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|| 145 BÍBLIA SAGRADA. Almeida Revista e Atualizada – com Números de Strong. Sociedade Bíblica do Brasil, 2003;
2005, S. Jo 17.3.
118 A Doutrina de Deus
das coisas que foram criadas.146 Amplia seu argumento afirmando que todos os
seres humanos mostram a norma da lei gravada no seu coração, testemunhando-
lhes também a consciência e os seus pensamentos, mutuamente acusando-se ou
defendendo-se.147
Por outro lado, Paulo também chama nossa atenção ao afirmar que há um
conhecimento especial de Deus, revelado nas Escrituras, e esta revelação é Jesus
Cristo. Paulo escreve aos Coríntios: visto como, na sabedoria de Deus, o mundo
não o conheceu por sua própria sabedoria, aprouve a Deus salvar os que creem
pela loucura da pregação. 22 Porque tanto os judeus pedem sinais como os gregos
buscam sabedoria; 23 mas nós pregamos a Cristo crucificado, escândalo para os
judeus, loucura para os gentios; 24 mas para os que foram chamados, tanto judeus
como gregos, pregamos a Cristo, poder de Deus e sabedoria de Deus. 25 Porque
a loucura de Deus é mais sábia do que os homens; e a fraqueza de Deus é mais
forte do que os homens.148
O conhecimento natural de Deus ocorre primeiramente pelas obras da
criação. Pela criação, o ser humano conhece aspectos da pessoa de Deus, sua
eternidade, sua onipotência e soberania. Deus naturalmente também é conhecido
pela continuidade da ação de Deus na natureza e na história do ser humano.
Paulo aponta isso para os atenienses quando afirma: para buscarem a Deus se,
porventura, tateando, o possam achar, bem que não está longe de cada um de nós;
28
pois nele vivemos, e nos movemos, e existimos, como alguns dos vossos poetas
têm dito: Porque dele também somos geração. 29 Sendo, pois, geração de Deus,
não devemos pensar que a divindade é semelhante ao ouro, à prata ou à pedra,
trabalhados pela arte e imaginação do homem.149 E nós também somos homens
como vós, sujeitos aos mesmos sentimentos, e vos anunciamos o evangelho para que
destas coisas vãs vos convertais ao Deus vivo, que fez o céu, a terra, o mar e tudo o
que há neles; 16 o qual, nas gerações passadas, permitiu que todos os povos andassem
nos seus próprios caminhos; 17 contudo, não se deixou ficar sem testemunho de si
|| 146 BÍBLIA SAGRADA. Almeida Revista e Atualizada – com Números de Strong. Sociedade Bíblica do Brasil, 2003;
2005, S. Rm 1.20.
|| 147 BÍBLIA SAGRADA. Almeida Revista e Atualizada – com Números de Strong. Sociedade Bíblica do Brasil, 2003;
2005, S. Rm 2.15.
|| 148 BÍBLIA SAGRADA. Almeida Revista e Atualizada – com Números de Strong. Sociedade Bíblica do Brasil, 2003;
2005, S. 1 Co 1.25.
|| 149 BÍBLIA SAGRADA. Almeida Revista e Atualizada – com Números de Strong. Sociedade Bíblica do Brasil, 2003;
2005, S. At 17.30.
A Doutrina de Deus 119
|| 150 BÍBLIA SAGRADA. Almeida Revista e Atualizada – com Números de Strong. Sociedade Bíblica do Brasil, 2003;
2005, S. At 14.18.
|| 151 BÍBLIA SAGRADA. Almeida Revista e Atualizada – com Números de Strong. Sociedade Bíblica do Brasil, 2003;
2005, S. Rm 2.15.
120 A Doutrina de Deus
não faz caso de Deus, nem espera dele este tanto de bem: que ele queira ajudar.
Também não crê que procede de Deus o que de bem lhe sucede”.152
Mas podemos arrolar alguns benefícios da lei natural. Por exemplo, é o
primeiro contato que os cristãos podem ter com os não cristãos. É o que Paulo
faz com os atenienses ao apelar ao conhecimento natural de Deus [At 17.13-19].
Mesmo não assegurando a salvação, observar a existência de Deus naturalmente
traduz-se em bênçãos para a vida neste mundo porque o ser humano pode se
sujeitar ao seu poder e onipotência. É o que aconteceu no Egito [Êx 1.20,21] e
é o que Paulo sugere aos não cristãos [Rm 1.18-32].
