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Memórias - primeira aula (22/08/2018)

Fundamentos da Educação
“Não há mal nenhum em ser ambíguo”1

O primeiro debate da disciplina Fundamentos em Educação II nos traz inquietações


imediatas sobre o sentido de nossas presenças nas pós-graduações, sobre as implicações e
responsabilidades que, enquanto pesquisadores/as, teremos e temos com a produção do
pensamento e conhecimento em Educação. São elementos disparadores dessas inquietudes
questões como: que tipo de criança, que tipo de professor, que tipo de sociedade temos e
queremos? Todo modelo educacional é pensado para um determinado modelo de
país/sociedade/indivíduo e está fundamentado em algum projeto de mundo, é partindo dessa
compreensão que podemos pensar na educação como processo de assujeitamentos e também
de emancipação.

Como destaca Antônio Severino (2006) a escola se configura como um território


ambivalente, como esse lugar da ambiguidade, nos espaços educativos temos um “cabo de
guerra” sendo jogado e, nessa brincadeira séria e disputada, identificamos dois pontos
centrais: objetividade e subjetividade, ou seja, ela envolve os projetos maiores de sociedade e
os projetos pessoais e existenciais dos/as sujeitos/as. Essa ambiguidade permite que um
mesmo território atue, de um lado, como agente reprodutor ideológico do Estado e, de outro,
como agente de formação contra ideológico. Metaforicamente poderíamos pensá-la não como
uma ponte (para o progresso, manutenção do status quo ou emancipação), mas como uma
encruzilhada que bifurca e dá acesso a rotas múltiplas.

Penso que um dos pontos centrais desses debates é compreendermos quais são as
concepções de educação e de escola que temos, em quais bases epistemológicas estão
fundamentas e quais são os principais autores/as que fizeram e fazem parte de cada momento
e processo sócio histórico e teórico. Compreender historicamente a formação do pensamento
educacional, principalmente no que tange as sociedades modernas e pós-modernas foi um dos
pontos trazidos pelos teóricos estudados nesse primeiro encontro.

Os modelos educativos ocidentais são resultado do conjunto sócio, político e cultural.


Caminhamos numa breve linha do tempo na qual foi possível observar como se organiza a
teoria educacional ocidental. A partir das contribuições de Ghiraldelli (2000) identificamos

1
Frase da música “Umbigo” de Tetê Espindola. Disponível em: https://www.kboing.com.br/tete-
espindola/umbigo/.
quatro Revoluções na Teoria Educacional, de acordo com o autor, nos séculos XIX e XX
tivemos três delas (modernas) cujas principais ideias foram trazidas por teóricos como
Herbart, Dewey e Paulo Freire e a desde o final do século XX e início do XXI estaríamos em
meio a quarta revolução (pós-moderna), que teria como representantes principais Donald
Davidson e Richard Rorty. Como elementos chave desses momentos temos em Herbat, a
emergência da mente; em Dewey a emergência da democracia, em Freire a emergência do
oprimido e, a quarta revolução teria como elemento central a metáfora (para Davidson a
metáfora não necessariamente seria algo descodificável/ou a ser explicado e entendido do
ponto de vista cognitivo).

Em articulação com os debates provocados pelos textos dos autores, assistimos ao


documentário “Escolarizando o mundo: o último fardo de homem branco” (2010) de Carol
Black. A cineasta elabora uma crítica bastante decolonial ao sistema de educação de bases
modernas implementado em regiões do sudeste asiático, ela vai nos mostrando ao longo do
seu trabalho como se dá o processo de “imposição” de um modelo ocidental de escola e
pedagogia em comunidades camponesas no Himalaia. Enquanto as leitura nos levam a
compreender um pouco melhor as bases (modernas) do nosso sistema educacional, o
documentário permite que nossa reflexão avance no sentindo de tecermos uma crítica a esse
modelo, questões centrais como a ideia de universalização do ensino/escola, uma promessa da
modernidade que visava contribuir para construção de uma sociedade voltada para o trabalho
e para um determinado conceito de progresso têm permeado nossas existências como
alunos/as, como educadores/as, como sujeitos/as sociais de modo geral.

Ainda não conseguimos uma conciliação epistemológica e prática que nos diga que
essa promessa de universalização seja possível. Universalizar para quê e para quem? No
âmbito das relações de poder e consumo da sociedade capitalista em que vivemos, talvez
tenhamos que pensar mais em pluriVersar como mais adiante os teóricos e teóricas pós e
decoloniais nos provocarão a debater.

O final do Documentário “Escolarizando o Mundo” termina com uma canção que nos
remete a metáfora da caixa, a ideia de que a educação (nos moldes ocidentais hegemônicos)
estaria nos colocando em pequenas várias caixinhas, seres todos iguais...Não penso que seja
apenas isso, acredito que os processos educativos são mesmo ambíguos e complexos e, é
exatamente nesse ponto que talvez more o sentido de nossas presenças nesse espaço de
produção de conhecimento.

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