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G il k a M a c h a d o e E ros V o lú sia
S o r a ia M a r ia S ilv a
EDITORA
B B
UnB
A o s que para além d o drama con seguem ser poesia!
E m m e m ó ria de
E ro s V o lú sia
A lm ir B ru n e ti
D a n ilo L ô b o
A lg u m a s p a la v r a s p r e lim in a r e s 9
1 . P o e s i a e d a n ç a : l i n g u a g e m e m m o v i m e n t o 12
2 . T r a n s m u t a ç ã o s e m i ó t i c a 18
4 . N ie tz s c h e e a fu n d a ç ã o da n ov a d a n ça 63
A nexo
D a n ilo L ô b o
P o e s ia e d a n ç a : lin g u a g e m
I em m o v im e n to
ÜELSARTE E L A B A N : A SE M IÓ TIC A DA A Ç ÃO
N ív e is C o rp o A lm a E s p ír it o
M o d a lid a d e expressiva
Voz G esto Palavra
e x te rio r
A expressão
A expressão de A expressão de
de d erivação
derivação a n ím ica d erivação esp iritu a l
v ital será
G ê n e r o da expressão será n o rm a l será c o n cê n trica
exc ên trica
(e q u ilíb r io en tre (voltada para o
(voltada para
e x te rio r e in te r io r ) in te rio r)
0 e x te rio r)
F lu ê n cia :
in te g ra ção ,
Precisão
sensação
(sen tim en to )
d e u n id a d e
A m p litu d e
c o rp o ra l. H o r iz o n ta l
L a d o —lad o F ren te—atrás (e x p a n d ir o u
E spaço: (m esa)
techar)
c o m u n ic a
A te n çã o
ção, in íc io do
(p en sam en to)
p r in c íp io de
re a lid ad e
Peso:
C o m p r im e n to
assertivi-
V e rtica l (e m e rg ir o u In ten são
d ade, A lt o —b aixo L a d o —lado
(p o rta ) a fu n d a r) (sensação)
estab ilid a d e
Tem po:
execu ção, P ro fu n d id a d e
o p e r a c io n a li Sagital F re n te — (avançar o u D ecisão
A lt o —b aixo
d ad e, (ro d a) atrás recu ar) (in tu içã o )
lo c o m o ç ã o ,
m o b ilid a d e
A m e to d o lo g ia de L ab an tam b ém in c lu i o trein a m en to da
h a b ilid a d e vo ca l seg u n d o o m esm o p r in c íp io de co m b in açã o dos
fatores flu ê n c ia , esp aço, peso e tem p o em p regad os n o d esen volvi
m e n to da ação. D essa fo rm a , voz e m o v im e n to p a rticip a m de um a
ed u cação in tegra d a n a b usca do m o v im e n to expressivo. A s o ito
ações básicas de esforço (socar, flu tu a r, p o n tu a r, pressionar, talhar,
to rcer, sacud ir, deslizar) "rep resen ta m u m a o rd en a ç ã o d e n tre as
c o m b in açõ es possíveis dos elem en to s p eso, esp aço, te m p o , a qu al
é estabelecid a de a co rd o co m duas atitudes m en tais p r in c ip a is que
envolvem , p o r u m lad o , um a fu n çã o o b jetiva e, p o r o u tr o , a se n
sação d o m o v im e n to ” .20 Essas ações básicas são ta m b ém em p re g a
das ao m esm o te m p o n o d esen v o lvim en to da ação vo cal e física n os
exercícios de trein a m en to de atores e d a n ç a r in o s .21
S eg u n d o L ab an , p recisão, a ten ção, in ten são e d ecisão são
estágios de p rep aração in te r io r de u m a ação c o rp o r a l e x te rn a .22
Essa ação só se m an ifesta q u an d o o esfo rç o é ativado (m o tiv ad o ) de
d en tro para fo ra e e n c o n tra sua expressão c o n c reta n o m o v im e n
to do c o rp o . A c o m b in açã o desses q u a tro fa to res d o m o v im e n to
dão o rig e m ao re p e rtó rio in d iv id u a l23 de m o v im e n to , q u e é ú n ic o
p ara cada in d iv íd u o e tão esp ecífico qu e, q u a n d o é " c a p tu ra d o ” na
• 28 • escritu ra sim b ó lica , p e rm ite a análise da p e rso n a lid a d e . Essa es
critu ra sim b ó lica do m o v im e n to p e rm ite o reg istro e a re p r o d u ç ã o
desse p o r pessoas qu e n u n ca vira m a c o re o g ra fia an tes. S eg u n d o
S olan ge A r ru d a , "a c o re o g ra fia M yfairla dy fo i c o n c e b id a e escrita
em L a b a n o ta tio n n os E U A p o r H a n ia H o lm e en viada para a I n
glaterra, o n d e fo i rea liza d a ” .24
A o d e fin ir as ações básicas d o m o v im e n to , s e le c io n a n d o
d e te rm in a d o s tip o s de ações e c o m b in a n d o - a s , le v a n d o -s e em
c o n ta o g ra u de in te n sid a d e d os e sfo rç o s , L a b a n te o riz a o m o v i
m e n to c o m o u m a esp écie de o rg a n iz a ç ã o frá sica em q u e há u m a
c o m b in a ç ã o das q u alid ad es in te rn a s d o m o v im e n to d e a te n çã o ,
in te n sã o , p re c isã o , d ecisã o , q u e são c o n fig u ra d a s em u m a s e le
ção de in fo rm a ç õ e s lin g ü ística s q u e m u ita s vezes in d ic a m açõ es
extern as.
P o r e x e m p lo , c o m a m e t o d o lo g ia de L a b a n , a cim a d e s
c rita , é p o ssív e l fa ze r a d a n s in te r s e m io tiz a ç ã o de u m a fra se d e
te rm in a d a , tr a n s fo r m a n d o - s e , p o r e x e m p lo , em in te r p r e ta ç ã o
c o r p o r a l exp ressiva u m a o r a ç ã o im p e ra tiv a , c u ja e s tru tu ra é
m u ito p r ó x im a à ação b ásica so c a r, q u e a r tic u la o te m p o r á p id o
c o m o p e so fir m e e o esp a ço fo c a liz a d o . U m a e q u iv a lê n c ia da
ação so ca r (p e so fir m e — esp a ço d ir e to — te m p o r á p id o ) te m -s e
n a c o n s tru ç ã o v e rb a l "Pedro, corra e leve logo a sa co la !", p e r f e it a
m e n te p o ssív e l d e ser tra n sla d a d a p a ra as a çõ es d o m o v im e n to
e q u e já c o n té m a in d ic a ç ã o síg n ic a da a titu d e c o r p o r a l a ser
assum id a, c o n fo r m e os p o s tu la d o s a cim a q u e se e n c o n tr a m n a
labanotation,25
Poesia, te escrevo
agora: fezes, as
impossíveis de poema. • 29 •
Te escrevo, por isso,
breve. Te escrevo
mais; [ . . . ] 26
Fu n ç ã o p o é t ic a d o m o v im e n t o
A c re sc e n ta n d o -s e a esse q u a d ro , ela b o ra d o p o r L ô b o , os
eixos sin tagm áticos e p a rad igm á tico s para a análise da po esia, cate
gorias de Jak o b so n , e a b o rd a n d o tam b ém a dança e os m éto d o s de
Delsarte e L ab an , o b té m - se: -35-
L ite r a
L ín g u a P in t u r a M ú s ic a P o e sia D ança
tu ra
E ixo h o r i C o re o g ra fia
zo n ta l *L ab an:
E n re d o D e n o ta ç ã o F igurativa M e lo d ia sin tagm ático co rê u tica
(c o m b in a - *D elsarte:
ção) estática
G esto/
m o vim e n to
à p ro cu ra de
E ixo vertical
P sicologia sign ificad o
H arm o p a ra d ig m á
das p e r C o n o ta ç ã o A b strata *L ab an:
n ia tico
son agens e u cin ética
(seleção)
*D elsarte:
d in âm ica e
sem iótica
Pa n o r a m a de G il k a M achado
Eros V o l ú s ia
F o i in sp ira d a n o s versos de m in h a m ãe q u e c r ie i b a i
lados co m o : "A n sia de a zu l” , " N o tu r n o ” , " A g o n ia da
sau d ad e” , "C a sc a v e la n d o ” , " M o v im e n to ” , " U ltim a
fo lh a de o u t o n o ” , " O r a ç ã o ” (em q u e p r o c u r e i r e
viver o so n h o de S an ta T e re z in h a , vestid a de fre ira ,
co m passos livres d o a ca d em icism o , e b u s q u e i todas
as atitudes d o estilo sacro, d esliza n d o su avem ente,
traçan d o lin h a s, p e q u e n o s m o v im e n to s de ascensão
e evocan d o u m a chuva de pétalas de rosas q u e c o n s e
g u i fazer ca ir n u m c e n á rio m a ra vilh o so ). T o d o s e s
ses n ú m e ro s eu dançava sob re págin as m u sicais q u e
n u n c a haviam sid o ap roveitad as p ara a d a n ç a .18
O esp írito p o é tic o é o c o n d u to r n a b u sca d o m o v im en to
expressivo, em p re e n d id a p o r E ro s, m a rcan d o u m a de suas p r in c i
pais características, e ch am o u a aten ção de vários crítico s da época.
A n d rad e M u ricy , em seu liv ro Caminho de música, co m en ta a respeito
dessa presença p o ética n a o b ra da b a ila rin a b ra sileira e da in flu ê n
cia atávica d os p a ren tes artistas:
P ro d u to de u m lo n g o e la b o r io s o ecletism o de m o
vim e n to s in te rn a cio n a is , e n riq u e c id o grad ativa-
m en te co m criaçõ es e d escob ertas resu ltan tes de seus
p r ó p rio s exercícios, a cham ada escola clássica h o je
c o n s titu i u m m éto d o severo, m as n a seq ü ên cia desse
m éto d o se revelam p r e d o m in a n te s, fa cilm e n te r e c o
n h ecíveis, os elem e n to s fo lc ló r ic o s esp a n h ó is, ita lia
n os e h in d u s .23
Soraia Silva
iom en a gem à bailarina Eros Volúsia, realizada em 26 de fevereiro de 2 0 0 5 , n o campus da
• Universidade de Brasília, m ostrando a reconstituição da coreografia Tico-Tico nofubá, de
Eros Volúsia, pelo C D P D a n /C E N U nB
O teatro restrito a u m d e te rm in a d o n ú m e ro de i n
d ivíd u os — literato s, c rítico s o u p ú b lic o de elite — n ão
é verd ad eiram en te u m te atro . T ea tro é divulgação.
