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BACHARELADO EM TEOLOGIA
APOSTILA DE DIACONIA
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“Habilitando os santos para o desempenho do ministério”
I. Conceituação de Diaconia
Entendendo o termo e seu uso.
O termo “diaconia” tem sido tradicionalmente associado a uma atividade secundária da Igreja. A missão
da Igreja seria a proclamação do Evangelho. Essa tarefa principal teria um cunho espiritual e poderia ser
cumprida, simplesmente, através do discurso. Portanto, a tendência à espiritualização da missão da Igreja
relegou o ministério da prática a um segundo plano.
O termo ―diaconia‖ tem sido também associado a assistencialismo. Quando Igrejas articularam a prática
diaconal, esta, muitas vezes, foi percebida como atividade beneficente acrítica, que apenas teria contribuído para
atenuar conflitos sociais e manter o status quo.
Pelo menos mais uma associação o termo ―diaconia‖ tem evocado: a sua identificação com a prestação de
serviços por parte de instituições de caridade. Nesse caso, a família, a comunidade, enfim, a sociedade delega o
cuidado por seus membros necessitados a instituições especializadas, a profissionais competentes. Essa terce-
rízação da caridade, no espírito neoliberal, individualiza os problemas e as soluções.
Em vista dessas compreensões, a diaconia tem permanecido uma atividade secundária na Igreja. Na
América Latina, também a Teologia da Libertação deixou de desenvolver um conceito contex-tualizado de
diaconia.
Todavia, em tempos mais recentes, a diaconia tem sido tema de alguns seminários, algumas consultas e
algumas publicações. Concílios têm tomado decisões quanto à organização do ministério diaconal. A diaconia
emerge, na América Latina, enfim, como disciplina teológica. Busca seu espaço, sua fundamentação teológica,
sua conceituação.
Este novo momento de busca da diaconia, no contexto latino-americano, é o tema do primeiro capítulo
deste trabalho. Trata-se de um momento de muita luz: perguntas são levantadas, experiências são avaliadas,
novas atividades são projetadas. As iniciativas práticas estão conduzindo à reflexão e a reflexão está conduzindo
a novas iniciativas.
Exercita-se, na verdade, o que é a tarefa própria da Teologia Prática. Por isso, essa disciplina teológica já
está participando do processo de articulação da diaconia. Ela se apresenta, com seu caráter interdisciplinar, como
espaço da diaconia no universo da ciência teológica, espaço imprescindível para a busca da fundamentação
teológica e da conceituação contextualizada da diaconia. Essa é a razão pela qual o primeiro capítulo inclui um
esboço do papel da mediação critica entre teoria e prática, o papel hermenêutico da Teologia Prática. Nesse
sentido, essa disciplina contribuirá decisivamente para a construção e o aprofundamento da teoria diaconal no
contexto latino-americano.
O novo momento da diaconia é também de reação às associa rim que tradicionalmente o termo
―diaconia‖ tem evocado. Publicações específicas sobre o tema ―diaconia‖ no contexto latino-americano foram
consultadas a partir das perguntas que essas associações levantam. Que propostas são apresentadas, nessas
publicações, diante da tendência de espiritualização das tarefas da Igreja, da tendência de se confundir diaconia
com assistencialismo, da tendência da institucionalização do trabalho diaconal? Que elementos de conceituação
essas propostas contêm para a diaconia no contexto da América Latina?
Os resultados desta investigação das publicações sobre diaconia fazem parte ainda do primeiro capítulo.
Constituem, porém, o ponto de partida, de motivação e de norteamento para uma pesquisa dos fundamentos da
diaconia no Novo Testamento, apresentada no segundo capítulo. Trata-se da ênfase em três dimensões da
diaconia: seu caráter prático, profético e comunitário. Além da atenção recebida na literatura específica sobre
diaconia em nosso contexto, essas dimensões podem ser percebidas também com destaque em escritos
representativos da Teologia da Libertação.
Em sua fase emergente como disciplina teológica na América Latina, a diaconia pede urgência para a
tarefa da fundamentação bíblico-teológica. O presente ensaio quer ser, dentro de suas limitações, uma
contribuição para essa tarefa. Em vista de seus objetivos, entretanto, a necessidade da delimitação se impõe:
serão investigados elementos diaconais em ensinamentos e em ações de Jesus. Os evangelhos, portanto, serão o
campo e, ao mesmo tempo, o limite da pesquisa.
Mesmo nos evangelhos, o tema da diaconia é por demais amplopara ser esgotado num trabalho com
espaço tão limitado. Por isso, é nossa intenção enfocar alguns textos e temas representativos do ensinamento e
da prática diaconais de Jesus, como será mostrado a seguir.
A perícope de Mc 10.35-45 servirá como ponto de partida e de referência para toda a pesquisa do
segundo capítulo. A sua escolha deve-se à consistência histórica e teológica da mensagem diaconal que abriga. A
análise do texto se dará na primeira parte do capítulo, mediante a sua localização na estrutura do Evangelho
segundo Macos e no seu contexto. Inclui-lo no bloco de textos que narram a subida de Jesus a Jerusalém,
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juntamente com as suas seguidoras e seus seguidores, tem implicações expressas para a compreensão da ordem
de Jesus, de cunho diaconal, registrada no centro da perícope. O mesmo vale dizer em relação aos textos
antecedentes, cujas mensagens fluem para dentro da referida ordem.
Considerado neste trabalho o texto-chave, Mc 10.35-45 revela sua relevância para a contextualização da
diaconia, especialmente quando lido na perspectiva da pergunta pelas dimensões prática, profética e comunitária
da mesma.
―Quem quiser tornar-se grande entre vós, será esse o que vos sirva‖ (Mc 10.43). À luz desta ordem são
interpretados, na sequência, os textos do julgamento final (Mt 25.31-46); do bom samaritano (Lc 10. 25-37) e do
lava-pés, juntamente com o novo mandamento (Jo 13.1-35). A interpretação tem também como pano de fundo a
pergunta pela possível presença dos elementos prático, profético e comunitário da diaconia. Cabe ressaltar que a
escolha destes textos obedeceu ao critério da sua função histórica de fundamentar a prática da misericórdia na
Igreja Cristã de todos os tempos. Com a análise desses textos se encerra a pesquisa dos elementos diaconais em
ensinamentos de Jesus.
A investigação dos elementos diaconais em ações de Jesus prioriza os temas da relação de Jesus com
publicarias, pecadores e pessoas pobres (a partir de Mc 2.15-17), com crianças (a partir de Mc 10.13-16), com
pessoas doentes e com mulheres. O estudo desses temas será também norteado pela pergunta acerca da
possível relevância das dimensões prática, profética e comunitária da diaconia.
Como se pode ver, os dois primeiros temas têm textos bíblicos específicos como referência. Isso se deve
ao desenvolvimento desses temas nos evangelhos em torno de textos básicos. Os dois últimos recebem uma
abordagem mais temática em razão de terem textos
diversos como referência. O estudo temático utiliza literatura com enfoque mais social.
De qualquer forma, os temas escolhidos representam um enfoque delimitado das ações diaconais de
Jesus. Chegou-se a eles levando-se em consideração a ênfase que recebem nos evangelhos: trata-se, em todos
eles, de temas que recebem um tratamento multiplicado. Além disso, todos eles dão atenção a categorias de
pessoas que se caracterizam pela gravidade de suas necessidades. Essas categorias se enquadram naquela dos
últimos e dos menores, referida no texto-chave de Mc 10.35-45. É possível ainda uma ligação com as obras de
caridade de Mt 25.31-46, especialmente aquelas que se referem às pessoas que são doentes e que passam fome.
No que se refere ao estudo de textos bíblicos neste trabalho, cabe esclarecer que não se trata
exclusivamente de um trabalho exegético, nem propriamente de uma pesquisa histórica dos textos, mas de uma
análise bíblico-teológica, baseada em literatura que facilita um enfoque também social dos textos e dos temas
tratados.
O caráter referencial de Mc 10.35-45 requer que, a partir de sua mensagem, sejam traçadas as
rimogênito s para a conceituação da diaconia na perspectiva do contexto latino-americano. Por isso, o final do
trabalho faz esse exercício, levando em consideração as dimensões prática, profética e comunitária da diaconia e
a ordem fundamental proclamada por Jesus à comunidade de suas seguidoras e seus seguidores. Esta última
contrapõe poder e serviço, dado que evoca um outro tipo de associação: do termo ―diaconia‖ com as vítimas do
exercício opressivo do poder, vítimas em número tão elevado, justamente no contexto latino-americano.
Resta-me ainda expressar um especial agradecimento a pessoas e instituições que apoiaram e tornaram
possível a elaboração do presente trabalho: Prof. Lothar Carlos Hoch, orientador da pesquisa; Prof. Uwe Wegner,
orientador da pesquisa exegética; CAPES e Igre r Evangélica Luterana da Baviera, pelo apoio financeiro; Igreja
Evangélica de Confissão Luterana no Brasil, pela liberação para o estudo.
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palavras, nem de língua, mas de fato e de verdade.‖ (I João 3:18) O amor de palavras é como árvore seca, sem
fruto e sem sombra. Amor expectral.
Um Ministério da Beneficência existe para que o verdadeiro amor seja evidenciado, praticado. Este
ministério é a luz visível da igreja. No Livro Sagrado está escrito: ―assim brilhe também a vossa luz diante dos
homens, para que vejam as vossas boas horas e glorifiquem a vosso Pai que está nos céus.‖ (Mateus 5:16) Ele é
também a Dispensa da igreja. Está escrito: ―Deus pode fazer-vos abundar em toda graça a fim de que, tendo
sempre, em tudo, ampla suficiência, superabundeis em toda boa obra como está escrito: Distribuiu, deu aos
pobres e a sua justiça permanece para sempre.‖ (Coríntios 8:8-9) Finalmente, o Ministério da Beneficência é o
vínculo da misericórdia e é uma exigência de Deus: ―Ele te declarou, ó homem, o que é bom; e o que é que o
Senhor pede de ti, senão que pratiques a justiça e ames a misericórdia, e andes humildemente com teu Deus?‖
(Miquéias 6:8).
Sabemos que o ministério da beneficência é temporal, mas de magnitude espiritual. Nele se revela a
bondade de Deus pela instrumentalidade dos Seus remidos. Nele a unidade da igreja é vista até por aqueles de
―outros apriscos.‖ É um ―oásis‖ onde o viajor cansado deste mundo adusto, encontra abrigo e hospitalidade cristã.
Na minha visão de leigo em eclesiologia, distingo entre os ministérios da igreja três que são fundamentais:
O Ministério da Palavra, o Ministério do Ensino e o Ministério da Beneficência. As igrejas que tenho primogênito
dão ênfase a vários outros ministérios, inclusive aos dois primeiros acima mencionados; todavia o Ministério da
Beneficência, em muitas delas, é inexistente. Na qualidade de um dos menores ministros da Beneficência, tenho
minha alma angustiada por ver este ministério, tão importante nas igrejas do primeiro século da era cristã, sendo
hoje ―desativado‖ em tantas igrejas do Senhor Jesus.
O leitor, evangélico ou não, com conhecimento de causa mas que este inconspícuo e pobre escriba, pode
opugnar estes escritos afirmando que a igreja de Cristo mudou no tempo e no espaço. Sim, o que não mudou foi o
homem, pois permanece, sempre, carente da graça de Deus e à margem do caminho, qual morfético rejeitado
pela igreja que não lhe dá acolhida e nem ajuda. Se estes rabiscos servirem para ―despertar‖ alguém para a ―bem-
aventurança do dar‖ e levar alguma igreja a ―reativar‖ ou ―criar‖ o Ministério da Beneficência fazendo dele uma
bênção para muitos, toda honra e toda glória hão de ser dados ―Autor da nossa fé‖, ―O primogênito dentre os
mortos‖, ―O Leão da tribo de Judá‖ e ―A Resplendente Estrela da Manhã‖ – Nosso Amável e Querido Salvador –
JESUS!.
Finalizando este prólogo, transcrevo a gratidão desse gigante do cristianismo – Apóstolo Paulo – na Carta
que escreveu aos crentes da Igreja de Filipos: ―Alegrei-me sobremaneira no Senhor porque, agora mais uma vez,
renovastes a meu favor o vosso cuidado; o qual também já tínheis antes, mas vos faltava oportunidade. Digo isto,
não por causa da pobreza, porque aprendi a viver contente em toda e qualquer situação. Tanto sei estar
humilhado, como também ser honrado; de tudo e em todas as circunstâncias já tenho experiência, tanto de
fartura, como de fome; assim de abundância como de escassez; tudo posso naquele que me fortalece. E sabeis
também vós, o filipenses, que no inicio do evangelho quando parti da Macedônia, nenhuma igreja se associou
comigo, no tocante a dar e receber, senão unicamente vós outros; porque para Tessalônica mandastes não
somente uma vez, mas duas, o bastante para as minhas necessidades. Não que eu procure o donativo, mas o
que realmente me interessa é o fruto que aumente o vosso crédito. Recebi tudo e tenho abundância; estou
suprido, desde que Epafrodito me passou às mãos o que me veio de vossa parte, como aroma suave, como
sacrifício aceitável e aprazível a Deus. E o meu Deus, segundo a sua riqueza em glória, há de suprir em Cristo
Jesus, cada uma das vossas necessidades.‖ (Filipenses 4:10 a 19).
