Você está na página 1de 8

05/11/2019 Diálogos entre Filosofia e Arte - Revista Cult


(https://www.uol.com.b

(https://revistacult.uol.com.br/home/)

Ex: Cena contemporânea



 (HTTPS://WWW.INSTAGRAM.COM/CULTREVISTA/)  (HTTPS://PT-BR.FACEBOOK.COM/REVISTACULT)

 (HTTPS://TWITTER.COM/REVISTACULT)

ASSINANTE DIGITAL (HTTPS://REVISTACULT.UOL.COM.BR/HOME/LOGIN)

ASSINE AQUI » (HTTPS://WWW.CULTLOJA.COM.BR/CATEGORIA-PRODUTO/REVISTA-

CULT/EDICOES/ASSINATURA/)

GRUPO CULT

E D I Ç Õ E S ( H T T P S : / / R E V I S TA C U L T . U O L . C O M . B R / H O M E / E D I C O E S / )

D O S S I Ê S D I G I TA I S ( H T T P S : / / W W W . C U L T L O J A . C O M . B R / C AT E G O R I A - P R O D U T O / R E V I S TA -

C U L T / D O S S I E S - D I G I TA I S / )

C O L U N I S TA S ( H T T P S : / / R E V I S TA C U L T . U O L . C O M . B R / H O M E / C O L U N I S TA S / )

S E Ç Õ E S ( H T T P S : / / R E V I S TA C U L T . U O L . C O M . B R / H O M E / N O S S A S - S E C O E S / )

A N U N C I E ( H T T P S : / / R E V I S TA C U L T . U O L . C O M . B R / H O M E / A N U N C I E / )

C O N TAT O ( H T T P S : / / R E V I S TA C U L T . U O L . C O M . B R / H O M E / C O N TAT O / )

S O B R E ( H T T P S : / / R E V I S TA C U L T . U O L . C O M . B R / H O M E / S O B R E / )

https://revistacult.uol.com.br/home/dialogos-entre-filosofia-e-arte/ 1/8
05/11/2019 Diálogos entre Filosofia e Arte - Revista Cult

Home (https://revistacult.uol.com.br/home) • Seções (https://revistacult.uol.com.br/home/categoria/secoes/) •


Filosofia (https://revistacult.uol.com.br/home/categoria/secoes/filosofia/) •

Diálogos entre Filosofia e Arte


Silvio Ferraz e Annita Costa Malufe 
14 de março de 2010

507

O filósofo francês Gilles Deleuze, 1987 (Reprodução)

São muitos os livros e artigos de Gilles Deleuze que trazem um diálogo privilegiado
com as artes. Mesmo naqueles escritos em parceria com Félix Guattari, a proliferação
de conceitos que nascem da conversa da Filosofia com campos artísticos parece
indicar-nos alguma coisa importante. Algo que talvez nos fale de um certo modus
operandi deste pensamento, um certo modo de funcionar a partir de acoplamentos,
misturas, diálogos, um pouco daquilo que Deleuze e Guattari chamaram de blocos de
devir.

Dizer que a Filosofia forma bloco com a Literatura, a Pintura e a Música não é o
mesmo que dizer que ela se utiliza destes domínios para criar seus exemplos, suas
comprovações nem vice-versa. Não é o mesmo dizer que a Filosofia se apropria das
artes para criar seus conceitos e dizer que ela cria um bloco de devir com certas obras
para daí fazer passar algo, deixar que neste encontro algo se crie, algo aconteça e faça
passar devires.

O fato é que Deleuze, nas inúmeras conversas que seu pensamento travou com o
Cinema, a Literatura, a Poesia, a Música, as Artes Plásticas, acabou deixando margens
para que sua filosofia pudesse ser tomada como crítica de arte, ou como arcabouço
teórico a fornecer “modelos” a serem “aplicados” na leitura de um objeto artístico. A
nós parece de fundamental relevância, para a compreensão de sua proposta, que essa
nuance seja explicitada: Deleuze não colocava a Filosofia “a serviço da Arte”,

https://revistacult.uol.com.br/home/dialogos-entre-filosofia-e-arte/ 2/8
05/11/2019 Diálogos entre Filosofia e Arte - Revista Cult

tampouco a Arte (ou as Ciências, a Psicanálise, a Política etc.) “a serviço da Filosofia”,


mas, antes, procurava fazer ressoar os planos de composição da arte e de imanência
da Filosofia, como se algo nascesse do encontro dos dois, desta trepidação.

