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Os sociólogos distraídos e a invasão ideológica nas Ciências Socia…ial com José de Souza Martins - Instituto Humanitas Unisinos - IHU

12/02/2021 17'06

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Os sociólogos distraídos e a invasão


ideológica nas Ciências Sociais. Entrevista
especial com José de Souza Martins

Foto: Agência Brasil

Por: Patricia Fachin | 24 Fevereiro 2020

Nos últimos 20, 30 anos, os sociólogos brasileiros


estiveram distraídos e “não prestaram atenção na direção em que as
mudanças estavam acontecendo, porque achavam que elas estavam
indo na direção contrária à da que se viu depois”, diz o sociólogo José
de Souza Martins. Mais recentemente, diante de uma “mudança brutal
na sociedade brasileira”, muitos ficaram surpresos, quando não havia
razões para surpresas.

De acordo com o professor Martins, a distração dos sociólogos


brasileiros com os rumos do país sinaliza um outro problema: a invasão
ideológica neutralizou a ciência. “Houve uma ideologização da
produção do conhecimento sociológico, aquela coisa do
politicamente correto, a coisa do engajamento. Mas a prioridade de
qualquer trabalho sociológico não é nem engajamento nem o

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politicamente correto. O sociólogo tem que ser objetivo; esse é um


princípio básico da ciência. Houve muita condescendência com esse
voluntarismo político que foi muito marcante no Brasil, e que
produziu análises que não servem para nada no fim das contas”, critica.

Na entrevista a seguir, concedida pessoalmente à IHU On-Line na


última terça-feira, 03-09-2019, quando esteve na Unisinos
ministrando a aula magna dos 20 anos do Programa de Pós-
Graduação em Ciências Sociais, cujo título foi “O Brasil ideológico
e desatento: Mudanças sociais e políticas e uma nova agenda de
prioridades temáticas da sociologia”, José de Souza Martins explica
a importância do método científico para fazer ciência e sugere um
retorno aos clássicos. “O que acho que houve a partir de 1964 foi que as
pessoas perderam a perspectiva do método, as ciências sociais e a
sociologia se expandiram pelo Brasil e se passou a fazer sociologia
imaginando que, usando conceitos, se faz ciência. A ciência não é feita
de conceitos. Conceitos são muletas que usamos para ir demarcando o
terreno da análise. Mas a questão central é a do método, do método
lógico, do método de explicação conectado com o método de
investigação”.

Ele também reflete o impacto das ideologias nas resoluções dos


problemas sociais, como o da questão agrária, que não se modificou. “A
atualização da minha interpretação da questão agrária já está feita,
porque a questão agrária não se modificou depois disso, ela parou ali,
isto é, houve uma derrota clara das lutas populares, uma acomodação e,
portanto, nenhuma novidade aconteceu depois disso”, afirma.

José de Souza Martins durante a Aula Magna (Foto: Frame do Youtube)

José de Souza Martins é graduado em Ciências Sociais, mestre e


doutor em Sociologia pela Universidade de São Paulo - USP. Foi
professor-visitante da Universidade da Flórida e da Universidade de
Lisboa e membro da Junta de Curadores do Fundo Voluntário da ONU
contra as Formas Contemporâneas de Escravidão, de 1998 a 2007. Foi

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professor da Cátedra Simón Bolívar, da Universidade de Cambridge


(1993-1994) e atualmente é professor titular aposentado da USP. Entre
suas obras, destacamos Exclusão social e a nova desigualdade
(São Paulo: Paulos Editora, 1997), A sociabilidade do homem
simples: cotidiano e história na modernidade anômala (São
Paulo: Contexto, 2000), Linchamentos: a justiça popular no
Brasil (São Paulo: Editora Contexto, 2015) e Do PT das lutas
sociais ao PT do poder (São Paulo: Editora Contexto, 2016).

A entrevista a seguir foi revisada pelo entrevistado após a publicação da


primeira versão, publicada em 09-09-2019.
Confira a entrevista.
IHU On-Line - A primeira parte do título da sua aula magna
no curso de Ciências Sociais da Unisinos é “O Brasil
ideológico e desatento”. Em que sentido o senhor está
empregando essas palavras e desde quando o Brasil está
“ideológico e desatento”?

José de Souza Martins – Eu faço uma crítica a uma certa distração


dos sociólogos brasileiros, que nos últimos 20, 30 anos, não prestaram
atenção na direção em que as mudanças estavam acontecendo, porque
achavam que elas estavam indo na direção contrária à de que se viu
depois.

Faço a crítica da distração e da falta de


prontidão dos sociólogos brasileiros,
de uma certa vulnerabilidade ao que
parece, mais do que aquilo que é - José
de Souza Martins

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IHU On-Line – Em que sentido especificamente?

José de Souza Martins – O Brasil não foi na direção suposta pelos


governos e muito menos pelos sociólogos e, de repente, há uma
mudança brutal na sociedade brasileira e fica todo mundo surpreso.
Surpreso com o quê? Não há que ficar surpreso; significa que o pessoal
estava distraído. Então, faço a crítica da distração e da falta de
prontidão dos sociólogos brasileiros, de uma certa vulnerabilidade
ao que parece, mais do que aquilo que é. Isso não é bom para um
sociólogo. O sociólogo não pode fazer isso.

IHU On-Line – Nem os jornalistas.

José de Souza Martins – Sim, mas o sociólogo menos, porque o

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jornalista sempre tem a desculpa de que as notícias mudam de um dia


para o outro. Mas os sociólogos não podem dizer isso de jeito nenhum.

IHU On-Line – Por que o senhor avalia que os sociólogos


estavam distraídos nos últimos anos? Identifica alguma
razão?

José de Souza Martins – Houve uma ideologização da


produção do conhecimento sociológico, aquela coisa do
politicamente correto, a coisa do engajamento. Mas a prioridade de
qualquer trabalho sociológico não é nem engajamento nem o
politicamente correto, da ilusória certeza na linearidade do processo
histórico. O sociólogo tem que ser objetivo; esse é um princípio básico
da ciência. Houve muita condescendência com esse voluntarismo
político que foi muito marcante no Brasil, e que produziu análises que
não servem para nada no fim das contas.

Houve uma ideologização da produção


do conhecimento sociológico - José de
Souza Martins

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IHU On-Line – A sua crítica se estende aos últimos 20, 30


anos. Então, ela não diz respeito somente aos sociólogos
ideólogos do PT? O senhor está falando de um processo que
iniciou antes?

José de Souza Martins – Estou falando também deles. Claro que a


sociologia em todos os países e em todas as sociedades reflete muito o
que aquela sociedade é e as dificuldades pelas quais ela está passando.
No Brasil, a sociologia acadêmica não nasce com Gilberto Freyre, mas
com a missão francesa que funda a Universidade de São Paulo e
nos traz padrões de trabalho científico. O primeiro professor de
sociologia da USP foi [Claude] Lévi-Strauss, que depois se tornou um
etnólogo famoso. Depois veio o Roger Bastide. Todos eles vieram
para o Brasil para escapar do que estava acontecendo na Europa: não
só na questão política stricto sensu - também por isso -, mas para
escapar do racionalismo exacerbado, da ideia de que a razão explica
tudo, de que tudo se resume nela. Eles sabiam que havia lugares no
mundo, como a África e a América Latina, em que a razão não
reinava. Era residual e adjetiva, como continua sendo. Bastide era
protestante, calvinista, de uma família de sobreviventes da Noite de
São Bartolomeu. Ele veio para o Brasil para estudar a cultura
negra, o candomblé, e se tornou filho de santo para poder entrar
nesse universo. Ele faz uma sociologia muito criativa parceira da
antropologia.

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Durante muito tempo a sociologia no Brasil foi uma sociologia como que voltada para entender os bárbaros

e civilizá-los - bárbaros eu é que estou falando -, mas para compreender o homem simples, primeiramente.

A ideia era fazer da sociologia um instrumento de mudança social – ela foi introduzida para formar

professores para a escola primária -, uma ponte entre pessoas que estavam à margem da sociedade e as

conquistas da sociedade moderna, como o desenvolvimento industrial, por exemplo. A sociologia no Brasil

se preocupou, durante muito tempo com as chamadas resistências sociais à mudança.