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Precisamos reagir como pessoas cristãs. A fé precisa colocar marcas em nosso contexto de vida e
esperança. Se diaconia é a vivência da fé no amor, se é uma forma de comunhão, urge lermos a Bíblia sob o
enfoque diaconal para conhecermos melhor o Cristo-diacono, para que nossas comunidades se tornem diaconais.
Convido para lermos juntos o texto de Lucas 13.10 a 17: A cura de uma enferma. Jesus nos traz este
exemplo porque a mulher da época fazia parte de um dos grupos de excluídos. Como é a realidade da mulher
hoje? O que mudou? O que permanece semelhante?
Queremos enfocar o texto sob três ângulos diferentes:
1. O texto como uma JANELA para o nosso contexto. Em grupos, conversar sobre os assuntos
propostos:
- Que lembranças este texto desperta de nossa realidade?
- Quem anda encurvado neste contexto? Por quê?
- O que leva as pessoas a abaixarem a cabeça, a andarem encurvadas?
- Que desculpas as autoridades dão para não cuidar dos problemas de saúde, educação, de justiça
social da cidade ou país?
- Quem vê e ajuda os encurvados do nosso contexto?
- O que nós, como comunidade cristã, podemos resolver? Que decisões podemos tomar? Que
passos dar?
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que disse Elias. Durante muito tempo ela teve o que comer, e a sua casa, e Elias.16 A farinha não se acabou na
panela nem se esgotou o óleo da ânfora, como o Senhor o tinha dito pela boca de Elias. 17 Algum tempo depois,
o filho desta mulher, dona da casa, adoeceu, e seu mal era tão grave que já não respirava.
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a) O tipo de interpretação universal defende que o critério no julgamento final de todos os povos será o
das obras de amor e misericórdia realizadas em favor (ou não) de todas as pessoas marginalizadas, pobres e
sofredoras no mundo (tanto cristãs quanto não cristãs), pessoas essas que são identificadas como as mais
pequeninas irmãs e os mais pequeninos irmãos de Jesus. Nesse tipo de interpretação, o não-saber de que as
boas obras feitas aos pobres eram feitas ao Filho do homem é, geralmente, parte constitutiva. Esse é o tipo de
interpretação mais difundido hoje, por causa de suas diversas dimensões de sentido, tornando-se quase um bem
comum; teve o seu florescimento nos inícios do século XIX.
b) O tipo de interpretação clássica restringe os pequeninos irmãos e as pequeninas irmãs da narrativa aos
membros da comunidade cristã; geralmente se pensava em todos os membros da comunidade, sendo mais raro
um estreitamento desse significado até os apóstolos. Quanto à expressão pánta ta ethne (todos os povos), na
maioria dos casos é interpretada no sentido universal, sendo que o papel dos não-cristãos no julgamento ficava
indefinido; mas há também muitos que a entendem como referência a todos os cristãos. Disso resultava um
sentido claro: para os cristãos, o critério no julgamento final eram as obras de caridade que praticavam ou dei-
xavam de praticar em relação a seus irmãos cristãos pobres e sofridos. A intenção dessa interpretação geralmente
é parenética: o texto quer motivar as comunidades para as obras de caridade. O não-saber das pessoas a respeito
de Cristo não tinha uma função clara nessa modalidade de interpretação, sendo usado como expressão de humil-
dade dos justos. Esse tipo era uma interpretação da Igreja, largamente difundida até aproximadamente o ano de
1800.
c) O tipo de interpretação exclusivo não entende a expressão pánta ta éthne como sendo todos os povos, mas
todos os gentios. As cristãs e os cristãos estão ao lado do juiz e não passarão pelo julgamento. Diante do trono
estão, portanto, apenas os não-cristãos e as não-cristãs, que são julgados e julgadas de acordo com o seu
procedimento em relação às pessoas cristãs. Portanto, "os pequeninos irmãos" são aqui interpretados como
sendo as pessoas cristãs e, às vezes, também só os apóstolos e os missionários. Nessa interpretação, o texto não
tem uma função parenética, mas de consolo para os missionários cristãos oprimidos e perseguidos. Esse tipo é
caracterizado por um espírito bem mais estreito, quase sectário, que surge no século XVIII e que esporadicamente
durante o século XIX e principalmente a partir de 1960 ganha cada vez mais expressão.
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Então, certamente se lembrarão que em sua própria comunidade o amor se esfriou, que o liberalismo
tomou conta (24.12; compare com 18.6-9), que em seu meio há traição e ódio (24.10), ambição pelo poder, fato
que ensejava a reiterada insistência de Jesus na necessidade da humildade (18.1-50) e do servir (20.20-28; 23.8-
11).
Devido a isso, o autor pensa que as pessoas das comunidades, ao lerem ou ouvirem o v. 40, não se
identificarão, sem mais, com os "pequeninos irmãos", como se não mais estivessem sujeitas ao juízo. Pelo
contrário, sabem-se desafiadas pela pregação de Jesus da mesma forma que todas as outras pessoas, e sabem
também que a própria comunidade pode estar no campo de ação do diabo, assim como o resto do mundo (cf.
13.38s.). Enfim, também elas fazem parte do pánta ta éthne e serão julgadas pelo mesmo critério de todas as
outras pessoas do mundo.
O autor constata que, no diálogo do juiz com as pessoas condenadas (25.41-45), fica evidente que a
relação com Jesus não pode ser separada da relação com pessoas necessitadas bem concretas (aqui, no caso,
aquelas pessoas da comunidade que o representam). Honrar a Jesus não significa outra coisa a não ser realizar
aquilo que ele ordenou, de levar a sério, acima de tudo, o mandamento do amor. No v. 44, as mesmas pessoas
sintetizam todas as obras de caridade na palavra diakonéo, dando a entender seu reconhecimento de que em sua
vida deveriam ter agido diaconaímente como o Filho do homem agiu (cf. 20.26,28; 23.11).
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escravas e escravos para socorrer pessoas em suas necessidades vitais; as mulheres, além de pobres, eram
discriminadas.
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missão da Igreja significa sempre um serviço aos homens, especialmente como aquele da parábola, homens
caídos e semimortos (v. 30). E, no parecer do mesmo autor, o que vive o continente sul-americano se assemelha
ao que se passa na parábola: Desde sua descoberta depende de outros que o despojam, lhe fazem violência e o
deixam semimorto. (...) um continente inteiro está caído junto à estrada, vítima de secular espoliação.‖
Diante de nossos olhos está colocada, pois, uma realidade da outra pessoa necessitada que se traduz
como povo espoliado, povo feito pobre. Pobreza aqui não significa "uma etapa casual, mas o produto de
determinadas situações e estruturas econômicas, sociais e políticas. Essa realidade de pobreza recebeu sua
correta definição em Puebla como sendo "o mais devastador e humilhante flagelo. A partir dessa realidade
historicamente concreta, como se fosse a cena do assalto da parábola, a Igreja é desafiada a redefinir
constantemente o seu agir diaconal.
Entretanto, a busca pela redefinição do agir diaconal a partir do outro assaltado, espoliado, empobrecido
estaria incompleta se a restringíssemos ao ser humano colocado nessa situação. E imprescindível ampliar, com
Uwe Wegner, o horizonte dessa busca para o universo da ecologia, já que a pessoa pobre precisa ser vista,
enquanto criatura de Deus, num sentido bem mais amplo, incluindo sua relação com a natureza. O autor parte do
princípio de que, se o tornar-se próximo significa aproximação a pessoas ou grupos para protegê-los e defendê-los
de opressão e injustiça, então "em termos de ecologia não pode haver mais dúvida de quem está — em nosso
século XX — mais à mercê de rapinagem, exploração e assaltos: trata-se da natureza, da criação de Deus. A
poluição e a devastação da criação de Deus são provas, conforme o autor, de que "a civilização ocidental (...) não
soube tomar-se um próximo para ela: tornou-se seu salteador; 'rouba-lhe tudo, causa-lhe muitos ferimentos e,
retirando-se, deixa-a semimorta' (v. 30).
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4.1 Estrutura
A narrativa do assim chamado lava-pés se encontra no início da segunda parte do Evangelho segundo
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João, desenvolvida sob o tema da revelação da glória de Jesus diante da comunidade , abrangendo os capítulos
13 a 20. Num contexto menor, o lava-pés está inserido na despedida de Jesus de seus discípulos (capítulos 13-
17), bloco também denominado de "o testamento de Jesus para seus discípulos. Os w. l a 30 do capítulo 13
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podem receber separadamente o título de "última ceia de Jesus" , enquanto que a narrativa específica do lava-
pés se restringe a 13.1-20 e recebe de Bultmann o título sugestivo de a constituição da comunidade e sua lei.
A estrutura do próprio texto do lava-pés pode ser dividida nas seguintes partes: introdução (vv. 1-3);
descrição do ato do lava-pés (4-5); diálogo entre Jesus e Pedro e a primeira explicação do ato (6-11); instrução
aos discípulos e a segunda explicação do ato do lava-pés (12-20). A indicação do traidor (vv. 21-30) não será
incluída na presente abordagem. Na sequência, serão considerados os versículos 31-35, que tratam do "novo
mandamento" deixado por Jesus para a sua comunidade.
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O serviço recebido no lava-pés tem, portanto, também o sentido de ser exemplo que orienta a forma de
vida e convivência dos discípulos, respectivamente da comunidade. "O procedimento de Jesus deve determinar o
procedimento dos discípulos entre si, isto é, de terem a mesma disposição para o serviço recíproco em humildade.
Assim, o serviço recebido compromete: se Jesus, como Senhor e Mestre, lhes lavou os pés, quebrando as
barreiras que separam prôtoi (primeiros) e eschátoi (últimos), então não há mais razões que pudessem impedir o
serviço mútuo entre as pessoas que o seguem. O procedimento de Jesus abriu caminho para que a comunidade
ouse a inversão de valores na sua convivência.
Mais, porém, do que ser uma ação cristã legitimada por Jesus, o servir-se reciprocamente é uma ordem.
O evangelista João usa duas vezes o imperativo nos w. 14 e 15. Conforme Rudolf Bultmann, este não se refere
simplesmente à prestação de serviço análogo ao que Jesus realizou, mas à "disposição de ser igual para a outra
pessoa", assim como também o imperativo não exige retribuição a Jesus pelo que ele fez, mas o "voltar-se à outra
pessoa"; Jesus não deu exemplo para uma imitatio, porém "o recebimento de seu serviço abre para os discípulos
uma nova possibilidade de vida em conjunto.
O imperativo está presente também no novo mandamento: "que vos ameis uns aos outros, assim como eu
vos amei (...)" (v. 34). Essa é uma palavra de despedida de Jesus do seu grupo de discípulos. A hora da
separação está se aproximando. Inevitável é a pergunta: como ficarão os discípulos sem a presença de Jesus?
"Em seu abandono os discípulos devem manter as relações com ele [Jesus], enquanto que, como ele, devem
dirigir sua solicitude para os demais", formula Rudolf Schnackenburg, enquanto Siegfried Schulz complementa: "O
futuro é colocado sob o 'novo' mandamento.
Entretanto, pode o mandamento do amor fraterno (a ação dia-conal) substituir a presença de Jesus? Não
estaria, assim, o futuro da obra de Jesus entregue às próprias mãos dos discípulos? Assim pergunta também
Rudolf Bultmann. Sua resposta é objetiva: "Só quem é amado pode amar". Com isso, ele propõe que o amor de
Jesus, demonstrado durante todo o seu ministério, radicalizado no lava-pés, culminando com a sua auto-entrega
na cruz, esteja vivo entre eles, em primeiro lugar, como presente a eles mesmos; segue-se que esse mesmo amor
estará vivo na convivência comunitária em forma de amor recíproco, no cumprimento do novo mandamento.
Resta frisar que o novo mandamento é um legado, um testamento de Jesus deixado para a comunidade
de suas seguidoras e seus seguidores. Esse registro é importante na medida em que se buscam dados que
fundamentem a ligação da diaconia com a comunidade cristã na sua origem. O novo mandamento, de fato, não é
uma exigência de amor ao próximo num sentido geral, mas um legado para o círculo das pessoas crentes em
Jesus, pois está em jogo a própria existência da comunidade dos discípulos.