Como ele mesmo lembra em sua palestra “O que é o ato de criação?: “A Filosofia não
foi criada para ficar refletindo sobre o que quer que seja. Ao se tratar a Filosofia como
uma potência de ‘refletir sobre’, acreditamos que lhe demos tudo, mas no fundo
retiramos tudo. Ninguém precisa da Filosofia para refletir.” Ao que podemos cantar
em coro com Deleuze e dizer que só a Arte pensa sobre a Arte. E quanto à Filosofia, ela
é uma máquina de produzir conceitos que, como toda máquina, deve ligar-se a outras
máquinas para funcionar. Tal seria o programa de uma filosofia prática, experimental:
criar, no acoplamento com aquilo que está fora dela – ou que é o seu fora –, conceitos
necessários, que se tornam necessários no confronto com campos problemáticos. Só
pensamos forçados, impulsionados por algo que está fora do pensamento, algo ainda
não pensado, não pensável. É aí que vale a pena pensar, é aí que o pensamento
filosófico é forçado a criar conceitos. Trata-se do projeto de uma filosofia que sirva
para pensar a vida, que só funcione uma vez acoplada a outros campos de
experimentação que a forçam a criar.

Assim, do acoplamento da filosofia de Deleuze e Guattari com a Arte, o que nasce são
conceitos, personagens conceituais que operam no plano de imanência, ou de
consistência, da Filosofia. Ou seja, ao se encontrar com as Artes, a Filosofia tem como
efeito produzir diferenciações múltiplas no pensamento, resultando na criação de
conceitos filosóficos e não de modelos analíticos, teóricos, a serem reaplicados ao
objeto artístico ou ao texto literário. É neste sentido que tanto os livros de cinema
(Cinema I – a imagem-movimento e Cinema II – a imagem-tempo) quanto o dedicado ao
pintor Francis Bacon (Francis Bacon-Logique de la sensation), ou a Proust (Proust e os
signos), ou ainda aquele em que ele e Guattari dedicam à literatura de Kafka (Kafka por
uma literatura menor) são livros de Filosofia e não de crítica de Arte. E poderíamos
acrescentar aí, apenas para efeito ilustrativo, os capítulos de Mil platôs em que
comparecem a música e as artes em geral, as belas páginas de O que é a Filosofia? sobre
afetos e perceptos, os ensaios de Crítica e clínica, dentre muitos outros momentos em
que a literatura – talvez esta tenha sido a mais evocada por eles – e as outras
manifestações artísticas são convocadas para ressoar e fazer proliferar conceitos da
mais alta plasticidade e singularidade.

Ritornelo

Dentre os conceitos que nascem deste encontro, o ritornelo talvez seja um dos mais
expressivos. Dizemos isto porque, ao descrever o movimento do ritornelo, no capítulo
11 de Mil platôs “Acerca do ritornelo” (volume 4 da tradução brasileira), Deleuze e
Guattari elaboram plasticamente o movimento mesmo da repetição da diferença.

Para fazer nascer este conceito, eles buscam na música sua principal imagem. Uma
criança que canta para afugentar o escuro, alguém que canta enquanto arruma a casa,
alguém que canta criando seu lugar, ou alguém que canta um canto de partida “adeus
amor, vou partir”. De um primeiro giro se faz um centro, um eixo de sobrevida, mas
um segundo giro se faz necessário e o eixo se amplia pela extensão que lhe envolve.
Mas como tudo aquilo que abriga também obriga, os filósofos imaginam sua ciranda
indo além desta simples fundamentação de um lugar, para enfim desfazer-se no seu
afundamento: forças diversas invadem o pequeno terreno e atraem para fora o seu
principal personagem que, estando fora, mergulha em um novo ciclo ou mergulha no
sem ciclo.

https://revistacult.uol.com.br/home/dialogos-entre-filosofia-e-arte/ 3/8
05/11/2019 Diálogos entre Filosofia e Arte - Revista Cult

É assim que o ritornelo consiste em três aspectos inseparáveis: 1. escolher um eixo; 2.


desenhar um domínio – território – em torno deste eixo; 3. traçar a partir deste
domínio, ou território, linhas de fuga que levem a outro ritornelo (no qual novamente
será desenhado um território em torno de um eixo, do qual serão traçadas linhas de
fuga etc…). Não seriam três etapas, mas três aspectos que devemos conceber como
simultâneos no ritornelo. Sendo o terceiro aspecto este vetor de desterritorialização,
em que o território se precipita em sua própria dissolução.

