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2020

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19 de Fevereiro de 1998. É proibida a duplicação ou reprodução deste volume ou qualquer parte deste livro,
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sem permissão expressa da Editora.

Título | Psiquiatria para Generalistas


Editor | Guilherme Melo
Diagramação | Deborah Silva
Capa | Mateus Machado
Revisão ortográfica | Lindsay Viola
Conselho Editorial | Caio Vinicius Menezes Nunes
Paulo Costa Lima
Sandra de Quadros Uzêda
Sheila de Quadros Uzêda
Silvio José Albergaria da Silva

Dados Internacionais de Catalogação na Publicação (CIP)


Tuxped Serviços Editoriais (São Paulo-SP)

S237p Santos, Mikkael Duarte dos.

Psiquiatria para Generalistas - Do Sintoma ao Tratamento / Mikkael Duarte dos Santos. - 1. ed. - Salvador,
BA : Editora Sanar, 2020.
832 p.; 16x23 cm.

Inclui bibliografia.
ISBN 978-65-87930-48-0

1. Generalistas. 2. Psiquiatria. 3. Sintomas. 4. Tratamento. I. Título. II. Assunto. III. Santos, Mikkael
Duarte dos.
CDD 616.89
CDU 616.89

ÍNDICE PARA CATÁLOGO SISTEMÁTICO


1. Medicina: Psiquiatria.
2. Psiquiatria.

Ficha catalográfica elaborada pelo bibliotecário Pedro Anizio Gomes CRB-8 8846

REFERÊNCIA BIBLIOGRÁFICA
SANTOS, Mikkael Duarte dos. Psiquiatria para Generalistas - Do Sintoma ao Tratamento. 1. ed. Salvador, BA:
Editora Sanar, 2020.

Editora Sanar Ltda.


Rua Alceu Amoroso Lima, 172
Caminho das Árvores,
Edf. Salvador Offiace & Pool, 3º andar.
CEP: 41820-770, Salvador - BA.
Telefone: 0800 337 6262
sanarsaude.com
atendimento@sanar.com.br
Autor e Editor-Chefe

Mikkael Duarte dos Santos


Mestre em Saúde da Família pela Universidade Federal do Ceará. Residência
médica em Psiquiatria pela Secretaria de Saúde de Sobral. Graduado em medi-
cina pela Faculdade de Medicina de Juazeiro do Norte. Preceptor no programa
de Residência Médica de Psiquiatria em Sobral. Professor e coordenador de psi-
quiatria e do internato de saúde mental das faculdades de medicina da UFC e
UNINTA. Interconsultor de psiquiatria na Santa Casa de Misericórdia de Sobral.
Psiquiatra assistente da unidade de internação psiquiátrica no Hospital Dr. Es-
tevam Ponte. Psiquiatra assistente no CAPS II do município de Sobral.

Autores

Alice Aguiar Teixeira


Formada em Medicina pela Universidade Federal do Ceará, 2009-2014. Resi-
dência médica em Psiquiatria pela Escola de Saúde Pública de Sobral-CE, 2015-
2018. Especialização em Psicoterapia Cognitivo-Comportamental pelo Instituto
Cognitivo, Santa Maria-RS (em curso).

Aline Taumaturgo Dias Soares


Geriatra com residência pelo Hospital Universitário Dr Walter Cantídio (HUWC)-
CE. Residência em Clínica Médica pelo Hosital Geral Dr César Cals de Oliveira
(HGCCO)- CE. Graduação em Medicina pela Universidade Federal do Ceará- UFC.
Especialização em Cuidados Paliativos pela UECE/ UNIMED.

Ana Luísa Barbosa Pordeus


Formada em medicina pela Universidade de Pernambuco em 2018
Médica residente em Psiquiatria pela Secretaria Municipal de Saúde de Sobral.
Andressa Müller da Conceição
Acadêmica de medicina no Centro Universitário UNINTA. Membro da Liga Aca-
dêmica de Psiquiatria e Saúde Mental (LIAPS).

Billy Ian Silva Vaz


Acadêmico de medicina no Centro Universitário UNINTA. Membro fundador da
Liga Acadêmica de Psiquiatria e Saúde Mental (LIAPS).

Cícero Arthur Borges de Carvalho


Formado em medicina pela Faculdade de Medicina de Juazeiro do Norte - CE
(Estácio-FMJ) em 2011. Residência Médica em Psiquiatria pela Secretaria Mu-
nicipal de Saúde de Sobral de 2013 a 2016. Preceptor da Residência Médica em
Psiquiatria da Escola de Saúde Pública do Ceará (ESA) em Iguatu-CE desde 2018.

Danilo de Sousa Rodrigues


Médico formado pelo Centro Universitário Uninovafapi. Residente em Psiquia-
tria pela SES – MA.

Danilo Gonçalves Dantas


Graduado em Medicina no Centro Universitário UNINOVAFAPI em 2017. Médico
residente de Psiquiatria na Escola de Saúde Pública Visconde de Saboia de So-
bral/CE.

David Alves de Albuquerque Filho


Graduado em medicina pela Universidade de Fortaleza (UNIFOR) em 2013. Resi-
dência Médica em Psiquiatria pela Secretaria Municipal de Saúde de Sobral em
2018. Com pós-graduação em transtornos alimentares e obesidade pela UNI-
FOR. Preceptor da residência de psiquiatria do Hospital Mental de Messejana e
do Hospital Universitário da Universidade Federal do Ceará (UFC).

David Cássio Ribeiro Vasconcelos


Graduado em Medicina pelo Centro Universitário Christus no ano de 2014. Re-
sidente de Psiquiatria da Rede de Atenção Integrada a Saúde Mental de Sobral.
Diana Negreiros de Sousa
Graduada em psicologia pela Universidade Federal do Ceará - UFC campus So-
bral. Residência em saúde mental pela Escola de saúde da família Visconde de
Saboya.

Eline Torres Passos


Acadêmica de medicina no Centro Universitário UNINTA. Membro fundador da
Liga Acadêmica de Psiquiatria e Saúde Mental (LIAPS).

Emanuella Sobreira Lacerda


Médica graduada na faculdade de Medicina Unichristus em 2015. Psiquiatra
titulada pela residência médica da Escola de Saúde Visconde de Sabóia, So-
bral-CE. Pós-graduanda em Terapia Cognitivo Comportamental pela Unichris-
tus. Preceptora da residência de psiquiatria no Hospital Universitário Walter
Cantídio.

Erica Camarço Saboia Fiuza


Acadêmica de medicina no Centro Universitário UNINTA. Membro fundador da
Liga Acadêmica de Psiquiatria e Saúde Mental (LIAPS).

Igor de Albuquerque Oliveira Sousa


Acadêmico de medicina no Centro Universitário UNINTA. Membro fundador da
Liga Acadêmica de Psiquiatria e Saúde Mental (LIAPS).

Isabela Cedro Farias


Graduada em Psicologia pela Universidade Federal do Ceará. Mestra em Saúde
da Família pela Universidade Federal do Ceará.

João Paulo Nunes Magalhaes de Oliveira


Médico pela faculdade de medicina de Juazeiro do Norte. Especialista em saú-
de da família pela UFC-Ce. Residência em psiquiatria pelo Instituto Municipal
Philipe Pinnel-RJ.
José Cleano Dias Arruda
Graduado em Medicina pela Universidade Federal do Ceará (UFC) - Campus So-
bral em 2011. Residência Médica em Psiquiatria pela Escola de Saúde Visconde
de Saboia (prefeitura municipal de Sobral-CE) de 2012 a 2015. Mestre em Gestão
e Saúde Coletiva pela UNICAMP. Experiência como docente do curso de Medici-
na da Uninta nas disciplinas de Psiquiatria e Bioética.

