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GRUPO I
Leia o texto.
E o Batola por mais que não queira, tem de olhar todos os dias o mesmo: aí umas quinze casinhas
desgarradas e nuas; algumas só mostram o telhado escuro, de sumidas que estão no fundo dos córregos.
Depois disso, para qualquer parte que volte os olhos, estende-se a solidão dos campos. E o silêncio. Um
silêncio que caiu, estiraçado por vales e cabeços, e que dorme profundamente. Oh, que despropósito de
5 plainos sem fim, todos de roda da aldeia, e desertos!
Carregado de tristeza, o entardecer demora anos. A noite vem de longe, cansada, tomba tão vagaro-
samente que o mundo parece que vai ficar para sempre naquela magoada penumbra.
Lá vêm figurinhas dobradas pelos atalhos, direito às casas tresmalhadas da aldeia. Nenhuma virá até à
venda falar um bocado, desviar a atenção daquele poente dolorido. São ceifeiros, exaustos da faina, que
10 recolhem. Breve, a aldeia ficará adormecida, afundada nas trevas. E António Barrasquinho, o Batola, não tem
ninguém para conversar, não tem nada que fazer. Está preso e apagado no silêncio que o cerca.
Ergue-se pesadamente do banco. Olha uma última vez para a noite derramada. Leva as mãos à cara,
esfrega-a, amachucando o nariz, os olhos. Fecha os punhos, começa a esticar os braços. E abre a boca num
bocejo tão fundo, o corpo torcido numa tal ansiedade, que parece que todo ele se vai despegar aos bocados .
15 Um suspiro estrangulado sai-lhe das entranhas e engrossa até se alongar, como um uivo de animal solitário.
Quando consegue dominar-se, entra na venda, arrastando os pés. E, sem pressentir que aquela noite
é a véspera de um extraordinário acontecimento, lá se vai deitar o Batola, derrotado por mais um dia.
De facto, na tarde seguinte apareceu uma nuvenzinha de poeira para as bandas do sul: ouvia-se ron-
ronar um motor. Pouco depois, o carro parou à porta da venda. Fazia anos que tal se não dava na aldeia.
20 Pelas portas, apareceram mulheres e crianças. […]
Mal o carro parte, deixando uma nuvem de poeira à retaguarda, atira a pasta para o assento de trás,
e grita alegremente:
— Hem, Calcinhas! Levou-me uma tarde inteira, mas foi. Foi de esticão!
De facto, era sol-posto, pelos atalhos, os ceifeiros recolhiam à aldeia.
25 Mas, nessa tarde, vieram todos à venda, onde entraram com um olhar admirado. Uma voz forte, rápida,
dava notícias da guerra.
Só de lá saíram depois de a voz se calar. Cearam à pressa, e voltaram. Era já alta noite quando recolhe-
ram a casa, discutindo ainda, pelas portas, numa grande animação.
Um sopro de vida paira agora sobre a aldeia. Todos sabem o que acontece fora dali. E sentem que não
30 estão já tão distantes as suas pobres casas. Até as mulheres vêm para a venda depois da ceia. Há assuntos
de sobra para conversar. E grandes silêncios quando aquela voz poderosa fala de cidades conquistadas,
divisões vencidas, bombardeamentos, ofensivas. Também silêncio para ouvir as melodias que vêm de longe
até à aldeia, e que são tão bonitas!…
MANUEL DA FONSECA, «Sempre é uma companhia», in O fogo e as cinzas, Lisboa, Caminho, 1998.
3. Explicite o impacto que a chegada de um carro à aldeia e a aquisição da telefonia têm junto dos
habitantes de Alcaria, recorrendo a elementos textuais.
Meendinho
4. O eu lírico desta cantiga de amigo é uma donzela que se encontra isolada na ermida de «Sam
Simiom».
Leia o texto.
Diariamente deparamo-nos, quer através da comunicação social quer pelo conhecimento próximo,
com situações de emigração dos jovens para outros países, à procura de novas oportunidades de emprego
e de melhor nível/qualidade de vida, e de migração do meio rural para o meio urbano, permanecendo
apenas as pessoas mais idosas acompanhadas pelas suas memórias. Estas pessoas ficam expostas a uma
5 série de riscos de saúde, à incapacidade e dependência sociais pelo inexistente ou deficiente apoio emo-
cional/afetivo e pela ausência de relações intergeracionais, ao isolamento, à solidão, ao sofrimento e à
exclu-são social. Estas situações de solidão e sofrimento pioram quando a pessoa idosa adoece ou quando
apre-senta incapacidade funcional que a impossibilite de sair, de se deslocar e de interagir com a
comunidade, vendo-se privada de estabelecer relações interpessoais.
