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RELAÇÕES DE TRABALHO
Tais deveres por parte do empregador são fundamentais para garantia dos
direitos trabalhistas de seus empregados, por isso, caso descumpridos, refletirão danos
que poderão ser observados de óticas diferentes, sejam patrimoniais ou até mesmo
extrapatrimoniais.
1. DO TEMPO
O tempo é uma das poucas coisas que não conseguimos recuperar. Depois que
se passa, não há quantia pecuniária que o compre novamente nem o faça vivê-lo de
outra forma que não a que você efetivamente viveu, em outras palavras “[...] o tempo
total de vida de cada pessoa é um bem finito individual; é o capital pessoal que, por
meio de escolhas livres e voluntárias, pode ser convertido em outros bens materiais e
imateriais, do qual só se deve dispor segundo a própria consciência”1.
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DESSAUNE, Marcos. Teoria Aprofundada do Desvio Produtivo do Consumidor: O prejuízo do tempo
desperdiçado e da vida alterada. 2. ed. rev. e ampl. Vitória: Edição Especial do Autor, 2017. p. 179.
Assim como outros objetos tutelados por outras modalidades de
extrapatrimoniais abarcados pelo direito, o tempo não pode ser recuperado, ou seja, seu
status quo ante definitivamente não será alcançado. Porém, mesmo que essa perda do
tempo seja irrecuperável, compensada deverá ser, ao menos é o que sugere a teoria que
iremos comentar.
Nessa toada, foi trazida por Marcos Dessaune, inicialmente para o direito do
consumidor, a “Teoria do Desvio Produtivo”, que é constatada quando:
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DESSAUNE, Marcos. Desvio Produtivo do Consumidor: o prejuízo do tempo desperdiçado. São Paulo:
Revista dos Tribunais, 2011.
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GAGLIANO, Pablo Stolze. Responsabilidade civil pela perda do tempo. Jus Navigandi, Teresina, ano 18,
n. 3540, 11 mar. 2013. Disponível em: https://jus.com.br/artigos/23925>. Acesso em: 24 agosto 2021
familiar ou realização e preparo de outra atividade que traria retorno material ou bem-
estar social. Com isso, cabe ao indivíduo a escolha de como utilizará seu tempo.
Por isso, defende essa teoria que, condutas que façam o indivíduo perder parte
de seu tempo ou ainda desviar seu aproveitamento de tempo para realizar uma outra
atividade que se fez necessária devido a uma negligência ou serviço mal prestado da
outra parte, ensejem indenização pecuniária, visto que a recuperação do tempo
desprendido não poderá ser alcançada. Nesse sentido, afirma Menelick de Carvalho
Netto que:
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TJ-RJ - APL: 00105322920198190045, Relator: Des(a). CHERUBIN HELCIAS SCHWARTZ JÚNIOR, Data de
Julgamento: 21/01/2021, DÉCIMA SEGUNDA CÂMARA CÍVEL, Data de Publicação: 28/01/2021;
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TJ-SP - AC: 10085267620198260032 SP 1008526-76.2019.8.26.0032, Relator: Maria Lúcia Pizzotti, Data
de Julgamento: 22/02/2021, 30ª Câmara de Direito Privado, Data de Publicação: 22/02/2021;
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DESSAUNE, Marcos. Teoria aprofundada do desvio produtivo do consumidor. O prejuízo do tempo
desperdiçado e da vida alterada.
Com isso, presentes esses requisitos essenciais, tem-se que o consumidor do
produto ou serviço sofreu um dano ao seu tempo útil que guarda total relação com a
falta de cumprimento dos preceitos legais pelo fornecedor e, por conseguinte, merece
ser compensado por esses danos.
Dessa maneira, tem-se que, do mesmo modo que o fornecedor, quando faltar
com suas obrigações, fazendo com que o consumidor perca tempo resolvendo um
problema por ele criado ou até mesmo ingressando em juízo para reaver direitos - que
pelo fornecedor deveriam ser cumpridos - seja indenizado, o trabalhador, nos casos
onde o empregador por ato omissivo ou comissivo deixar de realizar os pagamentos dos
encargos trabalhistas e previdenciários, suas verbas rescisórias ou até mesmo
negligencia a devida anotação em sua Carteira de Trabalho e Previdência Social (CTPS)
ao qual fazia jus, também possam ensejar indenização com fundamento na “Teoria do
Desvio Produtivo”.
