Você está na página 1de 58

Crimes contra a dignidade sexual

Profª. Luciana Fernandes


false

Descrição
Aspectos gerais dos crimes sexuais.

Propósito
As modalidades dos crimes sexuais integram importante parte do
ordenamento jurídico penal, sendo
fundamental que se conheçam as modalidades, os elementos dos tipos
penais em espécie e que se reflita
sobre o que estrutura tais delitos.

Preparação
Antes de iniciar este tema, tenha em mãos a Constituição e o
Código Penal.

Objetivos
Módulo 1

Os crimes sexuais
Identificar os crimes contra a liberdade sexual.
Módulo 2

Vulneráveis
Reconhecer os crimes sexuais contra vulneráveis.

Módulo 3

Lenocínio e tráfico de pessoa


Analisar os delitos do título “lenocínio e tráfico de pessoa para fim de
prostituição ou outra forma de
exploração sexual”.

Módulo 4

Ultraje público ao pudor


Classificar os tipos do “ultraje público ao pudor”.

report_problem

Aviso

O material apresentado pode gerar desconforto psicológico para algumas


pessoas. Caso esse
seja o seu caso, saiba que conta com a nossa simpatia. Se
precisar, não deixe de buscar ajuda na
Unidade Básica de Saúde (UBS) mais
próxima, ou no Serviço de Psicologia Aplicada de alguma
Instituição de
Ensino Superior ou no Centro de Valorização da Vida (CVV) através do site
cvv.org.br
ou número 188.

Introdução
Abusos sexuais de toda espécie são uma realidade infeliz
em todo o mundo. Suas diversas
modalidades distribuem-se desigualmente em nosso país e
atingem, principalmente, mulheres
negras, pobres e periféricas (ANDRADE, 2018). Além disso,
ao contrário do senso comum, diversas
pesquisas têm noticiado que os principais agressores,
especialmente no que se refere ao crime de
estupro, são homens dos círculos de convivência
íntimo de mulheres (IPEA, 2014).

Considerando essas condições, iniciamos este duro tema


convidando você, que é estudante, a
quebrar os paradigmas hegemônicos sobre
“autores” e “vítimas” e a refletir de forma sistêmica
sobre o assunto, mais
especificamente, sobre como o cisheteropatriarcado influencia a ocorrência
desses fatos.

Chamamos atenção para uma visão mais estrutural de como a


“cultura do estupro” (SOUSA, 2017),
aqui abrigando uma ampla gama de abusos sexuais, tem
contextualizado os delitos com maior
ocorrência nos módulos que apresentamos. Queremos
despertar em você senso crítico para, não só
conhecer as espécies de delito, que é sobre o
que mais nos debruçaremos neste material, mas
também para problematizar qualquer estereotipo
lançado a respeito das partes envolvidas e todo
tipo de cultura antidemocrática que subjaz
aos conflitos que descreveremos.

Uma das evidências de como o sexismo influiu – e ainda


influi –, inclusive na legislação criminal, é o
fato que, até 2005, para crimes como
“Sedução” (art. 217), “Rapto violento ou mediante fraude” e
“Rapto consensual” (arts.219 e
220), se o algoz se casasse com a vítima, haveria uma diminuição de
pena (art. 221). Essa
prática contribui para a construção cultural de que não há abusos em
casamentos instituídos
e tem intimidado, há décadas, mulheres a denunciarem casos de abusos no
próprio lar. Além
disso, havia dispositivo (revogado) que previa aumento de pena (art. 226, III) caso o
agressor fosse casado e, a pior violação de todas: todo o título VI, até 2009, era chamado
de “crimes
contra os costumes”.

A partir desta linguagem, reforçava-se que tais delitos


não tutelavam a liberdade sexual, a dignidade
humana, ou sequer o direito à sexualidade, mas
sim os “costumes” da família baseada na moralidade
cristã. Por esses e outros motivos, por
muitas décadas, o sistema de justiça criminal assentou o
entendimento, amparado na
legislação disponível, de que mesmo com aparência de violação sexual,
muitas práticas, desde
que costumazes e praticadas em meio ao seio familiar, não configuravam
crime. Assim, também,
tudo o que transcendia a moralidade desse modelo de família nuclear, não
constituía violação
relevante, motivo pelo qual a população LGBTQI+ e as(os) trabalhadoras(es)
sexuais encontram
grandes dificuldades ao enfrentar o sistema quando são vítimas de crimes
sexuais.

Neste conteúdo, portanto, exploraremos todos os chamados


crimes sexuais e, em síntese, buscamos
nesta introdução incentivar uma pesquisa
interdisciplinar sobre o tema. Isto é, uma busca engajada
aos pontos que possam
ir além dos limites da racionalidade jurídico descritiva, e implicar cada um
para a
discussão pública e pauta de práticas democraticamente localizadas no trato das pessoas
que
vivem conflitos como esses. Qualquer um/a que atua no sistema de justiça criminal e está
diante
de casos como esses deve se revisitar sempre, sobretudo para não reproduzir os
mecanismos de
vitimização secundária das pessoas que relatam abusos, produzindo ainda maior
sofrimento a essas
partes.

1 - Os crimes sexuais
Ao final deste módulo, esperamos que você identifique os crimes contra a
liberdade sexual.

Primeiras palavras
Começamos, então, com o corte dogmático fazendo
duas notas comuns a todos os crimes deste título:

Primeira nota: Segundo o art.


234-A, com redação dada pela Lei nº 13.718, de 2018 – implicando em uma
novatio
in pejus –, aumenta-se a pena (BRASIL, 2018):

III. de metade a 2/3 (dois terços), se do crime resulta gravidez;


IV. de 1/3 (um terço) a 2/3 (dois terços), se o agente transmite à vítima doença
sexualmente transmissível
de que sabe ou deveria saber ser portador, ou se a
vítima é idosa ou pessoa com deficiência.
Segunda nota: conforme o art.
234-B, “os processos em que se apuram crimes definidos neste título
correrão em
segredo de justiça”.

Feitos os registros, vamos, então, para o estudo


detalhado dos delitos, separados em função dos capítulos
que integram.

Crimes contra a liberdade sexual


Os crimes deste título são dolosos e têm como
razão de ser a proteção da liberdade e do direito à
sexualidade, assim como a
autonomia e a dignidade humana. Fala-se aqui no livre consentimento ou na
formação
da vontade em matéria sexual, sendo um importante espectro da liberdade e da
subjetividade das
pessoas.

Tivemos algumas alterações recentes


a este tema, como a emergência da Lei nº 13.718/2018 que criou
crimes
autônomos e causas de aumento de pena – os quais trataremos oportunamente –
e alterou a ação
penal referente aos títulos.

wb_incandescent

Dica

Tome nota, então, que, a partir dessa legislação, todos os casos de crimes
contra a liberdade
sexual e de crimes sexuais contra vulneráveis são
processados mediante ação penal pública
incondicionada (art. 225, CP).

Antes disso, a ação pública era condicionada à


representação, ressalvados alguns casos, como quando a
vítima fosse menor de 18 anos
ou pessoa vulnerável. Assim, por se tratar de uma novatio legis híbrida, com
caráter
processual e material, e que consiste em um prejuízo para o réu (nos casos em que a
ação dependia
de representação), passa a ser aplicada apenas após a sua regência.
Feitas as notas gerais, podemos passar a estudar
cada um dos crimes do capítulo separadamente.

O crime de estupro (art. 213, CP)

video_library
Estupro
Antes de entrarmos neste tópico, a professora
Luciana Fernandes discorrerá sobre o tipo penal de estupro e
as principais questões
relativas a ele.

Para fins meramente didáticos, dizemos que são


duas as possíveis modalidades do crime de estupro:

Aquela em que há ato conjunção carnal.


Aquela em que há qualquer outro ato
libidinoso.

extension

Exemplo

Por atos libidinosos podemos citar a “masturbação; os toques ou apalpadelas


com significação
sexual no corpo ou diretamente na região pudica (genitália,
seios ou membros inferiores etc.) da
vítima; a contemplação lasciva; os
contatos voluptuosos” (PRADO, 2019, p. 1436).

Dispensa-se, portanto, a penetração para a


tipificação do crime, embora esta possa integrar o contexto do
fato. Nesse sentido,
até mesmo um beijo lascivo, a depender do contexto fático, vem sendo encarado pelos
Tribunais como suficiente para ensejar a sua caracterização, o que podemos encarar
com bastante
desconfiança, sobretudo em face do princípio da lesividade e da
intervenção mínima.

Comete o crime de estupro, em tese, quem constrange alguém, mediante


violência ou
grave ameaça, para a prática ou permite com que ele se
pratique qualquer uma
dessas modalidades.

post_add
Saiba mais

O ato do constrangimento, que é elemento típico essencial, implica em forçar


ou obrigar alguém a
uma prática sexual.

No entanto, o CP sofreu alterações no art. 214:

Redação original

Na redação original, o CP trazia dois tipos penais: estupro e atentado


violento ao pudor (art. 214), e só
havia o estupro com a prática de
conjunção carnal.
close

Crime revogado

Com a Lei nº 12.015/09, o crime de atentado violento ao pudor foi


formalmente revogado e, como visto,
a prática de qualquer ato libidinoso
já atrai a incidência do crime de estupro.

