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METODOLOGIAS PARA ACELERAR E/OU MITIGAR OS

RECALQUES POR ADENSAMENTO

1. INTRODUÇÃO

O avanço populacional e as perspectivas de contínuo crescimento, pois segundo o IBGE a


população brasileira continuará em crescimento durante os próximos 40 anos, faz com que
moradia seja uma crescente necessidade. Como os grandes centros estão com altas taxas
de ocupação e solos com boa capacidade de suporte estão cada vez menos disponíveis,
tem-se explorado regiões mais distantes, inclusive próximas ao leito de rios e
consequentemente, com presença de solos muito moles, caracterizados por solos finos,
baixa permeabilidade, resistência não drenada menor que 25kPa e alta compressibilidade.
Empreendimentos implantados em regiões de solos moles, saturados, e com necessidade
de execução de aterro, sofrerão o fenômeno do adensamento. Este causará um recalque
que irá ocorrer de acordo com o escoamento da água dos vazios do solo, ou seja, ao longo
do tempo.
Em determinadas ocasiões, é necessário acelerar o recalque para que ele ocorra ainda
durante o período de obras, ou ainda buscar meios de mitigação. Estes métodos serão
abordados, apresentando-se vantagens, desvantagens e situações de uso.
Em vista do acima exposto, é possível verificar a relevância do assunto a ser abordado,
principalmente porque a cada dia é mais comum empreendimentos localizados em regiões
com presença de solos moles.
Após ilustração dos meios de aceleração/mitigação dos recalques, são apresentados
estudos de caso que possibilitam ver a aplicação de algumas das metodologias
apresentadas.

2. METODOLOGIAS PARA ACELARAÇÃO OU MITIGAÇÃO DOS RECALQUES POR


ADENSAMENTO
Neste capítulo são apresentadas as principais metodologias disponíveis para
acelerar/mitigar o recalque por adensamento, tendo em vista que estes recalques, em geral,
terão prazos de ocorrência superiores aos períodos de construção dos empreendimentos, e
terão de ser antecipados.

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2.1 Remoção do material altamente compreensível

Esta é a primeira solução que é analisada em situações de adensamento, entretanto, esta


medida possui algumas restrições e exige procedimentos de aferição e controle.
Em geral, experiências indicam que a remoção do material é viável, comparando-se com
outros métodos, em situações onde o material a ser removido não ultrapasse 4,0m de
espessura na superfície, sendo esta limitação uma desvantagem ao método.
Outra questão a ser avaliada está relacionada à possibilidade de descarte do material. Com
as preocupações pertinentes ao meio ambiente, a escassez de locais adequados e legais
para bota-fora podem inviabilizar a utilização deste método, em função do seu impacto
ambiental.
Os principais fatores de controle durante a execução são:
a) Necessidade de ensaios posteriores à remoção, visando aferir se o material
altamente compressível foi totalmente retirado, uma vez que o processo acaba gerando uma
mistura do material a ser retirado com o aterro a ser executado. Grandes falhas nesta
remoção irão acarretar em recalques devido ao adensamento da argila;
b) Monitoramento de recalques, visando acompanhar a ordem de grandeza dos
recalques previstos;
c) Sequência executiva. É preciso, geralmente, prever um aterro para circulação dos
equipamentos denominado aterro de conquista. Em função do peso dos equipamentos este
aterro é complementado pontualmente em função dos recalques que ocorrem ao longo
deste processo. Desta forma, a sequência executiva e de tráfego de caminhões deve ser
bem estudada.
A figura 01 ilustra esta solução.

Figura 01 – Remoção do material altamente compressível, visando eliminar ou


diminuir os recalques devido ao adensamento (ALMEIDA, 2010)