Se u m teatro n ão é fre q ü e n ta d o p e lo p ú b lic o , de
nada valerá. E, so b retu d o , o artista é gra n d em en te
p reju d ica d o . N ão fica c o n h e c id o e sua arte to rn a -se
h erm ética, circu n scrita . N o caso, u m a b aila rin a que,
p rin c ip a lm e n te , usa m otivos n acion alistas, r e p r e
sentados em b ailad o s sim ples, qu e lh e valerá (sic) o
aplauso de u m p ú b lico d im in u to e se le cio n a d o ? E,
de u m m o d o geral, para que p o d e rá servir o teatro
com elevação q u e so m en te possa ser alcan çado p o r
in telectu a is? T ea tro , sen d o diversão, in stru çã o e es
tética, n ão se p o d e lim ita r a u m p e q u e n o g ru p o de
assistentes.36
• 55 -
E m u m m o m e n to da entrevista, é possível p e rc e b e r o papel
de G ilka M ach ad o , q u e se p r o n u n c ia a respeito das in cu rsõ es a r
tísticas da filh a n o g ê n e ro revista. S eg u n d o a entrevista pu b licad a,
Gilka M a c h a d o :
[ ...] D e in íc io r e lu to u u m p o u c o p ara q u e E ro s n ão
deixasse o p a lco das casas snobes de esp etácu los para
v ir r e p r e se n ta r nas rib a ltas in te n sa m e n te ilu m i
nadas d os teatro s d o g ê n e ro revista. T o d a via , E ro s
c o n v e n c e u q u e desejava fa zer te a tro p ara o p ú b li
co e e s tre o u -s e n a revista, fa z e n d o apen as b a ila
d o s. Isso se d eu n a p e ça Passo da girafa, q u e a lc a n ç o u
a b so lu to sucesso. A p e sa r d os pesares, E ro s V o lú sia
s o fr e u u m a v e rd a d e ira cam p an h a . T o d o s os seus a d
m ira d o re s e até a c rític a c o n sid e ra va m e rra d o o seu
p r o c e d im e n to , a b a n d o n a n d o o clássico p e lo g ê n e ro
sim p les e p o u c o resp o n sá vel da revista. C o m o te m
p o , tu d o f o i se tr a n s fo r m a n d o . E ro s, co m fa c ilid a
de e c o m o cartaz q u e p o ssu ía, n ão teve d ificu ld a d e
em a lca n ça r o e stre la to , e a tu a lm e n te é a p r in c ip a l
fig u r a da c o m p a n h ia F e rre ira da Silva, o ra a tu an d o
n o T e a tr o C a r lo s G o m e s, co m a revista "B a la n ça,
mas n ão c a i” .37
N as d eclarações a n te rio rm e n te expostas, fic a clara a n eces
sidade de expressão artística q u e tin h a a b a ila rin a b ra sile ira ao não
c o n ta r co m recu rso s p r ó p rio s n ecessários e co m espaços ad eq u a
d os d isp o n íveis à sua dança, p o rq u a n to q u e ria d ivu lg ar os trab a
lh os realizad os para u m m a io r n ú m e ro de pessoas. M as em um a
socied ad e p u rita n a , c o m o a da ép o ca, a escolh a da revista m usical
fo i u m passo a rriscad o n a c arre ira de E ro s. S u rg ira m críticas com o
a de V ie ir a de M e lo , que declara:
•59 •
N o ta s d o c a p ítu lo 3
O h o m e m n ão gosta m u ito de a p ro fu n d a r. M a n
té m -se à su p erfície; isso exige m en o s esfo rço . "N a
verd ad e, n ad a é m ais p r o fu n d o do q u e a q u ilo que
é s u p e rfic ia l” — p r o fu n d o co m o o lo d o d o p â n tan o .
[ ...] O m o v im e n to sim ples q u e nada de e x te rio r p a
rece m o tiv ar esco n d e u m te so u ro im en so de p o ssi
b ilid a d e s .28
G il k a M a c h a d o e N ie t z s c h e : a d a n ç a c o m o
M E T O D O L O G IA D E C R IA Ç Ã O P O É T IC A
4 — M in ha cara verdadeira
1 — Eu vos saúdo
2 — heróis do dia
2 — que vos fizestes compreender
15 — da glória da Pátria.
• 80 • 1 / — de sentimento ou de imaginação
2 0 — e antipatias,
2 1 — souberam se insinuar
2 2 — no coração
23 ~~do M u n d o !
2 6 - d e vossos improvisos
2 8 — â bailarinos espontâneos
2 9 ~ ó p o eta s repentistas
3 1 — à sede de glória
3 2 — de um p o v o
3 3 — novo ?
3 6 — N a esportiva expressão
4 .1 — a milagrosa realidade
4 3 - E ia
44 — atletas franzinos
4 5 — gigantes débeis
47 — tenacidade e energia
4 8 — transfigurai-vos,
53 — A vante
54 — astros escuros,
55 — sóis morenos,
56 — continuai deslumbrando
5 7 ~ as louras multidões
5 9 - e fulgores
6 0 — de relâmpagos
6 1 — hum anos!
6 3 — neste momento
6 4 — paira
6 5 — 0 destino da Pátria.
6 9 — Em vossos p és heróicos
70 — depõe um beijo
71 — a alm a do B ra sil!Sl
Esse p o em a , de e n fo q u e p r o fu n d a m e n te n a cio n a lista , deixa
tran sp arecer a exaltação gilk ian a d os fe ito s em p o lg a n tes d os jo g a
d ores do fu te b o l b ra sileiro , suas a rtim an h as c o rp o r a is , q u e e m
p o lg a m n ão só os b ra sileiro s, mas o u tro s ob serva d o res em terras
estrangeiras. O esp írito n acio n a l fa z-se resp e ita d o co m seus atletas
fra n zin o s, os quais escrevem com os pés u m a e p o p é ia in te r n a c io
n al. O to m do p o em a é de lo u v o r aos b a ila rin o s, aos poetas, aos
esp on tân eo s e aos repentistas n a q u arta estro fe, m e tá fo ra que r e
m ete m ais u m a vez à dança e à po esia aliadas n o ato ú n ic o de o f e
recer o sangue à sede de g ló ria de u m p o vo n o vo .
O u tra s características nietzschian as, a d an ça c o n tín u a da
virilid a d e, da fe rtilid a d e e da alegria, da dança q u e n ã o e n c o n tra
b arreiras, que dança com os lim ites do sen tim en to h u m a n o , u m
• 82 • inesgotável d o m para a tran scen d ê n cia , estão m u ito p rese n tes na
p o esia de G ilk a , co m o em " O m u n d o necessita de p o e sia ” , d o livro
Su blim açã o:
6 — nos atropelos
7 — das carreiras
8 — de ambição
g - e n a luta p elo p ã o.
11 — tenham os a coragem
1 3 — do sentim ento;
1 4 — ponham os termo
1 5 — o esses malabarismos
1 6 — de palhaços
1 7 —falsos
1 8 — da modernidade,
2 2 — enferma.
27 — em meio aosprazeres,
2 8 — desligada em toda parte,
2Q — perdida em si mesma.
3 1 — do cam inho da f é
3 9 — do sonho.
4 4 — um sino de cristal,
4 7 — do m om ento angustioso!
51 — cantar
5 2 — para animar
5 3 — 0 labor do Universo,
54 — cantar para acordar,
5 5 — idéias emoções:
$ 6 — porque no nosso canto
5 7 — há um trigo louro,
5 8 — um p ã o estranho que impulsiona
59 — 0 braço humano,
6 0 — e o s cérebros orienta,
6 1 — uma hóstia
6 4 — a sublimação da existência.
• 84 •
Esse p o em a , can to de lo u v o r à p o esia , ao fazer p o ético ,
m arca a c o n sciên cia gilk ian a da n ecessid ade visceral da arte com o
recu rso fu n d a m en ta l na o rien ta çã o estética e e m o c io n a l das p es
soas. N a sexta estro fe, G ilk a estabelece o d estin o d os poetas com o
o d estin o das cigarras e d os pássaros: /ca n ta r/p a ra an im a r/ o labor do
Universo/. N a m esm a d ireçã o , p ara N ietzsch e to d o s devem ser p o e-
ta s-d a n ça rin o s em suas vidas. E le p ro p ag a q u e o h o m e m deve ser
capaz para a gu erra e a m u lh e r para a p r o c ria ç ã o , m as am bos devem
"d an çar com cabeça e p e rn a s” .63 O filó s o fo ju lg a , ain d a, p e rd id o
"o dia em qu e n ão se d a n ço u n em uma v e z l” 64
C a n ta r e d an çar, n o c am in h o da fé da p o esia , essa é a lin
gu agem que G ilk a e N ietzsch e in d ic a m p ara a tra n scen d ê n cia de
si m esm os, para o d esp ertar do in d iv íd u o n a m u ltid ã o in s e n s ib i
lizada e en ferm a . N ietzsch e fala das cap acid ad es qu e o d an çarin o
tem para e n fre n ta r exp eriên cias e tra n sc e n d e r as lim itaçõ e s do c o
m u m . S eg u n d o ele, "ge lo liso é paraíso p ara q u em sabe d a n ç a r” .65
G ilka, na segu n da estro fe de " O m u n d o n ecessita de p o e sia ” , diz:
/ponham os term o/ a esses malabarism os/ de p a lh a ço s/fa lso s/ da m o d er n id a d e,/ em
1 — Lépida e leve
2 — em teu labor que, de expressões à míngua,
4 — Lépida e leve,
5 —guardas, ó língua, em teu labor,
6 — gostos de afagos e afagos de sabor,
11 — e se f a z m enos rudo,
1 4 — estatuária da palavra,
1 8 — 0 divino pecado
3 0 — és tateio do coração,
45 — L ín gu a-lâ m in a , língua-labareda,
vestes qu a se,/ com o se o corpo meu de ti vindo me fo sse / . N a oitava estro fe,
são várias as q u alid ad es da lín g u a q u e na sín tese d o b em e do m al
co leia sem p re, em deslizes de sed a ... N a n o n a estro fe, a a u to ra exalta a
lín g u a, d o p o n to de vista fe m in in o , n a sua lin g u a g e m n ão verb al,
mas se n so ria l-a m o ro sa , co m o p o d e ser ob servad o n o s versos: /e
pelas frases mudas que proferes/ nos silêncios de A m o r !.../ .
