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UNIVERSIDADE FEDERAL DA FRONTEIRA SUL

CAMPUS DE LARANJEIRAS DO SUL


LICENCIATURA - INTERDISCIPLINAR EM EDUCAÇÃO DO CAMPO

EDIMAR TENUTTI

MELIPONICULTURA: CONTRIBUIÇÕES PARA O RESGATE E MANEJO DA


ABELHA INDÍGENA Melipona bicolor schencki (Hymenoptera, Apidae, Meliponini).

LARANJEIRAS DO SUL
2015
EDIMAR TENUTTI

MELIPONICULTURA: CONTRIBUIÇÕES PARA O RESGATE E MANEJO DA


ABELHA INDÍGENA Melípona bicolor schencki (Hymenoptera, Apidae, Meliponini).

Trabalho de conclusão de curso de graduação


apresentado como requisito para obtenção do grau de
Licenciado do curso Interdisciplinar em Educação do
Campo da Universidade Federal da Fronteira Sul.

Orientador: Alexandre Monkolski

LARANJEIRAS DO SUL
2015
Dedico este trabalho aos meliponicultores
comprometidos com a criação e conservação
de espécies de abelhas nativas sem ferrão,
muitas das quais estão ameaçadas de extinção,
esperando que o trabalho contribua no quesito
embasamento técnico.
Dedico também aos pesquisadores da área
esperando que o trabalho possa ser útil
academicamente.
AGRADECIMENTOS

Agradeço especialmente os meliponicultores, Flavio José Gowacki, Jean Carlos


Locatelli, Jorge Venson, José Carlos Wegrznoski, Rosalino Scrimin e Silvino Milak, fontes
inesgotáveis de conhecimentos sobre abelhas nativas.
Agradeço também a meu orientador Alexandre Monkolski, que muito me ajudou
para a concretização deste trabalho.
Agradeço a Maria Rosa Moraes Maximiano, que orientou nos aspectos inerentes
as normativas.
Agradeço a Elemar do Nascimento Cezimbra e a Antonio de Miranda, que com
coragem sempre acreditaram no potencial dos jovens.
Agradeço a meus pais, Ismael Tenutti e Irma Tenutti que sempre me ensinaram a
fazer as coisas com empenho e dedicação.
"Hay hombres que luchan un día y son buenos,
hay otros qué luchan un año y son mejores,
hay quienes luchan muchos años y son muy
buenos, pero hay os que luchan toda la vida,
esos son los imprescindibles ."

Bertolt Brecht
RESUMO

O presente trabalho abrange a área denominada de meliponicultura e teve por objetivo


elaborar um compêndio de informações sobre aspectos relacionados à biologia e manejo da
abelha Melipona bicolor schencki (guaraipo), para tanto levantou-se aspectos da biologia e
manejo da espécie. Utilizou-se do método da pesquisa exploratória, realizando-se pesquisa
bibliográfica, complementada pela pesquisa documental de primeira mão. A pesquisa
documental foi realizada nos estados do Paraná e Santa Catarina. A pesquisa documental de
primeira mão foi realizada com base em questionário semi-estruturado aplicado a criadores da
M. bicolor schencki. Os dados obtidos das entrevistas foram confrontados com documentos
históricos, o que chamamos de história oral híbrida, permitindo o cruzamento das entrevistas
com as demais fontes consultadas. Este processo permitiu a levantar os conhecimentos
práticos dos meliponicultores referentes a criação e manejo da abelha ora mencionada. Por
final os dados foram sistematizados neste trabalho que passa a servir de material de consulta
para pesquisadores e meliponicultores que buscam trabalhar e resgatar a M. bicolor schencki
do atual processo de extinção.

Palavras-chave: Meliponicultura. Abelhas sem ferrão. Melipona bicolor schencki. Guaraipo.


LISTA DE FIGURAS

Figura 1 - Distribuição geográfica de espécies de meliponíneos, apresentando representantes


por região. Grupo A: Melipona beecheii, Melipona yucatanica, scaptotrigona pectoralis;
Grupo B: Melipona Bicolor , Melipona scutellaris, Tetragonisca angustula; Grupo C:
Dactylurina schmidti, Meliponula beccarii; Grupo D: Tetragonula bengalensis,
Lepidotrigona terminata, Tetrigona apicalis; Grupo E: Homotrigona fimbriata, Tetragonula
pagdeni; Grupo F: Tetragonula carbonaria, Austroplebeia australis. ................................. 14
Figura 2 - Visão frontal da caixa didática fechada (A); visão superior da caixa didática aberta
(B). ...................................................................................................................................... 29
Figura 3 - Aspectos da morfologia externa da Guaraipo. Melipona bicolor bicolor Lepeletier,
1839: (A) Vista lateral e (B) vista dorsal; Melipona bicolor schencki Gribodo, 1893: (C) Vista
lateral e (D) vista dorsal. ...................................................................................................... 34
Figura 4 – Esquema gráfico de ninho de meliponíneos com suas estruturas básicas. ............. 35
Figura 5 – Colméia vertical para guaraipo, com melgueria de produção e de divisão. ........... 41
Figura 6 - Modelo de caixa horizontal simples para manejo de guaraipo. ............................. 43
Figura 7 - Diferença na coloração dos discos de cria novos e maduros da abelha guaraipo. .. 44
LISTA DE QUADROS

Quadro 1- Valores de comercialização de mel de meliponínieos em 2005. .......................... 21


Quadro 2 - Características físico-químico de 8 amostras de mel provenientes de Melipoma
marginata, Melipona Quadrifasciata, Melipona bicolor, Melipona monduri e Tetragona
clavipes. ............................................................................................................................... 22
LISTA DE TABELAS

Tabela 1 - Sistema de classificação didática das abelhas sem ferrão empregadas atualmente. 15
Tabela 2 – Nome popular e cientifico de plantas forrageadas por guaraipo. .......................... 39
Tabela 3 - Porcentagem da sacarose invertida (açúcar redutor – AR) e pH das soluções de
açúcar cristal submetidas a hidrólise com diferentes quantidades de sucos de limões Galego,
Tahiti ou Cravo. ................................................................................................................... 50
SUMÁRIO

1 INTRODUÇÃO ........................................................................................................ 11
2 A IMPORTANCIA DO ESTUDO DA MELIPONICULTURA ............................. 18
3 OBJETIVO GERAL ................................................................................................. 26
3.1 OBJETIVOS ESPECÍFICOS ...................................................................................... 26
4 METODOLOGIA ..................................................................................................... 27
5 RESULTADOS E DISCUSSÕES ............................................................................. 30
5.1 RELATOS DE OCORRÊNCIA DA GUARAIPO ...................................................................... 30
5.2 POTENCIAL PRODUTIVO DA ESPÉCIE............................................................................. 31
5.3 MORFOLOGIA E DIVERSIDADE DA GUARAIPO ................................................................ 33
5.4 ESTRUTURA DO NINHO ................................................................................................. 34
5.5 COMPORTAMENTO DA ESPÉCIE ..................................................................................... 36
5.6 HÁBITOS DE NIDIFICAÇÃO ............................................................................................ 36
5.7 CAPTURA PASSIVA....................................................................................................... 37
5.8 FORRAGEAMENTO E ESPÉCIES NECTARÍFERAS VISITADAS .............................................. 38
5.9 MODELOS DE CAIXA PARA MANEJO............................................................................... 39
5.10 MÉTODOS DE DIVISÃO DE FAMÍLIA ............................................................................... 43
5.11 INIMIGOS NATURAIS ..................................................................................................... 48
5.12 FATORES LIMITANTES E ESTIMULADORES DE PRODUÇÃO ............................................... 49
5.13 PRODUTOS APÍCOLAS OBTIDOS DA GUARAIPO ............................................................... 51
5.14 TÉCNICAS DE CONSERVAÇÃO DO MEL ........................................................................... 52
6 CONSIDERAÇÕES FINAIS .................................................................................... 54
REFERÊNCIAS........................................................................................................ 55
11

1 INTRODUÇÃO

A atividade de criação de abelhas indígenas sem ferrão (Hymenoptera, Apidae,


meliponini) nos remete a tempos antigos visto que era uma atividade praticada pelos povos
maia. (VILLANUEVA; ROUBIK; COLLI-UCAN, 2005). “Há muito tempo, povos indígenas
de diversos territórios se relacionam com os meliponíneos de muitas formas, seja estudando-
os, criando-os de forma rústica ou explorando-os de forma predatória.” (VILLAS-BÔAS,
2012, p. 11). Apesar da origem da meliponicultura como técnica ser uma incógnita, o achado
de uma colmeia tronco de cerâmica enterrado junto a uma pessoa Maia, datado de mais de mil
anos pode ser um indicativo do quanto antiga é a atividade. (ACERETO, 2012, p. 34). A
importância da meliponicultura para os povos que habitavam Yucatán está sinalizada nos
códices, livros escritos em papel feito com casca de figueira, do gênero Ficus
padifolia e Ficus cotinifolia, no qual os povos Maias pré-colombianos escreviam com seus
hieróglifos. Neles deuses foram representados manejando racionalmente as colmeias, em
operações como a retirada do mel. Nestas pinturas também se encontram informações de
inimigos naturais dos meliponíneos, além de outras informações que não são totalmente
compreendidas a partir dos códices. Prova de que os Maias foram meliponicultores
perspicazes é a domestificação da Melipona beecheii dentre as 17 espécies encontradas na
região. (ACERETO, 2012, p. 35) .
Segundo Acereto, (2012, p. 34) e Ballivián, (2011, p. 16) o manejo de abelhas sem
ferrão de forma sistematizada era uma pratica das culturas pré-hispânicas avançadas da região
da mesoamerica. No território mexicano e atuais países da centroamérica existia todo um
sistema estruturado para aproveitamento das abelhas sem ferrão de forma racional. Além de
torná-las mais produtivas, essa pratica propiciou disseminação destas espécies no ambiente,
aumentando significativamente a quantidade de ninhos em relação a regiões onde elas não
foram domesticadas. Esse fato foi constatado pelos conquistadores espanhóis durante a
colonização da Província de Yucatán, região de Chetumal, quando visualizavam grandes
concentrações de meliponíneos criados em várias colmeias do tipo jóbon. O Jóbon é um
modelo de colmeia feita de cerâmica ou de madeira escavada usada para a criação racional de
abelhas sem ferrão. Dados históricos relatam que essa forma de criação tem sido empregada
desde a idade média na província de Yucatán, em outras regiões do México, na America
Central e no norte da América do Sul, e ainda continuam sendo criadas na atualidade. No
senso realizado entre 2002 e 2004 na província de Yucatán, registrou-se que a atividade de
12

meliponicultura era praticada por cerca de 400 meliponicultores com um total de 4500
colmeias. (ACERETO, 2012, p. 39)
Apesar de possuírem bom nível de conhecimento sobre estas abelhas, os povos mais
ao Sul se utilizavam da exploração de forma extrativista, remontando a praticas primitivas dos
ancestrais humanos, abrindo os troncos e aproveitando o mel, pólen e cera. (ACERETO,
2012, p. 34). Independentemente da ocupação geográfica das populações indígenas do
território americano, o mel sempre foi utilizado como adoçante natural e fonte de energia,
para que os indivíduos pudessem suportar longas missões de caça e coleta na floresta. O
convívio estreito com estas espécies fez com que eles se tornassem grandes conhecedores das
abelhas sem ferrão, posteriormente repassando seus conhecimentos para os povos
tradicionais, especialmente no que diz respeito ao nome dado as abelhas. (VILLAS-BÔAS,
2012, p. 11). Fica evidente a herança indígena nos nomes populares dos meliponíneos, pois
dificilmente uma espécie, foge desse padrão nomenclatural. Por essa razão o uso de
denominações como jataí, uruçu, tiúba, monbuca, irapuá, tataíra, jandaíra, guarupu, vorá, iraí,
mandaguari, manduri, mandaçaia torna-se bastante comum para a distinção das espécies.
Caracteristicamente os meliponíneos se adaptam melhor a regiões do planeta com
clima mais quente, próxima da região equatorial e tropical (PRONÍ, 2000; WITTER;
BLOCHTEIN, 2009; NOGUEIRA-NETO, 1997). Contudo, existem registros da distribuição
de algumas espécies em região de clima temperado, na zona de transição com o clima
subtropical mesotérmico, como por exemplo, o extremo norte da Patagônia (NOGUEIRA-
NETO, 1997, p. 37). Assim, essas abelhas são encontradas na maior parte da América
Neotropical, ou seja, na maioria do território Latino-Americano. Nos pontos mais ao Sul do
continente podemos destacar o limite austral no Rio Grande do Sul, nas proximidades com o
Uruguai, e na área central da Argentina (Arizona, Província de San Luis). Nos pontos mais ao
norte são comumente encontradas no estado mexicano de Sonora, próximos dos USA, nos
arquipélagos que forma o Caribe, como Cuba, Jamaica, Guadalupe, Montserrat, Dominica,
Trinidad.
Em outras regiões do mundo, observa-se a ocorrência de meliponídeos na África,
Oceania e Ásia. Na África se distribuem dos países do Sul do Sahara, até o Transvaal, na
África do Sul, no Planalto de Nairóbi, de clima ameno, e no Kenya. No continente
Australiano habitam a metade Norte, se estendendo no litoral até a região Sul. Na Índia vão
do Sul até o estado de Uttar Pradesh, no sopé do Himalaia, no Norte da Federação Indiana.
Ocupam também o Sudeste da Ásia, e não seria surpresa se estiverem no Sul da China, pelo
13

fato de também serem registrados na ilha de Taiwan. Outros dados podem ser também
encontrados nos trabalhos de Herbert F. Schwarz, nos do Prof. Pe. Jesus S. Moure, nos do
Prof. C. D. Michener, nos do Prof. J. M. F. Camargo e nos do Prof. S. F. Sakagam.
(NOGUEIRA-NETO, 1997, p. 37).
As abelhas sem ferrão são encontradas nas regiões tropicais (PONÍ, 2000; WITTER;
BLOCHTEIN, 2009) e em algumas regiões de clima temperado subtropical, (PRONÍ, 2000;
NOGUEIRA-NETO, 1997) atingindo o máximo de 30 graus de latitude, sendo encontradas na
maior parte do continente latino americano, (América neotropical) do Rio Grande do Sul ao
México. Elas também podem ser encontradas na África, Austrália, Malásia, Indonésia e Índia,
sendo uma tribo de ampla dispersão no planeta. (PRONÍ, 2000, p. 146).
14

