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A SP ECTO S DA SO CIED A D E BIZA N TINA (395 – 1453)

Ao transitar pelas ruas da cidade de Istambul, na atual Turquia, nos deparamos com
esplendorosas igrejas e ruínas de uma grande muralha cercando toda a cidade em ambas os
lados, ocidental e oriental, sem imaginarmos que ali existiu por quase mil anos um império
que sobreviveu a tentativas sucessivas de invasões bárbaras durante toda a Idade Média e
esteve sob domínio do glorioso Império Romano na Antiguidade.

Estima-se que durante o século VII a. C. migrantes de origens gregas deixaram a


Mégara, uma cidadela grega localizada no istmo de Corinto liderados por Bizas ou Bizante
que ao chegarem ao estreito de Bósforo, no encontro do mar de Mármara com o mar Negro,
instalaram-se no lado ocidental, permanecendo como colônia grega por quase um milênio. Em
330 d. C., o imperador romano Constantino I, considerando a cidade com uma posição
estratégica, faria dali uma nova centralidade para o império, fundou-se ali a Cidade de
Constantino, Constantinopla (em grego: Κωνσταντινούπολις; tradução: Konstantinóupolis),
hoje uma das mais visitadas cidades da Turquia.

Estrategicamente posicionada, entre o oriente e o ocidente, ligando a Europa à Ásia,


além de estar no meio das grandes rotas comerciais marítimas e terrestres, sendo estas razões
para escolha da “Nova Roma”, Constantinopla, pelo primeiro imperador cristão de Roma.
Constantino não hesitou em garantir segurança da cidade, edificou, de terra ao mar, uma
grande muralha em torno da cidade, chegando a possuir doze a quinze metros de altura e
possuindo mais ou menos trezentos e noventa e quatro torres capazes espantar conquistadores
que tentassem invadir.

O Império Romano, historicamente conhecido devido sua grande expansão


dominando boa parte da área em volta do mar Mediterrâneo, sofria com a dificuldade de
governar para todos os territórios do império, sendo dividido e reunificado diversas vezes ao
longo de sua história, só 395 o império foi divido definitivamente, após a morte do imperador
Teodósio I: o Império Romano do Ocidente, governado pelo seu filho, Honório e o Império
Romano do Oriente, governado por seu outro filho Arcádio.

Embora tenham sido tempos difíceis, a parte oriental sobreviveu às invasões bárbaras
que em 476 causaram a queda do Império Romano do Ocidente, se tornando marco histórico
do fim da Antiguidade e início da Idade Média. A partir daí passamos a conhecer o lado
oriental do império como Império Bizantino, “reconhecido” pelos povos bárbaros através do
episódio em que enviaram para Constantinopla os símbolos imperiais de Rômulo Augústulo,
último imperador ocidental.

Dentre as fases políticas e históricas do Império Bizantino, temos:

 Antiguidade Tardia: trata-se do período do governo de Constantino até


Zenão, e o glorioso período de governo de Justiniano (527-565) e o governo
de seus sucessores diretos;
 Médio-Bizantina: trata-se do início da crise no século VII com as invasões
Persas, Árabes e lombardas, a conquista de Constantinopla pela Quarta
Cruzada, abrangendo a dinastia macedônica (867 – 1057) e a dinastia dos
Comnemos (1081-1185);
 Época Tardia: trata-se da resistência do exílio de Nicéia, a restauração em
1261, a dinastia dos paleólogos e a decadência política até a conquista de
Constantinopla pelos Turcos-Otomanos em 1453.

Síntese de componentes latinos, gregos, orientais e cristãos, a civilização bizantina


constituiu, durante toda a Idade Média, sendo o principal pilar do cristianismo contra a
expansão islâmica, e manteve para a cultura grande parte dos conhecimentos do mundo
antigo, sobretudo o direito romano, fonte das normas jurídicas contemporâneas, e a literatura
grega, sendo suas principais características:

 Intensa atividade comercial e urbana, contrapondo-se a ruralização europeia;


 Cidade luxuosas e altamente movimentadas, estima-se que a população do
império no seu auge, chegou a 26.000.000 habitantes, tendo mais de 550.000
apenas em Constantinopla;
 Nos primeiros séculos de existência, foram preservados os costumes
romanos, após houve predominância da cultura Helena, sendo o Grego a
língua falada no Império.

Foi durante o governo de Justiniano (527-565) que o império assumiu a política


expansionista, característica romana, com o objetivo de recuperar áreas perdidas do antigo
império do ocidente para os bárbaros. Justiniano conseguiu reconquistar grande parte do
antigo império, como: territórios no norte da África expulsando os Vândalos, a Península
Itálica dos Ostrogodos e o sul da Península Ibérica dos Visigodos. Também foi Justiniano que
ordenou a atualização do código de direito romano, reunindo e coordenando as leis e decretos
numa obra, o Código de Justiniano – Corpus Juris Civilis – instituição importante para o
direito atual.

O cristianismo nem sempre foi a religião oficial do império romano, de fato,


inicialmente a religião do império sempre esteve próximo a crença praticada na Grécia
(politeísta), absorvida pelos romanos durante a conquista da península Balcânica e contatos
culturais, sendo os mesmos deuses gregos com outros nomes.

