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Agnósticos e ateus têm feito muito barulho nos últimos anos, apesar de seus

sistemas de crenças serem obviamente muito falhos. Para combater a


propaganda deles, precisamos de livros que exponham quão frágeis são os
seus argumentos. Jeffrey Johnson escolheu a palavra “absurdo” para
caracterizá-los, e escolheu bem. Capítulo por capítulo, ele despoja a
incredulidade de qualquer vestígio de credibilidade e depois mostra com
clareza cristalina por que o caso bíblico a favor de Deus permanece supremo
quando contrastado com todos os outros sistemas de crenças filosóficas e
religiosas. Prevejo que esse livro será uma ajuda tão grande para muitos de
seus leitores quanto o foi para mim, e o recomendo com fervor.
— John Blanchard, autor de Does God Believe in Atheists?

A Bíblia não apenas afirma haver um credo ateu. Ela também nos fornece
uma avaliação desse credo: “Disse o néscio no seu coração: Não há Deus”
(Salmo 14:1). Em seu novo livro O Absurdo da Incredulidade, Jeffrey
Johnson demonstra habilmente que o escritor das Escrituras não está
proferindo insultos nem praticando ad hominem. Pelo contrário, como
Johnson mostra, a Bíblia está simplesmente dizendo a verdade. Rejeitar o
Deus triuno das Escrituras e substituí-lo por uma cosmovisão não bíblica é
profundamente irracional! Como Johnson defende essa tese (e afirmação
bíblica)? Primeiro, argumenta que as crenças humanas não são neutras, mas
são, de certa forma, tendenciosas e pré-condicionadas. Em seguida, passa a
expor, por meio de reductio ad absurdum, a irracionalidade das principais
filosofias das religiões não bíblicas do mundo. Por fim, expõe
cuidadosamente os argumentos e as evidências da veracidade do cristianismo,
e conclui com um sincero e humilde apelo para que o leitor incrédulo receba
o Evangelho de Jesus Cristo, o único que pode restaurar o verdadeiro
significado do mundo, e no qual está a verdadeira sabedoria de Deus. O
Absurdo da Incredulidade desafiará o ceticismo do incrédulo e confirmará a
fé do crente. Eu o recomendo altamente!
— Robert R. Gonzales Jr., autor de Where Sin Abounds
O novo livro de Jeffrey Johnson, O Absurdo da Incredulidade, demonstra o
absurdo da maioria das cosmovisões que se apresentam como verdade —
naturalismo, relativismo, ateísmo, existencialismo, panteísmo, materialismo e
as demais. Ele examina claramente as premissas de cada sistema de
pensamento e demonstra as suas muitas contradições. Sua erudição e
entendimento histórico de todo o campo da filosofia e das outras, assim
chamadas, religiões são evidentes ao longo do livro. Ele fez um trabalho
magistral ao mostrar que a cosmovisão cristã é o único sistema que atenderá a
todas os testes da lógica e da ética. Ele conclui essa excelente obra com um
apelo emocionante para que nos submetamos ao Deus das Escrituras, quem
nos deu o seu filho, Jesus Cristo, o qual nos purificará de todo o nosso pecado
e culpa. Confiar em qualquer uma das outras posições filosóficas ou
religiosas que se recusam a aceitar a oferta graciosa de salvação de Deus é
realmente um absurdo!
— Curtis C. Thomas, autor de Practical Wisdom for Pastors

Enquanto os cristãos se esforçam para manter o semblante de sanidade em


meio ao colapso da moralidade e do pensamento ocidentais, temos a
obrigação de apresentarmos um fundamento sólido sobre o qual
permaneçamos a fim de explicar continuamente a nossa indisposição de
dobrarmos os nossos joelhos diante de César. Em O Absurdo da
Incredulidade, Jeffrey Johnson fornece um argumento claro e convincente
para a fé cristã, cuja leitura deverá ser útil tanto para crentes quanto para
incrédulos.
— James R. White, Diretor do Ministério Alpha and Omega
Título Original
The Absurdity of Unbelief:
A Worldview Apologetic of the Christian Faith

Por Jeffrey D. Johnson



Copyright © 2015 Jeffrey D. Johnson. Todos os direitos reservados.

Publicado por Free Grace Press
1455 Champions Rd.
Conway, AR, 72034. United States.
freegracepress.com

Copyright © 2020 Editora O Estandarte de Cristo
Francisco Morato, SP, Brasil

1ª edição em português: 2020.

Todos os direitos em língua portuguesa reservados por Editora O Estandarte de Cristo.
Proibida a reprodução por quaisquer meios, salvo em breves citações, com indicação da
fonte.

Salvo indicação em contrário e leves modificações, as citações bíblicas usadas nesta
tradução são da versão Almeida Corrigida Fiel | ACF • Copyright © 1994, 1995, 2007,
2011 Sociedade Bíblica Trinitariana do Brasil.

Tradução: William e Camila Rebeca Teixeira
Revisão: William Teixeira
Capa: Scott Schaller (scottschallerdesigns.com)
Adaptação da Capa: William Teixeira
Sumário
Prefácio

PARTE 1 | A Natureza da Incredulidade


1 | A Fé Não é Cega
Separando a Razão da Fé
Conclusão
2 | A Fé Não é uma Experiência
Søren Kierkegaard
Immanuel Kant
Friedrich Schleiermacher
Karl Barth
Rudolf Bultmann
Paul Tillich
Gordon Kaufman
Conclusão
3 | A Fé Não é Irracional
A Fé Não é Irracional
A Fé Não é Ilógica
A Fé Confia em Deus
Conclusão

PARTE 2 | O que Molda as Crenças


4 | Moldados pelo Interesse Próprio
O Homem Não é Neutro
A Natureza do Homem Controla os seus Valores
A Natureza do Homem Controla o seu Comportamento
A Natureza do Homem Controla as suas Emoções
A Natureza do Homem Controla as suas Crenças
A Natureza do Homem Deve Mudar ou as Crenças Não Mudarão
5 | Moldados por Verdades Autoevidentes
O Fair Play é Autoevidente
A Lógica é Autoevidente
Deus é Autoevidente
Conclusão
6 | Moldados pela Consciência
Por que o Conhecimento é Possível
Em Guerra Contra Deus e Contra Nós Mesmos
Conclusão
7 | Moldados por Nossa Cosmovisão
Todos Têm uma Cosmovisão
Crenças são Interconectadas
Conclusão
8 | Moldados por Três Perguntas Fundamentais
Todo Sistema é Formado por Três Questões Fundamentais
1. O que é Real?
2. Como Sabemos?
3. Quem Determina o que é Certo?
Conclusão
9 | Moldados pelos Nossos Pressupostos
A Relação entre Deus, Conhecimento e Ética
A Necessidade de Pressupostos
O Sistema Controla o Veredicto
O Pressuposto Controlador
Conclusão
PARTE 3 | Como Testar as Crenças
10 | A Coerência é Obrigatória
A Veracidade de Qualquer Sistema Depende de sua Coerência
Nós Todos Devemos Começar em Algum Lugar
É Necessário Permanecer Fiel
Conclusão

PARTE 4 | O Absurdo da Incredulidade


11 | A Irracionalidade do Naturalismo
A Irracionalidade do Materialismo
A Irracionalidade do Big Bang
Conclusão
12 | A Irracionalidade da Evolução
Não Confunda Microevolução com Macroevolução
A Evolução Contraria a Lei da Biogênese
A Evolução Contraria o Princípio Reprodutivo
A Evolução Contraria o Princípio do Irredutivelmente Complexo
A Evolução Não Consegue Explicar a Consciência
A Evolução Não é Apoiada pelos Registros Fósseis
A Evolução é Baseada em uma Cosmovisão Naturalista, Não em Ciência
Conclusão
13 | A Irracionalidade do Empirismo e Determinismo
A Irracionalidade do Empirismo
A Irracionalidade do Determinismo
Conclusão
14 | A Irracionalidade do Relativismo e do Niilismo
A Irracionalidade do Relativismo
Irracionalidade do Niilismo
Conclusão
15 | A Irracionalidade do Existencialismo
O Absurdo de Jaspers e Sartre
O Absurdo de Friedrich Nietzsche
O Absurdo do Existencialismo
Conclusão
16 | A Irracionalidade do Pós-Modernismo
A Ascensão do Pós-Modernismo
A Chegada do Pós-Modernismo
O Desespero do Pós-Modernismo
Conclusão
17 | A Irracionalidade de Todas as Religiões Não Teístas
O Absurdo do Sobrenaturalismo Impessoal
Hinduísmo
Jainismo
Budismo
Outras Religiões Místicas
A Inconsistência de um Deus Incognoscível
A Inconsistência de Confundir Deus com a Natureza
Uma Força Cega e Ininteligente
Panteísmo
Panenteísmo
Politeísmo
Transcendência e Imanência Confundidas
Conclusão
18 | A Irracionalidade do Islamismo e do Judaísmo
A Inconsistência de um Deus Injusto
A Inconsistência de um Deus Monístico
O Problema da Justiça
O Problema do Amor
O Problema dos Relacionamentos
O Problema da Comunicação
Conclusão
19 | A Irracionalidade das Religiões Não-Trinitárias
O Problema de “Um” e de “Muitos”
O Problema da Diferenciação
O Problema do Movimento
O Problema do Pensamento e das Emoções
O Problema da Consciência
O Problema da Revelação Divina
O Problema da Criação
O Problema da Transcendência e Imanência
Conclusão
20 | A Irracionalidade de Monismo
A Solução para as Diferenciações
A Solução para a Revelação Divina
A Solução para os Pensamentos e as Emoções
A Solução para os Relacionamentos
A Solução para um Universo Separado
A Solução para a Transcendência e a Imanência de Deus
Conclusão

PARTE 5 | Os Fundamentos da Crença


21 | Apoiada pela Coerência
Deus é Bom
Deus é Todo-Poderoso
Compatibilidade
Conclusão
22 | Apoiada pela Razão e pela Evidência
Apoiada pela Razão
Apoiada pela Evidência Científica
Conclusão
23 | Apoiada pelo Registro Histórico
Conclusão
24 | Apoiada pela Experiência
A Praticidade da Cosmovisão Cristã
A Impossibilidade de uma Rejeição Total da Cosmovisão Cristã
Conclusão
25 | Apoiada pela Revelação
Obras Divinas
Palavras Divinas
26 | Apoiada pela Iluminação
A Luz Divina
A Fé Divina
O Amor Divino
O Conhecimento Divino
Conclusão

PARTE 6 | O Chamado para Crer


27 | O Gracioso Chamado para a Rendição
Culpa: Um Problema Universal
Justiça: Uma Certeza Universal
Perdão: Uma Oferta Universal
Bibliografia
Prefácio
O cristianismo não precisa de uma apologética, e é por isso que ele possui
uma apologética irrefutável. A palavra apologética significa defesa ou
argumento racional em favor de uma posição específica. O cristianismo é
defensável porque não precisa de defesa. Visto que o cristianismo é
verdadeiro, a sua veracidade pode ser demonstrada racional e empiricamente.
Um cético pode negar que 2 + 2 = 4, mas como 2 + 2 é igual a 4, o
matemático tem certeza de que a resposta à equação é racionalmente
defensável e facilmente demonstrável. Como os pressupostos centrais por trás
da cosmovisão bíblica são evidentes e prováveis em si mesmos, essa é a
única cosmovisão que pode ser defendida de modo irrefutável. Assim como
alguém parecerá tolo ao negar que 2 + 2 = 4, assim também uma pessoa
precisará se tornar irracional para atacar o Deus da Bíblia.
Dito isso, você tem o direito de conhecer meus pressupostos iniciais.
Eu não apenas começo a minha defesa pela cosmovisão cristã e afirmando
que creio nas pressuposições fundamentais por trás da cosmovisão cristã, mas
escrevo com ousadia e certeza que todos os meus leitores, incluindo você,
creem nas pressuposições fundamentais da cosmovisão cristã. Deus escreveu
esses pressupostos, que incluem as leis da lógica, as leis da moralidade e o
conhecimento de Deus, nas consciências de todas as pessoas.
Ninguém pode negar as leis da lógica ou da ética sem que, no processo,
faça uso das leis da lógica e da ética. Se alguns dizem que não se importam
com a lógica, também devem dizer que não se importam em parecerem
absurdos. Então por que alguém os levaria a sério? Se alguns não se
importam em ser éticos, por que alguém confiaria neles quando admitem que
mentir é bom? Pelo fato de que, como seres humanos, todos buscam utilizar a
lógica e a ética na argumentação, logo todos testemunham a existência de
Deus, pois sem Deus não há fundamento para a lógica ou para a ética (como
veremos). Sem Deus, não há sentido, verdade, padrão racional ou ético.
Embora alguns possam dizer que não creem nessas coisas, nossas vidas e
conversas provam o contrário.
Em outras palavras, não acredito em ateus intelectuais mais do que
acredito que os relativistas levam o relativismo a sério. Claro, há muitos que
se dizem ateus, porém estou convencido de que eles sabem, no fundo, que
estão mentindo para si mesmos. Certamente, há muitos que se apegam ao
pensamento relativista, mas isso não significa que eles realmente pensem que
é bom que os outros os trapaceiem, enganem, explorem ou matem. Não
importa o quão pós-modernos e de mente aberta muitos possam imaginar que
são, eles não conseguem deixar de ficar irritados quando os outros se
aproveitam deles. Então, não, eu não acredito em ateus ou relativistas.
Sabendo que essa é uma maneira ousada de apresentar um livro sobre
apologética cristã, eu apenas o desafiaria a tentar permanecer honesto consigo
mesmo ao ler este livro. Se você é um ateu ou cético autodeclarado, observe
se você pode ser honesto com a sua consciência e continuar negando a
existência de Deus. É um desafio que estou convencido de que nem você nem
ninguém mais pode enfrentar.
Espero que todos os céticos do cristianismo leiam este livro, não
porque sinto que escrevi o melhor livro sobre o assunto, mas porque estou
convencido de que o cristianismo é verdadeiro. Ele é a única visão de mundo
que é intelectualmente e praticamente defensável. Quando você está do lado
do argumento que afirma que 2 + 2 = 4, não é difícil estar confiante.
Escrevo com certeza e coragem, mas isso não significa que este livro
certamente faça qualquer incrédulo rejeitar a sua incredulidade e dobrar os
joelhos diante do senhorio de Cristo. Embora eu esteja convencido de que o
cristianismo é correto e defensável, não estou convencido de que isso seja
suficiente para convencer os céticos incrédulos. Só porque estou convencido
de que o cristianismo está certo não significa que tenho certeza de que vou
convencê-lo a confiar em Cristo.
O problema da incredulidade, como explico na PARTE 2, não é a falta
de evidência ou justificativa racional. A incredulidade se deve à falta de
apreço pela verdade. A fé em Cristo requer mais do que apenas conhecimento
intelectual acerca dele; requer um amor por Cristo que vem somente pela
iluminação do Espírito (como veremos no capítulo 26). Isso é algo que vai
além do alcance da apologética, pois somente Deus pode se revelar para nós
de tal maneira que nos tornemos dispostos a abrir mão de tudo o que temos
para segui-lo.
Embora eu não possa ter certeza de que este livro terá algum valor
eterno para os incrédulos, posso escrever com o conhecimento de que a
apologética é de grande valor para aqueles que já amam o Senhor Jesus. De
certa forma, a apologética é mais útil para os crentes do que para os
descrentes. Isso pode parecer estranho, uma vez que os crentes já têm fé em
Cristo. Mas, assim como o Evangelho é continuamente benéfico para os
crentes, a apologética cristã é útil para fortalecer e encorajar a fé daqueles que
já creem — especialmente se tivermos uma apologética bíblica, “de sorte que
a fé é pelo ouvir, e o ouvir pela palavra de Deus” (Romanos 10:17).
Meu objetivo, portanto, não é instruir o leitor sobre como praticar
apologética, ou discutir as diferenças entre as várias abordagens apologéticas,
mas realizar uma apologética. Não estou simplesmente buscando defender a
cosmovisão cristã das críticas externas, mas sim fazer um ataque direto contra
todas as formas de incredulidade.
Como a cosmovisão cristã é o único sistema de pensamento que é
coerente consigo mesmo, todas as outras cosmovisões possíveis são
inerentemente incoerentes. Não é o suficiente que um ateu ou qualquer outro
cético simplesmente ataque os muros da cosmovisão cristã. Eles também
devem defender o seu próprio território. Eles devem proteger os seus próprios
pressupostos e sistemas de crenças.
Meu objetivo é mostrar que o castelo da incredulidade está edificado
sobre areia movediça, e quanto mais os incrédulos lutam para defender a sua
cosmovisão, mais afundam sob o peso dela. Ateísmo, deísmo, naturalismo,
relativismo, existencialismo, panteísmo, politeísmo e qualquer outro ismo não
cristão, juntamente com o judaísmo e o islamismo, são incoerentes e,
portanto, racionalmente indefensáveis.
Então, vamos nos preparar para a batalha e ver qual visão de mundo é
digna de ser crida. Entretanto, antes de saltarmos para a névoa do campo de
batalha gostaria de agradecer a algumas pessoas importantes por sua ajuda.
Nenhum de nós luta sozinho, e este livro não foi o esforço de uma única
pessoa.
Quero começar agradecendo a Nathan Berry por seu incentivo para que
eu permanecesse na batalha. Sem suas palavras amáveis, o manuscrito não
teria saído do primeiro rascunho. Obrigado!
Também quero citar Brandon Burks e Mike Cantrell por
providenciarem meios para fortalecer ainda mais essa defesa. Com formação
em teologia e filosofia, respectivamente, eles foram capazes de dar um
feedback útil, o que, sem dúvida, melhorou a apresentação geral desta obra.
Robert Gonzales Jr. não apenas deu o seu aval, como também leu o
manuscrito com atenção e fez correções editoriais. Ele foi mais do que útil.
Obrigado, irmão. Dizer “obrigado” a Kathy Bland não me parece ser o
suficiente. Ela não apenas dedicou o seu tempo para editar o manuscrito,
como também ajudou a trazer muita clareza à linha de argumentação.
Thom Cole se tornou um bom amigo no processo de escrita deste livro.
Thom, obrigado por toda a sua ajuda, mas acima de tudo, obrigado por sua
genuína bondade e amizade. Que nosso Deus da aliança os abençoe
ricamente. Meu parceiro e colega de blog, Keith Throop, tem sido um grande
incentivo e bênção para mim. Este livro não estaria em sua forma atual sem
os seus labores sacrificiais. Obrigado!
Por fim, desejo expressar minha gratidão a Matt Millsap. Agradeço à
sua sabedoria e sua disposição de investir um pouco do seu tempo nesse
projeto. Obrigado por disponibilizar seus ouvidos para me ouvir sobre esse
assunto. Sou grato por ser seu pastor e oro pela contínua bênção do Senhor
sobre você e sua esposa, Katie.
Minha oração é que este livro seja usado por Deus para desafiar todas
as formas de incredulidade, tanto no crente quanto no incrédulo. A ele seja a
glória!
PARTE 1

A Natureza da Incredulidade

“De sorte que a fé é pelo ouvir,


e o ouvir pela palavra de Deus” (Romanos 10:17)
1

A Fé Não é Cega

“Em nome de Jesus!”. Essa foi a declaração que saiu da boca do motorista
desorientado ao fechar os olhos e sair rumo ao trânsito intenso. Para alguns,
isso foi um ato de fé — um salto cego na escuridão. Infelizmente, esse
motorista insensato, que tinha uma noção equivocada da fé, pode ser uma
pessoa real. Porém, ainda mais assustadora é a realidade de que ele não está
sozinho em sua compreensão da fé.
Existem tantas visões não bíblicas acerca da fé que se tornou difícil
discernir como a verdadeira fé é. É comum pensar que a fé é um
conhecimento que existe entre a certeza e a dúvida. A fé não é dúvida plena,
mas também não é certeza. Se tivéssemos certeza, não precisaríamos de fé
para crer. Nas palavras de Paul Tillich (1886-1965), um dos teólogos liberais
mais influentes, “a fé inclui tanto a si mesma quanto a dúvida de si mesma”.
[1]

Pensa-se que a fé até pode não ser completamente irracional, mas nem
sempre ela é baseada na razão. Da mesma forma que as crianças tendem a
acreditar em superstições, como OVNIs, o Pé Grande e o monstro do Lago
Ness, a fé em Deus exige que nos tornemos como crianças e desliguemos
nosso senso da realidade. De que outra forma poderemos acreditar nos
milagres sobrenaturais de Cristo, se não dermos um salto de fé? A fé na
divindade e ressurreição de Cristo é algo um pouco forçado. Somente pela fé
superamos a dúvida que decorre da razão e da experiência. É como se
dissessem: Eu não tenho motivos racionais ou empíricos para crer que essa
cadeira existe, e tenho ainda menos certeza de que ela poderá aguentar o meu
peso; contudo, pela fé sou capaz de dar um salto na escuridão e me sentar. A
fé, de acordo com esse modo de pensar, é cega. E a evidência pode até
mesmo contradizer a fé. Segundo o ateu Richard Dawkins, a fé é “a confiança
cega na ausência de evidências, e mesmo diante de evidência clara”.[2] Ou, se
evidências ou justificativas fossem necessárias, como alguns diriam, não
haveria necessidade de ter fé. A fé é um salto na escuridão, pois, afinal, é isso
que significa “andar pela fé e não pela vista”.
Separando a Razão da Fé
Parece que grande parte da confusão se concentra na relação entre fé e
razão. Há um esforço, começando por aqueles que pregam que a fé é
contrária à razão até aqueles que afirmam que a fé é independente da razão,
para separar a razão da fé.
Um exemplo de alguém que separou a razão da fé é o pseudo-Dionísio,
o Areopagita. Dionísio foi o místico cristão mais influente do século V, e
provavelmente durante toda a Idade Média. Ele construiu a sua teologia
mística sobre a ideia de que Deus é inefável (isto é, completamente
incognoscível). Dionísio afirmou que Deus transcende todo pensamento e
está além de qualquer comparação humana: “Se todos os ramos do
conhecimento pertencem às coisas que existem, e se os seus limites têm
referência ao mundo existente, então o que está além de todo ser também
deve ser transcendentemente acima de todo conhecimento”.[3]
Dionísio continuou alegando que não havia um conceito cognoscível
que pudesse descrever corretamente Deus. “Não devemos ousar falar, ou
mesmo formar alguma concepção, da divindade superessencial oculta”.
Outrossim, ele disse: “Aquele que está além do pensamento ultrapassa a
apreensão do pensamento, e o Deus que está além da expressão ultrapassa o
alcance das palavras”.[4] E visto que Deus não pode ser descrito pelo uso de
qualquer linguagem compreensiva, é melhor entender Deus pelas coisas que
ele não é (Via Negativa, também conhecida como teologia apofática).
O que Deus não é? Em primeiro lugar, Deus não é uma pessoa. O
homem é um ser pessoal; o homem é pessoal porque pode ser distinguido de
outras pessoas. A personalidade, portanto, é algo finito, algo separado do
todo e algo distinguível. Deus, no entanto, é infinito, simples e absoluto.
Deus transcende todas as formas de separação; Deus é Unidade. Assim, Deus
está além da personalidade; Ele é “Super-Pessoal”, como Dionísio costumava
dizer.
Em segundo lugar, de acordo com Dionísio, uma vez que Deus é
Unidade, Ele nem mesmo é um ser consciente. Por quê? Porque a consciência
implica um estado de pensamento, e o pensamento implica autoconsciência.
A autoconsciência não pode acontecer sem que um objeto pensante faça uma
distinção entre os seus pensamentos e o que está sendo pensado. Assim, há
uma separação, pelo menos na mente, entre o sujeito pensante e o objeto do
pensamento. Entretanto, em Deus não pode haver diferenciação ou divisões.
Em terceiro lugar, à medida que avançamos na cadeia do absurdo, Deus
sequer existe. Nas palavras de Dionísio: “Ele não foi, nem será, nem entrou
no processo da vida, nem entrará, nem jamais o fará, ou melhor, nem sequer
existe”.[5] Por quê? Segundo Dionísio, a palavra existência implica uma
distinção entre o que existe e o que não existe. Deus está além de todas as
distinções. Deus é Unidade.
Em quarto lugar, Dionísio chegou ao ponto de minar o fundamento de
todo o seu argumento. A razão pela qual Deus não é uma pessoa, um ser
consciente ou mesmo um ser que existe é que Ele é a Unidade absoluta.
Segundo Dionísio, Unidade é a única palavra que melhor descreve Deus.
Deus é um, porque ele é simples, ele é sem divisões ou limitações. Deus
transcende todos os limites. Contudo, segundo Dionísio, mesmo a palavra
unidade fica infinitamente aquém quando empregada para definir Deus.
Embora possa ser o melhor termo humano para ajudar a impulsionar nossas
mentes para fora da escuridão desconhecida do nada, ele permanece
inadequado para nos levar a qualquer conhecimento verdadeiro do
Incognoscível. O termo unidade falha porque implica uma distinção e
separação daquilo que é plural ou dividido. Deus não é um nem muitos — Ele
transcende os dois. Assim, Deus (se é que ele pode ser chamado de Deus
neste momento) não é sequer Unidade. Ele é, como Dionísio afirmou,
“Super-Unidade”.
Então, por fim, Deus está além da essência, consciência, vida,
existência e unidade, porque ele é absoluto e infinito. No entanto, porque
Deus é inefável, ele também está além de ser absoluto e infinito. Deus
transcende todas as palavras humanas, até mesmo a palavra transcendência.
Se Dionísio está correto, o que resta? Nada. Dionísio, de uma maneira
absurda, deseja nos fazer crer em um Deus incognoscível que sequer existe.
A negação mística de Dionísio influenciou grandemente outros
místicos medievais, como Bernardo de Claraval (1090-1153), Francisco de
Assis (1182-1226) e Boaventura (1221-1274). Por exemplo, Boaventura, em
seu livro The Journey of the Mind to God, baseou-se fortemente nos escritos
de Dionísio. Ele começou esse livro com as seguintes palavras:
Portanto, Dionísio em sua “Teologia Mística”, desejando nos instruir
acerca daquelas ações transcendentes da alma, estabelece a oração
como a primeira condição… Por essa oração, somos levados a
discernir os graus da ascensão da alma em direção a Deus. Pois, na
condição atual, esse universo de coisas é uma escada pela qual
podemos ascender a Deus.[6]
Como alguém ascende a Deus? Depois de contemplar o que é revelado,
é preciso, então, começar a contemplar o que não é revelado:
Ó amigo, busque com ousadia a visão mística, abandone a obra dos
sentidos e as operações das faculdades racionais, deixe de lado todas
as coisas visíveis e invisíveis, existentes e não existentes, e se apegue
tanto quanto possível e imperceptivelmente, à unidade daquele que
transcende todas as essências e todo conhecimento.[7]
Alguns anos depois, Meister Eckhart (1260-1328) explicou a maneira
prática de iniciar experiências místicas de atividade irracional. Ele declarou:
“‘Não devemos orar, ler ou ouvir um sermão…? Não!’, respondeu Eckhart,
‘Você pode ter certeza de que o silêncio e a ociosidade perfeitos são o melhor
que você pode fazer. Devo ficar na escuridão?’”, Eckhart respondeu, “Sim,
de fato. Você não poderia fazer nada melhor do que ir para onde está escuro,
ou seja, a inconsciência”.[8]
Conclusão
Dionísio e os místicos que o seguiram queriam que confiássemos em
nada. A teologia mística remove nossa necessidade de ter fé no Deus da
Bíblia. A fé nas reivindicações da verdade da Bíblia não é necessária. Por
quê? Porque Deus não pode ser conhecido pelas reivindicações da verdade. A
única coisa que pode nos conectar com Deus, se ele pode ser chamado de
Deus, é uma experiência mística inconsciente. Isso é realmente um salto cego
na escuridão.

2
A Fé Não é uma Experiência

Em vez de a fé ser um salto cego na escuridão, para outros, ela é mais como
uma experiência espiritual ou transcendental que leva uma pessoa a aceitar o
que de outra forma seria inacreditável. A fé é a causa ou o efeito de um
encontro sobrenatural com o Divino. Embora essa experiência espiritual
transcenda os poderes racionais da mente e os sentidos empíricos do corpo,
ela não pode ser negada por aqueles que creem. Deus é real, pelo menos para
aqueles que o experimentam.
Søren Kierkegaard
Podemos ver traços dessa noção de fé nos escritos de Søren
Kierkegaard (1813-1855).
Kierkegaard, o pai do existencialismo, ficou indignado com o
formalismo da Igreja Nacional Dinamarquesa. A Igreja da Dinamarca foi
atormentada por dois problemas. O primeiro problema foi que a igreja era
composta, em grande parte, por cristãos nominais. Para receber uma certidão
de nascimento, receber uma licença de casamento e ser enterrado no
cemitério da igreja, uma pessoa precisava ser registrada e batizada na igreja.
Essa união entre estado e igreja pode ter aumentado o número de membros
desta, mas também a encheu de incrédulos. Embora a Bíblia fosse pregada e
o catecismo de Lutero fosse memorizado, a fé pessoal e experimental em
Cristo não era mais necessária para ser cristão. Kierkegaard ficou alarmado
com a falta de fé pessoal e experimental dos membros da igreja.
A segunda preocupação para Kierkegaard foi a onda de racionalismo
que varria a Alemanha e a Dinamarca. O racionalismo inundou as
universidades e, quando a onda baixou, acabou entrando na igreja pela porta
dos fundos. Como consequência dessa tempestade, o texto bíblico foi
despojado de todos os seus elementos sobrenaturais. De uma rejeição da
inspiração divina até uma rejeição dos milagres registrados, o racionalismo
da alta crítica alemã neutralizou completamente o aspecto sobrenatural da
Bíblia. A preocupação de Kierkegaard era que sem uma religião sobrenatural
os cristãos não seriam mais obrigados a ter uma fé sobrenatural em um Deus
sobrenatural. Os não crentes eram acrescentados à igreja estatal ainda em sua
incredulidade e nunca eram chamados a crer em um Deus sobrenatural depois
disso. A igreja parecia ter perdido completamente a fé.
Immanuel Kant
Como isso aconteceu? Na geração que precedeu Kierkegaard,
professores de teologia e pastores foram grandemente influenciados pelos
escritos de Immanuel Kant (1724-1804).
Kant cria que todo conhecimento começa com a experiência:
Que todo o nosso conhecimento começa com a experiência, não resta
dúvida. Pois como é possível que a faculdade da cognição deva ser
despertada para o exercício, a não ser por meio de objetos que afetam
nossos sentidos e que, em parte, por si mesmos produzam
representações, e, em parte, despertem nossas capacidades de
entendimento para a ação, a fim de comparar, conectar ou separá-los
e, assim, converter a matéria-prima de nossas impressões sensoriais
em um conhecimento dos objetos, o que chamamos de experiência?
Com relação ao tempo, portanto, nenhum conhecimento nosso é
antecedente à experiência, mas começa com ela.[9]
O conhecimento começa com a experiência, mas a experiência é
restringida pelas limitações dos sentidos. Por exemplo, nossos olhos só
conseguem captar o que são capazes de ver; nossos ouvidos só podem ouvir
as ondas sonoras que nossos tímpanos são capazes de detectar; nossa língua
só pode provar aquilo que o paladar é capaz de sentir; nossos dedos só podem
sentir as texturas que nossos mecanorreceptores e nervos musculares são
capazes de perceber; e nosso nariz só consegue cheirar os aromas que podem
ser detectados pelos neurônios receptores olfativos. E se houver outros
aromas, cenas e sons que somos incapazes de perceber? Quem pode dizer que
a realidade não consiste em outras dimensões e propriedades? Quem pode
dizer que se tivéssemos um sexto sentido, não teríamos um conhecimento
adicional do universo? Cada um dos cinco sentidos só consegue perceber de
acordo com suas habilidades; então, quem pode dizer que nossos sentidos
estão corretos e detectando plenamente o que é real?
Além das limitações dos sentidos, antes que as sensações recebidas
sejam processadas, classificadas e catalogadas pela mente, elas são meros
fragmentos de estímulos desorganizados e indiscerníveis. Como a confusão
de um quebra-cabeça de 500 peças antes de ser montado, as meras sensações
vindas do mundo externo não fazem sentido sem que a mente processe e una
essas peças desordenadas.
As sensações precisam ser organizadas e processadas para que o
conhecimento seja alcançado. Embora o conhecimento comece pela
experiência, somente a experiência não nos fornece conhecimento. Para
construir o conhecimento, a mente deve fornecer à priori os conceitos de
espaço e tempo às sensações recebidas. Isso deve ser assim, visto que modos
de percepção, espaço e tempo não são observados pelos sentidos, pois não
são propriedades do mundo exterior. Espaço e tempo são conceitos
fornecidos pela mente para as experiências sejam sentidas. Somente depois,
quando os conceitos de espaço e tempo são aplicados às sensações, é que elas
se tornam percepções.
No entanto, as percepções ainda não são classificadas como
conhecimento, pois ainda precisam de processamento adicional. As
percepções desconexas devem ser filtradas e devidamente arquivadas nas 12
categorias do entendimento (tais como ideias de causa, unidade, relação
recíproca, necessidade, contingência etc.) antes de formarem o conhecimento.
Em resumo, somente após as sensações serem processadas através dos
conceitos mentais de espaço e tempo é que elas se tornam percepções, e
somente depois é que as percepções são filtradas pelas categorias mentais e
então formam o conhecimento.
Isso implica que a mente não é um tablete de cera passiva que espera
ser moldada e modelada pela experiência, mas sim que a mente é um órgão
ativo que coordena e transforma as sensações caóticas (reunidas pelas
experiências sensoriais do mundo exterior) em ideias. Segundo Kant, sem
que a mente forneça, à priori, esses conceitos para a experiência, o
conhecimento é impossível.[10]
Mas isso tem consequências. Isso significa que ordem e estrutura são
conceitos da mente, e não do mundo. O mundo, tanto quanto sabemos, não
tem nenhuma ordem ou estrutura. Mais importante, isso significa que as leis
da natureza (como a causalidade) são meramente as leis do pensamento. A
mente fornece ordem ao mundo. Em outras palavras, as leis da natureza não
estão na natureza, mas são fornecidas pela mente.
Embora o conhecimento se origine do mundo exterior, o conhecimento
do mundo exterior (como é em si) é incognoscível. Não podemos conhecer o
mundo como ele é, mas apenas como nossas mentes interpretam o mundo.
Segundo Kant, é impossível conhecer a realidade como ela verdadeiramente
é; tudo o que conhecemos com certeza é nossa percepção da realidade. Vendo
que nossas percepções internas são moldadas e organizadas pelas categorias à
priori, o mundo exterior permanece inacessível, protegido por um muro
intransponível. Segundo Kant, só podemos conhecer as coisas conforme elas
se apresentam diante de nós, e não como elas são “em si mesmas”.[11]
Se Kant estava certo, então esse “muro” (conhecido como muro
transcendental), que separa a percepção subjetiva da realidade objetiva, muda
tudo. Se os objetos objetivos do universo, como coisas em si, estão por trás
do muro transcendental, quanto mais um Deus invisível e imaterial
permanece incognoscível? Kant, por incrível que pareça, permaneceu
religioso, pois alegou que achava necessário negar o conhecimento de Deus
para dar lugar à fé em Deus. Mas a fé em Deus não se baseia em nenhum
conhecimento concreto. Como Bryan Magee, em seu livro The Story of
Philosophy, concluiu: “Ele [Kant] demoliu as chamadas ‘provas’ da
existência de Deus e, ao fazê-lo, reduziu aos escombros grande parte da
filosofia de séculos… A partir de Kant, foi aceito quase universalmente por
pensadores sérios que a existência de Deus não é algo que possa ser
provado”.[12]
Friedrich Schleiermacher
Como você pode imaginar, a filosofia de Kant teve um efeito
devastador sobre a igreja, pois destruiu a fé de muitos. Uma dessas pessoas
afetadas negativamente foi Friedrich Schleiermacher (1768-1834), pai da
teologia liberal moderna.
Depois que Schleiermacher deixou a sua família pietista e saiu de sua
casa para estudar na Universidade de Halle, ele começou a estudar a filosofia
de Kant. No processo, Schleiermacher tornou-se cada vez mais cético em
relação às reivindicações sobrenaturais do cristianismo. Ele acabou
escrevendo para o seu pai aflito com estas palavras:
A fé é a prerrogativa real da Divindade, você diz. Ah, querido pai, se
você acredita que sem essa fé ninguém poderá alcançar a salvação no
mundo vindouro, nem a paz neste — e sei que essa é a sua crença —
então ore a Deus que me conceda tal fé, pois eu a perdi. Não consigo
acreditar que aquele que chamava a si mesmo de Filho do homem era
o Deus verdadeiro e eterno; não acredito que a morte dele tenha sido
uma expiação vicária.[13]
Schleiermacher, em parte, abraçou a filosofia de Kant. Se Deus e a
realidade última, como coisas em si mesmas, estão trancados atrás de um
muro transcendental, então não pode haver conhecimento absoluto do Divino.
Isso significa que a Bíblia não poderia ter uma origem divina ou sobrenatural.
Consequentemente, uma vez que o sobrenatural é removido das páginas das
Escrituras, os milagres, a divindade de Cristo e todos os outros elementos
sobrenaturais devem ser removidos também.
O cristianismo ainda pode atuar sem o sobrenatural porque, segundo
Schleiermacher, a essência da religião é uma experiência religiosa.[14] A
Bíblia ainda é importante, não porque é autoritativa no que afirma, mas
porque é uma expressão confiável das experiências religiosas da igreja antiga.
[15]
A teologia liberal moderna floresceu sobre esse fundamento humanista.
No entanto, de modo estranho, Schleiermacher permaneceu um cristão
professo e até se tornou um pastor influente. Enquanto isso, ele se tornou um
dos principais colaboradores da alta crítica bíblica, que teve efeitos danosos
sobre a igreja.
E isso nos traz de volta à vida de Kierkegaard. Como Kierkegaard
“salvaria” o cristianismo da falta de crença no sobrenatural? O cristianismo
não é destruído quando o sobrenatural é eliminado? De que adianta uma
religião sem um Deus sobrenatural? Kierkegaard sabia que um cristianismo
não sobrenatural era inútil. Ele também sabia que o cristianismo deveria ser
mais do que um nome; deveria ser uma fé “apaixonada”. E com a ideia de
que o cristianismo é o principal exercício de fé apaixonada, Kierkegaard
criou uma solução que poderia fazer os crentes “saltarem” sobre o muro
transcendental de Kant.[16] Sua solução não foi defender a certeza objetiva da
historicidade da fé cristã, mas enfatizar a interioridade de uma fé apaixonada.
Segundo Kierkegaard, Deus é o paradoxo absoluto. Deus não pode ser
compreendido pelo raciocínio humano. Como Deus é “completamente
diferente” de nós, qualquer tentativa de entendê-lo termina em fracasso.
Quando tentamos explicar Deus, não podemos deixar de fazê-lo à nossa
própria imagem, atribuindo erroneamente as qualidades humanas à sua
natureza.
Deus ser paradoxal ao raciocínio humano não significa que é irracional
crer em Deus. Deus ser paradoxal, no entanto, significa que qualquer
concepção humana de Deus leva a aparentes absurdos ou contradições. Isso é
especialmente verdade quando tentamos entender a encarnação. A partir de
nossa perspectiva finita, parece absurdo que um Deus infinito e atemporal
possa ser unido ao tempo e ao espaço em um corpo humano. Embora isso
possa não ser uma contradição formal, vai além do alcance da razão.
Mas onde a razão é insuficiente, a fé dá um “salto”. A fé transcende a
razão e a percepção dos sentidos, fornecendo uma experiência existencial de
Deus. Embora a razão e a percepção sensorial sejam incapazes de dar
evidência objetiva do sobrenatural, a fé (à medida que é operada
sobrenaturalmente pelo Espírito) não precisa de razão lógica ou prova
empírica para crer.
E se, por um lado, a certeza objetiva é inatingível, por outro, essa
certeza objetiva não é necessária para a fé. Para que a fé dê um salto
apaixonado, a razão deve “deixar a si mesma de lado”. Segundo Ronald
Green, professor de religião em Dartmouth, a fé em Kierkegaard é “um salto
para além do conhecimento, um salto para o absurdo”.[17] Contudo, Stephen
Evans, professor de filosofia de Baylor, nos lembra que a crença no absurdo
não é crer em uma contração lógica, mas crer em uma aparente contradição
— um paradoxo.[18] Por exemplo, pela fé, Abraão esteve disposto a fazer algo
que, humanamente falando, aparentava ser completamente contrário à razão.
Ele se dispôs a seguir a Deus e sacrificar o seu filho. “Mas Abraão tinha fé”,
argumentou Kierkegaard, “e não duvidou. Ele cria no absurdo”.[19]
Segundo Kierkegaard, “verdade é subjetividade”.[20] “Somente na
subjetividade há decisão”.[21] Somente a fé pode operar na subjetividade.
Kierkegaard definiu a verdade como uma “incerteza objetiva, sustentada na
apropriação da mais apaixonada interioridade”.[22] A incerteza objetiva é o
que alimenta a fé: “Sem risco, sem fé. A fé é a contradição entre a paixão
infinita da interioridade e a incerteza objetiva. Se eu sou capaz de apreender
Deus objetivamente, não tenho fé; mas porque não posso fazê-lo, devo ter
fé”.[23]
Em outras palavras, sem dúvida, a fé é inexistente. Segundo
Kierkegaard, a objetividade destrói a fé.[24] Mas é por isso que a fé é
necessária. Pela fé apaixonada, os crentes podem “saltar” o muro da dúvida
racional e se apegar firmemente ao absurdo.
Karl Barth
Karl Barth (1886-1968), possivelmente o pensador teológico mais
influente do século XX, concordou com Kierkegaard que a essência da fé é
um apossar-se subjetivo de Cristo. Para Barth, Cristo é a Palavra de Deus
objetiva. E a Bíblia? Segundo Barth, a Bíblia tem autoridade não porque é
isenta de erro humano, mas porque dá testemunho de Cristo e o Espírito
Santo pode escolher iluminar esse testemunho para esclarecer nossos
corações. Barth afirmou: “A Escritura é santa e a Palavra de Deus, porque
pelo Espírito Santo, ela se tornou e se tornará para a igreja uma testemunha
da revelação divina”.[25] Nesse sentido, “a Bíblia é a Palavra de Deus, na
medida em que Deus permite que seja a sua Palavra, na medida em que Deus
fala por meio dela”.[26]
Portanto, Barth não via a historicidade da vida, morte e ressurreição de
Cristo como uma questão relevante. Não que ele negasse a historicidade de
Cristo, mas que a resposta não era pertinente à fé. Segundo Barth, o que é
relevante e importante é que o Espírito revele a Cristo, que é a Palavra de
Deus, aos nossos corações.
Não é a fé em um documento, mas a fé em uma pessoa viva que salva.
É no momento em que cremos, pelo poder do Espírito Santo, que a vida, a
morte e a ressurreição de Cristo significam efetivamente algo para nós.
Assim, de acordo com Barth, o conhecimento de Deus vem pela experiência
de um relacionamento pessoal com Cristo Jesus através da fé.
Rudolf Bultmann
Rudolf Bultmann (1884-1976) foi ainda mais radical na tentativa de
separar a fé da realidade. Ele concordou com Kierkegaard e Barth que a
principal preocupação no cristianismo é a fé em Cristo, mas a crença no Jesus
histórico era opcional. Em sua Demythology, Bultmann tentou remover os
aparentes mitos das páginas das Escrituras.[27] É a verdade espiritual por trás
da história que importa, não a historicidade da história. Para Bultmann, a
história da ressurreição não é um fato histórico tanto quanto é uma história
simbólica que retrata a nova vida e a esperança que os crentes têm em Cristo.
É a fé existencial na mensagem do Evangelho (não a crença na historicidade
do Evangelho) que salva os crentes de uma vida sem esperança e consolo.
Paul Tillich
O teólogo Paul Tillich (1886-1965), no entanto, levou o existencialismo
à sua conclusão lógica — ao ateísmo. Como o misticismo de Dionísio, o
existencialismo de Tillich afirmou que Deus (em si mesmo) é
incompreensível. Em sua avaliação da teologia de Tillich, Carl Armbruster
afirmou que a “declaração mais fundamental que Tillich faz sobre Deus é que
ele é o próprio ser”.[28] Armbruster, contudo, continuou dizendo:
“Negativamente, isso significa que Deus não é um ser, nem mesmo o mais
elevado, ao lado de outros seres… Ele está além da essência e da existência,
porque, como ser em si, não participa do não ser e da finitude. Ele não
existe”. Ou seja, Deus está além de toda concepção possível sobre Deus.
Embora Tillich não acreditasse que Deus existisse como uma realidade
independente, afirmava que termo Deus ainda era útil. E útil não porque o
termo Deus comunica algo real sobre esse ser supremo e incompreensível,
mas porque simboliza nossa preocupação última. “Deus é o símbolo
fundamental para o que nos preocupa em última análise”.[29] Em outras
palavras, o termo Deus não faz referência a alguma realidade externa, mas
simboliza aquilo que internamente nos controla subjetivamente. Se não
gostamos do termo Deus, então Tillich disse que somos livres para trocar esse
termo por qualquer outro que expresse a profundidade do coração ou a
preocupação última da nossa vida:
O nome dessa infinita e inesgotável profundidade e base de todo ser é
Deus. Essa profundidade é o que a palavra Deus significa. E se essa
palavra não tiver muito significado para você, mude-a e fale das
profundezas da sua vida, sobre o que você se preocupa, sem qualquer
reserva. Talvez, para fazer isso, você deva esquecer tudo o que
tradicionalmente aprendeu sobre Deus, talvez até essa própria
palavra. Pois se você sabe que Deus significa profundidade, você
sabe muito sobre ele. Você não pode, então, chamar a si mesmo de
ateu ou incrédulo.[30]
Portanto, como indica essa citação acima, Tillich não acreditava em
ateus, pois até os ateus têm alguma preocupação que é fundamental para eles.
A fé em Deus consiste nessa preocupação fundamental. Essa preocupação
última não se baseia na realidade da existência de Deus, mas no fato de que
todos os homens têm uma tal preocupação.
Porque nosso Deus é nossa preocupação última, Deus não tem
existência ontológica. Ele existe apenas dentro de nossos pensamentos
subjetivos. “‘Deus’ é o nome da preocupação última do homem. No entanto,
isso não quer dizer que exista primeiro um ser supremo que, então, obriga o
homem a prestar honra à preocupação última”.[31] Mas, ainda de acordo com
Tillich: “Significa que tudo o que diz respeito a um homem se torna deus
para ele e, inversamente, significa que o homem pode se preocupar, em
última análise, apenas com o que é deus para ele”.[32]
Em outras palavras, Deus não exige fé, mas nossa fé, segundo Tillich,
“é um ato total e centrado do eu pessoal; o ato da preocupação incondicional,
infinita e suprema”.[33] Por fim, a religião existe apenas porque o homem
existe. Assim, embora Tillich tenha argumentado contra o ateísmo, ele não
acreditava em um Deus que existia fora da mente humana.
Nesse sentido, David Hume (1711-1776) estava certo quando disse:
“Ou, como vocês MÍSTICOS [e eu acrescentaria existencialistas] que
sustentam a incompreensibilidade absoluta da Deidade, diferem dos céticos
ou ateus, que afirmam que a primeira causa é TOTALMENTE desconhecida
e ininteligível?”.[34]
Gordon Kaufman
O professor de teologia da Harvard Divinity School, Gordon Kaufman
(1925-2011), estranhamente concordou com Hume:
O problema central do discurso teológico, não compartilhado com
nenhum outro “jogo de linguagem”, é o significado do termo “Deus”.
“Deus” suscita problemas especiais de significado, porque é um
substantivo que, por definição, se refere a uma realidade
transcendente da experiência e, portanto, não localizável nela. Um
novo convertido pode desejar usar o temos “Deus” para se referir a
“sensação de aquecimento” no coração, mas Deus dificilmente se
identifica com essa emoção; os biblicistas podem considerar a Bíblia
como a Palavra de Deus; o moralista pode acreditar que Deus fala
através da consciência dos homens; o clérigo pode acreditar que Deus
está presente entre o seu povo — mas cada um deles concorda que o
próprio Deus transcende o locus mencionado. Como Criador ou Fonte
de tudo o que existe, Deus não deve ser identificado com nenhuma
realidade finita específica; como objeto adequado da fidelidade ou fé
última, Deus deve ser distinguido de todo valor ou ser próximo ou
penúltimo. Mas se absolutamente nada em nossa experiência pode ser
diretamente identificado adequadamente como aquele ao qual o termo
“Deus” se refere, então que significado essa palavra tem ou pode ter?
[35]

É incrível que existam teólogos que não creem em Deus. Alvin


Plantinga, ex-presidente da Associação Filosófica Americana, falou de sua
própria perplexidade com relação a esse fenômeno quando disse: “Um
teólogo que não crê em Deus é como um alpinista que está em dúvida acerca
da existência, ou não, das montanhas; ou então como um encanador que é
‘agnóstico’ quanto aos canos — um espetáculo curioso, mas difícil de ser
levado a sério”.[36] O ateísmo, no entanto, é a conclusão lógica do
existencialismo. Se não existe uma realidade objetiva e externa à qual a
crença possa se apegar, então deixa de haver qualquer fundamento concreto
para a crença.
Conclusão
Em tudo isso, vemos as várias tentativas de separar a fé da realidade.
Mesmo que possa não haver nenhuma evidência racional e objetiva da
existência de Deus, isso não é um problema para aqueles que tiveram uma
experiência. “Não preciso de provas para crer. E se você me perguntar por
que acredito em Cristo, responderia com as palavras do hino I Serve a Risen
Savior. Creio porque ‘Ele vive em meu coração’”.[37] Nesse caso, é a
experiência religiosa que conta, e ela, como dizem meus queridos amigos,
não pode ser comunicada ou verificada por aqueles que simplesmente não
creem. Como Blaise Pascal afirma: “O coração possui razões que a própria
razão desconhece”.[38]

3
A Fé Não é Irracional

As Escrituras nunca separam a fé da realidade. A fé pode crer em realidades


espirituais que transcendem nossos sentidos empíricos, mas Deus não requer
que suspendamos a lógica ou que creditemos em algo que é irracional ou sem
fundamento. Ele não está nos pedindo para dar um salto de fé no escuro. Ele
não está nos pedindo para crer em algo que não existe. Na verdade, somos
chamados a correr para a luz e edificar a nossa vida sobre o fundamento mais
sólido possível: A sua Palavra.
A Fé Não é Irracional
Além disso, a fé em Cristo não é cega e irracional. Não devemos crer
pelo fato que a fé é um absurdo. A fé não é uma mistura de certeza e dúvida.
A fé também não é apenas uma experiência existencial e subjetiva do Divino.
O renomado ateu francês François-Marie Arouet (1694-1778), mais
conhecido como Voltaire, se enganou quando disse: “A fé consiste em crer
não no que parece verdadeiro, mas no que parece falso”.[39] E ele também
estava errado quando afirmou: “A fé consiste em crer no que a razão não
acredita”.[40] A fé não é, como Friedrich Nietzsche (1844-1900) afirmou, um
desejo de “evitar conhecer o que é a verdade”.[41] E George H. Smith não
poderia estar mais errado quando bifurcou a razão e a fé em seu livro best-
seller Atheism: The Case Against God:
O conflito entre a razão e a fé pode ser visto como uma luta para
controlar esferas de influência. Como a razão e a fé não podem
habitar simultaneamente em uma esfera, o domínio de uma exige a
exclusão da outra. Uma vez que vemos que uma esfera da fé só pode
ser fabricada às custas da razão, podemos entender por que o
“incompreensível” é um habitante central do teísmo e por que o
cristianismo achou necessário declarar guerra à razão.[42]
Embora Smith tenha declarado guerra à fé, o cristianismo não declara
guerra à razão. De fato, de acordo com as Escrituras, rejeitar o Cristo das
Escrituras é um ato de irracionalidade e um absurdo. A fé é a única resposta
razoável à verdade. Por exemplo, o apóstolo Paulo pediu orações para que
fosse protegido da irracionalidade daqueles que se opunham ao Evangelho:
“No demais, irmãos, rogai por nós… para que sejamos livres de homens
dissolutos (ἀτόπων, átópōn) e maus”. E Paulo explica que a razão de seu
comportamento irracional é a falta de fé em Cristo, “porque a fé não é de
todos” (2 Tessalonicenses 3:1-2).
A irracionalidade é um sistema de incredulidade. Somos chamados a
pensar racionalmente sobre as promessas de Deus: “Vinde então, e argui-me,
diz o Senhor: ainda que os vossos pecados sejam como a escarlata, eles se
tornarão brancos como a neve; ainda que sejam vermelhos como o carmesim,
se tornarão como a branca lã” (Isaías 1:18).[43] Em vez de dizer aos outros
que é impossível que eles conheçam a Deus até que deem um salto de fé no
escuro, somos chamados a defender racionalmente aqueles que pedem uma
razão para a esperança que nós temos em Cristo (1 Pedro 3:15).
É verdade que frequentemente somos irracionais. E devido à
consciência de nossa própria falibilidade, nunca devemos elevar nossa razão
humana acima da revelação divina. Porém, mesmo assim, a verdade revelada
não é e não pode ser ilógica. Visto que a fé é razoável, o teólogo reformado
François Turretini (1623-1687) explicou que embora a razão não seja o
“princípio sobre o qual a fé repousa”, é “o instrumento da fé”.[44] O teólogo
de Princeton, Charles Hodge (1797-1878), afirmou corretamente: “A
suposição de que razão e fé são incompatíveis, de que devemos nos tornar
irracionais para nos tornarmos crentes é, não importa a sua pretensão, a
linguagem da incredulidade; pois a fé no irracional é, por necessidade, ela
mesma irracional”.[45]
A Fé Não é Ilógica
Embora a fé não seja ilógica, ela confia em Deus mesmo quando não
consegue entender completamente todas as informações disponíveis. Quando
buscamos a sabedoria e a experiência de um médico, não é necessário que ele
explique todos os detalhes científicos por trás do seu diagnóstico. Embora
uma explicação breve possa ser útil, geralmente ficamos satisfeitos em aceitar
a palavra do médico. Nesse caso, a fé não é um salto no escuro, mas uma
confiança na sabedoria e na experiência do médico. É verdade que,
ocasionalmente, os médicos estão errados, e que segundas opiniões são
justificadas porque o mesmo melhor dos médicos é apenas um homem. No
entanto, se é evidente que Deus é Deus (perfeito, onisciente, totalmente sábio
e onipotente), seria algo ilógico e uma insensatez da nossa parte não
confiarmos em sua Palavra.
Se temos fé em certas pessoas, é porque confiamos em sua sabedoria e
caráter. Há certas pessoas em quem confio — minha esposa é uma delas. Eu
confio nela. Não preciso que ela dê evidências quanto a tudo o que diz; a sua
fidelidade comprovada é suficiente para eu confiar nela.
Do mesmo modo, Deus deu ampla evidência de sua fidelidade. De fato,
quando a evidência é esmagadora, torna-se insensatez da nossa parte
continuar a questioná-lo. Dessa maneira, não foi um salto de fé cego para
Abraão e Sara crerem em Deus por causa da evidência empírica de que eles
eram velhos demais para ter filhos. Eles confiaram na Palavra de Deus
porque estavam “certíssimos de que o que ele tinha prometido também era
poderoso para o fazer” (Romanos 4:21). Deus já havia provado
suficientemente a si mesmo para eles. Sim, humanamente falando, o que ele
prometeu era impossível. Contudo, Deus fez a promessa. Deus, por definição,
é capaz de suspender as leis da natureza.
Do mesmo modo, “pela fé”, a Bíblia afirma, “entendemos que os
mundos pela palavra de Deus foram criados; de maneira que aquilo que se vê
não foi feito do que é aparente” (Hebreus 11:3). Novamente, se há boas
razões para crermos no Deus da Bíblia, é razoável crermos que ele criou o
universo a partir do nada. De fato, como espero mostrar neste livro, um Deus
pessoal que cria tudo a partir do nada é a única explicação lógica e
autoconsistente para a origem do universo.
Se Deus é Deus, e se a Bíblia é a sua Palavra, confiar na Bíblia é a
única coisa razoável a ser feita. Confiar na Palavra de Deus é confiar na
veracidade e confiabilidade de Deus. Eu, pessoalmente, nunca confiei em
duendes verdes ou em suas promessas tolas. Não apenas não há evidências de
sua existência duendes verdes, como não tenho motivos para acreditar que
seriam confiáveis, ainda que existissem. Por outro lado, são impressionantes
as evidências de que a Bíblia é a Palavra de Deus e de que Deus é totalmente
confiável. Ele provou ser fiel. Por esse motivo, aqueles que confiam em Deus
nunca serão confundidos (Romanos 10:11).
A Fé Confia em Deus
Confiar em Deus é a essência da fé salvífica. Eu tenho provado que sou
falível. Visto que é comum que eu cometa erros ao fazer julgamentos, por
que confiaria no meu próprio julgamento acima e além do julgamento de
Deus? Se Deus tem provado ser Deus, é um absurdo não confiar nele.
É evidente que toda filosofia criada pelo homem tem sua origem em
homens falíveis e finitos. Por causa desse fundamento defeituoso, as
filosofias dos homens não podem deixar de ser inconsistentes e sempre
mutáveis. Além disso, como veremos, as várias explicações que o homem
tem buscado sobre a origem, a natureza e o propósito do universo não se
sustentam sob seu próprio peso. Somente a Palavra de Deus não se contradiz,
pois é o único testemunho autoverificável que é coerente e consistente
consigo mesmo. Por que então eu confiaria na sabedoria dos homens acima
da sabedoria de Deus? A Palavra de Deus repetidamente prova ser fiel, e nos
oferece o único sistema de pensamento consistente e coerente. Sendo esse o
caso, é simplesmente racional confiar no Deus da Bíblia.
Conclusão
Embora Dionísio e Kierkegaard tenham (em um grau ou outro)
separado a fé da razão (como vimos nos capítulos 1 e 2), a Bíblia nunca
separa essas duas coisas. Se é impossível ser racional à parte das verdades
reivindicas pelo cristianismo, então devemos nos submeter a elas, ou então
somos aqueles que se tornam irracionais. Como veremos, a cosmovisão cristã
é a única cosmovisão racionalmente consistente consigo mesma. A
incredulidade, em todas as suas formas, é irracional. Toda a verdade, se
desenvolvida até o seu fim lógico, conduz a Cristo.
Por exemplo, 2 + 2 = 4, que é = Jesus é Deus. Embora isso pareça um
grande salto lógico, espero demonstrar de modo adequado nos capítulos
seguintes que a lógica por trás da matemática só faz sentido racional dentro
da cosmovisão cristã. De fato, toda verdade, onde quer que seja encontrada,
só faz sentido no contexto da cosmovisão cristã. Somente a cosmovisão cristã
pode tornar razoável a lógica, a matemática e as nossas experiências
sensoriais. Portanto, como procuro mostrar neste livro, se não crermos e nos
submetermos ao Deus da Bíblia, estaremos consciente e insensatamente
rejeitando a verdade, a fim de manter uma vida de egoísmo e a noção tola de
nossa própria autonomia.
PARTE 2

O que Molda as Crenças

“A estultícia do homem perverterá o seu caminho, e o seu coração se irará


contra o Senhor” (Provérbios 19:3)
4

Moldados pelo Interesse Próprio

“Vamos comprá-lo, papai!”. Essas palavras saíram da minha boca assim que
vi a caminhonete amarela com seus aros personalizados e luzes de neon por
baixo. Imediatamente eu conseguia me imaginar orgulhosamente dirigindo
para a escola. Ela não apenas era legal, mas eu não podia acreditar que estava
com um preço acessível. Ela poderia ser minha, pelo menos, era isso que eu
pensava.
Meu pai respondeu com as temidas, mas previsíveis, palavras: “Nós
precisamos fazer o test drive primeiro”. Embora isso pareça razoável, você
deve saber que eu era jovem e não tinha dinheiro. Meus pais prometeram me
ajudar a comprar meu primeiro carro acrescentado o dobro de todo o dinheiro
que conseguisse ganhar durante o verão. Eu trabalhei duro, mas economizei
apenas 900,00 dólares. E mesmo no início dos anos 90, você não podia
esperar muito de um carro que custasse 1.800,00 dólares. A última coisa que
eu queria era uma carroça do tempo da minha avó.
Então, quando vi aquela caminhonete personalizada, estava pronto para
puxar o gatilho sem fazer qualquer investigação. Na verdade, não queria
testá-la, porque no fundo eu sabia que era bom demais para ser verdade. Se
descobríssemos os seus problemas mecânicos, sabia que meu pai impediria
que eu me tornasse um cara legal. Veja bem, eu pensei que se o
comprássemos antes de sabermos que precisava de consertos, embora depois
fosse necessário gastarmos mais dinheiro para que aquilo funcionasse, a coisa
mais importante seria realizada: eu teria um carro respeitável para mostrar a
todos os meus amigos. O fato é que eu não queria saber a verdade, pois supus
que a verdade atrapalharia a minha felicidade.
Como você pode imaginar, quando abrimos o capô, estava faltando
metade do motor. Sim, era bom demais para ser verdade. Acabei com a
caminhonete velha e marrom do meu pai — confiável, mas sem luzes de
neon por baixo.
Agora percebo que estava disposto a ignorar todos os sinais de alerta e,
conscientemente, fazer algo tolo por causa do meu orgulho imprudente.
Minhas emoções, meu orgulho e meus valores invertidos atrapalharam o meu
julgamento. Eu não fui objetivo ou racional, porque eu não queria ser
objetivo ou racional.
A tolice consiste em viver em oposição ao que sabemos ser verdade.
Receio que essa condição irracional e esse modo de pensar sejam
universalmente predominantes em todos nós. Não somos simplesmente
irracionais de vez em quando. Sem Deus, vivemos em um estado de
irracionalidade.
Somente tolos irracionais negariam de forma consistente e prática que 2
+ 2 = 4. A resposta a essa equação não é apenas parte do senso comum, é
facilmente demonstrável e muito útil. Se um pensador pós-moderno
praticamente rejeitar os princípios absolutos e universais da matemática, ele
poderá aplaudir a si mesmo por ser consistente com a sua visão de mundo
relativista, mas, nesse processo, fará com que suas finanças sejam uma
bagunça completa. Independentemente do que afirmamos crer sobre as leis da
matemática, não podemos viver na prática sem nos submetermos
consistentemente a elas. Por essa e muitas outras razões, é intelectualmente
difícil negar a natureza absoluta e universal da matemática.
O mesmo se aplica à verdade das Escrituras. As Escrituras não
fornecem apenas algumas verdades isoladas, desconexas e sem credibilidade;
elas nos dão a única visão de mundo completa e coesa que fornece
significado e lógica ao universo. A partir daqui, pressupomos que o Deus da
Bíblia é a verdade suprema fundamental. Como este livro procura
demonstrar, Deus é uma certeza maior do que a lógica ou a matemática.
Pensadores pós-modernos questionam se 2 + 2 = 4. Isso ocorre porque sem
que antes o Deus da Bíblia seja pressuposto, não há base para a verdade
universal ou absoluta. 2 + 2 = 4 só é verdadeiro (universal e absolutamente)
porque Deus é e porque Deus se revelou de forma convincente para todos
nós. Sem o conhecimento de Deus, que todos nós temos, não podemos saber
mais nada, nem mesmo que 2 + 2 = 4. Deus é a realidade suprema e Deus é a
verdade suprema. Porque Deus é supremo, em vez de procurar justificar o
conhecimento com base apenas na razão humana ou em experiências
humanas, precisamos ter conhecimento de Deus para justificar o
conhecimento de tudo o mais. Sem o conhecimento de Deus, o próprio
conhecimento é impossível. Em outras palavras, sem o Deus da Bíblia, nada
faz sentido no grande esquema das coisas. Como o salmista diz: “Na tua luz
veremos a luz” (Salmos 36:9).
Se a Bíblia nos fornece o único sistema coerente de pensamento que
nos permite interpretar adequadamente toda a realidade, por que ela é tão
odiada e rejeitada por muitos? Se as alegações da verdade da Bíblia são
logicamente demonstráveis, por que ela é tão desprezada e ridicularizada por
algumas das mentes mais brilhantes e inteligentes? Você quer saber a
verdade? O fato é que, se as pessoas gostassem da verdade, elas não a
rejeitariam. Ou, como o famoso historiador britânico Malcolm Muggeridge
disse: “As pessoas não acreditam em mentiras porque precisam, mas porque
querem”. O problema não é que a verdade seja irracional; o problema é que o
homem caído não deixa de ter as suas propensões pessoais e seu orgulho tolo.
Como veremos neste capítulo, as pessoas são egoístas por natureza, e seu
egoísmo é a influência que controla o modo como se sentem, pensam e se
comportam (Romanos 1:18, 25).
O Homem Não é Neutro
A Bíblia descreve isso como depravação. A depravação é uma condição
interior do coração que nos impede de amar qualquer verdade que se oponha
ao nosso desejo interno de sermos independentes, livres e autônomos. Porque
nascemos depravados, com uma natureza caída, odiamos o Deus da Bíblia.
Podemos amar um deus de nossa própria imaginação — um deus que
podemos controlar. Se queremos ir para o céu, então também queremos poder
trabalhar para alcançá-lo. Se queremos ir para o inferno e sair com nossos
amigos embriagados, então é isso que faremos. Mas submeter amorosamente
todos os detalhes de nossas vidas, incluindo as nossas aspirações,
pensamentos e crenças ao Deus absoluto e soberano, não é nada atrativo.
Isso ocorre porque a Bíblia afirma que todo o universo e todas as
pessoas dentro dele são feitas para a glória de Deus. Esse propósito não
apenas determina nosso objetivo, mas ordena como devemos pensar, sentir e
viver. Em outras palavras, não somos feitos para nós mesmos. No entanto,
naturalmente, não queremos nos limitar a um estilo de vida tão sacrificial, e
menos ainda queremos que nosso pecado, vergonha e culpa sejam totalmente
expostos. Contudo, isso é o que a Bíblia faz. A Bíblia define as nossas vidas e
expõe nosso pecado e culpa. Essa repreensão e crítica pessoal é demais para
ser aceita por aqueles que amam a si mesmos. Aqueles de nós que desejam
encobrir os nossos pecados para estabelecer nosso próprio propósito e
controlar nossos próprios destinos rejeitarão qualquer verdade que coloque
em risco esses objetivos. Não é que sejamos incapazes de entender a verdade;
o que acontece é que, sem a graça de Deus, simplesmente não a estimamos.
Por esse motivo, é uma noção falsa pensar que nossas crenças, opiniões
e julgamentos são determinados apenas pelos fatos. Quando os fatos se
opuserem a nós, então nós nos oporemos aos fatos. Objetividade absoluta é
impossível para indivíduos pecadores e amantes de si mesmos. Somente
computadores e máquinas são completamente neutros. Isso ocorre porque os
computadores não se importam de modo algum com a verdade. Por mais que
eu goste do meu novo iMac, ele não consegue se importar comigo. Por mais
“inteligente” que seja, ele não tem emoções nem sentimentos. Se eu fizer uma
pesquisa na web por Adolf Hitler ou por Jesus Cristo, meu computador
permanecerá indiferente. Simplesmente não há julgamento ou opinião sobre
tais coisas.
Mas, isso não é verdadeiro no que diz respeito às pessoas emocionais.
As pessoas têm uma opinião sobre quase tudo, especialmente sobre as coisas
que se relacionam e afetam as suas vidas pessoais. A maioria das pessoas não
se importa muito com o fato de George Washington ter sido o primeiro
presidente dos Estados Unidos da América. A maioria das pessoas aceitará
esse fato histórico quer tenham pouca ou nenhuma evidência disso. “Quem se
importa, pois como isso afeta a minha vida cotidiana?”. No entanto, quando
algo nos afeta direta ou indiretamente, de repente, mostraremos grande
interesse e preocupação. Fale sobre religião, política, controle de armas,
aborto, orientação sexual, George Bush, Obama e outros temas acalorados, e
de repente as pessoas ficam irritadas. Se existe um assunto em que todos nós
investimos nossas emoções, esse é o grande assunto do “eu, eu e eu”.
Assim como naturalmente procuramos evitar a dor física e gravitar em
direção ao prazer físico, todos odiamos ser criticados, repreendidos e
envergonhados. Adoramos ser reconhecidos, elogiados e honrados. Essa
tendência torna mais fácil abraçar o que é pessoalmente benéfico e mais
difícil aceitar o que é pessoalmente prejudicial. Se você me disser que sou
brilhante, não levantarei argumentos contra isso, mesmo que não haja
evidências que apoiem essa declaração. Mas se você me disser que não sou a
pessoa mais inteligente que existe, isso me deixará louco, mesmo que isso
seja evidente para todos.
Richard Swinburne, professor emérito de filosofia da Universidade de
Oxford, reconhece que os “seres humanos”, como nós, “são criaturas de
inteligência limitada e notoriamente suscetíveis a esconder de si mesmos as
conclusões que parecem desafiá-las, quando tais conclusões não são bem-
vindas”.[46]
Infelizmente, vi isso acontecer de perto. No ensino médio, um dos
meus amigos se suicidou. Ninguém percebeu como isso ocorreu,
principalmente a mãe do menino. Eu sabia que a negação era uma das etapas
do luto, mas não percebi o quão forte essa emoção poderia ser. Ao lado do
túmulo, a mãe desse garoto se jogava em cima do caixão e começava a
sacudi-lo bruscamente, enquanto gritava: “Acorde, acorde, acorde!”. Todas
as pessoas ficaram em silêncio. A realidade era amarga e, naquele momento,
era muito difícil para aquela mãe aceitá-la. Naquela ocasião, ela não se
permitia acreditar que seu único filho estava prestes a ser enterrado. Embora
a evidência fosse esmagadora, não foi o suficiente para convencê-la de algo
que ela não queria acreditar. Porque ela amava o seu filho, ela não amava a
verdade. Assim vemos que nenhum de nós é neutro.
A Natureza do Homem Controla os seus Valores
Não podemos deixar de ter algo ou alguém que amamos mais do que
qualquer coisa ou qualquer outra pessoa. E quem ou o que mais amamos
determinará, por sua vez, o que odiamos e detestamos. Se amamos as trevas,
odiaremos a luz. Se amamos o prazer, odiaremos a dor. Se nos amamos,
odiaremos nossos inimigos. Essa dicotomia é inevitável. Com isso em mente,
tudo é colocado em uma escala descendente, do objeto de nossa maior
afeição ao objeto de nosso ódio mais profundo, incluindo todo o restante que
fica no meio. Essa escala é o nosso sistema de valores. As coisas que
estimamos e amamos formam os nossos valores, e esse sistema de valores
determina a nossa moral e comportamento ético.
Isso ocorre porque o objeto que mais amamos se torna nosso deus — o
qual servimos e adoramos. Tudo o que mais amamos controlará nosso
pensamento, emoções e comportamento. Isso nos controlará e nos
prostraremos diante dele com boa disposição. Por exemplo, digamos que
você tem amado mais o futebol do que a sua própria vida. Seu amor pelo
futebol não apenas moldaria a sua opinião sobre o futebol, mas também
controlaria a sua vida. Se o futebol fosse o seu maior amor, isso moldaria a
forma como você gastaria o seu tempo e dinheiro, influenciaria as suas
amizades e modelaria quase tudo na sua vida. Isso não significa que você não
apreciaria outras coisas que não são relacionadas ao futebol, mas significa
que essas coisas não relacionadas seriam subordinadas à sua principal
preocupação — futebol. Seu amor pelo futebol seria o princípio dominante
por trás de tudo que você tem pensado e feito. Sem dúvida, seria uma
escravidão voluntária, porém seria uma escravidão.
A Natureza do Homem Controla o seu Comportamento
Com isso em mente, como já mencionei, a Bíblia ensina de modo
autoritativo o que é claramente evidente em nossa própria observação pessoal
e experiência interior, a saber, que nosso principal objeto de afeto é o eu. Sem
a graça de Deus, nos tornamos o centro de nossos pensamentos e ações.
É difícil negar que a natureza humana é egoísta. Os bebês não nascem
pensando em suas mães, mas em si mesmos. As crianças não precisam ser
ensinadas a cobiçar e brigar por brinquedos. A história do mundo está cheia
de conflitos, derramamento de sangue e exploração. O homem pode se
entregar a vários prazeres e hobbies (como futebol), ao materialismo e à
busca por poder e fama, porém todas essas coisas estão enraizadas no amor a
si mesmo. Quando leis, restrições, supervisão e prestação de contas são
removidas, nossos corações não são atraídos naturalmente para o alto. Assim
como os halteres naturalmente caem em direção ao chão, assim também
colocamos nossas próprias necessidades e felicidade acima das necessidades
e felicidade dos outros.
Felizmente, nem todos nós queremos ser tão maus quanto Hitler, mas
sem o poder de Deus, nenhum de nós amará a Deus mais do que a si próprios.
Podemos ter o desejo de ser bons, mas esse amor próprio sempre controla o
motivo por trás de nossas ações aparentemente boas. Nós podemos ter um
amor por Deus, mas não um amor por Deus que seja maior que nosso amor
por nós mesmos. E tudo o que parece ser bom, se feito por razões egoístas,
fica aquém da glória de Deus e é classificado como pecaminoso.
Assim, o egoísmo é a influência controladora por trás do
comportamento do homem. Em outras palavras, o problema por trás do
comportamento pecaminoso e do pensamento irracional é o coração egoísta e
depravado do homem. Como afirma a Escritura: Por causa da “vaidade da sua
mente” os homens estão “entenebrecidos no entendimento, separados da vida
de Deus pela ignorância que há neles, pela dureza do seu coração” (Efésios
4:17-18). Como resultado, o coração pecaminoso é o coração do problema do
homem.
A Natureza do Homem Controla as suas Emoções
Esse coração pecaminoso também controla as emoções do homem
caído. É uma noção falsa, mas comum, pensar que não somos responsáveis
por nossas emoções. Costumamos falar como se nossas emoções fossem
criaturas alienígenas que nos atacam a partir do lado de fora, como se
estivessem fora do nosso controle. “Não posso fazer nada a respeito de como
me sinto”. “Você sentiria o mesmo se isso tivesse acontecido com você”.
“Não pude deixar de me apaixonar por ela”. “Você não pode escolher quem
você ama”. “Como minhas emoções não seriam afetadas se eu descobrisse
que algo ruim havia acontecido com minha mãe ou se eu soubesse que meu
tio rico estava prestes a me doar um milhão de dólares?”. “É claro que meus
altos e baixos emocionais são resultado de fatores que estão fora do meu
controle”. “Eu sou vítima das minhas próprias emoções”. “Eu sou uma vítima
das minhas circunstâncias”. “Eu sou uma pessoa emotiva. Não consigo
evitar”. Através de declarações comuns como essas, as pessoas gostariam que
acreditássemos que as suas emoções não provêm de si mesmas, mas de suas
circunstâncias exteriores.
Tais desculpas eliminam a responsabilidade de controlarmos as nossas
emoções. Problemas emocionais não são como câncer; não são doenças que
nos atacam sem a nossa permissão. Não somos vítimas inocentes das nossas
próprias emoções. As emoções não são forças externas causadas por nossas
circunstâncias em constante mudança. Em vez disso, nós somos responsáveis
por nossas emoções. Somos responsáveis por amar o que é bom e odiar o que
é mau. Jesus Cristo deixou claro no Sermão do Monte que não somos apenas
responsáveis pelo modo como nos comportamos exteriormente, mas também
pelo modo como nos sentimos interiormente.
É verdade que as nossas emoções estão conectadas às nossas
circunstâncias. Contudo, não é verdade que as nossas emoções são
controladas por nossas circunstâncias. Antes, nossas emoções são controladas
por nossos valores (ou seja, pelas coisas que amamos e odiamos). Porque eu
amo minha mãe, ficaria profundamente triste se soubesse que algo ruim
aconteceu com ela. Quão angustiado eu me sentiria? Tudo depende do nível e
grau de amor que tenho por minha mãe. Por valorizar o dinheiro,
naturalmente me alegraria ao saber que meu tio rico me daria um milhão de
dólares. Não é que nossas emoções sejam controladas por mudanças
descontroladas em nosso ambiente, o que acontece é que são os nossos
valores pré-estabelecidos que controlam como reagimos emocionalmente em
relação às mudanças descontroladas em nossas circunstâncias. Em outras
palavras, nossas circunstâncias em constante mudança expõem nossa
verdadeira natureza e nossos valores pessoais.
Se nós temos problemas emocionais — e toda a humanidade caída os
tem — é porque as nossas prioridades e valores estão fora do lugar.
Problemas emocionais são resultado direto de um problema do coração.
Como uma árvore má sempre produz frutos maus, um coração perverso
sempre produz pensamentos, sentimentos e comportamentos perversos. Um
estilo de vida egoísta, consumido pela satisfação das necessidades percebidas
e pela busca de gratificação pessoal a cada momento, sem dúvida resulta em
uma vida emocional instável. Em outras palavras, nossas emoções são um
reflexo de nossos valores e de nossa natureza.
A Natureza do Homem Controla as suas Crenças
Esse problema do coração que produz vários problemas emocionais é a
razão pela qual os pecadores não creem na verdade. Não é que a Bíblia não
tenha credibilidade ou seja incompreensível; é que o homem valoriza mais a
si mesmo do que valoriza a Palavra de Deus. Ou seja, o homem caído tem um
sistema de valores caído e invertido. Em vez de Deus ser a principal afeição
do homem, o homem caído se colocou naquele lugar. Para crer na verdade, o
homem deve receber fervorosamente a verdade, e isso requer submissão a
Deus. Submeter-se a Deus é difícil porque requer o destronamento do eu.
Porém, isso nos leva de volta ao cerne do problema — o homem é
voluntariamente um escravo do seu próprio egoísmo.
O egoísmo cega. O que as pessoas não amam, elas não receberão de
boa vontade. Se elas não têm ouvidos para ouvir, é porque não querem ouvir.
Por natureza, os incrédulos são escravizados por suas próprias paixões
carnais. Por causa disso, os incrédulos amam mais as trevas do que a luz
(João 3:19). Naturalmente, eles resistem e detêm a verdade em injustiça
(Romanos 1:18), porque sentem “prazer na iniquidade” (2 Tessalonicenses
2:12).
Assim, o conhecimento de Deus é visto como uma ameaça ao desejo de
viver para si mesmos. Como observou R.C. Sproul, presidente do Ministério
Ligonier: “Deus representa uma ameaça aos padrões morais do homem, uma
ameaça à sua busca por autonomia e uma ameaça ao seu desejo de se
ocultar”.[47]
A falta de fé não provém da falta de evidências racionais e credíveis,
provém de um coração espiritualmente morto, escravizado por seus próprios
desejos egoístas. O matemático francês Blaise Pascal (1623-1662) entendeu
isso quando afirmou: “Aqueles que não amam a verdade usam como pretexto
que ela é contestada e que uma multidão a nega. E assim o erro deles surge
exatamente disso, que eles não amam nem a verdade nem a caridade”.[48]
A Natureza do Homem Deve Mudar ou as Crenças Não
Mudarão
Por esse motivo, nem a lógica nem a evidência podem mudar nossos
corações. Negar e odiar a Palavra de Deus fará com que até as pessoas mais
intelectuais e brilhantes se tornem insensatas. Como dizem as Escrituras:
“Porquanto, tendo conhecido a Deus, não o glorificaram como Deus, nem lhe
deram graças, antes em seus discursos se desvaneceram, e o seu coração
insensato se obscureceu. Dizendo-se sábios, tornaram-se loucos” (Romanos
1:21-22). E, “disse o néscio no seu coração: Não há Deus” (Salmos 53:1).
Não é como se os incrédulos precisassem de mais evidências empíricas
para convencê-los da verdade, pois a Bíblia diz que mesmo que vissem um
homem ressuscitado dentre os mortos eles ainda se apegariam
persistentemente aos seus pecados e rejeitariam a verdade (Lucas 16:31). A
única coisa que pode produzir fé em Cristo é um transplante de coração. Os
pecadores devem nascer de novo, devem ter o amor de Deus derramado em
seus corações mortos antes que se arrependam voluntariamente de seus
pecados e corram para Jesus Cristo para o perdão. O pecado deve ser odiado
e Cristo deve ser amado antes que os pecadores abracem o Evangelho. Pascal
também entendeu isso:
Não admira ver pessoas simples crerem sem raciocinar. Deus lhes
concede o amor a ele e ódio ao eu. Deus inclina o coração deles a
crer. Os homens nunca crerão com uma fé salvífica e real, a menos
que Deus incline os seus corações; e, por outro lado, eles crerão assim
que ele os inclinar.[49]
Embora a fé não seja cega, ilógica ou sem evidências empíricas, ela é
sobrenatural. A fé vem de Deus porque a nova natureza vem de Deus.
Contudo, meu caro leitor, isso não o isenta de ser responsável por rejeitar o
Deus da Bíblia. A sua rejeição e negação da verdade não é porque você não
tem evidências, é porque você ama a si mesmo e os seus pecados mais do que
você ama o Cristo que veio morrer pelos pecadores.
5