José Lino Ferreira Júnior


Graduado em Medicina pela Universidade Federal do Ceará (UFC-Fortaleza) em
2011, residente em Psiquiatria pela Escola de Saúde Publica do Ceará (ESP-CE).

José Nilton de Azevedo Rodrigues


Graduado em Medicina pela Universidade Estadual do Ceará, 2004 - 2009. Resi-
dência médica em Psiquiatria pela Secretaria de saúde de Sobral 2015 – 2017.
Preceptor da residência de psiquiatria em Sobral.

José Péricles Magalhães Vasconcelos Filho


Formado em Medicina pela Faculdade de Medicina de Juazeiro do Norte em
2013. Residência Médica em Psiquiatria pela Escola de Saúde Pública do Ceará
em 2018. Residência Médica em Medicina do Sono pela Faculdade de Medicina
da Universidade de São Paulo em 2019.

Juan Lucas Furtado Lopes


Acadêmico de medicina no Centro Universitário UNINTA. Membro da Liga Aca-
dêmica de Psiquiatria e Saúde Mental de Sobral (LIAPS).

Júlia Caroline Peixoto Martins


Graduanda em Medicina no Centro Universitário INTA. Membro da Liga Acadê-
mica de Psiquiatria e Saúde Mental de Sobral (LIAPS).

Jurema Siqueira de Oliveira


Graduanda em Medicina no Centro Universitário INTA. Membro da Liga Acadê-
mica de Psiquiatria e Saúde Mental de Sobral (LIAPS).
Larissa Linhares Andrade
Acadêmica de medicina no Centro Universitário UNINTA. Membro fundador da
Liga Acadêmica de Psiquiatria e Saúde Mental (LIAPS).

Larissa Maria Lino de Sousa


Graduada em Medicina em 2019 pelo Centro Universitário Inta (Uninta) - Sobral.
Atua em saúde da família pelo Projeto Mais Médicos pelo Brasil e em Pronto
Atendimento.

Leandro de Lyra Lemos


Médico formado pela Faculdade Pernambucana de Saúde. Residente de psi-
quiatria pela secretaria de saúde de Sobral.

Leonardo Ávila Miranda


Médico formado pela UNIFOR. Residência de psiquiatria pela secretaria munici-
pal de sáude de Sobral. Pós-graduação em transtornos alimentares e obesidade
UNIFOR.

Leonardo Tiago Costa dos Santos


Formado em Medicina pela Faculdade Integral Diferencial - Teresina em 2016.
Residência Médica em Psiquiatria pela Rede de Atenção Integral à Saúde Men-
tal de Sobral – 2020. Professor de psiquiatria no Centro Universitário UNINTA.
Graduação em análise e desenvolvimento de sistemas pelo Instituto Federal do
Piauí, IFPI em 2008.

Marcelo Vinicius Almeida do Carmo


Acadêmico de medicina no Centro Universitário UNINTA. Membro fundador da
Liga Acadêmica de Psiquiatria e Saúde Mental (LIAPS).

Mônica Sales Farias


Graduada em Medicina pelo Centro Universitário Christus no ano de 2019. Re-
sidente de Psiquiatria da Rede de Atenção Integrada a Saúde Mental de Sobral.
Narceli América de Alencar Azevedo
Formada em medicina pela Universidade Federal do Ceará- Campus Sobral em
2006. Residência em Psiquiatria pelo Hospital de Saúde Mental Dr Frota Pinto,
em Fortaleza- CE, de 2007 a 2010. Mestrado em Ensino na Saúde pela UECE em
2019. Professora de psiquiatria no Centro Universitário UNINTA.

Pamella Ponte Mendes


Graduada em medicina pela Universidade Federal do Ceara-UFC (2012.2). Resi-
dente em psiquiatria da Rede de Atenção Integrada a Saúde Mental de Sobral.

Paulo César Nobre Júnior


Médico formado pela Universidade Federal do Ceará. Residência de Psiquiatria
pela Secretaria de Saúde e Ação Social de Sobral. Residência de Psiquiatria da
Infância e Adolescência pelo Núcleo de Atenção à Infância e Adolescência (NAIA)
do Hospital de Saúde Mental Professor Frota Pinto (HSM).

Priscila Garcia Câmara Cabral Tavares


Médica formada pela Universidade Federal do Ceará, campus Sobral. Residente
de clínica médica do Hospital Universitário Walter Cantídeo - Universidade Fe-
deral do Ceará.

Rafael Nobre Lopes


Formado em Medicina na Universidade Federal do Ceará - Sobral em 2007. Resi-
dência Médica em Psiquiatria pela Rede de Atenção Integral à Saúde Mental de
Sobral, Sobral - 2012. Mestrado em Saúde da Família pela Universidade Federal
do Ceará - 2018.

Renata Leite Vasconcelos


Graduada em Enfermagem na Universidade de Fortaleza – UNIFOR em 2005.
Acadêmica de medicina no Centro Universitário UNINTA. Membro da Liga Aca-
dêmica de Psiquiatria e Saúde Mental de Sobral (LIAPS).
Renê Eliomar Pinheiro Diógenes
Acadêmico de medicina no Centro Universitário UNINTA. Membro fundador da
Liga Acadêmica de Psiquiatria e Saúde Mental (LIAPS).

Samara Vasconcelos Alves


Graduada em Psicologia pela Universidade Federal do Ceará (UFC). Residência
Multiprofissional em Saúde da Família pela Escola de Saúde Pública Viscon-
de de Saboia (ESP-VS). Especialista em Educação Permanente em Saúde pela
UFRGS.

Stella Cecília Félix


Acadêmico de medicina no Centro Universitário UNINTA. Membro da Liga Aca-
dêmica de Psiquiatria e Saúde Mental (LIAPS).

Vanina de Lima Monteiro


Médica pela Universidade de Pernambuco. Residência médica em Psiquiatria
pelo Hospital das Clínicas da Universidade Federal de Minas Gerais. R4 em Psi-
coterapia pelo Hospital de Clínicas da Universidade Federal do Rio Grande do
Sul. Especialização em Educação na Saúde para Preceptores no SUS pelo Hos-
pital Sírio Libanês/Ministério da Saúde.

Vicente Bezerra Linhares Neto


Graduação em medicina pela Universidade Federal do Ceará – campus de so-
bral. Residência em Psiquiatria pelo Hospital de Saúde Mental Dr Frota Pinto,
em Fortaleza- CE. Especialização em logoterapia e análise existencial pela fa-
culdade católica de fortaleza. Professor do curso de medicina no centro univer-
sitário UNINTA. Coordenador do programa de residência médica em psiquiatria
da Rede de Atenção Integral à Saude Mental de Sobral – RAISM. Preceptor de
psiquiatria do internato – UFC sobral e UNINTA.
Sumário

FLUXOGRAMAS POR QUEIXAS-GUIA. . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 21


I. Irritabilidade. . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 24

II. Tristeza. . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 25

III. Ansiedade/ Preocupação/ Medo. . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 26

IV. Agitação/Agressividade . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 27

V. Alucinações. . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 28

VI. Insônia. . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 29

VII. Esquecimento. . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 30

VIII. Queixas Comportamentais na Infância. . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 31

IX. Queixas Somáticas Inespecíficas. . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 32

FUNDAMENTOS DA PSIQUIATRIA . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 33
1. Um Pouco de História: Da Loucura à Reforma Psiquiátrica. . . . . . . . . . . . . . . . . 35

2. Dispositivos de Atenção à Saúde Mental no Sistema Único de Saúde. . . . . . . . 43

3. Diagnóstico em Psiquiatria . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 61

4. Avaliação Psiquiátrica. . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 69

5. Exame Mental. . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 81

PSIQUIATRIA CLÍNICA. . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 123


Síndromes do Humor . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 125

6. Depressão Maior e Depressão Persistente . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 127

7. Crise Suicida. . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 143

8. Transtorno Bipolar . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 155


Síndromes Relacionados à Ansiedade . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 175