Figura 1 - Distribuição geográfica de espécies de meliponíneos, apresentando representantes


por região. Grupo A: Melipona beecheii, Melipona yucatanica, scaptotrigona pectoralis;
Grupo B: Melipona Bicolor , Melipona scutellaris, Tetragonisca angustula; Grupo C:
Dactylurina schmidti, Meliponula beccarii; Grupo D: Tetragonula bengalensis,
Lepidotrigona terminata, Tetrigona apicalis; Grupo E: Homotrigona fimbriata, Tetragonula
pagdeni; Grupo F: Tetragonula carbonaria, Austroplebeia australis.

Fonte: Elaborado pelo autor, 2015.

Em todo o mundo são encontradas aproximadamente 400 espécies, sendo que no


território brasileiro se verifica a maior diversidade de abelhas sem Ferrão (ASF). (WITTER;
BLOCHTEIN, 2009, p. 15). Embora seja registrada uma grande diversificação do grupo de
meliponíneos no Brasil, ocorrem dados bastante divergentes no que diz respeito à ocorrência
das espécies. Moure et al., (2007) sugere a existência de 50 gêneros de abelhas sem ferrão,
contudo, em seu trabalho com Michener (SILVEIRA; MELO; ALMEIDA, 2002, p. 80) estão
presentes apenas 27 gêneros na chave de identificação. Outro aspecto interessante das
discrepâncias taxonômicas dos meliponíneos se refere ao fato de que a chave disponibilizada
pelo laboratório de abelhas da USP, elaborada pelo mesmo autor, constam somente 17
gêneros (IMPERATRIZ-FONSECA; SANTOS, 2002), o que confirma a necessidade de
maiores investigações sobre a taxonomia dessas abelhas e elaboração de uma chave mais
atualizada que contemplem todos os gêneros.
Na classificação adotada por Silveira, Melo e Almeida (2002, p. 79) as abelhas sem
ferrão são incluídas na subfamília Apinae , tribo Apini e subtribo Meliponina. Meliponina
reúne as abelhas indígenas sem ferrão, onde se encontram as familiares jataí, mandaçaia,
irapuá entre outras. Esta subtribo é representada por várias centenas de espécies distribuídas
em todas as regiões tropicais do mundo, bem como nas regiões subtropicais do hemisfério sul.
15

São caracteristicamente abelhas eussociais, ocorrendo em poucas espécies o comportamento


cléptobiotico, ou seja, o habito de pilhagem de alimento das colmeias de outras espécies de
abelhas.
As abelhas sem ferrão possuem essa denominação por apresentarem um ferrão
atrofiado, o qual não serve como meio de defesa para, em inglês sua denominação é stingless
bees. (PRONÍ, 2000, p. 146).
Apesar de a classificação científica estar organizado conforme o parágrafo acima
existe uma classificação mais simplista, a qual ajuda separar didaticamente as características
das abelhas facilitando o entendimento de algumas técnicas de manejo (Tabela 1). Para
melhor elucidar a questão faremos uso da adaptação da tabela de (VILLAS-BÔAS, 2012, p.
13), apontando a classificação usual e a classificação didática.

Tabela 1 - Sistema de classificação didática das abelhas sem ferrão empregadas atualmente.
Classificação usual Classificação didática
Classe Insecta Insecta
Ordem Hymenoptera Hymenoptera
Superfamília Apoidea Apoidea
Família Apidae Apidae
Subfamília Apinae Meliponinae
Tribo Meliponini Meliponini
Trigonini
Fonte: Villas-Bôas, 2012.
Nota: Adaptado.

A importância classificação didática está no nível de tribo se dividindo em Meliponini


e Trigonini. Em Nogueira-Neto (1997, p. 35), ambos os grupos de abelhas podem formar
colônias nos mais diversos substratos, podendo construir sua colmeia em ocos de arvores,
cupinzeiros, formigueiros abandonados e até mesmo expostos. Os Trigonini constituem um
grupo muito diversificado, com dezenas de gêneros cuja morfologia se resume a um corpo
esbelto e fino, com asas que ultrapassam o limite do abdômen. A entrada do ninho é
construída com cerúmen formado por cera e resinas, e a engenharia dos favos remete a
construção de células reais sempre maiores que as outras, de onde emergem as futuras
rainhas. Assim como nas abelhas com ferrão as rainhas são determinadas troficamente, pois
todas as abelhas tem potencial genético para se tornarem rainhas, mas somente aquelas
alimentadas com uma quantidade maior de alimento desenvolvem o ovário e atingem esse
16

status. Assim o disco de cria apresenta uma célula realeira de oito a dez vezes o tamanho das
células normais onde nascem machos e operárias.
As meliponini possuem em geral um corpo mais robusto, as asas dificilmente
ultrapassam o limite do abdômen. Na entrada da colmeia é depositado uma mistura de barro e
resinas denominado de geoprópolis, estas abelhas não fazem células realeiras nos discos de
cria, sendo a gênese de uma nova rainha determinada pela questão genética, ou seja, apenas
algumas abelhas tem potencial genético para tal, e a alimentação não tem influencia sobre
essa determinação.
A Melipona bicolor popularmente conhecida como guaraipo, tanto na classificação
funcional como na didática é enquadrada como membro da tribo Meliponini, e atualmente são
descritas duas subespécies, a M. bicolor bicolor, Lepeletir, 1836 e a M. bicolor schencki
Gribodo, 1893. A seguir são descritos os nomes válidos para as duas espécies de acordo com
a atual nomenclatura proposta por Moure (2008):

Nome válido atualmente: Melipona bicolor bicolor Lepeletier, 1836


Histórico e sinonímias: Melipona bicolor Lepeletier, 1836: p. 423
Melipona nigra Lepeletier, 1836: p. 423
Melipona (Trigona) vestita Spinola, 1840: p. 124
Melipona vulpina Cockerell, 1919: p. 204
Nome válido atualmente: Melipona bicolor schencki Gribodo, 1893
Histórico e sinonímias: Melipona hirtella Spinola, 1840: p. 124
Melipona coyrepu Müller, 1875: p. 42, 43, 47, 49
Melipona cuculina Müller, 1875: p. 49
Melipona gurupina Müller, 1875: p. 50
Melipona gurupu Müller, 1875: p. 42, 43, 47, 50
Melipona schencki Gribodo, 1893: p. 255
Melipona picadensis Strand, 1910: p. 554

Dentro do gênero melípona a guaraipo pertence ao subgênero Eomelipona. A espécie


investigada no presente trabalho se refere a M. bicolor schencki, de ocorrência da região sul
do Brasil. Embora exista uma enorme quantidade de semelhanças entre as duas subespécies,
diferenças significantes são observadas no padrão de coloração, hábito de forrageamento,
nicho ocupado, e dispersão geográfica, intrinsecamente relacionada as interações com o
clima. A M. bicolor schencki possui diversos nomes populares, que derivam da conjunção de
características morfológicas e hábitos de nidificação, como por exemplo "eira-aviyú", "eirû",
17

"guarupú", "guaraipo", "guaráipo", "pé-de-pau" (CAMARGO; PEDRO, 2013). Ihering (1904,


p. 9) baseado nas denominações indígenas tupis, grandes conhecedores dos hábitos das
abelhas guaraipo, descreveu o significado dessas representações para a língua portuguesa.
Assim os nomes ibu ou ubú, se referem ao chão, enquanto guará, ao hábito de perfurar, varar.
A conjunção dessas palavras como guarubu, escrito ás vezes guaripú ou guaraipo, faz a
representação de uma espécie que constrói o ninho em paus ocos, na porção mais baixa do
tronco próxima ao solo.
Na linguagem popular a guaraipo pode ser chamada como “pé de pau”, pois muitas
vezes no tronco o ninho se prolonga para as raízes. Os nomes populares são a expressão do
grande conhecimento que os indígenas possuíam sobre abelhas nativas. As palavras eiru, ira,
eiru e uru, por exemplo, são todas variações tupis para designar a coletividade das abelhas, ou
mel podendo ainda ser estendido para a estrutura onde existe uma colmeia (IHERING, 1904,
p. 7). Na maioria das vezes as espécies eram nominadas com uma das variações da palavra
mel ou abelha, seguida pelas características especificas (orgânicas e biológicas) de cada
espécie (IHERING, 1904, p. 4). No caso da guaraipo aparece como eira-aviyú, que significa
abelha coberta por pilosidade, sendo uma ótima descrição para abelha, pois Gribodo (1893, p.
255) descreve a abelha como “média robusta, com pilosidade eriçada, quase como um veludo,
[...]”, ou seja, abelha que possui cerdas finas e sedosas.
18

2 A IMPORTANCIA DO ESTUDO DA MELIPONICULTURA

Quase que a totalidade das abelhas sem ferrão possuem uma dieta baseada em néctar e
pólen, ambos coletados das plantas e convertidos na colmeia em mel e samóra. Durante a
coleta as abelhas realizam a polinização, processo de transferência do pólen presente no
aparelho reprodutor masculino das plantas, para o aparelho reprodutor feminino, podendo
ocorrer das mais variadas formas. (WITTER; BLOCHTEIN, 2009, p. 58; VILLAS-BÔAS,
2012, p. 12). A verdade é que 90% das arvores brasileiras dependem diretamente da
polinização por abelhas especialmente as nativas, as quais coevoluiram com a floresta
(BALLIVIÁN, 2011, p. 8) e aproximadamente 30% das plantas que alimentam a humanidade
necessitam da polinização por abelhas. (WITTER; BLOCHTEIN, 2009, p. 58). Abelhas
sociais são bem aceitas na polinização de culturas agrícolas, pois possuem alta densidade
populacional, e ainda permitem ser alocadas em pequenos espaços. (CRUZ; CAMPOS, 2009,
p. 6).
Os meliponíneos desempenham papel essencial na produtividade das plantas nativas
assim como algumas espécies agrícolas. A M. bicolor deflagrada no presente trabalho é um
polinizador natural do bioma mata atlântica e floresta Ombrofila mista e, portanto,
indispensável para manutenção do equilíbrio destes. A conservação dos habitats propícios a
manutenção e reprodução destas abelhas devem ser preservadas, garantindo lugares de
nidificação, ocos de arvores de médio e grande porte. Para isso é necessário a conscientização
dos agricultores os quais estão mais próximos das áreas de remanescentes florestais. As
mudanças climáticas e a introdução de espécies exóticas alteram os níveis populacionais dos
meliponíneos, também causando impactos negativos. (WITTER; BLOCHTEIN, 2009, p. 60).
É necessário ter em conta que os serviços ecológicos prestados pelas abelhas sem
ferrão e demais grupos de abelhas desempenham papel essencial na manutenção da
diversidade vegetal da flora nativa, beneficiando indiretamente a fauna, visto que frutos,
sementes e o próprio habitat são consequências da polinização. (SILVA; PAZ, 2012, p. 150).
Devido à seletividade da abelha doméstica, problemas com parasitas, doenças e
limitação para alguns climas, além de algumas culturas possuírem especificidades na
polinização, outras abelhas podem ser utilizadas. (WITTER; BLOCHTEIN, 2009, p. 59).
Contrariamente as abelhas do gênero Apis muitas espécies de meliponíneos são adaptados e
exitosos em viverem em climas de regiões baixas, úmidas e neblinosas dos trópicos,
(NOGUEIRA-NETO, 1997, p. 250), representando potencial a ser exploradas como, por
exemplo, nas regiões da mata atlântica.
19