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2.2 Sobrecarga temporária

Sempre visando diminuir o prazo para ocorrência dos recalques devido ao adensamento da
camada de argila mole, também se utiliza desta solução que se baseia em aumentar
temporariamente a espessura do aterro de implantação do empreendimento, aumentando
os recalques para que os mesmos ocorram até o período estipulado como aceitável durante
a construção do empreendimento.
Segundo Márcio Almeida, “a sobrecarga temporária irá aumentar a velocidade dos
recalques primários e compensar total ou parcialmente os recalques secundários”. Desta
forma, essa solução também equaciona a questão do recalque secundário.
Esta solução pode ser exemplificada através da figura 02, onde as linhas tracejadas
representam o aterro de implantação do empreendimento e seus recalques, e as linhas
contínuas este mesmo aterro, porém com um acréscimo de altura, a sobrecarga temporária.
Nota-se que para um mesmo tempo t1, tanto o recalque quanto a sobrecarga são maiores
do que na situação sem sobrecarga. Desta forma, calculam-se os valores de recalques até o
prazo estipulado, e em seguida estes recalques para alturas pré-estabelecidas de
sobrecarga. Assim, busca-se atingir o valor do recalque calculado inicialmente, porém com o
uso da sobrecarga.

Figura 02 – Aceleração de recalques com sobrecarga temporária (ALMEIDA, 2010)

A solução de sobrecarga temporária é econômica, comparando-se com as demais que


serão abordadas. É extensamente aplicada no meio técnico, apresentando bons resultados,
entretanto, possui algumas desvantagens e restrições apresentadas a seguir:
Inicialmente pode-se comentar que o acréscimo de sobrecarga não resulta em uma redução
proporcional no tempo de consolidação, como pode ser verificado no exemplo da figura 03,
calculado para uma sondagem real:

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Tempo Recalque x Sobrecarga
120,00
100,00
80,00
60,00
40,00
20,00
0,00
0cm 50cm 100cm 150cm 200cm 250cm 300cm

Figura 03 – Tempo de recalque x sobrecarga (do autor)

No eixo das ordenadas apresenta-se o tempo de ocorrência dos recalques em meses e no


eixo das abscissas as espessuras consideradas de sobrecarga. Nota-se que sem nenhuma
sobrecarga teríamos aproximadamente 115 meses para estabilização de 90% dos
recalques, com 25cm de sobrecarga este prazo é reduzido para 78 meses,
aproximadamente 32% de diminuição do prazo. Porém, esta redução não é linear, como
verifica-se ao aumentar-se a sobrecarga para 50cm e o prazo para ocorrência dos recalques
reduzir para 60meses. Ou seja, com 25cm a redução foi de 32% no prazo, dobrando-se a
altura da sobrecarga, a redução é de 48%.
Portanto, na utilização de sobrecarga, não se obtêm grandes reduções nos prazos conforme
aumenta-se a altura do aterro.
Uma desvantagem deste método é o excessivo volume de terra que é movimentado em
função do empréstimo e bota-fora que se fazem necessários. Tal fator irá implicar neste
grande volume de terra a movimentar, e além disso, deve-se considerar o volume excedente
que será retirado após se atingir os recalques desejados.

2.3 Drenos verticais


Em determinadas situações a utilização da sobrecarga não é suficiente para atingir a
diminuição nos prazos de ocorrência dos recalques, conforme se deseja. Nestes casos,
podem ser utilizados, de maneira geral associados com a sobrecarga, os drenos verticais.
Estes, inicialmente, eram compostos por drenos de areia, sendo substituídos por drenos
verticais pré-fabricados, também chamados de drenos fibroquímos ou geodrenos. São
materiais com núcleo plástico e canaletas internas envoltas em filtro geossintético para
condução da água. Sua utilização visa acelerar o processo de expulsão da água dos vazios
do solo, e consequentemente os recalques.

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O processo é constituído pela cravação dos geodrenos, com auxílio de equipamento, e
utilização de mandril, o qual é retirado após atingir-se a cota de ponta desejada.
Na figura 04 apresenta-se uma ilustração de um corte típico com instalação de geodrenos e
um detalhe com suas membranas. A figura 05 ilustra o geodreno instalado e as figuras 06 e
07 uma situação de instalação em campo:

Figura 04 – Ilustração Geodreno (ALMEIDA, 2010)

Figura 05 – Geodreno Figura 06 – Instalação de


geodreno

Figura 07 – Geodrenos instalados (MARQUES, 2014)

Na solução somente com sobrecarga temporária apresentada anteriormente, mostrou-se


uma situação onde foi calculado um recalque que resultou em 115 meses para ocorrência.
Com a utilização de 50cm de sobrecarga este tempo foi reduzido para 60 meses.
Neste mesmo caso, acrescentando-se o geodreno através de uma malha triangular com
espaçamento de 1,50m, o prazo foi reduzido de 60 para 18 meses.