Moldados por Verdades Autoevidentes

Por que Esaú vendeu a sua primogenitura por um prato de lentilhas? Que
coisa tola. O pai de Esaú, Isaque, provavelmente era o homem mais rico vivo
e, como primogênito, Esaú estava prestes a herdar tudo. O problema, porém,
era que Esaú estava com fome — com muita fome. Faminto após um longo
dia de caça, ele considerou que a sua herança seria inútil, se ele morresse de
fome. “Preciso comer ou morrerei”, ele pensou consigo mesmo. Ele se dispôs
a desistir de tudo por um prato de lentilhas. Seu apetite presente era mais
importante que a sua glória futura. É claro que, depois, essa negociação tola
acabou levando Esaú a chorar amargamente com uma consciência culpada.
Todos nós somos culpados de negociamos benefícios futuros por
alguns momentos de prazer. Quem não comete erros? Errar é humano, certo?
Uma coisa é a nossa irresponsabilidade afetar esta vida presente, mas
outra é virar as costas para Cristo e perder as nossas almas por toda a
eternidade. Lembro-me de estar disposto a vender minha alma por uma
brincadeira de pega-pega. Olho para trás e penso: “No que eu estava
pensando?”. Quando eu tinha cerca de 12 anos, me senti convencido
interiormente quando ouvi o Evangelho de Cristo. Como filho de um
pregador, não era a primeira vez que ouvia o Evangelho, mas foi uma das
poucas vezes em que o Evangelho me convenceu. Lembrei-me das boas
novas de que Deus estava disposto a perdoar os meus pecados. Eu tive a
resposta para a minha culpa. Embora soubesse que Cristo era a única
resposta, havia algo mais importante para mim do que meu bem-estar eterno:
uma brincadeira boba. Enquanto eu pensava em meus pecados, culpa,
vergonha e na oferta gratuita do Evangelho, alguns amigos se aproximaram e
me convidaram para me juntar a eles em uma brincadeira de pega-pega.
Lembro-me de ficar em conflito porque eu queria ser salvo dos meus
pecados, mas não queria decepcionar os meus amigos. Infelizmente, pensei
comigo mesmo: “A salvação pode esperar”. Eu não estava disposto a entregar
o controle da minha vida a Deus. Eu amava os prazeres deste mundo mais do
que amava a Cristo. Eu odiava os meus pecados, mas não o suficiente para
abandoná-los. Era evidente que eu temia mais aos homens do que a Deus.
Tudo aquilo evidenciou que eu abriria mão da vida eterna por uma
brincadeira boba de pega-pega.
Assim como Esaú, minha loucura só aumentou a minha consciência já
culpada. A vergonha, é claro, vem quando fazemos algo que sabemos ser tolo
e irracional. Como todos agimos irracionalmente, todos sabemos como é a
culpa. Por outro lado, porque todos experimentamos uma consciência
culpada, é evidente que todos sabemos a diferença entre certo e errado. No
entanto, o pecado é irracional. É contrário ao que é razoável e bom. Porque
temos entendimento, uma consciência culpada é inevitável.
O Fair Play é Autoevidente
Se você esqueceu como é a culpa, reserve alguns momentos para se
lembrar de todas as coisas vergonhosas que você já fez no passado. Se você
já tentou encobrir algo que fez, então já sentiu culpa. Olhe para debaixo do
tapete e para tudo que você já varreu para baixo dele. Seja honesto. Você
gostaria que todas aquelas memórias fossem transmitidas na televisão em
rede nacional? O fato de tentarmos prender tais momentos vergonhosos com
as correntes de um milhão de desculpas e de procurarmos esquecê-los é uma
evidência de que temos uma consciência culpada.
Pare de ler por um momento e considere aquela lembrança feia que o
envergonha. Você pode ter que procurar um pouco, porque temos uma
maneira estranha de encobrir, suprimir e justificar a nossa vergonha. Fez
isso? Agora pergunte a si mesmo: “Por que isso me faz sentir tão sujo e
culpado? Por que eu quero manter isso escondido dos outros? De onde vem
essa culpa?”.
Uma consciência culpada é algo difícil de superar. Todos nós temos
uma, mas de onde ela veio? Por que tantas vezes nos sentimos culpados? A
culpa pode ser causada apenas por um código abstrato de moralidade? A
culpa é apenas um subproduto das construções sociais, correção política e
instrução dos pais? Edward O. Wilson, professor de entomologia de Harvard,
estava certo quando disse: “As respostas emocionais humanas e as práticas
éticas mais gerais baseadas nelas foram programadas em um grau substancial
pela seleção natural ao longo de milhares de gerações”?[50] A moralidade tem
evoluído? O conhecimento do certo e do errado é apenas relativo?
C.S. Lewis, um ex-ateu, argumentou contra essa noção. Segundo
Lewis, porque julgamos as pessoas, as culturas e nós mesmos, acreditamos
que existe uma lei universal de fair play. Ele disse que esse tribunal superior
é evidente quando duas pessoas brigam:
Brigar significa tentar mostrar que o outro homem está errado. E não
faria sentido tentar fazer isso, a menos que você e ele tivessem algum
tipo de acordo sobre o que é certo e errado; assim como não faria
sentido dizer que um jogador cometeu uma falta, a menos que
houvesse algum acordo sobre as regras do futebol.[51]
Ao dizer: “Isso não é justo”, não estamos apenas afirmando que a
ofensa pela qual estamos reclamando não nos agrada. Estamos dizendo que o
crime é contrário à regra universal do fair play. Nós estamos dizendo que a
outra pessoa está errada porque ela sabe como agir melhor. Uma coisa é
quando alguém senta no assento que você queria no cinema porque chegou lá
primeiro, mas outra coisa é ao voltar do banheiro, você descobrir que sua
jaqueta foi colocada em outro lugar e que um estranho está sentado no
assento que você tinha escolhido anteriormente. O primeiro incidente é um
inconveniente. O segundo incidente claramente vai contra o fair play. Mas
porque não é justo que alguém roube o seu assento? Quem disse que esse
“ladrão de assentos” deveria ter uma atitude melhor?
Quando as pessoas são confrontadas com a violação do padrão do fair
play, na maioria das vezes, diz Lewis, elas não argumentam contra o padrão.
Eles normalmente não dizem: “Quem disse que eu não posso ser egoísta e
explorar os outros para meu próprio benefício pessoal?”. Você consegue
imaginar alguém dizendo sinceramente: “A regra de ouro (faça aos outros o
que gostaria que fizessem a você) está errada?”. Em vez de negar a natureza
objetiva e vinculativa da lei universal do fair play, os violadores costumam
afirmar que não foram contra o padrão. Caso contrário, eles constroem
alguma desculpa ou circunstância especial que os isenta da obrigação moral
de seguir a regra do fair play. Em outras palavras, as pessoas envolvidas em
uma transgressão normalmente não argumentam contra a lei, mas negam,
justificam ou se desculpam.
Além disso, se dissermos que a lei do fair play é apenas uma
construção cultural, não temos o direito de julgar ou criticar outras culturas
por seus crimes contra a humanidade. Isso é evidente, diz Lewis:
No momento em que você diz que um conjunto de ideias morais pode
ser melhor que outro, você está, na verdade, medindo as duas por um
padrão, dizendo que uma delas está em conformidade maior com esse
padrão do que o outro. Mas o padrão que mede as duas coisas é algo
diferente de qualquer uma delas. Você está, de fato, comparando os
dois com alguma moralidade real, admitindo que existe um direito
real, independente do que as pessoas pensam, e as ideias de algumas
pessoas se aproximam mais desse direito real do que outras. Ou para
dizer isso de outra maneira: se as suas ideias morais podem ser mais
verdadeiras, e as dos nazistas menos verdadeiras, deve haver algo —
alguma moralidade real — em relação à qual elas são verdadeiras.[52]
Ele continuou afirmando que embora outras civilizações em diferentes
épocas possam ter diferenças sutis nas expectativas culturais, nenhuma
civilização jamais acreditou que o egoísmo seja honroso:
Imagine um país onde as pessoas fossem admiradas por fugir da
batalha, ou onde um homem se sentisse orgulhoso de enganar todas
as pessoas que fossem muito bondosas com ele. Você pode também
tentar imaginar um país onde dois mais dois é igual a cinco. Os
homens diferem em relação às pessoas com as quais você deve ser
altruísta — seja apenas com sua própria família, seus compatriotas ou
com todos. Mas eles sempre concordaram que você não deve se
colocar em primeiro lugar. O egoísmo nunca foi admirado.[53]
O egoísmo é o cerne de todo comportamento pecaminoso. A lei moral
proíbe o egoísmo. Cada um dos Dez Mandamentos proíbe uma expressão
diferente de egoísmo e pode ser resumido com a única palavra que é
antitética ao egoísmo: amor (Romanos 13:9-10). Segundo as Escrituras, o
amor é paciente, bondoso, doa-se sacrificialmente e não busca o seu próprio
interesse (1 Coríntios 13:4-5). É evidente que devemos amar os outros e
evitar o egoísmo. Pelo menos, é evidente que não queremos que os outros nos
explorem. Por esse motivo, a culpa não vem da quebra de um princípio
abstrato de vida, mas do fato de prejudicar outro indivíduo, ou seja, por trazer
vergonha a um Deus pessoal que nos criou para a sua glória.
Segundo a Bíblia, conhecemos o certo e o errado porque a lei de Deus
está escrita em nossos corações (Romanos 2:15). Se não soubéssemos
instintivamente o certo e o errado, não estaríamos constantemente
justificando, condenando ou desculpando-nos a respeito das coisas que
pensamos, sentimos e fazemos (Romanos 2:14-15). Não há razão para dar
desculpas se não existe o padrão do fair play ou se esse padrão não estivesse
enraizado em um Deus pessoal. Estamos condenando ou justificando a nós
mesmos quanto às coisas que fazemos (Romanos 2:15). É evidente que todos
conhecemos o certo e o errado, porque ficamos orgulhosos ou frustrados
conosco mesmos. Se não houvesse um padrão de fair play, não nos
sentiríamos culpados nem orgulhosos. Mas, pelo fato de sabermos como
deveríamos agir, nossa irracionalidade é indesculpável.
Além disso, todos nós aprovamos o padrão de fair play. Nunca conheci
uma pessoa sã que, consciente ou intencionalmente, queira ser maltratada,
lesada ou explorada. Com poucas exceções, as pessoas concordam que o
amor é melhor do que o egoísmo. O problema não é que exista um padrão,
mas sim que não cumprimos os seus requisitos.
O comportamento egoísta nos conduziu à autocondenação. Assim, a
culpa faz parte da condição humana. Se negarmos isso, apenas sofreremos
mais culpa porque sabemos que estamos mentindo para nós mesmos. Ou seja,
se formos honestos conosco mesmos, não podemos negar a nossa vergonha e
culpa. Embora não exista uma prova empírica para distinções éticas, não
podemos nos livrar do padrão externo. Ao mostrar como devemos nos
comportar, a lei revela com que frequência não cumprimos as suas
obrigações.
Algumas verdades, como a lei do fair play, são evidentes por si
mesmas, o que significa que algumas verdades são aceitas sem provas. De
fato, nenhum de nós, incluindo os ateus, pode provar tudo o que acredita.
Existem certas verdades que todos nós naturalmente tomamos como
garantidas. Por exemplo, não faz sentido pensar que só acreditamos em ideias
que possam ser comprovadas como verdadeiras. Se tudo tivesse que ser
provado por razão ou experiência, nada poderia ser provado. Se fossem
necessárias evidências para todas as proposições em que acreditamos,
precisaríamos acreditar em proposições infinitas. Mesmo se tivéssemos
tempo suficiente para responder a uma regressão infinita[54] de perguntas,
seríamos forçados a admitir que nossa incapacidade de encontrar qualquer
verdade última nos deixaria sem garantia para qualquer uma de nossas
crenças. Até o evidencialista convicto Antony Flew admitiu que todo
“sistema de explicação deve começar em algum lugar… Então,
inevitavelmente, todos esses sistemas incluem pelo menos alguns
fundamentos que não são eles mesmos explicados”.[55]
Felizmente, existem coisas como verdades autoevidentes. As verdades
evidentes demonstram a sua veracidade sem a necessidade de confirmação,
demonstração ou prova extra. “2 + 2 = 4” e “nenhum homem é casado e
solteiro ao mesmo tempo” são exemplos de verdades autoevidentes. Não
precisamos viajar até o fim de um poço sem fundo e responder a uma
regressão infinita de perguntas, pois podemos construir e ancorar nosso
conhecimento em verdades autoevidentes.
Chamamos essas verdades autoevidentes, como a lei do fair play, de
axiomas. Um axioma é uma premissa ou ponto de partida que é dado como
certo antes de produzir qualquer conhecimento adicional. Axiomas são
crenças autoevidentes que ancoram o restante de nossas crenças.
A Lógica é Autoevidente
Outra verdade autoevidente é a lei da não contradição. Por exemplo, a
lei da não contradição não pode ser provada de uma forma ou de outra. Ela
afirma que algo não pode ser completamente verdadeiro e completamente
falso ao mesmo tempo e no mesmo sentido. Ou seja, um elefante totalmente
cor de rosa não pode ser também totalmente azul. Isso seria uma contradição.
Embora todos saibamos que isso é verdade, não podemos prová-lo. Usar a
lógica para provar a lei seria uma forma de raciocínio circular, já que
teríamos que assumir o que queremos provar. A lei da não contradição
também não pode ser comprovada pela experiência sensorial, visto que leis
imateriais, como as leis da lógica, não podem ser examinadas ou testadas
pelo método científico. No entanto, sem o uso da lei da não contradição, o
raciocínio dedutivo e os experimentos científicos indutivos são impossíveis.
Portanto, se você acredita na lei da não contradição, acredita em algo que não
pode ser comprovado como verdadeiro. Esse é um axioma, se você preferir,
que deve ser tomado como garantido antes que qualquer outro conhecimento
possa ser obtido.
Além disso, aqueles que são tolos o suficiente para tentar negar a lei da
não contradição acabam contradizendo a si mesmos no processo. Sem a lei da
não contradição, uma afirmação positiva ou negativa pode ser totalmente
verdadeira e totalmente falsa ao mesmo tempo e no mesmo sentido. Se esse
fosse o caso, palavras e declarações proposicionais não significariam nada.
Além disso, negar as leis da lógica é usar uma lógica que é irracional. Assim,
negar as leis da lógica é argumentar de maneira autorreferenciada e absurda.
Aqueles que rejeitam intelectualmente a natureza absoluta e universal
da lógica se declaram tolos já no início. Felizmente, esses pensadores
absurdos não praticam as suas crenças no mundo real. Eles ainda dirigem no
lado direito da estrada assim como procuram evitar a contramão. Aqueles que
negam intelectualmente as leis da lógica provam ser mentirosos
ridiculamente absurdos ou grosseiros. Se encontrarmos uma pessoa assim,
que teimosamente se recusa a seguir as regras, a coisa mais prudente a se
fazer é simplesmente ir embora.
Deus é Autoevidente
Verdades autoevidentes, como a lei do fair play e a lei da não
contradição, devem ser aceitas antes que possamos acreditar racionalmente
em qualquer outra coisa. Com isso em mente, a cosmovisão bíblica oferece
três verdades básicas que são necessárias para um sistema coerente de
pensamento. Essas verdades são a lógica, distinções morais e Deus.[56]
Sim, Deus é uma crença básica que existe dentro de todos os homens.
[57]
Interiormente, todos sabemos que isso é verdade. Segundo a Bíblia, essas
três coisas estão pré-escritas na consciência de todos. Essas coisas são
inerentes porque são condições necessárias pré-programadas em nossas
consciências, para que possamos construir pensamentos significativos e
crenças cognitivas à medida que interagimos com o mundo exterior.[58]
“Tudo o que é significado”, pela palavra inerente, segundo Charles
Hodge (1797-1878), teólogo de Princeton, “é que a mente é constituída de tal
modo que percebe que certas coisas são verdadeiras sem prova e sem
instrução”.[59] Como João Calvino sabiamente escreveu o seguinte: “Donde
inferimos que essa não é uma doutrina que é aprendida pela primeira vez na
escola, mas uma doutrina sobre a qual todo homem é, desde o ventre, seu
próprio mestre; uma doutrina que a própria natureza não permite que nenhum
indivíduo esqueça, embora muitos, com toda a sua força, se esforcem para
fazê-lo”.[60]
Portanto, Calvino declarou ousadamente: “Existe na mente humana e,
de fato, por instinto natural, uma consciência da divindade”.[61] A consciência
da divindade, também conhecida como sensus divinitatis, de acordo com
Alvin Plantinga: “É uma disposição ou conjunto de disposições para formar
crenças teístas em várias circunstâncias, em resposta aos tipos de condições
ou estímulos que desencadeiam o funcionamento desse senso da divindade”.
[62]

Pode ser verdade, como indicado por Plantinga, que a experiência (ou
seja, a percepção da revelação geral) é necessária para que essas disposições
ou crenças intuitivas sejam ativadas, mas, mesmo assim, sem essas crenças
intuitivas, não poderíamos entender a autoconsciência e o mundo ao nosso
redor.[63] A experiência não poderia ser interpretada sem essas disposições
intuitivas ou crenças básicas. Isso significa, como veremos, que há certas
verdades (como Deus) que devem ser pressupostas antes que a razão ou a
experiência possam funcionar de modo adequado.
De fato, como explicarei mais detalhadamente na quinta parte deste
livro, o conhecimento de Deus é uma condição necessária para todo o
conhecimento. Segundo o professor do Seminário de Westminster, K. Scott
Oliphint, “este é um conhecimento que é pressuposto por qualquer (talvez
todos) outro conhecimento”.[64] Nenhum de nós, de acordo com Cornelius
Van Til (1895-1987), ex-professor emérito de apologética do Westminster
Theological Seminary, “poderia proferir uma única sílaba, seja em negação
ou afirmação, a menos que fosse pela existência de Deus”.[65]
Como veremos no capítulo 12, embora um ateu possa saber com razão
quem venceu a Copa do Mundo de 1970, um ateu não pode explicar a origem
das leis imateriais da física ou a origem da consciência humana. E tanto as
leis da física quanto a da consciência são uma parte vital do jogo de futebol.
Agora, ainda mais importante, assim como um ateu não consegue fornecer
um sistema racional abrangente, baseado em uma visão de mundo coerente
(ou seja, uma grande metanarrativa) — como eu espero demonstrar no
capítulo 14 — assim também o ceticismo não pode deixar de corroer como
um ácido universal e destruir cada porção de conhecimento. Se seguido até o
seu fim lógico, o ateísmo leva ao niilismo, e até mesmo eventos históricos,
como a Copa de 1970, são questionáveis. Em outras palavras, se o
conhecimento de Deus (que pressupõe distinções lógicas e morais) não fosse
pré-fornecido, a construção de uma visão de mundo coerente seria
impossível.
Especificamente, como sabemos que essas três verdades (Deus, lógica e
distinções morais) são inerentes a todos nós? Sabemos disso não apenas
porque essas crenças são confirmadas pelo testemunho interno de nossas
consciências, mas também porque sem esses conceitos, como veremos, nada
faz sentido. Nós precisamos de Deus, de lógica e de moralidade para
formular uma visão de mundo coerente que possa ser vivida em nosso
cotidiano. Suprimir ou eliminar o conhecimento dessas verdades conduz ao
absurdo.
Isso não significa, no entanto, que haja três crenças independentes e
intuitivas (Deus, lógica e distinções morais), pois a racionalidade (lógica) e a
retidão (distinções morais) são essenciais para a própria natureza de Deus. A
lei escrita na consciência do homem não é uma ideia abstrata de justiça que
existe fora de Deus. A lei é o caráter moral de Deus. Deus é justo. Deus é
logicamente consistente com sua própria natureza. Ele não pode contradizer
seu caráter. Deus não pode ser não-Deus. As leis da vida ética e as leis do
pensamento não são construções sociais ou princípios abstratos
independentes de Deus. Deus não está debaixo da lei. Ele é a lei. Ou seja, a
lei é um reflexo de sua essência moral. As leis da lógica e da moralidade
existem porque Deus existe.
Conclusão
Em outras palavras, a verdade suprema é Deus. O sensus divinitatis
inclui o conhecimento da lógica e das distinções morais, porque essas
verdades são essenciais para o conhecimento de Deus. Sem Deus, as leis do
comportamento e do pensamento seriam inexistentes. Em outras palavras,
nossas consciências culpadas, que derivam de nosso conhecimento das leis da
lógica e da moralidade, elas pressupõem Deus. O inverso também é
verdadeiro. Nosso conhecimento de Deus pressupõe as leis da moral e da
lógica.[66] Não podemos ter conhecimento das leis da moral e da lógica sem
ter o conhecimento de Deus.[67] Como essas crenças são inerentes,
incorrigíveis e necessárias, a Bíblia não procura provar essas coisas, mas as
aceita como realidades irrefutáveis. Toda verdade deve ser construída sobre o
conhecimento de Deus, ou, como veremos, não há fundamento para o
conhecimento.
6

Moldados pela Consciência

Visto que Deus é a verdade suprema, Ele também deve ser a fonte de toda
verdade.[68] Toda verdade vem de Deus e aponta para Deus. Sem a
autorrevelação de Deus, a verdade é impossível. “A existência de Deus”, diz
Don Collett, professor de Antigo Testamento na Trinity School of Ministry,
“é a base de toda afirmação, de modo que não se pode fazer uma afirmação
verdadeira ou falsamente sobre qualquer coisa, a menos que Deus exista”.[69]
Por que o Conhecimento é Possível
No entanto, como conhecemos a verdade? Como o conhecimento de
Deus é possível? Como a revelação é possível? Como vimos na introdução, o
pseudo-Dionísio afirmou que, por causa da infinita transcendência de Deus,
Ele não pode se revelar ao homem. Emanuel Kant, por outro lado, afirmou
que o conhecimento de Deus é impossível por causa das limitações
epistemológicas do homem finito. De qualquer maneira, o abismo entre um
Deus infinito e um homem finito é muito grande para Deus ou o homem
atravessarem. De acordo com a Bíblia, porém, Deus não é apenas capaz de se
revelar, mas ele de fato se revelou a nós através de seu Filho, Jesus Cristo.
Jesus é a Palavra de Deus (João 1:1). Jesus é a sabedoria de Deus (1 Coríntios
1:24). Jesus é a luz (João 1:4). Jesus é a verdade (João 14:6). Toda a verdade
deriva da mente de Deus, e Jesus Cristo, como a imagem expressa de Deus, é
o canal através do qual a mente de Deus é comunicada ao homem.[70]
O conhecimento de Deus, do eu e do universo revela a glória de Deus,
e essa glória nos foi comunicada por meio de Jesus Cristo. Como Carl Henry
(1913-2003), fundador da revista cristã popular Christianity Today, afirmou:
“O Logos [a segunda pessoa da Trindade] de Deus — pré-encarnado,
encarnado e agora glorificado — é o agente mediador de todas as revelações
divinas. Ele é o único Mediador da revelação do Deus Vivo”.[71]
Como qualquer obra de arte ou maravilha da engenharia revelam a
sabedoria e a criatividade do artista ou engenheiro, a criação revela a
sabedoria e o poder de Deus. “Os céus declaram a glória de Deus; os céus
proclamam as obras de suas mãos” (Salmos 19:1). E “toda a terra está cheia
da sua glória” (Isaías 6:3). “Porque as suas coisas invisíveis, desde a criação
do mundo, tanto o seu eterno poder como a sua divindade, se entendem, e
claramente se veem pelas coisas que estão criadas, para que eles fiquem
inescusáveis” (Romanos 1:20). George Park Fisher (1827-1909), professor
emérito de divindade em Yale, declarou: “Um cão olha para uma página
impressa apenas como marcas sem sentido em um fundo branco. Para nós,
elas contêm e transmitem ideias, e nos fazem ter comunhão com a mente do
autor. O mesmo acontece com a natureza”.[72] Ele continuou dizendo:
“Ignorar Deus como autor da natureza, assim como da mente, é tão absurdo
quanto considerar que um hino é o resultado de um som aleatório”.[73]
No entanto, o conhecimento dos atributos invisíveis de Deus, que são
claramente manifestos na criação, chegou até nós por meio de Cristo. Como
está escrito: “No princípio era o Verbo, e o Verbo estava com Deus, e o
Verbo era Deus. Ele estava no princípio com Deus. Todas as coisas foram
feitas por ele, e sem ele nada do que foi feito se fez (João 1:1-3)”. Como
instrumento através do qual Deus criou todas as coisas, o conhecimento
derivado do universo chega até nós pelo poder imanente de Jesus Cristo.
Cristo não é apenas o meio da revelação geral, mas também o Mediador
da revelação especial. Não apenas aprendemos sobre as obras de Deus
através de Cristo, como descobrimos a natureza de Deus através de Cristo.
Como podemos ver o Deus invisível? Ao olhar para Cristo, ele é a “imagem
do Deus invisível” (Colossenses 1:15). Deus se manifestou ao se encarnar.
Ele se aproximou tornando-se um de nós. “E o Verbo se fez carne, e habitou
entre nós, e vimos a sua glória, como a glória do unigênito do Pai, cheio de
graça e de verdade” (João 1:14). Embora ninguém jamais tenha visto Deus,
Cristo o revelou (João 1:18). A santidade, a justiça, a misericórdia, o amor e a
própria natureza de Deus foram manifestados neste mundo através da pessoa
e da obra de Jesus Cristo. Por exemplo, se queremos aprender sobre a justiça
e a misericórdia de Deus, tudo o que precisamos fazer é olhar para a cruz.
Como as Escrituras dizem: “…[Deus] falou-nos nestes últimos dias pelo
Filho… por quem fez também o mundo. O qual, sendo o resplendor da sua
glória, e a expressa imagem da sua pessoa, e sustentando todas as coisas pela
palavra do seu poder…” (Hebreus 1:1-3). Embora Deus seja transcendente e
separado do homem, ele também é imanente. Em Cristo, ele nunca está longe
de nós. Verdadeiramente, Jesus é o caminho, a verdade e a vida. Não há outro
caminho para Deus senão por meio dele (João 14:6).
Como o reflexo perfeito de Deus, Cristo é capaz de revelar a mente
infinita de Deus à mente dos homens. Porém, como o finito é capaz de
compreender o infinito? Mesmo através da mediação de Cristo, como o
homem pode ser o receptor apropriado da revelação natural e sobrenatural?
Embora exista um imenso abismo entre a Divindade e a humanidade, esse
abismo não é imensurável. O conhecimento de qualquer coisa requer alguma
forma de similaridade ou relacionamento análogo. É necessário algum ponto
de conexão entre Deus e o homem para que a comunicação seja possível. E é
exatamente isso que encontramos em Gênesis 1. Deus, em Cristo, criou todas
as coisas para revelar a sua glória, então criou o homem à sua própria
imagem e semelhança. Visto que o homem é feito à imagem de Deus (isso é
conhecido como Imago Dei), então ele não é idêntico a Deus, mas também
não é totalmente diferente. Essa relação análoga entre Deus e o homem é o
que torna o homem capaz de receber e compreender a revelação divina
(Gênesis 1:26). Como veremos, o Imago Dei nos capacita para um
conhecimento inato e incorrigível de Deus e de nós mesmos e nos fornece o
aparato para entendermos de modo adequado o mundo ao nosso redor.
O homem faz parte da revelação natural porque Deus o criou. Junto
com o restante da criação, a humanidade revela a glória e a sabedoria de
Deus. O homem revela Deus porque ele faz parte da sua criação, porém, e
mais importante, o homem revela Deus porque ele foi criado à semelhança de
Deus. Porque o homem não pode evitar conhecer a si mesmo, ele não pode
deixar de conhecer a Deus imediatamente. Essas verdades básicas fazem
parte do Imago Dei e fornecem ao homem um conhecimento imediato de
Deus através do conhecimento de si mesmo. João Calvino estava tão
convencido disso que iniciou sua obra magna, As Institutas da Religião
Cristã, com estas palavras:
Quase toda a sabedoria que possuímos, ou seja, a verdadeira e sã
sabedoria, consiste em duas partes: o conhecimento de Deus e o
conhecimento de nós mesmos. Mas, embora unidos por muitos
vínculos, não é fácil discernir qual precede e produz o outro. Em
primeiro lugar, ninguém pode olhar para si mesmo sem voltar
imediatamente os seus pensamentos para a contemplação de Deus,
em quem vive e se move… Outrossim, é um fato que o homem nunca
alcança um conhecimento claro de si mesmo, a menos que tenha
olhado primeiro para a face de Deus, e depois baixe o seu olhar de
contemplá-lo para examinar a si mesmo.[74]
Não podemos nos conhecer sem conhecer a Deus porque somos feitos à
imagem de Deus.[75] Porque não podemos deixar de conhecer a nós mesmos,
o conhecimento de Deus é inato. Nossa vida, à medida que nos foi dada
mediante o sopro de Deus em nós, nos concede luz suficiente para que
vejamos Deus (Salmos 56:13). Ao vermos a nós mesmos, vemos um reflexo
de Deus. Ter uma vida análoga à vida de Deus nos dá conhecimento de Deus,
ou como disse Van Til: “Para o homem, a autoconsciência pressupõe a
consciência de Deus”.[76] Fisher também entendeu que a crença “na
personalidade do homem e na personalidade de Deus permanecem ou caem
juntamente”.[77] Nossa consciência de Deus (sensus divinitatis) é o resultado
de sermos feitos à imagem de Deus. Oliphint afirma: “Em virtude de…
Sermos criado à imagem de Deus, sempre e em toda parte [levamos] o
conhecimento de Deus [conosco]”.[78] “Esse conhecimento não vem do
exercício apropriado e diligente de nossas capacidades cognitivas, emotivas
ou volitivas; antes, vem pela própria atividade reveladora de Deus dentro de
nós”.[79]
Isso significa que o conhecimento de Deus é intuitivo. O conhecimento
de Deus “é imediato”, de acordo com Oliphint, “porque não é obtido por
meio de inferência. Não há nada que façamos — nenhuma demonstração,
nenhum silogismo — que seja a base para a aquisição desse conhecimento”.
[80]
“O conhecimento de Deus é implantado (ou inserido)”.[81] Oliphint
continuou dizendo que ele é “dado a nós pelas coisas que são criadas pelo
próprio Deus”.[82] Como Fisher disse muitos anos antes: “A fonte suprema da
crença em Deus não está nos processos de argumentação. Sua presença é
mais manifesta[da] imediatamente”.[83]
O conhecimento de Deus é o que alguns filósofos chamam de uma
crença básica propriamente dita. Plantinga diz que as crenças básicas “não
são aceitas com base em evidências a partir de outras proposições”.[84] As
crenças básicas são semelhantes à memória ou às crenças perceptivas. Elas
não são inferidas ou deduzidas. Não precisamos de evidência ou
argumentação racional para crermos em Deus assim como não precisamos de
evidência ou argumentação para cremos nas memórias.
De acordo com Plantinga, “o sensus divinitatis é uma faculdade (ou
poder ou mecanismo) que produz crenças que, nas condições certas,
produzirão outras crenças que não são baseadas em evidências de outras
crenças”.[85] “Essa capacidade de conhecimento de Deus”, diz Plantinga, “faz
parte do nosso equipamento cognitivo original, parte do estabelecimento
epistêmico fundamental com o qual fomos criados por Deus”.[86]
A imago Dei nos dá a capacidade de conhecer a Deus, porém faz mais
do que isso — fornece-nos um conhecimento inerente a Deus (sensus
divinitatis). Ele nos concede distinções morais e lógicas. Embora isso possa
não parecer imediatamente claro, devemos entender que o conhecimento de
Deus, que é implantado em nós, não é simplesmente o conhecimento de um
ser abstrato (que chamamos de Deus), mas é o conhecimento de um ser
pessoal, moral e racional. Isso significa que as leis da lógica e da moralidade
são essenciais para a essência de Deus e foram impressas em nós porque
somos feitos à semelhança desse Deus. Ser criado à imagem de Deus nos
fornece uma mente racional e um padrão ético que garante o conhecimento de
Deus, do mundo ao nosso redor e de nós mesmos.[87] Conhecemos o certo e o
errado. Entendemos que “A” não pode ser “A” e “não-A” no mesmo sentido
e ao mesmo tempo porque somos feitos à imagem de Deus. Fomos projetados
para conhecer a Deus porque fomos criados à sua imagem e recebemos as
ferramentas cognitivas necessárias para ver Deus enquanto observamos a nós
mesmos e o mundo ao nosso redor. Conhecemos a Deus porque fomos feitos
para ser seres racionais e éticos.
Por consequência, ser criado à imagem de Deus significa que a nossa
própria autoconsciência é parte da revelação geral de Deus. Isso implica que
a revelação geral que Deus faz de si mesmo é interna (em nossa própria
autoconsciência) e externa (no universo físico que nos rodeia). E essa
revelação interna (sensus divinitatis) nos dá a capacidade de interpretar
adequadamente a mensagem da revelação externa de Deus.
Mais especificamente, ser feito à imagem de Deus nos dá o aparato
para vermos a semelhança de Deus em nós mesmos, bem como a glória de
Deus na criação. O sensus divinitatis garante que o universo seja eficaz em
revelar o conhecimento de Deus. Como observou erudito Greg Bahnsen
(1948-1995), quando residente no Southern California Center for Christian
Studies: “O homem é criado à imagem de Deus para se envolver no mundo
de modo racional. A mente do homem não é apenas análoga à de Deus, mas é
compatível com o universo criado por Deus por causa de Deus ter projetado a
nós mesmos e o nosso ambiente”.[88] Calvino disse: “Os homens não
conseguem abrir os olhos sem serem obrigados a vê-lo”.[89] Ele continuou
afirmando: “Para onde quer que você olhe, não há lugar no universo em que
você não consiga discernir pelo menos algum brilho de sua glória”.[90] “A
intenção de Moisés ao iniciar o seu livro com a criação do mundo é, por
assim dizer, tornar Deus visível para nós em suas obras… como um espelho
no qual devemos contemplar Deus”.[91]
Por esse motivo, John Murray (1898-1975), professor de teologia em
Princeton e depois em Westminster, afirmou:
Foi por sua vontade soberana que Deus criou o universo e nos fez
homens à sua imagem. Mas, como a criação é o produto de sua
vontade e poder, a marca de sua glória está necessariamente impressa
em sua obra, e, como somos criados à sua imagem, não podemos
deixar de ser confrontados com a manifestação dessa glória.[92]
Isso é ecoado por John Frame, um dos principais intérpretes da filosofia
de Cornelius Van Til, o qual afirma que “conhecemos Deus por meio do
mundo. Toda a revelação de Deus vem por meios criacionais… Portanto, não
podemos saber nada sobre Deus sem conhecer algo sobre o mundo ao mesmo
tempo… Não podemos conhecer o mundo sem conhecer Deus”.[93]
Plantinga explica como a criação revela o conhecimento de Deus para
nós:
Não é que alguém contemple o céu noturno, observe que ele é
grandioso e conclua que deve haver uma pessoa como Deus; um
argumento como esse seria ridiculamente fraco… É mais do que isso,
através da percepção do céu noturno, da vista da montanha ou da
pequenina flor, essas crenças simplesmente emergem em nós. Elas
são ocasionadas pelas circunstâncias; elas não são conclusões a partir
delas.[94]
Sendo feitos à imagem de Deus, a revelação de Deus (sensus
divinitatis) está sempre presente em nós. Mesmo que todas as nossas
memórias fossem apagadas, não perderíamos de vista Deus. “Sempre
renovando sua memória”, comentou Calvino, “ele lança repetidamente gotas
frescas… Pessoas de bom senso sempre terão certeza de que um senso da
divindade que nunca pode ser apagado está gravado na mente dos homens”.
[95]
Ao interagirmos com o mundo ao nosso redor, nossas próprias vidas não
podem deixar de continuamente revelar Deus para nós. A revelação natural
fala conosco mesmo quando não queremos ouvir a sua mensagem. É uma voz
constante que não pode ser silenciada. Oliphint afirma que é “um
conhecimento que Deus infunde em suas criaturas humanas, e continua a
infundir nelas, mesmo que continuem a viver os seus dias negando ou
ignorando-o”.[96]
Além da imago Dei imprimir, reproduzir e duplicar dentro de nós o
conhecimento de Deus, quando ela é renovado em Cristo e está funcionando
adequadamente, então nos capacita com as propriedades necessárias para
conhecermos Deus de modo experiencial. Deus nos criou à sua própria
imagem porque nos fez seres racionais e moralmente retos (Eclesiastes 7:29).
Antes que a semelhança de Deus no homem fosse desfigurada pela queda, ela
consistia no conhecimento racional de Deus e na retidão moral de amar e
obedecer a Deus. Calvino continuou dizendo: “Pelo fato de que sabemos que
os homens têm essa qualidade única acima dos outros animais, que eles têm
gravada em sua consciência a distinção entre o certo e o errado; assim
também não há homem em quem não penetre alguma consciência da luz
eterna”.[97] A humanidade tem essa marca porque fomos criados para ter mais
do que uma concepção intelectual de Deus. Fomos criados à semelhança de
Deus para que pudéssemos desfrutar e glorificar a Deus em nossas vidas.
Fomos criados para ter um relacionamento pessoal com Deus. Antes que a
imagem de Deus fosse manchada pelo pecado na queda, o homem estava
capacitado, segundo Martinho Lutero, “a amar a Deus, a crer em Deus, a
conhecer a Deus”.[98] Em resumo, ser criado à semelhança de Deus torna
possível que vivamos em um relacionamento mutuamente amoroso com
nosso Criador.[99]
Fomos projetados e eficientemente capacitados para desfrutar de um
relacionamento amoroso e pactual com Deus. No entanto, nossa culpa é a
evidência de que esse relacionamento pactual foi quebrado. Mesmo sem a
instrução de outros, porque somos feitos à imagem de Deus, não podemos
deixar de concluir imediata e irresistivelmente que nosso fracasso é um
fracasso contra um Deus pessoal. O fracasso em viver de acordo com as leis
do pensamento correto e as leis do comportamento correto é um fracasso não
apenas da nossa própria natureza, mas também um fracasso contra um Deus
pessoal que nos fez à semelhança de sua natureza.
A culpa testemunha o fato de que nosso relacionamento com o Criador
está rompido. Pois, um Deus que é racional e justo não é apenas uma força
sobrenatural e impessoal, mas uma pessoa viva, pensante, emocional e justa.
Alguém que tem o direito e o poder de nos dizer como viver. Por nos
conhecermos desse modo, não podemos deixar de entender essa realidade.
Imediatamente compreendemos pelo testemunho de nossas vidas e do mundo
ao nosso redor que estamos em algum relacionamento análogo com um Deus
pessoal e santo.[100]
Em Guerra Contra Deus e Contra Nós Mesmos
Sermos criados à imagem de Deus pode ter nos capacitado
originalmente para termos um relacionamento pessoal com Deus, mas o
pecado rompeu esse relacionamento há muito tempo. Como uma pintura que
foi desgastada pela exposição ao sol, a semelhança de Deus ainda está
presente em nós. No entanto, não é mais uma representação pura, pois a
imago Dei não funciona mais de acordo com o propósito original.
Consequentemente, como observamos no capítulo 4, sendo movidos
pelo interesse próprio, não podemos mais pensar ou viver de um modo que
reflita perfeitamente a glória da imagem de Deus. Nossos pensamentos,
afeições e vidas não são mais uma representação pura da semelhança de
Deus. Em vez de nos sentirmos atraídos pelo conhecimento de Deus que
permanece impresso em nossas consciências, estamos em guerra contra esse
conhecimento. O conhecimento de Deus permanece, mas o amor a Deus foi
suplantado pelo amor próprio. Embora o conhecimento do certo e do errado
ainda fale em nossas consciências, o desejo de amar a Deus e ao próximo
acima de nós mesmos não está mais presente em nossos corações. Embora as
leis racionais da mente (lógica) ainda estejam impressas em nosso
pensamento, à parte a graça de Deus, falta a consistência intelectual e prática
de viver em coerência com essas leis. O pecado é irracional, pois distorce,
deturpa e perverte uma mente sã e conduz a um comportamento tolo e
pecaminoso adicional.
Como resultado, as nossas consciências culpadas demonstram tanto o
nosso conhecimento de Deus quanto a nossa rejeição a esse conhecimento.
Essa culpa torna a santidade de Deus aterrorizante. Como Adão e Eva se
esconderam de Deus depois que o desobedeceram, procuramos suprimir o
conhecimento de Deus em injustiça (Romanos 1:18). Essa é nossa maneira de
nos escondermos de Deus. Isso acontece toda vez que deixamos de dar graças
a Deus (Romanos 1:21). Deixar de reconhecer Deus é o primeiro passo para o
ateísmo prático. Muitos de nós não negam intelectualmente a existência de
Deus. Simplesmente vivemos como se ele não existisse ou como se ele não
estivesse nos observando. Quando pensamos que afastamos o olhar santo de
Deus de nossas vidas, sentimos que não somos mais responsáveis por nossas
ações. Depois vem toda uma série de práticas pecaminosas que endurecem
ainda mais nossa mente e coração para com Deus (Hebreus 3:13). Como
Jonas fugiu de Deus, também procuramos fugir do conhecimento de Deus e
encontrar refúgio na frieza das trevas.
Até onde estamos dispostos a ir para longe de Deus? Embora todos nós
tenhamos nascido com o conhecimento de Deus, queremos viver e morrer
como ateus práticos. Para justificar nosso comportamento irracional,
concebemos sistemas de pensamento contraditórios e irracionais que
eliminam Deus da equação. Como naturalmente colocamos nossos próprios
interesses acima dos interesses de Deus, gostaríamos de pensar que somos
intelectualmente autossuficientes. Não precisamos nos submeter à revelação
divina. Do mesmo modo que suprimimos a culpa, procuramos abafar a nossa
consciência de Deus. O sensus divinitatis deve ser erradicado. Queremos
determinar o que é certo e errado, e o que é verdadeiro e falso para nós
mesmos, em vez de reconhecermos que todo conhecimento vem de Deus.
Isso aconteceu quando Eva questionou Deus no Jardim (Gênesis 3:4-6). E
desde então, tentamos nos tornar a fonte de nossas próprias crenças.
Estamos em guerra contra Deus e contra nós mesmos. Nós odiamos a
Deus, mas não podemos eliminar completamente o selo de Deus de nossa
própria consciência. Lutamos contra a realidade de que somos feitos à
imagem de Deus. Como Oliphint afirmou com razão: “É essa imagem de
Deus que é o pressuposto por trás de tudo o que somos”.[101] Assim, ficamos
atormentados e tentamos fugir de Deus porque carregamos o conhecimento e
o reflexo de Deus conosco onde quer que vamos. Ficamos perturbados
porque carregamos o conhecimento de Deus em nós mesmos.
Gostaríamos de nos libertar não apenas do conhecimento de Deus, mas
também das leis da lógica e da moralidade gravadas em nossos corações. As
leis são vinculativas e apontam para um legislador. Os padrões éticos servem
apenas para reforçar os nossos corações culpados. Por mais que tentemos,
não podemos viver sem as leis da lógica e da moralidade que derivam do
conhecimento de Deus, porque sem o conhecimento de Deus todo
conhecimento é impossível.
O pensador pós-moderno pode tentar viver sem absolutos, mas para
onde quer que se vire, colide com uma barreira lógica imóvel que o prende. O
homem, diz Van Til, “constantemente joga água no fogo que ele não
consegue apagar”.[102] O homem pode suprimir a verdade, porém a verdade
não morre. Não pode morrer. Entendendo isso, Calvino declarou:
Finalmente, eles se envolvem em uma montanha tão grande de erros
que a sua impiedade cega os sufoca e, por fim, apaga as faíscas que
uma vez surgiram para demonstrar a glória de Deus. Contudo,
permanece a semente, que de maneira alguma pode ser arrancada, de
que existe algum tipo de divindade; mas essa semente está tão
corrompida que, por si só, produz apenas os piores frutos.[103]
Até que ponto os homens depravados desfigurarão a imagem
remanescente de Deus que está impressa em sua natureza? Como veremos
nos próximos capítulos, eles chegarão ao ponto de negar a natureza universal
das leis da lógica e dos absolutos morais. Se a sanidade racional exige
submissão a Deus, o homem provou que está mais disposto a abraçar o
absurdo intelectual do que se sujeitar ao conhecimento da verdade.
Como os homens caídos preferem aceitar uma mentira a se submeterem
à verdade, eles ficam diante de um espelho desfigurando, ferindo e rasgando
os seus rostos para remover a imagem de Deus que está diante deles. Eles
desejam erigir um deus formado à sua própria semelhança humana, em vez
de se submeterem ao Deus que os criou à sua própria semelhança divina. Eles
preferem adorar um ídolo tolo para obter independência intelectual do que se
submeterem ao Deus de toda a sabedoria. Ao fazer isso, estão dispostos a
vender as suas almas por um prato de lentilhas. O absurdo e a consciência
culpada, no entanto, são coisas das quais a humanidade, feita à imagem
divina, nunca se livrará até que se volte para Cristo e dobre os joelhos ao seu
senhorio eterno.
Conclusão
Como veremos no próximo capítulo, sem nos submetermos a essas três
verdades inatas e que não podem ser erradicadas (lógica, moralidade e Deus),
não podemos pensar ou viver de modo coerente. Essas verdades básicas são
condições necessárias para o conhecimento. Em outras palavras, negar a
existência de Deus (o que inclui a negação das leis da lógica e das distinções
morais) leva alguém a pensar e se comportar de modo absurdo. Sem Deus,
todas as coisas desmoronam.
Entretanto, darei um passo adiante nos capítulos seguintes. Para
qualquer um de nós ter uma visão holística do mundo que seja capaz de
responder às questões mais profundas da vida, não é necessário apenas
qualquer deus. É necessário o Deus triuno da Bíblia. Embora nem todas as
alegações de verdade da Bíblia sejam inatas, elas consistem na única estrutura
lógica e coesa que está em perfeita concordância com o conhecimento
inerente da lógica, da moralidade e de Deus. A cosmovisão bíblica é o único
sistema coerente de pensamento. Somente quando nos submetemos à
autoridade de Deus podemos escapar do nosso próprio pensamento
incoerente e disfuncional. Até que isso ocorra, a consciência culpada, o
pensamento e o comportamento irracionais continuarão.
7

Moldados por Nossa Cosmovisão

Nossa percepção da realidade não é apenas controlada pelos afetos do nosso


coração, nossa percepção é controlada por nossa mentalidade. Isso parece
óbvio, mas devemos perceber que os nossos pensamentos cognitivos não são
mais neutros do que nosso coração é neutro. A maneira como pensamos sobre
qualquer assunto em particular não pode deixar de ser moldada por nossos
pensamentos sobre Deus, conhecimento e moralidade. Nossos pensamentos
sobre essas crenças centrais compõem a nossa cosmovisão, e nossa
cosmovisão molda o nosso pensamento.
Uma cosmovisão, ou o que os alemães chamam de weltanschauung, é
como um par de óculos que nos permitem observar o mundo. Se nossos
óculos forem da cor verde, teremos dificuldade em ver a verdadeira cor do
sol. Se nossos óculos tiverem tonalidade vermelha, teremos dificuldade em
identificar a verdadeira cor da grama. Até que vejamos através de lentes
claras, a realidade não aparecerá como realmente é em si mesma. O sensus
divinitatis, que inclui as leis da lógica e das distinções éticas, é o conjunto
inerente de óculos que Deus nos deu para percebermos a realidade. Todavia,
devido à nossa natureza caída, esses óculos caíram em arbustos cheios de
cardos e espinhos. O que antes era perfeitamente transparente foi
profundamente arranhado. Agora, a nossa visão está embaçada. Embora
possamos distinguir vagamente a imagem de Deus e as leis da lógica e da
moral em nossa própria natureza, não apreciamos mais a verdadeira beleza do
conhecimento, poder e glória de Deus que está claramente impressa em toda
folha de grama e em cada raio de sol.
Do mesmo modo que luz e poder são autoverificáveis, a lógica, a
moralidade e Deus são autoverificáveis. Sob que luz vemos a luz? Vemos a
luz por sua própria luz. Como o poder se prova poderoso? Prova-se por seu
próprio poder de efetuar mudanças. Como a lógica se mostra verdadeira?
Porque sem a lógica, não podemos saber de nada. Como a moralidade se
mostra inata em todos nós? Porque ficamos irados quando os outros nos
enganam e odiamos filmes que terminam mal — quando não é feita a devida
justiça aos mocinhos. Como conhecemos a Deus? Porque sem o
conhecimento de Deus, nada faz sentido. Como o restante deste livro procura
explicar, sem o Deus da Bíblia, tudo o que resta é absurdo.
O conhecimento de Deus, a lógica e a moralidade são crenças centrais
que tornam o conhecimento possível. Eles são os pilares por trás da
cosmovisão bíblica. Ou seja, a cosmovisão bíblica não se baseia apenas em
nosso conhecimento inato de Deus, da lógica e da moralidade, mas a
cosmovisão bíblica também reforça esses três pilares, fornecendo-nos o único
sistema de pensamento coeso e legítimo de defesa que corresponde a esses
pressupostos essenciais.
Como veremos, todas as outras cosmovisões não são consistentes
consigo mesmas. Essa inconsistência ocorre de duas maneiras. Ou uma
cosmovisão começa negando o conhecimento inato de Deus, a lógica e a
moralidade e, portanto, deixa de ser consistente desde o início. Ou, se uma
cosmovisão aceitar o conhecimento inato de Deus, a lógica e a moralidade
como premissas básicas, ela rapidamente negará essas premissas ao construir
um sistema de pensamento que seja inconsistente com o conhecimento de
Deus, com a lógica e com a moralidade.
Todos Têm uma Cosmovisão
Para entender isso, primeiro precisamos compreender que todos temos
uma cosmovisão. Nossa visão de mundo pode ser incoerente, ou podemos
viver de modo inconsistente com o que cremos, mas não podemos deixar de
formular, mesmo que inconscientemente, um sistema conceitual de
pensamento que incorpore as crenças mais básicas de alguém.
Ronald Nash (1936-2006), professor de filosofia do Reformed
Theological Seminary, define uma cosmovisão como “um conjunto de
crenças sobre as questões mais importantes da vida.[104] Nossas formas de
cosmovisão consistem em nossas crenças mais básicas sobre Deus, o
universo e nós mesmos”. Nash passou a afirmar:
Implícito em tudo isso, está o ponto adicional de que essas crenças
devem se unir de algum modo e formar um sistema. Um termo
sofisticado que pode ser útil aqui é um esquema conceitual, pelo qual
quero dizer um padrão ou arranjo de conceitos (ideias). Uma
cosmovisão, então, é um esquema conceitual pelo qual colocamos ou
encaixamos consciente ou inconscientemente tudo o que cremos e
pelo qual interpretamos e julgamos a realidade.[105]
Greg Bahnsen foi um pouco mais aguçado em sua descrição de uma
cosmovisão: “Uma cosmovisão é uma rede de pressupostos que não são
testados pela ciência natural e em cujos termos toda a experiência é
relacionada e interpretada”.[106] Essa definição clara afirma sucintamente
todos os principais componentes de uma cosmovisão. Trata-se de um
conjunto de pressupostos correlatos que não são derivados de experiências
sensoriais, mas são necessários para interpretar as experiências sensoriais.
James Sire, um estudioso sobre cosmovisão, lembra-nos que uma
cosmovisão é mais do que apenas um conjunto de pressupostos ou um
esquema conceitual que existe apenas na mente. Também consiste no
compromisso fundamental do coração. O que mais amamos, o que tem
relação com nossos valores éticos, tem mais a ver com nossa cosmovisão do
que com as respostas que nós daremos às questões filosóficas desconhecidas.
O que mais amamos determinará como nos sentimos sobre tudo, como
tomamos decisões e como nos comportamos. “Não seria melhor”, pergunta
Sire, “considerar uma cosmovisão como a história em que vivemos?”.[107] A
maneira pela qual vivemos (ou buscamos viver) não fala mais sobre o que
cremos do que aquilo que dizemos que acreditamos? Sire explica a
praticidade disso:
Acordo de manhã, sem me perguntar quem sou ou onde estou. Estou
imediatamente ciente de toda uma série de percepções que minha
mente ordena ao reconhecer que é manhã: Estou em casa, estou
levantando da cama. Nessa consciência imediata, não pergunto ou
respondo conscientemente: “O que é de fato real?” ou “Como sei que
estou em casa?” ou “Como posso saber a diferença entre certo e
errado?”. Antes, minha mente inconsciente está usando uma rede de
pressupostos sobre como interpretar para minha mente consciente o
que está acontecendo. De alguma forma, todas as perguntas básicas
da cosmovisão estão sendo respondidas pelo modo como estou
agindo e me comportando.[108]
Com essa questão em mente, Sire oferece uma definição expandida de
uma cosmovisão:
Uma cosmovisão é um compromisso, uma orientação fundamental
do coração, que pode ser expressa como uma história ou em um
conjunto de pressupostos (suposições que podem ser verdadeiras,
parcialmente verdadeiras ou totalmente falsas) que mantemos
(consciente ou inconscientemente, consistente ou
inconsistentemente) sobre a constituição básica da realidade, e que
fornece a base sobre a qual vivemos, nos movemos e existimos.[109]
Segundo Sire, uma cosmovisão não pode ser separada de uma “visão
do mundo e da vida”. E por esse motivo, uma cosmovisão deve não apenas
passar no teste da coerência, mas também deve passar no teste da vida.
Podemos viver consistentemente nossa cosmovisão no mundo real?
Crenças são Interconectadas
Como uma cosmovisão é um compromisso fundamental do coração e
uma estrutura cognitiva que usamos para entender tudo o que cremos,
construir uma cosmovisão — mesmo que não tenhamos plena consciência
disso — é inevitável para todos nós. Todos nós temos pressupostos. Além
disso, não podemos deixar de comparar e contrastar o que estamos
aprendendo com o que estamos convencidos de que já sabemos. Como já foi
dito, a lei da não contradição não pode ser comprovada pela lógica ou pela
ciência, mas a lógica e a ciência são construídas sobre os seus fundamentos.
Sem a lei da não contradição, nada faz sentido. A lógica é uma condição
necessária para processar dados e formular racionalmente o conhecimento.
Assim, gostemos ou não, todos nós, consciente ou inconscientemente,
utilizamos a lei da não contradição ao processar e assimilar novos dados.
Por exemplo, meu filho de cinco anos, Martyn, está aprendendo as
regras de trânsito. Se ele não tivesse um conceito inato da lei da não
contradição, ele não teria gritado comigo quando eu virei à direita e
atravessei o sinal vermelho. Ele disse: “Pare! A luz está vermelha!”. Quem
disse que o sinal vermelho sempre significa parar? Por que ele se assustou
tanto quando eu virei à direita? Ele estava assustado porque um sinal
vermelho não pode significar pare e prossiga ao mesmo tempo. Quem lhe
ensinou esse princípio lógico básico? O fato desse ser um conceito inato
permite processar novas informações e sensações com o que ele já processou
no passado. Os novos dados só fazem sentido quando comparados com os
dados antigos já armazenados em sua memória. Nesse caso, ele rejeitou a
nova informação porque ela não se encaixava com o que Martyn pensava que
já sabia. Depois de explicar que isso era uma exceção à regra, ele conseguiu
reajustar o seu pensamento e formatar um sistema de pensamento mais
complexo.
Conclusão
Todos fazemos isso porque uma única crença jamais fica isolada de
outras crenças. O que cremos sobre isso afetará consequentemente como e no
que cremos sobre aquilo. A verdade não é desarticulada de outras verdades.
Tudo no universo (como a palavra universo implica) está interconectado. Por
causa da lei da não contradição, não podemos deixar de procurar formular um
sistema coeso de pensamento. Se existe uma contradição em nossa
compreensão das regras de trânsito ou uma contradição em nossa
compreensão das complexidades do universo, então sabemos que por não
termos um sistema consistente e congruente de crenças, algo está errado em
nosso pensamento.
8

Moldados por Três Perguntas


Fundamentais

Como toda crença se correlaciona com todas as outras crenças, é impossível


não sistematizar nosso conhecimento em diferentes categorias de
pensamento. Como uma grande cômoda cheia de gavetas, pegamos o que
sabemos (ou pensamos que sabemos) sobre religião e colocamos essas
informações em uma gaveta, pegamos o que sabemos sobre ciência e
colocamos em outra gaveta, e assim por diante. Eventualmente, conforme
nosso banco de dados cresce, instalamos divisórias nessas gavetas e
começamos a fazer subcategorias de subcategorias. Se nossas mentes não
buscassem coerência, tudo isso seria impossível. Mas porque nossas mentes o
fazem de modo automático, isso também é inevitável.
Todo Sistema é Formado por Três Questões
Fundamentais
O arranjo coletivo e sistemático de todas as nossas crenças pode ser
reduzido a alguns pressupostos fundamentais. Sem dúvida, possuímos
inúmeras categorias de pensamento, mas todas as diversas categorias e
subcategorias de pensamento podem ser condensadas em três grandes
divisões: (1.) realidade objetiva, (2.) conhecimento subjetivo e (3.)
moralidade prática. Ou seja, as três questões básicas e últimas da vida são:
(1.) O que existe fora de nossas mentes? (2.) O que existe dentro de nossas
mentes? E (3.) Como nos sentimos a respeito disso? Como o conhecimento
de Deus, a lógica e a moralidade são inatos em todos nós, todo pensamento
cognitivo naturalmente se enquadra em uma dessas três categorias
abrangentes ou pontos de partida pressuposicionais. Curiosamente, essas três
categorias de pensamento correspondem muito bem aos três principais ramos
da filosofia: (1.) metafísica, (2.) epistemologia e (3.) ética.[110]
Embora essas categorias filosóficas (metafísica, epistemologia e ética)
pareçam complexas, todos nós temos crenças metafísicas, epistemológicas e
éticas. Por exemplo, mesmo os “cientistas”, afirmou Nash, “fazem suposições
epistemológicas, metafísicas e éticas importantes”.[111] Habilmente, Nash
explicou:
Eles assumem, por exemplo, que o conhecimento é possível e que a
experiência sensorial é confiável (epistemologia), que o universo é
regular (metafísica) e que os cientistas devem ser honestos (ética).
Sem essas suposições que os cientistas não conseguem justificar
dentro dos limites de sua metodologia, a investigação científica logo
entraria em colapso.[112]
Por esse motivo, Bahnsen concluiu: “As cosmovisões são sistemas de
pressupostos interligados. Como sistemas, eles incluem metafísica,
epistemologia e ética, todos ligados entre si em um sistema que sustenta a si
mesmo mutuamente”.[113]
1. O que é Real?

A metafísica[114] se preocupa principalmente com a definição última do


ser e de sua relação com o universo. A metafísica quer saber por que há algo
em vez de nada. A metafísica é, em última análise, uma questão sobre a
natureza e a existência de Deus e sobre nosso relacionamento individual com
ele. Uma das questões mais importantes para o filósofo é a questão de Deus.
Existe um Deus? De onde nós viemos? A Inteligência Divina (ou seja, Deus)
criou a matéria ou a consciência humana é derivada de um processo material
não direcionado? Em outras palavras, o que veio primeiro, a mente ou
matéria?
Se existe um Deus, qual é o nosso relacionamento com ele? Qual é a
nossa relação com o universo? Qual é a relação entre Deus e o universo?
Deus é o ser supremo, ou o universo é tudo o que existe? Deus e o universo
são o mesmo ou são distintos? Por fim, todas essas questões podem ser
resumidas nesta: Existe um Deus e, se existe, qual é a relação dele com o
universo?
Embora as muitas complexidades da vasta quantidade de diferentes
filosofias e construções religiosas possam confundir as coisas, existem
apenas três respostas possíveis para a questão de Deus — o naturalismo, o
sobrenaturalismo impessoal e o sobrenaturalismo pessoal. Além dessas três
opções, não há outras respostas possíveis.

A. Naturalismo

O naturalismo é a crença de que, se existe um Deus, Ele é totalmente


incognoscível e praticamente irrelevante. Assim, os naturalistas acreditam
que o universo é um sistema fechado e autossuficiente. A origem e a função
do universo são explicadas por causas naturais ou físicas, como a teoria da
evolução. Tudo o que é real pode ser reduzido ao mundo físico.
Segundo o matemático cristão John Byl: “O principal tema subjacente
do naturalismo é que a natureza é autossuficiente. Alega-se que a natureza
existe por si mesma, derivando todo significado e propósito de si mesma. Ele
não necessita de nada fora de si para explicar-se”.[115] Nas famosas palavras
do astrofísico Carl Sagan (1934-1996): “O cosmos é tudo o que existe, ou
sempre existiu ou sempre existirá”.[116] A natureza deve ser capaz de explicar
a si mesma. Nesse grupo estão incluídos os ateus, os agnósticos e os deístas.
[117]

B. Sobrenaturalismo Impessoal

Nesse grupo estão incluídos Yoda e seus seguidores, panteístas,


panenteístas, politeístas, animistas, monistas e dualistas. São aqueles que
acreditam que há uma força sobrenatural que é impessoal e totalmente
iminente (de uma maneira ou de outra) em todo o universo. Os elementos
sobrenaturais e naturais do universo estão eterna e vitalmente unidos.

