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ANTONIO CANDIDO
Resumo:
Este estudo tem como objetivo analisar a postura de Antonio Candido diante do
[
Regionalismo Literário Brasileiro, que vai mudando ao longo das suas obras, e com base
nesta mudança destacar os elementos basilares que serviram como referência para o
desenvolvimento do Neorregionalismo Brasileiro. A presente análise caracteriza-se,
essencialmente, como bibliográfica. Utilizando-se como base os seguintes autores:
Candido (1992, 2000, 2002, 2006), Braga (2017). Buscou-se, primeiro, apresentar as
diversas visões de Antonio Candido em relação ao Regionalismo. Em seguida,
evidenciamos os elementos conceituais que serviram como base para a configuração do
Neorregionalismo Literário Brasileiro.
ANTONIO CANDIDO
dossiê temático:
]
1
Professor adjunto de Teoria e Crítica Literária da Universidade Estadual do Piauí – UESPI e líder do Grupo de
Pesquisa NENIN – Núcleo de Estudos em Neorregionalismo, Imaginário e Narratividade.
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ISSN 2447-4274 CONTRAMÃO Teresina-PI | Número 3 | dezembro de 2017
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Não há dúvida que Antonio Candido e José Lins do Rêgo, e ainda apresentar os
foi o maior crítico literário brasileiro no século elementos que dão base para a formulação da
XX. Suas obras foram responsáveis por diversas análise configurativa de uma nova tendência
elucidações dentro do cenário literário na literatura brasileira contemporânea, o
nacional, como também contribuiu Neorregionalismo, constitui o ensejo do nosso
efetivamente na formação de diversos teóricos texto.
e críticos literários. Com tantas obras Sendo adepto do modernismo da
abordando tantas temáticas, períodos, Semana de Arte de 22 e do confronto dessa
autores, obras, seria impossível não haver Semana com os regionalistas nordestinos,
algumas questões a serem melhor resolvidas, representado por Gilberto Freyre e José Lins
outras mais aprofundadas e até mesmo do Rego, parece-nos que a tomada de uma
algumas serem questionadas, pois o posição por parte de Candido fez com que ele
pensamento crítico como tão bem ele se direcionasse a pormenorizar a questão
defendia deveria estar constantemente regional em um primeiro momento, como
apresentando novas possibilidades, novos ficou marcado em seu texto clássico Literatura
argumentos, ratificando e retificando ideias, e subdesenvolvimento. Diz ele:
lançando novas conjunturas. Dessa maneira,
portamo-nos diante de algo que, a nosso ver, [...] demora cultural. É o que ocorre
com o Naturalismo no romance, que
não foi confortável nas abordagens de Antonio
chegou um pouco tarde e se
Candido, como a questão do regionalismo prolongou até nossos dias sem
literário. quebra essencial de continuidade,
embora modificando as suas
Analisar, portanto, essa questão modalidades [...]. Por isso, quando na
apresentando um pouco dessa certa Europa o Naturalismo era uma
sobrevivência, entre nós ainda podia
condenação, em um primeiro momento, e ser ingrediente de fórmulas literárias
depois certa redenção por parte de Candido ao legítimas, como as do romance social
dos decênios de 1930 e 1940
trabalhar com autores como Graciliano Ramos
(CANDIDO, 2006, p. 180).
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existiu, existe e existirá enquanto houver Ramos. Diz ele nas primeiras páginas, ao se
condições como a do subdesenvolvimento, referir à obra Caetés:
que forçam o escritor a focalizar como tema as
A atmosfera geral do livro se liga
culturas rústicas mais ou menos à margem da
também à lição pós-naturalista,
cultura urbana. O que acontece é que ele vai voltada para o registro dos aspectos
modificando e adaptando, superando as mais banais e intencionalmente anti- 50
heróicos do quotidiano e com certo
formas mais grosseiras até dar a impressão de pudor de engatilhar os dramas
que se dissolveu na generalidade dos temas convulsos de que tanto gostavam os
fogosos naturalistas da primeira
universais, como é normal em toda obra bem- geração (CANDIDO, 1992, p. 14).
feita (CANDIDO, 2002, p. 86-87).
