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FE D E R A Ç Ã O E S P Í R I T A B R A S I L E I R A

DEUS, CRISTO E CARIDADE Ano 125 • Nº 2.144 • Novembro 2007


ISSN 1413 - 1749

R$ 5,00
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Expediente Sumário
4 Editorial
Na consciência!
11 Entrevista: Evandro Noleto Bezerra

Fundada em 21 de janeiro de 1883 Tradutor de O Livro dos Espíritos recomenda estudo


Fundador: Augusto Elias da Silva
14 Presença de Chico Xavier
De um casarão do outro mundo – Humberto de Campos
Revista de Espiritismo Cristão
Ano 125 / Novembro, 2007 / N o 2.144 21 Esflorando o Evangelho

ISSN 1413-1749 Ensejo ao bem – Emmanuel


Propriedade e orientação da
FEDERAÇÃO ESPÍRITA BRASILEIRA 32 A FEB e o Esperanto
Diretor: NESTOR JOÃO MASOTTI
Diretor-substituto e Editor: ALTIVO FERREIRA Esperanto e Espiritismo
Redatores: AFFONSO BORGES GALLEGO SOARES, ANTONIO
CESAR PERRI DE CARVALHO, EVANDRO 33 Trova / Trobo – Isolino Leal
NOLETO BEZERRA E LAURO DE OLIVEIRA SÃO THIAGO
Secretário: PAULO DE TARSO DOS REIS LYRA 42 Seara Espírita
Gerente: ILCIO BIANCHI
Gerente de Produção: GILBERTO ANDRADE
Equipe de Diagramação: SARAÍ AYRES TORRES, AGADYR
TORRES E CLAUDIO CARVALHO
Equipe de Revisão: MÔNICA DOS SANTOS E WAGNA
5 Renovação e evolução – Juvanir Borges de Souza
CARVALHO 8 Responsabilidade mediúnica –
REFORMADOR: Registro de publicação Manoel Philomeno de Miranda
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n 121.P.209/73 (DCDP do Departamento de Polí-
cia Federal do Ministério da Justiça), 16 Os três estágios – Richard Simonetti
CNPJ 33.644.857/0002-84 • I. E. 81.600.503
19 Base nova, homem novo – Carlos Abranches
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29 Em dia com o Espiritismo – Por que as pessoas

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usam drogas – Marta Antunes Moura
E-mail: feb@febrasil.org.br e 31 Modos de usar – André Luiz
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PARA O BRASIL 34 Literatura Espírita na XIII Bienal do Livro
Assinatura anual R$ 39,00
Número avulso R$ 5,00
36 Cristianismo Redivivo – História da Era Apostólica –
PARA O EXTERIOR Supranaturalismo x Racionalismo –
Assinatura anual US$ 35,00
Haroldo Dutra Dias
Assinatura de Reformador:
Tel.: (21) 2187-8264 • 2187-8274 38 Nada... – Antônio Torres
E-mail:
assinaturas.reformador@febrasil.org.br 39 Seminário sobre “O atendimento nas reuniões
mediúnicas” na FEB-Rio
Projeto gráfico da revista: JULIO MOREIRA
Capa: AGADYR TORRES 40 José Martins Peralva Sobrinho
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Editorial
Na consciência!
D eus, nosso Pai, criou o Universo e tudo o que nele se encontra, seja espiri-
tual ou material.

Criou os Espíritos em condição de igualdade, simples e ignorantes, atribuindo-lhes


a imortalidade e a perfectibilidade, com vistas à sua permanente evolução, intelec-
tual e moral.

Criou as Leis Naturais que permitem a atividade dinâmica do Universo, propi-


ciando habitabilidade e sustentabilidade, indispensáveis à existência e sobrevivên-
cia de todos os seres.

Dentre as Leis Naturais, encontram-se, também, as Leis Morais que norteiam o


relacionamento entre todos os seres humanos, indicando o que devem fazer ou
deixar de fazer, no seu próprio interesse e no interesse da coletividade e do ambiente
físico em que se encontram.

Para que não ficassem desconhecidas e cumprissem os seus objetivos de dar um


sentido à existência humana e de orientar o Espírito em sua caminhada ascensional
rumo à própria perfeição, Deus escreveu as suas Leis na consciência do homem.*

Assim, quando o ser humano tem interesse em saber se está no bom ou no mau
caminho, se a sua decisão é correta ou não, e se o seu gesto colabora ou não com a
harmonia do Universo, basta ouvir e sentir a sua consciência. Para tanto, é necessá-
rio que ela possa manifestar-se livremente, sem as injunções e pressões do orgulho,
do egoísmo, da vaidade ou da prepotência, que obscurecem a compreensão da exis-
tência e mantêm o homem na cegueira espiritual e moral.

Trabalhemos, pois, exercitando-nos na prática do bem, auxiliando, atendendo e


amando o nosso próximo, a fim de construirmos, gradativamente, com perseverança,
os hábitos da humildade, do altruísmo, da simplicidade e da mansuetude, para que
nossa consciência brilhe em toda a sua plenitude, clareando-nos o caminho com as
Leis de Amor, com as quais Deus, nosso Pai e Criador, estabeleceu a harmonia no
Universo.

*Allan Kardec – O Livro dos Espíritos – Questão 621.

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Renovação e
evolução
J U VA N I R B O R G E S DE SOUZA

A
Doutrina Espírita, o Con- ram teorias que contrariam a se verificar as transformações ope-
solador prometido e envia- realidade e a verdade, tais como radas pelos homens em seus co-
do pelo Cristo de Deus pa- o milagre, o céu, o inferno, o pur- nhecimentos, em suas condições
ra permanecer sempre com os ha- gatório, resultantes de interpre- sociais, em sua saúde e em tudo
bitantes deste planeta, é a solução tações inexatas das letras das an- que depende de sua atuação.
natural para problemas humanos tigas escrituras. Entretanto, em um orbe atrasa-
que nenhum dos conhecimentos Todas essas distorções necessi- do, como a Terra, há conhecimentos
filosóficos, religiosos ou científi- tavam de correções, para que o de difícil alcance, que fogem à capa-
cos puderam resolver. progresso do mundo e de seus ha- cidade comum de seus habitantes.
Antes da denominada Terceira bitantes não fosse impedido ou Nesses casos, o auxílio supe-
Revelação havia somente hipóte- contraditado pela ignorância de rior supre as deficiências huma-
ses formuladas pelas doutrinas re- uma realidade transcendente, in- nas, no tempo certo, quando a
ligiosas a respeito do homem, de compatível com crenças irreais ou capacidade de entendimento da
sua origem e do seu destino. descrenças oriundas do materia- população, ou de parte dela, per-
O materialismo, por outro la- lismo inconseqüente. mite a assimilação de coisas no-
do, acobertado com o manto da O progresso é uma das leis di- vas até então desconhecidas.
Ciência, tem distorcido a realidade vinas que incide sobre toda a É o que tem ocorrido desde tem-
dos fatos, negando a existência criação. As próprias criaturas po- pos imemoriais.
de Deus, o Criador do Universo, e dem ser agentes do progresso e O homem primitivo foi evo-
a natureza do homem, que é, na da evolução. luindo, impulsionado por suas
essência, um ser espiritual e não Na Humanidade terrena, basta próprias experiências e por sua
somente um corpo material. comparar duas épocas distancia- inteligência, nas vidas sucessivas
Por sua vez, as religiões cria- das pelos séculos e milênios para neste e em outros mundos.

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Mas o auxílio vindo das Esferas Jesus deixou em seus ensinos o A intolerância dos governantes
Superiores nunca faltou e sempre conhecimento das leis morais, poderosos e o fanatismo alimenta-
esteve presente através de emissá- que Ele sintetizou no Amor, para do por determinadas correntes reli-
rios a serviço do Governador Es- melhor compreensão daqueles que giosas, geradoras do fundamentalis-
piritual deste orbe. ouviram suas lições, expressas mui- mo, ainda subsistem nos dias atuais.
A história conhecida da Huma- tas vezes de forma alegórica, para Mas seu predomínio ocorreu em
nidade registra a presença desses se projetarem no futuro. toda a Idade Média e na Idade Mo-
enviados, na Antigüidade, no seio Apesar do método utilizado ser derna, até os fins do século XVIII,
de todos os povos: na China e na o mais apropriado a inteligências com o marco inconfundível da Re-
Índia milenares, no Egito, na Pér- e compreensões pouco desenvolvi- volução Francesa. Embora usando
sia e na Mesopotâmia, na Grécia e das, sabia o Mestre que sua Mensa- a violência, esse acontecimento his-
na Europa das Idades Medieval, gem não seria compreendida inte- tórico trouxe a conquista da liberda-
Moderna e Contemporânea. gralmente, no seu verdadeiro sen- de, com os ideais da igualdade e da
A denominada Primeira Reve- tido, não só pelos que se opunham fraternidade, aspirações de ideali-
lação, através de Moisés, não ex- a ela, mas também por muitos dos zadores de um mundo melhor, sem
clui muitas outras ocorridas no que a aceitaram, na época de sua as imposições descabidas do atra-
seio dos povos antigos. presença, ou no futuro distante. so, do absolutismo e da ignorância.
Mas a presença do Espírito Sabendo dessa realidade e pre- Somente com a conquista da li-
“mais perfeito que Deus tem ofere- vendo o que aconteceria no porvir, berdade, que se tornou a base para
cido ao homem, para lhe servir de com o desvirtuamento do sentido uma nova era na história da Hu-
guia e modelo” – Jesus, o Cristo – é de vários de seus ensinos, prometeu manidade, foi possível o envio do
a comprovação mais evidente de pedir ao Pai o envio, posteriormen- Consolador, que trouxe consigo
que a Humanidade, como toda a te, do Consolador, destinado a per- novas idéias e novos princípios que
criação, nunca estão sós. Deus, cau- manecer com os homens, lembrar- contrariam e retificam velhos con-
sa primária de todas as coisas e o -lhes as lições esquecidas ou mal in- ceitos, admitidos e assentes tanto
Governador da Terra cuidam, per- terpretadas, retificar os enganos do nas ciências quanto nas religiões.
manentemente, de sua evolução, entendimento humano e ainda tra- Se houvesse chegado antes dos
através das leis divinas ou naturais. zer o conhecimento de coisas novas. meados do século XIX, teria sido
A harmonia que existe em todo O Consolador prometido é a perseguido e dificilmente se fir-
o Universo, independentemente da Doutrina dos Espíritos, o Espiritis- maria em uma sociedade domi-
diversidade dos milhões de mun- mo, doutrina abrangente que mos- nada por interesses que se con-
dos existentes, demonstra a per- tra o caminho certo e a porta estrei- trapunham às verdades e às reali-
feição dessas leis, tanto no âmbito ta para o encontro com a felicida- dades de uma nova Revelação.
material quanto no moral. de, a que todos os homens aspiram.

Com a Revelação Espírita po- Sua vinda só se tornou possível
demos perceber alguns caracterís- muitos séculos após a promessa A presença do Espiritismo en-
ticos das leis divinas ou naturais: de Jesus, com o advento de um tre os homens tem uma impor-
a) promanam do Criador; mundo renovado pela evolução tância excepcional para uma nova
b) são de todos os tempos; natural em diversas áreas de atua- fase de conhecimentos e de pro-
c) são invioláveis, eternas e imu- ção do homem, tais como o pro- gresso moral da Humanidade.
táveis; gresso das ciências, a conquista das Suas verdades fundamentais,
d) são perfeitas e harmônicas; liberdades e o controle dos pode- especialmente seus esclarecimen-
e) constituem, para o homem, o res absolutistas dos governantes e tos sobre a vida do Espírito nas Es-
roteiro para a busca da felicidade. das direções religiosas. feras espirituais, após a morte do

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timentos elevados nas populações,


tornando possível a solidariedade,
a justiça e a compreensão no seio
das sociedades humanas.
Por desconhecimento dessas
verdades, fracassaram as tentativas
de resolver os grandes problemas
da organização social com base
na luta de classes, como se a so-
lução de um problema tão com-
plexo estivesse simplesmente na
substituição de uma classe do-
minante por outra mais nume-
rosa, qual a dos operários e tra-
balhadores em geral.
Essa teoria, de fundamento
Quadro A Liberdade guiando o Povo, inspirado na Revolução Francesa,
puramente materialista, baseada
pintado por Eugène Delacroix
no Manifesto Comunista de Karl
corpo físico, as vidas sucessivas também da percepção correta do Marx, de 1848, projetou-se por
nas reencarnações, a origem e a que é o homem, essência espiritual todo o século XX e foi mais uma
criação dos seres espirituais, os es- imortal ligada a um corpo material experiência fracassada na busca
clarecimentos sobre as leis divinas perecível, de onde ele vem e para de melhores condições para uma
ou naturais, atuantes em todo o onde vai, em sucessivas vidas físicas. sociedade mais justa, por partir de
Universo, e muitas outras questões O conhecimento de si mesmo, pressupostos falsos e enganosos.
essenciais, formam um conjunto recomendado pelo sábio grego da A civilização atual notabilizou-
sobre o qual o homem tem for- Antigüidade, antes da vinda do -se pela influência dos conheci-
mulado hipóteses que desvirtuam Cristo, continua válido na atuali- mentos científicos e pela aplica-
a realidade e contrariam os fatos. dade e no futuro. ção da Tecnologia em muitas ati-
Esses novos conhecimentos A própria renovação social, as- vidades humanas.
constituem a base sobre a qual se piração generalizada por toda par- Entretanto, o progresso autên-
apoiará uma renovação necessária te, necessita embasar-se em co- tico não pode ser medido pelo de-
no planeta que habitamos. nhecimentos sólidos e verdadeiros, senvolvimento somente no cam-
Correspondem esses esclareci- geradores da solidariedade, em po dos conhecimentos, sem a con-
mentos à promessa de Jesus for- seu sentido moral, capaz de vin- jugação com o cultivo dos senti-
mulada quando de sua passagem cular as individualidades huma- mentos sintetizados no amor.
pela Terra, há dois mil anos: nas a todos os seus semelhantes. No aperfeiçoamento do ser hu-
“Conhecereis a verdade e ela vos As injustiças sociais, oriundas mano não basta o cultivo da inteli-
libertará”. (João, 8:32.) dos privilégios de classes e das leis gência e dos interesses materiais da
As verdades e conhecimentos no- humanas injustas, assentam-se no vida. Torna-se imprescindível o de-
vos revelados pelo Consolador são egoísmo, no orgulho e na igno- senvolvimento, também, dos sen-
fundamentais para que a Humani- rância dos homens. Só terão fim timentos da humildade, da fé, da
dade, ao lado do progresso natural com a renovação individual, pelo paciência, da compreensão, da so-
produzido pelos avanços científicos conhecimento e aceitação das ver- lidariedade, que são desdobramen-
e tecnológicos, possa se beneficiar dades eternas, geratrizes dos sen- tos e manifestações do amor.