No fim dos anos 50, começo dos anos 60, quando me tornei aluno da universidade, essa perspectiva era

dominante e aprendíamos sociologia em função disso. Durante o período em que eu estava no curso,

aconteceu uma virada, que foi a da influência do nacional desenvolvimentismo, expressão do projeto de

nação do getulismo e do juscelinismo, expressos em obras de autores como Roberto Símonsen e

Celso Furtado.

O nacional desenvolvimentismo é o desenvolvimento social e


econômico voltado para dentro. A ideia era que o Brasil tinha que
deixar de ser colônia, reduzido à economia agrícola de exportação,
como o açúcar e o café. O país tinha a alternativa da industrialização
apoiada na valorização do mercado interno. Houve uma grande aliança
de classes sociais voltadas para fazer do Brasil um país moderno, mas
brasileiro. Foi o período do boom industrial, da indústria
automobilística, um momento bonito da sociedade brasileira. A
sociologia compreendeu e assumiu o desafio de estudar e analisar as
mudanças sociais na perspectiva das dificuldades do que era
historicamente possível. Aquele foi o período em que Fernando
Henrique Cardoso – que foi meu professor – foi aluno e professor na
USP, além de Octavio Ianni e os pesquisadores que se dedicaram ao
seminário semanal sobre o método em O Capital, de Karl Marx. Aí
vem o golpe de 1964, que enterrou isso tudo. Da noite para o dia,
mudou a temática da sociologia brasileira: enquanto projeto de estudo,
já não valia; aquele projeto histórico não dera certo.

Fernando Henrique defendeu a sua tese de


livre-docência no fim de 68 e, no começo de
69, ele foi cassado pela ditadura
ditadura,, assim
como outros professores de ciências sociais
do Brasil. Ele terminou a tese de livre-
docência em ciência política, perguntando:
subcapitalismo ou socialismo
socialismo?? É a coisa
mais precisa que já se definiu em termos das
dificuldades de compreensão dos processos,
porque era isso mesmo. A esquerda achava
que estávamos marchando para o
socialismo
socialismo;; não diziam qual socialismo, nem
sabiam qual era, porque todo mundo era
anti-stalinista. E, ao mesmo tempo, a

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alternativa capitalista do nacional


desenvolvimentismo era subcapitalista
subcapitalista,, era
uma subcolônia.

Nós vivemos, a partir de 1964, um período muito longo de


oposição pura e simplesmente, sem entender que as alternativas
para o Brasil eram justamente as de falta de alternativa. Não nos
deixaram nenhuma alternativa: as novas gerações não têm nenhuma
alternativa, os cientistas não têm nenhuma alternativa. Estamos sendo
transformados em colônia, de um país que avançou lá na frente e que
nos trata como um país lá de trás.

Vou tentar fazer uma crítica à sociologia perdida que estamos


fazendo: tudo fragmentário. Não tem um projeto de nação por trás
das ciências sociais.

IHU On-Line - É possível perceber, no seu percurso


intelectual e na sua produção acadêmica, uma análise
metassociológica e uma preocupação com o método de
pesquisa em ciências sociais. Inclusive, na introdução do seu
livro “Exclusão social e a nova desigualdade”, que é dos anos
1990, o senhor critica o fato de os conceitos terem um lugar
central em algumas análises sociológicas que tentam explicar
o social, porque esses conceitos funcionam como rótulos e
não captam o social propriamente dito. Em outras palavras, o
senhor diz que “os militantes não derivam os conceitos da
práxis, mas procuram fazer da práxis a realização dos
conceitos”. Em outro artigo publicado neste ano, o senhor
voltou a tratar da ideologia na ciência. O que eu gostaria de
perguntar é o seguinte: em que momento do seu percurso
intelectual o senhor se deu conta de que esse fenômeno
ocorre nas ciências sociais e como começou o seu processo de
fazer uma meta-análise das ciências sociais?

José de Souza Martins – Eu fiz toda a minha formação no grupo


de Florestan [Fernandes], na USP e, nesse grupo, a questão do método
precede todas as outras questões. Eu fui educado nessa linha. O que
acho que houve a partir de 1964 foi que as pessoas perderam a
perspectiva da precedência do método, as ciências sociais e a
sociologia se expandiram pelo Brasil e se passou a fazer sociologia
imaginando que, usando conceitos, se faz ciência. A ciência não é feita
de conceitos. Conceitos são muletas que usamos para ir demarcando o
terreno da análise. Mas a questão central é a do método, do método
lógico, do método de explicação conectado com o método de
investigação. O conceito resulta disso e não isso resulta do conceito.
Essa é a crítica forte que farei na palestra de hoje à noite [03-09-2019].

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As ideologias que têm invadido a


sociologia são as ideologias de
esquerda, de um marxismo mal
digerido, desvinculado do método
dialético, que é puramente conceitual-
José de Souza Martins

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Foi lá por 1975 que dei a minha virada. A chave não é só aplicar o
método, mas descobrir o que a realidade investigada, na perspectiva
do método, te obriga a fazer para pensar essa realidade. Os três
métodos científicos fundamentais explicativos usados na sociologia
são métodos produzidos na Inglaterra, na Alemanha e na França.
Na sociologia, os métodos científicos expressam o que determinada
sociedade é, sua estrutura social, seus valores, sua mentalidade. De
certo modo, os métodos correspondem às singularidades das
sociedades que os inspiraram. Os professores da Missão Francesa,
na USP, vieram atrás de descobertas no campo do singular e original, o
diferente em relação ao já conhecido.

IHU On-Line – A análise metassociológica é um processo que


o sociólogo ou os pesquisadores de outras áreas conseguem
perceber somente a partir da maturidade do
desenvolvimento das suas pesquisas?

José de Souza Martins – Depende da educação intelectual que ele


teve. Eu comecei a me dar conta de uma coisa diferente da linha em que
vinha, porque meus professores foram cassados e, de repente, junto
com um grupo da minha geração, que ainda não deveria estar
assumindo funções de orientação, fui obrigado a assumir funções de
criação interpretativa num grupo que ou fazia isso ou morria. A ideia, a
partir da perspectiva metodológica, passa a ser, então, tentar descobrir
o que é o Brasil de fato. Era isso que o grupo já vinha fazendo, mas
esse fazer fora interrompido. O que é o Brasil de fato? O que o
Brasil nos diz? Todas as sociedades têm a sua singularidade e o que se
tem hoje é que todo mundo copia o que os americanos fazem, o que os
europeus fazem. Mas isso não tem nada a ver com o Brasil, ou tem
muito pouco. Uma realidade social como a brasileira pede a
recriação das interpretações. Não adianta aplicar uma sociologia
parsoniana no Brasil, que não vai explicar nada. Nós temos que
descobrir o que é o Brasil, quem nós somos. É o que aconteceu com
Lévi-Strauss, que estava em Mato Grosso conversando com um
xamã indígena e o xamã contou para ele um mito nambiquara. Nesse
momento, deu um estalo na cabeça do Lévi-Strauss; é o momento
exato em que nasce o estruturalismo lévi-straussiano. Por que isso
aconteceu? Porque ele tinha formação teórica. Podia desenvolver um
método correspondente à realidade que estava observando, que virá a

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ser o seu estruturalismo. Então, a linha que tínhamos na USP – e isso


se perdeu lá também – era a linha da prontidão para ver
sociologicamente a realidade em situações que não pareciam
relevantes.

O Brasil foi gerado como sociedade do


avesso e não se liberta desse avesso;
tudo é pensado no avesso: agimos no
avesso, pensamos no avesso, e todo
mundo acha “bonitinho” - José de
Souza Martins

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Brasil: a sociedade do avesso


Estou trabalhando mais recentemente o fato de que o Brasil é uma
sociedade do avesso – esse é tema de um livro meu que deve sair
nos próximos meses. O Brasil foi gerado como sociedade do avesso e
não se liberta desse avesso; tudo é pensado no avesso: agimos no
avesso, pensamos no avesso. Temos que enfrentar essa singularidade. O
México, por exemplo, é outra sociedade: não é a sociedade espanhola,
não é a sociedade inglesa; é a sociedade mexicana, só tem lá. E Brasil só
tem aqui, então temos que identificar as singularidades da
sociedade brasileira para explicá-la sociologicamente.

IHU On-Line - Como a ideologia presente na ciência se


manifesta nas ciências sociais? Pode nos dar exemplos de
abordagens sociológicas ideológicas no Brasil, ou de que
ideologias têm determinado as pesquisas sociológicas?

