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Ondjiva ± O director provincial da Cultura no Cunene, Celestino Vicente, mostrou-se nesta


segunda-feira, em Ondjiva, capital local, preocupado com a proliferação de ceitas religiosas.

O sector notificou 21 instituições religiosas ilegais das 63 existentes na região.

O responsável, que falava hoje à Angop sobre as actividade do sector, disse que o surgimento de
várias igrejas ilegais, com os vários tipos de convicções, preocupa o sector, tendo em conta que
muitas destas instituições religiosas não contribuem para a paz social e equilíbrio mental do
cidadão.

³Em vez de ser um instrumento catalisador no fomento da paz de espírito e união entre os
citadinos, algumas promovem a divisão e discórdia no seio da sociedade cristã´, precisou.

Celestino Vicente frisou que na maioria estas igrejas ilegais assumem outros papeis, tal como de
casas de curandeiros, internando doentes com diversas enfermidades, alegando que, por
intermédio de oração e outras práticas exercidas nestes templos, poderá salvar o enfermo, facto
que contradiz com os princípios bíblicos.

Informou que o governo central, através do Ministério da Cultura, está a levar a cabo um trabalho
conjunto com outros sectores, com objectivo de estudar este fenómeno religioso e pôr fim a esta
prática que fere os bons costumes do cristianismo.

Contudo, o director da Cultura no Cunene apelou às igrejas a cumprirem o seu verdadeiro papel
dentro da sociedade, como fortes parceiros sociais do Estado na resolução de alguns problemas da
população.

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Em Cabinda, há quem recorra à religião para ganhar dinheiro. O negócio é lucrativo já que os seus
promotores encontram receptividade no seio da população, sobretudo entre as pessoas
desesperadas que, face às dificuldades sociais, recorrem às seitas na tentativa de atenuarem os
efeitos dos seus infortúnios.

E pagam a pronto. Até há cinco anos, o negócio das seitas era controlado por imigrantes ilegais
oriundos da RDC. Hoje, e por se tratar de um negócio de enriquecimento fácil, muitos cidadãos
nacionais fundam os seus «templos». A prosperidade do negócio promove a proliferação de seitas
religiosas ilegais por tudo quanto é canto da cidade de Cabinda. A maior parte delas estão
instaladas em quintais e os moradores das redondezas queixam-se que são massacrados com o
barulho ensurdecedor dos altifalantes que amplificam as orações e os cânticos de louvor a Deus. c

Afonso Zinga e Daniel Bongo, ambos moradores no bairro Chimpidi, são vizinhos da igreja
«Combate Espiritual» que tem origem no Congo Democrático. Disseram à reportagem do «JÁ»
que estão cansados com o funcionamento do templo, porque o barulho é tanto que atenta contra
as regras mínimas da boa vizinhança. São orações e cânticos 24 horas sobre 24 «com um barulho
que inquieta os vizinhos».

Afonso Zinga ainda acrescenta mais uma preocupação: «os meus filhos não conseguem estudar
em casa com o barulho que esta igreja faz». Os moradores do bairro já apresentaram queixa
contra a seita, mas ninguém tomou medidas.

Papás e pastores

Os chefes das seitas atribuem a si próprios o título de «Papá Pasteur». E são figuras muito
consideradas no seio dos fiéis das igrejas, apesar de serem também o principal instrumento de
extorsão de dinheiro aos seguidores. Os pastores destas seitas ilegais sacam aos fiéis gordas
esmolas e dízimos, recorrendo à uma profecia bíblica: «quem vai a casa de Deus não vai de mãos
vazias». Quem não tem dinheiro, paga com bens, mais ou menos valiosos. Em troca, os papás
pastores prometem que Jesus irá operar maravilhas nas vidas dos doadores.

A nossa reportagem apurou que os papás pastores, na esmagadora maioria dos casos, apenas
falam o «lingala» na celebração da liturgia, e nos cânticos de louvor a Deus. O Secretário
Provincial do Conselho de Igrejas Cristãs de Angola (CICA) em Cabinda, reverendo João Alberto,
disse à nossa reportagem que os papás pastores «estão camuflados como servidores de Jesus
Cristo» mas a única coisa que praticam é o «mercantilismo religioso». O reverendo João Alberto,
da Igreja Evangélica Reformada de Angola (IERA), disse que «eles estão a aproveitar-se da
mensagem bíblica para dizer que conseguem resolver infortúnios, como acabar com a miséria e a
pobreza, bastando para tal acreditar em milagres e gritar pelo nome de Jesus».