O conhecimento natural de Deus pode ser enquadrado no âmbito da lei.
Mueller escreve: “Porque o conhecimento natural de Deus não abrange o
Evangelho [1 Co 2.7-10], mas somente a lei [Rm 2.14,15], seu resultado prático
não vai além de uma consciência culposa [Rm 1.20; 2.15], medo da morte [Hb
2.15], o estado de condenação [Gl 2.10] e completa desesperança [Ef 2.12]. O
ser humano sabe por natureza que há um Deus justo e santo [Rm 1.21], porém
não sabe que as exigências eternas da sua justiça perfeita foram cumpridas pela
satisfação vicária de Cristo [1 Co 1.21]. Sabendo por natureza que há um Deus,
o ser humano natural não sabe que esse Deus é gracioso para com sua criatura
através de Cristo [1 Co 1.21; At 17.24,25; Mt 28.19,20]”.153
Portanto, é de suma importância para o estudo de Deus abarcar também a
revelação escriturística, o Deus Triúno, senão acontece o que Calov afirma: “Aqueles
que, na descrição de Deus, não incluem uma declaração referente às três pessoas, de
modo nenhum apresentam essa doutrina numa forma de todo genuína e completa,
uma vez que sem estas não se evidencia ainda qual seja o verdadeiro Deus”.154
|| 152 LUTERO, Martinho. Catecismo Maior 1ª Parte, 18-21. Livro de Concórdia. Porto Alegre: Concórdia; São Leopoldo:
Sinodal, 1983, p. 396.
|| 153 MUELLER, Dogmática cristã, p. 154.
|| 154 Conforme MUELLER. Dogmática cristã, p. 117.
A Doutrina de Deus 121
|| 155 BÍBLIA SAGRADA. Almeida Revista e Atualizada – com Números de Strong. Sociedade Bíblica do Brasil, 2003;
2005, S. Nm 6.26.
|| 156 BÍBLIA SAGRADA. Almeida Revista e Atualizada – com Números de Strong. Sociedade Bíblica do Brasil, 2003;
2005, S. Lc 11.20.
|| 157 PREUS, Robert D. The Theology of Post-Reformation Lutheranism. Electronic ed. St. Louis: Concordia Publishing
House, 1999, c. 1970, c. 1972, S. 2:47.
122 A Doutrina de Deus
|| 163 PREUS, Robert D. The Theology of Post-Reformation Lutheranism. Electronic ed. St. Louis: Concordia Publishing
House, 1999, c. 1970, c. 1972, S. 2:68.
|| 164 AULÉN, Gustaf. A fé cristã, p. 107.
|| 165 LUTERO, Martinho. Catecismo Menor, Pai-Nosso, 3-5 [LC 372].
A Doutrina de Deus 125
|| 166 PREUS, Robert D. The Theology of Post-Reformation Lutheranism. Electronic ed. St. Louis: Concordia Publishing
House, 1999, c. 1970, c. 1972, S. 2:69.
126 A Doutrina de Deus
Deus é, por si só, bom e a fonte e medida de todo o bem. De sua bondade
procedem todos os seus feitos de graça e misericórdia (Sl 25.8,10; 86.8). Tudo
o que Deus faz é bom e nada é manchado com injustiça (Tg 1.13). Ele nunca é
o autor do mal.
A santidade de Deus é temível, mas também confortadora. É sua absoluta
bondade, justiça e pureza, que habitam unicamente nele.
A misericórdia e a bondade de Deus não são de tal sorte que ignorem o
pecado, mas tratam dele de uma forma justa. A graça de Deus, que perdoa e
salva os pecadores, não é absoluta, mas é em Cristo; e em Cristo esta graça divina
não viola a justiça de Deus, mas a satisfaz (Rm 5.10).
|| 167 PREUS, Robert D. The Theology of Post-Reformation Lutheranism. Electronic ed. St. Louis: Concordia Publishing
House, 1999, c. 1970, c. 1972, S. 2:92.
