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BANCA EXAMINADORA
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Dedicatória
Agradecimentos
RESUMO
ABSTRACT
SUMÁRIO
1. INTRODUÇÃO.
O êxodo rural acentuado, somado à falta de infra-estrutura e
planejamento dos grandes centros urbanos, são as principais causas dos
problemas relativos à qualidade de vida das pessoas nas cidades.
Uma breve análise das estatísticas populacionais corrobora a tese
exposta, na medida em que, segundo informações coletadas e divulgadas
pelo IBGE1, em 1950, apenas 36,16% da população do país vivia em áreas
urbanas, enquanto 63,84% habitava áreas rurais. E tais percentuais foram se
invertendo, com o passar do tempo, até que, no ano 2000, a população
residente em áreas urbanas já representava 81,23% do total do país,
enquanto que os residentes em áreas rurais, inversamente, somavam apenas
18,77%.
As pessoas são, de forma maciça, atraídas aos grandes centros, em
busca de melhores condições de vida e trabalho, e como tais centros não
possuem estrutura, sequer para acomodar seus atuais moradores, quanto
mais para receber aqueles vindos das zonas rurais, a grande maioria da
população que ali reside é marginalizada, vivendo em condições
subumanas, o que agrava, a cada dia mais, o problema que se apresenta.
Assim, visando criar condições de sobrevivência nas cidades, com
dignidade e qualidade de vida, consagrou-se em nosso país a função social
da propriedade urbana, hoje princípio constitucional, cuja evolução
1
www.sidra.ibge.gov.br.
Tabela 1288 - População nos Censos Demográficos por situação do domicílio
Brasil
Variável = População (Percentual)
Situação do Ano
domicílio 1950 1960 1970 1980 1991 2000
Total 100,00 100,00 100,00 100,00 100,00 100,00
Urbana 36,16 45,08 55,94 67,59 75,59 81,23
Rural 63,84 54,92 44,06 32,41 24,41 18,77
9
2
Maria Conceição Maranhão Pfeiffer, divide em duas (voluntárias e compulsórias) as
medidas de ordenação urbanística do solo, nesses termos, in verbis: “As operações
jurídicas de ordenação urbanística do solo podem se dar de duas formas: por medidas
voluntárias, ou por medidas compulsórias.”
10
§4º, incs. I, II e III da Carta, que visam dar efetividade à função social da
propriedade urbana.
Por fim, é interessante frisar que a usucapião especial urbana,
conforme idealizada no art. 183 da Constituição Federal, bem como sua
regulamentação, nos termos do art. 9º ao 14 do Estatuto da Cidade, não será
objeto de estudo nessa oportunidade, vez que, embora se configure como
instrumento constitucional de efetivação da função social da propriedade
urbana, não possui natureza coercitiva.
Art. 157 - A ordem econômica tem por fim realizar a justiça social,
com base nos seguintes princípios:
(...)
III - função social da propriedade;
Na vigência da citada Carta, foi aprovada a Lei nº 6.766/79, que
dispõe sobre as regras para o parcelamento do solo urbano em nível federal,
não sendo vedada, contudo, sua utilização em nível estadual e municipal.
Conforme já exposto, a referida Lei 6.766/79 revogou o Decreto-Lei
58/37, o qual visava, primordialmente, estabelecer a forma e os requisitos
para a implementação de loteamentos3 e a realização de negócios
imobiliários envolvendo lotes urbanos, cujo pagamento do preço se desse
em prestações. Assim, nota-se que, na legislação revogada (Decreto-Lei
58/37), não havia preocupação considerável com o aspecto urbanístico do
loteamento, cuja implantação se buscava, a exceção de uma discreta
disposição, constante no §1º do art. 1º, que remetia a aprovação do projeto
3
Especialmente no que se refere à aprovação dos projetos junto ao órgão público
competente e aos registros e averbações junto ao cartório imobiliário.
14
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Art.1º. § 1º Tratando-se de propriedade urbana, o plano e planta do loteamento devem
ser previamente aprovados pela Prefeitura Municipal, ouvidas, quanto ao que lhes disser
respeito, as autoridades sanitárias e militares.
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CAPÍTULO II - Dos Requisitos Urbanísticos para Loteamento.
Art. 4º - Os loteamentos deverão atender, pelo menos, aos seguintes requisitos:
I - as áreas destinadas a sistemas de circulação, a implantação de equipamento
urbano e comunitário, bem como a espaços livres de uso público, serão proporcionais à
densidade de ocupação prevista pelo plano diretor ou aprovada por lei municipal para a
zona em que se situem. (Redação dada pela Lei nº 9.785, 29.1.99)
II - os lotes terão área mínima de 125 m2 (cento e vinte e cinco metros quadrados)
e frente mínima de 5 (cinco) metros, salvo quando a legislação estadual ou municipal
determinar maiores exigências, ou quando o loteamento se destinar a urbanização
específica ou edificação de conjuntos habitacionais de interesse social, previamente
aprovados pelos órgãos públicos competentes;
III - ao longo das águas correntes e dormentes e das faixas de domínio público das
rodovias e ferrovias, será obrigatória a reserva de uma faixa não-edificável de 15
(quinze) metros de cada lado, salvo maiores exigências da legislação específica;
(Redação dada pela Lei nº 10.932, de 2004)
IV - as vias de loteamento deverão articular-se com as vias adjacentes oficiais,
existentes ou projetadas, e harmonizar-se com a topografia local.
§ 1º A legislação municipal definirá, para cada zona em que se dívida o território
do Município, os usos permitidos e os índices urbanísticos de parcelamento e ocupação
do solo, que incluirão, obrigatoriamente, as áreas mínimas e máximas de lotes e os
coeficientes máximos de aproveitamento. (Redação dada pela Lei nº 9.785, 29.1.99)
§ 2º - Consideram-se comunitários os equipamentos públicos de educação, cultura,
saúde, lazer e similares.
§ 3o Se necessária, a reserva de faixa não-edificável vinculada a dutovias será
exigida no âmbito do respectivo licenciamento ambiental, observados critérios e
parâmetros que garantam a segurança da população e a proteção do meio ambiente,
conforme estabelecido nas normas técnicas pertinentes. (Incluído pela Lei nº 10.932, de
2004)
Art. 5º - O Poder Público competente poderá complementarmente exigir, em cada
loteamento, a reserva de faixa non aedificandi destinada a equipamentos urbanos.
Parágrafo único. Consideram-se urbanos os equipamentos públicos de
abastecimento de água, serviços de esgotos, energia elétrica, coletas de águas pluviais,
rede telefônica e gás canalizado.
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6
Nesse sentido anote-se o magistério de Marina Mariani de Macedo Rabahie:
“Inovação que merece destaque dentre as que foram trazidas pela nova ordem é a
fixação do conteúdo da função social a que deve estar adstrito o exercício dos direitos
relativos ao domínio. O caráter principiológico, de que era revestida a regra da função
social, na sistemática anterior, foi mantido. A inovação constitui em definir seu
conteúdo, exigir seu cumprimento e sancionar o seu descumprimento.” RABAHIE,
Marina Mariani de Macedo, Função Social da Propriedade, in Temas de Direito
Urbanístico II, São Paulo, 1991, Ed. Revista dos Tribunais – 1ª Edição, p. 252.
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7
“Como se sabe, os princípios da função social da propriedade e da função social da
cidade já figuravam no Texto da Constituição Federal de 1988, mas, não obstante o
pacífico entendimento doutrinário no sentido de que tais princípios são dotados de
positividade e eficácia, na prática, especialmente perante o Poder Judiciário, predomina
um fetichismo legalista, segundo o qual qualquer princípio, para ser aplicado, precisa
estar traduzido em normas legais, em específicas regras de comportamento.”
“Princípios são ‘normas’, no sentido que determinam ou autorizam determinados
comportamentos ou, pelo menos, vedam a adoção de comportamentos com eles
conflitantes.”. DALLARI, Adilson de Abreu, Instrumentos da Política Urbana, in
Estatuto da Cidade – Comentários a Lei Federal 10.257/01, São Paulo, Ed. Malheiros,
2002 – 1ª Edição, p. 73.
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10
“E uma outra distinção é relativa à sua generalidade, pois como princípio-garantia
pode ceder em colisão com outro qualquer princípio de valor igual ou superior, ou seja,
pode não se efetivar; mas como princípio fundamental da ordem econômica, enquanto
não for afastado por emenda ou revisão constitucionais, estará sempre orientando a
atividade econômica necessariamente, pois aqui ele não é só um princípio de peso, mas
um princípio que estrutura a própria ordem econômica, de modo que ela não pode
existir sem ele. Ali a propriedade é garantida de forma autônoma; aqui só existe a ordem
econômica instituída pela constituição se houver o princípio da função social da
propriedade. Ali, propriedade como função; aqui, propriedade-função.”Obr. Cit., pg. 69.
11
“Os institutos jurídicos acima referidos visam não apenas a vedar comportamentos
dos proprietários deletérios aos interesses da coletividade, mas, sim, mais que isso,
visam a obter comportamentos positivos, ações, atuações necessárias a realização da
função social da propriedade. Entretanto, a experiência indica que, na prática, será
muito difícil obter tais comportamentos, sejam eles omissivos (abstenções) ou,
principalmente, comissivos (obrigações de fazer), pois, será preciso vencer
preconceitos, especialmente no tocante a jurisprudência, que é predominantemente
individualista e não contempla a dimensão social da propriedade.” Obr. Cit., pg. 84.
19
12
MATTOS, Liana Portilho. Efetividade da Função Social da Propriedade Urbana à
Luz do Estatuto da Cidade, Rio de Janeiro, Ed. Temas e Idéias, 2003 – 1ª Edição, p.
113.
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13
Obr. Cit., p. 113.
14
Art. 41. O plano diretor é obrigatório para cidades:
I – com mais de vinte mil habitantes;
II – integrantes de regiões metropolitanas e aglomerações urbanas;
III – onde o Poder Público municipal pretenda utilizar os instrumentos previstos no
§ 4o do art. 182 da Constituição Federal;
IV – integrantes de áreas de especial interesse turístico;
23
15
“Com o advento do Estatuto da Cidade a função social da propriedade imóvel ganha
no roupagem. Ela passa a estar atrelada ao aproveitamento e à destinação que o Plano
Diretor lhe atribuiu.”
“Novamente o direito do proprietário receberá novo contorno no plano municipal. As
punições para o que descumpra o ordenamento recaíram sobre a res. É a propriedade
que responderá através da edificação compulsória, do IPTU progressivo e da
desapropriação-sanção.” SÉGUIN, Elida, Estatuto da Cidade, Rio de Janeiro, Ed.
Forense, 2002 – 1ª Edição, p. 144.
26
16
A respeito da distinção entre equipamentos urbanos e comunitários, registre-se o
disposto na Lei 6.766/79 (§2º do art. 4º e no parágrafo único do art. 5º), a qual inclui
dentre os primeiros: abastecimento de água, serviços de esgotos, energia elétrica, coletas
de águas pluviais, rede telefônica e gás canalizado; e dentre os segundos: educação,
cultura, saúde, lazer e similares.
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17
PEREIRA, Luis Portella A Função Social da Propriedade Urbana, Porto Alegre, Ed.