Mesmo com poucos dados para avaliar a utilização da ASFs na polinização agrícola se
sabe que as culturas do morango, pêssego, ameixa, pêra, maça, cebola, melancia, abobora,
pepino, girassol, goiabeira, jabuticabeira, laranja, funcho, pimentão, abacate, acerola, canola,
soja e diversos outros podem se beneficiadas com o trabalho prestado. (WITTER;
BLOCHTEIN, 2009, p. 59). Estudos têm apontado potencial de utilização de abelhas sem
ferrão na polinização comercial de culturas em casas de vegetação. Estas abelhas são aptas
para a atividade por apresentarem boa sociabilidade, forragearem em distancias relativamente
pequenas, possuir pouca defencibilidade e formarem colônias perenes. Por este motivos são
melhores que as abelhas do gênero Apis. (CRUZ; CAMPOS, 2009, p. 5).
Sobre a polinização em ambientes fechados Cruz e Campos, (2009) analisam as
bibliografias inerentes ao tema, mostrando que as abelhas sem ferrão Melipona beecheii
(Abelha real, Jicote gato), Melipona quadrifasciata (Mandaçaia), Scaptotrigona bipunctata
(Tubuna), Tetragonisca angustula (Jataí) e Nanotrigona testaceicornis (Iraí) importadas das
Américas, principalmente do Brasil já são usadas na polinização de culturas no Japão. Em São
Paulo e Minas Gerais a M. quadrifasciata anthidioides (Mandaçaia) está sendo utilizada nas
culturas de tomate e pimentão. Para o pimentão também existem estudos que demonstram a
eficiência da Melipona subnitida (Jandaira). De nodo geral nos estudos se constatou um
aumento no número de frutos, aumento de massa além de melhora de sabor dos mesmos.
Apesar de poucos trabalhos sobre o potencial polinizador da M. bicolor schencki,
acredita-se que a espécie possa apresentar potencial na polinização de culturas comerciais
como pimentão, tomate, berinjela, jiló assim como outras solanáceas, visto os registros visuais
da guaraipo forrageando plantas selvagens deste gênero (Solanum fastigiatum e Solanum spp.)
assim como polinizadora de espécies nativas que garantem o equilíbrio ambiental. Witter e
Blochtein (2009, p. 51), apontam que a guaraipo apresenta potencial para a produção de mel e
como consequência da coleta de pólen a polinização.
A criação de abelhas sem ferrão é uma pratica bastante distinta da apicultura
convencional que trabalha com abelhas com ferrão, do gênero Apis. Em função das
peculiaridades biológicas das espécies de meliponíneos, no que se refere a arquitetura do
ninho e dos reservatórios de mel, o termo meliponicultura foi então criado por Paulo
Nogueira-Neto em 1953, para realizar essa distinção. (NOGUEIRA-NETO, 1997, p. 35). A
meliponicultura pode ser definida como a arte de criação de abelhas sem ferrão considerando
aspectos biológicos que determinam um padrão diferenciado para o tratamento dessas
espécies. Nogueira-Neto (1997, p. 257) aponta como aspecto positivo das abelhas sem ferrão,
20

com as quais é possível a realização da meliponicultura migratória, podendo aproveitar


floradas que não coincidem com o local de instalação de meliponário, tendo como
peculiaridade do baixo impacto causado pelos meliponíneos quando comparados as abelhas
do gênero Apis.
O Brasil é reconhecido por abrigar grande variedade de espécies de abelhas sem
ferrão, e os remanescentes florestais das serras do litoral (mata atlântica), parte do cerrado,
pantanal, caatinga possuem grande potencial produtivo. Também se destaca o estado do Pará,
na região amazônica, onde meliponicultores pouco tecnificados criam e manejam Melipona
flavolineata (uruçu-amarela) e a Melipona fasciculata (uruçu-cinzenta), em caixas rústicas,
atingiam uma produção média que varia de 3 a 4 litros de mel por colmeia ano, conseguindo
uma renda média de R$ 1.275,00 ano/família. (MAGALHÃES; VENTURIERI, 2010, p. 16).
No Estado do maranhão em outro projeto de meliponicultura demonstra que os
meliponicultores conseguiram valores de R$ 1.600,00 ano/família com a atividade.
(DRUMOND, 2013, p. 5). O problema é quantificar esse potencial, pois não existem
levantamentos que consigam mapear o número de meliponicultores do país, assim seria
necessário realizar estudos que apontassem a produção por espécie e por região, podendo
chegar a uma estimativa aproximada.
Sobre o valor de mercado do mel de meliponíneos, em escala doméstica atingem
valores que variam de 60 a 120 R$/L (Quadro 1), já em escala comercial, onde seriam
negociados por tonelada, estes preços não se sustentariam, pois passariam a seguir a lei da
oferta e procura. Em escala é considerado razoável preços de 20 a 25 R$/Kg, valor pago no
projeto abelha nativa no Estado do Maranhão. Deve se considerar que o valor praticado no
mercado está razoavelmente acima ao valor de mercado do mel de Apis, cujo valor varia entre
2 e 3 R$/Kg. (DRUMOND, 2013, p. 6).
21

Quadro 1- Valores de comercialização de mel de meliponíneos em 2005.


Nome popular Espécie Preço R$/litro Estado
Melipona scutellaris 35,00 a 50,00 Bahia
Uruçu 70,00 Alagoas
M. rufiventris
100,00 Pernambuco
20,00 a 35,00 Bahia
Jandaíra M. subnitida
Rio Grande do Norte
35,00 a 50,00

M. mandacaia 20,00 a 35,00 Bahia


Mandaçaia M. quadrifasciata
quadrifasciata 20,00 a 35,00 São Paulo
M. quadrifasciata anthidioides
50,00 a 90,00 Bahia
Jataí Tetragonisca angustula
50,00 a 90,00 Paraná
Moça Branca, Mané
Frieseomellita spp. 20,00 a 25,00 Bahia
Abreu
Tiúba, Tubiba Scaptotrigona spp. 20,00 a 30,00 Bahia
Munduri, Papaterra M. asilvai 20,00 a 30,00 Bahia
40,00 a 50,00 Maranhão
Tiúba M. compressipes 30,00 a 40,00 Piauí
25,00 a 35,00 Amazônia
Fonte: ALVES et al., 2005.
Nota: Adaptado.

Durante grande parte da [...] “existência da humanidade, o mel foi praticamente a sua
única fonte concentrada de substâncias açucaradas, mais precisamente de açúcares em
solução.” (NOGUEIRA-NETO, 1997, p. 250). Mesmo que o mel de abelhas sem ferrão seja
um produto apreciado por aqueles que o conhecem, a demanda ainda é pequena, não
conseguindo impulsionar a produção para um mercado de escala, porque muitas vezes o
mercado local não existe. O mel é visto apenas como um produto medicinal e, por esse
motivo, outras aplicações são negligenciadas, como por exemplo, o uso alimentar. Em
mercados de consumo maior, é visto com desconfiança pela falta de conhecimento do
consumidor, sendo comum a aplicação de rotulagem de mel de abelha Apis. (DRUMOND,
2013, p. 5).
A inexistência de uma norma que estabeleça parâmetros físico-químicos na forma de
normativa para os méis dos meliponíneos no Brasil limita bastante o desenvolvimento da
22

atividade. Basicamente o mel dos meliponíneos para ser reconhecido como um produto
comercial necessita estar em conformidade com os parâmetros estabelecidos pela normativa
que regulamenta padrões de qualidade para o mel de Apis. O mel dos meliponíneos (Quadro
2) possui maior concentração de água e usualmente são mais ácidos, o que não influencia na
qualidade, mas reflete na sua reprovação legal por não se enquadrar na legislação vigente para
esse tipo de produto. Borsato et al., (2010) concluem em seus estudos que as amostras de mel
investigadas apresentam características físico-químicas fora dos padrões recomendados pela
legislação brasileira, entre eles a umidade, teor de açúcares redutores, porcentagem de cinzas
e o índice de acidez. “Dessa forma, os estudos realizados reforçam a necessidade do
desenvolvimento de um padrão próprio para os méis de abelhas sem ferrão, incluindo critérios
microbiológicos.” (BORSATO et al., 2010, p. 4).

Quadro 2 - Características físico-químico de 8 amostras de mel provenientes de Melipoma


marginata, Melipona Quadrifasciata, Melipona bicolor, Melipona monduri e Tetragona
clavipes.
Espécie Umidade Açucares Sacarose Cinzas pH Acidez HMF Cor
(%) redutores aparente (%) (mEq.Kg-1) (mg.
(%) (%) Kg-)
Melipona 32,16 61,06 2,92 2,81 4,93 10,64 0,45 Âmbar
marginata escuro
Melípona 28,84 59,23 1,50 0,32 4,21 21,41 1,15 Âmbar
quadrifasciata escuro
Melípona bicolor 32,76 62,31 1,79 0,29 3,47 71,14 0,07 Âmbar
escuro
Melipona bicolor 32,60 62,66 2,94 0,26 3,84 33,96 2,74 Âmbar
escuro
Melipona 31,40 60,84 1,94 0,21 3,33 33,04 18,7 Âmbar
monduri escuro
Melípona bicolor 31,40 53,04 3,02 0,21 2,87 180,82 19,16 Âmbar
escuro
Melípona 31,60 60,84 3,01 0,25 3,40 32,35 24,95 Âmbar
quadrifasciata escuro
Tetragona 27,20 48,52 1,22 0,36 3,50 68,01 6,89 Âmbar
clavipes escuro
Fonte: BORSATO et al., 2010.
Nota: Adaptado.
23

O desenvolvimento de legislação especifica que regulamente o comércio de produtos e


colmeias de meliponíneos ainda é uma barreira para expressão do potencial produtivo.
Enquanto a regulamentação não chega o meliponicultor é taxado de criminoso por manejar
espécies silvestres, e sua produção condenada a clandestinidade. Desse modo, os dados reais
de comercialização de mel, pólen, própolis e colmeias são mascarados e seguem sem
estatísticas oficiais ou extra-oficiais, restando a especulação.
Experimentos realizados por Borsato et al., (2013, p. 61) com mel de meliponíneos de
criadouros do Paraná demonstraram o grande potencial antimicrobiano desse produto. De 21
amostras submetidas ao teste in vitro, sob diferentes concentrações, 20 comprovaram
eficiência, sendo capazes de erradicar 90% dos inócuos de bactérias como Escherichia coli,
Staphylococcus aureus, e o fungo Candida albicans. Embora C. albicans tenha apresentado
maior resistência, o espécime foi suprimido com a elevação da concentração de mel na
amostra testada. Extratos fenólicos também testados nesse estudo, não foram tão eficientes
como agentes antimicrobianos, em comparação ao uso do mel in-natura, sugerindo que a
manutenção das propriedades originais do mel também é importante para justificar seu
potencial antimicrobiano. (BORSATO et al., 2013, p. 62).
Sobrevive na cultura maia o uso de produtos das abelhas sem ferrão, como o mel, cera
e própolis, nos rituais de cura, onde juntamente com ervas medicinais são administrados para
fortalecer o organismo, curar enfermidades, existindo enorme receituário passado de forma
oral de geração para geração entre os curandeiros e parteiras. (ACERETO, 2012, p. 35).
É comum o mel de abelhas sem ferrão ser procurado para fins de elaboração de
remédios caseiros em muitos casos para tratar de infecções de garganta, bronquite e até para o
tratamento de cataratas. Para fins terapêuticos o mel mais procurado é o da Tetragonisca
angustula, mas diversos méis possuem potencial medicinal, ainda que não sejam aceitos pela
sociedade médica a qual tem suas reais preocupações, pois a forma de coleta, armazenamento,
destes produtos na maioria das vezes é desconhecida, podendo apresentar riscos.
Outro produto de destaque das abelhas nativas sem ferrão é a própolis, utilizada por
sua ação biológica e terapêutica. A própolis vem sendo utilizada na prevenção e no tratamento
de feridas e infecções da via oral, ou como antifúngico e cicatrizante. Recentemente os
estudos comprovaram ação de alguns de seus compostos ativos como imunoestimulante e
antitumoral. (BALLIVIÁN, 2011, p. 75). No caso da Guaraipo teria que estudar a
possibilidade do uso visto que a espécie somente produz geoprópolis, misturando resinas, com
terra e material orgânico, sendo pouco aceitado no preparo de própolis para consumo humano.
24