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Responsabilidade
mediúnica
U
ma reunião mediúnica sé-
ria, à luz do Espiritismo, é
constituída por um con-
junto operacional de alta qualida-
de, em face dos objetivos superio-
res que se deseja alcançar.
Tratando-se de um empreendi-
mento que se desenvolve no cam-
po da energia, requisitos graves
são exigidos, de forma que sejam
conseguidas as realizações, passo
a passo, até a etapa final.
Não se trata de uma atividade Componentes da reunião*
com características meramente Resultado de dois aglomerados dos, ao tempo em que se encar-
transcendentais, mas de um labor de servidores lúcidos – desencar- regam de produzir a defesa do
que se fundamenta na ação da ca- nados e reencarnados – que têm recinto, a seleção daqueles que se
ridade, tendo-se em vista os Espí- como responsabilidade primor- deverão comunicar, providen-
ritos aos quais é direcionado. dial manter a harmonia de propó- ciando mecanismos de socorro
Formada por um grupamento sitos e de princípios, a fim de que para antes e depois dos atendi-
de pessoas responsáveis e conscien- os labores que programam sejam mentos.
tes do que deverão realizar, recebe- executados em perfeito equilíbrio. Confiando na equipe humana
ram preparação anterior, de modo Para ser alcançada essa sin- que assumiu a responsabilidade
a corresponderem aos misteres a cronia, ambos os segmentos com- pela participação no trabalho de
que todos são convocados para prometem-se a atender os compro- graves conseqüências, movimen-
exercer, no santificado lugar em missos específicos que devem ser tam-se, desde às vésperas, estabe-
que se programa a sua execução. executados. lecendo os primeiros contatos psí-
Deve compor-se de conhecedo- Aos Espíritos orientadores com- quicos daqueles que se comunica-
res da Doutrina Espírita e que pete a organização do programa, rão com os médiuns que lhes ser-
exerçam a prática da caridade sob desenhando as responsabilidades virão de instrumento, desenvol-
qualquer aspecto possível, de ma- para os cooperadores reencarna- vendo afinidades vibratórias com-
neira a conduzirem créditos mo- patíveis com o grau de necessidade
rais perante os Soberanos Códi- *N. da R.: As fotos que ilustram este arti- de que se encontram possuídos.
gos da Vida, assim atraindo as En- go são do livro Desobsessão, do Espírito Encarregam-se de orientar
André Luiz, psicografias de Francisco C.
tidades respeitáveis e preocupadas Xavier e Waldo Vieira, Ed. FEB de 2007, aqueles que se comunicarão, auxi-
com o bem da Humanidade. p. 19, 35 e 57. liando-os no entendimento do

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mecanismo mediúnico, para evi- do outro segmento, formando um os Espíritos nobres que anelam
tar choques e danos à aparelhagem todo harmônico. por criar uma nova mentalidade
delicada da mediunidade, tanto Aos médiuns é imprescindível entre as criaturas terrestres, supe-
no que diz respeito às comunica- a serenidade interior, a fim de rando as perturbações ora vigentes
ções psicofônicas atormentadas poderem captar os conteúdos das no planeta.
quanto às psicográficas de confor- comunicações e as emoções dos Não é, porém, responsável so-
to moral e de orientação. convidados espirituais ao trata- mente o medianeiro, embora gran-
Cuidam de vigiar os comuni- mento de que necessitam. de parte dos resultados dependam
cantes, poupando os componen- A mente equilibrada, as emo- da sua atuação dignificadora, o que
tes da reunião de agressões e de ções sob controle, o silêncio ínti- lhe constituirá sempre motivo de
distúrbios defluentes da agitação mo, facultam o perfeito registro das bem-estar e de felicidade, por des-
dos enfermos mentais e morais, mensagens de que são portadores, cobrir-se como instrumento do
bem como das distonias emocio- contribuindo eficazmente para a amor a serviço de Jesus entre os
nais dos perversos que também catarse das aflições dos seus agentes. seus irmãos.
são conduzidos ao atendimento. O médium sabe que a faculdade Aos psicoterapeutas dos desen-
Encarregam-se de orientar o cri- é orgânica, mantendo-se em clima carnados é impositivo fundamen-
tério das comunicações, estabele- de paz sempre que possível, não tal o equilíbrio pessoal, a fim de
cendo de maneira prudente a sua apenas nos dias e nas horas reserva- que as suas palavras não sejam vãs,
ordem, para evitar tumulto duran- das para as tarefas especiais de na- e estejam cimentadas pelo exemplo
te o ministério de atendimento, as- tureza socorrista, porquanto Espí-
sim como impedindo que o tempo ritos ociosos, vingadores, insensa-
seja malbaratado por inconseqüên- tos que envolvem o planeta encon-
cia do padecente desencarnado. tram-se de plantão para gerar di-
Nunca improvisam, porquanto ficuldades e estabelecer conflitos
todos os detalhes do labor são de- entre as criaturas invigilantes.
vidamente examinados antes, e Por outro lado, o exercício da
quando algo ocorre que não esta- caridade no comportamento nor-
va previsto, existem alternativas mal, o estudo contínuo
providenciais que impedem os da Doutrina e a
desequilíbrios no grupo. serenidade moral,
Equipamentos especializados são-lhe de grande
são distribuídos no recinto para valia, porque atraem
utilização oportuna, enquanto
preservam o pensamento eleva-
do ao Altíssimo...
Concomitantemente, cabem aos
membros reencarnados as res-
ponsabilidades e ações bem defi-
nidas, para que o conjunto se mo-
vimente em harmonia e as comu-
nicações fluam com facilidade e
equilíbrio.
Todo o conjunto é resultado de
interdependência, de um como

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ra o conjunto, sendo lamentável


essa autopermissão...
Aos médiuns passistas cabem
os cuidados para se manterem
receptivos às energias saudáveis
que provêm do Mundo Maior,
canalizando-as para os transeun-
tes de ambos os planos no mo-
mento adequado.
Todo o movimento entre as duas
esferas de ação deve acontecer suave-
mente, como num centro cirúrgico,
que o é, de modo a refletir-se na segu-
rança do atendimento que se opera.
Os círculos mediúnicos sérios,
de retidão e de trabalho a que se de, o respeito e o apoio dos Ben- que atraem os Espíritos nobres
afervoram. feitores auxiliem-nos na conquis- e que encaminham para os seus
O seu verbo será mantido em ta de si mesmos. serviços aqueles desencarnados
clima coloquial e sereno, dialogan- Numa reunião mediúnica sé- que lhes são confiados, não podem
do com ternura e compaixão, sem ria, não há lugar para dissimula- ser resultado de improvisações,
o verbalismo inútil ou a presunção ções, ressentimentos, antipatias, mas de superior programação.
salvacionista, como se fosse porta- censuras, porque todos os elemen- Os membros que os consti-
dor de uma elevação irretocável. tos que a constituem têm caráter tuem estarão sempre atentos aos
Os sentimentos de amor e de mi- vibratório, dando lugar a sintonias compromissos assumidos, de for-
sericórdia igualmente devem ser compatíveis com a carga emocio- ma que possam cooperar com os
acompanhados pelos compromissos nal de cada onda mental emitida. Mentores em qualquer momento
de disciplina, evitando diálogos de- Desse modo, não há porque al- que se faça necessário, mesmo fo-
morados e insensatos feitos de deba- guém preocupar-se em enganar o ra do dia e horário estabelecidos.
tes inconseqüentes, tendo em vista outro, porquanto, se o fizer, a pro- Pontualidade de todos na fre-
que a oportunidade é de socorro e blemática somente a ele próprio qüência, cometimento de conduta
não de exibicionismo intelectual. perturbará. no ambiente, unção durante os
O objetivo da psicoterapia pela À equipe de apoio se reservam as trabalhos e alegria por encontrar-
palavra e pelas emanações men- responsabilidades da concentração, -se a serviço de Jesus, são requisi-
tais e emocionais de bondade não da oração, da simpatia aos comu- tos indispensáveis para os resulta-
é o de convencer o comunicante, nicantes, acompanhando os diá- dos felizes de uma reunião me-
mas o de despertá-lo para o esta- logos com interesse e vibrando em diúnica séria à luz do Espiritismo.
do em que se encontra, predis- favor do enfermo espiritual, a fim
pondo-o à renovação e ao equilí- de que possa assimilar os conteúdos Manoel Philomeno de Miranda
brio, nele se iniciando o desperta- saudáveis que lhe são oferecidos.
mento para a vida espiritual. Nunca permitir-se adormecer (Página psicografada pelo médium Dival-
Conduzir-se com disciplina mo- durante a reunião, sob qualquer do Pereira Franco, na reunião mediúnica
ral, no dia-a-dia da existência, é justificativa em que o fenômeno da noite de 28 de agosto de 2007, no
um item exigível a todos os mem- se lhe apresente, porque esse com- Centro Espírita Caminho da Redenção, em
bros da grei, a fim de que a amiza- portamento gera dificuldades pa- Salvador, Bahia.)

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Entrevista E VA N D R O N O L E TO B E Z E R R A

Tradutor de
O Livro dos Espíritos
recomenda estudo
Evandro Noleto Bezerra tem traduzido obras de Kardec, recém-publicadas pela FEB.
Para o entrevistado não se pode conhecer a Doutrina Espírita sem fazer um estudo
aprofundado das obras do Codificador
Reformador: Qual a sua motivação neira alguma, desmerecer o traba- deveria ter agido, servindo-se da
para a tradução das obras de lho grandioso, heróico mesmo, le- linguagem da sua época, aquela
Kardec? vado a cabo pelo Dr. Guillon Ri- que estava em voga na década de
Evandro: Há cerca de cinco anos, beiro, tendo em vista a sua cultu- vinte do século passado, e o fez
em conversa com o presidente ra e capacidade inquestionáveis muito bem, atento ao público a
Nestor João Masotti, discorríamos no trato das línguas portuguesa e quem se dirigia, a maior parte
sobre as dificuldades encontradas francesa, bem assim o seu com- composta de pessoas de nível in-
por muitos leitores que compul- pleto domínio nas questões relati- telectual diferenciado, consideran-
sam as obras básicas da Codifica- vas ao Espiritismo. Ele agiu como do-se, então, as dificuldades ma-
ção Espírita editadas pela FEB, teriais que impediam o povo de ter
tendo em vista a linguagem erudi- acesso aos livros. Nossa motivação
ta, recheada de expressões comple- para traduzir as obras de Allan
xas e vocábulos peculiares à época Kardec, portanto, tivera e tem em
em que foram escritas, hoje em vista facilitar aos leitores despro-
desuso ou pouco empregados, ten- vidos de maiores recursos intelec-
do em vista o próprio dinamismo tuais a correta compreensão da-
da língua portuguesa. Além disso, quilo que estão lendo, por meio
a própria estrutura das frases, de uma linguagem leve, mais sol-
com inversões e interposições ta, recheada de termos e ex-
freqüentes, tornava a leitura pressões mais próxi-
um tanto cansativa, exi- mos da sua realida-
gindo do leitor maior do- de cotidiana, sem
se de atenção para a exa- prejuízo da corre-
ta compreensão e assi- ção da língua e
milação dos ensina- com escrupulosa
mentos ali contidos. observância da fi-
Com isso, não pre- delidade ao texto
tendemos, de ma- original, o que

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não significa, de modo algum, um “Aviso”, espécie de prefácio, por de tradução da coleção da Revista
que tenhamos traduzido ao pé da meio do qual Allan Kardec faz Espírita (1858-1869)?
letra, obrigados que fomos, algu- uma apreciação da obra e destaca Evandro: A Revista Espírita foi o
mas vezes, a nos servir de paráfra- as diferenças entre a 1a e a 2a edi- nosso primeiro trabalho de tradu-
ses e a substituir palavras e expres- ção do livro, sobretudo o aumen- ção, iniciado em setembro de 2001
sões sem correspondência com a to considerável de perguntas de e concluído em fevereiro de 2005.
nossa língua. Além disso, traduzir 501 para 1019, “Aviso” esse que não Com mais de seis mil páginas,
as obras de Allan Kardec repre- tem sido incluído em edições bra- divididas em doze alentados volu-
sentava uma oportunidade ines- sileiras e francesas, apesar de ter mes, serviu a Allan Kardec de la-
quecível de estudarmos a fundo a sido mantido em todas as edições boratório experimental para que
Codificação Espírita e, de certa publicadas por Kardec enquanto ele pudesse expor as idéias dos ho-
forma, mergulharmos na psicos- encarnado. Muito importante, mens e dos Espíritos acerca dos
fera abençoada do Codificador também, é a “Nota” que se segue princípios do Espiritismo que, en-
do Espiritismo. aos “Prolegômenos”, por meio da tão, dava seus primeiros passos,
qual Allan Kardec informa que o antes de validá-los e incorporá-los
Reformador: Qual o diferencial da livro só foi publicado depois de nas obras básicas que viria a publi-
nova tradução de O Livro dos ter sido cuidadosamente revisto e car, atento ao critério da concor-
Espíritos? corrigido pelos próprios Espíritos, dância e da universalidade do en-
Evandro: Embora a 2a impressão inclusive as observações e comen- sino dos Espíritos. Foi uma espé-
da 2a edição de O Livro dos Espíri- tários que ele aditou ao texto. Em- cie de tribuna livre, permitindo a
tos seja considerada a edição defi- bora excluída mais tarde (10a edi- Allan Kardec um contato mais di-
nitiva da obra, servindo de base ção – 1863), a nova edição da FEB reto com os leitores e simpatizan-
para as traduções nas diversas lín- contempla a sua tradução inte- tes da Doutrina Espírita. Ali o Co-
guas, o primeiro livro da Codifi- gral. Finalmente, para ficarmos dificador se expõe todo inteiro, re-
cação Espírita sofreu pequenas al- apenas com estes três exemplos, vela particularidades da sua vida
terações, acréscimos e supressões pois que há outros, as últimas pá- íntima, as lutas e os desafios que
ao longo das edições que se foram ginas do livro estampam uma teve de vencer para materializar na
sucedendo, até a 12a, de 1864, o “Errata”, que, embora não tendo Terra o Consolador prometido
que nos leva a afirmar que esta é, sido incorporada ao texto do li- por Jesus Cristo. Embora sendo
de fato, a edição definitiva de O vro, complementa algumas obser- uma obra subsidiária, comple-
Livro dos Espíritos. Nossa tradu- vações de Kardec disseminadas ao mentar da Doutrina Espírita, me-
ção destacou cada uma dessas al- longo da obra. Isto do ponto de receu de Allan Kardec o mesmo
terações, a fim de que ficassem vista dos registros históricos. Em cuidado e o mesmo carinho com
devidamente consignados os re- nossa opinião, porém, o maior di- que ele se houve na publicação das
gistros históricos relacionados ferencial da nova tradução está na obras básicas. Durante o processo
com as publicações originais do simplicidade, na clareza, na leveza de tradução dos volumes que
livro, facultando aos estudiosos do estilo e na atualização de algu- constituem a Revista Espírita
da Doutrina Espírita que não dis- mas palavras e expressões pouco ocorreu-nos um fato inusitado e
põem dos originais franceses o usadas atualmente e que podem muito gratificante: à medida que
acesso fácil e rápido a informa- impedir ou dificultar a compre- íamos traduzindo, sentíamo-nos
ções valiosas não contempladas ensão dos leitores. como que transportado para os
nas demais traduções disponíveis locais e eventos citados por Allan
em nosso país. Eis alguns exem- Reformador: Quais os principais Kardec, neles tomando parte como
plos. Logo no início do livro há registros que teria sobre o trabalho se de fato estivéssemos presente,