I é a três
U m b e r to E co destaca tarefa su p rem a e a atividade
aspectos q u e d e fin e m a Obra aberta: p ro p ria m e n te m etafísica desta v id a ”
" i — as ob ras 'a b erta s’ e n q u a n to ( N I E T Z S C H E , 19 9 2 , p . 2 6 ).
e m m o v im e n to se caracterizam 4 S E V C E N K O , 19 9 2 , p- 26.
p e lo c o n v ite a fa ze r a o b ra co m o 5 I b id ., p . 3 5 .
a u to r; 2 — n u m n íve l m ais am p lo 6 Jacó G u in s b u rg n o p o sfácio
(co m o g ê n e ro da esp écie ’ o b ra em ’'N ietzsch e n o te a tro ” analisa essa • 89 *
m o v im e n to ’)» existem aquelas obras q uestão a p a rtir do p e n sa m e n to do
q u e, j á co m p letad as fisicam e n te , filó s o fo alem ão, q u a n d o argu m en ta
p e rm a n e c e m c o n tu d o abertas a um a q u e das "p rofu n d ezas h e d io n d as
g e rm in a ç ã o c o n tín u a de relações d o so frim e n to e da m o rte , v o ltaria
in te rn as q u e o fr u id o r deve d e s c o b rir a jo r r a r , em im agen s radian tes
e e sc o lh e r n o ato de p e rc e p ç ã o da e su b lim es ilu sões, a trágica
to ta lid a d e d os e stím u lo s; 3 — cada m u sicalid a d e d o h o m e m às voltas
o b ra de arte, a in d a q u e p ro d u z id a co m seu fa d o e, n a co n te m p laçã o
em c o n fo r m id a d e c o m u m a exp lícita p raze ro sa e na co n cilia ção
o u im p líc ita p o é tic a da n ecessid ad e, c o n so la d o ra , ele re c o b ra ria o
é su b stan cia lm e n te aberta a u m a p o d e r de v ive n cia r-se e m ira r-se
série v irtu a lm e n te in fin ita de leitu ras na p le n itu d e de seu ser e seu d e v ir”
possíveis, cada u m a das qu ais leva ( N I E T Z S C H E , 1 9 9 2 , p . 17 0 ).
a o b ra a reviver, se g u n d o u m a 7 I b id ., p. 56.
p e rsp e ctiva , u m go sto , u m a execução 8 D U N C A N , 19 9 6 , p . 2 5 - 2 6 .
p esso al ( E C O , 19881 p . 6 2 ). 9 I b i d ., p . 6 0 - 6 1 .
2 K a n d in sk y , n a in tro d u ç ã o Do
10 I b id ., p . 53.
espiritual na arte, a b o rd a essa questão 11 L O V E , 1 9 6 4 , p. 12.
da evo lu çã o d o c o n h e c im e n to em 12 I b id ., p . 12.
d ire çã o ao alto : " A v id a e sp iritu a l, a 13 "P aralela m en te ao g ru p o
q u e a arte ta m b é m p e rte n c e e de que exp ression ista da Ausciruc/rsían^ e das
é u m d os m ais p o d e ro so s agentes, exp eriên cias cên icas da Bauhaus na
tra d u z -s e n u m m o v im e n to para A le m a n h a , d esen volvia-se o g ru p o
a fr e n te e p ara o a lto , co m p le x o , co n stitu íd o pela escola D en ish aw n ,
m as n ítid o , e q u e p o d e r e d u z ir -s e a criad a em 1915« em L ° s A n g e le s, nos
u m e le m e n to sim p les. E o p r ó p r io E stados U n id o s . Esta escola, fu n d ad a
m o v im e n to d o c o n h e c im e n to ” p o r R u th St. D e n is ( 1 8 7 8 9 -1 9 6 8 ) e
( K A N D I N S K Y , 1 9 9 0 , p . 3 1). T e d Shaw m (1 8 9 1 -1 9 7 2 ), de fo rm a
3 N o p re fá c io d e d ic a d o a R ich a rd eclética in c lu ía em seus cursos dança
W agn er, N ie tzsch e registra: " A arte o rie n ta l, e sp an h o la, in d o -a m e ric a n a
e balé clássico, assim c o m o as exp ressão, c o m p o r co m ele u m a nova
técn icas dos gra n d es in flu e n cia d o re s m u ltip lic id a d e ” ( O c o r p o -e s c r itu r a
da m e to d o lo g ia c o r p o r a l n a dan ça de N ie tzsch e , de S a n d ro K o b o l
exp ression ista: F ra n ço is D elsarte F o rn a za ri. Cadernos N iet& ch e, São
( 1 8 1 1 -1 8 7 1 ) e J a q u e s - D a lc r o z e P a u lo , D e p a rta m e n to de F ilo so fia da
( 1 8 6 5 - 1 9 5 0 ) ” (S IL V A , S o ra ia , U n iv e rsid a d e d e S ão P a u lo , g ru p o
2 0 0 2 , p . 2 9 3 ). G E N , n . II, p . II, 2 0 0 1 ).
14 N I E T Z S C H E , [s .d .], p . 12 5 . 3 0 " O s sete selos o u A canção d o sim e
15 V O L Ú S I A , 19 8 3 , p . 1 4 5 - 1 4 7 . a m ém ” ( N I E T Z S C H E , [ s.d .],
16 N I E T Z S C H E , [ s .d .], p . 1 9 4 -1 9 6 . p- 237 )-
17 A U L E R , 19 3 1. 31 N I E T Z S C H E . Breviário de citações,
18 N I E T Z S C H E , 19 8 3 , p . 4 15 . 2 0 0 1, p. 80.
19 C A L V I N O , 19 9 0 , p. 31. 32 N I E T Z S C H E , A gaia ciência , p . 2 7 -
2 0 I b id ., p . 31* 33 C o n c e ito e la b o ra d o p o r W assili
21 I b id ., p . 2 4 - K a n d in sk y , u m d os p a rticip a n te s
2 2 G a sto n B a ch e la rd exe m p lifica, d o g ru p o D e r B la u e r R ite r ( O
c o m u m texto de L e o n a rd o da C a v a le iro A z u l) , K a n d in sk y d efe n d ia
V in c i, a d ialética e n tre a ascensão e o " p r in c íp io da n ecessid ad e in t e r io r ”
a q u ed a p resen tes n o p r in c íp io da d ese n v o lv id o c o m base n o co n tato
•go- v erticalid a d e . Para D a V in c i: " A leveza e fica z d o o b se rv a d o r c o m a o b ra
nasce d o p eso, e re c ip ro c a m e n te , observada. A p a rtir daí a alm a h um an a
p agan d o im ed ia ta m en te o fa vo r de é "tocad a em seu p o n to m ais sen sível”
sua cria ção , am bos a u m e n ta m em ( K A N D I N S K Y , 19 9 0 , p . 6 6 ).
fo rç a na p r o p o rç ã o q u e a u m e n ta m 3 4 D U N C A N , 1 9 9 6 , p . 51.
em vid a e têm tan to m ais vida q u an to 35 M A R K A R D , A rm a ; M A R K A R D ,
m ais m o v im e n to têm . E les tam b ém H e rm a n n , 1 9 8 5 , p- 13 -
se d estro e m m u tu am e n te n o m esm o 36 K A N D I N S K Y , 1 9 9 0 , p . 14 3 .
in stan te, n a c o m u m v en d e ta de sua 37 D U N C A N , 1 9 7 7 , p . 6 3 .
m o rte . P ois assim é feita a p rova , 38 K A N D I N S K Y , 1 9 9 0 , p . 10 8 .
a leveza só é criad a se estiver em 39 I b i d ., p . 10 8 .
c o n ju n ç ã o co m o p eso, e o peso só 4 0 K a n d in sk y a in d a n o s fala,
se p r o d u z se se p r o lo n g a r n a leveza” nessa etapa d e seu d iscu rso , da
( B A C H E L A R D , 2 0 0 1 , p . 2 7 2 ). c o n cre tiza çã o da arte m o n u m e n ta l,
23 N I E T Z S C H E , [ s.d .], p . 3 4 .
q u e teria c o m o p r im e ir a realização
24 A fo ris m o 4 4 ( N I E T Z S C H E ,
a "c o m p o s içã o c ê n ic a ” , c o n fig u ra d a
2 0 0 1 , p . 3 9 ).
p o r três m o v im e n to s : I — o
2 5 N I E T Z S C H E , [ s.d .], p . 5 8 .
m o v im e n to m u sical; 2 — o m o v im e n to
26 I b id ., p . 19 9 .
2 7 K A N D I N S K Y , 1 9 9 0 , p . 10 7. p ic tó r ic o ; 3 — 0 m o v im e n to da
28 I b id ., p . 1 0 6 - 1 0 7 . d an ça c o n v e r tid o e m a rte. Esses três
29 S e g u n d o S a n d ro aKspectos
o b o l da co m p o siçã o cê n ica
F o rn a za ri, " 1e r o u escrever so b re g e ra m o q u e K a n d in sk y d e fin iu
N ietzsch e é certas vezes m ais q u e o c o m o " tr íp lic e e fe ito d o m o v im e n to
c o m p re e n d e r, é p e r m itir q u e c o m ele in t e r io r ” ( ib id ., p . 1 0 8 ).
se c o m p o n h a m fo rm a s novas, estilo s, 4 1 A lib e rd a d e de expressão pregad a
é en sejar q u e c o m ele n ovo s m u n d o s p o r W ig m a n t o r n a r - s e - á m o tivo de
(h ierarq u ias) se exp ressem . A le itu ra
p e rs e g u içã o , p o is , d u ra n te o regim e
que a filo so fia de N ietzsch e co n vid a a
nazista, sua escola, em D re s d e n ,
que se faça de si exige a in te rfe rê n c ia
f o i classificad a de "ce n tro de arte
d aq u ele que lê co m a q u ilo q u e está
d eg en era d a ” e fech ad a e m 1 9 4 o -
e sc rito , to car e d e ix a r-se to c a r p e lo
c o rp o -e s c r itu r a q u e a li se fez A p e sa r desse fato, ela co n segu iu fica r
n a A le m a n h a , o n d e passou a e n sin ar
na A ca d e m ia de M úsica de L eip zíg . 51 Id em , [ s.d .], p . 292-
A o fim da S egu n d a G u e rra M u n d ia l 5 2 I b id ., p . 2 76 .
foi para B e rlim O c id e n ta l e re to m o u 53 M A C H A D O , 1 9 9 9 , p . 3 9 3 - 4 0 5 -
suas atividades core o gráficas. 5 4 ( N I E T Z S C H E , [ s.d .], p . 1 0 0 -
4-2 P o d e -se v e rific a r a sem elhan ça 10 1).
estética da o b ra de E ro s V o lú sia co m 55 I b id ., p . 2 12 .
outras co reó grafas im p o rta n te s p ara a 56 Para F lávio K o th e , N ietzsch e é
dança n o sécu lo X X , em u m a a n alogia o "a to r m a ra vilh o so ” n a en cen ação
de danças de E ro s V o lú sia c o m as de da n ova crítica fic c io n a l m o d e rn a .
outras d an çarin as. N a c o re o g ra fia S e g u n d o o c rític o , na Origem da
"J o n g o ” , de E ro s V o lú sia , e na tragédia, N ietzsch e "c o n s tr ó i u m a
(lanças cria !1
1 — 0 silêncio é a expressão
5 ~ é a voz do sentimento.