O evangelista João não demonstra muito interesse em abordar o tema Igreja, com sua organização e
hierarquia; no entanto, coloca ênfase na existência da comunidade e sua marca essencial, o amor entre seus e
suas integrantes.
Esse sinal da comunidade a diferencia do mundo: "Nisto conhecerão todos que sois meus discípulos, se
tiverdes amor uns aos outros" (v. 35). Portanto, o pequeno círculo de crentes, para o qual João escreve seu
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evangelho * , se caracteriza pela sua estranheza no mundo.
―Quando seu amor continua sendo a resposta ao amor de Jesus", a comunidade cristã é colocada diante
do mundo com uma tarefa, sem no entanto, confundir-se com o mundo. Senão vejamos: ela se caracteriza pelo
novo mandamento e esse "novo" não deve ser entendido no sentido histórico (o mandamento do amor já fazia
parte da tradição do povo de Deus), mas no sentido do "fenômeno do novo mundo que Jesus iniciou. O v. 35
testemunha, nesse sentido, que na comunidade o novo mundo se torna realidade. Para quem está fora da
comunidade, o amor fundamentado em Jesus, que caracteriza a convivência comunitária, é critério para a
distinção entre o velho e o novo.
Por isso, Rudolf Bultmann fala da comunidade escatológica. A comunidade diaconal, portanto, na qual o
lava-pés com o seu novo mandamento é atual, é a comunidade escatológica. E ela, como tal, não está fechada
em si mesma; sua tarefa em relação ao mundo é a "desmundanização", isto é, o mundo "velho" ("os governadores
dos povos têm-nos sob seu domínio, e sobre eles os seus maiorais exercem autoridade", Mc 10.42) pode deixar
de sê-lo para fazer parte do "novo" mundo ("entre vós não é assim; pelo contrário, quem quiser tornar-se grande
entre vós, será esse o que vos sirva", Mc 10.43). "Através da pertença à comunidade escatológica, existe para o
mundo a permanente possibilidade de ser incluído no círculo do agapân".
5. Conclusão
1. Na abordagem do texto do julgamento final (Mt 25.31-46) optamos pela interpretação chamada clássica,
que tem o apoio de Ulrich Luz, Ulrich Bach e Ekkehard Heise, contra a tradicional compreensão que universaliza
as pessoas da narrativa, beneficiadas com as obras de caridade dos benditos.
Convenceu-nos a argumentação de que as seis obras enumeradas se coadunam com as necessidades
dos discípulos enviados em missão ao mundo, assim como, posteriormente, com as necessidades dos
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missionários e das missionárias itinerantes, enviados e enviadas pelas primeiras comunidades cristãs ao mundo
gentio. Essas pessoas eram acolhidas e socorridas por pessoas estranhas e, mais tarde, pelas novas
comunidades que iam surgindo no mundo estranho, também caracterizadas, num sentido geral, pela sua pobreza.
Em vista desses dados, torna-se quase supérfluo registrar a nítida presença das dimensões prática e
comunitária da diaconia no texto do julgamento final, dada a concreticidade das obras de caridade e a sua
importância na vida das primeiras comunidades cristãs, desde os primeiros momentos.
Na interpretação assumida neste trabalho, Jesus apresenta suas seguidoras e seus seguidores (enviadas
e enviados ao mundo) como sendo pobres e dependentes da ajuda alheia. Essas pessoas sofrem a diaconia de
outros. Isso necessariamente evita que elas se autocom-preendam como vocacionadas para assistirem os pobres,
assumindo uma postura acima dos e alheia aos pobres deste mundo, que dependem da caridade cristã.
Há aqui uma compreensão de comunidade, livre da concentração de poder e de posses. Ela não faz
assistencialismo paternalista. Não divide o mundo e a própria comunidade em dois tipos fixos de pessoas: as que
precisam de ajuda e as que não precisam, as que podem ajudar e as que não podem, as que são bondosas e as
que devem se conformar com a dependência da bondade alheia. As pessoas pobres não são objetos da
assistência da comunidade cristã.
No texto, as obras de caridade são experimentadas pêlos discípulos e missionários pobres; mas, ao
mesmo tempo, são também praticadas por comunidades cristãs pobres (recém-criadas), bem como por pessoas
estranhas. Isso indica a organização do trabalho diaconal a partir das necessidades de outras pessoas e não a
partir da bondade e do poder de ajuda das pessoas cristãs. Por isso, o critério no julgamento final não será a
bondade, mas a ajuda prestada nos momentos da necessidade.
O texto abriga, portanto, a crítica ao assistencialismo que quer manter o status quo. Vemos implícita nesse
dado a dimensão profética que o texto atribui à diaconia.
Constatamos no estudo de Mt 25.31-46 que se concebe a comunidade como organização de serviço
(desprovida de arrogância, de posses, de poder). Essa concepção coincide com a de Mc 10.35-45, em que a nova
ordem fundamental da comunidade é o serviço, realizado sempre em favor das pessoas que se encontram no
último lugar, desafiando sempre as que querem se colocar no primeiro lugar.
Na interpretação adotada de Mt 25.31-46 vislumbramos ainda uma clara relação com a eclesiogênese de
Leonardo Boff: uma nova Igreja nasce em meio ao mundo da miséria e se caracteriza pelo espírito solidário de
seus membros.
2. O segundo dos textos clássicos da diaconia tratado foi o do bom samaritano. Registramos a
preocupação pela vida como tema central de Lc 10.25-37. Diante desse tema, o consenso teológico parece não
bastar. O amor ao próximo se caracteriza pela sua concreticidade. O texto não teoriza nem espiritualiza. Aponta a
necessidade da prática, fato que embasa a tese da dimensão prática da diaconia.
Tratamos de explicitar também que, no texto, não se trata de qualquer prática. Como em Mt 25.31-46, o
amor ao próximo não se define a partir da bondade que alguém sente obrigação de demonstrar, mas da
necessidade em que alguém se encontra. Portanto, o que determina a ação solidária não é quem a pratica, mas
quem dela necessita. Na parábola do bom samaritano, Jesus nos mostra a partir de onde devemos articular a
diaconia: a partir da outra pessoa, daquela pessoa que mais necessita de ajuda para viver, que está mais distante
da vida plena, duradoura, perene. Isto é, na verdade, uma proposta de inversão, tão radical como em Mc 10.35-
45: não os primeiros (que agem a partir de si mesmos, de cima para baixo) devem determinar o programa de ação
da comunidade, mas os últimos.
Com Leonardo Boff procuramos definir que próximo de alguém é aquela pessoa que rompe o círculo de si
mesmo e se debruça sobre a outra pessoa abandonada. Foi isso que Jesus fez. O caminho da cruz demonstra a
sua renúncia de si mesmo (da sua glória e do seu poder) para estar a serviço de Deus. Marcos 10.45 o expressa
assim: "Eu não vim para ser servido, mas para servir e dar a vida em resgate por muitos". Romper o círculo de si
mesmo é justamente também o conteúdo da nova ordem fundamental da comunidade: "Quem quiser tornar-se
grande entre vós, será esse o que vos sirva" (Mc 10.43). Por isso, a Igreja encontra o sentido de sua existência no
serviço, particularmente às pessoas mais humilhadas e ofendidas da nossa história.
Entretanto, a busca pela redefinição do agir diaconal a partir do outro assaltado, espoliado, empobrecido
estaria incompleta se a restringíssemos ao ser humano colocado nessa situação. Uwe Wegner nos desafia a
ampliar o horizonte dessa busca para o universo da ecologia. A criação de Deus se encontra na situação de quem
foi assaltado: roubou-se tudo dela, causou-se-lhe muitos ferimentos, deixando-a semimorta.
O estudo do texto chamou nossa atenção para a importância da visão. O ato de compaixão do samaritano
parece pressupor o ver. O texto destaca o poder de determinação que está na leitura dos fatos: a visão que
alguém tem, por exemplo, de uma criança de rua determinará a atitude de ser ou não próximo dessa criança.
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“Habilitando os santos para o desempenho do ministério”
Assim, a diaconia pode aprender do texto do bom samaritano a necessidade de se valorizar a visão
correta da realidade, a leitura crítica dos acontecimentos, a perspectiva a partir da qual se interpreta os fatos, o
conhecimento de causa, para que a ação diaconal supere a marca da ingenuidade. Lembrando Uwe Wegner,
podemos dizer que, na diaconia, necessitamos de olhos que enxerguem além do óbvio, já que ao nosso redor
nem tudo é visível a olho nu. Parece não haver dúvida de que a percepção além do óbvio é um dom e uma tarefa
profética. Passar de largo, indiferente, equivale a deixar a realidade como está. Enxergar o que se oculta atrás do
estado miserável de tantas pessoas é o primeiro passo da ação profética.
Vimos, finalmente, que o texto insiste também na ação misericordiosa. O samaritano, após ver, investiu
tudo o que podia numa ação eficiente: arriscou-se, sacrificou-se, prestou assistência qualificada, agiu
solidariamente sem preconceitos, mostrou preocupação com o futuro da pessoa ferida, gastou dinheiro. O ver
criterioso (dimensão profética da diaconia) e o agir misericordioso do bom samaritano (dimensão prática da
diaconia): eis dois desafios para que a Igreja de hoje vá e proceda de igual modo.
3. Em terceiro lugar, abordamos o lava-pés (Jo 13.1-35). Foi destacado que mais uma vez Jesus assume
uma postura de identificação com as pessoas últimas na escala da vida social do sistema escravista e patriarcal,
já que o serviço de lavar os pés cabia a escravas, escravos e mulheres. O evangelista João destaca que Jesus, no
entanto, o faz como Senhor, como aquele a cujas mãos Deus tudo confiou, acentuando assim o tamanho do
contraste e a radicalidade do gesto. Nesse sentido, o lava-pés prefigura a radicalidade do acontecimento da cruz.
Constatamos que o lava-pés, como ato inversivo de valores, não foi uma atitude isolada no ministério de
Jesus. Nesse sentido, é possível traçar linhas diretas de ligação com Mc 10.35-45 e todo o seu contexto, em que
Jesus, no caminho da cruz (a via da renúncia do poder próprio), como Messias, desce ao mundo das pessoas
excluídas, identifica-se com elas e proclama a seus seguidores e suas seguidoras uma nova ordem de vida
comunitária na qual "quem quiser ser o primeiro entre vós, será servo de todos" (Mc 10.44). Por isso, reconhece-
se que "certamente o lava-pés é o melhor paradigma para a palavra do Senhor de Mc 10.45.
Também aqui, a resistência de Pedro ao gesto que caracteriza a renúncia de Jesus ao poder e à glória
próprios é comparável à sua tentativa de impedir a paixão de Jesus, no texto de Marcos. Não aceitar o serviço de
Jesus é opor-se ao seu projeto de auto-entrega, que passa pelo lava-pés e se consuma na cruz. Não aceitar o
serviço de Jesus é seguir o caminho da auto-afirmação, do fechamento em si, da arrogância, enfim, da autonomia
e do poder próprio.
Isto, no lava-pés, tem duas dimensões: a) verticalmente, em relação a Deus, rejeitar o seu serviço na cruz
é proclamar-se auto-salvador; b) horizontalmente, fechar-se ao serviço de outras pessoas é fechar-se em si
mesmo e acreditar na auto-suficiência. Quebrar o orgulho da superioridade, disfarçado na falsa modéstia de
Pedro, certamente é a intenção de Jesus no lava-pés.
Destacamos também a ordem de Jesus "como eu vos fiz, façais vós também" (Jo 13.15). O serviço
recebido no lava-pés tem, portanto, também o sentido de ser exemplo que oriente a forma de vida e convivência
dos discípulos, respectivamente da comunidade. O procedimento de Jesus deve determinar o procedimento dos
discípulos entre si. Jesus não deu exemplo para uma imitatio, mas o recebimento de seu serviço abre para os
discípulos uma nova possibilidade de vida em conjunto, baseada no serviço mútuo. Aqui claramente o lava-pés
explicita a dimensão muito concreta e prática da diaconia.
O imperativo expresso no lava-pés está presente também no novo mandamento: "que vos ameis uns aos
outros, assim como eu vos amei..." (v. 34). Essa palavra de despedida de Jesus do seu grupo de seguidores e
seguidoras coloca o futuro destes e destas sob o novo mandamento. O amor de Jesus, demonstrado ao longo de
todo o seu ministério, radicalizado no lava-pés, que alcançará o seu auge na cruz, deverá estar vivo entre eles,
acima de tudo, como dádiva a eles mesmos; essa dádiva tomará corpo na convivência comunitária em forma de
amor recíproco, no cumprimento do novo mandamento.