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Desta forma, é possível verificar que o uso de geodrenos associados com sobrecarga
temporária possui uma real capacidade de redução dos prazos de ocorrência dos recalques,
assim como demostrado na figura 08, ilustrando a vantagem da utilização de drenos
verticais para aceleração de recalques por adensamento, quando se compara a evolução
dos recalques com o tempo de um aterro com e sem drenos sobre uma espessa camada de
solos moles.

Figura 08 – Comparativo de utilização de geodrenos (MARQUES, 2014)


A seguir apresentam-se algumas questões relevantes com o uso desta solução que devem
ser consideradas no estudo de adensamento:

2.3.1 Restrição ao uso da solução


Esta solução passará a não ser mais viável no momento em que se atinja uma altura
excessiva de sobrecarga com espaçamentos mínimos entre geodrenos, e resultados de
prazos de recalques fora do período adotado como admissível, sempre em função do tipo de
obra e prazos de entrega.

2.3.2 Espaçamento entre geodrenos


Diversos especialistas afirmam que o espaçamento mínimo a ser adotado varia entre 1,50 e
1,30m. Isso justifica-se, pois, a partir destes valores ocorre uma sobreposição de áreas
amolgadas, diminuindo o coeficiente de permeabilidade do solo, impactando no valor do
coeficiente de adensamento horizontal e consequentemente, tornando a solução ineficaz.

2.3.3 Capacidade de instalação do geodreno em função da resistência do solo


Em determinadas situações a argila mole não se encontra na superfície, existindo assim
camadas sobre este material que precisarão ser atravessadas até que o geodreno atinja o
solo compressível.
Em função das características do geodreno e do seu sistema de cravação, em geral,
considera-se que solos com número de SPT, no ensaio de simples reconhecimento, maiores
que 7 impedirão a passagem do geodreno. Desta forma, será preciso prever pré-furos que
irão aumentar os prazos e também os custos.

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2.3.4 Pré-carregamento por vácuo
Esta solução surgiu há mais de meio século e tem como função criar um aumento na tensão
efetiva do solo mole através de aplicação de uma pressão ininterrupta de vácuo, a qual
chega até a camada de solo mole por meio de drenos verticais. Este incremento de tensão
efetiva substitui a sobrecarga temporária e acelera o adensamento e, consequentemente, os
recalques.
Nesta técnica é utilizado um sistema de bombeamento com eficiência da ordem de 70-75%,
resultando em um valor de sucção medido entre 70 e 75kPa. Desta forma, considerando um
aterro de 17kPa, esta solução substituiria uma sobrecarga provisória de aproximadamente
4,0m de espessura. Atingidos os recalques previstos, o sistema é desligado e não há
necessidade de bota-fora. A tensão total em um solo saturado não se altera durante o
processo, conforme é possível verificar na equação a seguir:

𝜎𝑡 = (𝜎 ′ + ∆𝜎 ′ ) + (𝑢 − ∆𝑢)
Onde,
∆𝜎 ′ = ∆𝑢 = ∆𝜎𝑣𝑎𝑐
∆𝜎𝑣𝑎𝑐 = incremento na tensão de vácuo aplicada

Existem duas técnicas para o pré-carregamento por vácuo. A primeira é um sistema com
membranas, figura 09, que exige a escavação de uma vala no perímetro da área a ser
tratada, a qual deve ser escavada abaixo do nível do lençol freático.

Figura 09 – Pré-carregamento por vácuo – técnica com membrana MARQUES, 2014)

Outro sistema também é utilizado no pré-carregamento por vácuo, não sendo necessária a
utilização de membrana e trincheira periférica. Neste, os drenos horizontais são ligados a
um sistema de tubulações.