Mas esta pequena ciranda não se dá sem que eles conversem incessantemente com a
música e outras artes. É então que entram em cena os compositores Luciano Berio,
Alban Berg, John Cage, Robert Schumann, Modest Mussorgsky, -Edgard Varèse e
Olivier Messiaen. Com exceção de Schumann, todos compositores que viveram o
desfazimento da música romântica do século 19. De cada um dos compositores eles
trazem uma idéia. Mas não se trata de extrair destes exemplos ilustrativos. A música
também tem seus conceitos e são os conceitos e estratégias de composição que
Deleuze e Guattari põem lado a lado com os conceitos da Filosofia para daí fazer
eclodir movimentos quase que inusitados.

Os interlocutores dessa conversa vão além da música e eles chamam Paul Cézanne,
Vincent Van Gogh, Paul Klee, Francis Bacon, Samuel Beckett, Antonin Artaud. E o ciclo
do ritornelo, que poderia ser fechado, abre-se frente a estes que escancararam as
portas da arte no século 20, que a retiraram de seu eixo seguro para fazê-la conectar-
se novamente com as forças não formadas do caos. E é aqui que advém um dos
motivos circulares de Deleuze, aquele que ele rouba sutilmente de Paul Klee: “A Arte
não imita o visível; ela torna visível o não-visível.” A Arte sai dos limites fáceis do que
é sensível, do que tem nome e forma, para buscar no caos, em que a forma é sempre
apenas provisória, pontos soltos, linhas soltas e então dar-lhes corpo. Dar corpo tátil
ao som, dar corpo sonoro ao tempo, dar visibilidade ao que é tátil, dar sonoridade ao
que era apenas volume em uma pedra. Este cruzamento, que o filósofo português José
Gil bem localizou no pensamento de Fernando Pessoa, sobretudo em seu Alberto
Caeiro e na sua teoria do sensacionismo: fazer ver o cheiro da chuva oblíqua.

E talvez o próprio Deleuze, com Guattari, tenha encontrado uma imagem, a partir de
D.H.Lawrence, que resumiria seu pensamento. Lemos em O que é a Filosofia?: “Os
homens não deixam de fabricar um guarda-sol que os abriga, por baixo do qual
traçam um firmamento e escrevem suas conversações, suas opiniões; mas o poeta, o
artista, abre uma fenda no guarda-sol, rasga até o firmamento, para fazer passar um
pouco do caos livre e tempestuoso e enquadrar, em uma luz brusca, uma visão que
aparece atrás da fenda, primavera de Wordsworth ou maçã de Cézanne, silhueta de
Macbeth ou de Ahab, segue a massa dos imitadores, que remendam o guarda-sol, com
uma peça que parece vagamente com a visão; e a massa dos glosadores que
preenchem a fenda com opiniões: comunicação.”

E é assim que a Filosofia, como lugar de criar conceitos, se força a cruzar com outros
personagens, aqueles da Arte a quem Deleuze e Guattari chamam de “seres de
sensação”, que acabam tornando sonoros, visuais, táteis, cheios de movimento os
conceitos filosóficos. E arrastam a Filosofia para onde ela não só é forçada a pensar
como ainda dançar e cantar. Tendo feito o seu ritornelo, imaginado uma primeira
canção, um primeiro conceito, imaginado todos seus amigos e debatedores, o filósofo
segue a viagem solitária, viagem longa, no entanto, viagem no mesmo lugar: a linha
de fuga que a Filosofia encontra na Arte. Esta, um dos ritornelos de Deleuze, que o
leva para longe da opinião, para longe da comunicação: “Nenhuma relação entre a
obra de arte e a comunicação.” A Arte, aquele ponto no futuro no qual a Filosofia
busca suas novas linhas de conexão.

https://revistacult.uol.com.br/home/dialogos-entre-filosofia-e-arte/ 4/8
05/11/2019 Diálogos entre Filosofia e Arte - Revista Cult

Silvio Ferraz é compositor, professor no Depto. de Música da Unicamp e autor de


Música e repetição (Educ, 1998) e Livro das sonoridades (Ed.7Letras, 2005)

Annita Costa Malufe é poeta, doutoranda no Instituto de Estudos da Linguagem da


Unicamp e autora de Fundos para dias de chuva, poemas (Ed.7Letras, 2004) e Territórios
dispersos: a poética de Ana Cristina Cesar (Annablume, 2006)

D E I X E O S E U CO M E N TÁ R I O
Você precisa fazer o login (https://revistacult.uol.com.br/home/wp-login.php?itsec-hb-
token=painel-
cult&redirect_to=https%3A%2F%2Frevistacult.uol.com.br%2Fhome%2Fdialogos-entre-
filosofia-e-arte%2F) para publicar um comentário.

