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Junho /Julho2020
ISSN: 1645-443X - Depósito Legal: 86929/95 Ano L- nº 402
Praça D. Afonso V, nº 86, 4150-024 Porto - PORTUGAL
APROVADA REVISÃO DO DIRECTÓRIO DAS FRATERNIDADES
«(…) Aprovo o Directó- um processo de reflexão a partir das realida-
rio das Fraternidades des existentes e vivências nas diferentes zo-
Leigas de São Domin- nas do mundo, a Assembleia Internacional
gos da Província de das Fraternidades realizadas em Fáti-
LAICADO DOMINICANO

Portugal, que recebi e li ma/2018, aprovou algumas resoluções e re-


atentamente. comendações que vieram a resultar na altera-
Este novo Directório é ção da Regra de vida dos leigos dominica-
um sinal da missão, nos, aprovada pela Congregação para os Ins-
comunhão e participa- titutos de Vida consagrada e as Sociedades
ção dos leigos na Ordem e na Igreja, grande res- de Vida Apostólica e a revisão e emissão por
ponsabilidade que partilhamos como Família Do- parte do Mestre da Ordem de novas Declara-
minicana diante dos novos desafios e da renova- ções Gerais em 2019. Tal processo teria na-
ção da pregação do Evangelho. turalmente de levar a uma revisão do Direc-
Quero expressar o meu agradecimento a quem tório/Estatutos da nossa Província de forma
elaborou este Directório com o apoio dos irmãos e a o adaptar a essas novas disposições, o que
irmãs que, fieis ao carisma e espiritualidade da agora foi feito, aprovado e promulgado.
Ordem, continuam a viver o Kerigma como cen- Na verdade, ser um leigo dominicano,
tro da nossa fé cristã, dando sentido â nossa membro das Fraternidades Leigas de São
vida de oração, estudo e pregação, a partir da Domingos é «prometer querer viver segundo a
fraternidade e amizade com Deus(…) Regra dos Leigos de São Domingos» (cfr, Regra
Fr. Gerard Timoner, OP, Mestre da Ordem. nº14), sendo que o seu modo de vida e das
fraternidades se regem pelo «estatutos próprios
«(…) é com muita que são a Regra, as Declarações Gerais do Mestre
alegria que se promul- da Ordem ou do Capitulo Geral e os directórios
gam esta Regra e Di- particulares» de cada província (Cf. Regra
rectório das mesmas nº24), que «devem ser aceites como um todo nor-
Fraternidades, devida- mativo e vividos desde o momento da admissão
mente actualizados, nas Fraternidades». (Cf. nº2 Directório).
revistos e aprovados O novo texto,
pelo Mestre da Or- que agora entra em
dem. Certamente que vigor, será em breve
ajudarão e alimenta- disponibilizado e
rão todas as comuni- publicado pelo
dades laicais na sua Conselho Provinci-
vida e missão.» al Leigo de forma a
Fr. José Nunes, OP, Prior Provincial. todos os leigos do-
minicanos mem-
Culminou com a aprovação do Mestre da bros das Fraternida-
Ordem e a promulgação pelo Prior Provinci- des portuguesas terem acesso ao mesmo, e
al, o processo de revisão dos estatutos e Di- que deverá ser estudado e aplicado em toda
rectório das fraternidades portuguesas. Ten- e cada uma das Fraternidades.
do passado 30 anos desde a aprovação da
Regra de Vida das fraternidades e mediante Gabriel Silva, op
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UM MANTO DE LUZ
consequências sócio-económicas da pandemia, que
conduzem a novas situações de pobreza que devem
ser atendidas. Outro aspecto muito importante foi o
de cada um, ora sozinho, ora em família, pudesse
ter tido a possibilidade de se encontrar, mais inti-
mamente, com Deus e com Maria, Sua e nossa mãe,
na oração internacional do Rosário, na noite de dia
12, na Capelinha das Aparições. Essa proximidade
foi reforçada no #MANTODELUZ, que correu nas
redes sociais tendo sido visível em muitas janelas de
casas um pouco por todo o país, quando aos pere-
grinos foi pedido que acendessem as suas velas, no
sítio a partir do qual estivessem a acompanhar as
celebrações. No Santuário propriamente dito, esta-
vam presentes os Bispos metropolitas - o Cardeal
Patriarca de Lisboa, o Arcebispo de Braga e o Arce-
bispo de Évora -, representantes das 21 Dioceses de
Portugal e também um estudante, uma senhora re-
formada e um colaborador do Santuário, em repre-
sentação das centenas de milhares de peregrinos,
com os quais se repetiu o rito do lava-pés, feito pelo
Bispo Cardeal da Diocese de Leiria-Fátima, ajudado
por servitas. Ao longo do recinto estavam acesas mil
velas, em jeito de homenagem às vítimas mortais do
Covid19, sem que faltasse uma menção muito espe-
O ser e o estar, como “peregrino no coração” foi cial aos médicos, enfermeiros, auxiliares, outros pro-
o ponto forte da homilia de D. António Marto, no fissionais de saúde e bombeiros, que se encontra-
Santuário de Fátima, nas celebrações de 12 e 13 de vam na linha da frente no combate ao vírus.
Maio de 2020, muito marcadas pela pandemia do Foi com uma atitude de confiança, depositada
Covid19, que determinou que as centenas de milha- nas mãos de Deus, que todos os “peregrinos no co-
res de fiéis que, anualmente, acorrem à Cova da ração” viveram mais um aniversário das aparições
Iria, não o pudessem ter feito, afim de ser evitado o de Nossa Senhora, aos pastorinhos Francisco, Jacin-
contágio provocado pelo novo corona vírus. O Bis- ta e Lúcia Marto. O Santuário esteve deserto, mas
po-Cardeal António Marto reforçou a ideia de estar- os peregrinos “estiveram” presentes.
mos num período em que é demasiado valorizada a
cultura do ter, embora tenha reconhecido as graves José Alberto Oliveira, O.P.