Síntese, 2003, 1ª Edição, pg.49.
30
18
MEIRELLES, Helly Lopes, Direito Administrativo Brasileiro, São Paulo, Ed.
Malheiros, 2005, 31ª Edição, pg. 326.
19
Obr. Cit., pg. 327/328.
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“A lei de uso e ocupação do solo urbano, como geralmente é denominada, destina-se
a estabelecer as utilizações convenientes às diversas partes da cidade e a localizar em
áreas adequadas, as diferentes atividades urbanas que afetem a comunidade. Para tanto,
classifica os usos e estabelece a sua conformidade com as respectivas zonas em que se
divide o perímetro urbano, visando a equilibrar e harmonizar o interesse geral da
coletividade com o direito individual de seus membros no uso da propriedade particular,
na localização e no exercício das atividades urbanas e até na utilização do domínio
público.” MEIRELLES, Hely Lopes, Direito Municipal Brasileiro, São Paulo, 2000, 11ª
Edição, Ed. Malheiros, pg. 459.
21
MEIRELLES, Helly Lopes, Direito Municipal Brasileiro, São Paulo, Ed. Malheiros,
2000, 11ª Edição, p. 461/464.
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22
“Art. 36. Lei municipal definirá os empreendimentos e atividades privados ou
públicos em área urbana que dependerão de elaboração de estudo prévio de impacto de
vizinhança (EIV) para obter as licenças ou autorizações de construção, ampliação ou
funcionamento a cargo do Poder Público municipal.
Art. 37. O EIV será executado de forma a contemplar os efeitos positivos e
negativos do empreendimento ou atividade quanto à qualidade de vida da população
residente na área e suas proximidades, incluindo a análise, no mínimo, das seguintes
questões:
I – adensamento populacional;
II – equipamentos urbanos e comunitários;
III – uso e ocupação do solo;
IV – valorização imobiliária;
V – geração de tráfego e demanda por transporte público;
VI – ventilação e iluminação;
VII – paisagem urbana e patrimônio natural e cultural.
Parágrafo único. Dar-se-á publicidade aos documentos integrantes do EIV, que
ficarão disponíveis para consulta, no órgão competente do Poder Público municipal, por
qualquer interessado.
Art. 38. A elaboração do EIV não substitui a elaboração e a aprovação de estudo
prévio de impacto ambiental (EIA), requeridas nos termos da legislação ambiental.”
38
23
“É estudo prévio. Sendo assim, vale afirmar que nenhuma licença ou autorização de
construção, ampliação ou funcionamento será concedida pelo Município sem que esse
estudo lhe tenha sido apresentado e atendido o interesse público.” GASPARINI,
Diógenes, O Estatuto da Cidade, São Paulo, Ed. NDJ, 2002, 1ª Edição, p. 19.
24
“Artigo 2º - Dependerá de elaboração de estudo de impacto ambiental e respectivo
relatório de impacto ambiental - RIMA, a serem submetidos à aprovação do órgão
estadual competente, e do IBAMA e em caráter supletivo, o licenciamento de atividades
modificadoras do meio ambiente, tais como: (...)
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25
Nesse sentido é o magistério de Carlos Ari Sundfeld, in verbis: “A exigência de um
ordenamento que conduza à regularização fundiária e urbanística das ocupações
populares existentes introduz um condicionante novo e transformador em nosso direito
urbanístico. Até então a incompatibilidade entre as ocupações populares e a ordem
urbanística ideal tinha como conseqüência a ilegalidade daquelas (sendo a superação
desse estado um dever dos responsáveis pela irregularidade – isto é, dos próprios
ocupantes). Com o estatuto a equação se inverte: a legislação deve servir não para impor
um ideal idílico de urbanismo, mas para construir um urbanismo a partir de dados da
vida real. Desse modo, o descompasso entre a situação efetiva das ocupações populares
e a regulação urbanística terá como conseqüência a ilegalidade dessa última, e não o
contrário.”
E continua o eminente jurista: “Com a legalização dos estados de fato, entra em pauta
um novo tipo de dever estatal: o da atuação positiva para elevar a qualidade urbanística
das situações existentes. Em suma: abandona-se a pretensão – um pouco ingênua, um
pouco cínica – de construir um urbanismo ideal baseado apenas na produção
normativa.”. SUNDFELD, Carlos Ari, O Estatuto da Cidade e suas Diretrizes Gerais, in
Estatuto da Cidade – Comentários a Lei Federal 10.257/01, São Paulo, Ed. Malheiros,
2002 – 1ª Edição, p. 59/60.
44
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Art. 182. A política de desenvolvimento urbano, executada pelo Poder Público
municipal, conforme diretrizes gerais fixadas em lei, tem por objetivo ordenar o pleno
desenvolvimento das funções sociais da cidade e garantir o bem-estar de seus
habitantes.
(...)
§ 4º - É facultado ao Poder Público municipal, mediante lei específica para área
incluída no plano diretor, exigir, nos termos da lei federal, do proprietário do solo
urbano não edificado, subutilizado ou não utilizado, que promova seu adequado
aproveitamento, sob pena, sucessivamente, de:
I - parcelamento ou edificação compulsórios;
45
27
“A compulsoriedade do parcelamento ou da edificação constam da Constituição, mas
o mesmo não ocorre com a utilização. Na verdade, o próprio texto da Constituição é
confuso, uma vez que faz uso das expressões ‘subutilização’ e ‘não utilização’ para
designar situações a serem coibidas, mas não prevê qualquer ‘utilização’ compulsória
enquanto sanção. De outro lado, não há qualquer referencia a um (sic) situação de
‘subparcelamento’, a ser sancionada com o parcelamento compulsório. É forçoso
concluir, portanto, que a ‘utilização’ a que se refere a Constituição resume-se aos
aspectos físicos de parcelamento e edificação, mas não inclui o uso propriamente dito da
edificação pelas pessoas.” PINTO, Vitor Carvalho in, Estatuto da Cidade Comentado,
Belo Horizonte, 2002, Ed. Mandamentos, 1ª Edição, p. 132/133.
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28
“O imóvel edificado também pode ser havido como não utilizado, quando está há
longo tempo desocupado e já começa a mostrar sinais de abandono.” Obr. cit., p. 30.
29
“Na situação prevista no inciso I do §1º do art. 5º do Estatuto, no qual se considera
subutilizado o imóvel cujo aproveitamento seja inferior ao mínimo definido no plano
diretor ou em legislação dele decorrente, como, por exemplo, a lei de uso e ocupação do
solo, para a propriedade urbana atender a sua função social, será suficiente que o Poder
Público exija do proprietário a utilização da propriedade no seu potencial mínimo de
uso fixado no plano, sem que haja a necessidade de ser feito algum tipo de parcelamento
ou edificação.” (...) “Vamos supor a existência na área do plano urbanístico local de
prédios, armazéns, galpões abandonados. Nesse caso, seria suficiente o plano
estabelecer os usos de interesse urbanísticos admitidos para esses imóveis, como os
equipamentos sociais, de modo a exigir de seus proprietários a utilização prevista no
plano.” SAULE JÚNIOR, Nelson, Aplicabilidade do Parcelamento ou Edificação
Compulsórios e da Desapropriação para Fins de Reforma Urbana, in Estatuto da Cidade,
São Paulo, 2001, Fundação Prefeito Faria Lima – CEPAM, p.231.
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30
“No uso da propriedade estão incluídos a efetiva utilização da coisa e o não-uso dela.
A mera manutenção da coisa em posição estática, sem que dela se sirva o dominus,
estampa uma das faculdades do domínio, de modo que, em princípio, ninguém pode
obrigar o proprietário a usar a coisa. Este ponto é pacífico entre os estudiosos.”
31
“Assim, entendo que o regulamento do instituto da utilização compulsória por lei
ordinária não fere a Constituição Federal, por ser esta uma medida implicitamente
prevista no § 4º do artigo 182, bem como consonante com a determinação geral de
cumprimento da função social da propriedade urbana contemplada no §2º do mesmo
artigo.” Obr., cit..
32
“Na correlação de ações previstas na Constituição e no Estatuto, naturalmente, para o
imóvel não edificado, estaria imposta a edificação, para o imóvel não utilizado, a
utilização. Sobraria, para o imóvel subutilizado, o seu parcelamento.”
“Ocorre que o Estatuto definiu o que seja imóvel urbano subutilizado. Repetimos: é
aquele cujo aproveitamento seja inferior ao mínimo definido no plano diretor ou em
legislação dele decorrente. Ora, estamos diante da hipótese de um imóvel com alguma
construção. Portanto, presume-se, um lote propriamente dito. Como pensar, então, nesta
hipótese, que o parcelamento seria a imposição para o imóvel subutilizado? Como
parcelar o que já está parcelado?” MACRUZ, João Carlos, MACRUZ, José Carlos e
MOREIRA, Mariana, O Estatuto da Cidade e seus Instrumentos Urbanísticos, São
Paulo, Ed. LTr, 2002 – 1ª Edição, p. 44.
48
33
“A única forma de compatibilizar os termos constitucionais com o texto legal é
imaginar o seguinte: impõe-se, para o imóvel não edificado, a edificação compulsória;
ao subutilizado, seria imposta a utilização compulsória; e para o imóvel não utilizado, o
parcelamento compulsório.” Obr. Cit., p. 44.
34
“Parece-nos que, se tal raciocínio não prevalecer, a utilização compulsória prevista no
Estatuto estaria eivada de inconstitucionalidade, a merecer, justamente, sua retirada do
texto legal.” Obr. Cit., p. 45.
49
35
Desde que não utilizadas ou edificadas na plenitude de sua capacidade, nos termos da
lei (art. 5º, §4º, inc. I. do Estatuto da Cidade).
36
Registre-se posição parcialmente corroborada de Vitor Carvalho Pinto, que não
contempla expressamente a área não parcelada, mas edificada, verbis: “A expressão
‘subutilizado’ é a mais vaga entre as empregadas na Constituição e na Lei para indicar o
não-cumprimento da função social da propriedade. Daí a necessidade de conceituá-la
claramente. O parágrafo deixa claro que o termo abrange os conceitos de gleba não
parcelada e de lote não edificado, mas não a edificação ociosa.” Obr. cit., p. 134.
51
37
“A invasão da intimidade jurídica do proprietário para impor-lhe uma obrigação de
fazer em seu imóvel há de respeitar a sua situação específica. Pode, por exemplo, ao
invés de construir no imóvel, por falta de recursos, optar por parcelá-lo e, com a venda
de lotes, aproveitar adequadamente seu restante. Não se vê como poderá o Município,
ao obrigar o aproveitamento integral, limitar a possibilidade de optar do proprietário,
opção essa que se inclui no direito de propriedade, que, nesse aspecto, não pode ser
violado.” OLIVEIRA, Regis Fernandes, Comentários ao Estatuto da Cidade, São Paulo,
2005, Ed. Revista dos Tribunais, 2ª Edição – p. 44/45.
38
“Com a notificação o Município determina a urbanização (parcelamento, edificação
ou utilização) a ser promovida pelo proprietário.”
“Portanto, não cabe ao proprietário escolher a urbanização (parcelamento, edificação ou
utilização) que entenda como a melhor para a satisfação de seus interesses, pois essa
liberdade poderia contrariar a função social da propriedade.” Obr. cit., p. 35.