Novembro

LEIA

(HTTPS://REVISTACULT.UOL.COM.BR/HOME/CAT

EGORIA/EDICOES/CULT-251-PARENTALIDADE/)

ASSINE

(HTTPS://WWW.CULTLOJA.COM.BR/CATEGORIA-

PRODUTO/REVISTA-

CULT/EDICOES/ASSINATURA/)

COMPRE
(https://revistacult.uol.com.br/home/categoria/edico
es/cult-251-parentalidade/) (HTTPS://WWW.CULTLOJA.COM.BR/PRODUTO/C

ULT-251-PARENTALIDADE-NOVEMBRO-2019/)

https://revistacult.uol.com.br/home/dialogos-entre-filosofia-e-arte/ 5/8
05/11/2019 Diálogos entre Filosofia e Arte - Revista Cult

(https://revistacult.uol.com.br/ (https://revistacult.uol.com.br/ (https://revistacult.uol.com.br/


home/categoria/edicoes/cult- home/categoria/edicoes/cult- home/categoria/edicoes/cult-
250-dossie-suicidio/) 249-psicanalise-no-brasil/) 248-paulo-leminski/)

V E R TO DA S + ( H T T P S : / / R E V I S TAC U L T. U O L . CO M . B R / H O M E / E D I CO E S )

ARTIGOS RELACIONADOS

O CINEMA E O CLICHÊ EM GILLES DELEUZE

CONCEITOS DE DELEUZE EM ‘MIL PLATÔS’ SÃO LEVADOS AO PALCO POR COMPANHIA DE SP

GILLES DELEUZE E A UTOPIA IMANENTE

DELEUZE, ESQUIZOANALISTA

DELEUZE E NÓS

TV CULT

TV CULT | O que é fascismo, com Vladimir Safatle

https://revistacult.uol.com.br/home/dialogos-entre-filosofia-e-arte/ 6/8
05/11/2019 Diálogos entre Filosofia e Arte - Revista Cult

(https://revistacult.uol.com.br/home/lugar-de-fala-cult/)

(https://revistacult.uol.com.br/home/onde-vende-revista-cult/)

(https://www.sescsp.org.br/programacao/207729_GOLD+MINA+DE+OURO+SERRA+PELADA?utm_source=CULT)

(https://masp.org.br/exposicoes/anna-bella-geiger)

TWITTER

https://revistacult.uol.com.br/home/dialogos-entre-filosofia-e-arte/ 7/8
05/11/2019 Diálogos entre Filosofia e Arte - Revista Cult

Tweets por @revistacult


Revista CULT
@revistacult
Cult 251 | Condições, impasses e saídas no exercício da parentalidade em nossa época para além da relação
mãe-bebê, tão insistente quanto dissimuladora

Leia a íntegra da apresentação do nosso dossiê de Novembro, por @vera_iaconelli bit.ly/32i5dr2

Foto: Afonso Pimenta

Incorporar Ver no Twitter

(https://revistacult.uol.com.br/home/)

EDIÇÕES (HTTPS://REVISTACULT.UOL.COM.BR/HOME/EDICOES/)

DOSSIÊS DIGITAIS (HTTPS://WWW.CULTLOJA.COM.BR/CATEGORIA-PRODUTO/REVISTA-CULT/DOSSIES-DIGITAIS/)

COLUNISTAS (HTTPS://REVISTACULT.UOL.COM.BR/HOME/COLUNISTAS/)

SEÇÕES (HTTPS://REVISTACULT.UOL.COM.BR/HOME/NOSSAS-SECOES/)

ANUNCIE (HTTPS://REVISTACULT.UOL.COM.BR/HOME/ANUNCIE/)

CONTATO (HTTPS://REVISTACULT.UOL.COM.BR/HOME/CONTATO/)

SOBRE (HTTPS://REVISTACULT.UOL.COM.BR/HOME/SOBRE/)

Pç. Santo Agostinho, 70 | 10º andar | Paraíso


São Paulo, SP | CEP 01533-070
Tel.: (11) 3385-3385

Copyright © 2019 Editora Bregantini. Todos os direitos reservados.


(http://www.bigfishmedia.com.br)

https://revistacult.uol.com.br/home/dialogos-entre-filosofia-e-arte/ 8/8

Você também pode gostar