C. Sobrenaturalismo Pessoal

O sobrenaturalismo pessoal é a crença em um Deus todo-poderoso,


transcendente e pessoal, quem criou e governa iminentemente o universo.
Embora seja transcendente, é onipresente. Deus criou e governa o universo,
mas permanece independente e separado do universo. Esse grupo inclui as
três principais religiões monoteístas do mundo — judaísmo, cristianismo e
islamismo.
Essas três respostas metafísicas diferentes (A. naturalismo, B.
sobrenaturalismo impessoal e C. sobrenaturalismo pessoal) podem ser
entendidas e distinguidas uma da outra pela maneira como procuram explicar
a relação entre substâncias materiais e imateriais (ou seja, a consciência). Em
outras palavras, o que veio primeiro, a mente ou a matéria?
A. Naturalismo = a matéria vem antes da mente
B. Sobrenaturalismo impessoal = Mente e matéria surgem juntas
C. Sobrenaturalismo pessoal = A mente vem antes da matéria
Para simplificar ainda mais o que já foi muito simplificado, essas três
categorias abrangentes podem ser reduzidas a duas — naturalismo e
sobrenaturalismo pessoal.
Embora sobrenaturalistas impessoais sejam diferentes dos naturalistas
por não serem materialistas ou empiristas (pois acreditam na existência de
uma dimensão espiritual invisível para o universo que não é detectável pelos
sentidos empíricos), eles, para todos os efeitos práticos, não acreditam na
existência de um poder sobrenatural que pode ser verdadeiramente
conhecido. Porque eles não creem em um Deus distinto e pessoal, o Deus
deles é incognoscível. Ou a força sobrenatural é inteiramente transcendente
ou totalmente iminente, mas de qualquer forma é incognoscível — pelo
menos incognoscível como ser pessoal.
E, se o lado sobrenatural do universo está além do muro transcendental,
tudo o que resta para a investigação racional e empírica é o lado físico e
material das coisas. Se o sobrenatural não pode falar, pensar ou sentir, então
ele não pode se comunicar com os outros e nem pode ser um objeto adequado
ao conhecimento. Portanto, de uma maneira menos precisa, o naturalismo e o
sobrenaturalismo impessoal podem ser agrupados na mesma categoria ampla.
Pois, em ambos, a natureza (aquilo que pode ser discernido pelos cinco
sentidos) é tudo o que realmente podemos saber sobre a questão metafísica da
definição última do ser. Assim, resta ao homem descobrir todas as respostas
por si mesmo.
Portanto, a questão metafísica final se resume nisso: O universo tem
todas as respostas para suas próprias origens e propósito? Em outras palavras,
a ciência é suficiente para nos fornecer todas as respostas? Como seres
finitos, somos autossuficientes e capazes de desvendar todos os mistérios do
universo? O pressuposto de um universo fechado nos fornece uma visão de
mundo coerente? Ou precisamos de um Deus sobrenatural e pessoal para
impedir que nos tornemos irracionais e absurdos em nosso pensamento? Em
resumo, precisamos de um Deus sobrenatural, pessoal e que revela a si
mesmo para responder às nossas perguntas finais sobre a realidade, ou a
ciência e a razão humana são suficientes?
2. Como Sabemos?
Isso naturalmente nos leva ao segundo ramo da filosofia, que é a
epistemologia. A epistemologia está preocupada com o conhecimento. O
conhecimento é possível? Em caso afirmativo, como sabemos o que
sabemos? Como sabemos se existe um Deus ou não? Como sabemos se a
ciência é suficiente para responder a todas as perguntas? Como sabemos qual
é o nosso relacionamento com a realidade última, Deus e o universo? Como
sabemos qual é a relação entre mente e matéria? Embora a questão de como
sabemos o que sabemos seja difícil de responder, há três respostas principais
que foram sugeridas historicamente: racionalismo, empirismo e
existencialismo.

A. Racionalismo

Os racionalistas, na maioria das vezes, são aqueles que acreditam que a


realidade suprema (ou seja, Deus) consiste em algo não material, como
ideias, mente, pensamento racional ou um ser espiritual supremo. Se a mente
(cósmica) vem antes da matéria, então o conhecimento é principalmente
derivado de modo dedutivo através do uso adequado da razão. Uma forma
extrema de racionalismo, que não é bíblica, é a ideia de que o homem é capaz
de determinar o conhecimento verdadeiro apenas por uma razão não auxiliada
(ou pura a priori), sem a assistência da revelação geral ou especial.
O matemático francês René Descartes (1596-1650) é considerado o
racionalista por excelência. Ele iniciou a sua investigação epistemológica
questionando tudo. Embora duvidasse da existência de tudo, não podia
duvidar de suas dúvidas. Porque duvidar era pelo menos uma coisa da qual
ele tinha certeza, ele concluiu que duvidando/pensando, ele existiria como um
ser autoconsciente. Assim, ele é conhecido pela fase: “Penso, logo existo”.
[118]
Por não ter certeza de que seu corpo existia, ele concluiu que a sua
existência estava no pensamento e não em qualquer substância física.[119]
Duvidando, Ele também deduziu que não poderia ser perfeito, “pois vi
claramente que saber é uma perfeição maior do que duvidar”.[120] Como ele
foi capaz de conceituar o que é inteiramente perfeito, ele determinou que a
ideia do que é perfeito não poderia ter surgido dentro de si mais do que é
lógico que o menor produza o maior. “Daí segue-se”, ele argumentou, “que
algo não pode surgir do nada, e também que o que é mais perfeito não pode
surgir do que é menos perfeito”.[121]
Por consequência, desde que Descartes viu que ele era capaz de
perceber não apenas uma coisa mais perfeita, mas a coisa mais perfeita, ele
argumentou que essa concepção da coisa mais perfeita não poderia ter
procedido ou se originado de outra coisa senão do próprio Deus. Dessa
maneira, Descartes deduziu logicamente que Deus também existia e, sobre
esse fundamento racional (baseado na razão pura), ele deduziu o restante de
sua cosmovisão.[122]

B. Empirismo

Diferentemente dos racionalistas, os empiristas, estritamente falando,


acreditam que todo conhecimento é derivado dos sentidos. Em sua maioria,
os empiristas são aqueles que acreditam que a realidade consiste apenas
naquilo que é físico ou material. Eles tendem a ser naturalistas, pois
respondem à pergunta sobre Deus dizendo que o universo é um sistema
fechado. Portanto, se a matéria vem antes da mente (consciência), o
conhecimento se origina pela experiência e a experiência somente se dá
através dos sentidos físicos. O empirismo, que também é antibíblico, é a
noção de que não existem pressupostos inatos ou crenças básicas dentro de
nossas mentes pré-cognitivas para nos ajudar no processamento e
categorização de todas as múltiplas sensações que estão fluindo em nossos
pensamentos através das experiências da vida.
Por exemplo, o filósofo inglês John Locke (1632-1704) rejeitou o
racionalismo de René Descartes. De onde se originaram essas ideias, das
quais Descartes duvidava? Descartes não chegou às suas conclusões quando
ele era recém-nascido; ele era um homem crescido com uma vida cheia de
experiências. A única coisa que conecta a mente ao universo exterior são os
cinco sentidos. Portanto, de acordo com Locke, é somente através da
experiência que as ideias podem entrar no processo de pensamento a partir do
exterior. Locke acreditava que o homem nasce sem conhecimento inato.
Suponhamos então que a mente seja, como dizemos, um papel em
branco, sem qualquer caractere, sem nenhuma ideia; como é que ela
chega até aquele vasto conteúdo que a imaginação do homem,
preenchida e sem limites, pintou nela com uma variedade quase
infinita? De onde vem todos os materiais da razão e do
conhecimento? A isso, respondo em uma palavra: da experiência;
nisso todo o nosso conhecimento é fundamentado, e a partir disso, em
última análise, ele se deriva.[123]
Para Locke, nossas mentes nascem como um quadro em branco (ou
uma tábula rasa). O conhecimento é limitado ao que é físico e ao que pode
ser discernido pelos sentidos. Como Deus não existe como parte do universo
observável, se é que existe, ele não é um objeto de conhecimento, pois não
pode ser detectado pelos sentidos empíricos.

C. Existencialismo

O existencialismo é a terceira principal teoria do conhecimento. O


existencialismo, pelo menos em sua forma secular, está enraizado no
naturalismo. O universo é um sistema fechado, o que significa que o
conhecimento é limitado às experiências sensoriais e que Deus não existe, ou
que ele é incognoscível e, portanto, irrelevante. Assim, o existencialismo é a
tentativa do homem finito criar o seu próprio caminho de escape de sua
finitude e um esforço para estabelecer sentido para a vida sem qualquer
fundamento objetivo.
Historicamente falando, o existencialismo surgiu após as filosofias de
Locke e Kant. Esses dois filósofos, de modos diferentes, trancaram o Deus
transcendental atrás de um muro impenetrável. No entanto, os existencialistas
não ficaram felizes com as consequências. O naturalismo leva à negação de
Deus, da vida após a morte, de um propósito, de um código absoluto de
moralidade e da liberdade do arbítrio (visto que nossos pensamentos são
meramente reações químicas e impulsos elétricos no tecido cerebral, que são
predeterminados por leis fixas da natureza, da mesma forma que os planetas
orbitam o sol de acordo com as leis fixas da física).
Sem Deus, a vida termina sem qualquer objetivo final. A vida termina
em morte e aniquilação. A resultante falta de sentido da vida era bastante
deprimente e inaceitável para os existencialistas. Contudo, em vez de voltar
atrás e questionar os pressupostos por trás do naturalismo, os existencialistas
concordaram que Deus é incognoscível. Mas então eles se viraram e alegaram
que a liberdade e o propósito individual ainda podiam ser mantidos. Ou
dando religiosamente um salto experimental de fé para o reino transcendental
incognoscível ou então criando ateisticamente o próprio significado e
propósito da vida por um ato da vontade, o homem pode se salvar de uma
vida de desespero e desesperança. Com a noção de que a verdade está
enraizada na existência humana, o homem pode então criar significado para si
mesmo.

3. Quem Determina o que é Certo?


O terceiro ramo principal da filosofia é a ética. A fonte de nossos
padrões éticos pode ser reduzida a duas opções: A ética é objetiva/absoluta
por natureza ou é subjetiva/relativa por natureza. Ou seja, nos submeteremos
a Deus ou faremos o que é certo segundo nossa própria opinião.
Como alguém responde (1.) à pergunta sobre Deus e (2.) à questão
sobre o conhecimento determinará, assim, como alguém responde (3.) à
questão ética.

A. Padrão Ético Universal e Absoluto

O padrão moral não é derivado de princípios abstratos, mas do caráter


de um Deus trinitário, santo e justo, porque o amor marca a essência do
relacionamento entre o Pai, o Filho e o Espírito Santo. Visto que Deus nos
criou para o seu próprio propósito, ele tem o direito de nos dizer como
cumprir esse propósito intencionado. Porque ele nos criou à sua imagem,
devemos refletir o seu amor ao ama-lo e aos nossos semelhantes. Por amor,
ele nos convidou a compartilhar o seu amor. Amar a Deus de todo nosso
coração, mente e alma e amar o próximo como a nós mesmos não é apenas a
essência do padrão universal de moralidade, é a chave para cumprirmos o
nosso propósito e encontrarmos significado e satisfação pessoal. O homem
não foi feito para ficar sozinho, pois o homem não é autossuficiente. O
egoísmo é proibido porque destrói relacionamentos significativos. Assim,
obedecer à lei de Deus é a chave para a nossa realização pessoal, porque nos
afasta da autoidolatria para um relacionamento amoroso e significativo com
Deus e com as outras pessoas.

B. Padrões Éticos Subjetivos e Relativos

Aqueles que rejeitam o Deus sobrenatural e pessoal são forçados, caso


desejem permanecer consistentes com suas crenças, a rejeitar qualquer padrão
ético absoluto. Sem um Deus transcendente para conhecer, obedecer e amar,
não apenas não há propósito para a vida, como também não há um padrão
absoluto a seguir. Com a remoção de qualquer destino objetivo, não há
necessidade de traçar mapas. Os relacionamentos são deixados para serem
governados pelo que parece certo aos olhos de indivíduos egoístas. Do ponto
de vista naturalista, a ética é construída para fins meramente pragmáticos. Na
melhor das hipóteses, a ética é situacional e de natureza relativa. Sem Deus,
não existe um legislador universal. Se não há justiça e responsabilidade
universal e absoluta, isso também significa que homens maus, como Adolf
Hitler, escapam com facilidade. De fato, sem um padrão universal, quem
diria que Adolf Hitler estava errado?
Conclusão
Como você pode observar, as várias respostas para essas três perguntas
fundamentais sobre Deus, sobre o conhecimento e a ética estão entrelaçadas.
O modo como respondemos a uma influenciará fortemente, se não
completamente, para determinar como respondemos às outras duas perguntas.
As respostas a essas perguntas determinam a nossa cosmovisão, e a nossa
cosmovisão não pode deixar de moldar o que cremos e como interpretamos o
mundo ao nosso redor.
9

Moldados pelos Nossos Pressupostos

John Frame estava certo quando disse: “A visão da realidade de alguém


determinará, em grande parte, a sua visão do conhecimento e vice-versa”.[124]
Por exemplo, se pressupusermos um universo fechado e autossuficiente, é
claro que nos apoiaremos fortemente, se não inteiramente, na percepção
sensorial e na ciência. Milagres e revelações especiais serão descartados, caso
alguém queira sustentar o naturalismo.
Por outro lado, se começarmos com o pressuposto de que existe um
Deus, nossa visão do conhecimento será determinada pela nossa posição
teológica sobre o relacionamento de Deus com o universo. Se Deus é
completamente transcendente, como acreditam os místicos e os teólogos
liberais, seremos propensos, se nos apegarmos à religião, a nos tornarmos
existencialistas.
Se acreditarmos que Deus é totalmente iminente, assim como os
panteístas, provavelmente nos tornaremos místicos também. Mas se
acreditarmos que Deus é transcendente (separado do universo) e iminente
(interage dentro do universo), olharemos tanto para a revelação geral de Deus
(o que aprendemos através da ciência) quanto para a sua revelação especial (o
que aprendemos nas Escrituras Sagradas) como fontes de informações
válidas. Ambas nos apontam de volta para Deus. A ciência revela certas
verdades sobre a ordem e a glória criadas por Deus, enquanto as Escrituras
revelam mais precisamente a identidade e a natureza desse Deus e como
devemos adorá-lo adequadamente. Com isso dito, Bahnsen concluiu: “Então,
claramente, [o nosso] método de conhecimento depende da natureza da
realidade”.[125]
A Relação entre Deus, Conhecimento e Ética
Como ressaltei no capítulo 4, nossos valores — as afeições de nosso
coração — influenciam fortemente o que escolhemos crer. Por exemplo, o pai
de John Stuart Mill admitiu que ele se tornou ateu não por causa de
preocupações epistemológicas, mas por razões éticas. Ele rejeitou a ideia de
Deus porque não conseguia apreciar e valorizar um Deus que permitia todo o
mal que acontecia no mundo. Nas palavras de seu filho, John Stuart Mill:
Meu pai, educado no credo do presbiterianismo escocês, pelos seus
próprios estudos e reflexões foi levado a rejeitar não apenas a crença
na revelação, mas também nos fundamentos do que é comumente
chamado de religião natural. A rejeição de meu pai de tudo o que é
chamado de crença religiosa não era, como muitos poderiam supor,
principalmente uma questão de lógica e evidência, seus fundamentos
eram morais, ainda mais do que intelectuais. Ele achava impossível
acreditar que um mundo tão cheio de maldade era obra de um autor
que combinava poder infinito com perfeita bondade e justiça. Sua
aversão à religião, no sentido geralmente associado ao termo, era do
mesmo tipo que a de Lucrécio: ele a considerava com os sentimentos
devidos não ao mero delírio mental, mas a um grande mal moral.
Teria sido totalmente inconsistente com as ideias de dever de meu pai
permitir que eu adquirisse impressões contrárias às suas convicções e
sentimentos a respeito da religião, e ele me inculcou desde cedo que a
maneira pela qual o mundo surgiu era um assunto sobre o qual nada
era conhecido.[126]
Ele não foi a primeira pessoa a rejeitar a ideia de Deus pelo fato de
odiá-lo. O ateu Thomas Nagel admitia abertamente o seu preconceito contra
Deus:
Eu falo por experiência própria, estando eu mesmo fortemente sujeito
a esse temor: desejo que o ateísmo seja verdadeiro e fico
desconfortável com o fato de que algumas das pessoas mais
inteligentes e bem informadas que conheço sejam crentes religiosos.
Não é apenas que eu não acredito em Deus e, naturalmente, espero
estar certo em minha crença. Espero que não exista Deus! Eu não
quero que exista um Deus; eu não quero que o universo seja assim.
Meu palpite é que esse problema da autoridade cósmica não
raramente é a condição e o responsável por grande parte do
cientificismo e reducionismo de nosso tempo.[127]
Da mesma forma, o físico inglês Paul Davies confessa que não é
emocionalmente neutro: “Não há necessidade de invocar nada sobrenatural
no que diz respeito às origens do universo ou da vida. Eu nunca gostei da
ideia de ajustes divinos”.[128] Davies sabe que não está sozinho em seus
sentimentos, pois acredita que muitos “cientistas que estão se esforçando para
construir uma teoria totalmente abrangente do universo físico admitem
abertamente que parte da motivação é, finalmente, se livrar de Deus”.[129]
Isso, no entanto, não deve ser tomado como algo incomum. Embora as
pessoas reconheçam que Deus existe, elas não confiarão nele de boa vontade
sem que antes possuam um coração para amá-lo. Eu acho que foi por essa
razão que Frame afirmou que é “útil considerar a epistemologia como um
ramo da ética”.[130]
Dito isso, como responderemos a qualquer uma dessas três perguntas,
consequentemente, influenciará como responderemos às outras duas
perguntas. Vern Poythress, professor de interpretação do Novo Testamento
no Westminster Theological Seminary, conclui: “Em muitos aspectos, elas
pressupõem uma à outra. Embora possamos nos concentrar temporariamente
em apenas uma subdivisão dentro da filosofia [metafísica, epistemologia ou
ética], as outras nos seguiram de perto em segundo plano”.[131] Como toda
cosmovisão, em seu nível básico, consiste nas respostas que damos (1.) à
questão sobre Deus, (2.) à questão sobre o conhecimento e (3.) à questão
ética, essas três perguntas estão intrinsecamente e inextricavelmente
entrelaçadas.
A Necessidade de Pressupostos
As respostas que damos às questões metafísicas, epistemológicas e
éticas tornam-se os pressupostos básicos que determinam nossa cosmovisão.
Esses pressupostos são como axiomas, que devemos presumir ser verdadeiros
antes que possamos avançar. Nós os tomamos como garantidos, pois não
temos evidências racionais ou empíricas para apoiar nossas respostas. Como
Cornelius Van Til afirmou:
Um “pressuposto” é uma suposição elementar no raciocínio ou no
processo pelo qual as opiniões são formadas… Não é apenas uma
suposição em um argumento, mas um compromisso pessoal que é
mantido no nível mais básico da rede de crenças de alguém.
Pressupostos formam uma ampla perspectiva fundamental (ou ponto
de partida) em termos dos quais todo o restante é interpretado e
avaliado. Como tal, os pressupostos têm a maior autoridade no
pensamento de alguém, sendo tratados como as crenças menos
negociáveis e recebendo a mais alta imunidade à revisão.[132]
Toda cosmovisão, incluindo o teísmo, o ateísmo, o naturalismo e o
empirismo, é baseada em alguns pressupostos fundamentais. Esses
pressupostos interpretam as experiências da vida, porém não se derivam das
experiências da vida.
Por exemplo, como não há evidências que sustentem a base do
empirismo, os empiristas são forçados a fazer um pré-compromisso com o
pressuposto inicial de que toda crença a ser justificada deve ser apoiada por
evidências. Esse pré-compromisso é um salto de fé. Embora aqueles que dão
esse salto possam se esforçar muito para provar, explicar, argumentar e
fornecer evidências de tudo o que creem, o fundamento pressuposicional de
sua cosmovisão é simplesmente tomado como garantido ou presumido. O
pressuposto essencial por trás da cosmovisão naturalista é que nada existe
além do mundo natural. Os naturalistas pressupõem essa crença sem
nenhuma evidência científica. Como John Lennox, professor de matemática
da Universidade de Oxford, pergunta retoricamente: “Então, o naturalismo é
realmente exigido pela ciência? Ou é apenas concebível que o naturalismo
seja uma filosofia trazida à ciência, mais do que algo em que a ciência
implica? Será que o naturalismo não seria, alguém poderia perguntar, mais
como uma expressão de fé, semelhante à crença religiosa?”.[133]
O biólogo húngaro-sueco George Klein estava disposto a admitir que
era: “Não sou agnóstico, sou ateu. Minha atitude não é baseada na ciência,
mas na fé”.[134] O professor Richard Lewontin, geneticista e um dos principais
apoiadores do mundo da biologia evolutiva, também confessou que está
comprometido com o materialismo antes mesmo de a investigação começar:
Nós ficamos do lado da ciência, apesar do absurdo patente de
algumas de suas construções… a despeito da tolerância da
comunidade científica para com histórias infundadas, porque temos
um compromisso prévio… com o materialismo. Não é que os
métodos e instituições da ciência de alguma forma nos obriguem a
aceitar uma explicação material do mundo fenomenológico, antes,
pelo contrário, somos forçados pela nossa adesão a priori às causas
materiais a criar um aparato de investigação e um conjunto de
conceitos que produzem explicações materiais, não importa o quanto
isso possa ser contraintuitivo e misterioso para os inexperientes.[135]
Por exemplo, Richard Dawkins reconheceu que aceitou o naturalismo
como um pressuposto inicial, sem nenhuma evidência ou prova:
Quando perguntado pela Edge Foundation: “O que você acredita é
verdade mesmo que não consiga prová-lo?”. Dawkins respondeu: “Eu
acredito que toda a vida, toda a inteligência, toda a criatividade e todo
o ‘design’ em qualquer lugar do universo são os produtos diretos ou
indiretos da seleção natural darwiniana. Segue-se que o design chega
tardiamente ao universo, após um período de evolução darwiniana. O
design não pode preceder a evolução e, portanto, não pode ser
subjacente ao universo”. No fundo, então, a rejeição de Dawkins de
uma Inteligência Suprema é uma questão de crença sem prova.[136]
Os cientistas podem ingenuamente pensar que não trazem pressupostos
para as suas investigações. Eles podem até afirmar que não creem em
realidades metafísicas — visto que a metafísica transcende o escopo da
investigação científica. Porém, dizer que você não acredita em metafísica é
uma afirmação metafísica. A ciência não pode provar que não existem
realidades metafísicas, e uma afirmação como “não creio em metafísica” não
faria sentido sem o uso da lógica e da ética.
Assim, mesmo os cientistas têm pressupostos sobre Deus,
conhecimento e ética que eles pressupõem e trazem consigo para os seus
laboratórios.
Não é que ter pressupostos esteja errado, pois todos temos
pressupostos. Os cristãos têm seus próprios pressupostos.[137] Como os
cristãos começam por pressupor o Deus da Bíblia, eles não têm problemas
com a crença em eventos sobrenaturais, como os milagres e a ressurreição de
Cristo, e também não têm nenhum problema com a ciência. Não há nada
errado com o conhecimento científico. Os cristãos podem agradecer a Deus
por um universo ordenado que lhes permite aprender com as experiências e
os ajuda a planejar o futuro. Um Deus transcendente e iminente, cujo governo
soberano é perfeitamente compatível com as leis da física, fornece ao cristão
uma base perfeita para todo o seu conhecimento empírico e racional. Um
universo ordenado só faz sentido quando se tem um Deus ordenado. Como
toda verdade vem através de revelação geral e especial, a verdade científica e
a verdade bíblica não estão em desacordo.
O Sistema Controla o Veredicto
Depois que escolhemos — consciente ou inconscientemente — nossos
pressupostos, como teísmo, ateísmo, naturalismo, racionalismo ou
empirismo, então os usamos como uma estrutura cognitiva para interpretar e
entender todas as experiências de nossa vida. Pressupostos são como um
sistema operacional em um computador — o sistema abrangente que
lê/executa todos os outros programas. Nossa base pressuposicional determina
não apenas como processamos as informações, mas também como
respondemos às perguntas que fazemos. Nossos pressupostos nos moldam da
mesma maneira que nossos valores nos moldam. Nosso pensamento não é
neutro. Simplesmente não processamos nenhuma informação no vácuo. O
modo como interpretamos e processamos dados não pode deixar de ser
influenciado e moldado pelas pressuposições básicas por trás de nossa
cosmovisão.
Por esse motivo, tentar convencer alguém que tem uma cosmovisão
naturalista sobre a validade dos milagres é como tentar ler a mesma página
com alguém que, por sua vez, está lendo um outro livro. A única maneira
certa de um naturalista ser convencido da validade dos milagres de Cristo é se
ele tiver uma mudança em sua cosmovisão e os pressupostos básicos que
estão por trás disso, como John Byl explicou:
Se a cosmovisão de alguém reflete os compromissos de fé mais
básicos, como podemos convencer racionalmente um oponente de
que qualquer crença em particular é falsa? Em outras palavras, se as
cosmovisões são como óculos através dos quais vemos o mundo,
como convencer alguém usando óculos de cor amarela de que
existem flores azuis? Ele não conseguirá ver o azul até trocar os seus
óculos amarelos por um par que permita ver uma variedade maior de
cores. Porém, isso equivale a uma conversão radical, uma grande
mudança no compromisso de fé.[138]
O Pressuposto Controlador
Assim, as três crenças ou pressupostos básicos que moldam todas as
cosmovisões, como já mencionamos, são as respostas que damos (1.) à
questão sobre Deus, (2.) à questão sobre o conhecimento e (3.) à questão
ética. Entre os pressupostos metafísicos, epistemológicos e éticos
correspondentes, qual é o conjunto de pressupostos central ou básico que
controla os outros dois?
Em favor de uma cosmovisão cristã, Sire diz enfaticamente: “A
ontologia [o que é real] precede a epistemologia [o que sabemos]”.[139] Em
outras palavras, o que sabemos não determina o que é real. O método de
como sabemos o que sabemos não estabelece a existência ou inexistência de
nada. Isso parece óbvio. Desejar que os unicórnios sejam reais não os tornam
mais reais do que o ateísmo elimina Deus. Antes, o que é de fato real, como
Deus e o universo, é que determina o que sabemos. É isso que Sire quer dizer
quando afirma: “A ontologia precede a epistemologia”.
Sire está certo a partir de uma perspectiva ontológica. A realidade ou
não realidade de Deus, Sua existência ou sua inexistência, determina todo o
restante. A existência de Deus é logicamente primária, pois Deus é a
realidade última. De fato, como procuro mostrar neste livro, sem pressupor a
existência de Deus, o conhecimento e as distinções éticas são impossíveis.
Devemos pressupor Deus se queremos ter uma epistemologia confiável e um
padrão ético. Se esse for o caso, tudo é redutível à existência de Deus, pois a
epistemologia e a ética fluem logicamente da ontologia e não o contrário.[140]
Dito isso, embora a existência de Deus seja necessária para o
conhecimento de Deus, não é necessário que comecemos com o
conhecimento de Deus para concluir que ele existe. Poderíamos começar com
epistemologia ou com ética e concluir com o conhecimento de Deus. Isso
ocorre porque ontologia, epistemologia e ética são interdependentes. Cada
uma delas não pode ser entendida corretamente sem entendermos
corretamente as outras duas.
Embora Deus seja o pressuposto controlador por trás da cosmovisão
cristã, a existência de Deus não exige um salto de fé. Isso ocorre porque até
os céticos começam dizendo que Deus não existe e, à medida que muitos
deles fazem isso, serão forçados a concluir que a sua cosmovisão é
incoerente, se procurarem permanecer logicamente consistentes consigo
mesmos. Como veremos na Parte 4, todas as cosmovisões não cristãs
terminam em absurdo.
Assim, embora a existência de Deus seja um pressuposto necessário
sem o qual não possamos compreender o mundo, não precisamos iniciar
nosso argumento apologético pressupondo a sua existência. Se quisermos,
podemos negar a sua existência. Podemos começar com a suposição de que o
empirismo é o único método válido para determinar o conhecimento e, se
formos consistentes, seremos forçados a aceitar o naturalismo e o relativismo.
Ou podemos começar com um pré-compromisso com o naturalismo. Isso
também terminaria no mesmo lugar e demonstraria os mesmos tipos de
problemas de cosmovisão. Assim, com respeito a essas três pressuposições
fundamentais, não importa se pressupomos Deus primeiro ou não, ao
apresentarmos nosso argumento apologético. O que importa é que
permaneçamos logicamente consistentes com os pressupostos que
escolhemos adotar como nosso ponto de partida definitivo.
O que importa é consistência. Permanecemos consistentes conosco
mesmos? Como nossa cosmovisão não pode ser separada do
comprometimento fundamental de nossos corações, podemos implementar e
viver de modo consistente com a nossa cosmovisão na vida cotidiana?
Conclusão
Em conclusão, todas as nossas crenças são moldadas por nossas
cosmovisões individuais, cada uma das quais está enraizada em alguns
pressupostos essenciais. Não podemos pensar de modo coerente ou aprender
algo novo sem filtrar as informações através de nossa estrutura conceitual que
inclui as nossas crenças sobre Deus, conhecimento e ética.
Contudo, se quisermos ser pensadores coerentes, devemos ter uma
cosmovisão capaz de responder a todas as questões fundamentais da vida sem
nos contradizermos nesse processo. A pergunta que devemos fazer a nós
mesmos é a seguinte: Nossa cosmovisão pode sustentar os seus próprios
pressupostos? Ou, em outras palavras, nossos pressupostos podem apoiar de
modo coerente a nossa cosmovisão? Somos consistentes conosco mesmos?
O objetivo do restante deste livro é mostrar que a cosmovisão bíblica é
a única cosmovisão coerente e consistente. Nas palavras do apologista
pressuposicional Cornelius Van Til: “Apenas nós, cristãos, temos uma
posição que é filosoficamente defensável”.[141] Negar a cosmovisão cristã é
viver inconsistentemente com nossa consciência (ou seja, as condições
necessárias de Deus, lógica e moralidade) devido a aceitarmos de boa
vontade um sistema de pensamento absurdo e autodestrutivo.
PARTE 3

Como Testar as Crenças


“Porque eu vos darei boca e sabedoria a que não poderão resistir nem
contradizer todos quantos se vos opuserem.”
(Lucas 21:15)
10

A Coerência é Obrigatória

“Meu pai me ensinou que a pergunta ‘Quem me criou?’ não pode ser
respondida, pois sugere imediatamente a pergunta adicional: ‘Quem criou
Deus?’”. Ler isso na Autobiografia de John Stuart Mill, levou Bertrand
Russell a rejeitar o argumento cosmológico da existência de Deus. Nas
palavras de Russell: “Se tudo deve ter uma causa, então Deus deve ter uma
causa. Se pode existir algo sem uma causa, o mundo pode ser como Deus, de
modo que não pode haver qualquer validade nesse argumento”.[142]
É verdade que o argumento cosmológico só faz sentido dentro da
estrutura da cosmovisão cristã. Mas o que Russell parece não entender é que
a sua crítica ao argumento cosmológico não faz sentido nem na cosmovisão
do cristão nem na do naturalista. De fato, não há cosmovisão em na qual a
sua afirmação faça algum sentido lógico. A afirmação de Russell, “Se pode
existir algo sem uma causa, o mundo pode ser como Deus”, é autorrefutável
em seus próprios termos. Em outras palavras, ele está tentando refutar um
argumento com uma afirmação irracional.
Por exemplo, dentro da cosmovisão cristã, o argumento cosmológico
faz todo sentido. Quando pressupomos o Deus da Bíblia, o Deus que criou o
universo para funcionar com regularidade exata, então a ciência e a religião
podem coexistir em perfeita harmonia. A Bíblia nos ensina certas coisas, e a
ciência nos ensina certas coisas. Esses dois conjuntos de coisas não estão em
oposição. A ciência ensina que tudo em movimento tem uma causa. Uma vez
que tudo em movimento deve ter uma causa, então tudo no universo, que está
em movimento, deve ter uma causa. Embora a ciência não possa provar ou
explicar a causa, a única resposta lógica é que a causa é algo que não está em
movimento — o Motor Imutável. Dentro da estrutura da cosmovisão cristã,
há uma explicação lógica e inata de quem realmente é esse Motor Imutável
— Deus. Talvez isso não expresse adequadamente a glória de um Deus
trinitário de amor, mas pelo menos na cosmovisão cristã o argumento
cosmológico é um argumento racional, porque o Deus da Bíblia, quem criou
o universo e é diferente do universo, é autônomo, imutável e autoexistente.
Russell rejeita o pressuposto básico por trás da cosmovisão cristã. O
ponto de partida para a cosmovisão cristã é que não há respostas definitivas
para qualquer pergunta sem primeiro pressupor o Deus da Bíblia. Sem o Deus
da Bíblia, nada faz sentido. Não há respostas definitivas e lógicas para
nenhuma pergunta. Russell, por outro lado, opera a partir de uma visão de
mundo ateísta e naturalista que não permite que Deus seja sequer considerado
como uma possível resposta a qualquer uma das perguntas da vida. Os
pressupostos, ou o ponto de partida, da cosmovisão naturalista são o
materialismo e o empirismo. O naturalismo procura explicar tudo com uma
causa naturalista. O materialismo é o conceito em que toda a realidade
consiste — e consiste apenas — naquilo que é físico ou material. A mente
existe apenas em função do corpo. Matéria e natureza são tudo o que existe.
[143]
Com esses pressupostos, o conhecimento só pode ser obtido pelos
sentidos empíricos (ou seja, percepção sensorial). Assim, naturalismo,
materialismo e empirismo são os pressupostos básicos da cosmovisão ateísta.
Com isso em mente, o fato de Russell afirmar que é possível o mundo
não ter uma causa é completamente irracional em uma cosmovisão ateísta em
que o conhecimento é determinado e limitado ao método científico. Segundo
as evidências, nada que tenha um começo é autônomo. Ou seja, nada é
autossuficiente e capaz de se mover sem qualquer ajuda exterior. A ciência
ensina na primeira, segunda e terceira leis do movimento que tudo que tem
um começo, como o universo, deve ter uma causa exterior.
Em outras palavras, todo efeito deve ter uma causa. Segundo a ciência,
não existe um efeito não causado. Dizer o contrário é negar as leis da ciência,
que são pressupostos centrais do ateísmo e do naturalismo. De acordo com as
leis da ciência, o universo não pode ser a sua própria causa mais do que
qualquer efeito pode ser a sua própria causa. A afirmação: “Se pode existir
algo sem uma causa, o mundo pode ser assim” não faz absolutamente
nenhum sentido dentro da cosmovisão ateísta. De fato, não faz absolutamente
sentido em nenhuma cosmovisão dizer que é possível que o universo exista
sem uma causa. Não faz sentido dizer que algo surgiu do nada sem alguma
causa externa. Mais precisamente, não faz sentido pressupor o empirismo —
que o conhecimento científico é o único meio de entender a existência do
mundo — e depois negar as leis da ciência em sua tentativa de explicar as
origens do universo.
Russell começou a sua crítica ao argumento cosmológico com a falsa
premissa de que “tudo deve ter uma causa”. No entanto, o argumento
cosmológico não afirma que tudo deve ter uma causa. Afirma que todo efeito
deve ter uma causa. Afirma que tudo que tem um começo deve ter uma
causa. Essa é uma grande distinção que Russell negligenciou de forma
conveniente. Nem tudo deve ter uma causa; apenas coisas contingentes
devem ter uma causa.
Não faz sentido dizer que algo pode ser a sua própria causa. Nem
mesmo Deus não pode criar a si mesmo. Isso seria uma clara contradição,
pois Deus teria que existir e não existir ao mesmo tempo e na mesma relação.
Para Deus criar a si mesmo, ele teria que existir antes do ato de autocriação.
Portanto, embora Deus seja autoexistente, ele não é autocriado, pois isso
seria impossível. Ou a existência de Deus é em si mesmo, ou ele não existe.
Ou ele é eterno, ou Ele é inexistente.
Porque o universo está cheio de efeitos, deve haver uma causa primeira.
Porque o universo não pode ser sua própria causa, deve haver um Deus
autoexistente que criou o universo. Deve haver um ser imaterial, não
contingente e autoexistente que criou o universo. Pelo menos esse é um
argumento lógico.
É por isso que Jonathan Edwards disse: “Nada acontece sem uma
causa. O que é autoexistente, deve sê-lo desde a eternidade e deve ser
imutável; mas, quanto a todas as coisas que começam a existir, elas não são
autoexistentes e, portanto, devem ter algum fundamento de sua existência
fora delas mesmas”.[144]
Embora o argumento cosmológico não seja suficiente para estabelecer
o Deus da Bíblia, é pelo menos um argumento coerente dentro do contexto
maior da cosmovisão cristã. Meu objetivo, no entanto, ao expor a
irracionalidade da crítica de Russell não é procurar fundamentar a existência
de Deus no argumento cosmológico. Antes, meu objetivo é ilustrar que, ao
argumentar, Russell deixou de lado a cosmovisão ateísta (uma cosmovisão
que consiste em naturalismo, empirismo e relativismo). E, se Russell quer
provar que Deus não existe,[145] ele deve fazê-lo de uma maneira que
permaneça coerente com os pressupostos básicos de sua própria cosmovisão
ateísta. Isso é algo que nem ele nem qualquer outro ateu pode fazer.
A tarefa difícil para os naturalistas é que eles são forçados a responder
a todas as perguntas da vida de uma maneira que não contradiga a base de sua
cosmovisão, ou então se tornam tagarelas irracionais e incoerentes. Ou seja,
os naturalistas devem ter uma explicação naturalista para tudo ou, caso
contrário, deixam de ser naturalistas. A evolução é uma explicação naturalista
para as origens do universo, mas será que a evolução é uma explicação
racional para as origens do universo, da lógica, da matemática, das emoções,
da intenção proposital e da ética? Procuraremos responder a essa pergunta
mais tarde, mas, por enquanto, é importante percebermos que os naturalistas
são obrigados a responder a todas as perguntas da vida dentro dos limites de
sua cosmovisão.
Isso não é verdade apenas para ateus; é verdade para todos nós. Seja o
que for que aceitemos como pressupostos iniciais, se continuarmos a
sustentar esses pressupostos, não podemos negar esses pressupostos iniciais
emprestando capital de uma cosmovisão antitética. Isso é agir com engano e
expõe uma inconsistência em nosso pensamento.
A Veracidade de Qualquer Sistema Depende de sua
Coerência
Se qualquer sistema de pensamento é incoerente, ele não pode ser
confiável. Por exemplo, quando eu era criança, um dos meus irmãos mais
velhos descobriu que nossos pais estavam escondendo nossos presentes de
Natal em uma grande caixa de papelão debaixo da cama. Você já pode
imaginar! Para uma criança, isso era como um baú do tesouro. Uma vez que
o segredo foi revelado, a tentação parecia grande demais para ser resistida.
Nós precisávamos apenas dar uma olhada. Com muita ansiedade, cada um de
nós se esgueirou para aquele esconderijo escuro. O que começou como algo
único, se transformou em várias visitas por dia; isto é, até que fomos
descobertos. Minha mãe percebeu que a tampa da caixa não estava
devidamente fechada. Um de nós foi descuidado.
Como sempre, quando minha mãe não sabia quem era a criança
culpada, ela perfilava os meninos na cozinha, do mais velho ao mais novo,
comigo no final. Todos éramos culpados, mas qual de nós receberia a
penalidade? O interrogatório começava com James, meu irmão mais velho.
Ele rapidamente negou saber alguma coisa sobre isso. Quando o rosto severo
de minha mãe se virou de James para o seu filho do meio, Jason disse com
uma voz convicta: “Não fui eu, mamãe, eu fechei bem a tampa toda vez que
olhei!”.
Embora o jovem Jason fosse sincero, pois ele não foi o motivo pelo
qual fomos apanhados, a sua defesa foi o motivo pelo qual todos fomos
punidos. É fácil detectar a inconsistência nessa história, mas qualquer
incoerência revela que algo está errado. A confissão autoincriminadora do
meu irmão é uma lembrança engraçada agora, mas e se a nossa inconsistência
existir nas crenças fundamentais da nossa cosmovisão?
Pequenas incoerências em assuntos periféricos podem ser facilmente
corrigidas em qualquer sistema de pensamento, mas a incoerência nas
declarações pressuposicionais primárias e centrais expõe um problema real
com o próprio sistema conceitual. Um ateu e um cristão podem estar
enganados sobre quem venceu a Copa de 1970, mas esse erro, por si só, não
prejudica nenhuma de suas cosmovisões. Esse conhecimento é tangencial ao
sistema conceitual geral de pensamento. É uma preocupação muito maior, no
entanto, se os pressupostos por trás de sua cosmovisão são defeituosos. Se o
alicerce estiver destruído, não há esperança de que o edifício permaneça em
pé.
C. Stephen Evans, professor de filosofia da Universidade Baylor,
chegou ao entendimento que crer em Deus não é a mesma coisa que acreditar
no monstro do Lago Ness: “O monstro do Lago Ness é apenas ‘mais uma
coisa’… Deus, no entanto, não é apenas ‘mais uma coisa’. A pessoa que crê
em Deus e a pessoa que não crê em Deus não apenas discordam sobre Deus,
mas discordam do próprio caráter do universo”.[146] É bastante inofensivo se
estivermos enganados sobre quem venceu a Copa do Mundo de 1970, porém
se errarmos na questão sobre Deus, em essência tudo o mais no que cremos
será afetado negativamente.
Por exemplo, o positivismo lógico costumava ser popular no início do
século XX. Os positivistas lógicos alegaram que apenas dois tipos de
proposições eram significativos: declarações analíticas e sintéticas que eram
empiricamente verificáveis. Uma afirmação analítica é uma proposição
verdadeira em virtude de seu significado. A afirmação, “todos os solteiros são
únicos”, é um exemplo de afirmação analítica. É significativa por causa da
impossibilidade do contrário. A afirmação, pela própria natureza de seus
próprios termos, se verifica. Uma afirmação sintética verificável, por outro
lado, é uma proposição confirmada pela experiência sensorial. “O fogo está
quente” é uma afirmação significativa porque é facilmente demonstrada pelo
teste empírico de colocar a mão nas chamas. Se alguma proposição fosse
incapaz de atender a essas duas formas de verificação, seria considerada uma
declaração sem sentido.
Visto que é impossível verificar a existência de Deus através de um
exame empírico, os positivistas lógicos argumentaram que a crença em Deus
não faz sentido. Em seu livro Language, Truth, and Logic, o professor de
lógica em Oxford, Alfred J. Ayer (1910-1989), explicou:
Não há como provar que a existência de um deus, como o Deus do
cristianismo, seja até mesmo provável. No entanto, isso também é
facilmente demonstrado. Pois, se a existência de um deus desse tipo
fosse provável, a proposição de que ele existia seria uma hipótese
empírica. E, nesse caso, seria possível deduzir a partir disso, e de
outras hipóteses empíricas, certas proposições experienciais que não
seriam dedutíveis apenas dessas outras hipóteses. Mas, na verdade,
isso não é possível… Afirmar que “Deus existe” é proferir uma
expressão metafísica que não pode ser verdadeira ou falsa. E pelo
mesmo critério, nenhuma sentença que pretenda descrever a natureza
de um deus transcendente pode possuir qualquer significado literal.
[147]

Por consequência, positivistas lógicos, como Ayer, se orgulhavam em


afirmar que declarações metafísicas, como “Deus existe”, não podiam ser
verificadas como significativas e, portanto, não deveriam ser aceitas. Sua
confiança em seus critérios de verificação continuou até que as pessoas
adotassem o seu próprio princípio de verificação. “Nenhuma proposição é
significativa a menos que seja uma afirmação analítica ou sintética” é em si
mesma uma proposição que não é analítica e nem sintética. Os positivistas
lógicos involuntariamente minaram o seu próprio fundamento, fazendo a
afirmação metafísica de que apenas declarações não metafísicas são
significativas. Logo, o positivismo lógico se autodestrói — é
autorreferencialmente absurdo.
A inconsistência no positivismo lógico não é apenas uma questão
periférica, como quem venceu a Copa do Mundo de 1970; é antes uma falha
fatal no próprio sistema filosófico. Mas, e o naturalismo, o empirismo e o
racionalismo? Esses pressupostos essenciais sustentam uma cosmovisão
consistente e coerente? Essas cosmovisões podem sustentar a si mesmas?
Nós Todos Devemos Começar em Algum Lugar
Devemos lembrar que todos nós temos pressupostos que vagamente
admitimos ou que pressupomos firmemente. Consciente ou
inconscientemente, todos começamos em algum lugar. Até os evidencialistas,
que afirmam que toda crença deve ser apoiada por evidências, reconhecem a
impossibilidade de tal afirmação. Não apenas eles não têm nenhuma
evidência para apoiar o pressuposto de que toda crença requer evidência, eles
também entendem que cada crença exigiria infinitamente mais crenças. Os
evidencialistas, gostem ou não, constroem sua cosmovisão com a alegação
não científica de que toda crença justificada exige evidência. Eles, como
todos nós, devem começar em um determinado ponto. Alguns começam com
um compromisso com o naturalismo e o empirismo, outros começam com a
revelação divina e um Deus pessoal. Independentemente disso, todo filósofo,
cientista, cético, pensador religioso e a mãe de um jogador de futebol tem
uma base sobre a qual sustenta todas as suas crenças.
Quais são os seus pressupostos? O que você pensa sobre Deus, sobre
conhecimento e sobre ética? Você pressupõe que existe um Deus ou não?
Você acredita que é autossuficiente para construir uma cosmovisão confiável
ou acredita que precisa da revelação divina para guiá-lo? Você acredita que a
ética é de natureza universal ou relativa?
É Necessário Permanecer Fiel
Embora eu acredite que Deus tenha escrito as respostas para essas
perguntas em nossos corações, nos dando o conhecimento inato dele mesmo,
da lógica e da moralidade, a título de argumentação, digamos que você
honestamente não saiba. “Eu não sei se existe um Deus ou não”. “Não sei se
a ética é universal”. “Não sei se acredito ou não na revelação divina”. “Eu
sou cético”. Se o agnosticismo é sua posição para essas questões importantes,
vá em frente e responda-as negativamente. Prossiga e diga que não acredita
em Deus. Diga que você não acredita na revelação divina ou em um código
absoluto de moralidade. Pressuponha o naturalismo (que Deus não existe), o
empirismo (que não há revelação divina) e o relativismo (que não existe um
padrão absoluto de certo e errado) e, em seguida, veja se você consegue
construir uma cosmovisão coesa e consistente sobre o fundamento que
escolheu.
No entanto, não importa quais pressupostos você tenha escolhido, você
deve permanecer coerente com eles até o fim. É logicamente inconsistente
pular de uma base pressuposicional para outra. Vimos como Bertrand Russell
cometeu uma falácia quando criticou o argumento cosmológico. Ele não se
manteve fiel ao seu pressuposto epistemológico central — o empirismo. Se
você é ateu, atenha-se às suas armas. Siga com as suas pressuposições. Não
construa sobre o fundamento de outra pessoa. Mantenha firmemente o que
você acredita. Ouça o conselho de Sócrates e “siga o argumento para onde
quer que ele leve”.[148] Se não existe um Deus sobrenatural e pessoal, as
consequências devem ser aceitas e recebidas. Os enganadores não podem ser
confiáveis, e isso inclui a nós mesmos.
Como não temos escolha a não ser aceitar alguns pressupostos
essenciais, a única coisa racional a fazer é examinar a validade de nossos
pressupostos e segui-los até as suas conclusões lógicas e naturais. Se nossos
pressupostos se mantiverem coerentes, valha a pena mantê-los. Se
descobrimos que nossa cosmovisão é inconsistente consigo mesma, somos
justificados em rejeitá-la e procurar outra. Como nas palavras do apologista
pressuposicional Gordon Clark (1902-1985):
Se um sistema pode fornecer soluções plausíveis para muitos
problemas, enquanto outro deixa muitas perguntas sem resposta, se
um sistema tende menos ao ceticismo e dá mais sentido à vida, se
uma cosmovisão é consistente enquanto as outras são
autocontraditórias, quem pode nos negar, desde que devemos
escolher, o direito de escolher o primeiro princípio mais promissor.
[149]

Não importa quão racional seja nossa linha de raciocínio, se nosso


fundamento pressuposicional estiver com defeito, o próprio sistema deve ser
descartado. Afinal, como R.C. Sproul explica:
Não se pode esperar que um cientista que se recuse a reconhecer fatos
que sabe serem verdadeiros chegue a conclusões sólidas. Qualquer
processo de raciocínio que comece com uma negação do conhecido e
prossiga com base no preconceito dificilmente produzirá luz, não
importa quão lúcido e convincente o argumento possa prosseguir após
o erro inicial.[150]
Portanto, coerência é necessário para qualquer cosmovisão. Se uma
cosmovisão não pode sustentar seu próprio peso, mas cai no absurdo sob a
pressão de suas próprias reivindicações da verdade, então não é uma
cosmovisão que valha a pena abraçar.
Por que você conscientemente construiria a sua casa sobre a areia? Por
que, então, você construiria sua vida sobre uma cosmovisão que cai diante
dos tremores criados por ela mesma? De fato, continuar abraçando e
defendendo uma cosmovisão defeituosa e incoerente é provar que você está
disposto a abraçar o absurdo e é voluntariamente cego para a verdade.
Conclusão
A cosmovisão cristã sustenta a si mesma? A cosmovisão naturalista
pode permanecer consistente com as suas crenças básicas? Nenhum sistema
de pensamento filosófico, humanístico ou religioso é baseado em uma única
linha de pensamento que leva a uma regressão eterna sem fundamento.
O ateísmo, o panteísmo, o sobrenaturalismo, o naturalismo ou qualquer
outra cosmovisão tem um fundamento, um sistema de pensamento interligado
baseado em um conjunto central de pressupostos que são ajustados, seja de
maneira consistente ou inconsistente. Todo mundo tem pressupostos, e se
queremos provar que valha a pena abraçar os nossos pressupostos, devemos
construir uma cosmovisão consistente com base nesses pressupostos.
Portanto, coerência, coerência e coerência é o teste final por trás de
qualquer cosmovisão. Como veremos, a cosmovisão cristã tem o único
fundamento pressuposicional válido, pois é o único sistema conceitual de
pensamento que passa com êxito no importante teste da coerência.
PARTE 4

O Absurdo da Incredulidade

“O tolo não tem prazer na sabedoria, mas só em que se manifeste aquilo que
agrada o seu coração.”
(Provérbios 18:2)
11

A Irracionalidade do Naturalismo

A cosmovisão cristã é verdadeira por causa da impossibilidade do contrário.


Não é apenas a melhor cosmovisão dentre todas as outras cosmovisões
possíveis; é a única cosmovisão coerente. Todas as condições necessárias
para o conhecimento são completamente perdidas sem o Deus da Bíblia.
Tanto o conhecimento dedutivo quanto o indutivo exigem que a revelação
divina seja comunicada àqueles que são feitos à semelhança de um Deus que
revela a si mesmo, e é racional, amoroso e pessoal. Se tirarmos da equação
um Deus pessoal e que se revela, e deixarmos o homem por si mesmo, então
tudo o que resta é o absurdo absoluto.
Para ajudar a demonstrar isso, vamos dar uma olhada nas
consequências lógicas dos pressupostos mais básicos que estão por trás das
várias cosmovisões não cristãs: o naturalismo, o sobrenaturalismo impessoal
e o sobrenaturalismo pessoal. Alguma dessas fundações é segura o suficiente
para suportar o seu próprio peso?
Começamos examinando a coerência de um dos pressupostos mais
amplamente aceitos no mundo ocidental — o naturalismo. O naturalismo é a
crença básica de que o universo material é tudo o que existe. Isso significa
que o universo é um sistema fechado, sem explicação sobrenatural para
qualquer uma das perguntas da vida. Isso implica em: (1.) materialismo — o
universo consiste apenas naquilo que é físico e material. Isso também implica
no (2.) empirismo — o conhecimento é limitado aos sentidos. (3.) O
determinismo também está implícito — o homem é apenas uma máquina,
sem vontade livre, com seus pensamentos e emoções sendo determinados
pelas leis fixas da física que controlam as ações de todas as coisas em
movimento nesse universo materialista. (4) O relativismo também é um
subproduto do naturalismo — se não há um legislador divino, a moralidade
ética deve ser situacional e, na melhor das hipóteses, relativa. (5.) O niilismo,
infelizmente, vem a seguir — toda a história do mundo e toda vida individual
nela são, em última análise, sem sentido.[151] Não existe uma intenção e nem
há propósito. Por fim, nada realmente faz sentido. Tire Deus de cena e é isso
que temos.
A Irracionalidade do Materialismo
Entretanto, vamos começar do começo. O naturalismo leva ao
materialismo — tudo o que existe é redutível à massa e energia,
independentemente de qualquer influência sobrenatural.
O materialismo tem raízes em alguns dos primeiros filósofos da Grécia
antiga. Thales acreditava que o elemento básico do universo era a água,
enquanto Anaxímenes acreditava que era o ar. Embora essas respostas
fornecidas por Thales e Anaxímenes pareçam um tanto primitivas, elas foram
algumas das primeiras tentativas de explicar o universo sem nenhum
elemento sobrenatural.
O que supostamente impedia os gregos de abandonarem a crença nos
deuses era um fenômeno natural inexplicável. Quaisquer ocorrências
incomuns ou traumáticas, que pareciam desafiar as funções ordenadas e
normais da natureza, como terremotos, tsunamis e eclipses solares e lunares,
eram vistas como eventos sobrenaturais. A ira dos deuses politeístas deve
estar por trás de coisas tão terríveis, pois que outra explicação poderia haver
para tais catástrofes terríveis e imprevisíveis? O sobrenatural era necessário
para explicar tais mistérios.
Thales, no entanto, pelo uso de observação científica, explicou e previu
um eclipse solar. O que antes era um ato dos deuses era agora um ato da
natureza. Com o tempo, a ciência deu explicações cada vez mais naturalistas
a muitos dos mistérios do universo.
Foram Nicolau Copérnico (1473-1543), Galileu Galilei (1564-1642) e
Isaac Newton (1642-1727) quem supostamente jogaram a bomba sobre a
religião. Copérnico colocou o nosso sol no centro do universo, enquanto
Galileu não discordava da Bíblia, mas de Aristóteles e de Ptolomeu, quando
afirmou que a Terra não está no centro do nosso sistema solar. Newton
forneceu uma explicação científica para os movimentos de nossos planetas
em sua lei gravitacional. O mistério de como a Terra e outros planetas ficam
suspensos no espaço agora tinha uma resposta naturalista. Como a ciência
parecia estar fornecendo cada vez mais respostas, a necessidade de Deus
estava sendo lentamente empurrada para fora, pela porta dos fundos.
O naturalismo estava ficando mais forte, mas foi apenas quando
Charles Darwin (1809-1882) forneceu uma explicação científica para as
origens da vida que, de acordo com Richard Dawkins, que se tornou
“possível ser um ateu intelectualmente realizado”.[152] Uma compreensão
naturalista das origens da vida não era nova para Darwin, mas, de acordo com
o professor de direito Phillip Johnson, da Universidade da Califórnia:
“Charles Darwin fez da evolução um conceito científico, mostrando, ou
afirmando ter mostrado, que grandes transformações poderiam ocorrer em
passos muito pequenos por meios puramente naturais, de modo que o tempo,
o acaso e a sobrevivência diferencial pudessem substituir o milagre”.[153] O
biólogo inglês Julian Huxley (1887-1975) chegou ao ponto de dizer o
seguinte: “No esquema evolutivo do pensamento, não há mais necessidade ou
espaço para o sobrenatural. A Terra não foi criada, evoluiu. O mesmo
aconteceu com todos os animais e plantas que a habitam, incluindo o ser
humano, mente e alma, além de cérebro e corpo”.[154]
O que Darwin foi para a biologia, Georges Lemaître (1894-1966) e
Edwin Hubble (1864-1934) foram para a astronomia. Lemaître propôs que o
universo teve um começo modificando os cálculos de Einstein, que
acreditava que o universo esteve em um estado eterno e constante. Ao mapear
as galáxias e seus movimentos, Hubble verificou a teoria de Lemaître,
provando que o universo está sempre se expandindo, mostrando que as
galáxias estão se afastando cada vez mais. Com a expansão do universo,
postulou-se que tudo se originou em um único ponto — uma singularidade.
Com um big bang, a partir dessa singularidade, o universo explodiu do
nada. Embora isso pareça com Gênesis 1:1, os naturalistas tentaram explicar
como o Big Bang poderia ter ocorrido sem Deus. Com a evolução e o Big
Bang[155] como explicações naturalistas da origem do universo, supostamente
as leis físicas da natureza tomaram o lugar de qualquer explicação
sobrenatural.
Mas certas perguntas precisam ser respondidas. Alguma explicação
naturalista/materialista pode apoiar as leis da física? O materialismo
consegue sustentar a sua própria fundação? Primeiro, mostraremos o absurdo
de um Big Bang sem Deus e, em seguida, mostraremos o absurdo da
evolução das espécies por meio da seleção natural. Nenhuma dessas teorias
pode explicar as leis que sustentam a sua fundação.
A Irracionalidade do Big Bang
Se um Deus sobrenatural não é uma opção, existem apenas duas
respostas possíveis para a origem do universo. Não três ou quatro, mas
apenas duas respostas podem ser dadas: ou o universo surgiu do nada ou é
eterno. Ambas estão em clara oposição às leis da ciência.
Se você acredita que o mundo surgiu do nada, você deve realmente
começar do nada! O apologista cristão Francis Schaeffer (1912-1984)
explicou que se você começar do zero, não poderá secretamente acrescentar
algo à equação: “Agora, para sustentar essa visão, não deve haver
absolutamente nada. Deve haver o que eu chamo de nada, nada. Se alguém
aceita essa resposta, não deve haver nada, o que significa que não deve haver
energia, massa, movimento ou personalidade”.[156] Eu também acrescentaria
que não haveria algo como tempo nem acaso. Se nada existe, o tempo e o
acaso também não existem. Eles não existem nem como conceitos sem que
algo (como uma inteligência ou massa e energia) exista primeiro.
Então, o nada criou algo? O ex-físico de Cambridge, Stephen Hawking,
e o ex-químico de Oxford, Peter Atkins, afirmam que sim. Hawking explica
que, porque “existe uma lei como a gravidade, o universo pode e criará a si
mesmo do nada”.[157] Atkins, com menos explicações, porém com mais
palavras, concorda:
No começo não havia nada. Vazio absoluto, não apenas espaço vazio.
Não havia espaço. Não havia espaço; nem havia tempo, pois isso era
antes do tempo. O universo era sem forma e vazio.
Por acaso, houve uma flutuação, e um conjunto de pontos, emergindo
do nada e tirando a sua existência do padrão que formaram, definiu
um tempo. A formação casual de um padrão resultou no surgimento
do tempo a partir de opostos coalescidos, isso surgiu do nada. Do
nada absoluto, absolutamente sem intervenção, surgiu uma existência
rudimentar.[158]
Hawking e Atkins não percebem o quanto eles soam ridículos? Para
que algo surja do nada, algo deve ter criado a si mesmo. Porém, a autocriação
é impossível. Como R.C. Sproul explica: “Para que algo crie a si mesmo,
deve ter a capacidade de ser e não ser ao mesmo tempo e na mesma relação”.
[159]
Se a lei da gravidade é uma propriedade observada da matéria, como a lei
da gravidade existia quando a matéria não existia? Como a gravidade pode
criar alguma coisa se ela nem existe? Perplexo com a afirmação de Hawking,
John Lennox afirma: “Pressupor a existência do universo para explicar a sua
existência soa como algo tirado de Alice no País das Maravilhas, não como
ciência”.[160] Mas, a explicação de Atkins não é melhor. Não é completamente
absurdo dizer: “No começo, não havia nada” e depois prosseguir dizendo,
“por acaso, houve uma flutuação”? Como pode haver acaso quando não há
nada para começar? O que é o acaso em um universo inexistente? É absurdo
pensar que podemos criar algo quando acrescentamos nada a nada. Nada,
mais o acaso (que não é nada), mais o tempo (que também não é nada) fez
surgir tudo. Se o tempo e o acaso não são nada, não importa quanto deles
existam, ainda não é suficiente. A velha máxima da afirmação de Parmênides
(515-460 a.C.), Ex nihilo nihil fit, ainda soa verdadeira hoje: nada pode vir do
nada.
Dizer o contrário, como já apontamos no Capítulo 10, vai diretamente
contra a primeira, a segunda e a terceira leis do movimento que afirmam que
toda causa deve ter um efeito. Acreditar que o universo é um efeito ou uma
flutuação que não tem causa é evidência de que preferimos negar a existência
de Deus do que permanecer racionalmente sãos. Dizer que nada criou algo é
acreditar em um milagre divino sem acreditar em Deus. “O que tudo isso
mostra é que o absurdo permanece”, concluiu Lennox, “mesmo quando
falado por cientistas mundialmente famosos”.[161]
Bem, talvez seja impossível que nada produza algo, mas isso não
significa que o universo não possa ser eterno. A teoria cíclica do universo
afirma que o universo é a sua própria causa eterna. Segundo esse modelo,
desde o momento do Big Bang, o universo continuará a se expandir em todas
as direções até que a sua própria força gravitacional seja tão forte que puxe
tudo de volta para si mesma, fazendo com que o universo desmorone em um
buraco negro cósmico, que em troca, fornecerá a energia necessária para
outro Big Bang. Esse processo eterno de expansão e retração se repete
indefinidamente.
Isso, no entanto, apenas traz o problema à tona novamente. Quem
disparou o começo do primeiro Big Bang? Uma regressão infinita de efeitos
não resolve nada. Essa é uma tentativa de explicar os efeitos por meio de uma
causa, mas nunca disposta a responder à pergunta de quem ou o quê causou o
primeiro efeito. Como a autocriação é uma contradição lógica, é impossível
que o universo tenha passado por múltiplas autocriações.
Além disso, a segunda lei da termodinâmica afirma que isso é
impossível. A segunda lei da termodinâmica afirma que a quantidade total de
energia utilizável em um sistema físico sempre diminui. O design e a
complexidade de um veículo alemão de alto desempenho não melhoram com
o tempo. Se você não acredita em mim, basta perguntar ao mecânico que foi
pago para trabalhar continuamente em meu Audi A4. Embora o carro tenha
rodado com precisão nos primeiros anos, antes de trocá-lo por um carro novo,
ele necessitava constante de consertos. Mas não estou me referindo apenas à
engenharia alemã, pois todas as coisas no universo — desde os automóveis
até as estrelas que estão morrendo — se desfazem com o tempo. Como a
quantidade de energia utilizável em qualquer sistema se dissipa naturalmente,
nada no universo é autossustentável. Assim, mesmo que o universo passasse
por múltiplas autorrecriações, esse processo não poderia se sustentar para
sempre. Em última análise, tudo terminaria em máxima entropia (desordem).
Eventualmente, o universo morreria com toda a sua energia utilizável sendo
totalmente esgotada. E se existe um fim definitivo no processo, não pode ter
havido um começo eterno. Assim, é irracional pensar que o universo é eterno.
A segunda lei da termodinâmica cria outro problema para o
naturalismo. Afirma que a ordem não vem da desordem. As explosões não
criam infraestruturas complexas e maravilhosamente projetadas, não importa
quantas vezes elas ocorram. O acaso e o tempo nunca criarão o Empire State
Building com água corrente, eletricidade, elevadores e janelas de vidro bem
ajustadas pela explosão aleatória de materiais raros. A energia massiva por
trás do Big Bang acabou lançando todos os materiais raros do universo em
uma estrutura precisa, matemática e uniforme, onde foram organizados com a
exatidão das leis imateriais da física. Devemos acreditar que matéria rara foi
lançada aleatória e cegamente em galáxias perfeita e matematicamente
estruturadas? Até mesmo o defensor do Big Bang, James Trefil, professor de
física na Universidade George Mason, confessou que “não deveriam existir
galáxias por aí, e mesmo que existam galáxias, elas não deveriam ser
agrupadas do jeito que são”. Ele continuou dizendo:
O problema de explicar a existência de galáxias provou ser um dos
mais espinhosos da cosmologia. Para todos os efeitos, elas
simplesmente não deveriam estar lá, porém lá estão elas. É difícil
comunicar a profundidade da frustração que esse simples fato
provoca entre os cientistas.[162]
No entanto, o Big Bang não terminou meramente com galáxias sem
vida, mas com um planeta perfeitamente posicionado capaz de toda a vasta
quantidade de complexidades necessárias para que a vida prospere e floresça
— o que conhecemos como princípio antrópico. O defensor do Design
Inteligente, Jim Nelson Black, resume a loucura em seu livro The Death of
Evolution:
Nós também sabemos que a mistura de oxigênio e nitrogênio na
atmosfera da Terra deve ser exata, dentro de limites muito estreitos,
para que possamos respirar. Para sustentar a vida, o planeta deve estar
exatamente situado no sistema solar para permanecer na zona
habitável ao redor do sol. Se a Terra orbitasse 5% mais perto do sol,
os mares, rios e lagos evaporariam e toda a vida formada por carbono
deixaria de existir. Se o planeta estivesse 20% mais distante do sol, a
água congelaria.
Em relação ao tamanho do planeta, a crosta externa da Terra é fina
como papel. Se fosse mais espessa, o processo das placas tectônicas,
que controla a temperatura interna da Terra e a presença de elementos
químicos essenciais à vida, não poderiam ocorrer. A profundidade
terrestre também afeta o movimento de elementos derretidos sob a
superfície da terra, incluindo o minério de ferro responsável pelo
campo magnético ao redor do nosso planeta. O campo magnético, por
sua vez, protege o planeta dos perigosos ventos solares gerados pelo
sol e mantém a Terra exatamente na órbita correta em relação ao sol,
à lua e aos planetas vizinhos.
Esses são apenas alguns dos fatores que tornam a Terra ideal para a
vida. E há muito mais… A chance de todos esses fatores e as
centenas de outros que permitem que a vida na Terra ocorra
meramente por acaso é astronômica — as chances são literalmente de
trilhões para um. O matemático britânico Roger Penrose realizou um
estudo da probabilidade de um universo capaz de sustentar a vida
ocorrendo por acaso e descobriu que as chances eram de 1 em 1010 123
(expresso em 10 na potência de 10 na potência de 123). Esse é um
número incompreensível. De acordo com a teoria da probabilidade,
probabilidades de 1 a 1050 representam “probabilidade zero”. Mas os
cálculos de Pentose colocam as probabilidades de vida surgindo como
Darwin a descreveu em mais de um trilhão de trilhões de trilhões de
vezes menos do que zero.[163]
Esses números pressupõem que os blocos de construção do universo já
existiam. Se, no entanto, nada vem do nada, não há chance de o Big Bang ter
criado o universo por sua própria iniciativa. Black concluiu, com razão, que
apegar-se à teoria do Big Bang “exige uma suspensão completa da crença
mais adequada aos leitores de contos de fadas”.[164] Até o evolucionista
Arthur Stanley Eddington (1882-1944) admitiu que as evidências científicas
por trás das origens do universo, embora ele achasse isso repugnante,
apontavam para um Designer Inteligente:
O retrato do mundo, conforme traçado nas teorias físicas existentes,
mostra arranjos dos elementos individuais para os quais as
probabilidades são de vários milhões para 1 contra uma origem por
acaso. Algumas pessoas gostariam de chamar esse recurso não
aleatório de objetivo ou design mundial; mas chamarei de anti-acaso
sem compromisso.[165] Na física, não estamos dispostos a dizer que o
anti-acaso desempenha algum papel nas reações entre os sistemas de
bilhões de átomos e quanta[166] que estudamos; e, de fato, todas as
nossas evidências experimentais mostram que elas são governadas
pelas leis do acaso. Consequentemente, removemos o anti-acaso das
leis da física — das equações diferenciais. Naturalmente, portanto,
ele reaparece nas condições de contorno, pois precisa entrar no
esquema em algum lugar. Ao afastá-lo o suficiente da esfera de
nossos problemas físicos atuais, imaginamos que nos livramos dele.
Só quando alguns de nós somos tão mal orientados a ponto de
tentarmos voltar bilhões de anos ao passado é que encontramos as
varreduras empilhadas como uma muralha alta e que forma um limite
— um começo de tempo — que não podemos ultrapassar.[167]
As probabilidades matemáticas são grandes demais para serem
superadas para que o universo tenha sido causado por mero acaso. Depois de
conhecer os fatos, é preciso mais fé cega para crer que um universo aleatório
se criou cegamente do que para aceitar em um Designer Inteligente.
Além disso, essas probabilidades matemáticas criam outro problema
para os naturalistas. As probabilidades matemáticas não apenas se opõem à
possibilidade de o universo ter vindo a existir por uma explosão cósmica não
inteligente; uma explosão não inteligente não consegue fornecer explicação
alguma para a existência das leis absolutas e imateriais da matemática.
As leis da física operam de acordo com as leis da matemática. Por
exemplo, a aceleração da gravidade pode ser medida com precisão por uma
equação matemática (g = 9.81m/s/s). A distância que um objeto em queda
viaja aumenta no quadrado do tempo em que ele viaja. De acordo com a lei
do quadrado inverso, a intensidade da gravidade é inversamente proporcional
ao quadrado da distância de dois corpos. A força de um ímã diminuirá com o
cubo da distância dos materiais ferromagnéticos (como o ferro). A questão é
que as leis da física não podem ser separadas da matemática. Ao ver essa
conexão, o astrônomo inglês James Jeans (1877-1846) observou: “O universo
parece ter sido projetado por um matemático puro”.[168]
Mas de onde vêm as leis imateriais e matemáticas? Como a matemática
pode existir de forma independente da consciência inteligente? O professor
de ciências matemáticas da Universidade Trinity Western, John Byl, explica
por que esse é um dilema embaraçoso para os naturalistas:
O naturalismo tem grande dificuldade em lidar com objetos
matemáticos. Objetos matemáticos são ideias abstratas. Como a
matéria pode evoluir para ideias? Como podem existir ideias, para
além de alguma mente? O naturalismo alega que a mente evoluiu da
matéria. Como, então, existia a matemática antes da mente evoluir?
Se a resposta é que a matemática não existia antes do surgimento do
homem, como devemos explicar a estrutura matemática das leis da
física, que se supõe terem existido desde o início? Se as verdades
matemáticas são universais e eternas, isso parece exigir a existência
de uma Mente eterna e universal. No entanto, se a matemática existe
objetivamente, além da mente humana e do mundo físico, como o
homem pode obter acesso a ela?[169]
Essa foi uma das razões pelas quais o ateu de longa data Antony Flew
renunciou ao seu ateísmo: “O ponto importante não é apenas que existem
regularidades na natureza, mas que essas regularidades são matematicamente
exatas, universais e ‘organizadas’”.[170] Um universo autocriado não faz
sentido, porque destrói os alicerces que busca defender: as leis da natureza.
Por consequência, a teoria do Big Bang não pode explicar por que o mundo é
organizado de forma simétrica e obedece aos princípios matemáticos das leis
da física.
Perceber uma Mente Inteligente por trás da estrutura matematicamente
exata do universo parece mais natural e plausível do que pensar que o acaso
cego criou e organizou o universo a partir do nada. No entanto, o colunista do
New York Times e escritor científico George Johnson tentou nos fazer
acreditar que as nossas mentes estão nos enganando quando assumimos
automaticamente que essa organização geométrica encontrada em todo o
universo foi projetada por uma Mente Inteligente: “Quando vemos uma
simetria tão complexa, nossos cérebros assumem automaticamente que houve
um inventor”.[171] Mas esse design aparente, diz Johnson, é apenas uma
ilusão. Da mesma forma, o biólogo evolucionário Richard Lewontin
observou que os objetos da natureza “parecem ter sido cuidadosa e
artisticamente projetados”.[172]
Johnson continuou dizendo que esse instinto de ver Deus como
arquiteto deve ser suprimido para que possamos entender o universo: “A
superação desse instinto levou séculos, e foi só então que o mundo vivo
começou a fazer sentido”.[173] Segundo Francis Crick, codescobridor da
estrutura do DNA, “os biólogos devem constantemente manter em suas
mentes que o que eles veem não foi projetado, mas evoluiu”.[174]
Em outras palavras, embora não seja natural acreditarmos que o
universo criou a si mesmo, devemos suprimir o conhecimento de Deus que é
acionado ao observar o universo, se quisermos crer que o mundo não tem um
design ou propósito. E, de acordo com Johnson, é somente quando vemos o
mundo sem um design ou propósito que podemos “entender” um mundo sem
sentido.
Naturalistas, como Eddington, Lewontin, Crick e Johnson, gostariam
que, se encontrássemos um relógio no deserto — com todas as suas peças
interfuncionantes operando coletivamente para um único propósito com
precisão matemática, e o relojoeiro não estivesse também visivelmente
presente — não acreditássemos que o relógio teve um designer inteligente.
Se o relojoeiro não puder ser observado através de observação científica, um
relojoeiro deve ser descartado.[175]
Contudo, o universo é muito mais complexo e matematicamente exato
do que qualquer relógio. Se é racional pensar que os relógios têm relojoeiros,
logo é irracional pensar que o relógio cósmico do universo não tem um
designer inteligente. Os relógios são apenas uma cópia imperfeita do nosso
sistema solar. Os relógios geralmente precisam ser ajustados, mas a Terra
continua girando em seu eixo a cada 24 horas e completa uma rotação
completa ao redor do sol a cada 365,25 dias. Existem muito mais
complexidades e necessidades matemáticas que mantêm o mundo
funcionando do que qualquer relógio feito pelo homem.
Conclusão
Uma explicação naturalista do universo, não importa se é por uma
explosão não sobrenatural de uma singularidade ou por outros meios, é
incapaz de explicar as leis da natureza que estão enraizadas nas leis imateriais
da matemática. Se existe um universo sem uma Mente Divina, por que existe
ordem e estrutura geométrica quando o caos é o que seria esperado?
12