De acordo com o documento Plano de conservação para Abelhas sociais nativas


sem ferrão no estado do Paraná, pouca atenção tem se dado as abelhas sem ferrão, pois a M.
Bicolor e outras espécies aparecem como vulneráveis e sujeitas ao processo de extinção
(PARANÁ, 2009). O mesmo quadro se observa para a M. bicolor quando estendido para o
estado do Rio Grande do Sul, constituindo um dos membros da lista de espécies ameaçadas
(BLOCHTEIN et al., 2008, p. 13). Locatelli (Informação verbal)1 sugere que se as espécies de
abelhas sem ferrão não forem domesticadas, existe o risco da extinção num curto período de
tempo em algumas regiões do Brasil. Reconhece-se a partir disso a necessidade do processo
de domesticação e criação racional como ferramenta da preservação dessas espécies e seu
patrimônio genético.
Ao ritmo da exploração da madeira pelos colonos e substituição dos ambientes
naturais para a prática da agricultura, árvores seculares foram suprimidas, extinguindo os
substratos de nidificação das mais variadas espécies de abelhas sem ferrão. A espécie M.
bicolor schencki, provavelmente foi uma das mais atingidas por esse processo de
antropização, visto a grande especificidade por nidificar espécies vegetais arbóreas, não se
encontrando registros de nidificação em muros, em cavidades no solo e nem fixados a galhos,
como ocorre na espécie Scaptotrigina spinipes. A M. bicolor schencki como uma espécie
endêmica da região sul, existente na mata atlântica, e das florestas de araucárias Ombrófila
mista, outrora abundante, por conta do processo de desmatamento tem caído no esquecimento.
Assim consideramos que a espécie M. bicolor schencki era certamente um elemento do bioma
original da região da Cantuquiriguaçu, que aos poucos passou a pequenas populações, até
chegar a extinção ou um nível muito próximo a ele.
Estudos referentes a abelha M. bicolor schencki, são escassos e contemplam apenas
alguns aspectos da biologia da abelha. Já em relação a trabalhos que possam dar a direção de
como proceder com o manejo são quase inexistentes podendo apontar uma única bibliografia,
como o Manual de Boas Práticas para a Criação e Manejo Racional de Abelhas Sem
Ferrão no RS, produzido por Betina Blochtein e outros colaboradores. No material são
abordados aspectos produtivos de três espécies; a guaraipo – M. bicolor schencki, manduri –
M. marginata obscurior e tubuna – S. bipunctata, carecendo de detalhamento das
necessidades e peculiares de manejo da espécie aqui estudada. (BLOCHTEIN, et al., 2008).
O primeiro material encontrado sobre a M. bicolor schencki é a descrição da espécie
feita por padre Giovani Gribodo em 1893. O documento foi publicado com o titulo Note

1
Informação verbal: LOCATELLI, J.C., Balneário Rincão (SC), 2015.
25

imenotterologiche. Nota II. Nuovi generi e nuove specie di Imenotteri antofili et


osservazioni sopra alcune specie gia conosciute, publicado no Boletim da sociedade
Entomológica Italiana, escrito em latim arcaico e italiano.(GRIBODO, 1893). Outro material
que faz menção a espécie é As Abelhas Sociais Do Brasil E Suas Denominações Tupis
escrito em 1904 por Hermann Von Ihering aborda em parte especifica o que o nome guaraipo
poderia significar na linguagem indígena. (IHERING, 1904). Olga Inés Cepeda Aponte
escreve em 2003 sua tese de doutorado, com o titulo Poliginia2 e monoginia3 em melípona
bicolor (Apidae, Meliponini) do coletivo para o individual. No trabalho são discutidas as
diferenças encontradas entre as colônias poliginicas e monoginicas, chegando a conclusão de
que colmeias com mais de uma rainha poedeira apresentam uma competição na realização das
posturas mas que isto não chega a desenvolver contatos violentos entre as rainhas. Nas
colmeias poliginicas são empregadas maior quantidade de operarias aprovisionadoras e
operculadoras de células, pois a velocidade que acontece o POP (processo de
aprovisionamento e postura) é mais rápido devido a competição por ovipositar. Também
acarretam maior demanda de trabalho para as operculadoras, pois em muitas células o
colarinho ainda não está pronto quando a rainha deposita o ovo, dificultando a operculação do
alvéolo. A pressa em ovipositar pode implicar em deficiência nutricional das rainhas, visto
que em muitos casos elas não esperam as operárias depositar o ovo trófico nas células.
(APONTE, 2003).
Existem referenciais que abordam os aspectos ecológicos e comportamentais da M.
bicolor schencki, mas as informações são muito dispersas e ainda escassas. Por essa razão
torna-se imprescindível reorganizar esses conhecimentos agregando informações daqueles
que conheceram a espécie em seu ambiente natural, ou seja, confrontar o conhecimento
prático com o científico a fim de determinar indicativos de manejo baseado nas necessidades
de nidificação, peculiaridades comportamentais, forrageamento, entre outros.
A sombra de muitas duvidas referentes a biologia, comportamento e manejo da M.
bicolor schencki pretende-se reunir um conjunto de informações que possibilitem ao leitor do
trabalho ter elementos que o ajudem a elaborar melhores estratégias de resgate, conservação e
disseminação da espécie. A partir dos elementos levantados, poderão ser traçadas estratégias
de repovoamento das áreas as quais a espécie já não existe mais.

2
Postura por mais de uma rainha fisiogástrica poedeira.
3
Postura realizada por uma única rainha fisiogástrica poedeira.
26

3 OBJETIVO GERAL

Elaborar um compêndio de informações sobre aspectos relacionados à biologia e


manejo da Melipona bicolor schencki.

3.1 OBJETIVOS ESPECÍFICOS


a) Levantar aspectos da morfologia, fisiologia e comportamento da M. bicolor
schencki;
b) Confrontar informações a respeito do manejo e criação desta espécie;
c) Propor modelos de caixa racional para criação racional da M. bicolor;
d) Organizar os dados coletados em forma de material de consulta, para produtores e
pesquisadores da área.
27

4 METODOLOGIA

O estudo foi realizado no período de julho a outubro de 2015, abrangendo alguns


meliponicultores dos estados de Santa Catarina e Paraná, devido a M. bicolor schencki ter sua
distribuição intrinsicamente relacionada a região Sul. Os meliponicultores foram selecionados
levando em consideração a trajetória ou histórico com a criação e manejo da espécie, sendo
esses contatados a partir dos grupos de criadores da M. bicolor schencki. Em Santa Catarina
foram entrevistados cinco meliponicultores organizados na Associação de Meliponicultores
da Encosta da Serra Geral (AMESG). Os entrevistados de Santa Catarina foram Jean Carlos
Locatelli, Silvino Milak (Criciúma) Jorge Venson (Balneario Rincão), Rosalino Scrimin
(Urussanga) e José Carlos Wegrznoski (Mafra). No estado do Paraná só foi possível realizar a
investigação com um produtor, Flavio José Gowacki de Laranjeiras do Sul, devido a
facilidade de contato e por aspectos relacionados ao conhecimento da espécie.
Utilizou-se neste trabalho o método de pesquisa exploratória, assentada no
procedimento de levantamento, pesquisa bibliográfica (SEVERINO, 2013, p. 122;
MARCONI; LAKATOS, 2010, p. 166) e documental. Os referenciais teóricos sobre a
espécie M. bicolor schencki, foram obtidos de produções como livros, teses e dissertações,
periódicos e artigos científicos.
Devido a escassez de material abordando técnicas de manejo e produção da abelha, se
tornou necessário a utilização da pesquisa documental (SEVERINO, 2013, p. 122;
MARCONI; LAKATOS, 2010, p. 157), em especial a de primeira mão, a partir de entrevistas
com meliponicultores que criam racionalmente a espécie. Os dados obtidos das entrevistas
foram confrontados com outros documentos históricos, o que chamamos de história oral
híbrida, procedimento que permite “[...] a mescla de análises derivadas das entrevistas
cruzadas com outros documentos.” (MEIHY; RIBEIRO, 2011, p. 16). Desse modo, pode-se
equiparar a fonte oral com a fonte escrita, já que “[...], a historia oral temática é, quase
sempre, usada como técnica, pois articula, na maioria das vezes, diálogos com outros
documentos”. (MEIHY; RIBEIRO, 2011, p. 88). Optou-se por esse procedimento, porque no
âmbito acadêmico é cada vez mais difícil validar os conhecimentos empíricos dos povos.
Sabemos que povos e comunidades tradicionais possuem um acumulo secular de
conhecimentos não sistematizados, mas estes conhecimentos possuem grande valor pratico.
Estes conhecimentos são capazes de dar suporte a muitas teorias, mas não são aceitos como
conhecimento cientifico, sobre isto discorem Meihy e Ribeiro (2011, p.37) “De regra, os que
se valem da história viva, feita por meio de entrevistas, enfrentam prechas preconceituosas
28

daqueles que entendem que o labor intelectual não produz sequer reformas, ainda mais
revoluções.”
Nessa perspectiva os entrevistados e o entrevistador, são [..] “sujeitos ativos, munidos
do propósito de produzir um resultado que demanda conivência.” (MEIHY; RIBEIRO, 2011,
p. 23), de modo que as “lacunas documentais” foram preenchidas com documentos feitos para
suprir ausências de dados ou informações.” (MEIHY; RIBEIRO, 2011, p. 29). Durante as
entrevistas procurou-se privilegiar as informações do entrevistado, mesmo em situações
divergentes submetidas a breve discussão para entendimento de sua posição. As discussões
afirmativas ou contraditórias foram importantes durante as entrevistas para elucidar os fatos
sobre os histórico da M. bicolor, sempre preservando as opiniões e experiências do
colaborador.
Um roteiro de questionário semi-estruturado foi preparado previamente junto a um
termo de consentimento para preservação das informações obtidas em comunicação verbal.
As entrevistas foram gravadas em áudio digital, com posterior transcrição. As perguntas
foram formuladas levando em consideração dados históricos e aspectos relacionados a
biologia, criação e manejo da espécie. Embora sujeito a um escopo de perguntas, abriu-se a
possibilidade de complementação do questionário quando surgiam situações ou elementos
dúbios. As entrevistas foram conduzidas com o máximo de naturalidade possível, como uma
conversa, mas com tema delimitado. As informações obtidas nas entrevistas passaram pela
transcrição e textualização para posteriormente se transformar em material de obtenção de
dados. Como a amostragem é pequena, mas rica em informações as técnicas e procedimentos,
os dados obtidos foram reorganizados de modo a dar cronologia, as etapas adotadas nas
técnicas de manejo possibilitando ao leitor a reprodução das mesmas.
Uma colmeia didática foi construída para se observar e demonstrar aspectos
comportamentais e biológicos da M. bicolor schencki, seguindo diferentes parâmetros
propostos para adequar a arquitetura as necessidades de criação e reprodução da espécie. A
caixa foi confeccionada a partir de madeira de canela (Ocotea pulchella) de 4 cm de espessura
, vidro liso 4 mm de espessura, e lamina de acetato fina. A colmeia didática é uma caixa tipo
cubo, possuindo as seguintes peças. Fundo, três paredes fixas pregadas ao fundo e duas
tampas, uma frontal e outra superior. As tampas foram fixadas por dobradiças, não sendo
necessário destacar as tampas ao expor o interior da colmeia aos observadores. Abaixo sobre
estas tampas de madeira com função de dar conforto térmico e luminoso as abelhas, existem
canaletas de 4,1 mm, onde a lamina de acetato sobreposta pelo vidro estão dispostas. O
29

acetato evita que as abelhas sujem o vidro, assim antes de uma exposição ele é retirado
deixando a colmeia totalmente exposta aos observadores. O tamanho externo da colmeia é 24
cm x 24 cm x 24.

Figura 2 - Visão frontal da caixa didática fechada (A); visão superior da caixa didática aberta
(B).

Fonte: Elaborado pelo autor, 2015.


30

5 RESULTADOS E DISCUSSÕES

Os resultados e discussões são o produto final, resultado de todo trabalho


investigativo. A seção aborda os aspectos inerentes a espécie M. bicolor schencki e por isso
está diretamente ligada a concretização dos objetivos a que se propõe o trabalho. As
subseções buscam abranger a mais variada gama de aspectos da biologia e manejo da espécie,
procurando dar suporte técnico a criadores e pesquisadores da abelha, apesar de algumas
informações não serem conclusivas.