9. Transtorno de Ansiedade Generalizada (TAG) . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 177

10. Transtorno de Ansiedade Social (Fobia Social). . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 191

11. Agorafobia. . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 201

12. Transtorno de Pânico . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 209

13. Fobia Específica. . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 223

14. Transtorno de Estresse Pós-Traumático . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 231

15. Transtorno de Adaptação. . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 245

Síndromes Psicóticas . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 255

16. Esquizofrenia. . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 257

17. Transtorno Psicótico Breve . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 275

18. Transtorno Esquizofreniforme . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 285

19. Transtorno Delirante. . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 293

20. Transtorno Esquizoafetivo. . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 301

21. Psicose Relacionada ao Uso de Substâncias Psicoativas. . . . . . . . . . . . . . . . . . 313

Síndromes Somatoformes. . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 319

22. Transtorno de Sintomas Somáticos. . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 321

23. Transtorno de Ansiedade de Doença . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 331

24. Transtorno Conversivo. . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 341

25. Transtorno Factício. . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 353

26. Transtornos Dissociativos . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 365

Síndromes Neurocognitivas. . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 375

27. Demências. . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 377

28. Delirium. . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 389


Síndromes do Neurodesenvolvimento. . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 399

29. Deficiência Intelectual . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 401

30. Transtorno do Espectro Autista (TEA) . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 411

31. Transtorno de Déficit de Atenção / Hiperatividade. . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 431

Síndromes Obsessivo-Compulsivas . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 451

32. Transtorno Obsessivo-Compulsivo . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 453

33. Transtornos Relacionados ao Transtorno Obsessivo-Compulsivo (TOC) ������ 467

Síndromes Relacionadas à Personalidade. . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 485

34. Transtorno de Personalidade do Grupo A. . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 491

35. Transtorno de Personalidade do Grupo B. . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 503

36. Transtorno de Personalidade do Grupo C. . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 519

Síndromes Psicomotoras . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 529

37. Agitação Psicomotora. . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 531

38. Catatonia. . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 543

39. Transtornos do Movimento Induzidos por Medicamentos . . . . . . . . . . . . . . . . 555

Síndromes Relacionadas ao Uso de Substâncias Psicoativas. . . . . . . . . . . . . . . . . 577

40. Transtornos Relacionados ao Uso de Álcool. . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 579

41. Transtornos Relacionados ao Uso de Cocaína e Crack. . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 605

42. Tabagismo. . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 615

Síndromes Relacionadas ao Comportamento Alimentar . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 633

43. Anorexia Nervosa. . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 635

44. Bulimia Nervosa. . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 651

45. Transtorno de Compulsão Alimentar. . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 665


Insônia. . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 677

46. Insônia. . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 677

Condutas Rápidas em Psiquiatria. . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 697

47. Condutas Rápidas em Psiquiatria. . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 697

TERAPÊUTICAS EM PSIQUIATRIA . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 709


Farmacologia aplicada à psiquiatria. . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 711

48. Farmacologia Aplicada à Psiquiatria. . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 711

49. Antipsicóticos. . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 729

50. Antidepressivos. . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 745

51. Estabilizadores de Humor . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 761

52. Benzodiazepínicos e Hipnóticos. . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 769

53. Psicoestimulantes. . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 785

54. Farmacoterapia em Situações Especiais. . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 797

Psicoterapias . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 823

55. Psicoterapias . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 823


Fluxogramas por
Queixas-Guia
FLUXOGRAMAS POR QUEIXAS-GUIA

I. Irritabilidade

II. Tristeza

III. Ansiedade/ Preocupação/ Medo

IV. Agitação/Agressividade

V. Alucinações

VI. Insônia

VII. Esquecimento

VIII. Queixas Comportamentais na Infância

IX. Queixas Somáticas Inespecíficas

23 Fluxogramas por Queixas-Guia


I. Irritabilidade

1. Funcionamento interpessoal marcado por fragilidades; Padrão de impulsividade; Distorções


cognitivas na interpretação do meio e da autoimagem; Alterações não episódicas da afetividade.

Fluxogramas por Queixas-Guia 24


Fundamentos da
Psiquiatria
Fundamentos da Psiquiatria
Um Pouco de História: Da Loucura
CAP. à Reforma Psiquiátrica

01 Leandro de Lyra Lemos


Narceli América de Alencar Azevedo

As profissões que estão ligadas à saúde têm em comum o compromisso com


o cuidado. Entender como diferentes formas de cuidar se criaram e foram trans-
formadas com o passar do tempo é importante para a manutenção das mudan-
ças. Conhecer o passado dá-nos ferramentas para pensar de forma provocativa,
curiosa e transformadora nos dias atuais.
Os pacientes psiquiátricos, chamados muitas vezes de loucos e alienados,
carregam consigo a história dos marginalizados e esquecidos, estudar a sua
história é também estudar os miseráveis e desabrigados. Com o propósito de
abrigo, nasceram os hospitais – que em latim significa hospedagem, hospeda-
ria – como uma instituição de caridade, dava proteção, alimentação e cuidados
àqueles que necessitavam e muitos estavam também doentes.
Com o tempo, esses espaços passaram a ser institucionalizados em objetos de
controle, com funções sociais e políticas. O hospital passou a isolar e segregar parte
da sociedade com o juízo do Estado e dentre eles estavam os loucos, internados
longe da vista das cidades. Os diretores exerciam poderes absolutos, sobre os usu-
ários e sua influência se estendia também de possíveis pacientes fora dos hospitais.
Com o advento da Revolução Francesa, no século 18, observou-se uma
maior projeção dos valores científicos, e os tratamentos médicos foram efetiva-
mente o objetivo das antigas hospedarias. Classificar, diagnosticar e tratar de
forma sistemática, por meio do modelo epistemológico, era o objetivo das ca-
sas de saúde, e o hospital tornou-se o centro dos cuidados. Com isso, foi possí-
vel estudar e observar com profundidade as enfermidades e produzir materiais
científicos, tendo em vista a ciência positivista hegemônica. Em contrapartida,
a institucionalização se deu ainda mais e os cuidados médicos foram afastados
das casas para grandes hospitais, os sintomas ganharam mais importância e

35
as pessoas foram classificadas em doenças. A prática da medicina se tornava
especialística, verticalizada e hierarquizada.
Diante desse contexto e influenciado pelos pensamentos de John Locke, Phi-
lippe Pinel, médico francês, considerado o pai da psiquiatria, incluiu o termo
alienista (estrangeiro, alienígena) no dicionário médico e classificou as doenças
mentais. Pinel acreditava que os loucos tinham direito de maior liberdade, pelo
afastamento das enfermidades. O isolamento do mundo exterior seria, assim,
uma terapêutica para dar maior autonomia aos doentes psiquiátricos. Diante
disso, o hospício, lugar do exercício da sua ação terapêutica, teria o objetivo de
acabar com a loucura. Pode-se pensar hoje de forma crítica, mas sua finalidade
não era a de impedir, afastar ou negar, mas de recuperar o paciente. Daí a impor-
tância de um espaço terapêutico, que obedecesse aos fundamentos médicos.
O internamento, segundo o alienista francês, diminuía interferências externas
e aumentava as chances de um diagnóstico mais fiel, além de fazer parte do tra-
tamento. Para ele, as regras invariáveis do hospital pineliano reeducavam suas
mentes e afastava os delírios e ilusões, trazendo-os à consciência da realidade
– essa terapêutica foi definida como tratamento moral. Apesar de ter um funda-
mento teórico voltado à liberdade, com imagens de Pinel desacorrentando os
internos, os loucos permaneciam nas instituições por necessidade terapêutica.
Cria-se, com Pinel, o conceito de loucura enquanto doença e a necessidade de
categorizar, diagnosticar, tratar, alicerçada no modelo biomédico vigente. A do-
ença mental passa a ser objeto de estudos médicos. Com discurso da neutralida-
de científica das ciências positivistas, a doença mental vai ganhando destaque
e anulando os sujeitos e suas subjetividades no modelo psiquiátrico tradicional.