José de Souza Martins – Nas ciências, não só na sociologia, a


ideologia está presente nos pressupostos extra-científicos da pesquisa e
da interpretação. Pressupostos religiosos têm condicionado, limitado e
orientado análises científicas, bloqueando-lhes a criatividade
investigativa e interpretativa. No Brasil, no último meio século, não foi
incomum, na sociologia, o pressuposto de uma evolução linear da
sociedade em direção à superação do capitalismo. Mesmo quando, no
mundo inteiro, o comunismo entrou em crise e regrediu para o
capitalismo. O próprio capitalismo já não é o capitalismo clássico, da
crítica da economia política. No Brasil é um capitalismo inacabado,
eivado de sobrevivências pré-capitalistas e atalhos não capitalistas. Não
reconhecer isso, sociologicamente, tem sido uma deformação ideológica
maximalista que compromete nossa sociologia como autoconsciência
científica da sociedade, a que se referia Florestan Fernandes, na
linha do sociólogo alemão Hans Freyer.

As ideologias que têm procurado aparelhar a sociologia são ideologias

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de esquerda, de um marxismo mal digerido, desvinculado do


método dialético, puramente conceitual. Vi um trabalho nos anos 1970
de uma antropóloga que fez um estudo sobre uma tribo do Xingu e
aplicou a categoria de modo de produção - que é uma categoria
marxista – para explicá-la, o que não tem cabimento. Sem contar que o
próprio Karl Marx escreveu trabalhos etnográficos e nunca cometeu
esse erro. Acho que há um pseudoesquerdismo difuso que
demarcou e empobreceu nosso pensamento sociológico ao estabelecer
um cerco à sociologia com base na ideia de que a revolução é inevitável
e só é boa a sociológica politicamente correta.

A realidade atual, não só no Brasil, desmente esse pressuposto. É a da


força social e política do repetitivo e do reprodutivo das relações
sociais, em detrimento do transformador e revolucionário. Tenho dado
cursos e escrito artigos e livros sobre isso. As condições e possibilidades
das transformações sociais e políticas são outras em nossos dias, em
comparação com as do fim do século XIX e início do século XX. O
tempo e a força da revolução deslocou-se para o modo de vida e as
brechas históricas da vida cotidiana. Henri Lefebvre e Agnes Heller
deram o grande salto interpretativo nessa linha de compreensão da
sociedade contemporânea.

Isso não quer dizer que seja ideológica a linha da ciência de todos os
sociólogos. Mas isso pode, às vezes, se fazer presente na sala de aula
através de uma pressão ideológica que vem dos partidos através
de alunos. É preciso saber dialogar com as diferentes correntes do
pensamento científico. Se o pesquisador considera que ciência é só
aquilo que ele acha isso não é ciência e ele nem precisa ficar na
universidade.

IHU On-Line - Hoje, pesquisadores são impedidos de


ministrar palestras em universidades por movimentos
estudantis de caráter sociopolítico. O senhor já foi vítima
disso pelo menos três vezes em universidades brasileiras e
essa prática tem sido comum nos EUA. Do mesmo modo,
alguns professores são questionados pelo uso de alguns
textos teóricos, porque tais textos “afetariam a sensibilidade”
de estudantes. A que o senhor atribui esse fenômeno e quais
as implicações disso para o fazer científico, especialmente na
área de ciências sociais, e para o debate acadêmico e público?

José de Souza Martins – Isso está acontecendo porque


historicamente a ciência não é ideologia nem se vincula a partido
político. Isso não quer dizer que os membros de partidos políticos não
devam se interessar por ciência, ao contrário. Acontece que os grupos
partidários, no caso brasileiro concretamente e da esquerda, estão
muito fragilizados e, rigorosamente, a esquerda passa por uma crise de
público no Brasil e há fatores para isso: a desindustrialização esvaziou a
classe operária; o operário está sendo substituído por máquinas. Na
região do ABC já existem fábricas em que não há nenhum operário. A

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profissão de Lula, torneiro-mecânico, se ele quisesse voltar para uma


fábrica, não existe mais. Sei disso porque sou do ABC e meu irmão é
ferramenteiro especialista em ferramentas leves de alta precisão, mas a
profissão dele desapareceu Hoje tem um computador que faz de
maneira muito melhor o que ele fazia.

A esquerda passa por uma crise de


público no Brasil e há fatores para isso
- José de Souza Martins

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A classe operária de fato, hoje, está numa situação difícil: em nosso país em que há 13 milhões de

desempregados. Não se pode ser classe nessa situação, porque classe só existe quando a categoria social

tem uma vontade peculiar dela, em que ela reivindica, pressiona e dirige o processo político em função de

identidade e vontade de classe. O reduto que sobrou para a esquerda é a universidade e não são todas as

áreas da universidade, mas as Humanas. Porém, sem qualquer conexão vital com uma categoria social que

dê sentido a suas manifestações.

IHU On-Line - As críticas que o senhor fazia nos anos 1990


também são reiteradas hoje. Alguns teóricos afirmam que as
universidades brasileiras e os intelectuais importam teorias
estrangeiras, como o marxismo, o estruturalismo, a teoria de
gênero, o feminismo, o pós-colonialismo, para interpretar os
fenômenos sociais do Brasil. Por que essa prática se acentuou
na universidade?

José de Souza Martins – Não tem sentido recusar a leitura de


autores estrangeiros e não tem sentido a falta de familiaridade com
os clássicos e autores teoricamente criativos. A criatividade teórica e
interpretativa da sociologia entre nós tem dependido e depende de
enraizamento do pensamento sociológico na sociedade brasileira. Não
só naquilo que é parecido com o que é próprio das sociedades de
origem as teorias sociológicas, mas também e sobretudo naquilo que é
próprio de nossa sociedade e que nos faz diferentes e mesmo
divergentes delas.

A metodologia, sim, se aplica a qualquer sociedade que tem as


características que foram referência daquela metodologia. Nós não
temos uma teoria nossa, uma metodologia brasileira. O
estruturalismo lévi-straussiano foi desenvolvido a partir da
conversa com o xamã porque havia um francês culto na frente dele que
era capaz de entender antropologicamente o que ele estava dizendo.

Fui professor na universidade de Cambridge, na Inglaterra. Meu


college, Trinity Hall, é um dos mais antigos de Cambridge, é de 1350.
Vizinho dele, tem outro muito mais jovem, que é de 1500 e alguma

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coisa, que foi o college de [Isaac] Newton. Na entrada do Trinity


existe um gramado e no meio tem uma macieira plantada, a qual é
descendente direta da famosa macieira da maçã que não caiu na cabeça
de Newton, mas caiu em sua frente. Junta muita gente, especialmente
japoneses, orientais, que ficam adorando a macieira. Por que ela é
importante? Ela não é importante; importante é Newton. Ela é
simbolicamente importante porque caiu quando Newton estava
sentado no horto do college com seus cadernos, tomando notas e
refletindo sobre o problema de pesquisa que o desafiava naquele
momento. À luz da pesquisa que Newton estava fazendo, a maçã não
caiu, ela foi atraída pelo centro de gravidade da Terra. Se você for um
cientista, você entende o que está acontecendo. Se você não for um bom
cientista, não perceberá as revelações do rotineiro.

Nós temos excelentes cientistas sociais no Brasil, porque tiveram


excelente formação metodológica e eles são capazes de ver as coisas,
dar uma explicação científica para elas e aprender com elas, porque o
cientista não é o que fica explicando que aquela planta é assim e tal; ele
interage: a coisa diz para ele algo e ele devolve explicando aquela coisa,
porque a situa, decifra e explica. As novas gerações tem
dificuldade percorrer esse caminho, especialmente aqui, em que
são tantos os desestímulos à pesquisa científica.

IHU On-Line – Isso acontece por quê? Há um problema de


formação nas universidades nos últimos anos?

