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TREVISAN, Jaqueline Dos S. A Arte-Educação Na Perspectiva Da Educação Popular de Paulo Freire
TREVISAN, Jaqueline Dos S. A Arte-Educação Na Perspectiva Da Educação Popular de Paulo Freire
DO SUL - UNIJUÍ
Ijuí
2008
JAQUELINE DOS SANTOS TREVISAN
Ijuí
2008
Dedico esta dissertação à todos os profissionais
educadores que buscam uma vida mais digna, justa e
igualitária para todos, e que acreditam que a Arte pode
fazer diferença. Ainda, dedico-a especialmente à minha
família, cujo apoio me fortaleceu e me fez crer que era
possível.
AGRADECIMENTOS
Escrever dói. E esta escrita doeu para muitas pessoas, quase como um parto. No
entanto, a dor passou, o “filho” nasceu e o alívio é imenso. A todos que sentiram dor
comigo, quero dedicar esta dissertação:
Marcelo, a você, meu esposo. Obrigada.
Helena, minha filha. Você nasceu durante o processo, e trouxe felicidade e a certeza
de que, pelo seu futuro, eu precisava concluir.
Pai e mãe, o que seria de mim sem vocês? Mãe, obrigada pelas palavras e atitudes de
incentivo e carinho constantes. Pai, além destas, obrigada pelo apoio técnico, por revisar o
português e se dispor a ler. Ah, e por eu existir!
Bea, minha irmãzinha, valeu! O que seria do meu bolso não fosse sua contribuição
imensa na revisão normativa? Obrigada! Inclusive por me importunar com frases do tipo
“minha dissertação está aqui, e a sua?”.
Scheila, minha irmã intelectual: sua leitura no início do processo foi um pontapé bem
grande para eu deslanchar. Valeu mesmo por todo o incentivo! E puxões de orelhas.
Nessa, minha irmã prática: perguntar nunca ofende, é o ditado. E você nunca cansou
de perguntar se eu estava escrevendo, quando e se ficaria pronto. Obrigada por apoiar e
incentivar!
Cunhados Nick, Gilnei e Claus, obrigada por se importarem.
Aos cunhados Jacque e Giovani, à sogra Maristela, obrigada por cuidar da Helena
quando precisei estudar. Valeu!
Comadre Débora: você já está entendendo tudo de Paulo Freire, pois leu várias vezes
e me disse outras tantas: “isto aqui você já falou, risca”. E eu risquei sem olhar. Deu certo!
Obrigada. E também à Gê, pela disposição de serem as duas minhas “office girls”, e pelo
apoio constante. Vocês são demais!
Professor Dr. Manfredo Wachs, sem o senhor acho que o Freire teria ficado no meio
do caminho. Agradeço imensamente sua disposição em ler e fazer os apontamentos devidos,
mesmo sem ter nada a ver com o processo. Obrigada!
Professoras Elza Falkembach e Marlene François, obrigada por acreditarem e por
contribuírem para que este trabalho fosse concluído.
Professor Ayrton Dutra Corrêa, agradeço a leitura e as palavras elogiosas na defesa
desta dissertação.
5
Professora Cláudia Caimi, minha orientadora, desculpe-me por fazê-la esperar tanto.
E muito, muito obrigada por acreditar em mim.
RESUMO
This inquiry intends to contribute to the development of the Art / Education in the schools of
popular education from two reports of experiences, of a theoretical revision of the popular
education in Brazil in Paulo Freire and of the Art / Education specially in Ana Mae Barbosa.
The first report, “ We, Sebastião and the Community ” describes a project made a list of the
photographies of Sebastião Salgado in a school of periphery with students of the Secondary
education. The second project, “The Contemporary Art: a bridge with the local community ”
describes a project in Contemporary Art in the same school, also with students of Secondary
education. Such projects caused the theoretical revision that follows. On popular education,
the historical thing is boarded of same in Brazil, which is a popular education from the
theoretical presuppositions of Paulo Freire, “Freirianos” concepts like freedom and
“dialogicidade” and the being educator educating “freiriano”. Permeating the theoretical
revision, there are done connections of the application of such concepts in the reported
projects. On Art / Education, it is done soon historically of same in Brazil, followed from the
Triangular Proposal of Ana Mae Barbosa and from the Education of the Sensitive one of
João Francisco Duarte Junior, and such theoretical presuppositions are inserted in the
reported experiences. It is boarded following the dimensions of the teaching of the Art.
There has been the conviction of which the Art boarded through the prism of the Triangular
Proposal, of the Education of the Sensitive one and through the optics “freiriana” of the
education is a slant for the emancipation of citizens who conscious of his starting point,
could assume his paper in the struggle for a more just world, which gives conditions of
access to everything and to all.
Fotografia 1 .................................................................................................................... 29
Fotografia 2 .................................................................................................................... 29
Fotografia 3 .................................................................................................................... 30
Fotografia 4 .................................................................................................................... 30
Fotografia 5..................................................................................................................... 31
Fotografia 6 .................................................................................................................... 31
Fotografia 7 .................................................................................................................... 32
Fotografia 8 .................................................................................................................... 32
Fotografia 9 .................................................................................................................... 33
Fotografia 10 .................................................................................................................. 33
Fotografia 11 .................................................................................................................. 34
Fotografia 12 .................................................................................................................. 34
Fotografia 13 .................................................................................................................. 35
Fotografia 14 .................................................................................................................. 35
Fotografia 15 .................................................................................................................. 35
Fotografia 16 .................................................................................................................. 36
Fotografia 17 .................................................................................................................. 36
Fotografia 18 .................................................................................................................. 40
Fotografia 19 .................................................................................................................. 40
Fotografia 20 .................................................................................................................. 42
Fotografia 21 .................................................................................................................. 42
Fotografia 22 .................................................................................................................. 45
Fotografia 23 .................................................................................................................. 48
Fotografia 24 .................................................................................................................. 51
Fotografia 25 .................................................................................................................. 52
Fotografia 26 .................................................................................................................. 52
Fotografia 27 ................................................................................................................. 54
Fotografia 28 .................................................................................................................. 56
SUMÁRIO
1 INTRODUÇÃO ............................................................................................................ 10
2 EXPERIÊNCIAS EMPÍRICAS NA ESCOLA ESTADUAL DE ENSINO
MÉDIO EMIL GLITZ................................................................................................. 13
2.1 A escola ............................................................................................................. 15
2.2 Apresentação do projeto “Nós, Sebastião e a Comunidade”.............................. 16
2.3 Atividades gerais com educandos - descrição pormenorizada das
atividades................................................................................................................... 19
2.3.1 Transcrição de textos............................................................................... 21
2.3.2 Considerações de duas educandas sobre o trabalho de campo ............... 27
2.4 Imagens fotográficas feitas pelos educandos ..................................................... 29
2.4.1 Considerações sobre a experiência ......................................................... 37
2.5 A arte contemporânea: um ponte com a comunidade local ............................... 37
2.5.1 Documentação: textos escritos pelos educando sobre o projeto e 39
respectivas fotografias .....................................................................................
3 EDUCAÇÃO POPULAR NO BRASIL EM PAULO FREIRE ............................ 57
3.1 Um histórico ................................................................. 61
3.2 Paulo Freire – educação como prática da liberdade ........................................... 66
3.2.1 Sobre liberdade e dialogicidade na educação ......................................... 70
3.2.2 Sobre dizer a palavra .............................................................................. 75
3.3 O método Paulo Freire ....................................................................................... 79
3.4 O educador - educando Freiriano ....................................................................... 82
4 ARTE/EDUCAÇÃO BRASILEIRA ........................................................................ 94
4.1 Arte/Educação no Brasil .................................................................................... 94
4.2 Proposta Triangular e Educação do Sensível ..................................................... 109
4.2.1 Aplicabilidade da Proposta Triangular e Educação do Sensível ............ 115
4.3 Dimensões do ensino da arte .............................................................................. 117
5 CONSIDERAÇÕES FINAIS ................................................................................... 120
125
6 REFERÊNCIAS ........................................................................................................ 124
129
1. INTRODUÇÃO
uma vez que é assim que o próprio autor a utiliza – Paulo Freire é a principal referência, já
que se buscou nesta pesquisa resgatar a sua obra, no que se refere à educação. Nesse sentido
os conceitos de liberdade, dialogicidade, democracia, amorosidade, interação e outros
cunhados pelo estudioso baseiam esta reflexão. É perceptível, no decorrer de sua obra, que
Paulo Freire utiliza constantemente as expressões “opressor” para referir-se à ideologia
dominante e “oprimido” para dizer dos que sofrem a massificação. Optou-se em manter tais
expressões no decorrer do texto, mesmo que talvez até o próprio Paulo Freire se inclinasse a
utilizar expressões diferentes, dados os contextos atuais. Entende-se que o educando de
escola pública de periferia seja um “oprimido”, uma vez que lhe falta muito para que tenha
uma vida digna no sentido amplo da palavra, isto é, acesso pleno à saúde, educação,
moradia, emprego, bens de consumo e cultura. Aqui, a partir do teórico supracitado, serão
feitas considerações sobre esta realidade, e propostas alternativas para uma educação
libertadora e significativa.
Sobre Arte/Educação elaborou-se um breve histórico desta no Brasil, especialmente a
partir de Ana Mae Barbosa a fim de contextualizar e, então, discorrer sobre a Proposta
Triangular e a Educação do Sensível, situando-as na aplicabilidade do ensino. O objetivo é
entender como tais conceitos foram abordados nos projetos relatados, que motivaram esta
pesquisa. Também aponta-se para as mudanças que ocorreram no ensino da Arte em nível de
Brasil, principalmente no que se refere às mudanças que operaram-se nas duas últimas
décadas no nosso país. No que concerne à nomenclatura optou-se por usar o termo
Arte/Educação a partir da explicação de Ana Mae Barbosa ao comentar que “prefiro a
designação Arte/Educação (com barra) por recomendação de uma lingüista, a Lúcia
Pimentel, que criticou o uso do hífem como usávamos em Arte-Educação, para dar o sentido
de pertencimento” 1. Entretanto observa-se nas bibliografias sobre o assunto o uso da
expressão arte educação e arte-educação. Por convicção e padronização usar-se-á sempre
Arte/Educação, salvo em citações de autores que empregam a outra expressão.
A escolha metodológica pouco convencional é proposital. Foi intencional relatar uma
experiência, fazer uma reflexão teórica sobre educação popular e Arte/Educação – Educação
do Sensível trazendo elos de ligação entre a reflexão teórica e a experiência narrada, e, por
fim, tecer uma análise que integre as partes operando com dois conceitos trabalhados
1
BARBOSA, Ana Mae. Uma introdução à Arte/Educação Contemporânea in Barbosa, Ana Mae (org).
Arte/Educação Contemporânea : consonâncias internacionais. São Paulo: Cortez, 2005.p.99.
12
teoricamente. Buscou-se não apenas a síntese do pensamento dos autores, mas uma escrita
reflexiva sobre temas por eles trabalhados.
Enfim, objetivou-se produzir um texto simples e claro, que possa dizer da
Arte/Educação na educação popular, através de uma análise da educação e da Arte/Educação
brasileiras. Para tanto tomou-se como exemplo projetos pedagógicos realizados em uma
escola que apresenta uma realidade pouco favorável economicamente, mas que ousou
experimentar práticas, especialmente em Artes, diferentes das tradicionais. Por esses motivos
enquadra-se no perfil denunciado e vivenciado pelos teóricos que respaldam este trabalho e
servem como exemplo de que ações pedagógicas diferenciadas e voltadas ao educando, são
possíveis e significativas.
2. EXPERIÊNCIAS EMPÍRICAS NA ESCOLA ESTADUAL DE ENSINO MÉDIO
EMIL GLITZ
2
As explicações sobre a escola e seu funcionamento estão a seguir, inclusive sobre o que consiste uma etapa e
como ela funciona.
14
3
FREIRE, Paulo. Pedagogia do Oprimido. 23ª reimpressão. São Paulo: Paz e Terra, 1994, p. 36.
15
refletindo o seu pensar e agir. Isto em busca, sempre, da libertação de sua condição de
oprimido, conforme defende Paulo Freire, o qual terá suas teses mais aprofundadas no
terceiro capítulo.
2.1 A escola
A Escola Estadual de Ensino Médio4 na qual foi realizado o projeto aqui descrito é
uma escola de periferia da cidade de Ijuí – RS. Possui em torno de 1.100 educandos. Nos
turnos matutino e vespertino oferece o Ensino Fundamental. O noturno, por sua vez, está
reservado para o Ensino Médio. A escola caracteriza-se por ser voltada à Educação
Popular, sendo que os educandos, em sua maioria, são oriundos dos bairros próximos a
esta escola, considerados de baixa renda. A Proposta Político Pedagógica da escola como
um todo busca fundamentação teórica, dentre outros, no educador Paulo Freire, que afirma
que “nenhuma pedagogia realmente libertadora pode ficar distante dos oprimidos [...]. Os
oprimidos hão de ser o exemplo para si mesmos, na luta por sua redenção” 5.
O Ensino Médio da escola em questão, desde sua criação, foi contemplado com uma
proposta diferenciada. Isto é, surgiu como uma alternativa para pessoas que haviam
interrompido seus estudos há algum tempo, em especial, trabalhadores. No início a faixa
etária dos educandos era bem elevada (de até 60 anos). Aos poucos a escola foi recebendo
também educandos mais jovens, provenientes do Ensino Fundamental da própria escola e
de escolas vizinhas, pois não há outra escola de Ensino Médio nas proximidades. No
segundo e terceiro anos de funcionamento do Ensino Médio trabalhou-se com EJA –
Educação de Jovens e Adultos – o que deixou de ser oferecido para que os educandos
menores de 18 anos freqüentassem o Ensino Médio noturno.
No ano de 2002 a escola optou por uma organização diferenciada das escolas formais
na modalidade de Ensino Médio. Ao invés de séries, desenvolveu o ensino em etapas. A
duração do Ensino Médio passou de três para três anos e meio, distribuídos em cinco
etapas que independiam do ano do calendário. As aulas aconteciam de segunda à quinta-
feira. A sexta-feira foi reservada para estudo e formação de professores e tempo-
comunidade para os educandos. Este tempo destinava-se a um projeto interdisciplinar que
pudesse gerar reflexão sobre a comunidade e resultar em ações dos educandos na própria
4
Os dados sobre a referida escola dizem da época na qual aconteceu o projeto, ou seja, o ano de 2002.
5
FREIRE, Paulo. Pedagogia do Oprimido. 17. ed. Rio de Janeiro: Paz e Terra, ,1987, p. 41.
16
6
No CTG a comunidade tem a possibilidade de se encontrar para festejar, dançar, conviver com os demais. É
um local que a família pode freqüentar em conjunto.
17
7
CAMARGO, Luiz apud PILLAR, Analice Dutra (Org). A Educação do Olhar no ensino das Artes. Porto
Alegre: Mediação, 1999, p. 14.
8
A forma como foi conduzido o projeto, bem como, todos os passos, conceitos e conteúdos trabalhados serão
especificados a seguir.
18
9
PILLAR, Analice Dutra. (Org). A Educação do Olhar no ensino das Artes. Porto Alegre: Mediação, 1999,
p. 13-14.
10
Idem, ibidem, p.15.
19
11
Anita Malfatti, Cândido Portinari, Lasar Segall, Tarsila do Amaral, Dejanira, Vicente do Rego Monteiro –
todos os artistas foram escolhidos pelos educandos a partir da apreciação de diversas imagens.
12
A UNIJUI – Universidade Regional do Noroeste do Rio Grande do Sul estava sediando uma exposição de
reproduções de fotografias do referido álbum do fotógrafo Sebastião Salgado aberta ao público, à qual os
educandos tiveram acesso.
20
13
MARTINS, Miriam Celeste; PICOSQUE, Gisa; GUERRA, M. Terezinha Telles. Didática do Ensino da
Arte: a língua do mundo: poetizar, fruir e conhecer arte. São Paulo: FTD, 1998, p. 54.
14
À medida que o Bairro Getúlio Vargas foi crescendo a partir dos movimentos pela moradia, os próprios
moradores foram numerando os aumentos do bairro. Hoje, já existe até o Getúlio Vargas 5. No entanto, esta
situação é exclusiva, pois os próprios moradores são preconceituosos com quem mora nos anexos do bairro.
21
Texto de educando A
15
Optou-se por colocar em itálico os textos dos educandos por estarem transcritos tal e qual foram escritos, e
serem em si palavras de outrem.
22
um garoto só, distanciado dos outros por ele estar no meio de uma das atitudes que os
povos tomam os conflitos dos sem-terra, a competência dos pais é pouca, por isso são
diminutas as possibilidades de mudar o que vimos nas fotos. E a foto que comparei, é de
um garoto tirando leite, de Cândido Portinari a sua obra é magnífica. A comparação, foi
por ele também ser um garoto sozinho trabalhador. As semelhanças são bem parecidas
pois criança sempre aparece, com jeito de sofrida, nestas fotos como minha pessoa me
chama atenção.”
Texto de educandos B e C
“Retirante (1944) Cândido Portinari: painel a óleo sobe tela 190cm x 190cm. Museu
de Arte de São Paulo.
Esta foto nos revela o estado em que as famílias sofridas do nordeste são famílias
inteiras em estado de grande pobreza, que não encontram trabalho e tem que fugir de sua
terra para outros lugares afim de encontrar alimento que mate a fome da sua família, pois
o seu rosto já estão cansados de ver tanta miséria, sm perspectiva de um futuro melhor.
Comparamos esta foto dos retirantes com a foto de Sebastião Salgado tirou dos
refugiados Ruandenses em Hdutu onde milhares de pessoas tinham que fugir por causa de
grande miséria ali existe que estava matando o seu povo de fome onde as pessoas estavam
muito desnutridas pois elas eram expulsos do seu habitat.”
Nosso projeto:
Nós, Sebastião Salgado e a realidade e a vida
Usamos isopor, palitos de picolé, plástico, caixas de papelão emitando casa e
galpão
Bonecos de plástico emitando pessoas
Flores de plástico
Animais de plástico emitando animais vivos
O tamanho é pequeno mas nos projeta para a realidade.