Nesse sentido, houve o fenômeno da continuidade


normativa ou da continuidade típico-normativa, com uma
alteração geográfica do tipo
penal, mas não a sua extinção. Não obstante, no Código Penal Militar, ainda há
essa
divisão entre o crime de atentado ao pudor e estupro – e que passa a ser aplicável,
estritamente, a esta
justiça.

Estamos diante de um tipo misto alternativo,


logo:

Se o agente, no mesmo contexto fático, pratica conjunção


carnal e
outro ato libidinoso contra uma só vítima, pratica um só crime do
art. 213 do CP.
(STJ, HC 212.305/DF)
Podem ser sujeitos ativo e passivo qualquer
pessoa, sendo um delito comum e, por mais óbvio que possa
parecer para alguns, vale
ressaltar que o casamento ou a união formalizada entre as pessoas envolvidas em
nada
interfere para a configuração típica. Outro elemento estruturante do delito é o
dissenso da vítima, isto
é, que ela não consinta com a prática de modo objetivo e
com clareza.

Trata-se de um crime doloso, em que a pessoa autora precisa ter


consciência e
vontade dos elementos do tipo e que demanda um
elemento subjetivo específico,
que é a intenção de obter o envolvimento
sexual.

Além disso, admite tentativa (art.


14, II, CP), quando por motivo alheio à vontade algum ato externalizando a
intenção do estupro for cometido, mas nenhum ato libidinoso for cometido.
Suponha, como exemplo, que a
vítima do crime grite e, despertando atenção
dos vizinhos, que tentam adentrar ao local do fato, o autor
tenha a
empreitada interrompida.

Em síntese, trata-se de crime comum, doloso, de


resultado comissivo e instantâneo. Há algumas formas
qualificadas do delito,
insculpidas nos parágrafos do art. 213:

§ 1º Se da conduta resulta lesão corporal de


natureza grave ou se a
vítima é menor de 18 (dezoito) ou maior de 14
(catorze) anos;
§ 2º Se da conduta resulta morte.
(DECRETO-LEI Nº2.848, 1940)

Vale lembrar que os resultados do estupro


qualificado devem se dar, necessariamente, de modo culposo.
Caso, por exemplo, haja
dolo na morte da vítima, que ocorre ao longo do estupro, não haverá estupro
qualificado, mas, sim, concurso de crimes (homicídio e estupro).

Outro caso de concurso de crimes


possível e que, infelizmente, tem recorrência é a hipótese do sujeito ativo
que sabe ou deve saber que está contaminado com doença venérea e que obriga
a vítima a com ele manter
relação sexual, expondo-a a risco de contrair a
moléstia. Nesse caso, em tese, responde por estupro em
concurso formal com
crime do art. 130, caput, CP.

A sanção da modalidade simples do estupro é de 6


a 10 anos de reclusão, e, das modalidades qualificadas,
de 8 a 12 ou 12 a 30 anos, a
depender da espécie do resultado. Todas as suas modalidades (simples e
qualificado)
são crimes hediondos.

Violação sexual mediante fraude (art. 215, CP)


Trata-se de crime doloso e comum, que admite
tentativa e que também envolve aqueles dois elementos: da
conjunção carnal ou ato
libidinoso. O tipo consiste em “ter conjunção carnal ou praticar outro ato
libidinoso
com alguém, mediante fraude ou outro meio que impeça ou dificulte a livre
manifestação de vontade da
vítima” (LEI Nº 12.015, 2009).

Segundo a redação exposta, esse delito altera o


modo como o autor executa o crime, aqui não sendo o
constrangimento de modo
genérico, mas a “fraude ou outro meio que impeça ou dificulte a livre
manifestação
de vontade da vítima” (LEI Nº 12.015, 2009). Estamos diante de um crime, portanto,
que tem o
vício da vontade como principal elemento, de modo que a vítima seja
enganada, equivocando-se quanto às
reais características do agente.

Esse é o motivo de haver


consentimento por parte do sujeito passivo, isto é, ter sido enganada,
embora
mantenha a consciência e a capacidade de resistência – motivo pelo
qual não será o caso de um estupro de
vulnerável. Mas a fraude é apenas uma
das hipóteses, contemplando o tipo também a interpretação
analógica desta,
por meio da expressão “outro meio que impeça [...]”, sendo que “o malicioso
silêncio e a
mentira podem ser utilizados como meios fraudulentos” (PRADO,
2019, p. 1443).
Mesmo contemplando a intervenção mínima e o
princípio da legalidade, é preciso ter bastante cuidado para
que não se banalize a
possível expressão “fraude”.

text_snippet

Resumindo

Em síntese, estamos diante de um delito comum, doloso, comissivo,


instantâneo e de resultado.

O delito é sancionado com pena de reclusão de 2 a


6 anos. Também há modalidade qualificada prevista,
quando cometido com o fim de
obter vantagem econômica, hipótese em que se aplica também multa (art.
215,
parágrafo único, CP).

Importunação sexual (art. 215-A, CP)


Trata-se de um crime recente, criado pela Lei nº
13.718/2018, e que tipifica de forma subsidiária a conduta
de praticar ato
libidinoso sem o consentimento da vítima. Veja que a redação do crime é bem próxima
a do
estupro, com exceção do elemento violência ou grave ameaça. Por isso, a sua
aplicação fica sujeita à
inexistência do cumprimento dos requisitos daquele crime:

Praticar contra alguém e sem a sua anuência ato


libidinoso com o
objetivo de satisfazer a própria lascívia ou a de terceiro.
(LEI Nº 13.718, 2018)

O delito foi trazido ao ordenamento


ao longo de uma onda de denúncias de casos de “importunação” em
transporte
público, especialmente envolvendo homens que esfregavam suas genitálias em
mulheres em
transportes públicos.
Essas condutas não chegavam a assumir os termos
do crime de estupro e, por isso, os poucos casos que
chegavam às instâncias formais
de controle eram arquivados.

Também é um crime comum, doloso, que admite


tentativa e que deve ter uma natureza física e voltar-se
contra vítima certa. O
autor da infração, tal como nos demais tipos vistos, deve ter consciência de que o
sujeito passivo não anuiu para a prática do ato libidinoso. Pela infração, o
legislador prevê pena de 1 a 5
anos de reclusão.

Como nota distintiva principal, entre este ilícito e o crime de estupro,


deve-se
verificar a discordância da vítima, que naquele está relacionada
ao
constrangimento decorrente do emprego de violência ou grave
ameaça, e aqui não
assume forma delimitada.

Ainda, por ser subsidiário, não estará


configurado se o aproveitamento se der em virtude da situação de
vulnerabilidade da
vítima, caso em que poderemos estar diante de um dos crimes do próximo título que
estudaremos.

Por fim, vale trazer a nota que estamos


reforçando ao longo da construção de todo este material que nem
todo constrangimento
deve, em virtude da ultima ratio que justifica o direito penal, ser considerado
crime. É
necessário assumir a centralidade da palavra da vítima, mas não banalizar a
responsabilização penal em
virtude de seus efeitos brutais; da seletividade que lhe
é imanente; e das limitações conhecidas no que
tange à reversão de questões como
essas que tocam aspectos sistêmico-estruturais.

Assédio sexual (art. 216-A, CP)


A principal característica deste crime,
distintiva das demais modalidades de abuso sexual (em sentido
amplo), é o âmbito em
que é realizada, isto é, nas “atividades de trabalho ou nos ambientes em que
determinadas pessoas tenham ascendência sobre outras, em razão do emprego, cargo ou
função, inclusive
na seara das relações docentes (v.g., relação entre
professor e aluno)” (PRADO, 2019, p. 1450).

Assim dispõe o tipo penal:


Constranger alguém com o intuito de obter vantagem ou
favorecimento sexual, prevalecendo-se o agente da sua condição de
superior
hierárquico ou ascendência inerentes ao exercício de
emprego, cargo ou
função.
(LEI Nº 10.224, 2001)

Em virtude disso:

Sujeito ativo

O sujeito ativo deve ter uma qualidade própria, qual seja, deve ser
superior hierárquico ou ter
ascendência sobre a vítima.
arrow_forward

Sujeito passivo

Já o passivo deve ser inferior hierárquico ou qualquer pessoa que esteja


submetida à ascendência do
agente.
g

Caso não tenham esses atributos, pode-se estar


configurado outro crime do título ou estar-se diante de um
irrelevante penal.

Vale notar que, ao contrário da hierarquia, que


demanda uma carreira funcional, na ascendência deve haver
qualquer relação de
domínio ou influência.

extension

Exemplo

Contemplam-se os casos envolvendo professor-aluno desde que os restantes dos


elementos do
assédio tenham sido praticados.