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O CUNHADO
Anos atrás, eu e a minha mulher, enquanto mem- irmãs e irmãos nas fraternidades leigas ele tinha cunhadas
bros do conselho provincial de então, colaborámos e cunhados. E levou isto a sério com envolvente natu-
com a fraternidade leiga de São Domingos de Elvas ralidade.
num projeto específico de formação. Assim, mês a Enquanto leigo dominicano das fraternidades de
mês, viajávamos ao seu encontro. São Domingos confesso que senti muito a falta das
Era presidente da fraternidade a querida Belém reuniões mensais neste tempo de confinamento
que nos convidou a ir a sua casa. Conheci então me- Atrevo-me a perguntar:
lhor seu marido António Rijo…que, logo de início se -será que nós membros deste ramo leigo da Ordem
apresentou duma forma original e inesperada: “eu sou dos Pregadores nos sentimos mesmo PERTENÇA da
o vosso cunhado António! Espero que não me levem a mal, FAMÍLIA dominicana?
mas tantas vezes tenho ouvido minha mulher falar nos ir- -será que sentimos mesmo falta de nos encontrar-
mãos Francisco e Filomena, que já era altura de puder estar mos na reunião da fraternidade como encontro de
com os meus cunhados.” família?
Sabia que o marido da nossa Belém tinha fama de -será que sentimos mesmo falta das reuniões nos
possuir um apurado sentido de humor…e achei-lhe meses de confinamento?
imensa graça… A surpresa, todavia, foi ir constatando -será que, entre as reuniões, nos sentimos ligados e
que aquela forma de privar era muito mais que uma preocupados uns com os outros duma forma concreta
graça. Na verdade, nunca mais deixámos de ser assim como apela a nossa Regra de vida?
tratados e a relação foi-se consolidando, criando laços Estar numa fraternidade como mais uma atividade
de genuína familiaridade. Não raras vezes, a Belém religiosa adicionada às restantes poderá confinar os
telefonava dizendo: “meu marido não para de me pergun- afetos, bloquear a vontade, atrofiar o ser e fazer.
tar se já telefonei aos cunhados para sabermos como estão? Que lugar ocupa a fraternidade leiga dominicana
“Mas o que mais me foi marcando no decorrer dos na hierarquia das minhas escolhas?
meses e dos anos foi a partilha crescente de gestos, Da honestidade da minha resposta, depende a
refeições, conversas plenas de alegria, simplicidade e qualidade da minha PERTENÇA.
sã amizade. Não raro nos acompanhava até à porta da Desejo a todos e cada um dos membros das frater-
Igreja de São Domingos antes do início das reuniões nidades leigas da província portuguesa um reinício
da fraternidade com a promessa de ali estar no final. das reuniões com gosto, paixão e vigor.
Lá o reencontrava com a sua boa disposição e hu- Um abraço do vosso,
mor.
No dia 28 de maio passado viajámos de novo até Francisco Piçarra, op
Elvas para participar, dentro dos condicionalismos
decorrentes da pandemia, nas exéquias do nosso cu-
nhado e acenar com gratidão e ternura à Belém.
Agradeço ao Senhor este “cunhado” tão especial, ge-
neroso e gratificante, de quem sinto mesmo sauda-
de…
Poderão os leitores questionar qual o interesse jor-
nalístico na divulgação de pormenores próprios desta
história privada.
È que na verdade aprendi nesta vivência a força e
o alcance da palavra PERTENÇA…. Para o António
Rijo tudo era claro e simples: se a sua esposa tinha
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O SILÊNCIO DE TOMÁS
Dizer “Deus não existe” é completamente idêntico a diz- mador com Jesus como raiz e eixo, estamos perdidos
er “Deus existe” no sentido em que de Deus não se diz que de nós mesmos. Escutando, estamos na esfera da
existe ou não: de Deus não se diz absolutamente nada. Só salvação como filhos de Deus.
ele deve falar. O silêncio da escuta é já um silêncio da pregação. A
— M. S. Lourenço pregação precisa de gerir a fala e a mudez, de ligar o
Como é sabido, São To- falar ao ser, para transmitir e testemunhar a fé cristã.
más de Aquino ficou pra- Para isso, temos Jesus como modelo, pois como
ticamente em silêncio no escreveu Santo Inácio de Antioquia:
fim da sua vida terrena. A Um só é o mestre que disse e foi feito; mas também é
6 de Dezembro de 1273, digno do Pai o que Ele fez em silêncio. O que possui a pala-
durante a celebração da vra de Jesus é capaz de perceber também o seu silêncio e
Eucaristia em Nápoles, chegar à perfeição, agindo segundo a sua palavra e fazendo-
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ficou em êxtase. Depois se reconhecer pelo seu silêncio.
desta prolongada experi- Nesta linha, Thomas Merton afirma que “[o] silên-
ência mística, abandonou cio de Deus deve-nos ensinar quando falar e quando
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a sua rotina e recusou os não falar.” A pregação tem diferentes objectos, con-
pedidos do seu confessor textos, e sujeitos. Por essa razão, confronta-nos com o
Reginaldo de Piperno desconhecido. O silêncio da pregação implica, portan-
para retomar o seu traba- to, o silêncio do estrangeiro. Ao estado de ser es-
lho intelectual. A Summa Theologica ficou inacabada. trangeiro (xenos), de abandonar o familiar e olhar
Tomás terá dito a Reginaldo que tudo o que tinha para o mundo como novo, ou estranho, chama-se
escrito lhe parecia “palha” (“palea”). Faleceu a 7 de xenìteia. Outro ancião do deserto afirmou: “A
Março de 1274, a meio de um comentário sobre o xenìteia ligada a Deus é boa se for acompanhada pelo
Cântico dos Cânticos, livro do amor como sabedoria. silêncio, porque 6com a liberdade da palavra deixa de
Silencioso, ele permaneceu o grande teólogo que sem- existir xenìteia.” Recuperar o sentido de novidade e
pre foi, seguindo uma via teológica negativa ou estranheza dos outros e do mundo é também
apofática que rima com a humildade do silêncio, con- restabelecer a leveza do silêncio e o peso da palavra
fessando que nenhuma descrição humana consegue que salva: “a fé surge da pregação, e a pregação surge
alcançar verdadeiramente o que Deus é. Assenta-lhe da palavra de Cristo” (Rm 10,17).
bem o que Angelus Silesius escreveu quase quatro Finalmente, e como foi aparecendo pontualmente
séculos depois: “Deus transcende tudo de tal modo nesta reflexão, todas estas formas de silêncio têm co-
que nada se pode dizer. / Portanto é também em mo fundo o silêncio de Deus, que podemos intuir ter
silêncio que melhor o adoras.”1 sido o que conduziu São Tomás ao silêncio. O jesuíta
O silêncio de São Tomás é, em primeiro lugar, um Karl Rahner escreveu algumas das mais profundas
silêncio de escuta. Praticar o silêncio é deixar que o nos- meditações sobre o encontro com o silêncio divino:
so deserto interior seja habitado, atravessado por sons “O teu Amor escondeu-se7 em silêncio, para que o
e palavras que se instalam, se relacionam, nos fazem meu amor se revele na fé.” Noutra passagem, escreve
existir. “Não existimos para nós”2, lê-se numa das car- que esse silêncio é uma presença inegável quando ele
tas de Santa Catarina de Sena. Escutar é dirigir o reza e pode ser entendido como “um discurso cheio
ouvido ao outro, dar-lhe a atenção devida. O silêncio de promessas infinitas, inimaginavelmente mais8 sig-
fértil é a liturgia da vida atenta, mais plena. A relação nificativo do que qualquer palavra audível” . A
do silêncio com a vida é salientada pelos padres do oração silenciosa é, muitas vezes, a resposta que senti-
deserto. Um desses anciãos disse: “O silêncio está mos como mais adequada a esse silêncio interpelante
cheio de vida, mas a morte está oculta de abundantes que é expressão do mistério. Fazemos um percurso de
discursos.”3 A linguagem mística de Mestre Eckhart entrega, abandono, imersão na quietude, e regressa-
insiste no nada, na nudez, no vazio, tentando aban- mos à presença de Deus mediante 9
a palavra, ao ritmo
donar todas as imagens, até ficarmos pobres de repre- da inspiração e da expiração. Da prece de um dos
sentações, assumindo uma presença desimpedida e salmos — “Não fiques calado! Senhor, não te afastes
disponível. Aprender o valor da escolha do silêncio de mim!” (35,22) — abre-se o desejo de ouvirmos De-