Pinel, médecin en chef de la Salpêtrière en 1795 – Tony Robert-Fleury.12

Fundamentos da Psiquiatria 36
O desdobramento da popularização dos hospitais pinelianos em todo o
mundo acabou por trazer superlotação institucional: existia um limite difícil
entre a razão e a loucura. Surgiram diversas denúncias contra violência, e as
características excludentes se mantiveram. Aparecia uma necessidade de uma
nova rede de cuidados aos loucos, surgindo as colônias dos alienados.
Embalados no contexto da Revolução Industrial, percebeu-se que pacientes
que se mantinham funcionais, exercendo o trabalho agrícola, tinham melhora
dos quadros. Foi proposto, portanto, o modelo de trabalho terapêutico, base-
ado em estímulo da vontade, energia e produtividade dos alienados. Apesar
das tentativas, as colônias mostraram-se semelhantes aos asilos antigos e no-
vamente formas de violência foram instituídas.

O INÍCIO DAS MUDANÇAS

Entre 1914 e 1945 o mundo via acontecer as duas maiores guerras da história
até os dias atuais, deixando um rastro de morte de milhares de pessoas, mas
também grande desenvolvimento tecnológico e modificação da forma de pen-
sar a natureza humana. Os campos de concentração apontavam a crueldade
e a segregação promovidas pelo homem e, apesar de sua extinção, evidencia-
ram que os loucos permaneciam enclausurados e violentados. Essas reflexões,
a necessidade de reconstrução da Europa e de mão de obra para crescimento
econômico, aliados à descoberta dos psicotrópicos, ao advento da psicanálise e
da saúde pública criaram condições para as primeiras experiências de reforma
psiquiátrica no mundo.
O pós-guerra exigia uma necessidade de reorganização para que os soldados
retornassem à sua participação social. Muitos voltaram doentes, física e psiqui-
camente, e o número de internamentos aumentou. A quantidade de profissio-
nais era incapaz de suprir as necessidades do novo mundo. Surgia a psicotera-
pia institucional, que requalificou a forma de atender os doentes com inclusão
dos usuários nas decisões dos processos terapêuticos. A prática de reuniões
e assembleias diárias, com os usuários, acompanhantes e funcionários tinha
como finalidade evitar situações de abandono e violência.
Na França, François Tosquelles, instituiu as “comunidades terapêuticas”, que
trouxeram novamente o trabalho terapêutico com corresponsabilidades por par-
te dos internos e funcionários. Foi criado ainda o clube terapêutico, uma organi-
zação com a finalidade de promover encontros, feiras, passeios e também sur-
giram ateliês, clubes de leitura… Esse “coletivo terapêutico” institucionalizou a
transversalidade com quebra nos padrões impositores e hierarquizados antigos.

37 Um Pouco de História
A psiquiatria preventiva, nascida nos EUA, trazia consigo o conceito de que,
diante do conhecimento da história natural da doença, seria possível uma in-
tervenção precoce para prevenir crises ou desadaptações sociais, e as equipes
passaram a ter papel de consultores comunitários, identificando e intervindo
nas crises. Desejava-se que os hospitais psiquiátricos fossem desnecessários,
à medida que os eventos preventivos abortassem a necessidade da hospita-
lização. Apesar de ter desenvolvido várias estratégias extra-hospitalares, não
questionava o modelo psiquiátrico tradicional centrado na doença e no saber
biomédico. A busca pela prevenção ao adoecimento mental abriu um período
de “caça” àqueles com predisposição aos desvios da normalidade, aumento da
demanda e necessidade de hospitalização.
Nos anos 1950, na Inglaterra, de maneira provocativa, nasceu a antipsiquia-
tria. Segundo seus pensadores, a experiência patológica não ocorria no indi-
víduo enquanto corpo ou mente, mas nas experiências que existiam entre ele,
a família e a sociedade. Considerava a loucura como fruto da opressão e vio-
lência sociais, sendo o hospital psiquiátrico um reprodutor dessas estruturas
opressoras. A interferência científica, inserida em um contexto essencialmente
humano, aumentaria o poder das estruturas opressoras e adoecedoras. Dessa
forma, não compreendia a doença mental enquanto objeto da psiquiatria, mas
como uma forma de expressão dos sujeitos, sendo o processo terapêutico um
caminho para expressão da subjetividade como forma de reorganização inte-
rior. Assim, o objetivo do cuidado seria proporcionar ao usuário a vivência das
suas experiências de uma forma segura.
A psiquiatria democrática teve início na cidade italiana de Gorizia, com o
médico Franco Basaglia. Nessa experiência, além da desconstrução importan-
te da necessidade dos hospitais psiquiátricos, a desinstitucionalização passa a
compreender não apenas a lógica de desospitalização, mas a necessidade da
quebra do paradigma psiquiátrico da loucura. A Reforma Italiana coloca a do-
ença entre parênteses e considera impossível que o saber psiquiátrico dê conta
da complexidade do fenômeno da loucura e do sofrimento psíquico, considera
mais importante o sujeito e possibilita a ampliação da noção de integralidade
no campo da saúde mental e da atenção psicossocial. Compreende o sofrimen-
to mental enquanto fenômeno social e que deve ser cuidado no seio comunitá-
rio, superando a lógica manicomial. Dessa forma, desenvolve os serviços subs-
titutivos, os centros de saúde mental (CSM), responsáveis pela integralidade
dos cuidados com base territorial, promove uma reformulação profunda dos
dispositivos de cuidado e dos conceitos sociais de sujeitos sofrimento mental.

Fundamentos da Psiquiatria 38
Diferente dos outros movimentos reformistas da Europa, a experiência ita-
liana e a antipsiquiatria inglesa deram início a processos de rompimento do pa-
radigma psiquiátrico tradicional. Esses dois movimentos passam a operar uma
ruptura na psiquiatria, olham criticamente a construção do saber psiquiátrico
legitimado como científico a partir da objetificação da loucura, que aprisiona e
reduz a complexidade dos fenômenos vividos.

A REFORMA PSIQUIÁTRICA BRASILEIRA

O movimento italiano tem sido apontado como modelo inspirador da re-


forma psiquiátrica brasileira, que foi contemporânea da Reforma Sanitária e
teve sua história com influência internacional desses movimentos de mudança
asilar. Inspirado pela reforma basagliana, o Movimento dos Trabalhadores em
Saúde Mental (MTSM) passou a denunciar os maus tratos em instituições asila-
res e promover reflexão sobre a necessidade de mudança, criticando a hegemo-
nia do saber psiquiátrico e do modelo hospitalocêntrico.
Em 1978, a Associação Brasileira de Psiquiatria (ABP) passa a apoiar o proje-
to político do MTSM após participação no V Congresso Brasileiro de Psiquiatria,
criticando o modelo psiquiátrico clássico e as instituições psiquiátricas.
As primeiras iniciativas da substituição nos serviços acontecem a partir de
1987, quando surgiu o primeiro Centro de Atenção Psicossocial (CAPS) do Brasil
na cidade de São Paulo. Logo aconteceu a primeira intervenção em hospital psi-
quiátrico, na Casa de Saúde Anchieta, em Santos, que teve repercussão nacional
e pôde demonstrar que a retórica da reforma era possível de ser executada.
Em 1989, o deputado Paulo Delgado lançou o projeto de Lei n. 3.657/1989,
que só foi aprovado doze anos depois, após muitas transformações, mas ampa-
rou as discussões sobre a reforma ao longo dos anos. Foi um período de grandes
mudanças no país, o Brasil havia promulgado sua nova Constituição e passava
pela primeira eleição direta após o período de ditadura militar, eram tempos de
abertura democrática.
Entre 1992 e 2000, vários estados conseguiram aprovar as primeiras leis que
determinaram a substituição dos leitos psiquiátricos por uma rede integrada
de cuidados em saúde mental e, finalmente, com a promulgação da Lei Paulo
Delgado e a II Conferência Nacional de Saúde Mental, a Reforma Psiquiátrica
Brasileira passou a ganhar sustentação e visibilidade.
Podemos caracterizar a Reforma Psiquiátrica não como um processo de mu-
dança administrativa, organizacional ou como um movimento de melhoria ou
aperfeiçoamento ético e científico da psiquiatria. Mas como um movimento de