A Irracionalidade da Evolução

A segunda lei da termodinâmica não apenas destrói qualquer possibilidade do


Big Bang ser a causa não inteligente do universo, mas também mina a teoria
da evolução das espécies por meio da seleção natural.
Não Confunda Microevolução com Macroevolução
Ao pensar sobre a evolução, não se deve confundir microevolução (a
capacidade de várias espécies se adaptarem ao ambiente, como quando uma
cepa do vírus da gripe se torna imune a certos anticorpos ao longo do tempo)
com macroevolução (a ideia de que todas as espécies descendem de um
ancestral comum). Confundir microevolução com macroevolução é
característico de uma ciência descuidada. Provar a microevolução não
equivale a provar a macroevolução.
A microevolução é um fato que pode ser facilmente demonstrado ao
observarmos as diferentes etnias humanas que se desenvolveram ao longo das
regiões geográficas. A macroevolução, por outro lado, é a teoria de que as
complexidades da raça humana evoluíram da matéria não viva através de um
lento processo de adaptação. Em outras palavras, a macroevolução exige que
o imaterial tenha surgido do material, que a vida tenha sido derivada da não
vida e que nossas emoções, pensamentos e aspirações se desenvolvam
lentamente a partir da matéria morta.
Darwin não ofereceu nenhuma evidência para a macroevolução, mas
encheu o seu livro, On the Origin of Species, com vários exemplos de
microevolução. Daniel Dennett, o grande apologista dos dias modernos da
teoria da evolução de Darwin, admitiu que as observações de Darwin
estavam limitadas ao estudo de várias adaptações ocorrendo em
características já existentes e em espécies já existentes:
Darwin não pretende oferecer uma explicação da origem da primeira
espécie ou da própria vida; ele começa no meio, supondo muitas
espécies diferentes com muitas habilidades já presentes, e afirma que,
a partir desse ponto intermediário, o processo que ele descreveu
inevitavelmente aprimora e diversifica as habilidades das espécies já
existentes.[176]
Em outras palavras, depois que Darwin observou a capacidade de uma
espécie específica de se adaptar ao ambiente, ele concluiu que o homem
evoluiu dos macacos a partir da seleção natural. Lennox, no entanto, lembra
que a “palavra ‘seleção’ deve nos alertar para o seguinte: a seleção é feita a
partir de entidades já existentes”.[177] A adaptação pode ocorrer dentro de
características e entidades que já existem. Os bicos de pássaros podem ficar
mais longos ou mais curtos, mas não há evidências empíricas de que os bicos
se transformem em focinhos. A cor da pele pode mudar e a altura pode variar
de geração para geração, dependendo de quem se casa com quem, mas todas
essas mudanças sutis são apenas mudanças nas características preexistentes.
Não é como se Darwin observasse qualquer caso em que houvesse um
processo criativo ou desenvolvimento de novas entidades em que essas
entidades não existissem em primeiro lugar. A sobrevivência do mais apto é
uma coisa; o surgimento do mais apto é outra coisa. Não vamos confundir
essas duas coisas.
A Evolução Contraria a Lei da Biogênese
A macroevolução soa como algo bobo. Há muito tempo, uma pedra, ou
um pedaço de pau, ou um monte de terra, ou uma poça de água se
reproduziram. Uma dessas pedras, varas, porções de terra ou poças de lama
depois de muitos anos se tornou autoconsciente. Teve sentimentos. Não
queria mais ser uma pedra, então decidiu se transformar em um macaco. Isso
parece absurdo, mas como a lentidão do processo e a adição de mais um
milhão de etapas ao processo ajudam? Como a vida pode surgir a partir da
matéria morta?
Isso não apenas soa ridículo, como também não é apoiado pelas
evidências. Dizer que a vida evolui a partir da não vida não apenas vai
diretamente contra a segunda lei da termodinâmica, mas também contra a lei
da biogênese. Louis Pasteur (1822-1895) pesquisou a possibilidade de a vida
ter sua origem a partir da não vida e concluiu: “Toda a vida vem do ovo”
(Omne vivum ex ovo). Os seres vivos vêm apenas de outros seres vivos.
Embora não tenha havido uma exceção observável a essa regra, os mesmos
naturalistas que rejeitam milagres, como a ressurreição de Cristo, que foi
verificada por mais de 500 testemunhas oculares, afirmam que devemos
acreditar em um milagre mais radical — que a vida evoluiu da não vida —
sem sequer uma única testemunha ocular. O que é mais inacreditável, a
ressurreição de Cristo ou a vida surgindo a partir de uma rocha? Pelo menos a
cosmovisão cristã abre espaço para milagres e para o sobrenatural.
A Evolução Contraria o Princípio Reprodutivo
Supostamente, por causa do importante princípio reprodutivo
conhecido como seleção natural, a vida surgiu da matéria não viva por meio
de adaptações lentas. Os elementos ou partes que não eram úteis para a vida
desapareceram e os que foram úteis para a vida foram reproduzidos.
Supostamente, uma rocha que se transforma em macaco não soa boba ou
milagrosa se retardarmos o processo e adicionarmos um bilhão de etapas
intermediárias. No entanto, como o sistema reprodutivo trabalha em prol
daquilo que não está vivo? Visto que a reprodução é um dos atributos da
vida, a vida deve primeiro existir antes que possa se reproduzir. A
sobrevivência do mais apto exige que o sistema reprodutivo já esteja
funcionando antes que qualquer adaptação possa ocorrer. Rochas não se
transformam ou se reproduzem. Como a seleção natural e o processo de
reprodução são iniciados? Por boas razões, Charles Darwin ficou
completamente mudo a respeito desse ponto.
A Evolução Contraria o Princípio do Irredutivelmente
Complexo
Dizer que a luz atingiu uma poça quente de água (ou seja, uma sopa
prebiótica) e fez surgir matéria viva — as células mais simples — é
inacreditável e vai contra a teoria de que a vida evoluiu de adaptações lentas e
graduais. Especialmente vendo como a célula mais simples é complexa e
surpreendente — o que inclui mais de três bilhões de partes móveis e reações
químicas complexas. Em seu livro Refuting Evolution, Jonathan Sarfati
explica a complexidade da célula mais simples e cita o trabalho do biólogo
molecular Michael Denton, que fornece essa incrível explicação:
Talvez em nenhuma outra área da biologia moderna o desafio
colocado pela extrema complexidade e engenhosidade das adaptações
biológicas seja mais aparente do que no fascinante novo mundo
molecular da célula… Para entender a realidade da vida, como foi
revelada pela biologia molecular, precisamos ampliar uma célula mil
milhões de vezes até que ela tenha vinte quilômetros de diâmetro e
assemelhe-se a uma aeronave grande o suficiente para cobrir uma
cidade como Londres ou Nova York. O que veríamos então seria um
objeto de complexidade incomparável e design adaptável. Na
superfície da célula, veríamos milhões de aberturas, como orifícios de
uma vasta nave espacial, abrindo e fechando para permitir que um
fluxo contínuo de materiais flua para dentro e para fora. Se
ingressássemos em uma dessas aberturas, nos encontraríamos em um
mundo de tecnologia suprema e complexidade desconcertante.
É realmente credível que processos aleatórios possam ter construído
uma realidade, mesmo o menor elemento — uma proteína ou gene
funcional — cuja complexidade vai além de nossas próprias
capacidades criativas, uma realidade que é a própria antítese do
acaso, que se destaca em todos os sentidos de qualquer coisa
produzida pela inteligência do homem? Quando comparados ao nível
de engenhosidade e complexidade exibido pela maquinaria molecular
da vida, até nossos artefatos mais avançados parecem grosseiros.[178]
Além disso, as células mais simples hospedam um código genético que
é duplicado na replicação. Uma grande quantidade de informação é copiada
do DNA para o RNA (ácido ribonucleico) durante a transcrição. O DNA
hospeda informações semânticas, como um manual de instruções, com
subunidades químicas que funcionam como caracteres alfabéticos. A
linguagem genética consiste em um alfabeto (sistema de codificação),
ortografia, gramática (arranjos apropriados das subunidades químicas),
significado (semântica) e finalidade intencionada. Essa informação genética é
traduzida à medida que é transmitida aos aminoácidos, que são reunidos em
proteínas. Esse processo é incrível. No entanto, como esse conhecimento
surgiu? De onde vêm essas informações específicas e funcionais? Outra
pergunta importante é como a célula mais simples evoluiu com a capacidade
de transmitir, armazenar e traduzir todas essas informações em seu processo
de replicação?
O DNA humano, por exemplo, contém mais de 3,5 bilhões de
caracteres e informações suficientes para preencher 12 conjuntos da
Enciclopédia Britânica de 32 volumes. Toda evidência empírica e bom senso
nos levariam a crer que a informação funcional vem de mentes inteligentes.
“DNA”, de acordo com o fundador da Microsoft, Bill Gates, “é como um
programa de computador, porém muito, muito mais avançado do que
qualquer software já criado”. No entanto, da mesma maneira que parece
absurdo pensar que o tempo e o acaso poderiam escrever um programa de
computador complexo, parece absurdo pensar que o acaso cego
repentinamente escreveu o código genético da vida em filamentos de DNA. É
preciso muita fé cega para crer que o acaso pode construir uma estátua de
mármore que se parece com Abraham Lincoln, mas é necessário mais do que
fé cega para crer que o acaso poderia escrever um manual de instruções de
385 volumes e empilhá-lo organizadamente no colo de Lincoln. Tal
informação simplesmente não pode ser explicada pelo arranjo aleatório e
cego de massa e energia.
De acordo com Paul Davies, “indiscutivelmente o mais influente
expositor contemporâneo da ciência moderna”,[179] esse é um grande
problema para a teoria da evolução: “O problema de como informações
significativas ou semânticas podem surgir espontaneamente de uma coleção
de moléculas irracionais sujeitas a forças cegas e sem propósito representam
um profundo desafio conceitual”.[180]
A macroevolução não pode ocorrer sem que novas informações
genéticas sejam adicionadas ao código genético de um organismo. Sem um
acréscimo de informação genética, é impossível evoluir um organismo
simples. No entanto, não há sequer uma evidência observável de que isso seja
possível.
Além disso, a microevolução opera apenas com informações genéticas
que já existem. Para que as proteínas sejam capazes de construir formas de
vida novas e mais complexas, elas precisam de instruções novas e mais
complexas para seguir. Porém, novas informações genéticas não podem ser
criadas. Mutações que alteram características existentes (por exemplo,
variedades de milho e de moscas de fruta) não são uma formação a partir de
novas informações, mas o rearranjo de informações preexistentes. No nível
molecular, algo não foi criado, mas modificado no processo de mutação.
Se não é criada, então de onde vem a informação genética? Stephen C.
Meyer, cofundador do Center for Science and Culture of the Discovery
Institute, explica por que não devemos descartar uma Mente Inteligente ao
fazer essa pergunta:
Cientistas em muitos campos reconhecem a conexão entre
inteligência e informação e fazem inferências de acordo com isso. Os
arqueólogos assumem que um escriba é que produziu as inscrições na
Pedra de Roseta. Os antropólogos evolucionistas reconhecem a
inteligência dos primeiros hominídeos a partir de pedras lascadas, que
são muito improvavelmente especificadas em sua forma e função para
terem sido produzidas por causas naturais. A busca da NASA por
inteligência extraterrestre pressupõe que qualquer informação
especificada incorporada aos sinais eletromagnéticos que vêm do
espaço indicaria uma fonte inteligente. Até o momento, os
radioastrônomos não encontraram nenhum sinal desse tipo. Porém,
mais perto de casa, os biólogos moleculares identificaram sequências
e sistemas ricos em informações na célula, sugerindo, pela mesma
lógica, a existência passada de uma causa inteligente para esses
efeitos.[181]
Toda essa informação genética e imensa complexidade supostamente
vieram de matéria não viva que, magicamente, foi capaz de se reproduzir. A
menos que você creia em mágica sem um mágico, a maravilha da engenharia
da célula mais simples não poderia ter evoluído da matéria não viva. Para a
vida começar, a célula simples teve que aparecer espontaneamente com todas
as partes necessárias, reunidas no lugar apropriado, criando as informações
semânticas necessárias para a célula viva se reproduzir.
O bioquímico Michael Behe, em seu livro Darwin’s Black Box, entra
em grandes detalhes não apenas na explicação da complexidade de uma única
célula, mas também em como é necessária essa complexidade, com todas as
suas diversas partes trabalhando simultaneamente juntas, para que a célula se
reproduza.[182] A célula é um sistema funcionalmente integrado que opera
apenas quando cada um de seus componentes (processadores, fontes de
energia e comutadores) funcionam juntos.
Em outras palavras, a célula mais simples é irredutivelmente complexa.
Behe ilustrou isso observando os componentes de uma ratoeira à moda
antiga. Uma ratoeira tem seis componentes — uma plataforma, uma mola,
um arame, um martelo, um prendedor e uma barra de retenção. Para que a
ratoeira funcione, todos os seus componentes devem estar presentes e em seu
devido local ou, caso contrário, ela não funcionará. Remova apenas uma de
suas partes, como a mola, e a armadilha torna-se completamente inútil.
Também são necessários todos os diferentes componentes da célula mais
simples para que ela possa se reproduzir. A célula é irredutivelmente
complexa. Portanto, se as partes desnecessárias são descartadas no processo
evolutivo, a célula mais simples terá necessária e simultaneamente que ter o
mesmo destino. No entanto, a união de todos esses componentes em um
simples momento espontâneo vai contra a teoria de que as coisas se adaptam
lentamente para sobreviver. Isso significa que uma única célula não poderia
ter evoluído pela reprodução, pois ela deve permanecer totalmente intacta ou
então não poderia ter vindo a existir.
Darwin assumiu que a célula viva mais simples consistiria em um único
componente (uma gota de protoplasma),[183] mas aprendemos que a célula é
mais parecida como uma fábrica complexa com uma rede de
telecomunicações em massa. Entendendo isso, Dean Kenyon, professor
emérito de biologia da San Francisco State University, afirma: “Não há a
menor chance de ter havido uma origem evolutiva química para as células
mais simples”.[184] Essa foi outra razão pela qual Flew deu as costas ao
ateísmo, pois concluiu que “a origem da vida não pode ser explicada se você
começar apenas com a matéria”.[185] Christopher Williams, professor de
bioquímica da Ohio State University, ecoou a mesma conclusão:
Poucas pessoas fora da genética ou bioquímica percebem que os
evolucionistas ainda não podem fornecer detalhes substanciais sobre
a origem da vida, e particularmente sobre a origem da informação
genética no primeiro organismo autorreplicante. Quais genes foram
necessários — ou até mesmo, ele tinha genes? Quanto de DNA e
RNA havia — ou possuía ácidos nucleicos? Como surgiram enormes
moléculas ricas em informação antes da seleção natural? Como
exatamente se originou o código genético que liga os ácidos nucleicos
à sequência de aminoácidos? Claramente, a origem da vida — o
fundamento da evolução —, na prática, ainda consiste completamente
em especulação e pouco ou nenhum fato.[186]
O que se pode dizer da célula mais simples pode ser dito de muitas
coisas, como a visão. A visão não poderia ter evoluído da não visão, porque o
olho precisa de todos os seus componentes ativos para funcionar. Até Darwin
admitiu: “Quanto à suposição de que o olho — com todos os seus artifícios
inimitáveis para ajustar o foco a diferentes distâncias, para perceber
quantidades diferentes de luz e para corrigir a distorção esférica e cromática
— possa ter sido formado pela seleção natural, eu voluntariamente confesso
que parece absurdo no mais alto grau possível”.[187]
Se o olho precisa ficar intacto para funcionar, de que serve 5% do olho
no processo inicial de adaptação do olho? Richard Dawkins parece bobo
quando tenta explicar isso:
Um animal no passado com 5% de olho pode realmente tê-lo usado
para algo que não seja a visão, mas parece-me provável que o tenha
usado para 5% da visão… Então, 1% é melhor do que cegueira. E 6%
é melhor que 5% e 7% é melhor que 6, e assim por diante na série
gradual e contínua.[188]
Dawkins parece estar perdendo o ponto. Com apenas 5% dos olhos, não
há absolutamente nenhuma visão. 5%, 10% e até 50% dos olhos são iguais a
zero por cento da visão. A visão é impossível sem todos os componentes
necessários e isso indica que é impossível para o olho evoluir lentamente.
Como a evolução é cega, não pode criar partes que possivelmente serão
necessárias milhares de anos no futuro. Supostamente, o processo evolutivo
elimina o que não é útil para a sobrevivência — como 5% de um olho que
não funciona. Por esse motivo, ou a visão fica intacta ou não poderia ter
vindo a existir de modo algum.
Um dos químicos mais citados no mundo, James M. Tour, que também
é professor de engenharia mecânica e ciência de materiais na Rice University,
argumentou que nenhum cientista é capaz de explicar a macroevolução:
Alguém compreende os detalhes químicos por trás da
macroevolução? Nesse caso, gostaria de me sentar com essa pessoa e
ser ensinado, por isso a convido para um encontro particular. O
almoço será por minha conta. Até lá, sustentarei que nenhum químico
a compreende, portanto, estamos coletivamente confusos. E nem
sequer lidei com os problemas da origem da primeira vida. Para mim,
isso é ainda mais cientificamente misterioso do que a evolução.
Darwin nunca tratou da origem da vida, e posso ver por que ele não o
fez; ele era esperto demais para isso. Os cientistas da atualidade que
expõem seus pensamentos sobre isso se tornam cada vez mais tímidos
quando conversam comigo em particular. Simplesmente não consigo
entender a fonte de sua confiança ao abordarem as suas posições
publicamente.[189]
Em um discurso proferido na Georgia Tech, Tour defendeu a sua crítica
à macroevolução:
Eu vou lhes dizer como cientista e químico sintético: se há alguém
que conseguiria entender a evolução, então esse alguém sou eu,
porque eu faço moléculas ganharem vida, e não apenas compro um
kit, misturo isso com aquilo, e obtenho aquilo outro. Quero dizer, ab
initio, eu crio moléculas. Eu entendo o quão difícil é criar moléculas.
Entendo que, se eu usar o kit de ferramentas da Nature, poderia ser
muito mais fácil, porque todas as ferramentas já estão lá, e apenas
devo misturá-las nas proporções e condições corretas, mas ab initio é
muito, muito difícil.
Não entendo a evolução e confesso isso a vocês. Tudo bem que
eu diga: “Eu não entendo isso”? Está tudo certo? Eu sei que há
muitas pessoas por aí que não entendem nada sobre síntese orgânica,
mas elas entendem sobre a evolução. Eu entendo muito sobre fazer
moléculas; eu não entendo a evolução.
Deixe-me contar o que acontece nas salas dos fundos da
ciência — com membros da Academia Nacional, com vencedores do
Prêmio Nobel. Tenho me encontro sentado com eles em particular,
não em público — porque é uma coisa assustadora, se você diz o que
acabei de dizer — então eu digo: “Você entende tudo isso, de onde
tudo isso veio e como isso acontece?”. Toda vez que eu me sento
com pessoas que são químicas sintéticas, que entendem disso, elas
dizem: “Ah, não”. Essas pessoas estão muito longe de acreditar que
essas coisas se uniram. Tenho conversado com membros da
Academia Nacional, com vencedores do Prêmio Nobel. Às vezes,
digo: “Você entende isso?”. E, se eles têm medo de dizer, “Sim”, não
dizem nada. Eles apenas me encaram, porque não conseguem
responder a isso sinceramente.
Fui convidado pelo reitor de um departamento, há muitos anos,
e ele era químico. Ele estava meio preocupado com algumas coisas.
Eu disse: “Permita-me perguntar uma coisa. Você é químico. Você
entende isso? Como você obtém DNA sem uma membrana celular?
E como você obtém uma membrana celular sem DNA? E como tudo
isso se une a partir desse pedaço de geleia?”. Não temos ideia, não
temos ideia. Eu digo: “Não é interessante que você, o reitor da
ciência e eu, o professor de química, possamos conversar sobre isso
em privado no seu escritório, mas não podemos ir a público e
conversar sobre isso?”.
Porém, há sete ou oito anos atrás, publiquei no meu site que eu
não entendo isso. E eu disse: “Pagarei um almoço para qualquer um
que se sentar comigo e me explicar a evolução, e eu não discutirei
com você até que eu não entenda alguma coisa — vou pedir que
você esclareça. Mas você não pode acenar e dizer: “Essa enzima faz
isso”. Você precisa se aprofundar nos detalhes e explicar para mim
de onde as moléculas são construídas”. Ninguém se pronunciou.
A Sociedade de Ateus (The Atheist Society) entrou em contato
comigo. Eles disseram que pagariam o almoço e desafiaram alguém
da própria Sociedade: “Vá para Houston, almoce com esse cara e
converse com ele”. Ninguém veio! Agora lembre-se, eu apenas vou
fazer perguntas, e quando eu parar de entender o que você está
falando, então vou perguntar. Então, sinceramente, eu quero saber.
Eu gostaria de acreditar na evolução. Mas eu simplesmente não
consigo.[190]
A Evolução Não Consegue Explicar a Consciência
A teoria da evolução não é apenas incapaz de explicar as origens da
vida a partir da matéria morta, como também não tem explicação para as
origens da consciência. De onde veio a consciência? Em seu livro The
Cosmic Jackpot, o evolucionista Paul Davies afirma: “Átomos sem mente e
desajeitados conspiraram para formar não apenas a vida, não apenas a mente,
mas o entendimento”.[191] No entanto, algumas páginas depois, ele admitiu
que “os cientistas não sabem como a vida começou e ficam quase totalmente
confusos a respeito da consciência”.[192] Isso ocorre porque a consciência, que
inclui autoconsciência e intenção voluntária, não pode ser reduzida a meras
propriedades físicas.
Por isso, Thomas Nagel, embora negue a existência de qualquer
inteligência divina, diz que a evolução natural sozinha não consegue explicar
as origens da consciência:
Se a teoria da evolução é uma teoria puramente física, ela pode, em
princípio, fornecer a estrutura para uma explicação física da
aparência dos organismos animais comportamentalmente complexos
dotados de sistemas nervosos centrais. Mas a consciência subjetiva,
se não for redutível a algo físico, não faria parte dessa história; ficaria
completamente inexplicável pela evolução física — mesmo que a
evolução física de tais organismos seja de fato uma condição
causalmente necessária e suficiente para a consciência.[193]
A Evolução Não é Apoiada pelos Registros Fósseis
Além disso, onde estão essas espécies de transição cegas com apenas
5% de um globo ocular que não funciona? Onde estão os registros fósseis?
Onde estão as conexões ausentes? O Homem de Java desapareceu? O que
aconteceu com Lucy? Onde está o Homem de Piltdown quando você precisa
dele? E o Homem de Nebraska? Todos esses supostos elos perdidos que
deram provas inegáveis do processo evolutivo das espécies acabaram se
revelando ser fraudes ou erros flagrantes de julgamento. Não existe nem
mesmo uma única conexão ausente que possa ser encontrada? Colin
Patterson, que era o paleontólogo sênior do British Museum of Natural
History, em seu livro Evolution, quando questionado por que ele não incluía
fotos ou ilustrações de formas de transição, explicou:
Concordo plenamente com seus comentários sobre a falta de
ilustração direta das transições evolutivas em meu livro. Se eu
conhecesse algum fóssil ou ser vivo, certamente os incluiria. Falarei
francamente: não existe um fóssil com o qual alguém possa
argumentar de forma clara.[194]
De fato, de acordo com o paleontólogo David Raup, do Field Museum
of Natural History, os registros fósseis não ajudaram em nada a teoria da
evolução de Darwin:
Estamos agora cerca de 120 anos depois de Darwin e o conhecimento
dos registros fósseis foi amplamente expandido. Agora temos um
quarto de milhão de espécies fósseis, mas a situação não mudou
muito. O registro da evolução ainda é surpreendentemente instável e,
ironicamente, temos ainda menos exemplos de transições evolutivas
do que tínhamos na época de Darwin.[195]
Niles Eldredge, do American Museum of Natural History, foi ainda
mais ousado ao admitir: “Nós, paleontológos, temos dito que a história da
vida fundamenta [a narrativa da mudança adaptativa gradual] mesmo sabendo
o tempo todo que ela não o faz”.[196]
Em vez de trabalhar a favor da evolução, de acordo com Stephen
Meyer, os registros fósseis fornecem evidências para o Design Inteligente.
Ele cita a admissão de Darwin de que “se numerosas espécies, pertencentes
ao mesmo gênero ou família, realmente entraram na vida de uma só vez, esse
fato seria fatal para a teoria da descendência com lenta modificação por meio
da seleção natural”.[197]
No entanto, paleontólogos de todo o mundo descobriram uma súbita
explosão de registros fósseis nos estratos cambrianos nas camadas
sedimentares de rochas sem nenhum “fóssil intermediário de transição que
conecta os animais cambrianos a formas pré-cambrianas mais simples”.[198]
Além disso, dentro da camada cambriana há “uma surpreendente variedade
de formas animais completamente novas, com novos planos corporais; e um
padrão em que diferenças radicais de forma no registro fóssil surgem antes de
diversificações e variações menores e em menor escala”.[199] “Isso”, segundo
Meyer, “inverte a expectativa darwiniana de pequenas mudanças
incrementais, apenas resultando gradualmente em diferenças cada vez
maiores na forma”.[200]
Fatos como esses levaram David Berlinski, um membro sênior do
Discovery Institute, a reivindicar:
A maior parte do debate sobre a teoria de Darwin não está a serviço
dos fatos. Nem da teoria. Os fatos são o que sempre foram: são
imprevisíveis. Entre os biólogos evolucionistas, esses assuntos são
bem conhecidos. Em privado, os docentes de Susan B. Anthony
costumam dizer um ao outro com alívio que é uma coisa muito boa
que o público não tenha ideia do que a literatura de pesquisa
realmente sugere.
“Darwin?”, uma vez um Prêmio Nobel de biologia comentou,
olhando-me por cima de seus óculos bifocais, “ele é apenas uma
agenda partidária”.[201]
A Evolução é Baseada em uma Cosmovisão Naturalista,
Não em Ciência
A teoria da evolução está repleta de problemas, mas, segundo
Lewontin, esses problemas são mais fáceis de aceitar do que admitir que
existe um Deus:
Nós ficamos do lado da ciência, apesar do absurdo patente de
algumas de suas construções, apesar de não ter cumprido muitas de
suas promessas extravagantes de saúde e vida, a despeito da
tolerância da comunidade científica com histórias injustificadas,
porque temos um compromisso prévio, um compromisso com o
materialismo. Não é que os métodos e instituições da ciência de
alguma forma nos obriguem a aceitar uma explicação material do
mundo fenomenológico, antes, pelo contrário, somos forçados pela
nossa adesão a priori às causas materiais a criar um aparato de
investigação e um conjunto de conceitos que produzem explicações
materiais, não importa o quanto isso possa ser contraintuitivo e
misterioso para os inexperientes. Além disso, esse materialismo é
absoluto, pois não podemos permitir um pé divino na porta.[202]
Como sugere a citação acima, muitos cientistas estão convencidos da
macroevolução não por causa das evidências, mas porque ela é uma
conclusão lógica do naturalismo. Assim, a macroevolução é mais uma
conclusão filosófica do que uma descoberta científica. Lewontin confessou
que, assim como outros cientistas, ele tinha um compromisso prévio com o
naturalismo — que é uma cosmovisão filosófica. Dennett estava certo quando
afirmou que “não existe ciência livre de filosofia; só existe ciência cuja
bagagem filosófica é admitida sem análise”.[203] Se pressupusermos e
permanecermos comprometidos com o naturalismo, a macroevolução deve
ser aceita, independentemente da evidência. Como vimos, cientistas como
Dawkins e Lewontin, continuam a abraçar o naturalismo, mesmo quando
estão diante de evidências opostas. Como Deus é inaceitável, a
macroevolução, mesmo com todas as suas inconsistências, deve ser
sustentada.
O naturalismo é a estrutura que esses cientistas aceitam pela fé e
utilizam para compreender e interpretar as suas observações e experiências.
Eles são naturalistas convictos antes mesmo de a investigação começar. Por
exemplo, depois que Dennett recapitulou o argumento de Darwin em On the
Origin of the Species, sem fornecer nenhuma evidência empírica para a
macroevolução, ele conclui: “Os leitores sensatos do livro simplesmente não
conseguiam mais duvidar que as espécies haviam evoluído ao longo das eras,
como Darwin afirmou”.[204]
Embora Darwin tenha observado apenas pequenas adaptações
ocorrendo em entidades preexistentes dentro de espécies preexistentes,
Dennett crê que isso era uma evidência suficiente para deduzir logicamente
que todas as espécies (incluindo a consciência humana) evoluíram a partir da
matéria morta por meio de seleção natural.
Darwin pode ter produzido um grande volume cheio de exemplos de
microevolução, mas mesmo se ele incluísse mais um bilhão de exemplos de
como os bicos de pássaros crescem lentamente mais ou menos nas
circunstâncias certas, isso não provaria que os pássaros evoluíram a partir de
peixes voadores. A evidência para a microevolução não prova a
macroevolução. Darwin não apresentou evidências de macroevolução, mas
isso não o impediu de concluir que os homens evoluíram dos macacos.
Dennett não apenas crê que Darwin provou o seu argumento de
maneira convincente, mas chegou a dizer o seguinte: “Para ser franco e justo,
qualquer pessoa que hoje em dia duvidar que a variedade de vida neste
planeta tenha sido produzida por um processo de evolução é simplesmente
um ignorante — ignorante indesculpável”.[205] É surpreendente que essa
confiança ousada e fundamentalista, que lembra o fanatismo, possa surgir
sem nenhuma evidência credível.
A confiança de Dennett, no entanto, parece estar mais fortemente
enraizada em seu naturalismo do que na evolução. Ele revelou intencional ou
involuntariamente seu principal compromisso quando disse: “Mesmo que a
ideia relativamente modesta de Darwin sobre a origem das espécies tenha
sido rejeitada pela ciência — sim, totalmente desacreditada e substituída por
alguma visão muito mais poderosa — ela ainda teria irremediavelmente
enfraquecido a convicção em qualquer defensor reflexivo da [antiga]
tradição”[206] de que existe um Design Inteligente. Em outras palavras,
mesmo que Darwin estivesse errado, Darwin estaria certo ao remover Deus
de qualquer explicação possível. E esse, meus queridos amigos, é a principal
preocupação e compromisso dos naturalistas.
Observe, a evolução que você vê não é uma das muitas explicações
naturalistas possíveis para as origens das espécies; é a única explicação
naturalista. Por essa razão, ao que parece, os naturalistas estão profundamente
comprometidos com a evolução. Como o fisiologista George Wald (1906-
1997), vencedor do Prêmio Nobel, professor emérito de biologia da
Universidade de Harvard, admitiu: “Nós optamos por acreditar no
impossível: que a vida surgiu espontaneamente e por acaso”.[207] De modo
semelhante, logo após o anatomista e antropólogo escocês Arthur Keith
(1866-1955) dizer que a macroevolução era “incomprovada e não
comprovável”, confessou: “Acreditamos nisso apenas porque a alternativa é a
criação especial”.[208]
Abandonar a crença na evolução exigiria que os naturalistas
abandonassem o seu compromisso de fé no naturalismo. Não importa o quão
ridícula a teoria possa parecer, não importa quais evidências faltem, não
importa que tipo de problemas internos sejam criados, os naturalistas
parecem se recusar a desistir da evolução porque parece que a única resposta
alternativa à origem da vida é completamente inaceitável — “pois não
podemos permitir um pé divino na porta”. Como Wolfgang Smith, um físico
que ajudou a resolver o problema de reentrada nas viagens espaciais,
explicou:
Estou convencido… de que o darwinismo, de qualquer forma, não é
de fato uma teoria científica, mas uma hipótese pseudometafísica
enfeitada com trajes científicos. Na realidade, a teoria deriva o seu
apoio não de dados empíricos ou deduções lógicas de tipo científico,
mas da circunstância de ser a única doutrina de origem biológica que
pode ser concebida com a cosmovisão restrita à qual a maioria dos
cientistas sem dúvida subscreve”.[209]
Wald não apenas admitiu que escolheu crer no impossível, mas também
explicou o seu motivo ao fazê-lo:
Existem apenas duas possibilidades de como a vida surgiu. Uma é a
geração espontânea que surge da evolução; a outra é um ato criativo
sobrenatural de Deus. Não há uma terceira possibilidade. Geração
espontânea — que diz que a vida surgiu de matéria não viva — tem
sido cientificamente refutada há 120 anos por Louis Pasteur e por
outros. Isso nos deixa com a única conclusão possível de que a vida
surgiu como um ato criativo sobrenatural de Deus. Não aceitarei isso
filosoficamente porque não quero acreditar em Deus. Portanto,
escolho acreditar naquilo que sei ser cientificamente impossível:
geração espontânea decorrente da evolução.[210]
Pelo menos Wald foi honesto em seu ateísmo. Consequentemente,
Thomas Nagel está certo quando questiona a base por trás da cosmovisão
naturalista:
O reducionismo físico-químico em biologia [ou seja o, naturalismo] é
a visão ortodoxa, e qualquer resistência a ela é considerada não
apenas cientificamente, mas politicamente incorreta…. Mas parece-
me que, como geralmente é apresentado, a ortodoxia atual sobre a
ordem cósmica é o produto de suposições dominantes
[pressuposições] que são infundadas e que contrariam o senso
comum.[211]
Nagel continuou nos lembrando que o naturalismo que sustenta a teoria
da evolução “não pode ser considerado inatacável. A evolução é uma
suposição que domina o projeto científico e não uma hipótese científica bem
confirmada”.[212] Creio que é por essa razão que Nagel continuou dizendo:
“Acho que a confiança que existe entre o establishment científico de que todo
o cenário é passível de uma explicação [física e] puramente química é difícil
de entender, exceto como uma manifestação de um compromisso axiomático
com o materialismo redutivo”.[213]
Esse compromisso axiomático com a cosmovisão naturalista, no
entanto, dá um salto cego e irracional de fé. Embora “mostre-me a evidência”
seja o slogan dos naturalistas, eles provam que estão dispostos a adotar uma
cosmovisão que é contrária às evidências. Por essa razão, o teólogo holandês
Herman Bavinck (1854-1921) concluiu que essas “explicações materialistas
do universo não são de caráter científico, mas são cosmovisões religiosas que
se disfarçam de ciência”.[214]
Conclusão
O naturalismo é uma cosmovisão que molda como os seus adeptos
interpretam as evidências, mas é uma cosmovisão inconsistente. Como
vimos, o naturalismo não é apenas uma cosmovisão que deixa de ser apoiada
pelas evidências, é uma cosmovisão que não oferece respostas para a
existência das leis imateriais da ciência — o próprio fundamento sobre o qual
o naturalismo é ostensivamente construído. Então, ironicamente, o
naturalismo pretende basear-se apenas nas leis da ciência, mas, na realidade,
é forçado a negar as leis da ciência ao tentar explicar um universo que criou a
si mesmo. O naturalismo não consegue explicar como nada mais nada criou
o universo que é matematicamente estruturado e milagrosamente
harmonizado para abrigar a vida na Terra. Essa inconsistência não é uma
lacuna no conhecimento científico. Pelo contrário, é um absurdo flagrante.
Além disso, o naturalismo não consegue explicar as origens da
linguagem semântica e funcional que está escrita no DNA, ou como a
complexidade da vida (e até mesmo da célula viva mais simples) surgiu da
matéria morta. Isso sem mencionar o problema da consciência. Por fim, o
naturalismo é uma tentativa de explicar tudo à parte de Deus, porém não
consegue nem explicar a si mesmo. Assim, o naturalismo (com todas as suas
suposições sobre as origens da massa, energia, vida e consciência) termina
em um absurdo. Dizer que a crença em Deus é um salto de fé soa ridículo
quando o comparamos com o absurdo da incredulidade.
13

A Irracionalidade do Empirismo e
Determinismo

“Todo absurdo”, diz Oliver Goldsmith, “tem um campeão para defendê-lo”.


Esses campeões incluem cientistas, filósofos e teólogos renomados. Posto
que os especialistas geralmente discordam entre si, apelar para a sua
experiência não é suficiente para resolver uma discussão.
A batalha entre cosmovisões, portanto, é vencida não pela
contabilização de homens falíveis que estão a seu favor. Cada cosmovisão
deve se sustentar sob o seu próprio peso. Já vimos como o naturalismo,
embora apoiado por muitos pensadores eminentes, é internamente
inconsistente consigo mesmo. Contudo, essa inconsistência se depara com os
resultados do naturalismo: empirismo, determinismo, relativismo e niilismo.
A Irracionalidade do Empirismo
O materialismo gera empirismo, pois se tudo é redutível a massa e
energia, o conhecimento é limitado à percepção sensorial. Embora a maioria
das cosmovisões, incluindo a bíblica, aceite a confiabilidade básica da
experiência sensorial, o empirismo afirma que todo conhecimento é redutível
à experiência sensorial. Sem evidência empírica, não há justificativa para crer
em algo.
O empirismo, no entanto, é inconsistente consigo mesmo. Por exemplo,
aqueles que dogmaticamente resolveram e se dedicaram a alegar que não
crerão em nada sem evidência empírica, têm pressuposto (sem nenhuma
evidência ou prova) o empirismo — que defende que o conhecimento só
pode ser obtido por meio dos cinco sentidos. Como William Clifford (1845-
1870) declarou sem pudor: “É sempre errado, em todos os lugares e para
qualquer pessoa, acreditar em algo com base em evidências insuficientes”.[215]
Bertrand Russell caiu nessa mesma armadilha em sua resposta quando
perguntado sobre o que ele diria a Deus se o enfrentasse no dia do juízo:
“Não há evidência suficiente, Deus! Não há evidência suficiente!”. Como
Clifford, Russell estava convencido de que não havia justificativa para
nenhuma crença sem evidência suficiente. “Qualquer que seja o
conhecimento que seja atingível”, Russell ilusoriamente declarou sem um
pingo de evidência científica, “deve ser alcançado por métodos científicos; e
aquilo que a ciência não pode descobrir, a humanidade não pode saber”.[216]
No entanto, o surdo não tem o direito de negar a existência do som
apenas porque não pode ouvi-lo. Da mesma forma, como o conhecimento
científico é limitado ao estudo do cosmos, é insuficiente afirmar que apenas o
cosmos existe. Ou seja, a ciência não tem motivos para negar a existência das
coisas que transcendem e vão além do alcance dela. Seria ridículo a pessoa
surda exigir evidências do som antes de crer na existência dele. É igualmente
ridículo os empiristas exigirem evidências empíricas antes de crerem em um
Deus invisível e imaterial.
A menos que você esteja disposto a crer pela fé que todo o
conhecimento se limita ao conhecimento científico e a abraçar as terríveis
consequências disso, é hipócrita dizer: “A ciência matou Deus”. Se a ciência
matou Deus, a ciência matou a matemática e as leis da moralidade junto com
ele. Se o conhecimento científico é tudo o que existe, a ciência também
matou a lógica. E uma vez que a lógica está morta, francamente, não temos
razão para acreditar em nada. Para que a ciência seja confiável, é necessário
que a lógica e a ética permaneçam vivas e bem. Desde que é evidente que a
verdade não se limita ao conhecimento científico, é impossível para a ciência
matar Deus.
Buscar evidências empíricas e materiais para um Deus espiritual e
invisível em um universo físico e material é como buscar o construtor de uma
casa nas partes da própria casa. Só porque o construtor não é feito de
madeira, tijolo ou argamassa, e ele não é encontrado na escada, no batente da
porta ou em qualquer outra parte da casa, não significa que não haja um
construtor.[217] O projeto e a estrutura do edifício evidentemente declaram que
de fato existe um construtor. Se Deus é um espírito transcendente, não
devemos esperar descobri-lo através de nossos órgãos sensoriais da visão,
paladar, olfato, audição e tato.
Certamente, um Deus invisível e transcendente não é um objeto de
experimentação científica. Porém, isso não o exclui, como os empiristas
querem nos faz acreditar. Se assumirmos que a experiência pessoal é a única
maneira de provar algo, não acreditaremos que as casas tenham construtores,
a menos que os encontremos pessoalmente. Se o empirismo é nosso
pressuposto inicial, também teríamos de suspender a crença na lógica, na
matemática e em outras mentes,[218] pois nenhuma experiência sensorial pode
verificar essas realidades.
A ciência tem os seus limites. Ela busca descobrir a razão pela qual as
coisas funcionam no universo, mas não consegue explicar a razão pela qual o
universo existe em primeiro lugar. John Lennox nos oferece uma ilustração
perspicaz disso:
É concebível que alguém de uma parte remota do mundo, que estava
vendo [um carro Ford] pela primeira vez e que não conhecia nada
sobre engenharia moderna, pudesse imaginar que existe um deus (Sr.
Ford) dentro do motor, fazendo com que o carro funcione. Ele
poderia ainda imaginar que, quando o motor funcionava bem, era
porque o Sr. Ford dentro do motor se agradava dele, e quando se
recusava a funcionar, era porque o Sr. Ford não se agradava dele. É
claro que, se posteriormente ele estudasse engenharia e examinasse as
partes componentes do motor, descobriria que o Sr. Ford não está
dentro dele. Também não seria preciso muita inteligência para ver
que ele não precisava apresentar o Sr. Ford como uma explicação
para o funcionamento do motor. Sua compreensão dos princípios
impessoais da combustão interna seria suficiente para explicar como
o motor funciona. Por enquanto, tudo bem. Mas se ele decidisse que a
sua compreensão dos princípios de como o motor funciona tornava
impossível acreditar na existência do Sr. Ford que projetou o motor
inicialmente, isso seria claramente falso — segundo a terminologia
filosófica ele estaria cometendo um erro de categoria. Se nunca
houvesse existido um Sr. Ford para projetar os mecanismos, eles não
existiriam para que ele os entendesse.[219]
Além disso, e mais importante, que evidência empírica os empiristas,
como Clifford e Russell, têm para apoiar a sua crença no empirismo? Vendo
que não há evidências para substanciar a crença de que toda crença deve ser
embasada por evidências, Clifford e Russell, sem querer, mantêm um
pressuposto contraditório. “Um homem sábio”, disse David Hume, “molda a
sua crença proporcionalmente à evidência”. Porém, um homem ainda mais
sábio entende que essa é uma afirmação tola. Como Hume não tinha
evidências para apoiar essa afirmação em primeiro lugar, a sua declaração é
autorrefutável.
Do mesmo modo que o materialismo não consegue explicar as leis da
física e as leis da moralidade, o empirismo não explica por que os sentidos
são os únicos meios de determinar o conhecimento. Assim, o empirismo é
autorreferencialmente absurdo.
A Irracionalidade do Determinismo
Se tudo pode ser reduzido às propriedades da matéria, então as leis da
física devem determinar todos os eventos, inclusive as ações humanas. Isso
significaria que no momento em que tudo, incluindo tempo e espaço, foi
explodido a partir do Big Bang, a reação em cadeia que determina o curso de
tudo foi determinada naquela ocasião — desde a localização e os movimentos
das galáxias até a inclinação exata do eixo da terra. As leis da natureza são
inegociáveis; elas determinam o curso de tudo.
Consequentemente, se as leis da natureza determinam tudo, como a
órbita dos planetas, elas também determinam as reações químicas no cérebro.
Se a matéria física é tudo o que existe, então nossas memórias, pensamentos e
emoções são meramente o subproduto dessas reações químicas. Como
Dawkins admitiu abertamente: “Os pensamentos e emoções humanas
emergem de interconexões extremamente complexas de entidades físicas
dentro do cérebro”.[220] Com menos elegância, o fisiologista francês Pierre
Jean Georges Cabanis (1757-1808) afirmou: “O cérebro secreta o
pensamento como o fígado secreta a bile”.[221]
Se for assim, não temos uma vontade livre, mas todos os nossos
pensamentos são apenas resultados predeterminados das leis da física. As leis
impessoais da natureza determinam e governam todas as nossas vidas,
pensamentos e emoções. Pelo menos, essa era a opinião do biólogo molecular
inglês Francis Crick (1916-2004), que descobriu junto com James Watson a
estrutura da dupla hélice da molécula de DNA. A noção que nos leva a sentir
que temos liberdade da vontade, de acordo com Crick, é apenas uma
impressão do cérebro.[222] Crick apresenta seu livro The Astonishing
Hypothesis: The Scientific Search for the Soul com estas palavras espantosas:
“Você, suas alegrias e tristezas, suas memórias e ambições, seu senso de
identidade pessoal e livre vontade, na verdade não são mais do que o
comportamento de um vasto ajuntamento de células nervosas e suas
moléculas associadas”.[223]
Crick foi um cientista impressionante, mas um filósofo miserável.
Crick estava certo quando vinculou a nossa atividade mental às células
nervosas e moléculas do cérebro, porém, ao acrescentar as palavras
filosóficas “não são mais do que” à sua explicação da alegria, tristeza,
lembranças, ambições, identidade pessoal e livre vontade, ele saiu do reino da
ciência e entrou na arena da filosofia e da teologia. Contudo, parece (pelas
leis da química ou por sua própria vontade) que Crick já estava convicto
antes mesmo de começar. Ele admite que uma das suas principais suposições
sobre a consciência é que “ela é algo que requer uma explicação científica”.
[224]
Mas, ele está certo ao fazer tal suposição? Carl Sagan estava correto
quando disse: “O cosmos é tudo o que existe ou existiu ou existirá”?
Está além do escopo e da capacidade da ciência explicar as realidades
metafísicas. Nenhuma quantidade de evidência científica pode provar que não
há nada mais nas experiências humanas do que reações químicas. Como é
possível para a ciência provar que não há nada mais na alma do que
propriedades físicas interagindo umas com as outras? Algumas realidades
estão além do domínio da ciência. Por exemplo, os cientistas devem utilizar
ética, lógica e sua vontade livre em suas experiências científicas, mas não
podem colocar essas realidades metafísicas (ética, lógica e vontade livre) em
qualquer tubo de ensaio de laboratório. De fato, para que cientistas como
Dawkins, Crick e Sagan neguem a existência de realidades metafísicas (como
lógica, ética e vontade livre), eles devem deixar temporariamente o campo
científico e entrar na arena metafísica. Porém, isso é autorrefutável. Não é
errado que os cientistas sejam filósofos e vice-versa, mas uma vez que os
cientistas lançam fora as realidades metafísicas, eles não têm o direito de
fazer declarações filosóficas e metafísicas. Se a ciência sozinha consegue
explicar tudo, como eles dizem que consegue, então ela não deveria ter que
confiar continuamente em categorias filosóficas e metafísicas no processo.
[225]

O determinismo, no entanto, não é algo provado pela ciência, mas é


uma cosmovisão filosófica deduzida quando o naturalismo é pressuposto.
Ainda assim, como o naturalismo, o determinismo é uma cosmovisão que
entra em colapso sob o seu próprio peso. Se a mente evoluiu a partir da
matéria através das leis da física, isso não apenas mina qualquer padrão
absoluto e universal de certo e errado, mas também mina a matemática, pois a
matemática, como a ética, está enraizada em absolutos universais que existem
independentemente do cérebro. Porém, uma vez que a natureza objetiva e
universal da matemática é minada, as leis da física, que estão enraizadas na
matemática, também são minadas. Supostamente, as leis imateriais da física
são as pernas que sustentam a biologia evolutiva. Para ser mais conciso, o
determinismo está enraizado no naturalismo, que está enraizado nas leis da
física, que estão enraizadas na matemática, que está enraizada na lógica, que
está enraizada em absolutos, que estão enraizados no imaterial, o que mina o
naturalismo e o determinismo.
Isso leva a outra inconsistência. Se o determinismo estiver correto, não
somos livres para aceitar ou rejeitar o argumento do determinismo. Por que
tentar convencer as pessoas de sua validade se nossas crenças são
determinadas não por um ato livre da vontade, mas pela hereditariedade, pelo
meio ambiente e pelo que comemos no café da manhã? Se as leis da natureza
determinam as nossas crenças para nós, então não temos base para sustentar
que alguma das nossas crenças é verdadeira ou falsa — e isso inclui a crença
no determinismo. C.S. Lewis viu a irracionalidade de tal argumento:
Se o sistema solar foi causado por uma colisão acidental, então o
aparecimento da vida orgânica neste planeta também foi um acidente,
e toda a evolução do homem também foi um acidente. Nesse caso,
todos os nossos processos de pensamento são meros acidentes — o
subproduto acidental do movimento dos átomos. E isso vale para os
materialistas e astrônomos, assim como para qualquer outra pessoa.
Porém, se os seus pensamentos — ou seja, sobre o materialismo e
astronomia — são meramente subprodutos acidentais, por que
deveríamos acreditar que eles são verdadeiros? Não vejo razão para
acreditar que um acidente seja capaz de dar uma explicação correta de
todos os outros acidentes.[226]
Os deterministas requerem que façamos algo que não temos a liberdade
de aceitar mais do que eles têm a liberdade de rejeitar. Segundo o filósofo
britânico J.R. Lucas, “O determinismo, portanto, não pode ser verdadeiro,
porque, se fosse, não deveríamos considerar os argumentos dos deterministas
como sendo realmente argumentos, mas como sendo apenas reflexos
condicionados”.[227]
Além disso, Lewis viu outra contradição com o determinismo, a qual
ele descreveu em seu livro Miracles: A Preliminary Study: se nossos
pensamentos são controlados pelas leis fixas da natureza, então “não há
garantia ou mesmo motivo para crer que qualquer pensamento corresponda
verdadeiramente a uma realidade externa ao pensador”.[228] Não podemos ter
certeza de que sabemos algo como realmente é, incluindo as leis da física que
supostamente controlam o nosso pensamento. Assim, os deterministas
argumentarem a favor do determinismo é autoestupidificante.
Se somos o que somos, faremos o que faremos, e nos tornaremos o que
nos tornaremos por meio das leis fixas do universo, então, quando um
determinista reclama de algo — como do clima ou de uma injustiça moral —
ele está protestando contra a própria cosmovisão que ele tão avidamente
abraça e defende. Porém, eu acho que são as leis da física que o forçam a
reclamar.
Conclusão
Em suma, a ciência explica muitas coisas, mas não pode explicar tudo.
Quando a ciência tenta explicar tudo, ela destrói a si mesma, minando a
natureza objetiva e universal das leis da natureza, nas quais a ciência está
fundamentalmente enraizada.
14

A Irracionalidade do Relativismo e do
Niilismo

O relativismo é a consequência do naturalismo. Se o naturalismo está certo ao


dizer que não há Deus, então não há Legislador. Sem um Legislador divino,
somos entregues a nós mesmos. Mas esse não é o único problema para a
abordagem naturalista. Se a natureza é tudo o que existe, nossos pensamentos
e nossos julgamentos éticos são apenas o subproduto das leis da natureza.
A Irracionalidade do Relativismo
Bertrand Russell (1872-1970) entendeu a consequência lógica do
naturalismo — o homem é uma mera máquina. O homem é simplesmente um
animal mecânico evoluído que é controlado pelas leis fixas da física. Russell
tentou explicar:
Os materialistas usaram as leis da física para mostrar, ou tentar
mostrar, que os movimentos dos corpos humanos são determinados
mecanicamente e que, consequentemente, tudo o que dizemos e toda
mudança de posição que efetuamos estão fora da esfera de qualquer
possível vontade livre. Se assim for, o que resta para nossas volições
irrestritas é de pouco valor. Se, quando um homem escreve um
poema ou comete um assassinato, os movimentos corporais
envolvidos em seu ato resultam apenas de causas físicas, pareceria
absurdo fazer uma estátua de um e enforcar o outro.[229]
Segundo Russell, essas máquinas mal comportadas não precisam ser
envergonhadas ou punidas; elas precisam ser corrigidas e tratadas pela
medicina:
Ninguém trata um automóvel de maneira tão tola quanto trata outro
ser humano. Quando o carro não funciona, ele não atribui o seu
comportamento irritante ao pecado; ele não diz: “Você é um
automóvel ímpio, e não lhe darei mais gasolina até que você
funcione”. Ele tenta descobrir o que está errado para corrigi-lo. No
entanto, uma maneira análoga de tratar os seres humanos é
considerada contrária às verdades de nossa religião santa.[230]
Evidentemente, isso remove toda culpa e responsabilidade dos atos
criminosos. Como Russell continuou explicando:
É evidente que um homem com propensão ao crime deve ser preso,
assim como também deve ser contido um homem acometido de
hidrofobia que quer morder as pessoas, embora ninguém o considere
moralmente responsável. Um homem que sofre de uma doença
contagiosa deve ficar em quarentena até que seja curado, embora
ninguém o considere ímpio por isso. O mesmo deve ser feito com um
homem que sofre de propensão a cometer falsificação; mas não deve
haver mais ideia de culpa em um caso do que no outro.[231]
Em outras palavras, criminosos, como Adolf Hitler, não devem ser
responsabilizados, julgados, punidos e responsabilizados por seu
comportamento egoísta e imoral, porque são vítimas de consequências
naturais que estão fora de seu controle. Eles são dignos de pena e não de
punição.
Todavia, as leis da física poderiam se importar menos com as
distinções morais. A natureza não se importa se produz uma mãe amorosa ou
um Hitler cruel. As leis da física não têm opinião sobre a vida ou a morte,
prazer ou dor, saúde ou doença e bem ou mal. Assim, o naturalismo não
apenas destrói a liberdade humana e a responsabilidade moral, mas também
elimina completamente as distinções éticas e a moralidade. É isso que
obtemos quando reduzimos tudo à ciência.
Para salvar o mundo da anarquia completa, Russell afirmou que o
pragmatismo deveria governar nosso comportamento. A moralidade não é um
código moral transcendental que nos foi dado do alto, mas é uma questão de
conveniência e utilidade prática. É claro que isso é totalmente inconsistente
com a negação da liberdade da vontade do naturalismo, mas parece que
alguns não se importariam em serem menos racionais, desde que pudessem
ser livres para fazerem o que quisessem com as suas vidas.
O filósofo britânico Jeremy Bentham (1748-1832) e seu discípulo John
Stuart Mill (1806-1873) também procuraram resgatar a humanidade da
imoralidade completa, propondo o utilitarismo — bom é o que conduz à
maior quantidade de felicidade à maior quantidade de pessoas. Como Mill
declarou em seu famoso livreto sobre o assunto:
O credo aceito como o fundamento da “utilidade” moral ou “princípio
da maior felicidade” sustenta que as ações são corretas na proporção
em que tendem a promover a felicidade; erradas, enquanto tendem a
produzir o contrário da felicidade. Por felicidade entende-se o prazer
e a ausência de dor.[232]
Em Animal Liberation, Peter Singer, professor de bioética na
Universidade de Princeton, aplicou o utilitarismo de Mill aos animais. O que
torna o homem especial? O homem é um pouco mais evoluído que um
macaco, enquanto um macaco é muito mais avançado que uma ostra.
Macacos e ostras são agrupados como animais, enquanto os humanos fazem
parte de uma classe própria. Mas por que? Singer argumentou que qualquer
fronteira que separa o homem do animal é totalmente arbitrária. Se
afirmamos que a inteligência do homem o separa dos animais, o que dizer das
pessoas com Síndrome de Down? Ele chama aqueles que dão tratamento
preferencial aos seres humanos como “especistas”. De acordo com Singer,
não devemos fazer nada com os animais que não faríamos com outros seres
humanos: “Assim como a maioria dos seres humanos é especista em sua
disposição de causar dor aos animais, quando não causaria uma dor
semelhante aos seres humanos pela mesma razão, assim a maioria dos seres
humanos é especista em sua disposição de matar outros animais quando eles
não matariam seres humanos”.[233] A partir dessa linha de argumentação,
Singer condenou as fazendas de frangos e o abate em massa de animais, e
depois terminou apresentando um argumento para o valor ético do
vegetarianismo.
Colocar os direitos dos animais em pé de igualdade com os direitos
humanos parece um absurdo. Mas se o homem é apenas um animal evoluído,
e não um ser criado à semelhança de Deus, quem deve dizer que os animais
não devem servir de alimento? Entretanto, se não há Deus, quem pode dizer
que não devemos nos alimentar deles? Se não há Deus, quem pode dizer que
Jeffrey Dahmer, o canibal de Milwaukee, estava errado por seus crimes
contra a humanidade? Quem?
Se não há Deus, quem pode fazer as regras? Será que uma pessoa que
carrega um grande taco de beisebol e vai até um parquinho pode dizer às
crianças que brincam ali como elas devem se comportar, mesmo que essa
pessoa seja como Hitler? Está correto os pais abusarem dos filhos? O poder
faz o direito? Como Wolf Larsen disse a Hump no romance Sea-Wolf: “O
poder faz o direito, isso é tudo. A fraqueza está errada. O que é uma maneira
muito pobre de dizer que é bom para si ser forte, e ruim para si ser fraco”.[234]
Se Hitler estiver me ameaçando, então eu teria o direito de matar judeus
inocentes? Sou obrigado a desobedecer ao meu superior, se ele me pedir para
roubar, explorar pessoas ou cometer fraudes? Se não há código transcendente
de moralidade, quem responderá essas perguntas?
A maioria é que dita as regras? Em caso afirmativo, quem determina os
limites ou o escopo de quem está incluído no censo? É certo que a maioria
dos alunos do ensino médio escolha quem é o esquisito da escola? A maioria
está sempre certa? Ou o governo deveria ser entregue para algumas pessoas
da elite (oligarquia)? Se não existe um padrão absoluto que governe todas as
pessoas, quem poderá responder a essas perguntas?
Se não há nenhuma Legislador transcendente que esteja acima da
humanidade, então a humanidade é deixada a si mesma para discutir e brigar
para ver quem estará no comando. No final das contas, tudo é relativo, e o
relativismo, independentemente da forma que assuma, é
autorreferencialmente absurdo. Dizer que “não há absolutos” é fazer uma
afirmação absoluta. O relativismo moral não tem fundamento em uma
cosmovisão puramente naturalista. Por que devemos ouvir Russell, Mill ou
Singer? Se Deus não existe, por que não viver uma vida de egoísmo? Por que
não fazer o que queremos, sem nos preocuparmos com que será prejudicado?
Isso pode soa como liberdade. Mas será que é mesmo?
Se vamos aceitar a liberdade que supostamente vem com o relativismo
e vamos negar a existência da verdade absoluta, teríamos que entender
melhor as consequências disso. O relativismo não apenas destrói as verdades
que achamos inconvenientes (como a existência de Deus), mas também
destrói toda a verdade. A verdade, por sua própria natureza, exige concretude.
Em última análise, algo existe ou não existe. Algo é verdadeiro ou falso. Se
algo é verdadeiro, nossas opiniões, sentimentos e desejos não têm nada a ver
com isso. Mas se a verdade não pode ser firmemente estabelecida, não temos
o direito de dizer que a verdade existe.
O relativismo não é o arqueiro que coloca o seu alvo em uma ladeira
escorregadia, pois isso implica que o alvo, embora em movimento, ainda está
presente para ser mirado. Ele remove o alvo completamente. O alvo caiu do
penhasco e não está em lugar algum. O relativismo não pode ser satisfeito,
como um sistema de pensamento, até que o niilismo completo envolva todos
os seus tentáculos em torno de cada grão da verdade. O relativismo nos
encoraja a não procurarmos nenhuma verdade. Nós escolhemos o que é
verdadeiro para nós mesmos. O alvo simplesmente existe subjetivamente em
nossa mente. Vendo que não há nada objetivo e exterior para mirar, basta
puxar a corda do arco e soltar a flecha em qualquer direção aleatória que
desejar.
Isso supostamente nos dá liberdade para escolher viver como
quisermos. As algemas das restrições e as leis que nos prendem são
removidas para sempre. Somos livres para quebrar vitrines, saquear,
incendiar carros e correr caoticamente pelas ruas, segundo o que acharmos
melhor.
Somos livres, mas as outras pessoas também o são. No entanto, com
todas essas flechas sem rumo, alguém vai se machucar. Não fiquemos
surpresos ou chateados se encontrarmos algumas dessas flechas voando em
nossa direção.
Irracionalidade do Niilismo
A falta de sentido é o alto custo de procurar viver em oposição à
verdade. Dawkins entende que o naturalismo não nos fornece uma visão
otimista do mundo: “Essa não é uma receita para a felicidade. Desde que o
DNA seja transmitido à geração seguinte, não importa quem ou o que se
machuca no processo”.[235] Ele continuou dizendo: “A natureza não é bondosa
nem cruel. Ela não é contra nem a favor do sofrimento. A natureza não está
interessada de uma maneira ou de outra no sofrimento, a menos que ele afete
a sobrevivência do DNA”.[236] Uma compreensão tão fria e deprimente do
mundo levou Dawkins a concluir que a própria vida não tem sentido: “Essa é
uma das lições mais difíceis para os humanos aprenderem. Não podemos
admitir que as coisas não sejam boas nem más, nem cruéis nem boas, mas
simplesmente insensíveis — indiferentes a todo sofrimento, sem qualquer
propósito”.[237] O historiador da Universidade Cornell, William Provine,
concordou com Dawkins sobre o absurdo da vida:
Contudo, as implicações da ciência moderna são claramente
inconsistentes com a maioria das tradições religiosas. Não há
nenhum princípio intencional na natureza. A evolução orgânica tem
ocorrido por várias combinações de desvio genético aleatório,
seleção natural, hereditariedade mendeliana e muitos outros
mecanismos sem propósito. Os seres humanos são máquinas
orgânicas complexas que morrem completamente sem haja qualquer
sobrevivência da alma ou da psiqué. Os seres humanos e outros
animais fazem escolhas com frequência, mas elas são determinadas
pela interação da hereditariedade e do ambiente e não são o resultado
da vontade livre. Não existem leis morais ou éticas inerentes, nem
existem princípios orientadores absolutos para a sociedade humana.
O universo não se importa conosco e não temos um significado
supremo na vida.[238]
Jim Black concluiu: “O darwinismo é uma filosofia anti-Deus que não
oferece esperança, consolo, felicidade ou significado final. Oferece apenas
uma existência fria e mecanicista, na qual o único objetivo do homem é viver
o máximo que puder antes que ele desapareça no esquecimento eterno”.[239]
Tais conclusões levaram o behaviorista C.F. Skinner a escrever Beyond
Freedom and Dignity, onde ele comparou essencialmente o homem a um
animal irracional e o animal irracional a uma máquina.[240] Embora Skinner
concordasse que o comportamento humano era menos do que desejável, ele
pensava que a chave para a humanidade atingir todo o seu potencial não viria
por abraçar as ideias ilusórias de que eles são dignos e pessoalmente livres,
mas ao buscar reformular os ambientes físico e social onde eles vivem.
Independentemente disso, o homem não é livre nem digno. O problema não
está no homem, mas nas leis da física.
Isso é niilismo — não há significado, propósito ou verdade suprema.
Jean Baudrillard (1929-2007), Jacques Derrida (1930-2004) e Jean-François
Lyotard (1924-1998) eram todos niilistas franceses de renome que,
estranhamente, construíram suas respectivas visões de mundo niilistas sobre a
tentativa de desconstruir todas as outras visões de mundo. No entanto, não é
preciso ser um gênio para ver a inconsistência em tal posição. Como James
Sire observou: “Niilismo… não impede os intelectuais de escrever, apenas de
escrever algo que faça sentido”.[241] Se não houver significado, nada poderá
ser confiável. Se nada pode ser confiável, os pressupostos por trás do niilismo
também não podem ser confiáveis. Como todas as formas de relativismo, o
niilismo é inconsistente consigo mesmo.
Além disso, nenhum niilista realmente vive de acordo com a sua
cosmovisão. Schaeffer estava certo quando disse: “Ninguém pode afirmar
consistentemente que tudo é caótico e irracional e que não há respostas
básicas. Isso pode ser sustentado teoricamente, mas na prática não é possível
que tudo seja um caos absoluto”.[242] Alguns podem afirmar que não há
absoluto e que sentido é apenas uma palavra elegante que não tem sentido em
si, mas assim que o professor sai da sala de aula e coloca sua chave na
ignição de seu Toyota Prius, ele esquece convenientemente tudo o que
acabou de ensinar enquanto dava aula. Felizmente, ele se submete às leis
absolutas que o cercam. A artista moderna pode pintar quadros como se não
houvesse alto, baixo, certo ou errado, mas ela também espera que, ao sair do
estúdio, a lei da gravidade seja verdadeira e que ela não voe em direção ao
espaço.
O behaviorista pode afirmar que a genética e o meio ambiente são a
principal causa do adultério, mas isso não o impede de ficar irado quando sua
esposa de vinte anos é pega em um caso de adultério com seu melhor amigo.
Por alguma razão, ele esquece de se irritar com as leis da natureza, mas
coloca a culpa em sua esposa e em seu amigo. “Ninguém”, de acordo com
William Lane Craig, professor de filosofia da Talbot School of Theology,
“utiliza hermenêutica pós-moderna na leitura das instruções de um frasco de
remédio”.[243] Os niilistas podem se expressar bem, mas não conseguem viver
consistentemente sem sentido. Suas ações negam as suas crenças e, portanto,
o niilismo não é uma cosmovisão que valha a pena se aceitar
intelectualmente. Essa não é uma cosmovisão que possa ser vivida no mundo
real.
Conclusão
O problema circular com a cosmovisão naturalista é que o naturalismo
conduz ao materialismo e ao empirismo, e o empirismo afirma que a verdade
só é obtida indutivamente pela percepção dos sentidos, e isso leva ao
determinismo, que termina voltando ao relativismo e ao niilismo, que diz que
nada faz sentido. Os naturalistas iniciam a conversa dizendo que as leis da
natureza controlam tudo, mas concluem negando que existam coisas como
leis universais da natureza. Por fim, o sistema coletivo da cosmovisão
naturalista, com todas as suas consequências lógicas, termina em falta de
sentido e em um absurdo completo. Não é que a ciência seja defeituosa, mas
que, se não há Deus, a ciência apenas leva ao desespero e ao absurdo
irracional. Por esse motivo, a cosmovisão naturalista não consegue suportar
os seus próprios pressupostos básicos; portanto, desmorona sob a pressão do
seu próprio peso. Sem pressupor Deus, essa loucura é tudo o que resta.
15

