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Morfologia da Língua Portuguesa UNIDADE 02 AULA 03

INSTITUTO FEDERAL DE
EDUCAÇÃO, CIÊNCIA E TECNOLOGIA
PARAÍBA

Estruturas das palavras

1 Objetivos de aprendizagem

„„ Classificar estruturalmente as palavras de Língua Portuguesa;


„„ Analisar e reconhecer as estruturas componentes das palavras.
Estruturas das palavras

2 Começando a história

Olá, Turma! Na terceira aula da disciplina de Morfologia da Língua Portuguesa,


começaremos uma nova unidade, a segunda do curso. Nesta unidade,
estudaremos desde a estrutura que os vocábulos do Português apresentam
até os processos através dos quais as palavras que utilizamos, muitas vezes
diariamente, são formadas.

Você lembra que, na aula anterior, nós discutimos sobre os princípios da análise
mórfica? Pois bem, você deve se lembrar de que as palavras podem ser decompostas
e analisadas a partir dos elementos que as constituem.
Figura 1 E você já parou para pensar sobre os vários elementos que
podem ser utilizados durante a formação das palavras no
Português? Muitas vezes, parece até que as palavras se
formam como um quebra-cabeça, no qual nós, usuários
da língua, vamos juntando peça a peça para formar o
produto final: nosso quebra-cabeça ou, melhor dizendo,
os vocábulos.

Vamos à aula, então!

3 Tecendo conhecimento

Como já foi discutido na aula anterior, o processo conhecido como análise mórfica
está restrito à decomposição dos morfemas em lexicais e gramaticais, o que
possibilita a visualização e compreensão da estrutura vocabular no Português.

Silva e Koch (2005) destacam que os vocábulos da Língua Portuguesa podem


ser constituídos basicamente através de quatro configurações, partindo da mais
simples, na qual há apenas um morfema lexical, à mais complexa, em que há
morfemas lexicais, flexionais, derivacionais, além da vogal temática.

Ribeiro (2009, p. 78), por sua vez, com base na observação das diferentes estruturas
sob as quais os vocábulos do Português se apresentam, constrói uma lista com
oito diferentes formatos nos quais as estruturas nominais da nossa língua se
constituem. Vejamos:

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1) Apenas morfema lexical


Essa configuração caracteriza-se pela ausência de morfemas flexionais e
derivacionais, sendo a palavra formada apenas por seu morfema lexical.
Como em: sol, mar, azul e feliz.

2) Morfema lexical + morfema classificatório


Ocorre quando a palavra apresenta, ao lado do morfema lexical, uma
vogal temática nominal. Podemos citar como exemplos os vocábulos:

I) terra = terr (morfema lexical – radical) + a (morfema classificatório


– vogal temática nominal);
II) livro = livr (morfema lexical – radical) + o (morfema classificatório –
vogal temática nominal)

3) Morfema lexical + morfemas flexionais


Nessa configuração, as palavras apresentam, ao lado do morfema lexical,
os morfemas flexionais, que determinam o gênero (desinência de gênero)
e o número das palavras (desinência de número). Exemplos:

I) garota = garot (morfema lexical – radical) + a (morfema flexional –


desinência de gênero, em oposição ao masculino na palavra garoto)
II) garotas = garot (morfema lexical – radical) + a (morfema flexional –
desinência de gênero) + s (morfema flexional – desinência de número)

4) Morfema lexical + morfema derivacional + morfemas flexionais


Quando se tem, junto ao morfema lexical, um morfema derivacional que
formará, por derivação, um novo vocábulo. Nesse caso, a palavra pode
ainda apresentar flexões. Como em:

I) garotinha = garot (morfema lexical – radical) + inh (morfema


derivacional) + a (morfema flexional – desinência de gênero, em
oposição ao masculino na palavra garotinho);
II) garotinhas= garot (morfema lexical – radical) + inh (morfema
derivacional) + a (morfema flexional – desinência de gênero) + s
(morfema flexional – desinência de número)

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5) Morfema lexical + morfema derivacional + morfema classificatório


Muito semelhante à configuração anterior. Difere-se, entretanto, por
apresentar um morfema classificatório (vogal temática nominal) e não um
morfema flexional de gênero. Todavia, a presença do morfema flexional
de número ainda é possível.