Verificamos nessa passagem a
Essa marca que ficou no regionalismo
presença ainda da centralidade discursiva da
de algo pitoresco e exótico fez-se bastante
questão naturalista associada aos autores
evidente nas primeiras obras do regionalismo
regionalistas, mas, ao longo das linhas, parece
romântico, que ao longo do tempo foi
ser deixada de lado e outros elementos
perdendo essas características. Os romances
valorosos começam a fazer parte das análises
da década de 30 são alguns exemplos da perda
em relação não só a outras obras aferidas
desse caráter. Todavia, ocorre a manutenção
posteriormente – até mesmo Caetés volta a
equivocada dessas ideias. Assim, diante da
ser lembrada, no entanto com outro olhar
presença desses estigmas, acaba por fazer com
apreciativo. Podemos destacar essa mudança
que diversos autores tidos por nós como
quando ele começa a analisar São Bernardo.
neorregionalistas rejeitem tal ideia.
Diz ele em suas passagens iniciais:
Interessante observarmos que se, em
um momento, Antonio Candido parece um
Não se trata, evidentemente, do
pensador a reforçar o estigma um tanto
resultado mecânico de certas
reducionista das obras regionalistas, relações econômicas. Uma profissão,
ou ocupação qualquer, é um todo
associando suas ideias às questões
complexo, integrado por certos
econômicas, como se percebe em Literatura e impulsos e concepções que
subdesenvolvimento (2000), e, no caso ultrapassam o objetivo econômico.
[...] Em Paulo Honório, o sentimento
específico, boa parte da prosa regionalista ser de propriedade, mais do que simples
relacionada à região nordeste, ao longo dos instinto de posse, é uma disposição
total do espírito, uma atitude geral
seus escritos essa visão parece se confrontar.
diante das coisas (CANDIDO, 1992, p.
Podemos ilustrar essa questão com a obra 28).
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Graciliano Ramos, no entanto, faz alusão a José Essa criação permite até animais ganharem
Lins do Rêgo, em outros momentos a autores uma projeção humana digna de
regionalistas diluídos ao longo dos seus universalidade, como, no caso de Vidas Secas,
diversos textos, tais como Raquel de Queiroz, de Graciliano, a cachorra Baleia, em
Jorge Amado e a outro que veio na geração semelhança ao tocante à humanização de
52
seguinte, Guimarães Rosa, à ideia de que esses sentidos, na ideia de humanização dos animais,
autores perceberam que “[...] a literatura não ao atribuir-lhes laços emotivos da relação
dá segurança, porque a obra de arte realiza entre pessoas, como a Moby Dick de Herman
apenas uma parcela mínima do que se Melville.
imaginou” (CANDIDO, 1992, p. 52), pois eles Ainda sobre as aproximações de
projetaram uma construção em que o ético Antonio Candido entre Graciliano Ramos e José
com o estético se associavam e, em prol de um Lins do Rêgo que podemos associar aos
engajamento ao mesmo tempo social, também grandes autores regionalistas nós temos a
abordava os dilemas internos universais dos seguinte constatação:
indivíduos, como, por exemplo, o silêncio de
Para Graciliano a experiência é
Fabiano tão bem explorado por Lourival
condição da escrita; e em José Lins do
Holanda em Sob Signo do Silêncio e a condição Rêgo admira a capacidade de
descrever com a pura imaginação.
de Conceição em O Romance de 30, de Luís
“Eu seria incapaz de semelhante
Bueno. proeza: só me abalanço a expor a
Interessante observarmos como coisa observada e sentida”. “Nada me
interessava fora dos acontecimentos”
Candido deixa-se envolver pela escrita desses (CANDIDO, 1992, p. 58).