8 — a sonora mentira.
9 — A m o o silêncio evangelizador;
1 0 — no silêncio absoluto
1 1 — é que eu me escuto,
• 106 •
12 — E e m nostalgias epa ixões consistes.
1 3 — M as a N o ite é tranqüila,
1 7 — a solidão perscruta:
1 9 — apenas, de momento
2 6 — de veludos
2 7 — longos e roxos...
3 2 — numa continuidade
23 — de oceano: onda após onda.
34 — Debruçada à ja n ela ,
3 $ — suponho se inundar
3 6 — degrandes vagas 0 ar,
4 3 — te n h o -a recente na memória;
6 2 — e estertora...
70 — calado! Estatelado!
71 — Com o vinda de longe,
72 — de novo a voz se abranda e, calma e grave,
73 — lembra 0 sermão de lágrimas de um monge,
74 — dentro de escura e vazia nave.
7 5 - f a z - s e o rumor inda mais suave,
76 — inda mais brando...
77 — E, p o u co a p o u co , desmaiando,
7# — num sm orzan d o
79 — dentro da noite a voz desata,
8 0 — neste momento,
8 1 — 0 suspiro prolongado
8 2 — de uma fe r m a ta ...
8 6 — Agora indo,
8 ? — e logo vindo,
8 8 — morrendo, ressuscitando,
9 4 — é m inha dor,
1 0 5 — rumores,
1 0 ? — supor,
1 1 3 — em pizzicatos,
1 1 4 — e as mesmas notas vibrantes,
1 1 5 — antes,
l i y — lânguido, lasso,
1 1 9 — A v o z expira...
1 2 0 — P or todo 0 am biente,
1 2 2 — que se desfia. ■
.
1 2 3 — A v o z expira,
1 2 4 — dolente,
1 2 $ — mansa,
1 2 6 — com o a agonia
1 2 7 — de uma criança...
1 2 8 — A v o z expira...
1 3 2 - j u l g o - a uma espira
1 3 3 — de incenso...
E n c o n tr a r n a tr a d iç ã o u m a e s tru tu ra m u s ic a l m o
d e r n a é p ro c e sso e s s e n c ia lm e n te a tu a l, p o r q u e
d e se m p e n h a ra m gran d e fu n ç ã o as e x p e r iê n c ia s
m o d a is de u m D eb u ssy , p e la u tiliz a ç ã o d os e n o r
m es re c u rso s la te n te s n o s a n tig o s m o d o s litú r g ic o s
e p o p u la r e s .61
E m sua fase m ais sim b olista, G ilk a M ach ad o escreveu "A nsia
de a zu l” , de Cristais partidos, e, in s p ira d a nesse p o em a , E ro s V o lú
sia c rio u u m a dança de m esm o n o m e , " d a n sin te r s e m io tiz a n d o ” as
palavras poéticas da m ãe, sob u m r itm o m u sical d e b u ssy n ia n o .62
S eg u n d o H u g o A u le r , em u m a rtig o p u b lica d o n o D iário de N otícias,
a co m p o siçã o co re o g rá fica de E ro s fo i m u ito fe liz, ex p rim in d o
tod a a ânsia de in fin ito expressa n o p o em a:
"Á n sia de azu l” . P ágin a de D ebussy. A m ú sica é e n
can tad ora de tanta expressão. C a d a n o ta orq u estral
que vib ra é u m frase to d a . E para cada a co rd e, E ros
V o lú sia tem u m a p o sição c o re o g rá fica que é b em
um a p rova elo q ü e n te de sua alta escola, a m esm a es
cola o n d e as on d as a p ren d e m a r o la r para m o r re r e
os pássaros ensaiam os vô os. A elegante d an çarin a
c o m p re e n d e p e rfe ita m e n te o p en sam en to m u sical de
D ebussy e viveu tod a a an siedad e, e to d a a in q u ie tu d e
da alm a im p o n d erá v el, m u sical da gra n d e p ágin a d e-
b ussyniana, que q u er to ca r o c é u .63
1 5 — esta mística fa la ,
1 7 — e conclam a, e ressoa
1 8 — em toda a natureza,
33 — e melodias.
3 9 — a atração do ignorado,
4 6 — da velha Sociedade
4 7 — 0 messalina hedionda
63 — 0 mágicas manhãs,
64 — vós me trazeis ao cérebro ânsias vãs!
6 5 — 0 fu lg o r que de vós se precipita • 117 •
6 6 — perturba a minha vida de eremita,
6 y — açora-m e os sentidos
8 4 — indecisos lentos,
8 g — p o r estes campos.
9 0 — Escampos.
10 1 - A v e s !
1 — N u m a nuvem de renda,
2 — M usa, tal com o a S alo m é da lenda
2 — na fo rm a nua
i y — e a imprevista beleza,
1 8 — a beleza incorpórea
29 — enche de adejos
3 0 — e rastejos
31 — teu ambiente;
3 2 — caíam em to m o a ti pedras ou flo res
3 4 — de lisonjeiros e de malfeitores
5 0 — da Terra
57 ~ ó M usa em ocional!
59 — de maneira tal,
60 — que eles se fiq u em , p elos séculos, dispersos,
61 — com os ritmos da existência universal.
62 — E a dançar
63 — num delicioso sacrifício,
6 4 ~ p a te n te ia a nudez
O to m d o p o e m a é de u m o rá c u lo im p e ra tivo , qu e p r e
vê, su gere, o rd e n a , d eseja, aco n selh a, n u m tratam e n to de c o n
ju g a ç ã o v e rb a l de seg u n d a pessoa d o sin gu lar, to d a u m a série de
c o m p o rta m e n to s e qualid ad es artísticas a serem desenvolvidas pela
m usa p o ética d an çarin a d o texto de G ilka. A m usicalidade é m arcada
p elo som da lira , qu e, co m o in s tru m e n to m u sical m ito ló g ico ou
co m o letras de m úsicas p o p u lares o u a in d a co m o estro p o é tic o , na
segunda estro fe, desfere sons de gargalhada, g o zo , lam e n to e d o r,
c o m p o n d o u m ritm o de todas as im pressões sen soriais, vividas pela
poeta em êxtase. Esse estado "ex tá tico ” , essencial n a p rática artística
da poeta, fala do o lh a r especial sob re a vida, p r o d u z id o p o r u m a
"em oção estética” , u m p r in c íp io de in teração co m o a m b ien te, que
fu n d a a p a rtir do im pacto ex te rio r da im agem observada e sentida,
n o silên cio fu n d a d o r do o lh a r pessoal, u m a resposta criativa, n o
caso da m eto d o lo g ia d o d a n çarin o aqu i tratada. Essa resposta será
um a d ansin tersem iotização , o u seja, essa le itu ra p ela d ança d o tem a
de que trata o poem a: o cu lto à p r ó p ria in sp iração p o ética .
A te rceira estro fe revela o q u e a p o eta deve d iz e r e c o m o .
• 122 • Sua p o esia deve d izer de to d o s os painéis encantadores da n atu reza e
d ar vid a a essas expressões co m os espasm os e as agon ias d os seus
recu rso s té cn ico s de d a n ç a rin a -p o e ta . A q u arta e a q u in ta estrofes
falam de esforços corp orais a serem realizadas n o p e rcu rso p o ético ,
in d e p e n d e n te m e n te das críticas, b oas o u ru in s, o u seja, a p o eta
d a n çarin a deve vo ar e deve rastejar ao m esm o te m p o , n a alm a de
pom ba em u m corpo de serpente, e nesse d u p lo m o v im e n to deve ser
verd a d eira , sed u tora, toda de risos tua boca enfeita, até m esm o n a sua
im p e rfe iç ã o . Essa d u p la característica p ro je ta d a p e la a u to ra ta m
b é m é um a con stan te em sua o b ra , o d esejo lib e rta d o r de im agen s
aladas e in fin ita s ao lad o da co n sciên cia trágica d o p eso das p risõ es
e d os desejos carnais.
N as sexta, sétim a e oitava estrofes, o m esm o d esejo p o é
tic o -d a n ç a r in o g ilk ian o lem b ra u m can to ritm a d o q u e m arca o
com passo da lição n ietzsch ian a n o s seus can tos de lo u v o r à vida
e à sa b e d o ria .66 N o s passos de N ietzsch e, G ilk a can ta a p r ó p ria
fo rtu n a p o ética, m arcada p ela m usa d a n ça rin a , satânica e d ivin a,
além d o b e m e do m al. N esse can to de lo u v o r à m usa d a n çarin a
sob ren a tu ral e e m o cio n a l, a p o eta e n c o n tra a tra n sc e n d ê n c ia dos
lim ites das lin g u ag en s, p r o c la m a n d o -a n o s versos 4 6 e 4 7 "na D a n
ça a poesia dos gestos” , e "n o s versos a dança da Poesia” . A m u sa -d a n ça rin a
plasm ada na vid a carn al e esp iritu a l te rre n a d a n sin tersem io tiza a
p r ó p ria T erra , d a n çan d o seu grande gozo m aternal. O p o e m a -c o r p o -
d a n ç a rin o , em sua p ro je ç ã o id ealizad a p e la au to ra, faz sua p r ó p ria
ginástica, a p rep ara çã o física e e m o cio n a l para a dança, to rc en d o
e d esto rcen d o o ser flex u o so , trab a lh an d o os versos para os ritmos de
uma existência universa l.67 J á a n o n a estro fe estabelece co m a p rim e ira
um p a ralelism o circ u la r, m a rcan d o o re to r n o à sina p o ética de
um a m usa d a n ça rin a , sacerdotisa de u m deus m a io r, p e rso n ifica d a
p o r S alo m é , m as n ão a líric a assassina e sim a q u e dança n a n u d ez,
velada apenas p o r rend as tran sparen tes e fe m in in a s, sua verdade
p o ética, seu a m o r im o rta liz a d o . T o d a a cena revela-se n o te m p lo
pagão da n atu reza.