O projeto nosso mostra a realidade de um povo a procura do seu chão ou seja do seu
pedaço de terra onde possa tirar o seu sustento e de sua família. Pois a realidade é mais
nua e crua pois ainda existe muita pobreza neste país.”
Texto de educando D
23
Texto de educando E
Texto de educando F
“Caixões
A idéia de fazer caixões veio da interpretação da foto de Sebastião Salgado: na
fotografia, caixões com integrantes dos sem terra mortos pela polícia em uma disputa de
fazenda.
24
Texto de educando G
Como vai ser: 2 mãos mostrando o sofrimento de uma vida sem oportunidades.”
Texto de educando H
“Sebastião Salgado
No nordeste a fome e a seca esta cada vez mais difícil, principalmente no nordeste,
pessoas a procura de água, e o encontram um pouco de água nos cactos.
As pessoas descascam os cactos para tomar a água, os adultos estão com calçados e
as crianças, descalsas, e até o cachorro passando fome e sede.
Se não é os cactos no nordeste, muitos morrem de sede, pos a procura de água.
Pois mostra a fome e sede das pessoas no nordeste isso é muito triste.
Pintura a óleo sobre tela: Retirantes (Cândido Portinari)
Mostra sobre a seca, a pobreza do nordeste, muita criança passando fome, e pessoas
sem trabalho.
(sobre sua criação)
Esta estátua significa uma pessoa que vive no nordeste e convive com a seca, ele
trabalha, apesar de estar triste por que falta água para beber, poder sobreviver, eles
bebem a água dos cactos. Com seu chapéu velho, magro ele tenta levar a vida como dá,
vencer a fome e a sede não é fácil, apesar da pobreza, eles esperam pela chuva o único
jeito de ter uma água para beber etc.”
Texto de educando I
esquerdo uma pilha de sacos de café prontos para o comércio. Entre vários negros há
montes de café no chão e os escravos estão muito inchados porque eles não ganham o que
calçar. As mulheres trabalham na colheita do café, elas se vestem com vestidos longos.
Eles estão trabalhando sobre comando do patrão.
Comentário:
Na foto e na obra contém pessoas com algumas diferenças sociais bem grave.
Na foto do MST as pessoas são trabalhadoras mas querem lutar para ganhar lucro
com seu trabalho mas elas não tem como produzir pois elas não tem condições de comprar
seu chão.
Na obra “café” nos mostra pessoas que trabalham sobre comando do patrão e são
obrigadas a fazer qualquer tipo de serviço. Por serem negros muitos acham que não
devem ter direito algum. Eles trabalham 24 hora por dia sem poder relaxar um minuto a
não ser para comer alguma coisa de vez em quando. Ainda assim estão sobre o comando
dos patrões. A diferença dessas pessoas não é grande pois são castigadas pelos que
possuem o poder.”
Texto de educando J
criança, que apesar do preconceito que os mesmos vivem a força que eles tem com seus
objetivos, as vezes até a marca da luta expressa em seu olhar”.
Texto de educanda A
“No sábado nós fomos fazer umas fotos nos bairros, para conhecer cada pessoa e
como vivem e reagem ao nosso trabalho escolar que é montar um “Êxodo” não tão
grande como o de Sebastião Salgado que são fotos de várias raças e estilos de vida
diferente daquele que muitos ignoram e não querem ver.
As fotos foi para aprendermos mais sobre as condições de vida de cada um por isso
que muitos dizem levamos a vida do jeito que dá.
Nossas fotos foi baseada nisto porque planejamos com a profe de artes que nos
acompanhou e conseguiu trazer câmera fotográficas e não conseguiu filme preto e branco
e tiramos fotos com o filme colorido. A profe “B” e a mãe da profe “A” nos acompanha
nesse passeio de trabalho e nos ajudou e motivos e, no nosso ofício de retratista naquele
dia.
Batemos fotos nos trilhos do trem, a “educanda A” tirou com crianças, bateu foto
dum bueiro entre outra fotos que cada um que estava ali escolheu para bater.
Adorei ter ido, foi uma experiência muito boa para o meu aprendizado. Só batemos
fotos daquelas pessoas que permitiram tirar.
Foi uma beleza se pudéssemos continuar se nos dessem mais chance apezar daqueles
receio de aproveitar a oportunidade oferecida. E que cada um vive a vida do jeito que dá.
Eu bati foto da casa do bairro novo, de crianças e todos teremos nos trilhos do trem
entre outras.”
Texto de educanda B
Em continuidade com o trabalho encima das fotos de Sebastião Salgado. Nos aluno
da 3ª etapa do ensino médio EJA da Escola Emil Glitz fizemos um trabalho com a profe de
Artes “B” fomos visitar alguns bairros de Ijuí.
Numa caminhada que fizemos vimos a realidade de pessoas que vivem em plena
miséria. São casebres na beira dos trilhos. Ao mesmo tempo dessa nossa visitas
aproveitamos para testas nossos conhecimentos em fotografia. Vamos fazer uma exposição
na nossa escola.
Nos alunos e profe observamos que as pessoas estão preocupadas ao ver nos
fotografando imaginaram que era político nesse momento houve um pequeno mal
entendido pois foi fotografado uma criança brincando soltando pipa e o pai da criança
nos chamou atenção pois não tinha autorização nos entendemos o erro e se desculpamos.
Sentimos que a esclusão social não tem espectativa de vida não cuido da natureza jogam
vários detritos de lixo em redor de suas casas virando um verdadeiro lixão.
Pois para mim foi importante esse nosso trabalho que realizamos apena que foram
poucos alunos que participaram. Foram fotografado vários momento dessa caminhada. O
que me chamou a atenção foi fotografar um senhor bem idoso, e uma vovozinha com 98
anos, e um criança inocente brincando com a natureza coma a terra fazendo bolo de
barro.
Para mim e a segunda experiência que participo na escola conhecendo pessoas que
moram em alguns bairro de Ijuí. Entendo que são pessoas humilde e talvez analfabetos.
Eu me imprecionei foi ver tantas crianças brincando alegres e contentes com o
coração inocente.
Ao chegar em casa percebi com o perigo que ocorremos em ir naqueles arrebalde
seu que sozinha não passo lá. Coitados daquelas crianças que acredita no futuro com
melhor condições de vida.
Precisamos mudar essa sociedade que uns têm e os outros não tem nada.
Vamos colocar políticos que olhe por nos classe pobre excluída sem emprego e
moradia.
Não somos um Sebastião Salgado para fazer aquelas fotos tão lindas mas esperamos
que as nossas fotografia seja tão bem batida e que mostre a realidade a nossos colegas
que eles consigam analizar a situação em que essas família estão vivendo na mais
precarias pobresa”.
29
Fotografia 1 - No meio do Bairro Getúlio Vargas 2, uma propriedade rural com gado e
cavalos. Uma casa grande e bonita de alvenaria contrasta com o restante do bairro.
Fotografia 2 - Duas senhoras idosas na porta de sua casa tomando chimarrão. Antes de serem
fotografadas quiseram se arrumar primeiro: pentearam os cabelos e trocaram de blusa, e não
30
permitiram que a fotografia fosse tirada da porta dos fundos (que aparece ao fundo na
fotografia) onde estavam quando da solicitação, mas na porta da frente 16.
16
Arte, escola e cidadania: um prêmio e seus premiados/Instituto Arte na Escola. – São Paulo : Instituto Arte na
Escola : Cultura acadêmica, 2006, p. 59.
17
Arte, escola e cidadania: um prêmio e seus premiados/Instituto Arte na Escola. – São Paulo : Instituto Arte na
Escola : Cultura acadêmica, 2006, p. 59.
31
Fotografia 5 - Filhos de um educando acharam uma boneca em bom estado em frente a uma
casa em ruínas. Bairro Getúlio Vargas 218.
18
< www.artenaescola.com.br/premio_2002 >. Acesso em: outubro/2007.
32
Fotografia 6 - Crianças sentadas nos trilhos do Bairro Alvorada. Durante todo o tempo em
que se permaneceu no bairro as duas crianças permaneceram neste local brincando.
Fotografia 8 - Senhora de 98 anos, surda, comendo feijão e arroz no meio da tarde. Ela ainda
varre o pátio todos os dias. Não tem dentes, e sorri sem parar, gritando e fazendo gestos
demonstrando estar feliz com nossa presença. A pessoa que cuida dela, uma sobrinha, quis
tirar a touca para a fotografia, solicitou-se que a deixasse como estava para não
descaracterizá-la.
33
Fotografia 9 - Pessoas jogando baralho e rindo. Disseram que “durante a semana nóis
trabáia, final de semana é só alegria e deversão”.
Fotografia 10 - Mãe do menino que estava sentado nos trilhos. Ela estava lavando roupas
quando pedimos para fotografá-la. Consentiu, desde que o filho estivesse junto, e não quis
ser fotografada lavando as roupas, mas fazendo pose.
34
Fotografia 12 - Casa queimada no Bairro Getúlio Vargas 3. O morador ao lado disse que a
casa queimou pela quantidade de cachaça que nela havia. O fogão a lenha permaneceu no
mesmo lugar, intacto.
35
Fotografia 13- Casas populares de alvenaria construídas pelo governo estadual com verba
federal. As casas medem 3m x 4m e se constituem de uma peça com banheiro.
Fotografia 14 - Três meninas brincando com o bolo de barro que fizeram a pós a chuva.
36
Fotografia 15 - Galpão com entulhos, um cachorro e muitos gansos que fugiram na hora da
fotografia. Um garoto alimentava as galinhas e carregava esterco neste local, mas não quis
ser fotografado. Bairro Alvorada.
Fotografia 16 - Casa do Bairro Getúlio 2, com a roupa na cerca. Os homens que estão na
carroça pediram para serem fotografados com seu instrumento de trabalho: a carroça de
fretes19.
19
< www.artenaescola.com.br/premio_2002 >. Acessoem: outubro/2007.
37
Este projeto originou-se na 4ª etapa do Ensino Médio, cujo foco também foi criado a
partir das falas da pesquisa participante, já citada anteriormente. O foco foi “Reflexão e
ação com inclusão”, e a fala que o desencadeou foi “Só tem conversa, só projeto”. Os
educandos que participaram do projeto estavam se encaminhando para o final do Ensino
Médio. Construíram conhecimento também em Arte, mesmo com a dificuldade de acesso
ao mundo formal da mesma.
A opção pela Arte Contemporânea nesta etapa aconteceu porque os educandos vivem
em um mundo contemporâneo e têm não só o direito como também o dever de conhecer o
processo criador de seu tempo, as manifestações da Arte que existem, bem como, os
38
artistas e os espaços. Isto para que possam tornar-se sujeitos sensíveis e de apurado senso
estético. No primeiro momento o projeto foi exposto à turma para apreciação e
concordância ou não da realização do mesmo. Uma vez aprovado, iniciou-se com os
educandos a leitura de diversos textos sobre o assunto. Na semana seguinte os mesmos
vieram “armados” de argumentos para desistirem do projeto, pois acreditavam ser muito
difícil. Ao explicar novamente como este funcionaria houve o entendimento da proposta e
com ela o consentimento para sua realização.
Começou-se a estudar as mais diversas manifestações da Arte Contemporânea e seus
significados: assemblages, ready-made, object trouvé, performance, happenings,
instalações, interferência urbana, land art, body art, dentre outros. Para cada conceito uma
imagem de um artista: performance de Joseph Beys; instalações de Tunga; móbiles de
Alexandre Calder; assemblages de Arthur Bispo do Rosário; esculturas de Lygia Clark;
bólides de Hélio Oiticicae outros. Buscou-se enfatizar as produções da Arte Brasileira. As
imagens acessíveis foram vistas e revistas, discutidas e refletidas. À medida que
aconteciam as apreciações, os educandos questionavam algumas obras quanto à sua
validade artística ou não.
Para refletir sobre os questionamentos, estudou-se um texto de Ferreira Gullar no
qual o autor afirma que “a arte não nasceu pronta, não foi presente dos deuses aos homens.
Ela é produto do trabalho humano, da imaginação e do fazer, da mente e da mão”20. As
respostas aos questionamentos foram sendo construídas ao longo de todo o processo de
criação. Os educandos pesquisaram as especificidades da Arte Contemporânea.
Descobriram a efemeridade, a diversidade de materiais, de linguagens, os diferentes
suportes ou a ausência destes, o uso de objetos industriais e muito mais. Não foi fácil
despir-se do conceito de Arte que se conhecia até então e reorganizá-lo. Após reflexões e
discussões sobre Arte, seguiu-se pensando sobre o contexto dos próprios educandos, no
sentido de como incluí-los socialmente a partir da Arte. Em grupos, os educandos
escolheram assuntos polêmicos relacionados ao seu cotidiano, discutiram e escreveram
sobre os mesmos. Dentre os temas escolhidos pôde destacar-se a “Prostituição”, o
“Casamento”, “A evolução tecnológica da Internet”, “Drogas”, ”A natureza pede socorro”,
“Pornografia na Televisão”, “A nossa versão de sociedade”, “Uma bomba social”. Em
seguida cada grupo elaborou um projeto de criação a partir do assunto escolhido, no qual
20
GULLAR, Ferreira. Argumentação Contra a Morte da Arte. 7. ed. Rio de Janeiro: Revan, 1999, p 30.
39
Para os educandos do Ensino Médio noturno tornou-se natural escrever sobre sua
prática e explorar, na forma de textos, os assuntos tratados em sala de aula. Surgiram novas
possibilidades de abordagem de outros assuntos por parte dos educandos, e isto se deu
através das reflexões e discussões geradas a partir do trabalho.
Abaixo serão transcritos alguns textos escritos pelos educandos durante o processo do
projeto acima citado, bem como as fotografias relacionadas aos mesmos. Por vezes, cada
um do grupo escreveu um texto individual. Colocou-se primeiro o nome dos componentes
do grupo, e, posteriormente, os textos individuais. Os textos estão transcritos, mais uma
vez, sem alterações.
40
Criação 1:
- Componentes: 4 educandos
- Título do Projeto: Bomba Social
- Intenção: fabricar uma bomba que represente um dos maiores problemas da
sociedade, a violência que começa dentro de casa e vai para as ruas e se transforma numa
bola de neve sem fim.
- Argumento: de fazer as pessoas pararem e pensarem nesta realidade, de se
chocarem e notarem que a situação é grave mesmo. Será que ainda poderemos mudar esta
realidade?
Texto 1
“Um dos problemas que mais afligem os seres humanos na atualidade sem dúvida
alguma é a violência, esta por sua vez abrange vários aspectos de nossa sociedade, indo
desde a família até os mais váriados segmentos da vida. Podemos enfocar a violência
verbal, física e também moral.
41
Enfocando este assunto com relação ao bairro onde moro posso afirmar que em
relação aos demais bairros dessa cidade este é relativamente calmo, registrando baixo
índice de assaltos, disculssões entre vizinhos, agressões físicas mutuas ou comumente
chamados brigas.
A violência em si origina-se no seio da família, onde os filhos crescem debaixo de
agressões físicas e verbais de modo que seu crescimento e conduta são afetados por todo
esse clima negativo, gerando na criança a revolta, a inferioridade, que na adolescência
começa a ser e muitas vezes sem limite, aí começa a violência.
O bairro onde moro é formado por uma boa parte de pessoas cristãs que receberam
e passam para os filhos os ensinamentos de Deus entre os quais cito o amor e o perdão o
que anula a violência.”
Texto 2
Texto 3
“A violência esta cada veis mais presente em nossa sociedade, e não adianta mais
tentar esconder, por que a cada dia que passa ela aumenta mais nas escolas, nas ruas, nos
bairros.
42
No meu bairro havia muita violência até um tempo atráz, hoje não é muito mas tem,
roubos, assaltos, briga nas ruas quase sempre pessoas alcoólicas.
Eu acho que a principal causa dos roubos e assaltos é a falta de emprego na nossa
cidade, tem famílias com vários filhos o pai e a mãe desempregado passando fome, o últi
alternativo é roubar, assaltar. Tem os vadios que roubam para comprar drogas, bebidas,
etc...”
Criação 2:
- Componentes: 4
- Título do Projeto: Casamento
- Intenção: Nossa intenção é mostrar que o casamento hoje não é mais tradicional,
já não tem mais o objetivo de união para se ter filhos. O casamento hoje não é mais aquele
onde o pai sustenta sua família, mãe que cuida do marido, da casa e da educação das
crianças. A mudança de costume permitiu que à crianças educadas só pelo pai, só pela
mãe (mãe e pai solteiros). Sendo comum a união (casamento) entre homossexuais e que
seus filhos tenham direito a casa, educação, alimentação, valores comuns em qualquer
outra união.
- Argumento: Hoje em dia a gente houve muito falar e viver o casamento.
Um olhar uma paixão, nasce o amor apartir daí, começa o namoro e, juntos decidem
unir-se, casam, juntos partilharão as alegrais, as dificuldades do dia a-dia, compreender a
pessoa amada.
Há casamentos que dão certo, duram uma vida inteira até que a morte os separem.
Já outros por falta de amor ou falta de algum intendimento, respeito terminam e nunca
mais é o mesmo. E também há os casamentos que com um certo tempo vão perdendo o seu
brilho, mas a um dos dois que é persistente e faz com que esse mesmo se renove, mas na
verdade o que permaneci são os filhos.
Talvez algum dia, pessoas mais experientes, venham nós dizer que há casamentos
perfeitos.
Hoje a maioria das pessoas não tem mais aquela compreensão com a outra, por
qualquer coisa faz crítica, só encherga os defeitos, sem o mínimo respeito, deixa que o
orgulho a falta de humanidade e dão um fim aquilo que começou tão bonito sem defeito e
com tanto amor, ficando, restando dessa união que foi um dia, os filhos.”
- Montagem: comesarmos montando os casamentos tradicionais, depois as novas
formas de união de hoje e as conseqüências dessas uniões, através da montagem de um
labirinto. Com recortes, de vários veículos de comunicação.
Com jornais, madeira, papelão, etc.