53
39
Nesse sentido: SUNDFELD, Carlos Ari, Função Social da Propriedade, in Temas de
Direito Urbanístico Vol. 1, São Paulo, Ed. Revista dos Tribunais, 1987, p. 19.
40
BUENO, Vera Scarpinella, Parcelamento, Edificação e Utilização Compulsórios da
Propriedade Urbana, in Estatuto da Cidade – Comentários a Lei Federal 10.257/01, São
Paulo, Ed. Malheiros, 2002 – 1ª Edição, p. 92.
41
Obr. Cit., p. 68.
55
42
“A obrigação propter rem é aquela em que o devedor, por ser titular de um direito
sobre uma coisa, fica sujeito a uma determinada prestação que, por conseguinte, não
derivou da manifestação expressa ou tácita de sua vontade. O que o faz devedor é a
circunstância de ser titular do direito real, e tanto isso é verdade, que ele se libera da
obrigação se renunciar a esse direito. RODRIGUES, Sílvio, Direito Civil – Parte Geral
das Obrigações, São Paulo, Ed. Saraiva, 1985 – 15ª Edição, pg. 105.
43
Registre-se a lição de Diógenes Gasaprini, para quem os dispositivos do Estatuto da
Cidade se aplicam, também aos superficiários, aos posseiros cujo prazo da prescrição
aquisitiva tenha transcorrido, ao enfiteuta e ao compromissário comprador,
independentemente de registro do compromisso. Obr. cit., p. 27
44
“Portanto, a obrigação de propter rem é aquela que se caracteriza pela presença de
três característicos básicos:
a) ela prende o titular de um direito real, seja ele quem for, em virtude de sua
condição de proprietário ou possuidor;
b) o devedor se livra da obrigação pelo abandono do direito real;
c) a obrigação se transmite aos sucessores a título singular do devedor.”
RODRIGUES, Sílvio, Ob. Cit., pg. 108.
56
plano diretor, haja vista que, a Lei específica nele citada, deve referir-se a
área incluída no mencionado plano diretor. E a necessidade da existência
prévia de um plano diretor, que no referido texto legal se deduz da análise
de seus termos, no art. 41, inc. III, do mesmo Estatuto da Cidade, é
expressa, verbis:
Art. 41. O plano diretor é obrigatório para cidades:
I – com mais de vinte mil habitantes;
II – (...);
III – onde o Poder Público municipal pretenda utilizar os
instrumentos previstos no § 4o do art. 182 da Constituição Federal;
Portanto, qualquer que seja a quantidade de habitantes de uma cidade,
caso o Poder Público municipal que a governa, pretenda utilizar os
instrumentos previstos no §4º do art. 182 da Constituição Federal (e arts. 5º
à 8º do Estatuto da Cidade), deverá elaborar um Plano Diretor, vez que, a
exigência contida no inciso III do art. 41 do Estatuto da Cidade, independe
da estatuída pelo inciso I do mesmo artigo.
No que concerne à Lei específica que vier a determinar o
aproveitamento da propriedade urbana, visando o cumprimento da sua
função social, nos termos previstos no plano diretor, temos que trata-se de
nítida Lei com efeitos concretos, em face da qual, cabível se mostra a
impetração de mandado de segurança, desde que cumpridas as demais
exigências legais (art. 5º, inc. LXIX da Constituição Federal c/c art. 1º da
Lei 1.533/51)45, mostra-se igualmente cabível a impetração de mandado de
45
Nesse sentido decidiu o e. STJ, in verbis:
PROCESSUAL CIVIL E TRIBUTÁRIO – MANDADO DE SEGURANÇA CONTRA
LEI EM TESE.
1. Doutrina e jurisprudência entendem que, se a lei gera efeitos concretos quando é
publicada, ferindo direito subjetivo, é o mandado de segurança via adequada para
impugná-la.
2. Na via estreita do mandado de segurança, o órgão jurisdicional limita-se a declarar a
compensabilidade dos tributos, resguardando ao Fisco o direito de verificar a
regularidade do creditamento decorrente da aquisição de insumos utilizados no serviço
de transporte efetuado pela recorrente.
3. Recurso ordinário provido.
57
Vistos, relatados e discutidos os autos em que são partes as acima indicadas, acordam os
Ministros da Segunda Turma do Superior Tribunal de Justiça "A Turma, por
unanimidade, deu provimento ao recurso ordinário, nos termos do voto da Sra. Ministra-
Relatora." Os Srs. Ministros João Otávio de Noronha, Castro Meira e Francisco Peçanha
Martins votaram com a Sra. Ministra Relatora.
RMS 20222/MT; RECURSO ORDINÁRIO EM MANDADO DE SEGURANÇA:
2005/0102076-8 – Relatora: Ministra ELIANA CALMON - Órgão Julgador:
SEGUNDA TURMA - Data do Julgamento: 14/03/2006 - Data da Publicação/Fonte: DJ
09.05.2006, p. 200.
58
46
Razões do veto: "O inciso II do § 1o do art. 5o do projeto equipara ao imóvel
subutilizado aquele "utilizado em desacordo com a legislação urbanística ou ambiental".
Essa equiparação é inconstitucional, porquanto a Constituição penaliza somente o
proprietário que subutiliza o seu imóvel de forma a não atender ao interesse social, não
abrangendo aquele que a seu imóvel deu uso ilegal, o qual pode, ou não, estar sendo
subutilizado.
Vale lembrar que, em se tratando de restrição a direito fundamental – direito de
propriedade –, não é admissível a ampliação legislativa para abarcar os indivíduos que
não foram contemplados pela norma constitucional." Fonte:
http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/Leis/Mensagem_Veto/2001/Mv730-01.htm.
47
Posição compartilhada com José dos Santos Carvalho Filho. Obr. cit., p.72.
59
48
Obr. Cit., p. 76.
61
49
“O certo e o esperado, portanto, é que a autoridade municipal providencie de imediato
a averbação da notificação, encaminhando-a ao competente cartório do registro de
imóveis.” (...) “A negligência no atendimento da lei pode causar gravames ao Município
e, se ocorrer, deve ensejar a responsabilização do servidor cuja atuação foi marcada pela
desídia.” Obr. cit., p. 77/78.
62
50
“Nada impede, no entanto, que venha a ser feita pelo cartório de títulos e documentos
ou por via judicial. O que importa é a ciência efetiva do ato e não a forma ou por quem
é feita a notificação.” Obr. cit, p. 44.
63
51
“O edital de notificação deve ser publicado uma vez no Diário Oficial do Município,
salvo se vigorar a respeito outra disciplina municipal.” Obr. Cit., p. 36.
52
“A despeito da omissão da lei, o edital da notificação deve ser publicado, ao menos
uma vez, no órgão de imprensa oficial do Município e em jornal local de grande
circulação. Somente assim se poderá assegurar ter sido observado o princípio da
publicidade consignado no art. 37, caput, da Constituição.” Obr. cit., p. 77.
64
53
Nesse sentido: “a fixação do prazo, assim, emana do poder discricionário do
legislador municipal e só pode ser questionado, administrativa ou judicialmente, ante a
comprovação de excesso ou desvio de poder e ofensa aos princípios da razoabilidade e
proporcionalidade.” CARVALHO FILHO, José dos Santos, obr. cit., p. 79.
54
A contagem do prazo será na forma estabelecida no Código Civil (art. 132),
excluindo-se o dia do começo e incluindo-se o do final, que deverá ser postergado ao
primeiro dia útil seguinte, caso ocorra em dia que a repartição responsável pelo
recebimento da documentação esteja fechada. Cf. CARVALHO FILHO, Jose dos
Santos, obr. cit., p. 79/80.
65
55
Interessante frisar, que o Estatuto da Cidade, em seu art. 49, (caput e par. ún.),
determinou o que prazo para, entre outras atividades, a aprovação de projetos de
edificação e parcelamento do solo urbano é de sessenta dias, caso o Poder Público
municipal, no prazo de noventa dias, a contar da entrada em vigor do próprio Estatuto,
não regulamentasse a matéria de forma diversa. Conforme infra-exposto.
56
“O Estatuto da Cidade não fixa prazo para essa análise e decisão (deferimento ou
indeferimento) sobre o pedido formulado, no que andou bem por tratar-se de matéria
administrativa, portanto da competência, no caso, do Município. Assim, caberá à
mencionada lei específica fixar esse prazo se não existir disciplina para tanto na
legislação municipal.” Obr. cit., p. 37.
66
57
“De outra maneira, se estivermos diante da obrigação de parcelar o solo urbano
compulsoriamente, o prazo de conclusão as obras necessárias não poderão contrariar o
disposto na Lei 6.766/79, alterada:” Obr. cit., p. 49.
68
estabelece o prazo máximo de quatro anos para a execução das obras (art.
9º, caput)58, sob pena de caducidade da aprovação do projeto (art. 12, caput
e par. ún.)59, o que também ocorrerá, caso este não seja submetido ao
registro imobiliário dentro de cento e oitenta dias, a contar de sua
aprovação (art. 18, caput)60.
Portanto, caso a função social a ser cumprida por uma determinada
propriedade, enseje o parcelamento do solo urbano, este deverá, em tese,
ser concluído no prazo máximo de seis anos, sendo dois concedidos pelo
Estatuto da Cidade (caso outro, maior, não seja concedido pela lei
específica ou o Poder Público municipal) para o início das obras (art. 5º,
§4º, inc. II), e outros quatro constantes na Lei 6.766/79, para a sua
execução (art. 9º). Caso tais prazos sejam desrespeitados, o proprietário
sofrerá as sanções de ambas as normas a que está subordinado, vale dizer, a
aprovação do seu projeto caducará (art. 12, par. ún. e art. 18 da Lei
6.766/79) e lhe será imputado o IPTU progressivo no tempo (art. 7º do
Estatuto da Cidade).
De qualquer forma, o próprio Estatuto da Cidade, em seu art. 49
(caput e par. ún.)61 estabeleceu o prazo de noventa dias, a partir da entrada
58
Art. 9º Orientado pelo traçado e diretrizes oficiais, quando houver, o projeto,
contendo desenhos, memorial descritivo e cronograma de execução das obras com
duração máxima de quatro anos, será apresentado à Prefeitura Municipal, ou ao Distrito
Federal, quando for o caso, acompanhado de certidão atualizada da matrícula da gleba,
expedida pelo Cartório de Registro de Imóveis competente, de certidão negativa de
tributos municipais e do competente instrumento de garantia, ressalvado o disposto no §
4º do art. 18. (Redação dada pela Lei nº 9.785, 29.1.99).
59
Art. 12 - O projeto de loteamento e desmembramento deverá ser aprovado pela
Prefeitura Municipal, ou pelo Distrito Federal quando for o caso, a quem compete
também a fixação das diretrizes a que aludem os artigos 6º e 7º desta Lei, salvo a
exceção prevista no artigo seguinte.
Parágrafo único. O projeto aprovado deverá ser executado no prazo constante do
cronograma de execução, sob pena de caducidade da aprovação. (Incluído pela Lei nº
9.785, 29.1.99).
