ao fordismo - o novo paradigma tecnológico-industrial -
podem ser obtidos graças a uma evolução estável e facilmente previsível da demanda
agregada72. Deste modo, as flutuações cíclicas da renda e do produto tornam-se suaves e a
inflação não se interrompe, mesmo durante as recessões. Conseqüentemente, um novo padrão
conjuntural estagflacionista emerge como característica muito específica do período de
vigência da regulação monopolista.

71
Os conceitos de superprodução e superacumulação não são coincidentes. A superprodução é um epifenômeno
da superacumulação como expressão de uma superprodução generalizada dos capitais em suas três formas
básicas (capital monetário, capital-mercadoria e capital produtivo). Em O Capital e nas Teorias da Mais-Valia,
MARX desenvolve aportes fundamentais para a análise das crises de superprodução (superacumulação). No
entanto, MARX não chegou a sistematizar em algum trabalho especial, as principais conclusões teóricas
levantadas pela problemática das crises cíclicas sob o modo de produção capitalista.
72
Note-se que o princípio da demanda efetiva em KEYNES [1936] refere-se exatamente a uma demanda
solvente antecipada ou prevista pelos empresários e investidores, o que, como será visto, pressupõe a
estabilidade do regime de acumulação e do correspondente modo de regulação. À página 51 da Teoria Geral, ele
argumentara que a demanda efetiva é simplesmente a renda agregada (ou produto) que os empresários esperam
receber, incluídas as rendas que fazem passar às mãos dos outros fatores de produção, por meio do volume de
emprego corrente que resolvem conceder. A função de demanda agregada relaciona várias quantidades
hipotéticas de emprego com os rendimentos que se espera obter do volume de sua produção; e a procura efetiva é
um ponto na função da demanda agregada que se torna realidade porque, levando em conta as condições da
oferta, ela corresponde ao nível de emprego que maximiza as expectativas de lucro do empresário.
2.4 O conceito de paradigma tecnológico-industrial

O conceito de paradigma tecnológico-industrial73 tem por finalidade explicitar as


formas de organização da produção e do processo de trabalho que, em função do nível da
ciência e da tecnologia disponível às firmas, permitem o desenvolvimento das bases técnicas
produtivas pela conjugação entre inovação técnica e inovação organizacional.

Uma hipótese subjacente que contribui para fundamentar este conceito, é a de


que as relações sociais de produção devem ser apreendidas a partir de suas dimensões técnica
e social (ou enquanto relações sócio-técnicas), por envolver a conjunção de formas
organizacionais com o leque de possibilidades produtivas que as bases técnicas produtivas
disponíveis aos empresários podem proporcionar. Neste sentido, uma mesma tecnologia pode
ser agenciada a partir de diferentes formas organizacionais do trabalho, resultando em perfis
diferenciados tanto para a evolução da produtividade, quanto para o nível de emprego
performance macroeconômica. Como observa BOYER [1988, p.85]:

As a first approximation, the 1920s and the 1960s can be said to belong to
the same technological paradigm. But, then, how do we explain why growth
replaced stagnation as a long-run tendency, and that, contrary to
contemporary fears, the collapse of 1929 did not repeat itself in the 1950s ?
The answer of the régulation approach is simple enough: due to drastic
social and political transformations, a new régulation replaced the old one
and made rapid technological change, quasi-full employment and sustained
growth compatible.

O quadro a seguir resume as características de quatro grandes modos de regulação


explicitados em BOYER (1998). Trata-se agora de formas contemporâneas de regulação, cada
uma delas respondendo pelas particularidades dos capitalismos existentes.

73
Baseando-nos em Robert DELORME [ 1991, p. 6], a palavra paradigma expressa a existência de princípios
organizacionais dominantes que, como atestam as pesquisas em Administração, são fundamentais ao
equacionamento do problema da produtividade do trabalho. Segundo A. LIPIETZ [1991, p. 101], o termo deve
ser entendido tanto em seu sentido grego original ( exemplo ou modelo predominante) como em sua acepção
moderna em linguística e epistemologia ( conjunto de termos unificados por uma noção comum, como as folhas
de uma árvore ). Ainda conforme LIPIETZ, paradigma é, em primeiro lugar, um termo gramatical: o conjunto
de palavras que se podem substituir entre si mantendo uma frase do mesmo gênero. Por exemplo, em tenho uma
caneta azul , pode-se substituir azul por outros adjetivos de cor; ter-se-á assim declinado o paradigma das
cores. Mas tenho uma caneta funcionar não faz sentido; saiu-se do paradigma. Em paradigma há portanto a
idéia de um tronco comum suscetível de variantes, mas dentro de certos limites.
QUADRO 2 - LÓGICA, IMPLICAÇÕES E CARACTERÍSTICAS DE QUATRO GRANDES MODOS DE REGULAÇÃO.

MODOS DE MERCANTIL MESO-CORPORATISTA PÚBLICO SOCIAL-DEMOCRATA


REGULAÇÃO (Ex: EUA, Canadá, Inglaterra) (Ex: Alemanha, Japão) (Ex: França, Itália) (Ex: Suécia e Áustria)

1) LÓGICA DE Lógica mercantil é o Princípio de divisão e de Circuito econômico formado Negociações entre atores
principio organizador mobilidade em grandes pelas intervenções públicas sociais quanto à regulação
CONJUNTO E PRINCíPIO
básico das formas unidades econômicas e na produção, demanda e dos componentes da
HIERÁRQUICO institucionais diversificado quanto à codificação institucional sociedade e da economia
produção

Ampla descentralização das Compromisso salarial Tendência à uma forte Centralização das
WAGE-LABOR negociações salariais, micro-centrado na grande institucionalização das regras negociações coletivas sob
individualização das empresa, mas em matéria de emprego, restrição da
NEXUS
2) IMPLICAÇÕES PARA AS FORMAS INSTITUCIONAIS

remunerações e segmentação sincronização dos duração do trabalho, do competitividade a curto e


do mercado de trabalho aumentos salariais salário e da cobertura social médio prazos

Limitação da concentração pela Relativamente intensa sobre Moderada pois canalizada Pequeno número de
FORMAS DA legislação, recomposição de o mercado de produto e pelos regulamentos públicos grandes empresas,
CONCORRÊNCIA uma concorrência oligopolista à entre grande empresas em ou das associações fortemente
outra múltiplos mercados profissionais, forte internacionalizadas e
concentração do capital submissa à concorrência

Independência do banco central, Papel do banco principal e Crédito e política monetária Financiamento
REGIME lógica do mercado financeiro, do keiretsu no financiamento fortemente controlados pelo principalmente bancário e
MONETÁRIO- multiplicação das inovações e alocação da capital. Forte Estado. Fraca autonomia do política monetária
FINANCEIRO financeiras, forte controle das controle das autoridades banco central, papel monitorando o objetivo de
empresas pelas finanças publicas (Ministério das determinante das finanças pleno emprego e de
finanças e banco central) competitividade

Fragmentado por agências e Assegura o fornecimento dos Forte desenvolvimento Multiplicidade das
FORMA instâncias de controle, forte serviços coletivos e quantitativo das intervenções intervenções públicas:
DO limitações a sua extensão pela coordenações não públicas: empresas transferências financeiras e
ESTADO concorrência sobre o mercado viáveis pela grande empresa. nacionalizadas, regulamentações amplas e
político Tamanho reduzido mas papel regulamentação, despesas disciplinadoras
significativo públicas, seguridade social, etc.

FORMA DE Adesão aos princípios do livre Padrão de comércio e finanças Forte controle estatal das
Aceitação do princípio de
comércio, relativa autonomia condicionado pela busca de relações exteriores(tarifas,
INSERÇÃO competitividade através da
segundo o estatuto e tamanho desenvolvimento tecnológico e normas, cotas, restrições aos
INTERNACIONAL inovação tecnológica e
econômico fluxos financeiros)
organizacional

Uma regulação amplamente Ajustamentos a nível meso- Estado no centro dos Negociação tripartite
3) CARACTERISTICAS DA mercantil sob controle de econômico da grande ajustamentos macroeconômicos, (patronal-sindicatos-Estado)
REGULAÇÃO dispositivos jurídicos empresa, mercado e Estado mercados e firmas se adaptam no centro das formas
sofisticados tem um papel secundário às regras do jogo institucionais

FONTE: Tradução e adaptação do Tableau 1 em BOYER (1998, p. 16).


Neste contexto, um dos resultados profícuos das análises em termos de
regulação refere-se a uma conclusão de grande importância para a teorização
macroeconômica: os efeitos macroeconômicos de um novo sistema técnico-
organizacional não podem ser avaliados independentemente do modo de regulação
existente ou emergente (BOYER, 1988, p. 84-85).

Segundo LIPIETZ [1991, p. 103] um modelo de organização do trabalho ou


paradigma tecnológico ou industrial é

um compromisso social, aceito voluntariamente ou por meio de


incitações institucionais - pelos dirigentes e trabalhadores. Além disso,
esse paradigma contribui para definir e conduzir a própria evolução
tecnológica.
Ainda conforme o mesmo autor [1991b, p. 28], trata-se de princípios gerais que
governam a organização do trabalho e sua evolução durante o período de supremacia do
modelo. Englobam não apenas as formas de organização do trabalho no interior das
empresas, mas as formas de divisão do trabalho entre empresas. Setores inteiros ou
regiões podem ficar de fora do modelo, mas não deixa de ser um modelo no sentido de
que os outros setores mais avançados, segundo esses princípios, inspiram a evolução
dos outros.

Em outros termos, o conceito de paradigma tecnológico-industrial tem por


objetivo expressar as grandes tendências da tecnologia em suas determinações sobre as
estruturas de produção.74 Todavia, a hipótese básica em sua definição é a de que estas
últimas são função não apenas do desenvolvimento científico e tecnológico disponível e
efetivamente aplicado, mas de um conjunto de variáveis sociais e institucionais que não
são meras derivações lógicas de exigências ou restrições técnicas. Conseqüentemente, o
paradigma tecnológico-industrial não se reduz às variáveis eminentemente técnicas
equacionadas nos quadros da engenharia de produção. De um ponto de vista
metodológico, trata-se de superar as diversas concepções do determinismo tecnológico

74
Os avanços nesta área do programa de pesquisa regulacionista devem-se particularmente aos trabalhos
de Benjamin CORIAT em L atelier et le chronomètre: essai sur le taylorisme, le fordisme et la
production de masse [1979], L atelier et le robot: essai sur le fordisme et la production de masse à l age
de l electronique [1990] e Penser a l envers: travail et organisation dans l entreprise japonaise [1991],
além de outros obras sobre a mesma temática. Tais trabalhos apontam para o advento de novas bases
técnicas produtivas pós-fordistas, possibilitadas pela tecnologia microeletônica e informática com sua
vasta aplicabilidade multisetorial.
que tende a reduzir ou eliminar os impactos das variáveis sócio-políticas e institucionais
na emergência, difusão e transformação dos sistemas produtivos e organizacionais.

Baseando-se nos trabalhos de H. SIMON [1982] e H. LEIBENSTEIN [ 1976], P.


LORINO [ 1992 ] observa que em geral o economista não se interessa pelo que se passa
dentro da empresa, mas exclusivamente pelo que acontece em torno dela. Seu domínio
predileto é o mercado, estando o funcionamento interno das organizações produtivas a
cargo da Administração e da Engenharia de Produção. Esta cisão improfícua é explicita
e recorrentemente rejeitada pelas análises regulacionistas, quer se trate das análises
micro, meso ou macroeconômicas, pois ela estaria em franca dissonância com os
fundamentos, método e objetivos da Teoria da Regulação.75

Segundo KUNDIG [1984], os impactos macroeconômicos dos diferentes tipos


de organização do trabalho industrial, sempre foram um objeto freqüentemente
secundarizado ou mesmo inexistente no âmbito das teorias dominantes. Quando se trata
da economia industrial, a ênfase parece deter-se, sem muita justificativa teórica, no
plano estritamente microeconômico que, segundo o mesmo autor, em nada surpreende:

« puisque celle-ci en constitue le cadre socio-économique immédiat, il


semble en revanche beaucoup plus complexe de vouloir conceptualiser
l impact global de ce facteur sur le fonctionnement de l économie dans
son ensemble ou même sur son évolution sectorielle. » [ KUNDIG, p. 55]
Ainda segundo KUNDIG, muitos economistas em outra posição extrema
consideram legítima a abstração do processo de trabalho e da organização da produção,
quando se trabalha com a hipótese de concorrência perfeita sobre o mercado. Neste
caso, os impactos microeconômicos não podem ter reflexos no conjunto da economia,
porque se cancelariam mutuamente. Mas como a questão realmente pertinente não é a
da concorrência perfeita, as análises devem levar em conta o comportamento dos
mercados. Mais amplamente precisam investigar a estrutura de circulação quando a
concorrência oligopolista torna-se dominante. KUNDIG argumenta então que os

75
A posição de H. SIMON [1982] converge substancialmente para a problemática da regulação. Segundo
este economista, desde que a maximização do lucro e a eficiência interna são postuladas por hipótese, há
muito pouco ou absolutamente nenhum lugar na teoria (econômica clássica da firma) para as
características institucionais familiares às empresas reais. E podemos acrescentar, tais características
institucionais e organizacionais estão em correlação sistêmica com o regime de acumulação e com o
modo de regulação vigentes, impactando diretamente sobre os determinantes do salário, da produtividade
e da própria performance macroeconômica.
impactos macroeconômicos dos sistemas técnico-organizacionais tais como o
taylorismo (e também o fordismo), estão indissociavelmente ligados ao caráter
monopolista ou oligopolista do capitalismo avançado.

O potencial heurístico deste conceito pode ser avaliado também por sua
dimensão interdisciplinar. Ele permite às análises regulacionistas extrair as
conseqüências micro e macroeconômicas das mudança técnicas e organizacionais sobre
a estabilidade e a transformação de um modo de desenvolvimento (enquanto conjunção
de um modo de regulação com um regime de acumulação), num quadro teórico onde
Economia, Gestão e Sociologia do Trabalho podem ser mobilizadas conjuntamente.
Questões como as relações entre formação do salário e os determinantes da
produtividade não podem ser teorizadas de forma consistente, se os espaços produtivos
reais são abstraídos ou reduzidos a fatores provenientes de determinações puramente
tecnológicas ou mercantis.

2.5 Os regimes de crescimento ou de acumulação


A noção de regime de crescimento ou de acumulação tem por objetivo descrever
as evoluções conjuntas e por um longo período, das condições de produção
(produtividade do trabalho, grau de automação, importância relativa dos diferentes
setores e ramos da economia) com as condições que respondem pelo uso social do
produto (consumo das unidades familiares, gastos do governo, comércio exterior). Este
conceito buscará explicitar as regularidades macroeconômicas que permitem a lógica
da acumulação desenvolver-se sob determinados padrões histórica ou geograficamente
contrastados.

A influência das análises marxianas em termos de esquemas de reprodução é


claramente uma das fontes de inspiração teórica para a elaboração deste conceito.
Todavia, como se procurou mostrar nas seções precedentes, o princípio da regulação
baseia-se na constatação empírica de que as estruturas de produção não assumem
automática e necessariamente configurações compatíveis com as estruturas de demanda.
Oferta e demanda são derivadas de regularidades que não se determinam mutuamente
como resultado de mecanismos puramente econômicos ou concorrenciais.

As origens do conceito de regime de acumulação encontram-se ainda nos aportes


de AGLIETTA [1976], para quem a articulação das leis da acumulação de capital com
as leis da concorrência estabelecia o ponto de partida correto para o entendimento das
formas específicas de evolução do modo de produção capitalista, em sua dinâmica de
longa duração. Negando que a concentração do capital tenha sido o fenômeno
fundamental no século XIX, para este autor, o critério teoricamente relevante consiste
em se partir da modificação radical das condições de reprodução do capital em geral,
considerando que as mesmas são indissociáveis das transformações das condições de
existência do trabalho assalariado, como instituição determinante nas economias que se
organizam sob o capitalismo. Conseqüentemente, as análises deveriam explicitar como
as transformações a nível do processo de trabalho e da organização da produção,
impactavam diretamente sobre o modo de vida assalariado, afetando as condições de
realização para o conjunto do sistema e, então, determinando-lhes as particularidades
observáveis no plano da macrodinâmica da acumulação.

Neste contexto, a diferenciação entre uma acumulação extensiva


(preponderante no século XIX e início do século XX, quando os ganhos de
produtividade são pouco significativos para conduzir a uma modificação profunda das
condições de produção) e uma acumulação intensiva (dominante a partir de finais dos
anos 20, quando os ganhos de produtividade são elevados e transformam as estruturas
de produção) permite elucidar-se diversos fatores que estão por trás das particularidades
conjunturais das respectivas épocas.

Como a correspondência dinâmica entre produção e demanda agregada não pode


ser plenamente assegurada por intermédio do mero desenvolvimento de uma lógica
puramente mercantil, em AGLIETTA (1976) encontra-se a hipótese de que a
estabilidade macrodinâmica do regime de acumulação deveria implicar em uma
correspondência entre as transformações das estruturas de produção e as mutações das
condições de reprodução do trabalho assalariado. O pressuposto implícito é o de que
um modo de produção é capaz de desenvolver uma variedade de regimes de
crescimento, em função do lugar e da época histórica em que sua estrutura determinante
(forma geral e dominante das relações sociais de produção e de distribuição) se move
mediatizada por fatores sócio-técnicos e institucionais que lhe conferem formas
particulares de evolução macroeconômica.
Este conceito visa portanto analisar as formas sociais básicas que veiculam a
articulação entre produção e demanda social, como condição necessária ao
desenvolvimento do processo de acumulação de capital. Neste sentido, um regime de
acumulação expressa um determinado padrão de crescimento e acumulação, cujos
fundamentos teóricos e empíricos não podem ser estabelecidos sobre a concepção
reducionista de um mercado auto-regulável, processando-se num vazio institucional
completo. Para que seja bem sucedido, um regime de acumulação deve ser capaz de
solucionar, mesmo temporariamente, a questão fundamental da compatibilidade
dinâmica entre produção e circulação dos capitais.

Em termos operacionais, o regime de acumulação representa-se no plano das


análises como um esquema ou modelo de crescimento para uma economia nacional em
uma certa época. Segundo JUILLARD [1995], na base deste conceito se encontra a
relação entre progresso técnico e distribuição da renda. Formalmente, ele pode ser
representado por um determinado esquema de reprodução, envolvendo dois ou mais
setores produtivos com suas inter-relações estruturais e macrodinâmicas ou pela
identificação das diversas regularidades ou padrões na evolução dos macroagregados
que suportam a acumulação de capital. Os trabalhos desenvolvidos por H. BERTRAND
[1978 e 1983], M. JUILLARD [1989 e1993], B. BILLAUDOT [1976 e1994] e ainda G.
BOISMENU et alii [1992], BOYER [1990 e 1995], UEMURA (2000) para os casos da
França, EUA, Canadá e Japão, fundamentam a problemática levantada pela diversidade
histórica e geográfica dos regimes de acumulação, permitindo lançar as bases para a
construção de modelos macroeconômicos que incorporem a regulação como princípio
organizador histórico.

Se um regime de acumulação existe e se sustenta dinamicamente, isto significa


que seu esquema de reprodução é macroeconomicamente coerente, permitindo que o
processo de acumulação de capital possa desenvolver-se superando, mesmo
provisoriamente, seus obstáculos endógenos. Como observa LIPIETZ [1982]:

Un régime d accumulation ne plane pas, désincarné, dans le monde


éthéré des schémas de reproduction. Pour que tel ou tel schéma se
réalise et se reproduise durablement, il faut que des formes
institutionnelles, des procédures, des habitudes, agissent comme forces
coercitives ou incitatives, conduisent les agents privés à se conformer à
de tels schémas. Cet ensemble de formes est appelé mode de régulation.
Un régime d accumulation ne se satisfait pas, on va le voir, de n importe
quel mode de régulation. Les crises économiques, qui se présentent
comme une inadéquation générale et manifeste de l offre à la demande,
peuvent en réalité manifester diverses conjonctures. 76
Nesta mesma perspectiva, esta noção traduz-se em BOYER [1986, p.46] por um
conjunto analiticamente inteligível de regularidades econômicas e sociais,
macrodinamicamente fundamentais por permitirem estudar as possibilidades de
acumulação a longo prazo:

a) um tipo de evolução da organização da produção e da relação dos


assalariados com os meios de produção;

b) um horizonte temporal de valorização do capital, a partir do qual podem ser


definidos os princípios de gestão;

c) uma divisão do valor que permita a reprodução dinâmica das diversas classes
ou grupos sociais;

d) uma composição da demanda social que reafirme a evolução tendencial das


capacidades de produção;

e) uma modalidade de articulação com as formas não-capitalistas, quando elas


ocupam um lugar determinante na formação sócio-econômica estudada.77

Em conseqüência, a definição de regime de acumulação fornecerá um ponto de


partida teórico consistente para a construção de macromodelos que incorporem
endogenamente as instituições e de modo mais geral, a noção de historicidade forte da
economia.

De acordo com a análise desenvolvida em BRUNO (1997), a articulação


histórica das duas últimas modalidades de regulação (a concorrencial e a monopolista)
com os diferentes regimes de acumulação (extensiva e intensiva), permite explicitar-se
76
Os esquemas de reprodução constituem uma ferramenta extremamente útil nas macroanálises da
reprodução e da acumulação de capital. Em sua forma original, lançada por MARX no Livro II de O
Capital, eles movem-se, todavia, em um nível ainda bastante elevado de abstração, não incorporando,
entre outros elementos, a estrutura institucional como instância indissociável e mediadora nos quadros da
lógica da valorização. Os trabalhos de KALECKI embora tenham contribuído para a divulgação dos
mesmos, inclusive permitindo a representação do problema keynesiano da demanda efetiva sob uma
análise setorial, permaneceram, contudo, alheios à questão fundamental das relações entre variáveis
institucionais e variáveis econômicas. Vide por exemplo KALECKI em As Equações Marxistas de
Reprodução e A Economia Moderna, MIGLIOLI, J. (org.) in Crescimento e Ciclo das Economias
Capitalistas, SP, HUCITEC, 1977.
77
Os grifos são de BOYER.
as particularidades determinantes dos modos de desenvolvimento engendrados pela
economia capitalista no século XX, assim como de cada uma de suas crises estruturais.
Nesta abordagem teórica, a questão da interação entre tecnologia, fatores econômicos e
sociais, torna-se mais complexa do que sugerem os modelos de crescimento neoclássico
ou mesmo keynesiano. Mas em compensação, esse intercâmbio entre o social e o
econômico permitirá às análises regulacionistas a obtenção de resultados muito
originais e, sem dúvida, mais aderentes à história viva dos fatos e dos agentes
econômicos.

A partir das formas da acumulação, as análises dos modos de desenvolvimento


buscam precisar o regime de acumulação predominante no período histórico estudado.
Mas como no caso dos modos de regulação, isto não deve significar que uma
modalidade seja exclusiva por ser dominante. Como observam J. MAZIER, M. BASLE
e J.F. VIDAL [1984, p. 30] uma análise precisa da natureza dos regimes de acumulação
que se sucederam, desde o início do século XX, torna-se necessária para que se possa
compreender como se articulam na dinâmica de longo período, produtividade do
trabalho, composição do emprego e acumulação de capital. A Teoria da Regulação
definirá então, duas grandes modalidades de acumulação:

a) uma acumulação com dominante extensiva se caracteriza por um


crescimento do capital se efetuando por ondas sucessivas, sem perturbação
maior das condições de produção e com ganhos moderados de produtividade.
Observa JUILLARD [1995, p.227], que na acumulação extensiva, o
desenvolvimento do capitalismo processa-se pela conquista de novos ramos e
de novos mercados, estendendo suas relações de produção às novas esferas de
atividade econômica, sem no entanto, modificar de um modo expressivo, as
condições de produção e a eficiência do trabalho e do capital;

b) uma acumulação com dominante intensiva se caracteriza por uma


transformação permanente dos processos de produção, permitindo a obtenção
de um crescimento sustentado da produtividade do trabalho. Tal fato viabiliza
a distribuição da renda salarial em progressão rápida, favorecendo a
emergência de uma nova norma ou modo de consumo.78A expansão dos
mercados que é assim obtida, contribui para um processo de acumulação
acelerada, através do crescimento mais regular dos investimentos, que se
acompanha de uma obsolescência planejada dos equipamentos e produtos.79
Conforme ainda Juillard, na acumulação intensiva, as condições de produção
serão então sistematicamente transformadas de maneira a elevar a
produtividade aparente do trabalho,80 com os novos investimentos traduzindo-
se em aumento do estoque de capital por trabalhador.

O Quadro 3 reúne os quatro regimes de acumulação, historicamente definidos a


partir de suas formas dominantes: a extensiva e a intensiva.

78
Este conceito foi utilizado pela primeira vez por Michel AGLIETTA em Régulation et crise du
capitalisme, 1976, para apreender as transformações que o desenvolvimento do capitalismo operava a
nível do modo de vida assalariado, em termos dos padrões de gastos que os trabalhadores incorriam
conforme a evolução histórica do capital industrial. Neste sentido, para AGLIETTA, o conceito de modo
de consumo permitiria estudar as conexões entre produção e demanda social com relação aos impactos
sobre o processo de acumulação de capital, quando a composição dos gastos dos assalariados era
substancialmente modificada. Quanto à acumulação intensiva fordista, seu modo de consumo típico
caracteriza-se por um consumo de massa de produtos uniformes e trivializados, que permitirá uma
expansão acelerada do setor de bens de produção em uma proporção compatível com o crescimento do
setor de bens de consumo. Trata-se pois de um consumo de massa adequado ao desenvolvimento de uma
produção igualmente de massa e padronizada.
79
É interessante do ponto de vista teórico, que KEYNES, na Teoria Geral, chamara a atenção para a
grande volatilidade do investimento privado numa economia coordenada exclusivamente por mecanismos
de mercado. Ele se preocupara com as conseqüências adversas que um crescimento irregular dos
investimentos teria sobre a evolução da demanda efetiva, afetando os níveis de renda e produto, caso
fossem deixados às oscilações próprias de um sistema econômico do tipo laissez-faire. Com isso
KEYNES abria o espaço teórico e depois político, para as intervenções do Estado com relação à busca da
estabilidade macrodinâmica da acumulação.
80
Segundo o INSEE - INSTITUT NATIONAL DE LA STATISTIQUE ET DES ÉTUDES ÉCONOMIQUES,
a produtividade aparente do trabalho mede a eficácia produtiva dos trabalhadores empregados e define-
se pela razão entre valor adicionado e efetivos empregados; trata-se do valor adicionado por pessoa ativa
empregada. O INSEE insiste na palavra aparente , já que nada indica exatamente a origem do valor
adicionado, o qual tanto pode progredir devido à novas máquinas e equipamentos que melhorem na
aparência a eficácia do trabalho, como em resultado de maior intensidade do trabalho (cadências,
eliminação de desperdícios), de melhor organização, da incorporação nos produtos de inovações que
valorizam os respectivos preços, etc.
QUADRO 3 - REGIMES DE ACUMULAÇÃO EXTENSIVA E INTENSIVA

NATUREZA DA
ACUMULAÇÃO COM DOMINANTE COM DOMINANTE
EXTENSIVA INTENSIVA
NATUREZA
DO CONSUMO

Economia inglesa Economia americana


Pouco integrado
ao capitalismo (século XVIII início do (século XIX)
XIX)

Muito integrado Economia americana Economias da OCDE


ao capitalismo
(último terço do século (depois de 1945)
XX)

FONTE: BOYER (1995)

De acordo com BOYER [1988, p. 79], na acumulação extensiva observa-se a


aplicação da ciência e da tecnologia aos processos de produção, mas as principais firmas
procuram antes aplicar o know-how já existente, ao invés de promoverem
permanentemente o seu desenvolvimento, seja através de novos métodos, seja pela
introdução contínua de inovações tecnológicas.81 Paralelamente, o horizonte temporal
onde as empresas operam é muito mais o de curto prazo, pois os muitos trabalhadores
assalariados no setor industrial são principalmente produtores dos bens e serviços
ofertados e apenas marginalmente consumidores dos mesmos. Isto se deve ao fato da
renda salarial ser quase inteiramente absorvida pelo consumo de bens-salário, freando a
expansão da demanda de bens duráveis e semi-duráveis do setor industrial emergente.82

81
Como é hoje o caso das grandes empresas multinacionais, que possuem os seus próprios departamentos
de pesquisa e desenvolvimento (P&D) ou então financiam instituições com o mesmo objetivo. Do ponto
de vista teórico, trata-se de uma fase na evolução histórica do capitalismo, onde a ciência e a tecnologia
convertem-se completa e efetivamente em capital a serviço da valorização e da acumulação.
82
Este problema seria parcialmente contornado com a busca de novos mercados externos e com o
processo histórico conhecido por neocolonialismo. Todavia, com a elevação dos ganhos de produtividade
também no setor agrícola, os preços dos gêneros alimentícios, que correspondem a uma parte significativa
dos bens-salário, fariam baixar o custo de vida. Em consequência, a parcela do salário destinada aos bens
de consumo duráveis seria aumentada em favor da expansão do capital industrial.
Como o crescimento é obtido preponderantemente por meio da intensidade do
trabalho e, sobretudo, do prolongamento da jornada de trabalho e do assalariamento de
novos contingentes de trabalhadores, possibilitado pela ampliação das plantas
industriais - a produtividade média e os salários reais permanecem quase estagnados
entre 1825 e 1920.83 Trata-se de uma das características marcantes da acumulação
extensiva, imprimindo grande instabilidade conjuntural à macrodinâmica do período.

Quanto à acumulação intensiva, a Teoria da Regulação identificará dois casos


fundamentais para se compreender a evolução do capitalismo no século XX.:

a) Acumulação intensiva sem consumo de massa - as novas bases técnicas


produtivas organizadas sob os princípios tayloristas, seriam rapidamente
difundidas pelas indústrias após a Segunda Guerra Mundial. Vários ramos da
indústria capacitam-se organizacional e tecnicamente para uma produção em
massa e padronizada, de uma gama enorme de bens de consumo duráveis e
semiduráveis. Isto explica o interesse das análises regulacionistas pela
chamada revolução taylorista , operada pela aplicação e aprofundamento da
Administração Científica do trabalho, tanto na indústria quanto nos demais
setores. Em conseqüência, durante os anos 20 a produtividade se acelera, mas
os efeitos sobre o produto e a renda são drasticamente interrompidos após
1930. Como oberva BOYER [1988, p. 82]:

Basically, mass production is technically possible but cannot be sustained


since the prevailing régulation strongly moderates real wages increases, at
the same time as wage-earners become a dominant fraction of the labour
force. It turns out that such intensive accumulation is highly contradictory
(the profit rate is too high to permit an adequate effective demand) and

83
É necessário neste momento, distinguir-se entre produtividade e intensidade do trabalho. Partindo-se de
uma jornada de trabalho fixa, se o quantum de produto por trabalhador se eleva em função da introdução
de novas tecnologias, materiais e processos de produção, porém reduzindo ou no mínimo permanecendo
constante o desgaste psicofísico do operário, então pode-se dizer que ocorreu um incremento puro de
produtividade. Por outro lado, se a produtividade elevar-se por meio de um maior desgaste físico e mental
do trabalhador, permanecendo inalteradas, a jornada, a base técnica e as formas organizacionais
envolvidas no processo de produção, então diz-se que ocorreu tão somente um aumento da intensidade do
trabalho. Todavia, na prática os dois fenômenos se intersectam, e podem de fato ocorrer simultaneamente,
tornando muito complexa a separação entre intensidade pura e produtividade pura do trabalho. Uma
análise científica desta questão, que objetivasse delimitá-las e mensurá-las, necessitaria - além dos aportes
da economia, da gestão ou da engenharia de produção - de incursões da psicologia, da ergonomia ou da
medicina do trabalho. Note-se que o conceito de produtividade aparente utilizado pelo INSEE e pelo
IBGE, procura justamente contornar esse problema ao conjugar em uma só expressão, tanto a
produtividade pura quanto a intensidade do trabalho.
unstable (look at inter-war production statistics).84 Therefore this is not a
viable mode of development in the long run.
Este é um dos principais aportes regulacionistas para a análise da crise de
1929/30 (a Grande Depressão ). Se a acumulação ultrapassasse as capacidades da
demanda social solvável, tratar-se-ia de uma crise típica de superprodução. No entanto,
ela não se explicaria pelo subconsumo, mas por uma evolução da demanda incompatível
com as necessidades da valorização do capital, isto é, tratar-se-ia de um consumo
insuficiente, relativamente ao processo de acumulação e não em relação às necessidades
sociais.85

b) Acumulação intensiva com consumo de massa - esta modalidade de


acumulação é observada a partir dos anos 50. Em avanço rápido, a gerência
científica taylorista conjuga-se agora com a linha de montagem fordiana,
produzindo efeitos sinérgicos diretos sobre a elevação dos ganhos de
produtividade das firmas. Além disso, novos produtos são lançados em
mercados em rápida expansão (rádio, aparelho de TV, eletrodomésticos, etc).
Mas um novo compromisso entre capital e trabalho emerge, assegurando que
os trabalhadores serão beneficiários também do progresso econômico e
tecnológico em curso. Agora os trabalhadores além de produtores, são
também consumidores dos novos bens e serviços gerados pela produção
capitalista moderna; e desta forma são estabelecidas as primeiras bases de um
consumo de massa, compatível com uma produção igualmente de massa.
Como observa BOYER, se os salários são um custo a ser minimizado, são

84
Reproduzidas no Quadro 2.
85
Nos Gründrisse, vol. I, há uma passagem de MARX extremamente elucidadora da problemática das
crises de superprodução ( ou superacumulação) que são normalmente interpretadas como se fossem crises
de subconsumo . À página 278, MARX argumenta que a superprodução geral terá lugar não porque os
trabalhadores consumam, relativamente, muito poucas mercadorias ou os capitalistas muito poucas das
mercadorias que hão de ser consumidas, senão porque de ambas se produziu em demasia; não demasiado
para o consumo, senão para assegurar a relação correta entre o consumo e a valorização; demasiado para
a valorização , portanto para garantir no mínimo a taxa média de lucro. Observe-se então, que o lugar
teórico e empírico de um modo de regulação é exatamente este: assegurar, mesmo provisoriamente, a
evolução dessa relação correta entre produção e consumo, como pressuposto da continuidade da
acumulação capitalista. Avaliar em que medida um determinado modo de regulação é ou não, bem-
sucedido nesta adequação macrodinâmica, que estabiliza o regime de acumulação, é o mesmo que
apreender suas particularidades históricas com relação a um período dado do desenvolvimento do
capitalismo. Como se expôs na primeira seção, LIPIETZ [1987] reconhece que a regulação permite a
unidade sempre relativa apesar da contradição, sempre absoluta, quer dizer, apesar da tendência imanente
à separação entre produção e circulação.
simultaneamente, um determinante-chave da demanda agregada, via efeito
acelerador do investimento. Eis um momento de explícita contradição no
âmbito da macrodinâmica da acumulação capitalista. Reduzir o salário para
aumentar o lucro pode traduzir-se num bloqueio dos investimentos produtivos
que permitem precisamente a obtenção do próprio lucro.86

Segundo a Teoria da Regulação, a mudança de uma coordenação


macroeconômica centrada em ajustes preponderantemente concorrenciais, para uma
regulação administrada de cunho fordista-keynesiano, favoreceu a gestação de um
novo modo de desenvolvimento. Por suas características macrodinâmicas, o mesmo é
considerado inusitado na história do capitalismo. No período que vai de 1945 a 1973, o
crescimento é originalmente alto e estável, impulsionado por uma evolução simultânea
da produtividade e dos salários reais.

Em síntese, a transição nos anos 20, de um regime de acumulação extensiva para


um regime de acumulação intensiva, porém em presença ainda de um modo de
regulação concorrencial, mostrou-se incapaz de estabelecer um modo de
desenvolvimento macrodinamicamente estável. Este fato pode ser constatado por sua
curta vigência histórica; ele se interrompe bruscamente com a crise de 1929/30.

Os anos 30 caracterizam-se por uma intensificação da concentração e da


centralização dos capitais, fenômeno muito peculiar nas fases de crise. As bases
institucionais para um modo de regulação monopolista são lançadas e possibilitariam a
compatibilidade dinâmica entre produção e demanda social, a partir da emergência de
estruturas que desenvolvem o consumo de massa. O resultado macroeconômico é o
modo de desenvolvimento fordista, responsável por cerca de quase 30 anos de
crescimento sustentável no pós-Segunda Guerra. Conseqüentemente, estudar suas
origens, formas nacionais de evolução e de crise, constituiria um objeto central para a
Teoria da Regulação.

86
O efeito acelerador deve-se à relação entre variações no investimento (I) provocadas por variações nos
gastos dos consumidores (C), podendo-se sintetizar por dI = a.dC, onde a é o fator ou coeficiente de
aceleração. Este fenômeno desenvolve-se potencializando o efeito multiplicador keynesiano, onde um
aumento nos investimentos gera uma elevação proporcionalmente maior na renda (Y). Sendo dY= k. dI, k
é o multiplicador dos investimentos. Como ocorre em muitos dos macrofenômenos, trata-se de mais um
caso de reciprocidade causal, onde o efeito se converte em causa em um segundo momento, reforçando-se
cumulativamente as conexões entre renda e investimento.
2.6 Regimes de produtividade e regimes de demanda
Os ensinamentos dos modelos de crescimento cumulativo (KALDOR, 1970,
1972, 1980) contribuíram para a formalização regulacionista, na medida em que
proporcionaram um quadro de referência geral e uma matriz de modelizações
específicas (PETIT, 1995). A idéia de reciprocidade causal implícita em um processo de
crescimento cumulativo permite o desenvolvimento de análises mais aptas a apreender
as formas de articulação das estruturas de produção e de demanda, fora dos
automatismos e dos reducionismos veiculados pelos modelos de origem neoclássica.

A análise de A. YOUNG já continha a essência da causalidade cumulativa ,


mas este autor abordava essa problemática introduzindo a lei de Say87. Os trabalhos de
KALDOR reconhecem explicitamente o papel fundamental da demanda e o referencial
de análise mostrou-se compatível com as hipóteses e os fundamentos teóricos
regulacionistas. Como observa PETIT:

Fondamentalement, le principe de causalité cumulative stipule que dans


une économie l évolution des marches conditionne l évolution des gains
de productivité et qu en retour l utilisation de ces gains conditionne la
dynamique de la demande, donc des marchés. ( ) Le schéma de
causalité cumulative s applique à analyse de régimes de croissance
intensifs comme extensifs. La dynamique endogène dont témoignent ces
rétroaction peut résulter d économies d échelle comme d externalités
positives à l intérieur du système économique considéré. ( ) Au-delà de
ces limites, le schéma cumulatif constitue un cadre conceptuel
particulièrement bien adapté pour articuler la formation des régimes
d accumulation dans un contexte explicitant la saillante, à une période
historique, de certaines données institutionnelles(PETIT, 1995, p. 246).
Estes dois conceitos constituiriam então um refinamento da definição de regime
de acumulação, aparecendo de forma mais sistemática nos trabalhos regulacionistas a
partir da segunda metade dos anos 80. Um regime de crescimento ou de acumulação
pode ser apreendido como um resultado da interação macrodinâmica entre um regime
de produtividade (uma generalização das relações de Kaldor-Verdoorn) e um regime de
demanda (expressando os impactos dos ganhos de produtividade sobre os diversos
componentes da demanda agregada).

87
Jean ARROUS, em Les Théories de la Croissance, fornece uma síntese das abordagens em termos de
causalidade cumulativa , desde os primórdios com A. Smith e A. Young até os trabalhos de Kaldor.
Os modelos de crescimento cumulativo combinam, portanto duas hipóteses
básicas:88

Hipótese 1: a taxa de crescimento da demanda Y promove os ganhos de

produtividade PR ; PR F Y
Hipótese 2: os ganhos de produtividade induzem a expansão da demanda

agregada. Y G PR
Para ser sustentável, um processo de crescimento cumulativo deriva de uma
compatibilidade estrutural entre um regime de produtividade e um regime de demanda.
A condição de estabilidade requer que a sensibilidade da demanda com relação à
produtividade seja limitada para qualquer elasticidade dada da produtividade com
relação ao crescimento do produto. Para a Teoria da Regulação este modelo tornou-se
particularmente relevante porque permite explicar porque um processo de crescimento
cumulativo não pode ocorrer se os mecanismos de distribuição de renda não se adequam
ao regime de produtividade vigente. BOYER (1988) e BOYER e PETIT (1989),
mobilizam os dois gráficos abaixo para ilustrar as duas curvas representativas dos
regimes de produtividade e de demanda. No primeiro caso, trata-se de um regime de
acumulação dinamicamente estável, pois a inclinação da curva do regime de
produtividade(II) é superior à do regime de demanda(I). No segundo, o regime é
instável, pois não há possibilidade de convergência para um equilíbrio das tendências da
produção e da demanda agregada.

Segundo KALDOR e a literatura sobre mudança técnica, há muitos processos


que podem conduzir a relações ex post positivas entre as tendências da produtividade e
as taxas de crescimento no médio e no longo prazo:

a) Retornos crescentes de escala ;

b) Aprofundamento da divisão do trabalho;

c) Conexão dinâmica entre produtividade e demanda;

88
Uma síntese desses modelos pode ser encontrada em BOYER e PETIT (1989), Kaldor s Growth
Theories: Past, Present and Prospects, CEPREMAP, n° 8905, february, 1989.
d) Qualificação do trabalho;

e) Learning by doing e learning by using .

FIGURA 4 UM PROCESSO DE CRESCIMENTO CUMULATIVO PRESSUPÕE UMA


COMPATIBILIDADE ESTRUTURAL ENTRE OS REGIMES DE PRODUTIVIDADE E DE
DEMANDA: UM ATRIBUTO DEPENDENTE DAS CARACTERÍTICAS DO MODO DE
REGULAÇÃO

PR PR
II I

I II

Y Y
Configuração Configuração
macrodinamicamente estável macrodinamicamente instável

REGIME DE DEMANDA ( I ): Y = c.PR + d

REGIME DE PRODUTIVIDADE ( II ): PR = a.Y + b

PR = produtividade do trabalho; Y = produto

FONTE: Adaptação a partir de BOYER e PETIT (1989).

Todavia, os trabalhos regulacionistas que utilizam essa perspectiva, buscaram


uma abordagem global da causalidade cumulativa, não apenas explicitando as condições
dos retornos crescentes de escala dinâmicos, mas também as bases da formação da
demanda89. Segundo PETIT, esse tipo de abordagem é de fato uma ferramenta apta para

89
BOYER e PETIT (1989, p. 8) observam que the cumulativeness of such a process is usually captured
by adding an endogenous improvement of total factor productivity into conventional production
functions. This is measured by an index of cumulative past production, at micro or macro level.
Analytically, this is not exactly similar to productivity growth relationships, but the flavour is quite
similar indeed.
a análise das mudanças estruturais. Seus pontos fortes em uma perspectiva
regulacionista são os seguintes:

Explicitar as formas centrais de organização que respondem pelas origens


dos ganhos de produtividade;

Explicitar as modalidades de arranjos institucionais e organizacionais que


estabelecem os padrões de repartição desses ganhos de produtividade e a
forma como os conflitos de interesses envolvidos estão ou não regulados;

Identificar o caráter das inter-relações das formas de organização e dos tipos


de arranjos institucionais, considerando se pertencem a um contexto geral do
período ou do país.

As regularidades macroeconômicas que suportam a evolução da produção e da


demanda agregada não evoluem sob padrões necessariamente compatíveis, pois do
contrário, os períodos de crescimento seriam a regra e a regulação como princípio de
coerência e compatibilidade tornar-se-ia completamente determinada por uma lógica
mercantil capaz de automaticamente equilibrar oferta e demanda sob configurações
macrodinamicamente estáveis90. Conseqüentemente, a análise busca identificar a forma
como as particularidades do modo de regulação em vigor determinam as conexões
estruturais entre a dinâmica da produtividade e sua interação com os fatores que
participam da formação da demanda agregada Nesta perspectiva a análise volta-se para
os determinantes da produção e da repartição da renda em interação dinâmica,
permitindo apreender os regimes de crescimento ou de acumulação como estruturas
macroeconômicas resultantes da combinação de diferentes regimes de produtividade e
de demanda. Todavia, a análise deve reconhecer e incorporar as mutações estruturais
contemporâneas como a internacionalização das economias, a terciarização das
atividades, a emergência e difusão de novas bases técnicas produtivas pós-fordistas e o
processo de expansão do capital financeiro.

Seguindo o percurso metodológico proposto pela Teoria da Regulação, trata-se


de superar as limitações e as insuficiências das análises tradicionais, no que concerne:

90
Em outros termos, o sistema econômico estaria funcionando sob a lei de Say e a noção de regulação
tal com foi definida perderia completamente o estatuto teórico.
às concepções que promovem o determinismo tecnológico, pois se abstraem
das influências das variáveis institucionais e mais amplamente, dos fatores
considerados convencionalmente como extra-econômicos ;

à abordagem da lógica mercantil que apreende os mercados como as únicas


instituições capazes de superar os problemas de coordenação;

à ênfase nas condições de produção, priorizando os problemas de oferta e


minimizando ou se abstraindo dos problemas de demanda na dinâmica do
crescimento econômico;

ao reducionismo mecanicista das análises em termos de funções de produção


que introduzem a tecnologia de um modo completamente abstrato, a-
histórico e conseqüentemente, de forma não mediatizada pelos fatores
sociais;

à premissa de equilíbrio de pleno emprego, presente em grande parte das


análises em termos de função de produção.

Essas cinco características da abordagem padrão são obviamente


interdependentes e resultantes de sua ontologia e da metodologia que implica.
Conforme BOYER e JUILLARD (1991):

(...) conventional production functions should be replaced by


productivity regimes which focuses upon the specificity and historicity of
production organization and innovation within any give socio-technical
system. ( ) This methodological is used in order to enlighten three
major issues. First of all, the new endogenous growth theory does enrich
conventional neoclassical models but always assumes invariant and
ahistorical laws governing technical change, an hypothesis which is
strongly invalidated over the period 1869-1987 .
Segundo esses autores, a desaceleração dos ganhos de produtividade a partir de
1967 é de difícil explicação, inclusive a diversidade das trajetórias nacionais. Além
disso, as evidências empíricas e históricas suportam a hipótese de vigência de um
regime de produtividade fordista entre 1934 e 1964, com retornos crescentes de escala
sem precedentes e mudança técnica do tipo equipment driven .

Uma das especificidades das análises em termos de regulação refere-se portanto


à forma de abordar a questão das origens dos ganhos de produtividade e de sua
distribuição entre os diversos atores econômicos. Neste contexto, a forma como o valor
adicionado é apropriado pelos setores e classes sociais condiciona decisivamente o
processo de acumulação de capital e o ritmo do crescimento econômico. Observa
BILLAUDOT (2000) que, para os regulacionistas, a noção de produtividade dos fatores
tem sentido apenas em dinâmica, quando se procura apreender os efeitos de uma
mudança das condições sócio-técnicas de produção. Segundo o autor:

Il revient alors au même de parler de productivité de l accumulation


(ou de la croissance) que d amélioration de la productivité. Les deux
ratios courants la productivité horaire du travail (le volume de PIB par
heure travaillée) et la productivité du travail par tête (le volume de PIB
par emploi) ne sont alors utilisés qu en évolution comme instruments
de mesure de cette amélioration (BILLAUDOT, p. 50)»
Por outro lado, a evolução da produtividade aparente do capital fixo (o volume
de PIB por capital fixo) permite avaliar o custo em capital fixo do crescimento, já que
uma baixa desta relação significa que será preciso mais capital fixo para obter um dado
volume de produção final à escala da economia nacional. BILLAUDOT propõe então o
seguinte esquema para ilustrar a questão:

FIGURA 5 MUDANÇAS NAS CONDIÇÕES SÓCIO-TÉCNICAS DE PRODUÇÃO E A


PRODUTIVIDADE DO TRABALHO

Evolução da
Aumento da Produtividade
Produtividade Horária
Global do Trabalho

Mudanças nas Evolução da Evolução da


Condições Sócio- Intensidade do Produtividade do
Técnicas de Capital Trabalho por
Produção Pessoal Ocupado

Evolução da
Duração Anual
Média do Trabalho

FONTE: Reelaboração a partir de BILLAUDOT (1997).


O conceito de regime de produtividade é então mobilizado para expressar a
diversidade das combinações possíveis entre capital e trabalho, a partir de relações que
são sempre mediatizadas por configurações institucionais historicamente definidas. Um
regime de produtividade é um conceito definido a nível macroeconômico e expressa um
determinado padrão de evolução do investimento, das relações capital-trabalho e da
mudança técnica nos quadros de um determinado paradigma sócio-técnico (ou
paradigma tecnológico-industrial). No contexto de um regime de produtividade operam
mudanças técnicas locais e path-dependents .91

Em conseqüência, não se trata de um conceito puramente técnico ou econômico,


uma vez que as cinco formas institucionais do capitalismo contribuem para determinar
as capacidades de produção agregada. Similarmente, a dinâmica da produtividade média
não é uma simples questão de tecnologia, desde que o trabalho não é uma mercadoria
pura sob controle direto dos gerentes de produção. Isto significa que os determinantes
da produtividade não se encontram em fatores exclusivamente técnicos. As relações
entre capital e trabalho e suas configurações institucionalizadas, a partilha do excedente
e o nível de emprego são fatores que se conjugam para compor as regularidades que se
expressarão num dado regime de produtividade.

Como cada regime de produtividade é um resultado de um determinado sistema


técnico-industrial, este conceito permite que análise possa identificar a existência de
épocas tecnológicas contrastadas, através das quais diferentes regimes de produtividade
se sucedem na história. Esta noção reconhece a forte interdependência entre efeitos-
substituição e fatores de mudança, combinando um espectro amplo de trajetórias
tecnológicas, não apenas os gastos em P&D, mas igualmente learning by doing ,
learning by using e as diversas configurações institucionalizadas das relações entre
trabalho, capital e organizações(BOYER e JUILLARD, 1991).

Segundo BILLAUDOT (2000), o regime de produtividade expressa a forma


como a evolução da produção comanda a evolução da produtividade do trabalho,

91
Conforme BOYER e JUILLARD (1991, p. 14), « the technological becomes local, not in the
geographical sense but due to the fact that only a very limited number of potential innovations are
explored at any give period of time : the ones which are in line with the prevailing paradigm, itself
function of the economic environment and dominant social relations. This apparently invalids any grand
and atemporal production function. Consequently, it might be erroneous to infer any global and long run
transformation in factor elasticity or technical change neutrality from a given local transformation
occurring at a given historical period.
quando ambas evoluem à taxas constantes. Esta definição provém da influência das
análises kaldorianas em termos de modelos de crescimento cumulativo. A lei de Kaldor-
Verdoorn está portanto contida no conceito de regime de produtividade uma vez que a
melhora da produtividade estrutural é função do ritmo de crescimento tendencial da
economia.

De maneira análoga, um regime de demanda expressa a forma como a evolução


da demanda final é comandada pela evolução da produtividade do trabalho. Tal forma
é um resultado da conjunção de fatores sócio-políticos e institucionais (veiculados pelo
modo de regulação em curso) e que determinam os diversos canais em que o valor
adicionado será repartido entre os diversos setores e agentes econômicos. Os ganhos
de produtividade agem sobre os diversos componentes da demanda agregada via
efeitos-preço ou via mudanças nos salários e nos lucros.

QUADRO 4 DOIS CASOS TEÓRICOS PARA OS REGIMES DE PRODUTIVIDADE

REGIMES DE PRODUTIVIDADE

TIPO CLÁSSICO PURO TIPO FORDISTA PURO

Não existem retornos crescentes de Existem retornos crescentes de escala


escala consideráveis

O investimento é totalmente O investimento é totalmente


impulsionado pelos lucros impulsionado pela demanda

Determinação concorrencial dos Determinação não concorrencial dos


salários (s/ repartição ex ante dos salários (c/ repartição ex ante dos
ganhos de produtividade) ganhos de produtividade em favor dos
assalariados)

COM EFEITO LUCRO COM EFEITO LUCRO COM LIMITADA COM ELEVADA
IMPORTANTE LIMITADO INDEXAÇÃO DOS INDEXAÇÃO DOS
SALARIOS À SALARIOS À
PRODUTIVIDADE PRODUTIVIDADE

A curva A curva A curva A curva


crescimento- crescimento- crescimento- crescimento-
produtividade é produtividade é produtividade produtividade é
positivamente negativamente reflete a relação de negativamente
inclinada inclinada Kaldor-Verdoorn inclinada

FONTE: Elaborado a partir da classificação proposta por BOYER (1988, 1992, 1995 e 1998).
Em termos operativos, isto significa que as formas institucionais que compõem
as áreas da régulation d ensemble devem ser analisadas em seus impactos sobre a
formação da demanda agregada (determinação da massa salarial, modo de consumo,
gastos públicos, etc.). Conseqüentemente, o regime de demanda pode apresentar
inclinação positiva ou negativa com relação à evolução da produtividade, determinando
as condições de estabilidade dinâmica do regime de crescimento.

Vários casos teóricos representando diferentes configurações tanto para os


regimes de produtividade quanto para os regimes de demanda são possíveis e foram
apresentados em diversos trabalhos por BOYER (1988, 1992, 1995 e 1998).92 Os
Quadros 4 e 5 exibem a tipologia desses regimes proposta por esse autor.

QUADRO 5 QUATRO CASOS TEÓRICOS PARA OS REGIMES DE DEMANDA

REGIMES DE
TIPO
DEMANDA TIPO TIPO TIPO
CLÁSSICO CLÁSSICO FORDISTA FORDISTA
PURO HÍBRIDO PURO HÍBRIDO

CARACTERÍSTICAS
Impulsão pelos Impulsão pela Impulsão pela Impulsão pelos
PADRÃO DO lucros demanda demanda lucros
INVESTIMENTO (profit-led) (demand-led) (demand-led) (profit-led)
Determinação Determinação Determinação Determinação
FORMAÇÃO DOS concorrencial concorrencial não- não-
SALÁRIOS concorrencial concorrencial
(c/ indexação (c/ sobre-
limitada à indexação à
produtividade) produtividade)

COMPORTAMENTO Crescente com Decrescente com Crescente com Decrescente com


DA DEMANDA a produtividade a produtividade a produtividade a produtividade

Os ganhos de O crescimento da O crescimento da O crescimento da


EFEITOS MACRO- PR promovem PR ocorre às PR eleva W e PR reduz os
ECONÔMICOS os lucros e estes, expensas de N, então C, que lucros,
oI levando à queda impulsiona I e N desestimulando I,
de W, de C e de I reduzindo N e C

FONTE: Elaborado a partir da classificação proposta por BOYER (1988, 1992, 1995 e 1998).

92
Além das obras dos próprios proponentes da abordagem regulacionista, uma síntese dos regimes de
produtividade e de demanda característicos do fordismo e dos vigentes sob regulação concorrencial,
podem ser encontrados em BRUNO (1997).
Em recente trabalho, PETIT (2003) propõe uma taxionomia alternativa (Quadros
6 e 7). Pode-se tipificar um regime de produtividade investigando se o processo de
inovação intrafirma é predominante na dinâmica dos ganhos de produtividade.
Inversamente, considerando-se a formação da demanda, é importante qualificar um
regime de demanda para saber se a economia é especialmente price ou non price
competitive ou se a demanda é impulsionada pelas exportações ( export-led demand )
ou ainda se os lucros são o principal beneficiário na alocação dos ganhos de
produtividade. Todas as variantes de um regime de produtividade e de demanda podem
ser expressas em termos de elasticidades. Mas sua caracterização precisa exige a
investigação das mudanças institucionais que veiculam as macro-regularidades que tais
regimes expressam geográfica e historicamente.

PETIT observa que ao traduzir o esquema de causalidade cumulativa descrito


por KALDOR, a noção de regime de crescimento como articulação entre um regime de
produtividade e um regime de demanda apresenta ainda características adicionais como:

a) o esquema mostra-se bastante geral em uma perspectiva dinâmica;

b) é menos estático do que as tradicionais curvas de oferta e de demanda; e

c) permite desenvolver a questão da validade de um regime de acumulação quando


se está numa trajetória de estabilidade ou em um período de transição ou de
crise.

QUADRO 6 UMA TAXIONOMIA ALTERNATIVA PARA OS REGIMES DE


PRODUTIVIDADE

REGIMES DE PRODUTIVIDADE:
QUANTO À ORIGEM DOS GANHOS DE PRODUTIVIDADE

INTRA-FIRMAS INTER-FIRMAS

INOVAÇÃO DE PR1 PR3


PRODUTO

INOVAÇÃO DE PR4
PR2
PROCESSO

FONTE: Adaptação a partir de PETIT (2003)


QUADRO 7 UMA TAXIONOMIA ALTERNATIVA PARA OS REGIMES DE DEMDANDA

REGIMES DE DEMANDA:
QUANTO AOS FATORES DE IMPULSÃO DA DEMANDA

INTRA-FIRMAS INTER-FIRMAS

WAGE-DRIVEN DR1 DR3

PROFIT-DRIVEN DR2 DR4

EXPORT
COMPETITIVENESS- DR5 DR6
DRIVEN

PUBLIC BUDGET
DR7 DR8
NEEDS-DRIVEN

FONTE: Adaptação a partir de PETIT (2003) e com a inclusão das modalidades export competitiveness-
driven e public budge needs-driven .
Os regimes de crescimento ou de acumulação emergem como resultado das
interações dinâmicas desses dois conjuntos. Algumas combinações podem se revelar
superiores em termos de ganhos de produtividade. O regime de crescimento fordista
associava inovação de processos intra-firmas (PR2) com um regime de demanda
impulsionado pelos salários, mas com crescimento indiferenciado destes últimos (DR1)

Há indícios de que na última década um regime de produtividade mais orientado


para a inovação de produto e a cooperação inter-firmas (PR3) parece se afirmar. Este
tipo de regime de produtividade é suposto interagir com um regime de demanda profit-
led (e com lucro diferenciado, se se considera que a expansão do capital financeiro
internacional tem efeito discriminatório sobre os salários (DR4). Em conseqüência,
observa PETIT (2003, p. 4):

Thus a candidate to replace the fordist growth regime (PR2, DR1)


would be (PR3, DR4). But this alternative remains to be qualified;
countries do not follow the same post fordist trajectories, is only because
internationalization of the economies has increased and also because
productivity and demand regimes are presenting themselves to external
competition (or collaboration) in a new manner (be it in generating
innovative products by means of international collaboration or
allocating capital by means of international financial places). It suggest
that present phase of internalization is forcing a greater variety of
capitalism (even if this variety was quite sizeable with fordism).
2.7 Os modos de desenvolvimento e os períodos de regime e de crise
O modo de desenvolvimento é um conceito-síntese que visa expressar o
resultado de longo prazo da associação entre um modo de regulação e um regime de
acumulação. Todavia, o modo de regulação e o regime de crescimento são estruturas
dinamicamente interdependentes. A regulação comanda o processo de crescimento e ao
mesmo tempo apresenta-se como instância sobredeterminada por este último.

As figuras 6 e 7 ilustram os vínculos da regulação com as formas institucionais,


o paradigma tecnológico-industrial, o regime de crescimento e o modo de
desenvolvimento resultante.

FIGURA 6 AS FORMAS INSTITUCIONAIS INTERAGEM COM O MODO DE


DESENVOLVIMENTO
4

1 2 Regime de
Formas Institucionais Modo de Regulação
Crescimento

Modo de Desenvolvimento

FONTE: Adaptação a partir de BILLAUDOT (2000).

Conforme BILLAUDOT (2001), a flecha (1) expressa o modo de regulação


como instância determinada pela conjunção das formas institucionais. A relação simples
de causa e efeito da regulação sobre o crescimento é representada pela flecha (2). Mas
esta relação se explicita diferentemente segundo a natureza do período analisado. Em
período de regime, fase de estabilidade do modo de regulação, este último pilota o
regime de crescimento. Mas em período de crise, a desestabilização da configuração
vigente das formas institucionais, e então do modo de regulação que lhe corresponde,
conduz a perda de coerência macrodinâmica e à instabilidade do crescimento. A flecha
(3) representa a retroação segundo a qual o crescimento sobredetermina a regulação.
Sob um modo de regulação estabilizado, os agentes tendem a se conformar às estruturas
vigentes, conservando os mesmos comportamentos através das regularidades do
crescimento que respondem pela coerência macroeconômica do conjunto do sistema
social. Inversamente ocorre quando essas regularidades desaparecem e induzem os
agentes a abandonar as rotinas passadas e a questionar as estruturas que suportavam a
regulação e o regime de crescimento. Neste contexto, a ausência de uma configuração
institucional global estabilizada desencadeia uma grande variabilidade dos prazos de
ajustamento e dos graus de indexação das variáveis macroeconômicas que veiculam o
processo de acumulação de capital.

Observa ainda BILLAUDOT, que não há retroação direta da regulação sobre as


formas institucionais, mas uma retroação global do modo de desenvolvimento sobre
estas últimas, representada pela flecha (4). O pressuposto é o de que as formas
institucionais comandam o desenvolvimento mas são sobredeterminadas por este. Isto
significa que o estabelecimento de um modo de desenvolvimento contribui para a
estabilização das formas institucionais que o veiculam, enquanto que sua entrada em
crise provoca ou acelera o esgotamento total ou parcial da configuração institucional
vigente.93

Conseqüentemente, um princípio de transformação endógena deriva do próprio


conteúdo do conceito de modo de regulação, entrando em ação toda vez que interagem
agentes e estruturas na história viva dos homens. Portanto, crescimento e crise se
alternam na macrodinâmica da acumulação capitalista, mas não se pode afirmar, a
priori, que o sistema sócio-econômico será sempre bem-sucedido em encontrar
trajetórias sustentáveis de expansão do nível de atividade econômica. Pode acontecer
que uma nova forma de regulação simplesmente não seja mais possível nos quadros das
mesmas relações fundamentais de produção e de distribuição, caso em que a análise se
defrontaria com uma crise geral ou final de um determinado modo de produção.94

93 Segundo BILLAUDOT(2000, p. 78), s appliquant à chaque économie nationale, cette conjecture


illustre le propos générale des historiens de l École des Annales pour qui chaque pays a la conjoncture et
les crises de sa structure .
94
Correspondente ao tipo de crise definida na teoria econômica marxiana que conduz à emergência
histórica de novas relações sociais de produção e de distribuição. Por exemplo, a crise do modo de
produção feudal e sua transição para o sistema capitalista.
FIGURA 7 O MODO DE DESENVOLVIMENTO COMO UM RESULTADO DE LONGO
PRAZO DA ASSOCIAÇÃO ENTRE UM MODO DE REGULAÇÃO E UM REGIME DE
ACUMULAÇÃO

Modo de Desenvolvimento
(Um padrão de evolução macrodinâmica no longo prazo)

Regime de Crescimento ou de Acumulação


(Nível macroeconômico de análise)

Modo de Regulação
(Nível meso-econômico de análise)

RMF FE

WLN

FII FC

Paradigma Tecnológico-Industrial
(Nível microeconômico de análise)

FONTE: Inspirada em Robert DELORME (1991).


NOTA: RMF = Regime monetário-financeiro; WLN = Wage-labor nexus; FE = Forma do Estado;
FII = Forma de Inserção no Regime Internacional; FC = Forma da concorrência.
2.8 Uma macroeconomia histórica e institucionalista: método e princípios de
análise

Historiciser l analyse économique et élaborer une


macroéconomie institutionnelle, tel pourrait être
l objectif que caractériseraient le mieux les
régulationnistes ».
(R. Boyer e Yves Saillard. Théorie de la
régulation: l état des savoirs, 2002)
Um dos aportes fundamentais da Teoria da Regulação consiste no
reconhecimento de que o processo de acumulação de capital é canalizado por uma rede
de relações sociais e políticas que respondem pelas regularidades macroeconômicas
observadas. Em conseqüência, a dinâmica macroeconômica não está submetida a
nenhuma lei geral, pois as macro-regularidades são funções de regulações parciais
induzidas pelas formas institucionais e, enquanto tais, permanecem vulneráveis à ação
da história. Como observa BILLAUDOT (1995), o modo de regulação descreve a forma
rotineira através da qual se opera o ajustamento recíproco do conjunto de decisões
descentralizadas dos agentes individuais e coletivos. Conseqüentemente, para BOYER
(1986), este conceito visa substituir a teoria da decisão individual e o conceito de
equilíbrio geral como ponto de partida para o estudo dos fenômenos macroeconômicos.

Nas análises em termos de regulação, os comportamentos dos agentes


elementares não possuem uma racionalidade a priori, de tipo individualista, como nos
modelos de equilíbrio da tradição teórica neoclássica. Nesses modelos a questão da
agregação é o problema básico, sendo contornado pela hipótese do agente
representativo. Em uma abordagem regulacionista, os problemas encontrados são
diferentes. Os comportamentos são orientados por uma racionalidade a posteriori que
depende das formas sociais forjadas pela interação agente-estrutura com sua
historicidade imanente, pois permanentemente reposta por seu conteúdo transformador e
criador de novos contextos e práticas comportamentais. Em conseqüência, os
procedimentos de coordenação observados nas economias reais ultrapassam
efetivamente a esfera mercantil. Eles envolvem o agenciamento de um conjunto de
instituições, regras, convenções e práticas coletivas que criam macro-regularidades e a
previsibilidade necessária à reprodução sócio-econômica. No entanto, tal conjunto não é
jamais uma derivação lógica de mecanismos de mercado ou de motivações puramente
econômicas. Em outros termos, práticas coletivas e demais procedimentos sociais que
permitem às economias alcançarem configurações macrodinamicamente estáveis não
podem ser inferidas por simples dedução da racionalidade individual otimizadora. A
razão para isto decorre do fato de que tais procedimentos dependem não só de
propriedades derivadas dos comportamentos individuais, mas de propriedades que se
originam das relações entre os diversos agentes econômicos.

Conseqüentemente, enquanto resultado da conjunção complexa de


racionalidades parciais através de uma rede densa de estruturas organizativas que
implicam vários fatores de mediação (leis, instituições, organizações, rotinas,
convenções, habitus), a macroeconomia nunca se apresenta como um fenômeno
resultante de variáveis puramente econômicas. As macro-regularidades derivam de
práticas sociais moldadas e reprodutíveis pelas formas institucionais que suportam o
processo de acumulação de capital. Uma comparação da teoria da regulação com a
teoria econômica tradicional esclarece os aspectos que as distinguem nos planos
analítico e metodológico (Quadro 8).

QUADRO 8 - TEORIA DO EQUILÍBRIO GERAL E TEORIA DA REGULAÇÃO: UMA


COMPARAÇÃO

TEORIA DO EQUILÍBRIO GERAL TEORIA DA REGULAÇÃO

1) A compatibilidade dos comportamentos dos 1) A compatibilidade de um conjunto de


agentes econômicos através de mercados instituições e organizações e dos
competitivos é possível: existência de um comportamentos que elas induzem é possível:
equilíbrio coerência de um modo de regulação

2) Idealmente, um único desses estados deveria 2) Uma variedade de formas de regulação é


ser possível:unicidade do equilíbrio possível e observada: diversidade dos modos de
regulação

3) As forças do mercado invariavelmente 3) As forças postas em movimento pelas


conduzem ao estado de compatibilidade: instituições conduzem à desestabilização do
estabilidade do equilíbrio modo de regulação: recorrência das crises
estruturais
4) Pivô da análise: busca dos preços de 4) Pivô da análise: apreensão das condições
equilíbrio, que dependem das preferências e das estruturais de compatibilidade dinâmica entre
técnicas produção e demanda agregada
5) As relações econômicas são governadas por 5) As relações econômicas se constituem e se
princípios trans-históricos, válidos quaisquer que reproduzem mediante configurações estruturais
sejam as configurações estruturais vigentes que são geográfica e historicamente
determinadas

FONTE: Extensão a partir de BOYER (1991), incluindo-se os itens 4 e 5.


Um modo de regulação é, portanto um processo baseado em estruturas
institucionais, normativas e convencionais que permitem coordenar os comportamentos
individuais e coletivos, estabelecendo as macro-regularidades econômicas que
reproduzem as condições de produção e de demanda. Em conseqüência, como observa
AGLIETTA (1997, p. 413), a problemática das análises regulacionistas é
essencialmente macroeconômica: apreender o funcionamento do sistema global de
forma compatível com uma representação do comportamento individual que não se
restrinja ao cálculo otimizador.

Em seu processo de desenvolvimento, as abordagens regulacionistas são


obrigadas a confrontar três principais paradoxos que desafiam as análises
macroeconômicas contemporâneas (BOYER, 1990, p. 59):

Por que e como, numa formação econômica dada, passamos de um


crescimento forte e regular para uma quase estagnação e uma instabilidade
das seqüências conjunturais ?

Durante um mesmo momento histórico, como explicar que crescimento e


crise assumam formas nacionais significativamente diferentes, com o
aprofundamento dos desequilíbrios em certos países e afirmação de uma
relativa prosperidade em outros ?

Finalmente, por que, apesar de certas invariantes gerais, as crises


apresentam aspectos diferenciados ao longo do tempo; por exemplo, no
século XIX, no entre-guerras e nos dias de hoje?

Partindo-se da hipótese de que um mesmo modo de produção reproduz-se na


história longa através da combinação de diferentes modos de regulação e de regimes de
acumulação, a abordagem regulacionista lança as bases metodológicas e os
fundamentos teóricos para uma macroeconomia histórica e institucionalista. O conceito
de regulação responde então a uma dupla necessidade: construir um nível teórico de
mediação entre os níveis micro e macroeconômico de análise e possibilitar a apreensão
das particularidades macrodinâmicas de uma determinada economia nacional no tempo
e no espaço, pois como já havia observado BRAUDEL, cada economia tem a
conjuntura e as crises de sua estrutura.

No processo de apreensão das características específicas de cada economia


particular, a análise deve superar as limitações impostas pela axiomática do equilíbrio
geral walrasiano, expressão teórica de um mundo hipotético homogêneo e harmonioso,
onde não há espaço para rupturas ou crises. As instituições, regras, convenções que
compõem a forma da regulação global não são introduzidas ex post no modelo teórico.
Elas integram a própria estrutura conceitual de base, proporcionando uma visão
particularmente rica do modo como a conjunção de fatores considerados extra-
econômicos com variáveis econômicas, determina os padrões de crescimento e
acumulação nas economias realmente existentes. Como observa BERTRAND (1995, p.
127):

(...) il n y a pas seulement dans cette approche endogénéisation


économique de formes sociales , mais également edogénéisation sociale
d un modèle économique.
Uma metodologia adequada requer a utilização de análises institucionalistas,
testes econométricos, bem como o recurso a comparações internacionais. Neste
contexto, pode-se superar a concepção arbitrária e irrealista que promove a existência de
uma instância social de um lado e o funcionamento de um suposto nível de análise
puramente econômico de outro.

2.8.1 Agentes e estruturas em interação: a racionalidade situada ou contextual


Segundo BILLADOT (2000), a metodologia regulacionista mobiliza um
estruturalismo aberto no sentido de que a abordagem busca integrar as duas concepções
extremas, tradicionalmente utilizadas em economia: o individualismo e o holismo
metodológicos. Na denominação proposta por BOYER (1992), tratar-se-ía de um
método holindividualista, termo que procura expressar a complementaridade, no plano
das análises, entre esses métodos. Como será visto a seguir, o conteúdo da noção de
regulação valida essa articulação metodológica e ao mesmo tempo é sancionado por esta
opção de síntese.

A ciência econômica normal adota um método individualista para o estudo dos


homens em sociedade. Postula-se que as propriedades do sistema (ou das estruturas) são
derivações lógicas e necessárias das propriedades de suas partes componentes. Os
comportamentos individuais criariam práticas e rotinas que se transferem ao plano
coletivo quase automaticamente, pois além das relações puramente mercantis como
fator primordial de coordenação, não há nenhuma estrutura mediadora que permita a
passagem das micro às macro-regularidades.95

Para a Teoria de Regulação cada sociedade é constituída de estruturas


diferenciadas e articuladas entre si, onde cada uma dessas estruturas é determinada por
uma conjunção de regras dotada de uma certa coerência. Cada tipo de sociedade é
caracterizado por um conjunto de estruturas fundamentais qualificadas de instituições
(BILLAUDOT, 2000 ).

O método estruturalista fechado ou holista promove um determinismo


unilateral. Na prática trata-se de suprimir os sistemas de interação convertendo-os em
simples sistemas de papéis (BOUDON, 1979) que serão ocupados por indivíduos ou
agentes que necessariamente se adequarão às imposições, por vezes inescapáveis das
estruturas e organizações. Em suas versões mais extremistas, o holismo metodológico
termina por abolir as interações dialéticas entre agentes e estruturas, instaurando um
determinismo mecanicista que reduz os homens a joguetes de forças produtivas que se
impõem com o mesmo estatuto das leis físicas. Ao suprimir-se o espaço para a ação
criadora e transformadora dos homens, suprime-se portanto, o conteúdo histórico-
dialético da dimensão humana na sociedade. Em conseqüência, a emergência de novas
estruturas e formas de organização tem sua origem completamente independente da
ação humana ou então é influenciada por esta última mas de uma maneira inteiramente
mecânica e inconsciente.

O estruturalismo aberto ou o holindividualismo proposto pelas análises em


termos de regulação reconhece a ação humana transformadora das estruturas e

95
Na construção dos modelos macroeconômicos, a hipótese do agente representativo, cuja origem pode
ser encontrada em Alfred Marshall, é mobilizada para contornar o problema da agregação. Mas, como
observa B. GUERRIEN(2000), o resultado é que a economia é reduzida a um número muito restrito de
centros de decisão, onde em geral são analisadas as interações em um quadro de equilíbrio geral. Para
GUERRIAN, o agente representativo seria de fato uma entidade coletiva , o que poderia ser interpretado
como uma violação da metodologia individualista, cara à tradição neoclássica e suas derivações
contemporâneas. Para A. VERCELLI (1991, p.235), o principal resultado obtido pelos economistas novos
clássicos é a demonstração - contra seus desejos e expectativas - de que uma síntese satisfatória da
macroeconomia com a microeconomia ainda não está madura. VERCELLI observa que as a matter of
fact, the micro-foundations of macroeconomics which they suggest are by now far from satisfactory. They
rely on the heroic assumption that the decision-makers of the models are representative agents, whose
behavior fairly well approximates the aggregate behavior of the economy. Unfortunately this assumption
surreptitiously eliminates the main object that should be studied by macroeconomics: aggregation
problems and failures of coordination between the behavior of individuals( os grifos são nossos).
processos. Os agentes têm a capacidade de mudar as regras do jogo, de transformar as
estruturas e de criar novas instituições. Observa BILLAUDOT (2002, p. 135):

En structuralisme ouvert, on dote les individus et les groupes sociaux


d une capacité de changer les formes des institutions en place et même
de créer de nouvelles institutions : le changement social est alors conçu
comme une évolution historique irréversible qui s effectue par
recomposition. Les sociologues parlent à ce propos de structuralisme du
sujet (BALIBAR, 1997). Les structures ont une efficacité, mais elles
n enferment pas l individu dans la tenue de rôles d une pièce déjà
écrite ; il a le statut de sujet. ( ) l analyse de cette interaction entre
structures et pratiques montrera que cette évolution institutionnelle ne
relève pas d une sélection naturelle comme le propose Darwin pour les
espèces naturelles, même si cette évolution est tout aussi imprédictible.
En ce sens précis, les régulationnistes ne sont pas des évolutionnistes. »
O método hol-individualista permite superar o dilema agente-estrutura situando-
o tanto no centro dos processos de socialização que estabilizam um determinado modo
de regulação quanto na base dos processos de transformação estrutural que
reconfiguram as formas institucionais. Em períodos de regime, quando as formas
institucionais canalizam as práticas dos indivíduos e dos grupos, estes últimos se
conformam às regras do jogo e às estruturas organizacionais vigentes. Mas na história
longa, forças endógenas originárias da própria dinâmica da acumulação de capital
tendem a minar as bases dos compromissos institucionalizados e um período de crise
emerge. Neste momento, os agentes investem contra as estruturas que, de suporte das
micro e das macro-regularidades que veiculavam o período de expansão precedente,
convertem-se agora em fatores de rigidez e de perda de coerência macroeconômica do
conjunto do sistema (Figura 8).

Tal problemática está no cerne do fenômeno macroeconômico porque se trata de


compreender o resultado a nível agregado, das múltiplas interações e decisões tomadas
de forma descentralizada pelos indivíduos e grupos em um ambiente marcado pela
incerteza radical. Como observa BOYER (2003, p.7), num tal contexto, a análise
estatística e econométrica, bem como a modelização macroeconômica simples devem
ser mobilizadas para examinar se a conjunção de um conjunto de compromissos
institucionalizados, por definição, locais e parciais, impulsiona efetivamente os
processos de ajustamentos que asseguram a estabilidade dinâmica da acumulação de
capital.
FIGURA 8 - TRÊS VISÕES (ONTOLOGIAS) DA VIDA DOS HOMENS EM SOCIEDADE
CONDUZEM A TRÊS METODOLOGIAS DIFERENTES

1. A visão individualista (individualismo metodológico)

fazem a sociedade (as


Os indivíduos (suas estruturas, as
predisposições naturais) organizações)

2. A visão estruturalista fechada (holismo metodológico)

As estruturas determinam os comportamentos


(a sociedade) dos indivíduos

3. A visão estruturalista aberta (holindividualismo metodológico)

canalizam,
conformam (nos períodos de as práticas dos
As estruturas indivíduos e dos
estabilidade da regulação)
grupos

transformam (na história e


nos períodos de crise
estrutural)

FONTE: Adaptação a partir de BOYER (1992) e de BILLAUDOT (2000).

Trata-se de uma macroeconomia do crescimento e das crises econômicas onde o


binômio agente-estrutura é apreendido como base para uma reconsideração das formas
sociais (instituições, convenções, regras, etc.) enquanto fatores indissociáveis dos
comportamentos econômicos concretos. O conceito de racionalidade adequado ao
desenvolvimento desta problemática é o de racionalidade contextual ou situada.
Como observa BILLAUDOT(2000, p. 186):

En incertitude radicale, c est d une rationalité procédurale forte dont il


s agit. D entrée de jeu l individu doit s en remettre à des conventions
pour trouver une solution au problème qu il se pose: que faire pour agir
dans mon propre intérêt ? Chacune d elles « n est pas autre chose
qu une régularité de comportement commune à un ensemble d agents
confrontés au même problème d anticipation »(Orléan, 1994). Ces
conventions donnent réponse à la question de savoir comment faire, en
évitant de se poser la question de savoir pourquoi faire comme cela.
Ainsi « ces conventions permettent aux personnes impliquées dans une
activité donnée de trouver une solution praticable à l incertitude. Elles
permettent d engendrer, dans le cours de la situation, des attentes
réciproques sur les compétences et les comportements des autres »
(Salais, 1994). Ces conventions changent d un mode de production à
l autre et, plus généralement, d une cité à l autre (Boltanski, Thévenot,
1987). L individu est ainsi doté d une rationalité située »
Não é por ser racional (no sentido do homo oeconomicus) que o indivíduo adota
as convenções do mundo no qual se encontra. Mas é seguindo essas convenções comuns
que ele se mostra racionalmente situado, a ação irracional seria não adotá-las. A
abordagem regulacionista considera que , na sociedade moderna, os habitus são ou se
tornam racionais. Isto implica que a racionalidade situada apresenta-se como
(BILLAUDOT):

uma racionalidade que é também individual como a racionalidade


substantiva do homo oeconomicus, mas não é nem individualista nem
natural;

uma racionalidade que não é monista; todos os indivíduos orientam-se por


seu interesse próprio, para ganhar dinheiro(para dispor de uma renda para
consumir), mas não são todos que possuem a intencionalidade burguesa que
tem na busca do enriquecimento privado o interesse principal. Este conceito
de racionalidade deixa espaço para uma pluralidade de projetos e de
interesses que não se reduzem à lógica do lucro privado ou da maximização
da utilidade do consumidor;

as formas das relações sociais de ordem econômica respondem a necessidade


de superar a incerteza radical na qual se encontram os indivíduos quando se
posicionam em algumas dessas relações. O sistema de regras vigente que
caracteriza cada uma das relações sociais, tem uma dupla propriedade:
orientar os agentes sobre o que lhes convém fazer na posição social que
ocupam, agindo em seu próprio interesse e de produzir sob formas renovadas
a representação deste interesse;

A racionalidade é situada ou contextual quando três condições estão presentes:

a) o comportamento do agente pode ser apreendido como estratégico ou


relacional, porque está inscrito em interação com outras práticas projetadas
para o futuro. Segundo ORLÉAN (1994), a racionalidade situada integra as
preocupações de coordenação entre estratégias;96

b) O comportamento racional se explica em razão do contexto no qual se


desenvolve. Este contexto se caracteriza por possuir um certo capital
cognitivo comum aos agentes que interagem, sob a forma de uma
comunidade de experiências, que pode-se acrescentar pressupõe um
nível suficiente de informações socialmente compartilhadas como
pressuposto da própria vida em sociedade. Portanto, não pode existir ação e
relação sem um quadro referencial comum, sem convenções constitutivas e,
mais amplamente, sem estruturas organizacionais e institucionais;97

c) Este quadro comum constitutivo da racionalidade situada está ligado à


emergência de atores coletivos, de estruturas coletivas de representação e
de decisão, de onde os agentes se servem para se coordenar, quando eles o
reconhecem sob uma certa legitimidade; sem no entanto, fazer desaparecer
98
os «interesses egoístas, locais, dos atores concernentes.

96
BILLADOT (2000) faz questão de ressaltar que com esta primeira condição, não existe mais lugar a
atribuir a um Robinson Crusoé, símbolo do homo oeconomicus racional e mascote do pensamento
econômico neoclássico individualista.
97
BILLAUDOT observa ainda, que esta segunda componente da racionalidade situada provém do homo
sociologicus. Mas quanto a mudança de vocabulário, ele argumenta que ela tem por objetivo mostrar que
não se trata de pura e simples conservação, uma vez que não se trata de normas mas de convenções. As
primeiras são imperativas e reportam-se a uma relação baseada no passado. Por outro lado, as convenções
permitem aos personagens implicados em uma atividade dada, escolher uma solução praticável face à
incerteza e, portanto, nova. Elas permitem engendrar, no curso da situação, as expectativas recíprocas
sobre as capacidades e comportamentos dos outros agentes.
98
Um exemplo característico são as chamadas redes sociais . As federações (e confederações) sindicais
são um bom exemplo. São os agentes organizados, distintos dos outros tipos comuns que são a empresa, a
administração e a família.
QUADRO 9 A RACIONALIDADE SITUADA É DE NATUREZA PROCEDIMENTAL FORTE

Tipos de
Racionalidade
Homo oeconomicus Homo conventionnalicus Homo regulationicus

Características
Origem da Histórica e
Natural Evolucionária
predisposição institucional

Natureza do Utilitarista (objetivo Não utilitarista Não utilitarista


interesse próprio único) variável de um pluralidade de projetos
mundo a outro numa mesma sociedade
e mudança histórica dos
mesmos
Caráter do Egoísta (não Não egoísta (o interesse Não egoísta (o
interesse cooperativo) próprio não exclui o interesse próprio não
interesse do outro) exclui o interesse do
outro)

Expressão da Substantiva Procedimental forte Procedimental


racionalidade forte

FONTE: Adaptação a partir de BILLAUDOT (2000).

Definida com base nas três condições acima, a racionalidade situada é de


natureza procedimental99, visto que se refere a uma forma de proceder que está
necessariamente referenciada em estruturas, organizações, convenções e instituições
específicas. Desenvolve-se portanto, em interações dialéticas com o meio ambiente,
transformando-o e sendo por ele transformada e permanentemente informada (BRUNO,
1997). Como argumenta BOYER [1995, p63 e 64]:

« Par rapport au néoclassicisme fondamentaliste, c est d abord


remplacer l équilibre statique par l analyse des processus dynamiques
de résorption des déséquilibres qu engendre en permanence
l accumulation, ensuite insérer les marchés dans une série de dispositifs
institutionnels socialisant aussi bien l information que les
comportements, enfin, c est restreindre la rationalité des agents aux
informations et capacités cognitives dont ils disposent vraiment, bref
adopter une rationalité située, éclairée par un réseau dense
d institutions.
Os problemas de agregação e de falhas de coordenação, que conferem à
Macroeconomia o seu estatuto teórico, podem então ser trabalhados a partir da estrutura
conceitual regulacionista. Os comportamentos e as regras mudam com as institucionais
e formas organizacionais, de maneira que a um modo de regulação estabilizado segue-se
99
Ou seja, envolve um conjunto de procedimentos desenvolvidos pelos agentes pertinentes.
um efeito de retorno das regularidades macroeconômicas sobre a formação das rotinas
(ou modos de gestão) microeconômicas. O Quadro 9 reúne as diferenças entre três tipos
básicos de racionalidade mobilizados em economia.

A Figura 9 procura representar a metodologia holindividualista proposta pela


Teoria da Regulação. As interações agente-estrutura surgem como a base da
estabilidade, mas também da transformação de um modo de regulação. As formas
institucionais incorrendo em mutações muito lentas, não chegam a afetar as
características principais do modo de regulação e do regime de crescimento vigentes.
São mudanças incrementais (caso A) que resultam das tensões suscitadas pelo próprio
funcionamento do modo de regulação. Sendo autocorrigíveis por alterações
incrementais nas formas institucionais, essas crises não põem em causa as macro-
regularidades que definem o regime de acumulação estabelecido. Tais mutações
respondem pelas chamadas pequenas crises ou crises na regulação. Do ponto de vista
estatístico, apresentam-se por vezes sob a forma de uma dinâmica cíclica, alternando
recessões curtas com fases de expansão do nível de atividade econômica.

Há todavia, a possibilidade de uma transformação profunda das estruturas que


suportam a regulação e o respectivo regime de acumulação. As mudanças radicais (caso
B) ocorrem a partir da emergência das grandes crises ou crises estruturais, quando os
agentes passam a questionar as regras e as estruturas institucionais estabelecidas. Os
períodos de crise estrutural são também, momentos de intensa criação social, porquanto
suscitam as inovações técnica, organizacional e institucional que podem recompor as
condições de retomada do crescimento, sob as bases de um novo regime de acumulação.

Em suma, nos períodos de regime, o sistema vigente de formas institucionais


determina as práticas convencionadas, definidoras do modo de regulação em curso. Há
predominância das práticas rotineiras e imitativas. Contudo, nos períodos de crise, as
práticas dominantes são as inovadoras e diferenciadoras, na medida em que rompem
com os padrões ou normas antes reconhecidos como socialmente satisfatórios para os
agentes pertinentes. Os comportamentos inovadores e diferenciadores são portadores de
mudanças conjuntas das condições de produção (produtos e processos) e das condições
de vida dos próprios agentes sociais. A partir deste momento, as formas institucionais
vigentes entram em um processo de desgaste irreversível e, por fim, são substituídas por
outras que expressam a codificação de novas práticas, convenções e instituições, no seio
de um novo modo de regulação.

FIGURA 9 AS INTERAÇÕES AGENTE-ESTRUTURA : BASE DA ESTABILIDADE E DA


TRANSFORMAÇÃO DE UM MODO DE REGULAÇÃO

MODO DE
DESENVOLVIMENTO

FORMAS COMPORTAMENTO
INSTITUCIONAIS DOS GRUPOS E DOS
(A) INDIVÍDUOS

TENSÕES
(sob influência das
PEQUENAS CRISES)

GRANDES CRISES

NOVAS FORMAS ENSAIOS


INSTITUCIONAIS E ERROS
(B)

FONTE: BOYER (1992).

Para a teorização macroeconômica importa então considerar que sob a ótica


regulacionista, os mercados surgem inseridos em uma série de dispositivos
institucionais que visam socializar a informação necessária à conformação dos
comportamentos individuais à lógica de conjunto. Tais dispositivos, como foi exporto
nas seções anteriores, emergem como condição necessária do funcionamento regular
dos mercados, dotando-os de densidade e eficiência. Portanto, quando há necessidade de
mecanismos de coordenação, surgem leis, jurisprudência, convenções, contratos
privados, acordos coletivos ou regras tácitas (BOYER, 1998) que não podem ser
diretamente derivados da lógica individual otimizadora. Conseqüentemente, a estrutura
institucional não é o resultado passivo (ou funcionalista) das necessidades de
coordenação macroeconômica. As relações sociais formam o sistema de valores, as
concepções e objetivos de cada agente individual, mas os agentes reagem e podem
transformar as estruturas e sistemas vigentes de regras e, portanto, suas próprias formas
codificadas de interação (BRUNO, 1997).100

Observam BOYER e ORLÉAN (1991, p. 1) que:

From methodological point of view, these concepts provide a link


between purely individualistic approaches and so-called holism. On one
hand, in the absence of any institution, the maximization principle would
be enable to deliver acceptable and realistic behavior on the part of
individual economic agents. On the other hand, it would be useless and
unrealistic to assume that collective rules totally determine individual,
especially in market economies and democratic societies, which are built
upon the strength of individuals. Therefore, elaborating a theory of
institutions might be an elegant way of overcoming both the sterility of
an extreme version of methodogical individualism and the mechanicism
of a totally funcionalist explanation in wich the relative autonomy of
each vanishes.
Conforme BRUNO (1997, p.177) pode-se identificar duas razões básicas
sustentadas pela Teoria da Regulação para superar tanto o individualismo quanto o
holismo metodológicos no âmbito das macro-análises:

a) de ordem metodológica (e ontológica) as especificidades do fenômeno


econômico vis-à-vis os fenômenos físicos e biológicos são um produto das
interações históricas entre agentes e estruturas, não autorizando as
interpretações causais mecanicistas que mascaram as diferenças
fundamentais em favor de analogias não determinantes entre o objeto
econômico e o mundo natural. Se as estruturas conformam e condicionam o
comportamento dos agentes (em período de regime), os agentes reagem e
transformam as estruturas (em período de crise). Portanto, o método
utilizado deve permitir que a teoria possa refletir a autonomia relativa dos
agentes econômicos face às estruturas sistêmicas em processo, mas
igualmente apreender as regularidades induzidas pelas mesmas sobre os

100
Observam BOYER & ORLEAN em Why are institutional transition so difficult?, Paris, CEPREMAP
nº 9139, March 1991, à página 2, que social relationships do shape the system of values, the visions and
the aims of each agent and they even provide coordinating signals. Economic behavior is embedded in a
whole social system, and no such thing as pure economic behavior exists.
comportamentos individuais.101 As mutações sistêmicas não são portanto,
automáticas, nem se encontram pré-determinadas por leis invariantes e
inescapáveis;102

b) de ordem teórica - a necessidade de se construir um nível meso-


econômico de análise ( o espaço do modo de regulação) enquanto síntese das
estratégias dos agentes em interação com as estruturas historicamente
definidas, para efetuar, no plano teórico, a passagem micro-macro sem
eliminar o principal objeto da macroeconomia que são, precisamente, os
problemas de agregação e de falhas de coordenação. O recurso aos conceitos
intermediários surge então como uma especificidade do projeto teórico
regulacionista.

Segundo BOYER (2003), a questão essencial para as análises regulacionistas


não é a da optimalidade das instituições, mas a viabilidade dos modos de regulação que
resultam de configurações particulares das formas institucionais. A contribuição
fundamental dessa abordagem consiste no reconhecimento de dois tipos de dinâmica
que impulsionam a evolução das instituições:

O próprio sucesso de um modo de regulação conduz a uma lenta alteração


dos parâmetros estruturais que definiam as regulações parciais, minando a
estabilidade dinâmica do regime de acumulação correspondente. De um
ponto de vista teórico, isto significa que mesmo na ausência de choques
exógenos, a dinâmica econômica pode mudar fundamentalmente sua
natureza;

Uma vez constatada a entrada em uma trajetória de crise estrutural aberta, as


estratégias contraditórias dos atores coletivos e individuais demandam a
utilização de instrumentos de análises diferentes dos mobilizados para os

101
Uma imagem pode ser útil para ilustrar o comportamento dos agentes face às restrições estruturais: a
existência e o próprio movimento dos rios pressupõem os limites impostos pelas margens .
102
Observa BILLAUDOT [1996, p. 142] que au plan méthodologique, c est au passage d une méthode
holiste à une méthode holindividualiste, auquel on est conduit pour traiter théoriquement de toute
trajectoire concrète de développent. Elle est holiste, dans la mesure où l on part toujours d un système
donné de formes institutionnelles. Mais elle emprunte à une méthode individualiste parce que les
individus sont, directement ou par l intermédiaire des acteurs collectifs dont ils se dotent pour les
représenter, des artisans tant de l altération des formes institutionnelles en phase de régime que de leur
mutation en phase de crise de régulation.
períodos de regime. A questão das interações com as variáveis políticas para
delimitar as condições de emergência de novos compromissos
institucionalizados passa então ao primeiro plano.

A Figura 10 ilustra essa problemática com as questões básicas das macroanálises


em termos de regulação.

FIGURA 10 QUESTÕES BÁSICAS DAS MACROANÁLISES REGULACIONISTAS

QUESTÕES
REGULACIONISTAS QUESTÕES ABERTAS
FUNDADORAS ÀS PESQUISAS ATUAIS

Problema 1 Problema 4

O impacto de um conjunto de Uma teoria geral


formas institucionais sobre o das instituições
modo de regulação e sobre
um regime de acumulação

Problema 3
Problema 2
O problema da
A dinâmica endógena: das passagem de um modo
crises cíclicas à uma crise de regulação a um outro
estrutural

FONTE: Adaptação a partir de BOYER (2003).

Conseqüentemente, a Teoria da Regulação fornece um método e uma estrutura


conceitual capaz de articular a busca por microfundamentos (não-neoclássicos) com os
impactos das instituições sobre os comportamentos individuais, no que concerne às
regularidades macroeconômicas que estas são capazes de induzir e reproduzir.103

103
Em Labour Institutions and Economic Growth [1992, p.30], Robert BOYER observa que first, this
research program tries to combine inductive and deductive methods, in other words intends to launch
bridges between the stylized facts shown by economic historians about capitalism development and the
highly abstract growth theory. Second, there is probably no grand theory able to explain synthetically the
whole set of relevant stylized facts: in my view, this is the Achilles heel of conventional economic theory,
including the more contemporary and promising ones. By contrast, the regulation approach looks for
2.8.2 Uma hipótese central: a macrodinâmica e a política econômica dependem
dos modos de regulação
Observa BILLAUDOT (1995) que a todo sistema de formas institucionais
corresponde um conjunto de relações macroeconômicas particulares, cujos parâmetros
(coeficientes ou elasticidades, impulsão autônoma) são estáveis a médio prazo. Em
conseqüência, pode-se enunciar a hipótese regulacionista básica da seguinte maneira:

o comportamento das macrovariáveis, das regularidades que podem


apresentar, é uma função dos modos de regulação e dos regimes de
acumulação vigentes em períodos históricos e regiões geográficas
determinadas e, portanto, não está submetido a nenhum modelo
macroeconômico universal, seja ele de equilíbrio geral ou não.
As funções macroeconômicas relacionam a evolução de uma determinada
variável aos níveis ou às evoluções presentes ou passadas de outras variáveis
consideradas como explicativas. Pela hipótese regulacionista básica, a configuração
vigente das formas institucionais que estruturam o modo de regulação determina um
conjunto de macro-regularidades específicas, porém, historicamente transitórias. O
objetivo deste tipo de macroanálise não é gerar novas estruturas institucionais e
organizacionais, mas derivar a dinâmica macroeconômica resultante de um dado
sistema estabilizado de formas institucionais.

Supõe-se que os agentes econômicos se conformam às regras e convenções nos


períodos de regime, na medida em que elas conduzem à evoluções consideradas
satisfatórias em seus níveis de atuação. Todavia, tendem a questioná-las
sistematicamente quando o modo de regulação tornar-se incapaz de garantir a coerência
macroeconômica necessária à estabilidade do regime de acumulação. Os modelos
construídos a partir dessas hipóteses permitem extrair as regularidades
macroeconômicas induzidas pela forma vigente de regulação e que determinaram as
trajetórias de crescimento e acumulação de capital. Como as instituições e as
organizações são o requisito da inserção da própria teoria no concreto-real, tais
regularidades constituirão o substrato para o funcionamento da política econômica.

A formação das expectativas pode então se processar segundo a norma


keynesiana onde as escolhas evoluirão no futuro como elas o fizeram no passado, a

local and period-dependent analyses of development, by proposing a set of intermediate concepts which
describe the coordination mechanisms in use for given economy and historical epoch.
menos que se tenha razões suficientes para se esperar por uma mudança . Neste
contexto, segundo BOYER(1995), três princípios de ação tem sido propostos pela
Teoria da Regulação para se analisar como o modo de regulação é capaz de canalizar e
conformar os comportamentos individuais e coletivos:

a lei, a regra ou regulamento como princípio de restrição têm caráter


coletivo e coercitivo;

o compromisso como princípio de negociação entre agentes privados ou


grupos, acordados sobre convenções específicas;

a comunidade de um sistema de valores ou de representação como um


princípio de rotina ou convenção tácita de comportamento.

Conseqüentemente, um modelo ou teoria macroeconômica não pode pretender-


se válida independentemente das formas institucionais que compõem a regulação em
curso. Isto significa recuperar a noção de historicidade forte no âmbito das
macroanálises, o que levou os regulacionistas a reconhecerem que a eficácia da política
econômica é um atributo completamente dependente das características do modo de
regulação estabelecido. Um corolário desta hipótese regulacionista básica refere-se ao
fato de que em períodos de desestabilização das formas institucionais, a política
econômica torna-se incapaz de produzir os resultados esperados pelo modelo teórico em
que se baseia. A razão fundamental para tanto é que as conexões entre as macro-
variáveis têm como substrato e suporte de suas regularidades, as estruturas
institucionais, as convenções e regras que integram um padrão determinado de
regulação. Como estrutura de mediação o modo de regulação opera a passagem dos
comportamentos microeconômicos ao nível macroeconômico ou global. Em outros
termos, as formas institucionais são o suporte das relações macroeconômicas e em
conseqüência, a validade dessas últimas restringe-se ao domínio de estabilidade das
instituições sociais em vigor. Como a configuração estável das formas institucionais é a
matriz geradora de um modelo estabilizado de regulação, o esgotamento de um modo de
regulação impulsiona o sistema sócio-econômico às zonas de instabilidade estrutural104.

104
De acordo com AGLIETTA(1997), as zonas ou regiões de instabilidade são os lugares onde os
antagonismos não são mais mediatizados pelas formas institucionais vigentes, porque o dinamismo das
rivalidades privadas supera o domínio codificado das diferenciações existentes. Em outros termos, novos
problemas e fenômenos sócio-econômicos surgem de maneira imprevista, escapando do espaço de
Uma grande crise emerge como expressão da perda de coerência macroeconômica e de
coesão social dos componentes do sistema, desencadeando um processo que, ao
transformar de maneira irreversível as formas da regulação em vigor, termina por minar
a eficácia da política econômica.

O não reconhecimento desta vinculação estrutural entre política econômica e


modo de regulação, têm levado as teorias dominantes a atribuírem as perdas de eficácia
dos modelos macroeconômicos (por exemplo, em suas versões dos anos 60 e 70, ainda
sem expectativas racionais) a problemas oriundos exclusivamente da lógica e dos
pressupostos de construção desses modelos.105

Contudo, em seus primeiros desenvolvimentos, a Teoria da Regulação de fato


reduziu o papel da política econômica, considerando-a totalmente sobredeterminada
pelo regime de acumulação estabelecido. Sua eficácia dependia inteiramente das formas
institucionais vigentes, de maneira que o Estado responderia sempre às necessidades da
acumulação em processo, por uma adaptação contínua de suas intervenções.106 Como
observa LORDON [1995, p.200]:

« Asservie par le poids des structures en régime , désorientée dans la


crise , la politique économique a décidément peu de place dans la vision
régulacionniste. »
Coube a BOYER (1986, p.53), a proposição segundo a qual se deve partir da
autonomia relativa da intervenção econômica do Estado. Para o autor:

« Selon cette conception, ne prévaut ni prédétermination stricte, ni


complète autonomie des formes d intervention étatique. »

regularidades criado pelas formas institucionais. Num tal contexto, essas mesmas regularidades
convertem-se em fatores de rigidez, dificultando a emergência e consolidação de um novo modo de
regulação.
105
A crítica de Lucas abstrai-se completamente do fato de que o sucesso das políticas keynesianas de
administração da demanda agregada pressupunha a estabilidade das estruturas institucionais e
organizacionais que codificavam o modo de regulação fordista. Não se trata de um simples problema de
formação de expectativas racionais ou do conhecimento do verdadeiro modelo da economia. Quando o
regime de crescimento que correspondia a esse modo de regulação entra em crise, ele arrasta com ele todo
o conjunto de macro-regularidades básicas que suportavam a lógica dos modelos de inspiração
keynesiana.
106
As análises com base no conceito de capitalismo monopolista de estado assentavam-se exatamente
neste pressuposto de influência ortodoxo-marxista.
Os trabalhos recentes de THÉRET (1992) e LORDON (1994) propuseram então,
a distinção entre duas formas de política econômica:107

a) a política econômica de regime: constitui uma das peças do modo de


regulação vigente. A política econômica surge, neste caso, como uma forma
suplementar de coordenação do nível macro, ao lado das cinco formas
institucionais e com o objetivo de as completar ou reforçá-la em sua inter-
articulação. Conseqüentemente, a política econômica de regime recebe como
um dado quase invariante, as formas institucionais de uma economia em
regime;

b) a política econômica de transição de regime: reconhecendo-se a autonomia


relativa das formas do Estado quando a política econômica se confronta com
a crise de um regime de acumulação, trata-se de utilizar o poder do Estado
para promover ou acelerar a mutação das outras formas institucionais no
sentido da superação da crise e da gestação de um novo regime de
acumulação que possibilite a retomada do crescimento sustentável.

Os instrumentais de política baseados no modelo IS-LM devem sua performance


bem-sucedida, nos anos 50 e 60, ao fato de expressarem - mesmo em uma interpretação
reducionista do pensamento econômico keynesiano - uma política econômica de
regime. Mas o esgotamento do regime de acumulação se superpõe à crise da política
econômica de regime e, então, as intervenções públicas baseadas na administração da
demanda agregada, progressivamente perdem sua eficácia em promover o crescimento
sustentável e em controlar as altas taxas de inflação que marcaram os anos 70 e 80. Esse
período de dificuldades para os formuladores da política keynesiana típica, termina
favorecendo um apressado e pouco fundamentado retorno às origens do pensamento
(neo)clássico liberal.108 Um movimento anti-keynesiano, liderado por economistas que

107
Conforme Fréderic LORDON [1995, p.198], Théorie de la régulation et politique économique , in
BOYER, R. & SAILLARD Y. (eds.), em Théorie de la régulation: L état des savoirs, Paris, La
Découverte.
108
Segundo LORDON [1995, p. 205], a crise da política keynesiana enquanto política econômica de
regime pareceria paradoxal, visto que ela seria ao mesmo tempo endógena e exógena. Endógena, pois as
dificuldades do paradigma keynesiano de política econômica derivaria inevitavelmente da crise do
fordismo. Mas também exógena, pois a perda da eficácia da política econômica de regime, reporta-se
grandemente a um conjunto de fatores relativamente independentes do coração do crescimento fordista:
as transformações do paradigma tecnológico, das formas da relação salarial, etc.
vão desde HAYEK à FRIEDMAN e LUCAS, parecia pretender tornar inócuos ou
mesmo um grande equívoco teórico, quase 30 anos de macroeconomia e de política
econômica keynesiana, abrindo espaço para as análises monetaristas e, em seguida,
novo clássicas.

Os regulacionistas extraem, então, três resultados teóricos fundamentais ao


desenvolvimento da macroeconomia como disciplina autônoma, cujo estatuto teórico
permanece irredutível ao da microeconomia:

a) A estabilidade das regularidades macroeconômicas de uma economia em


regime garante não apenas a qualidade de sua apreensão e de sua
instrumentalização pela política econômica, mas igualmente a homogeneidade e
a previsibilidade das reações dos agentes, em resposta aos estímulos da política
econômica;

b) A busca de uma política econômica ótima, válida em todos os tempos e lugares,


é inconsistente, pois a eficácia da política econômica vai depender crucialmente
da estrutura sobre a qual se aplica.109 AGLIETTA, ORLÉAN e OUDIZ (1981)
mostraram como a mesma política de câmbio pode produzir efeitos radicalmente
contrários, segundo o lugar na divisão internacional do trabalho e a posição
concorrencial do aparelho produtivo que a recebe;110

c) A política de curto prazo tem também efeitos de longo prazo. Por exemplo, os
regulacionistas têm advertido que é preciso considerar os obstáculos
suplementares que as políticas de deflação competitiva (que visam à
restauração dos lucros a curto e médio prazo )111 suscitarão em uma evolução

109
Pode-se considerar que, sem banco central ou instituição que o valha, a política monetária não seria
factível. Todavia, a estrutura, atribuição de poderes e formas de organização dos bancos centrais podem
variar significativamente de país para país, definindo os limites de alcance e a qualidade das intervenções
promovidas por esta instituição fundamental. Contudo, a eficácia da política dependeria não apenas da
autoridade monetária em questão, mas da própria estrutura institucional subjacente ao regime monetário-
financeiro vigente.
110
Citado por LORDON, opus cit nota 60.
111
As políticas de flexibilização das relações de trabalho, que na verdade tem conduzido a uma
desestruturação sem precedentes dos componentes centrais da relação salarial fordista, objetivam
recompor a lucratividade das empresas e pressupõem que efeitos positivos sobre a produtividade,
necessariamente ocorrerão também no longo prazo. Tais políticas são enquadradas por BOYER [1988] no
conceito de flexibilidade defensiva, que consiste em fazer jogar a concorrência sobre os mercados de
trabalho, para diferenciá-las das políticas de flexibilidade ofensiva. Estas últimas aprofundam o
movimento de institucionalização das relações salariais, porém adaptando-as às transformações dos
para um modo de desenvolvimento pós-fordista cooperativo . Segundo
LORDON(1994), como a deflação competitiva está centrada sobre o controle
dos custos, essa política prorroga uma lógica de competitividade-preço que
corresponde à mesma do modelo fordista que se pretende superar. Em
conseqüência, torna-se ainda mais difícil a gestação de uma nova lógica de
competitividade estrutural e a emergência das formas organizacionais que lhe
correspondem.

2.8.3 Análise regulacionista: uma macroeconomia do crescimento e das crises


econômicas
Enquanto processo de ajustamento recíproco entre agentes de uma economia
nacional, através de estruturas organizacionais e institucionais, a regulação a nível
macroeconômico ou global (régulation d ensemble) é composta por um conjunto de
regulações parciais. Em termos econométricos cada uma das regulações parciais se
traduz por uma relação de comando da evolução de uma variável macroeconômica pelas
evoluções de outros macroagregados, segundo modelos lineares ou não(BILLAUDOT,
2001).

Os coeficientes (elasticidades) dessas variáveis são determinados pelo ambiente


sócio-institucional onde operam os agentes econômicos. Em conseqüência, a dinâmica
macroeconômica emerge como um resultado das interações agente-estrutura através de
configurações institucionais particulares. Isto implica no reconhecimento de que o
comportamento das funções macroeconômicas depende de configurações particulares e
historicamente definidas para as cinco formas institucionais que definem os regimes de
produtividade e de demanda. Conseqüentemente, a variabilidade das dinâmicas
econômicas e sociais não pode ser explicada por modelos universais, supostamente
válidos em todos os tempos e lugares.

De um ponto de vista teórico, pode-se considerar a possibilidade de diversos


horizontes de análise (Quadro 10):

mercados e das estruturas produtivas, mas recuperando o conceito de flexibilidade sob outras dimensões e
não necessariamente ao nível do contrato de trabalho.
QUADRO 10 MACROECONOMIA REGULACIONISTA E SEUS HORIZONTES DE
ANÁLISE

HORIZONTE CARACTERÍSTICAS TIPO DE ANÁLISE

Prazo de ajustamento da Política econômica


Conjuntura produção à demanda
agregadas

Prazo de ajustamento do Dinâmica macroeconômica


Curto prazo investimento fixo bruto à de curto prazo
produção efetiva

Tempo da regulação Regimes de acumulação ou


econômica global (duração de crescimento (instável /
Médio prazo máxima da influência do estável)
passado nas diversas
regulações parciais)

Alteração dos parâmetros Transformações dos


da regulação em razão da regimes de crescimento ou
Longo prazo mudança estrutural crises estruturais
endógena a um modo de
desenvolvimento

FONTE: Adaptação a partir de BILLAUDOT (2001, p. 203)

Isto significa que se o regime de acumulação mudar, desencadeando uma


ruptura das macro-regularidades que lhe suportam, a eficácia dos instrumentais de
política econômica será problematizada, independentemente do nível de conhecimento
que os agentes possam ter acerca da estrutura da economia ou modelo vigente. De um
ponto de vista metodológico, significa também relativizar o alcance explicativo das
análises desenvolvidas em termos de leis econômicas gerais . Uma vez que não
existiriam determinações econômicas puras que possam sancionar no plano das análises
teóricas, a busca de princípios universais independentes de toda configuração sistêmica,
e considerados válidos quaisquer que sejam as relações sociais entre agentes
econômicos.

Na macroeconomia tradicional, as crises econômicas são freqüentemente


reduzidas e assimiladas às flutuações normais da atividade econômica, sendo explicadas
por fatores totalmente exógenos. De fato, o conceito de crise não tem nenhum estatuto
teórico nas teorias econômicas dominantes. Parte-se da hipótese de que o sistema é
sempre auto-regulável. Se em algum momento de sua trajetória ele se mostre
visivelmente incapaz de fazê-lo, fatores externos são responsabilizados por violarem as
pré-condições de um funcionamento equilibrado capaz de garantir uma convergência
perfeita do ótimo econômico com o ótimo social112. Postula-se portanto, a inexistência
de fatores endógenos de crise ou desequilíbrio.

Para a Teoria da Regulação, as origens das crises dos modos de desenvolvimento


e a compreensão de suas formas particulares de evolução em economias realmente
existentes é um objeto indissociável das análises dos modos de regulação e dos regimes
de crescimento. Na realidade, quando se trabalha com a noção de regulação enquanto
princípio de análise, o estatuto teórico das crises econômicas passa ao primeiro plano
das preocupações de uma macroeconomia histórica e institucionalista. Como observa
AGLIETTA (1997), enquanto produto de conflitos inerentes às relações sociais, a
regulação é sempre aberta, parcial e incompleta. Duplamente incompleta porque o
dinamismo mesmo das relações privadas contorna o campo das convenções
estabelecidas e faz surgir o afrontamento econômico direto, provocando uma
transformação das instituições. Mas também porque as instituições reguladoras são
portadoras de coerências apenas locais. Os períodos de estabilidade que caracterizam a
vigência de um determinado regime de crescimento resultam de instâncias parciais de
regulação, cujo caráter é sempre incompleto e vulnerável à ação da história.113

Em conseqüência, um regime de crescimento não exprime uma configuração


sistêmica harmônica, isto é, uma convergência de interesses e de classes que apenas
seria ameaçada por fatores externos (AGLIETTA, 1997). O conflito não é de forma
nenhuma suprimível, mas pode ser contido, atenuado temporariamente pelo modo de
regulação, dentro de limites que tornam possível a coerência macroeconômica e a
coesão social. Como observara Maurice HAURIOU, as instituições podem ser

112
Como observa BOYER [1986, p. 87], a grande maioria dos modelos neoclássicos não reconhece
nenhum estatuto teórico à noção de crise: no melhor dos casos, tenta-se caracterizar uma fase de correção
do boom anterior, com uma duração variável em função da dimensão e da imperfeição dos mecanismos
de ajustamento. Por outro lado, na maior parte do tempo, são os choques aleatórios que, ou promovem a
expansão econômica, ou precipitam uma mudança de conjuntura. Num outro extremo, algumas
intepretações marxistas, um pouco deterministas e, sem dúvida, reducionistas, consideram que as
economias capitalistas estão naturalmente submetidas aos elementos de uma crise estrutural latente e, em
seguida, aberta, que acabará provocando, com o tempo, o esgotamento do próprio modo de produção.
Entre o caso mais extravagante e a lei impiedosa de uma inevitável queda, parece sobrar espaço para
diversos níveis e definições de crise.
113
Observa AGLIETTA (1997) que a existência do Estado é a expressão política desta incompletude da
regulação sócio-econômica. Desta maneira, o Estado surge como o totalizador, a síntese das tensões
sociais que ultrapassam as formas institucionais estabelecidas.
apreendidas como um armistício social, após um período de conflitos e lutas sociais.114
Todavia, as crises devem ser apreendidas em seu caráter tendencial, pois decorrente da
lógica e natureza das economias que se organizam sob o modo capitalista de produção.

Em seu caráter mediador, o funcionamento das instituições permite apenas a


superação temporária de contradições inerentes à própria dinâmica da acumulação
capitalista. Freqüentemente ao custo da criação de novos conflitos e problemas
estruturais que, escapando da lógica da arquitetura institucional vigente, não podem ser
contidos por esta última. As instituições sociais são então transformadas
permanentemente pelas lutas de classes, abrindo o caminho para novas formas possíveis
de regulação.115

Conseqüentemente, a noção de regulação não suprime a crise, seja como


possibilidade, seja como necessidade. Como a unidade social é sempre frágil e limitada,
de um ponto de vista teórico não há garantias de que sempre e necessariamente emergirá
um novo modo de regulação apto a superar as condições endógenas de crise e
estabelecer as macro-regularidades que possam definir um novo regime de crescimento.
Sua estabilidade é estatística e tendencial, tanto que em sua representação
macroeconômica, observável pelo prisma das formas institucionais, o regime de
crescimento se manifesta pela continuidade das evoluções dos macro-agregados,
configurando um determinado padrão de crescimento e de distribuição do valor
adicionado.

Na origem e desenvolvimento das crises a Teoria da Regulação reconhece a


dinâmica conflituosa das relações sociais que desregulam, minam progressivamente as
condições de estabilidade do regime de crescimento. A renovação dos conteúdos das
lutas sociais acumulam tensões que atingem níveis insuportáveis pelo modo de
regulação. Como observa AGLIETTA, nos períodos de grande crise:

Les formas structurelles révèlent alors toute leur ambivalence; les


régularités qu elles produisaient antérieurement se muent en rigidités
qui bloquent la transformation sociale »

114
Citado por BOYER (1986), Maurice Hauriou (1856-1929) foi um jurista francês que elaborou uma
doutrina original sobre o Direito Público.
115
Conforme AGLIETTA (1997), as instituições são inovações sociais que permitem um espaço de
liberdade porque as normas e as convenções sociais que elas impõem conferem aos grupos sociais uma
restrição bem mais forte do que a imediaticidade de seus próprios conflitos.
A crise nasce no seio mesmo da regulação, de suas aporias e de seu caráter
aberto. Por exemplo, durante o período de crescimento fordista, a negociação coletiva,
que havia permitido a regularidade na progressão dos salários, se converte em
indexação rígida que tende a autonomizar o movimento das grandezas nominais,
desconectando-o das novas necessidades da acumulação de capital.

Neste contexto, a relevância das análises das crises para uma teoria
macroeconômica alternativa às visões tradicionais torna-se patente quando se parte de
uma problemática regulacionista. Pode-se compreender como a política keynesiana de
administração da demanda agregada pressupunha a existência do paradigma
tecnológico-industrial fordista e do correspondente modo de regulação administrado.
Os regimes de acumulação que emergiram no Pós-Segunda Guerra desenvolveram-se
sobre a base de configurações particulares das formas institucionais. Entre as quais
destacam-se as formas da relação salarial e do regime monetário-financeiro. Expressão
das transformações das condições de produção e de existência dos trabalhadores
assalariados, o rapport salarial fordista articulava-se com as demais formas
institucionais codificando a estrutura sócio-econômica116 necessária às macro-
regularidades que sustentavam as políticas fiscal e monetária, típicas do período.

A indexação do salário real à produtividade permitia um crescimento regular e


previsível da demanda para os bens de consumo. Isto garantia a estabilidade da
demanda efetiva, permitindo o desenvolvimento da indústria de produção de massa
como um dos eixos fundamentais desse regime de acumulação.117 Uma exploração
sistemática dos rendimentos de escala e a estabilidade da demanda permitiam uma
programação optimal dos investimentos. Os ganhos de produtividade obtidos eram
então repartidos entre trabalhadores, promovendo um processo de crescimento
cumulativo responsável pela longa expansão do período. Neste contexto, a política
econômica keynesiana funcionava como uma espécie de volante de um modo de
desenvolvimento cujo motor podia manter-se em movimento graças às
especificidades da regulação e do regime de acumulação em vigor.

116
Trata-se do conceito de estrutura social da acumulação, tal como foi definida por BOWLES,
GORDON e WEISSKOPF [1986, p.2] e que reserva uma grande convergência com os resultados das
análises em termos de regulação.
117
Mais detalhes dessa questão podem ser encontrados em JUILLARD [1995], Régimes d accumulation,
in BOYER e SAILLARD , L État des Savoirs,2002.
Quando a crise torna-se explícita nos anos 70, os regulacionistas já haviam
detectado os limites das condições sociais, técnicas e econômicas que suportavam as
estruturas de produção (o esgotamento do paradigma tecnológico-industrial fordista)118
e a incapacidade do modo de regulação vigente para acomodar os conflitos engendrados
pela própria lógica da acumulação do pós-guerra. Como argumenta BOYER (1986,
p.91), a regulação entra em crise quando os desequilíbrios locais conjugam-se e não
podem mais ser reduzidos pelos procedimentos sócio-econômicos vigentes.119

Em conseqüência, a crise do regime de acumulação fordista provocaria a perda


de eficácia da política econômica keynesiana, em sua versão neoclássica sob o modelo
IS-LM. As condições sócio-técnicas e institucionais, necessárias para garantir a
reprodutibilidade da lógica macroeconômica de um regime de acumulação intensiva
centrado no consumo de massa, haviam atingido seus limites estruturais e endógenos.

Cinco tipos de crise são definidos pelos regulacionistas e se reportam


precisamente ao lugar ocupado pelo modo de regulação e pelo regime de acumulação
em suas origens e especificidades. Essa taxionomia implicitamente pressupõe a validade
da hipótese de plasticidade estrutural do modo de produção capitalista:120

118
Esgotamento que se expressava precisamente pela incapacidade do sistema técnico vigente de gerar os
ganhos de produtividade necessários a manutenção do círculo virtuoso da acumulação fordista.
Conforme JUILLARD [1995, p. 230], le ralentissement de la productivité du travail à la fin des années
soixante, qui va jouer un rôle fondamental pour l évolution de l économie américaine dans les deux
décennies suivantes, semble toucher toutes les sections productives de la même manière. Com a queda
dos ganhos de produtividade quebrava-se um dos pilares da relação salarial fordista, que era exatamente o
crescimento regular dos salários reais proporcionalmente à elevação da produtividade aparente do
trabalho.
119
A época atual é particularmente ilustrativa dessa problemática regulacionista fundamental. Uma vez
constatada a perda de eficácia do modo de regulação fordista e, conseqüentemente, do regime de
acumulação que lhe corresponde, as economias procuram (sem nenhuma garantia prévia de êxito) o
estabelecimento de novos modos de desenvolvimento, social e economicamente viáveis.
120
Como já foi argumentado nas seções precedentes, os trabalhos de BRAUDEL confirmam a grande
capacidade de adaptação do capitalismo à situações aparentemente insuperáveis, dentro de sua própria
lógica constitutiva. Como observa BOYER [1986, p.97], trata-se de admitirmos a existência de uma certa
plasticidade das relações sociais capitalistas, suscetíveis à mudanças quanto às formas exatas, fazendo
com que, até hoje, este modo de produção possa superar uma série de crises importantes e de episódios
dramáticos, tais como as duas guerras mundiais. Parafraseando uma célebre fórmula, não é preciso que
tudo sempre mude para que nada de fundamental realmente mude ? Devemos assim concluir que o
capitalismo é insuperável ? Isto seria, teoricamente, uma conclusão exagerada, o que nos traz a
necessidade de definir um quinto e último nível de crise. BOYER refere-se à crise final de um modo de
produção, que coincide exatamente com a crise geral de que fala a teoria econômica marxista . Todavia,
em MARX a existência das crises cíclicas mais não fazem do que recompor, sobre novas bases, as
condições de novo movimento de expansão da acumulação capitalista. Portanto, tais crises são antes
fatores de reprodutibilidade do sistema.
a) a crise como perturbação externa: possui causas exógenas, sendo reportadas à
escassez resultante de catástrofes naturais ou climáticas, por circunstâncias
econômicas cujas origens encontram-se fora do espaço interno ( em particular
internacional) ou ainda por guerras. Segundo BOYER [1986, p. 88], a
particularidade deste tipo de crise é de não resultar nem do funcionamento
normal da regulação, nem do esgotamento do próprio modo de regulação ou do
regime de acumulação. A regulação vigente determina a forma assumida pela
contração da atividade e pela dinâmica dos preços e salários.121 Em certo sentido,
as economias agrário-exportadoras coloniais estavam sujeitas a este tipo de crise,
em razão de sua forte dependência dos fatores econômicos externos (demanda
internacional, preços dos produtos exportáveis, guerras e conflitos nas nações
centrais, etc);

b) as crises endógenas ou cíclicas (ou crises na regulação ): Trata-se das


pequenas crises que surgem como decorrência do próprio funcionamento do
modo de regulação e são superadas nos limites do mesmo. Portanto, a passagem
da recessão à retomada não necessita de nenhuma mudança institucional ou
alteração da política econômica. Possuem caráter cíclico e podem promover uma
aceleração da centralização e da concentração financeiras, sem , no entanto,
alterar a forma geral da concorrência. As crises industriais que marcaram a
segunda metade do século XIX são exemplos característicos;

c) as crises estruturais ou grandes crises (ou crises da regulação ) - quando as


contradições engendradas pela dinâmica da acumulação são tais que não podem
ser superadas nos limites do modo de regulação estabelecido. Os indicadores
deste tipo de crise são a incapacidade da recuperação dos lucros de maneira a
permitir uma retomada sustentada da acumulação, a destruição das formas
institucionais que antes sustentavam o modo de regulação e o regime de
acumulação, a intensificação dos conflitos sociais e políticos. Enfim, a
dissolução das regularidades e das determinações macroeconômicas anteriores.

121
Como já mencionamos nos capítulos anteriores, BOYER chama a atenção para o fato de que muitos
economistas interpretaram os acontecimentos posteriores a 1973, como sendo, essencialmente,
conseqüência de uma sucessão de aumentos dos preços de matérias-primas, de choques do petróleo , de
choques do dólar , etc.
Como exemplo, têm-se as crises de 1929/30 e a de 1968/73. Segundo BOYER
(1986), a regulação entra em crise quando os desequilíbrios locais se conjugam e
não podem mais ser reduzidos pelos procedimentos sócio-econômicos vigentes..
De um ponto de vista analítico, dois casos de crise estrutural podem ser
distinguidos:

i. a crise do modo de regulação - quando, apesar do regime de


acumulação manter-se, ao menos inicialmente, viável, os mecanismos
ligados ao modo de regulação vigente se mostram incapazes de superar
os obstáculos (endógenos) à continuidade da acumulação de capital.
Três fatores respondem pelas origens deste tipo de crise:

o surgimento de novos tipos de perturbação externa e interna


que escapam à lógica do modo de regulação vigente. Este
último se mostra então incapaz de contê-las segundo os
procedimentos sociais estabelecidos;

o desenvolvimento das lutas sócio-políticas que questionam


os compromissos institucionalizados, minando as condições
sociais de reprodutibilidade econômica do sistema;

o aprofundamento da lógica de regulação em vigor pode levar


ao esgotamento das possibilidade de crescimento e ao início
de uma crise de longo prazo;

ii. a crise do modo de desenvolvimento quando as contradições no


interior das formas institucionais atingem níveis tais que a coerência
macroeconômica do regime de acumulação é destruída. A perda de
coesão social e o desgaste das estruturas que suportavam a dinâmica do
crescimento levam então à desestabilização do modo de regulação e
então a crise do próprio regime de acumulação. Em conseqüência, o
modo de desenvolvimento como um todo entra em crise. Segundo
BOYER, este tipo de crise seria mais grave do que os precedentes, na
medida em que não se trata de um desequilíbrio parcial e pontual dos
mecanismos da regulação, mas de um bloqueio do processo de
reprodução dinâmica da economia em questão (BILLAUDOT). Por
outro lado, as dificuldades e a demora na superação da crise de um
modo de regulação pode também desencadear uma crise do regime de
acumulação;

d) a crise final de um modo de produção dominante: este tipo de crise


corresponde ao conceito de crise geral de um modo de produção. Sua
especificidade é traduzida pelo fato de que a estrutura determinante do modo
de produção não é mais capaz de reproduzir-se pela gestação de novos modos
de regulação e regimes de acumulação. Como exemplos, tem-se a crise do
feudalismo e a do modo de produção soviético. Segundo BOYER (1986, p.
98), este tipo de crise se aproxima do conceito de crise geral da teoria marxista
ortodoxa. Todavia, apresenta certas precisões e exigências que impedem que
se transforme toda crise - mesmo sendo apenas conjuntural ou cíclica na
crise final do modo de produção capitalista.

Para AGLIETTA (1997), cinco níveis de análise de uma grande crise ou crise
estrutural podem ser mobilizados:

Localização das fontes de tensões e a compreensão de seu caráter sistêmico,


insolúvel nos quadros da regulação em vigor;

Os processos indutores de crise: formas específicas dos efeitos da acumulação


das tensões no funcionamento das instituições estabelecidas;

A generalização provocada pela conexão desses processos no seio do Estado,


provoca um afrontamento político dos grupos sociais que põem em causa a
legitimidade das formas institucionais vigentes;

A polarização através das redes da circulação financeira, decorrente dos


comportamentos de defesa dos capitalistas e mediante à mobilização de seu
poder monetário privado. Em função das características do regime monetário-
financeiro em vigor, as crises podem assumir a forma de um movimento global
de inflação ou de deflação, conforme tomem o partido dos devedores ou dos
credores;

A reorganização social produzindo novas instituições adequadas às oposições


que prevalecem no paroxismo da crise.
O Quadro 11 resume a taxionomia das crises econômicas, proposta pela Teoria
da Regulação.

QUADRO 11 - A TAXIONOMIA DAS CRISES NA TEORIA DA REGULAÇÃO

TIPOS DE CRISE CARACTERÍSTICAS

(1) CRISE COMO Decorrente de fatores exógenos ao sistema econômico, isto é, que
PERTURBAÇÃO não se originam do modo de regulação e do regime de acumulação:
EXTERNA catástrofes naturais, circunstâncias econômicas externas, guerras.

Decorrente da depuração de tensões e desequilíbrios acumulados


(2) CRISE ENDÓGENA OU durante a fase de expansão. Esse tipo de crise emerge como
condição de superação dos obstáculos endógenos que a própria
CÍCLICA
dinâmica da acumulação instaura e reproduz, daí seu caráter
recorrente. Pode ser interpretada como uma crise na regulação .

(3) Os mecanismos ligados à regulação vigente são incapazes de


CRISE DO MODO
reverter os obstáculos endógenos à continuidade da acumulação de
DE REGULAÇÃO
capital, apesar da viabilidade do regime de crescimento. Trata-se de
CRISES uma crise da regulação .
ESTRUTURAIS
OU ( 4 ) CRISE DO As contradições no interior das formas institucionais atingem seu
GRANDES CRISES limite máximo, destruindo a coerência macroeconômica do regime
MODO DE
DESENVOLVIMENTO de acumulação e desestabilizando o modo de regulação. Em
conseqüência, o modo de desenvolvimento como um todo entra em
crise.

Observa-se uma transformação essencial das relações sociais


básicas de produção e apropriação do produto. Ou seja, a estrutura
determinante do modo de produção que o singulariza na historia
(5) CRISE FINAL DE UM
longa decompõe-se de tal maneira que não é mais possível a
MODO DE PRODUÇÃO
emergência de um novo modo de desenvolvimento nos quadros da
mesma lógica e natureza que definem o modo de produção anterior.

FONTE: Elaboração própria.

A Figura 11 reúne as noções de base da Teoria da Regulação, em sua vinculação


direta com as varáveis macroeconômicas.

2.8.4 As hipóteses de complementaridade e hierarquia das formas institucionais


Os avanços recentes das análises regulacionistas levaram a uma maior
compreensão das interações entre as formas institucionais e de seus impactos sobre a
dinâmica macroeconômica. Segundo BOYER (1998), entre os fatores explicativos da
coerência de um modo de regulação e da forma como ele determina as macro-
regularidades básicas da acumulação de capital, a análise do período 1973-1998 tem
ressaltado a importância da hierarquia que rege a configuração dada das formas
institucionais. Duas definições de hierarquia das formas institucionais foram então
elaboradas a partir de uma série de trabalhos teóricos e empíricos, tanto para os países
desenvolvidos quanto para os em desenvolvimento:

definição 1 uma forma institucional é considerada hierarquicamente


superior quando é capaz de impor restrições estruturais quanto à
configuração das outras formas institucionais. O exemplo canônico é o da
relação salarial fordista que desempenhou um papel-chave no modo de
regulação do pós-guerra, permitindo a difusão da acumulação intensiva com
consumo de massa. Construída a partir de um compromisso
institucionalizado entre capital e trabalho assalariado, este tipo de
configuração da relação salarial mostra de forma muito clara como a
existência de fatores que aparentemente são geradores de rigidez
institucional podem favorecer a eficiência dinâmica;
FIGURA 11 - AS NOÇÕES DE BASE PARA UMA MACROECONOMIA HISTÓRICA E INSTITUCIONALISTA

MODO DE REGULAÇÃO Configuração das Relações


(e seus componentes) Impacto sobre Macroeconômicas Resultado

REGIME DE
Divisão e organização PRODUTIVIDADE
Wage-Labor do trabalho
Taxa de
Nexus
Formação do salário crescimento
direto e indireto

Formação
Forma da dos preços
Concorrência Estabilidade
macroeconômica
Decisão de
investimento REGIME DE
Regime Monetário- ACUMULAÇÃO Evolução
Financeiro do emprego
Política de OU DE
estabilização
CRESCIMENTO

Infra-estrutura
Forma do Estado coletiva Inflação

Grau de
Inserção Abertura
Comércio
Internacional Especialização exterior

REGIME DE
DEMANDA

FONTE: BOYER (1998)


definição 2 uma forma institucional será considerada hierarquicamente
superior a uma outra se sua evolução implica em uma transformação desta
outra forma, em sua configuração e em sua lógica. Segundo BOYER (1998),
contrariamente à definição precedente, esta secunda forma não implica que o modo
de regulação que emerge deste conjunto complexo de transformações seja
coerente.

Em conjunção com as definições precedentes, a noção de complementaridade das


formas institucionais permite desenvolver as análises que buscam identificar os fatores que
concorrem para a gênese de um novo modo de regulação. Os compromissos
institucionalizados que regulam as diversas esferas das sociedades modernas não são
independentes, pois vários processos se conjugam. BOYER(1998, p. 20) listará quatro
resultados principais das análises recentes relativas à essa problemática:

A emergência de um compromisso institucionalizado incorpora um componente de


expectativa, que em certos casos implica a análise racional de seu impacto e de
suas condições de viabilidade. Mas não se trata de uma perspectiva funcionalista,
pois o aparecimento de um novo regime mostra-se extremamente contingencial.
Observa BOYER que a história mostra que a maior parte das inovações
institucionais maiores tem efeitos amplamente não esperados. No entanto, uma
forma de construtivismo está presente no processo de criação das formas de
organização econômica, pois a concepção holista correspondente implica
considerar-se certas interdependência, as mais evidentes, entre instituições,
organizações e mercado;122

Supondo-se que prevaleça ex ante uma incompatibilidade entre uma série de


inovações aparentemente sem ligação uma com as outras, a dinâmica econômica
que elas impulsionam é viável apenas se certas condições estruturais são
preenchidas: aptidão para responder a um horizonte marcado pela incerteza, à
variabilidade da conjuntura macroeconômica, à recorrência dos conflitos sociais e
dos desequilíbrios econômicos;123

122
Este argumento de BOYER mostra-se em franca analogia com a visão de LUCKÁS, apresentada no capítulo
1, no contexto da fundamentação ontológica e metodológica do conceito de regulação.
123
BOYER observa ainda que « ( ). En conséquence, conformément à l intuition des théories évolutionnistes,
ex post le divers compromis institutionnalisés doivent manifester une certaine compatibilité, ou dans certains cas
faire la preuve de leur indépendance. »
146

Mas o processo precedente parece fazer apelo de forma privilegiada à


aleatoriedade e à não intencionalidade. Uma hipótese plausível no contexto das
escolhas tecnológicas com fortes indivisibilidades. No entanto, para as formas
institucionais o conteúdo cognitivo é importante, organizando a coordenação das
estratégias e das atividades descentralizadas. O processo político como
solucionador ou redutor de conflitos encontra neste caso seu campo próprio de
atuação, condicionando as mutações das formas institucionais;

A complementaridade das instituições do capitalismo pode provir da existência de


uma hierarquia em virtude da qual algumas são concebidas para serem
estruturalmente compatíveis com uma instituição dominante, que impõe sua lógica
para além de sua esfera de ação. Para BOYER, a coerência sistêmica não é então
um mero resultado aleatório, nem um efeito direto da imposição política, mas a
conseqüência de um princípio constitutivo: segundo a sociedade e a época,
algumas formas institucionais são mais importantes do que outras.

Os modos de regulação e os regimes de crescimento fordistas pressupunham a


compatibilidade estrutural entre as cinco formas institucionais que o constituíam. Uma relação
salarial codificando uma divisão ex ante dos ganhos de produtividade em favor dos
assalariados, articulava-se com um determinado padrão de presença e intervenção do Estado
na economia, lançando as bases institucionais para o Welfare-State. Mas essa configuração
seria incompleta e dinamicamente ineficiente se não houvesse um regime internacional
específico que podia validar uma lógica de acumulação centrada preponderantemente nos
espaços econômicos nacionais e favorecida por um regime monetário-financeiro
relativamente autônomo, funcionando sob uma moeda de crédito. A lição regulacionista é,
portanto suficientemente clara: o crescimento excepcional do pós-Segunda Guerra baseou-se
em uma arquitetura institucional particular, historicamente definida. Como resultado das
lutas dos homens em suas múltiplas dimensões sócio-econômicas e políticas, esta
configuração institucional não pode ser deduzida de uma lógica mercantil centrada nos
comportamentos otimizadores, nem derivada de leis econômicas invariantes e inescapáveis.

As noções de complementaridade e de hierarquia das formas institucionais


mostram-se particularmente importantes para a análise do período atual, marcado pela
dominância da forma institucional de inserção no regime internacional. As conseqüências
sobre as demais formas institucionais listas em BOYER (1998) são as seguintes:
147

a) A forma da concorrência a concorrência oligopolista anteriormente centrada


nos espaços econômicos nacionais é fortemente desestabilizada pela processo
de abertura comercial e financeira. A importância dos mercados financeiros
sobre o modo de governança das firmas afeta diretamente a repartição das
rendas, com repercussões diretas sobre a relação salarial;

b) O regime monetário-financeiro dispondo anteriormente de ampla


autonomia em razão da fraca mobilidade dos capitais, agora esta forma
institucional mostra-se diretamente submissa à avaliação pelos mercados
financeiros internacionais. A credibilidade da política seguida pelos bancos
centrais, tornados independentes em muitos países, é um dos atributos
permanentemente monitorados pelos mercados financeiros. O objetivo de
controle da inflação passa ao primeiro plano das políticas monetária e fiscal e
as taxas de câmbio tornaram-se amplamente determinadas por esses mercados,
não mais resultando de decisões políticas;

c) A forma institucional do Estado como a política monetária tende a tornar-


se autônoma e a política fiscal condicionada pelas oscilações do regime
internacional, as relações Estado-economia transformaram-se profundamente.
O sistema tributário tende a evoluir em favor dos fatores de produção mais
móveis e os déficits públicos passam a ser interpretados como sinais de má
gestão. Neste contexto, as políticas fiscal e orçamentária tornam-se pró-cíclica
e não mais anti-cíclica como no período pré-globalização. BOYER observa
então que o Estado keynesiano e do salariado se transformou em um Estado
frugal e schumpeteriano, na medida em que busca estimular a empresa, o
investimento estrangeiro direto e a inovação;

d) A forma da relação salarial passa agora a um status de forma institucional


hierarquicamente subordinada e submissa às pressões que veiculam as
transformações das outras quatro componentes do modo de regulação. Neste
contexto, a grande variabilidade das finanças repercute sobre as decisões de
investimento e de produção das firmas. A maior parte dos arranjos previstos
pelas convenções coletivas e pelo direito do trabalho aparecem agora como
fontes de rigidez, comparativamente a velocidade da formação de preços no
mercado de ativos. A busca por maior flexibilidade quantitativa e salarial é
promovida como uma das condições básicas para a retomada do crescimento
148

econômico. O reconhecimento do salário como fator básico de demanda nas


economias capitalistas modernas é suplantada pela visão que o reduz a um
custo de produção entre outros e o qual é preciso minimizar.

O Quadro 12 ilustra quatro momentos históricos do capitalismo. Em cada um deles


pode-se identificar uma forma institucional hierarquicamente superior (FIHS). No período
fordista (1945-1975), a wage-labor nexus é a FIHS que, em complementaridade com as outras
componentes do modo de regulação, responde pelas características específicas deste modo de
desenvolvimento. No período atual, a wage-labor nexus tornou-se uma forma institucional
subordinada e o regime monetário-financeiro juntamente com as formas da concorrência
tornaram-se hierarquicamente superiores. A intensificação da concorrência, no contexto da
liberalização comercial e financeira, promove a reconfiguração dos modos de regulação e dos
regimes de crescimento no nível das economias nacionais.

2.9 Avanços recentes da Teoria da Regulação: uma síntese

Cada sociedade tem a conjuntura e as


crises de sua estrutura
(Fernand Braudel)

Após cerca de trinta anos de evolução desde suas origens em meados dos anos 70, o
exame da literatura regulacionista sugere que a Teoria da Regulação busca consolidar-se
como uma macroeconomia histórica e institucionalista. Padrões contrastados de crescimento e
crise encontram-se entre seus principais objetos, na medida em que a variabilidade das
dinâmicas econômicas e sociais permanece como fonte inesgotável de novos desafios às
teorias macroeconômicas estabelecidas.

Ao reconhecer as insuficiências das visões que promovem tanto o economicismo


reducionista, quanto o determinismo tecnológico, a metodologia regulacionista exige a
exploração de campos de pesquisa interdisciplinares. Isto significa também que a teoria
permanece sempre aberta à emergência do novo, pois as transformações estruturais,
envolvendo mudanças institucionais, convenções e comportamentos requerem nova
teorização. A partir dos trabalhos desenvolvidos por R. BOYER, B. THÉRET, P. PETIT, B.
BILLAUDOT, M. AGLIETTA e demais autores proponentes, pode-se listar alguns dos
avanços recentes da Teoria da Regulação:
149

QUADRO 12 - A HIERARQUIA DAS FORMAS INSTITUCIONAIS MUDA NA HISTÓRIA LONGA

FORMAS
HISTÓRICAS
DE
CAPITALISMO DA PRIMEIRA DO PERÍODO
DO SÉCULO DO PERÍODO
METADE DO FORDISTA
XIX ATUAL
SÉCULO XX (1945-1975)

CARACTERÍSTICAS

Desenvolvimento
Econômico
Crescimento - moderado, mas - forte, mas - muito forte e - lento e instável
estável instável estável
- moderado
Ganhos de - baixo, mas em - elevados - muito elevados (paradoxo de
produtividade progressão Solow)

Nível e modo de vida - muito baixo, - baixo, pois é - elevado, em - ainda elevado,
assalariado pois é muito fraca a inserção razão da forte mas tendência a
fraca a inserção no mercado de inserção no uma deterioração
no mercado de consumo mercado de das condições de
consumo consumo de vida
massa

Desenvolvimento Social e
Político
Seguridade Social - estruturas - consolidação - generalização - crise do
embrionárias dos primeiros dos sistemas e Welfare-State
sistemas emergência do
Welfare-State
Equidade da
distribuição das rendas - muito baixa - baixa - elevada - tendência a
uma
Nível efetivo de reconcentração
democracia - muito baixo - baixo - alto e sob - alto, mas
pressão da enfraquecimento
guerra fria dos movimentos
sociais

Formas Institucionais Regime Regime Wage-labor Regime


monetário- monetário- nexus monetário-
Hierarquicamente financeiro e financeiro e financeiro e
Superiores (FIHS) formas da formas da formas da
concorrência concorrência concorrência

FONTE: Adaptação a partir de M. BRUNO (2002).


150

i. As noções de complementaridade e de hierarquia das formas institucionais


permitem a análise das condições estruturais que favorecem a estabilidade
dinâmica de um regime de crescimento, na medida em que estão por trás do
sucesso e da crise de um modo de regulação;

ii. A passagem do crescimento à crise é determinada por fatores endógenos, pois


o modo de regulação, enquanto estrutura de mediação e de compatibilidade
dinâmica entre os comportamentos individuais e coletivos, responde pela coerência
macroeconômica de um regime de acumulação. Neste contexto, as economias
capitalistas estão submetidas à historicidade forte. Noção que expressa o fato de
que dos desequilíbrios, crises políticas e econômicas emergem novas regras,
instituições, organizações que se traduzem em diversos procedimentos de
coordenação. Estes por sua vez contribuem para determinar a lógica dos
comportamentos individuais e também o resultado de suas interações, ou seja, a
macroeconomia;

iii. O lugar do Estado-Nação face à maior interdependência das economias


nacionais num período marcado pelo processo de globalização comercial e
financeira se transforma, mas não suprime o caráter nacional nem as
fronteiras econômicas. Com efeito, a formação de blocos comerciais ou o
estabelecimento de unidades monetárias comuns permanecem dependentes dos
agenciamentos e de intervenções que emanam dos Estados Nacionais;

iv. As intervenções públicas mostram-se superiores ao mercado para todas as


decisões estratégicas que concernem à sociedade. Isto é particularmente visível
no caso da organização dos sistemas financeiros;

v. Diversas configurações de capitalismo podem coexistir em função de seus


respectivos modos de regulação. Não há um modelo superior do ponto de vista
social e econômico, para o qual todas as outras economias deveriam ou tenderiam
a convergir com o aprofundamento da internacionalização. Neste contexto, quatro
grandes modos de regulação podem ser identificados: o mercantil, o meso-
corporatista, o público e o social-democrata. Os demais podem ser interpretados
como variantes e combinações dessas grandes lógicas de regulação;

vi. Um aporte específico da Teoria da Regulação consiste no reconhecimento de que a


acumulação de capital é canalizada por uma rede de relações sociais e
151

políticas que expressam precisamente as particularidades da forma da


regulação em curso. Esta constatação permite elaborar uma taxionomia dos
modos de regulação observáveis no mundo contemporâneo e na história longa;

vii. O desenvolvimento do capital industrial pressupõe certo tipo de Estado


inserido e não circunscrito como no capitalismo preponderantemente
concorrencial do século XIX;

viii. Um regime de crescimento é viável se ele é capaz de compatibilizar as


esferas política e econômica enquanto base do desenvolvimento sustentável do
processo de acumulação de capital. Todavia, como uma esfera não é capaz de
impor sua lógica à outra, os modos de regulação são estáveis enquanto
reproduzirem as condições dessa compatibilidade;

ix. As formas institucionais engendram regularidades sociais por meio de


procedimentos que se mostram simultaneamente geradores de rigidez. Elas
criam referências convencionais e diferenciações estáveis permitindo aos grupos
sociais assim estratificados conceberem estratégias. Como elas bloqueiam a fluidez
dos movimentos econômicos, elas se convertem na sede de uma acumulação de
tensões que, uma vez superados os limites, explodem sob a forma de uma crise de
legitimidade;

x. A apreensão das interdependências das esferas política e econômica é um


expediente básico no entendimento dos processos de emergência de novos
modos de regulação e de regimes de acumulação. O movimento social vai do
econômico ao político e vice-versa, o que permite a transformação estrutural e a
emergência de novas configurações para as formas institucionais. Quando
estabilizadas e tornadas legítimas, essas configurações permitem derivar
relações macroeconômicas dotadas de uma permanência estatística;

xi. O objetivo das macroanálises regulacionistas não é otimizar as instituições,


mas buscar as condições de viabilidade de uma determinada arquitetura
institucional como expressão de um modo de regulação.

Em suma, neste capítulo e no precedente, os fundamentos teóricos e metodológicos,


bem como a estrutura conceitual de base e os avanços recentes da Teoria da Regulação foram
apresentados em suas implicações para uma macroeconomia histórica e institucionalista. Na
presente análise, eles serão mobilizados com vistas a proporcionar uma interpretação
152

institucionalista da evolução econômica brasileira, a partir da expansão e consolidação do


capital industrial neste país. O potencial explicativo da abordagem regulacionista será agora
requisitado - como uma alternativa às teorias neoclássicas e suas variantes contemporâneas - e
então, testado face às particularidades dessa formação social complexa e heterogênea.
153

CAPÍTULO 3 A PERFORMANCE MACROECONÔMICA EM PERSPECTIVA


HISTÓRICA: PRINCIPAIS FATOS ESTILIZADOS

3.1 Introdução

O teórico da economia deveria começar por um


resumo dos fatos estilizados que se supõe sejam
explicados pela teoria .
Nicholas Kaldor (1961)

Este capítulo desenvolve uma análise da performance macroeconômica brasileira de


longo prazo, a partir de um vasto conjunto de séries temporais. Busca-se identificar as
trajetórias de crescimento e seus momentos de inflexão. Estatísticas sócio-econômicas sobre
produção, emprego, renda, inflação, setor externo e setor público, e desempenho setorial são
apresentadas. São então reunidas as primeiras constatações empíricas e demais fatos
estilizados que caracterizaram o desenvolvimento econômico deste país no século XX,
iniciando-se a construção da base empírica necessária à aplicação do método e dos princípios
teóricos regulacionistas.

Em termos operacionais, a metodologia proposta pela Teoria da Regulação - exposta


em seus fundamentos epistemológicos nos capítulos 1 e 2 deste trabalho - desdobra-se em
cinco etapas básicas sintetizadas em BRUNO (2004, p. 21)124, com base em BOYER
(2003)125:

a) Análise histórica para periodizar a evolução das formas institucionais basicamente


qualitativa, esta etapa requer, porém, um mínimo de quantificação, cujo objetivo é
obter-se uma periodização parcial de cada uma das cinco formas institucionais: Estado,
wage-labour nexus, regime monetário-financeiro, concorrência e inserção
internacional. Busca-se explicitar-lhes a emergência, difusão e consolidação. Partindo-
se do reconhecimento do caráter situado ou contextual da racionalidade econômica,
cada forma institucional, quando estabilizada, é portadora de uma certa lógica e
condiciona o comportamento dos atores, resultando num conjunto particular de
regularidades macroeconômicas passíveis de identificação estatística ou econométrica;

124
M. BRUNO (2004). Macroanálise, Regulação e o Método uma alternativa ao holismo e ao individualismo
metodológicos para uma macroeconomia histórica e institucionalista . Anais do IX Encontro Nacional de
Economia Política, Uberlândia, junho de 2004.
125
BOYER (2003), Les institutions dans la théorie de la régulation. CEPREMAP n° 2003-08, mai 2003. Na
realidade este autor desdobra o método regulacionista em seis etapas, mas por simplificação resumiu-se as duas
primeiras.
154

b) Análise estatística e econométrica (testes de estabilidade das regulações parciais)


a regulação a nível macroeconômico ou global (régulation d ensemble) é composta por
um conjunto de regulações parciais que resultam de configurações particulares das
formas institucionais vigentes. Tais regulações reportam-se à formação dos salários,
dos preços, das taxas de juros, da demanda, etc. Testes econométricos são efetuados
para se verificar o grau de adequação dos diversos modelos ideais aos dados
estatísticos que caracterizam os diferentes períodos históricos.126 Cada uma das
regulações parciais se traduz por uma relação que expressa a evolução de uma variável
macroeconômica comandada pela evolução de outras variáveis. Os parâmetros dessas
equações (elasticidades) são, conforme o princípio da regulação, determinados
institucionalmente (BILLAUDOT, 2001);

c) Análise da transição das regulações parciais à regulação global - trata-se de analisar


a coerência de um modo de regulação, o que implica verificar a compatibilidade das
regulações parciais, sua aptidão para pilotar um possível regime de crescimento.
Nesta etapa procede-se à caracterização da forma das pequenas crises ou crises cíclicas
que respondem pelas flutuações de curto prazo no produto, mas que não chegam a por
em causa a coerência de um modo de regulação. Neste momento as análises podem
mobilizar a modelização macroeconômica simples ou macroeconométrica das
diferentes regulações com o objetivo de sintetizar-lhes a lógica, considerando-se o
conjunto das estruturas produtivas e as relações sociais específicas que se lhes
associam;

d) Diagnosticar as fontes de crises estruturais nesta etapa, BOYER (2003) observa


que a particularidade da Teoria da Regulação consiste em não postular a priori, a
existência de uma dinâmica estabilizada, visto que há a possibilidade de incoerência
entre os comportamentos suscitados pelas diversas formas institucionais.127 Um
princípio de transformação estrutural pode então ser mobilizado: trata-se do
endometabolismo que traduz a interdependência entre funcionamento e
desenvolvimento das estruturas que suportam a acumulação de capital. Como observa
LORDON (1993, p.504), a mudança estrutural endógena significa que de seu

126
Segundo BOYER (2003, p. 5), muito freqüentemente a Nova Economia Institucionalista (NEI) pecaria pela
insuficiência de procedimentos de verificação e se limitaria a constatar que as predições qualitativas não são
totalmente invalidadas. Por contraste, uma parte considerável dos trabalhos regulacionistas promove o uso de
testes econométricos como meio de refutação e então de seleção contra as hipóteses alternativas.
127
Observe-se que a teoria novo clássica segue exatamente uma démarche oposta com seus modelos de
equilíbrio.
155

próprio funcionamento a estrutura retira as forças motrizes de seu


desenvolvimento . Assim, o endometabolismo é o processo pelo qual o
funcionamento da estrutura altera a própria estrutura. O simples fato de ser uma
estrutura sócio-econômica que opera no tempo e no espaço pode ser motivo suficiente
para a sua transformação e crise.128 Em conseqüência, cada regime de acumulação e o
modo de regulação que lhe veicula terminam encontrando uma crise estrutural,
freqüentemente interpretada como um resultado de seu próprio sucesso.
Conseqüentemente, busca-se identificar os fatores de desestabilização da regulação
vigente;

e) Analisar os processos de saída das grandes crises busca-se caracterizar as


possíveis estratégias de superação das crises estruturais. Considera-se o papel das
representações, da ação coletiva, bem como a importância da esfera política na
codificação de novas formas institucionais. Estas por sua vez, se complementares ou
mutuamente compatíveis podem conduzir à emergência de um novo modo de
regulação e de seu correspondente regime de crescimento.

A Figura 12 resume as etapas da metodologia de análise regulacionista aplicada, neste


trabalho, à economia brasileira. A questão básica refere-se à maneira como se combinam as
diferentes características das formas institucionais enquanto componentes-chave da regulação
e qual seria a resultante global ou macroeconômica (objeto principal do capítulo 4). Mas uma
das características específicas dessa démarche é que a periodização surge como um resultado
da análise estatística ou econométrica, sem que isto signifique um retorno a posições
empiricistas radicais pré-popperianas que se equivocam na crença de que os fatos falam por
si mesmo . Em outros termos, os dados empíricos são interpretados em seu significado
econômico, o que obviamente pressupõe sempre a mediação da teoria, de suas hipóteses e
definições conceituais.

128
Isto significa que, contrariamente às críticas simplificadoras do conceito de regulação, este não exclui de
maneira nenhuma a possibilidade de crises. Conforme argumenta LIPIETZ (1988), a regulação expressa a
unidade, sempre relativa (pois provisória, já que vulnerável à ação da história viva dos homens) apesar das
contradições de caráter absoluto (pois ontológica, inerente à lógica das relações sociais de produção e de
distribuição capitalistas).
156

FIGURA 12 MACROANÁLISE REGULACIONISTA E O MÉTODO

ETAPA 1- Periodizar a evolução das formas institucionais


e explicitar sua lógica Início de um
Encontrar as datas-chave das mudanças nas formas novo ciclo de
institucionais pesquisa

ETAPA 2- Testar o campo e a validade das regulações


parciais
Definição e coleta de indicadores
Verificação das regulações parciais: testes econométricos
em séries longas

ETAPA 3 Analisar a coerência de um modo de regulação


Compatibilidade das regulações parciais
Capacidade para pilotar a acumulação de capital
Caracterizar as pequenas crises ou crises cíclicas

ETAPA 4 Diagnosticar as fontes de crises estruturais


Alteração lenta dos parâmetros-chave
Possível formalização
Verificar as fases de expansão e de crise de um regime de
acumulação

ETAPA 5 Analisar os processos de superação de crise


Verificar a emergência de novos modos de regulação e de
regimes de acumulação

FONTE: BRUNO (2004), adaptado da figura 1, em BOYER (2003, p.6).


157

3.2 A performance macroeconômica em perspectiva histórica: principais fatos


estilizados
Esta seção destaca os principais fatos estilizados do desenvolvimento econômico
brasileiro, no século XX, interpretando-os à luz da Teoria da Regulação. Proposta por
KALDOR (1961), esta noção refere-se a uma constatação de ordem empírica, necessária ao
confronto da teoria utilizada com os dados das economias reais129.

Segundo MADDISON (1989), a economia brasileira apresentou no período 1870-


1987, as maiores taxas de crescimento do PIB no mundo. Entre 1870 e 1930, a dinâmica do
complexo agro-exportador cafeeiro permitiu o surgimento das condições básicas para o
desenvolvimento industrial: o aprofundamento das relações de trabalho assalariado; a
expansão do mercado interno, das relações bancárias e financeiras e dos investimentos em
infra-estrutura. A força de trabalho proporcionada pela imigração e a elevação da oferta
monetária articulavam-se como fatores de desenvolvimento do mercado doméstico para as
primeiras indústrias de bens de consumo não duráveis.130 Todavia, o capital industrial
emergente tinha de enfrentar as restrições provocadas por uma economia caracterizada por um
elevado coeficiente de importações e por um aparelho de Estado controlado pelas classes
ligadas ao capital mercantil-agrário exportador. Além disso, como a quase totalidade das
instituições componentes do regime fisco-financeiro131 vigente permaneciam dependentes das
receitas tributárias originárias do setor agrário-exportador, o Estado se abstinha de promover
deliberadamente a base industrial brasileira.

Esta situação mudaria a partir do momento em que a grande crise de 1930 rompe com
um padrão secular de inserção internacional que mantinha a dinâmica da economia brasileira
fortemente dependente da demanda externa. A renda nacional cai cerca de 30% e o índice de
preços dos produtos importados sobe 33%, reduzindo em 60% o volume de importações
brasileiras.132 Mas nos anos que se seguiram à crise, como observa FURTADO (1980), o
mercado interno passaria a ser o fator dinâmico principal133. Neste contexto, a indústria

129
Como observa GUERRIEN (2000, p.211)129, é essencialmente a Macroeconomia que busca extrair os fatos
estilizados através dos agregados tradicionais das Contas Nacionais.
130
Segundo dados apresentados por LACERDA et alii (2000), em 1851 o coeficiente de monetização da
economia brasileira era de 0,85 libra esterlina por habitante, mas em 1889, este índice sobre para 1,65.
131
Conforme definição baseada em THÉRET (2002), no capítulo 1.
132
Dados citados por FURTADO (1980).
133
Entre 1929-1937, o valor da produção industrial cresce 50% e a produção do setor primário para o mercado
interno cresce 40%. Conforme LACERDA et alii (2000), a renda nacional aumentou 20% neste período. Na
mesma época, a renda nacional dos Estados Unidos decresceu e os países que adotaram políticas econômicas
ortodoxas permaneceram em depressão.
158

nascente passou então a contar com fatores endógenos de impulsão que terminaram por
aprofundar o processo de industrialização por substituição de importações (PSI)

Quando, a partir da Revolução de 30, novas forças sociais alcançam o controle do


aparelho de Estado brasileiro, os estímulos ao PSI revestem-se de um conteúdo ideológico
nacionalista e desenvolvimentista. Convertida num programa de governo, a lógica da
substituição de importações ganha um status de modelo necessário a um novo processo de
acumulação centrado na demanda doméstica. Dadas as condições econômicas internas e
internacionais, esse modelo pode ser considerado coerente em suas proposições normativas
para a época, embora rico em contradições enquanto base de um projeto de desenvolvimento
nacional autônomo. Examinando-se as estatísticas pode-se constatar que entre 1943 e 1980 -
período de difusão e consolidação do PSI - a economia brasileira apresentou forte dinamismo,
com uma taxa média de crescimento do PIB em torno de 7% anuais e embora se observem
desacelerações, como as da crise dos anos 60, as taxas de crescimento mantiveram-se todas
positivas. Todavia, no período 1981-2003, a taxa média de crescimento econômico não
ultrapassa os 2,4% e os problemas acumulados nas décadas anteriores se conjugam e se
expressam numa conjuntura de estagnação e alta inflação.

Sob as pressões ideológicas da globalização neoliberal dos anos 90, a economia


brasileira entrará em um processo acelerado de transformação estrutural, onde se destacam a
abertura comercial e financeira, as privatizações, a superação do regime monetário-financeiro
inflacionista e a reestruturação da indústria. Todas as formas institucionais foram submetidas
a um processo de reconfiguração rápida e profunda, sem que houvesse garantia teórica de que
as trajetórias das mudanças estruturais, promovidas pelo próprio Estado, conduziriam à
recomposição das condições de retomada da acumulação de capital e do crescimento
sustentável. Efetivamente, no período pós-Plano Real, o crescimento econômico tornou-se um
problema maior, na medida em que as condições que em tese são necessárias à estabilidade de
preços são as mesmas que bloqueiam a taxa de acumulação de capital e expandem o
endividamento interno e externo. Em razão da lógica do atual modelo centrar-se na
manutenção da abertura financeira, cujo suporte é o regime monetário à alta restrição, os
investimentos produtivos passam a contar prioritariamente com o aporte de recursos externos.
Todavia, como essa nova configuração das relações da economia brasileira com o exterior
pressupõe taxas reduzidas de inflação e taxas de juros atrativas aos fluxos de capitais
estrangeiros, o Estado recorrentemente freia esse tipo de economia interrompendo o
processo de retomada do crescimento e do desenvolvimento econômico.
159

Em conseqüência, quando se busca compreender as razões para o fraco desempenho


macroeconômico dos últimos 20 anos, as transformações ao nível da forma institucional de
inserção internacional revelam-se fundamentais na explicação das mudanças nos padrões de
acumulação de capital. No entanto, a existência de fatores endógenos responde pelas
especificidades na evolução de cada formação social concreta, pois determinam o leque de
respostas que uma economia pode formular a partir dos choques e condicionantes externos.
Conseqüentemente, a análise dessa problemática exige igualmente a consideração das outras
formas institucionais que estruturam um modo de regulação: a wage-labor nexus ou rapport
salarial; o regime monetário-financeiro; a forma institucional do Estado e as formas da
concorrência, pois de sua hierarquia e compatibilidade dependem a coerência
macroeconômica e a estabilidade de um regime de acumulação.

3.2.1 Acumulação de capital e crescimento econômico: primeiras constatações


A dinâmica do crescimento econômico brasileiro está representada no Gráfico 1 para o
período [1900-2003], onde se pode observar a evolução do PIB efetivo e do PIB potencial
estimado pelo filtro tradicional Hodrick-Prescott (HP) e para fins apenas descritivos134. A
partir dos testes do CUSUM e do CUSUMQ135 foram identificados três padrões de evolução
do PIB, com suas respectivas taxas médias de crescimento. Com relação ao terceiro período,
AGUIRRE e FERREIRA (2001) utilizando o método changing growth model determinaram
endogenamente uma quebra estrutural para o ano de 1979. Mantém-se a ruptura em 1980,
obtida pelo CUSUM, porque não há nenhuma alteração significativa nos resultados quando
comparados aos desses autores136.

134
O filtro HP (Hodrick-Prescott filter) é essencialmente descritivo, pois não considera as propriedades
estocásticas da série. Para contornar essa limitação, após as estimativas do PIB potencial, a série foi corrigida
considerando-se o ano de 1973 como o de utilização plena da capacidade produtiva instalada.
Conseqüentemente, esses dados passam a refletir, aproximadamente, o produto máximo da economia, antes que
o produto normal.
135
Os testes CUSUM (Cumulative Sum) e CUSUMSQ (Cumultive Sum of Squares).
136
A maioria dos trabalhos econométricos não rejeita a hipótese nula de presença de uma raiz unitária na série do
PIB brasileiro. Todavia, CATI (1998), adotando um método alternativo que permite considerar a presença de
uma quebra na tendência linear e AGUIRRE e FEREIRA (2001), utilizando uma abordagem do tipo changing
growth model , concluem pela inexistência de raiz unitária na série do PIB para o período 1950-1997. Mas,
como observa LIBANIO (2004), não há consenso sobre as metodologias mais apropriadas para se executar os
testes de raiz unitária, então, por razões teóricas, este trabalho alinha-se às metodologias de testes que confirmam
a existência de raiz unitária na série do produto e recorre à representação gráfica em termos de tendências
deterministas ou estacionárias apenas para fins descritivos. Na ocorrência de raiz unitária, não haverá retorno
automático à tendência normal de evolução da série ou a posições de equilíbrio sustentadas pelas teorias do
mainstream. Conforme LIBANIO (2004, p. 15): ... unit roots in GNP series pose another challenge for
traditional theories of macroeconomics fluctuations, which assume output to be mean-reverting and schocks to
have only temporary real effects.
160

GRÁFICO 1 PIB EFETIVO E PIB POTENCIAL [1900 2003].

LnPIB efetivo
LnPIB potencial
15,0

[1980 - 2003]: LnPIB = 11,5482+0,0233*t


14,0

13,0

12,0

11,0
[1942 - 1979]: LnPIB = 7,7692+0,0699*t

10,0

[1900 - 1941]: LnPIB = 9,0288+0,0428*t


9,0

8,0
1900
1903
1906
1909
1912
1915
1918
1921
1924
1927
1930
1933
1936
1939
1942
1945
1948
1951
1954
1957
1960
1963
1966
1969
1972
1975
1978
1981
1984
1987
1990
1993
1996
1999
2002
FONTE: Elaborado a partir de dados do IBGE e IPEADATA.
NOTA: PIB potencial estimado pelo filtro Hodrick-Prescott (HP). Valores a preços constantes de 2000 pelo
deflator implícito do PIB.

GRÁFICO 2 PIB EFETIVO E PIB POTENCIAL [1980 2003].

LnPIB
LnPIBpot_hp corr
14,1

14,0

13,9

13,8

13,7

13,6

13,5

13,4
1980 1982 1984 1986 1988 1990 1992 1994 1996 1998 2000 2002

FONTE: Elaborado a partir de dados do IBGE e IPEADATA.


NOTA: PIB potencial estimado pelo filtro Hodrick-Prescott (HP). Valores a preços constantes de 2000 pelo
deflator implícito do PIB.
161

Comparando-se as trajetórias efetiva e potencial do PIB nos períodos [1900-1941] e


[1942-1979], constata-se a forte desaceleração do crescimento econômico a partir de 1980,
expressão da entrada da economia brasileira em um longo período de dificuldades
macroeconômicas, representado pelo intervalo [1980-2003]. Neste terceiro período,
focalizado no Gráfico 2, a economia brasileira apresenta sua taxa média de crescimento mais
baixa (2,3% a.a.), já que para o primeiro e segundo períodos, as taxas atingem médias,
respectivamente, de 4,3% e de 7% anuais.137

GRÁFICO 3 FLUTUAÇÕES CÍCLICAS DO PRODUTO NA ECONOMIA BRASILEIRA [1900


2003].

Hiato do PIB = LnPIB potencial - LnPIB efetivo


0,16
0,14
0,12
0,10
0,08
0,06
0,04
0,02
0,00
-0,02
-0,04
-0,06
1900
1903
1906
1909
1912
1915
1918
1921
1924
1927
1930
1933
1936
1939
1942
1945
1948
1951
1954
1957
1960
1963
1966
1969
1972
1975
1978
1981
1984
1987
1990
1993
1996
1999
2002
FONTE: Elaborado a partir de dados do IBGE e IPEADATA.

NOTA: O hiato (h) do PIB foi calculado como o desvio do PIB efetivo em relação ao PIB potencial estimado
pelo filtro HP.

O Gráfico 3 representa o comportamento do hiato do PIB brasileiro calculado a partir


dessas duas séries. Ressalte-se que, apesar das taxas de crescimento econômico relativas ao
primeiro período [1900-1941] serem visivelmente mais voláteis do que as observadas no
segundo [1942-1979], é o terceiro período [1980-2003] que se apresenta como mais instável.

137
Observe-se que, para este período [1980-2003], o comportamento da série do produto potencial mostrou-se
similar ao encontrado por J.R. SOUZA JÚNIOR (2002) e por SILVA FILHO (2001) que, no entanto, utilizaram
o método da função de produção. Todavia, como observam esses autores, este método é muito sensível às
hipóteses sobre a taxa natural de desemprego e a taxa de utilização da capacidade ao nível de pleno emprego.
Uma redução da primeira ou uma elevação da segunda desloca a série para cima, pois o produto potencial
aumenta em todo o período. Mas como a dinâmica da série permanece inalterada, o método continua válido para
os fins da análise.
162

O fato torna-se mais grave quando se observa que, no caso do primeiro período, a volatilidade
das taxas de crescimento é em grande parte explicada pela vigência de uma base econômica
predominantemente agrário-exportadora e muito dependente da demanda externa. Portanto, o
padrão observado expressa os ciclos típicos do complexo exportador cafeeiro e,
conseqüentemente, das formas de inserção internacional condicionadas por essa atividade
produtiva. A Tabela 1 reforça essas constatações, na medida em que o coeficiente de variação
para o terceiro período [1980-2003] supera até mesmo o coeficiente observado no primeiro
período [1901-1941], quando se tratava de uma economia ainda agrário-exporadora. O
segundo período [1942-1979] caracteriza-se pelo avanço da industrialização brasileira e
apresenta-se como o de menor volatilidade.

TABELA 1 CRESCIMENTO E VOLATILIDADE AO LONGO DO SÉCULO XX

PERÍODO [1901-1941] [1942-1979] [1980-2003]

Taxa média de crescimento econômico 4,5% 7,1% 2,3%

Desvio-padrão 4,8% 3,5% 3,6%

Coeficiente de variação 108,4% 49,2% 153,7%

Nº de anos 41 38 24

FONTE: Elaborado a partir de dados do IBGE e IPEADATA.

NOTA: A volatilidade é medida pelo desvio-padrão das taxas anuais de crescimento do PIB e pelo coeficiente de
variação.

A evolução do PIB per capita é descrita no Gráfico 3 para o período [1900-2003].


Utilizando-se os testes do CUSUM e do CUSUMSQ para a invariabilidade dos parâmetros,
cinco principais tendências foram identificadas, o que permite delimitar cinco fases
contrastadas em todo o período sob análise. A primeira e segunda fases, respectivamente
F1[1900-1921] e F2[1922-1961], caracterizam-se pelas flutuações acentuadas em torno das
tendências, mas enquanto em F1 a taxa média de expansão situa-se em torno de 0,78% a.a., na
segunda fase constata-se um crescimento médio anual de 3,16%. Apenas a partir de 1942 se
observa uma nítida redução das oscilações do PIB per capita e sua entrada em uma longa
trajetória de expansão elevada, se for considerada como prolongamento, a quarta fase
F4[1967-1977], correspondente ao milagre econômico e à implementação do II PND, com
uma taxa média de crescimento no patamar de 6,7 %a.a. Esta trajetória apresenta-se, no
entanto, momentaneamente interrompida pelos anos de desaceleração do crescimento,
163

expressando a terceira fase F3[1962-1966], conhecida na literatura econômica como a


primeira crise cíclica endógena do capitalismo brasileiro em sua etapa industrial.

GRÁFICO 4 A EVOLUÇÃO DO PIB PER CAPITA NO PERÍODO [1900 2003]: CINCO FASES
CONTRASTADAS

9,0
8,8 F5[1978-2003]: Y = 8,0508 + 0,007*t
8,6
F4[1967-1977]: Y = 3,3934 + 0,0669*t
8,4
Ln (PIB per capita)

8,1
7,9 F3[1962-1966]: Y = 7,703 + 0,003*t
7,7
7,5
7,3
7,0 F2[1922-1961]: Y = 5,7982 + 0,0316*t
6,8
6,6
6,4
6,2 F1[1900-1921]: Y = 6,2507 + 0,0078*t
6,0
1900
1903
1906
1909
1912
1915
1918
1921
1924
1927
1930
1933
1936
1939
1942
1945
1948
1951
1954
1957
1960
1963
1966
1969
1972
1975
1978
1981
1984
1987
1990
1993
1996
1999
2002
FONTE: Elaborado a partir de dados do IBGE e IPEADATA.

A partir de 1978, o PIB per capita entra numa quinta e longa trajetória de reduzido
crescimento, o que permite definir uma quinta fase F5[1978-2003], comparável apenas à
primeira fase, por sua taxa média de expansão em 0,70% a.a. Mas, em contraste com F1, os
movimentos oscilatórios nesta quinta fase F5 refletem muito mais as intervenções de política
econômica (as recessões de 1981/83; as recessões do Plano Collor em 1990/92; as crises
financeiras pós-Plano Real e o ataque especulativo de janeiro de 1999, bem como a recessão
induzida de 2003) do que a dinâmica espontânea de uma economia fortemente dependente do
setor agro-exportador.

Ressalte-se, portanto, as diferenças fundamentais nas estruturas econômicas vigentes


em cada um desses subperíodos de análise. F1 corresponde a uma economia ainda de base
agrário-exportadora e fortemente dependente da demanda externa. Acrescente-se o fato de
que a primeira metade do século 20 foi marcada pelas duas Grandes Guerras Mundiais,
intercaladas pela crise dos anos 30, e por fluxos imigratórios importantes que, entre outras
conseqüências, contribuíram para a constituição da força de trabalho assalariada no Brasil138.

138
Anuário Estatístico do Brasil (1939-1940). Segundo F. TEIXEIRA e M. TOTINI (1994, p.99), na década de
1890 entraram no Brasil mais de 1.200.000 imigrantes e entre 1900 e 1930, cerca de 2.261.000.
164

As fases subseqüentes refletem o desenvolvimento do capital industrial e das relações


bancárias e financeiras na economia brasileira, em três momentos fundamentais: o da
afirmação do processo de industrialização por substituição de importações como política ativa
do Estado nacional, entre os anos 40 e 70; seu esgotamento e crise nos anos 80; e, por fim, a
última fase caracterizada pela abertura comercial e financeira de inspiração neoliberal que
romperá com a lógica básica desse processo sem, no entanto, lograr o restabelecimento das
condições de retomada sustentada da acumulação produtiva de capital e do crescimento
econômico.

Conseqüentemente, os níveis médios de expansão do PIB per capita, nas cinco fases,
refletem a conjunção de variáveis econômicas, políticas e demográficas ao longo de toda a
série representada no gráfico. Para ilustrar com um exemplo extraído do conjunto de
problemas macroeconômicos que atravessam esse tipo de economia, basta considerar a regra
prática de que um país que cresce a uma taxa de g% a.a. dobrará sua renda per capita a cada
70/g anos. Mas, mantida a expansão média do PIB em 2,3% a.a., conforme a última fase
representada no Gráfico 1, a economia brasileira precisará de no mínimo 30 anos para dobrar
sua renda per capita.139 Em face da intensificação dos graves problemas sociais numa
sociedade marcada pela excessiva concentração da propriedade e da renda, trata-se de um fato
ao mesmo tempo lastimável e alarmante.

Comparando-se os hiatos do PIB do Brasil com os hiatos do México e dos EUA,


constata-se a maior instabilidade do crescimento econômico brasileiro (Gráfico 5). A
amplitude das flutuações do produto é superior à observada tanto na economia dos EUA
quanto na do México. Os valores máximo e mínimo do hiato do PIB brasileiro foram,
respectivamente de 8,12%, em 1983, e de -8,52%, em 1980140. Para a economia americana
esses valores atingiram um máximo de 5,12%, em 1982, e um mínimo de -3,62%, em 1966.
Já para a economia mexicana, os valores máximo e mínimo observados foram de 5,9% (crise
financeira de 1995) e de 10,4% (1981). Os desvios-padrão das séries dos hiatos para essas

139
Esta regra, proposta por R. LUCAS Jr. (1988) e retomada em C. JONES (2000), deriva do fato de que se a
renda per capita no período t, Y(t), apresenta um crescimento exponencial então Y(t) = y0.eg.t , onde y0 é algum
valor inicial do PIB per capita e g é a taxa percentual de crescimento do PIB. O tempo necessário para dobrar a
renda per capita é dado pelo tempo t em que y(t) = 2.y0. Em conseqüência, t = ln2 / g e como ln 2 0,7 segue
que t = 70 / g.
140
Diferentemente dos Gráficos 1 e 2, na elaboração do Gráfico..., não se ajustou a série do produto potencial
brasileiro, considerando-se o ano de 1973 como o de utilização plena da capacidade produtiva, porque isto
implicaria dispor da mesma informação para as economias dos EUA e do México. Todavia, como o objetivo é
apenas comparar as amplitudes das oscilações concernentes aos hiatos dos produtos desses três países, essa
representação gráfica continua, portanto válida.
165

três economias foram respectivamente, de 2,1% para os EUA, 3,0% para o México e de 3,9%
para o Brasil.

GRÁFICO 5 FLUTUAÇÕES CÍCLICAS DO PIB: BRASIL, MÉXICO E EUA (1950-2002).

HiatoPIB_EUA
HiatoPIB_México
HiatoPIB_Brasil
10%
8%
6%
4%
2%
0%
-2%
-4%
-6%
-8%
-10%
-12%
1950 1958 1966 1974 1982 1990 1998
1954 1962 1970 1978 1986 1994 2002

FONTE: Dados para o PIB dos três países foram obtidos junto ao IBGE e IPEADATA.

NOTA: Para a comparação utilizou-se o filtro Hodrick-Prescott (HP).

Para FERREIRA e AGUIRRE (2001), que também estimaram o hiato do PIB


brasileiro segundo a mesma metodologia, essa acentuada volatilidade da série brasileira
refletiria, em parte, o efeito de choques externos sobre a economia doméstica. Todavia, para
uma análise regulacionista do crescimento econômico brasileiro, os fatores internos ao espaço
econômico nacional devem ser explicitados. As possíveis respostas da economia brasileira aos
choques externos permanecem sempre dependentes das particularidades das estruturas
internas, ou seja, das configurações das formas institucionais ou do modo de regulação que
estas possam implicar. Existem configurações que tendem a amplificar os impactos de
turbulências internacionais, enquanto outras são capazes de reduzir seus efeitos
desestabilizadores.

Complementando as informações constantes do Gráfico 5, a Tabela 2 compara as


taxas médias de crescimento e os indicadores de volatilidade para as economias do Brasil,
México e EUA. Os períodos foram delimitados considerando-se as mudanças nas inclinações
das tendências dos respectivos produtos internos dessas economias. Na passagem para o
segundo período, constata-se que nos EUA a volatilidade (mensurada pelo coeficiente de
166

variação) reduz-se em 34%, no Brasil assiste a uma queda de apenas 5,8%, enquanto para o
México, a volatilidade mais do que duplicou, provavelmente em razão da crise financeira de
1994/1995.

TABELA 2 CRESCIMENTO ECONÔMICO E VOLATILIDADE: BRASIL, MÉXICO E EUA (1950-


2002)

TAXA MÉDIA DE COEFICIENTE DE


PAÍS PERÍODOS DESVIO-PADRÃO
CRESCIMENTO VARIAÇÃO

[1950-1993] 3,4% 2,5% 73,5%


EUA
[1994-2002] 3,3% 1,3% 39,4%

[1950-1994] 5,7% 4,3% 75,4%


BRASIL
[1995-2002] 2,3% 1,6% 69,6%

[1950-1991] 5,4% 3,3% 61,1%


MÉXICO
[1992-2002] 2,9% 3,7% 127,6%

FONTE: Elaborado a partir de dados do IBGE e IPEADATA para México e EUA.

NOTA: A divisão dos períodos foi efetuada com base nos testes de estabilidade do CUSUM.

Sabe-se que no âmbito das análises dos determinantes do crescimento econômico, a


variável investimento ocupa um lugar fundamental. Conforme VILLIEU (2000), o
investimento é a variável-chave da evolução econômica. No curto prazo, a instabilidade das
decisões de investimento é a principal fonte das flutuações conjunturais. Mas no longo prazo,
o investimento determina as capacidades de produção de uma economia e, enquanto vetor do
progresso técnico, determina seu potencial de crescimento. O Gráfico 6 descreve a evolução
da taxa de investimento (participação da formação bruta de capital fixo no PIB) com a da taxa
de acumulação bruta de capital (a razão entre a formação bruta de capital e o estoque de
capital fixo disponível). As trajetórias dessas variáveis são declinantes a partir de 1974/75. Na
década de 90, há uma fase de recuperação que permanece até 1997, mas as tendências
continuam sendo de queda.

O Gráfico 7 mostra o comportamento da relação capital-produto entre 1950 e 2002.


Considerando-se que esta relação é o inverso da produtividade do capital, sua rápida elevação
167

tende a reduzir o ritmo de crescimento econômico.141 Pode-se observar que essa relação
dobrou da década de 70 para de 90, aproximando-se da média dos países desenvolvidos.
Observa-se também uma queda da inclinação da tendência nos anos 80 e que, como observa
FEU (2003), também ocorreu para os países da OCDE. Esta constatação empírica significa
que atualmente a economia brasileira necessita do dobro de capital necessário na década de 70
para gerar uma unidade de produto.142 Para ALVIN et alii (1996), citado por FEU (2003),
como o crescimento da razão capital-produto significa que a produção no Brasil passou a ser
mais exigente em aporte de capital, esta seria uma das principais razões para a redução do
crescimento econômico nas décadas de 80 e 90. Todavia, numa análise em termos de regime
de acumulação a questão distributiva deve ser incluída nas análises dos padrões de
crescimento.

GRÁFICO 6 INVESTIMENTO E ACUMULAÇÃO DE CAPITAL (1940 - 2003)

Taxa de acumulação = I / K (L)


Taxa de investimento = I / Y (R)
15% 36%

14% 34%
32%
13%
30%
12% 28%
11% 26%
24%
10%
22%
9%
20%
8% 18%
7% 16%
14%
6%
12%
5% 10%
4% 8%
1940 1946 1952 1958 1964 1970 1976 1982 1988 1994 2000
1943 1949 1955 1961 1967 1973 1979 1985 1991 1997 2003

FONTE: Dados sobre estoque de capital fixo estimados por MORANDI (2002) e IPEADATA.
NOTE: K é o estoque bruto de capital fixo, FBKF é a formação bruta de capital fixo, em valores constantes de
2000. As linhas pontilhadas indicam as séries tendenciais estimadas pelo método Lowess smoothing (Cleveland,
1979).

141
É interessante observar-se que a constância da relação capital-produto é um dos fatos estilizados listados por
KALDOR (1957). No entanto, FOLEY e MICHL (1999) chamam a atenção para a queda da produtividade do
capital observada para seis países (EUA, França, Alemanha, Países Baixos, Inglaterra e Japão).
142
Essa constatação também foi encontrada por BACHA e BONELLI (2004).
168

Conseqüentemente, não é sem razão que as décadas de 80 e 90 tornaram-se conhecidas


pejorativamente como as duas décadas perdidas , seja em termos de crescimento econômico,
seja em termos de deterioração dos indicadores sociais, numa sociedade secularmente
marcada por níveis extremos de desigualdade de renda e de propriedade.

GRÁFICO 7 EVOLUÇÃO DA RELAÇÃO CAPITAL-PRODUTO (1940 -2003)

RELAÇÃO CAPITAL-PRODUTO ----- SÉRIE TENDENCIAL


4,5

4,0

3,5

3,0

2,5

2,0

1,5

1,0

0,5
1940 1946 1952 1958 1964 1970 1976 1982 1988 1994 2000
1943 1949 1955 1961 1967 1973 1979 1985 1991 1997 2003

FONTE: Cálculos a partir dos dados sobre estoque de capital fixo estimados por MORANDI (2002) e
IPEADATA; IBGE para os valores do PIB. Série tendencial (linha pontilhada) estimada pelo método lowess
smoothing.

3.2.2 Inflação
A alta inflação foi uma das características dos anos 80 e da primeira metade dos 90,
constituindo-se num dos principais problemas macroeconômicos enfrentados pelo Estado
brasileiro. No que concerne às políticas de combate à inflação, o enfoque oscilou entre as
tradicionais medidas ortodoxas e os planos heterodoxos envolvendo controles de preços e
salários, alternados com políticas monetárias restritivas. Todavia, como se procurará mostrar
nas próximas seções, o Plano Real, o único programa de estabilização de preços bem-
sucedido em superar o regime monetário-financeiro inflacionista, pôde contar com a mudança
relativamente rápida da forma institucional de inserção no regime internacional, ao longo dos
anos 90. A intensificação da concorrência internacional contribuiu para conter as pressões
inflacionárias, sobretudo durante a fase de sobrevalorização cambial entre 1994 e 1999.
169

GRÁFICO 8 EVOLUÇÃO DO CUSTO DE VIDA E A DEFLAÇÃO DO SUBPERÍODO [1928-1933]

Taxa de variação do Índice de Preços ao Consumidor_RJ


18%
16%
14%
12%
10%
8%
6%
4%
2%
0%
-2%
-4%
-6%
-8%
-10%
-12%
1913 1915 1917 1919 1921 1923 1925 1927 1929 1931 1933

FONTE: Dados originários da FGV e obtidos no IPEADATA.


NOTA: Variação do antigo Índice de Custo de Vida (ICV) da Cidade do Rio de Janeiro, atualmente denominado
Índice de Preços ao Consumidor.
GRÁFICO 9 TAXAS DE INFLAÇÃO NO PERÍODO [1934-2003]

IGP-DI
IPC_RJ
5000%
2500%

750%
500%
250%
Escala log

75%
50%
25%

8%
5%
3%

1934 1940 1946 1952 1958 1964 1970 1976 1982 1988 1994 2000
1937 1943 1949 1955 1961 1967 1973 1979 1985 1991 1997 2003

FONTE: Dados originários da FGV e obtidos no IPEADATA.


O Gráfico 8 exibe, para o período [1913-1933], a evolução do índice de preços ao
consumidor (IPC)143 da Cidade do Rio de Janeiro. Iniciada em 1913, esta série é a mais antiga
medida de inflação disponível. Pode-se observar o único período do século 20, [1928-1933],
onde a economia brasileira teve deflação.
143
Anteriormente denominado Índice de Custo de Vida (ICV).
170

O Gráfico 9 mostra as mesmas variáveis para o período [1934-2003], em escala


logarítmica já que as taxas são todas positivamente crescentes.

O Gráfico 10 permite uma visualização mais precisa acerca do comportamento da taxa


de inflação para cada ano do período pós-Plano Real. O índice utilizado é o índice de preços
ao consumidor amplo (IPCA). Elaborado pelo IBGE, é este o indicador oficial eleito pelo
Fundo Monetário Internacional para gestão do sistema de metas de inflação, adotado pelo
Brasil após o ataque especulativo de janeiro de 1999.

GRÁFICO 10- TAXA DE INFLAÇÃO NO PERÍODO PÓS-PLANO REAL (1995 2003)

ÍNDICE DE PREÇOS AO CONSUMIDOR AMPLO -IPCA ( % a.a )


24%
22%
20%
18%
16%
14%
12%

9%
8%
6%
4%

2%
0%
1995 1996 1997 1998 1999 2000 2001 2002 2003

FONTE: IBGE

O exame da Tabela 3 sugere que taxas menores de inflação foram obtidas ao custo de
menos crescimento econômico. Em outros termos, a redução da inflação significou também a
entrada da economia brasileira numa fase em que vigoram taxas reais de juros extremamente
elevadas e tendem a aumentar o custo de capital. Desestimulando as inversões produtivas, as
atuais taxas de juros passam a desempenhar o papel antes ocupado pela inflação no período
pré-Real, ou seja, funcionam como mecanismo de alocação da poupança nacional para o setor
financeiro144. Uma outra hipótese pode então ser testada: com a perda dos ganhos
inflacionários imposta pelo Plano Real, o sistema bancário-financeiro os substitui pelos

144
No período de alta inflação, anterior ao Plano Real, as classes de mais alta renda mantinham parte
significativa de sua renda e riqueza sob forma financeira, porque o sistema bancário-financeiro garantia-lhes a
recomposição das perdas inflacionárias e ganhos fáceis e de liquidez imediata. Esta foi uma das razões básicas
para o rápido desenvolvimento financeiro observado naquele período. Atualmente, com inflação baixa, dever-se-
ía esperar o retorno dos capitais prioritariamente para inversões produtivas, inclusive as de prazo mais longo.
Contudo não o fazem, pois tendem a permanecer novamente concentrados na esfera financeira, dados os juros
reais extremamente generosos desfrutados pelos credores do Estado, das empresas e das famílias.
171

ganhos usurários dos ativos financeiros conectados ao endividamento público. A inflação


permanece baixa, mas o sistema econômico vê-se prisioneiro dos juros reais ainda em
patamares muito elevados para permitir uma retomada vigorosa e auto-sustentada do
crescimento econômico.

TABELA 3 INFLAÇÃO E CRESCIMENTO ECONÔMICO (1993 2003)

PERÍODO IPCA PIB


1993-1994 1696,8% 5,4%
1995-1998 9,7% 2,6%
1999-2003 8,9% 1,6%

FONTE: IBGE

NOTA: O critério para a periodização considerou a implementação do Plano Real em julho de 1994, sendo,
portanto, o ano de 1993 ainda de alta inflação. O segundo período [1995-1998] caracteriza-se pelos anos de
crise financeira nos países em desenvolvimento e que impactaram na gestão da política econômica
brasileira: México (1995), Ásia (1997), Rússia (1998). O terceiro e último período inclui as crises
financeiras cujos epicentros surgiram na própria economia brasileira (1999 e 2002).

3.2.3 Desemprego e relações de trabalho


Se o processo inflacionário pôde ser debelado a partir do Plano Real, a sociedade
brasileira enfrenta agora o grave problema do desemprego. A taxa média nas regiões
metropolitanas entrou numa tendência de elevação a partir de 1988. Após a desvalorização
cambial de 1999, essa tendência se reverte (Gráfico 11). Mas a situação do mercado de
trabalho da região metropolitana de São Paulo é particularmente grave, pois as taxas
dispararam nos anos 90 e o desemprego total (aberto mais oculto) atinge a média de 19,83%
em 2004 (Gráfico 12).

Ressalte-se ainda pelo Gráfico 13, que a redução das taxas totais entre 1985 e 1990,
deveu-se ao declínio do desemprego oculto, provavelmente em razão da retomada dos
movimentos sociais, num período marcado pela redemocratização do país e pela reafirmação
de direitos trabalhistas que seriam codificados na Constituição de 1988. No entanto, com as
transformações estruturais e as tendências estagnacionistas que marcaram os anos 90, o
desemprego oculto voltou a subir.
172

GRÁFICO 11 EVOLUÇÃO DO DESEMPREGO ABERTO (1980-2002)

Taxa de desemprego aberto e Lowess smootinhg


10%

9%

8%

7%

6%

5%

4%

3%

2%
1980 03 1983 09 1987 03 1990 09 1994 03 1997 09 2001 03
1981 12 1985 06 1988 12 1992 06 1995 12 1999 06 2002 12

FONTE: Taxa de desemprego aberto - referência: 30 dias Regiões metropolitanas - Mensal - (%) PME /
IBGE.