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circunstância que também se re- não obstante as alusões caluniosas Evandro: As bases fundamentais
novou quando traduzimos as suas de que vivia à custa da Doutrina do Espiritismo estão contidas in-
viagens espíritas pelo interior da Espírita. Além disso, essas viagens tegralmente nas obras de Allan
França. Em resumo, consideramos permitiram a Allan Kardec estabe- Kardec, de modo que não se pode
a Revista Espírita como uma das lecer um contato mais direto com conhecer a Doutrina Espírita sem
maiores contribuições de Allan os dirigentes espíritas, auscultar fazer um estudo aprofundado de
Kardec à vulgarização do Espiri- suas dificuldades e necessidades, tais obras. O Livro dos Espíritos re-
tismo, uma verdadeira autobio- ouvir suas opiniões e dirimir suas sume de forma admirável os con-
grafia do Codificador, um patri- dúvidas, sem imposições nem aco- ceitos que o espírita consciencioso
mônio inestimável de informações modações de quaisquer espécies. deve esforçar-se por compreender
e de emoções sempre renovadas, e pôr em prática, visto que contém
mas a que nem todos os espíritas Reformador: Há projetos para “os princípios da Doutrina Espírita
dispensam a devida atenção. outras traduções? sobre a imortalidade da alma, a na-
Evandro: Sim. É nossa intenção tureza dos Espíritos e suas relações
Reformador: Como sentiu os rela- traduzir as demais obras de Allan com os homens, as Leis Morais, a
tos de Kardec em Viagem Espírita Kardec. Além da Edição Come- vida presente, a vida futura e o por-
em 1862? morativa de O Livro dos Espíritos, já vir da Humanidade”. Como estu-
Evandro: Realizada nos meses de traduzimos O Evangelho segundo o dar as obras complementares, so-
setembro e outubro de 1862, foi Espiritismo e O Livro dos Médiuns, bretudo as de cunho científico, sem
essa a principal viagem de Allan a serem publicados no 1o semestre conhecer as bases da obra funda-
Kardec pelo interior da França, a do próximo ano. Atualmente, esta- mental? Como separar o joio do
serviço do Movimento e da Dou- mos ocupados com a tradução de trigo, principalmente agora, quan-
trina Espírita. Eram tempos herói- O Céu e o Inferno, restando por tra- do tantas obras de procedência du-
cos, difíceis, com meios de locomo- duzir A Gênese, Obras Póstumas e vidosa e até mesmo antidoutriná-
ção precários e sem conforto, mas O que é o Espiritismo. Nosso obje- rias são lançadas sem qualquer cri-
que não intimidaram o Codifica- tivo continua sendo o mesmo já re- tério no mercado livreiro, cada vez
dor em seu esforço de orientar os velado no tópico inicial desta en- mais florescente? Segue-se a leitura
centros espíritas que então se disse- trevista: atualizar a linguagem dos de O Livro dos Médiuns, que con-
minavam naquele país. O que ca- livros e facilitar o entendimento e tém a parte experimental do Espi-
racteriza tais relatos é a surpreen- a compreensão dos leitores. Pelo ritismo, O Céu e o Inferno e A Gê-
dente atualidade e oportunidade menos envidamos esforços para nese, nada impedindo que O Evan-
dos conceitos e conselhos expen- que assim suceda, estando sempre gelho segundo o Espiritismo seja lido
didos por Allan Kardec nas diversas aberto a críticas e sugestões que antes ou depois dessas obras, dado
cidades por onde passou naquele possam contribuir para aperfeiçoar o seu caráter eminentemente con-
tempo, bem como a sua preocupa- o nosso modesto trabalho, críticas solador. Finalmente, o leitor não
ção com a unidade doutrinária e a e sugestões que não nos têm falta- deve esquecer de Obras Póstumas
união dos espíritas em torno dos do e que nos estimulam a perseve- e da Revista Espírita, os grandes
postulados de que era o mais lídi- rar no ideal que abraçamos com desconhecidos da literatura kar-
mo representante. O mesmo suce- tanto carinho e dedicação. dequiana, a despeito da riqueza de
deu com outras viagens que ele ensinamentos que irradia de suas
realizou posteriormente, na França Reformador: Com base na expe- páginas verdadeiramente ilumina-
e na Bélgica, sempre a serviço do riência de leitura detalhada e pen- das. Só então teremos autoridade
Espiritismo, viagens que ele cobria sada das obras do Codificador, teria e segurança “para ler tudo e reter
com recursos do próprio bolso, alguma recomendação aos leitores? o que for bom”.

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Presença de Chico Xavier

De um casarão
do outro mundo
M
uitas vezes pensei que outras fossem as ao som de harmonias deliciosas para acalentar o sono
surpresas que aguardassem um morto, de- das filhas de Aqueronte e da Noite, a fim de que não vies-
pois de entregar à terra os seus despojos. sem, com as suas achas incandescentes e víboras maldi-
Como um menino que vai pela primeira vez a uma tas, perturbar a paz dos que ali esqueciam os sofrimen-
feira de amostras, imaginava o conhecido chaveiro dos tos, em repouso beatífico. De vez em quando se organi-
grandes palácios celestiais. Via S. Pedro de mãos encla- zariam, nessa região maravilhosa, solenidades e festas
vinhadas debaixo do queixo, óculos de tartaruga, como comemorativas dos mais importantes acontecimentos
os de Nilo Peçanha, assestados no nariz, percorrendo da Igreja. Os papas desencarnados seriam os oficiantes
com as suas vistas sonolentas e cansadas os estudos téc- das missas e Te-Déuns de grande gala, a que comparece-
nicos, os relatórios, os mapas e livros imensos, enuncia- riam todos os santos do calendário; S. Francisco Xavier,
dores do movimento das almas que regressavam da com o mesmo hábito esfarrapado com que andou pre-
Terra, como destacado amanuense de secretaria. Pre- gando nas Índias; S. José, na sua indumentária de car-
sumia-o um velhote bem conservado, igual aos senado- pinteiro; S. Sebastião, na sua armadura de soldado roma-
res do tempo da monarquia no Brasil, cofiando os lon- no; Santa Clara, com o seu perfil lindo e severo de mado-
gos bigodes e os fios grisalhos da barba respeitável. na, sustentada pelas mãos minúsculas e inquietas dos
Talvez que o bom do apóstolo, desentulhando o baú de arcanjos, como rosas de carne loura. As almas bem con-
suas memórias, me contasse algo de novo: algumas ceituadas representariam, nas galerias deslumbrantes, os
anedotas a respeito de sua vida, segundo a versão popu- santos que a Igreja inventou para o seu hagiológio.
lar; fatos do seu tempo de pescarias, certamente cheios Mas... não me foi possível encontrar o Céu.
das estroinices de rapazola. As jovens de Séforis e de Julguei, então, que os espíritas estavam mais acerta-
Cafarnaum, na Galiléia, eram criaturas tentadoras com dos em seus pareceres. Deveria reencontrar os que
os seus lábios de romã amadurecida. S. Pedro por certo haviam abandonado as suas carcaças na Terra, conti-
diria algo de suas aventuras, ocorridas, está claro, antes nuando a mesma vida. Busquei relacionar-me com as
da sua conversão à doutrina do Nazareno. falanges de brasileiros emigrados do outro mundo.
Não encontrei, porém, o chaveiro do Céu. Nessa de- Idealizei a sociedade antiga, os patrícios ilustres aí refu-
cepção, cheguei a supor que a região dos bem-aventura- giados, imaginando encontrá-los em uma residência
dos deveria ficar encravada em alguma cordilheira de principesca como a do Marquês de Abrantes, instalada
nuvens inacessíveis. Tratava-se, certamente, de um re- na antiga chácara de Dona Carlota, em Botafogo, onde
canto de maravilhas, onde todos os lugares tomariam recebiam a mais fina flor da sociedade carioca das últi-
denominações religiosas, na sua mais alta expressão sim- mas décadas do segundo reinado, cujas reuniões, com-
bólica: Praça das Almas Benditas, Avenida das Potências postas de fidalgos escravocratas da época, ofuscavam a
Angélicas. No coração da cidade prodigiosa, em paços simplicidade monacal dos Paços de S. Cristóvão.
resplandecentes, Santa Cecília deveria tanger a sua harpa E pensei de mim para comigo: Os rabinos do Siné-
acompanhando o coro das onze mil virgens, cantando drio, que exararam a sentença condenatória de Jesus

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Cristo, quererão saber as novidades de Hitler, na sua E, na graça de quem, esvaziando copos, andou en-
fúria contra os judeus. Os remanescentes do príncipe chendo o tonel das Danaides, desfolha o caderno de
de Bismarck, que perderam a última guerra, desejariam suas anedotas mais recentes.
saber qual a situação dos negócios franco-alemães. A vida, entretanto, não é mais idêntica à da Terra.
Contaria aos israelitas a história da esterilização, e aos Novos hábitos. Novas preocupações e panoramas no-
seguidores do ilustre filho de Schönhausen as questões vos. A minha situação é a de um enfermo pobre que se
do plebiscito do Sarre. Cada bem-aventurado me viria visse de uma hora para outra em luxuosa estação de
fazer uma solicitação, às quais eu atenderia com as águas, com as despesas custeadas pelos amigos. Resta-
habilidades de um porta-novas acostumado aos praze- belecendo a saúde, estudo e medito. E meu coração, ao
res maliciosos do boato. descerrar as folhas diferentes dos compêndios do infi-
Enganara-me, todavia. Ninguém se preocupava com nito, pulsa como o do estudante novo.
a Terra, ou com as coisas da sua gente. Sinto-me novamente na infância. Calço os meus ta-
Tranqüilizem-se, contudo, os que ficaram, porque, manquinhos, visto as minhas calças curtas, arranjo-me
se não encontrei o Padre Eterno com as suas longas à pressa, com a má vontade dos garotos incorrigíveis, e
barbas de neve, como se fossem feitas de paina alva e vejo-me outra vez diante da Mestra Sinhá, que me olha
macia, segundo as gravuras católicas, não vi também o com indulgência, através da sua tristeza de virgem
Diabo. desamada, e repito, apontando as letras na cartilha: –
Logo que tomei conta de mim, conduziram-me a A B C... A B C D E...
um solar confortável, como a Casa dos Bernardelli, na Ah! meu Deus, estou aprendendo agora os lumino-
praia de Copacabana. Semelhante a uma abadia de fra- sos alfabetos que os teus dedos imensos escreveram
des na Estíria, espanta-me o seu aspecto imponente e com giz de ouro resplandecente nos livros da Natureza.
grandioso. Procurei saber nos anais desse casarão do Faze-me novamente menino para compreender a lição
outro mundo as notícias relativas ao planeta terreno. que me ensinas! Sei hoje, relendo os capítulos da tua
Examinei os seus in-fólios. Nenhum relato havia a res- glória, por que vicejam na Terra os cardos e os jasmi-
peito dos santos da corte celestial, como eu os imagina- neiros, os cedros e as ervas, por que vivem os bons e os
va, nem alusões a Mefistófeles e ao Amaldiçoado. Igno- maus, recebendo, numa atividade promíscua, os bene-
rava-se a história do fruto proibido, a condenação dos fícios da tua casa.
anjos rebelados, o decreto do dilúvio, as espantosas vi- Não trago do mundo, Senhor, nenhuma oferenda
sões do evangelista no Apocalipse. As religiões estão na para a tua grandeza! Não possuo senão o coração,
Terra muito prejudicadas pelo abuso dos símbolos. exausto de sentir e bater, como um vaso de iniqüidades.
Poucos fatos relacionados com elas estavam naqueles Mas, no dia em que te lembrares do mísero pecador
documentos. que te contempla no teu doce mistério como lâmpada
O nosso mundo é insignificante demais, pelo que de luz eterna, em torno da qual bailam os sóis como pi-
pude observar na outra vida. Conforta-me, porém, rilampos acesos dentro da noite, fecha os teus olhos
haver descoberto alguns amigos velhos, entre muitas misericordiosos para as minhas fraquezas e deixa cair
caras novas. nesse vaso imundo uma raiz de açucenas. Então, Se-
Encontrei o Emílio radicalmente transformado. nhor, como já puseste lume nos meus olhos, que ainda
Contudo, às vezes, faz questão de aparecer-me de ven- choram, plantarás o lírio da paz no meu coração que
tre rotundo e rosto bonacheirão, como recebia os ami- ainda sofre e ainda ama.
gos na Pascoal, para falar da vida alheia.
– “Ah! filho – exclama sempre –, há momentos nos Pelo Espírito Humberto de Campos
quais eu desejaria descer ao Rio, como o homem invi-
Fonte: XAVIER, Francisco C. Crônicas de além-túmulo. 15. ed. Rio
sível de Wells, e dar muita paulada nos bandidos de de Janeiro: FEB, 2007. p. 15-20. Mensagem recebida em 27 de
nossa terra.” março de 1935.

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Os três
estágios
RICHARD SIMONETTI

D
esde Freud, as doutrinas vendo família, profissão, socie- 
psicológicas aprofundam a dade, saúde...
idéia de que é preciso cui- Tudo tem sua razão de ser. Em O Evangelho segundo o Es-
dar da mente, pôr ordem na casa Familiares difíceis são testes piritismo, capítulo VIII, item 7,
mental para que sejamos felizes. de paciência. Kardec comenta os três estágios
De fato, pensamento ajustado Doenças e limitações físicas são em que podemos nos situar, de
é o caminho para que vivamos em válvulas de escoamento de impu- acordo com o que pensamos.
paz, ainda que convivendo com rezas espirituais. Há aquele que sequer concebe
problemas e dificuldades, dores e Dificuldades profissionais são a idéia do mal.
dissabores. desafios. Não julga, não critica, não co-
O Espiritismo nos ajuda nes- Tudo obedece a mecanismos biça, não inveja, não se exalta, não
se particular, oferecendo-nos ex- de causa e efeito, em que colhe- se mortifica…
plicações claras e objetivas so- mos hoje o que semeamos ontem. É alguém sintonizado com os rit-
bre os porquês da vida, envol- Se não identificamos nesta exis- mos do Universo, Espírito superior,
tência nada que justifique nossas capaz de só pensar o Bem, em plena
dificuldades, certamente haverá sintonia com as fontes da vida.
em vidas anteriores. Quando um Espírito assim re-
Delas não nos recordamos encarna, nunca passa despercebi-
para evitar uma superposi- do, embora sem nenhuma inten-
ção de experiências pas- ção de aparecer, porquanto a vir-
sível de nos confundir tude é uma luz impossível de não
e perturbar. ser observada.
Dizia Mahatma Gandhi, que
jamais perdoou seus adversários,
porque, segundo ele, nada tinha a
perdoar, nunca se sentira ofendido:

A nossa natureza está enclausu-


rada a ver só o mal no adversário, a
atribuir-lhe sempre o mal, e mesmo
o mal que não existe.