A Doutrina de Deus 127
|| 168 PREUS, Robert D. The Theology of Post-Reformation Lutheranism. Electronic ed. St. Louis: Concordia Publishing
House, 1999, c. 1970, c. 1972, S. 2:93.
|| 169 BÍBLIA SAGRADA. Almeida Revista e Atualizada – com Números de Strong. Sociedade Bíblica do Brasil, 2003;
2005, S. Rm 11.36.
|| 170 BÍBLIA SAGRADA. Almeida Revista e Atualizada – com Números de Strong. Sociedade Bíblica do Brasil, 2003;
2005, S. Mt 23.39.
128 A Doutrina de Deus
|| 171 PREUS, Robert D. The Theology of Post-Reformation Lutheranism. Electronic ed. St. Louis: Concordia Publishing
House, 1999, c. 1970, c. 1972, S. 2:97.
|| 172 PREUS, Robert D. The Theology of Post-Reformation Lutheranism. Electronic ed. St. Louis: Concordia Publishing
House, 1999, c. 1970, c. 1972, S. 2:103.
A Doutrina de Deus 129
virginal, sabendo que para com Deus nada é impossível. (p.105) É veredicto
da fé que o poder divino não pode ser julgado pela razão (Mc 9.23; Gn 18.14),
pois Deus é EL-SHADAI e pantokrátoor (Gn 17.1; Ap 1.8). O poder infinito
de Deus não é apenas criador, mas redentor (Ef 3.20), operando em nós mais
do que possamos pensar ou querer. Esse poder redentor é conhecido em seu
comprimento, largura, profundidade e altura somente pelo conhecimento do
amor de Cristo que ultrapassa a compreensão. Embora sejamos recipientes da
majestosa graça e poder salvífico de Deus, nunca o captamos em toda a sua
dimensão. Esse poder gracioso de Deus é ainda incompreensível, infinito e
imensurável. Calov sente que um grande consolo evangélico pode ser encontrado
na infinidade e incomensurabilidade do poder criativo e salvífico de Deus, e
ele enfatiza esse fato. No entanto, em sua graça, Deus seguidamente faz aquilo
que nos parece impossível e tolo (Zc 4.6), e com atos que parecem manchados
pela maldade ele executa a sua vontade salvífica. Por exemplo: estamos presos a
medida, quantidade, tamanho, espaço. Um camelo não passa através do buraco
de uma agulha (Mt 19.24). Mas Deus de maneira alguma se encontra limitado
por qualquer lei de espaço e medida (Mt 19.26). Cristo pode, instantaneamente,
passar de um lugar para outro (Jo 20.19).
Embora o poder de Deus seja sempre o único e o mesmo poder infinito, os
dogmáticos ortodoxos algumas vezes distinguem entre o seu poder ordenado
e o poder absoluto. O poder de Deus é considerado ordenado quando Deus
é visto atuando segundo as leis e decretos que ele mesmo estabeleceu. Isso
pertence à sua providência, mas também à sua obra de regeneração e salvação
dos pecadores por meios definidos que ele estabeleceu, a saber, o Evangelho e
o batismo. O poder de Deus é considerado absoluto quando ele age sem uma
costumeira causa secundária. Um exemplo de tal poder é a criação de todas as
coisas, mas também o fato de Deus preparar uma virgem, sua ressurreição dentre
os mortos etc. Deve ser entendido em relação a essa distinção que as leis e meios
de Deus são seus, e ele não está preso a eles. Aquele que livremente estabelecera
as leis da natureza, não se prende a si mesmo às leis ou ordens da natureza. Se
Deus quiser, ele livremente reverte essas leis (Dn 3.27,28; Mt 1.23,25; Êx 14.22;
2 Rs 6.6; Jo 11.43; Is 38.8). O poder de Deus é, portanto, absolutamente sem
limites e infinito.
Vida e imortalidade em Deus é a necessidade de viver (1 Tm 6.16). Deus vive
não como resultado de sua vontade, antes ele é em sua própria essência o Deus
130 A Doutrina de Deus
vivo. Ele vive perfeita e ativamente, e ele vive diretamente através da sua própria
essência. A Escritura atribui vida a Deus em sua própria essência quando ela
o chama de verdadeiro e vivo (Dt 5.6; Hb 10.31). Ela indica a atividade da sua
vida quando afirma que ele vive (Dt 32.40). “Eu vivo”, de Deus, é o próprio Deus,
pois ele jura por si mesmo e por sua vida que é eterna (Ap 4.8).