É elemento subjetivo do tipo, para além do dolo


genérico que já dissemos estar em todas as infrações do
título, o intuito de obter
vantagem ou favorecimento sexual. Além disso, a maioria dos autores informa que
estamos lidando com um chamado “crime de mera atividade”, isto é, não é necessário
que haja a obtenção
da vantagem/favorecimento, mas que haja a intenção e a
externalização de algum ato voltado a essa
obtenção a ponto de deixar a vítima
perturbada (NUCCI, 2019; PRADO, 2019).

Por isso, também é possível que o crime se dê de


forma tentada (art. 14, II, CP), desde que a vítima não
tome conhecimento do ato.

Imagine, então, uma mensagem escrita


por um chefe a uma “subordinada hierárquica”, com a forma descrita
do
assédio, mas que seja recolhida por um terceiro. A depender dos demais
contornos do fato, podemos
estar diante da infração.

As manifestações de assédio podem ser físicas ou verbais e não


necessariamente
precisam ser explícitas, embora tenham que ser
relevantes.

Apesar de ser mais comum que ocorram no ambiente


laboral, não precisam ser praticadas nesse espaço
físico, basta que tenham como
elemento a hierarquia/ascendência no cargo e função.

A pena cominada ao assédio sexual é de 1 a 2 anos


de detenção, sendo aumentada em até 1/3 (um terço)
se a vítima for menor de 18 anos.
Trata-se, portanto, de um crime de menor potencial ofensivo, com uma
sanção penal
sensivelmente menor do que a dos outros crimes que estudamos anteriormente.

Registro não autorizado da intimidade sexual (art.


216-
B, CP)
Esse crime foi incluído pela Lei nº 13.772, de
2018, e é o único do capítulo I-A “Da exposição da intimidade
sexual” no item
referente aos delitos sexuais no Código. O tipo objetivo consiste em “produzir,
fotografar,
filmar ou registrar, por qualquer meio, conteúdo com cena de nudez, ato
sexual ou libidinoso de caráter
íntimo e privado, sem autorização dos
participantes”.

Caminhou o legislador, aqui, em sintonia com as


alterações na sociedade e tendo em vista a recorrência de
denúncias de práticas
nesse sentido, que não tinham definição precisa. Foi o caso paradigmático, por
exemplo, narrado por Rogério Sanches:

O tipo preenche a lacuna que existia em relação à punição


da conduta de
indivíduos que registravam a prática de atos sexuais entre
terceiros. Foi grande
a repercussão quando, em janeiro de 2018, um casal
alugou um apartamento
para passar alguns dias no litoral de São Paulo e,
depois de se instalar,
percebeu uma pequena luz atrás de um espelho que
guarnecia o quarto. O
inusitado sinal faz com que um deles vistoriasse o
espelho e, espantado,
descobrisse que ali havia uma câmera instalada. O
equipamento foi
imediatamente desligado e, logo em seguida, o casal recebeu
uma ligação do
proprietário do imóvel, que indagou se havia ocorrido algum
problema, o que
indicava que as imagens estavam sendo transmitidas em tempo
real.

(CUNHA, 2018).

Também estamos diante de um tipo doloso e que,


dado o último elemento da frase antecedente, requer que
se demonstre que o agente
conhecia a inexistência de autorização, sob pena de incorrer em erro de tipo.
Caso
haja autorização para o registro das cenas, a conduta será atípica. Além disso, é um
crime comissivo,
doloso, de mera atividade e instantâneo, sendo também possível,
embora de difícil configuração, a tentativa
(art. 14, II, CP).

warning

Atenção

Fotografar criança ou adolescente em poses nitidamente sensuais, com enfoque


em seus órgãos
genitais, ainda que cobertos por peças de roupas, e com
finalidade sexual e libidinosa, amolda os
tipos do art. 240 e 241-B do ECA,
considerando o princípio da especialidade.

A pena cominada é de 6 meses a 1 ano de detenção


e multa e o parágrafo único do art. 216-B, CP, dispõe
sobre a modalidade equiparada.
Assim, na mesma pena incorre quem “realiza montagem em fotografia,
vídeo, áudio ou
qualquer registro com o fim de incluir pessoa em cena de nudez ou ato sexual ou
libidinoso
de caráter íntimo”.

Finalizamos assim os crimes deste capítulo,


crimes sexuais que têm como vítimas pessoas “capazes” – nos
termos jurídicos.
Sugerimos a revisão profunda dos temas, visto que voltaremos a utilizar as
categorias
trabalhadas neste ponto sem nos aprofundarmos novamente, e seguimos,
então, para conhecer as
condições dos delitos cometidos contra aqueles que estão em
situação de vulnerabilidade.

playlist_play
Vem que eu te explico!
Os vídeos a seguir abordam os assuntos mais relevantes do conteúdo que você acabou de estudar.

Módulo 1 - Vem que eu te explico!

Violação sexual mediante fraude.

Módulo 1 - Vem que eu te explico!

Importunação sexual.
Módulo 1 - Vem que eu te explico!

Assédio sexual.

emoji_events

Falta pouco para atingir


seus objetivos.
Vamos praticar alguns
conceitos?

Questão 1
Com relação aos chamados crimes sexuais, assinale a alternativa correta:

A São indiferentes ao consentimento da vítima para caracterização dos crimes.

B Não podem ter como vítima o homem.

Todas as modalidades absorvem a eventual violência de natureza leve utilizada em


C
seu cometimento.

D A prática de qualquer ato libidinoso atrai a incidência do crime de estupro.

E Alguns crimes são processados mediante ação penal pública condicionada.

Responder
Questão 2
Sobre os crimes sexuais, assinale a alternativa correta:

No crime de assédio, a pena é aumentada em até 2/3 (um terço) se a vítima for
A
menor de 18 anos.

A consumação do crime de divulgação de cena de estupro ou de cena de estupro de


vulnerável, de cena de sexo ou de pornografia ocorre com a produção, a captura da
B
imagem por fotografia ou a filmagem da cena, e depende de que alguém tome
conhecimento da produção ou que haja qualquer divulgação do conteúdo.

O crime de importunação sexual implica em praticar contra alguém (vítima


C
determinada) e com a sua anuência ato libidinoso (de natureza sexual).

O crime de estupro tutela a liberdade sexual da pessoa em sentido, protegendo


D
apenas sua integridade e autonomia sexual.

A tentativa é possível no crime de assédio sexual, que demanda que o autor seja
E pessoa superior hierarquicamente ou que tenha ascendência sobre a vítima em razão
de emprego, cargo ou função (delito especial próprio).

Responder

starstarstarstarstar
2 - Vulneráveis
Ao final deste módulo, esperamos que você reconheça os crimes sexuais
contra vulneráveis.

Crimes sexuais contra vulneráveis


Dos crimes sexuais, os cometidos contra pessoas
“vulneráveis”, expressão que é digna de críticas, mas que
reproduzimos por ter sido
a escolhida por nosso legislador, são os que despertam maior repulsa no geral.
Nesse
caso, o direito penal diz proteger a intangibilidade sexual de pessoas que são ditas
como incapazes
de consentir validamente ao ato sexual.

Anote, então, este primeiro atributo, comum a


todas as espécies de ilícitos que conheceremos:

Têm como vítima pessoa que o legislador entende sem capacidade de


discernimento
para consentir, transitória ou permanentemente, e, por
isso, exercer plenamente
o direito à liberdade sexual.

O Código Penal faz presumir essa incapacidade em


algumas hipóteses e, em outras, atribui maior conteúdo
axiológico. Nesse sentido,
são vulneráveis:
As pessoas com menos de 14 anos (presunção iuris et
de iure de vulnerabilidade, ou seja,
presunção
absoluta.)

Aquelas que, por enfermidade ou deficiência mental, “não


têm o necessário discernimento para a
prática do ato, ou
que, por qualquer outra causa, não podem oferecer
resistência”.

Cada tipo penal contemplará apenas uma ou as duas


modalidades e, quanto àquelas que tenham menos de
14 anos, a depender da hipótese, é
possível aplicar o ECA.

O erro a respeito da menoridade da vítima ou


sobre sua enfermidade ou deficiência mental, isto é, sobre a
causa essencial da
condição de vulnerabilidade elide o dolo e afasta a tipicidade, tornando o fato
irrelevante
penalmente. Porém, a dúvida que configure dolo eventual, em tese, não
elide a responsabilidade.

Como dito, o legislador visou proteger pessoas


que, em virtude de uma condição permanente, transitória ou
acidental, estão mais
suscetíveis de serem violadas, sem que respondam pela liberdade sexual. Notem que,
diferentemente de alguns crimes que conhecemos anteriormente, não se requer o
dissenso da vítima, sendo
“independente de consentimento ou experiência sexual
anterior da vítima, bem como da existência de
relacionamento amoroso com o agente”
(PRADO, 2019, p. 1465).

Então, vamos considerar os seguintes cenários:


Imagine que se comprove que uma pessoa estava
completamente entorpecida, pelo uso de
tóxicos – e, por
isso, esteja incapaz de oferecer resistência – e que
seja abusada sexualmente
nesta condição.

Ou uma vítima que apresente alguma condição de


deficiência, enfermidade ou idade avançada que
impossibilitem a resistência; ou, sofrimento mental –
desde que qualquer uma dessas condições,
necessariamente, impactem no exercício da sua liberdade
sexual.