A Irracionalidade do Existencialismo

A loucura dos existencialistas é que eles abraçam o relativismo, mas


continuam a buscar objetivos e significados individuais. Quem são os
existencialistas? São aqueles que edificam sobre o fundamento do
naturalismo — a autossuficiência do homem — mas paradoxalmente se
recusam a aceitar as terríveis implicações do naturalismo — a vida não tem
sentido. Embora tenham rejeitado todos os pontos de referência
estabelecidos, os existencialistas continuam escrevendo sobre suas crenças
como se filosofias particulares pudessem ser confiáveis.
O Absurdo de Jaspers e Sartre
O existencialista alemão Karl Jaspers (1883-1969), por exemplo, não
estava disposto a aceitar o fatalismo que emerge do naturalismo. Se o
naturalismo estiver certo, o homem não é livre. O homem é apenas uma bola
de pó hidratada. Os pensamentos e emoções do homem são apenas um
conjunto de impulsos químicos que são controlados pelas leis da física. Por
esse motivo, de acordo com Jaspers, a ciência moderna e o empirismo não
podem fornecer respostas psicologicamente satisfatórias para nossas
perguntas mais básicas — como o sentido da vida. O conhecimento científico
só pode nos levar até determinado ponto e nos deixa fazer uma escolha. Nós
vamos afundar no desespero ou dar um salto transcendental de fé, o que
Jaspers chamou de transcendência. Transcendência se refere ao método de
intensa autocontemplação de Jasper. Isso consiste em uma busca interna por
significado existencial e autoprescrito. Nas suas próprias palavras: “Somente
a transcendência pode tornar boa essa vida questionável, o mundo, belo e a
própria existência, uma realização”.[244] Só depois somos consolados com
nossa própria liberdade ilimitada e a experiência da “existência autêntica”.
Esse processo, disse Jaspers, é o objetivo da filosofia:
Mas o pensamento filosófico começa nos limites desse conhecimento
racional. A racionalidade não pode nos ajudar no essencial: não pode
nos ajudar a supor objetivos e finalidades supremas, conhecer o bem
maior, conhecer Deus e a liberdade humana; essa inadequação do
racional gera um tipo de pensamento que, ao operar com as
ferramentas do entendimento, é mais do que entendimento. A
filosofia pressiona os limites do conhecimento racional e ali ateia-
lhes fogo.[245]
John-Paul Sartre (1905-1980) cria que a liberdade pessoal suprema só
existe quando não há Deus. O homem só pode se soltar e se libertar quando é
capaz de criar o seu próprio significado. O naturalismo e o empirismo
descartaram Deus como uma possível resposta para a pergunta final: Por que
estamos aqui, em primeiro lugar? Mas isso não deve nos deprimir, pois abre a
possibilidade de escolhermos o nosso próprio caminho. Sartre explicou:
O existencialismo ateísta, que eu represento, é o mais coerente. Ele
afirma que, se Deus não existe, há pelo menos um ser em quem a
existência precede a essência (significado), um ser que existe antes
que ele possa ser definido por qualquer conceito, e que esse ser é
homem, ou, como diz Heidegger, a realidade humana. O que
intencionamos ao afirmar que a existência precede a essência?
Significa que, antes de tudo, o homem existe, aparece, surge em cena
e, somente depois, ele se define. Se o homem, como o existencialista
o concebe, é indefinível, e isso porque, a princípio, ele não é nada. Só
depois ele será algo, e ele próprio terá feito o que será. Assim, não há
natureza humana, pois não há Deus para concebê-la. O homem não é
apenas o que ele se propõe ser, mas é apenas o que ele deseja ser após
esse impulso em direção à existência.[246]
No coração do existencialismo está um ataque ousado contra o governo
de Deus. Escolheremos o nosso próprio caminho nesse mundo. Somos livres
para fazer o que parece certo aos nossos próprios olhos. Não importa que ser
livre de Deus conduza ao nosso próprio aprisionamento, pois pelo menos
somos livres para agir como loucos dentro de nossas celas.
Para entender o absurdo do existencialismo, pense no design do martelo
de um carpinteiro. Seja quem for que tenha projetado esse martelo, tal pessoa
tinha um objetivo específico em mente: pregar pregos em coisas. A forma e o
design do martelo indicam a sua finalidade. Ele funciona bem quando usado
para o seu propósito adequado. Quanto ao martelo, seu design e finalidade
pretendidos precederam a sua existência. No entanto, para o existencialista, o
martelo, por acaso, simplesmente existe por nenhuma razão ou propósito
específico. O que aconteceu foi que o martelo evoluiu a partir do nada. Não
existe Deus, portanto não há um designer. Por acaso o martelo existe, e por
acaso o encontramos caído no chão. O que é isso? Não importa, temos que
decidir o seu significado por nós mesmos. Para nós, pensadores livres, “a
existência precede o significado”. Somos livres para usar o martelo como
quisermos. Que tal usar o martelo como uma tigela? Pois, como vendemos a
nossa herança por um dos deliciosos guisados de Esaú, precisamos de um
recipiente para armazená-la. Quem se importa se o martelo é inadequado e
nosso guisado cai ao chão durante o processo, pelo menos não teremos Deus
nos dizendo o que fazer.
Além disso, a natureza nos ensina que o design precede o propósito. O
sol, a lua, as árvores, os rios, as cobras, os caracóis, os pulmões, os ossos, os
dentes e tudo o mais na natureza têm um propósito pré-estabelecido que é
identificado pela observação de seu design. Eles são bons no que executam
porque foram feitos para fazer o que fazem. Podemos dizer arbitrariamente
que os dentes não são para mastigar e os pulmões não são para respirar, mas
pareceremos tolos no processo. Podemos objetar que homens e mulheres não
são criados um para o outro, mas o próprio design da anatomia humana nos
diz que casais do mesmo sexo não se encaixam corretamente e são incapazes
de procriar. O existencialismo é irracional, mas o homem provou que prefere
fazer o que deseja a manter a sua sanidade.
O Absurdo de Friedrich Nietzsche
Ninguém, no entanto, foi tão radical e, ouso dizer, tão audacioso quanto
o existencialista alemão Friedrich Nietzsche (1844-1900). Nietzsche foi
corajoso o suficiente para levar a ética do naturalismo às suas conclusões
lógicas e assustadoras: virando o bem e o mal de cabeça para baixo. Em uma
de suas passagens mais populares, ele proclamou vívida e
desavergonhadamente a morte de Deus:
Você nunca ouviu falar daquele louco que em plena manhã acendeu
uma lanterna, correu para o mercado e pôs-se a gritar
incessantemente: “Procuro a Deus! Eu procuro Deus!”. Como muitos
daqueles que não criam em Deus estavam ali naquele momento, ele
provocou muitas risadas. “Ele está perdido?” — Perguntou um. “Ele
se perdeu como uma criança?” — Perguntou outro. “Ou ele está se
escondendo? Ele tem medo de nós? Ele fez uma viagem? Emigrou?”
— Assim eles exclamaram e riram.
O homem louco se lançou para o meio deles e trespassou-os
com seu olhar. “Para onde foi Deus”, gritou ele, “já lhes direi! Nós o
matamos — vocês e eu. Somos todos seus assassinos! Mas como
fizemos isso? Como conseguimos beber inteiramente o mar? Quem
nos deu a esponja para apagar o horizonte? Que fizemos nós, ao
desatar a terra do seu sol? Para onde se move agora? Para onde nos
movemos nós? Para longe de todos os sóis? Não caímos
continuamente? Para trás, para os lados, para a frente, em todas as
direções? Existem ainda ‘em cima’ e ‘embaixo’? Não vagamos como
que através de um nada infinito? Não sentimos na pele o sopro do
vácuo? Não se tornou ele mais frio? Não anoitece eternamente? Não
temos que acender lanternas de manhã? Não ouvimos o barulho dos
coveiros a enterrar Deus? Não sentimos o cheiro da putrefação
divina? — também os deuses apodrecem! Deus está morto! Deus
continua morto! E nós o matamos!
Como nos consolar, a nós assassinos entre os assassinos? O
mais forte e mais sagrado que o mundo até então possuíra sangrou
inteiro sob os nossos punhais – quem nos limpará este sangue? Com
que água poderíamos nos lavar? Que ritos expiatórios, que jogos
sagrados teremos de inventar? A grandeza desse ato não é demasiado
grande para nós? Não deveríamos nós mesmo nos tornar deuses, para
ao menos parecer dignos dele?”.[247]
“Deus está morto”, Nietzsche afirmou. Segundo Nietzsche, o homem
moderno finalmente removeu a necessidade de qualquer explicação
sobrenatural para o universo. A ideia supersticiosa de Deus, que o homem
primitivo precisava para explicar coisas como eclipses lunares e desastres
naturais, não pode mais ser sustentada por pensadores livres e modernos.
Nietzsche entendeu o alto custo de eliminar Deus de nossas vidas —
nossa moral teria que vir de alguma outra fonte. Visto que Deus está morto,
devemos procurar as respostas na natureza. “O pecado contra Deus já foi o
maior pecado”, afirmou Nietzsche, “mas Deus morreu, e esses pecadores
morreram com ele. Agora, pecar contra a Terra é a coisa mais terrível bem
como estimar as entranhas do incognoscível como superiores ao sentido da
Terra”.[248] O que aprendemos quando olhamos para a natureza? Aprendemos
a importância da reprodução, da seleção natural e da sobrevivência do mais
apto.
A natureza é frequentemente cruel, mas o processo de evolução é o
objetivo final. Nietzsche alegou que aqui está o significado da existência do
homem e seu código ético de vida. Ele argumentou que a civilização evoluiu
do mundo animal pelas reivindicações dos fortes sobre os fracos. A
civilização só continuará a progredir quando os nobres, sábios, fortes e
poderosos decidirem conquistar e dominar os fracos e débeis. Assim, desejos
egoístas e ambiciosos não devem ser considerados maus, mas bons. Com
relação à filosofia de Nietzsche, o historiador Will Durant (1885-1981)
observou:
Se a vida é uma luta pela existência na qual o mais apto sobrevive, a
força é a virtude última e a fraqueza é a única falha. Bom é quem
sobrevive, quem vence; ruim é quem cede e falha… A ética suprema
é a biológica; devemos julgar as coisas de acordo com o seu valor
para a vida.[249]
Viver bem, de acordo com Nietzsche, é permitir que todos os seus
poderes intelectuais e paixões ambiciosas fiquem livres e destemidos de
quaisquer restrições religiosas supersticiosas. Observando essa abordagem
ética, Durant afirmou: “A melhor coisa no homem é a força de vontade,
poder e permanência da paixão; sem paixão a pessoa é como um mero copo
de leite, incapaz de ações. Ganância, inveja e até ódio são itens
indispensáveis no processo de luta, seleção e sobrevivência”.[250] Nietzsche
declarou: “Eu frequentemente tenho imaginado que seria ainda mais
abençoado roubar do que receber”.[251] Em seu livro Beyond Good and Evil,
Nietzsche foi audacioso o suficiente para dizer:
Abster-se de ferimentos mútuos, violência, exploração, equiparar a
vontade de alguém com a de outra pessoa… revela-se como negação
da vida, como o princípio da dissolução e da decadência… a própria
vida consiste essencialmente em desapropriar, ferir, dominar os
estrangeiros e mais fracos, supressão, severidade, imposição das
próprias normas, conquista e — pelo menos moderadamente —
exploração.
Até Charles Darwin percebeu a contraprodutividade de hospitais e da
assistência médica:
Nós, homens civilizados, fazemos o possível para verificar o processo
de eliminação; construímos asilos para os doentes mentais, mutilados
e enfermos. Assim, os membros fracos das sociedades civilizadas
propagam sua espécie. Ninguém que conheça a criação de animais
domésticos duvidará que isso se mostrará altamente prejudicial para a
raça humana. É surpreendente quanto tempo uma falta de cuidados,
ou cuidados mal direcionados, leva à degeneração de uma raça de
determinado animal doméstico; mas, exceto no caso do próprio
homem, dificilmente alguém é tão ignorante que permite que seus
piores animais se reproduzam.[252]
O neurologista austríaco Sigmund Freud (1856-1939), que considerava
Nietzsche como possuindo “um conhecimento mais penetrante dele mesmo
do que de qualquer homem que já viveu ou provavelmente viveria”, lamentou
a redução da taxa de mortalidade infantil provocada pelo progresso técnico da
medicina, porque isso “trabalha contra os efeitos benéficos da seleção
natural”.[253]
Por esse motivo, o cristianismo promoveu “o que Nietzsche chamou de
‘moralidade escrava’ que legisla normas monótonas de retidão, promovendo
assim o rebanho como quiescência e estigmatizando os “tipos humanos mais
elevados’”.[254] Em vez de virtudes cristãs, como piedade, compaixão e
bondade serem úteis, são prejudiciais ao importante processo evolutivo. Os
cristãos creem na dignidade do homem porque o homem é feito à imagem de
Deus. O homem não é um animal; portanto, a vida humana é santa e precisa
de proteção. Isso inclui bebês no ventre da mãe e idosos que precisam de
cuidados constantes. No cristianismo, os fortes devem proteger os fracos.
Porém, de acordo com Nietzsche, essas virtudes cristãs prejudicam os
poderosos e se rebelam contra a lei da natureza.[255]
Nesse programa evolutivo, o progresso social exige que os fortes
escolham voluntária, ativa e energicamente obter mais poder, e a única
maneira de fazer isso é remover do caminho os fracos e mentalmente
deficientes. Do mesmo modo que um fazendeiro procura eliminar o seu gado
fraco e alimentar seu gado mais forte, a sociedade deve eliminar aqueles
indivíduos que são deformados e incompetentes.[256] Nietzsche afirmou que o
casamento foi feito para esse fim: “Você não apenas se propaga, mas se
propaga se forma superior!”.[257] Ele também achava que a guerra era um
meio útil para esse fim. Isso pode parecer contraditório com o aprimoramento
da sociedade, mas Nietzsche alegou que a guerra deveria ser incentivada.
“Você diz que uma boa causa justifica a guerra?… Eu digo a vocês: é uma
boa guerra que justifica qualquer causa”.[258] A superioridade é estabelecida
da mesma maneira que os macacos mostram o seu domínio combatendo os
seus oponentes. A guerra é natural. A guerra é boa. Nas palavras distorcidas
desse homem distorcido:
O que é bom? Tudo o que aumenta o sentimento de poder, a vontade
de poder e o próprio poder no homem. O que é ruim? Tudo o que
procede da fraqueza. O que é felicidade? A sensação de que o poder
está aumentando, que a resistência foi superada. Não contentamento,
porém mais poder: não paz, mas guerra, não virtude, mas eficiência.
Os fracos e os fracassados perecerão; o primeiro princípio de nossa
humanidade. E eles devem até mesmo serem ajudados a perecer.[259]
É claro que essa linha de pensamento foi agradável para Adolf Hitler,
que disse: “Quem quiser viver, que lute, e quem não quer lutar nesse mundo
de luta eterna não merece viver”.[260]
Nós devemos lutar. Se a sociedade quiser ter mais “poder”, deve
primeiro “desejá-lo”. Devemos escolher poder acima de submissão e piedade.
Nietzsche cria que o desejo de poder estava enraizado em todos os homens
por natureza. A evolução instilou esse apetite em todos nós. Todos os homens
são egoístas; negar isso é negar a realidade. Por outro lado, restringir esse
desejo natural é prejudicial para o eu e para o coletivo. Nietzsche afirmou: “O
que é mais imperdoável em você é ter o poder de governar e não desejar tê-
lo”. A “vontade de poder” é simplesmente natural.[261]
Ao escolher (querer) poder, os indivíduos não apenas se aprimoram,
mas também ajudam na criação de uma nova raça superior de seres — uma
raça de “super-homens” (uma razão pela qual ele é conhecido como o
filósofo de Hitler).[262] Essa raça superior melhoraria a sociedade (artes,
ciências, literatura etc.). Sim, isso eliminaria os fisicamente fracos e
mentalmente débeis, pois essas pessoas não contribuem para a sociedade de
forma alguma. Elas retardam o processo evolutivo natural.
Nietzsche cunhou o termo super-homem (Übermensch, ou homem-
superior) para explicar a próxima fase da evolução do homem. O homem
evoluiu dos macacos e o que evoluirá do homem ainda está por surgir. “O
que é o macaco para o homem?”, Nietzsche perguntou, “Um motivo de
zombarias ou um constrangimento doloroso. Pois o home deve ser
exatamente isso para o homem superior (super-homem): uma piada ou um
constrangimento doloroso. Você fez o seu caminho de verme até o homem, e
muito do que há em você ainda é verme. Você já foi macaco, e agora também
o homem é mais macaco do que macaco”.[263] Nietzsche continuou dizendo:
“O homem é uma corda estendida entre o animal e o super-homem… O que é
de grande valor no homem é ele ser uma ponte e não um fim”.[264] O fim do
homem é o super-homem, uma nova raça de seres superiores em tudo aos
homens como conhecemos hoje. Todos os meios necessários para alcançar
esse objetivo devem ser executados.
No entanto, há uma inconsistência flagrante no existencialismo de
Nietzsche — a raça super-humana não ocorrerá sem que exista uma intenção
cognitiva e voluntária (a vontade de poder) dentro dos homens, embora
creiam que a evolução supostamente passada ocorreu sem nenhum
planejamento cognitivo vindo de dentro da espécie. São necessários criadores
inteligentes para produzir o gado mais forte e será necessário um homem
inteligente para criar o super-homem. Em que lugar da natureza estava a
inteligência voluntária que provocou o processo evolutivo? Não poderia ter
sido Deus, pois Deus está morto. Além disso, as forças cegas da natureza
frequentemente eliminam os mais fortes entre nós, porque não distinguem
entre os fortes e os fracos. Mas isso mina o fundamento de Nietzsche. Se,
como ele afirmou, a evolução não ocorrerá sem intenção voluntária, então a
evolução não poderia ter ocorrido no passado sem alguma orientação exterior
e inteligente.
O Absurdo do Existencialismo
O existencialismo ateísta é edificado sobre o fundamento insustentável
do materialismo. Se o materialismo não pode substanciar os seus próprios
pressupostos, como o existencialismo pode evitar uma conclusão irracional?
É verdade que se não houvesse Deus, não haveria sentido para a vida. Mas
não é verdade que o homem finito seja suficiente para criar o seu próprio
sentido sem absolutos. Buscar sentido sem absolutos é como um homem cego
e desorientado jogar um dardo em um alvo cósmico a um bilhão de
quilômetros de distância. Mesmo que, por acaso, jogue o dardo na direção
certa, ele não tem força para alcançar o alvo desejado. No final das contas, o
existencialismo é um salto no escuro destituído de qualquer justificativa para
ser crido. Na melhor das hipóteses, o existencialismo é um pensamento
positivo, construído sobre uma base pessimista.
Porém, mesmo com esse pensamento positivo, sem Deus, sempre
permaneceremos psicológica e emocionalmente insatisfeitos. Como
indivíduos finitos, não somos autônomos. Nós não somos autossuficientes.
Nós nascemos carentes. Nascemos em busca de algo que está fora de nós
mesmos. Nascemos principalmente em busca de sentido e felicidade. Não
podemos deixar de buscar essas coisas.
Freud concordou que todos buscamos a felicidade. No entanto, ele
desprezava qualquer forma de solução religiosa. Com relação à crença em
Deus, ele denunciou: “A coisa toda é tão claramente infantil, tão estranha à
realidade, que para qualquer pessoa com uma atitude amigável para com a
humanidade é doloroso pensar que a grande maioria dos mortais nunca será
capaz de ir além dessa perspectiva da vida”.[265]
Embora Freud desprezasse a fé religiosa, ele entendeu que o ateísmo
tinha as suas consequências: “Dificilmente se pode estar errado ao concluir
que a ideia que a vida possui um propósito permanece e cai junto com o
sistema religioso”.[266] Embora Freud não acreditasse que pudesse ser dada
uma resposta definitiva para o sentido da vida, ele concluiu que as pessoas
não desistiam de buscar a felicidade: “Elas buscam a felicidade; elas desejam
ser felizes e manter a felicidade”.[267] No entanto, depois de listar as várias
maneiras malsucedidas em que as pessoas tentam encontrar a felicidade,
Freud reconheceu: “O projeto de se tornar feliz, que o princípio do prazer nos
impõe, não pode ser cumprido; no entanto, não devemos — na verdade, não
podemos — desistir de nossos esforços para nos aproximar dessa realização
de uma maneira ou de outra”.[268] Embora ele nos obrigue a continuar
procurando, ele não podia nos dizer aonde procurar. Embora ele não quisesse
que desistíssemos, ele sabia que era inútil continuarmos procurando.
Freud estava certo sobre o desejo da humanidade de ser feliz. É
evidente que não possuímos felicidade inerentemente, ou então não
estaríamos procurando por ela. Freud também estava certo ao concluir que,
sem Deus, a felicidade não pode ser encontrada em lugar algum. O terapeuta
bem-intencionado pode nos dizer que não precisamos de outros para sermos
felizes. Ela pode até nos encorajar a amarmos mais a nós mesmos e
procurarmos dentro de nós as respostas que buscamos. Mas esse conselho se
torna tolo para quem é banido para uma ilha deserta. Se fôssemos deixados
totalmente sozinhos, nos apegaríamos a uma bola de vôlei, a
transformaríamos na imagem de um amigo e a chamaríamos de Wilson.
Poderíamos amar a nós mesmos o quanto quiséssemos, mas ainda assim
enlouqueceríamos. A insanidade nos alcançaria porque o desespero da
solidão seria esmagador. O próprio pensamento de viver as nossas vidas
sozinhos é totalmente deprimente. Isso ocorre porque não fomos feitos para
ficar sozinhos (Gênesis 2:18). Fomos criados à imagem de Deus para ter
comunhão com Deus.
Mesmo se tivéssemos todo o poder, fama e fortuna imagináveis, ainda
estaríamos solitários e infelizes se não possuíssemos amigos de verdade.
Podemos pensar que tudo o que precisamos é de dinheiro para sermos felizes,
porém mesmo se tivéssemos um poder de compra ilimitado, ainda assim
estaríamos procurando algo. “Os olhos não se fartam de ver, nem os ouvidos
se enchem de ouvir” (Eclesiastes 1:8). As paixões corporais e o desejo dos
cinco sentidos nunca são satisfeitos. Podemos amar nossos carros esportivos
raros, mas eles nunca vão nos amar de volta. Deve haver algo mais na vida do
que apenas acumular bens. Da mesma forma, a fama e o poder pouco
satisfazem os anseios mais profundos do coração.
Quando eu era jovem, viajei para a Europa sozinho e fui aos Alpes
Suíços. As paisagens eram de tirar o fôlego, mas a experiência tinha um
senso de vazio. Quem gosta de ir ao cinema ou a um bom restaurante
sozinho? Naturalmente, queremos experimentar a vida com outra pessoa.
Todas as nossas melhores lembranças, aquelas que não queremos esquecer,
incluem, no mínimo, uma outra pessoa. Somos feitos para relacionamentos.
Alguns meses atrás, tive o privilégio de abraçar meu terceiro filho,
Britain, momentos depois de seu nascimento. Não há sentimento semelhante
no mundo. Meu próprio filho! Naqueles momentos fugazes, a beleza da nova
vida removeu as escamas dos meus olhos e me permitiu vislumbrar o sentido
da vida. Quando encontramos algo pelo qual valha a pena morrer,
descobrimos algo pelo qual valha a pena viver. Embora o pequeno Britain
não me conhecesse ou me amasse, não pude deixar de encontrar a maior
alegria e felicidade em abraça-lo.
Nós fomos feitos para viver as nossas vidas por algo maior que nós
mesmos. Somos feitos para relacionamentos, mas de acordo com as
Escrituras, há apenas um relacionamento que pode nos satisfazer — um
relacionamento com um Deus infinito. “Existe no espírito humano”, disse
George Park Fisher, “uma profunda necessidade de Deus. Isso é resultado do
fato de que não somos apenas finitos, mas conscientemente finitos, e
insuficientes para nós mesmos”.[269]
Nós fomos criados à sua imagem para que possamos ter um
relacionamento com ele, mas não recuperaremos nossa alegria e propósito até
que essa imagem e relacionamento sejam renovados em Cristo. Por esse
motivo, concordo com Alister McGrath, professor de ciência e religião da
University of Oxford, que disse: “Somos criados com um desejo inerente por
Deus, o que foi expresso na famosa oração de Agostinho de Hipona (354-
430): ‘Fizeste-nos para ti e inquieto está nosso coração, enquanto não
encontrar em ti descanso’”.[270]
Valorizar a Cristo e saber que ele nos valoriza é a chave da felicidade;
esse é o verdadeiro sentido da vida. Se fomos feitos para ele, nunca ficaremos
realizados sem ele. Os mandamentos de Deus para amá-lo de todo o coração
e amar ao próximo como a nós mesmos não nos são dados apenas para nos
impedir de nos divertir. Eles são as chaves para o nosso próprio sentido
pessoal e felicidade.
Nietzsche pode ter pensado que o egoísmo e o desejo por poder eram as
chaves da vida, mas nos últimos anos de sua vida ele dependeu do altruísmo
de sua mãe. Depois que todos os seus amigos o abandonaram e ele ficou
completamente louco, ele teria morrido sozinho se não fosse pelo fato de sua
mãe cristã lhe mostrar amor e compaixão.
Os existencialistas podem não querer se submeter ao desígnio de Deus
para eles, mas não importa para o que escolham dedicar as suas vidas, eles
permanecerão infelizes fora de um relacionamento pessoal com Deus através
de Jesus Cristo. Quando tentamos usar algo para aquilo que ele não foi
projetado a única coisa que obtemos é frustração.
O pragmatismo pode funcionar a curto prazo, mas, em algum momento,
o sapato se despedaçará, se continuarmos a usá-lo como martelo. Da mesma
forma, quando eu era muito mais jovem, tive a ideia inteligente de limpar o
meu aquário com papel higiênico. Agora, pense nisso comigo. Bem,
aparentemente eu não estava pensando. Em vez de limpar o tanque, o papel
fez o que ele foi projetado para fazer — dissolveu-se na água de maneira
bastante rápida. Enquanto eu tentava limpar as algas nas laterais do aquário,
as coisas iam de mal a pior. O papel se partiu em um bilhão de pedaços,
obstruindo o filtro e turvando a água. Que ideia brilhante! Mas isso é
ilustrativo do que acontece quando tentamos dedicar as nossas vidas a algo
que não fomos projetados para fazer: frustração total.
Conclusão
Finalmente, fomos criados para andar com Deus. Se o expulsamos de
nossas vidas, conduzimos nós mesmos ao cativeiro. Deus não precisa de nós
para ser feliz. Ele, como Deus, é autossuficiente. O Pai, o Filho e o Espírito
Santo são eternamente felizes e glorificados com o amor que têm um pelo
outro desde toda a eternidade. Nós, por outro lado, nunca encontraremos
propósito, sentido ou felicidade sem ele. Nós não somos autossuficientes.
Nunca encontraremos o amor que procuramos sem ele. Nós não fomos
projetados para viver sem um relacionamento com Deus. É por isso que
precisamos da revelação divina. Assim, somente nos machucamos quando
abandonamos Deus e fechamos os nossos ouvidos ao que ele nos disse em
sua Palavra. Não é de admirar que tantas pessoas, separadas da alegria do
Senhor, sejam tão infelizes. E elas permanecerão nesse estado miserável
enquanto continuarem a viver intelectual e praticamente separadas dele.
16

A Irracionalidade do Pós-Modernismo

“Quão belo isso tudo parecia belo na época do iluminismo”, observou o


jornalista britânico Malcolm Muggeridge, “que o homem triunfante
conquistaria aquele paraíso terreno cujos bosques da academia garantiriam,
na prática, a realização permanente de paz, abundância e bem-aventurança.
Mas que pesadelo de guerras, fomes e loucuras resultaram dali”.[271]
A Ascensão do Pós-Modernismo
O historiador cultural Jacques Barzun (1907-2012) associou o declínio
da cultura ao declínio da fé:
A observação de Nietzsche, há oitenta anos, de que “Deus está
morto” foi retomada recentemente como uma ideia libertadora, mas
tudo o que isso registra é que os cidadãos do mundo industrial
moderno não costumam contar com a Providência ou apelar para uma
divindade. Eles apelam e consideram máquinas, remédios, dinheiro e
as forças do inconsciente. Esses não são deuses, falta a relação de
humilde intimidade, sacrifício e amor mútuo.
Afastados totalmente de si mesmos, os homens sentem a sua
insuficiência. Eles veem cada vez mais claramente que não estão no
controle de suas vidas individuais ou destino coletivo, e que muitos
de seus objetivos práticos escapam do seu alcance.[272]
Sem um grande objetivo para nos guiar, o vazio e a futilidade são o que
resta. De acordo com Barzun:
Desespero, indiferença, obsessão com crueldade e morte, o complexo
de Sansão de querer derrubar todo o edifício sobre sua própria cabeça
e sobre as cabeças de seus adversários — essas paixões dominam as
almas das gerações jovens e as transformam em agentes de mudança
violentos, ou em céticos e cínicos desiludidos.[273]
Em seu livro best-seller The Culture of Narcissism, o historiador
neomarxista Christopher Lasch (1932-1994) fez uma descrição vívida e
pessimista da decadência de nossos tempos. “Atormentado pela ansiedade,
depressão, descontentamento vago e uma sensação de vazio interior, o
‘homem psicológico’ do século XX não busca nem autoengrandecimento
individual e nem transcendência espiritual, mas paz de espírito, sob
condições que cada vez mais militam contra isso”.[274]
A escravidão à vaidade de nosso próprio egoísmo é o alto custo de ser
emancipado de Deus. Segundo Muggeridge, Barzun e Lasch, agora vivemos
na era do desespero, mas esse é o mundo que criamos. Trocamos esperança
pelo desânimo, vida pela morte, sentido pelo vazio, verdade pelo niilismo,
amor pelo egoísmo e Deus por um guisado de lentilhas de Esaú. Porém, a
troca nos custou tudo. Queríamos ser deixados sozinhos e agora descobrimos
a desolação de nosso próprio isolamento. Fomos ingênuos ao pensar que
poderíamos viajar sozinhos e não nos sentirmos solitários e infelizes quando
finalmente chegássemos ao nosso destino. Mas aqui estamos nós — viciados
em nossos medicamentos psicotrópicos e antidepressivos.
Mas, não ficamos deprimidos da noite para o dia. Percorremos um
longo caminho através dos muitos anos da modernidade, através da Era do
iluminismo e dos grandes avanços da revolução científica. De acordo com o
épico trabalho do filósofo canadense Charles Taylor, A Secular Age isso foi
uma jornada de 500 anos. Durante o qual passamos da impossibilidade de não
crer em Deus no século XVI para onde a descrença é “não apenas fácil, mas
inevitável”.[275] Nós ficamos, por assim dizer, “desencantados” com o
sobrenatural.[276]
Esse desencanto está relacionado, entre outros fatores, à noção falsa,
porém otimista, de nossa autossuficiência intelectual. Com um Deus iminente
sendo deixado de lado e nos tornando excessivamente fixados em nossa
própria autonomia e independência, entramos no que Taylor chama de “a era
da autenticidade”.[277] Em vez de viver dentro da caixa, sentimos a
necessidade de inventarmos um novo caminho para nós mesmos. “Com a
morte de Deus e o cosmos significativo”, diz Taylor, “somos a única agência
autorizadora que resta”.[278] Nisso, deixamos de encontrar a nossa identidade
na igreja, no estado ou mesmo em nossa família nuclear para buscarmos
sentido e valor pessoal em nossa própria expressão individual.[279] O eu é
supremo. Infelizmente, isso foi reforçado quando Abraham Maslow (1908-
1970) colocou “estima” e “autorrealização” no topo da hierarquia das
necessidades do homem. A “autorrealização” e a “ética da autenticidade”
substituíram a nossa dependência de qualquer padrão transcendental e
objetivo.
Nossa dependência de Deus foi suplantada pelo desejo de
autoidentificação. Pois não precisamos mais negar a nós mesmos e conduzir
as nossas vidas em conformidade com a vontade de Deus para encontrar
satisfação. Agora, nós somos encorajados a encontrar nosso propósito em
sermos nós mesmos — seja lá o que isso signifique.[280]
Certamente, essa independência intelectual, egoísmo e até narcisismo
podem ser rastreados até Adão e Eva, quando eles questionaram a sabedoria
de Deus e comeram o fruto proibido. O homem sempre colocou a sua própria
sabedoria acima da de Deus. Como uma mudança cultural, as raízes do
humanismo e da autonomia intelectual podem ser rastreadas através do
racionalismo de René Descartes. Ele cria que a humanidade era
autossuficiente na obtenção de conhecimento de todas as coisas através de
suas próprias capacidades intelectuais.[281] John Locke discordou em parte de
Descartes, argumentando que devemos confiar na experiência, e não na
razão. No entanto, como Descartes, Locke defendia a autossuficiência da
humanidade.
Em vez de a verdade descer da parte de Deus, o homem poderia subir
por si mesmo. Se o homem é deixado a si mesmo, Emanuel Kant estava certo
— Deus está por trás de um muro transcendental. Kant pode ter pensado que
estava resgatando a fé das garras do conhecimento, mas na verdade acendeu
um fogo que queimaria até que todas as partículas da verdade fossem
consumidas.
Embora Kierkegaard tenha procurado resgatar a religião do muro de
Kant, transformando a fé em um salto apaixonado e existencial, ele também
deixou de enfatizar que a verdade religiosa é acima de tudo uma certeza
objetiva que nos foi historicamente revelada em um livro infalível.
O homem é suficiente; a ciência é suficiente. Os grandes filósofos da
modernidade, como Descartes e Locke, não precisavam de orientação
sobrenatural. Esses homens tentaram construir as suas respectivas teorias do
conhecimento a partir de um ponto de partida finito: eles mesmos. Seu
objetivo era responder a todas as questões possíveis e obter conhecimento
universal. Ao construírem em direção ao alto, eles pensaram que poderiam
alcançar os céus.
Sua tentativa de alcançar o conhecimento universal, no entanto, seria
como tentar construir a Torre de Babel sobre um lago congelado. Não
importa quão sólida a construção possa ser, se a fundação for insuficiente
para suportar o peso, a estrutura cairá. A modernidade e seus filósofos podem
ter tido grandes esperanças de alcançar o auge do conhecimento, porém
quanto mais subiam, mais percebiam que a verdade suprema não podia ser
encontrada a partir de um ponto de partida finito. Antes de chegar ao topo, a
integridade de seus pressupostos começou a ficar em dúvida quando a
fundação começou a se desfazer sob os seus pés. Se ela não pode ter certeza
do fim da verdade, não pode ter certeza do seu começo.
A Chegada do Pós-Modernismo
Com a perda da esperança de obter conhecimento universal, de acordo
com o filósofo francês Jean-François Lyotard (1924-1998), a construção de
qualquer grande metanarrativa caiu.[282] Como um prédio em colapso, o
próprio conhecimento desmoronou e não há fundamento para reedificá-lo.
Estamos perdidos. Segundo Sartre, estamos à deriva em um barco sem leme
em um mar sem fim. Estamos eternamente flutuando no ar — um buraco
escuro — sem sabermos em que sentido estamos indo, se “para o alto” ou
“para baixo”. Tudo está em fluxo. Tudo é contingente e relativo. Sem Deus,
não há um ponto de referência eterno para nos impedir de perder o rumo
neste mundo sombrio. Tudo está fragmentado. Existem apenas pedaços que
não conseguem ser conectados. Quem está certo? Ninguém sabe. Tudo o que
sabemos é que é melhor não pensarmos que sabemos porque a certeza se
tornou um ato de intolerância.
A modernidade nos trouxe para aqui: a lugar nenhum. Por causa do seu
constrangimento, ela fugiu para a escuridão com a sua irmã gêmea, a pós-
modernidade, ocupando o lugar deixado por ela. A diferença entre elas é que
a modernidade nos dava esperança e prometia nos conduzir a toda a verdade,
enquanto a pós-modernidade é honesta quando ela não nos promete nada
além de desesperança e desespero.
O absurdo de tudo isso levou o vencedor do Prêmio Nobel, o francês
Albert Camus (1913-1960) a começar seu livro, The Myth of Sisyphus, com
as seguintes palavras: “Existe apenas um problema filosófico realmente sério,
que é o suicídio. Julgar se a vida é digna ou não de ser vivida significa
responder à questão fundamental da filosofia”.[283]
Camus concluiu — como o rei Salomão já fez há muito tempo (ao
contemplar a futilidade da vida “debaixo do sol”) — que toda a vida não tem
sentido e todo o seu trabalho infrutífero é como nada. Nada tem sentido,
mesmo as grandes descobertas da ciência. “Se a Terra gira em torno do sol,
ou o contrário, é uma questão de profunda indiferença. Para dizer a verdade, é
uma pergunta fútil”.[284] E ele está certo, se não há sentido na vida, qual é a
real importância disso?
Camus comparou a vida ao antigo mito de Sísifo, que foi amaldiçoado
e obrigado a carregar uma pedra pesada por uma montanha íngreme que só se
tornava cada vez mais íngreme enquanto ele subia. Quanto mais perto ele
chegava de seu objetivo, mais difícil o processo se tornava, até que,
finalmente, ficava totalmente impossível. Era inevitável, em um certo ponto
de sua jornada, que a pedra caísse de suas costas e rolasse todo o caminho de
volta para a base da montanha. Em desespero, Sísifo percebe, enquanto
caminha atrás de sua pedra, que a sua sorte na vida era continuar repetindo
esse processo opressivo sem fim.
O trabalho árduo é tolerável quando há uma razão ou motivo para o
trabalho, mas quando o trabalho se torna inútil, então o que resta é o
desespero. A vida e todo o seu trabalho sem sentido resultam em um monte
de nada. Nós vivemos e esperamos o amanhã, mas o amanhã apenas nos
aproxima da morte. No entanto, vivemos como se nunca fôssemos morrer —
até que o conhecimento da morte seja inevitável. A racionalidade e a ciência
não são consoladoras. Nós estamos sozinhos; trabalhamos, mas sem sucesso.
Quando despertamos para a realidade da nossa própria morte, não podemos
deixar de contemplar o absurdo da vida — uma vida sem sentido ou
propósito. Uma vez que o desespero e o absurdo se estabelecem, descobrimos
que, se não há nada pelo que valha a pena morrer, também não há realmente
nada pelo que valha a pena viver. “A partir do momento em que o absurdo é
reconhecido, ele se torna uma paixão, a mais angustiante de todas”.[285] O
homem anseia por sentido, mas, como ele é um ouro de tolo, o absurdo disso
tudo deve ser aceito:
Não sei se este mundo tem um sentido que o transcende. Mas sei que
não conheço esse sentido e que é impossível para mim simplesmente
não o conhecer. O que um sentido fora da minha condição significa
para mim? Só consigo entender em termos humanos. O que eu toco, o
que me resiste — é isso que eu entendo. E quanto à essas duas
certezas — meu apetite pelo absoluto e pela unidade e a
impossibilidade de reduzir este mundo a um princípio racional e
razoável — sei que não posso reconciliá-las. Que outra verdade posso
admitir sem mentir, sem criar uma esperança que me falta e que não
significa nada…?[286]
Embora a vida seja absurda, Camus concluiu que a única maneira de
superar isso era se rebelar e aceitar o vazio de tudo isso. Em vez de olhar para
Deus, como Salomão fez no passado, Camus sugeriu que aceitássemos nosso
destino, reconhecêssemos o absurdo da vida e continuássemos a subir a
montanha sem sentido. Ele nos diz para desafiar a verdade amarrando aquela
pedra nas costas e subindo a montanha do absurdo, porque a outra única
opção é o suicídio.
Embora Camus aceitasse a falta de sentido da vida, outros ateus não
suportariam sucumbir a esse desespero. Segundo os ateus, devemos criar
nosso próprio caminho no mundo. Nós devemos criar significado para nós
mesmos.
Por exemplo, o bioquímico francês Jacques Monod colocou
descaradamente o homem no lugar de Deus, apregoando dogmaticamente que
nós, como criaturas autônomas, somos livres para escolher o nosso próprio
sentido:
A antiga aliança está em pedaços. Finalmente, o homem sabe que
está sozinho na imensidão insensível do universo, da qual emergiu
por acaso. Nem o seu destino, nem o seu dever foram escritos. Ele
deve escolher o reino do alto ou das trevas, abaixo.[287]
O teórico social Jeremy Rifkin foi ainda mais ousado quando disse:
Não nos sentimos mais como convidados na casa de outra pessoa e,
portanto, obrigados a fazer com que o nosso comportamento se
conforme a um conjunto de regras cósmicas pré-existentes. A criação
é nossa agora. Nós fazemos as regras. Nós estabelecemos os
parâmetros da realidade. Nós criamos o mundo e, porque o fazemos,
não nos sentimos mais dependentes de forças exteriores. Não
precisamos mais justificar o nosso comportamento, pois agora somos
os arquitetos do universo. Não somos responsáveis por nada fora de
nós mesmos, pois somos o reino, o poder e a glória para todo o
sempre.[288]
Se Deus é Deus deixado de lado, valores e sentidos externos também o
são. Como viver e para quê viver não são perguntas que têm respostas
exteriores. A humanidade é deixada sozinha para descobrir ou criar essas
respostas. “Se Deus está morto”, concluiu Muggeridge, “alguém terá que
tomar o lugar dele. Será a megalomania ou a erotomania, a busca pelo poder
ou a busca pelo prazer, o punho cerrado ou o falo, Hitler ou Hugh Hefner”.
[289]
Alguns existencialistas concluíram que o significado da vida é “poder” e
outros recorreram a uma vida de “hedonismo”. Mas, independentemente de
qual resposta seja oferecida, o existencialismo é a tentativa finita do homem
de criar sentido em um mundo sem sentido, à parte de um dicionário divino.
O Desespero do Pós-Modernismo
As implicações da pós-modernidade são terríveis. Se Deus é exilado, é
o homem quem entrará em cativeiro. Se tirarmos o calor da luz, a escuridão
fria e sombria provavelmente nos consumirá. Se procuramos ser iluminados
sem olhar para a Luz, não espanta que tudo o que descobrimos seja a
escuridão. Se jogarmos fora a lei de Deus, não se surpreenda se não
conseguirmos encontrar o caminho. Se não queremos olhar para as coisas
celestiais, não fiquemos chocados se o inferno é tudo o que vemos.
Nosso cativeiro é de nossa própria autoria. Tiramos Deus de vista para
que possamos ser livres para criar nosso próprio mundo sem ele. Nós o
tornamos irrelevante para a vida, na esperança de encontrarmos liberdade
pessoal. Afirmamos que podemos escalar as nossas montanhas e desvendar
todos os segredos do universo por nós mesmos. Abandonamos a Deus
exaltando as nossas experiências, nossa sabedoria e nós próprios. Somos
autossuficientes — é o que pensamos. Mas depois de toda a nossa busca,
orgulho e autoexaltação, despertamos para a percepção deprimente de que
perdemos a nossa dignidade, liberdade e sentido.
Fomos dormir pensando que éramos deuses, mas acordamos e
descobrimos que somos menos do que cães. Sem Deus, somos meras bestas
procurando satisfazer as nossas paixões inferiores, latindo e farejando lixeiras
e montes de lixo em busco de algo para comer. Costumávamos andar na
posição vertical, mas agora nos rastejamos. Embora tenhamos sido feitos para
a grandeza, nos contentamos com as insignificâncias e vaidades deste mundo.
Sem Deus, nossa dignidade tem sido marcada por prazeres sujos e hedonistas
que escravizam e destroem as nossas almas. O que escolhemos amar é
exatamente o que está nos matando. Fomos chamados para ser a coroa da
criação. Fomos criados à semelhança de Deus, e recebemos a mais nobre de
todas as tarefas — encontrar felicidade, propósito e liberdade para amar,
adorar e obedecer ao Rei da Glória.
Fomos criados para caminhar ao lado do Deus vivo, mas o expulsamos
de nosso caminho e nos extraviamos de nosso próprio caminho nesse
processo. Sem Deus, miséria, desesperança e desespero são tudo o que resta
para nós, e apenas nós somos os culpados. Ao lançarmos Deus ao mar, não
percebemos que, sendo feitos à sua imagem, também seríamos arrastados
para esse túmulo frio e escuro.[290] Se matamos Deus, então matamos a nós
mesmos junto com ele.[291]
Conclusão
Por fim, o naturalismo é uma cosmovisão ateísta que termina em
desespero. Do pressuposto inicial de que o cosmos pode ser explicado sem
nenhuma revelação sobrenatural, vem o materialismo, o empirismo, o
determinismo, o relativismo, o niilismo e o existencialismo. No fundamento
do naturalismo, a modernidade começou com a confiança de que o homem
era autossuficiente para descobrir uma explicação abrangente de todas as
coisas. O objetivo original da modernidade não era matar a Deus, mas
explicar todas as coisas, inclusive Deus, sem a ajuda de Deus. A modernidade
estava enraizada na autoconfiança da autossuficiência do homem. Contudo,
após muitos anos de decepção, quando se tornou evidente que uma grande
metanarrativa não conseguiu ser descoberta a partir de um ponto de
referência finito, a modernidade sucumbiu à pós-modernidade. E a pós-
modernidade não declarou a morte de Deus, mas a morte da verdade. Sem
olhar para Deus, é isso que obtemos: absurdo, falta de sentido e desespero.
17

A Irracionalidade de Todas as Religiões


Não Teístas

O pecado contra um Deus santo é o problema, e nossa culpa é a evidência de


que todos sabemos que isso é verdade. O naturalismo é uma tentativa de
remover a culpa removendo Deus, mas como Deus não pode ser morto, nossa
culpa permanece viva. Como vimos, o naturalismo termina em absurdo,
porque não consegue sustentar os seus próprios pressupostos. O naturalismo
não apenas não consegue dar conta do pecado e da culpa, mas também não
pode dar conta do seu próprio fundamento — lógica, matemática e leis da
física.
Visto que é irracional aceitar o naturalismo, agora precisamos examinar
as próximas opções: sobrenaturalismo impessoal e sobrenaturalismo pessoal.
As várias cosmovisões impessoais e sobrenaturais, como hinduísmo,
jainismo, budismo e similares, nos oferecem soluções coerentes? Pode-se
encontrar consistência em alguma das religiões sobrenaturais não cristãs,
como o judaísmo e o islamismo? Primeiro, examinaremos a coerência do
sobrenaturalismo impessoal neste capítulo e, em seguida, voltaremos nossa
atenção para o sobrenaturalismo pessoal não bíblico no capítulo seguinte.
O Absurdo do Sobrenaturalismo Impessoal
O pensamento religioso oriental, como em todas as formas de
misticismo, pode ser monoteísta, politeísta, panteísta, dualista, monista,
animista, agnóstico e até ateísta. Embora isso pareça complicado, não importa
o que as várias religiões místicas creiam sobre a natureza do Ser Supremo (ou
seja, Deus), todos eles acreditam que o Ser Supremo é impessoal e totalmente
incognoscível. Deus, se ele/isso pode ser chamado de Deus, é uma força
impessoal que pode existir fora da natureza. Ele/Isso também pode ser uma
força unida à natureza, ou uma força que se manifesta dentro da natureza, ou
uma força totalmente não relacionada e separada da natureza.
Independentemente disso, esse ser ou força suprema (que é a causa de toda a
existência) não é um ser pessoal e possível de ser conhecido.
Visto que, mesmo dentro do politeísmo, há um Ser Supremo por trás de
todas as múltiplas divindades, o monoteísmo não está fora de questão. Como
esse Ser Supremo pode ser um com a natureza, o panenteísmo também está
incluído. O relacionamento exato entre Deus e a natureza pode ser debatido
entre dualistas e monistas. Porque essa força pode se manifestar em diferentes
graus e forças dentro do universo, o politeísmo e o animismo fazem parte de
algumas religiões orientais. Uma vez que essa força suprema transcende tudo
o que é conhecível e está além dos conceitos de ser e de existência, o
agnosticismo e até o ateísmo chegaram às práticas orientais.
As religiões orientais não estão preocupadas em identificar e definir a
natureza de Deus, pois isso é impossível para um Ser Supremo que é inefável
(incognoscível). A preocupação central dessas religiões consiste em como
escapar dos sofrimentos, corrupções, finitude ou individualidade de nossa
vida física, que está ligada ao mundo material e físico. O objetivo é que
nossas almas se unam com esse Ser Supremo impessoal e incognoscível.
Diferentes religiões orientais podem enfatizar um caminho ou maneira
ligeiramente diferente de obter união com o Ser Supremo, desde várias
formas de comportamento ético até a iluminação mística, mas todas elas nos
permitiriam encontrar uma maneira de escapar do mal e do sofrimento deste
mundo através de algum modo de iluminação ou nirvana com o Ser Supremo.
O objetivo é a aniquilação — deixar de existir como um ser pessoal e
consciente ao unir-se ao Ser Supremo impessoal e inconsciente.

Hinduísmo

No hinduísmo, o Ser Supremo é Brahma, que é algo que não pode ser
definido, pois é indiferenciado e está além da existência ou do próprio ser.
Brahma podia ser nada, bem como poderia ser alguma coisa. Para se unir
com Brahma, a alma deve ser libertada (Moksha) da roda do karma e da
Samsara (reencarnações) ao alcançar o nirvana através do caminho das obras,
ou do caminho do conhecimento, ou do caminho da devoção. Somente
depois, a alma estará livre da dor e do sofrimento advindos de ser acorrentada
a uma existência física e corporal.

Jainismo

No jainismo, o caminho (Dharma) para a alma escapar de sua


escravidão física é através da crença correta, do conhecimento correto e de
uma negação ascética da carne, conforme listado nos “Cinco Grandes Votos”
da renúncia, que são: (1.) matar ( 2.) mentir, (3.) roubar, (4.) prazer sexual e
(5.) apego mundano.

Budismo

O nirvana, a libertação do sofrimento e do apego às criaturas, é


alcançado no budismo não através do ascetismo extremo ou do hedonismo,
mas através de um caminho intermediário de conhecimento e de iluminação.
A iluminação é obtida através do caminho óctuplo: (1.) Conhecimento
correto — aceitação das quatro Verdades Nobres, (a.) crença na existência do
sofrimento, (b.) o sofrimento é causado por nossos desejos corporais, (c.) não
podemos ser livres sem que os nossos desejos corporais sejam extintos e (d.)
os desejos corporais são extintos seguindo o caminho óctuplo. (2.) Resolução
correta — renunciar aos prazeres corporais e evitar praticar o mal contra
qualquer criatura viva. (3.) Fala correta — parar de mentir, fofocar e falar
palavras vãs. (4.) Comportamento correto — não matar, roubar ou fornicar.
(5.) Ocupação correta — ganhar a vida sem explorar ou prejudicar os outros.
(6.) Esforço correto — resolver fazer o esforço adequado para eliminar
nossas características pecaminosas e aumentar nossas boas qualidades até que
sejamos aperfeiçoados. (7.) Contemplação correta — ser vigilante, constante
e alerta na tentativa de se libertar do desejo e do sofrimento. (8.) Meditação
correta — uma vez que abandonamos todos os desejos e estamos livres do
sofrimento, o nirvana pode ser alcançado através da meditação correta. Após
isso, somos um com o Ser Supremo (Brahma).

Outras Religiões Místicas

Juntamente com o hinduísmo, o jainismo e o budismo, muitas das


outras cosmovisões místicas como taoísmo, xintoísmo, siquismo e o
movimento da Nova Era se apegam a um Ser Supremo e impessoal. Essas
diferentes cosmovisões podem dar respostas diferentes sobre como devemos
nos tornar iluminados ou como podemos nos unir à divindade, mas a única
coisa que eles têm em comum é que o divino (qualquer que seja o seu
relacionamento com o universo) é totalmente incognoscível. O Ser Supremo
não possui propriedades semelhantes às que conhecemos. O Ser Supremo é
completamente transcendente; não é uma pessoa ou mesmo um ser
consciente. Nem sequer é uma força, porque uma força implica poder, e
poder é algo que pode ser experimentado e discutido. Até a expressão Ser
Supremo é apenas um símbolo vazio que aponta para algo que absolutamente
está além de ser. Isso está além da existência ou do ser. O que é isso? A
questão é: nós não podemos saber.
A Inconsistência de um Deus Incognoscível
Isso leva a uma grande inconsistência. Se não podemos conhecer a
Deus, se Deus não pode conhecer a si mesmo, e se Deus não pode se
comunicar conosco, então não podemos saber que Deus é incognoscível, em
primeiro lugar. Dizer que Deus transcende todos os conceitos conhecíveis é,
na melhor das hipóteses, uma especulação grosseira. Mesmo se um Deus
incognoscível existisse, seria impossível saber que ele/isso existia. Assim,
que guru tem o direito de dizer que esse Ser Supremo transcende todos os
conceitos concebíveis? Como ele sabe que Deus é incognoscível? Deus disse
isso a ele? O guru viu esse Deus incognoscível atrás de uma rocha? Ele teve
um encontro mágico com esse ser desconhecido?
Além disso, se um guru diz que experimentou esse Deus incognoscível,
ele não negaria com isso a incognoscibilidade de Deus? Uma experiência
com Deus é, no mínimo, uma conexão com Deus. Qualquer conexão exige
que haja pelo menos um ponto de semelhança entre Deus e o homem. Para
conectar-se com Deus, deve haver algum tipo de relacionamento análogo
com Deus — mesmo que seja mínimo. Onde quer que esse ponto de
semelhança possa estar, significa que Deus não pode ser absolutamente
transcendente ao homem. Se Deus é totalmente incognoscível, é uma
contradição afirmar que existe um caminho para a iluminação. O guru não
está falando de modo contraditório quando diz: “Deus é incognoscível, mas
eis como você pode conhecê-lo/experimentá-lo”? Eu acho que esses são os
mesmos gurus que gostam de ouvir pessoas aplaudindo os seus ensinamentos
com apenas uma das mãos.[292]
Sem uma revelação autoritativa de um Deus pessoal, quem pode
afirmar que o misticismo, as orações contemplativas, a yoga, o ascetismo, a
autoflagelação, o Caminho Superior, o Caminho Médio ou o Caminho
Inferior trazem iluminação e união com o Deus incognoscível? Sem um Deus
que possa se comunicar, o homem finito e falível é deixado tateando sem
rumo na escuridão. O homem pode articular arbitrariamente várias
conjecturas sobre como viver, mas não possuirá nenhuma autoridade
concreta. O sobrenaturalismo impessoal (em qualquer uma de suas formas)
não é basicamente diferente do absurdo do naturalismo, pois o conhecimento
é restrito apenas ao que está contido no universo visível. É fácil entender por
que muitas visões de mundo místicas sucumbem ao agnosticismo e ao
ateísmo, que são uma conclusão lógica. No entanto, uma vez admitido o
agnosticismo e o ateísmo, todo conhecimento termina em relativismo e
niilismo, o que faz com que o sobrenaturalismo impessoal seja inconsistente
consigo mesmo.
A Inconsistência de Confundir Deus com a Natureza
De alguma forma, esse Deus inefável, que está além da existência e do
ser, é o fundamento de toda existência e ser. Deus é supostamente o
fundamento de tudo o que é concebível, mas é alguém que não pode ser
conhecido. Em outras palavras, um Ser Supremo que não existe criou tudo o
que existe, e isso leva a uma série de contradições internas.
Uma Força Cega e Ininteligente
Esse Ser Supremo não é um ser consciente e inteligente, mas de alguma
forma é o fundamento de toda a inteligência. As leis da lógica, as leis da
física, a matemática e a intenção voluntária da raça humana estão todas
enraizadas em uma força cega, inconsciente e ininteligente. Como um poder
não inteligente cria (ou emana) um universo cheio de inteligência? Se um
guru iluminado diz que a inteligência que é evidente em todo o universo é a
inteligência da força ininteligente, então onde está localizada essa
inteligência? A Mãe Natureza e o Pai Tempo são termos antropomórficos que
comunicam a inteligência a humana à própria natureza. Mas o universo tem
uma alma? Ele tem cérebro? Pensa? Tem algum plano? Tem um propósito?
Se o universo é uma força, ele sopra cegamente sem nenhuma direção ou
intenção? Como pode haver um elemento sobrenatural no universo que é
mais irracional do que um cachorro ou uma barata? Como o sobrenatural
pode ser ininteligente? Se procurarmos responder a esse dilema dizendo que
não há elemento sobrenatural por trás ou dentro do universo, abandonamos o
sobrenaturalismo impessoal e somos forçados a abraçar o absurdo do
naturalismo.

Panteísmo

O panteísmo é a crença de que Deus e a natureza são a mesma coisa.


Paul Harrison, presidente do World Pantheist Movement, dá uma definição
simples do panteísmo: “Tudo é Deus”.[293] Benedito de Spinoza (1632-1677),
o grande profeta do panteísmo, apregoou que: “Além de Deus, nenhuma
substância pode existir, nem pode ser concebida. Por isso, segue-se com a
maior clareza… que Deus é um, ou seja, na natureza existe apenas uma
substância”.[294]
A chave da filosofia de Spinoza é o seu monismo, ou seja, a ideia de
que existe apenas uma substância, a substância divina infinita que é
idêntica à Natureza: Deus sive Natura, “Deus ou Natureza”. A
identificação de Deus e da Natureza pode ser entendida de duas
maneiras bastante diferentes. Se considerarmos a mensagem de
Spinoza de que “Deus” é apenas uma maneira pitoresca de se referir
ao sistema ordenado do universo natural, ele parecerá ateu. Por outro
lado, se alguém o leva a dizer que quando os cientistas falam de
“natureza” eles estão realmente falando o tempo todo sobre Deus,
então ele parece ser, nas palavras de Kierkegaard, um “homem
intoxicado por Deus”.[295]
Embora muitos panteístas desejem abraçar árvores enquanto adoram o
universo, o cerne de sua adoração mística é o ateísmo. Como o panteísmo é
simplesmente naturalismo, com o termo Deus acrescentado ao amor à
Natureza, o panteísmo participa da mesma inconsistência do naturalismo. Por
que adorar a Natureza, quando ela não pode dar conta de sua própria
existência?

Panenteísmo

O panenteísmo é semelhante ao panteísmo, mas, em vez de Deus e a


natureza serem um, o panenteísmo diz que Deus é separado, mas está
localizado na natureza. Em vez de ser monístico, o panenteísmo é dualista.
Deus está na natureza. Como o corpo é a casa da alma humana, o universo é a
casa da Alma do Mundo. Mas quais são as propriedades da Alma do Mundo?
Se a Alma do Mundo é impessoal, se não pode pensar ou ter intenção
voluntária, de que serve? Existe mesmo? Se a Alma do Mundo continua
sendo uma força impessoal e incognoscível que não pode se comunicar
conosco, então ainda permanecemos sozinhos, sem sentido e propósito final
na vida.

Politeísmo

Muitas das religiões politeístas, como o hinduísmo e o budismo, estão


enraizadas em uma mistura de crenças monoteístas e ateístas. Embora isso
pareça estranho, devemos lembrar que existe um Ser Supremo (monoteísta),
Brahma, que é completamente incognoscível e está além da ideia de ser e
existência (ateísmo). Ainda mais desconcertante é a ideia de que esse Deus
inexistente e incognoscível criou ou emanou tudo o que existe no universo.
Porque o universo é a emanação de Deus, Deus está em toda parte no
universo. Os vários poderes da natureza são manifestações de Brahma. Como
esses poderes são manifestações de Brahma, eles merecem adoração e
recebem nomes próprios. Brahma é o criador do universo, enquanto Shiva é o
deus da destruição. Vishnu é a deusa da preservação. Ganesha, o deus
elefante, é o deus da sabedoria e do conhecimento. Esses são apenas alguns
dos 33 milhões de deuses do hinduísmo. No entanto, esses deuses politeístas
não são divindades absolutamente distintas, mas manifestações diferentes do
ser incognoscível e impessoal, que supostamente está além da existência e do
ser. Embora alguns desses deuses sejam manifestações mais fortes de
Brahma, todos permanecem como expressões dos diferentes atributos de
Brahma. Isso significa que mesmo os ídolos mais fracos supostamente têm
alguma centelha de divindade dentro deles. Assim como muitas distinções
podem ser feitas no universo, assim também podem haver muitos deuses que
manifestam o único Ser Supremo.
Um homem-elefante pode ser criado a partir de uma pedra e colocado
em um templo para ser adorado. Os adoradores podem acreditar que esse
ídolo contém em si o espírito de Ganesha, mas eles estão adorando a
manifestação de um deus que é meramente uma manifestação de Brahma, que
é um deus que nem mesmo existe. Como Brahma está além do alcance da
adoração, os politeístas adoram várias emanações de Brahman. Se, no
entanto, Brahma está totalmente além do universo, então como esses deuses
politeístas (Shiva, Vishnu e Ganesha) são emanações de Brahma? Outrossim,
não existe uma lacuna infinita entre Brahma e Ganesha? Se pudermos nos
conectar com os vários deuses politeístas, que de alguma forma estão
conectados com Brahma, isso não significa que exista uma conexão real entre
Brahma e nós? E se existe uma conexão real entre Brahma e nós (por meio
dos deuses), isso não tornaria Brahma passível de ser conhecido? Isso não
consiste em uma contradição fundamental?
Transcendência e Imanência Confundidas
Isso aponta para a principal inconsistência dentro do panteísmo, do
panenteísmo e do politeísmo, que é a mistura da transcendência absoluta com
a imanência absoluta de Deus. Supostamente e ao mesmo tempo, Deus é
completamente separado do universo e completamente alguém que está
dentro do universo. De qualquer maneira, porém, Deus é incognoscível.
Se um círculo representa Deus, e se outro círculo representa o universo, se
Deus é totalmente transcendente, isso significa que não há absolutamente
nenhuma sobreposição ou conexão entre esses dois círculos. Se Deus é
totalmente separado do universo, sem nenhuma conexão análoga, então Deus
permanece para sempre incognoscível. Segundo o filósofo panteísta Benedito
de Spinoza: “As coisas que não têm nada em comum também não podem
chegar a um entendimento entre si, ou o conceito de um não envolve o
conceito de outro”.[296]

Por outro lado, se Deus é totalmente imanente, esses dois círculos se


sobrepõem perfeitamente, sem distinção entre eles. Se o universo e Deus são
um e o mesmo, então isso também torna Deus incognoscível e inútil.
Não é apenas uma contradição que Deus seja ao mesmo tempo
completamente transcendente e completamente imanente, mas sem que Deus
tenha nos criado à sua imagem, seria impossível conhecermos a Deus. Para
que o conhecimento de Deus seja possível, os dois círculos que representam
Deus e o universo não podem estar totalmente separados ou totalmente
sobrepostos, mas apenas conectados um ao outro. Em outras palavras, para
resolver a tensão, Deus e o homem não devem ser um e o mesmo, nem
totalmente diferentes, mas sim análogos um ao outro.

Vários místicos podem alegar que podemos percorrer o nosso caminho


para a iluminação e perder nossa individualidade e paixões corporais à
medida que nos fundimos com a Realidade Suprema, mas seja qual for o
caminho que sugiram que tomemos, logo após isso eles são forçados a negar
a validade desse caminho quando dizem que Deus está fora do alcance do
próprio conhecimento.
O filósofo neoplatônico Plotino (204-270) gostaria que escapássemos
da individualidade e nos uníssemos ao Uno (Ser Supremo), meditando
primeiro em conceitos universais e depois fazendo com que anulemos todo o
pensamento cognitivo ao darmos um salto na escuridão. Buda gostaria que
seguíssemos pelo Caminho Óctuplo antes de perdermos a consciência e a
individualidade à medida que fôssemos incorporados a Brahma, como uma
gota de água é absorvida pelo mar.
A escada que alcança Deus, no entanto, falha no último degrau. Se
Deus é totalmente incognoscível, não há escada grande o suficiente para
alcançá-lo. Plotino pode dizer que conceitos universais (como unidade e
unicidade) estão mais próximos de Uno do que conceitos particulares (por
exemplo, uma folha de grama e um carvalho individual), e o hinduísmo pode
dizer que Vishnu é uma manifestação maior de Brahma do que Hanuman (um
deus-macaco que ajuda Rama, que é o sétimo avatar de Vishnu), mas,
independentemente de qual deus ou conceito é o mais próximo da Realidade
Suprema, resta uma lacuna infinita entre esse último degrau e o nirvana.
Os deuses são apenas símbolos, e os símbolos se tornam ainda menos
que símbolos, porque não há conexão entre o símbolo e a Realidade
Suprema. Não importa o quão próximos estejam os degraus na parte inferior
da escada, sempre será impossível escalar o caminho até um Deus
incognoscível, visto que há uma lacuna infinita entre o último degrau e o ser
inefável. Assim, o misticismo, em todas as suas formas, destrói o seu próprio
fundamento.
Além disso, se confundirmos a transcendência e a imanência de Deus,
esse Deus impessoal se tornará a causa do mal. Se Deus é tudo, ou está em
tudo, sem distinção, então esse Ser Supremo também é um com tudo o que é
mau. Enquanto o universo físico é uma emanação de Deus, o mal também
deve ser uma emanação dele. Em última análise, então, Deus é o culpado por
todos os males e sofrimentos do mundo.
Conclusão
Não é que pensadores místicos não estejam cientes dessas contradições
lógicas. De fato, muitos deles argumentariam que a consistência lógica é
apenas uma preocupação ocidental. Embora eles possam dizer essas coisas,
ainda assim, eles realmente não querem dizer o que dizem. Eles valorizam a
honestidade tanto quanto nós. Se viajarmos para o Oriente, perceberemos
que, mesmo lá, 1 + 1 = 2. Da mesma forma que as leis da física se aplicam a
nós no Ocidente, elas se aplicam aos que vivem na Ásia. Não importa para
onde viajemos, descobriremos que as leis da lógica são universalmente
verdadeiras. Uma contradição é uma contradição, não importa em que área
geográfica ela esteja localizada ou quem a diga. Por essa razão, o
sobrenaturalismo impessoal se autorrefuta; e, portanto, não é digno de ser
levado a sério. Ele é um absurdo.
18

A Irracionalidade do Islamismo e do
Judaísmo

Com o naturalismo e o sobrenaturalismo impessoal sendo reprovados no teste


da coerência, tudo o que resta é o sobrenaturalismo pessoal. Dentro dessa
categoria de pensamento, existem três possibilidades principais: judaísmo,
islamismo e cristianismo. O que separa o cristianismo do judaísmo e do
islamismo é o ensino de que a salvação é somente pela graça de Deus.
Portanto, ao invés de repassar as alegações de verdade particulares de cada
uma das visões de mundo teístas não cristãs, é suficiente mostrar como o
judaísmo e o islamismo falham em permanecer coerentes consigo mesmos,
mostrando a impossibilidade lógica de os pecadores merecerem a sua
salvação diante de um Deus justo e reto.
A Inconsistência de um Deus Injusto
O judaísmo e o islamismo (juntamente com muitas seitas
pretensamente cristãs) ensinam a salvação por meio das boas obras. De fato,
todas as religiões do mundo, para além do cristianismo protestante,
reivindicam que devemos merecer nosso caminho de acesso a Deus. No
entanto, existe uma falha fatal nessa abordagem: ela torna Deus injusto.
Um Deus justo não pode permitir que o pecado — qualquer pecado —
fique impune. A lei, por sua própria natureza, exige satisfação. A lei exige
perfeição, mas isso é algo que nós não podemos cumprir. Nenhum de nós é
perfeito. Eu diria que é impossível praticarmos sequer uma obra perfeita, o
que incluiria termos motivações perfeitas. Todo ato bom, se for um ato
perfeito, deve ser feito apenas para a glória de Deus. E, pelo fato de que
somos indivíduos egoístas, isso é impossível.
Mas, para o bem do argumento, suponhamos que fosse possível
acumular mais boas obras do que más. Isso ainda não inclina a balança a
nosso favor. Um assassino pode ser perfeito em todas as áreas da sua vida,
desde o nascimento até a morte, exceto pelo fato de ter cometido um
assassinato. Contudo, aos olhos da lei, o assassino ainda é culpado e deve
pagar pelo seu crime. Uma vida de bondade não cancela uma única
transgressão. A lei exige que vivamos perfeitamente do começo ao fim. Isso
inclui amar a Deus de todo o coração e amar os outros como a nós mesmos
em tudo o que pensamos, dizemos e fazemos. Pecado é qualquer coisa que
não alcance esse padrão. Um Deus justo não pode dizer: “Bem, você está
perto o suficiente”. A justiça exige perfeição, e qualquer pecado exige uma
penalidade. Essa é a natureza da lei.
Se Deus, como Legislador e Juiz, negligencia a menor transgressão,
então ele se torna injusto. Qualquer injustiça em Deus faz dele um pecador.
Por exemplo, se a sua filhinha fosse sequestrada e abusada, e todas as
evidências forenses, incluindo DNA e testemunhas oculares, apontassem o
Sr. Fulano como o autor, seria injusto que o juiz rejeitasse o caso porque ele
tem sido um cidadão exemplar e um bom pai. Não faria diferença, mesmo
que o Sr. Fulano se desculpasse profunda e sinceramente. Se a justiça for
feita, ele deve pagar. Semelhantemente, é justo que o juiz o deixe ir embora
livremente, como se ele não tivesse feito nada? Não. A justiça exige justiça!
A justiça exige olho por olho e dente por dente. Isso é autoevidente.
A questão não é que as boas obras não mereçam favor e bênção de um
Deus justo, mas sim que a lei exige perfeição. Como nenhum de nós, além de
Jesus Cristo, é perfeito, e porque o judaísmo e o islamismo não têm meios
legítimos através dos quais um Deus justo pudesse permanecer enquanto,
simultaneamente, é gracioso e perdoa pecadores indignos, então o judaísmo e
o islamismo são cosmovisões que falham em permanecer logicamente
consistentes consigo mesmos. Não há salvação em um sistema tão falho.
Se Deus é justo, e se temos que nos esforçar para criar o nosso próprio
caminho de acesso até o favor de Deus, estamos com problemas. Se Deus não
é justo, também estamos com problemas, pois quem pode saber o que
acontecerá? A pergunta, “como um Deus justo pode perdoar os injustos?”, é
segura e belamente respondida pela cosmovisão cristã, segundo a qual Deus
enviou o seu único Filho para cumprir as exigências da lei e suportar a justiça
e a ira provenientes da lei na cruz por todos aqueles a quem ele representa
legalmente.
Mas agora se manifestou sem a lei a justiça de Deus, tendo o
testemunho da lei e dos profetas; isto é, a justiça de Deus pela fé em
Jesus Cristo para todos e sobre todos os que creem… para demonstrar
a sua justiça pela remissão dos pecados dantes cometidos, sob a
paciência de Deus; para demonstração da sua justiça neste tempo
presente, para que ele seja justo e justificador daquele que tem fé em
Jesus (Romanos 3:21-26).
Deus pode ser gracioso e justo ao mesmo tempo, pois a justiça e a
misericórdia se beijam aos pés da cruz. Para o bem daqueles que creem, Deus
fez Jesus “pecado por nós” “aquele que não conheceu pecado… para que nele
fôssemos feitos justiça de Deus” (2 Coríntios 5:21). Não podemos fazer nada
para obter ou ganhar a aprovação de Deus através da lei, mas somente pela fé,
somente em Cristo, podemos ser perdoados por todos os nossos pecados.
Somente em Cristo podemos ser declarados inocentes e justos diante de um
Deus justo e santo.
Esse é o Evangelho da livre graça, que é a única resposta à culpa do
homem. Podemos buscar fazer todo o bem que quisermos, mas nossa sujeira
sempre estará debaixo de nosso tapete, pois nossa vergonha e culpa não
podem ser lavadas por meios de atos religiosos de compensação.
A culpa é o problema, e as boas obras não são a solução. Precisamos
que a parte ofendida nos perdoe. Nós precisamos de um substituto legal para
ficar em nosso lugar, pagar por nossos crimes e merecer a justiça que
necessitamos para permanecermos diante de um Deus justo. Nós precisamos
que Deus nos perdoe, e somente o Deus da Bíblia é capaz de nos perdoar, e
ao mesmo tempo permanecer fiel ao seu próprio caráter justo. O Evangelho
de Jesus Cristo torna possível o perdão. Por esse motivo, Cristo é o único
caminho para Deus. O Senhor Jesus deixou isso bem claro quando disse: “Eu
sou o caminho, e a verdade e a vida; ninguém vem ao Pai, senão por mim”
(João 14:6).
A Inconsistência de um Deus Monístico

