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Expediente Sumário

4 Editorial
Mundo de Regeneração

11 Entrevista: Luiza Leontina Andrade Ribeiro


Fundada em 21 de janeiro de 1883 Vivência dos postulados espíritas
Fundador: A UGUSTO E LIAS DA S ILVA
21 Esflorando o Evangelho

Revista de Espiritismo Cristão


Busquemos a luz – Emmanuel
Ano 130 / Março, 2012 / N o 2.196
30 Evangelização Espírita Infantojuvenil
ISSN 1413-1749
Propriedade e orientação da Por que é importante evangelizar? – Cecília Rocha
FEDERAÇÃO ESPÍRITA BRASILEIRA
Diretor: NESTOR JOÃO MASOTTI 34 A FEB e o Esperanto
Editor: ALTIVO FERREIRA
Redatores: AFFONSO BORGES GALLEGO SOARES, ANTONIO Do Movimento Esperantista – Esperanto e Rio+20 –
CESAR PERRI DE CARVALHO, EVANDRO NOLETO
BEZERRA, GERALDO CAMPETTI SOBRINHO E Affonso Soares
MARTA ANTUNES DE OLIVEIRA DE MOURA
Secretário: PAULO DE TARSO DOS REIS LYRA
42 Seara Espírita
Gerente: SADY GUILHERME SCHMIDT
Equipe de Diagramação: AGADYR TORRES PEREIRA E
SARAÍ AYRES TORRES
Equipe de Revisão: MÔNICA DOS SANTOS E WAGNA 5 A morte sem mistérios – Christiano Torchi
CARVALHO
Projeto gráfico da revista: JULIO MOREIRA 8 Não julgueis – Clara Lila Gonzalez de Araújo
Capa: AGADYR TORRES PEREIRA
13 A prece de Kardec – Mário Frigéri
REFORMADOR: Registro de publicação
o
n 121.P.209/73 (DCDP do Departamento de 14 Aprendizado incessante – Richard Simonetti
Polícia Federal do Ministério da Justiça)
CNPJ 33.644.857/0002-84 • I. E. 81.600.503 16 A fórmula “quase mágica” da confiança –
Direção e Redação:
SGAN 603 – Conjunto F – L2 Norte
Geraldo Campetti Sobrinho
70830-030 • Brasília (DF)
18 Ações pioneiras dos movimentos cristão e espírita –
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FAX: (61) 3322-0523
Antonio Cesar Perri de Carvalho
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Rio de Janeiro (RJ) • Brasil
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29 Felizes os que têm Deus – Cruz e Souza
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32 Perigoso fascínio – Licurgo Soares de Lacerda Filho
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Número avulso R$ 7,00
36 Imortalidade da alma – José Passini
PARA O EXTERIOR
Assinatura anual US$ 50,00 39 Uma reflexão histórica – a força de um ideal –
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Tel.: (21) 2187-8264 • 2187-8274 Vladimir Alexei
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assinaturas.reformador@febrasil.org.br 41 Novas Atividades Doutrinárias da FEB
Editorial
Mundo de
Regeneração
“N
ão se turbe o vosso coração. – Credes em Deus, crede também em mim. Há
muitas moradas na casa de meu Pai; se assim não fosse, já eu vo-lo teria dito,
pois me vou para vos preparar o lugar”,1 afirmou Jesus em seu Evangelho.
Os Espíritos superiores, por meio da Doutrina Espírita esclarecem, também, que
são habitados todos os globos que se movem no espaço e que “o homem terreno está
longe de ser, como supõe, o primeiro em inteligência, em bondade e em perfeição”.2
Avançando na análise deste assunto, os orientadores espirituais esclarecem que,
com base no grau de evolução moral e intelectual de seus habitantes, os mundos
podem ser classificados em: I) primitivos – em que o ser humano está no início da
sua evolução; II) de expiações e provas – nos quais predominam o orgulho, o egoís-
mo e a violência; III) de regeneração – em que os seus habitantes já se reconhecem
como Espíritos imortais em processo de evolução, e se dispõem a trabalhar no seu
progresso moral; IV) felizes – em que predomina o bem; V) celestes ou divinos –
moradas dos Espíritos puros.1
A Terra está em fase de transição, saindo da condição de Mundo de Expiações e
Provas para a de Mundo de Regeneração. Nesta sua nova fase, tal como ocorre em
um estabelecimento escolar, separam-se os Espíritos que evoluíram o suficiente
para continuar progredindo na Terra, daqueles que, não conseguindo este estágio
evolutivo, continuarão habitando outros mundos de expiações e provas.
Aqueles que permanecerem na Terra, todavia, não vão encontrar um mundo já
regenerado. Eles terão que participar do trabalho de sua construção, tendo por base
os princípios contidos no Evangelho, e estarão contribuindo nessa obra, à medida
que trabalharem no seu próprio aprimoramento moral e intelectual, vivenciando
gradativamente as leis que emanam de Deus, e que foram ensinadas e exemplifi-
cadas por Jesus.
Aproveitemos, pois, a oportunidade de crescimento e mudança que este mundo
em transformação nos oferece, a fim de que modifiquemos o nosso interior, moral
e intelectualmente, para melhor.

1
KARDEC, Allan. O evangelho segundo o espiritismo. Trad. Guillon Ribeiro. 130. ed. 1. reimp. Rio de
Janeiro: FEB, 2011. Cap. 3, it. 1 e 4, respectivamente.
2
Idem. O livro dos espíritos. Trad. Guillon Ribeiro. 91. ed. 2. reimp. Rio de Janeiro: FEB, 2010. Q. 55.

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A morte
sem mistérios
C H R I S T I A N O TO RC H I

P
or que a morte, sendo tão provou, cientificamente, a imor- milagres ou sortilégios, entre eles
natural quanto o nasci- talidade e resgatou o espírito da a materialização de Espíritos, con-
mento, fenômeno corri- matéria, “matando a morte”. Não fundida com a “ressuscitação” ou
queiro ao qual todos estamos su- se trata mais de convicção reli- “ressurreição” dos mortos.
jeitos, sem exceção, ainda é con- giosa. Trata-se de estar bem ou Denomina-se “morte” o esgo-
siderada algo sinistro e tão miste- mal informado, pois, sem prejuí- tamento ou a cessação da ativi-
rioso? Por que ela é tão incom- zo dos princípios revelados pelo dade vital nos organismos. Nós,
preendida e causa tanto sofri- Consolador, o Espírito já foi pe- os espíritas, chamamo-la “de-
mento, sobretudo quando sur- sado, medido e fotografado por sencarnação”, palavra que desig-
preende prematuramente nossos uma legião de sábios, pesquisa- na, com maior precisão, o even-
entes queridos? dores e cientistas de renome, to, pois o que se dá, na realida-
O Espiritismo veio, em boa hora, conforme registrado nos anais da de, é o desprendimento do Espí-
desmistificar a morte, mostrando História. rito ou do princípio inteligente
a sua verdadeira face, e, o que é Muito da incompreensão e do do corpo físico, que a esse se ha-
mais importante, veio realçar temor da morte repousa no des- via ligado por meio do fenômeno
a importância da vida, demons- conhecimento da natureza espi- encarnatório.
trando que ela transcende a ques- ritual do homem e no desconhe- Deus criou os Espíritos sim-
tão da sobrevivência. Entretan- cimento do perispírito, este, o in- ples e ignorantes, impondo a eles
to, mesmo para os que estu- vólucro inseparável da alma ou encarnações sucessivas, com o
dam a realidade além-túmulo, a Espírito, elemento semimaterial, objetivo de fazê-los chegar à per-
morte dos entes queridos é al- fluídico, indestrutível, que serve feição, gradualmente, pelo pró-
go difícil de aceitar e adminis- de intermediário entre o Espírito prio mérito. Logo, a evolução se
trar. Isso mostra quanto ainda e o corpo físico. O estudo das pro- processa por fases, pois não é
somos imaturos, espiritualmen- priedades e das funções do peris- possível escalar o cume glorioso
te, e quanto temos ainda de des- pírito dilata novos horizontes à da plena vitória espiritual sobre
materializar nossos pensamen- Ciência e constitui a chave de si mesmo num só voo. Assim,
tos e sentimentos. uma grande quantidade de fenô- podemos comparar o mundo fí-
Todas as religiões pregam menos, preconceituosamente ne- sico a uma escola, a um campo
a imortalidade da alma, mas a gados pelo materialismo e quali- de provas para o Espírito. André
Doutrina Espírita foi além: com- ficados por outras crenças como Luiz afirma:

Março 2012 • Reformador 83 5


[...] O Espírito, eterno nos melhança de uma roupa impres- criaturas, que permitem o
fundamentos, vale-se da maté- tável, que se desprende do peris- desenvolvimento delas por eta-
ria, transitória nas associa- pírito e do Espírito, molécula a pas, o que proporciona, nos in-
ções, como material didático, molécula. Decompostos os ele- tervalos entre uma e outra exis-
sempre mais elevado, no curso mentos químicos, esses são res- tência física, a avaliação e a rea-
incessante da experiência para tituídos à Natureza para serem valiação das experiências, o pla-
a integração com a Divindade reutilizados na construção de nejamento das futuras encarna-
Suprema. [...]1 outros corpos. Sem a veste car- ções, para o recomeço proveito-
nal, o Espírito, em vibração dife- so de novas provas.
O estágio na carne é o buril renciada, desaparece dos olhos Se a morte fosse a destruição
que esculpe o aperfeiçoamento físicos dos encarnados, como se completa do homem (Espírito
do ser. Não é uma excursão de la- mudasse de residência, manten- encarnado), muito ganhariam
zer a que somos convidados a go- do-se intacto e conservando, em com ela os maus, pois se veriam
zar, à saciedade, na taça da vida, outra dimensão apropriada ao livres, ao mesmo tempo, do cor-
pois os excessos contribuem para progresso realizado, todo o pa- po, do Espírito e dos vícios. É
a destruição prematura do corpo trimônio de experiências adqui- uma ideia materialista que re-
físico, equiparando-se a um sui- ridas. pugna o bom-senso e a lógica. A
cídio inconsciente. O corpo é o instrumento do crença de que após a morte físi-
Com a desencarnação, o cor- progresso espiritual. A decompo- ca vem o nada, além de anti-
po grosseiro é descartado, à se- sição dele é uma sábia lei da Na- científica, é incompatível com a
tureza, sem a qual não haveria perfeição, a justiça e a bondade
1 renovação e transformação. A do Criador.
XAVIER, Francisco C. Obreiros da vida
eterna. Pelo Espírito André Luiz. 33. ed. 4. encarnação e a morte consti- A vida na carne é uma cons-
reimp. Rio de Janeiro: FEB, 2011. Cap. 19. tuem ciclos na trajetória das tante preparação para a morte.

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Todos sabemos que esta é inexo- 5. Se tiver dinheiro, não adie Ademais, tal comportamento
rável e pode acontecer a qualquer doações aos que realmente pre- demonstra o nosso egoísmo pelo
instante. Apesar disso, raramente cisem e observe cautela com tes- apego excessivo aos laços fami-
valorizamos a existência e quase tamentos, pois a morte pode liares, ou ainda a falta de con-
sempre desprezamos as oportu- chegar de surpresa, deixando-o fiança em Deus, de fé no futuro e
nidades de crescimento: aflito com pendências judiciais na imortalidade dos entes queri-
perante os familiares. dos, dos quais, a rigor, nunca nos
A educação para a morte não é 6. Não se apegue demasiado aos apartamos, havendo, até mesmo,
nenhuma forma de prepara- laços consanguíneos, pois os entes a possibilidade de nos comuni-
ção religiosa para a conquista queridos não nos pertencem. carmos com eles.
do Céu. É um processo educa- 7. Se você já possui o tesouro É realmente consolador haurir
cional que tende a ajustar os de uma fé religiosa, viva de acordo a certeza da imortalidade da alma.
educandos à realidade da Vida, com os preceitos que abraça. É Assimilar esses conhecimentos,
que não consiste apenas no vi- muito grande a responsabilida- adquirir essa convicção eleva
ver, mas também no existir e de moral de quem já conhece o a nossa condição de Espíritos, o
no transcender.2 caminho, sem equilibrar-se den- que nos faz sentir herdeiros do
tro dele. Criador e nos dá mais forças para
Aqueles que, durante a vida ter- 8. Faça o bem que puder, sem vencer as dificuldades do dia a
rena, se esforçarem sinceramente a preocupação de satisfazer a dia, permitindo que valorizemos
por se melhorar, mesmo errando todos. ainda mais a vida.
durante o curso de sua existência, 9. Trabalhe sempre. O serviço A maior prova que damos de
podem aguardar, serenos, a hora é o melhor dissolvente de nossas que realmente internalizamos as
de seu retorno para o mundo espiri- mágoas. noções imortalistas do ser e da
tual, pois verão recompensados seus 10. Ajude-se, através do leal reencarnação é recebermos com
suores, dores e lágrimas. O Espírito cumprimento de seus deveres.3 resignação e coragem a notícia
Irmão X (Humberto de Campos) do passamento de nossos entes
relaciona conselhos muito úteis para Em nossa quadra evolutiva, é queridos.
os que pretendem morrer bem. normal que sintamos tristeza pela Lamentar exageradamente a
Eis o resumo de alguns deles, em partida, inesperada ou não, dos partida daqueles a quem ama-
forma de decálogo: entes queridos. A lembrança e a mos é falta de caridade, pois seria
saudade geralmente evidenciam exigir a permanência deles na
1. Diminua gradativamente a o amor que nutrimos por eles, prisão do corpo, fustigados por
volúpia de comer a carne dos contudo, não devemos nos en- todo o cortejo de provas da exis-
animais. tregar ao desespero e à tristeza tência física, muitas vezes pelo
2. Evite os abusos do álcool e mórbida, sob pena de prejudi- egoísmo de tê-los junto de nós.
do fumo. carmos o restabelecimento dos Saibamos impor silêncio às
3. Não se renda à tentação dos recém-desencarnados, pois nos- nossas dores, entregando-nos ao
narcóticos. sos pensamentos e sentimentos trabalho do bem, que nos dará
4. Quanto ao sexo, guarde os atingem em cheio. forças para prosseguirmos no
muito cuidado na preservação do cumprimento dos deveres. Mor-
seu equilíbrio emotivo. 3
rer todos os dias para a existência
XAVIER, Francisco C. Cartas e crônicas.
inferior é uma forma de viver a
Pelo Espírito Irmão X. 13. ed. 2. reimp.
2
PIRES, J. Herculano. Educação para a Rio de Janeiro: FEB, 2010. Cap. 4. p. 21- vida eterna, construindo o futuro
morte. 9. ed. São Paulo: Paideia, 2004. p. 23. -24. glorioso que nos aguarda.

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Não julgueis
“Não julgueis, a fim de não serdes julgados; – porquanto sereis julgados conforme
houverdes julgado os outros; empregar-se-á convosco a mesma medida de que
vos tenhais servido para com os outros.” (Mateus, 7:1-2.)