não é aceitar a imposição do silenciamento, que é um us falar no seu silêncio, tão próximo que é impossível
gesto opressivo em qualquer contexto, mas o valor da afastarmo-nos.
palavra que revela e une — e que só chega através da
Sérgio Dias Branco, O.P.
experiência radical da escuta. Sem escutarmos, sem (notas na página 5)
encontrarmos, sem termos o frente a frente transfor- 4
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CRISE E MUDANÇA
1. O Retiro das Fraternidades Leigas de S. Domin- os mais idosos a “pisarem o risco”, mais resistentes a
gos, nos dias 6 a 8 de Março deste ano, em Fátima, obedecerem às regras de isolamento e distanciamento
coincidiu, de forma imprevisível e inesperada, com o social. Situações houve, de pais idosos que cuidavam
fim da velha normalidade (chamemos-lhe assim). No dos filhos e sobretudo dos netos, que passaram a ser
referido dia 8, à tarde, já eu recebia mensagens anu- cuidados por aqueles, numa curiosa e até comovente
lando iniciativas académicas e profissionais em que inversão de papéis. As crianças e jovens terão encon-
estava envolvido – uma conferência, o lançamento do trado, neste estranho mas frutuoso tempo, que não
livro de uma colega e, por fim, as aulas na Universida- têm apenas direitos, mas também deveres que são a
de. De repente a vida pareceu ficar suspensa e o espa- base estrutural para uma consciência cívica mais apu-
ço da casa tornou-se mais do que nunca um espaço rada. Neste particular aspecto, o comportamento dos
vital. É claro que nem toda a gente ficou em casa: os pais, professores e outros educadores nunca é neutro,
profissionais de saúde, as forças de segurança, os que mas, muito pelo contrário, é determinante, pois sabe-
garantem o abastecimento de mercados e a venda de mos que as crianças e os jovens (e até os menos jo-
produtos considerados indispensáveis, os que assegu- vens) aprendem sobretudo por identificação, imitan-
ram a distribuição do correio e a recolha de lixo e ou- do os modelos, isto é, aprendem mais e melhor com o
tros profissionais que permitem que a vida prossiga. que vêm fazer do que com aquilo que os educadores
Como foi referido, neste tempo denso que ainda vive- lhes dizem para fazer.
mos, os novos heróis passaram a ser gente anónima 2. Não posso deixar de referir aqui dois momentos
que garantem que o dia-a-dia continue e não os famo- que me marcaram neste tempo de pandemia.
sos, com estatuto social e dinheiro. Com as escolas O primeiro foi o “Momento Extraordinário de
encerradas e muitos adultos em teletrabalho, estar em Oração em Tempo de Pandemia”, no Vaticano, dia
casa tornou-se o novo quotidiano. Descobrimos, com 27 de Março: a imagem do Papa, cambaleante, idoso e
alguma surpresa, que o dia tem 24 horas e a falta de vulnerável, a atravessar a Praça de S. Pedro, “vazia mas
tempo, de que todos nos queixávamos, era afinal uma cheia do mundo” como escreveu no Público Fr. Bento
questão de estabelecer prioridades que organizassem a Domingues, sob um tempo agreste, com um céu carre-
agenda de outra maneira. Nas famílias e nas diversas gado de nuvens escuras e chuva miudinha, foi a ima-
comunidades, religiosas e outras, a convivência per- gem da própria vulnerabilidade humana confiada ali,
manente fez emergir inevitáveis conflitos latentes, que naquele tempo e lugar fundador, por Francisco à mi-
estavam adormecidos ou que encontravam outra for- sericórdia paterna de Deus.
ma de expressão, mas também deu origem, certamen- O segundo foi a Peregrinação Anual do 13 de
te, a novas aprendizagens, de abertura ao outro, na Maio, em Fátima: o silêncio denso que se abateu so-
sua diferença e originalidade, de tolerância – diga-se, a bre o Recinto neste 13 de Maio foi a expressão de
propósito, que não há grupo humano sem conflitos, e amor filial mais forte e mais bela que até hoje teste-
a principal questão não é a sua existência, mas a for- munhei, a mostrar que o silêncio não é ausência de
ma como se resolvem. Ouvimos notícias que relata- comunicação.
vam, na fase mais apertada do confinamento, serem
José Carlos Gomes da Costa,O.P.

