Escolar Documentos
Profissional Documentos
Cultura Documentos
https://www1.folha.uol.com.br/fsp/1995/1/11/ilustrada/21.html Página 1 de 3
Folha de S.Paulo - Lasch ataca elites com sensacionalismo - 11/1/1995 24/02/2021 18(06
elite do país.
O tom inteiro do artigo é inequivocamente reacionário. Lasch diz que,
enquanto as elites estão preocupadas com aborto, racismo, liberdade
sexual e progresso ilimitado, as "massas" é que sabem muito bem o
valor da estrutura familiar "como fonte de estabilidade num mundo
turbulento" e possuem "um sentido altamente desenvolvido dos
limites que Ortega y Gasset identificava com a civilização".
A nova elite, diz Lasch, tem "pouco senso de gratidão com os
ancestrais ou obrigação em cumprir com as responsabilidades
herdadas do passado. (...) Falta-lhe a continuidade que deriva de um
sentido de território e de padrões de conduta cultivados
restritivamente e passados de geração para geração".
Salta aos olhos o conservadorismo dessas considerações. Lasch está
apenas notando o seguinte: existe uma minoria da população
americana que não é nacionalista, que não tem preconceitos contra
homossexuais, que preza a liberdade individual e que confia numa
"liberação" do indivíduo frente aos tabus familiares, ao "american
way of life", ao fundamentalismo religioso.
É então que Lasch arranca os cabelos e, assumindo a pose de "crítico
cultural", ataca essa "elite", fazendo o elogio das classes médias e
baixas dos Estados Unidos, que têm vínculos de fidelidade ao passado
nacional, respeito às próprias tradições e inclinação para "fazer
sacrifícios".
O argumento de Lasch é ultraconservador, populista e inexato.
Começando de um ponto óbvio: por que acusar elites cosmopolitas e
liberais de renegar os valores do Ocidente? Se estes valores são a
família, a homofobia, a religião, Lasch está certo. Mas os valores do
Ocidente sempre ferem algo mais do que isto.
Dizem respeito à liberdade individual, ao debate de idéias, à busca
pela verdade, à crítica do preconceito. Não é na classe baixa
americana que encontraremos representantes de Freud e de Voltaire.
Seria possível dizer, até, que o ímpeto das "elites" americanas contra
o preconceito e a favor do "politicamente correto" é ele próprio
obscurantista, tolo e puritano. Mas o ponto de vista de Lasch é
oposto.
Escandaliza-se com a falta de "nacionalidade e de senso de sacrifício"
das camadas superiores da sociedade americana. Nacionalidade e
senso de sacrifício nunca significaram, a meu ver, outra coisa senão:
disposição para ser morto num campo de batalha.
Há um ponto, contudo, em que Lasch tem razão. Aplica-se tanto aos
Estados Unidos como ao Brasil. É o do progressivo distanciamento
entre classes baixas e classes altas –tanto do ponto de vista
econômico quanto do ponto de vista ético e cultural. Trata-se de lutar
contra isto. E Lasch está certo ao notar a extrema resistência das
"massas" em face de tudo o que signifique liberação sexual, aborto,
irreligiosidade, cosmopolitismo etc.
Nesse ponto, é claro que as "elites" –elas sim, representantes do
legado intelectual do Ocidente– se sentem frustradas. O povão
continua tão supersticioso, preconceituoso e crédulo quanto o era há
300 anos. Talvez um pouco menos.
https://www1.folha.uol.com.br/fsp/1995/1/11/ilustrada/21.html Página 2 de 3
Folha de S.Paulo - Lasch ataca elites com sensacionalismo - 11/1/1995 24/02/2021 18(06
Copyright Empresa Folha da Manhã S/A. Todos os direitos reservados. É proibida a reprodução do conteúdo desta página em
qualquer meio de comunicação, eletrônico ou impresso, sem autorização escrita da Folhapress.
https://www1.folha.uol.com.br/fsp/1995/1/11/ilustrada/21.html Página 3 de 3