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O mal que vemos nele depende seu superior, sorrindo-lhe Entre esses dois extremos, na
quase sempre do nosso modo apres- com os lábios, amaldiçoan- exposição de Kardec, situa-se o
sado e mesquinho de ver o homem. do-o com o pensamento. religioso que leva a sério seus
princípios e que, não obstante ex-
Madre Teresa de Calcutá, a ex- • O político que cogita de ne- perimentar ímpetos semelhantes
traordinária missionária do Cris- gociatas para pagar suas des- aos citados, sempre os combate
to, cuja vida foi um hino à bon- pesas de campanha. com veemência, travando intensa
dade, ao empenho de servir, dizia: luta íntima.
• O homem comum que pen- Não é fácil.
Se você julga as pessoas, não sa em exercitar o jeitinho Não dá para afirmar:
tem tempo para amá-las. brasileiro para tirar vanta- – A partir de agora, somente
gem em alguma atividade. bons pensamentos terão acesso à
Em oração, pedia: minha tela mental.
Dizem os Mentores espirituais
Deus adorado, faça-me dar que contra as gotas de luz do pre-
valor à dignidade de minha sente há oceanos trevosos do
mais alta vocação de servir passado.
e às suas responsabilida- E o apóstolo Paulo,
des. Jamais permita que afirma (Epístola aos
eu a desgrace doando Romanos, 7:19):
frieza, indelicadeza ou
impaciência. Pois não faço o

bem que quero, mas
o mal que não que-
Vemos no próxi- ro, esse faço.
mo o que há em
nós. Não há mágica
Espíritos bons de- capaz de eliminar de
têm-se no Bem. pronto esses aspectos
Espíritos maus vêem negativos de nossa per-
o Mal. Estes estão no ou- sonalidade.
tro extremo, no estágio opos- É preciso insistir nos bons
to, segundo Kardec. propósitos.
Alguns exemplos: Diz Jesus (Mateus, 24:13):

• O indivíduo empolgado por Aquele que perseverar até o fim


fantasias eróticas, envolven- Pessoas assim fixam-se tanto será salvo.
do respeitáveis mulheres. em seus devaneios que acabam
influenciadas por Espíritos infe- Entenda-se aqui a salvação não
• A esposa que cultiva forte riores que exacerbam seus senti- no sentido escatológico, de desti-
ressentimento contra o ma- mentos e as levam a um compor- no final, porquanto, ainda que de-
rido que dela se separou. tamento comprometedor. mande milênios sem conta, sere-
mos todos Espíritos puros e per-

• O subordinado que odeia feitos, habilitados à felicidade em

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plenitude, em plena harmoniza- O mesmo acontece em re- a oração o trará de volta ao bom
ção com a vida universal. lação à natureza de nossos pen- senso.
Somos filhos de Deus, que nos samentos. Em princípio haveremos de
criou para a perfeição, e lá chega- Temos dificuldade em susten- chamar por Jesus o tempo todo,
remos mais cedo ou mais tarde, tar apenas o Bem em nosso uni- exprimindo nossa incapacidade
porquanto essa é a Sua vontade verso íntimo. de manter o pensamento reto.
soberana, que não falha jamais. Se perseverarmos, conseguire- Com perseverança, o chama-
A perseverança nos bons pro- mos. remos sempre menos, na medida
pósitos vai nos salvar de nós mes- Hoje, alguns minutos; amanhã em que, superando nossas maze-
mos, de nossas tendências inferio- um pouco mais, e sempre mais, até las mentais, estivermos cada vez
res, de nossos maus pensamentos, chegarmos à plenitude do tempo. mais perto dele.
favorecendo um caminhar mais A auxiliar-nos nesse propósi-
tranqüilo e seguro, rumo à glo- to, o Evangelho. • O Bem. Vivenciar Jesus.
riosa destinação. Estudar as lições de Jesus em O sacrifício dos interesses pes-
profundidade, de forma a que soais em favor do próximo, a

possamos considerar, no desdo- marca inconfundível dos discípu-
As técnicas de meditação orien- bramento das horas, ante os pen- los autênticos, é a tranca inviolá-
tal envolvem um treino de esva- samentos que surgem: vel com a qual fechamos nossa
ziamento mental para assimilação – Pensaria assim Jesus? intimidade às incursões do mal.
das energias cósmicas. Se a resposta for negativa, será
Para tanto a pessoa deve fixar- oportuno mudar o pensamento. Resumindo, leitor amigo, situe-
-se num determinado ponto, a Nesse propósito, dois recursos mos a casa mental como um jar-
respiração, por exemplo, manten- maravilhosos: dim que desejamos ver enfeitado
do o pensamento preso nos movi- de coloridas borboletas, a simbo-
mentos de inspiração e expiração. • A oração. Buscar Jesus. lizarem tranqüilidade e beleza.
Os iniciantes sentem dificul- Se o pensamento se transvia, O segredo, explica
dade, porquanto, como um potro Mário Quintana, não
rebelde, o pensamento recusa-se é correr atrás delas. É
a permanecer aprisionado nos cuidar do jardim pa-
limites de uma imagem. ra que elas venham
A solução é o treinamento, a até nós.
insistência, a perseverança…

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Base nova,
homem novo
C A R LO S A B R A N C H E S

D
iante da Humanidade pro- e efeito, e tudo será visto com os xualidade inata no homem, incen-
fundamente conturbada, os olhos da eternidade. tiva a desconfiança no semelhante e
espíritas vivemos momen- 
oferece o inferno do sentimento de
tos de graves decisões. culpa como último reduto de sofri-
Se a modernidade presente ves- Analisemos então duas bases mento aos que erram, sem grandes
tiu de tecnologia e precisão as mes- de comportamento, duas estrutu- chances de perdão, a não ser que si-
mas calamidades do passado, co- ras de vida, com linhas de raciocí- gam, como bons cordeiros, as nor-
mo a fome e a guerra, dá mostras nio específicas e crenças consoli- mas definidas pelos senhores que
de que na jornada do tempo o ho- dadas, sobre as quais nossos pas- acreditam ter autoridade para le-
mem se ajustou mais à periferia sos já seguiram, para entender- gislar sobre a vida espiritual alheia.
belicosa do progresso, sem alterar mos aonde queremos chegar. 
substancialmente o núcleo de seu A primeira base vem do ontem.
próprio sentimento. Fundamentada nas diretrizes do A segunda é mais recente. Tem
Como personagens dessa via- autoritarismo, diz que o homem 150 anos de proposta codificada e
gem existencial, precisamos re- crédulo deve ser, na verdade, “te- é oferecida pelo Espiritismo.
pensar o passado, a fim de com- mente a Deus”. O Pai se revela como Com base na liberdade respon-
preender o presente e reajustar os punitivo e magoável. Sob esse pris- sável, afirma que o homem que tem
passos rumo ao futuro. ma, as emoções precisam ser ocul- fé deve descobrir a beleza de amar
Chegará o momento em que o tadas, reprimidas, para que a reali- a Deus – que é o próprio Amor e
tempo não mais será dividido em dade não se macule com expressões fonte do perdão e da esperança.
compartimentos estanques, liga- inferiores da condição humana. Acrescenta que as emoções
dos apenas por vínculos de causa Ataca, dentre outras coisas, a se-

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devem ser manifestadas, a fim de fim de resolver fraternalmente um dade teórica”. Explica ainda que
contagiar a realidade com o me- entrave do relacionamento, corre “fraternidade simplesmente acon-
lhor que trazem dentro de si. Se para o conforto das velhas ferra- selhada a outrem constrói facha-
forem boas, beneficiarão; se fo- mentas do autoritarismo e da ar- das brilhantes que a experiência
rem inferiores, serão descober- rogância disfarçada para silen- pode consumir num minuto”.*
tas, conhecidas em profundidade ciar a fala do outro e ter a prima- É tarefa urgente, portanto, al-
e reeducadas para melhor. zia da última palavra. cançarmos a substância, a essên-
Defende o direito à sexualida- No momento de exemplificar cia dos pressupostos doutriná-
de como acesso a expressões ínti- o “Deus Amor”, acaba preferindo rios. A base nova, a Doutrina dos
mas de elevação e entrega, equi- apoiar-se no “deus temor” de an- Espíritos, pede que seus profi-
líbrio e amor. tigas orientações, acendendo nos tentes não sejam somente distri-
Conduz o homem a confiar no que o rodeiam o pavor e a sub- buidores de benefícios, mas sim
semelhante e indica a bênção da missão cega, substâncias emocio- irradiadores de luz própria, nas-
reencarnação como veículo segu- nais infrutíferas para os homens cida no cadinho purificador da
ro daquele que se sente culpado, novos que pretendemos ser. própria transformação pessoal,
porém disposto a trabalhar pela autêntica e intransferível.

própria paz interior em novas Chegará o dia, lá no eterno pre-
oportunidades de serviço. Uma pergunta a ser respondi- sente em que haveremos de perma-
da: será que mergulhamos ape- necer, em que estaremos, enfim,

nas a cabeça e o intelecto na no- de pés e alma mergulhados na cons-
Interessante observar de que va estrutura de viver, mas deixa- ciência libertadora do novo, cons-
forma estamos procurando viver, mos os pés e as convicções finca- truindo o Reino esperado por den-
diante dessas duas bases. dos nos velhos fundamentos? tro e por fora e escolhendo a cons-
Inegavelmente, já entendemos Será que, na prática, somos li- ciência do dever retamente cum-
a grandeza de propósitos da Ter- bertadores só da inteligência pa- prido, como morada definitiva da
ceira Revelação. Nossos olhos já ra cima e aprisionados do cora- paz interior.
admiraram as páginas esclarece- ção para baixo?
*XAVIER, Francisco C. Pão nosso. Pelo
doras da codificação kardequiana. O Espírito Emmanuel sugere
Espírito Emmanuel. 29. ed. Rio de Janeiro:
A lógica e o bom senso de Kardec que “não nos detenhamos na pie- FEB, 2007. Cap. 99, p. 213-214.
já nos contagiaram.
Sem dúvida, estamos a par de
todos os princípios doutrinários.
Falamos bem, ensinamos com
acerto e anunciamos em alta voz
tudo o que essa nova matriz de
conduta oferece como resposta a
nossos questionamentos.
Um conflito, entretanto, per-
manece. Não poucas vezes, dentro
de casa, o mesmo estudioso que se
declara liberto pela consciência
espírita opta por utilizar recursos
da base velha para viver.
Na hora de usar o diálogo a

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Esf lorando o Evangelho


Pelo Espírito Emmanuel

Ensejo ao bem
“Jesus, porém, lhe disse: Amigo, a que vieste? – Então,
aproximando-se, lançaram mão de Jesus e o prenderam.”
(MATEUS, 26:50.)

significativo observar o otimismo do Mestre, prodigalizando oportunida-

É des ao bem, até ao fim de sua gloriosa missão de verdade e amor, junto
dos homens.
Cientificara-se o Cristo, com respeito ao desvio de Judas, comentara amorosa-
mente o assunto, na derradeira reunião mais íntima com os discípulos, não guarda-
va qualquer dúvida relativamente aos suplícios que o esperavam; no entanto, em se
aproximando, o cooperador transviado beija-o na face, identificando-o perante os
verdugos, e o Mestre, com sublime serenidade, recebe-lhe a saudação carinhosa-
mente e indaga: Amigo, a que vieste?
Seu coração misericordioso proporcionava ao discípulo inquieto o ensejo ao
bem, até ao derradeiro instante.
Embora notasse Judas em companhia dos guardas que lhe efetuariam a prisão,
dá-lhe o título de amigo. Não lhe retira a confiança do minuto primeiro, não o
maldiz, não se entrega a queixas inúteis, não o recomenda à posteridade com
acusações ou conceitos menos dignos.
Nesse gesto de inolvidável beleza espiritual, ensinou-nos Jesus que é preciso
oferecer portas ao bem, até à última hora das experiências terrestres, ainda que,
ao término da derradeira oportunidade, nada mais reste além do caminho para o
martírio ou para a cruz dos supremos testemunhos.

Fonte: XAVIER, Francisco C. Caminho, verdade e vida. Ed. especial. Rio de Janeiro: FEB, 2005.
Cap. 90, p. 195-196.

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As leis da
consciência
“Onde está escrita a lei de Deus? Na consciência.”*
S U E LY C A L DA S S C H U B E RT

A
questão 621 de O Livro dos tizaram, é a de mergulharmos nos- Na resposta dos Espíritos superio-
Espíritos, desde há muito, sa atenção no estudo constante dos res ficamos sabendo que:
pareceu-me como uma das princípios exarados em O Livro dos
mais importantes de toda a Codi- Espíritos, que emanam do próprio A lei natural é a lei de Deus. É a
ficação. Interessada em alcançar a Cristo, ao tempo em que é impres- única verdadeira para a felicida-
sua abrangência, tenho procurado cindível, igualmente, a busca da vi- de do homem. Indica-lhe o que
um aprofundamento maior, embo- vência do que nos é dado conhecer. deve fazer ou deixar de fazer e ele
ra minhas escassas luzes espirituais. Para chegarmos a um entendi- só é infeliz quando dela se afasta.
Neste ano de 2007, em que co- mento mais amplo acerca da ques-
memoramos o Sesquicentenário tão em epígrafe, que iremos analisar Nas perguntas subseqüentes,
de lançamento da obra básica da no transcurso deste artigo, faremos novas informações são transmiti-
Doutrina Espírita, nossa maior e algumas correlações com outras das: que a lei de Deus é eterna,
melhor homenagem aos Espíritos questões da mesma obra e, também, perfeita, que todas as leis da Na-
integrantes da falange do Espírito com textos de outros autores. tureza são leis divinas, que uma
de Verdade – Allan Kardec incluí- Kardec, sabiamente, aborda, única existência é insuficiente pa-
do –, que a conceberam e concre- na Terceira Parte de O Livro dos ra que o homem se aprofunde no
Espíritos, as leis morais, cuja apre- seu conhecimento e, também, que
*KARDEC, Allan. O livro dos espíritos. Ed. sentação didática é simplesmen- as leis divinas são apropriadas à na-
especial. Rio de Janeiro: FEB, 2005. Ques- te espetacular. Quanto mais leio, tureza de cada mundo e propor-
tão 621.
mais admiro. cionais ao grau de adiantamento
O assunto começa a ser abor- dos seres que os habitam.
dado a partir da pergunta 614, na Allan Kardec faz um comentá-
qual o Codificador indaga: “Que rio à pergunta 617-a, explicando as
se deve entender por lei natural?” duas situações nas quais as leis