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Os tubos devem ser impermeáveis até aproximadamente 0,50m dentro da camada de solo
mole, visando diminuir perdas de pressão.
A principal vantagem desta técnica sem utilização de membrana é a eliminação da
“trincheira periférica”, o que pode ser muito relevante para casos com limitação de espaço. A
figura 10 ilustra uma situação de sistema de pré-carregamento por vácuo sem utilização de
membranas:

Figura 10 – Pré-carregamento por vácuo – técnica sem membrana (MARQUES, 2014)


A principal dificuldade executiva do pré-carregamento por vácuo com ou sem membrana,
está relacionada à presença de lentes de areia pontuais na camada de solo mole a ser
tratado. Nestes casos, esta camada de solo granular permeável iria diminuir drasticamente a
eficiência, tornando o uso da técnica inviável. Além disso, também é preciso garantir um
fornecimento de energia constante, aumentando os custos de implantação.

2.4 Utilização de materiais com densidade reduzida


Como a magnitude dos recalques devido ao adensamento é função do acréscimo de tensão
vertical, utilizando-se materiais com peso específico menor do que o solo que seria utilizado,
esta magnitude é reduzida.
A tabela 01 a seguir apresenta alguns materiais com menor peso específico:
Material Peso específico (kN/m3)
Poliestireno expandido – EPS (isopor ou similar) 0,15 a 0,30
Tubos de concreto (diâmetro: 1m a 1,5m; espessura da
parede: 6cm a 10cm) 2a4
Pneus picados 4a6
Argila expandida 5 a 10
Serragem 8 a 10
Tabela 01- Pesos específicos dos materiais leves para aterros (ALMEIDA, 2010)

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O EPS tem sido o material mais utilizado, porém, existe uma real preocupação com a
utilização deste método em função da possibilidade flutuação em caso de elevação do nível
d’água.
Apesar desta solução ser utilizada com frequência na Europa e Canadá, em aterro sobre
solos moles no Brasil, a utilização deste método ainda é pouco estudada e difundida,
também em função da preocupação com a variação do nível d’água.
Além disso, o custo de transporte pode ser um fator preponderante para inviabilizar esta
solução

2.5 – Colunas Granulares


As colunas granulares compõem uma técnica de melhoramento de solo, entretanto para
situações de análise de adensamento, é utilizada para acelerar e reduzir os recalques
devido ao adensamento. Tais colunas podem ser tradicionais ou encamisadas.
O processo consiste em criar-se uma malha de colunas granulares que irão aumentar a
resistência do solo, diminuindo e acelerando os recalques por adensamento.
As colunas com ponta fechada, com deslocamento da argila, são as mais utilizadas, em
especial as colunas instaladas por vibrosubstituição. Esta técnica é bastante difundida no
mundo, tendo registros de sua utilização desde o início do século XX.

2.5.1 Colunas granulares tradicionais pelo método de vibrosubstituição


O processo de vibrosubstituição pode ser úmido ou seco. No processo úmido, o vibrador é
cravado devido ao efeito conjugado do peso próprio, da vibração e da água de injeção. O
material granular é lançado na depressão cônica formada junto ao vibrador.
No processo seco, o equipamento possui um compartimento para armazenar a brita, o qual
é abastecido assim que o vibrador atinge sua cota de ponta pré-estabelecida, abre sua
ponta e permite a passagem da brita.

Figura 11 – Equipamento e processo executivo (Workshop Keller, 2014 Catalogo pag. 5)

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Inicialmente o equipamento é posicionado e nivelado após execução do aterro de conquista,
em casos de solo mole na superfície. A brita presente no reservatório é lançada na
tremonha do vibrador que é em seguida fechada, a utilização de ar comprimido permite o
fluxo contínuo da brita até o orifício de saída. O vibrador é introduzido através da insuflação
de ar comprimido, comprimindo o solo ao seu redor, e atingindo a cota prevista, a ponta é
aberta e inicia-se a formação da coluna, a qual é compactada durante todo o processo, o
qual pode ser verificado na figura 11.
Analogamente ao dreno fibroquímico, as colunas de brita irão atuar como elemento
drenante, acelerando os recalques devido ao adensamento. Além disso, com o
melhoramento do solo, este método também irá reduzir a ordem de grandeza destes
recalques.
Existem estudos e casos reais que apontam que esta solução estabiliza o aterro sobre o
solo mole mais rapidamente do que em obras com drenos verticais, entretanto, como todos
os métodos, este também apresenta algumas restrições, dentro das quais se destaca aqui o
fato da existência de uma resistência mínima de 𝑆𝑢 , abaixo da qual não é possível o
emprego desta solução. Tal fato é devido à ausência de garantia de homogeneidade da
coluna, uma vez que a argila de baixa resistência não drenada poderá causar grandes
diminuições de seção ou até a interceptação da mesma.