Seja destacado que o novo mandamento é um testamento que Jesus deixou para a comunidade de suas
seguidoras e seus seguidores. Esse dado é importante porque fundamenta a relação da diaconia com a
comunidade cristã na sua origem. A partir do contexto de sua proclamação, o novo mandamento não é uma
exigência de amor ao próximo num sentido geral e vago, mas um legado concreto e direto para o círculo das
pessoas que seguiam a Jesus. A existência da comunidade dessas pessoas era o que estava em jogo quando
Jesus ordenou: "... que vos ameis uns aos outros" (Jo 13.34).
A vida comunitária sob a marca do mandamento do amor distingue a comunidade do mundo: "Nisto
conhecerão todos que sois meus discípulos, se tiverdes amor uns aos outros" (v. 35). Portanto, a comunidade das
pessoas que seguem Jesus se caracteriza pela sua estranheza no mundo. Nela o novo mundo, inaugurado por
Jesus, se toma realidade.
O mundo "velho" (assim caracterizado por Jesus: "os governadores dos povos têm-nos sob seu domínio, e
sobre eles os seus maiorais exercem autoridade", Mc 10.42) pode deixar de sê-lo para fazer parte do "novo"
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“Habilitando os santos para o desempenho do ministério”
mundo ("entre vós não é assim; pelo contrário, quem quiser tornar-se grande entre vós, será esse o que vos
sirva", Mc 10.43).
Portanto, também os textos do lava-pés e do novo mandamento propõem um contramodelo à sociedade
vigente. Isto é, ao mesmo tempo, denúncia de uma convivência social distante do amor e do serviço recíproco
(que Jesus demonstrou) e anúncio da possibilidade real de uma nova forma de vida comunitária. Nesse sentido, a
marca da estranheza em relação à velha sociedade é, sem dúvida, a marca profética da comunidade cristã.
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“Habilitando os santos para o desempenho do ministério”
haja vista a menção que deles faz nos seus ensinos e escritos. Creio, firmemente, que Salomão ajudou a todos
quantos estiveram no raio de sua ação benfeitora, direta ou indiretamente. Sua mejestade tinha um coração
magnânimo por isso deu. Repartiu. Ajudou. Não podia ser diferente, "porque a quem muito se lhe dá, muito se lhe
pede." A Salomão foi dado muito.
Na concepção do sábio, filho de Berseba, aquele que tapa os ouvidos aos reclamos do pobre, um dia há
de clamar e ninguém o ouvirá. Já ouvi muita gente clamar a Deus e não ser ouvida; é bom procurar, logo, a "chave
da dispensa" e abrir o coração, quem sabe não reside aí a "chave" do problema?
Quando o rei Lemuel, cujos ensinos ele mesmo diz ter recebido de sua mãe, escreveu o magistral "hino à
mulher virtuosa" registrado no livro de Provérbios 31:10 a 20, verificamos a preocupação "da mulher virtuosa" com
os necessitados. No verso 20 lemos: "Abre a mão ao aflito e ainda a estende ao necessitado." "Abre a mão!" O
que falta em muitos de nós é, justamente, isto: abrir a mão. Nossas mãos estão fechadas, e por isso não damos.
Enquanto não abrirmos os corações as nossas mãos continuaram fechadas. As mãos são os instrumentos da
beneficência; só que elas estão atreladas ao coração, tanto para quem executa quanto para quem a pratica. Quão
formosas são as mãos daqueles que praticam a beneficência! Parodiando os "pés formosos dos que anunciam a
paz..." (Isaías 52:7) Os pés, a Boca e as Mãos, eis neles os três Ministérios representados a serviço de Deus e
dos homens! Os Pés levam a Semente, "andando e chorando". A Boca - "a verdadeira instrução esteve na sua
boca". (Malaquias 2:6) e as Mãos - "abre a mão ao aflito..." (Provérbios 31:20)
No livro "O Cristão e a fome Mundial", pág. 56, o escritor, Dr. Thur-mon Bryant, eminente teólogo afirma:
"Nada é mais claro na Bíblia do que Deus ser campeão dos pobres, dos oprimidos e dos exploradores." Por
consultar 300 referências bíblicas à palavra "pobre", que traduzida de apenas seis termos básicos na língua
original, a gente se convence da preocupação bíblica pêlos pobres. Acrescentando a isso os termos como
"estrangeiro", "órfão" e "viúvas", todos normalmente enquadrados no contexto da pobreza. O número de
referências bíblicas à pobreza é muito grande.
No Velho Testamento nós encontramos o Senhor Deus preocupado com aqueles que passam privações
de ordem material e condena os opressores deles. Os dois pecados mais graves na religião de Israel foram: a
rejeição do culto ao Deus verdadeiro e a opressão aos pobres. No mesmo versículo, Ezequiel fala dos dois
pecados quando condena a pessoa que "oprime ao pobre e necessitado e o levantar os olhos aos ídolos."
(Ezequiel 18 e 12)
No Novo Testamento é igualmente decisivo quando fala sobre os pobres. Todo o contexto histórico e
cultural da encarnação - a circunstância humilde escolhida por Deus para Sua manifestação em carne - tem
implicações teológicas altamente significantes. A autocompreenção de Jesus e o Seu ministério são ligados
expressivamente aos pobres. Na declaração inicial de Sua identificação com o Messias, e do Seu ministério na
sinagoga de Nazaré, Ele citou Isaías 61 e disse: "O Espírito do Senhor está sobre mim, porquanto me ungiu para
anunciar boas-novas aos pobres; enviou-me para proclamar libertação aos cativos... para pôr em liberdade os
oprimidos." (Lucas 4:18) Após estabelecer essa ligação com os pobres, Jesus declarou: "Hoje se cumpriu esta
escritura aos vossos ouvidos." (Lucas 4:21)
Jesus não somente condenou os opressores dos pobres, mas também advertiu que tais malignos "hão de
receber muito maior condenação" do que receberiam de outro feito.
Esta ênfase aos pobres continua na igreja apostólica. Ficou resolvido que Pedro, Tiago e João
ministrariam aos da circuncisão, enquanto Paulo e Barnabé iriam aos gentios. Mas, na última e final estipulação
ficava "que eles se lembrassem dos pobres". O antigo carimbo oficial pelo qual se identificava o povo de Deus - o
da circuncisão - podia ser sacrificado, mas a atenção aos pobres, não! Paulo na admoestação de lembrar-se dos
pobres enfatizou: "o que também procurei fazer com deligência." (Gaiatas 2:10) A devoção de Paulo aos pobres
em Jerusalém e a advertência de Tiago quanto ao tratamento dos pobres (Tiago 2:1-7, 15-16; 5:1-6) põem o toque
final: A identificação da igreja com os pobres.
Por que há tanta ênfase aos pobres na Bíblia? A razão é que se não houvesse esforço todo especial para
incluir os pobres, estes seriam deixados de lado e esquecidos. Eles não têm cartaz, não têm força. São
desvalorizados! São expulsos. Banidos. Desterrados. Desprevilegiados. Eles não são incluídos. Têm pouco valor.
A pobreza é olhada como uma doença. Ela carrega um estigma. É ruim passar fome e não ter nada, comtemplar
os queridos passando privações e sofrendo a humilhação causada pela falta de suprimento das necessidades
básicas da vida. Mas o maior estigma é psicológico - a alienação, a desu-manização, a perda da dignidade e do
senso de utilidade, o que nunhuma criatura feita à imagem de Deus deve ser constrangida a sentir. O estigma
esmaga a pessoa. Por entender isto, Jesus manda que focalizemos, como cristãos, o valor do pobre.
Essas verdades ditas acima merecem de todo o povo que se chama pelo nome de Cristo, uma profunda
reflexão. Deus disse a Israel quando este não era ainda uma nação organizada: "Não seguirás a multidão para
fazeres mal; nem deporás, numa demanda, inclinando-te, para a maioria, para torcer o direito. Nem com o pobre
serás parcial na sua demanda." (Êxodo 23:2-3)
A igreja não pode "seguir a multidão" no tratamento aos pobres. A multidão precisa ver, como via aquela
do primeiro século, o tratamento que a igreja dispensava aos seus pobres. "Vede como se amam! Exclamou."
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“Habilitando os santos para o desempenho do ministério”
Os judeus ortodoxos associavam os males, doenças e sofrimentos de alguém ao fato desta pessoa não
ter se lembrado dos pobres. Observe a história da vida de Jó. Um amigo seu chamado Elifaz contesta a
integridade e probabilidade dele quando lhe dizia: "Porventura não é grande a tua malícia, e sem termo as tuas
iniqüidades? Porque sem causa tomaste penhores a teu irmão, e aos seminus despojaste das roupas. Não deste
água a beber ao cansado, e ao faminto retiveste o pão. As viúvas despediste de mãos vazias, e os braços dos
órfãos foram quebrados." "Por isso estás cercado de laços, e repentino pavor te conturba." No versículo 21 Elifaz
sugere a Jó o seguinte: "Reconcilia-te, pois com Ele, e tem paz e assim te sobrevirá o bem." (Livro de Jó cap. 22)
É interessante notar ao amado leitor que Elifaz não tem evidência alguma, mas supõe que Jó teria
praticado as injustiças que eram possíveis para um homem de sua posição. A maravilhosa mensagem de
reconciliação com Deus proposta por Elifaz não pode ajudar a Jó, pois é baseada na suposição da sua grande
maldade.
O leitor atentou nas palavras do amigo de Jó? Ele cria firmemente que a doença do seu amigo era
resultante da negligência da prática da beneficência.
No Velho Testamento há abundantes passagens que nos mostram a preocupação de Deus para com os
pobres e do Seu cuidado por eles. Prometeu Bênçãos aos que se compadecessem deles e maldição àqueles que
desprezassem os desvalidos e necessitados. Acredito que o Senhor continua com o mesmo desvelo e o mesmo
cuidado com os pobres nos dias atuais, porque o Senhor é o mesmo ontem, hoje e eternamente. "Eu o Senhor
não mudo...", disse Ele.
Grande parte do povo de Deus, além de não socorrer os necessitados, ainda os discrimina. Fazemos
acepção. Tiago mandou um recado duro aos seus contemporâneos; leia-o: "Se, portanto, entrar na vossa
sinagoga algum homem com anéis de ouro nos dedos, em trajes de luxo, e entrar também algum pobre andrajoso,
e tratardes com diferencia o que tem os trajes de luxo e lhe disserdes: Tu, assenta-te aqui em lugar de honra; e
disserdes ao pobre: Tu, fica ali em pé, ou assenta-te aqui abaixo do estrado dos meus pés, não fizestes distinção
entre vós mesmos, e não vos tornastes juizes tomados de perversos pensamentos? Ouvi, meus amados irmãos:
Não escolheu Deus os que para o mundo são pobres, para serem ricos em fé, e herdeiros do reino que Ele
prometeu aos que O amam? Entretanto, vós outros menosprezaste o pobre..." (Tiago 2:1-6)
No comentário do rodapé da Bíblia Nova Vida sobre este texto lemos: "A todo homem são dadas
dignidade e igualdade pela cruz de Cristo, uma vez que Ele morreu por todos. Em consequência, a eternidade
humilhará aquele que se gloriar na sua própria riqueza, e dará aos pobres, mas fiéis, a herança das riquezas
eternas. Por já sermos participantes do reino eterno, cometemos pecados se fizermos acepção de pessoa."
"Aquele que quer levantar alguém precisa descer, como o samaritano, pois a maioria infinita da raça humana
sempre tem sido e ainda é pobre."
(A. N. Graves)
Uma Fé encarnada
"Quem se compadece do pobre ao Senhor empresta, e este lhe paga o seu benefício."
Provérbios 19:17
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“Habilitando os santos para o desempenho do ministério”
Quando somos gerados em Cristo mediante o novo nascimento, recebemos do Senhor, entre tantas
coisas, uma porção da Sua bondade; logo, o ser bom é parte inerente da nossa nova vida. Antes, quando
vivíamos sob os impulsos da velha natureza, toda a nossa bondade e justiça própria eram consideradas sem ou
de pouco valor para Deus, mas agora, depois que a metamorfose espiritual se operou em nós, fomos feitos
herdeiros de um dos atributos mais maravilhosos de Deus - A Bondade! Afirmamos isto tendo por base bíblica o
que Paulo escreveu aos Gaiatas capítulo cinco e verso vinte e dois: "Mas o fruto do Espírito é: amor, alegria, paz,
BONDADE, fidelidade..."
Ora, diremos nós os que nascemos de novo, se o ser bom é uma dádiva de Deus, deve, portanto, calar
profundamente em todos as palavras que Tiago escreveu às doze tribos que se encontravam na Dispersão:
"Aquele que sabe fazer o bem e não faz, comete pecado." (Tiago 4:17) A melhor tradução deste versículo é esta:
"Aquele que sabe que deve fazer o bem e não faz, comete pecado." Por isso afirmamos que todo salvo por Jesus
não somente sabe, mas deve ser bondoso sob pena de incorrer no pecado da omissão.