5.1 RELATOS DE OCORRÊNCIA DA GUARAIPO

Segundo Witter e Blochtein (2009, p. 15) as abelhas do gênero Melípona, guaraipo,


mandaçaia e manduri, são encontradas frequentemente em flores, mas seus ninhos ainda que
raramente podem ser encontrados em remanescentes de florestas do Rio Grande do Sul. A
guaraipo mais especificamente é encontrada neste estado nas regiões altas do litoral, Alto e
médio Vale do Uruguai, planalto Superior-Serra do Nordeste, que são regiões do norte do
estado. (WITTER; BLOCHTEIN, 2009, p. 16).
No estudo sobre a ocorrência de meliponíneos na Bacia do rio Tibagi, embora em
baixo nível se constatou a existência da abelha guaraipo (PRONÍ, 2000, p. 147). No estudo ela
ainda aparece com o nome de Melípona nigra (gurupú), nomenclatura pouco utilizada para
variação da espécie que ocorre a partir de São Paulo em climas mais quentes. Na
nomenclatura mais atual esta abelha recebe o nome de Melípona bicolor bicolor.
Os relatos da existência da guaraipo nos remetem as décadas de 1940 a 1970,
primeiramente Locatelli (informação verbal)4 aponta que seu avô migrou do sul para o oeste
Paranaense, nesta época era comum as derrubadas da mata nativa para o posterior plantio.
Durante a derrubada era comum encontrar colmeias de guaraipo, das quais se retirava o mel e
as famílias eram descartadas. Ele teve conhecimento da existência na natureza das abelhas do
gênero Melípona como a guaraipo, mandaçaia, manduri, bugia em 1993 no interior Orleans e
Lauro Muller, visto que em Chapecó, região oeste de Santa Catariana onde ele morava
anteriormente as abelhas desta tribo já não existiam mais, restando apenas as trigonas.
Venson conta que a abelha guaraipo sempre existiu na propriedade da família. Seu pai
era madeireiro, assim encontravam muitas colmeias da espécie da qual coletavam mel, sendo
o enxame naquela época descartado, visto que não se conhecia técnicas de manejo. “Meu pai
4
Informação verbal: LOCATELLI, J. C., Balneário Rincão (SC), 2015.
31

sempre dizia que a guaraipo não vivia em caixinhas. Isto era dito por falta de conhecimento da
abelha”(informação verbal)5.
O primeiro contato com a espécie foi por volta de 1968, sendo a extração do mel
realizada com uso de machado, e por falta de conhecimento as famílias de abelhas eram
abandonadas, não se fazendo o devido aproveitamento racional. Este fato ocorreu no
município de Meleiro, próximo a Forquilhinha na encosta da Serra Geral, onde predominava a
mata atlântica. Neste local existiam muitos enxames e ainda hoje são possíveis de ser
encontrados. (informação verbal)6.
Gowacki recorda das conversas com seu pai, ocorridas por volta da década de 1970,
nas quais a guaraipo era muito comentada, mas já não era mais encontrada na natureza. Suas
falas faziam referencia aos enxames ao qual encontrou, e a predileção de seu pai em relação a
abelha. Por influencia do pai Gowacki também passou a admirar a espécie. (Informação
Verbal)7.
Dos seis entrevistados apenas três visualizaram colmeias naturais, mesmo que alguns
tivessem realizado expedições em matas fechadas em busca da abelha os relatos apontam para
a raridade da espécie nos dias atuais, (Informação Verbal)8, além da capacidade de nidificar
em lugares discretos e difíceis de encontrar. (Informação Verbal)9.
Apesar da dificuldade de encontrar os ninhos desta espécie e alguns lugares ainda é
possível encontrar na natureza, inclusive mapeados. Infelizmente em algumas ocasiões essas
colmeias são pilhadas. (Informação Verbal)10

5.2 POTENCIAL PRODUTIVO DA ESPÉCIE

Há relatos de colmeias nativas de guaraipo ocupando espaço de 100 cm de altura por


20 cm de diâmetro (espaço aproximado de 31,41 litros). O espaço descrito se encontrava
totalmente preenchido por família, pólen e mel, da qual foi retirado 10 litros de mel. Em
caixas nunca se conseguiu alcançar tal produtividade. (Informação Verbal)11

5
Informação verbal: VENSON, J., Balneário Rincão (SC), 2015.
6
Informação verbal: VENSON, J., Balneário Rincão (SC), 2015.
7
Informação verbal: GOWACKI, F. J., Laranjeiras do Sul (PR), 2015
8
Informação verbal: GOWACKI, F. J., Laranjeiras do Sul (PR), 2015
9
Informação verbal: LOCATELLI, J. C., Balneário Rincão (SC), 2015.
10
Informação verbal: LOCATELLI, J. C., Balneário Rincão (SC), 2015.
11
Informação verbal: VENSON, J., Balneário Rincão (SC), 2015.
32

Relatos de Gowacki, sobre a família nas décadas 1960 e 1970, no quesito extração de
mel de guaraipo indicam que se conseguia até mesmo quantidade suficiente para preencher
latas. Considerando que a medida utilizada para latas neste período possuía 18 litros, pode se
afirmar que a quantidade de mel acumulado nas colmeias naturais chegava a volume superior
a 18 litros. Outro detalhe importante é que o espaço colonizado por essas abelhas equivaleria
a hoje ao mesmo ocupado por abelhas maiores, como as que se observam nos ninhos do
gênero Apis, de abelhas com ferrão. Em relação a espessura das paredes das colmeias naturais
podem chegar a 50 cm de isolamento, fator positivo para a expressão produtiva da espécie.
(Informação Verbal)12.
O meliponicultor que atualmente deseja trabalhar com a espécie não deve possuir a
pretensão de atingir produções anuais tais como a dos relatos, visto que essas colmeias
provavelmente estavam instaladas há algumas décadas no mesmo local. Desse modo, todas as
condições necessárias para o bom desenvolvimento e expressão do potencial produtivo
estavam exarcebadas. As abelhas sem ferrão não desfrutam mais das mesmas condições
naturais de décadas atrás. Nos dias atuais existe escassez de recursos florais, pois a maioria
das espécies vegetais arbóreas preferenciais da espécie desapareceu, comprometendo o
suporte as colmeias. A guaraipo é mais produtiva no seu habitat natural, onde se destacam as
floradas de arvores nativas de regiões frias, como as espécies vegetais guamirim (Eugenia
sp.), guaviroveira (Campomanesia xanthocarpa), carne vaca (Clethra scabra), vassourão
branco (Piptocarpha angustifolia), bracatinga (Mimosa scabrella). As guaraipo tem um
estreitamento ecológico no que diz respeito a exploração do nicho fornecido por essas espécie
de arvores, pois são visualizadas em flores exóticas somente quando não existe outra fonte de
alimento, sendo estas o último recurso. (Informação Verbal)13.
Wegrzinoski possui três colmeias não manejadas, dedicadas a observação do potencial
produtivo. Isto é importante já que as colmeias estão juntamente com um grande numero de
colmeias de diversas espécies de meliponíneos, assim se pode estimar a produção real da
espécie em condições de alta densidade. As colmeias utilizadas para avaliar o potencial
produtivo não são alimentadas como acontece com as demais, pois o objetivo é avaliar o
potencial produtivo na natureza. Somando os dois meliponários que estão separados por 2 km
de distancia na propriedade de 5 alqueires, existem mais de 300 colmeias de variadas
espécies. Nestas condições o meliponicultor acredita ser possível uma colheita media 3

12
Informação verbal: LOCATELLI, J. C., Balneário Rincão (SC), 2015.
13
Informação verbal: WEGRZINOSKI, J. C., Mafra (SC), 2015.
33

litros/colmeia/ano, podendo chegar a mais em enxames fortes com varias rainhas poedeiras.
(Informação Verbal)14.

5.3 MORFOLOGIA E DIVERSIDADE DA GUARAIPO

A guaraipo (Melípona bicolor schencki) possui aproximadamente 8,9 mm, possui


corpo com coloração preta apresentando pilosidade ferrugínea na forma jovem (WITTER;
BLOCHTEIN, 2009, p. 51). Também podem apresentar coloração amarelada pardo quando
recém emergidas, chegando próximo ao marrom escuro. (BLOCHTEIN; et al., 2008, p. 13).
Nas abelhas adultas os pelos do tórax são predominantemente pretos, característica pela qual
se diferencia da gurupu (Melípona bicolor bicolor) que ocorre de estado são Paulo para cima,
no abdômen as cerdas são eretas e douradas. (WITTER; BLOCHTEIN, 2009, p. 51)
As abelhas as jovens são mais claras, as campeiras jovens tem na cabeça uma
coloração branca, mas com mais dois dias de trabalho elas mudam de cor, pra cor das adultas
mais escuras. A guaraipo é uma abelha robusta um pouco menor que a mandaçaia.
(informação verbal)15. Aspectos morfológicos são demonstrados na figura 3.

14
Informação verbal: WEGRZINOSKI, J. C., Mafra (SC), 2015.
15
Informação verbal: MILACK, S., Criciúma (SC), 2015; WEGRZINOSKI, J. C., Mafra (SC), 2015.
34

Figura 3 - Aspectos da morfologia externa da Guaraipo. Melipona bicolor bicolor Lepeletier,


1839: (A) Vista lateral e (B) vista dorsal; Melipona bicolor schencki Gribodo, 1893: (C) Vista
lateral e (D) vista dorsal.

Fonte: Obiols (2008) .


Nota: Adaptado.

5.4 ESTRUTURA DO NINHO

O ninho da abelha guaraipo como a maioria das abelhas sem ferrão é construído em
sua maior parte de cerúmen, mistura de cera e própolis. O ninho é característico por
apresentar discos de postura dispostos na horizontal, ficando um disco sobreposto ao outro ou
de forma helicoidal. Entre as células do disco superior e do disco inferior existe espaço
delimitado por pilares de cerúmen (espaço abelha) suficiente para a passagem de abelhas,
responsáveis pela higiene. Os discos de cria são formados pela união de inúmeras células de
35

crias, as quais são a base do desenvolvimento de uma abelha. Os discos estão presentes em
numero de 5 a 9 nas colmeias de guaraipo manejadas. Eles estão envoltos por uma estrutura
de finas malhas construídas com cerúmen denominadas de invólucro. Os potes de alimento
encontram-se distribuídos ao redor do ninho, sendo o pólen é disposto próximo aos discos
cria, pois é utilizado em maior quantidade que o mel para aprovisionar as novas células de
postura. Os potes de mel são geralmente de mesmo tamanho que os de pólen, e ficam
alocados depois dos potes de mel. Os potes de alimento de forma oval variam de tamanho, de
acordo com espaço da colmeia e época do ano, no fim do verão consequentemente da florada
os potes são menores 3 cm, mas em plena florada na saída do inverno os potes são maiores, 5
cm de altura, alguns chegando a 6 cm. O tamanho dos potes não é relativo ao tamanho do
enxame. Em ninhos naturais é comum o as extremidades do ninho ser delimitada pelo batume,
estrutura construída de geoprópolis, mistura de terra e resinas de madeiras as quais adquirem
grande densidade e dureza.

Figura 4 – Esquema gráfico de ninho de meliponíneos com suas estruturas básicas.

Fonte: Nogueira-Neto (1997, p. 47).


36

5.5 COMPORTAMENTO DA ESPÉCIE

As guaraipos são abelhas tímidas e mansas as quais se escondem nos ninhos quando se
aproximam pessoas. (WITTER; BLOCHTEIN, 2009, p. 51). “cessam as atividades de voo
quando são perturbadas”. (BLOCHTEIN, et al., 2008, p. 13).
A espécie é característica por apresentar em seus ninhos até cinco rainhas, Nogueira-
Neto (1997, p. 82) atribui o fato as colônias fortes. As rainhas emergem de células iguais as
das operarias e zangões, ou seja, sem a presença da realeira. (BLOCHTEIN, et al., 2008, p.
13; NOGUEIRA-NETO, 1997, p. 210). Cada espécie de abelha possui seus atributos
ecológicos, assim obter sucesso na atividade o meliponicultor deve respeitar as
especificidades das espécies, criando somente espécies adaptadas a região. (WITTER;
BLOCHTEIN, 2009, p. 16). Ao menos devem ser de áreas geográficas vizinhas ou que
possuam ecologia compatível. (NOGUEIRA-NETO, 1997, p. 96).

5.6 HÁBITOS DE NIDIFICAÇÃO

A entrada da do ninho permite a passagem de somente uma abelha por vez.