Esse p o em a , escrito em 19 2 2 , parece ser u m a descrição d e
talhada d o q u e será d ep o is tod a a carreira de E ro s V o lú sia , que
então te ria 8 an os de id ad e, co m o se G ilk a , em u m ato de p o d e r
p o ético v is io n á rio , fa la n d o de si m esm a, falasse da artista d a n ça
rin a q u e se d esen volveria p o ste rio rm e n te em sua filh a . O leg a
do de G ilk a para E ro s fo i a c o n stru çã o de u m a anted an ça p o ética
fu n d a d a n o gesto c ria d o r fe m in in o . E vocan d o a m usa d an çarin a
do b e m e d o m a l, tra ç o u o d estin o da filh a co m as palavras p r o fé
ticas de " C o m ig o m esm a” . E ro s, en ca rn a n d o essa m usa d an çarin a
do p o e m a g ilk ia n o , a S alo m é b ra sileira , co m o fic o u c o n h ec id a e
aclam ada em várias partes d o m u n d o ,68 im o rta liz o u n o s seus m o
vim en to s, nas suas ro u p a s u m a sen su alid ad e p r o fu n d a e exp ressi
va, p o is, co m o ela m esm a d izia, sua lin g u ag em p o r excelên cia era
a d ança: "M eu s p e n sa m en to s m ais re c ô n d ito s, m eus sen tim en tos
m ais ín tim o s, sem p re en c o n tra ra m expressão n a d an ça” .69 A b a i
larin a , d a n sin te rse m io tiza n d o a b ra silid a d e em seu c o rp o de m u
lh e r, to r n o u o gesto p o é tic o gilk ia n o realid ad e viva, e, p a rtin d o
desse im p u lso in ic ia l, tra ço u n o espaço evolu ções de u m a dança de
características m u ito pessoais e estilizadas.
L ic e n ç a p o é t ic a p a r a o o l h a r f e m in in o
uma fa m a injuriosa.70
G ilk a e E ro s são m u lh e re s q u e r o m p e r a m co m p a d rõ es
p ree sta b e le cid o s d o c o m p o rta m e n to fe m in in o , sen d o criad oras
de u m a expressão a ltam e n te in d iv id u a liz a d a e p o e tiz a d a . E m
certo se n tid o , elas c u m p rira m o q u e A r t h u r R im b a u d v a tic in o u ,
em carta a P au l D e m e n y , em 18 7 1, q u a n d o q u e s tio n a o p a p e l da
m u lh e r :
• 127 •
U m a o u tra ca ra cte rística p e rfe ita m e n te p e rc eb ív e l
n a p o e ta d os Cristais pa rtid os é a sua to r tu r a de m u lh e r ,
"a ca ch a p a d a m en te s e n h o r a ” , n o n osso m e io social!
E u m a das palavras m ais d ia b o lic a m e n te p é rfid a s,
n o B ra sil, esta palavra sen h o ra ! H á em quase tod o s
os verso s de G ilk a u m g r ito de p r is io n e ir a : m as f e
liz m e n te , há n e le s ta m b é m — p o r q u e n ão d iz ê - lo
— essa b o n d a d e in fin ita , g ló r ia m a io r de n ossa te rra ,
q u e é o co ra ç ã o da m u lh e r b ra sile ira . A cada verso
se vê u m eco desses, c o m o se a p o e ta fosse o f u lg u
ra n te L e a d e r - A z u l de tod as as suas co m p a n h eira s!
E a p o e ta p a ra re p re se n tá -la s ao c o m p le to , n o b r e ,
s u p e rfin a de b o a g ra n d eza , n o s d iz q u e p r e fe r ir ia
ve r seu filh o " s o fr e d o r c o m o C r is to , a s a b ê -lo na
vid a u m m a u , u m v il, u m J u d a s !” S im p le sm e n te S u
b lim e ! E dá v o n ta d e à g e n te d e, em fe c h a n d o esse
m a g n ífic o liv ro d os Cristais p a r tid o s, exclam ar: — H o
sana! H o san a! A G ilk a ... p o eta pagã q u e co n v e rso u
c o m J e s u s !.. . 79
D e J osé O itic ic a :
D e M ax V asco n cello s:
D e C ry sa n th èm e:
D e G o n d in da Fonseca:
D e F áb io L u iz:
D e P ovin a C avalcânti:
vida triste, insípida, isolad a,/b u sca r um com panheiro e encontrar um senhor . . ./ .88
A D A N Ç A DE E R O S: R ITM O FE M IN IN O N A PO E SIA
5 — a euritmia da Vida.
6 — D a n ça s...
7 — Teus lentos • 133 •
8 — movimentos
11 — D a n ça s...
12 — Teu corpo tem
1 3 — todas as nuanças
1 7 — palpitações de oceano.
3 8 — as m elodias do afago...
• 134 •
3 9 — Danças, e fic o , a quando e quando,
5 1 — maviosidades brancas
6 ? — smorzando, descendo,
73 — cheios
7 4 ~ dos meus anseios;
7 8 — e meu instinto
8 5 — a s e enroscar
8 6 — e a se desenroscar.
1 0 0 — da N atureza.
10 — D esejo de migração
11 — dos elem entos vitais
12 — às fo n tes primitivas;
1 3 — ânsia de desagregamento
14 — dos átomos
1 5 — pela atração irresistível das origens...
1 6 — D iante da natureza,
1 7 — assisto àfu ga
2 3 — em ar,
2 4 — em águo,
25 ~ em p ó ,
2 6 — misturada com as coisas,
2 7 ~ integrada no infinito.
2 8 — N atureza
3 5 — nos unifica:
4 3 ~ q ue extraordinária simbiose
4 5 - A m o - t e como me amas;
4 6 — minha v o z é 0 clarim
5 0 — de minha alma;
5 1 — só tu me possuis inteira.
5 2 — Q u e me valeria a existência
5 4 ~ em q ue confundim os os seres,
5 5 — em que rolamos p e lo infinito
5 6 — loucas de liberdade,
5 7 — num longo enleio
5<§ — de fêm eas
59 — en a m o ra d a s?!.. . IOS
2 — A n te a floresta
3 — D a tua alma.
5— 0 prodigioso murmúrio
9 — D as fro n d es altas
1 0 — E adivinhando, temerosos,
1 2 — Paludesferm entantes,
2 — acendiam astros...
4 — E n o corpo da mata
5 — os pirilam pos,
6 — de quando em quando,
7 — insinuavam
8 — fosforescentes carícias...
1 0 — chocalhava,
1 1 — com os guizos
1 2 — do cr i-c r i osculante
1 5 — E n o corpo da noite
1 6 — as estrelas cantavam
D e t a lh e d e O s ca va lo s d e N e p tu n o ( 1 8 9 2 ) , d e W a lte r C r a n e
l ? — o infinito do mar;
2 3 — teu coração,
2 4 — tem a palpitação
25 — indómita do mar;
2 6 — e, quando as ondas me envolvendo vão,
2 8 — teu coração,
• 148 •
1 2 — 0 meu tato se estende a todos os sentidos;
1 2 — é o em balo do sono
1 3 — de uma criança...
1 — M in h a infantilidade,
2 — para comparecer
2 — à festa da Beleza,
9 — p o r tal maneira
10 — transfigurada.
1 2 — e e u cantava,
1 2 — supondo que ao meu canto
15 — As horas passaram
1 6 — (atrozes!)
l j — e a minha ju v en tu d e descuidada
1 9 — nua
2 0 — diante do mundo.
21 — M eu ser espiritual,
22 — p o r onde ia passando,
2 3 — em suas mil facetas conduzia
2 4 ~ os ritmos das coisas:
2 7 — aves e nuvens
3 1 — e em minhas momentâneas
3 2 — imobilidades
3 3 — farandularam
3 4 — sensações
3 5 — e idéias.
3 6 — A natureza a m ou -m e
3 7 ~ contem plando-se
38 — na transparência
3 9 — de minha sensibilidade;
4 0 — porém o H om em ,
4 1 — receoso de se defrontar,
4 3 ~ na objetiva
4 4 ~ da minha frase,
4 5 — passou ao largo...
4 6 — Passou
4 7 — desejoso e tímido,
4 8 — incrédulo e desconfiado...
53 — de roupagens raras...
5 4 — Passou p o r minha alma nua,
55 — de longe,
5 6 — interrogando:
7 — p o r ti do inferno fa ç o - m e cativa,
12 — N a m anhã de cristal
1 3 — pa ira um silêncio ta!
24 — que o pensam ento soa:
25 — "Vamos, é tempo, reage, olha que a vida é boa
1 6 — e a natureza linda,
44 — N a manhã de cristal
4 5 ~ acolhedora e boa,
4 6 — há tal translucidez, há uma quietude tal
56 — D a m anhã de cristal
5 7 — o bservo-m e, surpresa,
72 — E me fic o , hesitante,
7 3 — ouvindo a cada instante,
7 4 — na m anhã de cristal,
75 — o labor cerebral
76 — que no silêncio soa:
77 — "Vamos, é tem po, reage, olha que a vida é boa
7 8 — e a natureza é linda!
E u v e n h o de lo n g e , su b in d o da gleba. M eus o lh o s
de so n h o ficam p r o fu n d o s de o lh a r os abism os. [ ...]
M e u c o rp o a fin o u -s e n o esfo rço c o n tín u o de ser a
m in h ’alm a. [ ...] N ão m e p ro c u re s d ete r: levo d a n
çan d o m in h a raça ao e n c o n tro da h u m a n id a d e , para
o b aila d o u n iversal d o fu tu ro em q u e serei a B e m -
A m a d a. N ão m e p ro c u re s d eter: há n a m in h a i n
q uietação u m lo u c o an seio de e te rn id a d e .134
8— Q u a n to mais avultares,
9 — mais subires,
10 — mais mergulharás em mim.
15 — transfigurei-te:
1 6 — és fo lh a , és flo r , és fr u to , és agasalho, és som bra...
2 4 — cativos,
2 6 — Es m uito m eu!
10 — de m om ento a momento:
1 1 — é ave aflita
1 3 — na tua mão.
1 4 — N a d a me dizes,
17 — na minha mão.
1 9 — de longe,
2 3 — penetrações supremas
29 — e m p o e m a s .158
1 8 — p elo fu lg o r solar,
2 0 — viver em hando,
2 1 — a voar, a voar.
2 7 — meu cantar.
2 9 — su fo ca -m e a estreiteza
2 1 — D iante
27 — e fic o a meditar:
42 — Eu quisera viver
4 7 — de deliciassem p a r ...