O sábio Salomão, que foi aquinhoado pelo Senhor com uma vastíssima sabedoria, tanta humana quanto
divina, legou-nos através dos seus escritos no que tange ao exercício da misericórdia, um cabedal de exortações
e lições práticas para o viver diário. Num dos seus famosos provérbios ele assim se expressou: "Não te furtes de
fazer o bem a quem de direito, estando na tua mão o poder de íazê-lo. Não digas ao teu próximo: "Vai, e volta
amanhã, então to darei, se o tens agora contigo." (Provérbios 3:27-28)
É muitas vezes penosa a prática de bem para quem ainda não aprendeu a lição do dar que nos advém do
Senhor, lição de sacrifício. Por essa razão o escritor Aos Romanos nos instiga, mesmo a despeito da aversão do
velho homem pelo bem, a nos esforçar de todo o nosso coração para a prática do bem: "Esforçai-vos", disse ele,
"para fazer o bem perante todos os homens." (Romanos 12:17) O próprio Apóstolo das Gentes, procurava dar âni-
mo aos Gaiatas quando dizia: "Não nos cansemos de fazer o bem." É próprio do ser humano o se enfadar na
prática do bem. Já ouvimos de tantos a frase: "Já fiz tanto a tantos, que cansei!" Há um provérbio libanês que diz:
"Semeia generosamente o grão da bondade na terra agreste que te parece estéril. Cedo, ou tarde, receberá o
bom semeador o fruto da sua semeadura multiplicado além das suas esperanças." William Barker dizia: "A
bondade sempre retribui, mas essa retribuição é sempre mais generosa quando nada se espera dela."
À igreja em Efeso o Apóstolo Paulo afirmava que a prática das boas obras, agradável a Deus, só é
possível quando Ele mesmo nos torna novas criaturas pela lavagem da água e do Espírito. Observe a singeleza e
a profundidade desta acertiva paulina: "Pois somos feitura dele, criados em Cristo Jesus para as boas obras, as
quais Deus de antemão preparou para que andássemos nelas." (Efésios 2:10) O mesmo Apóstolo, sob inspiração
divina, lembra ao nascido de novo, que toda e qualquer ação praticada deve vir do alto "porque Deus é quem
efetua em nós tanto o querer como a realizar, segundo a sua boa vontade." (Filipenses 2:13) Isto só é possível,
quando vivemos sob a influência do Espírito Santo no nosso viver diário. Cada gesto, cada atitude, cada ação
bondosa que praticamos, não vem de nós mesmos, mas dAquele que em nós opera o Seu querer. Isto é
maravilhoso demais para nós que antes não conhecíamos a profundidade, a altura e nem a largura do
imensurável amor de Deus!
No exercício das boas obras, pré determinadas pelo Senhor, o crente tem o alto privilégio de, através
delas, glorificar o Senhor e de ser conhecido como filho de Deus diante do mundo tão carente das misericórdias
do Criador de todas as cousas. Todo ser humano é essencialmente egoísta. Nada, senão a graça pode manter o
coração amplamente aberto a todas as formas de necessidade humana. Temos de permanecer junto à fonte do
amor celestial se queremos ser canais de bênçãos em meio à miséria moral e espiritual que nos cerca. Deus quer
conceder-nos o raro e excelente privilégio de sermos Seus imitadores. Graça admirável! O só pensar nela enche o
coração de admiração, amor e louvor. Não só somos salvos pela graça, mas permanecemos em graça, vivemos
sob o bendito reino da graça, respiramos a própria atmosfera da graça, e somos chamados para sermos os
expoentes vivos da graça, não apenas para os nossos irmãos, mas para toda a família humana. Não temos de
viver para nós mesmos, pois já não nos pertencemos. Somos do Senhor, Aleluia! Louvado e exaltado seja o
Senhor, para sempre seja louvado! Querido leitor, Deus espera que cada um de nós, onde quer que estejamos, na
família, no campo, no mercado ou na fábrica, na loja ou na casa bancária, todos os que entram em contato
conosco devem ver a graça de Jesus brilhar em nossos modos, nas nossas palavras, no nosso olhar. E então
quando se apresenta um necessitado diante de nós, se nada mais podemos fazer, devemos dizer-lhe ao ouvido
uma palavra de conforto, ou verter uma lágrima ou dar um suspiro de verdadeira e cordial simpatia. O Senhor
permita que todos os que professam ser cristãos, e assim se chamam, possam conduzir-se, em sua vida diária, de
modo a serem uma epístola de Cristo, conhecida e lida por todos os homens.
Convido o caro leitor e a nobre leitora a subirem comigo a ladeira íngrime e sinuosa muitas vezes, e
palmilhar a estrada dos que fizerem o bem, e às vezes sem olhar a quem, narradas nas Escrituras Sagradas. Os
exemplos que mostraremos, há de sacudir de nós, se porventura houver, todo o egoísmo e falta de fé, pois se tais
exemplos não nos incomodarem ruirá por terra todo o nosso esforço nestes escritos aqui exarados.
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da nossa botija." Temos sido mesquinhos e avarentos muitas vezes, e dizemos que somos abençoados pelo
Senhor, quando na realidade "são as Suas misericórdias" que nos suportam; e nada mais, e isto Ele derrama
sobre maus e bons.
J.A. Miller afirma: "Quando contemplares a miséria estampada no rosto do teu próximo, permite (tu) que
ele veja a misericórdia em teus olhos." Se Deus usa de misericórdia conosco porque não ser misericordioso na
mesma medida? Que Deus se apiede de nós e nos dê a graça de experimentarmos a "bem-aventurança que há
em ser misericordioso para que no dia da adversidade Deus use a misericórdia para conosco.
Deus operou na vida daquela viúva concedendo-lhe, entre outras coisas, três grandes bênçãos através do
profeta Elias: O sustento da sua casa nos dias da seca, a ressurreição do seu único filho e, a maior delas, a fé no
Deus que não conhecia!
Há um pensamento de Iran MacLaren que convém deixar transcrito para a meditação dos queridos
leitores: "Jesus nunca entra numa vida para empobrecê-la. Quando se compraz em galardoar homens a quem
ama, Suas mãos lhes proporcionam outros dons mais valiosos que a prata e o ouro." (Do livro 7 Mil Ilustrações e
Pensamentos, pg. 264)
Trago à memória dos leitores a pregação de João, o Batista. Informa-nos Lucas, o médico amado, o
seguinte: "No décimo quarto ano do reinado de Tibério César, sendo Pôncio Pilatos governador da Judéia, veio a
palavra do Senhor a João, filho de Zacarias. Ele percorria toda circunvizinhança do Jordão, pregando o batismo do
arrependimento para remissão de pecados. Dizia ele: Produzi, pois, frutos dignos do arrependimento, e não
comeceis a dizer entre vós mesmos: Temos por pai Abraão, porque eu vos afirmo que destas pedras Deus pode
suscitar filhos a Abraão. E também já está posto o machado à raiz das árvores; toda árvore, pois, que não produz
bom fruto, é cortada e lançada no fogo. Então as multidões o interrogavam, dizendo: Que haveremos, pois, de
fazer? Respondeu-lhes: Quem tiver duas túnicas, reparta com quem não tem; e quem tiver comida, faça o
mesmo." (Lucas 3:8-11)
Na visão do Precursor de Jesus, o batismo é o sinal público de mudança interna. O arrependimento
precede o batismo. Depois de ouvirem o duro sermão proferido por João as multidões o interrogam: "Que
haveremos, pois, de fazer?" João aponta para os frutos do arrependimento que são: O reconhecimento da
responsabilidade pessoal, a prontidão nas boas obras, etc e a "partilha com os necessitados" - "Quem tiver duas
túnicas reparta com quem não tem; e quem tiver comida, faça do mesmo modo."
João pregava uma mudança interna, isto é, mudança de hábitos, mudança de sentimentos, mudança no
relacionamento com o próximo, mudança que torna o homem humano e sensível às necessidades do seu irmão.
Depreende-se, pois, da pregação do Batista, que enquanto não houver mudança interna dificilmente repartiremos
o nosso "pão" e a nossa "túnica" com alguém carente. O homem tem de ser renovado nas mais profundas origens
do seu ser moral, antes de poder ser o veículo do amor divino; e até mesmo aqueles que experimentaram a graça
salvadora precisam vigiar, continuamente, contra as horrendas formas de egoísmo em que se reveste a nossa
natureza pecaminosa. Tomemos estas coisas a sério, e então teremos ocasião de bendizer a Deus pela "mudança
admirável" que Ele operou em nosso ser, capacitando-nos para "toda boa obra".
Zaqueu, o publicano, quando se converteu dos seus maus caminhos e tendo na sua casa o "Hóspede
Desejado" disse-lhe: "Senhor, resolvo dar (repartir) aos pobres a metade dos meus bens; e se nalguma coisa
tenho defraudado alguém, restituo quatro vezes mais." Com este gesto, Zaqueu o pecador consciente, demonstra
a realidade da sua conversão e mais, se prontificou a restituir o que roubara na cobrança dos impostos, além do
estipulado pelas leis romanas. A devolução era, e não podia ser de outra forma, com juros - a quatro vezes mais!
Provavelmente, o Cobrador de impostos tinha em mente quando da sua proposta em devolver por esse
percentual, uma velha lei mosaica que dizia: "Se alguém furtar boi ou ovelha, e o abater ou vender, por um boi
pagará cinco bois, e quatro ovelhas por uma ovelha." (Deuteronômio 22:1)
Quando há conversão genuína, o arrependimento não pode deixar de manifestar-se de modo público e
notório. Alguém que tenha experimentado as misericórdias do Senhor, não pode deixar de ser misericordioso.
Zaqueu se encontrou, pela primeira vez na sua vida, com a Verdade suprema frente a frente, olhos nos olhos, cara
a cara. Confronta seu padrão de moralidade com as palavras do Mestre, percebe então, radiografada e
reveladamente, toda sua miséria, tanto moral quanto espiritual. Apesar de religioso e se considerar descendência
de Abraão, nunca se sentira tão miserável e destituído do reino de Deus. Sua ética moral, seus padrões de vida
religiosa e filiação abraâ-mica foram despedaçados e tornados nulos diante do Filho do Deus Vivo. O que se
passou no mais profundo do seu coração só Jesus pôde perceber e avaliar. Zaqueu abriu-lhe a porta da casa e do
coração. Foi receptivo, confessou no seu íntimo ser um grande pecador. Era rico de bens materiais mas pobre
para Deus. Todos o tinham, por sua riqueza, um homem feliz, no entanto, era o mais infeliz dos mortais. Tinha
muitos amigos, contudo a solidão era sua companheira absoluta, diuturnamente.
Apesar de ter uma conciência pesado, rubricada na oficina da desonestidade, estava em vantagem dentre
os que exercem cargos públicos e se locupletam com o erário do Estado, posto ter ainda uma réstia do temor do
Senhor, herança quem sabe, dos dias de infância inculcada nele pela sua mãe ou pêlos rabinos. O certo e justiça
se lhe faça, ele não estava satisfeito com a vida que levava e por isso desejava "ver Jesus". Queria ver Jesus, não
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“Habilitando os santos para o desempenho do ministério”
como um curioso, apenas, mas com a insistência do cego Bartimeu. Esforça-se, tem bom ânimo, sobe a uma
árvore, rompe os liames que o prendiam à sua condição social, rende-se ao grito de sua alma que ansiava por
liberdade! Paz! Salvação! Zaqueu aproveita a brecha que se lhe oferece a porta da Graça e de mansinho entra por
ela. Hospeda-A, vislumbra extasiado "a Promessa feita a seus pais desde os tempos antigos", e recebe
gostosamente o Desejado de todas as nações!! Ali mesmo, no seu lar, onde tantas vezes curtiu sua solidão e
amargura, recebe com ternura a maior de todas as bênçãos que um ser humano pode receber - a salvação da sua
alma. Esse fato não podia ficar restrito apenas a quem recebeu; Jesus fez questão de torná-lo público e exclama
em alto e bom som: "Hoje veio salvação a esta casa..." Aleluias, muitas aleluias sejam dadas ao Senhor!
Zaqueu foi salvo e deu provas imediatas da mudança que se operou no seu coração. Disse ao Mestre:
"Senhor, resolvo dar - Jesus não lhe exigiu que procedesse assim, pelo menos o texto não nos induz a isto, -
metade dos meus bens aos pobres..." Ele deve ter feito conforme prometeu. A razão primeira dessa atitude do
nosso irmão Zaqueu reside no fato singular: Ele se sentiu perdoado, e "a quem muito se perdoa" muito se deve
amar. Por outro lado "a quem pouco se perdoa, pouco se ama." Não será este último, o nosso caso? nosso caso?
Jesus ficou satisfeito com "a metade" que Zaqueu se propôs a dar aos pobres como se fora o "tudo" dele.