(BLOCHTEIN et al., 2008, p. 14).“Em mandaçaia, guaraipo e manduri a entrada é marcada
por raias de barro ou de geoprópolis em torno de um orifício central.” (WITTER;
BLOCHTEIN, 2009, p. 13). Quando a colônia em ambiente natural é muito antiga e populosa
pode apresentar estrias formadas com barro e própolis, tendo inicio na entrada na qual passa
somente uma abelha. (BLOCHTEIN et al., 2008, p. 13). Witter e Blochtein (2009, p. 51)
descrevem a entrada como não evidente, disfarçada ou apresentando estrias que convergentes
para o buraco de entrada, o qual possui espaço para passagem de uma única abelha.
(WITTER; BLOCHTEIN, 2009, p. 51).
A entrada do ninho não passa de 1,5 m de altura, e quando é um enxame novo é só um
furinho na madeira, parece um manduri, depois ele começa a fazer depositar uma pequena
quantidade de barro, mas nem se compara a mandaçaia.“Eu ainda acho que a guaraipo
procura lugar pra fazer ninho de 2 metros para baixo.” (informação verbal)16.
O estudo de Freitas et al., (2006) encontrou a porcentagem de 42% para nidificação da
guaraipo em espécies de canelas (Ocotea pulchella, Cryptocarpa moschata) e 26,3% em
bugre (Lythrea brasiliensis). A espécie nidifica também em Canela Amarela ou canela

16
Informação verbal: WEGRZINOSKI, J. C., Mafra (SC), 2015.
37

amarelinha (Ocotea diospyrifolia), Vassourão (Piptocarpha angustifólia), guamirim (Eugenia


sp.), optando por arvores grossas que ajudam na proteção termorregulação. Já se constatou
nidificação em peroba (Aspidosperma lagoense), mas é algo raro visto que dificilmente a
espécie apresenta ocos passiveis de ocupação. A M. bicolor schencki é encontrada em
Cambara – SC uma das regiões mais frias do Brasil demonstrando seu potencial para criação
em regiões frias. As colmeias naturais encontradas na maioria das estão muito próximo ao
solo ou até mesmo a entrada iniciando no solo. (Informação verbal)17. O comportamento lhe
rendeu o nome popular de pé-de-pau.
Normalmente os relatos apontam para o habito de nidificar muito próximo ao solo
ocupando muitas vezes extensões das raízes para depositar o mel, e raramente foram
encontrados ninhos acima e três metros de altura. (Informação verbal)18.

5.7 CAPTURA PASSIVA

Caixas simples, porém bem vedadas são utilizadas na captura de abelhas que venham a
enxamear, no caso da abelha guaraipo nunca chegou a capturar uma nova família nestas
caixas iscas, enquanto a mandaçaia já capturou em iscas pets, caixas iscas e até mesmo em
caixas próprias para abelhas do gênero Apis. Nas inspeções na mata nunca chegou a encontrar
uma nova família de guaraipo em arvores, contrariamente do que acontece com a mandaçaia.
Apesar se atribuir a dificuldade da captura da guaraipo ao constante manejo das divisões de
colmeias, o meliponicultor lembra que possui enxames os quais não maneja, as quais se
prestam unicamente a observação do comportamento, e portanto poderiam chegar a
maturidade para a enxameação. (informação verbal) 19 . De todos os entrevistados nenhum
meliponicultor relatou ou tampouco ouviu falar de alguém que conseguiu a façanha da
captura. A técnica de aplicar verniz proveniente da mistura de geoprópolis da M.bicolor
schenchi e álcool combustível em caixas iscas com posterior ateamento de fogo pode gerar
ambiente propicio para captura da espécie, visto que o fogo elimina o cheiro forte do álcool e
libera odor característico das colmeias de guaraipo. A técnica descrita produz bom resultados
com M. quadrifasciata. (Informação verbal)20.

17
Informação verbal: WEGRZINOSKI, J. C., Mafra (SC), 2015; LOCATELLI, J. C., Balneário Rincão (SC),
2015 e VENSON, J., Balneário Rincão (SC), 2015.
18
Informação verbal: WEGRZINOSKI, J. C., Mafra (SC), 2015; LOCATELLI, J. C., Balneário Rincão (SC),
2015 e VENSON, J., Balneário Rincão (SC), 2015.
19
Informação verbal: WEGRZINOSKI, J. C., Mafra (SC), 2015.
20
Informação verbal: SCRIMIN, R., Urussanga (SC), 2015.
38

5.8 FORRAGEAMENTO E ESPÉCIES NECTARÍFERAS VISITADAS

Witter e Blochtein (2009, p. 62) recomendam o uso de um diário de campo, para que
sejam registrados as espécies nectaríferas visitadas pelas abelhas dentro da área de pastagem
apícola. Nele devem ser anotadas espécies de plantas visitadas, hora em que a coleta
realizada, data, qual recurso foi coletado e de qual parte da planta foi coletado. Estas
informações permitem ao meliponicultor elaborar um plano de ação de espécies a serem
plantadas em sua propriedade, potencializando a produtividade da espécie a qual deseja criar.
A guaraipo inicia a forragear com temperaturas a partir de 9,2 oC, sendo a faixa de
horário ideal de trabalho das 09:00 as 16:00. (FERREIRA JUNIOR, 2008, p. 20) A partir dos
dados levantados nas entrevistas foi possível elaborar a tabela 2, apontando as espécies em
que foram visualizadas abelhas da espécie M. bicolor schencki forrageando.
39

Tabela 2 – Nome popular e cientifico de plantas forrageadas por guaraipo.


Nome popular Nome científico
Ameixinha amarela Eriobotrya japonica
Amor agarradinho , cipó-mel Antigonon leptopus
Astrapéia rosa Dombeya wallichii
Baga de macaco Posoqueira acutifolia
Bracatinga Mimosa scabrella
Carne vaca Clethra scabra
Cipó d’agua, cipó – cabeludo, erva-cobre Mikania cordifolia
Camboatã Cupania vernalis e matayba
elaeagnoides
Crista de pavão (galo), diadema Celosia cristata
Eucalipto cedro Eucalipto robusta
Guabirobeira Campomanesia xanthocarpa
Guamirim Eugenia sp.
Jabuticaba Myrciaria cauliflora
Jurubeba Solanum fastigiatum
jurubebinha Solanum sp.
Laranjeira Citrus sinensis
Ligustro, alfeneiro Ligustrum lucidum
Mutre falso Alfazema bergata
Ora-pro-nóbis Pereskia aculeata
Pata de boi (vaca) Bauhinia variegata
Pitanga Eugenia uniflora
Tarumã Vitex montevidensis
Vassourão amarelo Piptocarpha sp.
Vassourão branco Piptocarpha angustifolia
Fonte: Elaborado pelo autor.

5.9 MODELOS DE CAIXA PARA MANEJO

Os meliponicultores estão em busca da padronização das caixas para manejo das


espécies de abelhas nativas sem ferrão, principalmente nos aspectos modelo e tamanho
externo principalmente. Quando as colmeias são fabricadas levando em consideração as
medidas externas é possível adicionar módulos ou melgueiras sem que as colmeias fiquem
cheias de degraus. Utilizando madeiras de espessuras diferentes meliponicultores podem
40

fabricar colmeias com o mesmo padrão externo, podendo manter a estética das caixas quando
adicionam um modulo ou melgueira. (informação verbal)21.
A padronização das colmeias apresenta a vantagem da manutenção da beleza exterior,
mas em contrapartida as colmeias podem flutuar muito em volume, já que algumas são feitas
com madeiras de 2 cm e outras com até 10 cm de espessura. Considerando que o volume
idealizado para a abelha guaraipo possui entre 9 a 10 litros/colmeia, assim a diferença de 8 cm
em cada lateral da caixa pode representar uma diferença gritante.
Blochtein el al., (2008, p. 30) esboçaram um modelo de colmeia racional para a
criação da guaraipo e da manduri a qual foi idealizada por Portugal-Araújo, modificada por
Venturieri. A colmeia apresenta uma subdivisão entre o ninho e o sobreninho a qual os
meliponicultores conhecedores da biologia da guaraipo, na grande maioria optam por retirar
visto que esta barreira atrapalha o desenvolvimento da postura, ou ainda pode impedir o
rebaixamento do ninho como um todo. Aqui não se apresentará o modelo, sendo apresentados
dois outros modelos com maior respaldo dos meliponicultores.
A figura 5 apresenta uma caixa simples e eficiente para a abelha Guaraipo é o modelo
adaptado da colmeia INPA e de sua variante ACRIAPA, assim chegando a um terceiro tipo de
colmeia. A colmeia deve ter 20 cm x 20 cm de espaço interno, com dois módulos para o
ninho, cada modulo com 8 cm, com um pequeno modulo de 2 cm denominado porão ou
lixeira, fixado ao fundo da colmeia. Em alguns casos este modulo é abolido para simplificar a
fabricação da caixa, mas este possui a função de lixeira, onde são depositados excrementos ou
materiais que não foi possível retirar da colmeia, servir de espaço para refugio de abelhas nos
momentos das divisões, e principalmente ser o espaço onde as abelhas constroem o tubo de
acesso ao ninho. Nele são fixadas varetas de madeira com espessura de 1 cm x 1 cm, dispostas
a cada 2 cm, criando o espaço de refugio, lixeira e entrada. Nos casos de abolir essa peça a
entrada para a colmeia é feita diretamente no ninho.
Em cima do ninho se acrescentada uma melgueira com o mesmo tamanho e altura dos
módulos, se diferenciando apenas por possuir uma base perfurada, para circulação das abelhas
do ninho para a melgueira. Quando a primeira melgueira está quase preenchida pode se
adicionar outra.

21
Informação verbal: WEGRZINOSKI, J. C., Mafra (SC), 2015; GOWACKI, F. J., Laranjeiras do Sul (PR),
2015.
41

Figura 5 – Colmeia vertical para guaraipo, com melgueira de produção e de divisão.

Fonte: Elaborado pelo autor, 2015.

Com a colmeia acima apresentada é possível iniciar divisões somente com o fundo
(porão), ninho e melgueira de divisão. Quando as abelhas não conseguem encher as
melgueiras de divisão pode optar por retirar 2 a 3 potes de mel desde que intactos colocando-
os na alça ninho. Conforme o desenvolvimento da colmeia se acrescenta, o sobreninho e mais
tarde a(s) melgueira(s). Essa colmeia possui alguns aspectos positivos; pode ser adequada a
divisão de famílias, quando utilizado melgueira repartida ao meio, ou melgueira inteira
quando utilizada na produção de mel, além de permitir o aumento da colmeia em casos de
super produção, assim a colmeia com uma melgueira apresenta 10,40 L, acrescentado mais
uma melgueira passa a ter 13,60 L. Acima da melgueira é colocada uma membrana plástica
preta que impede que a tampa fique fortemente aderida a melgueira, facilitando as vistorias da
mesma.
Na figura 6 é apresentado o modelo de caixa horizontal. Esta colmeia é característica
pela facilidade na construção, pois apresenta poucas peças e detalhes consistindo em um
retângulo de tabuas formado pelas dimensões de 40 cm de comprimento, 17 cm de largura e
15 cm de altura. O fundo é fixado por pregos ao retângulo, e a tampa pode ser fixada por
dobradiça ou simplesmente pode ser colocada sobre a caixa sem fixadores. Os
meliponicultores estão recorrem as dobradiças e esquemas de fechos, pois estes dispositivos
dão segurança as colmeias, impedindo os ninhos sofram danos em acidentes como quedas, ou
42

mesmo impedido a predação por animais. E comum que ventos fortes ou mesmo animais
derrubem as caixas dos cavaletes ou de seus lugares no meliponário.
Conforme no exemplo da caixa vertical, onde na base se fixam madeirinhas que
servem de abrigo durante as divisões, neste modelo de colmeia pode optar por pregá-las
diretamente no fundo ou construir um estrado, formando canais de circulação importantes
principalmente nos momentos de divisões, visto que impedem o contato dos discos de cria
com o fundo da caixa. Ele permite a circulação das abelhas que fazem a manutenção e
higienização garantindo maior sucesso nas multiplicações.
O manejo da caixa horizontal simples é relativamente fácil, pois as medidas permitem
o desenvolvimento da postura, invólucro e potes de alimento segundo o padrão da abelha.
Como a caixa possui pouca altura, os discos de cria que variam em numero de 5 a 8 nas
colmeias racionais são alocados de forma que em seu ápice chegam próximo a tampa. É
importante destacar a diferença de manejo quando se utiliza a caixa horizontal, visto que para
obter discos nascentes é necessário desmontar com cuidado o invólucro que encobre a
postura, posteriormente utilizando espátulas de ponta torta se alça (suspende) todo o conjunto
de discos de cria para encontrar os nascentes na parte de baixo. Durante este processo pode
ocorrer acidentes que machuque ou até mesmo leve a morte da rainha, assim quando possível
deve primeiramente capturar a rainha e colocá-la numa gaiola até o termino da operação. Para
pessoas com pouca experiência de manejo nestes modelos de colmeias, realizar as atividades
de divisão pode ser um pouco difícil, enquanto na colmeia vertical o manejo é executado na
parte de baixo abrindo a caixa entre o porão e o ninho, sendo encontrados os discos nascentes
nesta parte.
43

Figura 6 - Modelo de caixa horizontal simples para manejo de guaraipo.

Fonte: Elaborado pelo autor, 2015.

