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AFONSO MILANDO (Rui Burity da Silva), poeta, ensaísta e etnólogo, nasceu no Lobito,
em 1940 e faleceu em Luanda, em 1980. Estudou no Ambriz e posteriormente no
Huambo. Nesta cidade frequentou a Escola Industrial e Comercial de Sarmento
Rodrigues, onde foi galardoado por um poemeto intitulado “Natal”. Em 1963 passou a
integrar o Centro Juvenil de Estudos do Huambo, departamento dos Serviços Culturais
da Câmara Municipal de Nova Lisboa, que veio a promover a publicação de uma página
quinzenal no jornal O Planalto, um programa semanal no Rádio Clube do Huambo e a
criação de boletim interno destes serviços. Em 1964 ganhou os Jogos Florais de Nova
Lisboa, com o poema “Marimba”, tendo-se mudado para Lisboa em Dezembro, onde
passou a trabalhar nos Serviços Culturais da Companhia de Diamantes de Angola.
Posteriormente, veio a integrar a equipa que promoveu a exposição A Arte de um Povo
de Angola – Quiocos da Lunda, que decorreu em 1966 na Casa do Infante, no Porto.
Para além de artigos dispersos nos jornais O Planalto, de Nova Lisboa, A Província de
Angola, de Luanda, Jornal do Comércio, de Lisboa, e Alvorada, da Lourinhã, colaborou
também no Boletim da Agência-Geral do Ultramar. Em 1969 anunciava-se a publicação
do seu volume de poemas Foi Assim..., que acabou por sair em 1971 com chancela da
Sociedade de Expansão Cultural, e a preparação do volume “Também Já Fomos Um”
do qual não foram encontrados registos.
OBRAS PUBLICADAS
– Ochandala (1965) | Cantigas de Mama Zefa (1969) | Significado do Museu do Dundo
entre os povos de Luanda: algumas considerações (1970) | Foi assim… (1971) | A arte
afro-americana no contexto africano: aspectos e considerações (1971) | Recado para
Deolinda (1973).
…………………..
NDONGO
Dos vales e das montanhas. Dos mares e dos rios. Das florestas e savanas...
Lembranças de saudade.
Onde chingufos mil se elevam em uníssono com
o matraquear estonteante dos carros que passam.
Lavas de pranto incandescente se erguem das sonatas doloridas dos quissanges.
O silêncio.
O universo aberto em espaços infinitos onde saltam ridentes cores em simbiose.
Um dongo sulcando águas revoltas de rio escuro de cantares sombrios.
Música.
Caravanas cruzando estradas em passos arrastados de fadiga.
Música.
Até no choro profundo dos vivos em homenagem
derradeira aos mortos que partem há música.
Letras de alegria.
Letras de lágrimas ardentes.
Poesia estranha de estranho poeta que ninguém
conhece. Para lá dos seus poemas que existem, tudo é silêncio.
E indago:
Quem és tu estranho poeta que cantas os vales,
As montanhas, os mares, os rios, as florestas e savanas?...
Silêncio!
Cantas e teu povo canta também.
Vibras e vibram contigo almas estranhas
que guardam segredos fecundos de vidas passadas.
No anonimato em que persistes vives constante.
Pertenças ao presente, ou ao passado.
Morto, ou vivo.
Existes sempre presente no eco repetido dos teus
cantares e na sonata triste dos tocadores de quissanje.
(In “Cantiga de Mama Zefa)
……………………
CANTIGA DE MAMA ZEFA
Ainda me lembro dela
matrona forte desengonçada
tinha sempre uma oração nos olhos
uma canção nos lábios grossos
dorme menino dorme
oh! oh! oh! oh! oh!
cazumbi não está vir
mama Zefa tá lh'olhar
tinha ciúme do menino
de quem mama Zefa falava com paixão
um dia perguntei com ansiedade
se o menino seria assim como eu