José de Souza Martins – Além do desestímulo crônico, que


mencionei, sem sempre os governantes e as autoridades encarregadas
do trato com as áreas da educação, da cultura e especificamente da
ciência são qualificadas. É o problema do cerco ideológico que cerceia e
desqualifica a ciência. Eu sou um grande admirador de Lula, um
político comparativamente diferençado, não sou petista nem tenho
vínculo partidário com nenhum partido. A primeira vez que encontrei
com ele foi a pedido dele. Praticamente dei uma aula para ele sobre a
questão agrária que ele ouviu atentamente. Ele é um dos políticos
brasileiros mais inteligentes. Um dos grandes erros e problemas dele
foi, invariavelmente, ter depreciado os títulos acadêmicos. Essa é uma
obsessão de Lula. Ele tem dado frequentes demonstrações de que sofre
por ter sido sucessor de um intelectual de competência
internacionalmente reconhecida. Fernando Henrique – que conheço
bem, fui aluno dele e sou leitor de suas obras -, é um homem de
grandes méritos intelectuais, é um grande cientista. Ele é o único
ganhador do que é considerado o Prêmio Nobel de Sociologia – o
Prêmio da Biblioteca do Congresso dos EUA, que é equivalente
ao Prêmio Nobel –, e foi presidente da Associação Internacional
de Sociologia. Depois de ser presidente, voltou à sala de aula como
professor da Brown University, nos Estados Unidos. Ao fazer
deboche dos títulos e diplomas universitários, Lula estimula nos
estudantes universitários a ideia de que os livros não servem para nada,
o diploma não serve para coisa nenhuma.

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IHU On-Line - Como diferenciar o que é ideologia do que é


ciência em ciências sociais? Qual é o critério de demarcação
entre ideias científicas e não científicas na sociologia?

José de Souza Martins – A ideologia é orientada por valores,


quase sempre valores de grupo ou percepções individuais de valores de
grupo. Expressam interesses. A motivação é a de confirmar as
convicções extracientíficas de quem pesquisa, mesmo quando se
engana ao supor que sua verdade é a verdade inteira. Se você for
católico e não conseguir neutralizar o seu catolicismo ao fazer
sociologia, fará uma sociologia limitada ao que quer ou pode ver,
viesada ideologicamente. Se você for protestante, o viés vai ser
outro. Se você não for nada, pior ainda, porque não vai conseguir lidar
com uma sociedade como esta que é de pessoas religiosas. Eu não vou
discutir a qualidade da religiosidade do brasileiro, mas são pessoas que
acreditam; mesmo quem diz que não acredita, crê em alguma coisa. O
Brasil é um país em que um milhão de habitantes tem fé, mas não tem
religião, não tem opção confessional. Na pesquisa sociológica
tenho que ser objetivo, o que não quer dizer contra. Tenho que
desenvolver uma compreensão científica das crenças como objeto de
conhecimento e não como instrumento de conhecimento. Isso vale,
também, para o senso comum. Todas essas modalidades
extracientíficas de compreensão da realidade a deformam, são viesadas
do ponto de vista científico, embora tenham pleno sentido no vivencial.
A alienação do trabalho é socialmente necessária à justificação e
legitimação subjetiva da exploração do trabalho, sem a qual essa
exploração seria insuportável e comprometeria a reprodução social da
relação de exploração. A ideologia deforma e acoberta o real, ao mesmo
tempo que viabiliza a reprodução deformada do real.

Se você é – e isso aconteceu muito nos últimos anos – petista, não lê


quem não é petista. Eu passei por essa situação inúmeras vezes na
minha vida, de me questionarem, de porem em dúvida a objetividade
do conhecimento sociológico que produzo porque não é petista e não
sendo petista só pode ser dos inimigos do PT. Houve situações
cômicas. Depois da conversa que tive com o Lula, ele recomendou que
diferentes grupos de lulistas do Brasil inteiro conversassem comigo,
porque o PT estava querendo entrar na questão agrária e não sabia
nada sobre o assunto, incluindo os agraristas do partido, mais
acadêmicos de gabinete. O primeiro grupo que me chamou por
sugestão do Lula foi a Central Única dos Trabalhadores – CUT.
Passei um dia inteiro ministrando um curso no Sindicato dos
Metalúrgicos de São Bernardo, para cerca de mil pessoas. Num certo
momento, o presidente da CUT reagiu porque ele achava que ao
descrever os problemas sociais do campo, que são dramáticos e muito
mais dramáticos do que os da classe operária, eu estava diminuindo a
classe operária, porque ela é o “nó” da história.

Depois, fui dar um curso na Universidade do Ceará e um grupo do


PT veio me procurar. Convidou-me para almoçar no domingo na casa

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de um deles. Não estava claro que era um grupo do PT, mas eles
insinuaram que Lula tinha sugerido que conversassem comigo. Eu
chego lá, tudo muito simpático e à vontade – era uma conversa
informal –, aí me dei conta de que era um grupo do PT. Esclareci que
eu não era membro do PT mas estava à disposição para conversar, se
quisessem. Expliquei-lhes que não era membro de partido político nem
pretendia ser. Era o que já havia dito a Lula. O almoço esfriou na hora;
eles não conseguiram almoçar nem conversar comigo. O que
aconteceu? A ideologia se sobrepôs à possibilidade de uma conversa
sobre sociologia.

Um dos grandes erros e problemas de


Lula foi, invariavelmente, ter
debochado dos títulos acadêmicos -
José de Souza Martins

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Isso acontece com os alunos. A sociologia, enquanto ciência, é objetiva: um biólogo que está

estudando a minhoca não se apaixona por ela, porque não serve para nada se apaixonar pela minhoca. Da

mesma forma, se você estuda um grupo humano X, você não pode se converter ao grupo, você nunca será

membro daquele grupo porque você é outra pessoa. Então, o que tem que fazer é assumir a sua alteridade e

observar objetivamente de fora para dentro, sabendo quais são suas limitações, porque você não é daquele

grupo. Poderá viver com ele, mas sempre será o outro.

Se pensarmos num grupo indígena, por exemplo, eles têm valores que não se revelam imediatamente,

não são discursivos, eles não vão fazer uma sociologia ou uma antropologia para você; eles são eles e você é

quem tem que descobrir e, objetivamente, entender que a humanidade é feita de diferenças. Há homem e

mulher, que são diferentes, existem crianças que vão se tornar adultas e que são diferentes; as pessoas

mudam e se ressocializam. Então, temos que estar atentos a isso tudo. O pesquisador não pode determinar

o que a sociedade deve ser e nem fazer o que Bolsonaro faz. Para ele, ser brasileiro é ser o que ele acha

que é, e o que ele é não é brasileiro; esse é o detalhe. Ele recebeu uma educação de quartel, por isso ele tem

as limitações da visão de mundo instituição que o educou., como eu posso ter as minhas. O sociólogo

trabalha objetivamente quando consegue situar e relativizar todas essas diferenças.

A sociologia que eu faço é


uma sociologia de descoberta: estou de
prontidão para me surpreender - José
de Souza Martins

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IHU On-Line - Os intelectuais ou militantes que se apaixonam

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por partidos não têm, de outro lado, uma preocupação


genuína com questões sociais e por isso se vinculam
apaixonadamente a partidos ou teorias que acham que
representam suas preocupações?

José de Souza Martins - Certamente tem eles preocupações


genuínas com as questões sociais. Mas, porque limitados pelos
imperativos ideológicos da militância partidária, quando nela
se envolvem, isso não torna suas análises objetivas e científicas. O que
empobrece o próprio sentido que, com a ciência de viés ideológico,
querem dar à sua militância. São cientistas com bloqueios e limitações.
Tenho um pé atrás em relação às análises eu fazem. Frequentemente,
deixam um rastro de insuficiências no que analisam. Quase sempre é
uma sociologia enquadrada, sob cerco. A sociologia que faço é uma
sociologia de descoberta: estou de prontidão para me surpreender; essa
é a minha atitude e todo o cientista deveria fazer o mesmo. Por isso é
que existe, em todas as ciências, “serendipity” [feliz descoberta ao
acaso], que é o nome de uma ilha que foi descoberta por acaso. O
cientista tem que estar aberto para essa possibilidade. Foi assim que o
escocês Alexander Fleming descobriu a penicilina, em 1928. O
cientista tem que estar de prontidão científica para as revelações do
acaso. Ideologia não leva a descobertas de valor científico.

IHU On-Line – E com o DNA.