Além disso, a injustiça nesses deuses não bíblicos é apenas metade do


problema. Para que Deus seja justo, ele deve ser justo, amoroso, relacional e
capaz de comunicar a sua lei ao homem. Porém, apenas o Deus triuno da
Bíblia possui esses atributos.
O Problema da Justiça
Por exemplo, o pecado e a culpa vêm do fracasso em obedecer à lei
moral de Deus. Mas de onde vem a lei? O que torna a lei boa? No Eutífron de
Platão, Sócrates perguntou se a lei é boa porque os deuses a declararam, ou se
os deuses a declararam boa porque ela é boa. Isso, no entanto, é uma falsa
bifurcação. A primeira opção diminui a lei, pois torna o padrão da bondade
meramente arbitrário nos pensamentos de Deus. A segunda opção exalta
excessivamente a lei, pois coloca Deus sob o seu governo. O que Sócrates
não conseguiu entender é que existe uma terceira opção que está enraizada na
natureza trinitária de Deus.
A lei moral de Deus não é um código de conduta exterior ou abstrato
que exista fora do caráter de Deus. Deus não está sob a lei, mas a lei é um
reflexo do caráter moral de Deus. Deus é amor. Deus é justo. Assim, o
próprio Deus é o padrão da moralidade. Isso também significa que a lei não é
uma construção arbitrária na mente de Deus.
Porque Deus é amor, o amor é a essência da lei. A lei exige o amor e
proíbe o egoísmo. Com isso em mente, a lei e o amor definem os termos para
um relacionamento correto com Deus e com os outros. Se não houvesse Deus
e existisse apenas uma pessoa, o pecado e o egoísmo não poderiam existir.
Um único indivíduo em completo isolamento não poderia roubar, enganar,
fofocar, mentir, cobiçar ou matar. Ele também não podaria ser altruísta ou
egoísta. Ele não poderia ser mau, mas também não poderia ser bom. São
necessárias pelo menos duas pessoas para que a moralidade exista. Dessa
maneira, a lei e o amor existem por causa dos relacionamentos.
Assim, o objetivo da lei moral é criar e sustentar relacionamentos
felizes e significativos com Deus e uns com os outros. Por termos sido
criados para relacionamentos, a chave da nossa felicidade está em amar a
Deus com todo nosso coração e amar os nossos próximos como a nós
mesmos.
O Problema do Amor
Da mesma maneira, embora exista apenas um Deus, há três pessoas na
Divindade. Deus é um em natureza, mas três pessoas. Creio que isso não
apenas torna Deus eternamente completo e feliz em si mesmo, mas também
fornece a Deus uma via para expressar eternamente o seu amor — um amor
que não é centrado em si mesmo. Deus Pai ama eternamente e busca a glória
do Filho e do Espírito Santo. Da mesma forma, o Filho e o Espírito Santo
buscam eternamente a glória de Deus Pai. Cada uma das três pessoas ama as
demais perfeitamente. Esse amor não é focalizado interiormente, pois Deus,
por sua própria natureza, é o doador supremo. Como Michael Reeves aponta:
“Se Deus fosse apenas uma pessoa, o amor pelos outros não seria central para
o seu ser”.[297]
É interessante que Agostinho, em seu livro A Trindade, tenha
argumentado que, para Deus amar, é necessário que ele seja triuno.[298] Não
são necessárias apenas duas, mas três pessoas para que Deus seja amor. Deus
é amor, mas o amor requer três coisas: um sujeito, um objeto e uma
expressão. Ou seja, o amor envolve uma pessoa que ama, uma pessoa que é
amada e um canal de comunicação de amor daquele que ama para o amado.
Esses três requisitos só podem ser eternamente satisfeitos pelo Pai que ama o
Filho através do Espírito Santo, e vice-versa. Como o Pai ama o Filho? Ele
ama se entregando. Mas como o Pai se entrega ao Filho? Ele se entrega ao
Filho pela operação do Espírito. O Espírito conhece exaustivamente o Pai
(por sua coabitação nele) e toma o que pertence ao Pai e o comunica ao Filho.
Em outras palavras, Deus ama se entregando ao Filho por meio do Espírito
Santo. Certamente, esse amor é mutuamente recíproco entre as três pessoas
da Trindade.
O Problema dos Relacionamentos
Se é impossível que exista amor fora de um relacionamento, a Trindade
é necessária para a existência do amor. E se Deus é amor, então Deus deve
ser inerentemente pessoal e relacional. De acordo com C.S. Lewis:
Todo tipo de pessoa gosta de repetir a afirmação cristã de que “Deus
é amor”. Mas parecem não perceber que as palavras “Deus é amor”
não têm significado real, a menos que Deus contenha pelo menos
duas pessoas. O amor é algo que uma pessoa tem por outra pessoa. Se
Deus fosse só uma pessoa, então, antes de o mundo ser criado, ele
não era amor.[299]
Em referência a essa afirmação, Robert Letham, professor sênior de
teologia sistemática e histórica da Wales Evangelical School of Theology,
declara: “Se ele não fosse amor, também não poderia ser pessoal”.[300]
Letham continuou dizendo:
Somente um Deus que é triuno pode ser pessoal. Somente a
Santíssima Trindade pode ser amor. O amor humano não pode
possivelmente refletir a natureza de Deus como uma trindade de
pessoas em união e comunhão. Uma mônada solitária não pode amar
e, como não pode amar, não pode ser uma pessoa.[301]
Além disso, a glória de Deus não é um único atributo, mas é o brilho de
todos os atributos de Deus. A glória brilha para fora de Deus. Portanto, a
glória de Deus exige alguém com quem compartilhá-la; requer uma
testemunha ocular. Glória requer uma opinião ou julgamento; requer
apreciação. Esses requisitos só podem ser eternamente satisfeitos por uma
multiplicidade de pessoas dentro da Divindade.
Portanto, a glória eterna que é compartilhada na Divindade consiste em
cada uma das três pessoas se entregando às outras pessoas, e as outras
pessoas admirando adequadamente a beleza, a majestade e a honra da outra.
A glória de Deus é o valor infinito com o que cada uma das três pessoas da
Trindade estima uma à outra. Ou, dito de outra forma, é a apreciação entre as
três pessoas da Divindade que permite que o Pai, o Filho e o Espírito Santo se
amem e se glorifiquem perfeitamente.
Isso significa que o amor intertrinitário não é egoísta. O amor do Pai
não busca o que é seu próprio, mas a glória e a honra do Filho, e da mesma
forma o desejo do Filho e do Espírito é manifestar a glória e honra das outras
pessoas da bendita Trindade. Nisto vemos o relacionamento perfeito que está
enraizado no amor e na justiça.
O Problema da Comunicação
O amor, por sua própria natureza, procura dar e compartilhar. Mas, se
Deus fosse uma só pessoa, o desejo de compartilhar e se comunicar não seria
essencial à sua natureza. E se compartilhar não fosse essencial à natureza de
Deus, por que ele compartilharia conosco e se revelaria a nós? Por esse
motivo, Michael Reeves pergunta:
Se Deus é uma só pessoa e sempre esteve sozinho, por que ele
deveria falar? Na solidão da eternidade antes da criação, com quem
ele teria falado? E por que ele começaria a falar agora? O hábito de
manter-se ensimesmado estaria enraizado. Um Deus assim teria
muito mais probabilidade de permanecer desconhecido.[302]
Em outras palavras, se Deus não fosse essencialmente um ser relacional
e pessoal, não haveria motivo inerente para compartilhar, amar e se
comunicar conosco. Mas Deus é amor porque Deus é trinitário. Assim, é
inerente à sua natureza se comunicar e compartilhar a si mesmo.
A comunicação é possível porque o Filho habita no Pai e o Filho
conhece pessoalmente o Pai, e o Pai habita no Filho e o Pai conhece o Filho
pessoalmente. Da mesma forma, o Espírito habita no Pai e no Filho e conhece
pessoal e exaustivamente o Pai e o Filho. Porque Deus é amor, o Pai ama
comunicando e compartilhando o maior objeto de sua afeição — o seu Filho
(Mateus 16:17). O Filho nos ama revelando o Pai (João 14:6). O Espírito nos
ama compartilhando o Pai e o Filho (1 Coríntios 1:30). Cada pessoa se deleita
em revelar a glória das outras pessoas. Assim, podemos conhecer a Deus
porque Deus é triuno e ele naturalmente dá, compartilha e se comunica com
os outros — algo que não poderia ser dito sobre uma divindade monística.
O relacionamento amoroso que o Pai, o Filho e o Espírito Santo
compartilham entre si por toda a eternidade é o relacionamento que Deus
escolheu livremente compartilhar com o seu povo (João 17:22). O Pai dá o
seu Filho ao seu povo. O Filho, como a Palavra eterna, revela o Pai. E o
Espírito conduz os crentes à comunhão com o Pai e o Filho. O maior presente
de todos foi oferecido à humanidade — um chamado para ter acesso e
participar da alegria e glória do relacionamento que é compartilhado entre o
Pai, o Filho e o Espírito Santo. Ora, isso sim é amor!
Sem a Trindade, a moralidade e o amor seriam apenas um conceito
abstrato na mente de Deus. Alá pode ser um deus que ordene a obediência,
mas os seus mandamentos não estão enraizados no amor. Ele não é um deus
que poderia nos amar. Como Alá não pode explicar a sua própria justiça
eterna, ele falha em ser um deus de amor. Como um deus que é uma única
pessoa, Alá é inerentemente egoísta. Na eternidade passada, Alá pode ter se
admirado, mas ele não poderia ter desfrutado ou amado mais ninguém. Alá é
deixado à sua própria autoconsciência. Se você for Deus, a autoestima é
justificada, mas a autoapreciação por si só não justifica uma moralidade
eterna, pois carece de qualquer relacionamento significativo, dado que não
existe um desejo inerente de se comunicar e compartilhar pessoalmente com
outros.
Conclusão
A lei de Deus, o amor de Deus, a personalidade de Deus e a
comunicação de Deus são eternas porque Deus é triuno. Somente o Deus da
Bíblia é justo, pois ele não é apenas inerentemente relacional; ele é capaz de
perdoar com justiça todos aqueles que vêm a ele, em arrependimento e fé, por
meio da obra do Seu Filho que morreu na cruz. Em suma, nenhuma outra
cosmovisão, filosofia ou religião tem a resposta para a culpa do homem.
19

A Irracionalidade das Religiões Não-


Trinitárias

A culpa continua sendo o problema. Uma consciência culpada não apenas


testemunha que sabemos que existe um Deus justo, mas também testemunha
por que somos hostis a esse conhecimento. Por sermos culpados diante de um
Deus santo, preferimos que Deus seja impessoal ou que ele não exista.
Por causa de nossos pecados, temos uma atitude hostil para com Deus.
O capítulo anterior explicou por que Cristo é o único remédio para uma
consciência culpada. Somente em Cristo os pecadores podem ser perdoados e
reconciliados com Deus. Mas essa reconciliação faz emergir outro dilema
para as religiões não trinitárias. A saber, um relacionamento com Deus requer
uma correlação análoga entre coisas semelhantes, porém diferentes. Ou seja,
antes de tudo é necessário haver “unidade” e “diversidade” para que os
relacionamentos existam. Mas de onde vem a “unidade” e a “diversidade”?
O Problema de “Um” e de “Muitos”
O problema começa com a pergunta sobre o que é definitivo ou
primário — “unidade” ou “diversidade”? Não importa qual escolhamos,
acabamos destruindo o outro nesse processo.
Parece que a maioria das pessoas tem escolhido a “unidade” como a
realidade suprema. Por exemplo, os muçulmanos veem a “unicidade” de
Deus (Tawhid) como a realidade suprema. No judaísmo, o mesmo ocorre
com a indivisibilidade do Senhor. Brahma é a “Realidade Suprema” no
hinduísmo e no budismo. A unicidade da essência de Deus é a força
unificadora por trás do panteísmo. Para Aristóteles, é a pura substância
“transmissível e indivisível” do Motor Imóvel.[303] E o conceito unificador no
neoplatonismo é o “Uno”.
Escolher a “unidade” como suprema significa que tudo (todas as
formas de “diversidade”) pode ser reduzido à “um”. Mas esse tipo de
reducionismo tem as suas consequências.
Embora naturalmente desejemos classificar através da união, como o
fazemos ao reunir as 37 espécies diferentes de gatos (por exemplo, leões,
tigres e gatos domésticos) na família dos felinos (gênero felis), é impossível
encontrar um único componente ou conceito unificador que unifique todos os
gatos. Não podemos reduzir a família de gatos a peles, caudas ou orelhas
pontudas, porque peles, caudas e orelhas pontudas não estão restritas à
família dos gatos. Não apenas isso, se procurarmos identificá-los como um
gênero distinto, os gatos são mais do que apenas uma bola de pelos, uma
cauda que sacode ou orelhas pontudas. Se reduzimos as coisas a um único
traço ou a uma única ideia, acabamos destruindo o que estávamos tentando
explicar. Quando um gato é reduzido a uma bola de pelos, não temos mais
um gato. Assim, as religiões que buscam tornar o seu deus monístico a
realidade suprema têm dificuldade para explicar por que existe “diversidade”
no mundo. E isso sem mencionar que esse reducionismo deve ser aplicado a
Deus também. E quando Deus é reduzido a um único atributo ou a uma
característica particular, ele/isso nada mais é do que uma trama de substância
desconhecida.
Por outro lado, se tentarmos eliminar quaisquer princípios ou
classificações de unidade, tornando a diversidade a realidade última, Deus
desaparecerá da existência. Não apenas isso, nós destruímos o conhecimento
completamente, visto que o conhecimento do mundo vem a partir da
classificação e do contraste de coisas diferentes e similares. Se existe apenas
diversidade, como sugere o pós-modernismo, então não há similaridade e
relação análoga entre as coisas. Mas, se não houver relações similares ou
análogas entre as coisas, torna-se impossível conhecê-las.
Embora isso possa parecer apenas um nó filosófico, uma resposta pode
ser encontrada na Bíblia. A realidade suprema é “unidade” e “diversidade”,
como descobrimos na doutrina da Trindade. O “um e muitos” são igualmente
supremos, pois existe apenas um Deus que subsiste em três em pessoas
distintas. Podemos ter a unidade e a diversidade como supremas, porque
temos um Deus triuno que é supremo.
A definição igualitária de Deus é importante, e até mesmo vital, para
uma cosmovisão coesa. Embora alguns argumentem que a Trindade é uma
contradição, é a doutrina da Trindade que fornece a coerência da cosmovisão
cristã. Sem a Trindade, tudo desmorona na falta de sentido.
Por exemplo, Alá é um. No Alcorão, lê-se: “Ele é Deus, o Único”
(Surata Az-Zúmar 39:4). Mas isso não significa um em número, pois aquilo
que não tem segundo não pode existir em forma numérica. De acordo com
Vincent J. Cornell, erudito em estudos islâmicos e diretor do King Fahd
Center of Middle East and Islamic Studies na University of Arkansas: “‘Deus
é único’, no sentido de que não há multiplicidade ou divisão concebível nele,
nem externamente, nem na mente, nem na imaginação. Somente Deus possui
essa unidade”.[304]
Com relação ao judaísmo, o renomado rabino e estudiosa da Torá
Moshe ben Maimon (“Maimônides”, 1135-1204) declarou:
Esse Deus é um; ele não é nem dois nem mais de dois; ele é
simplesmente um. Sua unidade não é como nenhuma outra unidade
que existe no mundo. A dele não é a unidade de um tipo que engloba
muitos outros particulares; e não é como a unidade de um corpo
dividido em partes e extremidades; ao contrário, é uma unidade que é
totalmente diferente de qualquer outro tipo de unidade no universo.
[305]

Da mesma forma, o deus teísta de Aristóteles, o Motor Imóvel, é um


ser imaterial, infinito, eterno e imutável, que é pura realidade. Por ser
imaterial, ele é um ser simples, sem corpo, partes ou composição. Porque ele
é eterno, ele existe em um estado atemporal e imóvel. Ele é realidade pura
(actus purus) que não tem nenhum movimento. Ele não é como o homem que
está em fluxo e sempre em mudança. Deus é perfeitamente imutável. Deus
não está se tornando, ele é o que ele é e tudo o que ele é sem qualquer
diferenciação.
O homem sabe que existe um Deus infinito, eterno e imutável, mas sem
a revelação especial, a teologia natural nunca nos conduzirá adequadamente
ao Deus trinitário da Bíblia. Todos esses atributos maravilhosos
(imaterialidade, infinitude, eternidade e imutabilidade), no entanto, sem o
equilíbrio da Trindade, logicamente conduzem à inconsistência do panteísmo
monístico.
O Problema da Diferenciação
Se Deus não for triuno, então Aristóteles está certo — não há
fundamento para qualquer distinção dentro de Deus.[306] Sem distinções
inerentes, Deus não seria apenas atemporal (pois isso requer uma separação
na mente de Deus entre pensamentos sucessivos e distintos), mas ele seria um
com seus atributos, o que é bíblico. No entanto, todos os seus atributos
também seriam um com os demais, sem qualquer diferenciação, o que é
problemático.[307] É problemático porque, sem distinções entre os seus
atributos, não há diferença entre a onisciência de Deus e a onipotência de
Deus. Os atos de poder de Deus seriam idênticos aos seus pensamentos e
decretos. Como Aristóteles argumentou: “Se eles são um em número, todas
as coisas serão as mesmas”.[308] De fato, todos os atributos de Deus, como no
panteísmo, se tornariam um único atributo sem diferenciação (que é uma
visão extrema e não bíblica da simplicidade divina).[309]
O Problema do Movimento
Para Aristóteles, imutável significa imóvel. Ser puramente simples, sem
partes ou diferenciação significa que não pode haver movimento. E pela
palavra movimento, Aristóteles não se refere apenas a uma mudança de
localização física, mas também a qualquer mudança temporal que ocorra
através do exercício intencional do poder. Qualquer exercício intencional de
poder exige uma diferenciação entre o momento anterior e o momento após o
ato do poder. Essa diferenciação provocada pela sequência, secessão ou
tempo é impossível para um Deus simples e imutável, sem partes. Mesmo
que quisesse, Deus não pode entrar no espaço ou no tempo — um Deus de
pura unidade está completamente isolado. Assim, a imutabilidade não é
apenas a ideia de que a essência de Deus não muda, mas que Deus não
experimenta nenhuma forma de mudança provocada por movimento ou
sucessão.
O Problema do Pensamento e das Emoções
Além disso, sem nenhuma diferenciação, não há diferença entre a
mente, o coração e a vontade de Deus, pois todos eles são imutáveis. Isso
indicaria que é impossível para Deus interagir emocionalmente com a criação
sem que haja uma mudança em seu estado eterno de existência.
Segundo o preeminente rabino judeu medieval Maimônides, não pode
haver uma mudança nas emoções de Deus sem que haja uma mudança na
natureza de Deus: “‘Porque eu, o Senhor, não mudo’ (Malaquias 3:6). E se
ele, às vezes, estivesse irado e, outras vezes, feliz, estaria mudando”.[310]
Deus não é apenas sem alguma mudança emocional, a emoção de Deus
deve ser singular. Ele não pode destacar e se concentrar em um evento
individual da história e ter uma opinião ou juízo emocional sobre isso. Ele
não sabe nada sobre eventos relacionados ao tempo e, portanto, não tem
novas experiências.
Consequentemente, Deus não pode ter o que Jonathan Edwards
identificou como uma vontade de decreto e uma vontade de comando.
Biblicamente falando, essas duas vontades são unificadas, pois ambas
buscam a glória de Deus, mas buscam a glória de Deus de diferentes
perspectivas. A vontade divina de decreto é como Deus busca a sua própria
glória no grande esquema das coisas, ela é o plano eterno de Deus e pode ser
transgredida. A vontade divina de comando é como Deus busca a sua própria
glória em todos os eventos particulares da história, que muitas vezes é
transgredida.
Todavia, se Deus não pode diferenciar eventos temporais, ele não tem
vontade de comando. Ele não é afetado pelos atos injustos dos homens
porque esses atos são indiferenciados do restante do conhecimento e das
emoções de Deus. Ele é completamente apático aos assuntos dos homens.
Se Deus está irado com os ímpios, então ele deve ter se irado
eternamente com eles antes da fundação do mundo. Qualquer que seja o
estado emocional de Deus desde a eternidade passada, ele deve permanecer
nesse estado sem mudanças. É impossível que Deus seja apaziguado ou
provocado, pois é impossível que ele tenha opiniões emocionais sobre
qualquer evento no tempo. Deus é atemporal, portanto, deve estar irado
eternamente. No estado imóvel de Deus, ele apenas percebe todas as coisas
em um olhar contínuo, sem qualquer diferenciação cognitiva e emocional
sobre qualquer incidente particular na história.
Mas, novamente, se não há diferenciação em Deus, não há diferença
entre a ira de Deus e a satisfação de Deus. O que significa para Deus ficar
irado, se a ira de Deus é idêntica ao amor e ao deleite de Deus?
O Problema da Consciência
Mas isso não apenas rouba a Deus de qualquer interação emocional e
pessoal com a criação, mas também rouba a Deus de toda interação cognitiva.
Uma vez que as emoções de Deus são limitadas pelo coração de Deus sendo
absorvido no mar da sua simplicidade divina, a mente de Deus deve ser
absorvida nesse mesmo mar inefável.
Se Deus não pode distinguir entre os seus atributos, de acordo com
Pseudo-Dionísio, como apontamos no capítulo 3, Deus não pode distinguir
entre o que ele mesmo é e o que nõa é. Tal contemplação implica uma
distinção entre a autoconsciência de quem está pensando e o que está sendo
pensado.
Para Aristóteles, embora Deus seja puro pensamento, ele não pode
pensar em nenhum sentido verdadeiro da palavra, porque o pensamento
consiste em pensamentos compostos. Pensar é diferenciar coisas. E porque “o
pensamento é movido pelo objeto do pensamento”,[311] a contemplação não
pode ser possível para o Deus imóvel. Consequentemente, Deus não pode
conhecer as particularidades do universo, pois só pode conhecer o que é
indivisível. Porque a única substância indivisível é Deus, Deus só pode
conhecer a si mesmo.[312]
Assim, o deus de Aristóteles, para B.A.G. Fuller (1879-1956), ex-
presidente da American Philosophical Association, “conhece apenas a si
mesmo com um conhecimento em que não há distinção entre o eu e o não-eu,
nem da ação do pensamento como tal em relação ao seu conteúdo”.[313] Fuller
continuou explicando: “Toda a vida e o pensamento de Deus estão
inacessíveis. Ele não conhece nada além disso, nada além de si mesmo”.[314]
Por essa razão, Aristóteles disse que Deus está “pensando sobre o
pensar”.[315] Ou seja, a essência de Deus não pode ser distinguida do
pensamento de Deus. Se Deus é o que ele é, então ele é aquilo que
contempla. Deus é o que ele é, sem diferenciação; então, qualquer informação
que esteja na mente de Deus é a própria essência de Deus. A pura
simplicidade, sem nenhuma diversidade inerente de qualquer espécie, leva a
essa conclusão: um Deus que não pode pensar de modo consciente.
O Problema da Revelação Divina
Já vimos, no capítulo 18, como um Deus não trinitário não teria um
motivo intrínseco para se comunicar e se revelar, porém mesmo que ele
tentasse se revelar, isso seria impossível. Sem qualquer diferenciação, o
conhecimento de Deus sobre si mesmo é inefável. Um Deus que não pode
separar um pensamento de outro pensamento só pode conhecer a si mesmo
em um ato puro, simples e indivisível. Mas com todos os detalhes removidos
da mente de Deus, o que resta? Algo completamente incognoscível. Por essa
razão, Fuller concluiu: “É como a consciência sem nada além de seu mero
nome para estar consciente e, portanto, sem sentido”.[316] E se o
conhecimento de Deus de si mesmo está vinculado a um ato puro de
pensamento, sem distinções, como ele pode falar ao homem de uma maneira
inteligível? Na melhor das hipóteses, a inconsistência encontrada no
misticismo é tudo o que resta quando o conhecimento de Deus sobre si
mesmo é indivisível e incognoscível.
O Problema da Criação
Além disso, se não houver distinção entre os pensamentos de Deus,
também não haverá distinção entre o conhecimento de Deus de si mesmo e os
atos de Deus. Se não houver distinções entre os vários atributos de Deus, os
atos criativos do poder dele devem ser eternos da mesma forma que o
conhecimento de Deus é eterno. A mente de Deus está inefavelmente unida,
sem distinções, à vontade de Deus, às emoções de Deus e aos atos do poder
de Deus. Deus não tem paixões porque não tem partes, mas também não tem
mente ou vontade. Isso significa que Deus não escolheu criar, pois sempre
esteve e permanece em um estado atemporal de criação. E porque ele é
impedido de acessar o tempo, como Aristóteles argumentou, o universo deve
ser eterno.[317]
Novamente, de acordo com essa visão de Deus, não pode haver
movimento ou ação em Deus sem haver uma distinção em sua essência. Por
consequência, isso não apenas torna o universo eterno, mas também o torna
necessário e essencial para a essência de Deus. Ou seja, se o ato de criar não
pode ser separado dos atributos indiferenciados de Deus, então o ato de Deus
de criar o universo se torna atemporal e eternamente um com a essência de
Deus. Deus e o universo são misturados, onde um se torna o outro.
Como no panteísmo monístico, a criação é uma propriedade essencial
de Deus. Deus e a criação estão eternamente unidos e inseparáveis. Isso deixa
de considerar a criação como um ato da livre vontade de Deus que está
sujeito ao tempo, para o considerar apenas como uma emanação eterna que
não pode ser separada e distinguida da essência de Deus. Para que Deus seja
quem ele é, a criação deve ser o que é — tornando Deus e o universo
necessários e essenciais um ao outro.
O Problema da Transcendência e Imanência
Se Deus é completamente incognoscível em sua essência unificada,
então ele se torna totalmente outro. No entanto, a sua transcendência está,
estranhamente, em conflito com a sua imanência, porque o universo é uma
emanação atemporal do ser de Deus. É claro que isso leva a uma evidente
contradição: Deus não pode ser ao mesmo tempo totalmente diferente e
totalmente igual ao universo.
O deus do panteísmo não é apenas um com o universo, o deus do
panteísmo deixa de ser amoroso e pessoal. Ele é um ser simples que existe de
maneira apática e bem-aventurada em um estado imóvel de pensamento puro
e indivisível de si mesmo, sem qualquer preocupação pessoal ou
contemplação dos assuntos sempre em mudança do universo que é cheio de
detalhes.
Conclusão
Pode-se argumentar que esse deus de Aristóteles não é Alá ou o deus
do judaísmo, mas é para aqui que um deus unitário/monístico puro leva. Por
exemplo, o erudito árabe-islâmico Muhyiddin Ibn ‘Arabi (1165-1240)
reduziu a “unicidade” de Deus (Tawhid) no Islã à sua conclusão lógica — o
panteísmo. Ibn ‘Arabi acreditava que a realidade única e indivisível
transcende e se manifesta simultaneamente em todas as coisas. Da mesma
forma, o filósofo judeu Baruch Spinoza fez o mesmo com o judaísmo em seu
livro Ethics.[318] E, embora muitos muçulmanos e judeus não concordem com
Ibn ‘Arabi ou Spinoza, é aqui que termina as implicações lógicas da
“unicidade” de Deus.
Se nós começarmos com a pura unidade sem nenhuma diversidade
intrínseca, a Realidade Suprema se tornará mais uma força cega,
incognoscível e impessoal do que um Deus pessoal e amoroso que permanece
distinto do universo. Um deus unipessoal, se é que pode ser definido como
uma pessoa, não pode amar, cuidar e expressar uma diversidade de emoções
porque não há diferenciação em sua essência, pensamentos ou atos. Um deus
como Alá ou o deus do judaísmo, acaba por se tornar o deus por trás de um
tipo de panteísmo. E, como já vimos no capítulo anterior, o panteísmo é uma
cosmovisão incoerente.
20

A Irracionalidade de Monismo

Já vimos a irracionalidade do panteísmo no capítulo 17. Mas, felizmente, não


ficamos abandonados apenas à luz da teologia natural — o deus de
Aristóteles. Deus se revelou para nós em sua Palavra, onde aprendemos que
ele é um Deus subsistindo em três pessoas distintas que permanecem
eternamente unidas e distintas uma da outra. Deus é pessoal, amoroso e
cuidadoso, porque há três pessoas distintas, amorosas e cuidadosas na
Divindade que interagem de forma relacional.
A Solução para as Diferenciações
Embora o Deus da Bíblia seja simples, imaterial, infinito, eterno e
imutável em sua essência, ele também é inerentemente triuno e relacional.
Isso significa que há uma distinção eterna e intrínseca entre as três pessoas da
Divindade. Deus Pai sabe que não é o Filho nem o Espírito, o Filho sabe que
não é o Pai nem o Espírito, e o Espírito sabe que não é o Pai nem o Filho.[319]
Pode haver e há distinções dentro de Deus.[320] A simplicidade de Deus
deve ser entendida à luz da diversidade encontrada na Trindade, pois é a
Trindade que abre espaço para todas as distinções importantes dentro dos
pensamentos e atos de Deus.[321]
Em outras palavras, a simplicidade de Deus não anula a sua
multiplicidade. “Para evitar a identidade em branco do panteísmo”, afirmou
Van Til, “devemos insistir em uma identidade que seja exaustivamente
correlativa às diferenciações dentro da Divindade”.[322] A natureza de Deus
consiste em seus atributos. Porque Deus não depende de nada além de si
mesmo, seus atributos não existem independentemente ou fora de Deus. Isso
significa que cada atributo é inseparavelmente necessário e essencial para os
outros atributos de Deus. Ou seja, é logicamente impossível separar ou
remover qualquer uma das características essenciais de Deus sem destruir
Deus nesse processo. Isso também significa que cada atributo descreve
adequadamente cada um dos outros atributos de Deus da mesma maneira que
cada um deles descreve Deus. Porque Deus é amor, o amor de Deus é
soberano, eterno, onisciente etc. Dessa forma, ele é um ser simples, sem
partes. Ele é o que é. Mas dizer que é sem partes e que todos os seus atributos
se correlacionam inseparavelmente não é o mesmo que dizer que Deus só tem
um único atributo sem diferenciação formal.[323] Como Deus é triuno,
diferenciações e relações formais são essenciais e necessárias em Deus.
Segundo Oliphint: “Essas distinções e relações pessoais são todas idênticas a
ele; elas não são ‘acrescentadas’ a ele ‘de fora’”.[324] Em outras palavras, as
diferenciações dentro de Deus são essenciais para quem Deus é.
Se não houvesse diferenciações formais em Deus, como Alá, o Motor
Imóvel de Aristóteles e o deus por trás do panteísmo, não haveria
fundamentos para separar os decretos de Deus dos atos dele. De fato, como
apontado no capítulo anterior, o teísmo não trinitário, em todas as suas
formas, é redutível ao panteísmo monístico.
A Solução para a Revelação Divina
Se a unicidade de Deus é suprema, todos os seus atributos devem ser
reduzidos e misturados em um único atributo, sem qualquer diferenciação. E
isso, como acontece no panteísmo monístico, tornaria Deus incognoscível. Se
Deus não puder distinguir o seu conhecimento de nenhum de seus outros
atributos, seria impossível que ele se revelasse ao homem. Por exemplo, o
que significa dizer que Deus é amor se o amor de Deus é idêntico à
onisciência de Deus? O que a onisciência de Deus significaria, se fosse a
mesma coisa que a ira de Deus? Termos que descrevem Deus deixariam de
significar qualquer coisa, se puderem significar tudo. Assim, se Deus
estivesse restrito a um único atributo, então nosso conhecimento dele não
seria conhecimento algum.[325]
Sem distinções em Deus, diz Calvino, “apenas o nome nulo e vazio de
Deus passaria pelos nossos cérebros, e não o verdadeiro Deus”.[326]
Comentando sobre isso, o teólogo de Princeton B.B. Warfield (1851-1921)
afirmou: “De acordo com Calvino, ao que parece, não pode haver um Deus
monadístico; a ideia de multiformidade está na própria noção de Deus”.[327]
Nisso, Calvino entendeu que para Deus se revelar ao homem, ele deve
ser tripessoal. Somente um Deus cuja diversidade é igualmente suprema com
sua simplicidade é um Deus que pode ser conhecido.
A Solução para os Pensamentos e as Emoções
Somente um Deus triuno pode diferenciar entre seus diferentes
atributos, seus diferentes pensamentos, suas diferentes emoções e seus
diferentes atos. Deus pode ter uma vontade de decreto e uma vontade de
comando que permite que ele desfrute de uma paz impassível no que diz
respeito ao grande esquema das coisas e emocionalmente afligido no que diz
respeito aos atos pecaminosos específicos, à medida que acontecem na
história. Como um quebra-cabeça de 1.000 peças que pode ser totalmente
construído em uma única imagem ou dividido em suas peças individuais,
Deus é capaz de ver toda a história de uma só vez e também examinar cada
evento singular separadamente. Quando ele considera o quadro histórico
completo, fica eternamente feliz. Ele está impassivelmente satisfeito com o
cumprimento de sua vontade de decreto, porque todas as coisas estão
cooperando para sua glória, conforme planejado. E Deus é capaz de examinar
as peças individuais do quebra-cabeça, independentemente do todo, e se
entristecer com elas. Ele pode ficar irado com aqueles que transgridem a sua
vontade de comando, porque, nesses momentos efêmeros, ele deixa de ser
glorificado.
A essência de Deus não muda, mas isso não significa que ele não tem
uma opinião/julgamento sobre coisas que mudam. O puritano inglês Stephen
Charnock (1628-1680) entendeu que uma mudança na manifestação das
emoções não é apenas consistente com a imutabilidade de Deus, mas é
necessária:
Deus não muda, quando, por amar qualquer criatura, fica irado com
ela, ou ao estar irado, se apazigua… Deus sempre age de acordo com
a natureza imutável de sua santidade, e não pode mudar mais as suas
afeições para o bem e o mal, do que pode mudar a sua essência…
Embora alguns anjos não permaneceram sendo amados por Deus, isso
se deu porque a mesma razão que o levou a amá-los, também o levou
a odiá-los. Isso argumentaria uma mudança em Deus se ele os tivesse
amado com amor eterno e incondicional, a despeito de qualquer
atitude que eles tivessem adotada em relação a ele.[328]
Consequentemente, Deus pode estar entristecido após a queda do
homem e ser apaziguado pela obra expiatória de Cristo na cruz, porque ele,
que controla o tempo, pode diferenciar os eventos relacionados ao tempo.
A Solução para os Relacionamentos
E a diferenciação dentro da Trindade é o que permite que Deus seja
pessoal e relacional em sua natureza. Deus é inerentemente relacional e,
portanto, pode ser amoroso e pessoal, com todas as emoções necessárias. Ele
não é meramente uma força transcendente e incognoscível de pura unidade,
mas também é um Deus que é imanentemente pessoal e relacional com
aqueles que criou. Deus não está mais limitado pelo tempo do que pelo
espaço. Embora ele não esteja limitado pelo tempo e pelo espaço, também
não está trancado no tempo ou no espaço. O Deus da Bíblia é o Senhor do
tempo e do espaço, pois está pessoalmente sempre presente em todos os
assuntos particulares deste mundo.
A Solução para um Universo Separado
A diferenciação entre Pai, Filho e Espírito é tão vital quanto a unidade
de Deus. A diferenciação intrínseca dentro de Deus é vital para impedir que a
essência de Deus entre em conflito com o universo. Isso ocorre porque a
definição igualitária de Deus não apenas permite a diversidade na unidade,
mas também explica por que um Deus imutável foi capaz de criar um
universo distinto do nada (ex nihilo).
Aristóteles acreditava que o movimento (por exemplo, o movimento
puro das estrelas) era eterno, pois todo ato de movimento dentro do universo
deve ser causado por um ato anterior de movimento, que deve ser indefinido.
Embora o movimento seja infinito, deve haver um motor primário para
impedir a inconsistência lógica de uma regressão eterna. A solução, de
acordo com Aristóteles, é que o movimento é o efeito eterno do eterno Motor
Imóvel — tornando o Deus imóvel e o universo sempre em movimento
coeterno e coessencial.
Aristóteles estava certo — a imobilidade e o movimento devem ser
eternos. Não há como contornar isso. Mas como conseguimos as duas
realidades sem tornar a criação coeterna e coessencial com Deus? Como um
Deus imóvel pode criar algo temporal, se, ao criar o universo, é necessário
um ato de movimento dentro de Deus? Como Deus pode ser imóvel, mas
capaz de se mover para criar? Em outras palavras, como podemos ter um
Deus que está acima do tempo e do espaço, mas não está trancado no tempo e
no espaço?
A única solução é encontrada no Deus triuno da Bíblia. Deus é
imutável sem se restringir a um estado estático e imóvel. Isso ocorre porque
Deus é um em sua essência e três em suas pessoas. Ele é perfeito e imutável
em sua essência (o que nos previne do teísmo aberto).[329] Contudo, nesse
imutável e eterno estado de perfeição, o Pai, como pessoa distinta, é
intrinsecamente movido a amar e glorificar o Filho, e da mesma forma o
Filho e o Espírito são movidos a amar e a glorificar o Pai. Cada um deles é
instado a compartilhar, comunicar, dar, amar e glorificar o outro pelo valor
infinito que sempre vê no outro. São internamente movidos a agir pela glória
imutável do outro. Eles estão em um estado eterno de interação e
compartilhamento da sua glória um com o outro. Ou seja, dentro da Deidade
existe um estado eterno de movimento (isto é, interação) entre as três pessoas
sem que nenhuma mudança ocorra na unidade de sua essência.
A palavra automóvel originou-se do composto de duas palavras
francesas auto, que significa si mesmo, e móvel, que significa movível.
Assim, um automóvel é algo que se move. Mas, na verdade, isso não pode ser
dito de veículos sintéticos que exigem motorista e combustível. Os veículos
não se movem. A rigor, a palavra automóvel se aplica apenas a Deus.
Somente o Deus triuno é autonomamente independente. Ao contrário do
Motor Imóvel de Aristóteles, o Deus da Bíblia não precisa do universo como
veículo de movimento. Deus não depende de nada fora de si. Deus não está
paralisado em um estado imóvel, pois ele pode agir, mover, criar e fazer o
que bem entender.
Como o Deus triuno não está impedido de ter atos de movimento
dentro de si, criar um universo separado e vinculado ao tempo não é uma
impossibilidade. A criação não precisa ser eterna. Pensar, amar, compartilhar,
comunicar e agir são habilidades intrínsecas dentro de um Deus triuno. E, de
acordo com Michael Reeves, o amor era “o motivo por trás da criação”.[330]
Como Reeves explica:
O Pai o amou [o Filho] antes da criação do mundo, e a razão pela
qual o Pai o envia é para que o amor do Pai por ele também esteja nos
outros. É por isso que o Filho sai do Pai, tanto na criação quanto na
salvação, para que o amor do Pai pelo Filho seja compartilhado.[331]
Por amor ao Filho, o Pai procurou compartilhar esse amor dando um
povo a Ele. O Filho, por amor ao Pai, concordou em redimir seu povo e
reconciliá-lo com o Pai. O amor do Espírito pelo Pai e pelo Filho o motivou a
revelar o Pai e o Filho ao povo de Deus na salvação. Deus não teve que criar,
mas por amor à sua própria glória, escolheu livremente fazê-lo (Efésios 1:3-
14). Ele escolheu compartilhar seu amor com seu povo para sua própria
glória.
A Solução para a Transcendência e a Imanência de
Deus
Como vimos, uma divindade monística é totalmente incognoscível
porque seus atributos são inteiramente idênticos um ao outro. E porque ele
não pode ser entendido por quaisquer termos ou conceitos humanos, ele é
inteiramente transcendente e inacessível.
Por outro lado, porque essa divindade monística não pode exibir atos
intencionais e temporais de poder, o universo não poderia ter surgido do
nada. Ou seja, se o universo é eterno, é impossível que tenha havido um
tempo em que não havia nada em seu lugar. Como o universo não pode ser
sua própria causa, ele deve existir eternamente como uma emanação que flui
da essência indiferenciada do Motor Imutável. Assim como a luz flui do sol,
assim também o universo flui atemporalmente de Deus. Isso significa que
Deus e o universo são um e o mesmo, pois a luz é feita das mesmas coisas
que o sol.
Consequentemente, embora Deus seja totalmente outro em sua
transcendência incognoscível, ele é um com o universo em sua imanência
ontológica. Embora isso seja uma contradição flagrante, esse é o resultado de
um Deus que é restrito de qualquer movimento temporal.
Essa inconstância óbvia, no entanto, é resolvida com segurança com o
Deus da Bíblia. Com a Trindade, há uma clara distinção Criador/criatura, já
que Deus criou o universo do nada em um determinado ponto no tempo.
Somente Deus existia antes da fundação do mundo. Não havia mais nada
além de Deus até que ele intencionalmente, pela sua palavra, trouxe o
universo à existência a partir do nada. E como o universo e Deus não
consistem na mesma substância ontológica, Deus permanece transcendente.
Mas ele também é imanente, porque não está impedido de entrar no empo e
no espaço, pois interage pessoalmente com aqueles que criou segundo sua
própria semelhança. Essa unidade e diversidade entre Deus bem como a
criação é possível apenas porque há diversidade na unidade dentro da
Divindade.
Conclusão
O Deus trinitário da Bíblia é a única solução para as questões
fundamentais da vida relacionadas à: (1.) metafísica, (2.) epistemologia e (3)
ética. E primeiro lugar, como já apontado, a metafísica está preocupada com
o que é real ou fundamental; e somente a definição igualitária da unidade e
da diversidade na Trindade pode explicar adequadamente a eternidade de
Deus e a existência do universo temporal. Em segundo lugar, o problema
epistemológico de como sabemos o que sabemos é resolvido exclusivamente
com o Deus triuno da Bíblia, capaz de se revelar ao homem. Como vimos,
todo conhecimento está enraizado na revelação de Deus, e somente um Deus
trinitário pode se revelar ao homem. Em terceiro lugar e finalmente, a ética só
pode existir se Deus for inerentemente pessoal e relacional, o que não pode
ser dito de nenhuma divindade monística. E porque o Deus multipessoal da
Bíblia é inerentemente relacional, nele temos um padrão absoluto a seguir. As
religiões não trinitárias, como o judaísmo e o islamismo, não podem dar
conta do “um e dos muitos”, a distinção entre os pensamentos e atos de Deus,
um universo temporal e padrões de justiça moral que são vitais para os
relacionamentos amorosos. Em resumo, visões de mundo não trinitárias não
podem nos dizer coerentemente (1.) o que é real, (2.) como sabemos que é
real ou (3.) como devemos viver.
Embora todas as cosmovisões não trinitárias possam ser classificadas
em três categorias: (1.) naturalismo, (2.) sobrenaturalismo impessoal e (3.)
sobrenaturalismo pessoal, elas são reduzíveis ao absurdo porque terminam no
mesmo lugar — panteísmo monístico. Peter Jones, diretor da truthXchange,
afirma com razão que existem apenas duas visões de mundo abrangentes:
“One-ism” e “Two-ism”. “One-ism”, de acordo com Jones, é a crença de que
todas as coisas compartilham a mesma essência, enquanto “Two-ism” é a
crença de que Deus e a criação possuem duas essências diferentes.[332] Como
vimos, mesmo o sobrenaturalismo pessoal não trinitário (ou seja, islã e
judaísmo) é redutível ao panteísmo monístico.
De fato, todas as visões de mundo não trinitárias, se desejam
permanecer racionalmente consistentes com suas premissas iniciais, devem
sucumbir a essa conclusão autocontraditória. Se não temos um Deus trinitário
que permaneça ontologicamente distinto da criação e capaz de revelar a
verdade ao homem, devemos concluir que a verdade, toda verdade, é
impossível de descobrir. A essência do argumento é que, sem ancorar nossas
crenças no Deus da Bíblia, o absurdo é tudo o que resta. Segundo John
Frame, todas as cosmovisões, além do cristianismo, procuram explicar…
O pessoal por meio do impessoal, todas reivindicam autonomia, todas
reivindicam encontrar fins últimos não em Deus, mas na criação,
todas oferecendo como solução para nossa situação nada mais
profundo do que obras de justiça — de fato, não há qualquer mínima
diferença entre as ideologias convencionais.[333]
Como veremos na próxima seção (parte 5), a cosmovisão bíblica é a
única autoconsistente disponível. Não é simplesmente verdade por padrão,
mas, pelo fato de a cosmovisão cristã ser verdadeira, ela passa no teste de
coerência. Portanto, acreditar na Bíblia não é dar um salto cego de fé, mas o
oposto — é a única coisa racional a se fazer.
PARTE 5

Os Fundamentos da Crença

“Vinde então, e argui-me, diz o Senhor: ainda que os vossos pecados sejam
como a escarlata, eles se tornarão brancos como a neve; ainda que sejam
vermelhos como o carmesim, se tornarão como a branca lã.” (Isaías 1:18)
21

Apoiada pela Coerência

Como um Deus todo-benevolente e todo-poderoso pode criar um mundo


repleto de tanto mal? Se Deus é bom, por que não criou um mundo eterno e
perfeito onde o mal é impossível? Se Deus quisesse, ele poderia ter feito o
homem eternamente bom. Ele poderia ter evitado a queda. Ele poderia ter
prevenido toda a tristeza, doença, crime, exploração, escravidão, tráfico
sexual, assassinatos e guerra que têm atormentado o mundo por todos esses
anos. Porém, ele não o fez. Como isso é possível? Como um Deus onisciente
e todo-poderoso ainda pode ser considerado santo, se ele conscientemente
criou um mundo como o que nós temos — um mundo cheio de maldade?
A contemplação dessa pergunta levou muitos a abandonarem a crença
em Deus. O ateísmo de C.S. Lewis foi baseado neste dilema: “Meu
argumento contra Deus era que o universo parecia muito cruel e injusto”.[334]
Isso levou o pai de John Stuart Mill a rejeitar o Deus da Bíblia. Como já
vimos no testemunho de Mill:
A rejeição de meu pai de tudo o que é chamado de crença religiosa
não era, como muitos poderiam supor, principalmente uma questão de
lógica e evidência, seus fundamentos eram morais, ainda mais do que
intelectuais. Ele achava impossível acreditar que um mundo tão cheio
de maldade era obra de um autor que combinava poder infinito com
perfeita bondade e justiça.[335]
É verdade que Lewis abandonou o ateísmo depois de contemplar
aquele dilema mais de perto. Lewis percebeu que não tinha motivos para
julgar a Deus como sendo mau porque, para início de conversa, o ateísmo não
pode dar conta das distinções morais.[336] Entretanto, permanece o dilema em
relação à cosmovisão cristã: Como um Deus bom pode criar um mundo cheio
de maldade? Supostamente é aqui onde a cosmovisão cristã desmorona.
Aqueles que usam esse argumento como um meio para atacar o
cristianismo não percebem que a solução teológica para o problema é
exatamente aquilo que resguarda a cosmovisão cristã da incoerência. A
resposta teológica para esse problema é o que torna a Bíblia coerente e
perfeitamente compatível com a ciência.
A cosmovisão naturalista dá espaço apenas para a natureza e para a
ciência e, portanto, não permanece coerente com os seus próprios
pressupostos. Nesse sistema, não somente não há espaço para distinções
morais e para dizer que algo é certo ou errado, como também não há espaço
para quaisquer absolutos imateriais. Sem absolutos imateriais, não há espaço
para a matemática e para as leis da física que sustentam a ciência. Além
disso, as várias cosmovisões impessoais-sobrenaturalistas (tais como
panteísmo, panenteísmo, monismo e dualismo) também confundem a relação
entre Deus e o universo, e assim deixam de ser coesas e confiáveis. Elas
também não conseguem explicar corretamente a injustiça moral e o mal sem
um padrão absoluto ou sem culpar a Deus no processo. O poder de Deus e as
leis da física se tornam uma e a mesma coisa. Por fim, aqueles que se apegam
ao naturalismo ou ao sobrenaturalismo impessoal não têm motivos para se
queixar do sofrimento e do mal.
Em outras palavras, nas cosmovisões não trinitárias, em última análise,
não existe o bem ou o mal. A cosmovisão cristã, por outro lado, abre espaço
tanto para Deus como para a natureza, para o sobrenatural e para o natural,
para a metafísica e para a física, para a religião e para a ciência, para Deus e
para o homem, para as causas primárias e para as causas secundárias. Os dois
reinos não se confundem nem se misturam, pois em seu relacionamento um
com o outro, Deus e o universo permanecem unidos, mas distintos. Por essa
razão, o poder sobrenatural de Deus é perfeitamente compatível com as leis
da natureza, e essa é a beleza da cosmovisão cristã. É isso que lhe permite ser
coerente consigo mesmo. Por causa disso, Deus permanece perfeitamente
bom e todo-poderoso, enquanto o homem é totalmente responsável por suas
próprias transgressões. Há um Deus todo-poderoso e todo-benevolente que
responsabilizará os homens por toda a injustiça, sofrimento e crimes que têm
transtornado o mundo.
Deus é Bom
Deus é bom em sua natureza (Jeremias 12:1), em sua lei (Salmos 19:7-
11), em suas obras (Salmos 145:17), em seus juízos (Salmos 119:137) e em
suas misericórdias (Romanos 3:21-26). Deus é bom porque ele busca a sua
própria glória em todas as coisas (Colossenses 1:16-18). Cada pessoa da
Trindade ama perfeitamente as outras pessoas da Divindade. Cada uma
glorifica as outras acima de tudo (João 17:5-32). Porque nada é maior do que
a glória de Deus, para que Deus seja bom ele deve buscar a sua própria glória
acima de todas as coisas. Não glorificar o ser mais glorioso é ficar aquém da
glória de Deus. Cada uma das três pessoas da Trindade busca glorificar as
outras. Deus ama a humanidade, mas não acima da sua própria glória — é
por isso que Deus é bom.
Os motivos são importantes, mesmo no que diz respeito a Deus. Tudo
que Deus faz é bom porque tudo o que ele faz é feito para a sua própria
glória. O principal motivo por trás de cada ação do Pai, do Filho e do Espírito
Santo é glorificarem-se uns aos outros. Deus criou o universo para a sua
própria glória: “Todas as coisas foram criadas por ele e para ele”
(Colossenses 1:16). Ele salva os pecadores para a sua própria glória (Isaías
43:7; Efésios 2:6-7). E ele responde as nossas orações para a sua própria
glória (João 14:13). Até o pecado é permitido porque indiretamente trará
glória a Deus (Salmos 76:10). Então, quando pensamos na bondade de Deus,
devemos lembrar que a sua bondade não deriva principalmente do seu amor
pelo homem (embora ele ame o homem), mas do seu amor por si mesmo, ou
de outra forma, Deus deixaria de ser bom.
Deus é Todo-Poderoso
Além de ser bom, Deus é onipotente. Ele é absolutamente soberano.
Ele controla tudo, desde os fios de cabelos em cada uma de nossas cabeças
(Mateus 10:30) até o tempo em que cada pequeno pardal cairá em terra
(Mateus 10:29). Ele controla a ascensão e a queda das nações do mundo
assim como o levantar voo e a queda dos passarinhos (Daniel 2:21). Deus
determina quando e onde cada um de nós nasce neste mundo (Atos 17:26); e
ele determina quando cada um de nós irá partir deste mundo (Hebreus 9:27).
Ele diz ao mar até onde ele deve ir e a partir de onde não ultrapassará (Jó
38:11). Ele veste os lírios do campo e alimenta os leões no deserto (Lucas
12:27; Salmos 104:21). Ele controla o coração de todos os homens, pois até o
coração do rei está nas mãos do Senhor, e ele o inclina para onde quer
(Provérbios 21:1). Ele se compadece de quem quer e endurece a quem quer
(Romanos 9:18). Nem uma única folha é soprada ao vento senão em
obediência ao conselho eterno e predeterminado de Deus. Deus determina
tudo o que acontece na história, pois o seu conselho permanecerá firme.
Ninguém pode dizer a ele: “O que fazes?” (Daniel 4:35). Pois o oleiro não
tem o direito de fazer o que ele quer com o seu próprio barro (Romanos
9:21)? E o martelo tem o direito de dizer àquele que o utiliza: “Não me
manuseie assim” (Isaías 10:15)? Claro que não. Ele é Deus e faz todas as
coisas de acordo com a sua própria vontade (Salmos 115:3; Efésios 1:11).
Deus deixaria de ser Deus, se ele deixasse de estar no controle de todas as
coisas.
A soberania de Deus assegura que tudo coopera para a sua própria
glória. Embora nem todos os atos em e de si mesmos, tais como o pecado,
tragam glória a Deus, eles cooperam para realizar um propósito maior. Tudo,
incluindo Adolf Hitler e os terríveis crimes de Lênin, Stalin e Pol Pot, trará
louvor a Deus, ou então Deus não teria permitido que tais calamidades
ocorressem. Os planos perversos do homem serão todos frustrados e
transtornados antes que tudo seja dito e feito, a fim de que o nome do Deus
todo-sábio, todo-bom e todo-poderoso seja exaltado. Qualquer coisa menos
do que um Deus todo-poderoso não poderia conduzir as coisas, incluindo o
mal, a uma conclusão gloriosa.
Compatibilidade
Mas isso nos leva de volta ao nosso suposto dilema: se Deus é bom e
soberano, como então ele não é o responsável por todo o mal que há no
mundo? Devemos lembrar também que na cosmovisão cristã, Deus é ao
mesmo tempo transcendente e imanente. Ao contrário do panteísmo, Deus
não é um só com o universo. Se esse fosse o caso, então o mal poderia ser
diretamente atribuído às ações de Deus. Por outro lado, Deus não abandonou
ou deixou o universo entregue a si mesmo, ao contrário do deísmo — onde o
mal não possui qualquer propósito maior. Isso tornaria Deus negligentemente
irresponsável.
Apenas a cosmovisão bíblica tem a resposta para o porquê de haver mal
no mundo. Porque Deus está no controle de todas as coisas, o mal coopera
com todos os outros eventos na história para a glória de Deus e para o bem
daqueles que o amam. De acordo com as Escrituras, Deus não controla todas
as coisas diretamente. Ele controla o universo, mas ele não é um só com o
universo. Ele delegou e investiu uma medida do seu poder na própria
natureza. O universo físico é organizado segundo as leis naturais; e os seres
humanos foram dotados com o poder e a vontade de escolher entre o certo e o
errado. Em outras palavras, Deus controla as leis da natureza e as ações livres
dos homens, mas ele não é um só com essas coisas. Deus criou o universo
para operar de uma forma ordenada e precisa, e criou o homem para agir de
acordo com a sua natureza humana. Como a gravidade faz o que a gravidade
faz, e os cães fazem o que os cães fazem, assim os homens agirão do modo
como os homens agem. A natureza funcionará de acordo com as suas leis
estabelecidas, e as criaturas — incluindo os humanos — funcionarão de
acordo com as suas naturezas criadas.
Assim, de acordo com as Escrituras, Deus governa todas as coisas de
acordo com o seu próprio conselho e propósito, mas o faz de uma forma que
não viola as leis da natureza e nem a vontade homem. Como explica o
teólogo batavo-americano Louis Berkhof (1873-1957): “No mundo físico ele
estabeleceu as leis da natureza, e é por meio dessas leis que ele administra o
governo do universo físico”.[337] Assim, o poder direto de Deus e os poderes
indiretos da natureza trabalham e cooperam sem mistura e confusão. Deus e
as leis da natureza (religião e ciência) não são a mesma coisa, mas são
perfeitamente compatíveis um com o outro. Teologicamente falando, isso é
conhecido como concorrência, que Berkhof define da seguinte forma: “A
concorrência pode ser definida como a cooperação do poder divino com
todos os poderes subordinados, de acordo com as leis pré-estabelecidas do
seu funcionamento, levando-os a agir e a agir exatamente como agem”.[338]
Apesar de Deus ter anulado as leis da natureza em algumas ocasiões
especiais, como quando ele fez o ferro de um machado flutuar na água (2
Reis 6:6), ele, normalmente e quase sempre, utiliza as leis da natureza para
realizar os seus propósitos. Isso isenta Deus de ser moralmente responsável
pelo mal, mas também evita que o mal prejudique e frustre os seus propósitos
eternos. Além disso, isso significa que o homem não é uma máquina; as leis
impessoais da física não determinam a sua vontade. “A atividade divina”,
segundo Berkhof, “acompanha a ação do homem em todas as suas direções,
mas sem que com isso, de algum modo, a liberdade do homem seja
despojada”.[339] Isso significa que Deus é soberano e que o homem é
responsável.
O homem foi originalmente criado inocente, mas devido a sua própria
vontade, ele caiu do seu estado original (Eclesiastes 7:29). Por essa razão,
Deus não é o autor do pecado, pois o mal é derivado do coração do homem
(Tiago 1:13-14). O homem é responsável por se afastar de Deus. Embora
Deus o tenha permitido, de forma alguma Deus incitou, tentou ou estimulou o
homem a abandonar a sua posição original de inocência.
Uma vez que o homem escolheu deixar o seu estado original de retidão,
a sua natureza original foi desfigurada. Ele foi criado à imagem de Deus, mas
essa imagem foi manchada quando ele não mais amou a Deus com todo o seu
coração. Ele não podia mais amar a Deus porque não queria mais ama-lo —
agora, o amor a si mesmo era o fator dominante no coração do homem. O
homem continuou livre para fazer o que queria, mas isso também significava
que estava obrigado a fazer apenas o que queria. Porque o homem havia se
tornado escravo da sua própria natureza pecaminosa, era impossível para ele
agradar a Deus (Romanos 8:5). Como uma fonte contaminada não pode
produzir água doce ou uma árvore má, dar bons frutos, um homem depravado
não amará a Deus mais do que a si mesmo. Como o leopardo não pode mudar
as suas manchas, um homem egoísta jamais se entregará completamente a
Deus (Jeremias 13:23).
Por si mesmo, o homem abandonou Deus, e agora jamais poderá ir a
Deus por si mesmo. O homem caído sempre se afasta da glória de Deus.
Porque mesmo os melhores atos do homem não são feitos para a glória de
Deus, ele, por sua vez, considera esses atos como pecaminosos (Romanos
3:23). Assim como a metanfetamina atrai o viciado para o vício, o amor
próprio atrai as almas depravadas para o comportamento egoísta e
pecaminoso. O homem está continuamente indo para baixo, descendo em
espiral, fora de controle. Assim como a gravidade atrai os objetos para baixo,
assim também o coração do homem o afasta de Deus.
Embora o egoísmo afaste o homem de Deus, Deus permanece no
controle sobre o egoísmo dos homens. A natureza do homem o puxa para
baixo, mas apenas até o nível ou grau em que Deus permite. Como os
cadeados e os agentes da lei proíbem que muitos crimes aconteçam, assim
Deus tem soberanamente colocado muitas restrições exteriores sobre a raça
humana para impedir que a sociedade afunde completa e descontroladamente.
A consciência do homem, a estrutura familiar, os governos, a aceitabilidade
social, os agentes policiais e muitas outras coisas do tipo mantêm a
depravação sob controle. Deus controla as restrições e, assim, indiretamente
controla o grau em que o homem é capaz de cair em pecado.
Somente em juízo Deus remove a sua mão restringidora e entrega as
pessoas a si mesmas. A sua justiça é revelada do céu cada vez que ele entrega
as pessoas às suas próprias iniquidades (Romanos 1:18). Como Paulo
explicou, a consequência do pecado é Deus remover as suas restrições
exteriores e entregar o homem aos seus próprios desejos pecaminosos. Isaías
também entendeu isso. Em sua oração a Deus, Isaías clamou: “E já ninguém
há que invoque o teu nome, que se desperte, e te detenhas; porque escondes
de nós o teu rosto, e nos fazes derreter, por causa das nossas iniquidades”
(Isaías 64:7).
Assim, o pecado é o castigo justo pelo pecado. Se nós não queremos
viver para Deus, então Deus justamente dá um passo para atrás e nos entrega
a nós mesmos. Por causa do pecado, Deus nos dá o que queremos — mais
pecado. Deus não nos empurra para o pecado; ele simplesmente nos entrega
aos nossos desejos e nós afundamos por nossa própria vontade. Nós pecamos
de livre e espontânea vontade. Quanto mais avançamos no caminho da
injustiça, mais Deus nos entrega a nós mesmos (Romanos 1:24, 26, 28). Não
há limite para onde o pecado nos levará. E, se deixados sozinhos, nunca
buscaremos a Deus, antes somente nos afastaremos cada vez mais dele (João
6:44).
Pelo fato de que o pecado se origina no interior do nosso próprio
coração, somos totalmente responsáveis; porque Deus controla as restrições e
nada ocorre sem a sua vontade permissiva, não podemos pecar a menos que
Deus o permita, removendo as suas restrições. Além disso, porque ele é bom,
ele só permite aquilo que lhe trará glória (Salmos 76:10). Felizmente, não há
um único pecado aleatório que não será utilizado para o bem. Assim, Deus
permanece soberano sobre o pecado, enquanto nós permanecemos totalmente
responsáveis.
A soberania de Deus e a responsabilidade do homem podem ser vistas
em cada ato de maldade, porém são mais claramente reveladas no maior mal
que já ocorreu na história da humanidade: a morte de Jesus. Encarando os
judeus, o apóstolo Pedro teve a ousadia de dizer: “A este que vos foi entregue
pelo determinado conselho e presciência de Deus, prendestes, crucificastes e
matastes pelas mãos de injustos” (Atos 2:23).
Essa é uma acusação surpreendente, pois Pedro reconheceu que Cristo
era o Cordeiro morto antes da fundação do mundo quando disse que ele foi
“entregue pelo determinado conselho e presciência de Deus”. Se Pedro
reconheceu isso, então por que ele não culpou a Deus pela morte de Cristo?
Como Pedro pode afirmar que Deus ordenou a morte de Cristo, e depois se
virar e culpar os judeus por matá-lo, quando disse: “prendestes, crucificastes
e matastes pelas mãos de injustos”? Em outras palavras, como Deus pode ser
bom e permitir que tal mal — o ato mais maligno de todos — aconteça?
Isso não torna Deus mau e a cosmovisão cristã incoerente? Não, de
modo algum. Pois a resposta se encontra nos diferentes motivos e razões por
trás das ações de Deus e das ações do homem. Da parte de Deus, Ele ordenou
a morte do Seu único Filho por amor ao seu povo e para manter a sua própria
justiça. Deus estava executando a sua justiça pelo pecado quando ele
derramou a sua ira sobre Cristo na cruz. Portanto, Deus não pode ser acusado
de assassinato ou de culpa, pois o propósito de Deus era condenar o pecado e
manter a sua própria lei moral. Deus estava se certificando de que a sua
bondade e a sua justiça fossem preservadas enquanto provia a salvação para
pecadores culpados. Isso é glorioso. O propósito eterno de Deus ao enviar o
seu Filho para morrer pelos pecadores é trazer glória e louvor para si mesmo.
Os judeus, por outro lado, não tinham motivos puros semelhantes quando
entregaram Cristo para ser executado pelos Romanos. Eles o assassinaram.
Eles não buscavam nem a justiça nem a glória de Deus, pois agiram
motivados por inveja e ódio (Marcos 15:10).
Assim, nesse ato singular na história, podemos observar a mão
soberana de Deus e as ações livres dos homens que ocorrem sem mistura e
confusão. Os judeus cometeram pecado enquanto Deus punia o pecado.
Como quando os irmãos de José o venderam como escravo para cumprir o
propósito de Deus de salvar muitas pessoas da fome, o que os judeus
intentaram para o mal, Deus intentou para o bem (Gênesis 50:20).
Dessa forma, vemos a soberania de Deus governando todas as coisas —
até mesmo os atos maus dos homens — para a sua própria glória e para o
bem daqueles que o amam (Romanos 8:28). Quando Deus remove as suas
restrições, Ele o faz por justiça; quando os homens caem em pecado, eles são
totalmente culpáveis.
Conclusão
Consequentemente, se há algo bom ou louvável no universo, então a
glória por isso pertence somente a Deus. A culpa pelas corrupções e
crueldades que têm afligido a raça humana ao longo da história do mundo é
somente nossa. Assim, tanto a soberania de Deus quanto a liberdade da
vontade do homem impedem que o mundo não tenha sentido, pois o poder de
Deus proíbe que a história seja destituída de propósito, e nossa vontade
proíbe que nossas vidas sejam predeterminadas pelas leis da física, e,
portanto, também sejam sem propósito. Somente dentro da cosmovisão
bíblica os poderes sobrenaturais e naturais são perfeitamente compatíveis uns
com os outros. Somente a cosmovisão bíblica salva o mundo da falta de
sentido.
22

Apoiada pela Razão e pela Evidência

Porque a cosmovisão cristã dá lugar ao poder de Deus e às leis da natureza,


ela é apoiada tanto pela revelação natural como pela revelação especial.
Porque Deus criou o universo, a razão e o conhecimento científico apontam
de volta para o Deus da Bíblia, e o Deus da Bíblia coincide perfeitamente
com as leis da lógica e as descobertas legítimas da ciência.
Como veremos no capítulo seguinte, por causa do nosso conhecimento
inerente de Deus e da natureza autoverificadora da Sagrada Escritura, não
precisamos de argumentos racionais ou evidências empíricas para crer no
Evangelho de Jesus Cristo; mas antes, porque o Evangelho é verdadeiro, ele é
verificável pela argumentação lógica e pelas evidências históricas e
empíricas. Além disso, a cosmovisão bíblica é o único sistema de pensamento
que pode ser vivido sem contradição.
Apoiada pela Razão
Os argumentos cosmológicos, teleológicos e ontológicos são todos
argumentos válidos dentro da cosmovisão cristã. O argumento cosmológico
diz que toda causa tem um efeito, e porque nada no universo está sem
movimento, o universo deve ter uma causa exterior. Também, tudo que tem
um design, como relógios de bolso, canivetes de bolso e os próprios bolsos,
deve ter um designer. Isso logicamente implica que o universo também deve
ter um designer, já que ele apresenta um design, e esse é o argumento
teleológico.
O argumento ontológico baseia-se no princípio lógico de que algo que é
maior não pode ser produzido por algo que é menor.[340] Nesse contexto,
diríamos que algo maior do que as nossas capacidades de conceber não
poderia ter sido inicialmente concebido por nós. Por exemplo, podemos
muito bem ser capazes de imaginar a ilha perfeita, o que significa que os
nossos poderes de imaginação e pensamento devem ser maiores do que essa
ilha perfeita. Nesse caso, a ilha perfeita não necessariamente existe. Contudo,
a ideia de Deus, um ser infinito e supremamente perfeito, é um pensamento
demasiado grande para que uma mente finita e imperfeita possa conceber
pelos seus próprios poderes. Em outras palavras, se Deus não existisse, seria
impossível que nossas mentes finitas tivessem criado uma ideia tão infinita e
perfeita da mesma forma que seria impossível que o Castelo de
Neuschwanstein tivesse sido construído com um único tijolo.
Dentro da cosmovisão bíblica, na qual o conhecimento de Deus, a
lógica e a moralidade são pressupostos básicos, esses argumentos racionais
fazem sentido. Na verdade, como temos procurado demonstrar, a cosmovisão
cristã é a única cosmovisão coerente, e só ela passa no teste da razão. Isso é
verdade, por causa da impossibilidade do contrário.
Apoiada pela Evidência Científica
Porque os politeístas da Grécia antiga confundiam o(s) poder(es)
sobrenatural(is) com as leis da natureza, eles eram propensos a pensar que
seus deuses estavam diretamente por trás de eclipses solares e de outras
ocorrências incomuns. Contudo, o cristianismo não é politeísta. Os cristãos
acreditam em causas secundárias. Quando os ateus criticam tal pensamento
(que parece ser o seu argumento principal), eles estão criticando o politeísmo
e não o cristianismo. No cristianismo, Deus e a criação são entidades
distintas.
Muito antes da revolução científica e das descobertas de Copérnico,
Galileu e Newton, os cristãos entendiam o ensino das Escrituras de que o
universo operava de acordo com as leis da natureza. Agostinho de Hipona
(354-430), por exemplo, acreditava que a lua influenciava as marés e ele
creditou eclipses solares às “leis fixas do curso do sol” e não a qualquer
poder sobrenatural direto.[341] Agostinho distinguiu o cristianismo do
panteísmo grego em A Cidade de Deus quando defendeu a importância das
causas secundárias.
Adoramos o Deus que tem designado para as naturezas, por ele
criadas, tanto o início como o fim de suas existências e ações; ele
sustenta, conhece e dispõe as causas das coisas; ele criou a virtude
das sementes… ele criou e governa o fogo mais veemente e violento
desse mundo, em devida relação e proporção com os outros
elementos da imensa natureza; ele é o governador de todas as águas;
que fez do o sol a mais brilhante de todas as luzes materiais, e lhe deu
poder e movimento adequados… Portanto, ele governa todas as
coisas de modo que lhes permite realizar e exercer os seus próprios
movimentos.[342]
O Deus de Agostinho não era um deus de lacunas — um deus que só é
necessário para explicar o inexplicável. Deus não é necessário para preencher
as brechas restantes do conhecimento científico, o que faria dele um deus que
será lentamente espremido para fora da existência à medida que o
conhecimento científico aumenta. O deus das lacunas não é o deus da Bíblia.
Ao contrário, o Deus da Bíblia é necessário para explicar até mesmo o porquê
da existência das leis da natureza. Deus explica porque há uma estrutura
geométrica que governa as leis da natureza, e nenhuma outra explanação
pode explicar tal ordem.
Os cristãos entendem que existe um universo ordenado porque existe
um criador ordenado que sustenta o universo de acordo com as leis da
natureza. Como Lennox alegou: “No coração de toda a ciência está a
convicção de que o universo é ordenado. Sem essa convicção profunda, a
ciência não seria possível”.[343] Lennox citou o Prémio Nobel de bioquímica
Melvin Calvin na sua explicação sobre a origem dessa convicção:
Ao tentar discernir a origem dessa convicção, parece que a encontro
numa noção básica descoberta há 2.000 ou 3.000 anos, e anunciada
em primeiro lugar no mundo ocidental pelos antigos hebreus, a saber,
que o universo é governado por um único Deus, e não é produto dos
caprichos de muitos deuses, cada um governando a sua própria
província de acordo com as suas próprias leis. Essa visão monoteísta
parece ser o fundamento histórico da ciência moderna.[344]
Na verdade, um milagre deixaria de ser um milagre, se os cristãos não
acreditassem nas leis da ciência. Uma vez que os cristãos começam por
pressupor o Deus da Bíblia, eles não têm problemas com a crença em eventos
sobrenaturais, como os milagres e a ressurreição de Cristo, e também não têm
nenhum problema com a ciência. Não há nada de errado com o conhecimento
científico. Os cristãos não estão em guerra com a ciência. Eles não estão em
guerra com as leis da natureza. Muitos dos grandes cientistas do passado
eram cristãos devotos — sendo Newton o principal entre eles. Os cristãos
podem agradecer a Deus por um universo ordenado que nos permite aprender
com as nossas experiências passadas e nos ajuda a planejar o futuro. Um
Deus transcendente e iminente, cujo governo soberano é perfeitamente
compatível com as leis da física, nos fornece uma base perfeita para todo o
nosso conhecimento empírico e racional.
Considerando que toda a verdade vem através de revelação geral e
especial, as verdades científicas e bíblicas não estão em desacordo umas com
as outras. Ou seja, como o filósofo inglês Francis Bacon (1561-1626)
sustentou no passado, o livro da palavra de Deus não está em conflito com o
livro das obras de Deus. Como disse Charles Hodge: “Tudo o que as
Escrituras ensinam sobre o mundo exterior está de acordo com os fatos da
experiência”.[345]
O cristianismo não está em guerra com a ciência, nem a ciência está em
guerra com o cristianismo, de acordo com Richard Swinburne. Ele acredita
que a evidência científica de um universo ordenado só pode ser entendida
quando Deus é pressuposto. Não está além do domínio da ciência postular a
existência de algo que não é verificável pela percepção dos sentidos (como a
gravidade) para dar sentido à evidência em questão.[346]
Por exemplo, Newton não descobriu a gravidade ao observar as suas
propriedades imateriais. Isso porque a gravidade é uma força invisível que
não pode (em si mesma) ser observada. Embora Newton não pudesse dar
nenhuma evidência empírica direta para a sua existência, concluiu que uma
força invisível, como a gravidade, deve ser pressuposta, se quisermos dar
algum sentido racional aos movimentos dos planetas e aos objetos que caem
em direção ao chão. De acordo com Newton, a gravidade é a melhor
explicação para os movimentos dos corpos celestiais.
Além disso, uma vez pressuposta a força da gravidade, foi possível
localizar Netuno antes da sua descoberta em 1846. Ao observar o movimento
de Urano, os astrônomos notaram uma perturbação em um certo ponto da sua
órbita. Parecia que, além do sol, outra grande massa estava atraindo-o. A
única hipótese que poderia explicar a irregularidade na órbita de Urano era a
força gravitacional de um planeta desconhecido. Por esse meio, sem qualquer
confirmação sensorial direta, a existência, tamanho básico e localização de
Netuno foram previstos.
Da mesma forma que a gravidade é necessária para dar sentido ao
movimento dos planetas, Deus é necessário para dar sentido a um universo
ordenado. Newton entendeu que para a ciência funcionar era necessário que
houvesse um Deus: “A gravidade explica os movimentos dos planetas, mas
não pode explicar quem põe os planetas em movimento”.[347]
Segundo Swinburne, embora não haja evidência sensorial direta para a
existência de um Deus invisível e incorpóreo, a evidência física de um
universo ordenado o pressupõe. “O ponto de partida do teísta”, de acordo
com Swinburne, “não é que percebamos ordem em vez de desordem, mas que
essa ordem existe, em vez de desordem”.[348] Que hipótese pode fazer sentido
para tal ordem? Só quando pressupomos Deus temos uma explicação que
faça sentido. O teísmo “nos leva a esperar encontrar as coisas que
encontramos — quando de outra forma não esperaríamos encontrá-las”.[349]
Se existe um Designer Inteligente, então a ordem e o design do universo é o
que esperaríamos encontrar. Novamente ele diz: “A hipótese do teísmo é uma
hipótese simples que nos leva a esperar esses fenômenos observáveis, quando
nenhuma outra hipótese o faria”.[350] Por essa razão, Swinburne concluiu que
Deus existe: “Porque o teísmo satisfaz bem os critérios, a existência e o
comportamento regular dos objetos materiais, ele fornece boas evidências
para a existência de Deus”.[351]
Da mesma forma, Stephen Meyer explica que a inteligência é a única
explicação científica para as informações específicas dentro das células vivas.
[352]
Dado o critério usado pelos cientistas históricos para explicar eventos
passados, Meyer pergunta: “Que causas que estão em operação agora
produzem um código digital ou informação específica?”.[353] A resposta
óbvia, de acordo com Meyer, é a inteligência: “Porque temos evidências
independentes — ‘experiência uniforme’ — de que agentes inteligentes são
capazes de produzir informação específica. A atividade inteligente é
conhecida por produzir o efeito em questão. A ‘criação de nova informação
está habitualmente associada à atividade consciente’”.[354] No entanto, de
acordo com Meyer, uma mente inteligente não é apenas uma explicação; é a
única explicação científica.
Em primeiro lugar, não há “nenhuma outra explicação causalmente
adequada” para a linguagem semântica codificada no DNA.[355] “Processos
químicos aleatórios não produzem grandes quantidades de informação
específica a partir de antecedentes puramente físicos ou químicos”.[356]
Em segundo lugar, a evidência experimental confirma a adequação
causal de uma Mente Inteligente.[357]
Em biologia, onde a sobrevivência diferencial depende da
manutenção da função, a seleção não pode ocorrer até que novas
estruturas ou sequências funcionais surjam de fato. A seleção natural
não pode selecionar uma sequência ou estrutura não funcional com
base no “conhecimento” do que pode vir a ser útil no futuro, ou
enquanto aguarda alterações adicionais… Os poderes causais que
faltam à seleção natural — previsão e criatividade — são atributos da
consciência e da racionalidade, de uma inteligência dotada de
propósito.[358]
Em terceiro lugar, “a mente inteligente é a única causa conhecida de
informação especificada”.[359] “Causas materialistas aleatórias”, diz Meyer,
“não demonstraram a capacidade de gerar quantidades significativas de
informação específica. Enquanto a inteligência consciente tem repetidamente
se mostrado capaz de produzir tais informações”.[360] A partir disso, Meyer
conclui dizendo: “Como a inteligência é a única causa conhecida de
informação específica (pelo menos a partir de uma fonte não biológica), a
presença de sequências especificadas rica em informação até mesmo nos
sistemas vivos mais simples aponta definitivamente para a existência e para a
atividade passada de uma inteligência dotada de propósito”.[361]
Conclusão
Alvin Plantinga está certo quando diz que não há conflito entre a
ciência e o teísmo. A lei natural e o cristianismo sobrenatural são
perfeitamente congruentes. O verdadeiro conflito, segundo Plantinga, é entre
a ciência e o naturalismo.[362] Não precisamos de Deus para explicar como as
causas secundárias cooperam dentro do universo, precisamos de Deus para
explicar, em primeiro lugar, porque existe tal coisa como causas secundárias.
Por que existe um universo ordenado que torna a ciência possível? As
evidências nos apontam para a única resposta plausível: Deus.
23