João Alberto acrescentou: «Isto de ponto de vista teológico é uma aberração, porque Deus deu ao
homem a inteligência para transformar a natureza para o seu próprio benefício e o homem deve,
acima de tudo, trabalhar para ganhar a vida e nunca, conforme estas igrejas anunciam, depender
tão-somente da fé, de esmolas gordas ou de dízimos».
«Na Bíblia, está escrito que o homem deve trabalhar para conseguir o seu pão», disse ainda o
reverendo João Alberto, que alerta às autoridades e à sociedade para uma questão ainda mais
grave: «muitas destas seitas religiosas ilegais transformaram-se em locais de internamento para
tratamento e cura de doentes. E os pacientes, em vez de se dirigirem aos centros hospitalares,
recorrem a estes sítios onde muitas vezes encontram a morte».

Seitas da morte

As acusações de feitiçaria feitas por estes pastores a adultos e crianças já levaram muita gente à
morte. Em algumas «igrejas», as crianças, para se libertarem do «feitiço» e expulsarem os maus
espíritos, são obrigadas a jejuns que vão dos 20 aos 45 dias. «Não são os chinlongos (casas de
oração e de cura) que vão resolver os problemas de saúde das pessoas» disse o reverendo João
Alberto, que aconselha as autoridades a exigirem a legalização dessas seitas como «centros de
cura tradicionais», para haver um maior controlo.

O Chefe de Departamento Provincial da Cultura em Cabinda, Francisco Ângo, acusou os


responsáveis de seitas religiosas ilegais de serem os principais causadores da morte de muitos
cidadãos, que ocorrem nos templos, como consequência de falsos diagnósticos e das terapias. «A
proliferação de seitas em Cabinda deixou de ser normal, agora é muito preocupante, tendo em
conta o número de igrejas ilegais existentes na província e as consequências que o fenómeno
estão a causar no seio de muitas famílias».

Francisco Ângo recordou o caso da seita religiosa que fez cinco crianças reféns sob a alegação de
serem feiticeiras, uma odisseia que culminou com a detenção e julgamento dos responsáveis da
seita. O chefe do Departamento Provincial da Cultura disse que o número de seitas ilegais
existente em Cabinda é assustador e aumenta todos os dias. Actualmente, a instituição tem
notificadas 110 igrejas ilegais e 46 reconhecidas. Mas Francisco Ângo considera abismal o número
de igrejas numa região cujos habitantes são maioritariamente cristãs.

Francisco Ângo disse que o Governo está preocupado com o fenómeno de proliferação de seitas
religiosas, e apelou à conjugação de esforços no sentido de se banir esta prática que está a causar
graves problemas em várias famílias, por acusações de feitiçaria que culminam na morte de entes
queridos. «Estamos preocupados com o comportamento dessas seitas, mas a população vítima
das seitas deve queixar-se aos órgãos locais de justiça», concluiu.

Combater o fenómeno

O reverendo João Alberto diz que as autoridades que intervêm no processo de legalização de
igrejas em Angola, ?deveriam, antes de conceder a permissão das suas actividades, inteirarem-se
sobre o conteúdo e essência da sua doutrina. Apesar de falarem de Cristo, eles desvirtuam a sua
doutrina ao usarem a magia, o que contraria os princípios consagradas na Bíblia?.

Do ponto de vista sociológico, o reverendo João Alberto admite que a proliferação de seitas é um
fenómeno derivado da transformação política decorrente no país, ?daí que seja importante
identificar as igrejas ilegais, quem são as pessoas que as frequentam, a faixa etária, as suas
condições sociais, se trabalham ou não, o que ganham, se são casados ou não?.

Na vertente teológica, o representante do CICA em Cabinda, adverte as pessoas a não brincarem


com a religião, ?pois ela não é uma actividade comercial, mas de ligação do homem com Deus, a
quem devemos o culto de adoração por nos ter criado e, acima de tudo, por se considerar que é a
providência divina que guia o homem. A igreja é um sacramento de salvação, um instrumento
onde o homem realiza a redenção que Cristo trouxe para toda a humanidade?.

Legalizar é fácil

O reverendo João Alberto defende a necessidade da criação de uma estrutura oficial, que envolva
a participação de representantes das diversas igrejas tradicionais existentes em Angola, de modo
a contribuírem na análise de dossiers referentes a pedidos de abertura de novas igrejas e da sua
legalização. «A actual lei concede autorizações e legalizações de uma forma muito fácil, daí o
surgimento em Angola de muitas seitas religiosas ligadas aos novos movimentos pentecostais com
origem na República Democrática do Congo.
A assembleia-geral do CICA, realizada em 2007, em Luanda, recomendou ao Ministério da Justiça
e ao Ministério da Cultura para terem em conta o fenómeno das seitas ilegais, colocando junto da
Direcção Nacional de Assuntos Religiosos, individualidades com conhecimentos em teologia.
«Hoje, até o Budismo esta sendo reconhecido. Nós não estamos contra, mas atenção com os
preconceitos dessas igrejas que não se compadecem com os usos e costumes dos angolanos»,
disse o reverendo João Alberto. O ?JA? apurou que o Ministério da Justiça e o Ministério da Cultura
suspenderam as autorizações para a abertura de novas igrejas.