José de Souza Martins – E com o DNA. Aliás, sobre o DNA tem


uma historinha lindíssima: o DNA foi descoberto em Cambridge. Um
dos descobridores era do Clare College, que é o college de Fernando
Henrique Cardoso, que foi professor em Cambridge, e o outro é do
Gonville and Caius College. Eles faziam a pesquisa no
Laboratório Cavendish, que, se olhar o lugar, ninguém acredita que
uma revolução da ciência aconteceu ali. Eles se reuniam lá e todos os
sábados saíam do laboratório e iam almoçar no pub Eagle, que existe
desde 1667, localizado a 50 metros do laboratório. Num sábado, eles
estavam indo para o Eagle e no meio do caminho um deles, Francis
Crick, decidiu voltar ao laboratório para fazer mais um teste. Vinte
minutos depois ele chegou no pub “branco como uma cera” e disse para
James Watson: “acabamos de descobrir o segredo da vida”. O dono do
pub mandou colocar uma placa com essa frase na fachada da casa e a
mesa em que eles estavam quando isso aconteceu ainda está lá. A
pesquisa tem esse lado de aventura, mas uma aventura que só tem
sentido se você estiver trabalhando com as categorias da ciência, senão,
é só mais uma cervejinha.

IHU On-Line - Quais são as teorias sociais que têm crescido


na academia brasileira e quais suas implicações políticas e
sociais para o debate público?

José de Souza Martins – As teorias são as mesmas; nada de novo


aconteceu nas ciências sociais, na sociologia em particular, desde o

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último grande teórico que foi Max Weber. A partir disso, tudo o que
se fez depois foi desenvolvimento das possibilidades teóricas daquilo
que os clássicos já tinham formulado. No Brasil, a sociologia, de certo
modo, parou na obra de Florestan Fernandes e de seus discípulos
mais próximos. Mesmo aí, com a preocupante evidência de que a
sociologia de Roger Bastide, de Florestan, de Fernando Henrique
Cardoso, de Octavio Ianni, de Marialice Mencarini Foracchi
raramente é citada e raramente entra nos cursos de formação dos novos
cientistas. Em minha própria escola, num curso sobre relações raciais, a
obra de Florestan não foi incluída na bibliografia, embora ele tenha se
tornado um reconhecido sociólogo da questão racial. Gilberto Freyre
não só saiu do horizonte , como é satanizado pelas novas gerações
porque sua obra colide com o politicamente correto de certos grupos.
Minha tese é que para sair do imobilismo, é importante voltar aos
clássicos e reconstituir uma sociologia brasileira a partir dos clássicos,
porque o Brasil mudou muito. Temos que nos redescobrir no retorno
aos clássicos, sobretudo para rever aquilo que abandonamos.

No meu modo de ver, é hora de reler


atentamente Fernando Henrique
Cardoso - José de Souza Martins

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IHU On-Line - Há clássicos na sociologia brasileira que


deveriam ser retomados?

José de Souza Martins - Sim. Os clássicos devem ser relidos


sempre. Hoje, eu começaria um curso de introdução à sociologia com
Roger Bastide. Estou cada vez mais encantado com as coisas dele que
estou revendo – estou nesse voltar atrás. Ele era um homem incrível,
que trabalhou com a ideia de estruturas sociais profundas. Hoje se
discute a questão dos negros e das cotas. Bastide foi o grande
especialista na questão racial no Brasil, ele mergulhou de cabeça nisso,
se apaixonou pelo tema, foi à África com Pierre Verger, fotógrafo
francês radicado na Bahia, que fotografou o candomblé. Escreveu um
trabalho pequeno de baseado numa pesquisa sobre sonhos, de negros.
O que você sonha tem a ver com aquilo que você é.

Descobriu que boa parte dos negros – a pesquisa foi feita em São Paulo
– não sonha como negro, ou seja, eles não são mais negros; eles
sonham como brancos, o imaginário onírico de muitos negros é branco.
São negros aqueles que sonham com os ancestrais e com eles
conversam, pedem e ouvem conselhos. É a negritude. O candomblé faz
essa ponte, pois você fala com as entidades do candomblé e com os
ancestrais e eles te dão conselhos. Se você está sofrendo, está penando,
eles têm uma saída, te ajudam a compreender o que está acontecendo.

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Então, a negritude é isso, não é a cor da pele simplesmente.

É importante fazer a releitura de Florestan Fernandes. Seu melhor


trabalho de resposta para uma situação como a nossa não foi reeditado,
seu livro “Ensaios de Sociologia Geral e Aplicada” (Biblioteca
Pioneira de Ciências Sociais, 1960). Nós não desenvolvemos sua
proposta teórica de uma sociologia aplicada no Brasil. A sociologia
ficou indiferente às possibilidades de sua aplicação em face das
decorrências socialmente problemáticas do nosso desenvolvimento
econômico.

Eu leria não só o grupinho da USP e da Escola de Sociologia e


Política de São Paulo, bem como os “solitários” de várias regiões que
produziram trabalhos decisivos para compreender o Brasil em
perspectiva brasileira, no Rio, em Minas, em Pernambuco. Fizeram
pesquisas no momento em que a sociologia brasileira era muito
promissora; nós abandonamos o que eles estavam fazendo. O legado
da sociologia, em todas as partes, aqui também, é muito mais o das
perguntas ainda não respondidas, as indagações teoricamente
reveladoras, as dúvidas pendentes cujas respostas carecem de teoria e
de inovação teórica. É claro que, no meio do caminho, entre os
pioneiros e a geração mais jovem, muita coisa se fez, novas questões
foram levantadas, pesquisas esclarecedoras foram realizadas. Mas
estamos passando por um momento de “brazilianização” de nossas
ciências sociais, de estrangeirização das perguntas, de estranhamento
em relação ao que somos e ao que podemos. Um momento que pede
aos cientistas sociais a insurgência corajosa da redescoberta explicativa
do Brasil. Um grande desafio sem dúvida.

IHU On-Line – Há muitos anos o senhor afirma que existe


uma crise do pensamento crítico no Brasil. O que significa
falar nestes termos, em crise do pensamento crítico, uma vez
que praticamente todo mundo se julga “crítico” no debate
público?

José de Souza Martins – Falo do pensamento crítico na perspectiva


sociológica. Um dos reflexos na sociologia brasileira, sobretudo na
formação das novas gerações, é que muitos entendem que pensamento
crítico é o pensamento antagônico, sobretudo em relação àquilo de
que discordamos por motivos ideológicos ou partidários. O pensamento
crítico, na sociologia, é o pensamento que conduz à revisão de
interpretações científicas vencidas por novas descobertas, que pedem a
revisão do já conhecido e nela as novas questões a desafiar o
conhecimento existente.

O pensamento crítico é o pensamento que vê a si mesmo na


perspectiva sociológica, ou seja, você só pode fazer sociologia crítica
se situar sociologicamente a sociologia que você faz para poder ver as
insuficiências que nela há.

O pensamento crítico passa pela desconstrução das interpretações. A

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grande proposta metodológica nesse sentido é de Henri Lefebvre, o


grande dialético do século XX, que desenvolveu um método bem
simples. Método que Sartre reconheceu como a melhor formulação do
método dialético, que Lefebvre define como método regressivo-
progressivo.
Nessa perspectiva a sociologia decompõe a narrativa, a descrição da
realidade, de um primeiro momento de impressão do que a realidade é.
Em seguida, a partir do atual já descrito, o sociólogo faz a sua
desconstrução, define a estrutura e a data histórica da gênese dessas
relações. A realidade social é compreensível pelas determinações do
desenvolvimento desigual de suas estruturas. Ao fim do processo, o
pesquisador faz o retorno à superfície de partida, ao atual. Reconstitui
as conexões dos momentos e suas recíprocas e desencontradas
determinações, a unidade do diverso. A unidade das contradições que
desafiam a práxis dos personificadores das relações sociais desses
momentos e de suas necessidades sociais. Sejam elas as necessidades
radicais, que abrem à sociedade o desafio e a possibilidade da
transformação social e da revolução social. Sejam elas as necessidades
de revitalização do mesmo, do repetitivo, do mero reprodutivo. Sejam
elas as necessidades do novo na mera forma mimética da cópia e do
fingimento.

Um dos reflexos da ideologia na


sociologia brasileira, sobretudo na
formação das novas gerações, é que
muitos passaram a entender que
pensamento crítico é o pensamento
antagônico - José de Souza Martins

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A sociedade muda muito depressa. Há cinco anos nós achávamos que a


sociedade brasileira era uma. Neste momento, já não sabemos o que
ela é. O pensamento crítico nos leva a fazer o que estou chamando de
desconstrução, uma palavra que bem define o método.

