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AULA 5 FILOSOFIA

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O que será
tratado
nesta aula
Esta aula trata da crise no fundamento
da realidade, que é a crise na existência
de Deus enquanto ser absoluto e
ordenador da natureza humana.

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A crise no
fundamento
da realidade
E stamos refletindo sobre uma série
de ideologias que obscurecem a
compreensão acerca do ser humano, sobre
a ética no campo da cultura. O niilismo é a
crise no fundamento de toda a realidade; e
este fundamento é Deus.

Podemos pensar sobre Deus em dupla


perspectiva: uma religiosa e outra filosófica,
embora ambas estejam interligadas.
Nietzsche percebeu, no século XIX, que a
sociedade européia não era mais cristã, não

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tinha a religião no centro de seus valores


morais e sociais. Vários autores deste
período passam a professar um chamado
ateísmo esclarecido, interpretando a
realidade e propondo uma nova experiência
humana e social, em que Deus não tem
papel determinante.

Nietzsche fala da morte de Deus, usando


essa expressão jocosa para apontar que
a sociedade não atribui a Deus um papel
preponderante. A Igreja não tem mais seu
papel pedagógico, normativo e influente na
sociedade. A religião passa a ser vista como
um fenômeno individual que não tem
relevância na vida cultural e política; essa é
a compreensão do laicismo.

A questão está além da descrença pessoal, a


própria idéia de Deus é desvalorizada, e essa

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indiferença é ainda pior que o secularismo.


Quando falamos em idéia de Deus, não
nos referimos a uma idéia subjetiva, mas
à forma eterna, imutável e perfeita que
estrutura o aperfeiçoamento da realidade,
conforme compreendia Platão.

Todo ente tende à perfeição; para isso, é


necessário que haja um ser perfeitíssimo,
que realiza em si mesmo todas as
possibilidades, que está em puro ato, ou
seja, não conhece a potência, a mudança.
Deus está em um patamar ontológico
superior e transcendente, confere unidade
à perfeição, articulando a possibilidade
de uma perfeição moral e intelectual. Se
hoje não temos mais ideais normativos de
perfeição e excelência, é porque perdemos a
fé, a crença cultural de que há Deus.

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Há uma passagem de Nietzsche que


descreve bem o niilismo contemporâneo,
que é um ateísmo prático, um
indiferentismo moral: um homem louco
vai à praça pública e afirma: “Deus está
morto, e nós o matamos”. Há aí a crença de
que a vida não tem sentido último, porque
a morte apaga tudo, não há mais um valor
supremo, como é o amor na tradição cristã.
Nietzsche percebe a transvaloração, uma
mudança nos valores, no modo de aquilatar
o valor das coisas.

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Niilismo e
relativismo
O pensamento moderno é oposto à
virtude, pois as virtudes – como a
temperança, a fortaleza, a prudência, a
justiça – dependem da natureza humana.
Ou seja, uma natureza regida por uma lei,
o que implica a idéia de um Criador, uma
inteligência que a estruturou. Os dados da
criação – como os temperamentos, as cores
primárias, as estações do ano – são reais e
objetivos, são dados metafísicos da realidade,
não são fruto do acaso.

Mas se não há uma inteligência suprema


que ordena e governa as leis naturais, não
há natureza humana; e se não há natureza

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humana, a liberdade é vazia. Jean-Paul


Sartre, leitor de Nietzsche, proferiu uma
palestra chamada “O existencialismo é
um humanismo”, em que afirma que não
há Deus para ter criado uma natureza
humana; o ser humano não tem essência,
somente existência; ou ainda, para ele, a
existência é que precede a essência. Assim,
estamos em um mundo sem sentido, sem
um princípio de perfeição, porque esta é
transcendente, e nós estamos presos na
imanência.

Victor Frankl dizia que cada época tem


sua neurose coletiva, e a de nosso tempo
é o niilismo, o esvaziamento de todos
os valores. Os ideais de autonomia e
autenticidade, de estabelecer os próprios
valores, mostraram-se frágeis, geraram
uma mudança no modo de encarar a ética.

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Somente Deus pode oferecer um parâmetro


a nossos comportamentos, porque Ele é
absoluto.

A consequência do niilismo é o relativismo.


Quando o homem deixa de acreditar
em Deus, passa a idolatrar todo o resto.
Mais ainda, o homem passa querer ser
seu próprio deus, em um subjetivismo
exacerbado que considera o sujeito
individual como a fonte de seus valores e
reivindica para si as qualidades de Deus:
a onisciência, presente na relevância
exacerbada ao conhecimento científico, e
a onipotência, expressa na dimensão do
domínio técnico.

Essa perspectiva também pode ser


considerada gnóstica, conforme explica
Eric Voegelin. A gnose é a compreensão
de que uma espécie de conhecimento

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iluminado pode transformar a realidade


para melhor, mas isso tem um custo.
Voegelin percebe que as guerras mundiais
e os totalitarismos são como religiões
políticas e gnósticas da modernidade: têm
o projeto de progresso social, mas a custo
do poder total do Estado e da ciência.

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Vida humana e
transcendência
A religião sempre foi um limite ao
conhecimento científico, não porque
ela o restringisse, mas porque, como
disse Blaise Pascal, o último passo da
razão é entender que infinitas coisas a
transcendem. O verdadeiro sábio é aquele
que percebe a limitação de sua capacidade
de conhecer. Os grandes cientistas
reconheceram uma inteligência suprema
que ordena o cosmos, a existência de Deus.
E isso era o que impedia a sacralização
do mundo secular. O cristianismo,
naturalmente, foi a religião que separou

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com mais clareza os poderes político e


religioso.

O reconhecimento da existência de Deus


é fundamental para a vida humana, para
que haja liberdade e obediência na adesão a
um projeto de aperfeiçoamento, felicidade
e plenitude. O indiferentismo religioso,
o niilismo, a negação do fundamento da
realidade geram as patologias que são
enfrentadas no consultório e na vida
prática.

Em nosso tempo, é inegável a influência


de Freud, que também era um seguidor
de Nietzsche. Freud foi uma espécie de
Platão às avessas. Se para este o Eros é uma
força ascencional, que busca a beleza, a
perfeição e a transcendência, para Freud,
a libido é uma força que move a alma
para o prazer. Além disso, considerar que,

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para o ser humano, tudo tem origem


sexual é um modo totalmente incompleto
e incorreto de compreendê-lo. Perde-se
assim a capacidade de enxergar a dimensão
superior da vida humana, ficamos não
além, mas aquém do bem e do mal.

A proposta de Freud, de que o centro


agente do homem é o seu inconsciente, é
o contrário do mito da caverna de Platão,
em que se busca a ascensão, a luz. Freud
vai pelo caminho contrário da caverna,
afunda cada vez mais, chega a um lugar
profundamente escuro. Esse modo de
compreender o ser humano é o princípio
do caos.

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