10 Quando falo em solidão, a maioria das pessoas, incluindo as que são detentoras de mais habilitações
académicas, fica a olhar para mim com um ar de interrogação/dúvida, franze o sobrolho, encolhe os
ombros… A essas relembro que a palavra «solidão» existe e é uma palavra plena de significado. Para ser
mais explícita, vou pegar naquele aviso que encontramos nas passagens pedonais de caminho de ferro:
«Pare, escute, olhe.»
15 A avaliação da solidão é crucial para a manutenção do bem-estar e da qualidade de vida da pessoa
idosa. Em linhas muito breves, passo a elucidar que a solidão percecionada/vivida pelo idoso pode ser
avaliada em três vertentes: «romântica», associada à relação com o respetivo cônjuge e à necessidade que
o idoso sente de um parceiro romântico ou matrimonial; «solidão social», que diz respeito à relação com os
amigos; «solidão familiar», que reflete a falta de apoio familiar sentida pelo idoso.
20 Existem dois tipos de solidão: a objetiva e a subjetiva. A solidão objetiva refere-se às pessoas que estão
sós. A solidão subjetiva refere-se às pessoas que se sentem sós, independentemente de viverem sozinhas
ou acompanhadas.
Vários autores são unânimes em afirmar que os idosos que vivem com a família sofrem de mais solidão
do que os idosos que vivem sozinhos ou dos que vivem com amigos. Cabral et al. (2013) afirma que a «soli-
25 dão existe na copresença de outros e não apenas quando há isolamento físico ou social» (p. 38).
Infelizmente, a solidão é um enigma, mas hoje em dia constitui um problema sério: cada vez mais se
privilegia o materialismo em detrimento da afetividade, as pessoas encontram-se cada vez menos, as famí-
lias desculpam-se dizendo que o tempo não chega para tudo. Mas o que é o tempo? Se perguntarmos à
pessoa idosa o que é o tempo, talvez ela nos saiba responder e quiçá nos diga que o tempo é vida.
30 É premente a mudança de comportamentos e atitudes perante o envelhecimento, começando por
uma educação/reeducação dos mais jovens e elucidação/sensibilização da comunidade em geral acerca da
necessidade de eliminar o idadismo e as atitudes ageístas. Também os cuidadores informais devem ter
conhecimentos acerca do processo normal do envelhecimento, pois é crucial a adaptação e a satisfação
pelo que fazem, evitando, deste modo, que o considerem apenas uma obrigação ou um trabalho.
35 Para uma boa intervenção junto das pessoas idosas, não é necessário um amplo conhecimento cien-
tífico mas o conhecimento dos sentimentos e da perceção que a pessoa idosa tem do seu passado, pre-
sente e futuro, assim como da forma como este modo de pensar e sentir se reflete ou influencia o seu estilo
de vida. É indispensável uma política de desenvolvimento de estratégias com o objetivo de reduzir a per-
ceção subjetiva de solidão nos idosos.
40 É necessário que cada um de nós seja solidário com o próximo. «A solidariedade baseia-se na afetivi-
dade e não na obrigatoriedade.» (Pimentel, 2001, p. 89)
(A) alude ao facto de alguns idosos se sentirem sós, estejam eles sozinhos ou acompanhados.
(B) afirma que todos os idosos se sentem sós.
(C) sugere que há idosos que, injustificadamente, se sentem sós.
(D) pressupõe que o sentimento de solidão nos idosos é relativo.
(A) ao egoísmo dos mais novos. (C) ao isolamento dos mais velhos.
(B) à discriminação dos mais velhos. (D) ao favorecimento dos mais velhos.
4. Nas linhas 13 e 14, o segmento que se segue aos dois pontos introduz uma
9. Identifique o valor modal presente na frase «Se perguntarmos à pessoa idosa o que é o tempo, talvez
ela nos saiba responder e quiçá nos diga que o tempo é vida.» (linhas 28 e 29).
10. Identifique a função sintática desempenhada pelo constituinte «uma política de desenvolvimento de
estratégias com o objetivo de reduzir a perceção subjetiva de solidão nos idosos» (linhas 38 e 39).
GRUPO III
«Estou convicto de que qualquer ferramenta que melhore a comunicação tem efeitos profundos no modo como as
pessoas podem aprender umas com as outras e como podem alcançar o tipo de liberdades em que estão
interessadas.»
BILL GATES
Elabore um texto de opinião bem estruturado, com um mínimo de duzentas e um máximo de trezentas palavras,
em que defenda um ponto de vista pessoal sobre as ideias expostas na citação de Bill Gates acima apresentada.
Fundamente o seu ponto de vista recorrendo, no mínimo, a dois argumentos e ilustre cada um deles com, pelo
menos, um exemplo significativo.
Observações:
1. Para efeitos de contagem, considera-se uma palavra qualquer sequência delimitada por espaços em branco, mesmo
quando esta integre elementos ligados por hífen (ex.: /opôs-se-lhe/). Qualquer número conta como uma única palavra,
independentemente dos algarismos que o constituam (ex.: /2016/).