IHU On-Line - Como o senhor atualizaria as suas pesquisas


hoje à luz do Brasil atual? A partir das pesquisas que o
senhor fez ao longo da sua produção intelectual e acadêmica
sobre questões como os conflitos no campo, a questão da
terra, sobre as vítimas de processos sociais, políticos e
econômicos excludentes, que novas abordagens sociológicas
diria que precisariam ser consideradas para compreender
esses fenômenos hoje no Brasil?

José de Souza Martins – Minha obra tem dois grandes conjuntos: o


primeiro conjunto é o da questão agrária, com o qual trabalhei

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muitos anos, e o outro conjunto é o da questão suburbana e da vida


cotidiana. Minhas linhas de pesquisa são as seguintes: fazer uma
sociologia urbana é importante, mas o urbano num país como o Brasil
não se explica nos moldes clássicos da explicação do que é a cidade, em
termos de pesquisa. O segredo do urbano está aqui,
metodologicamente, no suburbano, no urbano que não se constitui: o
urbano das insuficiências, do incompleto, do inacabado, das lutas
operárias pela cidade. O centro é o centro do poder e do monumental,
Não é o lugar dos conflitos transformadores, mas dos conflitos pelo
poder.
Questão agrária
Desde os meus primeiros trabalhos sobre a questão agrária – que são dois artigos que publiquei em 1969, já

como resultados de pesquisas no campo– até os mais recentes, inclusive um publicado pela Editora da

Universidade Federal do Rio Grande do Sul - UFRGS, que não teve nenhuma divulgação, intitulado “O

Sujeito Oculto”, sobre reforma agrária, e o que foi publicado pela editora da USP, sobre o mesmo o

assunto, chamado “Reforma Agrária — o impossível diálogo”, não há descontinuidade. Eu não estou

me repetindo. Fui fazendo descobertas a partir das pesquisas e do trabalho de campo. Fui para o campo,

para a Amazônia, para fazer minha pesquisa decisiva e conclusiva sobre o peculiar da questão agrária no

Brasil: não o confronto entre o capital e a propriedade da terra, mas a anômala aliança entre capital e terra,

que responde pelo subcapitalismo do capitalismo brasileiro. Um problema já analisado em “O Cativeiro

da Terra”, de 1979 (9ª. edição, revista e ampliada, Editora Contexto, São Paulo, 2010). “Fronteira: a

degradação do Outro nos confins do humano” (Editora Contexto, 2009) é um livro de minhas

descobertas, sobre a sociedade do limite, estava lá e aquilo era muito revelador do que é o Brasil.

Então, a atualização da minha interpretação da questão agrária já está feita, porque ela não se modificou

depois disso, chegou ao seu limite. Houve ali uma derrota das lutas populares pela terra, apesar de

seu implícito projeto socialmente transformador, de valorização e modernização da cultura agrícola popular

e familiar. Os próprios governos do PT não compreenderam o profundo alcance social da luta pela

reforma agrária e de suas metas inovadoras e valorizadoras do capital social representado pela

agricultura familiar. Venceu o afã de poder e a opção preferencial pela aliança com o grande capital e o

agronegócio.

IHU On-Line - A questão fundiária continua sendo a fonte da


maioria dos problemas sociais do Brasil?

José de Souza Martins – Continua sendo. O lamentável drama é


que o Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem Terra - MST,
que poderia ter conseguido dar outro encaminhamento para a questão
agrária no Brasil, entrou para ser derrotado, porque entrou para fazer
trabalho ideológico em nome de um equívoco. O de achar que o
marxismo vê na questão agrária e no campesinato um fator da
revolução social; ele nunca viu. O próprio Marx é extremamente
crítico em relação aos camponeses, que, para ele, são a força do
conservadorismo. Não obstante, a reforma agrária, que é uma reforma
social, se completada, poderia representar a extensão das bases da
democracia ao campo.

O grande drama, o lamentável drama,

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é que o MST, que poderia ter


conseguido dar outro
encaminhamento para a questão
agrária no Brasil, entrou para ser
derrotado, porque entrou para fazer
trabalho ideológico - José de Souza
Martins

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Minha tese é que ser força do conservadorismo não é um defeito. A tradição conservadora em todo

o mundo, e no Brasil também, é carregadíssima de informações preciosas e de valores sociais preciosos

para a renovação do mundo, porque a tradição conservadora é inimiga da coisificação da pessoa. O

proletariado não luta contra a coisificação, de que não tem consciência, o que é o grande erro do

proletariado, das lideranças. O Sul do Brasil que é ainda campesino, familista e religioso, é um reduto da

tradição conservadora, é onde se tem o Brasil mais bem realizado. Onde não tem isso, não deu certo, e é por

causa dos valores precários relativos à coisificação da pessoa nas insuficiências de um capitalismo

patológico, não por causa do marxismo.

Se o MST, em particular, tivesse sido menos ingênuo, no sentido de ser menos instrumental, teria, por

exemplo, negociado com o governo Fernando Henrique. Ele é um especialista em questão agrária e na

questão do trabalho escravo — eu o conheço bem, fui aluno dele, trabalhei com ele e somos amigos até hoje.

Quando fracassou a política agrária de seu governo com o massacre de Eldorado dos Carajás, quando

ficou claro que não adiantava entregar a política agrária para os banqueiros porque eles não iriam fazer

uma reforma social, ele chamou Raul Jungmann [que foi ministro do Desenvolvimento Agrário e

ministro extraordinário de Política Fundiária do governo FHC].

Primeiro, Jungmann foi às livrarias e comprou todos os livros sobre a questão agrária. Leu tudo e foi atrás

dos autores que tratavam desse assunto. Ele me chamou em Brasília e queria que eu fosse seu assessor. Eu

não tinha condições de ser assessor de governo, sobretudo devido a meus compromissos de ensino e

pesquisa na Universidade de S. Paulo, mas poderia fazer sugestões. As sugestões que fiz foram as seguintes:

“Você tem que ir às universidades onde estão sendo feitas pesquisas sobre a questão agrária. Converse com

os pesquisadores e procure se reunir com eles ou em Brasília ou em outro lugar ao menos uma vez por mês

para avaliar o que você está fazendo”. Ele fez isso: se reuniu em São Paulo, em Brasília, criou um órgão no

governo, dirigido por um professor da USP, Juarez Brandão Lopes, para tratar desse assunto. Jungmann

era a pessoa que mais entendia o MST e estava disposto a levar a diante a reforma agrária, como levou. Seu

gesto mais ousado, nunca reivindicado por qualquer movimento pela reforma agrária, foi o de cobrar dos

proprietários, os grande latifundiários da região amazônica, a apresentação dos documentos relativos à

cadeia dominial das propriedades, isto é, foi atrás da legitimidade ou não do direito que invocavam sobre

terras, não raro de posse legítima de índios e posseiros. Milhões de hectares de terras foram arrecadados

pelo governo federal porque careciam de fonte de legitimidade.

Eu me lembro de uma conversa com FHC em que ele apostava na possibilidade de que, via a política de

agricultura familiar que o MST preconizava, seria possível criar uma alternativa de desenvolvimento

econômico e social em cima dos valores da família. O João Pedro [Stédile] não estava aberto para o

diálogo; foi uma pena. Mas o que eles [MST] fizeram, fizeram bem. Outro dia mesmo eu vi um

documentário sobre um assentamento no Rio Grande do Sul: é fascinante o que essas famílias fazem em

torno dos valores de família, sem contar as inovações técnicas de que são capazes em terras perdidas pelo

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latifúndio por gestão temerária e incapacidade de recorrer a meios simples e à organização comunitária do

trabalho.