60
Art. 18 - Aprovado o projeto de loteamento ou de desmembramento, o loteador
deverá submetê-lo ao Registro Imobiliário dentro de 180 (cento e oitenta) dias, sob pena
de caducidade da aprovação, acompanhado dos seguintes documentos:
61
Art. 49. Os Estados e Municípios terão o prazo de noventa dias, a partir da entrada em
vigor desta Lei, para fixar prazos, por lei, para a expedição de diretrizes de
69
62
O que se pretende consignar é que, após a elaboração da lei específica de que trata o
caput do art. 5º do Estatuto da Cidade, onde devem estar expressos os prazos para o
cumprimento das determinações por ela instituídas, tais prazos somente podem ser
alterados por iniciativa do Poder Público municipal, quando da aprovação do projeto
apresentado pelo proprietário do imóvel nela contido, em situações especiais, e desde
que visem ampliar tais prazos, o que, em tese, beneficiaria a parte obrigada (proprietário
do imóvel), jamais para reduzi-los.
72
63
Art. 46. O Poder Público municipal poderá facultar ao proprietário de área atingida
pela obrigação de que trata o caput do art. 5o desta Lei, a requerimento deste, o
estabelecimento de consórcio imobiliário como forma de viabilização financeira do
aproveitamento do imóvel.
§ 1o Considera-se consórcio imobiliário a forma de viabilização de planos de
urbanização ou edificação por meio da qual o proprietário transfere ao Poder Público
75
municipal seu imóvel e, após a realização das obras, recebe, como pagamento, unidades
imobiliárias devidamente urbanizadas ou edificadas.
§ 2o O valor das unidades imobiliárias a serem entregues ao proprietário será
correspondente ao valor do imóvel antes da execução das obras, observado o disposto
no § 2o do art. 8o desta Lei.
64
“Observe-se que é indispensável a pertinente legislação municipal para regular esse
consórcio em seus múltiplos detalhes, que, por certo, não disciplinará idêntica operação
entre particulares, que já as vêm realizando segundo as regras do Código Civil.” Obr.
cit., p. 40.
65
Art. 182. A política de desenvolvimento urbano, executada pelo Poder Público
municipal, conforme diretrizes gerais fixadas em lei, tem por objetivo ordenar o pleno
desenvolvimento das funções sociais da cidade e garantir o bem- estar de seus
habitantes.
(...)
76
69
“Anote-se, por último, que não há qualquer discricionariedade para o administrador
municipal no que toca à aplicação do tributo punitivo. Se o proprietário não adota as
providências para cumprir a obrigação de parcelar ou de edificar, depois de notificado
regularmente, há obrigatoriedade de aplicar o IPTU progressivo. O ente municipal,
desse modo, atua de forma vinculada. O texto legal é claro em ressaltar a
obrigatoriedade: não cumprida a obrigação, o Município ‘procederá à aplicação do
imposto’ (art. 7º)”. Obr. cit., p. 87.
80
70
“Decorrido o prazo para o proprietário do imóvel gravado adotar as providências
exigidas pelo Estatuto da Cidade ou pela legislação municipal própria, é deferida pelo
próprio Estatuto (art. 7º) a faculdade de o Município instituir e cobrar o denominado
IPTU progressivo no tempo, previsto no inciso II do §4º do art. 182 da Constituição
Federal, além de ser considerado pela lei como um dos instrumentos da Política Urbana,
sendo também um instituto tributário e financeiro (alínea a do inciso IV do art. 4º do
Estatuto da Cidade).” Obr. Cit. p. 53.
81
71
Nesse sentido é o magistério de Vitor Carvalho Pinto, in verbis: “A redação do § 1º é
inadequada ao dispor que ‘o valor da alíquota será fixado na lei específica’. Na
realidade, o valor da alíquota é fixado na lei geral que autoriza a cobrança do IPTU, a
qual poderá adotar como critérios a progressividade em função do valor e a
diferenciação pela localização e uso do imóvel. O que a lei específica fixa é um fator de
majoração da alíquota.” Obr. cit., p. 143.
82
72
Exemplificando: Imaginemos uma propriedade cuja função social estabelecida não
esteja sendo cumprida, nos termos do art. 5º do Estatuto da Cidade, o que dá margem a
aplicação do disposto no art. 7º do mesmo diploma legal. Sobre referido imóvel incide
IPTU, com uma alíquota de dois por cento, a qual, em aplicação ao disposto no art. 7º
do Estatuto da Cidade é majorada a razão de um por cento ao ano, portanto dentro do
limite legal que veda aumentos superiores ao dobro do ano anterior. Assim, no primeiro
ano teríamos uma alíquota de três por cento, no segundo, quatro por cento, e assim por
diante, até o quinto, e último ano de aumento, quando a alíquota seria de sete por cento.
84
cento) ou esta deve ser mantida na alíquota atual, fruto da majoração pelo
quinto ano consecutivo?
Em outras palavras, pelo disposto no §2º do art. 7º do Estatuto da
Cidade, após os cinco anos consecutivos de majoração da alíquota do
IPTU, sem que esta tenha atingido o máximo legal (quinze por cento), pode
(ou deve) o Poder Público municipal majorá-la mais uma vez para que
atinja tal máximo e assim seja mantida até que a obrigação seja cumprida
ou o imóvel desapropriado?
A resposta passa, inicialmente, pela extensão do sentido da palavra
“manterá” utilizada pelo legislador. Assim, para algo ser “mantido” por
determinação de uma ordem (disposição legal), deve preexistir a ela. Nesse
aspecto é interessante notar que a legislação determina que seja mantida a
“cobrança” e não a alíquota, a qual é tratada logo em seguida, quando a
determinação é que esta seja correspondente à máxima legalmente
permitida.
Diante disso, pensamos que, na ocorrência do disposto no §2º do art.
7º do Estatuto da Cidade, deve haver majoração da alíquota até o máximo
legalmente permitido, vale dizer, quinze por cento (15%), caso esta não
tenha atingido tal patamar, em razão da aplicação da majoração anual
prevista no art. 7º, caput e §1º, do mesmo diploma legal. Nesse sentido é a
lição de Diógenes Gasparini73. Registre-se tese discordante defendida por
Regis Fernandes de Oliveira74, para quem a alíquota máxima referida na
Lei é aquela aplicada ao longo do tempo, vez que a elevação deve ser
progressiva e também por João Carlos Macruz, José Carlos Macruz e
73
“A partir do quinto ano e até o cumprimento da obrigação ou desapropriação
mediante pagamento de títulos da dívida pública municipal será de 15%”. Obr. cit., p.
47/48.
74
“A alíquota máxima a que se refere o texto é aquela aplicada ao longo do tempo por
parte do Poder Público. A elevação deverá ser feita de forma paulatina, o que busca
constranger o contribuinte ao cumprimento da obrigação.” Obr. cit., pg. 53.
86
75
“Pois bem, passados 5 anos da cobrança do IPTU progressivo no tempo e mesmo
assim o proprietário permaneceu inerte quanto a sua obrigação de conferir a sua
propriedade a função social exigida, o Poder Público poderá manter a cobrança do
gravame pela alíquota máxima, que não é necessariamente a de 15%, mas a última
praticada pelo Município durante o quinto ano de aplicação. Lembremos que a alíquota-
teto de 15% é um limite imposto pelo legislador ao não-confisco, mas o que determnará
o seu valor abaixo disso será a possibilidade efetiva o proprietário arcar com o imposto,
sem que lhe acarrete a perda da propriedade.” Obr. cit., p. 59.
76
Constituição Federal: “Art. 150. Sem prejuízo de outras garantias asseguradas ao
contribuinte, é vedado à União, aos Estados, ao Distrito Federal e aos Municípios:” (...)
“IV - utilizar tributo com efeito de confisco;”.
77
“Pois bem. Dois aspectos suscitam o questionamento da validade dessas normas
perante a Constituição. O primeiro diz respeito ao teto da alíquota aplicável, de quize
por cento. Ainda que essa alíquota seja utilizada uma única vez, parece-nos que
dificilmente um imposto sobre a propriedade com alíquota nessa intensidade possa
deixar de ser considerado confiscatório, diante da substancial absorção da propriedade
que representará.” COSTA, Regina Helena, Instrumentos Tributários para a
87
79
“Na verdade, é lícito supor que a alíquota máxima eleita pelo Estatuto é aquilo que o
legislador considerou como o limite do não-confisco e, mesmo assim, somente
utilizável para acobrança do IPTU progressivo no tempo. Isso, essa alíquota máxima,
somente será aplicável, provavelmente, para casos muito isolados, exatamente atingindo
contribuintes com condições de arcar com tal gravosidade sem que lhe seja absorvido o
bem.” Obr. cit., p. 58.
80
“O IPTU progressivo no tempo, conforme o regime instituído pelo Estatuto da
Cidade, que permite, dentro da progressividade, a alíquota máxima de até 15%, seria
inconstitucional? A resposta, a nosso ver, é negativa, pois se cuida de tributo que visa
reprimir a manutenção de propriedade, não utilizada ou subutilizada, com o único
intuito de especulação. Impostos com esse perfil são tolerados pela Constituição
Federal, ainda que sejam por ela prestigiados os princípios da propriedade e da livre
empresa”. Obr. cit., p. 50.
81
“Não há qualquer vício de confisco no percentual máximo de 15% estabelecido para o
tributo. Não se trata, pois, de tributo com efeito de confisco, hipótese vedada pela
Constituição (art. 150, IV). Primeiramente, o imposto em foco tem, como vimos
natureza extrafiscal. Além disso, tem caráter sancionatório e objetiva compelir o
proprietário a política urbana traçada em favor da cidade. Ausente, pois, qualquer eiva
de inconstitucionalidade, como equivocadamente supõem alguns.” Obr. cit., p. 89.
82
“Sem entrar no mérito do dispositivo – que revela a louvável preocupação de evitar
que o IPTU seja utilizado como instrumento de confisco, mesmo quando o contribuinte
descura da função social de seu imóvel urbano -, temos para nós que o art. 7º, supra, é
inconstitucional, por haver se internado em seara própria das normas gerais em matéria
de legislação tributária (art. 146 da CF). Com efeito, ao invés de tratar simplesmente de
questões urbanísticas, a aludida lei federal ‘ditou’ regras tributárias aos Municípios,
desbordando de seu campo de atuação.” CARRAZZA, Roque Antonio, Curso de Direito
Constitucional Tributário, São Paulo, Ed. Malheiros, 2005 – 21ª Edição, p. 112/113.
89
disposto no art. 146 da Constituição Federal que determina que tal matéria
deve ser tratada por lei complementar83, verbis: “revela a louvável
preocupação de evitar que o IPTU seja utilizado como instrumento de
confisco, mesmo quando o contribuinte descura da função social de seu
imóvel urbano.”
Entendemos que não há caráter confiscatório na incidência do IPTU
progressivo em sua alíquota máxima, ainda que por tempo indeterminado,
na medida em que, o proprietário teve todas as oportunidades para evitar a
sua aplicação, pois, em primeiro lugar, houve a promulgação do Plano
Diretor, no qual constou o seu imóvel e para o qual foi atribuído
determinado aproveitamento, parcelamento, edificação ou utilização;
posteriormente sobreveio a Lei específica (art. 5º, caput do Estatuto da
Cidade), a qual determinou o aproveitamento do referido imóvel conforme
as diretrizes por ela apontadas, sendo o proprietário notificado para tanto (§
2º da mesma lei), ocasião em que lhe foi concedido um prazo, não inferior
a um ano, para apresentar o respectivo projeto junto ao órgão municipal (§
4º, inc. I) e outro prazo, não inferior a dois anos, a partir da aprovação do
projeto, para iniciar as obras (§ 4º, inc. II).