39 Um Pouco de História
transformação social e política da psiquiatria tradicional, alterando as relações
de saber e poder, rompendo com a objetificação dos sujeitos e da doença e
desinstitucionalizando os fenômenos, permitindo que o sofrimento humano
ocupe um novo lugar social. Ela não veio com a finalidade de fechar hospitais
psiquiátricos ou abandonar as pessoas às suas famílias, tampouco tirar do Esta-
do o papel do cuidado (muito pelo contrário). A desinstitucionalização requer a
desconstrução e a superação do modelo arcaico e segregado da doença mental
enquanto entidade abstrata, para o modelo dos sujeitos que sofrem em suas
existências e experiências concretas de vida.
Com a Reforma Psiquiátrica, surgem a atenção psicossocial e o campo da
saúde mental. A saúde mental, enquanto campo de conhecimento plural, com-
plexo e intersetorial, entrecruza uma rede de saberes sobre o estado mental
dos sujeitos e das comunidades. A atenção psicossocial enquanto práticas de
cuidado integral, intersetorial, multiprofissional e individualizado, orientadas
para a promoção da saúde e estímulos de aspectos essenciais para a vida em
sociedade e respeitando as singularidades e as subjetividades.
No modelo psicossocial, é importante perceber que o adoecimento é uma
condição de um cidadão com vontades e desejos, que tem trabalho, estuda,
tem parentes, vizinhos, rotinas e um cotidiano que devem ser respeitados.
Compreender que não se cuida de um doente, mas de um sujeito em sofrimen-
to psíquico abre opções de acolhimento, trocas sociais e medidas inclusivas.
Mais do que administração de fármacos ou psicoterapias, o usuário deve
tornar-se um sujeito e não objeto de estudos da psiquiatria. O processo de
cuidado deve construir possibilidades, por meio de uma prática que introduz
novos sujeitos de direito e novos direitos para os sujeitos. uma prática que re-
conhece, inclusive, o direito de as pessoas mentalmente enfermas terem um
tratamento efetivo, receberem um cuidado verdadeiro, uma terapêutica cida-
dã e libertadora.
O futuro da Reforma Psiquiátrica não está apenas no sucesso terapêutico-as-
sistencial das novas tecnologias de cuidado ou dos novos serviços, tampouco
nos aspectos técnico-científicos, mas na transformação social e na forma como
a sociedade escolhe lidar com os diferentes, com as minorias e com os sujeitos
em desvantagem social.

Fundamentos da Psiquiatria 40
REFERÊNCIAS

1. Amarante P. Saúde Mental e Atenção Psicossocial. 3 ed. Rio de Janeiro: Editora Fiocruz; 2007.
2. Vieira ARB. Organização e saber psiquiátrico. Rev. Adm. Empres. (São Paulo) 1981 Dec.; 21(4):
49-58.
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4. Ferreira de Lima A. Os movimentos progressivos-regressivos da reforma psiquiátrica antima-
nicomial no Brasil: uma análise da saúde mental na perspectiva da psicologia social crítica.
Salud & Sociedad 2016 nov. 16; 1(3): 165-177.
5. Foucault M. História da loucura na Idade Clássica. 3. ed. São Paulo: Perspectiva; 1991.
6. Amarante P. Novos sujeitos, novos direitos: o debate em torno da reforma psiquiátrica. Cad.
Saúde Pública (Rio de Janeiro) 1995 Set.; 11(3): 491-494.
7. Stucchi-Portocarrero S. La Primera Guerra Mundial y su impacto en la psiquiatría. Rev Neu-
ropsiquiatr (Lima) 2014 jul.; 77(3): 139-143.
8. Ministério da saúde (BR). Memória da loucura: apostila de monitoria. 2 ed. Brasília: Editora do
Ministério da Saúde, 2009.
9. Carvalho AL, Amarante P. Loucos pela vida: a trajetória da reforma psiquiátrica no Brasil. In:
Loucos pela vida: a trajetória da reforma psiquiátrica no Brasil. Rio de Janeiro: Editora Fiocruz
1995.
10. Heidrich, A. V. Reforma psiquiátrica à brasileira: análise sob a perspectiva da desinstitucio-
nalização. Porto Alegre: PUC-RS; 2007. Teses de doutorado (programa de pós-graduação em
Serviço Social).
11. Brasil. Ministério da Saúde. Secretaria de Atenção à Saúde. DAPE. Coordenação Geral de Saú-
de Mental. Reforma psiquiátrica e política de saúde mental no Brasil. Documento apresen-
tado à Conferência Regional de Reforma dos Serviços de Saúde Mental: 15 anos depois de
Caracas. OPAS. Brasília, novembro de 2005.
12. Meisterdrucke [publicação online] 23 Ago. 2020. Philippe Pinel à la Salpêtrière [aces-
so em 2020 ago. 31]. Disponível em: https://www.meisterdrucke.pt /kunstwer-
ke/500px/Tony_Robert_Fleury_-_Philippe_Pinel_%281745-1826%29_releasing_lu-
natics_from_their_chains_at_the_Salpetrie_-_%28MeisterDrucke-263903%29.jpg.
Amarante P. Saúde mental, formação e crítica. Rio de Janeiro: LAPS/Fiocruz; 2008.
13. Amarante P. A constituição de novas práticas no campo da Atenção Psicossocial: análise de
dois projetos pioneiros na Reforma Psiquiátrica no Brasil. Saúde em Debate 2001; 25(58): 26-34.

SIGLAS

• CAPS......Centro de Atenção Psicossocial


• CSM........Centros de Saúde Mental
• MTSM.....Movimento dos Trabalhadores em Saúde Mental
• ABP........Associação Brasileira de Psiquiatria

41 Um Pouco de História
Psiquiatria Clínica
Síndromes do Humor
Mikkael Duarte dos Santos

Nesta seção reunimos as manifestações patológicas do humor que o gene-


ralista deve se habituar com o diagnóstico e manejo, seja pela importância epi-
demiológica, seja pela sua importância clínica. Além das principais nosologias
– depressão maior, depressão persistente (distimia) e transtorno bipolar
– incluímos também a crise suicida. Essa, a crise suicida, apesar de presente
nesta seção, não é provocada apenas pelas crises de humor, como veremos no
capítulo que trata sobre o tema; contudo, as doenças do humor são as patolo-
gias psiquiátricas mais implicadas no suicídio.
As polarizações do humor caracterizam-se pela saída do paciente do seu tô-
nus afetivo basal normal (a eutimia) e a migração, de forma consistente, por
vários dias, a maior parte do tempo, para os polos depressivos – distimia e hi-
potimia (depressão) – ou para os polos maniformes – hipomania e mania. Há
também pacientes que, de forma contra intuitiva, experimentam sintomas dos
dois polos simultaneamente, condição conhecida tradicionalmente como epi-
sódio misto. O DSM-5 prefere adotar a nomenclatura “características mistas”.
Exemplo: um paciente que preencha critérios para um episódio maníaco com ca-
racterísticas mistas deve ter os critérios para mania satisfeitos e, pelo menos três
sintomas do polo oposto (depressão), devem estar presentes simultaneamente.