Porém, durantes os anos que seguiram, cristãos e os ditos pagãos se enfrentaram e


caracterizaram cenas de perseguição, sofridas pelos cristãos principalmente, fato que fez os
governos, de Constantino e Licínio, assinarem em 313 o Édito de Milão – latim: Edictum
mediolanense – determinando que o império romano era neutro em relação ao credo religioso
e assim acabando com a perseguição sancionada oficialmente, com relação especial aos
cristãos, garantindo liberdade religiosa.

No Império Bizantino, o cristianismo predominou, embora de maneira diferente,


onde o Imperador também passou a ser considerado o chefe da igreja (Cesaropapismo), além
do despreza das imagens, posteriormente iniciaria um movimento de Iconoclastia 1 e indo em
desencontro com os dogmas do cristianismo ocidental. Foi no Império Bizantino que no início
do século IV foi posto em pauta a dupla natureza e Cristo, humano e divino, argumentando
que a Santíssima Trindade só o Pai é Deus, chamado de Arianismo por seu idealizador, o
padre Árius de Alexandria. O primeiro momento de organização foi proposto por Constantino
em 325, o Concílio de Nicéia2, onde bispos aceitaram a existência de três pessoas na Trindade
e fixaram o dogma e desprezaram o arianismo, embora este foi adotado pelos povos bárbaros
(vândalos, visigodos, ostrogodos) em seus reinos. Em 381 um novo concílio foi chamado e
confirmou a negação ao arianismo. Mais tarde, em 431, foi a vez da negação ao nestorianismo
(acreditavam nas duas naturezas de cristo, não aceitando sua unidade e nem a figura de Maria
como mãe de Deus). Já em 451 no IV Concílio Ecumênico foi a vez do monofisismo
(doutrina que insistia na unidade de cristo e valorizando apenas a natureza divina) ser

1
O movimento Iconoclasta ocorreu durante os séculos VIII e IX no Império Bizantino, sendo um dos
movimentos político-religiosos mais importantes contra a idolatria, veneração, contemplação, adoração e até
mesmo produção de ícones e imagens de sentido religioso. É muito comum ver, atualmente, em muitas igrejas
na Turquia mosaicos cristãos com marcas de destruição, provenientes da época da Iconoclastia.

2
Foi o primeiro concílio ecumênico realizado pela Igreja Católica, realizado na cidade de Nicéia, província de
Anatólia com o objetivo de harmonizar a igreja, foi neste concílio que definiram a datas de comemoração da
páscoa, motivo de conflitos.
condenado, foi neste concílio que Cristo foi nos apresentado como uma pessoa dotada de duas
naturezas inseparáveis, declarado perfeitamente Homem e Deus. Devemos salientar também a
importância dos monarquistas na sociedade bizantina, sendo conferidos a eles e aos patriarcas
o controle espiritual e de mosteiros e suas dioceses.

As diferenças entre os dogmas praticados pela Igreja do Oriente e a Igreja do


Ocidente, a disputa pelo poder do papa e do imperador, que como vimos passou a ser chefe da
Igreja no Império Bizantino, culminaram na divisão da Igreja, onde ambas, representados pelo
Papa Leão IX e o Patriarca de Constantinopla Miguel Cerulário, se excomungaram no ano de
1054, fato esse que ficou conhecido como Grande Cisma ou Cisma do Oriente, formando a
Igreja Católica Apostólica Romana e a Igreja Católica Apostólica Ortodoxa.

A vida cultural bizantina era intensa, situado ao lado do Grande Palácio, era no
Hipódromo que ocorriam diversos eventos de divertimento público (Corridas de cavalo,
batalhas entre atletas, combate de feras, jogos, caçadas e espetáculos cênicos, por exemplo),
eis aqui uma herança da Roma antiga, o hipódromo fora construído a imagem do Circo
Máximo de Roma, erguido por Septímio Severo e expandido e renovado por Constantino.
Também existiam festividades públicas, como aniversário do Imperador, comemoração de
alguma conquista ou triunfo, sendo a mais importante o dia da inauguração da Nova Bizâncio,
por Constantino I. Também destacamos a arte na vida cultural bizantina, como maioria de sua
população não era alfabetizada e os aprendizados deveriam ser realizados através de imagens,
os mosaicos, contados de forma clara e objetiva.

Concluindo, o Império Bizantino se manteve desde 395 em sua divisão definitiva até
1453, quando os Turcos-Otomanos conquistaram a cidade de Constantinopla. A queda de
Constantinopla é considerada um marco, por alguns historiadores, como o fim da Idade Média
e início da Idade Moderna.
Referência: MONTEIRO, JOÃO GOUVEIA (Portugal). Universidade de Coimbra. O Sangue de
Bizâncio: Ascensão e Queda do Império Romano do Oriente. Coimbra: Imprensa da Universidade de
Coimbra, 2017. 154 p. Disponível em: <https://digitalis-dsp.uc.pt/bitstream/10316.2/40786/1/Hist
%C3%B3ria%20concisa%20do%20Imp%C3%A9rio%20Bizantino%20(Das%20origens
%20%C3%A0%20queda%20de%20Constantinopla)..pdf>. Acesso em: 20 abr. 2019.

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