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Exortação

Mauricio Gomes

Ribeiro Couto e Manuel Bandeira,


poetas do Brasil,
do Brasil, nosso irmão,
disseram:
“- É preciso criar a poesia brasileira, de versos quentes, fortes, como o Brasil,
sem macaquear a literatura lusíada”.

Angola grita pela minha voz,


pedindo a seus filhos nova poesia!

Deixemos moldes arcaicos,


ponhamos de lado,
corajosamente,
suaves endeixas,
brandas queixas,
e cantemos a nossa terra
e toda a sua beleza.

Angola, grande promessa do futuro,


forte realidade do presente,
inspira novas ideias,
encerra ricos motivos.

É preciso inventar a poesia de Angola

Fecho meus olhos e sonho,


abrindo de par em par o coração,
e vejo a projeção dum filme colorido
com tintas de fantasia
e cenas de magia:

As imagens são paisagens, gentes, feras.


E sucedem-se lenta, lenta, lentamente...
Assisto maravilhados
ao despenhar gemente
das quedas d’água do Duque de Bragança...
Vejo crescer florestas colossais
no Maiombe, onde o verde é símbolo
de tanta esperança...

(...)

Poesia inconformista,
diferente,
será revolucionária
como arte literária,
desprezando regras estabelecidas
ideias feitas, pieguices, transcendências...

Poesia nossa, única, inconfundível,


diferente,
quente, que lembre o nosso sol,
suave, lembrando nosso luar...
que cheire o cheiro do mato,
tenha as cores do nosso céu.
o nervosismo do nosso mar,

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o paroxismo das queimadas,
o cantar das nossas aves,
rugir de feras, gritos de negros,
gritos de há muitos anos,
de escravos, de engenhos das roças,
no espaço, vibrando, vibrando...

(...)

Uma poesia nossa, nossa, nossa!


- cântico, reza, salmo, sinfonia,
que uma vez cantada,
rezada,
escutada,
faça toda a gente sentir
faça toda a gente dizer:

- É poesia de Angola!

GOMES, Mauricio. “Exortação” In: FERREIRA, Manuel – No reino de


Caliban – Antologia panorâmica da poesia africana de expressão
portuguesa II. Lisboa: Seara Nova, 1976, pp. 85-89.

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Evocação do Recife
Manuel Bandeira
Recife
Não a Veneza americana
Não a Mauritsstad dos armadores das Índias Ocidentais
Não o Recife dos Mascates
Nem mesmo o Recife que aprendi a amar depois –
Recife das revoluções libertárias
Mas o Recife sem história nem literatura
Recife sem mais nada
Recife da minha infância

A rua da União onde eu brincava de chicote-queimado e


[ partia as vidraças da casa de dona Aninha Viegas
Totônio Rodrigues era muito velho e botava o pincenê na ponta do nariz
Depois do jantar as famílias tomavam a calçada com cadeiras, mexericos namoros risadas
A gente brincava no meio da rua
Os meninos gritavam:

Coelho sai!
Não sai!

A distância as vozes macias das meninas politonavam:

Roseira dá-me uma rosa


Craveiro dá-me um botão

(Dessas rosas muita rosa


Terá morrido em botão...)

De repente
nos longes da noite
um sino

Uma pessoa grande dizia:


Fogo em Santo Antônio!
Outra contrariava: São José!
Totônio Rodrigues achava sempre que era São José.
Os homens punham o chapéu saíam fumando
E eu tinha raiva de ser menino porque não podia ir ver o fogo.

