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Instituto Politécnico de Lisboa

Escola Superior de Música de Lisboa

Recensão Crítica sobre o artigo

QUAIS OS MOTIVOS DO INSUCESSO DE


ALGUMAS CRIANÇAS NA APRENDIZAGEM
MUSICAL?
De Susan O’Neill

Catarina Isabel Ferreira Barreiros


Mestrado em Ensino da Música

Psicologia do Desenvolvimento e Aprendizagem


Professor João Rosa
Ano lectivo 2016/2017
Dezembro 2016
Introdução
A presente recensão, no âmbito da disciplina de Piscologia do Desenvolvimento e
Aprendizagem, é acerca do artigo Quais os motivos do insucesso de algumas crianças na
aprendizagem musical? De Susan O’Neill. A autora é professora na Faculdade de Educação da
Universidade de Simon Fraser, no Canadá. É a investigadora principal de alguns projectos de
investigação na área da aprendizagem musical, educação multimodal e aspectos relacionados
com as vivências, experiências, valorização, etc, dos jovens.

Escolhi este artigo porque é importante como professora perceber a razão pela qual
algumas crianças não conseguem aprender música enquanto outras aprendem sem grandes
dificuldades. É importante para saber no futuro mas também no presente, dado que tenho uma
aluna que possivelmente tem dislexia ou outra perturbação e que não aprende da mesma forma
que os meus restantes alunos. Esta aluna está a ser um real desafio para mim e, por isso, este
artigo suscitou-me interesse. Também será interessante para aprender a motivar os alunos e
usar essa motivação como aliada da aprendizagem musical, além de perceber a influência de
experiências de flow na motivação e aprendizagem dos alunos.

Em anexo, encontra-se o documento recenseado.

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Síntese do conteúdo do documento
Este artigo é sobre um estudo realizado por O’Neill para responder às principais
questões: “os jovens que demonstram maiores níveis de performance musical têm os mesmos
padrões de flow experience e motivação que aqueles menos bem sucedidos?”; “ até que ponto
as flow experiences contribuem tanto para as diferenças de tempo gasto no estudo como para
os resultados finais dos jovens músicos?” e ainda qual a maneira mais eficaz de motivar um
aluno tendo por base o maior número de factores possível? Antes da apresentação formal do
estudo, a autora faz uma introdução ao tema, expondo o que já se sabe a partir de outros estudos
realizados por outros investigadores, confrontando-os com as fragilidades destes estudos.

A metodologia do estudo consiste em vários relatórios individuais que 60 alunos


participantes (21 rapazes e 39 raparigas entre os 12 e 16 anos; 40 de uma escola especializada
de ensino da música – dos quais foram selecionados os primeiros 20 com melhor desempenho
musical e os últimos 20 com desempenho médio – e 20 de uma escola pública de ensino
genérico da música) preenchiam sempre que um pager tocava aleatoriamente uma vez a cada
duas horas, entre as oito da manhã e as dez da noite, ao longo de uma semana. O relatório
tratava estados diversos dos alunos, incluindo tempo de estudo, satisfação, o que estavam a
pensar no momento do preenchimento do relatório, etc.

Os resultados são apresentados organizadamente por temas. Em relação ao tempo de


estudo, os alunos da escola pública gastaram uma média de 252 minutos a estudar (tocar) o
instrumento; os alunos da escola de música gastaram uma média de 682 minutos (nível médio)
e 896 minutos (nível avançado).

A autora conclui com “Sugestões práticas para desenvolver nos jovens a motivação para
a música”. Por tópicos, ela dá uma série de conselhos práticos de como motivar os alunos,
dentro e fora da sala de aula. Alguns desses conselhos são: criar um ambiente de trabalho
amigável, ser flexível, saber ajustar os objectivos de cada aluno ao nível de desafio necessário,
envolver os pais no processo de ensino/aprendizagem e abolir os termos “trabalho de casa” e
“treino”, encoranjado os alunos a tocar o mais possível.

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Análise crítica
O artigo está bem estruturado e delineado. E relação aos resultados e às conclusões do
estudo de O’Neill, fiquei um pouco confusa porque ela não expõe de facto as conclusões
directas do seu estudo nem os resultados de alguns temas investigados, falando apenas de como
foram analisados os resultados, o que é importante para evitar erros de investigação como
conclusões falsas, mas a informação colhida não é disponibilizada. Este seria um aspecto que
eu, enquanto investigadora, iria alterar.