5 6 — celestiais.
• 166 •
57 — Voar mais, ainda mais
58 ~ ( o vôo me seduz)
P o e s ia e tran se
2 — (m as que arrepios,
7 — com o os esguios
1 3 — de serão.
1 5 — na minha sensação.
1 7 — todas as coisas
i g — dizer com a fa la ,
28 — em que me acaricias,
29 — meu corpo todo, às tuas mãos macias,
30 — é um bárbaro instrumento
3 1 — que se volatiliza em m elodias...
3 2 — E, então, suponho,
4 3 — vibrar,
4 4 — cantar,
U m artigo de jo rn a l, sob o título de "D ança in con scien tem en te” , fala de um a
suposta rival de E ros Volúsia, um a bailarina negra da Bahia.
O artigo põe em evidência a m etodologia m ediúnica da dança volusiana,
m uito própria das danças de transe m ístico
w« *. t».j[
1— 0 p a d ê 197j á terminou;
3 — B om bongira-E m barabô
5 —e beijaram, reverentes,
8 — dançando na roda
10 — e o canto repetem.
11 — P or entre as espúmeas
12 — camisas de renda,
1 3 — emergem pescoços
1 4 — elásticos, longos;
1 5 — e espáduas se movem
21 — um rum or-pulsação,
3 3 — os seus orixás;206
3 4 — e o s cantos se alongam,
3 5 — se alargam,
• i 82 • 3 6 — se elevam,
4 0 — procuram viver,
43 — Cantos negros
4 5 — em cadeias macias
4 6 — de harm onias!
47 — Cantos de negros
5 0 — minha infância!
5 1 — Cantos de negros
5 2 — no batucagé,207
6 2 — assim, trescalantes
63 — do banho de fo lh a s,
6 4 — de defum ação,
65 — dançando no meio
6 6 — da dança das saias
67 — Q u e, amplas e alvas,
68 — vão desabotoando
69 — corolas no chão.
70 — £ 0 batuque recrudesce,
73 — O terreiro é um atabaque,
77 ~ das narinas
78 — e dos olhos das baianas.
79 — O batuque recrudesce
8 0 — e o babalaô corima
8 6 — indecisas e medrosas;
8 8 — que estremecem,
89 — estremecem,
90 — parecendo eletrizadas.
g i — H á um conflito de serpentes,
9 4 - q u e os envolvem, chocalhando...
98 — em transe de possessão.
1 0 2 — envernizadas de suor.
1 0 5 — e, fugas e chegadas,
1 0 8 — E o batuque continua
1 0 9 — alto eprofu nd o; d ir - s e - ia
A in c o rp o ra çã o se dá p o r m eio d o r itm o . A fo r ç a de
p e rc u tir os atabaques de u m m o d o p e cu lia r, c o n
fo rm e a in vocação, e c a n ta n d o -se co m u m a exatidão
rigorosa o p o n to que o caracteriza, o santo é fo rça d o a
b aixar, p o rq u e aqu ele ritm o é a p r ó p ria fo rm a de v i
b ra çã o da sua d ivin d a d e. In c o rp o r a d o , p e rd e o m é
d iu m tod a a sua p e rso n a lid a d e, passando a realizar
u m a o u tra , co m p letam e n te diversa da sua. V ê e m -s e
b ra n co s fa la n d o lín gu as de p re to , com esgares, c o n
to rç õ e s e passos de d ança im possíveis de execu tar em
c o n d iç õ e s n o rm a is .2’6
A ssim co m o G ilk a in c o r p o ra a co sm o g o n ia d o m o v im e n
to ritm a d o n o fa zer, na lap id ação , n a m estiçagem de sua dança
de palavras, E ro s c o m n ão m en o s v ig o r criativo se im p re g n o u da
fo lk - d a n c e b ra s ile ira ,224 a ssu m in d o o im p o n d erá v el transe caboclo
n a expressão de sua jo r n a d a artística, na tentativa de cria r um a
dan ça "c lá ssic o -b ra sile ira ” . T od as as suas observações técn icas do
m o v im e n to expressivo, analisad os n o te rr e iro , passam p e lo olh ar
criativo da b a ila rin a .
A n d ra d e M u ricy destaca a gra n d e sen sib ilid a d e d o p o vo e o
g ê n io cria d o r da b aila rin a b ra sileira . A firm a v a o c rític o q u e E ros
V olú sia tin h a u m a capacidade de im p reg n a çã o p r o fu n d a , de a b
sorção de tu d o que é p o vo , e tu d o é im ed ia tam e n te c o n d ic io n a d o
p elo seu ritm o de alm a, p ela sua expressividade e m in e n te m e n te
p lá stica.825 E ros realm en te teve de lid a r co m o aspecto d o tran se,
que perm eava as pessoas do p o vo à sua vo lta. E la c o m en ta c o m o sua
visão da dança, que levava os elem en to s p o p u la res tran sm u tad os
para os palcos, o n d e n o rm a lm e n te só se apresen tavam esp etá cu
los de elite, cham ava a aten ção do g ra n d e p ú b lic o . U m a de suas
apresen tações c u lm in o u co m u m d esfech o in e sp e ra d o . A b a ila
rin a con ta que ao apresen tar, na E scola de B e la s -A rte s d o R io ,
um a reco n stitu içã o das danças d o B rasil c o lo n ia l, co m u m n ú m e -
• 190 • ro de dança fetich ista (com m úsica de u m b a n d a ), "a m a io ria dos
co m p o n en tes da o rq u estra n o d e c o rre r da apresen tação fo i ca in d o
em tran se” .226 E m o u tra ocasião, q u an d o fazia u m a te m p o ra d a de
revista n o T eatro C a rlo s G o m es, ao en cen a r u m n ú m e ro , que se
cham ava " C a n d o m b lé ” , d u ra n te o qu al se realizavam desde as o f e
rendas até a dança das ia ô s, as b ailarin as que represen tavam a d es
cida dos p ro te to res m uitas vezes eram rea lm en te possu íd as e caíam
em transe; o m esm o a co n tecia co m algum as pessoas da p latéia.
Ela soube u tilizar esse lado m isterioso da alm a b rasileira na
criação dos seus bailados sem re p ro d u zir literalm en te as práticas p o
pulares. Seu credo artístico refin a d o sugeria u m trabalh o de ourives,
de lapidação do gesto n o ritm o e na fo rm a , sem que esse fosse im e
diatam ente reco n h e cid o nessa o u n aq u ela lin gu agem . A ssim , o b ser
va-se m ais u m a sin ton ia com os p receito s sim bolistas de expressão
poética, na qual a sugestão e não a n om eação con creta de u m a im a
gem p ro d u z a riq u eza de interpretações. Stéphane M allarm é fala em
"Poesia e sugestão” sobre o grand e p o d e r expressivo desse recu rso
de construção da lin gu agem p o ética, a qual deve apenas su gerir um a
im agem e não n o m ea r de im ed iato o o b jeto do p o e m a .227
C o m refin a d a d elicad eza, tran sm u ta n d o as in fo rm a çõ e s de
um a gestualidade esp ecificam en te p o p u la r, E ro s vai u n in d o l i n
guagens, c o n s tru in d o m o vim en to s q u e revelam , a p a r tir de um a
série de d ecifra çõ es, a p o esia da alm a b ra sile ira . A ssim , m e r a m e n
te re p ro d u zir um a realid ad e expressiva isolad a n ão interessava à
bailarin a, para q u em era fu n d a m en ta l a estilização das m an ifesta
ções esp on tân eas d o p o vo p o r m eio de criações in d iv id u a is.228
D o n acion alism o para um a am pla universalidade, eis a m eta
volusiana na dança brasileira. A abertura para vários significados,
para as m uitas form as de ser co m p reen d id a e am ada, esse era o ca
m in h o p ro p o sto p o r E ros n o desenvolvim ento do bailado clássico-
bra sileiro . Para essa bailarin a, que prim ava pela universalidade e não
pela exclusividade, pela inclusão e não pela exclusão, pelas m inorias
elevadas ao grau das m aiorias, p elo co n ceito e não p elo p reco n ceito ,
q u alq u er lu gar era lu gar para m ostrar sua arte, m esm o em cassinos
(pelo que fo i m u ito criticada). A escola de balé clássico era vista p o r
ela co m o m ais u m in stru m en to para a b rir as portas à im aginação
criad ora e n ão co m o u m m o d elo fixo a ser seg u id o .229
E ro s V o lú sia e n fre n to u o desafio de reto m a r u m a m e m ó ria • 191 •
ética/estética n a sala de aula da arte da dança. Mas essa m em ó ria ,
que p re te n d e re c o n h e c e r o passado, q u er ser viva e fu n d a d a na
ex p eriê n cia da d iversid ade e das trocas de in fo rm a çã o co m as tr a
d içõ es p o p u la res. O s co n ceito s de criação de u m b ailad o clássico
b ra sile iro , alm eja d o p o r E ro s, o qu al d ialo g u e co m várias fon tes
de m o v im e n to expressivo, vão ao e n c o n tro das teorias m ais am plas
de N o r b e r t W ie n e r , q u e ad vertem sob re as restriçõ es de u m pad rão
de c o m p o rta m e n to q u e só se c o m u n ic a com o passado e co m um a
fo n te u n id ir e c io n a l de in fo rm a çã o . Para o cria d o r da cib ern ética,
as fig u rin h a s q u e d ançam n o to p o de u m a caixa de m úsica m ovem -
se de a co rd o co m u m p a d rã o estab elecid o de an tem ão , cu jo estágio
u n id ir e c io n a l de co m u n ica çã o co m o m ecan ism o p reestabelecid o
da caixa de m úsica as d eixam incapazes de se desviarem do pad rão
c o n v e n c io n a l.230
E ros V olú sia prop aga qu e a m em ó ria do clássico com o estili
zação d o m ovim en to d ançado é im p ortan te, p o ré m m ais im p o rta n
te para o desenvolvim en to da arte criativa e d inâm ica é o feed b a ck com
o m e io , com a co m u n id a d e, com o p ú b lico . N a prática da b ailarina,
o artista deve estar atento para que os padrões estéticos do passado
se convertam em m e m ó ria in teligen te, de estruturas e fu n çõ es que
já fo ra m in co rp o ra d as e que se som am às novas perspectivas, e não
m em ó ria estática de "clo n agem de espécies extintas” sem as cores e as
dinâm icas da diversidade que o rigin alm en te apresen tariam .