Ainda que se alegue que “consentiu”, ou mesmo que


se afirme que o uso da substância fora por livre
escolha da vítima, o que se tem em
vista é o momento do ato sexual, presumindo-se, nesse caso, que estava
impossibilitada de concordar. Por isso, em tese, teremos a ocorrência de um dos
crimes insculpidos neste
tópico.

Passemos, assim, para a análise dos crimes


separadamente que, já adiantamos, são todos dolosos e
processados por ação penal
pública incondicionada (art. 225, CP, após a alteração da Lei nº 13.718, de
2018).

Características do crime de estupro de vulnerável


(art.
217-A, CP)
video_library
Estupro de vulnerável
Vamos entender as nuances desse tipo penal
assistindo ao vídeo a seguir?

Qualquer pessoa pode ser sujeito ativo deste


crime, enquanto o sujeito passivo deve ser “vulnerável”, nos
termos que expusemos na
introdução e que estão delimitados no art. 217-A, caput e §1º. A conduta
incriminada no caput é a de ter “conjunção carnal” ou praticar “outro ato
libidinoso” com essas pessoas,
conceitos que já estudamos quando vimos o crime de
estupro e que remetemos, mais uma vez, ao estudo.

post_add

Saiba mais

Trata-se de crime que foi incluído pela Lei nº 12.015, de 2009, sendo que,
antes dessa, era
tipificado como estupro com a causa de aumento esboçada no
art. 9º da Lei nº 8.072, o que
atribuía uma sanção penal mais favorável ao
agente.
Assim, conforme as lições de conflito de leis
penais no tempo, a Lei de crimes hediondos é ultrativa por ser
mais benéfica que o
estupro de vulnerável; mas a alteração no CP, com o tipo do art. 217-A, tem sido
aplicada para todas as práticas posteriores a sua vigência, quando não há conflito
de normas.

Também aqui falamos de um tipo subjetivo doloso,


com a finalidade específica de “constranger à conjunção
carnal ou ao ato
libidinoso”, não havendo modalidade culposa por incongruência mesmo com o fato em si
repreendido. Não se exige violência ou ameaça, sendo irrelevante o consentimento e a
efetiva conjunção
carnal, bastando que ocorra um chamado “ato libidinoso” (RHC
70.976, Informativo 587, STJ e HC
134591/SP, julgado pelo STF, Informativo 954).

Há incidência do crime na modalidade


omissiva imprópria, desde que satisfeitos os requisitos legais para a
configuração dos “agentes garantidores”. É o caso, por exemplo, de um
parente próximo ou de qualquer
pessoa que se coloque como responsável pela
vítima, desde que contemple todos os elementos do art. 13,
CP, quando não
afasta o sujeito passivo do agressor, mesmo em conhecendo os abusos.

Nesse sentido, julgou o STJ:

No caso concreto, a acusada omitiu-se, durante anos,


quanto aos
abusos sexuais praticados pelo seu marido, na residência do
casal,
contra sua irmã menor. Vale ressaltar que ela assumiu a
responsabilidade ao levar a criança para a sua casa sem a
companhia da
genitora e criou risco da ocorrência do resultado ao
não denunciar o
agressor, mesmo ciente de suas condutas, bem
como ao continuar deixando a
menina sozinha em casa.
(HC 603.195-PR, STJ)

É possível a tentativa (art. 14, II, CP), quando


o crime não se perfaz por circunstâncias alheias à vontade
do/a autor/a, mas desde
que haja alguma externalização dessa vontade relevante e que não chegue a
configurar
ato libidinoso, em virtude dos princípios da culpabilidade e da lesividade. Em suma,
trata-se de
crime comum, doloso, comissivo, instantâneo e de resultado.

O art. 217-A, §§3º e 4º, CP trabalha com as


modalidades qualificadas (delito qualificado pelo resultado) dos
crimes, quando há a
intensão de praticar o ato libidinoso e, por culpa, o sujeito ativo causar lesão
corporal
de natureza grave ou mesmo a morte.

refresh

Relembrando

Vale lembrar que se demanda que o resultado tenha emergido, no mínimo, a


título culposo e que,
caso haja o dolo no resultado, isto é, se há
consciência e vontade (dolo geral) ou a assunção de
risco de produção (dolo
eventual) da lesão corporal de natureza grave ou mesmo a morte, haverá
concurso de crimes.

Não obstante, como aponta Regis Prado, e como é


comum em crimes que têm a violência como modo de
execução:

A lesão corporal de natureza leve ou as vias de fato


resultantes da
violência empregada pelo agente integram a violência real,
sendo
absorvidas, por conseguinte, pelo tipo legal do artigo 217-A,
caput, do
Código Penal.
(PRADO, 2019, p. 1468)

A pena prevista é reclusão, de 8 a 15 anos (art. 217-A, caput e §1.º, CP).


Para as formas qualificadas, as
penas são reclusão, de 10 a 20 anos, se da conduta
resulta lesão corporal de natureza grave, e de reclusão,
de 12 a 30 anos, se da
conduta resulta morte, respectivamente (art. 217-A, §§3º e 4º, CP). Trata-se de um
crime hediondo, tanto na forma simples, como na qualificada (art. 1.º, VI, Lei
8.072/1990).

refresh
Relembrando

Lembre-se de que só corre a prescrição, caso a ação não tenha sido proposta
e antes de transitar
em julgado a sentença final, quando a vítima completa
18 anos (art. 111, V, CP).

Indução de menor de catorze anos a satisfazer a


lascívia
de outrem (art. 218, CP)
No crime do art. 218, CP, temos uma das exceções
ao monismo em matéria de concurso de pessoas (art.
29, CP), visto que se pune uma
das modalidades de participação no crime de forma autônoma. Aqui, o
legislador busca
reprimir quem “faz nascer a ideia” em uma pessoa menor de 14 anos, para satisfazer a
lascívia de outrem, isto é, para o prazer sexual de uma terceira pessoa.

Trata-se de um ilícito voltado


contra quem, portanto, induz a criança/adolescente a ceder e satisfazer a
sexualidade de alguém. Já a pessoa que cometer o abuso, isto é, o ato
libidinoso contra a criança ou
adolescente, efetivamente, irá responder pelo
art. 217-A, nos termos do item que estudamos anteriormente.

Vale notar que o modo de execução não está


recortado pelo tipo, mas, dada a recorrência, a Lei nº
8.069/1990 inseriu o §1º,
pontuando que no delito incorre quem pratica a indução por “meios eletrônicos,
inclusive salas de bate-papo da internet”.

Trata-se de um crime com vítima delimitada:


pessoa que tenha menos de 14 anos apenas, sendo que o CP
não trouxe aquele conceito
axiológico de vulnerabilidade mais amplo. Não obstante, por ser crime comum,
qualquer pessoa, desde que maior de 18 anos, pode ser sujeito ativo.

É um crime doloso e com pena de reclusão de 1 a 4


anos, que será aumentada em um terço se a infração
cometida ou induzida estiver
incluída no rol dos crimes hediondos, conforme o artigo 1º da Lei nº
8.072/1990
(art. 244-B, §2º, da Lei nº 8.069/1990). E, por fim, não se confunde com o art.
244-B do ECA,
também conhecido como “corrupção de menores”.

Satisfação de lascívia mediante


presença de criança ou
adolescente (art. 218-A, CP)
O delito em exame consiste na ação de praticar,
na presença de alguém com menos de 14 anos, ou induzi-lo
a presenciar, conjunção
carnal ou outro ato libidinoso, a fim de satisfazer lascívia própria ou de outrem.
Qualquer pessoa pode ser sujeito ativo (crime comum), embora o sujeito passivo deva
ser uma pessoa com
menos de 14 anos, como no crime anterior.

assignment_ind

Comentário

Note que não há necessidade de o ato ser praticado diretamente com a vítima,
bastando que
presencie qualquer ação voltada à satisfação do apetite sexual
e que esta tenha relevância.
Inclusive, quando houver, poderemos estar
diante de um concurso de crimes. Assim, o legislador
buscou preservar a
formação da personalidade de crianças e adolescentes, como também o fez
no
delito antecedente.

O crime é doloso e só se perfaz com a


demonstração da vontade de satisfazer a lascívia própria ou de
outrem. Trata-se de
uma finalidade específica sem a qual a infração penal não está perfeita. Isto é, o
caso de
pais que tiverem relações sexuais, ainda que adolescentes compartilhem o
dormitório – como é a realidade
de grande parte da população brasileira – não perfaz
o crime, que requer o elemento especial do propósito
de satisfação pelo fato mesmo
da presença da vítima.

Em suma, temos um delito comum, doloso, comissivo


e de resultado, sendo admitida a tentativa e que tem
pena prevista de reclusão de 2
a 4 anos.