A intenção da autora era dar resposta às falhas de um estudo de Csikszentmihalyi et al (1993),


onde se concluiu que os jovens músicos mais talentosos sentiam de facto um nível mais elevado
de motivação ou flow experience do que aqueles com um nível mediano de competências
musicais. O’Neill apontava como falhas o facto de não ser focada nenhuma competência
musical em particular, a falta de obtenção de dados relativos ao tempo gasto na prática do
instrumento, o facto de a obtenção dos dados recolhidos no grupo dos talentosos e dos medianos
ter ocorrido com oito anos de diferença, não se dando importância às mudanças ocorridas ao
longo desse tempo e o estudo ter sido aplicado apenas a adolescentes americanos. Ora, o estudo
que realizou também só foi aplicado a jovens do norte de Inglaterra e também não apontou
nenhuma competência musical em específico, sendo estas possíveis falhas do estudo de
O’Neill, além da fraca exposição dos resultados obtidos mencionada aciema.

Apesar disso, a linguagem é acessível e o artigo é de fácil leitura, também talvez por
tratar um tema do meu interesse.

Considero a motivação do aluno fulcral para que não ocorra insucesso escolar. O termo
“motivação” está associado a tudo o que leva o ser humano a agir, a desenvolver e a pensar
(Deci, 2009). O que muitas vezes acontece é que os piores alunos são os que estão mais
motivados a estudar; o interessante será passar o que está na génese dessa motivação para os
alunos com mais capacidades. Acontece que, por vezes, há insucesso nos alunos com maiores
facilidades por não haver o tratamento certo da motivação intrínseca.

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Conclusão
Em suma, esta recensão foi útil na medida em que fui confrontada com um estudo e
tive de o analisar criticamente. As conclusões, extraídas não só deste estudo mas também de
teorias sobre a motivação, estão muito bem fundamentadas e ficaram na minha memória para
uso futuro (embora algumas já soubesse e utilizasse quase inconscientemente).

Serve também, de certa forma, como inspiração para um possível estudo de caso que eu
venha a realizar, evitando os aspectos negativos do que foi feito por O’Neill neste estudo,
aproveitando, claro, os positivos.

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Referências bibliográficas
 Deci, Edward L. (2009) Large-scale school reform as viewed from the self-
determination theory perspective, Theory and Research In Education, V. 7, n. 2, p.
244-252

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Anexo 1: Artigo

Quais os motivos do insucesso de algumas


crianças na aprendizagem musical?
Motivação e Flow Theory
SUSAN O'NEILL
Este artigo aborda a natureza da motivação na sua relação com a aprendizagem musical, Um
dos objectivos principais é problematizar a questão das diferenças no sucesso da aprendizagem musical
quando nos encontramos perante indivíduos com níveis aparentemente semelhantes de capacidade e
potencial musicais. Começa por apresentar um conjunto de modelos teóricos que oferecem uma visão
acerca das razões que podem explicar as variações e mudanças na motivação. Refere-se investigação
recente que sugere que os processos motivacionais não são pré-determinados mas podem ser aprendidos
e que os indivíduos, para atingir níveis elevados de sucesso, necessitam de uma focagem no processo por
oposição a uma focagem no produto. São introduzidos e explorados processos cognitivos fundamentais
relacionados com a aprendizagem musical (por exemplo, comportamento auto-regulado, papel da
motivação intrínseca e extrínseca). Como conclusão, sugerem-se algumas práticas específicas para que
os professores possam reflectir acerca da melhor forma de encorajar e aumentar a motivação dos seus
alunos para aprender música.