M á rio de A n d ra d e , em "E ro s V o lú s ia ” , fala da m e to d o lo g ia
m ística e artística da b aila rin a . Esse é u m im p o rta n te d o c u m e n to a
resp eito da ob ra realizada p o r E ro s n a m ed id a em q u e o escrito r,
sen d o u m gra n d e c o n h e c e d o r da m ú sica e da litera tu ra b ra sileira ,
n ele p o d e retratar u m a crítica persp icaz:
p ro m isso ra ” (E ros V olú sia o frec ió co m d o tad o de m ós, para p o lir pedras
preciosas, co m o tam b ém u m
êxito u n a sesión de bailes brasilen os.
p re lo tip o g rá fico p rim itiv o , fe ito
La Prensa, B u en o s A ires, 3 ag °- 193^)-
à sem elhan ça da pren sa de lagar”
12 F oram vários os artigo s em q u e as
(F E R R E IR A , 1 9 9 9 , p . 1 9 7 5 ).
d eclaraçõ es de G ilk a M ach ad o são
31 M A C H A D O , 19 9 1, p . 19.
reticen tes a re sp eito de si p r ó p ria , se
32 E xiste u m a crítica a esse
a u to d e n o m in a n d o a co m p a n h a n te da
verso , realizad a p o r D o n R o g é r io
filh a c o m o uma sombra, e as m an ch etes (M ira n d a R ib e ir o ) , q u e co m en ta
nas quais figuravam in fo r m a ç õ e s sua im p ro p r ie d a d e e falta d e ritm o .
elevan d o ao p r im e ir o p la n o E ros O c rític o co m en ta q u e: " A a u tora
V o lú sia , c o m o : "Palestra co m G ilk a p re te n d e tra d u z ir c o m o r u m o r o
M ach ad o , a fam osa p oeta p a trícia fe n ô m e n o da v ib raçã o m o le cu la r
e g e n ito ra da 'D e u sa Pagã’ ” (E ro s — o q u e é in ad m issív el. N a arte de
V o lú sia . A S alo m é b ra sile ira . Folha escrever, cada palavra tem sua fu n çã o
Vespertina, B e lé m , 13 o u t. 1947 )- d e fin id a , ca racterística, q u e n ão p o d e
13 U n n u evo estilo de danzas creó e n ão deve ser c o n fu n d id a , sob p e n a
E ro s V . M ach ad o . E l Diário de Buenos de p r e ju d ic a r o e s tilo ” ( R O G É R I O ,
D o n . Farpas. A C id a d e . R io d e J a n e iro ,
A ires, B u e n o s A ir e s , C r ític a , 15 j u l.
12 ja n . 1 9 1 6 ). M as ao la d o dessa
1936.
crítica fo r m a l, D o n R o g é r io e lo gia
14 Ib id .
a q u alid ad e a rtística e a te n d ê n c ia
15 La p oeta b ra silen a G ilk a M ach ad o
n a tu ra l ao so n h o n o estilo de G ilk a
trae, expresa, e l m e jo r p o e m a : su
M ach ad o .
3 3 B A C H E L A R D , 2 0 0 1 , p . 1. M ach ad o: " C a d a palavra q u e articu la
3 4 I b id ., p . 2 2 9 . é u m p o e m a a d esab ro ch a r e o tom
3 5 D o u tr in a d o filó s o fo n o r te - suave co m q u e as p r o n u n c ia n o s dá a
a m e ric a n o Jam es M . B ald w in im p ressão de u m a m úsica b o n ita que
( 1 8 6 1 -1 9 3 4 ) , se g u n d o a q u al o real n os em b ala. G ilk a M ach ad o v eio à
se esgota n o q u e é re g id o p e lo b e lo B a h ia , aco m p a n h a d a de sua filh a E ros
(F E R R E IR A , 1 9 9 9 , p . 14 8 3 ). V o lú s ia ” (X A V IE R , 19 5 6 ).
3 6 I b id ., p . 2 3 1. 4 1 S T E I N E R , 19 8 8 , p . 6 4 .
3 7 I b id ., p . 233 - 42 "[•••] esq u ece os teus cantares.
38 Para B a ch e la rd , "se a p e d ra Já n ão so a m ./ C a n ta r é m ais.
p re cio sa to ca as re g iõ e s in c o n sc ie n te s C a n ta r é u m o u tro a le n t o ./ A r para
e p r o fu n d a s, é de a d m ira r q u e ela n ad a. A r fa r em D e u s. U m v e n to ”
possa c o n c e n tr a r to d as as fo rças ( C A M P O S , A u g u sto d e, 2 0 0 1 ,
cósm icas d os d ev a n e io s da p o tê n c ia p. 151)-
h um an a? T u d o o que um hom em 4 3 S T E I N E R , 19 8 8 , p . 6 5.
p o d e a lm eja r: saúd e, ju v e n tu d e , 4 4 I b id ., p . 6 6 .
a m o r, c la riv id ê n c ia , existem 4 5 B I L A C , O la v o . M úsica b ra sile ira .
ped ra s p recio sas p ara re a liza r suas In : B A R B O S A , F re d erico ( O r g .) .
a sp ira ç õ e s” ( ib id ., p . 2 3 6 .) . C in c o séculos de p o e s ia . São P a u lo : • 195-
39 B a ch e la rd fala da tarefa do E d . L a n d y, 2 0 0 0 , p . 2 7 8 .
la p id a d o r q u e faz o h o r ó s c o p o da jó ia 4 6 C o n t u d o n ão se q u e r a qu i
n o m o m e n to d e sua la p id a ç ã o , da d esm e re ce r o p o e ta p a rn asian o
d esco b erta de sua fo r m a g e o m é tric a : co m suas virtu d es p ró p ria s e seus
" [ ...] D o m esm o m o d o q u e se faz m éritos pessoais. L u iz C o sm e , ao
o h o r ó s c o p o de u m ser h u m a n o n o falar dos co m p ositores em m úsica,
m o m e n to em q u e o n a sc im e n to lh e salienta a im p o rtâ n cia das diferen ças
c o n fe re sua fis io n o m ia , c u m p re fa zer de expressão son ora p e lo v ín cu lo de
o h o r ó s c o p o da j ó ia n o m o m e n to p e río d o s h istóricos dos diversos estilos
em q u e o la p id a d o r d e gem as lh e dá pessoais. T am b ém a qu i se con sid era,
sua fo r m a g e o m é tric a . O la p id a d o r neste trabalh o, im p o rta n te as
deve so n h a r sim u lta n e a m e n te na in d ivid u alid ades expressivas vinculadas
cla rid a d e da gem a e n a cla rid ad e a este o u àqu ele estilo lite rá rio ao
d o fir m a m e n to . D eve u n ir as se bu scar traçar, n o caso de G ilka
p r o fu n d e z a s da su b stân cia e as M ach ad o, suas novas perspectivas
p r o fu n d e z a s d o cé u . D eve c o n ju g a r rítm icas expressas em seus poem as.
os sign o s d o céu e a assin atu ra da 4 7 C O S M E , 1 9 5 9 , p . 10 2 .
su b stân cia ” ( ib id ., p . 237)* 4 8 I b id ., p . 6 0 .
40 Essa m u sica lid a d e p resen te na4 9 P lín io C a v a lcâ n ti descreve suas
o b ra das artistas é co m en ta d a em im p ressõ es das c o re o grafias de
m an ch ete s e crítica s co m o esta: " N o E ro s V o lú sia : " A b a ila rin a que
m u n d o d o so m ” , em q u e C a rlo ta sou b e tra n s fo rm a r a nossa dança
X a v ie r co m en ta : " A d an ça está tão n u m v erd a d e iro p o e m a parece ter
u n id a à m ú sica q u a n to à p o esia . h e rd a d o de sua m ãe, G ilk a M ach ad o,
E é d ela, sem d ú vid a, q u e d ep e n d e o d o m de p o e ta r os m o vim e n to s,
o m e lh o r êxito d e u m p ro g ra m a de tra n s fe rin d o à sua arte u m a
b a llet. Falo e m se n tid o g e ra l. O sucesso in te rp re ta çã o co m p le ta m e n te n o v a ”
alcan ça d o p e lo b a llet d e E ro s V o lú sia é ( C A V A L C Â N T I , P lín io . 0 E sta d o de
E ro s, co m o le ge n d a de u m a fo to sua,
tuas castan h olas — e j á o m e u p é
a u to - in titu la - s e "cigan a b o ê m ia que o
se agitava n o fr e n e si p e la dan ça
m u n d o in te ir o fa scin o , le io o d estin o
— m e u ca lcan h ar se e m p in ava, os
d o s o u tro s, m as n ã o sei o m eu
d ed o s d o p é escutavam a ten tos para
d e s tin o ” ( V O L Ú S I A , 1983» p- 154)-
c o m p r e e n d e r - te : p o is o o u v id o , o
69 V O L Ú S I A , 1 9 3 9 , p. 2 0 . . 19 7.
d a n ç a rin o — o te m n o s d ed o s d os pés!
70 E U R ÍP ID E S , [ s.d .], p . 3 0 .
P u le i p ara ti, m as recusaste e fu giste
71 G E N G O U X , 1 9 5 0 , p. 25.
an te o m e u p u lo ; e a ç o ita ra m -m e
72 D U N C A N , 19 8 6 .
as lín gu a s v o lan te s d o te u ca b elo em
73 D e v olta de B u e n o s A ire s a
fuga! P u le i p ara lo n g e d e ti e d e tuas
b a ila rin a E ro s V o lú sia . D iá r io da N o ite ,
serp en tes; e j á lá estavas tu , vo ltad a
12 ago. 19 3 6 .
p e la m eta d e , o o lh a r c h e io de d esejo .
7 4 S A N T A C L A R A , 19 16 .
C o m sin u o so s o lh are s, e n sin a s-m e
75 M A C H A D O , 2 0 0 3 .
sin u o so s cam inhos,- em sin u o so s
7 6 A T H A Y D E , A u stre g é silo d e.
c a m in h o s a p re n d e o m e u pé — a
M u lh e r n u a. C o rreio da m a n h ã . R io de
a stu c ia r!” ( ib id ., p . 2 3 1)-
J a n e ir o , [s./ d .].