Favorecimento da prostituição ou outra forma de


exploração sexual de criança ou de adolescente ou de
vulnerável (art. 218-B, CP)
O crime em exame se perfaz em “submeter, induzir
ou atrair à prostituição ou outra forma de exploração
sexual alguém menor de 18 anos
ou que, por enfermidade ou deficiência mental, não tem o necessário
discernimento
para a prática do ato, facilitá-la, impedir ou dificultar que a abandone”. Veja que
várias formas
de execução estão abrangidas, já que o verbo “submeter” implica em uma
sujeição direta; “atrair”, uma
espécie de induzimento; “facilitar”, criar os meios
necessários; “impedir”, obstar e “dificultar” criar óbices
para o abandono da
prostituição, sendo esta o exercício do trabalho sexual, ou outra forma de
exploração
sexual.

Segundo o art. 218-B, §2º, I e II,


CP, incide nas mesmas penas desse artigo quem pratica conjunção carnal
ou
outro ato libidinoso com alguém menor de 18 e maior de 14 anos na situação
descrita no caput, bem
como o proprietário, o gerente ou o
responsável pelo local em que se verifiquem as práticas referidas no
caput deste artigo.

warning

Atenção

Para essa equiparação, segundo a qual “cliente que conscientemente se serve


de prostituição de
adolescente, com ele praticando conjunção carnal ou outro
ato libidinoso, incorre no tipo previsto
no inc. I do §2º do art. 218-B” (HC
288.375-AM, STJ).

Trata-se de crime comum, que pode ser praticado


por qualquer pessoa adulta, mas que contempla os dois
conceitos de “vulnerável”,
quanto ao sujeito passivo – vide introdução. Também é um delito doloso, sendo
que a
finalidade especial é de satisfazer a lascívia alheia. É possível a tentativa, dado
que só se consuma
com a inserção na prostituição ou na cena de outra forma de
exploração sexual (para os verbos induzir,
atrair e facilitar) ou então quando se
impedir ou dificultar o abandono destas (para o núcleo impedir ou
dificultar).

A pena é de reclusão, de 4 a 10 anos e há


modalidade qualificada, caso em que se aplica também multa (art.
218-B, §1º). Por
fim, vale dizer que também estamos diante de um crime hediondo (art. 1º, VIII, Lei
8.072/1990).

Divulgação de cena de estupro ou de cena de estupro


de
vulnerável, de cena de sexo ou de pornografia (art. 218-
C)
Este delito foi inserido pela Lei nº 13.718/2018
e consiste em “oferecer, trocar, disponibilizar, transmitir,
vender ou expor à
venda, distribuir, publicar ou divulgar, por qualquer meio – inclusive por meio de
comunicação de massa ou sistema de informática ou telemática –, fotografia, vídeo ou
outro registro
audiovisual que contenha cena de estupro ou de estupro de vulnerável
ou que faça apologia ou induza a sua
prática, ou, sem o consentimento da vítima,
cena de sexo, nudez ou pornografia”.

O primeiro apontamento que deve ser


feito é que, por estar no título referente aos crimes contra vulneráveis,
em
tese, têm esta vítima apenas. Não obstante, tal ponto ainda está gerando
debate na cena jurídica,
inclusive pela relação que mantém com o delito do
art. 241-B do ECA que listam práticas que envolvam
registro de “cena de sexo
explícito ou pornográfica envolvendo criança ou adolescente”.

Trata-se de um crime que pode ser cometido de


forma livre e que coíbe, na primeira parte do artigo, a
profusão de cena de estupro
ou estupro de vulnerável (arts. 213 e 217-A, CP) ou que faça apologia,
demandando
aqui a ocorrência e registro de um destes delitos.

Na segunda parte, proíbe-se a


divulgação de cenas de sexo, pornografia ou nudez, desde que haja o
dissentimento da vítima. Atenção! Para esta segunda modalidade,
especificamente, temos esse elemento
normativo da ausência do consentimento
da vítima de propalar as imagens. Isto quer dizer que, caso a
vítima
concorde em propagar as cenas, não haverá, em tese, a infração.

É um crime doloso e que demanda, para a


consumação, com a externalização de algum dos verbos que
sublinhamos, sendo que, na
modalidade “oferecer”, a simples oferta da imagem, mesmo sem o consumo, já
perfaz o
tipo. Admite-se tentativa, sobretudo nas modalidades de crime de resultado.

A pena é de reclusão de 1 a 5 anos.


post_add

Saiba mais

Segundo o §1º, ela pode ser aumentada de 1/3 a 2/3 se a vítima “mantém ou
tenha mantido
relação íntima de afeto com a vítima ou com o fim de vingança
ou humilhação”, caso que ficou
conhecido como revenge porn
(vingança pornográfica). Aqui, buscou-se coibir a recente onda de
exposição
de vídeos após términos de relação ou por qualquer outro motivo de
chantagem.

Não há crime quando o agente pratica as condutas


“em publicação de natureza jornalística, científica,
cultural ou acadêmica com a
adoção de recurso que impossibilite a identificação da vítima, ressalvada sua
prévia
autorização, caso seja maior de 18 (dezoito) anos” (§2º art. 218-C, CP), sendo esta
uma excludente
de ilicitude específica do crime. Nesse caso, o sopesamento é dos
bens jurídicos tutelados com a liberdade
de expressão.

Causas de aumento de pena (art. 226, CP)


Por fim, segundo o art. 234-A, todos os crimes
deste tópico terão a pena aumentada – valendo notar que as
causas de aumento
atribuídas pela Lei nº 13.718/2018 só se aplicam aos fatos cometidos posteriores a
sua
vigência:

Inciso I
De quarta parte, se o crime é
cometido com o concurso de 2 (duas) ou mais pessoas.

Inciso II
De metade, se o agente é
ascendente, padrasto ou madrasta, tio, irmão, cônjuge,
companheiro,
tutor, curador, preceptor ou empregador da vítima ou por qualquer
outro título
tiver autoridade sobre ela; (Redação dada pela Lei nº
13.718, de 2018).
Inciso IV
De 1/3 (um terço) a 2/3 (dois
terços), se o crime é praticado: (Incluído pela Lei nº 13.718, de
2018).

Estupro coletivo (Incluído pela


Lei nº 13.718, de 2018)

a) mediante concurso de 2 (dois)


ou mais agentes; (Incluído pela Lei nº 13.718, de 2018)

Estupro corretivo (Incluído pela


Lei nº 13.718, de 2018)

b) para controlar o comportamento


social ou sexual da vítima: (Incluído pela Lei nº 13.718, de
2018)

Duas notas sobre o que embasou a criação


legislativa:

Estupro coletivo
Primeiramente, no caso de “estupro
coletivo”, alguns casos paradigmáticos que tomaram a cena pública
envolvendo a violação de mulheres e pessoas LGBTQIA+ por um
coletivo, sobretudo, de homens. Diante
da circulação, inclusive, de
vídeos envolvendo flagrantes, houve uma intensa mobilização em favor
do
aumento da reprimenda nessa hipótese, que informa uma série de
aliciamentos que possibilitam a cultura
dos abusos sexuais contra as
referidas populações.

Estupro corretivo
Por último, o chamado “estupro
corretivo”, também inserido como uma causa de aumento de pena
aplicável a todos os crimes do título, e que foi fruto do
engajamento, sobretudo, da população LGBTQIA+.
Aqui, face ao acúmulo
de denúncias de casos de pessoas com identidades de gênero e
sexualidades não
hegemônicas (PRECIADO, 2014) que são abusadas
diariamente como uma forma de “correção”, o grupo
articulou-se para
que a punição fosse mais dura e houvesse algum conteúdo normativo
que reconhecesse
a incidência dos casos.

Embora não tenhamos espaço para ampliar a


discussão, convidamos você a realizar uma breve reflexão:

settings
Reflexão

A política do enrijecimento penal, com todos os seus limites, tem potencial


de transformar a
cultura que subjaz a estes casos?

Neste item, vimos os crimes sexuais cometidos


contra pessoas encaradas como “vulneráveis” e tocamos,
nesse último caso (art.
218-C, CP), em um delito que transcende essa classificação, já que contempla como
vítima também pessoas que não estejam nessa condição.

De todo modo, busca-se aqui tutelar, além dos


bens jurídicos em geral dos crimes sexuais, os direitos das
pessoas em condições
especiais de atenção, devendo ser notada a forma como os conceitos se constroem
e a
reprimenda se torna legal.

playlist_play
Vem que eu te explico!
Os vídeos a seguir abordam os assuntos mais relevantes do conteúdo que você acabou de estudar.

Módulo 2 - Vem que eu te explico!

Indução de menor de catorze anos a satisfazer a lascívia de outrem.

Módulo 2 - Vem que eu te explico!

Divulgação de cena de estupro ou de cena de estupro de vulnerável, de cena de sexo ou de pornografia.


emoji_events

Falta pouco para atingir


seus objetivos.
Vamos praticar alguns
conceitos?
Questão 1
O proprietário, o gerente ou o responsável pelo local em que se verifiquem práticas referidas como
exploração sexual de alguém menor de 18 (dezoito) anos em tese

A não pode ser responsabilizado penalmente.

B comete o crime de estupro de vulnerável.

incide nas penas do crime de “favorecimento da prostituição ou outra forma de


C
exploração sexual de criança ou de adolescente ou de vulnerável”.