CLARA LILA GONZALEZ DE ARAÚJO

O
luminoso ensinamento de daí deverá resultar em benefício Não raro, aquilo que nos chega
Jesus, registrado por Ma- para consolidação de uma socie- aos ouvidos são meras conjeturas
teus e pelos evangelistas dade ética e justa. Todavia, a repro- e suposições maldosas, às quais
Marcos (4:24) e Lucas (6:37), des- vação lançada à conduta de outra não deveríamos dar o menor cré-
taca os perigos de nos deixarmos pessoa, não significa denegri-la dito. Levianamente, porém, não
levar pelos julgamentos inconse- perante os demais, pois, nesse caso, só as transmitimos a outrem,
quentes de situações e pessoas, só há maledicência e maldade. Jesus emprestando-lhes foros de vera-
sem nenhuma cautela, alterando não proibiu que se destruísse o mal, cidade, como até exageramos,
o verdadeiro juízo dos aconteci- dando-nos exemplos significati- acrescentando-lhes detalhes fan-
mentos. Não somos comedidos nas vos para combatê-lo, mas chamou tasiosos para melhor convencer
sentenças que proferimos ao usar- atenção para agirmos de acordo os que nos escutam.
mos de excessiva severidade para com os verdadeiros preceitos da Quanto desamor ao próximo
com os deslizes alheios, esquecendo- caridade cristã. ressalta dessas atitudes!2
-nos dos graves erros que comete- Os malefícios decorrentes da ati-
mos, quiçá, muito mais sérios do tude imprudente de escarnecermos Ao se referirem às palavras deli-
que aqueles que exprobramos. o próximo, sem os cuidados neces- tuosas e levianas que transmiti-
Essa máxima é interpretada de for- sários na apreciação que fazemos mos ao mundo, os amigos espiri-
ma judiciosa por Allan Kardec, ao da sua conduta, estimulam a crítica tuais alertam-nos para a rapidez
afirmar: contumaz das pequenas imperfei- com que elas se deflagram, consti-
ções que possui, sem nos darmos tuindo-se “nesse quase impercep-
[...] não devemos julgar com conta de que certas ações que de- tível fermento de incompreensão”,
mais severidade os outros, do ploramos em outrem são insigni- sendo responsável pelo surgimen-
que nos julgamos a nós mes- ficantes diante das dificuldades to de “vasta epidemia de maledi-
mos, nem condenar em outrem morais que ainda possuímos. O cência”,3 resultado do exagero de
aquilo de que nos absolvemos. autor espírita Rodolfo Calligaris nos intrometermos na vida alheia.
Antes de profligarmos a alguém (1913-1975) legou-nos importan- Certas depreciações excessivas
uma falta, vejamos se a mesma tes contribuições a respeito do te- transformam-se em calúnia, fruto
censura não nos pode ser feita.1 ma, sobretudo ao afirmar que gos- da falta de vigilância daqueles que
tamos de “passar adiante fatos e possuem o errado hábito de me-
O mal deve ser banido, pois cons- boatos desagradáveis”2 com o in- noscabar, pelos motivos mais cor-
titui um dever reprimi-lo, o que tuito claro de provocar rumor: riqueiros, as pessoas que agem de

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forma contrária à sua maneira de semos empenhados na exemplifica-
ser. A partir daí, nascem as ofen- ção dos próprios defeitos ou pela
sas, transformando-se em quere- interpretação errônea dada às nos-
las graves, difíceis de solucionar, e sas palavras e ações, tornando-nos
que irão influir, negativamente, motivo de críticas inconsideradas
na convivência entre os indivíduos por parte dos conhecidos, dos ami-
no meio social, familiar, profissio- gos ou das afeições mais sinceras.
nal ou religioso, onde permane- Nossa alma sofre e se confrange,
cem, criando toda sorte de obstá- sem saber o que fazer para dirimir
culos para favorecer um relacio- a dor e o desapontamento de oca-
namento cordial e afável. Alguns siões como essas! Aconselha-nos o
preferem se tornar adversários Espírito Emmanuel, em uma de
uns dos outros e chegam ao cúmu- suas sábias lições:
lo de lutar entre si, de modo sub-
-reptício, com a intenção de enfra- Atingindo esse ponto ne-
quecer o oponente, ao se utiliza- vrálgico no caminho,
rem da difamação para atingir não te permitas o men-
os seus torpes objetivos. Infeliz- tiroso descanso no es-
mente, isso é mais comum do morecimento.
que se supõe. Os que assim agem Se trazes a consciên-
não recuam diante da infâmia, cia tranquila, entre
espalhando-a ao redor de todos: os limites naturais
de tuas obrigações
[...] Em consequência, quando ante as obrigações
o perseguido se apresenta nos alheias, ora pelos
lugares por onde passou o sopro que te censuram ou
do perseguidor, espanta-se de dar injuriam e prossegue
com semblantes frios, em vez de centralizando a pró-
fisionomias amigas e benevo- pria atenção no
lentes que outrora o acolhiam. desempenho dos
Fica estupefato quando mãos encargos que o
que se lhe estendiam, agora se Senhor te con-
recusam a apertar as suas. En- fiou, de vez
fim, sente-se aniquilado, ao ve- que o tempo
rificar que os seus mais caros é o juiz silen-
amigos e parentes se afastam e cioso de ca-
o evitam. [...]4 da um de
nós.5
É possível que venhamos a ser
submetidos por momentos de estu-
pefação quando julgados, da mes-
ma maneira, por falsas aparências,
resultado de comentários maldosos
em torno de nós, como se estivés-

Março 2012 • Reformador 87 9


Ao vivenciarmos situações como ver o mal quando ele existe. Certas conversações de escla-
essas, precisamos buscar condi- Fora mesmo inconveniente ver recimento exigem firmeza, sem
ções morais imprescindíveis para em toda parte só o bem. Seme- indecisão, mas o mal não deve pre-
vencer os obstáculos terrenos, sem lhante ilusão prejudicaria o pro- ponderar nas atividades verbais,
procurar acusar ou ferir os que gresso. O erro está no fazer-se ampliando-lhe a esfera de ação.
nos prejudicam e desanimam, que a observação redunde em É indispensável nos precavermos
pondo à prova a nossa paciên- detrimento do próximo, desa- da apreciação unilateral, pois não
cia. Cada Espírito, mormente creditando-o, sem necessidade, existe imperfeição completa ou
encarnado, colherá os bons efei- na opinião geral. Igualmente perfeição integral no plano ter-
tos de seu esforço, contribuindo repreensível seria fazê-lo alguém reno em que estagiamos. Desse
para a evolução e a felicidade de apenas para dar expansão a modo, quando o problema surgir
todos, ou criará sofrimento pa- um sentimento de malevolên- entre as criaturas, é razoável pro-
ra si se impedir que o bem seja cia e à satisfação de apanhar os curar a companhia do Mestre
praticado, procurando coibir a outros em falta. [...]7 para solucioná-lo à luz de seus
efusão das boas relações entre as ensinamentos.
pessoas. A autoridade moral daquele que
O Espírito São Luís, em res- censura deve apoiar-se no exem- Referências:
1
posta às perguntas formuladas plo do bem. “[...] Tornar-se alguém KARDEC, Allan. O evangelho segundo o
por Allan Kardec, dá-nos orienta- culpado daquilo que condena espiritismo. Trad. Guillon Ribeiro. 130. ed.
ção de como agir em certas situa- noutrem é abdicar dessa autori- 1. reimp. Rio de Janeiro: FEB, 2011. Cap.
ções nas quais seja necessário dade, é privar-se do direito de 10, it. 13, p. 191.
corrigir aqueles cuja tutela nos repressão. [...]”.8 Lições válidas, 2
CALLIGARIS, Rodolfo. Páginas de espiri-
foi confiada. Diz ele: sobretudo para os pais que pre- tismo cristão. 6. ed. 1. reimp. Rio de Ja-
cisam reprimir os filhos, a fim de neiro: FEB, 2011. Cap. 33.
3
[...] deveis fazê-lo com mode- que não adquiram vícios, desre- XAVIER, Francisco C. Instruções psicofôni-
ração, para um fim útil, e não, gramentos e péssimos hábitos. cas. Espíritos diversos. 9. ed. 3. reimp. Rio
como as mais das vezes, pelo Ao educá-los, porém, conseguem de Janeiro: FEB, 2009. Cap. 9, “Na esfera da
prazer de denegrir. Neste último primar na demonstração de uma palavra”, pelo Espírito André Luiz, p. 51.
4
caso, a repreensão é uma mal- boa conduta? Nem sempre: KARDEC, Allan. O evangelho segundo o
dade; no primeiro, é um dever espiritismo. Trad. Guillon Ribeiro. 130. ed.
que a caridade manda seja Dizer-lhes que não devem fu- 1. reimp. Rio de Janeiro: FEB, 2011. Cap.
cumprido com todo o cuidado mar, beber nem jogar, que de- 12, it. 9, p. 225.
possível. [...]6 vem ser recatados, honestos, 5
XAVIER, Francisco C. Rumo certo. Pelo
leais, verdadeiros etc., quando Espírito Emmanuel. 11. ed. 2. reimp. Rio
O preclaro Espírito comple- eles próprios fumam, bebem, de Janeiro: FEB, 2011. Cap. 11, p. 47-49.
6
menta o seu pensamento anali- jogam, transigem com a inde- KARDEC, Allan. O evangelho segundo o
sando o problema sobre a inicia- cência, enganam-se um ao ou- espiritismo. Trad. Guillon Ribeiro. 130. ed.
tiva de destacarmos as “imper- tro, falam mal das pessoas que 1. reimp. Rio de Janeiro: FEB, 2011. Cap.
feições dos outros, quando daí compõem seu círculo de ami- 10, it. 19.
7
nenhum proveito possa resultar zades, mentem deslavadamente, ______. ______. It. 20.
para eles”:7 violando a todo instante, as re- 8
______. ______. It. 13.
9
gras mais comezinhas do bom CALLIGARIS, Rodolfo. O sermão da mon-
Tudo depende da intenção. proceder, só pode dar nisso que tanha. 18. ed. 1. reimp. Rio de Janeiro: FEB,
Decerto, a ninguém é defeso vemos por aí.9 2010. Cap. “O argueiro e a trave”, p. 142.

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Entrevista L U I Z A L E O N T I N A A N D R A D E R I B E I R O

Vivência dos
postulados espíritas
Luiza Leontina Andrade Ribeiro, presidente da Federação Espírita do Estado
de Mato Grosso, faz considerações históricas e sobre a atualidade
do Movimento Espírita de seu Estado

Reformador: Como surgiu o Espi- cleos de estudos espíritas em Luiza: As ideias unificacionistas no
ritismo em Mato Grosso? Há Cen- Cuiabá em casas de famílias. Há, Movimento Espírita do país, em
tros antigos em funcionamento? arquivadas na Biblioteca Nacio- 1949, ano do Pacto Áureo, chegam
Luiza: A história do Espiritismo nal, 40 edições do jornal espírita a Mato Grosso, através do presiden-
em Mato Grosso tem seu marco A Verdade, que circulou em Cuia- te da FEB, Sr. Antônio Wantuil de
inicial na última década do século bá no final do século XIX e que Freitas que, naquele ano, manteve
XIX. Nesse período, a principal relatam a existência de algumas
via de transporte em nosso Estado sociedades espíritas fundadas na-
era a fluvial, pelos rios Cuiabá e quele período.
Paraguai e através da bacia do Prata. O Centro Espírita Cuiabá co-
Mato Grosso tinha comunicação memorou, em 2011, o seu centená-
direta não só com o litoral brasi- rio e continua em plena atividade.
leiro, mas também com o Exterior. Teve início em 1906, com estudos
Dessa forma, chega à cidade de no lar do italiano Rafael Verlan-
Cáceres, às margens do rio Para- gieri. Vianna de Carvalho, que mo-
guai, o espanhol Sr. Júlio Senderos rou em Cuiabá, participou ati-
y Palomares, trazendo consigo O vamente do Movimento Espíri-
Livro dos Espíritos. Ele reúne, no ta nesse período e, integrando-se
dia 30 de novembro de 1896, um ao grupo de trabalhadores espí-
grupo de obreiros para a funda- ritas da Capital, incentivou
ção de uma Associação, com a fi- a fundação desse
nalidade de estudar a Doutrina centro.
Espírita, o qual deu origem ao
Centro Espírita Mateus, que está Reformador: E
hoje com seus 115 anos, localiza- como ocorreu a
do na região Central da referida organização do
cidade, com várias atividades dou- Mov imento
trinárias. Em1893, já existiam nú- Espírita?
correspondência com espíritas Luiza: A Federação promove: en- lhante às reuniões das Comissões
mato-grossenses, lançando as pri- contros anuais de presidentes e vi- Regionais do CFN da FEB. No
meiras sementes sobre a ideia de se ces dos centros espíritas do Esta- sábado acontece uma reunião
criar uma entidade federativa no do, oportunidade em que trata- conjunta com todos os trabalha-
Estado. A Federação Espírita do Es- mos de assuntos importantes do dores, e, no domingo, reuniões es-
tado de Mato Grosso (FEEMT) foi Movimento Espírita em sintonia pecíficas por áreas. Cursos e se-
fundada na Convenção Espírita do com a reunião do CFN; reuniões minários nas áreas doutrinárias
Estado, em Campo Grande, em 14 do Conselho Federativo Estadual e administrativas são ministra-
de dezembro de 1956, tendo como que acontecem duas vezes por ano, dos nos centros espíritas pelos
presidente o Sr. Aristotelino Alves traçando diretrizes para o Movi- trabalhadores da Federação e das
Praieiro. Dois centros espíritas ti- mento Estadual; Caravanas fede- FEEMTs Regionais durante o ano;
veram relevante trabalho na fun- rativas da diretoria executiva para há, também, escalas de palestras
dação da Federação. Um foi a Fra- as regiões Centro, Sul, Norte, Leste, nos centros espíritas adesos.
ternidade Espírita Educandária, Oeste e Noroeste do Estado, onde
em Campo Grande, e o outro, na os facilitadores, em sintonia com Reformador: Como vocês imple-
Capital, Centro Espírita Cuiabá, o que acontece nas Comissões Re- mentam as Campanhas e temas
local onde a FEEMT funcionou até gionais e na Reunião do CFN, tro- definidos pelo CFN?
1995, quando construiu sua sede cam experiências com os traba- Luiza: As campanhas e temas
própria. Ao longo desses anos, a lhadores dos diversos centros do definidos pelo CFN, oriundos do
Federação vem exercendo sua fina- Interior; cursos de capacitação, trabalho unificado, têm sido di-
lidade doutrinária e administrativa, com o objetivo de qualificar dou- vulgados por todos os canais de
junto aos centros espíritas do Es- trinariamente o trabalhador nas integração com o trabalhador
tado. São órgãos constitutivos da diversas áreas de atuação do Cen- espírita e por todos os meios de
FEEMT: a Assembleia Geral, for- tro Espírita; Confraternização dos comunicação da FEEMT com o
mada pelos presidentes de centros Jovens Espíritas (Conjemat), no Movimento Espírita do Estado.
espíritas adesos, o Conselho Fede- período do carnaval. Em 2012 o Aproveitamos encontros como o
rativo Estadual, formado pelos evento será regionalizado e em de presidentes e vices, o momento
coordenadores gerais das FEEMTs 2013 a Conjemat será estadual; das Caravanas federativas e, tam-
Regionais, a diretoria executiva e o Projeto Espiritizar da FEEMT, por bém, os Encontros com os coor-
conselho fiscal, eleitos pela Assem- meio de seminários e videoaulas, denadores das FEEMTs Regio-
bleia Geral, e as FEEMTs Regionais. que têm, como norteadoras, as nas e reuniões do Conselho Fe-
Com o crescimento do Movimen- obras básicas kardequianas, as derativo Estadual, estas formadas
to Espírita unificado e a sua matu- quais cooperam em profundida- por coordenadores de FEEMTs
ridade, inicia-se, em agosto de 2010, de, com as atividades doutrinárias Regionais, as quais acontecem duas
o processo de instalação das FEEMTs dos centros espíritas; jornal Mato vezes por ano. Nesses espaços de
Regionais, que são as unidades Grosso Espírita, que está de volta convivência procuramos sensibi-
regionais da FEEMT. Hoje, já são com matérias e importantes arti- lizar as lideranças do Movimen-
20 delas instaladas, fortalecendo e gos doutrinários, alcançando o tra- to Espírita para a importância
ampliando o Movimento e esti- balhador espírita de todo o Estado. do trabalho unificado e capaci-
mulando a formação de novos tá-los para as campanhas defini-
centros espíritas. Reformador: Como vocês atuam das pelo CFN.
junto aos centros do Interior?
Reformador: Quais são as principais Luiza: Através de seis caravanas Reformador: Há programações
linhas de atuação da Federação? federativas, cujo modelo é seme- mais abrangentes para este ano?