Rua da União...
Como eram lindos os nomes das ruas da minha infância
Rua do Sol
(Tenho medo que hoje se chame do Dr. Fulano de Tal)
Atrás de casa ficava a Rua da Saudade...
...onde se ia fumar escondido
Do lado de lá era o cais da Rua da Aurora...
...onde se ia pescar escondido
Capiberibe
- Capibaribe

Lá longe o sertãozinho de Caxangá


Banheiros de palha

Um dia eu vi uma moça nuinha no banho


Fiquei parado o coração batendo
Ela se riu

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Foi o meu primeiro alumbramento

Cheia! As cheias! Barro boi morto árvores destroços redomoinho sumiu

E nos pegões da ponte do trem de ferro os caboclos destemidos em jangadas de bananeiras

Novenas
Cavalhadas
Eu me deitei no colo da menina e ela começou a passar a mão nos meus cabelos

Capiberibe
- Capibaribe

Rua da União onde todas as tardes passava a preta das bananas


Com o xale vistoso de pano da Costa
E o vendedor de roletes de cana
O de amendoim
que se chamava midubim e não era torrado era cozido

Me lembro de todos os pregões:


Ovos frescos e baratos
Dez ovos por uma pataca
Foi há muito tempo...

A vida não me chegava pelos jornais nem pelos livros


Vinha da boca do povo na língua errada do povo
Língua certa do povo
Porque ele é que fala gostoso o português do Brasil
Ao passo que nós
O que fazemos
É macaquear
A sintaxe lusíada
A vida com uma porção de coisas que eu não entendia bem
Terras que não sabia onde ficavam

Recife...
Rua da União...
A casa de meu avô...
Nunca pensei que ela acabasse!
Tudo lá parecia impregnado de eternidade

Recife...
Meu avô morto.
Recife morto, Recife bom, Recife brasileiro como a casa de meu avô.

BANDEIRA, Manuel. “Evocação do Recife” In: Estrela da vida inteira – poesias


reunidas. Rio de Janeiro: José Olympio Ed., 1991, pp. 104-107.

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Rua da Maianga
Mário António

Rua da Maianga
que traz o nome de um qualquer missionário
mas para nós somente
a rua da Maianga

Rua da Maianga às duas horas da tarde


lembrança das minhas idas para a escola
e depois para o liceu

Rua da Maianga dos meus surdos rancores


que sentiste os meus passos alterados
e os ardores da minha mocidade
e a ânsia dos meus choros desabalados!

Rua da Maianga às seis e meia


apito do comboio estremecendo os muros
Rua antiga da pedra incerta
que feriu meus pezitos de criança
e onde depois o alcatrão veio lembrar
velocidade aos carros
e foi luto na minha infância passada!
(Néné foi levado prHospital
meus olhos encontraram Néné morto
meu companheiro de infância de olhos vivos
seu corpo morto numa pedra fria!)

Rua da Maianga a qualquer hora do dia


as mesmas caras nos muros
(As caras da minha infância
nos muros inapagados!)
as moças nas janelas fingindo costurar
a velha gorda faladeira
e a pequena moeda na mão do menino
e a goiaba chamando dos cestos
à porta das casas!
(Tão parecido comigo esse menino!)

Rua da Maianga a qualquer hora


o liso alcatrão e as suas casas
as eternas moças de muro
Rua da Maianga me lembrando
meu passado inutilmente belo
inutilmente cheio de saudade!

ANTÓNIO, Mário. “Rua da Maianga”. In FERREIRA, Manuel – No reino de


Caliban – Antologia panorâmica da poesia africana de expressão
portuguesa II. Lisboa: Seara Nova, 1976, pp. 154-155.

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Estrela da Manhã
Manuel Bandeira

Eu quero a estrela da manhã


Onde está a estrela da manhã?
Meus amigos meus inimigos
Procurem a estrela da manhã

Ela desapareceu ia nua


Desapareceu com quem?
Procurem por toda à parte

Digam que sou um homem sem orgulho


Um homem que aceita tudo
Que me importa?
Eu quero a estrela da manhã

Três dias e três noites


Fui assassino e suicida
Ladrão, pulha, falsário

Virgem mal-sexuada
Atribuladora dos aflitos
Girafa de duas cabeças
Pecai por todos pecai com todos

Pecai com os malandros


Pecai com os sargentos
Pecai com os fuzileiros navais
Pecai de todas as maneiras
Com os gregos e com os troianos
Com o padre e com o sacristão
Com o leproso de Pouso Alto

Depois comigo

Te esperarei com mafuás novenas cavalhadas


[comerei terra e direi coisas
[de uma ternura tão simples
Que tu desfalecerás

Procurem por toda à parte


Pura ou degradada até a última baixeza
Eu quero a estrela da manhã

BANDEIRA, Manuel. “Estrela da manhã”. In: Estrela da vida inteira – poesias


reunidas. Rio de Janeiro: José Olympio Ed., 1991, pp. 120-121.