GRÁFICO 12 DESEMPREGO ABERTO E OCULTO NA REGIÃO METROPOLITANA DE SÃO


PAULO (1984 2004)

TAXA DE DESEMPREGO TOTAL


TAXA DE DESEMPREGO ABERTO
TAXA DE DESEMPREGO OCULTO
(DESALENTO + TRABALHO PRECÁRIO)
22%
20%
18%
16%
14%
12%
10%
8%
6%
4%
2%
0%
1984 1986 1988 1990 1992 1994 1996 1998 2000 2002 2004

FONTE: Dados mensais originários do Sistema Estadual de Análise de Dados e Departamento Intersindical de
Estatística e Estudos Sócio-Econômicos, Pesquisa de Emprego e Desemprego (SEADE e DIEESE/PED). As
séries correspondem às taxas médias anuais. Para o ano de 1984, taxa do mês de dezembro; para o ano de 2004,
taxa média do primeiro semestre.
173

As metodologias atualmente utilizadas para a construção dos indicadores de


desemprego buscam captar melhor as características do mercado de trabalho brasileiro.145
Segundo o DIEESE146, trata-se de um mercado pouco estruturado, com grande
disponibilidade de força de trabalho e dinamizado por uma estrutura produtiva marcada por
grandes diferenças entre empresas, no que concerne a tamanho, tecnologia, participação no
mercado e, pode-se acrescentar, quanto ao nível de institucionalidade das relações de
emprego. Mas independentemente da metodologia escolhida, todos os indicadores apontam
para a elevação das taxas de desemprego no país.

O fato alarmante refere-se não apenas ao aumento do desemprego em si, mas à


desestruturação do mercado de trabalho que marca a entrada da economia brasileiro no
terceiro período [1980-2003], destacado na seção 3.2.1. Como observa MATTOSO (1996,
p.9):

O Brasil nunca conviveu com um desemprego tão elevado. Tampouco com


um grau crescente de deterioração das condições de trabalho, com o
crescimento vertiginoso do trabalho temporário, por tempo determinado, sem
renda fixa, em tempo parcial, enfim, os milhares de bicos que se espalharam
pelo país
Este quadro contrasta fortemente com o padrão observado no segundo período [1942-
1979], quando o avanço da urbanização e da industrialização foi acompanhado de uma
elevada geração de empregos formais, apesar das altas taxas de crescimento demográficos
então vigentes. Mas ao longo dos anos 90 o processo de desestruturação do mercado de
trabalho se intensifica, atingindo inclusive o setor industrial, tradicionalmente caracterizado
por um maior grau de institucionalização das relações de emprego. Ao analisar o
comportamento do emprego industrial nesta década, SABOIA (2000)147 observa que:

(...) Os empregos resultantes do processo de enxugamento ao longo da


década de noventa mostraram-se, em grande parte, de má qualidade, exigindo
baixo nível de qualificação e pagando baixos salários. Apenas uma pequena
parcela pode ser considerada como bons empregos. Em outras palavras, a
modernização e o aumento da produtividade ocorridos nos últimos anos não
acarretaram a melhoria dos empregos. Por outro lado, o crescimento do nível
de renda verificado até 1997, foi praticamente perdido no final da década .
Pelo Gráfico 13 pode-se observar a evolução da participação do emprego formal e do
informal no total das relações de emprego nas regiões metropolitanas, pesquisadas pela

145
Estes são os casos específicos da Pesquisa de Emprego e Desemprego (PED) da Fundação Seade e do
DIEESE, e da Nova Pesquisa Mensal de Emprego (PME) do IBGE.
146
Departamento Intersindical de Estatísticas e Estudos Sócio-Econômicos, Elementos para Compreender a
Controvérsia sobre as Taxas de Desemprego no Brasil , site do DIEESE, julho de2004.
147
J.S. SABOIA. Emprego Industrial no Brasil Situação Atual e Perspectivas para o Futuro , IE/UFRJ, 2000.
174

PME148. Destaca-se o aumento da participação relativa dos empregos informais precisamente


a partir de 1990, quando a economia brasileira entra numa fase de grandes transformações
estruturais (privatização, abertura comercial e financeira, reestruturação industrial). Na escala
atual em que se processa, o avanço da informalidade traz conseqüências danosas sobre a
configuração da wage-labor nexus, como o aprofundamento da flexibilidade quantitativa e
salarial, além dos efeitos negativos sobre as contribuições previdenciárias.

GRÁFICO 13 EVOLUÇÃO DAS PARTICIPAÇÕES DO TRABALHO FORMAL E INFORMAL NO


TOTAL DAS RELAÇÕES DE EMPREGO (1982 -2002)

EMPREGADOR
TRABALHADORES FORMAIS
TRABALHADORES INFORMAIS
70%

60%

50%

40%

30%

20%

10%

0%
1982 1984 1986 1988 1990 1992 1994 1996 1998 2000 2002

FONTE: Dados obtidos no IPEADATA e originários da PME/IBGE.


NOTA: Não se considerou o pessoal ocupado em outras atividades.

A evolução do desemprego a nível setorial pode ser observada pelo Gráfico 14. A
indústria de transformação, as atividades comerciais e a construção civil apresentam as mais
elevadas taxas de desemprego

148
Pesquisa Mensal de Emprego do IBGE.
175

GRÁFICO 14 EVOLUÇÃO DO DESEMPREGO POR SETORES (1996 - 2002)

INDÚSTRIA DE TRANSFORMAÇÃO
CONSTRUÇÃO CIVIL
COMÉRCIO
SERVIÇOS
OUTRAS ATIVIDADES
10,00%
9,00%
8,38%
7,57%
6,79%
6,00%
5,00%
4,00%
3,00%
2,00%
1,00%
1996 1997 1998 1999 2000 2001 2002

FONTE: Abrangência: Seis Regiões Metropolitanas PME / IBGE Unidade: Porcentagem da PEA.

Para fins descritivos estimou-se a relação de Okun para o período [1980 2002],
utilizando-se dados trimestrais para a taxa de desemprego e para o hiato do PIB (Gráfico
15)149. Os dois coeficientes revelaram-se estatisticamente significativos ao nível de 1%.
Todavia, os testes do CUSUM identificaram duas mudanças estruturais (em 1987 e em 1996)
e então novas estimações foram realizadas para três subperíodos onde a relação mostrou-se
estável (Quadro 13).

149
FERREIRA e AGUIRRE (2001) definem o hiato do produto como a diferença entre o PIB efetivo e PIB
potencial, para efeitos de comparação, segue-se o mesmo procedimento. Esses autores obtiveram estimativas
próximas para a taxa de desemprego de longo prazo (6,05 %) na economia brasileira, verificada quando o
produto efetivo é igual ao produto potencial, e para o coeficiente do hiato (0,25).
176

GRÁFICO 15 RELAÇÃO DE OKUN PARA A ECONOMIA BRASILEIRA(1980 - 2002)

U = 6,16 - 0,27*H
10,0
TAXA DE DESEMPREGO ( U ) EM %

8,7
8,1
7,6
6,9
6,3
5,7
5,2
4,5
4,0
3,4
2,9

2,0
-8,0 -6,3 -5,2 -4,0 -2,6 -1,5 -0,4 0,6 1,9 3,1 4,5 5,6 8,0
HIATO DO PIB ( H ) EM %

FONTE: Taxa de desemprego aberto - referência: 30 dias - RMs - Mensal - (%) IBGE.
NOTA: Dados trimestrais. O hiato do produto ( H ) = PIB efetivo PIB potencial.

Em uma primeira análise, pois essa questão será aprofundada na seção sobre o rapport
salarial, pode-se mobilizar algumas hipóteses quanto a esses padrões contrastados de
evolução da relação entre desemprego e hiato do produto na economia brasileira
contemporânea.

QUADRO 13 DESEMPREGO E HIATO DO PRODUTO (1980-2002): TRÊS FASES PARA A


RELAÇÃO DE OKUN

[1980 T1 1987 T3] [1987 T4 1995 T4] [1996 T1 2002 T4]

U = 6,44 0,32. H U = 4,71 0,25. H U = 7,36 0,45. H

t: (28,72) (-4,97) t: (32,99) (-5,65) t: (41,94) (-3,44)

R2 = 0,44 R2 = 0,58 R2 = 0,29

FONTE: Estimações econométricas a partir de dados do IBGE e IPEADATA.


177

O primeiro subperíodo [1980 T1 1987 T3] caracteriza-se por uma economia ainda
fechada em termos de comércio internacional. E embora os dispositivos institucionais de
proteção do mercado interno tenham contribuído para uma maior estabilidade das relações de
emprego, a década dos 80 caracterizou-se pela estagnação e a alta inflação, bem como pela
chamada crise fiscal do Estado. Mais precisamente, os anos de 1981-1983 foram marcados
por forte recessão induzida pela política econômica150, enquanto a segunda metade da década
assistirá a implementação de diversos programas heterodoxos de estabilização de preços151.
Estes últimos apesar de não lograrem êxito no combate à inflação, contribuíram para
expansões temporárias da demanda agregada que terminaram por manter a curta fase de
recuperação do PIB, observada após o ano recessivo de 1983. Um resultado direto dessa
conjunção de fatores foi a redução da taxa de desemprego entre 1984 e 1987. Mas como o
processo de informalização continuou em uma tendência persistente de expansão152, o
coeficiente que expressa a sensibilidade da taxa de desemprego às variações do produto
terminou situando-se no patamar de 0,32.153 Isto significa que uma queda de 1% no PIB
efetivo em relação ao PIB potencial tende a provocar uma elevação de 0,32 % na taxa de
desemprego neste primeiro subperíodo da série.

No segundo período [1987 T4 - 1995 T4], paradoxalmente numa fase de


aprofundamento do grau de abertura comercial e financeira da economia brasileira, o
coeficiente reduz-se para 0,25. Considerando-se razoáveis os ajustes e a qualidade dos dados
utilizados, poder-se-ia propor a seguinte hipótese para explicar esse comportamento: neste
período, observa-se a retomada dos movimentos sociais, desencadeando o processo de
redemocratização do país e conduzindo, através da Nova República , à promulgação da
Constituição Federal de 1988. Esta última procurou reafirmar os direitos trabalhistas,

150
Nesse subperíodo, o Brasil assina um acordo com o FMI com o objetivo básico de equilibrar as contas
externas. Segundo LANZANA (2000, p. 114), a política econômica promoveu a desvalorização cambial, o
arrocho salarial, o corte dos gastos públicos com aumento de impostos, além do controle monetário e a elevação
das taxas de juros.
151
Plano Cruzado em 1986 e Plano Bresser em 1987.
152
Os dados do IBGE, relativos ao número de trabalhadores do setor informal, apontam uma tendência de
expansão que é prévia ao processo de abertura comercial e financeira, pois a série disponível tem início em 1982.
Detalhas dessa questão será explicitados durante a análise da evolução da forma institucional do rapport
salarial.
153
CORIAT e SABOIA (1995) argumentam que os setores formal e informal no Brasil evoluem em uma
dinâmica complementar de acordo com as fases do ciclo econômico. Durante as recessões constata-se a
migração de trabalhadores registrados para o setor informal, mas durante as fases de retomada do crescimento
econômico o inverso ocorre. Esta característica do mercado de trabalho brasileiro permitiria acomodar as
pressões sociais contribuindo para a reprodução das estruturas básicas da acumulação de capital no país. Numa
abordagem regulacionista considera-se que os parâmetros das relações macroeconômicas, inclusive a
regularidade de Okun, são determinados institucionalmente e portanto são estruturalmente dependentes das
particularidades da forma vigente de regulação.
178

apontando para uma reconstrução institucional das relações entre capital e trabalho no Brasil,
após o longo período sob regime político militar-autoritário. A hipótese então é a de que esse
processo teve algum efeito redutor da flexibilidade das relações de emprego.

O terceiro subperíodo [1996 T1 2002 T4] foi marcado pelo aprofundamento das
transformações estruturais que tiveram início na segunda fase e que rompem com a lógica do
modelo econômico baseado no processo de industrialização substitutiva de importações. A
implementação do Plano Real em 1994, conjugada com uma fase de sobrevalorização cambial
sem precedentes históricos provocaria uma rápida mudança na forma de inserção da economia
brasileira no regime internacional. No plano ideológico esse período caracterizou-se também
pelo predomínio do ideário neoliberal que, através do processo de globalização , criou as
condições sócio-políticas para uma reconfiguração relativamente rápida das formas
institucionais. A exposição drástica da indústria brasileira à concorrência internacional levou
à busca de maior flexibilidade quantitativa e salarial num mercado de trabalho já marcado por
níveis elevados de informalidade, precariedade e de rotatividade da mão-de-obra. Em
conseqüência, a resistência dos movimentos sindicais diante das transformações econômicas
então em curso é quebrada o que se refletirá na elevação do coeficiente para 0,45, sinalizando
o aumento da sensibilidade das taxas de desemprego aberto às variações no hiato do PIB.

Uma forma alternativa de apresentar essa relação entre desemprego e crescimento


econômico é mostrada no Gráfico 16. Neste diagrama de dispersão estão plotadas as taxas de
crescimento do PIB efetivo com as primeiras diferenças nas taxas de desemprego aberto da
economia brasileira.154 Os coeficientes obtidos foram estatisticamente significativos ao nível
de 5% e então se pode calcular a taxa de crescimento econômico necessária para se manter o
desemprego estável (0,51 / 0,21= 2,43), ou seja, a economia brasileira precisa crescer a uma
taxa de no mínimo 2,43 % a.a apenas para manter inalterada a taxa de desemprego aberto.

154
Esta formulação é utilizada por BLANCHARD (1997 ) e MANKIW (1992 ) e corresponde a de uso mais
comum.
179

GRÁFICO 16 TAXA DE DESEMPREGO E PIB EFETIVO (1981 -2002)

(Ut - Ut-1 ) = 0,51 - 0,21* TxY


t: (2,52) (-4,09)
3,0
1998
2,0
Variação (Ut - Ut-1 ) em %

1981
1,4 1990 2002
1992 1996
1983
0,8 1991 1984
1997
0,4 1988 1987
1999
-0,1 19951993 1994
2000
1989
-0,6 2001
1982
-1,1
1986
-1,9
1985
-2,3

-3,0
-6,0 -4,3 -2,9 -0,5 0,8 1,9 3,2 4,4 5,9 7,5 10,0
Taxa de crescimento do PIB (TxY) em %

FONTE: Taxas médias anuais calculadas a partir das taxas mensais de desemprego aberto - referência: 30 dias
regiões metropolitanas - PME do IBGE e PIB pelo IPEADATA.

3.2.4 Setor externo


A dinâmica cíclica das exportações, das importações e do PIB pode ser analisada a
partir do Gráfico 18. A fim de se eliminar as oscilações de curto prazo, as séries foram
filtradas pelo filtro 4253H, obtendo-se o comportamento tendencial. As séries iniciam-se em
plena Grande Crise de 1929/30, quando as taxas de crescimento são todas negativas, mas
voltam a subir a partir de 1931. Próximo do fim da Segunda Guerra Mundial as taxas de
crescimento dessas variáveis são positivas e em uma rápida expansão pró-cíclica. Conforme
BAER (1995, p.67), a queda drástica das importações durante a guerra e o incremento das
exportações decuplicaram as reservas cambiais do país. No entanto, como revela o Gráfico
18, a quase totalidade desse acúmulo de reservas foi consumido com a denominada febre de
importações que marcaria o imediato pós-guerra.

O padrão observado nos anos 50 contrasta fortemente com o anterior, destacando-se


pela evolução desconectada do PIB com relação às exportações e a redução da sensibilidade
das importações que evoluem sob taxas de crescimento bem menores do que as do PIB.
Segundo BAER (1995, p. 71), em meados dos anos 50, o caráter do sistema cambial mudou,
passando de um instrumento para resolver as dificuldades do balanço de pagamentos a uma
ferramenta para promover ativamente a industrialização. Trata-se do período em que o Plano
180

de Metas é implementado para promover o PISI em sua nova fase, concernente à lógica de
desenvolvimento econômico associado ao capital estrangeiro. E neste contexto destaca-se a
Lei de Tarifa de 1957, que oferecia a proteção às indústrias recém-criadas. A fase de expansão
correspondente desemboca na crise de 1962/63.

GRÁFICO 17 DINÂMICA DO PIB, DAS EXPORTAÇÕES E DAS IMPORTAÇÕES (1947-2003)

TAXA DE CRESCIMENTO DAS IMPORTAÇÕES (Esq.)


TAXA DE CRESCIMENTO DAS EXPORTAÇÕES (Esq.)
TAXA DE CRESCIMENTO DO PIB (Dir.)
30% 12%

20% 10%
TxX 8%
10%
6%
0% TxM
4%
-10%
TxY 2%
-20%
0%
-30% -2%

-40% -4%
1929
1931
1933
1935
1937
1939
1941
1943
1945
1947
1949
1951
1953
1955
1957
1959
1961
1963
1965
1967
1969
1971
1973
1975
1977
1979
1981
1983
1985
1987
1989
1991
1993
1995
1997
1999
2001
2003
FONTE: Elaborado a partir de dados do IPEADATA.

NOTA: Taxas de variação filtradas pelo filtro 4253H. Valores para o PIB, exportações e importações em dólares
de 2000 deflacionados pelo IPA dos EUA.

No início da década de 80, o governo brasileiro promoverá as políticas necessárias ao


ajuste do balanço de pagamentos e então o PIB reduz-se significativamente com as recessões
de 1981/83 e também as importações. Mas os anos 90 são particularmente atípicos, pois as
importações disparam e crescem à taxas bem superiores às exportações, provocando o déficit
na balança comercial observado no Gráfico 18. Neste último, pode-se acompanhar a evolução
das participações dessas variáveis no PIB. Note-se que apesar dos picos registrados em 1954
(13,9%), 1984(14,2%) e 2003 (14,8%), para as exportações, a média de toda a série não
ultrapassa 8% do PIB. Com relação às importações, os picos apresentam-se em 1954 (12,6%),
1974 (11,5%) e 2001 (10,9%), mas a média para o período completo limita-se a 7,3% do PIB.
Isto não é certamente um padrão típico de uma economia aberta em termos de comércio
exterior.
181

GRÁFICO 18 PARTICIPAÇÃO DAS EXPORTAÇÕES, IMPORTAÇÕES E SALDO COMERCIAL


NO PIB (1947-2003)

X / PIB
M / PIB
(X - M) / PIB
16%
14% X/Y
12%
10%
M/Y
8%
6%
4%
2%
0%
-2%
-4%
-6%
1947 1955 1963 1971 1979 1987 1995 2003
1951 1959 1967 1975 1983 1991 1999

FONTE: Elaborado a partir de dados do IPEADATA


NOTA: Exportações (X), importações (M) e PIB em bilhões de dólares correntes.

O exame da Tabela 4 permite constatar-se que em termos gerais, a balança comercial


manteve-se relativamente equilibrada. As exceções correspondem ao anos de 1952, 1960,
1962, no período correspondente ao primeiro e segundo choques energéticos dos anos 70 e
durante a fase pós-Plano Real de câmbio sobrevalorizado (1995-1999). Então o problema
básico se encontra na conta de serviços e rendas que permanece deficitária por toda a série
desde de 1947, em razão dos fluxos de pagamentos de juros e de remessas de lucros e
dividendos. Conseqüentemente, o saldo de transações correntes foi determinado na quase
totalidade do período pelo déficit na conta de serviços.155

A Tabela 5 mostra o resultado global do balanço de pagamentos, onde novamente


podem ser observados os saldos em transações correntes e a magnitude dos déficits que
caracterizaram o período pós-Real. Apesar dos fluxos de entrada de capitais estrangeiros
terem sido similares em ordem de grandeza, não foram suficientes para o equilíbrio do
balanço de pagamentos. O Brasil teve então de recorrer aos empréstimos de regularização,

155
Segundo GREMAUD et alii (2004, p. 271), a crise da dívida externa do Brasil e de outros países do terceiro
mundo serve para ilustrar os limites da manutenção por longos períodos de tempo de déficits nas transações
correntes financiados com endividamento externo. Em determinado ponto, só o pagamento de juros sobre essa
dívida pode consumir todo o esforço exportador do país.
182

com o conseqüente ônus social ocasionado pelas políticas de ajuste macroeconômico impostas
pelo FMI.

Pelo Gráfico 19 pode-se observar que, a partir de 1979, os pagamentos de juros


passam a responder por mais de 60% do déficit da conta de serviços e rendas. Por outro lado,
as remessas de lucros e dividendos permanecem relativamente estáveis numa média de cerca
de 20% do déficit dessa conta entre 1947-1979. Caem para um patamar próximo a 10% nos
anos 80 e depois atingem uma média de 15% do déficit dessa conta, nos anos 90.

Essa enorme transferência de recursos ao exterior está certamente relacionada ao


desempenho macroeconômico medíocre das últimas décadas do século XXI. Como se pôde
observar no exame do Gráfico 6, as taxas de investimento e de acumulação neste período são
as historicamente mais baixas obtidas pela economia brasileira em sua etapa industrial.

GRÁFICO 19 PARTICIPAÇÃO DOS PAGAMENTOS LÍQUIDOS DE JUROS E REMESSAS DE


LUCROS E DIVIDENDOS NO SALDO DA CONTA DE SERVIÇOS (1947-2003)

PAGAMENTO LÍQUIDO DE JUROS / SALDO DA CONTA DE SERVIÇOS


REMESSAS DE LUCROS E DIVIDENDOS / SALDO DA CONTA DE SERVIÇOS
90,0%

80,0%

70,0%

60,0%

50,0%

40,0%

30,0%

20,0%

10,0%

0,0%
1947 1955 1963 1971 1979 1987 1995 2003
1951 1959 1967 1975 1983 1991 1999

FONTE: Elaborado a partir de dados do IPEADATA.

Complementando as informações do Gráfico 19, o Gráfico 20 mostra a maneira como


a dívida externa total avançou como percentagem do PIB brasileiro, a partir do ano de 1998.
A tão decantada estabilidade de preços obtida pelo Plano Real teve obviamente um custo
econômico muito elevado para uma economia que tem se caracterizado por baixas taxas de
crescimento e por dificuldades maiores no que concerne à geração de empregos e à
manutenção dessa mesma estabilidade.
183

Três indicadores de vulnerabilidade externa estão representados no Gráfico 21, para o


período 1956-2003. A relação dívida externa / exportações permanece relativamente estável
entre 1956-1971. A partir de 1973, ano que marca a crise do milagre , a tendência dessa
relação é de crescimento. De meados dos anos 80 a 1994, a tendência foi de queda. O período
pós-Plano Real marca nova tendência de expansão que somente é interrompida após a
desvalorização cambial de 1999. Quanto à relação reservas internacionais / importações, na
primeira metade dos anos 90 período de abertura comercial e financeira as reservas
internacionais são mais do que suficientes para cobrir as importações de bens e serviços da
economia brasileira. Após 1996, a relação se deteriora continuamente até 2000, quando então
volta a recuperar-se. Em 2003, o volume de reservas internacionais é exatamente suficiente
para cobrir a totalidade das importações deste ano.
184

TABELA 4- BALANÇO DE PAGAMENTOS EM CONTA CORRENTE SALDOS EM MILHÕES DE


DÓLARES (1947 2003)

TRANSFERÊNCIAS TRANSAÇÕES CORRENTES


ANO BALANÇA COMERCIAL (A) SERVIÇOS E RENDAS (B)
UNILATERAIS (C) ( T = A + B + C)

1947 96 -276 -24 -204


1948 207 -315 -7 -115
1949 139 -271 -3 -135
1950 414 -319 -2 93
1951 44 -536 -2 -494
1952 -302 -421 -2 -725
1953 395 -393 -14 -12
1954 147 -378 -5 -236
1955 319 -344 -10 -35
1956 407 -419 -11 -23
1957 106 -393 -13 -300
1958 66 -327 -4 -265
1959 72 -407 -10 -345
1960 -24 -498 4 -518
1961 111 -389 15 -263
1962 -90 -402 39 -453
1963 112 -326 43 -171
1964 343 -317 55 81
1965 655 -446 75 284
1966 438 -548 79 -31
1967 213 -566 77 -276
1968 26 -630 22 -582
1969 318 -713 31 -364
1970 232 -1 092 21 -839
1971 -344 -1 300 14 -1 630
1972 -241 -1 452 5 -1 688
1973 7 -2 119 27 -2 085
1974 -4 690 -2 814 1 -7 504
1975 -3 540 -3 461 2 -6 999
1976 -2 255 -4 172 1 -6 426
1977 97 -4 923 0 -4 826
1978 -1 024 -6 030 71 -6 983
1979 -2 839 -7 880 11 -10 708
1980 -2 823 -10 059 143 -12 739
1981 1 202 -13 094 186 -11 706
1982 780 -17 039 -14 -16 273
1983 6 470 -13 354 111 -6 773
1984 13 090 -13 156 161 95
1985 12 486 -12 877 143 -248
1986 8 304 -13 707 80 -5 323
1987 11 173 -12 676 65 -1 438
1988 19 184 -15 096 92 4 180
1989 16 119 -15 334 246 1 032
1990 10 752 -15 369 833 -3 784
1991 10 580 -13 543 1 555 -1 407
1992 15 239 -11 336 2 206 6 109
1993 13 299 -15 577 1 602 -676
1994 10 466 -14 692 2 414 -1 811
1995 -3 466 -18 541 3 622 -18 384
1996 -5 599 -20 350 2 446 -23 502
1997 -6 753 -25 522 1 823 -30 452
1998 -6 575 -28 299 1 458 -33 416
1999 -1 199 -25 825 1 689 -25 335
2000 -698 -25 048 1 521 -24 225
2001 2 650 -27 503 1 638 -23 215
2002 13 121 -23 229 2 390 -7 718
2003 24 825 -23 640 2 867 4 051

FONTE: Elaborado a partir dos dados do IPEADATA.


185

TABELA 5- RESULTADO GLOBAL DO BALANÇO DE PAGAMENTOS SALDOS EM MILHÕES


DE DÓLARES (1947 2003)

RESULTADO GLOBAL DO
SALDO EM TRANSAÇÕES MOVIMENTOS DE CAPITAIS
ANO BALANÇO DE
CORRENTES ( T ) AUTÔNOMOS (KA)
PAGAMENTOS (T+ KA)
1947 -204 340 136
1948 -115 48 -67
1949 -135 168 33
1950 93 -123 -30
1951 -494 413 -81
1952 -725 698 -27
1953 -12 -28 -40
1954 -236 247 11
1955 -35 47 12
1956 -23 206 183
1957 -300 139 -161
1958 -265 235 -30
1959 -345 320 -25
1960 -518 504 -14
1961 -263 441 178
1962 -453 335 -118
1963 -171 134 -37
1964 81 -83 -2
1965 284 -66 218
1966 -31 22 -9
1967 -276 14 -262
1968 -582 679 97
1969 -364 895 531
1970 -839 1 373 534
1971 -1 630 2 167 537
1972 -1 688 4 226 2 538
1973 -2 085 4 465 2 380
1974 -7 504 6 463 -1 041
1975 -6 999 5 935 -1 064
1976 -6 426 9 114 2 688
1977 -4 826 5 540 714
1978 -6 983 11 245 4 262
1979 -10 708 7 493 -3 215
1980 -12 739 9 267 -3 472
1981 -11 706 12 331 625
1982 -16 273 11 731 -4 542
1983 -6 773 6 749 -24
1984 95 6 932 7 027
1985 -248 -209 -457
1986 -5 323 1 487 -3 836
1987 -1 438 2 453 1 015
1988 4 180 -2 931 1 249
1989 1 032 -146 886
1990 -3 784 4 265 481
1991 -1 407 1 038 -369
1992 6 109 8 561 14 670
1993 -676 9 385 8 709
1994 -1 811 9 026 7 215
1995 -18 384 31 303 12 919
1996 -23 502 32 168 8 666
1997 -30 452 22 545 -7 907
1998 -33 416 25 446 -7 970
1999 -25 335 17 513 -7 822
2000 -24 225 21 963 -2 262
2001 -23 215 26 522 3 307
2002 -7 718 8 020 302
2003 4 051 4 445 8 496

FONTE: Banco Central do Brasil e IPEADATA.


186

GRÁFICO 20 DÍVIDA EXTERNA DE CURTO PRAZO E DÍVIDA EXTERNA TOTAL COMO


PERCENTAGEM DO PIB (1994-2003)

DÍVIDA EXTERNA DE CURTO PRAZO / DÍVIDA EXTERNA TOTAL


DÍVIDA EXTERNA TOTAL / PIB
50%

45%

40%
Dív. Ext.
35% Total / PIB
30%

25%

20%

15%

10%

5%

0%
1994 1995 1996 1997 1998 1999 2000 2001 2002 2003

FONTE: Elaborado a partir dos dados do BACEN e IPEADATA.

GRÁFICO 21 INDICADORES DE VULNERABILIDADE EXTERNA (1956-2003)

DÍVIDA EXTERNA TOTAL / EXPORTAÇÕES


RESERVAS INTERNACIONAIS / IMPORTAÇÕES
PAGAMENTOS LÍQUIDOS DE JUROS / EXPORTAÇÕES
600%
500%
400%
300%
200%

100%
90%
80%
70%
60%
50%
40%
30%
20%

10%
9%
8%
7%
6%
5%
4%

1956 1960 1964 1968 1972 1976 1980 1984 1988 1992 1996 2000
1958 1962 1966 1970 1974 1978 1982 1986 1990 1994 1998 2002

FONTE: Elaborado a partir de dados do BACEN e IPEADATA.


NOTA: Variáveis em milhões de dólares.
187

Do exame do Gráfico 22, destaca-se o grande volume de reservas internacionais no


período [1992-2003], relativamente aos períodos anteriores, e que corresponde à fase de
liberalização comercial e financeira. Assiste-se a uma reinserção da economia brasileira no
fluxo de capitais internacionais e então uma nova fase de endividamento externo tomaria
curso.156 Do ponto de vista das transformações estruturais, o Brasil empreende várias
mudanças a nível do mercado cambial, preparando o caminho para a abertura financeira,
justamente num momento em que se observava uma expansão da liquidez internacional. A
conversibilidade da moeda nacional foi ampliada e a liberalização do ingresso e saídas de
recursos externos aprofundou-se (GREMAUD et alii, 2004).

GRÁFICO 22 EVOLUÇÃO DAS RESERVAS INTERNACIONAIS (1956-2003)

RESERVAS INTERNACIONAIS (Esq.)


TAXA DE VARIAÇÃO (Dir.)
70.000 180%
160%
Milhões de US$ constantes de 2000

60.000 140%
120%
50.000 100%
80%
40.000
60%
40%
30.000
20%
20.000 0%
-20%
10.000 -40%
-60%
0 -80%
1956
1958
1960
1962
1964
1966
1968
1970
1972
1974
1976
1978
1980
1982
1984
1986
1988
1990
1992
1994
1996
1998
2000
2002

FONTE: Elaborado a partir de dados do BACEN e IPEADATA.


NOTA: Série original deflacionada pelo IPA dos EUA.157

Como resultado da liberalização financeira, do processo de privatizações e das


elevadas taxas de juros que marcaram os anos 90, os investimentos estrangeiros em carteira

156
Como se sabe, este processo não foi exclusivo do Brasil pois pôde ser observado para o conjunto da América
Latina.
157
Segundo ZINI (1995, p. 132), o uso de índices de preços ao consumidor (IPC) seria favorecido em razão de
sua abrangência e por refletirem a variação no mercado final. Todavia, o problema com esses índices é que
incluem muitos bens não-comerciáveis (serviços pessoais, habitação, etc.), enviesando a medida do grau de
competitividade do país. Ainda segundo este autor, o índice de preços por atacado (IPA) é utilizado porque
confere grande peso ao preço dos bens comerciáveis (setores industrial e agrícola) e é relevante para
comparações de preços relativos no nível dos produtores.
188

tiveram um crescimento expressivo nesta década. Destaque particular para as aplicações em


títulos de renda fixa, cuja expansão superior às aplicações em ações, foi impulsionada
sobretudo pelos juros proporcionados pela economia brasileira, vis-à-vis o resto do mundo
(Gráfico 23). Isto permitiu um substancial aumento da participação dos capitais estrangeiros
no financiamento do saldo da conta de capital, que pode ser constatado na Tabela 6. Observa-
se que os investimentos estrangeiros diretos (IDE) possuem participação crescente nesse
processo desde 1972. As aplicações em ações, que nas décadas de 70 e 80 tiveram
participações inexpressivas, passam a apresentar valores significativos na década de 1990.

GRÁFICO 23 INVESTIMENTOS ESTRANGEIROS EM CARTEIRA (1969-2003)

TÍTULOS DE RENDA VARIÁVEL (AÇÕES)


TÍTULOS DE RENDA FIXA
50.000
Saldos em US$ milhões de 2000

40.000

30.000

20.000

10.000

-10.000
1969 1972 1975 1978 1981 1984 1987 1990 1993 1996 1999 2002

FONTE: Elaborado a partir de dados do IPEADATA. Valores deflacionados pelo IPA dos EUA.

TABELA 6 PARTICIPAÇÃO DOS INVESTIMENTOS ESTRANGEIROS DIRETOS (IDE) E EM


CARTEIRA NO FINANCIAMENTO DA CONTA DE CAPITAL (1994 2003)

TÍTULOS DE
PERÍODO IDE AÇÕES
RENDA FIXA

[1972-1979] 21,8% 1,5% 4,4%

[1980-1989] 93,0% -2,3% -18,2%

[1990-1999] 113,8% 59,5% 287,0%

[2000-2003] 155,7% 25,3% -3,7%

FONTE: Elaborado a partir de dados do IPEADATA.


NOTA: Média por período.
189

O Gráfico 24 reforça as observações baseadas na Tabela 6, permitindo uma


visualização de longo prazo com relação à dinâmica dos investimentos estrangeiros diretos na
economia brasileira. Destaca-se que esses investimentos permanecem numa tendência de
expansão desde o início da série em 1947, com taxas de crescimento muito elevadas no
período do milagre e nos anos 90.

GRÁFICO 24 EVOLUÇÃO DOS INVESTIMENTOS DIRETOS ESTRANGEIROS (1947-2003)

INVESTIMENTOS DIRETOS ESTRANGEIROS (IDE-Ingressos)


40.000
US$ milhões de 2000 - Escala logarítmca

20.000

8.000
6.000
4.000

2.000

800
600
400

200

1947 1951 1955 1959 1963 1967 1971 1975 1979 1983 1987 1991 1995 1999 2003

FONTE: Elaborado a partir de dados do IPEADA.


NOTA: Valores deflacionados pelo IPA dos EUA.

3.2.5 Setor público


A partir do exame do Gráfico 25 pode-se tecer algumas considerações sobre o
comportamento da dívida do setor público brasileiro. Entre 1981 e 1993, a dívida pública total
atingiu níveis muito elevados em proporção ao PIB. Observam-se reduções em dois
momentos neste período: durante a implementação dos programas de estabilização de preços,
Plano Cruzado (1986) e Plano Collor (1990). No entanto, é a partir do Plano Real que se
observa uma queda maior dos patamares do endividamento público proporcionalmente ao
PIB, apesar da entrada em uma nova tendência de crescimento puxada principalmente pela
dívida interna, mas que se mostra mais suave dos que nos períodos anteriores.
190

GRÁFICO 25 PARTICIPAÇÃO DAS DÍVIDAS INTERNA E EXTERNA LÍQUIDAS DO SETOR


PÚBLICO NO PIB (1981-2003)

INTERNA (%PIB)
EXTERNA(%PIB)
TOTAL(%PIB)
180%

160%

140%

120%

100%

80%

60%

40%

20%

0%
1981 1983 1985 1987 1989 1991 1993 1995 1997 1999 2001 2003

FONTE: Elaborado a partir de dados do IPEADA.

Esta constatação é reforçada pela trajetória da dívida mobiliária interna federal com
sua composição representada no Gráfico 26.

GRÁFICO 26 PARTICIPAÇÃO DA DÍVIDA MOBILIÁRIA INTERNA FEDERAL NO PIB (1964-


2003)

DÍVIDA MOBILIÁRIA INTERNA FEDERAL / PIB


EM TÍTULOS DA CARTEIRA DO BANCO CENTRAL / PIB
EM TÍTULOS FORA DO BANCO CENTRAL / PIB

131%
120%

100%
89%
75%
60%
49%

31%
20%
9%
0%
1964 1970 1976 1982 1988 1994 2000
1967 1973 1979 1985 1991 1997 2003

FONTE: Elaborado a partir de dados do Banco Central do Brasil e do IPEADATA.


NOTA: Valores de final de período.
191

A evolução do endividamento público como proporção do PIB, ao nível dos Estados e


Municípios, das empresas estatais e do Governo Federal e Banco Central, pode ser observada,
respectivamente, a partir dos dados constantes das Tabelas 5, 6 e 7, para o período (1981-
2003). O Gráfico 27 fornece uma síntese das evoluções do endividamento total desses três
níveis de governo, apresentados nessas tabelas. Destaca-se o fato de que a dívida total das
empresas estatais reduziu-se significativamente ao longo dos anos 90, passando de 53%, em
1993, para 1,17% do PIB, em 2003.

TABELA 7 DÍVIDA DOS ESTADOS E MUNICÍPIOS (1981-2003)

ANO INTE RNA (% PIB) EXTE RNA(% PIB) TO T AL(% PIB )

1981 5,52% 1,14% 6,65%


1982 7,33% 1,55% 8,88%
1983 10,54% 2,70% 13,24%
1984 11,11% 3,18% 14,29%
1985 11,68% 3,78% 15,46%
1986 7,92% 2,20% 10,12%
1987 13,83% 3,18% 17,01%
1988 21,05% 4,34% 25,39%
1989 27,12% 3,87% 31,00%
1990 15,18% 2,22% 17,41%
1991 14,97% 2,73% 17,69%
1992 23,20% 3,09% 26,30%
1993 31,60% 3,87% 35,47%
1994 14,11% 0,52% 14,63%
1995 10,87% 0,35% 11,22%
1996 11,60% 0,39% 11,98%
1997 12,82% 0,49% 13,31%
1998 13,65% 0,67% 14,32%
1999 16,57% 0,97% 17,54%
2000 15,82% 1,00% 16,83%
2001 18,09% 1,09% 19,15%
2002 20,18% 1,58% 21,77%
2003 19,65% 1,26% 20,91%

FONTE: Elaborado a partir de dados do IPEADATA.


192

TABELA 8 DÍVIDA DAS EMPRESAS ESTATAIS (1981-2003)

ANO IN T E RN A (% P IB ) E XT E RN A (% P IB ) T O T A L(% P IB )

1981 7,60% 12,70% 20,30%


1982 9,93% 15,15% 25,07%
1983 15,39% 28,40% 43,79%
1984 15,62% 30,73% 46,35%
1985 16,41% 31,41% 47,81%
1986 11,62% 15,94% 27,56%
1987 21,69% 24,02% 45,71%
1988 35,72% 29,17% 64,88%
1989 37,50% 27,79% 65,28%
1990 19,34% 15,88% 35,22%
1991 24,58% 19,87% 44,45%
1992 27,00% 17,93% 44,92%
1993 32,04% 21,31% 53,34%
1994 7,48% 2,90% 10,38%
1995 5,17% 1,88% 7,05%
1996 4,05% 2,04% 6,09%
1997 0,92% 1,93% 2,85%
1998 1,26% 1,34% 2,59%
1999 1,37% 1,66% 3,04%
2000 0,91% 1,35% 2,26%
2001 0,41% 1,21% 1,63%
2002 1,44% 0,59% 2,03%
2003 0,70% 0,47% 1,17%

FONTE: Elaborado a partir de dados do IPEADATA.

TABELA 9 DÍVIDA DO GOVERNO FEDERAL E BANCO CENTRAL (1981-2003)

ANO IN T E RN A (% P IB ) E XT E RN A (% P IB ) T O T A L(% P IB )

1981 3,83% 3,83% 7,65%


1982 4,03% 4,03% 8,06%
1983 7,67% 7,67% 15,33%
1984 13,73% 13,73% 27,47%
1985 13,50% 13,50% 27,00%
1986 8,17% 8,17% 16,33%
1987 6,84% 6,84% 13,67%
1988 12,29% 12,29% 24,59%
1989 36,61% 36,61% 73,23%
1990 4,99% 4,99% 9,98%
1991 -5,31% 36,62% 31,31%
1992 2,35% 32,26% 34,61%
1993 7,02% 29,83% 36,85%
1994 9,56% 9,29% 18,85%
1995 10,32% 3,67% 13,99%
1996 14,86% 1,63% 16,49%
1997 17,26% 2,01% 19,26%
1998 21,05% 4,25% 25,30%
1999 23,93% 8,54% 32,47%
2000 24,30% 7,75% 32,05%
2001 25,74% 8,61% 34,35%
2002 26,99% 14,68% 41,67%
2003 27,62% 10,58% 38,20%

FONTE: Elaborado a partir de dados do IPEADATA.


193

GRÁFICO 27 EVOLUÇÃO DAS DÍVIDAS TOTAIS DOS ESTADOS E MUNICÍPIOS, EMPRESAS


ESTATAIS E GOVERNO CENTRAL COMO PROPORÇÃO DO PIB (1981-2003)

DÍVIDA DOS ESTADOS E MUNICÍPIOS


DÍVIDA DAS EMPRESAS ESTATAIS
DÍVIDA DO GOVERNO FEDERAL E BANCO CENTRAL
80%

70%

60%

50%

40%

30%

20%

10%

0%

-10%
1981 1983 1985 1987 1989 1991 1993 1995 1997 1999 2001 2003

FONTE: Elaborado a partir de dados do Banco Central do Brasil e do IPEADATA.

As Tabelas de nº 8 a 13 exibem as estatísticas de fluxo, ou seja, relativas ao déficit


público por níveis de governo e empresas estatais, também como percentagem do PIB.
Mantém-se o conceito de necessidades de financiamento do setor público (NFSP), por ser
esta a denominação utilizada pelos organismos internacionais e já incorporada ao Sistema de
Contas Nacionais do Brasil. No entanto, é preciso considerar as definições dos três tipos de
déficit para que se possa compreender com exatidão o comportamento da NFSP158:

a) Conceito Nominal = variação da dívida fiscal líquida;

b) Conceito Operacional (ou Real) = NFSP nominal atualização monetária da


dívida líquida;

c) Conceito Primário = NSFP Nominal despesas líquidas de juros nominais159

158
Mais detalhes acerca dessas definições podem ser encontrados em GIAMBIAGI e ALÉM (2002).
159
Despesas líquidas de juros, porque se descontam as receitas de juros relativas às aplicações das reservas
internacionais.
194

TABELA 10 NECESSIDADES DE FINANCIAMENTO DOS ESTADOS E MUNICÍPIOS EM


PERCENTAGEM DO PIB (1981 2003)

ANO NOM INAL OPERACIONAL PRIMÁRIO


1981 3,7% 1,4% ...
1982 4,4% 1,4% ...
1983 5,3% 0,5% ...
1984 5,2% 1,3% ...
1985 6,8% 1,1% -0,1%
1986 2,8% 0,9% 0,1%
1987 8,1% 1,7% 0,6%
1988 12,2% 0,4% -0,5%
1989 18,0% 0,6% -0,3%
1990 8,8% 0,4% -0,2%
1991 9,8% -0,7% -1,4%
1992 16,9% 0,6% -0,1%
1993 27,1% 0,1% -0,6%
1994 12,1% 0,8% -0,8%
1995 3,6% 2,4% 0,2%
1996 2,7% 1,8% 0,5%
1997 2,7% 2,0% 0,5%
1998 2,0% 1,8% 0,2%
1999 3,1% 0,5% -0,2%
2000 2,1% 0,7% -0,5%
2001 2,0% 0,5% -0,9%
2002 3,8% -0,3% -0,8%
2003 1,8% 0,6% -0,9%

FONTE: Elaborado a partir de dados do BACEN e IPEADATA.


NOTA: Todas as séries incluem desvalorização cambial.

No que concerne ao conceito primário, observa-se que em todos os níveis de governo


e nas empresas estatais, contatam-se superávits em quase todos os anos das séries constantes
das tabelas mencionadas. Todavia, quando são considerados os pagamentos de juros sobre as
dívidas e sua atualização monetária, os déficits aparecem. Isto significa que os fluxos de juros
pagos pelo setor público brasileiro são os principais fatores de deterioração da situação fiscal
do Estado.
195

TABELA 11 NECESSIDADES DE FINANCIAMENTO DAS EMPRESAS ESTATAIS EM


PERCENTAGEM DO PIB (1981 2003)

ANO NOMINAL OPERACIONAL PRIMÁRIO


1981 4,7% 1,8% ...
1982 4,8% 1,2% ...
1983 11,8% 2,9% ...
1984 10,7% 1,3% ...
1985 9,8% 2,4% -1,0%
1986 2,8% 1,5% -1,4%
1987 7,4% 0,9% -1,5%
1988 14,3% 1,1% -1,5%
1989 16,8% 2,6% -0,1%
1990 8,9% 0,6% -1,7%
1991 10,4% 0,8% -0,3%
1992 12,5% 0,5% -0,4%
1993 13,7% 0,0% -0,8%
1994 4,7% -0,4% -1,2%
1995 1,3% 0,9% 0,1%
1996 0,6% 0,3% -0,1%
1997 0,7% 0,5% 0,2%
1998 0,5% 0,5% 0,4%
1999 -0,1% -0,3% -0,6%
2000 -0,7% -0,8% -1,1%
2001 -0,6% -0,5% -0,9%
2002 0,0% 0,0% -0,7%
2003 -0,7% -0,7% -0,9%

FONTE: Elaborado a partir de dados do BACEN e IPEADATA.


NOTA: Todas as séries incluem desvalorização cambial.
TABELA 12 NECESSIDADES DE FINANCIAMENTO DO GOVERNO FEDERAL E BANCO
CENTRAL EM PERCENTAGEM DO PIB (1981 2003)

ANO N O M IN A L O P E R A C IO N A L P R IM Á R IO
1981 5 ,6 % 2 ,0 % ...
1982 8 ,0 % 1 ,9 % ...
1983 4 ,8 % -0 ,1 % ...
1984 1 0 ,0 % 2 ,2 % ...
1985 1 3 ,6 % 1 ,2 % -1 ,7 %
1986 6 ,2 % 1 ,4 % -0 ,4 %
1987 1 8 ,1 % 3 ,3 % 1 ,9 %
1988 3 0 ,1 % 3 ,6 % 1 ,1 %
1989 5 5 ,2 % 4 ,2 % 1 ,5 %
1990 1 2 ,5 % -2 ,3 % -2 ,8 %
1991 6 ,5 % 0 ,1 % -1 ,0 %
1992 1 6 ,3 % 0 ,6 % -1 ,1 %
1993 2 4 ,0 % 0 ,7 % -0 ,8 %
1994 1 0 ,2 % -1 ,6 % -3 ,3 %
1995 2 ,4 % 1 ,7 % -0 ,5 %
1996 2 ,6 % 1 ,3 % -0 ,4 %
1997 2 ,6 % 1 ,8 % 0 ,2 %
1998 5 ,4 % 5 ,1 % -0 ,6 %
1999 6 ,8 % 3 ,1 % -2 ,3 %
2000 3 ,1 % 1 ,3 % -1 ,9 %
2001 3 ,7 % 1 ,5 % -1 ,8 %
2002 6 ,4 % 0 ,3 % -2 ,4 %
2003 2 ,6 % 1 ,0 % -2 ,6 %

FONTE: Elaborado a partir de dados do BACEN e IPEADATA.


NOTA: Todas as séries incluem desvalorização cambial.
196

TABELA 13 NECESSIDADES DE FINANCIAMENTO DO SETOR PÚBLICO EM PERCENTAGEM


DO PIB (1981-2003)

ANO N O M IN A L O P E R A C IO N A L P R IM Á R IO
1981 1 3 ,9 5 % 6 ,6 4 % ...
1982 1 7 ,2 3 % 7 ,2 5 % ...
1983 2 1 ,8 4 % 3 ,3 2 % ...
1984 2 5 ,9 0 % 3 ,0 3 % ...
1985 3 0 ,2 4 % 4 ,6 5 % -2 ,7 5 %
1986 1 1 ,8 1 % 3 ,7 6 % -1 ,6 7 %
1987 3 3 ,5 6 % 5 ,9 2 % 1 ,0 4 %
1988 5 6 ,5 5 % 5 ,1 2 % -0 ,9 6 %
1989 8 9 ,9 1 % 7 ,4 7 % 1 ,0 8 %
1990 3 0 ,1 5 % -1 ,3 2 % -4 ,6 9 %
1991 2 6 ,7 5 % 0 ,1 9 % -2 ,7 1 %
1992 4 5 ,7 5 % 1 ,7 4 % -1 ,5 7 %
1993 6 4 ,8 3 % 0 ,8 0 % -2 ,1 9 %
1994 2 6 ,9 7 % -1 ,1 4 % -5 ,2 1 %
1995 7 ,2 8 % 5 ,0 0 % -0 ,2 7 %
1996 5 ,8 7 % 3 ,4 0 % 0 ,0 9 %
1997 6 ,0 4 % 4 ,2 5 % 0 ,8 7 %
1998 7 ,9 3 % 7 ,4 0 % -0 ,0 1 %
1999 9 ,8 7 % 3 ,3 8 % -3 ,1 9 %
2000 4 ,4 8 % 1 ,1 7 % -3 ,4 7 %
2001 5 ,1 7 % 1 ,4 0 % -3 ,6 4 %
2002 1 0 ,2 7 % -0 ,0 1 % -3 ,8 9 %
2003 3 ,7 2 % 0 ,9 3 % -4 ,3 7 %

FONTE: Elaborado a partir de dados do BACEN e IPEADATA.


NOTA: Todas as séries incluem desvalorização cambial.

3.2.6 Evolução setorial e de ramos específicos da indústria


A evolução setorial representada no Gráfico 28 reflete o padrão observado nas
economias em processo de desenvolvimento. A participação da agricultura no PIB mostra-se
em uma tendência de queda desde o início da série, passando de 38,1% em 1900 para 8,7%
em 2003 e, portanto, aproxima-se da média típica para os países desenvolvidos. Por outro
lado, o setor industrial ampliou sua participação de 14,7% em 1900, para 42,4% do PIB em
1976. A partir de então, enquanto os serviços aumentam sua presença no PIB, a participação
da indústria reduz-se acentuadamente até o final da série em 2003, atingindo o patamar de
35,2%160.

160
Segundo J.C. CARDOSO JR. (2001), neste período, esse crescimento do setor terciário (comércio e serviços)
apresenta-se como patológico, pois reflete muito mais a desestruturação e a desregulação das relações de
trabalho, ocasionadas pela redução da participação das atividades secundárias. Em outros termos, o setor
serviços avançou em sua participação no PIB exatamente pela perda de participação da indústria, sobretudo por
ser um período onde se observam baixas taxas de crescimento econômico.
197

GRÁFICO 28 AGRICULTURA, INDÚSTRIA E SERVIÇOS: EVOLUÇÃO DAS PARTICIPAÇÕES


NO PIB (1900 -2003).

Agricultura
Indústria
Serviços
60%

50%

40%

30%

20%

10%

0%
1901
1904
1907
1910
1913
1916
1919
1922
1925
1928
1931
1934
1937
1940
1943
1946
1949
1952
1955
1958
1961
1964
1967
1970
1973
1976
1979
1982
1985
1988
1991
1994
1997
2000
2003
FONTE: Elaborado a partir de dados do Sistema de Contas Nacionais do IBGE.
NOTA: Participações referentes ao PIB a preços básicos em valores reais.
GRÁFICO 29 DISTRIBUIÇÃO DO PESSOAL OCUPADO POR SETOR DE ATIVIDADE (1990
2002)

SERVIÇOS
INDÚSTRIA
AGROPECUÁRIA

100%

80%

60%

40%

20%

0%
1990 1992 1994 1996 1998 2000 2002
1991 1993 1995 1997 1999 2001

FONTE: Elaborado a partir de dados do Sistema de Contas Nacionais do IBGE.


198

A distribuição do pessoal ocupado por setor de atividade econômica encontra-se


representada, para a década de 90, no Gráfico 29. O pessoal ocupado em atividades de
serviços já representa cerca de 64% das relações de trabalho. A ocupação no setor industrial,
que em 1990 representava 23%, reduziu-se ao longo de toda a década situando-se em 15% do
total, para 2002. No mesmo período, o setor agropecuário passa de 25,5% para 21%.

Nas análises do crescimento econômico, as estatísticas sobre utilização da capacidade


produtiva instalada são fundamentais. Como observa VILLIEU (2000), nos modelos
macroeconométricos, trata-se de um indicador das tensões no mercado de bens e serviços,
determinante tradicional da inflação, dos desequilíbrios do comércio exterior e do
investimento.

GRÁFICO 30 TAXA DE UTILIZAÇÃO DA CAPACIDADE PRODUTIVA POR RAMO DA


INDÚSTRIA (1970 -2004)

BENS DE CONSUMO
BENS DE CAPITAL
MATERIAL PARA CONSTRUÇÃO
BENS INTERMEDIÁRIOS
95
90
85
80
Em %

75
70
65
60
55
50
1970 1974 1978 1982 1986 1990 1994 1998 2002
1972 1976 1980 1984 1988 1992 1996 2000 2004

FONTE: FGV e IPEADATA. Dados para 2004 referem-se à média dos dois primeiros trimestre.

O Gráfico 30 mostra a evolução das taxas de utilização da capacidade produtiva


instalada para quatro ramos do setor industrial brasileiro, no período de 1970 a 2004. A
seguintes considerações podem ser feitas: no início dos anos 70, os quatro ramos da indústria
operam com taxas elevadas de utilização da capacidade produtiva. Observa-se uma queda da
taxa a partir de 1974, que é expressão da crise do regime de acumulação responsável pelo
milagre econômico . No entanto, as quedas se acentuam com as recessões de 1981/83 e
1990/92. Nos anos 80, salvo o ramo de bens intermediários e desconsiderando os anos
atípicos de 1986 (Plano Cruzado) e 1990/92 (Planos Collor I e II), os demais ramos operaram
199

com uma taxa de ociosidade média de 25%. Na década de 90, destacam-se a redução
acentuada da taxa de utilização da capacidade para o ramo de bens de consumo e a grande
volatilidade desse indicador para o ramo de bens de capital, sugerindo elevada instabilidade
das expectativas de investimento neste período. Apenas o ramo de bens intermediários
mostrou-se relativamente estável, numa média de 85% de utilização da capacidade.

A evolução da produção de bens industriais pode ser visualizada no Gráfico 31. O


ramo de bens de consumo duráveis foi o que mais cresceu nos anos 90, enquanto a produção
de bens de consumo não-duráveis permaneceu praticamente estagnada e com queda em 2003
e 2004. A produção de bens de capital também permaneceu estagnada. Isto permite algumas
considerações relevantes para uma análise da dinâmica econômica brasileira: a grande
expansão dos bens de consumo duráveis vis-à-vis os não duráveis pode resultar do perfil
extremamente concentrado da distribuição de renda neste tipo de economia; a estagnação da
produção doméstica de bens de capital reflete também a grande expansão das importações
desse item, resultante da abertura comercial e da sobrevalorização cambial vigente no período
[1995-1998] como se pode constatar pelo exame do Gráfico 32.

GRÁFICO 31 PRODUÇÃO POR RAMOS DA INDÚSTRIA (1975 2004)

BENS DE CONSUMO DURÁVEIS


BENS DE CONSUMO NÃO DURÁVEIS
BENS DE CAPITAL
320
300
ÍNDICE DE QUANTUM (1975 = 100)

280
260
240
220
200
179
160
140
120
100
80
60
40
1975 1979 1983 1987 1991 1995 1999 2003
1977 1981 1985 1989 1993 1997 2001

FONTE: Dados originais obtidos no IPEADATA relativos à PIM-PF. Valores para 2004 referem-se ao mês de
janeiro.
200

GRÁFICO 32 IMPORTAÇÕES DE BENS INDUSTRIAIS (1975-2003)

BENS DE CONSUMO DURÁVEIS


BENS DE CONSUMO NÃO-DURÁVEIS
BENS DE CAPITAL
1600
ÍNDICE DE QUANTUM (1975 = 100)

1400
1200
1000
800
600
400
200
0
-200
1975 1979 1983 1987 1991 1995 1999 2003
1977 1981 1985 1989 1993 1997 2001

FONTE: Dados originais obtidos no IPEADATA e originários da FUNCEX.

3.3 Síntese dos principais resultados

O Brasil é uma empresa potencialmente solvente, mas sem


liquidez. Estivemos acumulando capital e criando capacidade
produtiva, mas grande parte dessa capacidade permanece ociosa ou
se aplica em pura perda (...). As condições reais estão criadas para
um acelerado crescimento (...), mas não encontramos ainda meios
de por em evidência o potencial econômico adormecido, o que
supõe condições institucionais que a União não poderia criar,
porque é politicamente impotente. (...) por isso mesmo, devemos
começar a preparar desde já, a agenda da próxima assembléia de
credores.

(Ignácio RANGEL, em Do Ponto de Vista


Nacional, setembro de 1960)
A economia brasileira caracterizou-se por um elevado dinamismo entre 1900 e 1979,
com taxas médias de crescimento do PIB e do PIB per capita, respectivamente, de 6% e de
3% ao ano. A industrialização do país efetivamente contribuiu para esse resultado na medida
em que lançou as bases para a determinação endógena do nível de renda e emprego. Em
outros termos, o nível de atividade econômica passou a ser determinado pela dinâmica do
mercado interno, a partir do momento em que a difusão das relações salariais reconfigura o
sistema de remunerações em resposta à acumulação de base industrial.

Após este longo período de desenvolvimento econômico, a economia entra em uma


trajetória de grandes dificuldades macroeconômicas e estruturais. A performance
201

macroeconômica nos anos 80 e 90 mostra-se muito inferior a dos períodos precedentes.


Crescem as dificuldades para a geração de emprego e renda, concomitantemente ao avanço do
setor informal da wage-labor nexus; a alta inflação e as tendências à estagnação articularam-
se com a crise fiscal do Estado, tornado incapaz de restabelecer as condições para uma
retomada sustentada da acumulação de capital e do crescimento econômico. Como um
resultado direto, a taxa média de crescimento do PIB per capita reduz-se para a cifra medíocre
de apenas 0,7% a.a, nessas duas décadas, intensificando os conflitos distributivos e agravando
a dívida social.

QUADRO 14 RESULTADOS DAS TRANSFORMAÇÕES ESTRUTURAIS DOS ANOS 90 POR


COMPONENTE DO MODO DE REGULAÇÃO

FORMAS INSTITUCIONAIS O QUE MUDOU O QUE PERMANECE

Redução do papel direto do setor público na Forte subordinação às finanças nacionais e


economia internacionais
ESTADO
O Estado torna-se mais "regulador" e menos Endividamento público muito elevado e perda de
"produtor" autonomia da política econômica

O regime monetário inflacionista foi bloqueado Uma lógica usurária como suporte de um
processo de financeirização (taxas reais de juros
O sistema bancário-financeiro se abre ao capital extremamente elevadas bloqueiam a acumulação
estrangeiro num processo de fusões e aquisições de capital, apesar da recuperaçao das taxas de
REGIME MONETÁRIO- lucro)
FINANCEIRO
O sistema bancário-financeiro privado não financia
os investimentos de longo prazo e o mercado de
capitais é pouco desenvolvido

A flexibilidade quantitativa e salarial é A dualidade do mercado de trabalho num processo


aprofundada e os ganhos de produtividade se de "desinstitucionalização" das relações salariais
elevam expressivamente, mas às expensas do
emprego O desemprego, a precariedade e a contenção
WAGE-LABOR NEXUS salarial se articulam com o aumento das
Salário médio real se desconecta da evolução desigualdades sociais
dos ganhos de produtividade

A abertura comercial e financeira se afirma de A inserção subordinada ao regime internacional que


forma drástica e incompatível com um processo reproduz os fatores de instabilidade econômica e de
coerente de desenvolvimento econômico crise financeira
INSERÇÃO INTERNACIONAL
A vulnerabilidade externa se eleva A grande dependência dos fluxos de capitais
internacionais

A indústria foi exposta à concorrência Uma economia fortemente oligopolizada onde o


internacional sem uma política industrial capital bancário-financeiro é o setor de mais
consistente elevada rentabilidade

CONCORRÊNCIA Os setores financeiro, energético, automobilístico Os grandes grupos multinacionais predominam no


e de telecomunicações foram favorecidos por setor oligopolista
taxas de importação e garantias de lucro

O Quadro 14 descreve os resultados imediatos das transformações estruturais dos anos


90 ao nível das formas institucionais.
202

Pode-se considerar que um dos fatores explicativos para essa performance tão
incongruente com o potencial produtivo da economia brasileira no século XX, tenha sido a
resposta inadequada para a saída da crise dos anos 80. A busca de um novo padrão de
crescimento e acumulação incluiria, sem dúvida, a reconfiguração da arquitetura institucional
que definia o modo de regulação e o correspondente modo de desenvolvimento baseado na
substituição de importações. Mas havia outras possibilidades que poderiam ter sido
exploradas nos quadros das transformações estruturais e que simplesmente foram descartadas
em prol de uma re-inserção neoliberal no regime internacional.

Em conseqüência, um dos resultados diretos da abertura comercial e financeira dos


anos 90 foi a mudança no padrão de acumulação da economia brasileira segundo a lógica das
finanças nacionais e internacionais, retirando do Estado a legitimidade dos projetos nacionais
de desenvolvimento. Aos fatores endógenos de instabilidade do regime de crescimento, foram
acrescentados a pressão da concorrência internacional, a liberalização do fluxo de capitais, o
processo de privatização e demais reformas que modificaram as relações Estado-economia.
De acordo com o diagnóstico governamental, tais mudanças seriam condições necessárias à
superação dos problemas de financiamento decorrentes do esgotamento do modelo de
crescimento por substituição de importações .

A economia foi então submetida a um amplo conjunto de reformas liberalizantes e de


estímulos à lógica mercantil como principal meio de coordenação macroeconômica e sob a
pressuposição de que conduziriam necessariamente à recomposição das condições de
retomada do crescimento econômico sustentável. Todavia, a análise do desempenho
macroeconômico dos períodos pós-abertura comercial e financeira e pós-Plano Real permite
constatar-se que essas expectativas oficiais não se realizaram. Pelo contrário, a
vulnerabilidade externa e o endividamento público se agravaram e apesar da economia ter
alcançado uma relativa estabilidade de preços, ainda está longe de ter encontrado uma
trajetória de efetiva estabilidade e coerência macroeconômica. Esta última implicaria em taxas
sustentáveis de crescimento do PIB, geração de renda, redução significativa das taxas de
desemprego e equilíbrio intertemporal dos déficits público e externo.

Conjugando-se com essas condições macroeconômicas tão adversas, as


transformações no nível da forma institucional de inserção no regime internacional
aprofundaram o grau de dependência financeira e reduziram drasticamente a autonomia da
política econômica. Incapaz de desempenhar plenamente seu papel de indutor do processo de
acumulação de capital, o Estado parece supor que o mercado cumpra uma função que na
203

história dos capitalismos desenvolvidos sempre lhe foi reservada. Ideologia neoliberal e re-
inserção subordinada no processo de globalização articulam-se e submetem uma economia
cujo potencial produtivo é indubitável, mas que é premida a se adequar às prerrogativas da
atual lógica financeira internacional. Conseqüentemente, os projetos consistentes de
desenvolvimento econômico são esvaziados no plano político-ideológico porque sua
realização implicaria mobilizar funções estatais incompatíveis com as formas atuais de gestão
das dívidas externas e internas. E são essas últimas que funcionam como premissa e resultado
da acumulação rentista, potencializada no contexto de uma globalização preponderantemente
financeira.

QUADRO 15 PRINCIPAIS PROBLEMAS MACROECONÔMICOS NAS DÉCADAS DE 80 E 90:


UMA COMPARAÇÃO
ANOS 80 ANOS 90
Crise fiscal do Estado e perda da Tendência à estagnação ou ao baixo
capacidade de impulsionar o processo crescimento;
de acumulação de capital Baixa taxa de câmbio e de inflação;
Crise da dívida externa; Taxa real de salários estagnada;
Alta inflação e ineficácia dos planos Elevado nível de desemprego e de
de estabilização de preços informalidade das relações salariais;
Tendência à estagnação; Taxas reais de juros extremamente
Reconcentração da renda e da elevadas;
propriedade; Aumento do endividamento público;
Acumulação bancária e financeira Déficits elevados na balança
desenvolve-se com a inflação comercial e em transações correntes
Declínio acentuado das taxas de Tendência de declínio das taxas de
investimento e acumulação de capital investimento e acumulação de capital
Autonomia da política econômica Redução drástica da autonomia da
começa a reduzir-se política econômica a partir da
abertura financeira

Para efeitos de síntese, no Quadro 15 são destacados os principais problemas


macroeconômicos dos anos 80 e 90. Evidentemente, muitas das questões são cumulativas, isto
é, os problemas não resolvidos nos períodos precedentes permanecem sob novos contextos e
se conjugam aos novos obstáculos trazidos pela própria dinâmica da acumulação de capital.
As formas institucionais passam a ter sua estabilidade e coerência social e econômica
204

continuamente postas à prova, dificultando tanto a emergência quanto a afirmação de novos


modos de regulação e de regimes de crescimento sustentáveis. No próximo capítulo, essas
componentes-chave da régulation d ensemble serão analisadas em sua evolução de longo
prazo.
205

CAPÍTULO 4 AS FORMAS INSTITUCIONAIS NA ECONOMIA BRASILEIRA:


CONFIGURAÇÕES E TENDÊNCIAS EVOLUTIVAS
4.1 Introdução
Este capítulo busca caracterizar as configurações básicas das formas institucionais.
Destaca suas principais tendências evolutivas, iniciando a aplicação dos conceitos
regulacionistas à dinâmica macroeconômica brasileira. Não se trata, no entanto, de uma
análise exaustiva das diversas etapas da evolução histórica de cada uma dessas grandes áreas
da régulation d ensemble, o que estaria além do escopo deste trabalho. O objetivo básico é
identificar as especificidades e as principais configurações cujos impactos macroeconômicos
teriam sido decisivos na dinâmica dos regimes de crescimento e nas formas concretas de suas
crises.

Dispondo-se de séries longas confiáveis, busca-se diagnosticar as alterações lentas ou


as rupturas nas regulações parciais, permitindo-se delimitar os momentos históricos e as
condições estruturais através das quais padrões macroeconômicos particulares puderam se
desenvolver, se esgotar e entrar em crise. Embora por questões metodológicas busque-se
apreender as transformações estruturais de longo prazo, porque são necessárias à aplicação
consistente do instrumental teórico regulacionista, o principal objetivo da análise é a
compreensão das relações macroeconômicas em vigor a partir dos anos 90.

Como observara BRAUDEL, cada sociedade tem a conjuntura e as crises de sua


estrutura e uma abordagem em termos de regulação deve precisamente ser o suporte de uma
fecundação recíproca entre teoria e os fatos históricos. Neste contexto, a história econômica
inevitavelmente convida o economista a reconhecer suas limitações e a aceitar que uma
determinada época do desenvolvimento sócio-econômico de um país não pode ser jamais
compreendida a partir dela mesma, ou seja, sem a consideração das condições estruturais
herdadas do passado, que, apesar de suas mutações e rupturas, deixam suas marcas no
presente, condicionando o futuro.
206

4.2 As relações Estado-economia: entre intervencionismo autoritário e democracia


política
Manter o capital numa posição hegemônica e o trabalho
numa posição subordinada constitui uma constante
histórica em relação à teoria e à prática do Estado
brasileiro. As variações ocorridas são de ênfase ou de
estilo .
(Herbert de Souza e Carlos A. Afonso, 1977)

A análise da evolução das formas institucionais inicia-se, nesta seção, pelas relações
Estado-economia e por três razões principais que derivam das especificidades do caso
brasileiro:

a) Desde suas origens, a partir do período colonial, a economia e sociedade


brasileiras foram marcadas por estruturas institucionais que condicionaram
decisivamente o modo como o processo capitalista de acumulação se desenvolverá
neste país. Essas estruturas respondiam ao projeto colonizador português e
derivavam diretamente do Estado nacional lusitano em sua orientação econômica
mercantilista e em seu caráter patrimonialista.161 As transformações dessa forma
institucional ao longo da história econômica brasileira, passando pelos três
períodos históricos (colonial, imperial e republicano) reformularam o Estado
brasileiro, imprimiram-lhe novas características constitutivas, mas não suprimiram
completamente as formas de dominação típicas do patrimonialismo;162

b) A evolução do capitalismo brasileiro, como dos demais capitalismos existentes,


não é inteligível sem uma análise do setor público em razão de seu papel direto ou
indireto no processo de acumulação de capital. Como visto nos capítulos
precedentes, em sua dimensão nacional, o Estado deve ser analisado como
instância reguladora e organizadora de um modo particular de desenvolvimento
capitalista, correspondente aos interesses de determinadas classes sociais que

161
Conforme SANDRONI (2003), em Novíssimo Dicionário de Economia, um Estado de tipo patrimonialista
não diferencia a esfera pública da privada. Trata-se de um sistema de dominação política ou de autoridade
tradicional em que a riqueza, os bens sociais, cargos e direitos são distribuídos como patrimônios pessoal de um
chefe ou governante. Várias análises reconhecem que a tradição patrimonialista brasileira foi uma herança
transmitida por Portugal. Mais detalhes dessa questão podem ser encontrados na obra Os Donos do Poder de
R. FAORO (1958). A utilização deste conceito no contexto de uma análise regulacionista adequa-se, portanto à
própria metodologia e aos princípios teóricos mobilizados neste trabalho.
162
Como observa FAORO [1975], citado por BAER [1995, P. 255], A intervenção do Estado não se restringia
ao financiamento e ao crédito, mas, ao contrário, estendia-se a todas as atividades comerciais, industriais e de
serviços públicos. O Estado autorizava o funcionamento de sociedades por cotas de responsabilidade limitada,
fechava contratos com bancos, concedia privilégios, fazia concessões especiais para a administração de ferrovias
e portos, assegurava o fornecimento de matérias e garantia o pagamento de juros. A soma desses favores e
privilégios envolvia a principal parte das atividades econômicas... [que]... poderiam existir somente através da
vida transmitida pelo cordão umbilical do Estado.
207

traduzem sua hegemonia através de formas particulares de legitimação. Em sua


dimensão internacional, deve ser analisado como uma instância de articulação
econômica e política da formação social nacional com o sistema capitalista
mundial(AFONSO e SOUZA, 1977). Por outro lado, como demonstraram
historiadores econômicos e teóricos do desenvolvimento, o avanço do capital
industrial em países de industrialização tardia, como Alemanha, Japão e Itália,
tornou-se possível graças à ação estatal. O processo de industrialização brasileira
enquadra-se neste contexto, onde a participação direta do setor público na
implantação das indústrias de base, o estabelecimento de estruturas de
financiamento de longo prazo para o capital industrial e a própria
institucionalização do programa de substituição de importações foram decisivas;

c) Como conjunto de compromissos institucionalizados que uma vez estabelecidos


criam regras e regularidades na evolução das receitas e das despesas públicas
(BOYER, 1986), o Estado responde pelas particularidades de um regime fisco-
financeiro (THÉRET, 2002). Conforme definição apresentada no capítulo 1 deste
trabalho, o regime fisco-financeiro expressa um determinado padrão de
relacionamento entre o Estado e a economia, resultante da interação entre a
instância político-jurídica e a lógica da acumulação capitalista. Além disso, o
Estado igualmente responde por atributos determinantes da forma institucional do
rapport salarial e da moeda sob a forma de um regime monetário-financeiro. As
particularidades das relações capital-trabalho e os problemas suscitados pela
constituição e gestão de uma moeda nacional demandam a presença ativa do
Estado.163 Sobretudo, numa formação social marcada por relações Estado-
economia predominantemente autoritárias ao longo de vários períodos de sua
história, as estruturas de intervenção e presença do setor estatal devem ser
apreendidas como particularmente decisivas por seus impactos sobre a dinâmica da
acumulação de capital, tanto em suas fases de expansão quanto de crise.

163
De um ponto de vista marxista, BRUNHOFF (1977) observa que o capital sempre necessitou de uma certa
gestão estatal da força de trabalho e da moeda. Entretanto, a política econômica contemporânea tomou forma
como organização global da dominação de classe capitalista num momento de crise econômica e social (nos anos
1930). Posta em questão quarenta anos após seu nascimento, sob o efeito de uma crise que ela não soube
prevenir, ela está, segundo alguns, excessivamente enfraquecida pela privatização do Estado e pela
internacionalização do capital, de modo que se coloca o problema de seu reajustamento e de sua
modificação... . Todavia, esta perspectiva está inteiramente de acordo com os pressupostos teóricos de uma
abordagem em termos de regulação.
208

Em suma, conforme exposto no capítulo 1 deste trabalho, a importância do Estado no


âmbito das análises regulacionistas reside no lugar que esta forma institucional ocupa no
processo de codificação das estruturas que definem os modos de regulação e os regimes de
crescimento que deles resultam. O Estado é uma instância totalizadora, síntese das tensões
que atravessam as outras quatro formas institucionais, mas sem jamais abolir o caráter
contraditório do processo de acumulação de capital no contexto das formas da regulação e das
crises de um modo de desenvolvimento.

No caso brasileiro, a análise da evolução desta forma institucional ao longo da história


sugere a vigência, desde a etapa colonial, de formas diferenciadas da modalidade Estado
inserido.164 A hipótese neste contexto é a de que em razão das prerrogativas do Estado
português à época colonial, as estruturas de produção e de distribuição estabelecidas no
espaço econômico brasileiro permaneciam rigidamente sob o controle das instituições
165
derivadas do chamado exclusivo metropolitano . E mesmo com a emancipação política e
institucional obtida a partir da primeira metade do século XIX, a unidade lingüística e
territorial lograda por este país de dimensões continentais, dificilmente seria alcançada nos
quadros de um Estado circunscrito , voltado preponderantemente para questões de ordem e
segurança, mas pouco atuante na esfera econômica.166 Portanto, centralismo e autoritarismo,
baixa representatividade popular nas instituições e decisões públicas e presença permanente e
multiforme na economia e sociedade são as marcas históricas do Estado brasileiro.

4.2.1 Uma primeira periodização da evolução do Estado brasileiro167


Em uma primeira tentativa de periodização da evolução do Estado na economia
brasileira, a análise deve detectar as rupturas de ordem institucional que redefiniram esta
forma estrutural, bem como o sentido de suas novas configurações. Para tanto, essa seção se

164
Observa MENDONÇA (1988) que a principal especificidade do capitalismo brasileiro é a profunda
interferência do Estado na sua constituição. No bojo do processo de sua implementação, o Estado redefiniu suas
funções em matéria econômica, ampliando-as quantitativa e qualitativamente .
165
O exclusivo metropolitano refere-se ao impropriamente denominado pacto colonial entre Portugal e
Brasil durante os séculos XVI e XVIII. Correspondia a um conjunto de relações econômicas e políticas que
subordinavam a colônia à metrópole. Esta última desfrutava de uma dupla condição economicamente vantajosa:
era simultaneamente monopolista e monopsonista com relação ao comércio colonial. Os mecanismos desse
comércio eram controlados por grandes companhias formadas por capitais privados em associação com o Estado
ou totalmente controlados por este.
166
Mais detalhes e elementos teóricos e empíricos que suportam essa hipótese podem ser encontrados em M.
BRUNO (2000), A Formação dos Estados Nacionais na América Espanhola - do Choque da Conquista à
Fragmentação Política e Territorial , mimeo, IE/UFRJ, dezembro de 2000.
167
Esta seção baseia-se nos seguintes trabalhos e fontes de informações sobre as mudanças institucionais
implementadas neste período ao nível do Estado brasileiro: AFONSO e SOUZA (1977); IANNI (1977); S. R.
MENDONÇA (1988); BRESSER-PEREIRA (1986; 1992 e 2004); BAER (1995); TEIRXEIRA e TOTINI
(1994); GREAMAUD et alii (2004); IPEA; IBGE; ENAP; Plano Diretor da Reforma do Estado/Presidência da
República.
209

baseará inicialmente nos trabalhos disponíveis em história econômica, explicitando as


principais transformações do setor público brasileiro no que concerne à reelaboração
qualitativa das relações entre Estado e economia. Num segundo momento, o comportamento
de médio e de longo prazos das finanças públicas será considerado a partir da análise de séries
temporais, onde então a dimensão quantitativa passará ao primeiro plano. Combinando-se esta
última abordagem com uma análise histórico-institucional será possível testar a hipótese de
hierarquia e complementaridade dessa forma institucional de base e extrair suas
conseqüências sobre as demais componentes do modo de regulação. Não se trata, porém de
uma análise exaustiva de todas as configurações assumidas pela forma institucional do Estado
no Brasil, mas tão somente daquelas que, em conjunção com as demais componentes da
régulation d ensemble, respondem pelas especificidades dos regimes de acumulação
observados ao longo da história.

Em O Projeto do Estado Brasileiro , a historiadora Sônia. R. de MENDONÇA,


observa que,

a história do Estado brasileiro, mesmo tomado como relação e espaço do


exercício de hegemonia/consenso, tem-se caracterizado pela existência de um
conjunto de obstáculos à sua plena realização, posto que marcado pela
exclusão, permanentemente reposta, de vastos segmentos sociais: desde os
colonizados, de inícios do século 19, aos agregados e posseiros rurais da
Primeira República, passando pela totalidade dos trabalhadores do campo e
parte dos trabalhadores urbanos (os sem-carteiras ) não integrados ao
mundo regido pelos direitos trabalhistas da era Vargas, até os atualmente
inseridos no fenômeno da pobreza . Para todos eles foi, e ainda é, a coerção
a face mais visível deste Estado.
Esse caráter excludente das relações Estado-sociedade civil no Brasil é reproduzido
pela baixa representatividade das classes populares nas estruturas do aparelho de Estado e
pela enorme heterogeneidade social e econômica vigente. Os problemas de legitimidade
tornam-se então recorrentes e freqüentemente são resolvidos por vias autoritárias explícitas ou
por mecanismos que, apesar de transcorrerem nos quadros da democracia política, excluem
deliberadamente a participação popular.168 Essa especificidade do Estado brasileiro tem,

168
Um exemplo flagrante foi o processo de privatizações, que será comentado nas próximas seções. Enquanto
em países como a Inglaterra, Itália ou França, a pulverização das ações durante as privatizações permitiu que
amplos segmentos dessas sociedades pudessem se tornar acionistas, o processo de privatização no Brasil foi
fechado e excludente, porquanto restrito a grupos empresariais e aos próprios empregados das ex-estatais.
Contrariamente ao ocorrido no caso brasileiro, naqueles países os governos se preocuparam em democratizar o
acesso ao patrimônio público, evitando o aumento da concentração da renda.
210

portanto, conseqüências diretas sobre as formas de governo e regimes de política econômica


que implica. Como observa BRESSER-PEREIRA (2003, p. 8):169

Países industrializados, para serem governados, normalmente não


necessitam de uma coalizão política explícita. Suas sociedades são
suficientemente homogêneas para que um amplo contrato social, conforme
definido por Hobbes e pelos filósofos políticos do século XVIII, seja suficiente.
Um contrato social que defina os limites da sociedade civil e do Estado.
Entretanto, na maioria dos países em desenvolvimento, e certamente na
América Latina, apenas um contrato social básico seria um arranjo político
frágil. Devido à profunda heterogeneidade social que caracteriza sociedades
como a brasileira, tem sido necessário, para garantir a estabilidade política,
que uma coalizão de classes constitua um pacto político informal e formule
algum tipo de projeto para o país .
GRÁFICO 33 EVOLUÇÃO DA PARTICIPAÇÃO POLÍTICA (1933 1998)

PERCENTAGEM DA POPULAÇÃO DE ELEITORES QUE COMPARECEU ÀS ELEIÇÕES


60%

50%

40%

30%

20%

10%

0%
1933 1950 1955 1960 1966 1974 1982 1990 1998

FONTE: Dados originais obtidos em BRESSER-PEREIRA (2003), Quadro 3, p. 424.


NOTA: Os dados referem-se às eleições para Câmara dos Deputados.
Todavia, o reverso de seu caráter excludente é seu caráter inacabado, reflexo das
estruturas de produção e de distribuição que resultam das formas contraditórias assumidas
pelo processo de acumulação de capital neste país. Mas como um fator positivo de
transformação dessas estruturas e do Estado que lhes corresponde, pode ser argumentado que
apesar dos reveses econômicos que caracterizaram os anos 80 e 90, a sociedade civil
desenvolve-se e torna-se mais pluralista e mais democrática. O exercício da cidadania

169
BRESSER-PEREIRA (2003). Desenvolvimento e Crise no Brasil - História, Economia e Política de Getúlio
Vargas a Lula. Editora 34.
211

difunde-se e a participação política é crescente desde os anos 30, como pode ser constatado
pelo exame do Gráfico 33.

Baseando-se nas pesquisas históricas sobre as mudanças políticas e institucionais,


podem ser destacados cinco momentos em que se processaram transformações qualitativas
nas relações Estado-economia, cujas conseqüências foram decisivas para o desenvolvimento
econômico brasileiro em sua fase industrial:

1º) Período [1930-1954] o Estado sob um regime político autoritário promove o


nacional-desenvolvimentismo e busca lançar as bases para um processo autônomo de
desenvolvimento econômico

Este período caracteriza-se pela progressiva perda de hegemonia do capital mercantil


agrário exportador e a afirmação do capital industrial no espaço econômico nacional. No
plano externo, o período foi também marcado pela crise dos anos 30 e no plano interno pela
emergência do chamado Estado Novo de caráter totalitário170. As intervenções do Estado
aceleram-se e revestem-se de um conteúdo ideológico nacionalista. Multiplicam-se o número
de agências, institutos, conselhos e autarquias, permitindo que as demandas de diversos
grupos sociais pudessem ser representadas e administradas no âmbito do setor público. O
setor público brasileiro se reestrutura para desempenhar novas funções nos quadros de um
projeto de desenvolvimento econômico nacional. Observa-se a primeira ruptura com relação
ao avanço da acumulação capitalista: um núcleo básico de indústrias de bens de produção é
implantado e redefine-se o papel econômico do Estado no sentido de tornar o pólo urbano-
industrial o eixo dinâmico da economia.

Conforme F. OLIVEIRA (1977)171, o papel do Estado neste período foi o de criar as


bases para que a acumulação capitalista industrial pudesse se reproduzir. No âmbito da
regulamentação geral dos fatores produtivos pelo Estado, os mecanismos de formação de
preços via mercado foram progressivamente substituídos ou controlados por dispositivos
normativos e institucionais. No que concerne à configuração do rapport salarial, o Estado
promulga a legislação trabalhista e sindical. Evitava com isso a possibilidade de um
confronto direto entre capital e trabalho, pois ao fixar o salário mínimo em níveis realmente

170
A ditadura do Estado Novo desdobra-se entre 1937 e 1945, quando as eleições para a Presidência da
República e para o Congresso foram então retomadas. Isto significa que, embora o regime político autoritário
tenha sido uma característica deste subperíodo, foi durante a vigência do Estado Novo que o aparelho de Estado
brasileiro reestruturou-se para desempenhar novas funções concernentes à implementação de um projeto de
desenvolvimento econômico nacional.
171
OLIVEIRA, Francisco. A Economia Brasileira: crítica à Razão Dualista. In: Seleções CEBRAP. SP,
Brasiliense, 1977, nº 1, pp. 10-1.
212

biológicos, a legislação trabalhista reduzia ao máximo os gastos dos empresários com a folha
de pagamento, já que não foram computadas despesas com educação e saúde. (S.
MENDONÇA, 1988, p. 28);

O Ministério de Trabalho, Indústria e Comércio é estabelecido em 1930 e 1931


aprova-se a Lei de Sindicalização, onde todos os sindicatos eram obrigados a se filiar a este
ministério para serem oficialmente reconhecidos e receberem o fundo sindical. Na prática esta
lei representava a primeira restrição de ordem institucional à autonomia dos sindicatos de
trabalhadores. A jornada de trabalho foi fixada em 8 horas diárias, o trabalho das mulheres e
crianças foi regulamentado e foram criados os Institutos de Previdência Social para diversas
categorias profissionais.

O subperíodo [1937-1945] foi marcado pela ditadura do Estado Novo de caráter


totalitário, com tendências fascistas e difusor de uma ideologia nacional-desenvolvimentista.
As análises históricas [CARONE, E. (1976); MENDONÇA (1988); ALENCAR, F. (1989)]
reconhecem que o Governo neste período ao mesmo tempo em que protegia os trabalhadores,
atendendo à antigas reivindicações; de outro, disciplinava sua atuação, subordinando os
sindicatos ao Ministério do Trabalho e acabando com a tradicional independência. O Estado
consolidava assim as bases institucionais do que CORIAT e SABOIA (1995) identificariam
como um tipo de regulação tutelar característica da economia e sociedade brasileiras.172

A ditadura do Estado Novo institucionalizou o controle sobre as relações de emprego.


Mas o fator diferencial a ser destacado na presente análise é que este tipo de Estado
centralizador, autoritário e sob o domínio da alta burocracia civil e militar e dos grupos
oligárquicos e burgueses - comprometia-se com um processo de modernização conservadora
cujo eixo era a afirmação do capital industrial. Como não deixava de atender aos interesses de
outros setores das classes dominantes brasileiras, este modelo de Estado foi também
denominado pela historiografia nacional como Estado conciliador .

Toda a legislação trabalhista e social foi reunida em 1943, dando origem à


Consolidação das Leis do Trabalho (CLT), em vigor até hoje. Destacam ainda neste período, a
criação da PETROBRAS, da Companhia Siderúrgica Nacional (CSN) e do Banco Nacional de

172
Segundo BRUM, A (1988), esta intervenção direta do Estado na economia e nas relações de trabalho
decorria do entendimento que se tinha do estágio ainda atrasado do capitalismo brasileiro. De um lado, a
empresa nacional era ainda fraca e, portanto, não tinha interesse nem condições de assumir a responsabilidade de
empreendimentos econômicos de vulto, que exigem relativa intensidade de capital e largos anos para maturação;
de outro, considerava-se que nem patrões nem trabalhadores, com suas organizações ainda incipientes e pouco
representativas, tinham experiência e maturidade suficientes para dispensar a tutela do Estado.
Conseqüentemente, esta devia suprir-lhes as deficiências, ocupar o espaço devido e dirigir o processo.
213

Desenvolvimento Econômico e Social (BNDES) voltado para o financiamento de longo


prazo, modalidade não suprida pelo setor bancário-financeiro privado. Resultantes dos
compromissos institucionalizados que emergiram dos movimentos sociais e políticos dos anos
30, essas instituições exerceram impactos muito significativos no processo de
desenvolvimento econômico brasileiro e expressavam a percepção que as classes dirigentes
possuíam acerca dos novos papéis do Estado.

Em suma, destacam-se entre as características principais das intervenções econômicas


do Estado neste período:

a) Criação de um setor público para provimento de bens de produção que, mediante o


fornecimento de insumos e serviços a menores preços, viabilizava o repasse de seus
ganhos de produtividade às demais unidades industriais privadas;

b) Sem deixar de atender às demandas dos setores agrário-exportadores e do qual ainda


dependia ao nível das receitas públicas, o Estado promoverá medidas que visavam
acelerar o processo de industrialização do país: adoção de medidas voltadas para
responder às crises cambiais e ao desenvolvimento do processo de substituição de
importações (desvalorização real do câmbio; controle seletivo de câmbio; taxas
múltiplas de câmbio; elevação das tarifas aduaneiras);

c) A regulamentação de diversos componentes da wage-labor nexus (previdência, salário


mínimo, fixação da jornada de trabalho, etc.) no sentido de adequá-la ao novo padrão de
acumulação de capital impulsionado pela dinâmica da indústria. Mas essa adequação
processando-se nos quadros de um regime político não-democrático buscava
preponderantemente consolidar o papel tutelar do Estado junto aos sindicatos de
trabalhadores e difundir uma ideologia de fundo nacional-desenvolvimentista.
Conforme (GREMAUD et alii, 2004), buscava-se adequar o arcabouço institucional à
indústria, através da formação e regulação de um mercado de trabalho urbano,
definindo os direitos e deveres dos trabalhadores e as formas contratuais das relações de
emprego;

d) A crise do regime de acumulação agrário-exportador, ao conjugar-se no plano


externo com a grande crise dos anos 30, redefine o equilíbrio de forças políticas e abre
espaço para a emergência de novos compromissos institucionalizados que refletiam os
interesses do capital industrial no país. Em conseqüência, o processo de industrialização
por substituição de importações que se desenvolvia de modo espontâneo em interação
214

com a dinâmica cíclica da economia agrário-exportadora, contará com o apoio explícito


do Estado que o tomará como política de desenvolvimento.

2º) Período [1955-1963] ou Fase I do desenvolvimentismo associado: o Estado sob um


regime político democrático promove o desenvolvimento econômico associado ao capital
estrangeiro

Esse período foi marcado pela difusão e consolidação do modo de desenvolvimento


fordista em suas variantes nacionais nos países da OCDE com suas conseqüências sobre a
reconfiguração das relações comerciais e financeiras entre o centro e as nações periféricas. A
conjuntura política e econômica do pós-Segunda Guerra desencadeia um conjunto de
transformações sócio-institucionais que conduzem à superação do regime político do Estado
Novo. Isto haveria de implicar necessariamente na redefinição das políticas protecionistas e
na reformulação do Estado herdado da era Vargas para readequá-lo às novas demandas
internas e externas. No plano político tratava-se de superar os impasses da postura
nacionalista, pois uma das contradições do processo de industrialização substitutiva de
importações provinha de sua grande dependência com relação à capacidade de importar
gerada pelo setor agrário-exportador. Em conseqüência, como observa S. MENDONÇA
(1988), a abertura da economia ao capital estrangeiro se colocou como solução para os
impasses da política de substituição de importações.

Os trabalhos em história econômica brasileira reconhecem que este período foi


marcado por transformações estruturais profundas. Em termos regulacionistas, assiste-se a
uma redefinição relativamente rápida da forma institucional de inserção no regime
internacional e a mudança do eixo da acumulação industrial que passa do setor de bens de
produção para o setor de bens de consumo duráveis. São quatro as explicações normalmente
aventadas para essa mutação:

A alta concentração de renda que resultou do regime de crescimento anterior;

As transformações do mercado interno nacional, resultantes do processo de


urbanização e da ampliação da massa salarial;

Um fator de ordem política proveniente do pacto populista: segundo


MENDONÇA(1988), para garantir o equilíbrio das forças políticas, o Estado
continuaria a abster-se de tributar as classes proprietárias em geral. A burguesia
industrial em expansão foi então diretamente beneficiada;
215

O próprio desenvolvimento dos regimes de crescimento fordistas nos países centrais


foi acompanhado de uma internacionalização progressiva das economias periféricas. A
estabilidade econômica alcançada pelos centros capitalistas após a conclusão dos
planos de reconstrução do pós-guerra, levou-os a buscar novas oportunidades de
investimento. Não é por outra razão que neste período se observará uma expansão sem
precedentes das grandes empresas multinacionais que implicou no transplante, para as
economias em desenvolvimento, de estruturas de organização da produção e do
processo de trabalho tipicamente fordistas.173

Neste período, observa-se que a internacionalização da economia avançou no sentido


de superar as formas anteriores de financiamento do modelo de industrialização por
substituição de importações. O Estado brasileiro capacita-se então para permitir a entrada do
capital estrangeiro sob a dupla forma de empréstimos e investimentos diretos, mas sobretudo
para coordenar esse processo através do planejamento consubstanciado no Plano de Metas,
durante o governo KUBITSCHEK (1956-1961).

Tratava-se de um ambicioso conjunto de objetivos setoriais que, segundo LESSA


(1981) constituiu a mais sólida decisão consciente em prol da industrialização na história
econômica brasileira. Impulsionou o processo de substituição de importações em sua nova
fase agora em associação com o capital estrangeiro. O Estado financiava os gastos públicos e
privados com expansão dos meios de pagamento e do crédito, via empréstimos do BNDE e
também por avais para a captação de recursos no exterior. O setor público atuava duplamente
como regulador e produtor, aumentando sua participação direta na formação bruta de capital
fixo do país, ao mesmo tempo em que garantia as condições de produção e de distribuição às
empresas estrangeiras e nacionais.

Observa a historiadora S. MENDONÇA (1988, p. 49), que o Estado durante o Plano


de Metas lançou as bases do que se tornou conhecido como o tripé da indústria brasileira: o
capital privado nacional encarregava-se preponderantemente da produção dos bens de
consumo não duráveis; o capital estrangeiro respondia pelo setor de bens de consumo

173
Como será visto ao longo deste trabalho, isto não significa que o ingresso de capitais estrangeiros e das
empresas multinacionais tenham provocado a emergência de padrões fordistas de acumulação na economia
brasileira. Pelo contrário, como se verá nas próximas seções, a análise aqui proposta não corrobora a hipótese de
vigência deste tipo de regime de crescimento no Brasil. Destaca-se apenas que no que concerne à sua dimensão
produtiva, formas fordistas de organização do trabalho puderam ser estabelecidas.
216

duráveis e o capital estatal voltava-se para o setor de bens de produção.174 O Plano de Metas
reconfigurou as relações Estado-economia, integrando as atividades do capital público e do
privado nacional e estrangeiro, através de um planejamento que definia as prioridades de
investimento, bem como as estratégias para alocação dos recursos privados disponíveis. O
Estado brasileiro adquiria novas funções e esferas de atuação econômica que passavam desde
a sua definição como banqueiro do capital privado (através das agências públicas de
financiamento do crédito industrial), até o seu papel de proprietário (através das empresas
públicas). Segundo LESSA (1975), ocorria neste momento um processo de estatização
formal da economia brasileira que tinha por fundamento um Estado como importante
produtor direto nos setores estratégicos e controlador indireto de faixas expressivas de decisão
privada.

3º) Período [1964-1989] ou Fase II do desenvolvimentismo associado com seu apogeu e


crise: o Estado sob um regime político autoritário aprofunda o desenvolvimento
econômico associado ao capital estrangeiro e aumenta a dependência externa

Este período inicia-se pelo golpe militar de 1964, que pode ser interpretado como um
dos desdobramentos da crise de 1962, considerada a primeira crise industrial endógena
brasileira.175 O regime de crescimento anterior promovido pelo Plano de Metas intensifica
várias contradições inerentes à opção por uma determinada lógica de acumulação industrial: o
aumento excessivo da concentração de renda; subinvestimento no setor agrícola e a
desconexão entre os ganhos de produtividade e os salários. Esses fatores se conjugaram e
criaram as condições para a crise de 1962 e para a elevação da inflação no período.

Uma das conseqüências políticas do golpe foi o afastamento no controle do aparelho


de Estado dos setores mais atrasados das classes dominantes brasileiras, que foram
substituídos pela burguesia industrial e financeira. Simultaneamente as forças populares são
esmagadas e os movimentos sociais reprimidos. Uma nova legislação trabalhista foi
estabelecida com o objetivo de aprofundar a flexibilidade quantitativa e salarial das relações
de emprego no Brasil.

O Estado brasileiro implementa o Programa de Ação Econômica do Governo (PAEG)


para o período 1964-1966, através de um conjunto de reformas institucionais de grande
amplitude:
174
Para MENDONÇA, a mediação do Estado seria indispensável para o convívio harmonioso entre essas
frações do capital, resultando na velocidade e na intensidade das transformações estruturais promovidas neste
período da evolução econômica brasileira.
175
Conforme MANTEGA, G. e MORAES, M. Acumulação monopolista e crises no Brasil. Paz e Terra, 1973.
217

a) A reforma tributária introdução do dispositivo institucional da correção monetária


no sistema tributário, visando a reduzir as perdas de arrecadação causadas pela
inflação; reformatação do sistema tributário com a substituição dos impostos em
cascatas pelos impostos sobre valor adicionado. Criaram-se o imposto sobre produtos
industrializados (IPI), o imposto sobre circulação de mercadorias (ICM) e o imposto
sobre serviços; redefine-se o espaço tributário nacional entre as esferas do governo:
União (IPI e imposto de renda, imposto territorial rural, impostos únicos e sobre o
comércio exterior); Estados (ICM) e municípios (ISS imposto sobre propriedade
territorial urbana). Criaram-se os fundos de transferência fiscal intergovernamentais
(os Fundos de Participação dos Estados e dos Municípios). Destacam-se ainda o
surgimento dos fundos parafiscais como o FGTS e o PIS (Programa de Integração
Social)176. Aprova-se o novo Código Tributário Nacional em 1966, que eleva e
centraliza a arrecadação fiscal na União. Um dos resultados diretos dessas mudanças
institucionais no âmbito fiscal foi o aumento da arrecadação e a subordinação dos
estados ao governo central. Por outro lado, observou-se uma descentralização dos
gastos, com maior flexibilidade operacional, graças à vinculação da receita tributária e
da criação de órgãos associados à administração direta;

b) A reforma monetária e financeira foram estabelecidas as estruturas institucionais


básicas para o funcionamento de um moderno mercado bancário-financeiro. A antiga
Superintendência da Moeda e do Crédito (SUMOC) é transformada em um Banco
Central e cria-se o Conselho Monetário Nacional (CMN) visando a tornar a política
monetária independente. O Governo institui a correção monetária e cria as Obrigações
Reajustáveis do Tesouro Nacional (ORTN), superando as restrições impostas pela
antiga Lei da Usura que limitava as taxas de juros nominais ao teto de 12% anuais. Foi
criado, através da Lei nº 4.320, o Sistema Financeiro da Habitação e o Banco Nacional
da Habitação (BNH) com o objetivo de eliminar o déficit habitacional. Implementa-se
a reforma do mercado de capitais através da Lei nº 4.728. A estrutura institucional
deste mercado baseava-se no modelo norte-americano, caracterizado pela
especialização e segmentação;

176
Observa GREMAUD et alii (2004), que o Estado buscava com essas mudanças, romper o estímulo à
integração vertical da produção e facilitar a utilização dos impostos como instrumento de política de
desenvolvimento e de redução de distorções, ao permitir as diferenciações de alíquotas e facilitar a concessão de
isenções e incentivos fiscais às atividades específicas.
218

c) A reforma do setor externo seu objetivo era estimular o desenvolvimento


econômico e evitar as pressões sobre o balanço de pagamentos que constituíram uma
das distorções do processo de industrialização por substituição de importações. O
Estado brasileiro pautou-se por medidas que pudessem melhorar o comércio exterior e
atraíssem o capital estrangeiro para investimento direto. Buscou-se estimular as
exportações através de incentivos fiscais e da capacitação das instituições públicas
responsáveis pela gestão do comércio internacional. O Governo simplifica e unifica o
sistema cambial para eliminar as incertezas concernentes à política cambial. Um
sistema de minidesvalorizações cambiais é adotado a partir de 1968, de maneira que a
variação da taxa de câmbio pudesse refletir o diferencial entre a inflação interna e a
externa. Para estimular o ingresso de capitais estrangeiros, renegocia-se a dívida
externa brasileira e são oferecidas maiores garantias aos investimentos norte-
americanos.

Esses conjuntos de reformas institucionais foram considerados essenciais para a eficácia


do projeto desenvolvimentista do governo militar, que se materializaria nos chamados Planos
Nacionais de Desenvolvimento177:

I PND O Primeiro Plano Nacional de Desenvolvimento foi elaborado para ser


executado no período 1972-74, como extensão do Programa de Metas e Bases de Ação
do Governo anterior. Neste sentido, observa M. B. FURTADO (1988), que se pode
considerar o primeiro subperíodo [1964-66] como de reconstrução e modernização
das instituições ; o segundo [1967-71] representaria a fase de retomada do
crescimento econômico e o terceiro [1972-74] corresponderia à execução do I PND
com a ambição de elevar o Brasil à categoria de país desenvolvido ;178

II PND O Segundo Plano Nacional de Desenvolvimento foi elaborado para vigorar


de 1975 a 1979 e previa a retomada do processo de substituição de importações,

177
Durante o Governo Castelo Branco foi formulado o Plano Decenal de Desenvolvimento Econômico e Social
para os anos de 1967-1976. Segundo IANNI(1977), tratava-se de aproveitar as condições políticas
excepcionais, criadas com a hegemonia absoluta do Executivo sobre o Legislativo; e aproveitar também as
condições econômicas favoráveis, criadas pela experiência de formulação e execução do PAEG . Neste sentido,
o governo buscou se equipar para exercer com o máximo de eficiência as suas funções no âmbito das relações
econômicas. Todavia, como observa o mesmo autor, o Plano Decenal não passou de um conjunto de estudos,
relatórios e recomendações. A despeito do interesse revelado pelo governo e do empenho dos economistas e
técnicos que se dedicam à elaboração dos vários diagnósticos e prognósticos, ele não subsistiu no governo
seguinte e foi substituído pelos Planos Nacionais de Desenvolvimento.
178
Para M. B. FURTADO, a política de endividamento externo constituiu-se neste período no principal fator de
aceleração do crescimento econômico. A extroversão da economia, por outro lado, tornou o país ainda mais
dependente do exterior e, ao incentivar a exportação, provocou menor oferta interna, principalmente de produtos
agrícolas.
219

principalmente nos setores de bens de capital, eletrônica pesada e insumos básicos. O


Estado, como no primeiro período, buscaria redirecionar o eixo da acumulação de
capital novamente para o setor de bens de produção, completando o processo de
industrialização brasileira. Este plano previa investimentos anuais da ordem de 38%
do PIB brasileiro, mas como a poupança nacional era de 28%, a diferença seria
coberta por poupança externa.179 O II PND deve ser compreendido como uma
alternativa à dicotomia entre ajustamento e financiamento externo para a continuidade
do processo de desenvolvimento. Em fins de 1974, o lançamento do II PND
significava uma estratégia intermédia de se obter um ajuste na estrutura de oferta de
longo prazo, mantendo-se a economia numa trajetória de crescimento. Tratava-se do
que CASTRO e SOUZA (1985) denominaram por marcha forçada , onde a economia
continuaria promovendo os investimentos necessários à substituição das importações
dos bens de capital e insumos básicos. Segundo GREMAUD et alii (2004), dois
problemas centrais para a execução deste plano eram as questões do apoio político e
de seu financiamento. Na ausência desta sustentação política, o Estado transformou-se
em Estado-empresário à medida em que o eixo principal do processo centrava-se
nas empresas estatais.180

III PND O Terceiro Plano Nacional de Desenvolvimento procurou completar a


execução do anterior, para o período 1980-85. Todavia, foi mais flexível que o II
PND, inclusive não quantificando seus principais objetivos. Foi dada ênfase a três
grandes setores: o energético, o agrícola e o exportador. Tratava-se de responder às
condições macroeconômicas adversas do período, que se manifestavam num elevado
desequilíbrio externo, no aumento da inflação e na deterioração da situação fiscal.

A emissão de títulos públicos indexados à inflação e a reestruturação do mercado


bancário-financeiro instituem o processo de redefinição do papel do Estado como
garantidor do capital financeiro privado. E nos quadros de uma análise regulacionista,
o Estado implantava um novo regime fisco-financeiro considerado um dos pilares

179
Na área energética, destacou-se o Programa Nacional do Álcool (PROALCOOL), implementado em 1976,
usando a produção do álcool como combustível automotivo substituto da gasolina e como matéria-prima para a
indústria química.
180
Para FIORI (1995), citado por LACERDA et alii (2000), a tentativa de implantar o II PNB, articulando o
Estado e a burguesia industrial do setor de bens de capital, constituiu-se na segunda tentativa de via prussiana
rejeitada de afirmação de um projeto nacional. A primeira refere-se à era Vargas, quando o Estado buscou
consolidar as bases para um desenvolvimento econômico autônomo, mas igualmente não teve o apoio necessário
da parte da burguesia brasileira. A denominada via prussiana de industrialização decorre da experiência histórica
alemã, onde a articulação entre o Estado Nacional e a burguesia industrial e financeira lançou as bases para o
processo de desenvolvimento econômico deste país.
220

básicos para relançar a economia brasileira num novo ciclo expansivo de acumulação.
Tratava-se de superar os obstáculos estruturais que resultaram do regime de
crescimento que emergiu a partir das transformações desencadeadas pelo Plano de
Metas. Esse ponto de vista é defendido por S.R. MENDONÇA (op. cit.), ao
argumentar que o golpe de 1964 não teria significado nenhuma ruptura essencial com
o padrão de desenvolvimento construído durante o período precedente.
Conseqüentemente, duas hipóteses podem ser testadas neste contexto:

a) Os dois períodos [1955-1963] e [1964-1989] abarcariam a vigência de um


mesmo regime de acumulação. Neste caso, a crise de 1962 representaria
apenas uma crise cíclica ou crise na regulação e não uma crise do modo de
regulação e do próprio regime de crescimento. Esta teria se manifestado ao
longo dos anos 80 e responderia por grande parte dos problemas
macroeconômicos conhecidos na literatura econômica brasileira sobre esta
década, destacando-se a crise da dívida externa, a crise fiscal do Estado e o
processo inflacionário;

b) Os dois períodos expressariam a vigência de dois diferentes regimes de


acumulação. Mas então a crise de 1962, como uma crise endógena, traduziria a
inaptidão do modo de regulação para pilotar o regime de crescimento a partir
do momento em que as novas bases técnicas produtivas, montadas sob a égide
do Plano de Metas, entram em operação. E como na primeira hipótese, os
graves problemas macroeconômicos dos anos 80 seriam a expressão do
esgotamento e crise de todo um modo de desenvolvimento (compreendido
como a conjunção macrodinâmica de um regime de acumulação com um
determinado modo de regulação).

Se a primeira hipótese for corroborada, então o diagnóstico do PAEG com as reformas


institucionais implementadas representou muito mais o projeto de determinados grupos
sociais dominantes que disputavam a hegemonia e o controle do aparelho de estado brasileiro,
do que a existência de obstáculos endógenos insuperáveis nos quadros do modo de regulação
vigente. Todavia, se a segunda hipótese for a que melhor reflete a realidade, então as
transformações institucionais impostas pelo Estado brasileiro no início do governo autoritário
buscaram efetivamente reconfigurar o modo de regulação, recriando as condições para uma
retomada do processo de acumulação que desembocaria no milagre econômico brasileiro.
221

Ressalte-se que os estudos disponíveis sobre as relações Estado-economia, para esse


período, apontam que durante o regime militar, o setor público expandiu-se mais rápida e
intensamente do que nos governos anteriores. Seja através da administração direta, indireta ou
das empresas públicas, o Estado brasileiro aumentou substancialmente o seu controle sobre
vários setores econômicos e sociais. Uma das explicações para esse processo amplo e
acelerado de estatização reside não apenas nas necessidades econômicas stricto sensu, mas na
própria ideologia difundida pelo governo militar que buscou identificar o desenvolvimento
econômico como uma questão de segurança nacional e, portanto, um atributo inalienável do
Estado. Mas a dose de voluntarismo contida nos chamados Planos Nacionais de
Desenvolvimento (PND) é uma das expressões maiores de que não se tratava apenas de
necessidades econômicas ou de expedientes para bem reestruturar um modo de regulação que
se tornara inadequado. Cabe então aguardar pelas análises que serão propostas nos próximos
capítulos, na tentativa de elucidar essa questão fundamental quando se trata das
transformações de regimes de acumulação ao longo da história.

4º) Período [1990-2003] o Estado esvazia o discurso desenvolvimentista, incorpora a


ideologia da globalização neoliberal e inviabiliza no plano político-institucional a
retomada de um projeto de desenvolvimento nacional autônomo

Após toda uma década de dificuldades macroeconômicas e estruturais, conhecida na


literatura como a década perdida dos 80, o Estado brasileiro esvazia o discurso
desenvolvimentista, descaracteriza o papel anterior das intervenções públicas numa economia
como a brasileira e empreende uma saída pela via do retorno rápido, e pouco fundamentado a
nível teórico, ao mercado. Paralelamente, no plano externo, a ideologia da globalização
neoliberal buscava afirmar-se proclamando o caráter supostamente irreversível e inelutável do
novo processo de internacionalização. Às nações periféricas restaria então apenas o papel
passivo de adequar-se às imposições das novas forças de um mercado internacionalizado e
potencializado pelas novas tecnologias da comunicação e da informação.

Neste contexto, o Brasil, como outras nações altamente endividadas, foi pressionado a
abrir seus mercados num processo acelerado de liberalização comercial e financeira, cujas
conseqüências foram antecipadas como necessariamente benéficas à economia e sociedade181.

181
Nesta fase que marcou a entrada em cena das forças da globalização com sua difusão pela mídia, os tão
propalados benefícios econômicos e sociais só poderiam derivar de meras suposições sem conteúdo empírico ou
teórico, pois era flagrante a carência de pesquisas sérias e rigorosas sobre as reais conseqüências de um processo
de abertura comercial e financeira sobre as nações ainda em desenvolvimento. Evidentemente como se constatou
mais tarde, inclusive pelos próprios países desenvolvidos, a globalização mostrou-se um projeto político
222

Conseqüentemente, esse processo de abertura pressupôs mudanças institucionais que afetaram


vários níveis do sistema econômico brasileiro, incluindo a própria reformulação do setor
público e dos papéis a desempenhar numa economia ainda em desenvolvimento.

O Estado brasileiro lança-se num processo de reestruturação que se desdobra em cinco


dimensões básicas:

a) Reformas de caráter econômico (privatização e desnacionalização, nova forma de


inserção internacional; reforma monetária com a implementação do Plano Real,
etc.);

b) Reformas de ordem política;

c) Reforma do sistema de seguridade social;

d) Reforma do sistema tributário;

e) Reforma administrativa.

Para muitos analistas [SALUM (2002); FIORI (2000), GREMAUD et al (2004);],


neste período, as reformas na gestão estatal objetivaram o desmonte das estruturas
institucionais montadas nos anos 30 e que forneceram as bases econômicas para o processo de
industrialização substitutiva de importações. Compreende-se, portanto, as declarações oficiais
de que se tratava de superar a era Vargas , expressão da presença ativa do Estado em vários
níveis da economia e sociedade.182

A exemplo do que ocorrera com vários países latino-americanos, esse processo de


reestruturação foi amplamente influenciado pelo chamado Consenso de Washington.183 A
saída para a crise das economias latino-americanas consistiria numa estratégia de crescimento
market oriented que envolveria a liberalização comercial e financeira. Conforme

derivado dos interesses do capital financeiro internacional. Como atual fração hegemônica do capital é este quem
mais ganha com esse processo de internacionalização.
182
Esta forma de posicionar o discurso sobre as reformas do Estado esteve muito presente na gestão do então
Presidente da República Fernando Henrique Cardoso (1994-2002). Todavia, em que sentido os períodos JK e o
do Milagre econômico não teriam superado, cada qual a sua maneira, as linhas básicas de um Estado nacional-
desenvolvimentista ? Como observa SOUZA, H. e AFONSO, C. (1977), o verdadeiro significado do período JK
para a economia e a vida política brasileira, iria se revelar em toda sua plenitude quando as correntes
nacionalistas no Brasil descobriram, um pouco tarde, talvez, que o capital multinacional já havia ocupado seus
setores industriais estratégicos, no bojo da retórica desenvolvimentista do governo.
183
Segundo BRESSER-PEREIRA (1992), de acordo com a abordagem de Washington, as causas da crise
latino-americana são basicamente duas: (1) o excessivo crescimento do Estado, traduzido em protecionismo (o
modelo de substituição de importações), excesso de regulação, e empresas estatais ineficientes e em número
excessivo; e (2) o populismo econômico, definido pela incapacidade de se controlar o déficit público e de se
manter sob controle as demandas salariais tanto do setor privado quando do setor público .
223

WILLIANSON [1990, p. 8-17], citado por BRESSER-PEREIRA [1992, p. 16], o Consenso


de Washington envolve dez reformas:

1) Disciplina fiscal visando eliminar o déficit público;

2) Mudança das prioridades em relação às despesas públicas, eliminando subsídios e


aumentando gastos com saúde e educação;

3) Reforma tributária, aumentando os impostos se isso for inevitável, mas a base


tributária deveria ser ampla e as taxas marginais deveriam ser moderadas ;

4) As taxas de juros deveriam ser positivas e determinadas pelo mercado;

5) A taxa de câmbio deveria ser também determinada pelo mercado, garantindo-se ao


mesmo tempo em que fosse competitiva;

6) O comércio deveria ser liberalizado e orientado para o exterior (não se atribui


prioridade à liberalização do fluxo de capitais);

7) Os investimentos diretos não deveriam sofrer restrições;

8) As empresas públicas deveriam ser privatizadas;

9) As atividades econômicas deveriam ser desreguladas;

10) O direito de propriedade deve ser tornado mais seguro.

O processo de abertura comercial inicia-se em 1988, com a eliminação dos controles


quantitativos e administrativos sobre as importações e por uma proposta de redução tarifária.
Todavia, a partir de 1991 o processo se intensifica e se acopla ao programa de privatizações e
à liberalização dos fluxos de capitais financeiros.

a) O processo de privatização

No que concerne ao processo de privatização deve ser destacado que nos anos 80
tratava-se de uma fase de reprivatização de empresas que haviam sido absorvidas pelo Estado
brasileiro, em razão de dificuldades financeiras (Quadro 16).184 Mas em 1990, a privatização é
institucionalizada pela Lei nº 8.031 através da criação do Programa Nacional de

184
Segundo BAER [1995, p. 271], o movimento brasileiro em direção à privatização teria começado no final da
década de 70. Nesta época a desaceleração do crescimento econômico provocará um acirramento da
concorrência entre o setor público e o privado pelos recursos interno e externo de capital - tornados cada vez
mais escassos. Como as empresas estatais se encontravam no meio de grandes projetos de investimento aos quais
o governo dava total apoio, a oferta de recursos disponíveis para o setor privado reduziu-se, minando as bases
políticas e econômicas do chamado tripé sobre o qual o milagre dos 70 havia sido construído.
224

Desestatização (PND)185 convertendo-a em parte integrante das reformas econômicas do


Governo186. Ressalte-se que os setores atingidos pelas privatizações incluíram inicialmente as
empresas estatais que atuavam no segmento industrial. Em seguida o processo foi ampliado
com as concessões de serviços públicos à iniciativa privada, incluindo os setores de
eletricidade, transportes e telecomunicações. O Estado buscaria então se reestruturar para
desempenhar seu novo papel de regulador , abdicando-se da função de produtor direto. No
âmbito estadual, as privatizações também ganharam impulso, contribuindo para o aumento da
entrada de capitais estrangeiros com vistas à aquisição das empresas ofertadas.

Segundo GIAMBIAGI e ALÉM (1999), pode-se identificar três fases da privatização


no Brasil:

1ª) [1980 1989] nessa fase trata-se de um processo de reprivatização com o objetivo
de saneamento financeiro da carteira do BNDES. E embora não tenha havido privatização
das grandes empresas estatais, o Governo teve ganhos de experiência que seriam
utilizados na retomada do processo nos anos 90;

2ª) [1990 1995] esta fase se caracteriza pelo lançamento e implementação do Plano
Nacional de Desestatização que privilegia a privatização das empresas estatais. O Estado
promulga leis específicas que estabelecem um marco regulatório para a privatização de
setores, não apenas de empresas como anteriormente. O processo privilegiou as empresas
dos setores industriais (siderurgia, petroquímica e fertilizantes);

3ª) [1995 2002] essa terceira fase caracteriza-se pela aprovação da Lei de Concessões
que redirecionou o processo para a privatização de empresas de serviços públicos.
Destacam-se os setores de energia elétrica e telecomunicações que pela magnitude dos
recursos envolvidos podem ser consideradas megaprivatizações .

A análise da Lei 8.031 que lançou o PND é particularmente esclarecedora da nova


orientação do Estado brasileiro. Entre seus objetivos destacam-se:

O reordenamento estratégico da presença do Estado na economia tratava-se de


retirar o Estado de setores onde os capitais privados poderiam supostamente operar de

185
Uma curiosa ironia com relação ao período imediatamente anterior onde a sigla PND significava Plano
Nacional de Desenvolvimento.
186
Conforme LACERDA et al [2000, p. 194], inicialmente, 68 empresas foram incluídas no PND, mas até 1998,
somente no âmbito federal, 60 companhias tinham sido transferidas ao setor privado, gerando um resultado de
aproximadamente US$ 28,5 bilhões.
225

modo mais eficiente. Ao Estado caberia o provimento de bens tipicamente públicos:


educação, saúde, justiça, segurança e regulação;

A redução da dívida do setor público a receita da privatização da empresas estatais


seriam utilizadas no cancelamento de parte do estoque da dívida pública o que deveria
contribuir para reduzir a vulnerabilidade financeira do governo brasileiro. Julgava-se
também que a privatização poderia facultar ganhos fiscais, caso as taxas de juros
incidentes sobre a dívida cancelada do setor público fosse maior do que a rentabilidade
obtida pelo Tesouro Nacional enquanto proprietário majoritário das empresas estatais;

A retomada dos investimentos nas empresas privatizadas a deterioração das


finanças públicas não permitia o aporte de recursos necessários à manutenção do nível
de investimentos requeridos pelas estatais. Conseqüentemente, sua privatização
terminaria promovendo a retomada dos investimentos necessários à expansão da
capacidade produtiva;

A modernização do setor industrial esta seria um processo natural resultante da


privatização e da nova gestão das empresas industriais operando num ambiente de
maior competição. Novos investimentos seriam realizados tanto em expansão da
capacidade produtiva quanto em modernização tecnológica, aumentando os ganhos de
produtividade para a totalidade do sistema econômica;

O fortalecimento do mercado de capitais tradicionalmente o mercado de capitais


brasileiro caracteriza-se pela concentração das bolsas de valores em poucos papéis. A
privatização permitiria o aumento da colocação de papéis junto ao público o que
reduziria a concentração.
226

QUADRO 16 SINOPSE DO PROCESSO DE PRIVATIZAÇÃO

(US$ milhões)
NÚMERO MOEDAS
VALOR DÍVIDAS
TIPO PERÍODO DE TOTAL PODRES / TOTAL
ARRECADADO TRANSFERIDAS
EMPRESAS (%)
Reprivatização
1981-1989 39 ... ... 735 ...
1991 4 1.614 374 1.988 98,9
1992 14 2.401 982 3.383 98,7
1993 6 2.627 1.561 4.188 92,3
PLANO NACIONAL 1994 9 1.966 349 2.315 28,0
DE 1995 8 1.003 625 1.628 67,4
DESESTATIZAÇÃO 1996 11 4.080 699 4.749 25,1
(PND) 1997 4 4.265 3.559 7.824 4,5
1998 7 1.655 1.082 2.737 0,1
1999 2 133 133
2000 1 7.670 7.670
2001 820 820
Telecomunicações 28.793 2.125 30.918
Estaduais 1996-2001 27.919 6.750 34.669
TOTAL 84.946 18.076 103.022
FONTE: GREMAUD et al [2004], a partir de dados do BNDES.

b) A reforma da seguridade social

Além dos aspectos ligados aos desequilíbrios do fluxo de caixa do sistema


previdenciário, as pressões políticas em prol de sua reestruturação originaram-se também dos
mercados financeiros. A pressuposição de que caberia ao setor público garantir apenas
benefícios mínimos e compatíveis com a lógica do equilíbrio orçamentário ganhou então
relevo numa época de expansão dos fundos de aposentadoria complementar.

Os contínuos déficits da previdência são resultantes de uma conjunção de fatores onde


se destacam o envelhecimento da população, a queda da relação entre contribuintes e inativos,
decorrente da redução do emprego formal, e de problemas originários da própria gestão do
sistema. Mas, muitos analistas da crise da previdência [GIAMBIAGI e ALÉM, 2000;
OLIVEIRA e BELTRÃO, 1989], argumentam que a Constituição de 1988 fixou uma série de
benefícios sem concomitantemente estabelecer as fontes para custeá-los. O objetivo básico da
reforma da seguridade social é então adaptar o sistema previdenciário às novas condições
sócio-econômicas e demográficas do país: a elevação da expectativa de vida média da
população, os problemas do mercado de trabalho como o desemprego e a informalidade, além
da quase-estagnação do crescimento nas décadas de 80 e 90. Mas do ponto de vista do
orçamento público, trata-se de reduzir as despesas com benefícios e a ineficiência das práticas
anteriores de gestão de modo a se eliminar a médio ou longo prazo o déficit do sistema.
227

Como observa REZENDE (2000, p. 371), a reforma da previdência no Brasil tem


como princípio manter o regime de repartição e simultaneamente eliminar as diferenças de
critério entre os regimes dos funcionários públicos e do INSS, à exceção dos militares. Busca-
se empreender ajustes graduais no sistema, preservando-se os direitos adquiridos.

Conforme OLIVEIRA e BELTRÃO (1997), a reforma orienta-se pela


desconstitucionalização do tema previdenciário, na medida em que este passaria a ser objeto
de legislação complementar e ordinária. Objetiva-se criar uma legislação federal sobre
previdência, eliminando-se com a competência de Estados e Municípios para legislarem sobre
seguridade social. A reforma da previdência foi então promulgada em dezembro de 2003
depois de acirrados debates e muita confusão do público com relação aos eventuais prejuízos
e ou benefícios nova configuração do sistema. No entanto, para as fontes governamentais, a
reforma assegurará um processo de convergência entre os regimes previdenciários dos setores
público e privado, e garantirá um maior equilíbrio e a redução gradativa de sua necessidade de
financiamento no futuro187.

c) A reforma fiscal

Partindo-se do reconhecimento de que a carga tributária brasileira é superior a dos


países em processo de desenvolvimento [GIAMBIAGI e ALÉM (1999)], vários analistas
consideram que a reforma fiscal deve orientar-se no sentido do aumento da qualidade da
tributação188. As fontes oficiais argumentam que o objetivo principal da reforma tributária é
aumentar a eficiência e reduzir a complexidade do sistema, atacando os tributos cumulativos e
reduzindo o número de alíquotas dos impostos indiretos189. Somam-se também outros
objetivos como a redução dos incentivos à informalidade, o aumento da progressividade dos
impostos indiretos, diminuindo sua incidência relativa sobre a população de baixa renda.

Outro fato relevante para a análise do novo regime fisco-financeiro que se configura
no Brasil refere-se ao aumento da carga tributária observado ao longo dos anos 90 e antes
mesmo de que qualquer reformulação do sistema tributário tivesse sido implementada. Para
MATIAS PEREIRA (2003), existe uma estreita relação entre o programa fiscal firmado pelo
Brasil com o FMI e o aumento da carga tributária no país. No período 1999-2002, cerca de
5% do PIB foram acrescidos à carga tributária para conter uma expansão mais forte da dívida
pública, provocada pela elevação da taxa de juros. O aumento da receita impositiva
187
Conforme Helmut Schwarzer [2003], Secretário de Previdência Social do Ministério da Previdência Social.
188
Conforme MATIAS PEREIRA [2003], a economia brasileira possui a maior arrecadação tributária da
América Latina (36,11% do PIB).
189
O atual sistema tributário brasileiro é composto por 61 tributos (impostos, contribuições, taxas, fundos, etc.).
228

processou-se por meio da elevação de contribuições com incidência cumulativa (PIS-Cofins,


CPMF), além do aumento da tributação indireta e da arrecadação de outras receitas
extraordinárias. Um dos resultados foi o agravamento do caráter regressivo do sistema
tributário brasileiro, onde os impostos indiretos respondem por cerca de 51% da arrecadação e
os diretos representam apenas 19% (Quadro 17).

QUADRO 17 COMPOSIÇÃO DA ARRECADAÇÃO FISCAL: UMA COMPARAÇÃO ENTRE


BRASIL, EUA E UNIÃO EUROPÉIA

PAÍSES UNIÃO
EUA BRASIL
TIPOS EUROPÉIA
DE IMPOSTO
Indireto 30% 16% 52%
Direto 36% 50% 19%
Sobre a Propriedade 5% 11% 3%
Contribuições à Seguridade Social 28% 24% 25%
Outros 1% 0% 2%
Total 100% 100% 100%

FONTE: Adaptação a partir de PEREIRA (2003); Secretaria da Receita Federal (2000) para o Brasil; OCDE
(1998) para EU e EUA.

d) A reforma administrativa

Argumenta-se que no campo da administração, a prioridade educação-ciência-


tecnologia traduz-se em fortalecimento da administração central. Como observa REZENDE
(2000), trata-se de reverter a tendência ao crescimento da administração descentralizada que
marcou a experiência na gestão pública das últimas duas décadas. Os objetivos principais
dessa reforma constam do Plano Diretor da Reforma do Aparelho de Estado (1995). Segundo
o texto oficial:

Dada a crise do Estado e o irrealismo da proposta neoliberal do Estado


mínimo, é necessário reconstruir o Estado, de forma que ele não apenas
garanta a propriedade e os contratos, mas também exerça seu papel
complementar ao mercado na coordenação da economia e na busca da
redução das desigualdades sociais. Reformar o Estado significa melhorar não
apenas a organização e o pessoal do Estado, mas também suas finanças e todo
o seu sistema institutcional-legal, de forma a permitir que o mesmo tenha uma
relação harmoniosa e positiva com a sociedade civil
Ressalte-se no âmbito dessa reforma a promulgação da Lei de Responsabilidade Fiscal
e as mudanças institucionais que flexibilizaram a estabilidade do emprego público. Para
analistas jurídicos, a Emenda Constitucional nº19/98 foi a mais profunda reforma sofrida pela
229

Constituição de 1988190. Em termos quantitativos, porque abrangeu um vasto número de


dispositivos constitucionais. E em termos qualitativos, porque teria alterado a substância da
Administração Pública brasileira desviando-se do modelo social original e orientando-se por
conotações liberais, inspiradas em contornos da iniciativa privada. Em todo o caso, fica
patente que o discurso oficial, desde inícios dos anos 90, tem procurado justificar-se por meio
do estabelecimento de analogias ou convergências superficiais entre a lógica da gestão
privada e a gestão pública, abstraindo-se do fato que o poder de tributar é uma prerrogativa e
uma especificidade do Estado. Além disso, as contradições entre o discurso oficial são
flagrantes, pois apesar do Estado proclamar como irrealistas as propostas neoliberais, as
políticas governamentais ao longo de toda a década de 90, orientaram-se claramente no
sentido de conferir ao mercado um maior peso nos processos econômicos.

Segundo ALMEIDA (2002), fatores externos e internos concorrem para o processo de


reforma do Estado brasileiro. Destacam-se:

Entre os externos: a globalização e suas conseqüências sobre a autonomia da políticas


econômicas nacionais;

Entre os internos: a crise fiscal; o baixo grau de accountability ; a captura do Estado


tanto pelos interesses privados como pelas demandas imediatas de uma burocracia
centralizada, discricionária e altamente permeável aos interesses dominantes; a
existência de distorções estruturais que minam não só a eficiência das políticas
públicas mas a de todo o aparelho de Estado; a disjunção entre o Estado e a
sociedade, ou seja, conforme THEODORO (2000), a enorme distância entre a
sociedade representada e a sociedade real no setor público.

Poder-se-ía acrescentar as pressões do setor privado, e particularmente dos mercados


financeiros, no sentido de reduzir os custos de manutenção da máquina estatal, como um dos
fatores determinantes da solvência do setor público brasileiro.

Em suma, nos anos 90, assiste-se no Brasil, a implementação de um amplo conjunto


de reformas que tendem a atingir a totalidade do aparelho de Estado. Politicamente o Governo
tem encontrado apoio interno, seja no diagnóstico de crise das finanças públicas, seja nos
novos condicionantes externos trazidos pelo processo de globalização. E também, como
conjunção de ambos, a necessidade de manter a solvência do Estado face às elevadas dívidas
interna e externa.

190
Conforme artigo disponível no site JUS Navigandi [2004].
230

A reestruturação do Estado brasileiro articula-se, portanto à reconfiguração da forma


institucional de inserção no regime internacional. A abertura comercial e financeira pressupôs
a remoção de diversos dispositivos institucionais de controle do fluxo de capitais e de bens e
serviços que se enquadravam na lógica das relações Estado-economia características do modo
de desenvolvimento por substituição de importações. Em conseqüência, o atual regime de
política econômica encontra-se prisioneiro do elevado grau de restrição e vulnerabilidade
externa e portanto, tem sua autonomia extremamente reduzida.

O Quadro 18 reúne diversos momentos da evolução do Estado brasileiro para o


período [1930-2003], propondo uma periodização preliminar com base nas transformações
institucionais observadas ao longo da história.
231

QUADRO 18 EVOLUÇÃO DO ESTADO BRASILEIRO UMA PERIODIZAÇÃO EM TERMOS DE


MUDANÇAS INSTITUCIONAIS (1930 2003)
continua
PERÍODOS 1º 2º
[1930-1954] [1955-1963]
CARACTERÍSTICAS
- regime político autoritário até 1945 - regime político democrático
1. Regime Político - Ditadura do "Estado Novo" (1937-45)

- nacionalismo e desenvolvimentismo - desenvolvimentismo associado


2. Base Ideológica e
- controle político dos sindicatos e - "populismo" e "trabalhismo" de 1961 a
Formas de Legitimação associações para conter o antagonismo 1963
entre capital e trablho

3. Regime Fisco-Financeiro - arrecadação sobre produção interna - predomínio de impostos "em cascatas"
começa a superar arrecadação sobre - primeiros arranjos para tributação sobre
3.1 Sistema Tributário
importações valor adicionado

- criação da Superintendência da Moeda e do - prioridade às políticas de incentivo à


3.2 Estrutruras Crédito (SUMOC) com funções de banco indústria e investimentos do governo
Financeiras e Gestão central e do BNDE para crédito de longo financiados por imposto inflacionário
Monetária prazo - financiamentos de longo prazo por bancos
- prioridade às políticas de incentivo à públicos e a juros negativos
indústria nacional e investimentos em infra-
estrutura financiados por emissão monetária

- início da implantação com o Estado - Muita heterogeneidada na capacidade


3.3 Seguridade Social assumindo a gestão das caixas de financeira dos IAP gera pressões para
aposentadoria e pensões e criação dos IAP unificação das instituições previdenciárias
por categoria profissional - Promulgação da Lei Orgânica da
Previdência Social e unificação dos planos
com a criação do INPS (1960)

4. Codificação das relações de - implantação da legislação - legislação trabalhista propicia compressão


trabalho trabalhista e salarial (criação do salarial e diferencial produtividade-salários
salário mínimo, fixação da cresce
jornada de trabalho, etc.)

5. Provimento de Bens Públicos - Setor público complementa o fornecimento - Diminuição dos gastos sociais em relação
(educação, saúde, saneamento privado dos serviços de saúde e educação, ao período anterior
mas participação reduzida no orçamento
básico, etc.)

- Estabelecimentos das empresas públicas - Empresas estatais continuam


6. Setor Produtivo Estatal encarregadas dos bens de produção e dos
nos setores de bens de capital e
intermediários (petróleo, siderurgia, etc.) e investimentos em infra-estrutura e
participação estatal chega a uma média de participação estatal na FBKF mantém-se
24% da FBKF numa média de 23%
- unificação de várias empresas estatais do
setor elétrico e de telecomunicações

- estruturação de um Estado nacional, - políticas públicas para estimular a


7. Orientação Básica das entrada do capital estrangeiro
econômica e politicamente forte e ativo
Políticas Governamentais multinacional
- busca de autonomia com relação ao
- foco das políticas industriais muda
capital estrangeiro para o setor de bens de consumo
- criação do Conselho Federal de duráveis
Comércio Exterior(1934)
- fortalecimento do mercado interno,
criação da indústria pesada nacional

FONTE: Elaboração própria.


232

QUADRO 18 EVOLUÇÃO DO ESTADO BRASILEIRO UMA PERIODIZAÇÃO EM TERMOS DE


MUDANÇAS INSTITUCIONAIS (1930 2003)
conclusão
PERÍODOS 3º 4º
[1964-1988] [1989-2003]
CARACTERÍSTICAS
- ditadura militar - retorno à democracia política
1. Regime Político - abertura política a partir de 1985 ("Nova
República")

- desenvolvimentismo associado - neoliberalismo e "globalização" interpretados


2. Base Ideológica e
- ideologia do "Brasil potência" e doutrina como tendências inelutáveis
Formas de Legitimação da Segurança Nacional - estabilidade monetária e macroeconômica
se confundem
- "Era Vargas" deve ser superada

3. Regime Fisco-Financeiro - reforma fiscal centralizadora prioriza a - descentralização fiscal (1988) e


3.1 Sistema Tributário tributação sobre valor adicionado fortalecimento da posição dos municípios
- reforma fiscal (2004) em andamento

- criação do banco central e das instituições - prioridade do combate à inflação e política


3.2 Estrutruras básicas do mercado financeiro e de capitais monetária restritiva
Financeiras e Gestão - institucionalização da correção monetária e - implementação do Plano Real em 1994
Monetária fortalecimento do crédito ao consumidor - liberalização financeira
- prioridade às políticas de incentivo à
indústria

- extensão da cobertura para o setor - Constituição de 1988 estabelece sistema


3.3 Seguridade Social rural(1971) previdenciário considerado custoso e com
- Criação do Ministério da Previdência e várias distorções
Assistência Social (1974) e centralização dos - questionamento e pressão para mudanças
recursos conduzem, a partir de 1998, ao processo
- INPS desmembra-se em IAPAS e INAMPS de reforma da previdência

- O FGTS substituindo a Lei da Estabilidade, - Novas alterações na legislação trabalhista


4. Codificação das relações de
aumenta a flexibilidade quantitativa e salarial aprofundam a flexibilidade do mercado de
trabalho e funciona como popupança forçada trabalho
- aumentos salariais são regulados por - alto nível de informalidade
decreto do governo central

5. Provimento de Bens Públicos - Parte das responsabilidades com o - sucateamento e crise dos sistemas
(educação, saúde, saneamento provimento de serviços de saúde e públicos de saúde e de educação
educação são transferidas aos Estados, - proliferação dos planos privados de saúde
básico, etc.)
reduzindo drasticamente os gastos sociais e das instituições educacionais privadas
federais

- Grande crescimento das empresas - Implementação do Plano Nacional de


6. Setor Produtivo Estatal públicas e formação de um "Estado Desestatização e avanço do processo de
empresário" que centraliza o projeto de privatização das grandes empresas estatais
desenvolvimento econômico - Participação estatal na FBKF reduz-se
- participação estatal na FBKF atinge 32% para a média de 13%
em 1965 e mantém-se na média de 26% até
1971

- consolidação do processo de - reduzir o tamanho 'excessivo" do Estado,


7. Orientação Básica das internacionalização nos quadros da definir suas "verdadeiras" funções
Políticas Governamentais "modernização conservadora" (transição do "Estado provedor para o
- aumento dos gastos com políticas "Estado regulador")
antipopulares e repressivas - promover o equilíbrio das finanças
- foco das políticas industriais retorna ao setor públicas
de bens de produção no II PND (1975-79) - abandono das políticas industriais e de
- criação do CIP - Conselho Interministerial de desenvolvimento com a proclamação do
Preços (1968) "esgotamento do modelo de
industrialização por substituição de
importações"

FONTE: Elaboração própria.


233

4.2.2 A evolução do regime fisco-financeiro


Enquanto na seção anterior o objetivo principal foi delimitar as mudanças
institucionais que direta ou indiretamente contribuíram para reconfigurar as relações Estado-
economia, agora se trata de identificar seus impactos sobre as finanças públicas. Propõe-se
para tanto, uma análise das transformações ao nível do regime fisco-financeiro brasileiro,
procurando explicitar os padrões de evolução das receitas e das despesas públicas.

Numa abordagem regulacionista, o Estado emerge em seu caráter ambivalente


(BILLADOT, 1996)191. De um lado, possui um princípio de unidade própria, à medida em
que se organiza e se desenvolve como um centro de acumulação de poder político sobre as
demais instâncias da economia e sociedade. De outro, seu funcionamento e formas históricas
de atuação são dependentes e dinamizados pelos compromissos institucionalizados. E a
depender do nível de desenvolvimento das instituições democráticas, estes últimos podem
representar mais eficazmente os anseios da sociedade civil ou então serem,
preponderantemente, a expressão de projetos particulares de grupos ou de classes
hegemônicas.192 Segundo BILLAUDOT:

Cela permet de comprendre pourquoi l État peut prendre diverses formes


dans son rapport à l économie. Chaque forme transitoirement stable, qui
s accorde plus généralement à un régime politique, relève d un certain degré
de développement de la citoyenneté sociale différenciée. Il lui correspond un
régime économique de l ordre politique, encore qualifié de régime fisco-
financier. Ce régime doit être en cohérence avec le régime d accumulation
dans lequel il s inscrit. Cette cohérence est problématique, en raison de la
logique propre à l ouvre dans l ordre politique. Et pour cause : cette logique
avant tout dépensière tend à faire monter le taux global de prélèvements
obligatoires ou à provoquer un évincement de l accumulation (privée) par les
placements en rente d État. »
As relações Estado-economia implicam, portanto em determinadas estruturas de
receitas e despesas públicas que afetam a dinâmica da acumulação de capital. Essas estruturas
são reprodutíveis não apenas por processos estritamente econômicos, mas por mecanismos de
legitimação e por práticas sócio-políticas. Conforme THÉRET (2002), uma abordagem
regulacionista do Estado deve buscar elucidar a dinâmica interna à ordem política, isto é,
explicitar o sistema de restrições políticas que conferem às finanças públicas um certo ritmo
de desenvolvimento ou, pelo contrário, as conduzem à crise. Apreender o regime fisco-
191
B. BILLAUDOT (1996), L Ordre Économique de la Société Moderne un réexaman de la théorie de la
régulation. L Harmattan.
192
Conforme observa BILLAUDOT (1996, p. 56), enquanto organizado e administrado a partir de
compromissos institucionalizados, trata-se de um Estado para a sociedade, seu conservador, le lieu où
convergent, en quête d un arbitrage, toutes les tensions contradictoires nées de l interaction de groupes sociaux
aux intérêts conflictuels (Lordon, 1994).
234

financeiro significa então mostrar como, em uma situação histórica dada, essas estruturas se
configuram para assegurar o desenvolvimento financeiro do Estado e do poder político que
lhe corresponde.

4.2.3 Industrialização, regime fisco-financeiro e regime de política econômica


No caso da economia brasileira, a montagem e desenvolvimento do aparelho de
Estado conhecerá um grande impulso a partir da consolidação de um novo regime fisco-
financeiro de base industrial.

GRÁFICO 34 COMPOSIÇÃO DA ARRECADAÇÃO TOTAL DA UNIÃO (1901-2002)

Imposto sobre Importação


Imposto sobre Produto Industrializado
Imposto sobre a Renda e Outros Proventos
80%

70%

60%

50%

40%

30%

20%

10%

0%
1901
1904
1907
1910
1913
1916
1919
1922
1925
1928
1931
1934
1937
1940
1943
1946
1949
1952
1955
1958
1961
1964
1967
1970
1973
1976
1979
1982
1985
1988
1991
1994
1997
2000
FONTE: IBGE Estatísticas do Século XX. Rio de Janeiro, 2003.
NOTA: Referem-se apenas aos principais impostos da União como percentagem da receita total de arrecadação,
não se incluindo os impostos de menor participação.
Até os anos 30, a arrecadação federal é fortemente dependente das receitas de
impostos sobre importações, uma característica do modo de desenvolvimento extrovertido
baseado no complexo agrário-exportador cafeeiro.193 No entanto, a partir de 1939, a
arrecadação sobre a produção industrial supera as receitas originárias de importações. Estas
últimas caem drasticamente até estacionarem em torno de 10% da arrecadação federal entre os
anos 40 e 90. Mas com o rápido crescimento de uma classe média urbana, em 1943 seria a vez

193
Em seu trabalho O Setor Público Brasileiro 1980/1945 , p. 9, Lia Alt PEREIRA e Lia Valls PEREIRA
(2001) observam que a evolução da receita tributária espelha a evolução dos fatores que condicionaram o
crescimento da economia. (...) Até a segunda metade dos anos 30, sendo a economia fortemente dependente do
comércio exterior, também o era a receita pública, dos impostos de importação e de exportação. À medida em
que se consolidava a mudança da estrutura da economia com o processo de industrialização intensificado a
partir de 1933, os impostos internos passavam a dominar o sistema tributário brasileiro.
235

das receitas de impostos sobre a renda ultrapassarem a arrecadação obtida com o principal
tributo da República Velha (Gráfico 34). Em suma, a tributação sobre as importações
permanece estacionada numa média de 10% da receita fiscal total a partir de 1958. Mas
enquanto a arrecadação sobre produção industrial decai acentuadamente de 1968 a 1984, a
participação do imposto sobre a renda avança neste mesmo período e atinge nos anos 90, 60%
do total da arrecadação.

Observe-se que esta fase de transição processa-se no primeiro período [1930-1954],


delimitado, na seção anterior, em termos de mudanças institucionais. O Estado Novo que se
impôs à sociedade brasileira de forma autoritária foi também a expressão de novos
compromissos institucionalizados, mais consentâneos com as demandas do capital industrial.
Então se pode apreender a reconfiguração do Estado neste período, no sentido da montagem
de novas estruturas institucionais de legitimação e hegemonia, não apenas de controle social.
Como já exposto na seção anterior, os novos controladores do aparelho de Estado buscaram
capacitá-lo para desempenhar as novas atribuições exigidas numa conjuntura de crise
econômica, marcada pela transição do capital mercantil agrário-exportador para o capital
industrial. Por exemplo, a criação da Superintendência da Moeda e do Crédito (SUMOC), em
1945, a implantação pelo Estado das instituições básicas de seguridade social e a legislação
trabalhista e sindical, articularam-se enquanto fatores de constituição do novo regime fisco-
financeiro compatível com as exigências de uma acumulação de base industrial.

Para tanto, era preciso mudar o que na Teoria da Regulação é definido por regime de
política econômica. Neste contexto, pode-se mobilizar a classificação proposta nos trabalhos
de THÉRET (1992) e LORDON (2002, p. 202). Primeiramente, é possível considerar-se duas
formas diferentes da política econômica:

a política econômica de regime constitui uma das peças do modo de regulação


vigente. Ao lado das outras formas institucionais (WLN, RMF, FC e FII)194, ela
contribui para reproduzir as estruturas de acumulação, ao mesmo tempo em que é
validada por estas últimas. Neste contexto, a eficácia da política econômica depende
do grau em que expressa as necessidades e as características específicas do modo de
regulação.

194
De agora em diante, essas siglas significarão, respectivamente, wage-labor nexus ou rapport salarial, regime
monetário-financeiro, formas da concorrência e forma de inserção internacional, mantendo-se suas definições,
expostas no capítulo 1.
236

a política econômica de transição de regime a política econômica é também um


recurso da intervenção do Estado no sentido de administrar o espaço sócio-econômico
em situações de crise ou bloqueio da acumulação de capital. A partir do diagnóstico
de desestabilização do modo de regulação, a política econômica pode antecipar novas
regularidades e favorecer a emergência de novas formas institucionais.

É neste sentido que o Estado surge como uma instituição superior às demais
instituições, pois dotado de poder político que, apesar de limitado, é capaz de as transformar.
Neste contexto, observa LORDON (2002), o Estado se manifesta tanto como dispositivo
inscrito nas estruturas do modo de regulação, quanto como ponto de apoio externo de onde é
possível agir sobre este último. Neste sentido, se poderia considerar a forma regime de
política econômica como sendo constituída a partir dos seguintes elementos:

As formas de intervenção - reagrupam os instrumentos manipulados nos quadros da


política econômica de regime: orçamento público, moeda, câmbio, política de rendas,
etc.;

O quadro institucional de intervenção refere-se à natureza dos órgãos ou dos


agentes encarregados da concepção e / ou da condução da política econômica: agência
nacional, internacional, ministérios, etc. A definição do quadro institucional passa
também pelo exame da estrutura do aparelho de Estado, detalhando-se as atribuições
de poderes, as instâncias formadoras de doutrinas ou detentoras de legitimidade, etc.;

As condições de validação refere-se à importância da interação entre as


representações implícita ou explicitamente veiculadas pela política econômica e os
agentes privados que lhe são o objeto.

A interface com o modo de regulação trata-se de precisar as vinculações da política


econômica com os compromissos institucionalizados incorporados nas outras
componentes do modo de regulação. Uma multiplicidade de configurações são
possíveis, incluindo aquelas em que a política econômica pode ser exercida sem
efeitos significativos sobre os compromissos institucionalizados e os casos em que
pode, deliberadamente ou não, promover o seu desmantelamento.

Uma das muitas conseqüências analíticas que se pode extrair dessas considerações
teóricas refere-se ao fato de que o esgotamento de um regime de crescimento conduz
necessariamente à crise do regime de política econômica que lhe corresponde.
Conseqüentemente, a crise do regime de acumulação de base agrário-exportadora provocaria
237

mutações cada vez mais profundas no regime de política econômica consolidado ao longo da
República dos Fazendeiros . Sabe-se que até a Grande crise de 1929, a política econômica
respondia preponderantemente aos interesses do setor cafeeiro, as chamadas políticas de
valorização do café que procuravam minimizar os efeitos das grandes oscilações da demanda
mundial por este produto. Tratava-se de garantir não apenas os lucros do setor exportador,
mas também a base principal de arrecadação fiscal, já que as importações necessárias à
economia brasileira dependiam das divisas geradas naquele setor. Portanto, o regime fisco-
financeiro deveria responder a essa dupla finalidade e não voltar-se, por exemplo, para a
promoção do crédito às atividades não-agrícolas ou, mais especificamente, para satisfazer as
principais demandas do ainda incipiente setor industrial.195 Era necessário que as
transformações político-institucionais fossem capazes de superar a espontaneidade do
processo de substituição de importações, que até então vinha sendo promovido pela própria
dinâmica da economia cafeeira, convertendo-o em um regime de política econômica
associado a um modelo nacional de desenvolvimento.

Observando-se o Gráfico 35, pode-se constatar que entre 1901 e 1927, a produção de
café e as exportações totais do Brasil apresentam dinâmicas correlatas, embora com ciclos
nem sempre sincrônicos, em razão das defasagens da oferta em resposta às oscilações da
demanda internacional. Essa dessincronia entre oferta e a demanda externa está na base do
comportamento cíclico desse produto, mas com a Grande Crise dos anos 30, a superprodução
de café atinge magnitudes extremas, explicando a brusca desconexão entre as dinâmicas das
duas séries, relatada no mesmo gráfico. Em conseqüência, a grande crise dos anos 30 bloqueia
drasticamente a reprodução dos capitais no complexo agro-exportador brasileiro, mas também
abre um novo espaço de valorização, centrado no mercado interno, para uma indústria
nacional em expansão196. Portanto, a crise dos anos 30 pode ser interpretada como um
momento fundamental por suas conseqüências sócio-econômicas: ela interrompe um padrão
secular de inserção internacional que estava na base da reprodução sócio-política e econômica
da oligarquia agrária e do controle que exercia sobre o regime político e sobre o aparelho de
Estado brasileiro.

195
É por esta razão que várias análises para esse período ressaltam que a expansão industrial processou-se muito
mais nas brechas dos ciclos da economia cafeeira do que por incentivos do Estado. Diversos trabalhos podem
ser citados, como os de Celso FURTADO (1986), Caio PRADO JR (1977)., SUZIGAN (1986), VILELA LUZ
(1961), VERSIANI (1984) entre outros.
196
Esta constatação encontra-se na obra de Celso FURTADO, bem como de vários estudiosos, economistas e
historiadores do processo de industrialização brasileira.
238

GRÁFICO 35 EVOLUÇÃO DA PRODUÇÃO CAFEEIRA E DAS EXPORTAÇÕES TOTAIS (1901-


1950)

EXPORTAÇÕES TOTAIS
PRODUÇÃO CAFEEIRA
280
260
Índice de Quantum: 1901 = 100

240
220
200
180
160
140
120
100
80
60
1901 1905 1909 1913 1917 1921 1925 1929 1933 1937 1941 1945 1949

FONTE: Elaborado a partir das Séries Históricas IPEADATA.

A evolução da carga tributária descrita nos Gráficos 36 e 37 permite as seguintes


constatações: entre 1900 e 1946, a reduzida e quase-estagnada participação dos subsídios e
transferências no PIB sugere a vigência de um regime fisco-financeiro que ainda não está
estruturado para promover a acumulação de capital ou as instituições de seguridade social.
Um resultado coerente com o fato de que a essa época, não só os sistemas de previdência e
assistência social estavam ainda em sua fase embrionária, como o Estado brasileiro não
considerava como sua prerrogativa a promoção do desenvolvimento industrial.
239

GRÁFICO 36 EVOLUÇÃO DA CARGA TRIBUTÁRIA (1900-2003)

Carga Tributária Bruta / PIB


Carga Tributária Líquida / PIB
( Subsídios + Transferências ) / PIB
40%
35%
30%
25%
20%
15%
10%
5%
0%
-5%
1900
1903
1906
1909
1912
1915
1918
1921
1924
1927
1930
1933
1936
1939
1942
1945
1948
1951
1954
1957
1960
1963
1966
1969
1972
1975
1978
1981
1984
1987
1990
1993
1996
1999
2002
FONTE: IBGE Estatísticas do Século XX. Rio de Janeiro, 2003.

A queda da arrecadação tributária em 1962/63 é resultado das políticas de incentivo


fiscal derivadas do Plano de Metas (1955-1962). Observa-se também que o Estado manteve o
nível de transferências durante a crise de 1962, num comportamento anti-cíclico. O período
correspondente ao milagre econômico (1967-1973) caracteriza-se por uma expansão rápida
da carga tributária que não resulta apenas do forte dinamismo da economia. Após ter
estacionado no patamar de 25% durante os anos 80, na década de 90 a carga tributária bruta
volta a subir, atingindo os 36% do produto interno. Ressalte-se que no período pós-Plano
Real, a carga tributária líquida também voltou a aumentar.

As transferências sociais entram em uma trajetória de rápida expansão a partir de 1946


(Gráfico 37), o que mais uma vez está em coerência com a análise histórica desenvolvida na
seção anterior. O período pós-Segunda Guerra caracteriza-se por elevadas taxas de
crescimento econômico e pela capacitação progressiva do Estado brasileiro para desempenhar
seu novo papel de suporte da acumulação de base industrial. O Estado assume diretamente a
responsabilidade pelos investimentos em infra-estrutura e demais setores considerados
estratégicos.
240

GRÁFICO 37 PARTICIPAÇÃO DAS TRANSFERÊNCIAS E DOS SUBSÍDIOS DO GOVERNO


FEDERAL NO PIB (1900-1999)

Subsídios / PIB
Transferências / PIB
16%

14%

12%

10%

8%

6%

4%

2%

0%

-2%
1900 1914 1928 1942 1956 1970 1984 1998
1907 1921 1935 1949 1963 1977 1991

FONTE: IBGE Estatísticas do Século XX. Rio de Janeiro, 2003.

A fase de crescimento dos subsídios governamentais tem início a partir de 1955 com a
implantação do Plano de Metas. Ressalte-se que a partir de 1980, provavelmente como
conseqüência das novas prioridades do Governo em face da crise fiscal do Estado , a
participação dos subsídios no PIB declina substancialmente.

Uma outra característica do regime fisco-financeiro brasileiro é a sua regressividade,


resultante da predominância dos impostos indiretos que terminam sendo repassados aos
preços finais, onerando as classes de renda mais baixas. No Gráfico 38 podem ser observadas
as participações dos impostos diretos e indiretos no PIB brasileiro. A partir da primeira
metade dos anos 60, fase das reformas institucionais do PAEG, há um nítido processo de
convergência dessas participações. Todavia, em finais dos anos 90, as séries começam a
divergir, quando há um aumento da participação percentual dos impostos indiretos,
sinalizando para um possível retorno da tendência histórica que privilegia essa modalidade de
tributação.
241

GRÁFICO 38 PARTICIPAÇÃO DA TRIBUTAÇÃO DIRETA E INDIRETA NO PIB (1900-2003)

IMPOSTOS DIRETOS / PIB


IMPOSTOS INDIRETOS / PIB
20%
18%
16%
14%
12%
10%
8%
6%
4%
2%
0%
1900
1903
1906
1909
1912
1915
1918
1921
1924
1927
1930
1933
1936
1939
1942
1945
1948
1951
1954
1957
1960
1963
1966
1969
1972
1975
1978
1981
1984
1987
1990
1993
1996
1999
2002
FONTE: IBGE Estatísticas do Século XX. Rio de Janeiro, 2003.

4.2.4 Seguridade social e estruturas de bem-estar


O exame da Tabela 14, com dados para o período [1890-1945] permite a constatação
de que, no total da formação bruta de capital fixo, o Estado brasileiro priorizou os gastos em
infra-estrutura e em máquinas, equipamentos e instalações da administração pública. As
rubricas ligadas à educação, saúde e saneamento são extremamente reduzidas como
percentagem dos gastos totais em formação bruta de capital. Considerando-se o período
histórico em questão, isto poderia revelar um aparelho de Estado ainda em processo de
construção, voltado basicamente para as necessidades do capital e muito menos preocupado
com os gastos sociais. Todavia, deve ser ressaltado que este tipo de Estado aparentemente
circunscrito197 refere-se ao padrão característico vigente desde o século 19 até a primeira
metade do século 20. Mas a observação da Tabela 15 mostra que esse padrão de gasto
público, preponderantemente direcionado para o capital, portanto, com reduzida alocação em
bem-estar social, permanece praticamente inalterado ao longo de todo o século XX. Conforme
observam AFONSO e SOUZA (1977, p. 72):

os gastos da União indicariam um Estado altamente centralizado, econômica e


financeiramente controlado pelo Ministério da Fazenda, especialmente dedicado a
financiar a expansão da infra-estrutura básica requerida para o desenvolvimento do
capital multinacional dentro do subsistema nacional. Esses gastos facilitaram o
processo de monopolização pelo capital multinacional dos setores estratégicos da
197
Conforme definição desenvolvida no capítulo 1.
242

economia, estimularam o livre fluxo de capital e bens dentro da esfera das empresas
multinacionais, e foram seriamente indiferentes às necessidades de bem-estar social.
TABELA 14 COMPOSIÇÃO DOS GASTOS DO GOVERNO FEDERAL EM FORMAÇÃO BRUTA
DE CAPITAL FIXO (1890 1945)
ESCOLAS,
ANO SANEAMENTO FERROVIA, UNIVERSIDADES E MÁQUINAS, TOTAL
RODOVIA, PORTOS E HOSPITAIS E INSTITUTOS DE SEGURANÇA (BASES EQUIPAMENTOS E
AEROPORTOS POSTOS DE SAÚDE PESQUISA E QUARTÉIS) INSTALAÇÕES
1890 4,1% 69,5% 0,5% 0,1% 3,2% 22,5% 100%
1891 3,7% 59,6% 0,4% 1,1% 2,0% 33,2% 100%
1892 12,6% 54,0% ... 0,1% 4,0% 29,2% 100%
1893 3,8% 38,6% 0,3% 0,4% 3,1% 53,8% 100%
1894 4,8% 41,7% 4,3% 0,1% 3,4% 45,6% 100%
1895 6,3% 46,2% 3,3% 1,0% 6,6% 36,6% 100%
1896 3,4% 59,4% 2,1% 0,9% 2,1% 32,1% 100%
1897 4,5% 33,2% 1,0% 0,7% 4,6% 56,0% 100%
1898 1,8% 6,7% 0,1% 0,4% 4,4% 86,5% 100%
1899 1,5% 50,3% 0,0% ... 6,9% 41,3% 100%
1900 4,8% 28,1% 0,0% ... 17,1% 50,0% 100%
1901 10,9% 22,6% 3,5% ... 13,9% 49,1% 100%
1902 8,1% 26,7% ... 0,3% 17,4% 47,4% 100%
1903 4,3% 58,5% 0,1% 0,2% 8,0% 28,9% 100%
1904 1,8% 78,2% 0,5% 0,4% 4,9% 14,2% 100%
1905 3,8% 58,3% 0,3% 1,3% 5,8% 30,5% 100%
1906 4,0% 37,8% 0,5% 2,6% 3,9% 51,0% 100%
1907 13,9% 45,7% 0,1% 4,0% 4,2% 32,1% 100%
1908 31,5% 34,6% 0,2% 3,7% 8,5% 21,5% 100%
1909 5,8% 65,2% 0,1% 4,1% 9,3% 15,5% 100%
1910 1,8% 79,5% 0,1% 1,1% 6,8% 10,6% 100%
1911 2,6% 72,9% ... 0,5% 4,3% 19,7% 100%
1912 5,9% 68,4% 0,3% 0,1% 3,5% 21,8% 100%
1913 5,2% 73,1% ... 0,4% 0,4% 20,8% 100%
1914 3,1% 86,0% 0,2% 0,1% 0,6% 10,1% 100%
1915 ... ... ... ... ... ... ...
1916 ... ... ... ... ... ... ...
1917 1,9% 3,0% ... ... 0,4% 94,7% 100%
1918 0,9% 23,1% ... ... 0,0% 76,0% 100%
1919 0,0% 14,4% ... ... 0,5% 85,1% 100%
1920 0,0% 9,8% ... ... 0,3% 89,9% 100%
1921 0,0% 14,5% ... 0,1% 0,3% 85,1% 100%
1922 ... ... ... ... ... ... ...
1923 1,4% 45,7% 0,5% ... 4,8% 47,6% 100%
1924 25,2% 53,2% ... ... 1,7% 19,9% 100%
1925 3,0% 84,4% 0,6% ... 2,2% 9,8% 100%
1926 2,7% 88,9% ... ... 2,1% 6,3% 100%
1927 7,5% 18,1% ... ... 4,2% 70,2% 100%
1928 8,0% 53,1% ... ... 3,7% 35,2% 100%
1929 8,9% 56,7% ... ... 3,4% 31,0% 100%
1930 7,9% 79,5% ... ... 2,7% 9,9% 100%
1931 21,1% 63,3% ... ... 3,5% 12,2% 100%
1932 13,3% 67,0% ... ... ... 19,7% 100%
1933 41,8% 35,2% ... 7,5% 2,0% 13,5% 100%
1934 5,8% 25,1% ... 0,6% ... 68,5% 100%
1935 4,0% 24,8% ... 6,6% ... 64,5% 100%
1936 18,7% 16,3% ... 0,9% ... 64,1% 100%
1937 ... 52,4% 14,4% 6,5% ... 26,7% 100%
1938 2,4% 14,1% 3,2% 1,3% 52,7% 26,2% 100%
1939 2,1% 10,9% 0,8% 0,3% ... 86,0% 100%
1940 0,2% 7,8% 0,2% 3,0% ... 88,9% 100%
1941 0,3% 8,3% 1,2% 1,0% 0,8% 88,5% 100%
1942 7,8% 27,9% 2,0% 0,5% ... 61,8% 100%
1943 6,2% 28,0% 0,9% 1,0% ... 63,9% 100%
1944 0,0% 7,4% 0,5% 0,2% ... 91,8% 100%
1945 5,9% 32,3% 0,3% 0,2% 0,2% 61,1% 100%

FONTE: Elaborado a partir das Séries Históricas IPEADATA.


NOTA: Participação percentual de cada rubrica no total da formação bruta de capital fixo do governo.
243

TABELA 15 GASTOS DO GOVERNO FEDERAL POR MINISTÉRIOS (1901 2000)


continua
Agricultura, Previdência e
Forças Infra- Relações Ação
ANO indústria e Educação Fazenda Justiça Assistência Saúde Trabalho INSS TOTAL
armadas estrutura Exteriores Social
comércio Social
1901 21% ... 24,5% ... 46,7% 7,0% ... 0,9% ... ... ... ... 100%
1902 24% ... 24,3% ... 42,6% 8,6% ... 0,9% ... ... ... ... 100%
1903 22% ... 21,2% ... 48,1% 7,5% ... 0,9% ... ... ... ... 100%
1904 18% ... 17,6% ... 55,8% 7,7% ... 0,8% ... ... ... ... 100%
1905 21% ... 21,3% ... 46,9% 9,3% ... 1,1% ... ... ... ... 100%
1906 24% ... 21,8% ... 42,4% 9,7% ... 1,8% ... ... ... ... 100%
1907 22% ... 23,5% ... 43,8% 9,4% ... 1,0% ... ... ... ... 100%
1908 25% ... 26,8% ... 36,4% 10,4% ... 1,1% ... ... ... ... 100%
1909 26% 2% 25,2% ... 36,2% 10,1% ... 1,1% ... ... ... ... 100%
1910 21% 3% 27,6% ... 39,5% 7,8% ... 0,9% ... ... ... ... 100%
1911 23% 4% 28,9% ... 36,0% 7,4% ... 0,9% ... ... ... ... 100%
1912 21% 5% 35,1% ... 30,5% 7,1% ... 0,9% ... ... ... ... 100%
1913 18% 5% 30,5% ... 37,0% 7,1% ... 2,3% ... ... ... ... 100%
1914 19% 2% 30,0% ... 41,1% 6,9% ... 1,0% ... ... ... ... 100%
1915 18% 2% 30,2% ... 42,1% 6,9% ... 1,0% ... ... ... ... 100%
1916 16% 1% 35,3% ... 39,7% 6,6% ... 1,0% ... ... ... ... 100%
1917 14% 2% 30,6% ... 46,9% 6,3% ... 0,8% ... ... ... ... 100%
1918 17% 2% 32,2% ... 40,0% 7,2% ... 1,0% ... ... ... ... 100%
1919 18% 2% 42,3% ... 30,0% 6,9% ... 0,9% ... ... ... ... 100%
1920 19% 4% 46,4% ... 22,5% 7,1% ... 0,9% ... ... ... ... 100%
1921 24% 3% 33,2% ... 32,2% 5,2% ... 2,1% ... ... ... ... 100%
1922 30% 3% 25,3% ... 29,1% 10,5% ... 2,1% ... ... ... ... 100%
1923 21% 3% 26,2% ... 38,6% 9,5% ... 1,8% ... ... ... ... 100%
1924 22% 3% 28,0% ... 37,0% 8,3% ... 1,7% ... ... ... ... 100%
1925 24% 3% 30,6% ... 33,2% 7,7% ... 1,6% ... ... ... ... 100%
1926 23% 3% 33,6% ... 31,6% 7,9% ... 1,5% ... ... ... ... 100%
1927 22% 3% 28,1% ... 37,4% 7,8% ... 1,7% ... ... ... ... 100%
1928 20% 3% 25,1% ... 41,9% 8,1% ... 1,6% ... ... ... ... 100%
1929 20% 3% 23,8% ... 42,3% 9,2% ... 1,6% ... ... ... ... 100%
1930 21% 3% 25,3% 0,5% 39,1% 8,8% ... 1,7% ... 0,0% ... ... 100%
1931 20% 2% 20,4% 5,4% 46,0% 3,8% ... 1,7% ... 0,6% ... ... 100%
1932 31% 1% 20,8% 4,1% 37,6% 3,1% ... 1,2% ... 0,5% ... ... 100%
1933 25% 2% 22,5% 4,1% 40,3% 4,1% ... 1,5% ... 0,7% ... ... 100%
1934 26% 2% 20,5% 4,6% 40,1% 4,1% ... 1,7% ... 0,8% ... ... 100%
1935 25% 2% 20,0% 5,0% 40,4% 4,6% ... 2,1% ... 0,6% ... ... 100%
1936 24% 2% 22,7% 5,0% 39,2% 4,2% ... 1,6% ... 0,6% ... ... 100%
1937 31% 2% 22,3% 5,8% 31,8% 4,4% ... 1,3% ... 1,5% ... ... 100%
1938 30% 2% 26,3% 5,6% 29,0% 3,6% ... 1,2% ... 1,6% ... ... 100%
1939 25% 3% 25,0% 7,1% 30,4% 4,3% ... 1,6% ... 3,7% ... ... 100%
1940 27% 3% 28,5% 6,8% 27,1% 3,7% ... 1,7% ... 1,9% ... ... 100%
1941 27% 3% 23,4% 6,8% 30,6% 4,0% ... 1,7% ... 3,7% ... ... 100%
1942 37% 3% 18,4% 6,0% 27,0% 3,9% ... 1,6% ... 3,2% ... ... 100%
1943 30% 3% 18,9% 6,2% 33,0% 4,3% ... 1,4% ... 2,3% ... ... 100%
1944 31% 4% 18,1% 8,2% 29,2% 4,4% ... 1,1% ... 3,9% ... ... 100%
1945 28% 3% 18,6% 5,7% 32,5% 5,0% ... 1,1% ... 5,4% ... ... 100%
1946 36% 3% 15,2% 5,8% 29,7% 5,7% ... 1,1% ... 2,7% ... ... 100%
1947 35% 4% 16,7% 8,2% 28,1% 4,8% ... 0,9% ... 1,7% ... ... 100%
1948 31% 4% 19,9% 9,7% 26,3% 4,6% ... 1,2% ... 2,7% ... ... 100%
1949 32% 5% 17,6% 11,0% 25,0% 4,9% ... 1,0% ... 3,9% ... ... 100%

FONTE: IBGE Estatísticas do Século XX. Rio de Janeiro, 2003.


NOTA: Os dados para Forças Armadas agregam as informações para os ministérios da aeronáutica, exército e
marinha; a rubrica infra-estrutura engloba os ministérios das comunicações, transportes, interior, minas e
energia e infra-estrutura propriamente dita; os dados para os ministérios da agricultura e da indústria e comércio
foram também agregados.
244

TABELA 15 GASTOS DO GOVERNO FEDERAL POR MINISTÉRIOS (1901 2000)


conclusão
Agricultura, Previdência e
Forças Infra- Relações Ação
ANO indústria e Educação Fazenda Justiça Assistência Saúde Trabalho INSS TOTAL
armadas estrutura Exteriores Social
comércio Social
1950 31% 5% 18,5% 12,4% 22,7% 5,0% ... 0,9% ... 3,8% ... ... 100%
1951 36% 5% 19,3% 10,7% 20,7% 4,9% ... 0,9% ... 3,2% ... ... 100%
1952 34% 5% 22,3% 10,4% 20,1% 4,3% ... 0,8% ... 3,3% ... ... 100%
1953 31% 5% 20,4% 11,2% 23,6% 4,8% ... 0,7% 0,0% 3,0% ... ... 100%
1954 29% 5% 23,4% 6,8% 22,7% 4,6% ... 0,9% 5,0% 2,7% ... ... 100%
1955 30% 5% 23,4% 6,0% 23,8% 4,5% ... 0,7% 4,3% 2,5% ... ... 100%
1956 25% 3% 13,9% 4,0% 45,0% 3,0% ... 0,4% 2,9% 2,2% ... ... 100%
1957 31% 5% 25,8% 5,6% 21,6% 4,4% ... 0,6% 3,7% 2,5% ... ... 100%
1958 29% 4% 29,6% 6,6% 20,7% 3,8% ... 0,5% 3,7% 1,9% ... ... 100%
1959 25% 4% 23,5% 7,5% 29,7% 3,5% ... 0,8% 3,9% 1,7% ... ... 100%
1960 22% 4% 23,0% 7,2% 33,9% 3,3% ... 0,9% 4,2% 1,3% ... ... 100%
1961 18% 3% 22,9% 7,0% 41,3% 1,6% ... 0,8% 3,0% 2,7% ... ... 100%
1962 17% 3% 23,4% 7,2% 39,3% 1,3% ... 0,7% 3,3% 5,3% ... ... 100%
1963 16% 3% 26,5% 5,9% 39,8% 1,0% ... 0,5% 3,5% 3,2% ... ... 100%
1964 15% 4% 30,4% 6,3% 37,3% 1,0% ... 0,3% 2,7% 3,2% ... ... 100%
1965 22% 3% 25,2% 9,6% 32,1% 2,5% ... 0,3% 2,8% 2,1% ... ... 100%
1966 21% 3% 22,4% 8,2% 37,8% 1,6% ... 1,8% 3,6% 1,1% ... ... 100%
1967 26% 3% 26,1% 7,5% 29,8% 1,2% ... 1,4% 3,2% 1,5% ... ... 100%
1968 23% 3% 29,2% 7,4% 31,6% 0,8% ... 1,2% 2,6% 1,3% ... ... 100%
1969 20% 2% 25,4% 5,9% 43,4% 0,6% ... 0,9% 1,7% 0,6% ... ... 100%
1970 36% 3% 41,8% 9,4% 4,0% 0,9% ... 1,4% 2,2% 1,3% ... ... 100%
1971 41% 3% 36,2% 9,6% 4,0% 1,0% ... 1,8% 2,3% 1,6% ... ... 100%
1972 40% 3% 36,8% 11,1% 3,4% 0,9% ... 1,3% 2,2% 1,6% ... ... 100%
1973 44% 2% 35,0% 10,2% 2,7% 1,1% ... 1,3% 2,1% 1,6% ... ... 100%
1974 33% 4% 41,3% 12,0% 3,1% 1,2% ... 1,4% 2,3% 1,7% ... ... 100%
1975 39% 3% 29,3% 15,3% 4,5% 1,4% 1,6% 1,6% 3,4% 1,2% ... ... 100%
1976 34% 5% 22,9% 16,5% 5,5% 1,5% 7,5% 1,5% 4,3% 1,7% ... ... 100%
1977 31% 6% 23,6% 16,4% 4,8% 1,3% 9,0% 1,5% 4,7% 1,7% ... ... 100%
1978 31% 6% 21,0% 17,9% 5,5% 1,3% 9,0% 1,6% 4,9% 1,9% ... ... 100%
1979 29% 6% 23,3% 19,4% 5,2% 1,2% 7,9% 1,5% 4,7% 1,6% ... ... 100%
1980 28% 8% 27,6% 17,8% 4,6% 1,2% 6,1% 1,3% 4,0% 1,3% ... ... 100%
1981 22% 9% 31,1% 17,6% 4,2% 1,0% 10,0% 1,5% 3,2% 1,0% ... ... 100%
1982 24% 12% 32,6% 17,6% 3,6% 1,0% 3,5% 1,5% 3,2% 0,9% ... ... 100%
1983 26% 10% 32,6% 15,7% 3,1% 0,9% 5,6% 2,1% 3,0% 1,0% ... ... 100%
1984 25% 8% 36,7% 14,0% 2,8% 0,7% 6,5% 1,9% 2,9% 0,8% ... ... 100%
1985 25% 7% 30,5% 18,2% 3,7% 1,4% 5,9% 2,2% 4,6% 1,1% ... ... 100%
1986 25% 7% 30,2% 18,6% 3,8% 1,2% 4,6% 2,0% 6,6% 1,4% ... ... 100%
1987 14% 11% 21,8% 10,9% 35,8% 0,8% 1,6% 0,4% 3,0% 0,8% ... ... 100%
1988 11% 6% 13,6% 10,1% 55,1% 0,1% 1,2% 0,2% 2,1% 0,6% ... ... 100%
1989 6% 1% 5,8% 3,5% 77,4% 0,2% 3,6% 0,1% 1,3% 0,4% ... ... 100%
1990 4% 1% 1,2% 2,4% 88,2% 2,0% ... 0,2% 0,7% 0,0% 0,8% ... 100%
1991 7% 2% 2,8% 4,2% 56,3% 0,5% ... 0,6% 1,9% 23,4% 1,4% ... 100%
1992 5% 1% 1,9% 3,0% 67,9% 0,4% 13,7% 0,2% 3,1% 3,8% 0,7% ... 100%
1993 4% 2% 0,4% 2,4% 51,2% 0,2% 1,3% 0,2% 5,0% 9,0% 0,6% 23,4% 100%
1994 4% 3% 0,9% 2,8% 52,3% 0,4% 1,3% 0,2% 7,7% 3,9% 0,4% 23,6% 100%
1995 4% 3% 0,7% 3,5% 47,0% 0,5% 1,3% 0,1% 9,2% 4,2% 0,2% 25,4% 100%
1996 5% 3% 0,8% 3,9% 61,7% 0,7% 0,2% 0,2% 5,2% 2,6% ... 16,9% 100%
1997 4% 3% 0,7% 3,0% 68,2% 0,6% 0,1% 0,1% 4,9% 2,0% ... 13,6% 100%
1998 3% 2% 0,6% 2,5% 72,9% 0,5% 0,1% 0,1% 3,6% 1,7% ... 12,4% 100%
1999 3% 2% 0,5% 2,4% 75,2% 0,4% 0,1% 0,1% 3,5% 1,5% ... 11,5% 100%
2000 3% 2% 1,3% 2,7% 72,3% 0,5% 0,1% 0,1% 3,7% 1,6% ... 12,4% 100%

FONTE: IBGE Estatísticas do Século XX. Rio de Janeiro, 2003.


NOTA: Os dados para Forças Armadas agregam as informações para os ministérios da aeronáutica, exército e
marinha; a rubrica infra-estrutura engloba os ministérios das comunicações, transportes, interior, minas e
energia e infra-estrutura propriamente dita; os dados para os ministérios da agricultura e da indústria e comércio
foram também agregados.
Destaca-se ainda do exame da Tabela 15, que, com exceção do subperíodo [1970-
1986], há uma grande concentração dos gastos federais no Ministério da Fazenda. Esta
constatação pode ser um indicador tanto do crescimento do aparelho burocrático estatal,
quanto da centralização das funções econômicas e financeiras do Estado, sob a coordenação
direta deste ministério. Todavia, as cifras observadas no subperíodo [1987-2000] atingem
patamares sem precedentes desde o início da série em 1901, indicando um aprofundamento da
245

centralização das funções financeiras. Uma característica condizente com uma época onde o
endividamento público interno atinge níveis muito elevados e o Estado brasileiro prioriza uma
gestão do orçamento público sob os auspícios do FMI e sob as pressões dos mercados
financeiros nacional e internacional.

Quanto às estruturas de seguridade social, a análise do caso brasileiro revela que


apesar de sua implantação precoce nos anos 30 e 40198, o sistema se caracteriza, entre outros
aspectos, pela baixa cobertura previdenciária. Segundo J. Matias PEREIRA (2003), a soma
dos benefícios previdenciários do sistema oficial (INSS) e dos benefícios recebidos pelos
inativos do governo federal ultrapassava a soma de US$ 50 bilhões em 1999. Mas se esse
montante era elevado em termos absolutos, ele expressa a baixa cobertura do sistema de
previdência social, pois esse valor não chagava a atingir 8% do PIB brasileiro. A baixa
cobertura pode ser constatada em termos do número de pessoas beneficiárias e contribuintes
do sistema como percentagem da população economicamente ativa do país (Gráficos 39 e 40).

GRÁFICO 39 BENEFICIÁRIOS E CONTRIBUINTES DA PREVIDÊNCIA SOCIAL COMO


PROPORÇÃO DA POPULAÇÃO TOTAL DO PAÍS (1923-2003)

Beneficiários da Previdência Social / População Total do País


Contribuintes da Previdência Social / População Total do País

28%
26%
24%
22%
20%
18%
16%
14%
12%
10%
8%
6%
4%
2%
0%
1923
1925
1927
1929
1931
1933
1935
1937
1939
1941
1943
1945
1947
1949
1951
1953
1955
1957
1959
1961
1963
1965
1967
1969
1971
1973
1975
1977
1979
1981
1983
1985
1987
1989
1991
1993
1995
1997
1999
2001
2003

FONTE: Dados obtidos a partir do IPEADATA e originários do Ministério da Assistência e Previdência Social.

198
Uma das constatações de CORIAT e SABOIA (1998), em sua análise do regime de acumulação e da WLN no
Brasil.
246

GRÁFICO 40 - BENEFICIÁRIOS E CONTRIBUINTES DA PREVIDÊNCIA SOCIAL COMO


PROPORÇÃO DA POPULAÇÃO ECONOMICAMENTE ATIVA (1940-2003)

Beneficiários da Previdência Social / PEA


Contribuintes da Previdência Social / PEA
90%
80%
70%
60%
50%
40%
30%
20%
10%
0%
-10%
1940 1946 1952 1958 1964 1970 1976 1982 1988 1994 2000
1943 1949 1955 1961 1967 1973 1979 1985 1991 1997 2003

FONTE: Dados obtidos no IPEADATA e originários do Ministério da Assistência e Previdência Social.

A análise dos Gráficos 41 e 42 revela que entre 1982 e 1994, os recebimentos da


previdência social superam o total das despesas. Mas a partir de 1995, o excedente
operacional desaparece e as pressões pela reforma do sistema de seguridade social se
intensificam. Todavia, para alguns especialistas, o chamado déficit da previdência seria
decorrente da Desvinculação da Receita da União (DRU) dos recebimentos dos Ministérios.
Com esse dispositivo institucional, 20% dos recursos desvinculados são destinados a compor
o superávit primário do governo. Embora sejam arrecadados pelo Sistema de Seguridade
Social, esses recursos tornam-se indisponíveis para a previdência, que passa então a
apresentar déficits recorrentes. Daí a diferença nos padrões observados nos dois gráficos. No
Gráfico 41, os recebimentos da previdência incluem rubricas que não podem, por
determinação normativa, compor sua receita efetiva, o que explica o déficit observado no
Gráfico 42.

Diante da chamada crise da previdência , o Governo passa a adotar uma postura mais
ativa com relação à promoção da reestruturação do sistema, com vistas a superar sua
tendência ao desequilíbrio do fluxo de caixa.
247

GRÁFICO 41 FLUXO DE CAIXA DA PREVIDÊNCIA SOCIAL (1982 2004)

Recebimentos da Previdência Social


Despesas da Previdência Social
0140

0130
Índice dos Valores: 1982 = 100

0120

0110

0100

090

080

070
1982 1984 1986 1988 1990 1992 1994 1996 1998 2000 2002 2004

FONTE: Dados mensais obtidos a partir do IPEADATA e originários do Ministério da Assistência e Previdência
Social.
NOTA: Valores referem-se às médias anuais dos recebimentos e das despesas deflacionados pelo IGP-DI.

GRÁFICO 42 - FLUXO DE CAIXA DA PREVIDÊNCIA SOCIAL: RESULTADO ENTRE RECEITA E


BENEFÍCIOS (1982 2004)

RECEITA - DESPESA COM BENEFÍCIOS


4,0

3,0
Em R$ bilhões de julho de 2004

2,0

1,0

0,0

-1,0

-2,0

-3,0
1982 1984 1986 1988 1990 1992 1994 1996 1998 2000 2002 2004

FONTE: Dados mensais obtidos a partir do IPEADATA e originários do Ministério da Assistência e Previdência
Social.
NOTA: Valores referem-se às médias anuais dos recebimentos e das despesas deflacionados pelo IGP-DI.
248

4.2.5 Evolução do grau de centralização fiscal


A evolução do grau de centralização fiscal está representada no Gráfico 43. Pode-se
constatar que o Estado que emergiu das grandes transformações sócio-econômicas e políticas
dos anos 30, o Estado Novo , vigente entre 1937 e 1945, elevou as participações da receita
total ao mesmo tempo em que manteve a participação das despesas abaixo de 55%, neste
mesmo período. Isto significa que houve elevação do grau de centralização fiscal durante o
Estado Novo , mas esse aumento não superou os níveis observados nos anos anteriores a
1930. É nítida a redução deste indicador no imediato pós-Segunda Guerra, com o aumento da
participação das despesas do Governo Federal, concomitantemente com a queda da
participação das receitas.

GRÁFICO 43 GRAU DE CENTRALIZAÇÃO FISCAL (1900 2000)

Receita Total do Governo Federal / Total do Governo


Despesa Total do Governo Federal / Total do Governo
80%

75%

70%

65%

60%

55%

50%

45%

40%

35%
1900 1908 1916 1924 1932 1940 1948 1956 1964 1972 1980 1988 1996
1904 1912 1920 1928 1936 1944 1952 1960 1968 1976 1984 1992 2000

FONTE: Séries originais obtidas em Estatísticas do Século XX IBGE, Rio de Janeiro, 2003.
NOTA: Séries tendenciais estimadas pelo método lowess smoothing de regressão local.

4.2.6 Investimento, consumo e poupança do governo


Entre 1950 e 1964, as participações da União na receita e na despesa total do Governo
permanecem aproximadamente constantes em termos tendenciais. É exatamente ao longo do
regime político autoritário, instaurado com o golpe militar de 1964, que o grau de
centralização fiscal se eleva ao patamar mais alto desde 1900. Apenas em inícios dos anos 80
é que se observa uma reversão da tendência, quando o grau de centralização fiscal volta a cair.
Do ponto de vista institucional deve-se considerar que a promulgação da nova Constituição
249

Federal em 1988, reforçou a tendência atual no sentido da descentralização dos recursos


públicos.

O consumo do governo cresceu ao longo de todo o século XX, como normalmente


deve ocorrer à medida que a economia se desenvolve (Gráfico 44). As inflexões e quebras na
série são observadas entre os anos 1914 e 1945, refletindo os efeitos da Primeira e da Segunda
Guerra Mundial, intercaladas pela Grande Depressão e pela Revolução de 1930. Destaca-se o
fato de que o investimento do governo entrou em uma trajetória de forte expansão a partir de
1938 ano imediatamente posterior à implantação do Estado Novo . Esta fase engloba os
períodos do segundo governo Vargas, do Plano de Metas, milagre econômico e do II PND,
com o investimento do governo crescendo a uma média de 29 % a.a. Mas a partir de 1976, há
uma nítida inflexão na tendência e a formação bruta de capital fixo do governo estaciona em
uma taxa média de apenas 2,5 % anuais, inaugurando um período de esgotamento da ação
direta do Estado na produção de bens e serviços.

GRÁFICO 44 CONSUMO E INVESTIMENTO DO GOVERNO (1900 2003)

Cg
FBKFg
500.000
Bilhões de R$ de 2000 - Escala log

50.000

5.000

500

50
1900
1903
1906
1909
1912
1915
1918
1921
1924
1927
1930
1933
1936
1939
1942
1945
1948
1951
1954
1957
1960
1963
1966
1969
1972
1975
1978
1981
1984
1987
1990
1993
1996
1999
2002

FONTE: Séries originais obtidas em Estatísticas do Século XX IBGE, Rio de Janeiro, 2003 e IPEADATA.
NOTA: Cg = consumo do governo e FBKFg = formação bruta de capital fixo do governo.

No período [1931-1964], a participação da formação bruta de capital fixo no total da


formação de capital é crescente, sinalizando a vigência de um Estado-investidor que busca
promover o desenvolvimento econômico interno, mas ainda sem recorrer de forma
preponderante aos empréstimos externos (Gráfico 45). Quando a captação de recursos
250

externos para financiamento do setor privado se intensifica, no período pós-1964, o


investimento do governo é deslocado e perde participação para o investimento privado.

GRÁFICO 45 PARTICIPAÇÃO DO INVESTIMENTO GOVERNAMENTAL NO INVESTIMENTO


TOTAL (1901 2003)

FBKF Governo / FBKF Total


Y = Lowess
50%
45%
40%
35%
30%
25%
20%
15%
10%
5%
0%
-5%
1901
1904
1907
1910
1913
1916
1919
1922
1925
1928
1931
1934
1937
1940
1943
1946
1949
1952
1955
1958
1961
1964
1967
1970
1973
1976
1979
1982
1985
1988
1991
1994
1997
2000
2003
FONTE: Séries em R$ correntes obtidas no IPEADATA e originárias do Sistema de Contas Nacionais do IBGE.
NOTA: Série tendencial estimada pelo método de regressão local lowess smoothing.

As taxas de crescimento da despesa primária do governo revelam-se nitidamente mais


voláteis entre 1901 e 1934, refletindo a instabilidade de uma economia predominantemente
primário-exportadora (Gráfico 46). Em alguns anos deste período, podem ser observados
comportamentos anticíclicos das despesas públicas, como em 1907, provavelmente em
decorrência das políticas de valorização do café.199 O Gráfico 47 mostra os mesmos dados
sobre as despesas públicas e o PIB, mas em séries tendenciais obtidas com o filtro 4253H,
permitindo uma visualização mais precisa das dinâmicas dessas variáveis. As despesas
apresentam comportamento anticíclico na maior parte dos anos do período [1901-1989], mas
nos anos 90 as taxas médias de expansão conectam-se às taxas de crescimento econômico.

199
No âmbito das políticas de valorização do principal produto de exportação brasileiro, foi assinado o Convênio
de Taubaté (São Paulo), em 1906, onde o Estado se comprometia a comprar os excedentes de produção do café,
para conter a tendência de queda dos preços internacionais. Para alguns analistas como Celso Furtado (1975),
essas políticas, que perdurariam até os anos 30, anteciparam as intervenções de tipo keynesiano.
251

GRÁFICO 46 DINÂMICA DO PIB E DAS DESPESAS TOTAIS DO GOVERNO (1901-2003)

TXDESPG
TXPIB
60%
50%
40%
30%
20%
10%
0%
-10%
-20%
-30%
-40%
1901
1904
1907
1910
1913
1916
1919
1922
1925
1928
1931
1934
1937
1940
1943
1946
1949
1952
1955
1958
1961
1964
1967
1970
1973
1976
1979
1982
1985
1988
1991
1994
1997
2000
2003
FONTE: Séries originais obtidas em Estatísticas do Século XX IBGE, Rio de Janeiro, 2003 e IPEADATA.
NOTA: TXDESPG = taxa de crescimento das despesas do governo federal; TXPIB = taxa de crescimento do
PIB.

GRÁFICO 47 DINÂMICA DO PIB E DAS DESPESAS TOTAIS DO GOVERNO SÉRIES


FILTRADAS (1901-2003)
TXDESPG - filtrada
TXPIB - filtrada
25%

20%

15%

10%

5%

0%

-5%

-10%

-15%
1901 1915 1929 1943 1957 1971 1985 1999
1908 1922 1936 1950 1964 1978 1992

FONTE: Séries originais obtidas em Estatísticas do Século XX IBGE, Rio de Janeiro, 2003 e IPEADATA.
NOTA: As séries foram filtradas pelo filtro 4253H.
252

GRÁFICO 48 COMPOSIÇÃO DO CONSUMO DO GOVERNO (1900 2000)

Gastos com Funcionalismo / PIB


Encargos Patronais / PIB
Gastos com Bens e Serviços / PIB
12%

10%

8%

6%

4%

2%

0%

-2%
1900 1910 1920 1930 1940 1950 1960 1970 1980 1990 2000
1905 1915 1925 1935 1945 1955 1965 1975 1985 1995

FONTE: Séries originais obtidas em Estatísticas do Século XX IBGE, Rio de Janeiro.


NOTA: Séries interrompidas entre 1915 e 1937.
O Gráfico 48 revela que os gastos com funcionalismo superaram os gastos em bens e
serviços como percentagem do PIB brasileiro, a partir do implantação do regime autoritário
pós-1964, que expandiu o aparelho de Estado. Segundo AFONSO e SOUZA (1977), os gastos
com governo e administração cresceram de 30% do total das despesas federais em 1970, para
50% em 1973. Segundo os autores, entre 1970-73:

O Estado completa seu processo de modernização administrativa em


função do capital multinacional e estabelece controles mais estritos
sobre as forças econômicas e sociais que poderiam desafiar as
premissas do modelo econômico, proclamando a existência do milagre
econômico brasileiro , que deveria, nas palavras do governo, colocar
o Brasil, no período de uma geração, na categoria das nações
desenvolvidas.
A evolução da poupança do setor público em percentagem do PIB pode ser examinada
a partir da Tabela 16, que apresenta as mesmas estatísticas para as poupanças privada e
externa. Nas décadas de 80 e 90, quase todos os anos apresentam poupança negativa

Deve ser observado que o fato do governo incorrer em déficit não significa
necessariamente que a poupança do governo seja negativa. O déficit público - ou as
necessidades de financiamento do setor público (NFSP) - pode indicar que a poupança
pública, apesar de positiva, é inferior ao fluxo de investimento do governo.
253

A estatística denominada necessidades de financiamento do setor público (NFSP)


corresponde à receita tributária líquida de subsídios e transferências (RLG) deduzida dos
gastos em consumo (Cg), pagamentos de juros da dívida interna (Jg) e da formação bruta de
capital fixo do governo (Ig):

NFSP = Cg + Jg + Ig RLG (1)

Sg = RLG - Cg - Jg (2)

Substituindo (2) em (1):


NFSP = Ig - Sg ou Ig = Sg + NFSP (3)
Onde (3) expressa o déficit no conceito operacional, em que não se considera a
atualização monetária da dívida pública. Os conceitos de NFSP foram apresentados na seção
3.2.5 e seus respectivos valores para a economia brasileira encontram-se nas Tabelas 10 a
13.200

Um fator que deve ser destacado por seus efeitos sobre a reconfiguração do regime
fisco-financeiro brasileiro no período pós-1964, refere-se ao dispositivo institucional da
correção monetária que integrou as reformas monetária e fiscal do PAEG (1964-1966). Se
por um lado, essa instituição viabilizou um novo processo de formação da dívida pública no
Brasil e favoreceu o saneamento das finanças públicas; por outro, ela abriu o caminho para o
crescimento do endividamento público e para a generalização do processo de indexação. Este
último, como será visto na seção 3.5, se constituirá no suporte do regime monetário-
financeiro inflacionista dos anos 80. A superação da alta inflação a partir do Plano Real
pressupôs mudanças significativas na lógica de funcionamento do regime fisco-financeiro,
afetando o padrão de endividamento e de evolução das finanças públicas no final do século
XX.