FIGURA 1 – POLARIZAÇÕES DO HUMOR

Fonte: Extraído de Stahl SM. Psicofarmacologia: bases neurocientíficas e aplicações práticas.


4 ed. Rio de Janeiro: Guanabara Koogan; 2017.

125 Síndromes do Humor


Síndromes do Humor
Depressão Maior e
CAP. Depressão Persistente

06 Andressa Müller da Conceição


Rafael Nobre Lopes

CASO CLÍNICO 1

Arabella, 26 anos, estudante de Medicina, vem para o ambulatório de psi-


quiatria acompanhada de sua irmã. A paciente referiu sensação de vazio inte-
rior e inutilidade, desânimo intenso com dificuldade para as atividades diárias,
passando a maior parte do dia deitada. A acompanhante refere que Arabella
perdeu peso e estava muito chorosa nas últimas seis semanas. Acrescentou que
sua irmã não costumava ser assim. Atribui sintomas a uma queda no seu de-
sempenho acadêmico, mesmo diante de seus esforços para impedir tal redução
na aprendizagem.
Não há histórico nenhum de episódio depressivo ou maníaco anterior. Pa-
ciente não apresenta quaisquer comorbidades, não faz uso de medicações, não
é etilista e não realiza atividades físicas.

Exame mental: paciente entra na sala cabisbaixa, tem aparência ema-


grecida e abatida, com olheiras bem evidentes. Apresenta latência no
tempo de resposta e redução da atenção global.

DISCUTINDO O DIAGNÓSTICO

O estado melancólico é reconhecido desde os tempos de Hipócrates. O pró-


prio termo “melancolia” significa “bile negra”, de acordo com a teoria humoral
difundida na Grécia Antiga. Foi só durante o Iluminismo que tal estado foi carac-
terizado como uma “neurose”, termo empregado de forma pioneira por William

127
Cullen. Apenas no século 19 o termo “depressão” surge, pela primeira vez, com
um sentido mais próximo ao atual, e por volta de 1860 a palavra começa a apa-
recer nos dicionários médicos. Philippe Pinel classificou a “melancolia” como
doença e destacou a predisposição desses pacientes a cometerem suicídio.
O assunto que abordaremos aqui é de extrema relevância, visto que o trans-
torno depressivo maior (TDM) foi considerado pela Organização Mundial da
Saúde como o “mal do século” e afeta aproximadamente 264 milhões de pes-
soas no mundo inteiro. Trata-se de uma doença que se comporta como um se-
questrador, que além de roubar a vitalidade de sua vítima, a faz acreditar que
não existe solução para seus problemas, quando, na verdade, a chave para sair
do cárcere encontra-se em suas mãos. A tarefa do médico psiquiatra e do psicó-
logo, ambos em ação conjunta, é fazer com que o paciente entenda que pode
ser ajudado e que, com o tratamento correto, a doença pode ter sua resolução.
Para entendermos melhor com o que estamos lidando, é preciso saber que
a depressão maior está dentro do conjunto de transtornos do humor unipola-
res (em contraste com os transtornos de humor bipolares). É caracterizada pelo
DSM-5 como a presença de humor triste, vazio ou irritável em associação com
alterações somáticas e cognitivas, causando algum nível de prejuízo à pessoa
afetada, com duração igual ou superior a duas semanas, não ultrapassando
dois anos de forma ininterrupta (critério este que se faz presente para o diag-
nóstico de depressão persistente ou distimia, explicitada mais adiante neste
capítulo). Para fechar o diagnóstico de transtorno depressivo maior é preciso
que o paciente apresente pelo menos 5 critérios destes listados a seguir, sendo
obrigatória a presença de pelo menos um dos dois primeiros critérios:
1. Humor deprimido na maior parte do dia, quase todos os dias. Em crian-
ças ou em adolescentes, além do humor deprimido, pode ocorrer irrita-
bilidade.
2. Anedonia, ou seja, perda da capacidade de sentir prazer nas coisas que
anteriormente eram satisfatórias e traziam alegria.
3. Aumento ou perda do peso sem que o paciente tenha feito dieta ou mu-
dado de alguma forma seus hábitos alimentares.
4. Insônia ou hipersonia.
5. Agitação ou retardo psicomotor.
6. Fadiga ou perda de energia.
7. Sentimentos de inutilidade ou culpa excessiva.
8. A concentração pode estar prejudicada, podendo estar acompanhada
de lentificação da fala.
9. Pensamentos de morte ou suicídio.

Síndromes do Humor 128


A lógica é que as alterações nas funções mentais e no comportamento do
indivíduo acometido sejam compatíveis com o estado de humor rebaixado.
Assim, teremos na dimensão do pensamento a desesperança, o pessimismo,
ruminações de mágoas antigas, pensamentos de inutilidade e morte, autocul-
pabilização excessiva, autoestima diminuída e sentimento de incapacidade.
Na cognição, teremos dificuldade de concentração, de memória e na tomada
de decisões (pseudodemência ou “falsa demência” do depressivo). A psicomo-
tricidade também pode estar afetada, com latência no tempo de resposta, di-
minuição do fluxo da fala, lentificação global e, em casos graves, pode haver
sintomas psicóticos congruentes com a alteração afetiva, como delírios de ruí-
na, miséria e/ou culpa e alucinações auditivas de conteúdo depreciativo ou de
comando suicida.
Observemos, no entanto, que na descrição acima há dois sintomas que apa-
rentemente se contradizem: insônia e hipersonia, perda e aumento de peso. As
depressões que cursam com aumento de peso e hipersonia são chamadas de
atípicas: essas geralmente se acompanham de uma sensação de “corpo pe-
sado” (paralisia plúmbea) e possui relação com transtorno bipolar, sugerindo
vigilância, quando iniciado o tratamento, em relação ao possível surgimento
de sintomas ou sinais da esfera hipertímica (como aumento de energia ou hi-
pomania).
Além dos aspetos qualitativos da síndrome apresentados aqui, a quantidade
dos sintomas apresentados nos permite diferenciar o episódio em leve, mode-
rado, grave e grave com sintomas psicóticos (segundo a CID-10). No episódio
depressivo leve, o paciente apresentaria, além dos sintomas fundamentais
(humor deprimido e anedonia), 2 sintomas acessórios. No episódio depressi-
vo moderado, o paciente teria 3 ou 4 sintomas mencionados acima, e no caso
grave, mais de 4. Caso ocorram sintomas psicóticos, como delírios, alucinações
ou catatonia (estupor depressivo), estamos diante do episódio grave com sin-
tomas psicóticos.
É importante salientar que outros transtornos psiquiátricos também po-
derão apresentar alguns desses sintomas; logo, é preciso que o médico saiba
diferenciar bem uma patologia de outra. Para tanto, ele deverá conduzir uma
entrevista cuidadosa e detalhada, guiada pela queixa do paciente, duração e
frequência dos sintomas e quão prejudiciais eles são nas atividades cotidianas
do indivíduo. Ou seja, tendo em mente a caracterização do episódio depressivo
como um fenômeno dimensional, no qual em um extremo estariam sintomas
de entristecimento normais, e no outro depressões graves com sintomas psi-
cóticos, poderíamos compreender melhor e realizar um diagnóstico certo por

129 Depressão Maior e Depressão Persistente


meio da abordagem de aspectos como duração dos sintomas, persistência,
abrangência e influência no funcionamento habitual do paciente; assim como
a desproporcionalidade da condição que se apresenta em relação a qualquer
provável fator precipitante cogitado pelo paciente.