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Carta para Manuel Bandeira
Jorge Barbosa

Nunca li nenhum dos teus livros.


Já li apenas
a Estrela da Manhã e alguns outros poemas teus.
Nem te conheço
porque a distância é imensa
e os planos das minhas viagens nunca passaram
de sonhos e de versos.
Nem te conheço
mas já vi o teu retrato numa revista ilustrada.
E a impressão do teu olhar vagamente triste
fez-me pensar nessa tristeza
do tempo em que eras moço num sanatório da Suíça.

Aqui onde estou, no outro lado do mesmo mar,


tu me preocupas, Manuel Bandeira,
meu irmão atlântico.

Eu faria por ti qualquer cousa impossível.


Era capaz de procurar a Estrela da Manhã
por todos os cabarés
por todos os prostíbulos.
E eu ta levaria
pura ou degradada até à última baixeza.

Bateria de manso
à porta dos teus apartamentos de poeta solitário
ali na Avenida Beira Mara do Rio de Janeiro.
Terias qualquer pressentimento
porque se fosses pôr a vitrola a funcionar
tocarias o disco,
se estivesses a escrever na máquina portátil
deixarias o poema no meio

E virias abrir-me a porta

Então
sem qualquer palavra
passar-te-ia a Estrela da Manha

Depois voltaria tranquilamente para a minha ilha


no outro lado do Atlântico
E traria saudades do teu sorriso sem ressentimentos
Sem orgulho
que eu descobriria naquele instante
através da porta entreaberta

BARBOSA, Jorge. “Carta para Manuel Bandeira”. In : Caderno de um


ilhéu – poemas. Lisboa: Agência Geral do Ultramar/Divisão de
Publicações e Biblioteca,1956, pp. 53/54.

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Você, Brasil
Jorge Barbosa

Para o poeta RIBEIRO COUTO

Eu gosto de Você, Brasil,


porque você é parecido com a minha terra
Eu bem sei que Você é um mundão
e que a minha terra são
dez ilhas perdidas no Atlântico,
sem nenhuma importância no mapa.
Eu já ouvi falar das suas cidades:
A Maravilhosa do Rio de Janeiro,
São Paulo dinâmico, Pernambuco, Baía de Todos-os-Santos,
ao passo que as daqui
não passam de três pequenas cidades.
Eu sei tudo isso perfeitamente bem,
Mas Você é parecido com a minha terra.

É o seu povo que se parece com o meu,


é o seu falar português
que se parece com o nosso,
ambos cheios de um sotaque vagaroso,
de sílabas pisadas na ponta da língua,
de alongamentos timbrados nos lábios
e de expressões terníssimas e desconcertantes.
É a alma da nossa gente humilde que reflecte
a alma da sua gente simples,
ambas cristãs e supersticiosas,
sentindo ainda saudades antigas
dos serões africanos,
compreendendo uma poesia natural
que ninguém lhes disse,
e sabendo uma filosofia sem erudição
que ninguém lhes ensinou.

O gosto dos seus sambas, Brasil, das suas batucadas,


dos seus cataretês, das suas toadas de negros,
caiu também no gosto da gente de cá,
que os canta e dança e sente
com o mesmo entusiasmo
e com o mesmo desalento também.
As nossas mornas, as nossas polcas, os nossos cantares,
fazem lembrar as suas músicas,
com igual simplicidade e igual emoção.

Você, Brasil, é parecido com a minha terra.


As secas do Ceará são as nossas estiagens,
com a mesma intensidade de dramas e renúncias.
Mas há uma diferença no entanto:
é que os seus retirantes
têm léguas sem conta para fugir dos flagelos,

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ao passo que aqui nem chega a haver os que fogem
porque seria para se afogarem no mar...