Zaqueu aprendeu, e iria aprender mais ainda que repartir não é um fardo pesado ou cousa impossível ao rico, mas
a maneira divina de demonstrar que "nasceu de novo".
―Concluo este capítulo com um pensamento de Eleanor L. Doan: "Deus deve fazer primeiramente algo por
nós e em nós, antes que venha a fazer alguma coisa por nosso intermédio."
Mundo, Missão e Reino de Deus.
O REINO DE DEUS E SUA TEOLOGIA DIACONAL PARA UMA REALIDADE EM CARNE VIVA
(Trabalho apresentado pelo Rev. Uverland Barros da Silva, no V
Congresso Nacional de Diaconia, promovido pela Igreja
Presbiteriana Independente do Brasil e realizado de 9 a 12 de julho
de 1992, em São Paulo, SP)
1. Textos bíblicos: Atos 4.32-35; Mateus 5.1-12; Salmo 146.7-10 e l Coríntios 16.14.
2. Introdução
Este é um congresso nacional de diaconia. Somos uma parte do povo brasileiro e uma parte da igreja na
dimensão da nossa nacionalidade em todos os aspectos. O fato de sermos tão poucos em vista do tamanho do
país e da igreja — esta não é tão grande assim, infelizmente — não impede que abramos os olhos numa tentativa
de ver, refletir e procurar respostas, ainda que regionalizadas, para os desafios e problemas que atingem, de uma
maneira dramática e desumana, o nosso sofrido e minguado povo brasileiro, especialmente suas diversas
minorias que vivem na informalidade e na marginalidade.
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“Habilitando os santos para o desempenho do ministério”
c) Conceito de Amor
No nosso meio é urgente a necessidade de uma reinterpretação do conceito de amor que nos mostre que
ele não é simplesmente uma força emocional ou uma expressão espiritual. Infelizmente, é somente assim que o
amor tem sido vivido por nós. É necessária uma nova maneira de se ver e de se viver o amor. O amor é uma força
ou expressão ontológica, isto é, é a própria essência da vida. Tal amor une e reúne o que está separado,
fragmentado, quebrado, etc.
A Bíblia também ensina que o amor é uma pessoa, perfeita e eterna, isto é, Jesus Cristo. 36
Este amor conduz a uma grande e irresistível paixão por Deus, o Pai, por Jesus Cristo, o Filho, e pelo
Espírito Santo, doador da vida. Faz com que sejamos amantes do reino de Deus.
A paixão pelo Pai e pelo reino de Deus desemboca numa paixão integral pelo mundo. Sem este amor-
integral-ontológico, expressão radicalizada da nossa existência evangélica, como realizaremos nosso ministério
social, cristão e libertador?
Somente a graça e a força deste amor ontológico — essência da vida — nos encaminha aos sofridos,
desesperados, pequenos, famintos e miseráveis.
O projeto de Deus, trindade una e santa, é o de uma espiritualidade de um Pai e de um reino, bem como
de muitos amantes desse reino em que Jesus é o rei.
Afinal, Deus, o Pai, é aquele que, no Brasil, nas noites mal dormidas das crianças que jazem pelas ruas,
consola-lhes as lágrimas e serve-lhes de travesseiro, tentando protegê-las dos assassinos executores de crianças
indefesas, quando o seu povo, a igreja, se omite em fazer isso.
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“Habilitando os santos para o desempenho do ministério”
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“Habilitando os santos para o desempenho do ministério”
Uma igreja, onde se constatam profundas diferenças econômicas e sociais, onde uns têm fartura e outros
não possuem o mínimo necessário para sobreviver, onde aqueles que dispõem de sobras não partilham com os
que estão passando necessidade, onde se fala muito em amor e não se pratica o mesmo, vive em terrível pecado.
É uma igreja que se afastou da graça do servir e da graça generosa do compartilhar. Ora, o reino de Deus não é
gestado historicamente só com palavras e confissões bonitas. Há necessidade urgente de tomada de atitudes
libertadoras, de gestos concretos, para pôr fim às desigualdades existentes.
Todo cristão que sente fome e sede da verdadeira justiça desejará em toda a sua vida que a justiça não
se restrinja à sua família, aos seus amigos e à sua igreja, mas que ela se estabeleça em todos os níveis e lugares,
para todas as pessoas e estruturas sociais, em todas as dimensões de poder e serviço.
1. Introdução
Esta dissertação reflete sobre diaconia e edificação de comunidade, em busca de indicativos úteis para as
igrejas, no que se refere à visão de edificação de uma comunidade diaconal. Na Igreja Evangélica de Confissão
Luterana no Brasil (IECLB), existem comunidades que surgem a partir de projetos diaconais e de instituições
diaconais. Há poucas experiências de comunidades que surgem e são edificadas a partir de um trabalho diaconal
comunitário, liderado por obreiros ou obreiras diaconais.
Conheceremos a Comunidade Evangélica de Confissão Luterana de Balsas, que faz uma experiência
inédita: as primeiras obreiras que lá residiram e trabalharam de 1987 a meados de 1995 fazem parte do Ministério
Diaconal. Como a IECLB tem presença inexpressiva no Nordeste, ir para Balsas significa ir para uma situação de
fronteira. Resgatando a experiência dessa comunidade, recuperamos, simultaneamente, parte de sua história
referente ao período em que lá atuaram obreiras diaconais.
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“Habilitando os santos para o desempenho do ministério”
Analisando documentos surgidos no âmbito da IECLB no período de 1987 a 1995 e em anos anteriores e
inteirando-nos de posicionamentos de líderes da mesma, destacaremos o enfoque dado à diaconia.
2
Acompanharemos a trajetória de mudanças ocorridas na Igreja, bem como em sua Irmandade , possibilitando que
obreiras do Ministério Diaconal assumam a responsabilidade por edificar comunidade em novas fronteiras, a partir
de um trabalho diaconal.
O processo de edificação da comunidade de Balsas, localizada no sul do estado do Maranhão, servirá
como exemplo concreto para o nosso tema. Juntamente com o resgate da história desta comunidade,
abordaremos características do povo maranhense e da própria cidade de Balsas.
No decorrer da pesquisa surgem questionamentos, como: Quais são as etapas do processo de edificação
da comunidade de Balsas? O que a caracteriza como comunidade diaconal? Há indicativos na edificação dessa
comunidade que possam servir de exemplo para a edificação de outras comunidades?
Com este trabalho objetivamos tomar contato com o processo de edificação de uma comunidade e
apresentá-lo como um exemplo do qual se pode extrair indicativos. Estes podem ser adequados a outras
realidades ou usados em circunstâncias similares, principalmente quando se trata da edificação de comunidades
em situação de fronteira.
Para verificar como a IECLB confia a obreiras do Ministério Diaconal a responsabilidade de edificar
comunidade em Balsas, abordaremos alguns aspectos históricos dessa Igreja e de sua Irmandade. Salientaremos
que um dos objetivos básicos da Irmandade da IECLB é a diaconia comunitária.
Observando as comunidades luteranas e conhecendo alguns aspectos da Igreja Evangélica de Confissão
Luterana no Brasil, veremos que nela predomina a valorização do ministério pastoral, não havendo ainda um
espaço adequado aos demais ministérios ordenados. Por esse motivo, abordaremos a questão da ordenação,
pois entendemos que a reflexão em torno desse assunto ajuda a abrir caminho, possibilitando a ida de obreiras
diaconais a uma comunidade do Nordeste brasileiro.
Como a comunidade de Balsas está marcada por uma liderança feminina, incluiremos aspectos da
metodologia feminista para pesquisa. O método procura desenvolver uma visão de baixo para cima, construindo
algo novo de forma participativa e recíproca.
Também verificaremos compreensões de outros autores. Para poder explicar é importante entender e isso
implica ocupar-se com o sentido de uma ação. Um comportamento que se situa na fronteira entre uma ação com
sentido e uma ação tradicional tem importância sociológica. Este é um dos motivos que nos leva à pesquisa de
campo em Balsas: a necessidade de ouvir, de observar e de resgatar sentimentos que motivam ações com
sentido.
Procurando compensar a falta de bibliografia específica sobre edificação de comunidade a partir da
diaconia, incluiremos o estudo de diversos documentos da IECLB. Considerando que esta Igreja ainda não tem
indicativos para a edificação de comunidade a partir da diaconia, uma pesquisa nesta linha é importante e justifica-
se amplamente.
Assim propomo-nos a manejar três grandezas ao longo deste escrito: uma reflexão sobre diaconia e
edificação de comunidade, um olhar sobre a experiência de Balsas e um levantamento documental na história e
nas normas da instituição que referenda a prática pesquisada.
O trabalho que ora apresentamos está dividido em três capítulos. O primeiro reflete o quadro teórico e se
subdivide em duas partes: inicialmente, aprofundará a concepção de Igreja e de edificação de comunidade e
estudará a compreensão de diaconia e de comunidade diaconal. A segunda parte desse capítulo ocupar-se-á com
aspectos da Irmandade luterana e da IECLB. Como essa Igreja surge por imigração e tem considerável número de
membros migrantes, procuramos clarear, entre outros conceitos, a compreensão de fronteira. Apresentaremos a
cidade de Balsas, no Maranhão, na região Nordeste do país, e o encontro que lá acontece entre pessoas de
culturas muito diferentes.
No segundo capítulo, apresentaremos a metodologia usada na pesquisa de campo, seguida do resultado
desta pesquisa, formulado a partir do material reunido através de entrevistas e da observação participante. Com
isso, mostraremos as expectativas e decepções, o processo de crescimento e amadurecimento da Comunidade
Evangélica de Confissão Luterana de Balsas. Daremos a conhecer os eixos básicos em torno dos quais se
desenvolve o trabalho do Projeto Fundo de Quintal. Veremos que tanto as atividades com membros luteranos "su-
listas", como o trabalho com pessoas maranhenses objetivam a valorização da vida e a edificação de comunidade.
Observaremos que todo o processo de trabalho em Balsas foi marcado por situações que, por um lado,
geraram conflitos, mas que, por outro, promoveram mudanças. Veremos que até no interior da comunidade, no
culto cristão, instalam-se fronteiras que necessitam ser trabalhadas, viabilizando a edificação de uma comunidade
diaconal.
No terceiro capítulo, com base em documentos e posicionamentos oficiais da IECLB, apresentaremos reflexões e
preocupações dessa Igreja com a realidade social do país, com os seus membros migrantes e com a necessidade
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“Habilitando os santos para o desempenho do ministério”
de edificar comunidades. Como a comunidade de Balsas conta com a atuacão de obreiras do Ministério Diaconal,
incluiremos discussões e decisões em torno do reconhecimento deste ministério. Entendemos que estes enfoques
fazem parte da história que possibilita a ida de obreiras diaconais para Balsas. Na segunda parte desse capítulo,
apresentaremos depoimentos de líderes que ocupam cargos representativos na comunidade de Balsas ou na
IECLB e falam em nome destas instituições.
A pesquisa pretende mostrar como a diaconia marca o processo que edifica a comunidade de Balsas,
possibilitando que ela se tome uma comunidade diaconal e um exemplo do qual se pode extrair indicativos para a
edificação de outras comunidades.
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“Habilitando os santos para o desempenho do ministério”
forma uma unidade, uma só Igreja, onde Cristo é o Senhor. Lembra também a diversidade: apesar de ser um cor-
po, tem muitos membros com funções múltiplas. Essa comparação deixa clara a solidariedade existente entre as
diversas partes: os membros se ajudam e apóiam mutuamente. Se um membro sofre, todos sofrem com ele.
Cristo, como Senhor da Igreja, presenteia-a com uma multiplicidade de dons e talentos. Estes, sendo
usados, não atrofiam. A diversidade enriquece um grupo, toma mais significativa a comunhão e favorece a ajuda
mútua. Boff salienta que, no corpo Igreja, cada membro desempenha uma tarefa especial e o conjunto edifica o
todo. Quem recebe um carisma especial e tem função de liderança tem mais responsabilidades. Precisa zelar pela
unidade do todo, integrar e não competir, promover o diálogo, a escuta e a serenidade.
Conforme Dreher, a Igreja pode ser reconhecida por sinais, como: pregação da Palavra, Batismo,
Eucaristia, vocação, ordenação de ministros e ministras, cruz e tentação, oração pública.
Concordamos com autores que usam a metáfora do corpo de Cristo quando falam de Igreja. A interação e
a solidariedade, existentes entre os membros, na verdade, expressam a característica diaconal da Igreja. Cristo,
como o amor encarnado, é o centro da Igreja, a cabeça. Ele possibilita amar o outro, viver a justiça e a paz. A
força da comunhão, da partilha, do acolhimento e da ajuda mútua parte da fé em Cristo. A Igreja, criada por Deus
em Jesus Cristo, através do Espírito Santo, possibilita comunhão única entre as pessoas.