2.5.2 Colunas granulares encamisadas


Assim como as colunas tradicionais, esta solução também cria melhora nos parâmetros do
solo local e gera aceleração dos recalques devido ao adensamento, funcionando como
dreno.
O encapsulamento do material, que pode ser areia ou brita, é feito com geotêxtil, de modo a
manter condições favoráveis de drenagem da coluna.
Esta solução foi criada na Alemanha, e é utilizada como alternativa à coluna granular
convencional em situações nas quais onde as colunas não recebem o necessário
confinamento lateral da argila, em função de sua baixa resistência. Além disso, o
encapsulamento proporciona menos risco quanto sua integridade.
O processo executivo é iniciado com a introdução, através de vibração quando necessário,
de um tubo metálico de ponta fechada, utilizado como forma para configuração da coluna.
Atingido o extrato subjacente inferior, o encamisamento de geotêxtil é inserido internamente
ao tubo metálico, que é preenchido com areia ou brita. Ao mesmo tempo em que saca a
camisa metálica, o martelo vibratório densifica o material dentro da coluna, finalizando o
processo. O espaçamento entre colunas varia, em geral, entre 1,5 e 2,5m. A figura 12
apresenta uma coluna granular encamisada executada.

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Figura 12 – Coluna granular encamisada – integridade (Huesker, 2014.)

De acordo com Revista Fundações & Geotecnia, 2013, na implantação de uma rodovia em
São José dos Campos, onde o subsolo era composto por duas camadas de solo mole,
separadas por uma camada de areia siltosa, foi adotada a solução com colunas de brita
encamisadas, com aproximadamente 10m de profundidade. Os recalques medidos foram da
ordem de 100mm e a estabilização ocorreu em apenas 6 meses.
A estabilização dos recalques ocorreu em 3 meses, com valores de até 20cm.
As figuras 13, 14 e 15 ilustram parte do processo executivo, com a cravação da camisa
metálica, instalação do revestimento e coluna finalizada.

Figura 13 Figura 14 Figura 15

Figura 13 – Camisa metálica - vibração


Figura 14 – Detalhe encamisamento
Figura 15 – Estaca encamisada - conclusão

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2.6 – Aterro estaqueado com uso de geossintético
O aterro estaqueado com uso de geossintético é uma evolução da solução proposta por
Terzagui, onde a carga de um aterro era transmitida às estacas por arqueamento, através
dos capitéis. Esta solução quase não transmite acréscimo de tensão ao solo mole e
portanto, os recalques por adensamento são muito pequenos, isso quando não são nulos
A figura 16 apresenta um esquema geral do processo de aterro estaqueado com uso de
geossintético.

Figura 16 – Aterro sobre estacas reforçado com geossintético (ALMEIDA, 2010.)

A geogrelha, além de permitir o aumento do espaçamento entre estacas, tem as seguintes


funções:
- Separar o material a ser utilizado no aterro do solo natural; distribuir as cargas às
estacas que não foram transmitidas pelo efeito de arqueamento e reforçar a base do aterro.

A solução de aterro estaqueado, quando comparado com aterros convencionais, tem melhor
custo benefício para camadas espessas de argila mole, conforme é possível verificar na
figura 17:

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Figura 17 –Aterro sobre estacas reforçado x Aterro sobre drenos (MARQUES, 2014.)

Este método tem como principais vantagens: sem tempo de adensamento; prazos
construtivos inferiores aos de outras técnicas; ao contrário de aterros convencionais,
desempenho de aterro estruturado melhora com o aumento da altura do aterro; menores
volumes de aterro pois não é preciso acelerar e/ou compensar recalques; menor
interferência com o meio ambiente em função dos menores volumes de material de jazida e
bota-fora.
Uns dos pontos que podem ser considerados como uma desvantagem do método é a
necessidade de se verificar os carregamentos horizontais nas estacas ao longo da
profundidade (efeito Tschebotarioff) em função do possível adensamento de aterros vizinhos
ao aterro estruturado.
Para um desempenho global satisfatório, recomenda-se que a espessura do aterro ℎ𝑎𝑡 seja
igual ou maior do que 70% do vão (s-b) entre capitéis. Além disso, existem algumas
recomendações geométricas (MARQUES, 2014):