Se a mercadoria vai ser o núcleo da vida, os problemas sociais no campo vão se agravar. A mercadoria é

coisa e é uma coisa que coisifica as pessoas. Isso é próprio da grande produção industrial. Mas não é

próprio da agricultura familiar e da agricultura comunitária. Nestas, a mercadoria está a serviço delas. No

agronegócio as pessoas estão a serviço da mercadoria. Por aí podemos fazer a reforma agrária que

quisermos e daqui a um ano esse pessoal vai estar vendendo a terra, que é o que tem acontecido. Em São

Paulo houve vários casos. Por exemplo, houve o caso doloroso de uma grande fazenda de produção de

cana-de-açúcar no interior paulista que foi à falência e o governo se apropriou das terras por causa das

dívidas com impostos e fez um programa de reforma agrária. O que aconteceu? Um ou dois anos depois, os

colonos que foram assentados pelo governo, que poderiam fazer seu programa de reforma agrária, estavam

arrendando seus lotes para o mesmo dono que tinha ido à falência, para fazer a mesma monocultura de

cana-de-açúcar que ele tinha feito antes. Sem o inconveniente de imobilizar capital na propriedade da terra,

limitando-se ao muito menos do aluguel. Não dá; tem que ter uma mística. Essa foi uma coisa que eu disse

uma vez para o João Pedro, em Goiânia: você tem que ter uma mística; se não tiver, não faz reforma

nenhuma.

O Sul do Brasil que é ainda campesino,


familista e religioso, é um reduto da
tradição conservadora, é onde se tem o
Brasil mais bem realizado - José de
Souza Martins

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IHU On-Line – Problemas urbanos, como a questão do


tráfico, da proliferação das milícias, também têm relação
com a questão agrária?

José de Souza Martins – São duas coisas diferentes: a questão da


terra urbana e a questão rural agrícola. A política da reforma
agrária foi derrotada, especialmente com a eleição de 2018, isso está
bem claro. Antes que se destrua a cultura da economia agrícola de
família — e ela vai ser destruída, pois daqui a duas ou três gerações não
teremos mais quem queira ficar no campo — ainda é possível, num país
que tem 13 milhões de desempregados, criar uma coisa como os
kibutz em Israel, criar uma alternativa de economia autônoma,
criativa, ambientalista e natural.

O caso do Rio Grande do Sul, que mencionei, é o de uma fazenda que


faliu e que produzia pêssego. O governo ficou com a fazenda e fez
reforma agrária. Os colonos chegaram no local e lá estava cheio de
pessegueiros, nos quais os fazendeiros anteriores usavam agrotóxicos e
a terra estava toda contaminada. Esse pessoal teve apoio dos estudantes
de agronomia e fez um trabalho lindíssimo: não ficaram ancorados no
desconhecimento, foram atrás de quem tinha conhecimento, gente

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muito simples, mas muito ladina. A tentativa foi manter os


pessegueiros, mas primeiro tiveram que desintoxicar o terreno, e uma
coisa que eles fizeram, a partir da conversa com os estudantes, foi
borrifar leite de vaca nos pessegueiros para evitar que as moscas
pusessem ovos de um verme que come a fruta por dentro. Essa mosca
não prolifera onde tem proteína, então, o leite revestia as flores com
uma camada de proteína e a mosca não colocava o ovo. É uma coisa
natural, inteligente, científica, barata e antiamericana.

IHU On-Line - Por que o senhor elaborou suas pesquisas


sociológicas a partir de uma visão antieconomicista, que se
recusa a compreender os fenômenos sociais como sendo
redutíveis à economia e à política? Hoje, por exemplo, diante
da crise climática, econômica e social, muitos teóricos
sugerem pensar uma nova economia. Inclusive, o papa
Francisco está convocando os jovens economistas a pensar
sobre essa questão.

José de Souza Martins – O papa Francisco está cometendo um


erro; ele deveria convidar os sociólogos para neutralizar os
economistas. Os economistas — você não precisa ler um livro para
saber disso — mandam no mundo: tudo é a bolsa de valores, os
economistas e a taxa do dólar. Nós estamos sob uma tirania, que é a
tirania dos economistas. Eles estão destruindo conquistas dos direitos
sociais em nome da economia, e da economia em benefício do
particular, de alguns, do capital; a sociedade não vai recuperar
facilmente o que está perdendo.

Há, porém, um economicismo na análise sociológica que vem da


esquerda, que foi a esquerda do marxismo vulgar, como era chamado
por [Georg] Lukács, que reduz tudo à economia, porque a economia
explica o desenvolvimento das forças produtivas e, sem o
desenvolvimento das forças produtivas, não existe a revolução social.
Não é bem assim e nunca foi assim em lugar nenhum. Para poder ter
uma visão crítica dessa praga que é a economia explicando
tudo e não explicando nada, num país como o Brasil, temos que ter
uma visão sociológica que seja também antropológica, porque nós
somos diferentes. Você sabia que no Brasil ainda falamos português
com sotaque nheengatu, além de um monte de palavras originárias da
língua tupi que usamos no cotidiano? A lógica implícita nessa língua
corresponde a outra concepção do homem e das coisas, que pressupõe a
perenidade do que não morre.

O papa Francisco está cometendo um


erro; ele deveria convidar os
sociólogos - José de Souza Martins

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Em Portugal, eles falam comendo todas as vogais e falando só as


consoantes e tem lugares em que não entendemos o que as pessoas
falam. A influência tupi em nossa língua brasileira se deu pela invasão
das vogais na língua portuguesa. Sempre dou um exemplo que acho
incrível: flor. No Nordeste é “fulô”, ou seja, na língua portuguesa tem
uma só vogal e três consoantes, mas democratizamos, usam-se duas
vogais e duas consoantes, porque do contrário, não se consegue falar.
Da mesma forma, “oreia”: se tira um monte de consoantes e se
colocam vogais. Isso adoça a língua, ela fica suave. Nós falamos isso
naturalmente e somos bilíngues. Eu não escrevo “oreia”, mas me pego
falando assim. Então, nós não somos exatamente aquilo da receita
livresca do falar correto. Tem que ter a visão de que fomos feitos assim,
essa combinação de múltiplas influências. Nós massacramos os índios,
mas eles massacraram a língua portuguesa, civilizando-nos por meio de
um dialeto de combate à língua de poder.

Muito da resistência democrática


nesses últimos 30 anos vinha das
mulheres dos bairros pobres que
tinham uma aguda consciência de
onde estavam os fatores das injustiças
sociais - José de Souza Martins

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IHU On-Line - Como o senhor, enquanto um sociólogo


enraizado na sociedade brasileira, pensa a sociologia
brasileira e os seus desafios para tratar questões sobre
desigualdades? Qual é o papel das ciências sociais no
entendimento e na compreensão deste fenômeno que faz
parte da nossa sociedade?

José de Souza Martins – A sociologia tem feito a crítica das


expressões econômicas das desigualdades, porque estamos
discutindo as desigualdades com base em critérios econômicos. Mas as
desigualdades não são só econômicas. A discussão sobre o modo
como a mulher é tratada numa sociedade ou o modo como os
jovens são tratados, não tem a ver com a questão econômica; tem a ver
com outras coisas. Aqui pensamos as desigualdades como violação da
igualdade jurídica a todos assegurada pela Constituição.
O que falta aqui é aceitar o direito à diferença como um direito inerente
ao pressuposto da igualdade jurídica. Tomando como referência a
questão do gênero: mulher é mulher, homem é homem. São diferentes.
Mulher procria, homem só procria junto. Ambos procriam na diferença
que os une. Estou me referindo a uma diferença fundamental e natural,

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que depende de elaborações culturais em diferentes sociedades e em


diferentes épocas da história social. Aqui fazemos a crítica vulgar da
diferença em nome da igualdade jurídica, que é outra coisa. Nessa
perspectiva equivocada, acabamos por achar que o diferente não em as
suficientes próprias para ser juridicamente igual. Nessa concepção, o
diferente acaba por ser tratado como desigual.

A desigualdade tem a ver com o fato de que uma cultura, uma


experiência social enraizada, torna injusta a diferença entre homem e
mulher. Mas existe a contrapartida disso: o fogão é um poder e quem é
dono do fogão é dono de tudo dentro da família, da mesa, dos ritos
domésticos. Quem de certo modo descobriu isso foi o [Leon] Trótski,
que escreveu um trabalho sobre a vida cotidiana e fez uma
avaliação da revolução russa nessa perspectiva , curiosamente, muito
sociológica. A revolução não entrava nas casas das famílias. A
mulherada não queria a intromissão da revolução na vida da família.
Elas não queriam cozinha coletiva; queriam a cozinha delas, porque
pela mediação da cozinha da família, elas garantiam a unidade familiar,
e isso era um poder.