O conhecimento de Deus é um conhecimento imensurável e infinito pelo
qual todas as coisas são conhecidas diretamente e desde a eternidade. Coisas do
presente, do futuro e do passado, coisas contingentes (Mt 11.21) e não decretadas
por ele, bem como as coisas que ele mesmo decretou (Is 47.7-9), todas lhe são
conhecidas. Sendo esse o caso, o conhecimento de Deus é absoluto, é uma
onisciência, pois, se Deus conhece meus pensamentos que são contingentes (Sl
139.2), então ele deve conhecer todas as coisas absolutamente. O conhecimento
absoluto de Deus é mostrado pelas suas profecias, particularmente sobre
aquelas coisas que ocorrem contra a sua lei (por exemplo: a traição de Judas e
a negação de Pedro). É verdadeiro, certo e infalível e de maneira alguma pode
ser considerado mera opinião. É um conhecimento eterno e imutável que é um
único ato imediato, um ato que não tem quaisquer degraus e não é discursivo.
Deus não adquire o conhecimento assim como os homens. Todas as coisas lhe
são simplesmente conhecidas, todas de uma vez e totalmente. Todas as coisas
lhe são eternamente presentes, mesmo possibilidades (Is 41.22).173
Como vimos, o estudo de Deus a partir de seus atributos é uma fonte do
conhecimento evangélico da ação de Deus em nosso favor. Com isso, temos
conforto e consolo na ação de Deus em nosso favor.
O quadro abaixo nos ajuda a entender isso melhor quando observamos os
atributos de Deus à luz de lei e evangelho:
|| 173 PREUS, Robert D. The Theology of Post-Reformation Lutheranism. Electronic ed. St. Louis: Concordia Publishing
House, 1999, c. 1970, c. 1972, S. 2:108
A Doutrina de Deus 131
Referência comentada
LUTERO, Martinho. Catecismo Menor e Catecismo Maior. Livro de
Concórdia. Porto Alegre: Concórdia; São Leopoldo: Sinodal, 1983.
Uma das obras mais sistemáticas [ao lado dos Artigos de Esmalcalde e da
Vontade Cativa], os Catecismos de Lutero foram escritos com o objetivo de
preparar pessoas simples para entrar no texto bíblico. Como um resumo das
132 A Doutrina de Deus
escrituras, os Catecismos são como um mapa para se ler o texto bíblico. Pode-se
dizer que eles têm a intenção de descrever “a arte de viver da fé” em Cristo Jesus.
E esta arte se dá a partir da identificação do cristão a partir da obra de Deus.
Para Lutero, Deus se faz conhecido nos Dez Mandamentos, no Credo e no Pai-
Nosso. A partir do momento em que percebemos quem somos a partir de Deus,
necessitamos constantemente da manutenção desta fé e para Lutero isso se dá na
vida sacramental, atividade específica da Igreja Cristã. Batismo, Ofício das Chaves
e Santa Ceia são os meios que Deus utiliza para se aproximar do cristão de forma
individual e completa. O desempenho da vida cristã, a terceira parte especialmente
do Catecismo Menor, ocorre diariamente através de oração que acompanham o
crente do raiar ao poente do Sol e também por assumir o seu papel no mundo como
membro da família, da Igreja e da sociedade. De forma muito simples e peculiar,
os Catecismos são a menina dos olhos na explanação teológica de Lutero.
Referências
AULÉN, Gustaf. A fé cristã. São Paulo: ASTE, 2002.
BÍBLIA SAGRADA. Almeida Revista e Atualizada – com Números de
Strong. Sociedade Bíblica do Brasil, 2003; 2005.
LUTERO, Martinho. Catecismo Maior 1ª Parte, 18-21. Livro de Concórdia.
Porto Alegre: Concórdia; São Leopoldo: Sinodal, 1983.
______. Catecismo Menor, Pai-Nosso, 3-5. Livro de Concórdia. Porto Alegre:
Concórdia; São Leopoldo: Sinodal, 1983.
MUELLER, John T. Dogmática cristã. Porto Alegre: Concórdia, 2004.
PREUS, Robert D. The Theology of Post-Reformation Lutheranism. Electronic
ed. St. Louis: Concordia Publishing House, 1999, c. 1970, c. 1972.
Autoavaliação
A partir do estudo do presente capítulo, identifique as frases com V para
verdadeiro e F para falso:
a) ( ) O universo testemunha da obra de Deus em termos de causa e
efeito.