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divinas se apresentam: as leis físi- sabedoria hão podido compre- de retiro íntimo, uma fonte pro-
cas, pertencentes ao domínio da endê-las e ensiná-las. Pelos en- funda de onde podem jorrar on-
Ciência e que regulam o movimen- sinos, mesmo incompletos [...] das de vida, de amor, de virtude,
to e as relações da matéria bruta; as prepararam o terreno para re- de luz. Ali se manifesta esse refle-
leis morais, que abrangem o ser hu- ceber a semente. Estando as leis xo, esse gérmen divino, escon-
mano em si mesmo e suas relações divinas escritas no livro da natu- dido em toda Alma humana. (O
com Deus e os seus semelhantes. reza, possível foi ao homem co- Grande Enigma, cap. VI, “As leis
Temos nestas, portanto, as regras nhecê-las, logo que as quis pro- universais”, ed. FEB, p. 82-83.)
da vida do corpo e as da alma. curar. Por isso é que os precei-
A lei natural pode ser conheci- tos que consagram foram, desde Observem, os atenciosos leito-
da por todos, embora nem todos a todos os tempos, proclamados res e leitoras, que estamos enca-
compreendam. Todavia, os homens pelos homens de bem; e também deando a nossa linha de raciocínio,
de bem e os que se decidem a pes- por isso é que elementos delas se evidenciando, sobretudo, a seqüên-
quisá-la “são os que melhor a com- encontram, se bem que incom- cia didática da obra básica do Espi-
preendem”, esclarece a questão 619, pletos ou adulterados pela igno- ritismo, para chegarmos ao cerne
ressaltando que, um dia, todos a rância, na doutrina moral de to- do tema que vimos enfocando.
compreenderão, conforme a lei dos os povos saídos da barbárie. É oportuno, agora, analisarmos
do progresso. a pergunta 627 e a notável resposta
Na questão 625, o Codificador Pode-se dizer que este texto tem dos Espíritos superiores. Ao for-
indaga qual o tipo mais perfeito como seqüência as palavras de mular a indagação, que é um mo-
que Deus ofereceu à Humanida- Léon Denis, que, por sua vez, de- delo de síntese, o mestre lionês não
de, para servir-lhe de guia e mo- monstra com muita beleza a sua apenas confirma que Jesus ensinou
delo, obtendo como resposta: Je- inspiração superior: as verdadeiras leis de Deus, como
sus. Em seguida, desdobrando a também quer deixar bem clara a
palavra dos benfeitores, Kardec Deus nos fala por todas as vozes utilidade do ensino que os Espíritos
realça a importância do Mestre e do Infinito. E fala, não em uma estão transmitindo. A resposta está à
acrescenta que a doutrina legada Bíblia escrita há séculos, mas altura da questão proposta e traz
por Ele é a mais pura expressão em uma bíblia que se escreve to- o tom de uma revelação. Ressaltando
da lei divina, visto que sendo dos os dias, com esses caracterís- que os ensinamentos de Jesus foram
Jesus o ser “mais puro de quantos ticos majestosos, que se chamam transmitidos de acordo com a épo-
têm aparecido na Terra, o Espírito oceanos, montanhas e astros do ca e lugares, acrescenta que aquele
Divino o animava”. céu; por todas as harmonias, do- é o momento no qual a verdade
Logo depois, temos a pergunta ces e graves, que sobem do imo deve se tornar compreensível para
626, que nos interessa nesta refle- da Terra ou descem dos espaços todas as criaturas, sendo necessário
xão, pois Kardec quer saber se as etéreos. Fala ainda no santuário que as leis sejam explicadas e desen-
leis divinas e naturais só foram re- do ser, nas horas de silêncio e de volvidas, visto serem pouquíssimos
veladas por Jesus e se, antes dele, meditação. Quando os ruídos aqueles que as entendem e muito
as pessoas apenas as conheciam discordantes da vida material menos os que as praticam. Eles (os
por intuição. Vale a pena transcre- se calam, então a voz interior, a Espíritos da falange do Espírito de
ver a bela resposta: grande voz desperta e se faz ou- Verdade) vieram preparar o reino
vir. Essa voz sai da profundeza da de Deus anunciado por Jesus e
Já não dissemos que elas estão consciência e nos fala dos deve- têm a missão de ensinar de forma
escritas por toda parte? [...] to- res, do progresso, da ascensão da clara e sem equívocos as leis divi-
dos os que meditaram sobre a criatura. Há em nós uma espécie nas, a fim de que ninguém venha a

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interpretá-las ao sabor de suas pai- vação, destruição, sociedade, pro- propósito da Terceira Revelação: o
xões, falseando “o sentido de uma gresso, igualdade, liberdade e de jus- Amor em ação.
lei toda de amor e caridade”. tiça, amor e caridade. Os benfeito- O Codificador proclama na
Pode-se observar no texto a li- res aprovam e afirmam que a últi- “Conclusão”, item VIII, que o Es-
gação histórica do Espiritismo com ma lei é a mais importante. piritismo não traz moral diferen-
o Cristianismo, como também a Quais seriam as inferências que te da de Jesus, cujo preceito capi-
magna importância de se conhecer ressaltam disso tudo apresentado tal é o da caridade universal.
as leis divinas e praticá-las. Como até agora? As leis da consciência, portanto,
ponto capital fica muito clara a mis- São duas as nossas conclusões são as que regem nossa vida de Es-
são da Doutrina Espírita como a principais. píritos imortais. Na trajetória evo-
Verdade, que gradualmente vai sen- Primeiramente deduzimos, con- lutiva do Espírito, quando de seus
do revelada para a Humanidade. É forme a pergunta 621, que cada passos iniciais, essas leis jazem
a “Ciência do Infinito” a que se refe- Espírito, ao ser individualizado pe- adormecidas, pois este age sob o
re Kardec na “Introdução” da obra, lo Criador, tem insculpida em sua domínio dos instintos; na medida
item XIII, cujo véu que a encobre consciência a lei divina; que essa lei em que adquire alguma experiên-
(da nossa ignorância multimile- se desdobra nas dez apresentadas cia o livre-arbítrio desponta, tor-
nar) apenas começa a desvendar por Kardec e referendadas pelos nando-o responsável pelas esco-
seus prodigiosos arcanos, a partir Espíritos superiores; que a vivência lhas que faça. Lentamente a cons-
do advento da Terceira Revelação. dessas leis leva o Espírito a alcançar ciência desperta e se faz ouvir. A
Na parte final do capítulo I, des- a perfeição, que é, como sabemos, busca de algo melhor propele o ser
sa Terceira Parte, Allan Kardec pro- relativa à nossa condição de filhos humano a superar os desafios, a
põe a divisão da lei natural em dez de Deus. Não é por acaso que o Co- conquistar o que desconhece, seja
partes, a saber: as leis de adora- dificador termina a Terceira Parte, através de pesquisas e construções
ção, trabalho, reprodução, conser- referente às leis morais, com o capí- pessoais, como também valendo-
tulo XII: “Da perfeição moral”. Há, -se das que foram promovidas por
portanto, evidente ligação entre outras criaturas. A inexorável lei
todos os capítulos que culminam do progresso atua em toda parte,
com o tema da perfeição moral, a em nosso planeta e no Universo.
fim de deixar patenteado ser esta A compreensão das leis da cons-
a escalada evolutiva do Espírito. ciência e da reencarnação faz-nos
A segunda conclusão encontra- entender os mecanismos da Justiça
-se na última lei, aquela que os Es- Divina, como acentua Herculano
píritos declaram ser a mais im- Pires, no capítulo 19, intitulado “As
portante: a lei de justiça, amor e leis da consciência”, inserto no livro
caridade. Observemos que nesse Chico Xavier pede licença (Ed.
título estão embutidas as três GEEM), que nos inspirou a escre-
revelações de Deus à Hu- ver sobre este tema.
manidade, quais sejam: a Joanna de Ângelis, no livro Leis
Justiça, através de Moisés; morais da vida (Ed. LEAL), disser-
o Amor, pregado e exem- tando sobre a lei divina ou natu-
plificado por Jesus; e a ral, afirma que Jesus viveu com
Caridade – bandeira “toda pujança o estatuto das leis
da Doutrina Espírita morais”. E acrescenta: “Leis imu-
–, que bem resume o táveis, são as leis da vida. [...] Es-

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tão insculpidas na consciência das As leis que Deus implantou na nes em teu mundo íntimo se-
criaturas”. O homem primitivo tua intimidade consciencial ali jam movidas para recompensar-
“sente-as em forma de impulsos ou estão como guardiães da tua vi- -te com alegrias, com harmonia,
pelo luzir da sua grandeza trans- da, aguardando a ação da von- com luminosidade, em função
cendente nos pródromos da inte- tade amadurecida para identifi- de tua atividade positivamente
ligência”, elucida a Mentora. cá-las, entendê-las, admiti-las, desenvolvida. [...]
Através da psicografia de Raul esforçando-se para respeitá-las Aprimora-te sempre. Ilumina-
Teixeira, encontramos no livro e obedecê-las. [...] Todas as leis -te sempre e trabalha para que
Em nome de Deus, do Espírito Jo- de Deus, que fazem pulsar a vi- as divinas leis cantem bênçãos e
sé Lopes Neto (Ed. Frater), pági- da em redor de ti, fazem tam- acendam clarões de vida no teu
nas 37 e 38, as ponderações que bém vibrar a vida em ti. Impor- âmago, uma vez que anseias
transcrevemos: tante será que as leis que acio- pela felicidade.

A nossa FEB
No Planalto Central, luminosa e altaneira, Trabalho secular, vibra na experiência
Ergue-se a Casa-Mãe, dedicada e operosa. Que ilumina o presente embasando o porvir,
Sua missão desenvolve ante o Cristo, atenciosa, Ruma a Federação Brasileira a florir
A Federação Espírita Brasileira. Na pujança que vem lhe marcando a cadência.

E a mensagem dos Céus, que a Doutrina apresenta, Sob as mãos dedicadas do nobre Ismael,
Ela jorra em cascatas, inundando a Terra; Segue o nosso Brasil-Espiritual atento,
Conforta os corações nos projetos que encerra, A servir a Jesus e a buscar o incremento
E o rebanho que a busca ela abraça e apascenta. Do amor e da verdade, ante as Vozes do Céu.

Nas terras do Cruzeiro, onde o amor fez morada, Somos gratos a Deus por esse Monumento
Eis a Casa do Bem, ativa e generosa, Que exalta tanto o bem quanto a vida e a virtude,
Resguardando o valor da Doutrina Formosa, Nesse afã de expurgar o mal que, insano, ilude,
Orientando-nos o passo na caminhada. E de implantar a paz em nosso sentimento.

Na formação dos tempos de luz e bonança, Nobre é o tempo que passa entre lutas ingentes,
A nossa Casa-Mãe em campanhas apela E tudo o que nos traz grandeza à própria rota,
Para o grande labor que em bênçãos se revela: O que nos torna bons, renunciando à má nota,
Cuidar da juventude e educar a criança. Sendo espíritas veros, lúcidos, conscientes.

Ela atende a quem vive no mundo angustiado, Saudamos de Jesus essa Obra tão feliz,
E estende os seus braços para as pátrias diversas, Nossa Federação, que esparge o Espiritismo
P’ra que todas, então, sejam no amor imersas, No Brasil e no mundo, cheia de altruísmo,
Vivendo, com vigor, o ensino revelado. A unir-nos mais fraternos em sua diretriz.

Sebastião Lasneau
(Mensagem psicografada pelo médium Raul Teixeira, em 9/3/2005, na Sociedade Espírita Fraternidade, Niterói (RJ), por ocasião
da visita do presidente da FEB, Nestor João Masotti.)

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Cura d’Ars
Manifestações espirituais e
participação na Codificação
A N TO N I O C E S A R P E R R I DE C A RVA L H O

J
ean-Marie Vianney, também De início, é oportuno o esclareci- de leitura e de escrita. Na prima-
conhecido como Jean-Marie mento de que a palavra cura, co- vera e no verão, realiza a maior
Baptiste Vianney (1786-1859) mo era adotada na França, é utili- parte dos trabalhos da fazenda. É
– o cura d’Ars –, foi protagonista de zada para designação de sua fun- protegido e orientado por pre-
algumas manifestações espirituais, ção, ou seja, de vigário de aldeia lados católicos da região de
e após sua desencarnação transmi- ou povoação, não tendo nada a Lyon, que não aceitavam o Im-
tiu mensagem que foi inserida em ver com sua atuação, coincidente- perador, em virtude de sua rup-
O Evangelho segundo o Espiritismo. mente, de intermediário de algu- tura com o Vaticano. Encontra-
mas curas. Ars, localizada a uns -se com Monsenhor Balley, que
quarenta quilômetros ao Norte de lhe diz: “Jean-Marie jamais será
Lyon, era, àquela época, uma pe- soldado, mas padre”. Depois de
quena aldeia. quatorze meses, ao retornar, in-
Vianney era oriundo de famí- gressa em 1813 no Seminário
lia simples e afeita ao meio rural. Saint-Irénée, em Lyon. Como os
Viveu conflitos em seu lar, pois cursos eram dados em latim e ele
o pai pretendia o mesmo futuro não compreendia nada, tirou
ao filho. Na juventude, passou nota “D”, que representa “defi-
por outro problema ao ser con- ciente no último grau”, e foi dis-
vocado para combater no exérci- pensado. Monsenhor Balley reto-
to de Napoleão. Adoeceu, foi ma o trabalho com seu aluno e,
internado duas vezes e aconselha- pacientemente, o estimula a estu-
do a desertar e a viver numa fa- dar em francês e não mais em
zenda onde assume o papel de um latim. Foi readmitido em 1814 e
filho primogênito. Ele se ocupa ordenado subdiácono.
dos menores e lhes dá lições A dificuldade idiomática se re-
pete em outro episódio, pois na-
Jean-Marie Baptiste
quela época, em cada região ou até
Vianney, o cura d’Ars
em aldeias, se falavam distintos dia-
letos. Em seguida à sua ordena-
ção, foi designado para as funções

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de cura na aldeia de Ars. Chegan- Certa feita, Vianney comentou naram-se raros, mas não desapa-
do de carroça, com poucos uten- com a condessa des Garets: receram completamente.
sílios e cerca de trezentos livros, Embora a biografia de Joulin1
ocorreu o histórico encontro com Essa noite, o “capeta” não me dei- não faça referência, no pequeno
um jovem pastor de ovelhas, An- xou fechar o olho. [...] O demô- museu montado no local em que
toine Givre, com dez anos, que não nio é bem mau, mas ele é mui- Vianney residiu, ao lado da igreja,
sabia o francês e falava o dialeto to tolo! – Ele está nervoso, é bom está exposta a cama que ele utili-
de Ars, mas acabaram se compreen- sinal. – Oh! Eu me habituo. Ele zava, com as marcas de fogo,
dendo. Vianney obteve a informa- nada pode sem a permissão de como registro de uma das mani-
ção sobre o caminho e deu-lhe Deus. – Eu sei que é o capeta” e festações de perseguição espiri-
resposta que é registrada no mo- isso me basta. Há tempos que tual de que foi alvo.
numento – o cura com um jovem nós nos relacionamos, nós so- Allan Kardec2 analisa as mani-
–, existente à entrada de Ars: “Você festações do tipo de ruídos e pan-
me mostra o caminho de Ars, eu cadas e comenta que nem sempre
lhe mostrarei o caminho do céu”.1
Cinco anos depois de sua che-
Allan se limitam a isso. “[...] Degeneram,
por vezes, em verdadeiro estarda-
gada em Ars, no começo de 1823, lhaço e em perturbações. [...]”, e
Jean-Marie Vianney funda uma
escola com o nome “La Provi-
Kardec “[...] assumem, não raro, o caráter
de verdadeiras perseguições. [...]”.
dence”, que também era um orfa- O Codificador cita, especifica-
nato para crianças pobres e aban-
donadas por suas famílias, e para
analisa as mente, exemplos de manifesta-
ções com pessoas que são acorda-
jovens em situação de miséria. das com movimentações de obje-
Adotava a regra de que os mais manifestações tos do quarto e da própria cama.
velhos ajudavam os menores. Destaca, ainda: “[...] Essas pessoas
Vianney sempre foi amparado
pela família do visconde Fran- do tipo de ignoram possuir faculdades mediú-
nicas, razão por que lhes chama-
çois des Garets d’Ars e seus pri- mos médiuns naturais [...]”.
mos, o conde e a condessa Pros-
per des Garets. ruídos e Em nossos dias, é muita em-
pregada a palavra de origem ale-
O cura d’Ars também foi epi- mã poltergeist para as manifesta-
centro de manifestações espiri-
tuais de efeitos físicos. Nos últi-
pancadas ções que envolvem Espírito baru-
lhento, galhofeiro, desordeiro; e o
mos meses de 1823, por volta das pesquisador Hernani Guimarães
nove horas da noite, Jean-Marie mos quase camaradas. Eu era Andrade3 considera que, entre es-
Vianney escuta grandes golpes na atormentado, durante o dia pe- tes fenômenos, “os mais temíveis
porta da paróquia. Abre a janela los homens e durante a noite são aqueles que provocam incên-
do andar de cima e não vê pessoa pelo demônio, e sentia uma dios (parapirogenia)”. Este é o ca-
alguma. Por volta das onze horas grande paz. [...] O bom Deus é so do incêndio da cama em que
o barulho recomeça e, à uma hora melhor que o demônio mau. É dormia o cura d’Ars.
da manhã, o cabo e o trinco da ele que me protege. O que Deus Embora possam existir expli-
porta do pátio sacodem com vio- protege é bem guardado.1 cações variadas – e sem entrar no
lência. Durante o tempo que dura mérito da questão, mas é fato leva-
o barulho, toda a casa estremece. Após 1825, os fenômenos tor- do em consideração no processo