2.4 - Conclusão
Concordamos com Móller e Volkmann quando afirmam ser Deus quem edifica comunidade e os cristãos
os instrumentos, colaboradores da ação que é de Deus. Existe a necessidade de um trabalho integrado, no qual
todos os cristãos se engajem juntos na tarefa de edificar comunidade. A diversidade de talentos e dons a serviço
do Reino edifica e cria espaço para engajamentos múltiplos.
Reconhecemos que a tarefa da comunidade é chamar pessoas e deixar-se chamar por Deus, sem jamais
colocar limites excludentes. Só Ele sabe onde começa e onde termina a sua comunidade, a sua Igreja. Vimos que
o amor, o perdão e a reconciliação de Cristo são ofertas universais. Pessoas cristãs, obreiros e obreiras, são
incumbidas de transmitir essa Boa Nova a todas as pessoas, sendo o amor/ágape a base comum.
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“Habilitando os santos para o desempenho do ministério”
Pudemos verificar que continua sendo mistério que Deus, em Jesus Cristo, na atuação do Espírito Santo,
cria Igreja de forma visível e concreta neste mundo, inserida na história social. Este Deus triúno chama, capacita e
envia pessoas a continuarem a sua obra neste mundo. Igualmente continua sendo algo especial que cristãos são
colaboradores de Deus neste mundo e ajudam a edificar comunidades cristãs.
Constatamos que, na reflexão sobre edificação de comunidades, Volkmann usa como exemplos os
trabalhos das CEBs e da Pastoral Popular Luterana (PPL). Lamentamos que não foram incluídos exemplos da
contribuição da diaconia. Valeria a pena aprofundar o estudo sobre a relação que existe entre a PPL e a Diaconia
na IECLB.
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“Habilitando os santos para o desempenho do ministério”
c. A Igreja local. Na terceira ênfase, Oftestad coloca a comunidade que confessa a sua fé no Deus triúno
como base para toda ação diaconal. Cada pessoa criada por Deus à sua imagem é chamada para viver em
comunhão com Ele e com as outras pessoas. A partir da queda no pecado, esse relacionamento harmonioso foi
prejudicado e a relação com Deus, a relação das pessoas entre si e a relação com a natureza sofrem as
conseqüências. Através de Cristo, morto na cruz e assumindo assim o pecado da humanidade, a pessoa foi
justificada e reconciliada com Deus. Uma pessoa amada, justificada por Deus, está livre para amar outras pessoas
e a natureza. Assim, toda ação diaconal acontece como Igreja que pertence a Deus. Toda ação diaconal parte da
comunidade local. A comunidade vive da graça de Deus e da ajuda mútua entre seus membros. A partir disso, vai
ao encontro de pessoas com seus sofrimentos e fragilidades. A comunidade cristã sempre vê o outro em sua
totalidade e procura integrá-lo na comunhão com Cristo. Deus deseja viver em comunhão com as pessoas e
deseja que estas vivam num relacionamento fraterno entre si. Para receber e dar apoio, é imprescindível fazer
parte de uma comunhão que compartilha a mesma fé. Assim a fé e a esperança são renovadas e fortalecidas.
Oftestad afirma que a diaconia, em primeiro lugar, edifica a comunhão de ajuda mútua para dentro da comunidade
e, em segundo lugar, está a serviço de pessoas e grupos que se encontram ã margem. Deseja integrar essas
pessoas na comunhão para que juntas possam adorar e glorificar a Deus. A Igreja criada por Deus em Jesus
Cristo pela ação do Espírito Santo possibilita a vivência única de comunhão entre pessoas.
Boff, no livro Igreja: carisma e poder, destaca as seguintes compreensões de Igreja: a — Igreja voltada
para dentro de si mesma: Ela é portadora da mensagem de salvação de Jesus Cristo. Ela se organiza em torno de
ações religiosas: celebrações, estudos bíblicos. A política é considerada "suja". Esta compreensão tem aspectos
convergentes com o que Oftestad chama de movimento pietista, de vivência espiritual, individual; b — Igreja da
era colonial: a organização e o trabalho ocorrem em conformidade com os interesses das classes dominantes. Ela
é conservadora e torna-se Igreja para os pobres e não dos pobres. Também Oftestad admite que o movimento
pietista procura trabalhar em cooperação com as autoridades estabelecidas; c — A modernização da Igreja: a
partir dos anos 50 deste século, a Igreja começa a se abrir para reflexões sobre problemas sociais. O discurso se
torna mais profético, incluindo a denúncia. A Igreja se reconhece como instrumento, através do qual Cristo e o
Espírito Santo agem. O mundo é considerado o lugar onde Deus age e constrói o "seu Reino, já agora"; d — A
emergência de um novo modelo: o povo começa a organizar-se e a reconhecer as causas do subdesenvolvimento
e da dependência dos países do Atlântico Norte. Toma-se sujeito de sua história de libertação. A comunidade
cristã passa a constituir-se lugar de reflexão, onde se estuda a Bíblia, se aprofunda e celebra a fé, se cultiva a
piedade e se ensaia a organização.
É a partir da comunidade que acontece o envio para o compromisso junto aos irmãos e às irmãs que
sofrem e se cultiva a ajuda mútua. Nela se exercita uma eclesiologia que tem como eixos básicos: a comunhão, a
profecia e a diaconia. Dela emerge a busca por libertação de tudo o que oprime e marginaliza para possibilitar a
vinda do Reino de Deus. Da fé nasce o compromisso político que exige mudanças.
Constatamos que os itens "c" e "d", mencionados por Boff, constituem aspectos vivenciados na América
Latina. Eles se assemelham às ênfases que Oftestad chama de sociedade como centro e de Igreja local. Contudo,
a proposta de Boff e da Teologia da Libertação é mais crítica ao poder instituído, mais profética, e valoriza as
ações comunitárias. É o povo que, a partir de sua fé no Deus triúno, passa a organizar-se e a inserir-se nas
problemáticas sociopolíticas e busca mudanças a partir das causas do sofrimento. Reconhecemos que as diversas
ênfases contêm aspectos positivos: há necessidade de uma fé pessoal, entretanto é preciso, sobretudo, que ela
esteja inserida no comunitário e social. Faz-se mister que a denúncia e o anúncio caminhem lado a lado. O amor e
a graça de Deus se estendem a toda a sua criação, sendo, portanto, inclusivos. Jesus opta, em primeiro lugar,
pelas pessoas que estão à margem da sociedade, mas não exclui as demais. Por isso, cristãos não podem
compactuar com poderes instituídos que são excludentes, com mecanismos que promovem opressão e morte. É
necessário que a inserção social e política aconteça a partir da comunidade eclesial, pois é ali que cristãos se
fortalecem e preparam para o testemunho no cotidiano.
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samaritano (...) e o ouvir de Maria (...) deixa o ouvido de uma Igreja de Bases Populares missionária apurado e
atento".
Mõller atribui a uma comunidade evangélica ou de "Bases Populares" características que entendemos
como sendo próprias de uma comunidade diaconal, pois assume compromisso com o outro a partir do vínculo
estabelecido com Cristo. Assim, uma comunidade diaconal vive o Evangelho, a justiça e a paz que provêm de
Jesus, sendo solidária e portadora do ministério da reconciliação. Essa comunidade procura ajudar a carregar
cargas, sofrer com quem sofre e alegrar-se com quem se alegra. Uma comunidade diaconal celebra o amor de
Deus, que aceita as pessoas como elas são e as presenteia com dons. Quanto mais uma comunidade se deixa
presentear por Deus, tanto mais ativa ela se torna no amor, que é a prática da fé, é diaconia. Este amor, "ágape",
não exclui quem pensa diferente, mas procura integrar todas as pessoas e possibilita que a comunidade produza
frutos.
Quando Gutiérrez afirma que conhecer o amor de Deus leva a trabalhar por uma relação de justiça, esta
tem para nós marcas diaconais. Injustiça e desigualdade social, política, económica ou cultural comprovam a
ausência ou rejeição de Deus. A justiça de Deus é ativa: dá pão aos famintos, liberta os cativos, cura os cegos,
protege os forasteiros, ampara as viúvas e os órfãos. O amor das pessoas para com Deus se torna visível e
concreto no amor ao próximo. O próximo não é a pessoa que eu encontro em meu caminho, mas sim a pessoa em
cujo caminho eu me coloco.
Hase afirma que uma comunidade, uma Igreja, não existe para desenvolver determinados trabalhos: ou
ela é diaconal e serve, ou ela está morta, Para ele, é a diaconia que define o rosto da Igreja. Ajudar o outro exige
proximidade e tempo, exige comunhão e lugar estável. Se Deus é aquele que serve, a sua comunidade, sendo
servida por Ele, por seu Espírito, está capacitada para servir a quem sofre. Ela tem o direito e o dever de servir,
pois a dimensão diaconal é inerente ao ser comunidade cristã. É na comunhão com Deus e com outros cristãos
que a comunidade é libertada e capacitada para o servir.
Hase tem razão ao afirmar que uma comunidade que prega o Evangelho, mas falha no "diaconar", fica
desacreditada. O autor, referindo-se à Igreja, corpo de Cristo, afirma que o amor é como a circulação sanguínea, a
qual precisa irrigar todos os membros e alcançar as suas extremidades para conservar e possibilitar a vida. Assim
o amor de Deus deseja alcançar todas as pessoas e possibilitar-lhes a vida.
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Schober concorda que a fé vem pelo ouvir da Palavra de Deus e que a diaconia é a vivência corpórea da
fé. Contudo, destaca que Jesus nunca estabelece o que vem em primeiro ou em segundo lugar. Há situações
onde a mensagem de Cristo chega ao outro pelo testemunho prático de cristãos, noutras chega pelo testemunho
da Palavra. A diaconia não substitui a proclamação da Palavra, e esta não tira o lugar dos atos de amor. Ambos
precisam atuar de forma integrada no testemunho do amor e da graça de Deus.
3.8 - Conclusão
A diaconia, como essência do ser Igreja, nasce da fé em Jesus Cristo e é alimentada e fortalecida na
comunhão da comunidade cristã. Vimos que, pela diaconia, a comunidade expressa seu desejo de estar a serviço,
a exemplo de Jesus Cristo, que se revela como o Diácono.
Oftestad fala da personalidade cristã individualista. Esta visão de Igreja centrada na fé pessoal ainda está
bastante presente, como reflexo do Pietismo, em segmentos da IECLB. O movimento em questão tem forte ênfase
no espiritual, na conversão individual, sendo a ajuda física e material usada como um caminho para levar outras
pessoas a Deus.
Quando Oftestad diz que a diaconia precisa ser, em primeiro lugar, um movimento para dentro da
comunidade, certamente pensa na necessidade de que seja fortalecida e capacitada para um novo servir.
Reconhecemos que existe o perigo de comunidades esquecerem do segundo passo, que consiste no movimento
para fora, adentrando a sociedade.
A fé individual é importante, assim como é importante a expressão de fé da comunidade local.
Concordamos que a diaconia precisa estar inserida nessa comunidade; entretanto, de igual modo, necessita estar
integrada no mundo, envolver-se em mudanças e ali fazer a diferença. Concluímos que os três aspectos
apontados por Oftestad são importantes, mas precisam acontecer de forma integrada.
Da mesma maneira, é inegável a relevância do que Boff chama de emergência de um novo modelo.
Reconhecemos que, quando o povo está consciente de sua realidade, ele se organiza e assume o rumo de sua
história. Assim, a exemplo de Jesus, a diaconia se preocupa com pessoas em necessidade, fragilizadas, excluídas
da sociedade, com sua dignidade e vida ameaçadas, jamais colocando limites excludentes. O amor de Deus e a
reconciliação conquistada por Cristo destinam-se a todas as pessoas. Por isso, a diaconia é assistencial e
profética, acolhedora e transformadora, preventiva e curativa. Ela se ocupa com as causas e conseqüências de
toda situação que dificulta e destrói a vida. Ela se envolve com o bem-estar das pessoas de forma integral.
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A diaconia acontece para além da mera ação social, pois possui o diferencial de estar ancorada na fé
cristã. A partir da comunhão com Deus e de uns para os outros nasce e se fortalece o desafio diaconal. A sua
ação está enraizada na comunidade eclesial, sendo o culto o momento em que a comunidade celebra e se
reabastece para um novo servir. Esse serviço parte da fé no Deus triúno e não substitui a ação política, mas
fundamenta o discurso profético. O anúncio do amor, da graça de Deus, bem como a denúncia de tudo o que
dificulta e prejudica a vida andam lado a lado. A diaconia vê o ser humano integral: o seu sofrimento, a totalidade
de suas necessidades e possibilidades.