A Doutrina de Deus 133
Respostas: (V); (F); (V); (V); (V); (F); (V); (F); (V); (V); (V); (F); (V).
O Deus Triúno – uma exposição
do Credo Cristão
Introdução – A Trindade de Deus
Deus é um só, mas é testemunho da Igreja Cristã a distinção das assim
chamadas pessoas da Trindade de Deus. Deus é completo em si, mas uma é a
pessoa do Pai, outra a do Filho, outra a do Espírito Santo.
Mueller nos consola quando afirma: “Para a mente humana, a doutrina
escriturística da Santíssima Trindade é absolutamente incompreensível; pois, à
base da Escritura, professamos um Deus indiviso e indivisível, de forma a ser
cada pessoa de Deus completo; professamos, contudo, três pessoas realmente
distintas, de modo que, quando o Filho se encarnou, somente ele se tornou ser
humano, e não o Pai ou o Espírito Santo, e quando o Filho sofreu e morreu,
somente ele sofreu e morreu, não o Pai ou o Espírito Santo. Essa verdade
ultrapassa a razão, pois, de acordo com a razão, a Unidade anula a Trindade e a
Trindade, a Unidade. Não pode conciliar a Unidade e a Trindade, tampouco a
Trindade a Unidade. Em consequência disso, todos os que erraram neste ponto,
negaram ou a Unidade ou a Trindade”.174
Para evitar os problemas em relação à Unidade das Pessoas de Deus ou
à Trindade, a Igreja Cristã se posicionou nos Credos. Eles nos ajudam na
O que a Igreja Cristã está testemunhando neste Credo é que a obra de salvação
em Jesus Cristo assume o centro da ação de Deus. Por isso, se separarmos o Pai
do Filho e o Filho do Espírito Santo na ação trinitária de Deus, concluiremos
como Ario que Jesus não pode ser salvador por não ser Deus. Ao descrever
como a pessoa de Jesus é verdadeiramente Deus e Homem, a Igreja Cristã estava
argumentando sobre a centralidade de sua mensagem, isto de acordo com as
Escrituras Sagradas. Tanto a criação como a salvação não podem ser separadas da
obra de Deus – portanto é o próprio Deus que o faz – só que em ações pessoais
próprias ou diferentes.
Da contribuição de Atanásio, podemos concluir conforme Hägglund: “O
sentido principal da obra salvadora de Cristo encontra-se nisto, que a maldição
do pecado e da morte foi retirada. Isso aconteceu quando o Logos, que é o próprio
Filho de Deus, tomou sobre si mesmo as condições da existência humana,
levou sobre si os pecados dos homens e sujeitou-se à morte. Foi assim que estes
poderes foram vencidos, pois, em virtude do fato de que Cristo é da essência de
Deus, não foram capazes de derrotá-lo. Ele se libertou das cadeias do pecado
e da morte, e, assim fazendo, também libertou toda a natureza humana destes
poderes. Foi com esta finalidade que o Filho de Deus tornou-se homem. Se o
Logos não se tivesse realmente tornando homem, não poderia ter libertado os
homens, não poderia ter vencido o poder do pecado e da morte que mantinha
cativa a natureza humana. Em segundo lugar, a obra salvadora de Cristo implica
isto, que o homem, que foi libertado do pecado e da morte mediante a expiação,
pode ser renovado e deificado. O mesmo Cristo que derrotou a morte enviou seu
Espírito, por intermédio de quem recria o homem e o capacita a participar na vida
divina que foi perdida com a queda. O homem, desta maneira, chega a possuir
imortalidade e a viver novamente como o fizera no início – à imagem de Deus.
Esta deificação do homem é o alvo da salvação. A forte ênfase neste aspecto da
salvação, em vez de no perdão dos pecados, era típica dos Pais da Igreja Antiga.