12 90 Reformador • Março 2012


Luiza: Além das atividades habi-
tuais, que realizamos todo ano nas
diversas regiões do Estado, temos
promovido, no mês de fevereiro,
A prece de Kardec
trabalhos doutrinários com Divaldo “Senhor! pois que te dignaste lançar os olhos sobre mim
Pereira Franco nas várias regiões para cumprimento dos teus desígnios, faça-se a tua vontade!”
do Estado e na Capital. No mês de Allan Kardec
julho teremos a Confraterniza-
ção dos Espíritas de Mato Grosso Mário Frigéri
(Conemat), realizada a cada dois
anos, em uma cidade do Interior, Senhor de infinda bondade!
reunindo os trabalhadores espí- Que sobre mim teu olhar
ritas do Estado. Além da confra- Te dignaste pousar...
ternização, a Conemat tem uma Faça-se a tua vontade!
profícua atividade doutrinária.
Este ano o evento acontece em Malgrado a insuficiência
Barra do Garças, quando tere-
De minhas forças, Senhor,
mos a presença de vários exposi-
Deposito em teu amor
tores convidados.
A minha humilde existência.
Reformador: Comentários finais ou
mensagem para o leitor. Talvez as forças me faltem...
Luiza: Queremos lembrar Allan Mas minha boa vontade
Kardec, o nobre Codificador, nos Não fraquejará e há de
esclarecendo que esses são dias, Congregar os que te exaltem!
nos quais o Espiritismo contribui-
ria para a renovação social. Então, Nas graves lides diárias
nesses instantes de transição pla- Peço-te as forças reais
netária, quando já contamos com
– As físicas e as morais –
um conteúdo doutrinário profun-
Que me forem necessárias!
do, que possamos refletir, indo um
pouco mais além do conhecimen-
to, conscientizando-nos do nosso Bem sei que a tarefa é imensa!...
real dever, num sentimento de gra- Mas tendo a tua presença
tidão a Deus, por tudo que temos E a de teus anjos celinos,
recebido em benefício do Espírito
imortal que somos. Aprofundan- Tudo envidarei, Senhor,
do na vivência dos postulados es- Para cumprir com rigor
píritas, deixando-nos conduzir pe- Os teus desígnios divinos!
lo ideal fidedigno que consolidou
a tarefa dos primeiros cristãos, Fonte de consulta e Epígrafe: KARDEC, Allan. Obras póstumas. Trad. Guillon
adquirindo novos paradigmas que Ribeiro. 40. ed. 3. reimp. Rio de Janeiro: FEB, 2010. P. 2, Minha missão, p. 314-
contribuirão para este momento de -315.
espiritualização da Humanidade.

Março 2012 • Reformador 91 13


Aprendizado
incessanteRICHARD SIMONETTI

E
m várias oportunidades um que ninguém está aqui em jornada Isso costuma acontecer com o
confrade fez uma enquete de férias. homem comum, muito preocu-
com a seguinte pergunta: O resultado dessa displicência pado com o próprio bem-estar,
é o comportamento materialis- nada interessado em questões
O que está você fazendo na Terra? ta, o comer, vestir, dormir, trabalhar, que ultrapassem os limites do
procriar, divertir-se, em lamentá- imediatismo.
Espantosamente, a maioria não vel marca-passo espiritual. Onde passar o feriado prolon-
soube responder. A Doutrina Espírita explica gado, como pagar o cartão de cré-
Significa que considerável par- que não há retrocesso para o Es- dito estourado, questionar a con-
cela da Humanidade não sabe pírito. Nossos patrimônios inte- tratação de um jogador de fute-
nem cogita saber por que cargas lectuais, morais e espirituais, ja- bol, escolher a marca de cerveja,
d’água estamos neste bólido celes- mais se perdem. acompanhar a novela de desta-
te que é a Terra, viajando à veloci- Por concessão da Bondade Di- que, criticar o governo…
dade vertiginosa de 108 mil quilô- vina, o que somos hoje, fruto de Esses são alguns dos temas
metros por hora em torno do Sol. nossas aquisições no pretérito, ao que centralizam suas cogitações,
Pior: não se preocupa com sua longo dos milênios, é inalienável. sem tempo nem espaço para al-
ignorância! Construímos um patrimônio que go menos prosaico, mais metafí-
Está aí uma das razões pelas está guardado nos arquivos do in- sico, por exemplo, definir como
quais poucos aproveitam integral- consciente, a repercutir em nosso veio parar nesse atribulado pla-
mente as oportunidades de edifica- comportamento, maneira de ser, neta.
ção que a reencarnação nos oferece. vocação, aptidões…

Se nem mesmo sabem por que O problema é o estacionamen-
nasceram, por que vivem, e o to, o interromper o processo evo- Diz Montaigne (1533-1592):
que vai lhes acontecer portas aden- lutivo com a inércia, a ausência de
tro do túmulo, fica difícil cumprir iniciativa, de empenho por apren- O proveito dos estudos consiste
os objetivos da jornada humana, a der, crescer, conquistar novos pa- em nos tornarmos melhores e mais
partir do princípio elementar de tamares. sábios.

14 92 Reformador • Março 2012


O grande escritor francês estava exercita sua condição, negligen- Isso só o Espiritismo pode fazer
certíssimo. ciando a sapiência, visão compro- por nós, mostrando-nos uma am-
O empenho de aprender e des- metida pela ignorância, a tropeçar pla visão do mundo espiritual,
dobrar conhecimentos, alarga nos- em suas próprias mazelas. onde está nossa verdadeira pátria.
sos horizontes, desenvolve nossa Não obstante, não basta o co- Conscientiza-nos a Doutrina
capacidade de percepção, faz-nos nhecimento. de que somos seres imortais, des-
crescer em inteligência, cultura e Há muita gente de grande cul- tinados à perfeição, no desdobrar
entendimento, para que a jornada tura precipitando-se nos resvala- de incontáveis existências neste
humana não seja para nós um douros do vício, do materialis- mundo e em outros, convocados
exercício de estagnação. mo, da corrupção, da violência, da ao aprimoramento incessante.
E há um detalhe ponderável, maldade… Sobretudo, ficamos sabendo
decorrente do comportamento A cultura mal orientada é tão que sem esse esforço estaremos
estacionário: imaginemos alguém ou mais perniciosa do que a igno- resvalando para a estagnação, on-
atravessando uma selva sem co- rância. de sempre proliferam a indiscipli-
nhecer a topografia da região, a Por isso, se é importante estu- na, o vício, o desregramento, de
extensão da mata, as fontes de dar, aprender as coisas do mundo funestas consequências.
água… em que vivemos, como recomen- Por isso, é bom estarmos atentos
Viagem atribulada, difícil, peri- da Montaigne, igualmente impor- à máxima atribuída a Allan Kardec:
gosa. tante é conhecer as coisas do mundo
É exatamente o que acontece para onde iremos quando bater- Nascer, morrer, renascer ainda e
com o homo sapiens, quando não mos as botas. progredir sempre, tal é a lei.

Março 2012 • Reformador 93 15


A fórmula
“quase mágica”
da confiança
GERALDO CAMPETTI SOBRINHO

A
confiança constitui a base de Só serei confiável a alguém e tência da confiança. Jamais confiare-
um relacionamento feliz. confiarei em outro, se tornar-me mos em uma pessoa antiética. Assim
Em nossa vida, intera- acreditável ou perceber que ou- também não conquistaremos a con-
gimos com o semelhante o tempo trem é passível de credibilidade. fiança de outrem agindo sem ética.
todo, direta ou indiretamente. Em Caso contrário, não há confiança. Porém, confiança é mais que cre-
decorrência da característica de A credibilidade envolve pelo me- dibilidade. É também afinidade.
sociabilidade inerente à natureza nos três requisitos imprescindíveis: o A afinidade exige três condições:
humana, é compreensível a neces- conhecimento, a experiência e a ética. simpatia, convivência, amizade.
sidade de convivência com os ou- O conhecimento é adquirido pelo Quando nos simpatizamos com
tros para que o processo evolutivo estudo, pesquisa, busca, observa- alguém ou vice-versa, a confiança
se efetue. Por meio das relações ção, reflexão. Tendemos a confiar é fácil de ser estabelecida. Há uma
sociais, desenvolvemos as habili- em alguém que sabe, conhece, do- aproximação espontânea, seja por
dades de comunicação, interação mina o assunto. Sentimo-nos se- semelhança de gostos, seja por iden-
e compreensão do próximo na si- guros e mais tranquilos diante de tificação de ideias.A simpatia facilita-
tuação em que ele se encontra. A alguém especialista na área e que rá a empatia em que nos colocamos
alteridade torna-se indispensável se expressa com propriedade. no lugar do outro e tendemos a en-
para quem deseja seguir o curso A experiência advém da prática, xergar e socorrer suas necessidades.
natural de sua evolução. do exercício, da repetição, da vivên- Seria bom se a simpatia ocorresse
Todavia, a confiança não é virtude cia. Também temos mais facilidade naturalmente entre todos. Mas, não
fácil de conquistar. Nem ao que pre- em confiar em alguém que tem ex- é assim que acontece na realidade.
tende se tornar digno dela nem para periência, já viveu a situação ora en- Allan Kardec, em sua sabedoria
quem almeja confiar em alguém. frentada, aprendeu a lição. Pressu- orientada pelos Espíritos superiores,
Em certa oportunidade, aprendi põe-se intuitivamente que quem já tratou da questão em O Evangelho
a fórmula “quase mágica”1 da con- atravessou uma experiência dolo- segundo o Espiritismo, quando en-
fiança. Veja como é simples essa rosa saberá lidar com outra seme- sina que não teremos o mesmo
questão, para não dizer o contrário: lhante que surgir no caminho. O in- nível de afinidade para com todo
Confiança é igual à credibilidade. divíduo experto estaria, assim, mais mundo. Esclarece o Codificador:
apto a enfrentar a contingência e
1
lidar com segurança ante o desafio. A diversidade na maneira de sen-
Fórmula apresentada pelo Prof. Aldo Hon-
A ética na abordagem platônica – tir, nessas duas circunstâncias
da, em curso institucional ministrado pela
Fundação Dom Cabral, na cidade de Bra- da busca da verdade, do bem e do diferentes [diante de um inimigo
sília, em 2009. amor – é indispensável para a exis- e na companhia de um amigo],

16 94 Reformador • Março 2012


resulta mesmo de uma lei física:
a da assimilação e da repulsão
dos fluidos. [...]2

Isso, porém, não nos deve esti-


mular ao distanciamento daqueles
a quem não estimamos, ou sobre-
tudo que não nos causam boa im-
pressão à primeira vista. A convivên-
cia pode mudar tudo. Ao conhecer
mais adequadamente uma pessoa
que não nos foi agradável num pri-
meiro momento, podemos nos
surpreender em reconhecer, após
algum tempo de contato, que aquele
indivíduo não é nada daquilo que
havíamos imaginado inicialmente Porém, para termos confiança sobretudo daqueles que respeitamos
quando ele nos causou má impres- em alguém isso ainda não é sufi- como Espíritos superiores, esperan-
são. A afinidade, portanto, desenvol- ciente. Precisamos considerar o di- çosos em exercitar a confiança em
ve-se, em muitos casos, pela relação videndo. Ele poderá colocar a per- nós outros, transeuntes ainda vaci-
que estabelecemos com o próximo, der tudo o que foi dito até agora. lantes na jornada evolutiva.
quando o conhecemos de perto. Não podemos nos esquecer dos Se não fosse o aval desses ben-
A amizade é fundamental para a riscos. Se estes estiverem presentes, feitores, provavelmente não estaría-
confiança. Se não for amigo, dificil- a confiança ficará abalada. mos aqui outra vez desfrutando de
mente confiaremos em alguém. Daí Em resumo: nova oportunidade de aprendizado.
o companheirismo, quando obser-

vamos que, no enfrentamento dos Confiança = credibilidade + afinidade
momentos mais difíceis da vida, po- riscos Apenas para que a sensação de in-
demos contar com os amigos. Eles completude não nos domine, como
nunca nos abandonam.Assim como Observemos, então, que con- sói acontecer toda vez que redigimos
não abandonamos nossos amigos. fiança é o somatório de credibili- algumas linhas em tão pouco espaço,
A afinidade se estabelece natural- dade e afinidade, dividido pelos cabe-nos acrescer uma reflexão so-
mente, ou após algum tempo de con- riscos. Confiança é, portanto, in- bre a definição de confiança à luz
vivência, fortalecendo os laços de versamente proporcional aos ris- do Espiritismo aliada ao conceito de
união e garantindo um apoio re- cos. Quanto maior a confiança, fé. É André Luiz que nos alerta:
cíproco sempre que necessário e o menores os riscos. Quanto maiores
compartilhar dos instantes mais feli- os riscos, menor a confiança. A confiança não é um néctar
zes ofertados pela existência terrena. Riscos, menores ou maiores, para as suas noites de prata. É
Confiança é, pois, igual ao soma- sempre correremos em nossa vida. refúgio certo para as ocasiões
tório de credibilidade e afinidade. Quem pretende fazer algo está su- de tormenta.3
jeito ao risco. O que nos cabe é fazer
2 a gestão sobre os riscos, minimizan- 3
KARDEC,Allan. O evangelho segundo o espi- XAVIER, Francisco C. Agenda cristã. Pelo
ritismo.Trad.Guillon Ribeiro.130. ed.1.reimp. do os seus impactos e procurando Espírito André Luiz. 5. reimp. Rio de
Rio de Janeiro: FEB, 2011. Cap. 12, it. 3. ampliar o espectro da confiança, Janeiro: FEB, 2010. Cap. 29.

Março 2012 • Reformador 95 17


Ações pioneiras dos
movimentos cristão e espírita
A N TO N I O C E S A R P E R R I DE C A RVA L H O

A
s efemérides das publicações tos, meu filho. Ninguém se dimi- também apresentam um aspecto
de Paulo e Estêvão (70 anos nuirá por ser bom e tolerante. muito especial; todas as fisiono-
em julho) e de Viagem Espí- Quanto à providência mais dig- mias refletem a franqueza e cor-
rita em 1862 (150 anos em dezem- na, cabível no caso, é conceder dialidade; nós nos sentimos à
bro) merecem estudos e reflexões liberdade a todos eles.1 vontade nesses ambientes sim-
com vistas à transposição às situa- páticos, verdadeiros templos da
ções de vida e à aplicação para a Anota Kardec: fraternidade [...].4
realidade atual.
Os dois livros têm foco em via- Em caso de dissidência, aquele que Sobre o episódio da pitonisa de
gens, com diferenças de abrangência crer estar com a razão deverá pro- Filipes,considerada um oráculo infa-
espacial e de duração temporal: em vá-lo, sendo mais caridoso e mais lível e que mercantilizava seus dons:
Paulo e Estêvão, o autor espiritual benevolente. O erro estará, eviden- “Paulo, que nunca se conformou
rememora a epopeia da trajetória temente, com aquele que dene- com a mercancia dos bens celestes,
de Paulo, o notável divulgador que grir o outro e atirar-lhe a pedra.2 percebeu o mecanismo oculto dos
com suas muitas viagens concreti- acontecimentos e, senhor de todos
zou a disseminação do Cristianis- Emmanuel considera que “A insti- os particulares do assunto, esperou
mo; em Viagem Espírita em 1862, tuição de Antioquia era, então, mui- que o visitante do invisível nova-
Allan Kardec relata suas experiên- to mais sedutora que a própria igre- mente aparecesse” e o admoestou:
cias de contatos diretos com os pri- ja de Jerusalém. Vivia-se ali num
meiros centros, caracterizando a ambiente de simplicidade pura, sem [...] por amor ao Evangelho; em
primeira ação concreta de Movi- qualquer preocupação com as dispo- nome de Jesus Cristo ordeno que
mento Espírita. Respeitadas as dife- sições rigoristas do judaísmo [...]”.3 te retires para sempre! Proíbo-te,
renças, ambos visitaram, apoiaram, O Codificador relata sua experiência: em nome do Senhor, estabele-
orientaram e estimularam a forma- ceres confusão entre as criaturas,
ção de agremiações pioneiras. [...] recolhemos exemplos admi- incentivando interesses mesqui-
Analisemos as duas obras que ráveis de zelo, abnegação e de- nhos do mundo em detrimento
focalizam assuntos muito pertinen- votamento, numerosas demons- dos sagrados interesses de Deus!
tes aos trabalhadores espíritas de trações de caridade verdadeira- Imediatamente a pobre rapariga
nossos tempos. Para conciliar a in- mente evangélica que, com justa recobrou energias e libertou-se
dulgência com a necessidade de re- razão, poderíamos chamar: Belos da atuação malfazeja.5
primir o mal, assevera Gamaliel: traços do Espiritismo. As reuniões
compostas exclusivamente de Oportunos os comentários de
– Toda a autoridade é de Deus. verdadeiros e sinceros espíritas, Ismael Gomes Braga por ocasião
Nós somos simples instrumen- daqueles nos quais fala o coração, do lançamento de Paulo e Estêvão:

18 96 Reformador • Março 2012


[...] Paulo de Tarso trabalhava co- de espiritualidade. Em noites de- tante pisar o pé da vaidade ferida,
mo tecelão e Ananias como oleiro. terminadas, havia fenômenos há sempre mal-estar, constrangi-
[...] Os pregadores, os trabalha- de “vozes diretas”. A instituição de mento e desconfiança. [...]9
dores, os servidores da doutrina Antioquia foi um dos raros cen-
devem dar o exemplo de exercer tros apostólicos onde semelhan- As linhas de atuação dos primei-
uma profissão e nada receber pe- tes manifestações chegaram a atin- ros cristãos são destacadas: “[...]
los serviços que prestem à doutri- gir culminância indefinível. A fra- nossos serviços junto dos desfavo-
na, ou por intermédio da dou- ternidade reinante justificava es- recidos da sorte, para que os segui-
trina aos seus irmãos em huma- sa concessão do Céu. Nos dias dores do Evangelho, no futuro, não
nidade. Livre-nos Deus do profis- de repouso, a pequena comuni- se arreceiem das situações mais difí-
sionalismo em Espiritismo! [...]6 dade organizava estudos evangé- ceis e escabrosas, conscientes de que
licos no campo. A interpretação os mensageiros do Mestre os assis-
Prosseguindo sobre a pitonisa, dos ensinos de Jesus era levada tirão, sempre que se tornem instru-
indagou Silas: “– Todavia, será o a efeito em algum recanto ame- mentos legítimos da fraternidade
incidente uma lição para não en- no e solitário da Natureza [...].8 e do amor, ao longo dos caminhos
tretermos relações com o pla- que se desdobram à evolução da
no invisível?”.7 Ao que Paulo Humanidade”,10 concluindo
respondeu: Emmanuel: “A igreja tornou-
-se venerável por suas obras
– Como pudeste chegar a de caridade [...]”.11
semelhante conclusão? [...] De forma coerente orienta
O Cristianismo sem o pro- Kardec: “[...] Pela prática da
fetismo seria um corpo verdadeira caridade reconhe-
sem alma. Se fecharmos a cereis sempre um irmão, ainda
porta de comunicação com que não seja espírita, e deveis
a esfera do Mestre, como estender-lhe a mão, porquan-
receber seus ensinos? [...] to, se ele não partilha de vossas
Ninguém poderá fechar as crenças, nem por isso deixará
portas que nos comunicam de ser para vós menos bene-
com o Céu. O Cristo está volente e tolerante”,12 e comple-
vivo e nunca morrerá. [...]7 menta: “Fundai, então, uma socie-
dade sobre as bases da fraternidade,
E ainda citou as aparições do com ideias semelhantes! [...]”.13
Cristo depois do Calvário, no Pen- Sobre a homogeneidade nas ins- A valorização das pessoas e dos
tecostes, até mesmo quando o cha- tituições Kardec observa: colaboradores é ponderada por
mou às Portas de Damasco, e na Emmanuel:
libertação de Pedro, no cárcere.7 [...] Naquelas, ao contrário, em
que há divergência de sentimen- A existência humana é bem uma
A prática da mediunidade merece tos, onde as intenções não são in- ascensão das trevas para a luz. A
outras observações de Emmanuel: teiramente puras, em que se nota juventude, a presunção de auto-
o sorriso sardônico e desdenhoso ridade, a centralização de nossa
[...] A união de pensamentos em em certos lábios, onde se sente o esfera pessoal, acarretam muitas
torno de um só objetivo dava en- sopro da malquerença e do orgu- ilusões, laivando de sombras as
sejo a formosas manifestações lho, em que se teme a cada ins- coisas mais santas. [...]14

Março 2012 • Reformador 97 19


3
O assunto é claro para o Codi- pulos viriam do Oriente e do XAVIER, Francisco C. Paulo e Estêvão. P.
ficador: Ocidente.18 2, cap. 4, p. 342.
4
KARDEC, Allan. Viagem espírita em 1862
[...] nenhum entrave se oponha E Kardec vaticina: e outras viagens de Kardec. Cap. Impres-
à propagação dessas ideias entre sões gerais, p. 35-36.
os seus subordinados.15 [...] o Espiritismo será o traço de 5
XAVIER, Francisco C. Paulo e Estêvão. P.
união que aproximará os ho- 2, cap. 6, p. 444-445.
6
[...] Os que vissem os outros mens divididos pelas crenças e BRAGA, Ismael Gomes. Mais um livro pa-
com olhos ciumentos prova- pelos preconceitos mundanos; ra o futuro. In: Reformador, ano 60, p. 16
riam, só por isso, que estão sob ele derrubará as mais fortes (108)-17(109), mai. 1942.
7
má influência, desde que o Es- barreiras que separam os po- XAVIER, Francisco C. Paulo e Estêvão. P.
pírito do bem não pode produ- vos: o antagonismo nacional. À 2, cap. 6, p. 446.
8
zir o mal. Como bem o sabeis, sombra dessa bandeira, que se- ______. ______. P. 2, cap. 4, p. 342.
9
reconhece-se a árvore pelos rá o seu ponto de concentração, KARDEC, Allan. Viagem espírita em 1862
seus frutos. Ora, o fruto do or- os homens se habituarão a ver e outras viagens de Kardec. Cap. Impres-
gulho, da inveja e do ciúme é irmãos naqueles que só viam sões gerais, p. 36.
um fruto envenenado que mata como inimigos. [...]19 10
XAVIER, Francisco C. Paulo e Estêvão.
quem dele se nutre.16 P. 2, cap. 8, p. 537.
11
Interessante que, em outra obra, ______. ______. P. 2, cap. 4, p. 343.
12
E ainda destaca sobre o Espiri- comenta o Codificador: KARDEC, Allan. Viagem espírita em 1862 e
tismo: outras viagens de Kardec. Cap. Introduções
[...] A luz nova não constitui pri- particulares dadas aos grupos em resposta
[...] sua influência é uma garan- vilégio de nenhuma nação; para a algumas questões propostas, p. 111.
13
tia de segurança para as relações ela não existem barreiras, tem o ______. ______. Cap. Discursos pronun-
sociais, por ser o mais poderoso seu foco em toda a parte e todos ciados nas reuniões gerais dos espíritas
freio às más paixões, às eferves- os homens são irmãos. [...]20 de Lyon e Bordeaux, p. 73.
14
cências desordenadas, mostrando XAVIER, Francisco C. Paulo e Estêvão.
o laço de amor e de fraternidade A coerência entre as duas obras P. 2, cap. 8, p. 498.
15
que deve unir o grande ao pe- históricas na visão sobre os traba- KARDEC, Allan. Viagem espírita em
queno e o pequeno ao grande. lhadores pode ser culminada com 1862 e outras viagens de Kardec. Discur-
Fazei, pois, por vosso exemplo a evocação do Mestre: “Eu, porém, sos pronunciados nas reuniões gerais dos
que logo se possa dizer: Praza a no meio de vós, sou como aquele espíritas de Lyon e Bordeaux, p. 99.
Deus que todos os homens se- que serve”.21 16
______. ______. p. 101.
jam espíritas de coração!17 17
______. ______. p. 99-100.
Referências: 18
XAVIER, Francisco C. Paulo e Estêvão.
1
Significativa é a visão sobre a XAVIER, Francisco C. Paulo e Estêvão. Pelo P. 2, cap. 4, p. 352.
19
abrangência da difusão e a origem Espírito Emmanuel. 4. ed. esp. 4. reimp. Rio KARDEC, Allan. Viagem espírita em 1862
dos trabalhadores: de Janeiro: FEB, 2010. P. 1, cap. 7, p. 151. e outras viagens de Kardec. Discursos pro-
2
KARDEC, Allan. Viagem espírita em 1862 nunciados nas reuniões gerais dos espíri-
– Suponho que o Cristianismo e outras viagens de Kardec. Trad. Evandro tas de Lyon e Bordeaux, p. 104.
20
não atingirá seus fins, se espe- Noleto Bezerra. 2. ed. 2. reimp. Rio de Ja- ______. O evangelho segundo o espiritis-
rarmos tão só dos israelitas an- neiro: FEB, 2011. Cap. Projeto de Regula- mo. Trad. Evandro Noleto Bezerra. 1. reimp.
quilosados no orgulho da Lei. mento para uso dos grupos e pequenas Rio de Janeiro: FEB, 2010. Cap. 24, it. 10.
21
Jesus afirmou que seus discí- sociedades espíritas, p. 143. LUCAS, 22:27.

20 98 Reformador • Março 2012


Esf lorando o Evangelho
Pelo Espírito Emmanuel

Busquemos
a luz
“Toda escritura inspirada por Deus é proveitosa... para instrução na justiça.”
– PAULO. (II TIMÓTEO, 3:16.)

P
ocura a ideia pelo valor que lhe é próprio.
Quando a moeda comum te vem às mãos, não indagas de onde proveio.
Ignoras se procede da casa de um homem justo ou injusto, se esteve, antes,
a serviço de um santo ou de um malfeitor.
Conhecendo-lhe a importância, sabes conservá-la ou utilizá-la, com senso práti-
co, porque aprendeste a perceber nela o selo da autoridade que te orienta a luta
humana.
O dinheiro é uma representação do poder aquisitivo do governo temporal a que
te submetes e, por isso, não lhe discutes a origem, respeitando-o e aproveitando-o,
na altura das possibilidades com que se apresenta.
Na mesma base, surgem as ideias renovadoras e edificantes.
Por que exigir sejam elas subscritas, em sua exposição, por nossos parentes ou
amigos particulares, a fim de que produzam o efeito salutar que esperamos delas em
nós e ao redor de nós?
Toda página consoladora e instrutiva é dádiva do Alto.
Não importa que os pensamentos nela corporificados tenham vindo por inter-
médio do espírito de nossos pais terrestres ou de nossos filhos na carne, de nossos
afeiçoados ou de nossos companheiros.
O essencial é o proveito que nos possa oferecer.
O dinheiro com que adquires o pão de hoje pode ter passado ontem pelas mãos
do teu adversário maior, mas não deixa de ser uma bênção para a garantia de tua
sustentação, pelo valor de que se reveste.
Assim também, a mensagem de qualquer procedência, que nos induza ao bem ou
à verdade, é sempre valiosa e santa em seus fundamentos, porque, usando-a em
nossa alma e em nossa experiência, podemos adquirir os talentos eternos da
sabedoria e do amor, por tratar-se de recurso salvador nascido da infinita mise-
ricórdia de nosso Pai Celestial.
Busquemos a luz onde se encontre e a treva não nos alcançará.
Fonte: XAVIER, Francisco C. Fonte viva. ed. esp. 3. reimp. Rio de Janeiro: FEB, 2011. Cap. 121.

Março 2012 • Reformador 99 21


Temor da
morte Y VO N N E DO AMARAL PEREIRA1

U
ma prezada irmã, residente tamento! É preciso que a irmã se do respeito a Deus e suas leis, bem
em Brasília, minha corres- capacite de que a morte é um fato como da fraternidade para com o
pondente, escreveu-me carta tão natural em nossa vida como o próximo, nossos irmãos de Huma-
melancólica, queixando-se de males é o nascimento do Sol no Oriente, nidade. Necessariamente, se apenas
físicos, talvez sérios, e declarando todos os dias, e o seu ocaso, todas habitamos a Terra por determina-
que, sendo mãe de dez filhos, teme as tardes, no Ocidente. do tempo, se não é ela a verdadei-
a morte em vista da orfandade em Em verdade a morte não existe ra pátria do Espírito, nosso ser real,
que os deixará, e ainda porque ig- em parte alguma. Se o Sol desapa- e sim o além-túmulo, esse Infinito
nora o que a espera no Além, as rece no Ocidente e sobrevém a noi- sideral, havemos de, um dia, aban-
decepções, os erros que ali poderá te, doze horas depois ele ressurge donar o nosso corpo material à
deparar. Pede-me consolo e escla- no Oriente tão vivo, brilhante e Terra, de onde ele se origina, por-
recimentos, uma vez que me su- belo como nos dias anteriores. Se que esse corpo não tem entrada
põe espírita trabalhador. a semente, lançada à terra, apa- no Além, para vivermos a vida ver-
Minha irmã, o que, em primei- rentemente apodrece e morre, dadeira e imortal, que é a vida espi-
ro lugar, devo lhe aconselhar, o dias depois germina, floresce e ritual, a nossa vida normal. A mor-
de que será urgente tratar, antes de frutifica no esplendor dos jardins te, portanto, é apenas isto: uma fa-
tudo, é da recuperação da sua saú- e das searas, fornecendo vida e se nova do nosso ser real, que é o
de. E isso a irmã poderá conse- alegria para todos os seres viven- nosso Espírito, a nossa alma.
guir, certamente, perseverando tes. O mesmo sucede, pela morte, Nada há na morte que nos pos-
com o tratamento médico, esfor- a todos nós, homens e mulheres. sa atemorizar, causar horror. O te-
çando-se por combater esse incô- A Terra, planeta chamado de mor da morte foi criado pela teo-
modo do temor da morte, que al- “provas e expiações”, onde habita- logia das diversas religiões, que
tera o seu sistema nervoso, produ- mos temporariamente, não é a nos- nos falam de fogos eternos supli-
zindo um desequilíbrio que, em sa habitação verdadeira ou defini- ciando as almas sem remissão, de
absoluto, não auxiliará o seu tra- tiva. Nela apenas reencarnamos a demônios e castigos que nos tor-
fim de que o nosso Espírito possa turam pelas menores falhas, co-
1
Artigo inédito, gentilmente cedido por fa- progredir, evoluindo penosamen- metidas às vezes pela ignorância
miliares da médium, assinado com o pseu- te para libertar-se de suas imperfei- secular em que vivem os homens
dônimo Frederico Francisco, agora publi-
ções, seus instintos inferiores atra- a respeito dos assuntos de Deus.
cado por ocasião da passagem do 28o
aniversário de sua desencarnação, ocorri- vés dos testemunhos da dor, do tra- Por sua vez, os artistas de todos os
da em 9 de março de 1984. balho e, acima de tudo, do amor e tempos, desejando engrandecer as

22 100 Reformador • Março 2012


religiões, envolveram a morte em sas de encarnações passadas. Ela é é realidade e não existem fantasias,
longos sudários negros, com as- a liberdade, o consolo e a esperan- nem suposições, nem sofismas.
pecto sinistro de esqueleto com ça após as trevas do cativeiro, do A Doutrina dos Espíritos, ex-
uma foice nas mãos, símbolo infe- amargor das humilhações sofri- posta por Allan Kardec, é a única
rior daquilo que, em verdade, não das, da injustiça após as lutas pelo fonte de verdadeiros esclarecimen-
conhecem ou não conheciam. As direito; é o alívio e a alegria pe- tos que possuímos sobre o que nos
cerimônias fúnebres, em home- lo reencontro, na Pátria Espiritual, espera além da morte e como de-
nagem aos que deixaram este com aqueles a quem amamos correm os nossos últimos momen-
mundo, não são menos assusta- e que partiram antes de nós. A tos neste mundo. Ilustres sábios,
doras. Apesar do progresso que morte só não será benigna para filósofos, pesquisadores dos no-
vem abolindo tais cerimônias, ou suicidas, que abreviaram a exis- bres assuntos da alma humana e
das dificuldades financeiras da tência terrestre, com deplorável seus destinos obtiveram informa-
atualidade, porque tais cerimô- desrespeito a Deus e suas Leis; pa- ções seguras sobre o magno pro-
nias custam muito dinheiro, vía- ra os traidores, os criminosos de blema das próprias almas dos de-
mos no passado e ainda contem- qualquer espécie, os homicidas, os funtos, as quais, em circunstân-
plamos nas sociedades mais con- que viveram do mal e para o mal, cias especiais, o revelaram aos ho-
servadoras, rodeando o corpo iner- os que abusaram do próprio livre- mens em todas as partes do mundo e,
te, de onde a alma evolou-se, lon- -arbítrio tornando-se flagelos do não só expuseram a elevada dou-
gos crepes negros enfeitados de próximo, provocadores de desor- trina da Espiritualidade como infor-
amarelo, as cores chamadas dos dens sociais, de guerras etc., etc. maram aos homens justamente
mortos, meias luzes impressio- Mas o indivíduo que dirigiu sua sobre os fatos que a prezada irmã
nantes, cânticos lamentosos que, existência normalmente, o bom, o deseja saber a fim de conhecer os
efetivamente, só podem impres- honesto, o simples, que cumpriu segredos da morte. Além de Allan
sionar negativamente as almas tí- o próprio dever, o que procurou Kardec, citado em sua carta, o
midas, ignorantes do verdadeiro servir ao bem, o justo, o caridoso qual foi o missionário convocado
ensinamento sobre o grande, ma- etc., etc. esses nada terão que te- pelo Alto para reunir em códigos
jestoso problema da vida e da mor- mer, porque a própria consciência as exposições dos grandes Es-
te. Mas a morte nada disso é. A não os acusará ao penetrarem nas píritos que revelaram a Doutrina,
morte é sim a libertação de um esferas da vida real, isto é, no plano
Espírito aprisionado na carne, so- invisível ou espiritual, onde tudo
frendo, muitas vezes, a fim de ex-
purgar faltas cometidas nesta exis-
tência mesma ou em etapas diver-