Poder mágico

As seitas religiosas ilegais em Cabinda utilizam a magia negra como forma de ludibriar os crentes
que procuram cura para as suas doenças e uma vida melhor. Francisco Ângo é muito claro: «estes
sítios só aumentam a pobreza e miséria das pessoas e os pastores não passam de ilusionistas,
praticantes de artes mágicas, que aprendem em escolas de Kinshasa». Muitos pastores, antes de
emigrarem para Cabinda, «frequentam cursos de magia durante dois ou três meses, recebem os
diplomas e depois vêm para Angola enganar o Povo», denunciou Francisco Ângo.

O reverendo João Alberto alertou a população para a existência de falsos profetas, líderes
religiosos e pastores que fazem da religião «fonte para ludibriar e extorquir bens a cidadãos. O
nosso povo é cristão e sempre conheceu a palavra de Deus, daí que peço a todos os que estão
vinculados às igrejas tradicionais para não se deixarem enganar».

Fonte:Angop

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Huambo - O director provincial da cultura no Huambo, Pedro Nambongue Chissanga, mostrou-se


hoje, nesta cidade, preocupado com a proliferação de seitas religiosas que, clandestinamente, tem
vindo a realizar em alguns bairros desta cidade suas actividades.

Até ao momento, segundo disse, "estão nesta condição cerca de mil seitas religiosas", que
realizam cultos em locais inapropriados, que, no entanto, nem sequer deram os primeiros passos
para que figurem no lote de igrejas em vias de legalização.

Pedro Nambongue Chissanga considerou de "alarmante" tal número de seitas, pelo facto da
província do Huambo estar situada no interior do país, sem fazer fronteira com países nos quais
são originárias estas seitas religiosas.

Porém, disse, a sua instituição tem a situação controlada mediante a aplicação da lei que regula a
actividade religiosa em Angola.

"A actividade religiosa, sabemos todos, é licenciada pelo Ministério da Justiça, é claro, com o
parecer do Ministério da Cultura e é neste sentido que temos trabalhado para neutralizarmos
todas aquelas seitas que insistem em realizar sua actividades sem estarem devidamente
legalizadas", sublinhou.

Tais seitas religiosas, no entender do director provincial da cultura, têm subvertido os valores
cívicos e morais da sociedade e também desrespeitam os princípios espirituais defendidos pelas
igrejas tradicionais, que já estão reconhecidas.

Esclareceu, por outro lado, que muitas destas seitas, embora em número reduzido, foram
fundadas localmente por pessoas que se intitulam "profetas de Deus", enquanto as restantes são
provenientes da vizinha República Democrática do Congo.

Na província do Huambo estão reconhecidas pelas autoridades competentes (Ministério da Justiça


e da Cultura), 46 denominações religiosas, enquanto que 36 estão em vias de reconhecimento.

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Por: Carmen LUCIA TINDÓ RIBEIRO SECCO

(...) assistir à queda dos modelos, dos muros, dos dogmas e dos amanhãs que afinal não cantam.
Sem no entanto perder a integridade. Sem mudar de campo. (...) Sem fugir. De olhos abertos. Por
mais terrível que seja a melancolia1. Manuel Alegre

Desejo de Kianda, romance do escritor angolano Pepetela publicado em 1995, é uma caricatura
alegórica de Angola, de vastada pela guerra civil fratricida que se desencadeou após o resultado das
eleições presidenciais realizadas em 1992. A acção romanesca se desenvolve no ano de 1994 e o
cenário é a cidade de Luanda, cheia de mutilados, carros importados, enfim, prenhe de con tradições :

A rua tinha sido definitivamente fechada à circulação de veículos, por isso não se viam os carros dos
novos ricos, últimos modelos de vidros fumados e ar condicionado, para proteger os passageiros dos
pedidos constantes de esmola por parte dos meninos de rua, dos mutilados de todas as guerras, dos
velhos atirados para a rua pela nova mendicidade.2

O narrador, em terceira pessoa, par intermédio de intenso comprometimento político, consegue fazer
uma profunda e crítica análise do contexto social. Seu olhar assume a melancolia de quem narra de
um lugar dialeticamente dilacerado3 , ou seja, de quem adopta a dissonância característica do rebelde
radical, aquele que, segundo O filósofo WalterBenjamin, expressa um sentimento de mal-estar em
relação ao status quo, mostrando-se inadaptado ao presente e nostálgico das crenças e dos valores
absolutos do passado.