Notas relativas ao texto da página 4 “O silêncio de Tomás”


1. Angelus Silesius, A Rosa é Sem Porquê, trad. José Augusto Mourão, OP (Lisboa: Vega, 1991), 47.
2. Catarina de Sena, OP, “Carta 113: O plantio do amor cristão - Para Benedita Salimbeni”, in Cartas Completas, 1347-1380,
trad. João Alves Basílio, OP (São Paulo: Paulus, 2016), 271, e-book.
3. Ditos e Feitos dos Padres do Deserto, org. Cristina Campo e Piero Draghi, trad. Armando Silva Carvalho (Lisboa: Assírio &
Alvim, 2003), 45.
4. Inácio de Antioquia, “Carta aos Efésios”, in Liturgia das Horas, vol. III, 5.ª ed. (Coimbra: Gráfica de Coimbra, 2009), 163.
5. Thomas Merton, OCSO, Entering the Silence: Becoming a Monk and Writer: The Journals of Thomas Merton, Volume Two,
1941-1952, ed. Jonathan Montaldo (São Francisco, CA: HarperCollins Publishers, 1996), 396 (trad. minha).
6. Ditos e Feitos dos Padres do Deserto, 41.
7. Karl Rahner, SJ, Encounters with Silence, 2.ª ed. (South Bend, IN: St. Augustine’s Press, 1999), 56 (trad. minha).
8. Ibid., 21 (trad. minha).
9. Ver Jean-Marie Gueullette, OP, Pequeno Tratado da Oração Silenciosa, trad. Maria do Rosário Pernas (Prior Velho: Paulinas,
2016).

