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25 de Julho de 2021

A ilógica narrativa de Lula sobre a ocultação de patrimônio

Ocultação de patrimônio é o nome formal da principal acusação que pesa


sobre o ex-presidente Lula, no famoso caso do apartamento tríplex
localizado no Guarujá, litoral de São Paulo. Na prática, significa dizer que
Lula omitiu da Justiça ser dono de um determinado bem e, com isso,
sonegou os impostos devidos, por exemplo.

A narrativa que o ex-presidente Lula apresenta em todas as oportunidades


que falou sobre o caso, inclusive em seu interrogatório judicial, é que só
seria possível provarem que ele escondeu o imóvel no dia em que
encontrarem uma assinatura ou algo que prove que o imóvel era de fato
dele.
Primeiramente, salutar frisar que no nosso ordenamento jurídico vigora o
princípio da presunção da inocência, elencado na Constituição Federal, em
artigo que dita que ninguém será considerado culpado até o trânsito em
julgado de sentença penal condenatória. Diante dessa ressalva, há que se
esclarecer o óbvio: a lógica da “ocultação de patrimônio” é exatamente
evitar documentação. Havendo recibo, registro em cartório e escritura, não
há nada “oculto”, o que demonstra total descabimento na narrativa
apresentada por Lula.

Tal acusação, acontece justamente nos casos onde nada disso aparece e,
então, há outras provas demonstrando quem seria real proprietário de
determinado bem oficialmente colocado em nome alheio.

O caminho narrativo ora apresentado por Lula não esclarece o crime de que
o tipo penal consiste na conduta de quem oculta ou dissimula a origem de
bens, direitos ou valores provenientes de crime. Se encontrassem uma
escritura, logicamente a acusação estaria totalmente prejudicada.

Sobre esse aspecto, em análise ao que diz o artigo 1º da Lei 9.613/98,


temos: “Ocultar ou dissimular a natureza, origem, localização, disposição,
movimentação ou propriedade de bens, direitos ou valores provenientes,
direta ou indiretamente, de infração penal.”

As condutas típicas descritas em tal artigo consistem em ocultar ou


dissimular a natureza, origem, localização, disposição, movimentação ou
propriedade de bens, direitos ou valores provenientes, direta ou
indiretamente, de infração penal.

Ocultar expressa o ato de esconder, encobrir, não revelar. Dissimular


equivale a encobrir com astúcia, disfarçar, esconder.

Diante disso, a prova que o ex-presidente espera que o Ministério Público


apresente seria a demonstração da sua inocência, algo que demonstre que
ele não ocultou o patrimônio, e isso compete a ele apresentar em sua
defesa.
Em que pese a presente narrativa ser desconexa, árdua é a missão da
acusação que busca provar que o apartamento realmente é do ex-
presidente, e para isso se utiliza de outros meios de prova, que claramente
não será uma escritura pública, como clamou Lula em seu interrogatório.

Por mais que a acusação entenda que tenha satisfeito esse conjunto
probatório, o crime descrito só existirá se comprovada a existência do crime
de corrupção. Isso, pelo que estamos acompanhando pela mídia, não parece
demonstrado.

Não estamos afirmando que todo o esquema de corrupção orquestrado pela


OAS e outras construtoras efetivamente aconteceu, mas sim da prova do
pagamento da propina para o ex-presidente, o que caracterizaria o crime de
corrupção.

O fato de Lula ocultar esse patrimônio, se não estiver devidamente


comprovado que são diretamente ou indiretamente provenientes de
infração penal, caracterizará um crime fiscal, o que facilitará e muito a vida
do ex-presidente, que poderá resolver o caso com o pagamento do imposto
devido, tendo em vista que a extinção da punibilidade tem como
regramento o art. 9º, § 2º, da Lei n. 10.684/03, que prevê o pagamento
como condição para extinção do processo.

Jorge Calazans

Jorge Calazans é advogado especialista em direito penal e processo


penal, sócio do escritório Yamazaki, Calazans e Vieira Dias Advogados

Disponível em: https://jorgecalazans.jusbrasil.com.br/artigos/465684214/a-ilogica-narrativa-de-lula-


sobre-a-ocultacao-de-patrimonio

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