Nós também temos a nossa cachaça,


o grog de cana que é bebida rija.
Temos também os nossos tocadores de violão
e sem eles não haveria bailes de jeito.
Conhecem na perfeição todos os tons
e causam sucesso nas serenatas,
feitas de propósito para despertar as moças
que ficam na cama a dormir nas noutes de lua cheia.
Temos também o nosso café da ilha do Fogo
que é pena ser pouco,
mas — Você não fica zangado? —
é melhor do que o seu.

Eu gosto de Você, Brasil.


Você é parecido com a minha terra.
O que é é que lá tudo é à grande
e tudo aqui é em ponto mais pequeno...

Eu desejava fazer-lhe uma visita


mas isso é cousa impossível.
Queria ver de perto as cousas espantosas que todos me contam
de Você,
assistir aos sambas nos Morros,
estar nessas cidadezinhas do interior
que Ribeiro Couto descobriu num dia de muita ternura,
queria deixar-me arrastar na onda da Praça Onze
na terça-feira do Carnaval.
Eu gostava de ver de perto o luar do Sertão,
de apertar a cintura de uma cabocla
— Você deixa? —
e rolar com ela num maxixe requebrado.

Eu gostava enfim de o conhecer mais de perto


e Você veria como sou um bom camarada.
Havia então de botar uma fala
ao poeta Manuel Bandeira,
de fazer uma consulta ao Dr. Jorge de Lima
para ver como é que a Poesia receitava
este meu fígado tropical bastante cansado.
Havia de fala com Você,
com um i no si
– “si faz favor” –,
de trocar sempre os pronomes para antes dos verbos
– “mi dá um cigarro?” –

Mas tudo isso são cousas impossíveis – Você sabe? –


Impossíveis

BARBOSA, Jorge. “Você, Brasil”. In: Caderno de um ilhéu – poemas.


Lisboa: Agência Geral do Ultramar/Divisão de Publicações e
Biblioteca,1956, pp. 57/60.

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Recado para o Arquipélago
Ribeiro Couto

Jorge Barbosa
Em Cabo Verde te imagino
Olhando o céu – triste menino
Da Ilha do Sal.

Oh! Horizonte do destino!


Oh! Solidão da água amargosa!

Nascer poeta é sempre um mal,


Seja onde for – Jorge Barbosa!

Águas e céu é tudo estreito,

Jorge Barbosa:

Cada um de nós leva no peito


A Ilha do Sal.

COUTO, Ribeiro. “Recado para o Arquipélago”. In: Poesia Reunida. Rio de


Janeiro: José Olympio Ed.,1960.

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OLÁ! NEGRO
Jorge de Lima
Os netos de teus mulatos e de teus cafuzos
e a quarta e a quinta gerações de teu sangue sofredor
tentarão apagar a tua cor!
E as gerações dessas gerações quando apagarem
a tua tatuagem execranda,
não apagarão de suas almas, a tua alma, negro!
Pai-João, Mãe-negra, Fulô, Zumbi,
negro-fujão, negro cativo, negro rebelde,
negro cabinda, negro congo, negro ioruba,
negro que foste para o algodão de U.S.A.
para os canaviais do Brasil,
para o tronco, para o colar de ferro, para a canga
de todos os senhores do mundo;
eu melhor compreendo agora os teus blues
nesta hora triste da raça branca, negro!
Olá, Negro! Olá, Negro!
A raça que te enforca, enforca-se de tédio, negro!
E és tu que a alegras ainda com os teus jazzes,
com os teus songs, com os teus lundus!
Os poetas, os libertadores, os que derramaram
babosas torrentes de falsa piedade
não compreendiam que tu ias rir!
E o teu riso, e a tua virgindade e os teus medos e a tua bondade
mudariam a alma branca cansada de todas as ferocidades!

Olá, Negro!