ASPECTOS SOBRE EPIDEMIOLOGIA E ETIOLOGIA

A depressão é considerada mundialmente a maior causa de incapacitação


e, segundo a Organização Mundial da Saúde, em 2030, projeta-se que será a en-
fermidade mais prevalente no planeta. Um estudo populacional realizado em
São Paulo estimou que 10,6% da população brasileira apresentava um episódio
depressivo ao longo de 12 meses. A depressão é responsável pela maior parte
dos suicídios, sendo que 2/3 das ocorrências de tal fenômeno são cometidas
por portadores de depressão.
Os transtornos depressivos apresentam alta comorbidade com outros qua-
dros clínicos gerais, como artrite, lombalgia, problemas cardiológicos (incluin-
do infarto agudo do miocárdio), hipertensão arterial e hipotireoidismo, para
citar alguns. Quando isso ocorre, geralmente há um pior prognóstico para am-
bos os problemas. Devido a tal fato, nem sempre é fácil reconhecer um qua-
dro depressivo, pois boa parte dos sintomas físicos dos pacientes que buscam
atendimento ambulatorial não está associada a processo orgânico de doença.
O diagnóstico mais comum em cuidados primários é o de não doença. Quanto
mais sintomas físicos sem explicação o paciente apresente, maior a chance de
receber um diagnóstico de depressão e maior será sua incapacidade social e
profissional.
Boa parte (cerca de 46%) dos pacientes que sofrem de um episódio depres-
sivo terão um segundo episódio. Também é alto o número de pacientes com
curso crônico sem remissão dos sintomas. Aqui deparamos com as diversas mo-
dalidades de apresentação da depressão maior, que pode se configurar como
“episódio depressivo maior” (nomenclatura reservada a um primeiro quadro
de depressão apresentado que preencha os critérios diagnósticos anteriormen-
te citados; “transtorno depressivo recorrente”, quando o paciente já apresenta
uma recorrência de quadro depressivo maior) “depressão persistente” ou disti-
mia, quando o indivíduo apresenta sintomas por um período maior que 2 anos,
porém que não preenchem critérios completos para um episódio maior (expli-
cado posteriormente neste capítulo).

Síndromes do Humor 130


É interessante mencionar que o TDM é mais prevalente no sexo feminino.
Para ilustrar essa realidade usaremos um estudo transversal realizado no muni-
cípio da Zona da Mata Mineira, nas Unidades de Saúde da Família desse mesmo
local, em que comparando com a porcentagem de TDM em homens (9,7%), as
mulheres alcançaram a porcentagem de 21,6% dos casos da população. Acredi-
ta-se que o transtorno depressivo maior seja causado por múltiplos fatores, que
em conjunto ajudam a desencadear essa doença, e alguns eles estão represen-
tados no fluxograma a seguir.

FLUXOGRAMA 1 - POSSÍVEIS FATORES CAUSAIS PARA DEPRESSÃO.

Depressão Maior

Fatores Ambientais Histórico Familiar/ Genética Fatores Endógenos

Estilo de vida Presença de Outros


(sedentarismo, tabagismo) Transtornos
Psiquiátricos
Abuso de Substâncias
Hipercortisolismo

Traumas na Infância

Pequena Rede de Apoio

Perdas Significativas
Fonte: elaborada pelos autores.

Algumas características de personalidade podem estar associadas ao ir-


rompimento de um transtorno depressivo, como a introversão, a preocupa-
ção e a sensibilidade excessivas e a dependência. O desencadeamento de um
transtorno depressivo é, muitas vezes, consequente de um fator estressante,
geralmente constituído como um acontecimento vital, um estresse crônico ou
mesmo problemas cotidianos. No entanto, da mesma forma que existem fa-
tores agravantes, assim também se fazem presentes os protetores, como, por
exemplo: ampla rede de apoio (família e amigos), presença de companheiro(a)
e religiosidade.

131 Depressão Maior e Depressão Persistente


DIAGNÓSTICO DIFERENCIAL

Logo no início deste capítulo, no tópico em que estávamos discutindo o


caso, foi mencionado que era preciso que o médico que estivesse o conduzindo
soubesse diferenciar bem as patologias, para assim diminuir a probabilidade
de erro diagnóstico. Assim, também foi dito que o caminho para o acerto do
diagnóstico encontrava-se em uma boa anamnese, delimitando o início dos sin-
tomas, o fator desencadeante deles – se houver algum – bem como a frequência
e por último o prejuízo causado por eles no dia a dia do paciente. Dito isso,
podemos prosseguir para as demais doenças que fazem parte do diagnóstico
diferencial de TDM e que podem mimetizar os sintomas (Quadro 1).

QUADRO 1 - OUTROS TRANSTORNOS OU CONDIÇÕES QUE CURSAM COMUMENTE


COM SINTOMAS DEPRESSIVOS

Episódios maníacos com humor A distinção de TDM é feita por meio da presença clínica de
irritável. sintomas maniatiformes.
Transtorno depressivo ou bipolar
Neste transtorno uma determinada substância ou medi-
desencadeado por uso de
camento poderá ser a etiologia da crise.
medicamentos.
Pode ser diagnosticado em conjunto com o TDM, desde
Transtorno de déficit de atenção e
que cumpra os critérios. É necessária atenção em crian-
hiperatividade.
ças, para não confundir tristeza com irritabilidade.
A diferença dele para TDM é a não existência de todos os
Transtorno de adaptação com o
5 sintomas e também a necessidade premente de um es-
humor deprimido.
tressor psicossocial.
Aqui é importante o médico verificar a existência de outra
Transtorno de humor por outra
condição médica que mimetize os sintomas como: hipo-
condição médica.
tireoidismo; acidente vascular encefálico; dentre outros.
Aqui o médico deverá avaliar se o paciente está passando
por um luto, por exemplo, ou outra condição que o afete
sobremaneira (isso pode ser testado também pela reati-
Tristeza.
vidade do indivíduo aos estímulos positivos, ocorrência
que não procede na depressão maior, de fato). Os outros
comemorativos da depressão não estarão presentes.
Fonte: elaborada pelos autores.

E AÍ, O QUE FAZER?

Primeiramente, é importantíssimo que o médico que conduz o caso se mos-


tre atencioso e que saiba exercer a empatia com o seu paciente, visto que a

Síndromes do Humor 132


depressão ainda é um tema muito delicado de se discutir, principalmente pela
dificuldade dos pacientes em reconhecer sua condição de “doente”. É funda-
mental que o paciente confie e se sinta acolhido por seu médico, pois assim
existe também maior probabilidade de adesão ao tratamento, reduzindo então
o risco de abandono deste.
É conveniente, além de uma esmiuçada história clínica, investigar a
possibilidade de condições físicas ou medicamentosas que possam explicar
o surgimento de sintomas depressivos (hipotireoidismo, anemias, patologias
hepáticas etc.). Isso poderia ser feito por meio de medidas como exame físico e in-
vestigação laboratorial (quando houver suspeita): hemograma, ureia e creatinina,
transaminases hepáticas, gama-GT, T4 livre, TSH e qualitativo de urina. Se houver
história familiar de cardiopatia e/ou o paciente tiver idade acima de 40 anos, se-
ria prudente eletrocardiograma ou avaliação cardiológica. Após isso, avaliaremos
tudo aquilo que possa servir de gatilhos para que os episódios depressivos acon-
teçam e, por meio do trabalho adjunto com psicoterapia, será proporcionado ao
paciente o desenvolvimento de sua resiliência e de estratégias para melhor lidar
com tais gatilhos, ou a saber reagir de outra maneira a eles. É interessante lem-
brar que quanto maior a rede de apoio que o paciente possuir, mais amparado ele
se sentirá, e menos risco ele apresentará a si mesmo caso tenha ideação suicida.
Diversas modalidades de psicoterapia podem ser utilizadas nos quadros de-
pressivos, tanto TDM como depressão persistente:
• Terapia cognitivo-comportamental: associa estratégias baseadas na
compreensão de que cognições mais saudáveis conduzem a padrões de
comportamento mais adaptados, em via de mão dupla.
• Terapia interpessoal: ressalta as relações interpessoais saudáveis como
interferentes na depressão, sendo a ruptura destas um dos fatores em
seu desenvolvimento.
• Terapia em grupo: oferece oportunidade de explorar modos de interação
e proporciona ao paciente o conhecimento de que outros também com-
partilham de quadro semelhante.
• Terapia familiar: atende situações específicas de interações inadequa-
das entre membros familiares que podem se configurar como questões
centrais na origem e na manutenção da sintomatologia.