O ponto de vista melancólico, «melancolérico», segundo a filosofia benjaminiana, pressupõe a


indignação e a divergência de quem não concorda com a realidade social em que se encontra inscrito.
Etimologicamente, a palavra melancolia vem do grego, de melanos (negro) e kholé (bílis). Designava
um estado patológico do fígado que produzia bílis escura e acarretava depressão, irritção.4

Para Walter Benjamin, a melancolia não se relaciona a depressão e ao luto como ocorre na teoria
freudiana. De acordo com o pensamento do filósofo alemão, ela esta intimamente ligada a alegoria, no
que esta tem da faculdade de dizer o que se em contra reprimido.5

A narrativa de O Desejo de Kianda se tece, desde o início, melancolicamente, pois, das brechas
textuais , emana um discurso revelador das incoerências existentes no presente histórico de Angola.

O romance, concebido de acordo com a teoria de Lucien Goldman, em Sociologia do romance, se


desenvolve coma uma crónica social, dando ênfase a análise do contexto político angolano. Principia
com dois episódios quase simultâneos: o casamento das personagens principais, Carmina C.C. e João
Evangelista, e a queda inexplicável do primeiro prédio do largo do Kinaxixe. Fecha-se também, em
círculo vicioso, com outro desabamento: o do edifício em que moravam os protagonista s. O texto de
Pepetela instaura-se, dessa forma, como uma verdadeira escrita do desastre6 , o que implica uma
interpretação alegórica, um agudo olhar de denúncia sobre a história do país. Sob a aparente
ilogicidade das construções que se diluem, o texto al erta, figuradamente, para a dissolução do Estado-
Nação em Angola. E sintomático que o primeiro prédio tenha caído, justamente, na hora exacta em
que os noivos partiram para o banquete financiado por verbas públicas desviadas de seus fins sociais:

Carmina era membro destacado da Jota (...) Por estas razões a Jota investiu no casamento. Foram
feitas requisições as empresas estatais (...) E a noiva ainda arranjou uma missão fictícia aRoma, paga
evidentemente pelo Estado, para comprar o enxoval7

A descrição da festa das bodas expõe a derrocada dos valores éticos; o narrador, através de pequenos
comentários irónicos, põe a nu os mecanismos de corrupção presentes na realidade do país,
mostrando como o dinheiro público passa a ser desviado par uma minoria que del e se aproveita
indevidamente, enquanto a maioria do povo angolano se torna vítima da fome e da miséria.

A ruína e a imagem catalisadora do universo romanesco. Os constantes desmoronamentos pontuam o


espaço textual, chamando a atenção para a perda dos valores éticos em Angola, para o vazio dos
antigos sonhos e utopias. Narrador, personagens e leitor encontram-se,

submergidos na iminência do movimento da história, condenados a reflectir melancolicamente sobre


problemas insolúveis; a «instância mais alta» não é mais competente para formular julgamentos
claros, os valores absolutos estão morrendo.8

As núpcias dos protagonistas representam a aliança de ideologias antes inconciliáveis. João


Evangelista, o noivo, de origem protestante, encena a figura do acomodado, que aceita passivamente
tudo para não se indispor e não perder os privilégios:

João Evangelista também aproveitava do carro, sobretudo quando ela tinha daquelas reuniões de três
dias (...) Ele ficava com o carro todo o dia. O trabalho era chato e sem grandes perspectivas. E
ninguém notava a sua ausência, como acontecia com quase todos os funcionários. Ia para o Morro dos
Veados ou ainda mais longe, fazer uma praiada com musica e leitura.9

Carmina, a noiva, atéia, de temperamento forte e combativo, mantém ligações com o governo, mas,
embora tenha sido militante do Partido, como muitos companheiros, se beneficia, agora, do poder,
esquecida dos princípios que engendraram a luta política da independência:

- Vamos enriquecer (...). Quer dizer, o Governo legitimamente eleito não pode legalmente se armar
(...) Mas há uma maneira de se resolver a questão. Certas empresas que não São do Governo dão o
nome (...) claro que a empresa que da o nome ganha uma comissão, uma pequena percentagem
porque e para um fim patriótico. Só que uma pequena percentagem num negócio de muitos milhões e
muitas centenas de miles de dólares. (...) Fui contratada porque, bolas, já que há negócio, que seja
para camaradas que sempre foram firmes, por que razão dar a outros?10

0 Desejo de Kianda alegoriza, através da «síndroma de Luanda», a perda da moral revolucionária em


Angola; com 'a mudança do regime que ingressa na economia de mercado, o país soçobra sem
identidade, fragmentado par comflitos políticos, étnicos, linguisticos, religios os :