Pai-João, Mãe-Negra, Fulô, Zumbi


que traíste as Sinhás nas Casas-Grandes,
que cantaste para o Sinhô dormir,
que te revoltaste também contra o Sinhô;
quantos séculos há passado
e quantos passarão sobre a tua noite,
sobre as tuas mandingas, sobre os teus medos, sobre tuas alegrias!

Olá, Negro!

Negro que foste para o algodão de U.S.A.


ou que foste para os canaviais do Brasil,
quantas vezes as carapinhas hão de embranquecer
para que os canaviais possam dar mais doçura à alma humana?

Olá, Negro!

Negro, ó antigo proletário sem perdão,


proletário, bom,
proletário bom!
Blues
Jazzes,
songs,
lundus.
Apanhavas com vontade de cantar,
choravas com vontade de sorrir,
com vontade de fazer mandinga para o branco ficar bom,

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para o chicote doer menos,
para o dia acabar e negro dormir!
Não basta iluminares hoje as noites dos brancos com teus jazzes,
com tuas danças, com tuas gargalhadas!
Olá, Negro! O dia está nascendo!
O dia está nascendo ou será a tua gargalhada que vem vindo?

Olá, Negro!
Olá, Negro!
LIMA, Jorge de. “Olá Negro”. In: Poesia Completa vol.1. Rio de Janeiro:
Ed. Nova Fronteira, 1980, 179-181.
MAMÃ NEGRA-
(Canto de esperança)
Viriato da Cruz

Tua presença, minha Mãe — drama vivo duma Raça


drama de carne e sangue
que a Vida escreveu com a pena de séculos.
Pela tua voz
Vozes vindas dos canaviais dos arrozais dos cafezais dos seringais dos algodoais...
Vozes das plantações da Virgínia
dos campos das Carolinas
Alabama
Cuba
Brasil
Vozes dos engenhos dos banguês das tongas dos eitos das pampas das usinas
Vozes do Harlem District South
vozes das sanzalas
Vozes gemendo blues, subindo do Mississipi, ecoando dos vagões.
Vozes chorando na voz de Carrothers:
Lord God, what will have we done
Vozes de toda a América. Vozes de toda a África.
Voz de todas as vozes, na voz altiva de Langston
na bela voz de Guillén...
Pelo teu dorso
Rebrilhantes dorsos aos sóis mais fortes do mundo
Rebrilhantes dorsos, fecundando com sangue, com suor amaciando as mais ricas
[terras do mundo
Rebrilhantes dorsos (ai a cor desses dorsos...)
Rebrilhantes dorsos torcidos no tronco, pendentes da forca caídos por Lynch.
Rebrilhantes dorsos (ah, como brilham esses dorsos),
ressuscitados com Zumbi, em Toussaint alevantados.
Rebrilhantes dorsos...
brilhem, brilhem, batedores de jazz
rebentem, rebentem, grilhetas da Alma
evade-te, ó Alma, nas asas da Música!
... do brilho do Sol, do Sol fecundo
imortal
e belo...

Pelo teu regaço, minha Mãe

Outras gentes embaladas


à voz da ternura ninadas
do teu leite alimentadas
de bondade e poesia
de música ritmo e graça...
santos poetas e sábios...
Outras gentes... não teus filhos,
que estes nascendo alimárias
semoventes, coisas várias

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mais são filhos da desgraça
a enxada é o seu brinquedo
trabalho escravo — folguedo...

Pelos teus olhos, minha Mãe


Vejo oceanos de dor
claridades de sol posto, paisagens
roxas paisagens
dramas de Cam e Jafé...
Mas vejo também (oh, se vejo...)

mas vejo também que a luz roubada aos teus olhos, ora esplende
demoniacamente tentadora — como a Certeza...
cintilantemente firme — como a Esperança...
em nós outros teus filhos,
gerando, formando, anunciando
— o dia da humanidade
O DIA DA HUMANIDADE...

CRUZ, Viriato da. “Mamã Negra (Canto de esperança)”. In: FERREIRA,


Manuel – No reino de Caliban – Antologia panorâmica da poesia africana
de expressão portuguesa II. Lisboa: Seara Nova, 1976, pp. 173-174.

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