Em um cálculo superficial temos um prazo mínimo de três anos,
sendo, a partir da notificação do proprietário a que se refere o §2º do art. 5º
do Estatuto da Cidade: no mínimo um ano para apresentação do projeto, o
83
Quanto à inconstitucionalidade do art. 7º do Estatuto da Cidade, anote-se a posição
divergente de José dos Santos Carvalho Filho, o qual (em sentido oposto à lição de
Roque A. Carazza) assim leciona, verbis: “Há entendimento no sentido de que o art.
7º, §3º, do Estatuto, se caracterizaria como norma de direito tributário, fundada no art.
146 da Constituição, de modo que seu conteúdo seria passível de lei complementar.
Com a devida vênia, dissentimos de semelhante pensamento. Toda a matéria
relacionada ao IPTU progressivo no tempo, e isso inclui anistias e isenções, integra o
conteúdo de direito urbanístico e para disciplina-lo a Constituição – insista-se – previu
lei federal (logicamente lei ordinária), e não lei complementar, esta sim, adequada para
a disciplina tributária geral.” Obr. cit., p. 93.
90
qual levará certo tempo (alguns meses)84 para ser aprovado e no mínimo
dois anos para o início das obras.
Nota-se, portanto, que o proprietário somente será apenado com a
alíquota progressiva do imposto territorial e predial urbano, se
deliberadamente der causa a ela, na medida em que descumprir as
determinações que lhe forem impostas pelo Poder Público, com base na Lei
pertinente. Lembrando ainda, que a alíquota será majorada anualmente de
forma gradativa, vindo a atingir seu percentual máximo (quinze por cento),
somente após alguns anos de incidência.
Vislumbra-se até mesmo a possibilidade de, ainda com a incidência do
IPTU progressivo, ser interessante ao proprietário descumprir as
determinações do Poder Público, como no exemplo em que este determine
a edificação de uma área para ser usada como hospital, escola ou um centro
de abastecimento alimentício, e o proprietário esteja explorando o imóvel
como estacionamento (ou qualquer outra atividade distinta, que prestigie
exclusivamente seus interesses individuais, em detrimento dos sociais),
auferindo lucro tão grande com tal exploração, que lhe seja mais
compensatório arcar com o IPTU progressivo, do que cumprir a
determinação do Poder Público municipal.
De qualquer forma, o que se deve ter em mente é o princípio da
supremacia do interesse público sobre o privado, que conduz ao sacrifício
do direito (interesse) individual em benefício do interesse social, sobretudo
quando o sacrifício deste interesse ocorrer em razão da negligência ou dolo
do seu titular.
Por fim, cumpre-nos tratar do último tema relacionado ao imposto
predial e territorial urbano progressivo no tempo, no que toca as isenções e
anistias, assim disposto na lei, verbis:
84
No mínimo dois meses (sessenta dias), cf. art. 49 par. ún. do Estatuto da Cidade.
91
85
“Anote-se, outrossim, a impropriedade da dicção legal, porquanto, ao referir-se a
anistia, quer significar remissão, já que esta, sim, constitui o perdão do débito
tributário, enquanto aquela é o perdão da sanção aplicada e, eventualmente, também o
perdão da própria infração.” Obr. Cit., pg. 113.
86
“De se anotar a impropriedade do texto ao falar em anistia, querendo significar
remissão, uma vez que o que está vedando é o perdão. Anistia diz respeito ao perdão da
sanção, enquanto que remissão diz respeito à infração. No caso, ao vedar ‘anistia’, está
querendo dizer que não se pode perdoar o pagamento do tributo decorrente do fato de
não ter o proprietário dado destino a sua propriedade, o que ensejou a incidência da
progressividade do imposto. Obr. Cit., pg. 55.
87
“Embora o Estatuto da Cidade tenha mencionado nesse dispositivo a palavra anistia,
deve-se entender remissão, ou seja, o perdão, no caso, da dívida tributária.” Obr. cit., p.
55.
92
88
“A concessão de isenções ou anistias aos imóveis submetidos à obrigação de parcelar
ou edificar impediria a utilização extra-fiscal do IPTU. Isto comprometeria a aplicação
do instituto, instituindo tratamento privilegiado aos beneficiários da isenção, que
ficariam livres para especular com seus terrenos. Eventual baixa renda do proprietário
de um terreno não pode servir de pretexto para impedir a obrigação de parcelar ou
edificar. Se não dispuser de recursos, este deverá aliená-lo a quem possa cumpri-la.”
Obr. cit., p. 143/144.
89
“A fixação da alíquota deve estar prevista na lei municipal específica, como exige o
art. 7º, §1º, do Estatuto. (...) Qualquer das leis, todavia, deve observar o princípio da
anterioridade da lei fiscal, previsto no art. 150, III, “b”, da CF, segundo o qual é vedado
cobrar tributos ‘no mesmo exercício financeiro em que haja sido publicada a lei que os
instituiu ou aumentou’.” Obr. cit., p. 89/90.
90
Art. 150. Sem prejuízo de outras garantias asseguradas ao contribuinte, é vedado à
União, aos Estados, ao Distrito Federal e aos Municípios:
93
5.4) DA DESAPROPRIAÇÃO.
93
“No caso de a aplicação dos instrumentos urbanos de edificação, parcelamento ou
edificação compulsórios não funcionarem ou esgotarem seu potencial, o mesmo
sucedendo com a aplicação do IPTU progressivo, poderá haver desapropriação do
imóvel ‘com pagamento em títulos da dívida pública’ nos termos do art. 8º, que repete o
inciso II do art. 182 da Constituição. É o que se convencionou chamar de
desapropriação-sanção: não há supressão da garantia de prévia e justa indenização, mas
o proprietário é penalizado com a forma mais alongada e desvantajosa de pagamento.”
OLIVEIRA, Regis Fernandes, obr. cit. pg. 57. e “Antes de qualquer observação, impõe
asseverar que as regras trazidas pelo Estatuto da Cidade, serão aplicadas especial e
exclusivamente para a desapropriação-sanção, havida em nome do atendimento da
função social da propriedade, conforme definido no plano diretor.” MACRUZ, João
Carlos, MACRUZ, José Carlos e MOREIRA, Mariana. Obr. cit., p. 65.
94
“A segunda modalidade é a desapropriação urbanística sancionatória, prevista no art.
182, §4º, III da CF, e que vamos examinar a seguir.” CARVALHO FILHO, José dos
Santos, obr. cit., p. 97.
95
“Quanto a competência para promover a desapropriação em foco, a matéria merece
uma observação. Embora a desapropriação comum (por utilidade pública ou interesse
95
social) seja da competência concorrente de todos os entes federativos (art. 2º, Decreto-
Lei nº 3.365/41), a Constituição conferiu privativamente ao Município a competência
para deflagrar o processo de desapropriação urbanística sancionatória.” Obr. cit., p. 99.
96
96
“Aqui, sim, o Estatuto deixou opção discricionária para o governo municipal: ou
mantém a alíquota máxima após cinco anos, ou promove a desapropriação do imóvel.”
“Em nosso entender, esta última é que deve ser a providência a ser adotada pelo
governo municipal, a despeito da opção que o Estatuto lhe assegura. Manter apenas a
cobrança do tributo após cinco anos é o mesmo que manter o imóvel na situação
ofensiva ao plano urbanístico da cidade, hipótese em que não estará ele desempenhando
função social como impõe a Constituição. Ultimado o prazo sem que o proprietário
proceda à adequação do imóvel ao plano diretor, deve o Município, sem perda de
tempo, adotar as medidas necessárias à desapropriação.” Obr. cit., p. 90.
97
“A desapropriação ocorrerá quanto o Poder Público entender oportuno, após a
passagem do quinto ano da cobrança do IPTU progressivo no tempo, sujeitando-se,
contudo, à necessidade de decretação prévia de que aquele imóvel, por não atender à sua
função social, está sujeito à desapropriação.” Obr. cit., p. 66.
98
“Outro aspecto resida na dúvida sobre se é ou não exigível a expedição de decreto
expropriatório, no caso pelo Prefeito do Município, como ocorre com a desapropriação
comum. Em nosso entender, tal decreto é inexigível para a desapropriação urbanística
sancionatória.”
“Assim, o ato é apropriado para a desapropriação comum por utilidade pública e tem,
como um de seus objetivos, dar publicidade, notadamente ao proprietário, da intenção
do Poder Público de transferir o bem a ser objeto da desapropriação. Note-se que até
esse momento todo e qualquer procedimento estatal teve curso interno, isto é, tramitou
exclusivamente por entre os órgãos administrativos.”
97
101
“De outra forma, se alcançar a sede judicial, a desapropriação com pagamento de
títulos observará o rito judicial definido no Decreto-lei n. 3.365/41, a partir do seu art.
11 e até o art. 30. Assim, por exemplo, requisitos da petição inicial (art. 13), forma de
citação do réu (arts. 16 a 18), observância do rito processual ordinário (art. 19), dentre
outros ali previstos, deverão ser rigorosamente atendidos.” MACRUZ, João Carlos,
MACRUZ, José Carlos e MOREIRA, Mariana, Obr. cit., p. 65.
102
“A desapropriação judicial é a resolvida em juízo, por ter resultado inútil qualquer
tentativa de acordo. Assim ocorrendo, observadas as normas processuais do Dec.-Lei
federal nº 3.365/41 e, supletivamente, as pertinentes do Código de Processo Civil, o
Município ou, conforme o caso, o Distrito Federal, ingressará no juízo competente com
a devida ação de desapropriação.” Obr. cit., p. 65.
103
“Como o Estatuto instituiu apenas normas de caráter material, silenciando sobre o
procedimento a ser adotado na ação, é de considerar-se que se deverá observar o rito da
ação de desapropriação comum, ou seja, aquele disciplinado nos arts. 11 a 30 do
Decreto-Lei 3.365/41 – Lei que, na matéria, tem caráter geral. Importante salientar,
contudo, que referido procedimento deve ser observado no que couber, isto é,
procedendo-se à adequação entre os procedimentos e os fins a que se destina cada
espécie de desapropriação.” Obr. cit., p. 102.
104
“Enquanto não editada lei especial regulando a matéria, considerando a
inaplicabilidade dos diplomas que regem a desapropriação por necessidade, utilidade
pública ou interesse social, a solução se encontra no art. 271 do estatuto processual
civil, que preconiza que, salvo disposição em contrário, aplica-se a todas as causas o
procedimento comum, que, segundo o art. 272 do mesmo estatuto processual, pode ser
ordinário ou sumário.” BEZNOS, Clóvis – Desapropriação em Nome da Política
Urbana, in Estatuto da Cidade – Comentários a Lei Federal 10.257/01, São Paulo, Ed.
Malheiros, 2002 – 1ª Edição, p. 136.
99
dívida pública. Mais uma razão para que a desapropriação não seja
compulsória, ao Poder Público municipal, na medida em que, este
dependerá do Senado Federal para a emissão dos títulos que servirão para
pagamento do proprietário expropriado, como veremos infra.