5.10 MÉTODOS DE DIVISÃO DE FAMÍLIA

Apesar de não haver um período comprovado como correto para realização de divisões
de famílias, ocorrendo preferência de meliponicultor para meliponicultor, os indicativos
apontam que o período indicado para realização do procedimento se inicia no mês julho e vai
até final de outubro, apesar de ser alcançado bons resultados até o mês de janeiro, a partir do
qual não se indica mais as divisões. Nas regiões muito frias o mês de julho pode não ser muito
bom devido a diminuição das atividades de postura e por consequência o menor número de
discos de cria e, portanto de abelhas nascentes. Mesmo em período considerado inverno pode
ser realizado divisões, desde que se escolha um dia com temperaturas mais elevadas e de bom
sol. Cabe a observação de que muitas vezes a na época considerada ideal para as divisões, as
colmeias não estão com material suficiente, principalmente discos de cria maduros tornando
necessário retardar o processo.
Blochtein et al., (2008, p. 27) indicam que as divisões de colônias podem ser
realizadas quando na colmeia estão presentes seis ou mais discos de cria, os quais devem
conter no mínimo 200 células em cada um, não é necessária a verificação de realeira visto que
a guaraipo é uma Melipona, onde a realeira é inexistente.
Nas divisões sempre se deve ter clareza de qual disco de crias são nascentes (postura
antiga) e quais são os discos não nascentes (postura recente) visto que destas informações
depende o método de divisão a ser adotado. “A cor e o aspecto dos favos de cria variam de
44

acordo com a idade dos imaturos. Os favos mais claros e com paredes de cerume fino (às
vezes translúcido) são de cria nascente. Em contrapartida, os favos mais escuros são de cria
mais nova”, (BLOCHTEIN et al., 2008, p. 27), conforme observado na figura 7. O Aspecto
não comentado por Blochtein e Teixeira (2008) é o habito peculiar de a rainha de M. bicolor
schencki, realizar a postura sempre na parte superior do ninho, fincando os discos maduros na
parte inferior.

Figura 7 - Diferença na coloração dos discos de cria novos e maduros da abelha guaraipo.

Fonte: Elaborado pelo autor, 2015.

Locatelli relata uma exitosa experiência de divisões de famílias feitas na localidade de


santa Rosa de Lima- SC, com material retirado de uma colmeia de quaraipo que se encontrava
e uma arvore que estava morrendo por ter sido atingida por um raio. Da colmeia de Guaraipo
se fazia um resgate parcial, retirando discos nascentes, cerúmen e potes de alimentos e
abelhas. Os materiais retirados eram são alocados em uma colmeia nova e restante do o
enxame continua no mesmo local, sempre reconstituindo a abertura da arvore, com cipó,
argila e palha. Segundo o relato depois de algum tempo de manejo o enxame que estava nesta
arvore foi pilhado e destruído. (Informação verbal) 22 . A técnica citada não deve ser
empregada indiscriminadamente, pois colmeias na natureza devem ser preservadas.
Existem inúmeras variações dos procedimentos de divisão de família, mas usualmente
os meliponicultores têm empregado os métodos 1:1, 2:1 e o 3:1. O primeiro número de cada
22
Informação verbal: LOCATELLI, J. C., Balneário Rincão (SC), 2015.
45

intervalo representa o número de colmeias matrizes utilizados na formação da colmeia filha, e


o segundo número representa a quantidade de colmeias filhas que serão produzidas. O
meliponicultor de posse destas informações, com sua pratica de manejo pode levar a melhores
tomadas de definições sobre qual método utilizar em cada momento, e qual matriz doara
determinado material. Assim, os métodos podem sofrer adaptações conforme a quantidade de
recursos disponíveis e estagio de desenvolvimento da matrizeira. As divisões são feitas
utilizando dois discos maduros, quando existe abundancia de recursos pode-se optar por usar
três. A seguir são apresentados os métodos mencionados anteriormente e sua lógica de
execução: (A) Método 1:1 – O método é caracterizado por uma colmeia matrizeira ser
responsável pela criação de uma colmeia filha. Uma matriz doa os discos de cria maduros,
campeiras e alimento. Após os alocar os materiais na colmeia filha, deve realizar a troca de
lugar, passando a colmeia filha a ocupar a posição da colmeia matriz que é deslocada para no
mínimo 5 metros e distancia da sua antiga posição, recomendação que deve ser adotada para
qualquer método utilizado, visto que impede que as abelhas localizem a colmeia matriz e
retornem para ela. (B) Método 2:1 – Emprega duas colmeias matrizes na criação da colmeia
filha. Uma doa discos de cria e alimento e a outra doa campeiras. Após a caixa filha receber
os materiais ela ocupa o lugar da matriz, recebendo assim as abelhas que estavam
forrageando, enquanto que a caixa velha é alocada em outro local. (C) Método 3:1 – Emprega
três matrizes na formação da colmeia filha. Cada uma das três matrizes contribui com um
material, uma doa discos de cria, a outra o alimento, e a terceira doa campeiras, assim dando
lugar a colmeia filha. A matriz que doou campeiras é alocada conforme orientação do
primeiro método. O método 3:1 é também conhecido como método fracionado, no qual se
utiliza três colmeias matriz para formar uma colmeia filha. Assim a matriz A doa discos de
cria, ficando com alimento e campeiras, matriz B doa campeiras, ficando com discos
nascentes e alimento e a matriz C doa alimento, ficando com discos nascentes e campeiras.
Resumindo, se usa discos nascentes da matriz A, campeiras da matriz B e melgueira de matriz
C. Desta forma as colmeias não se enfraquecem tanto e rapidamente retornam ao estagio de
desenvolvimento que se encontravam antes da divisão, podendo novamente ser divididas
antes mesmo do prazo de dois meses. (Informação verbal)23. A divisão nesta técnica é feita
utilizando caixa de módulo tipo vertical, primeiramente utilizando um modulo e uma
melgueira, conforme a evolução da colmeia se agrega novos módulos.

23
Informação verbal: LOCATELLI, J. C., Balneário Rincão (SC), 2015 e VENSON, J., Balneário Rincão (SC),
2015.
46

Variações e adaptações nos métodos são comuns entre meliponicultores experientes,


apesar de alguns meliponicultores não indicarem a técnica da orfandade, outros relatam ter
obtido êxito, restando aqui retratar o procedimento e deixando a decisão de utilizar ou não a
técnica para o meliponicultor. Na técnica da orfandade se retira a rainha poedeira e discos de
cria verdes (jovens) alocando estes materiais em uma nova colmeia. A colmeia matriz neste
fica órfã, além de doar grande parte de suas campeiras, visto que a colmeia filha fica no local
da antiga. A colmeia velha é levada para outro local portando os discos nascentes, dos quais
uma nova rainha emerge e posteriormente é fecundada dando continuidade a colmeia. A
técnica da orfandade ocorre quando existe somente uma rainha na colmeia matriz.
Divisões utilizando rainhas fisiogástrica, ou seja, rainha poedeira e discos novos pode
ser também realizada quando existe mais de uma rainha poedeira, nestes casos tanto a matriz
como a colmeia filha ficam com rainha. As abelhas nascentes da matriz serão capazes de
utilizar o pólen, mel e a cera existentes na colmeia para reequilibrar a mesma. As divisões
realizadas com discos nascentes demoram aproximadamente de 25 a 30 dias para a formação
de rainha poedeira. (Informação verbal)24.
Wegrzinoski (2013) desenvolveu um método denominado JCW (iniciais do precursor
do método) para a divisão de colmeias, utilizando discos de cria nascentes da abelha guaraipo
e mini disco de cria (disco recém formado) da abelha mandaçaia, além de campeiras da abelha
ora mencionada. No método JCW de divisão famílias guaraipo, se utiliza dois discos de cria
maduros, cada um com diâmetro aproximado de 10 cm. Pode se obter sucesso com apenas um
disco de cria, mas nestes casos a nova colmeia se desenvolve mais lentamente, requerendo
atenção do meliponicultor, além de algum reforço com disco de cria em determinados
momentos.
O numero de campeiras nestas divisões variam de 80 a 100 abelhas. Essa quantidade
de campeiras é suficiente, visto que elas apenas possuem função de; reestruturar a nova
colmeia fazendo o invólucro em torno dos discos nascentes, realizar a manutenção destes,
fazer a limpeza da colmeia e a abastecer com provisões até que as guaraipos nasçam e
comecem a tomar conta da colmeia.
O método também prevê no intervalo de 20 a 30 dias o conflito diglóssico, uma briga
interna, pois as operarias de M. bicolor schencki e as de M. quadrifaciata possuem
características divergentes quanto à organização do invólucro, assim cada espécie tende a
reformatar utilizando seu padrão. O conflito dura de 15 a 20 dias, depois disso as

24
Informação verbal: GOWACKI, F. J., Laranjeiras do Sul (PR), 2015; SCREMIN, R., Urussanga (SC), 2015.
47

características da guaraipo vão prevalecendo visto que as mandaçaias entram na faze final da
vida. Também é indicado ter colmeias fortes de guaraipo no meliponário, que possuem a
função de suprir a demanda de zangões para fecundar a nova rainha.
O sucesso do método depende da linhagem de mandaçaia utilizada, sendo
recomendadas as espécies M. quadrifaciata quadrifasciata ou a hibrida. Não se recomenda a
espécie M. quadrifaciata anthidioides, por ser uma espécie temperamental, agressiva, e
portanto, divisões utilizando esta espécie tendem ao fracasso. (Informação verbal)25. Neste
método é importante retirar todo material necessário para a divisão de apenas uma colmeia de
mandaçaia, desde o mini disco de cria, campeiras e cerúmen, pois isso evita a rejeição do
ninho. Material alheio a colmeia de mandaçaia deve ser somente os discos nascentes de
guaraipo.
Outro aspecto indicado por Wegrzinoski para obtenção de sucesso com o método JCW
é a utilização do mini disco de mandaçaia com poucas células, recém formado. O disco recém
formado tem por objetivo incentivar as operarias a cobrir com invólucro os discos utilizados
na divisão. Além do mais, isso permite que todas as guaraipos nasçam antes que as
mandaçaias, principalmente uma nova rainha proveniente da casta guaraipo, a qual será
fecundada antes do nascimento das poucas mandaçaias.
A técnica vem sendo utilizada desde 2005 não ocorrendo cruzamento entre as
espécies, e segundo o precursor da técnica, o objetivo é conseguir formar mais colônias de
guaraipo utilizando menos recursos, assim contribuindo na recuperação do numero de
colmeias da espécie. (WEGRZINOSKI, 2013, p. 44).
O êxito em qualquer método de divisão de colmeia pode ser alcançado desde que
tomados os devidos cuidados: Danificar o mínimo possível os discos de cria, em especial os
novos que possuem alimento larval que ao ser exposto ao ambiente exala um odor
caracterísco atraindo a mosquinha de nome popular forídeo (Pseudohypocera kerteszi)
principal inimigo das abelhas sem ferrão; utilizar somente potes de alimento lacrados, potes
perfurados não devem ser adicionados a nova colmeia, havendo a necessidade de alimentação
melhor realizar no dia posterior a divisão, aprovisionando a colmeia com xarope artificial;
jamais colocar discos de cria em contato direto uns com os outros ou com fundo e lateral das
caixas.
Informações sobre o controle do forídeo estão na seção inimigos naturais, apresentada
a seguir.