Norma Alemã (EBG EO):


- (s-b) < ou = 3,0m, no caso de cargas fixas
- (s-b) < ou = 2,5m, no caso de elevadas cargas móveis;
- b/s > ou = 0,15;
- h > ou = k.(s-b); k varia com autores e normas
• K = 0,7 a 0,8 para normas britânicas (BS8006), alemã (EBGEO) e holandesa;
• K = 2 (EBGEO)no caso de cargas cíclicas ou cargas elevadas;
- s = espaçamento entre estacas;
- b = largura do capitel;

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- h = altura do aterro

Figura 18 –Captéis quadrados em malha quadrada (MARQUES, 2014.)

Depois de admitida uma determinada geometria com base nas recomendações acima, dois
cálculos são necessários para dimensionamento do aterro estruturado:
a) Cálculo das tensões verticais sobre o geossintético;
b) Dimensionamento do geossintético, em geral geogrelha.
Diversos métodos foram propostos para dimensionamento de aterros estruturados, desta
forma destacam-se neste trabalho dois deles:
Método de Russell e Pierpoint (1997): É uma adaptação do método de Terzaghi, onde o
coeficiente de empuxo no aterro foi adotado igual a 1. Desta forma, a equação para cálculo
da tensão fica conforme descrito abaixo:

𝜎𝑣 𝑠 2 − 𝑏2 4ℎ𝑎𝑡 .𝑏.𝐾𝑎𝑎𝑡 .𝑡𝑔∅𝑎𝑡


= (1 − 𝑒 𝑠2 −𝑏2 )
(𝛾𝑎𝑡 . ℎ𝑎𝑡+ 𝑞) 4. ℎ𝑎𝑡 . 𝑏. 𝐾𝑎𝑎𝑡 . 𝑡𝑔∅𝑎𝑡

Onde,
q = sobrecarga uniforme na superfície por unidade de área (kN/m²);
𝐾𝑎𝑎𝑡 = coeficiente de empuxo no aterro;
∅𝑎𝑡 = ângulo de atrito interno do aterro

O método de Kempfert et al. (2004) também é utilizado para cálculo da tensão vertical
atuante sobre o geossintético, e é baseado na teoria da elasticidade. Através do ábaco
proposto na figura 19 é possível calcular estas tensões verticais.

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Figura 19 –Cálculo de tensões verticais sobre o reforço (ALMEIDA, 2010.)

Para cálculo do esforço de tração atuante no reforço, T, também existem diversos métodos,
sendo que alguns autores partem de uma deformação específica (𝜀), o que não produz
valores consistentes, segundo McGuire e Filz (apud Almeida, 2010). Desta forma, as
equações são baseadas no valor de módulo do reforço J a ser utilizado.
No método da parábola, onde é admitido que a deformação do reforço tem formato
parabólico, o valor de T é dado pela equação:

96𝑇 3 − 6. 𝐾𝑔2 . 𝑇 − 𝐾𝑔2 . 𝐽 = 0


Onde,
𝜎𝑣 (𝑠 2 − 𝑏 2 )
𝐾𝑔 =
𝑏

e (𝑠 2 − 𝑏 2 ) é apresentado na figura 18.

O método da membrana tensionada admite que a deformação do reforço tem formato


circular. Também partindo de um valor de J conhecido, o valor de T é cálculo através da
equação:
2√2. 𝑇. 𝐽 𝜎𝑣 . (𝑠 − 𝑏)
. 𝑠𝑒𝑛−1 . [ ]−𝑇−𝐽 = 0
𝜎𝑣 . (𝑠 − 𝑏) 2√2. 𝑇

Pesquisas indicaram que o método das parábolas resulta em maiores valores de esforços
de tração do que o método da membrana tensionada.