Apoiada pelo Registro Histórico

A cosmovisão bíblica não é apoiada somente pela razão e pela evidência


científica, mas também é verificada pelas evidências históricas. O
cristianismo não é apenas um dogma teórico ou um sistema filosófico de
pensamento, mas a crença na vida real, em eventos históricos que
aconteceram no tempo e no espaço. O nascimento, vida, milagres, morte,
ressurreição e ascensão de Cristo, que são essenciais para o Evangelho, não
foram eventos secretos feitos em algum lugar obscuro e desconhecido. Não,
essas coisas aconteceram pública e notoriamente. Cristo foi uma figura
histórica, e isso está bem documentado. O apóstolo João dá seu próprio
testemunho pessoal acerca da existência dele:
O que era desde o princípio, o que ouvimos, o que vimos com os
nossos olhos, o que temos contemplado, e as nossas mãos tocaram da
Palavra da vida. (Porque a vida foi manifestada, e nós a vimos, e
testificamos dela, e vos anunciamos a vida eterna, que estava com o
Pai, e nos foi manifestada)” (1 João 1:1-2).
Os milagres de Cristo, que testemunharam o poder divino e a
veracidade dele, foram feitos de modo que todos puderam vê-los. Mais de
500 pessoas o viram depois que ressuscitou dentre os mortos (1 Coríntios
15:6). O túmulo vazio provou que ele era quem disse ser: o Filho de Deus.
Jesus Cristo não somente ressuscitou a si mesmo dentre os mortos, Ele
ensinou aos outros sobre essa realidade. Portanto, se não voltou a viver, então
ele é verdadeiramente a maior fraude que já existiu. Mas os Seus seguidores
mais próximos estavam convencidos da sua ressurreição. Eles estavam tão
convencidos da ressurreição de Cristo que se dispuseram a morrer por ele —
De fato, muitos deles deram as suas vidas por ele. Por que Pedro, Paulo e
João estariam dispostos a morrer por algo que sabiam que era mentira? Cristo
tinha mais de 8.000 seguidores passados apenas alguns meses após a sua
ressurreição. Isso seria impossível, se as evidências não reforçassem as
alegações de Cristo. Até Saulo de Tarso, que não queria acreditar, não só
parou de perseguir os seguidores de Cristo, mas se tornou o principal
defensor de Cristo depois de ter visto o Senhor ressuscitado.
Em The Resurrection of the Son of God (A Ressurreição do Filho de
Deus), N.T. Wright, ex-bispo de Durham, forneceu uma apologética
definitiva sobre a historicidade da ressurreição corporal de Cristo. Todos os
críticos da História Pascal que desejam ser levados a sério serão forçados a
interagir com essa obra maciça e formidável. Após uma revisão minuciosa e
quase meticulosa da literatura antiga sobre a ressurreição, desde Hades de
Homero aos Pergaminhos do Mar Morto, Wright concluiu que a História da
Páscoa não é o que esperaríamos se fosse apenas uma invenção fabricada ou
uma corrupção posterior do texto original. Pelo menos quatro detalhes
incomuns são registrados nas histórias dos Evangelhos que não fariam
sentido, se elas não fossem reais.
“A primeira surpresa”, diz Wright, “quando lemos as histórias da
ressurreição nos Evangelhos canônicos deve ser que elas são contadas
praticamente sem os adornos da tradição bíblica”.[363] “A segunda
característica das narrativas da ressurreição que deve causar considerável
surpresa também tem a ver com algo que lhes falta”,[364] Wright explicou,
“que em nenhum momento elas mencionam a esperança futura do cristão”.
[365]
Quase sempre que Paulo ou os outros apóstolos falam da ressurreição de
Cristo, eles a vinculam à esperança dos crentes em vencer o poder da
sepultura. Se os Evangelhos tivessem de alguma forma sido modificados
posteriormente (como alguns têm sugerido), é estranho que eles não se
assemelhem às histórias da ressurreição narradas por Paulo e Pedro. O
terceiro detalhe incomum é que as histórias evangélicas sobre a ressurreição
de Cristo não são influenciadas por nenhum dos textos importantes sobre a
ressurreição do Antigo Testamento. Os judeus do primeiro século
acreditavam que aqueles que Deus ressuscitaria dos mortos sairiam do
túmulo brilhando como estrelas celestiais (Daniel 12:2-3). Os corpos
ressuscitados eram considerados brilhantes ou luminosos. Embora essa fosse
a antiga crença judaica, os Evangelhos não retratam a ressurreição de Cristo
de tal maneira. Isso não é “o tipo de coisa que se esperaria se os evangelistas
ou suas fontes tivessem desejado afirmar que Jesus tinha sido exaltado a uma
posição de divindade ou de glória celestial”.[366] O quarto detalhe, que não
teria sido admitido, se a ressurreição de Cristo fosse uma simples invenção, é
a presença de mulheres no túmulo vazio. Isso porque o testemunho das
mulheres naqueles dias não era considerado válido em um tribunal de justiça.
“Francamente, é impossível imaginar que elas foram inseridas na tradição
depois da época de Paulo”.[367] Wright continuou a explicar:
Mesmo que suponhamos que Marcos tenha inventado a maior parte
do seu material, e que isso tenha acontecido no final dos anos 60, no
mínimo, seria inútil que ele, ou qualquer outra pessoa, inventasse uma
lenda apologética sobre um túmulo vazio e colocar mulheres como
testemunhas. Esse ponto tem sido repetido inumeráveis vezes na
academia, mas o seu pleno impacto nem sempre tem sido sentido: as
mulheres simplesmente não eram aceitáveis como testemunhas
legítimas. Podemos lamentar, mas era assim que o mundo judeu (e a
maioria dos outros povos) funcionava. O debate entre Orígenes e
Celso mostra que os críticos do cristianismo poderiam aproveitar a
história das mulheres para zombar de toda essa história; será que os
escritores das lendas eram realmente tão ignorantes sobre essa
provável reação? Se eles pudessem ter inventado histórias de
testemunhas masculinas de boa reputação e credibilidade, como as
que primeiro chegaram ao túmulo, eles teriam feito isso.[368]
Wright concluiu dizendo: “Se você tentar imaginar três dessas pessoas
fazendo isso de forma independente e chegando a três histórias diferentes,
ainda que todas compartilham dessa característica notável, além das outras
que citamos, eu penso que você o consideraria incrível. Eu certamente
considero”.[369] A única razão aparente para os Evangelhos registrarem esses
detalhes incomuns é o fato de que eles realmente aconteceram na história.
Não apenas detalhes improváveis são registrados nos Evangelhos, dos
quais os primeiros manuscritos datam do segundo século,[370] mas a vida de
Cristo é testemunhada por muitos textos não canônicos, como do historiador
judeu Flávio Josefo (37-120 d.C.). No ano 93, Josefo publicou uma história
do povo judeu na qual ele testificava da vida de Cristo:
Nesta época vivia Jesus, um homem sábio, se é que se deve chamar-
lhe homem. Pois ele foi um homem que realizou atos maravilhosos e
foi um mestre de pessoas que aceitam a verdade de bom grado. Ele
conquistou muitos judeus e muitos gregos. Ele era o Messias. E
quando Pilatos, acusado pelos principais homens entre nós, o
condenou a uma cruz, aqueles que primeiro vieram a amá-lo não
cessaram de fazê-lo. Ele lhes apareceu ao terceiro dia, ao ser
restaurado à vida, pois os profetas de Deus haviam predito essas
coisas e mil outras maravilhas a seu respeito. E a tribo dos cristãos,
assim chamada depois dele, ainda não desapareceu até hoje.[371]
O historiador romano Cornélio Tácito (55-120 d.C.) não apenas deu um
testemunho do início do segundo século sobre a vida de Cristo, mas um relato
vívido da perseguição experimentada pelos seguidores de Cristo quando
explicou como o Imperador Nero acusava falsamente os cristãos dos
incêndios de Roma em 64 d.C:
Nero rapidamente culpou e infligiu as mais torturas mais impensadas
a uma classe odiada por suas abominações, chamada pela população
de cristãos. Cristo, de quem deriva o nome, sofreu a pena extrema
durante o reinado de Tibério nas mãos de um dos nossos
procuradores, Pôncio Pilatos, e uma superstição mortal, assim
considerada até o momento, irrompeu novamente não apenas na
Judeia, a fonte desse mal, mas também em Roma, onde todas as
coisas horríveis e vergonhosas de todas as partes do mundo se
encontram e se tornam populares. Assim, primeiro foram
aprisionados todos os que confessaram; depois, segundo as
informações deles, uma imensa multidão foi condenada, não tanto
pelo crime de incêndio, mas pelo ódio à raça humana. Escárnios de
todos os tipos foram acrescentados às suas mortes. Cobertos com
peles de animais, foram rasgados por cães e pereceram, ou foram
pregados a cruzes, ou foram condenados às chamas, que serviram
para iluminar a noite quando a luz do dia acabava. Nero abria os seus
jardins para o espetáculo, e exibia uma apresentação circense,
enquanto se misturava com as pessoas em vestes de cocheiro ou
andando de carruagem.[372]
Segundo o professor de estudos do Novo Testamento em Acadia
Divinity College, Lee Martin McDonald, embora a abordagem crítica e
histórica (devido aos seus pressupostos iniciais)[373] não possa verificar a
divindade de Cristo, ela consubstancia sem dúvida a vida de Cristo como
figura histórica:
É claro que os historiadores como tais nunca serão capazes de afirmar
as declarações ou interpretações cristológicas sobre Jesus nos
primeiros documentos da igreja, mas é importante que os cristãos
saibam que a sua fé em Jesus não é contrária às evidências
disponíveis na antiguidade.[374]
Além do registro histórico, a esmagadora evidência arqueológica,
também apoia a confiabilidade das Escrituras. A história antiga da América
do Norte, como registrada no Livro de Mórmon, ainda precisa ser
corroborada por qualquer descoberta arqueológica. Joseph Smith (1805-
1844) aparentemente incluiu muita ficção em sua história. No entanto, a
Bíblia não só tem provado ser confiável pela arqueologia, mas também tem
provado ser um recurso valioso para indicar aos arqueólogos a direção
correta.
E mesmo quando a confiabilidade da história bíblica foi desafiada,
esses desafios foram respondidos por descobertas arqueológicas posteriores.
Por exemplo, uma vez pensou-se que os hititas eram uma lenda bíblica até
que sua capital e muitos de seus registros foram desenterrados em Bogazkoy,
Turquia. O rei assírio Sargom, que é mencionado em Isaías 20:1, também foi
considerado fictício até que o palácio de Sargom foi descoberto em
Khorsabad, Iraque. Além disso, a captura de Asdode, que é mencionada em
Isaías 20, foi registrada nas paredes do palácio. Essas são apenas algumas das
milhares de evidências arqueológicas que validam o registro bíblico.
Não só muitas das antigas cidades e civilizações do Antigo Testamento
foram desenterradas, o que fornece evidências empíricas e históricas da
confiabilidade da história bíblica, mas a exatidão do Novo Testamento
também tem sido firmemente estabelecida pela arqueologia. James
Charlesworth, do Princeton Theological Seminary, concluiu:
Seria tolice continuar a fomentar a ilusão de que os Evangelhos são
meramente histórias fictícias, como as lendas de Hércules e Asclépio.
As teologias no Novo Testamento são fundamentadas em
interpretações de acontecimentos históricos reais, especialmente a
crucificação de Jesus, em um determinado tempo e lugar.[375]
A história não é inimiga do Evangelho. Documentos históricos e provas
arqueológicas confirmam, como testemunhas externas, que a Escritura é
digna de confiança em seu testemunho histórico.
Conclusão
A cosmovisão bíblica não é apenas racional e apoiada pela evidência,
ela é a única cosmovisão que pode fazer uma reivindicação como essa. Mas
não só isso, como veremos no próximo capítulo, é também a única
cosmovisão que pode ser fielmente implementada na vida cotidiana.
24

Apoiada pela Experiência

Tal como as evidências científicas e históricas, as nossas experiências atuais e


cotidianas corroboram às reivindicações da verdade bíblica. Tudo o que
precisamos fazer para verificar a verdade das Escrituras é olhar para o mundo
ao nosso redor. A Bíblia diz que as pessoas são depravadas e egoístas por
natureza. Isso é evidente não apenas quando lemos nossos livros de história e
jornais locais, mas também quando vamos às compras de Natal. O espírito de
dar se tornou o espírito de receber. O mercantilismo, o materialismo e a
ganância decoram as casas. Vemos egoísmo e cobiça nos outros e também
escondido em nossos próprios corações. A Bíblia não está narrando uma
história surreal sobre a humanidade. Ela não só explica as origens do pecado,
mas também o motivo de as pessoas se comportarem como se comportam. E
quem, além de Nietzsche, é contra a regra de ouro? Quem, em boa posse de
suas faculdades mentais, se opõe a que os outros amem uns aos outros como
amam a si mesmos? A Bíblia reforça nosso conhecimento inerente do certo e
do errado, explica por que ficamos aquém desse padrão, e qual a origem de
nossa culpa. A maneira como a Bíblia explica nossa natureza humana e o
mundo ao nosso redor reflete o modo como as coisas realmente são: uma
confusão total.
Além disso, a Bíblia nos diz que aqueles que são sobrenaturalmente
nascidos de novo, embora não sejam perfeitos nesta vida, têm um verdadeiro
amor por Deus e uns pelos outros. O amor que os cristãos têm uns pelos
outros é uma evidência de que Cristo veio para salvar os pecadores (João
17:21, 35). Os seguidores de Cristo, aqueles que verdadeiramente creem,
demonstram um testemunho observável de uma vida transformada. Os
crentes foram transformados interiormente; isso é evidente por alguns que se
converteram de vários vícios egoístas para buscarem dar tudo o possuem para
o serviço de Deus (1 Tessalonicenses 1:4-10). Eu não sei se você conhece
algum verdadeiro crente em Cristo (e não apenas crentes professos), mas se
você conhece, então não pode deixar de notar que há algo de diferente neles.
Outrossim, o Senhor prometeu que os seus seguidores seriam
perseguidos por sua fé (João 15:20). E isso é evidente não só pelos relatos
históricos, mas também pelo menosprezo generalizado que os cristãos
recebem quando expressam publicamente a sua fé diante de um mundo
incrédulo.
A Praticidade da Cosmovisão Cristã
Porém, o mais importante é que a cosmovisão cristã é a única que
podemos implementar em nossa vida diária sem nos contradizermos
intelectualmente no processo. Isso transparece nas palavras de Francis
Schaeffer:
O cristianismo é verdadeiro quanto ao que existe. Você pode ir até o
fim do mundo sem jamais precisar ter medo, como os antigos tinham,
de cair afinal ou de dragões o devorarem. Você pode levar a sua
discussão intelectual até o fim porque o cristianismo não só é
verdadeiro quanto aos dogmas, mas também é verdadeiro quanto ao
que existe, e você nunca cairá do fim do mundo![376]
Outras cosmovisões falham nesse ponto. Será que os pensadores pós-
modernos, que intelectualmente se vangloriam do relativismo, atravessam as
paredes? Será que os pensadores pós-modernos negam os princípios da
matemática ao usar os seus talões de cheques? Será que eles esperam que
seus cônjuges permaneçam fiéis aos seus votos de casamento? Será que eles
olham para os dois lados antes de atravessar a rua? Será que vivem como se
não houvesse um “para cima” ou “para baixo”? Os desconstrucionistas,
aqueles que acham que a linguagem não tem sentido, param de falar? Será
que eles esperam que o adolescente que atende no McDonald's os
compreenda ao fazer o pedido de um Big Mac? Eles acreditam nas desculpas
dos filhos quando dizem: “Não sabia o que você queria dizer quando
mandou: ‘É melhor estar em casa à meia-noite’”. Aqueles que vivem no
Extremo Oriente, que pensam que a lei da não-contradição é apenas uma
forma ocidental de pensar, deixam de viver segundo a lei da não-contradição
na sua vida cotidiana? Será que aqueles que praticam o Zen esperam
realmente ouvir um som quando virem um homem bater palmas com uma só
mão? É fácil criar uma filosofia intelectual, mas o verdadeiro teste de
qualquer sistema de pensamento é observar se ele pode ser implementado e
vivido no mundo real.
A Impossibilidade de uma Rejeição Total da
Cosmovisão Cristã
A razão pela qual aqueles que expõem cosmovisões não cristãs são
incoerentes e inconsistentes consigo mesmos é que nenhum deles pode se
separar completamente da cosmovisão cristã. O conhecimento de Deus, a
lógica e a moralidade, em última análise, são inerentes a todas as pessoas.
Esses são os pressupostos centrais por trás da cosmovisão cristã. De fato, o
conhecimento de Deus, a lógica e a moralidade pertencem exclusivamente à
cosmovisão cristã, porque somente a cosmovisão cristã pode dar uma
explicação consistente da sua existência. Mas aí estão eles. Os não cristãos
podem torcer, distorcer e, intelectualmente, negar essas realidades, mas pelo
fato de que eles são criados à semelhança de Deus, não podem se separar
completamente delas. A sua própria vida é uma luz que eles não podem
extinguir. Eles podem dizer que não creem em nenhum absoluto, mas as suas
vidas provam a sua hipocrisia.
Alguns dizem que ateus, naturalistas e pensadores pós-modernos são
forçados a tomar emprestado capital da cosmovisão cristã para viverem as
suas vidas no mundo real, mas eu acho que eles nascem com esses princípios
inerentes implantados em suas consciências, e que eles precisam suprimir,
distorcer, negar e fazer um mal uso desses princípios indestrutíveis para
justificar as suas vidas ímpias (Romanos 1:18). Em resumo, o homem foi
feito para um relacionamento com um Deus santo, contudo, por causa do seu
egoísmo inato, ele não mais deseja um relacionamento com Deus. As
consequências disso são o pensamento irracional e a vida disfuncional.
Deus existe por causa da impossibilidade do contrário. Para dar sentido
ao mundo ao nosso redor, devemos pressupor Deus — o Deus trinitário
pessoal, transcendente e iminente da Bíblia. Deus é uma condição necessária
para o conhecimento — para todo o conhecimento. Ele é o fundamento de
tudo. Como diz Lewis: “Eu acredito no cristianismo como acredito que o sol
nasceu, não só porque o vejo, mas porque por meio dele vejo todas as outras
coisas”.[377] Sem a luz de Deus, nós permanecemos na escuridão. O
conhecimento, todo conhecimento, deve começar com Deus, ou então o
niilismo e o absurdo assumem o controle de tudo.
No entanto, Deus não deixou o homem na escuridão total, pois o
conhecimento de Deus foi implantado em todos os homens. Deus nos
concedeu a capacidade de conhecer o universo e a nós próprios, pois Ele nos
fez à Sua imagem e nos dotou com o conhecimento inato de si mesmo. Na
luz de Deus, nós podemos ver a luz (Salmos 36:9).
No entanto, quando o conhecimento de Deus é suprimido, a incoerência
é obrigada a suplantar o pensamento sadio. Quando tentamos cobrir a luz
com a escuridão, estamos fadados a tropeçar e cair. Alguns suprimem a luz
de Deus com prazeres hedonistas e outros com crenças filosóficas ou
religiosas complexas. Independentemente disso, todas as cosmovisões não-
cristãs, como o naturalismo e o sobrenaturalismo impessoal, acabam em
absurdo. Somente a fé em Cristo pode nos resgatar das trevas que nós
mesmos criamos.
Conclusão
Assim como a luz testifica de si mesma, assim também a Bíblia, pelo
seu próprio testemunho interno, prova ser a Palavra de Deus. Não é apenas
que eu sei que a Bíblia é a Palavra de Deus porque ela me diz que é a Palavra
de Deus. Eu sei disso porque sem a cosmovisão cristã nada faz sentido. O
conhecimento de qualquer tipo é, em última análise, impossível sem o Deus
da Bíblia. Além disso, a evidência racional, histórica e empírica colabora com
o testemunho da Escritura. A cosmovisão cristã é a única cosmovisão
confiável por causa da impossibilidade do contrário. “Portanto, a escolha é
essa:”, segundo John Frame, “ou aceita-se o Deus da Bíblia ou nega-se a
moralidade objetiva, a verdade objetiva, a racionalidade do homem e o
conhecimento racional do universo”.[378]
O absurdo de tudo isso é que os pecadores vão continuar a escolher o
absurdo em vez da sanidade. Isso acontece porque a sanidade só é possível
quando submetemos o nosso pensamento e a nossa vida ao senhorio de
Cristo, e isso, meus caros leitores, é a essência do problema.
25

Apoiada pela Revelação

Argumentos, evidências e provas não são essenciais para aceitarmos ou


rejeitarmos o Evangelho de Jesus Cristo.[379] O poder e a eficácia do
Evangelho não consistem no raciocínio intelectual superior, mas na simples
proclamação da verdade (Romanos 1:16). Como apresentado neste livro, não
é que a cosmovisão cristã carece de integridade intelectual, mas que a crença
no Evangelho não depende de qualquer demonstração externa de sua
superioridade sobre as cosmovisões opostas.
Os argumentos apologéticos têm o seu lugar (pois são úteis de muitas
maneiras), mas não são necessários para revelar a veracidade do Evangelho.
Porque o conhecimento inabalável de um Deus pessoal e justo existe dentro
de todas as pessoas, como evidenciado pela sua culpa interior, as pessoas são
condenadas pela verdade do Evangelho quando o ouvem inicialmente.
Os homens, por terem sido criados à semelhança de Deus, mesmo os
homens não regenerados, têm a capacidade intelectual de reconhecer a
verdade quando entram em contato com ela. O fato de que todos nós fomos
criados à imagem de Deus é o que torna possível o conhecimento de Deus, de
nós próprios e do mundo exterior. Essa relação análoga com Deus nos dá o
conhecimento inato das leis do pensamento (lógica) e da moralidade (lei de
Deus).
Portanto, embora o fato de que 2 + 2 = 4 e a “regra de ouro” não sejam
conceitos proposicionais inatos em nossos cérebros, contudo, eles são
conceitos proposicionais que soam verdadeiros uma vez que nós, como seres
racionais, nos tornamos conscientes deles. Não podemos deixar de acreditar
nesses conceitos porque eles concordam e correspondem ao que, de modo
inato, já sabemos ser verdade — que somos seres pessoais envolvidos em
relações éticas com Deus e com o próximo. Ou seja, porque todos nós temos
um conhecimento inato de Deus (o que inclui as leis da lógica e as leis da
moral), uma vez que 2 + 2 = 4 e a regra de ouro são apresentados à nossa
mente, não podemos deixar de acreditar neles porque concordam com o que
já sabemos ser verdade. O conhecimento inato de Deus é como um diapasão,
e quando a verdade é apresentada às nossas mentes, ele ressoa dentro da
nossa consciência.
E aqueles que negam essas verdades proposicionais, tais como 2 + 2 =
4, devem fazê-lo negando o senso comum e suprimindo o que é inato e
autoevidente dentro da sua própria consciência. Semelhantemente, o
Evangelho é convincente porque corresponde ao que já sabemos ser verdade.
A luz do Evangelho, portanto, só traz responsabilidade e condenação
adicionais para aqueles que o ouvem. Assim como a luz, a verdade é
poderosa.
Entretanto, quando ouvimos o Evangelho, todos nós o rejeitamos. Até
mesmo os melhores argumentos não podem mudar um coração rebelde.
Nosso problema é que o diapasão do nosso coração está curvado, já que a
Imago Dei já não mais funciona adequadamente. Contudo, ela ainda funciona
bem o suficiente para que o Evangelho traga uma medida de certeza e
convicção, embora isso esteja distorcido a ponto de fazer com que o
Evangelho não soe agradável aos nossos ouvidos. Por causa do amor próprio
de nossos corações depravados, nossos ouvidos estão desafinados e nossos
olhos desfocados. O Evangelho, porém, é mais penetrante e agudo do que
qualquer espada de dois gumes. É capaz de discernir as intenções, motivos e
pensamentos de nossos corações (Hebreus 4:12). A Palavra de Deus nos fala
como se nos conhecesse — como se pudesse ver as nossas consciências.
Mesmo assim, não podemos suportar os sons que ouvimos por causa dos
nossos pecados interiores que ela expõe (João 3:20). Sabemos que o
Evangelho é verdadeiro porque é testemunhado por nossa culpa, mas essa
mesma culpa nos faz desprezá-lo profundamente. Nós odiamos a
autocondenação e a convicção de pecados. Além disso, nossos corações têm
sido distorcidos pelo pecado a ponto de nos amarmos mais do que tudo e
todos. Assim, nossas mentes e corações já não estão mais em sincronia com a
verdade da Palavra de Deus.
Submeter-se à verdade exige amar a Deus mais do que a nós mesmos.
Contudo, se a nossa principal razão para rejeitar Cristo é nosso entranhável
amor por nós mesmos, como podemos alcançar um conhecimento salvífico
de Deus? Se a verdade por si só não é suficiente para nos convencer a
entregar nossas vidas e nos voltarmos para Cristo, como seremos salvos?
Devemos crer para sermos salvos, mas como poderemos alguma vez abraçar
de boa vontade aquilo que odiamos?
Enquanto desprezarmos o Deus da Bíblia, nunca entregaremos tudo a
Ele de livre e espontânea vontade. Todos nós precisamos de socorro. visto
que somos odiadores de Deus, não podemos converter a nós mesmos.
Precisamos de mais do que de alguém com um bom papo de vendedor que
nos ensine a repetir superficialmente a oração do pecador. A Bíblia deixa
claro que a fé e o conhecimento pessoal de Cristo vêm somente pela graça de
Deus.
A única maneira de recebermos um Deus santo e justo é se esse Deus
se revelar sobrenaturalmente a nós como Ele realmente é — totalmente digno
de todo o nosso amor e aceitação. É necessário que Deus se revele à nossa
mente de tal forma que nossos corações O percebam como totalmente
glorioso. Não é que Deus precise disfarçar a Sua aparência para que gostemos
mais dele, mas o que acontece é que Ele precisa mudar os nossos corações
para que possamos percebê-Lo como Ele realmente é. Além disso,
necessitamos de socorro para nos vermos como realmente somos —
completamente arruinados e indignos do menor favor de Deus. Somente
quando nos vemos como miseráveis e Cristo como adorável é que vamos nos
tonar conscientes de que realmente somos, nos arrepender dos nossos
pecados e abraçar desejosamente o que sabemos ser verdade. Em outras
palavras, nós que estamos assentados na escuridão precisamos ser iluminados
tanto em nossas mentes quanto em nossos corações. A imagem de Deus que
foi deformada pelo pecado precisa ser renovada.
Obras Divinas
Essa revelação de Deus começa com o próprio universo. A revelação
natural vem de Deus, porque Deus criou o universo. Essa revelação é
universal e autoautenticadora. Porque somos feitos à imagem de Deus, não
podemos deixar de ver o selo de Deus em todos os lugares que olhamos.
“Não há nenhum lugar no universo”, segundo João Calvino, “onde não
possamos discernir pelo menos algumas centelhas de sua glória”.[380] Por essa
razão, o puritano inglês John Owen afirmou, com razão:
Não há necessidade de tradições, não há necessidade de milagres, não
há necessidade da autoridade de nenhuma igreja, para convencer uma
criatura racional de que as obras de Deus são dele, e somente dele; e
que Ele é eterno e infinito no poder que as criou. Elas carregam
consigo a própria autoridade dele. Por serem o que são, elas declaram
de quem elas são.[381]
Com essa fonte divina de revelação, todos nós aprendemos (1.) que
existe um Deus (Romanos 1:19-20), (2.) que Ele criou o universo (Salmos
19:1), (3.) que Ele é absoluto (Atos 17:25), (4.) que Ele é infinito (Atos
17:24), (5.) que Ele é soberano (Atos 17:26), (6.) que Ele é todo-poderoso
(Romanos 1:20), (7.) que Ele é onipresente (Atos 17:25), (8.) que Ele é
iminente (Atos 17:27), (9.) que Ele é justo (Salmos 97:6) e (10.) que Ele está
irado com os pecadores (Romanos 1:18). Porque nós somos feitos à imagem
de Deus, nós inerente e imediatamente entendemos (11.) que existe uma lei
universal, (12.) que nós violamos essa lei (Romanos 2:15) e (13.) que
seremos responsabilizados por um Deus justo e irado (Romanos 1:32). Em
essência, a revelação natural revela a nossa culpa, deixando-nos sem
esperança, enquanto aguardamos pelo dia do julgamento; pois esse
testemunho é constante (Salmos 19:2), universal (Salmos 19:3) e inegável
(Romanos 2:15), deixando-nos indesculpáveis (Romanos 1:20).
A revelação natural é vital, mas ela somente não é suficiente para nos
levar a amar o Deus do universo. A revelação natural nos deixa condenados e
culpados diante de um Deus justo, e sem esperança de salvação. O universo
revela um Deus justo e poderoso, mas não revela a Sua disposição
misericordiosa e a Sua vontade de perdoar. Assim, deixados a nós mesmos,
criaremos todo tipo de meios religiosos para apaziguar a ira de Deus, ou
criaremos várias filosofias que afastam o conhecimento de Deus pela
exaltação de nós mesmos. Por causa das falsas noções de nossa autorretidão e
autonomia, nós continuamente pensaremos muito bem de nós mesmos e de
nossas próprias habilidades para buscar a Deus. A revelação natural é vital,
mas não é suficiente para levar alguém ao arrependimento e à fé.
Palavras Divinas
Por causa do nosso orgulho, precisamos de uma revelação especial. Em
geral, todos os atos de Deus na história são considerados parte da revelação
especial de Deus. Porém, mais estritamente falando, a revelação especial é
restrita àqueles atos históricos de Deus, profecias divinas e verdades que
foram registradas para nós nas páginas das Escrituras. As Escrituras revelam
a disposição misericordiosa de Deus para conosco na mensagem do
Evangelho de que Ele enviou Seu único Filho para morrer por nossos
pecados — o justo pelos injustos. Essa é a bondade de Deus que conduz os
pecadores ao arrependimento.
Assim como a revelação natural não precisa de nenhuma prova externa
para verificar a sua mensagem, a Escritura Sagrada, porque é inspirada pelo
Espírito de Deus, não precisa de nenhum argumento, prova ou evidência
externa para comprovar a sua natureza infalível e autoritativa. A Bíblia é
autossuficiente e autentica a si própria. A veracidade das Escrituras não se
baseia na aprovação de homens, concílios ecumênicos ou igrejas, mas em seu
próprio testemunho divino. Ela não precisa nem mesmo de apologistas.
A Bíblia não apenas afirma ser a Palavra de Deus (1 Coríntios 2:12-13,
2 Timóteo 3:16, 2 Pedro 1:20), mas também trata a si mesma como a Palavra
de Deus. Ela nos fala de forma autoritativa e infalível. Como a Palavra de
Deus, as Escrituras exigem crença e obediência da mesma forma que Deus
exige crença e obediência. “A autoridade de Deus brilhando nelas”, afirmou
Owen, “nos dá todas as evidências divinas”[382] que são necessárias. Em
outras palavras, a Bíblia mesmo prova ser a Palavra de Deus por sua própria
evidência interna.
Se as Escrituras provam ser a Palavra de Deus, por que tantos rejeitam
o Evangelho? Por que qualquer um de nós rejeitaria boas novas como essas?
Isso não ocorre porque o Evangelho é muito complicado para que possamos
entendê-lo. Segundo Owen, alguém “apenas possuído de razão e de
capacidade de usá-la de acordo com a medida dos seus talentos, pode (sem a
ajuda do Espírito Santo) descobrir o sentido das proposições bíblicas e
compreender o seu significado”.[383] Na verdade, eu chegaria ao ponto de
dizer que a Palavra escrita de Deus traz uma medida de convicção a todos os
que a ouvem. Ela nos descobre e nos expõe ao que somos. Ela mostra os
nossos pecados e reforça a nossa culpa. Mesmo aqueles que estão
espiritualmente mortos e incapazes de amar a verdade, não podem deixar,
devido a serem feitos à imagem de Deus, de se sentirem condenados pela
verdade, quando a ouvem.
Por essa razão, Deus responsabilizará mais aqueles de nós que ouviram
o Evangelho. Nenhum de nós será capaz de dizer ao Senhor no Dia do Juízo:
“Eu simplesmente não percebi que era o Senhor que estava falando comigo”.
Além disso, como já vimos, as afirmações verdadeiras da Bíblia não
são rejeitadas porque o Evangelho é racionalmente incoerente ou não é
sustentado por evidências históricas. Pelo contrário, a verdade é rejeitada
porque o coração não transformado permanece apaixonado pela falsa noção
de sua própria autojustiça moral e/ou autonomia intelectual.
O problema é que as coisas erradas são amadas e odiadas porque o
pecado causa cegueira. Como Alvin Plantinga afirmou: “O pecado é um mau
funcionamento da vontade, uma deturpação das afeições; é amar e odiar as
coisas erradas. Entretanto, o pecado também envolve cegueira, e
incapacidade de ver a glória e a beleza do Senhor”.[384] Esse mundo e o eu são
amados demais para serem abandonados. É por essa razão que a pessoa
permanece espiritualmente morta e não está disposta a abraçar o Evangelho.
É possível saber que Cristo é quem Ele diz ser, mas você pode não estar
conveido de que aprecia quem Ele diz ser.
Embora a morte esteja se aproximando, o guisado de Esaú parece bom
demais para que você se preocupe muito com a eternidade. O Evangelho é
para aqueles que sabem que são pecadores e percebem a sua necessidade de
serem salvos dos seus pecados (1 Timóteo 1:15). Parece que a maioria das
pessoas simplesmente não tem desejo de ser resgatada do que ama
servilmente — elas mesmas.
Conclusão
Consequentemente, todos os argumentos apologéticos podem ser
apresentados com absoluta certeza, e, como o Senhor diz, um homem pode
até mesmo ser ressuscitado dentre os mortos, mas por causa do nosso
menosprezo pelo Evangelho que nos ordena a renunciar a tudo, nós
teimosamente recusaremos essa maravilhosa oferta. “Por essa razão” — diz
Jonathan Edwards — “nenhum sinal que possa ser dado satisfará realmente
as pessoas em tal caso; mesmo que seja dados sinais muito bons e infalíveis,
e eles sejam claramente provados, eles não serão capazes de convencê-los”.
[385]
Consistência lógica, várias provas e evidências simplesmente não são
suficientes para quebrantar um coração duro — algo mais é necessário.
26

Apoiada pela Iluminação

Por causa da nossa condição de espiritualmente mortos, continuaremos a


rejeitar Cristo até que o Espírito Santo vivifique os nossos corações e mentes.
Não correremos para Cristo até que as trevas sejam removidas e possamos
ver claramente. É por isso que a iluminação espiritual é necessária.
A Luz Divina
A iluminação espiritual é o poder influenciador do Espírito Santo
agindo nas e através das Escrituras para dar luz e entendimento espiritual às
mentes e corações do povo de Deus, o que os capacita a crer, receber e
obedecer voluntariamente à verdade da Palavra de Deus. Assim, o
testemunho do Espírito Santo não é uma nova revelação (independente da
Escritura), mas o Espírito Santo falando nas palavras da Escritura.[386] A
iluminação espiritual nunca vai além da verdade apresentada no texto. É a
Palavra escrita que o Espírito usa para abrir os corações do nosso
entendimento. Quando isso ocorre, os crentes sabem com certeza que estão
ouvindo Deus pessoalmente falar com eles a partir das páginas da Escritura
(Lucas 24:45, 1 Tessalonicenses 2:13-14).[387] Por causa do testemunho do
Espírito que nos fala nas reivindicações da verdade das Escrituras, as
Escrituras são autoautenticantes. Como Calvino explicou:
Aqueles a quem o Espírito Santo ensinou interiormente confiam de
verdade na Escritura, e a Escritura realmente autentica a si mesma;
portanto, não é correto sujeitá-la à prova e a arrazoamentos… Pois
mesmo que ela admita reverência para si mesma por sua própria
majestade, ela somente nos afeta seriamente quando é selada sobre
nossos corações pelo Espírito… Não buscamos provas, nem marcas
de autenticidade sobre as quais nosso julgamento possa se basear;
mas submetemos nosso julgamento e compreensão a ela como a algo
muito além de qualquer especulação![388]
Mas não nos confundamos, a iluminação espiritual não é o Espírito
fortalecendo as Escrituras (como se fossem meras palavras mortas), mas o
Espírito iluminando as mentes e os corações dos crentes pelas palavras da
Escritura. O problema não está em nenhuma deficiência da Palavra escrita,
mas nas trevas e rebelião de nossos corações (Efésios 4:18). Neste sentido, a
iluminação é o Espírito de Deus falando em, por e através das Escrituras para
trazer luz às mentes cegas e aos corações mortos para que eles possam
receber e entender corretamente as Escrituras. É por isso que Edwards
entendeu que a iluminação do coração não ocorre sem a iluminação da mente:
“As santas afeições não são calor sem luz; mas sempre surgem da informação
do entendimento, alguma instrução espiritual que a mente recebe, alguma luz
ou conhecimento real”.[389]
Por essa razão, abraçamos as reivindicações da verdade da Bíblia não
com base em evidências externas, argumentos racionais ou mesmo na
apresentação coerente da cosmovisão cristã, mas no Espírito Santo
iluminando a verdade da Palavra de Deus para nós. Como foi esclarecido por
Calvino:
Que se considere, portanto, como estabelecido, que aqueles que são
ensinados interiormente pelo Espírito Santo concordam
implicitamente com a Escritura; que a Escritura, ao levar consigo a
sua própria evidência, não pretende se submeter a provas e
argumentos, mas deve ao testemunho do Espírito a plena convicção
com que a devemos receber. Iluminados por Ele, já não acreditamos
nem por nosso próprio julgamento nem pelos dos outros, que as
Escrituras provém de Deus; mas, de uma forma superior ao
julgamento humano, sentimo-nos perfeitamente seguros — tanto
quanto se víssemos a imagem divina visivelmente impressa nela —
de que ela veio até nós, pela instrumentalidade dos homens, a partir
da própria boca de Deus. Não pedimos provas sobre as quais o nosso
julgamento possa descansar, mas submetemos nosso intelecto e
julgamento à Escritura como mais transcendente do que possamos
estimar.[390]
A Fé Divina
A iluminação espiritual traz à luz o novo nascimento e a fé. Uma vez
que os olhos de nossos corações possam ver claramente, nós nascemos de
novo. E, uma vez que temos nova vida em Cristo, não podemos deixar de
crer. O novo nascimento não nos força a crer contra a nossa vontade, mas
transforma a nossa natureza ao renovar a Imago Dei com a infusão do amor
de Deus, para que nos tornemos dispostos.
A fé salvífica não é uma mera concordância intelectual com as
reivindicações da verdade da Bíblia. Os demônios reconhecem que Cristo é o
Filho de Deus, mas lhes falta um relacionamento pessoal com Ele. Muitos
cristãos professos também têm apenas uma compreensão intelectual do
Evangelho. Embora eles não neguem a verdade, eles não amam a verdade.
Eles podem professar crer, mas não morreriam pela verdade. Da mesma
forma que as pessoas acreditam em triângulos e quadrados, os cristãos
nominais acreditam na Bíblia. Mas esse conhecimento especulativo, que pode
até levá-los a frequentar a igreja e realizar algumas boas obras, não é mais fé
salvífica do que o temor e tremor é evidência de fé salvífica nos demônios
(Tiago 2:19). Os demônios conhecem a Deus, mas eles não amam a Deus.
Temo que muitos, se não a maioria, dos cristãos professos só possuam essa
forma superficial de fé — uma fé que opera sem amor.
A fé salvífica, porém, estabelece uma relação pessoal e experiencial
com Cristo porque é motivada e derivada de um amor sincero por ele. A fé
sozinha nos salva, mas é a fé que opera pelo amor (Gálatas 5:6). Esse amor é
o fruto do novo nascimento, onde a velha natureza pecadora e egoísta é
recriada à semelhança de Cristo. A imagem de Deus que foi desfigurada pela
queda é, então, restaurada em Cristo (Colossenses 3:10). A mente de Cristo
nos foi dada, a qual nos concede um discernimento adequado e amor à
verdade (1 Coríntios 2:16). O diapasão que foi encurvado pelo pecado é,
então, renovado pelo amor. Com um coração novo, o Evangelho agora ressoa
dentro de nossas novas naturezas, e isso de modo totalmente glorioso. Nós de
boa vontade nos prostramos diante do nosso Salvador porque, pela graça
salvífica de Deus, nós agora amamos o Senhor Jesus acima de todas as
coisas. Embora a Sua santidade e o seu senhorio uma vez tenham sido
repulsivos, agora nós vemos esses atributos como totalmente gloriosos e
dignos de toda a nossa adoração e louvor.
Plantinga estava certo quando disse: “O dom da fé e, consequentemente
a regeneração, não é apenas uma questão de restaurar o intelecto a uma
condição imaculada na qual podemos mais uma vez perceber Deus e as suas
glórias e belezas; requer também, e essencialmente, curar essa loucura da
vontade”.[391] Após a iluminação espiritual e o novo nascimento, nossas
afeições e nossa vontade, por causa de nossa nova natureza, foram
transportadas do egoísmo para um amor sincero por Deus. Como Plantinga
continuou a explicar: “A regeneração consiste em curar a vontade para que
finalmente comecemos a amar e a odiar as coisas certas; inclui também a
renovação cognitiva, para que venhamos a perceber a beleza, a santidade e o
encanto do Senhor e do esquema de salvação que ele concebeu”.[392] Agora, o
pecado agora é odiado e Deus é glorioso. Mas não é como se a realidade
tivesse mudado, é simplesmente que as trevas que uma vez cobriam os nossos
olhos foram removidas.
O Amor Divino
Neste sentido, o conhecimento salvífico de Cristo não vem por meio de
argumentos apologéticos, mas pela iluminação e regeneração espiritual e por
nossas mentes serem iluminadas para a verdade de Deus, para que os nossos
corações sejam inflamados de amor a Deus. Devemos amar a verdade antes
de podermos recebê-la (2 Tessalonicenses 2:10). Plantinga continuou
dizendo:
Quando as fontes da afeição funcionarem corretamente, amaremos o
que é amável, nos deleitaremos com o que é deleitável e desejaremos
o que é desejável. Amaremos a Deus acima de tudo e ao próximo
como a nós mesmos; nos deleitaremos com a sua beleza e glória, e
com os reflexos criados dessa beleza e glória; e desejaremos o que de
fato é bom para nós.[393]
Calvino também percebeu que nunca nos comprometeremos com Deus
até que O vejamos como totalmente digno de nossa devoção e serviço:
Pois, até que os homens reconheçam que devem tudo a Deus, que são
nutridos pelo seu cuidado paternal, que ele é o Autor de todo o seu
bem, que não devem procurar nada além dele — nunca lhe prestarão
um serviço voluntário. Não, a menos que o estabeleçam como a sua
completa felicidade, jamais se entregarão verdadeira e sinceramente a
ele.[394]
O Conhecimento Divino
É esse amor, que vem do novo nascimento, que nos proporciona um
conhecimento experiencial e pessoal de Deus. Paulo resume tudo isso em
Efésios 3:14-19:
Por causa disto me ponho de joelhos perante o Pai de nosso Senhor
Jesus Cristo, do qual toda a família nos céus e na terra toma o nome,
para que, segundo as riquezas da sua glória, vos conceda que sejais
corroborados com poder pelo seu Espírito no homem interior; para
que Cristo habite pela fé nos vossos corações; a fim de, estando
arraigados e fundados em amor, poderdes perfeitamente
compreender, com todos os santos, qual seja a largura, e o
comprimento, e a altura, e a profundidade, e conhecer o amor de
Cristo, que excede todo o entendimento, para que sejais cheios de
toda a plenitude de Deus.
Primeiro, observamos que o conhecimento experiencial de Deus é
sobrenatural e soberanamente concedido a nós por Ele: “Por causa disto me
ponho de joelhos perante o Pai de nosso Senhor Jesus Cristo, do qual toda a
família nos céus e na terra toma o nome, para que, segundo as riquezas da sua
glória, vos conceda que sejais corroborados com poder pelo seu Espírito no
homem interior” (vv. 14-16). Paulo roga a Deus que nos dê ou nos conceda
esse conhecimento espiritual, fortalecendo o nosso homem interior. Pois
Paulo sabia que, em nossas próprias capacidades naturais, somos
insuficientemente preparados e incapazes de lidar com verdades tão pesadas e
gloriosas. Para suportarmos tal peso, precisamos ser fortalecidos
(κραταιωθῆναι, krataiōthēnai) com o poder de Deus (δυνάμει, duvámei)
através da obra do Espírito Santo. “Como está escrito”:
As coisas que o olho não viu, e o ouvido não ouviu, e não subiram ao
coração do homem, são as que Deus preparou para os que o amam.
Mas Deus no-las revelou pelo seu Espírito; porque o Espírito penetra
todas as coisas, ainda as profundezas de Deus. Porque, qual dos
homens sabe as coisas do homem, senão o espírito do homem, que
nele está? Assim também ninguém sabe as coisas de Deus, senão o
Espírito de Deus. Mas nós não recebemos o espírito do mundo, mas o
Espírito que provém de Deus, para que pudéssemos conhecer o que
nos é dado gratuitamente por Deus (1 Coríntios 2:9-12).
Essa iluminação e fortalecimento do homem interior é o que dá origem
à fé, como Paulo passou a dizer aos Efésios: “Para que Cristo habite pela fé
nos vossos corações” (v. 17a). E a fé nos salva porque nos une legal e
experimentalmente à vida de Cristo. Porque por essa fé, que vem pela
iluminação espiritual, Cristo habita (κατοικῆσαι, katoikēsai — mora
permanentemente) em nossos corações. Com Cristo unido aos nossos
corações pela fé, somos providos não apenas de um conhecimento intelectual,
mas de um conhecimento vivo e pessoal dele.
Cristo é amor. Consequentemente, a razão pela qual precisamos que
Cristo habite em nossos corações é para que possamos estar “arraigados e
fundados em amor” (v. 17b). Estar arraigados e fundados em amor é o
fortalecimento do nosso homem interior que nos capacita a alcançar um
verdadeiro conhecimento de Deus. Em outras palavras, o poder de Deus que
era necessário para nos fortalecer é o amor de Deus que está escrito em
nossos corações.
O poder que Deus usa para quebrantar os nossos corações rebeldes é o
Seu amor sendo derramado em nossos corações. É o que gera a nova
natureza. Como resultado, o amor de Deus dentro de nós não apenas nos
concede um amor por ele, mas também nos capacita a conhecer a Deus
pessoalmente. O amor de Deus remove as nossas antigas naturezas egoístas
que nos escravizavam às nossas próprias paixões egoístas da carne e nos dá
um coração para conhecer e receber a Deus de boa vontade.
Por que precisamos ser fortalecidos com o amor de Deus? Segundo
Paulo, precisamos estar arraigados e fundados em amor para que possamos
“compreender, com todos os santos, qual seja a largura, e o comprimento, e a
altura, e a profundidade, e conhecer o amor de Cristo, que excede todo o
entendimento” (vv. 18-19a). Para conhecermos o amor de Deus, precisamos
ser cheios desse amor. Isso porque Deus é amor, e a plenitude do Seu amor
em toda a sua profundidade, largura, comprimento e altura, é demasiado
grande para que possamos compreender sem que antes tenhamos o amor de
Deus habitando em nós, na pessoa de Cristo. O Seu amor é inexprimível e
inescrutável. Precisamos ser fortalecidos no homem interior. Precisamos estar
arraigados e fundados em amor antes de podermos compreender o amor de
Deus.
Isso explica mais plenamente como o amor de Deus estabelece um
conhecimento pessoal e experiencial de Deus. Como Deus é amor, quando
experimentamos o amor de Deus, nós experimentamos Deus. Embora não
possamos vê-lo de forma visível, isso não significa que não possamos
conhecê-lo emocional e experiencialmente. Como o apóstolo João diz, se “O
amamos, Deus permanece em nós” (1 João 4:12). E esse amor que permanece
em nós é o ingrediente que precisamos para amá-lo e conhecê-lo em resposta,
pois “Deus é amor, e quem permanece em amor permanece em Deus, e Deus
nele” (1 João 4:16). “Amados, amemo-nos uns aos outros, porque o amor é
de Deus; e todo aquele que ama é nascido de Deus e conhece a Deus” (1 João
4:7). Como a visão nos conecta com o mundo ao nosso redor, a fé, que opera
pelo amor, nos conecta com Deus.
Esse amor, além disso, não é apenas uma mera experiência subjetiva e
emocional, mas é uma experiência emocional que está firmemente arraigada
no conhecimento objetivo de Deus que nos foi revelado sobrenaturalmente na
Palavra de Deus escrita. Com o amor sendo derramado em nossos corações
pela divina iluminação da objetiva Palavra de Deus, nós somos renovados à
semelhança de Deus para que possamos amá-lo.
Por isso, Paulo conclui a sua oração por nós acrescentando: “para que
sejais cheios de toda a plenitude de Deus” (v. 19b). Assim, ser fortalecidos e
arraigados no amor de Deus não somente nos dá um conhecimento
experiencial do amor de Cristo, como nos capacita (ἐξισχύσητε, exischúsēte,
v. 18a) a sermos cheios de toda a plenitude do próprio Deus.
Conclusão
Mas isso, a necessidade do amor, nos traz de volta ao problema básico
do homem — o homem está separado do amor de Deus. A separação e
rejeição de Deus pelo homem está enraizada na dureza do seu coração
(Efésios 4:18). O homem pode conhecer o certo e o errado e a diferença entre
o amor e o egoísmo, mas ele não tem o amor (motivo e poder) para valorizar
e cumprir esse padrão moral. Mais importante ainda, o homem não tem à
disposição interior para amar a Deus. O conhecimento inerente de Deus pelo
homem não é suficiente para proporcionar um conhecimento pessoal de
Deus. Você deve amar Cristo para conhecer verdadeiramente a Cristo, e isto
requer iluminação espiritual.
Consequentemente, os ateus intelectuais e práticos não carecem de
evidências para crerem em Deus, mas o que lhes falta é o amor necessário
para se submeterem a Deus. Não importa se você é um cristão nominal ou um
ateu, o que controla as suas crenças e comportamento é seu profundo amor
por si mesmo. Você está arraigado em um amor por si mesmo. Porque você
se ama demais, não deseja se submeter ao conhecimento de Deus. Você pode
fazer uma profissão de fé vazia ou inventar algum sistema filosófico
complexo que negue a existência de Deus, mas de qualquer forma você
procura abrandar uma consciência culpada sem confessar os seus pecados e
dobrar os seus joelhos ao senhorio de Cristo.
PARTE 6

O Chamado para Crer

“Todo aquele que crer nela não será confundido.”


(Romanos 9:33)
27

O Gracioso Chamado para a Rendição

Caro leitor, não podemos viver uma vida plena e consistente sem Deus. A
nossa culpa é a prova disso, ela é a evidência da nossa infelicidade e tolice.
Embora cada um de nós tenha tentado em vão aliviar a consciência culpada,
ela continua a falar contra nós. Porém, pior ainda, é a nossa própria voz que
cada um de nós ouve dentro das nossas cabeças. Não a queremos ouvir, mas
estamos constantemente condenando a nós mesmos. “Por que eu fiz isso?”,
“Eu não devia ter feito aquilo”, “Espero que ninguém tenha visto eu fazer
isso”. Nós nos amamos, e por isso odiamos esse sentimento de culpa.
Odiamos saber que estamos errados. A autocondenação é a pior coisa. Se
outros nos condenam, há a possibilidade de que eles tenham feito um
julgamento errado a nosso respeito, mas quando o nosso próprio coração fala
contra nós, é difícil negar a nossa culpabilidade. Tentamos calar a nós
mesmos, e embora nossa consciência possa ficar cada vez mais fraca à
medida que se torna mais e mais endurecida, nunca podemos nos livrar
completamente do fato de que sabemos que somos pecadores e que somos
merecedores do julgamento de Deus.
Culpa: Um Problema Universal
O que devemos fazer com as nossas consciências culpadas? Remédios?
Terapia? Uma peregrinação à Terra Santa? Autoflagelação? Embora a culpa
esteja sempre presente, cada um de nós se tornou um especialista em
silenciar a sua própria consciência. A nossa primeira defesa é inventar
desculpas incrivelmente formuladas. Somos bons em encontrar supostas
brechas nas circunstâncias que nos isentam do que se aplica universalmente
aos outros. Fazemo-nos de tolos. Ou, enxergamos a nós mesmos como
alguém que foi injustamente colocado em algum tipo de dilema ou
circunstâncias muito difíceis — “Não pudemos evitar isso”. Passamos de
culpados a vítimas.
Isso, é claro, leva a uma segunda camada de defesa — culpar os outros
pelas nossas ações. “Senhor, foi essa mulher, que me deste, que me fez
comer do fruto proibido”. “A culpa é dela, ou talvez até seja tua, Deus, por
tê-la dado a mim”.
E se culpar os outros não remove a nossa vergonha, procuramos
compensá-las praticando algumas boas ações. “Olha como eu sou bom; não
sou assim tão mau”. “Em vou para a igreja e, de vez em quando, planto uma
árvore e dou uns trocados a um morador de rua”.
Se a culpa continuar, então buscamos nos distrair. Assistimos muita
televisão e nos mantemos entretidos. Fazemos isso na esperança de que, se
passar tempo e água suficientes debaixo da ponte, poderemos nos sentirmos
melhores conosco mesmos.
Entretanto, o que cada um de nós acha mais útil para aliviar a sua
consciência é buscar uma multidão de amigos que serão sempre muito gentis
ao nos assegurar que estamos bem. Estamos à procura daqueles amigos que
aceitam as nossas desculpas, ou nos ajudam a criar novas. Sentimo-nos muito
melhor quando eles dizem: “Eu teria feito a mesma coisa”. Esses são os
amigos que nos ajudam. E se não é esse tipo de amigos que estamos
procurando, então os que estamos buscando são aqueles cujas ações e
comportamentos morais são um pouco piores do que os nossos. “Posso
escorregar aqui e ali de vez em quando, mas pelo menos não sou como
Roberto, que é completamente viciado nessas coisas”. “Eu posso até fazer
isso, mas o Roberto faz muito mais”. “Comparado com outros, sou uma
pessoa muito boa”.
Após anos suprimindo nossas consciências, achamos muito mais fácil
continuar na prática de nossos pecados sem nos sentirmos culpados. Um dos
meus amigos homossexuais admitiu que se sentiu sujo nas primeiras vezes
em que cedeu aos seus desejos. O seu parceiro o tranquilizou dizendo que
esse sentimento era normal, e que a chave para o superar era não pensar
nisso. Com o tempo, vai ficar cada vez mais fácil. Entretanto, o mesmo
acontece com todos aqueles que iniciam práticas pecaminosas. Os
criminosos obstinados não são feitos da noite para o dia; é preciso tempo
para produzir endurecimento em uma consciência sensível.
Debaixo de toda dureza, não importa quantos filmes tenhamos visto
para nos distrairmos e nem quantos amigos nos tenham tranquilizado, lá no
fundo sabemos que pecamos e estamos destituídos da glória de Deus. No
entanto, devido a nossa habilidade incomum de esquecer e suavizar as coisas,
não temos noção de quão perversos e condenáveis temos sido. Nós não
conhecemos a profundidade da nossa depravação. Cada um de nós sabe que é
pecador, mas nenhum de nós pode sequer começar a compreender quão
grandes pecadores nós realmente somos aos olhos de Deus. Se usamos
óculos sujos de lama, é difícil ver quão sujos realmente somos. Nós nos
vemos através de olhos pecadores. Como olharemos para aquele que é tão
puro de olhos que não pode contemplar o pecado?
Quais dos mandamentos de Deus nós não violamos? Nós roubamos,
mentimos e enganamos. Temos sido infiéis, impiedosos, grosseiros e
desamorosos. Temos dedicado nossas vidas para a satisfação de várias
paixões carnais e temos estado mais preocupados em ser ricos, populares e
poderosos do que em sermos amigos atenciosos para aqueles que precisam.
Temos gastado mais tempo e energia vivendo para nós mesmos do que
vivendo para Deus.
Não apenas transgredimos a lei de Deus, mas também falhamos em
fazer todas as coisas que deveríamos ter feito. Deveríamos ter ligado para a
vovó há alguns anos atrás, quando ela ficou doente. Deveríamos ter parado e
ajudado aquela pessoa que pedia ajuda no acostamento da estrada. Devíamos
ter feito isso ou aquilo, mas éramos demasiado preguiçosos e egocêntricos.
Negligenciamos a devida gratidão a Deus por todas as coisas. Temos
negligenciado a adoração que é devida ao Seu nome. Não temos vivido de
acordo com o padrão.
Isso para não mencionar os pecados do nosso coração, tais como raiva,
malícia, amargura, ciúmes, cobiça, pensamentos lascivos, imaginações vãs, e
toda sorte de desejos malignos.
Mas o que é mais terrível do que nossos corações nos condenando é
saber que Deus pessoalmente anotou tudo o que já fizemos. Cada
pensamento, palavra e ação foi registrado. Deus não se deixa enganar pelas
nossas desculpas tolas. Ele manifestou claramente para nós que aqueles que
praticam tais coisas são dignos de morte (Romanos 1:32).
Esses atos pecaminosos constituem traição contra Deus. Nós não
somente nos rebelamos contra o nosso Criador e Rei, como também
desertamos para o reino das trevas. Empunhamos nossas espadas e cerramos
nossos punhos em um desafio deliberado contra Ele. Nossos pecados são um
ataque direto e ousado contra Deus, que nos abençoou com a vida, e com
coisas boas, tais como a chuva e o sol. Ele tem sido graciosamente bondoso,
longânimo e paciente para conosco. Ele nos enviou o Evangelho, tem nos
dado muitas oportunidades para nos arrependermos, tem mantido o sangue
bombeando em nossas veias e sustentando o batimento de nossos corações.
Mas como temos respondido a essa bondade? Nós profanamos Seu nome
pelas coisas que temos visto e pelas piadas que temos feito. Continuamos a
ferir a mão que nos alimenta cada vez que utilizamos os dons, dinheiro,
recursos e saúde que Deus nos deu para atividades egoístas, pecaminosas e
vergonhosas. A vida que Deus nos deu para servi-lo, nós temos usado para
desafiá-lo e amaldiçoá-lo.
Justiça: Uma Certeza Universal
A ira de Deus é aterradora porque foi provocada pela nossa rejeição do
Seu amor. Deus encontra infinita alegria, felicidade e glória em Seu Filho;
Seu amor por ele é incompreensível. Deus ama Seu Filho, e também amou os
miseráveis pecadores o suficiente para dar o que ele mais ama — Seu Filho
unigênito (João 3:16). Deus não reteve Seu maior tesouro, mas ofereceu
graciosamente o seu Filho — o qual detém a vida, o sentido e a felicidade em
sua mão. Deus deu o melhor que Ele tinha para dar. Deus ofereceu tudo —
algo verdadeiramente sem preço. No entanto, não só provocamos a ira de
Deus pelas nossas transgressões, mas, pior ainda, desprezamos o amor de um
Deus zeloso ao rejeitar o seu dom de amor. Nós desprezamos o que Deus
mais valorizou, como se Seu Filho não fosse bom o suficientemente. Nós,
que não valemos nada, rejeitamos aquele que é de infinito valor. Nós, que
não somos amáveis, nos afastamos do imensurável amor de Deus. Assim,
que ira deve haver no coração de Deus pela afronta com que o cobrimos
quando viramos as costas ao Seu Filho amado?
A nossa rejeição do amor de Deus é uma rebelião aberta. A cada
momento que nos recusamos a nos ajoelhar e a entregar tudo à sua
majestade, continuamos a provocá-lo e a entesourar irá sobre nós mesmos.
Apenas um segundo, e será tarde demais para nós. Ele não vai reter a
Sua ira para sempre. O Dia do Juízo Final está chegando (Colossenses 1:6).
A nossa culpa testemunha a certeza disso.
A morte está chegando, mas nós vivemos como se isso não fosse
verdade; vemos a nossa culpa, mas preferimos ignorá-la. Temos fechado os
olhos para a severidade da nossa condição e para a gravidade da ira de Deus.
Fechamos os nossos olhos com uma falsa sensação de segurança por causa
da nossa justiça própria. Cegamos a nós mesmos com os prazeres e
preocupações do mundo. Estamos mais preocupados com um aumento de
salário do que em salvar nossas almas do inferno. Estamos muito ocupados
pescando, viajando, jogando futebol e nos mantendo em forma do que
buscando nos acertar com Deus. Estamos muito ocupados comendo o
guisado de Esaú e nos divertindo com nossos amigos do que buscando a face
de Deus. Porque ainda ouvimos as aves cantando e sentimos o calor do sol,
estamos sob a falsa ilusão de que tudo está bem.
Devíamos estar alarmados, mas estamos tranquilos. Estamos seguindo
a multidão, envolvidos na loucura, capturados pelos últimos modismos e
novidades. Assim como cães que andam à procura da próxima refeição,
somos levados pela maré do hedonismo. Estamos à deriva, perdidos no mar,
mas completamente despreocupados. Corremos atrás da próxima coisa que
nos dará prazer, semelhante ao rato que corre dentro de uma roda. A maré
está nos fazendo cair no sono e nos levando para o fundo do mar. Somos
inconscientemente escravizados pelas nossas rotinas. Nossa vida diária, cheia
de prazeres, negócios e entretenimento, nos cega para o perigo que se
aproxima. Como um rebanho de vacas que caminham de bom grado para o
matadouro, nós seguimos o curso deste mundo enquanto dançamos em nosso
caminho rumo ao inferno.
É apenas uma questão de tempo até que todo esse descuido e essa falsa
sensação de segurança sejam dissipados. A morte arrebatará a todos nós. Em
um momento — que frequentemente é imprevisível — você estará diante de
um Deus santo. Sem desculpas. Sem justiça própria. Sem uma cosmovisão
ateísta. Apenas você e sua culpa totalmente expostos diante do Deus todo-
poderoso. Porém, por enquanto, você continua descuidado.
Perdão: Uma Oferta Universal
A tragédia de tudo isso é que, em seu caminho rumo ao inferno, você
propositalmente irá caminhar sobre o corpo morto e ressurreto de Jesus
Cristo. Se você enfrentar a ira de Deus, será porque recusou continuamente o
amor de Deus. Em seu caminho para o inferno, você rejeitará a Cristo e a sua
livre oferta de graça. Quando você ouviu o Evangelho, uma promessa lhe foi
dada, uma maneira de escapar foi providenciada. Você não tem que enfrentar
a Deus em seus pecados, pois Cristo morreu pelos pecadores. Permanecer na
incredulidade é rejeitar conscientemente essa oferta graciosa.
Além disso, se você deixar Cristo de fora de sua vida, esteja
plenamente consciente acerca de quem é que você está rejeitando. O
Evangelho que lhe oferece a salvação custou tudo para Cristo. Para que Deus
lhe desse o universo, ele só teria que pronunciar algumas palavras. Mas para
salvar sua alma do pecado, ele teve que sacrificar seu único Filho. Essa
promessa gratuita não era sem custo para aquele que a fez. Cristo deixou de
lado a Sua glória e se tornou homem. Ele não veio vestido de Rei, mas de
servo. Ele veio a este mundo sabendo que, como homem, enfrentaria todas as
tentações imagináveis. Depois que João o batizou, Cristo foi conduzido a
uma região deserta por quarenta dias. Durante esse tempo, todo o inferno foi
desencadeado sobre Ele. O Diabo e todas as suas forças demoníacas atiraram
tudo o que tinham contra Ele. O Diabo procurou esmagá-lo com todo o seu
ódio. Durante esse tempo, Cristo estava faminto, cansado e abatido de todas
as maneiras possíveis. Ele permaneceu fiel ao Seu Pai, resistiu a todas as
tentações e não envergonhou nem desonrou aquele que a enviou ao mundo.
Ele amou a Deus e ao próximo com todo o seu coração, mente e alma
perfeitamente, inteiramente e em todos os momentos. Sua vida e ministério
terreno foram cheios de amor, misericórdia e compaixão pelos outros. Ele
não buscava fama, nem fortuna, nem poder. Ele era humilde de coração,
gentil e manso. Ele deu tudo o que tinha para o serviço de Deus e para ajudar
os outros. Ele era sem pecado, justo, perfeito e totalmente glorioso.
E isso não é tudo — nesse estado de humildade, bondade e ausência de
pecado, ele quis tomar o lugar dos pecadores na cruz — o justo pelos
injustos. Ele tomou a nossa vergonha e culpa sobre si mesmo. Ele abraçou de
bom grado a zombaria que merecíamos. Ele foi espancado, cuspido e
totalmente humilhado como o maior dos criminosos. Os seus próprios
discípulos e amigos mais próximos o abandonaram nessa hora tenebrosa. Ele
foi rejeitado porque era santo. Mas, o pior de tudo, a plenitude do furor e da
ira de Deus, que nós merecíamos, foi derramada sobre Ele. Ele suportou a
condenação de Deus para que os crentes pudessem ser declarados inocentes.
Que tipo de rei morre pelos seus inimigos? Esse é um Rei, que oferece um
perdão gratuito para aqueles que se arrependem.
Cristo ressuscitou dentre os mortos, o que provou a Sua inocência. Pela
Sua ressurreição, Cristo venceu o pecado, a morte e o Diabo. Nós podemos
ser perdoados porque o Rei da glória obteve justiça para aqueles que creem.
Que Salvador!
Se você prosseguir na incredulidade, então esse é o Salvador que você
está rejeitando. Esse é o Evangelho que você continua a rejeitar.
Se Deus exigisse um milhão de dólares para limpar os nossos pecados,
muitos pagariam o preço de boa vontade. Se Deus exigisse que déssemos o
nosso primogênito para herdar a vida eterna, este também seria um preço que
alguns estariam dispostos a pagar. Mas, não! É a parte ofendida — Deus —
que deu o Seu primogênito por aqueles que pecaram e se rebelaram contra
Ele. Cristo pagou o preço final para que você possa ser perdoado
gratuitamente. Não apenas o justo pelos injustos, mas o ofendido que toma o
lugar do culpado. A salvação é gratuita, mas isso é o que você rejeita quando
a recusa devido à sua incredulidade.
A que benevolência, graciosidade e bondade devemos dar as costas
quando rejeitamos o evangelho? Se você vai para o inferno, é porque recusa
essa oferta; você vira as costas para a bondade e misericórdia de Deus; você
rejeita um Salvador que morreu para que os pecadores pudessem viver. E
você o rejeita porque quer se divertir com os seus amigos. Você o rejeita
porque não deseja ser salvo de seus pecados. Você rejeita o humilde
Salvador por causa do seu orgulho; você rejeita o justo Juiz por causa dos
seus pecados; e você rejeita o Deus onisciente por causa da sua loucura.
Você rejeita a vida, o significado, o propósito e a felicidade para que você
possa se apegar ao pecado, à morte, à falta de sentido e ao desespero. Você
troca a verdade por uma mentira e o céu pelo inferno. Esse é o absurdo da
incredulidade.
Para aqueles de vocês que ainda estão relaxados e despreocupados com
a condição da sua alma, não há muito mais que eu possa dizer. Mas, para
aqueles que estão com o coração cansado e sobrecarregado, para aqueles que
conseguem ver os seus pecados e rebelião contra o seu Deus, para aqueles
que realmente odeiam os seus pecados, para aqueles que estão dispostos a
humildemente pedir perdão a Deus e se render ao senhorio de Cristo, eu
tenho uma notícia maravilhosa. Olhem para Jesus e vocês serão salvos. Essa
é uma promessa que certamente será cumprida por todos os que creem. Não
é pelas obras, mas é simplesmente por acreditar nessa promessa que nós
somos feitos justos diante de Deus.
Cristo veio para morrer pelos pecadores (1 Timóteo 1:15). Ele se
oferece gratuitamente a todos que em verdade desejam ser libertos dos seus
pecados e da sua culpa. Aqueles que escondem e encobrem os seus pecados
permanecerão neles, mas aqueles que se arrependem — reconhecem sua
culpa e confessam os seus pecados diante de Deus — e creem em seus
corações que Jesus é quem Ele diz ser, serão salvos. Caro leitor, existe
perdão. A sua culpa e o seu pecado podem ser removidos para longe de você,
assim como o Oriente está distante do Ocidente, e a perfeita justiça de Cristo
pode ser creditada à sua conta. Toda a sua culpa pode ser lavada, e o sangue
de Jesus é capaz de purificá-lo de todos os seus pecados. “Vinde a mim”, diz
Cristo, “e eu vos darei descanso”. Deus fez essa promessa. Ele não pode
mentir. Ele é capaz de salvar o pior dos pecadores. A salvação é gratuita;
você só precisa crer.
E crer, meus caros amigos, é a única coisa racional a se fazer.
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Zacharias, Ravi. A Shattered Visage: The Real Face of Atheism. Grand
Rapids: Baker Books, 1990.
A editora O Estandarte de Cristo é fruto de um trabalho que começou a ser
idealizado por volta do início de 2013, por William e Camila Rebeca, com o
propósito principal de publicar traduções de autores bíblicos fiéis. Fizemos
as primeiras publicações no dia 2 de dezembro de 2013 (publicação de 4
eBooks). De lá para cá já são quase 7 anos e centenas de traduções de
autores bíblicos fiéis, sobre diversos temas da fé cristã.