autores e toma Graciliano Ramos para
Assim, o escritor retira do seu
mencionar que “Um artista nada mais faz do
ambiente de vivência a carga de experiência
que tomar os lugares-comuns e renová-los
para compor as suas narrativas. É através,
pela criação” (CANDIDO, 1992, p. 54), e que os
portanto, dessa vivência experimentada que se
autores regionalistas fazem é exatamente esse
ganha certa roboração em sua escritura, já que
ato criativo profundo e não meramente
se parte do conhecido, do sentido, do
descritivo em que uma dada realidade de
verossímil: “O escritor vê o mundo através dos
condição de subsistência e de atraso
seus problemas pessoais; sente necessidade de
econômico e social não seja o único aspecto a
lhe dar contorno e projeta nos personagens a
se fazer presente nos enredos. A criação
sua substância, deformada pela arte”
desses autores perscruta os sentimentos que
(CANDIDO, 1992, p. 64). Essa ideia é
movem os sujeitos em um ambiente tão
devidamente constatada quando, ao
áspero e desprovido de recursos materiais;
meio em que a exploração parece ser a tônica.
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estudos mais antigos, era tido por ele como 2. o Espaço deixa de ser um
Frisamos que a motivação do nosso texto foi outros aspectos como espaço-
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uma estruturação peculiar das obras e tornando o seu retorno não como algo
penoso, apesar de todas as inúmeras
neorregionalistas. O espaço habita no interior
dos sujeitos e acaba promovendo a sua própria dificuldades que vivenciou durante aqueles
construção identitária. Podemos citar como meses, no entanto a rememoração traz para
ela um sentimento de afeto pelo lugar e pelas
exemplo a obra Galileia, de Ronaldo Correia de
pessoas.
Brito, em que o personagem Adonias rejeita o
espaço que habita no seu interior e isso acaba Dessa maneira, o destaque intrínseco
da questão do espaço serve como ponto
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político devido a sua condição de ter de viver autonomia e se constitui uma nova realidade
dentro de uma maior contextual e revela
diante dos seus semelhantes. Assim, dessa
condição ninguém tem como fugir. Da mesma determinadas fissuras ou questões pouco
maneira podemos evidenciar a inerência no visíveis dentro desse espaço realista maior.
Diante disso, o escritor ganha em
homem da capacidade de imitar, como destaca
credibilidade e consistência diante do público e
também Aristóteles em A Poética. Outra
premissa que vai nessa mesma linha de suas produções literárias, quando de
qualidade, perdem o caráter retórico ou belo
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letrista para ganhar um sentido maior de atualizada sem cair em descaracterização pela
significação no meio social. Também, com a massificação cultural imposta ao mundo de
autonomia da obra e com essa presença hoje.
marcante dos diálogos internos e externos das Entre os autores neorregionalistas
produções, muitas coisas passam a independer como Assis Brasil, Francisco Dantas, Raimundo
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da necessidade de apropriação de um dado Carrero, Maria Valéria Rezende há certo
aspecto, como de gênero, para se reconhecer, compromisso importante para a Literatura que
por exemplo, a autonomia da personagem é o seu compromisso com a qualidade. Esses e
feminina dentro dos enredos dos autores outros autores neorregionais, como já
neorregionalistas, se esses autores são abordamos anteriormente, não produzem um
masculinos ou femininos. O vetor valido para teor panfletário transvertido de obra literária.
construção de livros literários perscrutados na Eles produzem o que Antonio Candido (2000,
realidade, deve ter a necessidade da vivência, p. 45) faz referência:
da experiência compartilhada, e não somente
A grandeza de uma literatura, ou de
se vislumbrar algo ou apenas imaginar.