No que concerne aos impactos diretos sobre o regime fisco-financeiro brasileiro, o


dispositivo institucional da correção monetária permitiu:

a redução da perda real de receita que resultava do atraso no pagamento dos


débitos fiscais, em um ambiente macroeconômico sujeito à alta inflação;

200
Segundo GIAMBIAGI e ALÉM (1999), poder-se-ia utilizar a equação (3) para se calcular o resultado fiscal,
mas as estatísticas de variação da dívida pública não são compatíveis com as que medem a poupança do setor
público.
254

através da emissão das obrigações reajustáveis do tesouro nacional (ORTN), a


obtenção de recursos adicionais para o financiamento do déficit da União;

ao ser incorporado pelo sistema bancário-financeiro, um estímulo maior à


formação de poupança financeira individual.

A observação da Tabela 16 permite constatar-se que na quase totalidade dos anos a


partir de 1947, a poupança interna tem sido insuficiente para financiar a acumulação bruta de
capital e então o país recorre à poupança externa. Nas décadas de 80 e 90, a grande maioria
dos anos apresentou poupança do governo negativa.

Pela Tabela 17, observa-se que os pagamentos de juros entre 1989 e 1994, os
pagamentos de juros representaram uma média de 30% do PIB. Os investimentos
permaneceram reduzidos no mesmo período e caíram ainda mais após 1994, justamente numa
fase em que houve queda na participação dos juros governamentais.
255

TABELA 16 COMPOSIÇÃO DA POUPANÇA TOTAL EM PERCENTAGEM DO PIB (1947-2002)

ANO Sg / PIB Sp / PIB Si / PIB Se / PIB Stotal / PIB


Sg = poupança do
1947 3,14% 10,01% 13,16% 1,57% 14,73% governo;
1948 2,69% 9,95% 12,64% 0,00% 12,64%
1949 2,82% 8,89% 11,70% 0,62% 12,32% Sp = poupança do
1950 1,66% 11,59% 13,25% -0,92% 12,33% setor privado;
1951 3,07% 9,62% 12,70% 2,15% 14,85%
1952 2,32% 9,89% 12,21% 2,97% 15,18% Si = poupança interna;
1953 -0,22% 15,03% 14,81% -0,22% 14,59%
1954 2,07% 13,79% 15,86% 0,80% 16,66% Se = poupança externa
1955 0,55% 14,68% 15,23% -0,01% 15,22%
1956 0,34% 14,34% 14,67% -0,24% 14,43%
1957 1,09% 15,30% 16,39% 0,96% 17,35%
1958 3,17% 13,96% 17,13% 1,03% 18,16%
1959 3,29% 15,96% 19,25% 1,30% 20,55%
1960 3,49% 11,76% 15,25% 1,76% 17,01%
1961 0,67% 13,55% 14,22% 0,84% 15,06%
1962 -0,79% 16,49% 15,69% 2,00% 17,69%
1963 -0,15% 17,52% 17,38% 0,66% 18,04%
1964 -0,41% 17,87% 17,45% -0,60% 16,85%
1965 0,75% 19,29% 20,04% -1,62% 18,42%
1966 3,21% 15,42% 18,63% -0,19% 18,44%
1967 0,56% 14,95% 15,50% 0,76% 16,26%
1968 2,81% 14,68% 17,49% 1,49% 18,98%
1969 0,62% 20,64% 21,26% 0,75% 22,01%
1970 5,67% 13,55% 19,22% 1,32% 20,54%
1971 6,03% 12,57% 18,60% 2,66% 21,26%
1972 5,68% 13,00% 18,67% 2,53% 21,20%
1973 5,34% 14,70% 20,04% 2,01% 22,05%
1974 3,63% 14,23% 17,86% 6,45% 24,31%
1975 3,20% 17,34% 20,54% 5,16% 25,70%
1976 3,40% 15,73% 19,13% 3,91% 23,04%
1977 3,04% 16,73% 19,77% 2,28% 22,05%
1978 1,66% 17,90% 19,56% 3,47% 23,03%
1979 1,67% 16,66% 18,33% 4,81% 23,14%
1980 0,82% 17,79% 18,60% 5,40% 24,00%
1981 0,97% 18,95% 19,92% 4,54% 24,46%
1982 -0,09% 16,71% 16,62% 6,01% 22,63%
1983 -0,25% 15,03% 14,77% 3,61% 18,38%
1984 0,26% 17,39% 17,66% -0,02% 17,64%
1985 -2,05% 22,33% 20,28% 0,11% 20,39%
1986 -1,24% 19,23% 17,98% 2,06% 20,04%
1987 -0,94% 23,61% 22,66% 0,51% 23,17%
1988 -7,88% 33,57% 25,69% -1,37% 24,32%
1989 -4,96% 32,07% 27,11% -0,25% 26,86%
1990 -0,75% 19,84% 19,09% 1,07% 20,16%
1991 -5,13% 23,73% 18,60% 1,17% 19,77%
1992 -5,18% 25,03% 19,86% -0,92% 18,94%
1993 5,16% 14,93% 20,09% 0,76% 20,85%
1994 0,93% 20,30% 21,23% 0,92% 22,15%
1995 -2,55% 22,02% 19,47% 2,82% 22,29%
1996 -1,84% 19,61% 17,77% 3,15% 20,92%
1997 -0,36% 17,71% 17,35% 4,14% 21,49%
1998 -2,49% 19,29% 16,80% 4,32% 21,12%
1999 4,42% 10,93% 15,35% 4,71% 20,06%
2000 -1,64% 18,62% 16,98% 4,46% 21,44%
2001 -0,53% 17,28% 16,75% 4,55% 21,30%
2002 -0,77% 19,29% 18,51% 1,66% 20,17%

FONTE: Cálculos a partir dos dados do IBGE


256

TABELA 17 RECEITA LÍQUIDA, JUROS DA DÍVIDA INTERNA ,CONSUMO E INVESTIMENTO


GOVERNAMENTAIS COMO PERCENTAGEM DO PIB (1947-2000)

ANO Cg/PIB Jg/PIB Ig/PIB RLG /PIB


1947 9,85% 0,50% 2,52% 13,83% Cg = Consumo do
1948 10,52% 0,77% 3,38% 14,13% Governo;
1949 11,29% 0,54% 4,14% 15,01%
1950 11,36% 0,57% 4,12% 13,81% Jg = Juros da dívida
1951 10,92% 0,77% 3,47% 15,10% interna;
1952 10,99% 0,66% 3,24% 14,36%
1953 13,28% 0,59% 3,08% 14,42% Ig = investimento do
1954 11,22% 0,64% 3,11% 14,61%
Governo;
1955 11,54% 1,26% 2,74% 13,50%
1956 12,67% 0,57% 2,59% 13,67%
RLG = Renda Líquida do
1957 12,22% 0,54% 3,80% 13,97%
1958 11,61% 0,42% 4,41% 15,86%
Governo
1959 10,62% 0,40% 3,66% 14,61%
1960 11,51% 0,32% 3,98% 15,38%
1961 11,54% 0,30% 3,72% 12,73%
1962 11,20% 0,38% 4,00% 10,97%
1963 11,90% 0,32% 3,65% 12,18%
1964 11,14% 0,13% 3,68% 10,97%
1965 10,66% 0,18% 4,73% 12,58%
1966 10,61% 0,12% 4,04% 15,33%
1967 11,35% 0,31% 4,62% 13,60%
1968 11,05% 0,34% 4,39% 16,74%
1969 10,89% 0,57% 5,37% 14,87%
1970 11,32% 1,30% 4,42% 17,98%
1971 11,10% 1,22% 4,28% 18,11%
1972 10,77% 1,27% 3,88% 17,74%
1973 9,91% 1,15% 3,71% 17,01%
1974 9,33% 1,06% 3,86% 14,61%
1975 10,19% 1,19% 3,95% 15,08%
1976 10,49% 1,39% 4,03% 16,16%
1977 9,43% 1,91% 3,30% 15,25%
1978 9,68% 2,10% 3,15% 14,15%
1979 9,90% 2,09% 2,47% 14,35%
1980 9,11% 1,91% 2,34% 11,91%
1981 9,52% 2,31% 2,65% 12,94%
1982 10,39% 3,42% 2,44% 13,43%
1983 10,36% 4,53% 1,90% 13,25%
1984 9,19% 6,97% 2,03% 12,86%
1985 10,48% 11,72% 2,60% 13,75%
1986 11,44% 11,53% 3,18% 13,81%
1987 12,84% 10,59% 3,28% 16,98%
1988 13,55% 17,55% 3,43% 15,30%
1989 16,73% 24,61% 2,94% 16,75%
1990 19,29% 27,44% 3,73% 21,23%
1991 17,90% 20,93% 2,59% 16,28%
1992 17,06% 36,32% 3,16% 16,33%
1993 17,66% 48,10% 3,06% 20,56%
1994 16,51% 24,83% 3,20% 19,43%
1995 19,60% 9,75% 2,54% 23,85%
1996 18,49% 5,87% 2,31% 22,50%
1997 18,20% 5,00% 1,98% 22,78%
1998 18,79% 6,96% 2,43% 24,43%
1999 18,60% 8,88% 1,91% 25,42%
2000 14,79% 4,31% 2,49% 20,03%

FONTE: Séries originais obtidas em Estatísticas do Século XX IBGE, Rio de Janeiro, 2003.
257

A Tabela 18 reúne dados relativos às participações da poupança do setor público


(administração pública e empresas públicas) e do setor privado, para o período pós-Plano
Real. Pode-se constatar que neste período, as taxas negativas de poupança do setor público
resultaram do comportamento da poupança da administração pública.

TABELA 18- COMPOSIÇÃO DA POUPANÇA TOTAL INTERNA COMO PERCENTAGEM DO PIB


(1995 2002)

POUPANÇA
ADMINISTRAÇÃO EMPRESAS
ANO TOTAL SETOR PÚBLICO SETOR PRIVADO
PÚBLICA PÚBLICAS
INTERNA
1995 19,5% -3,0% -2,2% -0,8% 22,4%
1996 17,8% -1,0% -1,4% 0,3% 18,8%
1997 17,4% -1,6% -2,6% 1,0% 18,9%
1998 16,8% -3,9% -4,3% 0,4% 20,7%
1999 15,4% -5,8% -6,0% 0,1% 21,3%
2000 17,3% -1,6% -2,7% 1,0% 19,0%
2001 16,8% -0,5% -1,8% 1,3% 17,3%
2002 18,6% -0,8% -0,6% -0,2% 19,3%

FONTE: Cálculo a partir dos dados do IPEADATA.


NOTA: Elaborado a partir de valores constantes de 2000.

GRÁFICO 49 EVOLUÇÃO DA RENDA LÍQUIDA DO GOVERNO E DOS COMPONENTES DOS


GASTOS PÚBLICOS (1947-2000)

500,00
250,00
Em Bilhões de R$ de 2000 - Escala Log

75,00
50,00
25,00

7,50
5,00
2,50

0,75
0,50 Cg
0,25 Jg
Ig
1947 1955 1963 1971 1979 1987 1995 RLG
1951 1959 1967 1975 1983 1991 1999

FONTE: Séries originais obtidas em Estatísticas do Século XX IBGE, Rio de Janeiro.


NOTA: Cg = Consumo do Governo; Jg = Juros da dívida interna; Ig = Investimento do Governo; RLG = Renda
líquida do Governo (total da arrecadação fiscal + outras receitas correntes do Governo subsídios
transferências). Séries deflacionadas pelo deflator implícito do PIB, base 2000=100.
258

O Gráfico 49 mostra a enorme expansão dos pagamentos de juros reais a partir da


vigência do regime político autoritário pós-1964. Há uma quebra de tendência em 1994, mas
o nível dessa variável permanece ainda muito elevado.

O exame do Gráfico 50 revela que, as décadas de 80 e 90, as transferências mais


subsídios permaneceram estacionados na faixa de 40% do total da despesa primária do setor
público. Além disso, constata-se uma forte redução na participação do investimento
governamental que cai de um patamar médio de 20% entre 1948 e 1974, para menos de 10%
no período pós-Plano Real. Apesar da redução acentuada do consumo do governo entre 1990
e 2000, a partir de 2001, a participação dessa variável volta a subir, provavelmente refletindo
a conjuntura macroeconômica que emergiu da desvalorização da taxa de câmbio, em janeiro
de 1999, e o novo regime de câmbio flutuante.

GRÁFICO 50 EVOLUÇÃO DOS GASTOS EM CONSUMO, INVESTIMENTO, SUBSÍDIOS E


TRANSFÊNCIAS GOVERNAMENTAIS COMO PERCENTAGEM DA DESPESA PRIMÁRIA TOTAL
DO ESTADO (1900-2003)

Cg / DespTotal
(Ss+Trf)/DespTotal
FBKFg / DespTotal
70%

60%

50%

40%

30%

20%

10%

0%

-10%
1900 1908 1916 1924 1932 1940 1948 1956 1964 1972 1980 1988 1996
1904 1912 1920 1928 1936 1944 1952 1960 1968 1976 1984 1992 2000

FONTE: Séries originais obtidas em Estatísticas do Século XX IBGE, Rio de Janeiro.


NOTA: Cg = Consumo do Governo; FBKFg = Investimento do Governo; Ss = subsídios; Trf = transferências;
DespTotal = despesa primária total do Governo. Com exceção do investimento do Governo que foi deflacionado
pelo deflator implícito da FBKF, as demais séries foram deflacionadas pelo deflator implícito do PIB, base 2000
= 100. Todas foram filtradas pelo filtro 4253H para se obter a dinâmica tendencial.
259

4.2.7 Uma estrutura tributária regressiva e amplamente favorável ao capital


As Tabelas 19, 20 e 21 foram construídas com base na metodologia proposta por
AFONSO e SOUZA (1975). Elas permitem uma investigação sobre a forma como se processa
a distribuição dos impostos na economia brasileira. A carga tributária total foi dividida em
duas categorias básicas: as receitas provenientes dos impostos sobre o trabalho (TL) e as
oriundas dos impostos sobre o capital (TK). Na primeira categoria incluíram as seguintes
cargas: imposto sobre operações financeiras; imposto sobre produto industrializado; imposto
sobre importações; imposto sobre circulação de mercadorias; e imposto de renda sobre o
trabalho. Com relação a este último assumiu-se que a totalidade da receita do imposto de
renda da pessoa física (IRPF) é proveniente das relações de trabalho assalariado.

Na segunda categoria, foram incluídas todas as taxas, impostos e contribuições cujo


pagador final é provavelmente o capital: imposto de renda sobre o capital (IRPJ); contribuição
social sobre o lucro líquido (CSLL); imposto sobre a propriedade rural (ITR). Outra hipótese
simplificadora assumida por esses autores consistiu em considerar-se que os impostos sobre o
lucro não são transferidos imediatamente aos preços finais. Portanto, as taxas incluídas em TL
são relativas a impostos cujos efeitos em termos de aumento de preços são imediatos e muito
mais significativos, pois são cobradas continuamente à medida que o processo de circulação
de bens e serviços se desenvolve. Já as taxas incluídas em TK são pagas no final de cada
período de um ano.201

O exame das tabelas supracitadas permite contatar-se a vigência de um regime fiscal


amplamente favorável ao capital e baseado numa carga tributária regressiva, onde os impostos
indiretos respondem por mais de 50% da arrecadação total e os impostos diretos por apenas
19% (conforme Quadro 17, na seção 4.2.1 Reforma fiscal). Como observavam AFONSO e
SOUZA (1975), já nas décadas de 60 e 70, mais de 70% da arrecadação federal no Brasil
derivava-se de vários tipos de taxas diretas e indiretas sobre preços. Como conseqüência, a
carga tributária recai preponderantemente sobre o consumidor final, via acréscimos de preços
que compensam a tributação sobre o capital e mantém as margens de lucro. O quadro se
agravou ainda mais numa estrutura de mercado fortemente oligopolizada e, sobretudo,
protegida da concorrência internacional até finais dos anos 80.

À medida que o aparelho de Estado se moderniza e que o desenvolvimento capitalista


converte a WLN na relação fundamental de produção e de distribuição, a tendência do sistema
201
Conforme AFONSO e SOUZA (1975, p. 115), devido à magnitude dos impostos e taxas sobre a venda de
mercadorias, que constituem a maior parte dos impostos totais sobre o trabalho (TL), tomamos nossa
metodologia de cálculo como uma estimativa preliminar válida .
260

econômico é forçar a parte da população submetida às relações salariais, a arcar com parcelas
cada vez maiores da arrecadação fiscal do Estado.

Na Tabela 19 encontra-se a distribuição do imposto sobre a renda. Constata-se que a


participação percentual do imposto de renda sobre o trabalho (IRL) cresce de período a
período e, em conseqüência, a participação do imposto de renda sobre o capital (IRK) reduz-
se.

TABELA 19 DISTRIBUIÇÃO DOS IMPOSTOS SOBRE A RENDA (1950 1975)

PERÍODO IRL IRK

1950-1954 10% 90%


1955-1960 11% 89%
1961-1963 15% 85%
1964-1966 24% 76%
1967-1969 30% 70%
1970-1973 40% 60%
1974-1975 45% 55%

FONTE: C. A. AFONSO e H. de SOUZA (1977), O Estado e o


Desenvolvimento Capitalista no Brasil. Dados primários do Anuário
Estatístico do Brasil, 1951-1974 / IBGE e do Diário Oficial, n. 237, Dez.
1974, e n. 241, Dez. 1973.
NOTA: IRL = Imposto de renda sobre o trabalho; IRK = imposto de
renda sobre o capital.

Entre 1964 e 1969, período em que se completa a introdução de novos métodos de


arrecadação (a reforma tributária do Programa de Ação Econômica do Governo (PAEG),
exposto na seção 3.3.1), há um desvio da tendência histórica (Tabela 20). Todavia, a partir de
1970, a nova máquina de arrecadação fiscal do Estado começa a funcionar plenamente e
com grande eficiência (AFONSO e SOUZA, 1975) e a tendência regressiva do sistema
tributário brasileiro reaparece.
261

TABELA 20 DISTRIBUIÇÃO DO TOTAL DA CARGA TRIBUTÁRIA FEDERAL ENTRE


TRABALHO E CAPITAL (1950-1975)

PERÍODO TL TK

1950-1954 60% 40%


1955-1960 62% 38%
1961-1963 69% 31%
1964-1966 65% 35%
1967-1969 61% 39%
1970-1973 73% 27%
1974-1975 85% 15%
FONTE: C. A. AFONSO e H. de SOUZA (1977), O Estado e o
Desenvolvimento Capitalista no Brasil. Dados primários do Anuário
Estatístico do Brasil, 1951-1974 / IBGE e do Diário Oficial, n. 237, Dez.
1974, e n. 241, Dez. 1973.
NOTA: IRL = Imposto de renda sobre o trabalho; IRK = imposto de
renda sobre o capital.

A Tabela 21 fornece uma atualização para o período pós-1990, dos dados constantes
das tabelas precedentes. A carga tributária sobre o trabalho aprofunda-se nos anos 90,
mantendo-se a tendência histórica de regressividade, desonerando o capital.

TABELA 21 DISTRIBUIÇÃO DA RECEITA TOTAL DE IMPOSTOS ENTRE TRABALHO


E CAPITAL (1991 2004)

ANO TL TK

1991 89% 11%


1992 81% 19%
1993 79% 21%
1994 81% 19%
1995 81% 19%
1996 79% 21%
1997 80% 20%
1998 77% 23%
1999 77% 23%
2000 78% 22%
2001 78% 22%
2002 72% 28%
2003 73% 27%
2004 69% 31%

FONTE: Elaborado a partir de dados do Ministério da Fazenda Cotepe e


Secretaria da Receita Federal.
NOTA: TL = Receita total de impostos sobre o trabalho; TK = Receita total de
impostos sobre o capital. Os dados para 2004 referem-se à média do primeiro
semestre deste ano.
262

4.2.8 As transformações do regime fisco-financeiro: uma análise em termos de


mudança estrutural
a) Evolução das receitas públicas

Para captar as relações entre a receita tributária total, o PIB, as exportações e importações,
estimou-se a seguinte equação, para o período completo de análise [1900 2000]202:

LRECT = C0 + C1.LPIB + C2.LX+ C3.LM + (4)

Onde LRECT, LPIB, LX e LM são, respectivamente, os logarítimos nepperianos da


receita tributária total, do PIB, das exportações e das importações, com todas as variáveis
anuais a preços de 2000 e numa amostra de 101 observações. O resultado encontra-se no
Quadro 20. O valor reduzido da estatística DW com R2 elevado pode ser um sinal tanto da
existência de regressão espúria (GRANGER e NEWBOLD, 1974)203 quanto da instabilidade
estrutural do modelo. A partir dos testes de estabilidade do CUSUM constata-se que há uma
mudança estrutural nos anos 30, o que está de acordo com os demais testes apresentados
(Figura 13). Procedeu-se então a estimação do modelo para sub-amostras onde a estabilidade
dos parâmetros fosse confirmada pelos testes.

QUADRO 19 ESTIMAÇÃO DE LRECT PARA O PERÍODO [1900-2000]


Dependent Variable: LRECT
Method: Least Squares
Sample: 1900 2000
Included observations: 101
Variable Coefficient Std. Error t-Statistic Prob.
C -6.660030 0.399246 -16.68152 0.0000
LPIB 1.196094 0.037916 31.54608 0.0000
LM 0.221298 0.061061 3.624231 0.0005
LX -0.148416 0.074884 -1.981946 0.0503
R-squared 0.991206 Mean dependent var 16.56090
Adjusted R-squared 0.990934 S.D. dependent var 1.978213
S.E. of regression 0.188360 Akaike info criterion -0.462122
Sum squared resid 3.441522 Schwarz criterion -0.358553
Log likelihood 27.33715 F-statistic 3644.263
Durbin-Watson stat 0.229751 Prob(F-statistic) 0.000000

202
As estimações econométricas realizadas neste trabalho foram realizadas nos softwares EVIEWS 3.0, PCGive
9.2, GRETL 1.2.9, EASYREG, STATISTICA 6.0 e STATA 8.0.
203
GRANGER, C.W.J. e NEWBOLD, P. Spourious Regression in Econometrics, Journal of Econometrics, 2,
1974, p. 111-120.
263

FIGURA 13 TESTES DE ESTABILIDADE PARA O PERÍODO [1900-2000]

0.6 80 1.2

0.4 60 1.0

0.8
0.2 40
0.6
0.0 20
0.4
-0.2 0
0.2

-0.4 -20 0.0

-0.6 -40 -0.2


10 20 30 40 50 60 70 80 90 00 10 20 30 40 50 60 70 80 90 00 10 20 30 40 50 60 70 80 90 00

Recursive Residuals ± 2 S.E. CUSUM 5% Signific anc e CUSUM of Squares 5% Significance

15 2 .0
0.6 0.6
10 1 .5
0.4 0.4 5
1 .0
0.2 0.2 0
0 .5
0.0 0.0 -5
0 .0
-1 0
-0.2 -0.2
-1 5 -0 .5

-0.4 -0.4 -2 0 -1 .0
0.00 -0.6 0.00 -0.6
20 30 40 50 60 70 80 90 00 20 30 40 50 60 70 80 90 00

Re c u rs i v e C(1 ) Es ti m ate s ± 2 S.E. Re c u rs i v e C(2 ) Es ti m a te s ± 2 S.E.

0.05 0.05 1 .5 1 .0

1 .0 0 .8

0 .6
0.10 0.10 0 .5
0 .4
0 .0
0 .2
-0 .5
0.15 0.15 0 .0

10 20 30 40 50 60 70 80 90 00 10 20 30 40 50 60 70 80 90 00 -1 .0 -0 .2

-1 .5 -0 .4
20 30 40 50 60 70 80 90 00 20 30 40 50 60 70 80 90 00
One-Step Probability Recursive Residuals N-Step Probability Recursive Residuals Re c u rs i v e C(3 ) Es ti m ate s ± 2 S.E. Re c u rs i v e C(4 ) Es ti m a te s ± 2 S.E.

a.1) Primeiro período [1900-1926] - o primeiro regime identificado a partir dos testes de
estabilidade estrutural (Quadro 20 e Figura 14) compreende o período [1900-1926] e para o
qual realizou-se os testes de raízes unitárias ADF e PP204. Com exceção das exportações,
todas as séries revelaram-se não-estacionárias. Todavia, após os testes de co-integração de
JOHANSEN para o modelo sem as exportações, nas especificações em termos de VECM, os
coeficientes dos termos de correção de erro não apresentaram significância estatística
(detalhes dos testes encontram-se no anexo). Considerou-se então a representação VECM
como não válida neste primeiro sub-período, o que significa admitir a inexistência de uma
relação de longo prazo entre as variáveis do modelo. Isto poderia ser conseqüência do fraco
número de observações (n = 27). Mas por outro lado, trata-se de um período marcado por
grande instabilidade conjuntural, derivada do predomínio de uma base produtiva primário-
exportador e muito dependente da demanda externa205. Nestas circunstâncias, optou-se por um
modelo em diferenças a fim de que se pudesse estimar os efeitos de curto prazo.

204
Por questões de espaço e para não sobrecarregar demasiadamente o texto principal, os resultados completos
de todos os testes de raiz unitária encontram-se no anexo deste trabalho. ADF e PP referem-se, respectivamente,
aos testes aumentado de Dickey-Fuller e ao de Phillips-Perron. Este último permite considerar os problemas de
heterocedasticidade e dependência serial, através de ajustes não paramétricos.
205
Há três recessões neste período: 1902 (-0,5%); 1908(-3,2%); 1914 (-1,3%).
264

QUADRO 20 - ESTIMAÇÃO DE D(LRECT) PARA O PERÍODO [1900-1926]


Dependent Variable: D(LRECT)
Method: Least Squares
Sample(adjusted): 1901 1926
Included observations: 26 after adjusting endpoints
Variable Coefficient Std. Error t-Statistic Prob.
C 0.001492 0.031342 0.047589 0.9625
D(LPIB) 0.450696 0.566409 0.795707 0.4347
D(LM) 0.318502 0.109508 2.908475 0.0081
D(LX) 0.034751 0.184352 0.188502 0.8522
R-squared 0.348250 Mean dependent var 0.030741
Adjusted R-squared 0.259375 S.D. dependent var 0.132203
S.E. of regression 0.113773 Akaike info criterion -1.368577
Sum squared resid 0.284777 Schwarz criterion -1.175024
Log likelihood 21.79150 F-statistic 3.918422
Durbin-Watson stat 2.766791 Prob(F-statistic) 0.022083

FIGURA 14 TESTES DE ESTABILIDADE PARA O PERÍODO [1900-1926]

0.4 15 1.6

10
1.2
0.2
5
0.8
0.0 0
0.4
-5
-0.2
0.0
-10

-0.4 -15 -0.4


06 08 10 12 14 16 18 20 22 24 26 06 08 10 12 14 16 18 20 22 24 26 06 08 10 12 14 16 18 20 22 24 26

Recursive Residuals ± 2 S.E. CUSUM 5% Signific anc e CUSUM of Squares 5% Significance

0.4 0.4 0.2 5

4
0.2 0.2 0.1
3
0.0 0.0
0.0 2
-0.2 -0.2
1
-0.1
0.00 -0.4 0.00 -0.4 0
-0.2
-1
0.05 0.05
-0.3 -2
10 12 14 16 18 20 22 24 26 10 12 14 16 18 20 22 24 26
0.10 0.10 Recursive C(1) Estimates ± 2 S.E. Recursive C(2) Estimates ± 2 S.E.

0.15 0.15 3.0 1.0


06 08 10 12 14 16 18 20 22 24 26 06 08 10 12 14 16 18 20 22 24 26
2.5 0.5
One-Step Probability Recursive Residuals N-Step Probability Recursive Residuals 2.0
0.0
1.5
-0.5
1.0
-1.0
0.5

0.0 -1.5

-0.5 -2.0
10 12 14 16 18 20 22 24 26 10 12 14 16 18 20 22 24 26

Recursive C(3) Estimates ± 2 S.E. Recursive C(4) Estimates ± 2 S.E.

Este resultado está em conformidade com a análise desenvolvida na seção precedente


(vide Gráfico 35), a partir da consideração das principais mudanças institucionais observadas
ao longo da história econômica brasileira no século 20. A receita tributária total até os anos 30
revela-se dependente das importações brasileiras; os coeficientes relativos ao PIB e
exportações não são significativos. Há, portanto, forte evidência de funcionamento de um
265

regime fisco-financeiro muito dependente do comércio exterior e fracamente conectado à


dinâmica de uma indústria ainda com baixa participação na renda interna nacional.206

a.2) Segundo período [1928 - 1960] - a equação estimada (Quadro 21) mostrou-se estável
para o período [1928-1960] e então foram realizados os testes de raiz unitária. Todas as séries
revelaram-se integradas de primeira ordem I(1), havendo, portanto, possibilidade de co-
integração entre as variáveis do modelo. O teste de JOHANSEN confirma a existência de uma
relação de co-integração (Quadro 22) e então estimou-se o VECM correspondente (Quadro
23).

QUADRO 21 - ESTIMAÇÃO DE LRECT PARA O PERÍODO [1928-1960]


Dependent Variable: LRECT
Method: Least Squares
Sample: 1928 1960
Included observations: 33
Variable Coefficient Std. Error t-Statistic Prob.
C -11.26890 0.866109 -13.01095 0.0000
LPIB 1.366346 0.032643 41.85732 0.0000
LM -0.106913 0.040122 -2.664687 0.0125
LX 0.268347 0.074165 3.618244 0.0011
R-squared 0.993996 Mean dependent var 15.91724
Adjusted R-squared 0.993375 S.D. dependent var 0.728790
S.E. of regression 0.059321 Akaike info criterion -2.698484
Sum squared resid 0.102052 Schwarz criterion -2.517089
Log likelihood 48.52498 F-statistic 1600.280
Durbin-Watson stat 1.568913 Prob(F-statistic) 0.000000

As elasticidades de longo prazo encontram-se na equação de co-integração (Quadro


22) e confirmam a transição para um regime fisco-financeiro fortemente conectado à evolução
da produção interna ( = 1,4). O coeficiente da elasticidade-exportações da receita fiscal total
é positivo embora menor do que a unidade. Em outros termos, assiste-se a afirmação
progressiva de um processo de acumulação de capital centrado na dinâmica do mercado
interno. A hipótese subjacente é a de que os novos compromissos institucionalizados que
emergiram a partir da Revolução de 30 e dos condicionantes impostos pela Grande
Depressão e pela Segunda Guerra Mundial se consolidam ao longo dos anos 50 e 60. Em
conseqüência, o regime fisco-financeiro se reconfigura para capacitar o Estado a desempenhar
suas novas funções numa economia de base industrial, impulsionada pela lógica da
substituição de importações.

206
Entre 1900 e 1927, a participação média da indústria no PIB brasileiro manteve-se próxima dos 15%.
Somente a partir de 1936, essa participação superaria os 20% do produto.
266

FIGURA 15 - TESTES DE ESTABILIDADE PARA O PERÍODO [1928 1960]

0.3 20 1.6

0.2
1.2
10
0.1
0.8
0.0 0
0.4
-0.1
-10
0.0
-0.2

-0.3 -20 -0.4


32 34 36 38 40 42 44 46 48 50 52 54 56 58 60 32 34 36 38 40 42 44 46 48 50 52 54 56 58 60 32 34 36 38 40 42 44 46 48 50 52 54 56 58 60

Recursive Residuals ± 2 S.E. CUSUM 5% Signific anc e CUSUM of Squares 5% Significance

-4 2.2
0.4 0.4
2.0
-8
0.2 0.2 1.8
-12
1.6
0.0 0.0 -16
1.4

-0.2 -0.2 -20


1.2

0.00 0.00 -24 1.0


-0.4 -0.4 36 3 8 40 42 4 4 46 48 5 0 52 54 5 6 58 60 36 38 4 0 42 44 4 6 48 50 5 2 54 56 5 8 60

Re c urs i v e C(1) Es ti m ate s ± 2 S.E. Re c u rs i v e C(2 ) Es ti m a te s ± 2 S.E.


0.05 0.05
0 .1 0.8

0.10 0.10 0 .0
0.6

0.4
-0.1
0.2
0.15 0.15
-0.2
35 40 45 50 55 60 35 40 45 50 55 60 0.0

-0.3
-0 .2
One-Step Probability Recursive Residuals N-Step Probability Recursive Residuals
-0.4 -0 .4
36 3 8 40 42 4 4 46 48 5 0 52 54 5 6 58 60 36 38 4 0 42 44 4 6 48 50 5 2 54 56 5 8 60

Re c urs i v e C(3) Es ti m ate s ± 2 S.E. Re c u rs i v e C(4 ) Es ti m a te s ± 2 S.E.

QUADRO 22 -TESTE DE CO-INTEGRAÇÃO DE JOHANSEN PARA O PERÍODO [1926 -1960]


Series: LRECT LPIB LM LX
Lags interval: 1 to 2
Likelihood 5 Percent 1 Percent Hypothesized
Eigenvalue Ratio Critical Value Critical Value No. of CE(s)
0.567336 52.98932 47.21 54.46 None *
0.411527 25.34210 29.68 35.65 At most 1
0.165150 7.844698 15.41 20.04 At most 2
0.055608 1.888075 3.76 6.65 At most 3
L.R. test indicates 1 cointegrating equation(s) at 5%
Normalized Cointegrating Coefficients: 1 Cointegrating Equation(s)
LRECT LPIB LM LX C
1.000000 -1.390555 0.209616 -0.411988 12.38816
(0.04020) (0.03529) (0.08110)

Log likelihood 179.1641


267

QUADRO 23 - EQUAÇÃO DE CO-INTEGRAÇÃO E VECM PARA LRECT,


LPIB, LM E LX NO PERÍODO [1926 -1960]

Cointegrating Eq: CointEq1


LRECT(-1) 1.000000

LPIB(-1) -1.390555
(-34.5879)

LM(-1) 0.209616
(5.93975)

LX(-1) -0.411988
(-5.08011)

C 12.38816
Error Correction: D(LRECT)
CointEq1 -0.971806
(-4.03819)

D(LRECT(-1)) 0.418742
(1.63608)

D(LRECT(-2)) 0.845546
(3.02841)

D(LPIB(-1)) -0.954315
(-1.90112)

D(LPIB(-2)) -0.497874
(-1.37535)

D(LM(-1)) 0.106971
(1.69056)

D(LM(-2)) 0.078396
(1.36129)

D(LX(-1)) -0.122493
(-1.07642)

D(LX(-2)) -0.206854
(-1.79396)

C 0.054552
(1.92534)
R-squared 0.531959
Adj. R-squared 0.348812

a.3) Terceiro período [1962 2000] - a relação não apresentou estabilidade dos parâmetros
pelos testes do CUSUM, do CUSUMSQ e dos resíduos recursivos (Quadro 24 e Figura 16).
Em conseqüência, a tentativa de subdividi-lo para encontrar sub-amostras onde a equação
poderia ser considerada estável, tornou-se problemática. No entanto, no sub-período [1966-
1989] o modelo apresentou estabilidade por todos os testes, a exceção do teste do CUSUM
268

que se mostrou em desacordo com o teste do CUSUMQ. Num caso como este o analista deve
tomar a decisão com base nos outros testes disponíveis (Quadro 25 e Figura 17).207

QUADRO 24 - ESTIMAÇÃO DE LRECT PARA O PERÍODO [1962- 2000]


Dependent Variable: LRECT
Method: Least Squares
Sample: 1962 2000
Included observations: 39
Variable Coefficient Std. Error t-Statistic Prob.
C -6.576026 2.014825 -3.263821 0.0025
LPIB 1.317633 0.272383 4.837437 0.0000
LM 0.141796 0.050688 2.797402 0.0083
LX -0.210710 0.205837 -1.023670 0.3130
R-squared 0.981661 Mean dependent var 18.76173
Adjusted R-squared 0.980089 S.D. dependent var 0.681158
S.E. of regression 0.096116 Akaike info criterion -1.749600
Sum squared resid 0.323342 Schwarz criterion -1.578978
Log likelihood 38.11720 F-statistic 624.4884
Durbin-Watson stat 0.540271 Prob(F-statistic) 0.000000

FIGURA 16 - TESTES DE ESTABILIDADE PARA O PERÍODO [1962 2000]

0 6
20
5
-1 0

4
10 -2 0
3
-3 0
2
0
-4 0
1

-5 0 0
70 75 80 85 90 95 00 70 75 80 85 90 95 00
-10
Re c u rs i v e C(1 ) Es t i m a te s ± 2 S.E. Re c u rs i v e C(2 ) Es ti m a te s ± 2 S. E.

0 .4 1 .5
-20
1 .0
0 .0
0 .5
-30
70 75 80 85 90 95 00 -0 . 4 0 .0

-0 . 5
CUSUM 5% Signific anc e -0 . 8
-1 . 0

-1 . 2 -1 . 5
70 75 80 85 90 95 00 70 75 80 85 90 95 00

Re c u rs i v e C(3 ) Es t i m a te s ± 2 S.E. Re c u rs i v e C(4 ) Es ti m a te s ± 2 S. E.

Após considerar-se a estabilidade da relação neste sub-período (Figura 17), foram


realizados os testes de raiz unitária. Todavia, como os testes ADF e PP rejeitaram a hipótese
nula de raiz unitária para a variável log da receita tributária total (LRECT), a especificação em
termos de co-integração foi descartada neste sub-período e a equação foi reestimada em
termos de primeiras diferenças (Quadro 25).

207
No caso em que o teste do CUSUM mostrar-se em desacordo com o teste do CUSUMSQ, a literatura
econométrica sugere a condução de outros testes adicionais para que o analista possa tomar a decisão correta.
Essa é, por exemplo, a posição de I. SOARES e I. CASTELAR (2003), em Econometria Aplicada com o Uso do
Eviews.
269

QUADRO 25 - ESTIMAÇÃO DE LRECT PARA O PERÍODO [1966- 1989]


Dependent Variable: D(LRECT)
Method: Least Squares
Sample: 1966 1989
Included observations: 24
Variable Coefficient Std. Error t-Statistic Prob.
C 0.013336 0.020316 0.656422 0.5190
D(LPIB) 1.043438 0.354410 2.944153 0.0080
D(LM) 0.066300 0.081748 0.811033 0.4269
D(LX) -0.169461 0.105807 -1.601601 0.1249
R-squared 0.495110 Mean dependent var 0.066821
Adjusted R-squared 0.419376 S.D. dependent var 0.072055
S.E. of regression 0.054905 Akaike info criterion -2.815407
Sum squared resid 0.060292 Schwarz criterion -2.619065
Log likelihood 37.78489 F-statistic 6.537518
Durbin-Watson stat 2.229515 Prob(F-statistic) 0.002927

FIGURA 17 - TESTES DE ESTABILIDADE PARA O PERÍODO [1966 1989]

0.2 15 1.6

10
1.2
0.1
5
0.8
0.0 0
0.4
-5
-0.1
0.0
-10

-0.2 -15 -0.4


70 72 74 76 78 80 82 84 86 88 70 72 74 76 78 80 82 84 86 88 70 72 74 76 78 80 82 84 86 88

Recursive Residuals ± 2 S.E. CUSUM 5% Signific anc e CUSUM of Squares 5% Significance

0.4 4
0.2 0.2
0.3
2

0.1 0.1 0.2


0
0.1
0.0 0.0 -2
0.0

-0.1 -0.1 -0.1


-4

-0.2 -6
0.00 -0.2 0.00 -0.2 74 76 78 80 82 84 86 88 74 76 78 80 82 84 86 88

Re c u rs i v e C(1) Es ti m ate s ± 2 S.E. Re c urs i v e C(2) Es ti m a te s ± 2 S.E.

0.05 0.05 1.2 1 .5

0.8 1 .0

0.10 0.10 0.4 0 .5

0.0 0 .0
0.15 0.15
70 72 74 76 78 80 82 84 86 88 70 72 74 76 78 80 82 84 86 88 -0.4 -0.5

-0.8 -1.0
One-Step Probability Recursive Residuals N-Step Probability Recursive Residuals 74 76 78 80 82 84 86 88 74 76 78 80 82 84 86 88

Re c u rs i v e C(3) Es ti m ate s ± 2 S.E. Re c urs i v e C(4) Es ti m a te s ± 2 S.E.

Os testes econométricos confirmam mais uma vez os efeitos das mudanças


institucionais descritas na seção 4.2.1. Neste período o Estado brasileiro moderniza o sistema
tributário a partir das reformas institucionais do PAEG (1964-1966) e quando estas se
completam, a carga tributária avança (Gráfico 51), contrastando com o período anterior,
referente ao Plano de Metas (1955-1962). Essa nova configuração do regime fisco-financeiro
corresponde ao período de forte expansão econômica do milagre brasileiro (1967-1973),
mas também ao de seu esgotamento e crise ao longo da década de 80.
270

GRÁFICO 51 EVOLUÇÃO DA RECEITA TRIBUTÁRIA TOTAL, DO PIB E DA CARGA


TRIBUTÁRIA (1900-2003)

PIB(L)
RECT(L)
CARGA TRIBUTÁRIA BRUTA(R)
50000 40%
Índice dos valores a preços de 2000

25000 35%
(1900 = 100) - Escala log

7500 30%
5000
25%
2500
20%
750
500 15%
250
10%

75 5%
1900
1903
1906
1909
1912
1915
1918
1921
1924
1927
1930
1933
1936
1939
1942
1945
1948
1951
1954
1957
1960
1963
1966
1969
1972
1975
1978
1981
1984
1987
1990
1993
1996
1999
2002
FONTE: Séries originais obtidas em Estatísticas do Século XX IBGE, Rio de Janeiro.
NOTA: RECT é a receita tributária total. Séries deflacionadas pelo deflator implícito do PIB.
Para o período subseqüente [1990-2000], em razão do fraco número de observações
disponíveis em dados anuais, não se prosseguiu com a análise em termos de co-integração. A
equação em diferenças não apresentou coeficientes estatisticamente significativos,
provavelmente como conseqüência do reduzido tamanho da amostra.

b) Evolução das despesas públicas

Com o objetivo de se investigar o comportamento dos gastos governamentais e


identificar as mudanças estruturais, estimou-se a seguinte equação:

LDESPG = C0 + C1.LPIB + (5)

onde LDESPG e LPIB são, respectivamente, os logaritmos nepperianos da despesa primária


total do governo208 e do PIB, com todas as variáveis anuais a preços de 2000 e numa amostra
de 104 observações.

Os testes revelaram a ocorrência de instabilidade estrutural entre os anos 1900 e 1931


e a partir de 1980, quando a equação é estimada para o período completo [1900-2003]. Os
resultados encontram-se no Quadro 26 e na Figura 18.

208
A despesa primária total do governo não inclui os pagamentos de juros da dívida pública interna.
271

QUADRO 26 - ESTIMAÇÃO DE LDESPG PARA O PERÍODO [1900-2003]


Dependent Variable: LDESPG
Method: Least Squares
Sample: 1900 2003
Included observations: 104
Variable Coefficient Std. Error t-Statistic Prob.
C -4.914854 0.208751 -23.54410 0.0000
LPIB 1.176450 0.011244 104.6307 0.0000
R-squared 0.990769 Mean dependent var 16.84645
Adjusted R-squared 0.990678 S.D. dependent var 1.890791
S.E. of regression 0.182553 Akaike info criterion -0.544508
Sum squared resid 3.399215 Schwarz criterion -0.493654
Log likelihood 30.31440 F-statistic 10947.58
Durbin-Watson stat 0.459668 Prob(F-statistic) 0.000000

FIGURA 18 - TESTES DE ESTABILIDADE PARA O PERÍODO [1900 2000]

0.6 60 1.2

0.4 1.0
40
0.8
0.2
20 0.6
0.0
0.4
0
-0.2
0.2

-0.4 -20
0.0

-0.6 -40 -0.2


1920 1940 1960 1980 2000 1920 1940 1960 1980 2000 1920 1940 1960 1980 2000

Recursive Residuals ± 2 S.E. CUSUM 5% Significance CUSUM of Squares 5% Significance

0.6 0.6
10
0.4 0.4
0.2 0.2
0.0 0.0 0
-0.2 -0.2
-0.4 -0.4 -10
0.00 -0.6 0.00 -0.6

-20
0.05 0.05

0.10 0.10 -30

0.15 0.15
-40
1920 1940 1960 1980 2000 1920 1940 1960 1980 2000
10 20 30 40 50 60 70 80 90 00
One-Step Probability Recursive Residuals N-Step Probability Recursive Residuals
Recursive C(1) Estimates ± 2 S.E.

3.0

2.5

2.0

1.5

1.0

0.5

0.0
10 20 30 40 50 60 70 80 90 00

Recursive C(2) Estimates ± 2 S.E.

b.1) Período [1900-1931] - a instabilidade estrutural deste primeiro período pode ser
interpretada como um resultado das transformações econômicas e políticas que atravessaram a
economia brasileira no início do século 20: processo de institucionalização da República
Velha , Primeira Guerra Mundial , Revolução de 1930 e a eclosão da Grande Crise dos
272

anos 30. Trata-se de um período marcado por intensos conflitos entre as forças sociais ligadas
ao complexo agrário-exportador cafeeiro e a ascensão das classes médias e das burguesias
urbano-industriais que disputavam espaço no controle do aparelho de Estado.

b2) Período [1932-1989] como os testes indicaram estabilidade estrutural para esse período
(Figura 19), foram aplicados os testes de raiz unitária ADF e PP e a metodologia de
JOAHANSEN para co-integração. Ambas as séries são I(1) e há uma relação de co-integração
(Quadro 27 e 28). A estimativa do VECM (Quadro 29) permitiu a obtenção das elasticidades
de curto e de longo prazos das despesas públicas com relação à dinâmica do PIB.

QUADRO 27 - ESTIMAÇÃO DE LDESPG PARA O PERÍODO [1932-1989]


Dependent Variable: LDESPG
Method: Least Squares
Sample: 1932 1989
Included observations: 58
Variable Coefficient Std. Error t-Statistic Prob.
C -4.621224 0.225827 -20.46353 0.0000
LPIB 1.158031 0.011875 97.51521 0.0000
R-squared 0.994145 Mean dependent var 17.36625
Adjusted R-squared 0.994041 S.D. dependent var 1.239816
S.E. of regression 0.095708 Akaike info criterion -1.821160
Sum squared resid 0.512959 Schwarz criterion -1.750110
Log likelihood 54.81364 F-statistic 9509.216
Durbin-Watson stat 1.064713 Prob(F-statistic) 0.000000

FIGURA 19 - TESTES DE ESTABILIDADE PARA O PERÍODO [1932-1989]

0.6 30 1.6

0.4 20
1.2

0.2 10
0.8
0.0 0
0.4
-0.2 -10

0.0
-0.4 -20

-0.6 -30 -0.4


35 40 45 50 55 60 65 70 75 80 85 35 40 45 50 55 60 65 70 75 80 85 35 40 45 50 55 60 65 70 75 80 85

Recursive Residuals ± 2 S.E. CUSUM 5% Signific anc e CUSUM of Squares 5% Significance


273

1.0 1.0
10
0.5 0.5
5
0.0 0.0
0
-0.5 -0.5
0.00 0.00
-1.0 -1.0 -5
0.05 0.05
-10

0.10 0.10
-15

0.15 0.15
35 40 45 50 55 60 65 70 75 80 85 35 40 45 50 55 60 65 70 75 80 85 -20
40 45 50 55 60 65 70 75 80 85
One-Step Probability Recursive Residuals N-Step Probability Recursive Residuals
Recursive C(1) Estimates ± 2 S.E.

1.8

1.6

1.4

1.2

1.0

0.8

0.6

0.4
40 45 50 55 60 65 70 75 80 85

Recursive C(2) Estimates ± 2 S.E.

QUADRO 28 - TESTE DE CO-INTEGRAÇÃO DE JOHANSEN PARA O PERÍODO [1932-1989]


Series: LDESPG LPIB
Lags interval: 1 to 1
Likelihood 5 Percent 1 Percent Hypothesized
Eigenvalue Ratio Critical Value Critical Value No. of CE(s)
0.365199 34.52503 19.96 24.60 None **
0.131351 8.167308 9.24 12.97 At most 1
*(**) denotes rejection of the hypothesis at 5%(1%) significance level
L.R. test indicates 1 cointegrating equation(s) at 5% significance level
LDESPG LPIB C
1.000000 -1.182363 5.519169
(0.04534) (0.97724)

Log likelihood 173.4672

A equação de co-integração e o VECM revelam que a elasticidade-PIB de longo e de


curto prazos da despesa pública são, respectivamente, de 1,2 e 0,73. Isto significa que no
curto prazo, uma queda no nível de atividade econômica leva a uma redução menos do que
proporcional na despesa do governo. Um resultado esperado, pois há uma inércia dos gastos
públicos. No longo prazo, porém, as despesas respondem de maneira elástica ao
comportamento do produto. Um aumento de 1% no PIB eleva os gastos públicos em cerca de
1,2%.
274

QUADRO 29 - EQUAÇÃO DE CO-INTEGRAÇÃO E VECM PARA LDESPG E LPIB


NO PERÍODO [1932-1989]
Sample: 1932 1989
Included observations: 58
Standard errors & t-statistics in parentheses
Cointegrating Eq: CointEq1
LDESPG(-1) 1.000000

LPIB(-1) -1.169172
(-50.5411)

C 4.833785
Error Correction: D(LNDESPG) D(LNPIB)
CointEq1 -0.273777 0.121664
(-2.01185) (2.06367)

D(LDESPG(-1)) -0.320780 -0.066059


(-2.42291) (-1.15171)

D(LPIB(-1)) 0.725031 0.325876


(2.44625) (2.53791)

C 0.048494 0.043876
(2.47122) (5.16099)
R-squared 0.312824 0.139928
Adj. R-squared 0.274648 0.092146
b3) período [1990-2003] foram estimadas uma equação de co-integração e a
correspondente representação VECM. Todavia, em razão do fraco número de observações
disponíveis para este último período, os resultados devem ser considerados como
preliminares.

QUADRO 30 - ESTIMAÇÃO DE LDESPG PARA O PERÍODO [1990-2003]


Dependent Variable: LDESPG
Method: Least Squares
Sample: 1990 2003
Included observations: 14
Variable Coefficient Std. Error t-Statistic Prob.
C -10.95670 2.563587 -4.273974 0.0011
LPIB 1.477047 0.123722 11.93840 0.0000
R-squared 0.922343 Mean dependent var 19.64802
Adjusted R-squared 0.915871 S.D. dependent var 0.167106
S.E. of regression 0.048469 Akaike info criterion -3.084217
Sum squared resid 0.028191 Schwarz criterion -2.992923
Log likelihood 23.58952 F-statistic 142.5253
Durbin-Watson stat 2.455403 Prob(F-statistic) 0.000000
O coeficiente estimado na equação de co-integração (Quadros 30, 31 e 32) mostra que,
nos anos 90, a elasticidade dos gastos públicos à evolução do PIB aumentou com relação ao
período precedente, passando de 1,2 para 1,6. O mesmo pode ser constatado com a
elasticidade de curto prazo que passa de 0,73 no período [1932-1989] para 0,92 no período
atual [1990-2004]. A hipótese explicativa seria a de que as transformações estruturais dos
anos 90 levaram a um aumento da sensibilidade das despesas do governo à dinâmica do
275

crescimento econômico. O regime fisco-financeiro passou a se orientar segundo o preceito


neoliberal de gastar apenas o que se arrecada e diversos expedientes político-ideológicos,
bem como normativos (lei de responsabilidade fiscal)209 foram mobilizados para conter os
gastos governamentais. Esses resultados sugerem a vigência de um Estado mais
parcimonioso, cujos gastos agora devem adequar-se às receitas efetivamente disponíveis na
execução do orçamento público.

QUADRO 31 - TESTE DE CO-INTEGRAÇÃO DE JOHANSEN PARA O PERÍODO [1990-2003]


Series: LDESPG LPIB
Lags interval: 1 to 1
Likelihood 5 Percent 1 Percent Hypothesized
Eigenvalue Ratio Critical Value Critical Value No. of CE(s)
0.766933 21.11387 15.41 20.04 None **
0.050390 0.723848 3.76 6.65 At most 1
*(**) denotes rejection of the hypothesis at 5%(1%) significance level
L.R. test indicates 1 cointegrating equation(s) at 5% significance level
Normalized Cointegrating Coefficients: 1 Cointegrating Equation(s)
LDESPG LPIB C
1.000000 -1.561860 12.71937
(0.06399)

Log likelihood 61.43830

209
Segundo J.M. PEREIRA(2003, p. 183), a Lei de Responsabilidade Fiscal (LRF) de maio de 2000, apresenta-
se como um código de conduta para os administradores públicos ao nível federal, estadual e municipal. Esta lei
fixa limites para as despesas com pessoal e para a dívida pública e determina que sejam criadas metas a serem
seguidas para um maior controle de despesas e receitas. Uma das conseqüências deste dispositivo normativo foi
atrelar a evolução das despesas às receitas efetivamente disponíveis.
276

QUADRO 32 - EQUAÇÃO DE CO-INTEGRAÇÃO E VECM PARA LDESPG E LPIB


NO PERÍODO [1990-2000]

Sample: 1990 2003


Included observations: 14
t-statistics in parentheses
Cointegrating Eq: CointEq1
LDESPG(-1) 1.000000

LPIB(-1) -1.679176
(-22.4158)

C 15.14810
Error Correction: D(LDESPG)
CointEq1 -0.786193
(-4.48914)
D(LDESPG(-1)) 0.051202
(0.36733)
D(LDESPG(-2)) -0.008619
(-0.05851)

D(LDESPG(-3)) 0.249901
(1.75380)

D(LPIB(-1)) 0.915326
(2.65846)

D(LPIB(-2)) 0.391736
(1.35885)

D(LPIB(-3)) -1.693944
(-5.07404)

C 0.029222
(1.71561)
R-squared 0.950344
Adj. R-squared 0.892413

Nos anos 90 observa-se uma elevação da participação das despesas primárias do


Governo no PIB (Gráfico 52). Mas esse aumento é decorrente das baixas taxas de crescimento
econômico concomitantemente a uma certa rigidez nos gastos públicos. O Gráfico 48 já
mostrava uma elevação dos gastos em funcionalismo e em bens e serviços ao longo dessa
década.
277

GRÁFICO 52 EVOLUÇÃO DAS DESPESAS PRIMÁRIAS DO GOVERNO E DO PIB (1900-2003)

DESPG(L)
PIB(L)
DESPG em percentagem do PIB
50.000 45%
Índice dos Valores a preços de 2000

25.000 40%
( 1900 = 100) - Escala Log

35%
07.500
05.000 30%
02.500
25%

0750 20%
0500
15%
0250
10%
075 5%
1900
1903
1906
1909
1912
1915
1918
1921
1924
1927
1930
1933
1936
1939
1942
1945
1948
1951
1954
1957
1960
1963
1966
1969
1972
1975
1978
1981
1984
1987
1990
1993
1996
1999
2002
FONTE: Séries originais obtidas em Estatísticas do Século XX IBGE, Rio de Janeiro.
NOTA: DESPG é a despesa primária do setor publico. Séries deflacionadas pelo deflator implícito do PIB.

4.2.9 Síntese dos principais resultados

A análise da evolução da FI do Estado no Brasil permite as seguintes constatações:

i. Alta regressividade e expansão da carga tributária - uma característica do regime


fisco-financeiro brasileiro que se manteve praticamente inalterada ao longo de todo o
século 20, é a sua elevada regressividade. A predominância da tributação indireta,
numa estrutura econômica caracterizada pela alta concentração da renda e da
propriedade, reforça os fatores de desigualdade e seus efeitos adversos sobre a
macrodinâmica da acumulação de capital e do crescimento econômico. Após uma
fase de crescimento entre 1918-1970, a carga tributária estaciona em 25% do PIB até
1993. No período pós-Real, a carga tributária entra numa nova fase de expansão,
atingindo 36% do PIB em 2003.

ii. Estruturas de bem-estar incompletas - a tendência de evolução da forma institucional


do Estado, e de seu correspondente regime fisco-financeiro, tem sido no sentido de
priorizar as demandas diretas da acumulação de capital, adiando ou reduzindo ao
mínimo a satisfação das demandas sociais. Estas últimas se transformam em variáveis
de ajuste quando se trata de viabilizar o equilíbrio das contas públicas e garantir a
278

credibilidade do Governo junto aos organismos internacionais e ao capital


financeiro internacional. Metade das relações de emprego permanece fora do sistema
oficial de seguridade social, em razão do elevado nível de informalidade, do
desemprego e da ausência de políticas efetivas e abrangentes de proteção social;

iii. Endividamento público muito elevado a partir do regime político autoritário pós-
1964, o endividamento público entrou numa trajetória persistente de expansão cujas
conseqüências macroeconômicas tornar-se-iam explícitas nos anos 80. Todavia, no
período pós-Real, a dívida se eleva em função da lógica deste plano de estabilização
de preços que em sua primeira fase baseou-se na manutenção de taxas de câmbio
sobrevalorizadas combinadas com taxas de juros reais extremamente onerosas aos
cofres públicos;

iv. Reduzida autonomia da política econômica quando nos anos 90, a ideologia da
globalização neoliberal aprofunda a abertura comercial e financeira, a autonomia da
política econômica reduz-se drasticamente. Pressionado pelo grande capital bancário-
financeiro no plano nacional e internacional, o Estado vai priorizar o equilíbrio das
contas públicas e a gestão das dívidas interna e externa, passando a questionar
sistematicamente a eficácia das políticas industriais e de desenvolvimento econômico;

v. Caráter ambíguo do Estado no que concerne à taxonomia do Estado quanto às


formas de intervenção e presença na economia, sua caracterização como um État-
inseré (ANDRÉ, 2002) deve ser considerada com cautela. Historicamente, a
economia e sociedade brasileiras emergiram sob estruturas político-administrativas
derivadas das práticas mercantilistas e do patrimonialismo metropolitano. A evolução
das instituições públicas foi marcada pelo caráter excludente e autoritário desde o
período colonial. Conseqüentemente, controles administrativos, intervenções de
política econômica e participação direta do governo nas estruturas de produção e de
distribuição foram expedientes comuns na evolução de longo prazo das relações
Estado-economia. Essas ações não podem ser consideradas típicas do século 20, nem
exclusivas de um Estado moderno funcionando numa economia industrial. A análise
histórica e institucionalista desenvolvida neste capítulo sugere a vigência de um
Estado presente tanto direta quanto indiretamente na reprodução do capital, mas
preponderantemente voltado para as dimensões imediata e estritamente econômicas
deste processo. Ao longo do último século, a forma institucional do Estado
transformou-se significativamente em função das novas necessidades do
279

desenvolvimento econômico sem contudo superar seu caráter excludente e coercitivo


para a grande maioria da população. A disjunção entre o Estado e a sociedade civil,
ou seja, a enorme distância entre a sociedade representada e a sociedade real, ainda
permanece em níveis incompatíveis com as estruturas típicas de uma democracia
moderna. Trata-se, sem dúvida, de um Estado inserido ; porém; muito mais para o
capital e muito menos para o trabalho.

vi. Gastos reduzidos de legitimação - a análise em termos de regulação deve considerar


as modalidades pelas quais o Estado, através de um regime político, define suas
formas de legitimidade e assume-se como Estado de Direito. Neste contexto, os
gastos sociais integram de forma significativa as despesas de legitimação e de
reprodução dos regimes fisco-financeiros. É este o caso observado nos países
desenvolvidos. Todavia, como já haviam constatado AFONSO e SOUZA (1977), a
participação dos gastos sociais no orçamento estatal no Brasil é extremamente
reduzida quando comparada às participações das rubricas diretamente relacionadas à
acumulação do capital.

vii. Hierarquia e complementaridade da forma institucional do Estado somente após a


análise da evolução das outras formas institucionais poder-se-ia explicitar o lugar do
Estado na arquitetura institucional que define um modo de regulação. No entanto, a
este nível da análise é possível propor a seguinte hipótese a ser testada ao longo deste
trabalho: o Estado ocupa o lugar de forma institucional hierarquicamente superior
(FIHS) até finais dos anos 70. Nos anos 80, a alta inflação e o endividamento público
convertem-se no suporte da acumulação bancária e financeira, elevando o regime
monetário-financeiro à condição FIHS e subordinando o Estado brasileiro. Com a
abertura comercial e financeira, na década de 90, novos fatores reforçam a mudança
de hierarquia, mas agora conjugando as pressões das finanças internacionais e
nacionais que possuem na dívida pública a base para uma acumulação rentista. Em
conseqüência, o regime de política econômica muda, passando a responder aos novos
condicionantes impostos pela lógica financeira. Surgem então os imperativos de
credibilidade ; fundamentos econômicos ; avaliação do risco-país e demais
indicadores restritos do ponto de vista econômico, já que centrados basicamente na
lógica bancária e financeira de curto prazo. Neste contexto, a política econômica
volta-se prioritariamente para o controle da inflação, porquanto se trata de preservar a
rentabilidade dos capitais aplicados no financiamento das dívidas interna e externa e
280

ao mesmo tempo reduzir seus custos de entrada e de saída do mercado financeiro


brasileiro. Conseqüentemente, a subordinação da forma institucional do Estado
brasileiro torna-se tanto a premissa quanto o resultado do atual modelo econômico ;

viii. A evolução das receitas públicas por período:

a. [1900-1926]: a receita tributária apresenta-se dependente das importações,


revelando a vigência de um regime fisco-financeiro fracamente conectado à
produção interna;

b. [1928-1960]: o regime fisco-financeiro mostra-se agora fortemente conectado


à produção interna e às necessidades da acumulação de capital de base
industrial;

c. [1962-2000]: não há estabilidade da relação estimada entre receitas públicas e


o PIB. Todavia, no subperíodo [1966-1989], o modelo estimado apresentou
estabilidade por quase todos os testes de mudança estrutural. Trata-se do
regime fisco-financeiro correspondente ao milagre econômico brasileiro e
que resultou das transformações institucionais promovidas pelo PAEG (1964-
1966). Apresenta-se fortemente conectado à evolução do PIB. Os coeficientes
relativos ao comércio exterior não são estatisticamente significativos. No
subperíodo subseqüente [1990-2000], o modelo estimado não se revelou
estatisticamente significativo.

ix. A evolução das despesas públicas por período:

a. [1900-1931]: trata-se de uma fase marcada por transformações econômicas e


políticas (institucionalização da República Velha, eclosão da Primeira Guerra
Mundial, Crise de 1929 e Revolução de 1930) que se expressam em grande
instabilidade estrutural do regime fisco-financeiro;

b. [1932-1989]: a equação de co-integração e o VECM revelam que a


elasticidade-PIB de longo e de curto prazos são, respectivamente, de 1,2 e de
0,73, revelando que há certa rigidez dos gastos púlicos no curto prazo. No
longo prazo, as despezas públicas respondem de maneira elástica ao PIB;

c. [1990-2003] nos anos 90, a elasticidade-PIB dos gastos públicos aumentou


com relação ao período precedente de economia fechada, passando de 1,2 para
1,6. O mesmo aconteceu com a elasticidade de curto prazo que passa de 0,73
281

para 0,92. Este fato pode ser um indicador de que as transformações


estruturais dos anos 90 levaram a um aumento da sensibilidade das despesas
governamentais à dinâmica do crescimento econômico. O regime fisco-
financeiro passou então a orientar-se segundo o preceito neoliberal (e
microeconômico) de gastar apenas o que se arrecada e diversos expedientes
políticos-ideológicos, bem como normativos (Lei de Responsabilidade Fiscal,
por exemplo) foram mobilizados. Os resultados apontam para a vigência de
um Estado mais parcimonioso, cujos gastos devem limitar-se às
disponibilidades efetivas.

4.3 A wage-labor nexus: flexibilidade e institucionalização incompleta

«O trabalho assalariado constitui uma condição necessária


para a formação de capital e se mantém como premissa
necessária e permanente da produção capitalista»
(Marx, Capítulo VI, inédito, de O Capital)

« Il est essencial de remarquer que la partition sur l espace


de la valeur, opérée par le rapport salarial dans sa
détermination générale, est le fondement théorique d une
macroéconomie. »
(Aglietta, Régulation et Crises du Capitalisme,
p.65, deuxième édition, 1997)

4.3.1 O rapport salarial como sistema de relations salariales


A wage-labor nexus (WLN), ou rapport salarial, pode ser definida como uma
determinada configuração institucionalizada dos vínculos entre capital e trabalho assalariado,
em suas duas dimensões fundamentais: como relação de distribuição primária da renda (a
divisão salário-lucro) e como relação de produção (as formas organizacionais210 do processo
de trabalho). E desde que o trabalho assalariado é a principal relação social de produção e
apropriação nas economias que se organizam sob os diversos capitalismos, as formas de
organização da produção e os sistemas de remuneração que lhes são associados tornam-se
cruciais para explicar a direção e a velocidade da mudança técnica, bem como o grau de
equidade na distribuição da renda (BOYER, 2002). Conforme este autor:

210
Conforme definição explicitada no capítulo 2, as formas organizacionais do trabalho correspondem ao modo
como o coletivo de trabalhadores é distribuído e organizado no lócus produtivo, com vistas a implementar os
objetivos da valorização do capital. Esta dimensão da WLN tem sido muito enfocada nos trabalhos de CORIAT
e demais regulacionistas que se dedicam a análise das transformações dos sistemas sócio-técnicos de produção.
Na presente análise, serão privilegiados os aspectos ligados à dimensão da WLN como relação social global de
repartição do valor adicionado. Sua dimensão produtiva será destacada apenas nos momentos em que se tornar
necessária ao desenvolvimento da análise.
282

La notion de rapport salarial éloigne de l économie pure pour plonger les


déterminants du salaire, de la productivité et de l emploi dans un contexte
institutionnel, lui-même reflet des conflits et des crises structurelles
passées »211.
E em « Lien salaire/emploi dans la thérie de la régulation », BOYER (1998) observa
que :

« Les formes institutionnelles se définissent comme codification des rapports


sociaux fondamentaux constitutifs d une économie capitaliste. Les études
historiques ont mis au premier plan l une d entre-elles, le rapport salarial,
défini comme modalité d organisation de leur mode de vie. Cette forme est
bien sûr centrale pour la nature des relations entre salaire et emploi. En effet,
chaque principe de division du travail induit un certain type de changement
techniqye et donc d évolution de la productivité. »
Conseqüentemente, como visto nos capítulos 1 e 2, a relevância teórica e empírica
deste conceito reside no fato de que para as economias capitalistas, a forma vigente da WLN é
um elemento fundamental na macrodinâmica de um regime de acumulação, determinando, em
grande medida, a forma como a distribuição afeta o crescimento econômico.

Todavia, não deve haver confusão entre as noções conexas de rapport salarial e de
relation salariale. O conceito de rapport salarial possui estatuto teórico e aplicabilidade
principalmente macroeconômicos. Já a noção de relation salarial corresponde à projeção da
primeira no plano mais imediato dos atores concernentes212. Portanto, a WLN é um conceito-
síntese, resultado macroeconômico da conjugação de sistemas de relações salariais que
operam a nível setorial ou da empresa individualmente considerada. Esta diferenciação
conceitual é relevante porque cada empresa ou setor individualmente considerado possui seu
próprio sistema de relações salariais213. Mas, este sistema resulta da combinação de regras

211
BOYER, em Théorie de la Régulation l état des savoirs, 1995.
212
Essa diferenciação é já um desenvolvimento da Teoria da Regulação, pois como observa BOYER (1995, p.
111), le rapport salarial a donc donnée naissance par filiation à um système articulé de notions , como esta
de relation salariale, que visa estabelecer um elo de ligação entre o nível micro e macroeconômico. Portanto, a
tradução corrente no Brasil do conceito de rapport salarial por relação salarial é justificável para os trabalhos
anteriores a essa precisão teórica da abordagem regulacionista. Todavia, como não existe em língua portuguesa
um vocábulo que possa diferenciar essas duas noções, para se evitar qualquer confusão, optou-se por manter a
tradução inglesa wage-labor nexus(WLN) utilizada nos trabalhos de BOYER (1988,1995,1998).
213
O presente trabalho não abordará o sistema de relações salariais vigentes no setor público brasileiro, pois seu
principal objeto de análise situa-se no nível macroeconômico. Justifica-se, portanto, a ênfase na wage-labor
nexus e em seus dois eixos fundamentais: o segmeno formal e o informal. Uma análise detalhada do emprego
público no Brasil pode ser encontrada em E. D. P. CARVALHO FILHO, A Evolução do Emprego Público no
Brasil nos Anos 90 , Tese de Doutoramento, Unicamp. Conforme este autor, o Brasil apresenta a segunda menor
proporção de emprego público no emprego total (11,3%), perdendo apenas para o Japão (7%) e a quinta menor
proporão em relação à população (5,1%). Por esses dois critérios, conclui-se que o emprego público na economia
brasileira possui de fato dimensão reduzida quando comparada às experiências internacionais. Inclusive de
países de tradição mais liberal como os EUA e a Inglaterra.
283

sociais que derivam da wage-labor nexus, na qual ele está inscrito, com regras que são
específicas da empresa214. Conforme BILLAUDOT (1996, p. 86):

(...) une place est faite au système des relations salariales propres à
chaque entreprise. Ce système est un rapport social dual : il combine
des règles sociales, qui dérivent du rapport salarial dans lequel il
s inscrit, et des règles particulières. On ne le confond plus alors avec le
dit rapport salarial, précisément défini comme un rapport social global.
Já a noção de relação capital-trabalho, comumente utilizada em economia, não se
reporta a nenhuma abordagem ou teoria em particular e conseqüentemente seu estatuto teórico
e aplicabilidade podem variar muito.

QUADRO 33 RELAÇÃO CAPITAL-TRABALHO, WAGE-LABOR NEXUS E RELAÇÃO SALARIAL:


UMA COMPARAÇÃO ENTRE TRÊS NOÇÕES
APLICAÇÃO E
CONCEITOS DEFINIÇÃO
ESTATUTO TEÓRICO
se define pela vinculação pode ser aplicado no âmbito
entre capital e trabalho da economia pura ou não
assalariado, como nível de análise pode variar
pressuposto do processo
Relação capital-trabalho capitalista de acumulação
não especifica,
necessariamente, os
elementos concretos dessa
vinculação

se define pela não se aplica no âmbito da


complementaridade das
economia pura
instituições que codificam os
Wage-Labor Nexus ou Rapport
vínculos entre capital e nível macroeconômico de
Salarial trabalho assalariado
análise
forma particular e
institucionalizada da relação
capital-trabalho
se define na interseção entre não se aplica no âmbito da
Relation Salariale (relação as regras que derivam da economia pura
WLN com as regras que são nível setorial e
salarial)
próprias à empresa, ao ramo microeconômico
ou ao setor de atividade

FONTE: Elaboração própria.

214
Conforme BOYER e SAILLARD(2002, .p.70), la notion de rapport salarial a suscité des débats théoriques
d autant plus importants que son fondement initial n était autre que la théorie marxiste de l exploitation qui est
loin de constituer une réference majoritaire dans les années quatre-vingt-dix. La théorie privilégie aujourd hui
la question des relations entre pouvoir, nature du compromis salarial et déterminants institutionnels du partage
salaire/profit. Sur un tout autre plan, lorsque des enquêtes de terrain ont voulu utiliser cette notion, il est vite
apparu qu elle était inadéquate pour rendre compte de la logique des acteurs au niveau des firmes et des
esapces professionnels, au point de susciter le recours à d autres conecpts : relation salariale, système d emploi,
rapport social de travail on ainsi été avancé pour rendre compte de la diversité des status et des composantes
qui conduisent au plan macroéconomique aux régulatités étudiés en termes de rapport salarial. »
284

O Quadro 33 permite uma comparação entre os conceitos de relação capital-trabalho,


wage-labor nexus e relação salarial, precisando o estatuto teórico de cada um deles.215

Neste trabalho, a ênfase recairá sobre a evolução da WLN, considerando-se que o


principal objeto desta análise é de natureza macroeconômica. As dimensões próprias às
relações salariais serão passíveis de consideração apenas quando o desenvolvimento da
pesquisa assim o exigir.

4.3.2 Condicionantes históricos da constituição do salariado216 no Brasil


Em uma análise da evolução de longo prazo dessa forma institucional de base, os
condicionantes históricos do processo de constituição das relações salariais devem ser
explicitados. As condições de emergência e generalização do salariado no Brasil remontam à
segunda metade do século XIX e foram fortemente marcadas pela crise da economia
escravista agrário-exportadora. Destacam-se:

a) o esgotamento e crise das relações de trabalho escravo;

b) a expansão do complexo agrário-exportador cafeeiro;

c) a imigração européia217;

A conjunção desses três fatores permitiu o desenvolvimento das relações monetárias e


financeiras e do mercado interno, superando uma restrição endógena secular: o baixo
coeficiente de monetização da economia escravista primário-exportadora.

Uma outra questão importante refere-se à participação do Estado na constituição das


relações salariais. Além da promoção da imigração para suprir a demanda crescente de força
de trabalho, o governo estabelece medidas legais que restringem o acesso à terra. Em um país
onde o fator terra é abundante, em razão de suas dimensões continentais, havia sempre a
possibilidade de se tornar posseiro por simples ocupação de áreas devolutas ou sem

215
Por exemplo, quando essa noção é mobilizada nos quadros de uma análise marxista difere muito do conteúdo
que adquire em análises keynesianas ou neoclássicas. Por outro lado, a relação capital-trabalho pode também
expressar a razão capita fixo/pessoal ocupado na produção ou seja, a chamada intensidade do capital.
216
O vocábulo salariado não é muito utilizado no Brasil, mas existe em português segundo o dicionário
Houaiss. O mais comum é substituí-lo por assalariado . Todavia, este último se refere mais propriamente à
pessoa sujeita a uma relação de trabalho por assalariamento. Mas o vocábulo salariado é exatamente o que
corresponde em língua francesa à salariat , isto é, o conjunto de indivíduos sujeitos às relações salariais.
217
Conforme M. BRUNO (2002, p. 5), « cette immigration était constituée en grande majorité d italiens, mais,
dans le tournant entre les XIXe et XXe siècles, la région Sud a accueilli un important contingent d immigrants
d autres nationalités, notamment de suisses, de polonais et d allemands. Dans les années 40 et 50, arriveront
des japonais, aussi bien dans la région métropolitaine de São Paulo que dans le sud du Brésil. »
285

proprietário legal.218 Segundo SANDRONI (2003), para impedir essa alternativa, o Estado
promulga a Lei de Terras de 1850. Com esse dispositivo legal, a classe dominante visava a
alcançar três objetivos, todos eles confluindo para a obtenção, por parte dos fazendeiros, de
mão-de-obra abundante e barata:

proibir a aquisição de terras que não se desse por meio de compra, extinguindo,
portanto, o regime de posses;

aumentar o preço da terra e dificultar a sua obtenção por parte dos trabalhadores
rurais, visando a impedir a redução da oferta de força de trabalho na agricultura e,
conseqüentemente, a elevação dos salários;

os recursos obtidos com a venda das terras seriam destinados ao financiamento da


imigração de trabalhadores, com a finalidade de ampliar a oferta de força de trabalho
e impedir que os salários se elevassem.

A motivação básica dessa lei era precisamente impedir o acesso à terra num contexto de
crise do escravismo no Brasil. SANDRONI (2003) observa ainda, que:

Os proprietários de terra de São Paulo, e também de outras regiões onde a


agricultura se expandia com intensidade, estavam conscientes de que, se os
homens passassem a ser livres (com a abolição da escravatura), o acesso à
terra deveria deixar de sê-lo .
Segundo um processo similar ao dos enclosers britânicos, tratava-se, com efeito, de
mobilizar o poder estatal para acelerar a constituição do mercado de trabalho e o
aprofundamento das relações salariais. Três lições podem ser extraídas deste contexto:

a expansão das relações de emprego assalariado e, mais amplamente, da wage-labor


nexus, foi impulsionada no Brasil pelo poder do Estado através de mecanismos
institucionais deliberadamente concebidos para forçar os indivíduos livres a se
sujeitarem às formas vigentes de assalariamento. Em vista do reduzido coeficiente de
monetização da economia primário-exportadora de base escravista, a moeda não

218
Os documentos históricos confirmam que uma parte significativa da população brasileira conseguira escapar
tanto das agruras da escravidão (durante os períodos colonial e imperial) quanto do salariado (na virada do
século XIX para o XX), simplesmente se deslocando para as regiões ainda despovoadas do interior do Brasil e
onde o controle estatal era dificultado pelas enormes distâncias. Núcleos dispersos de ocupação baseados em
uma economia de subsistência puderam se desenvolver à margem dos centros econômicos mais dinâmicos. Mais
detalhes dessa questão podem ser encontrados em FLAMARION CARDOSO (1986), O Trabalho na Colônia, in
História Geral do Brasil.
286

poderia exercer ainda um papel determinante na constituição do salariado.219 Mas à


medida que o capital mercantil agrário-exportador se expandia, aprofundavam-se as
relações salariais e a monetização da economia, criando as bases para o processo de
industrialização;

O reverso dessa impulsão estatal, de caráter classista, no processo de constituição das


relações salariais foi a intensificação do conflito distributivo e a tendência recorrente
para resolvê-lo em favor do capital e em detrimento do trabalho. Dada a excessiva
concentração dos meios de produção em particular da propriedade da terra e a
oferta abundante de trabalhadores livres e pouco organizados, os salários são
submetidos a uma pressão contínua à baixa. 220 A legislação, restringindo o acesso à
terra, promove e sanciona este processo. Simultaneamente, ela permite adiar uma
ampla reforma agrária que certamente teria fortalecido o salariado e os sindicatos em
face de uma expansão capitalista excludente e sujeita, de forma recorrente, às
restrições externas; 221

Diferentemente do salariado que emergiu de sociedades outrora feudais, as economias


de base escravista deixaram seqüelas profundas no processo de emergência e
institucionalização da WLN. Quando não retardavam o desenvolvimento das
instituições democráticas de regulação do mercado de trabalho , as influências
culturais e políticas herdadas do passado escravocrata terminavam moldando-as
segundo as prerrogativas de um aparelho de Estado muito pouco representativo das
classes populares. Não se trata, todavia, de se focalizar o problema das mentalidades
ou de uma ideologia retrógrada que se reproduz através das deficiências das
instituições democráticas. É suficiente ter em conta que a emergência do salariado
industrial a partir de estruturas produtivas anteriormente fundadas sobre relações de
trabalho compulsório tende a distorcer ou dificultar o processo de institucionalização
do rapport salarial. Em primeiro lugar, a constituição dos sistemas de pagamento se
choca com barreiras endógenas que não são superadas por simples mecanismos de

219
Para AGLIETTA (1997), a moeda institui os sujeitos da relação mercantil e das relações salariais. Os
indivíduos detentores de moeda são precisamente aqueles que tem o poder de assalariar: le pouvoir d une classe
sociale sur une autre que le rapport salarial établit, c est le pouvoir de l argent .
220
Segundo R. SIMONSEN (1973), em 1938, cinqüenta anos após a abolição da escravatura no Brasil, o salário
de um trabalhador, em várias regiões do norte e nordeste do país, era inferior às despesas necessárias à
manutenção de um escravo durante os últimos anos do Império.
221
O atual movimento dos sem-terra o MST que já possui notoriedade internacional, não é outra coisa que
o resultado de cinco séculos de latifúndio.
287

mercado, sobretudo, se for suposta a anterioridade da moeda como condição de seu


funcionamento.222 E era neste contexto que o processo de industrialização brasileira
emergia e tinha de enfrentar dois grandes obstáculos seculares que se reforçavam
mutuamente: o reduzido coeficiente de monetização da economia primário-
exportadora baseada em trabalho compulsório e seu elevado coeficiente de
importações.223 A conclusão direta é que, neste tipo de economia, a mobilização do
poder do Estado se impõe como única alternativa social e economicamente viável para
impulsionar o processo de constituição dos sistemas de relações salariais e das novas
bases produtivas industriais.

Em conseqüência, a constituição do salariado e a formação do capital industrial na


economia brasileira foram amplamente impulsionados e configurados pelo intervencionismo
estatal, tanto sob regimes políticos autoritários quanto sob regimes democraticamente
instituídos. E é por isso que a institucionalização da WLN compreendida como o conjunto
de dispositivos normativos e organizacionais que codificam o sistema vigente de relações
salariais aparece, no caso brasileiro, como um atributo fortemente condicionado pelo caráter
classista e excludente das intervenções estatais. Na medida em que o controle do aparelho
burocrático estatal e das instituições jurídico-normativas permanecia sob o controle do grande
capital e das classes dominantes, os padrões de intervenção e presença do Estado na regulação
da WLN tornavam-se muito pouco representativo das necessidades efetivas das classes
trabalhadoras. Esta constatação justifica o fato de se ter iniciado na seção ... a análise da
evolução das formas institucionais pelas relações Estado-economia.

Todavia, a comparação com outras experiências de industrialização e de construção do


rapport salarial, nas quais o Estado participou ativamente, não deve se abstrair dos
determinantes históricos específicos de uma economia marcada pelo trabalho compulsório
durante 388 dos seus 504 anos de existência. Essas diferenças qualitativas que decorrem das
particularidades do Estado brasileiro vão condicionar decisivamente tanto a evolução da WLN
quanto à do modo de regulação que lhe corresponde. Por exemplo, há diferenças de conteúdo
entre a régulation de type publique definida por BOYER (1988, p.18 e 19) e a regulação de
tipo brasileiro. Em razão do caráter predominantemente arbitrário das relações Estado-
222
Que é precisamente a posição de AGLIETTA (1997), ao argumentar que a moeda é a instituição que funda a
economia mercantil capitalista. Todavia, a posição defendida neste trabalho, e exposta nos capítulos precedentes,
considera que a anterioridade da moeda (e dos mercados) é apenas uma condição necessária mas não suficiente
para a emergência do capitalismo. É o rapport salarial a instituição determinante, pois o trabalho assalariado é a
relação que efetivamente singulariza o modo capitalista de produção na história.
223
As obras de Celso FURTADO e de Caio PRADO JR já apontavam para essa restrição estrutural característica
da economia pré-industrial brasileira.
288

economia ao longo da história brasileira, a lei e o excesso de formalismo tendem a suprimir


ou bloquear os ajustamentos e fatores de coordenação espontâneos entre os atores sócio-
econômicos e mais especificamente entre capital e trabalho224. Um dos resultados diretos é a
dificuldade de emergência ou estabilidade de novos compromissos institucionalizados
necessários tanto à reconfiguração da WLN quanto das demais formas institucionais. Se de um
lado o Estado encontra-se inserido na esfera econômica, de outro, a fraca representatividade
social tem impedido a codificação efetiva das demandas das classes populares no seio do
modo de regulação.

4.3.3 As configurações-tipo da WLN em dois modelos teóricos


Em função da época histórica ou do espaço geográfico sob análise, a WLN pode
apresentar-se como variantes de duas configurações-tipo:

a) uma WLN concorrencial pode ser observada quando o consumo dos trabalhadores
assalariados ainda não se apresenta plenamente inserido na produção capitalista (forma
predominante no século XIX) ou quando a formação dos salários ocorre basicamente
por mecanismos de mercado (regiões ou países onde os trabalhadores e suas
associações possuem fraco poder de barganha e os salários refletem as tensões entre
oferta e demanda por força de trabalho). Num tal contexto, não há divisão ex ante dos
ganhos de produtividade, mas determinação concorrencial dos salários e o nível de
contratualização ou de institucionalização das relações de emprego tende a ser muito
baixo;

b) uma WLN não-concorrencial pode ser identificada quando os mecanismos de


formação dos salários escapam, pelo menos parcialmente, às influências diretas do
mercado de trabalho225. Neste caso pode-se observar a vigência de um conjunto de
regras, convenções e instituições que respondem pela codificação dos vínculos entre
capital e trabalho, estabelecendo, entre outras implicações, alguma forma de divisão ex
ante dos ganhos de produtividade e de recomposição do poder aquisitivo diante de
perdas inflacionárias.

224
Espontâneos não significa admitir, neste contexto, que sejam gerados por mecanismos exclusivamente
mercantis. Significa que seriam mais independentes dos regulamentos estatais e capazes de refletir ou serem o
resultado de convenções, regras tácitas e demais formas de relacionamento mais consentâneas com as
necessidades dos atores sociais e econômicos.
225
Como em Keynes, a teoria da regulação não apreende o mercado de trabalho como um mercado de fato.
Mas o conceito é utilizado em razão de seu uso corrente na literatura econômica sem que isto signifique que se
esteja apreendendo as relações de emprego como relações puramente mercantis, onde as convenções, regras ou
instituições surgiriam muito mais como fatores de perturbação ou geradores de rigidez.
289

Em termos gerais, o primeiro tipo de WLN caracteriza-se por grande flexibilidade


quantitativa e salarial, contrariamente ao segundo tipo. Todavia, a WLN não concorrencial
mostra-se mais apta a outros níveis ou dimensões de flexibilidade internas à empresa
(polivalência ou multifuncionalidade, remuneração flexível em função do faturamento, mas
com estabilidade das relações de emprego, etc.)226. Entre esses dois casos teóricos polares, as
economias reais podem engendrar configurações intermédias em função do grau de
informalidade das relações de trabalho, das interdependências dos sistemas técnico-produtivos
com os sistemas de remuneração, dos padrões de presença e intervenção do Estado ou mesmo
de fatores quantitativos que dependem do contingente de força de trabalho disponível face às
necessidades da acumulação de capital227.

Um modelo simples para a formação dos salários, dado pela equação (6), pode
representar esses tipos básicos da wage-labor nexus, em função dos valores dos parâmetros
referentes à produtividade, a indexação ao custo de vida e às influências do nível de emprego:

WR= k.PR + .P + .N (6)


onde WR é o salário médio real; PR é a produtividade do trabalho; P é o nível geral de preços
e N é o nível de emprego.

Se k = 0; =0e > 0 tem-se uma formação predominantemente concorrencial dos


salários, caracterizando a vigência de uma WLN concorrencial. Neste caso, são as
tensões entre a oferta e a demanda de força de trabalho o principal fator de
determinação dos salários;

Se k > 0; > 0 e = 0 então se trata de uma WLN fundamentalmente não-


concorrencial, pois há indexação dos salários à evolução dos ganhos de produtividade
e influência não significativa das tensões do mercado de trabalho .

Mas mesmo que o parâmetro seja estatisticamente maior do que zero, caso em que
há algum grau de indexação dos salários à evolução do índice geral de preços, isto não é
suficiente para eliminar o caráter concorrencial da WLN. É este o caso da WLN na economia
brasileira durante o período de alta inflação, marcado pela generalização dos dispositivos
institucionais de indexação dos salários à evolução do índice geral de preços.

226
Exemplos comuns na literatura regulacionista referem-se aos casos do Japão, Alemanha e Suécia.
227
Portanto, o padrão de mercado de trabalho neoclássico concorrencial seria apenas um caso teórico específico,
não constituindo um modelo universalizável, nem em suas supostas virtudes, nem por suas desvantagens
intrínsecas.
290

4.3.4 Uma sociedade salarial dual e a configuração da WLN


O conceito de sociedade salarial utilizado neste trabalho deve ser precisado. Em
algumas análises há uma tendência a considerar como sociedades salariais apenas aquelas
onde se pode constatar um nível elevado de institucionalidade do sistema de relações salariais
ou com um grau reduzido de exclusão social.228 Nesta definição, as sociedades em
desenvolvimento seriam caracterizadas por economias de salarisation restreinte , pois as
sociedades efetivamente salariais seriam somente aquelas onde o salário indireto e demais
formas de institucionalidade encontram-se desenvolvidos. Todavia, a inclusão social começa
a partir dos gastos em consumo, que dependem da participação dos indivíduos na produção /
acumulação do capital e isto depende, em primeira instância, do salário direto, seja mediante
relações de trabalho formais ou não.

Numa sociedade salarial avançada, o sistema de relações salariais é, por assim dizer,
bem institucionalizado, ao passo que numa economia como a brasileira, de alta exclusão
social e informalidade, a institucionalidade do rapport salarial é que é restrita, não a
salarização. Afinal, a massa salarial que sustenta a demanda efetiva depende não apenas do
trabalho formal, mas também do informal, com o lucro capitalista sendo gerado a partir desses
dois eixos da WLN. Se essa diferença não for considerada, poder-se-ia, no limite, classificar as
relações de trabalho no Brasil como ainda não assalariadas ou pior, como não-capitalistas.
Seria apreender a economia como se estivesse submetida a um tipo de trabalho pré-
assalariado ou sob um processo interminável de transição para o que se considera como o
autêntico mundo das relações salariais vigente no centro capitalista desenvolvido. Em suma,
a questão é muito mais de precisão conceitual, pois a noção de salarização restrita tem sido
usada, indevidamente, como sinônimo de institucionalização restrita ou incompleta .

No caso brasileiro, a expansão das relações salariais processou-se ao longo de todo o


século XX à medida que a economia se industrializava. A evolução para o período 1950-
2002229 pode ser observada a partir do Gráfico 53, onde o sub-período 1950-1989 apresenta-

228
Este parece ser o caso de LAUTIER (1994), citado por CAFFE e CAMARA (2004, p.6), que argumentam
que nas sociedades latino-americanas a salarização é restrita . Na realidade, não a salarização, mas a
institucionalização das relações salariais que é restrita ou incompleta, em razão do elevado nível de
informalidade e de exclusão social vigentes nessas sociedades.
229
Deve-se reconhecer as limitações quanto aos dados sobre a WLN brasileira para a primeira metade do século
XX e mesmo no que concerne à qualidade de certas estatísticas sobre o nível de emprego e de salários nos
períodos subsequentes. Esta é uma constatação compartilhada também por VELASCO E CRUZ (1985) em seu
artigo La Pertinence des problématiques em termes de régulation pour le Brésil: premiers résultats d une étude
historique. ». Segundo o autor je doute que l on puisse développer pour le Brésil une analyse comparable à
celle de Boyer pour la France . Todavia, como o objeto principal da presente análise refere-se às
transformações dos anos 90, essa restrição pode ser parcialmente superada.
291

se como o de expansão mais rápida do emprego assalariado, com uma taxa média de
crescimento de 3,1% ao ano. A partir de 1990, a taxa de expansão das relações de emprego
assalariado cai para a média de apenas 1% ao ano.

O sub-período 1968-1990 destaca-se pelo forte crescimento da participação das


relações salariais no total da população brasileira. Este fato pode ser explicado pela influência
conjunta de três fatores básicos:

Um de ordem demográfica: a desaceleração das taxas de crescimento da população


brasileira, decorrente da transição demográfica;

Dois de ordem econômica: o intervalo (1967-1973) corresponde à fase de forte


crescimento e acumulação de capital, relativa ao milagre econômico . Já o
intervalo (1974-1990) abrange tanto a fase do II PND (1975-1979) quanto à da
crise dos anos 80. E embora as tendências estagnacionistas tenham marcado esta
década, deve-se considerar que a forma institucional de inserção no regime
internacional ainda permanecia basicamente a mesma. Apenas a partir da abertura
comercial e financeira dos anos 90 é que a participação das relações salariais na
população total iria declinar.

GRÁFICO 53 EVOLUÇÃO DAS RELAÇÕES SALARIAIS (1950- 2002)

RELAÇÕES SALARIAIS (L)


RELAÇÕES SALARIAIS / POPULAÇÃO TOTAL (R)
450 42%
400
350
Índice: 1950 = 100 (Escala Log)

40%
300
250 38%
200
36%
150
34%

100
32%

30%

50 28%
1950
1952
1954
1956
1958
1960
1962
1964
1966
1968
1970
1972
1974
1976
1978
1980
1982
1984
1986
1988
1990
1992
1994
1996
1998
2000
2002

FONTE: Dados sobre o nível de emprego assalariado obtidos em MARQUETTI (2000) e IBGE.
NOTA: Os dados incluem as relações de emprego formais e informais.
292

A composição do pessoal ocupado no período 1990-2002 pode ser observada a partir


da Tabela 22, onde as relações salariais representam cerca de 63% do total das relações de
trabalho. Portanto, a WLN é a relação social básica de geração e de apropriação do valor
adicionado na economia brasileira contemporânea, apesar do movimento de desestruturação e
de des-regulamentação do mercado de trabalho que se observa nesta década.230

O Gráfico 54 mostra que a queda da participação relativa do emprego formal no total


das relações salariais é um fenômeno da década de 90, período marcado por profundas
transformações a nível das formas institucionais. Destaca-se também neste período, o
enfraquecimento dos movimentos sindicais como um dos resultados da elevação do
desemprego estrutural e conjuntural (Gráfico 55).

TABELA 22 COMPOSIÇÃO DO PESSOAL OCUPADO TOTAL (1990-2002)

Trabalhadores
Trabalhadores Trabalhadores
Ano independentes Empregadores
assalariados não remunerados
(conta própria)
1990 63,97% 14,60% 18,17% 3,26%
1991 63,57% 14,62% 18,76% 3,05%
1992 62,91% 14,73% 19,48% 2,88%
1993 62,53% 15,07% 19,58% 2,82%
1994 62,15% 15,70% 19,12% 3,03%
1995 61,69% 16,37% 18,67% 3,27%
1996 63,03% 16,45% 17,25% 3,27%
1997 62,81% 16,54% 17,02% 3,62%
1998 62,86% 16,91% 16,53% 3,71%
1999 61,68% 16,96% 17,59% 3,78%
2000 64,08% 16,85% 15,29% 3,78%
2001 65,35% 16,85% 13,77% 4,02%
2002 65,11% 16,76% 14,04% 4,09%

FONTE: Sistema de Contas Nacionais anual / IBGE.

230
CARDOSO JR. em Crise e Desregulação do Trabalho no Brasil (2001) fornece uma análise do processo de
desestruturação das relações de trabalho no Brasil ao longo dos anos 90.
293

FIGURA 20 A WAGE-LABOR NEXUS BRASILEIRA E SEUS EIXOS

WLN
BRASILEIRA

EIXO FORMAL EIXO INFORMAL

TRABALHADORES TRABALHADORES TRABALHADORES TRABALHADORES


ASSALARIADOS ASSALARIADOS SEM INDEPENDENTES
COM CONTRATO SEM CONTRATO REMUNERAÇÃO (CONTA-PRÓPRIA
LEGAL LEGAL OU AUTÔNOMO)

A Figura 20 procura representar esquematicamente os dois eixos básicos da WLN


brasileira que expressam o seu caráter dual. A justificativa para incluir o segmento dos
trabalhadores independentes no eixo informal da WLN decorre da existência de
interdependências macroeconômicas e estruturais entre os segmentos.

As análises empíricas mostram, por exemplo, que a redução dos empregos e dos
salários das grandes e médias empresas tem lançado uma grande massa de trabalhadores na
produção autônoma de bens e serviços. Em sua grande maioria, os trabalhadores por conta-
própria estão inseridos nas atividades econômicas mais precárias do país com baixos níveis
de remuneração, qualificação, estabilidade e contribuição à previdência além de trabalharem
em locais freqüentemente sem infra-estrutura adequada. Diferentemente dos trabalhadores
assalariados, em geral os trabalhadores independentes estão ocupados nas atividades menos
dinâmicas do país e que necessitam de extensas jornadas de trabalho para gerarem algum
excedente.231

231
Conforme dados e informações do DESEP/CUT Central Única dos Tabalhadores.
294

GRÁFICO 54 RELAÇÕES DE EMPREGO FORMAL E INFORMAL COMO PERCENTAGEM DA


PEA (1982-2002)

Assalariados formais / PEA


Assalariados informais / PEA
Trabalhadores independentes / PEA
60%

50%

40%

30%

20%

10%

0%
1983 07
1982 05
1982 12

1984 02
1984 09
1985 04
1985 11
1986 06
1987 01
1987 08
1988 03
1988 10
1989 05
1989 12
1990 07
1991 02
1991 09
1992 04
1992 11
1993 06
1994 01
1994 08
1995 03
1995 10
1996 05
1996 12
1997 07
1998 02
1998 09
1999 04
1999 11
2000 06
2001 01
2001 08
2002 03
2002 10
FONTE: Pesquisa Mensal de Emprego (PME) IBGE.
NOTA: PEA é população economicamente ativa.
Os trabalhadores independentes não estão normalmente sujeitos a uma relação de
emprego232, mas permanecem necessariamente subordinados à dinâmica da acumulação
capitalista, atenuando parcialmente seus efeitos de desestruturação do mercado de trabalho.
Em conseqüência, as configurações vigentes da WLN, suas instituições de base, exercem
impactos determinantes nas interações entre os segmentos. E no caso brasileiro em particular,
a deterioração das condições de trabalho e emprego certamente seria maior sem a
possibilidade de tornar-se autônomo ou trabalhador independente. Em resumo, a hipótese
básica proposta nesta análise é a de que os segmentos formal e informal incluindo os
trabalhadores autônomos são regidos direta ou indiretamente pela dinâmica
233
macroeconômica da WLN.

232
Pois existam empresas que mascaram um trabalho com características próprias de trabalhadores empregados,
contratando autônomos para se beneficiarem de uma carga tributária menor (FOLEGO, 2004).
233
UEMURA(2000) e J-F VIDAL (2003) também incluem os autônomos no cálculo da massa salarial total e do
nível geral de emprego.
295

GRÁFICO 55 DESEMPREGO E NÚMERO DE GREVISTAS (1991-1999)

Nuage de Points (Número de grevistas e Taxa de desemprego)


= Distance des Moindres Carrés Pondérés
1.000.000
Nº médio de grevistas por semestre

900.000 91.1

800.000
700.000 91.2

600.000
500.000
93.2 93.1
400.000
95.1 94.2
92.1
300.000
94.196.196.2 92.2
98.1 99.2
200.000 95.2 98.2 99.1
97.1 97.2
100.000
0
11,0 12,0 13,0 14,0 15,0 16,0 17,0 18,0 19,0 20,0
Taxa de desemprego (oculto + aberto) em % no semestre

FONTE: Gerado a partir das taxas de desemprego da SEADE e DIEESE/PED e do número de grevistas do
DIEESE, referentes à região metropolitana de São Paulo.

a) Características gerais do modo de consumo assalariado


O objetivo principal desta seção é mostrar a importância da WLN brasileira na
formação da demanda de consumo final das famílias. Em razão das limitações dos dados, não
se proporá uma análise por segmentos, o que possibilitaria uma avaliação das
heterogeneidades do modo de consumo no Brasil.

O Gráfico 56 mostra a maneira como a dinâmica do consumo das famílias conecta-se à


dinâmica do emprego assalariado, sendo mais um indicador da vigência de uma sociedade
salarial. Em outros termos, embora parte das famílias estejam fora do sistema de relações
salariais que compõe a WLN brasileira famílias de alta renda e proprietárias dos meios de
produção é nítido o fato de que a demanda de consumo é principalmente função do emprego
assalariado. A correlação é positiva em quase todos os pontos das séries. Já no Gráfico 57
pode-se observar as dinâmicas do consumo per capita das famílias em resposta às variações
do salário médio real entre 1950 e 2002, confirmando a importância do atual sistema de
relações salariais enquanto principal base do consumo das famílias e então do consumo
agregado total.
296

GRÁFICO 56 CONSUMO E RELAÇÃO SALARIAL (1951 -2002)

Taxa de variação do emprego assalariado (L)


Taxa de variação do consumo final das famílias (R)
8% 16%
14%
6% 12%
10%
4% 8%
6%
4%
2%
2%
0%
0% -2%
-4%
-2% -6%
-8%
-4% -10%
1951 1957 1963 1969 1975 1981 1987 1993 1999
1954 1960 1966 1972 1978 1984 1990 1996 2002

FONTE: Dados sobre o nível de emprego assalariado obtidos em MARQUETTI (2000) e IBGE.
NOTA: Séries deflacionadas pelo deflator implícito do PIB, base 2000 = 100.

GRÁFICO 57 SALÁRIO MÉDIO REAL E CONSUMO PER CAPITA DAS FAMÍLIAS (1950-2002)

Taxa de variação do consumo per capita das famílias


Taxa de variação do salário médio real
14%
12%
10%
8%
6%
4%
2%
0%
-2%
-4%
-6%
-8%
1951 1957 1963 1969 1975 1981 1987 1993 1999
1954 1960 1966 1972 1978 1984 1990 1996 2002

FONTE: Dados sobre massa salarial e nível de emprego foram obtidos em MARQUETTI (2000) e IBGE.
NOTA: Séries deflacionadas pelo deflator implícito do PIB, base 2000 = 100.
297

GRÁFICO 58 NÍVEIS DE CONSUMO E MASSA SALARIAL REAL (1950=2002)

Consumo final das famílias_Índice: 1950 =100


Massa salarial real_Índice: 1950 =100

1000
900
800
700
600
500
Escala log

400

300

200

100
90
1950
1952
1954
1956
1958
1960
1962
1964
1966
1968
1970
1972
1974
1976
1978
1980
1982
1984
1986
1988
1990
1992
1994
1996
1998
2000
2002
FONTE: Dados sobre massa salarial obtidos em MARQUETTI (2000) e IBGE. Consumo final das famílias e
pelo Ipeadata e proveniente do IBGE.
NOTA: Séries deflacionadas pelo deflator implícito do PIB, base 2000 = 100.

A evolução dos níveis de consumo e da massa salarial podem ser observados no


Gráfico 58. Entre 1950 e 1980, as tendências são de forte expansão para as duas séries, um
resultado dos regimes de crescimento e acumulação em vigor. Mas a partir da recessão de
1981, os salários e o consumo das famílias entram em uma trajetória de crescimento lento que
por sua vez reflete o período de quase-estagnação das décadas de 80 e 90.

O Gráfico 59 mostra as evoluções da relação massa salarial / consumo final das


famílias (W / C ) e da wage-share ( W / PIB) . Após evoluírem de forma muito similar desde
1950, a partir de 1999, há um indício de mudança no padrão de evolução. A razão W / C se
estabiliza em torno de 70 % enquanto a wage-share entra em declínio e atinge seu nível mais
baixo desde o início das séries (41%), um patamar inclusive inferior ao mínimo observado
durante o regime militar autoritário (44%). Considerando-se que a média internacional para as
economias com nível próximo de desenvolvimento situa-se em torno dos 60 %234, este fato é
um indicador do aumento drástico da concentração funcional da renda na economia brasileira
dos anos 90. Além disso, deve ser destacado que essa trajetória declinante do consumo das

234
Conforme A. E. HARRISON (2002) que em Has Globalisation Eroded Labor s Share ? Some Cross-
Country Evidence, apresenta várias estatísticas da wage-share, tanto para países desenvolvidos quanto em
desenvolvimento.
298

famílias e da wage-share processa-se sob um regime político democrático que, em tese,


reuniria as condições mais propícias para uma reversão dessa tendência, como legitimidade e
representatividade popular.

Para se estimar as elasticidades-salário da demanda de consumo das famílias, no curto


e no longo prazos, o seguinte modelo foi proposto, realizando-se os testes de raízes unitárias e
de co-integração:

LCONSF = C1 + C2.LW + (7)

onde LW = log natural da massa salarial real e LCONSF = log natural do


consumo final das famílias e é o erro de especificação.

GRÁFICO 59 WAGE-SHARE E PARTICIPAÇÃO DOS SALÁRIOS NO CONSUMO FINAL DAS


FAMÍLIAS (1950-2002)

Razão Massa Salarial / Consumo Final das Famílias ( L )


Wage-Share = [ Massa salarial / PIB ] ( R )
95% 54%

90% 52%

85% 50%

80% 48%

75% 46%

70% 44%

65% 42%

60% 40%

55% 38%
1950 1958 1966 1974 1982 1990 1998
1954 1962 1970 1978 1986 1994 2002

FONTE: Dados sobre massa salarial obtidos em MARQUETTI (2000) e IBGE. Consumo final das famílias e
PIB pelo Ipeadata e provenientes do IBGE.
NOTA: Séries deflacionadas pelo deflator implícito do PIB, base 2000 = 100.

A relação não se mostrou estável (Figura 21) para o período completo de análise e
então procedeu-se à estimação da equação (7) apenas para os sub-períodos onde a hipótese
nula de não mudança estrutural foi aceita.
299

FIGURA 21 RELAÇÃO CONSUMO E MASSA SALARIAL: TESTES DE ESTABILIDADE PARA O


PERÍODO (1950-2002)

0.2 1.6
0.1
0.0 1.2
-0.1
-0.2 0.8
0.00
-0.3
0.4
0.05

0.10 0.0

0.15 -0.4
55 60 65 70 75 80 85 90 95 00 55 60 65 70 75 80 85 90 95 00

One-Step Probability Recursive Residuals CUSUM of Squares 5% Significance

Após a confirmação da estabilidade da relação para o sub-período [1955-1980],


procedeu-se aos testes de raiz unitária e de co-integração.

QUADRO 34 ESTIMAÇÃO DE LCONSF NO SUB-PERÍODO (1955-1980)


Dependent Variable: LCONSF
Method: Least Squares
Sample: 1955 1980
Included observations: 26
Variable Coefficient Std. Error t-Statistic Prob.
C -1.429174 0.255617 -5.591080 0.0000
LW 1.096397 0.013643 80.36529 0.0000
R-squared 0.996298 Mean dependent var 19.10643
Adjusted R-squared 0.996144 S.D. dependent var 0.552332
S.E. of regression 0.034300 Akaike info criterion -3.833528
Sum squared resid 0.028236 Schwarz criterion -3.736751
Log likelihood 51.83586 F-statistic 6458.580
Durbin-Watson stat 1.116414 Prob(F-statistic) 0.000000
300

FIGURA 22 - RELAÇÃO CONSUMO E MASSA SALARIAL: TESTES DE ESTABILIDADE PARA O


PERÍODO (1955-1980)

0.10 1.6

1.2
0.05

0.8
0.00

0.4

-0.05
0.0

-0.10 -0.4
58 60 62 64 66 68 70 72 74 76 78 80 58 60 62 64 66 68 70 72 74 76 78 80
Recursive Residuals ± 2 S.E. CUSUM of Squares 5% Significance

0.10
6
0.05

0.00 4

-0.05
2
0.00 -0.10

0.05 0

0.10 -2

0.15
58 60 62 64 66 68 70 72 74 76 78 80 -4
62 64 66 68 70 72 74 76 78 80
One-Step Probability Recursive Residuals
Recursive C(1) Estimates ± 2 S.E.

1.3

1.2

1.1

1.0

0.9

0.8

0.7
62 64 66 68 70 72 74 76 78 80

Recursive C(2) Estimates ± 2 S.E.

Os testes confirmam a hipótese nula de existência de raiz unitária (Quadro 34) em


ambas as séries, mas não quando as séries são tomadas em primeiras diferenças235.

QUADRO 35 TESTES DE RAÍZES UNITÁRIAS PARA LCONSF NO PERÍODO (1955-1980)


ADF Test Statistic LCONSF LW
-2.356315
1% Critical Value* 0.139398 -3.5625
5% Critical Value -2.9190
10% Critical Value -2.5970
*MacKinnon critical values for rejection of hypothesis of a unit root.

Mas para que essa relação estática não seja uma regressão espúria é preciso que os
resíduos sejam estacionários. O Quadro 36 confirma a estacionaridade dos resíduos e então
pode-se estimar um modelo de correção de erro (ECM). Rigorosamente, os valores críticos
para comparação deveriam ser os tabulados por Engle e Yoo(1987) ou por McKinnon (1991).
No entanto, como o fraco número de observações tende a enfraquecer o poder dos testes de

235
Para não sobrecarregar o texto, são mostrados apenas os outputs parciais dos testes de raízes unitárias para as
séries em nível.
301

raiz unitária, optou-se pelo teste de JOHANSEN como mais uma alternativa e a hipótese de
co-integração não foi rejeitada (Quadro 37).236

QUADRO 36 TESTES DE RAÍZES UNITÁRIAS PARA OS RESÍDUOS DA EQUAÇÃO (1) NO


PERÍODO (1955-1980)
ADF Test Statistic RESÍD
-3.109169 1% Critical Value* -2.6649
5% Critical Value -1.9559
10% Critical Value -1.6231
*MacKinnon critical values for rejection of hypothesis of a unit root.

QUADRO 37 TESTE DO TRAÇO DE JOHANSEN E EQUAÇÃO DE CO-INTEGRAÇÃO


Sample: 1955 1980
Included observations: 26
Series: LCONS LW
Lags interval: 1 to 1
Likelihood 5 Percent 1 Percent Hypothesized
Eigenvalue Ratio Critical Value Critical Value No. of CE(s)
0.617739 25.01788 15.41 20.04 None **
0.000574 0.014926 3.76 6.65 At most 1
*(**) denotes rejection of the hypothesis at 5%(1%) significance level
L.R. test indicates 1 cointegrating equation(s) at 5% significance level

LCONS LW C
1.000000 -1.106956 1.619039
(0.01476)
Log likelihood 123.1262
Se o vetor de co-integração é único, pode-se estimar o modelo de correção de erros
pelo método de ENGLE e GRANGER (1987). O Quadro 38 exibe as estimativas da relação,
onde se pode observar as elasticidades de curto prazo. Como o coeficiente de RES(-1) é
estatisticamente significativo e negativo, a representação em termos de correção de erros é
validada. No longo prazo os desequilíbrios entre o consumo e a massa salarial real se
compensam.

236
STOCK e WATSON (2004, p. 379) argumentam que, como os testes de co-integração podem ser enganosos
(podem rejeitar inadequadamente a hipótese nula de ausência de co-integração com mais freqüência do que
deveriam e frequentemente deixam de rejeitar de forma inapropriada a hipótese nula), é especialmente
importante contar com a teoria econômica, o conhecimento institucional e o bom-senso ao estimar e utilizar
relações de co-integração.
302

QUADRO 38 ESTIMAÇÃO DO MODELO DE CORREÇÃO DE ERROS


Dependent Variable: D(LCONS)
Method: Least Squares
Sample(adjusted): 1956 1980
Included observations: 25 after adjusting endpoints
Variable Coefficient Std. Error t-Statistic Prob.
C -0.022746 0.017882 -1.272047 0.2179
RES(-1) -0.847699 0.197045 -4.302053 0.0003
D(LCONS(-1)) 0.199647 0.155081 1.287367 0.2127
D(LW) 1.244049 0.299242 4.157340 0.0005
D(LW(-1)) -0.077406 0.293147 -0.264052 0.7944
R-squared 0.697031 Mean dependent var 0.070712
Adjusted R-squared 0.636437 S.D. dependent var 0.044593
S.E. of regression 0.026888 Akaike info criterion -4.217445
Sum squared resid 0.014459 Schwarz criterion -3.973670
Log likelihood 57.71807 F-statistic 11.50333
Durbin-Watson stat 2.019317 Prob(F-statistic) 0.000052
Conseqüentemente, tem-se que as elasticidade-salário de longo prazo do consumo
final das famílias é de 1,096, para os anos de 1956 a 1980. Período que corresponde ao de
consolidação e apogeu do modelo de desenvolvimento por substituição de importações. 237

Para o segundo período [1981-2002], a equação não se mostrou estável (Figura 23).
Há instabilidade estrutural, conforme os testes revelam, para os subperíodos [1985-1988] e
[1995-1997]. O teste dos coeficientes recursivos mostra que os parâmetros estimados não
convergem.

Após evoluir numa trajetória estável em sua relação com a massa salarial no período
[1955-1980], a demanda de consumo das famílias entrou numa fase de grande instabilidade a
partir do início dos anos 80. De um ponto de vista estritamente macroeconômico e sem
considerar as questões relativas à distribuição pessoal da renda, a economia brasileira possuía
um modo de consumo que respondia adequadamente às necessidades da acumulação de
capital. Não necessariamente às demandas sociais, pois essa seria uma outra questão, relativa
às formas de se combinar expansão econômica com desenvolvimento social. Apesar de seus
limites endógenos, o crescimento econômico neste período histórico foi uma realidade,
englobando tanto a fase correspondente à implementação do Plano de Metas (1955-1962),
quanto à do milagre brasileiro dos anos 70.

237
S. LARDIC e V. MIGNON (2002) estimaram em essa mesma elasticidade de longo prazo para o caso da
França e encontraram o valor de 1,20 no período 1970-1995, usando dados trimestrais.
303

FIGURA 23 RELAÇÃO CONSUMO E MASSA SALARIAL: TESTES DE ESTABILIDADE PARA O


SUBPERÍODO [1981-2002]

1.6 0.2

0.1

1.2 0.0

-0.1

0.8 0.00 -0.2

0.05
0.4
0.10

0.0 0.15
84 86 88 90 92 94 96 98 00 02

-0.4 One-Step Probability Recursive Residuals


84 86 88 90 92 94 96 98 00 02

CUSUM of Squares 5% Significance

0.2 25

0.1
20

0.0
15
-0.1
10
0.00 -0.2
5
0.05
0

0.10
-5
86 88 90 92 94 96 98 00 02
0.15
Recursive C(1) Estimates ± 2 S.E.
84 86 88 90 92 94 96 98 00 02

N-Step Probability Recursive Residuals 1.2

1.0

0.8

0.6

0.4

0.2

0.0

-0.2
86 88 90 92 94 96 98 00 02

Recursive C(2) Estimates ± 2 S.E.

b) Dualidade e flexibilidade da WLN


A questão da dualidade da WLN brasileira foi tema abordado em diversas análises
regulacionistas [CORIAT e SABOIA (1988); SABOIA (1988); GUERRA (1993); CORIAT,
SABOIA e BRUNO (2002); BRUNO (2002) e BRUNO (2004)]. O caráter dual decorre da
elevada taxa de informalidade vigente no sistema de relações salariais que compõem a WLN
brasileira.

Uma questão fundamental no âmbito das análises da WLN é a caracterização do grau


de flexibilidade das relações de emprego. No entanto, o conceito de flexibilidade comporta
múltiplos aspectos e é freqüentemente mobilizado sem que seja precisada as dimensões a que
se refere. Conforme BOYER (1986, p.227):
304

la notion de flexibilité est trop souvent employée sans que l on définisse avec
précision les formes exactes qu elle revêt: relèvement de la vitesse
d ajustemenet de l emploi, adaptabilité de la durée du travail à la conjoncture,
sensibilité des taux d activité aux prespectives du marché du travail, essor du
travail à temps partiel, des contrats à durée déterminé et de l intérim
constituem a priori autant de moyens pour ajuster l activité à l évolution de la
production. Mais l on pourrait tout aussi bien invoquer la malléabilité des flux
d entré et de sortie du chômage, l adéquation du système de formation et de
requalification, ou encore la plus ou moins grande réaction des salaires à la
situation financière des firmes et à la conjoncture économique générale »
Segundo este autor, a abundante literatura sobre a questão sugere que apesar do uso
comum do termo, a flexibilidade pode ser definida por referência a objetivos que não tem, a
priori, relações evidentes entre si. O Quadro 39 a seguir reúne cinco diferentes princípios a
partir dos quais o conceito de flexibilidade pode ser definido. De fato, cada um desses
princípios corresponde a um componente da wage-labor nexus, passível de codificação
institucional ou normativa, considerando-se as relações Estado-economia. Mais amplamente,
essas características da flexibilidade dependerão das particularidades do modo de regulação
em vigor num determinado país ou região e não emergem jamais como simples atributo de
uma lógica mercantil supostamente trans-histórica ou válida quaisquer que sejam os espaços
geográficos.

Na presente análise, serão enfocadas as dimensões da flexibilidade referentes à


mobilidade dos trabalhadores e à formação dos salários, numa perspectiva macroeconômica.
Quando o desenvolvimento da abordagem assim o exigir, poderão ser explicitados outros
componentes do rapport salarial.
QUADRO 39 DEFINIÇÕES DO CONCEITO DE FLEXIBILIDADE A PARTIR DE CINCO PRINCÍPIOS DE BASE

ORGANIZAÇÃO DA HIRARQUIA DAS MOBILIDADE DOS FORMAÇÃO DOS SEGURIDADE


PRODUÇÃO QUALIFICAÇÕES TRABALHADORES SALÁRIOS SOCIAL

Capacidade de resposta à Adaptabilidade dos Possibilidade de variar o Sensibilidade dos salários à Eliminação das disposições
demanda trabalhadores às tarefas emprego e duração do situação das firmas e do desfavoráveis ao emprego
DEFINIÇÕES variadas, complexas ou não trabalho em função da mercado de trabalho em matéria tributária e de
conjuntura transferências sociais

Equipamentos de múltiplo Amplitude da formação Ausência de forte Ao nível macro: Ausência de encargos
uso; técnica ou geral; restrição proveniente do tributários que encareçam
direito do trabalho; - Salário médio como o trabalho para favorecer
Domínio da cadeia de Rotatividade dos postos função do desemprego, os lucros;
produção e gestão nos quadros de Fluidez das migrações da produtividade e dos
otimizada dos fluxos; trabalhadores; inter-regionais; termos de troca; Supressão dos limites
sociais e fiscais;
Adaptação do produto às Relativa proximidade das Inexistência de direitos - Ausência de salário
necessidades do tarefas de produção e de específicos a uma mínimo restritivo. Alívio das cargas pagas
COMPONENTES consumidor e à demanda controle; empresa (vantagens pelas empresas;
instantânea. sociais, aposentadorias); Ao nível micro:
Ausência de barreira Possibilidade de optar
gerente / operário. Resposta do emprego aos - Revisão permanente em entre previdência privada
diferenciais salariais. função da conjuntura e pública.
local;
- Atenuação do argumento
de paridade.

INDÚSTRIA FLEXÍVEL OPERÁRIO TRABALHADORES SALÁRIO EM FUNÇÃO SALARIADO DUAL


PROUDHONIANO ASSALARIADOS DO FATURAMENTO parte fortemente
FIGURA
TEMPORÁRIOS institucionalizada e parte
EMBLEMÁTICA sob as pressões diretas da
lógica mercantil privada

B. Kundig; P. Besson; B. G. Archier, H. Serieyx; M. Y. Gattaz; G. Gilder;... M. Weitzman; General R. Harris; A. Seldon...
REFERÊNCIAS Coriat; ... Piore; Ch. Sabel; Motors (1985)...
Schumacher...

FONTE: Tradução e adaptação do Tableau 21, p. 237, em BOYER (1986), La Flexibilité du Travail em Europe.
Como as características fundamentais da WLN são dependentes das formas possíveis
de codificação de seus diversos componentes, o nível de institucionalidade das relações
salariais torna-se um objeto privilegiado numa análise em termos de regulação.

No caso brasileiro, a institucionalização precoce e a construção incompleta foram


duas das características da WLN identificadas pioneiramente por CORIAT e SABOIA (1988 e
1995). Precoce, porque desde os anos 30 os principais componentes relativos às formas de
contratualização e às estruturas de seguridade social encontram-se codificados
constitucionalmente. Mas incompleta, porque a legislação trabalhista e o acesso aos sistemas
de previdência social permanecem à margem de praticamente metade da força de trabalho, em
razão da informalidade (Gráfico 60). Este fato se deve, em grande parte ao próprio caráter
inacabado do Estado de Bem-Estar brasileiro e de problemas estruturais maiores como a
excessiva concentração da propriedade e da renda juntamente com a baixa representatividade
de vários segmentos da população no seio do aparelho de Estado.

GRÁFICO 60 DISTRIBUIÇÃO DAS RELAÇÕES DE EMPREGO (1982-2002)

Trabalhadores autônomos
Trabalhadores sem carteira
Trabalhadores com carteira
100%
Trabalhadores independentes
80%

60% Trabalhadores sem carteira

40%

20% Trabalhadores com carteira

0%
1982 06
1982 12
1983 06
1983 12
1984 06
1984 12
1985 06
1985 12
1986 06
1986 12
1987 06
1987 12
1988 06
1988 12
1989 06
1989 12
1990 06
1990 12
1991 06
1991 12
1992 06
1992 12
1993 06
1993 12
1994 06
1994 12
1995 06
1995 12
1996 06
1996 12
1997 06
1997 12
1998 06
1998 12
1999 06
1999 12
2000 06
2000 12
2001 06
2001 12
2002 06
2002 12

FONTE: Pesquisa Mensal de Emprego (PME)/IBGE.


NOTA: Utilizam-se indistintamente os conceitos de autônomo e conta própria na classificação dos trabalhadores
independentes.
As evoluções do PIB, das relações salariais formais (englobando o conjunto dos
trabalhadores com carteira assinada) e informais (agregando os trabalhadores sem carteira
assinada e os trabalhadores autônomos) encontram-se no Gráfico 61. Constata-se que a
desestruturação da WLN brasileira antecede à mudança na forma de inserção internacional,
307

nos anos 90. Suas causas derivam tanto de fatores institucionais, quanto dos desdobramentos
da crise do regime de acumulação responsável pelo milagre econômico nos anos 70. Até
1989, as relações salariais formais e informais evoluíam ambas em correlação positiva com o
PIB. A partir de 90, o segmento formal cuja dinâmica no período anterior permanecera mais
conectada ao PIB do que o segmento informal desloca-se abruptamente para baixo e
permanece ligeiramente acima do patamar de 100. Isto significa que há visivelmente uma
grande dificuldade da economia brasileira para expandir o nível de emprego formal na última
década. Já as relações salariais informais encontram-se em uma trajetória persistente de
expansão positivamente relacionada com o crescimento econômico. Em suma, isto sugere que
o sistema econômico reduziu os quadros formais até o limite necessário para fazer frente às
transformações estruturais que lhes foram impostas pelo Estado e pela lógica da
globalização neoliberal e mantém o segmento informal como variável de ajuste aos ciclos
econômicos.

GRÁFICO 61 - O PROCESSO DE DESINSTITUCIONALIZAÇÃO DA WLN BRASILEIRA É


ANTERIOR À ABERTURA COMERCIAL E FINANCEIRA.

Segmento formal
Segmento informal
PIB trimestral
inform = 95,0646+1,0686*x
200
Índice dos valores: 1982 T2 = 100

180

160

140

120

100

80
1982 T2
1982 T4
1983 T2
1983 T4
1984 T2
1984 T4
1985 T2
1985 T4
1986 T2
1986 T4
1987 T2
1987 T4
1988 T2
1988 T4
1989 T2
1989 T4
1990 T2
1990 T4
1991 T2
1991 T4
1992 T2
1992 T4
1993 T2
1993 T4
1994 T2
1994 T4
1995 T2
1995 T4
1996 T2
1996 T4
1997 T2
1997 T4
1998 T2
1998 T4
1999 T2
1999 T4
2000 T2
2000 T4
2001 T2
2001 T4
2002 T2
2002 T4

FONTE: M.BRUNO (2004). Dados sobre números de trabalhadores sem carteira, com carteira e contra própria,
referentes às regiões metropolitanas, foram obtidos no IPEADATA e são originários da PME/IBGE.
NOTA: Séries originais dos segmentos formal e informal correspondem ao número de pessoas em cada
categoria. O segmento informal engloba os trabalhadores sem carteira e por conta própria.
Conseqüentemente, fatores institucionais e econômicos se conjugaram ao longo da
história e mantêm a WLN brasileira sob uma configuração eminentemente concorrencial. O
grau de flexibilidade quantitativa e salarial é potencializado tanto pela própria legislação
trabalhista vigente (as flexibilizações processadas na CLT desde o período do regime
308

militar) quanto pela incapacidade e desestímulo do sistema formal de emprego para absorver a
força de trabalho disponível nos quadros dessa mesma legislação.

TABELA 23 COMPOSIÇÃO DA WLN (1982-2002)

SEGMENTO SEGMENTO
ANO
FORMAL INFORMAL
1982 60,1% 39,9%
1983 59,3% 40,7%
1984 57,6% 42,4%
1985 59,1% 40,9%
1986 61,0% 39,0%
1987 61,2% 38,8%
1988 60,9% 39,1%
1989 61,6% 38,4%
1990 60,3% 39,7%
1991 56,8% 43,2%
1992 54,6% 45,4%
1993 53,6% 46,4%
1994 52,1% 47,9%
1995 51,3% 48,7%
1996 49,6% 50,4%
1997 49,1% 50,9%
1998 48,6% 51,4%
1999 47,1% 52,9%
2000 46,2% 53,8%
2001 47,4% 52,6%
2002 47,5% 52,5%

FONTE: Pesquisa Mensal de Emprego (PME)/IBGE.


Neste contexto, o elevado grau de informalidade (mais de 50% das relações de
emprego) tende a desencorajar os empregadores, por assim dizer, cumpridores da lei
(Tabela 23). Fato lastimável é observado quando o próprio Estado, em tese o agente que deve
zelar pelas garantias constitucionais e dar exemplo maior ao setor privado, promove um
amplo processo de terceirização precarizante de serviços fundamentais à população, onde
os trabalhadores são contratados sem nenhum vínculo formal que configure uma relação
institucionalizada de emprego. Acrescente-se a esse quadro o baixo nível de sindicalização e
de participação efetiva dos trabalhadores em movimentos sociais e políticos e tem-se o
conjunto de fatores que explicam a configuração da WLN brasileira como uma forma
institucional hierarquicamente subordinada. Um rapport salarial amplamente concorrencial e
segmentado, apesar de permanentemente monitorado pelo Estado de maneira a adequá-lo aos
imperativos considerados maiores de estabilidade de preços, dos equilíbrios orçamentário e do
balanço de pagamentos, além da atratividade aos capitais estrangeiros.
309

GRÁFICO 62 PIB E DESAGREGAÇÃO DOS SEGMENTOS FORMAL E INFORMAL (1982-2001)

com carteira
sem carteira
conta própria
PIB mensal
200

180
Índice: jun/1982 = 100

160

140

120

100

80
1982 06
1982 12
1983 06
1983 12
1984 06
1984 12
1985 06
1985 12
1986 06
1986 12
1987 06
1987 12
1988 06
1988 12
1989 06
1989 12
1990 06
1990 12
1991 06
1991 12
1992 06
1992 12
1993 06
1993 12
1994 06
1994 12
1995 06
1995 12
1996 06
1996 12
1997 06
1997 12
1998 06
1998 12
1999 06
1999 12
2000 06
2000 12
2001 06
2001 12
FONTE: Séries mensais da PME/IBGE e PIB real mensal, obtidos no IPEADATA.
NOTA: Dados para os segmentos com carteira, sem carteira e conta própria referem-se ao número de pessoas em
cada categoria.
O setor informal, composto por trabalhadores sem carteira e por autônomos, expande-
se desde o início da série em 1982, enquanto o setor formal entrou numa fase de declínio
relativo, com tendências à estagnação, a partir de 1990 (Gráfico 62). Como a massa salarial
do setor informal cresceu com o aumento do número de pessoas nesta categoria
(ultrapassando, a partir de 1996, o número de relações salariais formais), em grande parte
egressa do eixo formal, um dos resultados seria a convergência das massas salariais.

Os Gráficos 63 e 64 confirmam a importância dos salários pagos no setor informal


para a formação da demanda efetiva na economia brasileira. Há uma nítida convergência das
massas salariais desses dois eixos da WLN, a partir dos anos 90.
310

GRÁFICO 63 PARTICIPAÇÃO DOS SEGMENTOS NA MASSA SALARIAL TOTAL (1982-2002)

Rendimento conta própria / W total


Wsem carteira / Wtotal
Wcom carteira / Wtotal

100%
Salários_trabalhadores independentes

80%
Salários_trabalhadores sem carteira
60%

40%
Salários_trabalhadores com carteira

20%

0%
1982 1984 1986 1988 1990 1992 1994 1996 1998 2000 2002

FONTE: PME IBGE


NOTA: Os dados referem-se às regiões metropolitanas e foram deflacionados pelo INPC: nov/2003=100.
GRÁFICO 64 SALÁRIO E RENDIMENTO MÉDIO CONVERGEM NOS ANOS 90 (1982-2002)

Salário médio real_com carteira


Salário médio real_sem carteira
Rendimento médio real_conta própria
1300
1200
Valores em R$: nov/2003 = 100

1100
1000
900
800
700
600
500
400
1982 06 1985 04 1988 02 1990 12 1993 10 1996 08 1999 06 2002 04
1983 11 1986 09 1989 07 1992 05 1995 03 1998 01 2000 11

FONTE: PME IBGE


NOTA: Os dados referem-se às regiões metropolitanas e foram deflacionados pelo INPC: nov/2003=100.
Pesquisa Mensal de Emprego (PME)/IBGE.
311

b1) Relações salariais formais e flutuações conjunturais para se testar a sensibilidade


de curto prazo do segmento formal (com carteira) às oscilações conjunturais estimou-se o
seguinte modelo, em taxas de variação (Quadros 40 e 41):
-
Ncart = c1 + c2.Ncart -1 + c3.PIB + c4.PIB+ (8)

Onde Ncart corresponde à taxa de crescimento do número de relações de emprego


com carteira; PIB- são as taxas de variação negativa do PIB e PIB+ são as taxas positivas. Os
dados são trimestrais e originários da PME do IBGE.

QUADRO 40 ESTIMAÇÕES DE NCART PARA O PERÍODO (1983 1989)


Dependent Variable: Ncart
Method: Least Squares
Sample(adjusted): 1983:1 1989:4
Included observations: 28 after adjusting endpoints
Variable Coefficient Std. Error t-Statistic Prob.
Ncart -1 0.632905 0.111894 5.656292 0.0000
PIB- 0.317934 0.156233 2.034997 0.0526
+ 0.303996 0.090327 3.365510 0.0025
PIB
R-squared 0.566793 Mean dependent var 0.009675
Adjusted R-squared 0.532137 S.D. dependent var 0.012074
S.E. of regression 0.008259 Akaike info criterion -6.654157
Sum squared resid 0.001705 Schwarz criterion -6.511421
Log likelihood 96.15820 F-statistic 16.35458
Durbin-Watson stat 2.150766 Prob(F-statistic) 0.000029
Dependent Variable: Ncart
Method: Least Squares
Sample(adjusted): 1983:1 1989:4
Included observations: 28 after adjusting endpoints
Variable Coefficient Std. Error t-Statistic Prob.
C 0.001682 0.002069 0.813148 0.4238
Ncart -1 0.571582 0.127905 4.468789 0.0001
PIB 0.286203 0.080022 3.576568 0.0015
R-squared 0.577859 Mean dependent var 0.009675
Adjusted R-squared 0.544088 S.D. dependent var 0.012074
S.E. of regression 0.008152 Akaike info criterion -6.680033
Sum squared resid 0.001662 Schwarz criterion -6.537297
Log likelihood 96.52046 F-statistic 17.11095
Durbin-Watson stat 2.088913 Prob(F-statistic) 0.000021
312

QUADRO 41 - ESTIMAÇÕES DE NCART PARA O PERÍODO (1992 2001)

Dependent Variable: Ncart


Method: Least Squares
Sample: 1992:1 2001:4
Included observations: 40
Variable Coefficient Std. Error t-Statistic Prob.
Ncart -1 0.216263 0.152673 1.416512 0.1650
PIB- 0.641854 0.299979 2.139662 0.0390
PIB+ 0.146670 0.127749 1.148114 0.2583
R-squared 0.167773 Mean dependent var -0.001122
Adjusted R-squared 0.122788 S.D. dependent var 0.011848
S.E. of regression 0.011097 Akaike info criterion -6.092291
Sum squared resid 0.004556 Schwarz criterion -5.965625
Log likelihood 124.8458 F-statistic 3.729520
Durbin-Watson stat 2.289713 Prob(F-statistic) 0.033456
Dependent Variable: Ncart
Method: Least Squares
Sample: 1992:1 2001:4
Included observations: 40
Variable Coefficient Std. Error t-Statistic Prob.
C -0.002830 0.001936 -1.461801 0.1522
Ncart -1 0.222914 0.152760 1.459240 0.1529
PIB 0.301265 0.129221 2.331385 0.0253
R-squared 0.164282 Mean dependent var -0.001122
Adjusted R-squared 0.119108 S.D. dependent var 0.011848
S.E. of regression 0.011120 Akaike info criterion -6.088104
Sum squared resid 0.004575 Schwarz criterion -5.961438
Log likelihood 124.7621 F-statistic 3.636647
Durbin-Watson stat 2.245297 Prob(F-statistic) 0.036150
Os resultados mostram comportamentos bem contrastados das relações salariais
formais (com carteira ) antes e depois da abertura comercial e financeira. No período pré-
abertura, é nítida a rigidez à baixa do emprego com carteira: o coeficiente relativo à inércia é
de 0,63 e não há sensibilidade estatisticamente significativa às quedas do nível de atividade.
No entanto, o emprego responde positivamente às fases de expansão econômica, com uma
elasticidade de curto prazo de 0,30.238

No período pós-abertura, as respostas se invertem. As relações salariais formais


tornam-se insensíveis às variações positivas do PIB, mas passam a responder às recessões,
com um coeficiente de 0,64 que é mais do que o dobro da elasticidade às expansões do
período de economia fechada. O coeficiente relativo à inércia deixa de ser significativo. Este
resultado aponta para um aprofundamento do grau de flexibilidade quantitativa(conforme a

238
Apesar de próximo do nível de 5% de significância do teste, o p-valor para este coeficiente ainda é superior
(0,053) e não rejeita a hipótese nula. Este resultado pode estar sendo influenciado pelo tamanho da amostra, pois
o número de pontos amostrais com variações negativas tende a ser inferior ao número de pontos com variações
positivas no período pré-abertura. No período pós-abertura espera-se o inverso, o aumento do número de quedas
do PIB e a redução do número de pontos de expansão. Mas como outros testes serão propostos e o coeficiente de
inércia não está sujeito à mesma limitação, estes resultados devem ser considerados como preliminares e válidos
para uma primeira base de comparação dos períodos sob análise.
313

definição relativa à mobilidade dos trabalhadores, no Quadro 39) das relações salariais
formais, no período de economia aberta.

b2) Relações salariais informais e flutuações conjunturais a mesma metodologia foi


aplicada às relações de emprego informais e os resultados das estimações encontram-se
nos Quadros 42 e 43.

QUADRO 42 - ESTIMAÇÕES DE NSCART PARA O PERÍODO (1983 1989)


Dependent Variable: Nscart
Method: Least Squares
Sample(adjusted): 1983:1 1989:4
Included observations: 28 after adjusting endpoints
Variable Coefficient Std. Error t-Statistic Prob.
Nscart -1 0.017524 0.208060 0.084227 0.9335
PIB- -0.385860 0.362769 -1.063654 0.2977
+ 0.092259 0.205197 0.449613 0.6569
PIB
R-squared 0.019879 Mean dependent var 0.003447
Adjusted R-squared -0.058531 S.D. dependent var 0.018768
S.E. of regression 0.019309 Akaike info criterion -4.955530
Sum squared resid 0.009321 Schwarz criterion -4.812793
Log likelihood 72.37742 F-statistic 0.253522
Durbin-Watson stat 1.902475 Prob(F-statistic) 0.778034
QUADRO 43 ESTIMAÇÕES DE NSCART PARA O PERÍODO (1992-2001)
Dependent Variable: Nscart
Method: Least Squares
Sample: 1992:1 2001:4
Included observations: 40
Variable Coefficient Std. Error t-Statistic Prob.
Nscart -1 -0.073150 0.147483 -0.495994 0.6228
PIB- -0.410700 0.464178 -0.884791 0.3820
PIB+ 0.944317 0.220931 4.274258 0.0001
R-squared 0.177472 Mean dependent var 0.010506
Adjusted R-squared 0.108928 S.D. dependent var 0.018083
S.E. of regression 0.017070 Akaike info criterion -5.208327
Sum squared resid 0.010490 Schwarz criterion -5.039439
Log likelihood 108.1665 F-statistic 2.589166
Durbin-Watson stat 1.573847 Prob(F-statistic) 0.067916
Os resultados das estimativas mostram que, no período pré-abertura, as relações
salariais informais (sem carteira) se mostraram insensíveis, em termos estatísticos, às
variações tanto positivas quanto negativas do PIB. Além disso, o coeficiente relativo à inércia
também não é estatistivamente significativo, o que indica uma grande velocidade de ajuste
deste tipo de relação de emprego, mesmo nesse período pré-abertura, sobretudo, considerando
que os dados são trimestrais.

O fato novo no período pós-abertura refere-se ao aparecimento de uma elasticidade


importante do emprego sem carteira às variações positivas do PIB (0,94), embora continue
sua insensibilidade às quedas do nível de atividade econômica. As dinâmicas desses
314

segmentos ou eixos da WLN brasileira mostradas no Gráfico 61, acima, já apontavam para
resultados desse tipo.

b3) Relações de trabalho independente e flutuações conjunturais as estimações com


os dados amostrais em periodicidade trimestral não se revelaram estatisticamente
significativas para este segmento e o modelo foi então reestimado com dados mensais
(Quadro 44 e 45).

QUADRO 44 ESTIMAÇÕES DE NCPROP PARA O PERÍODO (1982-1989)


Dependent Variable: Ncprop
Method: Least Squares
Sample(adjusted): 1982:10 1989:12
Included observations: 87 after adjusting endpoints
Variable Coefficient Std. Error t-Statistic Prob.
C 0.004789 0.002295 2.086457 0.0400
Ncprop -1 -0.136182 0.102664 -1.326484 0.1883
PIB- -0.279639 0.122516 -2.282468 0.0250
+ 0.119130 0.106500 1.118596 0.2665
PIB
R-squared 0.127526 Mean dependent var 0.003388
Adjusted R-squared 0.095991 S.D. dependent var 0.014566
S.E. of regression 0.013850 Akaike info criterion -5.676228
Sum squared resid 0.015920 Schwarz criterion -5.562853
Log likelihood 250.9159 F-statistic 4.043941
Durbin-Watson stat 1.963680 Prob(F-statistic) 0.009793

QUADRO 45 - ESTIMAÇÕES DE NCPROP PARA O PERÍODO (1992-2001)


Dependent Variable: Ncprop
Method: Least Squares
Sample: 1992:01 2001:12
Included observations: 120
Variable Coefficient Std. Error t-Statistic Prob.
C 0.000668 0.001651 0.404592 0.6865
Ncprop -1 -0.390343 0.085710 -4.554205 0.0000
PIB- 0.120560 0.128998 0.934590 0.3519
PIB+ 0.237035 0.114024 2.078824 0.0398
R-squared 0.172459 Mean dependent var 0.002183
Adjusted R-squared 0.151057 S.D. dependent var 0.013055
S.E. of regression 0.012028 Akaike info criterion -5.970319
Sum squared resid 0.016783 Schwarz criterion -5.877403
Log likelihood 362.2192 F-statistic 8.058105
Durbin-Watson stat 2.165441 Prob(F-statistic) 0.000064
No período de economia fechada, as relações de trabalho independente não possuem
inércia de ajuste, mas mostram-se sensíveis às variações negativas do PIB, com uma
elasticidade de 0,28. Os fatos novos sob economia aberta referem-se ao surgimento de um
coeficiente de inércia estatisticamente significativo e negativo, de uma elasticidade às
variações positivas do PIB e da perda de sensibilidade às quedas do nível de atividade
econômica por parte deste segmento. Houve então uma inversão dos comportamentos com
relação ao PIB na passagem de uma economia fechada para uma economia aberta.
315

b4) Influências entre os segmentos o objetivo dessa análise é verificar as respostas de


um determinado segmento da WLN às variações de outros segmentos, considerando as
mudanças no nível de atividade econômica.

Uma questão relevante refere-se às relações entre o segmento formal e o informal da


WLN brasileira. O modelo estimado para o período de economia fechada e com base numa
amostra em dados mensais não se revelou estatisticamente significativo, embora o sinal seja o
esperado. O segmento sem carteira correlaciona-se negativamente com o segmento com
carteira, conforme o tradicional trade-off que subsiste nas relações entre esses dois eixos da
WLN. Para o período de abertura econômica, os resultados encontram-se no Quadro 46, onde
se pode constatar que uma queda de 1% no emprego formal provoca um aumento de 0,6% nas
relações salariais informais.

QUADRO 46 RELAÇÕES ENTRE SEM CARTEIRA E COM CARTEIRA (1992-2001)


Dependent Variable: Nscart
Method: Least Squares
Sample: 1992:01 2001:12 (periodicidade mensal)
Included observations: 120
Variable Coefficient Std. Error t-Statistic Prob.
C 0.003360 0.001211 2.773104 0.0065
Ncart -0.552434 0.153881 -3.590009 0.0005
R-squared 0.098467 Mean dependent var 0.003505
Adjusted R-squared 0.090827 S.D. dependent var 0.013911
S.E. of regression 0.013264 Akaike info criterion -5.791028
Sum squared resid 0.020760 Schwarz criterion -5.744570
Log likelihood 349.4617 F-statistic 12.88817
Durbin-Watson stat 1.992387 Prob(F-statistic) 0.000483

Dependent Variable: Nscart


Method: Least Squares
Sample: 1991:2 2001:4 (periodicidade trimestral)
Included observations: 43
Variable Coefficient Std. Error t-Statistic Prob.
C 0.005403 0.002672 2.022006 0.0499
Ncart -0.639391 0.216875 -2.948200 0.0053
PIB 0.502477 0.149395 3.363426 0.0017
R-squared 0.293017 Mean dependent var 0.009832
Adjusted R-squared 0.257668 S.D. dependent var 0.018328
S.E. of regression 0.015791 Akaike info criterion -5.391517
Sum squared resid 0.009974 Schwarz criterion -5.268643
Log likelihood 118.9176 F-statistic 8.289242
Durbin-Watson stat 1.862928 Prob(F-statistic) 0.000973
316

QUADRO 47 RELAÇÕES Nscart E NCART ANTES DE DEPOIS DO REAL (1991-2001)


Dependent Variable: Nscart
Method: Least Squares
ECONOMIA ABERTA PRÉ-REAL
Sample: 1991:1 1994:2
Included observations: 14
Variable Coefficient Std. Error t-Statistic Prob.
C 0.009947 0.008269 1.202939 0.2543
Ncart 0.475992 0.201746 2.359357 0.0379
PIB 0.245111 0.355675 0.689144 0.5050
R-squared 0.469863 Mean dependent var 0.004271
Adjusted R-squared 0.373474 S.D. dependent var 0.032368
Log likelihood 33.12418 F-statistic 4.874673
Durbin-Watson stat 1.959443 Prob(F-statistic) 0.030488
ECONOMIA ABERTA PÓS-REAL
Sample: 1995:1 2001:4
Included observations: 28
Variable Coefficient Std. Error t-Statistic Prob.
C 0.005089 0.002702 1.883699 0.0713
Ncart -0.575995 0.226593 -2.541979 0.0176
PIB 0.722678 0.230516 3.135044 0.0044
R-squared 0.332290 Mean dependent var 0.007776
Adjusted R-squared 0.278873 S.D. dependent var 0.015935
Log likelihood 82.33139 F-statistic 6.220689
Durbin-Watson stat 1.557334 Prob(F-statistic) 0.006417

QUADRO 48 TESTES DE CAUSALIDADE DE GRANGER PARA NSCART E NCART

Pairwise Granger Causality Tests

ECONOMIA FECHADA
Sample: 1982:3 1989:4
Lags: 2
Null Hypothesis: Obs F-Statistic Probability
NSCART does not Granger Cause NCART 28 6.43909 0.00602
NCART does not Granger Cause NSCART 0.02108 0.97916
ECONOMIA ABERTA PRÉ-REAL
Sample: 1991:1 1994:2
Lags: 2
Null Hypothesis: Obs F-Statistic Probability
NSCART does not Granger Cause NCART 14 1.74300 0.22918
NCART does not Granger Cause NSCART 11.4932 0.00332
ECONOMIA ABERTA PÓS-REAL
Sample: 1995:1 2001:4
Lags: 2
Null Hypothesis: Obs F-Statistic Probability
NSCART does not Granger Cause NCART 28 1.22078 0.31341
NCART does not Granger Cause NSCART 1.43386 0.25891

NOTA: Testes de causalidade realizados com as variáveis em logaritmo.


317

Os resultados das estimações do Quadro 47 mostram que no período de economia


aberta pré-Real, o coeficiente relativo à elasticidade-PIB do emprego informal não se revelou
estatisticamente significativo. Mas o emprego informal responde positivamente às variações
do emprego formal. No período de vigência do Real, tanto a elasticidade-PIB quanto a
elasticidade relativa ao emprego formal são estatisticamente significativas, mas o sinal do
primeiro coeficiente é agora negativo, ou seja, uma elevação do emprego formal reduz o
emprego informal.

No período de economia fechada, os testes de causalidade de Granger (Quadro 48)


revelaram que as variações do emprego informal precedem as variações do emprego formal.
Num ambiente macroeconômico caracterizado por grande instabilidade da demanda efetiva,
as empresas tendem a contratar inicialmente trabalhadores sem vínculos formais definitivos,
pois não têm garantias de que a expansão do nível de atividade é duradoura. Após serem
confirmadas as expectativas de uma expansão durável, as contratações legais começam então
a crescer. No período de abertura anterior ao Real, o sentido causal se inverte e as variações
do emprego formal precedem as do emprego informal. Provavelmente porque neste período
tem início o processo de destruição dos postos de trabalho formais, provocando o inchaço das
atividades terciárias. No período de abertura sob a vigência do Real, os resultados não são
conclusivos.

Os testes revelaram que há também uma relação estatisticamente significativa e


positiva entre os segmentos sem carteira e conta própria, tanto sob economia fechada quanto
aberta (Quadro 49 e 50).

O Quadro 50 revela que as relações salariais formais (com carteira) respondem


negativamente às variações positivas das relações de trabalho independente (conta própria).
Uma expansão de 1% do segmento conta própria provoca uma queda de 0,32% no segmento
com carteira. Este fato poderia sugerir uma preferência pelas relações de trabalho
independente (trabalhadores autônomos) mesmo em se tratando da possibilidade de um
emprego assalariado formal. Por outro lado, e do ponto de vista macroeconômico, mostra
também que a possibilidade de ser um trabalhador independente tenderia a atenuar as pressões
sobre o mercado de trabalho assalariado, pois se trata de mais uma alternativa de inserção
econômica e de sobrevivência.239

239
O modelo com o emprego formal como variável explicativa não se mostrou estatisticamente significativo pelo
teste F.
318

QUADRO 49 ESTIMAÇÃO DE NSCART NO PERÍODO DE ECONOMIA FECHADA E ABERTA


Dependent Variable: Nscart
Method: Least Squares
Sample(adjusted): 1982:4 1989:4
Included observations: 29 after adjusting endpoints
ECONOMIA FECHADA
Variable Coefficient Std. Error t-Statistic Prob.
C -0.001000 0.003541 -0.282427 0.7799
Ncprop 0.604579 0.178378 3.389312 0.0022
PIB -0.195157 0.152522 -1.279532 0.2120
R-squared 0.313518 Mean dependent var 0.003489
Adjusted R-squared 0.260711 S.D. dependent var 0.018431
S.E. of regression 0.015847 Akaike info criterion -5.353957
Sum squared resid 0.006529 Schwarz criterion -5.212512
Log likelihood 80.63237 F-statistic 5.937121
Durbin-Watson stat 2.032352 Prob(F-statistic) 0.007519
Sample: 1992:1 2001:4
Included observations: 40
ECONOMIA ABERTA
Variable Coefficient Std. Error t-Statistic Prob.
C 0.004389 0.003036 1.445462 0.1567
Ncprop 0.504385 0.204159 2.470557 0.0182
PIB 0.447971 0.185961 2.408944 0.0211
R-squared 0.262177 Mean dependent var 0.010506
Adjusted R-squared 0.222294 S.D. dependent var 0.018083
S.E. of regression 0.015947 Akaike info criterion -5.367005
Sum squared resid 0.009410 Schwarz criterion -5.240339
Log likelihood 110.3401 F-statistic 6.573751
Durbin-Watson stat 1.691381 Prob(F-statistic) 0.003607
QUADRO 50 ESTIMAÇÃO DE NCART NO PERÍODO DE ECONOMIA ABERTA
Dependent Variable: Ncart
Method: Least Squares
Sample: 1992:1 2001:4
Included observations: 40
Variable Coefficient Std. Error t-Statistic Prob.
C -0.001031 0.002035 -0.506676 0.6154
Ncprop -0.316941 0.136811 -2.316633 0.0262
PIB 0.320033 0.124617 2.568136 0.0144
R-squared 0.228142 Mean dependent var -0.001122
Adjusted R-squared 0.186420 S.D. dependent var 0.011848
S.E. of regression 0.010687 Akaike info criterion -6.167596
Sum squared resid 0.004226 Schwarz criterion -6.040930
Log likelihood 126.3519 F-statistic 5.468144
Durbin-Watson stat 1.812157 Prob(F-statistic) 0.008307

O teste de causalidade de Granger (Quadro 51) para o período completo mostra que as
variações do estoque de trabalhadores independentes (conta própria) precedem as variações
no estoque de trabalhadores formais (com carteira). Haveria então uma relação de causalidade
cujo sentido vai do trabalho independente para o emprego formal e não o inverso.
319

QUADRO 51 TESTE DE CAUSALIDADE DE GRANGER PARA Ncprop E Ncart (1982-2001)


Pairwise Granger Causality Tests
Sample: 1982:3 2001:4
Lags: 3
Null Hypothesis: Obs F-Statistic Probability
Ncprop does not Granger Cause Ncart 74 3.10952 0.03210
Ncart does not Granger Cause Ncprop 1.54781 0.21028

c) A formação dos salários por segmento o objetivo desta análise é investigar o


processo de formação do salário médio nominal e real em cada um dos segmentos da
WLN. A especificação do modelo é a seguinte:

WN = C1 + C2.ICV + C3.PIB - + C4.PIB + (9)

Onde WN é o salário nominal do segmento em questão; ICV é índice de custo


- +
de vida e como nas estimações anteriores, PIB e PIB , representam
respectivamente as variações negativas e positivas do produto interno bruto
brasileiro. Todas as variáveis são em taxas de crescimento e com periodicidade
trimestral.

c1) O salário nominal e as relações salariais formais (segmento com carteira) os


resultados das estimações para o salário médio nominal encontram-se no Quadro 52, onde
a especificação retida visa a captar a influência direta do desemprego conforme uma
formulação tradicional em termos de curva de Phillips (Equação 10).

Os testes mostram que a indexação à evolução do custo de vida é total no primeiro


período, pré-abertura e pré-plano Real. Todavia, não há efeito direto estatisticamente
significativo do desemprego sobre a formação dos salários nominais para as relações salariais
formais. No segundo período, sob economia aberta, mas antes da vigência do Real, observa-se
uma redução de 5% no valor do coeficiente que mede o grau de indexação dos salários à
inflação. O fato novo relevante quando se trata de examinar o caráter concorrencial da WLN
brasileira, diz respeito ao surgimento de um comportamento característico de uma curva de
Phillips. O desemprego passa a influir diretamente na formação dos salários de um setor
tradicionalmente mais estruturado das relações salariais. O coeficiente de INVTXD (o inverso
da taxa de desemprego aberto) é positivo e estatisticamente significativo com o valor de 0,50.

1
WNcart = -0,07 + 0,58. ICV + 0,50. (10)
TxD
Onde TxD é a taxa de desemprego aberto para as seis regiões metropolitanas do Brasil,
calculada pelo IBGE.
320

QUADRO 52 INFLUÊNCIA DO DESEMPREGO E DA INFLAÇÃO SOBRE WNcart (1982-2001)


Dependent Variable: WNcart
Method: Least Squares
Sample(adjusted): 1982:4 1989:4
Included observations: 29 after adjusting endpoints
ECONOMIA FECHADA
Variable Coefficient Std. Error t-Statistic Prob.
C -0.056658 0.049483 -1.144990 0.2626
ICV 1.023814 0.063614 16.09416 0.0000
INVTXD 0.238656 0.247406 0.964633 0.3436
R-squared 0.924792 Mean dependent var 0.381910
Adjusted R-squared 0.919006 S.D. dependent var 0.268339
Log likelihood 35.02794 F-statistic 159.8534
Durbin-Watson stat 1.896393 Prob(F-statistic) 0.000000
Sample: 1991:1 1993:4
Included observations: 12
ECONOMIA ABERTA PRÉ-PLANO REAL
Variable Coefficient Std. Error t-Statistic Prob.
C 0.134677 0.339855 0.396276 0.7011
ICV 0.946623 0.119500 7.921544 0.0000
INVTXD -0.528756 1.717960 -0.307781 0.7653
R-squared 0.890622 Mean dependent var 0.634110
Adjusted R-squared 0.866316 S.D. dependent var 0.204687
Log likelihood 15.80774 F-statistic 36.64165
Durbin-Watson stat 2.481515 Prob(F-statistic) 0.000047
Sample: 1995:1 2001:4
Included observations: 28
ECONOMIA ABERTA PÓS-PLANO REAL
Variable Coefficient Std. Error t-Statistic Prob.
C -0.067648 0.022501 -3.006419 0.0059
ICV 0.575663 0.200888 2.865596 0.0083
INVTXD 0.503004 0.150882 3.333752 0.0027
R-squared 0.496041 Mean dependent var 0.018548
Adjusted R-squared 0.455725 S.D. dependent var 0.031118
Log likelihood 67.53195 F-statistic 12.30363
Durbin-Watson stat 1.351737 Prob(F-statistic) 0.000191

c2) O salário real e as relações salariais formais (segmento com carteira) - para a
determinação do salário médio real, o modelo especificado em taxas de variação tem
como variáveis explicativas o PIB e o nível de emprego formal (Quadro 53). No período
pré-abertura apenas o coeficiente correspondente à elasticidade-produto do salário
mostrou-se estatisticamente significativa (0,58). No período de economia aberta sob
vigência do Real, a relação estimada não foi significativa.
321

QUADRO 53 - FORMAÇÃO DO SALÁRIO REAL NO SEGMENTO COM CARTEIRA (1982-1989)


Dependent Variable: WRcart
Method: Least Squares
Sample(adjusted): 1982:03 1989:12
Included observations: 94 after adjusting endpoints
Variable Coefficient Std. Error t-Statistic Prob.
C -0.005460 0.005688 -0.959793 0.3397
D(PIB) 0.578118 0.201830 2.864382 0.0052
D(NCCART) 0.871834 0.806918 1.080450 0.2828
R-squared 0.111643 Mean dependent var -0.002467
Adjusted R-squared 0.092119 S.D. dependent var 0.052687
Log likelihood 149.3651 F-statistic 5.718159
Durbin-Watson stat 2.159678 Prob(F-statistic) 0.004579

Mas com uma outra especificação visando a captar separadamente as reações às


oscilações conjunturais, o coeficiente associado ao nível de emprego neste segmento torna-se
estatisticamente significativo. O Quadro 54 mostra que, com esse modelo sob economia
fechada, o salário médio real para o segmento formal responde apenas às variações do nível
de emprego formal, com uma elevada elasticidade.

QUADRO 54 SENSIBILIDADE DE WRcart À CONJUNTURA E A Ncart (1983-2001)


Dependent Variable: WRcart
Method: Least Squares
ECONOMIA FECHADA
Sample(adjusted): 1983:1 1987:4
Included observations: 28
Variable Coefficient Std. Error t-Statistic Prob.
C -0.036120 0.012100 -2.985084 0.0087
PIB- -1.402786 0.817583 -1.715773 0.1055
PIB+ 1.503884 0.741080 2.029314 0.0594
Ncart 2.459462 0.743305 3.308821 0.0044
R-squared 0.456065 Mean dependent var -0.013050
Adjusted R-squared 0.354077 S.D. dependent var 0.054825
Log likelihood 36.29562 F-statistic 4.471758
Durbin-Watson stat 1.845255 Prob(F-statistic) 0.018361
ECONOMIMIA ABERTA
Sample: 1991:1 2001:4
Included
Included observations: 44
Variable Coefficient Std. Error t-Statistic Prob.
C 0.005729 0.005128 1.117121 0.2706
PIB- -0.701859 0.637967 -1.100150 0.2778
+ 1.150332 0.398086 2.889654 0.0062
PIB
Ncart 0.323380 0.203292 1.590716 0.1195
R-squared 0.211390 Mean dependent var 0.003820
Adjusted R-squared 0.152244 S.D. dependent var 0.036217
Log likelihood 89.29872 F-statistic 3.574053
Durbin-Watson stat 2.089282 Prob(F-statistic) 0.022144
No período de economia aberta, o salário médio real passa a responder às variações
positivas do PIB, mas não às negativas, embora o sinal desta última elasticidade seja o
esperado. Isto indica que neste período há rigidez à baixa dos salários para o segmento com
322

carteira. Esse resultado pode ser explicado ao se considerar a existência de custos de


deminssão, mas, sobretudo por se tratar de uma fase onde as empresas reduziram
significativamente seus quadros funcionais para responder ao aumento da concorrência
externa e a uma conjuntura macroeconômica de quase-estagnação.

c3) O salário nominal e as relações salariais informais (segmento sem carteira) - as


estimações mostram que antes da abertura econômica, o salário médio nominal do
segmento sem carteira responde positiva e elasticamente às variações do PIB (elasticidade
= 1, 67; Quadro 55). Todavia, não é sensível a queda do nível de atividade. No período
pós-abertura e pós-plano Real, essa relação muda: o WN dos sem carteira passa a
responder positivamente às quedas do PIB, sugerindo que, durante as recessões, a
economia brasileira tende a aumentar a demanda por relações salariais informais como
forma de ajuste aos ciclos conjunturais e isto exerce um efeito positivo nos salários
nominais pagos a esse segmento.

QUADRO 55 FORMAÇÃO DO SALÁRIO NOMINAL NO SEGMENTO SEM CARTEIRA (1982-


2001)
Dependent Variable: WNscart
Method: Least Squares
Sample(adjusted): 1982:4 1989:4
Included observations: 29 after adjusting endpoints
ECONOMIA FECHADA
Variable Coefficient Std. Error t-Statistic Prob.
C -0.012008 0.028753 -0.417634 0.6798
ICV 0.944519 0.059478 15.88025 0.0000
- 3.936974 1.919127 2.051441 0.0508
PIB
+ 1.671072 0.756699 2.208373 0.0366
PIB
R-squared 0.918179 Mean dependent var 0.383156
Adjusted R-squared 0.908361 S.D. dependent var 0.250206
Log likelihood 35.83504 F-statistic 93.51526
Durbin-Watson stat 1.606294 Prob(F-statistic) 0.000000
ECONOMIA ABERTA SOB VIGÊNCIA DO REAL
Sample: 1995:1 2001:4
Included observations: 28
Variable Coefficient Std. Error t-Statistic Prob.
C -0.011376 0.010949 -1.039025 0.3091
ICV 1.000890 0.231354 4.326231 0.0002
- 0.961008 0.434574 2.211378 0.0368
PIB
+ 1.451003 0.979220 1.481794 0.1514
PIB
R-squared 0.453052 Mean dependent var 0.022768
Adjusted R-squared 0.384683 S.D. dependent var 0.032383
Log likelihood 65.26972 F-statistic 6.626606
Durbin-Watson stat 2.152076 Prob(F-statistic) 0.002031

Por outro lado, esse comportamento é um indicador de que a flexibilidade salarial


da WLN brasileira é também obtida através da redução dos quadros formais e sua
323

substituição por relações salariais que possam escapar da legislação do trabalho. Este fato
foi observado por CORIAT e SABOIA (1995), que sustentaram a hipótese de existência
de relações complementares entre as dinâmicas dos setores formais e informais na
economia brasileira.

Testes foram realizados também para se captar os efeitos diretos do desemprego sobre
a formação do salário nominal deste segmento. O Quadro 56 mostra os resultados das
estimações cujo modelo foi especificado conforme a relação tradicional de Phillips, utilizando
uma função inversa do desemprego.

QUADRO 56 RELAÇÃO DE PHILLIPS PARA WNscart (1982-2001)


Dependent Variable: WNscart
Method: Least Squares
Sample(adjusted): 1982:4 1989:4
Included observations: 29 after adjusting endpoints
ECONOMIA FECHADA
Variable Coefficient Std. Error t-Statistic Prob.
C -0.066962 0.050768 -1.318985 0.1987
ICV 0.913038 0.065265 13.98961 0.0000
INVTXD 0.498059 0.253829 1.962180 0.0605
R-squared 0.908946 Mean dependent var 0.383156
Adjusted R-squared 0.901942 S.D. dependent var 0.250206
Log likelihood 34.28468 F-statistic 129.7725
Durbin-Watson stat 1.589651 Prob(F-statistic) 0.000000
Dependent Variable: WNscart
Method: Least Squares
Sample: 1995:1 2001:4
Included observations: 28
ECONOMIA ABERTA SOB VIGÊNCIA DO REAL
Variable Coefficient Std. Error t-Statistic Prob.
C -0.042013 0.024826 -1.692284 0.1030
ICV 0.739955 0.221646 3.338454 0.0026
INVTXD 0.339180 0.166473 2.037443 0.0523
R-squared 0.433523 Mean dependent var 0.022768
Adjusted R-squared 0.388205 S.D. dependent var 0.032383
Log likelihood 64.77857 F-statistic 9.566206
Durbin-Watson stat 2.197610 Prob(F-statistic) 0.000822
Considerando-se as limitações da amostra, os resultados mostram que o desemprego
não exerce uma influência direta estatisticamente significativa sobre a formação do salário
médio nominal das relações salariais informais.

Uma outra questão relevante seria investigar em que medida o emprego formal
influencia a formação dos salários no segmento informal (e vice-versa). O teste efetuado para
o período de economia fechada não foi significativo. Mas sob o período de abertura e vigência
do Real, uma expansão das relações salariais formais contribui para reduzir o salário médio
nominal no segmento informal (Quadro 57). Como se poderia explicar este fato
324

aparentemente paradoxal ? Uma hipótese plausível seria considerar que com a abertura
comercial e financeira, a demanda por trabalhadores mais qualificados aumentou e o
mercado de trabalho brasileiro foi pressionado pelo aumento do desemprego dos
trabalhadores menos qualificados. 240

QUADRO 57 SENSIBILIDADE DE WNscart ÀS VARIAÇÕES DE Ncart (1995-2001)


Dependent Variable: WNscart
Method: Least Squares
Sample: 1995:1 2001:4
Included observations: 28
Variable Coefficient Std. Error t-Statistic Prob.
C 0.022820 0.005580 4.089580 0.0004
Ncart -1.034453 0.406448 -2.545108 0.0172
R-squared 0.199448 Mean dependent var 0.022768
Adjusted R-squared 0.168657 S.D. dependent var 0.032383
Log likelihood 59.93645 F-statistic 6.477574
Durbin-Watson stat 1.552617 Prob(F-statistic) 0.017201
QUADRO 58 - SENSIBILIDADE DE WNscart ÀS VARIAÇÕES CONJUNTURAIS (1982-2001)
Dependent Variable: WRscart
Method: Least Squares
Sample(adjusted): 1982:09 1989:12
Included observations: 88 after adjusting endpoints
Variable Coefficient Std. Error t-Statistic Prob.
C -0.009153 0.007438 -1.230442 0.2220
PIB - 0.095766 0.403744 0.237195 0.8131
+ 0.917290 0.352779 2.600186 0.0110
PIB
Nscart 0.288128 0.362738 0.794314 0.4293
R-squared 0.092694 Mean dependent var 0.001335
Adjusted R-squared 0.060290 S.D. dependent var 0.047205
Log likelihood 148.6024 F-statistic 2.860580
Durbin-Watson stat 2.089167 Prob(F-statistic) 0.041694
Method: Least Squares
Sample: 1996:01 2001:12
Included observations: 72
Variable Coefficient Std. Error t-Statistic Prob.
C -0.003527 0.002957 -1.192798 0.2371
PIB - 0.131048 0.213445 0.613967 0.5413
PIB + 0.568332 0.218942 2.595809 0.0116
Nscart -0.267856 0.142376 -1.881336 0.0642
R-squared 0.115687 Mean dependent var 0.000542
Adjusted R-squared 0.076673 S.D. dependent var 0.017939
Log likelihood 192.2627 F-statistic 2.965289
Durbin-Watson stat 2.735107 Prob(F-statistic) 0.038072
c4) O salário nominal e as relações salariais informais (segmento sem carteira) - os
testes agora investigam a formação dos salários reais neste segmento. O primeiro modelo
especificado verifica a sensibilidade do salário médio real (Wcart) às variações do PIB e
do nível de emprego informal. Os dados são agora mensais.

240
Aliás essa também é uma conclusão de alguns trabalhos recentes, desenvolvidos pelo IPEA, sobre os
impactos da abertura econômica sobre o mercado de trabalho brasileiro.
325

WR = c1 + C3.PIB - + C4.PIB + + c3.N (11)

Tanto no período de economia fechada quanto no de economia aberta, o salário médio


real do segmento informal responde apenas às variações positivas do PIB. Houve porém uma
redução da elasticidade no período de abertura sob vigência do Real, que passa de 0,92 para
0,57 (Quadro 58).

O Quadro 59 mostra uma correlação positiva entre o salário médio do segmento


formal e o rendimento médio real dos trabalhadores independentes. Pode-se considerar que
parte expressiva da demanda pelos bens e serviços do segmento conta própria é proveniente
das relações salariais (tanto formais quanto informais) e então este resultado está expressando
esta vinculação macroeconômica. Houve também uma redução do valor dessa elasticidade
que passa de 1,04 para 0,89, no período de abertura. Por outro lado, o teste de causalidade de
Granger indica que variações no rendimento médio real dos trabalhadores independentes
precedem as variações do salário médio real do segmento com carteira (Quadro 60).

QUADRO 59 RELAÇÃO ENTRE WRcprop E WRcart (1982-2001)


Dependent Variable: WRcprop
Method: Least Squares
Sample(adjusted): 1982:4 1989:4
Included observations: 29 after adjusting endpoints
ECONOMIA FECHADA
Variable Coefficient Std. Error t-Statistic Prob.
C 0.005792 0.017541 0.330214 0.7440
PIB 0.296194 0.518757 0.570968 0.5731
Ncprop 0.013215 0.808802 0.016338 0.9871
WRcart 1.040025 0.214834 4.841061 0.0001
R-squared 0.485658 Mean dependent var 0.010370
Adjusted R-squared 0.423937 S.D. dependent var 0.109568
Log likelihood 33.12522 F-statistic 7.868587
Durbin-Watson stat 2.008440 Prob(F-statistic) 0.000730
Sample: 1995:1 2001:4
Included observations: 28
ECONOMIA ABERTA SOB VIGÊNCIA DO REAL
Variable Coefficient Std. Error t-Statistic Prob.
C 0.000618 0.005752 0.107444 0.9153
PIB 0.058731 0.281202 0.208857 0.8363
Ncprop 0.285495 0.427962 0.667104 0.5111
WRcart 0.891075 0.240642 3.702910 0.0011
R-squared 0.475271 Mean dependent var 0.001755
Adjusted R-squared 0.409680 S.D. dependent var 0.035965
Log likelihood 62.91264 F-statistic 7.245960
Durbin-Watson stat 1.872066 Prob(F-statistic) 0.001260
326

QUADRO 60 TESTE DE CAUSALIDADE DE GRANGER PARA WRcprop e WRcart (1982-2001)


Pairwise Granger Causality Tests
Sample: 1982:08 2001:12
Lags: 4
Null Hypothesis: Obs F-Statistic Probability
WRCCART does not Granger Cause 229 1.03926 0.38780
WCPROP
WCPROP does not Granger Cause WRCCART 3.28349 0.01222

Os testes também mostraram que para o segmento dos trabalhadores independentes, a


sensibilidade do rendimento médio real às variações conjunturais não é estatisticamente
significativa. Inclusive as variações do custo de vida também não se mostraram significativas
nem antes nem depois da abertura econômica.

d) A WLN e a fixação do salário mínimo


A institucionalização do salário mínimo foi um marco no processo de estruturação da
WLN brasileira. Como nos EUA, Austrália e Nova Zelândia foi também uma reivindicação
antiga dos movimentos de trabalhadores. Mas nesses países essa reivindicação foi atendida já
no século XIX. No Brasil, a discussão sobre a matéria começa em 1931 com a criação do
Ministério do Trabalho, sendo incluído nas Constituições de 1934 e 1937. Embora sua
regulamentação date de 1938, só começou a ser efetivamente pago a partir de 02 de julho de
1940. O Gráfico 65 mostra a sua evolução desde o primeiro ano de pagamento, onde se pode
constatar a perda de seu valor real, mesmo nos períodos de mais altas taxas de crescimento
econômico.

O salário mínimo real médio atingiu seu máximo em 1961. Segundo SABOIA (1985,
241
p. 86) :

A fixação do salário mínimo foi feita a partir das Comissões de Salário


Mínimo, com o auxílio do Serviço de Estatísticas da Previdência e Trabalho,
utilizando o Censo do Salário Mínimo. O resultado final significou a
institucionalização dos baixos valores pagos aos trabalhadores na época,
beneficiando as classes dominantes. (...). Embora programado para ser
reavaliado a cada três anos, após o reajuste de 1943, o salário mínimo
permaneceu inalterado em termos nominais durante oito anos, perdendo
parcela ponderável de seu valor no período.

Este ponto de vista é também compartilhado por S.R.de MENDONÇA (1985).


Segunda a autora, ao fixar o salário mínimo, em 1940, em níveis realmente biológicos, a
legislação trabalhista reduzia, ao máximo possível, os gastos dos empresários com a folha de

241
João SABOIA (1986), Salário Mínimo a experiência brasileira, Coleção Universidade Livre. L&PM
Editores.
327

pagamento, pois no seu cálculo não foram computados, por exemplo, as despesas com
educação e saúde.

GRÁFICO 65 EVOLUÇÃO DO SALÁRIO MÍNIMO, DO SALÁRIO MÉDIO E DO PIB PER CAPITA


(1944-2002)

Salário mínimo real


Salário médio real
PIB per capita
700
600
500
Índice dos valores: 1940 = 100

400
300
(Escala log)

200

100

1940 1946 1952 1958 1964 1970 1976 1982 1988 1994 2000
1943 1949 1955 1961 1967 1973 1979 1985 1991 1997 2003

FONTE: Dados para salário mínimo e PIB per capita obtidos no IPEADATA. Dados para salário médio obtidos
em MARQUETTI (2002); FGV e Sistema de Contas Nacionais-IBGE.

Segundo MENDONÇA, boa parte dos estudos dedicados ao tema preocupa-se mais
com a dimensão política da legislação trabalhista estabelecida durante o Estado Novo (1937-
1945) e deixam em segundo plano o fato de que o salário mínimo constitui um poderoso
instrumento da acumulação urbano-industrial. Como o salário mínimo tornou-se a referência
de base nos julgamentos dos dissídios coletivos, ele convertia-se no parâmetro para a fixação
do salário direto. A legislação salarial cumpria então sua tarefa de nivelar por baixo o
conjunto dos salários e essa característica, juntamente com o controle dos trabalhadores e dos
movimentos sociais242, tornar-se-ia uma das bases institucionais da regulação tutelar ,
243
analisada por CORIAT e SABOIA (1988) .

De 1961 a 1980, enquanto o PIB per capita cresceu 127 % em termos reais, o salário
mínimo real médio caiu 34 %. Se for considerado o período de 1961 a 1992, a queda

242
Segundo MENDONÇA (1985, p. 30), o imposto sindical cobrado de cada trabalhador com base em um dia
de trabalho por ano além de propiciar à União considerável reforço em sua receita, contribuiu para consolidar o
papel tutelar do Estado junto aos sindicatos.
243
CORIAT e SABOIA (1988), Regime de acumulação e relação salarial no Brasil: um processo de
fordização forçada e contrariada . Porto Alegre, Ensaios FEE, 1988.
328

praticamente dobra (- 62 %), enquanto o crescimento acumulado do PIB per capita foi da
ordem de 113 %. Apenas a partir de 1994 é que se observa uma recuperação do salário
mínimo real médio que, no entanto, permanece em cerca de 56 % do seu valor máximo
histórico.

O salário médio real acompanhou, de uma maneira geral, a evolução do PIB per
capita. Todavia, no Gráfico 65 são destacados três momentos onde as evoluções dessas duas
séries mostraram-se divergentes, correspondendo, em conseqüência, às fases de concentração
da renda. A primeira corresponde ao período de vigência do Plano de Metas [1955-1961], a
segunda, [1964 1974], ocorre durante o regime autoritário e a terceira durante os anos 90.

O Gráfico 66 sugere a existência de uma relação entre o salário mínimo real e o salário
médio real na indústria de transformação. Essa vinculação foi testada por CARNEIRO e
FARIA (1996) que utilizaram os salários neste setor como proxy para os demais salários.
Esses autores encontraram causalidade unidirecional do salário mínimo para os outros salários
no Brasil, entre 1980 e 1985. Mas para o período 1986-1993, encontraram simultaneidade ou
causalidade bi-direcional. Ainda pelo Gráfico 66, pode ser constatado que a partir de março
de 1996, as séries do salário mínimo real e do salário médio real na indústria de transformação
começam a divergir. Apenas a partir de março de 1999 momento da mudança do regime
cambial provocada por um ataque especulativo contra o Real é que as séries voltam a
evoluir em correlação positiva. Isto poderia levar a algumas hipóteses quanto aos impactos da
mudança da forma de inserção internacional na economia brasileira dos anos 90. A abertura
comercial e financeira reduziu a influência do salário mínimo nacional na determinação do
salário médio da indústria, à medida que a intensificação da concorrência levou ao aumento
do desemprego e à queda dos salários fixados no setor privado produtivo. Todavia, a
desvalorização cambial de 1999 teria permitido uma nova conexão entre as séries, mas a partir
de um patamar muito mais inferior do salário médio real na indústria de transformação. Isto
significa também que a indústria nacional voltada para exportação não enfrentaria problemas
de competitividade oriundos de custos salariais.
329

GRÁFICO 66 SALÁRIO MÍNIMO E SALÁRIO MÉDIO NA INDÚSTRIA (1985-2001)

Salário médio real na indústria de transformação


Salário mínimo real
5,2

5,0

4,8

4,6

4,4

4,2

4,0
Mar-85

Mar-86

Mar-87

Mar-88

Mar-89

Mar-90

Mar-91

Mar-92

Mar-93

Mar-94

Mar-95

Mar-96

Mar-97

Mar-98

Mar-99

Mar-00

Mar-01
Sep-85

Sep-86

Sep-87

Sep-88

Sep-89

Sep-90

Sep-91

Sep-92

Sep-93

Sep-94

Sep-95

Sep-96

Sep-97

Sep-98

Sep-99

Sep-00
FONTE: Dados sobre salário mínimo foram obtidos no IPEADATA. Os dados sobre salário médio são
provenientes da PIM-DG/IBGE.

Neste trabalho, outros testes foram realizados para se avaliar com dados mais recentes
essa relação tão relevante nas discussões sobre os efeitos do salário mínimo no mercado de
trabalho. A primeira equação estimada em taxas de variação (Quadro 61) revela uma relação
entre o salário médio na indústria de transformação (WRITRF) e o salário mínimo médio
nacional (SALMINR), ambos em termos reais.

D(WRITRF) = 1 + 2.D(SALMINR) + (12)

QUADRO 61 ESTIMAÇÃO DE WRITRF E SALMIN NO PERÍODO (1985-2001)


Dependent Variable: D(WRITRF)
Method: Least Squares
Sample(adjusted): 1985:2 2001:1
Included observations: 64 after adjusting endpoints
Variable Coefficient Std. Error t-Statistic Prob.
D(SALMINR) 0.383373 0.093211 4.112960 0.0001
R-squared 0.211506 Mean dependent var -0.000902
Adjusted R-squared 0.211506 S.D. dependent var 0.061722
S.E. of regression 0.054808 Akaike info criterion -2.954466
Sum squared resid 0.189246 Schwarz criterion -2.920733
Log likelihood 95.54290 Durbin-Watson stat 2.185340
NOTA: O termo constante não foi estatisticamente significativo.
330

FIGURA 24 TESTES DE ESTABILIDADE DA RELAÇÃO ENTRE WRITRF E SALMIN (1985:2 -


2001:1)

0.2 1.0
0.1
0.8
0.0
0.6
-0.1
0.4
-0.2
0.00
-0.3 0.2
0.05 0.0

-0.2
0.10
-0.4
0.15
86 88 90 92 94 96 98 00 -0.6
88 90 92 94 96 98 00
One-Step Probability Recursive Residuals
Recursive C(1) Estimates ± 2 S.E.

Há uma mudança estrutural, em inícios dos anos 90, que pode ser explicada pela
implementação dos planos de estabilização de preços (Collor I e II) com seus efeitos
recessivos. Essa quebra estrutural, juntamente com outros momentos de ruptura nas
regularidades macroeconômicas, será novamente confirmada nos testes econométricos
subseqüentes. Na presente análise, esses momentos são relevantes porque proporcionam um
critério empírico para a periodização da evolução econômica brasileira, a partir dos modelos
definidos para estimação (Figura 24).

QUADRO 62 TESTE DE CAUSALIDADE DE GRANGER PARA WRITRF E SALMIN (1985:1-


2001:1)
Pairwise Granger Causality Tests
Sample: 1985:1 2001:1
Lags: 2
Null Hypothesis: Obs F-Statistic Probability
WRITRF does not Granger Cause SALMIN 63 0.84140 0.43630
SALMIN does not Granger Cause WRITRF 3.36234 0.04153
O teste econométrico mostra que de fato há uma relação entre o salário mínimo real e
o salário médio real da indústria de transformação. Além disso, o teste de causalidade de
Granger mostra que as variações do salário mínimo real precedem as variações do salário
médio real neste setor (Quadro 62).

Mas o problema com esse teste em taxas de variação e com as variáveis em termos
reais é que ele pode estar simplesmente refletindo a corrosão inflacionária sobre as duas
séries. Então a mesma equação foi estimada com as variáveis em logaritmo e em termos
nominais, como o fizeram FARIA e CARNEIRO (1996):

LWNITRF = log natural do salário médio nominal na indústria de transformação;

LSALMINN = log natural do salário mínimo nominal


331

Os testes de raízes unitárias mostram que as séries são I(1)244 e então foi realizado o
teste de co-integração de JOHANSEN que rejeitou a hipótese nula de ausência de pelo menos
uma relação co-integrante (Quadros 63 e 64).

QUADRO 63 TESTES DE RAIZES UNITÁRIAS PARA LWNITRF E LSALMINN (1985:01 1989:11)


ADF Test Statistic LWNITRF LSALMINN
1.031806 0.914778 1% Critical Value* -4.1249
5% Critical Value -3.4889
10% Critical Value -3.1727
*MacKinnon critical values for rejection of hypothesis of a unit root
QUADRO 64 TESTE DE CO-INTEGRAÇÃO DE JOHANSEN PARA LWNITRF E LSALMIN
(1985:04-1989:11)
Sample: 1985:01 1989:11
Included observations: 57
Series: LWNITRF LSALMINN
Likelihood 5 Percent 1 Percent Hypothesized
Eigenvalue Ratio Critical Value Critical Value No. of CE(s)
0.320198 27.60132 19.96 24.60 None **
0.093605 5.601965 9.24 12.97 At most 1
*(**) denotes rejection of the hypothesis at 5%(1%) significance level
L.R. test indicates 1 cointegrating equation(s) at 5% significance level

Normalized Cointegrating Coefficients: 1 Cointegrating Equation(s)


LWNITRF LSALMINN C
1.000000 -1.106144 0.702650
(0.02955) (0.09185)

Log likelihood 134.7691

Para captar os efeitos de curto prazo foi estimado o VECM correspondente. O


coeficiente do termo de correção de erros revelou-se significativamente negativo como
esperado o que valida esse tipo de representação da relação estimada (Quadro 65).

244
Por razões de espaço, os testes de raízes unitárias nas séries em primeiras diferenças não são mostrados.
Todos rejeitaram a hipótese nula de presença de uma raiz unitárias, ou seja, as séries são estacionárias em
primeiras diferenças.
332

QUADRO 65 EQUAÇÃO CO-INTEGRANTE E VECM PARA LWNITRF E SALMINN (1985:04-


1989:11)
Sample(adjusted): 1985:04 1989:11
Included observations: 56 after adjusting
endpoints
t-statistics in parentheses
Cointegrating Eq: CointEq1
LWNITRF(-1) 1.000000

SALMINN(-1) -1.150703
(-18.0504)

C 0.694428
(4.78748)

Error Correction: D(LWNITRF)


CointEq1 -0.116928
(-3.22345)

D(LWNITRF(-1)) 0.774347
(5.17521)

D(LWNITRF(-2)) -0.105341
(-0.57409)

D(SALMINN(-1)) -0.164012
(-2.12816)

D(SALMINN(-2)) 0.009164
(0.11614)
R-squared 0.609583
Adj. R-squared 0.578962

QUADRO 66 - TESTE DE CAUSALIDADE DE GRANGER PARA LWNITRF E LSALMINN (1985:01 -


1989:11)
Pairwise Granger Causality Tests
Sample: 1985:01 1989:11
Lags: 2
Null Hypothesis: Obs F-Statistic Probability
LWNITRF does not Granger Cause 57 15.7102 4.6E-06
LSALMINN
LSALMINN does not Granger Cause LWNITRF 1.55732 0.22037

O resultado do teste de causalidade de Granger agora contradiz o teste anterior


realizado com as variáveis em taxas de variação e em termos reais. Neste período [1989:01
1989:11], mudanças no salário médio nominal da indústria de transformação precedem as
mudanças no salário mínimo (Quadro 66). Isto significa que a fixação dos salários no setor
privado teria exercido influência nas decisões governamentais quanto à fixação do nível do
salário mínimo.

A estimação da equação para o período seguinte [1991:01 2001:01] revelou-se


problemática, em razão da instabilidade estrutural presente entre 1990 e 1993 (segundo os
333

testes do CUSUM, Figura 25). O período foi então subdividido e a equação retida apenas
quando estruturalmente estável (Quadro 67).

FIGURA 25 TESTES DE ESTABILIDADE DA RELAÇÃO WRITRF E SALMIN (1991:01 2001:01)


40 1.2

1.0

20
0.8

0.6
0
0.4

0.2
-20
0.0

-40 -0.2
92 93 94 95 96 97 98 99 00 01 92 93 94 95 96 97 98 99 00 01

CUSUM 5% Signific anc e CUSUM of Squares 5% Significance

QUADRO 67 - ESTIMAÇÃO DE LWNITRF E LSALMIN NO PERÍODO (1995:06 - 2001:01)


Dependent Variable: LWNITRF
Method: Least Squares
Sample: 1995:06 2001:01
Included observations: 68
Variable Coefficient Std. Error t-Statistic Prob.
C 11.04644 1.101061 10.03254 0.0000
LSALMINN 0.503039 0.047390 10.61487 0.0000
R-squared 0.630615 Mean dependent var 22.73387
Adjusted R-squared 0.625018 S.D. dependent var 0.083792
S.E. of regression 0.051311 Akaike info criterion -3.072871
Sum squared resid 0.173763 Schwarz criterion -3.007591
Log likelihood 106.4776 F-statistic 112.6754
Durbin-Watson stat 0.616177 Prob(F-statistic) 0.000000

FIGURA 26 TESTES DE ESTABILIDADE DA RELAÇÃO ENTRE WRITRF E SALMIN (1995:06 -


2001:01)
30 1.2 0.2

1.0 0.1
20
0.0
0.8
10 -0.1
0.6
0.00 -0.2
0
0.4
0.05
-10
0.2
0.10
-20 0.0
0.15
-30 -0.2 1996 1997 1998 1999 2000 2001
1996 1997 1998 1999 2000 2001 1996 1997 1998 1999 2000 2001
One-Step Probability Recursive Residuals
CUSUM 5% Signific anc e CUSUM of Squares 5% Significance

Neste período a relação estimada revelou-se estável (Figura 26) e então foram
realizados os testes de raízes unitárias e de co-integração. Todavia, a qualidade do ajuste para
o subperíodo [1995:06 1998:01] e o fato de se tratar de uma fase anterior à mudança do
regime cambial em 1999, fornece uma base empírica para uma nova divisão do período
(Quadro 68). A relação foi então estimada antes e depois da desvalorização cambial de 1999.
Os resultados foram os seguintes:
334

QUADRO 68 - ESTIMAÇÃO DE LWNITRF E LSALMIN NO PERÍODO (1995:06- 1998:01)


Dependent Variable: LWNITRF
Method: Least Squares
Sample: 1995:06 1998:01
Included observations: 32
Variable Coefficient Std. Error t-Statistic Prob.
C -0.213269 2.745722 -0.077673 0.9386
LSALMINN 0.990305 0.118772 8.337892 0.0000
R-squared 0.698554 Mean dependent var 22.68013
Adjusted R-squared 0.688506 S.D. dependent var 0.093996
S.E. of regression 0.052461 Akaike info criterion -2.997047
Sum squared resid 0.082563 Schwarz criterion -2.905439
Log likelihood 49.95276 F-statistic 69.52044
Durbin-Watson stat 1.762770 Prob(F-statistic) 0.000000

As séries apresentaram raízes unitárias. Todavia, como o teste ADF sobre LSALMINN aceita
a hipótese nula de não estacionaridade apenas no nível de 1%, foi executado o teste de
Phillips-Perron (Quadros 69 e 70). Considerando-se que o teste PP, de maior potência que o
ADF, rejeitou a hipótese nula de raiz unitária nos níveis de 1%, 5% e 10%, concluiu-se que a
série do log do salário mínimo nominal não apresenta raiz unitária para esse período. A
hipótese de co-integração foi então descartada e a equação foi estimada em primeiras
diferenças para se captar a dinâmica de curto prazo.

QUADRO 69 - TESTES DE RAIZES UNITÁRIAS PARA LWNITRF E LSALMINN (1995:06 1998:01)


ADF Test Statistic LWNITRF LSALMINN
-2.611054 -4.188109 1% Critical Value* -4.2712
5% Critical Value -3.5562
10% Critical Value -3.2109
*MacKinnon critical values for rejection of hypothesis of a unit root

QUADRO 70 - TESTE DE PHILLIPS-PERRON PARA LWNITRF E LSALMINN (1995:06 1998:01)


Phillips-Perron Test Equation
Dependent Variable: D(SALMINN)
PP Test Statistic -4.662250 1% Critical Value* -4.2712
5% Critical Value -3.5562
10% Critical Value -3.2109
*MacKinnon critical values for rejection of hypothesis of a unit root.

Neste período [1995:06 1998:01], correspondente à fase de vigência do Plano Real


com regime de bandas cambiais (um regime de câmbio fixo, mas ajustável), o resultado da
estimação é análogo ao encontrado por FARIA e CARNEIRO (1996), para o período [1986-
1993], ou seja, há causalidade bidirecional do salário mínimo para o salário médio em vigor
no setor industrial (Quadro 71 e 72).
A estimação seguinte refere-se ao período posterior à mudança de regime cambial de
janeiro de 1999 (Quadro 73). Após a forte desvalorização do Real, o regime cambial passa ser
flutuante e a economia brasileira recompõe as condições de competitividade internacional que
335

mais dependiam da relação câmbio/salário. Entre janeiro de 1999 e julho de 2004, essa
relação é incrementada em 50% (Gráfico 67).

QUADRO 71 ESTIMAÇÃO DE LWNITRF E LSALMINN EM PRIMEIRAS DIFERENÇAS(1995:06-


1998:01)
Dependent Variable: D(LWNITRF)
Method: Least Squares
Sample: 1995:06 1998:01
Included observations: 32
Variable Coefficient Std. Error t-Statistic Prob.
C 0.014718 0.007071 2.081637 0.0460
D(LSALMINN) -0.408480 0.172645 -2.366006 0.0246
R-squared 0.157256 Mean dependent var 0.010995
Adjusted R-squared 0.129164 S.D. dependent var 0.041786
S.E. of regression 0.038994 Akaike info criterion -3.590364
Sum squared resid 0.045616 Schwarz criterion -3.498755
Log likelihood 59.44582 F-statistic 5.597985
Durbin-Watson stat 2.486890 Prob(F-statistic) 0.024638

QUADRO 72 - TESTE DE CAUSALIDADE DE GRANGER PARA LWNITRF E LSALMINN EM


PRIMEIRAS DIFERENÇAS (1995:06 - 1998:01)
Pairwise Granger Causality Tests
Sample: 1995:06 1998:01
Lags: 1
Null Hypothesis: Obs F-Statistic Probability
D(LSALMINN) does not Granger Cause 32 4.60129 0.04045
D(LWNITRF)
D(LWNITRF) does not Granger Cause 34.9786 2.0E-06
D(LSALMINN)

GRÁFICO 67 EVOLUÇÃO DA RELAÇÃO CÂMBIO / SALÁRIO (1979 2004)

Relação câmbio efetivo / salário - índice (dez. 1998 = 100) - Mensal

Lowess
400

350

300

250

200

150

100

50
1979 01
1979 10
1980 07
1981 04
1982 01
1982 10
1983 07
1984 04
1985 01
1985 10
1986 07
1987 04
1988 01
1988 10
1989 07
1990 04
1991 01
1991 10
1992 07
1993 04
1994 01
1994 10
1995 07
1996 04
1997 01
1997 10
1998 07
1999 04
2000 01
2000 10
2001 07
2002 04
2003 01
2003 10
2004 07

FONTE: Séries originais obtidas no IPEADATA.