D pratica o chamado revenge porn.

comete o crime de “indução de menor de catorze anos a satisfazer a lascívia de


E
outrem.

Responder

Questão 2
Sobre os crimes sexuais contra vulneráveis, assinale a alternativa correta:

A vulnerabilidade, seja em razão da idade, seja em razão do estado ou condição da


A pessoa, não diz respeito à sua capacidade de reagir a intervenções de terceiros
quando no exercício de sua sexualidade, não admitindo erro sobre a conduta.
O delito de satisfação de lascívia mediante presença de criança ou adolescente, tem
como elemento principal da ação praticar, na presença de alguém com menos de 14
B
anos, ou induzi-lo a presenciar, conjunção carnal ou outro ato libidinoso, a fim de
satisfazer lascívia própria ou de outrem.

C O estupro de vulnerável não é crime hediondo.

Nem todos os crimes são dolosos, e a maioria demanda ainda a presença do


D elemento subjetivo do injusto, consistente na finalidade expressa (a fim de) de
satisfazer a lascívia própria ou de outrem.

O erro a respeito da menoridade da vítima não elide o dolo, por conseguinte, não
E
afasta a tipicidade.

Responder

starstarstarstarstar
3 - Lenocínio e tráfico de pessoa
Ao final deste módulo, esperamos que você analise os delitos do título
“lenocínio e tráfico de pessoa para fim de prostituição ou outra forma de
exploração sexual”.

Lenocínio e tráfico de pessoa para fim de


prostituição ou outra forma de exploração
sexual
Todos os crimes contidos no Capítulo V do Título
VI do Código Penal referem-se ao “lenocínio” em sentido
amplo. Essa prática envolve
a mediação, facilitação e promoção de atos de libidinagem ou favorecimento da
prostituição alheia e pode ser perpetrada sob diferentes contornos. Vamos, então,
conhecer os crimes que
contemplam esse grupo.

Nuances do crime de mediação para servir a lascívia


de
outrem (art. 227, CP)

video_library
Mediação para servir a lascívia de outrem
Para melhor compreensão sobre o crime de mediação
para servir a lascívia de outrem, acompanhe o
panorama sobre o assunto, fornecido
pela professora Luciana Fernandes.

Agora que você assistiu ao vídeo, já deve ter


compreendido que se trata do crime perpetrado por aquele que
busca “induzir alguém a
satisfazer a lascívia de outrem” e, por ser comum, pode ser cometido por qualquer
pessoa. No entanto, a pessoa em prol de quem o sujeito ativo age, isto é, a pessoa
que tem a lascívia
satisfeita, não responde por este delito – não obstante possa
responder por outro delito sexual, satisfeitos
os requisitos legais - já que deve
ser “alheia” e não “própria”.

Um importante questionamento refere-se à


constitucionalidade do caput deste crime, já que a vítima é
adulta e livre
(não está em situação de vulnerabilidade), podendo aceitar ou não a referida indução
(PRADO,
2019, p. 1497; NUCCI, 2019, p. 1214).

settings

Reflexão

Por enquanto, o debate ainda está mais centralizado no campo teórico, mas
convidamos você a
pensar sobre o assunto, em cotejo sobretudo ao sentido do
direito à liberdade em um Estado
democrático.
Nesse delito, a pessoa que é autora persuade a
vítima a submeter-se ou a praticar atos libidinosos com
destinatário determinado,
não sendo necessário que haja habitualidade, nem mesmo finalidade de lucro –
sendo
que, nesse caso, falaremos à frente ser hipótese que qualifica o delito. É um crime
doloso e que, por
ser de resultado, só se consuma quando a vítima prática,
efetivamente, o ato libidinoso, sendo admissível a
tentativa (art. 14, II, CP).

Os parágrafos do art. 227 trabalham com as


modalidades qualificadas do crime, quais sejam:

§1º
Se a vítima é maior de 14
(catorze) e menor de 18 (dezoito) anos, ou se o agente é seu
ascendente, descendente, cônjuge ou companheiro, irmão, tutor ou
curador ou pessoa a quem
esteja confiada para fins de educação, de
tratamento ou de guarda.

§2º
Se o crime é cometido com emprego
de violência, grave ameaça ou fraude.

§3º
Se o crime é cometido com o fim de
lucro (venalidade).

Em relação à primeira modalidade de


qualificadora, é importante notar que, em razão do princípio da
taxatividade, apenas
as relações de parentesco expressas poderão ser consideradas para fins de aplicação
da circunstância diferenciada da pena.

extension
Exemplo

Logo, por exemplo, a esposa em relação ao marido não está abrangida e


responde em tese pela
forma simples do lenocídio.

Em suma, trata-se de um crime comum; material; de


forma livre; comissivo; instantâneo; unissubjetivo e
plurissubsistente.

A pena prevista é de 1 a 3 anos de


reclusão, na modalidade simples. Na hipótese do artigo 227, §1º, é de 2 a
5
anos de reclusão e, no caso do §2º, de reclusão, de 2 a 8 anos, além da pena
correspondente à violência.
Se presente a venalidade, também será aplicada
pena de multa (art. 227, §3º, CP).

Favorecimento da prostituição ou outra forma de


exploração sexual (art. 228, CP)
O tipo objetivo desse crime consiste em “induzir
ou atrair alguém à prostituição ou outra forma de
exploração sexual, facilitá-la,
impedir ou dificultar que alguém a abandone”.

Quanto ao tema, temos dois importantes


comentários a serem feitos:

Direção e natureza
O primeiro refere-se à direção da
incriminação e a natureza de ilegalidade da prostituição em nosso
país.
Segundo o nosso ordenamento jurídico, o trabalho sexual, em
si, não é criminalizado e, sim, o
favorecimento da prostituição.
Quer dizer, pode ser rotulada como criminosa a pessoa responsável
pela
criação da ideia (indução) ou atração ao trabalho sexual ou
exploração sexual, assim como quem
proporciona os meios para a
prática (facilitação) ou impede ou impõe de óbices ao abandono do
trabalho.

Definição
A segunda nota que também merece a
nossa atenção acerca desse assunto refere-se à definição da
“prostituição”, para fins de atribuição típica, entendendo-se ser
relação de trabalho – não de emprego –,
habitual, voltada à
satisfação sexual de um número indeterminado de pessoas.

Trata-se de crime comum e doloso, sendo que o


sujeito ativo pratica a conduta com o especial fim de
satisfação da lascívia alheia.
Admite-se a tentativa quando a vítima, por circunstâncias alheias à vontade do
agente, não se prostitui ou não há qualquer forma de exploração sexual (primeira
parte); ou quando
consegue abandonar o trabalho (segunda parte). Nucci entende ser
impossível nas modalidades “induzir” e
“atrair”, visto que a adesão à prática é
essencial para o delito (NUCCI, 2019, p. 1218).

Há três modalidades qualificadas, como no crime


anteriormente trabalhado, quais sejam:

Modalidade 1
Se o agente é ascendente,
padrasto, madrasta, irmão, enteado, cônjuge, companheiro, tutor ou
curador, preceptor ou empregador da vítima, ou se assumiu, por lei
ou outra forma, obrigação
de cuidado, proteção ou vigilância (§1º).

Modalidade 2
Se o crime é cometido com emprego
de violência, grave ameaça ou fraude.
Modalidade 3
Se o crime é cometido com o fim de
lucro.

A pena para a modalidade simples é de 2 a 5 anos


de reclusão e multa (art. 228, caput, CP). Para o delito
qualificado, nas
circunstâncias do artigo 228, §1º, CP, de 3 a 8 anos de reclusão; em caso de emprego
de
violência, grave ameaça ou fraude, de 4 a 10 anos, além da pena correspondente à
violência (art. 228, §2º,
CP); e na hipótese de venalidade, aplica-se também a pena
pecuniária (art. 228, §3º, CP).

Estabelecimento para exploração sexual (art. 229,


CP)
Trata-se de mais um crime que reforça a natureza
do trabalho sexual no Brasil, dado o legislador considerar
a prostituição, em si,
conduta atípica, mas se voltar contra as condutas do seu entorno, as pessoas que
tiram proveito da exploração. No caso do crime examinado, o tipo recai,
especificamente, contra aquelas
que mantém “por conta própria ou de terceiro,
estabelecimento em que ocorra exploração sexual, haja, ou
não, intuito de lucro ou
mediação direta do proprietário ou gerente”.

São sujeitos passivos as(os) trabalhadoras(es)


sexuais e qualquer um(a) pode ser sujeito ativo, inclusive as
proprietárias do
imóvel que não exploram diretamente a atividade.

extension

Exemplo

É o caso daquelas que cedem ou locam o espaço onde funciona a exploração


sexual, respondendo
como coautoras do art. 229, CP, desde que conscientes e
com vontade de contribuir ao fato.

Vale notar, também, que o injusto demanda que a


exploração aconteça em espaço de terceiro, voltando-se o
injusto contra estas
pessoas do “entorno”. Por isso, caso o trabalho ocorra na própria residência do(a)
trabalhador(a) sexual, não há o crime.