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Joulin1 destaca que a rados os que têm fechados os


visita do contemporâ- olhos”, que assina como Espírito
neo padre Lacordaire (Vianney, cura d’Ars, Paris, 1863)
à paróquia de Ars no original em francês da obra
atesta o renome de citada (texto da 3a edição)4 – o
Vianney. que nem sempre aparece nas tra-
Joulin1 destaca que duções –, ele emprega quatro ve-
as inspirações do cura zes a sua usual expressão “bom
d’Ars não eram jan- Deus”, tal como fazia, habitual-
senistas, não falava de mente, em seus escritos e prele-
salvação em Deus a ções em Ars, ao se referir ao
uma pequena elite de Criador. Este fato, até agora não
predestinados, onde destacado, é importante como um
todos os outros ho- dos itens para identificação de
mens estariam irre- Espíritos comunicantes, sendo,
mediavelmente con- portanto, oportuno, para finalizar-
denados ao inferno. mos, transcrever o seguinte tre-
Ele se referia sem ces- cho dessa obra:
sar ao amor de Deus,
do bom Deus, como Ah! Que sofrimento, bom Deus!
Cama que Vianney utilizava,
dizia, e na sua boca o Ela perdeu a vista e as trevas a
ainda com marcas de fogo
adjetivo “bom”não era envolveram. Pobre filha! Que
de canonização –, após a exuma- uma maneira de falar, mas expri- ore e espere; eu não sei fazer
ção de seu corpo constatou-se mia o essencial: milagres, sem a vontade do
que este estava conservado. Para bom Deus. Todas as curas que
assinalar o fato e talvez até como O bom Deus nos criou e nos tenho podido obter e que vos
estímulo a peregrinações, o cor- pôs no mundo porque nos ama; foram assinaladas, não as atri-
po do sacerdote está exposto em Ele quer nos salvar porque nos buais senão àquele que é Pai de
um dos altares da igreja, sendo ama – o bom Deus quer a nossa todos nós.
visível que apenas foi retocado felicidade – Ó meus filhos, que
com uma máscara facial de cera. Deus bom!
Vianney viveu e trabalhou du- Referências:
1
rante 41 anos em Ars. Pela sua de- A repercussão de seu trabalho JOULIN, Marc. La petite vie de Jean-Ma-
dicação extremada conquistou a na pequenina Ars estimulou a vi- rie Vianney: curé d’Ars. Paris: Desclée
população e o espaço da religião, sita de milhares de peregrinos en- de Brouwer, 2004. p. 153.
2
comprometida pelo período do quanto estava encarnado e após KARDEC, Allan. O livro dos médiuns.
“Terror” após a Revolução France- sua desencarnação, construindo a 79. ed. Rio de Janeiro: FEB, 2007. Parte
sa. Em função de sua dedicação à imagem de homem extremamen- segunda, cap. V, itens 87, 89 e 92.
3
comunidade, dos fenômenos espi- te bom, dedicado ao povo e cura- ANDRADE, Hernani G. Poltergeist. Algu-
rituais e da conservação de seu dor. Com base nessa lembrança é mas de suas ocorrências no Brasil. São
corpo, estão caracterizadas algu- que seu Espírito foi evocado e Paulo: Ed. Pensamento, 1988. Cap. I.
4
mas das condições que podem ter houve a manifestação inserida em KARDEC, Allan. L’évangile selon le
levado a Igreja Católica a canoni- O Evangelho segundo o Espiritis- spiritisme. Rio de Janeiro: FEB, 1979.
zá-lo no ano de 1925. O biógrafo mo. Na mensagem “Bem-aventu- Chapitre VIII, p. 121-122.

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Em dia com o Espiritismo


Por que as pessoas
usam drogas
M A RTA A N T U N E S M O U R A

O
s motivos são vários: curio- dar o seu conhecimento: torna- Compreende-se que não su-
sidade, insegurança, tédio, ram-se curandeiros, padres e polí- cumbir às tentações, presentes no
medo, timidez, frustrações, ticos. Tais poderes garantiram-lhes mundo atual, é tarefa de grande
insatisfações, auto-afirmação, fuga uma elevada posição social”.1 envergadura. Um desafio que afeta,
de problemas, crença de que as Segundo a Organização das Na- em especial, os indivíduos que não
drogas aumentam a criatividade, ções Unidas (ONU), o uso de dro- tiveram boa formação moral ou os
pressão de grupo, etc. A lista é lon- gas é fenômeno de ocorrência adolescentes, que se encontram
ga. Do ponto de vista histórico, o mundial, um preocupante proble- numa fase de fácil influenciação. A
uso de drogas era associado a as- ma de saúde pública, cuja gravida- Doutrina Espírita esclarece, porém,
pectos religiosos, culturais, medici- de varia de região para região, mas que Deus permite as tentações com
nais, místicos e até como forma de afeta praticamente todas as nações o objetivo de desenvolver a razão e
buscar a transcendência espiritual, do Planeta: 75% dos países enfren- preservar o homem dos excessos.3
pela alteração do estado de cons- tam problemas com o consumo Estudo realizado por docentes
ciência. Tratava-se, porém, de con- da droga. Em termos mundiais, as da Escola de Enfermagem de Ribei-
sumo restrito a grupos fechados, projeções estatísticas indicam que rão Preto, Universidade de São
diferentemente do caráter dissemi- cerca de 200 milhões de pessoas – Paulo, em 2006, em que foram en-
nador da atualidade. algo em torno de 5% da população trevistados 568 adolescentes do
A conhecida professora de far- entre 15 e 64 anos – usam drogas ensino médio com a finalidade de
macologia da Escola de Medicina ilícitas pelo menos uma vez por identificar os motivos que levam
do Alabama, Estados Unidos, dou- ano; metade deles usa drogas regu- o jovem ao primeiro contato com a
tora Gesina Longenecker, analisa larmente uma vez por mês. Recen- droga, conclui: “Verificou-se que
que o indivíduo que alimenta o ví- te relatório da ONU, o de setembro a curiosidade foi o motivo princi-
cio dos semelhantes é outro fator do corrente ano, informa que 4% pal apontado para o uso de drogas
de extrema relevância no uso de da população mundial, situada na pela primeira vez e que os respon-
substâncias psicoativas: “o processo faixa etária de 15-64 anos, usa can- sáveis pelo início do consumo
da descoberta e distribuição come- nabis (maconha), enquanto 1% é dessas substâncias pelos adoles-
çou a partir de homens comuns usuário de estimulantes do grupo centes foram os amigos”.4 Os da-
que se especializaram no assunto das anfetaminas, da cocaína e dos dos apresentados na publicação
das drogas, alcançando posições de opiáceos. O uso de heroína é tam- oferecem importantes subsídios
poder e influência ao usar e guar- bém grave problema mundial.2 para o planejamento de estratégias

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relativos aos “por- em cada existência, tem um novo


quês” do uso de dro- ponto de partida. [...] se se vê pu-
gas estão todos subordi- nido, é que praticou o mal. Suas
nados à imperfeição atuais tendências más indicam o
humana. Imperfei- que lhe resta a corrigir em si pró-
ção que prioriza uma prio e é nisso que deve concentrar-
vivência hedonista, onde a -se toda a sua atenção, porquanto,
busca pelo prazer é equivo- daquilo de que se haja corrigido
cadamente considerada o completamente, nenhum traço
bem supremo. A propósito, mais conservará. As boas resolu-
avalia Joanna de Ângelis: ções que tomou são a voz da cons-
ciência, advertindo-o do que é
O […] homem moderno dei- bem e do que é mal e dando-lhe
xou-se engolfar pela comodidade forças para resistir às tentações.6
e prazer, deparando, inesperada-
mente, o vazio interior que lhe re- A orientação familiar que valori-
sulta amargas decepções, após as za a educação moral, educação
secundárias conquistas externas. “que consiste na arte de formar ca-
preventivas Acostumado às sensações fortes, racteres [...]”7 previne os muitos
no controle passou a experimentar dificulda- males, criando obstáculos à curio-
do consumo de drogas na adoles- des para adaptar-se às sutilezas da sidade, tão comum nos jovens, de
cência, cujas conclusões contestam percepção psíquica, do que resul- experimentar substâncias psicoati-
as idéias de senso comum, que tariam aquisições relevantes pro- vas. Da mesma forma, o adulto que
associam o uso de substâncias psi- motoras da plenitude íntima e edificou o caráter em bases sólidas,
coativas à pobreza, a “lares desfei- realização transcendente.5 da moral e da ética, dificilmente faz
tos” e às “más companhias”. uso de drogas, ainda que se encon-
O controle social eficiente do Não desconhecemos, contudo, a tre sob o peso das provações e dos
problema, segundo posição unâni- existência de inúmeras criaturas testemunhos. Isto nos faz recordar
me de especialistas e estudiosos, que renascem em ambientes vicio- Emmanuel, que nos exorta cora-
tem como base: a) suprir a popula- sos e que não se deixam arrastar gem perante as tentações que nos
ção de informações corretas sobre pelo vício; ou de tantas outras que assaltam a existência:
as drogas, seus mecanismos de ação, experimentam drogas e as rejei-
efeitos no organismo e formas de tam. O que faz essas pessoas serem Vigiai na luta comum.
prevenção; b) estabelecer parcerias diferentes das demais? A resposta Permanecei firmes na fé, ante a
sociais que, efetivamente, desenvol- pode ser resumida nestas duas or- tempestade.
vam trabalhos de prevenção ao ví- dens de idéias: tendências instinti- Portai-vos varonilmente em to-
cio e/ou de recuperação do viciado. vas e educação familiar. dos os lances difíceis.
Nesta situação, o trabalho desen- As tendências que marcam a Sede fortes na dor, para guardar-
volvido nas casas espíritas, junto às personalidade do ser humano en- -lhe a lição de luz.8
crianças, jovens e adultos, por ser contram em Allan Kardec as se-
de caráter orientador e humanitá- guintes explicações:
rio, ocupa posição de relevância na Referências:
1
sociedade. Ao nascer, traz o homem consigo LONGENECKER, Gesina. Como agem as
Os motivos aqui apresentados, o que adquiriu, nasce qual se fez; drogas – abuso das drogas e o corpo

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4
PRATTA, Elisângela Maria Machado; SAN-
TOS, Manoel Antonio. Levantamento dos
motivos e dos responsáveis pelo primeiro
contato de adolescentes do ensino médio
com substâncias psicoativas. Revista
Electrónica de Salud Mental, Alcohol y
Drogas. Universidad Autónoma del Estado
de México, año 2, n. 2, 2006.
5
FRANCO, Divaldo P. Após a tempestade...
Pelo Espírito Joanna de Ângelis. Salvador:
LEAL, 1974. Cap. 8, p. 49.
6
KARDEC, Allan. O evangelho segundo o
espiritismo. Tradução de Guillon Ribeiro.
126. ed. Rio de Janeiro: FEB, 2006. Cap. 5,
A orientação familiar valoriza a educação moral, que previne males item 11, p. 114.
e vícios, criando bons hábitos 7
______. O livro dos espíritos. Tradução de
humano. Tradução de Dinah Kleve. São das contra Drogas e Crimes (UNODC). Se- Guillon Ribeiro. 89. ed. Rio de Janeiro: FEB,
Paulo: Quark Books, 1998. Cap. 1, p. 5. tembro de 2007. 2007. Questão 685-a.
2 3 8
Organização das Nações Unidas (ONU). KARDEC, Allan. O livro dos espíritos. Tra- XAVIER, Francisco C. Fonte viva. Pelo Es-
Programa de prevenção às drogas e HIV/ dução de Guillon Ribeiro. 89. ed. Rio de pírito Emmanuel. 34. ed. Rio de Janeiro:
/AIDS. Brasília: Escritório das Nações Uni- Janeiro: FEB, 2007. Questões 712 e 712-a. FEB, 2006. Cap. 90, p. 233.

Modos de usar
A s doações abençoadas da Misericórdia Divina
constituem exatos medicamentos às nossas
O conhecimento elevado, sem trabalho digno, é
acelerador do remorso.
necessidades e pedem modo particular de uso. O ninho familiar, sem o clima da concórdia, é
A inteligência exige burilamento constante no via de acesso para o desequilíbrio geral.
aprendizado construtivo. Assim, o amparo da Espiritualidade Maior traz
A saúde, sem atividade no bem, cede lugar à em si mesmo a sugestão para o necessário aproveita-
moléstia. mento.
A posse financeira não proporciona verdadeira Observe, pois, a disciplina requerida na admi-
alegria, quando vive a distância do socorro fraterno. nistração dos medicamentos espirituais que o Céu
A autoridade humana não constrói segurança lhe envia, sabendo que os horários, doses e formas
para ninguém, quando adota o regime de intempe- de emprego reclamam exatidão e persistência, boa
rança para si própria. vontade e confiança para sanarem efetivamente os
O prestígio social reduz-se a simples aparência, males que nos espoliam a vida íntima, de modo a
se brilha sem base no esforço honesto. que nos renovemos para mais altos destinos.
André Luiz
Fonte: XAVIER, Francisco C.; VIEIRA, Waldo. Estude e viva. Pelos Espíritos Emmanuel e André Luiz. 12. ed. Rio de
Janeiro: FEB, 2006. p. 100.