A determinação do pagamento com títulos da dívida pública contrasta
tanto com a regra geral, quanto com a regra específica (para imóveis
urbanos), ambas estabelecidas na Constituição Federal (arts. 5º, inc. XXIV
e art. 182, §3º, respectivamente), as quais prevêem, para as
desapropriações, justa e prévia indenização em dinheiro105.
Primeiramente cumpre afastar a idéia de inconstitucionalidade do
disposto no referido art. 8º, caput do Estatuto da Cidade, vez que, a
previsão de pagamento com títulos da dívida pública encontra-se
consagrada também no inc. III do §4º do art. 182 da Constituição Federal, o
qual não conflita com a regra geral insculpida no inc. XXIV do art. 5º
também da Carta Constitucional, na medida em que este expressamente
ressalva, quanto ao pagamento pela desapropriação, “os casos previstos
nesta Constituição”.
Em nosso sentir, a previsão de pagamento com títulos da dívida
pública, para os casos de desapropriação por descumprimento da função
social da propriedade (desapropriação-sanção), prevista no inc. III do § 4º
da Constituição Federal e no art. 8º do Estatuto da Cidade, configura mais
um fator de desestímulo, bem como, mais uma punição, para o proprietário
que não cumpre a obrigação que lhe foi exigida pelo Poder Público, em
detrimento do interesse social.
105
Art. 5º, inc. XXIV – “A lei estabelecerá o procedimento para desapropriação por
necessidade ou utilidade pública, ou por interesse social, mediante justa e prévia
indenização em dinheiro, ressalvados os casos previstos nesta Constituição.”; art. 182, §
3º - “As desapropriações de imóveis urbanos serão feitas com prévia e justa indenização
em dinheiro”.
100
106
“Assim, não produz qualquer efeito o fato de o proprietário decidir pelo
cumprimento da obrigação após ajuizada a ação. Sua única alternativa para não sofrer a
perda da propriedade consiste em cumprir a obrigação de parcelar ou edificar antes da
demanda expropriatória. Após a propositura, haverá exclusivamente um desfecho: a
transferência da propriedade para o patrimônio municipal.” Obr. cit., p. 103/104.
107
Para Regis Fernandes de Oliveira, não são os títulos que têm prévia autorização do
Senado, e sim as operações externas, in verbis: “Dispõe o §1º do art. 8º, da Lei
10.257/01, que ‘os títulos da dívida pública terão prévia aprovação pelo Senado
Federal...’ Ora, em primeiro lugar, não são os títulos que têm prévia autorização do
Senado Federal. O que deve ter prévia autorização são as operações externas (inciso V
do art. 52, CF), cabendo ao Senado estabelecer: a) limites globais para o montante da
dívida consolidada da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios (inciso
VI do art. 52) e b) estabelecer limites globais para o montante da dívida mobiliária dos
Estados, do Distrito Federal e dos Municípios (inciso IX, do art. 52, CF).” Obr. cit., p.
57/58.
101
Beznos108 (in verbis): “retira das mãos do município a decisão plena sobre
a efetivação das desapropriações.”; o que, segundo o referido autor,
explicaria o fato da desapropriação ser uma faculdade e não uma obrigação
do Pode Publico municipal109.
De acordo com expressa previsão constitucional, o Senado Federal
deve estabelecer limites globais e condições para o montante da dívida
mobiliária dos municípios (art. 52, inc. IX)110, e no exercício dessas
atribuições o Senado Federal baixou a Resolução 78/98, que “Dispõe sobre
as operações de crédito interno e externo dos Estados, do Distrito Federal,
dos Municípios e de suas respectivas autarquias e fundações, inclusive
concessão de garantias, seus limites e condições de autorização, e dá
outras providências.”, a qual dispõe em seu art. 10111, que até trinta e um
de dezembro de 2010 os municípios somente poderão emitir títulos da
dívida pública para refinanciar suas obrigações representadas por essa
espécie de títulos. Assim, enquanto vigente o referido dispositivo
normativo, os Municípios somente poderão emitir títulos da dívida pública,
para pagamento de indenizações referentes a desapropriações por
descumprimento da função social da propriedade urbana, nos termos do art.
8º do Estatuto da Cidade, após dezembro de 2010, ficando até tal data,
inviabilizada qualquer desapropriação com tal fundamento legal.
108
Obr. cit. p. 130.
109
“Como se lê do seu art. 8º, a Lei 10.257/2001 estabelece uma faculdade ao
Município no que tange à desapropriação, vez que utiliza o termo ‘poderá’, e não
‘deverá’.”
“Essa faculdade se explica, vez que os títulos que se constituem na moeda do
pagamento da desapropriação dependem de prévia aprovação do Senado Federal, o que
retira das mãos no Município a decisão plena sobre a efetivação das desapropriações.”
BEZNOS, Clóvis, obr. cit., p. 130.
110
Art. 52. “Compete privativamente ao Senado Federal: (...) IX - estabelecer limites
globais e condições para o montante da dívida mobiliária dos Estados, do Distrito
Federal e dos Municípios;”
111
Art. 10. Até 31 de dezembro de 2010, os Estados, o Distrito Federal e os Municípios
somente poderão emitir títulos da dívida pública no montante necessário ao
refinanciamento do principal devidamente atualizado de suas obrigações, representadas
por essa espécie de títulos.
102
112
Constituição Federal: arts. 5, inc. XXIV e 182, § 3º.
113
Constituição Federal: Art. 184. “Compete à União desapropriar por interesse social,
para fins de reforma agrária, o imóvel rural que não esteja cumprindo sua função social,
mediante prévia e justa indenização em títulos da dívida agrária, com cláusula de
preservação do valor real, resgatáveis no prazo de até vinte anos, a partir do segundo
ano de sua emissão, e cuja utilização será definida em lei.”
114
BEZNOS, Clóvis, Obr. Cit., p. 133:
“De outra parte, cabe referir que, em relação à desapropriação como sanção pelo
descumprimento da função social da propriedade rural, prevê a Constituição Federal o
requisito da justa indenização, como se observa no art. 184 da Carta Política.”
“Ora, não havendo razão jurídica para o discrímen em idêntica situação de
descumprimento da função social da propriedade, somente se pode concluir que o
asseguramento do valor real da indenização, tal como prevê o art. 182, quer significar a
mesma coisa que justa indenização.”
104
“De fato, o termo “real” significa verdadeiro, conclui-se, pois, que a indenização
verdadeira nada mais é do que a justa indenização.”.
115
“Parece-nos, contudo, que o requisito de justiça da indenização não tem – insistimos
– inteira aplicação no caso da desapropriação urbanística sancionatória. A ratio que
conduz o Poder Público a processar a desapropriação por utilidade pública ou interesse
social não tem qualquer conotação com eventual comportamento ilícito do expropriado.
Cuida-se apenas da aquisição de imóvel para certo fim público.”
“A desapropriação prevista no Estatuto, porém, pressupõe que o proprietário esteja
em situação de frontal desrespeito à ordem urbanística da cidade, mesmo após as
providências adotadas pela Administração com vistas à regularização do imóvel.” Obr.
cit., p. 106.
116
Constituição Federal: art. 182, § 3º - “As desapropriações de imóveis urbanos serão
feitas com prévia e justa indenização em dinheiro.”
105
117
“De fato, o verbo ‘indenizar’, segundo o dicionário Aurélio, tem sua formação pela
composição do termo indene, do latim indemne, com o sufixo izar. Ora, indene significa
‘que não sofreu dano ou prejuízo; íntegro, ileso, incólume’.”
“Assim, justa indenização nada mais é que uma expressão pleonástica, pois para ser
íntegra a recomposição patrimonial bastaria a referência à indenização.” Obr. Cit., p.
132.
118
“Ao que tudo indica, a expressão ‘real’ foi empregada para designar a correção
monetária do valor do título, como forma de impor a sua desvalorização inflacionária.”
Obr. cit., p. 147.
106
119
BEZNOS, Clóvis, Obr. Cit., p. 133:
“Assim, nada tem que ver essa preservação do real valor dos títulos na
desapropriação para a reforma agrária com o asseguramento do valor real da
indenização na desapropriação do imóvel urbano que descumpra sua função social, eis
que nessa hipótese o termo ‘real’ tem o mesmo sentido de ‘justa’, sendo pleonásticas
ambas as expressões – ‘justa indenização’ como ‘real indenização’.”.
120
Art. 1.062. “A taxa dos juros moratórios, quando não convencionada (art. 1.262),
será de 6% (seis por cento) ao ano.”
Art. 1.063. “Serão também de 6% (seis por cento) ao ano os juros devidos por força de
lei, ou quando as partes se convencionarem sem taxa estipulada.”
107
da entrada em vigor do Código Civil de 2002, que alterou a taxa dos juros
legais 121, como fica a disposição do Estatuto da Cidade?
Pensamos que a fixação do percentual de juros pelo §1º do art. 8º do
Estatuto da Cidade tornou-se inconstitucional, na medida em que a
Constituição Federal determina que os juros incidentes serão os “legais”, os
quais são estipulados no Código Civil, que atualmente não o faz mais a
razão de seis por cento ao ano, porém expressamente determina que sua
aplicação ocorrerá quando os juros forem devidos por determinação da Lei
(no caso, da Constituição), em taxa coincidente com a utilizada para a mora
do pagamento de impostos devidos à Fazenda Nacional, a qual, segundo
disposto no art. 161, §1º do CTN 122 é, salvo disposição legal em contrário,
de um por cento (1%) ao mês.
Portanto, ainda que o Estatuto da Cidade disponha expressamente que
a taxa de juros a ser aplicada, quando do resgate dos títulos da dívida
pública emitidos para pagamento da desapropriação-sanção, seja de seis
por cento ao ano (art. 8º, §1º), entendemos que tal taxa deve incidir à razão
de doze por cento (12%) ao ano, em virtude da inconstitucionalidade da
referida disposição legal, face à nova disciplina pertinente aos “juros
legais”, trazida pelo Código Civil de 2002. Neste caso, não há que se falar
em disposição legal ressalvada pelo art. 161 do CTN, na medida em que, a
norma que estabelece os juros devidos é a Constituição Federal (e não o
CTN), o fazendo de forma vinculada ao Código Civil, e não o Estatuto da
Cidade, o qual buscou regulamentar matéria que não necessitava de
121
Art. 406. “Quando os juros moratórios não forem convencionados, ou o forem sem
taxa estipulada, ou quando provierem de determinação da lei, serão fixados segundo a
taxa que estiver em vigor para a mora do pagamento de impostos devidos à Fazenda
Nacional.”
122
“Art. 161. O crédito não integralmente pago no vencimento é acrescido de juros de
mora, seja qual for o motivo determinante da falta, sem prejuízo da imposição das
penalidades cabíveis e da aplicação de quaisquer medidas de garantia previstas nesta Lei
ou em lei tributária.” (...) “§ 1º Se a lei não dispuser de modo diverso, os juros de mora
são calculados à taxa de um por cento ao mês.”