Um milagre vinha mesmo a calhar para essa época de pouca crença, em que o governo se dizia
marxista, embora muitos suspeitassem não passar de propaganda. A tese do milagre ganhou portanto
num ápice adeptos incondicionais, especialmente concentrados nas igrejas de Luanda, quer nas
tradicionais, europeias, americanas ou africanas, quer nas novas seitas electr6nicas.11
O vazio das utopias e propício a proliferação não só das religiões, mas também a formação de um
individualismo que visa a acumulação de bens, passando por cima dos antigos valores éticos
defendidos pelo socialismo. Em entrevista sobre o livro e o próprio Pepetela quem faz o seguinte
comentário :

O capitalismo instalou-se! nas consciências e as pessoas contam consigo próprias e lutam pela vida
passando por cima umas das outras, negociam ,fazem esquemas. A única moral e ganhar dinheiro
rápido12

Consoante com o pensamento filosófico de Walter Benjamin que atribui ao capitalismo moderno essa
destruição moral dos valores socializadores, o romance de Pepetela, adoptando também uma
perspectiva alegórica, consegue captar os deslizamentos de sentido presentes na sociedade angolana
actual, onde, com a entrada do capitalismo transnacional, vemos, como alertou o velho Marx, tudo
que era sólido desmanchar no ar. Sujeitos, objectos e ideologias encontram -se abalados e tudo
desaba em nuvens grossas de poeira, pois, conforme explica ainda a teoria do filósofo alemão
anteriormente referido, a

alegoria cava um túmulo tríplice: o do sujeito clássico que podia ainda afirmar uma identidade
coerente de si mesmo, e que, agora, vacila e se desfaz; o dos objectos que não são mais os
depositários da estabilidade, mas se decompõem em fragmentos; enfim, o processo mesmo de
significação, pois o sentido surge da corrosão dos laços vivos e materiais entre as coisas,
transformando os seres vivos em cadáveres ou em esqueletos, as coisas em escombros e os edifícios
em ruinas.13

É essa morte do sujeito uno, coerente com um universo ideológico sólido, e a desintegração dos
princípios sustentadores da revolução e da independência angolana que justificam a utilização
adequada do processo alegórico nesse último romance de Pepetela. A alegoria implica nostalgia das
certezas desaparecidas14 e isso a narrativa de o Desejo de Kianda alcança representar no âmago,
através de uma caricatura «mal humorada» da sociedade angolana. o narrador, usando o discurso
indirecto livre, penetra a consciência vacilante de João Evangelista, devassando- lhe, pelo humor, a
corrupta cumplicidade com a esposa:

Valia a pena insistir? Carmina estava decidida e nem uma ponta de remorso se adivinhava na sua
atitude. Se outros aproveitavam da situação, por que não eu , ainda por cima por uma causa justa?
Acabaram as morais de convento, agora estamos na economia de mercado, existem três séculos de
ética capitalista a demonstrar a legitimidade da coisa.15

Também não foi aleatória a escolha dos nomes das personagens centrais, os quais se encontram na
esfera semântica das profecias. O discurso profético faz parte das sociedades de tradição oral, nas
quais, se instaura, por intermédio da palavra magico-religiosa de sacerdotes, curandeiros, feiticeiros,
uma temporalidade abrangente que articula presente, passado e futuro. Nas profecias, o mítico se
sobrepõe ao histórico, devassando alegoricamente as contradições sociais. Na África ancestral cabia
aos velhos veicular palavras proféticas às gerações mais no vas. No romance de Pepetela, ha uma
inversão; há o esvaziamento do sentido tradicional das profecias. Estas se encontram falhadas tanto
no corpo social, como no corpo romanesco. Propositalmente, o narrador acentua a defasagem entre o
comportamento das personagens e a simbologia que emana de seus nomes. João Evangelista
encontra-se afas tado das crenças religiosas praticadas pelo pai e pelo avô que o registraram assim,
em homenagem a figura do profeta bíblico. Carmina cuja onomástica pode levar a uma associação
com as canções profanas Carmina Burana, cantos proféticos pagãos que existiam na Idade Média
encarna, no texto, a imagem dos marxistas ateus, cujos hinos ideológicos sustentadores da
independência angolana caíram por terra. É ela a representante corrupta do antigo Partido que,
perdendo a certeza das profecias revolucionárias, também entra no comércio de armas para manter o
status social próprio. O epíteto com que o narrador a designa, Carmina Cara de Cu, efectua a crítica
mordaz ao desmoronamento dos ideais «cantalutistas» que animaram a Revolução. A personagem
representa, pois, a própria profanação actual das profecias revolucionárias. O ro mance mostra que,
hoje, em Angola, o social dilacerado não abre mais margens para as utopias socialistas. O povo
angolano foi despido de tudo, até das moradias e das roupas, como bem ilustra, no texto, a ale goria
dos desabrigados inteiramente nus no Largo do Kinaxixe.