As mais recentes investigações têm salientado que as diferenças no


desenvolvimento das competências musicais das crianças não estão exclusivamente
associadas a capacidades cognitivas (e.g., para informação actualizada ver Howe et
al, in Press; Sloboda et al, 1994). A razão mais provável para as diferenças de sucesso
qualidade de performance musical entre as crianças terá mais a ver com o esforço e
persistência que demonstram aqueles que atingem níveis mais elevados, O tempo
gasto a praticar, desde muito jovem, é considerado um factor determinante para
atingir a excelência musical (Ericsson et al, 1993; Sloboda et al, 1996).
Contudo permanece uma importante questão. Porque é que algumas crianças
conseguem praticar durante várias horas e outras não? Muitos estudos têm realçado a
importância de factores externos, tais como o apoio familiar (Sosniak, 1985, 1990;
Davidson et al, 1996; Sloboda & Davidson, 1996). Embora seja reconhecido haver
uma forte ligação entre o ambiente social e cultural e a motivação para o estudo e
prática de um instrumento, existe um limite para além do qual nenhum tipo de apoio
e suporte fará com que a criança dispense tanto esforço para atingir, por vezes, níveis
modestos de qualidade, sem possuir ela própria um interesse intrínseco pela música,

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Existem cada vez mais indicadores que sustentam esta opinião. Por exemplo
Amabile (1983) defende que as condições mais favoráveis para o desenvolvimento da
performance criativa são aquelas que encorajam a auto-orientação e que são
essencialmente baseadas em razões intrínsecas ao indivíduo mais do que extrínsecas
ou factores sociais. O'Neill (em publicação) refere ter observado que as crianças que
revelam um comportamento de adaptação a novas situações ou situações difíceis
conseguem maiores progressos, logo ao fim do 1 0 ano de estudo do instrumento, do
que as outras. Num estudo sobre adolescentes talentosos, Csikszentmihalyi et al (1993)
produziram dados evidentes que sugerem que aqueles que desenvolvem o seu talento
com maior sucesso em diversas áreas, incluindo a música, o fazem devido a uma
grande perseverança face às dificuldades e à capacidade de as transformar em
oportunidades de aprendizagem encarando-as como desafios que ajudam a evitar a
rotina. Os investigadores referem que um dos factores cruciais que separa os jovens
(músicos) com mais sucesso daqueles com índices médios, reside na capacidade que
os primeiros demonstram em apreciar intrinsecamente as actividades musicais ou flow
activities . Segundo a Flow Theory de Csikszentmihalyi ,Jlow é um estado em que a
actividade em que o indivíduo se envolve o leva a entregar-se totalmente
disponibilizando todas as suas capacidades; conforme essas competências se vão
desenvolvendo, assim os desafios têm de ser maiores para atingir o estado deflow
(Csikszentmihalyi, 1975).
Tipicamente asflow experiences são avaliadas pelo nível atingido na relação
entre os desafios e a competência de cada indivíduo. A teoriaflow está estruturada segundo
um modelo em quatro quadrantes: (1) equilíbrio entre desafios e competências em que
ambas as variáveis estão acima da média individual (/low); (2) equilíbrio entre desafios e
competências em que ambas as variáveis estão abaixo da média individual (apatia);
equilíbrio entre desafio elevado e competência baixa (ansiedade); equilíbrio entre
competências elevadas e desafios baixos (enfado). Aplicando este modelo ao estudo
de flow experiences no quotidiano, podemos comparar o tipo de actividades com a
quantidade de vezes em queflow acontece em crianças que revelam níveis diferentes de
competências na performance musical.
Apesar do crescente reconhecimento de que os factores motivacionais
desempenham um papel chave no resultado do desempenho, tais factores têm recebido
pouca atenção por parte dos investigadores que se têm ocupado do estudo do