67 Esse d esejo de u n ive rsa lid a d e que
77 O to m d e gra ce jo p e rm an e ce até
m arca a p o e sia gilk ia n a é a m esm a
h o je em expressões ofen sivas co n tra
sen d a q u e m a rc o u o tra b a lh o de E ro s
as m u lh e re s, ditas, p o r e xem p lo ,
V o lú s ia n a d an ça. A n d ra d e M u ricy q u a n d o algu ém faz besteiras n o
fala dessa ca racterística v olu sian a trâ n sito , c o m o : "S ó p o d e ser
q u e "ten ta elevar a d an ça b ra sile ira m u lh e r ” , m as n a realid ad e as
a u m p la n o d e p e re n id a d e h u m an a , em presas de segu ro co b ra m m en os
sem p r e ju íz o da sua característica n o s segu ro s de ca rro s d irig id o s p o r
u n iv e rsid a d e , eis o ú n ic o m eio de m u lh e re s, p o r estas serem m u ito
n ão se p e rd e r n o m e r o e xo tism o m ais aten ciosas e responsáveis n o
o rn a m e n ta l, n o p ito r e s c o q u e d escora trâ n sito : " O q u e n ão q u e r d ize r
e passa, e o n d e o g o sto m u ita vez n ão qu e n ão existem h o m e n s cu id ad osos
te m p a rte , e j u n t o d o q u al o f a ls o anda o u m u lh e re s im p ru d e n te s n o
ro n d a n d o [ . . . ] ” ( M U R I C Y , 1946* trâ n sito , p r in c ip a lm e n te p o r q u e isso
p . 137)* M u ric y fala dessa característica d ep e n d e m u ito da edu cação q u e eles
d o u n ive rsa lism o co m o su p eração re c e b e ra m ” ( N e m m ais nem m enos: iguais.
12 9 M A C H A D O , 19 9 1, p . 1 5 0 - 1 5 1 . q u e o se n tim e n to d e reclu sã o o u de
S o m b ra , p . 6 8 , m ar. 19 4 9 )-
A D A N Ç A DAS PALAVRAS - A S P E C T O S DE
U M A SIM BIO SE A R T Í S T IC A
S o b re p o siçã o d os eixos
P arad igm áticos S intagm áticos
P oesia e d an Poesia e dança
D an ça/p oem a
P oem a/ dança
S ín tese da in fo rm a çã o estética e sem ântica.
S u p e ra çã o e tra n scen d ê n cia da d u alid ad e:
E ix o parad igm ático E ix o sin tagm ático
V ertica l H o riz o n ta l
S em elhança/ d essem elhança C o n tig u id a d e
D ia c r ô n ic o , p lu rissign ifica tivo S in c rô n ic o
A n a lo g ia d ialóg ica
• 212 •
TE^RO MUNICIPAL
EROS VOLÚSIA
B A ttA O O S O R A S íl E iR O S
PROGRAMA
s ’ cr jut«5m t*r
1 0 0 - Ganzáscascavelam...
1 0 1 - Aos uivos das cuícas,
1 0 2 - gorjeiam violões;
1 0 3 - E vozes se alongam
10 4 - aos céus, arrazoando...
1 0 5 - E dedos arrancam
1 0 6 - isócronos ruídos
ÍO J - das peles dos bombos,
1 0 8 - das palmas das mãos?
• 227 '
N o t a s d o c a p ít u l o 6
• 234 •
N o t a s d o c a p ít u l o 7
i P L A T Ã O , 19 9 7 , p. 16 9 . 6 I b id ., p. 16 7 .
2 A lgum as crianças fo ram batizadas 7 L E IT E , 19 6 9 , p. 3 2 9 .
com o nom e da dançarina brasileira,
assim com o tam bém encontram os
várias Isadoras, em hom enagem à
dançarina am ericana.
3 V O L Ú S IA , 19 8 3 , p. 1 8 0 - 1 8 1 . •235*
4 A bailarin a Izabel C osta, uma
das fu n dad oras do G ru p o C o rp o ,
com enta, em um a entrevista, que se
o B rasil da década de 1 9 4 ^ "tivesse
de ser representado p o r um a form a
hum ana, esta deveria ser a de E ro s
V olú sia. Izabel C osta, um a das
raras personalidades da dança que
reconheçe a grande im portância
da filh a de G ilka M achado para
o desenvolvim ento dessa arte em
territó rio nacional, com enta que
é um absurdo ser com pletam ente
desconhecida no B rasil, e afirm a que
a artista "está entre as m ais destacadas
b ailarin as que o m undo conheceu
(U m a B ailarin a B rasileira. Caros
Amigos, ano V II, n . 7 5 ’ p- 2 7 *
ju n . 2 0 0 3 , )•
5 A sacerdotisa D iotim a, nessa
o bra de Platão evocada pela fala de
Sócrates, defende o am or com o um
parto em beleza, tanto no corpo
(pela procriação m ediada pelo corpo
fem in in o ) quanto na alm a (a obra
realizada p o r poetas, criadores,
artesãos criativos),
co m p o n d o um a ascensão em direção
ao b elo na disciplina do am or
(P L A T Ã O , 19 9 7 , p. 16 7 ).
A n exo
* Exato. •237'
* S im lem bro.
O Tico-Tico no fu b á fo i film ado pela Metro.
+ En tão a senh ora era batizada pelo "san to ” , p o r isso é que o seu
co rp o estava aberto para fazer sucesso?
* E , o corpo estava aberto para a dança e fechado para as coisas
ruins.
+ P or que a senhora sem pre buscou a tem ática das danças b ra sile i
ras com o a m acum ba, sertaneja, cabocla, etc .?
• 239 •
+ E n o B rasil quais b ailarin as a senhora elogiaria?
* S im , Beijando beijo-.
(este m om en to E ro s recita Embora de teus lábios afastada, u m p oem a da G i-
lka, do livro Meu glorioso pecado, com gran de graça de in terpretação.)
In d a conservo a c a rn e d e lic ia d a
p e la tu a c a ríc ia que m o rd ia ,
que m e e n flo ra v a a p e le , p o is, em cada
b e ijo dos teus, u m a sau d ad e a b ria .
• 240 •
T eus b e ijo s a b so rv i-o s, esg o te i-o s:
g u a rd o -o s n a s m ã o s, n o s lá b io s e n o s seio s,
n u m a v o lú p ia im o r r e d o u r a e lo u c a .
E m teus m o m en to s de lu b ric id a d e ,
b e ija rá s o u tro s lá b io s co m sau d ad e
dos b e ijo s que ro u b e i de tu a b o c a .”
* S im , estilizava.
+ Q u a l a relig ião da se n h o ra ?
* C a tó lic a . Q u a n d o eu ia p a ra os t e r r e ir o s , e r a só p a r a a p r e n
d e r a d a n ç a r , eu n ã o fa z ia p a rte do r it u a l de je it o n e n h u m , eu
so u c a tó lic a ! M as gostava de i r p a ra a p re n d e r, c o lh e r m otivos.
+ E a sua ida aos Estados U n ido s para a film agem de Rio Rita, com o fo i?
+ A se n h o ra sem p re m o ro u n o R io de J a n e i r o ?
* S e m p re , eu gosto m u ito do R io , é u m a cid ad e m a ra v ilh o s a E u
m o re i u m p o u co e m São P a u lo . L á e u m e a p re se n te i n o T eatro
M u n ic ip a l co m o Irapuru do V ila L o b o s. E u c r ie i a c o re o g ra fia e
dançava ta m b ém o Irapuru.
* M in h a m ã e n ã o d a n ç a v a n e m u m a v a ls a , m a s e la o p i n a
v a , p o is e r a u m a p e s s o a q u e c o n h e c ia e s t é t ic a e v a l i a m u i -
to , p a r a m im , su a o p in iã o ; m a s d a n ç a r e la n ã o d a n ç a v a
n e m u m a v a ls a . E l a n ã o e r a c o r e ó g r a f a , m a s e r a a m in h a
i n s p i r a d o r a . E l a d iz ia a s s im : " I s s o a í q u e v o c ê fez é b o m ,
m u it o b o m ” , o u , " is s o a í n ã o é b o m ” . E l a a c o m p a n h a v a
s e m p r e os m e u s e n s a io s . D ir e t o . E r a m in h a c o m p a n h e i
r a , m in h a a m ig a , m in h a i n s p i r a d o r a , m in h a i n c e n t i v a -
d o r a e, ta m b é m , a m in h a c r í t i c a p o r q u e q u a n d o e u fa z ia
a lg u m a c o is a q u e n ã o p r e s ta v a e la d iz ia : " I s s o a í n ã o s e r
v e , n ã o p r e s t a ” . E r a u m a c r í t i c a s e v e r a . E l a o p in a v a s o b r e
tu d o .
• C la r o , sem d ú vid a!
• 244 •
(fo to s de R icard o A ra ú jo )
R e fe rê n c ia s
P u b l ic a ç õ e s de Eros V o l ú s ia
P u b l ic a ç õ e s sobre Eros V o l ú s ia
P e r ió d ic o s sem a s s in a t u r a s o b r e Eros V o l ú s ia
P u b l ic a ç õ e s de G il k a M achado
P u b l ic a ç õ e s sobre G il k a M achado
P e r ió d ic o s sem a s s in a t u r a s o b r e G il k a M achado
R e f e r ê n c ia s sobre d a n ç a
M A R K A R D , A n n a; M A R K A R D , H erm an n . Joos. K ö ln /C o lo g n e :
B allet-B ü h n en -V e rlag R o lf Garske, 19 8 5 .
R e f e r ê n c ia s g e r a is
A RIST O ' 1 E LE S. Arte retórica e artepoética. Rio d ejan eiro: Ediouro, [s.d.].
B R A D B U R Y , M .; M cF A R L A N E , J . Modernismo. São P a u lo : C o m
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B R I L L , A lice . Da arte e da linguagem. São Paulo: Perspectiva, 19 8 8 .
• 255 •
C A S S IR E R , E rn s t . A filosofia das formas simbólicas. São P au lo : M artins
Fontes, 2 0 0 1 .
N IC H O L S O N , L in d a J . Feminism/Postmodernism. New Y o rk : R o u -
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• 260 •
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Letras, 2 0 0 1 .
_______ Assim falou Zpratustra. São Paulo: C írcu lo do L ivro , [s.d .].
_______ Breviário de citações. São Paulo: Landy, 2 0 0 1 .
_______ Fragmentos Finais. Tradução de Flávio R . K o th e . B rasília:
E d itora U niversidade de B rasília; São Paulo: Im pren sa O fic ia l do
Estado, 2 0 0 2 .
_______ . OAntícristo. São Paulo-, C en tau ro E d ito ra, 2 0 0 0 .
_______ 0 nascimento da tragédia. Tradução de Ja c ó G u in sb u rg . São
P au lo : C om pan h ia das Letras, 19 9 2 .
_______ Obras completas. Tradução de E d u ard o O vejero y M aury.
M ad rid , 19 6 2 .
_______ Obras incompletas. São Paulo: A b r il C u ltu ra l, 19 8 3 .
• 264 •