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A FEB e o Esperanto

Esperanto e
Espiritismo
Transcrevemos abaixo, em tradução, um texto da autoria do presidente Nestor João
Masotti, publicado em esperanto na edição de 2007 do Almanako Lorenz,
um dos periódicos da Sociedade Editora Espírita F. V. Lorenz,
conhecida internacionalmente como a Societo Lorenz

O
esperanto, idioma neutro destinado nossos círculos, fazendo publicar, em
a servir a indivíduos e povos nas Reformador de 15 de fevereiro de
suas relações internacionais, 1909, significativa página transcrita
foi lançado na Polônia, em 1887, pelo de um periódico espírita francês,
médico judeu-polonês Lázaro Luís a qual se constituiria, juntamen-
Zamenhof (1859-1917). te com as mensagens A Missão
Logo suas virtudes, práticas e de do Esperanto (Emmanuel, 1940)
natureza espiritual, tocaram as al- e O Esperanto como Revelação
mas sensíveis de idealistas em dife- (Francisco Valdomiro Lorenz,
rentes campos da atividade humana, 1959), ambas psicografadas por
incluindo-se entre eles, obviamente, Francisco Cândido Xavier, em sóli-
os espíritas que, na França, menos de da coluna sustentadora das ati-
20 anos após o surgimento da língua, vidades do Movimento Es-
já se mobilizavam em torno do tema, pírita brasileiro em torno
nele enxergando um poderoso veícu- do esperanto.
lo para a disseminação de idéias em A partir de então, a
escala mundial. Estavam eles, to- FEB desenvolve suces-
davia, também conscientes de sivos programas ten-
prestar grande serviço à causa da dentes à consecução
Língua Internacional Neutra, for- dos objetivos de divul-
talecendo-a pela adesão de uma gar o idioma entre os es-
Leopoldo Cirne lançou a semente do
coletividade toda voltada para a esperanto através de Reformador píritas, e o Espiritismo en-
paz, a justiça e a fraternidade entre tre os esperantistas. Cur-
os povos, princípios comuns aos dois grandes ideais. sos gratuitos, publicação de manuais, dicionários,
É sob a influência de tais movimentos na França, antologias, biografias, traduções de obras doutri-
que Leopoldo Cirne, presidente da FEB no período nárias, bem como manutenção de programa ra-
entre 1900 e 1914, lança a semente do esperanto em diofônico, propaganda em Reformador, participação

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Publicações FEB: Dicionário Completo Esperanto/Português,


Novo Dicionário Português/Esperanto, e Doutor Esperanto

em eventos do Movimento Esperantista neutro – diferentes línguas nacionais, com base nas traduções
têm caracterizado a atividade permanente da em esperanto.
Casa de Ismael em favor do esperanto e seus ele- Presentemente, cuida o Departamento de Espe-
vados ideais. ranto da FEB, em colaboração com o Setor de Es-
Modernamente, utilizando os inapreciáveis re- peranto do Conselho Espírita Internacional, de dar
cursos da rede mundial de computadores, a FEB os primeiros passos no sentido de conscientizar os
exibe material esperantista em seu portal eletrôni- membros dos movimentos espíritas de outras ter-
co, em que disponibiliza aos internautas toda a ras sobre as excelências do idioma como instru-
obra de Kardec traduzida para a Língua Interna- mento para as relações internacionais da grande
cional, o livro Nosso Lar (Nia Hejmo), bem como família espírita mundial.
documentos importantes de natureza doutrinária. Trabalhemos todos, em inquebrantável união,
Excelentes têm sido os frutos dessa semeadura, nesse campo tão promissor, aguardando, em servi-
com destaque para o surgimento, principalmente na ço, o grande futuro, quando colheremos os primei-
Europa Oriental, de versões de livros espíritas em ros belos frutos de nossos esforços.

Trova Trobo
Encontro o amor, vida afora, Pri la am’ , sur vivovojo,
Neste quadro que apresento: Jen pensiga konsidero:
Uma alegria que mora Feli/e lo1anta 1ojo
Na casa do sofrimento. En la domo de l’ sufero.

Isolino Leal (Espírito)


Trad.: Affonso Soares

Fonte: XAVIER, Francisco C. Trovas do outro mundo. Por Diversos Espíritos. 4. ed. Rio de Janeiro: FEB, 2005.
Estrofe retirada do capítulo 11, “Idéias e rimas”.

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Literatura Espírita na
XIII Bienal do Livro
A XIII Bienal Internacional do Dentre eles: Minha Vida em outra Os autores Adeilson Salles,
Livro do Rio de Janeiro recebeu o Vida, Charles Richet – O Apóstolo Christiano Torchi, Dalva Silva
maior público da história da Fei- da Ciência e o Espiritismo, O que Souza, Samuel Nunes Magalhães,
ra. No período de 13 a 23 de se- dizem os Espíritos sobre o Aborto, Eloy Facco (Tieloy) e o tradutor
tembro, 645 mil pessoas visitaram Espiritismo passo a passo com Kar- de O Livro dos Espíritos – Edição
o evento. dec, Os Caminhos do Amor, Di- Comemorativa – Evandro Noleto
A Federação Espírita Brasileira mensões Espirituais do Centro Es- Bezerra estiveram presentes, con-
(FEB), com mais esta participação pírita e os infantis: Um por Todos e cederam autógrafos e conversa-
em bienais, cumpriu, novamente, Todos por Um, O Segredo da Onça- ram sobre suas obras, dissemi-
o seu papel: levar por meio das -Pintada, Bellinha e a Lagarta Ber- nando o estudo e a Doutrina Es-
obras literárias espíritas conheci- nadete, O Peixinho Azul e a Cole- pírita, com boa receptividade do
mento e luz à comunidade. ção A Vida Fala. público.
A FEB esteve atuante nos 11 Durante a Bienal, a FEB pro-
dias de evento, com um estande porcionou aos pequenos e tam-
de 230m², mais de 400 títulos, 7 bém aos pais a mágica do mundo
lançamentos e 11 relançamentos. teatral, um espaço lúdico com
princesas, contadores de história,
pintura, fantoches e esculturas de
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feitas e o público ainda pôde com-


prar exemplares do mês e antigos.
Este ano a FEB, além de divul-
gar, promoveu a venda de livros,
aproximadamente 16 mil exem-
plares, sendo Minha Vida em ou-
tra Vida, Agenda Cristã (de bolso),
O Livro dos Espíritos (de bolso) –
nova tradução – e os infantis: O
Segredo da Onça-Pintada, Belli-
nha e a Lagarta Bernadete, Um
por Todos e Todos por Um, os
mais procurados.
A FEB compreende a impor-
Adeilson Salles: alegria de ver dramatizadas tância da divulgação de suas obras
suas obras para o público infantil
para atrair o público ao conheci-
balões. O objetivo foi estimular o zadas por grupos de adolescentes mento da Doutrina Espírita e de
hábito da leitura desde cedo e in- de instituições espíritas do Rio de seus preceitos básicos. Com esse
centivar a importância dos livros Janeiro. Apresentaram-se o Gru- objetivo, distribuiu vasto material
na formação de valores éticos e na po de Teatro Espírita Humberto de promoção: cerca de 270 mil fo-
educação da criança. Cavalcante, do Centro Espírita lhetos, entre flyers, marcadores,
Para Adeilson Salles, a Bienal Humildade e Amor, trabalhando primeiros capítulos, folders, adesi-
lhe trouxe não apenas a promo- o texto sobre a vida de Chico Xa- vos, opúsculos da Campanha Em
ção dos seus livros, entre os mais vier; o Grupo de Teatro Eurípedes Defesa da Vida, mensagens, etc.
procurados na FEB, mas também Barsanulfo, do Centro Espírita Num incentivo à leitura espí-
a emoção de ver dramatizadas Maria Angélica, com o texto rita, estiveram presentes, na XIII
suas obras para o público infan- “Brasil, Coração do Mundo, Pá- Bienal, o Conselho Espírita In-
til. Segundo ele, foi uma tria do Evangelho”; e os ternacional (CEI) e a Associação
surpresa a dramati- jovens do Centro Es- de Editoras, Distribuidoras e
zação de suas his- pírita Caminhe- Divulgadores do Livro Espírita
tórias e a boa mos com Hu- (Adeler). Juntos somaram esfor-
receptividade mildade, com ços em prol da literatura espírita
das crianças o tema “O num espaço de 500m2.
diante dos Discípulo
espetáculos Anônimo”
Espaço dos estandes da
e da onça- do livro
FEB ao longo dos anos:
-pintada de Ressurreição
1,80m de al- e Vida. 2001 (RJ) – 30m2
tura que ani- Outro espa- 2003 (RJ) – 50m2
mou a garotada. ço que merece 2004 (SP) – 49m2
As atividades destaque é o da re- 2005 (RJ) – 110m2
juvenis, entre as vista Reformador. 2006 (SP) – 210m2
quais esquetes tea- Apresentação de uma das peças Mais de 200 novas 2007 (RJ) – 230m2
trais, foram reali- teatrais no estande assinaturas foram

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Cristianismo Redivivo
História da Era Apostólica
Supranaturalismo x Racionalismo
“A Ciência e a Religião não puderam, até hoje, entender-se, porque, encarando cada
uma as coisas do seu ponto de vista exclusivo, reciprocamente se repeliam. Faltava
com que encher o vazio que as separava, um traço de união que as aproximasse.
Esse traço de união está no conhecimento das leis que regem o Universo espiritual
e suas relações com o mundo corpóreo, leis tão imutáveis quanto as que regem o
movimento dos astros e a existência dos seres. Uma vez comprovadas pela expe-
riência essas relações, nova luz se fez: a fé dirigiu-se à razão; esta nada encontrou
de ilógico na fé: vencido foi o materialismo. Mas, nisso, como em tudo, há pessoas
que ficam atrás, até serem arrastadas pelo movimento geral, que as esmaga,
1
se tentam resistir-lhe, em vez de o acompanharem [...].”

HAROLD O DUTRA DIAS

E
m edições anteriores, desta- e nas curas de Jesus, e na unidade (Francis Bacon, 1561-1626) e do
camos que a Primeira Fase da natureza divina e da natureza Racionalismo Continental4 (René
do estudo da vida de Jesus humana na pessoa do Cristo Descartes, 1596-1650) surge Ba-
pode muito bem ser compreendi- (dogma da encarnação). ruch Spinoza (1632-1677), pro-
da como a etapa da abordagem Na esteira do Empirismo Inglês3 pondo a leitura e interpretação dos
puramente religiosa e teológica. livros bíblicos, como todo e qual-
[Ver Reformador dos meses de ju- quer escrito, à luz do Racionalismo.
nho/07, p. 34, e julho/07, p. 34.] natureza e não pode ser explicado com A oposição à fé e à religião, he-
base neles. É um conceito próprio da
O “endeusamento” da figura do Teologia Cristã, que atribui à fé a crença
rança do Renascimento, culmi-
Cristo estancou a busca pelas suas no sobrenatural, assim entendido.” naria no estabelecimento do Ilu-
origens, sua cultura, seus ensinos. ABBAGNANO, Nicola. Dicionário de filo- minismo (Aufklärung). Immanuel
Nessa época, vigorou o chamado sofia. 5. ed. revista e ampliada. Martins Kant, um expoente da filosofia
Fontes. p. 1080.
supranaturalismo,2 visto como 3
desta época, definiu o Iluminis-
credulidade ingênua nos milagres Corrente filosófica para a qual toda idéia mo como “a saída dos homens do
é proveniente de uma percepção sensorial
(cinco sentidos), logo a experiência é cri-
4
1 tério ou norma da verdade. Nesse sentido, Posição filosófica dos séculos XVII e
KARDEC, Allan. O evangelho segundo o
toda verdade pode e deve ser posta à pro- XVIII, na Europa, supostamente em opo-
espiritismo. 127. ed. Rio de Janeiro: FEB,
va, e, em conseqüência, modificada, cor- sição à escola que predominava nas ilhas
2007. Cap. I, item 8, p. 61.
rigida ou abandonada. Entre seus repre- britânicas, o Empirismo, tendo como
2
“O que acontece na natureza, mas não sentantes podemos citar Francis Bacon, expoentes Descartes, Malebranche, Spino-
decorre das forças ou dos procedimentos da Hobbes, Locke, Berkeley, Hume. za, Leibniz, Wolff.

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aplicação da crítica aos çamento dos “fragmentos de


textos sagrados. wolffenbüttel”,7 há uma profusão
A leitura tradicional e de publicações conhecidas como
piedosa dos Evangelhos, “Vidas de Jesus do Racionalismo”,
filha da credulidade in- caracterizadas como tentativas
gênua, eivada de dogma- da Teologia alemã de explicar, do
tismo religioso milenar, modo mais claro e racional pos-
sofre duro golpe. Influen- sível, o elemento supranatural
ciado pelo Iluminismo, das narrativas evangélicas.
H. S. Reimarus (1694-1768) A premissa básica desses auto-
inaugura a abordagem ri- res consiste em rejeitar, por falta
gorosamente histórica dos de embasamento histórico, todos
quatro Evangelhos. Tem aqueles fatos que não possam ser
início, com a publicação compreendidos com o auxílio das
dos seus fragmentos, a leis naturais. A dimensão espiri-
“busca do Jesus histórico”. tual da vida é rotulada de “sobre-
A Segunda Fase6 do es- natural” e, conseqüentemente,
tudo da vida de Jesus, desprezada. A Ciência, embora
Baruch Spinoza: leitura e interpretação dos iniciada por Reimarus, é ensaiando os primeiros passos, já
livros bíblicos à luz do Racionalismo marcada pelo espírito da se revestia da arrogância, tão du-
estado de menoridade (não-eman- época – Racionalismo. Nesse ramente criticada na Religião.
cipação) devido a eles mesmos. contexto, há uma resistência sis-
Menoridade é a incapacidade de temática a todos os fatos ditos 7
Nome dado aos sete fragmentos escri-
utilizar o próprio intelecto sem a miraculosos, descritos nas pági-
tos por H. S. Reimarus, publicados por
orientação de outro. Essa meno- nas do Novo Testamento. O nas- Gothold Ephraim Lessing, em 1778, na
ridade será devida a eles mesmos cimento virginal, a ressurreição, Alemanha.
se não for causada por deficiên- as curas e os milagres despertam
cia intelectual, mas por falta de o interesse de inúmeros pesqui-
decisão e coragem para utilizar o sadores, que buscam, cada um à
intelecto como guia. Sapere au- sua maneira, explicações “racio-
de! Ousa saber! É o lema do ilu- nais” para esses eventos extraor-
minismo”.5 dinários da vida do Mestre.
O século das luzes, trazendo Assim, concomitante ao lan-
em seu bojo o Empirismo, o Ra-
cionalismo, a crítica histórica e 6A maior parte dos estudiosos do tema
textual, o Enciclopedismo, não prefere chamar o período inaugurado por Immanuel
poupou os textos bíblicos. O com- H. S. Reimarus de Primeira Fase, já que Kant
plexo desenvolvimento de concep- desconsideram toda a produção do Su-
pranaturalismo. Em certo sentido, estão
ções e metodologias, abrangendo corretos já que não se pode falar em
várias áreas de estudo, favoreceu a “busca do Jesus histórico”, antes do traba-
lho daquele autor. Todavia, como pre-
tendemos traçar um esboço do estu-
5
ABBAGNANO, Nicola. Dicionário de filo- do da figura de Jesus, em sentido
sofia. 5. ed. revista e ampliada. Martins amplo, preferimos incluir o período
Fontes. p. 618. anterior ao Iluminismo.

