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Campus Umirim
Curso de Letras
RÓNAI, Paulo. A tradução vivida. 4.ed. - Rio de Janeiro: José Olympio, 2012.
21cm. ISBN 978-85-03-01106-8
“Dizia John Lehmann que falar em tradução era como conversar sobre o
vidro de um quadro, quando o que devia monopolizar a nossa atenção era
evidentemente a pintura” (p. 27)
“(...) assim, através dos séculos, um diálogo incessante entre os que atacam o
tradutor e os que lhe tomam a defesa. Nas Cartas persas de Montesquieu, uma
personagem, ao vir a saber que outra se ocupa de tradução há vinte anos,
lança lhe no rosto: "Como, cavalheiro? Então há vinte anos que o senhor não
pensa?" E acrescenta: "Se viver traduzindo sempre, não o traduzirão nunca."
D'Alembert, porém, tem opinião oposta: "Se quiserdes ser traduzido um dia,
começai vós mesmo por traduzir."” (p. 29)
“(...) consideremos o tradutor como ele devia ser. O primeiro requisito que deve
possuir é o conhecimento profundo da sua língua materna, para a qual ele
traduz. Quando, ao reler a página que acaba de verter, ele topa com uma frase
que não soa bem, terá nisso critério quase infalível do erro cometido. Uma
pessoa que não tivesse facilidade natural na sua própria língua nunca se
deveria abalançar a fazer uma tradução.” (p. 32)
“(...) deverá partir da suposição de que o texto que lhe cabe verter tem um
sentido no original; se, relendo a página que acaba de traduzir, encontrar um
trecho que ele mesmo não entende ou que lhe soa absurdo, o jeito será
recomeçar. Perceber que o auxílio dos dicionários não resolve uma dúvida, que
a solução encontrada não corresponde ao espírito da língua-alvo ou que
poderá dar lugar a ambiguidade; que o próprio autor cometa um erro; que o
leitor não poderá entender a interpretação sem a ajuda de uma explicação
suplementar ou uma nota; que certos trechos precisam de tradução mais livre
que outros... tudo isso é função do bom-senso.” (p. 34)
2. AS ARMADILHAS DA TRADUÇÃO
“(...) a palavra existe apenas dentro da frase, e o seu sentido depende dos
demais elementos que entram na composição desta. Ainda que dois vocábulos
de duas línguas sejam definidos de maneira igual, os enunciados de que eles
podem fazer parte não são os mesmos, nem as conotações que evocam serão
iguais.” (p. 42)
“(...) Valery Larbaud ao escrever que a etimologia era o sal das línguas
literárias, pois só ela dava sabor e duração ao material verbal, acrescentando
que tinha pena das pessoas que, não sabendo latim, ignoravam as etimologias.
Para elas todas as palavras devem dar a impressão de não repousarem sobre
nada, de puros e absurdos conglomerados convencionais de sílabas, palavras
no ar; e a ortografia, com suas anomalias demasiadamente reais, deve
parecer-lhes um quebra-cabeça infernal.” (p. 42-43)
“(...) chegamos aos parónimos, que, segundo Jean Maillot, são palavras do
mesmo radical com prefixo ou desinência diferente, como "janta" e "jantar", ou,
em francês, maturité e maturation ou prescrire e proscrire.” (p. 53)
“Não existe regra geral sobre a tradução dos antropónimos comuns. Certas
línguas são mais propensas a naturalizá-los (como o italiano e o espanhol),
mas na França e no Brasil são mantidos em suas formas primitivas.” (p. 61)
“(...) o problema das metáforas lembra-nos mais uma vez que não estamos
traduzindo palavras, mas sentenças. Noutros termos: o bom tradutor, depois de
se inteirar do conteúdo de um enunciado, tenta esquecer as palavras em que
ele está expresso, para depois procurar, na sua língua, as palavras exatas em
que semelhante ideia seria naturalmente vazada.” (p. 69)
3. OS LIMITES DA TRADUÇÃO
“(...) todo texto é alguma coisa mais do que a simples soma das palavras que o
compõem. O que devemos traduzir é sempre algo mais, isto é, a mensagem. E
não há duas línguas que exprimam uma mensagem de certa complexidade de
modo completamente igual. A língua A ora explicita algo que na língua B fica
subentendido; ora deixa de exprimir, por óbvio, algo que naquela exige uma ou
várias palavras.” (p. 94)
“(...) duas línguas não pedem emprestadas a uma terceira as mesmas palavras
e locuções. Neste caso haverá opção entre manter o termo estrangeiro com a
tradução entre parênteses ou uma nota de pé de página, ou simplesmente
traduzi-la.” (p. 103)
“(...) devemos reconhecer que tradução feita às pressas não pode ser boa.
Uma obra original pode às vezes nascer ao calor da inspiração, de um só jato,
em poucas sema nas ou dias, e se beneficiar disto; a tradução, porém, é
sempre lavor de filigrana e não deve ser executada em cima da perna.” (p. 110)
“(...) o título faz parte da obra e, por isso, salvo contraindicação especial, é
melhor conservá-lo quando possível. Mas quando, por um motivo ou por outro,
for alterado, convém que o título original seja lembrado no cartaz ou, em se
tratando de livro, no verso do frontispício.” (p. 131)
5. AS FALÁCIAS DA TRADUÇÃO
“(...) a tradução aprende-se traduzindo. Não quer isto dizer que não se deva
meditar o assunto por escrito; apenas que não se pode esperar de um manual
de tradução a precisão e a eficácia de um tratado de Óptica ou de Geometria.”
(p. 133)
“(...) mesmo um livro medíocre exige uma tradução cuidadosa, pois o erro, o
desleixo, a obscuridade perturbam tanto o leitor comum de um livro comum
quanto o connaisseur que saboreia em seu cantinho o poema do seu clássico
preferido.” (p, 134)
“(...) a tradução deve dar aos leitores a ideia de a obra ter sido escrita em sua
própria língua. Mas por mais perfeita que seja a interpretação, a impressão do
leitor estrangeiro sempre será diferente da do leitor patrício do autor, e que lê a
obra com o entendimento moldado por um background e uma experiência
comuns.” (p. 137)
“(...) hoje em dia, na tradução dos clássicos se fazem valer duas correntes:
uma tendente a salvar os componentes estruturais e intelectuais, mesmo com
prejuízo dos elementos sonoros; e outra, disposta a subordinar tudo à
suavidade e à harmonia.” (p. 142)