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MISSIONÁRIAS DOMINICANAS DO ROSÁRIO


Comunidade da Damaia - Portugal
A nossa vivência da Pandemia

Os factos ção comunitária mais serena, demorada, melhor pre-


Somos uma comunida- parada. A disponibilidade comprovadamente fraterna
de de 4 Irmãs, e integra- e amiga, do Fr. José Nunes OP, que todas as semanas
mos todas o Grupo cha- – menos uma – veio celebrar-nos a Eucaristia domini-
mado de “risco”. Vive- cal, proporcionando-nos, assim, também, poder co-
mos, sobretudo, as pri- mungar todos os dias e ter uns momentos fortes de
meiras semanas, com celebração, e convívio. Aquela oração transmitida des-
muito cuidado, bastante de o Vaticano para todo o Mundo, presidida pelo Pa-
resguardadas, com per- pa Francisco a subir a escadaria da Praça de S. Pedro,
plexidade, medo (?). Tu- sozinho, à chuva, com textos bíblicos tão apropriados,
do era tão estranho, di- uma Homilia e umas orações que se via e sentia que
ferente… que quase lhe brotavam do coração, que “tocaram” e chegaram,
nem dava para fazer per- sem dúvida, ao coração de Deus e ao da Humanidade.
guntas…prestávamos A oração/consagração, feita a Maria, a Senhora de
atenção às notícias e Fátima, com voz comovida, do D. António Marto,
queríamos abrir bem os olhos, para saber interpretar Bispo de Leiria /Fátima!...E o simbolismo da celebra-
as surpresas, encontrar respostas, sentir e interpretar ção maravilhosa e única do dia 13 de Maio, feita num
os sinais e a presença de Deus, em tempos nunca ants Santuário tão vazio aos nossos olhos, que nos arrepia-
vividos. Dúvidas de que Deus esteve e está no meio de va, mas com a Humanidade inteira, tão intensamente
nós, penso que não nos inquietaram. Ao contrário, presente e de muitos modos, momentos e através de
cantamos bastantes vezes em comunidade, e como tantas símbolos?. Não terá sido esta, uma das Celebra-
afirmação de fé, o cântico: “O Senhor conduz a marcha ções mais belas e intensas, das milhentas, imensamen-
deste mundo, cada dia, cada instante. Ele está presente, está te ricas, aí celebradas? A Oração fervorosa e bem pre-
connosco aqui, porque unidas no Amor!”. Também a frase parada, do Terço, no dia de Santa Catarina de Sena,
de S. Paulo: “tudo concorre para o bem dos que amam a feita em comunhão com a Família Dominicana de
Deus”, foi e é, para nós, um verdadeiro pilar. todo o mundo, a implorar a compaixão de Deus a fa-
vor da Humanidade tão doente, no ano em que cele-
Foi, providencial, pensamos, termos vivido o
pior desta rara situação em tempos de Quaresma/ brávamos os 50 anos como Padroeira da Europa?
Semana Santa/Páscoa e, ainda, no mês de Maria. Co- A nível da Congregação também há algo que mui-
mo isso nos ajudou e nos deu luz para acolhermos e to queremos agradecer a Deus: uma é o facto de, até
vivermos esta experiência dolorosa!... como também agora, nenhuma Irmã nossa ter sido afetada pelo cora-
nos ajudou a aprofundar e a viver estas Celebrações!... navírus. A segunda foi a seguinte surpresa: O Conse-
Só da vivência e do aprofundamento destes mistérios, lho Geral criou um Boletim denominado “Unidas na
nos poderia vir a Luz, a força, para se ver à luz da Fé e Esperança”, para que as Irmãs, das diferentes partes
da Esperança, as imagens tão estranhas e extremamen- do mundo, partilhem como aí se está a viver, a situa-
te dolorosas, que nos chegavam de todos os lados: mi- ção de pandemia. De tal modo se aderiu à iniciativa,
lhares de funerais, feitos de modo tão estranho. A an- que todas as segundas feiras, recebemos esse Boletim,
gústia expressa pelas pessoas que perdiam os seus en- enorme e com partilhas muito interessantes. A nossa
tes queridos, sem lhes poderem dizer um adeus. Os surpresa é grande, porque até aqui, para se colaborar
números crescentes, em cada dia, de infetados, de hos- no site, ou noutras modalidades, essa partilha era,
pitalizados e em cuidados intensivos. A exaustão dos com algum exagero, quase “puxada a ferros”.
Médicos e demais pessoal da linha da Frente…
Fica-nos, ainda, sem dúvida, o facto dos nossos
O que queremos guardar ? Governantes e Partidos Políticos, terem sabido, em
geral, viver esta crise, em espírito de diálogo, colocan-
O ritmo mais calmo dos dias, dos afazeres, do dor-
mir um pouquinho mais, que souberam bem. A ora- do acima dos interesses partidários, o bem nacional.