- Manifestações da arte contempladas na criação: arte pôvera, assemblages e ready
mades.
Texto 1
“O casamento deixou de ser uma união duradoura, onde um homem e uma mulher se
uniam por amor, para terem filhos e formarem uma família.
Hoje o casamento é apenas um contrato, sem amor, sem objetivo. E os casais que
ainda se unem não se esforçam par preservar o casamento, não respeitam mais o
juramento feito na frente o padre e do juiz, não respeitam mais a palavra ‘família’. E na
primeira dificuldade a única saída que procuram é a separação.
São poucos os casais que realmente levam a sério o casamento. Que procuram se
espelhar nos avós, pais e realmente se unem com o objetivo de constituírem uma família.”
Texto 2
outro pasam a dividir praticamente tudo, ai que começa alguns atritos, no casamento há
momentos bons, e momentos ruins, momentos em que o casal enfrenta dificuldades muitos
não percistem e acabam separando como nos tempos atuais.
Hoje o casamento está muito mudado não pe mais como antigamente, não há mais o
respeito e a fidelidade em muitos casais, o casamento é uma coisa tão bonita acho que
devia ser uma coisa zelada e muito respeitada e vivida com muito respeito e entendimento
e principalmente com muito amor, amor em 1º lugar sem amor nem um casamento vai
bem.”
Texto 3
Texto 4
Ambas trabalhando, para adquirir bens materiais, para que ao passar do tempo,
venham ter menos dificuldades no seu dia-a-dia, e para quando descidirem ter os filhos
estejam mais estáveis.
Quando decidem ter frutos dessa união, é por que já estão prontos à ter uma
responsabilidade maior do que o compromisso que os uniu, ‘filhos não é só para os
momentos e sim para o resto da vida’.
Então o casamento é bom, mas você tem que estar preparado para vivelo, não será
mais só você, e sim você e ele, mais tarde serão uma família. É muito gratificante poder
dizer: -Eu estou feliz, pó que tenho ao meu lado uma pessoa que amo e que me ama, me
compreende... Claro que não há só momentos bons, há momentos de dificuldades também,
mas faz parte, você cresce, aprende, e principalmente que tenha claro em você, que quer
viver em família, vão haver momentos que tem que tomar decisões, e não mais dependerá
só de você, mas também de seu companheiro.”
Criação 3:
- Componentes: 3
- Título do Projeto: Pornografia na Televisão
- Intenção: É mostrar que a pornografia esta muito solto na televisão, você pode
mudar de canal e sempre vai ter uma cena de pornografia. É que tempos atráz não tinha
cenas de pornografia, ter tinha, mas não era tanto assim como agora pois tudo tinha limite
hoje não tem limite nos programas, não existe moderação pois os programas não tem
horário para ser exibido pois nem ligam se tem criança assistindo e o exibem no horário
nobre.
Texto 1
Texto 2
“Pornografia no Bairro
Tudo o que se passa na televisão principalmente a pornografia que é nosso assunto
se reverte no dia-a-dia na sociedade.
As crianças, os adolescentes, e os jovens são os mais atingidos pela pornografia.
Tudo o que vêm na televisão querem fazer, nem que não seja igual. O que importa é
praticar o que para eles é aprender a fazer uma coisa nova.
Não importa a idade crianças de 2 anos pra cima são muito espertas. Tudo o que
vêem, ouvem querem fazer: dançar, cantar, se vestir como as crianças da TV se vestem.
47
Texto 3
“A pornografia no Bairro
Quais os motivos que levam a pornografia no bairro? Será a televisão, o colégio,
etc?
Para mim a pornografia começa na televisão porque a censura está liberada,
programas absurdos, onde o sexo é a coisa mais natural do mundo, isso tudo passando
nos horários livres, onde crianças de todas as idades estão na sala. É ali que começa, eles
acham o máximo em assistir e fazer suas imaginações, pondo em prática lá fora,
mostrando para seus amigos suas ilusões. Em meu bairro acontece muito disso, meninos e
meninas de pouca idade já estão se exibindo, colocando seu corpo em disposição se
vendendo só para emitar artistas de televisão, achando que tido isso é maravilhoso, está
na moda, muitas vezes nem sabendo o que estão fazendo.
Por isso nós pais de crianças e adolescentes temos o dever de alertá-los no que está
acontecendo e muitas vezes controlar os programas de televisão.”
Criação 4:
- Componentes: 3
- Título do Projeto: Prostituição
- Com quais manifestações da Arte Contemporânea se enquadra:
48
Nosso trabalho é feito de desenhos e se emquadra na Arte Pôvera que é arte pobre:
em sua origem trabalha com materiais relacionados aos quatro elementos: terra, fogo,
água e ar, mais tarde que incrementou-se com materiais pobres.
E o nosso trabalho foi usado apenas jornal, papel pardo, folha de ofício e lápis 6B;
que são materiais simples.
Como os elementos visuais aparecem no trabalho:
O nosso trabalho tem muitos gris, as formas são arredondadas e linhas sinuosas, ele
tem muita textura visual, ela é lisa.
Nosso trabalho tem perspectiva, tem profundidade, claro-escuro, sobreposição e
diminuição ou seja o volume visual.”
Texto 1
“Prostituição
A prostituição em nossos dias é um meio de ganhar dinheiro, “e muito dinheiro”. Só
que as crianças, jovens e mulheres que trabalham nesse ramo, não trabalham porque
querem ou gostam elas muitas vezes são obrigadas por seus pais e maridos, e muitas são
mães solteiras que precisan, sustentar a sua família.
Aqui em nosso bairro e na nossa cidade a prostituição é em grande número, mas a
maioria dessa pessoas estão em casa de programas, mas algumas delas são universitárias,
e que trabalham no comércio de Ijuí e que não parecem ser, mas são. A prostituição é um
vínculo de trabalho mas há riscos de doenças e outros más.
49
A prostituição não acaba pó aqui, para isso ter um fim tem que haver mais emprego
porque a prostituição também existe por causa do desemprego.”
Texto 2
“A Prostituição
Antigamente não se falava abertamente em prostituição. Em casa os pais evitavam
falar sobre o assunto e na sala de aula os professores não podiam comentar ou
argumentar com os seus alunos sobre prostituição e jamais colocavam o assunto em
questão tudo guardado em segredo pelos mais velhos.
Mas hoje tudo mudou, os pais já comentam com seus filhos, sem nenhum medo ou
receio de serem julgados pela sociedade; nas escolas os professores já falam sobre o
assunto abertamente, pedem trabalhos ou pesquisas pois estamos preocupados com algo
que se transformou em problema do interesse de todos.
A prostituição para muitos é uma maneira de se sustentarem, aqui em Ijuí por
exemplo temos várias moças que conseguem pagar fácil a faculdade aluguel, água, etc,
com essa maneira de ganhar dinheiro. Mas essas moças não usam o nome “prostitutas”,
mas sim garotas de programas ou acompanhantes, elas são contratadas por homens
geralmente mais velhos, casados para acompanha-los em festas da alta sociedade e é
claro para o divertimento deles.
Mas tem outras moças que trabalham em esquinas ou bares de bairros, geralmente
são moças novinhas com a idade entre doze e dezesseis anos, quase todas sonham com o
casamento, filhos, etc. Estas são consideradas prostitutas, vagabundas, rameiras e muitos
outros nomes, trabalham toda noite, ganham pouco e as vezes o dinheiro delas ainda fica
com os gigolôs.
Não podemos esquecer de falar que as vezes elas são prostitutas por opção, essas
sim vendem o corpo por mero prazer ou divertimento próprio mas quase sempre acabam
com doenças ou morrendo nas mãos dos gigolôs.
Na nossa sociedade é quase impossível nos vermos moças se prostituírem no centro
pois está cidade é uma cidade pequena e a maioria dessas moças se escondendo nos
bairros, boates ou as conhecidas “zonas”, mas nas grandes cidades é normal, em pleno
centro da cidade, a luz do dia ver elas se venderem os seus corpos. Esse “trabalho” nunca
dura muito tempo, não importa se são prostitutas ou acompanhantes, logo elas se vêem
velhas, usadas, não servindo mais para o ramo da prostituição.
50
Criação 5:
- Componentes: 3
- Título do Projeto: A Evolução Tecnológica da Internet
- Manifestação Contemporânea: Nosso trabalho se enquadra dentro do ready mades,
que consiste em pegar um objeto industrial sem valor artístico e dar um sentido de arte a
ele.
Nosso trabalho é monocromático.
Esse objeto (computador) é um objeto real, tridimensional e por isso tem volume.
Sua textura é áspera e lisa, sua forma é geométrica e também encontramos linhas
retas.
- Conceito: Atualmente a evolução tecnológica da Internet tem ocorrido de forma
surpreendentemente, vem acompanhada de novas tecnologias e tendências, e buscas
incensaveis, de cada vez mais aprimorar relações comerciais, procura e oferta de
produtos, tudo isso num espaço de tempo muito curto.
Saber manejar o computador, e ter noção da grandiosidade que isso representa
passou a ser hoje uma necessidade de cada pessoa tanto no profissional quanto no
pessoal, hoje dispomos de muitas coisas escenciais quando acessamos a Internet,
principalmente empresas utilizam desse serviço para compra e venda de seus produtos,
não somente a nível regional mas sim a uma coisa muito mais ampla, se refere a nível
universal, pode-se oferecer produtos a vários países do mundo, consultar preços e
melhorar a qualidade de seus produtos através de pesquisas observa-se está tendo uma
boa cotação no mercado internacional.
A principal intenção é tentar demonstrar os benefícios da Internet, que com ela
dispomos de muitos recursos para aumentar o progresso em seu ramo profissional,
consultar, pesquisar, oferecer, e comprar produtos, toda essa tecnologia gira em prol do
capital, envolve relações comerciais a nível mundial.
51
As conseqüências disso são, que cada vez mais dispomos desses temas melhores e o
mundo evoluiu a passos largos.
Criação 6:
- Componentes: 2
- Título do Projeto: A Nossa Versão de sociedade
- Intenção: O pais inteiro vive hoje uma conjuntura massacrante, são cercada toda e
qualquer tipo de propriedade, cada vez mais pessoas são jogadas fora da chamada roda
da sociedade.
A obra tem a finalidade de desenhar e mostrar a roda da sociedade, quem são as
pessoas que ficam para fora, atrás das cercas cada vê mais descriminadas. Já tem vários
movimentos procurando atravéz de manifestos, marchas, alguns chegam até com
vândalos, isso mostra a revolta de certos segmentos da sociedade excluída.
Existe entre nós uma grande paixão pelo nosso país, fazemos parte de uma geração
inovadora, que almeja por um país que ao invés de excluir, inclui cada vez mais pessoas e
que os governantes possam ajudar aos que querem derrubar as cercas da opressão.
Estamos de luto, mas lutando para que a justiça reine em nosso país.
Tentamos representar através das transformações do mundo em um relógio. As
mudanças que estão ocorrendo em nosso meio, no meu bairro, na cidade, no estado, no
52
meu país. As transformações do dia-a-dia do povo brasileiro. A luta das mulheres, dos
sem terra lutando por um pedaço de terra, sendo chamados de invasores. Tentamos
representar na arte, o nosso o Brasil, com toda a sua pobreza, e com isso a nossa
indignação perante essa miséria e os nosso governantes não estão fazendo nada por essa
gente que é considerada, arruaceiros, bagunceiros, é não fazem nada por nós, por eles.
Do outro lado as cores da nossa bandeira do Brasil.
Texto 1
Existe também um problema, que eu diria ser um dos mais graves: se investe em
presídios e em segurança pública ao invés de educação pública e gratuita, que é o mais
importante e o primeiro passo para o desenvolvimento de uma cultura mais globalizada.
Hoje, se formos ver nos presídios, 95% dos presos são a juventude, os jovens estão
deixando apagar a luz do horizonte, não se vê mais lugar para o jovem, que ele possa
plantar hoje e colher amanhã.
Nos preocupa bastante também o descaso do governo municipal para com a questão
das cooperativas, que são uma forma das famílias gerarem alguma renda para sua
subsistência, e fazendo o resgate da cidadania dessas pessoas, para que elas possam se
sentirem parte deste processo que chamamos de reingresso da população excluída do
nosso meio.
Estes itens colocados de forma alternativa para um progresso includente de nossa
cidade e a sociedade no todo, também é a única forma de fazer com que cais as cercas e os
muros que aprisionam as famílias. Diríamos que estas alternativas iriam ajudar a
erradicar a fome, a marginalização. As periferias teriam um novo sentido: ao invés de ser
um amontoado de casas, poderiam ser feitas frentes de trabalhos com as cooperativas de
forma que todos poderiam ter uma consciência mais voltadas para o solidarismo. Só assim
acreditamos numa sociedade reformada, onde todo cidadão terá direito de vez e voz. As
tarefas serão partilhadas assim como toda a produção.
Quando caírem os muros e as cercas que cercam o jardim, aí sim o povo será feliz.”
Criação7:
- Componentes: 3
- Título do Projeto: A Natureza pede socorro
- Intenção: Chamar a atenção de todos ao olhar essa obra sobre que está
acontecendo com a natureza e concientizar a todos nós cuidar e ter respeito com ela.
- Argumentação: para tudo que foi feito nessa obra foi extraído da natureza, como:
O papel, foi feito para fazer a bola e distinguir as cores amarelo que simboliza as
queimada que a cada dia aumenta para agricultores aumentar seus cultivos alguns
queimam folhas no quintal. A cor preta não são plantadas de volta, outros no local.
A cor verde, simboliza o que está ainda sendo preservado em outras regiões. A cor
laranja simboliza o que está sendo feito com as árvores derrubadas, são utilizadas para
construir casas, moveis, papel, etc. O galho de sustento serve para mostrar quantas
arvores foram tiradas da natureza.
54
O tronco simboliza todas as centenas de arvores, que todos os dias são derrubadas
em todo o território nacional por madeireiras algumas essas situação ilegal que visam
somente lucro, não se importando com a natureza.
Texto 1
Texto 2
Como se da para vê, a natureza esta sendo desmatada aos poucos pela mão do
homem que não sabe aproveitar algo tão importante.
Existe poucas pessoas que ajudam a preservar as arvores, pois existe nelas a
conciência e o respeito que elas fazem ao meio ambiente dando mais ar puro para nos,
protege os barrancos para não desmoronar para dentro do rio, se tem um vento forte faz
ele chegar mais fraco a uma casa.
Pelo que eu sei se derrubar uma arvore terei que plantar mais 3 arvores, isso seria
bom se todos fizessem essa parte.
Devemos ter amor a natureza, que esta ai, no pátio de nossa casa, na rua, no colégio
em todos os lugares, para que ela continue sempre a nos dar um clima agradável até para
esse calor não aumentar cada vez mais.
Se continuar assim na Amazônia e aonde habitamos tudo ficara pior, o clima
aumentando, e as matérias primas terminarão.
Portanto devemos proteger a cada arvore pequena que esta em crescimento até mais
grande”.
Criação 8:
- Componentes: 2
- Título do Projeto: Drogas
- Intenção: mostrar que a droga não compensa, que leva a destruição, à um caminho
sem volta.
Pensamos em fazer uma armação de madeira revestida com plástico, dentro um dado
de papelão mostrando a trajetória da droga com recortes e figuras. A medida que o dado
vai sendo jogado as pessoas vão percebendo o caminho sem volta. Vamos fazer as bolas
do dado, com pedaços de litro descartável transparente.
- Manifestações da arte: Assemblages, porque foram usados elementos diversos
revistas, jornais, plásticos.
Arte Povera porque foram usados materiais pobres, plásticos, ripas, caixa, et.
- Elementos Visuais que aparecem:
Cor: primária, secundária, terciária
Linha: reta na horizontal e na vertical
Forma: quadrangular
Textura: visual, lisa, áspera
Volume: tridimensional, dimensão real
56
- Conceito: A droga é uma droga, está a cada dia crescendo mais em nosso meio,
isso nos preocupa pois com isso as pessoas perdem o raciocínio, vivendo num mundo de
ilusão. As pessoas não tem coragem de enfrentar os problemas ou inventam problemas
onde não existe e acha que a solução é a droga.
A droga é um problema de toas as classes sociais, isso tem um sentido, uma raiz
profunda, no funcionamento de nossa sociedade que vive desprovida de sentido de vida. A
juventude procura na droga um sentido par a sua existência, o que ela não está
encontrando na sociedade.
O final da vida de um usuário de droga é muito triste.
A citação a seguir vem ao encontro dos anseios responsáveis por esta escrita sobre
educação, pois acredita-se ser impossível dissociar educação do cotidiano dos indivíduos.
Mais ainda, é impossível “engavetá-la” dentro de uma área do conhecimento apenas.
Educação diz da vida e a vida é complexa, não sendo possível dividí-la em fragmentos
disciplinares.
Educação tem a ver com a medida que damos aos homens e mulheres, tem a ver
com os sonhos que alimentamos em relação à sociedade. Por isso a tentativa de
compreender a educação ultrapassa os limites de uma área de conhecimento ou
disciplina acadêmica. A reflexão sobre educação é, pela própria natureza do
objeto, uma atividade interdisciplinar21.
21
STRECK, Danilo Romeu. Correntes Pedagógicas. Petrópolis: Vozes, 1994, p. 08.
58
direta à vida do educando, àquilo que o mesmo conhece e sobre o qual pode construir
significado22.
Quando se fala em educação popular pensa-se em educação do, para e com o
povo23. Sendo a escola um espaço de educação e de formação, acredita-se ser necessário
que a aprendizagem seja significativa para o educando, que diga de sua prática, de seus
anseios, das possibilidades que o mesmo tem de ser cidadão: de ter emprego, de continuar
os estudos, de ter casa própria, dentre outras. Insiste-se nesta tese: os conceitos e conteúdos
precisam ter significado para o educando.