Março 2012 • Reformador 101 23


sob os auspícios do Mestre por No caso de que se trata, velava o criminoso, o ímpio, esse será,
excelência – Jesus Nazareno, ou- ele à cabeceira de um moribun- certamente, um momento terrível,
tros eminentes vultos, dedicados do, tipógrafo de profissão. vendo-se diante de si mesmo, ten-
nos mesmos trabalhos de pesqui- O agonizante se extinguia aos do a consciência a mostrar-lhe tal
sas, obtiveram dos Espíritos reve- poucos, havia já meia hora. A qual é, como dirigiu a própria vi-
lações, informações, testemunhos respiração, cada vez mais opres- da. Muitas vezes sobrevém-lhe o
precisos de como se realiza a nos- sa, tinha-se tornado muito len- horror, e sofre. Há também, após
sa passagem deste para o outro pla- ta e difícil. Enfim, chegou o mo- o desenlace, o sono reparador, que
no da vida. Dentre tantos, um es- mento em que o velador o jul- pode ser breve e realmente tran-
pecializou-se no exame dos aconte- gou morto. De repente, porém, quilizador, depois do qual o Espí-
cimentos verificados nos últimos suas pálpebras se reabriram, rito desperta lúcido e revigorado
momentos daqueles que deixaram animadas com expressão de para a vida espiritual; ou longo, re-
a vida material: Ernesto Bozzano, grande surpresa, como se ele ti- pleto de pesadelos. Enquanto o Es-
sábio analista italiano, autor de im- vesse reconhecido alguém; ilu- pírito não passa por esse sono, bre-
portantes livros sobre o assunto, minou-lhe o rosto a embriaguez ve ou longo, não recupera a luci-
como A Crise da Morte e Fenôme- de grande alegria e exclamou: dez. Por essa razão é que devemos
nos Psíquicos no Momento da Mor- “Tu, tu, minha mãe!”. E caiu orar pelos recém-desencarnados.
te em que analisa apenas o passa- morto em seu travesseiro. O magnetismo da prece que por
mento de pessoas de vida normal. “Ninguém poderá nunca per- eles fazemos ajuda-os a desperta-
Em O Céu e o Inferno de Allan suadir-me – diz o narrador des- rem mais facilmente, orientando-
Kardec, obra igualmente analítica, te episódio – que este homem -os para o que deverão tentar a fim
serão encontrados copiosos teste- não tenha realmente percebido de melhorarem a própria situação.
munhos de Espíritos de todas as sua mãe diante de si.” Hudson Seria útil à nossa corresponden-
condições morais, inclusive suici- Tuttle – The Arcana of Spiritua- te e até à sua saúde física, bem co-
das, criminosos etc. Aqui trans- lism, pág. 167. mo à saúde moral, a dedicação à
crevemos um dos casos mais sim- boa leitura doutrinária-espírita,
ples, citados por Ernesto Bozzano Durante o estado pré-agônico, única que informa e prova com os
no segundo livro mencionado: ou após o passamento, comumen- fatos e a análise alguns aconteci-
III – Caso – O Sr. Hudson te o moribundo revê, em retros- mentos para além do túmulo. O
Tuttle assim fala de outro caso pectiva, os acontecimentos que estudo do Evangelho, que nos en-
vindo ao seu conhecimento: viveu durante a vida que deixou, caminha para o amor a Deus e ao
como se a vivesse novamente. Em- próximo, tornando-nos dóceis,
Episódio muito comovedor bora tal desfile seja rápido, nada educados moralmente, humildes
produziu-se, há alguns anos, na lhe escapa do berço ao túmulo. O de coração, seguidores do Grande
cidade de Hastford. Aquele que Sr. Bozzano dá a esse fenômeno Mestre Jesus Nazareno, conhece-
mo comunicou estava de tal o nome de “Visão Panorâmica”. dores de suas lições salvadoras, será
forma convencido da natureza Não resta dúvida que se trata tônico que fortalecerá a prezada ir-
supranormal do que tinha vis- de um momento solene, mesmo mã para o progresso que necessita
to, que o fato lhe ficara bem crítico. No entanto, para o indiví- fazer no conhecimento das coisas
gravado na memória. duo de caráter e vida normais, de Deus, ao passo que a constante
Ele vive ainda num Estado do para o honesto, o bom, essa visão leitura das boas obras espíritas a
Oeste; é um homem prático, po- panorâmica não é alarmante, pois instruirá sobre esse fato inevitável
sitivo – a última pessoa capaz de sua consciência não o acusa de fal- para todos nós, isto é, a passagem
se deixar arrastar por fantasias. tas graves. Necessariamente, para do Espírito para a vida espiritual.

24 102 Reformador • Março 2012


Capa

Em dia com o Espiritismo

O Sermão Profético M A RTA A N T U N E S M O U R A

O
Sermão Profético, também narão a muitos. 6Haveis de ou- entenda! – 16então, os que esti-
chamado Discurso Escato- vir falar sobre guerras e rumo- verem na Judeia fujam para as
lógico, foi pronunciado por res de guerras. Cuidado para montanhas, 17aquele que estiver
Jesus no monte das Oliveiras, o não vos alarmardes. É preciso no terraço, não desça para apa-
qual, em razão de sua amplitude, que essas coisas aconteçam, mas nhar as coisas da sua casa, 18e
merece estudo mais aprofundado. ainda não é o fim. 7Pois se le- aquele que estiver no campo não
O texto de Mateus (24:1-31), em vantará nação contra nação e volte atrás para apanhar a sua
seguida reproduzido, anuncia uma reino contra reino. E haverá fo- veste! 19Ai daquelas que estiverem
Era de Transição (versículos 6 a me e terremotos em todos os grávidas e estiverem amamen-
26) e outra de Regeneração (versí- lugares. 8Tudo isso será o prin- tando naqueles dias! 20Pedi que
culos 27 a 31), segundo interpre- cípio das dores”. a vossa fuga não aconteça no
tação espírita.1 9
Nesse tempo, vos entregarão à inverno ou num sábado. 21Pois
tribulação e vos matarão, e sereis naquele tempo haverá grande
Introdução – 1Jesus saiu do odiados de todos os povos por tribulação, tal como não houve
Templo, e como se afastava, os causa do meu nome. 10E então desde o princípio do mundo até
discípulos o alcançaram para muitos sucumbirão, haverá trai- agora, nem tornará a haver ja-
fazê-lo notar as construções do ções e guerras intestinas. 11E sur- mais. 22E se aqueles dias não fos-
Templo. 2Mas ele respondeu- girão falsos profetas em grande sem abreviados, nenhuma vida se
-lhes: “Vedes tudo isto? Em ver- número e enganarão a muitos. salvaria. Mas, por causa dos elei-
12
dade vos digo: não ficará aqui E pelo crescimento da iniqui- tos, aqueles dias serão abreviados.
23
pedra sobre pedra: tudo será dade, o amor de muitos esfriará. Então, se alguém vos disser:
destruído”. 3Estando ele senta- 13
Aquele, porém, que perseverar “Olha o Cristo aqui!” ou “ali!”,
do no monte das Oliveiras, os até o fim, esse será salvo. não creiais. 24Pois hão de surgir
14
discípulos foram pedir-lhe, em E este Evangelho do Reino será falsos Cristos e falsos profetas, que
particular: “Dize-nos quando proclamado no mundo inteiro, apresentarão grandes sinais e
vai ser isso, qual o sinal da tua como testamento para todas as prodígios, de modo a enganar,
vinda e do fim desta época”. nações. E então virá o fim. se possível, até mesmo os elei-
O princípio das dores – 4Jesus A grande tribulação de Jerusa- tos. 25Eis que vos preveni.
respondeu: “Atenção para que lém – 15Quando, portanto, virdes A vinda do Filho do Homem
ninguém vos engane. 5Pois a abominação da desolação, de será manifesta – 26Se, portanto,
muitos virão em meu nome, di- que fala o profeta Daniel, insta- vos disserem: “Ei-lo no deserto”,
zendo: ‘O Cristo sou eu’, e enga- lada no lugar santo – que o leitor não vades até lá; “Ei-lo em luga-

Março 2012 • Reformador 103 25


Capa

res retirados”, não creiais. 27Pois um alerta, a descrição da natureza passam, à semelhança dos abutres
assim como o relâmpago parte das tribulações, o comportamento que se alimentam de cadáveres
do oriente e brilha até o poente, dos verdadeiros cristãos perante os (versículo 28: “onde estiver o ca-
assim será a vinda do Filho do acontecimentos e aspectos signi- dáver, aí se ajuntarão os abutres”).
Homem. 28Onde estiver o cadá- ficativos do reinado da paz. Emmanuel pondera a respeito
ver, aí se ajuntarão os abutres. O alerta está relacionado aos com sabedoria:
A amplitude cósmica desse acon- falsos profetas (versículos 4-6; 11
tecimento – 29Logo após a tribu- e 23-26), pois Essa figura, de alta significação
lação daqueles dias, o sol escurece- simbológica, é dos mais fortes
rá, a lua não dará a sua claridade, [...] Em todos os tempos houve apelos do Senhor, conclamando
as estrelas cairão do céu e os po- homens que exploraram, em pro- os servidores do Evangelho aos
deres dos céus serão abalados. 30En- veito de suas ambições, de seus movimentos do trabalho santi-
tão aparecerá no céu o sinal do interesses e do anseio de domi- ficante.
Filho do Homem e todas as tribos nação, certos conhecimentos que [...]
da terra baterão no peito e verão o possuíam, a fim de alcançarem Um homem que se afirma inva-
Filho do Homem vindo sobre as o prestígio de um poder sobre- riavelmente infeliz fornece a im-
nuvens do céu com poder e grande -humano, ou de uma pretensa pressão de que respira num se-
glória. 31Ele enviará os seus anjos missão divina. São esses os falsos pulcro; todavia, quando procura
que, ao som da grande trombeta, cristos e os falsos profetas. [...]2 renovar o próprio caminho, as
reunirão os seus eleitos dos quatro aves escuras da tristeza negativa
ventos, de uma extremidade até Sabemos, contudo, que o “ver- se afastam para mais longe.
a outra extremidade do céu. dadeiro profeta se reconhece por Luta contra os cadáveres de qual-
características mais sérias e exclu- quer natureza que se abriguem
A profecia indica a sucessão de sivamente morais”.2 Comuns nos em teu mundo interior. Deixa
dois grandes acontecimentos na hu- dias atuais, os falsos profetas, en- que o divino sol da espirituali-
manidade terrestre: um de sofri- carnados e desencarnados, pro- dade te penetre, pois, enquanto
mento, denominado Transição, ou- duzem um clima de intranquili- fores ataúde de coisas mortas,
tro de paz, conhecido como Rege- dade e de negatividade por onde serás seguido, de perto, pelas
neração. Por trás do simbolismo águias da destruição.3
presente no texto evangélico, des-
tacam-se quatro ordens de ideias:
Capa

A natureza das tribulações é signação: “Ai daquelas que estive- Os versículos finais da profecia
diversificada: a) Conflitos entre os rem grávidas e estiverem ama- (30 e 31) – “Então aparecerá no céu
povos (versículos 6, 7 e 10); b) mentando naqueles dias! Pedi que o sinal do Filho do Homem e todas
Guerras (versículo 6) que, “como a vossa fuga não aconteça no in- as tribos da terra baterão no pei-
todo tipo de violência humana, verno ou num sábado. Pois na- to e verão o Filho do Homem vindo
individual ou coletiva, não são re- quele tempo haverá grande tribu- sobre as nuvens do céu com poder
sultantes da vontade de Deus, mas lação, tal como não houve desde o e grande glória. Ele enviará os seus
sim expressões do egoísmo e do princípio do mundo até agora, anjos que, ao som da grande trom-
orgulho imperantes nos mundos nem tornará a haver jamais” (ver- beta, reunirão os seus eleitos dos
atrasados como o nosso”;4 c) Fla- sículos 19 a 21). quatro ventos, de uma extremida-
gelos e Catástrofes (versículos 7, 9, O reinado da paz se instalará, de até a outra extremidade do céu”–
15-21 e 29), alguns decorrentes efetivamente, a partir da Regene- sugerem o retorno do Cristo ao
da ação humana (versículos 7, 9 e ração, quando o “Evangelho do Planeta. Kardec analisa, porém, que
10), outros, como terremotos Reino [for] proclamado no mundo Jesus “[...] não diz que voltará à Ter-
(versículo 7) e acidentes cósmicos inteiro, como testamento para todas ra com um corpo carnal, nem que
(versículo 29), consequentes das as nações” (versículo 14). São pala- personificará o Consolador. Apre-
transformações na Natureza. Os vras condizentes com outra profe- senta-se como tendo de vir em Espí-
flagelos destruidores, naturais ou cia, registrada por João, (10:16): “en- rito, na glória de seu Pai, para julgar
independentes do homem, devem tão haverá um só rebanho e um só o mérito e o demérito e dar a cada
ser considerados como “[...] pro- pastor”. Sendo assim, um segundo as suas obras, quan-
vas que dão ao homem oportuni- do os tempos forem chegados”.7
dade de exercitar a inteligência, de [...] Jesus anuncia claramente
demonstrar sua paciência e resig- que os homens um dia se uni- Referências:
1
nação ante a vontade de Deus, rão por uma crença única; mas, BÍBLIA DE JERUSALÉM. Diversos traduto-
permitindo-lhe manifestar seus como poderá efetuar-se essa res. São Paulo: Paulus, 2004. 3. reimp.
sentimentos de abnegação, de de- união? A tarefa parece difícil, Novo Testamento. Cap. Discurso escato-
sinteresse e de amor ao próximo, tendo em vista as diferenças que lógico.
caso o egoísmo não o domine”.5 existem entre as religiões, os an- 2
KARDEC, Allan. O evangelho segundo o
Perante qualquer tipo de pro- tagonismos que elas alimentam espiritismo. Trad. Evandro Noleto Bezer-
vação ou calamidade, Jesus ensina entre os seus respectivos adep- ra. 1. reimp. Rio de Janeiro: FEB, 2010.
qual deve ser o comportamento tos e a obstinação que manifes- Cap. 21, it. 6, p. 394.
3
do verdadeiro cristão: manter-se tam em se acreditarem na posse XAVIER, Francisco C. Pão nosso. Pelo Es-
resguardado na firmeza da fé, pois exclusiva da verdade. [...] Entre- pírito Emmnuel. 29. ed. 4. reimp. Rio de
quem “perseverar até o fim, esse tanto, a unidade se fará em reli- Janeiro: FEB, 2011. Cap. 32.
4
será salvo” (versículo 13); não ter gião, como já tende a fazer-se SOUZA, Juvanir Borges. Tempo de reno-
apego aos bens materiais: “então, social, política e comercialmen- vação. 3. ed. Rio de Janeiro: FEB, 2002.
os que estiverem na Judeia fujam te, pela queda das barreiras que Cap. 16, p. 131.
5
para as montanhas, aquele que es- separam os povos, pela assimi- KARDEC, Allan. O livro dos espíritos. Trad.
tiver no terraço, não desça para lação dos costumes, dos usos, da Evandro Noleto Bezerra. 2. ed. 1. reimp.
apanhar as coisas da sua casa, e linguagem. [...] Ela se fará pela Rio de Janeiro: FEB, 2011. Q. 740.
6
aquele que estiver no campo não força das coisas, porque se tor- ______. A gênese. Trad. Evandro Noleto
volte atrás para apanhar a sua ves- nará uma necessidade, a fim de Bezerra. 1. reimp. Rio de Janeiro: FEB,
te!” (versículos 16 a 18). Demons- que se estreitem os laços de fra- 2011. Cap. 17, it. 32, p. 489.
trar espírito de sacrifício e de re- ternidade entre as nações [...].6 7
______. ______. It. 45, p. 498.