25
Informação verbal: WEGRZINOSKI, J. C., Mafra (SC), 2015.
48

5.11 INIMIGOS NATURAIS

Witter e Blochtein (2009, p. 15) apontam como fatores para a diminuição das ASFs, e
entre ela a guaraipo, fatores como: A ação de meleiros que destroem os ninhos; a constante
supressão da cobertura vegetal no estado; e a competição com abelhas do gênero Apis, por
recurso floristicos e abrigos onde possam nidificar. Os problemas ora mencionados são
comuns no estado do Paraná, assim como aos demais estados do Brasil.
As formigas são especialmente perigosas nos casos de guaraipos criadas em colmeias
subterrâneas, Nogueira-Neto (1997, p. 379) relata ter perdido diversas colmeias para formigas
do gênero Solenopsis, conhecidas como lavapés, observando ainda que as guaraipos não
conseguem se defender bem quando instaladas em abrigos subterrâneos. As formigas lavapés
são de pequeno porte, geralmente avermelhadas, tendo uma ferroada dolorosa, se alimentam
de doces, frutas, insetos e até mesmo carne.
Os inimigos naturais mais comuns da guaraipo são o pica-pau (Melanerpes candidus)
a abelha limão (Lestrimelitta limão), (informação verbal)26, a irara (Eira barbara), lagartixa
(Hemidactylus mabouia), mosca soldado (Hermetia illucens), e principalmente o forídeo
(Pseudohypocera kerteszi) o qual merece maior atenção.( informação verbal)27.
A instalação da isca anti forídeo no interior de colmeia é de aspecto duvidoso, e os
meliponicultores divergem neste aspecto. Alguns preferem instalar a isca no momento da
divisão, outros apontam a isca como um atrativo para a praga, visto que as armadilhas
utilizam vinagre em seu interior, exalando forte cheiro acido que atrai a mosquinha. As iscas
utilizadas internamente nas colmeias consistem em pequenos fracos com 1/3 de seu volume
preenchido por vinagre de maça ou de vinho tinto, contendo em suas laterais ou tampas furos
de 1,5 a 2 mm de diâmetro, que permitem a entrada da mosquinha, mas dificultam sua saída.
Os meliponicultores que defendem que as isca interna atrai o inimigo, recomendam instalar
iscas maiores feitas a partir de garrafas pet de 250 ml, com diversos buracos de 1,5 a 2 mm
distribuídos ao redor do colo da mesma e localizados aproximadamente a 2,5 da tampa. Nela
segue o padrão de adicionar 1/3 do volume de vinagre. A instalação deve ser feita a 50 metros

26
Informação verbal: WEGRZINOSKI, J. C., Mafra (SC), 2015.
27
Informação verbal: MILACK, S., Criciúma (SC), 2015; LOCATELLI, J. C., Balneário Rincão (SC), 2015;
SCREMIN, R., Urussanga (SC), 2015 e VENSON, J., Balneário Rincão (SC), 2015;
49

de distancia do meliponário. A técnica é vista como preventiva contrariamente a técnica da


isca interna que busca capturar colmeias já infestadas.
Em casos de alta infestação se procede com uma limpeza da caixa, sendo necessária a
substituição do fundo, onde o odor característico fica impregnado na madeira, se tornando um
atrativo para a entrada de mais forídeos. Em altas infestações, onde já existem larvas em potes
de alimento é melhor salvar somente o ninho, realocando-o em uma nova colmeia. É
necessário coletar as abelhas saudáveis que estavam na caixa antiga, passando-as para a nova
colmeia.
A principal pratica para o controle do forídeo é o manejo adequado, onde as divisões
são realizadas com cuidado, sem danificar os discos de cria e potes de alimento. A
manutenção do espaço entre os discos é fundamental para evitar a postura de ovos entre
discos. Durante a alimentação artificial com xarope não se deve colocar grande quantidade,
visto que na falta de potes de mel as abelhas misturam o xarope aos potes reservados para o
pólen, aumentando a fermentação e atraindo os forídeos.

5.12 FATORES LIMITANTES E ESTIMULADORES DE PRODUÇÃO

A alimentação energética normalmente é fornecida com base no xarope. Nogueira-


Neto (1997, p. 194) propõe que a alimentação energética da guaraipo (M. bicolor schencki),
tenha 50% de água e 50% de açúcar, “pois ao evaporar parte da água essas abelhas umedecem
mais o ar, na sua colmeia. Para elas isso é importante,” (NOGUEIRA-NETO, 1997, p. 194),
para outras espécies este autor indicava uma proporção maior de açúcar, mas como ele
percebeu a importância da umidade para a espécie em questão recomendava a proporção 1:1.
Outras recomendações na alimentação energética são citadas. Uma receita é baseada
na proporção (2:1), 2 kg de açúcar para um 1 litro de água, acrescentando plantas aromáticas.
O preparo seguir as seguintes etapas: colocar o açúcar e a água em recipiente metálico, levar
ao fogo mexer a mistura para que o açúcar se dissolva sem se caramelizar. Quando iniciar a
fervura acrescentar alguns galhinhos pequenos de plantas aromáticas (hortelã, alecrim) e
deixar ferver. Quando existir a possibilidade de acrescentar mel de Apis, adicionar 1 colher.
Apesar do meliponicultor em alguns momentos ter utilizado gotas de limão no preparo da
solução esta não é uma pratica recorrente, mesmo tendo observado boa aceitação pelas
50

abelhas. Esta dieta energética é utilizada pelo meliponicultor a mais de 20 anos. (Informação
verbal)28.
Sobre a utilização de suco de limão no preparo de xarope para alimentação de abelhas
do gênero Apis, Brighenti et al. (2011, p. 301) constatou que ao adicionar 3,6 mL de suco de
limão Tahiti (Citrus latifólia), em uma solução (1:1) de água e açúcar cristal no inicio do
preparo do xarope, consegue-se a inversão de 21,0 % do açúcar, não sendo necessário a
correção do pH na solução final. Esta é uma recomendação para abelhas do gênero Apis, que
pode ser empregada a guaraipo, já que o pH médio do mel de Apis com 3,30 é praticamente
igual o valor encontrado no estudo de Borsato (2010, p. 3) onde o valor médio pH das três
amostras do mel de guaraipo foi de 3,39.
Seria importante verificar a aceitação do xarope em diferentes concentrações de suco
e espécies de limão de acordo com a disponibilidade dos produtores, sabendo-se que no o
meliponicultor deve ficar atento ao aumentar a quantidade de suco de limão no xarope, pois a
utilização de uma dieta mais ácida pode causar distúrbios fisiológicos como, “mudança
comportamental, rejeição de alimento, aumento do volume do abdômen, redução da
longevidade, morte prematura dos imagos, interferência na capacidade de voo e
forrageamento.” (BRIGHENTI et al. 2011, p. 301). A seguir a tabela 3 serve de parâmetro no
do aumento da dosagem de suco de limão com o respectivo aumento na inversão de açúcar.

Tabela 3 - Porcentagem da sacarose invertida (açúcar redutor – AR) e pH das soluções de


açúcar cristal submetidas a hidrólise com diferentes quantidades de sucos de limões Galego,
Tahiti ou Cravo.

Fonte: Brighenti et al. (2011, p. 300)

28
Informação verbal: WEGRZINOSKI, J. C., Mafra (SC), 2015.
51

A dieta energética é necessária quando adotado manejo intenso de divisões, houver


falta de recursos florais em determinadas épocas do ano, ou no caso da colmeia apresentar
pouco alimento de reserva.
Dieta proteinada com base de pólen de Apis, ração a base de soja e a base de
leveduras, pode ser oferecida quando a disponibilidade de pólen está baixa, porém existem
meliponicultores que preferem manter as colmeias somente com a dieta energética,
acreditando que ao oferecer pólen de outras espécies podem estar influenciando na expressão
gênica da espécie, alterando seu padrão de forrageamento.
A proteção contra incidência de ventos fortes, caixas com bom isolamento térmico,
são fatores importantes no bom desenvolvimento das colmeias de guaraipo, mas não são
limitantes. Os dois principais fatores limitantes são a pouca umidade e principalmente a
incidência de luz solar direta (radiação), as quais para a guaraipo são extremamente
prejudiciais. Considerando estes aspectos as colmeias de guaraipo devem ser instaladas em
lugares próximo a água, muito bem sombreados e preferencialmente próximo ao solo, de 0,5 a
1 metro de altura. As colmeias podem ser pintadas externamente com tinta a base de água,
dando preferência para cores claras, lembrando que isto não esta ligado diretamente ao
desenvolvimento das colmeias, mas sim relacionado a sua durabilidade.

5.13 PRODUTOS APÍCOLAS OBTIDOS DA GUARAIPO

O mel e o pólen das abelhas sem ferrão possuem características diferentes das
observadas na Apis mellifera. O mel de meliponíneos possui teor de água de 28 a 30%,o que o
torna sujeito a fermentação, já o pólen normalmente é uma massa fermentada. A fermentação
do pólen em algumas espécies o deixa em desvantagem ou mesmo impossibilita o uso
comercial, contrariamente ao que acontece com o pólen de Apis. (DRUMOND, 2013, p. 3).
Chagas e Carvalho (2005, p. 35) contrariando Drumond, afirmam que o pólen da uruçu
nordestina (Melipona scutellaris) produto que normalmente se apresenta como massa
fermentada, pode ser consumido na forma desidratada, ou misturado ao mel, orientando a
jamais consumir pólen mofado. Em outras espécies o pólen de abelhas sem ferrão possui
excelente sabor, como no caso de algumas Scaptotrigonas. Quando o pólen não foi coletado
não é necessária suplementação proteica das colmeias. (Informação verbal)29. A colheita e

29
Informação verbal: WEGRZINOSKI, J. C., Mafra (SC), 2015.
52

utilização do pólen normalmente não é executada, necessitando um melhor aproveitamento


deste recurso.
Tradicionalmente, o mel de abelhas sem ferrão é usado medicinalmente para curar
problemas físicos e doenças espirituais. Uma possível razão para tal aplicação medicinal é que
o mel é normalmente mantido em potes de cerume (uma mistura de cera e resina). Durante o
armazenamento, o mel pode adquirir alguns componentes do cerúmen, conhecido por ter
diversos efeitos medicinais. Por esta razão, quando se bebe o mel de abelhas sem ferrão, pode
ser, na verdade a ingestão de um composto de mel e própolis. (DRUMOND, 2013, p. 3).
De modo geral existe uma orientação da melhor época para extrair o mel, mas ela
varia de região para região, sendo mais apropriado esperar duas semanas após o auge da
produção de flores, para evitar que o mel esteja imaturo. Devido as abelhas possuírem nichos
de exploração diferenciados, num mesmo meliponário a época de colheita pode não coincidir
entre duas espécies de abelhas. (NOGUEIRA-NETO, 1997, p. 254). A colheita do mel é
realizada até o final de novembro para região de Mafra-Sc, mas para cada local deve-se
observar as épocas de floradas. Em casos que o mel é retirado após o final das floradas se
deve fazer alimentação energética durante o inverno.

5.14 TÉCNICAS DE CONSERVAÇÃO DO MEL

Técnicas tais como pasteurização e desumidificação têm sido utilizadas para


estabilizar o mel de meliponíneos, mas sempre com perda de algumas propriedades
particulares do produto. A técnica de maturação descrita por Villas-Bôas (2012, p. 78)
consiste em controlar os processos fermentativos causados por leveduras presentes no mel.
Não se sabe ao certo a origem do da técnica, mas indígenas Maias tinham o costume de
consumir o mel fermentado, na atualidade os meliponicultores maranhenses empregam a
técnica. Na técnica da maturação o mel passa por um processo de fermentação controlado,
limitando a entrada de ar na garrafa onde está armazenado. O produto final não apresenta
riscos a saúde visto que estabiliza a fermentação, ficando um pouco mais ácido e com leve
teor alcoólico. A aceitação do mel maranhense já é comprova em feiras no Maranhão e
eventos de gastronomia. O produto estável pode ficar na prateleira para venda sem risco de
estragar.
A técnica de maturação descrita por Villas-Boas (2012, p. 78) e Drumond (2013, p. 8),
ocorre em quatro etapas:
53

a) O mel colhido e armazenado em garrafas PET de 500 ml;


b) As garrafas são armazenadas em ambiente escuro, em caixa de isopor, em
temperatura estável (aproximadamente 30oC); No caso da região sul o processo pode levar
mais tempo dependendo a época do ano apresenta temperaturas mais amenas.
c) Quinze dias após a colheita as tampas das garrafas são levemente afrouxadas,
permitindo a liberação do gás carbônico formado pela fermentação. O procedimento é
repetido semanalmente por um período de 3 a 6 meses, até que seja observada a estabilização
da fermentação. Essa condição é observada quando o colarinho formado pela espuma da
fermentação se adere à garrafa, ou seja, não se move com a inclinação do recipiente;
d) O mel maturado esta pronto para consumo e pode ser envasado, rotulado e
comercializado.
Drumond (2013, p. 8) recomenda ainda um mês de margem de segurança, no qual o
mel possa ser estabilizado por completo, pois a exposição à luz direta, variação brusca de
temperatura e pressão pode reiniciar o processo fermentativo.
54

6 CONSIDERAÇÕES FINAIS

O trabalho permitiu aprofundar os conhecimentos sobre a meliponicultura, por não


enfocar somente um aspecto da criação dos meliponíneos propiciou na parte introdutória
compreender as raízes históricas da técnica, intimamente ligada com populações tradicionais
do continente latino americano se destacando os povos Maias na domesticação da M. beecheii
e no Brasil principalmente os guaranis com suas nomenclaturas que sintetizam aspectos
morfológicos das abelhas e dos ninhos que proveem, além de hábitos comportamentais dos
meliponíneos. Permitiu também permear áreas da microbiologia do mel e do pólen apontando
os aspectos como a eficácia do mel de meliponíneos sobre micro-organismos patógenos. O
aspecto inovador do trabalho consiste em reunir grande numero de informações úteis sobre a
biologia e o manejo da M. bicolor schencki, propiciando um material de consulta que embora
apresente algumas informações somente testadas empiricamente pelos meliponicultores têm
contribuído na recuperação do numero de colmeias da espécie. Deste modo, alem do esforço
somado aos meliponicultores em recuperar a espécie nos ambientes em que ela se encontra
praticamente extinta, o trabalho permite que novos meliponicultores se embasem
tecnicamente para iniciar na criação da espécie. Os aspectos empíricos expostos no trabalho
são campo fecundo para investigação cientifica a qual possui a função de ratificar ou a refutar
as conclusões aqui alcançadas.
55

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