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desenvolvimento das competências musicais. Isto deve-se em parte ao facto de até há
pouco tempo não existirem formas fiáveis e sistemáticas de avaliar a motivação.
Concomitantemente, os diversos estudos que têm sido levados a cabo têm realçado as
determinantes biográficas na excelência musical ou as mudanças de comportamento do
indivíduo mas não têm em conta a influência das mudanças no meio ambiente próprio.
Poucos estudos têm observado a relação quotidiana entre os jovens (músicos) e o seu meio
ambiente ou a forma como essa relação influencia as experiências e a motivação que têm
na aprendizagem de um instrumento.
Contudo, ao desenvolverem um método inovador, a Experience Sampling Method
(ESM) , Csikszentmihalyi e os seus colegas conseguiram aferir sistematicamente os
acontecimentos subjectivos que são determinantes para que um jovem queira ou não
dedicar-se ao estudo de um instrumento, com o necessário gasto de muitas horas que isso
envolve. Este método implica que os participantes usem um pager e tragam consigo um
livrinho de relatórios individuais, durante uma semana. Cada dia, a intervalos de tempo
aleatórios num período de duas horas, são enviadas mensagens para o pager para que os
voluntários preencham uma ficha do seu relatório. Assim, os registos fornecem
informação de pensamentos e actividades em momentos aleatórios ao longo de uma
semana normal. Através deste método, Csikszentmihalyi et al (1993) concluiram que os
jovens músicos mais "talentosos" sentiam de facto um nível mais elevado de motivação,
ou flow experience, quando envolvidos em actividades musicais, do que aqueles
considerados como possuidores apenas de competências musicais medianas.
Apesar desta importante descoberta, o estudo apresenta uma série de fragilidades.
Em primeiro lugar, os investigadores compararam adolescentes "talentosos" com
"medianos" ao longo de uma grande variedade de domínios mas não focaram em detalhe
qualquer competência musical em particular. Em segundo lugar, os investigadores não
tentaram obter dados sobre o tempo de prática gasto em cada momento de estudo musical.
Outra insuficiência é a de que os dados recolhidos no grupo dos "talentosos" e dos
"medianos" ocorreu com oito anos de diferença, não tendo tido em conta as mudanças
entretanto ocorridas na vida dos adolescentes em geral, tanto a nível social como
educacional. Finalmente, o estudo foi aplicado apenas aos adolescentes norte americanos
o que não quer dizer que seja válido também para adolescentes ingleses, ou de outro país
(as experiências vividas serão necessariamente diferentes).
É intenção do presente estudo dar resposta àquelas fragilidades e insuficiências e
alargar a nossa compreensão sobre a relação daflow theory com o desenvolvimento das
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competências instrumentais musicais de jovens músicos. A principal questão colocada
é: os jovens que demonstram maiores níveis de performance musical têm os mesmos
padrões deJlow experience e motivação que aqueles menos bem sucedidos?; até que
ponto as flow experiences contribuem tanto para as diferenças de tempo gasto no estudo
como para os resultados finais dos jovens músicos?
MÉTODO
PARTICIPANTES

Os participantes neste estudo foram 60 jovens músicos (Rapazes=21,


Raparigas=39) com idades compreendidas entre os 12 e os 16 anos que frequentavam
uma escola especializada de ensino da música (40) e uma escola pública de ensino
genérico (20) do norte de Inglaterra. Para a selecção dos alunos da escola
especializada os responsáveis por cada classe (piano, cordas, madeiras, metais e
percussão) seriaram cinquenta de acordo com as suas competências de performance
e potencial. Os vinte primeiros dessa seriação (melhor desempenho) e os vinte
últimos (desempenho médio) , dum variado leque de instrumentos, foram
convidados a participar no estudo. Os alunos da escola pública que participaram no
estudo foram indicados pelo Coordenador do Grupo de Educação Musical como
sendo os alunos musicalmente mais activos da escola . Um dos rapazes da escola de
música (do grupo com melhor desempenho) não preencheu todos os seus relatórios
diários de estudo pelo que foi eliminado da análise estatística.

METODOLOGIA

Cada aluno participante entregou uma autorização dos pais e durante uma
semana usou um pager e o caderno de relatórios individuais que preenchiam sempre
que o pager tocava uma vez cada duas horas (aleatoriamente) entre a 8 da manhã e
as dez da noite. O relatório incluia vinte e sete items abrangendo diversos estados do
alunos: estavam alerta ou distraídos, contentes ou tristes, até que ponto estavam a
dominar a situação e por aí adiante. Os níveis deflow eram medidos de acordo com
o nível do desafio e competências envolvidos numa escala de 1 a 10. O relatório
perguntava também onde e com quem e o que estavam a fazer e a pensar. Durante a
semana em que ocorreu o estudo cada aluno podia preencher até 49 relatórios.

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No último dia os participantes foram individualmente entrevistados pelo
investigador para obter informação complementar tal como: quão normal a
semana tinha sido; como se tinham sentido ao participar no estudo; informações
biográficas; aspirações para o futuro.