Há centralidade no exame do
estabelecimento onde a exploração acontece, como é o caso das “casas de
prostituição”. Por isso, os Tribunais têm entendido que não configuram o
tipo “casas de massagem, relax for
men, boates para encontros,
motéis, drive in, saunas mistas, hotéis de alta rotatividade”
(NUCCI, 2019, p.
1224).

O ilícito não demanda intuito de lucro como


elementar, nem mesmo mediação direta do proprietário ou
gerente. Não obstante, como
o que se reprime é a prática habitual do trabalho sexual, caso a manutenção
seja
pontual ou ocasional, estaremos diante de um fato atípico em tese.

É necessário o dolo, a vontade de manter o


estabelecimento voltado para a exploração sexual, e trata-se de
um delito habitual e
permanente. Em virtude disso, inclusive, é impossível a tentativa (art. 14, II, CP).

Por fim, a sanção penal é de 2 a 5 anos de


reclusão, além da pena pecuniária (art. 229).

Rufianismo (art. 230, CP)


Qualquer pessoa pode praticar o rufianismo, sendo
um delito comum, desde que tire “proveito da
prostituição alheia, participando
diretamente de seus lucros ou fazendo-se sustentar, no todo ou em parte,
por quem a
exerça”. Estamos diante, assim, de um agente que explora econômica e continuamente o
trabalho sexual, tirando proveito da atividade e precarizando em elevado grau a vida
das pessoas que vivem
da atividade. Não se está reprimindo a pessoa que, por
exemplo, ao se envolver afetivamente com esses
trabalhadores, fornece ajuda
econômica, mas aquela que se beneficia da exploração.

Segundo Regis Prado,

o legislador reprime duas formas de aproveitamento: a


participação
direta nos lucros obtidos pela pessoa prostituída ou o ato de
se fazer
sustentar, no todo ou em parte, por ela. Na primeira, o agente
torna-
se uma espécie de sócio da prostituta, participando diretamente dos
lucros por ela auferidos através da sua atividade, seja este dinheiro
ou
qualquer outra vantagem de natureza econômica. No que tange à
conduta de se
fazer sustentar, parcial ou totalmente, pela pessoa
prostituída, representa
ela o fato de o rufião viver às expensas
daquela, recebendo roupas,
alimentação, moradia etc.
(PRADO, p. 1510)

Tal como o crime anterior, a exploração sexual


deve ser habitual e contínua, sendo também um crime
permanente e que não admite
tentativa. A infração se consuma com a participação nos lucros ou a
manutenção
própria do rufião, por meio da exploração sexual de terceiro/a.

As modalidades qualificadas do crime são análogas


ao que vimos anteriormente, mas, apesar de aqui o
benefício econômico ser elementar,
não há previsão da venalidade:

Modalidade 1
Se a vítima for menor de 18 e
maior de 14 anos ou se o crime for cometido por ascendente,
padrasto, madrasta, irmão, enteado, cônjuge, companheiro, tutor ou
curador, preceptor ou
empregador da vítima, ou por quem assumiu, por
lei ou outra forma, obrigação de cuidado,
proteção ou vigilância
(§1º).

Modalidade 2
Se o crime for cometido mediante
violência, grave ameaça, fraude ou outro meio que impeça
ou
dificulte a livre manifestação da vontade da vítima (§2º).
A pena, na modalidade simples, é de reclusão, de
1 a 4 anos, e multa; na primeira modalidade qualificada,
reclusão, de 3 a 6 anos, e
multa; e na segunda reclusão, de 2 a 8 anos, sem prejuízo da pena correspondente
à
violência.

Promoção de migração ilegal (art. 232-A, CP)


Trata-se de crime que foi incluído no Código
Penal pela Lei nº 13.445, de 2017, a chamada Lei da Migração e
que,
reconhecidamente, não é um delito sexual propriamente dito. O legislador, assim,
equivocou-se ao
trazer este tipo para o referido capítulo, motivo pelo qual vamos
tecer comentários apenas genéricos.

Trata-se de um delito comum, que pode ser


cometido por qualquer pessoa, que tem como sujeitos passivos
a pessoa estrangeira ou
brasileira, assim como a coletividade.

O tipo objetivo reside em


“promover, por qualquer meio, com o fim de obter vantagem econômica, a
entrada
ilegal de estrangeiro em território nacional ou de brasileiro em
país estrangeiro”. O tipo subjetivo está na
intenção de obter vantagem
econômica. É admitida a tentativa e a consumação se dá com a promoção da
entrada ilegal da(o) migrante.

O §1º estabelece a forma equiparada, aduzindo que


“na mesma pena incorre quem promover, por qualquer
meio, com o fim de obter vantagem
econômica, a saída de estrangeiro do território nacional para ingressar
ilegalmente
em país estrangeiro”. A pena prevista para o crime é de reclusão de 2 a 5 anos e
multa (art. 232-
A, caput, CP) e que pode ser aumentada, de 1/6 (um sexto) a
1/3 (um terço):
person_remove
Se o delito é praticado com violência.

person_remove
Se a vítima é colocada em condição desumana ou degradante (art.
232-A, §2º, CP).

Assim concluímos os crimes do capítulo


relacionados ao lenicídio e convidamos você a pensar sobre as
condições sistêmico
estruturais que ainda possibilitam a realidade dessas práticas como orgânicas a
diferentes contextos regionais no nosso país.

settings

Reflexão

Chamamos mais uma vez o debate para a reflexão a respeito de se a resposta


oferecida pelo
direito penal se mostrado – e pode um dia se mostrar – capaz
de cumprir com as funções
prometidas de transformação da cultura da
exploração sexual de terceiros; e o quanto esses
crimes reforçam os sentidos
hegemônicos da sexualidade, esquivando a necessidade de se
pautar, por
exemplo, a regulação do trabalho da prostituição e agendas políticas que
possam
tornar menos precárias a atividade, em vista de um horizonte
democrático.

playlist_play
Vem que eu te explico!
Os vídeos a seguir abordam os assuntos mais relevantes do conteúdo que você acabou de estudar.
Módulo 3 - Vem que eu te explico!

Favorecimento da prostituição ou outra forma de exploração sexual.

Módulo 3 - Vem que eu te explico!

Rufianismo.

emoji_events
Falta pouco para atingir
seus objetivos.
Vamos praticar alguns
conceitos?

Questão 1
Sobre os crimes do título lenicídio, assinale a alternativa correta:

O agente do crime de rufianismo ativo garante o seu sustento mediante a exploração


A
de alguém que exerce a prostituição.

No crime de favorecimento da prostituição, é punível o proprietário do local em que se


B
verifiquem as práticas, ainda que delas não tenha conhecimento.

C O sujeito passivo deste título só pode ser pessoa menor de dezoito anos.
A maioria dos delitos prevê modalidade qualificada se a vítima é menor de 18 e maior
D
de 14 anos.

E Todas as modalidades exigem, como elementar, a finalidade de lucro.

Responder

Questão 2
Sobre o grupo de crimes do título lenocídio, assinale a alternativa correta:

O crime do favorecimento à prostituição tem como elemento subjetivo o especial fim


A
de satisfazer a lascívia própria.

B O delito de estabelecimento para exploração sexual não exige habitualidade.

C O sujeito ativo dos crimes pode ser qualquer pessoa do sexo masculino.

A enumeração das causas de agravamento de pena no art. 227, CP é taxativa, não


D sendo possível a contemplação de modalidades de parentesco não expressamente
previstas.

E O rufianismo não pode se dividir em ativo ou passivo.


Responder

starstarstarstarstar

4 - Ultraje público ao pudor


Ao final deste módulo, esperamos que você classifique os tipos do “ultraje
público ao pudor”.

Do ultraje público ao pudor


Os dois crimes deste tópico envolvem ainda a razão
sexual, não obstante, são carregados da moralidade
pública também, motivo pelo qual
assumem como vítima a coletividade. Como falaremos especificamente
em cada um dos
casos, são infrações que envolvem interpretação axiológica, estando bastante
circunscritas às delimitações culturais e morais do tempo de sua aplicação. Assim,
exigem ainda mais uma
aferição constitucional e democraticamente localizada da sua
possibilidade incriminadora. Como no caso
de todos os crimes deste material, são
delitos dolosos e processados mediante ação penal pública
incondicionada.
Passamos, então, a conhecer cada um deles.

Ato obsceno (art. 233, CP)

video_library
Ato obsceno
Vamos entender um pouco mais sobre esse delito?
Acompanhe a explanação da professora Luciana
Fernandes acerca deste assunto.

Como você pôde observar, esse delito é cometido


por quem “praticar ato obsceno em lugar público, ou
aberto ou exposto ao público”.
Mais uma vez, qualquer pessoa pode ser sujeito ativo e admite-se concurso
de
pessoas. O sujeito passivo é a coletividade, albergada no que o legislador trabalha
como “pudor público”,
uma expressão atravessada inteiramente pelo moralismo da época
de sua elaboração.

assignment_ind

Comentário

Por se tratar de um elemento normativo referente à moralidade pública, seu


conteúdo material
pode variar ao longo do tempo, da região e da cultura.
Nesse sentido, devemos nos atentar ao seguinte:

Por “ato obsceno” se deve entender uma conduta com


conteúdo sexual relevante, excluído, por
exemplo, o caso
do “beijo lascivo” em público. Também não se adequa à
razão de existência do
crime as ações com conteúdo
artístico.