Março 2012 • Reformador 105 27


O que importa?
“Que aproveita ao homem ganhar o mundo inteiro, se vier a perder-se a si mesmo?” 1

L E O N A R D O M AC H A D O

P
arece que, desde há muito, amiga me demonstrava, exata- -se pensar. Errado, pois, também
a Humanidade se vem en- mente, o oposto. Jovem bastante aí, ela não se podia queixar. Con-
tregando à conquista de or- inteligente, poliglota e estudan- fesso que, igualmente, perguntei-
dem externa na pretensão de en- te de um dos mais respeitáveis e -me isso. Contudo, no decorrer da
contrar o reino da felicidade. Nessa difíceis cursos universitários da conversação, a cara colega me dis-
perspectiva, pois, o protótipo da atualidade, ela me confidenciava se, como a pedir ajuda: “Apesar de
concepção de ser feliz das pessoas que tinha tudo, mas sentia que ter tudo, eu me sinto inútil, não
pode ser encontrado, diaria- algo mais importante lhe falta- consigo ver uma finalidade maior
mente, nos mais diversos meios va. De fato, sua condição finan- no que eu faço e na minha vida”.
de comunicação – poder, estética, ceira era singular, pois morava O relato da minha colega, por-
títulos e moeda, enfim um sem- em um dos terrenos mais valori- tanto, ia na contramão do que
-número de como “vencer na vida”. zados de certa cidade brasileira, muitos indivíduos, ingênuos, dei-
Certa noite, entretanto, além de viajar, constante- xam-se sonhar. A fala dela era
pela Internet, uma mente, no período de uma prova de que não se pode
férias, a países dife- mercadejar sentimentos, nem
1
LUCAS, 9:25. rentes. O que faltava comprar a felicidade com as pos-
a ela? – uma beleza ses que vêm de fora.
estética – pode- Na concepção cristã, de fato, esse
estado de plenitude advém com o
que Cristo chamou Reino de Deus.
Contudo, no ensino de Jesus, esse
reinado encontra-se dentro das
criaturas humanas,2 desejoso de
ser descoberto por elas.
Nesse sentido, é fácil deduzir que
a capacidade de ser feliz é algo
inerente a cada individualidade.3

2
LUCAS, 17:21.
3
KARDEC, Allan. O livro dos espíritos.
Trad. Evandro Noleto Bezerra. 2. ed. 1.
reimp. Rio de Janeiro: FEB, 2011. Q. 922.

28 106 Reformador • Março 2012


Cada qual abarca o mundo com conversa, quando pude dizer- Por isso, procuremos saber fa-
um olhar que lhe é peculiar, e, -lhe algumas palavras, já que ela zer escolhas nos nossos dias. “Não
com essa capacidade de observar me perguntava, observei que cobicemos a glória vã”,5 pois a nossa
as coisas, consegue realizar em começou a buscar um caminho maior glorificação será aquela ad-
sua vida as trajetórias próprias alternativo, dedicando, tam- vinda do encontro com a nossa
das suas ambições mais íntimas. bém, o seu tempo para ir ao en- consciência tranquila, quando
Quantos sofrimentos, então, não contro de outros indivíduos tivermos andado com sinceridade
são gerados por nós “na razão mais necessitados na dor, ao para conosco e para com Deus.6
das necessidades artificiais”4 que mesmo instante que procurava,
5
criamos? certamente, cuidar de si mesma GÁLATAS, 5:26.
Importa, dessa maneira, fazer- de uma outra forma. 6
2 CORÍNTIOS, 1:12.
mos uma real análise dos valores
que estamos elegendo na cons-
trução de nosso futuro. Porque,
ao final das festas, das bajulações
e das conquistas temporais, res-
Felizes os que
têm Deus
tar-nos-á a vida. Seremos, sempre,
invariavelmente, nós e a nossa
consciência, como me escreveu
certo amigo espiritual. Entre esse mundo de apodrecimento
O que importará, então, termos E a vida de alma livre, de alma pura,
conseguido possuir e fazer tudo
Ainda se encontra a imensidade escura
o que os outros disseram ser o
Das fronteiras de cinza e esquecimento.
melhor, muitas vezes repetindo
o que escutaram sem saber o por-
quê, se para isso tivermos que Só o pensador que sofre e anda à procura
perder o endereço de nós mes- Da verdade e da luz no sentimento,
mos e a nossa identidade? Pode guardar esse deslumbramento
O que nos importará a posse Da Fé – fonte de mística ventura.
dos títulos, se, ao final, não ti-
vermos conseguido ganhar o
maior título – o de ter tido uma Feliz o que tem Deus nessa batalha
vida que foi importante para al- Da miséria terrena, que estraçalha
guém, além de nós: um filho, Todo o anseio de amor ou de bonança!...
uma esposa, um pai, uma mãe,
um alguém? Venturoso o que vai por entre as dores
Lembro-me, portanto, sem- Atravessando o oceano de amargores,
pre da frase de Jesus, em epígra-
No bergantim sagrado da Esperança.
fe, recordando, ainda, a minha
sincera amiga. Depois daquela
Cruz e Souza
4 Fonte: XAVIER, Francisco C. Parnaso de além-túmulo. Autores diversos. 19. ed.
KARDEC, Allan. O livro dos espíritos.
2. reimp. Rio de Janeiro: FEB, 2010. p. 371.
Trad. Evandro Noleto Bezerra. 2. ed. 1. reimp.
Rio de Janeiro: FEB, 2011. Q. 926.

Março 2012 • Reformador 107 29


Evangelização Espírita Infantojuvenil

Por que é importante


evangelizar?
CECÍLIA RO CHA

A
evangelização da criança e do adolescente é de ensinamentos que devem formar a estrutura afe-
uma das mais importantes tarefas do Movi- tiva do ser humano.
mento Espírita por situar-se na base da edu- Quando o Cristo ensinou que os mansos herda-
cação humana. E a educação humana, sem estar es- riam a Terra, valorizou, sobremaneira, a capacidade
tribada nos princípios da Doutrina Espírita, não vai de tolerância e de ajuda mútua que os homens
cumprir a sua extraordinária missão na Terra. devem cultivar, e que é a base do desenvolvimento da
A educação humana, vista à luz dos esclarecimen- afetividade e do amor ao próximo.
tos espíritas, focaliza o educando antes do nascimen- Somente o homem evangelizado será capaz de mu-
to, durante a vida física, prolongando-se até a vida dar os parâmetros da sociedade atual, e podemos con-
espiritual; sua abrangência é, pois, transcendental. siderar evangelizado o homem de sentimentos eleva-
Não resta dúvida que a nossa sociedade precisa dos e razão esclarecida pelo conhecimento espírita.
mudar, com urgência, o seu modo de pensar, de sen- Razão e sentimento formam, pois, um binômio da
tir e de agir a fim de imprimir uma diretriz mais se- maior importância na conquista da espiritualidade
gura ao processo educativo. É preciso definir o edu- maior.
cando como um ser imortal e sujeito à ação educati- O pai, a mãe, aqueles que desempenham a função
va antes, durante e depois da vida física, focando-o de pai e/ou mãe e o evangelizador desenvolvem
em seus aspectos: vital, mental, psíquico e espiritual. papel fundamental na formação moral das novas
Esses aspectos se sucedem cronologicamente, não se gerações que desabrocham para a vida física, espe-
substituem mutuamente, mas complementam-se. rançosas e otimistas, porque todos reencarnam a fim
Educar e amparar a infância é preservar a socieda- de progredir. Ninguém volta à vida física para per-
de futura de todos os males que a afligem na atuali- manecer inativo no esforço das conquistas espiri-
dade, é evitar que se reproduzam os desequilíbrios tuais de que necessita. Todos reencarnam para pros-
que hoje perturbam o mundo. seguir avançando na escala espiritual.
A formação de sentimentos é de grande impor- Os delinquentes de todos os tempos foram crian-
tância na educação. Essa formação se processa por ças que cresceram na falta de recursos educativos e
meio do desenvolvimento das potências embrioná- de orientação moral; são órfãos de todos os matizes:
rias do Espírito, tais como: a piedade, a fraternidade de pais desencarnados, de pais vivos, mas incons-
e o amor ao próximo. cientes de seus deveres, de pais doentes, e, como tais,
Os conteúdos de ordem afetiva são os mais impossibilitados de amparar e educar os filhos.
importantes a serem ministrados na Evangelização O sentimento de abandono afetivo influi negati-
Espírita. O Evangelho de Jesus é o maior repositório vamente na formação psíquica da criança que será o

30 108 Reformador • Março 2012


adulto de amanhã, portador de todas as falhas que Aperfeiçoar a inteligência e o sentimento constitui o
são o característico das sociedades hodiernas. fim último de nossa estada na vida corpórea.
A experiência humana, que ocorre nos dois planos A educação embasada no conhecimento espírita e na
da vida, é fonte de enriquecimento intelectual, moral moral evangélica assegura o pleno aproveitamento da
e espiritual. existência terrena, porque direciona os passos da cria-
A Evangelização à luz do Espiritismo que, no tura humana para as conquistas dos bens do Espírito.
nosso entender, é a mais alta expressão de educar, Ensinar a viver é a função maior do conhecimen-
cumpre elevada missão no mundo, por descortinar a to espírita, que envolve toda uma filosofia de vida
seus habitantes o futuro que os espera na eternidade. capaz de garantir ao Espírito reencarnado o pleno
Evangelizar é a ação contínua e ininterrupta que sucesso de sua existência terrena.
modifica os seres, ajudando-os na escalada evolutiva Reforçando essas considerações, que integram as
rumo à perfeição na esteira infinita do tempo. Não se bases sobre as quais se alicerça o Programa da Evan-
realiza apenas numa existência corporal. Eis por que gelização Espírita, recorremos a Emmanuel1 que diz:
a ideia da reencarnação é tão importante na inter-
pretação da educação continuada: o que não é possí- Levantam-se educandários em toda a Terra.
vel adquirir numa experiência física, é factível em vá- Estabelecimentos para a instrução primária, univer-
rias experiências no corpo físico, considerando-se, sidades para o ensino superior. Ao lado, porém, das
ainda, o intervalo entre as encarnações, isto é, os pe- instituições que visam à especialização profissional e
ríodos na vida espiritual que oferecem aprendizados científica, na atualidade, encontramos no templo
variados aos Espíritos. espírita a escola da alma, ensinando a viver.
A vida terrena é um instante da vida imortal do
Espírito e deve ser muito bem aproveitada no sentido 1
XAVIER, Francisco C.; VIEIRA, Waldo. Estude e viva. Pelos
do seu aprimoramento. O objetivo fundamental da Espíritos Emmanuel e André Luiz. 13. ed. 2. reimp. Rio de Janeiro:
nossa encarnação é o progresso intelecto-moral. FEB, 2010. Na escola da alma.

Opinião dos Espíritos sobre a Evangelização


“É através da evangelização que o Espiritismo de- nos desideratos da evangelização, procurando, com
senvolve seu mais valioso programa de assistência grande empenho, alcançar o coração humano em
educativa ao homem. meio ao torvelinho da desenfreada corrida do século...
A escola de letras continua a informar e instruir a Tão significativa semeadura na direção do porvir!
fim de que a Ciência se fortaleça no seio das coletivi- Mestres e educadores, preceptores e pais colabo-
dades. Entretanto, é a educação religiosa que vem ram, ao lado uns dos outros, em meio às esperanças
estimulando a moral ilibada de modo a libertar a do Cristo, dinamizando esforços em favor de crian-
criatura despertada e vigilante junto aos imperativos ças e jovens, na mais nobre intenção de aproximá-los
da vida. do Mestre e Senhor, Jesus. [...]”
Aliando sabedoria e amor alcançaremos equilíbrio
em nossa faina educativa. Guillon Ribeiro
Eduque-se o homem e teremos uma Terra verda-
deiramente transformada e feliz! (Página recebida em 1963, pelo médium Júlio Cezar Grandi Ribeiro,
o
Contemplamos, assim com otimismo e júbilo, o durante o 1 Curso de Preparação de Evangelizadores – CIPE, rea-
Movimento Espírita espraiando-se, cada vez mais, lizado pela Federação Espírita do Estado do Espírito Santo.)

Março 2012 • Reformador 109 31


Perigoso
fascínio
L I C U R G O S OA R E S DE L AC E R DA F I L H O

A
tualmente, o progresso nos
dá condições para uma
vida cercada por como-
didades antes impensadas. Os
avanços tecnológicos colocaram
ao nosso alcance alternativas
para uma vida mais confortável
e com mais opções. São inúme-
ros os recursos que podem ser
utilizados para a diversão e o re-
fazimento das energias despen-
didas no cotidiano.
Entretanto, nem sempre sa-
bemos fazer uso equilibrado da-
quilo que possuímos, chegando,
até mesmo, a transformar em do a que a matéria nos submete, damente aos objetos de prazer
objetivo principal de nosso dia a seduzindo-nos pela via instinti- que cultuamos, deixando-nos
dia o uso daquilo que nos pro- va, que ainda comanda conside- levar pela atração do ócio.
porciona prazer. Este prazer – rável parcela de nossa persona- Enquanto isto se dá, não lon-
que deveria ocupar apenas uma lidade. É um círculo vicioso, que ge de nós, em casebres situados
parcela de nossas vidas, embora provoca “perigosa vertigem” e mui- nas periferias de todas as cida-
importante –, torna-se, muitas tas vezes nos atrai de forma ir- des, miseráveis de toda a sorte
vezes, a fundamental razão de refreável. têm como único propósito de
nosso viver. De nossa parte, nós – que de- vida a obtenção de comida e
Dessa forma, submetemo-nos veríamos estar em franca ativi- abrigo.
às fontes de nossos deleites, tu- dade, tornando-nos úteis, tanto É nestes lares, desprovidos do
do empenhando para delas fazer quanto possível, reservando o básico, que crianças são geradas
uso, o mais intensa e frequente- descanso para quando necessá- e permanecem convivendo, qua-
mente possível. Este é o chama- rio –, nos entregamos apaixona- se sempre, com a criminalidade.

32 110 Reformador • Março 2012


São órfãos sociais destinados a assustar aquele que desconheça aquela que ignora os abundan-
uma vida descabida e sem senti- as desventuras alheias, mas que cor- tes convites ao comodismo e à
do; desgraçados de toda sorte, responde a uma realidade cada estagnação, mas que, todavia,
convivendo no absurdo de um vez mais sombria e perturbadora. nos cobra abdicar parcialmente
mundo que lhes mostra o luxo e Em nosso íntimo sentenciamos: de nossos objetos de prazer.
o desperdício, enquanto quase trata-se da ação tempestiva dos É necessário que façamos algo
sempre não lhes há provido nem mecanismos da reencarnação, que – o mínimo que seja. As oportu-
o mínimo para que vivam com conduzem ao sofrimento e à repa- nidades estão à nossa volta, seja
dignidade. ração aquele que deles necessita. na Casa Espírita, onde estejamos
Atônitos, esses rebentos des- Lei exata e inquestionável. inseridos, seja na vizinhança onde
garrados de um mundo insusten- Entretanto, nos esquecemos de nos encontremos ou em nosso
tável não conhecem quaisquer que cabe àqueles em melhor con- local de trabalho.
oportunidades. Os serviços sociais dição social a responsabilidade de Auxiliemos a minorar – sem
que estão ao seu alcance são in- amparar e conduzir os que deles o engano da soberba – o sofri-
suficientes e quase sempre inefi- necessitem, provendo-os de con- mento que, grassando por toda
cazes. Não possuem acesso a dições e oportunidades, propi- parte, se faz oculto para aquele
uma educação adequada, a uma ciando-lhes instrumentos que lhes que se nega a vê-lo.
infraestrutura mínima. E nos permitam prosseguir em sua evo- O que não podemos é nos sub-
lares – refletindo os tormentos lução, o que, como resultado, re- meter ao perigoso fascínio que a
diários –, não lhes falta apenas o fletiria sob a forma de benefí- matéria exerce sobre nós, tornan-
alimento, mas carecem de uma cios incalculáveis para toda a do-nos individualistas, egocên-
orientação condizente, restan- sociedade. tricos, esquecendo-nos de que o
do-lhes apenas as sobras... Não podemos ignorar: a so- único caminho que nos conduz
Triste quadro pintado com tintas lução para esse estado de coisas ao progresso espiritual passa, essen-
obscuras e sem brilho, que pode passa unicamente pela ação, cialmente, pela caridade.