Neste sentido, não se pode discorrer sobre educação popular no Brasil sem citar
Paulo Freire. O processo de educação popular protagonizado e defendido por este teórico
do conhecimento teve início na década de 1960, no contexto do Nordeste Brasileiro, no
qual o povo vivia, conforme o próprio Paulo Freire, na “cultura do silêncio”. Com tal
expressão o autor estava a indicar que a cultura do silêncio se refere não só aos analfabetos
mas também aos que não têm coragem de falar. “Era preciso dar-lhes a palavra” para que
“transitassem” para a participação na construção de um Brasil, que fosse dono de seu
próprio destino e que superasse o colonialismo” 24.
Conceição Paludo diferencia educação popular de educação do popular. Para a
autora, a educação popular está associada a um projeto alternativo de desenvolvimento do
campo democrático e popular, enquanto que a educação do popular é um projeto das elites
para a sociedade brasileira.
22
Ainda se apresentam nas escolas, como exemplo, os textos, desenhos, poesias referentes ao Natal com renas
e neve, enquanto em nosso país é verão. Um Papai Noel cheio de presentes e que entra pela lareira, enquanto
que alguns de nossos educandos sequer têm o que comer na noite de Natal (como no restante do ano), quanto
mais presentes embaixo de um pinheirinho.
23
Esta expressão já é freiriana, pois para Paulo Freire, povo, classe popular, oprimido, são os sujeitos que
sofrem a massificação, que são domesticados pelo capital e pelas ideologias dominantes (opressores) e que, em
virtude desta dominação, se tornam como marionetes a serviço dos mesmos, responsáveis apenas pela
prestação de serviços que geram capital. Ainda, que a escola foi, para este povo e por muito tempo (e não o
deixa de ser ainda hoje), apenas mais uma forma de apoderamento utilizada pelos opressores para formar
trabalhadores obedientes e regrados, sem respeitar a vocação ontológica do ser humano de ser sujeito. O ser
humano precisa integrar-se, pois à medida que isto acontece é que se torna sujeito. É no pensar conjunto que
acontece o diálogo, e com ele, a liberdade, a criação e a crítica. Integrar-se não é necessariamente adaptar-se ao
meio, visto que o meio é de dominação do opressor e não do povo.
24
GADOTTI, Moacir. A voz do biógrafo brasileiro – A prática do sonho. Disponível em:
<www.paulofreire.org.br>. Acesso em: abril de 2005.
59
A educação popular é “(...) uma prática educativa que se propõe a ser diferenciada,
isto é, compromissada com os interesses e a emancipação das classes subalternas.”25 Tal
concepção tem início, conforme Conceição Paludo, antes da Proclamação da República,
com a luta pelo fim da escravidão e o princípio do movimento operário; segue na Primeira
República com o movimento sindical dos socialistas e operários na busca por escolas
públicas, e mais adiante, pelo fim dela (tal idéia partiu dos anarquistas que acreditavam que
a escola favorecia os interesses da burguesia). Quando do movimento da Escola Nova, a
luta intensificou-se não mais somente por uma escola pública para todos, mas por uma
politização das massas. Para Conceição Paludo,
25
PALUDO, Conceição. Educação Popular em Busca de Alternativas : uma leitura desde o campo
democrático popular. Porto Alegre: Tomo Editorial; Camp, 2001. p.82.
26
Idem, ibidem, p.85.
27
Idem, ibidem, p.65.
60
Paludo, “a educação do popular que prescreve, que dirige, que manipula, jamais será
libertadora, já que, em Freire, os sujeitos precisam tomar em suas mãos a história da
construção das suas caminhadas em direção ao ‘ser mais’”28.
No prefácio da obra Pedagogia do Oprimido o professor Ernani Maria Fiorin, ao
discorrer sobre a palavra em Paulo Freire, comenta da responsabilidade de ser homem.
Segundo ele, para isso, o homem “há de aprender a dizer a sua palavra, pois, com ela,
constitui a si mesmo e a comunhão humana em que se constitui; instaura o mundo em que
se humaniza, humanizando-o” 29.
Em Que Fazer? – Teoria e prática em educação popular30 Paulo Freire e
Adriano Nogueira dialogam. Um dos capítulos do diálogo versa sobre a definição de
educação popular, no qual Adriano Nogueira diz do seu entendimento sobre educação
popular:
Certo, meu amigo. Agora... depois que a entendo como mobilização, depois que a
entendo como organização popular para exercício do poder que necessariamente
se vai conquistando, depois que entendo essa organização também do saber...
compreendo o saber que é sistematizado ao interior de um ‘saber-fazer’ próximo
aos grupos populares. Então... se descobre que a educação popular tem graus
28
Idem, ibidem, p.95.
29
FIORIN, Ernani Maria. In: FREIRE, Paulo. Pedagogia do Oprimido. 23ª reimpressão. São Paulo: Paz e
Terra, 1994, p. 13.
30
FREIRE, Paulo; NOGUEIRA, Adriano. Que Fazer – Teoria e Prática em Educação Popular. 8. ed.
Petrópolis: Vozes, 2005.
31
Idem, ibidem, p.19.
61
Havia outro conceito que é bom lembrar: ação cultural. Isso quer dizer que a
cultura era entendida também dentro de movimentos e relações sociais dos
homens... Cultura seria, também, os gestos das pessoas se esforçando nos grupos e
no trabalho. Cultura seria o que dá sentido nas relações humanas 35 .
3.1 Um histórico
Paulo Freire começou muito cedo a trabalhar com educação. O princípio de seu
método foi na cidade de Angicos/RN, em 1963, quando 300 trabalhadores foram
alfabetizados num período de 45 dias. A experiência foi de tal modo compensatória que o
então presidente do Brasil, João Goulart, convidou Paulo Freire para repensar a educação
de adultos no país e implantar seu método para alfabetização de cerca de dois milhões de
analfabetos.
32
Idem, ibidem, p.19-20.
33
Idem, ibidem, p.60.
34
Idem, ibidem, p.61.
35
Idem, ibidem, p.61.
36
Idem, ibidem, p.62.
62
37
GADOTTI, Moacir. Cruzando Fronteiras – teoria, método e experiências Freirianas. Disponível em:
<www.paulofreire.org.br>. Acesso em abril de 2005.
38
HOLLANDA, Heloisa B; GONÇALVES, Marcos A. Cultura e Participação nos anos 60. 1ª reimpressão
da 10. ed .de 1995. São Paulo: Brasiliense, 1999, p. 09. (Coleção Tudo é História, 41).
63
39
intelectuais e militantes. Passava-se da euforia à dúvida, da ofensiva ao recuo” . A
ditadura, infelizmente, era mais permanente do que se poderia crer num primeiro
momento.
A intelectualidade brasileira protagonizou a resistência neste processo e
posicionou-se através de manifestações políticas e culturais. Musicais, teatros, poesia e
artes visuais faziam parte da arte engajada: “a idéia de que a arte é ‘tanto mais expressiva’
quanto mais tenha uma opinião” 40. A Arte tornou-se espelho dos sentimentos, no sentido
de expressar para enfrentar. Por este motivo, um novo público se configurou após o golpe:
ao invés de operários e trabalhadores, estudantes e intelectuais. Verificou-se a formação de
uma nova massa política, na qual se deu o surgimento de uma cultura do protesto, que teve
os artistas como inspiradores e a arte como via de manifestação e resistência. Neste caso, a
Arte foi mais movimentação que reflexão mas surtiu o efeito desejado. Com esta mudança
de rumos, a Arte buscou manifestações nada convencionais, e que muitas vezes
interagiam41 com o público. A produção cultural mostrou-se, seguidamente, uma expressão
coletiva.
A UNE – União Nacional dos Estudantes – foi uma das primeiras vítimas do golpe,
tendo sua sede invadida pelos integrantes do CCC – Comando de Caça aos Comunistas já
no dia 1º de abril de 1964. Ainda assim a UNE não deixou de protestar, organizando
passeatas e manifestações nas quais inúmeros estudantes foram presos e torturados. Alguns
foram assassinados, como o estudante Edson Luis de Lima Souto, em 1968, e o presidente
da UNE efetivado em 1971, Honestino Guimarães, que foi preso e assassinado em 1973.
Foram dias muito difíceis. A maioria das lideranças estava presa ou exilada. Mas
em 65, apesar de todas as perseguições, A UNE realiza o seu 27º Congresso [...].
O quadro de repressão é completado com a promulgação da Lei Suplicy [...]. Esta
lei previa a transformação dos antigos Centros Acadêmicos em Diretórios
Acadêmicos, totalmente subordinados a direção das faculdades, o que tornava
obrigatório a votação dos alunos nas eleições dos DAs. Os estudantes, porém, não
se dão por vencidos e iniciam um boicote à lei, seja pela ausência nas votações;
seja pela criação dos CAs livres. [...]1966 é o ano das passeatas e do início da
39
Idem, ibidem, p.14.
40
Idem, ibidem, p.23.
41
É o caso dos parangolés e dos happenings, manifestações de arte nas quais o público era convidado a
participar.
64
A UNE resistiu, mesmo que tropeçando, até 1971. Neste contexto de protestos, a
Igreja Católica teve papel relevante nos Congressos da UNE. Vários desses eventos
aconteceram em porões de igrejas ou em conventos, na clandestinidade43. A UNE
encabeçava a criação de Centros Populares de Cultura por todo o país, na intenção de
propagar uma “arte revolucionária” para o povo. O lugar não importava: qualquer espaço
era propício para uma apresentação teatral ou uma exposição. O que importava era
proporcionar espaços de cultura ao povo. A educação/alfabetização na forma de um
“amplo movimento didático-conscientizador” 44 buscava espaço, juntamente com a cultura,
a partir da educação política de Paulo Freire: “contra as infantilizantes ‘cartilhas’
tradicionais, procurava-se colocar a palavra política no comando do processo de
aprendizado como forma de deflagrar a tomada de consciência da situação social vivida
45
pelas populações analfabetas e marginalizadas” . A política de esquerda florescia,
incorporando uma cultura crítica que permeou todo o período da ditadura militar.
46
Sobre este assunto, Alfredo Bosi comenta que o governo da época tomou cinco
medidas oficiais para “calar” a cultura crítica. Primeira: preocupou-se em dar uma visão de
um país de progresso. Segunda: destituiu as escolas das disciplinas de História e Geografia
para transformá-las em Estudos Sociais. Terceira: destituiu o ensino da filosofia, no intuito
42
Histórico UNE – 60 anos a favor do Brasil, p, 56. Das são Diretórios Acadêmicos e CAs, Centros
Acadêmicos.
43
Em 1965, o congresso se realizou na Igreja dos Franciscanos, em São Paulo, com o apoio destes. Os
estudantes chegaram e foram entrando no porão pelo confessionário ou se fazendo passar por coroinha. Desta
forma, cerca de 300 estudantes puderam estar presentes. Em 1967, o congresso foi no Convento dos
Dominicanos, e aconteceu dentro da normalidade. A polícia só chegou depois e se voltou contra os freis,
depredando o convento e prendendo inúmeros deles.
44
HOLLANDA, Heloisa B; GONÇALVES, Marcos A. Cultura e Participação nos anos 60. 1ª reimpressão da
10. ed. de 1995. São Paulo: Brasiliense, 1999, p. 10. (Coleção Tudo é História, 41).
45
Idem, .ibidem, p. 10-11.
46
BOSI, Alfredo. Cultura Brasileira e Culturas Brasileiras. In. _____________. Dialética da Colonização. São
Paulo: Cia das Letras, 1992.
65
de acabar com o pensamento crítico 47. Quarta: o ensino de línguas clássicas foi abolido em
favor de uma língua estrangeira moderna, no caso, o inglês. Por fim, como quinta medida,
48
unificou o Ensino Médio a partir do vestibular . O intento do governo foi alcançado na
medida em que retirou as áreas humanas do ensino secundário e também do ensino
universitário para que os sujeitos não “precisassem” pensar.
Outros dois movimentos continuaram e deram significado ao processo cultural
desse momento, quais sejam, o Cinema Novo – frente na reflexão política e estética – e o
Tropicalismo – renovação na produção da cultura. O Cinema Novo iniciou na década de
1950 e não tinha pretensões de formalismo técnico e estético, pelo contrário, buscava uma
linguagem alternativa, “uma mesma vontade de superar a indigência crítica do cinema
comercial através da afirmação de uma prática cinematográfica desmistificadora, engajada,
deflagradora” 49.
No final da década de 1960, o país vivia sob o jugo da ditadura militar em sua fase
mais cruel de repressão. Caetano Veloso 50 explica que um grupo de músicos apoiados por
alguns poetas, jornalistas, artistas plásticos e cineastas, inquietos com os rumos que
tomavam o país e a música brasileira, buscavam um movimento que pudesse desestruturar
e reestruturar o que estava posto. Denominou-se este movimento de Tropicalista, ou
Tropicália, nome que se originou de uma instalação do artista plástico Hélio Oiticica. No
início, nem mesmo os protagonistas sabiam exatamente o que era o movimento, sabiam
apenas que propunha algo novo, universalizante, que fazia o uso de instrumentos elétricos
e uma estética muito semelhante a do Cinema Novo, além de grandes indícios de rock.
Alguns dos protagonistas do movimento como Caetano Veloso e Gilberto Gil foram presos
e exilados pela ditadura.
47
Pensa-se que esta medida surtiu um efeito mais forte e poderoso que o imaginado: o que se percebe nas
escolas atuais? O pensar não constitui prática efetiva dos educandos e, sente-se dizer, sequer da maioria dos
educadores. Não se criou a cultura do pensamento, da criticidade. Conseqüentemente, a cultura de massas tem
um poder de penetração muito superior a qualquer outra, pois não encontra barreira alguma que a impeça de
formatar, moldar, ajustar consciências à sua vontade.
48
Infelizmente, esta medida encontrou eco e persiste. Foi incorporada de tal modo pela sociedade brasileira que
se torna difícil projetar mudanças para esse sistema de ingresso no Curso Superior, e, conseqüentemente,
modificar o Ensino Médio.
49
HOLLANDA, Heloisa B; GONÇALVES, Marcos A. Cultura e Participação nos anos 60. 1ª reimpressão
da 10ª ed. de 1995. São Paulo: Brasiliense, 1999, p. 38. (Coleção Tudo é História, 41).
50
VELOSO, Caetano, Verdade Tropical. São Paulo: Companhia das Letras, 2004.
66
51
Educação como Prática da Liberdade é o título de um dos livros mais
importantes de Paulo Freire. Ao apropriar-se do título desta obra de Paulo Freire como
subtítulo deste capítulo, quer-se reafirmar que toda a teoria freiriana, incluindo a proposta
do método, tem por princípio a liberdade. A liberdade de aprender, de ensinar, de
conhecer, de ser, de acertar e errar e de dialogar. Paulo Freire viveu o que escreveu e seus
textos claramente demonstram esta vivência. Toda a sua obra está repleta de exemplos de
situações empíricas (vivenciadas por ele) que sustentam sua teoria.
Este pedagogo-pensador-humanista condensou linhas de pensamento em uma teoria
52
do conhecimento própria, baseada numa práxis libertadora. Conforme Moacir Gadotti ,
Paulo Freire despertou nas pessoas a crença de que é possível mudar o mundo. A causa
51
FREIRE, Paulo. Educação como Prática da Liberdade. São Paulo: Paz e Terra, 2005.
52
Vídeo - coleção grandes educadores. Paulo Freire. Ata mídia e educação: Paulos: 2004.
67
maior de Paulo Freire é, repetindo suas palavras, “colocar o oprimido no palco da história,
com vez e voz”. Ter o ser humano pensado e acreditado em sua totalidade.
Paulo Freire tem como “personagens” de sua teoria o oprimido e o opressor. O
oprimido como aquele que sofre com os métodos de opressão e de dominação de
consciência e o opressor como aquele que luta pela manutenção de uma pedagogia de
dominação das consciências. Ambos não podem se complementar, uma vez que o opressor
precisa do oprimido para manter-se no poder e, precisando dele, usa-o ao invés de
compartilhar com ele. Sendo assim, não pode haver liberdade para o oprimido através do
opressor. Neste sentido, Ernani Maria Fiorin reflete no prefácio da Pedagogia do
Oprimido que:
No que se refere aos projetos destacados nesta reflexão, acredita-se que o educando
− referido no primeiro capítulo − está na condição de oprimido, mas em um movimento de
tomada de consciência e despertar da alienação para a busca efetiva da consciência crítica e
da possibilidade de mudança, ou seja, quando constata sua realidade percebe tal
possibilidade. Ao registrar em fotografia o seu mundo, torna-se, possível, para ele, desvelar
a realidade através das imagens e construir uma nova condição, a de liberdade.
Para explicar a condição de dominação em que vivem os oprimidos, Paulo Freire faz
um resgate da constituição da sociedade brasileira desde o princípio da colonização
portuguesa. Para o estudioso as pessoas que vieram para cá não tinham a intenção de
53
FIORIN, Ernani Maria. In: FREIRE, Paulo. Pedagogia do Oprimido. 23ª reimpressão. São Paulo: Paz e
Terra, 1994, p.09.
68
Seguindo esta lógica percebemos que nossa sociedade foi fundada no extremismo
das relações: senhor e escravo. Não houve o desenvolvimento de uma classe à “base de
56
desenvolvimento político” , que se torna-se democrática. A grande propriedade ditou as
regras a partir dos senhores; em nenhum momento houve auto-governo, ou seja, o povo
governando por si mesmo. Conseqüentemente, não houve diálogo entre opressor e
oprimido. Como reflete Paulo Freire,
54
Os trabalhadores não eram escravos, mas extremamente dependentes do proprietário, o qual os explorava ao
máximo.
55
FREIRE, Paulo. Educação como Prática da Liberdade. São Paulo: Paz e Terra, 2005, p. 77.
56
Idem, ibidem, p.80.
57
Idem, ibidem, p.78.
69
O que nos importa afirmar é que, com essa política de colonização, com seus
moldes exageradamente tutelares, não poderíamos ter tido experiências
democráticas. Em que pesem alguns aspectos positivos, entre eles o da
miscigenação, que predisporia o brasileiro para um tipo de ‘democracia étnica’ 58.
58
Idem, ibidem, p.83.
59
Idem, ibidem, p.85.
60
Idem, ibidem, p.88.
61
Idem, ibidem, p.91.