Outro elemento importante é o “lugar público ou aberto


ou exposto ao público”, que contempla
espaços como ruas,
praias, praças, parques, cinemas e teatros.

Tem-se ressalvado, no entanto, os casos em que a


prática ocorre em um desses ambientes, mas desde que
em período ermo, como quando
estão fechados ou inacessíveis ao público; nesse caso, o fato poderá ser
atípico.
Assim, a publicidade deve ser considerada não apenas em abstrato, mas no caso
concreto, sob
pena de se configurar crime impossível.

A conduta deve ser dolosa, consistindo na


consciência da publicidade e vontade de praticar o ato com
conteúdo sexualizante. E,
embora de difícil caracterização, em tese, admite tentativa. A pena cominada é de
detenção, de três meses a um ano, ou multa.
Escrito ou objeto obsceno (art. 234, CP)
Essa infração é cometida por quem “fazer,
importar, exportar, adquirir ou ter sob sua guarda, para fim de
comércio, de
distribuição ou de exposição pública, escrito, desenho, pintura, estampa ou qualquer
objeto
obsceno”. Tal como no caso anterior, é um delito comum e que tem como sujeito
passivo a coletividade.

Com a expressão de conteúdo múltiplo “qualquer


objeto obsceno”, no legislador passou a admitir a
interpretação analógica e casos
como álbuns e filmes estão abrangidos, embora não estivessem
expressamente elencados
no rol da primeira parte do dispositivo. Exige-se, para a configuração típica, que
haja finalidade comercial ou intenção de obter vantagem econômica e a comprovação do
dolo. Em suma,
pode o delito ser assim classificado: comum, doloso, de perigo
abstrato e de mera atividade.

O parágrafo único equipara as seguintes condutas


como criminosas:

I
Vende, distribui ou expõe à venda
ou ao público qualquer dos objetos referidos neste artigo.

II
Realiza, em lugar público ou
acessível ao público, representação teatral, ou exibição
cinematográfica de caráter obsceno, ou qualquer outro espetáculo,
que tenha o mesmo
caráter.

III
Realiza, em lugar público ou
acessível ao público, ou pelo rádio, audição ou recitação de
caráter
obsceno.

Também uma infração de menor potencial ofensivo,


a sanção prevista para todas as modalidades é de 6
meses a 2 anos de detenção ou
multa.
Trata-se de um delito com baixíssima
incidência e muito questionado, dada a previsão constitucional do
direito à
liberdade de expressão da atividade intelectual, artística, científica e de
comunicação,
independentemente de censura ou licença. Caso envolva criança
ou adolescente, não obstante, são
aplicáveis os artigos 240 e 241 da Lei nº
8.069/90 (ECA).

playlist_play
Vem que eu te explico!
O vídeo a seguir aborda os assuntos mais relevantes do conteúdo que você acabou de estudar.

Módulo 4 - Vem que eu te explico!

Escrito ou objeto obsceno.


emoji_events

Falta pouco para atingir


seus objetivos.
Vamos praticar alguns
conceitos?

Questão 1
Segundo a constituição federal, “é livre a manifestação do pensamento, sendo vedado o anonimato”
(art. 5.º, IV, CF); “é livre a expressão da atividade intelectual, artística, científica e de comunicação,
independentemente de censura ou licença” (art. 5.º, IX, CF); “a manifestação do pensamento, a criação,
a expressão e a informação, sob qualquer forma, processo ou veículo não sofrerão qualquer restrição,
observado o disposto nesta Constituição” (art. 220, caput, CF); “é vedada toda e qualquer censura de
natureza política, ideológica e artística” (art. 220, § 2.º, CF).

Os dispositivos citados parecem colidir com o seguinte crime

A atentado ao pudor.

B escrito ou objeto obsceno.

C estupro.

D importunação sexual.

E assédio sexual.

Responder

Questão 2
(2009 - TJ-SP – Juiz) Pode constituir, em tese, ato obsceno, na figura típica do art. 233 do Código Penal

A a exposição de cartazes, em lugar aberto ao público, mostrando corpos nus.


a exposição à venda de revista com fotografias de cunho pornográfico em lugar
B
aberto ao público.

C o ato de urinar em lugar público com exibição do pênis.

D a exposição pública de fotografias de crianças nuas.

E a exibição de filmes de cunho pornográfico.

Responder

starstarstarstarstar

Considerações finais
Terminamos, assim, todos os chamados crimes sexuais e
retomamos, nesta conclusão, a discussão em
torno do fato de que, em nosso país, são
conflitos que atingem diferencialmente mulheres e a população
LGBTQIA+ em geral. Assim,
reforçamos a sugestão para uma pesquisa interdisciplinar sobre o tema e
fechamos convidando
você a incentivar a discussão pública sobre as formas de reverter a “cultura do
estupro” e a
necessidade de se pensar em políticas públicas sobre o trabalho sexual. É basilar a
problematização de delitos que expressam uma racionalidade antidemocrática, como os do
tópico que
acabamos de visitar, e a problematização sobre o limite da emergência de novos
tipos penais ou normas de
enrijecimento da punição, sobretudo conquanto desacompanhadas de
investimento no campo das agendas
voltadas ao enfrentamento do cisheteropatriarcado.
headset
Podcast
A professora Luciana Fernandes fará um
panorama geral sobre os crimes contra a dignidade sexual
neste
podcast.

00:00 12:37
speed
1x

Referências
ANDRADE, Mailô de Menezes Vieira. Perspectivas Feministas
em Criminologia: a interseccionalidade entre
gênero, raça e classe na análise do
estupro. Revista Brasileira de Ciências Criminais, v. 146, n. 2018, p. 435-
455, 2018. Consultado na
internet em: 27 ago. 2021.

BRASIL. Código Penal. Decreto-Lei nº 2.848, de 7 de


dezembro de 1940. Consultado na internet em: 26 ago.
2021.

BRASIL. Código Penal. Lei nº 12.015, de 7 de agosto de


2009. Consultado na internet em: 26 ago. 2021.

BRASIL. Código Penal. Lei nº 10.224, de 15 de maio de


2001. Consultado na internet em: 26 ago. 2021.

BRASIL. Código Penal. Lei nº 13.718, de 24 de setembro de


2018. Consultado na internet em: 26 ago. 2021.

CUNHA, Rogerio Sanches. Breves comentários às Leis


13.769/18 (prisão domiciliar), 13.771/18
(feminicídio) e 13.772/18 (registro não autorizado de
nudez ou ato sexual). Consultado na internet em: 27
ago. 2021.

IPEA. Estupro no Brasil: uma radiografia segundo


os dados da Saúde (versão preliminar). Brasília, 2014.
Consultado na internet em: 27 ago. 2021.

NUCCI, Guilherme de Souza. Manual de direito


penal. 16. ed. Rio de Janeiro: Forense, 2020.

PRADO, Luiz Regis. Curso de Direito Penal


Brasileiro. 17. ed. Rio de Janeiro: Forense, 2019.

PRECIADO. Paul B. Manifesto contrassexual:


Práticas subversivas de identidade sexual. São Paulo: N1
edições, 2014.

RUBIN, Gayle. O tráfico de mulheres: notas sobre


a economia política do sexo. Tradução Júlio Simões do
artigo originalmente publicado em: REITER,
Rayna (Ed.). Toward an Anthropology of Women. Nova York:
Monthly Review, 1975. Consultado na
internet em: 27 ago. 2021.

SOUSA, Renata Floriano de. Cultura do estupro:


prática e incitação à violência sexual contra mulheres.
Revista Estudos Feministas, v. 25, p. 9-29,
2017. Consultado na internet em: 27 ago. 2021.

Explore +
Para conhecer o mapeamento de algumas das questões que envolvem o
crime de estupro:

Veja o artigo: CERQUEIRA, Daniel; COELHO, Danilo Santa Cruz; FERREIRA, Helder. Estupro
no Brasil:
vítimas, autores, fatores situacionais e evolução das notificações no sistema de
saúde entre 2011 e
2014. In: Revista Brasileira de Segurança Pública, vol.
11, núm. 1, 2017, pp.24-48.

Para uma reflexão sobre violência sexual: SMITH, Andrea. A violência sexual como arma de
genocídio.
Espaço Ameríndio, Porto Alegre, v. 8, n. 1, p. 195-230, jan.-jun. 2014.

Para o debate teórico e interdisciplinar do crime de estupro: MACHADO, Lia Zanotta.


Masculinidade,
sexualidade e estupro: As construções da virilidade. Cadernos
Pagú, (11), 1998.

Ouça o episódio O que é a cultura do estupro, do podcast Mamilos.

picture_as_pdf Baixar conteúdo

Você também pode gostar