2. Relativamente ao desvio dos limites de extensão indicados — entre duzentas e trezentas palavras —, há que atender ao
seguinte:
— um desvio dos limites de extensão indicados implica uma desvalorização parcial (até 5 pontos) do texto produzido;
— um texto com extensão inferior a oitenta palavras é classificado com zero pontos.
1. O espaço circundante é experienciado como asfixiante, pois o protagonista, Batola, sente-se incapaz de fugir
à realidade quotidiana («tem de olhar todos os dias o mesmo»). É um espaço marcado pela pobreza e pelo
isolamento físico, psicológico e social, bem representado nas casas da aldeia de Alcaria — poucas
habitações, afastadas entre si e pobres (note-se a expressividade do diminutivo e da dupla adjetivação em
«quinze casinhas desgarradas e nuas») —, casas que mal se veem, confundindo-se com o resto da paisagem
(«de sumidas que estão no fundo dos córregos»).
Mesmo para lá de Alcaria, é impossível escapar à solidão («para qualquer parte que volte os olhos, estende-se a
solidão dos campos») e a um silêncio que se prolonga no espaço e no tempo («Um silêncio que caiu,
estiraçado por vales e cabeços, e que dorme profundamente»). O espaço em redor da aldeia contribui para
acentuar ainda mais a sensação de asfixia e de solidão, uma vez que a localidade é cercada, como se fosse
aprisionada, por planícies que parecem não terminar e surgem despovoadas, também elas sem vida («Oh,
que despropósito de plainos sem fim, todos de roda da aldeia, e desertos!»).
3. O carro atrai as mulheres e as crianças que estavam em Alcaria, pois «[f]azia anos que tal se não dava na
aldeia», e é o primeiro sinal do «extraordinário acontecimento» que vai ser a chegada da telefonia à aldeia.
Depois de os ceifeiros regressarem dos campos, os habitantes de Alcaria, em vez de ficarem em casa,
dirigem-se, curiosos, para a venda de Batola, «com um olhar admirado», e aí ouvem as notícias da guerra até
ao fim da emissão; jantam rapidamente e voltam à venda, onde ficam até muito tarde, regressando a casa
«numa grande animação». A telefonia ajuda, pois, a ligar os habitantes de Alcaria ao resto do país e do
mundo («Todos sabem o que acontece fora dali»), a aproximá-los entre si («E sentem que não estão já tão
distantes as suas pobres casas. Até as mulheres vêm para a venda depois da ceia») e a apreciar «as
melodias que vêm de longe até à aldeia, e que são tão bonitas!…»).
Com a chegada da telefonia à aldeia, o quotidiano monótono e triste de uma população que vive cansada e
isolada torna-se menos duro e pesado.
4. 4.1 A donzela — que espera o namorado («amigo») na ermida do ilhéu de «Sam Simion» —, porque o
tempo passa, o «amigo» não chega («eu atendend’o meu amigu’!») e a maré vai subindo («e cercarom-mi
as ondas, que grandes som», v. 2 / «cercarom-mi as ondas grandes do mar», v. 5), sem que haja
alguém que a transporte do ilhéu para a enseada («non ei i barqueiro, nem remador», v. 8), é dominada
pelo receio de que o namorado não chegue («E verrá?») e de morrer sozinha no mar («morrerei eu
fremosa, no mar maior», v. 14 / «morrerei eu fremosa no alto mar», v. 17), revelando angústia crescente
e, por fim, desespero.
5. 5.1 Existe, com efeito, um crescendo de intensidade na situação vivida pela donzela. No primeiro par de
coblas, a donzela exprime receio por ter sido cercada pelas ondas. No segundo par de coblas, refere-se,
além disso, à subida da maré e ao facto de estar sozinha, sem ninguém que a ajude. No terceiro par de
coblas, alude novamente ao seu isolamento e refere-se, agora, à morte iminente.
Este crescendo de intensidade dramática é realçado pelos seguintes elementos estilísticos: a repetição
do refrão ao longo do texto («eu atendend’o meu amigu’! E verrá?»), assim como a estrutura
paralelística perfeita, sugerindo que a donzela espera o amado com uma ansiedade, obsessão e
angústia crescentes; o emprego do gerúndio no refrão («atentend'»), que realça o prolongamento da
espera; o predomínio de formas verbais do pretérito no primeiro par de coblas («Sedia-m'eu»,
«cercarom-mi»), que dá lugar, no segundo par, ao presente («ei», «sei») e, no terceiro par, ao presente
e ao futuro («ei», «sei», «morrerei») — uma progressão temporal que evidencia o crescendo da
situação dramática e dos sentimentos da donzela.
GRUPO II
10. Sujeito.