Vejamos a sentença: “a beleza desta mulher é maior que todas as belezas


do mundo”. Analisando os termos destacados, temos:

I) beleza = bel (morfema lexical – radical) + ez (morfema derivacional)


+ a (morfema classificatório – vogal temática nominal);
II) belezas = bel (morfema lexical – radical) + ez (morfema derivacional)
+ a (morfema classificatório – vogal temática nominal) + s (morfema
flexional – desinência de número)

6) Morfema derivacional + morfema lexical


As palavras derivadas através do acréscimo de um prefixo (que vem antes
do radical da palavra) são exemplos dessa configuração. Vejamos:

I) infeliz = in (morfema derivacional – prefixo) + feliz (morfema lexical


– radical)

7) Morfema derivacional + morfema lexical + morfema derivacional + morfema


classificatório
Essa configuração é formada quando se acrescentam, ao formato anterior,
um sufixo (morfema derivacional posterior ao radical) e uma vogal temática.
Como exemplo, temos:

I) infelizmente = in (morfema derivacional – prefixo) + feliz (morfema


lexical – radical) + ment (morfema derivacional – sufixo) + e (morfema
classificatório – vogal temática)

8) Morfema lexical + morfema classificatório + morfema derivacional +


morfema classificatório
A oitava configuração a ser listada apresenta também um processo
derivacional em que há o acréscimo de um sufixo, entretanto, diferentemente
do formato anterior, e ao lado do radical já há uma vogal temática. Vejamos:

I) casamento = cas (morfema lexical – radical) + a (morfema classificatório


– vogal temática) + ment (morfema derivacional – sufixo) + o (morfema
classificatório – vogal temática)
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Quando tratamos sobre a estrutura dos nomes em Português, não podemos


nos esquecer de que, em algumas palavras, por motivo eufônico (SILVA & KOCH,
2005, p. 37), ou seja, para evitar sons que causem estranhamento, os vocábulos
podem apresentar vogais ou consoantes de ligação.

Tomemos, como exemplos, as palavras chaleira e escolaridade. Na primeira, ao


morfema lexical chá é acrescentado o morfema derivacional -eira, entretanto,
para evitar o som estranho e facilitar a produção da palavra, a consoante l aparece
como consoante de ligação. O mesmo acontece com a vogal i em escolaridade,
quando dá junção de escolar com o morfema derivacional -dade.

No que diz respeito às estruturas verbais do Português, Câmara Júnior (2011, p.


104) aponta uma fórmula geral que descreve a configuração dos verbos:

T (R + VT) + SF (SMT + SNP)

Em que T é o tema, composto por R (radical) e VT (vogal temática indicando a


conjugação correspondente: primeira, segunda ou terceira); SF é sufixo flexional
que se compõe através das noções de modo e tempo verbal, marcadas em SMT
(sufixo ou desinência modo-temporal) e pelas noções de número e pessoa, ou
SNP (sufixo ou desinência número-pessoal).

A configuração exposta pela fórmula elaborada por Câmara Júnior está sujeita
a processos de alomorfia e à possibilidade de zero (Ø) – quando não houver ou
o SMT ou o SNP –, no entanto, a fórmula representa, de forma geral, a maioria
das estruturas verbais do Português.

Vejamos alguns exemplos analisados:

TEMA (T)
SUFIXO
Vogal SUFIXO MODO-
Radical NÚMERO-
Temática TEMPORAL (SMT)
(R) PESSOAL (SNP)
(VT)
Ele cant a Ø Ø
Ela cant a rá Ø
Eles cant a Ø m
Elas cant a ri am

Com base no que estudamos, vamos à próxima seção.

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Estruturas das palavras

Exercitando

Leia a seguir um trecho do conto Amor, de Clarice Lispector.

“[...] Certa hora da tarde era mais perigosa. Certa hora da tarde as árvores que
plantara riam dela. Quando nada mais precisava de sua força, inquietava-se.
No entanto sentia-se mais sólida do que nunca, seu corpo engrossara um
pouco e era de se ver o modo como cortava blusas para os meninos, a
grande tesoura dando estalidos na fazenda. Todo o seu desejo vagamente
artístico encaminhara-se há muito no sentido de tornar os dias realizados e
belos; com o tempo, seu gosto pelo decorativo se desenvolvera e suplantara
a íntima desordem. Parecia ter descoberto que tudo era passível de
aperfeiçoamento, a cada coisa se emprestaria uma aparência harmoniosa;
a vida podia ser feita pela mão do homem [...]”