108
123
“Todavia, o desapropriado já é suficientemente sancionado pelo fato de não receber a
indenização prévia e em dinheiro, mas sim em parcelas anuais, em parcelas anuais, em
até dez anos, em títulos que não se prestam sequer como meio de pagamento de tributos,
conforme previsão do §3º do art. 8º.” Obr. Cit., p. 132.
124
“Destarte, parece-nos inconstitucional o inciso I do §2º do art. 8º da Lei 10.257/01,
na medida em que o atendimento de sua previsão, ao possibilitar a retirada da
propriedade com base em valor prefixado com a possibilidade de não ficar indene o
proprietário, vulnera o preceito da real indenização previsto pelo art. 182, §4º, III, da
Constituição.” Obr. Cit., p. 133.
125
“O valor da planta de valores é sempre inferior ao de compra e venda em condições
normais de mercado, seria ele inconstitucional pois não representaria a justa indenização
a que se referem os arts. 5º, XII, e 182, §3º, ambos da Constituição Federal? Não
cremos, ainda que tais valores (planta de valores e justa indenização) possam ser
diferentes. Com efeito, se o constituinte desejasse que o valor a ser pago pela
expropriação fosse igual ao da justa indenização, teria assim prescrito claramente, tal
como fez no parágrafo anterior, e haveria, nesse inciso do §4º do art. 182 da
Constituição Federal, a tradicional expressão: assegurada a justa indenização e os
juros legais. Ao contrário, em nítida demonstração de que desejava outro valor
indenizatório para tais desapropriações, mencionou: assegurados o valor real da
indenização e os juros legais. Obr. cit., p. 62/63.
110
§4º do art. 182 da CF, das demais desapropriações onde o critério seria o da
“justa indenização”, razão pela a qual, a vinculação do valor da indenização
ao valor venal do imóvel expropriado seria plenamente constitucional.
Nesse sentido também, como visto, é a lição de José dos Santos
Carvalho Filho126 (vide nota 115, supra), o qual acrescenta ainda que, o
legislador, ao dizer que a indenização “refletirá” o valor venal da base de
cálculo do IPTU, não pretendeu afirmar que tais valores serão idênticos, e
sim que aquele levará em consideração este, quando da sua fixação, bem
como, ainda que o valor venal seja inferior ao valor de mercado do imóvel
expropriado, a indenização pela expropriação poderá ser idêntica a ele, sem
que isso implique em inconstitucionalidade, vez que, o critério da “justiça”
para a fixação da indenização estaria afastado quando se trata de
desapropriação urbanística sancionatória.
De fato, conforme já exposto, nosso entendimento é no sentido que o
constituinte destinou tratamento diferenciado à desapropriação tratada no
art. 182, §4º, inc. III, somente no tocante ao tempo e a forma de pagamento
da respectiva indenização, assegurando, contudo, o seu “real valor”, o que
significa que a indenização deve corresponder ao real dano do lesado (justa
indenização), tanto no momento de sua fixação, quanto no momento do seu
efetivo pagamento, com o resgate os títulos.
Contudo, a Constituição não estabelece qual o critério para a fixação
da indenização na desapropriação tratada no art. 182, §4º, inc. III, como
não o faz com as demais formas de desapropriação, tal critério é definido
126
“A o dizer que o valor da indenização ‘refletirá’ o valor venal que serviu de base
para o IPTU, o legislador não pretendeu afirmar que a indenização terá valor idêntico a
este último, e sim que o levará em consideração como um dos fatores que conduzam à
fixação. Não obstante, se em tal apreciação o órgão municipal comprovar que o valor
indenizatório é, no caso, o reflexo do valor já fixado para o IPTU, ainda que inferior ao
preço de mercado, poderá haver igualdade de valores, sem que haja, em nosso entender,
qualquer eiva de inconstitucionalidade por falta do requisito da justiça indenizatória –
requisito esse notoriamente mitigado nessa espécie de desapropriação.” Obr. cit., p. 106.
111
127
O STJ já decidiu no sentido de que, nem sempre o valor venal do imóvel expropriado
proporciona uma justa indenização, ocasião em que esta deve ser efetivada por outros
meios, in verbis:
“DESAPROPRIAÇÃO - IMISSÃO PROVISORIA NA POSSE - VALOR DA
INDENIZAÇÃO.
- A imissão provisória na posse de imóvel em processo de desapropriação, somente e
possível mediante deposito de indenização justa.
- O valor adotado como base de calculo para o lançamento do IPTU nem sempre traduz
indenização justa.
Por maioria, vencido o ministro Garcia Vieira, dar provimento ao recurso.
RMS 2850/MG; RECURSO ORDINARIO EM MANDADO DE SEGURANÇA:
1993/0009312-6 – Relator: Ministro HUMBERTO GOMES DE BARROS - Órgão
Julgador: PRIMEIRA TURMA - Data do Julgamento: 06/06/1994 - Data da
Publicação/Fonte: DJ 22.08.1994, p. 21207.”
128
Nesse sentido é a posição de Victor Carvalho Pinto, in verbis: “o valor decorrente da
avaliação pelo Poder Público poderá ser contestado pelo proprietário, seja como
112
deve realmente ser punido por sua recalcitrância, porém tal punição deve
observar o princípio da razoabilidade e da proporcionalidade, no sentido
de, ao menos resguardar o direito ao recebimento do valor correspondente
ao bem que lhe é expropriado, sobretudo para evitar o enriquecimento
indevido do Poder Público expropriante.
Outro aspecto de interesse, refere-se à determinação de desconto do
“montante incorporado em função de obras realizadas pelo Poder Público
na área onde o mesmo se localiza após a notificação de que trata o § 2o do
art. 5o desta Lei;”.
Inicialmente é interessante frisar que as “obras realizadas pelo Poder
Público” constantes no texto legal, cujo desconto deve incidir sobre a
indenização devida, em razão da desapropriação urbanística sancionatória,
do imóvel que não esteja cumprindo sua função social, devem ter sido
realizadas após a notificação de que trata o §2º do art. 5º do Estatuto da
Cidade, vale dizer, caso tais obras tenham sido realizadas antes da referida
notificação, não se observará o pressuposto de aplicação da referida norma,
razão pela qual está não poderá ser aplicada, ou seja, o valor das referidas
obras não poderão ser descontados da indenização a ser paga em razão da
desapropriação perpetrada.
Como bem ensina Clóvis Beznos129, eventual valorização do imóvel
decorrente de obras realizadas pelo Poder Público, tem caráter de
contribuição de melhoria e, portanto, somente pode ser cobrada do
proprietário através de lei específica, de autoria da pessoa política
beneficiária com observância ao disposto nos arts. 81 e 82 do CTN.
contribuinte, seja como expropriado. Neste último caso, deverá ser adotado o
procedimento estabelecido pelo Decreto-Lei n. 3.365/41.” Obr. Cit., p. 147/148.
129
“Além disso, esse dispositivo ostenta outro defeito, ao nosso ver, consistente na
previsão do desconto do valor incorporado em razão das obras realizadas pelo Poder
Público na área onde o imóvel se localize.”
113
“Com efeito, tal previsão nada mais configura que uma contribuição de melhoria;
portanto, tributo que somente pode ser cobrado como tal mediante a edição de lei
específica oriunda da pessoa jurídica dele beneficiária, que obedeça a uma série de
requisitos previstos nos arts. 81 e 82 do Código Tributário Nacional.” Obr. Cit., p. 133.
130
“ADMINISTRATIVO - DESAPROPRIAÇÃO - JUSTA INDENIZAÇÃO –
VALORIZAÇÃO POSTERIOR À IMISSÃO NA POSSE.
- A indenização só é justa, se bastar para que o expropriado adquira bem da vida
correspondente àquele que lhe foi subtraído.
- No caso de desapropriação de um lote de terreno, a indenização será justa, na medida
em que o expropriado possa adquirir, na mesma região, lote em igual situação àquela do
terreno perdido. Se a valorização resultou de benefícios operados pelo Poder
expropriante, tudo se resolve com a cobrança de contribuição de melhoria, jamais com o
pagamento do preço injusto.
Vistos, relatados e discutidos os autos em que são partes as acima indicadas, acordam os
Ministros da PRIMEIRA TURMA do Superior Tribunal de Justiça na conformidade dos
votos e das notas taquigráficas a seguir, prosseguindo no julgamento, após o voto-vista
do Sr. Ministro Francisco Falcão, por unanimidade, negar provimento aos recursos
especiais do Município de Campos dos Goytacazes e Evandro Lima e, por maioria,
vencido o Sr. Ministro Relator, dar provimento ao recurso especial de Prolar S.A., nos
termos do voto-vista do Sr. Ministro Humberto Gomes de Barros, designado para lavrar
o acórdão. Votaram os Srs. Ministros Humberto Gomes de Barros (voto-vista), José
Delgado, Francisco Falcão (voto-vista) e Luiz Fux.
REsp 439878 / RJ ; RECURSO ESPECIAL: 2002/0069786-9 – Relator: Ministro
TEORI ALBINO ZAVASCKI - Relator p/ Acórdão: Ministro HUMBERTO GOMES
DE BARROS - Órgão Julgador: PRIMEIRA TURMA - Data do Julgamento:
09/03/2004 - Data da Publicação/Fonte: DJ 05.04.2004 p. 204 - RNDJ vol. 55, p. 96.”
114
131
Nesse sentido é a lição de Clóvis Beznos, in verbis: “Destarte, parece-nos que
‘expectativa de ganho’, desde que razoável, outra coisa não configura que os próprios
lucros cessantes.” Obr. cit., p. 134.
115
132
Súmula 618 – STF: “Na desapropriação, direta ou indireta, a taxa dos juros
compensatórios é de 12% (doze por cento) ao ano.”
133
Vez que o proprietário perde a posse do imóvel expropriado imediatamente, vindo a
receber a respectiva indenização somente em momento futuro, pelo que deve ser
compensado com os respectivos juros.
134
A linha de raciocínio utilizada é a mesma desenvolvida por Clóvis Beznos, ao
examinar o inc. I, §2º, art. 8º do Estatuto da Cidade (vide nota 124, supra).
135
“ADMINISTRATIVO. EMBARGOS DE DIVERGÊNCIA.
DESAPROPRIAÇÃO PARA FINS DE REFORMA AGRÁRIA. JUROS
COMPENSATÓRIOS. INCIDÊNCIA.
1. É irrelevante o fato de o imóvel ser ou não produtivo para a fixação dos juros
compensatórios na desapropriação, vez que estes são devidos tendo em vista a perda
117
nos termos do voto do Exmo. Sr. Ministro Relator. Votaram com o Relator os Exmos.
Srs. Ministros Garcia Vieira, Humberto Gomes de Barros e Milton Luiz Pereira.
Ausente, justificadamente, o Exmo. Sr. Ministro Francisco Falcão.”
REsp 228481/MA; RECURSO ESPECIAL: 1999/0078252-6 – Relator: Ministro JOSÉ
DELGADO - Órgão Julgador: PRIMEIRA TURMA - Data do Julgamento: 24/02/1999
- Data da Publicação/Fonte: DJ 20.03.2000, p. 46 - RIP vol. 8 p. 262, RSTJ vol. 132 p.
184.