336

QUADRO 73 - ESTIMAÇÃO DE LWNITRF E LSALMIN NO PERÍODO (1999:02 - 2001:01)


Dependent Variable: LWNITRF
Method: Least Squares
Sample: 1999:02 2001:01
Included observations: 24
Variable Coefficient Std. Error t-Statistic Prob.
C 15.26214 1.752046 8.711038 0.0000
LSALMINN 0.321650 0.074967 4.290579 0.0003
R-squared 0.455568 Mean dependent var 22.77941
Adjusted R-squared 0.430821 S.D. dependent var 0.026499
S.E. of regression 0.019992 Akaike info criterion -4.907312
Sum squared resid 0.008793 Schwarz criterion -4.809141
Log likelihood 60.88775 F-statistic 18.40907
Durbin-Watson stat 1.180527 Prob(F-statistic) 0.000297

QUADRO 74 - TESTES DE RAIZES UNITÁRIAS PARA LWNITRF E LSALMINN (1999:02 2001:01)


ADF Test Statistic LWNITRF LSALMINN
-0,773153 -2.273953 1% Critical Value* -3.7343
5% Critical Value -2.9907
10% Critical Value -2.6348
*MacKinnon critical values for rejection of hypothesis of a unit root

Apesar de serem I(1), as series neste período não co-integram (Quadros 74 e 75) e então o
modelo foi estimado em primeiras diferenças para se captar a dinâmica de curto prazo.

QUADRO 75 TESTE DE CO-INTEGRAÇÃO DE JOHANSEN (1999:02-2001:01)


Sample: 1999:02 2001:01
Included observations: 24
Series: LWNITRF SALMINN
Likelihood 5 Percent 1 Percent Hypothesized
Eigenvalue Ratio Critical Value Critical Value No. of CE(s)
0.355066 15.76534 19.96 24.60 None
0.196101 5.238773 9.24 12.97 At most 1
*(**) denotes rejection of the hypothesis at 5%(1%) significance level
L.R. rejects any cointegration at 5% significance level

QUADRO 76 - ESTIMAÇÃO DE LWNITRF E LSALMIN EM DIFERENÇAS (1999:02 - 2001:01)


Dependent Variable: D(LWNITRF)
Method: Least Squares
Sample: 1999:02 2001:01
Included observations: 24
Variable Coefficient Std. Error t-Statistic Prob.
C 0.003942 0.003832 1.028695 0.3148
D(SALMINN) -0.237463 0.171034 -1.388398 0.1789
R-squared 0.080562 Mean dependent var 0.002269
Adjusted R-squared 0.038769 S.D. dependent var 0.018177
S.E. of regression 0.017821 Akaike info criterion -5.137250
Sum squared resid 0.006987 Schwarz criterion -5.039079
Log likelihood 63.64700 F-statistic 1.927648
Durbin-Watson stat 2.572289 Prob(F-statistic) 0.178915

Os coeficientes da relação de curto prazo não são estatisticamente significativos e a


conclusão é a de que neste período não há nenhuma influência entre a evolução do salário
337

mínimo nominal e o comportamento do salário médio nominal na indústria de transformação,


considerado como proxy para os salários determinados pelo setor privado.

QUADRO 77 SENSIBILIDADE DO RENDIMENTO MÉDIO À EVOLUÇÃO DO SALÁRIO MÍNIMO


(1982 2001)

PERÍODOS
[1982 1989] [1992 1993] [1995 1998] [1999 2001]
SEGMENTOS

FORMAL
W nominal 1,03 1,02 0,96 0,23
(c/carteira)
W real 0,32 0,09 0,57 n.s.

INFORMAL
W nominal 1,04 0,98 0,97 0,42
(s/carteira)
W real 0,17 0,16 0,61 n.s.

NOTA: O modelo estimado foi especificado como: rendimento médio nominal (real) = b1 + b2. salário mínimo
nominal(real), com todas as variáveis em logaritmo natural. A periodização efetuou-se através dos testes de
estabilidade estrutural do CUSUM, CUSUMSQ e N-step forecast test.

Utilizando-se a mesma metodologia, a relação foi estimada para os segmentos com e


sem carteira que compõem os principais eixos da WLN brasileira. Os coeficientes relativos às
elasticidades dos rendimentos médios dos segmentos à evolução do salário mínimo
encontram-se no Quadro 77.

e) A WLN e o setor industrial

In case of the labor market, our preoccupation


with price-mediated market clearing as the natural
equilibrium condition may be a serious error.
(Robert Solow; 1986)245
Para se avaliar o grau de flexibilidade da WLN brasileira, um conjunto de testes
econométricos será proposto. Busca-se captar as dimensões referentes à flexibilidade
quantitativa e salarial, o que permitirá uma taxionomia mais precisa da atual configuração
desta forma institucional de base.

Os ajustamentos do emprego na indústria a presente especificação permite apreender


o grau de inércia do emprego e sua sensibilidade às mudanças do produto industrial e ao
custo salarial. Trata-se de se captar o modo como o emprego é determinado no setor
industrial brasileiro.

245
Citação em BOYER (1998) em « Le Lien Salaire / Emploi dans la Théorie de la Régulation autant de
relations que de configurations institutionnelles », Cepremap, 9814, septembre de 1998.
338

O modelo estimado foi especificado da seguinte forma:

Nind t = c + 1. Nind t-1 + 2 .Nind t-2 + 3 .Yind + 4.CW + dt + D + t (13)

Nind é o emprego industrial no período t; Yind é o nível de produção industrial em t; CW é o


custo salarial médio real da indústria; dt expressa uma tendência determinística do emprego
industrial; D são variáveis dummies sazonais; t é um distúrbio relativo a componentes
inobserváveis e erros de mensuração das variáveis em questão. Os dados originais são
provenientes da Pesquisa Mensal de Emprego (PIM) do IBGE.246

GRÁFICO 68 EMPREGO, PRODUÇÃO INDUSTRIAL E CUSTO SALARIAL (1985-2001)

Emprego industrial
Produção física
Custo salarial médio real
220
Índice dos valores: jan-1985 = 100

200
180
160
140
120
100
80
60
40
1985 01
1985 06
1985 11
1986 04
1986 09
1987 02
1987 07
1987 12
1988 05
1988 10
1989 03
1989 08
1990 01
1990 06
1990 11
1991 04
1991 09
1992 02
1992 07
1992 12
1993 05
1993 10
1994 03
1994 08
1995 01
1995 06
1995 11
1996 04
1996 09
1997 02
1997 07
1997 12
1998 05
1998 10
1999 03
1999 08
2000 01
2000 06
2000 11
2001 04
FONTE: Pesquisa Industrial Mensal (PIM-DG e PIM-PF) do IBGE, através do IPEADATA.
NOTA: Folha de salários deflacionada pelo IPA-OG e incorporando as alíquotas de contribuição social
(seguridade social; Funrural; fundo para acidentes de trabalho; salário-educação; contribuição para instituições
de ensino técnico e serviço social; INCRA e FGTS. Todas as séries foram dessazonalizadas pelo método
X11/2000 Census 2. Dados referem-se à produção da indústria geral.
A reestruturação da indústria, como resposta à abertura comercial e financeira e o
aprofundamento da restrição externa tiveram impactos decisivos na evolução da WLN
brasileira, afetando tanto o nível e a composição do emprego, como a determinação do salário.
O Gráfico 68 mostra a evolução dessas variáveis e a menor variabilidade da série do nível de

246
As defasagens do emprego foram escolhidas mediante o critério de informação de Schwarz. Para o produto e
para o custo salarial médio não houve defasagens estatisticamente significativas.
339

emprego. Como há custos de ajustamento, as alterações do nível de emprego efetuadas pelo


setor industrial são diluídas ao longo do tempo.247

Conforme GONZAGA e CORSEUIL (2001), essa característica da evolução do nível


de emprego é observada na maioria dos países. Mas em termos de uma análise regulacionista,
significa reconhecer que é a configuração da forma institucional da WLN que determina a
velocidade de ajuste do emprego. O nível de institucionalidade das relações salariais e de
emprego, em conjunção com as características das formas organizacionais do trabalho,
responde pelo grau de inércia ou de flexibilidade quantitativa e salarial. Mas neste contexto,
os arranjos institucionais e organizacionais não devem ser apreendidos como se fossem
fatores geradores de rigidez ou perturbadores de uma lógica mercantil otimizadora, pois as
configurações da WLN podem ser a expressão da coerência de um modo de regulação.248

A construção das séries do custo salarial médio baseou-se na metodologia utilizada em


GONZAGA e CORSEUIL (2001) que estimaram um modelo com a mesma especificação.
Porém as séries aqui utilizadas cobrem o período de mar/1985 a abr/2001, numa amostra
maior do que a utilizada por esses autores. O valor da folha de pagamento foi deflacionado
pelo IPA-OG e após incorporar as alíquotas de contribuição social (Funrural; fundo de
acidentes de trabalho; salário-educação; contribuição para instituições de ensino técnico e
serviço social; INCRA e FGTS), essa massa salarial real foi dividida pelo pessoal ocupado na
produção da indústria geral. Trata-se, portanto, de uma medida do custo salarial do ponto de
vista da empresa industrial. O modelo incorpora, portanto os custos de movimentação de
pessoal, ou seja, os custos de admissão e dispensa que são por sua vez influenciados por
determinações institucionais. Os resultados das estimações encontram-se nos quadros 78 a 81.
A Figura 27 mostra os testes de estabilidade estrutural correspondente ao período 1985-2001.

247
Conforme GONZAGA e CORSEUIL (2001), essa característica da evolução do nível de emprego é
observada na maioria dos países. Em termos de uma análise regulacionista, significa reconhecer que os custos de
ajustamento dependem das configurações da WLN.
248
As análises regulacionistas para o caso do Japão e Alemanha são particularmente ilustrativas dessa
problemática. Esses países mostram que mediante configurações específicas da WLN é possível obter-se outras
dimensões (dinâmicas) da flexibilidade, que não se reduzem à flexibilidade quantitativa (estática). Por exemplo,
a possibilidade de ajuste por horas de produção ou por salário variável em função do nível de demanda efetiva /
faturamento, permite acessar níveis de flexibilidade que preservam a estabilidade das relações de emprego, Nos
anos 90, a economia brasileira redescobriria também essa importante forma de flexibilizar as relações de
trabalho, apesar das instituições de regulação da WLN permanecerem ainda pouco adaptadas a essa modalidade.
340

QUADRO 78 ESTIMAÇÃO DA EQUAÇÃO (8) PARA O PERÍODO (1985:03 2001:04)


Dependent Variable: NIND
Method: Least Squares
Sample(adjusted): 1985:03 2001:04
Included observations: 194 after adjusting endpoints
Variable Coefficient Std. Error t-Statistic Prob.
C 0.057643 0.041408 1.392061 0.1657
NINDT_1 1.586868 0.057809 27.45027 0.0000
NINDT_2 -0.611317 0.056121 -10.89289 0.0000
YIND 0.021003 0.006480 3.241456 0.0014
CW -0.009698 0.003677 -2.637835 0.0091
dt -9.94E-05 2.80E-05 -3.553798 0.0005
D1 0.018122 0.002511 7.218271 0.0000
D2 0.008554 0.002465 3.470068 0.0007
D3 0.008600 0.002527 3.402654 0.0008
D4 0.010540 0.002455 4.293291 0.0000
D5 0.011780 0.002487 4.737283 0.0000
D6 0.007292 0.002528 2.884168 0.0044
D7 0.006101 0.002646 2.305560 0.0223
D8 0.006676 0.002771 2.409201 0.0170
D9 0.009288 0.002710 3.426821 0.0008
D10 0.006215 0.002732 2.274966 0.0241
D11 0.004461 0.002346 1.901374 0.0589
R-squared 0.999446 Mean dependent var 4.464779
Adjusted R-squared 0.999396 S.D. dependent var 0.234949
S.E. of regression 0.005775 Akaike info criterion -7.386980
Sum squared resid 0.005903 Schwarz criterion -7.100621
Log likelihood 733.5370 F-statistic 19953.82
Durbin-Watson stat 1.771714 Prob(F-statistic) 0.000000

QUADRO 79 -AJUSTAMENTO DO EMPREGO INDUSTRIAL: ELASTICIDADES DE CURTO


PRAZO (1985-2001)
Período Coeficiente de ajuste Elasticidade- Elasticidade- Tendência
( 1 + 2) produto do custo salarial do
emprego emprego
jan/1985
a 0,9755 0,0210 - 0,010 - 0,0001
abr/2001
QUADRO 80 AJUSTAMENTO DO EMPREGO INDUSTRIAL: ELASTICIDADES DE LONGO
PRAZO (1985-2001)249
Período Elasticidade- Elasticidade-
produto do custo salarial do
emprego emprego
jan/1985 a
0,8571 - 0,4082
abr/2001

249
Essas elasticidades foram calculadas considerando-se a acumulação dos efeitos de curto prazo, dividindo-se
os valores das elasticidades de curto prazo por (1- 1 - 2) que é a velocidade de ajustamento do emprego.
GONZAGA e CORSEUIL (2001) encontraram os valores de 1,13 para a elasticidade-produto do emprego e de -
0,66 para a elasticidade-custo salarial. Esses autores consideraram ainda o período completo de análise como
estável. Todavia, a análise proposta neste trabalho detectou mudanças estruturais significativas, o que levou a
reestimação para subperíodos onde essas elasticidades se tornam diferentes.
341

FIGURA 27 - TESTES DE ESTABILIDADE DA EQUAÇÃO DE AJUSTAMENTO DO EMPREGO


INDUSTRIAL (1985-2001)

40 1.2 0.03
0.02
20 1.0 0.01
0.00
0.8
0 -0.01
-0.02
0.6 0.00
-0.03
-20
0.4
0.05
-40
0.2
0.10
-60 0.0
0.15
-80 -0.2 88 90 92 94 96 98 00
88 90 92 94 96 98 00 88 90 92 94 96 98 00
One-Step Probability Recursive Residuals
CUSUM 5% Signific anc e CUSUM of Squares 5% Significance

Os três testes mostram que há de fato instabilidade estrutural entre finais dos anos 80 e
primeira metade dos 90. Isto implica na necessidade de se considerar os subperíodos nos quais
a relação estimada se mostre estável.

QUADRO 81 - ESTIMAÇÃO DA EQUAÇÃO (3) PARA O PERÍODO (1986:01 1989:04)


Dependent Variable: NIND
Method: Least Squares
Sample: 1986:01 1989:04
Included observations: 40
Variable Coefficient Std. Error t-Statistic Prob.
C 0.462561 0.187629 2.465295 0.0216
NINDT_1 1.222910 0.183081 6.679606 0.0000
NINDT_2 -0.462839 0.147603 -3.135711 0.0046
YIND 0.090393 0.043298 2.087713 0.0481
CW 0.047401 0.038673 1.225663 0.2327
DT -0.000146 0.000126 -1.161346 0.2574
D1 0.032855 0.013814 2.378441 0.0261
D2 0.029294 0.016211 1.807006 0.0839
D3 0.018581 0.014314 1.298117 0.2071
D4 0.023540 0.013373 1.760305 0.0917
D5 0.024122 0.014625 1.649373 0.1127
D6 0.011490 0.016648 0.690150 0.4970
D7 0.017936 0.017187 1.043588 0.3075
D8 0.014268 0.018354 0.777351 0.4449
D9 0.015385 0.018867 0.815421 0.4232
D10 0.015689 0.018522 0.847017 0.4057
D11 0.011641 0.011933 0.975497 0.3395
R-squared 0.974148 Mean dependent var 4.734011
Adjusted R-squared 0.956164 S.D. dependent var 0.035911
S.E. of regression 0.007519 Akaike info criterion -6.646220
Sum squared resid 0.001300 Schwarz criterion -5.928447
Log likelihood 149.9244 F-statistic 54.16797
Durbin-Watson stat 1.782810 Prob(F-statistic) 0.000000
No subperíodo pós-Plano Real, o modelo de ajustamento do emprego industrial
mostrou-se estável (Figura 28). Foi escolhido o intervalo [jan/1995-abr/2001] para que a
estimação não fosse afetada pelos efeitos da transição de um ambiente de alta inflação para
um de baixa. Inclusive a inflação acumulada em 1994 ainda é muito alta. Além disso, a
342

relevância na escolha desse intervalo não decorre apenas das evidências de instabilidade
estrutural do modelo, mas porque se trata de um período onde se aprofundam as mutações das
formas institucionais iniciadas a partir da abertura comercial e financeira.

FIGURA 28 - TESTES DE ESTABILIDADE DA EQUAÇÃO DE AJUSTAMENTO DO EMPREGO


INDUSTRIAL (1995 - 2001)

30 1.4 0.010

1.2 0.005
20
0.000
1.0
10 -0.005
0.8
0.00 -0.010
0 0.6

0.4 0.05
-10
0.2 0.10
-20 0.0
0.15
-0.2 1997 1998 1999 2000 2001
-30
1997 1998 1999 2000 2001 1997 1998 1999 2000 2001
One-Step Probability Recursive Residuals

CUSUM 5% Signific anc e CUSUM of Squares 5% Significance

Os pontos em meados de 1997 e de 1999 estão dentro dos limites de instabilidade e


devem estar expressando os efeitos das crises financeiras da Ásia e das demais crises com
epicentro na economia brasileira. No entanto, apenas esses pontos são insuficientes para
descaracterizar a estabilidade estrutural, que inclusive é confirmada pelos outros testes do
CUSUM e CUSUMSQ.

QUADRO 82 - ESTIMAÇÃO DA EQUAÇÃO (3) PARA O PERÍODO (1995:01 2001:04)


Dependent Variable: NIND
Method: Least Squares
Sample: 1995:01 2001:04
Included observations: 76
Variable Coefficient Std. Error t-Statistic Prob.
C 0.278081 0.111035 2.504441 0.0150
NINDT_1 1.264490 0.121347 10.42043 0.0000
NINDT_2 -0.344488 0.112415 -3.064440 0.0033
YIND 0.058097 0.016553 3.509707 0.0009
CW -0.027707 0.007132 -3.884845 0.0003
dt -0.000506 0.000134 -3.770001 0.0004
D1 0.008120 0.003619 2.244098 0.0286
D2 0.002316 0.003055 0.758133 0.4514
D3 -0.001928 0.004035 -0.477741 0.6346
D4 0.001323 0.003522 0.375506 0.7086
D5 -0.000555 0.003869 -0.143346 0.8865
D6 -0.002831 0.003773 -0.750147 0.4561
D7 -0.008988 0.004234 -2.122838 0.0380
D8 -0.009301 0.004801 -1.937157 0.0575
D9 -0.004726 0.004669 -1.012137 0.3156
D10 -0.005469 0.004691 -1.165637 0.2485
D11 -0.004551 0.003376 -1.348042 0.1828
R-squared 0.999375 Mean dependent var 4.214691
Adjusted R-squared 0.999206 S.D. dependent var 0.128156
S.E. of regression 0.003612 Akaike info criterion -8.214897
Sum squared resid 0.000770 Schwarz criterion -7.693548
Log likelihood 329.1661 F-statistic 5897.013
Durbin-Watson stat 2.326931 Prob(F-statistic) 0.000000
343

As estimações também foram realizadas para o período pós-Plano Real e os resultados


encontram-se no Quadro 82. Os Quadros 83 e 84 reúnem os resultados por período.

QUADRO 83 -AJUSTAMENTO DO EMPREGO INDUSTRIAL: ELASTICIDADES DE CURTO


PRAZO (1985-2001)
Período Coeficiente de ajuste Elasticidade- Elasticidade- Tendência
( 1 + 2) produto do custo salarial do
emprego emprego
1985:01
0,7601 0,0904 0,050 n.s.
1989-12
1995:01
0,9200 0,0581 - 0,030 - 0,001
2001:04

QUADRO 84 AJUSTAMENTO DO EMPREGO INDUSTRIAL: ELASTICIDADES DE LONGO


PRAZO (1985-2001)
Período Elasticidade- Elasticidade-
produto do custo salarial do
emprego emprego
1985:01
0,377 0,208
1989-12
1995:01
0,726 -0,375
2001:04

No período pós-Plano Real observa-se um aumento da inércia do emprego que pode


ser explicado pela redução dos quadros formais ao longo dos quatro primeiros anos da década
de 90. O Gráfico 62 mostra como o emprego formal para as grandes regiões metropolitanas
(em geral onde o emprego é mais dependente dos postos de trabalho gerados pela indústria)
permanece praticamente estagnado ao longo de toda a década de 90, conhecendo uma suave
recuperação apenas a partir da desvalorização cambial de 1999. O Gráfico 68 mostra que,
entre março de 1990 e dezembro de 1995, o emprego industrial tem uma queda de cerca de
20%; e no final desta década a redução acumulada atinge a cifra de 40%. A elasticidade-
produto do emprego industrial de curto prazo reduz-se de 0,09 para 0,06, expressando a
menor capacidade da indústria para gerar empregos neste período. Mas a constatação mais
interessante talvez seja esta que se refere à inversão do sinal da elasticidade-custo salarial do
emprego industrial. Tradicionalmente a teoria neoclássica considera o sinal dessa elasticidade
como invariante e sempre negativo250. Todavia, um dos aportes da Teoria da Regulação foi
mostrar que essa correlação depende fundamentalmente do modo de regulação vigente e mais
especificamente, das características do regime de produtividade e de demanda. Durante a

250
Aliás é este sinal sempre negativo que GONZAGA e CORSEUIL (2001) esperam encontrar na sua estimação
para o mesmo modelo, o que indica que esses autores possam estar abordando a questão do ponto de vista da
tradição teórica neoclássica.
344

vigência dos regimes de acumulação fordistas os testes econométricos apontavam uma


correlação positiva e significativa entre salários e emprego. Com o aprofundamento do grau
de abertura comercial e financeiras das economias nacionais, a partir da crise do fordismo, o
sinal negativo retorna na relação salário-emprego. Este parece ser o caso brasileiro também.

O conjunto das formas institucionais que compõem o modo de regulação e


particularmente a configuração da WLN determinam o comportamento da relação salário-
emprego. A abordagem regulacionista não retém nenhum efeito-substituição direta entre
salário e nível de emprego, pois são características dependentes das especificidades dos
sistemas de produção e de sua articulação com as formas institucionais no seio de um regime
de crescimento. Segundo BOYER (1998), a Teoria da Regulação introduz uma vasta gama de
relações entre emprego e salário, com o impacto desta última podendo ser tanto positivo
quanto negativo, na ausência de toda hipótese de substitutibilidade dos fatores:

Enfin et sourtout, trancher entre une élasticité positive, quasiment nulle ou


négative, devient une question empirique, et non pas le résultat d une
hypothése a priori conernant les techiques de production et leurs
caractéristiques. (...) Ainsi, de façon très largement endogène, le lien
salaire/emploi peut changer de signe, possibilité digne d intérêt pour rendre
compte de la succession de phases historiques au cours desquelles la
conjonction des variables macroéconomiques est loin de demeureur invariante.
Au passage, c est une façon de répondre à la vieille question de l économie du
travail : salaire réel et emploi sont-ils anti-cycliques ou pro-cycliques ? La
réponse est finalement simple : tout dépend du régme de croissance en vigueur
... et ce dernier peut changer au cours du temps.
No que concerne às elasticidades de longo prazo observam-se as seguintes mudanças:
a elasticidade-produto do emprego industrial praticamente dobrou no período de vigência do
Plano Real. Quanto à elasticidade-custo salarial, além de ter invertido de sinal passando de
positiva no período pré-abertura econômica (e também pré-Real), a negativa no período
subseqüente, seu valor quase dobrou em termos absolutos. Isto mostra como as empresas
industriais se tornaram sensíveis aos custos salariais a partir do momento em que a economia
brasileira modifica sua forma de inserção no regime internacional, através dos processos de
liberalização comercial e financeira.

Em resumo, segundo BOYER, a possibilidade de uma ligação salário/emprego


negativa depende de três mecanismos diversos:

Quando o grau de abertura da economia se eleva, surge uma restrição de


competitividade no processo de formação dos custos domésticos que pode anular
os efeitos favoráveis conectados à dinâmica do consumo e do investimento;
345

Supondo-se o grau de abertura constante, a intensificação da concorrência


internacional pode erodir o poder oligopolístico dos produtores nacionais,
aumentando as pressões por ajustes quantitativos e por reduções salariais;

Simultaneamente, a liberalização financeira, a invenção de novos instrumentos e a


deterioração de certos mercados financeiros no contexto da globalização ,
transformam o ambiente das firmas e suas decisões de investimento. Estas passam
a privilegiar o rendimento de capital, secundarizando a dinâmica do consumo
interno.

A conjunção dos três fatores pode explicar porque a busca de maior competitividade e
de maior rentabilidade do capital investido vai adquirir, no caso da economia brasileira dos
anos 90, um caráter particularmente perverso. Num ambiente macroeconômico marcado por
taxas reais de juros extremamente onerosas aos produtores e consumidores locais, a
rentabilidade financeira passa a ser incorporada nas decisões de produção e de investimento.
Estas tornam-se muito mais sensíveis à dimensão do salário como um custo de produção do
que como fator de demanda nas sociedades salariais. Por outro lado, uma sobrevalorização
cambial pode provocar a percepção de que o nível dos salários tornou-se excessivo, apesar de
terem conservado seu valor anterior (BOYER, 1998).

Sensibilidade às flutuações conjunturais


Para se testar a sensibilidade do emprego industrial às flutuações da conjuntura,
estimou-se um modelo que captasse separadamente as elasticidades do emprego às fases de
expansão e de queda do produto industrial. Os resultados encontram-se nos Quadros 85 a 88.
+ -
TXNIND t = 1 + 2.TXNIND t-1 + 3. TXPI + 4. TXPI + t (14)

Onde TXNIND = Taxa de variação do emprego industrial; TXPI + = Taxa de


variação positiva da produção industrial; TXPI - = Taxa de variação negativa da
produção industrial. Todas as séries em dados trimestrais.
346

QUADRO 85 SENSIBILIDADE DO EMPREGO INDUSTRIAL ÀS FLUTUAÇÕES CONJUNTURAIS


(1985:1 2000:4)
Dependent Variable: TXNIND
Method: Least Squares
Sample(adjusted): 1985:3 2000:4
Included observations: 62 after adjusting endpoints
Variable Coefficient Std. Error t-Statistic Prob.
C -0.003193 0.002181 -1.464249 0.1485
TXNIND(-1) 0.617050 0.072661 8.492205 0.0000
+ 0.219176 0.056605 3.872040 0.0003
TXPI
- -0.330419 0.057904 -5.706367 0.0000
TXPI
R-squared 0.700248 Mean dependent var -0.008499
Adjusted R-squared 0.684744 S.D. dependent var 0.021798
S.E. of regression 0.012239 Akaike info criterion -5.906051
Sum squared resid 0.008688 Schwarz criterion -5.768817
Log likelihood 187.0876 F-statistic 45.16444
Durbin-Watson stat 2.396614 Prob(F-statistic) 0.000000

FIGURA 29 TESTES DE ESTABILIDADE DA EQUAÇÃO 4 (1985:1 2000:4)


0.06 0 .8
0.06 1.4
0 .6
0.04 0.04
1.2 0 .4
0.02
0.02 0 .2
0.00 1.0 0 .0
-0.02 0.00
-0.2

-0.04 0.8
-0.0 2 -0.4
0.00 8 8 89 90 91 92 93 94 95 96 97 98 99 00 88 8 9 9 0 9 1 9 2 93 9 4 95 96 97 98 99 00
-0.06 0.6 Re c urs i v e C(1) Es ti m ate s ± 2 S.E. Re c urs i v e C(2) Es ti m a te s ± 2 S.E.

0.05 0.4 1.2 0 .0

0.8 -0.4

0.10 0.2
0.4 -0.8

0.0 0.0 -1.2


0.15
88 90 92 94 96 98 00 -0.2 -0.4 -1.6

88 90 92 94 96 98 00 -0.8 -2.0
One-Step Probability Recursive Residuals 8 8 89 90 91 92 93 94 95 96 97 98 99 00 88 8 9 9 0 9 1 9 2 93 9 4 95 96 97 98 99 00

Re c urs i v e C(3) Es ti m ate s ± 2 S.E. Re c urs i v e C(4) Es ti m a te s ± 2 S.E.


CUSUM of Squares 5% Significance

Os resultados demonstram que para o período completo, o emprego industrial é


sensível à conjuntura, tanto nas fases de expansão do ciclo, quanto nas fases de recessão,
apesar da baixa elasticidade do emprego à produção. Por outro lado, há também a presença de
um fator inercial que é estatisticamente significativo.

Como a partir do teste do CUSUMSQ pode-se observar a existência de pontos que


ultrapassam o limite da estabilidade e considerando a quebra estrutural em 1990 (já
identificada nos testes precedentes), o período foi subdividido. Os resultados para os
subperíodos [1985:03 1989:04], [1990:04 2000:04] e [1995:01 2000:04] encontram-se,
respectivamente, nos Quadros 86, 87 e 88.
347

QUADRO 86 - SENSIBILIDADE DO EMPREGO INDUSTRIAL ÀS FLUTUAÇÕES CONJUNTURAIS


(1985:1 1989:4)
Dependent Variable: TXNIND
Method: Least Squares
Sample(adjusted): 1985:3 1989:4
Included observations: 18 after adjusting endpoints
Variable Coefficient Std. Error t-Statistic Prob.
C 0.011273 0.007335 1.536811 0.1466
TXNIND(-1) 0.219366 0.180661 1.214239 0.2447
+ 0.092596 0.190367 0.486407 0.6342
TXPI
- -0.721750 0.242744 -2.973300 0.0101
TXPI
R-squared 0.626152 Mean dependent var 0.007093
Adjusted R-squared 0.546042 S.D. dependent var 0.023334
S.E. of regression 0.015722 Akaike info criterion -5.274429
Sum squared resid 0.003460 Schwarz criterion -5.076569
Log likelihood 51.46986 F-statistic 7.816125
Durbin-Watson stat 2.469331 Prob(F-statistic) 0.002629

FIGURA 30 - TESTES DE ESTABILIDADE DA EQUAÇÃO 4 (1985:1 1989:4)


0.10 1.0
15 1.5
0.08
0.5

0.06

10 0.04
0.0

1.0 0.02
-0 .5

5 0.00
-1 .0

-0.0 2 -1 .5
87 :3 88 :1 88 :3 8 9 :1 8 9 :3 87 :3 88 :1 88 :3 89 :1 89 :3

0 0.5 Re c urs i v e C(1 ) Es ti m a te s ± 2 S.E. Re c urs i v e C(2 ) Es ti m ate s ± 2 S.E.

1.0 0

-5
0.5 -1
0.0
0.0 -2
-10
-0.5 -3

-15 -0.5 -1.0 -4

86:3 87:1 87:3 88:1 88:3 89:1 89:3 86:3 87:1 87:3 88:1 88:3 89:1 89:3 -1.5 -5
87 :3 88 :1 88 :3 8 9 :1 8 9 :3 87 :3 88 :1 88 :3 89 :1 89 :3

Re c urs i v e C(3 ) Es ti m a te s ± 2 S.E. Re c urs i v e C(4 ) Es ti m ate s ± 2 S.E.


CUSUM 5% Signific anc e CUSUM of Squares 5% Significance

QUADRO 87 - SENSIBILIDADE DO EMPREGO INDUSTRIAL ÀS FLUTUAÇÕES CONJUNTURAIS


(1990:4 2000:4)
Dependent Variable: TXNIND
Method: Least Squares
Sample: 1990:4 2000:4
Included observations: 41
Variable Coefficient Std. Error t-Statistic Prob.
C -0.005823 0.002214 -2.629679 0.0124
TXNIND(-1) 0.654959 0.083156 7.876282 0.0000
DTXYIND 0.305860 0.060919 5.020772 0.0000
DTXYIND_ -0.325513 0.063405 -5.133862 0.0000
R-squared 0.756244 Mean dependent var -0.013731
Adjusted R-squared 0.736480 S.D. dependent var 0.017181
S.E. of regression 0.008820 Akaike info criterion -6.531206
Sum squared resid 0.002878 Schwarz criterion -6.364028
Log likelihood 137.8897 F-statistic 38.26371
Durbin-Watson stat 2.466822 Prob(F-statistic) 0.000000
348

FIGURA 31 - TESTES DE ESTABILIDADE DA EQUAÇÃO 4 (1990:4 2000:4)


0 .0 1 5 1 .2
0.04 1.6
0 .0 1 0 1 .0

0.02 0 .0 0 5 0 .8

1.2 0 .0 0 0 0 .6
0.00
-0 .0 0 5 0 .4

-0.02 -0 .0 1 0 0 .2

0.8 -0 .0 1 5 0 .0
0.00 -0.04 93 94 95 96 97 98 99 00 93 94 95 96 97 98 99 00

Re c u rs i v e C(1 ) Es ti m a te s ± 2 S.E. Re c u rs i v e C(2 ) Es ti m a te s ± 2 S.E.

0.05 0.4 0 .6 -0 .1

0 .5 -0 .2

0.10 0.0
0 .4 -0 .3

0 .3 -0 .4

0.15 0 .2 -0 .5

92 93 94 95 96 97 98 99 00 -0.4 0 .1 -0 .6

92 93 94 95 96 97 98 99 00 0 .0 -0 .7
One-Step Probability Recursive Residuals 93 94 95 96 97 98 99 00 93 94 95 96 97 98 99 00

Re c u rs i v e C(3 ) Es ti m a te s ± 2 S.E. Re c u rs i v e C(4 ) Es ti m a te s ± 2 S.E.


CUSUM of Squares 5% Significance

QUADRO 88 - SENSIBILIDADE DO EMPREGO INDUSTRIAL ÀS FLUTUAÇÕES CONJUNTURAIS:


PERÍODO PÓS-PLANO REAL
Dependent Variable: TXNIND
Method: Least Squares
Sample: 1995:1 2000:4
Included observations: 24
Variable Coefficient Std. Error t-Statistic Prob.
C -0.002849 0.003714 -0.767171 0.4519
TXNIND(-1) 0.772098 0.117151 6.590602 0.0000
DTXYIND 0.116071 0.130805 0.887363 0.3854
DTXYIND_ -0.328039 0.101012 -3.247518 0.0040
R-squared 0.766578 Mean dependent var -0.015187
Adjusted R-squared 0.731565 S.D. dependent var 0.015297
S.E. of regression 0.007926 Akaike info criterion -6.686438
Sum squared resid 0.001256 Schwarz criterion -6.490096
Log likelihood 84.23726 F-statistic 21.89390
Durbin-Watson stat 2.335737 Prob(F-statistic) 0.000002

FIGURA 32 - TESTES DE ESTABILIDADE DA EQUAÇÃO 4 NO PERÍODO PÓS-PLANO REAL


0.04 1.6
0.04 1.6
0.02 1.2

0.02
0.00 0.8

0.00 1.2
-0.0 2 0.4

-0.02 -0.0 4 0.0

0.8 -0.0 6 -0 .4
0.00 -0.04 97 :1 9 7 :3 98 :1 9 8 :3 99 :1 99 :3 00 :1 00 :3 9 7 :1 9 7 :3 9 8 :1 9 8 :3 9 9 :1 99 :3 00 :1 00 :3

Re c urs i v e C(1 ) Es ti m a te s ± 2 S.E. Re c urs i v e C(2 ) Es ti m ate s ± 2 S.E.

0.05
0.4 1.5 0.6

0.4
1.0
0.2
0.10 0.0 0.5 0.0

-0 .2
0.0 -0 .4
0.15
-0 .6
96:1 96:3 97:1 97:3 98:1 98:3 99:1 99:3 00:1 00:3 -0.4 -0.5
-0 .8
96:1 96:3 97:1 97:3 98:1 98:3 99:1 99:3 00:1 00:3 -1.0 -1 .0
One-Step Probability Recursive Residuals 97 :1 9 7 :3 98 :1 9 8 :3 99 :1 99 :3 00 :1 00 :3 9 7 :1 9 7 :3 9 8 :1 9 8 :3 9 9 :1 99 :3 00 :1 00 :3

Re c urs i v e C(3 ) Es ti m a te s ± 2 S.E. Re c urs i v e C(4 ) Es ti m ate s ± 2 S.E.


CUSUM of Squares 5% Significance

A análise dos testes econométricos mostra que no primeiro período de estimação


intervalo anterior à abertura econômica não há inércia estatisticamente significativa do
emprego. Por outro lado, o emprego não se mostra sensível às expansões da produção
industrial, mas apenas às fases de queda do nível de atividade, com uma elasticidade de 0,72.
Isto pode ser uma conseqüência da quase-estagnação da produção industrial nesta segunda
metade dos aos 80 (Gráfico 68).
349

O segundo período de estimação abrange as fases de abertura econômica anterior e


posterior à implementação do Plano Real. Os coeficientes são todos estatisticamente
significativos. Surge um fator de inércia do emprego (0,65) e as elasticidades do emprego às
recessões e às fases de expansão são respectivamente de 0,31 e de -0,33. O emprego responde
então as quedas e aumentos da produção industrial, embora os valores das elasticidades não
sejam tão elevados.

Quando a equação é estimada apenas na fase de abertura econômica sob a vigência do


Real, o coeficiente relativo à elasticidade do emprego às expansões da produção deixa de ser
significativo. Somente a elasticidade às quedas da atividade industrial é significativa. Uma
explicação seria considerar que neste período a indústria brasileira já havia feito grande parte
dos ajustes no nível de ocupação, com a introdução de novas formas organizacionais e
tecnologias poupadoras de força de trabalho. Essa reestruturação das plantas industriais visava
responder à intensificação da concorrência internacional e a contestabilidade do mercado
interno não mais protegido como no primeiro período de estimação. De maneira geral, os
ganhos de produtividade foram obtidos às expensas do emprego industrial (Tabela 25).

A conclusão seria a de que a abertura comercial e financeira e a sua aceleração sob a


primeira fase do Plano Real com câmbio sobrevalorizado aumentou o grau de
flexibilidade das relações salariais no setor industrial. Considerando-se o aumento da
precariedade das relações de emprego também para a indústria nos anos 90, já confirmado por
várias análises, o resultado reforça a hipótese de que houve aprofundamento do caráter
concorrencial da WLN brasileira neste período.

Inércia das horas e do emprego - a flexibilidade das relações salariais pode ser avaliada
do ponto de vista do emprego, mas também no que concerne às horas pagas na atividade
produtiva. Dois modelos simples visam captar tanto a inércia do emprego quanto a inércia
das horas:
(H) = 1 + 2. (H-1)+ 3. (PI) (15)
(N) = 4 + 5. (N-1)+ 6. (PI) (16)
Onde (H) = taxa de variação das horas pagas na produção industrial; (N) = taxa de variação
do emprego industrial; (PI) = taxa de variação da produção industrial.
Os resultados das estimações encontram-se nos Quadros 89 e 90, respectivamente para
o caso das horas e do emprego.
350

QUADRO 89 INÉRCIA DAS HORAS E SENSIBILIDADE À PRODUÇÃO (1985-2001)


PERÍODOS
[1985-1989] [1991-1994] [1995-1998] [1995-2001]
COEFICIENTES

constante n.s. n.s. n.s. n.s.


0,49 0,48 0,94 0,77
(H-1)
(2,30) (3,49) (5,78) (6,65)
0,28 0,64 0,44
(PI) n.s.
(6,29) (5,60) (4,78)
R2 0,39 0,79 0,75 0,72
DW 2,72 1,58 1,57 1,55

NOTA: Séries trimestrais geradas a partir dos dados da Pesquisa Industrial Mensal (PIM-DG)/IBGE.
(n.s.) = não estatisticamente significativo.

QUADRO 90 INÉRCIA DO EMPREGO E SENSIBILIDADE À PRODUÇÃO (1985-2001)


PERÍODOS
[1985-1989] [1991-1994] [1995-1998] [1995-2001]
COEFICIENTES
-0,01
constante n.s. n.s. n.s.
(-2,33)
0,46 0,84 0,80
(N-1) n.s.
(3,56) (4,05) (6,92)
0,27 0,45 0,35
(PI) n.s.
(6,84) (3,20) (4,01)
R2 - 0,82 0,55 0,69
DW - 1,71 1,35 1,15

NOTA: Séries trimestrais geradas a partir dos dados da Pesquisa Industrial Mensal (PIM-DG)/IBGE.
(n.s.) = não estatisticamente significativo.

Da análise acima pode-se concluir que as inércias do emprego e das horas não são
expressivamente diferentes em magnitude. Apenas no período correspondente à vigência do
Real sob regime de câmbio fixo é que a inércia das horas (0,94) supera em 10% a inércia do
emprego (0,84). Este fato pode estar indicando que os ajustes de horas são obtidos por ajustes
de pessoal (dispensas e contratações temporárias) já que a rotatividade das relações de
emprego (labor turnover) é muito elevada na economia brasileira (cerca de 42%, para o ano
de 2000, conforme a Tabela 24)251. Por outro lado, destaca-se o fato de que as taxas de
rotatividade na indústria de transformação estão muito próximas das do setor serviços, o que
sugere um aumento da precariedade num setor onde tradicionalmente as relações de emprego

251
Nos países desenvolvidos, o índice situa-se abaixo de 20%. Países da Europa e EUA, a taxa situa-se entre 7 e
15%.
351

se mostravam mais estáveis. Mas as dinâmicas praticamente idênticas das séries da


produtividade horária (PRH) e da produtividade por pessoal ocupado (PRN) também reforçam
essa interpretação (Gráfico 69).

Outra característica refere-se às elasticidades-produção das horas que se mostra maior


do que as do emprego, respectivamente, 0,64 e 0,45, para o terceiro período, e de 0,44 e 0,35,
para o quarto. Isto pode estar indicando que, após ter reduzido seus quadros em cerca de 40%
desde finais de 1990, a indústria começa a utilizar mais esse tipo de ajuste por horas sobre os
trabalhadores remanescentes.

TABELA 24 TAXAS ANUAIS DE ROTATIVIDADE - LABOR TURNOVER (1998 2000)

ATIVIDADE ECONÔMICA 1998 1999 2000


Extrativa mineral 24,6 22,4 22,6
Indústria de transformação 35,8 34,6 38,2
Serviços industriais utilidade pública 15,0 12,5 14,8
Construção civil 76,8 63,2 87,2
Comércio 46,7 47,2 47,0
Serviços 37,8 33,4 38,4
Administração pública 7,9 5,6 4,2
Agropecuária 34,6 39,1 66,0
Outras atividades 13,2 40,9 86,2
Todas atividades 40,1 37,9 42,8

FONTE: DIEESE, MTB e IBGE.


NOTA: Elaborado a partir das taxas mensais de rotatividade. Conforme definição do IBGE, a taxa de
rotatividade é a razão do mínimo entre as admissões e os desligamentos no mês de referência e o número médio
de pessoas ocupadas neste mesmo mês, multiplicado por 100. Representa, portanto, a relação entre o número de
trabalhadores substituídos e o total (médio) de trabalhadores.
352

GRÁFICO 69 GANHOS DE PRODUTIVIDADE E DINÂMICA DO EMPREGO NA INDÚSTRIA DE


TRANSFORMAÇÃO (1985-2001)

PR_Horária
PR_Pessoal ocupado
Nível de emprego
3%

2%
Taxas de crescimento

1%

0%

-1%

-2%

-3%

-4%
Mar-89

Mar-94

Mar-99
Sep-86

Aoû-89

Sep-91

Aoû-94

Sep-96

Aoû-99
Nov-85

Déc-87

Nov-90

Déc-92

Nov-95

Déc-97

Nov-00
Jan-85

Mai-88

Jan-90

Mai-93

Jan-95

Mai-98

Jan-00
Jui-85

Fév-87
Jul-87

Jui-90

Fév-92
Jul-92

Jui-95

Fév-97
Jul-97

Jui-00
Avr-86

Avr-91

Avr-96

Avr-01
Oct-88

Oct-93

Oct-98
FONTE: Séries mensais originárias da PIM-DG/IBGE.
NOTA: PR é a produtividade do trabalho. Todas as séries foram dessazonalizadas pelo método X11/2000-
Census 2 e suavizadas pelo filtro 4253H.

A formação do salário na indústria de transformação a determinação do salário real


e nominal dependem das configurações da WLN. A nível setorial, as relações salariais
respondem pelos padrões de evolução do salário médio, segundo suas conexões com os
ganhos de produtividade, suas reações às tensões entre oferta e demanda de força de
trabalho e aos impactos da inflação.

A evolução da produtividade, do salário médio real e do nível de emprego na indústria


de transformação podem ser observados a partir do Gráfico 70. A partir de julho de 1995,
a produtividade horária do trabalho continuará em expansão, mas o emprego e o salário
médio real entram em uma trajetória de queda e só se estabilizam em finais de 1999.
353

GRÁFICO 70 PRODUTIVIDADE HORÁRIA, SALÁRIO E EMPREGO NA INDÚSTRIA DE


TRANSFORMAÇÃO (1985 2001)

Produtividade horária
Salário médio real
Nível de emprego
160

140

120

100

80

60

40
Jan-85

Jan-86

Jan-87

Jan-88

Jan-89

Jan-90

Jan-91

Jan-92

Jan-93

Jan-94

Jan-95

Jan-96

Jan-97

Jan-98

Jan-99

Jan-00

Jan-01
Jul-85

Jul-86

Jul-87

Jul-88

Jul-89

Jul-90

Jul-91

Jul-92

Jul-93

Jul-94

Jul-95

Jul-96

Jul-97

Jul-98

Jul-99

Jul-00
FONTE: Séries originais da Pesquisa Industrial Mensal Dados Gerais (PIM-DG) do IBGE.
NOTA: As séries foram dessazonalizadas pelo X11-2000/Census 2 e correspondem aos índices dos valores.
O salário médio nominal na indústria: indexação ao custo de vida, influência das
variações da produção e do emprego

Modelo estimado: (WN) = c1 + c2. (PI)+ c3. (IP)+ c4. (N) (17)
Onde WN é o salário médio nominal; PI é a produção física; ICV é o índice do custo de vida
(calculado como a média entre ICV-FIPE e o ICV-RJ); N é o nível de emprego. As variáveis
foram estimadas em taxa de variação (Quadro 91).

QUADRO 91 RESULTADOS DAS ESTIMAÇÕES DA EQUAÇÃO 17


PERÍODOS
[1982-1987] [1991-1994] [1995-2001]
COEFICIENTES
0,05 -0,002 0,03
constante
(1,62) (0,90) (4,47)
-0,48 0,69 0,02
(PI)
(-1,71) (2,24) (0,10)
0,86 1,03 -0,47
(ICV)
(14,50) (37,97) (-1,16)
(N) 0,88 -0,60 0,76
(1,08) (-0,41) (2,57)
R2 0,95 0,99 0,47
DW 1,74 2,72 1,19
FONTE: Séries originárias da PIM-DG/IBGE.
NOTA: Dados trimestrais dessazonalizados pelo X11-Census/2000. A periodização foi realizada a partir dos
testes de estabilidade estrutural.
354

Destaca-se dos resultados da estimação econométrica que no período pré-abertura


econômica, os salários nominais respondem apenas às variações do índice de custo de vida.
Sob abertura, mas ainda sem a vigência do Real - 1991 a junho de 1994 o coeficiente da
produção industrial torna-se significativo e a indexação dos salários à evolução do custo de
vida é total. A partir da introdução do Real, o único coeficiente estatisticamente significativo
corresponde a este do emprego. Nesta fase, o salário médio nominal varia
preponderantemente em função do nível de emprego, apontando para um aprofundamento do
caráter concorrencial das relações salariais no setor industrial.

O salário médio real na indústria: indexação aos ganhos de produtividade e


influência das flutuações do emprego

Modelo estimado: WR = a1 + a2.PRH +a3.N (18)

Onde WR é o salário médio real; PRH é a produtividade horária e N é o nível de emprego.


Todas as variáveis em logaritmo natural.

No primeiro período [1985 T1-1989 T4], identificado com os testes de mudança


estrutural, as séries apresentam raízes unitárias mas os resíduos da relação estimada não são
estacionários. O teste de JOHANSEN não rejeitou a hipótese nula de inexistência de pelo
menos uma relação de co-integração e então a equação foi estimada em primeiras
diferenças.252

QUADRO 92 ESTIMAÇÃO DA EQUAÇÃO 8 NO PERÍODO (1991:T1 1995:T1)


Dependent Variable: D(WR)
Method: Least Squares
Sample(adjusted): 1985:2 1989:4
Included observations: 19 after adjusting endpoints
Variable Coefficient Std. Error t-Statistic Prob.
C 0.000563 0.009345 0.060216 0.9527
D(PRH) -0.049433 0.127636 -0.387299 0.7036
D(N) 2.005575 0.387593 5.174441 0.0001
R-squared 0.626174 Mean dependent var 0.016729
Adjusted R-squared 0.579446 S.D. dependent var 0.058318
S.E. of regression 0.037819 Akaike info criterion -3.568066
Sum squared resid 0.022885 Schwarz criterion -3.418944
Log likelihood 36.89663 F-statistic 13.40035
Durbin-Watson stat 1.910672 Prob(F-statistic) 0.000381

No segundo período, [1991:T1 1995:T1], a relação apresentou-se estruturalmente


estável pelos testes do CUSUM e N-step propability que verifica todas as possibilidades de

252
Por questões de espaço omitem-se os testes mencionados.
355

quebra estrutural realizando uma seqüência de testes de Chow. Após os testes de raízes
unitárias, o teste de JOHANSEN indicou a presença de uma relação de co-integração.

FIGURA 33 TESTES DE ESTABILIDADE ESTRUTURAL DA EQUAÇÃO 8 (1991:T1 1995:T1)


0.2 15 1.5

0.1
10
0.0 1.0
5
-0.1
0.00
-0.2 0 0.5

0.05
-5
0.0
0.10
-10
0.15
92:1 92:3 93:1 93:3 94:1 94:3 95:1 -15 -0.5
92:1 92:3 93:1 93:3 94:1 94:3 95:1 92:1 92:3 93:1 93:3 94:1 94:3 95:1
N-Step Probability Recursive Residuals
CUSUM 5% Signific anc e CUSUM of Squares 5% Significance

QUADRO 93 TESTES DE RAÍZES UNITÁRIAS PARA WR, PRH E N (1991:T1 1995:T1)


ADF Test Statistic WR PRH N
-0,727190 -1,015444 -2.378727
1% Critical Value* -3,8877
5% Critical Value -3,0521
10% Critical Value -2,6672
*MacKinnon critical values for rejection of hypothesis of a unit root
QUADRO 94 TESTE DE CO-INTEGRAÇÃO DE JOHANSEN PARA WR, PRH E N (1991:T1
1995:T1)
Sample: 1991:1 1995:1
Included observations: 17
Series: WR PRH N
Likelihood 5 Percent 1 Percent Hypothesized
Eigenvalue Ratio Critical Value Critical Value No. of CE(s)
0.787622 37.18723 29.68 35.65 None **
0.447263 10.84767 15.41 20.04 At most 1
0.044218 0.768824 3.76 6.65 At most 2
*(**) denotes rejection of the hypothesis at 5%(1%) significance level
L.R. test indicates 1 cointegrating equation(s) at 5% significance level

Normalized Cointegrating Coefficients: 1 Cointegrating Equation(s)


WR PRH N C
1.000000 -0.966987 1.573157 -7.444605
(0.23075) (0.22686)

Log likelihood 163.4936


356

QUADRO 95 - EQUAÇÃO CO-INTEGRANTE E VECM PARA WR, PRH E N (1991:T1 1995:T1)


Sample: 1991:1 1995:1
Included observations: 17
t-statistics in parentheses
Cointegrating Eq: CointEq1
WR(-1) 1.000000

PRH(-1) -0.966987
(-4.19070)

N(-1) 1.573157
(6.93455)

C -7.444605
Error Correction: D(WR)
CointEq1 -0.376779
(-3.52584)

D(WR(-1)) -0.855426
(-5.03213)

D(WR(-2)) -0.689732
(-5.24245)

D(PRH(-1)) -0.411445
(-2.67756)

D(PRH(-2)) 0.021305
(0.15369)

D(N(-1)) 2.364347
(2.96769)

D(N(-2)) -0.522980
(-1.03162)

C 0.044518
(4.11700)
R-squared 0.949665
Adj. R-squared 0.910516

A observação das elasticidades sugere que, no curto prazo, a produtividade contribui


para reduzir o salário médio real. Este fato poderia ser explicado ao se considerar que, neste
período, a reestruturação industrial (incluindo as inovações técnicas e organizacionais)
resultou em ganhos substanciais de produtividade, mas às expensas do emprego. Mas, como o
coeficiente do emprego é positivo, significa que os ganhos de produtividade que reduziram o
emprego tendem a elevar, num efeito contrário, o salário dos que permaneceram empregados.
Isto ocorre porque, como observam BONELLI e FONSECA (1997), o processo de redução
de postos de trabalho atingiu mais fortemente os trabalhadores de salários mais baixos, o
que tem o efeito de elevar o salário médio.
357

No que concerne à relação de longo prazo, a correlação é positiva e os ganhos de


produtividade elevam o salário médio real. Os trabalhadores se apropriaram de parte
expressiva dos ganhos de produtividade da indústria, no período compreendido entre 1991 e
1995. O Gráfico 71 mostra a evolução da profit share ( ) na indústria de transformação,
calculada pelo diferencial entre as taxas de crescimento da produtividade (PR) e do salário
médio real (WR). Com o aprofundamento do desemprego durante a primeira fase do Real
(com câmbio fixo sobrevalorizado), termina a indexação dos salários reais aos ganhos de
produtividade na indústria.

= PRH WR (19)

GRÁFICO 71 PROFIT SHARE NA INDÚSTRIA DE TRANSFORMAÇÃO (1985-2001)

Profit Share na indústria de transformação


Série tendencial = Lowess smoothing
140
130
120
Índice: mar/1985 = 100

110
100
90
80
70
60
50
40
Mar-85

Mar-86

Mar-87

Mar-88

Mar-89

Mar-90

Mar-91

Mar-92

Mar-93

Mar-94

Mar-95

Mar-96

Mar-97

Mar-98

Mar-99

Mar-00

Mar-01
Sep-85

Sep-86

Sep-87

Sep-88

Sep-89

Sep-90

Sep-91

Sep-92

Sep-93

Sep-94

Sep-95

Sep-96

Sep-97

Sep-98

Sep-99

Sep-00

FONTE: Séries originais da Pesquisa Industrial Mensal Dados Gerais (PIM-DG) do IBGE.
NOTA: As séries foram dessazonalizadas pelo X11-2000/Census 2 e correspondem aos índices dos valores.

O Gráfico 72 exibe a evolução da razão salário/produtividade. A relação é estável


exatamente neste período onde o salário médio real evoluiu em conexão com os ganhos de
produtividade.
358

GRÁFICO 72 EVOLUÇÃO DA RAZÃO SALÁRIO / PRODUTIVIDADE (1985-2001)

WR / PRN
WR / PRH
220
200
180
160
140
120
100
80
60
40
Jan-85

Jan-86

Jan-87

Jan-88

Jan-89

Jan-90

Jan-91

Jan-92

Jan-93

Jan-94

Jan-95

Jan-96

Jan-97

Jan-98

Jan-99

Jan-00

Jan-01
Jul-85

Jul-86

Jul-87

Jul-88

Jul-89

Jul-90

Jul-91

Jul-92

Jul-93

Jul-94

Jul-95

Jul-96

Jul-97

Jul-98

Jul-99

Jul-00
FONTE: Séries originais da Pesquisa Industrial Mensal Dados Gerais (PIM-DG) do IBGE.
NOTA: As séries foram dessazonalizadas pelo X11-2000/Census 2 e correspondem aos índices dos valores.

O período de desconexão entre WR e PRH na indústria - a partir de julho de 1995, o


salário médio real se desconecta da evolução da produtividade, entrando numa trajetória
de declínio até 1999. Em seguida permanece estabilizado até o final da série, num patamar
cerca de 30% menor do que o pico que atingira na fase de distribuição dos ganhos de
produtividade.

A relação não é estruturalmente estável com as variáveis em nível e a forte ligação


entre emprego e produtividade prejudica as estimativas. A equação foi então estimada sem o
emprego como variável explicativa e o coeficiente da produtividade torna-se negativo,
expressando a associação inversa dessas variáveis neste período. Isto confirma que parte
substancial dos ganhos de produtividade na indústria ocorreram às expensas do emprego e do
salário real médio. Mesmo que a terceirização e as operações de downsizing não possam ser
consideradas as principais causas dos ganhos de produtividade, sabe-se que as novas bases
técnicas produtivas são preponderantemente capital-intensivas e, portanto, poupadoras de
força de trabalho.
359

QUADRO 96 RELAÇÕES ENTRE WR E PR E WR E N (1995 2001)

Method: Least Squares


Sample: 1995:2 2001:1
Included observations: 24
Dependent Variable: D(WR)
Variable Coefficient Std. Error t-Statistic Prob.
C -0.008336 0.005909 -1.410791 0.1723
D(PRH) -0.175125 0.230527 -0.759671 0.4555
R-squared 0.025561 Mean dependent var -0.010780
Durbin-Watson stat 1.662317 Prob(F-statistic) 0.455515
Variable Coefficient Std. Error t-Statistic Prob.
C 0.003926 0.006032 0.650922 0.5218
D(N) 0.929736 0.279866 3.322081 0.0031
R-squared 0.334064 Mean dependent var -0.010780
Durbin-Watson stat 1.857955 Prob(F-statistic) 0.003095
Uma possível explicação pode ser então mobilizada: quando o desemprego ainda
permanecia em níveis tais que não bloqueavam as reivindicações salariais, os trabalhadores
puderam participar dos ganhos de produtividade da indústria. Mas com a implementação do
Plano Real, sobrevém uma fase de sobrevalorização cambial num ambiente de intensificação
da concorrência externa. O desemprego se eleva e os sindicatos são enfraquecidos. Nessas
circunstâncias, com o seu poder de barganha muito reduzido, os trabalhadores em atividade
perderam parcelas substanciais dos ganhos de produtividade que são então apropriados
quase em sua totalidade pelas empresas.

TABELA 25 PRODUTIVIDADE, PRODUÇÃO, EMPREGO E SALÁRIO NA INDÚSTRIA DE


TRANSFORMAÇÃO: VARIAÇÃO PERCENTUAL MÉDIA POR PERÍODO (1985-2001)

PERÍODOS PRH PRN PRA WR N PI

1985 T2 - 1989 T4 -1,3% -1,1% -0,2% 1,7% 0,8% -0,5%

1991 T1 - 1995 T1 1,6% 1,7% 2,6% 1,1% -0,9% 0,7%

1995 T2 - 1998 T4 1,9% 2,0% 0,7% -1,4% -2,3% -0,5%

1999 T1 - 2001 T1 0,6% 0,6% 0,6% -0,5% -0,3% 0,3%

FONTE: Cálculos a partir dos dados da PIM-DG do IBGE.


NOTA: PRH = produtividade horária; PRN = produtividade por empregado; PRA = produtividade aparente do
trabalho; WR = salário real médio; N = nível de emprego; PI = produção física. A periodização foi realizada
através dos testes de mudança estrutural dos modelos estimados precedentemente.

A Tabela 25 mostra as taxas de crescimento da produtividade, do salário real médio,


do nível de emprego e da produção industrial em quatro períodos identificados com os testes
de mudança estrutural, utilizados nas diversas estimações propostas. Podem ser observados
360

tanto os períodos onde houve repartição dos ganhos de produtividade como as fases onde
houve desconexão, com queda dos salários e aumento do desemprego na indústria.

f) Os ajustamentos do emprego total da economia


A análise desenvolvida a seguir tem por objetivo principal verificar o grau de
ajustamento do nível geral de emprego às oscilações conjunturais.

A especificação do modelo é a seguinte:

N t = b1 + b2.N t-1 + b3.N t-2 + b4.PIB t + b5.W t (20)

Onde N = nível geral de emprego (relações salariais formais e informais das regiões
metropolitanas, originários da PME-IBGE) ; PIB = índice do produto interno bruto mensal;

W = rendimento médio real dos trabalhadores formais (com carteira) e informais (sem carteira
+ conta própria). Todas as variáveis em logaritmo natural.

A equação para o período completo [ago/1982-abr/2001] não se mostrou estável pelos


testes do CUSUM e CUSUMSQ, tornando-se necessário uma subdivisão.

A relação foi considerada estável nos períodos [ago/1982-dez/1988] e [jan/1992-


abr/2001]. Os resultados das estimações encontram-se nos Quadros 97 a 100 e Figura 34.253

QUADRO 97 ESTIMAÇÃO DA EQUAÇÃO .... NO PERÍODO [1982 1988]


Dependent Variable: N t
Method: Least Squares
Sample: 1982:08 1988:12
Included observations: 77
Variable Coefficient Std. Error t-Statistic Prob.
C 0.042267 0.037939 1.114074 0.2690
N t-1 1.131217 0.114145 9.910374 0.0000
N t-2 -0.193147 0.110093 -1.754400 0.0836
PIBt 0.058378 0.020376 2.865015 0.0055
Wt -0.005249 0.004557 -1.151793 0.2532
R-squared 0.996305 Mean dependent var 4.702768
Adjusted R-squared 0.996100 S.D. dependent var 0.079215
S.E. of regression 0.004947 Akaike info criterion -7.717296
Sum squared resid 0.001762 Schwarz criterion -7.565101
Log likelihood 302.1159 F-statistic 4853.553
Durbin-Watson stat 1.879641 Prob(F-statistic) 0.000000

253
São apresentados apenas os testes de estabilidade do segundo período identificado.
361

QUADRO 98 - ESTIMAÇÃO DA EQUAÇÃO 20 NO PERÍODO [1992 2001]

Dependent Variable: N t
Method: Least Squares
Sample: 1992:01 2001:04
Included observations: 112
Variable Coefficient Std. Error t-Statistic Prob.
C 0.348584 0.130091 2.679546 0.0085
N t-1 0.712470 0.094365 7.550155 0.0000
N t-2 0.116955 0.090583 1.291130 0.1994
PIBt 0.107581 0.027746 3.877268 0.0002
Wt -0.012561 0.006610 -1.900165 0.0601
R-squared 0.981738 Mean dependent var 4.820481
Adjusted R-squared 0.981056 S.D. dependent var 0.041392
S.E. of regression 0.005697 Akaike info criterion -7.454112
Sum squared resid 0.003473 Schwarz criterion -7.332751
Log likelihood 422.4303 F-statistic 1438.073
Durbin-Watson stat 2.038984 Prob(F-statistic) 0.000000

FIGURA 34 TESTES DE ESTABILIDADE DA RELAÇÃO ... NO PERÍODO (1992-2001)

6 1 .2
30 1.2
4 0 .8

20 1.0
2 0 .4

0.8
10 0 0 .0

0.6 -2 -0 .4
94 95 96 97 98 99 00 01 94 95 96 97 98 99 00 01
0 Re c u rs i v e C(1 ) Es ti m a te s ± 2 S.E. Re c u rs i v e C(2 ) Es ti m a te s ± 2 S.E.
0.4
0 .8 0 .6

-10 0 .6 0 .5
0.2 0 .4
0 .4
0 .2
0 .3
-20 0.0 0 .0
0 .2
-0 .2
0 .1
-0 .4

-30 -0.2 -0 .6 0 .0

93 94 95 96 97 98 99 00 01 93 94 95 96 97 98 99 00 01 -0 .8 -0 .1
94 95 96 97 98 99 00 01 94 95 96 97 98 99 00 01

Re c u rs i v e C(3 ) Es ti m a te s ± 2 S.E. Re c u rs i v e C(4 ) Es ti m a te s ± 2 S.E.

CUSUM 5% Signific anc e CUSUM of Squares 5% Significance


0 .1 0

0 .0 5

0 .0 0

-0 .0 5

-0 .1 0

-0 .1 5
94 95 96 97 98 99 00 01

Re c u rs i v e C(5 ) Es ti m a te s ± 2 S.E.

QUADRO 99 ELASTICIDADES DE CURTO PRAZO DO EMPREGO REGIÕES


METROPOLITANAS (1982-2001)

Período Coeficiente de Elasticidade-PIB do Elasticidade-salário do


ajuste ( 1 + 2) emprego emprego

ago/1982-dez/1988 0,9400 0,0584 n.s

jan/1992-abr/2001 0,7125 0,1076 n.s


362

QUADRO 100 - AJUSTAMENTO DO EMPREGO INDUSTRIAL: ELASTICIDADES DE LONGO


PRAZO (1982-2001)
Período Elasticidade- Elasticidade-
produto do custo salarial do
emprego emprego
ago/1982-
dez/1988 0,97 -

jan/1992- 0,37 -
abr/2001
Os testes econométricos mostram que no curto prazo aumentou a velocidade de ajuste
do emprego nos anos 90. A elasticidade-PIB do emprego praticamente dobrou para as
relações salariais das regiões metropolitanas. A elasticidade-salário do emprego revelou-se
não significativa, embora o sinal seja negativo, conforme esperado num ambiente de
intensificação da concorrência e de ruptura dos compromissos institucionalizados,
correspondentes ao modo de desenvolvimento por substituição de importações.

Quanto às elasticidades de longo prazo, o teste revela um movimento inverso ao


observado no curto prazo: a redução do grau de resposta do emprego às variações do nível de
atividade econômica, que pode ser explicado pelo aumento do desemprego estrutural neste
período.

4.3.5 Síntese dos principais resultados


O início do processo de constituição das relações salariais na economia brasileira, em
finais do século XIX, foi condicionado pelas estruturas sócio-culturais e de organização da
produção herdadas de uma economia de base escravista. As implicações deste fato histórico
devem integrar toda análise consistente sobre a formação e institucionalização do salariado
brasileiro. As condições que reproduzem as grandes disparidades e assimetrias entre capital e
trabalho encontram suas origens ao menos em parte nessas estruturas, que igualmente
respondem pelo caráter inacabado do Estado brasileiro, dificultando tanto a implantação
quanto a eficácia de uma legislação do trabalho e seguridade social mais consentâneas com as
reais necessidades das classes menos favorecidas.

O Quadro 101 proporciona uma visão geral da evolução de longo prazo da wage-labor
nexus brasileira desde o período de constituição das relações salariais. O critério de
periodização baseou-se nas principais mudanças estruturais, mas a ênfase recai sobre as
transformações institucionais impostas pelo Estado, sob a hipótese de que este correspondia à
forma institucional hierarquicamente superior até os anos 80.
363

Alguns dos principais resultados e possíveis implicações da presente análise podem


então ser listados a seguir:

Com o avanço da industrialização, a WLN consolidou-se enquanto principal relação de


produção e de distribuição, conforme a tendência histórica de evolução das economias que
se organizam sob o modo de produção capitalista. Portanto, não há dúvidas que a
economia brasileira desenvolve-se sobre a base de uma sociedade salarial. Todavia, trata-
se de uma sociedade salarial dual, pois metade das relações salariais encontram-se fora da
legislação trabalhista e previdenciária. Trata-se de uma WLN com institucionalidade
restrita e incompleta. Restrita, em razão do elevado percentual de assalariados informais,
de relações de emprego precário e de postos de trabalho de baixa qualidade; mas também
incompleta, porque diversos componentes de proteção ao trabalho e de assistência social
permanecem ainda muito pouco desenvolvidos ou mesmo inexistentes;

Quanto à própria WLN brasileira, a análise histórica suportada pelos testes


econométricos fornece elementos empíricos consideráveis para classificá-la como uma forma
institucional sempre subordinada na arquitetura definidora dos modos de regulação no Brasil.
A lista a seguir não pretende reunir a totalidade das conclusões ou esgotar todas as
conseqüências que se pode extrair das análises propostas. Algumas das implicações
macroeconômicas surgirão apenas nas próximas seções ou capítulos, em razão da passagem
da análise ao plano da régulation d ensemble.
QUADRO 101 A WAGE-LABOR NEXUS BRASILEIRA EM PERSPECTIVA HISTÓRICA
PERÍODO DE
PERÍODO DE FORMAÇÃO PERIODO DE CONSOLIDAÇÃO PERÍODO DE TRANSIÇÃO
DESCONSTRUÇÃO
Tentativa de
Retomada dos A resistência dos
Fases

Salarização Institucionalização Expansão do Primeira fase de reafirmação dos Segunda fase de


movimentos sindicatos é
forçada autoritária salariado industrial flexibilização compromissos flexibilização
sindicais quebrada
(1850-1929) (1930-1945) (1946-1963) (1964-1973) Institucionalizados (1996-2002)
(1974-1979) (1990-1995)
(1980-1989)
- Grande variabilidade - Criação do salário - Forte diferencial - FGTS substitui a - Multiplicação das - Nova Constituição - Aumento do - Mudanças na
dos salários que são mínimo e da entre lei da estabilidade greves nos setores- federal de 1988 desemprego legislação do
fixados à níveis muito Consolidação das leis produtividade e do emprego motor tenta garantir os trabalho para
baixos do trabalho CLT salários reais direitos dos - Ganhos aprofundar a
(legislação das - Ganhos elevados - Salários nominais trabalhadores elevados de flexibilidade
- Criação da relações de trabalho - Movimentos de produtividade completamente produtividade às quantitativa e
Características

Confederação e seguridade social) sindicais se às expensas dos indexados à inflação - Estagnação da expensas do salarial
Brasileira do Trabalho desenvolvem salários produtividade emprego
em 1912 - Regulamentação - Conflito distributivo - Setor informal
estatal assume - Crise dos anos - Repressão dos se intensifica - Planos de - Conexão salário- atinge 50% da
- Início da caráter tutelar e de 60 movimentos estabilização de produtividade na WLN
regulamentação da controle dos sindicais preços perturbam indústria
organização do sindicatos os acordos entre - Desconexão
trabalho e da tutela capital e trabalho - Expansão da entre salários e
estatal da WLN informalidade e ganhos de
da precariedade produtividade na
- Primeiros institutos de indústria
aposentadorias

- Crise da economia - Revolução de 1930 - Criação das - O regime político - Crise do regime de - Abertura política e - Abertura - Abertura
escravista e Estado Novo indústrias de ditatorial promove, acumulação do criação da Nova comercial e comercial e
base em 1964, as milagre República em abandono do liberalização
Fatores de impulsão

- Imigração européia - Industrialização por reformas 1985 PISI financeira se


substituição de - Plano de Metas institucionais do - Esgotamento do aprofundam
- A lei de terras, em importações(ISI) (1955-1962) regime ditatorial - Crise da dívida - Reestruturação
1850, restringe o PAEG
como modelo de externa industrial - Taxas reais de
acesso à propriedade desenvolvimento - O governo - Milagre - II PND juros
territorial econômico procura manter o Econômico (1967- - alta inflação e - Globalização extremamente
poder de compra 1973) regime monetário- neoliberal elevadas
- Transição capital dos salários financeiro dual (privatização,
mercantil agrário- redução do - Vulnerabilidade
exportador / capital Estado, externa e
industrial financeirização) especulação

FONTE: Adaptação a partir de M. BRUNO (2002), « Rapport salarial et régime monetaire au Brésil - Émergence, Évolution et Perspectives d une Construction
Inachevée », Séminaire URA 922 Cepremap, Paris, novembre 2002.
Influência do salário mínimo na determinação do salário de mercado

- Em termos gerais, a influência do salário mínimo na determinação dos salários de


mercado mostrou-se muito dependente da forma institucional de inserção no regime
internacional. Quando a economia brasileira mantinha-se protegida da concorrência
externa (até 1989), a determinação do salário mínimo e do salário médio da indústria
podiam responder, de forma preponderante, aos fatores internos. No entanto, a fase de
abertura deve ser apreendida em três momentos característicos: o primeiro, antes do
Plano Real; e os dois demais sob o Plano Real com regime de câmbio fixo ajustável
(1995-1998) e em seguida com regime de câmbio flutuante (a partir de 1999);

- Sob economia fechada (1985-1989), os resultados mostram-se contraditórios. Com as


séries trimestrias e as variáveis em taxas de crescimento, as variações reais do salário
mínimo precedem (segundo o teste de causalidade de Granger) as variações no salário
médio da indústria de transformação. Neste caso, se poderia concluir que a fixação
governamental do salário mínimo teria sido uma referência importante para a
determinação dos demais salários pagos na economia brasileira. Mas com os dados
mensais e em níveis (log dos valores), mudanças no salário médio nominal da
indústria de transformação precedem as mudanças no salário mínimo. Isto significa
que a fixação dos salários no setor privado teria exercido influência nas decisões
governamentais quanto à fixação do nível do salário mínimo. Uma explicação
plausível refere-se à alta inflação que caracterizou o período, pois com os dados em
taxas de variação, a análise apreende os efeitos comuns de curto prazo da inflação
sobre a evolução de ambas as séries, mas não necessariamente suas influências
mútuas. As séries em log e em termos nominais são as que expressam os valores
visíveis ou efetivamente observados pelos agentes econômicos, que normalmente
possuem algum grau de ilusão monetária. No setor industrial, as relações salariais
normalmente são mais estruturadas e os sindicatos mais organizados, de maneira que
as perdas inflacionárias tendem a ser recompostas com mais agilidade do que nos
demais setores econômicos e podem mesmo anteceder a reatualização monetária do
salário mínimo por parte das autoridades governamentais. Se de um lado a economia
ainda estava fechada em termos comerciais, de outro o processo de abertura política
com a redemocratização do país favoreceu a retomada dos movimentos sindicais em
prol das reivindicações salariais. Então, mudanças no salário médio nominal da
indústria causaria-Granger as mudanças no salário mínimo nominal;
366

- Entre 1995:06 e 1998:01, fase de vigência do Real sob regime de câmbio fixo, os
testes apontam para a existência de simultaneidade ou bi-causalidade entre as duas
séries, quando a relação é estimada em primeiras diferenças. Todavia, a ausência de
uma relação de co-integração enfraquece a hipótese de uma ligação de causalidade
entre essas variáveis e a dependência de curto prazo pode simplesmente ser o reflexo
da dinâmica da inflação no período;

- No período 1999:02 a 2001:01, correspondente à fase posterior à crise financeira de


1999 e já sob o regime de câmbio flutuante, os coeficientes estimados não foram
estatisticamente significativos e não foi possível encontrar nenhuma vinculação entre
o salário mínimo e o salário médio na indústria de transformação. Neste período, os
salários neste ramo da indústria encontram-se em seu patamar mais baixo desde junho
de 1995 e as taxas de desemprego são as mais elevadas. Além disso, a retomada das
exportações brasileiras a partir de 2000, provavelmente exerceu pressão por contenção
salarial, para efeitos de competitividade.

- Uma das conclusões das análises sobre os determinantes do emprego é que se a


demanda das firmas é antecipada como não permanente ou em termos
macroeconômicos, quando a demanda efetiva é muito instável ou pouco previsível - o
emprego tende a reagir menos à evolução da produção, em razão dos custos de
contratação e de demissão envolvidos. Estes últimos são diretamente influenciados
pela configuração vigente da WLN, ou seja, das estruturas organizacionais e
institucionais que regulam o sistema de relações salariais em questão;

Tanto sob o período do milagre quanto nos anos 90, a wage-share sofreu quedas
sucessivas e acentuadas, expressando o aumento da concentração funcional da renda
em favor dos lucros. Todavia, a análise empírica mostra que no caso do milagre
econômico brasileiro, os ganhos de produtividade ocorreram às expensas dos salários,
enquanto nos anos 90, o aumento da produtividade foi obtido às expensas do emprego. No
primeiro caso, tratava-se de uma economia fechada em termos comerciais e sob um
regime político arbitrário. Nestas condições, a WLN foi submetida a um processo de
enquadramento forçado à lógica de um regime de acumulação socialmente excludente. No
segundo caso, o Estado, sob um regime político democrático, adere à lógica da
globalização neoliberal e ao receituário do Consenso de Washington e submete a WLN às
pressões da concorrência e das finanças internacionais. Em ambos os casos, o Estado foi
mobilizado para submeter as relações salariais às prerrogativas do grande capital nacional
367

e internacional. Durante o milagre , o Estado utiliza as formas de repressão direta das


classes trabalhadoras. No período democrático, faz jogar o peso dos mecanismos
concorrenciais sobre a WLN, através da legitimidade que lhe foi conferida enquanto
governo eleito pelo povo numa época marcada pela ideologia da globalização ;

No setor industrial, a análise precedente detectou, na primeira metade dos anos 90, uma
fase de conexão dos salários aos ganhos de produtividade. Essa indexação permaneceu
enquanto as taxas de desemprego não eram capazes de abalar as organizações e os
movimentos sindicais em termos de reivindicações salariais. Com a elevação rápida do
desemprego estrutural e tecnológico, provocada pela intensificação da concorrência
externa no período de sobrevalorização cambial imposta pelo Plano Real, a desconexão
sobreveio;

Conforme o modelo de ajustamento parcial do emprego industrial, os testes revelaram que


a elasticidade-produto do emprego de curto prazo reduziu-se em cerca de 30% com a
liberalização comercial e financeira e a inércia do emprego aumento de 0,76 para 0,92. O
fato de maior destaque do ponto de vista de uma análise regulacionista, refere-se à
mudança do sinal da elasticidade-custo salarial do emprego industrial. Antes da abertura
econômica, o sinal era positivo, enquanto sob economia aberta ele passa a ser negativo
conforme esperado pelas teorias derivadas da tradição neoclássica. Isto pode estar
expressando a existência de mutações importantes no modo de regulação e que foram
induzidas pelas transformações da forma institucional de inserção no regime internacional.
Por outro lado, os valores dessas elasticidades, tanto no curto quanto no longo prazos, são
muito pequenos e isto também corresponde a uma constatação das análises em termos de
regulação254. Conseqüentemente, a flexibilidade salarial está longe de ser um bom atributo
para garantir a geração de emprego. O problema da demanda efetiva parece explicar
melhor essa questão, na medida em que sua aderência às economias capitalistas
realemente existentes é teórica e empiricamente mais robusta;

Os testes econométricos demonstram também que o emprego industrial responde às


flutuações conjunturais. A elasticidade-produção foi de 0,22 para as fases de expansão e -
0,33 para as fases de queda da produção e considerando o período completo sob análise.
O coeficiente que capta a inércia do emprego é estatisticamente significativo com o valor
de 0,62 também para o perído completo. Como os testes revelaram a presença de

254
Mas também de outros autores que não se inscrevem nessa problemática. Mais detalhes das implicações
teóricas e empíricas dessa questão podem ser encontrados em BOYER (1998).
368

instabilidade estrutural em finais dos anos 80 e início dos 90, o período foi subdivido. No
período pré-abertura e pré-Real, existe apenas sensibilidade estatisticamente significativa
à baixa do nível de produção, com valor de 0,72. No período de economia aberta sob a
vigência do Real, permanece a resposta do emprego às variações positivas da produção da
indústria de transformação, mas a elasticidade cai mais do que a metade (0,32). Quando se
considera o período completo sob economia aberta, englobando as fases anteriores e
posteriores ao Real, o emprego industrial passa a responder as fases ascentes e descentes
da conjuntura, indicando que a rigidez à alta do emprego industrial foi uma característica
consolidada após a estabilidade de preços. A indústria se reestrutura e reduz os quadros
em cerca de 30% do nível de janeiro de 1995;

As inércias das horas e do emprego não são expressivamente diferentes em magnitude das
elasticidades envolvidas. Apenas no período de vigência do Real sob regime de câmbio
fixo é que a inércia das horas (0,94) supera em 10% a inércia do emprego (0,84). Este fato
é um indicativo de que os ajustes por horas são obtidos preponderantemente por ajustes de
pessoal, o que encontra apoio numa economia caracterizada por elavada rotatividade das
relações de emprego. É por esta razão que a dinâmica dos ganhos de produtividade horária
é praticamente idêntica à dinâmica dos ganhos de produtividade por pessoal ocupado. Por
outro lado, a elasticidade-produção do emprego industrial praticamente dobra no período
pós-Plano Real (0,46 entre 1991-1994 e 0,84 entre 1995-1998);

Com relação à formação dos salários na indústria de transformação, o salário médio


nominal responde apenas às variações do índice de custo de vida. Sob economia aberta e
antes do Real, o coeficiente da elasticidade-produção torna-se significativo (0,69) e a
indexação ao custo de vida é completa. Com a introdução do Real, apenas a constante e o
coeficiente da elasticidade-emprego permanecem significativos. No período anterior, a
constante não era estatisticametne significativa, o que sugere a entrada em cena de outros
fatores de determinação dos salários nominais. O coeficiente de indexação ao custo de
vida deixa de ser estatisticamente significativo, mas o sinal passa a ser negativo.
Considerando os efeitos do tamanho da amostra, a inversão deste sinal pode estar
indicando que houve perda real do poder aquisitivo dos salários em função da proibição
legal de indexação à evolução da inflação. Como o salário médio nominal passa a variar
preponderantemente em função das varições do nível de emprego na indústria, este fato
sinaliza para um aprofundamento do caráter concorrencial das relações salariais no setor
industrial;
369

Com relação aos salários reais na indústria de transformação, os testes confirmaram a


existência de uma fase de conexão do salário médio real à evolução dos ganhos de
produtividade. Fato que já podia ser inferido da análise gráfica das séries em questão. No
período compreendido entre 1991 e 1995, os trabalhadores se apropriaram dos ganhos de
produtividade na indústria, mas só enquanto as taxas de desemprego mantinham-se em
patamares insuficientes para enfraquecer os movimentos sindicais. Com a
sobrevalorização cambial que marcou a primeira fase do Plano Real, a desconexão salário-
produtividade se afirma e inaugura, para os trabalhdores, a entrada em um período de
declínio seguido de forte contenção salarial. A evolução da razão salário-produtividade
que se pôde observar no Gráfico 18, confirma estes fatos característicos da economia
brasileira sob globalização neoliberal;

Considerando-se os ajustamentos do emprego no total da economia, ou seja, utilizando


uma série representativa do nível de emprego geral, os resultados obtidos foram os
seguintes: a velocidade de ajuste de curto prazo do emprego total aumentou nos anos 90.
A elasticidade-PIB praticamente dobrou para as relações salariais com dados relativos às
regiões metropolitanas brasileiras. A elasticidade-salário do emprego revelou-se
estatisticamente não significativa (possivelmente em razão do tamanho da amostra
disponível), embora o sinal seja negativo, conforme esperado num ambiente
macroeconômico marcado pela intensificação da concorrência e pela destruição dos
compromissos institucionalizados vigentes no período de economia fechada em termos
comerciais;

Com relação à dualidade da WLN brasileira, as análises mostram comportamentos bem


contrastados das relações salariais formais antes e depois da abertura comercial e
financeira. Antes da abertura econômica dos 90, observa-se rigidez à baixa do eixo formal
da WLN, no que concerne ao emprego que responde apenas às fases de expansão, mas não
à queda do nível de atividade econômica. Todavia, no período pós-abertura, a inércia do
emprego formal desaparece e as respostas às flutuações conjunturais se invertem, com o
emprego tornando-se sensível às fases de queda da produção, mas não às fases de
expansão e com uma elasticidade que é maior do que o dobro da do período pré-abertura.
Este fato aponta para um aprofundamento do grau de flexibilidade quantitativa da WLN,
além de indicar uma dificuldade da economia brasileira para gerar empregos formais;

Quanto ao eixo informal da WLN, as relações salariais mostram-se insensíveis em termos


estatísticos, às variações tanto positivas quanto negativas do PIB. Mas como o coeficiente
370

de inércia também não se revelou significativo, pode-se considerar que o segmento sem
carteira estaria respondendo a movimentos sazonais. O fato novo é o aparecimento de uma
elasticidade importante (0,94) das relações salariais informais às fases de expansão
econômica, embora continue sua insensibilidade às quedas do nível de atividade;

No que concerne ao segmento dos trabalhadores independentes (conta própria), os


resultados apontaram para a ausência de inércia no período de economia fechada. Este
segmento, porém mostrou-se sensível às variações negativas do PIB. No período de
economia aberta, observam-se os seguintes fatos novos: aparecimento de um coeficiente
de inércia estatisticamente significativo e negativo, de uma elasticidade-PIB positiva, mas
perda de sensibilidade às quedas do nível de atividade econômica;

A análise das influências entre os eixos da WLN revela os seguintes fatos


característicos:

- há uma relação estatisticamente significativa e positiva entre os segmentos dos sem


carteira e dos trabalhadores independentes, tanto sob economia fechada quanto aberta
(uma elasticidade de 0,6 antes da abertura econômica e de 0,5 depois da abertura);

- As relações salariais formais respondem negativamente às expansões do número de


relações de trabalho independente (conta própria) com uma elasticidade de 0,32. Mas o
teste de causalidade de Granger mostra que as variações do contingente de trabalhadores
conta própria precedem as variações das relações salariais formais;

- No que concerne às relações entre os segmentos sem carteira e com carteira, os testes
econométricos revelam que há relação positiva sob economia aberta pré-Real (0,48), mas
negativa durante a vigência do Real (-0,58). Além disso, há o aparecimento de uma
elasticidade-PIB de 0,73 do segmento sem carteira;

- Os testes de causalidade de Granger detectaram os seguintes comportamentos: sob


economia fechada, as variações no número de relações salariais informais precedem as
variações no número de relações salariais formais. Isto sugere que nas fases de expansão
do nível de atividade, as empresas eram inicialmente propensas a expandir o emprego
informal, pois, em razão das incertezas e da instabilidade macroeconômica que marcou
este período, não possuíam garantia de que a expansão seria duradoura o suficiente para
justificar contratações legais, mais custosas e menos flexíveis. Portanto, o PIB estaria
puxando primeiro o emprego informal e em seguida, após as expectativas de demanda
efetiva confirmadas, o emprego formal se expande. No período de economia aberta antes
371

da introdução do Real, a causalidade se inverte e as variações do número de relações de


trabalho com carteira precedem as variações dos sem carteira. Nesta fase ocorre o
aprofundamento do processo de desestruturação das relações de trabalho provocado pela
abertura comercial e a redução rápida dos quadros formais passou a comandar a
expansão do setor informal. No período de economia aberta sob a vigência do Real, os
resultados dos testes foram inconclusivos, com a não-rejeição de ambas as hipóteses
nulas de não causalidade. Este resultado pode estar indicando que a economia brasileira
chegou a um patamar já suficientemente elevado de informalidade e de redução dos
quadros formais que lhe permite responder melhor, do pondo de vista das empresas, às
pressões da liberalização comercial e financeira que marcou este período. Por outro lado,
trata-se também de um período de quase-estagnação ou de crescimento lento e instável,
com a taxa média de crescimento do PIB em torno de 2% ao ano;

Quanto à formação dos salários por segmento os resultados foram os seguintes:

- No que concerne ao segmento formal (com carteira), a indexação dos salários ao


custo de vida foi total no período pré-Plano Real, em razão da alta inflação. Não
houve, contudo, influência direta, estatisticamente significativa, do desemprego sobre
a formação dos salários nominais. No período de economia aberta pré-Real, o
coeficiente de indexação dos salários ao custo de vida reduz-se em cerca de 5%,
permanecendo a não influência direta do desemprego. O fato novo relevante quando se
trata de examinar o caráter concorrencial da WLN brasileira, refere-se ao surgimento
de um comportamento característico de uma curva de Phillips. O desemprego passa a
influir diretamente na formação dos salários nominais de um setor tradicionalmente
mais estruturado da WLN, o que indica mais uma vez o aumento do grau de
flexibilidade quantitativa e salarial. O salário médio real responde às variações do PIB
no período pré-abertura, mas não às tensões entre oferta e demanda de trabalho. No
entanto, com especificações alternativas, os modelos captaram influência grande do
emprego formal sobre a formação do salário médio real deste segmento, mas apenas
sob economia fechada. Com economia aberta, a elasticidade-emprego do salário real
desaparece, surgindo uma elasticidade dos salários às variações positivas do PIB, mas
não às quedas do nível de atividade;

a) No período pré-abertura, a indexação dos salários nominais do segmento


informal ao custo de vida revelou-se menor do que a observada no segmento
formal, que responde às fases de crescimento do PIB, mas não às fases de
372

queda. No entanto, sob vigência do Real, a indexação aos preços é completa,


além da inversão do comportamento com relação ao PIB. Desaparece a
sensibilidade às expansões e surge uma elasticidade importante (0,96) às fases
de recessão. Os testes não revelaram como estatisticamente significativa a
influência direta do desemprego sobre a formação do salário médio nominal
neste segmento;

b) No período de abertura e sob vigência do Real, os testes revelaram que uma


expansão das relações salariais formais contribui para reduzir o salário médio
nominal no segmento informal. Uma explicação plausível seria considerar que a
abertura comercial e financeira aumentou a demanda por trabalhadores mais
qualificados e o mercado de trabalho foi pressionado pelo aumento do
desemprego dos menos qualificados, cujas remunerações foram reduzidas ainda
mais;

c) O salário médio real do segmento sem carteira responde apenas às variações


positivas do PIB, tanto antes quanto durante a fase de economia aberta. Mas
com a abertura, houve uma redução dessa elasticidade que passa de 0,92 para
0,57;

d) Existe uma correlação positiva entre o salário médio real do segmento formal e
o rendimento médio real dos trabalhadores independentes. O teste de
causalidade de Granger indica que as variações no rendimento médio real dos
trabalhadores independentes precedem as variações do salário médio real do
setor formal das relações salariais. A sensibilidade do rendimento médio real
dos trabalhadores conta própria com relação às flutuações conjunturais não se
revelou estatisticamente significativa;

As análises desenvolvidas precedentemente permitem caracterizar a wage-labor nexus


(WLN) brasileira como amplamente concorrencial, segmentada e permanentemente
monitorada pelo Estado de maneira à adequá-la aos imperativos considerados maiores de
estabilidade de preços e dos equilíbrios das contas públicas e externo. Entre essas
prerrogativas veiculadas pelas disposições normativas e reguladoras sobre o sistema de
relações salariais, o Estado promove a contenção salarial também para manter a atratividade
da economia brasileira aos capitais estrangeiros.
373

4.4 O regime monetário-financeiro: a difícil construção da moeda nacional

Há sempre uma alternativa à propriedade de ativos de capital real,


notadamente a propriedade de moeda e débitos .
(J. M. Keynes, General Theory)

Os credores do Estado, na realidade, não dão nada, pois a soma


emprestada é convertida em títulos da dívida, facilmente
transferíveis, que continuam a funcionar em suas mãos como se
fossem a mesma quantidade de dinheiro sonante. Porém, abstraindo
a classe de rentistas ociosos assim criada e a riqueza improvisada
dos financistas (...), a dívida do Estado fez prosperar (...) o jogo da
Bolsa e a moderna bancocracia.
(K. Marx, O Capital)

4.4.1 Introdução

A presente seção tem por objetivo sintetizar os principais fatos característicos da


evolução do regime monetário-financeiro (RMF), enquanto terceira forma institucional de
base da regulação. Busca-se destacar as mudanças institucionais mais relevantes por seus
impactos macroeconômicos como um dos suportes da análise desenvolvida no próximo
capítulo.

Historicamente, o Estado brasileiro tem sido o agenciador direto de um processo de


adequação dos regimes monetários-financeiros às exigências de estruturas produtivas e de
demanda que sempre tiveram de enfrentar o difícil problema da constituição da moeda
nacional. De fato, um grande problema quando se trata de uma economia ainda em
desenvolvimento, caracterizada por forte restrição externa derivada de suas formas
subordinadas de inserção internacional. A tendência à inflação, as dificuldades de
financiamento de longo prazo e a atrofia do mercado de capitais são alguns dos aspectos que
se reforçam mutuamente como premissa e resultado das distorções estruturais que
caracterizam este tipo de economia. Compreender a dinâmica das relações monetárias e
financeiras neste contexto, constitui uma das etapas necessárias para se apreender as
especificidades das formas através das quais o capital bancário-financeiro impõe limites ao
crescimento econômico e ao mesmo tempo se nutre tanto da inflação quanto das tendências
estagnacionistas que marcaram as décadas de 80 e 90.

4.4.2 O conceito de regime monetário-financeiro (RMF) e sua relevância

Conforme exposto no capítulo 1 deste trabalho, um regime monetário-financeiro pode


ser definido como um resultado da conjunção de estruturas organizacionais e institucionais,
públicas e privadas, que servem de suporte à circulação monetária e financeira, garantindo-
374

lhes formas de regularidade determinadas em função das atividades econômicas, das


relações Estado-economia e do próprio nível de desenvolvimento da acumulação de capital.

Esta definição não pretende fazer abstração ou minizar o papel das intervenções
deliberadas das autoridades governamentais, sobretudo através da instituição de um banco
central. Pelo contrário, seu objetivo é enfatizar os aspectos estruturais que permitam
apreender o modo como a política monetária (e também a fiscal) tem o seu raio de ação
sempre limitado pelos arranjos organizacionais e institucionais vigentes, à medida que estes
codificam os vínculos monetários e financeiros entre agentes econômicos255. Como observa
AGLIETTA (1995), a liquidez de um ativo financeiro qualquer não depende exclusivamente
das características microeconômicas deste ativo. Seu grau de liquidez é uma função da
organização das finanças, conforme as estruturas institucionais que codificam o RMF.
Conseqüentemente, as condições nas quais este ativo pode ser efetivamente convertido em
moeda são determinadas por macro-regularidades codificadas e induzidas pelo regime
monetário-financeiro em vigor. O que é a mesma coisa que dizer que dependem de arranjos
institucionais e organizacionais específicos e próprios a um determinada economia no tempo
ou no espaço.

Como observa MARQUES-PEREIRA (2004), a abordagem atual da moeda pela


Teoria da Regulação especifica de um ponto de vista sociológico como um regime monetário-
financeiro constitui um terreno de construção de compromissos sociais. A moeda é um meio
fundamental de ação social que procede da soberania do Estado. Segundo AGLIETTA e
ORLÉAN(2004), é neste contexto que a moeda passa a ser mais do que um bem econômico, é
também um medium de coesão social e de exercício de poder.

Em conseqüência, o regime monetário-financeiro surge necessariamente como um dos


componentes-chave da regulação a nível macroeconômico e baseia-se nas seguintes
premissas:

i. A moeda é o veículo fundamental das interdependências entre os participantes do


processo econômico. Enquanto premissa e ao mesmo tempo resultado da
acumulação capitalista, a moeda surge como uma construção institucional e não
como um atributo puramente mercantil;

255
É neste sentido que, como observa BILLAUDOT (2001), a política econômica depende das especificidades
do modo de regulação e do regime de acumulação que lhe é a resultante macroeconômica.
375

ii. O desenvolvimento econômico pressupõe a existência da moeda e dos outros


instrumentos ou ativos que lhe correspondam ou derivam;

iii. O Estado tem a capacidade de influenciar e mesmo remodelar o regime monetário-


financeiro em função das escolhas de política econômica que ele dispõe, das formas
possíveis de inserção internacional e das estruturas que suportam a acumulação
produtiva nos setores não-financeiros;

iv. Um regime monetário-financeiro pode então ser favorável ao desenvolvimento do


crédito para os setores diretamente produtivos, quando uma política monetária de
acomodação ou pelo menos não-restritiva encontra-se a ele associada. Por outro
lado, caso haja a permanência por longos períodos de uma política monetária
restritiva que tende a bloquear ou dificultar o desenvolvimento das formas de
crédito aos setores diretamente produtivos, o regime monetário pode se converter
em um fator impulsionador de uma acumulação predominantemente financeira ou
patrimonialista. Neste contexto, pode-se definir os regimes monetário-financeiros a
partir do grau de restrição monetária que impõem aos atores econômicos: RMF à
baixa, média ou alta restrição monetária. Cada um deles expressando as formas
vigentes de acesso ao crédito ou as particularidades da política monetária.

4.4.3 A evolução do RMF brasileiro: uma periodização em termos de mudança


institucional

Uma periodização do desenvolvimento financeiro brasileiro, baseada na delimitação


dos marcos institucionais ao longo da evolução econômica nacional, foi proposta por COSTA
e DEOS [1999]. A presente análise baseia-se na pesquisa desses autores, acrescenta novos
dados e informações relevantes, além do quinto e último período. Em seguida, traduz os
momentos determinantes desse processo de desenvolvimento, segundo a estrutura conceitual e
os princípios de análise propostos pela Teoria da Regulação.

Primeiro período (1500-1808) - este primeiro período poderia ser omitido, mas é
relevante para mostrar o ponto de partida histórico da formação das estruturas financeiras. Em
razão do baixo nível de desenvolvimento das relações de produção e de distribuição, típicos
de uma economia primário-exportadora escravista sob controle institucional da metrópole, há
reduzida entrada de capital estrangeiro. Apenas os fluxos necessários para a instalação e
funcionamento da empresa colonial , segundo o duplo monopólio imposto pela instituição
376

do exclusivo metropolitano256. O resultado direto é que este tipo de economia se caracteriza


por um baixo coeficiente de monetização e pelo predomínio das relações de escambo.

Segundo período (1808-1929) - corresponde a uma fase de abertura financeira, com


grande endividamento externo e tentativas frustradas de adaptação às regras de funcionamento
de um regime monetário internacional funcionando sob o padrão-ouro. Em 1808, o Banco do
Brasil é criado juntamente com uma dezena de bancos locais que, no entanto, tiveram vida
curta. Apenas no século XX pode-se observar a formação de um sistema bancário.

Os primeiros bancos foram criados por iniciativa de imigrantes, além de uma média de
aproximadamente mil Casas Bancárias de atuação local. Entre os fatos notórios neste período,
destacam-se o conhecido funding loan de 1914, a Caixa de Conversão (1906-1914) e a Caixa
de Estabilização (1927-29). Nos anos 20, uma onda de nacionalização e de tentativas de
fortalecimento do sistema bancário nacional desembocaria na Lei Bancária de 1921, limitando
a participação dos bancos estrangeiros e reservando o mercado domésticos aos capitais
bancários nacionais.257 Portanto, até os anos 1920, não existem empréstimos de liquidez de
uma autoridade monetária (banco central). Não havia sistema bancário ou rede integrada de
agências, apenas um conjunto de bancos isolados que na ausência de câmara de compensação
para generalizar o uso de cheques, não permitia a criação endógena de moeda.

Terceiro período (1930-1964) - define-se por uma fase de redução da demanda por
empréstimos externos. Mas a partir de 1930, asseguram-se os pré-requisitos mínimos para o
financiamento dos investimentos via crédito e, portanto, através da criação endógena de
moeda, independentemente de uma acumulação prévia de poupança . Este período
corresponde a uma fase de reconstrução do Estado Nacional, mas, num segundo momento,
também de mudança de seu relacionamento com o capital estrangeiro. Busca-se uma atuação
mais adequada às necessidades do novo padrão de acumulação de capital de base industrial,
considerando-se as transformações do capitalismo mundial no pós-Segunda Guerra e a
expansão das empresas multinacionais. A mobilização do Estado para o financiamento de
longo prazo dos capitais privados - via criação do BNDES, em 1952 - é um reflexo dessa
nova orientação do regime fisco-financeiro nos quadros de um projeto de desenvolvimento
econômico nacional.

256
Mais rigorosamente significa que a metrópole lusitana possuía a dupla vantagem de funcionar como
monopolista e monopsonista em relação à demanda e a produção da economia colonial brasileira.
257
Em 1924, 45% dos depósitos à vista estavam concentrados em bancos estrangeiros. No entanto, dados de
1945 mostram que essa participação cai para 7%, atestando a vigência de um sistema bancário efetivamente
nacional.
377

Quarto período (1964-1993) - tem início quando as reformas institucionais do


Programa de Ação Econômica do Governo (PAEG), elaborado para o período 1964-66,
inauguram uma fase de modernização e de montagem de estruturas financeiras, segundo os
moldes dos países desenvolvidos. Busca-se estabelecer as bases legais para a viabilidade de
um moderno mercado de capitais (1968) e o desenvolvimento de um sistema de crédito
compatível com as necessidades da acumulação de capital no Brasil.

Nos anos 70, verifica-se uma fase de grande facilidade de captação externa, em razão
da grande liquidez disponível nesta época nos mercados internacionais. Observa-se também
um processo de concentração bancária que passaria a ser promovido pelas próprias
autoridades econômicas do governo autoritário. Por outro lado, a crise da dívida externa
marcaria a década de 80, e pode ser interpretada como um dos desdobramentos do
esgotamento e crise do regime de acumulação responsável pelo milagre .

Por diversas razões políticas e institucionais, os objetivos de compatibilização do


sistema financeiro às necessidades dos setores reais foram progressivamente desvirtuados,
condicionando de forma decisiva o padrão de acumulação de capital no Brasil.

No subperíodo 1990-1992, implementam-se uma série de mudanças visando à


liberalização comercial e financeira. Conforme SODRÉ e GOTTSCHALK (2003), já na
segunda metade dos anos 80, o governo havia implementado algumas modificações
objetivando flexibilizar a legislação referente aos investimentos no mercado de capitais
brasileiro. Mas somente em 1991 seria feito um esforço para liberalizar de forma mais
profunda os investimentos externos em carteira. No que concerne à liberalização das saídas de
capitais, em 1992, o governo brasileiro autorizará os bancos estrangeiros a manterem contas
no país. Com isso poderiam comprar divisas no mercado flutuante e remetê-las para o
exterior. A liberalização avançaria ainda mais em 1994, durante a implementação do Plano
Real de estabilização de preços, ao serem criados os Fundos de Investimento no Exterior
(Fiex).

Período atual (de 1994 em diante) - o ano de 1994 entraria para a história com a
institucionalização do Plano Real de estabilização monetária. Este programa resultou na
virtual destruição do sistema de regras e contratos indexados montado a partir das reformas do
período autoritário pós-64. Como observa COSTA & DEOS [1999] todos os contratos
trabalhistas e de aluguéis são alongados de maneira compulsória. Todas as cláusulas de
reajuste em prazo inferior a um ano e as de indexação são proibidas .Esta intervenção do
poder público no sistema contratual brasileiro lançaria as bases para a constituição de um
378

novo regime monetário-financeiro, cujas conseqüências macroeconômicas ainda não foram


completamente delimitadas.

Novas regras são impostas ao sistema financeiro e à economia nacional. A própria


lógica de um regime monetário dual, baseado numa moeda financeira, é obstada pela redução
acentuada dos ganhos inflacionários e pela proibição legal dos dispositivos de indexação
generalizada. Concomitantemente, um processo de abertura ao capital bancário estrangeiro
conjuga-se com a lógica de liberalização comercial e financeira. Esse processo tem levado a
uma internacionalização e concentração do sistema bancário nacional sem precedentes na
história econômica brasileira.258

Uma outra característica desse período é o predomínio de concepções ortodoxas de


política econômica. Busca-se contornar o esgotamento do modelo anterior de financiamento
via setor público e via autofinanciamento, segundo as propostas de política compatíveis com
uma adesão neoliberal ao processo de globalização . Outro momento decisivo neste período,
refere-se à mudança do regime cambial imposta pelo ataque especulativo de janeiro de 1999,
inaugurando a segunda fase do Plano Real. Após a saída de recursos da ordem de 25 bilhões
de dólares observada em 1998, o Banco Central tornou-se incapaz de manter o regime de
bandas cambiais (câmbio fixo ajustável) e instituiu um regime flutuante.

Com relação ao aprofundamento da liberalização financeira, os dispositivos


institucionais que lhe dão suporte são os seguintes (SODRÉ e GOTTSCHALK; 2003):

As contas relativas à Carta-Circular nº 5 (CC-5) criada em finais de 1960,


permitem que os não-residentes e investidores possam transferir recursos para
aplicações no exterior. Atualmente, tanto pessoas físicas quanto empresas
utilizam a CC-5 para enviar capitais ao exterior ou para repatriá-los. Esta conta
converteu-se no mecanismo mais importante para as saídas de capitais da
economia brasileira, sobretudo em momentos de crise financeira.
Conseqüentemente, sua existência e formas de regulamentação passaram a
integrar o debate sobre o aumento da instabilidade cambial que estaria
provocando;259

258
Em 1997, o Banco Central esboçaria uma predisposição a frear a entrada das instituições bancárias de varejo,
para favorecer apenas a entrada dos bancos de investimento, segmento tradicionalmente minoritário na economia
brasileira. Todavia, no ano seguinte, todos os segmentos teriam passe livre para participar do mercado bancário
brasileiro.
259
Segundo dados fornecidos pelos autores supracitados, em 2002, as saídas pela conta CC-5 atingiram níveis
recordes. US$ 1,6 bilhão no mês de agosto e mais US$ 1,7 bilhão em outubro, mês das eleições presidenciais,
379

Fundos de investimento no exterior (Fiex) constitui um canal adicional,


criado em 1994, para a saída de recursos para a aplicação em títulos de dívida
no mercado internacional. Podiam participar investidores institucionais,
instituições financeiras, empresas e pessoas físicas. Mas após a crise cambial
de 1999, as instituições financeiras foram desautorizadas a adquirir cotas do
Fiex;

Em resumo, a construção da arquitetura institucional do sistema bancário-financeiro


brasileiro foi um processo de longo prazo, marcado pela tendência histórica ao desequilíbrio
externo e à alta inflação. Como um resultado direto da dinâmica dessas estruturas, o regime
monetário-financeiro não evoluiu no sentido de ser o suporte para o financiamento da
acumulação de base industrial. Pelo contrário, o desenvolvimento financeiro levou a uma
maior autonomia do capital bancário vis-à-vis os setores diretamente produtivos e as
dimensões do mercado de capitais permanecem ainda aquém dos níveis necessários ao capital
industrial e ao financiamento da acumulação de forma sustentada no longo prazo.

4.4.4 Particularidades do sistema financeiro brasileiro

Conforme relatório do próprio Banco Central do Brasil, sobre as transformações do sistema


financeiro nacional (SFN)260:

A identificação de alternativas de estruturação dos sistemas financeiros


depende de que se consiga responder algumas questões como qual a forma
mais apropriada para seu funcionamento tendo em vista uma certa perspectiva
de crescimento econômico (...). A configuração do SFN, desenhada a partir de
1964, sofreu uma mudança de enfoque a partir da edição da Resolução 1524,
de 21.09.88. De um enfoque assentado na visão de um sistema financeiro
formado por instituições especializadas, condicionadas pela regulamentação a
praticarem uma faixa restrita de operações, tomou-se o rumo para um outro
tipo, mais próximo do sistema constituído pelas chamadas instituições
universais .
Nesta nova configuração, embora as instituições sejam diferenciadas entre si na
organização funcional e administrativa e também na condução dos negócios e na escala de
operações, apresentam em comum o fato de poderem oferecer todos os serviços financeiros.
Porém, a reforma institucional de 1964/66 provocou o surgimento de um conjunto de
características peculiares ao RMF brasileiro. Observou-se um grande aumento da participação
dos ativos não-monetários no total de ativos (Tabela 26). Uma das principais razões encontra-

em razão da especulação sobre as supostas conseqüências de um governo do Partido dos Trabalhadores. No ano,
as remessas alcançaram US$ 9,1 bilhão, um crescimento quase de 50% em relação a 2001.
260
Relatório sobre as transformações do sistema financeiro brasileiro (1989-2000) disponibilizado no site do
BACEN.
380

se no dispositivo institucional da correção monetária, pois este tornou-se, nos anos 80, a base
de um processo de indexação geral da economia, distorcendo as funções originais ou
atividades-fim de muitas das instituições financeiras.

Segundo GREMAUD et al. (2004), o crescimento dos ativos não monetários do lado
da captação era acompanhado pela maior participação do setor não monetário na concessão de
empréstimos, provocando a redução da participação dos bancos comerciais e o crescimento
das financeiras, do Sistema Financeiro Habitacional e dos bancos de investimento.

Os títulos públicos federais sempre foram os principais ativos financeiros da economia


brasileira. Como foram utilizados tanto como instrumento de política econômica quanto para
a gestão das necessidades de financiamento do setor público, a participação dos títulos
públicos manteve-se sempre acima dos 30% do total de ativos não monetários.

TABELA 26 PARTICIPAÇÃO DOS ATIVOS FINANCEIROS NO TOTAL (1978-2000)

Ativos Ativos não


Ano Total
monetários monetários
1978 25,26 74,74 100,00
1979 33,04 66,96 100,00
1980 32,69 67,31 100,00
1981 23,90 76,10 100,00
1982 18,53 81,47 100,00
1983 13,01 86,99 100,00
1984 11,55 88,45 100,00
1985 11,63 88,37 100,00
1986 35,79 64,21 100,00
1987 16,10 83,90 100,00
1988 11,16 88,84 100,00
1989 10,53 89,47 100,00
1990 13,09 86,91 100,00
1991 10,74 89,26 100,00
1992 7,47 92,53 100,00
1993 7,12 92,88 100,00
1994 13,00 87,00 100,00
1995 11,37 88,63 100,00
1996 9,25 90,75 100,00
1997 12,03 87,97 100,00
1998 11,20 88,80 100,00
1999 11,30 88,70 100,00
2000 13,60 86,40 100,00

FONTE: Banco Central do Brasil e GREMAUD et al. (2004).

Como observa GREMAUD et al, encontram-se entre as características principais do


sistema financeiro brasileiro:
381

Elevada participação do Estado, tanto em termos de número de instituições como pelo


processo de estatização da poupança (existência de linhas de poupança
compulsórias administradas por instituições públicas, que direcionam os recursos para
as aplicações reais). Este fato não significava conflito de interesses entre as
instituições financeiras públicas e privadas. Pelo contrário, representava uma forma de
relacionamento bastante lucrativa, pois o setor público arcava com o risco e com
spreads negativos, captando em termos reais e repassando em termos nominais às
instituições financeiras privadas;

Não-criação de linhas de financiamento de longo prazo por parte do setor privado.


Em razão das elevadas taxas de inflação e de juros conectadas à evolução da dívida
pública e aos mecanismos de indexação generalizada de preços e salários, os bancos
de investimentos voltaram se para a concessão de crédito de médio prazo, como
capital de giro para as empresas e o mercado de capitais não se desenvolveu,
permanecendo com uma participação irrisória no financiamento da economia
brasileira.261 Além disso, a grande liquidez internacional dos anos 70 permitia o acesso
fácil ao capital estrangeiro para financiamento dos investimentos produtivos, com
custos inferiores aos do sistema financeiro brasileiro;262

Alta dependência de recursos externos em razão da internacionalização financeira


provocada pelo processo de endividamento externo na década de 70 e também pela
internacionalização dos bancos brasileiros. Estes buscavam criar filiais no exterior
para ter acesso aos recursos externos com juros inferiores aos praticados no mercado
financeiro doméstico;

Predomínio de uma estrutura bancária centrada no segmento banco comercial


(varejo), voltado preponderantemente para atividades típicas da esfera de circulação
de bens e serviços, onde a oferta de crédito de curto prazo constitui a maior demanda.
As linhas de financiamento de longo prazo tiveram então de ser supridas através do
setor público, via sistema BNDES, Caixas Econômicas e demais instituições públicas
ou semi-públicas.

261
GREMAUD et al observam que, no Brasil, além da instabilidade macroeconômica, havia muita incerteza em
relação às regras. A correção monetária foi sempre muito manipulada, não refletindo a taxa de inflação
verdadeira, além da existência de restrições institucionais que desestimulavam o alongamento dos prazos das
aplicações.
262
Entre as razões citadas pelos analistas para a atrofia do mercado de capitais brasileiro, encontra-se a estrutura
patrimonial das empresas brasileiras, onde os setores mais dinâmicos são dominados pelo capital estrangeiro
multinacional e pelas empresas estatais. Por outro lado, as empresas de capital nacional permaneceram
basicamente de natureza familiar, com capital fechado.
382

A evolução recente aponta para a redução da presença direta do Estado no SFN e o


aumento da participação dos bancos estrangeiros. O Quadro 102 mostra, no entanto, que até
1998, os bancos privados nacionais ainda detinham a maior participação pelos quatro critérios
utilizados (número de instituições, participação nos ativos totais, depósitos e patrimônio
líquido).

QUADRO 102 TRANSFORMAÇÕES DO SISTEMA FINANCEIRO BRASILEIRO (1988-1998)

Nº DE INSTITUIÇÕES 1988 1996 1998

Bancos públicos federais 6 6 6


Bancos públicos estaduais 37 34 24
Bancos privados nacionais 44 147 106
Filiais de bancos estrangeiros 18 19 16
Bancos com controle estrangeiro 7 19 36
Bancos com participação estrangeira 5 31 23
Bancos de investimento 49 17 22
Total do sistema bancário 166 273 233
PARTICIPAÇAO NO TOTAL DE
1994 1996 1998
ATIVOS (%)
Bancos públicos federais 23,8 16,7 27,4
Bancos públicos estaduais 19,0 24,5 5,9
Bancos privados nacionais 43 41,4 35,7
Filiais de bancos estrangeiros 3,0 2,7 2,6
Bancos com controle estrangeiro 5,4 9,1 18,4
Bancos com participação estrangeira 5,6 5,6 9,9
PARTICIPAÇÃO DO TOTAL DE
1994 1996 1998
DEPÓSITOS (%)
Bancos públicos federais 21,0 20,9 28,4
Bancos públicos estaduais 18,3 25,8 7,7
Bancos privados nacionais 48,9 40,4 39,3
Filiais de bancos estrangeiros 1,9 1,05 1,1
Bancos com controle estrangeiro 5,5 7,0 15,7
Bancos com participação estrangeira 4,4 4,4 7,7
PARTICIPAÇÃO NO TOTAL DO
1994 1996 1998
PATRIMÔNIO LÍQUIDO (%)
Bancos públicos federais 21,2 15,4 19,3
Bancos públicos estaduais 8,9 11,9 3,1
Bancos privados nacionais 52,9 53,8 46,5
Filiais de bancos estrangeiros 3,0 3,4 2,3
Bancos com controle estrangeiro 7,3 8,2 19,5
Bancos com participação estrangeira 6,7 7,3 9,3

FONTE: Adaptado de GREMAUD et al (2004, p. 604-605)

Dados para o ano de 2000, constantes do relatório citado acima, mostram que a
participação dos bancos com controle estrangeiro no total dos bancos múltiplos comerciais
383

atingiu a cifra de 33,11%, enquanto os bancos privados e públicos, ficaram com 42,56% e
24,33%, respectivamente.

Segundo o próprio Banco Central do Brasil, o estágio atual da organização do SFN é


conseqüência tanto da mudança na legislação, como do processo de ajuste às condições
macroeconômicas após o Plano Real e do alinhamento à tendência mundial, caracterizada por
fusões de empresas integrantes de diversos segmentos produtivos das modernas economias.
A orientação das autoridades monetárias foi no sentido de buscar uma redução do número de
instituições. Pautou-se, portanto pelos incentivos à concentração e à centralização dos
capitais, sob a hipótese de que isto conduziria necessariamente ao surgimento de instituições
mais eficientes e sólidas para operar num ambiente de liberalização financeira e intensificação
da concorrência internacional.

Uma medida do aumento de eficiência seria, por exemplo, a redução do spread


bancário e o aumento das operações de crédito. Todavia, análises recentes mostram que até o
presente momento, os bancos estrangeiros vêm se adaptando rapidamente ao ambiente
macroeconômico brasileiro - caracterizado por elevadas taxas de juros e pela grande
facilidade de ganhos elevados com operações de tesouraria sem que se observe redução
significativa do custo do crédito.263

Esses fatos são indicativos da força das estruturas internas em condicionar o


comportamento dos novos capitais em operação no sistema financeiro nacional. Em outros
termos, existem macro-regularidades que derivam das formas de relacionamento entre um
Estado altamente endividado e um setor financeiro que há duas décadas vem se beneficiando
da rolagem da dívida pública. Num primeiro momento (anos 80 e primeira metade dos 90), o
suporte para a acumulação centrada nos grandes lucros do setor bancário foi a alta inflação,
pois os ganhos inflacionários eram garantidos pelo funcionamento de uma economia indexada
com o aval do próprio Estado, interessado na rolagem de uma dívida essencialmente de curto
prazo. Num segundo momento (período pós-Plano Real), a base para a acumulação bancária-
financeira foi trocada por uma estrutura de taxas reais de juros extremamente elevadas, tanto
para rolar a dívida no mercado financeiro interno, quanto para manter a economia nacional
atrativa ao fluxo de capitais estrangeiros de curto prazo.264 Estudar as conseqüências dessa

263
Aliás, o relatório supracitado não aborda os impactos das transformações do SFN sobre a estrutura das taxas
de juros no Brasil. Uma questão vital para uma economia ainda em desenvolvimento, sobretudo por ser decisiva
para o financiamento de longo prazo.
264
Um artigo publicado no jornal O Globo, cujo nome do autor não consta na fonte veiculada pela Internet, foi
intitulado apropriadamente Da Hiperinflação ao Hiperjuro .
384

nova configuração do RMF sobre o atual padrão de acumulação de capital é um dos objetivos
do próximo capítulo.

4.4.5 Indicadores de desenvolvimento financeiro

Segundo MATOS (2002)265, a utilização da razão crédito do sistema financeiro ao


setor privado / PIB, para a mensuração do desenvolvimento financeiro tem sido uma medida
muito difundida porque incorpora informações mais próximas da intermediação financeira266.
Essa razão também pode refletir respostas do setor privado à sinalização de preços e outras
condições de mercado e traduzir de forma mais eficiente como o crédito influencia os
aumentos de investimentos produtivos e de produtividade em relação àquele destinado ao
setor público.

Nesta subseção são reconstruídos os indicadores utilizados em MATOS (2002),


recuperando-os para os fins da abordagem regulacionista proposta neste trabalho. A hipótese
subjacente é a de que o desenvolvimento financeiro pressupõe determinadas configurações do
RMF e do modo como respondem à dinâmica da acumulação de capital. Uma hipótese que
encontra evidência empírica nas análises do período fordista do pós-Segunda Guerra nos
países da OCDE, onde o RMF foi a base da moeda de crédito necessária à forte expansão
econômica observada entre 1945-1975.

A sigla IndDF significa indicador ou índice de desenvolvimento financeiro.

( M 2 PMPP) ( M 2 PMPP)
IndDF1 = ; IndDF2 =
M2 PIB

Onde M2 é o agregado monetário amplo; PMPP é o papel-moeda em poder do público ou


papel-moeda emitido que está em poder do setor não-bancário. A diferença (M2-PMPP)
representa a parcela dos ativos dos agentes econômicos que está sob a guarda do sistema
financeiro e são, portanto, potencialmente emprestáveis.

Os indicadores IndDF1 e IndDF2 captam a confiabilidade no sistema financeiro e nas


instituições responsáveis por sua eficiência, em termos de garantia dos contratos envolvidos
ou da proteção dos direitos de propriedade. Portanto, esses índices podem expressar os efeitos
diretos do funcionamento de um determinado regime monetário-financeiro. Para o caso
específico da economia brasileira nos anos 80 e na primeira metade dos 90, este indicador

265
Orlando C. de MATOS, Desenvolvimento do sistema financeiro e crescimento econômico no Brasil:
evidências de causalidade, texto para discussão nº 40, Banco Central do Brasil, setembro de 2002.
266
MATOS baseia-se nas constatações de KING e LEVINE (1993) e MARRISON (2001).
385

pode expressar as particularidades de um determinado regime monetário-financeiro,


estruturado para manter a confiança ou a credibilidade do público, mesmo em um ambiente
macroeconômico marcado pela alta inflação e pelas tendências estagnacionistas.

Os indicadores IndDF3 e IndDF4 representam, respectivamente, o agregado monetário


amplo (M2) e o total de empréstimos fornecidos pelo sistema financeiro ao setor privado
(EMPSF), como percentagens do PIB.

M2 EMPSF
IndDF3 = ; IndDF4 = ;
PIB PIB

Os Gráficos 73 e 74 a seguir mostram a evolução desses quatro indicadores. No


subperíodo 1964-1976, que inclui o milagre econômico brasileiro , os quatro indicadores
apresentam-se todos em uma trajetória de expansão. Após 1977, apenas IndDF1 continua
crescendo até 1985, enquanto IndDF2, IndDF3 e IndDF4 (Gráfico 74) entram em uma fase de
declínio momentaneamente interrompida em 1986, ano da implementação do Plano Cruzado.
A tendência foi de queda para IndDF2 e IndDF3 até a introdução do Plano Real em 1994.

GRÁFICO 73 INDICADORES DE DESENVOLVIMENTO FINANCEIRO 1, 2 E 3 (1946-2003)

IndDF1 = (M2-PMPP)/M2(L)
IndDF2 = (M2-PMPP)/PIB(R)
IndDF3 = M2/PIB(R)
95% 50%

90% 45%
40%
85%
35%
80% 30%
75% 25%

70% 20%
15%
65%
10%
60% 5%
55% 0%
1946 1952 1958 1964 1970 1976 1982 1988 1994 2000
1949 1955 1961 1967 1973 1979 1985 1991 1997 2003

FONTE: Dados do Banco Central do Brasil.

Talvez o fato mais interessante seja o comportamento dos indicadores no período pós-
Plano Real. No primeiro ano de vigência da nova moeda, todos os quatro indicadores crescem
expressando o aumento na confiabilidade do sistema bancário-financeiro e o próprio processo
de remonetização da economia. Em particular, destaca-se IndDF1 que havia permanecido em
386

queda durante a introdução do Plano Cruzado, mas não na introdução do Plano Real. Mas
IndDF1 declina de 1995 a 2000, expressando o aumento da confiança do público no novo
padrão monetário, pois em razão da inflação permanecer baixa e sob controle, aumenta a
quantidade de papel-moeda em poder do público (PMPP). Os outros três indicadores
permaneceram estagnados sob o Real, o mesmo ocorrerá com IndDF1 a partir de 2000. Estes
fatos expressam a vigência de um RMF à elevada restrição monetária, onde os objetivos de
controle da inflação e dos gastos públicos passam a ser mais importantes do que incentivar a
acumulação produtiva de capital. Por outro lado, nesta fase a economia brasileira aprofunda a
liberalização comercial e financeira e o Estado submete-se às imposições do FMI e mantém as
taxas de juros em patamares extremamente elevados.

GRÁFICO 74 INDICADOR DE DESENVOLVIMENTO FINANCEIRO 4 (1970-2003)

IndDF4 = EMPSF / PIB


70%

60%

50%

40%

30%

20%

10%

0%
1970 1973 1976 1979 1982 1985 1988 1991 1994 1997 2000 2003

FONTE: Dados do Banco Central do Brasil.

O Gráfico 75 mostra a evolução do total de empréstimos do sistema financeiro ao setor


privado. Pode-se observar as diferenças no comportamento da série no período [1970-1979] e
nas décadas de 80 e 90. Isto é mais um indicador de que nesses últimos 24 anos, a economia
brasileira evoluiu nos quadros de um RMF bem diferente do padrão observado durante a fase
de forte crescimento econômico.
387

GRÁFICO 75 TOTAL DE EMPRÉSTIMO DO SISTEMA FINANCEIRO: SÉRIE ORIGINAL E


TENDENCIAL (1970-2004)

Total de empréstimos do sistema financeiro ao setor privado


-------- série tendencial em Lowess smoothing
550
500
Índice dos valores reais de jan/1970

450
400
350
300
- escala log

250

200

150

100
1970 01
1970 11
1971 09
1972 07
1973 05
1974 03
1975 01
1975 11
1976 09
1977 07
1978 05
1979 03
1980 01
1980 11
1981 09
1982 07
1983 05
1984 03
1985 01
1985 11
1986 09
1987 07
1988 05
1989 03
1990 01
1990 11
1991 09
1992 07
1993 05
1994 03
1995 01
1995 11
1996 09
1997 07
1998 05
1999 03
2000 01
2000 11
2001 09
2002 07
2003 05
2004 03
FONTE: Para os dados sobre o total de empréstimos do sistema financeiro, o Banco Central do Brasil, obtida no
IPEADATA.
NOTA: A série em periodicidade mensal foi deflacionada pelo IGP-DI da FGV, com base em agosto de 2004.
No Gráfico 76 pode ser observada a evolução da participação das operações de crédito
do sistema financeiro no PIB. Constata-se que após a introdução do Plano Real, a tendência
foi de queda, o que mais uma vez indica a vigência, neste período, de um RMF à alta
restrição monetária e, conseqüentemente, incompatível com uma retomada auto-sustentada
do processo de acumulação de capital e do crescimento econômico. Este fato não deve causar
nenhuma surpresa, pois a política econômica esteve deliberada e preponderantemente voltada
para a gestão da dívida pública e o Estado brasileiro permaneceu prisioneiro dos
compromissos que assumiu com o capital financeiro nacional e internacional, por pressão
tanto das elites econômicas internas quanto das externas que apoiaram o duplo mandato de
FHC267. Estas frações do capital foram as mais fortalecidas e beneficiadas com o processo de
globalização neoliberal que implicou na derrubada dos entraves institucionais para a
aprofundar a liberalização financeira. Por outro lado, como estão centradas numa lógica de
maximização de curto prazo, permanecem em conseqüência muito pouco conectadas às
necessidades dos setores diretamente produtivos. Num tal contexto, o papel do Estado como
promotor do processo de acumulação de capital deveria ser percebido como um corolário, à
medida que a conjunção da lógica de liberalização financeira com o abandono das políticas de
desenvolvimento tem como resultado necessário a estagnação ou o crescimento lento e

267
Refere-se a Fernando Henrique Cardoso, Presidente do Brasil no período 1994-2002.
388

instável. O não reconhecimento deste fato significa o não comprometimento do Estado com o
desenvolvimento sócio-econômico nacional ou a sua captura pela lógica das finanças em
detrimento do conjunto da economia e sociedade.268

A Tabela 27 mostra a distribuição das operações de crédito por setores econômicos.


Nos anos 90, a indústria foi a maior demandante de recursos, mas as pessoas físicas
aumentaram expressivamente sua participação a partir de 1997. Com relação ao setor público,
a participação no total das operações de crédito foi decrescente e o setor privado detém cerca
de 90% do total (Gráfico 77).

GRÁFICO 76 PARTICIPAÇÃO DAS OPERAÇÕES DE CRÉDITO NO PIB (1988-2003)

Total das operações de crédito / PIB


55%

50%

45%

40%

35%

30%

25%

20%
1988 1991 1994 1997 2000 2003

FONTE: Para os dados sobre o total de empréstimos do sistema financeiro, o Banco Central do Brasil; para o
PIB, o IBGE. Ambas as séries foram obtidas no IPEADATA.
NOTA: A série dos empréstimos foi deflacionada pelo IGP-DI da FGV e a do PIB pelo deflator implícito do
PIB.

268
Os Gráficos 75 e 76 não fornecem a mesma informação, pois o crédito envolve tanto as operações de
empréstimos, quanto as de financiamento. Estas últimas estão vinculadas à aquisições específicas de
determinados bens e serviços.
389

TABELA 27 DISTRIBUIÇÃO DAS OPERAÇÕES DE CRÉDITO DO SETOR FINANCEIRO (1988-


2004)

ANO INDÚSTRIA HABITAÇÃO COMÉRCIO OUTROS SERVIÇOS PESSOAS FÍSICAS RURAL TOTAL

1988 28,5% 35,5% 7,9% 11,2% 4,5% 12,3% 100%


1989 23,1% 46,7% 6,2% 10,2% 3,8% 9,9% 100%
1990 26,9% 40,8% 7,4% 10,8% 3,1% 11,0% 100%
1991 28,6% 34,3% 8,8% 11,9% 3,6% 12,8% 100%
1992 29,4% 32,4% 8,8% 12,5% 3,7% 13,1% 100%
1993 29,1% 29,0% 10,8% 14,7% 4,9% 11,5% 100%
1994 28,9% 25,4% 12,5% 14,4% 7,9% 10,8% 100%
1995 27,6% 23,9% 14,9% 14,1% 8,6% 11,0% 100%
1996 28,1% 23,5% 15,3% 14,3% 8,7% 10,1% 100%
1997 28,3% 22,3% 12,9% 13,7% 13,5% 9,2% 100%
1998 29,1% 21,4% 11,3% 14,1% 14,4% 9,7% 100%
1999 31,6% 20,7% 10,3% 14,1% 14,0% 9,3% 100%
2000 28,7% 20,2% 10,0% 14,4% 17,6% 9,2% 100%
2001 29,9% 11,2% 10,9% 17,1% 22,7% 8,2% 100%
2002 31,4% 7,0% 11,1% 18,4% 23,8% 8,4% 100%
2003 30,6% 6,6% 10,9% 18,0% 23,4% 10,5% 100%
2004 28,5% 6,1% 11,2% 17,9% 25,1% 11,3% 100%

FONTE: Séries mensais originárias do BACEN e obtidas no IPEADATA.


NOTA: Os valores correspondem às participações percentuais dos saldos médios anuais no total das operações
de crédito do sistema financeiro. Os valores para 1988 referem-se à média dos meses de junho a dezembro Para
2004, referem-se à média dos meses de janeiro a agosto.
GRÁFICO 77 PARTICIPAÇÃO DOS SETORES PÚBLICO E PRIVADO NO TOTAL DE CRÉDITO
CONCEDIDO PELO SISTEMA FINANCEIRO (1988-2004)

Setor público
Setor privado

100%

80%

60%

40%

20%

0%
1988 1990 1992 1994 1996 1998 2000 2002 2004

FONTE: Séries mensais originárias do BACEN e obtidas no IPEADATA.


390

NOTA: Os valores correspondem às participações percentuais dos saldos médios anuais no total das operações
de crédito do sistema financeiro. Os valores para 1988 referem-se à média dos meses de junho a dezembro. Para
2004, referem-se à média dos meses de janeiro a agosto.
O Gráfico 78 mostra a evolução das taxas de crescimento dos empréstimos do sistema
financeiro ao setor privado (EMPSF) e do PIB, para o período 1971-2003.

GRÁFICO 78 EMPRÉSTIMOS DO SISTEMA FINANCEIRO AO SETOR PRIVADO E


CRESCIMENTO ECONÔMICO (1970-2003)

Empréstimos do sistema financeiro ao setor privado (L)


PIB(R)
40% 16%
14%
30%
12%
20% 10%
8%
10% 6%

0% 4%
2%
-10% 0%
-2%
-20%
-4%
-30% -6%
1971 1975 1979 1983 1987 1991 1995 1999 2003
1973 1977 1981 1985 1989 1993 1997 2001

FONTE: Séries mensais originárias do BACEN e obtidas no IPEADATA.


Para se investigar a relação entre essas variáveis macroeconômicas foi estimada a
equação PIB = 1 + 2.EMPSF. Em seguida foi aplicado o teste de causalidade de Granger.

QUADRO 103 ESTIMAÇÃO DA RELAÇÃO ENTRE EMPSF E PIB (1970-2003)


Dependent Variable: D(PIB)
Method: Least Squares
Sample(adjusted): 1971 2003
Included observations: 33 after adjusting endpoints
Variable Coefficient Std. Error t-Statistic Prob.
C 0.033590 0.005967 5.629277 0.0000
D(EMPSF) 0.187919 0.040853 4.599837 0.0001
R-squared 0.405658 Mean dependent var 0.038650
Adjusted R-squared 0.386485 S.D. dependent var 0.043012
S.E. of regression 0.033690 Akaike info criterion -3.884533
Sum squared resid 0.035186 Schwarz criterion -3.793836
Log likelihood 66.09480 F-statistic 21.15850
Durbin-Watson stat 1.421903 Prob(F-statistic) 0.000067
391

QUADRO 104 TESTE DE CAUSALIDADE DE GRANGER PARA EMPSF E PIB (1970-2003)


Pairwise Granger Causality Tests
Sample: 1970 2003
Lags: 1
Null Hypothesis: Obs F-Statistic Probability
EMPSF does not Granger Cause PIB 33 0.26960 0.60741
PIB does not Granger Cause EMPSF 6.82992 0.01388
O teste de causalidade de Granger mostra que variações do PIB antecederam as
variações dos empréstimos do sistema financeiro ao setor privado. Este fato está coerente com
o perfil do sistema financeiro privado brasileiro, voltado preponderantemente para o crédito
comercial de curto prazo e não para os investimentos produtivos. Trata-se de uma modalidade
de crédito que é dependente da expansão do PIB, respondendo às necessidades da circulação
de bens e serviços.

4.4.6 O regime monetário-financeiro dual

Uma questão a ser considerada, refere-se às relações entre o desenvolvimento


financeiro e o processo inflacionário brasileiro. A análise da evolução da inflação ao longo do
século XX, sugere algumas hipóteses a serem testadas: enquanto as instituições bancárias e
financeiras permaneceram pouco desenvolvidas e fracamente articuladas para permitirem o
surgimento de um efetivo sistema financeiro, as taxas de inflação foram relativamente baixas.
Quando as estruturas bancárias e financeiras ganham impulso através da institucionalidade
necessária a sua consolidação, o fenômeno inflacionário torna-se um problema crônico. Ao
mesmo tempo a alta inflação vai permitir uma expansão financeira sem precedentes na
história econômica brasileira.

Este processo é particularmente notável ao longo dos anos 70, uma década marcada
pelos efeitos das reformas institucionais do PAEG269 - que, entre outras implicações, criou as
bases estruturais para o desenvolvimento do setor bancário e financeiro mas atinge seu
paroxismo nos anos 80 e primeira metade dos 90, quando se conjuga com a crise da dívida
externa e com a crise fiscal do Estado.

O Gráfico 79 mostra a evolução conjunta da taxa de inflação e da participação do setor


bancário-financeiro no PIB, mensurada pelo método SIFIM (serviços de intermediação
financeira indiretamente medidos) utilizado pelo IBGE, conforme recomendação do System of
National Accounts (SNA). Esta metodologia consiste em se considerar o diferencial entre

269
Programa de Ação Econômica do Governo, elaborado pelo regime autoritário-militar para o período 1964-
1966 e que envolveu várias mudanças institucionais cujos impactos sobre a economia e sociedade brasileiras
foram indubitavelmente determinantes.
392

juros recebidos e pagos pelas instituições financeiras aos demais setores da economia, como
uma medida da contribuição do sistema financeiro ao valor adicionado total da economia.270

GRÁFICO 79 EXPANSÃO FINANCEIRA E INFLAÇÃO (1947 2003)

VA DO SETOR BANCÁRIO-FINANCEIRO / PIB (L)


TAXA DE INFLAÇÃO (R)
40%
35% 2500%
30%
25%
750%
20% 500%
15% 250%

10% 75%
50%
25%

5% 8%
5%
3%
1947
1949
1951
1953
1955
1957
1959
1961
1963
1965
1967
1969
1971
1973
1975
1977
1979
1981
1983
1985
1987
1989
1991
1993
1995
1997
1999
2001
2003
FONTE: Elaborado a partir das séries do IBGE relativas ao valor adicionado (VA) das instituições financeiras,
mensurado pelo método SIFIM (serviços de intermediação financeira indiretamente medidos) e do Índice Geral
de Preços IGP-DI da FGV.
NOTA: Os eixos verticais estão em escala logarítmica.
Pode-se constatar que a partir de 1970, mais inflação significa maior participação do
sistema financeiro no valor adicionado total da economia brasileira. Conseqüentemente, as
consideradas décadas perdidas certamente não o foram para este setor. Este fato é inclusive
reconhecido pelas autoridades monetárias brasileiras. No mesmo relatório divulgado no site
do Banco Central do Brasil, e mencionado acima, há uma passagem muito clara a esse
respeito:

O quadro inflacionário presente na economia brasileira desde a década de


60, foi extremamente favorável ao sistema bancário, que se adaptou bem a ele
em seu processo de desenvolvimento. Elevadas taxas de inflação contribuíram
para alavancar a participação do setor financeiro na renda nacional. As
instituições financeiras brasileiras obtiveram êxito na implementação de
inovações e no aproveitamento de oportunidades regulatórias, o que lhes
permitiu não apenas sobreviver em um contexto que aparentemente seria hostil
à atividade econômica e ao sistema financeiro, mas também acumular capital,

270
Adiciona-se também a parte do excedente operacional dos bancos que corresponde à cobrança por serviços
que não são diretamente ligados às atividades-fim, como as receitas provenientes de tarifas bancárias. Embora
no período pós-Real as receitas de tarifas tenham crescido muito, elas representam apenas 8 a 10% do valor
adicionado total conferido aos bancos pela metodologia do SIFIM .
393

desenvolver-se tecnologicamente e crescer, absorvendo parte considerável do


imposto inflacionário gerado. 271
Para se examinar a relação entre a participação do valor adicionado do sistema
bancário-financeiro no PIB e a evolução da inflação, a seguinte equação foi estimada:

LVAFPIB = 1 + 2. LINFLA (22),

onde LVAFPIB é o logaritmo da participação percentual do valor adicionado do SFN no PIB e


LINFLA é o logaritmo da taxa de inflação.

A relação não se apresenta estruturalmente estável no período completo (1947-2003).


Novas estimações foram realizadas apenas para os susbperíodos onde a estabilidade fosse
confirmada pelos testes do CUSUM, CUSUMSQ, one-estep forecast test, n-step forecast test
e recursive coefficients.

QUADRO 105 ESTIMAÇÃO DA RELAÇÃO ENTRE VAFPIB E INFLA (1947-1969)


Dependent Variable: D(LVAFPIB)
Method: Least Squares
Sample(adjusted): 1948 1969
Included observations: 22 after adjusting endpoints
Variable Coefficient Std. Error t-Statistic Prob.
C 0.021171 0.013128 1.612604 0.1225
D(LINFLA) -0.067920 0.021991 -3.088534 0.0058
R-squared 0.322930 Mean dependent var 0.015144
Adjusted R-squared 0.289077 S.D. dependent var 0.072220
S.E. of regression 0.060893 Akaike info criterion -2.672894
Sum squared resid 0.074159 Schwarz criterion -2.573708
Log likelihood 31.40183 F-statistic 9.539044
Durbin-Watson stat 1.709545 Prob(F-statistic) 0.005794

271
BELUZZO e ALMEIDA (2002, p. 154) observam que a dívida pública passou então a ser a base da renda
bancária: na intermediação do dinheiro financeiro (que substitui a função bancária da intermediação
financeira) e na absorção do imposto inflacionário . A concorrência, a modernização e a evolução da rede e
dos serviços bancários durante os anos 80 foram todos processos condicionados por uma ou outra dessas
formas de obtenção de renda.
394

FIGURA 35 TESTES DE ESTABILIDADE PARA VAFPIB E INFLA (1947-1969)


15 1.6 0.08

10
1.2
0.04
5
0.8
0 0.00
0.4
-5
-0.04
0.0
-10

-0.08
-15 -0.4
54 56 58 60 62 64 66 68
50 52 54 56 58 60 62 64 66 68 50 52 54 56 58 60 62 64 66 68
Recursive C(1) Estimates ± 2 S.E.
CUSUM 5% Signific anc e CUSUM of Squares 5% Significance

0.2

0.1

0.0

-0.1

-0.2
54 56 58 60 62 64 66 68

Recursive C(2) Estimates ± 2 S.E.

O primeiro período identificado compreende o intervalo [1947-1969], para o qual o


modelo em log não se revelou estatisticamente significativo e então a equação foi estimada
em taxas de variação para se captar a relação de curto prazo. Os resultados encontram-se no
Quadro 105. Neste subperíodo, o coeficiente relativo à taxa de inflação é significativo e
negativo, mas com um valor muito baixo. Embora essa influência seja pouco expressiva em
termos macroeconômicos, ela revela que à essa época o sistema bancário-financeiro ainda não
reúne as condições estruturais que lhe permitam apropriar-se dos ganhos inflacionários. O
próprio sistema financeiro ainda é pouco desenvolvido e as taxas de inflação muito baixas
para suscitar a proliferação de mecanismos de indexação generalizada de preços e salários. O
dispositivo institucional de correção monetária foi estabelecido em 1964, inicialmente para
correção dos títulos públicos, as chamadas obrigações reajustáveis do tesouro nacional
(ORTN). Apenas a partir dos desdobramentos da crise do milagre , expressa também pela
elevação das taxas de inflação, é que a indexação se generalizaria. Como observa
L.C.MENDONÇA DE BARROS (1992, p.5):

A reforma financeira realizada em 1964-5, pelos ministros Roberto Campos e


Otávio Gouveia de Bulhões (Governo Castelo Branco) introduziu o contrato
financeiro indexado no mercado financeiro formal. Foi criada uma moeda de
referência legal, a ORTN, que tinha seu valor corrigido mensalmente em
função de um índice de preços internos, o IGP, calculado pela Fundação
Getúlio Vargas.
395

Todavia, ainda segundo este autor, a utilização da indexação ainda estava restrita aos
contratos de prazos mais longos, uma limitação que foi desaparecendo ao longo dos anos.
Portanto, no período 1966-1974, a cláusula de indexação às ORTN foi muito pouco usada nos
contratos financeiros, pois as taxas de inflação ainda permaneciam baixas.

QUADRO 106 - ESTIMAÇÃO DA RELAÇÃO ENTRE VAFPIB E INFLA (1970-1993)


Dependent Variable: LVAFPIB
Method: Least Squares
Sample: 1970 1993
Included observations: 24
Variable Coefficient Std. Error t-Statistic Prob.
C -2.282640 0.027025 -84.46326 0.0000
LINFLA 0.295670 0.016842 17.55600 0.0000
R-squared 0.933376 Mean dependent var -2.202287
Adjusted R-squared 0.930348 S.D. dependent var 0.494412
S.E. of regression 0.130484 Akaike info criterion -1.155483
Sum squared resid 0.374571 Schwarz criterion -1.057312
Log likelihood 15.86580 F-statistic 308.2130
Durbin-Watson stat 1.883566 Prob(F-statistic) 0.000000

FIGURA 36 - TESTES DE ESTABILIDADE PARA VAFPIB E INFLA (1970-1993)


15 1.6 -2.0

10
1.2 -2.2

5
0.8
-2.4
0
0.4
-2.6
-5

0.0
-10 -2.8
76 78 80 82 84 86 88 90 92

-15 -0.4 Recursive C(1) Estimates ± 2 S.E.


72 74 76 78 80 82 84 86 88 90 92 72 74 76 78 80 82 84 86 88 90 92

CUSUM 5% Signific anc e CUSUM of Squares 5% Significance 0.5

0.4

0.3

0.2

0.1

0.0
76 78 80 82 84 86 88 90 92

Recursive C(2) Estimates ± 2 S.E.

No segundo período, 1970-1993, o valor do coeficiente correspondente à elasticidade-


inflação do valor adicionado pelas instituições financeiras é positivo com um valor de 0,30.
Isto implica que um aumento de 10% na taxa de inflação tende a provocar uma expansão de
3% no valor adicionado pelo setor bancário-financeiro (Quadro 106). Uma análise de co-
integração deve ser efetuada para confirmar que essa relação de longo prazo não é espúria. Os
testes ADF mostram que as séries em questão apresentam raízes unitárias e, além disso, os
resíduos estimados são estacionários (Tabela 28 e Gráfico 80).
396

TABELA 28 TESTES DE RAÍZES UNITÁRIAS (1970-1993)


LINFLA
ADF Test Statistic -0.193985 1% Critical Value* -3.7343
5% Critical Value -2.9907
10% Critical Value -2.6348
*MacKinnon critical values for rejection of hypothesis of a unit root.

LVAFPIB
ADF Test Statistic -0.473292 1% Critical alue* -3.7343
5% Critical Value -2.9907
10% Critical Value -2.6348
*MacKinnon critical values for rejection of hypothesis of a unit root.

RESÍDUOS
ADF Test Statistic -3.833950 1% Critical Value* -3.7667
5% Critical Value -3.0038
10% Critical Value -2.6417
*MacKinnon critical values for rejection of hypothesis of a unit root.

Os valores críticos de Engle-Yoo (1987) são -4,12; -3,29; -2,90; respectivamente a


1%, 5% e 10%. Portanto, a 5%, os resíduos se revelam estacionários (-3,83 > 3,29). O teste de
co-integração de Johansen também indica a existência de uma única relação de co-integração
e um MCE foi estimado. O coeficiente do termo de correção de erros revelou-se
estatisticamente significativo e negativo como esperado.

QUADRO 107 TESTES DE CO-INTEGRAÇÃO DE JOHANSEN PARA LVAFPIB E LINFLA (1970-


1993)
Sample: 1970 1993
Included observations: 24
Test assumption: Linear deterministic trend in the data
Series: LVAFPIB LINFLA
Lags interval: 1 to 1
Likelihood 5 Percent 1 Percent Hypothesized
Eigenvalue Ratio Critical Value Critical Value No. of CE(s)
0.526532 17.95286 15.41 20.04 None *
0.000364 0.008748 3.76 6.65 At most 1
*(**) denotes rejection of the hypothesis at 5%(1%) significance level
L.R. test indicates 1 cointegrating equation(s) at 5% significance level
Normalized Cointegrating Coefficients: 1 Cointegrating Equation(s)
LVAFPIB LINFLA C
1.000000 -0.298436 2.303487
(0.01434)

Log likelihood -4.782875


397

QUADRO 108 MODELO DE CORREÇÃO DE ERROS PARA A RELAÇÃO 22 (1970-1993)


Included observations: 24
t-statistics in parentheses
Cointegrating Eq: CointEq1
LVAFPIB(-1) 1.000000

LINFLA(-1) -0.298308
(-20.7163)

C 2.288686
(103.285)
Error Correction: D(LVAFPIB)
CointEq1 -1.030525
(-2.13028)

D(LVAFPIB(-1)) 0.378540
(1.10794)

D(LINFLA(-1)) -0.180353
(-1.45836)
R-squared 0.145790
Adj. R-squared 0.064437

GRÁFICO 80 SÉRIES REAL E ESTIMADA DA PARTICIPAÇÃO DO VA DO SETOR BANCÁRIO-


FINANCEIRO NO PIB E RESÍDUOS DA RELAÇÃO (1970-1993)

-1.0

-1.5

-2.0

-2.5
0.2
-3.0
0.1
0.0
-0.1
-0.2
-0.3
70 72 74 76 78 80 82 84 86 88 90 92

Residual Actual Fitted

QUADRO 109 TESTE DE CAUSALIDADE DE GRANGER PARA INFLA E VAFPIB (1970-1993)


Pairwise Granger Causality Tests
Date: 11/07/04 Time: 12:08
Sample: 1970 1993
Lags: 4
Null Hypothesis: Obs F-Statistic Probability
LINFLA does not Granger Cause LVAFPIB 20 3.82913 0.03465
LVAFPIB does not Granger Cause LINFLA 0.54831 0.70427
398

Os resultados do teste de causalidade de Granger mostram que há causalidade


unidirecional da inflação para a participação do valor adicionado pelo setor financeiro no PIB.
Em outros termos, as variações do índice geral de preços precedem as variações da
participação do VA financeiro no PIB, o que na expressão usual em econometria, significa
que o aumento da inflação Granger-causa a expansão financeira.

No próximo capítulo, as interdependências do setor financeiro com os setores


diretamente produtivos ocuparão um maior espaço na análise, em razão de seus impactos
sobre a dinâmica da acumulação de capital e do crescimento econômico. A própria
metodologia de mensuração do valor adicionado financeiro através dos serviços de
intermediação financeira indiretamente medidos (SIFIM) deverá ser reconsiderada no
âmbito dos indicadores de financeirização de uma economia. Isto porque, no caso específico
da economia brasileira, a hipótese de que é possível haver duas modalidades de
financeirização, uma baseada no avanço da inflação (1980-1993) e outra em níveis elevados
de juros (período de vigência do Real), precisa ser testada.

QUADRO 110 - ESTIMAÇÃO DA RELAÇÃO ENTRE VAFPIB E INFLA (1994-2003)


Dependent Variable: LVAFPIB
Method: Least Squares
Sample: 1994 2003
Included observations: 10
Variable Coefficient Std. Error t-Statistic Prob.
C -2.322077 0.073449 -31.61470 0.0000
LINFLA 0.153372 0.030050 5.103947 0.0009
R-squared 0.765053 Mean dependent var -2.608073
Adjusted R-squared 0.735685 S.D. dependent var 0.292086
S.E. of regression 0.150166 Akaike info criterion -0.777295
Sum squared resid 0.180398 Schwarz criterion -0.716778
Log likelihood 5.886477 F-statistic 26.05028
Durbin-Watson stat 1.648396 Prob(F-statistic) 0.000925

Em razão do reduzido número de observações, descartou-se a utilização de uma


abordagem em termos de co-integração. Isto significa que os resultados da equação estimada,
constantes do Quadro 111, devem ser considerados com cautela no que concerne a uma nova
relação de longo prazo entre VA financeiro e inflação, vigente no período pós-Plano Real. A
equação foi, no entanto, estimada também em taxas de variação para que as relações de curto
prazo pudessem ser evidenciadas. Como na primeira estimação, a constante não se revelou
estatisticamente significativa, optou-se por retirá-la para que não prejudicasse a significância
do coeficiente relativo à inflação.
399

QUADRO 111- ESTIMAÇÃO DA RELAÇÃO ENTRE VAFPIB E INFLA EM TAXAS DE VARIAÇÃO


(1994-2003)
Dependent Variable: D(LVAFPIB)
Method: Least Squares
Sample: 1994 2003
Included observations: 10
Variable Coefficient Std. Error t-Statistic Prob.
D(LINFLA) 0.126055 0.047155 2.673199 0.0255
R-squared 0.300722 Mean dependent var -0.149605
Adjusted R-squared 0.300722 S.D. dependent var 0.312592
S.E. of regression 0.261399 Akaike info criterion 0.249099
Sum squared resid 0.614963 Schwarz criterion 0.279357
Log likelihood -0.245493 Durbin-Watson stat 1.236456

Esses resultados para o período de vigência do Real mostram que ainda existe
apropriação de ganhos inflacionários, apesar das taxas de inflação permanecerem bastante
inferiores às observadas antes do plano de estabilização. O coeficiente cai de 0,30 para 0,15
(equação em log) e 0,13 (equação em taxa de variação). Por outro lado, como a magnitude das
taxas de inflação não são tão afastadas das taxas vigentes, por exemplo, no período 1947-1957
- em que o valor adicionado pelo SFN mantinha-se em uma média de 2% do PIB - pode-se
argumentar que a vinculação macroeconômica entre ganhos inflacionários e expansão
financeira pressupõe um certo nível de desenvolvimento das estruturas bancárias e
financeiras. Necessita da existência de dispositivos institucionais de indexação ou de correção
monetária, mais do que de taxas muito altas de inflação. Isto remete à questão da manutenção,
por parte do próprio Estado, de um conjunto de indexadores financeiros (como a TR, UFIR,
UFERJ, etc.), apesar de ter proibido a indexação formal de preços e salários quando da
implementação do Plano Real.272
Conseqüentemente, as relações entre a dinâmica da inflação (e também das taxas de
juros) e as formas possíveis em que se converte em uma base para a acumulação bancária-
financeira dependem das particularidades do regime monetário-financeiro, ou seja, de sua
configuração em uma determinada fase da evolução da economia.

Dualidade monetária e inflação

A funcionalidade da moeda indexada, resultante da generalização do dispositivo


institucional da correção monetária, se adequava à lógica do regime de crescimento dos anos
70. Uma característica notória do caso brasileiro vis-à-vis a experiência internacional, é que o

272
BRESSER-PEREIRA (2004), um dos pais da teoria da inflação inercial observa que no Plano Real, porém, o
governo cometeu o erro de manter algumas indexações, principalmente financeiras. A partir de 1995, aprofundou
o erro ao aceitar a indexação dos preços dos serviços públicos que privatizava . Para BRESSER-PEREIRA, o
Brasil estaria num segundo estágio de um processo de reinercialização da inflação o da indexação formal dos
salários.
400

regime monetário que evoluiu desse arranjo institucional promoverá um desenvolvimento


acentuado do sistema bancário-financeiro em um grau elevado de sofisticação. Vários
trabalhos ressaltaram a enorme capacidade do sistema financeiro brasileiro para economizar
moeda enquanto meio de pagamento [FARIA (1994; 1999); BARROS (1992); J.SACHS & A.
ZINI (1995)]. Isto levou a base monetária a cair abaixo de 1% do PIB, graças à emissão de
uma moeda financeira ou remunerada, lastreada em títulos da dívida pública de alta liquidez e
rentabilidade. Essa grande agilidade dos intermediários financeiros em proporcionar
substitutos para a moeda comum permitiu ao sistema financeiro privado brasileiro
desempenhar, no lugar do próprio Estado, o papel de guardião da função reserva de valor.
Essa característica evitou a emergência de uma hiperinflação clássica que teria efeitos
destrutivos sobre o sistema bancário-financeiro.

Mas é na economia brasileira dos anos 80 que se pode encontrar um exemplo notório
de como as configurações do RMF determinam o grau de liquidez dos ativos que são eleitos
para representar a moeda e suas formas. Nesta época o regime monetário-financeiro facultava
a existência de duas espécies de moeda . Como esperado em situações normais de
funcionamento de uma economia, havia uma moeda emitida pelo Estado, correspondente ao
meio circulante (M1), mas que permanecia invariavelmente sujeita à corrosão inflacionária. A
segunda modalidade (integrando os conceitos de M2, M3 e M4) tratava-se de uma moeda
indexada ou financeira, com alta liquidez proporcionada pela existência de ativos financeiros
lastreados em títulos de curto prazo da dívida pública, com rentabilidade real assegurada pela
correção monetária. Como através da moeda indexada emitida pelo sistema bancário-
financeiro privado, os estratos sociais de renda mais alta encontravam proteção contra a alta
inflação, a dualidade monetária evitava uma fuga em massa em direção a ativos reais e
divisas, tal como ocorre nos processos de hiperinflação clássica. 273

É neste contexto macroeconômico e através de um RMF dual que o processo


inflacionário converteu-se num fator de expansão do sistema bancário e financeiro. Por outro
lado, um tal regime monetário opera ele mesmo a dissociação das funções da moeda, típica
das hiperinflações, mas confere ao setor privado financeiro o papel de guardião da função
reserva de valor. Tudo se passa como se a hiperinflação virtualmente ocorre-se sobre a
moeda púbica corrente , mas não sobre a moeda financeira privada . Em conseqüência

273
As análises desenvolvidas por L.C. Mendonça de BARROS (1992), em A Moeda Indexada: uma experiência
brasileira e as de M.C.TAVARES (1972 e 1978) são particularmente esclarecedoras das causas e conseqüências
da dualidade monetária como uma especificidade do caso brasileiro.
401

preserva-se a confiança no sistema bancário e financeiro, apesar da forte desvalorização da


moeda emitida pelo Estado.

Essa caracterização mais precisa do processo inflacionário brasileiro é de fundamental


importância teórica e empírica, pois tem sido comum a classificação de uma conjuntura como
hiperinflacionária simplesmente pela observação de que as taxa de inflação estão acima de um
certo patamar (normalmente arbitrário de 50% ao mês). O problema com esse tipo de
abordagem é que o analista se abstrai do processo e da institucionalidade que está na base do
regime monetário-financeiro. Ele se abstrai ou secundariza todo um conjunto de micro e de
macro-regularidades que estão na base do processo inflacionário e que são reproduzidas pelo
RMF em vigor274. Por outro lado, sem essa apreensão institucionalista mais detida do caso
brasileiro, não se pode conferir à noção de inércia inflacionária, o estatuto teórico que
efetivamente lhe cabe por expressar momentos determinantes da lógica peculiar da inflação
brasileira, originalmente apreendida nos trabalhos de autores como BRESSER-PEREIRA e
NAKANO (1983 e 1984), e ARIDA e LARA-RESENDE(1984).

A noção de inflação inercial é um corolário desse regime monetário-financeiro dual


baseado nos mecanismos de indexação generalizada de preços e salários, onde a inflação pode
permanecer estável por vários períodos de tempo, independentemente da existência de
excesso de demanda275. A idéia básica é que neste contexto, a inflação não dependeria apenas
das expectativas quanto à evolução dos preços, pois está fortemente correlacionada com os
dispositivos institucionais que codificam e reproduzem os comportamentos remarcadores de
preços, motivados pelo conflito distributivo. Sob um tal regime e considerando uma estrutura
de mercado fortemente oligopolizada, as políticas monetaristas são completamente ineficazes
e simplesmente provocam recessões sem debelar o processo inflacionário.276

274
Essa abstração tem conduzido alguns autores a traduzir um processo inercial de inflação em termos da
abordagem monetarista das expectativas adaptativas. Uma abordagem tradicionalmente alheia aos conteúdos
institucionais da moeda e à sua não-neutralidade e endogeneidade.
275
Isto significa que um processo de inflação inercial é essencialmente diferente de um processo
hiperinflacionário, onde as taxas de inflação entram em uma trajetória explosiva. A hiperinflação é um processo
resultante da desestruturação de um regime monetário-financeiro, conduzindo à perda total da confiança no
sistema bancário-financeiro por parte dos agentes econômicos. Este argumento é compartilhado por LOYOLA
(1995), que em texto divulgado no site do Banco Central do Brasil, sustenta que a economia brasileira não
passou por um processo hiperinflacionário justamente pelo fato do sistema bancário-financeiro ter conseguido
preservar a função reserva de valor, adiando ou reduzindo significativamente a fuga para ativos reais e divisas.
276
Como observa LACERDA et alii [2000], o problema fundamental a partir de 1984, era como controlar a
inflação. O forte ajuste fiscal de 1983 havia praticamente zerado o déficit público, mas não conseguira estabilizar
os preços. Os economistas monetaristas que haviam aplicado a terapia convencional ajuste fiscal e política
monetária restritiva - estavam perplexos.
402

A seguir, o Quadro 112 resume as características básicas dos programas de


estabilização implementados na economia brasileira desde o início dos anos 80. Após a crise
cambial de janeiro de 1999, o Brasil passou a adotar o sistema de metas de inflação, que
necessariamente implica na manutenção de um RMF à alta restrição monetária, a fim de que a
meta seja atingida. Considerando-se que a economia brasileira ainda é uma economia em
desenvolvimento e altamente endividada, esse sistema implica na manutenção de elevadas
taxas de juros, inclusive para compensar a indexação das tarifas dos setores oligopolizados.
Conseqüentemente pode-se argumentar que dadas as peculiaridades da economia brasileira, a
permanência de um sistema de metas de inflação torna-se um obstáculo a uma retomada auto-
sustentada da acumulação de capital e do crescimento econômico.
QUADRO 112 SINOPSE DOS PLANOS DE ESTABILIZAÇÃO

Planos PLANO REAL


POLÍTICA
DO
PROGRAMA PLANO PLANO PLANO PLANO FASE I FASE II
FEIJÃO
FMI CRUZADO BRESSER VERÃO COLLOR
COM [1993-1998] [1999 - ]
[1981 1983] (1986) (1987) (1989) (1990)
Política ARROZ
(1988) Sistema de
Econômica Metas de
Inflação
(+) Tributação (-) Tributação (+) Tributação Tributação (-) Tributação (+) Tributação (+) Tributação (+) Tributação
(não corrige (alteração IR (não corrige constante (alteração IR de (IOF, IR) CPMF CPMF /
Fiscal tabela do IR) jan. /86) tabela IR) janeiro) FINSOCIAL

(-) Gastos (+) Gastos (+) Gastos (-) Gastos (-) Gastos (-) Gastos (+) Gastos (-) Gastos
(principal/pessoal)

(+) Taxa de (-) Taxa de (+) Taxa de Taxa de juros (+) Taxa de (+) Taxa de (+)Taxa de (+) Taxa de
juros juros juros ligeiramente juros juros juros juros
negativa
Monetária (-) Oferta de (+) Oferta de (-) Oferta de (-) Oferta de (-) Oferta de (+) Oferta de (-) Oferta de
créditos moeda moeda moeda moeda moeda moeda

(-) Salário real / (+) Salário (-) Salário real Salário real (-) Salário real (-) Salário real (+) Salário (-) Salário real
DL Nº 2044, real (médio cresce um real
Rendas 2045 real + 8%) pouco
(-) Inflação /
desindexação
(URV)

Máxi Congelamento Duas Variação Câmbio Reduz Apreciação Máxi


do câmbio midides- cambial igual congelado câmbio cambial
Cambial Variação valorizações à inflação Flutuação
cambial igual Não altera Variação
à inflação mesmo com a igual à
inflação inflação

FONTE: Adaptado de A. LANZANA (2001 p. 100).


NOTA: O símbolo (+) significa variações positivas e (-) as variações negativas.
Pode-se indagar sobre as relações entre a dualidade monetária e a WLN dual neste
período da evolução econômica brasileira. Como a grande parte dos assalariados de mais
baixa renda do eixo informal não tinha acesso às contas bancárias remuneradas277, eles não
podiam acessar os mecanismos de proteção inflacionária da moeda indexada emitida pelo
setor bancário privado. Portanto, se a dualidade do mercado de trabalho brasileiro não tem sua
origem no regime monetário dual, este último se adequava perfeitamente às características do
rapport salarial àquela época, amplificando e reproduzindo a concentração de renda, mas ao
mesmo tempo garantindo os níveis de consumo das camadas de mais alto poder aquisitivo.

GRÁFICO 81 SALÁRIO REAL, EMPRÉSTIMOS E CONSUMO (1979-2002)

Faturamento real em Bens de Consumo


Rendimento médio real dos assalariados
Empréstimos às pessoas físicas
180
160
140
( abril de 1979 = 100)
Índice dos valores

120
100
80
60
40
20
0
1979 04 1982 08 1985 12 1989 04 1992 08 1995 12 1999 04 2002 08
1980 12 1984 04 1987 08 1990 12 1994 04 1997 08 2000 12

FONTE: Dados originais obtidos no IPEADATA.


NOTA: Séries mensais do faturamento do comércio em bens de consumo e do rendimento médio referem-se à
região metropolitana do Estado de São Paulo e foram deflacionadas, respectivamente, pelo IPA-DI e pelo INPC;
série dos empréstimos às pessoas físicas foi deflacionada pelo IGP-DI e refere-se à economia nacional. Todas as
séries foram dessazonalizadas pelo método X11/2000 Census 2.
O Gráfico 81 mostra a evolução do rendimento médio real dos assalariados, dos
empréstimos às pessoas físicas e do faturamento do comércio em bens de consumo. Há uma
nítida correlação da renda salarial com os empréstimos até a implementação do Plano Real,
em 1994. Entre 1979 e 1987, as séries parecem ser, inclusive, co-integradas. Sobretudo, com
relação às séries da renda salarial e do faturamento de bens de consumo. Mas no período de
vigência do Real, os empréstimos entram em uma trajetória de forte expansão, se
desconectando tanto dos salários quanto do consumo. Este fato pode estar sinalizando uma

277
A existência de depósitos bancários remunerados diariamente através de sua vinculação com a moeda
indexada foi uma característica básica de legitimação do regime monetário-financeiro dual entre as classes
médias e assalariadas de mais alta renda que tinham acesso a esse instrumento financeiro.
405

mudança no modo de consumo, provocada tanto pelas transformações do RMF impostas pelo
Plano Real, quanto pela reconfiguração da forma institucional de inserção no regime
internacional.

Estudos recentes detectaram um aumento do endividamento das famílias, fato que já


se tornou uma característica do período pós-Real. Segundo relatório divulgado pelo Instituto
de Defesa do Consumidor (IDEC) com base em pesquisa de 2002:

As altas taxas de juros cobradas pelos bancos, pelas financeiras e pelas


empresas de crediário estão desequilibrando o orçamento dos consumidores.
Pesquisa da Associação Nacional dos Executivos de Finanças, Administração
e Contabilidade (Anefac) mostra que as despesas financeiras correspondem,
em média, a quase 30% (29,83%) dos gastos das famílias paulistanas,
compondo o item que mais pesa no orçamento.
A razão apontada pelos analistas é a maior facilidade de concessão de crédito a
famílias de baixa renda, pois o sistema financeiro vem reduzindo as exigências de garantias
nessas operações. Contudo, como as taxas de juros cobradas permanecem em patamares
excessivamente elevados, a inadimplência tende a aumentar. Os gastos financeiros das
famílias de mais baixa renda (que ganham entre R$ 260,00 e R$ 1000,00) correspondem em
média a 30% do total de rendimentos. Esse comprometimento da renda salarial tem como
contrapartida o aumento do valor adicionado apropriado pelas instituições financeiras. Mas a
questão macroeconomicamente relevante refere-se a sustentabilidade de um modo de
consumo baseado em endividamento crescente.

A questão das interdependências entre a wage-labor nexus e o regime monetário-


financeiro será recuperada em outros momentos da presente análise, quando for abordada a
problemática da acumulação de capital na economia brasileira atual. Como observa
MARQUES-PEREIRA (2004, p.15), mobilizando uma visão essencialmente regulacionista:

Dans les anées 80, l inflation résolvait ex post ce que les institutions ne
pouvait faire ex ante. A présent, elle peut être contrôlée par le taux d intérêt et
la dévaluation a vite généré de nouvelles sources de profit et fait baisser à
nouveau la part du travail dans le revenu national. Dans les anées 90, la
désinflation légitime la libéralisation ou, du moins, démobilise le mouvement
syndical, ce qui perpétue la concentration des revenus dans un contexte de
stabilité des prix et continue par là de freiner la demande domestique mais
accroître les gains financièrs à mesure que croît l émission de titres de la dette
publique couvrant le déficit commercial. »
O Quadro 113 fornece uma periodização do regime monetário-financeiro baseada nas
principais mudanças institucionais e organizacionais observadas desde o pós-Segunda Guerra
Mundial.
406

4.4.7 O regime monetário-financeiro pós-Plano Real

O aprofundamento da liberalização comercial e financeira nos anos 90 pressupunha


um ambiente macroeconômico de baixa inflação para permitir a livre circulação dos fluxos de
capitais sem perdas maiores para os proprietários de ativos financeiros. A fim de que pudesse
ser o receptáculo dos capitais globalizados e obter os recursos necessários à manutenção de
seus compromissos internacionais, a economia brasileira deveria dar provas do controle do
processo inflacionário. A implementação do Plano Real cumpriu essa função ao reduzir e
manter as taxas de inflação em patamares bem inferiores aos observados em períodos
anteriores da história econômica brasileira. E como observou MARQUES-PEREIRA, a
redução e controle da inflação legitimou a liberalização financeira e, portanto, a lógica de uma
inserção neoliberal no processo de mundialização do capital na década de 90.

GRÁFICO 82 TAXAS REAIS DE CÂMBIO (1950-2003)

eTNT = e. (IPA EUA) / (IPC Brasil)


eipc = e.(IPC EUA) / (IPC Brasil)
3,20
3,00
2,80
2,60
2,40
2,20
R$ / US$

2,00
1,80
1,60
1,40
1,20
1,00
0,80
0,60
0,40
1950 1958 1966 1974 1982 1990 1998
1954 1962 1970 1978 1986 1994 2002

FONTE: Séries mensais da taxa de câmbio nominal, do IPA e do IPC dos EUA e do IPC do Brasil foram obtidas
no IPEADATA.
NOTA: (e) é a taxa de câmbio nominal; (e TNT ) é a taxa real de câmbio tradeables/non tradeables e (eipc) é a taxa
real de câmbio utilizando como deflator o IPC de cada país. Os dados foram anualizados.
QUADRO 113 EVOLUÇÃO INSTITUCIONAL E ORGANIZACIONAL DO REGIME MONETÁRIO FINANCEIRO NO BRASIL (1945-2002)

REGIME
MONETÁRIO- 1945 - 1963 1964 1979 1980 1989 1990 - 1993 1994 - 1998 1999 - 2002
FINANCEIRO

Criação da SUMOC Criação do Banco Central e Generalização da Confisco da Plano Real institui Nova fase de fusões
(1945) das estruturas básicas do moeda indexada liquidez pelo Plano nova unidade e aquisições com
SFN ou financeira Collor monetária em julho participação de
Sem banco central de 1994 o Real instituições
institucionalmente Supressão da Lei da Usura e Atrofia do mercado Substituição do bancárias
definido criação do dispositivo de capitais overnight pelo Criação de estrangeiras
institucional da correção Fundo de programas de
Criação do BNDES monetária (1964) Forte expansão do Aplicação reestruturação Implementação do
Mudanças para financiamento sistema bancário, Financeira (FAF) bancária e novo sistema de
de longo prazo Reestruturação do regime mas grande retração financeira (PROER pagamento e de
institucionais e (1952) fisco-financeiro das operações de Criação do IPMF e e PROES) para medidas para
organizacionais crédito lançamento do superar crises de eficiência do SFN
Início do processo Avanço da concentração Plano de Ação
de concentração bancária estimulada pelo Criação dos bancos liquidez (2003)
Imediata (PAI), em
bancária em fins de Estado e criação de bancos múltiplos (1988) 1993 Regulação Institucionalização
1950 públicos estaduais prudencial e do sistema de metas
Criação da Unidade criação da Central de inflação (1999)
Real de Valor de Risco de Crédito
(URV) (1997)

Taxas múltiplas de Sistema de Maxidesvalorizações Câmbio flutuante Câmbio fixo Câmbio flutuante
Regime cambial câmbio minidesvalorizações ajustável e grande
cambiais apreciação do Real

Regime de câmbio Câmbio flutuante e livre Elevação das taxas Ideologia da Livre mobilidade se Ataques
Condicionantes fixo Breton Woods mobilidade do capital de juros globalização intensifica com as especulativos contra
externos sistema internacionais pressiona para TIC e câmbio o Real (1999 e
financeiro liberalização sobrevalorizado 2002)
internacional Fase de financeira e
liberalização do comercial Impactos das crises
mercado de capitais do México, Ásia e
Rússia

FONTE: Elaboração própria


O exame do Gráfico 82 permite constatar que a primeira fase do Plano Real (1994-
1998) manteve a tendência de valorização cambial iniciada em 1984, após o ajuste recessivo
de 1981-1983. Todavia, o ataque especulativo sobre o Real, em 1999, forçou o Banco Central
a deixar o câmbio flutuar e a sobrevalorização foi corrigida sob constrangimento das
autoridades monetárias que ainda viam na âncora cambial o sustentáculo da estabilidade de
preços. Como vários analistas perceberam, a insistência em prolongar o crowling-peg com
câmbio artificialmente baixo, seja por razões políticas ou por temor da inflação, levou a um
aprofundamento do déficit comercial com efeitos negativos sobre o emprego e a renda. No
entanto, uma abordagem regulacionista certamente teria contribuído para mostrar que como o
processo de reconfiguração das formas institucionais já havia avançado o suficiente para
impedir o retorno da inflação, o governo poderia ter desvalorizado o câmbio em 1996 ano
da desconexão dos salários aos ganhos de produtividade na indústria. O resultado direto teria
sido a recuperação do setor exportador e a melhora das contas externas. Em outros termos, a
âncora cambial deixara de ser a base da estabilidade de preços quando a liberalização
comercial e financeira aprofundou o grau de flexibilidade quantitativa e salarial, reforçando o
caráter subordinado da WLN na arquitetura institucional que define o modo de regulação
brasileiro. Como àquela época (e ainda hoje), a visão predominante da equipe econômica
pautava-se em pressupostos convencionais de modelos derivados da teoria padrão, cuja
abordagem das instituições é normalmente prisioneira da ênfase microeconômica, os policy
makers de Brasília não estavam munidos com um instrumental analítico apto para a decisão
correta. A opção teórica governamental foi então uma imposição política e ideológica,
subproduto de uma inserção neoliberal cujos custos sociais para uma economia do porte da
brasileira ainda aguardam por uma estimativa mais realista.278

O Plano Real pôde então contar com uma redefinição relativamente rápida da forma
institucional de inserção no regime internacional. De maneira que, ao ser implementada
efetivamente em inícios dos anos 90, a abertura comercial e financeira não cessou de se
aprofundar, impulsionada pela sobrevalorização cambial da primeira fase desse programa de
estabilização de preços. Por outro lado, as formas da concorrência, tradicionalmente
estruturadas em mercados oligopolizados e protegidos da concorrência internacional, terá o
sistema de mark-up pressionado para adequar-se aos fluxos de novos produtos importados e a

278
MARQUES-PEREIRA (2004, p. 15) observa que les crises financières semblemt avoir scellé définitivement
la légitimité de la libéralisation, révisée par le consensus post-Washington, que l on peut appeler maintenat
consensus de Brasília depuis que le parti, autrefois le plus critique de la gauche latino-américaine, l a endossé
pour arriver et se maintenir au governement.»
409

entrada de novos concorrentes por meio de investimentos diretos. No âmbito da WLN, a


contenção salarial e a elevação do desemprego foram outras das características da era pós-
Real. Então a complementariade das formas institucionais favoreceu a consolidação do
processo de estabilização dos preços. Um novo RMF à alta restrição; uma WLN
concorrencial; uma inserção internacional essencialmente neoliberal que intensificou a
concorrência oligopolista e conteve as pressões inflacionárias; um setor público altamente
endividado, cujas necessidades de financiamento converteram-se na base da valorização dos
capitais de curto prazo. Foi essa arquitetura institucional o suporte da estabilidade de preços
sob a nova moeda e não apenas a lógica original de um programa de combate à inflação. Mas
essa configuração foi também a responsável pela quase-estagnação do produto e da renda, que
caracterizou essa segunda década também perdida em termos de desenvolvimento e de
resgate da dívida social brasileira.

GRÁFICO 83 TAXAS DE JUROS REAIS PARA CAPTAÇÃO E EMPRÉSTIMO (1973-2003)

Taxas de juros reais_CDB (L)


Taxas de juros reais_ Capital de giro (L)
Razão Tx Capital de giro / Tx CDB (R)
120% 50

100%
40
80%
30
60%

40% 20

20%
10
0%
0
-20%

-40% -10
1973 1976 1979 1982 1985 1988 1991 1994 1997 2000 2003

FONTE: Séries mensais nominais originárias do BACEN e obtidas no IPEADATA.


NOTA: Tx = taxa.

No Gráfico 83 podem ser observadas a evolução das taxas reais de juros dos
certificados de depósito bancário (CDB)279, uma proxy para o custo de captação do sistema
bancário, e as taxas reais de juros dos empréstimos para capital de giro. Portanto, têm-se as

279
Conforme glossário divulgado por uma instituição bancária: os Certificados de Depósito Bancário (CDB)
são os títulos emitidos por bancos comerciais, múltiplos e de investimento, com o objetivo de gerar recursos para
o financiamento de capital de giro do próprio banco ou de terceiros. Esta modalidade de aplicação poderá render
tanto uma taxa de juros fixa quanto variável, dependendo da forma como foi emitido o certificado .
410

duas pontas da intermediação financeira, a da captação dos recursos e a da concessão do


crédito. O mesmo gráfico também mostra a razão entre essas taxas como uma medida da
rentabilidade dessas operações de crédito. As taxas nominais de juros foram convertidas em
taxas reais deflacionando-se os multiplicadores das taxas em termos nominais pelo IGP-DI e
em seguida foram anualizadas.

(1 i N
)
i R
(1 p)
(23)

onde iN e iR são, respectivamente, as taxas nominais e reais de juros e p é a taxa


de inflação.

Portanto, não se trata das taxas aparentes de juros que são calculadas pelo diferencial
entre taxas nominais e a taxa de inflação. As médias anuais foram então utilizadas para gerar
o gráfico em questão. Destaca-se a constância dessa relação desde 1973, ano que marcaria o
término do milagre econômico brasileiro .

Algumas hipóteses podem ser levantadas para esse comportamento. Excluindo os anos
atípicos de 1981 e 2004, a estabilidade da razão taxa de juros capital de giro / taxas de juros
CDB pode estar expressando o grau de oligopolização do sistema bancário-financeiro
brasileiro.

GRÁFICO 84 EVOLUÇÃO DA TAXA SELIC EM TERMOS REAIS (1974-2004)

Taxas reais de juros_SELIC


Y = Lowess
80%

60%

40%
% a.a.

20%

0%

-20%

-40%
1974 1978 1982 1986 1990 1994 1998 2002
1976 1980 1984 1988 1992 1996 2000 2004

FONTE: Séries mensais nominais originárias do BACEN e obtidas no IPEADATA.

A constância dessa relação pode ser interpretada como representativa da estabilidade


dos mark-ups derivados de uma estrutura financeira e patrimonial excessivamente
411

concentrada. Aliás, o processo de concentração bancária que começou nos anos 50, foi
inclusive promovido pelo próprio governo ao longo do regime arbitrário pós-1964, sob a
alegação de que isto traria benefícios para a economia nacional, em termos de aumento de
eficiência e da oferta de crédito para os setores diretamente produtivos. Mas uma outra onda
de fusões e aquisições de bancos, no contexto da inserção neoliberal, ocorreria na era pós-
Real, com a participação de instituições estrangeiras. Todavia, essa constatação assume
conotações mais surpreendentes, quando se considera que a entrada dos grandes bancos
estrangeiros não foi capaz de abalar essa relação em seu comportamento tendencial. Em
conclusão, o Gráfico 83 estaria expressando a força oligopolista das instituições bancárias e
financeiras no Brasil, e que se mantém praticamente inalterada através de períodos tão
díspares da evolução econômica nacional, por suas características estruturais e conjunturais.

GRÁFICO 85 TAXA NOMINAL SELIC E INFLAÇÃO (1974-2004)

Razão taxa SELIC / taxa IGP-DI (L)


SELIC - média das taxas anualizadas nominais (R)
IGP-DI - variação média anual (R)
20,0

10,0 5000%
9,0
8,0
7,0
6,0
5,0
4,0 500%
3,0

2,0
50%

1,0
0,9
0,8
0,7 5%
0,6
0,5
0,4

1974 1977 1980 1983 1986 1989 1992 1995 1998 2001 2004

FONTE: Séries mensais nominais originárias do BACEN e obtidas no IPEADATA.

O Gráfico 84 mostra a evolução das taxas de juros reais SELIC, com a série tendencial
correspondente, estimada segundo o método Lowess smoothing. Os anos 90 caracterizam-se
por apresentarem as mais elevadas taxas reais de juros, apesar da tendência de queda
observada a partir de 1999, quando o câmbio passou a ser flutuante. Sob um regime de
câmbio flutuante, o governo recuperou parte da autonomia da política monetária, que na
primeira fase do Real esteve voltada para a preservação da âncora cambial.
412

O Gráfico 85 fornece outras informações que complementam e reforçam às do Gráfico


84. Podem ser observadas a evolução da taxa nominal SELIC280, da taxa de inflação e a razão
entre essas variáveis, utilizada como um indicador do grau de restrição monetária imposto
pelo RMF em cada período. Entre 1974 e 1988, a restrição monetária é muito baixa e situa-se
numa média de 0,97. Na década de 90, salta para uma média de 3,82. Mas o RMF à elevada
restrição é justamente o vigente na era pós-Real, onde a razão taxa SELIC / taxa de inflação
cresce para 6,24 entre 1994-1998, justamente o período de vigência da âncora cambial. Com o
abandono do regime de câmbio fixo, o grau de restrição monetária cai para 1,73 entre 1999 e
2004.

GRÁFICO 86 DESEMPREGO E CHEQUE SEM FUNDOS (1991 2004)

Percentagem de cheques sem fundos (L)


Taxa de desemprego total (oculto + aberto) (R)
20% 22%
18%
20%
16%
14% 18%
12% 16%
10%
8% 14%

6% 12%
4%
10%
2%
0% 8%
1991 01
1991 07
1992 01
1992 07
1993 01
1993 07
1994 01
1994 07
1995 01
1995 07
1996 01
1996 07
1997 01
1997 07
1998 01
1998 07
1999 01
1999 07
2000 01
2000 07
2001 01
2001 07
2002 01
2002 07
2003 01
2003 07
2004 01
2004 07

FONTE: A série sobre a percentagem de cheques sem fundos é originária do SERASA e as taxas de desemprego
total referem-se à região metropolitana de São Paulo. Os dados foram obtidos no IPEADATA.

280
Taxa utilizada pelo Sistema Especial de Liquidação e Custódia do Banco Central do Brasil. Esta taxa
funciona como um piso para as taxas de juros fixadas pelo mercado bancário-financeiro.
413

GRÁFICO 87 ÍNDICE DE INADIMPLÊNCIA (1994 -2004)

Índice de inadimplência
28
26
24
22
20
18
16
14
12
10
8
6
4
2
0
1994 01
1994 06
1994 11
1995 04
1995 09
1996 02
1996 07
1996 12
1997 05
1997 10
1998 03
1998 08
1999 01
1999 06
1999 11
2000 04
2000 09
2001 02
2001 07
2001 12
2002 05
2002 10
2003 03
2003 08
2004 01
2004 06
FONTE: Dados originários da Associação Comercial de São Paulo, Boletim do Instituto de Economia Gastão
Vidigal (ACSP/IEGV) e obtidos no IPEADATA.
A análise do Gráfico 86 revela que a emissão de cheques sem fundos que pode ser
considerada como mais um indicador do elevado grau de restrição do RMF pós-Real - entrou
em uma tendência de expansão justamente a partir da introdução da nova moeda. Observa-se
também uma forte correlação (0,8240) com a evolução das taxas de desemprego total oculto
mais aberto - sobretudo, a partir de 2000.

O Gráfico 87 mostra o comportamento do índice de inadimplência sob o novo regime


monetário-financeiro do Plano Real. Pode-se observar duas fases distintas com relação à
tendência deste indicador. A primeira, entre julho de 1994 e dezembro de 1998, corresponde à
fase de sobrevalorização cambial, com o regime de bandas. O índice de inadimplência oscila
em torno de um patamar médio de 11%. A partir de 1999, com a mudança para o regime de
câmbio flutuante, esse patamar cai para 6%, sinalizando a passagem para uma redução
relativa no grau de restrição monetária que o RMF pós-Plano Real impõe à economia e
sociedade brasileiras.
414

GRÁFICO 88 CRÉDITO E INVESTIMENTO PRODUTIVO (1970-2003)

Multiplicador da taxa SELIC anualizada real (L)


Crédito do sistema financeiro (R)
Formação bruta de capital fixo (R)
1000 450
900 400
800
700 350
600 300
500
400 250

300 200

200 150

100
100
90
80
70
60
50
50
1970 1973 1976 1979 1982 1985 1988 1991 1994 1997 2000 2003

FONTE: Séries originárias do BACEN e IBGE e obtidas no IPEADATA.


NOTA: Para o período 1970-1987, foi utilizada a série dos empréstimos totais e de 1988 a 2003, a série das
operações de crédito do sistema financeiro nacional. Os eixos estão em escala logarítmica.
As relações entre crédito e formação bruta de capital fixo são fundamentais no
processo de crescimento e desenvolvimento econômicos. O Gráfico 88 mostra o modo como a
partir de 1979, término do II PND, as operações de crédito do sistema financeiro nacional
(SFN) despencam e, em seguia, o mesmo acontece com o fluxo de investimento. Destaca-se
também a grande volatilidade das séries ao longo dos anos 80, sinalizando a desestruturação
do regime de acumulação responsável pelo alto crescimento do milagre . O Gráfico 88
também apresenta a evolução do multiplicador da SELIC anualizada real. Observa-se que
entre 1970 e 1980, crédito e investimento permanecem sob trajetórias bastante regulares de
expansão. Há uma relativa desaceleração na série da formação bruta de capital fixo, a partir de
1976, mas que pode ser atribuída aos efeitos do choque energético sobre as decisões de
investimento e não a uma dificuldade endógena do regime de acumulação em vigor. A
questão fundamental é que neste período de expansão, a taxa de juros reais uma proxy do
custo de capital - permaneceu em níveis satisfatórios à formação de capital fixo. Isto significa
que o RMF ainda favorecia e validava as decisões de investimento produtivo. A partir de
1988, o multiplicador da SELIC dispara e o grau de restrição monetária do RMF tornar-se-ia
cada vez mais elevado. Entre 1993 e 1997, as séries mantiveram-se ainda em expansão, mas
como a escalada dos juros reais continuou avançando, sobretudo motivada pela crise
415

financeira da Ásia em 1997, o crédito e a formação bruta de capital fixo novamente


declinaram.

Em resumo, o RMF da era do Real apresenta-se muito pouco favorável à retomada dos
investimentos produtivos. Trata-se de um regime à elevada restrição monetária que responde
prioritariamente à lógica da acumulação financeira e patrimonial e que tem no endividamento
público e privado, sua premissa e também o seu resultado. A equipe econômica é
perfeitamente cônscia dessa problemática que instaurou um círculo vicioso entre
endividamento, baixo crescimento e mais endividamento. Mas como o grau de subordinação
das finanças públicas brasileiras às prerrogativas dos capitais bancário-financeiros nacionais e
internacionais é efetivamente muito elevado, o discurso oficial tenta inutilmente convencer os
agentes econômicos responsáveis pelas decisões cruciais de investimento, de que os juros não
seriam os únicos determinantes do crescimento econômico. E efetivamente não seriam, se os
níveis praticados no mercado financeiro brasileiro fosse ao menos próximo ao de países com
níveis de desenvolvimento e endividamento similares.281

4.4.8 Síntese dos principais resultados

No que concerne às transformações do regime monetário-financeiro brasileiro, os


seguintes fatos característicos podem ser destacados:

i. A análise da evolução de longo prazo do RMF brasileiro revela sua vinculação


estrutural e subordinada à forma institucional de inserção internacional, uma
característica que é de fato comum às economias ainda em desenvolvimento. Neste
contexto, a alta dependência dos capitais estrangeiros e a tendência histórica ao
desequilíbrio externo se reforçam enquanto fatores que problematizam a
consolidação da moeda nacional. Como conseqüência direta, as pressões
inflacionárias são recriadas de forma recorrente, apesar da relativa estabilidade de
preços alcançada sob o Real. Mas como a institucionalidade que garante a livre
mobilidade dos capitais é mantida como prerrogativa do capital bancário-financeiro
e legitimada e considerada adequada pelo próprio Estado, a taxa de juros converte-se
no instrumento par excellance de controle da inflação e de garantia da rentabilidade
real dos capitais financeiros. Todavia, como sua mobilização para impulsionar o
crédito aos setores produtivos é dificultada pelas próprias condições institucionais

281
BRESSER-PEREIRA (2004, p. 381) chama a atenção para o fato de que países com taxas de risco maiores do
que as do Brasil praticam, no entanto, taxas de juros reais menores.
416

que mantêm a abertura financeira, a retomada de uma trajetória de crescimento


econômico forte e durável torna-se pouco provável;

ii. Até 1979, o regime monetário-financeiro foi capaz de proporcionar o aporte de


recursos para o financiamento da acumulação produtiva de capital. Nos anos 80, esse
comportamento se reverte em prol de uma acumulação financeira baseada nos
ganhos inflacionários e no endividamento da economia brasileira pós- milagre . Um
regime monetário-financeiro dual e inflacionista emerge e torna-se o suporte da
expansão bancária e financeira e das tendências à estagnação e à alta inflação que
caracterizaram este período. Essa configuração foi possível graças à generalização
dos mecanismos de indexação da economia - cujas origens encontram-se no
dispositivo institucional da correção monetária - e à validação, pelo Estado, dos
padrões de circulação financeira induzidos por esse regime;

iii. A transição de um RMF dual e, por natureza, inflacionista, para um RMF à alta
restrição monetária implicou na mudança das condições sobre as quais a
acumulação financeira se desenvolvia. Entre 1980 e 1993, a alta inflação e os
mecanismos de indexação foram a base da expansão financeira e dos grandes lucros
do setor bancário. Este fato pôde ser constatado quando os testes econométricos
mostraram que existia causalidade unidirecional da inflação para o incremento da
participação do valor adicionado pelo setor financeiro no PIB;

iv. Com a implementação do Plano Real, as altas taxas de juros ocuparam o lugar antes
reservado aos ganhos inflacionários, perpetuando um regime monetário-financeiro
inadequado às necessidades da acumulação de capital produtivo. Este fato permite
também apreender a evolução do RMF brasileiro da década de 80 para a de 90 como
um processo de transição de um RMF inflacionista para um RMF usurário282, onde o
controle da inflação é mantido às custas do crescimento econômico e do desvio da
poupança macroeconômica para os centros de acumulação financeira e patrimonial;

282
O conceito de usurário não deve ser interpretado sob conotações pejorativas, pois sua utilização neste
contexto decorre da falta de um outro termo que expresse de forma mais precisa o RMF brasileiro do período
pós-Real. Segundo o Dicionário Houaiss, a usura significa juro, renda ou rendimento de capital, freqüentemente
acima da taxa legal. Significa também juro exagerado ou extorsivo. Uma das especificidades do caso brasileiro
decorre do fato de que os juros são exagerados não porque sejam praticados acima do nível legal. Pelo contrário,
são extremamente elevados dentro do próprio marco regulatório e, portanto, sancionados pelas Autoridades
Monetárias. A usura encontra-se neste caso perfeitamente institucionalizada, sendo inclusive mobilizada como
política econômica consistente com os objetivos de controle da inflação e de rolagem da dívida pública.
417

v. Em conseqüência, a análise do atual RMF pós-Plano Real permite sustentar a


hipótese de que o principal obstáculo à retomada dos investimentos produtivos em
montantes compatíveis com a expansão sustentada da taxa de acumulação de capital
não é propriamente a insuficiência de poupança. A questão fundamental refere-se às
particularidades do RMF sob condições de liberalização da conta de capital. Num
ambiente macroeconômico caracterizado por elevadas taxas de juros reais, os
recursos correspondentes à poupança interna e externa não se tornam disponíveis aos
setores diretamente produtivos, pois são canalizados atrativamente para os ativos
financeiros, de menor risco e rentabilidade garantida. Isto significa que o obstáculo
maior a retomada do crescimento econômico em bases sustentáveis encontra-se na
vigência de um regime monetário-financeiro à alta restrição, que bloqueia o
desenvolvimento do crédito e deteriora a qualidade dos financiamentos e
empréstimos aos setores diretamente produtivos.

vi. O RMF pós-Plano Real responde também pela contenção salarial e pela elevação do
desemprego, a partir de sua articulação com as outras formas institucionais. Uma
WLN concorrencial, um padrão de inserção internacional de orientação neoliberal,
e um Estado altamente endividado cujas necessidades de financiamento
converteram-se, como nos anos 80, no suporte da valorização dos capitais de curto
prazo. Foi essa arquitetura institucional o suporte da estabilidade de preços sob a
nova moeda e não apenas a lógica original de um programa de combate à inflação.
No entanto, essa configuração foi também a responsável pela quase-estagnação do
produto e da renda, que caracterizou essa segunda década perdida em termos de
desenvolvimento e de resgate da dívida social brasileira.
418

4.5 As formas da concorrência e de inserção internacional da substituição de


importações à globalização
Cabe indagar que espaço de manobra haverá para os países latino-
americanos e, particularmente, para o Brasil, no quadro desse novo
policentrismo. Submetidas a uma tutela financeira intermediada por
instituições multilaterais, como o FMI, que na realidade são
instrumentos do governo de Washington, as economias latino-
americanas operam hoje em dia essencialmente para produzir
excedentes comerciais em benefício das nações credoras,
principalmente dos EUA. Entre 1982 e 1989, os países da AL
transferiram para o exterior recursos no montante de 203 bilhões de
dólares, o que não impediu que sua dívida externa haja, no mesmo
período, crescido de 350 para 416 bilhões de dólares .