RESULTADOS
QUANTIDADE DE TEMPO DE ESTUDO

O tempo médio gasto a tocar (estudar) um instrumento durante uma semana


nos alunos da escola pública foi de 252 minutos (DP= 1195 ; variação entre 45 e
455). Nos alunos da escola de música esse tempo era de 682 minutos (DP= 316;
variação entre 225 e 1356) para os alunos de nível médio e 896 minutos (DP=290;
variação entre 485 e
1645) para os de melhor nível. A ANOVA revelou uma diferença significativa entre
grupos, F (2, 56) = 31.95, p< .001. A análise post-hoc ftikey revelou diferenças
significativas entre os três grupos. Estas conclusões suportam investigações anteriores
que indicavam que os alunos melhores sucedidos gastavam mais tempo na prática
instrumental do que os que apresentam resultados médios. (Ericsson et al. 1993; Sloboda
et al. 1996; O'Neill, 1997).

TIPOS DE ACTIVIDADES MUSICAIS

A tabela I mostra a média de minutos (e desvios padrão) gastos em diversas


actividades musicais a os resultados da ANOVA.

TABELA 1
Tipo Escola Pública Esc. de Música Esc. de Música F
ratio
de Nível Médio Nível Médio Nível Elevado
actividade
(N = 20) (N=20) (N=19)

Prática de peças88.50 (71.99)216.75 (92.85)474.47 (293.45)


Estudo de escalas 21.60 (18.15) 137.20 161.21 (88.59) 24.999*
(72.08)
Tocar livremente 48.55 37.95 (33.08) 20.74 (20.71) 2.646
(52.54)
Ensaio de grupo 43.10 167.60 129.37 3.511*
(49.07) (207.44 (154.93)

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Aula de música 39.05 90.50 (70.91) 102.26 (81.06) 5.455
(28.04)
Performance 11.57 32.00 (52.80) 7.63 (10.19)
2.991
(21.00)
Nota: .05, .01, ***p<.001

TEMPO GASTO EM ACTIVIDADES MUSICAIS E NÃO MUSICAIS

As actividades dos alunos foram categorizadas segundo 18 items envolvendo


'actividades produtivas' (trabalho na sala de aula, estudo, emprego, trabalho/prática
relacionado com a música), 'actividades de lazer' (social, desporto/jogos, ouvir
música, artes/hobies (não musicais), ler, pensar, tocar (por divertimento) e
'actividades de manutenção' (comer, higiene pessoal, descanso/sesta, viagens, outras
(animais de estimação, rezar, esperar, etc.) A análise implicará a comparação do
tempo gasto com cada uma destas actividades em cada um dos três grupos de alunos.

FLOW EXPERIENCE EM ACTIVIDADES MUSICAIS E NÃO MUSICAIS

Para interpretar com rigor e sentido a informação colhida é necessário ter em


conta as diferenças individuais de interpretação nas respostas aos diversos items.
Alguns dos inquiridos descrevem as experiências vividas (desafios e competências)
como muito significativas, enquanto que outros as classificam como muito pouco
significativas. No presente estudo, os níveis de dificuldade de desafio e competência
foram classificados numa escala de IO pontos. Contudo, para uma pessoa cujo nível
médio de desafio seja 6, uma situação específica classificada para nível 5 será
relativamente baixo enquanto para outra, cujo nível médio de desafio seja 2, uma
classificação específica de nível 5 será excepcionalmente elevado. Como tal, para se
poder estabelecer um ponto comum de comparação entre os diversos participantes é
necessário criar respostas norma com referências à média individual. As respostas
tal como foram dadas nos relatórios foram transformadas em números que
representam desvios padrão relativamente à média de cada participante. Estes
resultados (z scores) serão então comparados entre si e para cada indivíduo e
indicam, numa escala única, o grau de desvio da resposta média. Os resultados desta
análise são apresentados e discutidos em termos de comparação deflow experiences
em actividades musicais e não musicais em jovens músicos em cada um dos três
grupos.
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IMPLICAÇÕES PARA A EDUCAÇÃO MUSICAL