137
“Da mesma forma, a lei exclui os lucros cessantes, ou seja, as parcelas que o
proprietário deixará de receber em função da desapropriação. Também não poderão ser
calculados juros compensatórios em virtude da eventual perda da posse no início da
ação expropriatória. Juros dessa natureza são pacificamente admitidos na
desapropriação comum e se fundamentam na necessidade de compensação em favor do
proprietário. Na desapropriação em foco, no entanto, nada há a compensar, visto que o
proprietário já há muito vem abusando do direito de propriedade.” Obr. cit., p. 107.
119
Outro aspecto que nos interessa abordar, diz respeito ao fato de que os
títulos da dívida pública utilizados no pagamento da indenização, em razão
da desapropriação por descumprimento da função social da propriedade,
não podem ser utilizados para pagamento de tributos, a teor do disposto no
§3º do art. 8º do Estatuto da Cidade, in verbis:
138 Art. 105. Fica o Poder Executivo autorizado a emitir títulos, denominados Títulos da
Dívida Agrária, distribuídos em séries autônomas, respeitado o limite máximo de
circulação equivalente a 500.000.000 de OTN (quinhentos milhões de Obrigações do
Tesouro Nacional).
§ 1° Os títulos de que trata este artigo vencerão juros de seis por cento a doze por
cento ao ano, terão cláusula de garantia contra eventual desvalorização da moeda, em
função dos índices fixados pelo Conselho Nacional de Economia, e poderão ser
utilizados:
a) em pagamento de até cinqüenta por cento do Imposto Territorial Rural;
139
“Evidente está que, se os títulos são emitidos para resgate a prazo, as parcelas ainda
não vencidas, não têm, nem podem ter, poder liberatório. O poder liberatório significa a
cessação da relação de débito. No entanto, as parcelas vencidas, caso não resgatadas
120
pelo Poder Público, evidente que adquirem pode liberatório, pelo só não pagamento no
tempo.” Obr. cit., p. 60.
140
“A vedação dessa forma de pagamento de tributo evita que os títulos sejam
resgatados indiretamente antes do seu vencimento, prática que tem originado problemas
no campo da reforma agrária. É preciso notar, entretanto, que o problema ocorre
principalmente com os títulos vincendos, cujo valor atual precisa ser calculado no
momento do pagamento. A compensação com títulos vencidos nenhum inconveniente
traria ao Poder Público.” Obr. cit., p.148.
141
“Diante da inexistência de qualquer ressalva permissiva, é forçoso concluir que os
títulos não podem ser utilizados para pagar tributos mesmo se já forem resgatáveis, ou
seja, mesmo que o valor neles contido já possa ser recebido pelo proprietário junto à
pessoa pública emitente.” Obr. cit., p. 108.
142
Nesse sentido é a posição de Victor Carvalho Pinto, in verbis: “O prazo de cinco
anos diz respeito à conclusão da obra e aplica-se tanto ao próprio Poder Público quanto
121
147
“Não se pode olvidar, que, por força do Estatuto da Cidade, além da punição dos
agentes públicos envolvidos na desapropriação e da aplicação de outras sanções
cabíveis, o Prefeito estará sujeito à responsabilização por improbidade administrativa,
nos termos da Lei nº 8.429/92, se ‘deixar de proceder, no prazo de cinco anos, o
adequado aproveitamento do imóvel incorporado ao patrimônio público’, seja para
parcelamento, edificação ou utilização compulsórios (art. 52, II).” Obr. cit. p. 68.
148
“A inércia quanto ao aproveitamento do imóvel provoca efeitos gravosos para a
autoridade omissa, basicamente o Prefeito, mas podendo ser qualquer outro agente,
desde que responsável pela inércia. De acordo com o art. 52, II, do Estatuto, incorre em
improbidade administrativa o Prefeito que ‘deixar de proceder, no prazo de cinco anos,
o adequado aproveitamento do imóvel incorporado ao patrimônio público’. Ocorrendo
tal situação fática, o Prefeito sujeitar-se-á às regras da Lei nº 8.429, de 02.06.92 que
regula as condutas qualificadas como de improbidade administrativa e disciplina os
procedimentos a serem adotados contra o sujeito ativo dessas condutas.” Obr. cit., p.
109.
123
149
“O momento em que ocorre a incorporação é o do registro do mandado de imissão
definitivo de posse expedido pelo juiz, após o pagamento da indenização (artigo 29 do
Decreto-Lei 3.365/41).” Obr. cit., p. 148.
150
“Na hipótese de ter optado pela desapropriação sancionatória, o Município deverá
proceder ao aproveitamento do imóvel, na forma determinada pelo Plano Diretor, no
prazo máximo de 5 anos, que correrão a partir da incorporação do imóvel ao patrimônio
público municipal, que se dará com a sentença transitada em julgado ou com o sucesso
do processo amigável.” Obr. cit. p. 68.
151
“Mas quando se dá a incorporação? Com a sentença expropriatória transitada em
julgado? Com o registro da sentença expropriatória ou da escritura desapropriação no
cartório de registro de imóveis? Com a imissão provisória na posse? Cremos que será,
em termos constitucionais, com o pagamento do valor real da indenização, ou seja, com
a entrega dos títulos correspondentes a esse montante indenizatório ao expropriado ou
com seu depósito em juízo. É com tal pagamento ou depósito que o domínio é
transferido para o expropriante, consumando-se, nesse momento, a desapropriação. A
sentença, a escritura e o registro imobiliários desses atos são meros elementos
regularizadores da transmissão imobiliária.” Obr. cit., p. 71.
152
“Em alguns casos, a alienação ou a concessão a terceiros, previstas no §5º do art. 8º
se apresentam, talvez, como as únicas soluções para que o Poder Público dê ao imóvel
expropriado a função social requerida, pois não nos parece crível supor que o Poder
124
Público diretamente realize despesas de capital com atividades e obras cuja finalidade
não seja pública. Vale dizer, seria possível para o Município realizar construção de uma
unidade residencial unifamiliar em razão de ter sido exatamente esta a obrigação
constante na notificação expedida outrora? O mesmo se indaga relativamente a
obrigação de parcelar: poderia o Município parcelar o solo com o fim de implantar
loteamento que não seja de interesse social, isto é, com finalidade de lucro imobiliário?”
Obr. cit., p. 70/71.
153
“A concessão pode ter por objeto a obra ou o direito real de uso do imóvel. No
primeiro caso, o concessionário adquire a propriedade do bem e assume a obrigação de
executar a obra em determinado prazo, ressarcindo-se de seus gastos pela alienação das
unidades finais produzidas. No segundo caso, o concessionário adquire o direito real de
uso, assumindo a obrigação de realizar a obra e ressarcindo-se de seu investimento pelo
uso do imóvel durante o prazo de vigência do contrato. Ao final o bem é devolvido ao
Poder Público, acrescido das obras realizadas.”
“Em ambas as hipóteses, o prazo estipulado para a realização da obra pelo
concessionário poderá ser inferior ao fixado pela lei específica para o cumprimento da
obrigação pelo proprietário original.” Obr. cit., p. 149.
154
“Duas questões nos ocorrem quanto a essa possibilidade: a primeira consistente no
prazo que teria o novo adquirente para proceder às providências que lhe cabem para
cumprir a função social da propriedade; e a segunda, que envolve a possibilidade de o
desapropriado participar da licitação para a aquisição do imóvel.” Obr. Cit., p. 135.
125
155
“A solução que nos ocorre quanto à primeira questão é a de que os prazos poderão
ser estabelecidos no edital do procedimento licitatório para a alienação do imóvel, mas
se não o forem – o que seria lamentável – os prazos da lei haverão de ser devolvidos ao
adquirente, e, assim, teria ele o prazo de um ano para apresentar projeto e de dois para
dar início às obras após a aprovação do projeto. A partir daí, correriam, outra vez, os
prazos de aplicação por cinco anos do IPTU progressivo para, ao final, dar-se
novamente a desapropriação.”. Obr. cit. , p. 135.
126
156
“Em nosso entender os prazos são apenas os da lei, não se facultando ao Município
alterá-los no edital para a alienação do imóvel.” Obr. cit., p. 115.
157
“Quanto a segunda indagação, parece-nos que o desapropriado que já descumpriu a
função social da propriedade encontra-se proibido de participar da licitação, até porque
o interesse social, como aspecto relevantíssimo do direito de propriedade, não pode ficar
ao sabor de situações configuradoras de abuso de direito, ainda mais tendo-se em conta
o árduo caminho percorrido até a concretização da desapropriação.” Obr. cit., p. 135.
158
“Dessa licitação, todavia, não poderá participar o antigo proprietário, já que o
interesse no cumprimento da obrigação urbanística sobreleva o princípio da
competitividade na lei licitatória.” Obr. cit., p. 111.
127
159
“O prazo para a conclusão da obra não poderá ser superior a cinco anos contados da
desapropriação, ainda que a lei específica tenha indicado originalmente prazo mais
amplo.” Obr. cit., p. 149.
160
“A partir da aquisição, inicia-se a contagem de novo prazo para o cumprimento da
obrigação. Nesta hipótese, o registro em cartório, que é o momento em que se consuma
a transferência, é equiparado à notificação do proprietário.” Obr. cit. p. 149.
129
proprietário para aquisição, ainda que outra destinação social lhe seja
exigível, a qual ficaria à mercê da boa-vontade daquele que, por uma vez já
se mostrou recalcitrante quanto ao atendimento das determinações
imputadas pela ordem urbanística. Não nos parece que esse tenha sido o
escopo almejado pelo legislador.
Finalmente, quanto à expressa menção de que as obrigações são
mantidas para o “adquirente”, constante, conforme exposto, no texto do §6º
do art. 8º do Estatuto da Cidade, acreditamos que, na linha do pensamento
de José dos Santos Carvalho Filho162, o legislador disse menos do que
queria, vez que a obrigação não se transmite apenas ao adquirente, mas
também ao concessionário do direito real de uso do bem público ou do uso
da superfície (superficiário), os quais devem cumprir os mesmos objetivos
outorgados ao adquirente. Por estas razões entendemos que o disposto no
§6º do art. 8º do Estatuto da Cidade é igualmente aplicável
às hipóteses de concessão, embora o texto da lei não seja expresso nesse
sentido.
6. CONCLUSÃO.
A função social da propriedade urbana, mais que um princípio
norteador (e modulador) do exercício do direito de propriedade, consiste
em uma série de exigências e coordenadas, a serem observadas, sobretudo
161
Art. 519. Se a coisa expropriada para fins de necessidade ou utilidade pública, ou por
interesse social, não tiver o destino para que se desapropriou, ou não for utilizada em
obras ou serviços públicos, caberá ao expropriado direito de preferência, pelo preço
atual da coisa.
162
“Em nosso entender, a lei disse menos do que queria (lex dixit minus quam voluit).
Tanto o adquirente do imóvel como o concessionário do direito real de uso de bem
público ou do uso da superfície (superficiário) têm a seu cargo o mesmo objetivo:
providenciar a edificação ou o parcelamento exigidos pelo plano diretor e pela lei
municipal específica.”
“Ora, não teria sentido que o legislador mantivesse as obrigações urbanísticas para
aquele que adquirisse o imóvel e isentasse aquele a quem foi transferido o uso do bem
por meio de concessão. Não seria razoável essa interpretação. As obrigações devem ser
transferidas a ambos.” Obr. cit., p. 114.
133
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