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O que fizemos? to pouco valem, pois, de repente, tudo pode cair, des-
Sendo esta Comunidade responsável pelo Centro fazer-se. Experimentamos na pele que somos TODOS
Social 6 de Maio, houve, como é evidente, atividades muito pequeninos, frágeis e pobres. A criatividade, as
e serviços que não pararam, como por exemplo a área milhentas iniciativas maravilhosas, que foram surgin-
social e jurídica. As duas Técnicas do Serviço Social, do, não se esquecem. O desenvolvimento, a utiliza-
não tiveram mãos a medir, pois as necessidades, a ção, como nunca antes acontecera, das novas tecnolo-
vários níveis, foram-se multiplicando, como bem sabe- gias, aplicadas nas escolas, no trabalho, nas reuniões,
mos, e as solicitações, inclusive, por parte de Serviços nos Encontros das Famílias, dos Amigos... As ações
públicos, aumentaram. Algumas das respostas exigi- lindas entre vizinhos, que até aí mal se conheciam e
ram atendimentos presenciais. Continuou-se a distri- que com isto teve início uma nova caminhada de en-
buição semanal, no Centro social, do apoio alimentar treajuda, de amizade… A união, muitas vezes inédita,
a mais de 60 famílias. Como o número de famílias de empresas multinacionais para o estudo, investiga-
necessitadas aumentou, encaminhamos os processos ção e experiencias, a fim de se encontrar remédio pa-
de mais de 90, para serem apoiadas por Grupos de ra este vírus assustador… E que dizer dos gestos sem
solidariedade que nasceram, de modo voluntário e fim, de preocupação pelo outro, pelo que está só, pe-
espontâneo, para responder às necessidades surgidas lo que tem fome, pelo que está doente, que originou
por esta crise. Destaca-se uma, que nasceu por iniciati- um movimento jamais visto e sentido de solidarieda-
va dum Jovem, chamada “ Bundle” e que já distribuiu de?... Será que tanta vivência, tanta riqueza, tanta hu-
uns mil cabazes de alimentos manidade, poderá desaparecer a curto prazo? E como
No que toca à gestão e coordenação do Centro esquecer a questão ecológica, que de repente nos le-
Social, a legislação e orientações, sem fim e perma- vou a constatar que o mundo estava mais limpo?...
nente, vindas dos mais diversos departamentos gover- E a criatividade incrível a nível da Fé e da busca
namentais e não só, exigiram da Equipa Responsável de Deus? Algumas pessoas disseram-nos que o que
um trabalho constante e exaustivo. mais saudades sentiam, em tempos de igrejas fecha-
Honra se faça, ainda, às educadoras de infância e das, era da comunidade e de poder comungar sacra-
à animadora da Mediateca, que fizeram um lindo tra- mentalmente. Por outro lado, quantos testemunhos e
balho, não presencial, com as crianças, adolescentes e exemplos de famílias que passaram a ser verdadeiras
suas Famílias. comunidades domésticas, em que a oração, a reflexão
Há algo que nos deixa um pouco tristes e é o fac- em Família, passou a ser mais intensa, viva…
to de não termos sabido fazer nada com os nossos Por isto e muito mais, é nossa convicção que,
vizinhos, até porque, talvez, não fosse difícil, dada a quando tudo passar, teremos, é certo, que fazer um
estrutura e localização das casas, que constituem uma enorme esforço para não esquecer o MUITO e o BE-
pequena praceta. Mas!… LO que esta pandemia nos ensinou e nos trouxe, mis-
turado, sem dúvida, com muita DOR, - realidades
E o futuro?
que andam sempre juntas e, mutuamente, se regene-
É uma pergunta que ouvimos frequentemente e
ram e recriam -, mas que há “Marcas” e “Registos”
que tem merecido muitas reflexões, mais ou menos
que ficarão para sempre.
optimistas. Pensamos que há aspectos que, pelo me-
nos enquanto vivam as pessoas – mesmo as crianças –
Ir. Deolinda Rodrigues, O-P-
que sofreram esta pandemia, jamais se poderão esque-
e Irmãs da Comunidade
cer. Ex.: que os nossos planos, projetos, saberes, mui-

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VEM ESPÍRITO

Vem, criador Espírito de Deus,

Visita o coração dos teus fiéis

E com a graça do alto os purifica.

Paráclito do Pai, Consolador,

Sê para nós a fonte de água viva,

O fogo do amor e a unção celeste.

Nos sete dons que descem sobre o mundo,

Nas línguas que proclamam o Evangelho,

Realiza a promessa de Deus Pai.

Ilumina, Senhor, a nossa mente,

Acende em nós a tua caridade,

Infunde em nosso peito a fortaleza.

(El Greco, A descida do Espírito Santo)

FICHA TÉCNICA

Jornal bimensal Mário Rocha


Publicação Periódica nº 119112 / ISSN: 1645-443X Administração: Maria do Céu Silva (919506161)
ISSN: 1645-443X Rua Comendador Oliveira e Carmo, 26 2º Dtº
Propriedade: Fraternidades Leigas de São Domingos 2800– 476 Cova da Piedade
Contribuinte: 502 294 833 Endereço: Praça D. Afonso V, nº 86,
Depósito legal: 86929/95 4150-024 PORTO
Direcção e Redacção E-mail: laicado@gmail.com
Cristina Busto
José Alberto Oliveira Os artigos publicados expressam apenas
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