70
Acredita-se que, através de uma educação consistente que luta pela liberdade e busca
o desenvolvimento do educando como um indivíduo completo, é possível construir uma
sociedade sem oprimido e opressor, mas em igualdade de condições.
62
Idem, ibidem, p.95.
63
Idem, ibidem, p.96.
64
DUARTE Jr. João-Francisco. Por que Arte-Educação? 17.ed. Campinas: Papirus, 2006. (Coleção Ágere).
71
injustiças e a luta pelo fim das desigualdades. Disto decorre o bater de frente com o
opressor, o que é incômodo e gera conflitos. Para o oprimido que teme a liberdade é
melhor viver como oprimido, acomodado e sem conflitos, mas também sem liberdade, pois
liberdade busca-se quando há consciência crítica ou tomada de consciência.
Paulo Freire acredita que não se pode deixar de ser oprimido para ser opressor. A
grande tarefa do oprimido, então, é libertar a ambos, oprimido e opressor, buscando a
humanização, pois tanto opressor quanto oprimido estão desumanizados. O primeiro
porque não pode ser humanizado quando vive da injustiça, da exploração e da opressão, e
o segundo, porque perde a humanidade ao sofrer o jugo do opressor. Os opressores
precisam da injustiça e da miséria para parecer gloriosos e se perpetuarem, usando do
assistencialismo e do paternalismo para mascarar a condição do oprimido. Paulo Freire
aponta que
65
FREIRE, Paulo. Educação como Prática da Liberdade. São Paulo: Paz e Terra, 2005, p.65.
66
Para Freire, o “ser mais” é a humanização dos homens, que se busca na comunhão e na solidariedade.
67
FREIRE, Paulo. Pedagogia do Oprimido. 17. ed. Rio de Janeiro: Paz e Terra, 1987, p.36.
72
68
Idem, ibidem, p.41.
69
Idem, ibidem, p.41.
70
Idem, ibidem, p.56.
73
71
Idem, ibidem, p.59.
74
por sua vez, estão intimamente ligados à criticidade, nota fundamental da mentalidade
democrática” 72.
Para que haja uma educação problematizadora e libertadora é necessário um
educador que se identifique com o educando e pense na humanização de ambos. Diferente
da educação bancária, que só pensa em um sujeito no mundo, a educação libertadora pensa
73
em um sujeito no mundo, com o mundo e com os outros, afirma Paulo Freire , e esta
74
educação “afirma a dialogicidade e se faz dialógica” . O educador, então, precisa ter
humildade frente ao educando, reconhecendo que este também tem um saber. Além de
reconhecer-se, da mesma forma que o educando, como um ser inconcluso. Esta
consciência é responsável pela humanização que Paulo Freire acredita ser a vocação dos
homens. Assim, a educação nunca está pronta, conclusa, mas em constante processo de
mudança. Citando Paulo Freire, “para ser tem que estar sendo” 75.
É difícil para o educador reconhecer-se inconcluso, pois a formação dos educadores
brasileiros ainda é bancária. Nos projetos citados anteriormente fez-se a tentativa de ouvir
72
FREIRE, Paulo. Educação como Prática da Liberdade. São Paulo: Paz e Terra, 2005, p.104.
73
FREIRE, Paulo. Pedagogia do Oprimido. 17. ed. Rio de Janeiro: Paz e Terra, 1987, p.68.
74
Gadotti, no texto A voz do Biógrafo Brasileiro – A prática a altura do sonho. Disponível em:
www.paulofreire.org.br em abril/2005 cita o filósofo alemão Wolfrdietrich Schmied-Koowarzik, que faz a
seguinte reflexão sobre o ser dialógico em Paulo Freire: “Paulo Freire, entrelaçando temas cristãos e marxistas
e referindo-se a Buber, Hegel e Marx, retoma a ligação originária entre dialética e diálogo e define a educação
como a experiência basicamente dialética da libertação humana do homem, que pode ser realizada apenas em
comum, no diálogo crítico entre educador e educando. Desta forma, ele vincula de um modo fecundo à própria
dialética de Litt, referida à respectiva situação educacional concreta com a determinação dialética da educação
em Kant, como experiência histórica da totalidade da sociedade. Ao mesmo tempo, na medida em que para ele
a teoria e a prática da educação somente são determináveis uma em relação a outra, escapa inteiramente de
abordagens unilaterais, em que a educação é concebida linearmente como processo evolutivo ou processo
produtivo. Neste sentido, a educação se torna um momento de experiência dialética total da humanização dos
homens, com igual participação dialógica de educador e educando. Aqui se manifesta por inteiro o caráter
absolutamente dialético da determinação da atividade educativa. A dialética não reside apenas – como em
Schleiermacher – no desvelamento heurístico e aporético da situação educacional, que exige do educador uma
‘ação criadora’ própria, mas simultaneamente na inclusão prática da atividade educativa na experiência
continuada do trabalho educacional com os educandos; experiência sendo entendida por Freire não somente
como refinamento dos meios educacionais – como em Makaremko – mas, como em Kant, embora sem se
restringir a ele, enquanto o trabalho basicamente dialógico e necessariamente comum de educador e educando
na libertação humana do homem.”
75
FREIRE, Paulo. Pedagogia do Oprimido. 17. ed. Rio de Janeiro: Paz e Terra, 1987, p.73.
75
... por isso uma educação que apenas pretende transmitir significados que estão
distantes da vida concreta dos educando, não produz aprendizagem alguma. É
necessário que os conceitos (símbolos) estejam com as experiências dos
indivíduos. Voltamos assim à dialética entre o sentir (vivenciar) e o simbolizar.
Este é o ponto fundamental no método de alfabetização do educador brasileiro
Paulo Freire: aprende-se a escrever quando as palavras se referem às experiências
concretas vividas76.
76
DUARTE Jr. João Francisco. Por que Arte-Educação? 17.ed. Campinas: Papirus, 2006, p. 23. (Col. Ágere).
76
para que a liberdade aconteça, e dizer a palavra é dizer de sua inserção no mundo, no
contexto. Aprender a palavra só não basta, “não basta saber ler que ‘Eva viu a uva’, diz ele.
É preciso compreender qual a posição que Eva ocupa no seu contexto social, quem
trabalha para produzir a uva e quem lucra com esse trabalho” 77. Isto significa dizer que a
palavra não é só aprender a soletrar e a escrever um amontoado de vogais e consoantes, ou
perceber a sonoridade dela. É saber, sim, quem foi Eva, se ela era empregadora ou
empregada de uma vinícola, ou se conheceu a uva no supermercado. Se empregadora,
como produziu e o que ganhou com a uva, qual a relação que manteve com seus
empregados. Se empregada, quantas horas de trabalho diário fez para que a uva pudesse ser
produzida, qual a mais valia que lhe foi subtraída. Se a viu no supermercado, pôde comprá-
la ou não? Se não, precisa ter conhecimento de toda a cadeia produtiva e as implicações da
mesma para entender o motivo de seu não-acesso a este alimento.
Significa saber por que o educando conhece questões teóricas sobre Arte, cria a
partir dos elementos próprios da mesma, mas não tem acesso à Arte universal a não ser via
reproduções 78. Saber por que a obra de Arte consagrada está muito longe de seu cotidiano,
geralmente em grandes centros, que implicações isso tem em sua vida, por que não
freqüenta um museu na capital, que custo tem o transporte até lá, quanto do seu salário
significa este valor, o que deixaria de adquirir para poder ir ao museu, e outras reflexões
mais.
É preciso discutir possibilidades para que este acesso se torne possível. Esta é a
palavra verdadeira, dialógica, que tem significado, que gera reflexão, que cria conflitos
possíveis de serem problematizados e, conseqüentemente, que leva a uma práxis possível
de transformar o mundo. Então,
77
GADOTTI, Moacir. A voz do biógrafo brasileiro – A prática a altura do sonho. Disponível em
<www.paulofreire.org.br>.
78
A UNIJUI oferece seguidamente exposições de Arte. A referência aqui é à Arte reconhecida pela crítica e
pela história.
77
79
FREIRE, Paulo. Pedagogia do Oprimido. 17. ed. Rio de Janeiro: Paz e Terra, 1987, p.78.
80
FREIRE, Ana Maria. O que Paulo Freire diria aos sujeitos comprometidos com a justiça, com a ética,
com os oprimidos que querem construir a Escola Democrática e Popular no Estado do Rio Grande do
Sul e que sonham e desejam uma nova sociedade. Governo do Estado do Rio Grande do Sul, caderno
pedagógico 2, Semana Paulo Freire, 2001, p.13.
81
Idem, ibidem, p.13.
82
Freire tem predileção por determinadas palavras de cunho bastante emocional, poético até, mas que refletem
78
e condensam aquilo que é verdadeiramente a pedagogia freiriana. Generosidade é uma delas, como
amorosidade, boniteza, compartilhamento, dentre outras.
83
FREIRE, Paulo. Pedagogia da esperança, - um reencontro com a pedagogia do oprimido. 10. ed. São
Paulo: Paz e Terra, 2003, p.64.
84
FREIRE, Paulo. Pedagogia do Oprimido. 17. ed. Rio de Janeiro: Paz e Terra, 1987, p.79.
85
Idem, ibidem. p.80.
86
ORTEGA, Francisco. Para uma política de amizade : Arendt, Derrida, Foucault. Rio de Janeiro : relume
dumará, 2000.p.80.
79
O método Paulo Freire não é uma cartilha estática que prescreve “receitas” prontas
sobre o fazer pedagógico. Trata-se de um método em constante renovação, pois surge do
princípio de que a educação deve partir da vivência do educando. Tal método prevê a
inserção do educando no mundo não apenas decifrando letras, mas descobrindo seus
significados no cotidiano, na sua vida, para em seguida interferir nela e buscar a libertação
através da palavra. Antes de ser um método, o próprio Paulo Freire o considerava uma
teoria do conhecimento, pois
87
ORTEGA, Francisco. Para uma política de amizade : Arendt, Derrida, Foucault. Rio de Janeiro : relume
dumará, 2000.p.89.
88
FREIRE, Paulo. Pedagogia do Oprimido. 17. ed. Rio de Janeiro: Paz e Terra, 1987. p.82.
89
“Encharque” é mais uma das expressões de Paulo Freire e, para ele, o encharcar é mais do que se encher,
pois que dizer que o todo fica repleto e não só o interior.
80
Quando da criação deste método Paulo Freire e sua equipe pensavam em alfabetizar
adultos num processo não muito lento, a partir do qual os educandos pudessem produzir
conhecimento, criticidade e significado a partir de suas próprias realidades, dos elementos
do cotidiano. Diz ele:
90
FIORIN, Ernani Mari. In: FREIRE, Paulo. Pedagogia do Oprimido. 17. ed. Rio de Janeiro: Paz e
Terra,1987, p. 13.
91
FREIRE, Paulo. Educação como Prática da Liberdade. São Paulo: Paz e Terra, 2005, p. 112.
92
FREIRE, Paulo. Pedagogia da Esperança - um reencontro com a pedagogia do oprimido. 10. ed. São
Paulo: Paz e Terra, 2003, p. 64.
81
criticidade. Mas como? Para Paulo Freire, “A resposta parecia estar: a) num método ativo,
dialogal, crítico e criticizador; b) na modificação do conteúdo programático da educação;
c) no uso de técnicas como a da Redução e da Codificação” 93.
Paulo Freire dividiu o método em cinco fases de elaboração e execução, quais
sejam 94:
93
FREIRE, Paulo. Educação como Prática da Liberdade. São Paulo: Paz e Terra, 2005, p. 115.
94
Idem, ibidem, p.120-22.
95
Idem, ibidem, p.123.
82
96
O educador freiriano precisa ser dialógico . Precisa assumir-se enquanto educando
também, pois é na interação que o conhecimento se produz, sendo que o educador aprende
com o educando e vice-versa. Para Paulo Freire, “ninguém educa ninguém, ninguém educa
97
a si mesmo, os homens se educam entre si, midiatizados pelo mundo” . Educando-se
entre si, não existe a possibilidade de o educador formar o educando, pois não existe a
transferência de conhecimentos. Paulo Freire afirma que
Não é possível fazer educação sem diálogo, afirma Paulo Freire, pois
Desta maneira, o educador já não é o que apenas educa, mas o que, enquanto
educa, é educado, em diálogo com o educando que, ao ser educado, também
educa. Ambos, assim, se tornam sujeitos do processo em que crescem juntos e em
que os ‘argumentos de autoridade’ já não valem 99.
96
Na releitura que Gadotti faz do da dialogicidade em Freire ele escreve que o diálogo consiste em uma relação
horizontal e não vertical entre as pessoas implicadas, entre as pessoas em relação. No seu pensamento, a
relação homem-homem, homem-mulher, mulher-mulher, e homem-mundo são indissociáveis.
97
FREIRE, Paulo. Pedagogia do Oprimido. 17. ed. Rio de Janeiro: Paz e Terra, 1987, p. 68.
98
FREIRE, Paulo. Pedagogia da Autonomia. - saberes necessários à prática educativa. 28. ed. São Paulo:
Paz e Terra, 2003, p.23.
99
FREIRE, Paulo. Pedagogia do Oprimido. 17. ed. Rio de Janeiro: Paz e Terra, 1987, p. 68.
84
100
FREIRE, Paulo. Pedagogia da autonomia - saberes necessários à prática educativa. 28. ed. São Paulo:
Paz e Terra, 2003, p. 24-25.
101
Idem, ibidem, p.27.
102
Idem,ibidem, p.32.
85
ações. Ser generoso e saber lidar com as diferentes formas de pensar e de agir sem
qualquer forma de discriminação. Além disso, para além de uma prática docente crítica, é
necessário que o educador tenha uma reflexão crítica, de tal maneira que a ingenuidade do
querer pensar certo seja substituída pela rigorosidade do pensar certo efetivo, para tornar-
se “capaz de mudar, de promover-me, no caso, do estado de curiosidade ingênua para o de
103
curiosidade epistemológica” . Mais que pensar sobre a prática, é necessário que este
pensar a prática com rigorosidade se reflita no estado emocional, o qual faz com que o
educador sinta vontade de continuar lutando por uma educação do pensar certo. “Está
errada a educação que não reconhece na justa raiva, na raiva que protesta contra as
injustiças, contra a deslealdade, contra o desamor, contra a exploração e a violência um
papel altamente formador” 104. A raiva à qual se refere Paulo Freire é uma raiva no sentido
de resistência, e não de ressentimento.
Reconhecer-se enquanto indivíduo possuidor de uma identidade cultural própria é
imprescindível para o educador implicado no processo de ensinar a pensar certo. Paulo
Freire diz categoricamente que é preciso ao educador
... assumir-se como ser social e histórico, como ser pensante, comunicante,
transformador, criador, realizador de sonhos, capaz de ter raiva porque capaz de
amar. Assumir-se como sujeito porque capaz de reconhecer-se como objeto. A
assunção de nós mesmos não significa a exclusão dos outros. É a ‘outredade’ do
‘não eu’, ou do tu, que me faz assumir a radicalidade do eu 105.
103
Idem,ibidem, p.39.
104
Idem, ibidem, p.40.
105
Idem, ibidem, p.41.
86
É o bom senso que vai indicar ao educador como resolver situações diferentes do
combinado, como “chegar” em um educando cujo comportamento difere dos demais, como
encarar pequenas “revoltas” em sala de aula e descobrir quais os motivos das mesmas. É o
bom senso também que vai indicar quando e como modificar um planejamento se este não
106
Idem, ibidem, p.50.
107
Idem, ibidem, p.59.
108
Idem, ibidem, p.61.
87
estiver significando para os educandos. Além disso, vai apontar como dialogar com as
diferenças, como explicar e chamar para a prática frente às injustiças do mundo. É o bom
senso que deve nortear o educador quando da avaliação do educando, sabendo que esse
deve primeiro avaliar-se a si mesmo, a sua prática e depois o educando. É o bom senso que
conduz ambos a uma maneira de avaliarem-se em conjunto e lutarem por condições dignas
de ensino-aprendizagem. O bom senso exige, acima de tudo, humildade e tolerância de
reconhecer quando desconhece, e de “amorosidade” com os educandos e com a própria
prática.
O educador, para além de ter condições dignas de ensino-aprendizagem, precisa lutar
por seus direitos. A luta faz parte do cotidiano do educador consciente, comprometido com
uma práxis libertadora. Nesse sentido Paulo Freire defende que
Se há algo que os educandos brasileiros precisam saber, desde a mais tenra idade,
é que a luta em favor do respeito aos educadores e à educação inclui que a briga
por salários menos imorais é um dever irrecusável e não só um direito deles. A
luta dos professores em defesa de seus direitos e de sua dignidade deve ser
entendida como um momento importante de sua prática docente, enquanto prática
ética. Não é algo que vem de fora da atividade docente, mas algo que dela faz
parte. O combate em favor da dignidade da prática docente é tão parte dela
quando dela faz parte o respeito que o professor deve ter à identidade do
educando, à sua pessoa, a seu direito de ser 109.
Constata-se que para ensinar a pensar certo o educador precisa ainda apreender a
realidade, sabendo-se inacabado, bem como educar para que o educando seja, ele mesmo,
o construtor de seu conhecimento. Construção esta mediada e instigada pelo educador, que
precisa fazê-lo com alegria e esperança, conforme Paulo Freire, para que o educando não
reconheça como justa a realidade que está posta e saiba ser possível a mudança. “O mundo
110
não é. O mundo está sendo” . A palavra sendo traz em seu bojo a certeza de que está
acontecendo, e não de que está definido. Então, é possível construir a mudança em
conjunto. A reflexão e o diálogo são pontes para uma prática de mudança, seja em grupos
sociais, seja na escola.
109
Idem, ibidem, p.66-67.
110
Idem, ibidem, p.76.
88
Por fim, Paulo Freire aponta a curiosidade, novamente, como um pré-requisito para o
educador comprometido, afirmando que não há ensino nem aprendizagem sem curiosidade.
E trata-se da curiosidade de ambos, educador/educando, educando/educando, pois não é
possível ser curioso sozinho, e mais, não é possível ser curioso sem respeitar os limites do
outro. A curiosidade provoca inquietude, que a transforma de curiosidade ingênua em
curiosidade epistemológica.