Com a apresentação dos resultados tal como acima indicado, procura-se


explorar as implicações desta investigação para os educadores na área de música.
Em particular, o equilíbrio entre desafio e competência é discutido no contexto da
aprendizagem de um instrumento e da motivação dos jovens para actividades
musicais. Espera-se que os resultados deste estudo ajudem os educadores a
compreender porque é que algumas crianças atingem níveis elevados na
aprendizagem de um instrumento, enquanto outras, com capacidades e potencial
idênticos, apenas conseguem progressos modestos ou chegam mesmo a abandonar
os estudos musicais.
SUGESTÕES PRÁTICAS PARA DESENVOLVER NOS
JOVENS A MOTIVAÇÃO PARA A MÚSICA

É sabido que os benefícios da escolaridade não dependem apenas da


aprendizagem recebida pelos jovens, mas também do reflexo que produzem na sua
auto-estima e na orientação para tarefas específicas.
Tendo isto em mente, podemos extrair a seguintes conclusões, baseadas em
teorias sobre a motivação (principalmente em áreas não musicais, tal como a
matemática e o desporto) e investigações sobre como desenvolver a motivação dos
alunos.

l. Fazer crer aos jovens que podem aprender e desenvolver-se com o trabalho.
2. Criar um ambiente de trabalho que seja amigável para que os erros e falhas sejam vistos
como experiências e momentos positivos do processo de aprendizagem. Se a razão para
um aluno se envolver numa actividade for a preocupação com a avaliação, é mais
provável aconteceram desistências e/ou desajustes de comportamento.
3. Reconhecer em cada aluno o seu ponto de excelência e desistência e saber ajustar o seus
objectivos e o nível de desafio/esforço necessário. Aproveitar todas as oportunidades
para corrigir juízos desajustados ('Não sou capaz de fazer isto' ou 'Não sou bom nisto').
4. Ter cuidado para não criar dependência de factores motivadores extrínsecos (tal como
exames, competições, prémios) — a recompensa deverá ser a actividade em si mesma
e a partilha de experiências e conclusões com os outros de uma forma não competitiva.
Os alunos com tais motivações extrínsecas estão mais sujeitos a sofrer de baixa auto
confiança o que pode conduzir a comportamentos de inadaptação.
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5. Fornecer aos alunos instruções precisas e cuidadas que lhes darão maior controle
e responsabilidade na organização das sua actividades (p. ex., permitir que
escolham as actividades, instrumento(s), permitir que decidam quanto tempo
devem estudar para serem bem sucedidos e encontrar formas de aferir o seu
próprio progresso).
6. Identificar os obstáculos à motivação e ser flexível na ajuda aos alunos no sentido
de
um compromisso mais eficaz e efectivo com a actividade musical.
7. Aproveitar todas as oportunidades para desenvolver a consciência dos alunos
sobre género e música. E importante criar um contexto favorável tanto a
raparigas como a rapazes — por outras palavras, ajudar os alunos a analisarem
porque é que se consideram certos instrumentos ou actividades musicais
'próprias' para o homem ou para a mulher e encontrar maneiras de ultrapassar
esses estereótipos tanto no meio escolar como social.
8. Estar consciente dos efeitos sociais que os jovens antecipam no seu
envolvimento com a música e ser sensível à imagem que os companheiros têm
deles (rapazes e raparigas).
9. Envolver os pais tanto quanto possível no processo de ensino/aprendizagem
fornecendo-lhes toda a informação possível e informá-los também sobre como
podem encorajar e ajudar os seus educandos em casa.
IO. Abolir os termos 'treino' ou 'trabalho de casa'. Encorajar os alunos a tocar o mais
possível. É necessário que obtenham prazer com as suas actividades musicais.

NOTAS

1
Por não encontrarmos termo equivalente em português optamos por manter o termo flotv; contudo
concentração e absorção serão provavelmente os termos mais aproximados (nota do tradutor).
"Estes tipos de experiências são designados como experiências de fluxo porque os sujeitos que
Csikszentmihalyi estudou relatavam, com frequência, que aquilo que faziam durante a experiência
era tão agradável que parecia estarem a ser levados por uma corrente, como se estivessem num
fluxo", in Arends,
R. 1., (1995). Aprendera Ensinar, Portugal: MacGRAW-HILL, p.123.
Poderemos traduzir por Método de Amostragem de Experiências (nota do tradutor). 4
Convém esclarecer que em Inglaterra a educação musical está presente ao longo de todo o ensino
obrigatório (nota do tradutor).
5

- 14 -
DP — desvio padrão.
6
Análise da variância.

REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS

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