(Celso Furtado, Brasil: a construção interrompida, 1992)

4.5.1 Introdução

Esta seção tem por objetivo fornecer uma visão geral das transformações das formas
institucionais da concorrência (FC) e de inserção internacional (FII). Em razão de seus
vínculos diretos, a metodologia escolhida consiste em uma abordagem conjunta dessas duas
outras componentes do modo de regulação, facilitando tanto a exposição quanto a apreensão
de fenômenos que não seriam inteligíveis a partir de uma visão centrada em cada uma delas
separadamente. Todavia, as limitações de espaço e dos dados não permitem uma análise
exaustiva do conjunto de implicações macroeconômicas das mutações dessas áreas da
regulação. Tais limitações não são, contudo insuperáveis, mas aguardarão o desenvolvimento
de novas pesquisas tanto teóricas quanto empíricas.

Na literatura econômica regulacionista, essas duas FI não tem sido objeto de análises
mais acuradas, que são normalmente dedicadas às formas institucionais da wage-labor nexus,
dos regimes monetários e do Estado. Uma das explicações reside na preocupação da primeira
geração dos trabalhos da Escola da Regulação, em compreender as macro-regularidades
responsáveis pelo período fordista, a partir de suas duas formas institucionais
hierarquicamente superiores: a WLN e o Estado. Mas uma outra razão refere-se ao fato de que
ao se estudar as formas da WLN, os padrões de concorrência e de inserção internacional
emergem necessariamente no âmbito das análises. Como se pôde observar nas seções
precedentes, as formas da concorrência e de inserção no regime internacional estavam sempre
presentes, mesmo que em alguns momentos de modo implícito, mediante a consideração dos
impactos da abertura comercial e financeira. A presente abordagem não pretende superar a
carência de trabalhos centrados nas FC e na FII, mas apenas caracterizar seus efeitos
419

considerados mais relevantes para a dinâmica da acumulação de capital no Brasil, que é o


objeto principal deste trabalho.

4.5.2 Concorrência e inserção internacional no contexto da globalização

Como foi visto nos capítulos 1 e 2, as formas institucionais respondem pelas macro-
regularidades básicas de um regime de acumulação. Conforme PETIT (2004), essas cinco
grandes áreas da regulação macroeconômica reúnem todas as instituições que concorrem:

i. Paras as tarefas da administração central, os impostos, a seguridade, a justiça e


os gastos de defesa, ou seja, o Estado;

ii. Para o estabelecimento dos sistemas de pagamento e de financiamento, isto é, a


moeda, suas formas e implicações, através dos regimes monetário-financeiros;

iii. Para a organização das relações entre economias nacionais, através das formas
de inserção internacional;

iv. Para as modalidades da concorrência, na diversidade de relações mercantis


entre unidades autônomas de acumulação de capital;

v. Para a ativação das relações de trabalho assalariado e de suas formas de


reprodução, ou seja, para uma determinada configuração da WLN.

Observa PETIT que esta estruturação do contexto institucional desenvolvida pela


Teoria da Regulação tem a vantagem de corresponder a grandes conjuntos ou componentes do
sistema sócio-econômico, facilmente identificáveis, não somente pelos pesquisadores em
Ciências Sociais, mas, sobretudo pelos próprios atores econômicos. Por outro lado, estas
formas institucionais são diretamente objeto de opções sociais e de escolhas políticas dos
agentes. Neste contexto, a noção de instituição refere-se a todos os expedientes (habitus,
convenções, regras, etc.) que regulam os comportamentos dos agentes, quer se trate de
restringir sua margem de ação ou, ao contrário, de ampliar seu campo.283

283
Segundo FOURQUET (2003), em trabalho apresentado no Forum de la Régulation de 2003, o regime
internacional seria sempre uma componente ou forma estrutural dominante na hierarquia que define um modo de
regulação nacional. Trata-se no entanto, de uma posição que precisa ser mais bem trabalhada a partir dos
princípios teóricos e metodológicos da Escola da Regulação. Para os fins da presente análise, é suficiente que se
faça uma distinção entre o contexto externo - delimitado geográfica e politicamente - e que se pode denominar
por regime internacional e a forma particular que um Estado Nacional dispõe para conectar-se ou inserir-se
nesse regime.
420

As instituições são, portanto, vetores de regularidades comportamentais que podem ser


a base da cooperação e da coordenação das relações econômicas entre os diversos atores
sociais, incluindo, evidentemente, as relações entre Estados nacionais.

No capítulo 1, foi visto que uma determinada forma de inserção no regime


internacional resulta da confluência de fatores internos à economia nacional e de fatores
provenientes das estruturas monetárias e financeiras que compõem o ambiente externo aos
países, consubstanciando-se no cenário político e econômico sobre o qual desenvolvem-se as
relações internacionais. Além disso, procurou-se mostrar que uma configuração particular da
forma institucional de inserção no regime internacional responde pelo conjunto das
regularidades econômicas resultantes das relações comerciais e financeiras de uma formação
social nacional com o resto do mundo, refletindo tanto as imposições das nações hegemônicas
quanto o grau de autonomia relativa que a economia nacional pode dispor.

Quanto às formas da concorrência, buscou-se caracterizá-las como um momento


fundamental na reprodução do caráter mercantil das economias que se organizam sob o
capitalismo. Todavia, uma abordagem regulacionista das estruturas de mercado não implica
considerar que a concorrência e seus mecanismos sejam um fim a ser perseguido por toda
economia em busca de maior eficiência produtiva e distributiva. Os trabalhos em termos de
regulação foram pioneiros em mostrar que existem configurações, por exemplo, no mercado
de trabalho, onde o excesso de concorrência destrói a coerência macroeconômica do regime
de acumulação, tornando-o instável e incapaz de garantir uma trajetória de crescimento
sustentável. As análises regulacionistas recorrem, inclusive aos aportes de GOODWIN
(1967)284 em termos de dinâmica não linear. Com esses modelos este autor mostra justamente
que o aumento da concorrência no mercado de trabalho resulta em maior instabilidade e crise,
sem necessidade de apelar para forças desestabilizadoras exógenas à lógica mercantil.

No que diz respeito às grandes transformações da economia mundial a partir dos anos
80, que culminaram no processo de globalização, um dos resultados detectados pelas análises
regulacionistas foi a mudança de hierarquia das FI. O forte protecionismo comercial, a
legitimidade do Estado de Bem-Estar e o compromisso social fordista de pleno emprego, são

284
Richard M. GOODWIN mostra em A growth cycle - obra coletiva publicada pr H. FEINSTEIN, Socialism,
Capitalism and Economic Growth.- que os ciclos podem ser engendrados de forma endógena em um sistema
onde há interação entre salários, lucro e taxa de desemprego. A análise é próxima a dos autores clássicos e de
MARX.
421

deslocados enquanto base do modo de regulação que caracterizou o fordismo. As


transformações processaram-se no sentido do aprofundamento relativo do caráter mercantil
das economias que se organizam sob os diversos capitalismos. Uma espécie de retorno
apressado, e teórica e empiricamente pouco fundamentado, às estruturas de um capitalismo
predominantemente concorrencial em alguns aspectos similares ao vigente entre o século
XIX e as primeiras décadas do século XX - ganharia expressão política e ideológica como se
a redescoberta do mercado através de uma globalização neoliberal fosse a senha de
entrada num mundo pleno de vantagens econômicas e benefícios sociais inovadores e
irrecusáveis.

Esse retorno apressado constitui inclusive um paradoxo, pois na realidade a


desconstrução estrutural que a visão neoliberal impulsionou ao longo dos anos 90, parecia se
esquecer de que foram justamente as estruturas típicas de um capitalismo predominantemente
concorrencial que haviam conduzido à grande crise dos anos 30. Então, como poderiam agora
tornar-se um fator de estabilidade e de crescimento econômico sustentado, sobretudo, em um
contexto marcado pelas inovações financeiras e pelas novas tecnologias da informação e da
comunicação ?

Foi nessa atmosfera ideológica, mas ao mesmo tempo mítica, que, nos anos 90, as
elites burocrática governamental e econômica brasileiras optaram por uma inserção
fortemente subordinada na economia internacional. Pressionadas no plano externo pelo
elevado endividamento do país, escolheram o caminho do menor esforço político e o mais
compatível com os interesses econômicos de quem não têm pressa de ver a economia nacional
desenvolver-se com mais igualdade e justiça social.

Uma das características mais dramáticas por seus efeitos sinalizadores da perda da
soberania nacional, foi que essa subordinação passou a ser um ingrediente perverso na medida
em que contou (e ainda conta) com os mecanismos de legitimação do próprio Estado,
incluindo a oposição sistemática à toda alternativa ao atual modelo de inserção neoliberal .
O governo recusou-se (e recusa-se) a reconhecer as especificidades nacionais como geradoras
de vantagens geopolíticas e geoeconômicas que seriam um trunfo natural para a construção de
um novo projeto de desenvolvimento mais autônomo e mais consentâneo com o potencial
econômico do país.

O grau de subordinação e de perda de soberania e hegemonia do Estado frente às


finanças nacionais e internacionais revela-se também na composição híbrida em termos
teóricos e ideológicos - dos quadros responsáveis pela gestão da política econômica.
422

Economistas de formação tão díspares como neoclássicos e suas derivações novo clássicas
transitam entre os de formação mais compatível com os referenciais keynesianos ou
estruturalistas. Mas muito provavelmente sem os ouvir, seja porque estes últimos se recusam
a falar, dadas as enormes pressões dos mercados financeiros, seja porque simplesmente não
são ouvidos de qualquer modo, pois participam do poder para efeitos simbólicos de
legitimação de um partido que se construiu também por oposição à política econômica que
atualmente pratica. O fato é que a lógica e a natureza da política econômica permanece,
invariavelmente, a tradução dos pressupostos teóricos conservadores do mainstream, mas ao
mesmo tempo apostando em resultados macroeconômicos positivos e duráveis, ao menos
retoricamente, no futuro.

4.5.3 Da substituição de importações à globalização neoliberal

A substituição de importações285 foi um dos eixos fundamentais da industrialização


brasileira, desde finais do século XIX286. Todavia, as primeiras indústrias não podiam contar
com as políticas protecionistas e os incentivos estatais para o seu desenvolvimento. Com um
aparelho de Estado fortemente controlado pelos interesses agrário-exportadores, ao longo da
Primeira República, a indústria nascia a partir da dinâmica cíclica da economia cafeeira,
beneficiando-se da infra-estrutura montada especificamente para este setor287. Nas fases de
expansão das exportações agrícolas, a maior disponibilidade de divisas permitia a aquisição
do capital fixo e de insumos necessários à instalação das novas plantas industriais. Mas nas
fases de baixa do ciclo, quando as exportações caiam, a escassez de divisas encarecia as
importações, exercendo um efeito protecionista, sem a intenção deliberada do Estado. As

285
Esta seção faz uma diferenciação entre a substituição enquanto processo promovido pela própria dinâmica do
mercado interno em interação com os ciclos da atividade primário-exportadora e enquanto modelo ou estratégia
apoiada pelo Estado para promover a industrialização. Este último sentido provém da abordagem da CEPAL e
significa mais do que a produção local de bens tradicionalmente importados.
286
BRESSER-PEREIRA (2004, p. 61) observa que todo o desenvolvimento industrial brasileiro no período em
foco ocorreu fundamentalmente através de um processo de substituição de importações. Era esta, aliás a única
alternativa para o Brasil, dadas as limitações às possibilidades de aumento de nossas exportações. O Brasil,
durante o período de sua Revolução Industrial, voltou-se para dentro. (...). Tivemos, assim, uma drástica redução
do coeficiente de importações, que baixou de 12,6% no período 1950-1954 para 8,6% no 1955-1961
287
Os trabalhos de FURTADO (2002; 1992; 1976), J. M. C. MELO (1987); CANO (2004), SUZIGAN (1986),
VERSIANI e VERSIANI (1977) constituem referências obrigatórias nas análises das origens da indústria no
Brasil. Esta seção não pretende recuperar o debate das relações entre o setor exportador cafeeiro e a
industrialização brasileira, mas apenas destacar o lugar que a substituição de importação desempenhou neste
processo.
423

indústrias expandiam a produção, substituíam as importações e aprofundavam o mercado


interno brasileiro288.

Em uma perspectiva regulacionista, é importante considerar que ao deslocar a


oligarquia agrária do aparelho de Estado, a Revolução de 30 permitiu que as novas lideranças
mobilizassem o capital político necessário à readequação do regime-fisco financeiro às
necessidades do capital industrial em expansão. Como visto na seção 4.1, sobre a forma
institucional do Estado, a transição para o capital industrial pressupôs um conjunto de
transformações estruturais fundamentais, em que se destacam a reformulação da política
comercial e a redefinição do setor público como agente promotor das novas bases técnicas
produtivas industriais. Isto permite compreender-se como a substituição de importações
deixou de ser um processo promovido espontaneamente pelas interações café-indústria e
passa a compor, ao ser promovida pelo Estado, uma estratégia de desenvolvimento.

No que concerne aos seus impactos sobre as formas institucionais da concorrência e


inserção internacional, a industrialização por substituição de importações (ISI) caracteriza-se
por ser voltada para o mercado interno e, portanto, afasta-se deliberadamente da lógica dos
modelos de desenvolvimento baseados nas exportações ou modelos extravertidos. A ISI
torna-se fortemente dependente de medidas que protejam os produtores domésticos da
concorrência internacional. Todavia, é inegável que no caso brasileiro, apesar de suas
distorções, o modelo de ISI permitiu que o país tivesse uma das mais altas taxas de
crescimento do PIB no mundo, entre 1870 e 1987.289 Conforme MOREIRA (1999), no
período de vigência da lógica de ISI, o Brasil conseguiu construir uma estrutura industrial
ampla e diversificada. A indústria de transformação ampliou sua participação de 19% do PIB
em 1955, para 30% em 1990. Os produtos manufaturados que representaram apenas 1% das
exportações em 1955, passaram para 50% no final da década de 80. Mas as distorções geradas
pela ISI já foram amplamente debatidas e documentadas na literatura sobre comércio e
desenvolvimento econômico.290

288
Esta visão das relações entre a indústria e o complexo exportador cafeeiro tornou-se conhecida na literatura
econômica brasileira como teoria da complementaridade , porque apreende as fases de alta e de baixa dos
ciclos do café como momentos complementares em seus efeitos sobre o desenvolvimento industrial. Mais
detalhes podem ser encontrados em VERSIANI e VERSIANI (1977);
289
Conforme MADDISON, citado por LACERDA et al. (2002).
290
Não é objetivo da presente análise, listar todas as distorções estruturais e macroeconômicas que a lógica da
ISI necessariamente produz, mas tão somente explicitar suas características básicas. Mais detalhes podem ser
encontrados em KRUEGER (1984) e para o caso específico do Brasil, MOREIRA (1995) e FRANCO (1998).
424

Quanto aos expedientes utilizados para a proteção à indústria nacional, nos quadros da
ISI, destacam-se (GREMAUD et al. 2004):

i. A desvalorização real do câmbio constituiu uma das peças básicas da política


econômica durante o primeiro governo Vargas, nos anos 30;

ii. O controle administrativo do câmbio um sistema utilizado durante o governo


Dutra em resposta à crise cambial de 1947-1948;

iii. Taxas múltiplas de câmbio este modelo foi introduzido no segundo governo
Vargas, em resposta à crise cambial de 1952;

iv. Elevação das tarifas aduaneiras um mecanismo adotado durante o Plano de


Metas, no governo JK.

Quanto aos problemas da industrialização por substituição de importações podem ser


listados os seguintes (MOREIRA, 2004, p.295 e 296):

i. a proteção favoreceu principalmente os setores que demandavam recursos


escasso no país, como capital e tecnologia, gerando uma utilização inadequada
dos recursos abundantes, como trabalho e recursos naturais;

ii. a proteção elevada incentivou a entrada de grande número de produtores nos


setores intensivos em capital e tecnologia, basicamente empresas multinacionais,
inviabilizando a obtenção de escalas competitivas;

iii. o recurso freqüente a índices de nacionalização elevados, incompatíveis com o


grau de desenvolvimento tecnológico e com o tamanho do mercado brasileiro,
promoveu a ineficiência e o desperdício de recursos ao longo da cadeia
produtiva;

iv. elevada proteção ao mercado interno criou forte viés contra as exportações ,
bloqueando os ganhos de escala e eficiência a elas associados, pois permitiu que
os preços domésticos fossem mantidos bem acima dos vigentes no mercado
internacional;
425

v. e conseqüência de ii e iv, as empresas brasileiras restritas a um mercado interno


fragmentado, não conseguiram adquirir um tamanho que lhes permitisse reduzir
as desvantagens de escala vis-à-vis seus competidores internacionais;

vi. a proteção contra as importações e o desestímulo às exportações isolaram da


concorrência internacional o produtor local, minando os incentivos para a
redução de custos e a introdução de inovações de produto e processos;

A conjuntura estagflacionista e os problemas estruturais explicitados ao longo dos


anos 80 concorreram para o diagnóstico de falência do modelo de ISI, seja pelas distorções
que lhes foram diretamente imputadas, seja pelo esgotamento de suas formas tradicionais de
financiamento. Uma das características problemáticas refere-se à tendência ao desequilíbrio
externo que a própria dinâmica da ISI suscita. E há várias razões para explicar essa tendência:

o recurso à política cambial para estimular e baratear o investimento industrial,


como o confisco cambial. Este tipo de medida tendia a desestimular os setores
exportadores e, portanto, preparava as condições para um déficit comercial;

o excesso de proteção reduz a taxa de inovação e de produtividade, diminuindo


a competitividade internacional da indústria;

a elevação da renda e dos investimentos industriais pressionam a demanda por


importações gerando mais um fator de desequilíbrio da balança comercial;

à medida em que as divisas tornavam-se escassas, a continuidade da ISI só era


viável mediante o recurso ao capital estrangeiro.

Conseqüentemente, a conjuntura econômica e os problemas estruturais reforçavam o


os argumentos político-ideológicos sobre a necessidade urgente de mudanças substanciais nas
formas da concorrência e de inserção internacional.

4.5.4 Liberalização comercial e financeira nos anos 90

O modelo de industrialização por substituição de importações que o Brasil adotou


implicava necessariamente numa estratégia introvertida de desenvolvimento econômico, já
que as estruturas produtivas destinavam-se a atender prioritariamente a demanda doméstica.
Em conseqüência, o grau de abertura da economia brasileira tornou-se mais reduzido que o
426

observado em países que adotaram um modelo extravertido ou do tipo exported-led growth,


como nos países asiáticos.

As dimensões comercial e financeira da liberalização devem ser apreendidas enquanto


processos que se determinam mutuamente, a partir das configurações vigentes das formas
institucionais da concorrência e de inserção internacional. Aliás, nos modelos de economia
aberta da tradição neoclássica, a livre mobilidade dos capitais é considerada um dos fatores de
determinação das taxas domésticas de juros e de reequilíbrio do balanço de pagamentos. Mas
este tipo de abordagem não reconhece o caráter potencialmente desestruturador e causador de
instabilidade financeira, pois parte de uma axiomática que confere ao livre mercado um status
que ele empírica e historicamente não se mostra capaz de possuir: o de ser o lócus de
equilíbrios ótimos em termos sociais e econômicos. Conforme observa AGLIETTA (2001,
p.3):

La libéralisation financière améliore l allocation des ressources dans


l économie, ce qui est bom pour la croissance et le bien-être. Donc la
libéralisation financière n a que des vertus. (...) Ce slogan de la vulgata
économique a été diffusé par les médias avec la répétition lancinante
d un tube. Pourtant la croissance a faibli de décennie en décennie
depuis les années soixante dans les pays développés (...). Loin de se
conformer à l idéal d éfficacité et de transparence auquel elle prétend,
la libéralisation financière a montré d une crise à l autre son
incapacité à autoréguler. »

Foi preciso a ocorrência das crises financeiras que abalaram as economias da Ásia e da
América Latina para que o otimismo ingênuo com relação aos benefícios da liberalização
financeira fosse repensado nos quadros de uma visão mais realista.

4.5.5 A dimensão comercial

Segundo KUME et al. (2003), a partir de 1988, o Brasil inicia a implementação de


uma política de importação, com a intenção de induzir a uma alocação mais eficiente de
recursos. Conforme KUME (1990 e 1991), em 1988, a política de importação apresentava as
seguintes características básicas:

a) uma estrutura tarifária baseada, com pequenas modificações, nas alíquotas fixadas
em 1957;

b) presença generalizada de tarifas com parcelas redundantes;


427

c) cobrança de diversos tributos adicionais;

d) ampla utilização de barreiras não-tarifárias (BNTs);

e) existência de 42 regimes especiais, permitindo a isenção ou redução de impostos.

Três programas de reduções tarifárias foram realizados nos períodos:

i. [1988-1989] realizaram se duas reformas tarifárias, respectivamente, em


junho de 1988 e em setembro de 1989, buscando eliminar a parcela redundante
da tarifa nominal, sem efeitos significativos sobre o volume de importações;

ii. [1991-1993] eliminaram-se as BNTs e os regimes especiais de tributação, em


seguida foi implementado, e previamente anunciado, um cronograma de redução
gradual das tarifas de importação;

iii. [1994] ano da implementação do Plano Real, as reduções tarifárias estiveram


voltadas para a contenção dos preços internos, mediante a intensificação da
concorrência externa.

A Tabela 29 mostra o comportamento das tarifas nominal e efetiva. As tarifas médias


sobre produto e sobre insumo encontram-se na Tabela 30, para o período 1988-1998. Os
valores para o ano de 1998 caíram para menos da metade dos vigentes em 1998. O Gráfico 89
permite uma visão de longo prazo da evolução das tarifas legais sobre importações, mas
segundo o tipo de bem (intermediário, de consumo e de capital).
428

TABELA 29 TARIFAS NOMINAL E EFETIVA (1987-1998)


Tarifa nominal - média Tarifa efetiva - média ponderada
Ano ponderada pelo valor adicionado pelo valor adicionado de livre-
de livre-comércio (%) comércio(%)
1987 54,9 67,8
1988 37,7 46,8
1989 29,4 38,8
1990 27,2 37
1991 20,9 28,6
1992 14,1 17,7
1993 12,5 15,2
1994 10,2 12,3
1995 10,8 10,4
1996 10,8 14,3
1997 13,4 16,6
1998 13,4 16,2

FONTE: Dados estimados por KUME, PIANI e SOUZA (2003).

No período de vigência do Real, a abertura passou a integrar também os objetivos de


estabilidade de preços, além de cumprir com os compromissos de implementação do Mercado
Comum do Cone Sul - MERCOSUL. O Tratado de Assunção de março de 1991 estabeleceu
as metas para a formação deste mercado entre Brasil, Argentina, Paraguai e Uruguai. A partir
de 1995 passou a vigorar uma tarifa externa comum (TEC) entre os países membros, mas há
diversas restrições que ainda deverão ser removidas. Por outro lado, pode-se argumentar que a
formação de blocos comerciais ou mercados comuns esbarrou nos obstáculos criados pelas
formas de inserção neoliberal que tanto a Argentina quanto o Brasil optaram nos anos 80 e 90.
Não sendo uma questão de simples abertura das economias envolvidas, o processo de
estruturação de mercados comuns pressupõe um certo grau de articulação entre as políticas
econômicas e, sobretudo a participação dos Estados nacionais soberanos em suas decisões de
cooperação e intercâmbio comercial. Todavia, a lógica da globalização financeira mostrou-se
incompatível com a constituição dessa União Aduaneira na medida em que mina, no plano
político, as bases da soberania dos Estados participantes; e no plano econômico, promove a
instabilidade cambial necessária ao desenvolvimento sustentado das relações comerciais.291

291
Essas iniciativas no âmbito da América Latina são normalmente vítimas de sua própria época. A ALALC e a
ALADI foram obstaculizadas pela própria natureza dos modelos de industrialização substitutiva de importações.
429

TABELA 30 TARIFAS SOBRE O COMÉRCIO EXTERIOR (1988-1998)

ANO TARIFA MÉDIA SOBRE PRODUTO (%) TARIFA MÉDIA SOBRE INSUMO (%)

1988 40 34
1989 33 26
1990 31 24
1992 16 13
1993 14 11
1994 11 9
1995 13 10
1996 13 10
1997 16 13
1998 16 12

FONTE: LISBOA et al. (2002).

GRÁFICO 89 TARIFAS LEGAIS SOBRE IMPORTAÇÕES POR TIPO DE BEM (1955-2002)

Tarifa sobre bens intermediários (Tbi)


Tarifa sobre bens de capital (Tbk)
Tarifas sobre bens de consumo (Tbc)

100%

80%
Tbc

60%

Tbk
40%
Tbi
20%

0%
1955 1961 1967 1973 1979 1985 1991 1997
1958 1964 1970 1976 1982 1988 1994 2000

FONTE: Dados do IPEA e Secretaria da Receita Federal.


NOTA: A tarifa legal é o imposto calculado dividido pelo valor tributável.

Considerados aceitáveis e necessários para o desenvolvimento da indústria doméstica, eles tendem, no entanto, a
ser incompatíveis com a criação de áreas de livre comércio. Nos anos 90, seria a vez da globalização, que em
tese poderia ser muito mais favorável à formação dessas áreas, não fosse seus efeitos desestruturadores e
geradores de instabilidade financeira.
430

GRÁFICO 90 EVOLUÇÃO DA PARTICIPAÇÃO DA BALANÇA COMERCIAL NO PIB (1947-2003)

Participação da balança comercial no PIB


= Série original e tendencial por Lowess smoothing
32%
30%
28%
26%
[(X+M)/PIB].100

24%
22%
20%
18%
16%
14%
12%
10%
1947 1955 1963 1971 1979 1987 1995 2003
1951 1959 1967 1975 1983 1991 1999

FONTE: Dados da FUNCEX, obtidos no IPEADATA.

A observação do Gráfico 90 permite constar-se que após a desvalorização cambial de


1999, a participação da balança comercial brasileira no PIB entrou numa tendência de
expansão (estimada pelo método de regressão local, lowess smoothing, e correspondente à
linha contínua no gráfico). A abertura comercial iniciou-se em 1988, quando foram abolidos
diversos regimes especiais de importação, reduziu-se a redundância de tarifas e unificou-se a
incidência dos impostos sobre importações (GREMAUD et al. 2004). Além disso, foi
promovida uma redução das alíquotas, diminuindo também o tamanho de seu espectro. Mas
seria apenas em inícios dos 90 que a abertura comercial se constituiria numa meta explícita do
governo.

Destaca-se ainda da observação do Gráfico 90, que durante a fase de implementação


do Plano de Metas [1955-1962], a participação da balança comercial no PIB manteve-se no
patamar médio de 12,5% aproximadamente. Este nível é o mais baixo de toda a série
representada no gráfico. Este resultado decorre da lógica da industrialização por substituição
de importações.
431

Segundo MOREIRA (1999)292, a alocação mais eficiente de recursos e os ganhos de


escala são necessariamente dependentes do incremento das importações. Para este autor:

Quaisquer que tenham sido os fatores que influenciaram a velocidade


de crescimento dos coeficientes de importação, é importante reafirmar
que sua elevação era não só esperada como desejada, em face dos
níveis soviéticos de abertura da indústria brasileira ao final dos anos
80. O Caminho em direção a uma alocação mais eficiente dos recursos,
e aos ganhos de escala e especialização a ela associados, passava
inexoravelmente pelo crescimento das importações. O que se pode
argumentar é que esse mesmo caminho também leva à
desindustrialização. No entanto, os níveis atingidos pelos coeficientes
de importação no final do período 19,3% em termos de consumo
aparente e 20,3% em termos de produção -, quando confrontados com
a experiência internacional, não sustentam a hipótese de que isso tenha
ocorrido.

A questão da necessidade da abertura comercial parece estar fora de discussão, à


medida que seu papel como fator básico para a reestruturação industrial e para a obtenção de
maiores níveis de eficiência encontra suporte teórico e empírico abundante. Todavia, não se
pode dizer o mesmo no que concerne às formas possíveis de implementá-la, considerando as
especificidades nacionais e as condicionantes geoeconômicas e geopolíticas.

O problema com relação ao processo de abertura brasileiro refere-se à sua grande


velocidade de implementação e aos fins políticos e econômicos de curto prazo a que serviu no
contexto da preservação da estabilidade de preços da era pós-Real. Uma era marcada pela
submissão do Estado às prerrogativas dos organismos internacionais e ao receituário do
Consenso de Washington. A contrapartida dessa ingerência e subordinação foi a renúncia à
implementação de uma política econômica compatível com o crescimento e seu
redirecionamento para a gestão de caixa da União. Uma era enfim, particularmente notável
como momento de reafirmação da hegemonia do capital bancário-financeiro na economia
brasileira, cujo ponto de partida iniciara-se nos anos 80 com a crise fiscal do Estado.
Conseqüentemente, as análises que ressaltam as virtudes estritamente econômicas ou
contábeis do processo estão, portanto, automaticamente convidadas a explicitarem os reais

292
MOREIRA, M.M. A indústria brasileira nos anos 90. O que já se pode dizer ?. In GIAMBIAGI &
MOREIRA (eds.). Economia Brasileira nos anos 90. Rio de Janeiro: BNDES, 1999.
432

custos econômicos e sociais de uma abertura rápida e não inserida num projeto autêntico de
desenvolvimento.293

O exame dos Gráficos 91 e 92 mostra a existência de três diferentes padrões de


inserção da economia brasileira no regime internacional. Entre 1901-1942, os níveis médios
das importações em valor ou quantum são mais elevados do que os das exportações. Neste
período as estruturas produtivas e de demanda são muito dependentes das divisas geradas pela
base agrário-exportadora. A dinâmica da economia brasileira permanece fortemente
conectada à evolução da demanda externa e o coeficiente de importações é muito elevado, em
razão de uma estrutura industrial ainda incipiente.

Um segundo período corresponde ao intervalo 1945-1965, em que os níveis médios


das exportações e das importações em valor saltam para um patamar superior. Um terceiro
período pode ser observado, a partir de 1967, quando se inicia a fase de crescimento acelerado
do milagre econômico . As taxas médias de crescimento das exportações e importações são
muito mais elevadas do que nos períodos precedentes e parecem ter entrado em uma
tendência de expansão de longo prazo. Isto poderia estar sinalizando que as transformações
estruturais ocorridas desde o milagre teriam criado as condições econômicas para uma
mutação maior da forma de inserção internacional em direção ao um regime de crescimento
extrovertido. Mas a verificação desta hipótese aguardará as análises que serão propostas no
próximo capítulo.

As evoluções dos termos de troca e da capacidade de importar podem ser examinadas


pelo Gráfico 93. A capacidade de importar entrou em uma trajetória de expansão desde a crise
de 1962, o que reforça a hipótese anterior de tendência de extroversão294 do regime de
crescimento. O Gráfico 93 também mostra que houve uma deterioração dos termos de troca
ao logo dos anos 80, mas observa-se uma tendência de recuperação a partir de 1990.

293
Em uma comparação do processo de abertura brasileiro com o da Coréia, LACERDA (2002, p.146), mostra
que uma diferença fundamental refere-se à política cambial. Enquanto o Brasil, desprezando as experiências
anteriores proporcionadas pelos outros países, valorizou sua moeda ao mesmo tempo em que reduzia as alíquotas
de importação e as barreiras não tarifárias, a Coréia desvalorizava sua moeda, criando um mecanismo que,
combinado com as demais políticas, forneceu proteção às empresas locais .
294
A expressão regime de crescimento extrovertido é de fato uma tradução da expressão francesa extraverti .
Com exceção dos trabalhos em Psicologia, em economia o termo não é muito utilizado no Brasil. Mas esta
análise procura manter, na medida do possível, sua conexão direta com a estrutura conceitual regulacionista,
originalmente francesa.
433

GRÁFICO 91 EVOLUÇÃO DAS EXPORTAÇÕES EM VALOR, QUANTUM E PREÇO (1901-2000)

Índice de valor das exportações - IvX


Índice de quantum das exportações - IqX
Índice de preços das exportações- IpX

25000
IvX

7500
5000
2500 IpX

750 IqX
500
250

75
50
1901
1904
1907
1910
1913
1916
1919
1922
1925
1928
1931
1934
1937
1940
1943
1946
1949
1952
1955
1958
1961
1964
1967
1970
1973
1976
1979
1982
1985
1988
1991
1994
1997
2000
FONTE: Estatísticas do Século XX IBGE.
NOTA: Os eixos estão em escala logarítmica.

GRÁFICO 92 - EVOLUÇÃO DAS IMPORTAÇÕES EM VALOR, QUANTUM E PREÇO (1901-2000)

Índice de valor das importações - IvM


Índice de quantum das importações -IqM
Índice de preços das importações - IpM

50000
IvM

IqM
5000

IpM

500
1901
1904
1907
1910
1913
1916
1919
1922
1925
1928
1931
1934
1937
1940
1943
1946
1949
1952
1955
1958
1961
1964
1967
1970
1973
1976
1979
1982
1985
1988
1991
1994
1997
2000

FONTE: Estatísticas do Século XX IBGE.


NOTA: Os eixos estão em escala logarítmica.
434

GRÁFICO 93 TERMOS DE TROCA E CAPACIDADE DE IMPORTAR (1901-2000)

Termos de troca(L) - Índice: 1901=100


Capacidade de importar(R) - Índice: 1901=100
Capacidade de importar = Lowess
170
160 2000
150
140
130
120 1000
900
110 800
700
100 600
500
90 400
80 300
70
200
60

50 100
90
80
70
60
40 50
1901
1904
1907
1910
1913
1916
1919
1922
1925
1928
1931
1934
1937
1940
1943
1946
1949
1952
1955
1958
1961
1964
1967
1970
1973
1976
1979
1982
1985
1988
1991
1994
1997
2000
FONTE: Estatísticas do Século XX IBGE.
NOTA: Os eixos estão em escala logarítmica.

O mesmo se pode dizer do processo de privatização que lhe foi acoplado como peça
do mesmo jogo econômico. Aproveitando de toda a ideologia neoliberal veiculada pela
globalização, as elites econômicas e burocráticas sucatearam rapidamente o modelo de
industrialização substitutiva de importações, decretando-lhe a falência no que tange a sua
lógica e formas de financiamento. Em seguida submeteram a economia nacional às pressões
diretas dos mercados internacionais e denominaram tal processo como pertinente e integrante
de uma verdadeira política industrial mais adequada ao mundo atual. Mas a performance
macroeconômica dos anos 90, e particularmente no período de vigência do Real, não parece
responder adequadamente a esse aumento de eficiência. O debate sobre os ganhos de
produtividade da indústria brasileira em fase de economia aberta295 foi importante para
mostrar que de fato a reestruturação acontecera, incluindo a introdução de inovações técnicas
e organizacionais. Todavia, do ponto de vista macroeconômico, os ganhos de produtividade

295
A década de 90 assistiu a um debate entre vários especialistas acerca das origens e robustez das estatísticas de
ganhos de produtividade na indústria brasileira pós-abertura. Mas uma questão permaneceu pouco enfatizada;
onde foram parar os ganhos de produtividade, quem se apropriou deles, e por que não se converteram em um
novo impulso de acumulação sustentada de capital? Em um recente congresso nacional de economia, um
conceituado especialista em economia industrial fez questão de dizer que seus pares normalmente não se
importam com a macroeconomia, pois as questões realmente relevantes são sempre as microeconômicas.
Estranha colocação que despreza o ambiente global onde operam as estruturas produtivas, sobretudo porque
apesar dos ganhos de produtividade constatados nos anos 90, o PIB, a geração de empregos e demais indicadores
mais correlacionados com as demandas ou carências sociais permaneceram muito aquém das expectativas mais
otimistas.
435

não se converteram em fator de dinamização da economia, nem foram capazes de a colocar


em uma trajetória consistente de acumulação de capital e de crescimento sustentado.

4.5.6 Concentração e internacionalização

Com relação à abertura comercial e as contribuições das firmas nacionais e


estrangeiras para os ganhos de produtividade da indústria de transformação nos anos 90, um
primeiro esforço de pesquisa foi realizado por MOREIRA (1999).296 Este autor encontra uma
correlação positiva e estatisticamente significativa entre o crescimento da produtividade
aparente do trabalho (valor adicionado por pessoal ocupado) e a presença das empresas
estrangeiras. Os resultados para a equação estimada foram os seguintes:

PRL = 0,26 + 0,96.ESTR (24)


(2,5) (3,8) R2 = 0,44

onde PRL é a produtividade aparente do trabalho e ESTR é a


participação dos estrangeiros majoritários na receita operacional líquida
em 1997. Os números entre parênteses são os testes t.

QUADRO 114 ÍNDICES DE CONCENTRAÇÃO DA INDÚSTRIA DE TRANSFORMAÇÃO (1978,


1995, 1997)

Índices de HERFINDAHL Média Mediana Desvio-Padrão Valor Máximo Valor Mínimo


1978 0,16 0,11 0,18 0,95 0,01
1995 0,14 0,09 0,16 1,00 0,01
1997 0,15 0,10 0,15 0,86 0,01

Nº de Firmas Média Mediana Desvio-Padrão Valor Máximo Valor Mínimo


1978 103 59 119 597 2
1995 119 70 134 753 1
1997 108 66 125 731 2

FONTE: MOREIRA (1999); BRAGA E MASCOLO (1983).

A análise do Quadro 114 não indica a ocorrência de grandes alterações no que


concerne à concentração. No entanto, entre 1995 e 1997, período de abertura comercial sob
vigência do Real, o processo de concentração se inicia. MOREIRA (1999) também estima os
índices de concentração em termos de mercado e os resultados apontam para uma redução do
grau de concentração. Os resultados sinalizam também uma inversão da tendência observada

296
MOREIRA, M.M. Estrangeiros em uma economia aberta. In GIAMBIAGI & MOREIRA (eds.). Economia
Brasileira nos anos 90. Rio de Janeiro: BNDES, 1999.
436

durante o regime de substituição de importações quando o padrão era o de setores pouco


concentrados em termos de produção, mas muito em termos de mercados.

TABELA 31 PARTICIPAÇÃO DAS EMPRESAS COM PARTICIPAÇÃO ESTRANGEIRA NA ROL


1980-1995 (%)
Setor por Intensidade de Fator 1980 1995 Variação percentual
Capital 36 54 68
Trabalho 7 19 275
Recursos naturais 32 41 38
Média Geral 28 43 111
FONTE: MOREIRA (1999).
TABELA 32 VARIAÇÕES MÉDIAS NO GRAU DE DESNACIONALIZAÇÃO E CONCENTRAÇÃO
DA INDÚSTRIA DE TRANSFORMAÇÃO 1995-1997 (%)
Setor por Intensidade de Fator Desnacionalização Índice de Herfindahl CR4 CR8
Capital 31,74 16,05 5,25 3,09
Trabalho 31,9 16,14 6,84 4,74
Recursos naturais 30,4 0,34 1,72 2,13
Média Geral 31,59 13,81 5,14 3,36

FONTE: MOREIRA (1999).


NOTA: CR4 e CR5 são as participações, respectivamente, das quatro e das oito maiores empresas no total da
receita operacional líquida (ROL). O indicador de desnacionalização refere-se à participação das empresas
estrangeiras majoritárias na receita operacional líquida.

A média setorial do market share das empresas com participação estrangeira subiu
28% de 1980 para 43% em 1995 (Tabela 31). A busca de modernização e de ganhos de escala
pelas empresas estrangeiras gerou como contrapartida uma perda de participação das
empresas de capital nacional, sobretudo nos setores capital intensivos (Tabela 32). Ocorreu
perda de market share das empresas de capital nacional.

As análises desenvolvidas por ROCHA (2001)297, para o período 1996-2000, revelam


os seguintes fatos estilizados:
Pequena elevação do grau de monopólio;
Elevação na concentração não foi um fenômeno geral na indústria. Há grande
dispersão nas taxas de concentração industrial;
O aumento da produtividade revelou-se uma importante variável explicativa do
aumento da concentração industrial. Há forte correlação entre ambas;
O efeito de fusões e aquisições não parece ser forte como previsto na literatura dos
anos 70 e 80 (HANNAH e KRAY, 1977, 1981)298;

297
ROCHA, Frederico. Os Impactos das Fusões e Aquisições sobre a Concentração Industrial: o caso brasileiro
1996-2000. IE/UFRJ.
437

O aumento da concorrência não parece estar associado com a perda de eficiência


econômica. Os setores que mais se concentraram foram precisamente os que mais
obtiveram ganhos de produtividade. Não se encontram evidências de que tenha
ocorrido diminuição da quantidade produzida nos casos de intensificação da
concorrência.

Os impactos da abertura comercial podem ser apreendidos a partir da mobilização de


um conjunto de indicadores como os índices de penetração das importações, o coeficiente de
importação e de exportação; de mark ups médios setoriais, etc. Esta seção fornece um
conjunto de estatísticas básicas construídas a partir desses indicadores e resume alguns dos
resultados mais relevantes para a presente análise, encontrados por outros pesquisadores sobre
a problemática dos impactos da abertura comercial sobre a estrutura e o desempenho da
economia brasileira.

Dentre os indicadores, quatro foram utilizados por serem de uso mais freqüente na
literatura econômica sobre o tema em questão:

1) Coeficiente de importação = M i

VP i

2) Coeficiente de penetração das importações = M i


.100
(VPi M X) i i

Onde (VPi M X ) é o consumo aparente do setor i;


i i

3) Consumo aparente de máquinas e equipamentos ou absorção doméstica de capital


fixo produtivo = PF int + M X. Corresponde à parcela do fluxo de produção e
importação de máquinas e equipamentos que efetivamente contribui para incrementar
a capacidade produtiva da economia;

4) Coeficiente de exportação = X .100


i

VP i

Os Gráficos 94 e 95 mostram, respectivamente, os coeficientes de importação e de


exportação. Pode-se constatar que, de um modo geral, o coeficiente de penetração das
importações cresceu à taxas bem mais altas do que o coeficiente de exportação, o que resultou
na persistência dos déficits comerciais da primeira fase do Real sob regime de câmbio fixo e
sobrevalorizado. Este comportamento é particularmente notável para o setor metal-mecânico
cujo coeficiente de importação se distanciou muito dos demais setores.

298
Citados por ROCHA (2001).
438

GRÁFICO 94 COEFICIENTES DE PENETRAÇÃO DAS IMPORTAÇÕES POR MACRO-


COMPLEXOS E SETORES (1990-2000) - EM %

Coeficiente de penetração das importações = [ M i / (VP i + M i - Xi)].100


28
26
24
22
20
18
16
14
12
10
8
Construção
6 Metal-mecânica
4 Têxtil
2 Agroindústria
0 Química
1990 1992 1994 1996 1998 2000 Demais
1991 1993 1995 1997 1999

FONTE: Dados da FUNCEX, apud MARKWALD (2001).


NOTA: Séries em dólares de 2000.
GRÁFICO 95 COEFICIENTE DE EXPORTAÇÃO POR MACRO- COMPLEXOS E SETORES (1990-
2000) EM %

Coeficiente de Exportação = [ Xi / VP i].100


30
28
26
24
22
20
18
16
14
12
10
Construção
8 Metal-mecânica
6 Têxtil
4 Agroindústria
2 Química
1990 1992 1994 1996 1998 2000 Demais
1991 1993 1995 1997 1999

FONTE: Dados da FUNCEX, apud MARKWALD (2001).


NOTA: Séries em dólares de 2000. X representa as exportações e VP o valor da produção.
439

Segundo MARKWALD (2001), a elevação do coeficiente de exportação do complexo


têxtil decorreu muito mais de uma contração da produção do que do aumento das exportações
(Gráfico 95). Observa este autor que o setor têxtil e vestuário passou por um processo de
intensa modernização e registrou um aumento expressivo do coeficiente de exportação, mas
essa elevação ocorreu às custas de uma forte contração do valor da produção.

GRÁFICO 96 COEFICIENTE DE IMPORTAÇÃO POR SETOR CONFORME A INTENSIDADE DO


FATOR (1989-1998)

Coeficiente M / VP por intensidade de fator


50
45
40
35
30
em %

25
20
15
10
5 Capital
Força de Trabalho
0 Tecnologia
-5 Recursos Naturais
1989 1991 1993 1995 1997 Total da Indústria
1990 1992 1994 1996 1998

FONTE: Gerado a partir de dados estimados por MOREIRA (1999).


NOTA: M representa as importações e VP é o valor da produção do setor.

O setor intensivo em tecnologia foi o que apresentou maior coeficiente M/VP, seguido
das atividades intensivas em capital (Gráfico 96). O setor cujo coeficiente de importação
apresentou as mais baixas taxas de expansão corresponde às atividades intensivas em recursos
naturais, pois o Brasil possui vantagem comparativa nesta área.
440

GRÁFICO 97 COEFICIENTE DE EXPORTAÇÃO POR SETOR CONFORME A INTENSIDADE DO


FATOR (1989-1998)

Coeficiente X / VP por intensidade de fator


24

22

20

18

16
em %

14

12

10

8 Capital
Força de Trabalho
6
Tecnologia
4 Recursos Naturais
1989 1991 1993 1995 1997 Total da Indústria
1990 1992 1994 1996 1998

FONTE: Gerado a partir dos dados estimados por MOREIRA (1999).

GRÁFICO 98 - COEFICIENTE DE IMPORTAÇÃO / CONSUMO APARENTE: POR SETOR


CONFORME A INTENSIDADE DO FATOR (1989-1998)

Coeficiente M / ConsApar
35

30

25

20
em %

15

10
Capital
5 Força de Trabalho
Tecnologia
0 Recursos Naturais
1989 1991 1993 1995 1997 Total da Indústria
1990 1992 1994 1996 1998

FONTE: Gerado a partir dos dados estimados por MOREIRA (1999).


NOTA: M representa as importações e ConsApar é o consumo aparente.
441

QUADRO 115 GRAU DE ABERTURA: UMA COMPARAÇÃO INTERNACIONAL (1980-1990-2000)

Participação das
Grau de Abertura da Participação das
Países Importações no Mercado
Economia (1) Exportações no PIB
Interno (2)

1980 1990 2000 1980 1990 2000 1980 1990 2000

Alemanha 28,7 30,0 33,2 28,7 32,1 33,0 28,5 36,4 33,4

Argentina 8,0 7,5 11,1 9,0 10,6 10,7 6,7 19,7 10,8

Austrália 17,4 17,1 22,3 13,7 14,8 22,0 17,0 16,3 21,7

Brasil 10,0 6,8 11,1 10,8 5,6 10,5 8,9 7,2 10,6

Canadá 27,4 25,4 42,9 26,9 24,9 42,5 28,3 25,2 45,3

Chile 21,0 32,7 31,7 22,0 32,5 30,7 19,3 37,4 31,8

China n.d. 15,7 24,7 n.d. 18,0 24,0 n.d. 20,1 26,0
Coréia do
37,6 30,1 43,6 38,5 32,0 43,4 33,7 31,6 45,1
Sul
EUA 10,4 10,4 12,9 10,7 11,1 14,2 10,2 9,9 11,0

França 22,1 22,5 28,0 22,5 22,7 27,7 21,5 22,6 28,7

Índia 8,3 8,4 11,9 9,7 9,1 12,4 6,6 7,5 11,2

Indonésia 26,1 26,3 34,6 24,2 25,2 33,1 29,7 25,9 35,0

Itália 21,9 18,8 27,8 23,0 19,6 27,5 19,8 19,2 28,4

Japão 15,3 10,3 10,1 15,6 9,4 9,5 14,9 10,7 10,7

México 13,0 16,1 32,3 13,4 13,5 32,6 12,6 19,7 31,4
Reino
26,1 25,5 28,1 25,6 26,5 28,5 27,2 24,8 27,2
Unido
Rússia n.d. n.d. 34,5 n.d. n.d. 31,5 n.d. n.d. 45,8

Tailândia 27,2 37,7 62,2 28,3 40,8 63,3 24,5 36,8 66,3

FONTE: FMI, apud S.D. SILBER (2003).


NOTA: (1) GAE = [(Exportações + Importações) / 2] / PIB
(2) IMI = [Importações / (PIB + Importações Exportações)]

O Quadro 115 compara o grau de abertura do Brasil com o de um conjunto de países


selecionados da América Latina, Ásia e da OCDE. Comparado à Coréia do Sul (43,6 %) e
Canadá (42,9 %), no ano de 2000, o Brasil mantém-se cerca de três vezes mais fechado que
essas economias. Seu grau de abertura é similar ao da Índia (11,9 %), Japão (10,1 %) e
Argentina (11,1 %), mas próximo do dos EUA (12,9 %). A China, uma economia considerada
fortemente coordenada e controlada pelo Estado, possui um grau de abertura de cerca de
24,7%, o que equivale a mais do dobro do vigente no Brasil (11,1 %), para o ano de 2000.
442

Essas constatações empíricas reforçam a necessidade de se atentar para as


especificidades estruturais da economia brasileira. De um ponto de vista teórico, elas também
validam os princípios de análise regulacionistas que foram precisamente construídos para
proporcionar um tratamento mais adequado das diferenças ou particularidades das economias.
Num movimento inverso ao promovido pela tradição neoclássica dominante, que apreende as
economias nos quadros de tendências comuns e invariantes, a Teoria da Regulação busca
captar-lhes as singularidades históricas, enquanto produto de macro-regularidades não
dedutíveis de um modelo puramente econômico de equilíbrio geral.

4.5.7 Comportamento dos mark ups setoriais e mudanças estruturais na indústria


No que concerne às estruturas de produção ou de geração de valor, a produtividade
aparente do trabalho (valor adicionado por pessoal ocupado), torna-se uma medida relevante
porque permite transformar o conceito de produtividade do trabalho, de uma relação apenas
técnica de produção, em uma relação social e histórica (CARDOSO Jr., 2000).

QUADRO 116 METODOLOGIAS PARA ESTIMATIVA DOS MARK UPS SETORIAIS

Mensuração dos mark up Formulação


setoriais

MKi = VPi / (CIi + Mi + Wi), onde MKi é uma proxy


para mark up médio do setor i; VPi é o valor da
Pereira e Carvalho (1998) produção; CI é o consumo intermediário; Mi são as
importações totais realizadas pelo setor i; e W o total
de salários mais contribuições sociais.
n

p 1 j a p
ij
, onde pj é o preço final do
j i
i
Moreira (1999) produto e pi o preço do insumo i construídos a partir
do IPA-OG; j é o mark up; aij é o coeficiente técnico
de produção.

MK = VP / (Rn + CI); onde MK é o mark up; VP é o


Cardoso Jr. (2000)
valor da produção; Rn é o somatório dos salários e
contribuições sociais e CI é o consumo intermediário.

Esta seção recorre às estimativas de mark up setoriais realizadas por PEREIRA e


CARVALHO (1998), MOREIRA (1999) e CARDOSO Jr. (2000), a partir das matrizes de
insumo-produto do IBGE. O Quadro 116 resume as formulações utilizadas por esses autores
para o cálculo dos mark ups.
443

Quanto às estruturas de apropriação do excedente, é o conceito de mark up que surge


como mais adequado quando as formas da concorrência são organizadas,
preponderantemente, em mercados oligopolizados. Em termos teóricos regulacionistas, o
mark up pode ser apreendido como um resultado da partilha distributiva entre capital e
trabalho, através das configurações da wage-labor nexus (WLN). Mas enquanto as margens de
lucro fixadas pelos setores oligopolistas derivam de suas estratégias de formação de preços, os
salários surgem como um resultado do conflito distributivo no sistema de relações salariais. E
como as atuais condições estruturais e macroeconômicas mostram-se amplamente favoráveis
ao capital, os salários vem perdendo participação no valor adicionado total da economia. Mas
em que medida essa reconcentração funcional da renda que caracterizou a década de 80, se
converte num fator de bloqueio da taxa de acumulação de capital, é uma questão a ser
investigada no plano dos regimes de produtividade e de demanda.299

Segundo FRENKEL (1979), citado por CARDOSO Jr. (2000), a natureza altamente
instável do quadro macroeconômico latino-americano tendia a alterar a lógica da formação de
preços dos agentes privados, no sentido de flexibilizarem seus mark ups para cima, na
tentativa de defender a rentabilidade dos capitais investidos. Isto significa que no caso da
economia brasileira dos anos 80, com economia fechada e sob alta inflação, as firmas
possuíam um viés altista no processo de determinação dos seus preços.

O Gráfico 99 mostra que exatamente após o fim da momentânea estabilidade de


preços produzida pelo Plano Cruzado em 1986, os mark ups médios da indústria sobem
juntamente com a inflação, até 1993. A partir de 1994 as duas séries caem drasticamente,
tanto pela redução rápida da inflação quanto pela intensificação da concorrência externa que a
sobrevalorização cambial aliada a um processo de redução tarifária promoverão até 1998. A
abertura comercial e a liberalização financeira imporão um limite superior aos mark ups
setoriais, no período 1990-1993, embora a tendência mantenha-se de elevação. Quando a
estabilização de preços faz retornar a dimensão estratégica ao cálculo de formação de preços
das firmas líderes, as margens de lucro serão novamente pressionadas para baixo.

299
As análises regulacionistas freqüentemente partem dos insigths de KALECKI (1976) no que concerne à
abordagem em termos de mark up.
444

GRÁFICO 99 MARK UP MÉDIO DA INDÚSTRIA E INFLAÇÃO (1985-1996)

Inflação_ (L)
Mark up médio da indústria_ (R)

2500% 1,34
1,32

750% 1,30
500% 1,28
250% 1,26
1,24
75%
50% 1,22

25% 1,20

1,18
8% 1,16
1985 1987 1989 1991 1993 1995
1986 1988 1990 1992 1994 1996

FONTE: Estimativas de mark ups setoriais de PEREIRA e CARVALHO (1998) e inflação pela variação anual
do IGP-DI.
NOTA: Os eixos estão em escala logaritimica.

Os parâmetros que balizam as decisões privadas de determinação dos mark ups


desejados foram transformados pelo processo de abertura e pela estabilidade de preços obtida
com o Plano Real (PEREIRA e CARVALHO, 1998). Mas sob alta inflação, vigente até 1994,
os mark ups foram em geral inflados, como resposta defensiva a um ambiente
macroeconômico que se deteriorava. Este resultado foi também encontrado por CARDOSO
Jr. (2000). Todavia, após 1994, período de abertura sob vigência do Real, os resultados são
diferentes. Enquanto pela primeira metodologia ocorre queda dos mark ups setoriais médios,
pela segunda metodologia observa-se apenas uma desaceleração das taxas de crescimento. A
terceira fonte para esses dados foi obtida em MOREIRA (1999b) que estima os mark ups para
38 atividades, incluindo seu comportamento segundo a intensidade de fator. O resultado
encontrado por este autor confirma o encontrado por (PEREIRA e CARVALHO) no que
concerne às reduções dos mark ups setoriais no período pós-1994.300

300
O.T.C. GUILLÉN (2003), em Ensaios em Macroeconomia e Finanças tese de doutoramento, EPGE,
estima os mark ups setoriais e conclui pela ausência de evidências estatísticas de reduções das margens de lucro.
O autor argumenta que os setores não concorrenciais sob economia fechada ao comércio exterior continuaram
sendo após a abertura. GILLEN e FERREIRA (2001) concluem que não há indicação estatisticamente
significativa de queda do poder de mercado após a abertura econômica.
445

QUADRO 117 MARK UPS SETORIAIS MÉDIOS (1985-1996)

MARK UPs SETORIAIS MÉDIOS

Agropecuária Indústria Serviços Total


Índice Taxa Índice Taxa Índice Taxa Índice Taxa
1985 105,9 99,4 105,1 101,3
1990 100,0 -5,5 100,0 0,6 100,0 -4,9 100,0 -1,3
1991 101,7 1,7 101,2 1,2 106,3 6,3 103,6 3,6
1992 97,1 -4,5 103,7 2,5 110,6 4,1 106,7 3,0
1993 95,7 -1,5 107,7 3,9 111,7 0,9 109,4 2,5
1994 112,3 17,3 108,5 0,8 100,8 -9,7 105,8 -3,3
1995 115,3 2,7 109,5 0,9 99,1 -1,7 105,6 -0,2
1996 109,6 -4,9 110,7 1,1 99,8 0,7 106,1 0,5
Taxa Média 1,0
Anual 1,8 1,7 0,1

FONTE: J.C. CARDOSO Jr. (2000).

QUADRO 118 VARIAÇÃO MÉDIA DO MARK UP, PREÇO E CUSTOS REAIS POR SETOR
CONFORME A INTENSIDADE DO FATOR (1990-1998)
SETOR
CONFORME Mark-up (Preço / IGP) (Custo / IGP)
INTENSIDADE
DO FATOR 90/95 95/98 90/98 90/95 95/98 90/98 90/95 95/98 90/98
Capital -23,2 -7,1 -28,8 -38,4 -10,6 -44,9 -19,1 -3,5 -21,8
Trabalho -27,5 -7,5 -33,6 -42,7 -10,9 -49,2 -18,1 -5,0 -22,1
Tecnologia -22,7 -6,8 -26,3 -36,6 -13,9 -43,5 -19,6 -7,7 -25,6
Recursos Naturais -12,7 -0,2 -11,5 -26,3 -1,4 -25,7 -14,7 -1,4 -15,7
Total da Indústria -21,1 -5,3 -24,3 -35,0 -9,6 -40,0 -17,9 -4,7 -21,5

FONTE: Elaborado a partir dos dados estimados por MOREIRA (1999), com base nas matrizes de insumo-
produto do IBGE e do IPA-FGV.
NOTA: Valores em percentagem.

Em trabalho recente, C. GARCIA (2004)301, utilizando a metodologia da UNIDO


(1997)302 avaliou as mudanças estruturais na indústria de transformação brasileira.
Basicamente o método de avaliação é formulado como segue:

1
ME i
2 m i t m i t n

301
GARCIA, Carmem (2004). A Configuração da indústria Brasileira no Período 1985-2000 . IX Encontro
Nacional de Economia Política / SEP. Uberlândia, junho de 2004.
302
United Nations Industrial Development Organization UNIDO (1997).
446

ME é o índice de mudança estrutural; mi é a participação do valor adicionado da


atividade i no total do valor adicionado da indústria. Quanto maior for ME, maior será a
mudança na estrutura da indústria. A análise utiliza ainda a taxionomia da OCDE (1988 e
1998) que considera a indústria composta por cinco categorias: indústrias intensivas em
recursos naturais; intensivas em trabalho; produção diferenciada; produção em escala e
baseadas em ciências.

Um dos objetivos da autora é a obtenção de evidências empíricas que permitam testar


a validade de duas teses antagônicas sobre o desempenho da indústria brasileira nos anos 90.
A primeira interpretação, denominada tese da reintegração produtiva corresponde à visão
oficial característica da era FHC. Seu argumento básico consistia na afirmação de que a
abertura econômica levaria necessariamente à modernização e ao aumento da capacidade
produtiva da indústria. O crescimento econômico seria então um resultado direto da
emergência, após as transformações impostas pela abertura, de um parque industrial mais
dinâmico e especializado.

A segunda interpretação corresponde à tese da especialização regressiva e se trata de


uma visão crítica, pois não apreende o conjunto de transformações estruturais dos anos 90
como necessariamente geradores de características positivas.

QUADRO 119 ÍNDICE DE MUDANÇA ESTRUTURAL NA INDÚSTRIA BRASILEIRA (1985-1998)

AVALIAÇÃO DA MUDANÇA Períodos de Referência dos Cálculos


ESTRUTURAL

Variável
Base de Nº de 90-98 90-98 89-96 89-98 85-96 85-98
de
Dados Atividades
Cálculo

SCN 28 VP 0,92 8,23

Haguenauer 37 VP 0,56 _ 13,28 _ 17,52

Moreira 49 VP 17,16 18,6 19,14 22,17 _

Censo
Industrial - 95 VTI 21,34 39,0
PIA
FONTE: Carmen Garcia (2004, p.9).
NOTA: VP e VTI são, respectivamente, o valor da produção e os valor da transformação industrial. SCN é a
sigla convencional para Sistema de Contas Nacionais.
447

Um argumento básico dessa visão refere-se à afirmação de que o ambiente


macroeconômico sob vigência do Real fora marcado por taxas reais de juros extremamente
elevadas combinadas com um câmbio sobrevalorizado. Nessas condições, a tendência
predominante seria à de estagnação ou de crescimento lento, com eliminação desnecessária de
empregos e queda da renda, pois a capacidade produtiva não se ampliaria.

O Quadro 119, elaborado por GARCIA (2004), resume os resultados encontrados em


quatro análises das mudanças estruturais da indústria brasileira nos anos 90. O Quadro 6 reúne
os indicadores agregados conforme os fatores de especialização competitiva.

QUADRO 120 ESTRUTURA INDUSTRIAL BRASILEIRA( 1985, 1998, 2000)

VALOR DA TRANSFORMAÇÃO
INDÚSTRIAS SEGUNDO INDUSTRIAL (VTI) - % do total da
OS FATORES DE
ESPECIALIZAÇÃO indústria de transformação
COMPETITIVA
1985 1998 2000

Produção em Escala 33,3 35,2 35,7

Intensivas em Recursos Naturais 30,0 32,6 31,4

Intensivas em Trabalho 19,0 13,5 10,8

Produção Diferenciada 12,1 11,0 7,7

Baseada em Ciências 5,6 7,8 14,4

FONTE: Carmen Garcia (2004, p.12), a partir de dados do Censo Industrial 1985-PIA 1998.
NOTA: Indicadores agregados segundo os fatores de especialização competitiva.

A observação do Quadro 120 permite a constatação de que predominam na estrutura


industrial brasileira, as indústrias intensivas em escala e em recursos naturais ( 67% do VTI
total em 2000). Houve um aumento importante da participação das atividades baseadas em
ciências. Mas uma análise desagregada realizada por GARCIA, mostrou que esse resultado
decorre da expansão da indústria farmacêutica de 30 para 66%, enquanto, no mesmo período,
a participação das indústrias de informática e eletrônica caiu para mais da metade de suas
posições em 1985. Esses resultados tenderiam, segundo a autora, a corroborar a tese da
especialização competitiva. Isto significa que as transformações da indústria brasileira
caminharam no sentido de uma ampliação das indústrias intensivas em recursos naturais e em
escala. Os setores tecnologicamente mais sofisticados como a eletrônica e as demais
448

atividades ligadas às novas tecnologias da informação e da comunicação, perderam espaço.


Este resultado revela também a fragilidade ou o caráter incompleto do sistema nacional de
inovações brasileiro e provavelmente a influência da internacionalização das plantas
industriais brasileiras.

4.5.8 A dimensão financeira

Os fluxos financeiros constituem a segunda dimensão básica da forma institucional de


inserção no regime internacional, uma dimensão que foi extremamente potencializada pelo
processo de globalização, sem que houvesse preocupações maiores sobre seus efeitos
desestabilizadores da dinâmica da acumulação de capital. Evidentemente, as formas da
concorrência na economia brasileira, caracterizada por elevado grau de concentração e de
internacionalização, haveriam de responder aos impactos dos novos capitais estrangeiros em
busca de oportunidades de valorização.

Para CARNEIRO (2002, p. 265)303, a liberalização financeira envolve três dimensões


principais:

i. a ampliação da conversibilidade da conta de capital do balanço de pagamentos


refere-se as normas de conversão da moeda estrangeira em moeda doméstica
para fins de investimento e empréstimo. As mutações neste canal da FII
significou o aprofundamento dos fluxos de entradas e saídas de capitais de não
residentes e residentes, ou seja, o aumento do grau de mobilidade dos capitais;

ii. a desnacionalização de parcela expressiva do setor financeiro brasileiro que


envolve mudanças de controle da propriedade das instituições financeiras,
permitidas por alterações permanentes ou ad hoc na legislação;

iii. a substituição monetária refere-se ao uso de moedas estrangeiras em funções


que deveriam, em princípio, ser realizadas pela moeda nacional. Esta terceira
dimensão é na realidade uma conseqüência da combinação das outras duas
anteriores. Ao ampliar-se a posse de ativos no exterior por parte de não
residentes, a substituição da moeda nacional ocorre através das operações de
hedge, arbitragem, ou especulação dos agentes com uma moeda estrangeira. Em
outros termos a moeda nacional deixa de ser a representação da totalidade dos

303
CARNEIRO, R. (2002). Desenvolvimento em Crise a economia brasileira no último quarto do século XX.
Unesp. 2002.
449

estoques de riqueza e dos fluxos de renda gerados nas atividades produtivas


internas, em favor da moeda estrangeira mais forte.

Em uma perspectiva em termos de regulação, deve-se reconhecer que essas três


dimensões dependem das particularidades do regime monetário-financeiro vigente e, como
tal, trata-se de uma construção histórica e institucional. Isto significa que não existem
configurações a priori ótimas a serem adotadas por uma determinada economia. Muita
mobilidade de capital pode ser suportável por uma economia madura e desenvolvida, mas
pode ser um empecilho para a macrodinâmica da acumulação de capital se se trata de uma
economia ainda em desenvolvimento, caracterizada por um elevado grau de vulnerabilidade
externa e fragilidade financeira. CARNEIRO observa que:

Em razão das considerações já tecidas, admite-se como hipótese, para o caso


brasileiro país no qual circula uma moeda nacional não conversível, - que a
abertura financeira, nas suas várias dimensões, conduz necessariamente ao
enfraquecimento da moeda nacional, expresso em um grau significativo de
substituição monetária .

Uma conseqüência direta desta problemática pode ser a perda da autonomia da política
monetária, tornando-a impotente para administrar os fluxos de capitais ou administrar os
agregados monetários em uma trajetória compatível com a dinâmica da acumulação, se o
objetivo da política econômica for o crescimento e o desenvolvimento econômico.

No que concerne às mudanças institucionais que aprofundaram a mobilidade dos


capitais, o governo empreendeu uma redução progressiva das alíquotas do imposto sobre
operações financeiras (IOF), a partir da crise asiática em 1997, equiparando o tratamento entre
residentes e não residentes. Com isso absteve-se de influir no direcionamento e no prazo de
permanência de uma modalidade de capital caracterizada por sua elevada volatilidade e
reversibilidade. Esses capitais são compostos por recursos provenientes de bancos (47 %),
outras instituições financeiras e fundos de investimentos (32 %). A participação dos fundos de
pensão é normalmente reduzida (1,5 %).304

Os Gráficos 100 e 101 mostram o comportamento dos investimentos em carteira305,


onde se pode constatar o incremento dos níveis dos saldos, a partir de 1990.

304
Dados apresentados por CARNEIRO (2002), provenientes de PRATES & FREITAS (1999).
305
Os investimento em carteira ou em portfólio são destinados à aplicações, basicamente de curto prazo, em
ações e no mercado financeiro. Neste último caso, tratam-se de títulos de renda fixa, debêntures, derivativos, etc.
450

GRÁFICO 100 INVESTIMENTOS ESTRANGEIROS EM CARTEIRA (1970-2004)

Saldos positivos em milhões de US$ (L)


Saldos negativos em milhões de US$ (R)

50.000
5.000

5.000

500
500

50
50
5

1 5
1970 T1
1971 T3
1973 T1
1974 T3
1976 T1
1977 T3
1979 T1
1980 T3
1982 T1
1983 T3
1985 T1
1986 T3
1988 T1
1989 T3
1991 T1
1992 T3
1994 T1
1995 T3
1997 T1
1998 T3
2000 T1
2001 T3
2003 T1
2004 T3
FONTE: Séries originárias do BACEN, obtidas no IPEADATA.
NOTA: Os dados referem-se aos investimentos em ações e renda fixa. Os eixos do Gráfico estão em escala
logarítmica.

GRÁFICO 101 - INVESTIMENTOS BRASILEIROS EM CARTEIRA (1970-2004)

Saldos positivos em milhões de US$ (L)


Saldos negativos em milhões de US$ (R)
5.000

500
500

50
50

5 5

1 1

0
1973 T1
1973 T4
1974 T3
1975 T2
1976 T1
1976 T4
1977 T3
1978 T2
1979 T1
1979 T4
1980 T3
1981 T2
1982 T1
1982 T4
1983 T4
1984 T3
1985 T2
1988 T1
1989 T2
1991 T4
1993 T2
1994 T1
1994 T4
1995 T3
1996 T2
1997 T1
1997 T4
1998 T3
1999 T2
2000 T1
2000 T4
2001 T3
2002 T2
2003 T1
2003 T4
2004 T3

FONTE: Séries originárias do BACEN, obtidas no IPEADATA.


NOTA: Os dados referem-se aos investimentos em ações e renda fixa. Os eixos do Gráfico estão em escala
logarítmica.
451

No que concerne às aplicações estrangeiras em carteira ( investimentos em carteira),


os níveis dos saldos observados a partir da liberalização financeira, mas sobretudo a partir da
vigência do Real, são historicamente sem precedentes. As cifras atingem o patamar médio de
5 bilhões de dólares no trimestre, isto significa praticamente 100 vezes a média vigente nos
anos 70. A década de 80 foi marcada por saldos negativos em razão tanto dos dispositivos de
controle de capitais quanto das dificuldades macroeconômicas da época. Os saldos voltam a
ficar momentaneamente negativos a partir do segundo trimestre de 2001, quando o capital
financeiro passou a especular sobre o futuro da economia brasileira sob um governo
teoricamente de oposição à liberalização radical dos fluxos de capitais. Mas como o governo
respondeu segundo a mesma lógica do governo anterior, ou seja, aumentando as taxas básicas
de juros SELIC em 2002 e em 2003, os capitais retornaram e os saldos passaram a ser
novamente positivos. O governo foi então muito elogiado pela mídia e pelo mercado
bancário-financeiro por ter implementado uma política tão sábia de preservação dos
fundamentos econômicos do país. Fundamentos que desprezam o fato lógico de que não pode
haver estabilidade macroeconômica durável se a rentabilidade financeira não se conecta
com os setores diretamente produtivos de forma a contribuir efetivamente com a expansão da
taxa de acumulação de capital.

No segundo e terceiro trimestres de 2004, os saldos são negativos, mas este


comportamento integra os comportamentos especulativos de curto prazo não sendo,
necessariamente, um sinal de que os agentes estejam apostando em uma mudança de regras
com relação ao funcionamento do mercado financeiro brasileiro. E a razão principal é que o
atual e novo governo optou pela governabilidade, pressupondo que esta condição política
depende, fundamentalmente, da reprodução da lógica de um modelo econômico.

No que tange aos investimentos diretos estrangeiros (IDE), as análises para a década
de 90 mostram que o processo de privatizações respondeu por grande parte dos incentivos
para o ingresso dessa modalidade de capital no país (Tabela 33). Foram privatizados os
setores industriais de siderurgia e petroquímica, entre 1992 e 1994. Após 1995, o governo
privatizou os serviços de utilidade pública, como telecomunicações e energia elétrica. No
âmbito do setor bancário-financeiro, privatizou também os bancos públicos estaduais, abrindo
o mercado financeiro ao capital bancário estrangeiro.
452

TABELA 33 INVESTIMENTO DIRETO ESTRANGEIRO (1992-2000)

US$ Bilhões
1992 1993 1994 1995 1996 1997 1998 1999 2000
IDE Bruto 1,3 0,9 2,4 5,5 10,5 18,7 28,5 31,4 33,6
(-) Retornos 0,2 0,6 0,6 1,2 0,5 1,7 2,6 1,4 2,9
IDE Líquido 1,1 0,3 1,8 4,3 10,0 17,0 25,9 30,0 30,6
(-) Conversão e Reinvestimento -0,1 -0,1 -0,1 1,4 0,8 0,7 1,9 4,3 1,2
IDE c/ Aporte cambial 1,2 0,4 1,9 2,9 9,2 16,3 24,0 25,7 29,4
Remessa de Lucros e Dividendos -0,6 -1,8 -2,5 -2,6 -2,4 -5,6 -7,2 -4,0 -3,2

FONTE: Banco Central do Brasil, apud CARNEIRO (2002).

GRÁFICO 102 INVESTIMENTO DIRETO ESTRANGEIRO E REMESSAS DE LUCROS E


DIVIDENDOS (1992-2000)

IDE Bruto
IDE Líquido
IDE c/ Aporte cambial
( - ) Remessas de Lucros e Dividendos

30,0
US$ Bilhões - Escla log

10,0
8,0
6,0
4,0

2,0

0,9
0,7
0,5
0,3

1992 1993 1994 1995 1996 1997 1998 1999 2000

FONTE: Dados da Tabela 33.

Os investimentos em Fusões e Aquisições tiveram uma participação média de 65 % do


total de IDE no período 1994-2000, conforme dados do Banco Central do Brasil. Além disso,
segundo o Censo de Capital estrangeiro desta instituição, 68 % do IDE para o ano de 1999 se
destinaram ao setor serviços, um produtor de bens não comercializáveis com o exterior (non-
tradables) e apenas 30% foram alocados para a indústria. O ingresso dessa modalidade de
capital manteve-se em expansão a partir de 1994, mas à taxas decrescentes, conforme pode
ser constatado pelo exame do Gráfico 102. Isto poderia ser considerado um indício de queda
da atratividade dos IDE pela economia brasileira, pois o fator básico para o ingresso fora as
453

privatizações. Com o término desse processo somado às perspectivas incertas de retorno a


uma trajetória de crescimento de longo prazo, a reversão haveria de acontecer.

Uma das implicações diretas da abertura financeira foi a elevação rápida do passivo
externo líquido (PEL) da economia brasileira. O PEL corresponde à soma da dívida externa
líquida (dívida bruta subtraídas as reservas em moeda estrangeira) com o estoque de capital
estrangeiro (incluindo o estoque em portfólio) líquido do estoque de capital brasileiro no
exterior. Conforme LACERDA (2001):306

Nosso passivo externo líquido PEL vem crescendo significativamente nos


últimos anos, refletindo o aumento do grau de internacionalização de nossa
economia. O PEL representa atualmente cerca de 70,0% do PIB e mais de sete
vezes nossas exportações anuais. Este passivo externo demanda remuneração
representada pelas remessas de juros, lucros e dividendos que é refletida na
conta de serviços do balanço de pagamentos. No ano passado o resultado
dessa conta, que também registra despesas de fretes e seguros, viagens
internacionais e outros, representou déficit superior a US$25 bilhões.

TABELA 34 PASSIVOS E INDICADORES EXTERNOS DA ECONOMIA BRASILEIRA (1900-2000)


US$ Bilhões

1992 1993 1994 1995 1996 1997 1998 1999 2000


Dívida Externa
Longo prazo 110,8 114,3 119,7 129,3 142,1 163,3 220,0 214,1 206,2
Curto prazo 25,1 31,5 28,6 30,0 37,8 36,7 23,1 27,4 30,0
IDE 60,2 62,2 65,9 72,7 85,9 106,4 132,3 164,1 197,7
Invest. Portfólio 0,0 0,0 10,4 25,2 41,2 53,3 40,8 50,5 46,3
Passivo Externo Bruto 196,5 208,0 224,6 257,2 307,0 359,7 416,2 456,1 480,2

Reservas Internacionais 23,8 32,2 38,8 51,8 60,1 52,2 44,5 36,3 33,0
Ivestimentos brasileiros no exterior 3,7 3,8 4,1 4,3 4,2 5,8 9,2 9,4 12,4
Créditos brasileiros ao exterior 6,7 6,4 6,3 6,1 7,6 7,3 12,0 6,7 6,8
Haveres externos dos bancos comerciais 5,8 8,4 15,0 8,9 11,7 9,6 7,4 7,5 6,0
Ativos externos 40,0 50,1 64,2 71,1 83,6 74,9 73,1 59,9 58,2
Passivo Externo Líquido 156,1 157,2 160,4 186,1 223,4 284,8 343,1 396,2 422,0

PIB em US$ 387,3 429,7 543,1 705,4 775,4 804,1 834,0 555,2 595,9
Lucros e dividendos(líquido) 0,5 1,9 2,5 2,6 2,3 5,6 7,2 4,0 3,3
Juros (LÍquido) 7,3 8,3 6,3 8,1 9,2 10,4 12,0 15,1 14,6
Custo líquido do Passivo Externo 7,8 10,2 8,8 10,7 11,5 16,0 19,2 19,1 18,4
Exportações 35,9 38,6 43,5 46,5 47,7 53,0 51,1 48,0 55,1

Variação do PEB (%) n.d. 6,1 8,0 14,5 19,4 17,2 15,7 6,4 3,9
Variação do PEL (%) n.d. 0,7 2,0 16,0 20,0 27,5 20,5 9,4 6,5
Passivo Externo Bruto / PIB (%) 50,6 48,4 41,4 36,5 39,6 44,7 49,9 79,7 88,4
Passivo Externo Líquido / PIB (%) 40,3 36,6 29,5 26,4 28,8 35,4 41,1 67,6 70,8
PEB curto prazo / PEB total (%) 12,8 15,1 17,4 21,5 25,7 25,0 15,4 15,3 15,9
PEB longo prazo / PEB total (%) 87,2 84,9 82,6 78,5 74,3 75,0 84,6 84,7 84,1
PEB curto prazo /reservas (%) 105,5 97,8 100,5 106,6 131,4 172,4 143,6 161,0 231,2
Custo líquido /PIB (%) 2,0 24,0 1,6 1,5 1,5 2,0 2,3 3,4 3,1
Custo líquido/ Exportações (%) 21,7 26,4 20,2 23,0 24,1 30,2 37,6 39,8 33,4

FONTE: Banco Central do Brasil, Sobeet, Anbid, apud CARNEIRO (2002).

306
LACERDA, A.C. O Aumento do Déficit Externo. SOBEET/SIEGEP 2001.
454

A Tabela 34 mostra a evolução do Passivo Externo e de outros indicadores externos da


economia brasileira para o período 1992-2000.

Um dos resultados diretos da liberalização financeira foi o rápido crescimento do


passivo externo. Este fato tem conseqüências macroeconômicas fundamentais, pois a
magnitude do passivo externo e sua composição respondem pelo elevado grau de
vulnerabilidade externa da economia brasileira atual. As dimensões da vulnerabilidade
referem-se tanto aos estoques quanto aos fluxos. Em termos de estoques observa-se a elevada
participação do passivo de curto prazo no total e às amortizações não programadas da dívida
externa de longo prazo.

Como a relação passivo de curto prazo/ reservas internacionais aumentou muito nos
anos 90, passando de 105,5% em 1992 para 231,2% em 2000, a capacidade da economia
brasileira de resistir a um novo ataque especulativo foi muito reduzida. Conforme
CARNEIRO (2002), a pressão sobre as reservas pode ser ainda maior se forem computadas as
amortizações não programadas e o passivo interno público dolarizado, ou seja, a dívida com
correção cambial. Outro problema observado por este autor refere-se à rolagem dos estoques
que implica no refinanciamento das amortizações da dívida de longo prazo em títulos, o que
pode provocar novas pressões sobre a taxa de câmbio.

Quanto aos desequilíbrios de fluxos, observa-se que a relação custo líquido do passivo
/PIB vem assumindo valores crescentes desde 1997. Isto significa que a desvalorização
cambial de 1999 teria agravado o problema ao situar a transferências de recursos líquido no
patamar de 3% do PIB.307 Por sua vez, o custo líquido /exportações é crescente desde 1995,
atingindo cerca de 40% em 1999. Como observa CARNEIRO:

Ao longo da década (de 1990), o aumento desse indicador traduz uma


taxa implícita de remuneração do passivo líquido, superior à taxa de
crescimento das exportações. A implicação mais relevante desse fato é
a rigidez da conta de transações correntes, na qual o peso da
remuneração de capitais é crescente. Ou seja, com o custo do passivo
absorvendo uma parcela crescente das exportações, diminui
proporcionalmente o espaço para importações de bens e serviços e,
portanto, para o crescimento doméstico.

307
Para CARNEIRO (2000), este é um valor muito elevado quando comparado com outros períodos históricos e
expressa tanto o nível mais elevado da taxa de juros quanto as novas exigências de remuneração do IDE.
455

GRÁFICO 103 INFLAÇÃO E TAXA BÁSICA DE JUROS DO GOVERNO (1994-2004)

Taxa de inflação anual pelo IGP-DI


Taxa SELIC nominal anualizada
80%

70%

60%

50%

40%

30%

20%

10%

0%
1994 1995 1996 1997 1998 1999 2000 2001 2002 2003 2004

FONTE: Séries originárias do BACEN, obtidas no IPEADATA.


NOTA: Séries anuais calculadas a partir das séries mensais.
No Gráfico 103 encontram-se a evolução da taxa SELIC nominal e da taxa de inflação
medida pelo IGP-DI. Há dois picos da inflação; o primeiro devido ao ataque especulativo que
levou à desvalorização cambial, em 1999. O segundo é observado em 2002 quando
novamente a vulnerabilidade financeira e a fragilidade do modelo econômico vigente
permitiram novo ataque especulativo contra os supostos e suspeitos fundamentos
econômicos do Brasil. A taxa de inflação retorna ao nível próximo de 10% ao ano em 2003,
permitindo que o governo, para não asfixiar mais a economia, reduzisse a taxa nominal
SELIC para a média anual de 16%, em 2004.308 Mas uma questão relevante é que o patamar
em que se encontra a taxa básica de juros da economia tem servido muito mais para garantir o
fluxo líquido de capital externo e a rentabilidade real dos aplicadores em títulos da dívida
pública do que propriamente uma medida efetiva de convergência para as metas de inflação.

Em outros termos, os efeitos dos aumentos das taxas de juros sobre a evolução de uma
inflação inercializada em 10% é de fato altamente questionável e não encontra base empírica,
sobretudo se forem considerados os níveis atuais de demanda efetiva da economia e os ganhos
de produtividade que a indústria alcançou nos últimos anos. Conseqüentemente, a análise da

308
Segundo BRESSER-PEREIRA (2004, p.298), a taxa de inflação tendeu a estabilizar-se em um patamar
inercial muito baixo nos quatro primeiros anos (do Real). Com a flutuação cambial de 1999, a inflação acelerou,
embora muito menos do que se temia, e acabou se inercializando em torno de 6%. Com a depreciação cambial de
2002, tudo indica que o patamar da inflação brasileira passou para cerca de 10% .
456

política econômica do período pós-Real sugere que o combate a inflação tem sido mobilizado
pelas autoridades monetárias como justificativa para proceder a aumentos de juros sempre que
o patamar de rentabilidade real exigido pelos mercados financeiros for considerado ameaçado,
seja pela própria inflação, seja por uma reversão de expectativas quanto aos fundamentos da
economia brasileira.

GRÁFICO 104 EVOLUÇÃO DAS RESERVAS INTERNACIONAIS E INDICADORES


FINANCEIROS (1956-2003)

Reservas internacionais (L)


M1/M0(R)
Fase D
(M2-PMPP)/M0(R)
9,0
8,0
7500 Fase C 7,0
6,0
Fase B 5,0
2500
Índice: 1956 = 100

4,0
3,0
Fase A
500
2,0

75
1,0

25
1956
1958
1960
1962
1964
1966
1968
1970
1972
1974
1976
1978
1980
1982
1984
1986
1988
1990
1992
1994
1996
1998
2000
2002
FONTE: Dados do BACEN obtidos no IPEADATA.
NOTA: M0 é a base monetária; PMPP é a quantidade de papel-moeda em poder do público; M1 e M2 são os
agregados monetários convencionais.
A observação do Gráfico 104 permite a identificação de comportamentos contrastados
ou fases do regime monetário-financeiro, resultantes das alterações na configuração da forma
de inserção internacional da economia brasileira. Essas mutações poderiam ter sido
analisadas na seção anterior sobre o RMF, mas implicariam por sua vez, o exame das
configurações da FII. Utilizou-se a diferença (M2 PMPP) que representa o estoque de
recursos financeiros que o público mantém sob guarda no sistema bancário financeiro. A
relação (M1 / M0) representa o multiplicador monetário tradicional. Destaca-se o fato de que
no intervalo 1956-1966, Fase A, essas relações mantêm-se relativamente estáveis como
proporção da base monetária M0, enquanto as reservas internacionais declinam
tendencialmente. As análises históricas mostram que nesta fase, que corresponde aos anos de
implementação do Plano de Metas, o Estado brasileiro recorreu também a políticas monetárias
expansionistas para financiar os investimentos produtivos.
457

A partir de 1968, inicia-se a Fase B, onde as reservas internacionais entram em uma


trajetória de expansão acelerada, porque os capitais externos são canalizados para financiar os
investimentos do milagre .

Com o término do crescimento acelerado dos anos 70, inaugura-se a Fase C, [1980-
1992], de crescimento tendencial das reservas internacionais. Mas desta vez para a rolagem da
dívida pública, segundo a lógica da ciranda financeira característica da década de 80, como
revela o indicador (M2-PMPP)/M0. Aliás, é a partir de 1980 que este indicador financeiro se
afasta do multiplicador da base monetária, uma expressão de que a liquidez da economia
passa a ser progressivamente retida na esfera bancária-financeira. Este fato pode estar
indicando a vigência de um processo de financeirização da economia brasileira e cuja origem
deve ser buscada nas transformações conjunturais e estruturais dos anos 80.

Na Fase D, anos 90, as dinâmicas de M1/M0 e de (M2-PMPP)/M0 se descolam das


reservas, sinalizando que o ingresso de capitais agora não se destina ao financiamento da
acumulação produtiva de capital. Uma outra constatação relevante refere-se ao
comportamento dos indicadores monetários nesta década. (M2-PMPP)/M0 permanece
elevado com um valor médio de 3,0, enquanto M1/M0 permanece no nível mais baixo de toda
a série. Como o primeiro indicador capta os recursos que o público mantém sob a guarda do
sistema bancário-financeiro, sua elevação neste período não é um indício apenas de que a
confiança no sistema foi preservada sob o Real, mas também de que a moeda está sendo
desviada dos gastos em consumo e investimento produtivo.

Para apoiar a verificação dessa hipótese, o Gráfico 105 exibe as evoluções conjuntas
do investimento produtivo e das reservas internacionais, complementando a análise
precedente no que concerne aos possíveis impactos sobre a formação bruta de capital fixo. A
fase do milagre , como se sabe, foi caracterizada pelo ingresso de capitais estrangeiros
basicamente sob a forma de empréstimos. As reservas se expandem rapidamente, mas a
formação bruta de capital fixo cresce também, embora a uma velocidade menor. Entre 1973 e
1991, as reservas tornam-se muito voláteis e o investimento produtivo sofre uma primeira e
suave inflexão em 1977. Todavia, a partir de 1980, a FBKF entra em uma nítida tendência de
estagnação que perdurará ao longo de toda a década dos 90, fase em que as reservas se
recuperam rapidamente. Este fato pode estar expressando que o ingresso de capitais do
período de abertura comercial e de liberalização financeira destinou-se, basicamente, à
consecução de objetivos econômicos pouco conectados à dinâmica da acumulação produtiva
de capital.
458

GRÁFICO 105 RESERVAS INTERNACIONAIS E INVESTIMENTO (1956-2003)

Reservas internacionais _US$ milhões de 2000


Formação bruta de capital fixo - R$ milhões de 2000
- Série tendencial da FBKF por Lowess smoothing
3000
2000
Índice dos valores_escala log

1000
900
800
700
600
500
400
300
200

100
90
80
70
60
50
40
30
1956
1958
1960
1962
1964
1966
1968
1970
1972
1974
1976
1978
1980
1982
1984
1986
1988
1990
1992
1994
1996
1998
2000
2002
FONTE: Reservas internacionais_BACEN e formação bruta de capital fixo_IBGE, séries obtidas no
IPEADATA.
TABELA 35 BALANÇO DE PAGAMENTOS DO BRASIL (1990 2002)
US$ BILHÕES
1990 1994 1995 1996 1997 1998 1999 2000 2001 2002
BALANÇO COMERCIAL 10,7 10,4 -3,2 -5,5 -8,4 -6,4 -1,2 -0,7 2,6 5,4
Exportações 31,4 43,6 46,5 47,7 53,0 51,1 48,0 54,9 58,2 37,0
Importações 20,7 33,2 49,7 53,3 61,4 57,5 49,2 55,6 55,6 31,6
SERVIÇOS -15,3 -14,4 -18,6 -21,7 -27,3 -30,4 -25,2 -26,4 -27,5 -15,3
Lucros e Dividendos -1,6 -2,5 -2,6 -2,4 -5,6 -6,9 -4,1 -3,6 -5,0 -3,4
Viagens Internacionais -0,1 -1,2 -2,4 -3,6 -4,4 -4,3 -1,4 -2,1 -1,5 -0,6
Juros -9,8 -6,4 -8,2 -9,8 -10,6 -12,1 -15,2 -15,9 -14,9 -8,5
TRANSF. UNILAT. 0,8 2,6 4,0 2,9 2,2 1,9 2,0 1,8 1,6 1,4
CONTA CORRENTE -3,8 -1,5 -17,8 -24,3 -33,4 -35,0 -24,4 -25,3 -23,2 -8,5
CAPITAL 0,4 14,8 29,8 33,0 25,5 26,5 16,6 20,9 26,8 10,8
IDE 0,4 8,1 4,7 9,4 17,1 26,1 30,1 29,8 24,9 9,5
Financ/ Emprést. 11,1 11,0 18,5 32,4 40,2 34,1 38,4 18,9 33,5 21,3
Amortizações -11,1 -6,6 -11,0 -14,4 -28,8 -33,7 -51,9 -27,8 -31,6 -20,0
SUPERÁVIT (+) / DÉFICIT (-) -4,2 12,9 13,5 8,7 -7,8 -8,5 -7,8 -4,4 3,3 0,8
RESERVAS 14,1 38,5 51,5 59,9 52,1 44,6 36,3 31,9 35,8 37,6
DÍVIDA EXTERNA 122,8 148,3 157,4 178,1 199,9 233,9 236,9 232,3 228,6 219,1

FONTE: S.D. SILBER (2003), a partir de dados do Banco Central do Brasil.


NOTA: Valores para o ano de 2002 referem-se ao período janeiro-agosto.
A Tabela 35 mostra que os saldos dos serviços permanecem negativos em todo o
período 1990-2002. Aliás, este tem sido o padrão de longo prazo, observado desde 1947
459

(conforme Tabela 4, no capítulo 3) e que expressa precisamente a tendência histórica ao


desequilíbrio externo que caracteriza a economia brasileira.

4.5.9 Impactos das transformações das formas da concorrência sobre a WLN:


primeiras constatações

As quedas dos salários reais tendem a acompanhar a piora das contas externas. No
Gráfico 106 podem ser observadas as dinâmicas das séries do salário médio real (total da
economia) e da restrição externa (usando como indicador o resultado da balança comercial
como percentagem do volume total de comércio, defasado em um período). Uma correlação
ainda mais nítida é observada quando se trata do salário médio real do setor industrial
(Gráfico 107). Considerando-se que as elasticidades-renda do comércio exterior são
normalmente altas e as elasticidades-preços baixas, as reduções ou contenções salariais
mostram-se a forma mais rápida de ajustar o nível de atividade para equilibrar as contas
externas.309

GRÁFICO 106 RESTRIÇÃO EXTERNA E CONTENÇÃO SALARIAL: TOTAL DA ECONOMIA


(1951-2002)

Taxa de Crescimento do Salário Médio Real (L)


Restrição Externa = [X - M] / [ X + M ] t -1 (R)
12% 40%
11%
9% 30%
7% 24%
5% 16%
4% 10%
2% 5%
1% -0%
-1% -5%
-2% -10%
-4% -15%
-21%
-6%
-8% -30%
1951 1957 1963 1969 1975 1981 1987 1993 1999
1954 1960 1966 1972 1978 1984 1990 1996 2002

FONTE: Salário real médio apud MARQUETTI (2002) e IBGE.


NOTA: Séries em taxa de variação.

309
Essa forma de ajuste via salários foi identificada também para a economia Argentina, por MIOTTI (1991).
460

GRÁFICO 107 - RESTRIÇÃO EXTERNA E CONTENÇÃO SALARIAL: SETOR INDUSTRIAL (1976-


2003)

(X-M)/(X+M)t-1 (L)
Salário médio real na indústria (R)
40% 20%

30% 15%

20% 10%

10% 5%

0% 0%

-10% -5%

-20% -10%

-30% -15%
1976 1979 1982 1985 1988 1991 1994 1997 2000 2003

FONTE: Dados originários da Fiesp, relativos à região metropolitana de São Paulo.


NOTA: Séries em taxa de variação.

GRÁFICO 108 SALÁRIO MÉDIO NA INDÚSTRIA E TAXA DE JUROS (1976-2003)

Salário médio real_indústria (L)


Taxa real de juros SELIC (R)
20% 80%

15% 60%

10%
40%
5%
20%
0%
0%
-5%

-10% -20%

-15% -40%
1976 1979 1982 1985 1988 1991 1994 1997 2000 2003

FONTE: Dados originários da Fiesp, relativos à região metropolitana de São Paulo.


NOTA: Séries em taxa de variação.
461

O exame do Gráfico 108 mostra que entre 1976 e 1990, o salário médio real na
indústria correlaciona-se positivamente com a taxa básica de juros da economia brasileira.
Este fato pode ser explicado se for considerado que nos períodos de crescimento econômico
as taxas de juros e os salários são pró-cíclicos. Mas nos anos 90, período marcado por uma
quase-estagnação do PIB, um novo padrão emerge e as séries passam a evoluir, na grande
maioria dos anos, sob uma correlação negativa.

4.5.10 Síntese dos principais resultados

Se houvesse me submetido às imposições do Fundo (FMI)... teria


de abrir mão do Programa de Metas; deixaria o povo passando
fome; não construiria Brasília; nem realizaria a industrialização do
país .
(Kubitschek, 1978)

i. Os resultados empíricos indicam que as formas da concorrência - que na economia


brasileira são baseadas em estruturas de mercado fortemente oligopolistas - não teriam
sido significativamente afetadas pela abertura comercial e pela liberalização financeira.
A queda dos indicadores de mark ups setoriais seria mais a expressão de uma fase
preliminar de adaptação ao novo ambiente macroeconômico pós-abertura e pós-
estabilização de preços do que uma tendência de longo prazo de redução do poder de
mercado das grandes empresas nacionais e multinacionais. Os trabalhos que analisaram
o padrão de concorrência no setor bancário-financeiro também apontam para o mesmo
resultado. A entrada dos bancos estrangeiros através do aprofundamento do processo de
fusões e aquisições indica que essas instituições procuraram se adaptar às características
do mercado financeiro brasileiro, caracterizado por elevadas taxas reais de juros e pela
reduzida participação das receitas de operações de crédito no excedente operacional do
setor;

ii. A questão da substituição monetária provocada pelo aprofundamento de uma


liberalização financeira sob regulação neoliberal pode ser colocada nos seguintes
termos: quando o grau de liberalização financeira é aprofundado sob condições
estruturais típicas de uma economia ainda em desenvolvimento - onde o regime
monetário-financeiro ainda não pode ancorar-se plenamente no potencial produtivo
interno - a moeda nacional deixa de ser a representação, em última instância, da
totalidade dos estoques de riqueza e dos fluxos de renda gerados nas atividades
econômicas domésticas. Nestas circunstâncias, a moeda local perde espaço para a
moeda estrangeira mais forte. Sua demanda passa a ser dependente dos atuais critérios
462

de credibilidade e de confiança dos atores econômicos na manutenção das próprias


condições de mobilidade dos capitais, pois são elas que permitem a fuga para a moeda
forte em caso de movimentos especulativos ou de crises reais. Incapaz de lastrear a
moeda fiduciária que emite, nas próprias condições de produção e de acumulação
produtiva interna, o Estado recorre a uma validação exógena: âncora cambial (na
primeira fase do Real, sob câmbio fixo ajustável) e âncora monetária (na segunda fase
sob câmbio flutuante). Todavia, essas condições tornam-se fundamentalmente
dependentes da política monetária e cambial, bem como dos dispositivos institucionais
de regulação dos fluxos de capitais. Mais amplamente, significa reconhecer que
dependem das configurações particulares da forma institucional de inserção no regime
internacional. Configurações essas que são sempre derivadas de opções políticas e não
um resultado necessário de tendências inescapáveis da globalização . Um dos
resultados diretos reflete-se na desconexão do regime monetário-financeiro das
necessidades da acumulação de capital produtivo, base do crescimento econômico
sustentável. E isto é o mesmo que dizer que o RMF vigente caracteriza-se por sua
elevada restrição monetária. Um RMF não inflacionista, pois efetivamente capaz de
conter a aceleração da inflação, mas ao custo de menos emprego e da redução ou do
bloqueio da taxa de acumulação de capital;

iii. A análise dos indicadores de abertura comercial mostrou que o grau de abertura da
economia brasileira é similar ao do Japão, Índia e Argentina e próximo ao dos EUA.
Todavia, permanece cerca da metade do observado na China e um quarto do da Coréia
do Sul, para o ano de 2000. Por outro lado, foi a abertura financeira que mais avançou
nos anos 90 aprofundando o grau de vulnerabilidade externa da economia. Novas
análises sobre o processo de abertura econômica precisam ser feitas para se testar em
que medida a forma escolhida de liberalização financeira poderia impedir o
desenvolvimento da dimensão comercial no médio e longo prazos. Esta última requer
tanto a estabilidade do câmbio em patamares consideráveis rentáveis para os setores
exportadores, quanto taxas de juros reais substancialmente menores. Nessas
circunstâncias, a abertura comercial poderia se converter em um estímulo durável para a
ampliação do mercado interno, enquanto base do desenvolvimento econômico;

iv. No que concerne aos mark ups médios setoriais, os trabalhos empíricos disponíveis
mostram que houve reduções dos níveis na transição para uma economia aberta sob
463

vigência do Real. No entanto, se os indicadores apontam para um aumento relativo da


concorrência oligopolista, não se observa redução substancial do poder de mercado das
grandes empresas que controlam os setores-chave da economia. Esse padrão é
particularmente notável tanto no setor industrial quanto no setor bancário-financeiro.
Neste último, a entrada dos bancos estrangeiros não foi capaz de modificar o padrão de
financiamento da economia brasileira, caracterizado pela ausência de crédito privado de
longo prazo e pela atrofia do mercado de capitais. As instituições financeiras
estrangeiras rapidamente se adaptaram a um mercado bancário-financeiro cuja
rentabilidade provém, em grande medida, das operações envolvendo os títulos da dívida.
Conseqüentemente, não se observa expansão ou melhora significativa das condições de
financiamento da economia brasileira, que possibilitasse uma maior conexão do capital
financeiro com as necessidades do capital produtivo;

v. Quanto às mudanças estruturais da indústria brasileira, os trabalhos constataram os


seguintes fatos:

predominância na estrutura industrial brasileira das indústrias intensivas em


escala e em recursos naturais, cujo valor da transformação industrial já
representa cerca de 67% do VTI total;
as atividades baseadas em Ciências aumentaram a participação. Todavia, esse
resultado decorre da expansão do ramo farmacêutico, pois no mesmo período
de análise, as indústrias de informática e eletrônico tiveram queda de mais da
metade de suas posições em 1985;
as atividades intensivas em trabalho perderam participação, o que pode ser
considerado como um fator a mais nos limites à geração de emprego no Brasil;
a liberalização financeira aprofundou os fluxos de capitais voláteis com suas
conseqüências negativas sobre a dinâmica da acumulação de capital. Como
mostram os exemplos da China, Índia ou Coréia do Sul, a entrada dos IDE não
dependeria do aprofundamento da mobilidade dos capitais de curto prazo.
Inclusive o próprio decálogo do Consenso de Washington não considerou
como prioritário a liberalização financeira.
464

CAPÍTULO 5 CRESCIMENTO ECONÔMICO, MUDANÇAS ESTRUTURAIS E


DISTRIBUIÇÃO: AS TRANSFORMAÇÕES DO REGIME DE ACUMULAÇÃO NO
BRASIL

J essayais de trouver quel type de régularités peut être


détecté dans les phénomènes observés empiriquement et de
découvrir alors quelles hypothèses particulières et testables
seraient en mesure d expliquer l association. (...) Cette
approche est en un sens d une portée plus modeste (en ce
qu elle ne recherche pas des explications qui dérivent d un
modèle global du système) et également plus ambitieuse en
ce qu elle vise directement à découvrir des solutions (ou
des remèdes) à des problèmes réels ».

[KALDOR (1978), p.17 e 18]310


5.1 Introdução

Após a caracterização da evolução das formas institucionais, desenvolvida no capítulo


precedente, trata-se agora de mobilizar o instrumental estatístico e econométrico para uma
apreensão das particularidades do regime de acumulação brasileiro e de suas transformações
recentes. A análise passa do plano das regulações parciais ao nível da regulação global ou
macroeconômica (régulation d ensemble), mantendo-se os princípios teóricos e
metodológicos expostos nos capítulos 1 e 2.

Diversos procedimentos e abordagens quantitativas são utilizados para fornecer uma


perspectiva geral das principais tendências da acumulação de capital e do crescimento
econômico brasileiro. Através dos padrões dinâmicos das variáveis macroeconômicas, tais
como o PIB, a profit share, a wage share, a taxa de utilização da capacidade produtiva, a
razão produto potencial / estoque de capital e os preços relativos, é possível obter uma
caracterização da dinâmica dos regimes de acumulação e, então, tecer considerações sobre o
estado atual da economia.

Parte-se da hipótese de que grande parte dos problemas macroeconômicos brasileiros


derivam da configuração atual do regime monetário-financeiro e da opção por uma forma
particular de inserção internacional. Essas duas formas institucionais tornaram-se
hierarquicamente superiores, uma característica, em certo sentido, imposta pela adesão
neoliberal à lógica da globalização , cujo processo, obviamente, não possui status de
fenômeno da natureza, pois se inscreve no rol das escolhas políticas disponíveis aos governos
nacionais.

310
KALDOR citado por J. ARROUS (1999, p. 159), em Les Théories de la Croissance. Éditions du Seuil,
février, 1999.
465

5.2 Distribuição e acumulação de capital: as bases do crescimento econômico


Ao se analisar a trajetória do PIB em volume, a detecção de um certo padrão de
regularidade no perfil observado é um indicador da vigência de um determinado regime de
crescimento (BILLAUDOT, 2001)311. Duas principais regularidades podem ser constatadas:

o crescimento cíclico o crescimento se processa por ondas sucessivas, cada onda (ciclo)
comporta inicialmente uma fase de retomada e expansão, seguida de uma inflexão e
contração do nível de atividade econômica e então de um novo movimento ascendente. O
relevante do ponto de vista empírico é que os ciclos implicam em flutuações recorrentes
do nível de atividade econômica ou de sua taxa de crescimento;312

o crescimento quase-contínuo o crescimento se processa a um ritmo muito regular sem


ondas, mas com flutuações limitadas e irregulares. À medida que o crescimento se acelera,
assiste-se a um momento passageiro de desaceleração (ralentissement) que pode assumir a
forma de uma curta recessão.

O crescimento econômico também pode ser considerado em seus aspectos qualitativos


e quantitativos. Conforme BILLAUDOT (2001), o fato de que o PIB seja uma grandeza
monetária a diferença entre o total das produções dos setores produtivos e o total de seu
consumo intermediário não impede que se possa avaliar o conteúdo da expansão econômica.
A evolução em volume desta produção se decompõe em um efeito quantidade e um efeito
qualidade. Este último provém da criação de novos dos bens e serviços ou então de uma
mudança na estrutura da produção.

Em termos teóricos, um processo de crescimento puramente em quantidade existiria


se em todos os ramos o efeito qualidade fosse nulo. Na prática, porém, pode ser considerada a
possibilidade de um padrão de crescimento dominante em quantidade. Por outro lado, o
crescimento seria dominante em qualidade quando na grande maioria dos ramos, o efeito
qualidade é positivo e importante. Este é o caso observado em tendência de longo período,
quando se observa que o aumento da produção de bens de maior valor agregado torna-se a
regra na maior parte dos setores produtivos.

No que concerne aos padrões de crescimento com relação à forma institucional de


inserção no regime internacional, a análise pode considerar os indicadores de abertura

311
BILLADUDOT, B. Régulation et croissance: une macroéconomie historique et institutionnelle. L Harmattan.
Paris, 2001.
312
Normalmente este padrão cíclico refere-se na literatura econômica aos chamados ciclos de Juglar , que entre
o século XIX e a primeira metade do XX, apresentavam uma periodicidade média de seis a 11 anos.
466

econômica. Por exemplo, os coeficientes de exportação e de penetração das importações, sob


restrição de um equilíbrio das contas externas, tenderiam geralmente a evoluir em conjunto no
longo prazo. Se for constatada que a evolução conjunta desses dois indicadores apresenta uma
certa regularidade, então isto sugeriria a vigência de um modo de inserção internacional do
crescimento nacional313 Como essa denominação é pouco utilizada, para uma taxionomia mais
precisa, a análise recorre aos dois tipos principais de regularidades que podem ser observados:

um padrão ou regime de crescimento extrovertido ( extraverti ) ou


internacionalizado os dois coeficientes evoluem de forma muito regular na
dinâmica de longo período. Os processos de industrialização por promoção das
exportações implicam na viabilidade macroeconômica de um tal regime.
Paradoxalmente, como observa PIRIOU (2001, p.53), as industrializações
extrovertidas foram freqüentemente acompanhadas de uma forte intervenção e
presença do Estado e não de uma estratégia neoliberal de inserção internacional.314
Paralelamente, ocorre expansão dos salários e dos investimentos públicos;

um padrão ou regime de crescimento autocentrado corresponde à lógica do


modelo de industrialização por substituição de importações e pressupõe também
uma forte presença do Estado para sustentar o nível de investimento e implementar
as medidas de proteção e defesa do mercado interno.

5.3 Estoque de capital fixo bruto, intensidade do capital e ritmo de substituição


capital/trabalho
A noção empírica de acumulação de capital busca traduzir o processo de
transformação do capital monetário-financeiro em capital fixo. Em sua vinculação com o
crescimento econômico, a análise da acumulação de capital é uma variável condicionada pela
evolução da produtividade. Poder-se-ia considerar também o papel dos investimentos
imateriais, mas em razão da disponibilidade de dados, a formação bruta de capital fixo passa a
ser a variável principal, requisitada nos modelos de crescimento e de acumulação.

Considerando-se K t 1 K I d
t t t
, onde K é o estoque de capital fixo bruto; I é o

fluxo de investimento ou a formação bruta de capital fixo; e d é a depreciação do capital,


pode-se derivar as seguintes relações315:

313
Originalmente em francês e conforme BILLAUDOT (2001, p. 45): um mode d insertion internacionale de la
croissance nationale.
314
Este é o caso, por exemplo, da China e também da Coréia do Sul.
315
Esta seção baseia-se em BILLAUDOT (2001), cujas contribuições sistematizam os aportes da Teoria da
Regulação para as macroanálises do crescimento e do desenvolvimento econômico.
467

K I d é o montante real de acumulação em capital fixo ou simplesmente


acumulação de capital. Dividindo-se esta relação por K, obtém-se:

K I d
ou , onde é o ritmo de acumulação de capital
K K K
(líquida); é a taxa bruta de acumulação e é a taxa de depreciação do estoque de capital
fixo.

K
A intensidade do capital é dada pela relação , onde N é o nível de emprego. Com o
N
desenvolvimento do processo de acumulação de capital, as mudanças sócio-técnicas nas
condições de produção conduzem às variações relativas no nível de emprego. Tomando-se os
logaritmos dessa última relação, chega-se à:

K N que representa a velocidade ou o ritmo em que a força de trabalho é substituída

por capital fixo. Se, por exemplo, K N então houve substituição de trabalho por capital.

Esta relação é válida tanto ao nível da empresa individual quanto no nível setorial e da
economia nacional.

Em termos qualitativos, o processo de acumulação pode ser apreendido a partir do


modo como a economia acumula capital. Mais precisamente trata-se de verificar em que
condições sócio-técnicas e institucionais de produção e de distribuição, se desenvolve um
determinado padrão ou regime de acumulação. Há duas formas básicas, já explicitadas na
Parte I deste trabalho, mas que pode ser recuperada da seguinte maneira:

regime de acumulação à dominante extensiva quando o processo de acumulação


de capital implica, de forma preponderante, no aumento das unidades de produção
sem modificar substancialmente as características do processo de trabalho e de
organização da produção. Mobilizam-se as mesmas técnicas e formas
organizacionais e não se observam inovações de produto ou de processo que
provoquem impactos significativos nas condições de produção e de distribuição do
excedente econômico. Conforme LORENZI et al. (1979), a acumulação extensiva
deveria, em teoria, significar ausência de ganhos de produtividade do trabalho e
constância da taxa de acumulação de capital associada à ausência de progresso
técnico. Em termos de uma análise empírica, é suficiente que os ganhos de
468

produtividade sejam em média pouco expressivos ou reduzidos com relação à


evolução do produto;

regime de acumulação à dominante intensiva quando o processo de acumulação


de capital baseia-se (e ao mesmo tempo promove), de forma preponderante,
transformações significativas do processo de trabalho e de organização da
produção. Ocorrem modificações consideráveis no tamanho das plantas, incluindo
a introdução de inovações técnicas e organizacionais que permitem o surgimento
de novos produtos e processos de produção. Como uma conseqüência direta, os
ganhos de produtividade são incrementados substancialmente e a intensidade do
capital é aprofundada.

Um indicador que se pode utilizar para captar empiricamente esses padrões de

acumulação é justamente o ritmo de substituição do trabalho pelo capital ( ). Conforme


BILLADOUT:

nos países e nos períodos onde se observa um acumulação à dominante extensiva,


constata-se também uma fraca progressão da intensidade do capital (cerca de 1%
a.a.);

nos países e para os períodos onde se observa uma acumulação à dominante


intensiva, registra-se também uma forte progressão da intensidade do capital (mais
de 3% a.a.).

A análise não deve, no entanto, considerar essas relações como se fossem provenientes
de uma lei geral que deveria necessariamente se aplicar no futuro. A detecção de um
comportamento tendencial ou de uma trajetória relativamente estável pode ser apreendida
como um indício da presença de um desses padrões. Essa tendência se traduz, em geral, por
uma regularidade da evolução da intensidade do capital e então este fato estilizado pode ser
utilizado, juntamente com outras estatísticas, para uma caracterização mais segura. Quanto
mais intensivo for o processo de acumulação de capital, maior a velocidade de substituição do
trabalho por capital e então menor será a geração de empregos a uma dada taxa líquida de
acumulação.

A relação entre acumulação de capital e crescimento econômico decorre de duas


vinculações estruturais. Por um lado, a acumulação responde pelas estruturas de produção e
oferta e então pela dinâmica do crescimento. De outro, seu desenvolvimento cria uma parte
469

essencial da demanda final os investimentos em capital fixo e os gastos em consumo


provenientes da massa salarial permitindo escoar a produção.

Os regulacionistas não enfatizam a produtividade por fator. Eles consideram que esta
noção tem sentido apenas em dinâmica, quando se observam os efeitos das mudanças nas
condições sócio-técnicas de produção. Consideram ainda que é mais coerente falar-se de
produtividade da acumulação (ou do crescimento) do que de melhoria da produtividade. As
duas razões correntemente utilizadas produtividade horária do trabalho e produtividade por
pessoal ocupado são utilizadas em evolução como instrumentos de medida desta melhoria
(BILLADOUT, 2002).

Um outro indicador também relevante refere-se à produtividade aparente do capital


fixo (o volume de PIB por capital fixo) que fornece informações sobre os custos em capital do
crescimento econômico:

PIB
PR K
K
, onde PRk é a produtividade aparente do capital.

Uma queda dessa razão significa que será preciso sempre mais capital fixo para se
obter um dado volume de produção final à escala da economia nacional. Todavia, este
indicador, também denominado por eficiência do capital, pode baixar simplesmente porque a
taxa de utilização da capacidade instalada baixou em conseqüência de uma desaceleração do
nível de atividade. Um indicador mais apropriado para captar esses efeitos é a razão
316
PIB/capital em uso :

PIB
, onde u é a taxa de utilização da capacidade produtiva instalada e K é o
u.K
estoque de capital fixo bruto. Conseqüentemente, u.K representa o estoque de capital fixo que
está sendo efetivamente utilizado.

PIB
A produtividade aparente do trabalho é formulada como PR N
N
. O termo

aparente assinala que a produtividade não pode ser inteiramente imputada a um único fator
em questão, pois depende também de outros insumos ou condições sócio-técnicas de
produção. Pode por exemplo, depender do aumento da intensidade ou do ritmo do trabalho,
onde se observa crescimento da produtividade sem que necessariamente tenha havido
mudanças tecnológicas ou das formas organizacionais.

316
Nos trabalhos em língua inglesa costuma-se denominar por the ratio GDP/capital stock in use .
470

Quanto à noção de crescimento econômico, as análises regulacionistas a consideram


num sentido estrito e num sentido amplo. Neste último caso, o crescimento engloba as
dimensões relativas à acumulação de capital, ao crescimento no sentido estrito de expansão do
PIB em volume e ao processo de desenvolvimento econômico. Este pode ser avaliado a partir
de indicadores como o PIB per capita, o padrão de consumo final per capita e a evolução da
duração anual média do trabalho assalariado.

A questão da distribuição de renda está no centro da articulação entre processo de


acumulação de capital e desenvolvimento econômico. Neste contexto, a parcela salarial no
PIB ou a wage-share ( ) torna-se um indicador fundamental por suas implicações
macrodinâmicas. Se o poder de compra do salário médio progride em paralelo com os ganhos
de produtividade então permanece estável. Quando PRk permanece estável, a rentabilidade
do capital também estará inalterada, caracterizando um padrão de crescimento equilibrado .

Em termos gerais, quando se constata a presença em um país, e em longo período, de


um conjunto de regularidades (tanto quantitativas quanto qualitativas) na forma como se
processa a articulação entre acumulação de capital e crescimento econômico, este fato é
traduzido no âmbito das análises pelo conceito de regime de acumulação ou regime de
crescimento, no sentido amplo. Conforme BILLAUDOT (2001, p. 52):

« Les régularités em question sont essenciellement qualitatives. Les régularités


quantitatives en son la traduction; ce ne sont pas des régularités de rythmes,
mais de proportions. Un tel régime de croissance(l.s) est quelque chose de tout
à fait différent du type de dynamique macroéconomique couramment qualifié
par les économistes de dynamique de croissance en régime. Ce dernier
correspond au cas òu le rythme de croissance (s.s.) est régulier et où ce rythme
s accompagne d évolutions régulières des autres variables économiques
(productivités apparentes, revenus réels, etc.). Au contraire, le régime de
croissance (l.s.) des régulationnistes n implique aucune régularité de rythme :
il peut correspondre à une croissance cyclique ou quasi-continue ; et l on peut
être en présence du même régime si le rythme moyen diffère. »317
Conseqüentemente, quando esses conceitos são aplicados à realidade da economia
brasileira, várias implicações macroeconômicas podem ser consideradas tanto por sua
especificidade quanto por suas conseqüências mais gerais.

O Gráfico 109 mostra a dinâmica de longo prazo do crescimento econômico brasileiro,


no período 1901-2003. As taxas reais de crescimento também aparecem suavizadas pelo filtro

317
Os termos (s.s.) e (l.s.) significam, respectivamente, sens strict (sentido estrito) e sen large (sentido amplo).
471

4253H318 para que se possa ter uma perspectiva do comportamento tendencial, ao se eliminar
as flutuações maiores de curto prazo. Conforme observam BONELLI e BACHA (2004,
p.1)319:

A mystery surrounds Brazil s long-term growth experience. Why is it that this


country s GDP growth collapsed since 1980 after expanding at some 7% per
year from 1940 through 1980 ?
Para PINHEIRO (2003, p.1), a falta de um consenso sobre a agenda de
desenvolvimento não seria mero acaso. Priorizou-se a estabilidade macroeconômica (mais
precisamente, a estabilidade de preços) e além disso existe o aparente paradoxo de o Brasil
ter crescido mais rapidamente no período em que adotou políticas hoje consideradas
equivocadas, enquanto em anos recentes a adoção de políticas corretas resultou em não mais
que um pequeno aumento do crescimento .

Como foi constatado no capítulo 3 sobre a performance macroeconômica, as taxas de


crescimento do PIB brasileiro foram muito voláteis na primeira metade do século XX. A
economia, de base primário-exportadora, ainda era fortemente dependente da demanda
externa, sobretudo das exportações de café. Além dessas condicionantes estruturais, a
economia sofreu os impactos de fatores externos como a Primeira Guerra, a Grande Crise dos
anos 30 e a Segunda Guerra Mundial. Mas, de um modo aparentemente paradoxal, ao
elevarem o grau de restrição externa a patamares extremos, esses choques adversos
forçaram mutações consideráveis na forma institucional de inserção internacional. Em
conseqüência, o mercado interno, nesses momentos de ruptura no padrão de relacionamento
com o exterior, passava a ser a base da industrialização substitutiva de importações. Em
Formação Econômica do Brasil, FURTADO (1980) observou que:

(...) o fator dinâmico principal, nos anos que se seguem à crise, passa a ser,
sem nenhuma dúvida, o mercado interno. A produção industrial, que se
destinava em sua totalidade ao mercado interno, sofre durante a depressão
uma queda de menos de 10%, e já em 1933 recupera o nível de 1929.

318
Como foi mencionado no capítulo 3, este filtro consiste de vários passos de suavização por média móvel e
mediana e é considerado um filtro potente para o alisamento de séries temporais. Conforme consta no software
Statistica 6.0, as seguintes transformações são executadas por este filtro: (1) a 4 points moving median centered
by a moving median of 2, (2) a 5 point moving median, (3) a 3 point moving median, and (4) a 3-point weighted
moving average using Hanning weights (.25, .5, .25), (5) residuals are computed by subtracting the transformed
series from the original series, (6) steps 1 through 4 are then repeated for the residuals, (7) the transformed
residuals are added to the transformed series. In practice, this filtering method often produces a smooth series
while maintaining the salient characteristics of the original series.
319
ARONOVICH (1991), BONELLI e BACHA (2004) e MARQUETTI (2002 e 2003) encontram-se entre os
poucos autores brasileiros que recorreram às análises em termos de acumulação de capital e aos aportes neo-
estruturalistas para a compreensão da problemática atual do crescimento econômico brasileiro.
472

GRÁFICO 109 DINÂMICA DO CRESCIMENTO ECONÔMICO BRASILEIRO (1901-2003)

Taxa de crescimento do PIB


Série suavizada pelo filtro 4253H

14%
12%
10%
8%
6%
4%
2%
0%
-2%
-4%
-6%
1901
1904
1907
1910
1913
1916
1919
1922
1925
1928
1931
1934
1937
1940
1943
1946
1949
1952
1955
1958
1961
1964
1967
1970
1973
1976
1979
1982
1985
1988
1991
1994
1997
2000
2003
FONTE: Elaborado a partir de dados do IBGE e séries históricas, obtidas no IPEADATA.

NOTA: Em novembro de 2004, o IBGE, órgão responsável pelo cálculo do PIB brasileiro, revisou a estatística
divulgada para 2003 (recessão de 0,2%) para um crescimento de 0,5%. A mudança deveu-se à alterações da
metodologia de cálculo do PIB, que consideraram novas informações provenientes da Pesquisa Industrial Mensal
e da PNAD de 2003.
Em termos regulacionistas, este fato mostra que as crises e conjunturas
macroeconômicas adversas tendem a provocar mutações do modo de regulação e do regime
de acumulação que lhe é a resultante macroeconômica. As transformações estruturais
permitem o surgimento de novas configurações das formas institucionais que podem
estabelecer novas bases para o desenvolvimento da acumulação de capital.

Um fato igualmente notável refere-se ao dinamismo observado no período 1943-1980,


que pode ser considerado o de consolidação e apogeu do modo de desenvolvimento baseado
no processo de industrialização substitutiva de importações (ISI). Não se observa nenhuma
recessão, apenas desacelerações das taxas de crescimento do PIB. Aliás, a crise dos anos 60
que sucedeu o período de expansão do Plano de Metas (1955-1962), expressou-se em
reduções acentuadas das taxas de crescimento do produto, mas não em queda do nível de
atividade econômica. Antes da vigência do modelo ISI observam-se oito recessões (1902,
1908, 1914, 1918, 1930, 1931, 1940, 1942) que foram, em sua maioria, provocadas por crises
e choques externos. Mas a partir dos anos 80, quando o modelo é considerado esgotado, são
observadas seis recessões (1981, 1983, 1988, 1990, 1992 e 2003) que têm em comum o fato
de terem sido provocadas deliberadamente pelo Estado.
473

A linha suave representativa da série filtrada das oscilações de curto prazo permite
uma abordagem da dinâmica do crescimento em termos de ciclos. Constata-se que a partir da
recessão de 1981, as taxas de crescimento do PIB entraram em uma trajetória de queda
tendencial, pois a amplitude dos ciclos mostra-se sucessivamente menor de período a período.
Os momentos de retomada correspondem às fases de implementação dos programas de
estabilidade de preços, Plano Cruzado em 1986 e Plano Real, em 1994; e foram todos
abortados pela própria política econômica. Esses fatos característicos demonstram a
dificuldade da economia brasileira para encontrar uma trajetória de crescimento forte e
estável, condizente com o potencial produtivo do país. Explicar as razões para essa
performance macroeconômica na década de 80 e 90 é um dos objetivos de uma análise em
termos de modo de regulação e de regime de acumulação.

A taxa de acumulação de capital é uma variável fundamental para explicar a dinâmica


do crescimento econômico. No Gráfico 110 pode ser observada a forte correlação entre as
dinâmicas do PIB e da acumulação de capital fixo.

GRÁFICO 110 ACUMULAÇÃO DE CAPITAL E CRESCIMENTO ECONÔMICO (1941-2003)

Taxa de crescimento do PIB


Taxa de crescimento do estoque de capital fixo
16%
14%
12%
10%
8%
6%
4%
2%
0%
-2%
-4%
-6%
1941
1943
1945
1947
1949
1951
1953
1955
1957
1959
1961
1963
1965
1967
1969
1971
1973
1975
1977
1979
1981
1983
1985
1987
1989
1991
1993
1995
1997
1999
2001
2003

FONTE: Elaborado a partir de dados do IBGE e séries históricas, obtidas no IPEADATA.

Um teste econométrico reforça a constatação de que essas variáveis são


estruturalmente dependentes:

TXPIB C TXK (25)


474

onde TXPIB é a taxa de crescimento do PIB e TXK é a taxa de crescimento do estoque de


capital fixo. C é a constante usual e como não se mostrou estatisticamente significativa, o
modelo foi estimado sem considerá-la.

QUADRO 121 ESTIMAÇÃO DA EQUAÇÃO 1- PERÍODO (1941-2003)


Dependent Variable: TXPIB
Method: Least Squares
Sample(adjusted): 1941 2003
Included observations: 63 after adjusting endpoints
Variable Coefficient Std. Error t-Statistic Prob.
TXK 0.833693 0.060138 13.86299 0.0000
R-squared 0.362358 Mean dependent var 0.050174
Adjusted R-squared 0.362358 S.D. dependent var 0.039809
S.E. of regression 0.031788 Akaike info criterion -4.043691
Sum squared resid 0.062651 Schwarz criterion -4.009673
Log likelihood 128.3763 Durbin-Watson stat 1.783543

QUADRO 122 ESTATÍSTICAS DESCRITIVAS PARA TXPIB E TXK E CORRELAÇÕES (1941-


2003)

Nº Média Mínimo Máximo Desvio- TXK TXPIB


OBS Padrão
TXK 1,000 0,605
TXPIB 63 0,052 -0,043 0,140 0,042
TXPIB 0,605 1,000
TXK 63 0,062 0,012 0,117 0,032

O coeficiente relativo à taxa de acumulação de capital mostra-se elevado (0,83) e


estatisticamente significativo, o que confirma a relação macroeconômica entre acumulação de
capital e crescimento na economia brasileira. O teste de Granger aplicado para o período
completo de análise e com as variáveis em logaritmo revela que há causalidade bilateral, ou
seja, a taxa de acumulação de capital influencia o crescimento econômico que por sua vez
impulsiona a acumulação, de forma coerente com a teoria econômica.

QUADRO 123 TESTE DE CAUSALIDADE DE GRANGER PARA LPIB E LK


Pairwise Granger Causality Tests
Sample: 1940 2003
Lags: 2
Null Hypothesis: Obs F-Statistic Probability
LPIB does not Granger Cause LK 62 4.73986 0.01247
LK does not Granger Cause LPIB 3.62977 0.03283

Recorreu-se inicialmente à abordagem de JONES (1995) e de LEHMANN (2000) que


estimaram essa relação, respectivamente, em taxas de crescimento e em taxas de crescimento
suavizadas pelo filtro HP. Este último procedimento decorre do argumento de que as
flutuações de curto prazo ocultariam as tendências de médio e de longo prazos nas séries do
PIB e do estoque de capital fixo, pois estas oscilações tendem a responder mais às mudanças
475

no grau de utilização da capacidade produtiva, nas taxas de câmbio ou nos termos de troca. O
Gráfico 111 exibe as duas séries filtradas pelo Hodrick-Prescott Filter (HP).

GRÁFICO 111 TAXAS DE CRESCIMENTO DO PIB E DO ESTOQUE DE CAPITAL FIXO


FILTRADAS DAS FLUTUAÇÕES DE CURTO PRAZO (1914-2003)

TXK_HP
TXPIB_HP
10%
9%
8%
7%
6%
5%
4%
3%
2%
1%
1941
1945
1947
1949
1951
1953
1955
1957
1959
1963
1965
1967
1969
1971
1973
1975
1977
1979
1981
1983
1985
1987
1989
1991
1993
1995
1997
1999
2001
2003
1943

1961

FONTE: IPEADATA e Anexo.


O exame do comportamento tendencial a partir do Gráfico 112 torna a questão das
quedas dessas duas taxas ainda mais dramática. A evolução dessas séries sugere, de forma
lamentável, que a economia brasileira, após um longo período de expansão e de acumulação
de capital teria saído de sua trajetória de crescimento de longo prazo, demonstrando enorme
dificuldade para reencontrá-la sobre novas bases ou regimes de acumulação.

Todavia, diferentemente do encontrado por LEHMANN, para o caso do Chile, a


análise de co-integração para as séries filtradas revelou-se inadequada para captar a relação de
longo prazo. A equação foi então estimada em níveis (logaritmos das variáveis) e foi aplicado
o método de estimação em duas etapas de ENGLE e GRANGER (1987):

QUADRO 124 TESTES DE RAÍZES UNITÁRIAS PARA LK E LPIB (1940-2003)


ADF Test Statistic
LPIB -0.374490 1% Critical Value* -4.1135
LK -0.290738 5% Critical Value -3.4836
10% Critical Value -3.1696
*MacKinnon critical values for rejection of hypothesis of a unit root.
476

QUADRO 125 TESTE DE RAÍZES UNITÁRIAS DOS RESÍDUOS (1940-2003)


ADF Test Statistic
RES -3.353116 1% Critical Value* -3,37
5% Critical Value -3,17
10% Critical Value -2,91
*Valores críticos de Engle e Yoo (1987) para o teste de co-integração ADF

Como pode ser constatado pelos Quadros 124 e 125, as duas séries em questão são
integradas de primeira ordem I (1), mas os resíduos da relação 6 são estacionários.

QUADRO 126 ESTIMAÇÃO DA RELAÇÃO ESTÁTICA ENRE LPIB E LK (1940-2003)


Dependent Variable: LPIB
Method: Least Squares
Sample: 1940 2003
Included observations: 64
Variable Coefficient Std. Error t-Statistic Prob.
C 0.789635 0.039962 19.75981 0.0000
LK 0.835914 0.005790 144.3806 0.0000
R-squared 0.997035 Mean dependent var 6.464711
Adjusted R-squared 0.996987 S.D. dependent var 1.050369
S.E. of regression 0.057658 Akaike info criterion -2.837829
Sum squared resid 0.206115 Schwarz criterion -2.770364
Log likelihood 92.81052 F-statistic 20845.76
Durbin-Watson stat 0.303967 Prob(F-statistic) 0.000000

O coeficiente associado ao erro de equilíbrio é negativo (-0,22) e estatisticamente


significativo ao nível de 5%. Conseqüentemente, a representação em termos do modelo de
correção de erros (MCE) é validada (Quadro 127) e a relação estimada (Quadro 126) não é
espúria. Ela representa uma relação de co-integração entre a acumulação de capital fixo e o
nível de produto da economia brasileira, ou seja, existe uma relação de longo prazo entre
essas variáveis. Isto demonstra a importância fundamental da acumulação produtiva de capital
para o desenvolvimento econômico do país.

QUADRO 127 ESTIMAÇÃO DO MODELO DE CORREÇÃO DE ERRO (1940-2003)


Dependent Variable: D(LPIB)
Method: Least Squares
Sample(adjusted): 1942 2003
Included observations: 62 after adjusting endpoints
Variable Coefficient Std. Error t-Statistic Prob.
C -0.007903 0.010392 -0.760471 0.4501
RES(-1) -0.218819 0.084431 -2.591690 0.0121
D(LPIB(-1)) 0.116553 0.134833 0.864425 0.3910
D(LK) 1.759722 0.410773 4.283928 0.0001
D(LK(-1)) -0.879642 0.396677 -2.217526 0.0306
R-squared 0.485162 Mean dependent var 0.050211
Adjusted R-squared 0.449033 S.D. dependent var 0.040133
S.E. of regression 0.029789 Akaike info criterion -4.112128
Sum squared resid 0.050582 Schwarz criterion -3.940585
Log likelihood 132.4760 F-statistic 13.42862
Durbin-Watson stat 1.941367 Prob(F-statistic) 0.000000
477

Mas uma questão também relevante do ponto de vista teórico refere-se ao fato de que
a existência de uma relação de longo prazo entre a acumulação de capital fixo e produto
interno bruto pode ser interpretada, também, como um indício de crescimento endógeno
segundo o modelo conhecido como AK model. Essa denominação provém da forma de sua
função de produção em que Y = A.K, com Y representando o PIB e K o estoque de capital
fixo. O conceito de K deve ser interpretado em um sentido amplo que inclui o capital humano
e as infra-estruturas públicas.

O crescimento endógeno segundo o AK model requer que os aumentos no estoque de


capital fixo sejam acompanhados por aumentos do PIB no longo prazo.320 Conforme JONES
(2000, p.134), o AK model é um modelo simples de crescimento endógeno que foi
apresentado por REBELO (1991). O interesse em recuperá-lo para uma abordagem
regulacionista do caso brasileiro decorre dos seguintes fatos:

a Teoria da Regulação considera os fatores que respondem pelo crescimento


econômico, como endógenos (a mudança técnica e organizacional e os
mecanismos de distribuição de renda), sem que seus pressupostos teóricos e
metodológicos convirjam para os propugnados pelas análises do crescimento
endógeno, derivadas da tradição neoclássica;321
a existência de estudos que aplicaram essa abordagem para o caso de países latino-
americanos, como LEHMANN (2000), para o Chile, e BONELLI e BACHA
(2004), para o Brasil.322

Esses modelos permitem considerar o modo como políticas do governo e mudanças


institucionais afetam permanentemente o crescimento econômico. E aí reside mais uma das
aplicações da análise em termos de co-integração. Uma relação de co-integração implica que
as séries em questão possuam raízes unitárias e então mudanças estruturais endógenas ou
mesmo choques exógenos não deslocam apenas temporariamente a economia de sua trajetória
de equilíbrio; os efeitos sobre a dinâmica do crescimento econômico seriam permanentes.

320
Em sua análise para o caso da economia chilena, LEHAMANN considerou o longo prazo como um intervalo
de 50 anos em média.
321
Por exemplo, o modelo de ROMER (1986) ou o de BARRO (1990).
322
ARONOVICH (1991, p.57) observa que as formulações neo-estruturalistas de BACHA (1981) e TAYLOR
(1983) assumem que seja observado na economia o fenômeno do desemprego estrutural. Nesse caso, o único
fator limitativo da expansão do produto seria o estoque de capital à disposição das firmas. Em termos formais, a
N K
função de produção seria Y ; . Todavia, em razão do desemprego estrutural da força de trabalho (L),

apenas o capital seria fator restritivo à expansão da produção.


478

O exame do Gráfico 112 permite identificar a quebra de tendência tanto na série da


produtividade aparente do trabalho (PIB/N) quanto na intensidade do capital (K/N), no
período 1950-2002. Esta razão cresceu a uma taxa média de 5,4% ao ano, entre 1950 e 1981,
revelando-se um forte indício de vigência de um padrão de acumulação preponderantemente
intensiva. Todavia, com a quebra de tendência, no período [1981 2002], a taxa média de
crescimento da intensidade do capital cai para 0,7% ao ano, sinalizando a entrada da
economia brasileira num padrão de acumulação de capital à dominante extensiva. Esta
questão é de importância fundamental na problemática dos ganhos de produtividade
observados na década de 90.

GRÁFICO 112 INTENSIDADE DO CAPITAL E PRODUTIVIDADE DO TRABALHO NA


ECONOMIA BRASILEIRA (1950-2002)

Produtividade aparente do trabalho ( PIB / N)


Intensidade do capital( K / N)
650
600
550
500
450
400
Índice: 1950=100

350
300
250

200

150

100

1950 1958 1966 1974 1982 1990 1998


1954 1962 1970 1978 1986 1994 2002

FONTE: Série do nível geral de emprego obtida em MARQUETTI (2002) e IBGE. Série do estoque de capital
fixo estimado por MORANDI (2003).
NOTA: N = nível geral de emprego; K = estoque de capital fixo produtivo (sem construções residenciais).
Conforme exposto acima, normalmente, a existência de ganhos elevados de
produtividade é um indício de vigência de acumulação de capital predominantemente
intensiva (BILLAUDOT, 2002). Mas no período 1980-2002 podem ser observados dois
padrões contrastados. A década de 80 caracteriza-se nitidamente pela estagnação dos ganhos
de produtividade e da intensidade do capital, o que revela a inexistência de mudanças
significativas nas condições de produção e a perda de dinamismo da economia brasileira. Mas
sob economia aberta, a partir de 1990, a intensidade do capital e a produtividade aparente do
479

trabalho voltam a crescer, embora esse crescimento tenha se processado em taxas médias bem
inferiores ao do período 1950-1981.

LORANZI et alii (1980) observam que, em teoria, um regime de acumulação à

dominante extensiva caracterizar-se-ia pela ausência de ganhos de produtividade ( PR 0) e

pela constância da taxa de acumulação de capital ( g 0 ), em razão da ausência de progresso


técnico significativo em seus impactos sobre as estruturas de produção e de demanda. Em
uma análise empírica deve-se considerar o comportamento médio dessas variáveis para uma
taxionomia.

Conforme MIOTTI (1991), o caráter extensivo ou intensivo da acumulação de capital


depende das modalidades de conversão dos lucros em capital. E este processo pode assumir
duas dimensões básicas:

a) composição e natureza dos investimentos ponto de vista estático;

b) intensidade dos ganhos de produtividade ponto de vista dinâmico.

Conseqüentemente, em um regime de acumulação predominantemente extensivo, os


investimentos destinam-se primordialmente à ampliação da capacidade de produção. Segundo
o mesmo autor, o Chile, entre 1980 e 1995 apresentou esse padrão, que se expressava na
expansão da produção por meio da incorporação progressiva de força de trabalho. Num
regime de acumulação predominantemente intensivo, os investimentos destinam-se à
obtenção de elevados ganhos de produtividade pela introdução de novos processos produtivos
e formas organizacionais que tendem a substituir trabalho por capital fixo.

O exame do Gráfico 113 mostra que os ganhos de produtividade na economia


brasileira ocorreram com crescimento simultâneo do nível geral de emprego durante três
décadas consecutivas (1950-1980). A quebra de tendência em 1980 deve ser interpretada
como uma expressão do esgotamento e crise do regime de acumulação e do modo de
desenvolvimento baseado na industrialização por substituição de importações. Como já foi
constatado nos capítulos anteriores, os ganhos de produtividade foram praticamente nulos por
toda a década de 80. Mas a análise da evolução da WLN, desenvolvida no capítulo 4, revelou
um crescimento da produtividade na economia brasileira, nos anos 90. Numa primeira fase,
1990-1993, os ganhos de produtividade ocorreram concomitantemente à expansão do nível
geral de emprego. Mas, a partir de 1994, com a introdução da âncora cambial em um contexto
de abertura econômica e política monetária restritiva, os ganhos de produtividade passaram a
480

crescer às expensas do emprego. Isto é um indício de entrada da economia brasileira em um


novo padrão de acumulação intensiva. A hipótese a ser testada neste contexto, refere-se à
vigência de um regime de produtividade com inclinação positiva que se associa a um regime
de demanda com inclinação negativa e, portanto, inadequado à continuidade da acumulação
de capital e do crescimento econômico em bases dinamicamente sustentáveis.

GRÁFICO 113 EVOLUÇÃO DA PRODUTIVIDADE E DO EMPREGO TOTAL DA ECONOMIA


(1950-2002)

PR = produtividade aparente do trabalho; N = nível de emprego; diagrama de dispersão e Lowess smoothing


6,0
1980 2002
5,8
1994
5,6 1990
1973

5,4
Ln ( PR )

5,2

1963
5,0

4,8

4,6
1950

4,4
4,4 4,6 4,8 5,0 5,2 5,4 5,6 5,8 6,0
Ln ( N )

FONTE: Elaborado a partir de dados do nível de emprego estimados por MARQUETTI (2002) e IBGE.

MIOTTI (1991) observa ainda, que numa economia sob processo de industrialização
por substituição de importações, o analista pode ser levado a considerar que os investimentos
visam preponderantemente à expansão das capacidades de produção. No entanto, apenas a
análise macroeconômica pode identificar se há predominância de um tipo ou de outro de
acumulação. Por exemplo, pode acontecer que o processo de industrialização substitutiva de
importações seja iniciado pelas indústrias intensivas em capital. Neste caso, para que o nível
de emprego aumente é necessário que o ritmo de crescimento dos diferentes componentes da
demanda agregada seja superior às tendências do progresso técnico de economizar trabalho.
Este foi o caso do regime de acumulação responsável pelo milagre econômico brasileiro do
período 1967-1973.

Por último, para que a trajetória de acumulação e crescimento seja estável e capaz de
compensar os desequilíbrios de curto prazo, é preciso que a partilha dinâmica dos ganhos de
produtividade se encontre em certos limites, que por sua vez estão ligados aos parâmetros
481

definidos pelas características tecnológicas e de formação da demanda. Isto implica que o


modo de regulação deve ser capaz de reproduzir simultaneamente duas condições
fundamentais à viabilidade dinâmica do regime de acumulação:

a) uma partilha dos ganhos de produtividade entre capital, trabalho e governo que
não estrangule os lucros;

b) assegurar uma progressão favorável do emprego e da demanda.

O Gráfico 114 mostra a evolução das taxas de crescimento do investimento e da


intensidade do capital, com as respectivas taxas tendenciais obtidas pelo método de regressão
local (lowess smoothing).

GRÁFICO 114 INVESTIMENTO E INTENSIDADE DO CAPITAL (1950-2002)

Investimento (L)
Razão K / N (R)

40% 12%

30% 10%

8%
20%
6%
10%
4%
0%
2%
-10%
0%
-20% -2%

-30% -4%
1951 1957 1963 1969 1975 1981 1987 1993 1999
1954 1960 1966 1972 1978 1984 1990 1996 2002

FONTE: Série do nível geral de emprego obtida em MARQUETTI (2002) e IBGE. Série do estoque de capital
fixo estimada por MORANDI (2003).
NOTA: N = nível geral de emprego; K = estoque de capital fixo produtivo (sem construções residenciais). As
variáveis estão em taxa de crescimento anual.
Um teste econométrico com as séries em nível (log das variáveis) mostra a existência
de uma quebra estrutural em inícios de 1980. A equação estimada procura captar a influência
dos investimentos sobre a intensidade do capital, uma variável que expressa a evolução do
progresso técnico poupador de força de trabalho.

K
L = C1 + C2.LINV (26)
N
482

Onde LINV é o logaritmo do investimento e L(K/N) é o logaritmo da razão K/N. Os testes de


estabilidade confirmam a ocorrência de mudança estrutural nos anos 80 (Figura 37).

FIGURA 37 TESTES DE ESTABILIDADE DA RELAÇÃO 26 NO PERÍODO (1950-2002)

0.4 30 1.6

0.2
20
1.2
0.0
10
-0.2 0.8
0.00
-0.4 0
0.05 0.4
-10
0.10 0.0
-20
0.15
55 60 65 70 75 80 85 90 95 00 -30 -0.4
55 60 65 70 75 80 85 90 95 00 55 60 65 70 75 80 85 90 95 00
One-Step Probability Recursive Residuals
CUSUM 5% Signific anc e CUSUM of Squares 5% Significance

Pode ser constatado que entre 1950 e 1980, essas variáveis evoluem em tendências
muito próximas uma da outra. Nos anos 80 e 90, observa-se um nítido afastamento entre as
duas séries, sinalizando a vigência de um novo padrão de acumulação, onde os investimentos
realizados não visam, de forma preponderante, ao aumento da capacidade produtiva
instalada. A relevância deste resultado é que ele está coerente com a quase-estagnação ou o
baixo crescimento econômico que caracterizou essas duas últimas décadas do século XX.

FIGURA 38 A FUNÇÃO DE PROGRESSO TÉCNICO DE KALDOR

PIB P FPT
N

45º
K
N

A perda de dinamismo da economia brasileira é um resultado das transformações do


regime de acumulação e, portanto, das condições estruturais que lhe reproduzem a lógica e
483

natureza. Um modo alternativo de apreender essa problemática consiste numa abordagem em


termos de função de progresso técnico de Kaldor. Segundo KALDOR (1961), o progresso
técnico mensurado pela dinâmica dos ganhos de produtividade depende do ritmo de
acumulação de capital. A taxa de crescimento do produto por trabalhador aumenta com a taxa
de crescimento do capital por trabalhador, mas à taxa decrescente, ou seja, a derivada segunda
é negativa.

Segundo ARROUS (1999, p.154), a função de progresso técnico (FPT) é, após a


crítica da ausência de uma função investimento, o segundo elemento crítico, particularmente
conseqüente, que KALDOR empreende contra a teoria neoclássica do crescimento. Esta
última recorre às funções de produção com fatores substituíveis e progresso técnico neutro
para medir as contribuições dos fatores de produção ao crescimento econômico.
Evidentemente, uma tal démarche está inteiramente fora dos princípios teóricos e
metodológicos das análises em termos de regulação. De fato, a crítica de KALDOR e sua
metodologia de análise são recuperados numa abordagem regulacionista do crescimento e da
acumulação de capital. Aliás, KEYNES e KALECKI também fornecem o substrato teórico e
metodológico para formalizações macroeconômicas alternativas à visão neoclássica e suas
variantes contemporâneas. E é por isso que neste trabalho, os modelos macroeconômicos
utilizados, seja implícita ou explicitamente, serão denominados como modelos K3, isto é,
derivados de uma tradição teórica herdeira dos legados de KALDOR, KALECKI e KEYNES.

Conseqüentemente, KALDOR substitui a função de produção da abordagem


neoclássica do crescimento por uma função de progresso técnico. Nas palavras do autor, a
justificativa para esta nova função é a seguinte:

Dans um monde dans lequel la tecnologie est incorporée dans l équipement


en capital et où le progrès de la connaissance et la production de nouveaux
biens de capital sont continus, il est impossible d isoler la croissance de la
productivité qui est due à l accumulation du capital en tant que telle de la
croissance de la productivité qui est due à des progrès de la connaissance
techinique. Il n existe pas de chose telle qu un ensemble de plans qui reflète
un état donné des connaissances les connaissance requises pour fabriquer,
disons, le Concorde n ont été élaborées qu au cours du processus de dessin et
de développement de l avion ; les coûts d obtention des nouvelles
connaissances nécessaires sont causalement indistinguables des autres
éléments de l investissement » (Kaldor, 1978, p. 9-10).
Para KALDOR, a conseqüência direta dessa nova démarche seria a irrelevância das
noções de função de produção e a inconsistência das teorias que explicam os preços dos
484

fatores de produção (ou de suas parcelas na repartição) sobre a base do princípio da


produtividade marginal.

Conforme ARROUS (1999), para representar graficamente a função de progresso


técnico, KALDOR distingue entre a posição e a forma da curva correspondente. A posição
desta curva é obtida supondo-se que certos acréscimos de produtividade poderiam existir
mesmo se o capital por trabalhador permanecesse constante. Há um certo número de
inovações por exemplo, de melhorias organizacionais que permitem elevar a produção
sem investimento suplementar. Com relação à forma da curva, o crescimento da
produtividade vai depender da taxa de crescimento do estoque de capital, com a curva sendo
crescente a uma taxa decrescente.

A FPT está representada na Figura 38. Em termos globais, esta curva reflete, nas
palavras de seu criador, o grau de dinamismo técnico da economia no sentido amplo. Nos
períodos onde se observam inovações técnicas e organizacionais, a curva é deslocada para
cima. E no caso de fraca absorção de progresso técnico, move-se para baixo. Sua convexidade
traduz, em cada ponto, em que medida um investimento engendra ganhos de produtividade.
Até um certo ponto P, de interseção da curva de progresso técnico com a reta de 45 º, a taxa
de crescimento da produtividade é maior do que a taxa de acumulação de capital. Neste caso,
variações na taxa de lucro impulsionarão a taxa de acumulação em direção a P, através de
novos investimentos. Além de P, a taxa de acumulação supera a taxa de crescimento da
produtividade, configurando um padrão de rendimento decrescente.323 No ponto P, a razão
capital/produto (K/PIB) é constante, pois o produto e o estoque de capital fixo teriam a
mesma taxa de crescimento.

Em síntese, segundo KALDOR, uma economia onde a acumulação de capital é um


processo contínuo, a fronteira que constitui a função de produção não é jamais atingida, pois
os capitais materiais não são jamais plenamente adaptados aos níveis tecnológicos esperados.
Conseqüentemente, a economia não está numa situação de equilíbrio estacionário de longo
prazo. GAFFARD (1999) observa que na perspectiva kaldoriana, o progresso técnico não
pode ser assimilado a um fator de produção que é preciso tomar em consideração juntamente
com o capital. O progresso técnico e a acumulação de capital são a mesma coisa, e é isto que

323
Conforme GAFFARD (1997, p. 186), isto decorreria de um tipo de lei de rendimentos decrescentes cuja
justificação permaneceria estritamente formal, isto é, a demonstração da existência de um equilíbrio, neste caso,
no ponto P.
485

exprime a função de progresso técnico, cuja principal virtude é mostrar a existência de


trajetórias fora do equilíbrio para a evolução da economia.

GRÁFICO 115 FUNÇÃO DE PROGRESSO TÉCNICO DE KALDOR E A ECONOMIA BRASILEIRA


(1950-2002)

Diagrama de dispersão e lowess smoothing


6,0
1980
Curva de Progresso Técnico de Kaldor 2002
5,8

5,6 1973 1990


Teórica
Ln (PR = PIB / N)

Empírica
5,4

5,2 1964

5,0
1955
4,8

4,6 1950

4,4
4,4 4,6 4,8 5,0 5,2 5,4 5,6 5,8 6,0 6,2 6,4 6,6
Ln (K / N)

FONTE: Série do nível geral de emprego obtida em MARQUETTI (2002) e IBGE. Série do estoque de capital
fixo estimado por MORANDI (2003).
NOTA: Ln significa o logaritmo natural da variável em questão.
O Gráfico 115 mostra a função de progresso técnico de KALDOR para a economia
brasileira, no período 1950-2002. De forma análoga ao observado para as variáveis plotadas
nos Gráficos 112 e 113, constata-se uma evolução regular entre 1950-1980 para a FPT.
Todavia, na década de 80, há uma quebra estrutural que se expressa numa forte redução dos
ganhos de produtividade. Após 1990, a FTP parece retomar uma fase de expansão, sugerindo
que a economia brasileira poderia ter entrado numa nova trajetória tecnológica que, por sua
vez, pode constituir-se em uma das bases para um novo regime de acumulação.

5.4 A evolução da taxa de lucro na economia brasileira e seus determinantes

Uma questão fundamental nas análises em termos de modo de regulação e de regimes


de crescimento refere-se aos determinantes da taxa de acumulação de capital. Numa economia
que se organiza em bases capitalistas, a busca do lucro é a força motriz que orienta os projetos
de investimento necessários à continuidade da acumulação. Em conseqüência, a taxa de lucro
surge como uma categoria-chave, condicionado de forma decisiva a dinâmica do crescimento
econômico.
486

A análise que se segue proporciona uma primeira abordagem dos determinantes da


acumulação de capital, no nível da economia nacional, a partir de três variáveis básicas que
respondem pelo comportamento da taxa de lucro: a produtividade do capital, a produtividade
do trabalho e o salário médio real.

Considerando-se o produto total da economia segundo a divisão primária da renda,


tem-se que Y W (i) , onde Y é o produto interno bruto, é a massa de lucro bruto e
W
W a massa salarial. Mas esta equação é equivalente à 1 (ii) e sendo a produtividade
Y Y
Y
aparente do trabalho dada por PR N
N
(iii) e a massa salarial W N .wr (iv), onde N é o

nível geral de emprego e wr o salário médio real, a substituição de (iii) e (iv) em (ii) conduz à

wr
Y. 1 . Dividindo-se esta equação pelo estoque de capital fixo produtivo K,
PR N

obtém-se a equação geral da taxa de lucro bruto:

Y wr wr
1 , ou seja r PR K
1 (28).
K K PR N PR N

A equação (28) expressa a taxa de lucro em função da produtividade do capital, da


r r
produtividade aparente do trabalho e do salário médio real, onde 0; 0 e
PR K PR N

r
0 . Isto significa que variações positivas no salário médio real que não são
wr
compensadas pelos ganhos de produtividade tendem a reduzir a taxa média de lucro bruto da
economia. Por outro lado, esta relação mostra que é possível haver aumentos sustentáveis do
salário médio real desde que os ganhos de produtividade sejam capazes de manter inalterada a
taxa de lucro média.
487

TABELA 36 ÍNDICES DA PRODUTIVIDADE, SALÁRIO MÉDIO E TAXA DE LUCRO (1950-2002)


continuação
ANO PRk = Y/K PRn =Y/N wr = W / N r ANO PRk = Y/K PRn =Y/N wr = W / N r

1950 100,00 100,00 100,00 100,00 1981 50,59 328,94 318,72 48,23
1951 90,92 103,87 100,01 95,05 1982 48,89 314,64 309,52 45,37
1952 85,27 110,79 110,52 85,69 1983 46,33 302,02 308,24 40,81
1953 81,05 110,85 108,65 79,66 1984 47,75 307,27 310,58 42,37
1954 79,34 117,58 113,79 78,82 1985 50,04 309,50 302,94 46,01
1955 79,82 121,21 124,51 73,77 1986 51,45 322,63 325,31 46,79
1956 75,89 122,00 135,28 64,83 1987 51,22 322,53 329,17 45,80
1957 74,27 132,39 147,14 64,35 1988 49,59 315,10 326,23 43,42
1958 74,94 136,46 150,98 65,12 1989 49,72 314,91 325,27 43,49
1959 74,73 144,78 158,04 66,09 1990 46,58 294,05 322,37 38,01
1960 74,93 149,73 162,33 66,15 1991 46,40 294,81 300,71 40,49
1961 76,20 164,19 174,76 67,13 1992 45,68 292,11 304,91 38,83
1962 75,77 166,88 178,86 66,52 1993 47,39 304,55 328,42 39,00
1963 71,26 170,21 184,54 61,67 1994 49,19 318,23 305,69 45,54
1964 69,56 171,47 179,96 61,66 1995 50,13 327,24 302,98 47,97
1965 66,82 176,41 183,83 60,03 1996 50,45 344,15 319,11 48,10
1966 66,08 178,62 186,13 60,09 1997 50,93 353,29 318,76 49,74
1967 64,14 183,23 192,76 57,48 1998 49,89 350,01 326,15 47,48
1968 64,60 198,62 205,01 59,91 1999 49,64 342,55 314,75 47,32
1969 64,54 207,95 211,04 61,16 2000 51,04 343,37 310,92 49,31
1970 65,27 222,88 221,11 62,90 2001 50,85 351,82 310,41 50,18
1971 66,06 240,21 233,02 65,43 2002 51,44 348,05 297,08 51,49
1972 66,77 259,62 246,79 67,73
1973 67,85 274,22 253,32 71,33
1974 65,17 290,05 267,23 68,93
1975 61,08 292,08 273,38 63,57
1976 60,43 319,76 293,83 63,39
1977 58,02 317,66 294,99 59,19
1978 56,06 322,33 301,69 56,49
1979 55,48 334,91 313,47 55,52
1980 55,89 351,85 327,95 56,39

FONTE: Elaborado a partir dos dados do IBGE e MARQUETTI (2002).


488

A etapa seguinte consiste em se aplicar esta formulação aos dados disponíveis da


economia brasileira.

GRÁFICO 116 DINÂMICA DOS DETERMINANTES DA TAXA DE LUCRO (1950-2002)

Produtividade do capital: PRk = Y/ K


Produtividade do trabalho: PRn = Y / N
Salário médio real: wr = W / N
Taxa média de lucro bruto
10%
8%
Taxas reais de variação

6%
4%
2%
0%
-2%
-4%
-6%
-8%
-10%
1951 1957 1963 1969 1975 1981 1987 1993 1999
1954 1960 1966 1972 1978 1984 1990 1996 2002

FONTE: Elaborado a partir dos dados do IBGE e MARQUETTI (2002).

NOTA: Séries filtradas pelo filtro 4253H.

A dinâmica dos determinantes da taxa de lucro de acordo com a equação (28) pode ser
observada no Gráfico 116. As séries foram suavizadas pelo filtro 4253H para se eliminar as
flutuações de curto prazo, de maneira que o comportamento tendencial e cíclico fosse
explicitado.

Entre 1951 e 1963, o padrão de acumulação de capital foi predominantemente


extensivo, pois os ganhos de produtividade permanecem estagnados entre 1951-1960,
inclusive com queda entre 1961-1963.324 Este fato está coerente com a lógica do Plano de
Metas que visava justamente ampliar a capacidade produtiva instalada e consolidar a
industrialização do país. Da análise do Gráfico 116, considerou-se o período completo 1950-
1980 como caracterizado pela vigência de um processo de acumulação à dominante intensiva.

A crise de 1960-63 marca a passagem para um regime de acumulação à dominante


intensiva, precisamente o regime de crescimento responsável pelo milagre econômico . A

324
Como foi explicitado acima, em termos teóricos rigorosos, os ganhos de produtividade deveriam ser nulos
para caracterizar a dominância da acumulação extensiva. Mas numa análise empírica é suficiente considerar os
ganhos de produtividade como fracos ou em queda.
489

taxa de lucro se recupera, puxada mais pela produtividade do trabalho do que pela
produtividade do capital. É importante, por suas conseqüências macrodinâmicas, observar-se
que a taxa média de crescimento do salário médio real permaneceu aquém da taxa média de
crescimento da produtividade do trabalho, o que confirma a concentração funcional da renda
ocorrida sob o regime político arbitrário pós-64.325 Após 1973, todas as variáveis entram em
uma trajetória de declínio, com a ressalva de que entre 1975 e 1980, a taxa de lucro e a
produtividade do capital se estabilizam. Provavelmente como um dos efeitos da marcha
326
forçada, resultante do Segundo Plano Nacional de Desenvolvimento (II PND),
implementado no período 1975-1979.

Nas décadas de 80 e 90, os ciclos apresentam-se com menor amplitude e


periodicidade, ou seja, os períodos de expansão são mais curtos e processam-se a taxas de
crescimento inferiores às observadas nas etapas anteriores. De uma perspectiva mais geral,
pode-se considerar que esta dinâmica observada nesses últimos 20 anos não está condizente
com o potencial produtivo da economia brasileira.

Uma análise de co-integração pode revelar, de forma mais precisa, as influências da


produtividade do capital, da produtividade do trabalho e do salário médio real no
comportamento da taxa de lucro na economia brasileira. Como a análise de co-integração está
sendo mobilizada de forma recorrente neste trabalho, antes de prosseguir com novos testes
econométricos, é relevante considerar as observações a seguir.

A ausência de co-integração implica que não há equilíbrio de longo prazo entre as


variáveis do modelo em questão. Mas W. ENDERS (1995, p.359) adverte que:

the use of the term equilibrium is unfortunate since economic theorists and
econometricians use the term in different ways. Economic theorists usually
employ the term to refer to an equality between desired and actual
transactions. The econometric use of term makes reference to any long-run
relationship among nonstationary variables. Cointegration does not require
that the long run (i.e. equilibrium) relationship be generated by market forces
or the behavioral rules of individuals. In Engle and Granger s use of the term,
the equilibrium relationship may be causal, behavioral, or simply a reduced-
form relationship among similarly trending variables. 327

Isto significa que a existência de co-integração não implica que a análise esteja
refletindo a lógica dos equilíbrios de mercado , tão cara a tradição teórica neoclássica e suas
325
Na verdade, a concentração funcional da renda é um fato estilizado já bastante discutido na literatura
econômica sobre este período da evolução da economia brasileira no século XX.
326
Expressão cunhada por CASTRO e SOUZA (1985), em A Economia Brasileira em Marcha Forçada.
327
Os grifos são nossos.
490

variantes contemporâneas. Conseqüentemente, do ponto de vista de uma abordagem


regulacionista, uma relação de longo prazo ou espaço de co-integração entre as variáveis
pode estar expressando a coerência macroeconômica de um modo de regulação estabilizado.
Mas pode também ser a expressão de alguma regularidade de crise328, induzida por seu
esgotamento. A questão empiricamente relevante neste contexto, é que a existência de
relações de co-integração entre variáveis macroeconômicas pode ser um resultado
dependente de estruturas organizacionais e institucionais, não significando a vigência de
algum equilíbrio puramente mercantil.

No que concerne às mudanças estruturais - já que esta análise também se volta para a
identificação dos períodos de quebra das regularidades macroeconômicas fundamentais ao
processo de acumulação de capital (análise dos regimes de acumulação ou de crescimento) é
igualmente relevante considerar as seguintes definições a seguir:

Conforme J. STOCK e M. WATSON (2004, p. 318):


Quebras podem surgir de uma mudança discreta nos coeficientes da
regressão da população em uma data precisa ou de uma evolução gradual dos
coeficientes ao longo de um período temporal mais longo.

E ainda segundo G.S. MADDALA (2003, p. 304 e 305):


Os testes de co-integração têm sido usados para uma grande variedade de
problemas (...). Contudo, o uso desses testes e suas interpretações apresentam
muitos problemas, como os casos das raízes unitárias e da co-integração, em
que há muita ênfase no teste e pouca na estimação.

Este econometrista chama também a atenção para o excessivo enfoque nos testes de
co-integração de tal maneira que o analista desconsidera a influência da instabilidade
estrutural:
Ao estimarmos as regressões de co-integração, muitos dos problemas que
geralmente discutimos no caso dos modelos de regressão usual e de equações
simultâneas (por exemplo, variáveis omitidas, instabilidade dos parâmetros
devido à mudança estrutural, multicolinearidade, heterocedasticidade, etc.)
são comumente ignorados, e a atenção concentra-se no teste de co-integração,

328
A idéia de regularidade de crise pode ser apreendida a partir da noção de regime de crise encontrada em
BILLAUDOT (2002). Uma conjuntura de crise econômica não significa necessariamente um estado de caos ,
no sentido da ausência de qualquer forma de regularidade dos comportamentos. Por exemplo, quando aplicada à
crise dos anos 80, o potencial heurístico dessa idéia parece ser irrecusável. As tendências estagnacionsitas e de
alta inflação eram tanto o resultado quanto a premissa de todo um conjunto de dispositivos institucionais e de
comportamentos entre atores econômicos que outra coisa não faziam do que reproduzir o regime de crise
característico daquele período da história econômica brasileira. Um regime de crise pode então emergir como um
mecanismo de defesa ou reação diante da afirmação dos obstáculos à continuidade do processo de acumulação
em suas bases econômicas normais.
491

como se esse fosse o objetivo maior de toda a análise. Mesmo se se está


desenvolvendo uma análise com variáveis I(1), muitos desses problemas não
devem ser ignorados, pois eles também afetam os testes de co-integração.

Com relação aos testes de raízes unitárias que compõem a primeira etapa das análises de co-
integração, MADDALA observa que:
Muitos testes foram sugeridos para raízes unitárias. Em sua maioria, a
hipótese nula é que há uma raiz unitária, a qual é rejeitada apenas quando há
fortes evidências contra ela. Usando esses testes, descobriu-se que a maior
parte das séries temporais econômicas tem raízes unitárias. Entretanto, alguns
testes foram desenvolvidos de forma a usar a estacionaridade como a hipótese
nula e a raiz unitária como a hipótese alternativa. Com o uso desses testes,
descobriu-se que a maior parte das séries temporais não tem uma raiz
unitária. (...). A evidência das raízes unitárias em séries temporais econômicas
é aparentemente frágil. 329
Voltando à equação 28, ela também permite apreender o modo como a questão
distributiva, ao afetar a taxa de lucro, condiciona de forma decisiva a dinâmica da acumulação
de capital e então, a taxa de crescimento econômico. Retomando-se a assertiva de LIPIETZ
(1987), já mobilizada neste trabalho durante a análise da WLN, a repartição do valor
adicionado entre salários e lucros estabelece uma nova contradição: trop de salaire et pas
assez d accumulation, ou trop de profits et pas assez de demande. C est le problème
fondamental de la régulation du rapport salarial ». Uma contradição que decorre da
ambigüidade do salário, que se apresenta simultaneamente como um custo de produção e fator
básico de demanda efetiva nas economias capitalistas.

Como observam BOWLES e BOYER [1990 e 1995], a taxa de salário não é apenas o
custo da força de trabalho, é também um determinante do nível de demanda agregada e então
da própria demanda de trabalho. Enquanto um aumento de salário pode desencorajar o
emprego pela elevação dos custos de produção, ele pode também promover o emprego
suportando um nível mais alto de demanda. E é por isso que uma apropriada distribuição de
renda é um dos fatores que reconciliam esse caráter ambíguo do salário como custo e fator
de demanda.330 Além disso, como KALECKI havia notado, a taxa de salário também surge
como um importante instrumento nas estratégias de gestão e disciplina nas relações entre
capital e trabalho assalariado.331 Portanto, mesmo indiretamente, o nível de salário

329
Os grifos são nossos, pois se trata de uma afirmação muito forte, sobretudo quando proveniente de um
econometrista internacionalmente reconhecido.
330
Para maiores detalhes, consultar BOWLES e BOYER (1995 e 1990) que desenvolvem uma interessante
análise teórica e uma investigação empírica acerca dessa problemática keynesiana e kaleckiana.
331
As teorias do salário de eficiência terminam por confirmar essa intuição kaleckiana.
492

influenciará o nível de utilização da capacidade e o comportamento da produtividade do


trabalho.

O Gráfico 117 mostra a evolução em nível e em taxa de variação anual da taxa de


lucro média da economia brasileira, no período 1950-2002. Podem ser destacados os
seguintes fatos característicos: inicialmente a taxa de lucro permaneceu em uma trajetória
forte declínio entre 1950-1956. No período de implementação do Plano de Metas, ela se
recupera até a eclosão da crise de 1960-63. Alias, a queda da taxa de lucro neste último
período é justamente uma expressão da crise econômica e política que desembocaria no
regime arbitrário pós-1964. Durante o período correspondente ao milagre econômico (1967-
1973), a trajetória foi de crescimento forte e regular da taxa de lucro, uma das expressões da
vigência de um regime de acumulação.

A crise do milagre é flagrante, pois uma de suas expressões mais manifestas é


precisamente a queda tendencial, forte e prolongada da taxa média de lucro da economia
brasileira, no período 1973-1983. Isto significa uma década de queda sistemática de uma
variável fundamental ao processo de acumulação de capital.

Deve ser ressaltado que apesar dos anos 90 serem considerados uma segunda década
perdida em termos de crescimento e de desenvolvimento econômico, foi neste período que a
taxa de lucro saiu de sua trajetória de declínio. Considerando-se a evolução nesta década,
pode ser observado que foi em 1990, com a recessão imposta pelo Plano Collor, que a taxa de
lucro atingiu seu nível historicamente mais baixo (19,6%). Mas a entrada em uma trajetória de
recuperação começa a partir de 1994, com a implementação do Plano Real. Em 2002, a taxa
de lucro atinge o nível de 25,8%, o mais alto desde a recessão de 1983.

Observando-se a série das taxas de variação da taxa de lucro pode ser contatado o
aumento da volatilidade das taxas a partir da crise do milagre . Nos anos 80 e 90, as
oscilações em torno da série tendencial, obtida por regressão local (lowess smoothing),
possuem amplitudes bem superiores às vigentes entre 1950-1980, período de
desenvolvimento e consolidação do modelo de industrialização por substituição de
importações.
493

GRÁFICO 117 NÍVEL E VARIAÇÃO ANUAL DA TAXA DE LUCRO MÉDIA DA ECONOMIA


BRASILEIRA (1950-2002)

Taxa de Lucro (L)


Variação anual e tendencial por lowess (R)
55% 20%

50% 15%

Variação anual da taxa de lucro


45% 10%
Nível da taxa de lucro

40% 5%

35% 0%

30% -5%

25% -10%

20% -15%

15% -20%
1950
1952
1954
1956
1958
1960
1962
1964
1966
1968
1970
1972
1974
1976
1978
1980
1982
1984
1986
1988
1990
1992
1994
1996
1998
2000
2002
FONTE: Série da taxa de lucro calculada como a razão entre o fluxo de lucro bruto macroeconômico e o estoque
de capital fixo produtivo.
NOTA: Maiores detalhes da metodologia de construção das séries encontram-se no anexo.
Na Tabela 37 encontram-se as variações anuais da taxa de lucro entre cada um dos
turning points (picos e vales, pontos de inflexão) observados no Gráfico 117. O exame dos
desvios-padrão permite constatar-se uma crescente volatilidade a partir de 1973. Em termos
de coeficiente de dispersão, observa-se que apenas no período correspondente aos anos de
forte crescimento do milagre é que as taxas de lucro permaneceram numa trajetória bastante
estável de expansão.

Quando se consideram as taxas de variação da taxa de lucro, observa-se que a série


tendencial permanece numa trajetória de crescimento entre 1980 e 2002. Reconhecendo-se
que os pontos de queda acentuada foram provocados deliberadamente por intervenções do
Estado (recessões de 1981-1983; Planos Collor I e II, 1990-1992; aumento das taxas de juros
em resposta à crise cambial de 1998-1999), não há razões para supor que, estruturalmente, a
economia brasileira apresente problemas de rentabilidade ou de valorização dos capitais.
Desde que a política econômica seja compatível com a retomada dos investimentos
produtivos, isto é, que não promova a elevação do custo de uso do capital e renda financeira,
o processo de acumulação e o crescimento econômico sustentável são factíveis.
494

Ressalte-se também o fato de que a taxa média de expansão anual da taxa de lucro no
período 1993-2002 foi similar a do período 1967-1973. Todavia, a volatilidade foi
substancialmente maior nos anos de globalização do que durante o milagre . Essa
instabilidade das taxas de lucro está por trás das dificuldades de recuperação da taxa de
acumulação de capital e do crescimento econômico neste último período analisado.

TABELA 37 VOLATILIDADE DA TAXA MÉDIA DE LUCRO (1950-2002)

Taxa média de
Turning Coeficiente de
variação da taxa Desvio-Padrão
points Dispersão
de lucro (% a.a.)
1950
1956 -6,3% 3,9% -0,6
1967 -1,0% 2,7% -2,7
1973 3,2% 1,1% 0,4
1983 -4,7% 4,8% -1,0
1993 -0,3% 6,1% -22,2
2002 3,5% 5,8% 1,7

FONTE: Elaborado a partir da série de taxa de lucro constante do Gráfico 9.


NOTA 1: As taxas anuais de variação foram calculadas entre os turning points.
NOTA 2: O ponto acima das variáveis (.) significa, como de costume, que se trata de taxa de crescimento da
variável em questão.

TABELA 38 TAXA DE LUCRO, PRODUTIVIDADE DO CAPITAL, PRODUTIVIDADE DO


TRABALHO E SALÁRIO MÉDIO REAL (1950-2002)
Turning
points da
Taxa de r (%) r PR K PR N wr
Lucro
1950 50,16
1956 32,52 -6,32 -4,45 3,40 5,27
1967 28,83 -1,00 -1,49 3,81 3,31
1973 35,78 3,23 0,94 6,96 4,67
1983 20,47 -4,65 -3,70 1,09 2,03
1993 19,56 -0,31 0,28 0,13 0,72
2002 25,83 3,50 0,93 1,52 -1,05

NOTA: O ponto acima das variáveis (.) significa, como de costume, que se trata de taxa de crescimento da
variável em questão. Os valores estão em percentagem.

A Tabela 38 exibe os níveis da taxa de lucro em cada turning point. Observa-se no


primeiro período (1950-1956), uma queda da taxa de lucro, que passa de 50,2% para 32,5%.
Essa redução foi provocada por uma baixa média de 4,5% na produtividade do capital que
combinada com um aumento de 3,4% na produtividade do trabalho foi insuficiente para
compensar uma expansão de 5,3% no salário médio real. Um comportamento análogo ocorreu
495

no segundo e quarto períodos, respectivamente entre (1956-1967) e (1973-1983), ressalvadas


as diferenças de magnitude.
O quinto período (1983-1993) inclui-se na década perdida dos 80, sendo o
subperíodo 1990-93 um prolongamento das tendências à estagnação do produto e à alta
inflação. A taxa de lucro atinge o nível de 19,6% no ano de 1993 e depois inicia uma
trajetória de recuperação, no período de vigência do Real.
O sexto e último período destaca-se por sua singularidade. Em primeiro lugar,
apresenta-se como o único período em que o salário médio real permaneceu em queda média
de 1,1% ao ano entre 1993-2002, enquanto as produtividades do capital e do trabalho,
cresceram à taxas médias anuais de 0,9% e 1,5%, respectivamente. Mas um fato característico
se destaca quando se compara este período com o do milagre econômico (terceiro período ,
1967-1973). Quanto às taxas de expansão da taxa de lucro, elas se mostram muito similares
(3,5% e 3,2%), inclusive as relativas às produtividades do capital são iguais . O contraste é
observado em duas variáveis: primeiramente, nas produtividades do trabalho, que no período
do milagre foi de 7,0 % a.a enquanto no período 1993-2002, situa-se em apenas 1,5% a.a.332
Mas também no que concerne à variação do salário médio real que no período do milagre
cresceu a uma taxa média anual de 4,7% e no período 1993-2002, permaneceu em queda de -
1,0 % a.a.

wr
A equação r PR K
1 , algebricamente simples, expressa no entanto,
PR N

relações macroeconômicas fundamentais à dinâmica de um regime de crescimento. A taxa de


acumulação de capital é uma variável que responde às variações na taxa de lucro e então na
taxa de salário da economia. Isto significa que essa equação expressa a taxa de lucro como
função de variáveis que são fundamentais por seus efeitos sobre as condições de produção e
de distribuição do valor adicionado total. Condições de produção e condições de repartição do
excedente econômico são de fato duas dimensões ou momentos de um mesmo processo: a
acumulação de capital.

Como a parcela salarial no produto ou a wage share corresponde à razão entre o

wr
salário médio real e a produtividade aparente do trabalho, 1 expressa a profit
PR N

share, ou a participação dos lucros no valor adicionado total da economia. Conseqüentemente,


332
Trata-se da produtividade do trabalho para a economia nacional e não dos ganhos de produtividade
observados na indústria de transformação brasileira. Estes últimos foram objeto de vários trabalhos na segunda
metade dos anos 90, em função do debate sobre suas origens e verdadeira magnitude.
496

o conflito distributivo está contido nesta formulação da taxa de lucro média, influenciando as
decisões de investimento e acumulação de capital produtivo.

A abordagem a seguir baseia-se na metodologia proposta por UEMURA (2000) e


BOWLES e BOYER (1990 e 1995) para a análise dos determinantes da taxa de lucro.
Diferentemente do método anterior, a taxa de lucro é agora considerada em termos nominais.
A partir das contas nacionais pode ser obtida uma fórmula básica para a taxa de lucro
média ou geral da economia:

.p y Y liq Y Y pot
p y
r =
.p Y liq
Y Y pot
K p
k k

Os símbolos significam as seguintes variáveis:


r taxa de lucro em termos nominais; massa de lucro bruto; K estoque bruto
de capital fixo produtivo, ou seja, as construções residenciais não são consideradas;

Y liq
produto interno líquido = Y (PIB) depreciação do estoque de capital fixo;

Y pot
produto potencial; p y
deflator implícito do produto; p k
deflator implício

da formação de capital fixo.


As razões decorrentes dessas variáveis são então:

é a profit share ou participação dos lucros no produto;


Y
W
w s
Y
é a wage share ou participação dos salários no produto;

Y liq
é a razão produto líquido / produto bruto, representando portanto, a renda
Y
efetivamente disponível após a dedução da parcela correspondente à depreciação do
estoque de capital fixo;
Y
u é a taxa de utilização da capacidade produtiva instalada;
Y pot

Y pot
é a razão produto potencial / estoque de capital fixo;
K

p y
p é a razão preços do produto / preços do capital;
p k

A taxa de lucro ( r ) pode então ser formulada como o produto dessas quatro razões:
497

r . .u . . p

Aplicando-se logaritmo, chega-se à relação entre as taxas de variação dessas variáveis:

r + +u + + p
Mas a wage-share pode ser expressa como a razão entre o salário médio real e a
produtividade do trabalho, da seguinte maneira:

W wr.N wr
w s
; onde W é a massa salarial; wr o salário médio
Y Y PRL n

real; N é o nível geral de emprego e PRn é a produtividade líquida do trabalho.


Esta última equação mostra que apesar de sua determinação ser um processo
considerado complexo, pois envolve a própria estrutura institucional e organizacional da
WLN333, a wage-share depende da produtividade líquida do trabalho e do salário médio.
Mas quanto aos determinantes da produtividade do trabalho ( PR ), eles também são
dependentes de fatores que não se reduzem a questões puramente técnicas ou mercantis. No
entanto, conforme UEMURA (2000), é possível identificar vários desses fatores, incluindo a
taxa de utilização da capacidade produtiva ( u ), a taxa de emprego ( ) e a taxa de
I
acumulação ( g ; I = formação bruta de capital fixo). Cada uma dessas variáveis tem seu
K
próprio horizonte temporal de atuação sobre a dinâmica da produtividade: no curto prazo, a
utilização da capacidade (u) e a taxa de emprego ( ); no longo prazo, a taxa de acumulação
(I / K) tem um efeito positivo sobre o crescimento da produtividade. Expressando a existência
de retornos crescentes de escala dinâmicos, trata-se da chamada lei de Kaldor-Verdoorn
[KALDOR (1978)].

PR (u , ). PR 0 . e[ .( I / K ) t ] , com 0; 0; 0
u I /K

Em conseqüência, a taxa de crescimento do emprego pode ser formulada como

N Y PR .
O efeito da utilização da capacidade produtiva sobre a evolução da produtividade
tende a ser muito forte em economias com um grande contingente de força de trabalho
disponível durante as recessões. Em segundo lugar, um decréscimo do nível de emprego tende
333
É, portanto, uma variável dependente do modo de regulação vigente e não um resultado de mecanismos
puramente mercantis .
498

a aumentar a produtividade através do que BOWLES e BOYER (1990) chamam por efeito
exército de reserva . A redução dos quadros tende a aumentar a pressão sobre os
trabalhadores remanescentes em termos de maior disciplina e aceitação de níveis mais
elevados de intensidade do trabalho.
Por sua importância na explicação dos ganhos dinâmicos de produtividade, os efeitos
de longo prazo em termos da relação de Kaldor-Verdoorn serão, mais adiante, empiricamente
testados para o caso brasileiro.
499

TABELA 39 OS COMPONENTES DA TAXA DE LUCRO NA ECONOMIA BRASILEIRA (1950-


2002)

ANO r nom u p
1950 0,90471 0,54357 0,96210 0,98647 0,97228 1,80368
1951 0,85326 0,56123 0,96338 0,97116 0,90795 1,78973
1952 0,81200 0,54492 0,96188 0,96033 0,85393 1,88910
1953 0,67344 0,55447 0,96022 0,96327 0,77905 1,68551
1954 0,62663 0,55977 0,96168 0,96551 0,76064 1,58503
1955 0,61057 0,53059 0,96116 0,97264 0,74602 1,65000
1956 0,53673 0,49000 0,96125 0,96118 0,71830 1,65049
1957 0,55428 0,48822 0,96234 0,95210 0,72156 1,71725
1958 0,48699 0,49073 0,96223 0,97990 0,70594 1,49090
1959 0,48848 0,49792 0,96256 0,98901 0,69935 1,47353
1960 0,50308 0,50142 0,96291 0,98903 0,69481 1,51627
1961 0,48373 0,51144 0,96252 0,99054 0,69058 1,43653
1962 0,43818 0,50772 0,96260 0,98273 0,69476 1,31317
1963 0,39623 0,50146 0,96284 0,95190 0,67306 1,28089
1964 0,42444 0,51835 0,96335 0,94393 0,65614 1,37238
1965 0,45040 0,52181 0,96375 0,90810 0,65932 1,49585
1966 0,46709 0,52198 0,96343 0,93165 0,64330 1,54975
1967 0,43457 0,51766 0,96235 0,91995 0,62911 1,50727
1968 0,44455 0,52688 0,96344 0,94834 0,62423 1,47934
1969 0,44321 0,53558 0,96322 0,96039 0,61917 1,44476
1970 0,44438 0,54679 0,96340 0,97071 0,61699 1,40850
1971 0,45308 0,55773 0,96325 0,97586 0,62600 1,38052
1972 0,47880 0,56762 0,96287 0,98173 0,63318 1,40933
1973 0,53434 0,58023 0,96398 1,00000 0,63966 1,49349
1974 0,50417 0,58177 0,96343 0,99276 0,62135 1,45823
1975 0,45435 0,57474 0,96306 0,97968 0,58806 1,42482
1976 0,45761 0,58363 0,96235 0,99066 0,57142 1,43927
1977 0,42269 0,57955 0,96109 0,96519 0,55226 1,42365
1978 0,38592 0,57583 0,96125 0,95634 0,53530 1,36196
1979 0,35175 0,57617 0,96068 0,95263 0,52812 1,26314
1980 0,36808 0,57768 0,96138 0,96006 0,53047 1,30138
1981 0,27991 0,55968 0,96089 0,90972 0,49443 1,15716
1982 0,25738 0,55221 0,96110 0,89675 0,47811 1,13108
1983 0,23013 0,53397 0,96099 0,87522 0,45580 1,12420
1984 0,23863 0,53865 0,96134 0,88301 0,46482 1,12274
1985 0,27423 0,55410 0,96206 0,91249 0,47443 1,18830
1986 0,28623 0,53916 0,96261 0,94832 0,47681 1,21968
1987 0,23058 0,53324 0,96234 0,93562 0,47851 1,00366
1988 0,19805 0,52618 0,96188 0,92583 0,46474 0,90946
1989 0,17624 0,52729 0,96202 0,93567 0,45962 0,80787
1990 0,18656 0,49605 0,96161 0,88449 0,45194 0,97843
1991 0,21381 0,53405 0,96138 0,88837 0,44531 1,05270
1992 0,18920 0,52237 0,96113 0,86900 0,44638 0,97148
1993 0,18402 0,50522 0,96112 0,90665 0,44438 0,94060
1994 0,21554 0,56354 0,96137 0,92967 0,45354 0,94357
1995 0,23604 0,58075 0,96138 0,95618 0,45072 0,98097
1996 0,24880 0,58030 0,96102 0,94499 0,45781 1,03121
1997 0,26418 0,59221 0,96180 0,95775 0,45730 1,05896
1998 0,25323 0,57780 0,96138 0,94508 0,45361 1,06341
1999 0,24194 0,58437 0,96116 0,93531 0,45185 1,01924
2000 0,24736 0,59104 0,96111 0,95268 0,45707 1,00000
2001 0,24870 0,60154 0,96271 0,94446 0,46019 0,98809
2002 0,25498 0,61646 0,96166 0,92718 0,46985 0,98731
FONTE: Metodologia de construção dos dados constantes do anexo.
500

GRÁFICO 118 EVOLUÇÃO DOS DETERMINANTES DA TAXA DE LUCRO (1950-2002)

Taxa de lucro (R) ß(L) B = Y liq / Y


p(R) u = Y / Ypot
u(R) P = Py/ Pk
s(R) s = Y pot / K
0,96450 1,10
0,96400
0,96350 0,90

0,96300
0,70
0,96250
0,96200
0,50
0,96150
0,96100 0,30
0,96050
0,96000 0,10
1950
1952
1954
1956
1958
1960
1962
1964
1966
1968
1970
1972
1974
1976
1978
1980
1982
1984
1986
1988
1990
1992
1994
1996
1998
2000
2002
FONTE: Dados da tabela 39.

A Tabela 39 exibe os dados utilizados na análise dos determinantes da taxa de lucro


em termos nominais e o Gráfico 119 plota essas mesmas séries para que se possa visualizar
sua evolução tendencial. Pode ser observado que tanto no período do milagre quanto no
período 1990-2002, a taxa de lucro acompanhou a evolução da razão p = py / p k334 . Outro fato
de destaque refere-se à razão Y pot / K que após permanecer em uma tendência de queda desde
1950, apresenta-se em uma trajetória de recuperação suave.

A Tabela 40, mais adiante, permite uma análise mais precisa das influências dos
componentes da taxa de lucro sobre o seu comportamento desde 1950. Inicialmente foram
identificados os turning points da taxa de lucro nominal e calculadas as taxas médias de
variação entre cada um desses pontos críticos. Como na primeira abordagem, o objetivo é
explicitar qual ou quais dos componentes foram os responsáveis pela dinâmica da taxa de
lucro. Todavia, a vantagem dessa segunda formulação em termos nominais é que ela permite
captar de um modo explícito, os efeitos das variações da inflação (preços do produto e preços
do capital). Por exemplo, há um nítido movimento de alta da taxa de lucro entre 1983-1986.
Sendo este último ano o da implementação do congelamento de preços do Plano Cruzado,
pode se considerar que a estrutura fortemente oligopolista da economia brasileira usou seu

334
No cálculo desta relação, foi considerado apenas o estoque de capital fixo produtivo, valorado pelo deflator
implícito da formação bruta de capital fixo. Quando o estoque de capital é considerado em sua totalidade, isto é,
incluindo as construções residenciais, essa relação permanece estagnada ao longo dos anos 90.
501

poder de mark-up para contornar as restrições impostas por esse programa de estabilização.
Como na análise em termos reais, a taxa de lucro se recupera na década de 90.

Do ponto de vista de uma análise das crises econômicas, se a taxa de lucro for
considerada como um indicador básico para avaliar as tendências do regime de acumulação,
então pode-se dizer que a economia brasileira não está no pior dos mundos . Em seu mais
recente trabalho sobre a economia japonesa, BOYER (2004, p.11) observa que:

« La déterioration de la rentabilité des firmes et son non-rendressement tout au


long de la période montrent clairement qu il s agit non d un cycle conjoncturel
mais d une crise structurelle. (...) Le non-rétablissement du profit, indice d une
crise et non pas d un cycle traditionnel. »

Essas considerações quando transpostas à realidade brasileira atual permitem constatar


que, diferentemente do caso japonês, a taxa média de lucro da economia brasileira apresenta-
se sob tendência de recuperação. Após ter se estabilizado em finais dos anos 80, observa-se
uma nítida trajetória de crescimento da lucratividade. A conclusão direta é que não há indícios
de crise estrutural na economia brasileira. Por outro lado, não há razões teóricas para supor
que o restabelecimento da lucratividade seja uma condição por si só suficiente para relançar a
economia num processo de crescimento econômico forte e durável. A elevação da taxa de
lucro pode ser, por exemplo, um meio de sobrevivência dos capitais diretamente produtivos
diante da punção rentista que lhes é imposta pelo capital financeiro numa época de
globalização neoliberal .

No período [1993-1999], a taxa de lucro cresceu a uma média de 5% a.a., puxada


principalmente pela expansão da profit share e da razão p. Em comparação com o período do
milagre , uma referência em termos de crescimento econômico, a profit share cresceu a um
ritmo superior nos anos 90. Com relação à razão , ela permaneceu em queda de 0,5% a.a
entre 1963-1973, que pode ser explicada por se tratar de um período de expansão dos
investimentos em capital fixo produtivo. Aliás, este fato se reflete no crescimento médio da
taxa de utilização da capacidade produtiva instalada u em 0,5% a.a.

Outro fato característico da era pós-Real, já identificado na primeira formulação da


taxa de lucro, refere-se à queda do salário médio real. Considerando-se os anos de 1999-2002,
variação entre os últimos turning points, a queda do salário médio real foi de praticamente 2%
ao ano. Trata-se, portanto, de um padrão de acumulação de capital muito diverso do
observado durante as fases de crescimento sob a lógica da industrialização substitutiva de
importações.
502

TABELA 40 MUDANÇAS NOS COMPONENTES DA TAXA DE LUCRO SEGUNDA


FORMULAÇÃO (1950-2002)
Turning
points da r
Taxa de nominal r nom u p PRL n wr
Lucro (%)
Nominal

1950 90,47

1963 39,62 -5,97 -0,573 0,006 -0,264 -2,750 -2,426 4,22 4,89

1973 53,43 3,15 1,476 0,012 0,513 -0,497 1,637 4,93 3,25

1983 23,01 -7,79 -0,817 -0,031 -1,309 -3,313 -2,723 1,05 2,03

1986 28,62 7,66 0,350 0,056 2,718 1,516 2,783 2,29 1,89

1989 17,62 -14,85 -0,737 -0,020 -0,441 -1,207 -12,756 -0,82 0,00

1991 21,38 10,23 0,867 -0,034 -2,516 -1,569 14,351 -3,22 -3,81

1993 18,40 -7,13 -2,734 -0,013 1,076 -0,104 -5,447 1,66 4,55

1999 24,19 4,94 2,546 0,001 0,536 0,284 1,393 2,02 -0,63

2002 25,50 1,77 1,799 0,017 -0,279 1,312 -1,053 0,56 -1,89

NOTA: 1) O ponto acima das variáveis (.) significa, como usual, que se trata de taxa de crescimento da variável
em questão. Os valores estão em percentagem; 2) PRLn é a produtividade líquida do trabalho, isto é, o fluxo total
de valor adicionado líquido de depreciação pelo nível geral de emprego.