Na narrativa, quase todas as personagens se apresentam coma subjetividades problemáticas,


prisioneiras da alienação resultante do vazio reinante tanto no espaço cultural, como no interior dos
próprios sujeitos. João Evangelista e o exemplo do alienado no trabalho e no casa mento, fugindo
constantemente através do computador diante do qual fica horas a se distrair com um jogo que revive
a queda do Império Romano. Aprisionado no imaginário electrónico, em um pais onde falta tudo, ate
energia eléctrica, Evangelista «vive», na tela, a decadência de Roma, sem perceber a que o rodeia e
desmantela seu próprio lar e seu próprio país. A modernidade do discurso de Pepetela reside
justamente nessa ponta de ironia corrosiva a desvelar as contradições presentes. O jogo do
computador funciona, pois, na narrativa, como um duplo irónico e alegórico das guerras que dilaceram
Angola.

As únicas personagens que representam uma excepção a esse universo de degradante corrupção são
o pai de João Evangelista, chamado «O mais velho Mateus», que recriminava as fraudes na vida
política do país, o velho cego Kalumbo, que morava no prédio de João, o único a dialogar com
Cassandra, e esta, uma menina, cuja pureza e inocência faziam com que ouvisse e profetizasse o
desejo de Kianda:

Kianda se sentia abafar, com todo aquele peso em cima, não conseguia nadar, e finalmente se
revoltou. E cantou, cantou, até que os prédios caíssem todos, u m a um, devagarinho, esse era o
desejo de Kianda. E foi isso que Cassandra contou a mais velho Kalumbo.16

Representantes da tradição africana, os velhos, por serem guardiães do saber ancestral, e a criança,
por apresentar um olhar ainda não contaminado pelos vícios do presente social, são, na narrativa,
valorizados, sendo os que oferecem ainda alguma resistência, embora fique claro no texto que não são
ouvidas pela sociedade angolana em crise. Cassandra, cujo nome oriundo da mitologia grega também
remete a ideia de profecia, e a única que decifra o vaticínio de Kianda. Mas, em vão, pois não lhe dão
crédito e ela acaba, também, vítima do último desabamento: cai pelos ares e mergulha fundo, para
sempre, na lagoa do Kinaxixe, indo ao encontro da deusa angolana das águas. A ruína dos prédios
representa alegoricamente o próprio ruir da tradição oral, a interdição de qualquer tipo de discurso
profético, o que assinala, no contexto actual de Angola, o carácter apocalíptico das utopias.

0 interessante e a solução romanesca encontrada por Pepetela para expressar sua revolta e a
sensação de perda que define a realidade de seu país, no momento histórico presente. Em
contraponto ao discurso céptico do narrador e a desesperança dos diálogos travados pelas perso
nagens, emerge, em itálico, como prenúncio da ruína que se abate sobre Luanda, o canto mágico de
Kianda, alegorizando a identidade perdida, a impossibilidade actual do retorno as origens.

Em Angola, o culto às ianda (plural de Kianda, divindade do mar) sempre exis tiu, secretamente,
mesmo apôs a colonização, sendo uma prova de resistência do imaginário mítico africano. As ianda
são entidades reguladoras de tudo que se relaciona ao oceano. Segundo Ruy Duarte de Carvalho,
cativam-se pelas pessoas, velam par elas e pelas águas 17 , manifestando-se, de acordo com as
pesquisas feitas por esse antropólogo e poeta, de formas diferentes: a de lençóis de luz sob as águas,
for mando feixes de fitas coloridas; a de patos nadando; a de pombos sobrevoando as praias, a de
crianças gémeas brincando, entre muitas outras.