Março 2012 • Reformador 111 33


A FEB e o Esperanto

Do Movimento
Esperantista
Esperanto e Rio+20
A F F O N S O S OA R E S
“Sim, o Esperanto é lição de fraternidade. Aprendamo-la, para sondar, na Terra, o
pensamento daqueles que sofrem e trabalham noutros campos. Com muita proprie-
dade digo: ‘aprendamo-la’, porque somos também companheiros vossos que, havendo
conquistado a expressão universal do pensamento, vos desejamos o mesmo bem espi-
ritual, de modo a organizarmos, na Terra, os melhores movimentos de unificação.”
EMMANUEL1

A
Universala Esperanto-Asocio – UEA (Associa- A UEA e a TEJO, em sua argumentação, formali-
ção Universal de Esperanto) e a Tutmonda zam integral apoio a uma recomendação, inserida na
Esperantista Junulara Organizo – TEJO (Or- Declaração da 64a Conferência Anual da ONU
ganização Mundial da Juventude Esperantista) tive- DPI/NGO, realizada em Bonn, Alemanha, nos dias 3
ram plenamente aceita pela Organização das Nações a 5 de setembro de 2011, em que é feito
Unidas (ONU) sua proposta para o Documento de
Compilação da United Nations Conference on Sustai- [...] um apelo para o respeito e a inclusão das lín-
nable Development – UNCSD-RIO+20 (Conferência guas étnicas no sistema educacional, uma vez que
das Nações Unidas sobre Desenvolvimento Susten- estas línguas fazem parte da complexidade de seus
tável), a realizar-se no Rio de Janeiro, de 20 a 22 de respectivos ambientes, e que seja levado em conside-
junho próximo. ração o potencial de uma língua internacional neu-
Nesse documento, as duas mais expressivas orga- tra que combine facilidade de aprendizado e clareza
nizações do esperantismo mundial manifestam o de- com neutralidade, e que possa, portanto, ser vista
sejo de que as recomendações finais da RIO+20 con- como inerentemente sustentável.
templem uma política que proteja a diversidade lin-
guística, permitindo, ao mesmo tempo, uma efetiva Nesse importante documento, as duas organiza-
comunicação, bem como condenem claramente as ções esperantistas mundiais também evocam, como
práticas que levam à extinção de línguas e à domina- reforço de argumentação, o célebre Compromisso no
ção das línguas maiores sobre as menores. 14 da Declaração de Compromissos Éticos para a Pos-
tura e Comportamento Ecológico Global como um
1 dos tratados alternativos, produzidos em 1992, pela
A Missão do Esperanto – mensagem ditada ao médium Francisco
Cândido Xavier, em 19/1/1940, em Pedro Leopoldo (MG), e pu- comunidade das Organizações Não-Governamen-
blicada em Reformador do mês seguinte. tais (ONGs), durante a Conferência RIO-92.

34 112 Reformador • Março 2012


Reza esse Compromisso 14: 

Contribuir com entusiasmo para a superação das bar- Evidenciam-se, cada vez mais, os efeitos da multi-
reiras artificiais sejam elas políticas ou religiosas, com o plicidade das línguas nas relações internacionais, tra-
objetivo de construir uma nação universal humana. duzida como renitente estorvo ao progresso geral, seja
Sugerimos a adoção da Língua Internacional Esperanto no campo material, seja no campo espiritual, dificul-
como segunda língua de todos os povos e recomen- tando a difusão do conhecimento, a aproximação das
damos que todas as ONGs participem de sua difusão. diferentes culturas, o cultivo da verdadeira fraternidade
entre os povos. A ferramenta para a definitiva solução
A proposta da UEA e da TEJO, evidenciando a seme- desse problema e consequente erradicação de seus pre-
lhança entre aspectos do desenvolvimento sustentável juízos já existe há mais de cem anos, e agora, quando a
e uma transição para uma plataforma de línguas eficaz e Humanidade é compelida, pela “força das coisas”, como
não-discriminatória, que preserve a diversidade linguís- se expressavam os reveladores espirituais na Codifica-
tica e torne possível o acesso à comunicação no mundo ção de Allan Kardec, a ingressar na chamada globali-
inteiro, aponta para a necessidade de medidas coorde- zação, na fase universalista de sua vida planetária, sur-
nadas por muitos atores: indivíduos e governos com gem os primeiros abalos nas velhas estruturas sociais
suas respectivas políticas educacionais, os quais, pela carcomidas pelo tempo. O assombroso avanço tecnoló-
falta de uma orientação central, poderão inclinar-se para gico no terreno das comunicações não se coaduna com
escolhas medíocres. Nesse sentido, as instituições da ONU as fórmulas já caducas de convivência, à semelhança
e das ONGs deverão constituir-se em exemplos positi- do que está dito no Evangelho sobre o vinho novo ver-
vos da aplicação bem-sucedida de políticas linguísticas tido em odres velhos. Impõe-se a mudança, tudo está a
no seio de suas organizações, em que se combine comu- exigi-la, a Humanidade já está aparelhada para tan-
nicação eficaz com igualdade de direitos para todos, in- to, e, nesse agitado contexto, labutam, confiantes e pa-
dependentemente de línguas nativas, usando, por exem- cientes, os arautos do progresso, entre os quais Emma-
plo, uma língua internacional neutra, isto é, o esperanto. nuel reconhece os que compõem o movimento espe-
O documento é concluído com uma abordagem rantista. Os espíritas, igualmente arautos do progresso,
sobre os caminhos da aludida transição para um sistema entreviram essa fase com o auxílio das luzes da Dou-
linguístico em que seja considerada a adição de uma lín- trina, apoiando a Língua Internacional Neutra e seus
gua internacional neutra na escolha de línguas existentes. ideais desde 1909, quando a Federação Espírita Bra-
A transição pode ser iniciada com decisões relati- sileira publica em Reformador daquele ano o primei-
vamente fáceis no que diz respeito aos processos in- ro texto de propaganda do esperanto no generoso cír-
ternos da ONU e das ONGs, sem grandes custos no culo dos adeptos da Terceira Revelação da Lei de Deus.
curto-prazo e com possibilidade de consideráveis Perseveremos, caros coidealistas, nos serviços em
economias no longo-prazo. prol da divulgação e do uso desse genial instrumen-
A introdução de uma língua internacional neutra to de comunicação internacional trazido do mundo
nos programas de educação dos estados-membros espiritual pelo Apóstolo da Concórdia que, na Terra,
pode exigir tempo mais longo e um plano de transi- tomou o nome de Lázaro Luís Zamenhof. Criemos
ção cuidadosamente elaborado, já que as competên- cursos da língua, publiquemos material didático pa-
cias linguísticas em línguas nacionais, hoje vasta- ra o seu aprendizado, traduzamos e editemos as boas
mente aplicadas na comunicação internacional, per- obras doutrinárias, esforcemo-nos por antecipar en-
manecerão vitais durante a desejada transição, a qual tre nós essa anunciada fase universalista da vida no
poderá ser facilitada por intermédio da experiência planeta, fazendo do esperanto a língua para as rela-
do movimento esperantista, considerando o valor ções internacionais da crescente família espírita
propedêutico de seu Idioma Neutro. mundial.

Março 2012 • Reformador 113 35


Imortalidade
da alma
J O S É PA S S I N I

O
homem moderno, que ex- foi apresentado esse assunto a uma meu!”. Até agora, o encaminha-
plora o fundo dos ocea- seleta plateia, não-espírita, inte- mento do assunto está lógico, claro.
nos e cada vez mais do- ressada em pesquisas sobre fenô- Mas quando analisamos o uso do
mina o espaço sideral, ainda não menos extrafísicos. Ao ouvirem possessivo nas frases acima, a ques-
conhece a sua própria natureza. essa pergunta, os presentes se agi- tão se complica. Vejamos: uma cria-
Conhece o mundo exterior, mas taram e começaram a murmurar, tura morreu. Corpo e alma sepa-
não se conhece; sabe quem é, até que um deles falou: “Não serei raram-se. O corpo foi enterrado e
mas não sabe o que é. eu que ficarei enterrado aqui. Será a alma foi para uma outra dimen-
Excluem-se os materialistas. o meu corpo”. Diante dessa afirma- são do Universo. Se alguém ameaça
Esses pensam que já sabem o que tiva, o auditório acalmou-se, até o tocar naquele corpo, quem dirá:
são: apenas matéria pensante. E momento em que o palestrante “Não toques nesse corpo porque
os espiritualistas – aqueles que disse: “Você não resolveu o pro- ele é meu”? Ou se alguém tentar
creem que, após a morte, algo blema, pelo contrário, complicou-o tocar na alma: “Não toques nessa
continua, algo sobrevive – será ainda mais, a ponto de torná-lo alma porque ela é minha”? Quem
que sabem o que são? até contrário à razão”. Para se en- é esse ser que possui esse corpo e
Ao inquirir-se alguém, que diz tender bem por que o problema se essa alma?
ter alma ou Espírito, onde quer ser tornou complicado, deixemos por Segundo posição – não só espí-
enterrado quando morrer, geral- um momento o campo do espírito rita em particular, mas espiritualista
mente obtém-se a resposta: “Quero e passemos a outro, ao campo da de modo geral – perfeitamente ló-
ser enterrado em minha cidade, gramática e da lógica. As gramáti- gica, deve-se riscar a frase: “minha
perto dos meus pais, parentes e cas de todas as línguas ensinam alma”, substituindo-a por “eu”. Eu
amigos”. Interrogada essa mesma que o possessivo é a palavra que sou o possuidor do corpo, ou me-
pessoa a respeito do destino de sua indica alguém que pode reclamar lhor, fui o dono do corpo que mor-
alma, a resposta, sem dúvida, indi- a posse de algo, ou seja, do objeto reu. Fui o seu usuário temporário.
cará um lugar bom, de acordo com possuído. Portanto, se for dito: Eu, Espírito, diante do corpo morto,
a sua convicção religiosa. Entre- “Meu relógio”, isso significa que o posso afirmar: “Este corpo foi meu,
tanto, poder-se-ia objetar: “Que relógio pertence à pessoa que fala, usei-o durante o tempo em que vi-
importa se ela for para um lugar que se declara ser o seu possuidor. veu”. O corpo jamais poderá dizer:
ruim, uma vez que é ela quem vai No caso de alguém tentar apossar- “Essa alma era minha”.
e não você? Você disse que ficará -se dele, essa pessoa dirá: “Não to- Assim, chega-se à conclusão de
enterrado em tal lugar”. Certa vez, ques nesse relógio porque ele é que eu, Espírito, sou imortal, indes-

36 114 Reformador • Março 2012


trutível. Eu uso um corpo material Sou eu, alma ou Espírito quem cósmica. Essa cidadania espiritual
atualmente. Este corpo morrerá um pensa, aprende, sente, odeia, ama... é uma postura diante da vida,
dia. Não eu! O corpo não é parte Não o corpo. Quando meu corpo muito diferente daquela: “Eu sou
essencial do ser humano. Ele é ape- morrer, deixá-lo-ei como veste um homem e tenho uma alma”.
nas vestimenta temporária do Espí- usada e entrarei noutra dimensão Pelo contrário, a criatura diz: “Eu
rito imortal, e poderá durar de al- do Universo infinito, usando um sou um Espírito imortal. Tenho um
guns segundos a até pouco mais corpo mais sutil. Entretanto, essa corpo, no qual estou encarnado
de um século. Embora todo o res- dimensão não posso ver atual- temporariamente”. A ideia de ser
peito que lhe devemos, como ins- mente, porque estou limitado mortal e ter uma alma imortal
trumento imprescindível à evolu- pelo corpo material. Mas, quan- impõe sofrimento. Observe-se que,
ção do Espírito, o corpo deve ser do partir, levarei tudo aquilo que segundo essa posição equivocada,
encarado como instrumento, como aprendi, todo o progresso que fiz não sou eu que sou imortal, mas,
objeto e não como sujeito. E para no campo da inteligência e do a minha alma.
aqueles que ainda não se despoja- sentimento, isto é, tudo o que in- A ideia de ser mortal e de ter
ram do costume de visitar cemité- corporei nesse período evolutivo uma alma imortal contém um
rios, deve ser lembrado que os que vivi no mundo material. sentimento de destruição, pois ao
componentes do corpo, num curto Pensando desse modo, pode-se menos metade do ser se destruiria
prazo de tempo após o sepultamen- desenvolver um novo estado de pelo fenômeno da morte.
to, passarão a fazer parte de outros consciência, a que se pode chamar Por que se pode dizer que é uma
organismos, animais ou vegetais... “cidadania espiritual”. Trata-se de ideia de destruição, de perda?
E uma conclusão ainda mais con- uma cidadania que não é nacio- Porque a criatura se habitua a
tundente: o corpo é descartável... nal, nem mesmo planetária, mas concentrar todo o seu potencial

Março 2012 • Reformador 115 37


de vida no corpo e não no Espí- E, pedagogicamente, demons- Vê-se perfeitamente que o Após-
rito, a ponto de dizer: “Quando tra a completa destrutibilidade do tolo sabia que aquele homem dei-
eu morrer, quero ser enterrado corpo físico, ao compará-lo à se- xara seu corpo físico dormindo e
aqui ou ali”. O homem sente-se mente, que realmente desaparece fora procurá-lo, a fim de pedir-
mais como corpo mortal do que para dar surgimento à planta: -lhe ajuda.
como Espírito imortal. Assim, “Assim também a ressurreição Outra passagem que atesta a
sofre! Sofre porque sua razão lhe dos mortos. Semeia-se corpo em naturalidade com que os judeus
assevera que, ao ocorrer a morte, corrupção; ressuscitará corpo em tratavam esse assunto é demons-
seu corpo em breve se consumirá, incorrupção”. (Vv. 42.) trada também em Atos dos
apodrecendo rapidamente, e que “Semeia-se corpo animal, res- Apóstolos: altas horas da noite,
os elementos que o constituem suscitará corpo espiritual. Se há Pedro fora libertado da prisão.
tomarão parte na formação de corpo animal, há também corpo Procurou a casa de Maria, mãe
novos organismos vegetais e ani- espiritual”. (Vv. 44.) de João Marcos, batendo à porta.
mais. Segundo esse ponto de vista E, antecipando-se àqueles que Uma menina reconhece-lhe a voz,
equivocado, o Espírito é apenas criariam a nefasta teoria da res- mas não lhe abre a porta, indo
parte do ser. Por isso afirma: surreição da carne, adverte: anunciar a boa nova no interior
“Quando eu morrer, minha alma “E, agora, digo isto, irmãos: da casa. Mas não creram nela,
vai para...”. Segundo essa posi- que carne e sangue não podem pois àquela hora da noite não
ção, a morte destrói o eu, pois herdar o reino de Deus, nem a era costume libertar-se um pri-
diz: “Eu quero ser enterrado” aqui corrupção herda a incorrupção”. sioneiro, e nem era fácil fugir
ou ali. (Vv. 50.) da prisão. Por isso, aventaram a
Ora, só é enterrado o que é Como se pode concluir, o Após- possibilidade de ser Pedro des-
morto! Pode-se argumentar, entre- tolo Paulo ensinou que o corpo dobrado pelo sono físico que ali
tanto, dizendo que a alma é indes- material ficará enterrado e, simul- estava a bater, pois disseram à
trutível. Bem, isso é verdade, porém, taneamente, o corpo espiritual será menina: “Estás fora de ti. Mas ela
ela é tratada como uma terceira libertado. afirmava que assim era. E diziam:
pessoa: ela, cuja natureza e desti- Em verdade, a existência do É o seu anjo”. (Atos, 12:15.)
no não estão claramente definidos corpo espiritual e a sua indepen- Infelizmente, com o passar do
pelos teólogos. Não bem defini- dência do corpo físico já era co- tempo, os teólogos apagaram
dos pelos teólogos, mas claramen- nhecida pelos judeus, como se esse entendimento de que somos
te definidos por Paulo, o Apóstolo, constata na seguinte passagem do seres imortais, que temos a posse
em sua primeira carta aos Corín- Novo Testamento, citada em Atos temporária de um corpo mortal,
tios, no capítulo 15: dos Apóstolos: passando a ensinar que somos cor-
“Mas alguém dirá: Como res- pos que temos uma alma, o que
suscitarão os mortos? E com que E Paulo teve, de noite, uma vi- leva muitos a um temor doentio
corpo virão?”. (Vv. 35.) são em que se apresentou um da morte.
O Apóstolo ensina que temos varão da Macedônia e lhe ro- O Espiritismo, ao resgatar as ver-
outro corpo além do material, isto gou, dizendo: Passa à Macedô- dades cristãs, trouxe-nos de volta
é, um corpo espiritual, indestrutí- nia e ajuda-nos. a certeza da nossa imortalidade, si-
vel, sutil: E, logo depois desta visão, pro- tuando-nos na Terra como Espíritos
“E há corpos celestes e corpos curamos partir para a Macedônia, imortais, temporariamente encar-
terrestres, mas uma é a glória dos concluindo que o Senhor nos nados em corpos mortais que, em-
celestes, e outra a dos terrestres”. chamava para lhes anunciarmos bora de um valor inapreciável, são
(Vv. 40.) o evangelho. (Atos, 16:9 e 10.) de uso temporário.