2.7 – Injeções de consolidação

O último método a ser apresentado nesta abordagem é baseado na aplicação de


aglomerante em pó no solo mole. Esta técnica visa acelerar os recalques devido ao

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adensamento através deste aglomerante, o qual irá reagir com a água dos vazios do solo e
provocar o adensamento.
Existem algumas variações no processo executivo em função de limitação de profundidade
atingida, associação com outros métodos, entre outros fatores. Desta forma, temos
determinadas variações de nomenclatura com base em tais características.
Um dos processos é denominado Dry-Mix. É oriundo da Finlândia e utiliza uma escavadeira
hidráulica com um misturador na extremidade para criar uma mistura mecânica e
monitorada com o solo mole, utilizando cimento ou cal, e a água dos vazios do solo,
conforme figura 20. Este procedimento tem uma limitação de profundidade de 6m.

Figura 20 –Metodologia de mistura mecânica (Hayward Baker, 2015.)

Além da limitação de profundidade, este método, conhecido no Brasil como Stabtec, pode
não ser viável em situações de presença de solo resistente na camada superior ao solo
mole, impedindo seu avanço.
Outro processo de injeções de consolidação surgiu na Escandinávia e Japão e é conhecido
como Deep mixing. Este cria colunas de solo-cimento com diâmetros controlados, de
maneira semelhante ao jet grouting, porém com menor consumo de aglomerante, maior
precisão nos diâmetros das colunas e menor prazo de execução.
O método consiste na criação de colunas de aglomerante misturado ao solo mole, tornando
este solo menos compressível e adensando o mesmo. A figura 21 apresenta um
equipamento de injeção para criação das colunas.
A mistura pode ser executada pelo método úmido ou método seco. Em geral, para situações
de argilas muito moles, o método seco é mais apropriado, uma vez que o teor de umidade

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do solo é suficiente para proporcionar a reação química de ligantes estabilizadores injetados
na forma seca com o solo e nas águas dos vazios das partículas.
O consumo de cimento varia em função das propriedades do solo mole, porém, uma faixa
de valor típico estaria entre 150 e 350kg de cimento por metro cúbico de solo a ser tratado,
de acordo com informações de uma das grandes empresas executoras do método.

Figura 21 –Equipamento injeção de aglomerante para criação de colunas (ALMEIDA, 2014).

Outra solução para acelerar o adensamento e ainda melhorar as propriedades dos solos é
denominada CPR, consolidação profunda radial, patenteada por uma empresa brasileira. O
princípio executivo é o mesmo, porém o emprego de geodrenos verticais associados à
criação de colunas de solo-cimento facilita a dissipação da poropressão.

3. ESTUDO DE CASO

Neste capitulo é apresentado um estudo de caso no Recreio dos Bandeirantes - Rio de


Janeiro. Nesta ocasião foi adotada a solução com CPR (Consolidação Profunda Radial).
Trata-se de um empreendimento multifamiliar no Recreio dos Bandeirantes-RJ, onde o perfil
geológico do terreno é composto por camadas intercaladas de solo altamente compressível
abaixo do nível d’água, com valores de Nspt entre 0/78 a 2 golpes. Este tipo de material está
presente no terreno desde a superfície.
Os níveis internos do empreendimento estão, em média, 2,30m abaixo dos níveis da rua.
O projeto arquitetônico prevê a execução de um subsolo praticamente neste nível,
eliminando necessidade de aterros de implantação nesta região. Entretanto, visando atender
a legislação, uma parcela do terreno será aterrada para criação de áreas permeáveis.

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Este aterro de implantação sobre estas camadas de solo muito mole implicou na
necessidade de um estudo de adensamento para estabilização deste aterro.
A figura 22 apresenta um perfil geológico típico presente na região do empreendimento,
verificado através da sondagem de simples reconhecimento SP125.
Os dados para dimensionamento e os valores dos recalques e tempos de ocorrência para
tal perfil de sondagem são:
• Altura do aterro de implantação a ser executado: 2,50m
• Espessura das camadas de argila muito mole:
-Primeira camada: 2,00m
-Segunda camada: 2,05m
• Recalque por adensamento previsto: 28cm
• Tempo de ocorrência para 90% do recalque: aproximadamente 4 anos

Envoltórias (valores mínimos e máximos com bases em todas as sondagens da


obra):
• Altura de aterro a ser executada: 1,55m a 3,29m
• Espessura da camada de argila muito mole: 1,22m a 8,33m
• Recalque por adensamento previsto: 4cm a 36cm
• Tempo para ocorrência de 90% do recalque: 6 meses a 23,6 anos.