Pode-se dizer, todavia, que Atanásio, mais do que outros, também enfatizou a
necessidade de perdão; reconheceu que o pecado trouxe a culpa e que a obra
expiatória de Cristo foi sacrifício pelo pecado. Mas, acima de tudo, a salvação
é associada à imortalidade. Pecado e morte, afinal, andam juntos. Se o pecado
não tivesse trazido a morte, diz Atanásio, poderia ter sido facilmente removido
pela penitência. Mas à vista do fato de que o pecado resultou em imortalidade,
a salvação só poderia ser obtida se a morte fosse vencida. E assim, visto o poder
do pecado ter sido derrotado, a obra do Espírito Santo é a de dar vida ao homem
138 O Deus Triúno – uma exposição do Credo Cristão
Mas é o Credo Apostólico, mais simples e direto, que melhor descreve a ação
trinitária de Deus nas Três Pessoas. Seu uso na liturgia do culto cristão bem
como seu aspecto pessoal caracterizado pela primeira pessoa do singular faz do
Credo Apostólico um belo resumo do conteúdo das Escrituras.
Eis o texto do Credo: “Creio em Deus, o Pai onipotente, criador do céu e da
terra. E em Jesus Cristo, seu único Filho, nosso Senhor, o qual foi concebido
do Espírito Santo, nasceu da Virgem Maria, padeceu sob Pôncio Pilatos, foi
crucificado, morto e sepultado, desceu aos infernos, no terceiro dia ressuscitou
dos mortos, subiu aos céus, está sentado à destra de Deus, o Pai onipotente,
donde há de vir para julgar os vivos e os mortos. Creio no Espírito Santo, a santa
igreja católica, a comunhão dos santos, a remissão dos pecados, a ressurreição
da carne e a vida eterna. Amém”.179
Assim como as confissões de fé do Novo Testamento, o Credo faz o crente
assumir através da confissão de sua fé o Deus revelado nas Escrituras.
No Primeiro Artigo do Credo Apostólico, confessamos que cremos em Deus
Pai todo-poderoso, criador do céu e da terra. O que significa isto: “Creio que Deus
me criou a mim e a todas as criaturas; e me deu corpo e alma, olhos, ouvidos e
todos os membros, razão e todos os sentidos, e ainda os conserva; além disso,
me dá vestes, calçado, comida e bebida, casa e lar, esposa e filhos, campos, gado
e todos os bens. Supre-me abundante e diariamente de todo o necessário para o
corpo e a vida; protege-me contra todos os perigos e me guarda de todo o mal. E
tudo isso faz unicamente por sua paterna e divina bondade e misericórdia, sem
nenhum mérito ou dignidade da minha parte. Por tudo isso lhe devo graças e
louvor, servi-lo e obedecer-lhe. Isto é certissimamente verdade”.180
Algumas ideias de Lutero destacadas nesta explicação são interessantes.
Observe que “criador” quer dizer que nenhum de nós recebe a sua vida a partir
de si mesmo e nenhum de nós pode garantir a vida recebida. Esta descrição
concreta da ação de Deus sobre cada um de nós é uma questão de fé, recebimento,
e confissão, resposta. Observemos: o ato de dar de Deus aparece em termos
de corpo e alma, de pão, e nada pode nos afastar desta dádiva. “Corpo, alma,
olhos, ouvidos e todos os membros, razão e todos os sentidos me deu e ainda os
conserva” consiste no ato de Deus prover a minha existência. Só que ele continua
com ação divina quando ele providencia o necessário para que eu continue
dele: através do pão, isto é, através de seu prover diário, ganho “vestes, calçado,
comida e bebida, casa e lar, esposa e filhos, campos, gado e todos os bens”. Este
cuidado a partir do que já se recebeu é sumarizado no “de todo o necessário
e o alimento para o corpo e vida supre-me abundante e diariamente” e nada
pode ser contrário a este ser Criador e Mantenedor, que é o Deus Pai, pois ele
“me protege contra todos os perigos e me guarda de todo o mal”. Isso Deus faz
porque ele é Pai e age com “bondade e misericórdia, sem nenhum mérito ou
dignidade da minha parte”. Diante desta ação e dádivas divinas, o que podemos
fazer: apenas confirmar com uma resposta de confissão de fé: “por tudo isso lhe
devo graças e louvor, servi-lo e obedecer-lhe” e confirmar isso com o amém:
“isto é certamente verdade”.