5.4 Uma análise da mudança estrutural como mudança de regime


A análise da mudança estrutural é um dos momentos fundamentais em uma
abordagem em termos de regulação. Neste contexto, os aportes de GAFFARD (1997) e
GAFFARD e AMENDOLA (1998)335 são mobilizados com o intuito de proporcionar mais
uma alternativa à visão tradicional.

O ponto de partida de GAFFARD (1997) é a definição de um método de análise


estrutural. Segundo o autor, este método consiste de três ingredientes:

a) um instrumental de descrição estatística dos estados que podem caracterizar a


economia em sua evolução no tempo histórico;

b) a definição de uma noção de regime e da noção correspondente de mudança


estrutural como mudança de regime;

335
Citado por GAFFARD (1997).
503

c) um modelo geral de análise do crescimento fora do equilíbrio, que pertença à


classe dos modelos de dinâmica evolucionária adaptativa (segundo Day,
1993).336

Conforme o próprio GAFFARD:

Il n est pas question, en l occurrence, de construire un modele dynamique de


changement structurel pour ensuite procéder à des tests économétriques. Il
n est pas question non plus de mimer la réalité au moyen d un modèle
d équilibre calculable. Il s agit d utiliser les résultats d une analyse conduite
au moyen d un modèle théorique de désequilibre pour interpreter des éléments
factuels rassemblés au moyen d un outil descriptif approprié. »
A definição de mudança estrutural deve ser inicialmente explicitada. Uma definição
qualificada de fenomenológica foi proposta pelo econometrista R. FRISCH (1933). A
estrutura econômica materializa-se numa rede de relações funcionais estáveis entre as
unidades semi agregadas que são os setores de atividade. Esta definição é compatível com
uma abordagem regulacionista, desde que se apreenda a estabilidade das relações funcionais
inter-setoriais como um resultado dos procedimentos de coordenação codificados pelas
formas institucionais e não como uma derivação necessária da atuação de mecanismos
puramente mercantis.

Em outros termos, isto significa reconhecer que a estrutura econômica enquanto rede
de relações funcionais é um complexo de regularidades macroeconômicas não dedutível de
uma lógica de otimização individual. Neste contexto, é suficiente relembrar os fundamentos
teóricos regulacionistas explicitados no capítulo 1 deste trabalho. Ao permitir superar o
dilema agente-estrutura, o método hol-individualista lança as bases para uma macroeconomia
histórica e institucionalista onde a mudança estrutural passa ao primeiro plano das análises.

GAFFARD observa que, utilizando essa definição de FRISCH, as matrizes de insumo-


produto são amplamente utilizadas para a análise da produção e da mudança estrutural.
Todavia, o autor lembra que as matrizes permitem apenas uma análise estática e não
dinâmica. A estrutura do sistema é identifica ao conjunto de coeficientes técnicos e com as
relações de proporcionalidade entre os setores. Trata-se de observar fotografias dos diversos
estados do sistema, mas em nenhum caso, se analisa a dinâmica das conexões entre esses
estados em momentos sucessivos.

A abordagem de GAFFARD enfatiza as trajetórias que conectam os estados


sucessivos do sistema, para que sejam apreendidos os aspectos essenciais do processo de

336
Citado por GAFFARD (1997).
504

mudança estrutural. Neste sentido, é necessário recorrer a uma definição de estrutura que se
refira ao comportamento dinâmico do sistema ao longo do tempo, antes que a sua
configuração interna.337

Da abordagem insumo-produto duas idéias básicas são conservadas:

a) uma economia é descrita através de valores e perfis temporais de variáveis de


fluxo;

b) os dados são estatisticamente organizados mediante a categoria de setor . Mas a


noção de sistema é genérica, pois pode reportar-se a um país, região ou o setor
propriamente dito.

Um subconjunto de vetores das matrizes é selecionado em razão do lugar que ocupa


no âmbito do processo de acumulação de capital. Trata-se do investimento ( I ), do emprego
(N) e do valor adicionado (VA), pois são as variáveis mais fortemente conectadas à tecnologia
e à produtividade, e então, à inovação. GAFFARD observa ainda, que os dados sobre
investimento devem ser coerentes com as séries sobre o valor adicionado e dar conta da
capacidade de produção em curso de construção antes que da demanda final. É esta a razão
pela qual se utiliza uma série de investimento em capital fixo produtivo para uma aplicação à
economia brasileira.

A idéia diretriz neste quadro analítico é que a mudança estrutural não se identifica a
uma mudança tecnológica que se expressaria numa mudança do valor dos coeficientes
técnicos de produção. Ela se manifesta numa mudança de regime que se pode constatar pela
observação do comportamento de variáveis que são endógenas ao sistema: a evolução
conjunta do investimento, do consumo e do nível de emprego. Isto significa que, este tipo de
abordagem permite a apreensão de mudanças de regime que não são diretamente dedutíveis
de mudanças tecnológicas.

Segundo GAFFARD pode-se então definir um espaço analítico de referência para a


análise das mudanças de regime de acumulação. A descrição consiste em se confrontar o
investimento e o valor adicionado, numa disposição gráfica deliberadamente simples para que
a complexidade possa ser considerada em um outro plano.

As séries temporais (investimento, consumo e emprego) podem ser reduzidas a duas,


mediante a divisão do investimento e do valor adicionado pelo nível de emprego.

337
As matrizes insumo-produto permitem precisamente uma apreensão da configuração interna da estrutura ou
sistema, sem que se possa apreender as trajetórias entre as configurações em diferentes pontos no tempo.
505

A primeira coordenada é a taxa de crescimento do valor adicionado por pessoal


ocupado, ou seja, a produtividade aparente do trabalho (PR):

d VA / N N
PR .
dt VA

A segunda coordenada é a taxa de crescimento do investimento bruto por pessoal


ocupado ( INV):

d I/N N
INV .
dt I

Para se analisar a dinâmica de um sistema é suficiente considerar o conjunto dos


estados concernentes no espaço (PR; INV). L histoire ainsi décrite a son propre mecanismo
générateur qui dit comment la séquence est articulée (GAFFARD, 1998, p. 328). Trata-se de
um mecanismo de path dependency que se escreve da seguinte maneira:

PR t
f PR ; INV
t 1 t 1

INV t
z PR ; INV
t 1 t 1

As flutuações surgem como o resultado tanto de causas endógenas quanto exógenas


que se explicariam através de um modelo teórico. Do ponto de vista regulacionista, as crises
cíclicas ou endógenas decorrem do próprio funcionamento do modo de regulação e são
normalmente superadas nos quadros de sua própria lógica, sem que seja necessário uma
mudança institucional ou da política econômica.338

Dois eixos podem então ser definidos e se tornam o espaço analítico de referência: o
eixo (horizontal) da produtividade e o eixo da acumulação ou do investimento produtivo por
pessoal ocupado. A Figura 39 a seguir representa o espaço analítico de referência para o
tratamento da mudança de regime:

338
Mais detalhes sobre a taxionomia regulacionista das crises encontram-se no capítulo 2 deste trabalho.
506

FIGURA 39 O ESPAÇO ANALÍTICO DE REFERÊNCIA PARA OS REGIMES DE ACUMULAÇÃO

I
INV Regimes de
N acumulação tipo A
Regimes de
acumulação tipo D VI
V Regimes de
acumulação tipo B
I
45º VA
PR
N
IV II

Regimes de
Crises de regime e III acumulação tipo C
regimes de crise

FONTE: Adaptação a partir da Figura 20 em GAFFARD (1997, p. 329).


NOTA: INV = investimento ou formação bruta de capital fixo produtivo; N = nível geral de emprego; PR =
produtividade aparente do trabalho; VA = valor adicionado total da economia.
INV
Os regimes regulares segundo GAFFARD seriam aqueles para os quais a razão
VA
é constante ao curso do tempo. A região corresponde à primeira diagonal dos eixos que é o
lugar geométrico dos pontos onde as taxas de crescimento do investimento é igual às do valor

adicionado ( I VA ). Esta diagonal permite a identificação dos regimes de acordo com o


comportamento das duas variáveis em questão. Os regimes não são apreendidos como
intrinsecamente estáveis, pelo contrário, uma vez identificados, a análise deve também
explicitar as condições de sua instabilidade ou crise.

A tipologia dos regimes é a seguinte:

i. Seção do plano acima da diagonal (VI) - engloba as trajetórias em que as taxas


de crescimento do investimento por pessoal ocupado supera os ganhos de

produtividade, INV PR . Corresponde aos regimes de crescimento no qual


um progresso técnico incorporado é comandado por uma forte acumulação de
capital. Pode revelar uma utilização ineficaz do capital ou expressar o chamado
paradoxo da produtividade característico dos períodos iniciais de mudança de
507

tecnologia.339 Para efeitos de sistematização, esta análise denominará esse padrão


de crescimento como pertencentes aos regimes de acumulação tipo A;

ii. Seção nº ( I ) do plano abaixo da diagonal nesta região as trajetórias são tais
que a taxa de crescimento da produtividade excede a taxa de crescimento do

investimento por pessoal ocupado, PR INV . Trata-se dos regimes de

crescimento onde a capacidade produtiva em curso de utilização (o estoque de


capital em uso), estruturado por tecnologias já difundidas e sob amplo domínio
das organizações, permite a obtenção de ganhos de produtividade substanciais.
Pode-se denominar esse padrão de crescimento como característico dos regimes
de acumulação tipo B;

iii. Seção do plano nº ( II ) - nesta região, as trajetórias são aquelas em que a taxa
de crescimento do investimento por pessoal ocupado é negativa e a da

produtividade positiva, INV 0 e PR 0 . Designa os regimes de

crescimento nos quais os ganhos de produtividade não alimentam a taxa de


acumulação de capital. Esse padrão de crescimento será dito como característico
dos regimes de acumulação tipo C;

iv. Seções do plano (III) e (IV) nessas regiões as trajetórias são aquelas em que
as taxas de crescimento do investimento e da produtividade são ambas negativas.
Trata-se dos regimes de contração em que surge e se generaliza uma
insuficiência global de demanda. Primeiramente puxada pela queda dos
investimentos e em seguida do consumo agregado. Em termos teóricos
regulacionistas, essa região corresponderia às fases de crise estrutural se os
ajustamentos veiculados pelo modo de regulação mostrarem-se incapaz de
restaurar as condições de retomada da acumulação de capital sobre novas bases.
Como pode também expressar uma fase de transição para um novo regime de

339
O chamado paradoxo da produtividade ou paradoxo de Solow é freqüentemente resumido da seguinte
maneira: os computadores estão por toda parte exceto nas estatísticas . Robert Solow designava assim o fato de
que a informatização não se traduzia claramente nas performances econômicas, notadamente no que concerne à
produtividade do trabalho. Há na realidade uma certa defasagem entre o surgimento de uma nova tecnologia, sua
aplicação efetiva e os efeitos esperados. Estes últimos exigem um domínio prévio das novas condições sócio-
técnicas do trabalho e da organização da produção. Um novo sistema de produção não é nunca uma questão
puramente técnica, sua eficiência e eficácia dependem da institucionalidade das relações sociais, da forma como
são compatíveis ou não com as exigências das novas bases produtivas e dos sistemas de pagamento.
508

crescimento, a noção de regime de crise proposta por BILLAUDOT (2001) seria


compatível com esse padrão de trajetória;340

v. Seção do plano (V) nessa região trata-se das trajetórias em que a taxa de
crescimento do investimento por pessoal ocupado é positiva e a da produtividade
é negativa, ou seja, não há ganhos de produtividade apesar da expansão dos
investimentos. Correspondem aos regimes de crescimento nos quais a taxa de
acumulação de capital é mantida mediante o ingresso significativo de recursos
externos. Esse padrão será denominado como o característico dos regimes de
acumulação tipo D.

Deve-se atentar que, neste contexto, a abordagem proposta por GAFFARD está sendo
recuperada para uma abordagem regulacionista, considerando-se que a Teoria da Regulação é
capaz de proporcionar os fundamentos teóricos e metodológicos pertinentes a uma análise
consistente dos regimes de crescimento e das mudanças estruturais que lhes correspondem.

Cada regime é identificado por um par de taxas de crescimento e então a relação


funcional INV e PR implica numa dinâmica macroeconômica. Os saltos entre as trajetórias
devem ser considerados como representativos de mudanças estruturais. Conseqüentemente, os
regimes assim definidos são essencialmente instáveis, pois as trajetórias fora da diagonal
pertencem aos estados de desequilíbrio. Conforme GAFFARD (2001, p.330):

La transmission des desequilibres est au couer de la dynamique: elle traduit,


à la fois, les défauts de coordination inter temporelle et les phénomènes de
complémtarité inter temporelle. La manière dont les déséquilibres s enchaînent
dénpend à la fois des mécanismes d ajustement des prix et des salaires et des
interventions externes destinées à rétablir la complémentarité de la production
et la coordination des décisions au cours du temps.
A região que constitui a diagonal INV = PR inclui os regimes regulares em que não há
distorções da estrutura da capacidade produtiva. O deslocamento no espaço analítico de
referência indica efetivamente mudanças na estrutura produtiva da economia. Outros
indicadores globais da economia (como a taxa de desemprego, de inflação, a wage share)
podem então ser mobilizados para complementar o diagnóstico, uma vez que decorrem
precisamente dessas alterações estruturais.

Esta abordagem quando aplicada por setor de atividade torna-se evidentemente mais
rica e complexa. Todavia, por razões de disponibilidade de séries completas, por setor, para

340
Segundo BILLAUDOT (2001), a fase de esgotamento de um regime de crescimento pode ser interpretada
como a transição da crise de um regime para um regime de crise .
509

um horizonte de longo prazo, a aplicação será limitada ao nível macroeconômico ao invés de


setorial.341

A seguir aplica-se a metodologia proposta por GAFFARD ao caso brasileiro, no


período 1950-2002, permitindo uma taxionomia dos regimes de acumulação a partir das
dinâmicas da produtividade e do investimento. O Gráfico 119 gera um diagrama de dispersão
para os logaritmos das variáveis INV e PR e a spline correspondente, como um modo de
aproximar a trajetória da evolução conjunta das duas variáveis.342

GRÁFICO 119 MUDANÇAS ESTRUTURAIS COMO MUDANÇAS DE REGIME (1950-2002)

Diagrama de Dispersão e Spline [1950-2002]

6,2 45º 1980


1975
6,0
1973
5,8 1986
Ln ( INV = I / N )

5,6
1990
5,4 1994
1999
5,2 1992
1967 2002
1959
5,0

4,8 1961

4,6 1955
1950
4,4
4,4 4,6 4,8 5,0 5,2 5,4 5,6 5,8 6,0
Ln ( PR = VA / N )

FONTE: Nível de emprego em IBGE e MARQUETTI (2002); Investimento e PIB em IBGE.


NOTA: Os dados sobre investimento referem-se à formação bruta de capital fixo produtivo, isto é, sem
considerar as construções residenciais. As variações de estoques não foram incluídas porque se parte da hipótese
de que elas respondem prioritariamente às flutuações de curto prazo da demanda agregada. Ln é o logaritmo
natural.
Os símbolos utilizados no Quadro 128 correspondem às seguintes variáveis:

PR = taxa média de crescimento da produtividade do trabalho;

341
Os dados setoriais poderiam ser extraídos das matrizes insumo-produto, no entanto, elas estão disponíveis,
para a economia brasileira, apenas para os anos de 1985 a 1996.
342
Para se determinar a curva em conjuntos de dados bivariados, o procedimento spline resolve equações cúbicas
para cada ponto em um intervalo regular. Conforme T. GODIM (2004), uma interpolação spline é uma técnica
de aproximação que consiste em se dividir o intervalo de interesse em vários subintervalos e interpolar, da forma
mais suave possível, nestes subintervalos com polinômios de grau pequeno.
510

INV = taxa média de crescimento do investimento por pessoal ocupado na

produção;

I
g =
K
= taxa média de acumulação de capital; g = variação relativa entre as taxas

médias de acumulação de dois regimes subseqüentes;

y = taxa média de crescimento do PIB; y = variação relativa entre as taxas médias

de crescimento do PIB de dois regimes subseqüentes.

QUADRO 128 REGIMES DE ACUMULAÇÃO E DE CRISE NA ECONOMIA BRASILEIRA (1950-


2002)

REGIMES DE
TRAJETÓRIAS
PR INV g g y y ACUMULAÇÃO

[1951-1959] 4,23 5,77 13,70 7,15 Tipo A

[1962-1975] 4,24 8,89 13,68 -0,15 7,44 4,06 Tipo A

[1976-1980] 3,85 1,30 13,47 -1,54 7,24 -2,69 Tipo B

[1981-1992] Regime de crise ou de


-1,49 -6,30 7,59 -43,65 1,43 -80,25
contração

[1993-1997] 3,88 6,62 6,96 -8,30 4,20 193,71 Tipo A

[1998-2002] Regime de crise ou de


-0,29 -5,97 6,54 -6,03 1,38 -67,14
contração

NOTA: Os valores correspondem às taxas médias de variação em % a.a, por período.

Os dois primeiros períodos identificados, [1951-1959] e [1962-1975] são separados


pela crise dos anos 60, que no Gráfico 119 aparece como uma trajetória de declínio do
investimento por pessoal ocupado (INV < 0), enquanto as taxas de crescimento da
produtividade permanecem positivas. Mas o fato relevante é que os ganhos de produtividade
da ordem de 6,5% a.a não são capazes de impulsionar o investimento e este conhecerá uma
queda média de cerca de -6,93% a.a. Poder-se-ia considerar esses dois períodos como
pertencentes a um mesmo regime de acumulação do tipo A que se desenvolve no intervalo
completo [1950-1975], em linha com as análises que apreendem a crise dos anos 60 como
511

uma crise endógena ou cíclica.343 Observa GREMAUD et al. (2004, p. 388) que depois da
década de 50, a economia brasileira já tinha superado a fase de industrialização restringida,
que caracterizara os anos 30 e 40. Em conseqüência, havia entrado em uma fase em que a
dinâmica capitalista se processa por elementos endógenos, especialmente os ligados às
relações intersetoriais. Neste contexto, a crise dos anos 60 resultaria de uma desaceleração dos
investimentos em bens de capital em razão do excesso de capacidade produtiva gerado pelo
Plano de Metas.

Apreendida sob a definição regulacionista de crise cíclica, ela não implica numa crise
do regime de acumulação e pode ser interpretada como uma crise na regulação e não da
regulação. Decorrentes da depuração das tensões e dos desequilíbrios acumulados durante a
fase de expansão, esta modalidade de crise tende a ser recorrente, pois emerge como condição
da superação dos obstáculos endógenos que a própria dinâmica da acumulação instaura e
reproduz.

É interessante notar-se que de acordo com essa metodologia, o regime de acumulação


em vigor no período [1976-1980] praticamente coincide com a fase de implementação do II
PND (1975-1979), onde os ganhos de produtividade são agora superiores às taxas de
investimento por pessoal ocupado. Isto implica em um regime de acumulação do tipo B.

Um regime de crise ou de contração desenvolve-se entre 1981-1992, pois ambas as


taxas médias, INV e PR permanecem negativas no período em questão. Pelo Gráfico 121, que
fornece uma visão focada nas décadas de 80 e 90, essa trajetória de contração mostra-se ainda
mais nítida.

Assiste-se ao retorno de um padrão do tipo A, no período 1993-1997, que será


abortado pelo ataque especulativo de 1998-1999 que, entre outras conseqüências adversas,
levou às autoridades monetárias a elevarem drasticamente as taxas de juros da economia,
inicialmente em outubro de 1998 e depois em março de 1999.

343
Que é uma posição defendida pelos autores de tradição estruturalista como TAVARES (1978) e SERRA
(1982). Nesta perspectiva esta crise é derivada da conclusão dos grandes investimentos promovidos pelo Plano
de Metas (1955-1961), que expandiu a capacidade de produção de forma mais rápida do que a demanda
necessária para absorvê-la. Segundo LACERDA (2000, p. 100), o setor produtor de bens de consumo duráveis
enfrentou dificuldades pos a demanda não crescia de maneira satisfatória. Em razão da elevada concentração de
renda e da baixa renda per capita da economia brasileira, a demanda reprimida que o processo de
industrialização substitutiva de importações buscou atender se esgotou rapidamente. Como fatores agravantes
acrescentaram-se a elevação da inflação e a inexistência de linhas para o financiamento de longo prazo do
consumo. Acelerando a inflexão da conjuntura macroeconômica, o Plano Trienal implementa uma política de
estabilização nos moldes tradicionais baseada em contração monetária. Articulavam-se fatores endógenos com
práticas de política que levariam à desaceleração do crescimento e à queda dos investimentos produtivos.
512

O último padrão detectado corresponde a um regime de contração, cuja queda média


nos investimentos por pessoal ocupado (-5,97 % a.a.) é muito próxima à observada nos anos
80 (-6,30% a.a.). Ressalvadas as diferenças no plano das outras formas institucionais, pois na
década de 80, a economia permanecia ainda fechada em termos comerciais e da conta de
capital, um fator comum a esses dois regimes de crise refere-se ao papel desestabilizador
desempenhado pelas finanças.

O Quadro 128 também exibe as taxas de acumulação de capital g e de crescimento

econômico y . Destaca-se o fato de que a taxa de acumulação de capital apresenta-se em


queda desde o primeiro regime, a partir de 1950. Mas nos três primeiros regimes, as taxas de
acumulação caem de um patamar médio para outro, a um ritmo bem mais suave do que os
observados nos regimes subseqüentes.

GRÁFICO 120 UM ZOOM SOBRE AS DÉCADAS DE 80 E 90

Diagrama de Dispersão e Spline [1980-2002]


6,2
6,1 1980

6,0
5,9 1981
Ln ( INV = I / N )

5,8
1986
5,7
5,6 1998
1983
5,5 1996
1990 1994
5,4
1999
5,3
5,2 1992
2002
5,1
5,66 5,68 5,70 5,72 5,74 5,76 5,78 5,80 5,82 5,84 5,86 5,88
Ln ( PR = VA / N )

FONTE: Nível de emprego em IBGE e MARQUETTI (2002); Investimento e PIB em IBGE.


Na transição para o primeiro regime de crise na década de 80, o decréscimo da taxa de
acumulação de capital foi muito grande (-43,65%), o que está em conformidade com os
graves problemas macroeconômicos deste período. Após essa forte redução, o ritmo de queda
da taxa média de acumulação de capital por regime continua elevado, em comparação com o
observado nos três primeiros regimes de alto crescimento (-8,3% entre 1993-1997 e 6,03%,
513

entre 1998-2002). Esta redução forte e persistente da taxa de acumulação responde pelas
tendências ao baixo e instável crescimento econômico que caracteriza o período pós-Real.

Em suma, a observação do conjunto de pontos fora da trajetória de crescimento estável


que caracterizou os três primeiros regimes (que juntos respondem por uma média de 7% a.a
de crescimento do PIB), é um sintoma das mudanças estruturais que atravessaram a economia
brasileira nas décadas de 80 e 90. Com uma visão ampliada do intervalo [1981-2002],
proporcionada pelo Gráfico 120, pode ser contatada a enorme dificuldade da economia
brasileira para reencontrar uma trajetória ou regime de crescimento dinamicamente estável,
após a estabilização de preços. Observam-se fases curtas de expansão seguidas de declínio
acentuado das taxas de investimento e produtividade.

5.3 A relação de Kaldor-Verdoorn e os regimes de produtividade


Os padrões de crescimento e acumulação de capital são estruturalmente dependentes
das formas como os ganhos de produtividade são gerados e distribuídos entre os participantes
do processo produtivo. Para a Teoria da Regulação, a relação de Kaldor-Verdoorn, que
estabelece uma relação direta entre o crescimento da produção e o da produtividade, é
particularmente importante.

Segundo BOYER e PETIT (1989, p. 7), a generalização da lei de Kaldor-Verdoorn


conduz no plano macrodinâmico à idéia de regime de produtividade. Ao se considerar a noção
de regime de demanda obtém-se as duas dimensões fundamentais de um regime de
crescimento ou de acumulação, conforme explicitado no capítulo 2 deste trabalho. Em outros
termos, a relação de Kaldor-Verdoorn pode ser interpretada como a forma reduzida da
interação de diversos mecanismos sócio-técnicos e institucionais responsáveis pela dinâmica
de um determinado regime de produtividade.

Um regime de produtividade pode ser então gerado pela combinação de cinco


diferentes mecanismos que estariam por trás da relação de Kaldor-Verdoorn:

a) retornos crescentes de escala estáticos e dinâmicos;

b) aprofundamento da divisão do trabalho intra e inter-firmas, devido à expansão


dos mercados e conectando dinamicamente as tendências da produtividade com a
expansão da demanda agregada;

c) learning by doing e learning by using;

d) avanços tecnológicos incorporados aos bens de capital;


514

e) processo de inovação técnica e organizacional.

Em consequência, a lei de Kaldor-Verdoorn como um fundamento do conceito de


regime de produtividade pode ser expressa formalmente como um sistema completo de
relações (BOYER e PETIT, 1989, p. 8):
I
pr f 1
q; Q ;
Q
; EME; INOV ;...

I L
Q
f 2
q;
VA
; INOV ;...

EME f 3
Q;...

INOV f 4
EINOV ; q; P & D;...

Onde pr representa os ganhos de produtividade ( PR , nas seções precedentes); Q é a

produção em nível; q a produção em taxa de crescimento; EME é a escala mínima de


eficiência; L / VA é a participação dos lucros no valor adicionado ou a profit share ( = , nas
seções precedentes ) e; P&D são os gastos correntes em pesquisa e desenvolvimento técnico-
científico e EINOV é o estoque de conhecimentos acumulados.

A primeira equação fornece os principais fatores determinantes dos ganhos de


produtividade (o crescimento econômico, o tamanho do mercado, a taxa de investimento, a
escala mínima de eficiência e a inovação). A segunda explica a taxa de investimento pelo
crescimento da demanda, da profit share e da inovação. A terceira expressa a escala mínima
de eficiência como função do tamanho do mercado e a quarta equação descreve as inovações
como resultante do estoque de conhecimentos acumulados, do crescimento da demanda e dos
gastos em P&D. Em sua forma reduzida, o sistema pode ser expresso como:

L
pr pr q; Q; INOV ; ;...
VA
Os impactos dos ganhos de produtividade sobre a renda e a demanda conduzem à
noção de regime de demanda, a qual foi também definida no capítulo 2 deste trabalho.
Formalmente, um regime de demanda em sua forma reduzida é dado pela função:

q q PR;W ; Q; QM
515

Onde q é a taxa de crescimento da produção; pr são os ganhos de produtividade; W é a


massa salarial real; Q é a demanda doméstica e QM a demanda externa ou mundial pela
produção nacional.

A conseqüência teórica relevante neste contexto é que as regularidades


macroeconômicas expressas pela relação de Kaldor-Verdoorn dependerão dessa combinação
entre um regime de produtividade e um regime de demanda. Em outros termos, a causação
cumulativa como um princípio explicativo do crescimento econômico resulta da
compatibilidade macrodinâmica entre esses dois regimes.

5.4 A relação de Kaldor-Verdoorn e a economia brasileira


Estimações da relação de Kaldor-Verdoorn para a economia brasileira foram
realizadas por MARINHO, NOGUEIRA e ROSA (2001) e por GUIMARÃES (2002). Este
último trabalho voltou-se inclusive para as implicações dessa relação no caso do setor
agrícola. Na presente análise, reestima-se a equação de Kaldor-Verdoorn, considerando-se a
disponibilidade dos dados para o período [1985-2001].

As séries utilizadas são as referentes à produção física e à produtividade horária da


indústria de transformação, obtidas através da Pesquisa Industrial Mensal (PIM) e da Pesquisa
Industrial Mensal de Emprego e Salários (PIMES) do IBGE. Os dados com periodicidade
mensal foram então dessazonalizados pelo método X11/2000-Census 2 para que se pudesse
captar seu comportamento de longo prazo sem as influências das variações sazonais (Gráfico
121). A equação estimada foi:

LPRH .LPRODF (29)


Onde LPRH = log natural da produtividade horária do trabalho; LPRODF = log
natural da produção física, com > 0. Os resultados encontram-se no Quadro 129.
516

GRÁFICO 121 PRODUTIVIDADE E PRODUÇÃO FÍSICA NA INDÚSTRIA DE


TRANSFORMAÇÃO (1985-2001)

Produtividade_hora
Produtividade_pessoal ocupado
Produção física
260
Índice dos valores: jan-1985 = 100

240
220
200
180
160
140
120
100
80
60
Mar-89

Mar-94

Mar-99
Nov-85

Sep-86

Déc-87

Aoû-89

Nov-90

Sep-91

Déc-92

Aoû-94

Nov-95

Sep-96

Déc-97

Aoû-99

Nov-00
Jan-85

Mai-88

Jan-90

Mai-93

Jan-95

Mai-98

Jan-00
Jui-85

Fév-87
Jul-87

Jui-90

Fév-92
Jul-92

Jui-95

Fév-97
Jul-97

Jui-00
Avr-86

Avr-91

Avr-96

Avr-01
Oct-88

Oct-93

Oct-98
FONTE: Pesquisa Industrial Mensal (PIM-DG e PIM-PF) e Pesquisa Industrial Mensal de Emprego e Salários
(PIMES) do IBGE através do IPEADATA.
NOTA: Todas as séries foram dessazonalizadas pelo método X11/2000 Census 2. Dados referem-se à
produção da indústria de transformação.

QUADRO 129 ESTIMAÇÃO DE LPRH PARA O PERÍODO (1985-2001)

Dependent Variable: LPRH


Method: Least Squares
Sample: 1985:01 2001:04
Included observations: 196
Variable Coefficient Std. Error t-Statistic Prob.
C -5.262383 1.023322 -5.142451 0.0000
LPRODF 2.133633 0.213757 9.981592 0.0000
R-squared 0.339309 Mean dependent var 4.950521
Adjusted R-squared 0.335904 S.D. dependent var 0.299126
S.E. of regression 0.243764 Akaike info criterion 0.024921
Sum squared resid 11.52767 Schwarz criterion 0.058371
Log likelihood -0.442239 F-statistic 99.63218
Durbin-Watson stat 0.063961 Prob(F-statistic) 0.000000

MARINHO et alii (2001), que utilizaram as mesmas séries, encontraram raízes


unitárias para o período [1985-1997]. Os testes a seguir igualmente confirmam a não
estacionaridade dessas séries para o período [1985-2001]. Os mesmos testes aplicados às
séries em primeiras diferenças rejeitaram a hipótese nula de não-estacionaridade, ou seja, as
séries em nível são integradas de primeira ordem ou I(1). Conseqüentemente, há um risco de
co-integração. Todavia, o teste de JOHANSEN não rejeitou a hipótese nula de nenhuma
equação de co-integração. Um resultado oposto ao encontrado pelos autores supracitados e
que remete ao chamado paradoxo estático-dinâmico .
517

Segundo GUIMARÃES (2002, p.15), o paradoxo estático-dinâmico da lei de Kaldor-


Verdoorn estabelece que há diferenças substanciais no grau de retorno de escala estimado
quando a relação é testada com as variáveis em taxas de crescimento (especificação dinâmica)
ou em níveis (especificação estática). Essa constatação, originária de uma análise empírica de
McCOMBIE (1982)344, reconhece que ao se testar a lei com as variáveis em nível (logaritmo),
o grau de retorno de escala é muito reduzido ou mesmo inexistente.

QUADRO 130 TESTE DE RAÍZES UNITÁRIAS PARA LPRH E LPRODF NO PERÍODO (1985-2001)

LPRH
ADF Test Statistic -2.305780 1% Critical Value* -4.0088
5% Critical Value -3.4342
10% Critical Value -3.1408
*MacKinnon critical values for rejection of hypothesis of a unit root.
LPROF
ADF Test Statistic -2.966811 1% Critical Value* -4.0088
5% Critical Value -3.4342
10% Critical Value -3.1408
*MacKinnon critical values for rejection of hypothesis of a unit root.

QUADRO 131-TESTE DE CO-INTEGRAÇÃO DE JOHANSEN (1985-2001)

Sample: 1985:01 2001:04


Included observations: 191
Test assumption: Linear deterministic trend in the data
Series: LPRH LPRODF
Lags interval: 1 to 4
Likelihood 5 Percent 1 Percent Hypothesized
Eigenvalue Ratio Critical Value Critical Value No. of CE(s)
0.056367 12.57777 15.41 20.04 None
0.007804 1.496346 3.76 6.65 At most 1
*(**) denotes rejection of the hypothesis at 5%(1%) significance level
L.R. rejects any cointegration at 5% significance level

QUADRO 132 ESTIMAÇÃO DA EQUAÇÃO 1 (1985 2001)

Dependent Variable: LPRH


Method: Least Squares
Sample: 1985:01 2001:04
Included observations: 196
Variable Coefficient Std. Error t-Statistic Prob.
C 3.298063 0.769420 4.286425 0.0000
D1 -4.853059 0.491899 -9.865974 0.0000
LPRODF 0.285812 0.161411 1.770708 0.0782
D2*LPRODF 0.230632 0.021520 10.71719 0.0000
R-squared 0.862232 Mean dependent var 4.950521
Adjusted R-squared 0.860079 S.D. dependent var 0.299126
S.E. of regression 0.111891 Akaike info criterion -1.522383
Sum squared resid 2.403770 Schwarz criterion -1.455483
Log likelihood 153.1935 F-statistic 400.5480
Durbin-Watson stat 0.227782 Prob(F-statistic) 0.00000

344
Citado por GUIMARÃES (2002).
518

Há indícios de instabilidade estrutural em abril de 1990 e então, após a introdução de


uma variável dummy para se testar a hipótese de quebra estrutural, a equação foi reestimada
para o subperíodo [1985-1989] e em seguida para o período [1991-2001]
Conforme a análise da performance macroeconômica desenvolvida no capítulo 3, os
anos 80 foram marcados pela quase-estagnação do nível de atividade econômica.
Praticamente não houve ganhos de produtividade ao longo de toda essa década. Em
conseqüência, quando a equação é estimada para esse período da história econômica
brasileira, a relação de KV desaparece, pois a conjuntura estagflacionista vigente não permite
dinamizar a produtividade da indústria conforme previsto por essa relação.

QUADRO 133 ESTIMAÇÃO DA EQUAÇÃO 1 (1985:01 1989:01)

Dependent Variable: LPRH


Method: Least Squares
Sample: 1985:01 1989:01
Included observations: 49
Variable Coefficient Std. Error t-Statistic Prob.
C 4.132433 0.294430 14.03539 0.0000
LPRODF 0.108221 0.061605 1.756688 0.0855
R-squared 0.061613 Mean dependent var 4.649608
Adjusted R-squared 0.041647 S.D. dependent var 0.028026
S.E. of regression 0.027436 Akaike info criterion -4.313942
Sum squared resid 0.035379 Schwarz criterion -4.236725
Log likelihood 107.6916 F-statistic 3.085953
Durbin-Watson stat 1.261220 Prob(F-statistic) 0.085485

Neste período, a equação mostrou-se relativamente estável conforme pode ser


constatado pelos testes de mudança estrutural. De um ponto de vista teórico, pode-se
considerar que a economia brasileira estava funcionando sob um regime de crise , conforme
definição explicitada nos capítulos 1 e 2, onde as regularidades macroeconômicas
reproduziam as condições de estagnação e de inflação que caracterizaram este período. Um
período de crise, em que, paradoxalmente, não se observam mudanças estruturais
significativas do ponto de vista de uma reconfiguração das formas institucionais e do modo de
regulação brasileiro. Algo muito diverso do que iria acontecer na década de 90.
519

FIGURA 40 TESTES DE ESTABILIDADE ESTRUTURAL PARA A EQUAÇÃO 1 (1985 1989)

1.6 0.10

0.05
1.2
0.00
0.8
-0.05
0.00
0.4 -0.10

0.05
0.0

0.10
-0.4
85:07 86:01 86:07 87:01 87:07 88:01 88:07 89:01
0.15
CUSUM of Squares 5% Significance 85:07 86:01 86:07 87:01 87:07 88:01 88:07 89:01

N-Step Probability Recursive Residuals

Vários trabalhos desenvolvidos para os anos 90 apontam para uma retomada dos
ganhos de produtividade da indústria brasileira e então a relação de KV poderia surgir345. A
equação foi então estimada no subperíodo [1991-2001] e realizaram-se os testes de raízes
unitárias. Os testes ADF confirmaram que as séries são I(1).

QUADRO 134 - ESTIMAÇÃO DA EQUAÇÃO 1 E TESTES DE RAÍZES UNITÁRIAS (1991 2001)

Dependent Variable: LPRH


Method: Least Squares
Sample: 1991:01 2001:04
Included observations: 124
Variable Coefficient Std. Error t-Statistic Prob.
C -6.756162 0.701530 -9.630609 0.0000
LPRODF 2.476764 0.146289 16.93066 0.0000
R-squared 0.701454 Mean dependent var 5.119385
Adjusted R-squared 0.699007 S.D. dependent var 0.249472
S.E. of regression 0.136867 Akaike info criterion -1.123610
Sum squared resid 2.285390 Schwarz criterion -1.078121
Log likelihood 71.66380 F-statistic 286.6473
Durbin-Watson stat 0.201139 Prob(F-statistic) 0.000000
LPRH
ADF Test Statistic -3.671371
1% Critical Value* -4.0342
5% Critical Value -3.4463
10% Critical Value -3.1479
*MacKinnon critical values for rejection of hypothesis of a unit root.
LPRODF
ADF Test Statistic -3.157917
1% Critical Value* -4.0342
5% Critical Value -3.4463
10% Critical Value -3.1479
*MacKinnon critical values for rejection of hypothesis of a unit root.

345
Diz-se que essa relação reaparece porque muito provavelmente esteve presente no período de expansão da
economia brasileira entre os anos de 1940 e 1970. Período que corresponde à difusão, consolidação e
esgotamento do modelo de industrialização por substituição de importações . Entre os vários trabalhos sobre a
questão da produtividade na década de 90, encontram-se os de SABOIA e CARVALHO (1997), ROSSI e
FERREIRA (1999), BONELLI e FONSECA (1998) e BONELLI (2002).
520

Teste de raízes unitárias sobre os resíduos da equação estática. Se forem estacionários


então a relação estática entre LPRH e LPRODF é uma relação de co-integração.
QUADRO 135 TESTES DE RAÍZES UNITÁRIAS DOS RESÍDUOS DA EQUAÇÃO 1 - (1991 2001)

ADF Test Statistic -2.519896 1% Critical Value* -4.0373


5% Critical Value -3.4478
10% Critical Value -3.1488
*MacKinnon critical values for rejection of hypothesis of a unit
root.

Como se utilizam os resíduos estimados para se testar a hipótese de co-integração, e


não os verdadeiros valores, deve-se utilizar os valores críticos tabulados por Engle e Yoo
(1987) para o teste de co-integração ADF: 1% (-4,00); 5% (-3,37); 10% (-3,02), e o valor
calculado de -2,52 é maior para do que os valores críticos em todos os três níveis de
significância do teste. Conseqüentemente, está descartada a hipótese de co-integração para o
período [1991-2001]. O teste de co-integração de JOHANSEN também corrobora esta
conclusão, não rejeitando nos níveis de 5% e 1% a hipótese de nenhuma equação de co-
integração.

QUADRO 136 -TESTE DE CO-INTEGRAÇÃO DE JOHANSEN (1991-2001)

Sample: 1991:01 2001:04


Included observations: 124
Test assumption: Linear deterministic trend in the data
Series: LPRH LPRODF
Lags interval: 1 to 4
Likelihood 5 Percent 1 Percent Hypothesized
Eigenvalue Ratio Critical Value Critical Value No. of CE(s)
0.054762 7.044868 15.41 20.04 None
0.000495 0.061367 3.76 6.65 At most 1
*(**) denotes rejection of the hypothesis at 5%(1%) significance level
L.R. rejects any cointegration at 5% significance level

Este resultado está coerente com o fato de que a década de 90 foi marcada por grandes
transformações estruturais e intervenções de política econômica, além da quase-estagnação:
Plano Collor I e II; Plano Real; liberalização comercial e financeira; sobrevalorização
cambial; taxas reais de juros elevadas; crises financeiras do México, Ásia, Rússia e Brasil em
1999; e a própria reestruturação da indústria brasileira como resposta a esse conjunto de
fatores. Isto implica que as séries do logaritmo da produtividade (LPRH) e do logaritmo da
produção física (LPRODF), apesar de serem I(1), não co-integram e, portanto, não
manifestam nenhuma relação de longo prazo conforme a proposta por Kaldor-Verdoorn.
521

Além disso, este resultado era esperado, em se tratando de duas décadas marcadas por
graves problemas macroeconômicos. Tendências à estagnação do produto e vigência da alta
inflação nos anos 80. Transformações institucionais, quase-estagnação e também pela alta
inflação, nos anos 90. Conseqüentemente, os testes de estabilidade estrutural rejeitaram a
hipótese nula de não mudança estrutural tanto para este período em questão [1991-2001]
quanto para o período completo [1985-2001]346.

FIGURA 41 TESTES DE ESTABILIDADE ESTRUTURAL PARA O PERÍODO (1985-2001)

0.6 250 1.2

0.4 200 1.0

0.8
0.2 150
0.6
0.0 100
0.4
-0.2 50
0.2

-0.4 0 0.0

-0.6 -50 -0.2


86 88 90 92 94 96 98 00 86 88 90 92 94 96 98 00 86 88 90 92 94 96 98 00

Recursive Residuals ± 2 S.E. CUSUM 5% Significance CUSUM of Squares 5% Significance

0.6 0.6
8
0.4 0.4
0.2 0.2 6
0.0 0.0
4
-0.2 -0.2
-0.4 -0.4 2
0.00 -0.6 0.00 -0.6
0

0.05 0.05 -2

-4
0.10 0.10
-6
0.15 0.15
86 88 90 92 94 96 98 00 86 88 90 92 94 96 98 00 -8
86 88 90 92 94 96 98 00
One-Step Probability Recursive Residuals N-Step Probability Recursive Residuals
Recursive C(1) Estimates ± 2 S.E.

3.0

2.5

2.0

1.5

1.0

0.5

0.0

-0.5
86 88 90 92 94 96 98 00

Recursive C(2) Estimates ± 2 S.E.

346
Mesmo quando se utilizam dados semestrais, a instabilidade da equação permanece.
522

5.5 Teste da primeira lei de Kaldor


Para confirmar esse resultado estimou-se uma variante dessa relação, conhecida na
literatura econômica como Kaldor s engine-of-growth (ou Primeira Lei de Kaldor), onde o
setor industrial surge como o motor do crescimento econômico. Em seu trabalho seminal,
Engle e Granger (1987) mostram que o logaritmo do nível da produção industrial (log
PRODIND) e o do nível do produto (log PIB) são co-integrados se cada um for não-
estacionário, mas existir uma combinação linear estacionária dessas duas séries.

LPIB .LPRODIND (30)


1 2

Todavia, a validade teórica e empírica dessa proposição requer não apenas a existência
de uma correlação significativa entre crescimento industrial e o crescimento do PIB, mas
também que a causalidade seja no sentido do crescimento industrial para a performance
econômica global (YAMAK, 1996).

O trabalho de YAMAK, para o caso da Turquia; e de DÍAZ-BAUTISTA, para o


México, detectam a relação de Kaldor-Verdoorn para essas economias. Mas esses
pesquisadores não realizaram os testes de mudança estrutural347, o que tende a tornar frágeis
os resultados dos testes de raízes unitárias e de co-integração que utilizaram para os períodos
completos analisados. 348

As dinâmicas do produto industrial e do PIB são exibidas no Gráfico 122 e em séries


tendenciais no Gráfico 123. Pode-se constatar a forte correlação entre as duas séries, o que
demonstra que a indústria é efetivamente um setor fundamental ao crescimento econômico.

347
MARINHO et al. (2001) e GUIMARÃES (2002) também não verificaram a ocorrência de mudança
estrutural. O primeiro, no entanto, considera uma quebra estrutural em abril de 1990 e estima o VECM em dois
subperíodos: (1985.01-1990.04) e (1990.05-1997.12), concluindo pela validade da relação de Kaldor-Verdoorn
para os anos 90, onde as estatísticas oficiais confirmam a retomada dos ganhos de produtividade da indústria
brasileira, a partir da abertura econômica.
348
Como a periodização da evolução econômica brasileira é um dos objetivos básicos da análise desenvolvida
neste trabalho, os testes de mudança estrutural serão mobilizados freqüentemente. Mas mesmo do ponto de vista
da teoria econométrica, a verificação da existência de mudança estrutural nas séries e modelos propostos deve
ser considerada. Ver observação de G.S. MADDALA (2003, p. 304 e 305), na seção 5.4.
523

GRÁFICO 122 DINÂMICAS DO PRODUTO INDUSTRIAL E DO PIB (1901-2003)

PIB
Produto industrial
25%

20%
Taxas reais de crescimento

15%

10%

5%

0%

-5%

-10%

-15%
1901
1904
1907
1910
1913
1916
1919
1922
1925
1928
1931
1934
1937
1940
1943
1946
1949
1952
1955
1958
1961
1964
1967
1970
1973
1976
1979
1982
1985
1988
1991
1994
1997
2000
2003
FONTE: Séries originais obtidas no IPEADATA.
NOTA: Dados para o produto industrial real referem-se à indústria de transformação.

GRÁFICO 123 - DINÂMICAS DO PRODUTO INDUSTRIAL E DO PIB: SÉRIES TENDENCIAIS


(1901-2003)
PIB
Produto industrial
14%
Taxas reais de crescimento filtradas pelo

12%

10%

8%

6%
4253H

4%

2%

0%

-2%

-4%
1901
1904
1907
1910
1913
1916
1919
1922
1925
1928
1931
1934
1937
1940
1943
1946
1949
1952
1955
1958
1961
1964
1967
1970
1973
1976
1979
1982
1985
1988
1991
1994
1997
2000
2003

FONTE: Dados originários do IBGE e IPEADATA para indústria de transformação.


NOTA: As séries em nível foram deflacionadas pelo deflator implícito do PIB, base 2000 = 100 e em seguida
filtradas pelo filtro 4253H para eliminar as flutuações de curto prazo.
524

QUADRO 137 - ESTIMAÇÃO DA EQUAÇÃO 30 (1900-2003)

Dependent Variable: LPIB


Method: Least Squares
Sample: 1900 2003
Included observations: 104
Variable Coefficient Std. Error t-Statistic Prob.
C 0.710764 0.055741 12.75112 0.0000
LPRODIND 0.826385 0.006986 118.2977 0.0000
R-squared 0.992764 Mean dependent var 7.111165
Adjusted R-squared 0.992693 S.D. dependent var 1.599867
S.E. of regression 0.136757 Akaike info criterion -1.122181
Sum squared resid 1.907648 Schwarz criterion -1.071328
Log likelihood 60.35343 F-statistic 13994.36
Durbin-Watson stat 0.055789 Prob(F-statistic) 0.000000

FIGURA 42 - TESTES DE ESTABILIDADE ESTRUTURAL (1900-2003)

0.4 80 1.2

0.3 60 1.0

0.2 0.8
40
0.1 0.6
20
0.0 0.4
0
-0.1 0.2

-0.2 -20 0.0

-0.3 -40 -0.2


1920 1940 1960 1980 2000 1920 1940 1960 1980 2000 1920 1940 1960 1980 2000

Recursive Residuals ± 2 S.E. CUSUM 5% Signific anc e CUSUM of Squares 5% Significance

0.4 0.4
3
0.2 0.2

0.0 0.0 2
-0.2 -0.2
0.00 0.00
-0.4 -0.4 1

0.05 0.05

0
0.10 0.10

0.15 0.15
1920 1940 1960 1980 2000 1920 1940 1960 1980 2000 -1
10 20 30 40 50 60 70 80 90 00
One-Step Probability Recursive Residuals N-Step Probability Recursive Residuals
Recursive C(1) Estimates ± 2 S.E.

1.2

1.0

0.8

0.6

0.4
10 20 30 40 50 60 70 80 90 00

Recursive C(2) Estimates ± 2 S.E.

O primeiro período identificado corresponde ao intervalo [1900-1927]. Como a


equação mostrou-se estável (Figura 42), foram aplicados os testes de raízes unitárias para
verificar a possibilidade de co-integração. As séries apresentaram raízes unitárias, mas o teste
Johansen não rejeitou a hipótese de nenhuma relação de co-integração.
525

QUADRO 138 - ESTIMAÇÃO DA EQUAÇÃO 30 (1900-1927)

Dependent Variable: LPIB


Method: Least Squares
Sample: 1900 1927
Included observations: 28
Variable Coefficient Std. Error t-Statistic Prob.
C 1.660047 0.095722 17.34243 0.0000
LPIBIND 0.656733 0.017872 36.74610 0.0000
R-squared 0.981108 Mean dependent var 5.162676
Adjusted R-squared 0.980382 S.D. dependent var 0.331074
S.E. of regression 0.046372 Akaike info criterion -3.235501
Sum squared resid 0.055909 Schwarz criterion -3.140343
Log likelihood 47.29701 F-statistic 1350.276
Durbin-Watson stat 0.948503 Prob(F-statistic) 0.000000

FIGURA 43 - TESTES DE ESTABILIDADE ESTRUTURAL (1900-2003)

0.15 15 1.6

0.10 10
1.2

0.05 5
0.8
0.00 0
0.4
-0.05 -5

-0.10 0.0
-10

-0.15 -0.4
02 04 06 08 10 12 14 16 18 20 22 24 26 -15
02 04 06 08 10 12 14 16 18 20 22 24 26 02 04 06 08 10 12 14 16 18 20 22 24 26

Recursive Residuals ± 2 S.E. CUSUM of Squares 5% Significance


CUSUM 5% Signific anc e

0.2 0.2
3
0.1 0.1
2
0.0 0.0
1
-0.1 -0.1
0.00 0.00
-0.2 -0.2 0
0.05 0.05
-1

0.10 0.10
-2

0.15 0.15
02 04 06 08 10 12 14 16 18 20 22 24 26 02 04 06 08 10 12 14 16 18 20 22 24 26 -3
06 08 10 12 14 16 18 20 22 24 26
One-Step Probability Recursive Residuals N-Step Probability Recursive Residuals
Recursive C(1) Estimates ± 2 S.E.

1.6

1.4

1.2

1.0

0.8

0.6

0.4
06 08 10 12 14 16 18 20 22 24 26

Recursive C(2) Estimates ± 2 S.E.


526

QUADRO 139- TESTES DE RAÍZES UNITÁRIAS PARA LPIB, PRODIND E RESÍDUOS DA


EQUAÇÃO 30 (1900-1927)
LPIB
ADF Test Statistic 0.902993 1% Critical Value* -3.7076
5% Critical Value -2.9798
10% Critical Value -2.6290
*MacKinnon critical values for rejection of hypothesis of a unit root.

LPRODIND
ADF Test Statistic 0.037047 1% Critical Value* -3.7076
5% Critical Value -2.9798
10% Critical Value -2.6290
*MacKinnon critical values for rejection of hypothesis of a unit root.

RESÍDUOS
ADF Test Statistic -2.376604 1% Critical Value* -3.7076
5% Critical Value -2.9798
10% Critical Value -2.6290
*MacKinnon critical values for rejection of hypothesis of a unit root.

Os valores críticos de Engle e Yoo (1987) são 1% (-4,07) e 5% (-3,37). O valor


estimado da estatística ADF = -2,38, logo os resíduos não são estacionários e as séries não co-
integram pela metodologia de Engle e Granger (1987). O teste de Johansen também não
rejeitou a hipótese nula de ausência de uma relação de co-integração (Quadro 140).

QUADRO 140 TESTE DE CO-INTEGRAÇÃO (1900-1927)

Sample: 1900 1927


Included observations: 26
Test assumption: Linear deterministic trend in the data
Series: LPIB LPRODIND
Lags interval: 1 to 1
Likelihood 5 Percent 1 Percent Hypothesized
Eigenvalue Ratio Critical Value Critical Value No. of CE(s)
0.188428 5.545961 15.41 20.04 None
0.004514 0.117631 3.76 6.65 At most 1
*(**) denotes rejection of the hypothesis at 5%(1%) significance level
L.R. rejects any cointegration at 5% significance level

No segundo período identificado, [1933 1963], a relação revelou-se instável,


refletindo os desdobramentos da crise de 1929, a Segunda Guerra Mundial e as
transformações estruturais promovidas pelos novos papéis do Estado no pós-Guerra e pelo
Plano de Metas (1955-1961]. A análise de co-integração foi descartada em razão dessa
instabilidade estrutural que tende a afetar os testes, fragilizando os resultados econométricos
(MADDALA, 2003).
527

QUADRO 141 - ESTIMAÇÃO DA EQUAÇÃO 30 (1962-1980)

Dependent Variable: LPIB


Method: Least Squares
Sample: 1962 1980
Included observations: 19
Variable Coefficient Std. Error t-Statistic Prob.
C -0.343387 0.091893 -3.736805 0.0016
LPRODIND 0.926316 0.009817 94.35511 0.0000
R-squared 0.998094 Mean dependent var 8.316120
Adjusted R-squared 0.997982 S.D. dependent var 0.450760
S.E. of regression 0.020249 Akaike info criterion -4.862129
Sum squared resid 0.006970 Schwarz criterion -4.762714
Log likelihood 48.19022 F-statistic 8902.886
Durbin-Watson stat 1.312187 Prob(F-statistic) 0.000000

FIGURA 44 - TESTE DE ESTABILIDADE PARA O PERÍODO [1962-1980]

0.08 15 1.6

10
1.2
0.04
5
0.8
0.00 0
0.4
-5
-0.04
0.0
-10

-0.08 -0.4
64 66 68 70 72 74 76 78 80 -15
64 66 68 70 72 74 76 78 80 64 66 68 70 72 74 76 78 80
Recursive Residuals ± 2 S.E. CUSUM of Squares 5% Significance
CUSUM 5% Signific anc e

0.10 0.10
4
0.05 0.05

0.00 0.00 2

-0.05 -0.05
0
0.00 0.00
-0.10 -0.10

0.05 0.05 -2

0.10 0.10 -4

0.15 0.15
64 66 68 70 72 74 76 78 80 64 66 68 70 72 74 76 78 80 -6
67 68 69 70 71 72 73 74 75 76 77 78 79 80
One-Step Probability Recursive Residuals N-Step Probability Recursive Residuals
Recursive C(1) Estimates ± 2 S.E.

1.6

1.4

1.2

1.0

0.8

0.6

0.4
67 68 69 70 71 72 73 74 75 76 77 78 79 80

Recursive C(2) Estimates ± 2 S.E.

O terceiro período, [1962- 1980], revelou-se estável por todos os testes e engloba a
fase do milagre econômico (1967-1973) e a do II PND (1975-1979). O período corresponde
ao apogeu e esgotamento do modo de desenvolvimento por substituição de importações
(Quadro141). A este nível da análise da economia brasileira no século XX já é possível
528

aplicar-se o conceito regulacionista de modo de desenvolvimento, definido no capítulo 2


como a resultante em sua evolução quantitativa e qualitativa da conjunção de um regime
de acumulação com um modo de regulação. Neste contexto, a análise histórica e
institucionalista mostra que a lógica da acumulação de capital baseada no processo de
substituição de importações pressupunha uma configuração particular das formas
institucionais e então do modo de regulação resultante.

QUADRO 142 - TESTES DE RAÍZES UNITÁRIAS PARA LPIB E LPRODIND E RESÍDUOS DA


RELAÇÃO 30 (1962-1980)
LPIB
ADF Test Statistic 0.689965 1% Critical Value* -3.8304
5% Critical Value -3.0294
10% Critical Value -2.6552
*MacKinnon critical values for rejection of hypothesis of a unit root.

LPRODIND
ADF Test Statistic 0.509838 1% Critical Value* -3.8304
5% Critical Value -3.0294
10% Critical Value -2.6552
*MacKinnon critical values for rejection of hypothesis of a unit root.
Log likelihood 29.97942 F-statistic 0.180345
Durbin-Watson stat 2.057955 Prob(F-statistic) 0.836656

RESÍDUOS
ADF Test Statistic -1.467356 1% Critical Value* -3.8877
5% Critical Value -3.0521
10% Critical Value -2.6672
*MacKinnon critical values for rejection of hypothesis of a unit root.

QUADRO 143 TESTE DE CO-INTEGRAÇÃO DE JOHANSEN PARA LPIB E LPRODIND (1962-


1980)

Sample: 1962 1980


Included observations: 19
Test assumption: Linear deterministic trend in the data
Series: LPIB LPRODIND
Lags interval: 1 to 1
Likelihood 5 Percent 1 Percent Hypothesized
Eigenvalue Ratio Critical Value Critical Value No. of CE(s)
0.311607 8.710380 15.41 20.04 None
0.081529 1.615860 3.76 6.65 At most 1
*(**) denotes rejection of the hypothesis at 5%(1%) significance level
L.R. rejects any cointegration at 5% significance level

As séries são, portanto I(1) e são estacionárias em primeiras diferenças. Se os resíduos


forem estacionários, então a equação estimada não é espúria, pois haveria uma relação de co-
integração. Mas os valores críticos de Engle e Yoo (1987) a 1% e 5%, são, respectivamente de
-4,32 e 3,67, portanto, menores do que a estatística ADF estimada (-1,47), indicando a
529

presença de uma raiz unitária na série dos resíduos. Isto invalida a hipótese de co-integração
das séries do LPIB e do LPIBIND pela metodologia de Engle-Granger. O teste de Johansen
também reforça esse resultado, pois também não rejeitou a hipótese nula de ausência de uma
relação de co-integração (Quadro 143).

Em resumo, não há evidências empíricas de que a relação de Kaldor-Verdoorn possa


ter atuado na economia brasileira no período [1962-1980], que inclui a fase de forte expansão
do milagre (1967-1973). Embora isto não signifique a ausência de qualquer influência ou
dependência entre essas variáveis, o resultado encontrado não permite suportar a hipótese de
que a relação de Kaldor-Verdoorn esteve presente ao menos neste período da história
econômica brasileira, pois o fato das séries não co-integrarem expressa a ausência de uma
relação de longo prazo entre as dinâmicas da indústria e do PIB. Talvez a principal razão
esteja no próprio padrão de crescimento econômico que caracterizou essa época: um
modelo de crescimento concentrador de renda e impulsionado por elevadas taxas de lucro e
por empréstimos externos. Mas essa é já uma outra hipótese a ser testada neste trabalho, isto
é, a da possível vigência de um regime de acumulação profit-led, onde a influência da
demanda agregada como fator indutor do investimento é pouco significante e então o
mecanismo kaldoriano de causalidade cumulativa não pode atuar.

No quarto período, [1991-2003], embora a relação estimada seja estatisticamente


significativa, não há estabilidade dos coeficientes e a amostra é ainda muito reduzida para
permitir uma maior robustez dos testes (Quadro144; Figura 45).

QUADRO 144 - ESTIMAÇÃO DA EQUAÇÃO 30 (1991-2003)


Dependent Variable: LPIB
Method: Least Squares
Sample: 1991 2003
Included observations: 13
Variable Coefficient Std. Error t-Statistic Prob.
C -3.064777 1.069913 -2.864511 0.0154
LPRODIND 1.218765 0.105051 11.60161 0.0000
R-squared 0.924449 Mean dependent var 9.347572
Adjusted R-squared 0.917581 S.D. dependent var 0.102477
S.E. of regression 0.029420 Akaike info criterion -4.073650
Sum squared resid 0.009521 Schwarz criterion -3.986735
Log likelihood 28.47873 F-statistic 134.5973
Durbin-Watson stat 1.025499 Prob(F-statistic) 0.000000
530

FIGURA 45 TESTE DE ESTABILIDADE ESTRUTURAL PARA A RELAÇÃO 30 (1991-2003)

0.08 15 1.5

0.06
10
0.04 1.0

0.02
5
0.00 0.5

-0.02 0

-0.04 0.0
-5
-0.06

-0.08 -0.5
93 94 95 96 97 98 99 00 01 02 03 -10
93 94 95 96 97 98 99 00 01 02 03 93 94 95 96 97 98 99 00 01 02 03
Recursive Residuals ± 2 S.E. CUSUM of Squares 5% Significance
CUSUM 5% Significanc e

0.10 0.10
2
0.05 0.05

0.00 0.00 0
-0.05 -0.05
0.00 0.00
-0.10 -0.10 -2
0.05 0.05

0.10 0.10 -4

0.15 0.15
93 94 95 96 97 98 99 00 01 02 03 93 94 95 96 97 98 99 00 01 02 03 -6
96 97 98 99 00 01 02 03
One-Step Probability Recursive Residuals N-Step Probability Recursive Residuals
Recursive C(1) Estimates ± 2 S.E.

1.6

1.4

1.2

1.0

0.8

0.6
96 97 98 99 00 01 02 03

Recursive C(2) Estimates ± 2 S.E.

Conseqüentemente, em razão do reduzido número de observações poder-se-ia concluir


pela fragilidade desse resultado. Mas considerando as estimações precedentes para o mesmo
período, realizadas com maior número de observações (já que em séries mensais), e a
reconfiguração das formas institucionais nos anos 90, este resultado implica na inexistência da
relação de Kaldor-Verdoorn nesta década.

Uma conclusão idêntica à encontrada por FEIJÓ e CARVALHO (2002), que


observam que as chamadas leis de Kaldor perdem força em momentos de transição na
estrutura produtiva, onde os condicionantes da oferta têm um maior impacto sobre o
comportamento do produto349. Além disso, a abordagem kaldoriana está fundada na existência
de causação cumulativa no plano macroeconômico, pressupondo a influência da demanda

349
FEIJÓ e CARVALHO (1997) mostraram, no entanto, que a segunda lei de Kaldor-Verdoorn teria sido válida
para o período 1972-1996. Mas CARVALHO (2000) reconheceu que a regressão que estimaram só teve
resultados significativos quando se confronta produção com emprego e que é necessário um patamar mínimo de
expansão da produção para que a geração de emprego tenha início.
531

agregada como fator de impulsão da dinâmica da indústria e da economia. Todavia, nos anos
90, a demanda agregada permaneceu, na maior parte do período, muito contida, tanto pela
própria lógica da política de estabilização de preços, quanto pela elevação do desemprego
conjuntural e estrutural neste período. Este fato pode ser constatado pelo exame do Gráfico 1.
Apesar do relance da produtividade industrial, a produção não tem o mesmo dinamismo,
permanecendo numa quase-estagnação, sobretudo no período pós-Plano Real, a partir de
1995. Portanto, a economia não apresenta neste período uma expansão do nível de atividade
seja industrial seja global que justifique a vigência da relação de Kaldor-Verdoorn. Conforme
observaram MARINHO et al. (2001), esta relação não é simétrica, ou seja, ela só é válida para
períodos de crescimento econômico, pois do contrário, em caso de queda da produção
industrial, a produtividade deveria cair mais que proporcionalmente.

GRÁFICO 124 PRODUÇÃO INDUSTRIAL E PIB (1982-2001)


Produção industrial_indústria de transformação
PIB mensal
170
160
Índice dos valores: jun/1982 = 100

150
140
130
120
110
100
90
80
70
1982 06
1982 12
1983 06
1983 12
1984 06
1984 12
1985 06
1985 12
1986 06
1986 12
1987 06
1987 12
1988 06
1988 12
1989 06
1989 12
1990 06
1990 12
1991 06
1991 12
1992 06
1992 12
1993 06
1993 12
1994 06
1994 12
1995 06
1995 12
1996 06
1996 12
1997 06
1997 12
1998 06
1998 12
1999 06
1999 12
2000 06
2000 12
2001 06
2001 12

FONTE: Dados obtidos através do IPEADATA e provenientes do IBGE.


NOTA: As séries em índice de quantum foram dessazonalizadas pelo X11/2000 Census 2. Séries tendenciais
estimadas por regressão local lowess smoothing.

Uma alternativa de estimação pode ser efetuada com séries mensais do PIB e da
produção física da indústria de transformação, no período 1982-2001 (Quadro 145):
LPIB c c .LPI
1 2
(31)

com as variáveis em logaritmo natural.


O Gráfico 124 mostra a evolução dessas duas séries. Observa-se novamente forte
correlação entre as variáveis e as evoluções tendenciais, estimadas pelo método de regressão
local lowess smoothing, sugerem a possibilidade de co-integração.
532

QUADRO 145 - ESTIMAÇÃO DA EQUAÇÃO 31 (1982-2001)

Dependent Variable: LPIB


Method: Least Squares
Sample: 1982:06 2001:12
Included observations: 235
Variable Coefficient Std. Error t-Statistic Prob.
C -0.887874 0.236267 -3.757930 0.0002
LPI 1.218047 0.050140 24.29290 0.0000
R-squared 0.716939 Mean dependent var 4.850425
Adjusted R-squared 0.715724 S.D. dependent var 0.145121
S.E. of regression 0.077375 Akaike info criterion -2.271837
Sum squared resid 1.394939 Schwarz criterion -2.242393
Log likelihood 268.9408 F-statistic 590.1451
Durbin-Watson stat 0.225944 Prob(F-statistic) 0.000000

QUADRO 146 TESTES DE ESTABILIDADE DA RELAÇÃO 31 (1982-2001)

400 1.2

1.0
300
0.8

200
0.6

0.4
100

0.2
0
0.0

-100 -0.2
84 86 88 90 92 94 96 98 00 84 86 88 90 92 94 96 98 00

CUSUM 5% Significance CUSUM of Squares 5% Significance

A relação com as variáveis em nível revelou-se muito instável como pode ser
observado pelos testes de mudança estrutural e então a divisão do período tornou-se
necessária.
QUADRO 147 ESTIMAÇÃO DA RELAÇÃO 31 - [1991-1994]

Dependent Variable: LPIB


Method: Least Squares
Sample: 1991:01 1994:06
Included observations: 42
Variable Coefficient Std. Error t-Statistic Prob.
C 2.060530 0.191598 10.75446 0.0000
LPI 0.594896 0.041242 14.42454 0.0000
R-squared 0.838753 Mean dependent var 4.824049
Adjusted R-squared 0.834722 S.D. dependent var 0.035951
S.E. of regression 0.014616 Akaike info criterion -5.566986
Sum squared resid 0.008545 Schwarz criterion -5.484240
Log likelihood 118.9067 F-statistic 208.0673
Durbin-Watson stat 0.487641 Prob(F-statistic) 0.000000

O primeiro período considerado razoavelmente estável compreende o intervalo


[1991:01-1994:06]. Os resultados das estimações encontram-se no Quadro 147 e Figura 46.
No Quadro 148 estão os testes de raízes unitárias correspondentes.
533

FIGURA 46 TESTE DE ESTABILIDADE DA RELAÇÃO 31 (1991-1994)

0.04 0.04 1.6


0.02 0.02
1.2
0.00 0.00

-0.02 -0.02
0.8
0.00 -0.04 0.00 -0.04

0.05 0.05 0.4

0.10 0.10 0.0

0.15 0.15
91:07 92:01 92:07 93:01 93:07 94:01 91:07 92:01 92:07 93:01 93:07 94:01 -0.4
91:07 92:01 92:07 93:01 93:07 94:01
One-Step Probability Recursive Residuals N-Step Probability Recursive Residuals
CUSUM of Squares 5% Significance

QUADRO 148 TESTES DE RAÍZES UNITÁRIAS PARA LPI E LPIB (1991-1994)


LPI
ADF Test Statistic -2.019399
1% Critical Value* -3.5930
5% Critical Value -2.9320
10% Critical Value -2.6039
*MacKinnon critical values for rejection of hypothesis of a unit root.

LPIB
ADF Test Statistic -1.411223
1% Critical Value* -3.5930
5% Critical Value -2.9320
10% Critical Value -2.6039
*MacKinnon critical values for rejection of hypothesis of a unit root.

Mas o teste de JOHANSEN não rejeitou a hipótese nula de ausência de pelo menos
uma relação de co-integração (Quadro149). Por outro lado, os testes de raízes unitárias sobre
os resíduos estimados da relação estática também não rejeitaram a hipótese nula de presença
de raiz unitária, ou seja, os resíduos não são estacionários (Quadro 150).

QUADRO 149 TESTE DE CO-INTEGRAÇÃO DE JOHANSEN PARA LPIB E LPI (1991-1994)

Sample: 1991:01 1994:06


Included observations: 42
Test assumption: Linear deterministic trend in the data
Series: LPI LPIB
Lags interval: 1 to 3
Likelihood 5 Percent 1 Percent Hypothesized
Eigenvalue Ratio Critical Value Critical Value No. of CE(s)
0.118337 6.239022 15.41 20.04 None
0.022350 0.949333 3.76 6.65 At most 1
*(**) denotes rejection of the hypothesis at 5%(1%) significance level
L.R. rejects any cointegration at 5% significance level
534

QUADRO 150 TESTES DE RAÍZES UNITÁRIAS PARA OS RESÍDUOS DA RELAÇÃO 31 (1991-


1994)
RES
ADF Test Statistic -1.612462 1% Critical Value* -2.6211
5% Critical Value -1.9492
10% Critical Value -1.6201
*MacKinnon critical values for rejection of hypothesis of a unit root.
Considerando a ausência de co-integração entre as séries da produção física da
indústria de transformação e do PIB, a equação foi então novamente estimada em taxas de
variação.

QUADRO 151 - ESTIMAÇÃO DA RELAÇÃO 31 EM TAXAS DE VARIAÇÃO - [1991-1994]

Dependent Variable: D(LPIB)


Method: Least Squares
Sample: 1991:01 1994:06
Included observations: 42
Variable Coefficient Std. Error t-Statistic Prob.
C 0.000915 0.001156 0.791402 0.4334
D(LPI) 0.435495 0.025607 17.00711 0.0000
R-squared 0.878509 Mean dependent var 0.002420
Adjusted R-squared 0.875471 S.D. dependent var 0.021166
S.E. of regression 0.007469 Akaike info criterion -6.909645
Sum squared resid 0.002231 Schwarz criterion -6.826899
Log likelihood 147.1025 F-statistic 289.2419
Durbin-Watson stat 1.855824 Prob(F-statistic) 0.000000
O coeficiente relativo ao termo constante que capta a influência de fatores como
capital humano, learning by doing, etc - não é estatisticamente significativo, o que não
permite suportar a validade da lei de Kaldor-Verdoorn para a economia brasileira neste
período pré-Plano Real (Quadro 151).

QUADRO 152 ESTIMAÇÃO DA RELAÇÃO 31 EM TAXAS DE VARIAÇÃO - [1995 2001]

Dependent Variable: D(LPIB)


Method: Least Squares
Sample: 1994:08 2001:12
Included observations: 89
Variable Coefficient Std. Error t-Statistic Prob.
C 0.001734 0.000823 2.105547 0.0381
D(LPI) 0.482938 0.025633 18.84061 0.0000
R-squared 0.803153 Mean dependent var 0.002223
Adjusted R-squared 0.800891 S.D. dependent var 0.017401
S.E. of regression 0.007764 Akaike info criterion -6.856300
Sum squared resid 0.005245 Schwarz criterion -6.800375
Log likelihood 307.1053 F-statistic 354.9687
Durbin-Watson stat 2.374524 Prob(F-statistic) 0.000000
O segundo período considerado estável pelos testes do CUSUM foi o intervalo
[1995:01 2001:12], em que os dois coeficientes são estatisticamente significativos.
Realizou-se então o teste de causalidade de Granger, com a defasagem 2, escolhida com base
no critério de informação de Schwarz (Quadros 152 e 153).
535

QUADRO 153 TESTE DE CAUSALIDADE DE GRANGER (1995-2001)

Pairwise Granger Causality Tests


Sample: 1995:01 2001:12
Lags: 2
Null Hypothesis: Obs F-Statistic Probability
LPIB does not Granger Cause LPI 84 2.79461 0.06719
LPI does not Granger Cause LPIB 2.80963 0.06626

O resultado do teste de causalidade é inconclusivo, pois ambas as hipóteses nulas de


ausência de causalidade não foram rejeitadas, o que mais uma vez enfraquece a influência da
dinâmica da indústria na determinação do PIB, segundo a relação de Kaldor-Verdoorn, neste
período. Novamente deve ser observado que este resultado está coerente com a performance
macroeconômica do período analisado. A economia brasileira apresentou um baixo
dinamismo, com as taxas médias de crescimento da produção industrial e do PIB situando-se,
respectivamente, em -0,03% e 0,14% ao mês. Já as taxas de crescimento acumulado atingiram
-7,5% para a produção industrial e de 10% para o PIB.

Especificação em taxas de crescimento e dados anuais

A especificação com as variáveis em taxa de crescimento e dados anuais revela a


existência de uma relação entre o produto do setor industrial e o crescimento econômico
(Quadro154). E com exceção do teste do CUSUMSQ, todos os testes indicam a estabilidade
da equação para o período completo de análise 1900-2003 (Figura 47). Mas o problema com
essa especificação dinâmica, apesar de ter sido originalmente formulada pelo próprio Kaldor,
é que ela expressa muito mais o comportamento de curto prazo da relação e não as macro-
regularidades de longo prazo que se poderia captar através de uma análise em termos de co-
integração, com a estimação das variáveis em níveis.

QUADRO 154 ESTIMAÇÃO DA RELAÇÃO 3 EM TAXAS DE VARIAÇÃO E DADOS ANUAIS


(1901-2003)
Dependent Variable: PIB
Method: Least Squares
Sample(adjusted): 1901 2003
Included observations: 103 after adjusting endpoints
Variable Coefficient Std. Error t-Statistic Prob.
C 0.018134 0.003798 4.774573 0.0000
PRODIND 0.530435 0.043564 12.17590 0.0000
R-squared 0.594789 Mean dependent var 0.049252
Adjusted R-squared 0.590777 S.D. dependent var 0.044570
S.E. of regression 0.028512 Akaike info criterion -4.257769
Sum squared resid 0.082105 Schwarz criterion -4.206609
Log likelihood 221.2751 F-statistic 148.2526
Durbin-Watson stat 1.764449 Prob(F-statistic) 0.000000
536

FIGURA 47 TESTES DE ESTABILIDADE DA RELAÇÃO 31 (1901-2003)

0.2 30 1.2

1.0
20
0.1
0.8
10
0.6
0.0 0
0.4
-10
0.2
-0.1
-20 0.0

-0.2 -30 -0.2


1920 1940 1960 1980 2000 1920 1940 1960 1980 2000 1920 1940 1960 1980 2000

Recursive Residuals ± 2 S.E. CUSUM 5% Signific anc e CUSUM of Squares 5% Significance

0.2 0.2 0.10


0.1 0.1
0.08
0.0 0.0
0.06
-0.1 -0.1
0.04
-0.2 -0.2
0.00 0.00
0.02
0.05 0.05
0.00
0.10 0.10
-0.02

0.15 0.15 -0.04


1920 1940 1960 1980 2000 1920 1940 1960 1980 2000 10 20 30 40 50 60 70 80 90 00

One-Step Probability Recursive Residuals N-Step Probability Recursive Residuals Recursive C(1) Estimates ± 2 S.E.

1.2

1.0

0.8

0.6

0.4

0.2

0.0

-0.2

-0.4
10 20 30 40 50 60 70 80 90 00

Recursive C(2) Estimates ± 2 S.E.

Procedeu-se ao teste de causalidade de Granger (Quadro 155). A defasagem 2 foi


escolhida segundo o critério de informação de Schwarz (1978).

QUADRO 155 TESTES DE CAUSALIDADE DE GRANGER PARA PIB E PIBIND (1901-2003)


Pairwise Granger Causality Tests
Sample: 1901 2003
Lags: 2
Null Hypothesis: Obs F-Statistic Probability
PRODIND does not Granger Cause PIB 101 3.13921 0.04780
PIB does not Granger Cause PIBIND 0.36578 0.69462

O crescimento do produto industrial causa-Granger o PIB brasileiro, pois a hipótese


nula de não causalidade do produto industrial para o PIB foi rejeitada, enquanto a hipótese
nula de não causalidade do PIB para o produto industrial foi aceita. Todavia, três observações
devem ser feitas quanto a esse resultado:
537

a) o p-valor que rejeitou a hipótese nula de que o produto industrial não causa o
PIB está muito próximo do limite de significância do teste, o que pode ser
decorrente do tamanho da amostra utilizada;
b) a especificação em taxas de variação capta a relação de curto prazo entre as
variáveis e não o comportamento de longo prazo que se poderia apreender caso
as séries co-integrassem. Segundo (1986) e Engle e Granger(1987), desde que
haja co-integração entre as variáveis estimadas, a causalidade deverá existir pelo
menos em uma direção. Portanto, na ausência de co-integração, não se poderia
sustentar a validade empírica dessa Primeira Lei de Kaldor para o período
[1901-2003];350
c) Foi utilizada a série do valor adicionado da indústria como proxy do valor da
produção industrial, pressupondo que a variação real do primeiro segue a do
segundo. No entanto, em alguns subperíodos, as Contas Nacionais mostram que
o VA real da indústria aumentou mais do que a produção física. Este foi o caso
para 1990-1996.

5.6 A lei de Kaldor-Verdoorn nos setores não-industriais


Os resultados de GUIMARÃES (2002) para a vigência da relação de Kaldor-Verdoorn
nos setores não-industriais não foram conclusivos. Para a indústria, a conclusão foi que há
evidências de retornos crescentes de escala, mas esses ganhos permaneceram modestos
quando comparados aos observados em estudos de caso para outros países.

A análise a seguir estima a relação entre o produto não-industrial e o produto


industrial, mediante a relação:
LYNIND c c .LYIND
1 2
(32)

Onde LYNIND é o log do produto não-industrial e LYIND é o logo do produto


industrial.

350
Conforme F. CARNEIRO (1997), o termo causalidade, no sentido estatístico, não é sinônimo de
endogeneidade. Por essa razão, LEAMER (1985) sugere o uso do termo precedência ao termo causalidade.
Contudo, este último já se encontra popularizado e bem estabelecido na literatura. Desta forma precedência
temporal e causalidade significam a mesma coisa.
538

QUADRO 156 ESTIMAÇÃO DA RELAÇÃO 32 (1900-2002)

Dependent Variable: LYNIND


Method: Least Squares
Sample(adjusted): 1900 2002
Included observations: 103 after adjusting endpoints
Variable Coefficient Std. Error t-Statistic Prob.
C 4.818434 0.131981 36.50843 0.0000
LYIND 0.771721 0.007635 101.0800 0.0000
R-squared 0.990211 Mean dependent var 18.07614
Adjusted R-squared 0.990115 S.D. dependent var 1.500109
S.E. of regression 0.149149 Akaike info criterion -0.948509
Sum squared resid 2.246803 Schwarz criterion -0.897349
Log likelihood 50.84821 F-statistic 10217.16
Durbin-Watson stat 0.049940 Prob(F-statistic) 0.000000

FIGURA 48 TESTE DE ESTABILIDADE DA RELAÇÃO 32 (1900-2002)


80 1.2

60 1.0

0.8
40
0.6
20
0.4
0
0.2

-20 0.0

-40 -0.2
1920 1940 1960 1980 2000 1920 1940 1960 1980 2000

CUSUM 5% Signific anc e CUSUM of Squares 5% Significance

Os testes do CUSUM e CUSUMSQ mostram que a equação não é estruturalmente


estável para o período completo de análise e então deve-se considerar os subperíodos onde a
relação se apresente estável.
O primeiro período, [1960-1979], revelou-se estável pelos mesmos testes e então
procedeu-se ao teste de Johansen para co-integração (Quadro 157).351
QUADRO 157 ESTIMAÇÃO DA RELAÇÃO 32 (1960 1979)

Dependent Variable: LYNIND


Method: Least Squares
Sample: 1960 1979
Included observations: 20
Variable Coefficient Std. Error t-Statistic Prob.
C 2.895524 0.272400 10.62969 0.0000
LYIND 0.866042 0.014555 59.50308 0.0000
R-squared 0.994942 Mean dependent var 19.09846
Adjusted R-squared 0.994661 S.D. dependent var 0.441732
S.E. of regression 0.032277 Akaike info criterion -3.934274
Sum squared resid 0.018753 Schwarz criterion -3.834701
Log likelihood 41.34274 F-statistic 3540.616
Durbin-Watson stat 1.112877 Prob(F-statistic) 0.000000

351
Por questões de espaço e porque este período já foi considerado estável nas estimações anteriores, os
respectivos testes de estabilidade não serão exibidos.
539

As séries são I(1), todavia os resíduos não são estacionários (a estatística ADF
estimada foi de -1,23, que é maior do que os valores críticos de Engle e Yoo(1987),
respectivamente, -4,32, a 1%, e -3,67, a 5%) e então a hipótese de co-integração foi
descartada (Quadro 158). O teste de Johansen também não revelou a presença de nenhuma
relação de co-integração.
QUADRO 158 TESTES DE RAÍZES UNITÁRIAS PARA LYIND, LYNIND E RESÍDUOS DA
RELAÇÃO 32 (1960-1979)
LYIND
ADF Test Statistic -1.563590 1% Critical Value* -3.4979
5% Critical Value -2.8909
10% Critical Value -2.5822
*MacKinnon critical values for rejection of hypothesis of a unit root.

LYNAOIND
ADF Test Statistic -0.594885 1% Critical Value* -3.4979
5% Critical Value -2.8909
10% Critical Value -2.5822
*MacKinnon critical values for rejection of hypothesis of a unit root.

RESÍDUOS
ADF Test Statistic -1.226234 1% Critical Value* -3.8572
5% Critical Value -3.0400
10% Critical Value -2.6608
*MacKinnon critical values for rejection of hypothesis of a unit root.

A alternativa foi estimar a equação em taxas de variação para se captar o


comportamento de curto prazo (Quadro 159).

QUADRO 159 - ESTIMAÇÃO DA RELAÇÃO 32 EM TAXAS DE VARIAÇÃO (1960 1979)

Dependent Variable: D(LYNIND)


Method: Least Squares
Sample: 1966 1979
Included observations: 14
Variable Coefficient Std. Error t-Statistic Prob.
C 0.046330 0.012858 3.603120 0.0036
D(LYIND) 0.370721 0.130852 2.833141 0.0151
R-squared 0.400800 Mean dependent var 0.079779
Adjusted R-squared 0.350866 S.D. dependent var 0.023658
S.E. of regression 0.019061 Akaike info criterion -4.950812
Sum squared resid 0.004360 Schwarz criterion -4.859518
Log likelihood 36.65568 F-statistic 8.026687
Durbin-Watson stat 2.025894 Prob(F-statistic) 0.015088
540

QUADRO 160 - TESTE DE CAUSALIDADE DE GRANGER (1966-1979)

Pairwise Granger Causality Tests


Sample: 1966 1979
Lags: 2
Null Hypothesis: Obs F-Statistic Probability
LYNAOIND does not Granger Cause LYIND 14 0.95537 0.42048
LYIND does not Granger Cause LYNAOIND 1.65326 0.24461

Mais uma vez o resultado do teste de causalidade de Granger revela-se inconclusivo e


então não se poderia concluir pela vigência da primeira lei de Kaldor também com relação às
atividades econômicas não-industriais (Quadro 160).
Uma síntese dos resultados pode então ser efetuada. Ao se referirem ao problema da
indústria britânica nos anos 80, BOYER e PETIT (1989, p.18) observam que as divergências
entre as tendências da produtividade e da demanda respondem pelas dificuldades em se
apreender os mecanismos kaldorianos de causação cumulativa. No caso britânico, ganhos
elevados de produtividade foram observados, mas as taxas de crescimento nas vendas da
indústria permaneciam moderadas;
No caso brasileiro dos anos 90, os ganhos de produtividade do setor industrial não se
traduziram em uma expansão significativa do nível de atividade econômica, tanto que
as taxas de crescimento do PIB permaneceram reduzidas ao longo de toda a década;
Como argumenta MADDALA (2003), a ocorrência de mudanças estruturais afeta os
testes de co-integração e tende a fragilizar as conclusões em prol da vigência da
relação de Kaldor-Verdoorn. A grande maioria dos trabalhos empíricos que testaram a
relação de Kaldor-Verdoorn para a economia brasileira não realizou os testes de
mudança estrutural. Quando se consideram as mudanças estruturais e se estima a
relação apenas para os períodos de estabilidade, os testes econométricos para a
economia brasileira não confirmam a ocorrência dessa relação;
Isto significa que, nas palavras de BOYER e PETIT, even for a single country, the
generalized Kaldorian model is not stable in the long run ;
As críticas normais à abordagem de Kaldor estão focadas na versão da causação
cumulativa em sua forma reduzida. E, sobretudo, nos momentos de mudança
estrutural, quando novos fatores deveriam ser considerados, a relação tende a tornar-se
subespecificada e a conclusão equivocada dos críticos é a de que a relação em si não
teria suficiente base empírica ou mesmo teórica;
A decomposição da forma reduzida das relações de Kaldor-Verdoorn conduz às
seguintes considerações, apontadas pelos autores supracitados:
541

i. Para ser sustentado, um processo de crescimento cumulativo deriva de uma


compatibilidade estrutural entre um regime de produtividade e um regime de
demanda. A condição de estabilidade requer uma sensibilidade limitada da
demanda à produtividade, para uma dada elasticidade da produtividade ao
crescimento econômico. Isto implica considerar-se que os ganhos de
produtividade não podem ocorrer às expensas do emprego e da demanda
agregada, uma condição que parece não ter sido satisfeita na economia brasileira
dos anos 90;
ii. Conseqüentemente, a generalização da lei de Kaldor-Verdoorn através das
noções de regime de produtividade e de demanda explica porque um tal processo
cumulativo nunca pode ocorrer em uma economia particular se, por exemplo, os
mecanismos de distribuição de renda não se ajustam ao regime de produtividade.
Isto fornece um insight para responder à questão de MYRDALL: why some
economy do not experience a cumulative growth as older industrialized
capitalist counstries did?
iii. Segundo BOYER e PETIT (1989), a objeção de ROWTHORN(1975) sobre as
dificuldades em se estimar as relações de Kaldor-Verdoorn pode então ser
respondida. A relação estimada corresponderá à função do regime de
produtividade se as mudanças que ocorrerem na economia afetarem apenas o
regime de produtividade, mas não o regime de demanda;
iv. Todavia, no caso geral, as mudanças estruturais modificam ambos os regimes de
produtividade e de demanda, algo que a análise empírica confirma para o caso
brasileiro pós-liberalização e pós-Real. Em conseqüência, a equação simples
convencional, que é normalmente estimada, conduz a uma elasticidade viesada
da produtividade em relação ao crescimento. E desde que as evidências
empíricas suportam uma tal hipótese, a aparente instabilidade das relações de
Kaldor-Verdoorn encontram uma explicação muito natural.
A consideração dos efeitos de mudanças estruturais ou da inadequação dos regimes de
demanda face aos regimes de produtividade exige então novas especificações para se testar a
vigência de um processo de crescimento cumulativo ou a atuação das relações de Kaldor-
Verdoorn numa determinada economia. Não se deve supor a invariância temporal do modelo
de causalidade cumulativa como se as transformações das estruturas econômicas fossem
incapazes de quebrar as macro-regularidades expressas por esse modelo ou relação.
542

5.7 Regimes de acumulação e abordagem neo-estruturalista: o modelo de Bowles-Boyer


e o caso brasileiro

Os regimes de crescimento ou de acumulação são o resultado de um conjunto de


regularidades macroeconômicas que asseguram uma progressão geral e relativamente
coerente da acumulação de capital (BOYER, 2002). De acordo com os princípios teóricos
regulacionistas essas regularidades nunca emergem ou se reproduzem a partir de processos
econômicos puramente mercantis e centrados numa racionalidade individual otimizadora.
Modos particulares de regulação respondem pelos padrões de evolução das variáveis
macroeconômicas, inclusive pelas especificidades das crises no tempo e no espaço. Esses
padrões de regularidades macroeconômicas são passíveis de identificação estatística ou
econométrica e expressam, no plano das análises, as formas vigentes de relacionamento entre
os determinantes fundamentais do processo de produção e de distribuição do excedente
econômico.

A análise que se segue aplica ao caso brasileiro um conjunto de princípios teóricos que
se inscrevem numa tradição do pensamento econômico tributária de KEYNES, KALECKI e
KALDOR. Os modelos derivados dessas contribuições são normalmente conhecidos como
pertencentes à abordagem estruturalista., um rótulo que na realidade pode abrigar diversos
tipos de análise e concepções teóricas que se afastam da visão neoclássica e de suas variantes
contemporâneas.

A Teoria da Regulação, por seus princípios de base e metodologia, é claramente uma


teoria estruturalista que é herdeira dessa tradição ao mesmo tempo em que contribui para
mantê-la viva e pertinente à realidade econômica atual. Desde os anos 80, os modelos
macroeconômicos estruturalistas foram incorporados às análises em termos de regulação
porque proporcionam uma maneira simples e eficaz de se averiguar o modo como a dinâmica
da acumulação de capital é influenciada por arranjos institucionais e mudanças estruturais
endógenas. Neste sentido, vários estudos de caso foram desenvolvidos para diversos países da
OCDE e América Latina, destacando-se os trabalhos regulacionistas para os casos dos EUA,
França, Alemanha, Japão, Chile e Argentina.

Os modelos formais estruturalistas originaram-se dos trabalhos de KALECKI e


KALDOR e buscam articular a dinâmica da demanda efetiva com a lógica do conflito
distributivo inerente à relação capital-trabalho, que, em termos da presente análise, significa a
wage-labor nexus (WLN). No contexto das economias contemporâneas enquanto economias
monetárias, mas igualmente salariais, as relações entre crescimento e distribuição não são
543

determinadas segundo um padrão único e universal. Elas formam um certo regime que
depende dos mecanismos de coordenação institucional entre investimento, produtividade do
trabalho e salários. E é por isso que, para a Teoria da Regulação, a análise das relações
monetárias e financeiras dos determinantes do crescimento econômico devem ser
complementadas com uma investigação da configuração vigente da WLN ou rapport salarial.

Em ARONOVICH (1991) pode ser encontrada uma síntese das hipóteses mobilizadas
pelas abordagens neo-estruturalistas. A Figura 49, a seguir, reproduz o diagrama estilizado,
proposto por esse autor, para representar os ajustes macroeconômicos que podem ser
apreendidos a partir desses modelos.

As hipóteses neo-estruturalistas podem ser listadas procurando-se vinculá-las


diretamente aos princípios e conceitos da Teoria da Regulação:

a) a renda nacional é composta por duas classes de renda: lucros e salários.


Hipótese compatível com o caráter determinante da wage-labor nexus,
responsável pela distribuição primária da renda;

b) a economia é considerada fechada e sem governo. Uma hipótese que deve ser
removida em uma época marcada pela globalização e pelas transformações
das relações Estado-economia;

c) o produto físico corrente é uma função do coeficiente tecnológico e do grau de


utilização do estoque de capital fixo disponível (teoria do acelerador). Esta
hipótese não implica uma adesão ao determinismo tecnológico que permeia a
grande maioria das análises econométricas em termos de funções de produção
(BOYER e JUILLARD, 1992). A noção regulacionista de regime de
produtividade é mobilizada neste contexto para dar conta da interdependência
entre os efeitos substituição e os fatores de mudança endógena;
544

FIGURA 49 AJUSTE MACROECONÔMICO EM MODELOS NEO-ESTRUTURALISTAS

OFERTA DE
Taxa de acumulação POUPANÇA
de capital ( g )
g2 II

DEMANDA DE
INVESTIMENTO

I
g1

Utilização da r1 r2 Taxa de lucro ( r )


capacidade
instalada ( u )

u
u1

r
Salário médio
real ( wr )

w
p

FONTE: ARONOVICH, S. (1992).


545

d) o salário nominal é constante. Consideradas as restrições institucionais à


redução nominal do salário, características dos sistemas de pagamento fordistas
e de suas variantes;352

e) os preços são formados por uma regra de mark-up sobre os salários. Mais
amplamente o mark-up incidiria sobre os custos totais de produção, mas com
uma economia oligopolizada e uma WLN concorrencial, o nível de emprego
passa a ser a principal forma de ajuste aos movimentos conjunturais;

f) o mark-up planejado é igual ao mark-up realizado de tal forma que possa ser
estabelecida uma relação única entre esta variável e a taxa de lucro calculada
sobre o estoque de capital fixo (produtivo).

g) o equilíbrio macroeconômico se estabelece no ponto de igualdade entre oferta


agregada e demanda agregada;

h) em geral, supõe-se ausência de depreciação do estoque de capital, mas esta


hipótese é removida, por exemplo, na formulação de UEMURA (2000) para o
cálculo da taxa de lucro;

i) os assalariados consomem a totalidade de sua renda e a variável determinante


do consumo capitalista é a massa de lucros. Uma hipótese, portanto, kaleckiana;

j) o investimento ( ou a taxa de acumulação de capital) é uma função linear de


sua taxa de retorno (taxa de lucro) e do nível de utilização da capacidade
produtiva instalada;

Considerando-se a versão de UEMURA (2000), para o modelo de BOWLES e


BOYER (1990, 1995), a dinâmica da acumulação de capital é governada pelo comportamento
do investimento. Nos quadros de uma visão kaleckiana, sob condições oligopolísticas, o
investimento reage às mudanças na taxa de lucro e na utilização da capacidade. Neste
contexto, uma função investimento linear pode ser definida da seguinte maneira:
I
g 0 g r .r g u .u (33)
K

352
Esta hipótese não se adequaria aos sistemas de pagamento derivados dos métodos japoneses de gestão ou do
tipo économie du partage à la Weitzman. Nesses casos, os salários nominais poderiam variar em função do
faturamento das empresas.
546

I é a taxa real de investimento; r é a taxa de lucro bruto, isto é, incluindo a depreciação do


estoque de capital. Pela equação (2), a taxa de acumulação de capital (I / K) é influenciada por
três fatores principais:

a) o coeficiente (g0) procura captar as influências do ambiente macroeconômico sobre as


decisões de investimento. De fato, a vigência de um determinado modo de
regulação353 se expressa na existência de fatores institucionais que compõem a
estrutura macro-social onde o processo de acumulação de capital se desenvolve. Isto
posto, as expectativas de investimento não reagem a fatores meramente subjetivos,
pois o modo de regulação vigente fornece a estrutura institucional e organizacional em
que as decisões são tomadas na prática;

b) a sensibilidade da taxa de acumulação à taxa de lucro bruto (gr) exerce um papel ativo
e varia com as mudanças de expectativas no processo de acumulação de capital; e

c) a resposta da taxa de acumulação de capital à evolução da utilização da capacidade


instalada (gu) pode ser apreendida como um mecanismo de ajuste para adequar a oferta
às condições oligopolistas de produção. Conforme observa ARONOVICH (1991),
incorre-se neste contexto numa importante abstração, pois a variável taxa de utilização
da capacidade produtiva (u) é considerada como exógena. Apreende-se u como uma
proxy da expectativa corrente do nível efetivo de produto, que pode ser considerada
exógena porque depende da percepção média das empresas, supostamente aleatória.
Essa variável reflete a influência do nível de demanda efetiva sobre a decisão de
investir. Sob estruturas de mercado fortemente oligopolizadas como a brasileira, a taxa
de utilização da capacidade produtiva é frequentemente mobilizada como mecanismo
de ajuste às flutuações conjunturais e aos ciclos econômicos. Em suma, a variação do
grau de utilização da capacidade produtiva instalada é um indicador básico para a
tomada de decisão quanto aos novos investimentos.

Partindo-se da função poupança kaldoriana [KALDOR (1978)] tal como segue:

S sr . s w .W (34)

353
Pode ser útil relembrar a definição proposta por BOYER [1986, p. 54-55], em que um modo de regulação
refere-se a todo conjunto de procedimentos e de comportamentos, individuais e coletivos com as seguintes
propriedades: reproduzir as relações sociais fundamentais através da conjunção de formas institucionais
historicamente determinadas; sustentar e pilotar o regime de acumulação existente; assegurar a
compatibilidade dinâmica de um conjunto de decisões descentralizadas, sem que seja necessário a interiorização
dos princípios de ajustamento do conjunto do sistema por parte dos atores econômicos.
547

onde s w
taxa de poupança proveniente dos salários; W = massa salarial; s r taxa de

poupança proveniente dos lucros; e massa de lucros, pode-se chegar aos determinantes
fundamentais do investimento. Conforme a hipótese kadoriana, s s
r w
, refletindo as

diferentes propensões a consumir das duas classes básicas de uma economia capitalista.

Uma função excesso de demanda agregada (ED) é obtida a partir das funções
investimento e poupança. Normalizando-se ED pelo estoque de capital nominal, pk.K, tem-
se354:

I ( p y .S G T NEX )
ED (35)
K p k .K

onde G = gastos do governo; T = arrecadação fiscal; NEX = (exportações importações). G, T


e NEX são em termos nominais. Mas pode-se escrever ED em função da participação dos
lucros brutos no produto, profit-share ( ) e do nível de utilização da capacidade (u):

(G T NEX )
ED g 0 g r .r g u .u ( s w.W s r . ).( p y / p k .K )
p k .K

(G T NEX )
ED g0 g r . .u. . p g u .u s w.(1 )u. . p s r .u. . p (36)
p k .K

A condição de equilíbrio macroeconômico pode ser escrita de maneira a igualar a demanda de


investimento à poupança agregada, ou seja, ED 0 . Neste contexto, o investimento
determina a poupança e pode-se obter as seguintes derivadas parciais, fundamentais para se
identificar os padrões de crescimento econômico:

( NEX / p .K )
ED (sr s g ). u.
w r
.p + k
(37)

ED u g. r
. .p g u s w
(1 ) .p s r
. .p (38)

O efeito das mudanças na profit-share sobre a utilização da capacidade instalada é


determinado por diferenciação total da condição de equilíbrio no mercado de produto. Tem-se
du ED
então: (39)
d ED u

354
Como observa ARONOVICH (1991, p. 16), o artifício de expressar as variáveis em termos do valor do
estoque de capital fixo tem o objetivo de enfatizar a determinação das taxas de crescimento e de lucro ao invés
de níveis de investimento e de pagamentos ao fator capital.
548

Em uma análise do processo de acumulação de capital no médio prazo - horizonte no


qual o modo de regulação e o regime de crescimento encontram-se estabilizados - assume-se
que as variações da utilização da capacidade visam a estreitar o gap entre demanda e oferta no
mercado de produto. Então tem-se ED u 0 , uma condição keynesiana de estabilidade. Mas
sob esta condição se ED 0 , o regime de crescimento é considerado profit-led , no sentido
de que um aumento em (profit-share) conduz a um aumento no execesso de demanda
agregada por causa da alta sensibilidade do investimento à taxa de lucro. Nestas condições um
aumento na participação dos lucros no produto levaria a um aumento da taxa de acumulação
(I / K). Por outro lado, se ED 0 , o regime de crescimento é wage-led [BOWLES e
BOYER (1995); UEMURA (2000)], já que esta condição é equivalente a ED ws 0 . Neste

caso, um aumento da participação relativa dos salários (ws) provocaria um aumento no


excesso de demanda e então, na taxa de acumulação, em razão da alta sensibilidade do
investimento ao consumo agregado.

Estimação da função poupança: S sr . s w .W


Os testes de estabilidade revelaram que há uma mudança estrutural em inícios de 1980
e então a equação foi reestimada para os períodos em que é significativamente estável (Figura
50).

FIGURA 50 TESTES DE ESTABILIDADE DA FUNÇÃO POUPANÇA (1950-2003)


1.6 1.0

0.5
1.2
0.0

0.8 -0.5
0.00
-1.0
0.4 0.05

0.0 0.10

0.15
-0.4 55 60 65 70 75 80 85 90 95 00
55 60 65 70 75 80 85 90 95 00
One-Step Probability Recursive Residuals
CUSUM of Squares 5% Significance

O primeiro período identificado corresponde ao intervalo [1950-1980] e para o qual


foram realizados os testes ADF de raízes unitárias (Quadro 161). Todas as três séries são I(1)
e então aplicou-se o teste de co-integração de JOHANSEN. Este teste revelou a existência de
duas equações co-integrantes, mas com base na teoria econômica optou-se pela primeira
549

equação que revela exatamente a vigência de um mecanismo kaldoriano de determinação da


poupança agregada (Quadros 162 e 163).355

QUADRO 161 FUNÇÃO POUPANÇA - ESTIMAÇÃO DA RELAÇÃO ESTÁTICA (1950-1980)


Dependent Variable: S
Method: Least Squares
Sample: 1950 1980
Included observations: 31
Variable Coefficient Std. Error t-Statistic Prob.
C -1.370309 0.528889 -2.590921 0.0150
0.609949 0.145740 4.185178 0.0003
W 0.427042 0.163255 2.615795 0.0142
R-squared 0.986841 Mean dependent var 17.91408
Adjusted R-squared 0.985901 S.D. dependent var 0.691153
S.E. of regression 0.082066 Akaike info criterion -2.070815
Sum squared resid 0.188576 Schwarz criterion -1.932042
Log likelihood 35.09763 F-statistic 1049.926
Durbin-Watson stat 0.398815 Prob(F-statistic) 0.000000
QUADRO 162 TESTES DE RAÍZES UNITÁRIAS FUNÇÃO POUPANÇA (1950-1980)
ADF Test Statistic
S -3.258871 1% Critical Value* -4.3082
-2.270625 5% Critical Value -3.5731
W -2.215808 10% Critical Value -3.2203
*MacKinnon critical values for rejection of hypothesis of a unit root.
QUADRO 163 TESTE DE CO-INTEGRAÇÃO DE JOHANSEN FUNÇÃO POUPANÇA (1950-1980)
Sample: 1950 1980
Included observations: 29
Test assumption: Linear deterministic trend in the data
Series: S W
Lags interval: 1 to 1
Likelihood 5 Percent 1 Percent Hypothesized
Eigenvalue Ratio Critical Value Critical Value No. of CE(s)
0.549910 39.06514 29.68 35.65 None **
0.401945 15.91421 15.41 20.04 At most 1 *
0.034099 1.006109 3.76 6.65 At most 2
*(**) denotes rejection of the hypothesis at 5%(1%) significance level
L.R. test indicates 2 cointegrating equation(s) at 5% significance level
Normalized Cointegrating Coefficients: 1 Cointegrating Equation(s)
S W C
1.000000 -0.654659 -0.361566 0.980798
(0.10864) (0.12308)

Log likelihood 194.9983


Normalized Cointegrating Coefficients: 2 Cointegrating Equation(s)
S W C
1.000000 0.000000 -1.205171 4.438594
(0.05371)
0.000000 1.000000 -1.288618 5.281829
(0.08054)

Log likelihood 202.4523

355
Considerou-se que a segunda equação co-integrante teria apenas um sentido algébrico e não econômico, pois
a poupança proveniente dos lucros seria nula e a massa salarial responderia por toda a poupança agregada, além
de apresentar uma elasticidade superior à unidade.
550

Após a confirmação da existência de co-integração entre as séries, um VECM foi


estimado para captar as elasticidades de curto prazo. O coeficiente correspondente ao erro de
equilíbrio (CointEq1) é estatisticamente significativo e negativo, o que valida a representação
em termos de vetor de correção de erros (Quadro164).

QUADRO 164 VECTOR ERROR CORRECTION MODEL (VECM) FUNÇÃO POUPANÇA (1950-
1980)
Sample(adjusted): 1952 1980
Included observations: 29 after djusting
endpoints
t-statistics in parentheses
Cointegrating Eq: CointEq1
S(-1) 1.000000

(-1) -0.654659
(-6.02576)

W(-1) -0.361566
(-2.93770)

C 0.980798
Error Correction: D(S)
CointEq1 -0.223975
(-3.46975)

D(S(-1)) 1.087157
(8.51302)

D( (-1)) -0.093268
(-0.96371)

D(W(-1)) 0.099834
(0.72246)

C -0.008377
(-0.57425)
R-squared 0.752597
Adj. R-squared 0.711363
Sum sq. resids 0.011748
S.E. equation 0.022125
Log likelihood 72.11514
Akaike AIC -4.628631
Schwarz SC -4.392890
Mean dependent 0.069769
S.D. dependent 0.041182

A taxa de poupança proveniente dos lucros apresenta o valor de 0,65 e a proveniente


dos salários tem o valor de 0,36, o que revela a existência de um processo kaldoriano de
determinação da poupança, a partir das diferentes propensões a poupar das classes
trabalhadora e capitalista, e onde s s
r w
. Sendo pertencentes à estimação estática na

equação co-integrante, essas elasticidades referem-se à relação de equilíbrio de longo prazo,


551

conectando a poupança agregada à evolução da distribuição primária da renda entre lucros e


salários.

As estimativas para o segundo período [1984-2003] encontram-se nos quadros.


Embora o teste do CUSUM mostre uma mudança estrutural a partir de 1994, ano da
implementação do Plano Real, o teste do CUSUM of Squares mostra estabilidade da relação
estimada. Como o teste one-step probability recursives residuals mostra apenas dois pontos
com o p-valor menores do que 0,05 (região onde os resíduos recursivos encontram-se fora do
intervalo de estabilidade), a relação pode ser considerada estável (Quadro 51).

FIGURA 51- TESTES DE ESTABILIDADE DA FUNÇÃO POUPANÇA (1984-2003)


15 1.6 0.2

0.1
10
1.2
0.0
5
-0.1
0.8
0.00
0 -0.2
0.4 0.05
-5

0.0 0.10
-10
0.15
-15 -0.4 88 90 92 94 96 98 00 02
88 90 92 94 96 98 00 02 88 90 92 94 96 98 00 02
One-Step Probability Recursive Residuals
CUSUM 5% Signific anc e CUSUM of Squares 5% Significance

Seguindo a mesma metodologia econométrica, foram realizados os testes de raízes


unitárias (Quadro 165). Embora as séries da massa de lucro ( ) e da massa salarial (W)
apresentem raízes unitárias, o teste ADF rejeitou a hipótese nula de presença de raiz unitária
para a série da poupança (S). Isto implica que neste período a hipótese de co-integração entre
as três variáveis está descartada. Como alternativa estimou-se a função poupança com as
variáveis em primeiras diferenças para se captar o comportamento de curto prazo dessa
relação (Quadro166). Esse resultado pode estar refletindo não só as mudanças estruturais e
conjunturais que marcaram os anos 80 e 90, mas também as limitações da amostra em termos
do número de observações. Do ponto de vista de uma análise regulacionista, a ausência de
uma relação de longo prazo pode ser a expressão de uma fase de quebra das macro-
regularidades que suportam o regime de acumulação ou sua transição para outro regime.

QUADRO 165 - TESTES DE RAÍZES UNITÁRIAS FUNÇÃO POUPANÇA (1985-2003)


ADF Test
Statistic
S -7.660200 1% Critical Value* -4.5000
-2.117300 5% Critical Value -3.6591
W -2.416642 10% Critical Value -3.2677
*MacKinnon critical values for rejection of hypothesis of a unit root.
552

QUADRO 166 ESTIMAÇÃO EM PRIMEIRAS DIFERENÇAS FUNÇÃO POUPANÇA (1984-2003)


Dependent Variable: D(S)
Method: Least Squares
Sample: 1984 2003
Included observations: 20
Variable Coefficient Std. Error t-Statistic Prob.
C -0.009047 0.010461 -0.864819 0.3992
D( ) 0.598534 0.149825 3.994887 0.0009
D(W) 0.690324 0.214116 3.224068 0.0050
R-squared 0.544823 Mean dependent var 0.022654
Adjusted R-squared 0.491272 S.D. dependent var 0.048555
S.E. of regression 0.034632 Akaike info criterion -3.750600
Sum squared resid 0.020389 Schwarz criterion -3.601240
Log likelihood 40.50600 F-statistic 10.17404
Durbin-Watson stat 1.490309 Prob(F-statistic) 0.001243

Observa-se que no curto prazo, as taxas de poupança sobre lucro e salários


praticamente se equalizam. Mais uma vez as limitações dos dados, para este último período,
conduzem a considerar esses resultados como preliminares. De qualquer modo, a conclusão
mais importante que se pode extrair refere-se ao fato de que as relações macroeconômicas
mudaram, expressando as transformações incorridas pelo modo de regulação e pelo regime de
crescimento na economia brasileira dos anos 80 e 90.
I
Estimação da função investimento: g 0 g r .r 1
g u .u 1
K
Os testes confirmam a estabilidade da relação para o primeiro período [1966-1980] e
então foram realizados os testes de raízes unitárias e de co-integração (Figura 52; Quadros
167, 168 e169).

FIGURA 52 TESTES DE ESTABILIDADE DA FUNÇÃO INVESTIMENTO (1966-1980)


15 0.06 0.06
0.04 0.04
10 0.02 0.02
0.00 0.00
-0.02 -0.02
5
-0.04 -0.04
0.00 -0.06 0.00 -0.06
0
0.05 0.05
-5
0.10 0.10
-10
0.15 0.15
-15 69 70 71 72 73 74 75 76 77 78 79 80 69 70 71 72 73 74 75 76 77 78 79 80
69 70 71 72 73 74 75 76 77 78 79 80
One-Step Probability Recursive Residuals N-Step Probability Recursive Residuals
CUSUM 5% Signific anc e

QUADRO 167 TESTES DE RAÍZES UNITÁRIAS FUNÇÃO INVESTIMENTO (1966-1980)


ADF Test Statistic
I/K -1.697423 1% Critical Value* -3.9635
r -1.604992 5% Critical Value -3.0818
u -2.063565 10% Critical Value -2.6829
*MacKinnon critical values for rejection of hypothesis of a unit root.
553

QUADRO 168 TESTE DE CO-INTEGRAÇÃO DE JOHANSEN (1966-1980)


Sample: 1966 1980
Included observations: 15
Test assumption: Linear deterministic trend in the data
Series: I / K r u
Lags interval: 1 to 1
Likelihood 5 Percent 1 Percent Hypothesized
Eigenvalue Ratio Critical Value Critical Value No. of CE(s)
0.922238 44.94293 29.68 35.65 None **
0.233520 6.631424 15.41 20.04 At most 1
0.161506 2.642217 3.76 6.65 At most 2
*(**) denotes rejection of the hypothesis at 5%(1%) significance level
L.R. test indicates 1 cointegrating equation(s) at 5% significance level
Normalized Cointegrating Coefficients: 1 Cointegrating Equation(s)
I/K r u C
1.000000 -0.438304 -0.340955 0.324368
(0.04800) (0.03571)

Log likelihood 160.5381

QUADRO 169 VECTOR ERROR CORRECTION MODEL (VECM) FUNÇÃO INVESTIMENTO


(1966-1980)
Sample: 1966 1980

Included observations: 15
t-statistics in parentheses
Cointegrating Eq: CointEq1
I / K (-1) 1.000000

r (-2) -0.437684
(-9.11168)

u (-2) -0.341385
(-9.55478)

C 0.325960
(13.7352)
Error Correction: D(IK)
CointEq1 -1.025584
(-2.22026)

D(I / K(-1)) 0.658095


(1.72297)

D(r(-2)) -0.276811
(-0.60500)

D(u(-2)) 0.298411
(1.00301)
R-squared 0.417654
Adj. R-squared 0.258832
Sum sq. resids 0.001578
S.E. equation 0.011977
Log likelihood 47.41404
Akaike AIC -5.788539
Schwarz SC -5.599725
Mean dependent 0.000357
S.D. dependent 0.013912
554

A equação foi estimada para o segundo período [1984-2003]. Os testes revelaram a


presença de raízes unitárias nas séries da taxa de acumulação de capital, taxa de lucro e taxa
de utilização da capacidade produtiva instalada. No entanto, o teste de JOHANSEN não
rejeitou a hipótese nula de ausência de ao menos uma equação de co-integração.
Consequentemente, não há evidências empíricas de vigência de uma relação de longo prazo
para a função taxa de acumulação, conforme a especificação retida (Quadro 170, 171 e 172).

QUADRO 170 TESTES DE RAÍZES UNITÁRIAS FUNÇÃO INVESTIMENTO (1984-2003)

ADF Test Statistic


I/K -0.393574 1% Critical Value* -2.6889
r 0.797729 5% Critical Value -1.9592
u 0.543391 10% Critical Value -1.6246
*MacKinnon critical values for rejection of hypothesis of a unit root.
QUADRO 171 TESTE DE CO-INTEGRAÇÃO DE JOHANSEN FUNÇÃO INVESTIMENTO (1984-
2003)
Sample: 1984 2003
Included observations: 20
Test assumption: No deterministic trend in the data
Series: I / K r u
Lags interval: 1 to 1
Likelihood 5 Percent 1 Percent Hypothesized
Eigenvalue Ratio Critical Value Critical Value No. of CE(s)
0.519056 29.87517 34.91 41.07 None
0.428430 15.23509 19.96 24.60 At most 1
0.183221 4.047741 9.24 12.97 At most 2
*(**) denotes rejection of the hypothesis at 5%(1%) significance level
L.R. rejects any cointegration at 5% significance level
A dinâmica de curto prazo foi estimada por uma especificação em taxas de variação (Quadro).

QUADRO 172 ESTIMAÇÃO DA FUNÇÃO INVESTIMENTO EM TAXAS DE VARIAÇÃO (1984-


2003)
Dependent Variable: DIK
Method: Least Squares
Sample: 1984 2003
Included observations: 20
Variable Coefficient Std. Error t-Statistic Prob.
C -0.018041 0.012654 -1.425642 0.1721
DR 0.570867 0.293550 1.944697 0.0685
DU 2.503001 0.723294 3.460559 0.0030
R-squared 0.738097 Mean dependent var -0.001430
Adjusted R-squared 0.707284 S.D. dependent var 0.102058
S.E. of regression 0.055217 Akaike info criterion -2.817627
Sum squared resid 0.051831 Schwarz criterion -2.668268
Log likelihood 31.17627 F-statistic 23.95472
Durbin-Watson stat 2.574942 Prob(F-statistic) 0.000011

O coeficiente relativo à variação da taxa de lucro não é estatisticamente significativo,


mas a elasticidade da taxa de acumulação às variações da taxa de utilização da capacidade
produtiva instalada é muito elevada (Quadro 172). Este resultado confirma a análise
555

desenvolvida por BACHA e BONELLI (2004), segunda a qual a queda da taxa de


acumulação de capital e então do crescimento econômico desde os anos 80 não se explicaria
satisfatoriamente pela insuficiência de poupança. Segundo os autores, a explicação está
contida na elevação da razão capital/produto, nas mudanças dos preços relativos dos bens de
investimento e na redução do grau de utilização da capacidade produtiva instalada.

Por outro lado, a não significância do coeficiente relativo à elasticidade-taxa de lucro


do investimento expressa a desconexão, nos anos 90, dessas variáveis fundamentais ao
crescimento econômico. O Gráfico 126 mostra a evolução da taxa de acumulação de capital e
da taxa de lucro, onde se pode constatar as trajetórias divergentes dessas variáveis, sobretudo
a partir de 1994, ano da introdução do Plano Real. Esse novo padrão indica a vigência de um
novo regime de crescimento, cujas particularidades serão objeto das próximas etapas dessa
análise.

5.8 Uma análise econométrica das relações entre lucro e acumulação de capital
O objetivo dessa análise é testar a dependência da taxa de acumulação de capital com
relação apenas à taxa média de lucro da economia brasileira, considerada o principal
determinante de longo prazo da dinâmica da acumulação e do crescimento econômico356.

A idéia diretriz é que a taxa de utilização da capacidade produtiva instalada é um


determinante principalmente da dinâmica de curto prazo, captando as flutuações da demanda
efetiva em suas influências sobre o investimento, de acordo com uma perspectiva keynesiana.
Tanto que o teste de JOHANSEM para a taxa de lucro e a taxa de utilização da capacidade
não rejeita a hipótese nula de ausência de ao menos uma equação co-integrante e este fato
pode ser interpretado como ausência de influência de longo prazo desta segunda variável
sobre a primeira.

356
A idéia é que a taxa de utilização da capacidade produtiva instalada é um determinante principalmente da
dinâmica de curto prazo, captando as flutuações da demanda efetiva em suas influências sobre o investimento, de
acordo com uma perspectiva keynesiana. Tanto que o teste de Johansem para a taxa de lucro e a taxa de
utilização da capacidade não rejeita a hipótese nula de ausência de ao menos uma equação co-integrante e este
fato pode ser interpretado como ausência de influência de longo prazo desta segunda variável sobre a primeira.
556

GRÁFICO 125 LUCRO E ACUMULAÇÃO DE CAPITAL (1960-2003)

Taxa média de lucro bruto (L)


Taxa de acumulação de capital (R)
38% 18%

36%
16%
34%
14%
32%

30% 12%
28%
10%
26%

24% 8%

22%
6%
20%
4%
18%

16% 2%
1960 1964 1968 1972 1976 1980 1984 1988 1992 1996 2000
1962 1966 1970 1974 1978 1982 1986 1990 1994 1998 2002

O Gráfico 125 mostra as séries originais e tendenciais obtidas pelo método de


regressão local de Cleveland (1979, 1985), conhecido como lowess smoothing. A dinâmica
dessas variáveis entre 1960 e 1993 apresenta forte indício de co-integração, em razão da
tendência comum de evolução das séries. Todavia, a análise gráfica é apenas um dos métodos
que podem apontar para essa possibilidade, que deve ser confirmada mediante os testes
econométricos apropriados.

QUADRO 173 TESTE DE RAÍZES UNITÁRIAS PARA I/K E r (1960-1993)

ADF Test Statistic


I/K -0.609140 1% Critical Value* -3.6852
r -0.423310 5% Critical Value -2.9705
10% Critical Value -2.6242
*MacKinnon critical values for rejection of hypothesis of a unit root.

Após a confirmação da existência de raiz unitária nas séries em questão (Quadro 173),
o teste de JOHANSEN detectou uma relação de co-integração e portanto, existe uma relação
de longo prazo entre lucro e acumulação de capital na economia brasileira (Quadro 174). Esta
relação está de acordo com a teoria econômica marxista e com os trabalhos de KALDOR e de
KALECKI.
557

QUADRO 174 TESTE DE CO-INTEGRAÇÃO PARA I/K E r (1965-1993)


Sample: 1965 1993
Included observations: 29
Test assumption: Linear deterministic trend in the data
Series: I / K r
Lags interval: 1 to 1
Likelihood 5 Percent 1 Percent Hypothesized
Eigenvalue Ratio Critical Value Critical Value No. of CE(s)
0.500329 20.93306 15.41 20.04 None **
0.027636 0.812734 3.76 6.65 At most 1
*(**) denotes rejection of the hypothesis at 5%(1%) significance level
L.R. test indicates 1 cointegrating equation(s) at 5% significance level
Normalized Cointegrating Coefficients: 1 Cointegrating Equation(s)
I/K r C
1.000000 -0.750417 0.100036
(0.04418)

Log likelihood 196.5052


Uma confirmação alternativa pode ser realizada através do método de ENGLE e
GRANGER (1987). Esta técnica em duas etapas tem como principal vantagem sua
simplicidade de implementação. Todavia, somente é aplicável para séries CI (1,1), ou seja,
co-integradas de primeira ordem, que é precisamente o caso em questão.

Na primeira etapa é estimada a relação de longo prazo. Se os resíduos (RES) forem


estacionários ou I(0) passa-se à segunda etapa. Nesta se trata de estimar o modelo de correção
de erros (ECM), obtendo-se as estimativas de curto prazo. A equação estática é descrita no
Quadro 178.

QUADRO 175 ESTIMAÇÃO DA RELAÇÃO ESTÁTICA ENTRE TAXA DE ACUMULAÇÃO E


TAXA DE LUCRO (1966-2003)
Dependent Variable: I / K
Method: Least Squares
Sample: 1966 1993
Included observations: 28
Variable Coefficient Std. Error t-Statistic Prob.
C -0.091133 0.008292 -10.99000 0.0000
r (-1) 0.715448 0.030157 23.72380 0.0000
R-squared 0.955844 Mean dependent var 0.102287
Adjusted R-squared 0.954145 S.D. dependent var 0.037411
S.E. of regression 0.008011 Akaike info criterion -6.747255
Sum squared resid 0.001669 Schwarz criterion -6.652097
Log likelihood 96.46156 F-statistic 562.8187
Durbin-Watson stat 2.266788 Prob(F-statistic) 0.000000
558

QUADRO 176 TESTE DE RAIZ UNITÁRIA SOBRE OS RESÍDUOS E GRÁFICO DOS VALORES
REAIS E PREVISTOS (1966-1993)

ADF Test Statistic


RES -5.350887 1% Critical Value* -3.7076
5% Critical Value -2.9798
10% Critical Value -2.6290
*MacKinnon critical values for rejection of hypothesis of a unit root.

0.20

0.15

0.02 0.10

0.01 0.05

0.00 0.00

-0.01

-0.02
70 75 80 85 90

Residual Actual Fitted

Os testes ADF de raízes unitárias confirmaram a estacionaridade dos resíduos da


regressão. Como a estatística ADF para os resíduos é inferior aos valores críticos tabulados
por ENGLE e YOO (1987), de -4,32 (1%) e de -3,67 (5%), estes constituem uma série I(0)
para este período de análise. Consequentemente, a co-integração está confirmada também
pelo método de ENGLE e GRANGER e pode-se passar à estimação do ECM correspondente.

QUADRO 177 ESTIMAÇÃO DO MODELO DE CORREÇÃO DE ERROS PELO MÉTODO DE


ENGLE E GRANGER (1967-1993)
Dependent Variable: D(I / K)
Method: Least Squares
Sample(adjusted): 1967 1993
Included observations: 27 after adjusting endpoints
Variable Coefficient Std. Error t-Statistic Prob.
C 0.000959 0.001053 0.911039 0.3721
RES(-1) -0.690568 0.178432 -3.870198 0.0008
D(I / K (-1)) 0.064447 0.138685 0.464700 0.6467
D(r) 0.416340 0.070603 5.896888 0.0000
D(r(-1)) 0.413808 0.117559 3.519991 0.0019
R-squared 0.808094 Mean dependent var -0.002413
Adjusted R-squared 0.773202 S.D. dependent var 0.010744
S.E. of regression 0.005117 Akaike info criterion -7.547047
Sum squared resid 0.000576 Schwarz criterion -7.307077
Log likelihood 106.8851 F-statistic 23.15982
Durbin-Watson stat 1.973630 Prob(F-statistic) 0.000000
NOTA: A letra D antes das variáveis significa primeiras diferenças.
559

QUADRO 178 ESTIMAÇÃO DO VECM PARA I/K E r (1960-1993)


Sample: 1966 1993
Included observations: 28
t-statistics in parentheses
Cointegrating Eq: CointEq1
IKPR(-1) 1.000000

R(-1) -0.747899
(-24.6403)

C 0.098035
Error Correction: D(IKPR)
CointEq1 -0.839562
(-4.26743)

D(IKPR(-1)) -0.069046
(-0.31927)

D(R(-1)) -0.025457
(-0.15599)

C -0.002093
(-1.28907)
R-squared 0.507266
Adj. R-squared 0.445674
Sum sq. resids 0.001588
S.E. equation 0.008134
Log likelihood 97.15433
Akaike AIC -6.653881
Schwarz SC -6.463566
Mean dependent -0.001871
S.D. dependent 0.010925

Conforme GRANGER se duas séries são co-integradas então deve existir ao menos
uma relação de causalidade unilateral. O teste de causalidade no Quadro 182 confirma que as
variações na taxa de lucro precedem as variações na taxa de acumulação, o que implica que a
taxa de lucro causa-Granger a acumulação de capital, no período [1966-1993].

QUADRO 179 TESTE DE CAUSALIDADE DE GRANGER PARA I/K E r (1966-1993)


Pairwise Granger Causality Tests
Sample: 1966 1993
Lags: 2
Null Hypothesis: Obs F-Statistic Probability
r does not Granger Cause IK 28 9.39649 0.00104
IK does not Granger Cause r 1.28120 0.29679

Consequentemente, a tendência declinante da taxa média de lucro bruto encontra-se


entre as principais razões para o declínio da taxa de acumulação de capital, na economia
brasileira, entre 1974 e 1993.
560

VIDAL (2003, p.15) fala em trajetória marxiana , para caracterizar a persistência de


uma tendência de declínio da taxa geral de lucro da economia que estabelecerá as condições
para uma passagem endógena a um regime de acumulação extensiva. Segundo este autor
regulacionista:

« Normalement, une baisse de la productivité du capital entraîne une baisse du


taux de profit, qui freine les investissements; par conséquent, la croissance du
stock de capital et le rythme de substitution du capital au travail doivent être
freinés, ce qui conduit spontanément à un régime d accumulation extensive
dans lequele la productivité du capital en volume est stabilisée. Le retour à
l accumulation extensive est donc une sortie endogène de la trajectoire
marxienne. »357
Para a economia brasileira dos anos 90, observa-se uma nítida recuperação da taxa
média de lucro e, portanto, uma saída da trajetória marxiana . De acordo com os princípios
teóricos mobilizados nesta análise, a endogeneidade da passagem a um novo regime de
acumulação e crescimento, pressupõe necessariamente mudanças a nível do modo de
regulação. E esta condição pôde ser constatada a partir da análise das transformações das
formas institucionais desenvolvida no capítulo 4 deste trabalho. Além das mutações
decorrentes do endometabolismo, segundo o qual o funcionamento das estruturas altera as
próprias estruturas, todas as componentes-chave do modo de regulação foram submetidas a
um processo de transformação promovido deliberadamente pelo próprio Estado e sob pressão
da lógica de uma globalização neo-liberal.

Pela Tabela 40, pode-se constatar que um dos resultados diretos desse processo de
transformação das estruturas que suportavam o modo de regulação foi a queda da wage-share
nos anos 90 e, consequentemente, a expansão da profit-share a uma taxa média de 2,5% a.a.
entre 1993 e 1999. Esta evolução foi conseqüência da recuperação dos ganhos de
produtividade do trabalho (2,2% a.a) com concomitante queda do salário médio real (-0,6%

p y
a.a.). Houve também uma recuperação dos preços relativos numa média de 1,4% a.a. no
p k

mesmo período. Essas mudanças resultaram num crescimento médio da taxa de lucro bruto da
economia brasileira de 5% a.a. entre 1993 e 1999; e de 2% a.a. entre 1999 e 2002.

357
Jean-François VIDAL em Regimes de croissances post-fordistes: comparaison des États-Unis, du Japon et de
la France. Forum de la Régulation, 9/10 octobre, 2003, Paris. A expressão trajetória marxiana para designar o
tipo de crescimento desequilibrado associado à alta dos coeficientes de capital é devida a DUMENIL e LÉVY
(2000; 2003).
561

GRÁFICO 126 CICLOS DA PRODUTIVIDADE, SALÁRIO MÉDIO E PROFIT SHARE (1950-2003)

Produtividade do trabalho (L)


Salário médio real (L)
Profit share (R)
10% 0,60
Taxas de variação filtradas pelo filtro 4253H

8% 0,58

6% 0,56

4% 0,54

2% 0,52

0% 0,50

-2% 0,48

-4% 0,46
1950
1952
1954
1956
1958
1960
1962
1964
1966
1968
1970
1972
1974
1976
1978
1980
1982
1984
1986
1988
1990
1992
1994
1996
1998
2000
2002
FONTE: Séries calculadas a partir dos dados sobre nível geral de emprego (N) obtidas em MARQUETTI (2003)
e IBGE.
NOTA: Os ciclos da produtividade foram obtidos através do filtro 4253H que elimina as flutuações de curto
prazo nas séries em questão.
Pelo Gráfico 126 pode ser observado que em inícios dos anos 50, os ganhos de
produtividade tendencial permaneceram positivos mas em declínio até 1956, enquanto o
salário médio real expandiu-se de modo acelerado. Isto explica a redução da profit share que
antecede o período de implementação do Plano de Metas (1955-1961). Mas a partir de 1956,
os ganhos de produtividade crescem, mas os salários reais caem e então a participação dos
lucros no produto volta a crescer. O Gráfico 127 mostra a evolução da wage share líquida de
impostos diretos, onde se pode constatar que em 2003, a participação dos salários no PIB
atinge seu nível mais baixo desde 1950.

É importante observar-se que esse afastamento entre as dinâmicas da produtividade e


do salário médio real é um fator-chave e endógeno para explicar a crise dos anos 60. Numa
perspectiva regulacionista, ele significa uma dissociação entre o regime de produtividade que
emergiu da ampliação da capacidade produtiva criada pelo Plano de Metas e o regime de
demanda. Nessas circunstâncias, surge o afastamento entre normas de produção e normas de
consumo, criando as bases para uma superprodução ou superacumulação do capital vis-à-vis a
capacidade de absorção da demanda efetiva. Este fato confirma a análise histórica
562

desenvolvida por Sônia MENDONÇA (1977), para quem um dos pontos fracos, do ponto de
vista social e econômico, do modelo implantado neste período, fora justamente a não
participação dos trabalhadores nos ganhos de produtividade. Aliás, um padrão que se repetiria
de maneira mais dramática sob o regime político arbitrário pós-1964.

Na fase de forte crescimento econômico correspondente ao milagre brasileiro (1967-


1973), a produtividade do trabalho cresce a um ritmo superior ao do salário médio real,
aumentando a concentração de renda em favor dos lucros. Mais precisamente, no período
entre os turning points exibidos na Tabela 5, intervalo [1963 -1973], a produtividade cresceu
a uma taxa média de 5% a.a enquanto o salário médio real cresceu a 3%a.a. Esse diferencial
permitiu uma expansão média da profit share em 1,5% a.a., o que equivale a dizer, que a
wage share declinou na mesma magnitude.

A crise do regime de crescimento responsável pelo milagre mostra-se, no entanto,


muito mais grave quando se utiliza a taxa geral de lucro como indicador de crise. A queda
tendencial da taxa média de lucro processa-se por quase duas décadas inteiras, entre 1973 e
1992, enquanto que na crise dos anos 60, a fase de declínio não ultrapassou seis anos.
Combinada com uma tendência persistente à alta inflação, compreende-se então as razões
para as dificuldades da economia brasileira em retomar uma trajetória de crescimento estável
e durável ao longo da década de 1980 e primeira metade dos 90. Essas considerações
reforçam a interpretação da crise dos anos 60 como uma crise cíclica, que não implicou
alterações substanciais no modo de regulação ou no regime de acumulação baseado na
substituição de importações.

As medidas implementadas pelo PAEG desencadearam mudanças qualitativas


importantes no regime monetário-financeiro e aprofundaram o grau de flexibilidade
quantitativa da WLN. Contudo, manteve-se o padrão de presença e intervenção do Estado na
economia, bem como a configuração básica da forma de inserção internacional. Com o acesso
fácil aos capitais externos via empréstimo, as bases técnicas produtivas e as estruturas de
produção herdadas do período JK puderam ser novamente reativadas para um novo ciclo de
expansão, mantendo-se as características principais do regime de acumulação. Pode-se
considerar que as mudanças implementadas pelo Estado visaram o estabelecimento de um
novo padrão de financiamento da acumulação de capital, que no entanto permaneceu nos
quadros de um mesmo regime de crescimento, baseado na lógica da substituição de
importações.
563

GRÁFICO 127 EVOLUÇÃO DA PARTICIPAÇÃO DOS SALÁRIOS NO PIB A CUSTO DE


FATORES

Wage share líquida de tributação direta


Série tendencial = Lowess
58%
56%
( W - Td ) / PIB a custo de fatores

54%
52%
50%
48%
46%
44%
42%
40%
38%
36%
1950
1952
1954
1956
1958
1960
1962
1964
1966
1968
1970
1972
1974
1976
1978
1980
1982
1984
1986
1988
1990
1992
1994
1996
1998
2000
2002
FONTE: Metodologia de construção das sérires constantes do anexo.
NOTA: W é a massa salarial real e Td representa a tributação direta.
Na segunda metade da década de 90, observa-se um novo padrão de evolução e então
a questão analiticamente pertinente refere-se aos fatores que possibilitaram a economia
brasileira sair da trajetória marxiana de queda tendencial da taxa geral de lucro. Em
primeiro lugar, um fato já suficientemente decantado na literatura econômica sobre a
economia brasileira pós-Plano Real. A estabilidade de preços, ou seja, a superação da alta
inflação, restabelecendo condições mais propícias para a retomada do investimento, incluindo
a redução dos preços dos bens de capital, já mencionada mais acima.

A lucratividade do capital foi também restaurada mediante transformações de todas as


formas institucionais, aumentando a flexibilidade da WLN brasileira e sua subordinação às
prerrogativas da nova forma de inserção internacional. Com isso a participação dos lucros no
produto passa de 47% em 1990, para 59% em 2003 (vide Gráfico 126). A partir de 1996,
observa-se uma desaceleração dos ganhos de produtividade tendencial. E após a
desvalorização de 1999, as taxas médias de crescimento da produtividade do trabalho tornam-
564

se negativa, mas como no mesmo período a queda do salário médio real foi maior, a profit
share seguiu em tendência de expansão até 2003.358

Portanto, não é nenhuma surpresa o fato da elevação do desemprego estrutural e da


redução dos salários médios reais terem sido uma das características dos anos 90. O processo
em si não comporta nenhuma fatalidade, nem emerge como um fenômeno necessário ou
natural em uma época de globalização. Sobretudo, porque existem formas alternativas de se
globalizar , mas que foram descartadas por questões políticas ou de pressões internacionais.

A seguir, a estimação da função exportações líquidas completará a próxima etapa para


uma caracterização mais precisa dos padrões de evolução macroeconômica ou regimes de
acumulação no Brasil.
Estimação da função exportações líquidas
As exportações líquidas são estimadas conforme a especificação proposta em
UEMURA (2000), onde as variáveis explicativas são a profit share ( ), a taxa de utilização da
capacidade produtiva (u) e a taxa de câmbio real (e):
NEX 0 1
. 1 2
.u 1 3
. e 1 ; onde 1
, u 1
e e 1
são, respectivamente,

a profit share, a taxa de utilização da capacidade produtiva da economia e o logaritmo natural


da taxa real de câmbio. Para a construção dessa última série foram utilizadas as taxas médias
nominais de câmbio multiplicadas pela razão entre o IPC dos EUA e o deflator implícito do
PIB.
Algumas considerações quanto aos sinais esperados das variáveis devem ser feitas. No
que concerne à variável u, vários trabalhos empíricos no Brasil confirmam o sinal negativo
(por exemplo, CARVALHO e DE NEGRI, 2000). Esta relação inversa decorre do fato de que
os exportadores preferem primeiramente suprir o mercado interno, para só depois voltarem
para a demanda externa.

As exportações líquidas tendem a reagir positivamente à elevação da profit share, o


que, consideradas as demais elasticidades das funções poupança e investimento, poderia
sinalizar para a presença de um padrão do tipo export-led growth.

Espera-se que uma desvalorização cambial (aumento da taxa de câmbio) provoque


uma expansão das exportações e uma contração das importações. Isto implica que haveria

358
Deve-se atentar para o fato de que no Gráfico 2 estão plotadas as séries da produtividade do trabalho e do
salário médio real em termos tendenciais, estimados pelo filtro 4253H. Portanto, não se trata dos dados
constantes da Tabela 5, onde aparecem as séries originais sem o filtro.
565

uma redução do déficit na balança comercial ou elevação do superávit, pois NEX equivale às
exportações menos as importações de bens e serviços.

Os testes revelaram que os coeficientes da equação são estáveis para o período [1950-
1980]. Mas o teste ADF rejeitou a hipótese nula de presença de uma raiz unitária nas séries
NEX e e, que são portanto, I(0) descartando a possibilidade de co-integração entre as variáveis
da função exportações líquidas (Quadro 180 e Figura 53). A estratégia foi então estimar a
função em taxas de variação para captar a dinâmica de curto prazo (Quadro 181 e 182).

FIGURA 53 TESTES DE ESTABILIDADE DA FUNÇÃO EXPORTAÇÕES LÍQUIDAS (1950-1980)


15 1.6 0.04

0.02
10
1.2
0.00
5 -0.02
0.8
0.00
0 -0.04

0.4 0.05
-5
0.10
0.0
-10
0.15
-15 -0.4 56 58 60 62 64 66 68 70 72 74 76 78 80
56 58 60 62 64 66 68 70 72 74 76 78 80 56 58 60 62 64 66 68 70 72 74 76 78 80
N-Step Probability Recursive Residuals
CUSUM 5% Signific anc e CUSUM of Squares 5% Significance

QUADRO 180 TESTES DE RAÍZES UNITÁRIAS FUNÇÃO EXPORTAÇÕES LÍQUIDAS (1950-


1980)
ADF Test Statistic: NEX -2.492076 1% Critical Value* -2.6453
5% Critical Value -1.9530
10% Critical Value -1.6218
*MacKinnon critical values for rejection of hypothesis of a unit root.
ADF Test Statistic -2.729498 1% Critical Value* -4.3082
5% Critical Value -3.5731
10% Critical Value -3.2203
*MacKinnon critical values for rejection of hypothesis of a unit root.
ADF Test Statistic u -0.175122 1% Critical Value* -2.6453
5% Critical Value -1.9530
10% Critical Value -1.6218
*MacKinnon critical values for rejection of hypothesis of a unit root.
ADF Test Statistic e -3.208741 1% Critical Value* -3.6752
5% Critical Value -2.9665
10% Critical Value -2.6220
*MacKinnon critical values for rejection of hypothesis of a unit root.
566

QUADRO 181 ESTIMAÇÃO DE NEX PARA O PERÍODO (1950-1980)


Dependent Variable: NEX
Method: Least Squares
Sample(adjusted): 1952 1980
Included observations: 29 after adjusting endpoints
Variable Coefficient Std. Error t-Statistic Prob.
C -0.012695 0.005071 -2.503485 0.0192
D (-1) -0.089720 0.068195 -1.315646 0.2002
Du(-1) -0.041357 0.101303 -0.408248 0.6866
e (-1) 0.012545 0.007172 1.749064 0.0925
R-squared 0.157433 Mean dependent var -0.004442
Adjusted R-squared 0.056325 S.D. dependent var 0.008501
S.E. of regression 0.008258 Akaike info criterion -6.627712
Sum squared resid 0.001705 Schwarz criterion -6.439119
Log likelihood 100.1018 F-statistic 1.557078
Durbin-Watson stat 1.309445 Prob(F-statistic) 0.224598

QUADRO 182 ESTIMAÇÃO DE NEX PARA O PERÍODO (1984-2003)


Dependent Variable: NEX
Method: Least Squares
Sample: 1984 2003
Included observations: 20
Variable Coefficient Std. Error t-Statistic Prob.
C -0.014391 0.002387 -6.028521 0.0000
D (-1) -0.023097 0.026002 -0.888284 0.3875
Du(-1) -0.042428 0.040846 -1.038742 0.3144
e (-1) 0.028680 0.003371 8.508735 0.0000
R-squared 0.830880 Mean dependent var 0.004047
Adjusted R-squared 0.799170 S.D. dependent var 0.008987
S.E. of regression 0.004027 Akaike info criterion -8.014605
Sum squared resid 0.000260 Schwarz criterion -7.815459
Log likelihood 84.14605 F-statistic 26.20250
Durbin-Watson stat 1.514811 Prob(F-statistic) 0.000002

Os resultados mostram que os coeficientes relativos à elasticidade-lucro das


exportações líquidas (NEX) e à elasticidade-taxa de utilização da capacidade não são
estatisticamente significativos nos dois períodos em questão. Apenas a elasticidade-câmbio de
NEX revela-se significativa. Embora reduzida, esta elasticidade passa de 0,01 para 0,03,
triplicando seu valor na passagem para o segundo período que inclui os ajustes dos anos 90
(desvalorizações para promover exportações) e a fase de economia aberta pré e pós-Real.
Todavia, o p-valor (0,2246) para a estatística F de significância global mostra que o modelo
no primeiro período é inadequado para explicar o comportamento de NEX.
567

GRÁFICO 128 EXPORTAÇÕES, IMPORTAÇÕES E PIB EVOLUÇÃO EM NÍVEL (1901-2003)

Índice de quantum das exportações( IqX)


Índice de quantum das importações( IqM)
PIB

PIB

7500
5000 IqM
Escala log: 1901=100

IqX
2500

750
500

250

75
1901
1904
1907
1910
1913
1916
1919
1922
1925
1928
1931
1934
1937
1940
1943
1946
1949
1952
1955
1958
1961
1964
1967
1970
1973
1976
1979
1982
1985
1988
1991
1994
1997
2000
2003
FONTE: Dados da Funcex obtidos no IPEADATA.

O Gráfico 128 descreve as evoluções das exportações, importações e do PIB no


período [1901-2003]. As importações progridem segundo saltos que são provocados por
crises e situações externas adversas. Durante o período [1960-1973], a expansão das
importações processa-se com concomitante crescimento das exportações. De modo geral, as
exportações evoluíram de maneira muito mais regular do que as importações. A crise do
milagre brasileiro , a partir de 1973 não foi capaz de interromper a trajetória de expansão
das exportações. Deve-se considerar os efeitos das medidas do II PND e das recessões de
1981 e 1983 que provocaram uma redução expressiva nas importações, enquanto promoviam
as exportações.

No período pós-Plano Real observa-se um comportamento que contrasta fortemente


com as fases de forte crescimento econômico que caracterizou o modelo de industrialização
por substituição de importações. As importações disparam, enquanto o PIB permanece numa
trajetória de crescimento tendencial de apenas 2,2 % a.a. e as exportações não se expandem de
forma compatível com as necessidades do equilíbrio externo.
568

GRÁFICO 129 DINÂMICA CÍCLICA DAS EXPORTAÇÕES, IMPORTAÇÕES E PIB (1901-2003)

Taxa de crescimento das exportações


Taxa de crescimento das importações
Taxa de crescimento do PIB
40%
Crise 2 ª Guerra Crise Crise Abertura
1ª Guerra
de 1930 Mundial dos anos 60 do "milagre" comercial
Mundial
e "milagre" e II PND e Plano Real
30% brasileiro

20%

10%

0%

-10%

-20%

-30%
1901
1904
1907
1910
1913
1916
1919
1922
1925
1928
1931
1934
1937
1940
1943
1946
1949
1952
1955
1958
1961
1964
1967
1970
1973
1976
1979
1982
1985
1988
1991
1994
1997
2000
2003
FONTE: Dados da Funcex obtidos no IPEADATA.
NOTA: Séries filtradas pelo filtro 4253H para se eliminar as flutuações de curto prazo.
Os fatos estilizados descritos nos parágrafos imediatamente anteriores, tornam-se mais
explícitos quando se observam o comportamento das taxas de crescimento tendencial das
variáveis em questão (Gráfico 129). Esta forma de abordagem permite uma visualização da
dinâmica cíclica das exportações, importações e PIB. Até o término da 2ª Guerra Mundial, o
padrão de evolução é pró-cíclico. Até a crise dos anos 30, o PIB é puxado pelas exportações
que ao permitirem acúmulos periódicos de divisas em função do aumento da demanda
externa, provocam a expansão das importações nas fases subseqüentes. A dinâmica da
economia brasileira, ainda de base primário-exportadora, é muito dependente das oscilações e
dos ciclos econômicos da economia mundial.

Destaca-se o fato de que o boom das importações nos anos 90 não tem precedentes
históricos. Seja pela magnitude das taxas de expansão seja pelo comportamento do PIB em
um crescimento médio muito reduzido e com o crescimento das exportações em tendência de
queda. Apenas a partir da desvalorização cambial de 1999 é que se pode observar a aceleração
569

do crescimento das exportações e desaceleração das importações. A taxa de crescimento


tendencial do PIB permanece, no entanto, estagnada nos 2,2% a.a.

Estes resultados podem ser interpretados como decorrentes da lógica do modelo de


industrialização por substituição de importações e, portanto, pela inexistência de um modo de
desenvolvimento extrovertido, no período em questão. A passagem para o segundo período
não significou o estabelecimento de um regime de crescimento puxado pelas exportações,
apesar do bom desempenho dos setores exportadores, após o fim do regime de câmbio fixo,
em 1999.

Este fato pode ser comprovado pelo exame das respectivas elasticidades das funções
estimadas através do modelo especificado acima. As Tabelas 41, 42 e 43 resumem os
resultados das estimações precedentes:

TABELA 41 ESTIMAÇÃO DA FUNÇÃO POUPANÇA (1950-2003)

Variável
dependente: S 1
S s s. 0 r s w
.W

Período s s s 2
0 r w R
[1950-1980] 0,98 0,65 0,36 0,75
(6,03) (2,94)
[1984-2003]2 -0,01 0,60 0,69 0,54
(3,99) (3,22)
1
Da mesma forma como em UEMURA (2000), incluiu-se uma constante s0 na função poupança para absorver
os efeitos dos distúrbios estatísticos provocados pela tributação direta e indireta, bem como pelos pagamentos de
transferências do Governo sobre o nível da poupança.
2
Estimação em primeiras diferenças.

TABELA 42 ESTIMAÇÃO DA FUNÇÃO ACUMULAÇÃO DE CAPITAL (1966-2003)

Variável I
I K
g g .r
0 r 1 g .u u 1
dependente:
K
Período g g g 2
0 r u R
[1966-1980] 0,33 0,44 0,34 0,42
(13,74) (9,11) (9,55)
[1984-2003]1 -0,02 0,57 2,50 0,73
(1,94) (3,46)
1
Estimação em primeiras diferenças.
570

TABELA 43 ESTIMAÇÃO DA FUNÇÃO EXPORTAÇÕES LIQUIDAS (1950-2003)

Variável
dependente: NEX K 0
. 1 u
.u 1 e
.e 1

NEX K

Período 2
0 r u e R
[1950-1980] n.s

[1984-2003]1 -0,014 -0,02 -0,04 0,03 0,80


(-6,03) (-0,89) (-1,04) (8,51)
NOTA: 1 Estimação em primeiras diferenças; n.s. = não estatisticamente significativa.

Conforme anteriormente definida, a elasticidade a ser testada é formulada como:

ED ( NEX / p .K )
ED ( sr s g ). u.
w r
.p + k

No primeiro período, [1950-1980], as taxas de poupança provenientes dos lucros e dos


salários são muito altas, respectivamente, 0,65 e 0,36. Além disso, a taxa de acumulação de
capital é muito sensível à taxa de lucro (r) e também à taxa de utilização da capacidade
produtiva instalada (u). Mas nesse mesmo período, o efeito das exportações não é
estatisticamente significativo e então é suficiente testar-se o sinal de

ED (sr s g ). u.
w r
. p . E como u. . p 0 , o sinal é dado por (sr s g)
w r
=

0,65 0,36 0,44 = 0,15 > 0

Isto implica que uma expansão da profit share leva a um aumento do excesso de
demanda agregada, em razão da alta sensibilidade do investimento à taxa de lucro.
Consequentemente, o padrão de crescimento econômico entre 1966 e 1980 foi do tipo profit-
led growth, no sentido de que um aumento da participação dos lucros no produto conduz a
um aumento da taxa de acumulação de capital. Este período inclui a fase correspondente ao
milagre econômico brasileiro (1967-1973), tradicionalmente considerado pelas análises do
desenvolvimento econômico brasileiro como um modelo de crescimento baseado em alta taxa
de lucro e endividamento externo.359

Os valores dos parâmetros para o modelo de curto prazo no segundo período, [1984-
2003], conduzem a um valor igualmente positivo para ED . Considerando-se que tanto

359
Para a economia japonesa, no período [1963-1971], UEMURA (2000) encontrou também um padrão profit
led growth, com o valor de 0,14 para a elasticidade-taxa de lucro do investimento.
571

( NEX / p .K )
1
k
quanto g r
não se revelaram estatisticamente significativos, tem-se

que o sinal de ED é 0,60 0,69 0,09 0 . Isto implica em uma baixa sensibilidade da

demanda agregada às variações da profit share, resultante da não significância estatística da


elasticidade-taxa de lucro do investimento. No entanto, o coeficiente relativo à elasticidade-
taxa de utilização da capacidade produtiva do investimento é muito elevado (2,50) e
estatisticamente significativo.

A taxa de acumulação de capital responde apenas às variações da utilização da


capacidade, o que pode estar expressando que as decisões de investimento são tomadas
prioritariamente com base em expectativas de curto prazo ou seja a partir das percepções
acerca das flutuações da demanda efetiva. Por outro lado, o Estado se abstém de liderar um
projeto de expansão dos investimentos de longo prazo, por exemplo em infra-estrutura, que
forneça um quadro mais propício à retomada da acumulação de capital em bases sustentáveis.
Basta reconhecer que as fases anteriores de crescimento forte foram lideradas pelos
investimentos estatais ou incentivados direta ou indiretamente por formas variadas de
participação do setor público. Este não é o padrão observado nos anos 90, em que o Estado
tenta delegar ao setor privado prioridades que ele efetivamente não pode assumir.
Consequentemente, uma racionalidade de curto prazo ainda predomina nas decisões de
investimento e tende a adiar a retomada do crescimento em uma trajetória durável e
compatível com as necessidades do desenvolvimento econômico nacional.

O resultado acima confirma a análise de BACHA e BONELLI (2004) que mostram


que a queda da taxa de acumulação de capital nas décadas de 80 e 90 não se explica pelo
comportamento da poupança.

O exame dos Gráficos 126 e 127 reforça este resultado econométrico, pois mostra
precisamente, que a partir de 1994, as trajetórias de evolução da taxa de lucro e da taxa de
acumulação são divergentes. O aumento da taxa de lucro não implica em expansão dos
investimentos. A profit share expande-se, mas a taxa de acumulação de capital, pouco
sensível à taxa de lucro, permanece em uma tendência de declínio.
Todavia, os anos 80 e 90 são períodos singulares pelos padrões de evolução
macroeconômica e pelo comportamento do setor financeiro diante das transformações
estruturais que caracterizam a última década. Neste contexto, o modelo de BOWLES-BOYER
precisa ser modificado para incluir explicitamente os determinantes financeiros sobre a
572

acumulação de capital no Brasil, objeto principal da última seção. Antes porém, uma análise
da influência da poupança sobre a taxa de acumulação de capital faz-se necessária.

5.9 Poupança e acumulação de capital no período [1984 2003]

A análise que se segue parte das contribuições de BACHA e BONELLI (2004)360, que
proporcionam uma abordagem empírica do crescimento econômico brasileiro, baseada em
princípios teóricos e metodológicos compatíveis com os mobilizados neste trabalho. Mais
precisamente, os autores utilizam uma análise em termos dos determinantes da taxa de
acumulação de capital, enquanto principal fator do crescimento econômico, em uma
perspectiva claramente neo-estruturalista. Consequentemente, diversos momentos da
abordagem que desenvolvem podem ser recuperados numa análise em termos de modo de
regulação e de regime de crescimento.

Um dos resultados mais interessantes do trabalho desses pesquisadores refere-se ao


fato de que o desempenho da poupança agregada, por si só, não explicaria a redução das taxas
de crescimento econômico que o país assiste desde 1980. A explicação residiria na evolução
da relação produto/capital e nas mudanças de preços relativos dos bens de investimento, além
da redução do grau de utilização da capacidade produtiva instalada.

Iniciando-se com a evolução da poupança, o exame do Gráfico 130 mostra que o


período [1947-1965], que inclui a fase de expansão econômica sob a vigência do Plano de
Metas, a absorção de poupança externa como percentagem do produto permaneceu estável e
num patamar reduzido. Já nas fases correspondentes ao milagre e anos 90, a poupança
externa aumentou expressivamente sua participação na poupança total. Todavia, no intervalo
[1966-1980], a poupança externa respondeu por parte significativa da acumulação de capital
do período, enquanto na década de 90, os recursos externos foram canalizados basicamente
para ativos financeiros e aquisição de empresas privatizadas.

O resultado é que a absorção de poupança externa, sobretudo, no período pós-Plano


Real, pouco contribuiu para o aumento do estoque de capital fixo da economia brasileira. O
endividamento externo cresceu sem que isto se refletisse em taxas mais elevadas de
crescimento econômico. Mas a partir de 2002, observa-se uma queda da participação da
poupança externa, enquanto a poupança doméstica cresceu, mantendo a poupança total
estacionada em 20% do PIB.

360
BACHA e BONELLI (2004), Accounting for Brazil s Growth Experience 1940-2002 , Texto para
discussão nº 1018. Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada IPEA, Rio de Janeiro, maio de 2004.
573

GRÁFICO 130 EVOLUÇÃO DOS COMPONENTES DA POUPANÇA TOTAL (1947-2003)

Poupança total / PIB


Poupança doméstica / PIB
Poupança externa / PIB
30%

25%

20%

15%

10%

5%

0%

-5%
1951
1947
1949

1953
1955
1957
1959
1961
1963
1965
1967
1969
1971
1973
1975
1977
1979
1981
1983
1985
1987
1989
1991
1993
1995
1997
1999
2001
2003
BACHA e BONELLI (2004) observaram que o comportamento da poupança total não
explica a baixa da taxa de acumulação de capital nas décadas de 80 e 90. De fato, o exame dos
coeficientes estimados da função poupança no período [1984-2003], constantes da Tabela 41,
mostrou que as taxas de poupança provenientes dos lucros e dos salários permaneceram
elevadas, mas sem impactos significativos sobre a taxa de acumulação. A principal explicação
reside na baixa elasticidade da demanda agregada às variações da profit share, neste período,
e que, por sua vez, reflete a perda de sensibilidade do investimento à taxa média de lucro.

Alternativamente, os autores supracitados mostram que o impacto da taxa de poupança


sobre a taxa de acumulação de capital é condicionado pelos preços relativos do investimento
574

p
( p k
)361, pela taxa de utilização da capacidade produtiva instalada ( u ) e pela razão
i
p y

produto / capital em uso ( ).

BACHA e BONELLI propõem a seguinte decomposição da taxa de acumulação, a fim


de que os seus determinantes sejam explicitados:

I
K K
(1)

onde é a taxa de depreciação; I é o investimento bruto real; K é o estoque de capital

e K é a taxa de crescimento do estoque de capital ou taxa de acumulação.


I I Y
Mas = . (2)
K Y K

ou seja, a taxa de acumulação é o produto da taxa de investimento pela razão produto / capital.

Considerando-se que a taxa de investimento é equivalente ao produto da taxa nominal


de poupança pelo inverso do preço relativo do investimento, tem-se que:

I p K
.I p y S p y
. = . (3)
Y p Y
.Y p k
p y
.Y p k

1
isto significa que s . Esta terceira igualdade é uma decorrência das definições de taxa
p i

de poupança nominal e de preço relativo do investimento.

Y
A razão produto /capital pode ser escrita como o produto da taxa de utilização
K
da capacidade u pela razão produto / capital em uso :

Y Y
u. u. (4)
K u.K

361
Para que seja preservada a coerência com as variáveis definidas na seção sobre os determinantes da taxa de
lucro, utilizou-se o símbolo p i
para significar os preços relativos do investimento. Consequentemente,

p permanece sendo a razão inversa, isto é, p y


.
p k
575

Substituindo-se (3) e (4) na equação (2) e o resultado em (1), tem-se que

1
K = s. p .u. (5) ou, o que é equivalente, g s. p.u (6)
i

Onde ( g ) é a taxa de acumulação e ( p ) é a razão preços do produto / preços dos bens


de capital, sendo esta formulação apenas para se manter a compatibilidade da notação
anteriormente usada na decomposição da taxa média de lucro da economia brasileira.

A relevância macroeconômica da relação (6) é que ela mostra que o impacto da taxa
de poupança sobre a taxa de acumulação não é imediato, pois depende do comportamento da
razão entre os preços do produto e o preço dos bens de investimento p , da taxa de utilização
da capacidade produtiva instalada u e da razão produto / capital em uso, .

A Tabela 44 a seguir recorre à mesma metodologia utilizada para a decomposição dos


efeitos dos componentes da taxa de lucro. Os anos referem-se aos turning points da taxa de
acumulação de capital. Como a depreciação do estoque de capital pode ser considerada
praticamente uma constante, variando entre 0,038 e 0,040 nas séries em questão, BACHA e
BONELLI concluem que ela não contribui para explicar as mudanças na taxa de acumulação
ao longo do tempo. Por outro lado, considerando-se a taxa bruta de acumulação de capital

g b
, o efeito da depreciação pode ser abstraído, de maneira que a Tabela 1 exibe apenas as

variáveis da relação g b
g s. p.u

As variáveis com os pontos em cima estão em taxas de variação percentual e seus


valores referem-se à taxa média de crescimento anual entre os turning points. Isto implica

que, aproximadamente, g b = s + p +u + .
576

TABELA 44 MUDANÇAS NOS COMPONENTES DA TAXA DE ACUMULAÇÃO DE CAPITAL


(1941-2003)

Turning points
da taxa
acumulação
de g b
(%) g s p u
1947 14,56 10,2 3,37 7,21 0,65 -1,05

1961 9,56 -0,7 0,85 -0,57 0,23 -1,21

1974 15,74 3,8 4,15 0,23 0,04 -0,63

1984 7,01 -8,6 -2,87 -2,50 -1,15 -2,03

1986 8,77 14,7 6,97 4,24 3,63 -0,19

1992 5,39 -5,3 -0,02 -2,88 -1,42 -0,94

1997 6,99 6,2 2,72 1,78 1,98 -0,28

2003 4,96 -3,4 -1,04 -1,99 -0,76 0,43

NOTA: O estoque de capital fixo utilizado refere-se apenas ao estoque produtivo, ou seja, máquinas e

equipamentos mais construções não residenciais. Isto responde também pelas diferenças nos valores de
encontrados nesta análise e os calculados por BACHA e BONELLI que utilizaram o estoque de capital total.

No período que inclui a fase do milagre [1961-1974], a variação média da taxa de


acumulação (4 %) foi impulsionada pela expansão da taxa de poupança na mesma magnitude.
A razão preços do produto / preços dos bens de investimento cresceu 0,23% a.a., enquanto o
grau de utilização da capacidade que já estava num nível bastante elevado, teve pouca
variação média neste período (0,04%). A razão produto / capital em uso caiu a um ritmo
médio de 0,63 a.a.

No período [1975-1984], constata-se queda expressiva em todos os componentes da


taxa de acumulação de capital, cuja queda média anual atinge 8,6%. Um sinal inequívoco da
própria crise do regime de acumulação responsável pelo crescimento acelerado da fase
anterior.

Nos anos de 1985 e 1986, a taxa de acumulação expande-se rapidamente, puxada com
um crescimento médio de 7% na taxa de poupança, 4% na razão preços do produto / preços
dos bens de investimento e de 3,6% no grau de utilização da capacidade. Basicamente este
resultado reflete o efeito-renda provocado pelo Plano Cruzado, instituído em 1986. Mas esse
resultado também reflete a base de comparação muito baixa do turning point anterior.
577

O período [1987-1992] está nitidamente em conformidade com a argumentação de


BACHA e BONELLI (2004), segundo a qual o comportamento da poupança por si só não
explica o declínio da acumulação de capital na economia brasileira dos anos 80 e 90.
Enquanto a taxa de poupança cai apenas a uma taxa média de 0,02% a.a., a taxa de
acumulação declina a uma média de quase 8% a.a. Os fatores que mais contribuíram para isto
foram a queda da razão preços do produto / preços dos bens de capital p (-3 %) e do grau de
utilização da capacidade produtiva u (-1,4 %).

No período seguinte, [1993-1997], que inclui a fase pós-Plano Real, a economia


parecia retomar sua trajetória de expansão, ensaiando uma reversão da tendência de declínio
da taxa de acumulação de capital. Porém, a partir de 1998, último período, a tendência retorna
e a acumulação de capital novamente declina até 2003. Este fato característico pode ser
observado pelo Gráfico 131, a seguir, que fornece um zoom sobre o comportamento real e
tendencial da taxa de acumulação em todo o período pós- milagre , ou seja, desde 1974.

GRÁFICO 131 EVOLUÇÃO DA TAXA DE ACUMULAÇÃO DE CAPITAL NO PERÍODO PÓS-


MILAGRE (1974-2003)

Taxa bruta de acumulação de capital


e série tendencial

16%

12%
gb= I/K

8%

4%
1974 1978 1982 1986 1990 1994 1998 2002

FONTE: Dados originais do IBGE, obtidos no IPEADATA.


NOTA: Séries tendenciais estimadas por regressão local Lowess smoothing.
578

Neste último período, [1998-2003], com exceção de , todos os componentes da taxa


de acumulação apresentam-se novamente em queda. Mas o principal fator explicativo do
declínio de 3,4% da acumulação foi a queda média anual de 2% em p . Contrariamente ao
discurso oficial, a redução rápida da inflação nem sempre tem um efeito positivo sobre a
acumulação e o crescimento econômico, pois isto depende do comportamento dos preços dos
bens de investimento. Este período reflete portanto, a política de manutenção de taxas reais de
juros que elevam demasiadamente o custo de utilização do estoque de capital, além de
promover uma transferência expressiva de recursos dos setores diretamente produtivos para o
setor financeiro. As taxas de poupança e de utilização da capacidade tiveram queda,
respectivamente, de 1% e de 0,76%. Apenas a razão produto / capital em uso ( ) permaneceu
positiva, com um crescimento médio do PIB de cerca de 1,5% a.a. e o declínio da utilização
do estoque de capital.

GRÁFICO 132 EVOLUÇÃO DA TAXA DE POUPANÇA TOTAL, DA RAZÃO p E DA TAXA DE


ACUMULAÇÃO BRUTA DE CAPITAL g (1941-2003)

Taxa de acumulação de capital: g = I / K (L)


Taxa de poupança total: s = S / Y (L)
Razão preços do produto / preços do capital: p = p Y / p K
28% 1,50
26% 1,40
24%
1,30
22% s
20% 1,20
18% 1,10
16%
1,00
14%
12% 0,90
10% p 0,80
8%
0,70
6% g
4% 0,60

2% 0,50
1941
1943
1945
1947
1949

1953
1955
1957
1959
1961
1963
1965
1967
1969
1971
1973
1975
1977
1979
1981
1983
1985
1987
1989
1991
1993
1995
1997
1999
2001
2003
1951

FONTE: Dados originais do IBGE, obtidos no IPEADATA.


NOTA: Séries tendenciais estimadas por regressão local Lowess smoothing.
O exame do Gráfico 132 mostra uma forte correlação entre a evolução da taxa de
acumulação de capital e a da razão preço do produto/ preço dos bens de investimento (0,84),
para o período completo [1941-2003]. A partir do final do milagre , em 1973, as tendências
579

evoluem de forma ainda mais próxima. A correlação da taxa de acumulação com a taxa de
poupança total mostrou-se muito reduzida e negativa.

Para que o efeito de escala não prejudicasse a visualização das dinâmicas das séries, as
outras duas componentes, e u , foram plotadas separadamente no Gráfico 133. Isto permite
uma melhor compreensão do modo como influenciaram a acumulação. Este gráfico destaca
ainda o patamar médio em que se encontrava o grau de utilização da capacidade produtiva no
período [1941-1980] e entre 1981 e 2003. Observa-se uma redução média de 4% no nível de
utilização da capacidade, que persiste ao longo dos anos 80 e 90. Destaca-se também a
tendência de declínio da razão produto / capital em uso desde 1941.

GRÁFICO 133 TAXA DE UTILIZAÇÃO DA CAPACIDADE PRODUTIVA E RAZÃO PRODUTO /


CAPITAL EM USO (1941-2003).

Taxa de utilização da capacidade produtiva (L)


Razão produto / capital em uso ( v ) = [PIB / (u.K)] (R)
v = Lowess
102% 0,7

100% 0,6

98%
0,6

96%
0,5
94%
0,5
92%
0,4
90%

0,4
88%

86% 0,3

84% 0,3
1945
1941
1943

1947
1949
1951
1953
1955
1957
1959
1961
1963
1965
1967
1969
1971
1973
1975
1977
1979
1981
1983
1985
1987
1989
1991
1993
1995
1997
1999
2001
2003

FONTE: Metodologia de construção das séries no anexo.


580

TABELA 45 - MATRIZ DE CORRELAÇÕES PARA O PERÍODO (1941-2003)

Y g u p s
1.000000
Y
g 0.601665 1.000000

u 0.726271 0.717099 1.000000

0.384647 0.490803 0.423051 1.000000

p 0.553011 0.844624 0.613126 0.661892 1.000000

s -0.123295 -0.059223 -0.090512 -0.800726 -0.479332 1.000000

NOTA: Diferentemente de BACHA e BONELLI (2004), a variável p é definida inversamente, ou seja, como a
p y
razão entre os preços do produto e os preços dos bens de capital p .
p k

Pela Tabela 45, o coeficiente de correlação entre Y e g é de 0,60 para o período

[1941-2003]. Em segundo lugar está a correlação com a razão p (0,55), seguida da correlação
com a razão produto / capital em uso (0,38). Conforme observaram BACHA e BONELLI
(2004, p. 4), não há uma correlação estatisticamente significativa entre o crescimento do
estoque de capital (g) e a taxa de poupança total (s) quando se considera o período completo
de análise (Quadro 183)362.

QUADRO 183 ESTIMAÇÃO DA RELAÇÃO ESTÁTICA ENTRE (g) e (s) [1941-2003]


Dependent Variable: g
Method: Least Squares
Sample: 1941 2003
Included observations: 63
Variable Coefficient Std. Error t-Statistic Prob.
C 0.070362 0.010425 6.749282 0.0000
s 0.293921 0.058050 5.063224 0.0000
Dummy [1981-2003] -0.064043 0.004949 -12.94096 0.0000
R-squared 0.737152 Mean dependent var 0.102153
Adjusted R-squared 0.728391 S.D. dependent var 0.032353

A razão para este fato está na ocorrência de mudanças estruturais em inícios dos anos
80, que podem ser confirmadas estatisticamente pelos testes de estabilidade (Figura 54). Para
identificar os períodos de quebra estrutural, foi estimada uma equação em nível e em seguida
foram aplicados os testes de estabilidade do CUSUM e o one-step probability.

362
Rigorosamente, isto implica na inexistência de uma relação linear.
581

Alternativamente, uma segunda estimação introduziu uma dummy de intercepto, confirmando


mais uma vez a mudança estrutural na transição para o período [1981-2003].363

FIGURA 54 TESTES DE ESTABILIDADE (1941-2003)


40 1.4 0.10

1.2 0.05
20
1.0 0.00

0.8 -0.05
0
0.00
0.6 -0.10

-20 0.4 0.05

0.2 0.10
-40
0.0
0.15
-60 -0.2 45 50 55 60 65 70 75 80 85 90 95 00
45 50 55 60 65 70 75 80 85 90 95 00 45 50 55 60 65 70 75 80 85 90 95 00
One-Step Probability Recursive Residuals
CUSUM 5% Signific anc e CUSUM of Squares 5% Significance

A periodização baseia-se nas análises anteriormente propostas. O período [1966-1980]


correspondente ao de vigência do regime de crescimento profit-led, responsável pelo milagre
econômico brasileiro e identificado pelos testes econométricos realizados na seção 5.9. A
taxa de crescimento do produto se relaciona positivamente com a taxa de poupança, mas o
coeficiente de correlação é muito reduzido. No entanto, quando se trata da correlação entre a
taxa de poupança e a taxa de acumulação de capital, o coeficiente apresenta o valor de 0,71. A
estimação da função poupança já havia revelado as taxas elevadas da poupança das empresas
e dos assalariados.

Destaca-se também neste período a forte correlação entre g e u que atinge o valor de
0,92 (Tabela 46).

TABELA 46 MATRIZ DE CORRELAÇÕES PARA O PERÍODO (1966-1980)

Y g u p s
1.000000
Y
g 0.379188 1.000000

u 0.601657 0.921515 1.000000

0.430705 0.038710 0.055992 1.000000

p 0.035873 0.016531 -0.120370 0.760293 1.000000

s 0.040651 0.713224 0.674368 -0.556828 -0.551634 1.000000

363
Foi este o método utilizado por BACHA e BONELLI (2004).
582

O período [1984-1993] caracteriza-se por uma conjuntura macroeconômica muito


adversa, combinando alta inflação com tendências à estagnação do produto. A correlação
negativa entre taxa de crescimento do produto e taxa de poupança novamente retorna, embora
seu valor seja muito baixo (Tabela 47).

TABELA 47 MATRIZ DE CORRELAÇÕES PARA O PERÍODO (1984-1993)

Y g u p s
1.000000
Y
g 0.495428 1.000000

u 0.487708 0.839098 1.000000

0.583189 0.837290 0.487093 1.000000

p 0.567314 0.346255 0.009191 0.565043 1.000000

s -0.078498 0.359653 0.664551 0.028594 -0.683297 1.000000

O último período refere-se à fase de abertura econômica sob vigência do Real [1994-
2003]. A taxa de acumulação de capital (g) permanece altamente correlacionada com a taxa
de utilização da capacidade u (0,83), assim como a taxa de poupança s (0,73) e a razão p
(0,62). Mas um outro destaque com relação aos períodos precedentes refere-se à correlação
entre g e que se tornou negativa e com um valor de -0,52. Este fato pode ser explicado
pelas sucessivas quedas do produto induzidas por um regime monetário-financeiro à elevada
restrição, combinado com uma rápida elevação da intensidade do capital ( K / N) entre 1994-
1998. Neste período u, , p e s apresentam os mais elevados coeficientes de correlação com a
taxa de acumulação g (Tabela 48).

TABELA 48 MATRIZ DE CORRELAÇÕES PARA O PERÍODO (1994-2003)

Y g u p s
1.000000
Y
g 0.342252 1.000000

u 0.336515 0.832952 1.000000

0.117845 -0.517742 -0.621309 1.000000

p -0.284366 0.620527 0.631650 -0.534929 1.000000

s 0.737305 0.737772 0.629995 -0.209983 -0.005422 1.000000


583

BACHA e BONELLI (2004) chamam a atenção para o fato de p e estarem entre as


variáveis com os maiores coeficientes de correlação (0,66) no período completo de análise
[1941-2003]. E também na matriz de correlações, estimada por esta análise, para o período
[1966-1980], o valor do coeficiente é ainda maior (0,76).

Do mesmo modo que em PINHEIRO (2003), estes autores observam que é preciso
considerar os impactos da elevação do preço relativo do investimento como um importante
fator de explicação da queda da taxa de acumulação de capital e do crescimento econômico
nos últimos 24 anos364. Em primeiro lugar, o comportamento dos preços relativos dos bens de
investimento é atípico (Gráfico 134). A série cresce rapidamente nos anos 50, declina entre
1962-1977, para em seguida entrar em uma trajetória de expansão acelerada. A questão
teórica e empiricamente relevante é que este fato estilizado seria uma anomalia específica da
economia brasileira. Nas palavras dos próprios autores:

Such an increase in the relative price of investment is a Brazilian anomaly in


a worldwide perspective.
As explicações elencadas por esses autores, para a elevação dos preços relativos do
investimento no Brasil são as seguintes:

i. aumento do poder de oligopólio nas indústrias produtoras tanto de bens finais


quanto de bens intermediários de investimento;

ii. progressiva ineficiência no processo de produção de bens de capital, à medida que


a substituição da importações desses bens avançava;

iii. um nível mais elevado de demanda por bens duráveis como proteção contra a alta
inflação e o risco de default financeiro;

iv. comportamento defensivo de uma estrutura de formação de preços oligopolista


(price-maker) em face dos prazos de pagamento das compras do governo, num
contexto de aceleração da inflação;

v. erro de mensuração do índice de preços dos bens de investimento. Um


argumento proposto por PINHEIRO (2003), que destaca a possível superestimação
dos aumentos dos preços desses bens, no período 1987-1989, em razão da alta
inflação do período.

364
Segundo PINHEIRO (2003, p.17), (...) consistentemente com o observado para o Brasil, diversos trabalhos
mostram que as diferenças entre países nas taxas de acumulação de capital resultam muito mais de diferenças no
preço dos bens de capital, em relação ao preço dos bens de consumo, do que de diferenças nas taxas de
poupança.
584

Uma questão básica neste contexto refere-se à constatação de que a elevação dos
preços relativos do investimento processou-se na economia brasileira com concomitante
queda da produtividade do capital e, em conseqüência, queda da profit share. Em seus
comentários acerca dos primeiros resultados da presente análise, BOYER (2004) observa que:

Le grafique 133 montre que la principale raison de la chute du profit est que
la productivité du capital baisse dramatiquement, plus vite que n augmente la
part des profits. Cela appellerait une analyse plus poussée. A nouveau cela
suggere le passage d un modèle productif a un autre »365
Na seção sobre os determinantes da taxa de lucro, a Tabela 38 mostrou que esta
variável-chave do processo de acumulação permaneceu em queda na maioria dos períodos
identificados. As exceções correspondem ao período do milagre (1967-1973 e entre 1993 e
2002). Por exemplo, no período [1974-1983], a produtividade do capital caiu a uma taxa
média de 3,7% a. e a taxa de lucro reduziu-se em 4,7% a.a.

Segundo Pascal PETIT (2002)366, apesar do declínio da razão produto/ capital ser uma
tendência da economia mundial, a queda no caso brasileiro é particularmente acentuada.
BACHA e BONELLI (2004) também constatam este fato estilizado da economia brasileira na
segunda metade do século XX. Segundo os autores, the productivity of capital decreased in
most countries, as we have seen, albeit not as much as in Brazil; peculiar to Brazil is the
association of this decline with a sharp rise in the price of investment goods.

No capítulo 3, a relação capital/produto (o inverso da produtividade do capital) foi


destacada como um dos fatos estilizados da performance macroeconômica brasileira numa
perspectiva histórica. A. FEU (2001, p. 32) mostrou que o aumento da razão K / Y (ou do
declínio da produtividade do capital) na economia brasileira, se aproxima da média observada
na economia mundial. Uma das constatações foi que essa relação duplicou entre 1970 e 1998,
passando de 1,5 para 3367, o que significa que o país necessita hoje do dobro de capital
necessário na década de 70, para gerar uma unidade de produto.

365
Segundo Pascal PETIT, CEPREMAP (2002), apesar do declínio da razão produto/ capital ser uma tendência
da economia mundial, a queda no caso brasileiro é particularmente acentuada. BACHA e BONELLI (2004)
também constatam este fato estilizado da economia brasileira na segunda metade do século XX. Segundo os
autores, the productivity of capital decreased in most countries, as we have seen, albeit not as much as in
Brazil; peculiar to Brazil is the association of this decline with a sharp rise in the price of investment goods.
366
Durante os Seminários URA 922, CEPREMAP-Paris, apresentação de BRUNO (2002), Rapport salarial et
régime monétaire au Brésil - émergence, évolution et perspectives d une construction inachevée.
367
Conforme A. FEU (2001), em A Evolução da Razão Capital/Produto no Brasil e nos Países da OCDE.
Economia & Energia. Nº 28, setembro-outubro 2001, as razões capital/produto dos países membros da OCDE,
bem como para o Brasil, mostraram tendência positiva. A relação inversa entre o nível inicial e o crescimento da
razão, sugere um comportamento convergente que se daria em torno do nível médio de 3. Notamos, ainda, um
585

Para MARQUETI (2004, p.11-12), a explicação para o declínio da produtividade do


capital na economia brasileira deve ser buscada nos padrões de progresso técnico
característico de um país de industrialização tardia. O Brasil ocupa um lugar subordinado na
economia mundial no que concerne ao processo de mudança tecnológica. Gerada nos países
capitalistas desenvolvidos, as novas tecnologias são transferidas com defasagens, pois a
difusão nunca é imediata, seja por razões financeiras, seja pelo tempo necessário para se
absorver e dominar os conteúdos das novas bases técnicas. Disto resulta que a economia
brasileira tende a reproduzir com atraso as fases de dinamismo da produtividade que
caracteriza os EUA, enquanto principal centro gerador de inovações.

MARQUETTI identifica três fases para as produtividades do capital e do trabalho, no


Brasil e que reproduzem as mesmas fases ocorridas nos EUA com uma defasagem média de 7
a 8 anos. Na terceira fase, observam-se os efeitos da terceira revolução industrial nos EUA
e no Brasil. Todavia, enquanto nos EUA, a produtividade do capital aumentou, no Brasil esta
permaneceu relativamente constante ao longo dos anos 90. Mas sua estabilização permitiu
interromper a trajetória de queda da taxa de lucro.

GRÁFICO 134 EVOLUÇÃO DOS PREÇOS RELATIVOS DO INVESTIMENTO (1950-2003)

Razão preços do investimento / preços do produto: p i = p K /pY


1,8

1,6

1,4

1,2

1,0
Média internacional da razãop i

0,8

0,6
1950

1954

1958
1960
1962
1964
1966
1968
1970
1972
1974
1976
1978
1980
1982
1984
1986
1988
1990
1992
1994
1996
1998
2000
2002
1952

1956

FONTE: Dados originais do IBGE, obtidos no IPEADATA.

arrefecimento da tendência crescente a partir da década de 80 na maioria dos países e uma maior queda da razão
após a recessão de 1992, coincidindo, com a aceleração do crescimento do produto.
586

NOTA: A média internacional da razão pi foi calculada a partir dos dados constantes da Penn World Table
(PWT) versão 6.1.

Para BACHA e BONELLI (2004), três hipóteses poderiam ser mobilizadas para
explicar a queda da razão produto / capital em uso ( ), conforme pode ser observada no
Gráfico 135:
i. o declínio da razão produto-capital pode ser considerado um resultado
esperado da transição de uma economia de base agrícola para uma economia
industrial. Mas a tendência de queda pode ter sido aprofundada pelas
características particulares do processo brasileiro de industrialização por
substituição de importações;
ii. o comportamento da razão Y/K no Brasil pode estar simplesmente refletindo
uma tendência mundial;
iii. nos quadros do modelo de Solow-Swan, a razão Y/K não é um dado
tecnológico e pode declinar porque estaria convergindo para um valor mais
baixo de estado estacionário, compatível com um aumento persistente da
taxa de poupança.

GRÁFICO 135 PARTICIPAÇÃO DOS LUCROS NO PRODUTO, RELAÇÃO PRODUTO/ CAPITAL


EM USO E PRODUTIVIDADE DO CAPITAL (1950-2003)

Relação Y / K (L)
Relação Y / (u.K) (L)
Profit-share (R)
0,90 0,60

0,80 0,58

0,56
0,70
0,54
0,60
0,52
0,50
0,50

0,40 0,48

0,30 0,46
1950
1952
1954
1956
1958
1960
1962
1964
1966
1968
1970
1972
1974
1976
1978
1980
1982
1984
1986
1988
1990
1992
1994
1996
1998
2000
2002

FONTE: Metodologia de construção das séries no anexo.


587

O Gráfico 136 mostra, através de um diagrama de dispersão, que há uma correlação


negativa entre a v e p , particularmente a partir de 1950. Todavia, a existência de correlação
i

não garante a vigência de uma relação causal entre as variáveis.

GRÁFICO 136 RAZÃO PRODUTO-CAPITAL EM USO ( ) E PREÇOS RELATIVOS DO


INVESTIMENTO ( p i
) [1940-2003]

Diagrama de dispersão e ajuste polinomial [1950-2003]


1,20 46 45 44
43
1,10 41
Razão produto-capital em uso = Y/(u.K)

42 40
47

1,00 48
49
0,90
50

51
0,80
52
53
55 54
0,70 5756
5961
58
60 62
65 64 63
6667
0,60 686972
73 71
74 70
75
76
77 78
8079
0,50 86858182 02 03
84
83 9987
9196
97
98 0
00 192 94
90
95 93 88 89

0,40
0,60 1,00 1,40 1,80
Preço relativo do investimento = p K / p Y

FONTE: Metodologia de construção das séries no anexo.

Segundo JOHNSTON e DINARDO (2000, p.10), é preciso manter-se cauteloso diante


de correlações muito elevadas entre os níveis das variáveis:

Muitas séries que apresentam correlações muito elevadas entre X e Y (os


níveis) apresentarão correlações muito baixas entre X e Y (as primeiras
diferenças). Geralmente, este resultado indica que existe uma relação espúria.
Por outro lado, se existir uma relação causal entre as variáveis, será de se
esperar a existência de correlações entre os níveis e também entre as
primeiras diferenças.

Segundo estes econometristas, este aspecto foi destacado no importante artigo de


STIGLER e SHERWIN.368 A principal tese deste artigo refere-se ao fato de que se dois bens
ou serviços estão no mesmo mercado, os seus preços devem estar relacionados um com o

368
G. STIGLER e R. SHERWIN, The Extent of the Market . Journal of Law and Economics, 28, 1985, 555-
585
588

outro. Contudo, visto que a maioria dos preços e séries econômicas apresentam movimentos
tendenciais ao longo do tempo, STIGLER e SHERWIN pretendem precaver-se quanto à
possibilidade de correlações espúrias. Para contornar esse problema, os autores além de
correlacionarem os níveis dos preços, eles correlacionam também as flutuações dos preços.
Um dos exemplos utilizados por esses pesquisadores, mostrou que os preços mensais de
venda de uma indústria alimentícia, no período 1971-981, conduziram a correlações de 0,97
para os níveis e de 0,92 para as primeiras diferenças. Consequentemente, a correlação entre as
primeiras diferenças reforça fortemente a correlação entre as variáveis e suportam a tese de
existência de uma ligação entre elas.

Em linha com essas considerações pertinentes, e seguindo a metodologia básica desta


análise, foram obtidas as correlações em níveis e em primeiras diferenças para os períodos
identificados previamente (Quadro 184):

QUADRO 184 CORRELAÇÕES EM NÍVEIS E PRIMEIRAS DIFERENÇAS ENTRE E p i


POR
PERÍODO

[1952 -1963]
1ªs
Níveis p i Diferenças p i
1 -0.769510 1 0.008598

p i
-0.769510 1 p i 0.008598 1

[1966-1980]
1ªs
Níveis p i Diferenças p i
1 -0.7644 1 -0.0997
p i
-0.7644 1 p i
-0.0997 1

[1984-1993]
1ªs
Níveis p i Diferenças p i
1 -0.490832 1 0.0580
p i
-0.490832 1 p i
0.0580 1

[1994-2003]
1ªs
Níveis p i Diferenças p i
1 0.378023 1 0.188883
p i
0.378023 1 p i
0.188883 1

A conclusão que se pode extrair com base nos resultados das correlações acima é que
as correlações em primeiras diferenças não reforçam as correlações em níveis. Isto significa a
589

existência de correlações espúrias entre as variáveis em questão. Apenas no último período,


[1994-2003], a correlação em diferenças atinge 50% do valor do coeficiente de correlação em
nível, o que poderia ser considerado um indício de ligação entre e p . Todavia, o sinal do
i

coeficiente é agora positivo e se trata de um período onde a relação produto / capital parou de
cair e se estabilizou (Gráfico 134).

Se for considerado o período de declínio acentuado da razão , justamente a partir da


crise do milagre , a correlação em nível é ainda mais forte (-0,80), mas em primeiras
diferenças é muito fraca (Quadro 185).

QUADRO 185 CORRELAÇÕES EM NÍVEIS E PRIMEIRAS DIFERENÇAS ENTRE E p i


(1974-
1993)

[1974-1993]
1ªs
Níveis p i Diferenças p i
1 -0.804260 1 -0.054460
p i
-0.804260 1 p i
-0.054460 1

Uma alternativa seria considerar a possibilidade de uma relação de longo prazo entre
e p,i
dada por uma equação de co-integração, pois se ela existir, de acordo com

GRANGER, deve haver no mínimo um vínculo causal unidirecional. Contudo, apesar do teste
de JOHANSEN mostrar a existência de uma equação de co-integração, a elasticidade de
longo prazo é muito fraca (-0,09) e desafia a existência de uma influência economicamente
relevante da elevação dos preços dos bens de investimento como explicação para a queda da
razão produto/capital em uso (Quadro 186). O teste de causalidade de GRANGER reforça
ainda esse resultado pois não detecta nenhuma precedência temporal de uma variável sobre
outra (Quadro187).

Consequentemente, da análise empírica precedente pode-se concluir, em caráter


preliminar, que a elevação tendencial dos preços dos bens de capital não estaria entre as
principais causas da queda da produtividade do capital na economia brasileira. Uma hipótese
alternativa seria considerar a influência de um ambiente macroeconômico caracterizado por
uma tendência persistente de elevação das taxas reais de juros, provacadas por um
endividamento externo crescente. Neste contexto, o custo de utilização do estoque de capital
torna-se muito elevado vis-à-vis à alternativa de alocação da poupança agregada para ativos
financeiros, de menor risco e alta rentabilidade, lastreados em títulos da dívida pública.
590

QUADRO 186 TESTE DE JOHANSEN PARA E p i


(1974-1993)

Sample: 1974 1993


Included observations: 20
Test assumption: No deterministic trend in the data
Series: p i
Likelihood 5 Percent 1 Percent Hypothesized
Eigenvalue Ratio Critical Value Critical Value No. of CE(s)
0.601858 23.92330 19.96 24.60 None *
0.240594 5.504369 9.24 12.97 At most 1
*(**) denotes rejection of the hypothesis at 5%(1%)
significance level
L.R. test indicates 1 cointegrating equation(s) at 5%
significance level
Normalized Cointegrating Coefficients: 1 Cointegrating Equation(s)
V PI C
1.000000 0.087761 -0.554124
(0.03274) (0.04047)

Log likelihood 90.15243

QUADRO 187 TESTE DE CAUSALIDADE DE GRANGER PARA E p i


(1974-1993)

Pairwise Granger Causality Tests


Sample: 1974 1993
Lags: 2
Null Hypothesis: Obs F-Statistic Probability
20 0.72597 0.50010
p does not Granger Cause
i
1.25322 0.31383
does not Granger Cause p i

Um novo teste pode, no entanto, se proposto como uma alternativa para se verificar os
impactos da elevação do custo dos bens de capital sobre as decisões de investimento e
acumulação de capital. Tomando-se as séries taxa de acumulação produtiva de capital
(excluídas as construções residenciais) e os preços relativos dos bens de capital pode-se
investigar se há uma relação de longo prazo conectando a evolução dessas variáveis, segundo
a equação 46. Os resultados encontram-se no Quadro 188.

I
0 1
.LPK (46)
K
591

QUADRO 188 ESTIMAÇÃO DA EQUAÇÃO 46


Dependent Variable: IKPR
Method: Least Squares
Date: 12/19/04 Time: 01:16
Sample: 1950 2003
Included observations: 54
Variable Coefficient Std. Error t-Statistic Prob.
C -0.735258 0.056881 -12.92634 0.0000
LPK -0.172859 0.011730 -14.73708 0.0000
R-squared 0.806822 Mean dependent var 0.102209
Adjusted R-squared 0.803107 S.D. dependent var 0.040802
S.E. of regression 0.018105 Akaike info criterion -5.148952
Sum squared resid 0.017045 Schwarz criterion -5.075285
Log likelihood 141.0217 F-statistic 217.1816
Durbin-Watson stat 0.569009 Prob(F-statistic) 0.000000
FIGURA 55 TESTES DE ESTABILIDADE DA RELAÇÃO 46 (1950-2003)
30 1.6 0.06
0.04
20 0.02
1.2
0.00
10 -0.02
0.8 -0.04
0.00
0 -0.06

0.4 0.05
-10
0.10
0.0
-20
0.15
-30 -0.4 55 60 65 70 75 80 85 90 95 00
55 60 65 70 75 80 85 90 95 00 55 60 65 70 75 80 85 90 95 00
N-Step Probability Recursive Residuals
CUSUM 5% Signific anc e CUSUM of Squares 5% Significance

0.06 0.06
0
0.04 0.04
0.02 0.02
0.00 0.00 -1
-0.02 -0.02
-0.04 -0.04
0.00 0.00
-0.06 -0.06 -2
0.05 0.05

0.10 0.10 -3

0.15 0.15
55 60 65 70 75 80 85 90 95 00 55 60 65 70 75 80 85 90 95 00 -4
60 65 70 75 80 85 90 95 00
One-Step Probability Recursive Residuals N-Step Probability Recursive Residuals
Recursive C(1) Estimates ± 2 S.E.

0.0

-0.1

-0.2

-0.3

-0.4

-0.5

-0.6

-0.7
60 65 70 75 80 85 90 95 00

Recursive C(2) Estimates ± 2 S.E.