O terceiro capítulo, “Ensinar é uma especificidade humana”, versa sobre a autoridade
democrática do educador que não necessita impor-se como tal, pois é sábio em sua
autoridade, movido pela curiosidade e pela liberdade em suas relações com os educandos,
do educador que sabe ouvir e que é consciente de suas decisões, da compreensão de que a
educação é uma intervenção no mundo e possui uma ideologia.
Ao educador comprometido é necessário segurança de seu conhecimento e sua
formação, competência profissional para ter autoridade sem ser autoritário, e generosidade
para ter respeito e humildade frente aos educandos, de forma a promover uma educação
libertária, na qual os educandos possam assumir com ética as responsabilidades de suas
ações no exercício mesmo da liberdade.
É neste exercício de liberdade que a autonomia vai sendo construída. “No fundo, o
essencial das relações entre educador e educando, entre autoridade e liberdades, entre pais,
mães, filhos e filhas é a reinvenção do ser humano no aprendizado de sua autonomia. Me
112
movo como educador porque, primeiro, me movo como gente” . A prática docente não
111
Idem, ibidem, p.93.
112
Idem, ibidem, p.94.
89
113
Idem, ibidem, p.95.
114
Idem,ibidem, p.102-103.
90
educador. Por outro lado, esta autoridade precisa ser exercida sem autoritarismo, mas
também sem excessiva liberdade. A liberdade também tem limites, pois “quanto mais
criticamente a liberdade assume o limite necessário tanto mais autoridade tem ela,
115
eticamente falando, para continuar lutando em seu nome” . Esta liberdade com
autoridade, acredita Freire, precisa ser exercida na família, na escola, em ambientes de
trabalho, em qualquer espaço de convivência, pois ela será a responsável pela constituição
e pelo fortalecimento da autonomia de cada indivíduo. O educador jamais deve ter medo
de apostar na liberdade.
O educador consciente do que exige seu ensinar sabe que a educação é, para Paulo
Freire, um “ato de intervenção no mundo”, no sentido de lutar por mudanças sociais em
todos os campos. Este ato de intervenção necessariamente precisa ser conduzido com
coerência, com respeito aos educandos. Sendo um ato de intervenção que por si
impossibilita a neutralidade, a educação se faz sempre política. Conforme Paulo Freire, a
educação se faz política porque somos seres inacabados, conscientes disto – o que nos faz
históricos – e temos, então, a possibilidade de tomar decisões e nos posicionarmos, de
sermos éticos ou não. Para que não fosse política, a educação teria que ser neutra, o que é
impossível, ainda mais em um país de tamanhas desigualdades e divergências. Todavia,
não é só por isso que ela não pode ser neutra, mas porque em qualquer circunstância ela
estará sempre respondendo a interesses. Então, conclui Paulo Freire,
115
Idem, ibidem, p.105.
116
Idem, ibidem, p.111-112.
91
educação na qual seja possível promover mudança, sabendo que é um trabalho árduo e do
qual aparecem poucos resultados, mas que deixa raízes profundas e atesta a possibilidade
de um mundo mais justo. Paulo Freire reafirma que
É por isso, repito, que ensinar não é transferir conteúdo a ninguém, assim como
aprender não é memorizar o perfil do conteúdo transferido no discurso vertical do
professor. Ensinar e aprender têm a ver com o esforço metodicamente crítico do
professor de desvelar a compreensão de algo e com o empenho igualmente crítico
do aluno de ir entrando como sujeito em aprendizagem, no processo de
desvelamento que o professor ou professora deve deflagrar. Isso não tem nada que
ver com a transferência de conteúdo e fala da dificuldade mas, ao mesmo tempo,
da boniteza da docência e discência 117.
Ao educador que quer ensinar cabe defender uma ideologia a favor da vida, que não a
ideologia dominante − que visa o lucro acima de tudo, que destitui de humanidade o ser
humano, que usa a ciência e a tecnologia para somar para poucos e não para o bem
comum. Isto é, um educador precisa ser rebelde contra tudo o que desumaniza. “A grande
força sobre que alicerçar-se a nova rebeldia é a ética universal do ser humano e não a do
mercado, insensível a todo reclamo das gentes e apenas aberta à gulodice do lucro. É a
ética da solidariedade humana” 118.
A luta contra uma ideologia que desumaniza só terá efeito se o educador estiver
disposto ao diálogo, consciente de suas convicções e aberto a novos saberes. O educador
testemunha a abertura do educando, sua curiosidade, suas descobertas, a construção de sua
autonomia. Pressupõe conhecer a realidade do educando para poder, partilhando dela,
dialogar sobre o que tem significado para este sujeito. Este compartilhamento com a
realidade do educando diz respeito à ideologia do educador e de sua vontade de lutar por
um outro mundo, sem exploração. “O sujeito que se abre ao mundo e aos outros inaugura
com seu gesto a relação dialógica em que se confirma como inquietação e curiosidade,
como inconclusão em permanente movimento na História” 119.
117
Idem, ibidem, p.118-119.
118
Idem, ibidem, p.129.
119
Idem, ibidem, p.136.
92
Somente escutar e dialogar não basta: é preciso amorosidade, é preciso querer bem ao
educando e à própria prática educativa não permitindo, no entanto, que esta amorosidade
interfira no compromisso de ensinar. Freire refere-se à alegria de ensinar, que está ligada à
rigorosidade metódica da docência, ao conhecimento mesmo do educador progressista e
consciente, pois quanto melhor o educador ensina mais alegria terá ao ensinar, sem
descuidar de sua ideologia e da dignidade da tarefa docente.
Ensinar é uma especificidade humana, portanto,
... nada que diga respeito ao ser humano, à possibilidade de sua inteligência sendo
produzida e desafiada, os obstáculos a seu crescimento, o que possa fazer em
favor da boniteza do mundo como de seu enfeamento, a dominação a que esteja
sujeito, a liberdade por que deve lutar, nada que diga respeito aos homens e às
mulheres pode passar despercebido pelo educador progressista 120.
Tais coisas não podem passar despercebidas porque o educador lida com gente.
Gente que cria e transforma e que pode ter na Arte um dos pilares da educação popular,
uma vez que esta traz consigo a amorosidade, a liberdade e a crítica, pois não é possível a
criação sem o pensar genuíno, sem fazer escolhas, sem incorporar na própria criação o ser
sujeito. É preciso pesquisa, é preciso conhecimento. A amorosidade diz da fruição, de ser
possível apreciar e embevecer-se com a estética, com a beleza, e reconhecer na Arte uma
necessidade mesma do sujeito, de ser ela parte integrante da boniteza da vida. A liberdade
diz do buscar na manifestação artística mais do que fruição e conhecimento: também uma
via de expressão que, para além da capacidade criadora de cada sujeito, possa ser também
uma via de denúncia, de protesto e de compreensão do mundo. E que destas vias resulte a
crítica, mas uma crítica construtiva, capaz de alimentar o ser sujeito e sua capacidade de
integrar-se, de ser no mundo, na busca também por uma arte popular e de acesso irrestrito.
Educar em Arte provoca no educador esta alegria mesma do ensinar. É um “ato
amoroso’: ‘ato’ como ação, prática, libertação, e ‘amoroso’ como bem-querer, confiança e
reciprocidade” 121. Educar em Arte é também trazer a arte para perto do povo, esta arte que
é um bem universal, mas elitizado e distante do cotidiano. É buscar no meio do povo a arte
120
Idem, ibidem, p.143-144.
121
BOFF, Clodovis. Prefácio, In: FREIRE, Paulo; NOGUEIRA, Adriano. Que Fazer – Teoria e Prática em
Educação Popular. 8. ed. Petrópolis: Vozes, 2005, p.04.
93
que vem do próprio povo, para entendê-la como um bem cultural e procurar na educação
popular subsídios para que todos possam ter acesso a ela.
Paulo Freire faz da educação um momento artístico, uma experiência estética. Se a
educação é um exercício estético, podemos pensar que a Arte, em suas diversas
manifestações, desperta nos educandos novas possibilidades de ver/estar no mundo, pois
possibilita o desenvolvimento da apreciação estética deste mundo a partir do conhecimento
dos elementos estéticos/visuais próprios da Arte, e faz com que o educando torne-se mais
capaz de exprimir sentimentos e emoções, com habilidade de sensibilizar-se e estabelecer
interações através de diferentes linguagens. Então, para Paulo Freire,
Outro ponto que faz da educação um momento artístico é exatamente quando ela
é, também, um ato de conhecimento. Conhecer, para mim, é algo de belo! Na
medida em que conhecer é desvendar um objeto, o desvendamento dá “vida” ao
objeto, chama-o para a “vida”, e até mesmo lhe confere uma nova “vida”. Isto é
uma tarefa artística, porque nosso conhecimento tem qualidade de dar vida,
criando e animando os objetos enquanto estudamos122.
122
FREIRE, Paulo; SHOR, Ira. Medo e Ousadia – O cotidiano do professor. 10. ed. Rio de Janeiro: Paz e
Terra, 2003, p.145.
94
4. ARTE-EDUCAÇÃO BRASILEIRA
123
BARBOSA, Ana Mãe. Arte Educação no Brasil. 5. ed. São Paulo: Perspectiva, 2002, p.13.
95
preconceitos freqüentes com diminuição de seu valor enquanto ciência. Ana Mae Barbosa
pesquisou durante longo tempo sobre a evolução e o histórico do ensino da Arte nas
escolas do Brasil, encontrando raros registros e referências não específicas. Sendo assim,
neste subcapítulo tem-se a intenção de explanar, de forma resumida, especialmente a
pesquisa histórica de Ana Mae Barbosa para situar a Arte/Educação no Brasil desde os
tempos coloniais. Outros autores serão utilizados como suporte e Brent Wilson, teórico da
Arte e grande amigo de Ana Mae Barbosa, que auxilia ao apontar que
... embora a arte-educação seja apenas uma pequena parte do mundo da arte – e
aos olhos de muitos, uma parte insignificante – ela é, apesar disso, formada e
modelada pelo mundo da arte, e reflete suas crenças. A arte-educação tem muitos
valores em comum com o mundo da arte, os professores de arte reproduzem as
mesmas concepções de realidade que são encontradas também no mundo da arte.
Neste século, a arte-educação esteve baseada em crenças modernistas sobre a
natureza da arte, o papel da arte na sociedade, o caráter da criatividade artística, e
observações pertinentes à originalidade artística. Mas agora o clima do mundo da
arte mudou. Deixamos o período moderno e entramos no período ao qual
chamamos, por falta de melhor designação, período pós-moderno124.
Ana Mae Barbosa indica a Academia Imperial de Belas Artes como o princípio da
educação artística brasileira. Criada em 1816, só começou a funcionar em 1826. No
entanto, o advento da república trouxe importância ímpar para as Faculdades de Direito, e
“foi reiterado o preconceito contra o ensino da arte” que “estivera a serviço do adorno do
Reinado e do Império” 125. Para Miriam Celeste Martins “o ponto forte dessa escola era o
desenho, com a valorização da cópia fiel e a utilização de modelos europeus” 126.
Darcy Ribeiro em O Povo Brasileiro reintera o que diz Ana Mae Barbosa − no
sentido de que a Arte estava exercendo um papel decorativo, no qual alguns artistas
124
WILSON, Brent. Mudando Conceitos da Criação Artística: 500 anos de Arte-Educação para crianças,
p.51.In: BARBOSA, Ana Mae; SALES, Heloísa M. (Org) O Ensino da Arte e sua História. São Paulo:
MAC/USP, 1990.
125
BARBOSA, Ana Mae. Arte Educação no Brasil. 5. ed. São Paulo: Perspectiva, 2002, p.16.
126
MARTINS, Mirian C; PICOSQUE, Gisa; GUERRA, M. Terezinha Tellles. Didática do Ensino da arte: a
língua do mundo: poetizar, fruir e conhecer arte. São Paulo: FTD, 1998, p.10.
96
O advento da Missão Francesa só veio acentuar a distância entre a Arte e o povo, pois
os representantes europeus eram extremamente clássicos e não admitiram a Arte nacional,
encontrada aqui. Afirmavam ser “uma arte distinta dos originários modelos portugueses e
obra de artistas humildes. Enfim, uma arte de traços originais que podemos designar como
128
barroco brasileiro” . O afastamento da Arte da camada popular legou um preconceito
que perdura até os dias atuais, qual seja, de que a Arte é supérflua, um acessório cultural e
museológico, e que está destinada às camadas mais elevadas da sociedade. Soma-se aqui o
modelo educacional da época baseado na educação jesuítica, a qual valorizava sobremodo
a literatura e “demonstrava acentuado preconceito contra as atividades manuais, com as
129
quais as Artes Plásticas se identificavam pela natureza de seus instrumentos” . As
atividades manuais, para a sociedade, eram próprias de índios e negros. Então, muitos
artistas foram “importados” para compor a Academia Imperial de Belas Artes. Ana Mae
Barbosa alerta para o fato de que
127
RIBEIRO, Darcy. O povo Brasileiro, São Paulo: Companhia das Letras, 1995, p.75-76.
128
BARBOSA, Ana Mae. Arte Educação no Brasil. 5. ed. São Paulo: Perspectiva, 2002, p.18.
129
Idem, ibidem,.p.21.
130
BARBOSA, Ana Mae. Tópicos Utópicos. Belo Horizonte: C/Arte, 1998, p.31.
97
Foi a partir da reforma do Marquês de Pombal no final século XVIII, que uma
abertura, ainda que pequena, se fez sentir no Ensino da Arte, resumindo-se ao desenho
geométrico e desenho da figura humana. Algumas academias adotaram estas cadeiras e em
algumas localidades tornou-se obrigatório às pessoas, “conhecidamente curiosas”, o estudo
da Geometria “com a pena de sentar praça de soldado pago para os que não cumprissem
esta determinação” 131. O resultado de tais medidas no que tange ao ensino do desenho foi
132
o “desenvolvimento das profissões técnicas e científicas” , não havendo qualquer
mudança significativa no que diz respeito às Artes propriamente ditas. “Restou à Arte
apenas o caminho estreito e pouco reconhecido de se firmar como símbolo de distinção e
refinamento” 133, o que foi reiterado por Dom João VI ao introduzir no Brasil “as Artes na
134
educação dos príncipes” . Com esta atitude apenas reafirmava-se o preconceito contra a
Arte, e Barbosa condensa este pensamento ao comentar que:
Uma vez que a arte como criação, embora atividade manual, chegou a ser
moderadamente aceita pela sociedade como um símbolo de refinamento, quando
praticada pelas classes abastadas para preencher as horas de lazer, acreditamos
que, na realidade, o preconceito contra a atividade manual teve uma raiz mais
profunda, isto é, o preconceito contra o trabalho, gerado pelo hábito português de
viver de escravos. Daí o fato de o preconceito contra a Arte ter-se concentrado na
Arte aplicada à indústria, na Arte como trabalho, durante as sete primeiras
décadas do século XIX, quando um quarto da população do país era composta de
escravos 135.
131
BARBOSA, Ana Mae. Arte Educação no Brasil. 5. ed. São Paulo: Perspectiva, 2002, p.24.
132
Idem, ibidem, p.25.
133
Idem, ibidem, p.26.
134
Idem, ibidem, p.26.
135
Idem, ibidem, p.27.
98
em industrialização, o que fica bem evidente no parecer feito por Rui Barbosa
sobre o ensino primário, em 1883, onde relaciona o desenho com o progresso
industrial. Aqui também o ensino do desenho adquire um sentimento utilitário,
direcionado ao preparo técnico de indivíduos para o trabalho, tanto de fábricas
quanto de serviços artesanais. Na prática, o ensino do desenho nas escolas
primárias e secundárias apresenta-se ainda com uma concepção neoclássica ao
enfatizar principalmente a linha, o contorno, o traçado, e a configuração 136.
A preocupação central a respeito do ensino da Arte, nos inícios do século XX, era
a sua implantação nas escolas primárias e secundárias e mesmo a sua
obrigatoriedade: não só os argumentos reivindicatórios de um lugar para a Arte
nos currículos primários e secundários como também os modelos de implantação
estavam baseados principalmente nas idéias de Rui Barbosa, expressas em 1882 e
1883 nos seus projetos de reforma do ensino primário e do secundário, e no
ideário positivista extensamente divulgado no país, principalmente a partir da
segunda metade do século XIX. É com freqüência, portanto, que teremos que nos
referir ao século XIX, para tentar aclamar os princípios e praticas que regeram o
ensino da Arte na escola primária e secundária durante as primeiras etapas
cronológicas do século XX, quando vivemos um prolongamento ideológico do
século XIX. As idéias que levaram à República continuaram ativas no sentido de
assegurá-la, institucionalizá-la. É preciso esclarecer, antes de tudo, que o ensino
da Arte na escola secundária e primária se resumia ao ensino do Desenho138.
136
FUSARI, Maria F. de Rezende e; FERRAZ, Maria H. C. de Toledo. Arte na educação escolar. São Paulo:
Cortez, 1992, p. 24. (Coleção magistério 2° grau. Série formação geral).
137
BARBOSA, Ana Mae. Arte Educação no Brasil. 5. ed. São Paulo: Perspectiva, 2002, p.32.
138
Idem, ibidem, p.33.
99
139
Idem, ibidem, p.36.
140
Iden, ibidem, p.45.
141
Idem, ibidem, p.52.
142
Este parecer de Rui Barbosa foi apresentado em 13 de abril de 1882, e segundo AnaMae Barbosa, foi usado
nas escolas primárias brasileiras na primeira metade do século XX. Lembra-se que o referido parecer foi
elaborado a partir das idéias de Walter Smith, e grande parte do mesmo usa citações do próprio Smith, mesmo
que Rui Barbosa não as tenha indicado como citação. Ana Mae Barbosa comenta que o parecer foi a primeira
tentativa de educação de massa, tendo como intenção educar a massa para o trabalho industrial.