Em conjunto com a psicoterapia e com o tratamento farmacológico que co-


mentaremos adiante, podemos aliar também mudanças de estilo de vida que
são refletidas na alimentação, prática de exercícios físicos e diminuição dos fa-
tores estressantes.

133 Depressão Maior e Depressão Persistente


FARMACOTERAPIA
São utilizados antidepressivos (AD) que, apesar da alcunha, não são utili-
zadas exclusivamente para transtornos depressivos, mas também para diver-
sas condições, como quadros patológicos de ansiedade, transtorno obsessivo-
-compulsivo, transtornos alimentares etc.
Essas medicações possuem diferentes mecanismos de ação (vide capítulo
“Antidepressivos”), mas com o mesmo objetivo, que seria aumentar a concen-
tração e/ou a ação da serotonina e de outros neurotransmissores envolvidos
(como dopamina e noradrenalina) nas fendas sinápticas. Sendo assim, eles têm
as subdivisões apresentadas no Quadro 2.

QUADRO 1 - ANTIDEPRESSIVOS EM SUAS CLASSES FARMACOLÓGICAS

Inibidores da monoaminoxidase (IMAO)


Não seletivos e irreversíveis Seletivos e irreversíveis Seletivos e reversíveis
Iproniazida Brofaromina
Tranilcipromina Clorgilina (MAO-A) Moclobemida
Fenelzina Befloxatona
Inibidores não seletivos de recaptura de monoaminas
(ADTs – antidepressivos tricíclicos)
Imipramina Amitriptilina
Clomipramina Nortriptilina
Inibidores seletivos de recaptura de serotonina (ISRS)
Fluoxetina Sertralina Fluvoxamina
Paroxetina Citalopram Escitalopram
Inibidores de recaptura de 5-HT/NE (IRSN)
Venlafaxina Duloxetina Desvenlafaxina
Inibidores de recaptura de 5-HT e antagonistas ALFA-2 (IRSA)
Nefazodona Trazodona
Estimulantes da recaptura de 5-HT (ERS)
Tianeptina
Inibidores seletivos de recaptura de noradrenalina (ISRN)
Reboxetina Viloxazina
Inibidores seletivos de recaptura de DA (ISRD)
Amineptina Bupropiona Minaprina
Antagonistas de alfa-2 adrenorreceptores
Mianserina Mirtazapina
Fonte: Elaborada pelos autores.
5-HT: serotonina; NE: noradrenalina; DA: dopamina

Síndromes do Humor 134


Os efeitos terapêuticos dos ADs em geral podem ser vistos de duas a qua-
tro semanas após o início do tratamento. Esse é um tempo médio, pois alguns
pacientes respondem antes desse prazo, e outros podem exigir mais que oito
semanas para uma resposta adequada. A farmacoterapia, em geral, obedece aos
passos: ensaio clínico com um AD de primeira escolha; aumento da dose; troca
para outra classe; potencialização ou combinação de ADs; tratamentos específi-
cos para refratariedade. Fala-se em tratamento da fase aguda os 2 a 3 primeiros
meses de farmacoterapia, no qual os objetivos visam a redução dos sintomas
depressivos (resposta) com meta à remissão dos sintomas. A seguir, com a re-
missão ou resposta de pelo menos 90% dos sintomas, entra-se no tratamento de
continuação (4 a 9 meses), no qual deve-se manter a melhora obtida evitando
recaídas dentro do mesmo episódio depressivo. Em alguns pacientes, será ne-
cessário o tratamento de manutenção, quando se trata de uma depressão recor-
rente (no qual o histórico é composto de mais de um episódio depressivo).
A superioridade de um AD em relação a outros não foi, até então, bem-esta-
belecida, sendo encontradas informações contraditórias ou divergentes até o
momento. A escolha do AD dependerá das características clínicas do episódio
depressivo e também de fatores como: resposta anterior ao uso da medicação
(tanto dos pacientes como de seus familiares), perfil de efeitos colaterais, con-
dições clínicas do paciente, sua idade, comorbidades psiquiátricas e presença
de sintomas psicóticos.
Atualmente, os antidepressivos mais utilizados são os Inibidores Seletivos de
Recaptação da Serotonina, visto que eles têm menor perfil de efeitos colaterais
em comparação aos demais, apresentam melhor tolerabilidade e maior janela
terapêutica. Eles agem potencializando a neurotransmissão serotoninérgica, ini-
bindo seletivamente, assim como seu nome diz, a receptação da serotonina. Seus
efeitos colaterais são variáveis e estão entre eles, vômito, diarreia, dor abdomi-
nal, aumento da ansiedade (principalmente nas duas primeiras semanas de uso)
alterações de sono e alterações no peso. Maiores detalhes sobre os potenciais
efeitos adversos e terapêuticos dos ADs serão vistos no capítulo Antidepressivos.
Apresentamos a seguir um quadro com especificidades de classes AD em re-
lação as condições do paciente (incluindo comorbidades):

QUADRO 2 - ANTIDEPRESSIVOS EM CONDIÇÕES ESPECÍFICAS

Presença de cardiopatia Evitar ADTs.


Contraindica maprotilina.
Presença de epilepsia
Cuidado com aumento de dose de bupropriona.

135 Depressão Maior e Depressão Persistente


Obesidade Evitar ADTs e mirtazapina.
Podem agravar-se com ISRS, favorece uso de trazodona,
Disfunções sexuais
nefazodona, mirtazapina ou bupropriona.
Preferir sertralina, citalopram ou reboxetina; caso opte por
Idosos
ADT, preferir nortriptilina.
Amitriptilina ou mirtazapina poderão ser uma escolha para
Comorbidade com insônia ou contrabalancear tais sintomas associados; por opção, as-
ansiedade grave. sociar benzodiazepínico. Evitar bupropriona pelo potencial
piora da ansiedade ou agitação.
Associação com transtorno de
pânico, com transtorno obsessi- Preferir medicações que tratam também as comorbidades:
vo-compulsivo ou com transtor- ISRS, IRSN ou clomipramina.
no de ansiedade generalizada.
Fonte: elaborada pelos autores.

REDESCOBRINDO O CASO

Arabella, 26 anos, estudante de Medicina,2 vem para o ambulatório de psiquiatria


3 acom-
4

panhada de sua irmã. A paciente referiu sensação de vazio interior e inutilidade, desânimo
intenso com dificuldade para as atividades diárias, passando a maior parte do dia deita-
da. A acompanhante refere que Arabella5 perdeu peso e estava muito chorosa nas últimas

6 seis semanas. Acrescentou que sua irmã não costumava ser assim. Atribui sintomas a uma
queda no seu 7 desempenho acadêmico, mesmo diante de seus esforços para impedir tal

redução na aprendizagem.
Não há histórico nenhum de episódio depressivo ou maníaco anterior. Paciente não
apresenta quaisquer comorbidades, não faz uso de medicações, não é etilista e não realiza
atividades físicas.

Exame mental: paciente entra na sala cabisbaixa, tem aparência emagrecida e abati-
8
da, com olheiras bem evidentes. Apresenta latência no tempo de resposta e redução da
atenção global.

1 Sexo feminino 5 Perda do apetite/peso

2 Humor deprimido 6 Tempo de evolução (> 15 dias)

3 Culpa/inutilidade 7 Possível estressor

4 Fadiga 8 Diminuição da concentração e bradipsiquismo

Síndromes do Humor 136

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