uma obra, depende da sua relativa
Portanto, essa relação de capacitação ou de intemporalidade e universalidade, e
estas dependem por sua vez da
qualificação ao estabelecer como parâmetro
função total que é capaz de exercer,
se é homem ou mulher escrevendo sobre uma desligando-se dos fatores que a
personagem feminina e sua autonomia, se a prendem a um momento
determinado e a um determinado
obra estiver repleta dos elementos lugar.
anteriormente elencados, não passa de
Essa intemporalidade e
bandeiras ideológicas que apenas
universalidade tanto os escritores dos
empobrecem os debates críticos.
romances regionalistas de 1930 tiveram
À vista dessas questões podemos
quanto os autores contemporâneos
associar que o que liga os escritores
neorregionalistas mantém essas questões
neorregionalistas é essa consciência comum
presentes nas suas obras. Esses aspectos se
que Candido menciona: “os artistas podem
dão porque tanto regionalistas e
permanecer desligados entre si ou vincular-se
neorregionalistas souberam utilizar elementos
seja por meio de uma consciência comum, seja
estéticos para problematizar questões sociais,
pela formação de grupos geralmente
valorando aspectos significativos das suas
determinados pela técnica” (2000, p. 28-29).
regiões sem se perderem em esterelidades
Assim, os escritores neorregionalistas parecem
discursivas de imposição.
se configurar dentro das características
De maneira não programática
comuns e das suas percepções temporais e do
associavam a uma ideia significativa já
seu meio, mantendo a tradição regionalista
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acrescentando nos pontos de convergência a crítica e valorativa dos aspectos locais que são
defesa da tradição regional com aspectos de universais.
universalidade e resistência cultural, Assim, procuramos destacar nesse
constituindo e singularizando uma identidade nosso pequeno texto o quanto Antonio
cultural e espacial para que o indivíduo sinta- Candido contribuiu para os estudos
60
se pertencente a um lugar e com isso dar regionalistas e até mesmo neorregionalistas –
sentido às coisas próximas. A literatura enquanto formação da base teórica para
regionalista e a neorregionalista agora análise, quando mudou a sua postura em
contribuem para essa manutenção significativa algum momento condenativa e depois
de toda uma tradição valorativa que promove apresentando em suas análises os pontos
a ressonância dessas concepções diante da diferenciadores do regionalismo modernista e
formação de uma consciência não amena, mas da sua imensa contribuição para a nossa
tradição literária.
[referências]
CANDIDO, Antonio. Ficção e confissão: ensaios sobre Graciliano Ramos. Rio de Janeiro: Editora 34,
1992.
______. Formação da literatura brasileira: momentos decisivos. 6. ed. Belo Horizonte: Editora Itatiaia
Ltda, 2000.
______. Literatura e subdesenvolvimento. In: CANDIDO, Antonio. A educação pela noite e outros
ensaios. 5. ed. Rio de Janeiro: Ouro sobre Azul, 2006.
______. Textos de intervenção. Introdução, apresentação e notas de Vinícius Dantas. São Paulo: Duas
Cidades; Ed. 34, 2002.
BRAGA, Herasmo Braga de Oliveira Brito. Neorregionalismo brasileiro: análise de uma nova tendência
na literatura brasileira. Teresina: EDUFPI, 2017.
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Regionalismo y la fundamentación
]
teórica para el Neorregionalismo
Resumen:
Este estudio tiene como objetivo analizar la postura de Antonio Candido ante el
Regionalismo Literario Brasileño, que va cambiando a lo largo de sus obras, y con
base en este cambio destacar los elementos basilares que sirvieron como referencia
para el desarrollo del Neorregionalismo Brasileño. El presente análisis se caracteriza
esencialmente como bibliográfica. Se utiliza como base los siguientes autores:
Candido (1999, 2000, 2002, 2006), Brito (2017). Se buscó, primero, presentar las
diversas visiones de Antonio Candido en relación al Regionalismo. A continuación,
evidenciamos los elementos conceptuales que sirvieron como base para la
configuración del Neorregionalismo Literario Brasileño.
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