Valores médios (Também com base em todas as sondagens da obra):


• Altura de aterro: 2,3m
• Espessura da camada de argila orgânica: 4,2m
• Recalque por adensamento: 18,5cm
• Tempo para ocorrência de 90% do recalque: 7 anos.

Após diversas análises decidiu-se, juntamente com o cliente, utilizar a solução com CPR
(Consolidação Profunda Radial), a qual foi finalizada em Agosto de 2014. No mês seguinte o
aterro foi lançado e em 18.09.2014 iniciaram-se as medições, conforme figuras 23 e 24.

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Figura 22 –Sondagem SP125

Figura 23 –Placas de recalque. Área amarela - Aterro, demais subsolo.


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Figura 24 –Recalques medidos após tratamento com CPR.

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Desta forma, nota-se que nesta obra de aterro sobre solo mole, onde existia uma
previsão de recalque médio de 18,5cm em 7 anos, a solução com CPR atingiu a
estabilização deste aterro com recalques inferiores a 2,3cm em 4 meses.
O consumo de aglomerante também é um fator importante na distinção dos métodos e
muito relevante em função dos custos envolvidos. A metodologia de injeções de
consolidação, em geral, é uma opção também aos prazos executivos, uma vez que,
em geral, estabiliza o aterro em poucos meses. Este fator pode ser preponderante
também em casos de empreendimentos imobiliários, tendo em vista que cada vez de
uma maneira mais significativa, os prazos podem ser mais relevantes do que os
custos.

4. CONSIDERAÇÕES FINAIS

Solos finos saturados de baixa permeabilidade, e em geral de alta compressibilidade


de e baixa resistência à compressão, ao serem carregados sofrem recalques em
função do adensamento deste solo, sendo estes recalques proporcionais ao volume
de água drenado dos vazios do solo. Entretanto, essa caraterística de baixa
permeabilidade faz com que a drenagem seja lenta, e consequentemente gerando
recalques ao longo do tempo.
Como em geral não é possível aguardar que os recalques ocorram para implantação
das obras, foram apresentados diversos métodos de aceleração/mitigação dos
recalques, com suas particularidades, aplicações e características, verificando-se que
a sequência de hipóteses a serem estudadas, com base em custos, seria:
Remoção do material; sobrecarga temporária; geodrenos; materiais de baixa
densidade; colunas granulares; aterro estaqueado e injeções de consolidação.
Esta ordem é praticamente inversa, quando a referência são os prazos de execução e
consolidação. De qualquer maneira, cada caso de aterro sobre solo mole deve ser
tratado individualmente, levando-se em conta as condições de contorno e
necessidades da obra. A eficiência de uma das soluções de injeções de consolidação
foi verificada e apresentada, onde recalques previstos para ocorrência em 7 anos, em
média, ocorreram em 4 meses, sendo a ordem de grandeza dos valores
extremamente inferiores.

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5. REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS

ALMEIDA, M. S. S. Aterro sobre solos moles – projeto e desempenho. São Paulo:


Oficina de Textos, 2010.

ALMEIDA, M. S. S. Curso “Obras sobre Solos Moles”. COPPE/URFJ, 2014

Huesker Colunas Ringtrac, Houten, Holanda. Disponível em


http://www.huesker.com.br/areas-de-atuacao/geotecnia/aterros.html acesso em
6.12.2014.

MARQUES, Maria Esther Soares. Curso “Obras sobre Solos Moles”. COPPE/URFJ,
2014

Revista Fundações & Obras Geotécnicas – Ano2 N°14 – Artigo: Fundações de pátios
de estocagem com colunas confinadas com geotêxtil e reforços horizontais em áreas
de solos moles, 2013.

Hayward Baker. DrySoilMixing/. Disponível em


http://www.haywardbaker.com/WhatWeDo/Techniques/GroundImprovement/DrySoilMi
xing/default.aspx acesso em 18.06.2016

Workshop Keller 2014. Técnicas de melhoramento de Solo: Colunas de Brita e


Colunas de Solo-cimento (DSM), Palestrante Dr. Clemens Kummerer – Hotel
Mercure São Paulo Privilege – 26.11.2014.

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