38 116 Reformador • Março 2012


Uma reflexão histórica
– a força de um ideal
“Aquele que se adianta 100 anos aos seus contemporâneos precisa de mais 100
anos para ser compreendido.” – Carl du Prel sobre Allan Kardec

VLADIMIR ALEXEI

N
o primeiro ano da Revue Em França, a cidade de Tours foi Sardou (autor aclamado de peças
Spirite, em novembro de uma das primeiras a conhecer o Es- teatrais, um mestre dos diálogos),
1858, Allan Kardec publi- piritismo. Foi lá também que os em- Russel Wallace, Alexander Aksakof,
cava o artigo “Polêmica Espírita”. bates tiveram seus primeiros movi- Jean Meyer, Sir Conan Doyle,
“Há polêmica e polêmica”, asseve- mentos. Em 1862, Tours possuía um dentre outros.
rava o Codificador. “[...] uma há Grupo Espírita presidido pelo Dr. Os trabalhos exigiam mais.
diante da qual jamais recuaremos: Chauvet que já havia escrito um li- Membros da Igreja de então, num
é a discussão séria dos princípios vro (Esprit, Force, Matière) em “re- rompante criminoso, denominados
que professamos”. futação cerrada contra Büchner”. por Allan Kardec o resto da Idade
Allan Kardec, intuído pelo Espí- Na mesma Tours, dois anos de- Média, deflagram golpe violento à
rito de Verdade, já anunciava ro- pois, o Apóstolo do Espiritismo, liberdade de pensamento, produ-
teiro seguro a seguir ante a luta que Léon Denis, então com 18 anos, zindo o que ficou conhecido na his-
se travaria para divulgar o Espiritis- iniciava sua trajetória de esclare- tória do Espiritismo como o “Auto-
mo em sua plenitude. cimentos à sociedade, burilando -de-Fé de Barcelona”. A pedido de
Artesãos das palavras serviram- seu Espírito em um contexto de Maurice Lâchatre uma remessa
-se da imprensa de um modo ge- limitações que não eximiram este de livros foi enviada para Barcelo-
ral, e espírita em particular, para sábio dos mais profundos teste- na, seguindo os trâmites aduaneiros
esculpir obras de luz. As respon- munhos de amor à causa espírita. entre países, conforme determinava
sabilidades pela divulgação dos O célebre Apóstolo, autor de a lei vigente. Porém, era tarde.
ideais santificados de Allan Kardec Depois da Morte – obra compulsa- Antevendo o futuro, Kardec en-
tiniam nas consciências evolucio- da por Eurípedes Barsanulfo em fatiza a necessidade de se fazer co-
nistas e renovadoras dos seus dis- uma noite, definindo o “toque de nhecer as armas usadas contra o
cípulos, fiéis às bases, desde o prin- despertar” para os valores espiri- Espiritismo.
cípio. Entretanto, a incompreen- tuais, segundo Corina Novelino – No Brasil, antes da existência da
são e o preconceito marcaram os protagonizaria os Congressos de Codificação, antes até dos fenôme-
passos dos pioneiros na divulgação 1900 (Paris), 1905 e 1910 (Bélgica), nos com as irmãs Fox, em Hydesville
do Espiritismo, exigindo esforço 1913 (Suíça) e 1925 (Paris) resga- (EUA), encontraremos, em 24 de
transcendente e profundo conhe- tando as ideias da Doutrina Espí- maio de 1845, na Bahia, ocorrência
cimento de um ideal anunciado rita. Nomes ilustres acompanha- policial assinada por Joaquim dos
por Jesus. ram-no nos Congressos: Victorien Santos (Juiz Municipal), “oficiali-

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zando o provável início de um de 1873) publicava a obra Os tempos primeiros sete meses de 1895, su-
processo contra pessoas que fa- são chegados, demonstrando que perou incompreensões em momen-
ziam reuniões espíritas noturnas novas ideias faziam parte da cons- tos de dissensões convidando o ho-
no Distrito da Mata de São João trução do pensamento humano. mem a soerguer-se perante o cla-
[...]”. É possível que antes dessa Na mesma capital, ideais revolu- mor da vida. Na sua obra, A Casa
data, em outras localidades do cionários revelariam, aos espíritas de Deus, publicada pela primeira
país, tal prática fosse comum. A do Brasil e do Mundo, sua face vez em 1894, já dizia:
luta estava travada. amorável na figura do ilustre “Mé-
Outra ocorrência policial, mais dico dos Pobres”, Adolfo Bezerra A ambição, o orgulho, as paixões
tarde, em 1917, ficaria na memó- de Menezes Cavalcanti. e os apetites da matéria a têm
ria espírita, quando Eurípedes Bar- As atividades doutrinárias exerci- afastado [Humanidade], em
sanulfo é processado por fazer uso das por autoridades civis e militares todos os tempos e lugares, do
da mediunidade em benefício dos repercutiam pela imprensa e pelos desempenho fiel dos seus maio-
que sofrem. hábitos de um país em franco des- res deveres.
Em 1853, na cidade de Fortale- pertar espiritual. O marechal Ewer-
za, capital do Ceará, o periódico O ton Quadros, primeiro presidente da Os eventos da verdade não ocor-
Cearense registrava comentários Federação Espírita Brasileira (FEB), riam isolados, mas exigiam dedica-
sobre as mesas girantes, causando médium psicógrafo, abraçou o Espi- ção e foco em seus empreendimen-
sobressalto na população. O pre- ritismo difundindo sua crença, ven- tos. O ideal espírita ganhava reforço.
conceito movido pela ignorância cendo preconceitos e esclarecendo No ano de 1886, acordes divinos
resistia a altos brados. corações visitados pela dor. sopravam na capital da República,
No Rio de Janeiro, na década de Júlio César Leal, um dos pionei- conduzindo mais de duas mil pes-
1860, Casimir Lieutaud (mais tar- ros do Espiritismo no Brasil, que soas à sala de honra da “Guarda
de tesoureiro do Grupo Espiritista também fora presidente da Casa Velha” para um comovente e sin-
“Confúcio”, fundado em 2 de agosto Máter do Espiritismo no Brasil, nos cero convite de Bezerra de Menezes

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(discurso de conversão ao Espiri- ______. Revista espírita: jornal de estudos MONTEIRO, Eduardo C. Túnel do tempo –
tismo) à renovação que atingia psicológicos. n. 1, ano 1, nov. 1858. Trad. as primeiras publicações espíritas no Brasil.
plenitudes de convicção para um Evandro Noleto Bezerra. 4. ed. 3. reimp. Rio São Paulo: Madras Editora, 2005.
Espírito de tamanha envergadura, de Janeiro: FEB, 2011. Polêmica Espírita. ______. Memórias de Bezerra de Menezes.
crivado por provas que o Espiri- KLEIN FILHO, Luciano. Barão de Vasconcelos, São Paulo: Madras Editora, 2005.
tismo só fizera acalentar: um precursor de Kardec no Ceará. In: Anuário NOBRE, Freitas. A perseguição policial
histórico espírita. São Paulo: Madras Edi- contra Eurípedes Barsanulfo. 2. ed. EDICEL,
[...] Minha alma encontrou final- tora, 2003. 1987.
mente onde pousar, tendo deixa- LEAL, Júlio César. A casa de Deus. 3. ed. SOARES, Sylvio Brito. Vida e obra de Be-
do os espaços agitados pelo ven- Rio de Janeiro: FEB, 1928. zerra de Menezes. 13. ed. 1. reimp. Rio de
daval da descrença, da dúvida, do LUCE, Gaston. Léon Denis – o apóstolo Janeiro: FEB, 2010. Vida e obra, p. 62.
ceticismo que devasta, que este- do espiritismo: sua vida, sua obra. Rio de WANTUIL, Zêus. (Org.) Grandes espíritas do
riliza, que calcina, se assim posso Janeiro: Edições CELD, 2003. Brasil. 4. ed. Rio de Janeiro: FEB, 2002.
exprimir-me, recordando as tor-
turas de quem sente a necessi-
dade de crer, mas não encontra
onde assentar sua crença. [...] Novas Atividades
O “Kardec brasileiro”, como
passou a ser conhecido, indicou-
Doutrinárias da FEB
-nos o caminho seguro a trilhar. Iniciam-se no corrente mês, nas Sedes da FEB, em Brasília e no
Seus sucessores e companheiros Rio de Janeiro, novas atividades doutrinárias, as quais consistirão
de primeira hora também segui- no estudo de três das cinco obras de Allan Kardec que compõem a
ram o fluxo do amor, confortando Codificação do Espiritismo.
e esclarecendo corações ampara- Na Sede Seccional do Rio de Janeiro será também inaugurada,
dos pela força de um ideal supe- neste mês, para funcionamento na segunda-feira, das 12h30 às 14h,
rior: o Espiritismo! uma nova turma para o Estudo Sistematizado da Doutrina Espírita
“Nós vos convidamos, a vós ho- (ESDE).
mens, para o divino concerto. To- O Estudo das obras básicas obedecerá à seguinte programação:
mai da lira, fazei uníssonas vossas
vozes, e que, num hino sagrado, Em Brasília:
elas se estendam e repercutam de • O Livro dos Espíritos: domingo – das 9h30 às 11h
um extremo a outro do Universo.” • O Livro dos Médiuns: domingo – das 9h30 às 11h
– Espírito de Verdade • O Evangelho segundo o Espiritismo: quarta-feira – das 20h às 21h30
No Rio de Janeiro:
Referências:
• O Livro dos Espíritos: quinta-feira – das 12h às 13h30
BARRERAS, Florentino. O processo dos espí-
• O Evangelho segundo o Espiritismo: sexta-feira – das 14h30 às 16h
ritas. São Paulo: Madras Editora, 2004.
KARDEC, Allan. Obras póstumas. Trad.
Em ambas as Sedes o estudo de cada obra será realizado no
Guillon Ribeiro. 40. ed. 3. reimp. Rio de
período de março a dezembro.
Janeiro: FEB, 2010. Informações:
______. O evangelho segundo o espiritismo. • Em Brasília: 0XX-61-2101-6161
Trad. Guillon Ribeiro. 130. ed. 1. reimp. • No Rio de Janeiro: 0XX-21-3078-4747
Rio de Janeiro: FEB, 2011. Prefácio.

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Seara Espírita

Rio de Janeiro: As redes sociais e o Uruguai: Federação comemora Jubileu e


Espiritismo lança curso
Ocorreu na cidade do Rio de Janeiro, no dia 29 de A Federação Espírita Uruguaia comemorou seus 25 anos
janeiro, encontro com o tema “O espírita e as re- de fundação, no dia 29 de janeiro, e lançou o Curso
des sociais”, para análise do potencial das redes “Gestão de Centro Espírita”, e passa a ser o primeiro
sociais com vistas à divulgação do Espiritismo. O país a adotar o curso iniciado pela FEB nas modali-
evento foi promovido pelo Conselho Espírita do dades presencial e a distância. Nos eventos realizados
Estado do Rio de Janeiro (CEERJ). Informações em Montevidéu houve a participação do diretor da
<www.ceerj.org.br>. FEB e do CEI, Antonio Cesar Perri de Carvalho, que
também proferiu palestra no Centro Espírita Hacia La
Amazonas: Relacionamento interpessoal Verdad. Informações: <www.espiritismouruguay. com>.
Nos dias 3 a 5 de fevereiro, a Federação Espírita
Amazonense realizou eventos em Manaus, com o DVD do filme Nosso Lar é muito procurado
seminário “Relacionamento interpessoal entre os O DVD do filme Nosso Lar alcançou o 17o lugar en-
membros da reunião mediúnica”, com atuação tre os filmes estrangeiros mais vendidos pela Ama-
de Roberto Fuina Versiani e Marco Rosa, ambos da zon, na 2a quinzena de janeiro. Informações: Foreign
equipe da secretaria-geral do CFN da FEB. No dia 4 Films in Amazon Best Sellers, and find the top 100
de fevereiro foi inaugurada a sede da Sociedade Es- most popular Amazon Foreign Films, na página ele-
pírita Bezerra de Menezes, no município de Mana- trônica: <www.amazon.com>.
quiri, com palestra pelo primeiro, sobre o tema
“Os Convites de Jesus no Coração da Floresta”. Infor- Angola: Visita da FEB e do CEI
mações: <mediunidade.fea@gmail.com>; <www. Nos dias 27 a 29 de janeiro, o presidente da FEB e
femazonas.org.br>. secretário-geral do CEI, Nestor João Masotti, esteve
em visita à Sociedade Espírita Allan Kardec de
Maranhão: Evangelizar almas Angola, localizada em Bluanda, onde mantém exten-
O Departamento de Infância e Juventude da Fe- so trabalho social e outras instituições. Informações:
deração Espírita do Maranhão realizou, nos dias <www.seaka.org>.
28 e 29 de janeiro, a primeira capacitação para
evangelizadores. As atividades foram desenvol- Chico Xavier em “O Maior Brasileiro de
vidas na Sociedade de Estudos Espíritas Ismael Todos os Tempos”
– Centro Espírita Maranhense. À luz do tema Chico Xavier está entre os inscritos no concurso “O
“Evangelizar almas: Educando para a eternida- Maior Brasileiro de Todos os Tempos”, promovido
de” atuaram como palestrantes Cirne Ferreira e pela TV SBT. A votação pela página eletrônica da TV
Tereza Cristina Leite, ambos da equipe do DIJ da foi encerrada no dia 29 de fevereiro. Informações:
FEB. <www.sbt.com.br>.

Pará: A reunião mediúnica espírita Filmes Espíritas na Universidade de Londres


A União Espírita Paraense realizou, em sua sede, um O Clube de Filmes Lusófonos da Universidade de
treinamento, cuja abordagem teve por foco a organi- Londres promoveu a 1a Mostra de Filmes Espíritas
zação e funcionamento da reunião mediúnica espíri- Lusófonos de 21 a 25 fevereiro, incluindo o filme
ta, nos dias 28 e 29 de janeiro. Informações: <www. Nosso Lar. Informações: <oceano.vieira@dvdversa
paraespirita.com.br>. til.com.br>; <bussevents@gmail.com>.

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