100
Na mesma linha de pensamento João Francisco Duarte Júnior posiciona-se no que diz
respeito ao ensino da Arte ao apontar que:
O verdadeiro ensino da arte foi reservado às horas de ócio das classes superiores,
dando-se apenas nos “conservatórios” e “academias” particulares. Na escola
oficial a arte sempre entrou pela porta dos fundos e, ainda assim, de maneira
disfarçada. Teve ela de se disfarçar tanto que se tornou descaracterizada e deixou
de ser arte. Virou tudo: desenho geométrico, artes manuais, artes industriais, artes
domésticas, fanfarras, etc. Tudo, menos arte 146.
143
Sobre o livro de Desenho de Abílio Cézar Pereira Borges, Ana Mae Barbosa comenta ainda que o mesmo
utiliza os princípios metodológicos de Smith, inclusive no que diz respeito aos professores, pois argumenta que
não seria necessário um artista para ensinar desenho, sendo que os professores regulares poderiam dar conta
disso.
144
BARBOSA, Ana Mae. Arte Educação no Brasil. 5. ed. São Paulo: Perspectiva, 2002, p.56.
145
Idem, ibidem, p. 60.
146
DUARTE Jr. João Francisco. Por que Arte-Educação? 17.ed. Campinas: Papirus, 2006 p. 80. (Col. Ágere).
101
147
BARBOSA, Ana Mae. Arte Educação no Brasil. 5. ed. São Paulo: Perspectiva, 2002, p. 66.
148
Idem, ibidem, p.77.
149
Idem, ibidem, p.86.
150
Idem,ibidem, p.87.
151
Idem,ibidem, p.92.
102
da criança através das relações que estabelecia com o desenho, destacou-se o trabalho de
Adalgiso Pereira, que procurou “averiguar de que modo se inicia, e como se desenvolve na
152
mente da criança, a representação figurada das coisas comuns que a circundam” . A
pesquisa levou em conta, esclarece Ana Mae Barbosa, a memória visual, a memória
cinética e os centros grafo-motores da criança. Acredita-se que tal pesquisa já era um
indício do que hoje é denominada leitura da imagem. Nela, o autor “demonstra ainda a
importância pedagógica do Desenho, porque ele representa um meio de o professor
descobrir as lacunas de cultura da criança que, de outra maneira, não descobriria” 153.
A Semana de Arte Moderna trouxe a valorização do desenho da criança como
produto estético. Para Barbosa,
152
Idem, ibidem, p.103.
153
Idem, ibidem, p.108.
154
Idem, ibidem, p.112.
155
Idem,ibidem, p.114.
156
Barbosa, Ana Mae. Arte-educação: conflitos/acertos. São Paulo: Max Limonad, 1984, p.14.
157
A década de 1920, na área da educação, foi um período de grandes iniciativas. Foi a década das reformas
educacionais. Não havia ainda um sistema organizado de educação pública, como é hoje a rede de ensino
controlada pelo Ministério da Educação e do Desporto. Abriu-se assim um grande espaço para propostas em
103
prol da educação. Um dos movimentos mais importantes da época ficou conhecido com o nome de Escola
Nova. Defendia de uma escola pública, universal e gratuita. A educação deveria ser proporcionada a todos, e
todos deveriam receber o mesmo tipo de educação. Disponível em:
<www.cpdoc.fgv.br/nav_historia/htm/anos20/ev>. Acesso em: janeiro de 2007.
158
BABOSA, Ana Mae. Arte-educação: conflitos/acertos. São Paulo: Copirraite,1984, p 14.
159
O período autoritário que ficou conhecido como Estado Novo teve início no dia 10 de novembro de 1937
com um golpe liderado pelo próprio presidente Getúlio Vargas que eliminou as resistências existentes nos
meios civis e militares e formar um núcleo coeso em torno da idéia da continuidade de Vargas no poder.
<.cpdoc.fgv.br/nav_historia/htm/anos30-37/ev_golpe_estado.htm>. Acesso em: janeiro de 2007.
160
BARBOSA, Ana Mae. Arte-educação: conflitos/acertos. São Paulo, Max Limonad, 1984, p.14.
161
Idem, ibidem, p.15.
104
João Francisco Duarte Jr. Manifesta-se negativamente sobre a Lei 5692/71. Pode-se
perceber isso pela consideração que ele faz a respeito:
Pode-se dizer que nos anos 70, do ponto de vista da arte, em seu ensino e
aprendizagem foram mantidas as decisões curriculares oriundas do ideário do
início e meados do século 20 (marcadamente tradicional e escolanovista), com
ênfase, respectivamente, na aprendizagem reprodutiva e no fazer expressivo dos
alunos. Os professores passam a atuar em todas as áreas artísticas,
independentemente de sua formação e habilitação. Conhecer mais profundamente
cada uma das modalidades artísticas, as articulações entre elas e conhecer os
artistas, objetos artísticos e suas histórias não faziam parte de decisões
162
FUSARI, Maria F. de Rezende e; FERRAZ, Maria H. C. de Toledo. Arte na educação escolar. São Paulo:
Cortez, 1992, p. 37. (Coleção magistério 2° grau. Série formação geral).
163
DUARTE Jr. João Francisco. Por que Arte-Educação? 17.ed. Campinas: Papirus, 2006 p. 80. (Col.
Ágere).
105
A roupa que vestem é produto do desenho, o tecido de suas roupas é produto das
artes na indústria têxtil, a cadeira em que sentam alguém desenhou, em geral
algum estrangeiro, mesmo que ela tenha sido produzida no Brasil, porque temos
pouca gente que foi educada para ser competente em desenho. E a culpa é dos
fazedores de currículo 165.
164
BRASIL.Ministério da Educação. Secretaria de Educação Fundamental. Parâmetros Curriculares
Nacionais: arte. 3. ed. Brasília: A Secretaria, 2001, p 29.
165
BARBOSA, Ana Mae. A imagem no Ensino da Arte. São Paulo: Perspectiva; Porto Alegre: Fundação
Ioschpe, 1991, p.02.
166
BRASIL. Ministério da Educação. Secretaria de Educação Fundamental. Parâmetros Curriculares
Nacionais: arte. 3. ed. Brasília: A Secretaria, 2001, p. 30
106
Ana Mae Barbosa comenta que tal movimento eclodiu após a ditadura militar, com o
processo de redemocratização que trouxe a preocupação com a multiculturalidade, baseada
na diferença de classes sociais e em respeito à produção destas.
Em 1988 uma nova LDB - Lei de Diretrizes e Bases da Educação - começa a ser
discutida, e em alguns projetos a Arte/Educação seria eliminada das escolas. Somente um
projeto, o do Conselho dos Secretários de Educação, tornava a Arte obrigatória. Em 20 de
dezembro de 1996 a nova LDB – Lei n° 9.394 – é promulgada e torna obrigatória a
Educação Artística em todos os níveis da educação básica segundo o Art. 26 § 2º: “O
ensino da arte constituirá componente curricular obrigatório, nos diversos níveis da
educação básica, de forma a promover o desenvolvimento cultural dos alunos”. No
entanto, a LDB não explicita que o ensino da Arte seja obrigatório em todas as séries da
educação básica (ensinos fundamental e médio), e no currículo de algumas escolas o
ensino da Arte aparece em uma série apenas, sem contemplar a totalidade das séries,
especialmente no Ensino Médio, quando se resume a uma série. Ana Mae Barbosa
comenta que “no Brasil, como vemos, nem a mera obrigatoriedade nem o reconhecimento
da necessidade são suficientes para garantir a existência da Arte no currículo” 168.
Percebe-se que as universidades têm se aprimorado em seus cursos de graduação para
arte-educadores, investindo na formação de um profissional capacitado e a arte-educação
vem conquistando espaço nas escolas e universidades. O profissional da área tem se
tornado cada vez mais consciente nas discussões acerca da educação em Arte, buscando
novas metodologias e concepções. No entanto, a Arte/Educação ainda não atingiu um
patamar satisfatório para Ana Mae Barbosa, que comenta:
167
BARBOSA, Ana Mae. Uma introdução à Arte/Educação contemporânea in BARBOSA, Ana Mae (org).
Arte/Educação Contemporânea : consonâncias internacionais. São Paulo: Cortez, 2005.p.15
168
BARBOSA, Ana Mae (Org). Inquietações e mudanças no ensino da arte. São Paulo: Cortez, 2002, p.14.
107
169
BARBOSA, Ana Mae. Tópicos Utópicos. Belo Horizonte: C/ Arte, 1998, p.15.
170
BARBOSA, Ana Mae (Org). Inquietações e mudanças no ensino da arte. São Paulo: Cortez, 2002, p.14.
108
Com a atenção que a educação vem dando às novas tecnologias na sala de aula,
torna-se necessário não só aprender a ensiná-las, inserindo-as na produção cultural
dos alunos, mas também educar par a recepção, o entendimento e a construção de
valores das artes tecnologizadas, formando um público consciente 174.
171
BARBOSA, Ana Mae. Uma introdução à Arte/Educação contemporânea in BARBOSA, Ana Mae (org).
Arte/Educação Contemporânea : consonâncias internacionais. São Paulo: Cortez, 2005.p.17.
172
BARBOSA, Ana Mae. Dilemas da Arte/Educação como mediação cultural em namoro com as
tecnologias contemporâneas in BARBOSA, Ana Mae (org). Arte/Educação Contemporânea :
consonâncias internacionais. São Paulo: Cortez, 2005.p.109.
173
Idem, ibidem, p.110.
174
Idem, ibidem, p.111.
175
Idem, ibidem, p.112.
109
se refere àqueles que não tiveram, no ambiente escolar, acesso às novas tecnologias. Para
ela,
176
Idem, ibidem, p.112.
177
BARBOSA, Ana Mae. A imagem no Ensino da Arte. São Paulo: Pesrspectiva; Porto Alegre: Fundação
Ioschpe, 1991, p.32.
178
Idem, ibidem, p.32.
110
A Proposta Triangular foi influenciada por outras três abordagens: “as Escuelas al
Aire Libre mexicanas, o Critical Studies inglês e o Movimento de Apreciação Estética
182
aliado ao DBAE (Discipline Based Art Education) americano” . Ana Mae Barbosa
adaptou tais abordagens para a realidade brasileira, buscando uma proposta que pudesse
dar conta das necessidades de um país no qual o ensino da Arte tem pouca
representatividade e ainda há crianças e adolescentes fora da escola. A autora cita o
momento da alfabetização e da adolescência como os de maior necessidade da Arte para o
ser humano e comenta que “há uma alfabetização cultural sem a qual a letra pouco
significa. A leitura social, cultural e estética do meio-ambiente vai dar sentido ao mundo da
179
Idem, ibidem, p.35.
180
BARBOSA, Ana Mae. Tópicos Utópicos. Belo Horizonte: C/ Arte, 1998, p.33.
181
Idem, ibidem, p.33.
182
Idem, ibidem, p.33-34.
111
A Proposta Triangular, como adaptação, não é uma cópia, uma tradução das
abordagens acima citadas. Ana Mae Barbosa comenta que, no Rio Grande do Sul, alguns
educadores se opuseram ferrenhamente à sua proposta por designá-la cópia do DBAE. Mas
ele defende que
183
BARBOSA, Ana Mae. A imagem no Ensino da Arte. São Paulo: Pesrspectiva; Porto Alegre: Fundação
Ioschpe, 1991, p.28.
184
Idem, ibidem, p.33.
185
BARBOSA, Ana Mae. Tópicos Utópicos. Belo Horizonte, C/ Arte, 1998, p37.
186
PILLAR, Analice; VIEIRA, Denyse. O vídeo e a Metodologia Triangular no Ensino da Arte. Porto
Alegre: Universidade Federal do Rio Grande do Sul: Fundação Ioschpe, 1992, p17.
112
A leitura da imagem propõe que o educando possa ler a imagem a partir de seus
diversos significados, significando-a conforme o contexto que se insere e dando a ela uma
interpretação pessoal, ao mesmo tempo em que busca os elementos visuais próprios da
arte. “A leitura da imagem, nesta proposta de ensino da Arte, quer desenvolver as
habilidades de ver, julgar e interpretar as qualidades das obras, compreendendo os
elementos e as relações estabelecidas no todo do trabalho” 188. Ana Mae Barbosa dá ênfase
à leitura quando afirma que “num país onde os políticos ganham eleições através da
televisão, a alfabetização para a leitura é fundamental, e a leitura da imagem artística,
189
humanizadora” . Fazer a leitura das imagens de Sebastião Salgado ou das reproduções
de Arte Contemporânea possibilitaram aos educandos envolvidos nos projetos citados
maiores subsídios para entender o apelo imagético atual, e mais, para saber selecionar o
que há de positivo e questionar o que não tem qualidade. Para a autora,
187
Idem, ibidem, p.17.
188
PILLAR, Analice; VIEIRA, Denyse. O vídeo e a Metodologia Triangular no Ensino da Arte. Porto
Alegre: Universidade Federal do Rio Grande do Sul: Fundação Ioschpe, 1992, p.18.
189
BARBOSA, Ana Mae. Tópicos Utópicos. Belo Horizonte: C/ Arte, 1998, p.35.
113
A história da Arte tem a intenção de contextualizar a obra no seu tempo, para que o
educando saiba o que acontecia quando o artista produziu sua obra, como era o modo de
vida, que visão da Arte e do artista aquele momento histórico possuía, que relação os
sujeitos da época tinham com a Arte, que materiais o artista utilizava, que influências o
modo de vida teve na obra do artista, pois “apesar de ser um produto da fantasia e da
imaginação, a arte não está separada da economia, da política e dos padrões sociais que
191
operam na sociedade” . Ana Mae Barbosa afirma que “contextualizar é estabelecer
relações. Neste sentido, a contextualização no processo ensino-aprendizagem é a porta
aberta para a interdisciplinaridade” 192. Ainda, que “a contextualização pode ser a medição
entre percepção, história, política, identidade, experiência e tecnologia, que transformará a
tecnologia de mero princípio operativo em um modo de participação, tornando visíveis os
193
mundos participatórios do consumo imediato” . Contextualizar a obra de Sebastião
Salgado e de outros diversos artistas contemporâneos possibilitou aos educandos
envolvidos nos projetos citados uma maior percepção do mundo que os rodeia para além
do cotidiano. As imagens remetem a outros países, culturas, tecnologias, que abrangem um
mundo globalizado, mas ainda assim com particularidades que diferenciam realidades,
incluindo a deles próprios.
Acredita-se que à Proposta Triangular compete a formação mais acadêmica do
educando, mas que somente tal formação não é suficiente. Concomitante a ela, é necessário
educar a sensibilidade do educando, para significar seu cotidiano, que está repleto de
sensações e emoções, e que, seguidamente, são escondidas e mascaradas, pois a sociedade
prima pela razão, desconsiderando estados emocionais inerentes ao ser humano. A própria
Ana Mae Barbosa aborda a Educação do Sensível mais recentemente, e define
sensibilidade como desenvolvimento dos sentidos, dizendo ser esta a única concepção de
sensibilidade que interessa ao ensino da Arte. “Esta definição de sensibilidade como
conjunto de funções que buscam a inteligibilidade, o prazer, a sensualidade é a que
190
Idem, ibidem, p.40.
191
PILLAR, Analice; VIEIRA, Denyse. O vídeo e a Metodologia Triangular no Ensino da Arte. Porto
Alegre: Universidade Federal do Rio Grande do Sul: Fundação Ioschpe, 1992, p18.
192
BARBOSA, Ana Mae. Tópicos Utópicos. Belo Horizonte: C/ Arte, 1998, p.39.
193
Idem, ibidem, p.43.
114
... não será demais insistir que a Educação do Sensível, antes de significar um
desfile de obras de arte consagradas e de discussões históricas e técnicas perante
os olhos e ouvidos dos educandos, deve se voltar primeiramente para seu
cotidiano mais próximo, para a cidade onde vive, as ruas e praças pelas quais
circula e os produtos que consome, na intenção de despertar sua sensibilidade para
com a vida mesma, consoante levada no dia-a-dia. A Educação do Sensível é,
sobretudo e primeiramente, a educação dos nossos sentidos perante os estímulos
mais corriqueiros e até comezinhos que a realidade do mundo moderno nos
oferece em profusão – quantidade que, evidentemente, não significa qualidade 197.
194
BARBOSA, Ana Mae. Dilemas da Arte/Educação como mediação cultural em namoro com as
tecnologias contemporâneas in Barbosa, Ana Mae (org). Arte/Educação Contemporânea : consonâncias
internacionais. São Paulo: Cortez, 2005.p.99.
195
DUARTE Jr. João Francisco. O sentido dos sentidos: a educação (do) sensível. 2ed. Curitiba: Criar, 2003,
p.13.
196
Idem, ibidem, p.23.
197
Idem, ibidem, p.25.
115
Para tanto, a inserção deste sujeito num dada realidade, numa dada comunidade e
cultura local não pode ser menosprezada em favor de um universalismo abstrato e
extirpador de raízes. Sentir o mundo consiste, primordialmente, em sentir aquela
sua porção que tenho ao meu redor, para que então qualquer pensamento e
raciocínio abstrato acerca dele possa acontecer a partir de bases concretas e, antes
de tudo, sensíveis. Porque tal desenraizamento, tal dessensibilização para com a
realidade da qual fazemos parte, caracterizou até aqui o grosso da educação oficial
a que nos submetemos, sempre ciosa em ensina as grandes verdades universais, o
grande pensamento, a grande ciência, desconsiderando todo e qualquer “pequeno
198
saber” detido pelos membros da cultura local .
198
Idem, ibidem, p.175-176.
116
da Arte, sendo possível uma visão mais crítica e seletiva das imagens que estão à sua volta
diária e constantemente. Ainda, busca-se perceber como a sensibilidade do educando foi
aguçada e explorada para que houvesse um maior entendimento da realidade e uma
preocupação com ações possíveis para modificar tal realidade.