Kianda, embora de usa do mar, também esta na terra. O embondeiro e sua árvore predilecta, assim
como outras árvores, como a mafumeira que aparece no texto de Pepetela, e as regiões ricas em
petróleo. Seu poder é ili mitado; só obedece ao deus criador. Ela rege as marés, as vagas, os peixes, a
pesca. Gosta de ser lembrada , retribuída, homenageada. Se a esquecem, se enfurece e retém os
peixes, tornando o mar bravia e ameaçador. E, segundo a tradição angolana, responsáv el pela
escassez ou fartura dos alimentos vindos do mar. Quando enraivecida, lança seu grito, enviando
doenças, fome e mortes. Por isso, pescadores lhe fazem oferendas, geralmente um banquete anual
em praias afastadas da Ilha de Luanda. Esses cultos (os kakulus, do verbo akula
Vquimbundo]=crescer, visa ao aumento da produção de peixes) são fechados, dirigidos por velhos
Kimbandas (feiticeiros) e praticados em locais desertos, próximos ao mar, em praias onde haja um
embondeiro ou uma mafumeira. Nesses cultos, e tocado o mbendu, instrumento musical de bambu
que serve a invocação das ianda. Toalhas brancas são estendidas no chão com comidas, bebidas; há
sacrifício de porcos, galinhas, cabritos. Os pescadores dançam e não pescam durante o Kakulu.
Também guardam silêncio sobre o ritual praticado, condição para que Kianda se alegre e atenda os
pedidos de fartura. E geralmente associada ao arquétipo da mãe d¶água, a fêmea maternal e, ao
mesmo tempo, sensual para a qual convergem os desejos inconscientes do povo.18

De acordo com Virgílio Coelho, em estudo19 sobre a sociedade luandense, em especial sobre as
populações Túmúndòngo que habitarn as ilhas e o platô de Luanda e os povos de língua quimbunda, a
Kyàmdà é um «génio da natureza» criado por Nzambi (Deus) e se diferen cia do mito da sereia, cujas
origens se encontram na cultura ocidental de tradição greco-romana. Segundo o referido antropó1ogo,
esses «seres fantásticos» não podem ser confundidos. O mito de Kyàndà, Kítútà ou Kìxìmbì pertence
ao imaginário quimbundo e tem suas origens em épocas remotas, referentes as primeiras migrações
dos povos bantu que vieram do leste do rio Kwàngu e chegaram à região do rio Lúkàlà, onde se
fixaram e, para isso, fizeram pactos com os «génios da natureza». A difusão da tradição oral desses
povos se fez do interior para o litoral, a medida que foram ocupando diferentes territórios:
primeiramente a região do Lúkàlà; posteriormente, a do rio Kwanza; e, finalmente, a da costa do
Oceano Atlântico e a das ilhas situadas na orla marítima de Luanda.

No romance de Pepetela, Kianda e alegoricamente veiculada pelo discurso ficcional. O animismo


africano invade a narrativa e o grito rebelde da deusa ressoa na dimensão mítica e literária. Luandino
Vieira e Arnaldo Santos, escritores da vida real e conhecedores das tradições luandenses, são
apropriados pelo texto de Pepetela e se tornam personagens que dialogam com João Evangelista.
Representam o contraponto da resistência literária em diálogo fecundo com o imaginário mítico
angolano, na defesa da identidade angolana em crise que o canto de Kianda alegoriza:

Ouviu a estória um dia, ali mesmo numa esplanada do Kinaxixe, quando se sentou cam o maior
respeito a mesa onde se encontravam dois escritores, Luandino Vieira e Arnaldo Santos, grandes
sabedores das coisas de Luanda. Como não podia deixar de ser, os kotas falavam da sua meninice
kinaxixense, embora Luandino fosse do Maculusso, que de facto era ali ao lado. E foi ele mesmo que
contou, lembras, Arnaldo, quando a mafumeira chorou sangue durante s ete dias, não se sabe se de
dor de ser cortada se de pesar por tirarem a lagoa a Kianda?20

A lagoa de Kianda, na tradição angolana, era chamada em quimbundo dizanga dia muenhu cujo
significado era «lagoa da vida», fonte de força criadora e reservatório do s mitos primordiais. No
romance de Pepetela, ao invés de representar a fecundidade, a energia vital, a lagoa lodosa que se
forma sob as ruínas dos edifícios caídos alegoriza a putrefacção social, a morte e a asfixicia do tecido
mítico. É um dos sinais da «síndroma de Luanda» que revela o esgarçamento das utopias cultu rais e
políticas na Angola actual e alerta para a perda dos elos com a ordem cósmica reguladora das
tradições do imaginário popular.

Kianda, na narrativa de Pepetela, apresenta-se como uma alegoria irada que denuncia o vazio
identitário e busca desesperadamente a preservação das raízes angolanas soterradas por contradições
que sufoca ram o tecido social e impediram a consolidação da nação angolana. O lado rebelde da
deusa, posto em cena pelo ficcional, representa a poetização mitológica da realidade que se converte
em fonte do animismo angolano, e se manifesta como uma forma de reacção do imaginário an golano.