1) Decomponha os vocábulos sublinhados no texto, descrevendo a estrutura


que os compõem.
a) perigosa

b) árvores

c) plantara

d) precisava

e) sólida

f) blusas

g) meninos

h) realizados

i) emprestaria

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j) harmoniosa

2) Considere os vocábulos: íntima e corpo. Procedendo à decomposição e


análise mórfica, teremos:
Íntima = intim (morfema lexical – radical) + a (morfema flexional – desinência
de gênero)

Corpo = corp (morfema lexical – radical) + o (morfema classificatório –


vogal temática)

a) Observando que, na primeira palavra, a vogal representa um morfema


flexional, enquanto na segunda, um morfema classificatório, o que
você pode concluir sobre a diferença entre os vocábulos?

b) Cite e proceda à análise de mais dois exemplos que ilustrem a


mesma ocorrência.

4 Aprofundando seu conhecimento

Como já pudemos perceber durante as aulas que tivemos de Morfologia, as


palavras não surgem do nada, por mais curioso que seja o processo pelos quais
elas se estruturam.

Observar a estrutura das palavras do Português como aquele quebra-cabeça


sobre o qual falamos no início da aula pode, certamente, deixar-nos muito curiosos
para saber como e por que cada peça se encaixa da forma que se encaixa.

A curiosidade é perfeitamente ilustrada nas crianças em Figura 2


aquisição da linguagem, em suas combinações de elementos
que a nós, adultos, podem parecer estranhas.

Como forma de nos fazer pensar um pouco mais sobre o


modo como chegamos a usar a língua (e seus incontáveis
vocábulos), nossa sugestão é que você volte aos tempos
de criança em aquisição da linguagem fazendo a leitura
da história “Marcelo, marmelo, martelo”, inclusa no livro
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Estruturas das palavras

homônimo da escritora Ruth Rocha, que você pode encontrar disponível para
download na internet.

Na história, Marcelo é um menino curioso que vive inventando palavras.

Esperamos que a leitura desperte seu interesse em se aprofundar, cada vez


mais, na investigação de como as palavras que usamos a todo instante surgem.

Boa leitura!

5 Trocando em miúdos

Ao final da terceira aula de Morfologia da Língua Portuguesa, conhecemos e


discutimos um pouco mais sobre a estrutura dos vocábulos da nossa língua.
Vimos que:

1) São basicamente oito os formatos nos quais as palavras em Português


podem se constituir;
2) O morfema lexical, também conhecido como radical, é de fato o elemento
mais importante das palavras, pois carrega o significado;
3) Fatores fonológicos também influenciam a estruturação das palavras, a
exemplo das consoantes e vogais, que são acrescentadas por motivo de
eufonia em algumas palavras;
4) As estruturas verbais geralmente seguem uma fórmula, que facilita a
compreensão e visualização dos elementos que compõem tais estruturas.

6 Autoavaliando

Você já havia parado para pensar que uma única palavra pode apresentar vários
elementos em sua estrutura?

Considerando não só o conhecimento compartilhado durante a aula, mas também


o que previamente sabia sobre estruturas de palavras, você acredita que já era
capaz de descrever a estrutura dos vocábulos do Português?

E, por fim, como você julga o conhecimento compartilhado, isto é, como ele
pode auxiliar a compreensão da Língua Portuguesa?

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Referências

CÂMARA JÚNIOR, J. M. Estrutura da língua portuguesa. 44. ed. Petrópolis, Rio


de Janeiro: Vozes, 2011.

RIBEIRO, M. das G. C. Introdução à Morfologia. In: ______. A morfologia e


sua interface com a sintaxe e com o discurso (org.). João Pessoa: Editora da
UFPB, 2011.

______. Morfologia da Língua Portuguesa. In: ALDRIGUE, A. C. de S.; FARIA, E.


M. B. de. Linguagens: Usos e Reflexões. v. 3. João Pessoa: Editora da UFPB, 2009.

SILVA, M. C. P. de S; KOCH, I. G. V. Linguística aplicada ao Português: Morfologia.


15. Ed. São Paulo: Cortez, 2005.

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