Somos uma editora de fé cristã batista reformada e confessional.


Estamos firmemente comprometidos com as verdades bíblicas fielmente
expostas na Confissão de Fé Batista de 1689.

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O Estandarte de Cristo

A Confissão de Fé Batista de 1689 + Catecismo Puritano compilado por


C.H. Spurgeon

❝ Nós precisamos de um estandarte pela causa da verdade; pode ser que esse pequeno
volume ajude a causa do glorioso Evangelho, testemunhando claramente quais são as suas
principais doutrinas… Aqui os membros mais jovens da nossa igreja terão um Corpo de
Teologia, que servirá como uma pequena bússola, e por meio de provas bíblicas, estarão
prontos para dar a razão da esperança que há neles… Apeguem-se fortemente à Palavra de
Deus que está aqui mapeada para vocês. ❞ — C.H. Spurgeon, 1855
A Interpretação das Escrituras
A.W. Pink

❝ Dificilmente encontraremos um “tratado sobre hermenêutica”, tão bíblico e completo,


tão profundo e ao mesmo tempo tão prático, como diz o próprio autor: Nestes capítulos
temos nos esforçado para colocar diante de nossos leitores as regras que temos usado há
muito tempo em nosso próprio estudo da Palavra; elas foram projetadas mais
especialmente para os jovens pregadores. Nós não poupamos esforços para torná-los tão
lúcidos e completos quanto possível, colocando em suas mãos esses princípios de
exegese que nos foram de grande proveito. ❞
Os Distintivos da Teologia Pactual Batista
Pascal Denault

❝ Pascal Denault merece muitos agradecimentos por seu trabalho ao pesquisar e descrever
as nuances da teologia do pacto da Inglaterra no século XVII. Ele mostrou fatores
significantes que contribuíram para as diferenças entre o pensamento e a prática dos
presbiterianos e batistas particulares, descrevendo categorias teológicas em termos fáceis e
acessíveis. ❞ — James M. Renihan, Ph.D. Deão e professor de teologia histórica Institute of
Reformed Baptist Studies
A Falha Fatal da Teologia por Trás do Batismo Infantil
Jeffrey Johnson
❝ Jeffrey Johnson produziu uma interação minuciosa, vigorosa e impressionante com a
teologia pactual, enquanto usada como apoio para o batismo infantil. Ele expôs uma análise
detalhada de cada parte do sistema, aprovou o que era biblicamente fundamentado,
desafiou o que é indefensavelmente inventado e ofereceu alternativas convincentes para
cada parte do sistema que ele desafiou. ❞ — Tom J. Nettles, Ph.D. Professor de teologia
histórica Southern Baptist Theological Seminary
Um Guia para a Oração Fervorosa
A.W. Pink
❝ A oração particular é o teste de nossa sinceridade, o indicador de nossa
espiritualidade, o principal meio de crescimento na graça. A oração particular é a única
coisa, acima de todas as demais, que Satanás busca impedir, pois ele bem sabe que, se ele
puder ser bem sucedido neste ponto, o cristão falhará em todos os outros… Por mais
desesperado que seja o nosso caso, maior é nossa necessidade de orar, se a graça em nós
está fraca, a contínua negligência em orar a fará ainda mais fraca, se nossas corrupções
são fortes, a omissão em orar as fará ainda mais fortes. ❞
Oração: Orando com o Espírito Santo e com o Entendimento
John Bunyan
❝ A oração é uma ordenança de Deus que deve ser praticada tanto em público quanto em
particular. Além disso, é uma ordenança que conduz aqueles que possuem o espírito de
súplica para grande familiaridade com Deus, e também possui efeitos tão notáveis que
alcançam grandes coisas de Deus, tanto para a pessoa que ora como para aqueles por quem
ela ora. A oração abre o coração de Deus e através dela a alma, mesmo quando vazia, é
preenchida. Através da oração o cristão também pode abrir seu coração a Deus como o
faria com um amigo, e obter um testemunho renovado de Sua amizade. ❞
Piedade Cristã: Os Frutos do Verdadeiro Cristianismo
John Bunyan

Todo aquele que foi justificado pela graça de nosso Senhor Jesus Cristo encontrará aqui
um excelente guia para que possa viver de modo agradável a Deus. Este livro faz lembrar
a magistral obra, A Prática da Piedade, do piedosíssimo Lewis Bayly, por seu fervor e
fidelidade bíblicos, e por sua sobriedade e zelo piedoso de obedecer aos mandamentos do
Senhor em todas as áreas de nossas vidas e em todos os nossos relacionamentos. O autor
nos exorta à prática da verdadeira piedade cristã a partir de Tito 3:7-8.
O Homo como Sacerdote em seu Lar
Samuel Waldron
❝ A ideia de que um homem é sacerdote em seu lar se deriva naturalmente da tese de que
todo ministério cristão tem caráter sacerdotal. No entanto, esse assunto confronta os
homens com algumas das responsabilidades mais difíceis que enfrentaremos. Quando
cumprimos nosso dever e sentimos nosso pecado e fraqueza nessa área, devemos
constantemente nos lembrar da graça e das promessas que Deus nos deu. Não podemos
fazer progresso confiado em nossas próprias forças. Somente cresceremos e assumiremos
nossas responsabilidades com a ajuda de Deus. ❞
A Doutrina da Trindade
John Owen
John Owen fez uma defesa magistral da grande doutrina bíblica da Santíssima Trindade
contra os socinianos. Dificilmente veremos hoje alguém que se denomine um sociniano,
mas não é tão raro assim encontrar alguém indouto e inconstante que segue as pisadas deles
e nega a verdade bíblica sobre a bendita doutrina da Trindade, para sua própria perdição
eterna (2Pe 3:16). Portanto a refutação que Owen faz das principais objeções dos oponentes
dessa doutrina permanece útil também para os nossos dias. Sobretudo é proveitosa a
exposição fiel e profunda feita por ele sobre os principais textos bíblicos que revelam essa
verdade fundamental sobre o único e verdadeiro Deus: Pai, Filho e Espírito.
Os 5 Pontos do Calvinismo
C.H. Spurgeon
Nesta excelente coletânea de sermões Charles Spurgeon expõe o ensino bíblico sobre
aqueles que ficaram conhecidos como os 5 Pontos do Calvinismo: 1. Depravação Total;2.
Eleição Incondicional; 3. Expiação Limitada; 4. Graça Irresistível; 5. Perseverança dos
Santos. A capacidade ímpar com que Deus dotou o pregador e a beleza e firmeza da
verdade bíblica por ele tratada fazem deste livro um recurso extremamente importante
para todos aqueles que desejam obter uma compreensão clara e robusta do ensino bíblico
acerca da soberania da graça divina na salvação dos homens.
Como Saltar em Segurança para a Eternidade
Lidiano Gama
❝ Com habilidade, o autor L.A. Gama desenvolveu a viagem de Greg Thopp rumo à
eternidade sempre ladeado pelas doutrinas que foram o fundamento e alicerce não
apenas dos batistas particulares (reformados), mas da própria Reforma Protestante e do
puritanismo inglês e norte-americano que se seguiu. O livro é valioso para todos os
cristãos, mas, sobretudo, é uma preciosa contribuição para os batistas e uma excelente
oportunidade para se examinar cuidadosamente esse documento, a Confissão de Fé
Batista de 1689. ❞ — Marcus Paixão
Teologia Bíblica Batista Reformada
Fernando Angelim
❝ Estou convencido da extrema necessidade e urgência da igreja brasileira, especialmente
os batistas, recuperar um entendimento bíblico profundo e piedoso sobre os pactos de
Deus. E estou igualmente convencido de que este livro tem muito a contribuir para esse
fim. Escrito de maneira clara e didática, e sobretudo bíblica, este livro se mostrará útil tanto
para o pai de família que deseja conhecer melhor sua Bíblia e guiar a sua família
piedosamente quanto para aquele que foi chamado a se “apresentar a Deus aprovado, como
obreiro que não tem de que se envergonhar, que maneja bem a palavra da verdade” (2
Timóteo 2:15). ❞ — William Teixeira

[1]
Paul Tillich, Biblical Religion and the Search for Ultimate Reality
(Chicago: The University of Chicago Press, 1955), 85.
[2]
Richard Dawkins, The Selfish Gene (New York: Oxford, 2006), 198.
Dawkins afirma que a Bíblia ridiculariza a dúvida de Tomé por pedir provas
antes de ele crer na ressurreição de Cristo (Ibid.).
[3]
Dionysius, “The Divine Names”, em Dionysius the Areopagite on
the Divine Names and The Mystical Theology, trans. C. E. Rolt (Berwick,
MA: Ibis Press, 2004), 59.
[4]
Ibid., 53.
[5]
Ibid., 135.
[6]
Bonaventure, “The Journey of the Mind to God”, em Late Medieval
Mysticism, ed. Ray C. Petry (Philadelphia: The Westminster Press, 1957),
132.
[7]
Ibid., 140-141.
[8]
Meister Eckhart, “Another Sermon on the Eternal Birth”, em Late
Medieval Mysticism, ed. Ray C. Petry (Philadelphia: The Westminster Press,
1957), 189.
[9]
Immanuel Kant, Critique of Pure Reason, trans. J. M. D. Meiklejohn
(Amherst, NY: Prometheus Books, 1990), 1.
[10]
Como Kant declarou: “Embora todo o nosso conhecimento comece
com a experiência, não ocorre de modo algum que tudo surja da experiência.
Pois, pelo contrário, é bem possível que nosso conhecimento empírico seja
composto por aquilo que recebemos através de impressões, e daquilo que a
faculdade da cognição fornece a si mesma” (Ibid.). Dessa forma, Kant não
estava sugerindo que não existam conceitos fornecidos pela cognição, mas
sim que esses conceitos (ou categorias, como ele os chamou) não eram
iniciados até que fossem simulados pelas sensações derivadas pelos sentidos.
Por essa razão, as categorias nunca podem estender-se para além dos objetos
da experiência. Em outras palavras, não existe algo como
razão/conhecimento puro (sem ajuda) à priori que seja independente das
sensações empíricas.
[11]
Kant, em seu livro a Critique of Pure Reason, dividiu a existência
em duas esferas, a nominal — o mundo tal como ele realmente é, e os
fenômenos — o mundo tal como ele nos parece. Segundo Kant, nunca
poderemos conhecer o mundo tal como ele realmente é, mas apenas o mundo
dos fenômenos, o mundo da aparência.
[12]
Bryan Magee, The. Story of Philosophy (London: Dorling
Kindersley, 2001), 137.
[13]
B. A. Gerrish, A Prince of the Church: Schleiermacher and the
Beginnings of Modern Theology (Philadelphia: Fortress Press, 1984), 25.
[14]
Essa experiência religiosa, para Schleiermacher, era um sentimento
de dependência.
[15]
Veja John L. Murphy, Modernism and the Teaching of
Schleiermacher, Part II (Washington: The Catholic University of America
Press, 1961), 15-38.
[16]
Embora Kierkegaard faça referência ao abismo de Lessing (um
abismo que separa as verdades eternas da razão das verdades contingentes da
história), Ronald Green sugere que Kierkegaard tinha em mente a distinção
de Kant entre os reinos nominal e fenomenal quando fala da fé em Deus
como um salto (Veja Ronald Green, Kierkegaard and Kant: The Hidden
Debt). Gotthold Ephriam Lessing (1729-1781), contudo, achou que não era
razoável crer na historicidade dos milagres, porque a fé repousaria não na
prova demonstrada pelo milagre, mas no testemunho falível das testemunhas
históricas do milagre. Como Lessing afirmou: “Profecias cumpridas que eu
mesmo experimentei são uma coisa; profecias cumpridas das quais só tenho
conhecimento histórico de que outros afirmam tê-las experimentado são outra
coisa” (“On the proof of the spirit and of power (1777)” em Lessing:
Philosophical and Theological Writings. Edit. H.B. Nisbet. Cambridge:
Cambridge University Press, 2005, 83). Depois de separar os relatos dos
milagres históricos de Cristo das nossas experiências atuais que correm de
modo contrário do milagroso, Lessing prosseguiu afirmando: “Então, esse é o
grande e feio abismo que eu não consigo atravessar, por mais que, frequente e
sinceramente, eu tenha tentado dar esse salto” (Ibid., 87).
[17]
Ronald Green, Kierkegaard and Kant: The Hidden Debt (Albany:
State University of New York Press, 1992), 76.
[18]
Stephen Evans, Passionate Reason: Making Sense of Kierkegaard’s
Philosophical Fragments (Bloomington: Indiana University Press, 1992), 88.
[19]
Søren Kierkegaard, Fear and Trembling, trans. Alastair Hannay
(London: Penguin Books, 2003), 54.
[20]
Søren Kierkegaard, ‘Concluding Unscientific Postscript’ in
Kierkegaard’s Writings, Vol. 1. ed. e trans. Howard V. Hong & Edna H.
Hong (Princeton: Princeton University Press, 1992), 203.
[21]
Ibid.
[22]
Ibid.
[23]
Ibid., 204.
[24]
Kierkegaard afirmou que se os crentes insensatamente tentassem
fortalecer a sua fé através de uma “investigação objetiva”, a sua fé seria
perdida nesse processo. Quando o absurdo se torna cada vez mais provável,
então a fé não tem onde se agarrar, “pois o absurdo é precisamente o objeto
da fé, e o único [objeto] em que se pode acreditar” (Ibid., 211). Ele disse isso
como que afirmando que a fé não pode se apegar ao que não é absurdo.
[25]
Karl Barth, Church Dogmatics, ed. G. W. Bromiley and T.F.
Torrance (Edinburgh: T. & T. Clark, 1936-1969), 1.2, 457.
[26]
Church Dogmatics., 1.1.123.
[27]
Veja Rudolf Bultmann, New Testament and Mythology (New York:
Harper & Row, 1966).
[28]
Carl Armbruster, The Vision of Paul Tillich (New York: Sheed And
Ward, 1967), 136.
[29]
Ibid., 53.
[30]
Paul Tillich, “The Depth of Existence”, em The Shaking of the
Foundations (New York: Charles Scribner’s Sons, 1948), 57.
[31]
Ibid., 136.
[32]
Ibid., 136.
[33]
Citado em Ibid., 47.
[34]
David Hume, Dialogues Concerning Natural Religion
(Indianapolis: The Bobbs — Merrill Company, 1947), 158. As palavras entre
colchetes são minhas.
[35]
Citado em Alvin Plantinga, Warranted Christian Belief (New York:
Oxford University Press, 2000), 32.
[36]
Ibid., 39.
[37]
Escrito por Alfred H. Ackley (b. Spring Hill, PA, 1887; d. Whittier,
CA, 1960), tanto as letras quanto a melodia foram publicados no hinário de
Rodeheaver, Triumphant Service Songs (1933).
[38]
Blaise Pascal, Pensées, 277.
[39]
Voltaire, The Works of Voltaire: A Contemporary Version, 21 Vols.
A Critique and Biography by John Morley, notes by Tobias Smollett, trans.
William F. Fleming (New York: E.R. DuMont, 1901)., 4:327.
[40]
Ibid., 5:253.
[41]
Friedrich Nietzsche, Anti-christ. Trans. H.L. Mencken (New York:
Cosimo Classics, 2005), 57.
[42]
Smith, George H., Atheism: The Case Against God (Amherst, NY:
Prometheus Books, 1989), 125.
[43]
Ênfase minha.
[44]
Francis Turretin, Institutes of Elenctic Theology, Vol. 1, trans.
George Musgrave Giger (Phillipsburg: P&R, 1992), 24.
[45]
Charles Hodge, Systematic Theology, Vol. 3, (Grand Rapids:
Eerdmans, 1981), 83.
[46]
Richard Swinburne, Is There a God? (New York: Oxford, 1996),
123.
[47]
R.C. Sproul, If There’s a God, Why are there Atheists? (Wheaton,
IL: Tyndale House Publishers, 1988), 73.
[48]
Pensées, 261.
[49]
Pensées, 284.
[50]
Edward O. Wilson, On Human Nature (Cambridge: Harvard
University Press, 2004), 6.
[51]
C.S. Lewis, Mere Christianity (New York, NY: Touchstone, 1980),
18.
[52]
Mere Christianity, 25.
[53]
Ibid., 19.
[54]
Uma regressão infinita é uma série interminável de proposições que
seriam necessárias se cada proposição exigisse uma demonstração.
[55]
There Is a God, 134.
[56]
Eu creio que existem outras crenças básicas e verdades inerentes,
tais como a confiabilidade geral da percepção dos sentidos, a lei da
causalidade e a crença em outras mentes.
[57]
O teólogo holandês do século XIX Herman Bavinck concordou:
“Estamos plenamente convencidos — antes de qualquer argumentação — da
nossa própria existência, da existência do mundo à nossa volta, das leis da
lógica e da moralidade, simplesmente como resultado das impressões
indeléveis que todas essas coisas causam em nossa consciência. Aceitamos
essa existência — sem constrangimentos nem coação — de forma espontânea
e instintiva. E o mesmo acontece com a existência de Deus” (Reformed
Dogmatics. Trad. John Vriend. Grand Rapids: Baker, 2004., Vol. 2. 90).
[58]
Charles Hodge não se sentia confortável com a palavra inata, mas
procurou explicar o conhecimento de Deus como uma faculdade pré-
condicionada ou inerente que torna o conhecimento de Deus inescapável: “Eu
não digo que os homens nascem com algum conhecimento inato de Deus —
eles não têm nenhum — mas eu digo que eles nascem com a faculdade de
conhecer a Deus” (Systemic Theology, Vol. 1. 192).
[59]
Systemic Theology, Vol. 1. 192.
[60]
Institutes, 1.3.3.
[61]
Institutes, 1.3.1.
[62]
Warranted Christian Belief, 173.
[63]
Calvino, entretanto, afirmou que nós não precisamos sair de nós
mesmos para processar o conhecimento de Deus (Institutes, 1.4.4).
[64]
Covenantal Apologetics,103.
[65]
Citado em Don Collett, “Van Til and Transcendental Argument” in
Revelation and Reason, ed. K. Scott Oliphint and Lane G. Tipton
(Phillipsburg, NJ: P&R, 2007), 269.
[66]
De acordo com Richard Muller, “Calvino havia distinguido entre
três tipos de ‘razões’: a ‘razão naturalmente implantada’ no ser humano por
Deus, que ‘não pode ser condenada sem insultar a Deus’; uma razão viciada,
habitando na ‘natureza corrupta’, que distorce pecaminosamente a revelação
de Deus; e a ‘razão... derivada da Palavra de Deus’” (Post-Reformation
Reformed Dogmatics, Vol. 1., 275).
[67]
Meredith Kline nos auxilia na forma como conecta o nosso
conhecimento da ética ao fato de termos sido feitos à semelhança de Deus:
“A semelhança com Deus é significada tanto pela imagem de Deus como
pelo Filho de Deus. A semelhança do homem com Deus é uma exigência
para ser como Deus; o indicativo aqui tem a força de um imperativo.
Formado à imagem de Deus, o homem é informado por um senso da
divindade pelo qual ele sabe como Deus é, não apenas que Deus existe
(Romano 1:19). E o conhecimento de alguém do que é Deus Pai é o
conhecimento do que, como criatura, ele mesmo deve ser. Com o senso da
divindade vem a consciência, o senso da divindade no modo imperativo. A
norma básica e geral da imitação de Deus foi assim escrita nas tábuas do
coração do homem (Romanos 1:32; 2:14)” (Kingdom Prologue: Genesis
Foundations for a Covenantal Worldview. Eugene, OR: Wipf & Stock, 2006,
62).
[68]
O puritano inglês John Owen afirmou: “É necessário para a
autossuficiência ilimitada de Deus que somente ele próprio se conheça
perfeitamente. A sua compreensão é perfeita e não tem limites. Portanto,
como esse atributo de Deus, pelo qual ele compreende a si mesmo e todas as
suas perfeições, é um atributo infinito, ele não pode ser tido por nenhum
outro ser. Somente o próprio Deus é onisciente e todo-sábio e, portanto, o
conhecimento em sua verdadeira plenitude só pode repousar no próprio
Deus” (Biblical Theology, 15).
[69]
Don Collett, “Van Til and Transcendental Argument” in Revelation
and Reason, ed. K. Scott Oliphint e Lane G. Tipton (Phillipsburg, NJ: P&R,
2007), 266.
[70]
Veja Ronald Nash, The Word of God and the Mind of Man
(Phillipsburg, NJ: P&R Publishing, 1982), 59-69.
[71]
Carl Henry, God, Revelation and Authority (Waco: Word Books,
1979), Vol. 3., 203. As palavras entre os colchetes são do presente autor.
[72]
George Park Fisher, The Grounds of Theistic and Christian Belief
(New York: Charles Scribner’s Sons, 1915), 34.
[73]
Ibid.
[74]
Institutes 1.1.2., 1.1.1.
[75]
De acordo com os pensamentos de Calvino, John Frame declarou:
“Nem o conhecimento de Deus nem o conhecimento de si mesmo é possível
sem o conhecimento do outro” (The Doctrine of the Knowledge of God, 65).
[76]
Cornelius Van Til, The Defense of the Faith (Philipsburg, NJ: R&R,
1967), 90.
[77]
George Park Fisher, The Grounds of Theistic and Christian Belief
(New York: Charles Scribner’s Sons, 1915), 1.
[78]
K. Scott Oliphint, Reasons for Faith (Philipsburg, NJ: P&R, 2006),
139.
[79]
Covenantal Apologetics, 103.
[80]
Reasons for Faith,155.
[81]
Ibid.
[82]
Ibid.
[83]
The Grounds of Theistic and Christian Belief, 24.
[84]
Warranted Christian Belief, 175.
[85]
Ibid., 179.
[86]
Ibid., 180.
[87]
Cornelius Van Til afirmou: “Assim, o conhecimento de Deus é
inerente ao homem. Está presente em virtude dele ter sido criado à imagem
de Deus” (Defense of the Faith, 172.), citado em Greg Bahnsen, Van Til’s
Apologetic (Phillipsburg, NJ: P&R Publishing, 1998), 221.
[88]
Greg Bahnsen prosseguiu com o seu discurso: “Em vez disso,
estamos dizendo que as leis da lógica refletem a sua natureza, a forma como
ele é em si mesmo. Elas são, portanto, expressões eternas do caráter imutável
de Deus” (Pushing the Antithesis, 210-211).
[89]
Institutes 1.5.1.
[90]
Ibid.
[91]
John Calvin, Calvin’s Commentaries, Vol. 1, trans. John King
(reprint, Grand Rapids: Baker, 2003), 58-62.
[92]
Collected Writings of John Murray, Vol. 4, 1.
[93]
The Doctrine of the Knowledge of God, 64.
[94]
Ibid., 175
[95]
Institutes 1.3.1, 1.3.3.
[96]
Reasons for Faith, 140.
[97]
Calvin’s Commentaries, Citado em Greg Bahnsen, Always Ready,
39.
[98]
Citado em Herman Bavinck, In the Beginning (Edinburgh: Banner
of Truth Trust, 1979), 179.
[99]
Reasons for Faith, 155.
[100]
O nosso relacionamento pactual com Deus é de natureza legal.
Assim, ela é baseada na lei da não-contradição e na lei de Deus.
[101]
K. Scott Oliphint, Covenantal Apologetics (Wheaton, IL:
Crossway, 2013), 93.
[102]
The Defense of the Faith, 92.
[103]
Institutes, 1.4.4.
[104]
Ronald Nash, Worldviews in Conflict (Grand Rapids: Zondervan,
1992), 16.
[105]
Ibid.
[106]
Greg L. Bahnsen, Pushing the Antithesis (Powder Springs, GA:
American Vision, 2007), 42.
[107]
James W. Sire, Naming the Elephant: Worldview as A Concept
(Downers Grove, IL: IVP, 2004), 101.
[108]
Ibid., 107-108.
[109]
Ibid., 122.
[110]
James Sire lista os pressupostos por trás de cada cosmovisão como
as respostas que damos a estas 7 perguntas: (1.) “Qual é a principal realidade
— a verdadeira realidade?” (2.) “Qual é a natureza da realidade exterior, ou
seja, do mundo à nossa volta?” (3.) “O que é um ser humano?” (4.) “O que
acontece com as pessoas após a morte?” (5.) “Porque é possível conhecer
alguma coisa?” (6.) “Como sabemos o que é certo e o que é errado?” (7.)
“Qual é o significado da história humana?” (Ibid., 94). Concordo com essa
lista de perguntas de Sire. Contudo, parece-me que essas questões podem ser
reduzidas à metafísica, epistemologia ou ética.
[111]
Faith and Reason, 27.
[112]
Ibid.
[113]
Pushing the Antithesis, 118.
[114]
Technically, by metaphysics, I am referring to ontology — the
nature of being.
[115]
John Byl, The Divine Challenge (Edinburgh: Banner of Truth
Trust, 2004), 33.
[116]
Carl Sagan, Cosmos (New York: Random House, 2002), 4.
[117]
Os deístas não se encaixam adequadamente nesse campo. Depois
de explicar as origens do universo olhando para uma causa sobrenatural, eles
partem e dão as mãos aos naturalistas, tornando essa causa sobrenatural inútil
para a vida.
[118]
René Descartes, Discourse on Method and Meditations on First
Philosophy (Indianapolis/Cambridge: Hackett Publishing Company, 3rd ed.,
1993), 19.
[119]
“A partir disso”, disse Descartes, “soube que eu era uma substância
cuja essência ou natureza consistia completamente apenas em pensar, e que,
para existir, não precisava de lugar e não dependia de nada material” (Ibid.).
[120]
Ibid.
[121]
Ibid.
[122]
Em vez de interpretar Descartes como um racionalista puro,
poderia ser argumentado que ele previu o argumento pressuposto para a
existência de Deus. Para que o silogismo Cogito, ergo sum funcione, o
conhecimento de Deus deve ser pressuposto. Comentando isso, Jean-Marie
Beyssade explicou que essa “prova não pode ser bem sucedida, ou até mesmo
sair do chão, se alguém não tem ideia, ou seja, percepção, que corresponda ao
significado da palavra ‘Deus’” (“The Idea of God and Proofs of His
Existence” em The Cambridge Companion to Descartes. ed. John
Cottingham. Cambridge: Cambridge University Press, 1995., 176). Beyssade
passou a declarar: “A prova a priori de Deus parte do fato suposto, que é
tomado como certo, de que todas as perfeições estão unidas em uma única
natureza que é chamada ‘Deus’” (Ibid.,178). Porque todos sabemos que Deus
existe como o ser mais perfeito, podemos concluir, observando a nossa
própria imperfeição, que não poderíamos ter chegado a esse pressuposto
acerca desse ser mais perfeito por nós mesmos, mas ele deve ter sido
implantado ali pelo próprio Deus.
[123]
Citado em Gordon Clark, Thales To Dewey (Jefferson, MD: The
Trinity Foundation, 2nd ed., 1989), 360.
[124]
The Doctrine of the Knowledge of God, 401.
[125]
Pushing the Antithesis, 119.
[126]
Citado em Bertrand Russell, Why I Am Not a Christian, 118.
[127]
Thomas Nagel, The Last Word (Oxford: Oxford University Press,
1997), 130–131.
[128]
Citado em John C. Lennox, God and Stephen Hawking (Oxford:
Lion Books, 2011), 41.
[129]
Paul Davies, The Cosmic Jackpot (Boston: Houghton Mifflin
Company, 2007), 15.
[130]
The Doctrine of the Knowledge of God, 63.
[131]
Vern Poythress, Redeeming Philosophy (Wheaton: Crossway,
2014), 19.
[132]
Citado em Greg L. Bahnsen, Pushing the Antithesis (Powder
Springs, GA: American Vision, 2007), 44.
[133]
John Lennox, God’s Undertaker (Oxford: Lion Books, 2009), 9.
[134]
George Klein, The Atheist in the Holy City (Cambridge, MA: MIT
Press, 1990), 203. Citado em Ibid., 35.
[135]
Citado em God’s Undertaker., 35-36.
[136]
Roy Abraham Varghese, prefácio de Antony Flew, There Is a God
(New York: HarperOne, 2007), xix.
[137]
Porém, os seus pressupostos não são autorreferencialmente
absurdos (como a noção de que toda crença deve ser apoiada por evidências),
mas sim verdades autoverificáveis (como a existência de Deus, a lógica e os
absolutos morais). Uma vez que todos nós, quer queiramos quer não,
devemos começar a nossa busca de conhecimento baseados algum
fundamento pré-estabelecido, então é importante que comecemos com um
fundamento que seja capaz de se sustentar à luz do seu próprio testemunho.
[138]
The Divine Challenge, 19.
[139]
Naming the Elephant, 56. As palavras entre colchetes são minhas.
[140]
James Sire nos lembra que tudo fica invertido quando colocamos a
epistemologia antes da ontologia (a natureza do ser). Isso coloca o homem no
lugar de Deus, e coloca as opiniões subjetivas acima da realidade objetiva.
No entanto, gostaria de sugerir que o que motiva o homem caído a colocar o
seu próprio pensamento e poder de raciocínio acima da realidade objetiva —
isto é, acima de Deus — é aquilo que há em seu coração caído. O homem
desregrado é depravado. O seu principal amor é o eu. A ética (que se
preocupa com o que devemos amar e como devemos nos comportar) deve
fluir primeiramente do ser de Deus e a partir de nosso conhecimento dele. O
homem caído, porém, colocou o eu acima de Deus. O amor-próprio é o
principal compromisso dele, e esse amor-próprio (o seu compromisso ético)
molda a sua epistemologia, que por sua vez molda a sua compreensão e
aceitação de Deus (ontologia). A ordem apropriada da ontologia (realidade
última), da epistemologia e da ética (o compromisso primário do homem) foi
invertida por ocasião da queda.
[141]
Cornelius Van Til, Common Grace and the Gospel (Phillipsburg,
NJ: R&R Publishing, 1972), 8.
[142]
Bertrand Russell, Why I Am Not a Christian (New York, NY:
Simon & Schuster, 1957), 6-7.
[143]
Os materialistas acreditam que nossas memórias, pensamentos e
sentimentos são explicados pelas propriedades do cérebro.
[144]
Jonathan Edwards, The Freedom of the Will (Morgan, PA: Soli
Deo Gloria, 1996), 48.
[145]
Embora não seja justo exigir aos ateus que provem a inexistência
de Deus, é justo e razoável lhes pedir que produzam uma visão do mundo que
não seja autocontraditória.
[146]
Citado em John Blanchard, Does God Believe in Atheists?
(Darlington, UK: Evangelical Press, 2001), 14.
[147]
A.J. Ayer, Language, Truth, and Logic (New York: Dover Books,
1952), 115.
[148]
Na República de Platão, Sócrates instrui os seus interlocutores da
seguinte maneira: “Devemos seguir o argumento para onde quer que, como o
vento, ele nos leve” (394d: trans. G.M.A. Grube. Indianapolis: Hackett,
1974., 65).
[149]
Citado em Ronald Nash, Worldviews in Conflict, 54.
[150]
R.C. Sproul, If There’s a God, Why are there Atheists? (Wheaton,
IL: Tyndale House Publishers, 1988), 65.
[151]
O materialismo, o empirismo, o relativismo etc. não são visões de
mundo opostas, mas sim várias facetas de uma visão de mundo naturalista.
[152]
Richard Dawkins, The Blind Watchmaker (New York: Norton,
1996), 6.
[153]
Phillip E. Johnson, Darwin on Trail (Downers Grove, IL: IVP, 2
ed. 1993), 12.
[154]
Citado em God’s Undertaker, 87.
[155]
Por Big Bang quero dizer uma explosão cósmica ininteligente, não
que o universo não possua um ponto de início finito.
[156]
Francis Schaeffer, Trilogy, “He is There and He is Not Silent”
(Wheaton, IL: Crossway, 1990), 282.
[157]
Stephen Hawking e Leonard Mlodinow, The Grand Design (New
York: Bantam Books, 2010), 180.
[158]
Peter Atkins, Creation Revisited (Oxford: W. H. Freeman &
Company, 1992), 149.
[159]
R.C. Sproul e Keith Mathison, Not a Chance: God, Science, and
the Revolt against Reason (Grand Rapids, Baker Books, 2014), 26.
[160]
John C. Lennox, God and Stephen Hawking (Oxford: Lion Books,
2011). 31.
[161]
Ibid., 32.
[162]
Citado em Jonathan Sarfati, Refuting Evolution (Green Forest, AR:
Master Books, 1999), 93.
[163]
The Death of Evolution, 31-32.
[164]
Ibid., 33.
[165]
No original: Non-committally anti-chance.
[166]
Nota de tradução: Plural de quantum, que é o menor valor que
certas grandezas físicas podem apresentar.
[167]
http://www.uncommondescent.com/intelligent-design/arthur-
stanley-eddington-darwinists-and-repugnant-notions/
[168]
Citado em The Cosmic Jackpot, 8.
[169]
The Divine Challenge, 59.
[170]
Antony Flew, There Is a God (New York: HarperOne, 2007), 96.
[171]
George Johnson, “Creation, in the Beholder”, The New York Times,
20 May 2014, D3.
[172]
Citado em Stephen C. Meyer, Signature in the Cell (New York:
HarperOne, 2009), 17-18. A ênfase é de Stephen Meyer.
[173]
Ibid.
[174]
Citado em Signature in the Cell, 12.
[175]
Veja ing, Natural Theology (New York: Oxford, 2008), 1-10.
[176]
Daniel Dennett, Darwin’s Dangerous Idea (New York:
Touchstone, 1996), 42-43.
[177]
God’s Undertaker, 104.
[178]
Refuting Evolution, 124.
[179]
There Is a God, 111.
[180]
Citado em There Is a God, 129.
[181]
Signature in the Cell, 343-344.
[182]
M.J. Behe, Darwin’s Black Box (New York: The Free Press, 1996).
[183]
A Teoria Protoplasmática assumiu falsamente que o protoplasma
era o elemento básico da vida e que — tal como duas substâncias químicas
como o hidrogênio e o oxigênio formam a água quando combinadas — dois
ingredientes químicos poderiam se combinar nas circunstâncias ambientais
corretas e criar o protoplasma.
[184]
Citado em Jim Nelson Black, The Death of Evolution (Grand
Rapids: Zondervan, 2010), 2.
[185]
There Is a God, 90.
[186]
Citado em The Death of Evolution, 142.
[187]
Citado em Ibid., 110.
[188]
Citado em Darwin on Trail, 34.
[189]
http://www.jmtour.com/personal-topics/the-scientist-and-
his-“theory”-and-the-christian-creationist-and-his-“science”
[190]
https://www.youtube.com/watch?v=PZrxTH-
UUdI&feature=youtu.be (52:00 to 56:44) June, 2014.
[191]
Paul Davies, The Cosmic Jackpot (Boston: Houghton Mifflin
Company, 2007), 5.
[192]
Ibid., 14.
[193]
Thomas Nagel, Mind and Cosmos (New York: Oxford, 2012), 44-
45.
[194]
Citado em Jonathan Sarfati Refuting Evolution (Green Forest, AR:
Master Books, 1999), 48.
[195]
Citado em God’s Undertaker, 113-114.
[196]
Citado em Ibid., 114. As palavras entre colchetes são de Lennox..
[197]
Stephen C. Meyer, Darwin’s Doubt (New York: HarperOne, 2013),
17.
[198]
Ibid., 34.
[199]
Ibid.
[200]
Ibid.
[201]
David Berlinski, The Devil’s Delusion: Atheism and Its Scientific
Pretensions (New York: Basic Books, 2009), 191-192.
[202]
Citado em Refuting Evolution., 17-18.
[203]
Daniel Dennett, Darwin’s Dangerous Idea (New York:
Touchstone, 1991), 21.
[204]
Ibid., 46.
[205]
Ibid.
[206]
Ibid. 83.
[207]
Citado em There Is a God, 131.
[208]
Citado em John Blanchard, Is Anybody There (Darlington:
Evangelical Press, 2006), 18.
[209]
Citado em Death to Evolution, 3.
[210]
George Wald, “Innovation and Biology”, Scientific American, Vol.
199, Sept. 1958, 100.
[211]
Thomas Nagel, Mind and Cosmos (New York: Oxford, 2012), 5.
As palavras entre colchetes são minhas.
[212]
Ibid., 11.
[213]
Ibid., 49.
[214]
Herman Bavinck, In the Beginning (Edinburgh: Banner of Truth
Trust, 1979), 23.
[215]
W.K. Clifford, “The Ethics of Belief”, em Philosophy of Religion,
ed. Charles Taliaferro e Paul J. Griffiths (Oxford: Blackwell, 2003), 199.
[216]
Bertrand Russell, Religion and Science (New York: Oxford, 1997),
243.
[217]
Veja Mere Christianity, 33.
[218]
Veja Alvin Plantinga, God and Other Minds (Ithaca: Cornell
University Press, 1990). Contudo, antes de Plantinga fazer essa comparação,
George Park Fisher vinculou os fundamentos da crença em outras mentes
com os fundamentos da crença em Deus quando disse: “Nós inferimos a
existência de uma Deidade inteligente, assim como inferimos a existência da
inteligência nos nossos semelhantes, e por razões não menos razoáveis... Os
meus sentidos não tomam conhecimento da mente dos outros homens... Que
prova há da consciência no amigo que está ao meu lado? Como posso ter a
certeza de que ele não é uma mera automatização, totalmente inconsciente
dos seus próprios movimentos? O mandado para a inferência contrária reside
no fato de que, estando possuído de consciência e conhecendo os seus efeitos
em mim mesmo, considero os efeitos semelhantes como prova do mesmo
princípio nos outros. Mas essa inferência transcende os limites do sentido e
da experiência física. Na verdade, ao admitir a realidade da consciência em
mim mesmo, dou um passo que nenhuma observação física pode justificar”
(The Grounds of Theistic and Christian Belief, 43).
[219]
God’s Undertaker, 45.
[220]
Richard Dawkins, The God Delusion (Boston: Mariner Books,
2006), 34.
[221]
Citado em James Sire, The Universe Next Door (Downers Grove,
IL: IVP Academic, 2009), 72.
[222]
Francis Crick, The Astonishing Hypothesis: The Scientific Search
for the Soul (New York: Touchstone, 1994), 266. As palavras em itálico são
do presente autor.
[223]
Ibid., 3.
[224]
Ibid. 19.
[225]
Falando sobre questões metafísicas, Stephen Hawking afirmou:
“Tradicionalmente essas são questões para a filosofia, mas a filosofia está
morta. Ela não acompanhou os desenvolvimentos modernos da ciência,
particularmente da física. Como resultado, os cientistas tornaram-se os
portadores da tocha da descoberta na nossa busca pelo conhecimento”.
Comentando essa afirmação, Lennox observou: “A primeira coisa que
observo é que a declaração de Hawking sobre filosofia é, em si mesma, uma
declaração filosófica. Não é manifestamente uma afirmação científica: é uma
afirmação metafísica sobre a ciência. Por conseguinte, a sua afirmação de que
a filosofia está morta contradiz a si mesma. Esse é um exemplo clássico de
incoerência lógica” (God and Stephen Hawking. Oxford: Lion, 2011. 18).
Lennox prosseguiu: “Desacreditar a filosofia, por um lado, e depois adotar
imediatamente uma posição filosófica autocontraditória, por outro, não é a
coisa mais sábia a fazer por qualquer cientista, e muito menos para uma
superestrela da ciência” (Ibid., 19).
[226]
C.S. Lewis, God in the Dock (Grand Rapids: Eerdmans, 1970), 52-
53.
[227]
Citado em Ronald Nash, Faith and Reason, 53.
[228]
Thomas Morris, Francis Schaeffer’s Apologetics (Grand Rapids:
Baker Books, 1987), 42.
[229]
Bertrand Russell, Why I Am Not a Christian (New York: Simon &
Schuster, 1957), 37-38.
[230]
Ibid., 40.
[231]
Ibid., 41.
[232]
John Stuart Mill, Utilitarianism (Indianapolis: Hackett Publishing
Company, 1979), 7.
[233]
Peter Singer, Animal Liberation (New York: HarperCollins, 2002),
17.
[234]
Jack London, The Sea-Wolf (New York: Tom Doherty Associates
Books, 1993), 65.
[235]
Richard Dawkins, River Out of Eden (New York: Basic Books,
1995), 131.
[236]
Ibid.
[237]
Ibid.
[238]
Ibid., 128
[239]
Jim Nelson Black, The Death of Evolution (Grand Rapids:
Zondervan, 2010), 12.
[240]
C.F. Skinner, Beyond Freedom and Dignity (Indianapolis: Hackett
Publishing Company, 1971).
[241]
Naming the Elephant, 40.
[242]
Trilogy, 280.
[243]
William Lane Craig, Reasonable Faith (Wheaton, IL: Crossway,
2008), 229.
[244]
Karl Jaspers, Way to Wisdom, trans. Ralph Manheim (New
Heaven: Yale University Press, 1954), 126.
[245]
Ibid.
[246]
Jean-Paul Sartre, Existentialism and Human Emotions (New York:
Citadel Press, 1987), 15. Os parêntesis foram acrescentados por mim.
[247]
Friedrich Nietzsche, The Gay Science, trans. Walter Kaufmann
(New York: Vintage Books, 1974), 181.
[248]
Friedrich Nietzsche, Thus Spoke Zarathustra, trans. Walter
Kaufmann (New York: Penguin Books, 1966), 13.
[249]
Will Durant, The Story of Philosophy (New York: Simon &
Schuster, 1961), 301, 318.
[250]
Ibid, 317.
[251]
Ronald Hayman, Nietzsche (New York: Penguin Books, 1980),
266.
[252]
Citado em Jim Nelson Black, The Death of Evolution (Grand
Rapids: Zondervan, 2010), 129-130.
Ao desenvolver o darwinismo, Ernst Haeckel (1834-1919), biólogo,
naturalista e filósofo alemão, ajudou a lançar as bases do racismo
evolucionário e do darwinismo social em 1899 em seu livro The Riddle of the
Universe. Haeckel buscou proporcionar uma visão naturalista do mundo que
explicasse todos os mistérios do universo, como a consciência, por exemplo,
cientificamente reduzindo tudo à matéria e energia. Entre outras coisas,
Haeckel cria que as diferentes raças evoluíram independentemente umas das
outras, o que impulsionou a ideia de que algumas raças eram mais evoluídas
do que outras. The Riddle of the Universe vendeu meio milhão de exemplares
só na Alemanha, o que fez de Haeckel um dos pensadores mais influentes do
seu tempo, e criou o clima intelectual para o nazismo alemão prosperar
algumas décadas mais tarde.
[253]
Sigmund Freud, Civilization and Its Discontents (New York: W.W.
Norton & Company, 1961), 40.
[254]
Helen Zimmern, from the introduction to Friedrich Nietzsche,
Beyond Good and Evil (Mineola: Dover Publications, 1997), vii.
[255]
Da mesma forma que Nietzsche odiava Cristo, ele odiava o Novo
Testamento: “É melhor colocar luvas antes de ler o Novo Testamento. A
presença de tanta sujeira faz disso algo muito aconselhável... Em vão procurei
no Novo Testamento por um único traço de simpatia; nele não há nada que
seja livre, bondoso, sincero ou leal. Nele a humanidade nem mesmo dá seu
primeiro passo ascendente – o instinto de limpeza está ausente... Apenas
maus instintos estão presentes, e tais instintos nem ao menos são dotados de
coragem. Nele tudo é covardia; tudo é um fechar os olhos, uma
autoenganação. Após ler o Novo Testamento qualquer outro livro parece
limpo” (The Anti-Christ, seção 46).
[256]
Sendo influenciado pelo seu meio primo Charles Darwin, Francis
Galton (1822-1911) defendeu a eugenia (termo que ele próprio cunhou) em
Hereditary Genius (1869). A eugenia se preocupa em fazer a raça humana
avançar, através do que Galton chamou de “acasalamento judicioso” e
esterilização obrigatória. Ele definiu a eugenia como “a ciência que lida com
todas as influências que melhoram as qualidades inatas de uma raça. e
aquelas que as desenvolvem com o máximo aproveitamento” (Eugenics: Its
Definition, Scope, and Aims”, The American Journal of Sociology. Vol. 10;
Julho, 1904; n. 1). Otmar Freiherr von Verschuer (1896-1969), Karin
Magnussen (1908-1997), Josef Mengele (1911-1979) e a Alemanha nazista
conduziram o darwinismo social e a eugenia de Galton à sua conclusão
radical, usando aqueles que eles consideravam inferiores como cobaias de
experimentos e depois os executando.
[257]
Ibid., 319.
[258]
Nietzsche., 259.
[259]
Isso é estranho, visto que Nietzsche foi muito doente durante a
maior parte da sua vida. Era um homem fraco que precisava ser cuidado por
amigos e familiares. Nos últimos dez anos da sua vida enlouqueceu e
precisou de cuidados constantes da sua mãe cristã.
[260]
Citado em William L. Shirer, The Rise and Fall of the Third Reich
(New York: Simon and Schuster, 1960), 86.
[261]
Nietzsche, 266.
[262]
Veja John Blanchard, Does God Believe in Atheists (Darlington,
UK: Evangelical Press, 2000), 75.
[263]
Thus Spoke Zarathustra, 12.
[264]
Ibid., 14-15.
[265]
Civilization and Its Discontents, 22.
[266]
Ibid., 24-15.
[267]
Ibid., 25.
[268]
Ibid., 34.
[269]
The Grounds of Theistic and Christian Belief, 90.
[270]
Alister McGrath, Why God Won’t Go Away (Nashville: Nelson,
2010), 145.
[271]
Malcolm Muggeridge, The End of Christendom (Grand Rapids:
Eerdmans, 1980), 8.
[272]
Jacques Barzun, “Toward the Twenty-First Century”, em The
Culture We Deserve (Middletown, CT: Wesleyan University Press, 1989),
172.
[273]
Ibid., 163.
[274]
Christopher Lasch, The Culture of Narcissism (New York: W.W.
Norton & Company, 1991), 13.
[275]
Charles Taylor, A Secular Age (Cambridge, MA: Harvard
University Press, 2007), 25.
[276]
Esse desapontamento, diz Taylor, não foi apenas o resultado da
revolução científica, pois ele diz: “Uma parte crucial do meu argumento para
a ‘desconstrução’ da visão da morte de Deus é que os argumentos da ciência
natural para a ausência de Deus não são assim tão convincentes” (Ibid., 557).
A secularização e o desencanto têm as suas raízes, em parte, na ascensão e
propagação do deísmo nos séculos XVII e XVIII.
[277]
“A era da autenticidade”, segundo Taylor, foi moldada por muitos
fatores, incluindo o consumismo, o egoísmo, o individualismo, o hedonismo
e até mesmo o expressivismo — no qual a moda se tornou uma parte vital da
autoexpressão e identidade pessoais. A revolução sexual dos anos 60 foi
também uma parte do impulso para encontrar significado pessoal e liberdade
fora de quaisquer normas exteriores.
[278]
Ibid., 587-589.
[279]
“Commodities [such as Nike shoes] become vehicles of individual
expression, even the self-definition of identity” (Ibid., 483).
[280]
“A busca da felicidade”, diz Taylor, “chegou a parecer não apenas
não precisar de uma ética sexual restritiva e das disciplinas da gratificação
adiada, mas também exigir a sua transgressão em nome da autorrealização.
As pessoas que mais sentem isso são, naturalmente, exatamente aquelas para
quem muitas dessas disciplinas se tornaram uma segunda natureza, não
necessitando de um forte apoio ético/espiritual para se manterem” (Ibid.,
493).
[281]
Isso pode não ser uma acusação justa contra Descartes. Veja a nota
de rodapé 13 na página 95.
[Isso se refere à versão em papel. A referência é à seguinte nota:
Em vez de interpretar Descartes como um racionalista puro, poderia ser
argumentado que ele previu o argumento pressuposto para a existência de
Deus. Para que o silogismo Cogito, ergo sum funcione, o conhecimento de
Deus deve ser pressuposto. Comentando isso, Jean-Marie Beyssade explicou
que essa “prova não pode ser bem sucedida, ou até mesmo sair do chão, se
alguém não tem ideia, ou seja, percepção, que corresponda ao significado da
palavra ‘Deus’” (“The Idea of God and Proofs of His Existence” em The
Cambridge Companion to Descartes. ed. John Cottingham. Cambridge:
Cambridge University Press, 1995., 176). Beyssade passou a declarar: “A
prova a priori de Deus parte do fato suposto, que é tomado como certo, de
que todas as perfeições estão unidas em uma única natureza que é chamada
‘Deus’” (Ibid.,178). Porque todos sabemos que Deus existe como o ser mais
perfeito, podemos concluir, observando a nossa própria imperfeição, que não
poderíamos ter chegado a esse pressuposto acerca desse ser mais perfeito por
nós mesmos, mas ele deve ter sido implantado ali pelo próprio Deus].
[282]
Veja Jean-François Lyotard, The Postmodern Condition: A Report
of Knowledge, trans. Geoff Bennington e Brian Massumi (Minneapolis: The
University of Minnesota, 1983).
[283]
Albert Camus, The Myth of Sisyphus, trans. Le mythe de Sisyphe
(New York: Vintage Books, 1991), 3.
[284]
Ibid., 3-4.
[285]
Ibid., 22.
[286]
Ibid., 51.
[287]
Citado em Ravi Zacharias, A Shattered Visage: The Real Face of
Atheism (Grand Rapids: Baker Books, 1990), 41-42.
[288]
Citado em John Blanchard, Does God Believe in Atheists
(Darlington, UK: Evangelical Press, 2000), 121.
[289]
Citado em Ravi Zacharias, A Shattered Visage: The Real Face of
Atheism (Grand Rapids: Baker Books, 1990), 25.
[290]
George Park Fisher estava certo quando disse: “O ateísmo é um
insulto à humanidade” (Grounds of Theistic and Christian Belief, 62). Fisher
explicou que é uma “afronta grosseira” à “razão e ao sentido moral” dizer a
um homem para “se abster da frivolidade” e para “agir com um propósito
inteligente, para a realização de fins racionais; quando antes lhe é dito que o
universo é fruto de uma gigantesca frivolidade” (Ibid.).
[291]
Como Francis Schaeffer colocou isso, “Se Deus está morto, então o
homem morreu também”.
[292]
N. de T.: Referência a uma famosa koan (charada filosófica) Zen
que pergunta: “Qual é o som obtido ao se bater palmas com apenas uma das
mãos?”. O estudante de Zen deve meditar sobre essa charada até que algum
grau de “discernimento” ou “esclarecimento” se manifeste. O interessante é
que, em tese, “não há uma resposta certa”.
[293]
Paul Harrison, Elements of Pantheism (Shaftesbury, UK: Element
Books, 2013), 1.
[294]
Benedict De Spinoza, Ethics, trans. W.H. White in Great Books of
the Western World, ed. Robert Maynard Hutchins (Chicago: Encyclopedia
Britannica, Inc. 1952.), Vol. 31, 360.
[295]
Kenny Anthony, The Oxford Illustrated History of Western
Philosophy, ed. Kenny Anthony (Oxford: Oxford University Press, 1997),
147.
[296]
Benedict De Spinoza, Ethics. Trans Edwin Curley (New York:
Penguin Books, 1996), 2.
[297]
Michael Reeves, Delighting in the Trinity (Downers Grove, IL:
IVP, 2012), 112.
[298]
Augustine, The Trinity, trans. Edmond Hill, ed. John E. Rotelle
(New York: New City Press, 1992).
[299]
Mere Christianity, 152.
[300]
Robert Letham, The Holy Trinity (Phillipsburg, PA: P&R, 2004),
444.
[301]
Ibid., 446.
[302]
Delighting in the Trinity, 80.
[303]
O Motor Imóvel de Aristóteles é um ser não trinitário: “Como
podem ter razão aqueles que dizem que o princípio primeiro é a unidade e
que a unidade é a substância, e então fazem derivar da matéria e da
substância o número primeiro, sustentando que também ele é substância? E
como é possível pensarmos em “dois”, e em cada um dos outros números
compostos de unidades, como sendo uma unidade”? (Metaphysics. Trad. W.
D. Ross. Stilwell, KS: Digireads Publishing, 2006, 11.2).
[304]
Vincent J. Cornell, “God in Islam”, em the Encyclopedia of
Religion, Ed. Lindsay Jones, Vol. 5, 2nd Edition (New York: Macmillan
Reference of Thompson Gale, 2005), 3561-3562.
[305]
MT, Hilkhot Yesodei Ha Torah, 1:7, Citado em Micah Goodman,
Maimonides and the Book that Changed Judaism (Philadelphia: The Jewish
Publication Society, 2015), 5.
[306]
De acordo com Aristóteles: “O infinito não pode ser uma coisa
separada e independente. Pois isso não é uma magnitude espacial nem uma
pluralidade, mas é uma substância e não um acidente, então deverá ser
indivisível; pois o divisível ou é magnitude ou pluralidade” (Metaphysics,
11.10).
[307]
O teólogo holandês Geerhardus Vos (1862-1949) explicou porque
isso era problemático: “Podemos também dizer que os atributos de Deus não
se distinguem uns dos outros? Isso é extremamente arriscado. Podemos nos
contentar em dizer que todos os atributos de Deus estão muito intimamente
relacionados entre si e penetram uns nos outros na unidade mais íntima. No
entanto, isto não é de forma alguma afirmar que eles devem ser identificados
uns com os outros. Em Deus, por exemplo, amor e justiça não são a mesma
coisa, embora ajam em perfeita harmonia. Não podemos deixar que tudo se
entrelace de forma panteísta, porque isso seria o fim do nosso conhecimento
objetivo de Deus” (Theology Proper, vol. 1 of Reformed Dogmatics, trad. e
ed. Richard B. Gaffin. Bellingham, WA: Lexham Press, 2012-2014, 5).
Scott Oliphint lembra-nos que “A doutrina da simplicidade, nas suas
melhores formulações, nunca afirmou que Deus é uma espécie de ser em que
nenhuma distinção existe ou possa existir” (God with Us, 64).
[308]
Metaphysics, 11.2.
[309]
Ironicamente, embora Aristóteles tenha rejeitado o politeísmo pelo
teísmo, o teísmo que ele abraçou conduz novamente ao panteísmo que produz
o politeísmo, que ele havia rejeitado. Não é de admirar que quanto mais uma
sociedade se afasta do conhecimento do teísmo, mais panteísta e até animista
ela se torna. Por causa da culpa interior, o homem naturalmente quer adorar
um mediador (por exemplo, uma emanação de Deus) que os protege da ira do
Deus supremo.
[310]
Citado em Maimonides and the Book that Changed Judaism, 8.
[311]
Ibid., 11.7.
[312]
Ibid., 12.9
[313]
B.A.G. Fuller, “The Theory of God in Book Λ of Aristotle’s
Metaphysics” in The Philosophical Review, Vol. 16, No. 2 (Mar., 1907), 170-
183., 173.
[314]
Ibid., 175.
[315]
Metaphysics, 12.9.
[316]
Ibid., 177.
[317]
Metaphysics, 12.6. For a Christian thinker who defends the
eternality of the universe see Eternal God by Paul Helm (New York: Oxford,
2012), 234-250.
[318]
Veja Benedict De Spinoza, “Of God” Part 1 in Ethics. Trans Edwin
Curley (New York: Penguin Books, 1996).
[319]
Os eunomianos (ou seja, neoarianos) negaram a doutrina ortodoxa
da Trindade aplicando a lógica aristotélica à doutrina da simplicidade divina.
Em resumo, eles argumentaram que se não há distinções dentro de Deus,
então apenas o Pai existe a se (não dependente de nada fora de si mesmo). A
unicidade última é redutível ao Pai — só ele possui a essência simples da
divindade. A essência do Filho é gerada pelo Pai e a essência do Espírito
procede do Pai e do Filho, pois eles são ontológica e eternamente
subordinados ao Pai, que é o único Deus Todo-Poderoso. Veja Thomas H.
McCall “Trinity Doctrine, Plain and Simple” em Advancing Trinitarian
Theology (Grand Rapids: Zondervan, 2014), 46.
[320]
Scott Oliphint busca manter o equilíbrio quando nos lembra: “Um
aspecto importante dessa doutrina da simplicidade de Deus é que essas
distinções em Deus não são consideradas como ‘coisas’ reais em Deus. Ou
seja, elas não devem ser pensadas como coisas, de modo que a Divindade
seja uma composição de ‘coisas sobre coisas’” (God with Us, 65).
[321]
Para um excelente artigo sobre a relação entre a simplicidade
divina e a Trindade veja Thomas H. McCall “Trinity Doctrine, Plain and
Simple” em Advancing Trinitarian Theology (Grand Rapids: Zondervan,
2014).
[322]
Cornelius Van Til, An Introduction to Systematic Theology, 2nd ed.,
William Edgar (Philipsburg, NJ: P&R, 2007), 273.
[323]
Por diferenciação formal quero dizer algo mais do que uma
distinção conceitual (distinctione rationis, uma distinção no pensamento) que
só existe em nossas mentes finitas para nos ajudar a entender um Deus
inefável que transcende a linguagem humana.
[324]
K. Scott Oliphint, “Simplicity, Trinity, and Incomprehensibility of
God” em One God in Three Persons, Ed. Bruce Ware e John Starke
(Wheaton, IL: Crossway, 2015), 230.
[325]
B.A. Bosserman explicou: “As teologias unitárias... sucumbem a
um tipo de mistério estupidificante onde Deus é idêntico ou sujeito a um
vazio inefável, que o torna completamente incapaz de falar, ou de falar com
autoridade. Pois, nada pode ser precisamente baseado em uma Divindade
estritamente unitária, uma vez que a multiplicidade envolvida na afirmação
está em desacordo com a sua natureza. Se tal ser desfrutasse de uma definição
negativa à medida que ele existe em contraste com a esfera criada, isso só
demonstraria a sua dependência do universo temporal para desfrutar do tipo
de diferenciação, propósito e relação que falta em si mesmo” (The Trinity and
the Vindication of Christian Paradox, 101).
[326]
Calvin, Institutes, 1.13.2.
[327]
B.B. Warfield, “Calvin’s Doctrine of the Trinity”, Works of
Benjamin B. Warfield (Grand Rapids: Baker Books, 2003), 5.191.
[328]
Stephen Charnock, The Existence and Attributes of God (reprint,
Grand Rapids: Baker, 1996), 1:345.
[329]
Os defensores do teísmo aberto, tais como Richard Rice, Clark
Pinnock e John Sanders, podem dizer que Deus é imutável em sua essência,
mas minam essa sua pretensão ao fazer da diversidade da relação tripessoal
da Divindade o último reduto da unicidade da sua essência imutável. Isto é, a
unicidade da essência de Deus acaba por ser, pelo menos parcialmente,
absorvida pela diversidade da interação tripessoal de Deus dentro da criação.
Ao elevar a diversidade de Deus acima da unicidade dele, a soberania, a
onipotência e a onisciência de Deus já não permanecem imutáveis. O
conhecimento, as emoções e o poder de Deus tornam-se limitados à
multiplicidade de coisas que acontecem fora do seu ser. Em vez de estar
imutavelmente fechado, Deus está aberto à mudança. Em vez do Todo-
Poderoso controlar todas as coisas, ele é mais como um semideus poderoso.
Ele é capaz de ajustar adequadamente os seus planos conforme seja
necessário, mas permanece restrito aos diversos caprichos e decisões do
homem. O seu conhecimento é dependente da criação.
O Deus trinitário, contudo, é capaz de interagir com a criação de uma
forma pessoal e imanente, porque ele é inerentemente capaz de diferenciar
entre as coisas dentro e fora de si mesmo. Porque a diversidade é essencial à
sua natureza, Deus é capaz de distinguir entre os seus pensamentos, suas
emoções, seus atos e os eventos relacionados com o tempo. No entanto, ele
permanece transcendente e separado da criação porque a sua unidade também
é igualmente essencial à sua natureza. Porque ele é capaz de diferenciar entre
a sua vontade de decreto e a sua vontade de comando, então ele é capaz de
interagir providencial e emocionalmente com a criação de uma forma
pessoal. Mas, ele também conhece e vê todas as coisas ao mesmo tempo. E,
finalmente, nada pode fazer Deus sofrer, porque ele conhece e controla todas
as coisas sem que haja qualquer mudança dentro dele mesmo.
Em suma, sem a diversidade das três pessoas, a simplicidade de Deus
conduziria ao panteísmo. Por outro lado, sem a unicidade da essência de
Deus, as propriedades relacionais inerentes dentro da Trindade levariam ao
teísmo aberto. Embora em aspectos diferentes, tanto o panteísmo como o
teísmo aberto tornam Deus dependente da criação. A igualdade fundamental
entre a unicidade e a diversidade da Trindade é a única salvaguarda para nos
impedir, de ambos os lados, de cair no abismo.
[330]
Delighting in the Trinity, 47.
[331]
Ibid., 44. Palavras em colchetes são do presente autor.
[332]
Veja Peter Jones, One or Two: Seeing a World of Difference
(Escondido, CA: Main Entry Editions, 2010), 17.
[333]
Apologetics to the Glory of God, 55.
[334]
Mere Christianity, 45.
[335]
Citado em Bertrand Russell, Why I Am Not a Christian, 118.
[336]
Ibid., 45.
[337]
Louis Berkhof, Systematic Theology (Grand Rapids: Eerdmans,
1994), 175.
[338]
Ibid., 171.
[339]
Ibid., 173.
[340]
Isso é verdade em relação à versão de René Descartes do
argumento ontológico. Anselmo (1033-1109), arcebispo de Cantuária, no
entanto, colocou o argumento desta forma: “Mesmo o insensato está, pois,
convicto de que ‘alguma coisa maior do que a qual nada pode ser pensado’
existe pelo menos na mente: porque ele compreende-o quando o ouve, e tudo
o que é compreendido existe na mente. Mas, sem dúvida, ‘aquilo maior do
que o qual nada pode ser pensado’ não pode existir unicamente na mente. Se,
na verdade, existe pelo menos na mente, pode pensar-se que exista também
na realidade, o que é ser maior. Se, pois, ‘aquilo maior do que o qual nada
pode ser pensado’ existe apenas na mente, então ‘aquilo mesmo maior do que
o qual nada pode ser pensado’ é ‘algo maior do que o qual algo pode ser
pensado’. Porém, isso é claramente impossível. Existe, pois, sem a menor
dúvida, ‘alguma coisa maior do que a qual nada pode ser pensado’ tanto na
mente como na realidade” (“Proslogion” em Anselm of Canterbury: The
Major Works, Ed. Brian Davis e G.R. Evans. New York: Oxford, 2008., 87-
88).
[341]
Augustine, The City of God. Trans. George Wilson and J. J. Smith
(Peabody, MA: Hendrickson, 2013), 79.
[342]
Ibid., 212.
[343]
God’s Undertaker, 20.
[344]
Ibid.
[345]
Charles Hodge, Systematic Theology, Vol. 3, (Grand Rapids:
Eerdmans, 1981), 82.
[346]
Veja Richard Swinburne, Is There a God (New York: Oxford,
1996), 67.
[347]
“Esse belíssimo sistema contendo sol, planetas e cometas”, afirmou
Newton, “só poderia proceder do conselho e domínio de um Ser inteligente e
poderoso” (The Principia. reprint. Thousand Oaks, CA: Snowball Publishing,
2010., 440).
[348]
Is There a God, 67.
[349]
Ibid., 43.
[350]
Ibid., 55.
[351]
Ibid.
[352]
Stephen C. Meyer, Signature in the Cell (New York: HarperOne,
2009), 156.
[353]
Ibid., 171.
[354]
Ibid.
[355]
Ibid., 330.
[356]
Ibid., 332.
[357]
Ibid., 333
[358]
Ibid., 336, 137.
[359]
Ibid., 341.
[360]
Ibid.
[361]
Ibid., 343.
[362]
Alvin Plantinga: “Embora exista um conflito superficial, há uma
profunda concordância entre a ciência e a religião teísta, por outro lado, há
uma concordância superficial e um profundo conflito entre a ciência e o
naturalismo” (Where the Conflict Really Lies. New York: Oxford, 2012., ix).
[363]
N.T. Wright, The Resurrection of the Son of God (Minneapolis:
Fortress Press, 2003), 599.
[364]
Ibid., 602.
[365]
Ibid.
[366]
Ibid., 605.
[367]
Ibid., 607.
[368]
Ibid., 607-608.
[369]
Ibid., 610.
[370]
Veja Philip Comfort, Encountering the Manuscripts (Nashville:
Broadman & Holman, 2005), 126-139.
[371]
Jewish Antiquities, 18.3.3 §63 (Baseado na tradução de Louis H.
Feldman, The Loeb Classical Library.) Embora esse texto tenha sido
considerado como uma interpolação cristã posterior, uma das principais
autoridades sobre Flávio Josefo, Paul Maier, o professor de história antiga
Russell H. Selibert, Western Michigan University, defende a sua fidelidade
textual: “Josefo deve ter mencionado Jesus em material autêntico em 18:63,
já que essa passagem está presente em todos os manuscritos gregos de Josefo,
e a versão agapiana está de acordo com a sua gramática e vocabulário em
outros lugares. Além disso, Jesus é retratado como um “homem sábio”
[sophos aner], uma frase que não era usada pelos cristãos, mas sim
empregada por Josefo para personalidades como Davi e Salomão, na Bíblia
hebraica.
Além disso, a sua afirmação de que Jesus conquistou “muitos dos
gregos” não é substanciada no Novo Testamento e, portanto, dificilmente é
uma interpolação cristã, mas algo que Josefo teria notado em seus próprios
dias. Finalmente, o fato de que a segunda referência a Jesus nas Antiquities
20:200, que se segue, apenas o chama de Cristos [Messias] sem mais
explicações, sugere que uma identificação anterior, mais completa, já tinha
ocorrido. Se Jesus tivesse aparecido pela primeira vez no último ponto do
registo de Josefo, muito provavelmente ele teria introduzido uma frase como
“...irmão de um certo Jesus, que era chamado o Cristo” (Paulo L. Maier,
“Josephus on Jesus”, em Josephus: The Essential Works. trans. and ed. Paul
L. Maier. Grand Rapids: Kregel, 1994, 284).
[372]
Annals (ca. 116-117), 15.44.2-8, trans. J. Stevenson as Citado em
McDonald, The Story of Jesus in History and Faith, 137.
[373]
A abordagem crítica histórica não vê as fontes originais como
dotadas de autoridade, pois desde o período pós-iluminismo, os historiadores,
tais como os cientistas, trabalham a partir de uma visão de mundo naturalista,
a qual nega as possibilidades de milagres. Jürgen Moltmann, por exemplo,
diz que devemos rejeitar os milagres mesmo antes de investigarmos as
provas: “Diante da definição positivista e mecanicista da natureza da história
como um sistema autocontido de causa e efeito, a afirmação de uma
ressurreição de Jesus realizada por Deus aparece como um mito sobre uma
incursão sobrenatural que é contrariada por toda a nossa experiência do
mundo” (Citado em The Story of Jesus in History and Faith, 19).
[374]
Lee Martin McDonald, The Story of Jesus in History and Faith
(Grand Rapids: Baker Academic, 2013), 45.
[375]
James H. Charlesworth, “The Historical Jesus and Biblical
Archaeology: Reflections on New Methodologies and Perspectives” em Jesus
and Archaeology, ed. James H. Charlesworth (Grand Rapids: Eerdmans,
2006), 694.
[376]
Trilogy, 289.
[377]
C.S. Lewis, “Is Theology Poetry?” em The Weight of Glory (New
York: HaperCollins, 2001), 140.
[378]
Apologetics to the Glory of God, 102.
[379]
João Calvino argumentou que aqueles “que se esforçam para
construir uma fé firme na Escritura através da disputa estão fazendo as coisas
ao contrário... Pois como só Deus é uma testemunha cabal de si mesmo em
sua Palavra, assim também a Palavra não encontrará aceitação no coração dos
homens antes de ser selada pelo testemunho interior do Espírito” (Institutes,
1.7.4).
[380]
Institutes, I.V.1
[381]
The Works of Owen (Edinburgh: Banner of Truth Trust, 1995), Vol.
16, 310-311.
[382]
The Works of Owen (Edinburgh: Banner of Truth Trust, 1995), Vol.
16, 307.
[383]
Biblical Theology, 606.
[384]
Alvin Plantinga, Warranted Christian Belief (New York: Oxford,
2000), 303.
[385]
Jonathan Edwards, The Religious Affections (Edinburgh: Banner of
Truth Trust, 1994), 122.
[386]
Edward Young afirmou que a Iluminação “não é a comunicação
para nós de informações além do que está contido na Bíblia”. Não é a
transmissão de novos conhecimentos. Não é uma nova revelação de Deus ao
homem. Antes, é aquele aspecto da obra sobrenatural do novo nascimento, na
qual os olhos do nosso entendimento foram abertos para que nós, que antes
estávamos na escuridão e na escravidão do pecado, passemos a ver aquilo
para o que antes estávamos cegos” (Thy Word is Truth. Edinburgh: Banner of
Truth Trust, 1963., 34).
[387]
John Owen escreveu o seguinte: “Uma vez que a mente de Deus foi
reduzida à escrita, cada homem mortal e individual, que tiverem acesso às
Escrituras, ouve a voz de Deus falando com ele não menos diretamente do
que se ele estivesse ouvindo próprio Deus falando audivelmente com ele...
Até mesmo a voz falada não pode alcançar os ouvidos dos homens senão
através de um meio de comunicação, isto é, o ar do qual ela é formada; assim
também não pode ser negado que a Escritura é a voz de Deus falando aos
homens, embora ela seja transmitida por meio de comunicação escrita. A
Palavra de Deus não é diminuída de modo algum pelo simples fato de ter sido
reduzida à escrita” (Biblical Theology. 374-75).
[388]
Institutes, trans. Henry Beveridge (Grand Rapids: Eerdmans,
1989), 1.7.5.
[389]
Ibid.,192.
[390]
Ibid.
[391]
Warranted Christian Belief, 303.
[392]
Ibid., 304.
[393]
Ibid., 309.
[394]
Institutes, 1.2.1.

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