O final do romance, em aberto, com a imagem de Kianda, livre, fugindo para o alto mar, aponta,
ambiguamente, para o esfacelamento das utopias, mas, entretanto, acena para uma trilha talvez
possível: a do universo mitico-literário, espaço de reflexão crítica e denúncia das corrupções que
afogam o pais. A fuga de Kianda configura, assim, não só a impossibilidade dos antigos ideais
socialistas, mas se constitui também como a alegoria de uma esperança desesperada de indignação,
que, talvez, possa, reencontrando vozes poéticas como, por exemplo, a de Ruy Duarte de Carvalho,
acreditar ainda na resistência do discurso literário:

Vou caminhar enfrente até que atinja o mar. Não este mar que vejo a retaguarda, donde nos vem a
brisa laminar das tardes de Setembro (...)

Eu vou seguir em frente e ultrapassar o paredão das serras, a cortina das águas que na distância
acende a redobrada angústia de uma possível esperança. (Gravida brecha no vapor salgado, que
permitisse o derramar das águas na raiz dos pastos, na porcelana uítrea das lagoas, na sede solta dos
areais das dambas! (...) . Vou caminhar em frente e procurar o espelho de outras águas, como se
fosse a última estação e eu nunca mais morresse ao pardo Sol (....) 21

Essa e uma leitura possível!. O romance permite outras, porque termina abruptamente, deixando em
suspenso o leitor, cuja perplexidade se encontra com a do narrador e a das personagens. Todos ficam
com «cara de cu», como sugere o satírico epíteto usa do, corrosivamente, pelo discurso enunciador
para designar Carmina, a antiga militante comunis ta que se tom a empresária da firma, ironicamente
denominada, na narrativa, Import-Export do Ultramar. De modo alegorico, a voz narradora evidencia
as contradições. Carmina, por exemplo, que fora representante ferrenha do Partido, passa a defender
o livre mercado e próprio enriquecimento. A abreviatura de seu nome C.C.C. talvez possa ser lida
como: Comando de Caça ao Comunismo... uma blague do narrador, cujo humor céptico, denuncia a
inversão dos antigos paradigmas. O clima do desfecho narrativo e o do desencanto reinante em
Angola, inscrita, hoje, em uma era de ambiguidade e deslizamento das antigas certezas.

1 ALEGRE, Manuel. In: lomal de Letras. Lisboa:29-3-95. p. 19.

2 PEPETELA. 0 desejo de Kianda. Lisboa: Ed. Dom Quixote, 1995. p. 95.

3 KONDER, Leandro. WaIter Benjamin: 0 marxismo da melancolia. Rio: Ed. Campus,1988. p. 27

. 4 Idem, ibidem, p. I 02.

5 KHOTE, Flcivio. A alegoria. Sao Paulo: Atica, 1986. p.7.

6GAGNEBIN, ]eanne-Marie. Historia e narrGl;do em waIter Benjamin. SP: Perspectiva; Campinas: Ed.
UNICAMp, 1994. p. 51.

7PEPETELA. 0 desejo de kianda, 1995. pp. 12 -13.

8KONDER, L. Op. cit., 1988. p.27.

9PEPETELA. 0 desejo de kianda, 1995. p.13.IOIdem, ibidem, pp.57 -58.

11 Idem, ibidem, p.11.

12 PEPETELA. In:lomal de Letras.Lisboa:29 -3-95. p. 15.

13 GAGNEBIN,f. Op. cit., 1994. p.46.

14 Idem, ibidem, p.45.

15 PEPETELA. 0 desejo de kianda, 1995. p.59.

16 Idem, ibidem, p. I 09.

17CARVALHO, RUy Duarte. Ana a Manda: os filhos da rede. Lisboa: Instituto de Investiga<;ao
Cientifica TI'Opical, 1989. pp. 284 -285.

18 DURAND, Gilbert. Les structures anthropologiques de l' imaginaire. Paris; Bruxelles; Montreal:
Bordas, 1969. p.268

19 COELHO, Virgilio. «Imagens, Simbolos Representações. Quiandas, «Quitutas, Sereias!»:


Imaginarios locais, identidades regionais e alteridades. Reflexoes sob re 0 quotidiano urbana
luandense na publicidade e no universo do marketing». In: NGOLA Revista de Estudos Sociais (ASA).
Luanda: I ( I ), janeiro-dezembro de 1997. pp. 127 -191.

20 PEPETELA. 0 desejo de banda, 1995. p.4 7.

21CARVALHO, Ruy Duarte. A decisilo da idade. Lisboa: Sa da Costa, 1976, p.55.

*Texto, originalmente intitulado «A Alegoria da Kianda e 0 Olhar Melanco}(~rico de Pepetela», publica


do nas ACTAS DO 5Q Congresso de Lusitanistas. Organização de T F. Earle. Texto apresentado no 5Q
Congresso, realizado em Oxford, de 1 a 8 de setembro de 1996. Oxford; Coimbra : Ed. Universidade
de Oxford; Universidade de Coimbra, 1998. pp. 1437 -1443.

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