No primeiro projeto, “Nós, Sebastião e a Comunidade”, o processo não foi linear,
pois a leitura da imagem, a contextualização histórica e o fazer artístico aconteceram várias
vezes, num movimento constante no decorrer do projeto. A primeira ação foi a visita à
exposição das reproduções das fotografias do álbum Êxodos, de Sebastião Salgado. Na
exposição, os educandos fizeram anotações sobre as imagens, e em sala de aula
socializaram tais informações e fizeram uma leitura contextualizada das mesmas. Os
educandos estudaram a vida e a obra de Sebastião Salgado a partir de texto trazido pelo
educador. Algumas reproduções fotográficas de Sebastião Salgado foram apreciadas em
sala de aula, oportunizando aos educandos um contato mais direto com as imagens. Foi
possível fazer um exercício de trazer para a realidade do próprio educando o teor das
imagens, no sentido de como tais situações aconteciam no lugar de origem dos mesmos,
buscando atingir a sensibilidade. A leitura da imagem e a contextualização histórica
estiveram contempladas.
A seguir efetivou-se a leitura de imagens do modernismo brasileiro, quando cada
grupo de educandos fez leitura da imagem do artista escolhido e pesquisou sobre a vida e a
obra do mesmo a fim de fazer relações do conteúdo da obra com o cotidiano. Estudou-se
em conjunto o período modernista no Brasil, a Semana de Arte Moderna de 1922, os
acontecimentos históricos da época através de pesquisa em fontes disponíveis na biblioteca
da escola e de materiais fornecidos pelo educador. Foram feitas pinturas, desenhos e
objetos tridimensionais a partir do assunto. Não é possível esquecer que os educandos
tiveram momentos de reflexão sobre os assuntos em pauta e registraram em textos suas
impressões e sentimentos. Com efeito, acredita-se ter contemplado a triangulação: leitura
da imagem, contextualização histórica e fazer artístico, bem como, a Educação do
Sensível.
Dos conceitos próprios da Arte, a linguagem fotográfica foi o conceito mais
explorado. Os demais foram sendo estudados de acordo com a necessidade de cada
educando. Analisou-se a fotografia enquanto documento e enquanto criação artística, o
processo fotográfico, o processo de interferência na fotografia e o porquê da fotografia em
preto e branco. Acredita-se que a sistematização de todo o projeto ocorreu com o fazer
artístico utilizando a linguagem fotográfica e, por mais que não tenha sido possível, como
117
era a intenção inicial, documentar com filme preto e branco, o processo de fotografar. O
resultado plástico das fotografias foram imensamente compensadores para os educandos e
educador. Ainda, os textos dos educandos escritos durante todo o processo foram respostas
à sensibilização que perpassou todo o projeto, desde a apreciação de imagens até o fazer
artístico em si.
No segundo projeto, “A Arte Contemporânea – Uma Ponte com a Comunidade
Local”, pensando-se na Proposta Triangular, fez-se apreciação e leitura de imagens de
obras contemporâneas e o estudo sobre algumas manifestações contemporâneas. Os
educandos participaram deste processo ativamente, pois o educador deixou à disposição
materiais de pesquisa para que os próprios educandos conceituassem Arte Contemporânea.
O processo de contextualização histórica foi tranqüilo por ser a época vivida pelos
educandos. O fazer artístico aconteceu através de composições criadas conforme as
manifestações da Arte Contemporânea e de assuntos relacionados ao cotidiano dos
educandos. Também acredita-se que a Proposta Triangular tenha sido contemplada aqui,
mas pensa-se que a Educação do Sensível deixou a desejar em relação ao primeiro projeto,
mesmo tendo suscitado reflexões e textos sobre os problemas cotidianos. Isto porque
observou-se um envolvimento emocional menor por parte dos educandos.
Os projetos relatados não foram criados no intuito de pôr em prática a Proposta
Triangular – como opção de proposta de ensino de Arte na escola – e a Educação do
Sensível a partir da educação popular. Esta constatação deu-se posteriormente, quando em
pesquisa teórica mais profunda tais questões foram percebidas e repensadas. Apesar do
trabalho não ter sido feito com consciência teórica, de antemão, verificou-se que os
projetos foram significativos para os educandos que deles participaram, contribuindo para
a construção do conhecimento dos mesmos.
dizer que:
A educação, que deveria significar o auxílio aos indivíduos para que pensem sobre
a vida que levam, que deveria permitir uma visão do universo cultural em que
estão inseridos, se desvirtua das escolas. Impõe-se uma visão de mundo e
transmite-se conhecimentos desvinculados das experiências da vida. Em suma:
preparam-se pessoas para executar um trabalho parcializado e mecânico, no
contexto social; pessoas que se preocupam apenas com o seu trabalho (com o seu
lucro), sem perceber como ele se liga a todos os outros no interior da sociedade.
No fundo isto se constitui mais num adestramento do que numa educação 199.
A arte como linguagem aguçadora dos sentidos transmite significados que não podem ser
transmitidos por meio de nenhum outro tipo de linguagem, tal como a discursiva ou a
científica. Dentre as artes, as visuais, tendo a imagem como matéria-prima, tornam possível a
visualização de quem somos, de onde estamos e de como sentimos 200.
199
DUARTE Jr. João Francisco. Por que Arte-Educação? 17.ed. Campinas: Papirus. 2006, p. 34. (Col.
Ágere).
200
BARBOSA, Ana Mae. Dilemas da Arte/Educação como mediação cultural em namoro com as
tecnologias contemporâneas in Barbosa, Ana Mae (org). Arte/Educação Contemporânea : consonâncias
internacionais. São Paulo: Cortez, 2005.p.99.
119
201
esse saber” . A Arte é conhecimento e contém em si informação, tradição, cultura. Para
além da educação e da cognição, ainda está intrinsecamente ligada a diversas profissões, o
que diz respeito ao crescimento do país. Então,
Ana Mae Barbosa afirma que “se a arte não fosse importante não existiria desde o
203
tempo das cavernas, resistindo a todas as tentativas de menosprezo” . Se desde tempos
imemoriais a Arte faz parte do cotidiano do ser humano, se é uma produção do ser humano,
não é possível retirar dela sua importância histórica enquanto legado cultural e artístico da
humanidade, nem enquanto necessidade para a sobrevivência social e econômica dos
sujeitos. E:
A Arte para o educando de uma escola popular, então, precisa ser um fator de
identificação deste com a cultura presente no seu espaço, e um identificador da cultura
201
MARTINS, Miriam Celeste; PICOSQUE, Gisa; GUERRA, M. Terezinha Telles. Didática do Ensino da
Arte: a língua do mundo: poetizar, fruir e conhecer arte. São Paulo: FTD, 1998, p13.
202
BARBOSA, Ana Mae. A Imagem no ensino da Arte. São Paulo: Perspectiva, 1991, p.04.
203
Idem, ibidem, p.27.
204
BARBOSA, Ana Mae. Tópicos Utópicos. Belo Horizonte: C/Arte, 1998, p.16.
120
construída ao longo da história. Conhecer a Arte, a história, o contexto no qual a obra foi
criada, são imprescindíveis para o educando estar no mundo e agir nele. No entanto, é
fundamental que o educando faça relações com sua realidade, como aconteceu nas
experiências empíricas relatadas, quando os educandos criaram objetos artísticos os mais
diversos, fizeram fotografias do seu contexto e conseguiram registrar as impressões,
sentimentos e experiências através da escrita. O conhecimento se dá quando o todo é
contemplado: o sentido acadêmico, aqui entendido como a Proposta Triangular, mais a
Educação do Sensível e a escrita enquanto uma possibilidade de registro da reflexão sobre
todo o processo. Voltando à dificuldade de acesso à obra de Arte, Ana Mae Barbosa faz um
comentário bastante significativo ao abordar as possibilidades tecnológicas em relação ao
ensino e apreciação da Arte. Ela diz que:
Antes do computador, nosso remoto acesso às obras de arte dava-se apenas por meio
de livros caríssimos, que no Brasil eram produzidos principalmente pelos bancos par
presentear clientes no fim do ano, pois até os catálogos eram raros e em preto e
branco. Nós, professores e alunos de arte, ficávamos a ver navios. Que professor tem
capital suficiente para ser considerado bom cliente de instituições financeiras, tão
bom que justifique ganhar um presente do banco no fim do ano?
Os vídeos CDROM e DVDs produzidos sobre artistas, exposições e coleções vieram
democratizar muito o aceso à obra de arte visual, embora para usá-los em sala de
aula, freqüentemente, tive de passá-los primeiramente sem som, só a imagem,
porque os textos supostamente críticos eram tão pobres, tão ufanistas, tão melosos e
inócuos que tinha medo que contaminassem a percepção e a capacidade de análise
dos meus alunos 205.
205
BARBOSA, Ana Mae. Dilemas da Arte/Educação como mediação cultural em namoro com as
tecnologias contemporâneas in Barbosa, Ana Mae (org). Arte/Educação Contemporânea : consonâncias
internacionais. São Paulo: Cortez, 2005.p.105.
121
206
somente os sentimentos que existem nela própria” . A Arte não pode ser compreendida
pela lógica e pela razão, mas pelo sentimento, pois além de ser conhecimento, também é
prazer, e diz da formação subjetiva dos sujeitos. Por exemplo, quando um educando observa
a obra de Sebastião Salgado, o fotógrafo não quer que este educando constate que há
depósitos de lixo nas periferias e que pessoas vivem dele, pois isto seria o significado da
fotografia. O fotógrafo está exprimindo sentimentos em relação à questão do “lixão”, e
buscou uma forma de mostrar tal sentimento. Assim, para João Francisco Duarte Jr.,
A Arte, então, não está regida por regras e convenções rígidas, explicitamente
formuladas, como a linguagem. Se a Arte, de certa forma, Simboliza sentimentos,
ela o faz de maneira diversa da simbolização lingüística: ela Simboliza apenas e
tão-somente os sentimentos que existem nela própria, engastados em suas formas.
Ela não nos remete a significados conceituais, mas a sentidos do mundo dos
sentimentos 207.
... os estudantes têm o direito de contar com professores que estudem e saibam
arte vinculada à vida pessoal, regional, nacional e internacional. Ao mesmo
206
DUARTE Jr. João Francisco. Por que Arte-Educação? 17.ed. Campinas: Papirus, 2006 p. 46. (Col.
Ágere).
207
Idem, ibidem, p.47.
208
FUSARI, Maria F. de Rezende e; FERRAZ, Maria H. C. de Toledo. Arte na educação escolar. São Paulo:
Cortez, 1992, p. 49. (Coleção magistério 2° grau. Série formação geral).
122
209
Idem, ibidem, p. 49.
210
MARTINS, Miram Celeste. In: BARBOSA, Ana Mae. Inquietações e mudanças no ensino da arte. São
Paulo: Cortez, 2002, p.52.
123
Esse educador/mediador remete a Paulo Freire de uma forma muito concreta, pois
para ele o educador precisa ser dialógico, interagir constantemente com o educando,
intermediar os saberes e assim, ensinar aprendendo. E ainda ser sensível, amoroso, tanto
em relação ao cotidiano do educando quanto à obra consagrada.
Existe um distanciamento, nesse país, da Arte/Educação e do artista em si. É muito
raro ter conhecimento do artista – fala-se do artista vivo, que está em pleno processo de
criação – dentro da escola. Ana Mae Barbosa preocupa-se com esta ausência e com a visão
que alguns artistas têm da Arte/Educação ao pensarem que a mesma não é necessária, pois,
para eles, Arte não se ensina: tais artistas dão a impressão de que a arte é domínio
exclusivo do artista, e não um legado da humanidade para ela mesma, ao qual todos
deveriam ter acesso. A autora comenta que “na cultura artística brasileira, educação é
212
considerada sinônimo de mediocridade” . Então, a autora propõe que “compete a nós,
professores de arte e artistas, numa ação conjunta, tentar através da educação pública uma
melhor distribuição do patrimônio artístico, da riqueza estética, elevando assim a qualidade
213
de vida da população” . Ainda referindo-se ao assunto artista/escola, explicita o que,
para ela, seria a educação, referindo-se inclusive a Paulo Freire:
211
MARTINS, Miram Celeste. In: BARBOSA, Ana Mae. Inquietações e mudanças no ensino da arte. São
Paulo: Cortez, 2002, p.56.
212
BARBOSA, Ana Mae (org). Arte/Educação Contemporânea : consonâncias internacionais. São Paulo:
Cortez, 2005.p.102.
213
BARBOSA, Ana Mae. Arte-educação: conflitos/acertos. São Paulo: Max Limonad Ltda, 1984, p.160.
124
214
Idem, ibidem, p.160-61.
5. CONSIDERAÇÕES FINAIS
215
MARTINS, Miram Celeste In: BARBOSA, Ana Mae. Inquietações e mudanças no ensino da arte. São
Paulo: Cortez, 2002, p.58.
126
apesar disso continuar tendo acesso limitado à Arte Universal. Porém, sem esquecer que
não existe diálogo sem esperança, é isso também que ensina Paulo Freire. E a esperança
mostra-se na luta, na incorformidade, na inquietude, na curiosidade e no
compartilhamento. Esse processo de ouvir, articular e mediar foi experimentado nos
projetos relatados, quando se ouviu as situações de vida dos educandos, discutiu-se com os
mesmos sobre os problemas enfrentados no cotidiano e sobre seus anseios. A dialogicidade
se deu nas relações que estes fizeram das obras com sua vida e, por fim, no processo de
criação que sistematizou e tornou visível todo o processo reflexivo.
Crê-se que a Arte não estará sempre distante, restrita às galerias e museus, mas que as
manifestações de Arte próximas sejam igualmente valorizadas e que transformem-se em
objetos de estudo, tanto quanto aquelas consagradas pela história e pela crítica. A Arte na
escola tem a responsabilidade de inserir o educando no mundo da Arte Universal, de fazê-
lo sentir-se parte integrante do conhecimento historicamente construído. Esta inserção
precisa estar além da repetição da vida e obra de artistas, que são importantes, mas que
sozinhas não terão significado para o educando. É necessário que o mesmo consiga
conectar este saber com sua realidade, entender o porquê de o artista ter criado daquela
forma a partir do contexto histórico no qual vivia, reportar-se ao seu cotidiano e imaginar
como o artista faria se vivesse no tempo de agora. Isso não significa decifrar a obra, mas
sentí-la e entender que relações são possíveis fazer a partir dela. Assim, a percepção e
sensibilidade estão intrinsecamente ligadas ao cotidiano do educando, e serão fatores
decisivos quando do processo de criação deste sujeito. João Francisco Duarte Jr. se
manifesta, nesse sentido, ao escrever que:
216
DUARTE Jr. João Francisco. O sentido dos sentidos: a educação (do) sensível. 2ed. Curitiba: Criar, 2003,
p.27.
127
No que diz respeito à cultura local, pode-se constatar que apenas o nível erudito
desta cultura é admitido na escola. As culturas de classes sociais baixas continuam
a ser ignoradas pelas instituições educacionais, mesmo pelos que estão envolvidos
na educação destas classes. Nós aprendemos com Paulo Freire a rejeitar a
segregação cultural na educação. A décadas de luta para salvar os oprimidos da
ignorância sobre eles próprios nos ensinaram que uma educação libertária terá
sucesso só quando os participantes no processo educacional forem capazes de
identificar seu ego cultural e se orgulhar dele. Isto não significa a defesa de guetos
culturais, nem de excluir a cultura erudita das classes baixas. Todas as classes têm
o direito de acesso aos códigos da cultura erudita porque esses são os códigos
dominantes – os códigos do poder. É necessário conhecê-los, ser versado neles,
mas tais códigos continuarão a ser um conhecimento exterior a não ser que o
indivíduo tenha dominado as referências culturais da própria classe social, a porta
de entrada para a assimilação do ‘outro’. A mobilidade social depende da inter-
relação entre os códigos culturais das diferentes classes sociais 217.
217
BARBOSA, Ana Mae. Tópicos Utópicos. Belo Horizonte: C/Arte. 1998, p.14-15.
128
fatos vividos, pois as imagens e situações às quais as mesmas remetem, têm semelhanças
com o cotidiano do educando da escola pública na qual se fez o projeto.
No projeto “Arte Contemporânea: uma ponte com a comunidade local” as relações
com a realidade também foram intensas, pois as criações decorrentes do
ensino/aprendizado em Arte aconteceram a partir de situações desta realidade, de fatos
vividos e presenciados. No entanto, o envolvimento emocional, que diz do sensível, foi em
menor grau em relação ao primeiro projeto. Não houve uma entrega dos educandos ao
projeto, no sentido de o tomarem para si como se fosse seu. Os educandos envolveram-se
em um processo de sala de aula, e não em um projeto de vida.
Vale dizer que as propostas pedagógicas realizadas e relatadas no primeiro capítulo
buscaram dimensionar a Arte a partir do que se acredita ser importante para o
ensino/aprendizagem do educando. Se a Arte é importante, se é imprescindível para o ser
humano, então é necessária dentro da escola, para que o educando que lá está construa um
conhecimento que contribua para que seja realmente sujeito de sua história. Isto é, tem-se
convicção de que a Arte, abordada sob o prisma da Proposta Triangular, da Educação do
Sensível e sob a ótica freiriana de educação, seja um viés para a emancipação dos
cidadãos. Cidadãos estes que, conscientes de seu ponto de partida, possam assumir seu
papel na luta de um mundo mais justo, que lhes dê condições de acesso a tudo e a todos.
Por fim, faz-se necessário dizer que os objetivos aos quais se tinha proposto ao
escrever tal dissertação foram atingidos, pois o embasamento teórico sobre a experiência
relatada aconteceu de forma satisfatória. Ainda, foi possível aprofundar-se no estudo da
educação popular de Paulo Freire e na Arte/Educação, fazendo relações de tais revisões
teóricas entre si e com os projetos relatados.
6. BIBLIOGRAFIA
BARBOSA, Ana Mae. A Imagem no ensino da Arte. São Paulo: Perspectiva, Porto Alegre:
Fundação Ioschpe, 1991.
DUARTE Jr. João Francisco. O sentido dos sentidos: a educação (do) sensível. 2.ed.
Curitiba: Criar, 2003.
______________________ Por que Arte-Educação? 17.ed. Campinas: Papirus, 2006. (Col.
Ágere).
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justiça, com a ética, com os oprimidos que querem construir a Escola Democrática e
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130
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