Lutero nos anima a esta confissão: “Por essa razão, devemos exercitar-nos
diariamente neste artigo, no-lo incutir, e, em tudo o que se nos apresenta diante
dos olhos e no que de bom nos sucede, bem como nos casos em que saímos
de necessidades ou perigos, cumpre nos lembremos que é Deus quem nos dá
e faz tudo isso, a fim de sentirmos e vermos nisso seu coração paterno e seu
imenso amor para conosco. Isso aqueceria o coração e o estimularia a ser grato
e a fazer uso de todos esses bens para honra e louvor de Deus. [...] Pois aqui
vemos como o Pai se deu a nós, juntamente com todas as criaturas, e como
nos provê da maneira mais rica nesta vida, além de nos cumular ainda com
bens inefáveis e eternos, por intermédio de seu Filho e de seu Espírito Santo,
conforme ouviremos”.181
O Segundo Artigo do Credo Apostólico descreve o eixo de toda a Teologia,
de toda a forma de ver a Deus. Confessamos a nossa redenção “em Jesus Cristo,
seu único Filho, nosso Senhor, o qual foi concebido pelo Espírito Santo, nasceu
da Virgem Maria, padeceu sob Pôncio Pilatos, foi crucificado, morto e sepultado,
desceu ao inferno, no terceiro dia ressuscitou dos mortos, subiu ao céu, está
sentado à direita de Deus, o Pai todo-poderoso, donde há de vir para julgar os
vivos e os mortos. Que significa isso? Creio que Jesus Cristo, verdadeiro Deus,
nascidodo Pai desde a eternidade, e também verdadeiro homem, nascido da
Virgem Maria, é meu Senhor, que me remiu a mim, homem perdido e condenado,
Referências comentadas
HÄGGLUND, Bengt. História da Teologia. Porto Alegre: Concórdia, 1986.
Esta história da teologia tem como objetivo servir de introdução à literatura
dogmática cristã e descrever suas etapas de desenvolvimento. A história da
teologia é um ramo da história das idéias, pois trata das fontes da tradição cristã
e examina o desenvolvimento das ideias nelas refletidas. Isso Hägglund faz
quando parte da era apostólica, passando pela história da Igreja até meados do
século XX. A obra é um marco na história do dogma cristã porque se mantém
fiel à revelação do Deus Triúno, analisando criticamente o pensamento teológico
nas diversas etapas do desenvolvimento da teologia.
|| 186 LUTERO, Martinho. Da Ceia de Cristo – Confissão. Obras Selecionadas, v. 4. São Leopoldo: Sinodal; Porto
Alegre: Concórdia, 1993, p. 371s.
O Deus Triúno – uma exposição do Credo Cristão 145
Referências
BAYER, Oswald. A teologia de Martim Lutero. São Leopoldo: Sinodal, 2007.
HÄGGLUND, Bengt. História da Teologia. Porto Alegre: Concórdia, 1986,
p. 68.
KELLY, J. N. D. Doutrinas centrais da fé cristã. São Paulo: Vida Nova, 1994.
LUTERO, Martinho. Catecismo Menor. Obras Selecionadas, v. 7. Porto
Alegre: Concórdia; São Leopoldo: Sinodal, 2000.
______. Catecismo Maior. Obras Selecionadas, v. 7. Porto Alegre: Concórdia;
São Leopoldo: Sinodal, 2000.
______. Da Ceia de Cristo – confissão. Obras Selecionadas, v. 4. São Leopoldo:
Sinodal; Porto Alegre: Concórdia, 1993.
MUELLER, John. Dogmática cristã. Porto Alegre: Concórdia, 2004.
O SÍMBOLO Apostólico. Livro de Concórdia. Porto Alegre: Concórdia; São
Leopoldo: Sinodal, 1983.
OS TRÊS Símbolos Ecumênicos. Livro de Concórdia. Porto Alegre:
Concórdia; São Leopoldo: Sinodal, 1983.
146 O Deus Triúno – uma exposição do Credo Cristão
Autoavaliação
1. Sobre o posicionamento da Igreja Cristã através dos Credos, é correto
afirmar:
a) que eles reproduzem o ensino bíblico.
b) mesmo que, usando categorias da filosofia, como o termo pessoa,
natureza, o testemunho deles constitui um belo resumo da fé
cristã.
c) que o papel dos Credos é colocar em termos e categorias humanas
algo que é incompreensível para a razão e pode ser testemunhada
no âmbito da fé cristã.
d) as alternativas acima apresentadas reproduzem o testemunho da
Igreja Cristã através dos Credos.
Respostas:
1) d
2) b, c, d, f, g, h
6) a