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Na próxima edição, traçaremos tual das entidades encarnadas vazio que separa Religião e Ciência
um esboço das idéias principais na Terra.8 com o conhecimento das leis que
dos racionalistas, citando os auto- regem o Universo espiritual e suas
res mais representativos do perío- Vê-se que a proposta da Espiri- relações com o mundo corpóreo.
do. Antes, porém, cumpre avaliar tualidade superior reside na con- Uma vez compreendidas essas
a atitude desses estudiosos à luz jugação da Razão e da Fé, não so- relações, os milagres, as curas, e
da revelação espiritual. mente nos assuntos relacionados ao outros fenômenos eminentemente
Abordando a questão do Ra- conhecimento, mas, sobretudo, na espirituais, descritos nos Evan-
cionalismo, o Espírito Emmanuel construção de uma sociedade pacífi- gelhos, serão vistos como decor-
faz considerações valiosas a res- ca, justa e fraterna. Na feliz expressão rentes de leis imutáveis. Vencida
peito do assunto: do Codificador,9 é preciso encher o essa resistência tola, imposta pela
ciência materialista pós-iluminis-
Questão 199 – Poderá a Razão 8 ta, o aprendiz do Mestre estará em
XAVIER, Francisco Cândido. O consola-
dispensar a Fé? dor. Pelo Espírito Emmanuel. 27. ed. Rio condições de extrair o espírito da
– A razão humana é ainda de Janeiro: FEB, 2003. letra, recolhendo as lições imorre-
muito frágil e não poderá dis- 9
Texto utilizado como epígrafe deste arti- douras que fluem dos fatos ex-
pensar a cooperação da fé que go (Referência 1). traordinários da Vida de Jesus.
a ilumina, para a solução dos
grandes e sagrados problemas
da vida. Nada...
Em virtude da separação de
ambas, nas estradas da vida, é Nada!... Filosofia rude e amara,
que observamos o homem ter- Na qual acreditei, com pena embora
restre no desfiladeiro terrível da De abandonar a Crença que esposara,
miséria e da destruição. [...] – A minha aspiração de cada hora.
....................................................
Questão 202 – No problema da Crença é o perfume dalma que se enflora
investigação, há limites para Com a luz divina, resplendente e rara
aplicação dos métodos raciona- Da Fé, única Luz da única Aurora,
listas? Que as trevas mais compactas aclara.
– Esses limites existem, não só
para a aplicação, como tam- Revendo os dias tristes do Passado,
bém para a observação; limites Vi que troquei a Fé pela Ironia,
esses que são condicionados Nos desvios e excessos da Razão;
pelas forças espirituais que
presidem à evolução planetá- Antes, porém, não fosse tão ousado,
ria, atendendo à conveniência Pois nem sempre a Razão profunda e fria
e ao estado de progresso moral Alivia ou consola o Coração.
das criaturas.
É por esse motivo que os limi- Antônio Torres
tes das aplicações e das análi-
ses chamadas positivas sempre Fonte: XAVIER, Francisco C. Parnaso de além-túmulo. 18. ed. Rio de Janei-
acompanham e seguirão sem- ro: FEB, 2006. p. 106. Edição Comemorativa – 70 anos.
pre o curso da evolução espiri-

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Seminário sobre
“O atendimento nas reuniões
mediúnicas” na FEB-Rio
No dia 1o de setembro, mais
uma vez os espíritas fluminenses
marcaram sua presença na Sede
Seccional da FEB, no Rio de Janei-
ro, para participar do Seminário
“O atendimento nas reuniões me-
diúnicas”, desenvolvido por Marta
Antunes de Oliveira Moura, dire-
tora da FEB na Área Doutrinária e
coordenadora da Área da Ativida-
de Mediúnica.
Como vem sendo realizado
mensalmente, esse evento fez
parte da comemoração dos 150
Marta Antunes de Oliveira Moura expõe seu tema
anos da edição de O Livro dos Es-
píritos, dando seqüência à eficien- cos e práticos da mediunidade, tão grande importância, nume-
te parceria da Federação Espírita tudo isso em linguagem clara e rosas perguntas foram direcio-
Brasileira (FEB) com o Conselho objetiva, abrangendo, com sim- nadas a Marta e a Henrique, o
Espírita do Estado do Rio de plicidade, as dificuldades do mé- que ensejou maiores elucidações
Janeiro (CEERJ), e teve a coorde- dium e os meios de obter a boa sobre o assunto. Aproveitando
nação geral de Amauri Alves da realização do trabalho, ao qual se as respostas a essas muitas inda-
Silva, diretor da FEB, acompa- propõe. gações, foi realizado o estudo
nhado de Aloísio Ghiggino, dire- Participou também o confrade de casos sobre os diversos graus de
tor de Unificação do CEERJ. Henrique Fernandes, espírita da complexidade no atendimento
Marta, após a introdução, di- Baixada Fluminense e atuante no mediúnico.
recionou todos os participantes Movimento Espírita estadual. Foi um dia proveitoso para o
a pensarem sobre a responsabili- Após intervalo para o almo- Movimento Espírita, quando mais
dade da tarefa mediúnica, discor- ço, em face do manifesto interes- uma vez se consolidou essa auspi-
reu a respeito dos aspectos teóri- se dos assistentes por tema de ciosa parceria FEB-CEERJ.

Novembro 2007 • Reformador 445 39


reformador novembro 2007 - b.qxp 25/1/2008 16:34 Page 40

José Martins
Peralva Sobrinho
E
mbora se alinhe entre as fi- Apesar de ser o mais novo dos tente da Procuradoria da Fazen-
guras mais destacadas do filhos, nosso biografado assumiu da Municipal.
Movimento Espírita de Mi- o comando da casa e procurou Em 4 de fevereiro de 1938,
nas Gerais, o nosso biografado logo trabalhar, para obter o pão com 20 anos, verificou-se o fale-
não é mineiro. Nasceu em Bu- de cada dia. cimento de sua mãe, sobrevindo
quim, cidade do Sul de Sergipe, Teve vários empregos, no co- novas dificuldades. Os irmãos
em 1o de abril de 1918, estando, mércio e como apontador na dispersaram-se e Martins Peral-
portanto, com 88 anos. va, já com emprego certo na Pre-
Martins Peralva iniciou-se no feitura, permaneceu em Aracaju.
Espiritismo sob assistência e Em agosto de 1942, casou-
orientação diretas de seu pai, -se com Jupira Silveira – a
excelente médium cura- devotada esposa que de-
dor, vigoroso polemista e sencarnaria em 15 de ju-
inspirado doutrinador. lho de 2003 –, com
Acompanhando, desde quem teve três filhos:
os 6 anos, os trabalhos Ieda, nascida em Ara-
desenvolvidos com ex- caju; Basílio e Alcio-
traordinária seguran- ne, nascidos em Belo
ça, presenciou em sua Horizonte, os quais lhe
própria casa notáveis deram 5 netos. Basílio,
curas realizadas por in- atualmente, é membro
termédio de seu genitor. do Conselho de Admi-
Teve a infância e a adoles- nistração da União Espí-
cência enriquecidas por fatos rita Mineira.
extraordinários e pelo contato com Em 1949, indo ao Rio de Ja-
a Doutrina, o que lhe proporcio- neiro representar Sergipe na Fes-
nou formação espírita essencial- José Martins Peralva Sobrinho ta Nacional do Livro Espírita,
mente baseada em Allan Kardec. promovida por valorosos com-
Do ponto de vista material, sua construção civil, até fazer con- panheiros, entre os quais Leo-
adolescência foi extremamente curso público para o cargo de poldo Machado, Arthur Lins de
difícil, pois o pai desencarnou escriturário da Prefeitura Muni- Vasconcelos Lopes e Carlos Im-
quando ele tinha apenas 13 anos, cipal de Aracaju, tendo sido apro- bassahy, estendeu sua viagem, após
ficando a viúva Etelvina e seus fi- vado e nomeado. Depois, por o encontro, a Minas Gerais, obje-
lhos Edison, Eurídice e José em merecimento, ocupou os cargos tivando conhecer e abraçar Chi-
situação de pobreza. de oficial administrativo e assis- co Xavier, rever Virgílio Pedro de

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Almeida, discípulo de seu pai na tando-se em 1985, após 35 anos ve grande repercussão na época,
área espírita, e visitar um irmão de trabalho. quando o tema era ainda um tabu
de seu pai, residente em Belo Ho- Martins Peralva foi membro no meio espírita.
rizonte: José Martins Peralva. do Conselho Geral e secretário do Como escritor e jornalista de ra-
Seu primeiro contato com Abrigo Jesus, sócio efetivo do Hos- ra competência, pertenceu à Asso-
Chico Xavier ocorreu na noite de pital Espírita André Luiz e 2o se- ciação Sergipana de Imprensa, in-
13 de maio de 1949, em reunião cretário do Centro Espírita Luz, tegrando ainda o corpo associativo
do Centro Espírita Luiz Gonza- Amor e Caridade. do Sindicato dos Jornalistas Profis-
ga, de Pedro Leopoldo, sob gran- Em Minas Gerais escreveu cin- sionais de Minas Gerais e da As-
de emoção espiritual. co obras evangélico-doutrinárias sociação Brasileira de Jornalistas e
Desse encontro com Chico Xa- de reconhecido valor: Estudando Escritores Espíritas. Sempre cola-
vier nasceu-lhe o desejo de trans- a Mediunidade (26 edições), Estu- borou em jornais e periódicos espí-
ferir residência para Belo Hori- dando o Evangelho (9 edições), O ritas, escrevendo durante muitos
zonte. Voltando a Aracaju, trocou Pensamento de Emmanuel (8 edi- anos artigos sobre Doutrina Espí-
idéias com seu médico, Dr. Lou- ções), Mediunidade e Evolução (9 rita no principal jornal dos minei-
rival Bonfim, que o considerava edições), todas editadas pela FEB, ros – o matutino O Estado de Minas.
como filho, sendo orientado a e Mensageiros do Bem, com tira- Após grave enfermidade, Mar-
mudar-se para a capital mineira, gem de dez mil exemplares, edita- tins Peralva desencarnou em 3 de
tida na época como cidade de da pela União Espírita Mineira. setembro deste ano, conforme
clima ideal para a cura de pro- Em 1963, apresentou na XVI registro em Reformador de outu-
blemas pulmonares, o que ocor- Concentração de Mocidades Es- bro, p. 25(391).
reu em 4 de setembro de 1949. píritas do Brasil Central e Estado
Quando chegou a Belo Hori- de São Paulo o trabalho intitulado Fonte: Jornal O Espírita Mineiro – com
base em dados fornecidos por Basílio
zonte, a Mocidade Espírita “O “O Comportamento do Jovem em Silveira Peralva – de setembro/outubro
Precursor” contava apenas 6 me- face do Problema Sexual”, que te- de 2006. (Transcrição parcial.)
ses de existência. Integrando-se
ao movimento moço, foi um dos
mentores da Mocidade, função
que corresponde hoje à de coor-
denador.
Em 1964, depois de participar
do Centro Espírita Célia Xa-
vier durante 15 anos ininter-
ruptos, fixou-se na União Es-
pírita Mineira (UEM), exercen-
do os cargos de 1o secretário e
posteriormente os de vice-presi-
dente, secretário de O Espírita Mi-
neiro, diretor do Departamento
de Doutrina e Divulgação e dire-
tor-executivo do Conselho Fede-
rativo Espírita de Minas Gerais.
Ingressou na carreira bancária Capa dos livros escritos por
em 1o de abril de 1950, aposen- Martins Peralva e editados pela FEB

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Seara Espírita

Minas Gerais: Feira do Livro Espírita do Conselho Espírita do Estado do Rio de Janeiro
A União Espírita Mineira realizou, entre os dias 1o e (CEERJ), a FEERJ transformou-se no Instituto Espí-
7 de outubro, em Belo Horizonte, a 25a Feira do Li- rita Bezerra de Menezes (IEBM). As comemorações
vro Espírita, nas dependências da livraria da sua se- tiveram início em janeiro, na Sessão Solene de que
de. Ocorreram palestras proferidas por Walterson da participou o presidente da FEB, Nestor João Masotti,
Silva Lage, Magda Luzimar de Abreu, Francisco de prosseguindo, no dia 30 de junho, com palestra de
Assis Faria e Afonso Chagas Corrêa. Sandra Borba Pereira, presidente da Federação Espí-
rita do Rio Grande do Norte.
Pará: Homenagem a Kardec Centro Espírita Fé e Caridade: Esta tradicional insti-
A União Espírita Paraense promoveu palestras, em tuição, da cidade de Rio Claro (SP), completou 100
Belém, em comemoração à data natalícia do Codifi- anos de existência em 5 de agosto de 2007. A institui-
cador, tendo como convidado Antonio Cesar Perri de ção realizou uma reunião comemorativa no dia 4,
Carvalho, diretor da FEB. As palestras foram realiza- com palestra do escritor espírita Richard Simonetti.
das dia 3 de outubro, no Centro Espírita Benedita Fer-
nandes e, dia 4, na sede da União Espírita Paraense. João Pessoa (PB): Congresso da ABRADE
A Associação Brasileira de Divulgadores do Espiri-
Colômbia: Seminário Em Defesa da Vida tismo (Abrade) promoveu no período de 11 a 14 de
A Associação Espírita Terceira Revelação, de Bogotá, outubro, em João Pessoa, o II Congresso Brasileiro
promoveu, nos dias 8 e 9 de setembro, o XVIII Se- de Divulgadores do Espiritismo (CONBRADE), com
minário de Difusão e Educação Espírita, dedicado à temas como: “Da Torre de Babel às torres de TV”, “A
Campanha Em Defesa da Vida. Foram abordados os ética na Comunicação Social Espírita”, “Comunicação
temas: “Não à Eutanásia”, “Não à Violência”, “Não ao Social Espírita – Sempre com Kardec”, “Espiritismo e
Aborto” e “Não ao Suicídio”. Integração Humana: conteúdo e metodologias”, “Espi-
ritismo e Ecologia” e “De Kardec ao III Milênio”.
Salvador (BA): Congresso da ABRAME
A Associação Brasileira dos Magistrados Espíritas São Paulo: Encontro de Delegados de
(Abrame) realizou de 10 a 13 de outubro, em Sal- Polícia Espíritas
vador (BA) o IV Congresso Brasileiro dos Magistra- A União dos Delegados de Polícia Espíritas do Es-
dos Espíritas. O objetivo do evento foi discutir temas tado de São Paulo realizou, no dia 25 de outubro, o
como: “A espiritualização do Direito e a humaniza- 10o Encontro de Delegados de Polícia Espíritas, na
ção da Justiça”, “A tarefa de julgar e os desafios dia-a- sede da Associação dos Delegados de Polícia do Es-
-dia da vida profissional”, “Bioética e Direito”, “Hu- tado de São Paulo. Foram convidados profissionais
manização do sistema penitenciário”, “Aborto” e da Justiça, familiares e amigos, espíritas e simpati-
“Questões outras que dizem com a missão e respon- zantes do Espiritismo, para tratar dos temas “O poli-
sabilidade do juiz espírita”. cial espírita”, por Roosevelt de Souza Bormann, que
falou sobre como o policial espírita deve se compor-
Casas Espíritas Centenárias tar no desempenho da sua função de servidor públi-
Antiga FEERJ: Em 30 de junho de 1907 era fundada co e “Filosofia penal do futuro”, por José Leal, com
a Federação Espírita do Estado do Rio de Janeiro, abordagem sobre a filosofia espírita a respeito dos
que durante um século foi o órgão de unificação conceitos de crime, criminologia, castigo e direito
do Movimento Espírita fluminense. Com a criação penal.

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Bienal 2007

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