592

QUADRO 189 TESTES DE RAÍZES UNITÁRIAS PARA I/K E LPk (1950-2003)


ADF Test Statistic
I/Kpr -2.008284 1% Critical Value* -3.5598
LPK -1.468549 5% Critical Value -2.9178
10% Critical Value -2.5964
*MacKinnon critical values for rejection of hypothesis of a unit root.
QUADRO 190 TESTE DE CO-INTEGRAÇÃO DE JOHANSEN (1950-2003)
Sample: 1950 2003
Included observations: 52
Test assumption: Linear deterministic trend in the data
Series: IKPR LPK
Lags interval: 1 to 1
Likelihood 5 Percent 1 Percent Hypothesized
Eigenvalue Ratio Critical Value Critical Value No. of CE(s)
0.270793 18.80555 15.41 20.04 None *
0.044812 2.384051 3.76 6.65 At most 1
*(**) denotes rejection of the hypothesis at 5%(1%) significance level
L.R. test indicates 1 cointegrating equation(s) at 5% significance level
Normalized Cointegrating Coefficients: 1 Cointegrating Equation(s)
IKPR LPK C
1.000000 0.175948 0.750384
(0.01850)

Log likelihood 239.1240

Este resultado mostra que há uma relação de longo prazo entre a taxa de acumulação
de capital (I/K) e os preços relativos dos bens de investimento (PK). Todavia, o valor do
coeficiente de PK, embora significativo, não é suficiente para suportar a hipótese de que a
queda da taxa de acumulação de capital na economia brasileira tenha sido provocada
principalmente por uma elevação dos preços dos bens de capital. Além disso, quando se
considera o subperíodo [1981-2003], as duas séries não apresentam raízes unitárias e o
modelo em taxas de variação não apresentou coeficientes estatisticamente significativos.

O aumento do custo dos bens de capital certamente teve influência, mas é preciso
observar-se as transformações no nível das formas institucionais que, entre outras
conseqüências, determinaram o deslocamento do Estado e elevaram o regime monetário-
financeiro à condição de forma institucional hierarquicamente superior. Nestas condições, os
custos financeiros das empresas se elevam significativamente e a alternativa, facilmente
acessível, de aplicações em ativos financeiros de alta liquidez e rentabilidade, vis-à-vis às
inversões reais produtivas, promovem a queda da taxa de acumulação ou a sua manutenção
em patamares muito baixos.

Consequentemente, uma outra questão também relevante diz respeito à influência de


um ambiente macroeconômico caracterizado pela alta inflação por longos períodos de tempo.
593

Conforme o procedimento proposto por MELO e RODRIGUES JR. (1998), pode-se utilizar a
taxa de inflação como uma proxy para a instabilidade e incerteza. Os resutados da estimação
de um modelo bivariado em taxas de crescimento são dados pela Tabela 49.

INV a b.P (47)

onde INV e P são, respectivamente, o investimento produtivo e a taxa de inflação.

TABELA 49 INFLUÊNCIA DA INFLAÇÃO SOBRE O INVESTIMENTO

PERÍODOS a b R2 DW

[1966-1980] 0,10 - -
n.s.
(5,12)
[1981-2003] -0,04 0,22 1,37
n.s.
(-2,45)
[1994-2003] -0,04 0,36 2,51
n.s.
(-2,13)
O valor estimado da elasticidade-inflação do investimento estimado por MELO e
RODRIGUES JR. (1998) foi de -0,07, num modelo de co-integração. Mas esses autores
utilizaram como variável dependente o nível de investimento total (que inclui as construções
residenciais) e não realizaram testes de estabilidade estrutural, considerando o valor estimado
como válido para o período completo de estimação.

Na presente análise considera-se o investimento produtivo, isto é, sem as construções


residenciais. A conclusão, com base nos testes econométricos, é a de que o impacto da
inflação, enquanto proxy da instabilidade e incerteza, é de fato reduzido. Contrariamente ao
discurso oficial e a visão das teorias econômicas monetaristas, a inflação não se encontra entre
os principais obstáculos à retomada sustentada dos investimentos na economia brasileira.
Provavelmente o desengajamento do Estado com relação a um projeto efetivo de
desenvolvimento econômico nacional e a disponibilidade de recursos para financiamento de
longo prazo estejam exercendo muito maior influência sobre as decisões de investimento.

Uma outra maneira de abordar essa questão é proporcionada por VIDAL (2003).
Y
Segundo este autor regulacionista, a baixa da produtividade do capital pode ser
K
explicada por uma substituição do trabalho por capital que se torna excessiva com relação à
possibilidade de obtenção de ganhos de produtividade do trabalho. Esta conclusão deriva da
equação padrão de produtividade e corresponde a uma idéia de MARX. A taxa de crescimento
594

Y
da produtividade do trabalho pode ser escrita como uma função linear da intensidade do
N
K
capital . Considerando-se esta relação em taxas de variação, tem-se que:
N

Y N a. K -N + (48)

é a taxa de crescimento da produtividade global dos fatores (PGF), que corresponde ao


progresso técnico autônomo ou residual das teorias tradicionais do crescimento. Segundo
VIDAL (2003), os testes econométricos dão frequentemente um valor compreendido entre 0,3
e 0,4 para o parâmetro a. Todavia, a estimação para o caso brasileiro revela um valor mais
elevado, atingindo 0,59 para o período [1951 2003] um fato que pode estar expressando as
particularidades do processo de industrialização brasileira baseado na substituição de
importações com a implantação de bases técnicas capital intensivas (Quadro 191).

Provavelmente é isto que está por trás da queda mais acentuada da produtividade do
capital, no caso brasileiro, quando comparada às trajetórias de outros países que
experimentaram o mesmo processo. Um valor mais alto para o parâmetro a implica em uma
taxa mais elevada do progresso técnico neutro de HARROD.369 Um fato que pode estar
expressando as particularidades do processo de industrialização brasileira baseado na
substituição de importações, através da implantação de grandes indústrias capital intensivas.

QUADRO 191 ESTIMAÇÃO DO PARÂMETRO a (1951-2003)


Dependent Variable: Y/ N
Method: Least Squares
Sample: 1951 2003
Included observations: 53
Variable Coefficient Std. Error t-Statistic Prob.
K/N 0.592237 0.101411 5.839964 0.0000
R-squared 0.400741 Mean dependent var 0.024326
Adjusted R-squared 0.388991 S.D. dependent var 0.038020
S.E. of regression 0.029719 Akaike info criterion -4.157029
Sum squared resid 0.045045 Schwarz criterion -4.082679
Log likelihood 112.1613 F-statistic 34.10517
Durbin-Watson stat 1.404991 Prob(F-statistic) 0.000000

Como mencionado mais acima, VIDAL (2003) observa que « le retour à


l accumulation extensive, avec um faible taux de croissance du stock de capital et une faible
substitution du captal au travail est donc une issue endogène qui permet de sortir de la

369
O progresso técnico neutro no sentido de HARROD é aquele que mantém o coeficiente de capital (K/Y)
constante.
595

trajectoire marxienne ». Esta última traduz-se por uma tendência de queda persistente da taxa
média de lucro cujo efeito direto é derrubar a taxa de acumulação de capital e então, o
crescimento econômico.

Como observa este autor regulacionista, estudar as trajetórias da acumulação de capital


e os mecanismos de repartição de renda com as tendências da demanda é precisamente
apreender as transformações dos regimes de crescimento e verificar se são capazes de
conduzir a novos regimes. Segundo VIDAL, três formas básicas podem ser mobilizadas para
bloquear uma tendência de queda da taxa de lucro, permitindo uma saída da trajetória
marxiana:

a) aumentar a profit share e então reduzir a wage-share;

b) inverter a tendência à baixa da produtividade do capital (Y/K);

c) baixar os preços relativos dos bens de investimento.

Qual delas a economia brasileira teria feito uso ? A experiência internacional mostra
que essas três soluções não são mutuamente exclusivas ou contraditórias e cada país tende a
adotar uma combinação própria, de acordo com as suas condições estruturais e sócio-
políticas. Todavia, algumas soluções têm sérios inconvenientes por seus impactos negativos
sobre o regime de demanda.370

O progresso técnico neutro no sentido de HARROD implica que a produtividade do

capital deve ser constante e então Y K = 0. Portanto, a condição para que a produtividade

do capital não caia é equivalente à Y K > 0. Então, por operação algébrica simples chega-

se a uma expressão para o resíduo . Para facilitar a notação serão usadas letras minúsculas
no lugar das letras com pontos, para simbolizar as taxas de variação:

y n ak n

y n k ak n k

y k ak n k n

a 1 k n 0

370
VIDAL chama atenção para os casos dos EUA, Japão e França, onde se pode observar um movimento geral
de alta da razão py / pk, ou seja, uma baixa dos preços relativos dos bens de capital que está ligada ao progresso
técnico realizado nas tecnologias da informação e da comunicação (NTIC).
596

1 a k n , logo k n que é o progresso técnico neutro no sentido de


1 a
HARROD.

Em suma, y k 0 k n . Consequentemente, a condição para que a


1 a

produtividade do capital não caia pode ser expressa como k n , ou seja, o ritmo de
1 a
substituição do trabalho por capital deve ser menor ou igual ao ritmo de progresso técnico
neutro harrodiano (PTN). Por outro lado, PTN depende de , a taxa de crescimento da
produtividade global dos fatores. Se a substituição do trabalho pelo capital for muito rápida,
em razão por exemplo da inércia do crescimento do estoque de capital fixo, a produtividade
do capital irá baixar. Para a economia brasileira, a estabilização da produtividade do capital
Y
, nos anos 90, coincide com a quase estagnação da taxa de crescimento do estoque de
K
capital.

Após a estimação do parâmetro a para a economia brasileira, a Tabela 50 mostra em


taxas de crescimento, os dados para o progresso técnico no sentido de HARROD (PTN), o
produto total (Y), as produtividades do trabalho (Y/N) e do capital (Y/K) e a intensidade do
capital (K/N). Foi utilizado o valor estimado de a = 0,59 para o cálculo da taxa PTN. Os
períodos referem-se aqueles identificados nas análises econométricas precedentes. Os valores
correspondem às taxas médias anuais em cada um desses períodos.

TABELA 50 CRESCIMENTO, PRODUTIVIDADE E PROGRESSO TÉCNICO DE HARROD (1951-


2003)

Y Y K
Y PTN
N K N
[1951-1963] 6,92% 4,22% -2,52% 7,00% 0,21%

[1966-1980] 8,49% 4,75% -1,16% 5,99% 2,98%

[1984-1993] 2,84% 0,13% 0,28% -0,13% 0,50%

[1994-2003] 2,50% 1,28% 0,84% 0,44% 2,48%

Os dois primeiros períodos onde a economia brasileira apresenta as mais elevadas


taxas médias de crescimento do PIB correspondem aqueles em que os ritmos de substituição
do trabalho pelo capital são também os mais elevados. 7% para o período [1951-1963] e 6%
para [1966-1980]. Neste último, que inclui a fase do milagre , a taxa de progresso técnico no
597

sentido de HARROD atingiu a média anual de 3%. Pode-se constatar que a produtividade do
capital caiu nesses dois períodos conforme previsto pela relação (1), pois a taxa de
crescimento de K/N foi superior à taxa PTN. Apenas nos dois últimos períodos [1984-1993] e
[1994-2003] quando o ritmo de substituição do trabalho pelo capital foi menor do que a taxa
PTN é que se pode observar a recuperação da taxa média de crescimento da produtividade do
capital (Y/N).

O Gráfico 137 exibe a evolução das taxas de crescimento da intensidade do capital (ou
o ritmo de substituição do trabalho pelo capital) para a economia brasileira. A partir de 1975,
como um dos desdobramentos da crise do regime de acumulação do milagre , o crescimento
K
da razão desacelera-se rapidamente, até estagnar-se nos anos 80. Essa desaceleração
N
significa redução do crescimento do estoque de capital, conduzindo, endogenamente, a um
regime de acumulação extensiva, onde a produtividade do capital se estabiliza.

GRÁFICO 137 TAXAS DE VARIAÇÃO REAL E TENDENCIAL DA INTENSIDADE DO CAPITAL


K
- (1951-2003)
N

(k-n)_real
(k-n)_tendencial
16,00%

14,00%

12,00%

10,00%

8,00%

6,00%

4,00%

2,00%

0,00%

-2,00%

-4,00%

-6,00%
1951 1959 1967 1975 1983 1991 1999
1955 1963 1971 1979 1987 1995 2003

FONTE: Dados originais do IBGE e MARQUETTI (2000), para o nível de emprego; MORANDI (2003) e
IPEADATA, para o estoque de capital fixo.
NOTA: k e n são, respectivamente, as taxas de crescimento do estoque de capital fixo K e do nível geral de
emprego N.
598

O Gráfico 138 mostra a dinâmica da produtividade do trabalho em série real e


tendencial, para a economia total. Com a recuperação da taxa de crescimento da produtividade
do capital nos anos 90, que se pode constatar no gráfico anterior, a produtividade do trabalho
também se recupera. Mantém-se sob taxas positivas até 1998/99, quando a crise cambial e a
elevação das taxas de juros impõem uma forte redução do produto.

GRÁFICO 138 GANHOS DE PRODUTIVIDADE DO TRABALHO- SÉRIE REAL E TENDENCIAL


(1951-2003)

(y-n)_real
(y-n)_tendencial
12,00%

10,00%

8,00%

6,00%

4,00%

2,00%

0,00%

-2,00%

-4,00%

-6,00%

-8,00%
1951 1959 1967 1975 1983 1991 1999
1955 1963 1971 1979 1987 1995 2003

FONTE: Dados originais do IBGE e MARQUETTI (2000), para o nível de emprego; IPEADATA, para o PIB.

NOTA: y e n são, respectivamente, as taxas de crescimento do produto e do nível de emprego.

A baixa da eficiência do investimento é uma das expressões da queda da produtividade


do capital.371 O Gráfico 139 mostra sua evolução para a economia brasileira no período
[1944-2000]. Como esta série é muito sensível aos ciclos conjunturais, utilizou-se uma média
móvel de 9 anos para remover as oscilações de curto prazo. O Gráfico também mostra a série
tendencial, onde se constata que houve uma recuperação da eficiência do investimento nos
anos 90, em termos tendenciais.

371
VIDAL observa que como a redução da eficiência do investimento acompanhou a queda da eficiência do
capital, não se pode atribuir esta última a problemas relacionados à construção das séries do estoque de capital.
599

Y
GRÁFICO 139 EFICIÊNCIA DO INVESTIMENTO NA ECONOMIA BRASILEIRA (1944-
I
2000)

dY / I
0,8

0,7

0,6

0,5

0,4

0,3

0,2

0,1
1944 1952 1960 1968 1976 1984 1992 2000
1948 1956 1964 1972 1980 1988 1996

FONTE: IPEADATA, para o PIB e investimento.

A baixa dos preços relativos dos bens de investimento abre a possibilidade para uma
intensificação da acumulação, pois ela permite elevar a produtividade do capital em volume.
Em conseqüência, o ritmo de substituição do trabalho pelo capital pode ser mais elevado do
que o progresso técnico no sentido de HARROD e sem que a taxa de lucro caia. É exatamente
este argumento que VIDAL (2003, p. 17) mobiliza para explicar a aceleração dos ganhos de
produtividade nos EUA ao longo dos anos 90. A recuperação dos ganhos de produtividade é
uma decorrência da passagem para um novo regime de acumulação intensiva, baseado nas
novas tecnologias da informação e da comunicação e na redução dos preços dos bens de
capital.
600

GRÁFICO 140 INTENSIDADE DO CAPITAL E PRODUTIVIDADE DO TRABALHO (1980-2003)

K/N(L)
Y/N(R)
3,7 2,9
2,9
3,7
2,8
3,7 2,8
2,8
3,7
2,8
3,7 2,8
2,7
3,6
2,7
3,6 2,7
2,7
3,6
2,7
3,6 2,6
1980 1982 1984 1986 1988 1990 1992 1994 1996 1998 2000 2002

FONTE: Dados originais do IBGE e MARQUETTI (2000), para o nível de emprego; MORANDI (2003) e
IPEADATA, para o estoque de capital fixo.
NOTA: Os valores estão em logaritmos.

O Gráfico 140 mostra que nos anos 90, a produtividade do trabalho (Y/N) cresceu em
decorrência do aumento da intensidade do capital (K/N), ou seja, os ganhos de produtividade
foram obtidos principalmente por substituição de trabalho por capital.

5.10 Os determinantes da taxa de poupança na abordagem Aglietta-Vidal


Esta seção explicita a abordagem proposta por AGLIETTA (2001) e VIDAL (2003)
para os determinantes da taxa de poupança. Em razão das limitações de dados quanto ao
estoque de riqueza das famílias, não serão realizados testes empíricos para verificar as
hipóteses dessa abordagem no caso brasileiro372. O principal objetivo é proporcionar mais um
aporte teórico a uma problemática fundamental aos regimes de acumulação e crescimento,
deixando as evidências empíricas para futuras pesquisas.

VIDAL (2003) observa que há um consenso na constatação de que a alta das taxas de
juros reais nos anos 80 foi acompanhada por uma baixa da taxa de poupança. Segundo este
autor, este fato estilizado fragiliza a teoria neoclássica em sua expressão mais simples.

372
POCHMANN em recente estudo, Os Ricos no Brasil , observa que há grande dificuldade para se obter
dados sobre o estoque de riquezas das famílias.
601

Parte-se do pressuposto de que o estoque de riqueza ( poupança ) acumulada é


principalmente destinado a ser uma reserva de poder de compra que serve para manter o nível
de vida em caso de baixa imprevista das rendas. VIDAL recupera a hipótese simplificadora de
AGLIETTA (2001, p. 11), segundo a qual a riqueza acumulada (W) deve ser proporcional à
renda disponível das famílias (Yd):

W a.Y d (49)

O parâmetro (a) representa a razão desejada de riqueza a ser acumulada com relação
ao fluxo de renda corrente.

A taxa de poupança (s) pode ser escrita da seguinte forma:

s
S W
=
W Y d
, o que implica que s a. y , ou seja a taxa de poupança é
Y d Y d Y d Yd

proporcional a taxa de crescimento da renda. Contudo, empiricamente pode ser constatado


que em caso de uma queda da renda, a taxa de poupança cai a um ritmo menor, porque a razão
(a) se eleva para compensar a baixa da renda e manter inanlterado o padrão de vida. Este
fenômeno pode ocorrer em uma situação de crise ou recessão induzida por um regime
monetário-financeiro à elevada restrição. Consequentemente, a elevação de (a) provoca um
aumento da taxa de poupança ou freia sua baixa, no caso de queda da renda. Por outro lado, o
W
aumento temporárioa da razão abaixo da razão desejada (a), em caso de aumento real
Y d

imprevisto dos preços dos ativos, incita as famílias a poupar menos e faz baixar a taxa de
poupança (s) para reencontrar a razão desejada. É este um fato estilizado típico das fases de
financeirização, onde as famílias (e também as empresas do setor produtivo com coeficiente
elevado de financeirização) tendo acesso aos ganhos nos mercados financeiros globalizados
tendem a reduzir a taxa de poupança. 373 AGLIETTA observa que a liberalização financeira
provocou os dois fenômenos, um permanente e outro temporário:

La carence à les distinguer a entraîné les plus grandes ambigüités dans les
diagnostics portés sur l épargne des ménages ».
A variação da riqueza W depende do fluxo de poupança (S) e do comportamento dos
preços dos ativos (PA):

373 AtivosFinanceiros
O coeficiente de financeirização pode ser formulado em termos gerais como a razão
( AtivosTotais )
das famílias e empresas não-financeiras. Para uma indústria, por exemplo, o crescimento desta razão tende a ter
impactos consideráveis sobre as decisões de investimento produtivo e acumulação de capital fixo.
602

W S PA

S W PA
-
Y d Y Y d d

W Y d PA
, mas Y d
é a variação da renda nominal que pode ser
Y d Y d Y d

W
decomposta em variação real e variação de preços. E como a , a taxa de poupança
Y d

pode ser escrita como:

S PA
s a. y+ p - .
Y d Y d

Da última equação acima se conclui que:

a) a médio prazo, a taxa de poupança é uma função da taxa de crescimento da


renda: quanto mais aumenta a renda real, mais a reserva de poder de compra deve
ser acrescida pela poupança.374 Mas a curto prazo essa relação também existe, pois
as variações da taxa de poupança servem para amortecer as variações da renda
disponível e manter a progressão do consumo;

b) a taxa de poupança é também função crescente da inflação: a alta dos preços


desvaloriza os ativos monetários ou quase-monetários provocando um esforço de
poupança para recontituir seu poder de compra (efeito de encaixe real);

c) o terceiro fator que age sobre a taxa de poupança são os ganhos realizados
graças à alta dos preços dos ativos financeiros. Eles têm por efeito reduzir as taxas
de poupança pois permitem aumentar a riqueza sem esforço de poupança (efeito
riqueza).

374
Segundo VIDAL, as séries longas construídas por A. MADDISON (1992) confirmam esta relação entre o
crescimento da renda e a poupança.
603

5.11 A evolução das tendências da demanda agregada: o regime de demanda


Os capitalistas podem decidir quanto investirão e
consumirão no próximo ano, mas não podem
decidir a respeito de quanto serão suas vendas e
seus lucros.
(M. KALECKI, 1977)375
I think I paid too little attention to the problem of
effective demand.
(Robert SOLOW; 1988).376
Como argumentado acima, o aumento da razão K/N pode abrir espaço para a
emergência de um novo regime de acumulação intensiva. Todavia, como a economia
brasileira permaneceu num processo de quase-estagnação, em razão da própria lógica do
modelo de estabilização de preços, esse ganhos de produtividade devem ser considerados
estáticos, pois não contribuíram para elevação da taxa de acumulação de capital. Um dos
resultados diretos foi o baixo crescimento econômico que marcou esse período.

Segundo VIDAL (2003, P. 19):

Dans le nouveau régime d accumulation intensive fondé sur les NTIC, les gains de
productivité globale des facteurs sont surtout localisés dans les secteurs produisnt les
NTIC, et ils contribuent à accroître quelque peu le trend de progrès techique
macroéconomique ; ils entraînant de plus une baisse rapide du prix des biens des
capitaux, qui améliore le taux de profit, et permet de rentabiliser une croissance plus
rapide du stock de capital et du capital par emploi. Les auteurs qui ne prennent pas en
compte le rôle du taux de profit ou du coefficient de capital (inverse de la productivité
du capital) dans la croissance, négligent le fait que la baisse du prix réel des biens des
capitaux diffuse à l ensemble de l économie les gains d efficacité réalisée dans le
secteur produisant les NTIC, par un processus tout à fait traditionnel, la hausse du
taxu d accumulation, qu elle rend moins coûteuse. »
O fato da economia brasileira nos anos 90 ter acessado as novas tecnologias e
processos de gestão, com conseqüentes ganhos substanciais de produtividade, sem conseguir
elevar sua taxa de acumulação de capital é um fato estilizado no sentido kaldoriano e que
precisa ser explicado.

Uma alternativa de abordagem dessa problemática parte do reconhecimento de que um


regime de acumulação ou de crescimento é um resultado da associação entre um regime de
produtividade e um regime de demanda. Até agora a ênfase das análises recaiu sobre os
determinantes da produção e da produtividade sem considerar explicitamente os

375
Citado por BELLUZZO e ALMEIDA (2002).
376
Citado por BOYER (1998).
604

determinantes da demanda.377 E no caso brasileiro, o regime de demanda permaneceu


deliberadamente contido pela lógica da estabilização de preços do período pós-Plano Real e
isto necessariamente tem impactos negativos sobre a evolução da taxa de acumulação de
capital. O Gráfico 141 mostra a forte correlação entre as variações da demanda interna (Y+M-
X) e as variações da taxa de acumulação de capital (I/K). O Gráfico 143 exibe as mesmas
séries suavizadas pelo filtro 4253H para se obter um comportamento tendencial.

GRÁFICO 141 DINÂMICA DA DEMANDA INTERNA E DA TAXA DE ACUMULAÇÃO DE


CAPITAL SÉRIES REAIS (1950-2003)

Taxa de crescimento da demanda interna = d (Y+ M - X) (L)


Taxa de variação da taxa de acumulação = d (I / K) (R)
0,16 0,30
0,14
0,12 0,20
0,10
0,08 0,10
0,06
0,04 0,00
0,02
0,00 -0,10
-0,02
-0,04 -0,20
-0,06
-0,08 -0,30
1950

1954

1958
1960
1962
1964
1966
1968
1970
1972
1974
1976
1978
1980
1982
1984
1986
1988
1990
1992
1994
1996
1998
2000
2002
1952

1956

FONTE: Com exceção do estoque de capital estimado por MORANDI (2003), os demais dados foram obtidos no
IPEADATA e originários do IBGE.
O Quadro 192 mostra as correlações entre a demanda interna e a taxa de acumulação
nos três períodos identificados pelas análises econométrias precedentes. No primeiro período,
que inclui a fase de forte crescimento do milagre , a correlação é alta e estatisticamente
significativa (r = 0,66), mas o valor de 0,43 para o R2 pode estar expressando o fato de que
outras variáveis contribuíram para a elevada taxa de acumulação deste período. Os testes
econométricos precedentes mostraram que a esta época, um regime de acumulação profit-led
foi a base das tendências macroeconômicas observadas, precisamente porque a taxa de

377
Segundo VIDAL, o papel da demanda é frequentemente negligenciado nas análises tradicionais do
crescimento econômico, como se os problemas estruturais e macroeconômicos tivessem sua origem sempre no
plano da produção e da oferta. É claro que essa forma de abordagem é herdeira de uma tradição do pensamento
econômico que foi fortemente influenciada pelas concepções ricardianas em termos de lei dos mercados de Say.
605

investimento era altamente sensível à taxa de lucro. Nestas condições um aumento da profit
share resultava em uma expansão da demanda agregada e então da taxa de acumulação de
capital

O segundo período, [1984-1993], caracteriza-se pelas tendências estagnacionistas e a


alta inflação, embora se observe uma fase de expansão entre 1984-1986. O fato é que a
correlação entre essas variáveis permanece e ainda mais alta (0,89) e estatisticamente
significativa. Inclusive a elasticidade da taxa de acumulação com relação à demanda interna
mantém-se também elevada (2,18).

No terceiro período, [1994-2003], a correlação entre essas variáveis não é mais


estatisticamente significativa a 5% (p-valor = 0,073), o que pode estar expressando a reduzida
sensibilidade da taxa de acumulação às variações da demanda interna.

GRÁFICO 142 DINÂMICA DA DEMANDA INTERNA E DA TAXA DE ACUMULAÇÃO DE


CAPITAL SÉRIES TENDENCIAIS (1950-2003)

Série tendencial de d (Y + M - X) (L)


Série tendencial de d( I / K ) (R)
0,14 0,08
0,06
0,12
0,04

0,10 0,02
0,00
0,08 -0,02
-0,04
0,06
-0,06
0,04 -0,08
-0,10
0,02 -0,12
-0,14
0,00
-0,16
-0,02 -0,18
1950

1954

1958
1960
1962
1964
1966
1968
1970
1972
1974
1976
1978
1980
1982
1984
1986
1988
1990
1992
1994
1996
1998
2000
2002
1952

1956

FONTE: Com exceção do estoque de capital estimado por MORANDI (2003), os demais dados foram obtidos no
IPEADATA e originários do IBGE.
606

QUADRO 192 CORRELAÇÕES ENTRE AS VARIAÇÕES DA DEMANDA INTERNA d(Y+M-X) E


DA TAXA DE ACUMULAÇÃO DE CAPITAL d(I / K) [1966-2003]

[1966-1980] r² = 0,43; r = 0,66, p = 0,0079; y = -0,13 + 1,70*x

[1984-1993] r² = 0,80 r = 0,89, p = 0,0005; y = -0,09 + 2,18*x

[1994-2003] r² = 0,35; r = 0,59, p = 0,0729; y = -0,05 + 2,23*x

NOTA: y = variação da taxa de acumulação de capital (I/K); x = variação da demanda interna (Y+M-X)

Um exame da questão da causalidade entre essas variáveis é relevante numa análise


dos determinantes do crescimento econômico. O Quadro 193, a seguir, mostra os testes de
causalidade de Granger realizados para os três períodos em questão. Os resultados mostram
que, tanto no primeiro quanto no terceiro períodos, há precedência das variações da demanda
interna com relação às variações da taxa de acumulação de capital e portanto, pode-se dizer
que a demanda interna causa-Granger a taxa de acumulação .

Quanto ao segundo período, conforme analisado, trata-se de um período de crise. Na


taxionomia proposta por GAFFARD (2001) e aplicada nas seções precedentes, foi constatado
que se tratava de um regime de crise ou de contração e então não se poderia esperar macro-
regularidades estáveis que mantivessem o vínculo dinâmico entre demanda e acumulação.

QUADRO 193 TESTES DE CAUSALIDADE DE GRANGER PARA A DEMANDA INTERNA E A


TAXA DE ACUMULAÇÃO DE CAPITAL (1966-2003)

Pairwise Granger Causality Tests


Período: [1966 - 1980]
Lags: 3
Null Hypothesis: Obs F-Statistic Probability
L( I / K) does not Granger Cause LDI 15 1.45835 0.29700
LDI does not Granger Cause L(I / K) 6.69742 0.01422
Período: [1984 - 1993]
Lags: 2
Null Hypothesis: Obs F-Statistic Probability
L( I / K) does not Granger Cause LDI 10 4.31193 0.08160
LDI does not Granger Cause L(I / K) 4.36281 0.08009
Período: [1994 - 2003]
Lags: 3
Null Hypothesis: Obs F-Statistic Probability
L( I / K) does not Granger Cause LDI 10 0.52660 0.69421
LDI does not Granger Cause L(I / K) 24.1795 0.01327
NOTA: L (I/K) e LDI são, respectivamente, o logartimo da taxa de acumulação de capital e
da demanda interna.
607

5.12 Indicadores das tendências da demanda


A Tabela 51 mostra a evolução dos componentes da demanda agregada para o período
(1950-2003). Destaca-se a queda do consumo das famílias de período a período. A
participação média cai de 72,5%, no período 1950-1963, para 60,5% do PIB, entre 1994-
2003. Quanto à formação bruta de capital fixo, a participação média mensurada em termos
nominais permaneceu estável nos três últimos períodos. Todavia, na Tabela 52, a mensuração
em valores constantes mostra que de fato ocorrreu queda expressiva da participação média do
investimento produtivo e do investimento total.

TABELA 51 COMPONENTES DA DEMANDA AGREGADA - % DO PIB (1950-2003)


Preços correntes

Saldo
Consumo das Gastos do
Período FBKF Externo
famílias governo
(X-M)

[1950-1963]
72,5 11,6 16,2 -0,4
[1966-1980]
69,5 10,3 21,7 -1,5
[1984-1993]
61,1 14,4 21,2 3,3
[1994-2003]
60,5 19,1 21,0 -0,6

NOTA: Os valores referem-se às participações médias nos períodos.

TABELA 52 INVESTIMENTO PRODUTIVO E INVESTIMENTO TOTAL EM % (1950-2003)


Preços constantes de 2000

MaqEq ConstrNR FBKF var estoq FBKF var estoq


Período
FBKFtotal PIB PIB

[1950-1963]
72,3 25,6 24,1
[1966-1980]
75,2 30,8 29,0
[1984-1993]
69,0 21,4 20,9
[1994-2003]
59,4 21,1 19,4

NOTA: MaqEp + ConstrNR = formação bruta em máquinas e equipamentos e construção não-residencial;


FBKF+ vr.estoq = formação bruta de capital fixo mais variações de estoques.

Um fato a ser destacado refere-se à tendência de queda acentuada da participação do


investimento em máquinas e equipamentos, a partir de 1977, que é acompanhada pela
608

elevação da razão taxa de lucro / taxa de acumulação de capital (Gráfico 143). No mesmo
período, a renda líquida do Governo (impostos indiretos + impostos diretos + outras receitas
correntes subsídios e transferências) expande-se fortemente como proporção do PIB,
enquanto caem a renda disponível e o consumo das famílias (Gráfico 144). Essas
regularidades macroeconômicas expressam os desdobramentos da crise do regime de
acumulação profit led do período 1966-1980 e os ajustes impostos pelo Estado com vistas a
equacionar o problema da dívida externa.

GRÁFICO 143 PARTICIPAÇÃO DAS MÁQUINAS E EQUIPAMENTOS NO TOTAL DA FBKF E


RAZÃO TAXA DE LUCRO/ TAXA DE ACUMULAÇÃO (1950-2003)

Máquinas e equipamentos / Total da FBKF (L)


Razão taxa de lucro / Taxa de acumulação de capital (R)
84% 6,5
82%
6,0
80%
78% 5,5
76%
74% 5,0
72%
4,5
70%
68% 4,0
66%
3,5
64%
62% 3,0
60%
58% 2,5
56%
2,0
54%
52% 1,5
1950
1952
1954
1956
1958
1960
1962
1964
1966
1968
1970
1972
1974
1976
1978
1980
1982
1984
1986
1988
1990
1992
1994
1996
1998
2000
2002

FONTE: Metodologia de construção das séries no anexo.

BELLUZZO e ALMEIDA (2002) mostram o modo como as intervenções do Estado


brasileiro nos anos 80 visavam o restabelecimento da rentabilidade do setor privado, buscando
recuperar a taxa de lucro das firmas altamente endividadas. Em termos regulacionistas,
tratava-se também de implantar um novo regime de política econômica necessário à geração
de excedentes comerciais para fazer frente ao financiamento do passivo externo brasileiro.
Esses autores observam que esse regime de política econômica estabelecido entre 1980 e
1984, que visava responder à crise externa, foi responsável não só pela maior recessão já
609

vivida pelo país até então, como desencadeou mudanças e processos que iriam influenciar a
economia ao longo dos anos 80 e primeira metade dos 90. 378

GRÁFICO 144 RENDA LÍQUIDA DO GOVERNO, RENDA DISPONÍVEL E CONSUMO DAS


FAMÍLIAS EM % DO PIB (1950-2002)

Renda líquida do governo / PIB (L)


Renda disponível / PIB (R)
Consumo das famílias / PIB (R)
30% 95%
28% 90%
26%
85%
24%
80%
22%
20% 75%

18% 70%
16%
65%
14%
60%
12%
10% 55%

8% 50%
1950
1952
1954
1956
1958
1960
1962
1964
1966
1968
1970
1972
1974
1976
1978
1980
1982
1984
1986
1988
1990
1992
1994
1996
1998
2000
2002
FONTE: Estatísticas do Século XX / IBGE.

O Gráfico 145 mostra que, em termos gerais, as fases de expansão da wage-share


líquida de impostos coincidiram com as fases de crescimento do déficit público. Este tipo de
comportamento é de fato esperado em uma economia onde o setor público tem uma
participação ainda significativa. De acordo com VIDAL (2003), trata-se de uma expressão de
características da regulação monopolista ou administrada que permanece sob o paradigma
sócio-técnico pós-fordista.

378
BELLUZZO e ALMEIDA (2002), em Depois da Queda a economia brasileira da crise da dívida aos
impasses do Real, Ed. Civilização Brasileira, 2002. Segundo os autores (p.97 e 98): o ajustamento, longe de
impedir a sobrevivência empresarial, patrocinou a reestruturação corrente e patrimonial do grande capital, ao
mesmo tempo em que provocava o desequilíbrio do setor público. (...). O descompasso entre a acumulação de
capital real e a acumulação de direitos sobre a riqueza (acumulação financeira), por parte do setor empresarial
e dos rentistas, promoveu a aguda instabilidade e desencadeou a crise monetária, marca registrada da
economia brasileira por um longo período.
610

GRÁFICO 145 MASSA SALARIAL LÍQUIDA DE IMPOSTOS DIRETOS E DÉFICIT


OPERACIONAL DO GOVERNO EM % DO PIB (1950-2002)

Massa salarial real líquida de impostos diretos / PIB (L)


Déficit operacional / PIB (R)
58% 4%

56% 2%
54%
0%
52%
-2%
50%

48% -4%

46% -6%
44%
-8%
42%
-10%
40%

38% -12%

36% -14%
1950
1952
1954
1956
1958
1960
1962
1964
1966
1968
1970
1972
1974
1976
1978
1980
1982
1984
1986
1988
1990
1992
1994
1996
1998
2000
2002
FONTE: Metodologia de construção das séries no anexo e Estatísticas do Século XX / IBGE.

GRÁFICO 146 SALDO EXTERNO E DÉFICIT OPERACIONAL EM % DO PIB (1950-2002)

Saldo externo / PIB (L)


Déficit operacional / PIB (R)
8% 4%

7% 2%
6% 0%
5%
-2%
4%
-4%
3%
-6%
2%
-8%
1%

0% -10%

-1% -12%

-2% -14%
1950
1952
1954
1956
1958
1960
1962
1964
1966
1968
1970
1972
1974
1976
1978
1980
1982
1984
1986
1988
1990
1992
1994
1996
1998
2000
2002

FONTE: Estatísticas do Século XX / IBGE.

Pelo exame do Gráfico 146 pode ser constatado que a fase de crescimento
correspondente à implantação do Plano de Metas (1955-1961) caracterizou-se pela
estabilidade, em termos médios, das participações do saldo externo (X-M) e das necessidades
611

de financiamento do setor público como percentagem do PIB. A partir de 1966, essas


participações crescem como resultado da forte absorção de poupança externa para financiar os
grandes projetos de investimento do regime arbitrário pós-1964. Em quase todo o período
descrito neste gráfico, as séries evoluem sob correlação positiva. Em termos tendenciais, esta
constatação fica ainda mais patente. Todavia, a desconexão entre as séries é observada a partir
de 2000, em razão do forte ajuste fiscal exigido pelos organismos internacionais cujas
pressões levaram o Estado brasileiro a praticar superávits primários extremamente penosos
por seus impactos negativos sobre a evolução da renda e do emprego.

Em Régulation et croissance, BILLAUDOT (2001, p. 281) observa que os regimes do


tipo finance led growth tendem a ser instáveis pelas seguintes razões: vigência de uma
regulação neo-concorrencial dos salários e dos preços, num contexto em que os ganhos de
produtividade são obtidos às expensas do emprego. Disto resulta que o crescimento da
produtiviade tende a superar a expansão da massa salarial. Nas palavras do próprio autor: la
productivité a um effet positif sur les profits. Comme ces derniers déterminent pour une part
les cours, la productivité impulse donc à la hausse à la fois l investissement et la
consommation (via l effet de richesse). Mais cela est insuffisant, (...) pour contrecarrer l effet
négatif de la productivité sur la consommation qui passe par l emploi. Au total, on retrouve
un régime de demande à pente négative », e, portanto, incapaz de sustentar dinamicamente o
regime de produtividade.

QUADRO 194 - ESTIMAÇÃO DA RELAÇÃO ENTRE PR E CF (1993-2003)


Dependent Variable: D(LC)
Method: Least Squares
Sample: 1995 2003
Included observations: 9
Variable Coefficient Std. Error t-Statistic Prob.
D(LPR) 0.825822 0.297486 2.776004 0.0241
R-squared 0.175509 Mean dependent var 0.017829
Adjusted R-squared 0.175509 S.D. dependent var 0.024041
S.E. of regression 0.021830 Akaike info criterion -4.706638
Sum squared resid 0.003812 Schwarz criterion -4.684724
Log likelihood 22.17987 Durbin-Watson stat 1.619868

NOTA: D(LCF) = primeiras diferenças do log do consumo final das famílias;


D(LPR) = primeiras diferenças do log da produtividade aparente do trabalho (PIB / N).

Um teste econométrico para a relação de curto prazo entre os ganhos de produtividade


e as variações do consumo final das famílias mostra que o coeficiente relativo à elasticidade-
produtividade do consumo é estatisticamente significativo a 5% com o valor de 0,83 (Quadro
194). Portanto, para o caso brasileiro atual, o efeito da produtividade sobre o consumo
612

agregado não é negativo. Todavia, permanece o problema da desconexão entre o investimento


e a taxa de lucro.

5.13 A economia brasileira em financeirização forçada


Em um trabalho original que já se tornou famoso por suas contribuições, CASTRO e
SOUZA (1985)379 sustentaram a hipótese de que a economia brasileira foi levada a ingressar
num longo período de marcha forçada , para responder à crise de 1974. Este processo
implicou na manutenção por parte do Estado de taxas excepcionalemente altas de
investimento, apesar das dificuldades trazidas pelo esgotamento do regime de crescimento do
milagre . Em razão dessa opção, os bons resultados macroeconômicos em termos do balanço
de pagamento puderam ser colhidos em inícios dos anos 80.

A presente análise procurará mostrar que no período pós-abertura e pós-Real, a


economia brasileira encontra-se num outro tipo de marcha que, contrariamente ao anterior,
não se traduz por um esforço de novos investimentos em ampliação da capacidade produtiva.
Parafraseando CASTRO e SOUZA, a economia brasileira da era do Real é uma economia em
financeirização forçada e incapaz de encontrar as condições estruturais para uma retomada
sustentada da taxa de acumulação de capital e então, do crescimento econômico. Pode crescer
por períodos curtos e sob taxas historicamente inferiores à média histórica. Mas não pode
garantir taxas crescentes de acumulação, sem o aval das expectativas dos mercados
financeiros com sua pressão para a elevação periódica das taxas de juros. Consequentemente,
nas atuais condições estruturais não há garantias de que a economia brasileira possa desfrutar
de uma expansão forte e durável, necessária à retomada de seu processo de desenvolvimento.

O conceito de financeirização das economias difunde-se a partir do processo de


globalização na década de 90, quando uma sucessão de crises financeiras [México (1995),
Ásia(1997), Rússia(1998), Brasil(1999)] ao expor sua dimensão desestabilizadora, levantaria
dúvidas quanto às possibilidades de um crescimento forte e durável sob condições de
liberalização ampla da conta de capitais. Desde então vários autores [AGLIETTA (2001);
CHESNAIS(1997); ORLÉAN (1999), BOYER (2000); LORDON (2000); STIGLITZ (2002)]
passariam a assumir uma postura mais crítica quanto aos aspectos supostamente positivos
desse processo, sobretudo no que concerne à constituição de regimes de crescimento
macrodinamicamente estáveis.

379
Antonio Barros de Castro e Franciso Eduardo Pires de Souza. A Economia Brasileira em Marcha Forçada. 3ª
edição. Paz e Terra, 2004.
613

Em outros termos tratava-se de investigar as condições macroeconômicas de


viabilidade de regimes de acumulação à dominante financeira ou regime de crescimento
financeirizado380. As economias teriam de enfrentar uma nova configuração sistêmica onde a
gestão da poupança coletiva convertera-se numa forma institucional que permite às finanças
impor sua lógica aos demais atores econômicos. Neste contexto, as margens de rentabilidade
dos setores diretamente produtivos são pressionadas para cima, de maneira a responder a
ponction rentiste (punção rentista) dos mercados financeiros, com conseqüências diretas
sobre as decisões de investimento e portanto sobre o ritmo de acumulação de capital.

A idéia de ponction rentiste tem sido utilizada pelas análises em termos de regulação
para caracterizar a dependência estrutural dos setores não-financeiros com relação às finanças.
MIOTTI (1991), por exemplo, a mobiliza no contexto da economia argentina para explicitar o
modo como as transferências financeiras líquidas (endividamento novo menos encargos de
juros) se constituem em uma punção rentista que limita a gestão do Estado ao reduzir
drasticamente a autonomia da política econômica. No mesmo sentido, FURTADO (2003)
chamara a atenção para o fato de que a economia e o Estado brasileiros estariam funcionando
prioritariamente para pagar juros.

Segundo BOYER (1998, p.56), um regime do tipo finance led growth ou regime de
acumulação financeirizado - não tem sua estabilidade garantida. Para este autor
regulacionista, as características principais de uma economia na qual as finanças teriam
imposto sua lógica são as seguintes:

i. a taxa interna de retorno deve ser mais alta para responder as exigências dos
investidores institucionais e demais acionistas. O modo de governança das firmas é
afetado, bem como o volume, a direção e o modo de financiamento do investimento;

ii. os dirigentes são premidos a revisar a maior parte de seus métodos de gestão,
concernentes às reações aos ciclos econômicos, ao grau de especialização ou ainda à
natureza do compromisso capital-trabalho. O conjunto dos componentes devem ser re-
calibrados para dar conta das exigências em termos de nível e estabilidade da taxa de
rendimento para os acionistas. A forma institucional da concorrência e a configuração

380
Segundo CHESNAIS, « le coup d État qui a ouvert la voie à la dictature des créanciers , au sens élargi d
André Orléan (1999), aurait été impossible sans les politiques de libéralisation, de déréglementation et
privatisation, pas simplement dans le domaine de la finance, mais aussi des IDE et des échanges de
marchandises et de services ». No período 1980-1995 observa-se a devolução ao mercado de setores ou grandes
atividades de serviços que haviam sido incluídos no setor público desde o pós-Segunda Guerra. Para
CHESNAIS, numa perspectiva neo-marxista, « la prétention à l autonomie de la finance a pour fondement une
extension très forte à la sphère géopolitique, mais aussi sociale, du règne de la marchandise ».
614

da WLN são então diretamente afetados, por exemplo, a exigência de flexibilidade se


traduz pelo estabelecimento de novas formas de contrato salarial;

iii. O comportamento das famílias transforma-se notadamente com relação ao padrão


observado no pós-Guerra. A renda salarial continua a ser um componente essencial da
remuneração, mas as perspectivas de ganhos nos mercados financeiros exercem uma
influência direta sobre a arbitragem entre poupança e consumo. As famílias investem
em fundos de pensão, alocam sua poupança diretamente nos mercados financeiros ou
aderem a diversos planos de poupança a nível das empresas que as empregam.
Segundo BOYER, é esta a razão pela qual este regime de crescimento é qualificado de
patrimonial , uma vez que a riqueza , tal como ela é avaliada pelos mercados
financeiros tende a se tornar uma componente importante do consumo de bens
duráveis e da aquisição de habitação e de endividamento junto aos bancos. Estas novas
regularidades podem induzir uma dinâmica do consumo sem precedentes. Um
exemplo notável foi a economia dos EUA entre 1992 e 1998;

iv. As relações Estado-economia são consideravelmente transformadas em múltiplas


dimensões. Inicialmente, as dificuldades para reduzir os déficits públicos ao longo dos
anos 90, conduziram a um forte endividamento, de maneira que as despesas do Estado
tornam-se progressivamente mais sensíveis aos níveis das taxas de juros reais sobre os
títulos públicos. Paralelamente, os mercados financeiros atribuem uma grande
importância à manutenção de déficits públicos em estreitos limites. Mas como a base
de tributação não se expande mais como no imediato pós-Guerra, emerge uma forte
pressão para a racionalização das despesas públicas. Neste contexto, o aumento da
mobilidade dos capitais provoca um redirecionamento da carga tributária para os
fatores mais imóveis, tal como o trabalho e os ativos imobiliários;

v. Uma questão muito relevante refere-se ao fato de que sob o atual regime de
crescimento, o orçamento tende a ser pró-cíclico e não mais anti-cíclico conforme um
regime do tipo keynesiano;

vi. A política monetária não tem mais por função assegurar o melhor mix entre
crescimento e inflação, mas sim pilotar da melhor forma a evolução dos mercados
financeiros, mantendo-se sempre de prontidão face aos comportamentos especulativos
que o Banco Central tenta conter. De fato, é a estabilidade dos mercados financeiros, e
não a estabilidade de preços, que se torna o critério cardinal;
615

vii. As dificuldades de financiamento dos sistemas de seguridade social por repartição, o


envelhecimento da população e a fragilidade dos sistemas de aposentadoria, são
fatores que suscitaram a emergência dos seguros privados e o recurso à capitalização.
Trata-se de uma mudança que afeta diretamente a configuração da WLN;

viii. Todos os componentes da demanda agregada são afetados pela dominância da


lógica financeira. As decisões quanto ao investimento produtivo se tornam mais
prudentes porque se deve levar em conta um fluxo durável de rentabilidade mais
elevado que no passado. O consumo das famílias torna-se mais volátil em razão da
maior sensibilidade da remuneração à situação econômica geral e ao caráter mais
restritivo dos regimes monetários e das despesas públicas. Se de um lado o acesso ao
crédito é facilitado, de outro os custos do financiamento são condicionados pelas
movimentos e incertezas dos mercados financeiros.

O modelo proposto por BOYER (1998)381 para uma economia financeirizada ou


patrimonial conduzem aos seguintes resultados, considerados ainda provisórios pelo autor:

Quando os efeitos patrimoniais são muito desenvolvidos e os mercados


financeiros induzem a generalização de decisões de investimento fortemente
determinadas pela rentabilidade, então pode existir um regime virtuoso de
crescimento financeirizado. Num tal regime, uma elevação da norma de
rentabilidade tem um efeito favorável sobre a demanda, desde que o efeito
acelerador seja significativo;

Se, pelo contrário, a financeirização intervém em uma economia ainda


dominada pela sociedade salarial, isto é, uma economia onde a renda do
trabalho é um determinante essencial do modo de consumo, então uma elevação
da norma de rentabilidade tem um impacto negativo;

As configurações são viáveis apenas se a WLN não for predominantemnte


concorrencial, isto é, se a remuneração real dos assalariados não é condicionada
de forma determinante pela evolução da demanda. Este resultado mostra que
muita flexibilidade da WLN prejudica a estabilidade macroeconômica;

Existe um limiar para a rentabilidade exigida pelos mercados financeiros: um


limite superior se o efeito acelerador do investimento é fraco e um limite
inferior se ele for forte. Aparece assim um limite ao poder dos mercados

381
Esse modelo não será exposto aqui. Mis detalhes podem ser encontrados em BOYER (1998).
616

financeiros que, se ele não é respeitado, introduz-se uma série de patologias


macroeconômicas (inexistência de equilíbrio ou instabilidade);

Uma reivindicação salarial elevando a remuneração de forma exógena tem


influência positiva sobre a atividade econômica apenas se a condição de
estabilidade está sendo preenchida;

O desenvolvimento dos mercados financeiros amplia a zona do regime


patrimonial mas, simultaneamente, ele aproxima a economia da zona de
instabilidade estrutural. Existe então um limite a partir do qual a
financeirização desestabiliza o equilíbrio macroeconômico;

Para estabilizar um regime financeiro, é preciso que as reações do instituto de


emissão sejam suficientemente rápidas para prevenir o estouro das bolhas
financeiras .

O exame do Gráfico 147 mostra o modo como evoluiu a razão entre a taxa de
r
acumulação de capital e a taxa de lucro , juntamente com a taxa de ociosidade 1 u na
g
economia brasileira, entre 1950 e 2003. Até meados dos anos 80, os comportamentos
r
tendenciais da taxa de ociosidade e da razão são muito próximos. A principal alteração
g
ocorre a partir de 1986, quando, apesar da redução em termos tendenciais da taxa de
ociosidade, a razão taxa de lucro / taxa de acumulação de capital continuou em ascensão. Uma
explicação para este fato reside no elevado grau de financeirização da economia brasileira a
partir de finais dos anos 80. Com relação aos primeiros resultados empíricos da presente
análise, BOYER (2004) argumenta:382

Comment expliquer la montée des reserves internationales après 1990 ? (...)


N a-t-on pas une evidence indirecte de l impact de la financiarisation dans le
fait que l accumulation stagne alors que les profits croissent dans les années
90 ? Des lors il ne s agit pas d un régime tiré par les salaires mais plutôt par
la finance.

382
BOYER (2004) em comentários ao artigo Wage-labor nexus, financeirização e acumulação de capital no
Brasil: evolução, configuração atual e interdependências estruturais , de BRUNO (2004), Anais do IX
Encontro Nacional da Sociedade Brasileira de Economia Política, Uberlândia, junho de 2004.
617

GRÁFICO 147 TAXA DE OCIOSIDADE E RAZÃO TAXA DE LUCRO / TAXA DE ACUMULAÇÃO


(1950-2003)

Taxa de ociosidade = (1-u) (L)


Razão taxa de lucro / taxa de acumulação de capital = r / g (R)
0,14 240

0,12 220

200
0,10

Índice: 1950 = 100


180
0,08
160
0,06
140
0,04
120
0,02
100

0,00 80

-0,02 60
1950 1958 1966 1974 1982 1990 1998
1954 1962 1970 1978 1986 1994 2002

FONTE: Metodologia de construção das séries no anexo.

NOTA: Taxa de ociosidade calculada como 1 u , onde u é a taxa de utilização da capacidade produtiva
instalada da economia.
Os testes empíricos indicam que o padrão de crescimento mudou nos anos 90,
passando de um regime do tipo profit-led para um regime de acumulação finance-led. O
aumento da participação dos lucros no produto não resultou em expansão da taxa de
acumulação de capital, porque a elevação da taxa de lucro foi uma resposta endógena dos
setores produtivos à punção rentista exercida pelas finanças internacionalizadas com o aval do
Estado através do atual regime de política econômica.

Como haviam mostrado MARX e KALECKI, o juro é uma dedução do lucro bruto
total e a rápida expansão da profit-share na economia brasileira dos anos 90, visava à
preservação das margens de lucro empresarial num ambiente macroeconômico caracterizado
pela manutenção de taxas reais de juros extremamente onerosas à utilização produtiva do
capital. Nestas condições, os investimentos em ampliação da capacidade produtiva são
reduzidos ou adiados, em razão tanto da elevação do custo de uso do capital fixo quanto da
alternativa de ganhos rápidos e mais seguros nos mercados financeiros.

Esse padrão teve início nos anos 80, quando as causas endógenas da crise do regime
de acumulação profit-led se conjugam com a interrupção dos financimentos externos. Neste
618

contexto, a conjuntura macroeconômica do período e a crise da dídiva forçam o Estado


brasileiro a mudar o regime de política econômica, reconfigurando-o para a rolagem da dívida
pública sob condições de escassez de recursos externos e inflação crescente. Todavia, na
década de 80 não se observam ainda mutações significativas na arquitetura institucional
herdada do período de forte crescimento. As formas institucionais (Wage-labor nexus; regime
monetário-financeiro; forma do Estado; forma de inserção internacional e forma da
concorrência) que definem o modo de regulação ainda permaneciam sob as configurações
básicas que deram origem ao milagre .

As transformações fundamentais de conteúdo, que fariam emergir uma nova


hierarquia das formas institucionais, se produziriam nos anos 90 sob a pressão da
liberalização comercial e financeira. Para tanto foi necessário um acúmulo prévio de reservas
internacionais que permitisse suportar o custo crescente do passivo externo, a âncora cambial
na primeira fase do Plano Real e as séries de medidas liberalizantes do Consenso de
Washington, as quais as classes econômicas dominantes e a alta burocracia governamental
aderiram passivamente.

Neste contexto de mudança estrutural, o Plano Real cumpriu uma primeira exigência
básica para a globalização de orientação neoliberal: a redução da inflação necessária ao
rebaixamento dos custos de entrada e saída dos fluxos de capitais estrangeiros. A partir da
estabilização de preços, num contexto de abertura econômica, o processo de mutação das
outras formas institucionais pôde então ser implementado rapidamente: aprodundamento do
grau de flexibilidade quantitativa e salarial da WLN; privatizações e desnacionalizações com a
conseqüente mudança dos papéis do setor público; estabelecimento de um regime monetário-
financeiro à elevada restrição e seu correspondente regime de política econômica (metas de
superávit primário e metas de inflação; taxas de câmbio sobrevalorizadas; taxas reais de juros
extremamente elevadas e contenção salarial) para garantir a rentabilidade dos ativos
financeiros conectados às dívidas interna e externa. Uma análise dessas medidas revela que
seu objetivo maior consistia em criar as condições estruturais necessárias ao ingresso de
capitais externos sob a hipótese, desmentida em finais da década, de que o aumento da
poupança externa seria por si mesmo suficiente para garantir a recomposição das condições de
retomada do crescimento econômico sustentado.

O Gráfico 148 mostra que a elevação das reservas internacionais como percentagem
do PIB brasileiro entra em uma trajetória de crescimento a partir de 1976. Todavia, no período
de elevado crescimento, entre 1966 e 1975, as reservas mantiveram-se em um patamar
619

elevado mas financiaram grande parte dos investimentos. Tanto que a razão taxa de lucro/taxa
de acumulação declinou fortemente até 1975. Contudo, ao longo dos anos 80 e 90, as reservas
r
internacionais e a razão se expandem de um modo inusitado historicamente. Mas como
g
se poderia interpretar o significado desse novo padrão para essas variáveis macroeconômicas?
r
A elevação da razão significa expansão da taxa de lucro acima da taxa de acumulação de
g
capital, ou seja, a massa de lucro se expande mas não é capaz de estimular o investimento.

Um exame do Gráfico 149 mostra que no caso brasileiro, a taxa de lucro se expande
com queda tendencial da taxa de acumulação de capital. Consequentemente, um dos fatos
estilizados característicos da economia brasileira pós-abertura e pós-Real é precisamente a
desconexão entre essas duas variáveis-chave do processo de crescimento econômico. Um
comportamento atípico, considerando-se a natureza e a lógica das economias que se
organizam sob o modo capitalista de produção. Todavia, o aparente paradoxo representado
por esse padrão desaparece quando a questão do relacionamento entre os setores real e
financeiro é considerada. Nas seções a seguir, a análise buscará identificar as particularidades
dessas relações e a maneira como exercem impactos negativos sobre a dinâmica do
crescimento econômico.

GRÁFICO 148 PARTICIPAÇÃO DAS RESERVAS INTERNACIONAIS NO PIB E RAZÃO TAXA


DE LUCRO/ TAXA DE ACUMULAÇÃO DE CAPITAL (1950-2003)

Razão reservas internacionais / PIB (L)


Razão taxa de lucro / taxa de acumulação de capital = r / g (R)
0,12 240

220
0,10
200

0,08 180

160
0,06
140

0,04 120

100
0,02
80

0,00 60
1950 1958 1966 1974 1982 1990 1998
1954 1962 1970 1978 1986 1994 2002

FONTE: Reservas internacionais obtidas no IPEADATA e originárias do BACEN.


620

GRÁFICO 149 - LUCRO E ACUMULAÇÃO: UM ZOON NAS DÉCADAS DE 80 E 90

Taxa de lucro (L)


Taxa de acumulação de capital produtivo (R)
Taxa de acumulação de capital total (R)
29% 14%

28% 13%

27% 12%

26% 11%

25% 10%

24% 9%

23% 8%

22% 7%

21% 6%

20% 5%

19% 4%
1980

1982

1984

1986

1988

1990

1992

1994

1996

1998

2000

2002
FONTE: Metodologia de construção dos dados no anexo.
NOTA: As três séries foram filtradas pelo filtro 4253H para se obter um comportamento tendencial
Em outros termos, as transformações estruturais do período pós-Real resultaram na
reconfiguração do modo de regulação cujo principal objetivo era adequar a economia
brasileira às prerrogativas da liberalização comercial e financeira. O pressuposto implícito
neste processo era o de que a abertura econômica seria capaz de proporcionar as condições
propícias ao refinanciamento do endividamento público e privado, garantindo o retorno ao
crescimento econômico sustentável como um fato natural.

5.16 Financeirização na economia brasileira e o padrão finance led growth

Um processo de financeirização ocorre quando a participação relativa dos ativos


financeiros no total de ativos das empresas não-financeiras e das famílias atinge cifras
consideráveis por seus impactos nas decisões de investimento e acumulação de capital
produtivo. Podem ser utilizados vários indicadores como a proporção da riqueza em títulos de
renda variável e renda fixa no total da renda disponível; total dos ganhos de capital / renda
disponível; parte das ações e obrigações / total de ativos financeiros das famílias; rendimento
das obrigações; etc.

Em razão das limitações dos dados sobre o estoque de riqueza na economia brasileira,
esta análise utilizará indicadores indiretos do grau de financeirização. Pesquisas futuras
621

deverão ser realizadas para se chegar a um diagnóstico mais preciso e detalhado do padrão de
financeirização, pois a depender do nível de desenvolvimento econômico do país, a tendência
subjacente à financeirização para aprofundar a lógica especulativa dos investimentos em
portifólio pode variar e assumir formas contrastadas. A hipótese básica neste contexto é a de
que existem configurações ou modalidades de financeirização que não são capazes de garantir
níveis suficientes e estáveis de expansão da demanda efetiva e então o crescimento econômico
e a acumulação de capital são prejudicados.

Análises recentes e comparações internacionais revelam que o grau de financeirização


da economia dos EUA é de fato excepcional (BOYER 2000 e 2002). Contudo, a hipótese
mobilizada neste trabalho sustenta que se pode identificar um padrão de financeirização
inflacionista nos anos 80 e sua transmutação para um padrão usurário na década de 90. Esta
última forma contrasta fortemente com o padrão vigente nos EUA, em razão da atrofia do
mercado de títulos de renda variável e da hipertrofia do mercado de títulos de renda fixa, daí
seu caráter eminentemente usurário e estruturalmente dependente do endividamento interno e
externo.

Tradicionalmente a literatura econômica descreve uma relação inversa entre taxa de


juros e investimento. Mas a formulação regulacionista utilizada nesta análise admite que a
taxa de lucro e a taxa de utilização da capacidade produtiva são também variáveis
fundamentais nas decisões de investimento e acumulação. Mantendo-se este pressuposto neo-
estruturalista, a equação a ser estimada acrescenta a taxa de juros entre as variáveis
explicativas.

A série de taxa de juros utilizada corresponde às taxas de juros dos empréstimos para
capital de giro, em periodicidade mensal. Deflacionadas pelo IGP-DI, a série foi em seguida
anualizada. O objetivo é dispor de uma proxy para o custo de utilização do capital.

A série do investimento corresponde ao investimento total em valores constantes de


2000 pelo deflator implícito da formação bruta de capital fixo, fornecido pelo IBGE. A série
da taxa de utilização da capacidade instalada corresponde à economia nacional. Trata-se de
uma série estimada a partir das séries disponíveis para o setor industrial e com a mesma
metodologia proposta por BACHA e BONELLI (2004).

Os resultados da estimação da relação estática encontram-se no Quadro 195 a seguir.


622

QUADRO 195 ESTIMAÇÃO DA RELAÇÃO ESTÁTICA PARA INVT, r, u e TXJUR E GRÁFICO


DOS RESÍDUOS (1982-2003)
Dependent Variable LINVT
Method: Least Squares
Sample: 1982 2003
Included observations: 22
Variable Coefficient Std. Error t-Statistic Prob.
C -12.63385 4.186035 -3.018094 0.0074
Lr(-1) -0.693244 0.506886 -1.367653 0.1883
LU(-1) 4.928014 1.246593 3.953185 0.0009
TXJUR -0.459427 0.187059 -2.456052 0.0244
R-squared 0.678694 Mean dependent var 6.933887
Adjusted R-squared 0.625144 S.D. dependent var 0.156458
S.E. of regression 0.095792 Akaike info criterion -1.690302
Sum squared resid 0.165171 Schwarz criterion -1.491931
Log likelihood 22.59332 F-statistic 12.67381
Durbin-Watson stat 2.179287 Prob(F-statistic) 0.000108

7.2

7.0

6.8
0.2
0.1 6.6

0.0
-0.1
-0.2
-0.3
82 84 86 88 90 92 94 96 98 00 02

Residual Actual Fitted

QUADRO 196 TESTE DE CO-INTEGRAÇÃO PARA INV, U E TXJUR (1984-2003)

Sample: 1984 2003


Included observations: 20
Test assumption: No deterministic trend in the data
Series: LINVT LU TXJUR
Lags interval: 1 to 1
Likelihood 5 Percent 1 Percent Hypothesized
Eigenvalue Ratio Critical Value Critical Value No. of CE(s)
0.684532 37.48518 34.91 41.07 None *
0.413580 14.41122 19.96 24.60 At most 1
0.170425 3.736847 9.24 12.97 At most 2
*(**) denotes rejection of the hypothesis at 5%(1%) significance level
L.R. test indicates 1 cointegrating equation(s) at 5% significance level
Normalized Cointegrating Coefficients: 1 Cointegrating Equation(s)
LINV LU TXJUR C
1.000000 -1.492484 -0.056442 0.087543
(0.58511) (0.07448) (2.67055)

Log likelihood 128.1012

Todas as quatro variáveis apresentaram raízes unitárias e o teste de JOHANSEN


revela que de fato existem duas equações de co-integração. Mas como no caso de dois vetores
623

de co-integração o que se está efetivamente estimando é o espaço de co-integração, perde-se a


interpretação de uma relação de longo prazo compartilhada pelas variáveis. Todavia, como a
taxa de lucro (r) não se apresentou estatisticamente significativa neste período, a equação foi
estimada novamente, mas sem incluir esta variável como explicativa (Quadro 196).

QUADRO 197 VECTOR ERROR CORRECTION MODEL PARA A RELAÇÃO (1984-2003)


Sample: 1984 2003
Included observations: 20
t-statistics in parentheses
Cointegrating Eq: CointEq1
LINVT(-1) 1.000000

LU(-1) -4.135107
(-7.18630)

TXJUR(-1) 0.210823
(1.89561)

C 11.75277
(4.45031)
Error Correction: D(LINVT)
CointEq1 -1.302286
(-4.09770)

D(LINVT(-1)) 0.668757
(2.10536)

D(LU(-1)) -4.171280
(-2.55276)

D(TXJUR(-1)) -0.739687
(-3.31302)
R-squared 0.550719
Adj. R-squared 0.466479

Os resultados da equação de co-integração sugerem não haver influência


estatisticamente significativa da taxa de juros sobre as decisões de investimento de longo
prazo, no período [1984-2003]. O investimento responde preponderantemente às variações da
taxa de utilização da capacidade produtiva instalada com uma elasticidade elevada (1,49).
Contudo, as elasticidades de curto prazo são todas estatisticamente significativas, destacando-
se o coeficiente das taxas de juros com um valor de -0,74. Isto significa que, no curto prazo,
as taxas de juros influenciam negativamente as decisões de investimento.

No que concerne ao valor da elasticidade-juros de longo prazo do investimento, as


estimações de MELO e RODRIGUES JR. (1998) conduziram a um valor estatisticamente
significativo mas muito reduzido (-0,07), para o período [1970-1995].
624

ARONOVICH (1991) encontrou, para o período [1970-1987], um valor para a taxa de


juro real de empréstimo com o sinal esperado (-0,02), mas com uma probabilidade de
aceitação da nulidade do coeficiente de cerca de 11%. Segundo o autor esse resultado parece
revelar a reduzida importância do financiamento via sistema financeiro em condições usuais
de mercado. O único agente financiador de projetos econômicos de longo prazo é o Sistema
BNDES, que durante a década de 70 oferecia crédito à taxa de juros subsidiada e prazos
longos de pagamento.

Quanto à influência das taxas de juros sobre as decisões de investir, VILLIEU (2000,
p. 67) observa que:
Au-delà de ces désaccords théoriques sur l effet de la politique monétaire, il
est difficile de croire que la politique monétaire affecte fortement
l investissement par le canal du taux d intérêt. D une part, l élasticité de
l investissement au taux d intérêt est faible. D autre part, la politique
monétaire agit sur le taux d intérêt nominal à court terme, alors que
l investissement répond au taux d intérêt réel à long terme, et le lien entre ces
deux taux dépend des anticipations sur l évolution future des taux d intérêt et
de l inflation. »

Para captar o efeito das taxas de juros sobre o investimento é necessário introduzir o
canal de transmissão da política monetária: o canal do crédito . O canal do crédito põe o
acento sobre as conseqüências redistributivas da política monetária, visto que o custo de
financiamento não é o mesmo para todos os investidores. Um regime monetário-financeiro
(RMF) à elevada restrição, como o regime atual pós-Real, além da elevação da taxa média de
juros reais (com o conseqüente aumento do custo do capital que isto implica) tem outros dois
efeitos adicionais. Por um lado, este regime incita os bancos a restringirem a oferta de crédito,
restringindo o acesso ao financiamento e atingindo mais fortemente as pequenas e médias
empresas que são normalmente as mais dependentes do crédito bancário. De outro, a elevação
das taxas de juros eleva rapidamente os encargos da dívida e reduz o valor presente da riqueza
líquida das empresas e então das garantias que ela pode oferecer aos mercados financeiros
como tomadoras de recursos para investimento.383

383
Mais detalhes dessa questão macroeconômica fundamental podem ser encontrados em Patrick VILLIEU
(2000). Macroéconomie l investissement. Repères. La Découverte, Paris, 2000.
625

GRÁFICO 150 TOTAL DAS OPERAÇÕES DE CRÉDITO DO SISTEMA FINANCEIRO NACIONAL


E FBKF TOTAL (1970-2003)

Total das operações de crédito do SFN


Formação bruta de capital fixo
450
Índice dos valores em R$ de 2000 - escala log

400
350
300

250

200

150

100

1970 1973 1976 1979 1982 1985 1988 1991 1994 1997 2000 2003

FONTE: Dados originários do IBGE e Banco Central do Brasil, obtidos no IPEADATA.

O exame do Gráfico 150 mostra que, nos anos 70, as operações de crédito do sistema
financeiro nacional cresceram a um ritmo muito forte e o mesmo foi observado com o nível
da formação bruta de capital fixo. Nos anos 80 há uma nítida quebra estrutural e as séries
declinam. Nos anos 90, o padrão de evolução das séries é muito particular. Entre 1991 e
1996, crédito e investimento pareciam ter entrado em uma trajetória sustentável de expansão,
mas a partir de 1997, as séries assumem novamente tendências de queda. Consequentemente,
crédito e formação de capital fixo estão relacionados macroeconomicamente e as taxas de
juros ao influenciar o custo do primeiro, afetam necessariamente as decisões de investimento
e acumulação de capital real.
Essas ponderações levam a análise a introduzir variáveis explicativas que possam
captar o fenômeno financeiro na economia brasileira e, mais precisamente, o modo como
influenciam as decisões de investimento e acumulação de capital.

Uma formulação alternativa consiste em se considerar como variáveis explicativas, as


variáveis que possam captar as influências das finanças sobre as decisões cruciais de
investimento produtivo:

a taxa de juros enquanto proxy para o custo de utilização do capital;

o nível de endividamento externo como proporção do produto total;


626

Um dos fatos estilizados da evolução econômica brasileira, destacado por BACHA e


BONELLI (2004), refere-se à elevação da taxa de ociosidade 1 u e sua estabilidade num
patamar persistentemente mais elevado. Esses pesquisadores falam em histerese dessa
variável. O Gráfico 151 mostra que o nível médio da taxa de ociosidade mais do que dobrou a
partir da crise do regime de acumulação profit led, responsável pelo período de forte
crescimento do milagre . Mas para esses mesmos autores:

a permanent lack of effective demand may hardly be argued to be the reason


for such of affairs, since in a number of years in this period (e.g., 1986, 1989,
1995-1996), inflation or external deficits cleary accelerated und the pressure
of excess domestic demand.
GRÁFICO 151 EVOLUÇÃO DA TAXA DE OCIOSIDADE (1937-2003)

Taxa de ociosidade = (1 - u)
14%
Média [1981-2003] = 7,8%

12%

10%

8%
Média [1937-1980] = 3,8%
6%

4%

2%

0%

-2%
1937
1939
1941
1943

1947
1949
1951
1953
1955
1957
1959
1961
1963
1965
1967
1969
1971
1973
1975
1977
1979
1981
1983
1985
1987
1989
1991
1993
1995
1997
1999
2001
2003
1945

FONTE: Dados estimados segundo a metodologia proposta por BACHA e BONELLI (2004), constante do
anexo.
NOTA: u é a taxa de utilização da capacidade produtiva instalada.
Mas a análise acima mostrou que há uma forte dependência entre a taxa de
acumulação de capital e a demanda interna no período [1966-1993]. A dinâmica da demanda
efetiva condiciona o comportamento do investimento. Apenas no período [1994-2003] a
correlação entre essas variáveis não se mostrou estatisticamente significativa. O exame do
deste gráfico mostra que o excesso de demanda nos anos 1986, 1989, 1995 e 1996 foram
prontamente respondidos por um aumento da taxa de utilização da capacidade, tanto que
nesses anos é clara a redução da taxa de ociosidade. Todavia, como as recessões de 1981-
627

1983 e a de 1990-92 foram particularmente fortes (em torno de 4%) e a média é sensível a
valores extremos, o patamar de 7,8% estaria refletindo este efeito estatístico.

Se os anos marcados por essas graves recessões - induzidas deliberadamente pela


política econômica e não provocadas por fatores endógenos ao regime de acumulação forem
retirados da amostra, a taxa média de ociosidade cai para 6,4%. Essa média, embora ainda
superior a do período de alto crescimento pode ser considerada um nível normal em se
tratando de uma economia que precisamente nas décadas de 80 e 90 entra em uma trajetória
de mudança estrutural e de transformação do modo de regulação. Dentre essas transformações
encontram-se a elevação do regime monetário-financeiro (RMF) à categoria de forma
institucional hierarquicamente superior. Nesta condição, o RMF vigente se converteu na base
de uma acumulação financeira e patrimonial que se mantém ativa desde a crise fiscal do
Estado nos anos 80 e ao longo de toda a década de 90. O resultado direto foi o desestímulo
aos investimentos em ampliação da capacidade e a predominância de um comportamento
defensivo e centrado num horizonte de curto prazo por parte das firmas. A taxa média de
ociosidade tende a elevar-se porque o regime de demanda permanece demasiadamente
contido pela lógica do regime de política econômica que tem priorizado a estabilidade de
preços acima de qualquer outra variável considerada prioritária do ponto de vista do capital
produtivo: redução do custo do crédito ao consumo e ao investimento, financiamento para
projetos de infra-estrutura e estabilidade da demanda efetiva em patamares compatíveis com
uma retomada auto-sustentada do crescimento e da acumulação de capital.
Consequentemente, a inércia da taxa de ociosidade, em um patamar historicamente
elevado, é um resultado do esgotamento do regime de acumulação profit led responsável pelo
milagre , de seus desdobramentos nos anos 80 e da visível dificuldade em encontrar um
substituto adequado nos anos 90. Neste contexto, se destaca o avanço de um processo
particular de financeirização da economia brasileira que submete o Estado e o sistema
produtivo a uma lógica de acumulação patrimonial e usurária sem precedentes históricos.384

384
Como as estatísticas de taxa de utilização existentes são relativas ao setor industrial, talvez um exercício
interessante fosse aplicar uma metodologia adequada para se mensurar a taxa de ociosidade das instituições
bancárias e financeiras neste período. Certamente será encontrada a média setorialmente mais baixa de todas as
atividades econômicas.
628

5.17 Utilização da capacidade instalada (u) e razão dívida externa / PIB (bx)

A relação entre a taxa de utilização da capacidade produtiva e o nível de


endividamento externo como proporção do PIB pode ser estimada em primeiras diferenças
das variáveis em logaritmo.. Os resultados estão nos Quadros 198 e 199, respectivamente para
o período [1960-1980] e [1981-2003].

O primeiro período, que corresponde historicamente a uma fase de elevada


acumulação de capital e crescimento econômico, o coeficiente de bx não é estatisticamente
significativo e o sinal é positivo, indicando que a poupança externa é absorvida mas com uma
destinação principalmente produtiva em novos investimentos.

No segundo período, que envolve as duas décadas perdidas em termos de


acumulação de capital e crescimento econômico, o coeficiente bx tem o sinal negativo e
estatisticamente significativo.

QUADRO 198 ESTIMAÇÃO DA RELAÇÃO ENTRE u E bx PERÍODO (1960-1980)


Dependent Variable: D(LOG(U))
Method: Least Squares
Sample(adjusted): 1961 1980
Included observations: 20 after adjusting endpoints
Variable Coefficient Std. Error t-Statistic Prob.
C -0.002121 0.004539 -0.467279 0.6459
D(LBX) 0.010110 0.029603 0.341523 0.7367
R-squared 0.006438 Mean dependent var -0.001486
Adjusted R-squared -0.048760 S.D. dependent var 0.018084
S.E. of regression 0.018519 Akaike info criterion -5.045371
Sum squared resid 0.006173 Schwarz criterion -4.945798
Log likelihood 52.45371 F-statistic 0.116638
Durbin-Watson stat 2.163689 Prob(F-statistic) 0.736664

QUADRO 199 ESTIMAÇÃO DA EQUAÇÃO PERÍODO (1981-2003)


Dependent Variable: D(LOG(U))
Method: Least Squares
Sample: 1981 2003
Included observations: 23
Variable Coefficient Std. Error t-Statistic Prob.
C 0.002318 0.004922 0.470987 0.6425
D(LBX) -0.078586 0.028146 -2.792082 0.0109
R-squared 0.270725 Mean dependent var -0.001090
Adjusted R-squared 0.235998 S.D. dependent var 0.026162
S.E. of regression 0.022867 Akaike info criterion -4.635295
Sum squared resid 0.010981 Schwarz criterion -4.536556
Log likelihood 55.30589 F-statistic 7.795724
Durbin-Watson stat 1.674624 Prob(F-statistic) 0.010922
629

O Gráfico 152, a seguir, mostra a razão dívida / PIB, a taxa de ociosidade e a taxa de
crescimento do PIB em séries suavizadas pelo filtro 4253H para se obter um padrão dinâmico
tendencial, isto é, sem as oscilações acentuadas de curto prazo. Pode-se constar que as taxas
historicamente mais elevadas de crescimento ocorreram quando o endividamento externo
mantinha-se abaixo de 10% do produto total. No início dos anos 80, quando o endividamento
externo aumentava, as taxas de crescimento do PIB subiam juntas e então a taxa de ociosidade
caia. Mas a partir de 1996, o grau de endividamento se eleva de tal maneira que não é capaz
de novamente puxar o PIB, como acontecera antes nos anos 70 e entre 1981-1986. Em
outros termos, a entrada de recursos externos, sob a forma de poupança externa sob economia
aberta e liberalização da conta capital implicou em um conjunto de novas regularidades
macroeconômicas.
GRÁFICO 152 ENDIVIDAMENTO EXTERNO, TAXA DE OCIOSIDADE E CRESCIMENTO
ECONÔMICO (1956-2003)
Razão dívida externa / PIB (L)
Taxa de ociosidade = 1- u (R)
Taxa de crescimento do PIB (R)
60% 12%

50% 10%

8%
40%
6%
30%
4%
20%
2%

10% 0%

0% -2%
1956
1958
1960
1962
1964
1966
1968
1970
1972
1974
1976
1978
1980
1982
1984
1986
1988
1990
1992
1994
1996
1998
2000
2002

FONTE: Taxa de ociosidae segundo a metodologia no anexo. Dívida externa segundo dados do BACEN, PIB
originário do IBGE, ambos obtidos no IPEADATA.
Uma hipótese seria a de que o modo de regulação anterior, caracterizado por uma forte
presença e intervenção direta do Estado como agente promotor da acumulação de capital ou
seja, a forma de regulação que suportava a lógica do modo de desenvolvimento por
substituição de importações entrou em crise nos anos 80 e foi substituído por outro nos anos
90. Esse novo modo de regulação não deslocou o Estado como agente organizador e
estruturador do espaço econômico nacional, segundo as suposições simplistas da ideologia da
630

globalização neoliberal. A coerência macroeconômica da nova configuração atual é buscada


através de novos papéis para essa forma institucional básica. Entre essas funções destaca-se a
criação das condições estruturais para o aprofundamento da acumulação financeira
pressupondo-a necessariamente geradora de poupança para um novo ciclo de crescimento.

5.18 Determinantes da taxa de investimento produtivo sob condições de elevado


endividamento externo e finanças liberalizadas

Segundo BRESSER-PEREIRA (2004) e BRESSER-PEREIRA e NAKANO (2003), o


principal problema macroeconômico que estaria impedindo a economia brasileira de
requacionar as condições de retomada da acumulação de capital em bases sustentáveis,
residiria na estratégia de crescimento com poupança externa.

O regime de política econômica estabelecido a partir da vigência do Real reflete no


plano ideológico a teoria ortodoxa convencional e as medidas consubstanciadas no chamado
consenso de Washington, já explicitadas no capítulo 4, durante a análise das relações Estado-
economia. Sua pressuposição básica é a de que o ingresso de capital externo não é só
necessário para complementar a poupança interna, é também suficiente para relançar o país
numa trajetória de crescimento estável. No plano interno, deve ser implementado um conjunto
de reformas estruturais para tornar a realidade sócio-econômica brasileira compatível com o
modelo que se supõe livre de populismos, ineficiências e caracterizado por sua
aplicabilidade universal.385 Basicamente, o encadeamento causal seria o seguinte: a economia
deveria aderir ao processo de globalização, liberalizar a conta de capitais, baixar a inflação,
manter o câmbio valorizado e as taxas de juros reais elevadas para manter o ingresso de
capitais e, portanto, a poupança necessária ao financiamento do investimento (e também das
aplicações conectadas ao endividamento interno e externo que alimentam os ganhos dos
rentiers).

O argumento de BRESSER e NAKANO é que o modelo falha por seus pressupostos


de base. O aumento da poupança externa acarreta valorização da taxa de câmbio e então da
riqueza financeira e dos salários reais. Em conseqüência, o estímulo ao consumo supera as
motivações de investir produtivamente. Então a formação bruta de capital fixo é freiada ou
mesmo reduzida. Quanto ao aumento da riqueza financeira, a abordagem de AGLIETTA-
VIDAL mostrou que os ganhos de capital (obtidos pela variação dos preços dos ativos)
tendem a reduzir a taxa de poupança porque permitem aumentar a riqueza sem esforço

385
E, obviamente, recomendado e sancionado pelas mais importantes praças financeiras internacionais.
631

adicional de poupança. Nessas condições, um aumento do déficit em conta corrente, ou seja,


do recurso à poupança externa, tende a ser compensado pela redução da poupança interna.
Segundo BRESSER-PEREIRA (2003, p. 19-20):

Neste modelo, portanto, o investimento é função da taxa de juros e da taxa de


lucro esperada, enquanto as exportações, as importações, os salários e o
consumo são funções da taxa de câmbio. (...). Nesse modelo, a taxa de
investimento e a taxa de poupança são necessariamete baixas. E,
consequentemente, a taxa de crescimento do PIB por habitante será
insatisfatória. Além disso, a economia se manterá em permanente desemprego
e sub-utilização de capacidade. Desemprego de longo prazo, porque o
crescimento da renda não é suficiente para absorver o crescimento natural da
força de trabalho, desemprego de curto prazo e sub-utilização de capacidade,
porque a demanda agregada é mantida substancialmente abaixo da oferta
agregada através de altas taxas de juros. 386
Em termos gerais, as implicações dessa hipótese levam a considerar que o excesso de
absorção de poupança externa (existência de persistentes déficits em transações correntes)
significa endividamento externo excessivo com relação ao potencial produtivo das economias
em desenvolvimento. Em conseqüência, essas economias vêm acrescidas seu grau de
vulnerabilidade externa, além de tornarem-se prisioneiras das tendências à estagnação ou de
trajetórias de crescimento lento e instável.

Essa hipótese pode também contribuir para explicar a persistência de uma elevada taxa
média de ociosidade nas décadas de 80 e 90, tal como foi destacada por BACHA e BONELLI
(2004). Em uma economia marcada por elevado endividamento interno e extermo, e onde as
taxas reais de juros são muito elevadas em relação à média internacional, a poupança externa
tende a ser absorvida por ativos financeiros de curto prazo. Em outros termos, a possibilidade
de aplicações muito mais rentáveis e com elevada liquidez nos mercados financeiros é um
fator que tende a esterilizar grande parte do fluxo de capitais externos que ingressam na
economia brasileira. Além disso, as taxas de juros funcionam muito mais como variáveis de
realocação de renda entre ativos e classes sociais do que como fator de geração de poupança
adicional macroeconômica. Isto significa que uma elevação das taxas de juros aumenta a
participação dos rentistas e dos mercados financeiros em detrimento dos proprietários de
ativos reais, sem que o produto ou valor adicionado total da economia tenha necessariamente
crescido.

386
As hipóteses e o modelo propostos por BRESSER-PEREIRA (2003) e BRESSER-PEREIRA e NAKANO
(2003) foram formalizadas por OUREIRO (2003). Um dos resultados encontrados por este autor refere-se à
existência de dois equilíbrios: no primeiro, a economia apresenta baixo endividamento como proporção do PIB,
mas alta taxa de utilização da capacidade instalada; no segundo, onde se observa alto endividamento, a taxa de
utilização da capacidade produtiva é baixa.
632

Um meio de defesa contra esse padrão de transferência de renda, pela mera detenção
de direitos sobre o fluxo gerado de valor adicionado, consiste precisamente na elevação do
grau de financeirização dos ativos das empresas não-financeiras e das famílias. Mas neste
contexto, os comportamentos defensivos contribuem para generalizar a lógica de um regime
de acumulação financeirizado ou patrimonialista. Um círculo vicioso articulando acumulação
financeira, baixo crescimento e tendências à crises por movimentos de especulação com
ativos fica estabelecido.387

5.19 Lucro empresarial, juros e acumulação de capital

Os juros são uma dedução do lucro bruto total388 e consequentemente o lucro


empresarial pode ser escrito conforme a expressão:

e
J , onde e
é o lucro empresarial e J representa o fluxo de juros

sobre o estoque de dívida dos setores não-financeiros.


Mas uma questão fundamental refere-se ao modo como a distribuição do lucro total
entre lucro empresarial e juros pode afetar a taxa de acumulação de capital (STEINDL,
1952)389 Na formulação proposta por AGLIETTA (2001), parte-se do fato de que os custos do
endividamento afetam negativamente a poupança das empresas:
S i.D DIV , onde S é a poupança das empresas; i é a taxa de juros
sobre o estoque de dívida D; e i.D são os fluxos de juros pagos.
A participação dos dividendos DIV pagos aos acionistas é pouco expressiva em termos
relativos na economia brasileira, em razão tanto da excessiva concentração da propriedade e
da renda quanto da predominância de um processo de financeirização baseada em ativos de
renda fixa (geradores de juros) vis-à-vis os ativos de renda variável (ações).
S i. D (49)
O investimento total realizado pelas empresas pode ser financiado por recursos
próprios (S) ou mediante endividamento junto ao sistema financeiro:

I t 1 S t 1 D t 1 D t
(50)

Substituindo-se (1) em (2), tem-se que:

387
POCHMANN (2004) observa, que a partir de 1992, com a liberalização da conta de capitais, sustenta-se o
avanço do ciclo de financeirização da riqueza e se aprisiona a política macroeconômica aos interesses diretos de
cerca de 15 mil famílias ricas. Trata-se de um regime de rentier que asfixia a produção e o trabalho,
aprofundando a exclusão social.
388
BELUZZO e ALMEIDA (2002) observam que MARX foi o autor que mais firmemente insistiu na
peculiaridade dos juros, a remuneração do capital-propriedade e não do capital em função . Por essa razão, na
abordagem marxiana, os juros surgem como uma dedução do lucro.
389
STEINDL, Josef. Maturidade e Estagnação no Capitalismo Americano (1952).
633

I t 1 t 1
i. Dt D t 1 D t
(51)

I t 1 t 1 D t
1 i D t 1
(52)

Dividindo-se ambos os membros da equação (52) pelo estoque de capital fixo


produtivo (K), obtém-se a expressão:

g It 1 t 1 D1 t
i D t 1
(53), onde g é a taxa de acumulação de capital.
K t 1 K t 1

g t 1 r t 1 d .1t
i d t 1
(54)
D
Onde r e d são, respectivamente, a taxa de lucro e a taxa de
K K
endividamento das empresas. Segundo AGLIETTA, o regime de crescimento a longo
prazo depende das seguintes condições:

d t 1 d d , a taxa de endividamento deve ser constante;


t

g K K = D D , a taxa de acumulação deve


t 1 t t 1 t
ser igual à taxa de
K tD t

crescimento do estoque de dívida.


Ressalte-se que nenhuma das duas condições é cumprida pela economia brasileira
atual, sobretudo, quando se constata que a taxa de acumulação de capital permanece em
tendência de queda, enquanto o estoque de dívida e seus encargos são muito elevados. O
problema tende a ser agravado também pelo próprio ambiente macroeconômico pós-
liberalização financeira característico do período pós-fordista que imprime um novo
padrão ao ciclo de investimento e acumulação de capital em longo período. Sob finanças
liberalizadas, o clima dos negócios depende das expectativas que se formam sobre os
mercados financeiros e que se refletem nos preços dos ativos. AGLIETTA (2001, p.107)
observa que:
Lorsque des perturbations dans la réalisation des programmes
d investissement entraînent des coûts fixes irrécupérables, l investissement est
irréversible. Le sentier d accumulation du capital dépend de son histoire
passée; il existe une hystérésis. C est pourquoi le régime du crédit en finance
libéralisée, dans la mesure où il se caractérise par de fortes fluctuations des
prix des actifs et de l endettement entraîne une rémanence des ajustements
récessifs sur le stock de capital. »390

390
É esta uma das razões que explicam o fato, ressaltado por CASTRO (2004), das empresas que operam no
Brasil terem se adaptado a uma dinâmica do tipo stop and go . Se as fases de expansão tendem a ser de curta
duração, não há estímulos para investimentos significativos em ampliação da capacidade produtiva instalada. Os
grifos pertencem a esta análise.
634

A dinâmica do crescimento econômico e o comportamento da taxa de acumulação de


capital, na economia brasileira dos anos 90 é um exemplo empírico dessa problemática
abstraída ou simplesmente desacreditada pelos formuladores e defensores do atual regime de
política econômica.

No Gráfico 153, pode-se observar a evolução da relação dívida externa / PIB,


juntamente com a taxa de lucro empresarial r i e a taxa de acumulação de capital
produtivo.391

GRÁFICO 153 LUCRO EMPRESARIAL, DÍVIDA EXTERNA E ACUMULAÇÃO DE CAPITAL


(1960-2003)

Taxa média de lucro empresarial (L)


Relação dívida externa / PIB (L)
Taxa de acumulação de capital (R)
60% 18%

40% 16%

20% 14%

0% 12%

-20% 10%

-40% 8%

-60% 6%

-80% 4%

-100% 2%
1960 1964 1968 1972 1976 1980 1984 1988 1992 1996 2000
1962 1966 1970 1974 1978 1982 1986 1990 1994 1998 2002
FONTE: Taxas de lucro e acumulação segundo a metodologia no anexo. Dívida externa segundo dados do
BACEN, obtidos no IPEADATA.

Constata-se que a taxa de lucro empresarial e a taxa de endividamento (dívida externa


/ PIB) estão sob mesma tendência de crescimento a partir da implementação do Plano Real.
Todavia, neste mesmo período, a taxa de acumulação de capital produtivo permanece sob
tendência de queda. Os setores não-financeiros respondem à punção rentista representada pela
grande participação dos juros no valor adicionado total gerado na economia brasileira,

391
Como proxy do custo de uso do capital foram utilizadas as taxas de juros dos empréstimos para capital de giro
das empresas, deflacionadas pelo IGP-DI e em seguida anualizadas.
635

elevando a taxa de lucro bruto. Mas conforme a equação (6), a taxa de acumulação deve
declinar se o nível de endividamento e seus encargos superarem o crescimento do excedente
operacional.

Os dados empíricos indicam ser este o caso atual da economia brasileira sob
financeirização forçada . O crescimento econômico não é nunca uma hipótese improvável
nestas condições, como pode ser constatado pela recuperação de 2004. O que está em jogo é a
qualidade e durabilidade desse crescimento, pois sua magnitude e estabilidade dinâmica,
permanecem sempre sujeitos às expectativas dos mercados financeiros e da proporção do
valor adicionado que é apropriada pelas finanças, via punção rentista sobre os setores
diretamente produtivos. O Estado brasileiro não contribui para quebrar este círculo vicioso
entre acumulação financeira (incentivada e em expansão) e acumulação real (contida ou em
queda). Pelo contrário, o atual regime de política econômica reforça e reproduz a dependência
financeira dos setores produtivos. De maneira que a economia cresce até o próximo ataque
especulativo ou pressão inflacionária que ameace as estruturas internas que suportam as
finanças liberalizadas. O Governo responde com aumentos das taxas básicas de juros e o
crescimento é desacelerado.

Para reforçar a base empírica necessária à compreensão dessa problemática


fundamental, a presente abordagem vem mobilizando, de forma recorrente, a análise gráfica
das séries macroeconômicas em questão. Em comparação com o uso de tabelas, este
expediente permite uma visualização mais rápida das dinâmicas e tendências envolvidas, além
de ser um suporte natural para as especificações retidas nos testes econométricos.

O duplo diagrama de dispersão constante do Gráfico 154 mostra nitidamente que


houve expansão da taxas de investimento e de acumulação de capital produtivo enquanto a
razão dídiva externa / PIB permaneceu a abaixo dos 10%, ou seja, no período [1960-1974].
Consequentemente, há um limite a partir do qual a correlação entre endividamento e
investimento inverte o sinal, passando de positiva à negativa. Quando isto ocorre sob
condições estruturais específicas - regime monetário-financeiro inflacionista, entre 1984-1993
e à alta restrição monetária sob finanças liberalizadas, a partir de 1994 o resultado direto é
a estagnação ou a queda da taxa de acumulação de capital.
636

GRÁFICO 154 RAZÃO DÍVIDA /PIB, TAXA DE INVESTIMENTO E TAXA DE ACUMULAÇÃO


(1960-2003)

Taxa de acumulação de capital produtivo = IKPR / K


Taxa de investimento = I / Y
30%
28% 75
74 76
26% 73 77 78 80
24% 72 79
69 71
22% 6870 81
20% 66 60
67 82
86
18% 65
63 87
62 73 7475
64 89
88 8385
16% 61 76 84
71
72 95 90
97 98
14% 69 77 96 94 91
687060 78 80 92
93 01
79 00 99
12% 66
6763
62
61 03
65 02
64 81
10%
82 86
87
8% 88
89
9794
959690 98 8385 84
6% 91 93
92 00 99 01
0203
4%
2%
0% 10% 20% 30% 40% 50%
bx = razão dívida externa / Y

FONTE: Metodologia de construção das séries macroeconômicas no anexo.


NOTA: As curvas ajustadas foram geradas a partir do método de regressão local lowess smoothing.

GRÁFICO 155 RAZÃO DÍVIDA INTERNA FEDERAL /PIB E TAXA DE ACUMULAÇÃO DE


CAPITAL PRODUTIVO (1960-2003)
18%

1974
Taxa de acumulação de capital produtivo IKPR

16% 1975
1973
1976
1972
14% 1971
1969 1977
1970
1968
1980 1978
12% 1966 1979
1967
1965
10% 1964 1981

1982 1986
8% 1987
1985 1988
1989
1983
1984 1997
6% 1994 1995 1996 1990 1998
2000 2001
1991
1993 1999
1992 2003
2002
4%

2%
-10% 0% 10% 20% 30% 40% 50% 60% 70%
Dívida mobiliária interna federal / PIB
FONTE: Metodologia de construção das séries macroeconômicas no anexo.
637

GRÁFICO 156 JUROS E REMESSAS DE LUCRO E DIVIDENDOS E TAXA DE INVESTIMENTO


(1960-2003)
30%

28% 75
76
74
26%
Taxa de investimento = FBKF / PIB

73 77 78 80
24% 72 79
69 71
22% 68 70 81
57
59
20% 58
66
67 82
60 86
18% 56
65 87
63
62 88
16% 64
61 89 83
85
90 84
95
94 97 98
14% 96 91
92 93 01
00 99
12%
03
02
10%

8%
0% 1% 2% 3% 4% 5%
Juros e remessas de lucros e dividendos ao exterior / PIB
FONTE: Metodologia de construção das séries macroeconômicas no anexo.

Este padrão manifesta-se tanto com relação à dívida interna federal (Gráfico 155),
quanto com relação aos pagamentos de juros e remessas de lucro ao exterior (Gráfico 156).
Aliás isto era esperado, pois os endividamentos interno e externo são duas dimensões de um
mesmo fenômeno macroeconômico: a absorção de poupança externa como estratégia de
promoção da acumulação financeira e patrimonial. Por isso os administradores da alta finança
(com os demais rentistas) e os gestores da atual política econômica são sempre contrários ao
controle de capitais. Os primeiros temem a perda de posições e de ganhos de capital que
pressupõem a continuidade da liberalização financeira. Os segundos receiam que possa haver
uma fuga de capitais ou a queda do fluxo de ingresso além das enventuais sanções dos
organismos internacionais - de tal maneira que perderiam tanto o controle da política
econômica quanto sua reputação como bons policy makers de acordo com os critérios dos
mercados financeiros nacional e internacional. Ambos permanecem portanto reféns da lógica
das finanças liberalizadas. Ambos respondem pela manutenção das taxas de acumulação de
capital e de crescimento econômico as mais medíocres de toda a história do capitalismo
industrial brasileiro.

A discussão poderia enveredar também através das dimensões sociológicas e políticas


desse processo, argumentando que se trata de uma questão de perda de soberania do Estado
brasileiro diante das pressões das elites financeiras e dos organismos internacionais. Todavia,
isto supera os objetivos principais desta análise, que se limitará apenas a constatar que essas
638

variáveis consideradas pelas teorias tradicionais como extra-econômicas não o são de


maneira nenhuma.

GRÁFICO 157 TAXA DE LUCRO E TAXA DE ACUMULAÇÃO - DIAGRAMA DE DISPERSÃO

I / K = Spline
18%
74
Taxa de acumulação de capital = FBKF / K

75 73
16%
76
72
14% 71
7768 69 70 60
78
80
12% 79 66
67 62
63 61
65
10% 81 64

82 86
8% 87
88
89 85
83 84 95 97
6% 90 94 98
96
91 99 0201
93
92 03
02
4%

2%
16% 18% 20% 22% 24% 26% 28% 30% 32% 34% 36% 38%
Taxa de lucro = Lucro bruto / K

FONTE: Dados estimados do estoque de capital fixo estimados por MORANDI (2003) e de formação bruta de
capital fixo originários do IBGE e obtidos no IPEADATA.

O diagrama de dispersão (Gráfico 157) a seguir, com a correspondente spline, indica


que a economia brasileira transitou de um regime de crescimento à alta taxa de lucro e
acumulação de capital, para um regime de baixa ou mesmo declinante taxa de acumulação de
capital. Neste último caso, as taxas de lucro que embora tenham se recuperado no período
pós-Real, são absorvidas pela punção rentista que se expressa na imposição de margens mais
elevadas de rentabilidade pelos mercados financeiros. Nestas condições, as taxas de
acumulação real tendem a permanecer em níveis apenas suficientes para reproduzir as
estruturas da acumulação financeira e patrimonial.

Para testar a hipótese de que há um limite a partir do qual o endividamento externo


ou a absorção de poupança externa passa a ter impactos negativos sobre a taxa de
acumulação de capital e então, sobre o crescimento econômico, uma função investimento foi
especificada da seguinte maneira:

TXINV .r 1
.bx (55)
0 1 2
639

FBKFprod
TXINV é a taxa de investimento produtivo ou seja, a formação bruta de capital
PIB
fixo em máquinas, equipamentos e construções não-residenciais como percentagem do PIB.392

é a taxa média de lucro bruto da economia brasileira


r
Kprod
DívidaExterna
bx é a dívida externa como percentagem do produto total.
PIB
As variáveis foram tomadas em logaritmos a fim de que as elasticidades fossem
imediatamente lidas da regressão.
Os resultados da estimação da equação (55) encontram-se no Quadro 200, a seguir:
A equação não se revelou estável para o período completo (Figura 56). Uma
subdivisão fez-se necessária e os testes novamente detectaram que há estabilidade no
subperíodo [1966-1980] que corresponde ao de vigência do regime de acumulação profit-led.

FIGURA 56- TESTES DE ESTABILIDADE PARA A EQUAÇÃO 55


20 1.6 0.4
0.2

10 1.2 0.0
-0.2

0 0.8 -0.4
0.00 -0.6

-10 0.4 0.05

0.0 0.10
-20

0.15
-30 -0.4 70 75 80 85 90 95 00
70 75 80 85 90 95 00 70 75 80 85 90 95 00
One-Step Probability Recursive Residuals
CUSUM 5% Signific anc e CUSUM of Squares 5% Significance

QUADRO 200 ESTIMAÇÃO DA EQUAÇÃO 55 (1966-1980)


Dependent Variable: TXINV
Method: Least Squares
Sample: 1966 1980
Included observations: 15
Variable Coefficient Std. Error t-Statistic Prob.
C -4.015731 0.806200 -4.981061 0.0003
r (-1) 0.866488 0.191387 4.527421 0.0007
bx 0.130275 0.022858 5.699182 0.0001
R-squared 0.805473 Mean dependent var 0.216248
Adjusted R-squared 0.773052 S.D. dependent var 0.109774
S.E. of regression 0.052295 Akaike info criterion -2.886967
Sum squared resid 0.032817 Schwarz criterion -2.745357
Log likelihood 24.65225 F-statistic 24.84409
Durbin-Watson stat 1.427460 Prob(F-statistic) 0.000054

392
Inclui as construções governamentais que, segundo o IBGE, são consideradas produtivas.
640

Seguindo a metodologia utilizada ao longo deste trabalho, deve-se verificar a presença


de raízes unitárias e uma eventual relação de co-integração, para se evitar o problema de
regressões espúrias.
Os testes de raízes unitárias conformam que as três séries em questão são I(1) e além
disso o teste de JOHANSEN confirmou a presença de uma equação de co-integração
(Quadros 201 e 202):

QUADRO 201 TESTE DE RAÍZES UNITÁRIAS PARA TXINV, r e bx (1966-1980)


ADF Test Statistic
TXINV -2.455999 1% Critical Value* -3.9635
r 0.864092 5% Critical Value -3.0818
bx -0.653131 10% Critical Value -2.6829
*MacKinnon critical values for rejection of hypothesis of a unit root.

QUADRO 202 TESTE DE CO-INTEGRAÇÃO DE JOHANSEN (1966-1980)


Sample: 1966 1980
Included observations: 15
Test assumption: Linear deterministic trend in the data
Series: TXINVPR r bx
Lags interval: 1 to 1
Likelihood 5 Percent 1 Percent Hypothesized
Eigenvalue Ratio Critical Value Critical Value No. of CE(s)
0.821008 36.79593 29.68 35.65 None **
0.447195 10.98972 15.41 20.04 At most 1
0.130553 2.098465 3.76 6.65 At most 2
*(**) denotes rejection of the hypothesis at 5%(1%) significance level
L.R. test indicates 1 cointegrating equation(s) at 5% significance level
Normalized Cointegrating Coefficients: 1 Cointegrating
Equation(s)
TXINVPR r bx C
1.000000 -0.820969 -0.098281 3.680350
(0.14969) (0.02582)

Log likelihood 78.26813

Para o próximo período, [1981-2003], as séries têm raízes unitárias mas o teste de
JOHANSEN não revelou nenhuma relação de co-integração, o que está coerente com o fato
de que a economia brasileira sai de sua trajetória de crescimento econômico e acumulação de
capital, a partir dos anos 80 (Quadro 203). No entanto, quando os testes são aplicados ao
subperíodo [1991-2003], uma nova relação de co-integração surge e confirma a influência
particular do endividamento externo sobre as decisões de investimento produtivo.
641

QUADRO 203 TESTE DE CO-INTEGRAÇÃO DE JOHANSEN (1981-2003)


Sample: 1981 2003
Included observations: 23
Test assumption: Linear deterministic trend in the data
Series: TXINVPR LR LBX
Lags interval: 1 to 1
Likelihood 5 Percent 1 Percent Hypothesized
Eigenvalue Ratio Critical Value Critical Value No. of CE(s)
0.609809 27.02305 29.68 35.65 None
0.208008 5.377334 15.41 20.04 At most 1
0.000593 0.013641 3.76 6.65 At most 2
*(**) denotes rejection of the hypothesis at 5%(1%) significance level
L.R. rejects any cointegration at 5% significance level

Os testes são agora executados para o período [1991-2003] que corresponde à fase de
liberalização comercial e financeira (Quadro 204).

QUADRO 204 ESTIMAÇÃO DA EQUAÇÃO 55 (1991-2003)

Dependent Variable: TXINVPR


Method: Least Squares
Sample: 1991 2003
Included observations: 13
Variable Coefficient Std. Error t-Statistic Prob.
C 1.199067 0.575458 2.083675 0.0638
LR(-1) 0.107993 0.166127 0.650065 0.5303
LBX -0.303682 0.059854 -5.073737 0.0005
R-squared 0.744756 Mean dependent var -0.399146
Adjusted R-squared 0.693707 S.D. dependent var 0.101242
S.E. of regression 0.056031 Akaike info criterion -2.726641
Sum squared resid 0.031395 Schwarz criterion -2.596268
Log likelihood 20.72317 F-statistic 14.58908
Durbin-Watson stat 2.067259 Prob(F-statistic) 0.001083
QUADRO 205 TESTE DE CO-INTEGRAÇÃO DE JOHANSEN (1991-2003)
Sample: 1991 2003
Included observations: 13
Test assumption: No deterministic trend in the data
Series: TXINVPR LR LBX
Lags interval: 1 to 1
Likelihood 5 Percent 1 Percent Hypothesized
Eigenvalue Ratio Critical Value Critical Value No. of CE(s)
0.836486 36.24168 34.91 41.07 None *
0.419986 12.70054 19.96 24.60 At most 1
0.350961 5.619403 9.24 12.97 At most 2
*(**) denotes rejection of the hypothesis at 5%(1%) significance level
L.R. test indicates 1 cointegrating equation(s) at 5%
significance level
Normalized Cointegrating Coefficients: 1 Cointegrating
Equation(s)
TXINVPR LR LBX C
1.000000 0.044090 0.289819 -1.610526
(0.12347) (0.05203) (0.49681)

Log likelihood 56.22006


642

Novamente as variáveis são todas I(1), mas desta vez o teste de JOHANSEN detecta
uma relação de co-integração e isto sugere a entrada da economia brasileira em um novo
padrão de acumulação de capital (Quadro 205).
Para facilitar a leitura dos resultados e sua análise, a Tabela 53 a seguir reúne os
valores dos parâmetros estimados. Os resultados são muito claros e confirmam a hipótese de
financeirização da economia brasileira no período pós-Real.

TABELA 53 ELASTICIDADES DE LONGO PRAZO DA RELAÇÃO 55

PERÍODOS r 1 bx

[1966 1980] 0.82 0.10


(5,48) (3,80)

[1991 2003] - 0.04 - 0.30


(0,36) (5,57)

NOTA: As estatísticas t estão entre parênteses.


Sob o regime de crescimento profit-led, vigente no período [1966-1980], os efeitos do
endividamento externo sobre o investimento são positivos, pois parte expressiva dos recursos
externos que ingressaram no país destinaram-se às inversões produtivas. Mas quando se
analisam os resultados do teste econométrico para o período [1991-2003], destacam-se os
seguintes fatos: o coeficiente relativo à taxa de lucro não é mais estatisticamente significativo
e o sinal é agora negativo. O mesmo acontecendo com o sinal do coeficiente relativo a bx,
cujo valor é agora três vezes superior ao do primeiro período (-0,30). Em resumo, a taxa de
investimento não é mais sensível à taxa de lucro e sua sensibilidade à evolução da razão
dívida externa / PIB foi triplicada.

Uma segunda equação estimada considera o efeito do endividamento externo sobre a


acumulação de capital produtivo (sem as construções residenciais). Os resultados estão no
Quadro de nº 206 a 209 e os testes mostram que há instabilidade estrutural a partir dos anos
80 (Figura 57). A relação é estimada apenas para os subperíodos onde há estabilidade e então
novamente surge o intervalo [1966-1980].

IKPR .r 1
.bx , onde IKPR é a taxa de acumulação de capital
1 2 3

produtivo (56)
643

FIGURA 57 TESTES DE ESTABILIDADE DA RELAÇÃO 56 (1957-2003)


0.06 0.06
0.04 0.04
0.02 0.02
0.00 0.00
-0.02 -0.02
-0.04 -0.04
0.00 0.00
-0.06 -0.06

0.05 0.05

0.10 0.10

0.15 0.15
60 65 70 75 80 85 90 95 00 60 65 70 75 80 85 90 95 00

One-Step Probability Recursive Residuals N-Step Probability Recursive Residuals

QUADRO 206 ESTIMAÇÃO DA EQUAÇÃO 56 (1966-1980)


Dependent Variable: IKPR
Method: Least Squares
Sample: 1966 1980
Included observations: 15
Variable Coefficient Std. Error t-Statistic Prob.
C -0.050405 0.030530 -1.650998 0.1246
r(-1) 0.635196 0.094162 6.745740 0.0000
bx 0.005237 0.003552 1.474139 0.1662
R-squared 0.795811 Mean dependent var 0.133507
Adjusted R-squared 0.761779 S.D. dependent var 0.016667
S.E. of regression 0.008135 Akaike info criterion -6.608430
Sum squared resid 0.000794 Schwarz criterion -6.466820
Log likelihood 52.56322 F-statistic 23.38450
Durbin-Watson stat 1.913453 Prob(F-statistic) 0.000072

QUADRO 207 TESTES DE RAÍZES UNITÁRIAS (1966-1980)

ADF Test Statistic


IKPR -1.091526 1% Critical Value* -4.7315
r -1.604992 5% Critical Value -3.7611
bx 0.864092 10% Critical Value -3.3228
*MacKinnon critical values for rejection of hypothesis of a unit root.

QUADRO 208 TESTE DE CO-INTEGRAÇÃO DE JOHANSEN (1966-1980)


Sample: 1966 1980
Included observations: 15
Test assumption: Linear deterministic trend in the data
Series: IKPR r bx
Lags interval: 1 to 1
Likelihood 5 Percent 1 Percent Hypothesized
Eigenvalue Ratio Critical Value Critical Value No. of CE(s)
0.826419 36.32459 29.68 35.65 None **
0.452436 10.05791 15.41 20.04 At most 1
0.065975 1.023775 3.76 6.65 At most 2
*(**) denotes rejection of the hypothesis at 5%(1%) significance level
L.R. test indicates 1 cointegrating equation(s) at 5% significance level
Normalized Cointegrating Coefficients: 1 Cointegrating Equation(s)
IKPR R LBX C
1.000000 -0.648952 -0.004917 0.056461
(0.05315) (0.00277)

Log likelihood 124.7751


644

QUADRO 209 VECM PARA A RELAÇÃO 56 (1966-1980)


Sample: 1966 1980
Included observations: 15
t-statistics in parentheses
Cointegrating Eq: CointEq1
IKPR(-1) 1.000000

R(-1) -0.648952
(-12.2100)

LBX(-1) -0.004917
(-1.77653)

C 0.056461
Error Correction: D(IKPR)
CointEq1 -0.726574
(-2.66530)

D(IKPR(-1)) 0.032316
(0.10160)

D(R(-1)) 0.004711
(0.01908)

D(LBX(-1)) 0.003166
(0.16846)

C 0.001052
(0.34142)
R-squared 0.487023
Adj. R-squared 0.281832

QUADRO 210 ESTIMAÇÃO DA RELAÇÃO ESTÁTICA ENTRE IKPR, r E LBX (1990-2003)


Dependent Variable: IKPR
Method: Least Squares
Sample: 1990 2003
Included observations: 14
Variable Coefficient Std. Error t-Statistic Prob.
C 0.006637 0.011396 0.582390 0.5720
R(-1) 0.114330 0.040289 2.837741 0.0161
LBX -0.017690 0.003098 -5.710196 0.0001
R-squared 0.747818 Mean dependent var 0.053280
Adjusted R-squared 0.701967 S.D. dependent var 0.005457
S.E. of regression 0.002979 Akaike info criterion -8.606951
Sum squared resid 9.76E-05 Schwarz criterion -8.470010
Log likelihood 63.24865 F-statistic 16.30965
Durbin-Watson stat 1.996375 Prob(F-statistic) 0.000512

No período [1990-2003], as séries apresentam raízes unitárias e são todas as três I (1),
mas não co-integram, o que significa que não há relação de longo prazo (Quadro 210 e 211).
Isto é coerente com o predomínio de expectativas de curto prazo nas decisões de
investimento, num ambiente marcado por elevadas taxas de juros e incertezas geradas pela
645

ausência de sinalizações do Estado com relação à retomada das perspectivas de


desenvolvimento ou das prioridades em projetos de infra-estrutura.

QUADRO 211 TESTE DE CO-INTEGRAÇÃO DE JOHANSEN (1990-2003)


Sample: 1990 2003
Included observations: 14
Test assumption: No deterministic trend in the data
Series: IKPR R LBX
Lags interval: 1 to 1
Likelihood 5 Percent 1 Percent Hypothesized
Eigenvalue Ratio Critical Value Critical Value No. of CE(s)
0.678319 33.25401 34.91 41.07 None
0.544088 17.37528 19.96 24.60 At most 1
0.365955 6.378901 9.24 12.97 At most 2
*(**) denotes rejection of the hypothesis at 5%(1%) significance level
L.R. rejects any cointegration at 5% significance level

Um modelo em taxas de variação foi estimado para o período [1981-2003], que inclui
as duas décadas em que se expressam os graves problemas macroeconômcios e estruturais da
economia brasileira. Como neste período a variável taxa de acumulação (IKPR) não
apresentou raiz unitária pelo teste Phillips-Perron (Quadro 212), não há risco de co-integração
e o modelo dinâmico pode captar os efeitos de curto prazo (213).

QUADRO 212 TESTE DE PHILLIPS-PERRON PARA IKPR (1981-2003)


PP Test Statistic -4.322959 1% Critical Value* -3.7497
5% Critical Value -2.9969
10% Critical Value -2.6381
*MacKinnon critical values for rejection of hypothesis of a unit root.

QUADRO 213 ESTIMAÇÃO EM TAXAS DE VARIAÇÃO PARA A RELAÇÃO 56 (1981-2003)


Dependent Variable: TXIK
Method: Least Squares
Sample: 1981 2003
Included observations: 23
Variable Coefficient Std. Error t-Statistic Prob.
C -0.015374 0.017837 -0.861940 0.3989
TXR 0.854946 0.276045 3.097123 0.0057
TXBX -0.274770 0.098762 -2.782147 0.0115
R-squared 0.602135 Mean dependent var -0.033437
Adjusted R-squared 0.562348 S.D. dependent var 0.122493
S.E. of regression 0.081035 Akaike info criterion -2.066753
Sum squared resid 0.131335 Schwarz criterion -1.918645
Log likelihood 26.76766 F-statistic 15.13414
Durbin-Watson stat 2.242566 Prob(F-statistic) 0.000099

No período [1981-2003] o coeficiente relativo à sensibilidade das variações da taxa de


acumulação de capital às variações da taxa de lucro é estatisticamente significativo, assim
como existe efeito negativo do endividamento externo sobre o investimento. Além da
possibilidade do tamanho da amostra estar influindo neste resultado, este período inclui o
646

intervalo [1981-1989], pré-globalização, e portanto, a economia permanecia fechada em


termos comerciais e sem a liberalização da conta capital.

QUADRO 214 ESTIMAÇÃO EM TAXAS DE VARIAÇÃO PARA A RELAÇÃO 56 (1991-2003)


Dependent Variable: TXIK
Method: Least Squares
Sample: 1991 2003
Included observations: 13
Variable Coefficient Std. Error t-Statistic Prob.
C 0.014778 0.031036 0.476157 0.6442
TXR 0.144131 0.519233 0.277585 0.7870
TXBX -0.397944 0.164668 -2.416637 0.0363
R-squared 0.503052 Mean dependent var -0.010611
Adjusted R-squared 0.403662 S.D. dependent var 0.102570
S.E. of regression 0.079208 Akaike info criterion -2.034310
Sum squared resid 0.062739 Schwarz criterion -1.903937
Log likelihood 16.22302 F-statistic 5.061408
Durbin-Watson stat 2.614319 Prob(F-statistic) 0.030308

No período de abertura econômica, [1991-2003], desaparece o efeito lucro sobre as


variações da taxa de acumulação (Quadro 214), constatação que está em consonância com o
Gráfico 150 onde se pôde observar a desconexão entre essas duas variáveis. Por outro lado, a
sensibilidade da acumulação às variações do endividamento externo como proporção do PIB
(-0.397944) é muito maior do que à sensibilidade ao nível dessa variável (-0.017690). Isto
indica que as expectativas de investimento são mais sensíveis à dinâmica da dívida externa do
que ao tamanho relativo do estoque da dívida no produto. Uma implicação possível deste
resultado é que se a dívida estiver em um nível considerável aceitável em termos de
sustentabilidade intertemporal, mas começar a crescer rapidamente, haverá redução do
investimento produtivo.

Como se poderia explicar este fato estilizado em uma perspectiva regulacionista ? A


explicação passa também pela questão da absorção da poupança externa para financiar o
crescimento econômico, mas sob novas estruturas institucionais, diferentes das vigentes entre
1966-1980. Trata-se da emergência de um novo modo de regulação compatível com um
processo de liberalização que buscava afirmar-se como alternativa ao esgotamento do padrão
de financiamento do modo de desenvolvimento por substituição de impotações.

A liberalização comercial e financeira sob orientação neoliberal implicou na mudança


da natureza da restrição externa. Durante o regime de crescimento profit led do milagre , a
restrição externa contribuía para a expansão dos níveis de emprego e salário através do aporte
de recursos externos para o financiamento dos investimentos. No período [1994-2003], a
647

natureza da restrição externa é diferente. O Estado brasileiro promoveu o processo de abertura


da economia e então a mudança na configuração da forma de inserção internacional. Nestas
circustâncias a restrição externa sobredetermina a política econômica, impedindo-a de
responder prontamente às necessidades da acumulação de capital real. O regime de política
econômica volta-se prioritariamente para garantir o fluxo de capitais externos necessários ao
refinanciamento das dívidas interna e externa,393 instaurando um círculo vicioso composto de
mais déficit mais endividamento elevação tendencial das taxas de juros reais maior
pressão sobre o déficit futuro e mais endividamento.

A vigência, no período pós-liberalização e pós-Real, de um regime monetário-


financeiro à alta restrição é a contrapartida da manutenção de um regime de política
econômica pouco favorável aos investimentos produtivos. E isto não porque o sistema
financeiro brasileiro exerça um papel fundamental como agente financiador da acumulação de
capital (o que efetivamente nunca foi), mas porque o regime de demanda derivado dessa
configuração atual do modo de regulação não se mostra compatível com o potencial do atual
regime de produtividade.

5.20 Indicadores de financeirização


Para suportar a hipótese de financeirização são necessários indicadores estatísticos que
possam, mesmo que indiretamente, mostrar o modo como as finanças se articulam com os
setores produtivos.

QUADRO 215 ATIVOS DOS FUNDOS DE PENSÃO EM % DO PIB: VÁRIOS PAÍSES - 2003
Ativos dos Fundos de
% do PIB
Pensão
Holanda 120,0
Suíça 100,0
Rússia 80,0
EUA 78,0
Japão 72,0
Chile 44,3
Brasil 14,4
FONTE: MPAS

393
MIOTTI (1991) constatou o mesmo padrão de evolução para o caso da economia argentina nos anos 80.
Segundo o autor, la politique économique se trouve contraint à une gestion au jour le jour qui empêche la mise
en place d une véritable stratégie de croissance à long terme, et c est ce sans que l on parle de
surdétermination. »
648

O Quadro 215 mostra que na economia brasileira, os investidores institucionais detêm


cerca de 14% do PIB em ativos. Trata-se de uma tendência da economia mundial em época de
finanças liberalizadas.
Como observa AGLIETTA (2001, p.113), a busca por parte das famílias de uma
valorização elevada de sua riqueza financeira modificou as estruturas das finanças e os
investidores institucionais adquiriram uma grande influência. Como resultado, os mercados de
títulos se expandiram e a governança das empresas passa a ser marcada pela vontade dos
acionistas. Em conseqüência, as estratégias das empresas são condicionadas pelos critérios
impostos pelas finanças, incitando-as a se expor ao endividamento.

As consequências macroeconômiocas dessas transformações conduziram ao


surgimento de regimes de crescimento caracterizados por flutuações cíclicas fortemente
influenciadas pelos preços dos ativos financeiros. Nesse contexto, a instabilidade inerente às
finanças liberalizadas aumenta a volatilidade do investimento e então do crescimento
econômico.

GRÁFICO 158 TOTAL DE ATIVOS DAS ENTIDADES FECHADAS DE PREVIDÊNCIA


COMPLEMENTAR COMO PERCENTAGEM DO PIB (1996-2004)

Ativos das Entidades Fechadas de Previdência Complementar / PIB


18%
72 bilhões
16% de US$*

14%

12%
24 bilhões
10% de US$

8%

6%

4%

2%

0%
1996 1997 1998 1999 2000 2001 2002 2003 2004
FONTE: ABRAPP.
NOTA: O valor para 2004 refere-se à posição de janeiro.

Uma questão fundamental por suas implicações para os regimes de acumulação refere-
se às particularidades nacionais dessas novas relações estruturais e as macro-regularidades
649

que determinam. No Gráfico 158 pode ser constatado que parcelas cada vez maiores da
poupança financeira brasileira são também mobilizadas por investidores institucionais
fundos fechados e abertos de previdência, fundos mútuos de investimentos e companhias de
seguro. Todavia, a Tabela 54 mostra que a expansão dos investidores institucionais no
mercado financeiro brasileiro processa-se basicamente por ativos não conectados à atividade
diretamente produtiva. 63% dos ativos totais correspondem a títulos de renda fixa, isto é,
ativos que são remunerados por juros, em grande parte ligados à dívida pública brasileira. Em
segunda posição, encontram-se os ativos de renda variável (ações) com uma participação de
28%. Os demais ativos possuem participações economicamente pouco expressivas. Portanto,
da análise da composição do ativo das entidades fechadas de previdência complementar pode-
se concluir que, no caso brasileiro atual, a poupança absorvida por esses investidores
institucionais não está sendo canalizada para atividades diretamente produtivas. Essas
instituições simplesmente se adaptam ao ambiente macroeconômico e seu correspondente
regime de política econômica, onde vigoram altas taxa de juros reais que tendem a tornar a
grande maioria das alocações produtivas pouco rentáveis ou muito arriscadas vis-à-vis a
detenção de direitos de propriedade sobre a renda de terceiros.
Em suma, a atuação dos investidores institucionais não é uma panacéia para a
obtenção de poupança necessária ao financiamento do investimento. Na realidade, a opção
por ativos financeiros em detrimento dos ativos reais não só confirma a vigência de uma
estrutura econômica financeirizada como também a reforça e reproduz. Essas constatações
indicam que a manutenção de taxas de juros exorbitantes e sua contrapartida, a
financeirização usurária, não são derivações lógicas das opções disponíveis de política
econômica. Sua persistência indica que existem estruturas organizacionais e mecanismos de
legitimação que se incorporaram ao atual modo de regulação brasileiro e como tal encontram
apoio para sua continuidade no seio do próprio Estado.
650

TABELA 54- ATIVO DE INVESTIMENTO DAS ENTIDADES FECHADAS DE PREVIDÊNCIA


COMPLEMENTAR, R$ MIL - POSIÇÃO EM JAN/2004

Patrocínio Patrocínio
Segmento de Aplicação Total
Público Privado

Renda Fixa 75.119.597,45 61.889.732,94 137.009.330,39 63,1%

Renda Variável 47.800.520,12 13.062.751,02 60.863.271,14 28,0%

Investimentos
8.033.414,68 3.189.449,96 11.222.864,64 5,2%
Imobiliários
Operações com
6.569.389,85 899.142,99 7.468.532,84 3,4%
Participantes

Outros Realizáveis 462.440,24 37.863,78 500.304,02 0,2%

Total 137.985.362,34 79.078.940,69 217.064.303,03 100,0%

FONTE: ABRAPP.

O Gráfico 159 foi elaborado a partir dos dados das chamadas Contas Intermediárias do
IBGE, que fornecem informações desagregadas por setores institucionais (empresas
financeiras; empresas não-financeiras; administração pública; previdência e instituições de
seguros). No presente caso, trata-se das empresas não-financeiras e que podem ser tomadas
como uma proxy dos setores diretamente produtivos da economia brasileira, para verificar o
modo como são afetados pela financeirização usurária. As seguintes constatações podem ser
feitas:
a) A reduzida participação dos pagamentos de dividendos é uma expressão da atrofia
relativa do mercado de capitais na economia brasileira. Conseqüência tanto de uma
excessiva concentração da propriedade dos ativos produtivos e da renda, como da
ausência de uma instucionalidade que promova o acesso da população aos ativos
empresariais;
651

GRÁFICO 159 REPARTIÇÃO DO VALOR ADICIONADO DAS EMPRESAS NÃO-FINANCEIRAS


(1995-2002)

Lucro empresarial (Le)


Salários e contribuições (W)
Distribuição de dividendos aos acionistas(D)
Pagamento de juros ao setor bancário-financeiro(J)
Impostos totais(T)
120%

100%
Le

80%

W
60%

40%

D
20% J

0% T
1995 1996 1997 1998 1999 2000 2001 2002

FONTE: Elaborado a partir dos dados das Contas Intermediárias do IBGE.

b) O Governo ampliou sua parcela de 5,1% (1995) do VA deste setor institucional, para
7,4% (em 2002);
c) Abstraindo-se da participação reduzida dos dividendos, observa-se que apenas os
salários e contribuições perderam participação no total do valor adicionado. Todas as
outras componentes aumentaram sua participação e, consequentemente, às expensas da
massa salarial, que passa de 60,3% em 1995 para 43,2% em 2002. Uma perda
considerável de 17% que certamente terá impactos na evolução da demanda efetiva
desta economia;
d) Um outro destaque fica por conta dos lucros líquidos cuja participação aumenta de
12,2% em 1995, para 29,1% em 2002; ou seja, a proporção do aumento dos lucros
(+16,9%) coincide com a proporção perdida pelos salários (-17%). Um fato
característico que já havia sido constatado na análise da WLN, pois o aprofundamento
de seu caráter concorrencial tinha exatamente como objetivo a restauração da
lucratividade dos setores produtivos, para fazer face à lógica da globalização neoliberal
que lhes foi imposta;
652

e) Destaca-se também neste período, a expansão dos pagamentos de juros realizados


pelas empresas não-financeiras ao setor bancário-financeiro. Um outro fato
característico do período pós-liberalização e pós-Real que contribuiu significativamente
para a capitalização dos grandes bancos. Isto porque a base da rentabilidade financeira
consiste exatamente no diferencial entre juros recebidos e juros pagos pelos demais
setores não financeiros. Mas como já foi constatado, na economia brasileira as taxas de
juros reais são simplesmente exorbitantes e sancionadas pelo próprio Governo que está
sempre encontrando razões para justificar sua manutenção em patamares incompatíveis
com uma economia industrial moderna.

TABELA 55 JUROS RECEBIDOS, JUROS PAGOS E VALOR ADICIONADO PELO SETOR


FINANCEIRO EM PERCENTAGEM DO PIB (1995-2002)

JR / Y JP / Y VA financeiro / Y

1990 67,7 58,8 8,8


1991 62,5 56,6 5,9
1992 86,7 77,2 9,5
1993 37,4 33,5 3,9
1994 75,9 67,6 8,3
1995 29,6 23,8 5,8
1996 23,8 18,6 5,3
1997 22,2 17,1 5,1
1998 26,8 21,5 5,3
1999 42,9 38,6 4,3
2000 18,6 15,0 3,6
2001 33,1 27,9 5,2
2002 46,8 41,2 5,6
FONTE: Elaborado a partir de dados do IBGE.
NOTA: A participação do sistema financeiro no PIB (VAfinanceiro / PIB) é mensurada pelo
método SIFIM.
Uma outra questão que deve ser destacada por sua relevância refere-se à mensuração
da participação do setor financeiro no valor adicionado total da economia. O método de
mensuração consiste no cálculo do valor dos serviços de intermediação indiretamente
medidos (SIFIM) e que corresponde, principalmente,394 ao diferencial entre juros recebidos e
pagos pelas instituições financeiras. Como se trata de uma diferença entre dois fluxos, o
SIFIM tende a ocultar a real participação do setor financeiro na economia brasileira. Através
do exame das Tabela 55 e 56, juntamente com o Gráfico 160, pode-se constatar que embora

394
Principalmente , porque se deve adicionar também uma fração reduzida correspondente aos serviços
mercantis como o valor das tarifas cobradas pelos bancos e demais instituições financeiras. Um componente que
alías aumentou demasiadamente no período pós-Plano Real para compensar, juntamente com a elevação das
taxas de juros proporcionada pelo Governo, a perda dos ganhos inflacionários que no período [1980-1993]
responderam pela maior parte dos lucros dos grandes bancos brasileiros.
653

tenha havido queda da participação do setor financeiro no PIB pelo método SIFIM, os
montantes de juros cobrados pelos bancos e distribuídos aos rentistas permaneceram elevados
como proporções do PIB. Em 1999, ano da crise cambial que forçou o Governo a mais do que
dobrar as taxas básicas de juros (SELIC) em relação a 1998, há grande expansão desses fluxos
de juros sobre o PIB e no entanto, o diferencial que corresponde ao SIFIM perde participação
no produto total. Nos anos de 2001 e 2002, os fluxos de juros recebidos pelas instituições
financeiras e distribuídos aos rentistas voltam a crescer e suas participações no PIB aumentam
muito mais do que a participação do SIFIM.

TABELA 56 JUROS RECEBIDOS E PAGOS PELO SFN - PARTICIPAÇÕES MÉDIAS POR


PERÍODO (1990-2002)

Períodos JR / Y JP / Y SIFIM / Y

[1990-1994] 66,0 58,8 7,3

[1995-2002] 30,5 25,5 5,0

NOTA: JR/Y = juros recebidos pelo sistema financeiro nacional-SFN como percentagem do PIB;
JP/Y = idem para juros pagos pelo SFN;
SIFIM / Y = participação dos serviços de intermediação financeira no PIB.
GRÁFICO 160 VALOR ADICIONADO DO SETOR FINANCEIRO E JUROS RECEBIDOS E PAGOS
PELO SETOR FINANCEIRO (1990-2002)

Juros recebidos pelo setor financeiro / PIB


Juros pagos pelo setor financeiro / PIB
Juros recebidos - Juros pagos (SIFIM) / PIB
100%

90%

80%

70%

60%

50%

40%

30%

20%

10%

0%
1990 1992 1994 1996 1998 2000 2002

FONTE: Elaborado a partir de dados do IBGE.


654

O montante médio de juros recebidos pelo sistema financeiro no período [1990-1994]


situou-se em 66% do PIB, enquanto o montante médio de juros pagos aos rentistas atingiu
58,8% do produto total. No período de estabilização de preços, [1995-2002], as médias para
os juros recebidos e pagos caíram, respectivamente, para 30,5% e 25,5%. São cifras ainda
vultosas que expressam a vigência de um padrão de financeirização usurária na economia
brasileira. Isto significa que o método SIFIM não deve ser utilizado como um indicador do
grau de financeirização de uma economia, pois a simples queda do valor adicionado
financeiro no PIB, mensurada por essa metodologia recomendada pelo SNA395, omite a
magnitude do VA apropriado por uma parte da população brasileira na condição de rentista e,
portanto, parceira da acumulação financeira e patrimonial.

Uma das condições de viabilidade de um regime de acumulação financeirizado refere-


se aos impactos do aumento da riqueza financeira sobre as decisões de consumo. Todavia, mo
caso brasileiro, as correlações entre o estoque de ativos financeiros (AF) e o consumo final
das famílias (CF) são negativas e sobretudo reduzida no período 1988-2003 (-0,17; Quadro
216).

QUADRO 216 CORRELAÇÕES ENTRE ATIVOS FINANCEIROS E CONSUMO DAS FAMÍLIAS


(1988-2003)

Correlação entre AF e
Período
CF

[1988-2003] -0.170395

[1988-1993] -0.612353

Pode ser estabelecida uma relação entre os juros recebidos pelos rentistas e a dinâmica
da demanda efetiva. Mas como observam BELUZZO e ALMEIDA (2002), é relevante
relembrar as análises desenvolvidas por TOBIN (1978) sobre a propensão a consumir dos
rentistas e sobre a inelasticidade da poupança rentista, proposta por KALECKI (1973) e
STEINDL(1983). A propensão a consumir dos possuidores de riqueza líquida é baixa e sua
poupança inelástica às variações da renda. Além disso, em uma situação de queda dos preços
dos ativos, a poupança dos rentiers tende a se elevar.
Um teste econométrico simples (Quadro 217) mostra que, embora estatisticamente
significativa e positiva, a elasticidade do consumo das famílias às variações do estoque de

395
System of National Accounts (SNA)-ONU-FMI é o sistema-padrão dos métodos de elaboração das contas
nacionais recomendado por esses organismos internacionais. O Departamento de Contas Nacionais do IBGE
adota essa metodologia para a construção dos agregados macroeconômicos, incluindo os relativos ao valor
adicionado pelo setor financeiro.
655

ativos financeiros é de fato reduzida (0,20)396. Um aumento de 1% no estoque de ativos


financeiros eleva o consumo em apenas 0,2%. Esse padrão inelástico pode ser explicado pela
excessiva concentração da renda já que apenas uma fração reduzida das famílias brasileiras,
as de mais alta renda, tem acesso ao mercado bancário-financeiro, mas também pela própria
teoria econômica. Em pesquisa recente, POCHMANN (2004) mostrou que 10% das famílias
mais ricas (que controlam 45,3% do PIB, segundo o IBGE) detêm 75,4% de todo o estoque de
riqueza brasileira. Portanto, a concentração em estoque é muito superior à concentração em
termos de fluxo, tradicionalmente divulgada pelas mídias e a propriedade de ativos
financeiros reflete esse perfil.
No Quadro 218 encontram-se os resultados da estimação da relação entre os juros
pagos pelo setor financeiro aos demais setores da economia brasileira (JPF) e o consumo final
das famílias (CF). O coeficiente relativo ao consumo é negativo embora estatisticamente
significativo. Isto significa que o aumento dos juros pagos pelo setor financeiro aos rentistas
(causado, por exemplo, pelo aumento das taxas de juros básicas do governo), reduz o
consumo final das famílias, sendo portanto, um fator que restringe a demanda efetiva da
economia brasileira.397

QUADRO 217 ESTIMAÇÃO DA RELAÇÃO ENTRE AF E CF (1994-2003)


Dependent Variable: TXCF
Method: Least Squares
Sample(adjusted): 1994 2002
Included observations: 9 after adjusting endpoints
Variable Coefficient Std. Error t-Statistic Prob.
TXAF 0.199201 0.056207 3.544054 0.0076
R-squared 0.422547 Mean dependent var 0.018956
Adjusted R-squared 0.422547 S.D. dependent var 0.028898
S.E. of regression 0.021960 Akaike info criterion -4.694771
Sum squared resid 0.003858 Schwarz criterion -4.672858
Log likelihood 22.12647 Durbin-Watson stat 2.062974

NOTA: TXCF = taxa de variação real do consumo final das famílias;


TXAF = taxa de variação real do valor do estoque de ativos financeiros.
Os estoques de ativos financeiros incluem títulos públicos em poder do público,
títulos privados em poder do público, quotas de fundo de renda fixa e aplicações

396
Um teste mais eficaz deveria ser realizado com o fluxo de renda gerado por esses ativos financeiros e
efetivamente apropriado pelas famílias. Mas há grande dificuldade em se ter acesso a esse tipo de dado, que
normalmente não é disponibilizado pela Receita Federal brasileira.
397
Em Régulation et croissance, BILLAUDOT (2001, p. 281) observa que os regimes do tipo finance led growth
tendem a ser instáveis pelas seguintes razões: vigência de uma regulação neo-concorrencial dos salários e dos
preços, num contexto em que os ganhos de produtividade são obtidos às expensas do emprego. Disto resulta que
o crescimento da produtiviade tende a superar a expansão da massa salarial. Nas palavras do autor: la
productivité a um effet positif sur les profits. Comme ces derniers déterminent pour une part les cours, la
productivité impulse donc à la hausse à la fois l investissement et la consommation (via l effet de richesse). Mais
cela est insuffisant, (...) pour contrecarrer l effet négatif de la productivité sur la consommation qui passe par
l emploi. Au total, on retrouve un régime de demande à pente négative », e, portanto, incapaz de sustentar
dinamicamente o regime de produtividade.
656

em poupança. Os dados são provenientes do Banco Central do Brasil.

QUADRO 218 - ESTIMAÇÃO DA RELAÇÃO ENTRE JP E CF (1993-2003)


Dependent Variable: D(CF)
Method: Least Squares
Sample: 1993 2002
Included observations: 10
Variable Coefficient Std. Error t-Statistic Prob.
C 0.020761 0.007229 2.871993 0.0208
D(JPF) -0.102476 0.042603 -2.405376 0.0428
R-squared 0.419694 Mean dependent var 0.023041
Adjusted R-squared 0.347156 S.D. dependent var 0.028047
S.E. of regression 0.022662 Akaike info criterion -4.559414
Sum squared resid 0.004108 Schwarz criterion -4.498897
Log likelihood 24.79707 F-statistic 5.785836
Durbin-Watson stat 1.776286 Prob(F-statistic) 0.042816
NOTA: D(CF) = primeiras diferenças do log do consumo final das famílias;
D(JPF) = primeiras diferenças do log do valor do fluxo de juros reais pagos pelo
sistema financeiro aos demais setores da economia.

Em resumo, numa economia como a brasileira, de alta concentração da propriedade e


da renda, onde o mercado de capitais é pouco desenvolvido e com um sistema financeiro
voltado preponderantemente para operações de curto prazo, a financeirização adquire um
caráter usurário, pois baseada sobretudo em juros. Nutrindo-se permanentemente do
endividamento público, ela o reproduz, instaurando um círculo vicioso em que mais
endividamento exige maiores taxas de rentabilidade esperada, conduzindo a um maior e novo
endividamento. Em conseqüência, sob condições de financeirização usurária, o consumo
agregado e o investimento são penalizados e as tendências estagnacionistas um resultado
direto, porque as poupanças das empresas e das famílias são retidas num circuito improdutivo
de acumulação patrimonial.398

5.21 Síntese dos principais resultados


i. A principal causa da elevação da taxa de ociosidade no período 1981-2003 foi a queda da
taxa de lucro iniciada em 1974. O modo de desenvolvimento por substituição de
importações processava-se sob a lógica de regimes de crescimento do tipo profit-led com
forte presença do Estado e participação do capital estrangeiro. A economia brasileira
jamais realizou a transição para um regime wage-led ou export-led que poderiam ser a

398
O regime de acumulação financeirizado (porém não usurário) que os EUA conheceram nos anos 90, facultou-
lhes o crescimento, porque a circulação financeira exercia impactos positivos sobre o consumo e o investimento,
dada a elevada participação das famílias como proprietárias de ativos financeiros (de renda fixa e variável). Não
é o caso da economia brasileira onde o mercado de capitais e de renda fixa está restrito às camadas de mais alta
renda e onde os juros respondem pela maior parte dos ganhos financeiros. Daí a noção de financeirização
usurária em oposição a uma financeirização, por assim dizer, acionária porquanto baseda no mercado de
capitais e não no mercado de títulos de renda fixa.
657

base para uma sociedade de consumo de massa e mais igualitária. Neste contexto, a queda
da taxa de lucro, concomitantemente a uma expansão e concentração financeiras sem
precedentes históricos, desencadearia a queda da taxa de utilização da capacidade
produtiva instalada;

ii. Em inícios dos anos 90, a taxa de lucro se recupera, mas a taxa de acumulação de capital
permanece estagnada. Durante as fases de forte crescimento econômico, taxa de
acumulação, taxa de lucro e taxa de utilização da capacidade produtiva permaneceram
positivamente relacionadas. No período pós-Plano Real, a persistência de uma elevada
taxa de ociosidade pode ser explicada pelo processo de financeirização que submete a
economia brasileira às prerrogativas da globalização e tem como suporte o elevado
endividamento externo e interno do país. As evidências empíricas indicam que a economia
brasileira atual funciona sobre a base de um novo regime impulsionado pelas finanças ou
regime do tipo finance led growth;

iii. Ao manter taxas reais de juros extremamente elevadas e a taxa de câmbio sobrevalorizada,
o atual regime de política econômica torna-se ele próprio um obstáculo ao ajuste fiscal e
ao equilíbrio das contas externas. Consequentemente, a estabilidade em sua acepção
macroeconômica, e que não se reduz à estabilidade de preços, nunca é alcançada, não
passando de uma retórica oficial para legitimar o modelo econômico diante da opinião
pública;

iv. Os testes empíricos confirmam a forte correlação entre crescimento e acumulação de


capital na economia brasileira, no período 1941-2003. O teste de causalidade de
GRANGER revela que há causalidade bilateral entre acumulação de capital e crescimento
do PIB. A análise de co-integração revela que existe uma relação de longo prazo entre
essas variáveis, demonstrando a importância fundamental da acumulação de capital para o
desenvolvimento econômico do país. As séries tendenciais dessas variáveis mostram que a
economia brasileira, após um longo período de expansão e de acumulação de capital, saiu
de sua trajetória de crescimento de longo prazo, demonstrando uma grande dificuldade
para reencontrá-la sob novos regimes de acumulação;

v. O regime de acumulação foi predominantemente extensivo no período 1951-1963, com os


ganhos de produtividade permanecendo estagnados entre 1951-60 e em queda entre 1961-
63. Um fato que está coerente com os resultados do Plano de Metas que visava ampliar a
capacidade produtiva instalada e consolidar a industrialização do país;
658

vi. A crise de 1960-63 marca a transição para um regime de acumulação à dominante


intensiva. Além disso, a análise econométrica revela que o padrão de crescimento no
período 1966-1980 foi do tipo profit led, em razão da alta sensibilidade da taxa de
acumulação de capital à taxa de lucro. A taxa média de lucro foi excepcionalmente
elevada e apesar do salário médio real ter crescido, esse crescimento permaneceu abaixo
dos ganhos de produtividade. Isto confirma o processo de concentração funcional da renda
que caracterizou o período do milagre econômico brasileiro ;

vii. A crise do regime de acumulação responsável pelo milagre brasileiro manifestou-se


numa queda tendencial, forte e prolongada da taxa média de lucro e da taxa de acumulação
de capital da economia brasileira, observada entre 1973-1993. Isto significa duas décadas
de declínio tendencial em duas variáveis fundamentais ao processo de crescimento
econômico;

viii. Deve ser ressaltado que apesar dos anos 90 serem considerados uma segunda década
perdida em termos de crescimento e de desenvolvimento econômico, foi a partir de 1994
que a taxa geral de lucro saiu de sua tendência de declínio. Em 2002, a taxa geral de lucro
da economia brasileira atinge o nível de 25,8%, o mais alto desde a recessão de 1983.
Quando se consideram as taxas de variação da taxa de lucro, observa-se que a série
tendencial permanece numa trajetória de crescimento entre 1980 e 2002. Reconhecendo-se
que os pontos de queda acentuada foram provocados deliberadamente por intervenções do
Estado (recessões de 1981-1983; Planos Collor I e II, 1990-1992; aumento das taxas de
juros em resposta à crise cambial de 1998-1999), não há razões para supor que,
estruturalmente, a economia brasileira apresente problemas de rentabilidade ou de
valorização dos capitais.

ix. A taxa média de lucro é um indicador fundamental nas análises das crises econômicas. No
caso brasileiro atual, constatou-se que essa variável apresenta-se numa nítida trajetória de
recuperação. A conclusão direta é que não há indícios de crise estrutural na economia
brasileira. Por outro lado, também não há razões teóricas para supor que o
restabelecimento da lucratividade seja uma condição por si só suficiente para relançar a
economia num processo de crescimento econômico forte e durável. A elevação da taxa de
lucro pode ser, por exemplo, um meio de sobrevivência dos capitais diretamente
produtivos diante da punção rentista que lhes é imposta pelo capital financeiro numa
época de globalização neoliberal ;
659

x. O período 1994-2002 destaca-se por ser o único em que o salário médio real permaneceu
em queda média de 1,1% a.a, enquanto as produtividades do capital e do trabalho, para o
total da economia, cresceram à taxas médias de 0,9% a.a. e 1,5% a.a, respectivamente. Um
outro contraste em relação aos padrões identificados no intervalo 1950-1973 refere-se aos
ganhos médios de produtividade do trabalho para o total da economia. No período pós-
Plano Real, a produtividade do trabalho cresceu a uma taxa média de 1,5% a.a, enquanto
entre 1950-56; 1957-66 e 1967-73, o crescimento foi respectivamente de 3,4%; 4% e 7%
a.a. com expansão do emprego e do salário médio real;

xi. A análise empírica revelou que o padrão de acumulação de capital do período pós-Real é
muito diverso do observado durante o modo de desenvolvimento por substituição de
importações. Uma das características mais surpreendentes desse novo regime finance led
growth é precisamente a desconexão entre taxa de lucro e taxa de acumulação de capital;

xii. A análise da mudança estrutural como mudança de regime proposta por GAFFARD
(1997) e GAFFARD e AMENDOLA (1998), quando aplicada ao caso brasileiro revela os
seguintes fatos:

no período 1951-1975, o regime de acumulação foi do tipo A, ou seja, correspondente


às trajetórias em que as taxas de crescimento do investimento por pessoal ocupado
(INV) supera os ganhos de produtividade (PR) . Trata-se de um regime de crescimento
no qual o progresso técnico incorporado é comandado por uma forte acumulação de
capital. Por outro lado, pode revelar também uma utilização ineficaz do capital ou
expressar o paradoxo da produtividade, característico das fases iniciais de mudança
tecnológica;

entre 1976-1980, o regime de acumulação em vigor caracteriza-se por ganhos de


produtividade superiores às taxas de investimentos por pessoal ocupado e portanto,
trata-se de um regime do tipo B. Esta fase praticamente coincide com a fase de
implementação do II PND (1975-1979);

no período 1981-1992, por esta metodologia, foi detectada a vigência de um regime de


crise ou de contração caracterizado por taxas de crescimento negativas tanto para a
variável INV quanto para PR;

entre 1993-1997, um padrão do tipo A retorna com elevados ganhos de produtividade


aparente do trabalho mas, processando-se sob finanças liberalizadas, será facilmente
abortado pelo ataque especulativo de 1998-1999;
660

no período 1998-2003, a taxa média de crescimento da variável INV e de PR foram


negativas, configurando a entrada em um novo regime de crise ou de contração.

x. No que concerne à relação de KALDOR-VERDOORN (KV), os trabalhos empíricos


mostram que há diferenças substanciais no grau de retorno de escala estimado quando a
relação é testada com as variáveis em taxa de crescimento (especificação dinâmica) e
quando é realizada em níveis (especificação estática). Essa constatação, originária de uma
análise empírica de McCOMBIE (1982), reconhece que ao se testar esta relação com as
variáveis em níveis (log), o grau de retorno de escala é muito reduzido ou mesmo
inexistente.

xi. Não há evidências empíricas de que a relação de KALDOR-VERDOORN tenha atuado na


economia brasileira no período [1962-1980], que inclui a fase de forte expansão do
milagre (1967-1973). Embora isto não signifique a ausência de qualquer influência ou
dependência entre essas variáveis, o resultado encontrado não permite suportar a hipótese
de que a relação de KALDOR-VERDOORN esteve presente ao menos neste período da
história econômica brasileira, pois o fato das séries não co-integrarem expressa a ausência
de uma relação de longo prazo entre as dinâmicas da indústria e do PIB.

xii. Para o período 1991-2003, também não foram obtidas evidências empíricas que suportem
a existência da relação KV. A abordagem kaldoriana dessa relação está fundada na
existência de causação cumulativa no plano macroeconômico, pressupondo a influência
da demanda agregada como fator de impulsão da dinâmica da indústria e da economia.
Todavia, na década de 90, a demanda agregada permaneceu na maior parte do período
muito contida, tanto pelo regime de política econômica quanto pela elevação do
desemprego conjuntural e estrutural;

xiii. Com uma especificação em taxas de variação surge uma relação entre o produto do setor
industrial e o crescimento econômico. Mas o problema com essa especificação dinâmica,
apesar de ter sido formulada pelo próprio KALDOR, é que ela expressa a relação de curto
prazo e não as macro-regularidades de longo prazo pressupostas pela teoria. O teste de
causalidade de GRANGER, para essa especificação mostra que o produto industrial
causa-Granger o PIB brasileiro. Todavia, na ausência de co-integração não se poderia
sustentar a validade empírica da primeira lei de KALDOR para o período 1901-2003. Por
outro lado, a grande maioria dos trabalhos empíricos que testaram a relação de KV para a
economia brasileira, não realizou os testes de estabilidade estrutural. Quando se
consideram as mudanças estruturais (que normalmente afetam os testes de raízes unitárias
661

e de co-integração) e se estima essa relação apenas para os subperíodos de estabilidade, os


testes empíricos não confirmam a ocorrência dessa relação para a economia brasileira;

xiv. Quanto aos setores não-industriais, os resultados do teste de causalidade de GRANGER


foram inconclusivos e portanto, não suportam a validade da primeira lei de KALDOR
também para essas atividades econômicas;

xv. O modelo de BOWLES-BOYER (1990; 1995) para os regimes de acumulação foi testado
para o caso brasileiro, na versão proposta por UEMURA (2000). Os resultados das
estimações das funções poupança, investimento e exportações líquidas permitem as
seguintes considerações:

a) No que concerne à função poupança:

no período 1950-1980, foi detectada a vigência de um processo kaldoriano


de determinação da poupança agregada, de acordo com as propensões a
poupar dos trabalhadores assalariados e dos proprietários de capital. O
coeficiente relativo à taxa de poupança proveniente dos lucros apresentou o
valor de 0,65 e o relativo à taxa de poupança salarial foi de 0,35. Essas
estimativas referem-se às elasticidades de equilíbrio de longo prazo,
conectando a poupança agregada à evolução da distribuição primária da
renda entre lucros e salários;

no período 1984-2003, a poupança agregada, a massa de lucros e a massa


salarial não co-integram. Este resultado pode ser interpretado como
expressando a ausência de uma relação de longo prazo entre essas
variáveis. Um fato decorrente das transformações no modo de regulação e
no regime de acumulação que marcaram essas duas décadas;

b) Quanto à função investimento:

No período 1966-1980, o coeficiente relativo à sensibilidade da taxa de


acumulação de capital à evolução da taxa de lucro apresentou o valor de
0,44 e o relativo à taxa de utilização da capacidade produtiva instalada foi
de 0,34;

No período 1984-2003, as variáveis da função investimento não co-


integram e como no caso da função poupança, não há uma relação de longo
prazo. Uma especificação em taxas de variação para captar os efeitos de
662

curto prazo revela que a taxa de acumulação de capital deixou de ser


sensível às variações da taxa de lucro. Um resultado que já poderia ser
inferido a partir da análise gráfica das séries temporais em questão. Por
outro lado, a elasticidade da taxa de acumulação de capital às variações da
taxa de utilização da capacidade produtiva instalada revelou-se muito
elevada (2,50). Este fato reforça o argumento de que a queda da taxa de
acumulação de capital, nas décadas de 80 e 90, não pode ser
satisfatoriamente explicada apenas pela insuficiência de poupança;

Uma análise da dinâmica da taxa geral de lucro e da taxa de acumulação de


capital confirma a forte dependência da segunda em relação à primeira. Um
pressuposto teórico das abordagens neo-estruturalistas também
compartilhado pela Teoria da Regulação. Tanto que o teste de de
JOHANSEN detectou uma relação de co-integração entre lucro e
acumulação. Consequentemente, há uma relação de longo prazo entre essas
variáveis, de acordo com o estabelecido pela teoria econômica marxiana e
pelos trabalhos de KALECKI. Conforme GRANGER, se duas séries são
co-integradas então deve existir pelo menos uma relação de causalidade
unilateral entre elas. Quando aplicado a essas variáveis, no período 1966-
1993, o teste de causalidade de GRANGER revela que a taxa de lucro
causa-Granger a acumulação de capital. Consequentemente, a tendência
declinante da taxa de lucro encontra-se entre as principais razões estruturais
para a queda da taxa de acumulação de capital e então, para o baixo
crescimento econômico no período 1974-1993;

Um dos resultados das transformações do modo de regulação ao longo da


década de 90 foi a queda da wage-share e, consequentemente, a expansão
da profit share a uma taxa média de 2,5% a.a. entre 1993 e 1999;

Tanto sob a fase de expansão do Plano de Metas (1955-1962), quanto


durante a fase do milagre (1967-1973) observa-se um afastamento entre
as dinâmicas da produtividade (PR) e do salário médio real (WR). Numa
perspectiva regulacionista, a desconexão entre PR e WR surge como um
fator endógeno de crise ou bloqueio da taxa de acumulação de capital, já
que tende a tornar incompatíveis o regime de produtividade e o regime de
demanda;
663

A crise dos anos 60 pode ser interpretada como um resultado desse


afastamento entre a evolução dos ganhos de produtividade e o salário
médio real, quando a acumulação de capital inicia sua fase intensiva.
Enquanto crise cíclica, ela não decorreu da desestruturação do modo de
regulação vigente, mas da incapacidade das formas institucionais em
absorver os novos desequilíbrios gerados por uma expansão rápida das
capacidades de produção, durante a implementação do Plano de Metas.
Este fato encontra suporte empírico, a partir de uma análise das reformas
institucionais do PAEG. Esse conjunto de mudanças institucionais
contribuiu para capacitar o modo de regulação para uma nova fase de
expansão, mantendo-se a mesma lógica do modo de desenvolvimento por
substituição de importações;

A crise do regime de acumulação do milagre mostra-se muito mais grave


quando se utiliza a taxa de lucro como indicador de crise. A queda
tendencial da taxa média de lucro processa-se por duas décadas, enquanto
na crise dos anos 60, a fase de declínio não ultrapassou seis anos. Trata-se
de um claro sinal de crise estrutural e não de uma crise cíclica que pode ser
absorvida nos quadros da regulação em curso ou através de reformas que
não põem em causa a lógica do regime de acumulação;

Na década de 90, um conjunto de transformações estruturais possibilitou a


economia brasileira sair de sua trajetória marxiana de queda tendencial
da taxa geral de lucro. Essas transformações além de permitirem a
superação da alta inflação e a redução dos preços dos bens de capital,
desencadearam um processo rápido de mudança nas configurações das
formas institucionais. Um resultado direto foi a elevação do regime
monetário financeiro e do novo padrão de inserção internacional à categoria
de formas institucionais hierarquicamente superiores, submetendo o
Estado e a wage-labor nexus às prerrogativas de uma adesão neoliberal ao
processo de globalização;

O caráter concorrencial da WLN foi aprofundado, ampliando-se a


flexibilidade quantitativa e salarial. Em conseqüência, a participação dos
lucros no PIB passa de 47% em 1990, para 59% em 2003. O período
caracteriza-se pela queda do nível geral de emprego e pela redução do
664

salário médio real. Enquanto no período de vigência do modo de


desenvolvimento por substituição de importações , os ganhos de
produtividade ocorreram às expensas do salário médio real, no período pós-
Real e sob finanças liberalizadas, os ganhos de produtividade processam-se
às expensas do emprego e sob taxas medíocres de crescimento do produto
per capita;

Consequentemente, não é nenhuma surpresa o fato da elevação do


desemprego estrutural e da queda dos salários reais terem sido uma das
características dos anos 90. O processo em si não comporta nenhum
determinismo econômico ou tecnológico, nem tão pouco emerge como um
fenômeno necessário ou natural em uma época de mundialização do
capital. Sobretudo, porque existiam e existem formas alternativas de se
globalizar , mas que foram descartadas por questões políticas ou de
pressões internacionais;

c) Quanto à função exportações líquidas:

Nos dois períodos em questão, 1966-1980 e 1984-2003, os coeficientes


relativos à sensibilidade das exportações líquidas à taxa de lucro e à taxa de
utilização da capacidade instalada não se mostraram estatisticamente
significativos. Apenas a elasticidade-taxa de câmbio revelou-se significativa,
embora com um valor reduzido, passando de 0,01 no período de forte
crescimento para 0,03 no seguinte;

Estes resultados podem ser interpretados como decorrentes da lógica do


modelo de industrialização por substituição de importações e portanto, pela
inexistência de um padrão de crescimento extrovertido. Todavia, a transição
para o segundo período não significou o estabelecimento de um regime de
acumulação do tipo export-led growth que poderia ser a base para a
recuperação dos níveis de renda e emprego na economia brasileira pós-
liberalização;

d) Em resumo, os sinais das elasticidades das funções estimadas do modelo BOWLES-


BOYER permitem as seguintes constatações:

como o sinal da elasticidade-lucro do excesso de demanda é positivo,

ED (0,15).(0,82) 0,12 0 para o período 1966-1980, o regime de


665

acumulação foi do tipo profit led growth. Este fato confirma as análises
históricas acerca da vigência durante o milagre de um modelo de
crescimento impulsionado por elevadas taxas de lucro e endividamento
externo;

no período 1984-2003, uma especificação de curto prazo conduz a um valor


também positivo para a elasticidade-lucro do excesso de demanda agregada,

ED (0,09).(0,43) 0,04 0 . Isto implica em uma baixa sensibilidade da

demanda agregada às variações da profit-share. A taxa de acumulação de


capital responde apenas às variações da taxa de utilização da capacidade
produtiva instalada, o que pode estar expressando o predomínio das
expectativas de curto prazo nas decisões de investimento. Por outro lado, trata-
se de um período onde a taxa de lucro e a taxa de acumulação não
compartilham mais uma tendência comum, conforme esperado em situações
normais para uma economia industrial.

xvi. Com relação à problemática entre poupança e crescimento econômico, a análise do


caso brasileiro revela os seguintes fatos:

Diferentemente do período de vigência do regime de acumulação profit led, a


absorção de poupança externa no período pós-Real sob finanças liberalizadas
pouco contribuiu para o aumento do estoque de capital fixo da economia
brasileira. Em conseqüência, o endividamento externo aumentou sem que isto
se refletisse em taxas mais elevadas de crescimento econômico;

A queda da taxa de poupança (s), a partir de 1974, não explica totalmente o


declínio da taxa de acumulação de capital (g). A queda da razão preços do
produto/ preços dos bens de capital; taxa de utilização da capacidade instalada
e da razão produto/capital em uso também contribuíram. A partir da crise do
regime de crescimento profit led em 1974, a correlação entre g e p revelou-se
muito forte, enquanto a correlação entre g e s mostrou-se muito fraca;

No período 1966-1980, o coeficiente de correlação entre g e s foi de 0,71.


Todavia, para o período de crise 1984-1993, a correlação entre essas duas
variáveis foi negativa (-0,08).
666

No período pós-Real, 1994-2003, g permanece altamente correlacionada com u


(0,83), com s (0,74) e com p (0,62). Neste período, a razão produto/ capital em
uso correlaciona-se negativamente com g (-0,52);

Contudo, deve-se ter cautela com correlações elevadas em termos de níveis das
variáveis. Para que não sejam correlações espúrias deve haver correlações
também entre as primeiras diferenças (JOHNSTON e DINARDO). Apenas no
último período a correlação em primeiras diferenças atinge 50% do valor do
coeficiente de correlação em nível das variáveis e p. Isto reforça a existência
de uma ligação significativa em termos macroeconômicos. Consequentemente,
a queda da taxa de acumulação de capital pode ser explicada pelo declínio da
razão , que por sua vez foi causada pela queda de p;

xvii. Uma análise de co-integração revela a existência de uma relação de longo prazo
entre e p, mas a respectiva elasticidade é contudo, muito fraca (-0,09) e desafia a
existência de uma influência economicamente relevante da elevação dos preços
dos bens de capital como explicação satisfatória para a queda da razão produto/
capital em uso. Além disso, o teste de causalidade de GRANGER não detecta
nenhuma precedência temporal das variações de uma variável sobre outra.
Portanto, não se pode concluir que variações de p causem-Granger as variações de
e vice-versa. Por outro lado, o valor do coeficiente da elasticidade de longo
prazo da taxa de acumulação de capital com relação aos preços dos bens de capital,
para o período completo 1950-2003, embora seja estatisticamente significativo é de
fato reduzido (0,18). Mas quando se considera o subperíodo de baixo crescimento,
1981-2003, o coeficiente não é mais significativo;

xviii. Uma hipótese alternativa para explicar a queda da produtividade do capital na


economia brasileira seria considerar a emergência de um ambiente
macroeconômico caracterizado por uma tendência persistente de elevação das
taxas reais de juros, provocadas por uma expansão sem precedentes históricos, do
passivo externo. Neste contexto, o custo de uso do estoque de capital torna-se
muito elevado vis-à-vis à alternativa de alocação da poupança agregada para ativos
financeiros, de menor risco e alta rentabilidade, lastreados em títulos públicos.
Pode-se ainda derivar um corolário dessa hipótese, considerando-se que, a partir de
um determinado nível de endividamento com abertura da conta de capitais, ficam
667

estabelecidas as condições estruturais para o avanço de um processo de


financeirização da economia brasileira;

xix. Uma segunda explicação alternativa para a queda da produtividade do capital é


proposta por VIDAL (2003). A queda da razão produto / capital em uso pode ser
explicada por um aumento excessivo da razão K/N (a intensidade do capital) em
relação à possibilidade de obtenção de ganhos de produtividade, o que leva a uma
perda da eficiência do investimento. Em conseqüência, o retorno à acumulação
extensiva com uma baixa taxa de crescimento do estoque de capital e uma redução
do ritmo de substituição de trabalho por capital constitui uma saída endógena que
permite sair da trajetória marxiana de queda da taxa de lucro;

xx. Para que a produtividade do capital não caia é necessário que o ritmo de
crescimento da razão K/N seja menor ou igual ao ritmo de progresso técnico neutro
no sentido de HARROD (PTN). Nos períodos 1951-1963 e 1966-1980, a
produtividade do capital caiu porque a taxa de crescimento da intensidade do
capital (K / N) foi maior do que a taxa PTN. Apenas nos dois últimos períodos
K
1984-1993 e 1994-2003, quando PTN é que se pode observar a recuperação
N
da taxa média de crescimento da produtividade do capital;

xxi. A análise empírica mostra que a produtividade do trabalho cresceu nos anos 90, em
decorrência do aumento da intensidade do capital (K/N), ou seja, os ganhos de
produtividade foram obtidos principalmente por substituição de trabalho por
capital;

xxii. Nos anos 90, a economia brasileira tem acesso às novas tecnologias da informação
e da comunicação (NTIC) com forte impacto na reestruturação de suas bases
técnicas produtivas. Todavia, destaca-se o fato de não ter conseguido sustentar a
elevação de sua taxa de acumulação de capital apesar dos ganhos notáveis de
produtividade, particularmente na indústria de transformação. Uma explicação
possível é proporcionada pela Teoria da Regulação: um regime de crescimento ou
de acumulação é um resultado da compatibilidade dinâmica entre um regime de
produtividade e um regime de demanda. As evidências empíricas indicam que o
regime de demanda do período pós-liberalização e pós-Real não se mostra capaz
de suportar o novo regime de produtividade. As taxas de variação da taxa de
acumulação de capital e a taxa de crescimento da demanda interna (Y+M-X)
668

permaneceram em queda tendencial entre 1994 e 2003, enquanto a razão taxa de


lucro / taxa de acumulação permaneceu em uma tendência anômala de
crescimento. Em outros termos, os aumentos da profit share observados neste
período não foram capazes de estimular a expansão das capacidades de produção;

xxiii. Além deste fato, a wage-share líquida de impostos diretos, que havia entrado em
tendência de queda nos anos 90, cai de 49% em 1990 para 39% em 2003.
Paralelamente, o Governo promove a manutenção de superávits primários que
tendem a reforçar o perfil já demasiadamente contido da demanda efetiva;

xxiv. A hipótese de financeirização da economia brasileira requer uma qualificação mais


precisa: em uma economia marcada por elevadas taxas de juros reais, mercado de
capitais pouco desenvolvido e com um sistema bancário-financeiro voltado
prioritariamente para operações de curto prazo conectadas ao endividamento
público, a financeirização adquire um caráter eminentemente usurário. Nestas
condições, os efeitos potencialmente positivos da elevação da renda financeira
sobre o consumo e o investimento produtivo são necessariamente restritos, em
razão da excessiva concentração da renda e do estoque de riqueza em poder de uma
minoria da população. Um padrão muito diferente do regime de acumulação
finance led que os EUA conheceram nos anos 90;

xxv. Os testes econométricos mostraram que embora estatisticamente significativo e


positivo, o valor da elasticidade do consumo das famílias às variações da riqueza
financeira é reduzido (0,20). Com relação aos juros pagos pelos setores não
financeiros, o coeficiente relativo ao consumo final é estatisticamente significativo,
mas negativo. Isto implica que o aumento dos juros pagos aos rentistas, causado,
por exemplo, pelo aumento das taxas básicas de juros do governo, reduz o
consumo final das famílias sendo, portanto, um fator de restrição da demanda
efetiva da economia brasileira.

xxvi. Para o caso brasileiro, as análises detectam um sinal negativo para a elasticidade-
juros da acumulação de capital, como esperado pela teoria econômica, mas com
valores muito reduzidos para os coeficientes de longo prazo (-0,02 e -0,07). Este
resultado está em conformidade com os trabalhos empíricos que mostram que os
efeitos das taxas de juros sobre a taxa de acumulação de capital são mediados pelo
canal do crédito. No entanto, a elasticidade de curto prazo estimada nesta análise
apresentou valor elevado (-0,74);
669

xxvii. As especificidades das relações entre o setor financeiro e os setores diretamente


produtivos nos anos 80 e as transformações estruturais ao longo dos anos 90
exigiram da análise novas especificações que incorporassem explicitamente o
fenômeno financeiro na economia brasileira;

xxviii. A análise empírica traz fortes evidências de que a inércia da taxa de ociosidade em
um patamar elevado, historicamente sem precedentes, é um resultado do processo
de financeirização usurária da economia brasileira. Esse processo teve início com a
crise da dívida externa e a crise fiscal do Estado na década de 80, encontrando no
regime monetário-financeiro dual e inflacionista então vigente sua base de
desenvolvimento. Com a liberalização comercial e financeira e a implementação
do Plano Real, nos anos 90, os ganhos inflacionários que alimentavam o circuito da
acumulação patrimonial sob alta inflação são substituídos pela renda financeira
derivada das altas taxas de juros reais conectadas ao novo padrão de
endividamento sob finanças liberalizadas. A continuidade desse novo padrão
pressupõe a manutenção de um regime monetário-financeiro à elevada restrição,
que aprisiona a política econômica aos interesses diretos dos rentistas e
proprietários de capital;

xxix. Os testes econométricos revelam que a elasticidade da taxa de utilização da


capacidade produtiva à razão dívida externa / PIB não era estatisticamente
significativa no período 1961-1980. Todavia, no período 1981-2003 o coeficiente é
negativo e estatisticamente significativo, demonstrando que a elevação do passivo
externo contribui agora para reduzir as taxas de utilização da capacidade produtiva
instalada. Existe, portanto, um limiar a partir do qual o endividamento torna-se
excessivo e tende a deprimir a taxa de acumulação de capital. Como o RMF à alta
restrição é mantido pelas autoridades monetárias brasileiras, o regime de demanda
permanece contido desestimulando os investimentos em ampliação do estoque de
capital fixo do país;

xxx. Consequentemente, a estratégia atual de crescimento com poupança externa


encontra no processo de financeirização usurária da economia brasileira seu
principal obstáculo. Nos anos 70, os dispositivos institucionais de indexação não
estavam ainda generalizados, não havia liberalização da conta de capitais nem a
concentração bancária e financeira observada a partir dos anos 80. A política
econômica podia então ser mobilizada para impulsionar a acumulação de capital e
670

o crescimento econômico. Mas nas condições atuais, sob finanças liberalizadas e


altas taxas reais de juros, o ingresso de capitais externos tende a ser absorvido no
circuito da acumulação financeira com efeito pouco significativo sobre a expansão
e melhoria do sistema de crédito ao consumo e às atividades diretamente
produtivas. Como resultado, o atual regime de crédito se caracteriza por fortes
flutuações dos preços dos ativos e do endividamento das empresas e das famílias,
provocando a recorrência de ajustes recessivos sobre o estoque de capital;

xxxi. Os dados empíricos mostram que, nos anos 90, a taxa média de lucro empresarial
(taxa de lucro bruto taxa média de juros) evolui segundo a mesma tendência de
crescimento da relação dívida externa / PIB, enquanto a taxa de acumulação de
capital permanece em tendência de queda;

xxxii. Enquanto a razão dívida externa/ PIB permaneceu abaixo de 10% e sem abertura
da conta de capitais, houve expansão da taxa de acumulação de capital da
economia brasileira. Há um limiar a partir do qual a correlação entre
endividamento e investimento produtivo inverte o sinal passando de positiva à
negativa. Quando isto ocorre sob condições estruturais específicas regime
monetário-financeiro inflacionista entre 1984-1993 e à alta restrição monetária sob
finanças liberalizadas, a partir de 1994 o resultado direto é o desestímulo aos
investimentos produtivos, conduzindo à quase-estagnação ou à queda da taxa de
acumulação de capital. Fases curtas de crescimento econômico são contudo
possíveis, em função dos intervalos em que as taxas de juros permanecem em
níveis menores ou as exportações são estimuladas. Todavia, a sustentabilidade e o
ritmo do crescimento econômico são uma incógnita à medida que as expectativas
de investimento tornam-se fortemente condicionadas pelas dinâmicas dos
mercados financeiros nacional e internacional conectados pelos canais da
globalização neoliberal. Neste ambiente macroeconômico, as autoridades
monetárias exercem um papel visivelmente subordinado, pois o regime de política
econômica é prisioneiro das macro-regularidades induzidas pela lógica financeira.
Pressionado no plano interno pelas instituições privadas e segmentos sociais que
controlam a renda financeira e no plano externo pelos organismos internacionais
que representam os credores, o Estado se obriga a legitimar essas macro-
regularidades e o regime de política econômica que as reproduz. É por esta razão
671

que o discurso oficial argumenta sistematicamente que a política econômica está


correta e errados seus opositores;

xxxiii. Os endividamentos interno e externo são duas dimensões de um mesmo fenômeno


macroeconômico: a absorção de poupança externa como estratégia de promoção da
acumulação financeira e patrimonial e (talvez) do crescimento econômico. Por isso
os administradores da alta finança (com os demais rentistas que lhes pressupõem) e
os gestores da atual política econômica são sempre contrários ao controle de
capitais. Os primeiros temem a perda de posições e de ganhos de capital que
pressupõem a continuidade da liberalização financeira. Os segundos receiam que
possa haver uma fuga de capitais ou a queda do fluxo de ingresso além das
eventuais sanções dos organismos internacionais - de tal maneira que perderiam
tanto o controle da política econômica quanto sua reputação como bons policy
makers , de acordo com os critérios dos mercados financeiros nacional e
internacional. Ambos permanecem portanto reféns da lógica das finanças
liberalizadas. Ambos respondem pela manutenção das taxas de acumulação de
capital e de crescimento econômico as mais medíocres de toda a história do
capitalismo industrial brasileiro;

xxxiv. Sob o regime de crescimento profit-led, vigente no período [1966-1980], os efeitos


do endividamento externo sobre o investimento foram positivos, pois parte
expressiva dos recursos externos que ingressaram no país destinaram-se às
inversões produtivas. Mas quando se analisam os resultados dos testes
econométricos para o período [1991-2003], destacam-se os seguintes fatos: o
coeficiente relativo à taxa de lucro não é mais estatisticamente significativo e o
sinal é agora negativo. O mesmo acontecendo com o sinal do coeficiente relativo à
razão dívida externa / PIB (variável bx), cujo valor tornou-se três vezes superior ao
do primeiro período (-0,30);

xxxv. Em resumo, a liberalização comercial e financeira sob orientação neoliberal


implicou na mudança da natureza da restrição externa. Durante o regime de
crescimento profit led do milagre , a restrição externa contribuía para a expansão
dos níveis de emprego e salário através do aporte de recursos externos para o
financiamento dos investimentos. No período [1994-2003], a natureza da restrição
externa é diferente. O Estado brasileiro promoveu a abertura da economia,
desencadeando o processo de reconfiguração da forma de inserção internacional e
672

das demais componentes do modo de regulação, mas minimizou a relevância de


um projeto de desenvolvimento de longo prazo. Nestas circunstâncias, a restrição
externa passou a sobredeterminar a política econômica, impedindo-a de responder
prontamente às necessidades da acumulação de capital real. O regime de política
econômica volta-se prioritariamente para garantir o fluxo de capitais externos
necessários ao refinanciamento das dívidas interna e externa, instaurando um
círculo vicioso composto de mais déficit mais endividamento elevação
tendencial das taxas de juros reais maior pressão sobre o déficit futuro e mais
endividamento. Sem autonomia suficiente para liderar um projeto de
desenvolvimento econômico, o Estado é obrigado a responder prioritariamente às
demandas de curto prazo dos mercados financeiros.
673

CONCLUSÃO GERAL

Eu preferiria descobrir uma causa a ganhar o


reino da Pérsia
(Demócrito)
Uma teoria deve ser julgada tanto pela
ignorância que ela requer, quanto pelo
conhecimento que ela produz .
(Marshall Sallins)

Este trabalho buscou desenvolver as etapas metodológicas necessárias a uma aplicação


das macroanálises regulacionistas à economia brasileira. Nos capítulos 1 e 2 foram
explicitados o método de análise, os fundamentos teóricos e as noções de base da Teoria da
Regulação, seus principais objetos e objetivos.

Apesar das concepções positivistas em Epistemologia terem esvaziado a questão do


estatuto ontológico das teorias, relegando-a a discussões puramente filosóficas e consideradas
cientificamente estéreis, reconhece-se a relevância desta perspectiva no âmbito da teorização
macroeconômica. Procurou-se mostrar que a maior adequabilidade da noção de regulação ao
estudo das macro-regularidades econômicas, vis-à-vis à concepção neoclássica de equilíbrio, é
antes uma questão fundamentalmente ontológica que determinará a escolha do método e do
percurso teórico.

O potencial heurístico e explicativo dessa abordagem tornou-se patente à medida que


os dados empíricos suportavam as hipóteses de estabilidade e de mudança das macro-
regularidades fundamentais à compreensão das formas da regulação d ensemble e dos regimes
de crescimento correspondentes. Atributos que não são satisfatoriamente explicados em
análises centradas no comportamento de mercados ou num mundo econômico vazio de
instituições e formas estruturais.

O capítulo 3 desenvolveu uma análise da performance macroeconômica brasileira


numa perspectiva de longo prazo, destacando os principais fatos estilizados da evolução
econômica no século XX. A economia brasileira caracterizou-se por um elevado dinamismo
entre 1900 e 1979, com taxas médias de crescimento do PIB e do PIB per capita,
respectivamente, de 6% e de 3% ao ano. Todavia, nos anos 80, perde sua trajetória de
crescimento e passa a demonstrar enorme dificuldade em reencontrá-la sob novos regimes de
acumulação.
674

Um dos fatores explicativos para essa performance tão incongruente com o potencial
produtivo da economia brasileira no século XX, foi a sucessão de respostas inadequadas para
a saída da crise dos anos 80 e seus desdobramentos nos anos 90. A busca de um novo padrão
de crescimento e acumulação incluiria, sem dúvida, a reconfiguração da arquitetura
institucional que definia o modo de regulação e o correspondente modo de desenvolvimento
baseado na substituição de importações. Mas havia outras possibilidades que poderiam ter
sido exploradas nos quadros das transformações estruturais e que simplesmente foram
descartadas em prol de uma re-inserção neoliberal no regime internacional.

Em conseqüência, um dos resultados diretos da abertura comercial e financeira dos


anos 90 foi a mudança no padrão de acumulação da economia segundo a lógica das finanças
nacionais e internacionais, retirando do Estado a legitimidade dos projetos nacionais de
desenvolvimento. Aos fatores endógenos de instabilidade do regime de crescimento, foram
acrescentados a pressão da concorrência internacional, a liberalização do fluxo de capitais, o
processo de privatização e demais reformas que modificaram as relações Estado-economia.

As transformações no nível da forma institucional de inserção no regime


internacional aprofundaram o grau de dependência financeira e reduziram drasticamente a
autonomia da política econômica. Incapaz de desempenhar plenamente seu papel de indutor
do processo de acumulação de capital, o Estado parece supor que o mercado cumpra uma
função que na história dos capitalismos desenvolvidos sempre lhe foi reservada.

Ideologia neoliberal e re-inserção subordinada no processo de globalização


articulam-se e submetem uma economia cujo potencial produtivo é indubitável, mas que é
premida a se adequar às prerrogativas da atual lógica financeira internacional.
Conseqüentemente, os projetos consistentes de desenvolvimento econômico são esvaziados
no plano político-ideológico porque sua realização implicaria mobilizar funções estatais
incompatíveis com as formas atuais de gestão das dívidas externas e internas. E são essas
últimas que funcionam como premissa e resultado da acumulação rentista reproduzida pelo
atual regime de política econômica e pela estrutura institucional que lhe pressupõe.

A análise desenvolvida no capítulo 4 permitiu uma caracterização da evolução e da


configuração atual das cinco formas institucionais que compõem o modo de regulação
brasileiro. Procurou-se identificar suas especificidades e principais tendências cujos impactos
foram fundamentais na definição do regime de acumulação e nas formas concretas de suas
crises. Dentre os resultados mais significativos podem ser destacados os seguintes:
675

a) forma institucional do Estado - apesar de suas transformações ao longo da história


econômica, o Estado brasileiro sempre esteve presente, tanto direta quanto
indiretamente, na reprodução do capital. Ao longo do século 20, o Estado transformou-
se significativamente em função das novas necessidades do desenvolvimento
econômico de base industrial, sem contudo superar seu caráter excludente e coercitivo
para a grande maioria da população brasileira.

Permanece ainda a disjunção entre o Estado e a sociedade civil, ou seja, a


enorme distância entre a sociedade real e a sociedade representada, em níveis que são
de fato incompatíveis com uma democracia e uma economia industrial modernas. Com
relação aos gastos de legitimidade, a análise empírica mostrou que os gastos sociais não
integram de forma significativa as despesas de legitimação e de reprodução dos regimes
fiscos-financeiros, como é o caso nos países desenvolvidos. Observam-se alta
regressividade no sistema tributário e estruturas de bem-estar incompletas e, portanto,
insatisfatórias tanto por critérios quantitativos quanto qualitativos. Este padrão confere
às relações Estado-economia um caráter ambíguo, pois se trata de um Estado
inserido , mas muito mais para o capital e muito menos para o trabalho.

Após ter ocupado o lugar de forma institucional hierarquicamente superior no


modo de regulação; a partir dos anos 80, o Estado se submete ao regime monetário-
financeiro e às estruturas da acumulação rentista e patrimonial, centrada nos lucros dos
grandes bancos.

Nos anos 90, com a vigência do Real sob finanças liberalizadas, essa
subordinação atinge um paroxismo, aprisionando o regime de política econômica aos
interesses diretos dos proprietários de ativos financeiros e em detrimento da
acumulação de capital real. Consequentemente, no plano político-ideológico, as
alternativas ao atual regime de política econômica passariam a ser sistematicamente
descaracterizadas, pelo discurso oficial e pelos segmentos beneficiários dos elevados
ganhos financeiros, como inadequadas ou portadoras de conteúdos populistas ;

b) forma institucional do rapport salarial ou wage-labor nexus (WLN) - com o avanço


da industrialização, a WLN brasileira consolidou-se enquanto principal relação de
produção e de distribuição, conforme a tendência histórica de evolução das economias
que se organizam sob o modo de produção capitalista. Portanto, não há dúvidas que a
economia brasileira desenvolve-se sobre a base de uma sociedade salarial. Todavia,
676

trata-se de uma sociedade salarial dual, pois metade das relações salariais encontra-se
fora da legislação trabalhista e previdenciária.

A análise histórica suportada pelos testes econométricos fornece elementos


empíricos suficientes para classificá-la como uma forma institucional sempre
subordinada na arquitetura definidora dos modos de regulação no Brasil. Trata-se de
uma WLN amplamente concorrencial, segmentada e permanentemente monitorada pelo
Estado com o objetivo de adequá-la aos imperativos de curto prazo do regime de
política econômica e da acumulação de capital. Caracteriza-se também por uma
institucionalidade restrita e incompleta. Restrita, em razão do elevado percentual de
assalariados informais, de relações de emprego precário e de postos de trabalho de
baixa qualidade; mas também incompleta, porque diversos componentes de proteção ao
trabalho e de assistência social permanecem ainda muito pouco desenvolvidos ou
mesmo inexistentes.

Tanto sob o período do milagre quanto nos anos 90, a wage-share sofreu
quedas sucessivas e acentuadas, expressando o aumento da concentração funcional da
renda em favor dos lucros e da renda financeira. A análise empírica mostra que no caso
do milagre econômico brasileiro, os ganhos de produtividade ocorreram às expensas
dos salários; enquanto nos anos 90, o aumento da produtividade foi obtido às expensas
do emprego.

No setor industrial, a análise detectou uma fase de conexão dos salários aos
ganhos de produtividade, na primeira metade dos anos 90. Essa indexação permaneceu
enquanto as taxas de desemprego não eram capazes de abalar as organizações e os
movimentos sindicais em termos de reivindicações salariais. Com a elevação rápida do
desemprego estrutural e tecnológico, provocada pela intensificação da concorrência
externa, no período de sobrevalorização cambial imposta pelo Plano Real, a desconexão
sobreveio.

Quanto ao caráter dual da WLN brasileira, as análises mostram comportamentos


bem contrastados das relações salariais formais antes e depois da abertura comercial e
financeira. Antes da abertura econômica dos 90, observa-se rigidez à baixa do eixo
formal da WLN, no que concerne ao emprego que responde apenas às fases de
expansão, mas não à queda do nível de atividade econômica. Todavia, no período pós-
abertura, a inércia do emprego formal desaparece e as respostas às flutuações
conjunturais se invertem, com o emprego tornando-se sensível às fases de queda da
677

produção, mas não às fases de expansão e com uma elasticidade que é maior do que o
dobro da do período pré-abertura. Este fato aponta para um aprofundamento do grau de
flexibilidade quantitativa da WLN, além de indicar uma dificuldade da economia
brasileira para gerar empregos formais.

No período pós-Real, o desemprego passa a influir diretamente na formação dos


salários nominais das relações salariais formais, o segmento tradicionalmente mais
estruturado da WLN. Este fato é mais um indicador do aumento do grau de flexibilidade
quantitativa e salarial, desencadeado pela reconfiguração da forma de inserção
internacional sob orientação neoliberal.

c) forma institucional da moeda ou regime monetário-financeiro (RMF) a análise da


evolução de longo prazo do RMF brasileiro revelou sua vinculação estrutural e
subordinada à forma institucional de inserção internacional, uma característica que é de
fato comum às economias em desenvolvimento. A alta dependência dos capitais
externos e a tendência histórica ao desequilíbrio do balanço de pagamentos se reforçam
como principal obstáculo à consolidação da moeda nacional. Em conseqüência, as
pressões inflacionárias são recorrentemente recriadas.

O RMF brasileiro e as estruturas institucionais em que se baseia não têm sido


capazes de proporcionar um regime de crédito adequado às necessidades da
acumulação de capital em uma economia industrial moderna. A transição de um RMF
dual e inflacionista (1980-1993) para um RMF à alta restrição monetária implicou na
mudança das condições sobre as quais a acumulação financeira se desenvolvia. Entre
1980 e 1993, a alta inflação e os mecanismos de indexação foram a base da expansão
financeira e dos grandes lucros do setor bancário. Este fato é confirmado pelo teste de
causalidade de GRANGER que mostra a existência de causalidade unidirecional da
inflação para o incremento da participação do valor adicionado pelo setor financeiro
no PIB.

Com a implementação do Plano Real, as altas taxas reais de juros ocuparam o


lugar antes reservado aos ganhos inflacionários, perpetuando um regime monetário-
financeiro inadequado às necessidades da acumulação de capital produtivo. Este fato
permite também compreender-se que o controle da inflação é mantido à custa do
crescimento econômico e do desvio da poupança macroeconômica para os centros de
acumulação financeira e patrimonial.
678

A partir de sua articulação com as outras formas institucionais, o atual RMF


responde também pela forte contenção salarial e pela elevação do desemprego sob
finanças liberalizadas. Um RMF à elevada restrição monetária conjuga-se com uma
WLN amplamente concorrencial, com um Estado altamente endividado e dominado
pelos interesses financeiros de curto prazo e com um padrão neoliberal de inserção
internacional. Foi essa arquitetura institucional o suporte da relativa estabilidade de
preços sob o Real e não apenas a lógica original de um programa de combate à
inflação. No entanto, essa configuração foi também a responsável pela quase-
estagnação do produto e da renda, caracterizando uma segunda década perdida no que
concerne ao desenvolvimento econômico e ao resgate da dívida social brasileira.

d) as formas da concorrência e de inserção internacional - de acordo com os resultados


empíricos, e contrariamente ao discurso neoliberal, as formas da concorrência não
foram significativamente afetadas pela abertura comercial e financeira. Mais
precisamente, as estruturas de mercado fortemente oligopolizadas permaneceram
enquanto tais após o aprofundamento do processo de liberalização. Após as mudanças
estruturais no setor industrial, durante a década de 90, os trabalhos empíricos
constataram os seguintes fatos: na estrutura industrial brasileira predominam as
indústrias intensivas em escala e em recursos naturais; em decorrência da expansão do
ramo farmacêutico, as atividades baseadas em Ciência tiveram um aumento de
participação; as atividades intensivas em trabalho perderam participação, o que pode ser
considerado um fator adicional que reforça os limites atuais para a geração de emprego
na economia brasileira.

Não foram observadas expansão e melhora significativa das condições de


financiamento da economia brasileira, que possibilitasse uma maior conexão do capital
financeiro com as necessidades do capital produtivo. A abertura financeira possibilitou
uma nova fase para a absorção de poupança externa mas os efeitos sobre a taxa de
acumulação de capital e o crescimento econômico foram muito pouco significativos.
Todavia, sob finanças liberalizadas a acumulação rentista-patrimonial ganhou um novo
patamar com o acesso a novos instrumentos e produtos oferecidos por instituições que
operam em mercados financeiros internacionalizados e cada vez mais interdependentes.

No que concerne ao setor bancário-financeiro, a entrada das instituições


estrangeiras não confirmou o discurso oficial de que haveria melhoria das condições de
financiamento da economia. O regime de crédito permanece incompatível com uma
679

retomada sustentada do crescimento e da acumulação de capital produtivo. Fato que


pode ser constatado pela tendência de declínio do total das operações de crédito como
percentagem do PIB, desde a introdução do Real. Os grandes bancos estrangeiros
simplesmente se adaptaram a um ambiente macroeconômico onde as operações de
crédito não são prioritárias e sim as operações com ativos conectados ao endividamento
público e privado (operações de tesouraria), base da acumulação rentista-patrimonial.

Os dados empíricos mostram que, após a desvalorização cambial de 1999, a


participação do saldo da balança comercial no PIB entrou numa tendência de expansão.
Este fato pode ser interpretado como uma melhoria da competitividade das exportações
brasileiras, deteriorada na primeira fase do Real por uma taxa de câmbio
excessivamente sobrevalorizada.

Com relação à evolução dos indicadores financeiros, destacam-se os seguintes


fatos: a partir da liberalização da conta de capitais, a evolução das reservas
internacionais desconecta-se da evolução da formação bruta de capital fixo. Este fato é
um indicador de que o ingresso de capitais do período de abertura comercial e de
liberalização financeira destinou-se, basicamente, à consecução de objetivos
econômicos pouco conectados à dinâmica da acumulação produtiva de capital. Além
disso, enquanto o estoque de recursos financeiros mantidos pelo público no sistema
bancário como proporção da base monetária permanece com um valor médio de 3,0, o
multiplicador monetário, que havia decrescido desde 1980, permanece estacionado no
nível mais baixo desde 1950.

Outro fato característico do período pós-abertura e pós-Real refere-se à


correlação entre salário médio real e grau de restrição externa. Considerando-se que as
elasticidades-renda do comércio exterior são normalmente altas e as elasticidades-
preços baixas, as reduções ou contenções salariais tornam-se o meio mais rápido para
ajustar o nível de atividade de maneira a reequilibrar as contas externas. A análise
empírica mostrou que as taxas de crescimento do salário médio real, tanto para o total
da economia quanto para a indústria, acompanharam tendencialmente as taxas de
variação do grau de restrição externa. Um padrão que também reflete o aumento da
flexibilidade da WLN nos anos 90.