Por vezes, parece haver uma compreensão errônea do lugar e significado da diaconia, sendo confundida
com assistencialismo. A Teologia da Libertação prefere a palavra "práxis", sendo o termo "diaconia" raro em seus
escritos. Urge resgatar as diversas dimensões da atuação diaconal, pois cabe à diaconia aliviar dores, curar
feridas, acolher e integrar, mas cabe-lhe também denunciar injustiças e colocar sinais do Reino de Deus neste
mundo, sinais de justiça, de amor e de esperança.
Uma comunidade que, de fato, vive o Evangelho é uma comunidade libertadora e diaconal. Nela são
incluídos os excluídos e esquecidos, pois a diaconia, como vivência da fé e resposta ao amor gratuito de Deus, é
centrada no culto cristão, que edifica a comunhão de ajuda mútua e conclama todas as pessoas para o louvor e a
adoração a Deus. É a comunhão que fortalece e reabastece para um novo servir.
Vimos que toda ação diaconal acontece como Igreja que está comprometida com o Reino de Deus e visa
estabelecer a paz com justiça e uma comunhão na qual o amor não tem fronteiras. Essa Igreja se reconhece como
instrumento, através do qual Cristo e o Espírito Santo agem. A diaconia arrisca o encontro com o mundo que a
cerca e que tem sede de acolhimento, de amor e de justiça. Ela se insere no mundo, atua em parceria com
serviços que a sociedade oferece, trabalha com outras igrejas cristãs e, assim, está presente em lugares de
fronteira.
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casas, criando pequenas comunidades domésticas. Paralelamente pedem pela presença de "sua" igreja. Começa,
assim, o envio de obreiros catequistas, pastores e diaconais a lugares distantes do Sul, como é o caso de
Rondônia, Tocantins, Maranhão, Goiás e outros. Nessas comunidades, os membros, os obreiros e as obreiras, por
vezes, precisam percorrer centenas de quilômetros para chegar à próxima paróquia ou comunidade, a fim de
acompanhar os membros luteranos.
Muitos núcleos comunitários em regiões de fronteira, com o decorrer dos anos, tornam-se comunidades
da IECLB. É assim que surge a comunidade de Balsas, no Maranhão, tendo uma diaconisa como primeira obreira
residente.
4.4 - Conclusão
Vimos que os imigrantes europeus vindos ao Brasil trouxeram consigo a sua fé e confissão, o que
caracteriza a IECLB como uma Igreja migrante desde o início de sua história. As inúmeras necessidades e
dificuldades existentes nesse "novo" país, em situação de fronteira, desafiaram os luteranos a praticarem diaconia
voluntária, espontânea e, mais tarde, a buscarem diaconisas da Alemanha para atuarem no Brasil.
Constatamos que havia grupos de mulheres que, na década de 30, empenharam-se em favor do
surgimento de uma Irmandade brasileira. O sonho era que jovens das comunidades se preparassem para uma
profissão na área diaconal e depois retornassem para ajudar as comunidades a se tornarem diaconais. Entretanto,
observamos que, inicialmente, as diaconisas eram muito absorvidas por instituições diaconais. Apenas na década
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de 70, a Irmandade, à semelhança da Igreja, foi desafiada a ir para novas fronteiras. Ela aceitou o desafio, e irmãs
foram trabalhar em novos campos diaconais.
Na história dos imigrantes e dos migrantes da IECLB, bem como na trajetória da Irmandade, o encontro
com situações de fronteira foi de fato uma constante. Por essa razão, sentimos a necessidade de aprofundar a
reflexão em torno do seu significado.
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“Habilitando os santos para o desempenho do ministério”
Nessa situação de alto índice de desnutrição e analfabetismo, acontece o encontro de maranhenses com
migrantes sulistas, os quais têm mais escolaridade e poder aquisitivo.
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“Habilitando os santos para o desempenho do ministério”
Tanto a cultura quanto o Evangelho têm propostas de organização social onde haja paz, justiça e
solidariedade. Ambos, Evangelho e cultura, "são projetos de vida. Ambos transmitem experiências e proposta de
vida (...) zelam pela identidade das pessoas e de grupos sociais e por sua liberdade com responsabilidade (...)
apostam na continuidade da vida coletiva". Para Suess, a cultura é de ordem antropológica, enquanto o Evangelho
é de ordem transcendental. O Evangelho se torna perceptível através de símbolos culturais. "A proposta do Evan-
gelho nas culturas exige uma presença solidária, amável, diferenciada e crítica".
Gibellini, comentando Tillich, afirma que "a religião é a substância da cultura, a cultura é a forma da
religião"- A religião traz pensamentos do divino, de Deus. Como dimensão de profundidade torna-se a base da
cultura, sendo a vida eterna a dimensão do transcendente, do Reino de Deus. A religião leva a buscar o sentido
da vida. A cultura é a totalidade de formas e símbolos pelos quais a religião se expressa, os quais demonstram
qual é o seu sentido de vida.
Suess lembra que o Filho de Deus se encarnou na cultura hebréia. Para poder transmitir a boa nova de
Deus, usou símbolos, parábolas e sinais. O Evangelho se toma perceptível através de símbolos culturais, os quais
podem ser construções, igrejas, festas, organização política e ideológica, entre outros. É na vivência histórica do
cotidiano e nos símbolos aí usados que a cultura e o Evangelho se concretizam. Para que o Evangelho possa
inculturar-se, é necessário: — reconhecer a gratuidade do próprio Evangelho; — haver respeito para com a
diferença antropológica e teológica; — descobrir afinidades e possibilidades de complementaridade e articulação
entre ambos. Não basta um optar pelo outro. Ambos precisam vincular-se numa única opção. A identificação pode
acontecer em duas dimensões: o evangelizador se identifica com a cultura do outro, ou este se identifica com a
cultura do evangelizador. Jesus se encarna em Nazaré, mas se identifica com a vontade de Deus e não com os
nazarenos. "O Evangelho protege em solidariedade fraterna a alteridade, a identidade e a perspectiva" de futuro
de cada grupo e pessoa.
O Evangelho, como gratuidade plena, protege contra qualquer degradação, também ideológica. Por isso,
o Evangelho pressupõe inculturação, na qual objetivos e caminhos se fundem. O agente evangelizador que se
incultura pode falar de suas propostas, da história da salvação que perpassa a história das pessoas e a realidade
de cada grupo.
Tillich reconhece que a vida exige decisões diante de situações múltiplas. Optar por uma possibilidade
significa excluir outras. O confronto de duas culturas pode promover exclusão, mas igualmente possibilita
encontros e inculturação. O religioso, o eterno, é uma verdade dinâmica que nos coloca diante de fronteiras e leva
a romper com elas. Fronteiras podem existir entre submissão e autoridade, entre classes sociais, entre teoria e
prática, entre etnias e culturas diferentes, como é o caso de maranhenses e sulistas. Fronteiras e limites também
podem existir dentro de lares e de instituições, na Igreja e na sociedade em geral.
5.6 - Conclusão
Vimos que a IECLB, como Igreja que vem ao Brasil pela imigração, procurou acompanhar seus membros
que se deslocam dos estados do Sul do país para as novas fronteiras no Norte e Nordeste em busca de melhores
condições de vida e de trabalho. Balsas é uma das cidades que acolhe migrantes e, por isso, torna-se lugar de
fronteira, onde acontece o encontro entre etnias, costumes, valores, culturas diferentes. No confronto dos
diferentes, instalam-se situações de conflito, que desafiam para novas possibilidades.
Refletindo sobre fronteira, constatamos que é em situação de limite que se instalam encontros e
desencontros com culturas diferentes. No decorrer da história, o Evangelho encontra as culturas e pede licença
para inserir-se nelas. Tanto o Evangelho quanto a cultura desejam facilitar a vivência da paz, da justiça e da
solidariedade. Para que isso possa concretizar-se, é necessário o respeito pelo diferente e a vivência do amor
cristão. A partir dessa reflexão percebemos que, na verdade, toda nossa vida está marcada por fronteiras.
Como já vimos em Tillich, são muitos os fatores que instalam fronteiras. Mas é onde está o limite que
também surge a possibilidade de se criar o novo, a nova sociedade, novas concepções que induzem à
modernização e à mudança social.
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“Habilitando os santos para o desempenho do ministério”
Evangelho acontece pela Palavra falada e pela fala das obras de amor. Ao refletir sobre aspectos de uma
comunidade diaconal, tivemos dificuldade de separar características do ser Igreja cristã do ser Igreja diaconal. Isto
significa que ou uma Igreja é diaconal e servidora, ou ela não é Igreja cristã, pois a diaconia faz parte da
identidade de uma Igreja cristã.
Ao compararmos a Igreja com a metáfora do corpo de Cristo, percebemos que, em um corpo saudável, os
membros interagem, se ajudam e apóiam mutuamente. Vimos que Hase compara o amor à circulação sanguínea.
Numa comunidade diaconal, esse amor, como o sangue que circula, renova e possibilita a vida, atinge pessoas
que estão excluídas e fragilizadas. Observamos, contudo, que há fronteiras que fragilizam o amor cristão,
favorecendo barreiras excludentes, mas há também sinais do Cristo que ajuda e salva.
Na segunda parte do capítulo, vimos como a IECLB se expandiu pelo Brasil afora ao acompanhar seus
membros migrantes. Esta Igreja de Jesus Cristo é desafiada a envolver-se onde a vida de pessoas está
ameaçada, como também a viver e testemunhar do Deus que ama, que reconcilia e acolhe as pessoas assim
como elas são, dentro e fora dos muros eclesiais. Também a Irmandade se abriu para novos desafios a partir do
encontro com o próximo fragilizado e foi ao encontro de culturas diferentes.
Reconhecemos que a crise social e política vigente no país nas décadas de 60 e 70 ajudou a IECLB e a
sua Irmandade a se abrirem para novas realidades. Com isso, Igreja e Irmandade começaram a voltar-se mais
para o povo empobrecido e a ser sensíveis aos pedidos de quem está à margem e distante do Sul do país.
Assumindo novos desafios, Igreja e Irmandade confrontam-se com situações de fronteira. Sociologicamente, o
lugar de fronteira é caracterizado como área de conflito social. Ele aparece onde existe encontro com o diferente,
onde há situações-limite. Balsas se torna um exemplo dessa experiência. Constatamos que uma Igreja é
desafiada a viver o amor cristão e a colocar sinais do Reino de Deus, sinais de esperança e vida que ultrapassam
barreiras e fronteiras étnicas, culturais e sociais.
De acordo com a história "oficial" das Irmandades, citada neste capítulo, foram destacados nomes de
homens que motivaram e favoreceram o seu surgimento. Sabe-se, contudo, que mulheres desempenharam papel
decisivo tanto na trajetória das Irmandades, quanto na vida e diaconia das igrejas cristãs. Muitos desses nomes
permanecem ofuscados e ocultos. Isso se repete na história da Igreja até os dias atuais. Desejamos evitar que
isso aconteça na história da comunidade de Balsas. O capítulo dois do presente trabalho permitirá conhecer o pro-
cesso de formação desta comunidade, a qual é edificada com a participação de obreiras do Ministério Diaconal.
Verificamos que, nas comunidades da IECLB, existem expressões diaconais voluntárias. A partir do
desafio cristão, pessoas são solidárias e ajudam-se mutuamente, mas poucas comunidades têm trabalhos
diaconais organizados, com objetivos definidos, inseridos na sociedade local. Falta uma metodologia diaconal
apropriada, coordenada por profissionais da diaconia. Por vezes, falta a consciência de que a diaconia é um dos
fatores imprescindíveis na edificação de comunidades, que ela é essência do ser Igreja cristã e que a Palavra
requer o testemunho do amor para ter crédito. A Comunidade Evangélica de Balsas ensaia a ajuda mútua desde o
início de sua história, marcada pela atuação de obreiras diaconais. Com isso, o exemplo de Balsas oferece
indicativos para a edificação de comunidades diaconais.
A IECLB dispõe de dois centros de formação diaconal. Ambas as instituições consideram a vida
comunitária, a comunhão, essencial para o trabalho diaconal, razão por que existem hoje duas comunhões
diaconais na IECLB: a Irmandade, que congrega as diaconisas, e a Comunhão de Obreiros Diaconais (COD), que
congrega os diáconos e as diáconas.
Constatamos que, na área da diaconia, há muito a ser construído em termos de marco teórico, com vistas
à edificação de comunidades diaconais. Essa lacuna afeta também a formação de obreiros e obreiras. Este
trabalho confrontou-se com a referida deficiência e teve de lidar com ela. Segundo Rodolfo Gaede Neto, a
diaconia é uma "disciplina teológica emergente (...), que se encontra ainda em fase de busca de sua conceituação
contextualizada, de seu lugar como disciplina teológica e de sua fundamentação teológica".
Não há, pois, como esquivar-se de ampliar a reflexão, especialmente a partir da nossa realidade.
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