Em Cuba — eu fui como jurado do Prêmio Casa de las Américas,


um prêmio literário — tive a chance de conversar três vezes com Fidel,
duas vezes com Raul e conversei com a figura mais importante da
família, que era o Ramon, que não era político. E foi dele que ouvi
estas coisas: o governo cubano fez a reforma agrária, que foi um
problema e também gerou problemas que já tinham sido gerados na
União Soviética. A reforma agrária era coletivista e este era o
problema, porque algumas famílias não aceitaram que as parcelas
fossem unificadas num grande empreendimento e o governo depois
criasse núcleos urbanos nas áreas rurais. Além disso, todo o serviço
doméstico era modernizado e coletivizado para as mulheres não
ficarem presas aos fogões — essa era uma crítica que os intelectuais
faziam, mas não perguntavam para as mulheres o que achavam dessa
inovação social. Eu sou a favor de que a mulher não fique presa ao
fogão, mas ela tem que participar do processo e decidir.

Fomos com o Ramon ver o projeto do Valle Picadura, que virou


uma grande pastagem moderna para a pecuária renovada com o
cruzamento de gado rústico e nativo com gado canadense e holandês. O
objetivo era multiplicar a produção de leite, de modo que todas as
crianças o tivessem. Olhando de cima do morro, viam-se as casas
caipiras, iguais às nossas, de pessoas que não aceitaram participar do
programa com todas as vantagens que o governo estava oferecendo em
compensação. Isso significa que tem algo a mais na resistência: a
unidade da família, a questão de manter os filhos na terra, ou seja, eles
preferiam ser pobres, mas ser eles mesmos e não agentes de projeto
social de um partido político.

IHU On-Line – Que avaliação o senhor faz da revolução


cubana?

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José de Souza Martins – Cuba não teve alternativa e esse foi um


problema. Os EUA tratavam Cuba como a zona do meretrício
deles: os ricaços saíam de Miami para Havana de lancha e
transformaram Cuba em uma “putaria” antes da revolução — isso ouvi
de muitas pessoas. A revolução não era uma revolução socialista
necessariamente, mas os americanos decidiram colocar os cubanos de
joelhos e eles se agarraram à União Soviética. O Partido Comunista
nem participou da revolução e transformou Cuba num país socialista e
essa foi a única alternativa que tiveram; os americanos insistiram no
boicote e não deixaram nenhuma alternativa. Os cubanos fizeram
milagres: transformaram um país de analfabetos em um dos países com
os maiores índices de alfabetização do mundo. Eu fui às escolas em
Cuba e fiquei muito impressionado. Outra coisa, fomos levados à Ilha
de Pinos, numa cidadezinha chamada Gerona. Na praça, os poetas
da ilha se reuniam no fim do dia para ler seus poemas.

A sociedade muda quando quebra as


estruturas que expressam
necessidades radicais e isso é
transformação social - José de Souza
Martins

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Numa escola em Havana, conversei com as crianças matriculadas nas


escolas primárias. Num certo período do ano, eram levadas para a
escola dos Pioneiros de acordo com o interesse profissional que
manifestavam. Nessa escola que visitei, elas conviviam com os
profissionais da profissão pela qual tinham interesse: o profissional ia
fazendo sua atividade e ensinando o que fazia. Naquela época, a única
estação de TV colorida de Cuba era uma estação cujos programas eram
feitos e transmitidos por crianças. A Sony deu todo o equipamento para
eles. Esse lado romântico da revolução não é mencionado e vale a pena.
Cuba fez uma edição do Dom Quixote com papel de bagaço de cana-
de-açúcar, tiraram um milhão de exemplares e os venderam em um dia.
Outras crianças se dedicavam à literatura, e os alunos aprendiam a
escrever poemas. Aqui no Brasil, eu vi coisas dolorosas, como uma
professora da Amazônia que me disse ganhar menos em um mês do
que uma puta ganhava numa noite.

IHU On-Line – Agora, algumas questões conjunturais: já é


possível avaliar qual é ou será o legado da Lava Jato para a
história do país? Algo mudou na sociedade brasileira depois
desse episódio?

José de Souza Martins – Mudou muito. Não satanizo a Lava Jato.

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Os sociólogos distraídos e a invasão ideológica nas Ciências Socia…ial com José de Souza Martins - Instituto Humanitas Unisinos - IHU 12/02/2021 17'06

Eles cometeram erros por serem imaturos e jovens demais e não


entenderam a missão para a qual foram chamados, mas fizeram bem a
missão: colocaram um bocado de gente na cadeia e expuseram as tripas
deste país. O legado da Lava Jato é um legado moral, muito mais
do que político: corrupto vai para a cadeia, não importa o poder que
tenha ou a classe social a que pertença.

IHU On-Line – E a “vaza jato”?

José de Souza Martins – A “vaza jato” é a anti-Lava Jato. A ideia da


“vaza jato” — não questiono as conversas que descobriram — é
desmoralizar a Lava Jato. Os envolvidos na “vaza jato” ainda não
mostraram onde está a boa intenção do que fizeram nem explicaram de
que modo sua iniciativa fortalecerá o combate à corrupção no país.

IHU On-Line - Como o senhor avalia a atuação e o futuro do


PT, do MDB e do PSDB na cena política hoje e que futuro
vislumbra para esses partidos?

José de Souza Martins – Nenhum futuro. Eles atingiram o


vencimento. Também na política, um partido envelhece, desgasta e se
torna ineficaz. Claro que o PT tem seu resíduo de militantes fiéis, mas
não vão conseguir fazer nada porque o líder deles está na cadeia. Não
estou dizendo que é justo ou injusto; é um fato. O PSDB se fragmentou
e caiu nas mãos de pessoas que não têm a mínima identificação com as
ideias sociais democráticas e liberais. O MDB é um partido fisiológico
que não tem mais poder porque, no meu modo de ver, a virada de 2018
foi em boa parte contra o PT, imitando o PT em grande parte, e foi
também contra o MDB, que não é um partido que represente o que o
Brasil precisa.

IHU On-Line - Bolsonaro foi eleito com a bandeira de


combate à corrupção, criticando o “nós contra eles”, mas
repete o jogo do PT em seus discursos e declarações diárias?

José de Souza Martins – Repete o jogo do PT e não vou dizer que é


um erro do Bolsonaro; Bolsonaro é o erro. Provavelmente ele não
acreditava que chegaria ao poder, mas chegou em função de um cenário
de desgaste dos partidos políticos, em particular do PT, que por sua vez
tinha desgastado o PSDB, e não sobrou nada. Sobrou um buraco, tinha
um sujeito fazendo um discurso, então foi eleito. Só que o poder é
maior do que ele, e o poder no Brasil é um poder corruptor. Resta
saber o que vai acontecer. Na eleição do ano que vem, vamos saber dos
primeiros resultados.

Não satanizo a Lava Jato. Eles


cometeram erros por serem imaturos e
jovens demais e não entenderam a
missão para a qual foram chamados,

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mas fizeram bem a missão - José de


Souza Martins

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IHU On-Line - O que impede a elaboração de um projeto de


país para o Brasil?

José de Souza Martins – Já tivemos um projeto de nação com


Getúlio Vargas e os tenentes, depois um projeto no período nacional
desenvolvimentista, com toda aquela diferença política e ideológica,
mas todos sabiam que queriam fazer disso aqui um país capitalista
enraizado com preocupações sociais, uma espécie de capitalismo
social, se é que se pode chamar assim. Funcionou durante uns 20
anos. Depois, nunca mais tivemos um projeto de nação. Tivemos
“antiprojetos”: a ditadura foi um antiprojeto. Este governo é um
antiprojeto.

O vice-presidente Hamilton Mourão, durante a campanha


eleitoral, fez uma conferência na principal loja Maçônica no Rio de
Janeiro, que vale a pena conferir: o projeto é desmontar todo o legado
que está aí e estamos vendo que eles estão desmontando. Mas o que
pretendem colocar no lugar? Eles não têm ideia porque para ter um
projeto de nação, precisa ter competência para articular o mínimo de
coerência e apoio em torno deste projeto, fazer uma coalizão
democrática para o Brasil e para as novas gerações do país. Eles não
têm competência para fazer isso.

Assista à aula magna de José de Souza Martins na Unisinos:

Aula Magna com José de Souza Martins : O Brasil ideológic…

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