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Ter çafeira, 08/03/2011
OPINIÃO DO DIA 2
A reeleição e as falácias dos políticos
Publicado em 06/06/2009 | ADRIANO CODATO E LUIZ DOMINGOS COSTA
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Existem três falácias embutidas no argumento a favor do continu ísmo. A primeira diz respeito ao
“clamor popular”. O conceito de democracia sup õe, evidentemente, que se atenda à vontade dos
eleitores. Mas n ão é apenas isso caracteriza o regime liberal democrático. Outros elementos são
fundamentais na defini ção e na prática da democracia ocidental. Dentre esses, a alternância no
poder e a estabilidade das regras do jogo.
É necess ário que um candidato derrotado nas urnas entregue o governo aos opositores quando
estes forem vencedores. Paralelamente, a oposi ção tem de acreditar que um governante, na
iminência de perder seu mandato nas urnas, n ão vire a mesa e desfaça o acordo legal e t ácito de
que o próximo vencedor assume o poder. Este tipo de confiança, fundamental para garantir a
alternância no poder, só existe com base na f é de todos na legalidade e na legitimidade das regras
do jogo.
Por isso um líder ou um partido que altera as regras do jogo em benef ício próprio sabota dois
princípios fundamentais da democracia representativa, pois abala tanto a confiança que a classe
política deposita no tipo de jogo (a democracia como método de sele ção de líderes) quanto a
confiança popular na natureza do jogo (a democracia como um valor político generoso).
Plebiscitos, consultas periódicas, mandatos mais curtos, mecanismos mais eficientes de controle
sobre os representantes, elei ções para postos pol íticoadministrativos e judiciários, formas de
deliberação alternativas à parlamentar n ão são práticas estranhas a democracias consolidadas.
Nem foram inventadas pelo socialismo bolivariano, como imaginam, escandalizados, os
conservadores. H á muitos mecanismos de participa ção cívica. Nos EUA, em alguns estados elege se
desde magistrados das cortes estaduais at é o administrador regional da prefeitura. Na Fran ça, o
cargo de vereador recebe uma remuneração simbólica (pouco mais de 200 euros), as reuniões s ão
à noite, uma vez por semana e após o trabalho. Os conselheiros municipais se especializam em um
assunto apenas e t êm de prestar contas das suas decis ões, além de ouvir as associa ções civis
envolvidas em cada questão.
No Brasil, junto com a consolidação democrática cristalizouse a ideia errada, na “opinião pública” e
naqueles que fazem a opinião pública, de que democracia é igual a eleições periódicas. E só. E que
os mandatos s ão propriedade dos pol íticos de carreira. O fato de usarem essas posi ções de poder
para, na maioria do tempo, investir na pr ópria carreira e o fato dos eleitores se esquecerem em
quem votaram menos de seis meses depois da “festa da democracia ” dá bem a medida do car áter
limitado do regime democrático entre nós.
Se decidirmos estender os mandatos de cada presidente com alta popularidade no Brasil (de dois
para três, de três para quatro etc.), correremos dois riscos. Primeiro: manter um único presidente
por períodos muito longos, experi ência que dificilmente dá certo. O segundo risco é transferir o
poder de delibera ção não para o eleitorado, mas para os institutos que medem e as empresas que
divulgam a “popularidade ”. Quem já fez pesquisa sabe como podem ser feitas. Al ém de tudo,
sempre pode surgir a mesma proposta, s ó que pelo verso: a destitui ção de governantes por falta
de apoio “popular ” ou por baixos índices de aprova ção da “opinião pública”. Desnecess ário lembrar
como a opinião pública é produzida.
Assim, o que está em jogo hoje n ão é responder ao apelo geral de uma fictícia opinião pública, mas
aos interesses particulares do campo pol ítico. Raciocínio idêntico poderia ser aplicado à “emenda da
reeleição” do doutor Fernando Henrique. Que os pol íticos que apoiaram esta estejam contra a
emenda atual n ão é uma incoerência. É um sintoma da falta de responsabilidade de toda a classe
política com os princípios e pressupostos da democracia liberal.
Adriano Codato é professor de Ciência Política na Universidade Federal do Paraná (UFPR),
coordenador do Núcleo de Pesquisa em Sociologia Política Brasileira (NUSP/UFPR), e editor da
Revista de Sociologia e Política www.scielo.br/rsocp .
Luiz Domingos Costa é cientista político, mestrando em Ciência Política na Unicamp e
pesquisador do Núcleo de Pesquisa em Sociologia Política Brasileira da UFPR. É o editor do
blog http://gacnusp conjuntura.blogspot.com
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