No que concerne às particularidades da regulação brasileira, a análise aponta para a


continuidade nos anos 90 de um modo de regulação administrado, apesar das transformações
incorridas pelas formas institucionais no contexto de uma adesão neoliberal ao processo de
680

globalização. O caráter tutelar , destacado pioneiramente por CORIAT e SABOIA (1995),


ainda permanece como a expressão de compromissos institucionalizados que atribuem ao
Estado um papel determinante na gestão macroeconômica e na configuração da wage-labor
nexus. Esta última assiste, durante a fase de liberalização comercial e financeira, ao
aprofundamento de sua condição de forma hierarquicamente subordinada. Contudo, torna-se
necessário precisar a especificidade da regulação administrada brasileira pois se trata de uma
tutela voltada prioritariamente para os interesses do capital e dos segmentos beneficiários da
acumulação rentista-patrimonial. Dado o perfil demasiadamente concentrado da renda e do
estoque de riquezas e o elevado nível de exclusão social, o controle que as elites econômicas
exercem sobre o aparato burocrático do Estado brasileiro, não permite que as principais
demandas da grande maioria da população sejam efetivamente representadas e atendidas. O
caráter administrado e tutelar é direcionado para atender prioritariamente os interesses das
classes dominantes e em detrimento das classes de mais baixa renda. Este padrão é muito
diverso do padrão de regulação administrada característico dos países desenvolvidos com
democracias mais robustas e efetivas. Nestes últimos, o modo de regulação administrado
refletia um padrão de concorrência oligopolista articulado com uma WLN não concorrencial.
No caso brasileiro, a tutela visa manter ou aprofundar o caráter concorrencial da WLN sob
estruturas de mercado fortemente oligopolizadas. Em conseqüência, a regulação administrada
brasileira também responde pelo caráter incompleto e limitado das estruturas de bem-estar
social e pela privatização das funções do Estado, através da forte ingerência dos grandes
grupos econômicos e financeiros a nível do regime de política econômica e das prioridades do
orçamento estatal.

No capítulo 5, a análise passou do plano das regulações parciais para o plano da


regulação global (régulation d ensemble), para identificar os padrões de crescimento ou
regimes de acumulação e portanto, confluindo para o escopo principal deste trabalho.
Basicamente se procurou identificar as rupturas estruturais e os períodos de estabilidade das
macro-regularidades que suportam a dinâmica do crescimento econômico e da acumulação de
capital. Vários procedimentos estatísticos, testes de estabilidade estrutural e a análise de co-
integração foram mobilizados de forma recorrente para explicitar os determinantes do
crescimento econômico brasileiro.

Os testes econométricos mostraram que um regime de acumulação profit led esteve


presente no período [1966-1980], que inclui a fase de forte crescimento do milagre
brasileiro (1967-1973). Este resultado confirma as análises históricas que apreendem esta fase
681

como decorrente de um modelo de crescimento baseado em altas taxas de lucro, concentração


de renda e endividamento externo.

No período [1984-1993], os testes econométricos e os procedimentos metodológicos


alternativos detectaram a vigência de um regime de crise. Todavia, a tendência comum de
declínio da taxa de lucro e da taxa de acumulação de capital por duas décadas consecutivas, a
partir de 1973, pode ser interpretada como um sinal de crise estrutural e não de uma crise
cíclica, superável nos quadros do mesmo modo de regulação.

A análise empírica buscou identificar também as tendências e obstáculos à


acumulação de capital que emergiram das transformações impostas ao modo de regulação nos
anos 90: mudança de hierarquia das formas institucionais com a elevação do regime
monetário-financeiro e da nova forma de inserção internacional à condição de formas
hierarquicamente superiores; ruptura com os compromissos institucionalizados herdados do
modo de desenvolvimento por substituição de importações, incluindo as relações Estado-
economia e a perda de legitimidade das estratégias de desenvolvimento econômico nacional.

Uma das principais hipóteses desta análise é a hipótese de financeirização da


economia brasileira. Mas a aplicação deste conceito ao caso brasileiro exigiu uma
qualificação mais adequada ao padrão de relacionamento entre as instituições financeiras e os
setores diretamente produtivos. Num ambiente macroeconômico caracterizado por elevadas
taxas reais de juros, o processo de financeirização adquire um caráter usurário, diverso do
observado em países com baixo endividamento ou taxas reduzidas de juros. Além disso, o
grau de concentração da renda e do estoque de riqueza são também fatores importantes na
determinação das particularidades de um padrão de financeirização.

Procurou-se mostrar que sob finanças liberalizadas, elevado endividamento externo,


regime monetário à alta restrição e grau excessivo de concentração da renda e da riqueza, as
condições para a emergência de um regime do tipo finance led growth ficam estabelecidas.

Um dos aspectos do regime de crescimento finance led brasileiro é que ele se constitui
a partir do padrão usurário de acumulação rentista-patrimonial. A economia alterna fases
curtas de expansão com fases de declínio do nível de atividade em razão dos ajustes
recessivos sobre o estoque de capital, provocados pela permanência de um regime de crédito
muito sensível às flutuações dos preços dos ativos e do endividamento das famílias e das
empresas. Consequentemente, tal regime torna-se incompatível com a expansão sustentada
das taxas de crescimento econômico.
682

Uma das características mais surpreendentes deste novo regime finance led growth é a
desconexão entre taxa de lucro e taxa de acumulação de capital. Um fator básico que conspira
contra a sustentabilidade do crescimento econômico em ritmo elevado. Os dados empíricos
mostraram também que nos anos 90, a taxa média de lucro empresarial (deduzidos os
pagamentos de juros ao sistema financeiro) evolui segundo a mesma tendência de crescimento
da razão dívida externa / PIB, enquanto a taxa de acumulação de capital produtivo permanece
em tendência de queda. Isto significa que a elevação da profit share neste período foi uma
resposta endógena à pressão da lógica financeira sobre os capitais diretamente produtivos,
provocando a estagnação e até mesmo o declínio dos níveis de investimento em alguns
períodos.

Em conseqüência, numa economia caracterizada pela alta concentração da propriedade


e da renda, com níveis elevados de oligopolização de suas estruturas produtivas, o lucro
empresarial pode expandir-se para absorver custos financeiros crescentes. Mas esse processo
desenvolve-se às expensas da taxa de acumulação de capital produtivo e com pressões
permanentes sobre o nível geral de preços da economia, afinal juros são custos financeiros das
empresas. E como a nova fase de abertura econômica inaugurada pela globalização
neoliberal pressupõe, para sua efetivação e lógica de financiamento, taxas de inflação baixas
e taxas de juros atrativas aos fluxos de capitais transnacionais, o Estado recorrentemente
freia esse tipo de economia. A recomposição das condições de retomada da acumulação de
capital produtivo, base do crescimento e do desenvolvimento econômico, torna-se
visivelmente um problema maior. Sobretudo, se tratando de uma economia ainda em
construção e submetida a um processo de financeirização sem precedentes históricos.

Pesquisas futuras terão de ser desenvolvidas com dados desagregados por setores
institucionais, o que permitirá uma estimação mais precisa do grau de financeirização a nível
das empresas e das famílias. A hipótese de financeirização usurária deve ser considerada
como teórica e empiricamente relevante para uma explicação consistente da perda de
dinamismo da economia brasileira. Não se trata de insuficiência de poupança, pois num
ambiente marcado por uma das mais altas taxas de juros do mundo, os aumentos da poupança
agregada tendem a ser absorvidos pela acumulação rentista-patrimonial, tornando-se
automaticamente indisponíveis para a formação bruta de capital fixo. No plano teórico isto
significa que a abordagem neoclássica da relação entre taxa de juros e poupança não encontra
suporte empírico, pois as taxas de juros funcionam muito mais como variável de transferência
de renda entre segmentos ou classes sociais. Um aumento dos juros implica no aumento da
683

participação dos rentistas e instituições financeiras no valor adicionado total, reduzindo a


participação dos setores diretamente produtivos. Evidentemente, isto não resulta em um
aumento da poupança agregada da economia.

A recomposição das condições de retomada do crescimento econômico


evidentemente passa pela redução significativa dos juros reais, cujos patamares atuais
bloqueiam a taxa de acumulação de capital e agravam os problemas estruturais. Mas o
desenvolvimento financeiro brasileiro processa-se desde a primeira década perdida às
expensas da acumulação de capital real, o que restringe os graus de liberdade do Estado para
promover um novo regime de crédito mais consentâneo com a superação do
subdesenvolvimento do país.

A questão é de fato complexa pois as dimensões envolvidas extravasam o âmbito das


relações puramente econômicas. Em outros termos, a mudança desse padrão de
relacionamento entre acumulação de base rentista-patrimonial e acumulação de capital
produtivo exige a mobilização de forças políticas que possam contrabalançar a influência
exercida pelas elites financeiras sobre o aparato de Estado brasileiro e, consequentemente,
sobre os rumos da política econômica. Isto significa recuperar a soberania do Estado
incluindo seu caráter público, aproveitando-se das novas condições propiciadas pela
democracia política, também para aprofundar e concretizar a democracia econômica.
684

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ÍNDICE DE GRÁFICOS

GRÁFICO 1 PIB EFETIVO E PIB POTENCIAL [1900 2003]. .....................................160


GRÁFICO 2 PIB EFETIVO E PIB POTENCIAL [1980 2003]. .....................................160
GRÁFICO 3 FLUTUAÇÕES CÍCLICAS DO PRODUTO NA ECONOMIA BRASILEIRA
[1900 2003]..........................................................................................................................161
GRÁFICO 4 A EVOLUÇÃO DO PIB PER CAPITA NO PERÍODO [1900 2003]: CINCO
FASES CONTRASTADAS ...................................................................................................163
GRÁFICO 5 FLUTUAÇÕES CÍCLICAS DO PIB: BRASIL, MÉXICO E EUA (1950-
2002). ......................................................................................................................................165
GRÁFICO 6 INVESTIMENTO E ACUMULAÇÃO DE CAPITAL (1940 - 2003)..........167
GRÁFICO 7 EVOLUÇÃO DA RELAÇÃO CAPITAL-PRODUTO (1940 -2003) ...........168
GRÁFICO 8 EVOLUÇÃO DO CUSTO DE VIDA E A DEFLAÇÃO DO SUBPERÍODO
[1928-1933] ............................................................................................................................169
GRÁFICO 9 TAXAS DE INFLAÇÃO NO PERÍODO [1934-2003] .................................169
GRÁFICO 10- TAXA DE INFLAÇÃO NO PERÍODO PÓS-PLANO REAL (1995 2003)
................................................................................................................................................170
GRÁFICO 11 EVOLUÇÃO DO DESEMPREGO ABERTO (1980-2002) ........................172
GRÁFICO 12 DESEMPREGO ABERTO E OCULTO NA REGIÃO METROPOLITANA
DE SÃO PAULO (1984 2004) ............................................................................................172
GRÁFICO 13 EVOLUÇÃO DAS PARTICIPAÇÕES DO TRABALHO FORMAL E
INFORMAL NO TOTAL DAS RELAÇÕES DE EMPREGO (1982 -2002)........................174
GRÁFICO 14 EVOLUÇÃO DO DESEMPREGO POR SETORES (1996 - 2002) ............175
GRÁFICO 15 RELAÇÃO DE OKUN PARA A ECONOMIA BRASILEIRA(1980 - 2002)
................................................................................................................................................176
GRÁFICO 16 TAXA DE DESEMPREGO E PIB EFETIVO (1981 -2002) .......................179
GRÁFICO 17 DINÂMICA DO PIB, DAS EXPORTAÇÕES E DAS IMPORTAÇÕES
(1947-2003) ............................................................................................................................180
GRÁFICO 18 PARTICIPAÇÃO DAS EXPORTAÇÕES, IMPORTAÇÕES E SALDO
COMERCIAL NO PIB (1947-2003)......................................................................................181
GRÁFICO 19 PARTICIPAÇÃO DOS PAGAMENTOS LÍQUIDOS DE JUROS E
REMESSAS DE LUCROS E DIVIDENDOS NO SALDO DA CONTA DE SERVIÇOS
(1947-2003) ............................................................................................................................182
GRÁFICO 20 DÍVIDA EXTERNA DE CURTO PRAZO E DÍVIDA EXTERNA TOTAL
COMO PERCENTAGEM DO PIB (1994-2003)...................................................................186
GRÁFICO 21 INDICADORES DE VULNERABILIDADE EXTERNA (1956-2003)......186
GRÁFICO 22 EVOLUÇÃO DAS RESERVAS INTERNACIONAIS (1956-2003)...........187
GRÁFICO 23 INVESTIMENTOS ESTRANGEIROS EM CARTEIRA (1969-2003) ......188
GRÁFICO 24 EVOLUÇÃO DOS INVESTIMENTOS DIRETOS ESTRANGEIROS (1947-
2003) .......................................................................................................................................189
GRÁFICO 25 PARTICIPAÇÃO DAS DÍVIDAS INTERNA E EXTERNA LÍQUIDAS DO
SETOR PÚBLICO NO PIB (1981-2003)...............................................................................190
GRÁFICO 26 PARTICIPAÇÃO DA DÍVIDA MOBILIÁRIA INTERNA FEDERAL NO
PIB (1964-2003) .....................................................................................................................190
GRÁFICO 27 EVOLUÇÃO DAS DÍVIDAS TOTAIS DOS ESTADOS E MUNICÍPIOS,
EMPRESAS ESTATAIS E GOVERNO CENTRAL COMO PROPORÇÃO DO PIB (1981-
2003) .......................................................................................................................................193
GRÁFICO 28 AGRICULTURA, INDÚSTRIA E SERVIÇOS: EVOLUÇÃO DAS
PARTICIPAÇÕES NO PIB (1900 -2003)..............................................................................197
706

GRÁFICO 29 DISTRIBUIÇÃO DO PESSOAL OCUPADO POR SETOR DE ATIVIDADE


(1990 2002)..........................................................................................................................197
GRÁFICO 30 TAXA DE UTILIZAÇÃO DA CAPACIDADE PRODUTIVA POR RAMO
DA INDÚSTRIA (1970 -2004) ..............................................................................................198
GRÁFICO 31 PRODUÇÃO POR RAMOS DA INDÚSTRIA (1975 2004)....................199
GRÁFICO 32 IMPORTAÇÕES DE BENS INDUSTRIAIS (1975-2003) .........................200
GRÁFICO 33 EVOLUÇÃO DA PARTICIPAÇÃO POLÍTICA (1933 1998) ................210
GRÁFICO 34 COMPOSIÇÃO DA ARRECADAÇÃO TOTAL DA UNIÃO (1901-2002)
................................................................................................................................................234
GRÁFICO 35 EVOLUÇÃO DA PRODUÇÃO CAFEEIRA E DAS EXPORTAÇÕES
TOTAIS (1901-1950) .............................................................................................................238
GRÁFICO 36 EVOLUÇÃO DA CARGA TRIBUTÁRIA (1900-2003)............................239
GRÁFICO 37 PARTICIPAÇÃO DAS TRANSFERÊNCIAS E DOS SUBSÍDIOS DO
GOVERNO FEDERAL NO PIB (1900-1999).......................................................................240
GRÁFICO 38 PARTICIPAÇÃO DA TRIBUTAÇÃO DIRETA E INDIRETA NO PIB
(1900-2003) ............................................................................................................................241
GRÁFICO 39 BENEFICIÁRIOS E CONTRIBUINTES DA PREVIDÊNCIA SOCIAL
COMO PROPORÇÃO DA POPULAÇÃO TOTAL DO PAÍS (1923-2003) ........................245
GRÁFICO 40 - BENEFICIÁRIOS E CONTRIBUINTES DA PREVIDÊNCIA SOCIAL
COMO PROPORÇÃO DA POPULAÇÃO ECONOMICAMENTE ATIVA (1940-2003) .246
GRÁFICO 41 FLUXO DE CAIXA DA PREVIDÊNCIA SOCIAL (1982 2004) ...........247
GRÁFICO 42 - FLUXO DE CAIXA DA PREVIDÊNCIA SOCIAL: RESULTADO ENTRE
RECEITA E BENEFÍCIOS (1982 2004) ............................................................................247
GRÁFICO 43 GRAU DE CENTRALIZAÇÃO FISCAL (1900 2000) ...........................248
GRÁFICO 44 CONSUMO E INVESTIMENTO DO GOVERNO (1900 2003).............249
GRÁFICO 45 PARTICIPAÇÃO DO INVESTIMENTO GOVERNAMENTAL NO
INVESTIMENTO TOTAL (1901 2003) .............................................................................250
GRÁFICO 46 DINÂMICA DO PIB E DAS DESPESAS TOTAIS DO GOVERNO (1901-
2003) .......................................................................................................................................251
GRÁFICO 47 DINÂMICA DO PIB E DAS DESPESAS TOTAIS DO GOVERNO
SÉRIES FILTRADAS (1901-2003) .......................................................................................251
GRÁFICO 48 COMPOSIÇÃO DO CONSUMO DO GOVERNO (1900 2000) .............252
GRÁFICO 49 EVOLUÇÃO DA RENDA LÍQUIDA DO GOVERNO E DOS
COMPONENTES DOS GASTOS PÚBLICOS (1947-2000) ................................................257
GRÁFICO 50 EVOLUÇÃO DOS GASTOS EM CONSUMO, INVESTIMENTO,
SUBSÍDIOS E TRANSFÊNCIAS GOVERNAMENTAIS COMO PERCENTAGEM DA
DESPESA PRIMÁRIA TOTAL DO ESTADO (1900-2003) ................................................258
GRÁFICO 51 EVOLUÇÃO DA RECEITA TRIBUTÁRIA TOTAL, DO PIB E DA
CARGA TRIBUTÁRIA (1900-2003) ....................................................................................270
GRÁFICO 52 EVOLUÇÃO DAS DESPESAS PRIMÁRIAS DO GOVERNO E DO PIB
(1900-2003) ............................................................................................................................277
GRÁFICO 53 EVOLUÇÃO DAS RELAÇÕES SALARIAIS (1950- 2002) .....................291
GRÁFICO 54 RELAÇÕES DE EMPREGO FORMAL E INFORMAL COMO
PERCENTAGEM DA PEA (1982-2002)...............................................................................294
GRÁFICO 55 DESEMPREGO E NÚMERO DE GREVISTAS (1991-1999) ...................295
GRÁFICO 56 CONSUMO E RELAÇÃO SALARIAL (1951 -2002)................................296
GRÁFICO 57 SALÁRIO MÉDIO REAL E CONSUMO PER CAPITA DAS FAMÍLIAS
(1950-2002) ............................................................................................................................296
GRÁFICO 58 NÍVEIS DE CONSUMO E MASSA SALARIAL REAL (1950=2002) .....297
707

GRÁFICO 59 WAGE-SHARE E PARTICIPAÇÃO DOS SALÁRIOS NO CONSUMO


FINAL DAS FAMÍLIAS (1950-2002)...................................................................................298
GRÁFICO 60 DISTRIBUIÇÃO DAS RELAÇÕES DE EMPREGO (1982-2002)............306
GRÁFICO 61 - O PROCESSO DE DESINSTITUCIONALIZAÇÃO DA WLN
BRASILEIRA É ANTERIOR À ABERTURA COMERCIAL E FINANCEIRA.................307
GRÁFICO 62 PIB E DESAGREGAÇÃO DOS SEGMENTOS FORMAL E INFORMAL
(1982-2001) ............................................................................................................................309
GRÁFICO 63 PARTICIPAÇÃO DOS SEGMENTOS NA MASSA SALARIAL TOTAL
(1982-2002) ............................................................................................................................310
GRÁFICO 64 SALÁRIO E RENDIMENTO MÉDIO CONVERGEM NOS ANOS 90
(1982-2002) ............................................................................................................................310
GRÁFICO 65 EVOLUÇÃO DO SALÁRIO MÍNIMO, DO SALÁRIO MÉDIO E DO PIB
PER CAPITA (1944-2002).....................................................................................................327
GRÁFICO 66 SALÁRIO MÍNIMO E SALÁRIO MÉDIO NA INDÚSTRIA (1985-
2001) .......................................................................................................................................329
GRÁFICO 67 EVOLUÇÃO DA RELAÇÃO CÂMBIO / SALÁRIO (1979 2004) ........335
GRÁFICO 68 EMPREGO, PRODUÇÃO INDUSTRIAL E CUSTO SALARIAL (1985-
2001) .......................................................................................................................................338
GRÁFICO 69 GANHOS DE PRODUTIVIDADE E DINÂMICA DO EMPREGO NA
INDÚSTRIA DE TRANSFORMAÇÃO (1985-2001)...........................................................352
GRÁFICO 70 PRODUTIVIDADE HORÁRIA, SALÁRIO E EMPREGO NA INDÚSTRIA
DE TRANSFORMAÇÃO (1985 2001)...............................................................................353
GRÁFICO 71 PROFIT SHARE NA INDÚSTRIA DE TRANSFORMAÇÃO (1985-2001)
................................................................................................................................................357
GRÁFICO 72 EVOLUÇÃO DA RAZÃO SALÁRIO / PRODUTIVIDADE (1985-2001)
................................................................................................................................................358
GRÁFICO 73 INDICADORES DE DESENVOLVIMENTO FINANCEIRO 1, 2 E 3
(1946-2003) ............................................................................................................................385
GRÁFICO 74 INDICADOR DE DESENVOLVIMENTO FINANCEIRO 4 (1970-2003)386
GRÁFICO 75 TOTAL DE EMPRÉSTIMO DO SISTEMA FINANCEIRO: SÉRIE
ORIGINAL E TENDENCIAL (1970-2004) ..........................................................................387
GRÁFICO 76 PARTICIPAÇÃO DAS OPERAÇÕES DE CRÉDITO NO PIB (1988-2003)
................................................................................................................................................388
GRÁFICO 77 PARTICIPAÇÃO DOS SETORES PÚBLICO E PRIVADO NO TOTAL DE
CRÉDITO CONCEDIDO PELO SISTEMA FINANCEIRO (1988-2004) ...........................389
GRÁFICO 78 EMPRÉSTIMOS DO SISTEMA FINANCEIRO AO SETOR PRIVADO E
CRESCIMENTO ECONÔMICO (1970-2003) ......................................................................390
GRÁFICO 79 EXPANSÃO FINANCEIRA E INFLAÇÃO (1947 2003) ........................392
GRÁFICO 80 SÉRIES REAL E ESTIMADA DA PARTICIPAÇÃO DO VA DO SETOR
BANCÁRIO-FINANCEIRO NO PIB E RESÍDUOS DA RELAÇÃO (1970-1993) ............397
GRÁFICO 81 SALÁRIO REAL, EMPRÉSTIMOS E CONSUMO (1979-2002)..............404
GRÁFICO 82 TAXAS REAIS DE CÂMBIO (1950-2003)................................................406
GRÁFICO 83 TAXAS DE JUROS REAIS PARA CAPTAÇÃO E EMPRÉSTIMO (1973-
2003) .......................................................................................................................................409
GRÁFICO 84 EVOLUÇÃO DA TAXA SELIC EM TERMOS REAIS (1974-2004) .......410
GRÁFICO 85 TAXA NOMINAL SELIC E INFLAÇÃO (1974-2004) .............................411
GRÁFICO 86 DESEMPREGO E CHEQUE SEM FUNDOS (1991 2004)....................412
GRÁFICO 87 ÍNDICE DE INADIMPLÊNCIA (1994 -2004) ...........................................413
GRÁFICO 88 CRÉDITO E INVESTIMENTO PRODUTIVO (1970-2003) .....................414
708

GRÁFICO 89 TARIFAS LEGAIS SOBRE IMPORTAÇÕES POR TIPO DE BEM (1955-


2002) .......................................................................................................................................429
GRÁFICO 90 EVOLUÇÃO DA PARTICIPAÇÃO DA BALANÇA COMERCIAL NO PIB
(1947-2003) ............................................................................................................................430
GRÁFICO 91 EVOLUÇÃO DAS EXPORTAÇÕES EM VALOR, QUANTUM E PREÇO
(1901-2000) ............................................................................................................................433
GRÁFICO 92 - EVOLUÇÃO DAS IMPORTAÇÕES EM VALOR, QUANTUM E PREÇO
(1901-2000) ............................................................................................................................433
GRÁFICO 93 TERMOS DE TROCA E CAPACIDADE DE IMPORTAR (1901-2000)..434
GRÁFICO 94 COEFICIENTES DE PENETRAÇÃO DAS IMPORTAÇÕES POR
MACRO-COMPLEXOS E SETORES (1990-2000) - EM %...............................................438
GRÁFICO 95 COEFICIENTE DE EXPORTAÇÃO POR MACRO- COMPLEXOS E
SETORES (1990-2000) EM %............................................................................................438
GRÁFICO 96 COEFICIENTE DE IMPORTAÇÃO POR SETOR CONFORME A
INTENSIDADE DO FATOR (1989-1998) ............................................................................439
GRÁFICO 97 COEFICIENTE DE EXPORTAÇÃO POR SETOR CONFORME A
INTENSIDADE DO FATOR (1989-1998) ............................................................................440
GRÁFICO 98 - COEFICIENTE DE IMPORTAÇÃO / CONSUMO APARENTE: POR
SETOR CONFORME A INTENSIDADE DO FATOR (1989-1998) ...................................440
GRÁFICO 99 MARK UP MÉDIO DA INDÚSTRIA E INFLAÇÃO (1985-1996)..........444
GRÁFICO 100 INVESTIMENTOS ESTRANGEIROS EM CARTEIRA (1970-2004) ....450
GRÁFICO 101 - INVESTIMENTOS BRASILEIROS EM CARTEIRA (1970-2004).........450
GRÁFICO 102 INVESTIMENTO DIRETO ESTRANGEIRO E REMESSAS DE LUCROS
E DIVIDENDOS (1992-2000) ...............................................................................................452
GRÁFICO 103 INFLAÇÃO E TAXA BÁSICA DE JUROS DO GOVERNO (1994-2004)
................................................................................................................................................455
GRÁFICO 104 EVOLUÇÃO DAS RESERVAS INTERNACIONAIS E INDICADORES
FINANCEIROS (1956-2003) .................................................................................................456
GRÁFICO 105 RESERVAS INTERNACIONAIS E INVESTIMENTO (1956-2003) .....458
GRÁFICO 106 RESTRIÇÃO EXTERNA E CONTENÇÃO SALARIAL: TOTAL DA
ECONOMIA (1951-2002) ......................................................................................................459
GRÁFICO 107 - RESTRIÇÃO EXTERNA E CONTENÇÃO SALARIAL: SETOR
INDUSTRIAL (1976-2003) ...................................................................................................460
GRÁFICO 108 SALÁRIO MÉDIO NA INDÚSTRIA E TAXA DE JUROS (1976-2003)
................................................................................................................................................460
GRÁFICO 109 DINÂMICA DO CRESCIMENTO ECONÔMICO BRASILEIRO (1901-
2003) .......................................................................................................................................472
GRÁFICO 110 ACUMULAÇÃO DE CAPITAL E CRESCIMENTO ECONÔMICO (1941-
2003) .......................................................................................................................................473
GRÁFICO 111 TAXAS DE CRESCIMENTO DO PIB E DO ESTOQUE DE CAPITAL
FIXO FILTRADAS DAS FLUTUAÇÕES DE CURTO PRAZO (1914-2003) ....................475
GRÁFICO 112 INTENSIDADE DO CAPITAL E PRODUTIVIDADE DO TRABALHO
NA ECONOMIA BRASILEIRA (1950-2002).......................................................................478
GRÁFICO 113 EVOLUÇÃO DA PRODUTIVIDADE E DO EMPREGO TOTAL DA
ECONOMIA (1950-2002) ......................................................................................................480
GRÁFICO 114 INVESTIMENTO E INTENSIDADE DO CAPITAL (1950-2002) .........481
GRÁFICO 115 FUNÇÃO DE PROGRESSO TÉCNICO DE KALDOR E A ECONOMIA
BRASILEIRA (1950-2002) ....................................................................................................485
GRÁFICO 116 DINÂMICA DOS DETERMINANTES DA TAXA DE LUCRO (1950-
2002) .......................................................................................................................................488
709

GRÁFICO 117 NÍVEL E VARIAÇÃO ANUAL DA TAXA DE LUCRO MÉDIA DA


ECONOMIA BRASILEIRA (1950-2002) .............................................................................493
GRÁFICO 118 EVOLUÇÃO DOS DETERMINANTES DA TAXA DE LUCRO (1950-
2002) .......................................................................................................................................500
GRÁFICO 119 MUDANÇAS ESTRUTURAIS COMO MUDANÇAS DE REGIME (1950-
2002) .......................................................................................................................................509
GRÁFICO 120 UM ZOOM SOBRE AS DÉCADAS DE 80 E 90 ................................512
GRÁFICO 121 PRODUTIVIDADE E PRODUÇÃO FÍSICA NA INDÚSTRIA DE
TRANSFORMAÇÃO (1985-2001)........................................................................................516
GRÁFICO 122 DINÂMICAS DO PRODUTO INDUSTRIAL E DO PIB (1901-2003) ...523
GRÁFICO 123 - DINÂMICAS DO PRODUTO INDUSTRIAL E DO PIB: SÉRIES
TENDENCIAIS (1901-2003) .................................................................................................523
GRÁFICO 124 PRODUÇÃO INDUSTRIAL E PIB (1982-2001) .....................................531
GRÁFICO 125 LUCRO E ACUMULAÇÃO DE CAPITAL (1960-2003) ........................556
GRÁFICO 126 CICLOS DA PRODUTIVIDADE, SALÁRIO MÉDIO E PROFIT SHARE
(1950-2003) ............................................................................................................................561
GRÁFICO 127 EVOLUÇÃO DA PARTICIPAÇÃO DOS SALÁRIOS NO PIB A CUSTO
DE FATORES ........................................................................................................................563
GRÁFICO 128 EXPORTAÇÕES, IMPORTAÇÕES E PIB EVOLUÇÃO EM NÍVEL
(1901-2003) ............................................................................................................................567
GRÁFICO 129 DINÂMICA CÍCLICA DAS EXPORTAÇÕES, IMPORTAÇÕES E PIB
(1901-2003) ............................................................................................................................568
GRÁFICO 130 EVOLUÇÃO DOS COMPONENTES DA POUPANÇA TOTAL (1947-
2003) .......................................................................................................................................573
GRÁFICO 131 EVOLUÇÃO DA TAXA DE ACUMULAÇÃO DE CAPITAL NO
PERÍODO PÓS- MILAGRE (1974-2003)...........................................................................577
GRÁFICO 132 EVOLUÇÃO DA TAXA DE POUPANÇA TOTAL, DA RAZÃO p E DA
TAXA DE ACUMULAÇÃO BRUTA DE CAPITAL g (1941-2003).................................578
GRÁFICO 133 TAXA DE UTILIZAÇÃO DA CAPACIDADE PRODUTIVA E RAZÃO
PRODUTO / CAPITAL EM USO (1941-2003).....................................................................579
GRÁFICO 134 EVOLUÇÃO DOS PREÇOS RELATIVOS DO INVESTIMENTO (1950-
2003) .......................................................................................................................................585
GRÁFICO 135 PARTICIPAÇÃO DOS LUCROS NO PRODUTO, RELAÇÃO
PRODUTO/ CAPITAL EM USO E PRODUTIVIDADE DO CAPITAL (1950-2003)........586
GRÁFICO 136 RAZÃO PRODUTO-CAPITAL EM USO ( ) E PREÇOS RELATIVOS
DO INVESTIMENTO ( p ) [1940-2003]..........................................................................587
i
GRÁFICO 137 TAXAS DE VARIAÇÃO REAL E TENDENCIAL DA INTENSIDADE
K
DO CAPITAL - (1951-2003) .......................................................................................597
N
GRÁFICO 138 GANHOS DE PRODUTIVIDADE DO TRABALHO- SÉRIE REAL E
TENDENCIAL (1951-2003) ..................................................................................................598
Y
GRÁFICO 139 EFICIÊNCIA DO INVESTIMENTO NA ECONOMIA
I
BRASILEIRA (1944-2000) ....................................................................................................599
GRÁFICO 140 INTENSIDADE DO CAPITAL E PRODUTIVIDADE DO TRABALHO
(1980-2003) ............................................................................................................................600
GRÁFICO 141 DINÂMICA DA DEMANDA INTERNA E DA TAXA DE
ACUMULAÇÃO DE CAPITAL SÉRIES REAIS (1950-2003).........................................604
710

GRÁFICO 142 DINÂMICA DA DEMANDA INTERNA E DA TAXA DE


ACUMULAÇÃO DE CAPITAL SÉRIES TENDENCIAIS (1950-2003)..........................605
GRÁFICO 143 PARTICIPAÇÃO DAS MÁQUINAS E EQUIPAMENTOS NO TOTAL
DA FBKF E RAZÃO TAXA DE LUCRO/ TAXA DE ACUMULAÇÃO (1950-2003) ......608
GRÁFICO 144 RENDA LÍQUIDA DO GOVERNO, RENDA DISPONÍVEL E
CONSUMO DAS FAMÍLIAS EM % DO PIB (1950-2002) .................................................609
GRÁFICO 145 MASSA SALARIAL LÍQUIDA DE IMPOSTOS DIRETOS E DÉFICIT
OPERACIONAL DO GOVERNO EM % DO PIB (1950-2002)...........................................610
GRÁFICO 146 SALDO EXTERNO E DÉFICIT OPERACIONAL EM % DO PIB
(1950-2002) ............................................................................................................................610
GRÁFICO 147 TAXA DE OCIOSIDADE E RAZÃO TAXA DE LUCRO / TAXA DE
ACUMULAÇÃO (1950-2003)...............................................................................................617
GRÁFICO 148 PARTICIPAÇÃO DAS RESERVAS INTERNACIONAIS NO PIB E
RAZÃO TAXA DE LUCRO/ TAXA DE ACUMULAÇÃO DE CAPITAL (1950-2003) ...619
GRÁFICO 149 - LUCRO E ACUMULAÇÃO: UM ZOON NAS DÉCADAS DE 80 E 90
................................................................................................................................................620
GRÁFICO 150 TOTAL DAS OPERAÇÕES DE CRÉDITO DO SISTEMA FINANCEIRO
NACIONAL E FBKF TOTAL (1970-2003) ..........................................................................625
GRÁFICO 151 EVOLUÇÃO DA TAXA DE OCIOSIDADE (1937-2003) ......................626
GRÁFICO 152 ENDIVIDAMENTO EXTERNO, TAXA DE OCIOSIDADE E
CRESCIMENTO ECONÔMICO (1956-2003) ......................................................................629
GRÁFICO 153 LUCRO EMPRESARIAL, DÍVIDA EXTERNA E ACUMULAÇÃO DE
CAPITAL (1960-2003)...........................................................................................................634
GRÁFICO 154 RAZÃO DÍVIDA /PIB, TAXA DE INVESTIMENTO E TAXA DE
ACUMULAÇÃO (1960-2003)...............................................................................................636
GRÁFICO 155 RAZÃO DÍVIDA INTERNA FEDERAL /PIB E TAXA DE
ACUMULAÇÃO DE CAPITAL PRODUTIVO (1960-2003) ..............................................636
GRÁFICO 156 JUROS E REMESSAS DE LUCRO E DIVIDENDOS E TAXA DE
INVESTIMENTO (1960-2003)..............................................................................................637
GRÁFICO 157 TAXA DE LUCRO E TAXA DE ACUMULAÇÃO - DIAGRAMA DE
DISPERSÃO...........................................................................................................................638
GRÁFICO 158 TOTAL DE ATIVOS DAS ENTIDADES FECHADAS DE
PREVIDÊNCIA COMPLEMENTAR COMO PERCENTAGEM DO PIB (1996-2004) .....648
GRÁFICO 159 REPARTIÇÃO DO VALOR ADICIONADO DAS EMPRESAS NÃO-
FINANCEIRAS (1995-2002) .................................................................................................651
GRÁFICO 160 VALOR ADICIONADO DO SETOR FINANCEIRO E JUROS
RECEBIDOS E PAGOS PELO SETOR FINANCEIRO (1990-2002)..................................653

ÍNDICE DE TABELAS
TABELA 1 CRESCIMENTO E VOLATILIDADE AO LONGO DO SÉCULO XX ........162
TABELA 2 CRESCIMENTO ECONÔMICO E VOLATILIDADE: BRASIL, MÉXICO E
EUA (1950-2002) ...................................................................................................................166
TABELA 3 INFLAÇÃO E CRESCIMENTO ECONÔMICO (1993 2003).....................171
TABELA 4- BALANÇO DE PAGAMENTOS EM CONTA CORRENTE SALDOS EM
MILHÕES DE DÓLARES (1947 2003) .............................................................................184
TABELA 5- RESULTADO GLOBAL DO BALANÇO DE PAGAMENTOS SALDOS EM
MILHÕES DE DÓLARES (1947 2003) .............................................................................185
711

TABELA 6 PARTICIPAÇÃO DOS INVESTIMENTOS ESTRANGEIROS DIRETOS


(IDE) E EM CARTEIRA NO FINANCIAMENTO DA CONTA DE CAPITAL (1994
2003) .......................................................................................................................................188
TABELA 7 DÍVIDA DOS ESTADOS E MUNICÍPIOS (1981-2003)................................191
TABELA 8 DÍVIDA DAS EMPRESAS ESTATAIS (1981-2003).....................................192
TABELA 9 DÍVIDA DO GOVERNO FEDERAL E BANCO CENTRAL (1981-2003) ...192
TABELA 10 NECESSIDADES DE FINANCIAMENTO DOS ESTADOS E MUNICÍPIOS
EM PERCENTAGEM DO PIB (1981 2003) ......................................................................194
TABELA 11 NECESSIDADES DE FINANCIAMENTO DAS EMPRESAS ESTATAIS
EM PERCENTAGEM DO PIB (1981 2003) ......................................................................195
TABELA 12 NECESSIDADES DE FINANCIAMENTO DO GOVERNO FEDERAL E
BANCO CENTRAL EM PERCENTAGEM DO PIB (1981 2003)....................................195
TABELA 13 NECESSIDADES DE FINANCIAMENTO DO SETOR PÚBLICO EM
PERCENTAGEM DO PIB (1981-2003) ................................................................................196
TABELA 14 COMPOSIÇÃO DOS GASTOS DO GOVERNO FEDERAL EM
FORMAÇÃO BRUTA DE CAPITAL FIXO (1890 1945) .................................................242
TABELA 15 GASTOS DO GOVERNO FEDERAL POR MINISTÉRIOS (1901 2000)
................................................................................................................................................243
TABELA 16 COMPOSIÇÃO DA POUPANÇA TOTAL EM PERCENTAGEM DO PIB
(1947-2002) ............................................................................................................................255
TABELA 17 RECEITA LÍQUIDA, JUROS DA DÍVIDA INTERNA ,CONSUMO E
INVESTIMENTO GOVERNAMENTAIS COMO PERCENTAGEM DO PIB (1947-2000)
................................................................................................................................................256
TABELA 18- COMPOSIÇÃO DA POUPANÇA TOTAL INTERNA COMO
PERCENTAGEM DO PIB (1995 2002) .............................................................................257
TABELA 19 DISTRIBUIÇÃO DOS IMPOSTOS SOBRE A RENDA (1950 1975).260
TABELA 20 DISTRIBUIÇÃO DO TOTAL DA CARGA TRIBUTÁRIA FEDERAL
ENTRE TRABALHO E CAPITAL (1950-1975) ..................................................................261
TABELA 21 DISTRIBUIÇÃO DA RECEITA TOTAL DE IMPOSTOS ENTRE
TRABALHO E CAPITAL (1991 2004)..............................................................................261
TABELA 22 COMPOSIÇÃO DO PESSOAL OCUPADO TOTAL (1990-2002).............292
TABELA 23 COMPOSIÇÃO DA WLN (1982-2002) ......................................................308
TABELA 24 TAXAS ANUAIS DE ROTATIVIDADE - LABOR TURNOVER (1998
2000) .......................................................................................................................................351
TABELA 25 PRODUTIVIDADE, PRODUÇÃO, EMPREGO E SALÁRIO NA
INDÚSTRIA DE TRANSFORMAÇÃO: VARIAÇÃO PERCENTUAL MÉDIA POR
PERÍODO (1985-2001) ..........................................................................................................359
TABELA 26 PARTICIPAÇÃO DOS ATIVOS FINANCEIROS NO TOTAL (1978-2000)
................................................................................................................................................380
TABELA 27 DISTRIBUIÇÃO DAS OPERAÇÕES DE CRÉDITO DO SETOR
FINANCEIRO (1988-2004) ...................................................................................................389
TABELA 28 TESTES DE RAÍZES UNITÁRIAS (1970-1993).........................................396
TABELA 29 TARIFAS NOMINAL E EFETIVA (1987-1998) .........................................428
TABELA 30 TARIFAS SOBRE O COMÉRCIO EXTERIOR (1988-1998) ......................429
TABELA 31 PARTICIPAÇÃO DAS EMPRESAS COM PARTICIPAÇÃO
ESTRANGEIRA NA ROL 1980-1995 (%).........................................................................436
TABELA 32 VARIAÇÕES MÉDIAS NO GRAU DE DESNACIONALIZAÇÃO E
CONCENTRAÇÃO DA INDÚSTRIA DE TRANSFORMAÇÃO 1995-1997 (%)..............436
TABELA 33 INVESTIMENTO DIRETO ESTRANGEIRO (1992-2000) ........................452
712

TABELA 34 PASSIVOS E INDICADORES EXTERNOS DA ECONOMIA BRASILEIRA


(1900-2000) ............................................................................................................................453
TABELA 35 BALANÇO DE PAGAMENTOS DO BRASIL (1990 2002) ....................458
TABELA 36 ÍNDICES DA PRODUTIVIDADE, SALÁRIO MÉDIO E TAXA DE
LUCRO (1950-2002) ..............................................................................................................487
TABELA 37 VOLATILIDADE DA TAXA MÉDIA DE LUCRO (1950-2002) ...............494
TABELA 38 TAXA DE LUCRO, PRODUTIVIDADE DO CAPITAL, PRODUTIVIDADE
DO TRABALHO E SALÁRIO MÉDIO REAL (1950-2002)................................................494
TABELA 39 OS COMPONENTES DA TAXA DE LUCRO NA ECONOMIA
BRASILEIRA (1950-2002) ....................................................................................................499
TABELA 40 MUDANÇAS NOS COMPONENTES DA TAXA DE LUCRO SEGUNDA
FORMULAÇÃO (1950-2002) ...............................................................................................502
TABELA 41 ESTIMAÇÃO DA FUNÇÃO POUPANÇA (1950-2003).............................569
TABELA 42 ESTIMAÇÃO DA FUNÇÃO ACUMULAÇÃO DE CAPITAL (1966-2003)
................................................................................................................................................569
TABELA 43 ESTIMAÇÃO DA FUNÇÃO EXPORTAÇÕES LIQUIDAS (1950-2003)..570
TABELA 44 MUDANÇAS NOS COMPONENTES DA TAXA DE ACUMULAÇÃO DE
CAPITAL (1941-2003)...........................................................................................................576
TABELA 45 - MATRIZ DE CORRELAÇÕES PARA O PERÍODO (1941-2003) ..............580
TABELA 46 MATRIZ DE CORRELAÇÕES PARA O PERÍODO (1966-1980) .............581
TABELA 47 MATRIZ DE CORRELAÇÕES PARA O PERÍODO (1984-1993) .............582
TABELA 48 MATRIZ DE CORRELAÇÕES PARA O PERÍODO (1994-2003) .............582
TABELA 49 INFLUÊNCIA DA INFLAÇÃO SOBRE O INVESTIMENTO ...................593
TABELA 50 CRESCIMENTO, PRODUTIVIDADE E PROGRESSO TÉCNICO DE
HARROD (1951-2003)...........................................................................................................596
TABELA 51 COMPONENTES DA DEMANDA AGREGADA - % DO PIB (1950-2003)
................................................................................................................................................607
TABELA 52 INVESTIMENTO PRODUTIVO E INVESTIMENTO TOTAL EM %
(1950-2003) ............................................................................................................................607
TABELA 53 ELASTICIDADES DE LONGO PRAZO DA RELAÇÃO 55 .....................642
TABELA 54- ATIVO DE INVESTIMENTO DAS ENTIDADES FECHADAS DE
PREVIDÊNCIA COMPLEMENTAR, R$ MIL - POSIÇÃO EM JAN/2004 .................650
TABELA 55 JUROS RECEBIDOS, JUROS PAGOS E VALOR ADICIONADO PELO
SETOR FINANCEIRO EM PERCENTAGEM DO PIB (1995-2002) ...............................652
TABELA 56 JUROS RECEBIDOS E PAGOS PELO SFN - PARTICIPAÇÕES MÉDIAS
POR PERÍODO (1990-2002) .................................................................................................653

ÍNDICE DE QUADROS

QUADRO 1 - EQUILÍBRIO E REGULAÇÃO COMO NOÇÕES DE BASE DAS TEORIAS


ECONÔMICAS: UMA COMPARAÇÃO ...............................................................................48
QUADRO 2 - LÓGICA, IMPLICAÇÕES E CARACTERÍSTICAS DE QUATRO
GRANDES MODOS DE REGULAÇÃO. ...............................................................................86
QUADRO 3 - REGIMES DE ACUMULAÇÃO EXTENSIVA E INTENSIVA ....................95
QUADRO 4 DOIS CASOS TEÓRICOS PARA OS REGIMES DE PRODUTIVIDADE 106
QUADRO 5 QUATRO CASOS TEÓRICOS PARA OS REGIMES DE DEMANDA .....107
QUADRO 6 UMA TAXIONOMIA ALTERNATIVA PARA OS REGIMES DE
PRODUTIVIDADE................................................................................................................108
QUADRO 7 UMA TAXIONOMIA ALTERNATIVA PARA OS REGIMES DE
DEMDANDA .........................................................................................................................109
713

QUADRO 8 - TEORIA DO EQUILÍBRIO GERAL E TEORIA DA REGULAÇÃO:


UMA COMPARAÇÃO ........................................................................................................114
QUADRO 9 A RACIONALIDADE SITUADA É DE NATUREZA PROCEDIMENTAL
FORTE....................................................................................................................................122
QUADRO 10 MACROECONOMIA REGULACIONISTA E SEUS HORIZONTES DE
ANÁLISE ...............................................................................................................................134
QUADRO 11 - A TAXIONOMIA DAS CRISES NA TEORIA DA REGULAÇÃO...........142
QUADRO 12 - A HIERARQUIA DAS FORMAS INSTITUCIONAIS MUDA NA
HISTÓRIA LONGA...............................................................................................................149
QUADRO 13 DESEMPREGO E HIATO DO PRODUTO (1980-2002): TRÊS FASES
PARA A RELAÇÃO DE OKUN ...........................................................................................176
QUADRO 14 RESULTADOS DAS TRANSFORMAÇÕES ESTRUTURAIS DOS ANOS
90 POR COMPONENTE DO MODO DE REGULAÇÃO ...................................................201
QUADRO 15 PRINCIPAIS PROBLEMAS MACROECONÔMICOS NAS DÉCADAS DE
80 E 90: UMA COMPARAÇÃO ...........................................................................................203
QUADRO 16 SINOPSE DO PROCESSO DE PRIVATIZAÇÃO .................................226
QUADRO 17 COMPOSIÇÃO DA ARRECADAÇÃO FISCAL: UMA COMPARAÇÃO
ENTRE BRASIL, EUA E UNIÃO EUROPÉIA ....................................................................228
QUADRO 18 EVOLUÇÃO DO ESTADO BRASILEIRO UMA PERIODIZAÇÃO EM
TERMOS DE MUDANÇAS INSTITUCIONAIS (1930 2003)..........................................231
QUADRO 19 ESTIMAÇÃO DE LRECT PARA O PERÍODO [1900-2000].....................262
QUADRO 20 - ESTIMAÇÃO DE D(LRECT) PARA O PERÍODO [1900-1926] ................264
QUADRO 21 - ESTIMAÇÃO DE LRECT PARA O PERÍODO [1928-1960] .....................265
QUADRO 22 -TESTE DE CO-INTEGRAÇÃO DE JOHANSEN PARA O PERÍODO [1926
-1960]......................................................................................................................................266
QUADRO 23 - EQUAÇÃO DE CO-INTEGRAÇÃO E VECM PARA LRECT,............267
QUADRO 24 - ESTIMAÇÃO DE LRECT PARA O PERÍODO [1962- 2000] ....................268
QUADRO 25 - ESTIMAÇÃO DE LRECT PARA O PERÍODO [1966- 1989] ....................269
QUADRO 26 - ESTIMAÇÃO DE LDESPG PARA O PERÍODO [1900-2003]...................271
QUADRO 27 - ESTIMAÇÃO DE LDESPG PARA O PERÍODO [1932-1989]..................272
QUADRO 28 - TESTE DE CO-INTEGRAÇÃO DE JOHANSEN PARA O PERÍODO
[1932-1989] ............................................................................................................................273
QUADRO 29 - EQUAÇÃO DE CO-INTEGRAÇÃO E VECM PARA LDESPG E LPIB
................................................................................................................................................274
QUADRO 30 - ESTIMAÇÃO DE LDESPG PARA O PERÍODO [1990-2003]..................274
QUADRO 31 - TESTE DE CO-INTEGRAÇÃO DE JOHANSEN PARA O PERÍODO
[1990-2003] ............................................................................................................................275
QUADRO 32 - EQUAÇÃO DE CO-INTEGRAÇÃO E VECM PARA LDESPG E LPIB
................................................................................................................................................276
QUADRO 33 RELAÇÃO CAPITAL-TRABALHO, WAGE-LABOR NEXUS E RELAÇÃO
SALARIAL: UMA COMPARAÇÃO ENTRE TRÊS NOÇÕES ..........................................283
QUADRO 34 ESTIMAÇÃO DE LCONSF NO SUB-PERÍODO (1955-1980)..................299
QUADRO 35 TESTES DE RAÍZES UNITÁRIAS PARA LCONSF NO PERÍODO (1955-
1980) .......................................................................................................................................300
QUADRO 36 TESTES DE RAÍZES UNITÁRIAS PARA OS RESÍDUOS DA EQUAÇÃO
(1) NO PERÍODO (1955-1980)..............................................................................................301
QUADRO 37 TESTE DO TRAÇO DE JOHANSEN E EQUAÇÃO DE CO-INTEGRAÇÃO
................................................................................................................................................301
QUADRO 38 ESTIMAÇÃO DO MODELO DE CORREÇÃO DE ERROS......................302
714

QUADRO 39 DEFINIÇÕES DO CONCEITO DE FLEXIBILIDADE A PARTIR DE


CINCO PRINCÍPIOS DE BASE............................................................................................305
QUADRO 40 ESTIMAÇÕES DE NCART PARA O PERÍODO (1983 1989)................311
QUADRO 41 - ESTIMAÇÕES DE NCART PARA O PERÍODO (1992 2001).................312
QUADRO 42 - ESTIMAÇÕES DE NSCART PARA O PERÍODO (1983 1989)...............313
QUADRO 43 ESTIMAÇÕES DE NSCART PARA O PERÍODO (1992-2001).................313
QUADRO 44 ESTIMAÇÕES DE NCPROP PARA O PERÍODO (1982-1989) ...............314
QUADRO 45 - ESTIMAÇÕES DE NCPROP PARA O PERÍODO (1992-2001) ................314
QUADRO 46 RELAÇÕES ENTRE SEM CARTEIRA E COM CARTEIRA (1992-2001)
................................................................................................................................................315
QUADRO 47 RELAÇÕES Nscart E NCART ANTES DE DEPOIS DO REAL (1991-2001)
................................................................................................................................................316
QUADRO 48 TESTES DE CAUSALIDADE DE GRANGER PARA NSCART E NCART
................................................................................................................................................316
QUADRO 49 ESTIMAÇÃO DE NSCART NO PERÍODO DE ECONOMIA FECHADA E
ABERTA ................................................................................................................................318
QUADRO 50 ESTIMAÇÃO DE NCART NO PERÍODO DE ECONOMIA ABERTA ....318
QUADRO 51 TESTE DE CAUSALIDADE DE GRANGER PARA Ncprop E Ncart (1982-
2001) .......................................................................................................................................319
QUADRO 52 INFLUÊNCIA DO DESEMPREGO E DA INFLAÇÃO SOBRE WNcart
(1982-2001) ............................................................................................................................320
QUADRO 53 - FORMAÇÃO DO SALÁRIO REAL NO SEGMENTO COM CARTEIRA
(1982-1989) ............................................................................................................................321
QUADRO 54 SENSIBILIDADE DE WRcart À CONJUNTURA E A Ncart (1983-2001)
................................................................................................................................................321
QUADRO 55 FORMAÇÃO DO SALÁRIO NOMINAL NO SEGMENTO SEM
CARTEIRA (1982-2001) .......................................................................................................322
QUADRO 56 RELAÇÃO DE PHILLIPS PARA WNscart (1982-2001) ...........................323
QUADRO 57 SENSIBILIDADE DE WNscart ÀS VARIAÇÕES DE Ncart (1995-2001)324
QUADRO 58 - SENSIBILIDADE DE WNscart ÀS VARIAÇÕES CONJUNTURAIS (1982-
2001) .......................................................................................................................................324
QUADRO 59 RELAÇÃO ENTRE WRcprop E WRcart (1982-2001) ..............................325
QUADRO 60 TESTE DE CAUSALIDADE DE GRANGER PARA WRcprop e WRcart
(1982-2001) ............................................................................................................................326
QUADRO 61 ESTIMAÇÃO DE WRITRF E SALMIN NO PERÍODO (1985-2001) .........329
QUADRO 62 TESTE DE CAUSALIDADE DE GRANGER PARA WRITRF E SALMIN
(1985:1- 2001:1) .....................................................................................................................330
QUADRO 63 TESTES DE RAIZES UNITÁRIAS PARA LWNITRF E LSALMINN
(1985:01 1989:11)................................................................................................................331
QUADRO 64 TESTE DE CO-INTEGRAÇÃO DE JOHANSEN PARA LWNITRF E
LSALMIN (1985:04-1989:11) .................................................................................................331
QUADRO 65 EQUAÇÃO CO-INTEGRANTE E VECM PARA LWNITRF E SALMINN
(1985:04-1989:11) ..................................................................................................................332
QUADRO 66 - TESTE DE CAUSALIDADE DE GRANGER PARA LWNITRF E
LSALMINN (1985:01 - 1989:11) .........................................................................................332
QUADRO 67 - ESTIMAÇÃO DE LWNITRF E LSALMIN NO PERÍODO (1995:06 -
2001:01).................................................................................................................................333
QUADRO 68 - ESTIMAÇÃO DE LWNITRF E LSALMIN NO PERÍODO (1995:06-
1998:01).................................................................................................................................334
715

QUADRO 69 - TESTES DE RAIZES UNITÁRIAS PARA LWNITRF E LSALMINN


(1995:06 1998:01)................................................................................................................334
QUADRO 70 - TESTE DE PHILLIPS-PERRON PARA LWNITRF E LSALMINN (1995:06
1998:01) ..................................................................................................................................334
QUADRO 71 ESTIMAÇÃO DE LWNITRF E LSALMINN EM PRIMEIRAS
DIFERENÇAS(1995:06-1998:01)..........................................................................................335
QUADRO 72 - TESTE DE CAUSALIDADE DE GRANGER PARA LWNITRF E
LSALMINN EM PRIMEIRAS DIFERENÇAS (1995:06 - 1998:01) .................................335
QUADRO 73 - ESTIMAÇÃO DE LWNITRF E LSALMIN NO PERÍODO (1999:02 -
2001:01).................................................................................................................................336
QUADRO 74 - TESTES DE RAIZES UNITÁRIAS PARA LWNITRF E LSALMINN
(1999:02 2001:01)................................................................................................................336
QUADRO 75 TESTE DE CO-INTEGRAÇÃO DE JOHANSEN (1999:02-2001:01) .......336
QUADRO 76 - ESTIMAÇÃO DE LWNITRF E LSALMIN EM DIFERENÇAS (1999:02 -
2001:01).................................................................................................................................336
QUADRO 77 SENSIBILIDADE DO RENDIMENTO MÉDIO À EVOLUÇÃO DO
SALÁRIO MÍNIMO (1982 2001) .......................................................................................337
QUADRO 78 ESTIMAÇÃO DA EQUAÇÃO (8) PARA O PERÍODO (1985:03 2001:04)
................................................................................................................................................340
QUADRO 79 -AJUSTAMENTO DO EMPREGO INDUSTRIAL: ELASTICIDADES DE
CURTO PRAZO (1985-2001)................................................................................................340
QUADRO 80 AJUSTAMENTO DO EMPREGO INDUSTRIAL: ELASTICIDADES DE
LONGO PRAZO (1985-2001) ...............................................................................................340
QUADRO 81 - ESTIMAÇÃO DA EQUAÇÃO (3) PARA O PERÍODO (1986:01 1989:04)
................................................................................................................................................341
QUADRO 82 - ESTIMAÇÃO DA EQUAÇÃO (3) PARA O PERÍODO (1995:01 2001:04)
................................................................................................................................................342
QUADRO 83 -AJUSTAMENTO DO EMPREGO INDUSTRIAL: ELASTICIDADES DE
CURTO PRAZO (1985-2001)................................................................................................343
QUADRO 84 AJUSTAMENTO DO EMPREGO INDUSTRIAL: ELASTICIDADES DE
LONGO PRAZO (1985-2001) ...............................................................................................343
QUADRO 85 SENSIBILIDADE DO EMPREGO INDUSTRIAL ÀS FLUTUAÇÕES
CONJUNTURAIS (1985:1 2000:4) ....................................................................................346
QUADRO 86 - SENSIBILIDADE DO EMPREGO INDUSTRIAL ÀS FLUTUAÇÕES
CONJUNTURAIS (1985:1 1989:4) ....................................................................................347
QUADRO 87 - SENSIBILIDADE DO EMPREGO INDUSTRIAL ÀS FLUTUAÇÕES
CONJUNTURAIS (1990:4 2000:4) ....................................................................................347
QUADRO 88 - SENSIBILIDADE DO EMPREGO INDUSTRIAL ÀS FLUTUAÇÕES
CONJUNTURAIS: PERÍODO PÓS-PLANO REAL ............................................................348
QUADRO 89 INÉRCIA DAS HORAS E SENSIBILIDADE À PRODUÇÃO (1985-2001)
................................................................................................................................................350
QUADRO 90 INÉRCIA DO EMPREGO E SENSIBILIDADE À PRODUÇÃO (1985-
2001) .......................................................................................................................................350
QUADRO 91 RESULTADOS DAS ESTIMAÇÕES DA EQUAÇÃO 17.........................353
QUADRO 92 ESTIMAÇÃO DA EQUAÇÃO 8 NO PERÍODO (1991:T1 1995:T1).....354
QUADRO 93 TESTES DE RAÍZES UNITÁRIAS PARA WR, PRH E N (1991:T1
1995:T1)..................................................................................................................................355
QUADRO 94 TESTE DE CO-INTEGRAÇÃO DE JOHANSEN PARA WR, PRH E N
(1991:T1 1995:T1)...............................................................................................................355
716

QUADRO 95 - EQUAÇÃO CO-INTEGRANTE E VECM PARA WR, PRH E N (1991:T1


1995:T1)..................................................................................................................................356
QUADRO 96 RELAÇÕES ENTRE WR E PR E WR E N (1995 2001)...........................359
QUADRO 97 ESTIMAÇÃO DA EQUAÇÃO .... NO PERÍODO [1982 1988] ..............360
QUADRO 98 - ESTIMAÇÃO DA EQUAÇÃO 20 NO PERÍODO [1992 2001]...............361
QUADRO 99 ELASTICIDADES DE CURTO PRAZO DO EMPREGO REGIÕES
METROPOLITANAS (1982-2001) .......................................................................................361
QUADRO 100 - AJUSTAMENTO DO EMPREGO INDUSTRIAL: ELASTICIDADES DE
LONGO PRAZO (1982-2001) ...............................................................................................362
QUADRO 101 A WAGE-LABOR NEXUS BRASILEIRA EM PERSPECTIVA
HISTÓRICA ...........................................................................................................................364
QUADRO 102 TRANSFORMAÇÕES DO SISTEMA FINANCEIRO BRASILEIRO
(1988-1998) ............................................................................................................................382
QUADRO 103 ESTIMAÇÃO DA RELAÇÃO ENTRE EMPSF E PIB (1970-2003) .......390
QUADRO 104 TESTE DE CAUSALIDADE DE GRANGER PARA EMPSF E PIB (1970-
2003) .......................................................................................................................................391
QUADRO 105 ESTIMAÇÃO DA RELAÇÃO ENTRE VAFPIB E INFLA (1947-1969) .393
QUADRO 106 - ESTIMAÇÃO DA RELAÇÃO ENTRE VAFPIB E INFLA (1970-1993).395
QUADRO 107 TESTES DE CO-INTEGRAÇÃO DE JOHANSEN PARA LVAFPIB E
LINFLA (1970-1993) .............................................................................................................396
QUADRO 108 MODELO DE CORREÇÃO DE ERROS PARA A RELAÇÃO 22 (1970-
1993) .......................................................................................................................................397
QUADRO 109 TESTE DE CAUSALIDADE DE GRANGER PARA INFLA E VAFPIB
(1970-1993) ............................................................................................................................397
QUADRO 110 - ESTIMAÇÃO DA RELAÇÃO ENTRE VAFPIB E INFLA (1994-2003).398
QUADRO 111- ESTIMAÇÃO DA RELAÇÃO ENTRE VAFPIB E INFLA EM TAXAS DE
VARIAÇÃO (1994-2003) ......................................................................................................399
QUADRO 112 SINOPSE DOS PLANOS DE ESTABILIZAÇÃO....................................403
QUADRO 113 EVOLUÇÃO INSTITUCIONAL E ORGANIZACIONAL DO REGIME
MONETÁRIO FINANCEIRO NO BRASIL (1945-2002) ..................................................407
QUADRO 114 ÍNDICES DE CONCENTRAÇÃO DA INDÚSTRIA DE
TRANSFORMAÇÃO (1978, 1995, 1997) .............................................................................435
QUADRO 115 GRAU DE ABERTURA: UMA COMPARAÇÃO INTERNACIONAL
(1980-1990-2000) ...................................................................................................................441
QUADRO 116 METODOLOGIAS PARA ESTIMATIVA DOS MARK UPS SETORIAIS
................................................................................................................................................442
QUADRO 117 MARK UPS SETORIAIS MÉDIOS (1985-1996) .....................................445
QUADRO 118 VARIAÇÃO MÉDIA DO MARK UP, PREÇO E CUSTOS REAIS POR
SETOR CONFORME A INTENSIDADE DO FATOR (1990-1998) ...................................445
QUADRO 119 ÍNDICE DE MUDANÇA ESTRUTURAL NA INDÚSTRIA BRASILEIRA
(1985-1998) ............................................................................................................................446
QUADRO 120 ESTRUTURA INDUSTRIAL BRASILEIRA( 1985, 1998, 2000)............447
QUADRO 121 ESTIMAÇÃO DA EQUAÇÃO 1- PERÍODO (1941-2003) ......................474
QUADRO 122 ESTATÍSTICAS DESCRITIVAS PARA TXPIB E TXK E
CORRELAÇÕES (1941-2003)...........................................................................................474
QUADRO 123 TESTE DE CAUSALIDADE DE GRANGER PARA LPIB E LK...........474
QUADRO 124 TESTES DE RAÍZES UNITÁRIAS PARA LK E LPIB (1940-2003) ......475
QUADRO 125 TESTE DE RAÍZES UNITÁRIAS DOS RESÍDUOS (1940-2003) ..........476
QUADRO 126 ESTIMAÇÃO DA RELAÇÃO ESTÁTICA ENRE LPIB E LK (1940-2003)
................................................................................................................................................476
717

QUADRO 127 ESTIMAÇÃO DO MODELO DE CORREÇÃO DE ERRO (1940-2003) 476


QUADRO 128 REGIMES DE ACUMULAÇÃO E DE CRISE NA ECONOMIA
BRASILEIRA (1950-2002) ....................................................................................................510
QUADRO 129 ESTIMAÇÃO DE LPRH PARA O PERÍODO (1985-2001).....................516
QUADRO 130 TESTE DE RAÍZES UNITÁRIAS PARA LPRH E LPRODF NO
PERÍODO (1985-2001) ..........................................................................................................517
QUADRO 131-TESTE DE CO-INTEGRAÇÃO DE JOHANSEN (1985-2001)..................517
QUADRO 132 ESTIMAÇÃO DA EQUAÇÃO 1 (1985 2001) ....................................517
QUADRO 133 ESTIMAÇÃO DA EQUAÇÃO 1 (1985:01 1989:01)..........................518
QUADRO 134 - ESTIMAÇÃO DA EQUAÇÃO 1 E TESTES DE RAÍZES UNITÁRIAS
(1991 2001)..........................................................................................................................519
QUADRO 135 TESTES DE RAÍZES UNITÁRIAS DOS RESÍDUOS DA EQUAÇÃO 1 -
(1991 2001)..........................................................................................................................520
QUADRO 136 -TESTE DE CO-INTEGRAÇÃO DE JOHANSEN (1991-2001).................520
QUADRO 137 - ESTIMAÇÃO DA EQUAÇÃO 30 (1900-2003) ........................................524
QUADRO 138 - ESTIMAÇÃO DA EQUAÇÃO 30 (1900-1927) ........................................525
QUADRO 139- TESTES DE RAÍZES UNITÁRIAS PARA LPIB, PRODIND E RESÍDUOS
DA EQUAÇÃO 30 (1900-1927) ............................................................................................526
QUADRO 140 TESTE DE CO-INTEGRAÇÃO (1900-1927) ...........................................526
QUADRO 141 - ESTIMAÇÃO DA EQUAÇÃO 30 (1962-1980) ........................................527
QUADRO 142 - TESTES DE RAÍZES UNITÁRIAS PARA LPIB E LPRODIND E
RESÍDUOS DA RELAÇÃO 30 (1962-1980) ........................................................................528
QUADRO 143 TESTE DE CO-INTEGRAÇÃO DE JOHANSEN PARA LPIB E
LPRODIND (1962-1980) .......................................................................................................528
QUADRO 144 - ESTIMAÇÃO DA EQUAÇÃO 30 (1991-2003) ........................................529
QUADRO 145 - ESTIMAÇÃO DA EQUAÇÃO 31 (1982-2001) ........................................532
QUADRO 146 TESTES DE ESTABILIDADE DA RELAÇÃO 31 (1982-2001) .............532
QUADRO 147 ESTIMAÇÃO DA RELAÇÃO 31 - [1991-1994] ......................................532
QUADRO 148 TESTES DE RAÍZES UNITÁRIAS PARA LPI E LPIB (1991-1994) .....533
QUADRO 149 TESTE DE CO-INTEGRAÇÃO DE JOHANSEN PARA LPIB E LPI
(1991-1994) ............................................................................................................................533
QUADRO 150 TESTES DE RAÍZES UNITÁRIAS PARA OS RESÍDUOS DA
RELAÇÃO 31 (1991-1994)....................................................................................................534
QUADRO 151 - ESTIMAÇÃO DA RELAÇÃO 31 EM TAXAS DE VARIAÇÃO - [1991-
1994] .......................................................................................................................................534
QUADRO 152 ESTIMAÇÃO DA RELAÇÃO 31 EM TAXAS DE VARIAÇÃO - [1995
2001] .......................................................................................................................................534
QUADRO 153 TESTE DE CAUSALIDADE DE GRANGER (1995-2001) .....................535
QUADRO 154 ESTIMAÇÃO DA RELAÇÃO 3 EM TAXAS DE VARIAÇÃO E DADOS
ANUAIS (1901-2003) ............................................................................................................535
QUADRO 155 TESTES DE CAUSALIDADE DE GRANGER PARA PIB E PIBIND
(1901-2003) ............................................................................................................................536
QUADRO 156 ESTIMAÇÃO DA RELAÇÃO 32 (1900-2002) ........................................538
QUADRO 157 ESTIMAÇÃO DA RELAÇÃO 32 (1960 1979)...................................538
QUADRO 158 TESTES DE RAÍZES UNITÁRIAS PARA LYIND, LYNIND E
RESÍDUOS DA RELAÇÃO 32 (1960-1979) ........................................................................539
QUADRO 159 - ESTIMAÇÃO DA RELAÇÃO 32 EM TAXAS DE VARIAÇÃO (1960
1979) .......................................................................................................................................539
QUADRO 160 - TESTE DE CAUSALIDADE DE GRANGER (1966-1979)......................540
718

QUADRO 161 FUNÇÃO POUPANÇA - ESTIMAÇÃO DA RELAÇÃO ESTÁTICA


(1950-1980) ............................................................................................................................549
QUADRO 162 TESTES DE RAÍZES UNITÁRIAS FUNÇÃO POUPANÇA (1950-1980)
................................................................................................................................................549
QUADRO 163 TESTE DE CO-INTEGRAÇÃO DE JOHANSEN FUNÇÃO
POUPANÇA (1950-1980)......................................................................................................549
QUADRO 164 VECTOR ERROR CORRECTION MODEL (VECM) FUNÇÃO
POUPANÇA (1950-1980)......................................................................................................550
QUADRO 165 - TESTES DE RAÍZES UNITÁRIAS FUNÇÃO POUPANÇA (1985-2003)
................................................................................................................................................551
QUADRO 166 ESTIMAÇÃO EM PRIMEIRAS DIFERENÇAS FUNÇÃO POUPANÇA
(1984-2003) ............................................................................................................................552
QUADRO 167 TESTES DE RAÍZES UNITÁRIAS FUNÇÃO INVESTIMENTO (1966-
1980) .......................................................................................................................................552
QUADRO 168 TESTE DE CO-INTEGRAÇÃO DE JOHANSEN (1966-1980) ...............553
QUADRO 169 VECTOR ERROR CORRECTION MODEL (VECM) FUNÇÃO
INVESTIMENTO (1966-1980)..............................................................................................553
QUADRO 170 TESTES DE RAÍZES UNITÁRIAS FUNÇÃO INVESTIMENTO (1984-
2003) .......................................................................................................................................554
QUADRO 171 TESTE DE CO-INTEGRAÇÃO DE JOHANSEN FUNÇÃO
INVESTIMENTO (1984-2003)..............................................................................................554
QUADRO 172 ESTIMAÇÃO DA FUNÇÃO INVESTIMENTO EM TAXAS DE
VARIAÇÃO (1984-2003) ......................................................................................................554
QUADRO 173 TESTE DE RAÍZES UNITÁRIAS PARA I/K E r (1960-1993)................556
QUADRO 174 TESTE DE CO-INTEGRAÇÃO PARA I/K E r (1965-1993) ..................557
QUADRO 175 ESTIMAÇÃO DA RELAÇÃO ESTÁTICA ENTRE TAXA DE
ACUMULAÇÃO E TAXA DE LUCRO (1966-2003) ..........................................................557
QUADRO 176 TESTE DE RAIZ UNITÁRIA SOBRE OS RESÍDUOS E GRÁFICO DOS
VALORES REAIS E PREVISTOS (1966-1993)...................................................................558
QUADRO 177 ESTIMAÇÃO DO MODELO DE CORREÇÃO DE ERROS PELO
MÉTODO DE ENGLE E GRANGER (1967-1993) ..............................................................558
QUADRO 178 ESTIMAÇÃO DO VECM PARA I/K E r (1960-1993).............................559
QUADRO 179 TESTE DE CAUSALIDADE DE GRANGER PARA I/K E r (1966-1993)
................................................................................................................................................559
QUADRO 180 TESTES DE RAÍZES UNITÁRIAS FUNÇÃO EXPORTAÇÕES
LÍQUIDAS (1950-1980).........................................................................................................565
QUADRO 181 ESTIMAÇÃO DE NEX PARA O PERÍODO (1950-1980) .......................566
QUADRO 182 ESTIMAÇÃO DE NEX PARA O PERÍODO (1984-2003) .......................566
QUADRO 183 ESTIMAÇÃO DA RELAÇÃO ESTÁTICA ENTRE (g) e (s) [1941-2003]
................................................................................................................................................580
QUADRO 184 CORRELAÇÕES EM NÍVEIS E PRIMEIRAS DIFERENÇAS ENTRE
E p POR PERÍODO ............................................................................................................588
i
QUADRO 185 CORRELAÇÕES EM NÍVEIS E PRIMEIRAS DIFERENÇAS ENTRE
E p (1974-1993) ................................................................................................................589
i

QUADRO 186 TESTE DE JOHANSEN PARA E p i


(1974-1993) ...........................590
QUADRO 187 TESTE DE CAUSALIDADE DE GRANGER PARA E p i
(1974-
1993) ......................................................................................................................................590
QUADRO 188 ESTIMAÇÃO DA EQUAÇÃO 46.............................................................591
719

QUADRO 189 TESTES DE RAÍZES UNITÁRIAS PARA I/K E LPk (1950-2003) ........592
QUADRO 190 TESTE DE CO-INTEGRAÇÃO DE JOHANSEN (1950-2003) ...............592
QUADRO 191 ESTIMAÇÃO DO PARÂMETRO a (1951-2003).....................................594
QUADRO 192 CORRELAÇÕES ENTRE AS VARIAÇÕES DA DEMANDA INTERNA
d(Y+M-X) E DA TAXA DE ACUMULAÇÃO DE CAPITAL d(I / K) [1966-2003] .......606
QUADRO 193 TESTES DE CAUSALIDADE DE GRANGER PARA A DEMANDA
INTERNA E A TAXA DE ACUMULAÇÃO DE CAPITAL (1966-2003) ..........................606
QUADRO 194 - ESTIMAÇÃO DA RELAÇÃO ENTRE PR E CF (1993-2003).................611
QUADRO 195 ESTIMAÇÃO DA RELAÇÃO ESTÁTICA PARA INVT, r, u e TXJUR E
GRÁFICO DOS RESÍDUOS (1982-2003) ............................................................................622
QUADRO 196 TESTE DE CO-INTEGRAÇÃO PARA INV, U E TXJUR (1984-2003)..622
QUADRO 197 VECTOR ERROR CORRECTION MODEL PARA A RELAÇÃO (1984-
2003) .......................................................................................................................................623
QUADRO 198 ESTIMAÇÃO DA RELAÇÃO ENTRE u E bx PERÍODO (1960-1980)
................................................................................................................................................628
QUADRO 199 ESTIMAÇÃO DA EQUAÇÃO PERÍODO (1981-2003) .......................628
QUADRO 200 ESTIMAÇÃO DA EQUAÇÃO 55 (1966-1980)........................................639
QUADRO 201 TESTE DE RAÍZES UNITÁRIAS PARA TXINV, r e bx (1966-1980) ...640
QUADRO 202 TESTE DE CO-INTEGRAÇÃO DE JOHANSEN (1966-1980) ...............640
QUADRO 203 TESTE DE CO-INTEGRAÇÃO DE JOHANSEN (1981-2003) ...............641
QUADRO 204 ESTIMAÇÃO DA EQUAÇÃO 55 (1991-2003)........................................641
QUADRO 205 TESTE DE CO-INTEGRAÇÃO DE JOHANSEN (1991-2003) ...............641
QUADRO 206 ESTIMAÇÃO DA EQUAÇÃO 56 (1966-1980)........................................643
QUADRO 207 TESTES DE RAÍZES UNITÁRIAS (1966-1980) .....................................643
QUADRO 208 TESTE DE CO-INTEGRAÇÃO DE JOHANSEN (1966-1980) ...............643
QUADRO 209 VECM PARA A RELAÇÃO 56 (1966-1980) ...........................................644
QUADRO 210 ESTIMAÇÃO DA RELAÇÃO ESTÁTICA ENTRE IKPR, r E LBX (1990-
2003) .......................................................................................................................................644
QUADRO 211 TESTE DE CO-INTEGRAÇÃO DE JOHANSEN (1990-2003) ...............645
QUADRO 212 TESTE DE PHILLIPS-PERRON PARA IKPR (1981-2003) ....................645
QUADRO 213 ESTIMAÇÃO EM TAXAS DE VARIAÇÃO PARA A RELAÇÃO 56
(1981-2003) ............................................................................................................................645
QUADRO 214 ESTIMAÇÃO EM TAXAS DE VARIAÇÃO PARA A RELAÇÃO 56
(1991-2003) ............................................................................................................................646
QUADRO 215 ATIVOS DOS FUNDOS DE PENSÃO EM % DO PIB: VÁRIOS PAÍSES -
2003 ........................................................................................................................................647
QUADRO 216 CORRELAÇÕES ENTRE ATIVOS FINANCEIROS E CONSUMO DAS
FAMÍLIAS (1988-2003).........................................................................................................654
QUADRO 217 ESTIMAÇÃO DA RELAÇÃO ENTRE AF E CF (1994-2003) ................655
QUADRO 218 - ESTIMAÇÃO DA RELAÇÃO ENTRE JP E CF (1993-2003) .................656

ÍNDICE DE FIGURAS

FIGURA 1 TRÊS RELAÇÕES SOCIAIS FUNDAMENTAIS DETERMINAM A LÓGICA


E A NATUREZA DAS ECONOMIAS CAPITALISTAS.......................................................36
FIGURA 2 O CONCEITO DE REGULAÇÃO PODE EXPRESSAR, NO PLANO DAS
MACROANÁLISES, PROPRIEDADES E MOMENTOS DETERMINATIVOS QUE SÃO
ESPECÍFICOS DOS SISTEMAS SOCIAIS............................................................................42
FIGURA 3 O LUGAR DA TEORIA DA REGULAÇÃO NAS PESQUISAS SOBRE AS
INSTITUIÇÕES .......................................................................................................................51
720

FIGURA 4 UM PROCESSO DE CRESCIMENTO CUMULATIVO PRESSUPÕE UMA


COMPATIBILIDADE ESTRUTURAL ENTRE OS REGIMES DE PRODUTIVIDADE E
DE DEMANDA: UM ATRIBUTO DEPENDENTE DAS CARACTERÍTICAS DO MODO
DE REGULAÇÃO .................................................................................................................101
FIGURA 5 MUDANÇAS NAS CONDIÇÕES SÓCIO-TÉCNICAS DE PRODUÇÃO E A
PRODUTIVIDADE DO TRABALHO ..................................................................................104
FIGURA 6 AS FORMAS INSTITUCIONAIS INTERAGEM COM O MODO DE
DESENVOLVIMENTO .........................................................................................................110
FIGURA 7 O MODO DE DESENVOLVIMENTO COMO UM RESULTADO DE
LONGO PRAZO DA ASSOCIAÇÃO ENTRE UM MODO DE REGULAÇÃO E UM
REGIME DE ACUMULAÇÃO .............................................................................................112
FIGURA 8 - TRÊS VISÕES (ONTOLOGIAS) DA VIDA DOS HOMENS EM SOCIEDADE
CONDUZEM A TRÊS METODOLOGIAS DIFERENTES .................................................119
FIGURA 9 AS INTERAÇÕES AGENTE-ESTRUTURA : BASE DA ESTABILIDADE E
DA TRANSFORMAÇÃO DE UM MODO DE REGULAÇÃO ...........................................124
FIGURA 10 QUESTÕES BÁSICAS DAS MACROANÁLISES REGULACIONISTAS 127
FIGURA 11 - AS NOÇÕES DE BASE PARA UMA MACROECONOMIA HISTÓRICA E
INSTITUCIONALISTA.........................................................................................................144
FIGURA 12 MACROANÁLISE REGULACIONISTA E O MÉTODO............................156
FIGURA 13 TESTES DE ESTABILIDADE PARA O PERÍODO [1900-2000] ...............263
FIGURA 14 TESTES DE ESTABILIDADE PARA O PERÍODO [1900-1926] ...............264
FIGURA 15 - TESTES DE ESTABILIDADE PARA O PERÍODO [1928 1960] .............266
FIGURA 16 - TESTES DE ESTABILIDADE PARA O PERÍODO [1962 2000] .............268
FIGURA 17 - TESTES DE ESTABILIDADE PARA O PERÍODO [1966 1989] .............269
FIGURA 18 - TESTES DE ESTABILIDADE PARA O PERÍODO [1900 2000] .............271
FIGURA 19 - TESTES DE ESTABILIDADE PARA O PERÍODO [1932-1989] ................272
FIGURA 20 A WAGE-LABOR NEXUS BRASILEIRA E SEUS EIXOS...........................293
FIGURA 21 RELAÇÃO CONSUMO E MASSA SALARIAL: TESTES DE
ESTABILIDADE PARA O PERÍODO (1950-2002).............................................................299
FIGURA 22 - RELAÇÃO CONSUMO E MASSA SALARIAL: TESTES DE
ESTABILIDADE PARA O PERÍODO (1955-1980).............................................................300
FIGURA 23 RELAÇÃO CONSUMO E MASSA SALARIAL: TESTES DE
ESTABILIDADE PARA O SUBPERÍODO [1981-2002] .....................................................303
FIGURA 24 TESTES DE ESTABILIDADE DA RELAÇÃO ENTRE WRITRF E SALMIN
(1985:2 - 2001:1)..................................................................................................................330
FIGURA 25 TESTES DE ESTABILIDADE DA RELAÇÃO WRITRF E SALMIN (1991:01
2001:01) ...............................................................................................................................333
FIGURA 26 TESTES DE ESTABILIDADE DA RELAÇÃO ENTRE WRITRF E SALMIN
(1995:06 - 2001:01) ................................................................................................................333
FIGURA 27 - TESTES DE ESTABILIDADE DA EQUAÇÃO DE AJUSTAMENTO DO
EMPREGO INDUSTRIAL (1985-2001) ...............................................................................341
FIGURA 28 - TESTES DE ESTABILIDADE DA EQUAÇÃO DE AJUSTAMENTO DO
EMPREGO INDUSTRIAL (1995 - 2001) .............................................................................342
FIGURA 29 TESTES DE ESTABILIDADE DA EQUAÇÃO 4 (1985:1 2000:4) ..........346
FIGURA 30 - TESTES DE ESTABILIDADE DA EQUAÇÃO 4 (1985:1 1989:4)...........347
FIGURA 31 - TESTES DE ESTABILIDADE DA EQUAÇÃO 4 (1990:4 2000:4)...........348
FIGURA 32 - TESTES DE ESTABILIDADE DA EQUAÇÃO 4 NO PERÍODO PÓS-
PLANO REAL........................................................................................................................348
FIGURA 33 TESTES DE ESTABILIDADE ESTRUTURAL DA EQUAÇÃO 8 (1991:T1
1995:T1)..................................................................................................................................355
721

FIGURA 34 TESTES DE ESTABILIDADE DA RELAÇÃO ... NO PERÍODO (1992-2001)


................................................................................................................................................361
FIGURA 35 TESTES DE ESTABILIDADE PARA VAFPIB E INFLA (1947-1969) ......394
FIGURA 36 - TESTES DE ESTABILIDADE PARA VAFPIB E INFLA (1970-1993).......395
FIGURA 37 TESTES DE ESTABILIDADE DA RELAÇÃO 26 NO PERÍODO (1950-
2002) .......................................................................................................................................482
FIGURA 38 A FUNÇÃO DE PROGRESSO TÉCNICO DE KALDOR ...........................482
FIGURA 39 O ESPAÇO ANALÍTICO DE REFERÊNCIA PARA OS REGIMES DE
ACUMULAÇÃO....................................................................................................................506
FIGURA 40 TESTES DE ESTABILIDADE ESTRUTURAL PARA A EQUAÇÃO 1 (1985
1989) ....................................................................................................................................519
FIGURA 41 TESTES DE ESTABILIDADE ESTRUTURAL PARA O PERÍODO (1985-
2001) .......................................................................................................................................521
FIGURA 42 - TESTES DE ESTABILIDADE ESTRUTURAL (1900-2003).......................524
FIGURA 43 - TESTES DE ESTABILIDADE ESTRUTURAL (1900-2003).......................525
FIGURA 44 - TESTE DE ESTABILIDADE PARA O PERÍODO [1962-1980] ..................527
FIGURA 45 TESTE DE ESTABILIDADE ESTRUTURAL PARA A RELAÇÃO 30
(1991-2003) ............................................................................................................................530
FIGURA 46 TESTE DE ESTABILIDADE DA RELAÇÃO 31 (1991-1994).................533
FIGURA 47 TESTES DE ESTABILIDADE DA RELAÇÃO 31 (1901-2003) .................536
FIGURA 48 TESTE DE ESTABILIDADE DA RELAÇÃO 32 (1900-2002)....................538
FIGURA 49 AJUSTE MACROECONÔMICO EM MODELOS NEO-
ESTRUTURALISTAS ...........................................................................................................544
FIGURA 50 TESTES DE ESTABILIDADE DA FUNÇÃO POUPANÇA (1950-2003) ..548
FIGURA 51- TESTES DE ESTABILIDADE DA FUNÇÃO POUPANÇA (1984-2003) ....551
FIGURA 52 TESTES DE ESTABILIDADE DA FUNÇÃO INVESTIMENTO (1966-1980)
................................................................................................................................................552
FIGURA 53 TESTES DE ESTABILIDADE DA FUNÇÃO EXPORTAÇÕES LÍQUIDAS
(1950-1980) ............................................................................................................................565
FIGURA 54 TESTES DE ESTABILIDADE (1941-2003) .................................................581
FIGURA 55 TESTES DE ESTABILIDADE DA RELAÇÃO 46 (1950-2003) .................591
FIGURA 56- TESTES DE ESTABILIDADE PARA A EQUAÇÃO 55...............................639
FIGURA 57 TESTES DE ESTABILIDADE DA RELAÇÃO 56 (1957-2003) .................643
722

ANEXOS

1. FONTES DE DADOS
1.1. Fontes básicas dos dados utilizados: IPEADATA; IBGE; Banco Central do Brasil;
DIEESE; Ministério da Previdência e da Assistência Social; Pen World Table; OIT;
CEPAL; Ministério da Fazenda; Ministério da Indústria e Comércio; Funcex e
BNDES;

1.2. Os dados sobre o nível geral de emprego e massa salarial foram obtidos em
MARQUETTI (2000), Notas Metodológicas sobre as Informações Estatísticas
Utilizadas na Análise do Padrão de Progresso Técnico na Economia Brasileira, 1950-
1998. As fontes utilizadas por este autor foram o IPEA, o IBGE, a FGV e Summers e
Heston (1991). Foram considerados como trabalhadores os empregados, os
trabalhadores independentes (conta-própria) e os trabalhadores não-remunerados;

1.3. As séries do estoque de capital fixo foram estimadas por MORANDI (2003) e podem
ser encontradas no IPEADATA;

1.4. As séries da taxa de utilização da capacidade produtiva instalada para o total da


economia foram estimadas segundo a mesma metodologia proposta por BACHA e
BONELLI (2004), a partir da taxa de utilização da capacidade da indústria de
transformação;

1.5. A massa de lucro bruto foi calculada pela diferença entre o valor do produto interno
bruto e a massa salarial. A taxa de lucro bruto consiste na razão entre a massa de
lucro bruto e o estoque total de capital fixo produtivo (isto é, sem considerar-se as
construções residenciais);

2. SOFTWARES UTILIZADOS:
2.1. Análise Gráfica: EXCEL 2003 e STATISTICA FOR WINDOWS 6.0;

2.2. Análise Econométrica: EVIEWS 3.1; GNU Regression, Econometrics and Times-
Series Library-Gretl 1.3.0; PcGive 9.21 e STATA 8.0;

2.3. Redação: WORD 2003 e POWERPOINT 2003.


723

RÉSUMÉ DE LA THÈSE (deux pages)

CROISSANCE ÉCONOMIQUE, CHANGEMENTS STRUCTURELS ET


DISTRIBUTION

LES TRANSFORMATIONS DU RÉGIME D ACCUMULATION AU BRÉSIL

Une analyse régulationniste

Miguel BRUNO

La performance macroéconomique brésilienne dans les décennies de 80 et 90 est


restée beaucoup au-dessous de la moyenne historique. Plusieurs explications ont été
proposées, les plus importantes étant l environnement de haute inflation présente jusqu en
1994, l excessif endettement externe et l insuffisance d épargne. Les critiques adressées aux
inefficacités produites par la propre logique du mode de développement par substitution
d importations n ont pas manqué. En général on suppose que les sorties des grandes crises
consistent à toujours explorer la direction opposée. S il y avait protectionnisme, alors il faut
libéraliser ; si la présence de l État était considérée excessive, alors sa participation doit être
réduite ; s il y avait des garanties minimes d emploi, alors il est nécessaire de les enlever et
d approfondir le degré de flexibilité des relations de travail.

Les gouvernements sont censées faire transiter les économies d un extrême à l autre,
en acceptant passivement les "solutions" exogènes, en général complètement déconnectées
des spécificités nationales. L objectif principal de cette analyse est de fournir une approche
alternative à ces deux extrêmes, en mobilisant les contributions théoriques et
méthodologiques de la Théorie (française) de la Régulation, en tant que macroéconomie
historique et institutionnelle. La thèse explicite les particularités des modes de régulation et
des régimes d accumulation qui sont à l origine des principales tendances macroéconomiques
observées dans l économie brésilienne.

La thèse cherche à développer les étapes méthodologiques nécessaires à une


application des macro-analyses régulationnistes à l économie brésilienne. Les chapitres 1 et 2
explicitent la méthode d analyse, les fondements théoriques et les notions de base de la
Théorie de la Régulation.
724

Le chapitre 3 développe une analyse de la performance macroéconomique brésilienne


dans une perspective de longue période, en détachant les principaux faits stylisés de
l évolution économique dans le XXe siècle L économie brésilienne s est caractérisée par un
fort dynamisme entre 1900 et 1979, avec des taux moyens de croissance du PIB et du PIB
tête, respectivement, de 6 % et de 3 % par an. Néanmoins, dans les années 80, elle s éloigne
de cette trajectoire de croissance et commence à démontrer énorme difficulté à la retrouver
sous de nouveaux régimes d accumulation. Un des facteurs explicatifs pour cette performance
aussi médiocre comparée au potentiel productif de l économie brésilienne a été la succession
de réponses inadéquates pour la sortie de la crise des années 80 et leurs répétitions dans les
années 90.

L analyse du chapitre 4 permet une caractérisation de l évolution et de la configuration


actuelle des cinq formes institutionnelles qui composent le mode de régulation brésilien. Il
explicite les spécificités et principales tendances dont l impact a été fondamental dans la
définition du régime d accumulation et dans les formes concrètes de leurs crises.

Lors du chapitre 5, l analyse passe du plan des régulations partielles à celui de la


régulation d ensemble, pour identifier les régimes de croissance. On a cherché à distinguer
entre les ruptures structurelles et les périodes de stabilité des macrorégularités qui supportent
la dynamique de la croissance économique et de l accumulation de capital. Plusieurs
procédures statistiques, en l occurrence des tests de stabilité structurelle et une analyse de
cointégration et des modèles à corrections d erreurs (les approches de ENGEL et GRANGER
et l approche multivariée de JOHANSEN), ont été mobilisées de façon récurrente pour
expliciter les déterminants de la croissance économique brésilienne.

Une des principales hypothèses de cette analyse est l hypothèse de financiarisation de


l économie brésilienne, dans les décennies de 80 et 90. Mais l application de ce concept au
cas brésilien exige une caractérisation appropriée à la nature des relations entre les institutions
financières et les secteurs directement productifs. Dans un environnement macroéconomique
caractérisé par des taux réels d intérêt élevés, le processus de financiarisation acquiert un
caractère « usuraire », différent de ce qui est observé dans les pays qui ont un faible
endettement ou bénéficient de taux d intérêts réduits. En outre, le degré de concentration du
revenu et celui des richesses sont aussi des facteurs importants dans la détermination des
particularités d une forme de financiarisation ainsi que de ses conséquences
macroéconomiques.
725

RÉSUMÉ DE LA THÈSE (quarante-six pages)

AUTEUR:

Miguel BRUNO

TITRE:

CROISSANCE ÉCONOMIQUE, CHANGEMENTS STRUCTURELS ET


DISTRIBUTION : LES TRANSFORMATIONS DU REGIME
D ACCUMULATION AU BRESIL UNE ANALYSE REGULATIONNISTE »

MOTS-CLÉS:

Mode de régulation ; régime d accumulation; formes institutionnelles ; rapport


salarial ; forme de l État ; régime monétaire et financier ; forme de la
concurrence ; forme d adhésion au régime international ; macroéconomie
historique et institutionnelle ; financiarisation ; croissance ; crise économique

DIRECTEURS DE THÈSE:

Robert BOYER (EHESS-Paris) e

João SABOIA (IE/UFRJ-Rio de Janeiro)

LIEU ET DATE DE SOUTENANCE :

Rio de Janeiro, Brasil, mars de 2005

JURY:
Jaime MARQUES-PEREIRA (UPMF) rapporteur
Octavio A. CAMARGO CONCEIÇÃO (UFRS) rapporteur
Luiz Carlos BRESSER-PEREIRA (FGV) Examinateur
Benjamin CORIAT (Paris XIII) Examinateur
Robert BOYER (EHESS) Co-Directeur de thèse
João SABOIA (IE/UFRJ) Co-Directeur de thèse
726

CROISSANCE ÉCONOMIQUE, CHANGEMENTS STRUCTURELS ET


DISTRIBUTION

LES TRANSFORMATIONS DU RÉGIME D'ACCUMULATION AU BRÉSIL

Une analyse régulationniste

INTRODUCTION

Nothing is as practical as a good theory


(Johnson, Jr et alii, Econometrics, 1987)

La performance macroéconomique brésilienne dans les décennies de 80 et 90 est


restée beaucoup au-dessous de la moyenne historique. Plusieurs explications ont été
proposées, les plus importantes étant l'environnement de haute inflation présente jusqu'en
1994, le passif externe élevé et l'insuffisance d'épargne. Ils n'ont pas manqué de critiques aux
inefficacités produites par la propre logique du mode de développement par substitution
d'importations.

En général on suppose que les sorties des grandes crises consistent à toujours adopter
la direction opposée. S'il y avait protectionnisme, alors il faut libéraliser; si la présence de
l'État était considérée excessive, alors sa participation doit être réduite; s'il y avait des
garanties même minimes d'emploi, il est alors nécessaire de les enlever et d approfondir le
degré de flexibilité des relations de travail.

Les économies sont incitées à passer d'un extrême à l autre, avec les gouvernements en
acceptant passivement les "solutions" exogènes, en général complètement déconnectées des
spécificités nationales. L'objectif principal de cette analyse est de fournir une approche
alternative aux deux extrêmes, en mobilisant les contributions théoriques et méthodologiques
de la Théorie (française) de la Régulation, en tant que macroéconomie historique et
institutionnelle. La thèse essaie de montrer les particularités des modes de régulation et des
régimes d'accumulation qui répondent par les principales tendances macroéconomiques
observées dans l'économie brésilienne.

Le chapitre 1 fournit une synthèse de la problématique instaurée par l'application du


concept de régulation (dans sa signification macro-économique et non-néoclassique) en
économie. Il montre les liens théoriques entre la régulation et la reproduction dans les
727

économies capitalistes et cherche à répondre aux fréquentes accusations de fonctionalisme


dans les analyses. Le « noyau dur » de la Théorie de la Régulation est alors explicité avec les
hypothèses fondatrices. Ensuite, sont présentés les concepts intermédiaires avec les
définitions de formes institutionnelles. Ces dernières occupent un rôle fondamental dans la
construction d'un niveau mésoéconomique d'analyse, en permettant le passage micro-macro
sans le subterfuge de l'agent représentatif.

Au chapitre 2, sont introduits les concepts de mode de régulation et modes de


développement. S'explicitent les conditions théoriques qui font de macro-analyses en termes
de régulation une alternative possible aux traditionnelles approches par l'équilibre. L'idée de
rationalité située ou contextuelle devient fondamentale dans le contexte de l'interaction agent-
structure car c est alors une des bases pour le développement d'une macroéconomie historique
et institutionnelle.

La notion de régime d'accumulation ou de croissance est définie comme la


conjonction d'un régime de productivité avec un régime de demande. Dans ce contexte, une
hypothèse centrale est explicitée: la macrodynamique et la politique économique dépendent
des particularités du mode de régulation en vigueur. Ceci signifie que l'efficacité d'un certain
régime de politique économique est une fonction des conditions structurelles à travers
lesquelles les macrorégularités économiques sont reproduites. Changer la politique
économique ou le "modèle" qui la présuppose implique de changer les institutions et les
autres facteurs organisationnels qui supportent les relations entre des secteurs ou entre les
agents économiques.

Une taxinomie régulationniste des crises économiques et des hypothèses de hiérarchie


et de complémentarité des formes institutionnelles intègrent aussi ce chapitre qui conclut avec
une synthèse des avancées récentes de la Théorie de la Régulation.

Le chapitre 3 fournit une vision générale de la performance macroéconomique


brésilienne dans une perspective de longue période. Plusieurs indicateurs statistiques sont
présentés, concernant l'accumulation de capital, croissance économique, inflation, chômage,
secteur public, relations internationales et évolution sectorielle. Son principal objectif est de
réunir un ensemble de faits stylisés dans la définition kaldorienne, en préparant l'analyse pour
les étapes ultérieures où ils seront expliqués conformément aux principes et aux hypothèses
théoriques régulationnistes.
728

Le chapitre 4 développe une analyse de l'évolution des cinq formes institutionnelles


qui composent un mode de régulation: le rapport salarial; les relations État-économie; le
régime monétaire et financier; les formes de la concurrence et de l'insertion internationale.
On propose de périodiser leurs évolutions et d expliciter leurs logiques, à travers l'analyse de
séries temporelles et de tests économétriques avec les données disponibles pour l'économie
brésilienne. L'hypothèse de base dans ce contexte est que chaque économie et société
développent des configurations particulières pour ces formes institutionnelles. Ces
configurations spécifiques répondent par les normes de développement macroéconomique
dans la mesure où elles déterminent les caractéristiques du régime d'accumulation.

Il y a ici une claire rupture avec les visions traditionnelles qui cherchent à expliquer
« l'économique par l'économique », c'est-à-dire, par la mobilisation d une axiomatique
totalisante et en même temps réductrice, la réalité économique est considérée comme le
résultat des déterminations purement marchandes, dérivées du comportement de sujets
individuels. Quand les structures, des institutions ou des formes sociales d'organisation sont
considérées, elles sont rajoutées à l'axiomatique de départ sans jamais modifier leurs
hypothèses micro-économiques. En utilisant une analogie, les institutions sont introduites
dans le contexte des analyses néoclassiques comme si elles entraient par les fenêtres d'une
construction déjà complète et définitive"; sont des ornements ou des composantes pour
enrichir une structure théorique considérée universellement valable. Mais dans les analyses
régulationnistes, les institutions émergent comme "les fondations elles-mêmes d'un bâtiment
qui doit, par principe méthodologique, s'adapter aux mutations irréversibles de la réalité "; les
institutions, les règles et les conventions ne sont pas des entités déductibles d'une logique
d'optimisation. Ce sont les supports de micro, méso et macrorégularités fondamentaux à la
reproduction sociale et économique. Au lieu de doter les marchés de densité et d'efficacité,
elles sont le substrat par excellence des relations et régularités économiques.

Le chapitre 5 conduit l analyse au plan de la régulation d'ensemble, en convergeant au


principal objet de ce travail : l'identification des régimes d'accumulation, en explicitant leurs
particularités et leurs transformations. Les formes de croissance et d'accumulation de capital
pendant le « Plan de Metas (1956-1960)» et le "miracle économique brésilien (1967-1973)"
sont explicitées en mobilisant plusieurs ressources statistiques et procédures théoriques.
L'analyse de cointégration constitue une technique économetrique utilisée de façon récurrente.
Néanmoins, sont considérés les changements structurels ou les périodes de stabilité, non
729

seulement parce que la périodisation est un des objectifs de ce travail, mais parce qu ils
influencent les résultats des tests de racines unitaires et de cointégration.

Cette analyse cherche fournir une approche macroéconomique de la croissance


brésilienne, où leurs déterminants, comme le taux de profit et le taux d'accumulation de
capital, sont explicités dans leur évolution de long terme. Normalement, les approches
traditionnelles s'inquiètent excessivement avec des problèmes d'insuffisance d'épargne et
minimisent les aspects déstabilisants d'un environnement caractérisé par des finances
libéralisées. Ils pratiquent un retour précipité et théoriquement peu fondé aux structures d'un
capitalisme concurrentiel, en s abstrayant du fait qu elles ont été à l origine de la grande crise
des années 30 et des autres crises observées dans la décennie de 90.

Une hypothèse considérée fondamentale dans cette analyse se rapporte au processus


de financiarisation qui a émergé au début de la décennie de 80 avec la crise de la dette et la
crise fiscale de l'État. Un régime monétaire et financier dual et inflationniste a pu émerger et
reproduire les tendances à la stagnation, en même temps qu il devenait le support d'une
accumulation rentier, centrée dans les grands profits du secteur bancaire. Le secteur pour
lequel il n y a pas eu des « décennies perdues». Dans les années 90, les prélèvements
inflationnistes sont rapidement substitués par le revenu financier dérivé des taux d'intérêts
réels les plus élevés de la planète. Il s'agissait de créer les conditions structurelles pour
l'approfondissement de la dimension financière de l'ouverture économique et alors la haute
inflation devrait cesser. Apparaissaient beaucoup de promesses d'augmentation d'efficacité
économique avec le conséquent retour à une trajectoire de croissance forte et durable.
Néanmoins, les données empiriques montrent que malgré le fait que le taux de profit subit une
récupération à partir du Plan Real (il venait dans une tendance de chute depuis la fin du
"miracle"), le taux d'accumulation de capital continue à un niveau historiquement médiocre et
dans une tendance de baisse.

La reprise de la croissance économique en 2004 ne signifie pas une garantie que


l'économie brésilienne ait trouvé une nouvelle trajectoire stable d'expansion. Dans les
actuelles conditions de financiarisation et d'accumulation rentier et patrimoniale, la croissance
n'est pas un résultat impossible. Néanmoins, l'économie tend à alterner des phases courtes
d'expansion avec des phases de contraction déchaînées par la propre logique du régime de
politique économique sous des finances libéralisées. Comme le taux de profit s'est déconnecté
du taux d'accumulation de capital productif, une expansion prolongée soutenable est de fait
très peu probable et même indésirable de la part des secteurs bénéficiaires de l'accumulation
730

financière et de l'État lui-même. Ce dernier, périodiquement est pris à décélérer le niveau


d'activité ou interrompre la croissance en "profit de la stabilité".

Dans ce dernier chapitre nous cherchons à développer cette problématique


fondamentale à pour la macrodynamique de la croissance économique. Dans ce sens, outre de
récupérer, dans une perspective régulationniste, divers apports des travaux qui se sont
consacrés à des problématiques voisines, la présente analyse teste le modèle de BOWLES-
BOYER (1990; 1995) pour le cas brésilien, dans la version proposée par UEMURA (2000).
Ensuite, des nouvelles spécifications sont proposées pour que le phénomène financier dans
l'économie brésilienne puisse être explicité dans leurs impacts sur la forme actuelle
d'accumulation de capital.

CHAPITRE 1 LA RÉGULATION COMME PRINCIPE D'ANALYSE: ORIGINES,


FONDEMENTS THÉORIQUES ET MÉTHODOLOGIQUES

"Je parle de cas dans lesquels il n y a rien que limite la


concurrence, aucun obstacle à elle, ni dans la nature du cas ni sous
la forme d'obstacles artificiels et, néanmoins, le résultat n'est pas
déterminé par la concurrence, mais par l'habitude ou l'usage, en
étant que la concurrence ou bien n a pas importance, ou bien
produit son effet d'une forme bien différente de celle qui
normalement se suppose lui être naturelle."
(John Stuart MILL, in Principes d'Économie Politique, p. 200, 1848)

Les origines historiques de la Théorie de la Régulation et les conditions


épistémologiques qui font des macro-analyses régulationnistes une alternative possible aux
traditionnelles approches par l'équilibre sont explicitées dans ce chapitre. Les notions
intermédiaires, composées par les cinq formes institutionnelles: le rapport salarial; les
relations État-économie; le régime monétaire et financier; les formes de la concurrence; et la
forme d'insertion dans le régime international sont aussi définis.

Malgré le fait que les conceptions positivistes en Épistémologie méprisent la question


du statut ontologique des théories, en la reléguant à des discussions purement philosophiques
et considérées scientifiquement stériles, nous reconnaissons l'importance de cette perspective
dans le contexte de la théorisation macroéconomique. Nous cherchons à montrer que la plus
grande adéquation de la notion de régulation à l'étude de macrorégularités économiques, vis-
à-vis la conception néoclassique d'équilibre, c'est avant tout une question fondamentalement
ontologique et qui déterminera le choix de la méthode et du parcours théorique. En s'utilisant
de la terminologie proposée par SCHUMPETER (1954), il s'agit d'une certaine "vision"
concernant les caractéristiques spécifiques de l'objet analysé.
731

Dans le cas des théories économiques traditionnelles, cette vision a été réglée par un
ensemble d'analogies avec des phénomènes physiques ou biologiques: "équilibre",
"hystérésis", taux "naturel", etc. Dans les mots de JEVONS (1988), "la théorie économique
traitée de cette façon suggère une étroite analogie avec la science de la Mécanique et on
vérifie que les lois de l'échange se ressemblent aux lois d'équilibre d'un levier". Néanmoins,
par la réduction de plusieurs processus sociaux déterminants à des normes de comportement
caractéristiques du "monde naturel", ces théories s abstraient de propriétés qui sont
spécifiques des systèmes économiques: dynamique évolutive, complexité, historicité,
indétermination, etc. Comme a déjà observé LATOUCHE (1977), les phénomènes
économiques sont alors appréhendés dehors de leur enracinement social effectif, comme si
l'économie fût une dimension de l'homme ou une dimension de la nature et pas un produit de
l'histoire.

Les économies capitalistes se reproduisent par la création de nouvelles structures de


production et de distribution qui ne sont pas déductibles à partir d'une conception
déterministe, exprimée, par exemple, en termes de "lois économiques générales" ou de
"principes universels d'optimisation". Les analyses historiques et les comparaisons
internationales montrent que ce processus de mutation structurelle ne contient pas en lui
même les principes qui lui assurent la cohérence macroéconomique et la cohésion sociale
comme conditions nécessaires de sa reproduction ou de sa viabilité historique. Des facteurs de
médiation, qui implique des dimensions sociopolitiques et institutionnelles, sont demandés
comme l expression d'un certain mode de régulation qui répondra par les particularités de
l'accumulation de capital et de la croissance économique.

En conséquence, la régulation exprime la manière comme un processus


essentiellement contradictoire - le processus d'accumulation de capital - réussit à se reproduire
avec un degré suffisamment intelligible de régularité, malgré et à partir même des
contradictions et des conflits qu il produit en permanence. Néanmoins, une certaine forme de
régulation restera toujours géographique et historiquement datée, n'étant pas capable de
supprimer les conditions endogènes qui sont responsables par le passage de la croissance à la
crise. Dans ce contexte, cette approche permet de comprendre comment, malgré de l'existence
de facteurs qui dérangent la logique de l'accumulation de capital et des obstacles qui sont
restitués continuellement par sa propre dynamique, les économies du monde réel trouvent des
trajectoires stables de croissance et d'accumulation. Il s agit, donc, d'un concept-clé capable
de traduire les moments déterminants de la reproduction sociale et économique. En fait, par
732

son contenu dynamique et complexe, la régulation dépasse les obstacles épistémologiques


(dans la conception bachelardienne) que le concept d'équilibre nécessairement impose à
l'analyse macroéconomique.

La définition de capitalisme n'est pas consensuelle et, conformément aux


présuppositions de chaque approche théorique, son contenu décline, fréquemment en
soulignant des moments partiels de la logique et de la nature de ce système. Pour les macro-
analyses régulationnistes, la conjonction toujours contradictoire entre des marchés, des
monnaies et le salarié définissent précisément l'espace concret et le statut théorique du
concept de régulation en économie. Ceci signifie que trois relations sociales sont
déterminantes dans les divers capitalismes existants: la relation marchande, la relation
monétaire et la relation salariale.

D'un point de vue ontologique, les propriétés d'un système plus complexe comme le
social ne peuvent pas être déduites par simple analogie avec le comportement de systèmes de
moindre complexité (comme les systèmes physiques ou biologiques). L'importance du
concept de régulation est qu'il peut traduire, dans le plan des analyses, des propriétés et des
moments qui sont spécifiques aux systèmes socio-économiques. Il cherche à exprimer
l'existence de moments de compatibilité dynamique entre la production et la demande, en tant
qu un résultat de la conjugaison de structures sociales complexes et non comme une
dérivation logique de "mécanismes" purement marchands, centrés exclusivement dans les
comportements individuels optimisateurs.

Les cinq formes institutionnelles (rapport salarial, État, régime monétaire et financier,
les formes de concurrence et d'adhésion au régime international) émergent comme
conjonction de procédures sociopolitiques et institutionnelles. Ce sont des unités d'analyse
dont l'importance théorique provient de la constatation empirique qu ils produisent des
régularités macroéconomiques fondamentales à la dynamique de l'accumulation de capital.
Ces régularités sont dérivées de procédures qui sont en même temps génératrices de rigidité.
Ceci explique parce que certaines configurations favorisent, dans un premier moment,
l'émergence de trajectoires stables de croissance, mais elles ensuite tendent à se convertir en
facteurs endogènes d'inertie et de crise des régimes d'accumulation. En conséquence, la
régulation apparaît comme l expression d'une phase transitoire de stabilité des structures du
système socio-économique et de l'existence de facteurs qui n empêchent pas l existence des
crises économiques.
733

L enseignement méthodologiquement important dans ce contexte se rapporte au fait


que le domaine de validité de ces relations macroéconomiques nécessairement coïncide avec
le domaine de validité des institutions sociales en vigueur. Les macrorégularités dépendent de
conditions structurelles particulières et que se transforment avec l'histoire vivante des
économies réelles. Une certaine configuration stable des formes institutionnelles est alors la
matrice génératrice d'un mode stabilisé de régulation. Celui-ci à son tour se traduit
analytiquement par un modèle macroéconomique particulier. Dans ce contexte il y a une
hypothèse centrale: la macrodynamique et la politique économique dépendent du mode de
régulation. Il s'agit d'un principe de base de la Théorie de la Régulation qui met en cause la
prétention universalisante des modèles d'équilibre général d'origine néoclassique.

En conséquence, la Théorie de la Régulation du capitalisme est une théorie de la


genèse, du développement et de la disparition des formes sociales qui permettent la
reproduction socio-économique seulement comme une possibilité historique. La reproduction
en économie se développe toujours sous des formes nouvelles et non déductibles d'aucune
axiomatique, dont l historicité contenue dans le "lien social" est essentiellement créatrice. En
autres termes, le "lien social" est un principe de transformation permanente, une fois que les
systèmes socio-économiques se reproduisent en se transformant. Et le concept de régulation
est apte à appréhender les formes à travers lesquelles cette transformation s opère dans une
dynamique historique, où la croissance et la crise s'alternent. Il ne fait pas appel à aucune
hypothèse théologique. Leurs fondements épistémologiques divergent donc des
présuppositions contenues dans la notion néoclassique et traditionnelle d'équilibre.

CHAPITRE 2 MODES DE RÉGULATION ET RÉGIMES D'ACCUMULATION:


LES DÉTERMINANTS ENDOGÈNES DE LA PERFORMANCE
MACROÉCONOMIQUE

"Ou bien il y a, vraiment, des lois de l'histoire - et, dans ce cas, une
activité typiquement humaine est impossible, excepté, dans le
meilleur des hypothèses, comme technique; ou alors les hommes font
leur histoire - et la tâche du travail théorique n'est plus celle de
découvrir des lois, mais l'élucidation des conditions qui encadrent et
délimitent cette activité, des régularités qu'elle peut présenter, etc."
(Cornelius CASTORIADIS, in les Carrefour du Labyrinthe, 1986)

Une macroéconomie historique et institutionnelle trouve ses fondements théoriques


dans une Théorie de la Régulation du capitalisme. Néanmoins, tant l holisme que
l'individualisme méthodologiques doivent être dépassés par une méthodologie appropriée aux
spécificités des systèmes socio-économiques. Deux raisons principales pour cette démarche
734

peuvent être soutenues: a) d'ordre méthodologique (et ontologique) - les spécificités du


phénomène économique vis-à-vis des phénomènes physiques et biologiques sont un produit
des interactions historiques entre des agents et des structures, et n'autorisent pas les
interprétations causales mécanicistes qui déguisent les différences fondamentales en faveur
d'analogies non déterminantes entre l'objet économique et le monde naturel. Si les structures
conforment et conditionnent le comportement des agents (dans les périodes de régime), les
agents réagissent et transforment les structures (dans les périodes de crise). Donc, la méthode
utilisée doit permettre que la théorie puisse refléter l'autonomie concernant des agents
économiques face les structures systémiques en processus, mais également appréhender les
régularités induites par ces structures sur les comportements individuels. Les mutations
systémiques ne sont pas donc, automatiques, ni se trouvent prédéterminées par des lois
invariantes et inéluctables; b) d'ordre théorique - la nécessité de construire un niveau
mésoéconomique d'analyse (l'espace du mode de régulation) en tant que synthèse des
stratégies des agents dans l interaction avec les structures historiquement définies, pour
effectuer, dans le plan théorique, le passage micro-macro sans éliminer le principal objet de la
macroéconomie qui sont, précisément, les problèmes d'agrégation et de coordination. La
mobilisation des concepts intermédiaires émerge alors comme une spécificité du projet
théorique régulationniste.

La notion de régime de croissance ou d'accumulation a l objectif de décrire les


évolutions communes et par une longue période, des conditions de production (productivité
du travail, degré d'automatisation, importance relative des différents secteurs et branches de
l'économie) avec les conditions qui répondent par l'utilisation sociale du produit (la
consommation des familles, dépenses publiques, commerce extérieur). Ce concept cherche à
expliciter les régularités macroéconomiques qui permettent, à la logique de l'accumulation de
capital, se développer sous certaines formes historiquement ou géographiquement contrastées.

Son intérêt pour une analyse empirique du cas brésilien dérive du fait que dans son
évolution de long terme, une économie capitaliste industrielle est capable de développer une
variété de régimes d'accumulation, en fonction des configurations historiques des formes
institutionnelles. En outre, comme combinaison structurelle d'un régime de productivité avec
un régime de demande, une approche en termes de régimes de croissance permet de dépasser
le réductionnisme et le mécanicisme des analyses traditionnelles en termes de fonctions de
production. Le concept de régime de productivité est alors mobilisé pour exprimer la diversité
des combinaisons possibles entre capital et travail, à partir de relations qui sont toujours
735

médiatisées par des configurations institutionnelles historiquement déterminées. Un régime de


productivité est un concept défini au niveau macroéconomique et exprime une certaine norme
d'évolution de l'investissement, des relations entre capital et travail et du changement
technique au sein d un certain paradigme sociotechnologique. Dans le contexte d'un régime
de productivité opèrent des changements techniques locaux et "path-dependent".

Le régime de productivité expresse la forme comme l'évolution de la production


commande l'évolution de la productivité du travail, quand toutes les deux évoluent à des taux
constants. Cette définition vient de l'influence des analyses kaldoriennes en termes de
modèles de croissance cumulative. La relation de Kaldor-Verdoorn est donc contenue dans le
concept de régime de productivité vu que l'amélioration de la productivité structurelle est
fonction du rythme de croissance tendancielle de l'économie.

De la même façon, un régime de demande exprime comment l'évolution de la


demande finale est commandée par l'évolution de la productivité du travail. Cette forme est un
résultat de la conjonction de facteurs sociopolitiques et institutionnels (propagés par le mode
de régulation) et qui déterminent les divers canaux dans lesquels la valeur ajoutée sera
distribuée entre les divers secteurs et les agents économiques. Les gains de productivité
agissent sur les diverses composantes de la demande globale via effets-prix ou via des
changements dans les salaires et dans les profits.

Une taxinomie des régimes d'accumulation se rend alors importante dans le contexte
des macro-analyses régulationnistes: il y a des régimes à dominante extensive ou à dominante
intensive; profit led growth; demand led growth; export led growth; et aussi régimes finance
led growth. Chacun de ces régimes répond par une certaine norme d'évolution
macroéconomique, y compris les spécificités de leurs crises et aussi par les formes de
génération et de distribution de la valeur ajoutée totale. Dans ce contexte, le potentiel
explicatif et heuristique de la Théorie de la Régulation dérive du fait que sa méthodologie et
principes de base n'opèrent aucune dissociation arbitraire entre une sphère considérée
purement économique et autre considerée comme non-économique, où gravitent les
comportements sociaux et politiques.

La problématique de l'émergence de nouveaux modes de régulation trouve dans les


hypothèses de hiérarchie et de complémentarité des formes institutionnelles une grande
impulsion de développement, particulièrement à l'époque actuel marquée par le processus de
globalisation. Dans le cas brésilien, après une longue période correspondante au processus
de développement par substitution d'importations dans laquelle l'État a joué un rôle
736

prépondérant comme forme institutionnelle voir hiérarchiquement supérieur, il se soumet, à


l époque actuelle, aux finances libéralisées et à une norme néolibérale d'insertion
internationale. Cette mutation est décisive pour expliquer la médiocre performance
macroéconomique observée dans les décennies de 80 et 90.

Après environ trente ans d'évolution depuis son origine dans des milieux des années
70, l'examen de la littérature économique régulationniste suggère que la Théorie de la
Régulation cherche à se consolider comme une macroéconomie historique et institutionnelle.
Des régimes contrastés de croissance et de crise sont leurs principaux objets, dans la mesure
où la variabilité des dynamiques économiques et sociales reste comme une source inépuisable
de nouveaux défis aux théories macroéconomiques établies.

CHAPITRE 3 - LA PERFORMANCE MACROÉCONOMIQUE EN PERSPECTIVE


HISTORIQUE: PRINCIPAUX FAITS STYLISÉS

"Le théoricien de l'économie devrait commencer par un


résumé des faits stylisés qui se supposent soit expliqué par
la théorie".
Nicholas Kaldor (1961)
Ce chapitre développe une analyse de long terme de la performance macroéconomique
brésilienne, à partir d'un vaste ensemble de séries temporelles. Il cherche à identifier les
trajectoires de croissance et leurs moments d'inflexion. Les statistiques socio-économiques sur
production, emploi, revenu, inflation, secteur externe, secteur public et performance
sectorielle sont présentées. Sont alors réunis les premières constatations empiriques et
d autres faits stylisés qui ont caractérisé le développement économique de ce pays dans le
XXe siècle, pour initier la construction de la base empirique nécessaire à l'application de la
méthode et des principes théoriques régulationnistes. Seront observés les principaux faits
stylisés du développement économique brésilien, en les interprétant à la lumière de la Théorie
de la Régulation. Proposée par KALDOR (1961), la notion de fait stylisé se rapporte à une
constatation d'ordre empirique, nécessaire à la confrontation de la théorie avec les données
des économies réelles.

Selon MADDISON (1989), l'économie brésilienne a présenté dans la période 1870-


1987, les plus grands taux de croissance du PIB dans le monde. Entre 1870 et 1930, la
dynamique du secteur agro-exportateur a permis l établissement des conditions initiales pour
le développement industriel: l'approfondissement des relations salariales; l'expansion du
marché intérieur, des relations bancaires et financières et des investissements dans
l infrastructure. La force de travail proportionnée par l'immigration et l élévation de l'offre
737

monétaire s'articulaient en tant que facteurs de développement du marché domestique pour les
premières industries de biens de consommation non durables. Néanmoins, le capital industriel
émergent devait affronter aux restrictions provoquées par une économie caractérisée par un
coefficient d'importations élevé et par un appareil d'État contrôlé par les classes liées au
secteur agro-exportateur. En outre, comme la presque totalité des institutions composantes du
régime fisco-financier (THÉRET; 2002) restaient dépendantes des recettes fiscales originaires
du secteur agro-exportateur, l'État s'abstenait de promouvoir délibérément la base industrielle
brésilienne. Cette situation changerait à partir du moment où la grande crise de 1930 rompt
avec une norme séculaire d'insertion internationale qui maintenait la dynamique de l'économie
brésilienne fortement dépendante de la demande extérieure.

Quand, à partir de la Révolution de 30, de nouvelles forces sociales atteignent le


contrôle de l'appareil d'État brésilien, les stimulations au processus de substitution
d importations (PSI) s'enduisent d'un contenu idéologique nationaliste et développementiste.
Convertie dans un programme du gouvernement, la logique de la substitution d'importations
gagne un statut de "modèle" nécessaire et légitime pour un nouveau processus d'accumulation
centrée dans la demande domestique. Compte tenu les conditions économiques internes et
internationales, ce modèle peut être considéré cohérent dans leurs propositions normatives de
son époque, bien que riche en contradictions en tant que base d'un projet de développement
national indépendant. En s'examinant les statistiques on peut constater qu'entre 1943 et 1980 -
période de diffusion et consolidation de PSI - l'économie brésilienne a présenté fort
dynamisme, avec un taux moyen de croissance du PIB autour de 7% et bien que s'observent
des décélérations, comme dans la crise des années 60, les taux de croissance se sont
maintenus positifs. Néanmoins, dans la période 1981-2003, le taux annuel moyen de
croissance économique ne dépasse pas 2,4% et les problèmes accumulés dans les décennies
précédentes se conjuguent et s'expriment dans une conjoncture de stagnation et
d'augmentation de l inflation.

Sous les pressions idéologiques de la "globalisation" néolibérale des années 90,


l'économie brésilienne entrera dans un processus accéléré de transformation structurelle, où se
détachent l'ouverture commerciale et financière, les privatisations, le surpassement du régime
monétaire et financier inflationniste et la restructuration de l'industrie. Toutes les formes
institutionnelles ont été soumises à un processus de reconfiguration rapide et profonde, sans
qu'il n y ait de garantie théorique que les trajectoires des changements structurels, promues
par l'État lui-même, conduiraient à la recomposition des conditions de reprise de
738

l'accumulation de capital et de la croissance économique soutenable. Efficacement, dans la


période postérieure au Plan Real, la croissance économique est devenue un problème plus
complexe, dans la mesure où les conditions qui, théoriquement sont nécessaires à la stabilité
de prix sont les mêmes qui bloquent le taux d'accumulation de capital et développent
l'endettement interne et externe.

L accumulation de capital et croissance économique - en comparant les trajectoires du


PIB réel et du PIB potentiel dans la période [1900-1941] et [1942-1979] nous pouvons
constater la forte décélération de la croissance économique à partir de 1980, une expression de
l'entrée de l'économie brésilienne dans une longue période de difficultés macroéconomiques.
Malgré que les taux de croissance économique concernant la première période [ 1900-1941 ]
d être visiblement plus volatils que ceux observés dans la deuxième période [ 1942-1979 ],
c'est la troisième période [ 1980-2003 ] qui se présente comme la plus instable.

En comparant les différences entre le PIB réel et le PIB potentiel au Brésil avec les
mêmes différences au Mexique et aux Etats-Unis, on constate mieux la plus grande instabilité
de la croissance économique brésilienne. L'amplitude des fluctuations du produit est
supérieure à celle observée dans l'économie des Etats-Unis et au Mexique. À partir de
1974/75, le taux d investissement (participation au PIB de la formation brute de capital fixe)
et le taux d accumulation de capital (taux de croissance du stock de capital fixe brut) sont
déclinants au Brésil.

L inflation - la haute inflation a été une forte caractéristique des années 80 et de la


première moitié des 90, en se constituant comme un des principaux problèmes
macroéconomiques affrontés par l'État brésilien. En ce qui concerne les politiques de combat
à l'inflation, l'approche a oscillé entre les traditionnelles mesures orthodoxes et les plans
hétérodoxes qui imprimaient des contrôles de prix et des salaires, de façon alternés avec des
politiques monétaires restrictives. Néanmoins, comme nous le montrerons dans les prochaines
sections, le Plan Real, le seul programme de stabilisation de prix qui a réussi à dépasser le
régime monétaire et financier inflationniste, a pu aussi compter avec le changement
relativement rapide de la forme institutionnelle d'insertion dans le régime international, au
long des années 90. L'intensification de la concurrence internationale a contribué pour
contenir les pressions inflationnistes, surtout pendant la phase de surappréciation du taux de
change entre 1994 et 1999.

Chômage et relations de travail - à partir de la seconde moitié des années 80, les taux
de chômage entrent dans une tendance d'expansion. La chute du niveau d'emploi dans le
739

secteur industriel a été néanmoins, dramatique. Tant que dans les périodes de forte croissance
économique, les gains de productivité se sont produits aux dépenses du salaire moyen réel,
dans la période postérieure au Plan Réal, ils ont été obtenus aux dépenses de l'emploi et avec
de la chute de la masse salariale.

Secteur externe - la dynamique cyclique des exportations, des importations et du PIB


peut être analysé à partir du Graphique 18. Dans le début de la décennie de 80, le
gouvernement brésilien a promu les politiques nécessaires à l'ajustement de l'équilibre de
paiements et alors le PIB se réduit significativement avec les récessions de 1981/83 et aussi
les importations. Mais les années 90 sont particulièrement atypiques, avec une augmentation
des importations à des taux supérieurs aux exportations, ce qui provoque un déficit dans la
balance commerciale et augmente la vulnérabilité externe du pays. On observe aussi que les
paiements liquides d'intérêts comme pourcentage du solde du compte de service passent d'une
moyenne de 20% entre 1947-1974 pour environ 60% entre 1975-2003. Comme résultat de la
libéralisation financière, du processus de privatisations et des élevés taux d'intérêts qui ont
marqué les années 90, les investissements étrangers de portefeuille ont connu une croissance
expressive dans cette décennie. La souscription des titres à revenu fixe, dont l'expansion
supérieure aux achats d actions a été impulséé surtout par le différentiel de taux d intérêts
entre l'économie brésilienne et le reste du monde.

En ce qui concerne le concept primaire, dans toutes les instances du gouvernement et


dans les entreprises publiques, on constate des surplus dans presque tous les ans. Néanmoins,
quand sont considérés les paiements d'intérêts sur les dettes et leur mise à jour monétaire, les
déficits apparaissent. Ceci signifie que les flux d'intérêts payés par le secteur public brésilien
sont les principaux facteurs de détérioration de la situation fiscale de l'État.

L'économie brésilienne s'est caractérisée par un dynamisme élevé entre 1900 et 1979,
avec des taux moyens de croissance du PIB et du PIB par habitant, respectivement, de 6% et
de 3% à l'année. L'industrialisation du pays a effectivement contribué à ce résultat dans la
mesure où elle lance les bases pour la détermination endogène du niveau de revenu et
l'emploi. Après cette longue période de développement économique, l'économie entre dans
une trajectoire de grandes difficultés macroéconomiques et structurelles. La performance
macroéconomique dans les années 80 et 90 se montre très inférieure par rapport aux périodes
précédentes.
740

CHAPITRE 4 - LES FORMES INSTITUTIONNELLES DANS L'ÉCONOMIE


BRÉSILIENNE : CONFIGURATIONS ET TENDANCES ÉVOLUTIVES

4.1 Les relations État-économie : entre interventionnisme autoritaire et démocratie


politique

"Maintenir le capital dans une position hégémonique et le travail


dans une position subordonnée constitue une constante historique
concernant la théorie et la pratique de l'État brésilien. Les
variations produites sont d'accent ou de style ".
(Herbert de Souza et Carlos A. Afonso, 1977)

L'analyse de l'évolution de cette forme institutionnelle au long de l'histoire suggère la


validité, depuis l'étape coloniale, de formes différenciées de la modalité d État inséré. En
raison des prérogatives de l'État portugais au temps colonial, les structures de production et de
distribution établies dans l'espace économique brésilien restaient rigidement sous le contrôle
des institutions dérivés de l'appel "exclusif métropolitain", que correspondait à un ensemble
de relations économiques et politiques qui subordonnaient la colonie à la métropole. Cette
dernière jouissait d'une double condition économiquement avantageuse: c'était simultanément
monopoliste et monopsoniste concernant le commerce colonial. Les mécanismes de ce
commerce étaient contrôlés par de grandes entreprises formées par des capitaux privés dans
une association avec l'État ou totalement contrôlés par celui-ci. Et même avec l'émancipation
politique et institutionnelle obtenue à partir de la première moitié du XIXe siècle, l'unité
linguistique et territoriale atteint par ce pays de dimensions continentales, difficilement aurait
été obtenue sous la prédominance d'un "État circonscrit. En conséquence, le centralisme et
l autoritarisme, la faible représentativité populaire dans les institutions et décisions publiques
et la présence permanente et multiforme dans l'économie et dans la société sont les marques
historiques de l'État brésilien.

Une première périodisation de l'évolution de l'État brésilien peut-être proposée à partir


des recherches historiques sur les changements politiques et institutionnels. L'analyse doit
détecter les ruptures d'ordre institutionnel qui ont redéfini cette forme structurelle, ainsi que le
sens de leurs nouvelles configurations. 1º) Période [ 1930-1954 ] - l'État sous un régime
politique arbitraire promeut le développementisme nationaliste et cherche à lancer les bases
pour un processus indépendant de développement économique ; 2º) Période [ 1955-1963 ] ou
Phase I du développementisme avec la participation du captal étranger: l'État sous un régime
politique démocratique promeut le développement économique en association avec le capital
741

étranger; 3º) Période [ 1964-1989 ] ou Phase II du développementisme avec la participation


du capital étranger, avec son apogée et sa crise: l'État sous un régime politique arbitraire
approfondit le développement économique associé au capital étranger et augmente la
dépendance externe ; 4º) Période [ 1990-2003 ] - l'État vide le discours développementiste, il
incorpore l'idéologie de la globalisation néolibérale et rend impraticable dans le plan politique
et institutionnel la reprise d'un projet de développement national indépendant.

L'analyse de l'évolution de la forme institutionnelle de l'État au Brésil permet les


suivantes constatations :

i. Haute régressivité et expansion de la charge fiscale une caractéristique du régime


fisco-financier brésilien qui s'est maintenue pratiquement inchangée tout au long du XXe
siècle, c'est son importante régressivité. La prédominance de la fiscalité indirecte, dans une
structure économique caractérisée par la haute concentration du revenu et de la propriété,
renforce les facteurs d'inégalité et leurs effets défavorables sur la macrodynamique de
l'accumulation de capital et de la croissance économique. Après une phase de croissance entre
1918-1970, la charge fiscale reste dans 25% du PIB jusqu'en 1993. Dans la période post-Real,
la charge fiscale entre dans une nouvelle phase d'expansion, en atteignant 36% du PIB en
2003.

ii. Structures de bien-être incomplètes - la tendance d'évolution de la forme


institutionnelle de l'État, et de son correspondant régime fisco-financier, est celle de donner la
priorité à toutes les demandes directes provenant de l'accumulation de capital, en reportant ou
en réduisant au minimum la satisfaction des demandes sociales. Ces demandes sont
transformées en variables d'ajustement quand il s'agit de viabiliser l'"équilibre" des comptes
publics et de garantir la "crédibilité" du Gouvernement auprès des organismes internationaux
et du capital financier international. Quant aux institutions de protection sociale, la moitié des
relations d'emploi reste en dehors du système officiel de sécurité sociale, en raison du niveau
élevé d informalité, du chômage et de l'absence de politiques efficaces et englobantes;

iii. Endettement public très élevé - à partir du régime politique arbitraire post-1964,
l'endettement public est entré dans une trajectoire persistante d'expansion dont les
conséquences macroéconomiques devenaient visibles dans les années 80. Néanmoins, dans la
période post-Real, la dette s'élève en fonction de la logique de ce plan de stabilisation de prix
que dans sa première phase s'est basée sur la manutention de taux de change surapprécié et
combinées avec des taux d'intérêts réels extrêmement onéreux au Trésor National Brésilien;
742

iv. Forte réduction de l'autonomie de la politique économique - dans les années 90,
l'idéologie de la globalisation néolibérale approfondit l'ouverture commerciale et financière,
provoquant une réduction drastique dans l'autonomie de la politique économique. Sous la
pression du grand capital bancaire et financier dans le plan national et international, l'État va
établir comme priorité l'équilibre des comptes publics et la gestion des dettes interne et
externe, tout en questionnant l'efficacité des politiques industrielles et du développement
économique;

v. Caractère ambigu de l'État en ce qui concerne à la taxonomie de l'État par rapport


aux formes d'intervention et de sa présence dans l'économie, la caractérisation comme un
"État-inseré" (ANDRÉ, 2002) doit être considéré avec précaution. Historiquement, l'économie
et la société brésiliennes ont émergé sur des structures politiques et administratives dérivées
des pratiques du mercantilisme et du patrimonialisme portugais. L'évolution des institutions
publiques a été marquée par le caractère excluant et arbitraire depuis la période coloniale. Par
conséquent,, des contrôles administratifs, des interventions de politique économique et la
participation directe du gouvernement dans les structures de production et de distribution ont
été des procédures communes dans l'évolution de longue période des relations État-économie
au Brésil. Ces actions ne peuvent pas être considérées typiques du XXe siècle, ni exclusives
d'un État moderne en fonctionnant dans une économie industrielle. L'analyse historique et
l'institutionnelle développée par ce chapitre suggère l existence d'un État présent tant
directement qu indirectement dans la reproduction du capital, mais de façon prépondérante
préoccupée avec les dimensions immédiates et strictement économiques de ce processus. Au
long du dernier siècle, la forme institutionnelle de l'État s'est transformée significativement en
fonction des nouvelles nécessités du développement économique sans néanmoins dépasser
son caractère excluant et coercitif pour la grande majorité de la population. La disjonction
entre l'État et la société civile, c'est-à-dire, l'énorme distance entre la société politiquement
représentée et la société réelle, reste encore à des niveaux incompatibles avec les structures
typiques d'une démocratie moderne. Il s agit, sans aucun doute, d'un "État inséré"; néanmoins,
davantage pour le capital beaucoup plus que pour le travail;

vi Dépenses restreintes de légitimation - l'analyse en termes de régulation doit


considérer les modalités par lesquelles l'État, à travers un régime politique, définit leurs
formes de légitimité et s affirme comme un État de Droit. Dans ce contexte, les dépenses
sociales intègrent de façon significative les dépenses de légitimation et de reproduction des
régimes fisco-financiers. Nous pouvons l observer ainsi dans les pays développés.
743

Néanmoins, comme avaient déjà constaté AFONSO et SOUZA (1977), la participation des
dépenses sociales dans le budget d'état au Brésil est extrêmement réduite quand comparée aux
participations des rubriques directement rapportées à l'accumulation du capital ;

vii Hiérarchie et complémentarité de la forme institutionnelle de l'État - seulement


après l'analyse de l'évolution des autres formes institutionnelles la place de l'État dans
l'architecture institutionnelle qui définit un mode de régulation pourrait être explicitée.
Néanmoins, à ce niveau de l'analyse il est possible de proposer la suivante hypothèse à être
testé au long de ce travail: l'État occupe un rôle de forme institutionnelle hiérarchiquement
supérieure (FIHS) jusqu'à la fin des années 70. Dans les années 80, la haute inflation et
l'endettement public se convertissent dans le support de l'accumulation bancaire et financière,
en élevant le régime monétaire et financier à la condition de FIHS et en subordonnant l'État
brésilien. Avec l'ouverture commerciale et financière, dans la décennie de 90, des nouveaux
facteurs renforcent le changement de hiérarchie, mais maintenant en conjuguant les pressions
des finances internationales et nationales qui possèdent dans la dette publique la base pour
une accumulation rentier. En conséquence, le régime de politique économique change, puis
qu il commence à répondre aux nouvelles conditions imposées par la logique financière.
Apparaissent alors les impératifs de "crédibilité"; "fondements économiques"; "évaluation des
risques" et autres indicateurs restreints du point de vue économique, puisque centrés
principalement sur la logique bancaire et financière de court terme. Dans ce contexte, la
politique économique se tourne prioritairement au contrôle de l'inflation, puisqu il s'agit de
préserver la rentabilité des placements financiers connectés aux dettes interne et externe et en
même temps de réduire leurs coûts d'entrée et de sortie du marché financier brésilien. Par
conséquence, la subordination de la forme institutionnelle de l'État brésilien devient la
prémisse et le résultat de l'actuel "modèle économique".

4.2 Le rapport salarial: flexibilité et institutionnalisation incomplète

"Le travail salarié constitue une condition nécessaire pour


la formation de capital et se maintient comme prémisse
nécessaire et permanente de la production capitaliste"
(Marx, Chapitre VI, inédit, du Capital)
« Il est essentiel de remarquer que la partition sur l espace
de la valeur, opérée par le rapport salarial dans sa
détermination générale, est le fondement théorique d une
macroéconomie. »
(Aglietta, Régulation et Crises du Capitalisme,
p. 65, deuxième édition, 1997)
744

Le processus de constitution des relations salariales dans l'économie brésilienne, à la


fin du XIXe siècle, a été conditionné par les structures socioculturelles et de l'organisation de
la production héritée d'une économie de base esclavagiste. Les implications de ce fait
historique doivent intégrer toute analyse cohérente sur la formation et institutionnalisation du
salarié au Brésil. Les conditions qui reproduisent les grandes disparités et les asymétries entre
capital et travail trouvent leurs origines au moins en partie dans ces structures, qui sont aussi
responsables par le caractère inachevé de l'État brésilien, en rendant difficile l'implantation
efficace d'une législation du travail et de la sécurité sociale, conformément aux réelles
nécessités des classes moins favorisées.

Avec l'avance de l'industrialisation, le rapport salarial s'est consolidé comme principal


relation de production et de distribution, selon la tendance historique d'évolution des
économies qui s'organisent sous le mode de production capitaliste. Donc, il n'y a pas de
doutes que l'économie brésilienne se développe sur la base d'une société salariale. Néanmoins,
il s'agit d'une société salariale duale parce que la moitié des relations salariales se trouvent en
dehors de la législation du travail et de la protection sociale. Il s agit d un rapport salarial
avec institutionnalisation restreinte et incomplète. Restreinte, en raison du pourcentage
élevéde salariés informels, de relations précaires d'emploi et de postes de travail de basse
qualité; mais aussi incomplète, parce que les diverses composantes de protection au travail et
d'assistance sociale restent encore très peu développées ou même inexistants.

Quant à la hiérarchie du rapport salarial brésilien, l'analyse historique supportée par les
tests économétriques fournit des éléments empiriques considérables pour le classer comme
une forme institutionnelle toujours subordonnée dans l'architecture définissant les modes de
régulation au Brésil.

Dans le secteur industriel, les relations salariales sont normalement plus structurées et
les syndicats plus organisés, de sorte que les pertes inflationnistes tendent à être recomposées
avec plus d agilité que dans les autres secteurs économiques et cette recomposition peut
éventuellement précéder à l actualisation monétaire du salaire minimum de la part des
autorités gouvernementales. Si d'un côté l'économie était encore fermée en termes
commerciaux (jusqu en 1989), d'autre côté la procédure d'ouverture politique avec la
redémocratisation du pays a favorisé la reprise des mouvements syndicaux en profit des
revendications salariales. Alors, les changements dans le salaire moyen nominal de l'industrie
"causent au sens de Granger" les changements dans le salaire minimum nominal;
745

De telle façon que sous la période du « miracle brésilien"(1966-1973) mais aussi dans
les années 90, la part salariale a souffert des chutes successives et accentuées, en exprimant
l'augmentation de la concentration fonctionnelle du revenu en faveur des profits. Néanmoins,
l'analyse empirique montre que dans le cas du "miracle économique" brésilien, les gains de
productivité se sont produits aux dépenses des salaires, tandis que dans les années 90,
l'augmentation de la productivité a été obtenue aux dépenses de l'emploi. Dans le premier cas,
il s'agissait d'une économie fermée en termes commerciaux et sous un régime politique
arbitraire. Dans ces conditions, le rapport salarial a été soumis à un processus d'encadrement
forcé à la logique d'un régime d'accumulation socialement excluant. Dans le deuxième cas,
l'État, sous un régime politique démocratique, adhère à la logique de la globalisation
néolibérale et aux préceptes du « Consensus de Washington » et soumet le rapport salarial aux
pressions de la concurrence et des finances internationales. Dans les deux cas, l'État a été
mobilisé pour soumettre les relations salariales aux prérogatives du grand capital national et
international.

Conformément au modèle d'ajustement partiel de l'emploi industriel, les tests ont


révélé que l'élasticité de court terme de l'emploi par rapport à la production s'est réduite
d environ 30% à partir de la libéralisation commerciale et financière et l'inertie de l'emploi a
augmenté de 0.76 pour 0.92. Le fait de plus grande proéminence du point de vue d'une
analyse régulationniste se rapporte au changement du signe de l'élasticité-coût salarial de
l'emploi industriel. Avant l'ouverture économique, le signe était positif, tandis que sous une
économie ouverte il passe à être négatif, comme attendu par les théories dérivées de la
tradition néoclassique. Ceci peut exprimer l'existence de mutations importantes dans le mode
de régulation entraînées par les transformations de la forme institutionnelle d'insertion dans le
régime international.

Concernant la dualité du rapport salarial brésilien, les analyses montrent des


comportements bien contrastés des relations salariales formelles avant et après l'ouverture
commerciale et financière. Avant l'ouverture économique des années 90, s'observe une
rigidité à la basse de l'axe formel du rapport salarial, en ce qui concerne à l'emploi qui répond
seulement aux phases d'expansion, mais pas à la chute du niveau d'activité économique.
Néanmoins, dans la période post-ouverture, l'inertie de l'emploi formel disparaît et les
réponses aux fluctuations conjoncturelles s'inversent, et l'emploi devient sensible aux phases
de chute de la production, mais pas aux phases d'expansion et avec une élasticité qui est plus
que le double de celle observée dans la période pré-ouverture. Ce fait indique un
746

approfondissement du degré de flexibilité quantitative du rapport salarial, mais aussi une


difficulté de l'économie brésilienne pour créer des emplois formels;

Quant à l'axe informel du rapport salarial, les relations salariales se montrent


insensibles, en termes statistiques, tant aux variations positives que négatives du PIB. Mais
comme le coefficient d'inertie ne s'est pas révélé significatif, il se peut considérer que le
segment informel répondrait à des mouvements saisonniers. Le fait nouveau est l'émergence
d'une élasticité importante (0,94) des relations salariales informelles dans les phases
d'expansion économique, malgré son insensibilité aux chutes du niveau d'activité.

Les analyses développées précédemment permettent de caractériser le rapport salarial


brésilien comme amplement concurrentielle, segmentée et en permanence contrôlée par
l'État, de manière qu il est souvent ajusté aux impératifs considérés plus urgents de stabilité
de prix et d équilibre des comptes publics et externes. Parmi ces prérogatives propagées par
les dispositions normatives et régulatrices sur le système de relations salariales, l'État promeut
la restriction salariale aussi pour maintenir l'attraction de l'économie brésilienne aux capitaux
étrangers.

4.3 Le régime monétaire et financier: la difficile construction de la monnaie nationale

"Il y a toujours une alternative à la propriété d'actifs de capital réel,


notamment la propriété de monnaie et de débits ".
(J. M. Keynes, Général Theory)
"Les créanciers de l'État, dans la réalité, ils ne donnent rien, une
fois que l'addition prêtée est convertie en titres de la dette,
facilement vendus, et que continuent à fonctionner dans leurs mains
comme s ils étaient la même quantité d'argent sonnant. Néanmoins,
en s abstrayant de la classe de rentiers oisifs ainsi créée et de la
richesse improvisée des financiers (...), la dette de l'État a fait
prospérer (...) le jeu de la Bourse et le pouvoir de la Banque
moderne ."
(K. Marx, Le Capital)
Un régime monétaire et financier peut être défini comme un résultat de la conjonction
de structures organisationnelles et institutionnelles, publiques et privées, que servent de
support à la circulation monétaire et financière, en leur garantissant des formes de régularité
déterminées en fonction des activités économiques, des relations État-économie et du propre
niveau de développement de l'accumulation de capital. La tendance à l'inflation, les difficultés
de financement de long terme et l'atrophie du marché des capitaux sont certains des aspects
qui se renforcent mutuellement comme une prémisse et un résultat des déformations
structurelles qui caractérisent l'économie brésilienne. Comprendre la dynamique des relations
monétaires et financières dans ce contexte constitue une des étapes nécessaires pour
747

appréhender les spécificités des formes à travers lesquelles le capital bancaire et financier
impose des limites à la croissance économique et en même temps se nourrit tant de l'inflation
comme des tendances à la stagnation qui ont marqué les décennies de 80 et 90.

En ce qui concerne aux transformations du régime monétaire et financier (RMF)


brésilien, les suivants faits caractéristiques peuvent être détachés:

L'analyse de l'évolution de longue période du RMF brésilien révèle son rôle structurelle et
subordonnée à la forme institutionnelle d'insertion internationale, une caractéristique qui
est commun aux économies en développement. Dans ce contexte, la haute dépendance des
capitaux étrangers et la tendance historique au déséquilibre extérieure se renforcent
comme obstacles à la consolidation de la monnaie nationale. En conséquence, les
pressions inflationnistes sont recréées de forme récurrente, malgré la stabilité relative
atteinte sous le Réal. Cependant, comme l institutionnalisation qui garantit la mobilité des
capitaux est maintenue comme une prérogative du capital bancaire et financier et
légitimée par l'État, le taux d'intérêts se convertit dans l'instrument par excellence de
contrôle de l'inflation et de garantie de la rentabilité réelle des capitaux financiers.
Néanmoins, comme sa mobilisation pour impulser le crédit aux secteurs productifs est
rendue difficile par les conditions institutionnelles qui maintiennent l'ouverture financière,
la reprise d'une trajectoire de croissance économique forte et durable est peu probable;

La transition d un RMF dual et, par nature, inflationniste, à un RMF avec haute restriction
monétaire a impliqué le changement des conditions sur lesquelles l'accumulation
financière se développait. Entre 1980 et 1993, la haute inflation et les mécanismes
d'indexation ont été la base de l'expansion financière et des grands profits du secteur
bancaire. Ce fait a pu être constaté quand les tests économétriques ont montré qu existait
une causalité unidirectionnelle entre l'inflation et l'accroissement de la participation au
PIB de la valeur ajoutée par le secteur financier;

En conséquence, l'analyse de l actuel RMF postérieur au Plan Real permet de soutenir


l'hypothèse que le principal obstacle à la reprise des investissements productifs dans des
sommes compatibles avec l'expansion soutenue du taux d'accumulation de capital n'est pas
proprement l'insuffisance d'épargne. La question fondamentale se rapporte aux
particularités de ce type de RMF sous conditions de libéralisation du compte de capital.
Dans un environnement macroéconomique caractérisé par des élevés taux d'intérêts réels,
les ressources correspondantes à l'épargne interne et externe ne deviennent pas
748

automatiquement disponibles aux secteurs directement productifs, donc ils sont canalisés
vers les actifs financiers, de moindre risque et de rentabilité réelle garantie.

Le RMF postérieur au Plan Real répond aussi par la restriction salariale et par la hausse
du chômage, à partir de son interaction avec les autres formes institutionnelles. Un rapport
salarial fortement concurrentiel, une norme d'insertion internationale d'orientation
néolibérale et un État hautement endetté dont les besoins de financement se sont convertis,
comme dans les années 80, dans le support de l'évaluation des capitaux de court terme.
Cette architecture institutionnelle a été le support de la stabilité de prix sous la nouvelle
monnaie et non seulement la logique originale d'un programme de combat à l'inflation.
Néanmoins, cette configuration a été aussi la responsable par la quasi-stagnation du
produit et du revenu, ce qui a caractérisé la "deuxième décennie perdue" en ce qui
concerne le développement et le rachat de la dette sociale brésilienne.

4.4 Les formes de la concurrence et de l'insertion internationale: de la substitution


d'importations à la globalisation

"Si je m'étais soumis aux impositions du Fond (le FMI)...


j aurais abdiqué du Plan de Metas ; j aurais laissé le
peuple malnutri; je n aurais pas construit Brasília ni
réalisé l'industrialisation du pays ".
(Kubitschek, Ex-Président du Brésil, 1978)

Le modèle d'industrialisation par substitution d'importations que le Brésil a adopté


impliquait nécessairement une stratégie introvertie de développement économique, une fois
que les structures productives se dirigeaient prioritairement vers la demande domestique. En
conséquence, le degré d'ouverture de l'économie brésilienne est devenu plus restreint que
celui observé dans les pays qui ont adopté un modèle extraverti ou du type exported-led
growth, comme les pays asiatiques.

Les dimensions commerciales et financières de la libéralisation doivent être


appréhendées comme processus qui se déterminent mutuellement, à partir des configurations
en vigueur des formes institutionnelles de la concurrence et de l'insertion internationale.
D'ailleurs, dans les modèles d'économie ouverte de la tradition néoclassique, la mobilité des
capitaux est considérée comme un des facteurs de détermination des taux domestiques
d'intérêts et de rééquilibre de la balance de paiements. Mais ce type d'approche ne reconnaît
pas le caractère potentiellement générateur d'instabilité financière, parce que son point de
départ est basé sur une axiomatique qui confère au marché un statut qu il ne possède pas,
c est-à-dire, d'être le lieu d'équilibres optimaux en termes sociaux et économiques;
749

Les résultats empiriques indiquent que les formes de la concurrence - que dans l'économie
brésilienne sont basées sur des structures de marché fortement oligopolisés - n'auraient pas
été significativement touchées par l'ouverture commerciale et par la libéralisation
financière. La chute des indicateurs de taux de marge sectoriels serait plus l'expression
d'une phase préliminaire d'adaptation au nouvel environnement macroéconomique post-
ouverture et post-stabilisation de prix qu une tendance de long terme de réduction du
pouvoir de marché des grandes entreprises nationales et multinationales.

La question de la substitution monétaire provoquée par l'approfondissement d'une


libéralisation financière sous régulation néolibérale peut être posée dans les suivants
termes: quand le degré de libéralisation financière est approfondi sous conditions
structurelles typiques d'une économie encore en développement - où le régime monétaire
et financier ne peut pas encore s'ancrer complètement dans le potentiel productif interne
la monnaie nationale cesse d'être la représentation, en dernier ressort, de la totalité des
stocks de richesse et des flux de revenu produit dans les activités économiques
domestiques.

L'analyse des indicateurs d'ouverture commerciale a montré que le degré d'ouverture de


l'économie brésilienne est semblable à celui du Japon, Inde et Argentine et proche à celui
des Etats-Unis. Néanmoins, il reste environ la moitié du degré observé en Chine et un
quart de celui de la Corée du Sud, pour l'année de 2000. D'autre part, l'ouverture
financière brésilienne a été la plus profonde dans les années 90, approfondissant le degré
de vulnérabilité externe de l'économie.

En ce qui concerne les taux de marge moyens sectoriels, les travaux empiriques
disponibles montrent qu'il y a eu des réductions dans leurs niveaux à partir de la transition
pour une économie ouverte, sous la validité du Real. Néanmoins, si les indicateurs
indiquent une augmentation relative de la concurrence oligopolistique, on n'observe pas
une réduction substantielle du pouvoir de marché des grandes firmes qui contrôlent les
secteurs-clefs de l'économie.

Les activités intensives en travail ont perdu participation, ce que peut être considéré
comme un facteur supplémentaire dans les limites à la création d'emploi au Brésil ;

La libéralisation financière a approfondi les flux de capitaux volatils avec leurs


conséquences négatives sur la dynamique de l'accumulation de capital. Conformément
aux exemples de la Chine, Inde ou Corée du Sud, l entrée des investissements direct
750

étrangers ne dépendrait pas de l'approfondissement de la mobilité des capitaux de court


terme.

CHAPITRE 5 - CROISSANCE ÉCONOMIQUE, CHANGEMENTS STRUCTURELS


ET DISTRIBUTION: LES TRANSFORMATIONS DU RÉGIME
D'ACCUMULATION AU BRÉSIL

Après la caractérisation de l'évolution des formes institutionnelles, développée au


chapitre précédent, l'instrumental statistique et économétrique est mobilisé pour une
appréhension des particularités du régime d'accumulation brésilien et de leurs transformations
récentes. L'analyse passe du plan des régulations partielles au niveau de la régulation
d'ensemble. Des diverses procédures et approches quantitatives sont utilisés pour fournir une
perspective générale des principales tendances de l'accumulation de capital et de la croissance
économique brésilienne. À travers l examen des comportements des variables
macroéconomiques, tels comme le PIB, la part des profits et des salaires, l'utilisation des
capacités productives, le ratio produit potentiel / stock de capital et les prix relatifs, il est
possible d'obtenir une caractérisation de la dynamique des régimes d'accumulation et, alors,
saisir des considérations sur l'état actuel de l'économie.

Nous parlons de l'hypothèse que grande partie des problèmes macroéconomiques


brésiliens dérivent de la configuration actuelle du régime monétaire et financier et de l'option
par une forme particulière d'insertion internationale. Ces deux formes institutionnelles sont
devenues hiérarchiquement supérieures, une caractéristique, peut-on dire, imposée par
l'adhésion néolibérale à la logique de la "globalisation", dont le processus ne possède pas un
statut de phénomène de la nature, puisqu il s'inscrit dans les choix politiques disponibles aux
gouvernements nationaux.

Parmi les principaux résultats de l'analyse développée à ce chapitre peuvent être


détachés les suivants:

La principale cause de la chute du taux d utilisation des capacités dans la période 1981-
2003 a été la chute du taux de profit initiée en 1974. Le mode de développement par
substitution d'importations se développait sous la logique de régimes de croissance du
type profit-led avec forte présence de l'État et la participation du capital étranger.
L'économie brésilienne n a jamais fait la transition pour un régime wage-led ou export-
751

led, ce que pourrait être la base pour une société de consommation de masse et plus
égalitaire. Dans ce contexte, la chute du taux de profit, concomitament à une expansion et
à une concentration financières sans précédents historiques, il déchaînerait la chute du
taux d'utilisation des capacités productives;

Au début des années 90, le taux de profit augmente, mais le taux d'accumulation de capital
reste stagné. Pendant les phases de forte croissance économique, taux d'accumulation,
taux de profit et taux d'utilisation des capacités sont restés positivement corrélées. Dans la
période postérieure au Plan Real, la persistance d'un faible taux d'utilisation des capacités
peut être expliquée par le processus de financiarisation qui soumet l'économie brésilienne
aux prérogatives de la "globalisation" et a comme support l' endettement extérieur et
intérieur élevé du pays. Les évidences empiriques indiquent que l'économie brésilienne
actuelle fonctionne sur la base d'un nouveau régime tiré par les finances, c est-à-dire, d'un
régime du type finance led growth;

Les tests empiriques confirment la forte corrélation entre croissance et accumulation de


capital dans l'économie brésilienne, dans la période 1941-2003. Le test de causalité de
GRANGER révèle qu'il y a causalité bilatérale entre l accumulation de capital et la
croissance du PIB. L'analyse de cointégration révèle l existence d une relation de long
terme entre ces variables, en démontrant l'importance fondamentale de l'accumulation de
capital pour le développement économique du pays. Les séries tendancielles de ces
variables montrent que l'économie brésilienne, après une longue période d'expansion et
d'accumulation de capital, a sorti de sa trajectoire de croissance de longue période, en
démontrant une grande difficulté de la retrouver sous de nouveaux régimes
d'accumulation;

Le régime d'accumulation a été à dominante extensive dans la période 1951-1963, avec les
gains de productivité stagnants entre 1951-60 et en chute entre 1961-63. Un fait qui est
cohérent avec les résultats du « Plan d'Objectifs » lesquels visaient élargir les capacités de
production et consolider l'industrialisation du pays;

La crise de 1960-63 marque la transition pour un régime d'accumulation à dominante


intensive. En outre, l'analyse économétrique révèle que la croissance dans la période
1966-1980 a été du type profit led, en raison de la haute sensibilité du taux d'accumulation
de capital par rapport au taux de profit ;
752

La crise du régime d'accumulation responsable par le "miracle brésilien" s'est manifestée


dans une chute tendancielle, forte et prolongée du taux moyen de profit et du taux
d'accumulation de capital de l'économie brésilienne, observée entre 1973-1993. Ceci
signifie deux décennies de chute tendancielle en deux variables fondamentales au
processus de croissance économique;

Il faut remarquer que si les années 90 ont été considérés comme une deuxième "décennie
perdue" en termes de croissance et de développement socio-économique, c est à partir de
1994 que la tendance à la chute du taux de profit s interrompt. En 2002, le taux général de
profit de l'économie brésilienne atteint le niveau de 25.8%, le plus haut depuis la récession
de 1983 ;

Dans le cas brésilien actuel, on constate que cette variable se présente dans une nette
trajectoire de croissance. La conclusion directe est qu il n'y a pas d'indications d une crise
structurelle dans l'économie brésilienne. D'autre part, il n'y a pas de raison théorique pour
supposer que le rétablissement de la rentabilité des capitaux est une condition suffisante
pour relancer l'économie dans un processus de croissance économique forte et durable. La
hausse du taux de profit peut être, par exemple, un moyen de survie des capitaux
directement productifs en face de la "ponction rentier" qui leur est imposée par le capital
financier dans une époque de « globalisation » néolibérale et financière;

L'analyse empirique a révélé que la forme d'accumulation de capital de la période post-


Real est très diverse de celle observé pendant le mode de développement par substitution
d'importations. Une des caractéristiques la plus surprenante de ce nouveau régime finance
led growth est précisément la déconnexion entre le taux de profit et le taux d'accumulation
de capital;

Il n'y a pas d'évidences empiriques qui montrent que la relation de KALDOR-


VERDOORN ait agi dans l'économie brésilienne dans la période [1962-1980], qu'inclut la
phase de forte expansion du "miracle" (1967-1973). Bien que ceci ne signifie pas
l'absence de quelconque influence ou la dépendance entre ces variables, le résultat trouvé
ne permet pas de supporter l'hypothèse que la relation de KALDOR-VERDOORN a été
présente dans cette période de l'histoire économique brésilienne. Le fait que des séries ne
sont pas cointégrées exprime l'absence d'une relation de long terme entre les dynamiques
de l'industrie et du PIB ;
753

Pour la période 1991-2003, nous n avons pas obtenu des évidences empiriques qui
supportent l'existence de la relation KV. L'approche kaldorienne de cette relation est
établie dans l'existence de causalité cumulative dans le plan macroéconomique, en
estimant l'influence de la demande globale comme un facteur d'impulsion de la dynamique
de l'industrie et de l'économie. Néanmoins, dans la décennie de 90, la demande globale est
restée, dans la plupart de la période, très contenue, tant par le régime de politique
économique que par la hausse du chômage conjoncturel et structurel;

Le modèle de BOWLES-BOYER (1990; 1995) pour les régimes d'accumulation est testé
pour le cas brésilien, dans la version proposée par UEMURA (2000). Les résultats des
estimations des fonctions d épargne, d investissement et d exportations nettes permettent
les considérations suivantes:

a) En ce qui concerne la fonction épargne:

Dans la période 1950-1980, a été détectée la validité d'un processus kaldorian de


détermination de l'épargne globale, conformément aux propensions à épargner des
travailleurs salariés et des propriétaires de capital.

Dans la période 1984-2003, l'épargne globale, la masse de profits et la masse


salariale ne sont pas cointégrés. Ce résultat peut être interprété comme l expression
de l'absence d'une relation économique de long terme entre ces variables. Un fait
lié aux transformations dans le mode de régulation et dans le régime
d'accumulation qui ont marqué ces deux décennies;

b) Quant à la fonction investissement:

Dans la période 1966-1980, le coefficient concernant la sensibilité du taux


d'accumulation de capital à l'évolution du taux de profit a présenté la valeur de
0.44 et celui concernant la sensibilité du taux d'utilisation des capacités
productives a été de 0.34 ;

Dans la période 1984-2003, les variables de la fonction investissement ne sont pas


cointégrées et comme dans le cas de la fonction épargne, il n'y a pas une relation
macroéconomique de longue période.

Une analyse de la dynamique du taux général de profit et du taux d'accumulation de


capital confirme la forte dépendance entre ces variables. Ceci est un présupposé théorique des
approches néostructuralistes aussi partagé par la Théorie de la Régulation. De telle façon que
754

le test de JOHANSEN a détecté une relation de cointégration entre le profit et l accumulation.


En conséquence, il y a une relation de longue période entre ces variables, conformément à ce
qui est établi par la théorie économique marxienne et par les travaux de KALECKI. Le test de
causalité de GRANGER révèle que, pour la période 1966-1993 le taux de profit provoque
l'accumulation de capital. En conséquence, la tendance déclinante du taux de profit se trouve
entre les principales raisons structurelles pour la chute du taux d'accumulation de capital et
pour la faible croissance économique observée dans la période 1974-1993;

Un des résultats des transformations du mode de régulation au long de la décennie de


90 a été la chute de la part salariale et, en conséquence, l'expansion de la part des profits à un
taux moyen de 2.5% par an entre 1993 et 1999;

Tant sous la phase d'expansion du « Plan de Metas » (1955-1962), comme pendant la


phase du "miracle" (1967-1973) s'observe un éloignement entre les dynamiques de la
productivité (PR) et du salaire moyen réel (WR). Dans une perspective régulationniste, la
déconnexion entre PR et WR apparaît comme un facteur endogène de crise ou un blocus du
taux d'accumulation de capital, une fois que cette dissociation mène à une incompatibilité
entre le régime de productivité et le régime de demande;

La crise des années 60 peut être interprétée comme un résultat de cette déconnexion
entre l'évolution des gains de productivité et le salaire moyen réel, quand l'accumulation de
capital initie sa phase intensive. Comme une crise cyclique, elle n est pas un résultat de
l épuisement du mode de régulation en vigueur, mais de l'incapacité des formes
institutionnelles à absorber les nouveaux déséquilibres produits par une expansion rapide des
capacités de production, pendant la mise en uvre du « Plan de Metas ».

La crise du régime d'accumulation du "miracle" se montre plus grave quand on utilise


le taux de profit comme un indicateur de crise. La chute tendancielle du taux moyen de profit
se prolonge pendant deux décennies, sachant que dans la crise des années 60 la phase de chute
n'a pas dépassé six ans. Il s'agit d'un clair signe de crise structurelle et non d'une crise cyclique
qui peut être absorbée au sein du mode de régulation en cours ou à travers des réformes qui ne
mettent pas en cause la logique du régime d'accumulation;

Dans la décennie 90, un ensemble de transformations structurelles a permis l'économie


brésilienne de sortir de sa "trajectoire marxienne" de chute tendancielle du taux général de
profit. Ces transformations, n ont pas seulement permis le dépassement de la haute inflation et
la réduction des prix des biens de capital, mais ont déchaîné un processus rapide de
755

changement dans les configurations des formes institutionnelles. Un résultat direct a été la
conversion du régime monétaire financier et de la nouvelle forme d'insertion internationale à
la catégorie de formes institutionnelles hiérarchiquement supérieures, en soumettant l'État et
le rapport salarial aux prérogatives d'une adhésion néolibérale au processus de globalisation;

Le caractère concurrentiel du rapport salarial brésilien a été approfondi, en élargissant


la flexibilité quantitative et salariale. En conséquence, la participation au PIB des profits passe
de 47% en 1990 à 59% en 2003. La période se caractérise par la chute du niveau général
d'emploi et par la réduction du salaire moyen réel;

c) Quant à la fonction exportations nettes:

Dans les deux périodes 1966-1980 et 1984-2003, les coefficients relatifs à la


sensibilité des exportations nettes au taux de profit et au taux d'utilisation des capacités ne se
sont pas montrés statistiquement significatifs. Seulement l'élasticité par rapport au taux de
change s'est révélée significative, bien qu'avec une faible valeur, en passant de 0.01 dans la
période de forte croissance à 0.03 dans la période suivante;

Ces résultats peuvent être interprétés comme étant liés à la logique du modèle
d'industrialisation par substitution d'importations et par conséquence, à l'inexistence d'un
standard de croissance extravertie. Néanmoins, la transition observée dans la deuxième
période ne signifie pas l'établissement d'un régime d'accumulation du type export-led growth,
ce qui pourrait être la base d une montée des niveaux de revenu et de l'emploi dans l'économie
brésilienne post-libéralisation et post-Plan Real;

d) En bref, les signes des élasticités des fonctions estimées du modèle BOWLES-
BOYER permettent les suivantes constatations :

comme le signe de l'élasticité par rapport au profit de l'excès de demande est


positif ED (0,15).(0,82) 0,12 0 pour la période 1966-1980, le régime

d'accumulation a été du type profit led growth. Ce fait confirme les analyses
historiques concernant l existence, pendant le "miracle", d'un modèle de croissance
tiré par des élevés taux de profit et d'endettement extérieur;

dans la période 1984-2003, une spécification de court terme conduit à une valeur
aussi positive pour l'élasticité par rapport au profit de l'excès de demande globale,

ED (0,09).(0,43) 0,04 0 . Ceci implique une faible sensibilité de la

demande globale aux variations de la part des profits. Le taux d'accumulation de


756

capital répond seulement aux variations du taux d'utilisation des capacités


productives, ce que peut être une expression de la prédominance des anticipations
de court terme dans les décisions d'investissement. D'autre part, il s'agit d'une
période où le taux de profit et le taux d'accumulation ne partagent plus une
tendance commune, comme attendu dans les situations normales pour une
économie industrielle.

Concernant la problématique entre l épargne et la croissance économique, l'analyse du


cas brésilien révèle les faits suivants:

Différemment de la période de validité du régime d'accumulation profit led,


l'absorption d'épargne externe dans la période post-Real sous des finances
libéralisées a très peu contribué pour l'augmentation du stock de capital fixe de
l'économie brésilienne. En conséquence, l'endettement extérieur a augmenté sans
que ceci se reflète en des taux plus élevés de croissance économique;

La chute du taux d'épargne (s) à partir de 1974 n'explique pas de façon


satisfaisante la chute du taux d'accumulation de capital (g). La chute du ratio prix
du produit/ prix des biens de capital; du taux d'utilisation des capacités et du ratio
produit/capital en usage ont également contribué. À partir de la crise du régime de
croissance profit led en 1974, la corrélation entre g et p s'est révélée très forte,
pendant que la corrélation entre g et s s'est montrée faible;

Dans la période post-Real, 1994-2003, g reste hautement corrélé avec u (0.83),


avec s (0,74) et avec p (0.62). Dans cette période, le ratio produit/ capital en usage
se corrèle négativement avec g (-0.52);

Une hypothèse alternative pour expliquer la chute de la productivité du capital dans


l'économie brésilienne est l'émergence d'un environnement macroéconomique caractérisé par
une tendance persistante de hausse des taux réels d'intérêts, provoqué par une expansion, sans
précédents historiques, du passif externe brésilien. Dans ce contexte, le coût d'utilisation du
stock de capital monte à des valeurs très élevées vis-à-vis l affectation de l'épargne disponible
pour l acquisition des actifs financiers, ceux-ci de moindre risque et de rentabilité garantie, à
savoir les titres de la dette publique;

Une deuxième explication (alternative) pour la chute de la productivité du capital est


proposée par VIDAL (2003). La chute du ratio produit/ capital en usage peut être expliquée
par une augmentation excessive du ratio K / N (l'intensité du capital) vis-à-vis la possibilité
757

d'obtention de gains de productivité, ce que conduit à une perte dans l'efficacité de


l'investissement. En conséquence, le retour à l'accumulation extensive avec un faible taux de
croissance du stock de capital fixe et une réduction du rythme de substitution du capital au
travail constitue une sortie endogène qui permet de sortir de la trajectoire marxienne de chute
du taux de profit;

L'analyse empirique montre que la productivité du travail a augmenté dans les années
90, ce qui a résulté de l'augmentation dans l'intensité du capital (K/N), c'est-à-dire, les gains
de productivité ont été obtenus principalement par la substitution accélérée du capital au
travail;

Dans les années 90, l'économie brésilienne a eu accès à des nouvelles technologies de
l information et de la communication (NTIC), avec des forts impacts dans la réorganisation de
leurs bases techniques productives. Néanmoins, il est surprenant le fait que cette économie n a
pas réussi à soutenir la hausse de son taux d'accumulation de capital, malgré des gains
considérables de productivité, particulièrement dans l'industrie de transformation. Une
explication possible est proportionnée par la Théorie de la Régulation: un régime de
croissance ou d'accumulation est le résultat de la compatibilité dynamique entre un régime de
productivité et un régime de demande. Les évidences empiriques indiquent que le régime de
demande dans la période post-libéralisation et post-Real n est pas capable de supporter le
nouveau régime de productivité. Les taux de variation du taux d'accumulation de capital et le
taux de croissance de la demande intérieure (Y+M-X) ont continué en chute tendancielle entre
1994 et 2003, en même temps que le ratio profit/ taux d'accumulation est resté dans une
tendance anormale de croissance. En autres termes, les augmentations de la part des profits,
observées dans cette période, n'ont pas été capables de stimuler de l'expansion des capacités
de production.

L'hypothèse de financiarisation de l'économie brésilienne exige une qualification plus


précise: dans une économie marquée par des élevés taux d'intérêts réels, avec un marché des
capitaux peu développé et avec un système bancaire et financier tourné prioritairement pour
des opérations de court terme reliées à l'endettement public, la financiarisation acquiert un
caractère éminemment usurier. Dans ces conditions, les effets potentiellement positifs de la
hausse du revenu financier sur la consommation et l'investissement productif sont
nécessairement restreints, en raison de l'excessive concentration du revenu et du stock de
richesse en possession d'une minorité de la population. Un standard très différent du régime
d'accumulation finance led que les Etats-Unis ont connu dans les années 90;
758

L'analyse empirique apporte des fortes évidences dans le sens que l'inertie des taux
d utilisation des capacités dans une moyenne basse et historiquement sans précédents est le
résultat du processus de financiarisation usuraire de l'économie brésilienne. Ce processus a
été inauguré du début avec la crise de la dette extérieure et la crise fiscale de l'État dans la
décennie de 80, en trouvant dans le régime monétaire et financier dual et inflationniste sa
condition structurelle de développement. Avec la libéralisation commerciale et financière et la
mise en uvre du Plan Real, dans les années 90, les prélèvements inflationnistes qui
nourrissaient le circuit de l'accumulation patrimoniale sous haute inflation ont été substitués
par le revenu financier dérivé des hauts taux d'intérêts réels reliés à la nouvelle norme
d'endettement sous des finances libéralisées. La continuité de cette nouvelle norme
présuppose la manutention d'un régime monétaire et financier à forte restriction, ce qui
emprisonne la politique économique aux intérêts directs des rentiers et propriétaires de
capital;

Tant que le ratio dette extérieure/ PIB est resté au-dessous de 10% et avant que le
compte de capital soit ouvert, il y a eu une expansion du taux d'accumulation de capital dans
l'économie brésilienne. Il y a un seuil à partir duquel la corrélation entre l endettement et
l investissement productif a son signe inversé, en passant de positive à négative. Quand ceci
se produit sous conditions structurelles spécifiques - régime monétaire et financier
inflationniste entre 1984-1993 et haute restriction monétaire sous des finances libéralisées, à
partir de 1994 - le résultat direct est la réduction des investissements productifs, en conduisant
à la quasi-stagnation ou à la chute du taux d'accumulation de capital.

Quand s'analysent les résultats des tests économétriques pour la période [1991-2003],
se détachent les faits suivants: le coefficient concernant le taux de profit n'est plus
statistiquement significatif et le signe est maintenant négatif. Le même effet se passe avec le
signe du coefficient concernant le ratio dette extérieure/ PIB (variable « bx »), dont la valeur
est devenue trois fois supérieure à celle de la première période;

En bref, la libéralisation commerciale et financière sous orientation néolibérale a


impliqué dans le changement de la nature de la restriction externe. Pendant le régime de
croissance profit led du "miracle", la restriction externe contribuait à l'expansion des niveaux
d'emploi et de salaire à travers l'apport de ressources externes pour le financement des
investissements. Dans la période [1994-2003], la nature de la restriction externe est différente.
L'État brésilien a promu l'ouverture de l'économie, en déchaînant le processus de
reconfiguration de la forme d'insertion internationale et d autres composantes du mode
759

régulation, tout en minimisant l'importance d'un projet de développement de long terme. Sous
ces conditions, la restriction externe a passé à surdéterminer la politique économique,
l'empêchant de répondre rapidement aux nécessités de l'accumulation de capital réel.

Le régime de politique économique est utilisé pour garantir le flux de capitaux


externes nécessaire au refinancement de la dette intérieure et extérieure, instaurant un cercle
vicieux composé de: augmentation de déficit plus d endettement hausse tendancielle des
taux d'intérêts réels majeure pression sur le déficit futur - et plus d endettement. Sans
autonomie suffisante pour conduire un projet de développement économique, l'État est obligé
de répondre prioritairement aux exigences de court terme des marchés financiers.

CONCLUSION GÉNÉRALE

"Je préférerais découvrir une cause à gagner le royaume de


la Perse"
(Démocrite)
"Une théorie doit être jugée tant par l'ignorance qu elle
exige, que par la connaissance qu elle produit ".
(Marshall Sallins)
Nous avons développé les étapes méthodologiques nécessaires à une application des
macro-analyses régulationnistes à l'économie brésilienne. Dans les chapitres 1 et 2 ont été
explicités la méthode d'analyse, les fondements théoriques et les notions de base de la Théorie
de la Régulation, leurs principaux objets et objectifs.

Dans le chapitre 3 nous avons développé une analyse de la performance


macroéconomique brésilienne dans une perspective de longue période, en détachant les
principaux faits stylisés de l'évolution économique dans le XXe siècle. L'économie brésilienne
s'est caractérisée par un dynamisme élevé entre 1900 et 1979, avec des taux moyens de
croissance du PIB et du PIB par tête, respectivement, de 6% et de 3% l an. Néanmoins, dans
les années 80, elle perd sa trajectoire de croissance et commence à démontrer une énorme
difficulté à la retrouver sous les nouveaux régimes d'accumulation.

Un des facteurs explicatifs pour cette performance, incompatible avec le potentiel


productif de l'économie brésilienne dans le XXe siècle, a été la succession de réponses
inadéquates pour la sortie de la crise des années 80 et leurs dédoublements dans les années 90.
La recherche d'un nouveau modèle de croissance et d'accumulation aurait demandé, sans
aucun doute, la reconfiguration de l'architecture institutionnelle qui définissait le mode de
régulation et le correspondant mode de développement basé sur la substitution d'importations.
Mais il y avait d autres possibilités qui auraient pu être explorées dans le cadre des
760

transformations structurelles, mais qui simplement ont été refusées en profit d'une réinsertion
néolibérale dans le régime international.

En conséquence, un des résultats directs de l'ouverture commerciale et financière des


années 90 a été le changement dans le standard d'accumulation de l'économie, en retirant de
l'État sa légitimité de conduire des projets nationaux de développement. Aux facteurs
endogènes d'instabilité du régime de croissance, se sont rajoutés la pression de la concurrence
internationale, la libéralisation du flux de capitaux, le processus de privatisation et d autres
réformes qui ont modifié les relations État-économie.

Les transformations dans la forme institutionnelle d'insertion dans le régime


international ont approfondi le degré de dépendance financière et ont réduit drastiquement
l'autonomie de la politique économique. En conséquence, incapable de jouer pleinement son
rôle d'inducteur du processus d'accumulation de capital, l'État semble supposer que le marché
puisse accomplir un rôle qui dans l'histoire des capitalismes développés lui a toujours été
réservé.

L idéologie néolibérale et la réinsertion subordonnée dans le processus de


"globalisation" s'articulent et soumettent une économie dont le potentiel productif est
indubitable, mais qui a accepté s'ajuster aux prérogatives de l'actuelle logique financière
internationale. En conséquence, les projets cohérents de développement économique sont
vidés dans le plan politique et idéologique parce que sa réalisation impliquerait de mobiliser
des fonctions étatiques incompatibles avec les formes actuelles de gestion des dettes externes
et internes. Ces dernières fonctionnent comme prémisse en même temps qu elles résultent de
l'accumulation rentier reproduite par l'actuel régime de politique économique et par la
structure institutionnelle que lui correspond.

L'analyse développée au chapitre 4 a permis une caractérisation de l'évolution et de la


configuration actuelle des cinq formes institutionnelles qui composent le mode de régulation
brésilien. Il cherche à identifier leurs spécificités et principales tendances dont les impacts ont
été fondamentaux dans la définition du régime d'accumulation et dans les formes concrètes de
leurs crises. Parmi les résultats les plus significatifs peuvent être détachés les suivants:

a) la forme institutionnelle de l'État - malgré leurs transformations au long de l'histoire


économique, l'État brésilien a toujours été présent, tant directement qu indirectement, dans la
reproduction du capital. Au long du XXe siècle, l'État s'est transformé significativement en
fonction des nouveaux besoins du développement économique de base industrielle, sans
761

néanmoins dépasser son caractère excluant et coercitif pour la grande majorité de la


population brésilienne.

Il reste encore la disjonction entre l'État et la société civile, c'est-à-dire, l'énorme


distance entre la société réelle et la société politiquement représentée, à des niveaux qui sont
de fait incompatibles avec une démocratie et une économie industrielle modernes.

Après avoir occupé le rôle de forme institutionnelle hiérarchiquement supérieure dans


le mode de régulation, à partir des années 80 l'État se soumet au régime monétaire et financier
et aux structures d'accumulation rentier et patrimoniale, centrée dans les profits des grandes
banques.

Dans les années 90, sous la validité du Real et les finances libéralisées, cette
subordination atteint un paroxysme, en emprisonnant le régime de politique économique aux
intérêts directs des propriétaires d'actifs financiers et en détriment de l'accumulation de capital
réel. En conséquence, dans le plan politique et idéologique, les alternatives à l'actuel régime
de politique économique sont systématiquement contestées par le discours officiel et par les
segments bénéficiaires des grands profits financiers, comme inadéquates ou porteuses de
contenus "populistes" anachroniques;

b) la forme institutionnelle du rapport salarial ou du wage-labor nexus (WLN) - avec


l'avance de l'industrialisation, le rapport salarial brésilien s'est consolidé comme principale
relation de production et de distribution, selon la tendance historique d'évolution des
économies qui s'organisent sous le mode de production capitaliste.

L'analyse historique supportée par les tests économétriques fournit des éléments
empiriques suffisants pour la classer comme une forme institutionnelle toujours subordonnée
dans l'architecture définissant des modes de régulation au Brésil. Il s'agit d une WLN
amplement concurrentielle, segmentée et en permanence contrôlée par l'État avec l'objectif de
l'ajuster aux impératifs de court terme du régime de politique économique et de
l'accumulation de capital.

Dans la période post-Plan Real, le chômage commence à influencer directement dans


la formation des salaires nominaux des relations salariales formelles, un segment
traditionnellement plus structuré de la WLN. Ce fait est un indicateur supplémentaire de
l'augmentation du degré de flexibilité quantitative et salariale, déchaîné par la reconfiguration
de la forme d'insertion internationale sous une orientation néolibérale.
762

c) la forme institutionnelle de la monnaie ou du régime monétaire et financier (RMF) -


l'analyse de l'évolution de longue période du RMF brésilien a révélé son rôle structurel
subordonné à la forme institutionnelle d'insertion internationale, une caractéristique qui est
commun aux économies en processus de développement. La haute dépendance des capitaux
externes et la tendance historique au déséquilibre de la balance de paiements se renforcent
comme principal obstacle à la consolidation de la monnaie nationale.

Avec la mise en uvre du Plan Real, les hauts taux réels d'intérêts ont occupé la place
avant réservée aux prélèvements inflationnistes, en perpétuant un régime monétaire et
financier inadéquat aux besoins de l'accumulation de capital productif. Ce fait permet aussi de
comprendre que le contrôle de l'inflation c est maintenu aux coûts de la croissance
économique et du détour de l'épargne macroéconomique pour les centres d'accumulation
financière et patrimoniale.

À partir de son interaction avec les autres formes institutionnelles, l actuel RMF
répond aussi par la forte restriction salariale et par la hausse du chômage sous des finances
libéralisées. Un RMF avec une restriction monétaire élevée se conjugue avec une WLN
amplement concurrentielle, un État hautement endetté et dominé par les intérêts financiers de
court terme et un standard néolibéral d'insertion internationale. Cette architecture
institutionnelle a été le support de la relative stabilité de prix sous le Real et non seulement la
logique originale d'un programme de combat à l'inflation.

d) les formes de la concurrence et de l'insertion internationale - conformément aux


résultats empiriques, et contrairement au discours néolibéral, les formes de la concurrence
n'ont pas été significativement touchées par l'ouverture commerciale et financière. Plus
précisément, des structures de marché fortement oligopolisées sont restées comme tels après
l'approfondissement du processus de libéralisation.

Ils n'ont pas été observés l'expansion et l amélioration significative des conditions de
financement de l'économie brésilienne, ce qui aurait possibilité une plus grande connexion du
capital financier aux nécessités du capital productif. L'ouverture financière a rendu possible
une nouvelle phase pour l'absorption d'épargne extérieure mais les effets sur le taux
d'accumulation de capital et sur la croissance économique sont restés très peu significatifs.
Néanmoins, sous des finances libéralisées l'accumulation rentière-patrimoniale a gagné un
nouveau palier avec l'accès à de nouveaux services et des produits offerts par des institutions
qui opèrent dans les marchés financiers internationalisés et de plus en plus interdépendants.
763

Concernant l'évolution des indicateurs financiers, se détachent les suivants résultats: à


partir de la libéralisation du compte de capital, l'évolution des réserves internationales se
déconnecte de l'évolution de la formation brute de capital fixe. Ce fait est un indicateur que
l'entrée des capitaux dans la période d'ouverture commerciale et de libéralisation financière
s'est destinée, principalement, à la réalisation d'objectifs économiques peu reliés à la
dynamique de l'accumulation productive de capital.

En ce qui concerne les particularités de la régulation brésilienne, l'analyse indique


pour la continuité dans les années 90 d'un mode de régulation administré, malgré les
transformations encourues par les formes institutionnelles dans le contexte d'une adhésion
néolibérale au processus de globalisation. Le caractère "tutélaire", d abord identifié par
CORIAT et SABOIA (1995), reste encore comme l'expression de compromis
institutionnalisés qui attribuent à l'État un rôle déterminant dans la gestion macroéconomique
et dans la configuration du wage-labor nexus. Ce dernier assiste, pendant la phase de
libéralisation commerciale et financière, à l'approfondissement de sa condition de forme
hiérarchiquement subordonnée. Néanmoins, il faut expliciter la spécificité de la régulation
administrée brésilienne, une fois que la tutelle concerne prioritairement les intérêts du capital
et ceux des segments bénéficiaires de l'accumulation rentier.

Compte tenu du profil excessivement concentré du revenu et du stock de richesses et


l'élevé niveau d'exclusion sociale, le contrôle que les élites économiques exercent sur
l'appareil bureaucratique de l'État brésilien ne permet pas que les principales demandes de la
grande majorité de la population soient effectivement représentées et satisfaits. Le caractère
tutélaire est dirigé aux intérêts des classes dominantes et au détriment des classes de plus bas
revenu. Cette régulation est très diverse de la forme administrée caractéristique des pays
développés avec des démocraties plus robustes. Dans ces derniers, le mode de régulation
administré reproduit une norme de concurrence oligopoliste articulée avec une configuration
du rapport salarial non concurrentielle. Dans le cas brésilien, la tutelle vise à maintenir ou à
approfondir le caractère concurrentiel du rapport salarial sous des structures de marché
fortement oligopolistes. En conséquence, la régulation administrée brésilienne répond aussi
par le caractère incomplet et limité des structures de bien-être social et par la "privatisation"
des fonctions de l'État, à travers la forte ingérence des grands groupes économiques et
financiers sur le régime de politique économique et sur les priorités du budget d'État.

Au chapitre 5, l'analyse a passé du plan des régulations partielles au plan de la


régulation d'ensemble, pour identifier les régimes de croissance ou d'accumulation et
764

finalement, atteindre l objectif principal de ce travail. On a cherché à identifier les ruptures


structurelles et les périodes de stabilité des macrorégularités qui supportent la dynamique de
la croissance économique et de l'accumulation de capital. Plusieurs procédures statistiques et
des tests de stabilité structurelle et d analyse de cointégration ont été mobilisés de forme
récurrente pour expliciter les déterminants de la croissance économique brésilienne.

Les tests économétriques ont montré qu'un régime d'accumulation profit led a été
présent dans la période [1966-1980], qu'inclut la phase de forte croissance du "miracle
économique brésilien" (1967-1973). Ce résultat confirme les analyses historiques qui
appréhendent cette phase comme liée à un modèle de croissance basée sur des hauts taux de
profit, concentration du revenu et endettement extérieur.

Dans la période [1984-1993], les tests économétriques et les procédures


méthodologiques alternatives ont détecté la présence d'un régime de crise. Néanmoins, la
tendance commune de baisse du taux de profit et du taux d'accumulation de capital par deux
décennies consécutives, à partir de 1973, peut être interprétée comme un signe de crise
structurelle et non d'une crise cyclique, surmontable dans le cadre du même mode de
régulation.

L'analyse empirique a cherché à identifier aussi les tendances et les obstacles à


l'accumulation de capital qui ont émergé des transformations imposées au mode de régulation
dans les années 90: le changement de hiérarchie des formes institutionnelles avec la
conversion du régime monétaire et financier et de la nouvelle forme d'insertion internationale
à la condition de formes hiérarchiquement supérieures; la rupture avec les compromis
institutionnalisés hérités du mode de développement par substitution d'importations, y
compris les relations État-économie et la perte de légitimité des stratégies de développement
économique national.

Une des principales hypothèses de cette analyse est celle d une financiarisation de
l'économie brésilienne. Mais l'application de ce concept au cas brésilien actuel exige une
qualification plus appropriée à la norme de relations entre les institutions financières et les
secteurs directement productifs. Dans un environnement macroéconomique caractérisé par
des taux réels d'intérêts élevés, le processus de financiarisation acquiert un caractère usuraire,
différent de celui observé dans les pays avec un faible endettement ou des taux d'intérêts bas.
En outre, le degré de concentration du revenu et celui du stock de richesse sont aussi des
facteurs importants dans la détermination des particularités d'un standard de financiarisation.
765

L analyse a montré que sous des finances libéralisées, un endettement extérieur élevé,
un régime monétaire avec haute restriction et un degré excessif de concentration du revenu et
de richesse, sont les conditions nécessaires pour l'émergence d'un régime du type finance led
growth.

Un des aspects du régime de croissance finance led brésilien est qu'il se constitue à
partir d un standard usuraire d'accumulation rentier. L'économie alterne des phases courtes
d'expansion avec des phases de baisse du niveau d'activité en raison des ajustements récessifs
sur le stock de capital, provoqués par la permanence d'un régime de crédit très sensible aux
fluctuations des prix des actifs et de l'endettement des familles et des firmes. En conséquence,
tel régime rend incompatible avec l'expansion soutenue des taux de croissance économique.

Une des caractéristiques les plus surprenantes de ce nouveau régime tiré par les
finances est la déconnexion entre le taux de profit et le taux d'accumulation de capital. Un
facteur fondamental qui conspire contre le développement durable de la croissance
économique sous un rythme élevé.

En conséquence, dans une économie caractérisée par la haute concentration de la


propriété et du revenu, avec des élevés niveaux d'oligopolisation de leurs structures
productives, le profit des entreprises peut se développer pour absorber des coûts financiers
croissants. Mais ce processus se développe aux dépenses du taux d'accumulation de capital
productif et avec de pressions permanentes sur le niveau général de prix de l'économie (c est
clair que les intérêts représentent des coûts financiers des firmes). Et comme la nouvelle phase
d'ouverture économique inaugurée par la "globalisation néolibérale" présuppose, pour sa
réalisation et logique de financement, des taux d'inflation bas et des taux d'intérêts attrayants
aux flux de capitaux transnationaux, l'État, de façon récurrente, "freine" ce type d'économie.
La recomposition des conditions de reprise de l'accumulation de capital productif, base de la
croissance et du développement économique, devient clairement un problème plus complexe.
Surtout, dans une économie encore en construction et soumise à un processus de
financiarisation sans précédents historiques.

La recomposition des conditions de reprise de la croissance économique évidemment


passe par la réduction significative des intérêts réels, dont les niveaux actuels bloquent le taux
d'accumulation de capital et aggravent les problèmes structurels. Mais le développement
financier brésilien s est produit, depuis la "première décennie perdue", aux dépenses de
l'accumulation de capital réel, ce qui restreint aujourd hui les degrés de liberté de l'État pour
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promouvoir un nouveau régime de crédit plus conforme avec le surpassement du sous-


développement du pays.

La question est, en fait, complexe et ses dimensions dépassent le contexte des relations
purement économiques. En d autres termes, le changement de cette norme de relation entre
l accumulation de base rentière-patrimoniale et l accumulation de capital productif exige la
mobilisation de forces politiques qui puissent contrebalancer l'influence exercée par les élites
financières sur l'appareil d'État brésilien et, en conséquence, sur le régime de politique
économique. Ceci signifie récupérer la souveraineté de l'État, y compris son caractère public,
tout en profitant les nouvelles conditions rendues propices par la démocratie politique, ayant
pour but approfondir et concrétiser la démocratie économique.
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