Insta observar que nesses casos, presente deve se fazer o requisito principal da
aplicação dessa teoria (dada sua responsabilização objetiva e in re ipsa), o nexo de
causalidade entre a omissão ou comissão do empregador que ensejou a perda do tempo
útil do trabalhador, pois caso tivesse realizado os pagamentos de maneira correta, assim
como as devidas anotações na CTPS de seu empregado, este não teria que desprender
tempo para reaver seus direitos e garantias que deveriam anteriormente serem
cumpridos.
Recentes decisões dos órgãos da esfera trabalhista têm, acertadamente,
entendido pela aplicação dessa teoria em função da proteção do trabalhador, como a
Juíza do Trabalho Substituta da 53ª Vara do Trabalho do Rio de Janeiro, Rossana
Tinoco Novaes, por meio do processo 0100540-78.2019.5.01.0053, onde a sentença
datada de 11/07/2019, tratou de reconhecer o desvio produtivo do tempo do trabalhador
para pleitear em juízo a devida anotação em CTPS:
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TRT1 – RTSum 0100540-78.2019.5.01.0053, Juíza do Trabalho Substituta: ROSSANA TINOCO NOVAES,
Data do Julgamento: 11/07/2019, 53ª Vara do Trabalho do Rio de Janeiro.
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TRT2 – RTord 1000887-85.2018.5.02.0088, Juiz do Trabalho Substituto: GUSTAVO CAMPOS
PADOVESE, Data do Julgamento: 29/01/2019, 88ª Vara do Trabalho de São Paulo.
Não obstante, a primeira decisão a qual se tem notícia da aplicação desta teoria
no direito do trabalho, que desencadeou o reconhecimento da valorização do tempo do
trabalhador, advém do Tribunal Regional do Trabalho da 17ª Região, que fora
recentemente mantida pelo Tribunal Superior do Trabalho, no Processo 1380-
97.2018.5.17.0141, com sentença datada de 24/5/2021. Nesses autos, o TRT da 17ª
Região entendeu por aplicar a teoria do desvio produtivo pela perda de tempo que o
trabalhador teve ingressando em juízo para reaver seus direitos básicos, como a
anotação em Carteira:
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TST – AIRR 1380-97.2018.5.17.0141, Relatora: KÁTIA MAGALHÃES ARRUDA, Data do Julgamento:
24/05/2021, Sexta Turma, Data da Publicação: 28/05/2021.
Nego provimento.”12
Com isso, podemos extrair que tais decisões, reconhecendo que, ao deixar o
empregador de realizar as devidas anotações na Carteira de Trabalho e Previdência
Social do empregado, aquele sonegou suas verbas rescisórias e seu período de
contribuição. Fato esse, que prejudica o trabalhador até mesmo na busca de um novo
emprego.
Desse modo, por meio da brilhante teoria redigida pelo advogado Marcos
Dessaune13, podemos concluir que o trabalhador, assim como o consumidor - apesar de
não conseguir recuperar o tempo perdido, devido a inalcançabilidade do status quo ante
desse objeto tutelado - tem direito a ser ressarcido pelo tempo que poderia estar
utilizando em outras atividades mais produtivas ou de seu agrado, porém teve de gastá-
lo para buscar direitos que foram infringidos por meio do descumprimento dos deveres
do empregador/fornecedor.
REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS
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TST – AIRR 1380-97.2018.5.17.0141, Relatora: KÁTIA MAGALHÃES ARRUDA, Data do Julgamento:
24/05/2021, Sexta Turma, Data da Publicação: 28/05/2021.
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DESSAUNE, Marcos. Teoria Aprofundada do Desvio Produtivo do Consumidor: O prejuízo do tempo
desperdiçado e da vida alterada. 2. ed. rev. e ampl. Vitória: Edição Especial do Autor, 2017.
DESSAUNE, Marcos. Teoria Aprofundada do Desvio Produtivo do Consumidor: O
prejuízo do tempo desperdiçado e da vida alterada. 2. ed. rev. e ampl. Vitória: Edição
Especial do Autor, 2017.
GAGLIANO, Pablo Stolze. Responsabilidade civil pela perda do tempo. Jus Navigandi,
Teresina, ano 18, n. 3540, 11 mar. 2013. Disponível em:
https://jus.com.br/artigos/23925> Acesso em: 24 agosto 2021.